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C Á L I C E D E S A N G U E
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CAPÍTULO 27 (NOVELA EM 30 CAPÍTULOS)
“É o fim?”
ORIGINAL de: Carlos Lira e
João Sane Malagutti
Escrita Por: Carlos Lira E
João Sane Malagutti
PARTICIPAM DESTE CAPÍTULO:
1. LEOFÁ (José de Abreu)
2. SUMÉRIA (Elisa Lucinda)
3. SALVADOR (Antônio Fagundes)
4. ÚRSULA (Bianca Bin)
5. JÚLIO (Chay Suede)
6. GORETE (Bia Seidl)
7. EURICO (Alexandre Nero)
8. BRIANE (Daniele Winitz)
9. VALDIR (Paulo Rocha)
10. MANFRED (Matheus Nachtergaele)
11. GUTEMBERG (Humberto Carrão)
12. JOÃO (Leonardo Vieira)
13. LEOPOLDINA (Regina Duarte)
14. PETRÔNIO (Sidney Sampaio)
15. JADE (Camila Queiroz)
16. DIONE (Sophie Charlotte)
17. FILIPA (Totia Meireles)
18. NADIR (Paloma Bernardi)
19. QUITÉRIA (Nívea Maria)
20. PÂMELA (Adriana Birolli)
21. SINIRA (Bel Kutner)
22. SERENA (Beth Goffman)
23. SOLIMAR (Rosane Goffman)
24. PILAR (Malú Galli)
25. JOSÉ (Gabriel Godoy)
26. PABLO (Luiz Felipe Melo)
27. ZECA (Celso Frateschi)
28. PADRE (Irandhir Santos)
Direitos autorais pertencentes à CARLOS LIRA e JOÃO SANE MALAGUTTI ®
CENA 01. GABIENTE. INTERNA. DIA
Retomada. Eurico bufando.
EURICO: (enlouquecido) – Se não for prefeito,
ninguém mais será.
Pega a arma e atira várias vezes para o alto.
Clima tenso.
Corta para:
CENA 02. QUARTO DE JÚLIO. EXTERNA. DIA
Leofá entra fraco e cambaleando. Júlio se assusta e pega a
faca debaixo do travesseiro. Leofá se aproxima dele e senta
na cama cansado e zonzo.
LEOFÁ: - Abaixe essa faca. Não vê que estou
fraco para qualquer mal?
Júlio olha para ele desconfiado com a faca em riste.
(Cont’d) Preciso sair dessa casa! Essa negra
está me envenenando. Ela vai me matar! Acha
que não percebi. Mas eu já entendi tudo. Só
que antes de ir. Eu vou acertar as minhas
contas com tudo e com todos. Se você é meu
filho e quer ser alguém, passe por cima de
suas fraquezas e me ajude. Seja homem! (T) Tá
esperando o que? Anda! Me leve para a cidade!
JÚLIO: (desconfiado) – O que vai fazer?
Júlio abaixa a faca. Clima de suspense. Antes de responder,
o olha severamente.
LEOFÁ: - Primeiro, vou colocar Eurico no
lugar dele! (T) E, se não sobrar mais tempo
para mim, que um Pimenta assuma o poder dessa
cidade.
Júlio desconfiado. Suspense.
Corta para:
CENA 03. PRAÇA. EXTERNA. DIA
Tensão Instrumental. Passeio CAM: cidade alagada. Pessoas
carregam seus pertences sobre a cabeça. Malas, trouxas e
todos os tipos de objetos propostos pela direção. Cachorros
nos colos dos donos. Um perfil pobre e miserável. Caminhão
“pau-de-arara” com letreiro da prefeitura (PL. Detalhe)
encosta. Pilar e Léo coordenam as pessoas a fazerem filas.
Do outro lado, um grupo é coordenado por Briane a colocar
as coisas sobre carroças. Briane deve demonstrar liderança.
Corta para:
CENA 04. RUA CENTRAL. EXTERNA. DIA.
Tensão instrumental. Irmãs Dávila e núcleo da igreja.
SINIRA: (quase implorando) - Vamos Solimar!
Ficaremos mais seguras.
SOLIMAR: (teimosa) – Jamais colocarei os meus
pés numa fazenda Bianchini.
JOÃO: - Que diferença faz Bianchini ou
Pimenta? Não entendo.
Serena agoniada.
SOLIMAR: - Jamais trairei meus princípios
pisando nas terras de um assassino.
PADRE: - Está sendo intransigente e no mínimo
inconsequente, minha senhora.
SERENA: (jeitosa) - Pense, irmã! Moramos numa
casa velha. Pode ruir!
SOLIMAR: (Irritada) – Não vou!
Silêncio. Clima de incerteza.
SINIRA: - Então, também não vou. Somos nós
três uma entidade só.
José se aproxima.
(Cont’d) Não tem sentido duas abandonar uma.
Serena pode ir, eu fico e cuido dela.
SERENA: (cede) - Tem razão. Não podemos nos
separar. Eu vou ficar.
Padre ergue os braços para o céu inconformado.
PADRE: (exausto) - Senhor! Senhor! Por quê?
JOSÉ: (arrependido) - Sinira, vamos comigo.
Vamos sair da cidade e nos refugiar. Eu
estive pensando melhor. Eu me caso com você.
Vou honrar a sua donzelice.
Expectativa em silêncio.
SOLIMAR: (emocionada) – Vai, minha irmã.
Precisa seguir a sua vida! Vai ser feliz!
Deus vai me proteger e não vai acontecer
nada. Na volta faremos o seu casamento.
Padre meneia a cabeça. Trovão. Sinira abraça Solimar.
JOSÉ: - Precisamos pegar suas coisas. Vamos!
Parece que a chuva vai voltar!
João olha para Serena.
JOÃO: - Você não vai, Serena? Venha conosco!
SERENA: (triste) – Vou ficar com Solimar.
Minha irmã precisa de mim.
JOÃO: (olhando o padre) – Se for assim... Eu
fico! Fico com vocês e cuido das duas.
PADRE: - Tem certeza disso? Vocês ouviram que
a represa pode ceder e se ficarem podem ser
soterrados?
JOÃO: - Não tenho ninguém, padre. Se for da
vontade de Deus, meus últimos minutos serão
ao lado de uma pessoa que admiro (à Serena) e
tenho um imenso carinho.
PADRE: - Está certo! Quem sou eu para julgar.
Trovão. Ao fundo Gorete passa rápido. Câmera desvia a cena
atual e a acompanha. Ela olha para os lados e certifica que
ninguém a nota. Chega à porta da prefeitura e olha
novamente para trás. Abre a porta e entra.
Fusão com:
CENA 05. PREFEITURA: RECEPÇÃO. INTERNA. DIA
Gorete entra sorrateira. Vazio e silêncio. Ao se aproximar
de uma porta qualquer Eurico aparece com uma arma e coloca
em sua cabeça. Ela se assusta e mantém-se imóvel.
EURICO: - Posso parecer maluco, Dona Gorete,
mas eu sei que Leofá pode estar lhe usando
como boi de piranha e eu não sou trouxa de
cair. (enfático) Essa prefeitura é minha!
Suspense.
Corta para:
CENA 06. ESTRADA DE TERRA. EXTERNA. DIA
Júlio e Leofá dentro do carro. Relâmpago. Carro escorrega
no barro.
LEOFÁ: - Desse jeito não chegamos! Vai por
cima do mato que vai mais rápido.
JÚLIO: (concentrado) – Falta pouco. E outra,
é perigoso escorregar e batermos.
LEOFÁ: (sádico) - Tem medo da morte, Júlio?
Júlio o olha assustado.
Corta para:
CENA 07. PREFEITURA: RECEPÇÃO. INTERNA. DIA
Retoma. Gorete sob a arma de Eurico. Ele não abaixa a arma
hora nenhuma.
GORETE: (com medo) – Por favor, Euriquinho!
Leofá não sabe que estou aqui.
EURICO: - E eu sou besta, é?
GORETE: - Venho como uma mãe desesperada.
Preciso muito que me tire um peso da mente.
Por favor. O senhor é pai, vai compreender o
que estou passando.
EURICO: (desconfiado) – O que é?
GORETE: - Diga se meu Júlio participou da
morte de Epitácio.
EURICO: (sorriso deboche) – Não só
participou. Ele foi a estrela do crime, Dona
Gorete. Cada facada partiu das mãos lisas e
doentias de seu filho.
Gorete fecha os olhos em gesto de dor lancinante.
(Cont’d) Era só isso?
GORETE: (chora) – Era! Sua resposta fez mais
estragos que o tiro que poderia ter dado.
Faça-me o favor: acabe comigo.
Eurico oscila entre a compaixão e o desejo. Mexe o dedo
algumas vezes para apertar o gatilho e desiste.
EURICO: – Deixe de besteira. Agora saia! Não
quero mais surpresas aqui.
Suspense. Gorete sai cabisbaixo e chorando.
EURICO: (pensativo) – Podia ter lhe atirado.
Mas isso não ia afetar Leofá. Agora preciso
me vingar de todos que me desmoralizaram. Eu
sou o prefeito, sou Lei maior daqui!
Sai e bate a porta.
Corta para:
CENA 08. RUAS DA CIDADE. EXTERNA. DIA
Céu escuro. Tempestade formando Vista do alto. Pessoas
carregam suas coisas para um carro de boi e carroças.
Briane em cima do carro de boi ajuda as pessoas a ajeitar a
bagagem. Distante o carro de Leofá estaciona na parte seca
da enchente. Ele desce do carro com cuidado. Olha tudo com
asco. Júlio desce depois e debruça na porta com espanto.
Mais próximo do carro de boi Valdir e Manfred carregam
mantimentos.
VALDIR: - Com isso, encerra tudo o que tenho
na padaria. Deve dar por alguns dias. Volto
para pegar o Pablo e partirmos.
Valdir sai.
MANFRED: (triste) – Sempre quis sair daqui.
Mas, jamais, em minha vida, imaginei sair
fugido dessa cidade.
BRIANE: (carinhosa) - Vai dar tudo certo e
vamos voltar em breve.
MANFRED: - Só espero que esteja tudo de pé.
Briane ajuda uma mulher colocar a mala dela no carro.
BRIANE: - Não pode ser pessimista, Manfred.
Vai estar sim! (se aproxima) Faz um favor
para mim; ajeita as meninas, D. Quitéria e
subam no caminhão o quanto antes. Eu me
importo com vocês! Nós já vamos indo adiante
com o carro de boi para garantir não sermos
pego por enxurradas fortes no caminho.
Manfred retribui um carinho no cabelo dela e sorri. Sai.
Leofá passa ao fundo sem ser notado por eles. (Stead-Cam)
Sai da cena principal e acompanha Leofá que anda perdido.
Música instrumental. Júlio atrás.
JÚLIO: - Aonde vai andando com dificuldade?
Leofá continua sem dar ouvidos.
LEOFÁ: (horrorizado) – Minha cidade! No que a
transformaram?!
JÚLIO: - Pai!
LEOFÁ: - Eurico acabou com a minha cidade.
Júlio desiste. Faz um gesto de “deixa pra lá” com as mãos e
volta. Instrumental sobe Leofá anda em direção à igreja.
Trovão.
Fusão com:
CENA 09. PRAÇA. EXTERNA. DIA
Suspense. Trovões e relâmpagos sequenciais enquanto outros
caminhões da prefeitura estacionam. Pilar gesticula e fala
com o povo da fila. Guardas municipais fazem cordão de
isolamento. Léo ajuda a colocar as crianças nos caminhões.
Um raio cai numa árvore e todos começam a gritar e correr
fazendo tumulto e a chuva despenca. Medo coletivo. As
pessoas avançam em cima das carrocerias. Derrubam mulheres
e crianças. Pessoal do Boteco aparece correndo com as malas
e Manfred consegue colocar Quitéria no caminhão. Pessoas
começam puxar as outras do caminhão. Brigas esparramadas.
Padre desce de um dos caminhões e desespera-se tentando
intervir sem conseguir. Leva as mãos à cabeça. Tumulto
generalizado. Gorete passa aos prantos correndo e Léo,
assustada, a segue. Pessoas derrubam o padre. Pilar fica
desesperada.
PILAR: (com eco) – Paaaaarem!
Som de tiro.
Fusão com:
CENA 10. FACHADA DA IGREJA. EXTERNA. DIA
Debaixo de chuva Leofá segue caminhando com dificuldade.
Olha para a igreja e vê os fantasmas dos familiares. Mais
adiante vê os fantasmas da família de Salvador aparecer.
Seus olhos enchem de lágrimas e depois sorri como louco
continuando para sua caminhada e acenando aos fantasmas que
retribuem. Gorete passa ao fundo e Léo atrás sem que Leofá
as perceba. Léo vê Leofá acenando para o nada e para de
seguir Gorete. Começa a segui-lo.
Fusão com:
CENA 11. PRAÇA. EXTERNA. DIA
Chuva torrente. Silêncio. Todos parados. Num jogo de câmera
aparece Eurico rindo alto e com a arma para o alto.
PILAR: (inconformada) - Para que isso?
EURICO: - O prefeito sou eu, minhas regras!
(grita) Todos se afastem desses caminhões.
Quem está em cima fica!
Vai se aproximando olhando todos (subjetiva).
(Cont’d) (á Quitéria) A puta desce!
MANFRED: (avança) – Desgraçado!
Eurico aponta a arma para ele com fúria.
EURICO: (espumando) – Cala a boca, viado! Já
me prejudicou demais por hoje. Eu vou lhe
mostrar qual é o seu lugar.
Pilar entra na frente de Manfred.
PILAR: - Vai ter que atirar em mim primeiro.
Não vê que essas pessoas estão doidas para
sair daqui? Estão com medo da represa se
romper! Não temos tempo para as suas questões
pessoais.
EURICO: - Essa represa é uma invenção
política de vocês para me desmoralizar. Ela
sempre esteve lá e nunca rompeu e não vai ser
agora!
PILAR: - Põe a mão na consciência! Não íamos
brincar com a vida das pessoas. (negociando)
Faz assim. Coordena do seu jeito e
ajudaremos. Não daremos palpite na sua
administração.
EURICO: (perdido) – Melhor... Primeiro...
Pode fazer como estavam fazendo, mas, as
putas, ficam! Se for para morrer, que o juízo
final seja primeiro aos pecadores. (ao padre)
O senhor primeiro, Padre Paulo.
PADRE: (contrariado) - Eu agradeço. Mas, eu
fico. Espero o juízo final em frente minha
igreja.
EURICO: (dá de ombros) - Como queira!
Silêncio.
(Cont’d) Vamos! Retomem os trabalhos.
As pessoas voltam a se organizar em fila. Eurico fica com a
arma em riste. As prostitutas se afastam do caminhão
LEOFÁ: (deboche/in off) – Ei, Prefeitinho!
Jogo de câmera procura na multidão a pessoa. Encontra e
enfoca Leofá.
(Cont’d) Que papelão, hein?! Em pouco mais de
um mês você estragou a cidade toda. Conseguiu
ser mais decadente que Salvador. (sorriso
debochado) Como pode?
Vai na direção dele.
EURICO: (apreensivo) – Leofá! Ainda vivo?
(aponta a arma) Nem mais um passo ou.../
LEOFÁ: - Ou nada, seu merda! Você não tem
culhões! Tá provando isso agora nesse
tumulto. Sozinho com uma arama? Se as pessoas
passivas dessa cidade fossem espertas tinham
lhe matado e você não teria munição para
todas. (olhando para todos) Sua sorte é que
Tetembau é formada por miseráveis e
retardados.
EURICO: (morde) – Já fui muito desmoralizado
por hoje. Você não vai tomar o meu lugar na
prefeitura, Leofá.
LEOFÁ: - A prefeitura nunca foi sua e nem
está sendo. Nem nunca será. (sorri) Eu sou o
próximo prefeito dessa cidade.
EURICO: (louco) – Nãããããooooooooo!
Close: Atira duas vezes (eco). PL. GERAL/SLOW-MOTION: Leofá
solavanca com dois tiros no ombro e cai para trás. As
pessoas abrem a roda fugindo aos gritos. Léo corre acudí-
lo.
Corta para:
CENA 12. DELEGACIA: CELA. INTERNA. DIA
Porta da cela aberta e carcereiro está colocando algemas em
Salvador.
SALVADOR: (assustados) – Tiros!
PETRÔNIO: (afobado) - Mamãe e Pilar estão na
praça!
Salvador tem o ímpeto de correr e o carcereiro o segura.
CARCEREIRO: - O senhor está preso.
Fecha a algema nos braços de Salvador.
SALVADOR: - Vá, filho. Cuide de sua mãe.
Petrônio sai.
Corta para:
CENA 13. PRAÇA. EXTERNA. DIA
Leofá caído no colo de Pilar e de alguns populares. Eurico
assustado com a sua reação. Vai se afastando até que some
correndo.
LÉO: (assustada) – Leofá! Leofá! Fale comigo!
De longe Manfred sussurra às meninas.
MANFRED: - Se morreu, foi tarde! Esse não
valia nada!
JADE e NADIR: - Credo!
Fazem o sinal da cruz.
PILAR: (aos guardas) – Vocês não presenciaram
um crime aqui? Corram deter aquele homem! Não
interessa se é o prefeito. A justiça é para
todos.
LÉO: - Precisamos de um socorro!
PILAR: - O caminhão! O hospital fica no
caminho. Sobe com ele e vai.
Léo sobe. Os populares colocam Leofá no colo dela e algumas
pessoas ajudam a segurá-lo. O caminhão sai.
(Cont’d) (coordenando) – A chuva vai
aumentar, mas é preciso ter calma. Vai chegar
mais caminhões. Primeiro mulheres e crianças.
MANFRED: - As putas podem?
PILAR: - Podem!
Quitéria e as meninas sobem. Protestos na Praça.
PILAR: - Sem vaias! Todos são cidadãos e
serão salvos!
MANFRED: (engrossa a voz) – Isso mesmo! Quero
ver quem vai se meter comigo.
Clima tenso.
Corta para:
CENA 14. RUAS DA CIDADE. EXTERNA. DIA.
Carro de Leofá parado. Passa o cortejo com carros de bois e
carroças partindo. Várias pessoas seguem com guarda-chuvas
e capas de chuvas. Briane à frente com Valdir levando Pablo
no colo. O caminhão passa repleto de pessoas mexendo na
água e tombando pessoas que gritam e protestam. Distraída e
chorando Gorete atravessa o cortejo e passa pelo carro.
Júlio a vê e sai do carro e caminha atrás dela.
JÚLIO: - Mãe! Mãe!
GORETE: (se vira) – Júlio!
Ele a abraça.
(Cont’d) Filho! Vai embora! Some dessa
cidade! Por favor!
JÚLIO: - Vamos sair da chuva. Eu te levo onde
quiser ir.
GORETE: - Não! É melhor você fugir enquanto
há tempo. O Euriquinho está louco! Ele falou
de você para mim. Ele vai contar para todos.
Você vai ser preso!
JÚLIO: (apreensivo) – Não importa isso. Quero
ficar com você.
GORETE: (dividida) – Eu o amo filho! Você não
entende a dor de uma mãe. Melhor correr. Some
uns tempos. Depois, quando tudo isso passar
você volta. Eu estarei aqui te esperando de
braços abertos.
JÚLIO: (teima) - Não! Não vou!
GORETE: (chorando) – Não faz isso comigo! Eu
não vou aguentar ver você preso. Por amor a
mim que sou sua mãe. Se esconda!
Júlio fica baqueado com o pedido. Silêncio. Ela se afasta e
segue o cortejo sempre olhando para trás. Ele entra no
carro e dá ré.
Corta para:
CENA 15. ESTRADAS RURAIS/PEDREIRA/FAZ.BIANCHINI. EXT. DIA
Chuva. Cortes descontínuos. Música instrumental de tensão.
Composição: takes minimalistas da expressão de medo e
insegurança dos figurantes e atores. Carros de bois e
carroças em comitivas. Multidão com guarda-chuvas e capas
forma um êxodo urbano. As pessoas são guiadas por Valdir
que puxa o carro de boi com Briane ao seu lado. Pablo e
outras crianças vão sentados sobre as malas no carro de
boi. PL. GERAL: caminhões da prefeitura passam lateralmente
repleto de pessoas. CAM mostra algumas faces como Quitéria
e Pâmela, Sinira e José de mãos dadas e, Pilar. O DESENHO
da cena deve remeter passagem pelas pedreiras, a travessia
de um pequeno e raso trecho de rio (nas pedreiras que marca
a delimitação de terras de Bianchini/Pimenta) até chegarem
na entrada da Fazenda de Salvador. Porteira fechada.
Caminhão para e Pilar desce. Zeca vem ao encontro.
PILAR: - Abre a porteira Zeca! Vamos hospedar
toda essa gente nos galpões de café. Homens
pra um lado e mulheres pra outro. Traz os
colonos todos para ajudar. Quero cada um bem
recebido com carinho.
ZECA (sorridente) – Pode deixar Dona Pilar.
Úrsula e Gutemberg sorriem surpresos.
Fusão com:
CENA 16. BARRACÃO. INTERNA. DIA.
Som de chuva lá fora. Grua passeia pelo barracão lotado de
colchões no chão e pessoas sentadas. Mulheres com crianças.
Funcionários da fazenda carregam mesas. Mulheres da roça
carregam panelões enquanto outras acendem os fogões feitos
de tijolos. Algumas enxugam seus cabelos e outras trocam as
crianças com roupas de frio. Com a ajuda de Pilar e Briane,
Úrsula distribui cobertor e toalhas.
ÚRSULA: (assustada) – Tem muita gente!
PILAR: (fala baixo) - Precisamos atentar aos
mantimentos. Essa gente toda tem fome e não é
justo ficarem à mingua.
BRIANE: (tom baixo) - Veio pouco mantimento.
Não tinha como carregar tudo nos carros. Mas,
se preciso, volto para buscar.
PILAR: - Não. Não precisa se arriscar ainda.
O que temos aqui por ora deve dar. Eu vou dar
um jeito.
Tensão.
Corta para:
CENA 17. BARRACÃO DE CAFÉ MASCULINO. INTERNA. DIA.
Homens trocando de roupa. Valdir distribuindo panos para as
pessoas se enxugarem.
GUTEMBERG: (tenso) - Essas pessoas devem
estar morrendo de frio. Precisamos criar um
sistema de aquecimento.
ZECA: (preocupado) – O frio a gente espanta
se encostando um no outro com uma fogueira
por perto, Doutor. Quero ver o que fazer se
acabar a comida.
Clima de tensão.
DO OUTRO LADO:
Manfred tremendo num canto acuado. Valdir aproxima.
VALDIR: - Não vai se trocar ‘Fala Fina’?
MANFRED: (tímido) - Agora não. Mais tarde. À
noite quando dormirem.
VALDIR: (amigo) - Não vai aguentar tanto
tempo sem que adoeça.
MANFRED: (frágil) - Tenho vergonha do meu
corpo!
Valdir pegar alguns panos e abre o tampando.
VALDIR: - Vamos! Pelo menos a camisa molhada.
Tire ela e coloque uma seca.
Manfred obedece e começa a se trocar. Briane entra e
Manfred tenta se tampar precariamente com as mãos no peito.
Briane vai ao ouvido de Valdir.
BRIANE: (tom baixo) - Dona Gorete não está no
barracão das mulheres. Ela por acaso apareceu
aqui.
VALDIR: (pensando) – Não! Pelo menos que eu
tenha visto, não.
MANFRED: (preocupado) – A última vez que a vi
foi quando passamos pela Fazenda dos Pimenta.
Tensão.
Corta para:
CENA 18. CASARÃO PIMENTA. INTERNA. DIA.
Abre a porta e Gorete entra ensopada e cansada.
GORETE: (dura) - Leofá! Cadê você!
Suméria aparece.
SUMÉRIA: (surpresa) – Dona Gorete!
Corta para:
CENA 19. CASARÃO BIANCHINI. INTERNA. DIA
Som de chuva. Pilar, Gutemberg, Úrsula e Briane.
BRIANE: (preocupada) – Suspeito que ela tenha
voltado para a fazenda de vocês.
GUTEMBERG: - Depois de tudo o que aconteceu?
Acho que não! Meu tio Leofá acabaria com ela.
ÚRSULA: - Às vezes foi ver o filho.
PILAR: (pensativa) – Não sei exatamente o que
aconteceu; mas, é melhor para o desencargo de
consciência.
Corta para:
Corta para:
CENA 20. CASARÃO PIMENTA. INTERNA. DIA.
Retoma Gorete e Suméria descontente. Tensão.
GORETE: - Preciso falar com Leofá! Onde ele
está?
SUMÉRIA: - Saiu com o Júlio e não voltou.
GORETE: - Está com um aspecto estranho
Suméria. Parece não ter gostado de me ver
novamente.
SUMÉRIA: (mente) – Não é isso. Só fico
preocupada.
GORETE: - Com o quê?
SUMÉRIA: - Com o que Leofá pode achar de sua
presença e o que possa fazer com a senhora.
(inventa) Ele está fora de si e a cada dia
pior, Dona Gorete. Ele enlouqueceu. Se eu
fosse a senhora eu não o esperava.
Gorete caminha até o sofá e se senta.
GORETE: (decidida) - Agradeço a sua
preocupação. Mas, vou espera-lo mesmo assim.
Preciso ter com ele uma conversa única... e
definitiva.
Suméria tranca a cara. Telefone toca. Suméria atende.
SUMÉRIA: (atende) - Residência da Família
Pimenta. (T) Sim. Ela está aqui sim. Vai
esperar a vinda de Leofá. (à Gorete) Para a
senhora, seu sobrinho.
GORETE: - Pronto.
Suméria sai de perto e espia pela janela.
SUMÉRIA: (para si) – Vai estragar meus
planos.
GORETE: - Pretendo ficar por esta noite.
Assim que decidir partir eu ligo para me
pegarem aqui. Agradeço a preocupação. Deixe
meu abraço a todos (desliga).
SUMÉRIA: - Não pude deixar de ouvir. Vou
preparar o quarto de Dona Léo para a senhora.
GORETE: - Obrigada.
Suméria sai. Gorete passeia pela casa e abre a janela.
Ventania entra.
GORETE: - A casa está mais pesada que nunca!
A câmera passeia com foco em Gorete e conforme anda vai
revelando os fantasmas esparramos pela sala.
Corta para:
CENA 21. CASARÃO BIANCHINI. INTERNA. DIA
Trovões. Úrsula, Pilar e Guto na sala.
PILAR: (preocupada) – Essa chuva não vai
parar. Será que ficou muita gente na cidade
ou que não conseguiu sair?
ÚRSULA: (pensativa) - A cidade é pequena.
Todos devem ter procurado refúgio. A senhora
assossegue e fique aqui comigo. Não quero a
senhora correndo riscos. Meu bebê precisa da
senhora conosco.
Pilar olha para ela surpresa.
GUTEMBERG: - Úrsula tem razão.
Telefone toca. Gutemberg atende.
GUTEMBERG: - Pois não? (surpreso) Mãe! Onde
você está? (T) Certo. E, pensar que depois de
tudo, a senhora ainda cuida dele. (T) Eu
aviso! Pode deixar. Me mantenha informado.
(T) Também te amo.
Desliga.
PILAR: - Aconteceu algo além do que sabemos?
GUTO: - Estão na capital. O meu tio está
medicado e fora de risco. Os tiros pegaram de
raspão. Ela pediu para avisar que Petrônio
está com meu pai na capital também. A polícia
o conduziu para outra cidade a fim de evitar
mais tragédias caso a represa se rompa.
Úrsula fica apreensiva.
Fusão com:
Corta para:
CENA 22. STOCK-SHOT: REPRESA. EXTERNA. DIA
Chuva forte. Represa lotada com água se mexendo forte.
Relâmpagos e raios. Drone passeia sobre a represa e segue
para a mata em volta.
Fusão com:
CENA 23. TETEMBAU. EXTERNA. NOITE
Do alto. Filipa e Dione com malas e mochilas atravessam a
enchente da praça e entram na igreja.
Fusão com:
CENA 24. IGREJA/TORRE. INTERNA. ANOITECER
Velas acesas por toda a igreja. Dione e Filipa andam
assustadas.
DIONE: (impressionada) – É o fim para nós.
FILIPA: - Deixe de besteira! Isso vai passar.
Só vamos para a torre. É o lugar mais alto e
que possa nos garantir mais segurança.
Fusão com:
TORRE:
Lances finais da escada. Dione e Filipa chegam ao topo.
Câmera revela o padre de joelhos orando. À sua frente uma
vela. Ele está de frente com um vitral.
DIONE: (surpresa) - Padre!
Ele olha surpreso para elas.
FILIPA: - Podemos ficar aqui? Não temos mais
a quem recorrer. Todos sumiram dessa cidade
em busca de um lugar seguro.
PADRE: - Não há muito espaço, mas com jeito
podemos nos alocar. Fico feliz que tenham
escolhido a casa do Senhor. (estranha) Só não
entendo porque escolheram ficar se a cidade
tem possibilidade de ser destruída?
FILIPA: - Não temos para onde ir, Padre. Vir
para cá foi uma necessidade e não escolha.
PADRE: (decepcionado) – Tinha os caminhões da
prefeitura para terras mais altas da Fazenda
Bianchini.
DIONE: (chateada) - Minha mãe não quis ir. Eu
avisei para ela.
FILIPA: (desdém) - Prefiro a morte a ter que
pisar novamente naquelas terras.
PADRE: (respira fundo) – De uma forma ou de
outra, Deus nos mostra o peso de nossos atos,
Dona Filipa. E, agora, a senhora começa a
sentir o peso de suas ações.
Filipa o olha com contrariedade.
(Cont’d) (À Úrsula) Acomode-se minha querida.
Se quiser me acompanhar numa oração pedindo
interseção de Deus para que a chuva cesse o
quanto antes, será bem-vinda.
Dione coloca a mochila no chão e ajoelha ao lado do padre.
Começam a orar e Filipa se deita encostada na mochila. Fica
pensativa e lacrimeja vira de lado para ninguém ver suas
lágrimas escorrendo.
Corta para:
CENA 25. COZINHA DAS DÁVILA. INTERNA. NOITE.
João, Solimar e Serena sentados à mesa. Tomam café. Luz de
velas e baldes para segurar goteiras.
SOLIMAR: - É na hora do fim que todos buscam
a Deus.
JOÃO: - Sábias palavras D. Solimar. Mas,
creio que não seja o fim ainda.
SERENA: - Deus queira que não. Gostaria que o
pai me desse mais uma chance, mesmo que
pequena de ser feliz.
Serena e João trocam olhares. Seguram um na mão do outro.
Desfoque das mãos revela Solimar triste.
Corta para:
CENA 26. HOSPITAL. INTERNA. NOITE
Suspense. Leofá dormindo. Desfoque: Leopoldina enrolada num
cobertor e sentada. Olha para o nada. Petrônio entra. Léo
se levanta e joga a manta na cadeira e corre abraça-lo.
LÉO: (tom baixo/agoniada) – Filho! E seu pai?
PETRÔNIO: - Tá triste. Chateado com os fatos
de hoje. (T) O quanto antes entregarmos esses
bandidos, mais cedo ele estará livre.
LÉO: - É o que mais desejo! A liberdade dele
também será a minha, filho!
PETRÔNIO: - A liberdade dele será a de todos
nós! Sobre aquilo que me pediu...
Léo leva o dedo na boca e pede silêncio.
(Cont’d) Está feito! O investigador já está
na cola. O deslize de hoje o coloca em maus
lençóis perante a justiça. (T) Como ele está?
LÉO: - Fora de risco. Vai ficar em observação
por um tempo e depois voltará para casa.
PETRÔNIO: (irritado) – Vaso ruim não quebra!
Poderia ter passado dessa para melhor.
LÉO: - O que é isso?! Não o criei pra viver
de ódio. Deixa esse sentimento para àqueles
que não têm a chance de amar.
PETRÔNIO: (ressentido) – Não dá! Meu pai está
preso por causa dele.
LÉO: - Aguenta mais um pouco! Algo dentro de
mim está dizendo que assim que entregar todo
o material que gravou o seu pai será liberto
logo! Confie nisso!
Câmera fecha em Leofá.
Corta para:
CENA 27. MATA. EXTERNA. NOITE
Suspense. Chuva forte. Eurico corre na mata com a arma em
riste. O jogo de cenas (STEAD-CAM) deve remeter uma caçada.
Eurico sempre desesperado e, guardas municipais procurando
pela mata com lanterna. Dado momento, encontra uma árvore
caída e adentra o tronco oco. Guardas passam por ele sem o
ver.
Corta para:
CENA 28. QUARTO DE ÚRSULA. INTERNA. NOITE
Guto e Úrsula deitados. Gutemberg acaricia a barriga de
Úrsula. Telefone tocando. Úrsula se levanta.
GUTEMBERG: - Calma amor! Aonde vai?
ÚRSULA: – Atender! (apreensiva) Estou com um
sentimento ruim.
GUTEMBERG: - O telefone já parou de tocar.
Sua mãe deve ter atendido.
ÚRSULA: (desiste) – Tem razão.
Ela se deita.
GUTEMBERG: - Não pode ficar agitada. Pode
prejudicar nosso filho.
Pilar abre a porta eufórica. Úrsula e Guto se levantam
assustados.
PILAR: - As notícias não são boas. A guarda e
nem a polícia conseguiu encontrar Euriquinho.
Corta para:
CENA 30. CASARÃO BIANCHINI/VARANDA. INTERNA. NOITE
Na varanda. Guto, Úrsula e Pilar andam de um lado para o
outro. Zeca com arma na mão escolta Valdir, Briane e Pablo
que chegam molhados àvaranda.
PILAR: (acolhendo) – Entrem, por favor. Podem
ir tomar um banho quente. A Úrsula arrumou o
quarto para vocês.
Úrsula pega Pablo pela mão.
ÚRSULA: - Vem comigo. Depois vamos brincar
com um jogo muito legal. Gosta de jogar?
Faz que sim com a cabeça. Eles entram. Pilar segura Briane
e sinaliza à Valdir para entrar. Pilar espera. Ele entra.
PILAR: - Eurico escapou. Como você nos ajudou
com a gravação a nossa obrigação é lhe
proteger contra qualquer represália da parte
dele.
BRIANE: (com medo) – Será que...?
GUTEMBERG: - Melhor não esperar! Fique aqui
na casa da sede que estará mais protegida.
BRIANE: - Mas, e as outras pessoas. Gostaria
muito de ficar e ajudar nos barracões.
PILAR: - Nós cuidaremos. Fique tranquila!
Agora entre, tome um banho e descanse.
Instrumental tensão. Briane entra.
GUTEMBERG: - Acha que ele virá mesmo?
PILAR: - Não sei. Mas, não quero dar sorte ao
azar. (à Zeca) Faz um favor, meu amigo.
Ajunte os homens e arme um esquema de
segurança em volta dessa casa e dos galpões.
Qualquer estranho que aparecer não deixe que
entre sem revista e sem me comunicar. Seja a
hora que for me avise!
ZECA: - Sim senhora, patroa!
Gutemberg fica com medo.
Corta para:
CENA 31. HOSPITAL. INTERNA. NOITE
Suspense. Meia luz. Léo e Petrônio dormem numa poltrona. A
janela do hospital se abre com a ventania. Cortinas voam.
Pela janela abre entra uma luz forte. Ele abre o olho e vê
Ludmila e Santiago se beijando fica assustado e chocado.
Nessa cena os mesmos vestem a mesma roupa do assassinato e
estão sujos de sangue. Santiago e Santinha chamam Leofá com
as mãos.
LUDMILA: (in off/eco) – Viemos lhe buscar.
Risada de criança com eco. O negrinho se senta no pé da
cama. Leofá tenta gritar e a voz não sai. Ele se nega com a
cabeça. Começa a chorar. Ludmila e Santiago sorriem. Apito
do Eletrocardiograma.
TRANSIÇÃO DE TEMPO. Fade out/Fade in.
Léo chora abraçada a Petrônio no canto do quarto. Leofá sem
roupa recebe descargas do desfibrilador. Corte descontínuos
entre os choques; Leofá desfalecido e sem cor; Léo chorando
e Petrônio assustado.
Corta para:
CENA 32. MATA. EXTERNA. NOITE
Suspense. Chuva forte. Eurico sai do tronco e corre pela
mata até alcançar uma trilha. Vai escorregando no barro e
se sujando. Se levanta e continua a correr na chuva.
EURICO: (assustado) - O que eu vou fazer? O
que vou fazer agora? Para onde ir, meu Deus?
Dê-me um sinal! (chora) Eu fui idiota de ter
ido na onda de Leofá. Que você morra!
Desgraçado! Desgraçado!
Drama/Suspense.
Corta para:
CENA 33. GALPÕES MASCULINO E FEMININO. INTERNA. NOITE.
Cortes descontínuos. Dentro dos galpões há pequenos núcleos
e específicos na forma que a direção escolher. Panorama
Geral dado por TRAVELLING lateral: pessoas tomando sopas em
canecas e partilhando pães. Pessoas bem vestidas, outras
maltrapilhas e outras enroladas em cobertores. Instrumental
que deve remeter compaixão.
QUITÉRIA: (preocupada) - Briane foi para a
casa da sede e não voltou.
NADIR: (baixo) - Tem alguma coisa acontecendo
e esse povo não fala nada.
QUITÉRIA: - Só espero que não seja o pior?
PÂMELA: - O que seria pior? Porque se for
sobre a represa, não teria motivo para tê-la
buscado. O que ela pode resolver?
QUITÉRIA: (pensativa) - Nada. Tem razão.
DO OUTRO LADO:
Pessoas servindo o sopão. Jade pega sopão e pão para comer
e sai da fila. Atrás está Sinira. Ela pega a caneca e vai
se sentar no seu canto isolada. Jade come sentada num latão
gigante. A observa. Sinira está triste.
OUTRO LADO:
Galpão masculino. Tomando sopão, Manfred sorrateiramente
observa rapazes trocando de roupa por trás da pilastra. Um
dos rapazes percebe e pisca para ele. Manfred sorri
discretamente e sai.
OUTRO LADO:
José está sentado sobre umas sacas de café sozinho. As
pessoas passam e lhe cumprimentam. Está triste e pensativo.
OUTRO LADO:
Galpão feminino. Sinira pensativa. Jade se aproxima dela e
oferece:
JADE: - Quer que eu pegue mais pão e sopa
para você?
SINIRA: (simpática) – Estou satisfeita. Mesmo
assim eu agradeço a sua gentileza.
JADE: (amigável) - Me parece triste!
SINIRA: - Um pouco. Preocupada na verdade.
Deixei as minhas irmãs na cidade. Não sei o
que está acontecendo por lá. Só estou pedindo
a Deus em oração para que essa represa não
rompa.
JADE: - Porque não vieram? Não coube?
SINIRA: - Quiseram ficar. Eu deveria ter
ficado! (se culpa) Não se abandona a família
assim.
JADE: - Acho que nessa vida, nada é por
acaso. Se você veio e elas ficaram era porque
isso vai ter algum significado mais pra
frente.
SINIRA: - Ouvir isso é tão diferente! Como as
minhas irmãs tudo era sempre tão certo que
não havia motivos dos quais não soubéssemos
de nada!
JADE: (sorri) - Irmãs Dávila. Sempre rígidas
nos conceitos!
SINIRA: (sem graça) – É... Não é bem assim.
Somos boas pessoas, é que o nosso jeito meio
que espanta as pessoas.
JADE: - Eu sei como é. Quando eu falo que sou
prostituta as pessoas se afastam também.
Correm de mim achando que vão pegar lepra ou
coisa do tipo.
SINIRA: - Pois é. Todos temos um calvário a
carregar. (T) É a primeira vez que falo com
uma prostitua.
JADE: (brinca) – Sou normal. Não faço nada a
mais que outra mulher faria. Acho eu!
Sinira fica constrangida.
(Cont’d) Desculpa! Não quis ser indiscreta1
SINIRA: - Tudo bem. Preciso mesmo conhecer o
mundo que não vivo. Pode me falar um
pouquinho de você, da sua vida, da sua
família?
Jade senta do lado dela e começa a falar.
DO OUTRO LADO:
Nadir cutuca Quitéria.
NADIR: - Jade é mesmo uma maluca! (aponta)
Vejam! Está sendo doutrinada por uma Dávila.
PÂMELA: - Que maldade! Estão fazendo amizade.
NADIR: (sorri) - Pode ser! Mas não deixa de
ser maluquinha. Vou buscar mais sopa.
Nadir sai e Quitéria debruça sobre o ouvido da filha.
QUITÉRIA: (desconfiada) - Acho que o sumiço
de Briane tem haver com o seu pai.
PÂMELA: (arisca) – Ele não é nada meu! Não
permito que a senhora fale isso de novo. Por
mim esse monstro pode morrer!
Quitéria assustada.
DO OUTRO LADO:
Manfred se esconde atrás do caminhão e o rapaz aparece e o
beija e abraça roçando nele.
MANFRED: - Aqui não! As pessoas podem ver.
Vamos pro mato aqui perto.
RAPAZ: - Está chovendo. Faz um agradinho. Uma
brincadinha com a boca aqui mesmo.
MANFRED: - Não! Ou no mato, ou fica sem nada!
Você é quem sabe.
RAPAZ: (cedendo) - Está bem! Vamos.
Saem.
Fusão com:
CENA 34. MATA DA FAZENDA. EXTERNA. NOITE
Manfred e Rapaz correm debaixo de chuva. Num dado momento
uma pessoa aparece com uma espingarda na mão.
ZECA: (ordena) – Parados ou eu atiro.
Os dois param. Rapaz fica com medo.
(Cont’d) Quem são? Aonde pensam que vão?
MANFRED: - Somos do galpão masculino. Saímos
para dar uma brincadinha entre... dois. Dois
rapazes sedentos por diversão, capataz!
ZECA: - Ara, sô! Cada um faz o que quer da
vida; mas debaixo de chuva!
RAPAZ: (á Manfred) - Vamos voltar!
MANFRED: - De jeito nenhum! Já que molhamos,
agora vamos até o fim. (à Zeca) Sabe onde tem
um lugar mais íntimo para fazermos... aquilo!
O senhor sabe!
ZECA: - Ara! Não quero essas graças aqui na
fazenda não! Tem que respeitar as pessoas que
estão aí. Quer fazer coisa errada, vai pra lá
porteira. Deve de ter um casebre Velho pros
lados da ponte. Fora daqui vocês podem fazer
o que quiser; mas, pra voltar vão ter que ser
revistados na volta.
MANFRED: - Sem problemas, lindão!
ZECA: (grosso) – Sai de mim, Jaraguá!
Manfred e o rapaz continuam correndo. Passam pela porteira
e seguem.
RAPAZ: (desconfiado) – Acho que não é uma boa
ideia ir tão longe com essa chuva!
MANFRED: (sorri) - Deixa de bobeira. Quer ou
não quer uma noite de prazer com um homem?
Rapaz faz que sim. Sai correndo e o rapaz atrás. Suspense.
Corta para:
CENA 35. ESTRADA DE TERRA. EXTERNA. NOITE
Suspense. Chuva. Júlio dirige e deslizando pela estrada de
terra com ar de preocupação.
Fusão com:
CENA 36. PONTE DA ESTRADA DE TERRA. EXTERNA. NOITE.
Eurico sai correndo do meio do mato cansado. Segue andando
mais um trecho até encontrar o rio transbordado. Toda a
cena deve ser acompanhada por suspense instrumental.
EURICO: - Droga!
Se curva cansado e apoia uma das mãos na perna. Percebe do
outro lado dois vultos correndo. Close: Eurico apreensivo e
arfando fica com a
RAPAZ: (mais atrás) - Acho melhor voltarmos.
Manfred se aproxima da enchente pelo outro lado da ponte e
avista um vulto. Fica em dúvida. Espreme os olhos para ver
(close).
MANFRED: (para si) - Quem será?
Fica olhando até o moço se aproximar. O farol do carro de
Júlio vindo da curva ilumina rapidamente o rosto de Eurico
e revela o rosto de Manfred que coloca a mão sobre os olhos
para tentar enxergar.
RAPAZ: (assustado) – Aquilo na mão dele...?
MANFRED: - É. É uma arma! Vamos. É melhor não
comentar nada a ninguém pra não causar pânico
Os dois saem sem virar as costas. Eurico ergue a arma.
(Cont.)
O carro diminui a velocidade e Eurico se vira de frente
para o carro apreensivo Engole seco (close). Manfred e o
rapaz aproveitam e fogem na corrida. Júlio se assusta ao
ver Eurico com a arma. Eurico tampa o farol na direção dos
olhos com a mão. Júlio vira o carro rapidamente e adentra a
porteira em cavalo de pau deslizando sem controle por causa
da chuva. Eurico abre fogo contra o carro e volta para a
mata correndo.
EURICO: - É o carro de Leofá. (grita/ira) O
desgraçado sobreviveu! Preciso acabar com ele
antes que ele me incrimine ainda mais. (para
si) Eu não vou morrer numa prisão!
Corta para:
CENA 37. GALPÃO MASCULINO. INTERNA. NOITE
Atrás do caminhão. Manfred e rapaz.
MANFRED: (orientando) – Nós nunca saímos
daqui e nunca vimos ninguém. Entendeu?
Faz que sim com a cabeça.
(Cont’d) Isso nunca existiu! Quando der
certo, nos encontramos. Eu saio primeiro para
ninguém desconfiar.
Manfred sai preocupadíssimo. Close: Rapaz assustado.
Corta para:
CENA 38. CASARÃO PIMENTA: SALA/QUARTO DE JÚLIO. INT. NOITE
Júlio entra com duas malas. Fecha a porta sorrateiramente
com a chave. Coloca as malas sobre o sofá e abre. Muitos
dólares.
JÚLIO: - Ele descobriu tudo!
Suspense.
QUARTO DE JÚLIO:
Júlio entra e não percebe que não fechou a porta. Pega a
faca debaixo do travesseiro, tira o lençol e corta lateral
do colchão. Enfia o dinheiro dentro. Gorete espia. Dado
momento empurra a porta e entra.
GORETE: - Que dinheiro é esse, Júlio?
Júlio se vira surpreso.
JÚLIO: - Mãe, o que faz aqui?
Corta para:
CENA 39. GALPÃO FEMININO. INTERNA. NOITE
Todas deitadas dormindo. Manfred se aproxima de Quitéria e
a acorda e com um gesto de silêncio gesticula para segui-
lo. Se aproximam da porta. Pâmela abre os olhos e vê.
QUITÉRIA: (preocupada) – O que está houve?
MANFRED: - Vi Eurico do outro lado do rio.
Está armado.
QUITÉRIA: - O que foi fazer lá?
MANFRED: - Não importa! Não é o caso! O que
fazemos. Contamos ou não para D. Pilar?
QUITÉRIA: (apreensiva) - Acho melhor não
incomodar a esta hora.
Pâmela os surpreende.
PÂMELA: - Ou vocês vão contar isso agora ou
vou eu!
Quitéria e Manfred se olham preocupados. Suspense.
Corta para:
CENA 40. CASARÃO BIANCHINI: SALA. INTERNA. NOITE
Pilar de roupão, acompanhada de Zeca. Pâmela frente a ela.
PILAR: - Eu agradeço por ter vindo avisar. (à
Zeca) Tem como iniciar uma caçada contra ele?
ZECA: - Não dá, Dona Pilar. O rio transbordou
e a correnteza fica perigosa. Não dá para nós
passarmos para lá e nem ele para cá.
PILAR: - Está certo. Pode voltar ao posto,
Zeca. Vemos isso pela manhã.
Zeca sai.
PILAR: - Obrigada de coração. Só não entendo
porque quer entregar o seu pai.
PÂMELA: - Ele não é meu pai. Pai é quem cria,
Dona Pilar. Eu nunca tive um pai. Se é para
ter um bandido como pai, prefiro ser órfã.
PILAR: - Está certo. (carinhosa) Seu jeito de
pensar é meio duro, mas a sua clareza deixa
evidente que a vida vai lhe presentear ainda
com coisas boas.
PÂMELA: - Espero! Sou otimista que sim!
Corta para:
CENA 41. CAS. PIMENTA: QUARTO JÚLIO/COZINHA. INTERNA. NOITE
Gorete e Júlio discutem.
GORETE: - Porque foi se arriscar desse jeito?
JÚLIO: - Esse dinheiro é nosso, mãe. A
quantidade de dinheiro que tem aqui da para
cada um comprar a sua casa e viver uma vida
sossegada.
GORETE: - Dinheiro não é tudo, filho! Não
seja como se pai.
JÚLIO: - Dinheiro pode não ser tudo, mas eu
não quero mais a senhora morando com as
putas. Eu vou te dar um lar. Só que, jamais
imaginei que ele pudesse desconfiar que
entrei no Hotel e peguei. Ninguém estava lá!
Eu tive que arrombar a janela!
GORETE: - Pega esse dinheiro e foge, Júlio.
Vai para fora do Brasil, filho! Eles vão te
incriminar. Eurico me contou que naquela
noite você matou o seu tio com as próprias
mãos. (T) Vim aqui para esperar seu pai e
pedir que ele assuma a culpa.
JÚLIO: - Ele não vai fazer isso! Não conhece
o papai.
GORETE: - Não custa tentar! Mas, por
garantia, some enquanto é tempo.
JÚLIO: (irredutível) – Vou acabar de ajeitar
tudo isso aqui e dormir. Amanhã é outro dia e
penso no seu conselho.
Gorete o abraça chorando.
Corta para:
COZINHA:
Suméria banha o boneco de vodu numa panela com sangue.
SUMÉRIA: - Você não vai morrer pela mão de
ninguém, Leofá. Não vou deixar. Você vai
voltar e definhar aqui. Em nossas mãos! Os
fantasmas e eu ainda vamos lhe assombrar. Por
tempo o suficiente antes de você partir.
Suspense. Contra-plongé/close: Suméria sorri sadicamente.
Fusão com:
CENA 42. QUARTO DO HOSPITAL. INTERNA. NOITE
Eletrocardiograma funcionando normalmente. Leofá dorme.
Efeito desfoque. Petrônio e Léo dormem apoiado um no outro.
A CAM passeia pelo quarto durante a fala.
SUMÉRIA (in off) – Os fantasmas do passado
sempre voltam para o acerto de contas.
Ninguém está imune.
Corta para:
CENA 43. IGREJA: TORRE/ALTAR. INTERNA. NOITE
Filipa descalça desce as escadas segurando uma vela. Ela
chora. Caminha pela água (detalhe) Até chegar ao altar.
Olha para a imagem de Jesus e chora.
SUMÉRIA: (in off) - Quando você enfraquece a
mente e chega no estágio mais obscuro da alma
e é aí que eles se permitem vê-los. Isso só
mostra o quanto que a vida ou a morte podem
estar no mesmo plano. O que muda é a ótica.
Passos de alguém cheio de sangue. Filipa olha para trás e
vê Nadir toda ensanguentada esticando a mão e pedindo
“socorro”. Filipa grita, escorrega e cai. Apagando a vela.
Padre e Dione descem a escada correndo e não veem nada a
não ser Filipa de debatendo no chão como se tivesse vendo
algo.
PADRE: - O que foi minha, filha?
Dione assustada. Filipa só chora e não fala nada.
(Cont’d) Está tudo bem. Foi só um susto.
Padre faz sinal da cruz. Dione com ar de preocupação.
Corta para:
CENA 44. REPRESA. EXTERNA. AMANHECER
Tempo nublado. Não chove mais. Drone passeia por represa
lotada. Deve revelar as comportas abertas jorrando muita
água.
Fusão com:
CENA 45. RIO. EXTERNA. DIA
Cortes descontínuos. Correnteza forte arrasta árvores e
troncos. Plano Geral: Zeca e alguns homens procuram por
Eurico na mata. Do outro lado da margem. Carros de polícia
estacionado e homens armados. Plano do investigador olhando
atentamente para as marcas de pneu no chão.
Corta para:
CENA 46. FACHADA DO GALPÃO. EXTERNA. DIA
Drama. Muitas pessoas aglomeradas. Pilar sobe na carroceria
do caminhão. Pigarreia antes de falar. Encontra dificuldade
para começar. Enquanto fala, as pessoas lacrimejam. Umas
abraçam as outras.
PILAR: (triste) - Durante a noite choveu
muito. Mais do que o esperado e bem mais que
a capacidade que a represa pode comportar.
Com isso, foi necessário abrir as comportas
da represa e deixar a água vazar aos poucos
para que ela não rompesse de uma vez. Essa
medida foi para evitar uma tragédia maior
para a nossa cidade. Infelizmente o volume de
água aumentou consideravelmente o rio e os
afluentes que cercam nossa Tetembau. Estamos
ilhados. Presos. Ninguém consegue chegar a
Tetembau se não for com embarcações. Há
notícias que na cidade algumas casas foram
alagadas. Para a nossa tristeza, a maior
parte delas na periferia. Sempre o pobre está
no prejuízo. Mas, peço que não se revoltem.
Tão logo a água abaixe e ajudaremos vocês
reconstruir tudo, e juntos, numa ação
humanitária, vamos reconstruir a nossa
Tetembau.
Close em Quitéria abraçada com Pâmela emocionada. Manfred
abraçada Jade e Nadir com carinho. Briane abraça Valdir e
Pablo cos os olhos marejados.
(Cont’d) Não sei se vocês têm parentes que
não se refugiaram em outros lugares, ou se
ficaram. Mas sinto informar que essa hora é
de muita força e oração. Chegou até nós a
informação que o corpo de duas mulheres e um
homem foram encontrados presos às árvores dos
bairros.
Sinira da um grito e desaba em choro abraçando José.
(Cont’d) Força, minha gente. Peço que firmem
vossas cabeças em orações. Força! Enquanto os
bombeiros vindos das outras cidades trabalham
para recuperar nossa cidade e resgatar nossa
gente, vamos organizar aqui uma força tarefa
para que todos tenham o que comer, o que
beber e o que vestir. Vamos precisar da ajuda
de todos.
Burburinho, choros e insatisfação. Briane sobe ao caminhão.
BRIANE: - Por favor, pessoal. Não é hora de
chorarmos o azar. Estamos vivos e precisamos
nos manter vivos. Vamos olhar para frente!
Vamos ajudar. É para frente que se anda. Eu
vou ajudar Dona Pilar que muito tem feito por
nós. Ela não tinha obrigação alguma de nos
receber. E, mesmo assim... o fez, com muito
carinho e empenho. (sincera) Obrigada por nos
ajudar. Eu estou com Dona Pilar para ajudar.
Vamos?! Quem está conosco nessa luta?
Ela ergue a mão. Valdir e Pablo. Aos poucos as pessoas vão
erguendo os braços. DO OUTRO LADO, Gutemberg acolhe Sinira
e José. Sinira não para de chorar. Ele a leva para se
sentar. Ela desmaia.
JOSÉ: (triste) - As irmãs e um amigo nosso
ficaram na cidade. Cremos que possa ser essas
as pessoas que morreram.
GUTEMBERG: (mobilizado) – Meus sentimentos!
Corta para:
CENA 47. COZINHA CASARÃO PIMENTA. INTERNA. DIA
Júlio pensativo tomando café. Gorete entra. Suméria passa
de um lado para outro com bacia de legumes. A conversa de
Júlio e Gorete deve ser truncada. Ela se aproxima da mesa e
se senta diante dele. Enche uma xícara de café.
GORETE: (tensa) - Não preguei os olhos de
preocupação.
JÚLIO: - Tia Léo ligou e avisou que durante a
noite de ontem o papai sofreu uma parada
cardíaca.
Suméria para assustada.
(Cont’d) Foi dado como morto. Mas, como por
um milagre ele melhorou muito de ontem para
hoje.
Suméria abaixa a cabeça e sorri.
GORETE: - Graças a Deus! Ele não pode partir
sem fazer o que pedi. Ele tem que intervir
por ti. Ele é pai!
JÚLIO: - Mãe. Esquece isso! Ele não vai
assumir nada! A senhora o conhece. Não pense
que ele vai mudar por causa do que houve. Ao
contrário, ele voltará mordendo a tudo e a
todos.
GORETE: - Se pensa assim, o que decidiu sobre
aquilo que conversamos?
Suméria encostada na pia descasca batatas. Tenta disfarçar
a curiosidade.
JÚLIO: - Vou ficar. Aquilo que me viu... (se
segura) O que fiz ontem, usarei aqui. Todo
ele. Vou ajeitar a nossa vida. E, Se tiver
que ser culpado por algo, assumirei meu erro.
GORETE: (triste) – Deus nos proteja, Júlio.
Segura as mãos do filho e aperta com força como apoio.
(Cont’d) Não vai ser fácil daqui para diante
se essa é a sua decisão final.
Suméria, curiosa, sai e vai à dispensa. Júlio olha para a
direção que ela saiu e segreda à mãe.
JÚLIO: - Enterrarei esse dinheiro na matinha.
Perto das pedreiras. Desenterrarei conforme
as necessidades.
Suméria ouve por trás da porta.
(Cont’d) (in off) O que tem lá nos vai nos
garantir por um bom tempo.
Suméria sorri.
Corta para:
CENA 48. PRESÍDIO: SALÃO DE VISITA. INTERNA. DIA
Petrônio sentado á mesa. Salvador entra algemado e é solto.
Petrônio levanta e vai abraça-lo.
SALVADOR: - Tão bom um abraço sem as grades
para atrapalhar!
PETRÔNIO: - Nem me fale. Creio que logo o
senhor se verá livre disso tudo.
SALVADOR: (sorri) – É essa esperança que me
faz aguentar esses dias todos preso.
PETRÔNIO: - Acabei de falar com o advogado
que vai defender a sua causa. Está tudo
certo! Também serei arrolado como testemunha.
E, agora, com esse envolvimento de Eurico
tentando matar o tio Leofá, vai ficar mais
fácil de provar a armação dos três.
SALVADOR: - E, seu tio, como está?
PETRÔNIO: - Sobreviveu. Aquilo tem mais sorte
que muita gente1
SALVADOR: - Não fale assim. Ele tem os
defeitos dele, mas é uma vida. Nenhuma vida
merece ser ceifada num assassinato. Se você
soubesse o quão cruel é isso, não desejaria a
morte de ninguém. (T) Ele nem teve como se
defender.
PETRÔNIO: - Pai. Eu sou justo. O tio teve o
que mereceu. E, se ele e safar dessa, pode
ter a certeza que ele não vai parar com as
maldades. Um homem corrompido é um homem de
escolhas ruins para o resto da vida.
SALVADOR: - Palavras duras. (T) Não acredita
na mudança?
PETRÔNIO: - Não!
SALVADOR: - Então não sabe amar, Petrônio. O
amor todo dia se reinventa e é preciso
acompanha-lo se não quiser ficar sozinho.
Você está envelhecendo. Vai precisar de
alguém. Que seja uma escolha por amor. E
quando for pai, verá que a cada minuto terá
que se desdobrar em mudar-se por dentro para
compreender os filhos.
PETRÔNIO: (nocauteado) – Nossa! Sempre uma
lição de vida! Por essa eu não esperava!
Salvador sorri. E segura as mãos dele com carinho.
SALVADOR: - A lição só é dada para quem possa
cumpri-la. Eu confio em você. Faça tudo o eu
fizer pautado pelo amor e nada falhará. Pense
nisso daqui para adiante, meu eterno
defensor.
PETRÔNIO: (sorriso/carinho) – Não esquecerei
essa lição preciosa, pai.
Instrumental. O diálogo entre eles continua empolgado.
Corta para:
CENA 49. QUARTO DO HOSPITAL/COZINHA CAS. PIMENTA. INT. DIA
Corte descontínuo. Luz branca e forte entra pela janela.
Quarto iluminado. De trás das cortinas surge Dona Olímpia
vestida de branco.
OLIMPIA: (carinhosa/chama) – Filho.
Leofá abre os olhos.
(Cont’d) Está na hora. Temos que partir.
LEOFÁ: (emocionado) – Mamãe! Que saudade!
(abre o sorriso) Está tão bonita! Parece um
anjo.
OLÍMPIA: - Sim. Estou aqui onde me colocou.
Agora sou um anjo.
LEOFÁ: (desfaz o sorriso) – Me arrependi,
mamãe. Me perdoa? Eu não queria ter feito
isso com a senhora. Foi mais forte que eu. Me
arrependi cada fio de cabelo e chorei tanto
quando a vi sobre aquela mesa.
OLÍMPIA: (angelical) - Se desprenda disso. Se
desprenda dessa terra, de tudo e de todos.
Venha comigo. Prometo que vou cuidar de sua
cura. Não sentira nada!
Olímpia estende a mão. Leofá estica a mão ao seu encontro.
Efeito espírito saindo do corpo. Apito do eletrocardiograma
invade a cena. Quando está flutuando a luz fica avermelhada
e com sombras. Seu espírito volta a ser sugado pelo corpo.
Olímpia some. O apito para e volta ao normal. Som de graves
batidas de coração. Terror.
Fusão com:
COZINHA:
Suméria banhando o bonequinho com sangue na panela dentro
da dispensa. CAM em travelling passando pelas prateleiras
revela a cena.
SUMÉRIA: - Enquanto um pedaço seu for banhado
de sangue você estará preso a esse mundo.
Esse boneco recheado com seus cabelos me
garante a sua volta para cá. Garante a minha
vingança. Você não vai embora, porque eu não
vou deixar.
Todos os fantasmas em volta de Suméria. Olímpia aparece por
último com aspecto triste.
Fusão com:
QUARTO DO HOSPITAL:
Suspense/Terror. Médicos saem. Eletrocardiograma registra
as batidas normais comprovando que está vivo. Enfermeira
cobre Leofá o peito desnudo de Leofá e sai. Léo aproxima de
seu ouvido e cochicha.
LÉO: - Eu nunca desejei o seu mal e nem
queria isso para você, mesmo descobrindo
todas as suas maldades. Mas, se tiver que ir,
vá! Não se prenda a nada, eu cuido de sua
família. Eu ajeito tudo por aqui.
Instrumental terror. Leofá abre o olho. Léo se afasta
assustada. Ele fecha o olho de novo. Ela faz sinal da cruz
e sai do quarto. Ele sorri.
Corta para:
CENA 50. PONTE DA ESTRADA. EXTERNA. DIA
Tardezinha. Investigador e vários militares atravessam a
ponte e vão ao encontro de Gutemberg e Zeca.
INVESTIGADOR: - Vasculhamos toda a mata! Não
encontramos nem vestígio. Fomos nas fazendas
vizinhas e nada. Só falta a vossa propriedade
e a do vizinho.
GUTEMBERG: - Creio que aqui ele não esteja.
Senão os nossos rapazes teriam o visto.
ZECA: - O menino tem razão. Se, entrou, foi
muito em surdina. Mas creio que não passou
pela nossa guarda não.
INVESTIGADOR: - Posso enviar uma diligência
para vasculhar a propriedade.
GUTEMBERG: - Creio que Sim. Dona Pilar não há
de se importar. É de interesse dela a prisão
desse bandido.
ZECA: - Pode entrar sim. A dona não liga não.
INVESTIGADOR: - O senhor pode acompanhar o
nosso pessoal?
ZECA: - Sim, posso; vamos adentrar.
Zeca sai conduzindo o pessoal pela estrada. Carros passam
por ultimo. Enquanto isso Guto e Investigador conversam.
INVESTIGADOR: - Creio que ele possa estar
aqui nessa fazenda. Meu faro está aguçado.
Esse cara está me desafiando. Quero ir
sozinho para não espantá-lo.
GUTEMBERG: - Não acho que ele iria á casa do
meu tio após tentar assassiná-lo em público.
INVESTIGADOR: (sorri) - Tem gente pra, rapaz.
Se trabalhasse onde eu trabalho veria cada
coisa absurda! (T) Obrigado pela colaboração.
Investigador entra no carro faz a volta e entra na Fazenda
de Cerro Grande. Guto observa o Rio passando por baixo da
ponte.
GUTEMBERG: (aliviado) - Está abaixando. Logo
essas pessoas poderão voltar para as suas
casas.
Corta para:
CENA 51. ENCHENTE TETEMBAU. EXTERNA. ENTARDECER
Bombeiros chegam de barca motorizada. No alto do telhado,
ilhados, Solimar, Serena e João. Solimar tem em seus braços
um álbum e alguns diários. Os bombeiros ajudam Serena e
João a entrar no barco. Solimar, pela roupa e idade
apresenta maior dificuldade. A persistência de Solimar em
proteger os livros deve ser algo maior que seu afetivo.
BOMBEIRO: - Senhora, solte os livros e nos dê
a mão. Vamos lhe ajudar. Depois a senhora
pode voltar para pegá-los.
SOLIMAR: - Não. Não são livros. São álbuns e
diários. A minha vida está presa a isso tudo.
SERENA: - Vem, mulher. Joga para mim e vem
pro barco.
SOLIMAR: - Não. Se cair na água vai estragar.
Podem ir, eu fico esperando a água abaixar.
JOÃO: - Vamos Dona Solimar. Eu prometo que
cuido dos seus livros.
SOLIMAR: (agressiva) - Não são livros!
BOMBEIRO: - Tudo bem. Vamos trocar. Um de nós
temos mais mobilidade. Vamos para e seguramos
os seus pertences enquanto a senhora vem para
cá. Depois o que fiou traz tudo!
SOLIMAR: - jura que não vai molhar?
BOMBEIRO: - Não molhará! Pode confiar.
JOÃO: - Eu seguro esses livros. Os bombeiros
vão precisar tirar a senhora.
Calmamente João desce e pega os livros no telhado. Solimar
abre as pernas com dificuldade para subir no barco. Ela
desequilibra para um lado. Serena coloca o peso para outro.
O barco quase vira. Elas ficam duras com estátuas (comédia)
até que João chega com os livros. Assim que ele senta os
bombeiros ligam a barca e seguem. Solimar tira os livros da
mão de João com força e os abraça com firmeza. Serena
meneia a cabeça negativamente.
Corta para:
CENA 52. GALPÃO MASCULINO/FEMININO. INTERNA. ENTARDECER
Homens descascam legumes e verduras sobre uma grande mesa.
Manfred ajuda. O rapaz da noite anterior passa por ele e o
encara. Valdir sorri.
VALDIR: (baixo tom) - Não disse que ia chegar a
sua vez em alguma hora.
MANFRED: (desabafa) - Isso é só diversão. Nessa
idade eles querem fogo de qualquer jeito.
(pensativo) Mas na hora de assumir um transviado,
eles escolhem as mulheres. Dói menos esconder o
desejo e casar do que ter o desejo e assumir.
VALDIR: (baixo tom) - Eita. Você sempre com uma
resposta negativa na língua. Desse jeito não vai
ser feliz nunca!
Corta para:
GALPÃO FEMININO:
Fogões de tijolos acesos, mulheres mexem em tachos, bules e
panelas. José leva uma caneca de café quente esfumaçando.
Até Sinira que está com feição de choro. Mais ao lado está
Jade e Nadir mexendo as panelas.
JOSÉ: - Trouxe para ti. Está melhor?
SINIRA: - Sim. Meu coração está esperançoso
que elas se salvaram.
JADE: (intromete) – Eu falei! Não falei,
Nadir?
NADIR: - Falou sim! Pensamento positivo traz
energias boas. Só pensar nisso que logo ela
reencontra as irmãs.
JOSÉ: (sorri) – Tá vendo! É isso mesmo. Logo
voltaremos e já marco o casamento e combino a
festa com suas irmãs.
Sinira dá um sorrisinho tímido.
JADE: - Quero ver a festança!
DO OUTRO LADO:
Pâmela e Quitéria separando roupas.
PÂMELA: - Tem umas que só jogando fora mesmo!
QUITÉRIA: - A desgraça torna todos iguais!
PÂMELA: (estranha) – Como?
QUITÉRIA: - Veja lá uma das irmãs abutres
conversando com algumas das meninas. Mas,
nunca que em outro tempo fariam isso.
PÂMELA: (irônica)- Não é a desgraça que torna
os outros iguais. É a hipocrisia que faz se
enxergar diferente, mãe. Se um dia sair daqui
vai ver que o preconceito é menor, embora
ainda exista. Nessa cidade, tudo é excessivo!
QUITÉRIA: - Nasci aqui, me afundei aqui. Aqui
vou morrer. Não saio mais. Mas, quando quiser
ir, eu lhe apoiarei sem dúvida.
PÂMELA: (sorri) – Isso vai demorar um pouco.
Quero curtir a minha mãezinha.
A abraça. Quitéria fica feliz.
Corta para:
CENA 53. FAZENDA CERRO GRANDE. EXTERNA. ANOITECER
Carro do investigador visto do alto. Acompanha na estrada
de terra até chegar na Fachada da Casa de Leofá. Desce do
carro e sobe as escadas. Ajeita a jaqueta e o cabelo.
Fusão com:
CENA 54. CEMITÉRIO DE CERRO GRANDE. EXTERNA. ANOITECER
Eurico arfando pula o muro do cemitério e caminha abaixado
para não ser visto. Caminha entre os túmulos e vê as fotos
dos familiares de Leofá. Com muito custo abre o portão do
mausoléu de Santinha, entra e fecha a grade. Se esconde
debaixo de um pequeno aparador e se tampa com a toalha de
enfeite.
Corta para:
CENA 55. CAS. PIMENTA: SALA/QUARTOS/COZINHA. INT. NOITE
Investigador, Gorete e Suméria na sala.
GORETE: - Como pode ver. Não há ninguém além
de nós na casa.
INVESTIGADOR: (desconfiado) – Aqui não. Bem
verdade! (olha para todos os lados atento)
Poderia olhar os demais cômodos?
Suméria e Gorete trocam olhares. Ele percebe.
(Cont’d) Para averiguação apenas. Não que eu
esteja desconfiando de nada. Só um mero
procedimento, já que vim até aqui.
Gorete assente com a cabeça.
GORETE: - Suméria, o acompanhe, por favor.
QUARTOS:
Procura em todos os quartos, abre portas, gavetas e olha
debaixo da cama. Em clima de suspense, ao entrar no quarto
de Júlio olha mais demoradamente. Abre o guarda-roupa, olha
debaixo da cama. Sai. Suméria dá uma olhada antes de fechar
a porta.
COZINHA:
Olha por toda a cozinha e na porta que dá para a dispensa
vê (OBJETIVA) o balde cheio de sangue coberto por um pano.
Ele abaixa para pegar.
SUMÉRIA: (rápida) – Não!
Suspense aumenta.
(Cont’d) Não toque nisso.
INVESTIGADOR: - O que tem aqui?
SUMÉRIA: (mente) – Caldo grosso! Sarapatel.
(desculpa esfarrapada) Se descobrir antes do
tempo o caldo mingua e não fica suculento.
Crenças antigas de mamãe, mas, sigo sempre.
INVESTIGADOR: - Coisa nojenta! Quem come isso
pode ser capaz de qualquer coisa.
Vira-se e vê Gorete na porta.
(Cont’d) Acho que encerrei. Se virem um homem
com as descrições que lhes dei, por favor, me
liguem. Eu voltarei.
GORETE: - Sim. Ligaremos!
Ele sai devagarzinho. Gorete o acompanha. Júlio sai da
dispensa e gesticula algo.
SUMÉRIA: (baixo) Se esconda e não saia daí.
Corta para:
CENA 56. TORRE DA IGREJA. INTERNA. NOITE
Padre sentado recostado na parede tem as mãos cruzadas
sobre a barriga. Dione em silêncio olha para o nada. Filipa
está incomodada e com medo.
FILIPA: - Tenho fome! Não tem nada na
sacristia para comer?
PADRE: - Infelizmente, não.
FILIPA: - Se demorar para a água abaixar
vamos morrer por inanição.
PADRE: - Não é para tanto. Jesus jejuou
quarenta dias no deserto.
FILIPA: - Mas, ele era Jesus! O escolhido. Eu
não tenho tanta pretensão.
DIONE: - Nem chegaria à tanto. Ele tinha fé e
não sucumbiu às necessidades mundanas.
Filipa olha para Dione com surpresa.
PADRE: (à Filipa) – Aprenda minha filha: Deus
proveu, provê e proverá. Nada acontece sem
que Ele saiba.
Filipa dá de ombros.
Corta para:
CENA 57. CASARÃO PIMENTA: COPA. INTERNA. NOITE
Jantar com candelabros na penumbra. A CAM passeia pela sala
e mostra os enormes candelabros que serão peças principais
nas próximas cenas. Júlio limpa a boca e se levanta.
JÚLIO: - Vou me retirar.
GORETE: - Vai, filho. Também vou. Sem energia
elétrica não resta recursos do que fazer.
Júlio beija a testa da mãe e sai. Suméria retira os pratos.
Olha a janela e vê Epitácio sentado na janela olhando o
nada. Fica assustada e boquiaberta.
(Cont’d) O que foi? Tudo bem com você?
SUMÉRIA: - Ele está aqui.
GORETE: - Quem.
SUMÉRIA: (sussurra) – Epitácio. Na janela!
Gorete se arrepia e cruza doas braços com medo.
GORETE: (medrosa) - Vou para o quarto. Quando
for assim, não me fale nada. Sabe que temo
essas coisas.
Gorete sai. Suméria faz sinal da cruz e sai.
Corta para:
CENA 58. CEMITÉRIO DE CERRO GRANDE/CAS. PIMENTA. EXT. NOITE
Eurico olha através das grades do mausoléu. Sai e caminha
sorrateiro próximo ao muro. Abre o portão do cemitério e
sai. Cortes descontínuos dele caminhando pelo pasto até
chegar até a fachada do casarão Pimenta. Ele abre os braços
e sorri como um louco.
EURICO: - Vou me apossar de sua casa Leofá.
Não tentou me roubar a carreira política?
Agora vou escorraçar com os teus daqui (riso
sádico).
Fusão com:
CENA 59. QUARTO DE LEOFÁ/BANHEIRO/QUARTO DE GORETE/QUARTO
DE JÚLIO/PORÃO/CORREDOR/ESCRITÓRIO. INTERNA. NOITE
Eurico adentra o QUARTO DE LEOFÁ com candelabro aceso. Ele
fecha a porta e caminha pelo luxuoso quarto de Leofá.
EURICO: (tom baixo/admirado) - Então é assim
que o todo poderoso Leofá Pimenta desfruta de
sua intimidade? Com luxo!
Abre o guarda-roupa; passa a mão em roupas penduradas como
uma obra de arte de tão arrumado. Vai até a porta do quarto
e passa a chave.
BANHEIRO:
Eurico coloca a arma sobre a pia. Tira a roupa e entra no
chuveiro. Caretas com a água gelada. Muita fumaça.
QUARTO DE GORETE:
Barulho do chuveiro. Ela se levanta assustada. Faz sinal da
cruz.
GORETE: (para si) – Deus! Proteja-me desses
fantasmas!
QUARTO DE JÚLIO:
Barulho do chuveiro. Júlio abre os olhos assustado.
QUARTO DE LEOFÁ:
Eurico abe a porta do banheiro e entra no quarto nu. Coloca
o candelabro sobre uma cômoda e procura uma roupa.
PORÃO:
Suméria sentada enrolada num chale. Ouve passos acima no
forro.
SUMÉRIA: - Estranho. Dona Gorete não ia dormir? Preciso ver
o que está acontecendo. Povo chato!
ESCRITÓRIO:
Sem revelar ator/atriz. Mão com luva revira as gavetas do
escritório sob luz de vela.
CORREDOR:
Mão com luva segura o candelabro andando pelo corredor e se
aproxima da porta do quarto. Suspense.
QUARTO DE LEOFÁ:
Suspense. Eurico termina de colocar uma roupa. Ajeita e
abre a porta para sair. A mão com candelabro acerta a sua
cabeça. Cai ao chão sangrando. O seu corpo é arrastado.
CORREDOR:
Eurico arrastado desmaiado sem revelar o corpo e a mão de
quem puxa.
Corta para:
CENA 60. FACHADA CASARÃO PIMENTA/ESTÁBULO. EXTERNA. NOITE
Cortes descontínuos. Eurico é jogado pela escadaria. Depois
arrastado até a frente do estábulo. Seus pés são amarrados
numa corda que está presa ao cavalo. A mão bate forte na
traseira do cavalo que dispara. A CAM acompanha um trecho
de Eurico sendo arrastado.
Corta para:
CENA 61. TETEMBAU. EXTERNA. NOITE
Clipe: Cidade alagada. Cortes descontínuos revela o estrago
da chuva. Música: DEZEMBRO (Fagner & Zeca Baleiro).
Fusão com:
CENA 62. CADEIA. INTERNA. NOITE
A música se estende. Travelling. Salvador pensativo chora.
Lágrimas escorrem.
Corta para:
CENA 63. TETEMBAU: PRAÇA. EXTERNA. DIA.
A música perpassa. Água recuada, e praça enlameada. Efeito
sobreposição revela aos poucos as pessoas andando nas águas
e lama. Algumas pessoas surgem varrendo a rua. Aos poucos
os caminhões da prefeitura estacionam na Praça e as pessoas
descem. Dentre elas, Quitéria e Pâmela.
QUITÉRIA: (aliviada) – Jamais me imaginei
dizendo isso, mas senti muita falta de nossa
casa.
PÂMELA: (desanimada) – E, só de pensar que
temos um longo trabalho pela frente me
desanima.
QUITÉRIA: - Força, filha! Temos que cuidar do
que é nosso.
PÂMELA: - E eu só queria quem cuidasse de
mim.
Ela olha para trás e vê Manfred conversando empolgado com o
rapaz. Quitéria se entristece.
QUITÉRIA: (chateada) - Às vezes você vai ter
que ir embora para conhecer o amor.
Música para a cena toda: Brincar de Viver (Maria Bethânia).
Câmera desfoca e revela Sinira descendo desastrada do
caminhão sendo segura por José.
SINIRA: (afoita) - Não vejo a hora de ver
minhas irmãs.
JOSÉ: (apaixonado) - Vai. Vou ver como está a
igreja. Vemos-nos logo.
Despedem-se com um selinho romântico. PLANO GERAL: Nadir e
Jade de braços dados olham para o Boteco.
JADE: - Enfim casa!
NADIR: - E pensar que um dia eu voltaria a
ser feliz em ver esse anto.
JADE: - Digo o mesmo.
NADIR: - Sina é sina! Não podemos reclamar.
Manfred chega por trás e abraça as meninas.
MANFRED: (feliz) – Temos que ter fé que tudo
mudará.
JADE: - Esses olhinhos brilhantes tem nome?
MANFRED: (segura e depois solta) – Tem! É
felicidade o nome do que eu sinto. Agora bora
trabalhar que lá dentro deve estar um regaço.
Vamos retomar nossa casa.
NADIR: (sorri) – Vamos sim. Mas, depois quero
saber o nome real dessa sua felicidade.
Risos. Tocam as mãos.
Corta para:
CENA 64. COZINHA DAS DÁVILA. INTERNA. DIA
Barro em cima de móveis e paredes manchadas. Solimar entra
desolada de braços dados com Serena. Estão tristes por ver
tudo esparramado e sucateado. Solimar com os diários sempre
nos braços. Cena triste.
SOLIMAR: (despedaçada) - E agora? O nosso
ganha-pão. Nossa vida toda foi-se embora,
Serena. O que será de nós daqui para diante.
SERENA: – Seremos as melhores confeiteiras,
irmã. Como sempre fomos. Força e bravura!
Sinira aparece pela porta.
SINIRA: (emocionada) – Temi tanto por vocês!
(chora) Só Deus soube de minha angústia.
Corre abraça-las. O abraço deve ser acompanhado por musica
instrumental e de muito choro e risos. O diário cai no chão
aberto e algumas fotos de Leofá ficam expostas. Sinira
abaixa para pegar. Suspense.
SINIRA: (estranha) – É Leofá?
Solimar e Serena trocam olhares.
Corta para:
CENA 65. ESTRADA. EXTERNA. DIA
Carros de boi. Êxodo das pessoas voltando para cidade. À
frente Valdir puxando o povo. Atrás, Pilar na caminhonete
com Briane. De longe, o carro da polícia se aproxima.
Dentro dele o investigador. Param e abordam Valdir. Briane
e Pilar conversam.
BRIANE: - Queria poder fazer mais coisas por
esse povo, Dona Pilar, assim como a senhora.
PILAR: - Você pode! Você foi corajosa e de
grande ajuda em nossas ações; me demonstrou
bastante equilíbrio.
BRIANE: (insegura) - Dona Léo me prometeu
ajuda política. Não sei se seria possível eu
me tornar uma boa prefeita.
Pilar a olha com surpresa e sorri.
PILAR: - Porque não? Não é o que quer? (T) A
mulher é sensível e capaz de ver além do que
os homens não veem. Porque não ser a primeira
mulher da História de Tetembau a assumir uma
prefeitura?
BRIANE: (sorri) - Obrigada pela confiança.
O carro de polícia se aproxima e sinaliza para encostar a
caminhonete. Pilar vai encostando.
PILAR: (preocupada) – O que será dessa vez?
BRIANE: (apreensiva) - Espero que esteja tudo
bem na cidade!
O investigador desce e se aproxima da caminhonete.
INVESTIGADOR: - Dona Briane?
BRIANE: (assustada) – Sou eu.
INVESTIGADOR: - Poderia vir conosco para nos
ajudar num reconhecimento?
PILAR: (assustada) – Como assim?
INVESTIGADOR: - Encontramos um corpo à margem
do rio amarrado pelos pés a um cavalo. Um ato
e tortura. Suspeitamos que seja o procurado.
As descrições físicas batem, mas está muito
deformado para termos certeza.
Suspense.
Corta para:
CENA 66. IGREJA. INTERNA. DIA
Padre de batina suja limpa tudo com ajuda de Diácono, José
e Dione. Filipa com cara de sono Aparece no ultimo lance de
degraus da escada.
FILIPA: (surpresa) – Como pode? Como aquele
aguaceiro todo sumiu?
PADRE: (sorri) – Como lhe disse ontem: “Deus
proveu”.
Filipa torce o nariz.
Corta para:
CENA 67. QUARTO DO HOSPITAL. INTERNA. DIA
Petrônio tamborila os dedos na cadeira. Leofá deitado. Léo
entra.
LÉO: - A água abaixou. Podemos voltar.
PETRÕNIO: - Que bom! Não via a hora de voltar
para casa e matar a saudade de todos.
Léo se aproxima de Leofá e acaricia o cabelo dele com
carinho. Abaixa e sussurra em sua orelha.
LÉO: - Vai ficar tudo bem.
PETRÔNIO: - É incrível a sua compaixão.
LÉO: - Dessa vida nada se leva. Se fez tudo o
que fez é que por algo lhe doía. Tente
enxergar o mundo pelos olhos do outro.
Empatia é bom.
PETRÔNIO: - Lindo discurso; vamos logo daqui!
Os dois saem. A CAM vai se fechando no roso de Leofá. Ele
abre os olhos arregalados e fecha novamente.
Corta para:
CENA 68. QUARTO DE HOSPITAL/SALA DE ESPERA. INTERNA. DIA
Hospital com paredes manchadas de enchente. Eurico deitado
numa cama com soro. Briane entra com o investigador.
BRIANE: (horrorizada) – Parece ser ele. Não
sei dizer ao certo, o rosto está deformado.
INVESTIGADOR: - Ele tinha algum sinal físico.
Ou algo que só a senhora soubesse?
BRIANE: - Uma pinta no mamilo.
Investigador descobre e a pinta aparece. Ela coloca a mão
na boca mais horrorizada ainda pela confirmação.
Fusão com:
SALA DE ESPERA;
Briane entra lacrimejando. Valdir coloca Pablo no colo de
Pilar e vai até ela.
VALDIR: (sussurra) – E aí?
BRIANE: (tom baixo) - É ele! (segura o choro)
Não consigo entender como fizeram isso com
ele. Será que era para tanto?
VALDIR: (compreensivo) – É chata a situação.
Mas, santo ele não era. Não é verdade?
Corta para:
CENA 69. CADEIA: SALA DE VISITAS. INTERNA. DIA
Léo entra. Salvador corre abraça-la. Música: Sinônimos
(Chitãozinho e Xororó). Os dois se beijam.
SALVADOR: - Já não me aguentava mais sem seus
abraços. (desabafa) Não aguento mais ficar
aqui, Pilar. Estou morrendo aos poucos.
LÉO: - Eu também estou com muita saudade.
Logo você vai sair daqui e seremos felizes
como nunca podemos ser. Seremos, Livres!
Livres!
SALVADOR: - Eu sei que não. A armação foi bem
feita! Eu não tenho mais esperanças. O que me
mantém vivo é o seu amor. A lembrança de seus
olhos, a doçura e o seu sorriso.
LÉO: - Não fala assim. Petrônio esteve atrás
das coisas de seu caso.
SALVADOR: (ansioso) – Pelo menos são notícias
menos pesadas?
LÉO: (sorri) - São coisas boas! O que tenho
pra lhe falar é bom.
SALVADOR: (ansioso) – Pois então, diga logo,
Leopoldina, acabe com essa minha amargura!
Corta para o:
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P R Ó X I M O C A P Í T U L O
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