Boletim Informativo DSIP 6

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Editorial Artigo de Opinião: Rejeições de pescado: acabar com o desperdício! Importância da análise nutricional do pescado Publicações Campanhas de monitorização ambiental recife artificial da Ponta Pequena- 2011 Contributos da certificação para a sustentabilidade da pesca Entrevista: Dra Mafalda Freitas Retrospectiva da DSIP Curiosidades EDITORIAL BOLETIM INFORMATIVO Nº 6| ABRIL-AGOSTO 2011 A sociedade actual despertou para a temática da divulgação cientifica para o público em geral, que pouco ou nada conhece sobre o trabalho que se realiza dentro das instituições de investigação. Jorge Duarte* chamou a atenção para a importância de que “Cada instituição científica possui a responsabilidade social específica não apenas de prestar conta do uso destes recursos, mas de contribuir com a evolução da sociedade e ajudar a torná-la mais justa. E, pela acção de seus integrantes, podem optar por assumir esta responsabilidade ou esconder-se; podem divulgar que produzem conhecimento, mas também serem activas em inserir a ciência nas preocupações e interesses quotidianos”. Todos nós sabemos que divulgar ciência ajuda a melhorar a educação, formando assim uma sociedade crítica, com cabeças pensantes que tenham as ferramentas necessárias para actuar no benefício de todos. Inspirar a juventude é um óptimo começo para alcançarmos a maior entre todas as aventuras: aprender e praticar ciência. Daí a importância de incentivar/ promover visitas de estudo guiadas aos diversos laboratórios existentes na região, incluindo a DSIP, que já realiza essa prática. Estas iniciativas/ actividades podem servir de instrumento impulsionador para uma maior consciência social sobre a actividade científica, o seu papel e importância actual para a sociedade, bem como serem ferramentas para a desmistificação da opinião pública sobre a ciência. Por outro lado, um trabalho bem apresentado ao público poderá render reconhecimento e fundos para continuar as investigações. A população deve ter conhecimento da importância e necessidade da investigação realizada nos nossos laboratórios. Quando o cientista divulga o seu trabalho presta contas à sociedade daquilo em que ela investiu. Finalizando, o nosso trabalho como agentes da ciência deve contribuir para o reforço da investigação pesqueira, para a resolução dos problemas das nossas pescarias regionais, assim como promover a investigação nos meios de comunicação social como elemento-chave para melhorar a projecção/ divulgação da ciência para a sociedade. *Jorge Duarte Jornalista, relações-públicas, mestre e doutoramento em Comunicação Social. Adriana Alves Bióloga da DSIP Nesta edição: Editora : Adriana Alves Redacção : Graça Faria, Sara Reis Gomes e Lina Correia Colaboradores : Graça Faria, Lina Correia, Sara Reis Gomes, Maria João Aveiro, e Antonieta Amorim Fotografia : Antonieta Amorim, Adriana Alves e Rui Reis Ficha técnica:

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Boletim Informativo do Laboratório de Investigaçãs das Pescas- Funchal

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Page 1: Boletim Informativo DSIP 6

Editorial

Artigo de Opinião: Rejeições de

pescado: acabar com o desperdício!

Importância da análise nutricional

do pescado

Publicações

Campanhas de monitorização

ambiental recife artificial da

Ponta Pequena- 2011

Contributos da certificação para a

sustentabilidade da pesca

Entrevista: Dra Mafalda Freitas

Retrospectiva da DSIP

Curiosidades

EDITORI AL

BOLETIM INFORMATIVO Nº 6| ABRIL-AGOSTO 2011

A sociedade actual despertou para a temática da divulgação cientifica para o

público em geral, que pouco ou nada conhece sobre o trabalho que se realiza

dentro das instituições de investigação.

Jorge Duarte* chamou a atenção para a importância de que “Cada instituição

científica possui a responsabilidade social específica não apenas de prestar

conta do uso destes recursos, mas de contribuir com a evolução da sociedade

e ajudar a torná-la mais justa. E, pela acção de seus integrantes, podem optar

por assumir esta responsabilidade ou esconder-se; podem divulgar que

produzem conhecimento, mas também serem activas em inserir a ciência nas

preocupações e interesses quotidianos”.

Todos nós sabemos que divulgar ciência ajuda a melhorar a educação,

formando assim uma sociedade crítica, com cabeças pensantes que tenham as

ferramentas necessárias para actuar no benefício de todos. Inspirar a

juventude é um óptimo começo para alcançarmos a maior entre todas as

aventuras: aprender e praticar ciência. Daí a importância de incentivar/

promover visitas de estudo guiadas aos diversos laboratórios existentes na

região, incluindo a DSIP, que já realiza essa prática. Estas iniciativas/

actividades podem servir de instrumento impulsionador para uma maior

consciência social sobre a actividade científica, o seu papel e importância

actual para a sociedade, bem como serem ferramentas para a desmistificação

da opinião pública sobre a ciência.

Por outro lado, um trabalho bem apresentado ao público poderá render

reconhecimento e fundos para continuar as investigações. A população deve

ter conhecimento da importância e necessidade da investigação realizada nos

nossos laboratórios. Quando o cientista divulga o seu trabalho presta contas à

sociedade daquilo em que ela investiu.

Finalizando, o nosso trabalho como agentes da ciência deve contribuir para o

reforço da investigação pesqueira, para a resolução dos problemas das nossas

pescarias regionais, assim como promover a investigação nos meios de

comunicação social como elemento-chave para melhorar a projecção/

divulgação da ciência para a sociedade.

*Jorge Duarte – Jornalista, relações-públicas, mestre e doutoramento em Comunicação Social.

Adriana Alves Bióloga da DSIP

Nesta edição:

Editora: Adriana Alves

Redacção: Graça Faria, Sara Reis

Gomes e Lina Correia

Colaboradores: Graça Faria,

Lina Correia, Sara Reis Gomes,

Maria João Aveiro, e Antonieta

Amorim

Fotografia: Antonieta Amorim,

Adriana Alves e Rui Reis

Ficha técnica:

Page 2: Boletim Informativo DSIP 6

Todos os anos, grandes quantidades do peixe capturado, são devolvidas ao mar pelos

pescadores europeus, a maior parte já morto. A rejeição (ou devolução ao mar) de

parte da captura de pescado é prática comum em todo o mundo e este valor é excluído das

estatísticas pesqueiras, que não têm acesso ao pescado rejeitado e portanto não é

considerado na avaliação de stocks em que se baseia a gestão pesqueira em geral. Esta

porção de mortalidade por pesca que é infligida aos stocks pesqueiros, afecta também o

recrutamento das coortes. As rejeições devem-se essencialmente a três factores:

quantidades de pescado que excederam os valores acordados a descarregar (excesso de

captura), incumprimento das dimensões mínimas exigidas por lei e falta de valor comercial do pescado (sem

mercado ou preço compensatório).

Actualmente, as rejeições são permitidas em todas as pescarias na União Europeia e o seu volume não consta para o

cálculo de quotas de pesca. Perante esta situação, a Comissão Europeia preparou em 2007 um plano para reduzir as

capturas acessórias e eliminar as devoluções. O fim das rejeições de peixes ao mar, fará parte de uma nova Politica

Comum de Pesca (PCP) que deverá entrar em vigor em 2013, facto que é há muito reivindicado pelas organizações

ambientalistas. Já existem propostas por parte de alguns países para combater a rejeição de pescado como por

exemplo: aplicação de uma quota de captura de modo a que todo o peixe apanhado seja descarregado; redução do

tempo de mar das embarcações de pesca; alterações nas técnicas de pesca e criação de mercados europeus e

internacionais para espécies de peixe actualmente pouco consumidas.

Esta reforma tem tido grande apoio (no Reino Unido as grandes cadeias de supermercado uniram-se ao WWF para

reivindicar a sua implementação) mas os países-membros com maiores quotas de pesca provavelmente contestarão

esta medida, dificultando a sua aprovação. Em Portugal, foi criada em 2009, a Plataforma PONG-Pesca – Plataforma

das ONG Portuguesas sobre a Pesca, para acompanhar e participar na reforma da PCP da União Europeia, sendo

constituída pelo GEOTA, LPN, Quercus, SCIAENA e SPEA. Considerando que quase 90% dos stocks de pesca da

UE são sobre-explorados, as organizações entendem que o objectivo da sustentabilidade no sector das pescas só será

atingido através da inclusão, no novo regulamento da PCP, de objectivos ambientais que sejam prioritários

relativamente aos objectivos económico e social, e da vinculação legal dos pareceres científicos sobre Totais

Admissíveis de Capturas (TAC‟s).

Em relação à realidade das pescarias madeirenses, a maioria das pescarias fazem-se utilizando artes de pesca

selectivas, o que contribui significativamente para a redução de capturas de espécies não desejadas. Contudo as

rejeições continuam a existir, afectando espécies sem valor comercial ou em más condições. No caso dos pequenos

pelágicos existem rejeições por vezes consideráveis, principalmente com a cavala, devido a problemas de mercado.

Segundo Saeterdal (1984) ”A gestão das pescas procura proporcionar o melhor aproveitamento possível dos

recursos em benefício da comunidade”. Proteger o meio marinho e orientar a sua exploração de forma sustentável, de

modo a que as necessidades das gerações futuras não sejam comprometidas pelas acções das gerações actuais,

deverão ser objectivos prioritários da administração pesqueira. Metas estas que só serão alcançadas com

envolvimento e consciencialização por parte da comunidade piscatória. Se fizermos um esforço, poderemos

assegurar a conservação e uso mais eficiente destes recursos, que são um património de todos nós. Proteger hoje para

termos amanhã.

E por isso, pôr fim a práticas de desperdício é o mínimo que podemos fazer! Graça Faria

Bióloga da DSIP

Página 2 Artigo de Opinião

Rejeições de pescado: acabar com o desperdício!

Page 3: Boletim Informativo DSIP 6

Página 3 Importância da análise nutricional do pescado

Segundo a Organização das Nações Unidas para Agricultura e Alimentação, no que respeita aos produtos de pesca e

seus derivados, Portugal revela ter um dos consumos mais elevados da Europa, estimado em 57 Kg/ano/per

capita. O potencial do sector pesqueiro aliado ao crescimento da utilização do pescado como fonte alimentar, exige

um conhecimento da composição bromatológica (composição dos alimentos) e tornam necessárias análises mais

detalhadas sobre a sua composição química. Em geral, a água, as proteínas e os lípidos (óleos e gorduras), perfazem

cerca de 98% dos constituintes principais do pescado, razão pela qual é um produto altamente perecível. Entre os

compostos minoritários salientam-se os minerais, hidratos de carbono e vitaminas.

O pescado constitui uma importante fonte de nutrientes apresentando um valor nutricional semelhante à carne de

aves e mamíferos, no qual se destaca as proteínas de alta qualidade e de rápida digestão. Contudo, considera-se que a

sua grande importância decorre da composição da gordura com elevados teores em ácidos gordos polinsaturados

(PUFA) especialmente os alusivos à família omega-3 (ɷ3). Destacam-se os ácidos eicosapentaenóico (EPA) e

docosahexaenóico (DHA), cuja ingestão tem sido associada à redução dos níveis de triacilglicéridos no sangue.

Estudos realizados com base em intervenção de dietas, comprovaram que o consumo destes ácidos gordos presentes

no pescado ou em óleos derivados, reduzem factores bioquímicos de risco associados a doenças cardiovasculares,

diabetes, artrites e diversos tipos de neoplasias. De salientar que são considerados compostos essenciais para o

Homem, uma vez que a única fonte possível é através da dieta, mas também são vitais para a própria espécie, dado

que quantidades deficientes inviabilizam a fecundidade.

Desde meados de 2009 que são feitas análises de composição bioquímica na DSIP, sobretudo no que respeita aos

lípidos, aos principais recursos pesqueiros a nível regional, de forma a traçar o perfil nutricional das espécies. De

acordo com a quantidade de gordura, os peixes são classificados em magros, semi-gordos e gordos. Exemplos de

espécies de cada uma destas categorias estão indicadas na Tabela 1.

Tabela 1– Classificação dos peixes de acordo com o teor de gordura.

Magro ( < 2%) Semi-gordo (2 a 5%) Gordo ( > 5%)

Pargo (Pagrus pagrus) Peixe-espada preto (Aphanopus spp.)

Cavala (Scomber colias)

Chicharro (Trachurus picturatus)

Page 4: Boletim Informativo DSIP 6

Página 4

No que respeita à qualidade da gordura, está é dada pelo balanço de ácidos gordos essenciais. A informação da

literatura indica, que são nos peixes marinhos de águas frias que encontramos maiores quantidades destes

compostos. Das espécies estudo, os resultados revelam que a cavala além de ser uma espécie considerada gorda, a

qualidade dessa mesma gordura é também elevada (Tabela 2).

A composição bioquímica varia consideravelmente de espécie para espécie e mesmo entre indivíduos da mesma

espécie, influenciada por diversos factores (Tabela 3).

Tabela 2– Teores médios de ɷ3 por 100g de fracção edível Tabela 3– Factores que influenciam a composição química das espécies

É devido a todos estes factores de variabilidade que se torna necessário proceder localmente à análise nutricional.

Maria João Aveiro

Bióloga da DSIP

Publicações:

Morphological identification of two sympatric species of Trichiuridae, Aphanopus carbo and A. intermedius, in NE

Atlantic. Biscoito M., Delgado J., González J.A. , Stefanni S., Tuset V.M., Isidro E., García-Mederos A. & Carvalho D. pages 19-32. 2011. Cybium. http://www.mnhn.fr/sfi/cybium/numeros/351/03-Biscoito%20676%

20Abs.pdf

Factores bióticos Factores abióticos

Estado de maturação sexual Zona geográfica

Reprodução Estação do ano

Sexo Temperatura da água

Disponibilidade alimentar Habitat

Espécie Lípidos totais ɷ3/100g

Cavala 12g 2,15 g

Chicharro 2,8g 0,34g

Espada 2,8g 0,27g

Pargo 0,5g 0,05g

Page 5: Boletim Informativo DSIP 6

Página 5

Realizou-se no passado dia 6 de Abril a 1ª campanha de 2011, para a monitorização ambiental do recife artificial do

Paul do Mar (Calheta), as quais decorrerão mensalmente. Os trabalhos de recolha e medição das variáveis

oceanográficas em estudo foram realizados a bordo da embarcação “Ziphius” do Museu da Baleia/ C.M. Machico,

que permitirá a caracterização ambiental e hidrodinâmica da área.

A avaliação do plâncton e hidrografia na área de instalação do recife,

fornece dados sobre a dinâmica de base da teia trófica dos ecossistemas

marinhos. Para a sua determinação foram efectuadas as seguintes

medições: temperatura, salinidade e oxigénio dissolvido com a

multi-sonda CTD/O2 (Conductivity, Temperature, Depth and Oxygen

Sensor); profundidade de penetração da luz com o disco de secchi e

foram recolhidas amostras de água para determinação de clorofila a e

nutrientes.

A clorofila a é o pigmento fotossintético das microalgas, responsável pela

avaliação da produção primária, dando-nos a indicação da biomassa de algas e

potencial riqueza dos oceanos. Os nutrientes estudados são os nitratos, nitritos,

fosfatos e silicatos, pois são os principais compostos químicos que limitam o

crescimento de diatomáceas e dinoflagelados (microalgas).

Para a determinação de correntes junto à costa foram lançados flutuadores

derivantes para os 0, 5 e 20 metros de profundidade. Foram ainda efectuados

arrastos horizontais de superfície com rede cónica para a avaliação específica

(identificação à espécie, sempre que possível) e quantitativa do ictioplâncton. As

estações de amostragem estão distribuídas ao longo de um transecto

perpendicular à costa, orientado para sudoeste nas batimétricas de 20, 50 e 100

metros.

Estas campanhas inserem-se no Projecto “Repovoamento Costeiro” que tem como objectivo o desenvolvimento de

áreas recifais na costa Sul da Ilha da Madeira visando simultaneamente o papel de recuperação e enriquecimento da

produtividade natural e protecção de áreas contra a pesca predatória. A monitorização ambiental tem sido regular

desde o ano de instalação do recife artificial (2000), e visa o acompanhamento da evolução dos factores bióticos e

abióticos em relação ao estudo prévio

efectuado na área (1996/1997).

Antonieta Amorim

Bióloga da DSIP

Multi-sonda CTD/O2 )

Campanha de monitorização ambiental do recife artificial do Paul do Mar - 2011

Embarcação „Ziphius”

Rede cónica para recolha de plâncton.

Largada de um flutuador para medição de correntes.

Page 6: Boletim Informativo DSIP 6

Página 6 Contributo da Certificação para a Sustentabilidade da Pesca *

Contexto Internacional e Nacional

A crescente procura da certificação de pescarias e de obtenção de rótulos de “pesca sustentável”, surge num contexto de

incremento da preocupação dos consumidores, a nível Europeu e Mundial, com os impactos decorrentes do exercício da

actividade da pesca nas populações exploradas, nos ecossistemas e no ambiente marinho.

Data somente de Janeiro de 2010 a primeira, e única até ao momento, certificação de uma pescaria Portuguesa. Concretamente,

a pesca de sardinha com rede de cerco.

Quem certifica e como?

Um dos programas de certificação mais completos e divulgados actualmente na Europa é o do Marine Stewardship Council

(MSC).

Este programa, que certificou recentemente a pesca da sardinha Portuguesa, é consistente com a normativa FAO de 2005 e

utiliza uma entidade independente, acreditada pela Acreditation Services International (ASI), para verificar a conformidade da

pescaria candidata com as normas de certificação da MSC, a qual funciona assim como organismo normativo, estabelecendo as

directrizes a ser cumpridas pela pescaria candidata. A conformidade com as normas é auditada por uma terceira parte,

independente dos promotores e da entidade certificadora, dando garantia de independência e transparência no processo.

Impõe-se aqui um parêntese para clarificação. No nosso País onde este tema é ainda incipiente, falar-se em certificação de

pescarias, leva, regra geral, a uma conotação com a qualidade do produto comercializado ou presta-se à confusão com o concei-

to de marca ou certificação de origem dos produtos.

Assim, desde logo, o que não é a certificação “pesca sustentável”:

1) Não é um sistema de rotulagem relativo às informações voluntárias, que se podem encontrar em produtos da pesca, relativas à

sua qualidade nutricional (proteínas, gorduras, ómega 3 etc.);

2) Não se refere às características organolépticas do pescado (frescura, apresentação, cor, sabor, etc.);

3) Não avalia o contexto social de produção (comércio justo, etc.);

4) Não certifica a região ou zona de origem do produto, como o faz, por exemplo, a marca: Produto da Madeira, nem confere

qualquer estatuto especial, propriedade ou liga a originalidade e individualidade do produto de forma indissociável a uma

denominação de origem, como acontece, no caso dos vinhos, com as regiões demarcadas.

Qual então o propósito deste processo?

A atribuição da certificação “pesca sustentável”, segue três critérios de avaliação principais, os quais incidem sobre os aspectos

a certificar:

1) O (bom) estado das unidades populacionais exploradas. É avaliada a não ocorrência de sobre exploração, ou seja, se a

pescaria é exercida de forma sustentável, permitindo a capacidade de renovação dos mananciais explorados, não

comprometendo assim a passagem do recurso às gerações seguintes. A pescaria não deverá também originar níveis

desnecessários de capturas acessórias, isto é, não capturar excessivamente espécies que não são o(s) alvo(s) primário(s) da

pescaria;

2) O sistema de gestão. É verificada a conformidade da pescaria com as medidas de gestão legal, em vigor nas zonas de pesca

em causa, caso, por exemplo, da existência de TAC‟s (capturas máximas admissíveis) e quotas ou limitações ao esforço de

pesca, sendo adoptada uma abordagem de precaução no caso de insuficiência de dados científicos;

3) O impacto no ecossistema. É verificado se a pescaria não gera impactos que prejudiquem gravemente o ecossistema e, em

caso de impacto negativo, deve ser capaz de encontrar soluções para minimizá-lo.

A iniciativa é, regra geral, desencadeada e conduzida pelas organizações de produtores ou por uma pescaria específica, com

interesse na certificação, as quais irão beneficiar comercialmente da utilização do rótulo.

O processo, no entanto, inevitavelmente envolve outros stakeholders, nomeadamente a administração do sector e organismos de

investigação pesqueira cujo apoio e orientação deverão concorrer para o seu sucesso.

Page 7: Boletim Informativo DSIP 6

Página 7 Existem pescarias, na Madeira, com condições para iniciar este processo?

Várias pescarias da Madeira se afiguram com possibilidades de configurar uma candidatura sólida à certificação. A apanha de

lapas e pesca de pequenos pelágicos (Ruama) possuem um conjunto de circunstâncias técnicas que as tornam “bons” candidatos

para a certificação. Porquê?

1) São pescarias de pequena dimensão com informação adequada acerca da frota e dos regimes de operação.

2) Os mananciais explorados são constituídos por populações com distribuição local, sem entradas ou saídas significativas por

migração.

3) Existe um bom conhecimento da biologia e dinâmica populacional das populações exploradas e avaliações recentes dos

stocks.

4) Há uma monitorização permanente dos recursos por parte da investigação pesqueira da Madeira e capacidade de intervenção

da Administração na implementação de quadros legais adequados à gestão racional dos recursos.

O caso da pesca Madeirense do peixe-espada preto

A certificação da pescaria do peixe-espada preto, surge como uma tentação óbvia, porém há alguns aspectos que, na nossa

opinião, condicionam uma eventual candidatura que necessita uma preparação ponderada, provavelmente pensada para um

horizonte de médio a longo prazo:

1) Trata-se de uma pescaria de maior dimensão, relativamente às outras atrás referidas, com maior complexidade na obtenção de

informação adequada acerca da frota e dos regimes de operação, sobretudo no segmento das pequenas embarcações menores de

12 metros;

2) Embora exista actualmente um bom conhecimento da biologia e dinâmica populacional das populações exploradas e uma

monitorização permanente do recurso por parte da investigação pesqueira da Madeira, as avaliações de stocks efectuadas

regionalmente serão sempre cientificamente discutíveis em virtude de a investigação local ter acesso apenas à fracção adulta da

população que é alvo da pesca;

3) Acresce o facto dos fortes indícios existentes, que cada vez mais tendem para a consensualização, por parte dos cientistas, de

que estamos em face de um manancial com forte possibilidade de efectuar migrações em extensas áreas do Atlântico norte e centro-oriental, desovando na área geográfica da Madeira e com outras frotas a actuar, a montante do mesmo recurso, pescando

fortemente fracções imaturas da população e, muito provavelmente, influenciando o recrutamento às nossas áreas de pesca e,

consequentemente, a abundância de peixe nos pesqueiros à volta deste arquipélago;

4) A situação tornou-se ainda mais complexa, do ponto de vista técnico-científico com a recente confirmação da presença e

captura de duas espécies de peixe-espada preto nestas áreas (Aphanopus carbo e A. intermedius);

5) A capacidade actual de intervenção da Administração Regional na implementação de quadros legais adequados à gestão

racional desta pescaria, ou no eventual delineamento de planos de gestão ou de recuperação do recurso é, neste caso, limitada

comparativamente às outras pescas regionais mencionadas. Essa situação decorre da obrigatoriedade da aplicação dos modelos

de gestão decididos pela Comunidade Europeia, vigorando actualmente o regime de limitação do esforço de pesca e aplicação

de quotas bienais no âmbito do Regulamento Europeu de acesso às oportunidades de pesca de espécies profundas.

Conclusão

Na nossa opinião, seja qual for o modelo de acesso à certificação adoptado e o horizonte temporal escolhido, inevitavelmente

este caminho será trilhado pela pesca Madeirense, a qual poderá (deverá) encarar resolutamente esta oportunidade de

valorização dos produtos oriundos da pesca regional.

Todavia, o maior benefício a colher será, na nossa perspectiva, o incremento de credibilidade da pescaria - cuja sustentabilidade

biológica passa a ser garantida por um organismo certificador acreditado Internacionalmente - face à governança Europeia do

sector.

Tal facto poderá traduzir-se numa maior capacidade negocial e acesso a maior equidade e justiça na gestão dos recursos

pesqueiros Europeus, nomeadamente em sede de atribuição de TAC‟s e quotas, uma vez que, na prática actual, as frequentes

reduções nas oportunidades de acesso aos recursos são aplicadas em função do aconselhamento científico existente, o qual, sen-

do frequentemente insuficiente ou inexistente no caso dos recursos profundos, força a aplicação transversal da abordagem de precaução, pesando pouco nas decisões a especificidade das distintas pescarias e a abismal disparidade dos seus contributos

relativos para a sobrecapacidade das frotas e sobre exploração dos recursos pesqueiros Europeus, mas, pesando muito, a

capacidade de demonstração irrefutável, por uma determinada pescaria, do seu compromisso com a sustentabilidade biológica

dos recursos que explora.

*Resumo da Comunicação oral:

Delgado, J. & Gouveia, N. 2011. Contributo da certificação para a sustentabilidade da pesca. Cenários para o desenvolvimento da pesca da R.A.M., no horizonte da “nova” Política Comum de Pescas. Semana Bio Madeira, Seminário “Alimentar o Futuro”. Funchal.

João Delgado & Nuno Gouveia Direcção Regional de Pescas

Page 8: Boletim Informativo DSIP 6

Página 8 Secção de Entrevista

Nesta edição, entrevistamos a Dra Mafalda Freitas. Licenciou-se em Biologia Marinha e Pescas pela Universidade do Algarve. Actualmente é Directora da Estação de Biologia Marinha e

Presidente do Clube Naval do Funchal. É mãe de dois filhos.

1.Licenciou-se em Biologia Marinha e Pescas na Universidade do Algarve. Saudades

desses anos? / Qual o professor da UAlg que mais a marcou? Tenho muitas saudades dos tempos que passei no Algarve, principalmente de morar na Ilha de

Faro de pegar no carro e poder ir até Espanha ou até o norte de Portugal e claro da vida

boémia. Tive tanta dificuldade de sair de lá que tive de ser ameaçada pelo meu pai. Gostei muito de estudar numa

Universidade perto do mar e tirar um curso com uma forte componente prática que me foi fundamental para os cargos que hoje ocupo. Anualmente tento ir até Faro e reunir-me com os colegas, tanto com os que ainda lá estão

como com os que estão espalhados pelo restante continente. Assim mantemos sempre o contacto e vamos

recordando os bons tempos. Quanto ao professor que mais me marcou foi sem dúvida o Prof. Emydio Cadima razão pela qual o escolhi para meu orientador.

2.Ocupa o cargo de Directora da Estação de Biologia Marinha, quais os principais objectivos deste

departamento?

Os objectivos da Estação de Biologia Marinha do Funchal são o de promover e divulgar a investigação científica na

área das Ciências do Mar bem como o de manter e aumentar as colecções marinhas do Museu Municipal do Funchal (História Natural) aqui depositadas. Temos ainda como objectivos a promoção do intercâmbio e cooperação com

outras instituições científicas, públicas ou privadas, da Região Autónoma da Madeira ou de fora dela, assegurando

ainda o acolhimento de investigadores visitantes.

3.Qual a sua opinião sobre a investigação marinha em Portugal e particularmente na Madeira?

Vou apenas dar a minha opinião em relação à investigação marinha na Madeira pois não tinha espaço para mais. Sendo a Madeira rodeada por mar é um laboratório vivo por excelência. Devido às suas características

oceanográficas é um dos melhores locais a nível mundial para o estudo do mar profundo por isso penso que ainda

temos muito a desenvolver. A Madeira conta com boas instituições de investigação nesta área como o caso do Laboratório de Investigação das Pescas (DSIP), o Museu de História Natural do Funchal, o Museu da Baleia, o

Centro de Maricultura da Calheta e claro a Universidade da Madeira.

4.Quais os contributos da cooperação entre as diferentes instituições nacionais e estrangeiras, mais

especificamente com DOP (UAç) e ICCM (Canárias)?

Estas duas instituições têm sido os parceiros estratégicos da Estação de Biologia Marinha fora da Madeira. Trabalhamos em projectos de investigação com estas instituições desde 1996, anteriormente à existência da EBMF e

ainda hoje somos parceiros. Penso que juntos e com a DSIP constituímos uma rede de investigação do domínio do

Mar profundo cujos resultados estão à vista.

5.Tendo em conta a situação galopante de desemprego dos nossos recém-licenciados, qual a

mensagem que deixa aos biólogos que anseiam iniciar a sua carreira?

Penso que deverão começar a pensar em empregos alternativos à função pública e se virar para o

empreendedorismo. A Madeira vive do Turismo e penso que na área do turismo ligado ao Mar existem ainda

pequenos nichos a colmatar.

Page 9: Boletim Informativo DSIP 6

Página 9 6.Como se sente sendo a primeira mulher Presidente de um Clube Naval, em Portugal?

Com muito orgulho, pela confiança depositada em mim tanto pelos sócios como pelos meus antigos e presentes colegas de direcção. É um desafio fantástico mas muito trabalhoso. Temos 6600 sócios mais de 600 atletas

federados e fomos o 1º Clube a apurar um atleta para os jogos olímpicos de Londres. Organizamos eventos

internacionais e temos em mãos o Europeu da classe olímpica em prancha à vela RS:X que se realizará em Fevereiro

de 2012. Temos 5 pólos geograficamente separados e 100 colaboradores pelo que é uma grande embarcação.

7.Como consegue conciliar a vida profissional e familiar?

Com muita ajuda da minha família e com muita organização.

8.Quais são os seus planos para o futuro?

Continuar a desenvolver a minha carreira de investigação, divulgar cada vez mais o trabalho que fazemos aqui na

Estacão de Biologia Marinha do Funchal, fazer “um dia” o meu doutoramento e no respeitante ao Clube Naval torna-lo por um lado auto-suficiente e por outro lado continuar a formação da geração futura com valores e muita

ambição desportiva.

Entrevista conduzida por Adriana Alves

Retrospectiva da DSIP

Nesta 2ª Edição, continuamos com a retrospectiva dos 25 anos da DSIP, recordando algumas actividades

desenvolvidas pelos nossos colegas, nomeadamente a participação na reunião da Comissão Internacional para a

Conservação dos Atuns do Atlântico (ICCAT).

1989. 11ª Reunião da ICCAT, realizada no Funchal (Hotel Savoy), de 13 a 17 de Novembro

Os colegas Rui Silva, Lídia Gouveia e José Drumond.

Os colegas Ana Rita Pinto, Graça Faria e Fernando Silva.

Os colegas José Luis Sousa, Dalila Carvalho, Graça Faria,

Ana Rita Pinto e Maurílio Lemos.

Os colegas Carlos Andrade e Antonieta Amorim.

Page 10: Boletim Informativo DSIP 6

Página 10

Assim vai o meio marinho…

Este peixe com atraentes “lábios vermelhos” (Ogcocephalus

darwini), pode ser encontrado perto das ilhas Galapagos e está

adaptado a andar no fundo

marinho, devido às

modificações das suas

barbatanas peitorais e

pélvicas.

Apesar do seu tamanho pequeno, este polvo de anéis azuis

(Hapalochlaena lunulata) é um dos mais perigosos seres

marinhos conhecidos,

devido ao poderoso

veneno que contém.

Habitam as regiões

tropicais do oceano

Pacifico.

Cores nos oceanos…

O bicolor Pictichromis paccagnellae é um garrido exemplar

marinho do Indo-Pacifico.

Está associado aos

recifes de coral.

Os caranguejos do género Trapezia, vivem em associação

com os corais, defendendo-os dos predadores. Esta espécie

(Trapezia rufopunctata)

apresenta o corpo com

manchas avermelha-

das e tem uma ampla

distribuição no Pacífico

Ocidental.

Curiosidades

Direcção de Serviços de Investigação das Pescas

Direcção Regional das Pescas

Estrada da Pontinha 9004-562 Funchal

Tel: 291 203200

Fax: 291 229691

O peixe foi consultar-se com uma cartomante e assim que ela distribuiu as cartas sobre a mesa, profetizou: - Vejo uma moça loira, muito bonita e inteligente, querendo saber tudo sobre ti...

- Oops! Quando e onde é que eu vou conhecer essa gatinha?

- Na próxima semana, no laboratório de amostragem!

Dito ou provérbio… "Nunca tenham medo de inovar. Lembrem-se, a Arca foi construída por amadores, profissionais construíram o

Titanic."

Anónimo...

L. Correia L. Correia L. Correia [email protected]

Pequenininhas…

Qual é o peixe de água quente mais

famoso do mundo?

O peixe cozido.

O que faz um peixe no meio do

oceano?

Nada.