Comportamento, Biologia e Ciências Sociais

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  • 8/14/2019 Comportamento, Biologia e Cincias Sociais

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    om Cincia - SBPC/Labjor

    simplesmente se atiravam ao combate sem uma avaliao de suas possibilidades de vitria, e que eventualmenteacabavam por serem mortos, e aqueles indivduos que sempre fugiam, privilegiando assim os genes que levavam indivduos a apresentarem um comportamento estratgico e oportunista. Isto acabou por se tornar um dos pontos bdo raciocnio sociobiolgico: os animais no agem por instintos (termo, alis, ausente na maioria dos trabalhossociobiologia) imutveis, mas antes tm a possibilidade de fazer opes dentro de uma gama herdada de comportapossveis.

    A seleo natural favorece aqueles comportamentos que difundem os genes de um indivduo no apenas ao aumennmero de seus prprios descendentes, mas tambm os de seus parentes prximos, como irmos e irms, que posmuitos dos mesmos genes. isto que explica, em parte, a existncia de indivduos estreis em vrias espcies (coformigas e cupins): eles ajudam a reproduzir cpias de seus genes atravs de indivduos aparentados frteis, comorainha em uma colmia.

    A evoluo tambm permitiu o surgimento de comportamentos altrusticos dirigidos a indivduos que no partilhamesmos genes, o chamado altrusmo recproco . A seleo favoreceu aqueles comportamentos baseados na estratgolho por olho, privilegiando os genes que levam os indivduos a ajudarem no aparentados na medida, e somentmedida, em que exista uma expectativa de reciprocidade por parte do indivduo que recebe o benefcio.

    Os indivduos que sempre agiram de forma totalmente egostica, nunca retribuindo os benefcios recebidos, acabano receber mais benefcios, deixando de produzir novas cpias de seus prprios genes. Contudo, sempre que houpossibilidade oportunista de se auferir algum benefcio, sem a devida reciprocidade, esperado pela teoria sociobque surjam indivduos abertamente egostas. Caractersticas humanas como a tica, a religio ou as leis possuem, sociobiologia, uma profunda razo de ser em termos de seleo natural: elas surgiram como mecanismos de puniindivduos que procuram fugir da reciprocidade, fornecendo uma base para a vida social em uma espcie cuja prinadaptao a produo de cultura.

    A sociobiologia tornou-se o paradigma dominante nos estudos do comportamento social dos animais. Contudo, astentativas dos sociobilogos em se utilizar desses esquemas tericos para explicar comportamentos e instituieshumanas, como o cime e o adultrio, ou a monogamia e a guerra, foram claramente rechaadas pelas cincias soespecialmente por antroplogos como Marshall Sahlins e Clifford Geertz. Afinal, a sociobiologia negava alguns pque foram bsicos para a constituio das cincias sociais como rea do conhecimento.

    Dentre esses princpios est a constatao de que os homens apresentam bvias semelhanas de comportamento ninterior dos grupos sociais e diferenas marcantes entre os vrios grupos. Estas diferenas entre os grupos no podestar associadas a uma suposta diversidade biolgica (como queriam as teorias racio lgicas do sculo XIX), dadoinmeros casos conhecidos de rpida mudana social e de trocas culturais entre grupos bem distintos. Alm dissobiologia contempornea demonstrou que a maior parte da diversidade biolgica se dentre indivduos , e no entrepopulaes ou raas.

    Por outro lado, as crianas nascem, em todos os lugares, com as mesmas caractersticas e capacidades, e com asmesmas potencialidades em termos de desenvolvimento. Este o princpio conhecido comounidade psquica da

    humanidade . Ora, as crianas so semelhantes, mas os adultos diferem em um alto grau. Como uma constante (unidade biolgica) no pode explicar uma varivel (as diferenas entre os grupos), as cincias sociais tendem aconsiderar que a natureza humana no pode ser a causa da organizao mental dos humanos adultos, de seus sissociais, de suas culturas e de suas mudanas histricas. Essas caractersticas devem ser adquiridasculturalmente , pcrianas, no decorrer do desenvolvimento.

    Para muitos cientistas sociais, a nova biologia do comportamento, quando aplicada aos humanos, desconsiderava diversidade cultural, naturalizava comportamentos e instituies ocidentais e confundia processos evolucionriosnatureza cultural e histrica com a evoluo darwiniana. Como disse Clifford Geertz, a sociobiologia um progpesquisa em degenerao, fadado a se esgotar em suas prprias confuses.

    O fato que a oposio humano/animal algo profundamente inscrito no pensamento ocidental, e a viso que temosobre os animais o fator constituinte bsico da viso que temos sobre os homens. O dualismo clssico da tradiocidental (mente/corpo; humano/animal; natureza/cultura) reflete-se na diviso de trabalho das disciplinas acadmseja, cincias naturais/cincias sociais .

    Desta forma, certo dizer que os sociobilogos foram com demasiada sede ao pote, e pagaram um preo bem altoisso. A esperana dos fundadores da sociobiologia era a de que seus modelos se tornassem dominantes tambm ncincias sociais, mas a sociobiologia acabou sendo percebida como mais uma forma de darwinismo social. Os ciesociais desconsideraram a revoluo cientfica no estudo do comportamento, temendo a utilizao poltica da bioltrouxe, no passado, conseqncias terrveis para a humanidade, como a eugenia e o nazismo.

    verdade que a idia de que somos como uma folha de papel em branco, umatbula rasa , no mais se sustenta, tenem vista a constatao de que muitos comportamentos humanos possuem uma base biolgica. No obstante, tamverdade que uma efetiva incorporao desse conhecimento ao estudo do comportamento humano somente ocorrerquando este puder se articular com a noo de queo nosso ambiente a cultura , e de que isso torna o homem umaespcie necessariamente distinta das outras. O campo continua aberto para o dilogo, mas precisamos, talvez, de unova revoluo.

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    om Cincia - SBPC/Labjor

    Joo Azevedo Fernandes professor do Departamento de Histria, Universidade Federal da Paraba.

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