Biorremediacao de Solo Argiloso Contaminado

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UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO DE JANEIRO DOUGLAS GUEDES FERREIRA Biorremediação de Solo Argiloso Contaminado com Gasolina Aditivada com Diferentes Teores de Etanol RIO DE JANEIRO 2010

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dissertação sobre solos contaminados

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  • UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO DE JANEIRO

    DOUGLAS GUEDES FERREIRA

    Biorremediao de Solo Argiloso Contaminado com Gasolina Aditivada com Diferentes Teores de Etanol

    RIO DE JANEIRO

    2010

  • DOUGLAS GUEDES FERREIRA

    Biorremediao de Solo Argiloso Contaminado com Gasolina Aditivada com Diferentes Teores de Etanol

    Dissertao de Mestrado apresentada ao Programa de Ps-graduao em Tecnologia dos Processos Qumicos e Bioqumicos, Escola de Qumica, Universidade Federal do Rio de Janeiro, como requisito parcial para a obteno do Ttulo de mestre em Cincias

    Orientao: Prof. Dra. Eliana Flvia Camporese Srvulo Prof. Dra. Denise Dias de Carvalho

    RIO DE JANEIRO

    2010

  • F383b Ferreira, Douglas Guedes

    Biorremediao de Solo Argiloso Contaminado com Gasolina Aditivada com Diferentes Teores de Etanol/ Douglas Guedes Ferreira. - 2010

    xx, 113 f.: il. Dissertao (Mestrado em Tecnologia dos Processos Qumicos e

    Bioqumicos) Universidade Federal do Rio de Janeiro, Escola de Qumica, Rio de Janeiro, 2010.

    Orientadoras: Eliana Flvia Camporese Srvulo e Denise Dias de Carvalho. 1. Solo Argiloso. 2. Gasolina. 3. Biorremediao. Teses. I. Srvulo, Eliana

    Flvia Camporese (Orient.). II. Carvalho, Denise Dias (Orient.). III. Universidade Federal do Rio de Janeiro, Programa de Ps-graduao em Tecnologia dos Processos Qumicos e Bioqumicos, Escola de Qumica. IV. Ttulo.

    CCD 363.7

  • AGRADECIMENTOS

    Gostaria de agradecer:

    Deus pela sua iluminao e conforto at mesmo nos momentos mais difceis; Aos meus pais, em especial ao meu pai que hoje um exemplo de serenidade e

    sabedoria que me permite encontrar o equilbrio mesmo nos momentos mais

    turbulentos;

    Professora Eliana que foi muito mais que uma orientadora durante toda a nossa convivncia, emprestando seus ombros e ouvidos como uma grande amiga e

    ainda o colo confortvel de uma me amorosa;

    Professora Denise pela colaborao; Dra Mrcia e toda a equipe do Laboratrio de Biocorroso e Biodegradao,

    Instituto Nacional de Tecnologia (Ana, Luciana, Mariana, Miriam e Viviane), que

    permitiram a realizao deste trabalho tanto pelo fornecimento do espao fsico

    quanto pela ajuda na realizao dos ensaios;

    equipe do Laboratrio de Microbiologia Industrial pela amizade e contribuio, principalmente a Juliana e Kally por compartilhar dos momentos de aflio;

    equipe do Laboratrio de Tecnologia Ambiental pela colaborao na realizao desse trabalho, principalmente as tcnicas Suzana e Vernica;

    equipe do Laboratrio de Geotecnia/COPPE pela colaborao na realizao desse trabalho, principalmente a Dra Alcione Chagas;

    s minhas amigas de faculdade que me permitem compreender que mesmo com a vida atribulada ainda possvel manter os laos de amizade, em especial a

    Aline, Andreza, Carol B., Carol K., Juliana, Patrcia e Tatiana;

    minha amiga Fernanda por muitas vezes ser meus olhos, ouvidos e conscincia;

    Ao Conselho Nacional de Desenvolvimento Cientfico e Tecnolgico (CNPq) e PETRORAS pelo fornecimento de bolsa e todo o suporte financeiro para a

    realizao desse trabalho;

    E, todos aqueles que participaram de forma direta ou indireta para que eu alcanasse esse meu objetivo.

  • Qualquer coisa que voc fizer na

    vida ser insignificante, mas muito

    importante que voc o faa

    Mahatma Ghandi

  • RESUMO

    O solo um ecossistema rico em biodiversidade, entretanto as atividades

    antrpicas ameaam a dinmica e at mesmo a permanncia das espcies de

    microrganismos, animais e vegetais que compem esse bioma. O uso intensivo do

    petrleo e seus derivados podem ser apontados como uma das origens dessa

    ameaa ambiental. Dentre os derivados do petrleo, a gasolina se destaca pela

    gerao de efeitos agressivos ao meio ambiente e sade humana. No caso da

    gasolina brasileira ainda existe um agravante, pois a legislao nacional determina

    que a gasolina comercial contenha 25% (v/v) de etanol. Essa adio aumenta a

    solubilidade da gasolina em gua permitindo a maior difuso do contaminante, e, por

    conseguinte aumentando a rea contaminada. Desse modo, h a necessidade de se

    aplicar mtodos de tratamento nas reas afetadas pela contaminao. As opes de

    tratamento incluem tcnicas fsico-qumicas e/ou biolgicas, contudo as tcnicas

    biolgicas so, em geral apresentam custos inferiores s tcnicas fsico-qumicas e,

    ainda, possuem maior aceitabilidade por parte da sociedade e agncias reguladoras.

    Por isso, este estudo dividiu-se em duas partes, a primeira foi realizada em

    microcosmos e teve por finalidade avaliar as condies nutricionais e de umidade na

    biorremediao da gasolina em solo argiloso, bem como verificar se a variao no

    percentual de etanol na gasolina interfere no processo de biorremediao. J a

    segunda parte foi realizada em colunas cilndricas de 60 cm de comprimento e 10

    cm de raio visando verificar a realizao do processo em diferentes profundidades

    de solo. Os resultados obtidos na primeira etapa indicaram que o teor de etanol

    testado (25%) no interfere no processo de biorremediao, por outro lado, o ajuste

    do solo para 50 ppm de fsforo permitiu a remoo de mais 50% do contaminante

    nos ensaios. Baseado nisso, verificou-se que o maior teor de umidade (40%)

    colabora para a maior eficincia do processo. Na segunda etapa, o etanol tambm

    no interferiu na biorremediao, entretanto permitiu que o contaminante atingisse o

    fundo da coluna em um menor intervalo de tempo. A degradao do contaminante

    foi irrisria no solo sem ajuste de nutrientes, enquanto que nos ensaios com ajuste

    de 50 ppm de fsforo foi possvel remover cerca de 70% do contaminante. Esses

    dados indicam que a biorremediao pode ser aplicada no tratamento de solos

    contaminados com gasolina, que introduo de nutrientes crucial para isso, e

    tambm pde-se observar que a presena do etanol no interfere nesse processo.

  • ABSTRACT

    Soil is an ecosystem rich in biodiversity, however human activities threaten the

    dynamic and even the permanence of microorganisms, animals and plants species

    which compose this biome. The intensive use of oil and its derivatives are one of the

    causes these environmental threats. Among the petroleum, gasoline promotes

    harmful effects to the environment and human health. Additionally, the Brazilian

    gasoline still has an aggravating, because the legislation provides that the

    commercial gasoline contains 25% (v / v) ethanol. This addition increases the water

    solubility of gasoline and allows greater diffusion of the contaminant, therefore

    increases the contaminated area. So, its necessary to apply treatment methods in

    the areas affected by contamination. Treatment options include physico-chemical

    techniques and / or biological, but biological techniques have generally lower costs

    than physico-chemical techniques, and also have greater acceptance by society and

    regulator agency. Therefore, this study was divided into two parts, the first one was

    performed in microcosms and aimed to evaluate the nutritional status and moisture

    for gasoline bioremediation in clay soil and verify if the variation in the ethanol

    percentage in gasoline interfere in bioremediation process. The second part was

    performed in cylindrical columns with 60 cm long and 10 cm in radius in order to

    verify the completion of the process in different soil depths. The results obtained in

    the first stage indicated that the concentration of ethanol tested (25%) did not

    interfere in bioremediation process, however, adjusting the soil to 50 ppm of

    phosphorus allowed the removal of over 50% of the contaminant in the assays.

    Based on that, it was found that the higher moisture content (40%) contributes to

    greater efficiency. In the second stage, ethanol also did not interfere in

    bioremediation, however allowed the contaminant to reach the bottom of the column

    in a shorter time interval. The degradation of the contaminant was negligible in the

    soil of nutrients without adjustment, while tests with adjustment of 50 ppm of

    phosphorus was possible to remove about 70% of the contaminant. These data

    indicate that bioremediation can be applied in the treatment of soils contaminated

    with gasoline, the introduction of nutrients is crucial for this, and could also be

    observed that the presence of ethanol does not interfere in this process.

  • LISTA DE FIGURAS

    PGINA

    Figura 1 Representao dos cinco horizontes de um solo completo 18 Figura 2 Classificao textural dos solos segundo departamento de agricultura dos Estados Unidos da Amrica, 1993

    20

    Figura 3 Distribuio dos argissolos e dos latossolos no territrio brasileiro

    21

    Figura 4 Processo de refino do petrleo e as reaes de transformao dos produtos da destilao

    27

    Figura 5 Principais fontes poluidoras do estado de So Paulo 32 Figura 6 Causas da poluio por postos de combustveis na cidade de So Paulo

    33

    Figuras 7 Principais combustveis contaminantes do solo no estado de So Paulo

    33

    Figura 8 Local de coleta do solo argiloso 43 Figura 9 Ilustrao do reator usado no ensaio de diversidade microbiana

    52

    Figura 10 Testes de percolao do contaminante feitos em coluna (mido: 20% de umidade; saturado: 40%)

    53

    Figura 11 Placa multipoo usada para a estimativa da concentrao de bactrias hidrocarbonoclsticas pela tcnica do nmero mais provvel

    55

    Figura 12 Ciclo usado na reao de PCR (polymerase chain reaction) para a identificao de culturas isoladas

    57

    Figura 13 - Avaliao da ecotoxicidade 60 Figura 14 - Constituio granulomtrica do solo argiloso utilizado 61 Figura 15 Teores finais de hdrocarbonetos totais do petrleo, expressos em valores mdios, para a biorremediao de latossolo contaminado com

    10% (m/m) de gasolina em diferentes condies de etanol, fertilizante e

    umidade.

    69

    Figura 16 Concentraes inicial e final de bactrias hidrocarbonoclsticas para biorremediao de solo contaminado com

    gasolina nas diferentes condies ensaiadas usando solo mido.

    73

    Figura 17 Concentraes inicial e final de bactrias hidrocarbonoclsticas para biorremediao de solo contaminado com

    gasolina nas diferentes condies ensaiadas usando solo saturado.

    74

  • Figura 18 Comparao entre o percentual de remoo de HTP e a variao da concentrao de BHC nos ensaios do planejamento fatorial

    (Quadros 5 e 6).

    76

    Figura 19 Percentual de mortalidade de minhocas nos ensaios do planejamento fatorial

    79

    Figura 20 Diagrama de Pareto mostrando a contribuio das variveis estudadas na remoo de hidrocarbonetos totais do petrleo

    82

    Figura 21 Diagrama de Pareto mostrando a contribuio das variveis estudadas para o crescimento das bactrias hidrocarbonoclsticas

    82

    Figura 22 Diagrama de Pareto mostrando a contribuio das variveis estudadas na mortalidade de minhocas (Eisenia fetida)

    83

    Figura 23 Grfico das Mdias relacionando a mortalidade de minhocas e a concentrao de fsforo, com base na umidade (mido-20%;

    saturado-40%)

    84

    Figura 24 Teor de hidrocarbonetos totais do petrleo no ensaio EB-1 em diferentes profundidades ao longo de 60 dias

    87

    Figura 25 Teor de hidrocarbonetos totais do petrleo no ensaio EB-2 em diferentes profundidades ao longo de 60 dias

    87

    Figura 26 Teor de hidrocarbonetos totais do petrleo no ensaio EB-3 diferentes profundidades ao longo de 60 dias

    88

    Figura 27 Teor de hidrocarbonetos totais do petrleo no ensaio EB-4 em diferentes profundidades ao longo de 60 dias

    88

    Figura 28 Variao da populao de bactrias hidrocarbonoclsticas no

    controle CEB-I em diferentes profundidades de solo ao longo do tempo.

    90

    Figura 29 Variao da populao de bactrias hidrocarbonoclsticas no controle CEB-II em diferentes profundidades de solo ao longo do tempo

    91

    Figura 30 Variao da populao de bactrias hidrocarbonoclsticas no ensaio EB-1 em diferentes profundidades de solo ao longo do tempo.

    91

    Figura 31 Variao da populao de bactrias hidrocarbonoclsticas no ensaio EB-2 em diferentes profundidades de solo ao longo do tempo.

    92

    Figura 32 Variao da populao de bactrias hidrocarbonoclsticas no ensaio EB-3 em diferentes profundidades de solo ao longo do tempo.

    94

    Figura 33 Variao da populao de bactrias hidrocarbonoclsticas no ensaio EB-4 em diferentes profundidades de solo ao longo do tempo

    95

  • LISTA DE QUADROS

    PGINA

    Quadro 1 Distribuio de microrganismos em vrias profundidades do solo

    22

    Quadro 2 Fraes tpicas do petrleo 26 Quadro 3 - Componentes da gasolina identificados por Solid Phase Microextraction (SPME)

    29

    Quadro 4 Parmetros analisados para caracterizao do solo 46 Quadro 5 Quadro 5 Matriz do Planejamento Fatorial 22 em Solo com 20% de umidade

    49

    Quadro 6 Matriz do Planejamento Fatorial 22 em Solo com 40% de umidade

    49

    Quadro 7 Matriz dos ensaios controles realizados 50 Quadro 8 Matriz do Ensaio de Biorremediao em Coluna 52

    Quadro 9 Concentrao final dos reagentes na reao de PCR 57 Quadro 10 Caractersticas fsico-qumicas do solo 64 Quadro 11 Caractersticas fsico-qumicas e microbiolgicas do solo corrigido

    67

    Quadro 12 Bactrias isoladas do solo in natura e de amostras dos ensaios de biorremediao

    98

  • SUMRIO

    PGINA

    1. INTRODUO E OBJETIVOS 12 2. REVISO BIBLIOGRFICA 16 2.1. Solo 16

    2.1.1. Formao do Solo 16

    2.1.2. Caractersticas do Solo 18

    2.1.3. Solo Brasileiro 21

    2.1.4. Microbiologia do Solo 22

    2.1.4.1. Fatores que Afetam a Microbiota do Solo 23

    2.2. Petrleo e Derivados 25

    2.2.1. Gasolina 28

    2.2.2. Mistura Gasolina/lcool 30

    2.3. Contaminao dos Solos 31

    2.4. Tratamento de Solos Contaminados 34

    2.4.1. Biorremediao 35

    2.4.1.1. Fatores que Afetam a Biorremediao 37

    2.4.1.2. Avaliao da toxicidade do solo 40

    2.5. Ferramentas Estatsticas 41

    3. MATERIAL E MTODOS 43 3.1. Solo 43

    3.2. Combustveis 44

    3.3. Fertilizante 44

    3.4. Ajuste do pH do Solo 44

    3.5. Preparo do Inculo 45

    3.6. Detalhamento dos Ensaios de Biorremediao 46

    3.6.1. Caracterizao do Solo 46

    3.6.2. Ensaios de Biorremediao em Mocrocosmos 47

    3.6.3. Avaliao da Biorremediao em Colunas 51

    3.7. Anlises Quantitativas 54

    3.7.1. Anlises Microbiolgicas 54

    3.7.1.1. Quantificao das Bactrias Heterotrficas Cultivveis Totais 54

    3.7.1.2. Quantificao das Bactrias Hidrocarbonoclsticas Cultivveis 54

    3.7.1.3. Mtodos Moleculares 55

    3.7.1.3.1. Extrao de DNA 56

    3.7.1.3.2. PCR (polymerase chain reaction) 56

  • 3.7.1.3.3. Seqenciamento das Culturas Isoladas 58

    3.8. Anlises Fsico-Qumicas 58

    3.8.1. pH (potencial de Hidrognio) 58

    3.8.2. Teor de Umidade Total 58

    3.8.3. Teor de Hidrocarbonetos Totais do Petrleo (TPH) 59

    3.9. Anlise de Ecotoxicidade 59

    3.9.1. Teste de mortalidade de Minhocas 59

    3.10. Anlise Estatstica 60

    4. RESULTADOS E DISCUSSO 61

    4.1. Solo 61

    4.2. Avaliao de Parmetros para a Biorremediao da Gasolina 67

    4.2.1. Anlise Estatstica do Planejamento Fatorial 80

    4.3. Ensaio de Biorremediao em Colunas 85

    4.4. Isolamento e Identificao de Microrganismos 96

    5. CONCLUSES 101 6. REFERNCIAS BIBLIOGRFICAS 104

  • Ferreira, D.G. Introduo e Objetivos

    12

    1. INTRODUO E OBJETIVOS

    A superfcie do planeta Terra composta por trs camadas distintas, que so a

    atmosfera, hidrosfera e litosfera. Essas camadas consistem, respectivamente, na

    camada de ar que envolve a superfcie do planeta, e nos ecossistemas aquticos e

    terrestres. Por sua vez, a associao dessas trs camadas permite a existncia de vida,

    representada por seres humanos, animais, vegetais e microrganismos, que juntos

    compem a biosfera (Oliveira, 2008).

    A biosfera varia com o ambiente. Por exemplo, o solo um ecossistema rico em

    biodiversidade, em grande parte composta por microrganismos. Por outro lado, a

    dinmica dessas espcies microbianas autctones pode ser alterada artificialmente por

    atividades antrpicas, principalmente, em conseqncia do desenvolvimento dos

    centros urbanos e dos setores industriais. As atividades humanas tm provocado a

    poluio do meio ambiente, de modo crescente e descontrolado, particularmente pela

    circulao da elevada frota de veculos automotores.

    Um levantamento realizado na cidade de So Paulo mostrou que os postos de

    combustveis so as maiores fontes de poluio, sobretudo atravs de vazamentos em

    tanques de armazenamento e em tubulaes (CETESB, 2005; CETESB, 2006). No

    caso dos vazamentos nos tanques de armazenamento de combustveis, 72% dos

    registros foram atribudos ao derramamento de gasolina, seguidos pelo leo diesel

    (19%) e etanol combustvel (2%). Esses dados, obviamente, so decorrentes da grande

    circulao de veculos nos grandes centros urbanos, da maior frota de veculos movidos

    a gasolina, e do tempo de vida til dos tanques de armazenamento, de

    aproximadamente 30 anos, j ter expirado (CETESB, 2005).

    Os vazamentos de gasolina apresentam grande importncia, poisos

    hidrocarbonetos que compem esse combustvel provocam impactos graves ao meio

    ambiente e sade humana (Corseuil & Fernandes, 1999; Niven, 2005).

    A gasolina uma mistura complexa de hidrocarbonetos, que pode variar de

    acordo com a composio do leo de origem e dos aditivos adicionados para a

    comercializao. Em geral, os hidrocarbonetos que compem esse combustvel

  • Ferreira, D.G. Introduo e Objetivos

    13

    apresentam cadeias de estrutura varivel que possuem de 4 a 12 tomos de carbono

    (Harris, Whiticar & Eek, 1999). Dentre os hidrocarbonetos, destacam-se os compostos

    aromticos volteis benzeno, tolueno, etilbenzeno e os ismeros orto-, para- e meta-

    xileno (BTEX), pela sua elevada toxicidade sade humana atuando como, por

    exemplo, depressores do sistema nervoso central, agentes mutagnicos e

    carcinognicos. Alm disso, em relao aos demais hidrocarbonetos presentes na

    gasolina, os BTEX apresentam maior solubilidade em gua, o que permite que, em

    casos de vazamento, esses compostos possam no s ser nocivos as atividades no

    solo, mas tambm comprometer a potabilidade das guas subterrneas (Corseuil &

    Fernandes, 1999; Niven, 2005).

    No caso da gasolina comercializada no territrio nacional, a presena de 25%

    etanol (Art. 1, Resoluo CIMA, n37 de 27/06/2007) tem sido motivo de preocupao

    para os rgos ambientais. Isto se deve a solubilidade do etanol em gua que, pelo

    fenmeno de co-solvncia, poderia agir como uma ponte para a solubilizao dos

    hidrocarbonetos. Dessa forma a presena do lcool permitiria que, em casos de

    vazamento, o contaminante se alastrasse mais, atingido uma maior rea de solo e,

    inclusive, que maiores concentraes alcanassem as guas subterrneas (Corseuil &

    Fernandes, 1999; Niven, 2005).

    Portanto, no caso de ocorrerem acidentes seja por vazamentos de tanques de

    armazenamento de gasolina ou pelo seu transporte imprescindvel que sejam

    definidas estratgias para a remediao da rea impactada, de modo a conter o

    contaminante e tentar reconstituir a condio natural da rea afetada (Riser-Roberts,

    1998).

    Algumas tcnicas j foram desenvolvidas para o tratamento de reas

    contaminadas por petrleo e seus derivados. Dentre essas, as tcnicas fsico-qumicas,

    que envolvem o emprego de substncias qumicas e fatores fsicos como, por exemplo,

    temperatura e presso, so de uso freqente devido grande eficincia e ao curto

    perodo de tratamento. Porm, alm do alto custo, esses tratamentos apresentam

    inconvenientes, como a gerao de grandes volumes de rejeitos contaminados (guas

  • Ferreira, D.G. Introduo e Objetivos

    14

    e solventes), e risco de poluio atmosfrica atravs da volatilizao de alguns

    compostos (Riser-Roberts, 1998; Khan, Husain & Ramzi, 2004).

    Uma alternativa aos mtodos fsico-qumicos so os mtodos biolgicos que

    consistem na aplicao de organismos vivos capazes de atuar na remoo do

    contaminante. Os tratamentos biolgicos tambm apresentam grande eficincia, em

    geral, so menos onerosos e possuem maior aceitabilidade por parte da sociedade e

    agncias reguladoras. Entretanto, tambm possuem desvantagens como tempo maior,

    a dependncia de condies ambientais e a especificidade do processo (Riser-Roberts,

    1998; Iwamoto & Nasu, 2001; Khan, Husain & Ramzi, 2004).

    A biorremediao um exemplo de tratamento biolgico que se baseia na

    capacidade dos microrganismos de modificar ou decompor o contaminante. Essa

    tcnica, diferentemente das tcnicas fsico-qumicas, pode permitir como benefcio

    mximo a mineralizao do contaminante (Riser-Roberts, 1998; Khan, Husain & Ramzi,

    2004).

    Nos solos, a biorremediao da rea contaminada, pode ser efetuada pela ao

    dos microrganismos autctones que, dependendo do caso, pode ser estimulada pela

    introduo de nutrientes (bioestimulao). Alm disso, quando a concentrao de

    microrganismos baixa ou a microbiota nativa no capaz de degradar os compostos

    xenobiticos, pode ser feita a introduo no solo de microrganismos com potencial

    degradador (bioaumento), a fim de aumentar a remoo do contaminante (Bento et al.,

    2005; Olaniram, Pillay & Pillay, 2006; Serrano et al., 2007; Stucki et al., 2007).

    A aplicao da biorremediao no tratamento de ecossistemas contaminados com

    gasolina j foi alvo de alguns estudos (Corseuil et al., 1996; Phelps & Young, 1999;

    Yerushalmi, Manuel & Guiot, 1999; Barbaro & Barker, 2000; Kao & Wang, 2000;

    Solano-Serena et al., 2000; Rahman et al., 2002; Silva & Alvarez, 2002; Landmeyer &

    Bradley, 2003; Ghazali et al., 2004; Nardi et al., 2005; Tiburtius, Peralta-Zamora &

    Emmel, 2005; Baldwin, Nakatsu & Nies, 2007; Dou et al., 2007). No entanto, poucos

    trabalhos deram nfase ao papel e aos efeitos da presena de lcool em associao a

    adio de fertilizante no processo. As informaes disponveis na literatura indicam que

    a presena de lcool na gasolina resulta no aumento dos danos ao ambiente e interfere

  • Ferreira, D.G. Introduo e Objetivos

    15

    negativamente na atividade microbiana (Corseuil et al., 1996; sterreicher-Cunha et al.,

    2004; Niven, 2005; sterreicher-Cunha et al., 2007; sterreicher-Cunha et al., 2009).

    Ademais, no h registros sobre os efeitos da variao da concentrao de etanol na

    gasolina, tampouco registros relacionados interferncia das condies nutricionais ou

    de umidade. Nesse contexto, e considerando a relevncia da contaminao dos solos

    urbanos com combustveis, fundamental conhecer as possveis implicaes da

    interao do contaminante com o ecossistema.

    Este estudo teve como objetivo principal a avaliao do processo de

    biorremediao da gasolina, aditivada ou no com etanol anidro, em solo argiloso, em

    funo da condio nutricional, da umidade do solo e da profundidade do solo. Para

    tanto, foram delineados os seguintes objetivos especficos:

    Caracterizar o solo quanto aos seus aspectos fsico-qumicos e microbiolgicos; Realizar ensaios em microcosmos, baseados em um planejamento fatorial, para

    verificar a significncia da umidade, da concentrao de etanol na gasolina e do

    bioestmulo no processo de biorremediao da gasolina;

    Determinar o efeito da adio e da concentrao de etanol (0, 12,5 e 25%) gasolina no processo de biorremediao, atravs do planejamento fatorial;

    Estimar a influncia da condio nutricional do solo na degradao dos hidrocarbonetos do petrleo pelo ajuste da concentrao de fsforo para 25 e 50

    ppm, atravs do planejamento fatorial;

    Avaliar a toxicidade do solo aps a biorremediao, nos ensaios de microcosmos, utilizando aneldeos da espcie Eisenia fetida;

    Realizar ensaios em colunas para avaliar o efeito da concentrao de etanol na gasolina e da umidade do solo na percolao do contaminante no solo;

  • Ferreira, D.G. Reviso Bibliogrfica

    16

    2. REVISO BIBLIOGRFICA

    2.1. Solo

    Segundo a Pedologia*, o solo pode ser definido como um corpo natural

    resultante da ao conjunta de vrios processos pedogenticos quer biolgicos quer

    ambientais, que se constituem nos fatores de formao do solo (Jenny, 1994;

    Oliveira, 2008).

    2.1.1. Formao do Solo

    Em geral, a formao e a evoluo do solo ocorrem atravs da ao de quatro

    fatores de formao: material de origem; clima; relevo; e seres vivos (Oliveira, 2008).

    O solo tem sua origem nas rochas presentes na litosfera, do grego, lithos, que

    significa pedra, basicamente formada por trs grandes grupos de rochas:

    magmticas; metamrficas; e sedimentares (Oliveira, 2008).

    As rochas magmticas so resultado do resfriamento e da consolidao do

    magma, enquanto que as rochas sedimentares se originam da compactao dos

    sedimentos. J, a formao das rochas metamrficas ocorre a partir da ao da

    temperatura e da presso atmosfrica sobre as rochas sedimentares e magmticas

    (Amaral & Leinz, 2001).

    Esses trs tipos de rocha apresentam composio elementar semelhante, em

    geral, compostos por: oxignio (62,6%), silcio (22,1%), alumnio (6,5%), sdio

    (2,6%), ferro (1,9%), clcio (1,9%), magnsio (1,4%) e potssio (1%) (Oliveira,

    2008).

    Na superfcie, as rochas ficam expostas a uma srie de fatores ambientais -

    biticos (ao dos seres vivos) e abiticos (ao de interaes qumicas e de

    agentes climticos) - que provocam o desgaste e o enfraquecimento das rochas.

    Esse fenmeno denominado intemperismo, e pode ser classificado como qumico,

    fsico ou biolgico de acordo com o seu agente promotor (Gordon & Dorn, 2005;

    Turkington, Phillips & Campbell, 2005; Oliveira, 2008). Ademais, o grau de

    intemperismo possibilita a formao de diferentes tipos de solo.

    * Pedologia cincia que estuda o solo.

  • Ferreira, D.G. Reviso Bibliogrfica

    17

    Na formao do solo, o clima e o relevo agem de maneira integrada, e

    interferem diretamente na ocorrncia e na velocidade dos fenmenos, uma vez que

    esto relacionados a dinmica e ao escoamento da gua no solo, a incidncia da

    radiao solar na sua superfcie, e conseqentemente, na temperatura do solo

    (Oliveira, 2008). Como a radiao solar atinge apenas a superfcie do solo, nela

    onde ocorrem as maiores variaes de temperatura. Entretanto, com o aumento da

    profundidade, a temperatura tende a diminuir at um ponto de isotermia, que em

    solos da regio intertropical ocorre a partir da faixa entre 50 e 100 cm (Oliveira,

    2008).

    Os seres vivos flora, fauna e microbiota colaboram diretamente no processo

    de formao do solo, seja em sua superfcie ou em seu interior. Particularmente, a

    microbiota nativa atravs dos microrganismos autotrficos atuam desde os estgios

    iniciais do intemperismo, com a secreo de produtos do seu metabolismo capazes

    de dissolver sais e outros nutrientes inorgnicos da rocha matriz. A esfoliao das

    rochas por esses agentes qumicos promove o acmulo de partculas sobre a rocha

    matriz, que formam a camada superficial do solo. Ao longo do tempo, essa camada

    superficial se expande e a matria orgnica presente, oriunda principalmente dos

    microrganismos, viabiliza que outros seres possam se desenvolver. Assim,

    microrganismos heterotrficos, animais e vegetais, do continuidade ao processo de

    formao e evoluo do solo.

    A evoluo do solo tambm est envolvida no aumento da espessura dessa

    camada superficial, afastando cada vez mais a rocha matriz da superfcie do solo. E

    entre a superfcie do solo e a rocha matriz so formadas camadas de solo

    denominadas de horizontes que diferem, entre si, em composio e em grau de

    intemperismo (Oliveira, 2008). O nmero de horizontes varia com o tipo e o estgio

    de evoluo do solo, uma vez que o processo evolutivo do solo ininterrupto e,

    portanto, estando em constante transformao e sujeito a ao dos fatores de

    formao (Oliveira, 2008).

    Genericamente, um solo com o seu processo de formao concludo apresenta

    cinco diferentes horizontes (O, A, B, C e R), como mostra a Figura 1 (EMBRAPA,

    1988). Ressalta-se que a separao entre os horizontes no abrupta, mas sim

    gradativa. Assim, possvel observar regies intermedirias que apresentam

    caractersticas mistas tanto na camada superior quanto na inferior.

  • Ferreira, D.G. Reviso Bibliogrfica

    18

    Em paralelo s aes naturais, as atividades antrpicas, tais como a

    agricultura, o desmatamento, o reflorestamento, as construes e a poluio

    tambm esto envolvidas no processo de transformao e evoluo do solo

    (Oliveira, 2008).

    Fonte: Adaptao de http://www.dct.uminho.pt/pnpg/gloss/gifs/perfil_ampl.jpg; Oliveira (2008).

    Figura 1 Representao dos cinco horizontes de um solo completo.

    2.1.2. Caractersticas do Solo

    O solo se divide basicamente em trs fases: lquida (gua e soluo do solo),

    gasosa (vapor dgua, CO2, O2, NH3 e outros gases) e slida (partculas de solo e

    seres vivos). As fases lquida e gasosa so complementares e ocupam os espaos

    vazios formados entre os slidos (Prevedello, 1996).

    A gua ao penetrar no solo dissolve alguns dos componentes qumicos nele

    presentes, formando uma soluo constituda de diferentes ons como, por exemplo,

    NO3-, H2PO4-, SO42-, Cl-, Na+, K+, Ca2+, H+ e NH4+. Essa soluo recebe o nome de

    soluo do solo. A composio qumica da soluo do solo, bem como o grau de

    intemperismo conferem ao solo diferentes caractersticas, principalmente

    relacionadas consistncia, textura, porosidade, permeabilidade e colorao

    (Oliveira, 2008).

  • Ferreira, D.G. Reviso Bibliogrfica

    19

    A consistncia o aspecto ttil que o solo assume baseado nas interaes das

    partculas (foras de coeso) entre si e com a soluo do solo (foras de adeso).

    Por isso, a consistncia pode variar de acordo com a umidade, composio qumica

    e tamanho das partculas do solo (Lodi, 2007).

    O tamanho das partculas de solo tambm interfere na textura do solo, sendo

    as principais partculas quelas com tamanho inferior a 2 mm (areia, silte e argila).

    No solo, essas partculas se arranjam formando espaos vazios, que se constituem

    nos poros do solo. O tamanho dos poros varivel, distinguindo-se em macro e

    microporos. Os macroporos so importantes para a aerao e infiltrao da gua no

    solo, j os microporos esto relacionados com o armazenamento da gua no solo.

    Para os poros de tamanhos intermedirios, atribui-se a conduo dos gases e da

    gua no solo (Oliveira, 2008).

    A proporo das partculas de areia, silte e argila adotada para classificao

    dos solos em trs grandes grupos: arenoso, siltuoso e argiloso. No entanto, classes

    intermedirias tambm podem ser encontradas como ilustra a Figura 2

    (Departamento de Agricultura dos EUA, 1993).

    Na escala textural, as partculas de areia so as maiores (2,0 a 0,05 mm) e se

    compem, principalmente, por materiais resistentes ao intemperismo como, por

    exemplo, quartzo e dixido de titnio (TiO2). Em geral, essas partculas apresentam

    superfcie especfica reduzida e fracas interaes de coeso e adeso. Por conta do

    seu tamanho e das interaes qumicas, os solos com alto teor de areia apresentam

    alta permeabilidade e porosidade (CETESB, 2001; Oliveira, 2008).

    J as partculas de silte, com dimetro entre 0,05 e 0,002 mm, so constitudas

    tanto por materiais resistentes (dixido de titnio e quartzo), quanto por materiais

    sensveis ao intemperismo (feldspatos, micas, anfiblios e outros minerais

    primrios). As partculas de silte apresentam fortes interaes entre si, o que faz

    com que, em comparao com as partculas de areia, apresentem menor

    permeabilidade e maior capacidade de reteno de gua (CETESB, 2001; Oliveira,

    2008).

  • Ferreira, D.G. Reviso Bibliogrfica

    20

    Fonte: http://media-2.web.britannica.com/eb-media/21/24021-004-3F055051.gif;

    (Departamento de Agricultura dos EUA, 1993).

    Figura 2 Classificao textural dos solos.

    Comparativamente, a argila a partcula de menor tamanho, com dimetro

    inferior a 0,002 mm, e, portanto, grande superfcie especfica (CETESB, 2001;

    Oliveira, 2008). Tambm apresentam carga inica pela presena xidos de ferro e

    de alumnio. Em relao areia e ao silte, a argila a que possui a maior

    capacidade de interagir com ons e reter gua.

    Os solos podem apresentar diversas coloraes que dependem da proporo

    dos compostos qumicos neles presentes. Por exemplo, a existncia de altas

    concentraes de xidos de ferro e/ou alumnio no solo confere a ele coloraes que

    variam do amarelo ao vermelho. J xidos de mangans causam o enegrecimento

    do solo, enquanto o carbonato de clcio gera o seu branqueamento. Por outro lado,

    a presena de material orgnico confere ao solo uma colorao mais escura

    (EMBRAPA, 1999). Considerando que a concentrao dos compostos qumicos

    varia no solo, este pode apresentar diferentes matizes (EMBRAPA, 1999; Oliveira,

    2008).

    Clay Argila Sand Areia Silt Silte Loam Franco Percent - Percentual

  • Ferreira, D.G. Reviso Bibliogrfica

    21

    2.1.3. Solo Brasileiro

    No Brasil h predomnio de duas classes de solos argilosos - Latossolos e os

    Argissolos (Oliveira, 2008) - cuja distribuio pode ser observada na Figura 3. Essas

    duas classes de solo se subdividem em diversos tipos que se distinguem quanto as

    constituies qumica, granulomtrica e estrutural. As denominaes desses solos,

    normalmente, esto relacionadas a estrutura, colorao e textura, como, por

    exemplo, Argissolo amarelo distrfico arnico (EMBRAPA, 1999).

    Fonte: Adaptao de http://www.dcs.ufla.br/Cerrados

    Figura 3 Distribuio dos Argissolos e dos Latossolos no territrio brasileiro.

    Os Latossolos ocupam mais de 50% da extenso do territrio nacional e

    caracterizam-se pelo avanado estgio de intemperismo e reduzida reserva de

    nutrientes. Enquanto que os Argissolos recobrem pouco mais de 30% do solo

    nacional, e se caracterizam pela presena de uma camada mineral subsuperficial

    com caracterstica franco-arenosa imediatamente abaixo ao horizonte A (Santos et

    al., 2006).

    ArgissoloLatossoloArgissoloLatossoloArgissoloLatossolo

  • Ferreira, D.G. Reviso Bibliogrfica

    22

    2.1.4. Microbiologia do Solo

    Em geral, o solo um ecossistema composto por um elevado nmero de

    organismos, com predominncia de microrganismos em termos quantitativos e em

    diversidade de espcies (Moreira & Siqueira, 2006). A microbiota autctone dos

    solos engloba seres procariotos (Archaeas e Bactrias) e eucariotos (Fungos,

    Microalgas e Protozorios).

    A atividade biolgica mais intensa na camada superficial do solo (at cerca de

    20 cm de profundidade), pois nessa camada encontra-se um maior acmulo de

    nutrientes, que resultam da deposio de materiais vegetais e animais (Madigan,

    Martinko & Parker, 2004; Moreira & Siqueira, 2006). A variao qualitativa e

    quantitativa das populaes microbianas encontradas nas diferentes camadas de

    solo pode ser observada no Quadro 1.

    Os microrganismos tm papel de destaque no processo de formao do solo.

    No entanto, uma vez o solo formado, os microrganismos continuam participando

    ativamente de fenmenos como decomposio de matria orgnica, produo de

    hmus, ciclagem de nutrientes e de energia, decomposio de compostos

    xenobiticos e no controle biolgico de pragas e doenas (Riser-Roberts, 1998;

    Madigan, Martinko & Parker, 2004). Em geral, essas atividades so realizadas pela

    interao das diferentes espcies microbianas em comunidades, o que torna o solo

    um ecossistema rico em biodiversidade. Todavia, a biodiversidade pouco

    Quadro 1 Distribuio de microrganismos em vrias profundidades do solo

    Profundidade Microrganismos por grama de solo

    Bactrias Aerbicas

    Bactrias Anaerbicas Actinomicetos Fungos Algas*

    3-8 7,8 x 106 2,0 x 106 2,1 x 106 1,2 x 105 2,5 x 104

    20-25 1,8 x 106 3,8 x 105 2, 5 x 105 5,0 x 104 5 x 103

    35-40 4,72 x 105 9,8 x 104 4,9 x 104 1,4 x 104 5 x 102

    65-75 1,0 x 102 1 x 103 5 x 103 6 x 103 1 x 102

    135-145 1,0 x 101 4 x 102 - 3 x 102 - *Inclui as cianobactrias

    Fonte: Moreira & Siqueira (2006).

  • Ferreira, D.G. Reviso Bibliogrfica

    23

    conhecida devido a uma srie de limitaes metodolgicas, tais como, a

    heterogeneidade espacial, a adeso dos microrganismos na matriz do solo ou nos

    tecidos vegetais, a similaridade morfolgica dos microrganismos, as ambigidades

    nas chaves taxonmicas e a dificuldade do cultivo in vitro de vrias espcies pela

    impossibilidade de se reproduzir as condies nutricionais e ambientais de cada

    micronicho (Hill et al., 2000; Kirk et al., 2004). Alm da importncia de conhecer as

    espcies que compem a biodiversidade do solo h tambm um grande interesse no

    potencial biotecnolgico dessas espcies, principalmente naquelas capazes de

    degradar compostos xenobiticos.

    Os estudos iniciais foram feitos baseados em mtodos fenotpicos que, devido

    pequena quantidade de microrganismos cultivveis e semelhana na estrutura e

    na composio celular, mostraram-se pouco representativos (Hill et al., 2000; Kirk et

    al., 2004). Todavia, os avanos tecnolgicos e cientficos permitiram que atualmente

    diversas metodologias possam ser aplicadas para o estudo da dinmica e da

    biodiversidade dos mais variados ecossistemas, baseadas nas caractersticas dos

    microrganismos, quer fenotpicas quer genotpicas (Hill et al., 2000; Kirk et al., 2004;

    Leckie, 2005; Liu et al., 2006). Como exemplos, as tcnicas moleculares, que

    embora apresentem algumas desvantagens para estudos da biodiversidade em

    solos, ainda so mais fidedignas e representativas do que as tcnicas baseadas em

    cultivos in vitro (Wolk, Mitchell & Patel, 2001; Kirk et al., 2004).

    Alguns autores j conseguiram mostrar que, no solo, h uma grande e intensa

    dinmica populacional microbiana estimulada por diversos fatores ambientais, como

    estresse nutricional, variaes de pH, distribuio de gases, quantidade de gua e

    variaes de temperatura (Degens et al., 2001; Insam, 2001; Moreira & Siqueira,

    2006).

    2.1.4.1. Fatores que Afetam a Microbiota do Solo

    Em geral, o solo contm uma ampla diversidade de compostos orgnicos e

    inorgnicos, cujas concentraes variam de acordo com o tipo e as caractersticas

    do solo. Naturalmente, a matria orgnica presente no solo origina-se de resduos

    de plantas, animais e microrganismos, no entanto em alguns casos de contaminao

    tambm podem ser encontrados compostos xenoiticos.

  • Ferreira, D.G. Reviso Bibliogrfica

    24

    No solo, a matria orgnica formada basicamente por resduos de plantas,

    animais e microrganismos e, em casos de contaminao, por compostos

    xenobiticos. A distribuio da matria orgnica varia, e sua degradao depende

    das propriedades qumicas, fsicas e biolgicas dos micro-habitats, bem como da

    disponibilidade desses compostos degradao (Moreira & Siqueira, 2006). A baixa

    concentrao de nutrientes no solo pode ser um fator limitante para o metabolismo

    microbiano, interferindo na sntese de energia, na diviso celular, na mobilidade e

    at nas relaes simbiticas (Moreira & Siqueira, 2006).

    Alm da disponibilidade de nutrientes, o pH um dos fatores essenciais para a

    atividade microbiana. A maioria dos solos apresenta valor de pH na faixa entre 4,0 e

    8,5. Os horizontes superficiais dos solos, em regies de clima mido, tendem a ser

    mais cidos devido lixiviao dos compostos formados pela decomposio da

    matria orgnica. Por outro lado, em regies de clima seco, o solo tende a

    apresentar um carter alcalino (Moreira & Siqueira, 2006).

    A diversidade metablica dos microrganismos permite que fungos e bactrias

    apresentem pH timo desde extremamente cido at extremamente bsico. No

    entanto, de forma genrica, o pH ideal para o metabolismo fngico ligeiramente

    cido, em torno de 5,0, enquanto que as bactrias so mais adaptadas a valores

    prximos a neutralidade, variando de 6 a 8 (Madigan, Martinko & Parker, 2004).

    No solo, as variaes de pH podem afetar a fisiologia dos microrganismos

    autctones por: desnaturao de protenas estruturais e enzimas, desestabilizao

    da membrana e canais de troca inica, disponibilidade de ons, e aumento da

    toxicidade de alguns compostos inicos, principalmente queles contendo alumnio,

    ferro e mangans (Moreira & Siqueira, 2006).

    Outra limitao para o metabolismo microbiano a disponibilidade de oxignio.

    A disponibilidade de oxignio est diretamente relacionada com a umidade do solo

    posto que os gases ocupam os espaos no ocupados pela gua, o que por sua vez

    contribui para a sua solubilizao na soluo do solo. A solubilizao do oxignio

    um dos pontos crticos, no caso dos solos mais midos, pois a solubilidade dos

    gases em gua geralmente baixa e depende do tipo de gs, da temperatura, da

    concentrao de sais e da presso local (Moreira & Siqueira, 2006).

  • Ferreira, D.G. Reviso Bibliogrfica

    25

    A disponibilidade de oxignio determina o tipo de metabolismo que ir ocorrer

    no solo. O metabolismo aerbico mais vantajoso, pois resulta na mineralizao da

    matria orgnica e na gerao de maior quantidade de energia. No entanto,

    considerando a baixa disponibilidade de oxignio no solo, o metabolismo anaerbio

    poder ser o mais recorrente (Moreira & Siqueira, 2006). Neste caso, haver

    predomnio dos microrganismos anaerbios e facultativos se desenvolvendo em

    condio de anaerobiose, cujo metabolismo mais lento, e pode levar formao

    de compostos nocivos como gs sulfdrico, nitrito, etc.

    Ademais, independentemente do tipo de metabolismo, a velocidade das

    reaes metablicas dependente da temperatura. O solo com cobertura vegetal

    pode ser considerado um isolante trmico. Nos 5 cm superficiais, a temperatura

    varia de 15 a 18C, mas com o aumento da profundidade tende reduzir de 1 a 2C a

    partir dos 30 cm de profundidade, at atingir um ponto de isotermia.

    Em geral, a temperatura tima para a atividade de microrganismos mesfilos se

    situa na faixa entre 25 e 30C, embora ainda sejam capazes de manter o seu

    metabolismo ativo em temperaturas um pouco acima ou abaixo dessa faixa de modo

    mais lento (Madigan, Martinko & Parker, 2004; Moreira & Siqueira, 2006).

    A diminuio da temperatura reduz a atividade microbiana, principalmente, pelo

    enfraquecimento das ligaes entre as protenas, o que compromete a fluidez da

    membrana celular e, por conseguinte, a entrada de nutrientes e sada dos produtos

    do metabolismo. Por outro lado, o aumento da temperatura provoca a desnaturao

    das protenas celulares (enzimas) inviabilizando as reaes metablicas (Madigan,

    Martinko & Parker, 2004; Moreira & Siqueira, 2006).

    2.2. Petrleo e Derivados

    O petrleo um combustvel fssil composto predominantemente por uma

    mistura complexa de hidrocarbonetos distinguindo-se em: parafnicos normais,

    parafnicos ramificados, parafinicos cclicos (naftnicos), aromticos, e resinas e

    asfaltenos (Corra, 2003; Thomas, 2004).

    No estado lquido, o petrleo uma substncia oleosa, inflamvel, menos

    densa que a gua, com cheiro caracterstico e cor variando entre o negro e o

  • Ferreira, D.G. Reviso Bibliogrfica

    26

    castanho-claro. Apesar de sua composio qumica variar em funo do

    reservatrio, os diferentes tipos de petrleo apresentam semelhanas na anlise

    elementar, sendo constitudos (%m/m) de: carbono (83-87); hidrognio (11-14);

    enxofre (0,06-8); nitrognio (0,11-1,7); oxignio (0,1-2); e metais (at 0,3).

    Como mostrado no Quadro 2, os derivados de petrleo so obtidos atravs de

    destilao do petrleo em fraes de diferentes pontos de ebulio.

    Quadro 2 Fraes tpicas do petrleo

    Frao Temperatura de Ebulio (oC) Composio

    aproximadamente Aplicaes

    Gs residual Gs Liquefeito de Petrleo GLP

    At 40 C1 C2 C3 C4 gs combustvel engarrafado, uso

    domstico e industrial.

    Gasolina 40 175 C5 C10 combustvel de automveis,

    solvente.

    Querosene 175 235 C11 C12 iluminao, combustvel de

    avies a jato.

    Gasleo leve 235 305 C13 C17 diesel, fornos.

    Gasleo pesado 305 400 C18 C25 combustvel, matria-prima para

    lubrificantes

    Lubrificantes 400 510 C26 C38 leos lubrificantes.

    Resduo Acima de 510 C38+ asfalto, piche,

    impermeabilizantes.

    Fonte: Thomas, 2004

    Aps a destilao, as fraes so submetidas a alguns processos qumicos de

    sntese, como a alquilao e a reforma cataltica, e de craqueamento, conforme

    apresentado na Figura 4. Os processos qumicos tm por objetivo modificar as

    fraes sem interesse econmico para gerar produtos de alto valor agregado como

    combustveis veiculares, na forma de querosene de aviao, gasolina, leo diesel, e

    combustveis industriais, como propano e butano, e ainda na fabricao de

    borrachas, lubrificantes e asfalto (Thomas, 2004).

    Dentre os combustveis derivados do petrleo, a gasolina a mais importante

    dentro dos centros urbanos, uma vez que grande parte dos veculos que circulam

    nas cidades movido gasolina.

  • Ferreira, D.G. Reviso Bibliogrfica

    27

    Fonte: Adaptao de http://www.galpenergia.com

    Figura 4 Processo de refino do petrleo e as reaes de transformao dos produtos da

    destilao.

  • Ferreira, D.G. Reviso Bibliogrfica

    28

    2.2.1. Gasolina

    A gasolina, um dos principais derivados do petrleo utilizados no cotidiano dos

    habitantes das cidades, basicamente composta por hidrocarbonetos que possuem

    uma cadeia carbnica relativamente pequena, quando comparada aos

    hidrocarbonetos constituintes do leo bruto e do leo diesel.

    Os hidrocarbonetos da gasolina diferem entre si quanto ao tamanho (com 4 a

    12 tomos de carbono) e estrutura das cadeias, que se distinguem em: abertas,

    cclicas e aromticas. As variaes de tamanho e estrutura da cadeia definem as

    propriedades fsico-qumicas e, portanto, a qualidade do combustvel. No Quadro 3

    esto discriminados alguns dos diferentes hidrocarbonetos constituintes da gasolina.

    As duas caractersticas de maior interesse no uso da gasolina como

    combustvel so o ponto de ebulio e o ndice de auto-detonao (ou octanagem)

    dos hidrocarbonetos nela presentes. O primeiro pode variar desde temperaturas

    ambientes, em torno de 30C, at temperaturas elevadas, acima dos 200C.

    Enquanto que o segundo varia de 40 a 101, estando, em geral, prximo a 85. Como

    o ndice de auto-detonao relativamente baixo, pode-se elev-lo pela introduo

    de substncias com maior poder de detonao, denominadas aditivos (Cruz, 2003).

    No Brasil, desde a dcada de 1970, a gasolina aditivada com etanol anidro

    em substituio ao chumbo tetraetila, com o intuito de reduzir a emisso de

    poluentes e aumentar a qualidade do combustvel (Corseuil & Fernandes, 1999;

    Niven, 2005). Atualmente, toda a gasolina comercializada em territrio nacional

    recebe a adio de 25% de etanol anidro, por determinao da legislao (CIMA,

    n37; Lei 10.203/2001).

    A gasolina um combustvel relativamente estvel capaz de preservar as suas

    caractersticas por at seis meses se estocada em condies apropriadas. A

    deteriorao do combustvel ocorre quando h a precipitao de compostos

    formados pela reao entre os hidrocarbonetos insaturados e ons de cobre, que

    constituem os reservatrios de combustvel (Hamilton, 1995).

  • Ferreira, D.G. Reviso Bibliogrfica

    29

    Quadro 3 Componentes da gasolina identificados por Solid

    Phase Microextraction (SPME)

    Nome Qumico

    Propano 2,2-dimetilhexano

    Isobutano Tolueno

    n-Butano 2,3,4-trimetilpentano

    trans-2-buteno 3-metilheptano

    cis-2-buteno 2-metilheptano

    3-metil-1-buteno n-octano

    Isopentano 2,4,4-trimetilhexano

    1-penteno 2,2-dimetilheptano

    2-metil-1-buteno Etilbenzeno

    2-metil-1,3-butadieno p-xileno

    n-pentano m-xileno

    Trans-2-penteno 3,3,4- trimetilhexano

    2-metil-2-buteno o-xileno

    2-metil-1,2-butadieno 2,2,4-trimetilheptano

    3,3-dimetilbutano n-nonano

    Ciclopentano 3,3,5-trimetilheptano

    3-metil-1-penteno n-propilmenzeno

    2,3-dimetilbutano 2,3,4-trimetilheptano

    2-metilpentano 1,3,5-trimetilbenzeno

    3-metilpentano 1,2,4-trimetilbenzeno

    n-hexano n-decano

    Metilciclopentano Metilpropilbenzeno

    2,2-dimetilpentano Dimetilbenzeno

    Benzeno n-undecano

    Ciclohexano 1,2,4,5-tetrametilbenzeno

    2,3-dimetilpentano 1,2,3,4-tetrametilbenzeno

    3-metilhexano 1,2,4-trimetil-5-etilbenzeno

    3-etilpentano 1,2,3,4-trimetiletilbenzeno

    n-heptano n-dodecano

    2,2,4-trimetilpentano Naftaleno

    Metilciclohexano Metilnaftaleno Fonte: Harris, Whiticar & Eek, 1999.

  • Ferreira, D.G. Reviso Bibliogrfica

    30

    Alguns dos hidrocarbonetos constituintes da gasolina apresentam baixos

    pontos de ebulio, podendo passar para a fase gasosa temperatura ambiente.

    Alm da perda de parte do combustvel, a volatilizao gera poluio atmosfrica.

    Os hidrocarbonetos volteis mais importantes so conhecidos pela sigla BTEX, que

    o acrnimo de benzeno, tolueno, etilbenzeno e xileno (Corseuil & Fernandes,

    1999; Niven, 2005).

    Os compostos BTEX so nocivos sade humana pelo seu potencial

    mutagnico e carcinognico. Esses compostos penetram pela mucosa nasal,

    atingindo o sistema nervoso central (SNC) e a medula ssea vermelha. A curto

    prazo, a exposio a altas concentraes causa enjos, alucinaes e perda de

    conscincia, e a longo prazo pode provocar leucemia e leses irreparveis ao SNC,

    fgado e rins (Corseuil & Fernandes, 1999; Niven, 2005; Durmusoglu, Taspinar &

    Karademir, 2010).

    A transferncia dos BTEX para a fase gasosa pode ser potencializada pela

    presena de alcois. Nesse caso, a gasolina brasileira pelo seu contedo de etanol

    aumenta as chances de volatilizao desses compostos e, conseqentemente,

    aumenta os danos sade humana (Corseuil & Fernandes, 1999; Niven, 2005).

    2.2.2. Mistura Gasolina/lcool

    Desde o incio do emprego de gasolina como combustvel automotor houve

    adio de compostos com o propsito de elevar a sua octanagem. Inicialmente,

    utilizavam-se compostos altamente agressivos ao meio ambiente como o chumbo

    tetra-etila. Com os avanos tecnolgicos e a ampliao da conscincia ambiental,

    foram desenvolvidas novas formas para aumento da octanagem.

    Atualmente, em vrios pases e no Brasil, o chumbo tetra-etila no mais

    aplicado. Em substituio adiciona-se o etanol, que individualmente apresenta um

    ndice de octanagem de 110. A adio de etanol gasolina permite a

    comercializao do combustvel com ndices de octanagem entre 87 e 95 (Santos &

    Peixoto, 2008).

    O uso da mistura etanol e gasolina ao invs da gasolina pura tambm contribui

    para a reduo na emisso de poluentes. Isto porque alm da queima de menor

  • Ferreira, D.G. Reviso Bibliogrfica

    31

    quantidade do combustvel fssil que gera vrios compostos, muitos dos quais

    poluentes como o monxido de carbono (CO) e xidos de enxofre (SOx) e nitrognio

    (NOx), a combusto do etanol completa com formao de CO2 e gua.

    Em decorrncia dos grandes impactos ambientais pelo uso de combustveis

    fsseis, somados a impossibilidade da sua renovao, vrias pesquisas esto sendo

    desenvolvidas para a otimizao de processos de obteno de biocombustveis. O

    etanol combustvel uma alternativa tcnica e economicamente vivel em uso

    desde a dcada de 1970 (Corseuil & Fernandes, 1999; Niven, 2005; Santos &

    Peixoto, 2008).

    Comercialmente, o etanol usado como combustvel e como aditivo da gasolina

    produzido pela fermentao alcolica do caldo da cana-de-acar. Em geral, a

    fermentao do caldo da cana realizada pela levedura Saccharomyces cerevisiae.

    O mosto fermentado destilado e comercializado na forma hidratada (92,6%, v/v)

    quando usado como combustvel, ou na sua forma anidra (99,3% v/v) quando usado

    como aditivo da gasolina.

    Cabe enfatizar que apesar das vantagens citadas para a adio de etanol

    gasolina, isto pode trazer conseqncias srias ao meio ambiente. O etanol, alm de

    aumentar a capacidade de volatilizao dos BTEX, pode aumentar a solubilidade

    dos hidrocarbonetos da gasolina em gua. Logo, em caso de derrames, ir ocorrer

    maior difuso do contaminante na rea impactada, com grande risco de atingir as

    guas subterrneas (Corseuil & Fernandes, 1999; Niven, 2005).

    2.3. Contaminao dos Solos

    comum a aplicao de conceitos errneos no que concerne a contaminao

    dos solos. H uma tendncia a aplicar os conceitos de poluio e contaminao

    como sinnimos. Contudo, segundo Nass (2002) a poluio um termo abrangente,

    que consiste em qualquer alterao causada por atividades antrpicas que

    provoquem danos ao meio ambiente. Por outro lado, a contaminao mais

    restritiva e se refere exclusivamente introduo de compostos nocivos sade

    humana e ao ambiente (Nass, 2002). Portanto, acidentes ambientais envolvendo

    petrleo e seus derivados, so considerados como contaminantes.

  • Ferreira, D.G. Reviso Bibliogrfica

    32

    Segundo o relatrio da Companhia Ambiental do Estado de So Paulo

    (CETESB, 2006), os postos de combustveis so as principais fontes de

    contaminao dos solos, como mostra a Figura 5.

    Postodecombustvel

    74%

    Indstria15%

    Comrcial6%

    Resduo4%

    Acidentes1%

    Desconhecida0%

    Fonte: CETESB (2006).

    Figura 5 Principais Fontes de Contaminao do Estado de So Paulo.

    Os acidentes relacionados aos postos de combustveis tm inmeras causas,

    conforme ilustra a Figura 6. Nesses acidentes, o combustvel mais recorrente foi a

    gasolina, como pode ser observado na Figura 7 (CETESB, 2005). E, esses dados,

    possivelmente, so decorrentes da maior frota de veculos movidos a gasolina e do

    maior potencial corrosivo desse combustvel em relao aos demais.

    A maioria desses acidentes ocorreu pela deteriorao dos tanques de

    armazenamento de combustveis, pois a validade desses reservatrios de no

    mximo 30 anos e grande parte dos postos de combustveis foi construdos na

    dcada de 1970. E, a fim de evitar esses danos ambientais a legislao se tornou

    mais restritiva em relao construo dos reservatrios de combustveis.

    Atualmente a construo e a instalao dos reservatrios de combustveis

    devem seguir as orientaes da resoluo CONAMA no 273, que prev, inclusive,

    que o postos de revenda de combustveis obrigatoriamente sejam licenciados e

    fiscalizados periodicamente pelas agncias reguladoras. Alm de determinar que os

    reservatrios possuam diversos mecanismos para evitar vazamentos, como parede

  • Ferreira, D.G. Reviso Bibliogrfica

    33

    dupla (NBR 13785) com a parte externa no metlica, vlvulas de controle e cmara

    de conteno

    .

    PassivoAmbiental

    18%

    Extravazamento8%

    Bomba4%

    Tanque33%

    Tubulao17%

    CaixaSeparadora

    1%

    Descarte6%

    Outros5%

    NoIdentificada

    1%

    TubulaesdoTanque4%

    PostosDesativados

    3%

    Fonte: CETESB (2005).

    Figura 6 Causas da poluio por postos de combustveis na cidade de So Paulo.

    Gasolina72%

    lcool2%

    Diesel19%

    GNV2%

    Resduo2%

    leoLubrificante

    1%

    NoIdentificado

    2%

    Fonte: CETESB (2006).

    Figura 7 Principais Combustveis Contaminantes do Solo no Estado de So Paulo.

  • Ferreira, D.G. Reviso Bibliogrfica

    34

    No entanto, mesmo com o aumento das medidas para evitar os acidentes, a

    sua ocorrncia em alguns casos inevitvel, sendo necessria a realizao de

    aes corretivas que possam, inicialmente, impedir a propagao do dano, e

    posteriormente restabelecer o equilbrio da rea afetada, bem como as suas

    condies naturais (Dias & Mello, 1998).

    2.4. Tratamento de Solos Contaminados com Hidrocarbonetos

    O tratamento das reas contaminadas envolve a identificao da fonte de

    contaminao e da extenso da rea atingida, o conhecimento das caractersticas

    da rea e dos contaminantes envolvidos, e informaes quanto legislao

    aplicvel (Riser-Roberts, 1998; Khan, Husain & Ramzi, 2004).

    As diversas tcnicas para o tratamento de reas impactadas com compostos

    xenobiticos se dividem em processos fsico-qumicos e processos biolgicos. Em

    alguns casos, inclusive, pode ser feita a combinao de duas ou mais tcnicas a fim

    de se obter o melhor resultado possvel.

    Independente do processo em que o tratamento conduzido, a remediao

    pode ocorrer no local onde o processo ser conduzido (in situ), ou pode ser feita a

    remoo do material contaminado para uma rea externa onde o tratamento ser

    efetuado (ex situ). Sendo que na maioria dos casos de tratamento ex situ o material

    removido devolvido ao local de origem (Riser-Roberts, 1998; Khan, Husain &

    Ramzi, 2004).

    A principal vantagem do tratamento in situ que o material contaminado no

    precisa ser transportado, o que reduz os custos. Porm, tem como desvantagens a

    necessidade de adequao das condies do local contaminado e o elevado tempo

    necessrio para que ocorra a descontaminao. Por outro lado, as tecnologias ex

    situ so realizadas em menor prazo uma vez que permitem estabelecer as

    condies ideais para a atividade microbiana. Entretanto, faz-se necessria a prvia

    remoo do material contaminante, implicando na escavao do local contaminado e

    o transporte de todo o material coletado at a rea de tratamento (Baptista, 2003).

    Existem diversas tcnicas fsico-qumicas para a remediao das reas

    contaminadas, mas no que concerne s reas contaminadas com gasolina

  • Ferreira, D.G. Reviso Bibliogrfica

    35

    destacam-se o tratamento trmico que consiste no aquecimento do solo transferindo o contaminante para a fase gasosa, a extrao de vapores por um sistema de suco vcuo instalado em poos no local contaminado e o air

    stripping que se baseia na injeo de ar na rea contaminada, favorecendo a

    transferncia dos compostos volteis para a fase gasosa que em seguida so

    coletados por um sistema de coleta de gases. (Riser-Roberts, 1998; Iwamoto &

    Nasu, 2001; Baird, 2002; Khan, Husain & Ramzi, 2004).

    Essas trs tcnicas so potencialmente eficientes na remoo dos

    contaminantes volteis, contudo se no forem instalados equipamentos de captao

    dos compostos volteis gerados pode haver a promoo da poluio atmosfrica

    pela transferncia do contaminante para a atmosfera.

    Uma estratgia interessante para o tratamento de reas contaminadas com

    eficincia equivalente aos mtodos fsico-qumicos, em geral, de menor custo e

    maior aceitabilidade pelos rgos ambientais e pela sociedade so os processos

    biolgicos. Esses se baseiam no uso de seres vivos para a remoo do

    contaminante. No caso do organismo aplicado para a remoo do contaminante ser

    uma planta, o processo denominado fitorremediao, j quando so utilizados

    microrganismos o processo recebe o nome de biorremediao (Riser-Roberts, 1998;

    Iwamoto & Nasu, 2001; Khan, Husain & Ramzi, 2004).

    2.4.1. Biorremediao

    O conceito de biorremediao pode sofrer pequenas alteraes de acordo com

    o autor, no entanto de uma forma geral um processo que se baseia em reaes

    qumicas realizadas por microrganismos, em condies aerbias e/ou anaerbias,

    sobre compostos estranhos ao ambiente natural. Essa ao microbiana capaz de

    modificar ou decompor o composto original em formas mais simples, atxicas ou

    menos txicas, sendo a mineralizao do contaminante o benefcio mximo

    alcanado nesse processo (Riser-Roberts, 1998; DelArco, 1999; Semple, Reid &

    Fermor, 2001)

    Esse processo pode ocorrer naturalmente pela ao dos microrganismos

    autctones, processo denominado atenuao natural. No entanto, em geral, os solos

    apresentam limitaes nutricionais que submetem os microrganismos a condies

  • Ferreira, D.G. Reviso Bibliogrfica

    36

    estarvantes, o que reduz a eficcia da biorremediao por atenuao natural.

    Nesses casos o solo pode receber a introduo de nutrientes, como fontes de

    nitrognio e fsforo que ao estimular o metabolismo microbiano, contribuiro para o

    aumento das chances de sucesso do tratamento, e principalmente oxignio para

    favorecer a atividade dos microrganismos aerbicos. A estimulao dos

    microrganismos pela introduo de fontes nutricionais denominada bioestimulao

    (Serrano et al., 2007; Stucki et al., 2007).

    Contudo, em algumas situaes a melhora nas condies nutricionais do solo

    no suficiente para atingir os resultados esperados. Por exemplo, quando

    inexistem microrganismos hbeis em atuar na modificao e decomposio dos

    compostos xenobiticos ou seu nmero muito baixo. Ento, torna-se necessrio

    realizar a introduo de microrganismos endgenos, processo conhecido como

    bioaumento (Bento et al., 2005; Olaniram, Pillay & Pillay, 2006; Serrano et al., 2007;

    Stucki et al., 2007).

    Existem diversas tecnologias de biorremediao, sendo o bioslurry, biosparging

    e o bioslurping as mais adequadas no tratamento em casos de contaminao com

    gasolina. Essas trs metodologias se baseiam na introduo de nutrientes para a

    estimulao do metabolismo microbiano, variando em relao a forma de conduo

    do processo e os nutrientes aplicados.

    O bioslurry uma tecnologia ex situ que utiliza um reator contendo o material a

    ser tratado misturado a uma grande quantidade de gua acrescida de nutrientes,

    formando uma espcie de pasta, e no caso do tratamento de volteis h tambm um

    sistema de introduo e captao de gases acoplado ao reator (Banerji et al., 1995).

    Por outro lado o biosparging uma tecnologia in situ que consiste na unio de

    duas metodologias, o bioventing (introduo de oxignio para a estimulao do

    metabolismo aerbio) e o air sparging (introduo de ar no solo para a remoo dos

    compostos volteis), dessa forma essa metodologia permite, atravs da injeo de

    fontes de nutrientes e oxignio no solo, a remoo dos contaminantes volteis e no

    volteis (EPA, 1994).

    Assim como o biosparging, o bioslurping tambm uma tecnologia in situ

    baseada na associao do bioventing com metodologias de extrao dos vapores,

  • Ferreira, D.G. Reviso Bibliogrfica

    37

    que pode ser aplicada na remoo do contaminante de guas subterrneas e dos

    compostos volteis do solo.

    As tcnicas acima apresentadas viabilizam a recuperao da rea

    contaminada, entretanto, sempre que h o envolvimento de microrganismos

    necessrio o monitoramento e a avaliao de uma srie de fatores limitantes que

    interferem no metabolismo microbiano e, por conseguinte, na eficincia e eficcia do

    processo (Riser-Roberts, 1998; Iwamoto & Nasu, 2001; Khan, Husain & Ramzi,

    2004). Em geral, a avaliao do processo de biorremediao feita pelo

    monitoramento da concentrao do contaminante e/ou pela estimativa dos

    microrganismos envolvidos na biodegradao. O monitoramento dos

    microrganismos pode ser feito diretamente por tcnicas de contagem microbiana, ou

    de forma indireta atravs de tcnicas baseadas na atividade metablica.

    A quantificao do nmero de microrganismos no solo, geralmente, feita por

    diluies seriadas semeadas em meios de cultura especficos, onde podem ser

    feitas a contagem de unidades formadoras de colnias (UFC), ou a estimao do

    nmero mais provvel de clulas (NMP) presentes em conhecida quantidade de

    amostra (Balba, Al-Awadhi & Al-Daher, 1998).

    2.4.1.1. Fatores que Afetam a Biorremediao

    O nmero de microrganismos e a diversidade de espcies so fatores

    primordiais para a eficcia do tratamento por biorremediao da rea impactada.

    Sabe-se que quanto maior for a versatilidade enzimtica e o nmero de clulas

    metabolicamente ativas, maior ser a eficincia da degradao do contaminante.

    A diversidade microbiana do solo ainda pouco conhecida, no entanto alguns

    gneros bacterianos apresentam destaque no que concerne biorremediao de

    compostos xenobiticos, principalmente queles derivados de combustveis fsseis.

    As espcies dos gneros Nocardia, Pseudomonas, Micrococcus e Bacillus j

    so amplamente difundidas pela capacidade de degradar hidrocarbonetos presentes

    em combustveis derivados do petrleo (Solano-Serena et al., 2000; Ghazali et al.,

    2004; Silva & Alvarez, 2004; Dou et al., 2007). Mas, embora as bactrias tenham

    papel de destaque, os demais grupos microbianos (fungos, actinobactrias e

  • Ferreira, D.G. Reviso Bibliogrfica

    38

    cianobactrias) tambm j foram descritos pelo seu potencial para a biodegradao

    de derivados do petrleo (Reddy, 1995; Alvarez, 2003; Gallego et al., 2006;

    Mancera-Lopez et al., 2007).

    Em geral, a composio qumica dos contaminantes heterognea e altamente

    complexa. Dessa forma improvvel a existncia de um nico microrganismo, que

    naturalmente, seja capaz de decompor todas as substncias qumicas presentes.

    Por isso, em processos de biorremediao comum o emprego de consrcios

    microbianos para obter um melhor resultado final (Ghazali et al., 2004).

    Os microrganismos com a capacidade de utilizar petrleo e seus derivados

    como fontes de carbono e energia so chamados de hidrocarbonoclsticos. Essa

    populao microbiana possui em seu material gentico, os genes especficos para a

    produo das enzimas que atuam no processo de biodegradao.

    possvel encontrar essas espcies em ambientes sem histrico de

    contaminao. Nesse caso, a sua deteco pode ser dificultada pela predominncia

    de outras populaes mais adaptadas ao ambiente natural. Contudo, em casos de

    contaminao pode haver a seleo e aumento das populaes tolerantes e com

    potencial para a degradao ao contaminante (Hamme, Sigh & Ward, 2003; Ollivier

    & Magot, 2005).

    Entretanto, importante ressaltar que o aumento da populao com potencial

    degradador s ocorre se o solo apresentar condies favorveis para isso (Semple,

    Reid & Fermor, 2001). A biorremediao de solos pode ser afetada por diferentes

    fatores como a concentrao de oxignio dissolvido, pH, temperatura, presena de

    metablitos txicos, potencial de oxi-reduo, disponibilidade de nutrientes e

    umidade (Rodriguez, 2006). Por exemplo, em alguns casos, o solo pode conter um

    grande teor de matria orgnica que se encontra humificada e, portanto, no

    disponvel para o consumo imediato. Essa caracterstica permite que as fontes de

    carbono sejam lanadas paulatinamente no solo funcionando como um mecanismo

    de controle da dinmica populacional (Moreira & Siqueira, 2006).

    No ambiente natural, resduos de plantas e animais mortos so fontes de

    carbono disponveis para a pronta assimilao pelos microrganismos autctones.

    Em contrapartida, em situaes de contaminao o xenobitico pode interagir com a

    matriz do solo e tornar-se indisponvel para a biodegradao (Alexander, 1999).

  • Ferreira, D.G. Reviso Bibliogrfica

    39

    Alm da fonte de carbono, outros elementos nutricionais so limitantes para o

    desenvolvimento dos microrganismos, em especial fontes de nitrognio e fsforo,

    cujas concentraes devem ser convenientemente ajustadas. Esses elementos so

    fundamentais para as funes vitais dos microrganismos como na sntese de

    material gentico (RNA e DNA) e protenas, e para a gerao de energia (ATP)

    (Rogers et al., 1993).

    A presena de oxignio, que atua como doador de eltrons, estimula o

    metabolismo aerbico, permitindo a gerao de maior quantidade de energia para as

    clulas. No entanto, na sua ausncia outros compostos podem substitu-lo como, por

    exemplo, NO-3, SO4-2, Mn+4 e Fe+3, estabelecendo uma condio de anaerobiose

    (Madigan, Martinko & Parker, 2004).

    A presena de gua e sua disponibilidade, assim como os nutrientes tambm

    so fundamentais, j que esto diretamente relacionadas homeostase e ao

    transporte de nutrientes atravs da membrana celular. Com exceo dos perodos

    de chuva ou irrigao, os solos contm quantidades de gua insuficientes para

    suportar o pleno funcionamento do metabolismo microbiano, pois normalmente a

    gua drenada at atingir o lenol fretico (Moreira & Siqueira, 2006).

    Nos solos, a temperatura na camada superior, onde se concentra o maior

    nmero de microrganismos, praticamente no varia, estando prxima da

    temperatura ambiente do local. Por isso, os microrganismos so predominantemente

    mesfilos (Madigan, Martinko & Parker, 2004).

    A concentrao do on hidrognio no solo outro parmetro de relevncia que

    deve ser considerado. Em geral, em solos cidos predominam fungos, enquanto que

    em solos neutros predominam bactrias. O pH tambm afeta o potencial de oxi-

    reduo (Eh), que pode ainda ser influenciado pela temperatura, presso e

    compostos presentes. A coexistncia de microrganismos aerbios, facultativos e

    anaerbios na mesma amostra de solo indica que podem haver micronichos

    prximos com diferentes valores de Eh (DEsposito, 1999).

  • Ferreira, D.G. Reviso Bibliogrfica

    40

    2.4.1.2 Avaliao da toxicidade do solo

    Independente da tcnica de remediao aplicada necessrio que antes de se

    determinar a concluso do tratamento seja feita uma avaliao adequada da

    toxicidade dos compostos residuais, pois ao longo da degradao pode haver a

    formao de compostos to ou mais nocivos que o composto original, o que ir

    provocar efeitos ainda mais danosos ao ambiente (Balba et al., 1998; Riser-Roberts,

    1998; Phillips et al., 2000; Niven, 2005).

    Bioensaios de ecotoxicidade so metodologias analticas que permitem

    caracterizar a toxicidade de efluentes e substncias qumicas em geral sobre o meio

    ambiente a partir da exposio de organismos vivos (bioindicadores) a estas

    substncias e da observao e quantificao dos efeitos txicos das mesmas sobre

    aqueles organismos. Em funo da elevada sensibilidade dos bioindicadores a

    efeitos txicos em seu ambiente, estas valiosas ferramentas de anlise ambiental,

    apenas recentemente introduzidas no Brasil, j vm sendo utilizadas extensivamente

    e com timos resultados em pases desenvolvidos.

    No caso de solos, os testes para essa avaliao podem ser baseados no uso

    de seres vivos como sementes de vegetais, organismos invertebrados ou algas, ou

    ainda kits comerciais baseados na bioluminescncia e na mutao de culturas

    microbianas padro (Amadi, Dickson & Maate, 1993; Xu & Johnson, 1995;

    Chaineau, Morel & Outdot, 1997; Balba et al., 1998; Ratte, Hammers-Wirtz &

    Cleuvers, 2003; Ogboghodo et al., 2004; Labud, Garcia & Hernandez, 2007; Silva et

    al., 2009).

    A atividade enzimtica pode ser utilizada para descrever os efeitos de

    compostos txicos sobre a populao microbiolgica do solo. No caso da

    biorremediao, comum o teste da atividade desidrogensica, uma vez que a

    maioria das reaes de oxidao biolgica de compostos orgnicos um processo

    de desidrogenao (Ratsep, 1991). O composto qumico mais usado nessa anlise

    o cloreto-2,3,5-trifeniltetrazlico (TTC) que age como aceptor final de eltrons de

    enzimas desidrogensicas, sendo reduzido a trifenilformazan (TPF) de cor vermelha,

    cuja intensidade diretamente proporcional atividade microbiana, e pode ser

    determinada por espectrofotometria (Bitton & Koopman, 1992; Gong et al., 1997).

  • Ferreira, D.G. Reviso Bibliogrfica

    41

    As minhocas tambm tm sido empregadas como bioindicadores. As espcies

    recomendadas pelo padro OECD (1984) e ASTM (1995) so Eisenia fetida e

    Eisenia andrei, facilmente cultivveis em laboratrio. Os efeitos usados para

    diagnstico podem ser o crescimento, comportamento, reproduo e processos

    fisiolgicos, bem como, observaes de mudanas patolgicas externas como leso

    ou dureza. H tambm o teste de fuga de minhocas que, em muitos casos, pode ser

    um indicador mais sensvel para avaliar compostos txicos no solo, para nvel de

    estresse baixo dos organismos (Kapanen & Itavaara, 2001).

    A fitotoxicidade pode ser determinada pela germinao das sementes,

    alongamento das raizes e crescimento de mudas. Muitos estudos tm demonstrado

    e eficincia de espcies como pepino e agrio (Helfrich et al., 1998), alface e soja

    (Gundersson et al., 1997) em testes de toxicidade.

    Knoke et al. (1999) avaliaram a toxicidade de solo contaminado com

    hidrocarbonetos do petrleo aps a utilizao de tcnicas de biorremediao como

    bioestmulo e bioaumento. Foram avaliados ensaios com adio de nutrientes como

    fsforo e/ou bioumento com Pseudomonas sp UG30, com capacidade de degradar

    compostos xenobiticos. Aps os ensaios de biodegradao, observaram que os

    testes feitos com minhoca e com a germinao de alface, a adio de fsforo ao

    solo aumentou a toxicidade enquanto que os testes com o bioaumento houve

    reduo da toxicidade, sugerindo que dependendo da tcnica de biorremediao

    utilizada a toxicidade pode aumentar ou diminuir.

    2.5. Ferramentas Estatsticas

    No mbito da pesquisa cientfica busca-se continuamente a melhor forma de

    obter o mximo de informaes com o mnimo de experimentos, o que reduz os

    custos dos estudos. E, uma das formas de se organizar experimentos nesse

    contexto a aplicao de ferramentas estatsticas, como o planejamento fatorial

    (Barros-Neto, Scarminio & Burns, 2007).

    O planejamento fatorial pode ser aplicado quando h diversos fatores que

    interagem entre si e podem interferir na realizao de um processo, esses fatores na

    linguagem estatstica so conhecidos como variveis independentes. E, os valores

    atribudos a esses fatores so denominados nveis.

  • Ferreira, D.G. Reviso Bibliogrfica

    42

    Essa ferramenta estatstica permite a combinao das diversas variveis

    independentes, inclusive em diferentes nveis. Tal fato permite analisar os resultados

    integrados e os fatores que influenciam o processo. Em termos prticos, um

    planejamento fatorial deve ser feito em 2 ou 3 nveis, pois o uso de mais nveis

    aumentaria o nmero de experimentos, inviabilizando a sua aplicao (Calado &

    Montgomery, 2003).

    Uma vez organizados e realizados os experimentos, a interpretao estatstica

    dos dados obtidos pode ser executada atravs de vrios critrios estatsticos de

    significncia, como por exemplo, o Teste p, o Teste t e o modelo matemtico

    proposto, atravs do coeficiente de correlao (Rodrigues & Iemma, 2005).

    O Teste p fundamenta-se na probabilidade de se descartar os efeitos principais

    e de interao da varivel em estudo, em um nvel de confiana pr-determinado. o

    valor do nvel de confiana normalmente encontrado em trabalhos de 95%, no

    entanto a sua determinao varia de acordo com a acurcia desejada.

    No caso do Teste t de Student a sua anlise feita atravs dos efeitos

    calculados (sejam eles positivos ou negativos), considerados significativos e

    diferentes de zero, em um determinado nvel de confiana.

    O coeficiente de correlao mede a aproximao entre os pontos experimentais

    e uma curva qualquer. Quando este valor se aproxima de 1, tem-se um bom ajuste

    dos pontos curva, indicando que o modelo proposto pode ser usado para a

    previso de resultados dentro da faixa estudada.

    Embora o planejamento experimental seja til, difcil identificar a influncia de

    uma ou mais variveis sobre outra varivel de interesse. O sistema, inicialmente,

    considerado com uma funo desconhecida que atua sobre as variveis de entrada

    (os fatores) e produz como sada, as respostas observadas. Sendo assim, o intuito

    principal do planejamento fatorial identificar a funo que represente de modo mais

    fidedigno o processo (Rodrigues & Iemma, 2005; Barros-Neto, Scarminio & Burns,

    2007).

  • Ferreira, D.G. Material e Mtodos

    43

    3. MATERIAL E MTODOS

    3.1. Solo

    Nesse trabalho foi utilizado um solo, coletado no municpio de Belford Roxo-RJ

    no ms de dezembro de 2006, de uma rea urbana sem histrico de contaminao.

    Esse solo caracterstico do estado do Rio de Janeiro e por isso foi estudado no

    tratamento de biorremediao de solos contaminados com petrleo ou seus

    derivados.

    Logo aps a coleta, o solo foi peneirado grosseiramente para a retirada de

    material como plantas, razes, pedras e gravetos. Em seguida, o solo foi quarteado,

    com o intuito de homogeneizar o solo a ser utilizado nos ensaios de biorremediao,

    de modo que as amostras de solo aplicadas nos diferentes ensaios possussem

    caractersticas similares em relao a sua composio granulomtrica, fsico-

    qumica e microbiolgica.

    Todos os ensaios de biorremediao foram realizados com solo de um mesmo

    lote, isto , de mesma procedncia e data. Para tanto, aps o quarteamento o solo

    foi acondicionado em sacos plsticos de 10 kg cada, os quais foram armazenados

    sob refrigerao a 51C, at o momento do uso.

    Figura 8 Local de coleta do solo argiloso

  • Ferreira, D.G. Material e Mtodos

    44

    3.2. Combustveis

    Foram usados dois combustveis comerciais, gasolina automotiva e etanol

    anidro, misturados em diferentes propores (100:0; 100:12,5; 100:25). Ambas as

    amostras foram provenientes da Petrobras de modo a garantir a sua pureza, ou seja,

    a ausncia de qualquer aditivo ou adulterao que pudesse interferir nos resultados

    obtidos nesse estudo.

    A gasolina e o etanol so combustveis estveis e no sofrem degradao

    quando armazenados sobre refrigerao e em recipientes no metlicos. Portanto,

    os combustveis utilizados nos ensaios de biorremediao foram coletadas do

    mesmo local e data, e ao chegar no laboratrio foram armazenados em bombonas

    de polietileno a 51C, at o momento do uso.

    3.3. Fertilizante

    Em algumas condies ensaiadas foi feita a adio de fontes de nutrientes,

    atravs da aplicao do fertilizante comercial da marca ULTRAVERDE, com relao

    Nitrognio:Fsforo:Potssio de 4:14:8. O ajuste da condio nutricional do solo foi

    baseada no teor de fsforo presente no solo, podendo ser de 25 ou 50 ppm de

    acordo com o ensaio.

    3.4. Ajuste do pH do Solo

    De um modo geral os solos argilosos possuem um carter cido, ento a fim de

    favorecer o metabolismo bacteriano, elevando o pH a um valor prximo

    neutralidade, foi realizada a calagem do solo com Carbonato de Clcio (CaCO3).

    Para tanto foi adicionado 15 g de CaCO3 em cada quilo de solo utilizado antes da

    realizao dos ensaios.

  • Ferreira, D.G. Material e Mtodos

    45

    3.5. Preparo do Inculo

    A fim de reduzir o tempo dos ensaios de biorremediao, a populao

    microbiana autctone do solo foi aumentada atravs da introduo das culturas

    endgenas previamente adaptadas ao contaminante (gasolina). Com esse propsito,

    foi produzido um inculo em fase slida conforme metodologia desenvolvida por

    Baptista (2007).

    O preparo do inculo em fase slida foi conduzido em recipiente plstico

    retangular (40 cm x 80 cm x 20 cm), onde foi distribudo aproximadamente 15 kg do

    solo. Em seguida, esse solo recebeu ajuste da umidade (para aproximadamente

    25%) e da condio nutricional para 50 ppm de fsforo. Esses ajustes foram feitos

    pela solubilizao de 3,2 g de fertilizante por quilo de solo em gua e ento

    aplicados paulatinamente no solo, ajustando a condio nutricional e de umidade

    concomitantemente.

    Aps uma semana o solo foi contaminado artificialmente uma nica vez com

    5% (v/m) de gasolina automotiva sem adio de etanol. Aps a contaminao o

    inculo foi incubado em local arejado com temperatura mdia de 30C por 21 dias,

    atingindo nesse perodo uma quantidade de bactrias metabolicamente ativas e

    adaptadas ao contaminante. Nesse nterim a umidade foi ajustada pela disperso de

    gua destilada na superfcie do solo.

    O monitoramento das populaes cultivveis de interesse (bactrias

    heterotrficas totais e bactrias hidrocarbonoclsticas) foi feito atravs da

    quantificao semanal de cultivos das amostras retiradas do sistema em meios

    especficos (Item 3.7.1.).

    Finalizadas as etapas de ativao do metabolismo das bactrias

    hidrocarbonoclsticas (BHC) e sua adaptao aos hidrocarbonetos da gasolina,

    amostras desse solo foram incorporadas aos ensaios de biorremediao na

    proporo de 10%(m/m).

  • Ferreira, D.G. Material e Mtodos

    46

    3.6. Detalhamento dos Ensaios de Biorremediao

    Esse trabalho foi realizado em etapas seqenciais, na primeira foi feita a

    caracterizao granulomtrica, fsico-qumica e microbiolgica do solo. Na segunda

    foram realizados ensaios em microcosmos baseados em um planejamento fatorial

    para definir a significncia da condio nutricional, da umidade e da concentrao de

    etanol adicionada na gasolina no processo de biorremediao. E, na terceira foram

    conduzidas algumas condies propostas pelo planejamento fatorial em colunas de

    60 cm a fim de reproduzir condies mais prximas da realidade e estudar a

    biorremediao e a percolao vertical da gasolina adicionada com 25% de etanol.

    3.6.1. Caracterizao do solo

    A caracterizao do solo foi feita baseada na sua granulometria, condio

    nutricional, fsico-qumica e microbiolgica. No Quadro 4 podem ser observadas as

    metodologias utilizadas nessa caracterizao.

    Quadro 4 Parmetros analisados para caracterizao do solo Parmetro Metodologia

    Granulometria ABNT-NBR 7181/84

    Matria orgnica (mg/Kg), Nitrognio

    e Fsforo Jaramillo, 1996

    Cobre, Ferro, Mangans, Zinco,

    Alumnio, Clcio, Magnsio, PotssioRaij et al., 2001

    pH Baptista, 2007

    Umidade Espectrmetro de

    infravermelho

    Bactrias Heterotrficas Totais

    Cultivveis Pour plate

    Bactrias Hidrocarbonoclsticas

    Cultivveis Nmero Mais Provvel

  • Ferreira, D.G. Material e Mtodos

    47

    A anlise granulomtrica foi realizada segundo a metodologia descrita na

    norma ABNT-NBR 781/84. A determinao da condio nutricional do solo foi

    baseada nas metodologias descritas por Jaramillo (1996) e por Raij et al. (2001). O

    pH foi feito seguindo a metodologia descrita por Baptista (2007) e o teor de umidade

    foi determinado atravs de um espectrmetro de infravermelho. E, as anlises

    microbiolgicas foram feitas pela tcnica de pour plate para as bactricas

    heterotrficas totais cultivveis e pela tcnica do nmero mais provvel para as

    bactrias hidrocarbonoclsticas cultivveis.

    A caracterizao granulomtrica (ABNT-NBR 781/84) e a dosagem de Cobre,

    Ferro, Mangans, Zinco, Alumnio, Clcio, Magnsio e Potssio (Raij et al., 2001)

    foram realizadas pelo Laboratrio de Geotecnia (COPPE/UFRJ). A dosagem de

    matria orgnica, nitrognio e fsforo (Jaramillo, 1996) foram realizadas no

    Laboratrio de Tecnologia Ambiental (Escola de Qumica/UFRJ). E a determinao

    do pH e da umidade foram realizados no Laboratrio de Biocorroso e

    Biodegradao (Instituto Nacional de Tecnologia).

    3.6.2. Ensaios de Biorremediao em Microcosmos

    Aps a sua caracterizao, esse solo foi usado como base para o estudo da

    interferncia da umidade, da condio nutricional e da presena de etanol na

    gasolina no processo de biorremediao. Para tanto, foram organizadas 12 ensaios

    usando duas matrizes de planejamento fatorial completo de dois nveis e dois fatores

    (22), conforme apresenta os Quadro 5 e 6.

    A condio nutricional e a adio de etanol na gasolina foram definidos como

    variveis independentes. E, nos Quadros 5 e 6 pode-se observar os fatores

    (parmetros) e os nveis (valores mnimo, mximo e intermedirio) atribudos para

    cada uma das variveis independentes.

    Os nveis atribudos concentrao de fsforo (0; 25 e 50 ppm) foram

    estabelecidos de acordo com a classificao de solo, em termos nutricionais,

    segundo Jaramillo (1996) em pobre ou rico. Em relao ao teor de lcool adicionado

    gasolina (0; 12,5 e 25%), os percentuais foram baseados na legislao brasileira,

  • Ferreira, D.G. Material e Mtodos

    48

    que determina a adio de 25% de lcool na gasolina comercial (CIMA, n37; Lei

    10.203/2001). E, as duas condies de umidade estudadas contemplaram uma

    condio normal de solo mido (aproximadamente 20%) e outra saturada

    (aproximadamente 40%).

    Os valores mnimos e mximos estabelecidos para cada um dos fatores foram

    combinados de forma a organizar todas as condies experimentais possveis, e

    tambm foram realizadas duas rplicas do ponto central.

    Alm de avaliar a condio nutricional e a presena de lcool, tambm foi

    estudada o efeito da umidade no processo de biorremediao. Dessa forma, foram

    estudados duas condies de umidade, uma com o solo apresentando um aspecto

    mido (aproximadamente 20% de umidade) e outra com o solo visualmente

    encharcado (cerca de 40% de umidade).

    O aspecto visual que o solo apresenta est intimamente ligado sua

    capacidade de reteno de gua (CRA), ou seja, a CRA consiste no mximo de

    gua