Common Law e Civil Law 01
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SOBRE A COMMON LAW, CIVIL LAWE O PRECEDENTE JUDICIAL1.
Srgio Gilberto PortoDoutor em Direito pela PUC-RS
Professor Titular de Direito Processual Civil da PUC-RSEx Procurador-Geral de Justia do RS
Membro do Instituto Brasileiro de Direito ProcessualAdvogado.
SUMRIO: 1. Observaes Preliminares. 1.1 Noes elementares sobre a origem eformao do sistema da common law. 1.2 A circulao de modelos entre famliasjurdicas diversas: uma realidade intensificada, em face da globalizao. 2.Compreenso e propsito do precedente vinculante na Common Law. 3. Requisitos paraa formao e aplicao do precedente vinculante. 4. Sinais do prestigiamento da idia deprecedente vinculante no Brasil. 5. Stare Decisis e Res Iudicata: 5.1 Funo formativada Coisa julgada na common Law. 5.2 Desdobramento da idia de coisa julgada nacommon law americana. 5.3 Observaes conclusivas.
1. OBSERVAES PRELIMINARES
O estudo analtico entre os sistemas jurdicos da civil law, tambm conhecido
como romano germnico, e o da common law j foi objeto de preocupao de grandes
doutrinadores comparatistas. Muitos, sem sombra de dvida, atravs de informaes
enriquecedoras, demonstraram com erudio as semelhanas e dessemelhanas entre os
modelos2.
O presente ensaio, contudo, no tem a pretenso de enfrentar a discusso a respeito
dos dois grandes sistemas. Antes, pretende instigar os leitores meditao quanto ao papel de
1Estudo em homenagem ao Professor Egas Moniz de Arago.
2 Dentre os vrios autores que pesquisaram detidamente sobre ambas as famlias jurdicas, destacam-se, p. ex.:GUSTAV RADBRUCH Lo spirito del diritto inglese -, REN DAVID - Os Grandes Sistemas do DireitoContemporneo.Direito Comparado UGO MATEI - Stare Decisis. Il valore del precedente giudiziario negli StatiUniti D'America e MAURO CAPELLETTI Il Processo civile italiano nel quadro della contraposizione civil law
common law (Appunti storico-comparativi).
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determinados institutos de direito processual que desempenham tarefa de grande importncia
numa e noutra ordem jurdica.
Assim, com brevssimas pinceladas histricas, registrar-se- a formao dacommon law, para em seguida situar o instituto do precedente vinculante neste sistema. O passo
seguinte, quase que inevitvel, em face do propsito, a comparao com o instituto
estabilizador das demandas do direito processual civil brasileiro.
Portanto, a idia bsica aqui lanada de estimular o debate acerca do singular
papel da deciso judicial em cada sistema, apontando eventuais traos comuns, realando as
diferenas e identificando influncias, tudo com o fito de apreciar criticamente a efetividade de
uma e outra proposta.
1.1 Noes elementares sobre a origem e formao do sistema dacommon law.
Considerando a obviedade de que o sistema da civil law do domnio dos
operadores nacionais, parece oportuno que se introduza to-somente a matria referente a origem
e formao da common law. Com este propsito, pode-se registrar que o direito nascido neste
sistema funda-se essencialmente na tradio, a ponto de forjar entre seus operadores um senso
histrico que lhe rendeu a adjetivao de direito costumeiro. Como ressalta GUSTAV
RADBRUCH, trata-se de um verdadeiro amor dos ingleses pela tradio 3, razo pela qual se faz
necessrio esta breve incurso histrica.
Nesta linha, cumpre destacar que no raras vezes o sistema da common law
chamado de direito ingls ou direito anglo-saxo ou, ainda, direito da Gr-Bretanha. Contudo, o
uso de tais expresses para designar o direito da common law considerado absurdo por aqueles
3 Segundo RADBRUCH: Questo senso inglese della realt anche la base Del senso inglese della storia,dellamore dellinglese per la tradizione. Antiche usanze, antiche forme di um remoto, ormai pallido passato si sonotramandate fino al iorno doggi. Linglese si affezionato a queste antiche forme, anche se egli si d laria di nonaverle in gran conto. RADBRUCH, Gustav.Lo spirito del diritto inglese. Trad. Alessandro Baratta. Milo: Giuffr,1962, p. 10.
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que se dedicaram ao estudo do tema4. Na verdade, tais expresses poderiam ser consideradas
espcies do gnero common law, uma vez que fazem parte deste sistema, assim como
demonstram peculiaridades histricas do direito nascido na comunidade britnica.
Com o propsito de elucidar as origens do sistema da common law, observaREN DAVID, autor da clssica obra Os Grandes Sistemas do Direito Contemporneo, que a
evoluo deste sistema divide-se em perodos distintos. Com efeito, inicialmente foi regido sob a
gide do direito anglo-saxnico, expresso cunhada em razo das tribos que dividiam a grande
ilha anglos, saxes e dinamarqueses. Apesar do povo ingls estar submetido a um nico
soberano, o direito era fracionado, guardando a caracterstica de direito local.
A conquista normanda, de sua parte, como segundo momento, nos idos de 1066,
data marcante para a compreenso do direito da common law, pois assinala o trmino da
sociedade tribal, dando lugar para uma sociedade feudalista com base na experincia
administrativa da Normandia. a partir da invaso normanda que se tem os primeiros registros
da expresso common law ou comune ley5. Destarte, o desenvolvimento do direito ingls deveu-
se, em grande parte, pela atuao dos Tribunais Reais de Westminster, onde o processo tinha seu
curso marcado pela forma como a demanda era conduzida. Ainda, nas palavras de REN
DAVID, a cada writcorresponde, de fato, um dado processo que determina a seqncia dos atos
a realizar, a maneira de regular certos incidentes, as possibilidades de representao das partes, as
condies de admisso das provas e as modalidades da sua administrao, e os meios de fazer
executar a deciso6.
Neste passo, importante destacar que fica consagrada a expresso remedies
precede rights. Assim, era patente a presena de um direito formalista, apegado a regras
processuais que conduziam a produo jurisprudencial da poca.
4 DAVID, REN. Os Grande Sistemas do Direito Contemporneo. Trad. Hermnio A. Carvalho. 3 ed. So Paulo:Martins Fontes, 1996, p. 284.5 REN DAVID infere que A comune ley ou common law , por oposio aos costumes locais, o direito comum atoda a Inglaterra. Este direito, em 1066, no existe. (...) A elaborao dacomune ley, direito ingls e comum a toda aInglaterra, ser obra exclusiva dos Tribunais Reais de Justia, vulgarmente designados pelo nome do lugar onde voestabelecer-se a partir do sculo XIII, Tribunais de Westminster." Op. Cit., p. 286.6 DAVID, REN, op. Cit., p. 289.
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O excesso de formalismo da poca, contudo, acabou por causar um certo
desprestgio ao direito da common law, abrindo espao para o surgimento de uma nova forma de
soluo dos conflitos. Desse modo, aps a grande expanso da common law, sentida no sculo
XIII, surge sistema rival, a equity, buscando solucionar as injustias perpetradas pela commonlaw. Criou-se, pois, uma forma de recorrer ao soberano quando a deciso dada pelos Tribunais de
Westminster no satisfizesse as partes. Este recurso deveria ser apreciado pelo confessor do Rei,
chamado Chanceler (Cousellor)7 . Todavia, os casos excepcionais que deveriam ensejar tal
recurso passaram a se tornar to comuns que possibilitaram o desenvolvimento desta jurisdio
paralela a ponto de gerar celeuma na justia britnica. Esta foi resolvida atravs de pacto selado
entre os Tribunais da common law e a jurisdio do Chanceler, fazendo coexistir as duas formas
de soluo de conflitos no direito ingls.
Por derradeiro, destaca-se o perodo moderno, marcado sobretudo pelas reformas
do sculo XIX, e, tambm, pelo triunfo das idias democrticas e influncia de JEREMY
BENTHAM. Nada obstante, a organizao judiciria sofre profundas alteraes nos anos de
1873-1875 pelos Judicature Acts que consolidaram o trmino da ciso entre os tribunais da
common law e da equity8 , cada qual podendo aplicar regras de uma ou outra jurisdio
indistintamente.
Hoje, como sabido, trata-se de sistema consolidado, gozando de largo prestgio no
mundo ocidental, presente na comunidade britnica - ressalvada a Esccia que pertence a famlia
romano-germnica - e, modo especial, com adequaes, na maioria dos Estados da Federao
americana.
1.2 A circulao de modelos entre famlias jurdicas diversas: uma realidade intensificada
em face da globalizao.
7 Chanceler, segundo REN DAVID, era o conselheiro do Rei, encarregado de guiar a conscincia do soberano (op.cit, p. 346).8 DAVID, Ren. Op. Cit., p. 298. Segundo o autor, a equity tinha nas suas solues o significado reconhecido nosculo XVI, representando a equidade. No entanto, hodiernamente, para afastar qualquer equvoco, evita-se naInglaterra o emprego da palavra equity para designar equidade; prefere-se falar dejustice, defairness ou de goodconscience.
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Apesar, mxima vnia, da existncia de poucos estudos por parte da doutrina
nacional acerca da origem e caractersticas da famlia da common law, no traduz, esta realidade,
a importncia e influncia que este sistema desempenha no mundo ocidental e, inclusive, no
direito brasileiro.Com efeito, o que a primeira vista pode parecer uma realidade completamente
distante, com um olhar mais centrado no nosso prprio ordenamento jurdico, pode-se afirmar,
com segurana, que h circulao de solues e propostas entre a famlia romano-germnica, da
qual faz parte o direito brasileiro, e a famlia da common law.
Esta afirmao encontra respaldo, p. ex., em MAURO CAPPELLETTI que em
excelente trabalho que historia as razes do processo civil italiano, faz um comparativo entre
influncias havidas na common law e na civil law pelo Direito Romano. De fato, voltando-se o
olhar para Roma possvel identificar uma intensa aproximao entre as duas famlias j naquele
momento e que so realadas pela pena talentosa de CAPPELLETTI. Refere o mestre peninsular
que: Pode acontecer que seja tambm esse um dos mltiplos sintomas daquele movimento
grandioso de unificao jurdica, ou pelo menos de aproximao dos ordenamentos jurdicos
nacionais, que foi na maior parte auspiciado9, ou previsto ou assinalado. Desse movimento, de
fato, a pesquisa histrico-comparativa que aqui conclumos ps em luz mais de uma etapa. A
prpria contraposio, delineada eficaz e autorizadamente por Pringsheim, entre os dois pares
(direito romano clssico e common law, de um lado, e direito justiniano e civil law do outro) foi,
por fora dos desenvolvimentos que a common law e a civil law tiveram no curso dos sculos
XIX e XX, atenuada fortemente. O movimento de aproximao operou, ou est operando, de
maneira convergente em ambas as partes. Se posso levar adiante a analogia (que ainda ,
obviamente, uma simplificao, que dever ser considerada com bastante cautela!), traada, entre
outros, por Pringsheim, direi que se tem, de um lado, uma mitigao das escritas romanas tardias
ou bizantinas nas codificaes dos pases da Europa continental, correspondente, de outro, a umaatenuao das prpriasescritas romanas clssicas na common law10.
9 Sobre o tema me limitarei a assinalar o recente volume da American Bar Association, Special Committee onInternational Unification of Private Law, intitulado Unification of International Private Law, Chicago, 1961 (vide aeficaz recenso de K. H. NADELMANN, inAmerican Journal of Comparative Law, 11 [1962], p. 112 ss.). Cf. ainda omeu estudo sobre asIdeologie nel diritto processuale, cit., pp. 217-219.10 No original: Pu darsi che sai anche questo uno dei molteplici sintomi di quel grandioso movimento diunificazione giuridica, o per lo meno di avvicinamento degli ordinamenti giuridici nazionali, ch stato da pi parti
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Realmente, o dilogo entre famlias jurdicas diversas de h muito inegvel e se
existe dilogo, existem influncias recprocas. Inclusive, como demonstra de forma clara
CAPPELLETTI, influncia nas origens dos sistemas.
Cumpre, outrossim, registrar que, hodiernamente, em face da globalizao a
qual para o bem ou para o mal indiscutivelmente facilitou as comunicaes - observa-se um
dilogo mais intenso entre as famlias romano-germnicas e a da common law, onde uma recebe
influncia direta da outra. Da common law para civil law, h, digamos assim, uma crescente
simpatia por algo que pode ser definido como uma verdadeira "commonlawlizao" no
comportamento dos operadores nacionais, modo especial, em face das j destacadas facilidades
de comunicao e pesquisa postas, na atualidade, a disposio da comunidade jurdica.
Realmente, a chamada "commonlawlizao" do direito nacional o que se pode perceber, com
facilidade, a partir da constatao da importncia que a jurisprudncia, ou seja, as decises
jurisdicionais vm adquirindo no sistema ptrio, particularmente atravs do crescente
prestigiamento da corrente de pensamento que destaca a funo criadora do juiz11.
auspicato o previsto o segnalato. Diquesto movimento, del resto, lindagine storico-comparativa che qui concludiamoh messo in luce pi di una tappa. La contrapposizione stessa, efficacemente ed autorevolmente individuata dalPrinsheim, fra le dua copie diritto romano classico e common law, da un lato, e diritto giustinianeo e civil lawdallaltro lato -, quella stessa contrapposizione si andata, in forza degli svolgimenti che la common law e civil lawhanno avuto nel corso del XIX e del XX secolo, fortemente attenuando. Il movimento di avvicinamento h oprato osta operando, da entrambe le parti, in maniera convergente. Se posso portare avanti lanalogia (che per anche,ovviamente, una semplificazione, da prendersi con molti grani del tradizionale sale!), tracciata fra altri dalPringsheim, direi che si h, da un lato, un attenuarsi delle impostazioni tardo-romane o bizantine delle codificazionidei paesi dellEuropa continentale, corrispondente peraltro ad un attenuarsi delle impostazioni stesse romaneclassiche della common law. CAPPELLETI, Mauro.Il Processo civile italiano nel quadro della contraposizionecivil law common law (Appunti storico-comparativi). In: Annalli della Universit di Macerata. v. XXVI, 1963,p. 115.11 V. p. ex., dentre outros CAPPELLETTI, Mauro. Giudici Legislatori ? Milano: Giuffr, 1984; ______.Riflessionisulla creativit della giurisprudenza nel tempo presente. Revista Trimestrale di Diritto e Procedura Civile, nmero 3Milano, Giuffr, Settembre 1982; CARDOZO, Benjamin N.A Natureza do Processo e a evoluo do Direito. Trad.Lda Boechat Rodrigues. 3 ed. Porto Alegre: Coleo Ajuris 9, 1978; CALAMANDREI, Piero. A Funo da
Jurisprudncia no momento atual. Trad. Isolde Favaretto. Bari: Gius. Laterza & Figli, 1955; FERNANDEZ, AlbertoVicente. Funcion Creadora del juez. Buenos Aires: Abeledo Perrot, 1980; LANERI, Fernando Fueyo.Interpretacin
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Evidncias do aumento do grau de aceitao de tal corrente de pensamento podem
ser identificadas na pesquisa acadmica sobre casos j julgados pelo Poder Judicirio para
fundamentar teses, assim como em acrdos que servem para embasar demandas e, qui, o mais
eloqente exemplo de tal influncia, constata-se na verificao do valor atribudo interpretaodivergente verificada entre tribunais na aplicao do direito, a qual, capaz, inclusive, de ensejar
Recurso Especial, consoante disposio constitucional (105, III, c, CF), muito embora, atravs
dele se busque, ainda que em sede retrica, uniformizar a interpretao e/ou aplicao da lei.
Poder-se-ia, nesta linha, ainda, citar os efeitos vinculantes das decises tomadas
na jurisdio constitucional, a qual torna patente a importncia do caso julgado em tais situaes,
bem como o trao de similitude com acommon law
, em face do valor atribudo s decises
jurisdicionais nesta sede.
Cumpre lembrar, - em face da afirmativa de que o crescente valor atribudo
jurisprudncia na civil law brasileira representa, de certa forma, a influncia da common law no
sistema nacional, em face da globalizao - que a fonte primeira do direito da common law a
jurisprudncia, eis que este sistema absolutamente pragmtico, formando-se o direito atravs
das decises jurisdicionais. H nele, pois, um compromisso prvio de prestigiamento do caso
antecedente na deciso futura - circunstncia operada atravs do distinguishing efetivado pelo
magistrado posterior. So cotejados os grupos de casos semelhantes para ao fim decidir qual
precedente mais se afeioa ao caso concreto. Assim, nos pases em que vige o sistema da
common law, acima da legislao e acima de qualquer outra fonte do direito est o caso julgado
pelas cortes e que, portanto, criam precedentes e, por decorrncia, verdadeiramente, fazem nascer
o direito com base na experincia. Nesse sentido, as decises jurisdicionais, em tais pases, como
se v, desempenham um papel que transcende o caso posto ao crivo judicial.
2. COMPREENSO E PROPSITO DO PRECEDENTE VINCULANTE NA COMMON
LAW
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Como se pode perceber, a idia de prestigiamento superlativo das decises
jurisdicionais da essncia da common law, em face do direito, nesta famlia jurdica, se formar
preferencialmente com base na experincia e no apenas na lgica abstrata antecedente ao fato.
Expresso maiscula de que o direito neste sistema tem por fonte primordial a experincia est noprestgio adquirido pelo precedente jurisdicional, a ponto deste autorizar vinculao a casos
futuros, ou seja, os efeitos da coisa julgada ultrapassam as partes e o objeto discutido em
determinada e passam a ser aplicados a um universo em que haja casos de situao jurdica
idntica ou assemelhada. H, pois, na common law, razes profundamente pragmticas e
desvinculadas de qualquer compromisso com modelos abstratos representados pela existncia de
lei em tese.
Neste sistema, a idia de vinculao do julgado precedente s demandas
semelhantes surgiu nos idos do sculo XIX, quando a Cmara dos Lordes admitiu o carter
vinculativo das suas prprias decises nos casos Beamish v. Beamish em 1861, referendado no
caso London Street Tranways v. London County Council, este ltimo tido como o mais clebre
case12. Restou decidido pelo Lord Halsbury que seria mais sensato para a sociedade que fossem
estabilizados os litgios com uma soluo por vezes, at mesmo, inadequada, do que eternizar as
incertezas e inseguranas.
Assim, foram lanadas as bases para o desenvolvimento da idia do precedente
vinculante ( rectius: stare decisis) que representa, em linhas gerais, a possibilidade jurdica de
que o juzo futuro declare-se vinculado a deciso anterior, em face da identidade de casos. De
sorte que, Standing by a decision (firmar numa deciso), representa a tarefa de decidir uma
questo de direito de modo uniforme em casos materialmente idnticos. Na proposta clssica,
encerra a idia: stare decisis et non quieta movere, ou, deixe-se a deciso firmada e no altere-se
as coisas que foram assim dispostas, ou, ainda, ficar com o que foi decidido e no mover o queest em repouso.
12 ASCENO, J. Oliveira. Fontes do Direito no sistema do Common Law. In: Revista de Direito Pblico n. 35-36, p. 12.
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A proposta , pois, de que nos pases onde se segue a tradio anglo-saxnica da
commun law, a deciso jurisdicional assuma a funo no apenas de dirimir determinada
controvrsia posta apreciao do juzo, mas, alm disto, tambm desempenhe a tarefa de
estabelecer um precedente com fora vinculante, de modo a assegurar que no futuro, em casoanlogo, venha a ser decidido da mesma forma.
A doutrina norte-americana, de sua parte, elenca uma srie de explicaes para a
utilizao da idia de precedente vinculante. Convm, pois, ressaltar os argumentos apresentados.
(a) Primeiro, em decidindo as demandas, os juzos devem dirimir questes de
direito. Na mesma jurisdio, o direito deve dar a mesma resposta para as mesmas questes
legais. Para desenvolver o direito uniformemente e atravs do sistema judicial, as Cortes devem
respeitar as resolues hierarquicamente superiores. Trata-se, pois, do prestgio ao valor
segurana jurdica. (b) Em segundo lugar, justia imparcial e previsvel significa que casos
semelhantes sero decididos da mesma forma, independentemente das partes envolvidas, numa
homenagem ao princpio da isonomia. (c) Em terceiro lugar, se na prtica fosse de outra forma,
isto , no fossem as decises judiciais previsveis, o planejamento nas demandas iniciais seria de
difcil concepo. (d) Em quarto lugar, stare decisis representa opinies razoveis, consistentes e
impessoais, a qual incrementa a credibilidade do poder judicante junto a sociedade. (e) Em
quinto lugar, alm de servir para unificar o direito, serve para estreitar a imparcialidade e
previsibilidade da justia, facilitando o planejamento dos particulares, em face do padro pr-
fixado de comportamento judicial. Em resumo, a existncia da doutrina da stare decisis acredita
implementar - modo claro - qualidade e segurana na prestao do servio justia e, por
decorrncia, melhorar o convvio social.
Dentre seus propsitos encontra-se a idia de encorajar os juzes a serem maiscuidadosos e diligentes na formao das decises precursoras, por fazer com que estes
preferencialmente confiem e construam sobre os esforos de seus antecessores; bem como, por
induzir os magistrados a aplicao do princpio do julgamento impessoal e fazer com que se
distanciem de seus prprios pr-conceitos e, tambm, para demover os litigantes de retornar ao
Judicirio na iluso de obter uma resposta diferente para o seu caso.
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As decises jurisdicionais, no sistema da commun law, portanto, vinculam o juzo
futuro. Devem ser seguidas, no por vir, pelo prprio juzo prolator e pelas cortes
hierarquicamente inferiores, em havendo reconhecimento pelo juzo posterior da identidade decasos.
Stare decisis aplica-se a todos os casos que apresentam a mesma questo legal,
sem apresentar preocupao com a idia de identidade de partes, mas sim quando revele
preocupao com a identidade de demanda, a partir do primado que causas iguais merecem
solues idnticas. O que importa, adotando-se linguagem prpria do sistema romano-germnico,
especialmente na senda brasileira de tal famlia jurdica, a identidade de suporte ftico e
pretenso. Havendo, pois, identidade de causas, h vnculo a ser seguido e respeitado, como
garantia de isonomia de tratamento jurisdicional.
A tal propsito, observa o prof. da faculdade de Direito de Nova York, EDWARD
RE: Conseqentemente, os precedentes no se devem aplicar de forma automtica. O precedente
deve ser analisado cuidadosamente para determinar se existem similaridades de fato e de direito e
para estabelecer a posio atual da Corte com relao ao caso anterior. Prossegue, dizendo que:
Logo, a fora vinculativa de um caso anterior limita-se ao princpio ou regra indispensvel
soluo das questes de fato e de direito efetivamente suscitadas e decididas. Por fim, enfatiza
que Ela (stare decisis) no se aplica a um caso onde possa ser demonstrado que o direito foi mal
compreendido ou mal aplicado ou onde a deciso anterior seja evidentemente contrria
razo13.
Registre-se, contudo, que tal propsito princpio e no garantia absoluta e
insupervel, no havendo, portanto, obedincia cega, vez que possvel deciso diversa doprecedente, uma vez verificada ausncia de razoabilidade e/ou erronia na deciso anterior.
Assim, pode-se afirmar que o precedente representa, em verdade, um ponto de
partida para a anlise e julgamento do caso concreto e no uma restrio ao poder de julgar,
13 RE, Edward. RE, Edward D. Stare Decisis. trad. Elle Gracie Northfleet.In: Revista Forense v. 327, p. 38-39.
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deixando, desse modo, bem claro a diferena entre o stare decisis e a chamada smula vinculante
que, nesta quadra da histria, preocupa a comunidade jurdica nacional. Note-se, pois, diferena
fundamental entre uma e outra situao. Na espcie stare decisis a deciso de adotar o
precedente, como j registrado, cabe ao juiz posterior, ou seja, aquele que esta no momentojulgando e no se constitui numa imposio do juzo anterior como no caso da edio de smula,
mxime quando e se de carter vinculante.
3. REQUISITOS PARA A FORMAO E APLICAO DO PRECEDENTE
VINCULANTE
O stare decisis, evidentemente, tem limites e possui requisitos para formao.
Alis, como refere EDWARD RE: O que doutrina do stare decisis e quais so
suas inerentes limitaes? preciso compreender que o caso decidido, isto , o precedente,
quase universalmente tratado como apenas um ponto de partida. Diz-se que o caso decidido
estabelece um princpio, e ele na verdade um principium, um comeo, na verdadeira acepo
etimolgica da palavra. Um princpio uma suposio que no pe obstculo a maiores
indagaes. Como ponto de partida, o juiz no sistema do common law afirma a pertinncia de um
princpio extrado do precedente considerado pertinente. Ele, depois, trata de aplic-lo moldando
e adaptando aquele princpio de forma a alcanar a realidade da deciso ao caso concreto que tem
diante de si. O processo de aplicao, quer resulte numa expanso ou numa restrio do princpio,
mais do que apenas um verniz; representa a contribuio do juiz para o desenvolvimento e
evoluo do direito14.
Oportuno, ainda que se registre que nas decises judiciais existem razes que
passam a vincular o juzo futuro e outras que apenas so utilizadas como suporte argumentativo.
Trata-se da distino daquilo que compe - na common law - o precedente e, por decorrncia,passar a vincular as decises futuras, daquilo que constou nas razes da deciso, mas que era
pertinente somente para aquele caso, naquele momento. Na primeira hiptese, se est referindo a
14 RE, Edward. Op. cit. p. 38.
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fundamentao da deciso, ratio decidendi15 ou, ainda, holding, j no segundo caso, ao obter
dictum.
Consoante lio de UGO MATTEI, a ratio decidendi a verdadeira deciso doTribunal16. Valendo-se da doutrina de WAMBAUGH, refere, ainda, que propositions of law,
legal doctrines, rationes decidendi constituem deciso no caso concreto. Tais hipteses fazem
precedente e so estudados nos bancos das universidades nos chamados study of cases. Arremata
o mestre italiano, dizendo que "a ratio decidendi uma regra geral sem a qual o caso teria sido
decidido diversamente. No a deciso do caso particular que a faz precedente, mas a razo
jurdica da deciso"17.
Para a clssica jurisprudence de Salmond, citada por UGO MATTEI, "o
precedente uma deciso judicial que contm dentro de si um princpio. O princpio inferior que
constitui um elemento de autoridade freqentemente chamado ratio decidendi. A concreta
deciso vinculante entre as partes, mas a abstrata ratio decidendi que tem fora de lei"18.
De outra sorte, tudo aquilo que integrou a deciso, mas no pode ser considerado
ratio decidendi relegado para a categoria de obiter dictum, gratis dictum ou, simplesmente,
dicta. O obiter dictum refere-se quela parte da deciso considerada dispensvel, que o julgador
15 Sobre a expresso ratio decidendi: "The ratio decidendi of a case is any rule of law wxpressly or impliedly treatedby the judge as a necessary step in reching his conclusion having regard to the line of reasoning adopted by him, ora necessary party of his direction to the jury". Rupert Cross apud Rodolfo de Camargo Mancuso. Divergncia
Jurisprudencial e Smula Vinculante. So Paulo: RT, 1999.16 No esclio de UGO MATTEI: "Il significato di quet'ultimo termine (tecnicamente sinonimo di ratio decidendi)
pu essere reso in italiano utilizzando i verbi asserire, stabilire o ritenere. L'holding di una Corte dunque quantoasserito dalla Corte medesima in un particolare caso: costituisce, in altre parole, la decisione della Corte medesima(di Qui il legame intimo cui si accenava poc'anzi fra i due ordini di contrapposizioni concettuali). Il passagio ad unesteso utilizzo dottrinario del termine holding negli Stati Uniti pu forse spiegarsi con le profonde implicazioni'formalistiche' del concerto, precisamente definito, di ratio decidendi". MATTEI, Stare decisis..., p. 202.17 Interpretao livre do seguinte excerto: "La ratio decidendi cosi: una regola generale senza la quale il casosarebbe stato deciso diversamente. Non la decisione del caso particolare che lo rende precedente ma la ragionegiuridica della decisione, la ratio decidendi, vale a dire il principio giuridico sottostante che, applicato ai fatti, hdeterminato quella particolare decisione". Idem, ibidem.18 Na ntegra: "Un precedente una decisione giudiziale che contiene dentro di s un principio. Il principiosottostante che costituisce l'elemento autoritativo sovente chiamato ratio decidendi. La concreta decisione vincolante fra le parti ma l'astratta ratio decidendi che sola h forza di legge com riguardo al resto del mondo".Idem, ibidem.
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disse por fora da retrica e que no importa em vinculao para os casos subseqentes 19.
Referem-se aos argumentos expendidos para completar o raciocnio, mas que no desempenham
papel fundamental na formao do julgado. So verdadeiros argumentos acessrios que
acompanham o principal - ratio decidendi. Neste caso, a supresso do excerto considerado obiterdictum no prejudica o comando da deciso, mantendo-a ntegra e inabalada.
Portanto, a formao do precedente leva, como dito, em conta a ratio decidendi e
no o obiter dictum, vez que aquela que consagra o princpio jurdico prestigiado na deciso
concreta.
As declaraes de direito ou do significado do direito produzido pela corte fixam
um precedente para os casos futuros somente se o juzo fizer a declarao de resolver a questo
de direito que era necessria para a deciso do caso. Com efeito, como afirma LEONARDO
LIMA, "o precedente s ter fora vinculante se houver identidade com base nos fatos ou nas
questes de direito suscitadas (binding ou leading precedents), caso contrrio servir apenas de
elemento persuasivo (persuasive precedents)"20. Somente tais declaraes so vinculantes.
Adicionais consideraes de direito constantes da opinio da corte so dicta que os casos
posteriores podero ou no seguir. A distino entre o precedente vinculante e o dictum nem
sempre se apresentam tarefa fcil de superar, particularmente em casos onde a proposio legal
anunciada pela corte, como a base para a sua deciso, mais difundida do que necessariamente
deveria ser.
19 UGO MATTEI, ainda, nos brinda com uma bela reflexo acerca da distino: "Ogni nostra riflessione critica suquesta parte della teoria classica, deve prima dar spazio alle principali critiche che le sono state mosse da giuristiautoctoni. perci per il momento sufficiente osservare ancora una volta che il giudice anglo-americano, presta la
propria opera sotto giuramento di risolvere i casi applicando il diritto. La ratio decidendi di un caso, dunque,
diviene vincolante nei casi successivi in quanto principio di diritto scoperto dalla corte ed applicato allacontroversia. L'obiter dictum, viceversa, non un principio enunciato sotto il vincolo di giuramento di scoprire edapplicare il diritto, e dunque non vincolante. Anche la contrapposizione classica fra ratio decidendi ed obterdictum, mi pare, h nella teoria dichiarativa del common law il suo fondamento teorico, e risulta assai menogiustificabile, qualora venga riconosciuto alla Corte in quanto tale il potere di creare diritto, trattare diversamenteaspetti del suo stesso operato. Soltanto la teoria dichiarativa, inoltre, appare coerente com il potere conferitosoltanto alla Corte sucessiva di estrapolare la ratio decidendi della Corte precedente, e com la correlativamancanza, sulla quale ci intratterremo fra un attimo, del potere in capo ad una corte (sempre stando alla teoriaclassica) di delimitare essa stessa, nell'ambito della propria opinion, la legal rule intende tracciare". MATTEI, op.cit., p. 206.
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A respeito dos requisitos para a formao do precedente, enfatiza LEONARDO D.
MOREIRA LIMA que (a) os precedentes no se devem aplicar de forma automtica; ao
contrrio, devem ser analisados cuidadosamente para determinar se existem similaridades de fato
e de direito e para estabelecer a posio atual da Corte com relao ao caso anterior; (b) almdisso, a doutrina do stare decisis no exige uma obedincia cega a decises passadas, permitindo
na verdade que os tribunais se beneficiem da sabedoria do passado, mas rejeitem o que seja
desarrazoado ou errneo21
Ante o exposto, emerge a pergunta: quando se est frente a um precedente? A
pergunta respondida por UGO MATTEI, que descreve o case in all fours (case in point).
Segundo o eminente doutrinador peninsular, o precedente se manifesta quando h (1) identidade
de fato; (2) quando j tenha sido adotado em Corte da mesma jurisdio; (3) quando no tenha o
precedente sido modificado ou revisto, isto , no tenha sido superado por entendimento mais
atual e (4) quando a matria jurdica se apresenta idntica22.
Por derradeiro, vale referir que a realidade americana a de que a doutrina do
stare decisis desenvolveu-se flexivelmente (contrastando com a mais restrita forma apresentada
pela doutrina Inglesa), tornando-se, assim, uma distino mais em graus do que em espcie.
Exemplo disso a overruling, que possibilita ao magistrado adotar nova orientao
jurisprudencial quando aquela no mais representar a melhor medida de justia. Tambm, pode-
se elencar o distinguishing, que significa a prtica adotada pelos Tribunais para no adotar
determinados precedentes, porquanto levada a efeito uma distino entre o alegado precedente e
o caso concreto.
20 LIMA, Leonardo D. Moreira. Stare decisis e smula vinculante: um estudo comparado. Disponvel em:http://sphere.rdc.puc-rio.br/direito/revista/online/rev14_leonardo.html#_ftnref3, acessado em 12.10.2003, s 23:3021 LIMA, Leonardo D. Moreira. Stare decisis e smula vinculante: um estudo comparado. Disponvel em:http://sphere.rdc.puc-rio.br/direito/revista/online/rev14_leonardo.html#_ftnref3, acessado em 12.10.2003, s 23:30.22 Esta a doutrina do precedent in all fours, desenvolvida COEHN-BERRING na obra How to find the law eapresentada por UGO MATTEI, na ntegra: "Questa natura di regola quotidiana per cui un precedente: (a) il pi
possibile vicino ai fatti rilevanti; (b) reso nel pi alto grado possibile all'interno della medesima giurisdizione; (c)che non sia stato n 'overruled' n 'modified'; (d) che riguardi lo stesso punto didiritto, vincolante per il fattostesso di essere stato deciso (bene o male), non pu essere assolutamente trascurata". MATTEI, Stare decisis..., p.3.
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No que diz respeito aplicao do precedente vinculante, a primeira tarefa a ser
enfrentada pelo juzo perante o qual o precedente oposto, est em estabelecer a identificao do
caso.
Esta exigncia se imps com tal fora perante o magistrado da common law
americana que este desenvolveu de forma extraordinria uma fina arte de distinguir um caso de
outro e, como decorrncia, aguou os sentidos de percepo de semelhanas e dessemelhanas
entre casos aparentemente idnticos.
Isto, tambm, de alguma forma diz presente no sistema brasileiro, vez que tal
exigncia no estranha ordem jurdica indgena. Realmente, em sede de recurso de natureza
extraordinria, p. ex., tem-se obrigado o juiz brasileiro - igualmente ao americano - a voltar seus
olhos para as semelhanas e divergncias entre causas. Com efeito, um dos fundamentos para
admissibilidade do chamado Recurso Especial, que tem natureza extraordinria, est na
divergncia jurisprudencial (105, III, c, CF). Assim, tem exigido o STJ que para a
admissibilidade de tal recurso demonstre o recorrente a chamada interpretao divergente, ou
seja, a circunstncia de que estaria a lei sendo aplicada de forma diversa para casos idnticos.
Dentre as exigncias de admissibilidade se impe ao recorrente demonstrao da
divergncia pela via de exame analtico entre o paradigma e o caso paragonado, ou seja, a
imposio de que se proceda a identificao de suporte ftico e aplicao de lei de forma
divergente por tribunais diversos, circunstncia que exige um pronunciamento superior aos
efeitos de uniformizar a aplicao da lei. Contudo, como sabido, sem eficcia vinculante a
qualquer juzo, porm exigida a perfeita identificao de semelhanas e dessemelhanas, aos
efeitos de admissibilidade do recurso pelo fundamento da divergncia jurisprudencial.
Assim, tanto aqui, como l, est posta a questo da identificao de demandas. L,
porm, com intensidade tal que reclama uma superlativa ateno do magistrado, na medida em
que se outorga fora vinculante a certos precedentes e, por decorrncia, faz nascer a idia, at
mesmo, de deciso facilmente previsvel ao litgio, eis que, em razo do comportamento do
Judicirio, pode-se, com grau elevado de certeza, a partir da identificao das demandas, prever
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a soluo da causa, da a importncia da perfeita identificao de demandas que no sistema da
common law vai para alm das hipteses de coisa julgada e litispendncia presentes no sistema
brasileiro, contempladas aqui a partir de idias MATEO PESCATORE, corifeu da
individualizao das aes no sistema romano-germnico, mais especificamente o italiano erecepcionado pelo sistema brasileiro.
Como se v, pois, h uma intensa atividade de joeiramento desenvolvida pelo
magistrado da common law americana, aos efeitos de assegurar que efetivamente existe
identidade de casos e, por decorrncia, salvo erro na origem, o posterior merecedor de
tratamento idntico ao anterior. Assim, pode-se afirmar que dentre os requisitos para
reconhecimento do precedente aparece com intensidade superlativa a atividade de identificao
de demandas, pela via da anlise do suporte ftico e do direito.
4. SINAIS DO PRESTIGIAMENTO DA IDIA DE PRECEDENTE VINCULANTE NO
BRASIL
Como visto, modo genrico, a grande distino entre os sistemas da common law e
da cvel law est na fonte do direito. Enquanto para o nosso sistema romano-germnico a lei
fonte primeira, para o direito da common law, a jurisprudncia situa-se no mais alto nvel das
fontes jurdicas. Dessa forma, quando se afirma que ocorre uma commonlawlizao do direito
nacional, se quer dizer que h uma tendncia a valorizar a jurisprudncia criativa como fonte de
direito.
Nesta linha, cumpre registrar que efetivamente vem ocorrendo um saudvel
prestigiamento das decises judiciais no Brasil. Veja-se, nesse sentido, os chamados efeitosvinculantes ou efeitos erga omnes, outorgado a certas decises.
Com efeito, nesta senda, so exemplos de vinculao judicial no Brasil, as
decises tomadas em litgios que versem sobre direitos coletivos latu sensu, com forte inspirao
nas class actions norte americanas. Segundo dispe o Cdigo de Proteo e Defesa do
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Consumidor, em seu artigo 103 e incisos, a coisa julgada ser erga omnes quando posto em causa
interesses difusos: ultra partes quando versar sobre interesses coletivos strictu sensu e erga
omnes/secundum eventus litis quando julgar demandas que veiculem interesses individuais
homogneos. Em todos os casos, nota-se uma preocupao em fazer com que as decisestomadas num litgio, transborde seus efeitos para indivduos que no fizeram parte do processo,
mas que, de uma forma ou de outra, possuem vnculo com o litgio e, portanto, merecem
tratamento paritrio pelo Judicirio. Aqui, pois, a mesma concepo inspiradora do stare decisis.
Poder-se-ia, ainda, citar o exemplo da jurisdio constitucional, quando decises
tomadas pelas cortes superiores, firmando posicionamento a respeito da inconstitucionalidade de
atos normativos em abstrato, vinculam as demais instncias naquela questo especfica de
direito23.
23 A propsito do tema jurisdio constitucional vale esclarecer a matria referente a coisa julgada. Assim, em sedeconstitucional o exame do instituto da coisa julgada, pode-se dizer, que merece especial realce, em face de suaparticular situao, entendendo-se esta como a atuao do Poder Judicirio na aplicao e interpretao daConstituio ou na palavra abalizada de PAOLO BISCARETTI DI RUFFIA (Direito Constitucional..., p. 440) as
funes jurisdicionais exercidas para tutelar direitos e interesses atinentes matria constitucional. Realmente, ajurisdio constitucional que, modo genrico, envolve o controle da adequao de atos normativos e textos legais, emnvel federal, Carta da Repblica e em nvel estadual s Cartas Estaduais respectivas, exercido basicamente detrs formas distintas, ou seja, atravs dos chamados controle difuso e concreto e pelo iterdo controle positivo de
constitucionalidade, operado este ltimo pela via da Ao Declaratria, tambm, abreviadamente, denominada deADC. Com efeito, o controle da constitucionalidade efetivado atravs de Ao Declaratria deInconstitucionalidade (ADIn), atravs de incidente de incostitucionalidade suscitado no curso de uma demanda ouainda atravs de Ao Declaratria de Constitucionalidade (ADC), Mandado de Injuno, Argio deDescumprimento de Preceito Fundamental e Intervenes. A inconstitucionalidade pode configurar-se por ao oupor omisso e tanto numa como noutra das hipteses a deciso adquirir determinada autoridade e certa eficcia.Afora tais circunstncias, cumpre ressaltar, ainda, que o vcio pode configurar-se na elaborao da lei, por violaodo devido processo legislativo ou no prprio contedo da norma. A presente nota, pois, tem por escopo primordialdemonstrar de que maneira projeta-se a autoridade da deciso que reconhece a inconstitucionalidade, por ao ouomisso, ou ainda a constitucionalidade da lei ou ato, levando em linha de conta a via pela qual estas possam serdeduzidas e reconhecidas. Assim, apenas para dimensionar as dificuldades existentes para perfeita compreenso doproblema, oportuno destacar observao de GILMAR FERREIRA MENDES (Jurisdio Constitucional..., p. 282),em torno de um dos ngulos da questo. Diz o eminente jurista:Independentemente de se considerar a eficcia 'ergaomnes' como simples coisa julgada com eficcia geral ou de se entender que se cuida de instituto especial que afastaa incidncia da coisa julgada nesses processos especiais, certo que se cuida de um instituto processual especficodo controle abstrato de normas e, portanto, que, declarada a constitucionalidade de uma norma pelo SupremoTribunal, ficam tambm os rgos do Poder Judicirio obrigados a seguir a orientao fixada pelo prprioguardio da Constituio.Declarao de inconstitucionalidade. Controle incidental e difuso. Como brevementedestacado nas consideraes preliminares desta nota, h mais de uma forma de exerccio do controle deconstitucionalidade. Aqui ser tratado do controle difuso e da autoridade que adquire a deciso proferida nesta sede.Assim, prefacialmente, parece adequado destacar que o chamado controle difuso aquele exercido em qualquer graude jurisdio e por qualquer rgo do Poder Judicirio. Compete, portanto, a todo e qualquer juiz, em qualquer nvelde jurisdio, eis que passvel de incidncia nos casos concretos submetidos apreciao do Poder Judicirio. Paraque tal ocorra, basta que seja levantada a questo do conflito entre o direito que fundamenta a pretenso deduzida e aConstituio, aos efeitos de que o juzo, reconhea, incidentemente, incidenter tantum, naquele caso e nos estreitos
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limites daquele caso, se h ou no situao de inconstitucionalidade ou, dito de outro modo, se o juzo nega ou no,no caso concreto, a aplicao de lei considerada inconstitucional. Por ser possvel sua ocorrncia e acolhimento emqualquer grau de jurisdio como questo prejudicial, entende-se o mesmo como difuso, desconcentrado, eis queverdadeiramente disperso e passvel de soluo por qualquer juiz que venha do incidente conhecer e no por um
nico tribunal como no controle abstrato que concentrado. Sobre a autoridade da deciso proferida em controleincidente observa, corretamente, TEORI ALBINO ZAVASCKI. Tem-se, portanto, no Brasil, que as decisesjudiciais, tomadas em casos concretos, sobre questes constitucionais, inclusive as que dizem respeito legitimidadedos preceitos normativos, limitam sua fora vinculante s partes envolvidas no litgio. A rigor, no fazem sequercoisa julgada entre os litigantes, pois a apreciao da questo constitucional serve apenas como fundamento para o
juzo de procedncia ou improcedncia do pedido deduzido na demanda. E a coisa julgada, sabe-se, no se estendeaos fundamentos da deciso (CPC, art. 469)(Eficcia das sentenas..., p. 30). Efetivamente, bem examinada amatria conclui-se que a inconstitucionalidade de determinado preceito, quando apreciada incidentemente em certademanda, tem por escopo ensejar as razes de acolhimento ou de rejeio da pretenso deduzida com base no ato ouna lei que apresenta ou no mcula de constitucionalidade. No tem, pois, como visto, a demanda por escopoprincipal o reconhecimento do vcio de constitucionalidade e sim apenas apresenta-se este como fundamento dadeciso ou, dito de outro modo, a inconstitucionalidade no o objeto da causa, , em verdade, apenas a fundamentoda deciso. Desta forma, rejeio da demanda pelo acolhimento da alegao de vcio no importa automaticamente
em declarao de inconstitucionalidade, mas to-somente no reconhecimento da inconstitucionalidade como razo dedecidir para aquela causa. Desta forma, consoante destaca com propriedade a lio retro, os fundamentos da deciso,por representarem apenas argumentos de acolhimento ou rejeio, verdadeiras razes de decidir, so incapazes deadquirir o status de coisa julgada, frente o que dispe o artigo 469, III, CPC. Assim, no controle incidente no hque se falar na existncia de coisa julgada material em torno de inconstitucionalidade, em concreto, reconhecida. H,apenas, eficcia inter partes (472, CPC). Sem embargo, contudo, dos mecanismos que outorgam deciso eficciaanexa ou reflexa, quando a matria vem de ser apreciada pela Corte Suprema. Este , todavia, outro fenmeno queno se identifica com o instituto da coisa julgada, mas sim tem por fito dar a necessria eficcia expansiva decisoque reconheceu vcio de constitucionalidade na lei ou no ato invocado como suporte da pretenso, uma vez que aCorte Constitucional competente reconheceu a mcula. A eficcia anexa e reflexa das decises no se constituiem situao privativa da jurisdio constitucional ou das decises do Supremo Tribunal Federal, haja vista que aprocessualstica de muito identifica este fenmeno, ou seja, a capacidade da sentena atingir relaes jurdicasconexas a relao acertada pela deciso e os efeitos legais embutidos numa sentena independente de disposiojurisdicional. O primeiro identifica-se como eficcia reflexa e o segundo como eficcia anexa. Assim, por exemplo, a
relao jurdica de sublocao ser inexoravelmente - por via reflexa - atingida pela deciso que extinguiu a relaojurdica de locao, bem como, em determinada hipteses disciplinadas pela lei, ser constituda a hipoteca legal debens em verdadeira conseqncia anexa a determinada situao jurdica. Controle abstrato e concentrado. Ocontrole concentrado e abstrato, contrariamente ao controle difuso que trabalha em cima de uma hiptesedeterminada, opera com a lei ou o ato normativo sem a incidncia de determinado suporte ftico. Quer isto dizer quese trata do exame, em tese, frente a ordem jurdica constitucional, se aquela lei ou aquele ato apresenta vcio deconstitucionalidade. Diz-se, pois, que o controle abstrato por que tem por causa de pedir no um fato ou umconjunto de fatos como exige a jurisdio ordinria (282,III, CPC), mas est em causa uma lei ou um ato frente aordem jurdica constitucional, sem que esteja a reger uma certa situao concreta. H, pois, uma verdadeira causa depedir aberta. Afirma-se, outrossim, que concentrado exatamente por que compete apenas a Suprema Corte - no quediz respeito a matria federal - e aos Tribunais de Justia - no que diz respeito a matria estadual e municipal - ocontrole de constitucionalidade, no cabendo, assim, a nenhum outro rgo do Poder Judicirio deliberar em torno dotema. A via adequada para suscitar o vcio constitucional de uma lei ou ato normativo a chamada Ao Direta de
Inconstitucionalidade (ADIn) e os legitimados encontram-se arrolados no artigo 103, da Constituio Federal. Aqui,contrariamente a hiptese de controle difuso, a inconstitucionalidade o objeto principal da causa, o prprio pedidoda demanda, portanto h declarao expressa em torno da constitucionalidade e, por decorrncia, coisa julgadamaterial. Assim, a deciso de mrito proferida na Ao Declaratria de Inconstitucionalidade adquire autoridade decoisa julgada material, e, dir-se-, at mesmo, na linguagem contempornea, que adquire autoridade de coisasoberanamente julgada, vez que nem mesmo est sujeita a ao rescisria. Realmente, observa TEORI ALBINOZAVASKI que "as sentenas de mrito proferidas em aes de controle abstrato de constitucionalidade das normas
fazem coisa julgada formal e material, isto , tornam-se imutveis e indiscutveis, no s no prprio processo, comoem qualquer outro. Mais: no esto sujeitas nem mesmo a ao rescisria. o que prev o art. 26 da Lei n9.868,de 10.11.1999. 'A deciso que declara a constitucionalidade ou inconstitucionalidade da lei ou do ato normativo emao direta ou em ao declaratria irrecorrvel, ressalvada a interposio de embargos declaratrios, no
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podendo, igualmente, ser objeto de ao rescisria (Eficcia das sentenas..., p. 102). No bastasse talcircunstncia, releva destacar ainda que a deciso proferida em sede de ADIn, alm de adquirir autoridade de coisajulgada material, possui eficcia erga omnes, em face da natureza - constitucional em tese - do direito posto emcausa. Inconstitucionalidade por omisso. O vcio de constitucionalidade pode configurar-se tambm por omisso.
Esta hiptese no poderia passar desapercebida, pena do sistema de controle de constitucionalidade resultarcomprometido frente a pretendida eficcia da Constituio. Assim, criou-se o controle da constitucionalidade poromisso que tem por escopo impedir que a inao do poder competente provoque ablao nas garantias oferecidaspela Constituio da Repblica ao cidado. Constitui-se, pois, numa espcie de ataque ausncia de normaregulamentadora por inrcia do poder competente para expedir o ato cuja existncia reclamada. Duas so asmedidas disponveis para ataque a omisso que gera vcio de constitucionalidade. A ao de inconstitucionalidadepor omisso (103, 2, CF) e o mandado de injuno (5, LXXI, CF). So institutos que no se confundem, vez quepossuem diferenas marcantes. Com efeito, lembra UADI LAMMGO BULOS que na ao por omisso a matria versada to-somente em abstrato, na injuno, em concreto. Por isso os efeitos da sentena da primeira d-se 'ergaomnes', enquanto na segunda os efeitos da sentena opera-se 'inter partes', a competncia para processar e julgar aomisso privativa do Supremo Tribunal Federal, ao passo que a injuno poder ser processada e julgada noapenas pela Corte Suprema, mas tambm pelo Superior Tribunal de Justia e pelos Tribunais dos Estados; alegitimidade para a propositura da omisso abarca, apenas, os sujeitos enumerados no art. 103; a legitimidade
para a propositura do mandado de injuno pertence a qualquer pessoa, indivduo, grupos, partidos, sindicatos,associaes etc; a legitimidade passiva na omisso recai sobre o sujeito inibidor do exerccio do direito; o objeto daomisso cinge-se garantia da Constituio, impedida de ser aplicada por falta de providncia legislativa; o objetoda injuno a satisfao do direito ou liberdade obstaculizada pela inrcia do legislador; a omisso visa garantira efetividade das normas constitucionais de eficcia limitada; a injuno visa defender o exerccio do direito,liberdade ou prerrogativa de ndole constitucional (Constituio Federal Anotada..., p. 315). Consoante se v,existem diferenas marcantes entre os institutos, muito embora a finalidade de ambos atacar a omisso existente.No que diz respeito a autoridade da coisa julgada e efeitos da deciso, tudo que foi dito ADIn aplica-se a AoDeclaratria de Inconstitucionalidade por omisso, eis que tambm esta se constitui numa espcie do gnero ADIn,inclusive na caracterstica de gerar eficcia erga omnes. J no que se refere ao Mandado de Injuno, a decisoproferida neste tambm adquire autoridade de coisa julgada material, porm no possui eficcia erga omnes, hajavista que decidida a inconstitucionalidade - no em tese - mas em cima de um determinado caso concreto, limitando,pois, sua, autoridade entre as partes que integraram a causa. Declarao de constitucionalidade. A AoDeclaratria de Constitucionalidade, de sua parte, no que diz respeito ao instituto da coisa julgada possui regimejurdico idntico ao da declaratria de inconstitucionalidade, ou seja, por ser a higidez constitucional da lei ou do atoo objeto principal da demanda, a sentena de mrito que acolhe a declarao de constitucionalidade, na dico do 2, do artigo 102, da Constituio Federal, produz eficcia contra todos e efeito vinculante, relativamente aos demaisrgo do Poder Judicirio e do Poder Executivo e, mais do que isto, adquire autoridade de coisa julgada material(Nery e Nery. Comentrios..., p. 1396), pois contm declarao, reconhecendo o novo estado jurdico de certeza deconstitucionalidade, frente aquela Carta, ou na palavra abalizada de CELSO RIBEIRO BASTOS o que se pretendecom a propositura da ao declaratria de constitucionalidade dar soluo ao estado de incerteza que paira sobrea legitimidade de uma lei ou ato normativo federal. Portanto, consoante observa MOREIRA ALVES, comobjetividade e preciso, o objeto da tutela constitucional a certeza e a segurana jurdica (Comentrios Constituio..., v. IV, t. III, p. 150). A adequao da coisa julgada jurisdio constitucional.A adequao da coisa
julgada jurisdio constitucional. Em arremate conclusivo da presente nota, cumpre registrar que o instituto dacoisa julgada, tambm na jurisdio constitucional no unvoco, como j demonstrado anteriormente, eis que aqui,em tcnica avanada de controle de constitucionalidade ou num verdadeiro controle constitucional high-tech, a
projeo que se outorga autoridade do instituto de que este sofrer a necessria adequao, em face da naturezado direito posto em causa, ou seja, adquire autoridade de coisa julgada material, com eficcia erga omnes, apenasquando objeto principal da causa (ADIn, ADC e ADIn por omisso), onde no submetida ao conhecimento doPoder Judicirio uma situao concreta, mas a constitucionalidade - em tese - de uma lei ou ato que compe a ordemjurdica. J na via incidente (controle difuso), no h que se falar em coisa julgada, na medida em que ainconstitucionalidade apenas fundamento de deciso. o vcio, pois, nesta sede, causa de pedir e no pedido. NoMandado de Injuno, de sua parte, h coisa julgada material, porm no com eficcia erga omnes, vez que posto apreciao do Poder Judicirio uma situao concreta, portanto, com partes definidas e identificadas. Assim, nestesestreitos limites adquirir a deciso autoridade, tal qual quando posto em causa direito individual, onde os limitessubjetivos da coisa julgada estendem-se apenas as partes entre as quais a deciso foi proferida. Em resumo, se postaem causa a constitucionalidade de lei ou ato, em tese, a deciso faz coisa julgada material e adquire eficciaerga
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Outro eloqente exemplo hodierno da recepo da idia de precedente vinculante
(stare decisis) no Brasil a tramitao no Congresso Nacional da Proposta de Emenda
Constituio (PEC n 29/2000)24, que, dentre algumas modificaes no texto da Constituio,
pretende inserir a chamada smula de efeito vinculante no ordenamento jurdico nacional.
Quer, pois, o projeto, fazer com que as decises sumuladas, vale dizer, questes de
direito que tenham sido julgadas diversas vezes da mesma forma, sejam obedecidas pelas
jurisdies inferiores, vinculando os magistrados aos precedentes jurisprudenciais superiores.
Este movimento representa, ainda que de maneira criticvel, uma verdadeira pitada de
commonlawlizao no direito nacional, pois institui algo similar ao propsito do stare decisis.
Contudo, se h, de um lado, o saudvel desejo de prestigiamento das decises judiciais dos
tribunais superiores, aos efeitos de oferecer segurana jurdica ao cidado que passa a desfrutar
de um Judicirio mais previsvel, h tambm, de outro, a grave preocupao, nos termos em que
est posto o projeto, de limitar a capacidade criativa do juzo sujeito vinculao, circunstncia,
hoje, intolervel, eis que aquela se constitui tambm na concepo mais moderna do sistema
romano-germnico brasileiro em legtima fonte de direito. Qui, o temperamento necessrio
esteja, na exata frmula stare decisis da common law, ou seja, o juzo superior disciplina a
matria, mas ao juzo da causa caber estabelecer a identificao entre esta (a causa) e aquela (a
smula) aos efeitos de reconhecer ou no a incidncia de efeito vinculante, pela via do exame
analtico entre os casos, praticando exatamente a atividade de joeiramento presente no
distinguish.
omnes; se posta em causa a constitucionalidade de lei ou ato, em concreto, a deciso faz coisa julgada material interpartes e, finalmente, se posta em causa inconstitucionalidade em concreto, pela via incidente, no h que se falar decoisa julgada material, eis que o vcio apenas fundamento e no objeto da deciso.24 Art. 103-A. O Supremo Tribunal Federal e os Tribunais Superiores podero, de ofcio ou por provocao,
mediante deciso de dois teros dos seus membros, aps reiteradas decises sobre a matria, aprovar smula que, apartir de sua publicao na imprensa oficial, ter efeito vinculante em relao aos demais rgos do Poder Judicirio,sujeitos sua jurisdio e administrao pblica direta e indireta, nas esferas federal, estadual e municipal, bemcomo proceder sua reviso ou cancelamento, na forma estabelecida em lei. 1. A smula ter por objetivo avalidade, a interpretao e a eficcia de normas determinadas, acerca das quais haja controvrsia atual entre rgosjudicirios ou entre esses e a administrao pblica que acarrete grave insegurana jurdica e relevante multiplicaode processos sobre questo idntica. 2. Sem prejuzo do que vier a ser estabelecido em lei, a aprovao, reviso oucancelamento de smula poder ser provocada por aqueles que podem propor a ao direta de inconstitucionalidade. 3. Do ato administrativo ou deciso judicial que contrariar a smula aplicvel ou que indevidamente a aplicar,caber reclamao ao Tribunal que a houver editado, o qual julgando-a procedente, anular o ato administrativo ou
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Contudo, para efeitos e propsitos do presente ensaio parece inegvel a
identificao de um movimento claro de reconhecimento da necessidade de atribuir-se, nesta
quadra da histria, ao menos a certas decises judiciais, um prestgio superlativo e, nesta medida,
passa a existir clara identificao com o propsito da doutrina do stare decisis, cujo seu assentoprincipal est - exatamente - no necessrio prestigiamento das decises judiciais. Isto decorre de
vrios fatores e dentre esses, mxima vnia, inclui-se a facilidade de acessos a outras culturas, via
globalizao, ou seja, a facilidade de comunicao facilitou o dilogo entre famlias jurdicas
distintas e, por decorrncia, intensificou aquilo que denominamos commonlawlizao do direito
nacional, pois conseqncia das experincias colhidas junto a common law.
5. STARE DECISIS ERES IUDICATA.
5.1 Funo formativa da coisa julgada nacommon law.
Stare decisis e res iudicata em momento algum podem ser confundidos, eis que
institutos diversos, sendo, em realidade, esta base para formao daquele. Assim, oportuno que
sejam dedicadas algumas linhas dessemelhana entre os institutos jurdicos.
Nesta senda, cumpre esclarecer que coisa julgada nos pases que adotam a
orientao da common law assume funes de maior projeo do que aquelas que desempenha
nos pases de tradio romano-germnica. Na common law, o caso julgado, ao ser reconhecido
como precedente, tem o efeito de tambm vincular s prximas decises, isto , a deciso
tomada no caso concreto alm de fazer lei entre as partes, tem o condo de vincular as solues
dos conflitos subseqentes, uma vez presente a identidade jurdica entre estes. J, no sistema
romano-germnico, como sabido, as decises judiciais tm apenas a funo de fazer lei entre aspartes envolvidas no interferindo na soluo de outras demandas, com partes diversas25.
cassar a deciso judicial reclamada e determinar que outra seja proferida com ou sem a aplicao da smula,conforme o caso.25 Idia bsica que leva por suporte os chamados conflitos individuais, na medida em que nos conflitos coletivos acoisa julgada poder adquirir projeo ultra partes e erga omnes, a sim se aproximando dos propsitos presentes nacommon law, vez que regula a situao jurdica de pessoas que no integraram relao jurdica processual. A verdade que quando coisa julgada no direito nacional se outorga eficcia erga omnes e ultra partes, pode ser identificada
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Os limites diversos de projeo de uma e outra, basicamente, residem no papel
basilar que desempenham num e noutro sistema. Na common law, como sabido, a jurisprudncia
fonte primeira do direito26, enquanto que na civil law famlia romano-germnica ajurisprudncia encontra-se - modo ortodoxo - abaixo da lei, esta sim fonte principal de direito.
A Coisa julgada, portanto, nos pases da common law representa, sob uma
perspectiva mais ampla, os efeitos de uma deciso judicial sobre todos os litgios subseqentes 27,
no apenas como referncia, mas com fora de fonte do direito apta a regular o novo caso
concreto.
O instituto da coisa julgada, segundo CASAD E CLERMONT, desempenha um
papel essencial para a operao judicial. Na lio dos referidos professores, se um litigante
pode simplesmente reabrir seus litgios j decididos, no existiria fim para estes, nem nenhum
comeo de autoridade. No apenas uma eficiente medida, sim uma condio para a existncia
do judicirio28.
Nesta linha, pode ser identificada como principal dessemelhana entre os institutos
do stare decisis e a coisa julgada da civil law, a circunstncia de que quele possui fora
superlativa no sistema da common law, gerando um precedente apto a sustentar a formao do
direito para casos futuros, uma vez presente a identidade de situao jurdica, ao passo que a
coisa julgada da famlia romano-germnica limita-se a estabilizar a lide entre as partes litigantes,
gerando apenas uma referncia comportamental para futuros casos.
uma similitude de propsitos entre ambos, qual seja: a idia de paridade de tratamento queles que desfrutam damesma situao jurdica26 A respeito do tema, o esclio de CASAD e CLERMONT: Res judicata is a classic common law doctrine. First,responding to felt needs, every legal system has produced a body of res judicata law. The doctrine of res judicata is aprinciple of universal jurisprudence forming part of the legal systems of all civilized nations.27 CASAD, Robert C. e CLERMONT, Kevin M.Res Judicata. A handbook on its theory, doctrine, and pratice.Durham: Caroline Academic Press, 2001, p. 3. Os autores, no mesmo sentido, afirmam queAt a mundane level, res
judicata specifies the effect that any adjudication has on all subsequent litigation.28 CASAD e CLERMONT. Op. Cit., p. 4. Esta a traduo livre da seguinte passagem da obra citada: If disputantscould just reopen their adjudicated disputes, there would be no end to litigation, nor any beginning of authority.Finality is not just an efficient policy, it is a necessary condition for the existence of a judiciary.
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5.2 Desdobramentos da idia de coisa julgada nacommon law americana.
Na tentativa de sistematizar o estudo da coisa julgada, a doutrina norte-americana
tem produzido significativos trabalhos. O Instituto de Direito Americano American LawInstitute adotou, para facilitar a compreenso do tema, uma nova terminologia que divide o
termo res iudicata em duas dimenses: claim preclusion e issue preclusion29. Na primeira,
aborda-se o problema relativo rediscusso de uma demanda j julgada, de modo que toda a
segunda ao invivel. J issue preclusion refere-se rediscusso de assuntos especficos e no
propriamente de trazer novamente a demanda j decidida por completo. Neste caso, portanto, a
precluso cinge-se a assunto individualmente considerado.
A premissa da incidncia res iudicata na common law sinaliza, tal qual a idia
universal do tema, que a parte, em regra, no pode trazer novamente a demanda que j foi
decidida por um julgamento final e vlido30. O julgamento extingue a demanda por completo,
fazendo precluir todas as questes pertinentes ao caso que foram ou poderiam ter sido trazidas ao
conhecimento do Judicirio atravs da petio inicial31. Estas premissas dizem respeito doutrina
da claim preclusion32.
CASAD e CLERMONT dividem claim preclusion em merge e bar. Para os
professores, merge ocorre se o julgamento na demanda foi em favor do autor. O demandante no
pode trazer uma segunda ao na esperana de ganhar um julgamento ainda mais favorvel.
Todavia, o autor pode buscar reforar o que j havia sido concedido, por via recursal. De outro
lado, o ru no pode acrescentar defesas que foram ou que podiam ter sido argidas no momento
oportuno, uma vez que se no apresentadas esto preclusas.
29 A nova tese defendida peloAmerican Law Institute vem ganhando adeptos, como ALLAN VESTAL e atualmenteat a Suprema Corte dos Estados Unidos (Baker v. General Motors Corp., 522 U.S. 222, 233 & n.5 (1998).30 Considera-se julgamento vlido aquele que deve possuir qualidade suficiente para resistir ao ataque na forma deuma demanda. Um julgamento somente ser considerado vlido se satisfizer os requisitos de competncia em razoda pessoa e do lugar. Por julgamento final entende-se aquele que deu a ltima palavra em matria de fato e/ou dedireito (CASAD e CLERMONT, op. cit., p. 49 e50).31 Aqui nota-se semelhana com o instituto jurdico da eficcia preclusiva da coisa julgada material, consagrado noordenamento ptrio no artigo 474, CPC, vez que consideram-se julgadas implicitamente todas as questes e defesasque a parte poderia opor tanto ao acolhimento, quanto a rejeio do pedido.32 Idem, p. 11, 61 e ss. Na tentativa de fazer uma comparao com a estrutura da coisa julgada no ordenamentojurdico brasileiro, poder-se-ia dizer queclaim preclusion seria comparvel coisa julgada material.
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Se a demanda, entretanto, julgada em favor do ru (bar), o pedido do autor
considerado obstrudo pelo julgamento. Neste caso, o autor no pode trazer uma segunda ao no
intuito de obter xito.No tocante a issue preclusion, pode-se afirmar que independentemente de qual seja
a parte vitoriosa, o demandante, em regra, no pode litigar novamente qualquer questo de fato e
de direito que efetivamente foi apreciada, se houve um julgamento final e vlido. Tal doutrina
subdivide-se em direct estoppel e collateral estoppel. Poder-se dizer que a direct estoppel ,
verdadeiramente, a precluso do assunto debatido novamente na mesma ao. No entanto,
considera-se tal instituto em desuso, pois a matria j estaria superada por conta da claim
preclusion.. J a
collateral estoppel, comumente confundida com a
res judicata,refere-se a
precluso aplicvel a uma tentativa de rediscutir matria especfica (no se trata de toda a
demanda) j julgada em ao antecedente.
5.3 Observaes conclusivas
A doutrina do precedente vinculante ou stare decisis, como largamente difundida
na common law, pode at mesmo em algum momento guardar alguma semelhana de propsito
com a res judicata.33 No entanto, difere desta com relao ao modo e ao alcance quanto aos casos
futuros. Para os professores norte-americanos CASAD e CLERMONT, p. ex., stare decisis,
como anteriormente j registrado, significa que um Tribunal ir estar sujeito pelas suas prprias
decises e pelas decises tomadas por Cortes superiores. Estar sujeito significa decidir uma
questo especfica de direito no mesmo sentido em cada caso que apresentar questo
semelhante34.
33 Quando posto em causa direitos que vo para alm dos direitos individuais, percebe-se o propsito, ao menos nosistema brasileiro, da assegurar paridade de tratamento a pessoas que desfrutem da mesma situao jurdica. Estacircunstncia, faz assemelhar propsitos dos institutos da coisa julgada e do precedente vinculante no que dizrespeito aos efeitos.34 No original: Basically stare decisis means that a court will stand by its decisions and by those of a higher courtin a given judicial hierarchy. Standing by a decision means deciding a particular question of law the same way ineach case that presents the question and, moreover, deciding so without serious reconsideration.Op. cit., p. 13.
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Aponta, de sua parte, GUIDO SOARES, que stare decisis o que sobrou da
expresso latina stare decisis et non quieta movere; ao p da letra: que as coisas permaneam
firmes e imodificadas, em razo das decises judiciais " 35.
Em face do insstituto stare decisis, as decises do mesmo Tribunal ou de corteshierarquicamente inferiores esto vinculadas s decises previamente firmadas seja atravs de
interpretao da Constituio (no caso dos pases que a possuem), seja por meio de interpretao
de leis, assim como decises declarando regras da common law 36.
Todavia, a doutrina dos precedentes vinculantes tem, como visto, limites, vez que
a regra aplicada somente queles casos que realmente se enquadram na moldura j constante de
repertrio de jurisprudncia catalogada37. Os julgados, aos efeitos de fixar precedentes, faro
declarao do direito ou do significado do direito.
Sintetizando, a stare decisis tende a dar estabilidade ao direito, na medida em que
as questes de direito resolvidas pelas Cortes sero, modo ordinrio, seguidas nos casos futuros
ao passo que a coisa julgada tem por fito bsico dar estabilidade a relao concreta que se tornou,
por esta ou aquela razo, controvertida.
Resumindo, pois, o stare decisis da essncia da common law e sua idia matriz
a de dar estabilidade ao direito, provendo que a jurisprudncia nas mesmas questes legais ser,
em regra, seguida pela mesma corte e por qualquer outra de hierarquia inferior, em qualquer caso
futuro que apresente fatos e direito idnticos.
35 SOARES, Guido. Op. Cit., p. 35.36 CASAD e CLERMONT, ao argumentarem em favor sistemtica da common law, elencaram os seguintes pontospositivos: First, in deciding cases, courts must decide legal questions. Within the same jurisdiction, the law shouldgive but one answer to a given legal question. To develop a law uniform over time and throughout the judicial
system, courts must bow to a prior resolution. Second, even-handed and predictable justice means that like casesmust be decided alike, regardless of who the parties involved may be. Third, if the pratice were otherwise, predictionand palnning in primary private ordering would be difficult. Fourth, stare decisis results in the appearance ofreasoned, consistent, and impersonal opinions, wich increases public support for the judiciary. Fifth, besides servingto unify the law, to foster even-handed and predicatable justice, to facilitate private prediction and planning, and toaugment public support, the existence of the doctrine of stare decisis improves the quality of judicial performanceitself in a number of ways.37 Neste particular ilustrativa a lio de Ren David quando d notcia sobre a forma de publicao dosprecedentes: Esta publicao est sujeita a uma certa seleo: 75% dos acrdo da Cmara dos Lordes, 25% dosacrdos do Court of Appeal e unicamente 10% das decises doHigh Court of Justice so publicados. Torna-se
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assim possvel eliminar um grande nmero de decises que no so dignas de se considerem como precedentes.Evita-se por outro lado que os juristas inglesas sejam submersos pela avalanche de precedentes Op Cit p 344