BENSAID, D. Marx, Manual de Instruções (Boitempo, 2014)

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    bre Marx, manual de instrues

    arcelo Ridenti

    Ler e reler Marx. Eis uma proposta que pode parecer dogmtica, como se todooblemas do presente e do futuro estivessem resolvidos nas sagradas escrituras dtigo profeta visionrio. No o caso deste livro do filsofo e ativista francs Dnsad. Tampouco se trata de descobrir algum aspecto despercebido que daria uma ave de leitura obra do revolucionrio alemo, nem de enveredar em discusses sobrerdadeiro pensamento. A proposta fornecer um manual de instrues possveisterpretar a obra do Mouro, plena de controvrsias, enfatizando o carter crtico ra

    seu pensamento, avesso a ortodoxias e fanatismos, aberto autocrtica e apompanhar o movimento contraditrio e cambiante da vida social, que envolve constuto)questionamento. E usar esse instrumental terico para compreender e transformndo no comeo do sculo XXI, dominado como nunca pelo fetichismo da mercado

    ante de uma grave crise do capital.Recorrendo a referncias literrias, numa prosa bem-humorada, Bensad lana o lerodamoinho do pensamento de Marx. Expe sua trajetria de vida e destaca trecho

    a obra para tratar de temas como a religio e os fetiches; classes e luta de classualidade do Manifesto Comunista; a revoluo e sua temporalidade; a poltica, o Estapartido; a teoria do valor e a contribuio de O capital; as crises; a ecologiaodutivismo; a cincia e o comunismo. Por fim, faz um balano alentador da heranarx em pensadores do presente. H quem possa contestar o estilo metafrico adotadotor por sinal, inspirado no barbudo , bem como aspectos da interpretao propas so inegveis sua verve criativa e seu conhecimento do tema. O leitor ganha

    anhado polmico no s para investigar o clssico pensador alemo, mas tambm o leBensad.

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    Est longe a poca em que uma imprensa barulhenta anunciava ao mundo a mortarx, to aliviada por seu desaparecimento quanto temerosa de que ele retornasse. Pass

    anos, eis que o semeador de drages ressurge e volta a causar alvoroo: as edies pital se multiplicam mundo afora e sua verso em mang torna-se um best-seller no Japvista Time o celebra como uma torre imensa que domina as outras no nevoeiro e atall Street h manifestaes aos gritos de Marx tinha razo!.

    Este livro, com texto de Daniel Bensad e ilustraes bem-humoradas de Charb, pretstrar como a crtica radical de Marx, relutante a qualquer ortodoxia, a qual

    natismo doutrinrio, sempre pronta autocrtica, sua prpria transformaperao, vive as questes deixadas entreabertas e as contradies no resolvidas em nmpo. um convite descoberta e controvrsia e, ao mesmo tempo, uma introddtica e divertida a essa teoria fenomenal que, como disse o filsofo francs Jean-rtre, estar viva enquanto o capitalismo existir.

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    Sumrio

    troduo

    . Como se tornar barbudo e comunista

    2. De que morreu Deus?

    3. Por que a luta tem classe4. Como o espectro encarnou epor que sorri

    . Por que as revolues nunca chegam na hora certa

    6. Por que a poltica desregula os relgios

    7. Por que Marx eEngels so intermitentes no partido

    8. Quem roubou o mais-valor?O romance noir do capital

    9. Por que o sr. Capital corre risco de crise cardaca

    0. Por que Marx no nem um anjo verde, nem um demnio produtivista

    . Como e em que pensa o dr. Marx

    2. Uma herana sem dono em busca de autores

    onologia resumida de Marx e Engels

    bre o autor e o ilustrador

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    Introduo

    Ser sempre um erro no ler, reler e discutir Marx. Ser um erro cada vez maior, uma faresponsabilidade terica, filosfica, po

    Jacques D

    Um trovo inaudvel, escreveu o filsofo Grard Granel a respeito de O capaudvel talvez para aqueles que foram seus contemporneos. O estrondo desse trovtanto, no deixou de se amplificar desde ento, a ponto de ser hoje ensurdecedor.

    Est longe a poca em que uma imprensa ruidosa anunciava triunfalmente ao munrte de Marx. Involuntariamente, ela exprimia assim tanto o alvio por saparecimento quanto o temor de que ele voltasse. Esse temido retorno causa hojande alvoroo. A edio alem de O capital triplicou suas vendas em um ano. Sua ve

    mang tornou-se um best-seller no Japo. Jacques Attali [a]incensa o monumento Ms sugere despropositadamente inspirar-se no papel importante dos fundos de pens mercados financeiros norte-americanos. Alain Minc[b]proclama a si prprio o lrxista francs (sic!), tomando o cuidado de acrescentar: sob certos aspectos.

    timo, a revista Time celebra Marx como uma torre imensa que domina as outravoeiro. At em Wall Street houve manifestaes aos gritos de Marx tinha razo!.Esse entusiasmo suspeito justifica o receio de que o come-back de um Marx pleiadiza

    nteonizado reduza-se a uma banalizao miditica, tornando inofensivo aquele quemear drages. Um Marx sem comunismo nem revoluo; em sntese, academicamrreto. As homenagens, to numerosas quanto tardias, so, na maior parte, prestadas

    cio virtude. Queiram ou no, saibam ou no, todos os homens sobre a terra so, de c

    neira, herdeiros de Marx, escreveu Jacques Derrida, em seu Espectros de Marx

    rnand Braudel recordou a que ponto o esprito da poca e seu vocabulrio estpregnados das ideias de Marx. Em suma, e at certo ponto, a poca pratica o marxim saber.

    H mais. Na realidade do mundo atual, o capitalismo se aproxima de seu conrico. Faz tudo virar mercadoria: as coisas, os servios, o saber e a vida. Generalvatizao dos bens comuns da humanidade. Desencadeia a concorrncia de todos codos. Nos pases desenvolvidos, 90% da populao ativa agora assalariada. Tudoncorre para que a crise atual apresente-se como uma crise indita daquilo que Mi

    usson chama de capitalismo puro. Justifica-se assim plenamente a afirmao de Dergundo a qual no h futuro sem Marx, ou pelo menos sem a memria e a herana d

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    rto Marx. Sua atualidade a do prprio capital, de sua crtica da economia poltico faz dele um grande descobridor de outros mundos possveis.Este livro no pretende restabelecer, por trs das falsificaes e da espessa crost

    eias recebidas, o verdadeiro pensamento de um Marx autntico e desconhecido. Pretenas apresentar um manual de instrues possveis, mostrando como sua crtica radlutante a qualquer ortodoxia, a qualquer fanatismo doutrinrio, sempre prontocrtica, sua prpria transformao ou sua prpria superao, vive as queixadas entreabertas e as contradies no resolvidas. um convite descobertantrovrsia.Ao mesmo tempo introduo recreativa a uma obra, lembrete, caixa de ferramentas

    nsar e agir, este livro deseja contribuir, na aproximao de grandes turbulncrmentas com desfecho incerto, para afiar novamente nossas foices e nossos martelos.

    Economista, conselheiro do presidente Franois Mitterrand. (N. T.)

    Empresrio francs. (N. T.)

    Jacques Derrida, Espectros de Marx: o estado da dvida, o trabalho do luto e a nova Internacional (trad. Annner, Rio de Janeiro, Relume-Dumar, 1994). (N. E.)

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    Como se tornar barbudo e comunista

    No mesmo ano em que Mary Shelley traz ao mundo um certo doutor Frankenstein, vz um robusto beb, em 5 de maio de 1818, na famlia Marx, rua Brcken, 665, em Tennia). Morre-se muito, e jovem, na casa dos Marx. Um irmo mais velho morre no mo do nascimento do pequeno Karl. Quatro outros irmos e irms perecem prematuram

    tuberculose. S lhe restam uma irm mais velha e duas mais jovens. Mais tarde, dohos de Karl e de sua companheira Jenny, apenas trs filhas sobrevivero Jenny, Laeanor , mas as duas ltimas acabaro por se suicidar.

    Como o rei Lear, o jovem Karl tem a trgica vocao de ser homem entre vlheres. E moas.

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    Pelo lado da me, os Marx descendem de uma linhagem de judeus holandeses, rabinculos, qual tambm pertence o prspero tio Philips. Papai Marx, por sua vez, mamem das Luzes, alimentado por Voltaire, Rousseau e Lessing. Para escapar da interdposta aos judeus pelas autoridades prussianas de se tornarem funcionrios do Estrschel Marx, advogado em Trier, coagido a converter-se ao catolicismo e tor

    einrich Marx.De 1830 a 1835, em uma Rennia agitada por manifestaes a favor da unidade alem

    erdades polticas, o jovem Karl um estudante mediano do Ginsio de Trier, versificalguns momentos e talentoso para a escrita. No outono de 1835, de posse de seu dipl

    rte para Bonn a fim de iniciar um curso de direito. Em composio redigida nesse mo, sobre a meditao de um adolescente diante da escolha de sua profisso, ele demonaspirao de agir no interesse comum, a incerteza quanto escolha da carreiranscincia das determinaes sociais dessa escolha: Nem sempre possvel abraofisso para a qual ns nos sentimos impelidos, porque nossas relaes com a sociemearam, de certa forma, antes que pudssemos determin-las.Habitus, quando nos pegas!

    filho prdigo...

    Em Bonn, o estudante Marx, bom bebedor, frequenta as tabernas e o clube dos potusiasta, briguento, bomio, perseguido por dvidas e bate-se em duelo, apesarprimendas de um pai que julga incompatveis o duelo e a filosofia.

    Em 1836, com dezoito anos, vai de Bonn para Berlim. Ao longo de sua correspondncdescobre em seu menino uma paixo demonaca. As cartas traduzem uma te

    escente. Em 10 de novembro, Karl escreve:

    Meu caro pai, h na vida momentos que so como marcas de fronteira erguidas ao fim de um perodo concludoao mesmo tempo, indicam uma nova direo. A poesia no poderia ser mais do que um coadjuvante. Era necessreu estudasse jurisprudncia, e sentia principalmente um forte desejo de me aplicar filosofia. Tive de passar noites em claro, sustentar muitas lutas [...]. Tombou um vu, meu santo dos santos estava despedaado, era necprocurar novos deuses. Queimei todos os poemas, todos os novos projetos.

    m ms mais tarde, Marx pai responde:

    Desordem, sombrios passeios por todos os domnios do saber, sombrias cogitaes luz de uma lamparina; a indo

    em robe de intelectual, com os cabelos desgrenhados, substitui a indolncia diante do copo de cinsociabilidade que afasta a todos, com desprezo a toda dignidade e a toda considerao por seu pai. Voc caseus pais muito sofrimento e lhes deu bem pouca, ou mesmo nenhuma, alegria.

    stador, o filho festeiro e paga de bom grado a conta dos colegas. O pai deploraodigalidade: Como se fssemos duendes revestidos de ouro!. Fica indignado coscaso filial: Mas como um homem que, a cada quinze dias, precisa inventar novos sistasgar seus velhos trabalhos poderia, pergunto, ocupar-se desses pequenos detalhes?.Heinrich Marx morre cinco meses depois, em 10 de maio de 1838, sem reconciliao.

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    Nas frias de vero de 1836, o jovem Marx havia noivado secretamente com Jennyestphalen, quatro anos mais velha. Em Trier, as famlias Marx e Westphalen so vizi

    crianas compartilham brincadeiras, estudos, emoes juvenis. Cortejada como aravilhosa princesa por muitos homens da boa sociedade, Jenny a rainha do bailetanto, prefere conceder seus favores a esse adolescente moreno e turbulento, a qelida meu javali selvagem. No Natal de 1836, Karl lhe dedica trs volumes de potitulados O livro do amor. Mas o casamento oficial s acontece sete anos mais tarde, junho de 1843, em Kreuznach. Os dois amantes dilapidam, ento, em poucas semanas, o noiva.

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    Na vspera do casamento, Karl escreve a seu correspondente Arnold Ruge:

    Posso lhe assegurar, sem sombra de romantismo, que estou apaixonado da cabea aos ps, o mais seriamente poFaz mais de sete anos que estou noivo, e minha noiva teve de enfrentar por mim duros combates, tanto contrparentes quanto contra minha prpria famlia, na qual se intrometeram alguns padres e outras pessoas que nsuportam.

    a filho prodgio

    Em Berlim, Karl torna-se amigo de jovens estudantes fascinados por Hegel, mucos anos antes, cujo esprito ronda os crculos intelectuais. Juntos, decifram a lgrevoluo, entusiasmam-se pela crtica da religio de Feuerbach, devoram Espino

    ibniz. Mas as liberdades acadmicas estreitam-se como a pele de onagro[a]sob os golpao prussiana. As perspectivas de carreira universitria desaparecem.

    Em abril de 1841, Karl Marx torna-se doutor, defendendo em Iena a tese A difertre as filosofias da natureza em Demcrito e Epicuro. A comparao entre os sofos gregos, para quem o mundo material composto por tomos, favorece o segura Demcrito, a necessidade seria o destino e o direito, a providncia e a criador

    ndo. Para Epicuro, a necessidade, que alguns apresentam como senhora absolutaste: algumas coisas so fortuitas, outras dependem da nossa vontade e vivercessidade no uma necessidade. Os anos de formao sempre deixam traos profundos que veem em Marx um determinista vulgar, para quem todos os fenmenos socorreriam de uma implacvel necessidade econmica, deveriam se lembrar rendizado filosfico.

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    Sob Frederico Guilherme IV, a Prssia permanece um Estado reacionrio e intolermo a carreira universitria parece inacessvel, os jovens intelectuais rebeldes dirig

    ra a imprensa. Em 1ode janeiro de 1842, surge em Colnia, sob a responsabilidade editMoses Hess, o primeiro nmero da Gazeta Renana. Voltando de Berlim, o jovem dr. M

    z a, aos 23 anos, sua brilhante estreia como jornalista. Seus primeiros artigos soberdade de imprensa causam sensao. Em outubro, torna-se editor do jornal. Moses aa, ento, um retrato muito elogioso e proftico:

    um fenmeno que me causou enorme impresso [...]. Dr. Marx (esse o nome de meu dolo) um homem muito de 24 anos no mximo. Ele dar na religio e na filosofia medieval o tiro de misericrdia. Ele alia a mais proseriedade filosfica ao esprito mais mordaz. Imagine Rousseau, Lessing, Heine e Hegel fundidos no mesmo perso e ter o dr. Marx.

    Em janeiro de 1843 a Gazeta Renana interditada pela censura. Marx cogita, enixar o pas:

    lamentvel testemunhar trabalhos servis, mesmo que em nome da liberdade, e lutar com alfinetadas e ncacetadas. Estou cansado de hipocrisia, de estupidez, de autoridade brutal. Estou cansado de nossa docilida

    nossa obsequiosidade, de nossos recuos, de nossas querelas por meio de palavras. Nada posso fazer na Alemanhafalsifica-se a si mesmo.

    s celebrar seu casamento e consagrar o vero leitura crtica das obras de Hegel soesto do direito e do Estado, parte em setembro para um exlio voluntrio em Pelha escola superior de filosofia e capital do novo mundo.

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    mutao

    De outubro de 1843 a janeiro de 1845, a primeira temporada parisiense ocasicontro de Marx com a imigrao operria alem e com o movimento socialista frastalado com Jenny em um quarto na rua Vanneau, Karl desembarca cheio de entusiasdor nessa capital do novo mundo, com um projeto de publicao mensal, os Aanco-Alemes. O ttulo frisa a vontade de aliar a tradio filosfica alem trad

    volucionria francesa. A revista ter um s e nico nmero. Marx nele publicatigos, sobre a filosofia do direito de Hegel e sobre a questo judaica. Eles traduzemoluo do liberalismo democrtico ao socialismo, mas no ainda ao comunismo.

    Em 1842, em Colnia, o jovem dr. Marx cruzara com um colaborador ainda mais jovezeta, trs anos mais moo, a caminho de Manchester. Enquanto o estudante Marx beelava em Berlim, o turbulento Engels de riso eterno se entediava em Bremenpresa familiar de importao-exportao onde deveria fazer seu aprendizado comer

    mpreendedor enrgico e religioso rigorista, Engels pai fundou em Manchester, ca

    ndial dos fios de algodo, uma fbrica de fiao, Ermen & Engels, da qualproprietrio. Destinado a ser seu sucessor, Engels filho no herdou muita vocefere escrever poemas exticos sobre a caa aos lees e a vida livre dos bedunos, balanna rede, enfumaar-se com grossos charutos, fazer a ronda das tabernas, cobrir cadem esboos e caricaturas. Bebe muito, pratica esgrima e equitao e exibe um biovocador. Vangloria-se de no ter comprado por um ttulo o direito de filosofavia uma circular a todos os jovens em idade de usar bigode para lhes dizer que eegou o momento de amedrontar todos os burgueses. Como poeta supremo e beberrte, declara aos antigos, aos presentes, aos ausentes e a todos que viro que no pacriaturas podres, estagnadas no desgosto da prpria existncia. Ele tenta at

    mance espanhol, escreve uma carta danarina Lola Montez e se entedia profundameDe setembro de 1841 a outubro de 1842, Friedrich, que aos vinte anos j se dec

    munista, faz seu servio militar como voluntrio na artilharia. o incio de uma par assuntos militares que lhe valer o apelido de General. Enviado a Manchesterntinuar sua educao comercial, entra em contato com o movimento cartista e desc

    pioneiro da sociologia urbana e da sociologia do trabalho, a condio operrialta, seu encontro com Marx em Paris tem a fora da paixo intelectual. Um ac

    rfeito emerge de suas longas conversas no Caf de la Rgence. Comeam a escrever jua pequena brochura, A sagrada famlia. Engels volta para a Alemanha e Marx

    ochura a dimenso de um livro, do qual escreve oito dcimos. Engels, que no escris do que um curto captulo a bem da verdade, decisivo , fica atnito ao ver seu capa da publicao.

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    Na Rennia, h agitao. Reunies e crculos comunistas multiplicam-se. Em maio degels publica seu prprio livro, A situao da classe trabalhadora na Inglaterra: A gucial, a guerra de todos contra todos, aqui explicitamente declarada. [...] permanec

    antados com o fato de este mundo enlouquecido ainda continuar funcionando[b].

    o momento utpico ao comunismo

    Em artigo de 1843, Os progressos da reforma social no continente, o jovem Engel

    enas vinte anos) declara, no sem iluses, um entusiasmo juvenil pelo comunismo: Hana mais de meio milho de comunistas, sem contar os fourieristas e outros reformadciais menos radicais[1]. O comunismo para ele, ento, uma concluso necessria qm de extrair das condies gerais da civilizao moderna. Em suma, um comungico. Um novo comunismo, produto da revoluo de 1830, porque:

    [os trabalhadores] retornaram ento s fontes vivas e ao estudo da grande revoluo e apoderaram-se vivamecomunismo de Babeuf, o animador da Conspirao dos iguais contra a reao termidoriana, em 1795. Isto tuse pode dizer com certeza do comunismo moderno na Frana: discute-se primeiro nas ruas sombrias e nas abarrotadas de gente do subrbio Saint-Antoine.

    Antes de 1848, esse comunismo espectral, sem programa definido, ronda o espritoca sob as formas mal esculpidas da seita dos Igualitrios ou dos devaneios icarianobet, terico nos anos 1840 de uma utopia comunitria. Na Alemanha, pelo contr

    arece primeiro como uma tendncia filosfica. J em agosto de 1842, alguns entre n

    rtido[2]estimavam que as mudanas unicamente polticas seriam insuficientes e declare suas concepes filosficas s poderiam caminhar junto com uma revoluo sociamunismo surge assim como uma consequncia to necessria da filosofia hegeliana

    ngum poderia mais destru-lo. Parece que esse comunismo filosfico (sic) estraizado na Alemanha. Sua origem tem, no entanto, uma consequncia paradoxal, lamovem Friedrich, na medida em que ns recrutamos entre as classes que se beneficis privilgios da cultura, quer dizer, entre universitrios e homens de negcios quenheceram pessoalmente muitas dificuldades na vida. por isso que temos muirender com os socialistas ingleses, que nos precederam e fizeram praticamente toabalho[3].

    No incio dos anos 1840, o jovem dr. Marx mais reservado que seu colega mais mo

    munismo (de Cabet, Demazy, Weitling) ainda a seus olhos uma abstrao dogmta manifestao original do princpio do humanismo. Escreve a Ruge, em 30 de nove1842:

    Tinha por despropositada, ou melhor, por imoral, a introduo sub-reptcia de dogmas comunistas e socialistseja, uma nova concepo de vida, nas narrativas de teatro que nada tm a ver com isso, e eu gostaria ddiscusso completamente diferente e aprofundada do comunismo, se que o assunto merecia ser discutido...

    m nova carta a Ruge, em maio de 1843, ele pede para refletir ainda mais antes donunciar:

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    Desde sua chegada a Paris, mesmo prestando homenagem aos pioneiros dos socialpicos, Marx manifestou a vontade de ultrapassar seus balbucios doutrinrios:

    No queremos antecipar dogmaticamente o mundo, mas, ao contrrio, encontrar o novo mundo a partir da crtantigo. [...] Embora a construo do futuro e sua consolidao definitiva no sejam assunto nosso, tanto mais le certo o que atualmente temos de realizar; refiro-me crtica radical da realidade dada; radical tanto no sde que a crtica no pode temer os seus prprios resultados quanto no sentido de que no pode temer os concom os poderes estabelecidos. No nos apresentamos ao mundo como doutrinrios com um novo princpio: aquiverdade, ajoelhem-se diante dela! Trazemos ao mundo os princpios que o prprio mundo desenvolveu em seu seiapenas lhe mostramos por que exatamente ele luta.

    Assim, o comunismo a que adere no uma cidade imaginria em esboo, movimento real que suprime a ordem existente. Em seus manuscritos parisienses deanuscritos econmico-filosficos], j o define como a expresso positiva da proprievada abolida. Mas tambm adverte contra as formas primitivas e rudes de um comune seria somente a consumao do nivelamento a partir do mnimo; que no suprimitegoria de trabalhador, mas se contentasse em estend-la a todos os homens; que nusesse ao casamento que certamente uma forma de propriedade privada exclusiva

    uma comunidade de mulheres, na qual a mulher se tornasse uma propriedade coletmum.Na primavera de 1847, Marx e Engels ingressam na Liga dos Justos, animada

    grantes alemes em Paris. Seu congresso acontece em 1o de junho, em Londres, ecidida a mudana de nome para Liga dos Comunistas. O lema Todos os homens so irmubstitudo por Proletrios de todos os pases, uni-vos.O segundo congresso acontece em novembro do mesmo ano, ainda em Londres. Ma

    carregado de redigir com Engels um manifesto. Em dezembro, pem-se a trabalhar, m

    atraso. Os dirigentes londrinos da Liga se impacientam. Quando, em fevereiro deto no prelo as ltimas provas do Manifesto Comunista, Paris vive uma revoluo.

    O espectro do comunismo ronda de fato a Europa.O jovem espadachim imberbe berlins tornou-se um homem barbudo e comunista.

    bliografia selecionadaNSAD, Daniel. Passion Karl Marx: les hiroglyphes de la modernit. Paris, Textuel, 2001.LLINICOS, Alex. Les ides rvolutionnaires de Marx. Paris, Syllepse, 2008.RNU, Auguste. Karl Marx et Friedrich Engels, 4 v. Paris, PUF, 1955-1970.

    RSCH, Karl. Karl Marx. Paris, Champ Libre, 1971.LER, Henri. Congdier lutopie? Lutopie selon Karl Marx. Paris, LHarmattan, 1994.HRING, Franz. Karl Marx, histoire de sa vie. Paris, ditions Sociales, 1983 [ed. bras.: Karl Marx: a histria de suaSo Paulo, Sundermann, 2013].ZANOV, David. Marx et Engels. Paris, Anthropos, 1974.

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    Referncia ao livro A pele de onagro, de Honor de Balzac, que conta a histria de uma pele mgica capaz de redesejos de seu proprietrio. A cada pedido atendido, porm, a pele se encolhe um pouco, reduzindo simultaneam

    po de vida daquele que a possui. (N. E.)Friedrich Engels, A situao da classe trabalhadora na Inglaterra (trad. B. A. Schumann, 1. ed. rev., So tempo, 2010), p. 68-9. (N. E.)

    The New Moral World, 4 nov. 1843. Engels separa aqui os comunistas dos fourieristas, argumentando que, em Fouma grave contradio, porque ele no abole a propriedade privada.

    Engels entende por partido no uma organizao partidria, no sentido moderno, mas a corrente dos elianos de esquerda, identificados com os Anais Alemes.

    dem.

    Karl Marx, carta a Arnold Ruge, maio 1843, em Sobre a questo judaica (trad. Nlio Schneider, So Paulo, Boi

    0), p. 69-70. (N. T.)Karl Marx e Friedrich Engels, Manifesto Comunista (trad. lvaro Pina, 1. ed. rev., So Paulo, Boitempo, 2010), pE.)

    Ibidem, p. 66-7. (N. T.)

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    De que morreu Deus?[a]

    Os dois artigos publicados por Marx em Paris, no ano de 1844 Crtica da filosofireito de Hegel Introduo e Sobre a questo judaica , no se limitam a anuncrte do Deus das religies. Eles se empenham no combate contra os fetiches e os d

    bstitutos: o Dinheiro e o Estado.

    Em A essncia do cristianismo[b], Feuerbach no s mostrou que o homem no a criaDeus, e sim seu criador. No s sustentou que o homem faz a religio, a religio n

    homem. Ele tambm comprovou que a filosofia simplesmente a religio transpostadeia e por esta desenvolvida, escreve Marx. Ao fazer da relao social do homem cmem o princpio fundamental da teoria, fundou o verdadeiro materialismo. Pmem no um homem abstrato, acocorado fora do mundo, o mundo do homemem em sociedade que produz, troca, luta, ama. o Estado, a sociedade.

    pio do povoUma vez admitido que esse homem real no a criatura de um Deus todo-poderoso,

    ber de onde vem a necessidade de inventar uma vida aps a vida, de imaginar um Cu s misrias terrestres. A misria religiosa constitui ao mesmo tempo a expresso da mial e o protesto contra a misria real. A religio o suspiro da criatura oprimida, o um mundo sem corao, assim como o esprito de estados de coisas embrutecidos. El

    io do povo.[c]Como o pio, ela atordoa e ao mesmo tempo acalma.

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    Portanto, a crtica da religio no pode se contentar, como acontece coticlericalismo manico e o racionalismo das Luzes, em ser hostil com o clero, came ou com o rabino. Essa abordagem da questo religiosa tambm adotada por Engo aps a Comuna de Paris. Ele considera o problema do atesmo ultrapassado e crguns exilados parisienses por quererem transformar as pessoas em ateias por ordefti, em vez de tirarem lies da experincia.

    Pode-se ordenar tudo o que se quer no papel sem que, no entanto, isso seja colocado em prtica, e as persegui

    a melhor maneira de dar origem a fiis estorvantes. Uma coisa certa: o nico servio que se pode prestar ahoje, declarar que o atesmo um artigo de f obrigatrio e sobrevalorizar as leis anticlericais, proibindo a rem geral.

    Desde 1844, trata-se para Marx de atacar as condies sociais que provocam cessidade de crena e de paraso artificiais:

    A supresso [Aufhebung] da religio como felicidade ilusria do povo a exigncia da sua felicidade real. A exide que abandonem as iluses acerca de uma condio a exigncia de que abandonem uma condio que neces

    iluses. A crtica da religio , pois, em germe, a crtica do vale de lgrimas, cuja aurola a religio. [d]

    A crtica da religio visa, assim, a um objetivo necessrio, mas limitado: privar o hosuas iluses, de seus consolos ilusrios, frustr-lo, abrir-lhe os olhos a fim de qu

    nse, aja, configure a sua realidade como um homem desenganado, que chegou razo, que ele gire em torno de si mesmo, em torno de seu verdadeiro sol. Uma vez acabad

    m da verdade religioso, a tarefa histrica estabelecer a verdade do aquesmascarar a autoalienao nas suas formas no sagradas: A crtica do cu transformim, na crtica da terra, a crtica da religio, na crtica do direito, a crtica da teolcrtica da poltica[e].Ao proclamar que, para a Alemanha, a crtica da religio est, no essencial, termin

    s que ela o pressuposto de toda a crtica[f], a Crtica da filosofia do direito de Hntroduo, de 1844, tem um ar de manifesto antes do Manifesto Comunista e o d

    ograma de trabalho que anuncia as novas tarefas da crtica. O artigo Sobre a quedaica, publicado no mesmo e nico nmero dos Anais Franco-Alemes, muitas tendido em sentido inverso, seu prolongamento ou sua primeira aplicao prtica.

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    questo judaica

    A polmica com Bruno Bauer vale hoje a Marx uma fama falsa e perversa. A lenda darx antissemita instalou-se no dicionrio das ideias recebidas. Antes de tudo, acronismo grosseiro. O antissemitismo racial ganhou importncia na segunda metadculo XIX, paralelamente ao desenvolvimento do racismo colonial, de que so emblemteorias de Gobineau e Chamberlain, ou do darwinismo social. Segundo o Dictionn

    storique de la langue franaise [Dicionrio histrico da lngua francesa], o termo suenas em 1879. Antes, tratava-se de um antijudasmo religioso, alimentado pelo mito bbdois conceitos, bvio, podem se fundir e sobrepor. Quanto afinidade eletiva e

    deus e dinheiro, evocada no texto de Marx, essa era poca uma banalidade literriaenas entre os panfletrios como Toussenel ou Bakunin, mas tambm entre os escritmo Balzac A casa Nucingen! , mais tarde Zola e outros autores de origem judaica, c

    einrich Heine ou Moses Hess. E ainda mais tarde no David Golder, de Irne NmirovsQuanto a Marx, embora, arrebatado por seu universalismo, possa se irritar c

    tologia de povo eleito e com o particularismo comunitrio, no deixa de apoivimento dos judeus de Colnia pelos direitos civis. Em carta a Ruge em maro de nta como aceitou redigir, a pedido deles, uma petio para o reconhecimento dreitos:

    Agora mesmo, recebo aqui a visita do chefe da comunidade judaica, que me pede para redigir, para os judeupetio Dieta. Vou faz-la. Por maior que seja minha repugnncia pela religio israelita, a maneira de ver deme parece demasiadamente abstrata. No que depende de ns, trata-se de abrir o maior nmero possvel de brecEstado cristo e nele introduzir secretamente a razo.

    nge de contradizer as teses de Sobre a questo judaica, escrito poucas semanas dee gesto , ao contrrio, sua ilustrao prtica. Procura-se emancipar o Estaddasmo, do cristianismo, da religio em geral, em outras palavras, separar o Escular da Igreja emancipando-se da religio de Estado, de tal forma que este no pronhuma religio, mas se mostre simplesmente pelo que . No se deve acreditar, no entae sob o pretexto de ter obtido liberdade religiosa o homem esteja liberado da reli

    propriedade, do egosmo profissional. Em outras palavras, longe de serndamentalista laico e de fazer do atesmo uma nova religio de Estado, Marx

    esto de liberdade de culto, um liberal no sentido antigo do termo: um defensor fs liberdades pblicas.Quando bem mais tarde, em 1876, durante uma cura termal em Karlovy Vary, ele de

    m Heinrich Graetz, pioneiro de estudos judaicos desde os anos 1840, autor denumental Histoire du peuple juif [Histria do povo judeu], advogado da desassimilacontro muitssimo cordial. Em sinal de estima recproca, presenteiam-se com suas oarx certamente est muito distante de um Proudhon, que deseja o fechamento de todagogas e a deportao em massa dos judeus para a sia, e dos sinais precursoretissemitismo racial, destinado a ser, segundo a frmula do socialista alemo August Bsocialismo dos imbecis.

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    primeiro comunismo

    A crtica do atesmo contemplativo e abstrato leva Marx a se distanciar de Feuerbe no v que o prprio sentimento religioso um produto social e que o indivstrato que ele analisa pertence a uma forma de sociedade bem determinada. terialismo, que faz do esprito uma emanao da natureza, e no o contrrio, mant

    rspectiva da sociedade burguesa. Tem de ser superado por um novo materialismo, qloque na perspectiva da sociedade humana ou da humanidade social: Assim, uma vez

    descobriu que a famlia terrestre o segredo da Sagrada Famlia, justamente a prime deve ser aniquilada na teoria e na prtica.Esse novo materialismo social, essa superao do atesmo abstrato, simplesmen

    munismo:

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    Da mesma maneira que o atesmo, enquanto negao de Deus, o desenvolvimento do humanismo tercomunismo, enquanto negao da propriedade privada, a reivindicao da verdadeira vida humana como proprdo homem: o comunismo o desenvolvimento do humanismo prtico. Em outras palavras, o atesmo o hummediado pela supresso da religio, e o comunismo o humanismo mediado pela supresso da propriedade privada

    preciso ainda distinguir diferentes momentos no desenvolvimento da ideia comunm sua forma primitiva, o comunismo rude quer aniquilar tudo o que no suscetvr possudo por todos. A condio do trabalhador no suprassumida, mas estendida a t

    homens. A propriedade privada generalizada encontra sua expresso animalmunidade das mulheres. Esse comunismo rude s o aperfeioamento desta inveja e velamento a partir do mnimo representado. A suprassuno da propriedade privada, so, no a apropriao social efetiva, mas a negao abstrata do mundo inteirltura [Bildung] e da civilizao; o retorno simplicidade no natural do ser hubre e sem carncias que no ultrapassou a propriedade privada, e nem mesmo at

    egou[l].O comunismo poltico ou democrtico visa supresso do Estado, supera

    enao humana e ao retorno do homem para si. Mas, no tendo ainda compreendincia positiva da propriedade privada e muito menos a natureza humana da carncia

    nda continua embaraado na mesma e por ela infectado. O comunismo na condiprassuno [Aufhebung] positiva da propriedade privada, enquanto estranhamento-elbstentfremdung] humano, e por isso enquanto apropriao efetiva da essncia hulo e para o homem, a verdadeira resoluo [Auflsung] do conflito entre a existnessncia, entre objetivao e autoconfirmao [Selbstbesttigung], entre liberdacessidade [Notwendigkeit], entre indivduo e gnero[m].

    Se para suprassumir o pensamento da propriedade privada basta de todo o comunnsado, para suprassumir a propriedade privada efetiva preciso uma ao comuetiva, um movimento que sofrer na efetividade um processo muito spero e extens

    m suma, enquanto o atesmo apenas a negao abstrata de Deus, o comunismo gao concreta. Ele vai raiz das coisas e procura acabar praticamente com um mundustraes e misrias das quais surge a necessidade de consolo divino.

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    crtica dos fetiches terrestres

    Acabar de uma vez por todas com o Deus celeste de sinistra memria tambm acm seus substitutos terrestres, com todas as criaes humanas que se edificam diantemens como poderes autnomos, como fetiches que os transformam em joguetes, a com

    lo Estado e pelo Dinheiro, mas igualmente pela Sociedade ou pela Histria.O Dinheiro: tudo aquilo que tu no podes, pode o teu dinheiro: ele pode comer, b

    ao baile, ao teatro, sabe de arte, de erudio, de raridades histricas, de poder polde viajar, pode apropriar-se disso tudo para ti; pode comprar tudo isso; ele a verdapacidade. Tem a aparncia de um simples meio mas o verdadeiro poder e a finaliica. o poder corruptor que transforma a fidelidade em infidelidade, o amor em dio em amor, a virtude em vcio, o vcio em virtude... a estupidez em entendimenttendimento em estupidez[o]. Ele confunde e embaralha tudo. a confuso geral.A Sociedade no um conjunto nem um corpo em que os indivduos so somente pembros: preciso evitar fixar mais uma vez a sociedade como abstrao frent

    divduo. O indivduo o ser social. Sua manifestao de vida [...] , por isso, ternao e confirmao da vida social[p].A Histria no este personagem todo-poderoso, a Histria universal, da qual serrionetes. A Histria no faz nada, escreve sobriamente Engels em A sagrada famo luta nenhum tipo de luta! [...] no , por certo, a Histria, que utiliza o homem cio para alcanar seus fins como se se tratasse de uma pessoa parte , pois a Histria

    eno a atividade do homem que persegue seus objetivos.[q] A histria presente e aqr vir no so a meta da histria passada. Traar planos para a eternidade no prob

    sso, escreve Marx j em 1843. Em 1845, os dois esclarecem em A ideologia alem:A histria nada mais do que o suceder-se de geraes distintas [...] o que ento pode ser especulativadistorcido, ao converter-se a histria posterior na finalidade da anterior [...]. Com esse procedimeninfinitamente fcil dar histria orientaes nicas, bastando apenas descrever o seu ltimo resultado co

    tarefa que ela, na verdade, desde sempre se props.[r]

    diferena da histria religiosa, a histria profana no conhece predestinao lgamento final. uma histria aberta, que faz no presente a crtica radical de todem existente, uma luta entre classes, com desfecho incerto.

    Como Deus morreu? E de que? Gravemente ferido dois sculos antes pela demonstrque a Terra gira em torno do Sol, pela observao de manchas na Lua pouco compatm a pureza divina, pela descoberta do movimento elptico dos planetas, contradizenrfeio circular, esse Deus de sinistra memria sofre, no sculo XIX, novos golptao geolgica arruna o mito bblico da criao. A teoria da evoluo reeniatura admica sua origem animal. Essas feridas narcisistas acumuladas tornam-se moando os homens aprendem que eles mesmos fazem sua histria em condies que

    colheram. Deus , de certa forma, a primeira vtima colateral da luta de classes no cen

    uma histria tornada profana.

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    At ento, os filsofos tinham se contentado em interpretar o mundo de diferneiras; o que importa agora transform -lo. Para transform-lo, certamente prntinuar a decifr-lo e interpret-lo, mas interpret-lo de outro modo, de maneira crrtica. Esgotou-se a crtica da religio e da filosofia especulativa. Daqui para a frentz da crtica da economia poltica, que vai mobilizar a inteligncia de Marx atrte.

    bliografia selecionadaLIBAR, tienne. La philosophie de Marx. Paris, La Dcouverte, 1993 [ed. bras.: A filosofia de Marx. Rio de JaZahar, 1995].LDMANN, Lucien. Marxisme et sciences humaines. Paris, Gallimard, 1970.PPOLITE, Jean. tudes sur Marx et Hegel. Paris, Marcel Rivire, 1955.UVLAKIS, Eustache. Philosophie et revolution: de Kant Marx. Paris, PUF, 2003.

    BICA, Georges. Le statut marxiste de la philosophie. Bruxelas, Complexe, 1976.___. Karl Marx, les thses sur Feuerbach. Paris, PUF, 1987 [ed. bras.: As teses sobre Feuerbach. Rio de Janeiro, Z1990].NDEL, Ernest. La formation de la pense conomique de Marx. Paris, Maspero, 1967 [ed. bras.: A formapensamento econmico de Karl Marx. Rio de Janeiro, Zahar, 1968].RX, Karl, Sur la question juve. Prsentation et commentaires de Daniel Bensad. Paris, La Fabrique, 2006 [edSobre a questo judaica. Apresentao e comentrios de Daniel Bensad. So Paulo, Boitempo, 2010].

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    Trechos deste captulo foram publicados anteriormente em Daniel Bensad, Apresentao e Posfcio, emrx, Sobre a questo judaica (trad. Nlio Schneider, So Paulo, Boitempo, 2010). (N. T.)

    2. ed., Petrpolis, Vozes, 2009. (N. E.)

    Karl Marx, Crtica da filosofia do direito de Hegel Introduo, em Crtica da filosofia do direito de Hegelbens Enderle e Leonardo de Deus, 2. ed. rev., So Paulo, Boitempo, 2010), p. 145. (N. E.)

    Ibidem, p. 145-6. (N. E.)

    Ibidem, p. 146. (N. E.)

    bidem, p. 145. (N. E.)

    Karl Marx, Primeira campanha da crtica absoluta, em Karl Marx e Friedrich Engels, A sagrada famlia rcelo Backes, So Paulo, Boitempo, 2003), p. 107. (N. E.)

    Idem, Terceira campanha da crtica absoluta, em Karl Marx e Friedrich Engels, A sagrada famlia, cit., p. 124. (

    Filsofo francs, atesta militante. (N. T.)

    bidem, p. 123. (N. E.)

    Karl Marx, Manuscritos econmico-filosficos (trad. Jesus Ranieri, So Paulo, Boitempo, 2004), p. 106. (N. T.)

    bidem, p. 103-4. (N. E.)

    Ibidem, p. 105. (N. E.)

    Ibidem, p. 145. (N. E.)

    Ibidem, p. 142, 160. (N. T.)

    Ibidem, p. 107. (N. T.)Friedrich Engels, Segunda campanha da crtica absoluta, em Karl Marx e Friedrich Engels, A sagrada famlia, (N. T.)

    Idem, A ideologia alem (trad. Rubens Enderle, Nlio Schneider e Luciano Cavini Martorano, So Paulo, Boi7), p. 40, 149. (N. T.)

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    Por que a luta tem classe

    O comunismo a que Marx adere, no incio dos anos 1840, ainda uma ideia filosficaectro sem corponem carne. O mesmo pode ser dito do proletariado. Ele faz sua apar

    artigo dos Anais Franco-Alemes sobre a filosofia do direito como possibilisitiva de emancipao social. Essa possibilidade repousa, com efeito,

    na formao de uma classe com grilhes radicais, de uma classe da sociedade civil que no seja uma clasociedade civil, de um estamento que seja a dissoluo de todos os estamentos, de uma esfera que possua um cuniversal mediante seus sofrimentos universais e que no reivindique nenhum direito particular porque cont

    no se comete uma injustia particular, mas a injustia por excelncia. [a]

    que no pode se emancipar sem emancipar todas essas esferas [da sociedade]: soluo da sociedade, como um estamento particular, o proletariado.Em sua espetacular entrada em cena, mesmo que sua formao esteja ligada ao emerg

    vimento industrial[b], esse proletariado ainda uma abstrao, a negao abstratopriedade e o agente ativo da filosofia, que procura nele suas armas materiais, mo ele busca na filosofia suas armas espirituais.A cabea e as pernas, em sntese.

    proletariado em carne e osso

    Em Paris, nos crculos operrios esfumaados do subrbio Saint-Antoine, entrmerosos imigrantes alemes, Marx descobre esse movimento prtico e suas novas fosociabilidade:

    Quando os artesos comunistas se unem, vale para eles, antes de mais nada, como finalidade a doutrina, propaetc. Mas ao mesmo tempo eles se apropriam, dessa maneira, de uma nova carncia, a carncia de sociedade, eaparece como meio, tornou-se fim. Este movimento prtico pode-se intuir nos seus mais brilhantes resultados qse v operrios (ouvriers) socialistas franceses reunidos. Nessas circunstncias, fumar, beber, comer etc., no emais como meios de unio ou como meios que unem. A sociedade, a associao, o entretenimento, que novamentesociedade como fim, basta a eles; a fraternidade dos homens no nenhuma frase, mas sim verdade para el

    nobreza da humanidade nos ilumina a partir d[ess]as figuras endurecidas pelo trabalho. [c]

    encontro com Engels, que traz da Inglaterra um conhecimento concreto da c

    abalhadora e do movimento cartista, a oportuna confirmao dessa descoberta.

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    Antes de ser confrontado com a emergncia do proletariado moderno, Marx j tatado de questes econmicas e sociais na poca em que dirigia a Gazeta Renana. Em

    relembrar o percurso de seus prprios estudos econmicos, ele recordrcunstncias em que teve de falar pela primeira vez, com grande embarao, dos chamteresses materiais. Isso aconteceu em 1842, na Rennia, durante os debates parlamenbre o furto da madeira e a fragmentao da terra. Nos anos 1820-1840, no apenaemanha, mas tambm na Frana durante a Restaurao e na Inglaterra com a famoss Pobres de 1834, uma srie de medidas legislativas restringe os direitos consuetudins pobres (recolhimento de madeira, respiga, pasto livre), que autorizavam o uso de muns para satisfazer necessidades bsicas. Destroem-se as formas elementarelidariedade camponesa e paroquial e transformam-se os bens comuns tradicionais (codeira) em mercadorias, com a inteno de impelir os aldees para as cidades e obrig-vender e se exaurir na indstria nascente. Da mesma forma, hoje a contrarreferal desmantela metodicamente o direito ao trabalho e os sistemas de proteo s

    ra coagir os trabalhadores a aceitar condies de salrio e emprego cada vez trgradas.

    Na verdade, essas medidas destinam-se a redefinir a fronteira entre o domnio pblicopriedade privada. Ao atacar o direito de utilizao dos bens comuns, elas inventra o que Marx chama de formas hbridas e incertas de propriedade, herdadas dsado longnquo. , desse modo, a partir da questo da propriedade, que o jovem M

    orda a luta de classes moderna.A histria de todas as sociedades at hoje existentes a histria das lutas de classes

    ta para a reedio do Manifesto Comunista, Engels esclarece a frase inicial do captitulado Burgueses e proletrios: isto , toda histria escrita, porque a pr-Hist

    organizao social anterior histria escrita, era desconhecida em 1847[d]. De quela poca as pesquisas antropolgicas ainda engatinhavam.Mas, mesmo restrita histria escrita, a frmula s aceitvel se a palavra classe sentido amplo, que englobe formas diferentes de agrupamentos sociais (castas,

    dens, estados, status), e no apenas as classes modernas, que pressupem o trabalhre e as relaes de produo capitalistas. As sociedades antigas tendiam a torn

    ofisses hereditrias, petrific-las em castas ou, ainda, ossificar em corporaferentes ramos da indstria. Na sociedade capitalista, o trabalhador no est atre

    r seu nascimento a um status ou a um grupo hereditrio. Ele teoricamente livre, ormite a todos o devaneio da promoo social ou do sucesso pessoal. Todos podem soe so Henry Ford. Mas no existe evaso em massa da condio trabalhadora.Em um sentido amplo, a diviso da sociedade em classes provm da diviso do traba

    o logo a produtividade, graas ao uso de ferramentas, atinge a capacidade de gerumular um excedente, surgem as castas, a comear pelos padres, encarregadontabilizar e administrar esse excedente social. Na escravido e na vassalagem, a relaplorao imediatamente visvel. Nas formas de trabalho forado ou corve

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    bretrabalho extorquido pelo monoplio da violncia. No contrato de trabderno, a violncia e a coao esto ocultas, mas conservam sua fora.Em vo busca-se em Marx uma definio simples de classes ou um quadro estatstic

    tegorias socioprofissionais. Ou seja, as classes aparecem em seus escritos como uma reltagnica recproca. Definem-se na luta e pela luta. Para Marx, a luta de classes o estratgica tanto como ou mais do que sociolgica.

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    ploradores e explorados

    O Livro I de O capital, sobre o processo de produo, sobre o que se passa no locaabalho, chama a ateno para a relao de explorao (a extorso do mais-valor nos po

    mercado, onde se elucida o prodgio do dinheiro que parece fazer dinheiro, fertilimesmo em mistrio to fantstico quanto a imaculada conceio). Esse fato advarao entre o trabalhador e seus meios de produo, entre o campons e a terra, ent

    errio e as mquinas e ferramentas, transformadas em propriedade exclusiva do patrera da produo, no entanto, a relao de explorao apenas a carcaa ou o esques relaes de classe, quer dizer, sua forma mais rudimentar. No captulo 8 do Livrogulamentao da jornada de trabalho se apresenta, na histria da produo capitamo uma luta em torno dos limites da jornada de trabalho uma luta entre o conjs capitalistas, i.e., a classe capitalista, e o conjunto dos trabalhadores, i.e., a cabalhadora. Nesse sistema (capitalista), todos os meios para o desenvolvimentoduo se convertem em meios de dominao e explorao do produtor e fazem del

    r parcial, degradam-no condio de um apndice da mquina. Alienam ao trabalhanto a outras potncias hostis, a cincia como potncia autnoma. Ao trabalho cria

    bstituem o trabalho forado e transformam seu tempo de vida em tempo de trabalhoO Livro II, sobre o processo de circulao (o caminho que percorre o capital des

    vestimento inicial em dinheiro at a obteno do lucro, passando pela produo e nsumo das mercadorias), introduz determinaes novas, como as relaes salariampra e a venda da fora de trabalho. Introduz particularmente as noes de trabretamente) produtivo e no ou indiretamente produtivo (da mesma forma que o Linha introduzido as noes de trabalho concreto/trabalho abstrato). Porm, esse nceitual no inclui um critrio de definio de classes, ao contrrio do que peguns autores, que consideram a identidade entre trabalho produtivo e cabalhadora o fundamento de uma concepo restritiva e operarista do proletariado.s consequncias desse enfoque, em razo da desindustrializao e descentralizdustrial, o questionamento da prpria existncia do proletariado. No entanto, de exista separao entre o trabalhador e os meios de produo (terra, ferramentas) edetentor da fora de trabalho se defronte com os meios de produo como proprieheia, existe uma relao de classes entre capitalista e assalariado:

    trata-se de compra e venda, de uma relao monetria de compra e venda, em que o comprador um capitalisvendedor um assalariado, e essa relao resulta do fato de as condies necessrias ao da fora de trabmeios de existncia e meios de produo estarem separadas, enquanto propriedade alheia, do detentor da fotrabalho.

    O Livro III de O capital aborda o processo global da produo (e da reprodupitalista. No se trata simplesmente de acompanhar o percurso de um capital abstraico ao longo de suas metamorfoses, e sim de compreender o movimento conjunt

    ltiplos capitais em concorrncia no mercado. apenas nesse nvel, mais concreto, qlaes de classes aparecem como o conflito entre o trabalhador global e o capita

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    obal. Torna-se perfeitamente lgico que o captulo inacabado sobre as classes, em qterrompe a edio do Livro III, pare nesse ponto preciso. Na prtica, a diviso em clmais aparece de forma pura, porque as formas intermedirias e transitrias atenuamites precisos. No captulo inacabado, as grandes classes parecem primeira vfinidas pelas fontes de renda salrio, lucro e renda fundiria , relacionadopriedade de simples fora de trabalho, do capital ou da terra. Mas, primeira mente, porque, observando de mais perto, essas grandes divises se complicam no camp

    ta poltica. pergunta simples O que constitui uma classe?, Marx responde que,finio for feita pela renda, chega-se a uma pulverizao ligada infinita variedadteresses e situaes que a diviso social do trabalho provoca na classe trabalhadorasse capitalista e nos proprietrios fundirios, estes, por exemplo, divididosticultores, proprietrios de campos, florestas, minas, locais de pesca etc.. Aqui termnuscrito de Marx, anota simplesmente Engels, sem comentrios.Ou seja, o manuscrito termina em um insustentvel suspense terico, uma pergunta

    sposta, que possivelmente se complicaria ainda mais nos livros inicialmente previstpois abandonados sobre o Estado e o mercado mundial. Eles introduziriam sem dvas determinaes que permitiriam considerar o papel especfico da burocracia (esboCrtica da filosofia do direito de Hegel) ou as contradies do proletariado em e

    ternacional.

    randes grupos de pessoas

    Assim, no se encontra nas obras de Marx, nem mesmo em O capital, uma definfinitivamente fixada de classes, mas uma abordagem dinmica, na histria e na uando ele fala de proletrios, no fala do trabalhador industrial emblemtico bin em Trgico amanhecer ou os operrios da Fiat em Rocco e seus irmos nem

    rrovirios e mineiros lendrios de Zola, mas dos trabalhadores de ofcio, artestureiros, sapateiros, joalheiros, encanadores. Na realidade, o proletariado nunca dese metamorfosear, em funo das tcnicas e da organizao do trabalho. por issovez de definies formais, encontram-se em Marx algumas aproximaes descritivas, O 18 de brumrio de Lus Bonaparte:

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    Milhes de famlias existindo sob as mesmas condies econmicas que separam o seu modo de vida, os seus intera sua cultura do modo de vida, dos interesses e da cultura das demais classes, contrapondo-se a elas como in

    formam uma classe.[f]

    Ou ainda, em Engels, uma definio bem elstica de proletariado: por proletarntende-se] a classe dos assalariados modernos que, no tendo meios prprios de produ

    o obrigados a vender sua fora de trabalho para sobreviver[g].Finalmente, Lenin deu aos aficionados por definies a resposta menos insatisfat

    bora no a mais simples, questo das classes:

    Chama-se classes a grandes grupos de pessoas que se diferenciam entre si pelo seu lugar num sistema de prosocial historicamente determinado, pela sua relao (as mais das vezes fixada e formulada nas leis) com os meproduo, pelo seu papel na organizao social do trabalho e, consequentemente, pelo modo de obteno e

    dimenses da parte da riqueza social de que dispem.[1]

    sa definio pedaggica combina, assim, a posio referente aos meios de prodcluindo o estatuto jurdico da propriedade) com o papel na diviso do trabalho e

    laes hierrquicas, a natureza e o valor do salrio. Ao contrrio das sociolassificatrias, no pretende resolver casos individuais nem arbitrar situaes limtrs situar grandes grupos de pessoas.Pergunta-se frequentemente hoje em dia se o proletariado estaria ou no em via

    saparecer, substitudo por comunidades de privaes, que compartilham humilhafrimentos anlogos, mas filiaes, situaes e associaes variveis. Porm, ninrgunta se a burguesia desapareceu, porque ela mantm seus salrios mirabolantes,

    ubes (fechados) e suas ostensivas organizaes de combate (Medef, UIMM[h]). A prov

    rguesia so a senhora Parisot, o senhor Gauthier Sauvagnac, o senhor Bollor[i]

    ega mesmo a tornar-se hereditria, comportar-se em casta, parodiar a velha aristocrm um toque de vulgaridade. Exibe sua riqueza em revistas de celebridades, bem distantsteridade protestante do suposto esprito do capitalismo das origens.Se h os que subjugam, deve haver subjugados; se h dominantes, dominados; burg

    burguesados e proletrios. Estes existem no mundo, sim, mais do que nunca. O probside na diviso, na individualizao que no uma aspirao a mais liberdade e autondividuais, mas uma poltica de individualizao forada (horrios, tempo, lazer, segu

    minha junto com a concorrncia de todos contra todos, com o esprito de competm o jogo do elo mais fraco: cada um por si, e ai dos vencidos!

    bliografia selecionadaRIN, Daniel. La lutte de classe sous la Premire Rpublique. Paris, Gallimard, 1968 [ed. port.: A luta de clasFrana na Primeira Repblica. Lisboa, Regra do Jogo, 1977].

    ULANTZAS, Nicos. Pouvoir politique et classes sociales. Paris, Maspero, 1968 [ed. bras.: Poder poltico e classes sSo Paulo, Martins Fontes, 1977].EMER, John. A General Theory of Exploitation and Classes. Cambridge, Harvard University Press, 1983.NTE-CROIX, Geoffrey de. The Class Struggle in the Ancient Greek World. Ithaca, Cornell University Press, 19

    OMPSON Edward Palmer. La formation de la classe ouvrire anglaise. Paris, Gallimard/Seuil, 1998 [ed. bformao da classe operria inglesa. Rio de Janeiro, Paz e Terra, 1987].

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    RIGHT, Erik Olin. Classes. Londres, Verso, 1985.

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    Karl Marx, Crtica da filosofia do direito de Hegel (trad. Rubens Enderle e Leonardo de Deus, So Paulo, Boi0), p. 156. (N. T.)

    Idem. (N. T.)

    Idem, Manuscritos econmico-filosficos (trad. Jesus Ranieri, So Paulo, Boitempo, 2004), p. 145-6. (N. T.)

    Karl Marx e Friedrich Engels, Manifesto Comunista (trad. lvaro Pina, 1. ed. rev., So Paulo, Boitempo, 2010)E.)

    Karl Marx, O capital, Livro I (trad. Rubens Enderle, So Paulo, Boitempo, 2013), p. 390 e 720. (N. E.)

    Idem, O 18 de brumrio de Lus Bonaparte (trad. Nlio Schneider, So Paulo, Boitempo, 2011), p. 142-3. (N. T.)

    Friedrich Engels, nota edio inglesa de 1888, em Manifesto Comunista, cit., p. 40. (N. T.)

    Vladimir I. Lenin, Uma grande iniciativa (So Paulo, Alfa-mega, 1980, verso digital).

    Associaes patronais francesas. (N. T.)Empresrios franceses. (N. T.)

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    Como o espectro encarnou e por que sorri

    H uns vinte anos, o semanrio Newsweek anunciava triunfalmente em sua manchrte de Marx. Nenhum diretor de revista pensaria em provocar o leitor com semelh

    ro de reportagem a respeito da morte de Aristteles, Descartes ou Espinosa.Supe-se que a manchete provocadora tivesse valor de conjurao, conjurao d

    pectro, evidentemente. E, no entanto, ele voltou. Em 2008, ainda antes da crispitalismo globalizado, o rumor se espalhava: Marx, o retorno (Courrier Internatio

    Marx, um renascimento (Le Magazine Littraire).At o arcebispo da Canterbury em pessoa denunciava a corrida ao lucro respon

    lo desastre financeiro e saudava a memria desse Marx que, h muito tempo, revmo um capitalismo sem freios pode atuar da mesma maneira que um mito, atribualidade e poder a coisas que no existem por elas mesmas (sic!).

    Por que essa ressurreio? Simplesmente porque Marx nosso contemporne

    nscincia pesada do capital. E porque o capital, que ainda ensaiava os primeiros deando ele traou seu retrato falado, tornou-se hoje um social killer adulto que dedo o planeta.

    teses do Manifesto

    A atualidade de Marx a do Manifesto Comunista. Escrito s pressas nas ltimas sem1847 e publicado em fevereiro de 1848, no exato momento em que irrompe a revol

    risiense, anunciando a Primavera dos Povos europeus, todos sabem de cor sua retumb

    ertura: Um espectro ronda a Europa o espectro do comunismo. O esprito romnpoca aprecia runas gticas, castelos assombrados e fantasmas. Revelando-se luz do

    rnando-se manifesto, o espectro encarna e reivindica abertamente sua identidmunista! Por qu? que socialismo j uma palavra inspida, tolerada, respeitvel.

    reito de assento nos cenculos filantrpicos. Casa-se bem com utopias grandes e pequfinitivamente, no ameaa a ordem estabelecida. De modo que se declarar comunistneira de anunciar um excepcional projeto de subverso: nada mais, nada menos dodar o mundo.

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    Essa novidade em forma de modesta brochura deu a volta ao mundo. O Manifesto, do texto mais traduzido e divulgado depois da Bblia. Captura na fonte a vitalitraordinria do capital como poder social impessoal, cujo dinamismo a impulso oc

    sentimento moderno de acelerao da histria e desencantamento do mundo. Tue era slido e estvel se desmancha no ar, tudo o que era sagrado profanado e os ho

    o obrigados finalmente a encarar sem iluses a sua posio social e as relaes cotros homens.[a]

    Sua atualidade ainda ativa pode se resumir em sete teses:a formao de um mercado mundial tambm globaliza a luta de classes;a luta de classes o segredo desvendado do desenvolvimento histrico;a questo da propriedade a questo fundamental [dos movimentos];o objetivo , em primeiro lugar, a conquista do poder poltico;os proletrios de todos os pases devem se unir alm da estreiteza das naes;

    ao mesmo tempo ato e processo, a nova revoluo uma revoluo permanento livre desenvolvimento de cada um a condio para o livre desenvolvimde todos.

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    Retomemos:1. Marx soube compreender, no estado nascente, a lgica da globalizao capitalista

    A grande indstria criou o mercado mundial, preparado pela descoberta da Amrica. O mercado mundial acenormemente o desenvolvimento do comrcio, da navegao, dos meios de comunicao [...]. Pela exploramercado mundial, a burguesia imprime um carter cosmopolita produo e ao consumo em todos os pases. velhas indstrias nacionais foram destrudas e continuam a ser destrudas diariamente. So suplantadas porindstrias [...]. Ao invs das antigas necessidades, satisfeitas pelos produtos nacionais, surgem novas demandareclamam para sua satisfao os produtos das regies mais longnquas e de climas os mais diversos. [...] E isto se

    tanto produo material como produo intelectual.[b]

    Mas ele no se contenta em descrever o fenmeno jornalisticamente. O objetivrtica da economia poltica desvendar seu segredo. Para superar as contradies ne o corroem, o capital compelido continuamente a aumentar seu espao de acumulaelerar o ciclo de suas rotaes. Transformando tudo em mercadoria, ele devora o espmoniza o tempo.Desencadeada pela contrarreforma liberal e pela desregulao financeira do l

    arto de sculo, a globalizao contempornea tem muitas analogias com a do re

    toriano e do Segundo Imprio. A revoluo tecnolgica das telecomunicaes, dos persnicos e dos satlites, guardadas as devidas propores, corresponde das ferro

    telgrafo e das mquinas a vapor. As pesquisas genticas, s descobertas da qugnica. As inovaes em matria de armamento, chegada do que Engels qualifico

    ndstria do massacre. O escndalo da Enron e a crise dos subprimes, quebra da Bolscndalo do Panam, bancarrota do Crdit Immobilier ou da Union Gnrale, evor Zola em O dinheiro. O entusiasmo especulativo, alimentado por artifcios de cralenta a iluso do dinheiro que faz dinheiro, at que, na crise e pela crise, a real

    ame a fico ordem.Destacou-se com frequncia a ambivalncia de Marx, dividido entre a admirao didinamismo do capital e a indignao em face de sua barbrie social. Essa tenso tr

    a contradio real. Se a burguesia no pode existir sem revolucionar incessantementrumentos de produo[c], essa transformao portadora de potencialidancipatrias, sendo a primeira delas a reduo drstica do tempo de trabalho obrigatas, cingido pelas relaes sociais de explorao e dominao, esse progresnstantemente aniquilado por seu reverso destrutivo: Aqui progresso, l regresso

    pital). Essa contradio hoje resultante da chamada globalizao. por isso quvimentos reunidos nos fruns sociais no se definem mais como antiglobalistas, mo alterglobalistas: no contra a globalizao simplesmente, mas contra a globalizmpetitiva e mercantil, a favor de uma globalizao solidria e social.2. A histria de todas as sociedades at hoje existentes a histria das lutas de cla

    frase inicial do primeiro captulo do Manifesto tem o mrito de acabar com o entosfico de uma Histria universal ditada de antemo pela Providncia divinvelando a si prpria o Esprito do mundo e seu destino. Tudo o que humano histr

    engendra na incerteza da luta. A inteno de romper de uma vez por todas com a olgica do mundo, no entanto, no acontece sem simplificaes. Em uma reedi

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    anifesto, em nota de rodap, Engels sente a necessidade de esclarecer que se entendetria de qualquer sociedade toda histria escrita, porque a pr-Histrganizao social anterior histria escrita, era desconhecida em 1847.Essa no a nica simplificao. No Manifesto, a frmula estende o termo clas

    versos tipos de grupos e organizaes sociais (castas, corporaes, estados), enquanttros textos Marx o reserva s sociedades modernas, caracterizadas por uma relarao do poltico, do social e do religioso. Enfim, como um texto polmi

    daggico, o Manifesto foca um padro depurado de luta de classes, restrita a ncipais protagonistas: burgus e proletrio, patrcio e plebeu, homem liv

    cravo, mestre de corporao e companheiro[d]. Nos textos que abordam situalticas concretas, como O 18 de brumrio, ou nos artigos sobre a vida poltica inglelaes sociais permanecem estruturadas pelo antagonismo de classe, mas readquirem toa complexidade.

    Entende-se hoje que as classes teriam se dissolvido na globalizao e no individuancorrencial; a diferena conflituosa, na diversidade indiferente. Contra a redgmtica de todo conflito social a um conflito de classes, chegada a hora da pluraliafiliaes e situaes. Por certo, cada indivduo um entrelaamento mpar de mlt

    terminaes, mas o narcisismo das pequenas diferenas propcio s genealogias nico de identidade. A sociedade moderna complica as contradies e desdobrferenas de classe, gnero, cultura, idade, origem... Irredutveis entre si, so tndicionadas pela dominao sistmica do capital. por isso que, sem negar ecificidades, a luta de classes pode lhes servir, para alm das igrejas e capelas, de traio. Quando ela definha e enfraquece, vem, ao contrrio, o tempo do confinamosta e rancoroso, a hora dos cls, hordas e tribos.

    3. O Manifesto anuncia a revolta das foras produtivas modernas contra as modelaes de produo, contra as relaes de propriedade que condicionam a existnc

    rguesia e seu domnio[e]. O regime de propriedade privada no parou de ganhar terrtende-se atualmente aos bens comuns da humanidade (terra, gua, ar), ao espao pua), aos seres vivos e ao saber (com o desenvolvimento exponencial das patenteolncia (ascenso do mercenarismo), lei (em benefcio do contratualismo generalizora que as tcnicas de reproduo e comunicao permitiriam acesso gratuimerosos bens, a propriedade privada surge como o resultado de um processo

    sapossamento generalizado e como um freio inovao. A importncia que tem sua crManifesto destaca-se de modo mais do que nunca justificado: os comunistas po

    sumir sua teoria numa nica expresso: supresso da propriedade privada[1]. Em ttes movimentos colocam em destaque, como questo fundamental, a questo

    opriedade.[2]

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    No se trata de abolir toda forma de propriedade, mas, precisamente, a modopriedade privada, [a] propriedade burguesa[f], e o modo de apropriao fundamentadplorao de uns pelos outros. Essa preciso muito importante, pois estabelecetino entre duas compreenses de propriedade, cuja confuso utilizada tratores do comunismo para apresent-lo como um rateador [partageux] que dprimir todos os bens de uso pessoal (moradia, meios de locomoo etc.). O que necesolir a propriedade que tem como contrapartida a despossesso do outro, aquela

    torga poder sobre o trabalho e a vida dos dominados.O questionamento dessa propriedade privada dos meios de produo, tromunicao no se limita regulamentao de mquinas ou empresas. Ele est presenioria das dez medidas programticas expostas no Manifesto: Expropriao da propriendiria e emprego da renda da terra para despesas do Estado; imposto fortemogressivo; abolio do direito de herana; confisco da propriedade de todos os emigrrebeldes (hoje se diria: de todos os responsveis pela evaso fiscal e fuga de capientralizao do crdito nas mos do Estado [...]; multiplicao das fbricas nacionais

    trumentos de produo [...]; educao pblica e gratuita

    [g]

    .4. Para elevar-se a classe dirigente da nao, tornar-se ele prprio naooletariado deve conquistar o poder poltico[h]. Essa ideia, aparentemente bannsata, na realidade rompe com a tradio de um socialismo compassivo e filantrpial fantasiava sobre experincias econmicas e sociais alternativas que coabitassem coder estatal tolerante sob a condio de nunca ser ele prprio contestado. Rom

    uso social de um socialismo experimental mantido distncia da ao poltica, segao de pureza.

    O Manifesto critica assim vrias correntes que, de forma diversa, perduraramtria dos movimentos sociais. O socialismo feudal, nostlgico de um passado mcontra-se em mltiplas variantes do populismo reacionrio ou da volta mtica erro dentro de uma economia de troca autrquica e produo imediata de valores de

    m mediao monetria e sem comrcio generalizado. Outros se contentam, hoje ctem, em corrigir as anomalias sociais da ordem burguesa, organizando a beneficncme de uma moral caritativa. Para os autores do Manifesto, no se trata de erguer casar nem de cozinhar bons momentos em banho-maria para oferecer, de chaves na m

    dade feliz, mas de orientar o movimento real que quer abolir a ordem existente nquistar o poder poltico e dele fazer uma alavanca para a transformao econmicerao cultural: O proletariado utilizar sua supremacia poltica para arrancar pouuco todo o capital da burguesia[i]. poca em que a democracia parlamentar ainda exceo na Europa, Marx e Encaram essa primeira fase da revoluo operria como sinnimo de conquistmocracia[j]e da instituio do sufrgio universal. Assim, a Comuna de Paris logicames parece a frmula enfim encontrada.5. A estreiteza e a unilateralidade nacionais tornam-se cada vez mais impossvei

    niversal interdependncia da produo material e da produo intelectua

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    egando at a criar uma literatura universal[k] tende a romper os grilhesrreiras nacionais. A globalizao comercial tem como consequncia a globalizata de classes. Esse o fundamento do internacionalismo, no como imperativo mtegrico, mas como princpio poltico prtico. Se for elevado a classe dirigente da naproletariado, mesmo que nessa medida nacional, no o ser de modo nenhum no senrgus da palavra[l]. A emancipao que traz em si comea no espao nacional, mas s orescer ao se expandir para o espao continental e mundial.

    O que j era verdade no sculo XIX e comprovado nas revolues de 1848 e 1871 aindrtiori verdade hoje. Contrariamente aos que declaram que as naes j se dissolveraao homogneo e escorregadio do mercado mundial, os Estados nacionais ainda modparte as relaes de fora entre as classes. possvel que pases dominados

    perialismo e pelo neocolonialismo sejam ponto de partida de um movimvolucionrio, como confirmam as experincias da Venezuela e da Bolvia. Elas tammonstram que tais processos s tm futuro se rapidamente se ampliarem a uma escalanos continental, opondo uma revoluo e uma Amrica bolivariana ao pro

    perialista de um grande mercado das Amricas. Da mesma maneira, na Europa, cstrou a rejeio francesa, holandesa e irlandesa ao Tratado Constitucional atado de Lisboa, o quadro nacional tambm pode organizar a resistncia construa Europa liberal, de concorrncia livre e no falseada. Porm, essa rejeio pressu

    b pena de se retrair dentro de uma lgica chauvinista e xenfoba, um projeto alternaEuropa democrtica e social dos povos e dos trabalhadores.

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    Do mesmo modo que a globalizao vitoriana, por ocasio das grandes exposiversais de Londres e Paris, favoreceu a internacionalizao do movimento opeergente e a criao em 1864 da Primeira Internacional, tambm a globalizao neolibscita uma globalizao planetria das resistncias. Assim comprova a gnese do movimterglobalista, da insurreio zapatista de 1ode janeiro de 1994 aos fruns sociais mun

    Porto Alegre, Mumbai e Nairbi, passando pelas manifestaes de Seattle contunio de cpula da Organizao Mundial do Comrcio em 1999 e as da primavera de

    ntra a guerra do Iraque. Comparado ao internacionalismo do sculo XIX, esse ternacionalismo enfrenta no apenas os capitalismos nacionais como as empresas mulansnacionais e um capitalismo financeiro extremamente globalizado. o que explergncia de um internacionalismo agrrio, representado pela Via Campesina, que rricultores de mais de cinquenta pases, confrontados s mesmas firmas agroalimentaodutoras de sementes, como Monsanto ou Novartis.

    6. A revoluo burguesa alem s poder ser, portanto, o preldio imediato de

    voluo proletria.[m] As revolues modernas parecem condenadas a falta

    mpromisso, chegar cedo ou tarde demais, sempre no tempo errado, divididas entre is e ainda no. Nunca aparecem na hora certa. As revolues polticas burgroavam o poder de uma classe que j tinha conquistado o essencial do poder econmltural. As revolues proletrias, pelo contrrio, so as de uma classe submetida apla dominao, social, poltica e cultural, que de repente deve se tornar, se no t

    lo menos alguma coisa. A conquista do poder poltico s o comeo de um processancipao.Como declara Marx em 1850, em sua Mensagem do Comit Central Liga

    munistas], ao fazer o balano das revolues de 1848, a tarefa :

    tornar a revoluo permanente at que todas as classes proprietrias em maior ou menor grau tenham sido alijapoder, o poder estatal tenha sido conquistado pelo proletariado e a associao dos proletrios tenha avanad

    s em um pas, mas em todos os pases dominantes do mundo inteiro. [n]

    revoluo permanente em uma tripla acepo. Ela no reconhece divisria entrejetivos poltico-democrticos e seus objetivos sociais e no estagna a meio caminho envoluo burguesa e a proletria. No um milagre surgido do nada, mas amadurectas cotidianas, na acumulao de experincias vitoriosas ou derrotas, e se aprofunda,

    m da conquista do poder poltico, pela transformao radical das relaeopriedade, organizao e diviso do trabalho, das condies de vida cotidiana. Eciada no terreno nacional, no respeita fronteiras e s se completa verdadeiramentampliar ao espao dos continentes e do mundo. Ela , ao mesmo tempo, ato e procptura e continuidade.7. Inversamente lenda reacionria que apresenta o comunismo como o sacrifci

    divduo em prol da coletividade annima, o Manifesto o define como uma associaal o livre desenvolvimento de cada um a condio para o livre desenvolviment

    dos[o]. Assim entendido, parece o auge da livre realizao pessoal. No conviria conf

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    nem com as miragens do individualismo impessoal, nem com o igualitarismo vulgar dcialismo de caserna. A espcie humana retira do desenvolvimento das necessidadpacidades mpares de cada indivduo os recursos para seu prprio desenvolvimiversal. Reciprocamente, no se concebe o livre desenvolvimento de cada

    dependentemente do livre desenvolvimento de todos. Isso porque a emancipao no azer solitrio.

    Como fazer, ao certo, para que o apelo iniciativa e responsabilidade individuais nduza a uma submisso lgica da dominao, se no pela adoo de uma redistribudical de riqueza, poder e saber? Como democratizar as possibilidades de realizados e todas sem associar essa redistribuio a medidas especficas de discriminao posntra as desigualdades naturais ou sociais? Para se desenvolver, o indivduo modecisou de solidariedades sociais (legislao do trabalho, previdncia social, aposentadgulamentao salarial, servios pblicos) que a contrarreforma liberal visa precisamdestruir, para reconduzir a sociedade a uma selva concorrencial impiedosa.

    Embora o liberalismo pretenda desenvolver o indivduo, na realidade s desenvoosmo na concorrncia de todos contra todos, em que o desenvolvimento de cada umr condio a aniquilao ou eliminao dos outros. A liberdade oferecida a cada um ndo cidado, a do consumidor livre para escolher entre produtos padronizadoeologias liberais fazem do risco o princpio de reconhecimento do valor individualltura do risco e do mrito praticamente serve de libi s polticas de demolilidariedades, mediante a individualizao dos salrios, do tempo de trabalho, dos rante da sade, da velhice ou do desemprego); da individualizao das relaes contrantra as convenes coletivas e a lei comum; do desmantelamento das regulamentaeetexto de melhor reconhecimento das trajetrias individuais.

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    Karl Marx e Friedrich Engels, Manifesto Comunista (trad. lvaro Pina, So Paulo, Boitempo, 1998), p. 43. (N. T.)

    Ibidem, p. 41 e 43. (N. T.)

    Ibidem, p. 43. (N. T.)

    Ibidem, p. 40. (N. T.)

    Ibidem, p. 45. (N. T.)

    bidem, p. 52. (N. T.)

    Ibidem, p. 69. (N. T.)

    bidem, p. 52. (N. T.)

    Ibidem, p. 58. (N. T.)

    Ibidem, p. 56. (N. T.)

    bidem, p. 58. (N. T.)

    dem. (N. T.)

    Ibidem, p. 43. (N. T.)

    Ibidem, p. 56. (N. T.)

    Ibidem, p. 69. (N. T.)

    Idem, Mensagem do Comit Central Liga [dos Comunistas], em Lutas de classes na Alemanha (trad. neider, So Paulo, Boitempo, 2010), p. 64. (N. T.)

    Idem, Manifesto Comunista, cit., p. 59. (N. T.)

    Alexis de Tocqueville, Lembranas de 1848 (trad. Modesto Florenzano, So Paulo, Companhia das Letras, 2011),T.)

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    Por que as revolues nunca chegam na hora certa

    No mais... Ainda no... Um mundo est morrendo, o novo luta para nascer.No entreato, o necessrio e o possvel no se avizinham mais. o destino trgico

    volues. Marx tem este pressentimento luz dos acontecimentos de 1848: A revolde vir antes do que esperamos. Nada pior para os revolucionrios do que ter d

    eocupar com o abastecimento de po (carta de 19 de agosto de 1852). No entantastecimento de po continuou a ser uma preocupao prioritria para os revolucionsculo XX.

    histria a contratempo

    Mais explcito, Engels confidencia a um correspondente:

    Tenho certo pressentimento de que nosso partido, em razo da morosidade e indeciso dos outros partidos, udia ser catapultado ao governo para implantar medidas que no sero exatamente de nosso interesse, m

    correspondero aos interesses gerais da revoluo, especificamente aos da pequena-burguesia. Nessas circunstimpelidos pelo povo proletrio, seremos coagidos a fazer experincias comunistas e dar saltos adiante, que samelhor do que ningum o quanto seriam inoportunos. Nesses casos, perde-se a cabea esperemos que s no sfigurado e ocorre uma reao, e, at que o mundo seja capaz de ter um julgamento histrico sobre acontecimdesse tipo, passaremos no apenas por bestas ferozes, mas por bestas, o que bem pior. No consigo imaginar qtranscorra de outro modo... Como precauo a essa eventualidade, melhor que a literatura de nosso pfornea por antecipao os fundamentos de sua reabilitao histrica. (Carta de 12 de abril de 1853.)

    uitos, com efeito, forados pelas circunstncias a adotar medidas que no tinhamevisto nem desejado, perderam a cabea no sentido literal. Outros tambm a perdera

    ntido figurado. Mas a esperana de Engels, de que a literatura comunista crtica ajusemaranhar os fios da tragdia e se norteie nos labirintos da histria, talvez notalmente v.Toda situao presente um entrelaamento de fatores com temporalidades difere

    lm das misrias modernas, aflige-nos toda uma srie de misrias herdadas, decorrentrmanncia vegetativa de modos de produo arcaicos e antiquados, com o seu squitlaes sociais e polticas anacrnicas [zeitwidrigen gesellschaftlichen und politisrhrnissen][a].

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    As revolues enfeixam um conjunto dspar de determinaes. Combinam tesarmoniosos. Sobrepem as tarefas de ontem e as de amanh. Por isso so inconstalnerveis a transfiguraes e metamorfoses, irredutveis a uma definio simples, burgproletria, social ou nacional.

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    O nome sob o qual uma revoluo concebida no ser jamais o que ostentar em sua bandeira no dia do triunfoter chance de sucesso, os movimentos revolucionrios so forados, na sociedade moderna, a tomar emprestadincio, seus smbolos dentre os elementos da nao, que, mesmo se opondo ao governo oficial, vivem em total harcom a sociedade existente. Em resumo, as revolues devem conseguir o bilhete de ingresso na cena pblica c

    prprias classes dominantes.[1]

    As revolues nunca chegam na hora certa. Divididas entre o no mais e o ainda tre o que vem cedo demais e o que vem tarde demais, elas no conhecem a hora certa:

    muna [a de 1793] chegou cedo demais, com suas aspiraes de fraternidade, Babeuf chito tarde. E se o proletariado ainda no podia governar a Frana, a burguesia no pis faz-lo[b]. Nesse hiato entre o necessrio e o possvel sobrevm a tragdia, arnadas de junho de 1848 ou de julho de 1917, ou ainda a de janeiro de 1917 na Alemanhe perderam a vida Rosa Luxemburgo e Karl Liebknecht, os dois grandes personagenvem Partido Comunista alemo. Arte das mediaes, a poltica tambm a arte do insteciso e do contratempo.

    ma outra escrita da histriaA filosofia hegeliana da histria a ltima consequncia, levada sua mais

    presso, de toda essa historiografia alem, para a qual no se trata dos interesses m mesmo polticos, mas apenas de pensamentos puros. [...] Tal concepo verdadeiramligiosa, escrevem os duetistas Marx e Engels em A ideologia alem. Os filsosseguem, so incapazes de evocar algum dos verdadeiros acontecimentos histricossmo as intervenes verdadeiramente histricas da poltica na histria. Sugerem quu lugar, nos seja oferecida uma narrao que no se baseia em estudos mas sim

    nstrues artificiais e em intrigas literrias[c]

    . Tambm em Proudhon no h tria, quando muito a histria na ideia, um simulacro de histria. A essas concepligiosas ou idealistas da histria preciso opor uma concepo materialista e profana.

    Essa histria profana no tem um sentido predeterminado nem chega a umeestabelecido. Contudo, permanece inteligvel. A trilogia das lutas de classe na Fransse modo, a obra de um novo tipo de narrador, cuja narrativa inventa ou fabrltica[2]. Essa longa crnica de um quarto de sculo de lutas complica a intriga e romsenrolamento linear do tempo. Sua histria no retilnea. Avana frequentemente

    ado mau. Marx foi criticado por fazer, em nome do progresso, a apologia da colonizmo forma imposta de modernizao. enganar-se sobre sua viso. Para ele, a histria na linha reta, mas uma sequncia de encruzilhadas e bifurcaes: ou ento, ou ento..lonizao britnica da ndia suscita uma revoluo social no Hindusto, mesmovida por interesses srdidos, a Inglaterra ter evitado involuntariamente os suplacumulao capitalista e contribudo para tirar a ndia do imobilismo. Do contrr

    glaterra, quaisquer que sejam seus crimes, foi um instrumento inconsciente da hist

    provocar essa revoluo[3].

    Longe dos contos edificantes e das lendas moralizantes, a histria ter, uma vez sado pelo lado errado. No h nenhum documento de cultura que no seja tamb

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    cumento de barbrie, escreve Walter Benjamin. Assim, enquanto perdurar um sistemplorao e opresso, progresso e catstrofe permanecero mortalmente entrelaadosarx. Por isso, a histria deve ser pensada politicamente, e a poltica, historicamente.

    No do passado, mas unicamente do futuro, que a revoluo social do sculo XIX pode colher a sua poesia. Epode comear a dedicar-se a si mesma antes de ter despido toda a superstio que a prende ao passado. As revoanteriores tiveram de recorrer a memrias histricas para se insensibilizar em relao ao seu prprio conterevoluo do sculo XIX precisa deixar que os mortos enterrem os seus mortos para chegar ao seu prprio cont

    Naquelas, a fraseologia superou o contedo, nesta, o contedo supera a fraseologia.[d]

    m O 18 de brumrio de Lus Bonaparte, Marx, narrador profano, exorta a que seliticamente a histria, em vez de se suport-la religiosamente.

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    Sua trilogia sobre a luta de classes na Frana prope uma escritura crtica da histque o fato, os indivduos, a mentalidade tenham o lugar que lhes cabe. Em que o pos

    o importe menos do que o real. Concretiza-se assim a ruptura com as filoseculativas da histria, prenunciada em A sagrada famlia e A ideologia alem. E

    grada famlia, Marx e Engels refutam a viso apologtica de que tudo o que acontveria necessariamente acontecer para que o mundo fosse o que e ns fssemos omos. Por um lado, [continua-se] a atividade anterior sob condies totalmente alterpor outro, [modifica-se] com uma atividade completamente diferente as antigas condique ento pode ser especulativamente distorcido, ao converter-se a histria posterionalidade da anterior. A esse fetichismo de uma Histria maiscula, reduzida a uma fcularizada do antigo Destino ou Providncia, eles opem, em A ideologia alem,ncepo definitivamente desencantada: A histria nada mais do que o suceder-raes distintas[e].

    Uma frmula lapidar de Engels em A sagrada famlia resume muito bem a mudana raperspectiva: A histria no faz nada. No um novo deus que manipula a com

    mana. Quem faz tudo [...], quem possui e luta , muito antes, o homem, o homem realve; no , por certo, a Histria, que utiliza o homem como meio para alcanar seus fmo se se tratasse de uma pessoa parte , pois a Histria no seno a atividade do hoe persegue seus objetivos.[f] Essa histria profana, que se decide na luta e pela tifica plenamente o ttulo de um belo livro de Michel Vade: Marx, penseur du pos

    arx, pensador do possvel][4].Ocupado com a infindvel Crtica da economia poltica, tambm ela uma escrita orihistria, Marx deixou poucas consideraes filosficas gerais sobre o assu

    contram-se apenas notas esparsas, como as publicadas na introduo dos Grundrissa nota bene, escreve Marx. Essas oito anotaes breves, lembretes garranchados em elegrfico, merecem ateno especial.

    Na primeira, em vez de uma determinao mecnica da poltica pela economia, Minala a importncia da guerra como laboratrio e cadinho de novas relaes sociai

    gunda, convida a submeter a historiografia ideal existente at o presente provtoriografia real, para desmistificar a velha histria das religies e dos Estados

    rceira, ressalta a importncia, para atingir a complexidade da transformao hists relaes de produo secundrias e tercirias [...] derivadas, transpostas, iginrias, dentre as quais as relaes internacionais. Na sexta, recomenda nceber de modo algum o conceito