Complicação pós parto

5

Click here to load reader

Transcript of Complicação pós parto

Page 1: Complicação pós parto

PESQUISA 1 RESEARCH

Complicações Pós-Aborto Provocado: Fatores AssociadosFactors Associated with Complications Following Induced Abortion

Ellen Hardy1

Graciana Alves 2

HARDY, E. & ALVES, G. Factors Associated with Complications Following Induced Abortion.Cad. Saúde Públ., Rio de Janeiro, 8 (4): 454-458, oct/dec, 1992.

Illegal induced abortion exposes women to risks and complications. These decrease when theabortion is carried out safely. Complications resulting from unsafe abortions can cause death ormay effect future pregnancies, increasing ectopic pregnancy and spontaneous abortion, forexample. The purpose of this paper is to present Brazilian data on the association betweencomplications caused by illegal induced abortions and the conditions in which they areperformed. The study was done in 1990 in a Brazilian university. Data was obtained through aquestionnaire distributed to all the female employees and graduate students. Forty-two percentof the students and 27% of the employees responded; 82 students and 264 employees had had atleast one illegal abortion; 15 and 50, respectively, had suffered health problems (complications)after the last one. The women whose abortions had been done by physicians, in a clinic orhospital, and using modern techniques presented fewer complications. Younger women were notsignificantly different from the others when frequency of complications was studied. However,this group was composed mainly of students with a higher level of education and more economicresources.

Keywords: Induced Abortion; Complications; Unsafe Abortion

1 Departamento de Tocoginecologia da Faculdade deCiências Médicas da Universidade Estadual de CampinasCaixa Postal 6181, 13081-170, Campinas, SP, Brasil.2 Centro de Pesquisas e Controle das DoençasMaterno-Infantis de Campinas. Cidade Universitária"Zeferino Voz". Caixa Postal 6181, 13081-170,Campinas, SP, Brasil.

INTRODUÇÃO

O aborto provocado expõe a mulher a riscose complicações severas. Tais riscos variamconsideravelmente, de acordo com as circuns-tâncias nas quais é feito o aborto. Ao mesmotempo, as pesquisas médicas mostram que,quando realizado em boas condições, o risco decomplicações do aborto torna-se muito pequeno(Tietze & Henshaw, 1986). Do contrário, serealizado na clandestinidade, chega a represen-tar um grande perigo (Barroso & Cunha, 1980).

As complicações do aborto clandestino in-cluem perfuração do útero, retenção de res-tos de placenta, seguida de infecção, peritonite,

tétano, e septicemia. As seqüelas ginecológicasincluem a esterilidade e também inflamaçõesdas trompas e sinéquias uterinas. O risco e agravidade das complicações crescem com oavanço da gestação (Barroso & Cunha, 1980;Tietze & Henshaw, 1986).

Tietze & Henshaw (1986) afirmaram que aincidência das complicações do aborto estárelacionada com a forma como ele é realizado.Entretanto, existe pouca informação concretaque mostre esta relação, exceto a experiênciainternacional que aponta a redução das compli-cações quando o aborto é legalizado, ou oaumento das mesmas, quando torna-se ilegal.

As complicações resultantes de abortos mal-feitos podem levar à morte (Verardo, 1987),tanto quanto podem afetar as subseqüentesgestações, aumentando o risco de prematurida-de, gravidez ectópica, abortamento espontâneo,e baixo peso ao nascer (Schor, 1991). O contro-le de tais complicações constitui um problemasério, principalmente para as mulheres residen-

Page 2: Complicação pós parto

tes em comunidades pobres, com poucos servi-ços médicos disponíveis (Ladipo, 1987).

No Brasil, apesar do muito que se fala doassunto, não se encontram evidências, na litera-tura nacional, que confirmem a relação entrecomplicações do aborto ilegal e as condições desua prática. Os estudos brasileiros que fazemreferência às complicações apresentam infor-mações obtidas de mulheres hospitalizadas porabortamento provocado. Conseqüentemente,descrevem as características de mulheres comcomplicações que não podem ser comparadascom aquelas que não foram hospitalizadas. Istonos motivou a analisar, em um grupo de mulhe-res que declararam ter feito aborto, as variáveisassociadas às complicações, dentro de umapesquisa mais ampla sobre a experiência comaborto entre alunas e funcionárias de umauniversidade.

MATERIAL E MÉTODO

Este trabalho é uma análise secundária dosdados obtidos através de uma pesquisa desen-volvida em 1990 numa universidade brasileira.A população alvo dessa pesquisa esteve consti-tuída de todas as funcionárias e alunas dagraduação. As informações foram colhidasatravés de um questionário pré-testado comfuncionárias e alunas de uma das faculdades.Detalhes da metodologia deste estudo já forampublicados previamente (Hardy et al., 1991).

À medida que os questionários respondidosforam sendo devolvidos, estes eram revisados,checando-se a sua consistência. As respostasforam digitadas duas vezes, por pessoas diferen-tes, utilizando-se o módulo de entrada de dadosdo SPSS PC-DE. Procedeu-se também à cor-reção das inconsistências e dos erros lógicos.

Foram recebidos 937 questionários respondi-dos por alunas e 1987 respondidos por funcio-nárias, o que correspondeu a 42% e 27% derespostas, respectivamente. Oitenta e duasalunas e 264 funcionárias tinham feito pelomenos um aborto. Este trabalho analisa algumascaracterísticas do último aborto provocado feitopor cada uma destas 346 mulheres, das quais 65(18,8%) declararam sofrer complicações pós-a-borto. Praticamente a metade destas últimasficou internada pelo menos um dia, enquanto

27% ficaram internadas durante três dias oumais. Quase todas (88%) tomaram algumremédio, a metade teve que fazer curetagem, e14% acabaram fazendo uma cirurgia. Foi estu-dada a associação entre ocorrência de compli-cações e idade da mulher, bem como as cir-cunstâncias e características da realização doaborto. Os dados foram analisados utilizando-seo Statistical Package for Social Science — PC(SPSS-PC) e o Statistical Analysis System(SAS). Para estudar a significação estatísticadas diferenças observadas, foi utilizado o testede qui-quadrado para tabelas de contingência.Para controlar pela relação que as variáveisindependentes têm entre si, utilizou-se a técnicade regressão logística de Cox (1970). Nastabelas são apresentados somente os valores dep <0,05.

RESULTADOS

As mulheres abaixo de 20 anos, por ocasiãodo aborto, tiveram a mais alta porcentagem decomplicações, chegando a ser o dobro daquelascom 30 ou mais anos (Tabela 1). A porcenta-gem de complicações aumentou significativa-mente com o tempo de gestação por ocasiãodo aborto, sendo mais de duas vezes superiorquando realizado aos três meses ou mais, emcomparação com o primeiro mês (Tabela 2).

Com relação ao local onde foi feito o aborto,houve significativamente menos complicaçõesentre as mulheres que o fizeram num hospital,clínica ou consultório, comparadas com as que

Page 3: Complicação pós parto

abortaram na própria casa ou na casa de outrapessoa (Tabela 3).

Foi significativamente maior a porcentagemde mulheres que tiveram complicações entre asque fizeram o aborto com sonda ou agulha,comparadas às que utilizaram outros métodos:curetagem, aspiração ou remédios (Tabela 4).

Também foi estudada a freqüência de compli-cações segundo a qualificação da pessoa quefez o aborto. As complicações foram cincovezes menos freqüentes quando o aborto foifeito por médico, em comparação com os não-profissionais, e três vezes menos freqüentequando feito por enfermeiras ou parteiras(Tabela 5).

A análise por regressão logística revelou que,quando cada variável independente foi controla-da por todas as outras, apenas a realização doaborto fora do hospital ou clínica revelou-seestatisticamente associada à complicação doaborto (Tabela 6).

DISCUSSÃO

Os resultados confirmaram o esperado. Asmulheres que tiveram o aborto realizado maisprecocemente, por médico, em clínica ou hospi-tal, e praticado por métodos mais modernosapresentaram menos complicações. Ao estudara associação entre idade e problemas de saúdepós-aborto, as mulheres mais jovens não foramdiferentes das outras com relação à freqüênciadas complicações. Entretanto, este grupo esteverepresentado principalmente por alunas que,naturalmente, possuem maior nível de educação

Page 4: Complicação pós parto

e geralmente mais recursos econômicos. Aperda da associação entre complicações deaborto com idade gestacional, com quem o feze o modo como foi feito, ao se fazer a regres-são logística, deve ser o resultado da estreitaassociação entre estas variáveis independentese o local em que o aborto foi praticado. Comoesta última variável era a que apresentava maiorcorrelação com complicações, foi a que perma-neceu ao fim da regressão logística.

A população de mulheres que provocouaborto, estudada no presente trabalho, não érepresentativa das mulheres que recorrem aoaborto provocado na cidade onde foi realizadaa pesquisa, nem das mulheres brasileiras. Umdesvio evidente foi a menor representação demulheres com menos escolaridade e de baixonível sócio-econômico dentro do grupo querespondeu ao questionário.

Entretanto, é materialmente impossível teruma amostra que seja realmente representativadas mulheres que provocam aborto. Por outrolado, como a análise limita-se às condições ecircunstâncias em que foi realizado o aborto, édifícil imaginar de que forma a falta de repre-sentatividade poderia afetar os resultados obti-dos.

É corriqueiro que se fale que quanto piores ascondições em que se realiza o aborto e a técni-ca utilizada, bem como quanto menor a qualifi-cação de quem o faz, maiores as possibilidadesde complicações e piores as conseqüências paraa mulher que o sofre. É evidente que quantomenores os recursos econômicos das mulheres,piores as condições em que será feito o aborto.Conclui-se, portanto, que o aborto provocado éde risco apenas para quem não tem condiçõeseconômicas para pagar a sua realização com asmelhores condições técnicas e por pessoalespecializado.

O presente estudo proporciona dados queconfirmam esta hipótese, já que inclui tantomulheres que tiveram complicações como umgrupo sem complicações. Isto o diferencia damaior parte dos trabalhos já desenvolvidos, quese referem a estatísticas hospitalares e incluemapenas mulheres que apresentaram compli-cações.

RESUMO

HARDY, E. & ALVES, G. ComplicaçõesPós-Aborto Provocado: Fatores Associados.Cad. Saúde Públ., Rio de Janeiro, 8 (4): 454-458, out/dez, 1992.O aborto provocado expõe a mulher a riscos ecomplicações. Estes diminuem quando oaborto é feito em boas condições. Ascomplicações resultantes de abortos mal feitospodem levar à morte ou afetar as gestaçõesfuturas, aumentando, por exemplo, a gravidezectópica e o abortamento espontâneo. Oobjetivo do presente trabalho é apresentardados brasileiros sobre a relação entrecomplicações do aborto provocado e ascondições de sua prática. A pesquisa foidesenvolvida em 1990 em uma universidadebrasileira. Os dados foram obtidos através deum questionário distribuído a todas asfuncionárias e alunas da graduação.Foram respondidos 42% dos questionários dasalunas e 27% dos das funcionárias; 82 alunase 264 funcionárias tinham feito pelo menosum aborto provocado; 15 e 50,respectivamente, tiveram problemas de saúde(complicações) após o último aborto. Asmulheres que tiveram o aborto realizado pormédico, em clínica ou hospital, e praticadopor métodos mais modernos apresentarammenos complicações. As mulheres maisjovens não foram significativamente diferentesdas outras com relação à freqüência dascomplicações. Entretanto, esse grupo esteverepresentado principalmente por alunas commaior nível de educação e, geralmente, maisrecursos econômicos.Palavras-Chave: Aborto Provocado;Complicações; Aborto Ilegal

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

BARROSO, C. L. M. & CUNHA, M. C., 1980. Oque é aborto? São Paulo: Cortez.

COX, D. R., 1970. The analysis of binary data.London: Methuen & Co. Ltd.

HARDY, E.; REBELLO, L; RODRIGUES, T. &MORAES, T. M., 1991. Aborto provocado: dife-renças entre pensamento e ação. Revista Brasilei-ra de Ginecologia e Obstetrícia, 2: 111.

Page 5: Complicação pós parto

LADIPO, A., 1988. Tratamento do aborto incomple-to: prevenção e controle das complicações ime-diatas. Trabalho apresentado no ChristopherTietze International Symposium, Rio de Janeiro,29 - 30 outubro. (Mimeo.)

SCHOR, N., 1991. Morbidade e mortalidade poraborto. Trabalho apresentado no SeminárioNacional: A realidade do aborto no Brasil.Embú, São Paulo, 25 - 27 outubro. (Mimeo.)

TIETZE, C. & HENSHAW, S. K. (eds), 1986.Induced abortion — World Review, 1986. NewYork: The Alan Guttmacher Institut

VERARDO, M. T., 1987. Aborto — um direito ouum crime? São Paulo: Editora Moderna.