COMO VALORAR RESILIÊNCIA NO SETOR ELÉTRICO EM TEMPOS … · OPINIÃO COMO VALORAR RESILIÊNCIA NO...

10
COMO VALORAR RESILIÊNCIA NO SETOR ELÉTRICO EM TEMPOS DE CORONAVÍRUS? AUTORAS Adriana Gouvêa e Gláucia Fernandes abril.2020

Transcript of COMO VALORAR RESILIÊNCIA NO SETOR ELÉTRICO EM TEMPOS … · OPINIÃO COMO VALORAR RESILIÊNCIA NO...

Page 1: COMO VALORAR RESILIÊNCIA NO SETOR ELÉTRICO EM TEMPOS … · OPINIÃO COMO VALORAR RESILIÊNCIA NO SETOR ELÉTRICO ... 01/03 02/03 03/03 04/03 05/03 06/03 07/03 08/03 09/03 10/03

COMO VALORAR RESILIÊNCIA NO SETOR ELÉTRICO EM TEMPOS DE CORONAVÍRUS?

AUTORAS Adriana Gouvêa e Gláucia Fernandes abril.2020

Page 2: COMO VALORAR RESILIÊNCIA NO SETOR ELÉTRICO EM TEMPOS … · OPINIÃO COMO VALORAR RESILIÊNCIA NO SETOR ELÉTRICO ... 01/03 02/03 03/03 04/03 05/03 06/03 07/03 08/03 09/03 10/03
Page 3: COMO VALORAR RESILIÊNCIA NO SETOR ELÉTRICO EM TEMPOS … · OPINIÃO COMO VALORAR RESILIÊNCIA NO SETOR ELÉTRICO ... 01/03 02/03 03/03 04/03 05/03 06/03 07/03 08/03 09/03 10/03

DIRETOR

Carlos Otavio de Vasconcellos Quintella

ASSESSORIA ESTRATÉGICA

Fernanda Delgado

EQUIPE DE PESQUISA

Coordenação Geral Carlos Otavio de Vasconcellos Quintella

Superintendente de Relações Institucionais e Responsabilidade Social Luiz Roberto Bezerra

Superintendente de Ensino e P&D

Felipe Gonçalves

Coordenação de Pesquisa

Magda Chambriard

Pesquisadores

Acacio Barreto Neto

Adriana Ribeiro Gouvêa

Ana Costa Marques Machado

Carlos Eduardo P. dos Santos Gomes

Gláucia Fernandes

Julio Pinguelli

Magda Chambriard

Marina de Abreu Azevedo

Priscila Martins Alves Carneiro

Thiago Gomes Toledo

PRODUÇÃO Coordenação Simone C. Lecques de Magalhães

Execução

Beatriz Azevedo

Thatiane Araciro

Diagramação

Bruno Masello e Carlos Quintanilha

Page 4: COMO VALORAR RESILIÊNCIA NO SETOR ELÉTRICO EM TEMPOS … · OPINIÃO COMO VALORAR RESILIÊNCIA NO SETOR ELÉTRICO ... 01/03 02/03 03/03 04/03 05/03 06/03 07/03 08/03 09/03 10/03

4

COLUNA OPINIÃO ABRIL • 2020

OPINIÃO

COMO VALORAR RESILIÊNCIA NO SETOR ELÉTRICO EM TEMPOS DE CORONAVÍRUS?

Adriana Gouvêa e Gláucia Fernandes

Nas últimas semanas, em meio à pandemia gerada

pelo novo coronavírus (Covid-19), a economia

brasileira tem sentido os tremores de uma recessão.

O setor elétrico, em especial, é um dos setores que

vem sofrendo fortemente com a paralização de

parte da indústria e do comércio. O maior impacto

do Covid-19 no setor elétrico está associado à

redução forçada do consumo de energia elétrica no

país, principalmente dos consumidores de serviço

(comercial, pequenas indústrias e serviços públicos).

A Figura 1 mostra os principais setores que foram

impactados pelo Covid-19.

Page 5: COMO VALORAR RESILIÊNCIA NO SETOR ELÉTRICO EM TEMPOS … · OPINIÃO COMO VALORAR RESILIÊNCIA NO SETOR ELÉTRICO ... 01/03 02/03 03/03 04/03 05/03 06/03 07/03 08/03 09/03 10/03

5

COLUNA OPINIÃO ABRIL • 2020

A redução de carga desses consumidores, que utilizam

equipamentos com uso intenso de eletricidade,

não compensa a mudança do perfil do consumidor

residencial, que vem exigindo mais do uso do ar-

condicionado, televisores, computadores e outros

aparelhos eletroeletrônicos.

Diante desse cenário, as distribuidoras de energia elétrica

se tornaram o vórtice desse turbilhão de eventos, sendo

foco das discussões nos encontros do setor de energia.

Como o volume de energia previsto antes do Covid-19 está

respaldado nos contratos firmados entre distribuidoras

e geradoras de energia elétrica, a redução abrupta

do mercado colocou as distribuidoras numa situação

de elevada sobre-contratação, consequentemente,

escassez de caixa. Parte desse volume sobre-contratado

pode ser negociado no mercado de curto prazo, porém,

com o preço de mercado reduzido a 39,68 R$/MWh,

haverá perdas financeiras. Esse cenário é agravado

pelo aumento das inadimplências no mercado cativo,

podendo afetar compromissos contratuais de compra

de energia e setoriais, bem como os pagamentos dos

geradores e transmissores.

Essa crise terá um efeito direto na saúde financeira

das empresas e, possivelmente, nos financiamentos

tomados para implantação dos novos projetos, uma

vez que na maioria das vezes esses empréstimos são

lastreados nos contratos de venda de energia. Além

disso, as usinas em construção já estão sentindo as

baixas na oferta de mão de obra e dificuldades no

acesso a materiais necessários para continuidade dos

empreendimentos. Esses atrasos nas obras afetarão a

viabilidade econômico-financeira dos projetos.

Fonte: CCEE (2020).

Figura 1: Principais setores de atividade impactados pela pandemia.

Comércio Manufaturados DiversosVeículos Minerais Não-metálicosServiços Têxteis

Demais Total

18/03 20/03 22/03 24/03 26/03 28/03 30/03 01/0419/03 21/03 23/03 25/03 27/03 29/03 31/03 02/04 03/04

-9%

10%

-10%

-30%

-50%

-70%

-20%

-40%

-60%

-80%

0%

-22%-16%

-25%

-39%

-52%

-75%

Page 6: COMO VALORAR RESILIÊNCIA NO SETOR ELÉTRICO EM TEMPOS … · OPINIÃO COMO VALORAR RESILIÊNCIA NO SETOR ELÉTRICO ... 01/03 02/03 03/03 04/03 05/03 06/03 07/03 08/03 09/03 10/03

6

COLUNA OPINIÃO ABRIL • 2020

Esses efeitos da crise no setor elétrico dificultam a

previsão dos mercados para os próximos cinco anos,

realizada pelas distribuidoras que devem declarar

suas demandas. Com essas incertezas, houve a

dilatação dos investimentos no setor, bem como o

adiamento de leilões de infraestrutura e energia,

que estavam previstos para o início desse ano para

atender a carga, conforme publicado pelo Ministério

de Minas e Energia (MME) na portaria nº134/2020.

Nesse contexto, todo o cenário de disponibilidade de

energia muda para os próximos anos.

Além do mercado regulado, o mercado livre também

tem sentido os efeitos negativos da crise, conforme

apresentado na Figura 2. Note que o mercado livre

representa quase 1/3 do mercado total de eletricidade,

o que corrobora para um mercado mais aberto.

O não cumprimento de obrigações contratuais

no mercado livre poderá dar início a uma onda

de disputas contratuais entre comercializadoras,

geradoras e consumidores livres e especiais, que

deverão ser liquidadas no mercado de curto prazo.

Nesse período de confinamento, as liquidações

financeiras poderão ser maiores que as registradas

no ano de 2019, que totalizaram R$ 18,7 bilhões. Ano

passado, a inadimplência teve seu pico em janeiro,

quando mais de 7% dos valores não foram quitados.

Essas informações estão apresentadas na Figura 3.

Em fevereiro de 2020, a inadimplência registrada foi

dentro da normalidade, a liquidação financeira do

Mercado de Curto Prazo (MCP) movimentou R$ 880

milhões, dos R$ 9,20 bilhões contabilizados. Ainda

não foi registrado o impacto do cenário de incertezas

provocado pelas medidas de contenção do Covid-19,

Fonte: CCEE (2020).

Figura 2: Consumo de energia elétrica nos ambientes de contratação regulado e livre.

MW

m

10.000

-

30.000

50.000

70.000

20.000

40.000

60.000

80.000

01/0

3

07/0

3

02/0

3

08/0

309

/03

10/0

311

/03

12/0

313

/03

14/0

315

/03

16/0

317

/03

18/0

3

03/0

3

19/0

3

04/0

3

20/0

321

/03

22/0

323

/03

24/0

325

/03

26/0

327

/03

28/0

329

/03

30/0

3

05/0

3

31/0

3

06/0

3

01/0

402

/04

03/0

4

TotalACLACR

Page 7: COMO VALORAR RESILIÊNCIA NO SETOR ELÉTRICO EM TEMPOS … · OPINIÃO COMO VALORAR RESILIÊNCIA NO SETOR ELÉTRICO ... 01/03 02/03 03/03 04/03 05/03 06/03 07/03 08/03 09/03 10/03

7

COLUNA OPINIÃO ABRIL • 2020

que deverá sair nos próximos anúncios da Câmara de

Comercialização de Energia Elétrica (CCEE).

É importante ressaltar que a desaceleração abrupta

do mercado, aconteceu em meio às discussões da

modernização do setor elétrico. Essas propostas

poderão contribuir para que o setor elétrico se

recupere dessa crise de forma mais acelerada.

A aprovação do Projeto de Lei (PSL) 232/16 traz um

novo fôlego ao setor elétrico. Esse novo marco trata

da atualização do modelo de comercialização. Além

da liberalização do mercado livre, o novo modelo se

desdobra no fim dos subsídios às fontes incentivadas

e na separação entre lastro e energia. Com a

separação de lastro e energia pretende-se evitar

a contaminação cruzada dos preços formados na

elaboração do contrato de eletricidade, incentivando,

dessa maneira, sinais econômicos adequados e

monitorar o poder de mercado. A separação desses

atributos desobriga a comprovação bilateral de lastro

para todos os agentes, eliminando as penalidades por

falta de lastro, e favorece a abertura do mercado de

forma sustentável.

Sob essa expectativa, a revisão da regulação do setor

elétrico é imprescindível para todos os segmentos,

inclusive o de distribuição de energia, favorecendo

novos modelos de negócio e serviços. Nessa linha, o

Grupo de Trabalho da Modernização do Setor Elétrico

(GTMSE), instituído pela portaria do MME nº187/2019,

já encaminhou um plano de ação com quinze frentes

de atuação. Dentre as quais, algumas dependem de

estudos e análises de impacto regulatório e de risco,

Fonte: Elaboração própria a partir de dados da CCEE (2020).

Figura 3: Liquidações no mercado de curto prazo.

0

0,5

Valo

res e

m R

$ Bi

lhão

Ano

jan/19

abr/1

9jul

/19ou

t/19

fev/19

mai/19

ago/1

9

nov/1

9jan

/20

mar/19

jun/19

set/19

dez/19

fev/20

1

1,5

2

2,5

3

3,5 7%

6%

5%

4%

3%

2%

1%

0%

Valor Liquidado (R$) Inadimplência (%)

Page 8: COMO VALORAR RESILIÊNCIA NO SETOR ELÉTRICO EM TEMPOS … · OPINIÃO COMO VALORAR RESILIÊNCIA NO SETOR ELÉTRICO ... 01/03 02/03 03/03 04/03 05/03 06/03 07/03 08/03 09/03 10/03

8

COLUNA OPINIÃO ABRIL • 2020

outras precisam de severas mudanças de dispositivos

legais com prazos diluídos para se tornarem ativas.

Portanto, no pós-pandemia, vislumbram-se novos rumos

para a contratação de energia elétrica no Brasil, que

poderão redefinir vetores de crescimento, perfis de

consumo, modelos de projeção, entre outros. Nesse

sentido, a retomada do crescimento depende da saúde

financeira de todos os segmentos do setor elétrico.

É preciso resiliência dentro do setor para poder

superar e se adaptar ao novo contexto num esforço

não solitário. Ser resiliente é ser como um cacto, que

tem a capacidade de se adaptar as intempéries da

vida de forma duradoura. Por isso, para progredir

no pós-crise, é preciso agora trabalhar em sintonia,

considerando todos os elos da cadeia (distribuidoras,

geradoras, transmissoras, comercializadoras e

operadoras de geração distribuída), a fim de alcançar

soluções equilibradas e de forma ordenada.

No que tange a agência reguladora, iniciativas já foram

tomadas considerando um conjunto de medidas,

informadas na Resolução Normativa 878/2020, para

garantir a continuidade do serviço de distribuição de

energia elétrica. Ideias como a postergação do prazo de

outorga, a criação de linhas de crédito especial para lidar

com a crise de liquidez ou até mesmo a compensação

do valor reduzido da energia ao longo do tempo

remanescente dos contratos surgiram como propostas.

De certo que o estresse que o Covid-19 gerou ao

setor elétrico terão repercussões de longo prazo. No

entanto, assim como as flores dos cactos florescem

em condições específicas, alguns pontos positivos

estão sendo observados no setor elétrico durante a

pandemia. Por exemplo, a redução do consumo de

eletricidade contribuiu com o aumento do nível dos

reservatórios das usinas hidrelétricas, o que era algo

bastante preocupante antes da pandemia. Como

efeito, foi ampliado a segurança do atendimento da

carga aos consumidores brasileiros tanto no cenário

atual, quanto futuro, após a retomada das atividades

econômicas e crescimento do país. Também, houve

uma redução do acionamento de termelétricas,

evitando custos ao consumidor e emissões tóxicas ao

meio ambiente. Adicionalmente, têm-se observado

uma redução acentuada das emissões de gases do

efeito estufa, relacionado à queda na produção dos

principais setores industriais.

No momento, a melhor alternativa pode ser manter os

investimentos de fontes renováveis e estar preparado

para os novos desafios com a retomada do consumo num

setor elétrico mais dinâmico e cada vez mais integrado.

Page 9: COMO VALORAR RESILIÊNCIA NO SETOR ELÉTRICO EM TEMPOS … · OPINIÃO COMO VALORAR RESILIÊNCIA NO SETOR ELÉTRICO ... 01/03 02/03 03/03 04/03 05/03 06/03 07/03 08/03 09/03 10/03

9

COLUNA OPINIÃO ABRIL • 2020

Adriana Gouvêa é graduada em Engenharia Química pela Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ) e mestra em Planejamento Energético pela COPPE/UFRJ. Sua linha de pesquisa envolveu uma visão estratégica do setor de distribuição de energia elétrica frente aos desafios da expansão de recursos energéticos distribuídos no Brasil. Possui pós-graduação em Engenharia de Processo pela PUC-RJ e Engenharia de Processamento de Gás Natural na UFRJ. Experiência como Engenheira de Processo em projeto de engenharia básica da Petrobras nas áreas de abastecimento e E&P. Como Pesquisadora na FGV Energia, atua nas áreas do setor elétrico brasileiro e de energias renováveis.

Gláucia Fernandes é pesquisadora na FGV Energia e Coordenadora Adjunta do MBA/FGV em Gestão de Negócios para o Setor Elétrico. Economista pela Universidade Federal de Viçosa (UFV). Obteve o título de Mestre em Economia pela Universidade Federal de Juiz de Fora (UFJF) e os títulos de Doutor em Finanças e Pós-doutor em Engenharia Industrial pela PUC-Rio. Durante o doutorado, foi pesquisadora visitante na University of Texas at Austin - McCombs School of Business. Foi Pesquisadora do Núcleo de Energia e Infraestrutura - NUPEI, no Departamento de Administração da PUC-Rio. Foi Assessora do Mestrado de Matemática Profmat, com núcleo no IMPA. Dentre seus interesses destacam-se: análise de risco, análise de projetos & investimento, estrutura de capital, modelos de opções com aplicações direcionadas ao Setor Elétrico Brasileiro.

Este artigo expressa a opinião do autor, não representando necessariamente a opinião institucional da FGV.

Page 10: COMO VALORAR RESILIÊNCIA NO SETOR ELÉTRICO EM TEMPOS … · OPINIÃO COMO VALORAR RESILIÊNCIA NO SETOR ELÉTRICO ... 01/03 02/03 03/03 04/03 05/03 06/03 07/03 08/03 09/03 10/03