Avaliação de Métodos de Dimensionamento de Estacas Moldadas Em Solos Arenosos (Guimarães, 2010)

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Fundações, Taludes e Estruturas Geotécnicas 793 AVALIAÇÃO DE MÉTODOS DE DIMENSIONAMENTO DE ESTACAS MOLDADAS EM SOLOS ARENOSOS EVALUATION OF DESIGN METHODS OF DRILLED SHAFTS IN SAND Lopes Pinto, Paulo, DEC-FCT-Universidade de Coimbra, GEG, Portugal, [email protected] Figueiredo, José Nuno, GEG, Portugal, [email protected] Cunha, Sérgio, GEG, Portugal, [email protected] Campos e Matos, António, GEG, Portugal, [email protected] RESUMO Existem diversos métodos propostos para o dimensionamento de estacas moldadas, com estimativas de capacidade de carga frequentemente contraditórias. A decisão sobre o método mais adequado de previsão requer a execução de ensaios de carga, que deverão ser realizados numa fase inicial da obra de modo a que os resultados permitam o desenvolvimento de soluções económicas e seguras. No presente artigo são comparadas as previsões obtidas por dois dos métodos mais frequentemente utilizados, propostos pela FHWA e pelo LCPC, aplicados ao caso particular de areias cimentadas na região de Tripoli, Líbia. Os resultados das previsões são comparados com as capacidades obtidas em ensaios de carga estática e dinâmica. ABSTRACT There are several methods applicable to the design of drilled shafts, often predicting contradicting axial capacities. The decision on the most adequate method requires the execution of load tests. These should be performed at an initial stage of the works in order to develop safe and economical foundations. This paper presents a comparison of axial capacity prediction by two of the most frequently used methods, proposed by FHWA and LCPC. These methods were applied to the cemented sands found in Tripoli, Libya. The predicted capacities are compared with the results from static and dynamic load tests. 1. INTRODUÇÃO 1.1. A Terceira Circular de Tripoli No início da década de 1970, duas novas circulares foram previstas no Plano Urbanístico de Tripoli – a Second Ring Road (SRR), que constitui hoje uma importante artéria da capital líbia, e a Third Ring Road (TRR) cuja construção ficou pendente desde a conclusão do seu primeiro Projecto de Execução em 1978. Constituída por duas vias com três faixas de rodagem em cada sentido e 24 km de extensão, a TRR envolve 21 obras de arte especiais, num investimento do governo líbio inicialmente estimado em cerca de 250 milhões de euros. O envolvimento do GEG, a convite do consórcio liderado pela construtora brasileira Odebrecht, prende-se com a coordenação das diversas especialidades, sendo ainda responsável directo pelos projectos de obras de arte correntes e especiais e projectos de geotecnia.

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Fundações, Taludes e Estruturas Geotécnicas

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AVALIAÇÃO DE MÉTODOS DE DIMENSIONAMENTO DE ESTACAS MOLDADAS EM SOLOS ARENOSOS

EVALUATION OF DESIGN METHODS OF DRILLED SHAFTS IN SAND

Lopes Pinto, Paulo, DEC-FCT-Universidade de Coimbra, GEG, Portugal, [email protected] Figueiredo, José Nuno, GEG, Portugal, [email protected] Cunha, Sérgio, GEG, Portugal, [email protected] Campos e Matos, António, GEG, Portugal, [email protected] RESUMO Existem diversos métodos propostos para o dimensionamento de estacas moldadas, com estimativas de capacidade de carga frequentemente contraditórias. A decisão sobre o método mais adequado de previsão requer a execução de ensaios de carga, que deverão ser realizados numa fase inicial da obra de modo a que os resultados permitam o desenvolvimento de soluções económicas e seguras. No presente artigo são comparadas as previsões obtidas por dois dos métodos mais frequentemente utilizados, propostos pela FHWA e pelo LCPC, aplicados ao caso particular de areias cimentadas na região de Tripoli, Líbia. Os resultados das previsões são comparados com as capacidades obtidas em ensaios de carga estática e dinâmica. ABSTRACT There are several methods applicable to the design of drilled shafts, often predicting contradicting axial capacities. The decision on the most adequate method requires the execution of load tests. These should be performed at an initial stage of the works in order to develop safe and economical foundations. This paper presents a comparison of axial capacity prediction by two of the most frequently used methods, proposed by FHWA and LCPC. These methods were applied to the cemented sands found in Tripoli, Libya. The predicted capacities are compared with the results from static and dynamic load tests. 1. INTRODUÇÃO 1.1. A Terceira Circular de Tripoli No início da década de 1970, duas novas circulares foram previstas no Plano Urbanístico de Tripoli – a Second Ring Road (SRR), que constitui hoje uma importante artéria da capital líbia, e a Third Ring Road (TRR) cuja construção ficou pendente desde a conclusão do seu primeiro Projecto de Execução em 1978. Constituída por duas vias com três faixas de rodagem em cada sentido e 24 km de extensão, a TRR envolve 21 obras de arte especiais, num investimento do governo líbio inicialmente estimado em cerca de 250 milhões de euros. O envolvimento do GEG, a convite do consórcio liderado pela construtora brasileira Odebrecht, prende-se com a coordenação das diversas especialidades, sendo ainda responsável directo pelos projectos de obras de arte correntes e especiais e projectos de geotecnia.

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O presente trabalho tem como objectivo apresentar parte da experiência adquirida na validação do dimensionamento de fundações profundas em areias siltosas cimentadas encontradas nesta região. 1.2. Geologia local A geologia da região de Tripoli e do próprio Oeste da Líbia é marcada pela grande planície costeira de Jeffara, situada entre o Mediterrâneo e o planalto de Jebel Nefusa. A planície costeira é constituída essencialmente por areia siltosa de depósitos eólicos, calcreto, calcarenito, arenito e calcário. Embora predomine a areia siltosa, nesta encontram-se por vezes intercalações de siltes, argilas e areias com diferentes distribuições granulométricas. A zona mais superficial da camada de areia siltosa resulta de deposição recente e apresenta pouca cimentação, mas as camadas subjacentes, mais antigas e densificadas, apresentam considerável cimentação com carbonatos. O calcreto apresenta possança que em média não excede 2m e resulta de um processo de cimentação da areia siltosa, localizando-se portanto no seio desta. O processo tem início com a dissolução de carbonatos na água que percola através da areia. Sob elevadas temperaturas, os carbonatos localizados nos vazios entre partículas de areia cristalizam, provocando a progressiva cimentação desta e a melhoria das respectivas propriedades mecânicas. A variabilidade da cimentação é grande, pelo que as propriedades mecânicas são igualmente pouco homogéneas, tal como a própria distribuição espacial do calcreto. O substrato rochoso de arenito ou calcário localiza-se a profundidade bastante variável, entre os 12m e os 66m. O nível freático é encontrado a uma cota muito próxima do nível médio da água do mar. A Figura 1 apresenta a evolução de NSPT com a profundidade, com base em várias sondagens, num determinado ponto do traçado, próximo do local onde foram realizados ensaios de carga, que irão ser descritos nos subcapítulos seguintes. Repare-se na grande variação dos resultados.

-30

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Cot

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)

NSPT

BH-2 BH-A1 BH-A2 SC-3

Figura 1 – Variação de NSPT com a profundidade

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1.3. Solução de fundação Tendo em conta a fraca capacidade portante das camadas superiores, muitas vezes com possança considerável, a solução para as fundações das obras de arte que se afigurou desde logo mais viável foi a de fundações indirectas, mais concretamente estacas moldadas. Entre os vários aspectos considerados na escolha do tipo de fundações, foi inicialmente avaliado o potencial de hidro-colapsibilidade das areias cimentadas, tendo sido concluído através da análise cuidadosa de ensaios edométricos simples, com inundação, que aquele potencial era muito reduzido. Definida a solução de estacas moldadas, tornou-se necessário avaliar a respectiva capacidade de carga. Para esse efeito foram seleccionados dois métodos, cuja descrição será feita no capítulo seguinte para o caso de funcionamento à compressão. Serão apenas apresentadas as expressões correspondentes aos materiais mais relevantes, tendo em conta a litologia local. 2. MÉTODOS DE CÁLCULO DA CAPACIDADE AXIAL 2.1. Avaliação da segurança Para estacas sujeitas a esforços de compressão, o valor característico da capacidade de carga axial resulta da soma da contribuição da resistência de ponta e da resistência lateral, conforme expresso na seguinte equação:

kskbkc RRR ;;; += [1] onde Rc;k é o valor característico da capacidade de carga axial total, para esforços de compressão; Rb;k é valor característico da resistência de ponta e Rs;k é o valor característico da resistência lateral. Por seu lado, o valor de cálculo da capacidade de carga axial é obtido através da equação [2]:

s

ks

b

kbdsdbdc

RRRRR

γγ;;

;;; +=+= [2]

onde Rc;d é o valor de cálculo da capacidade de carga axial total, para esforços de compressão, Rb;d é o valor de cálculo da resistência de ponta, Rs;d é o valor de cálculo da resistência lateral, γb e γs são os factores de segurança para a resistência de ponta e para a resistência lateral, respectivamente. Os valores característicos da resistência de ponta e da resistência lateral são apresentados nas equações [3] e [4], respectivamente.

kbbkb qAR ;; .= [3]

).( ;;;; kisisks qAR ∑= [4]

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onde Ab é a área da ponta da estaca; As;i é a área do fuste da estaca na camada i; qb;k é o valor característico da resistência de ponta por unidade de área e qs;i;k é o valor característico da resistência lateral unitária na camada i. 2.2. Aspectos específicos do método da FHWA Este método, proposto por Reese e O’Neill (1999), baseia-se fundamentalmente em resultados de ensaios de carga realizados em diferentes ambientes geotécnicos. Estabelece categorias de materiais, para as quais são propostas expressões para o cálculo da resistência de ponta e do atrito lateral unitários. Na verificação da segurança através da tensão admissível (ASD), os factores de segurança para a resistência de ponta e lateral tomam igual valor. Reese e O’Neill (1999) referem valores entre 2,3 e 3,5, para estruturas “monumentais” (grandes pontes) e entre 1,7 e 2,3 para estruturas temporárias, dependendo do controle a exercer durante a construção. Para estruturas com carácter de sensibilidade entre os dois tipos citados deverão ser utilizados valores intermédios. A resistência de ponta unitária é calculada, para solos granulares, pelas expressões [5] e [6], consoante o valor de NSPT é respectivamente inferior ou superior a 50 pancadas para penetração de 30cm. Estes últimos são definidos como Geomateriais Intermédios, ou IGM.

kPaNkPaq kb 2900.5,57)( 60; ≤= [5]

[ ] bvbvakb pNq ,8,0

,60; '.)'/.(.59,0 σσ= [6] onde N60 é o valor médio de pancadas SPT entre a cota da base da estaca moldada e uma distância 2B abaixo dessa cota, sendo que o valor de N60 não deve ser tomado superior a 100 pancadas, pa é pressão atmosférica e σ’v,b é a tensão efectiva vertical à cota de base da estaca moldada. A resistência lateral unitária é calculada, para solos granulares com NSPT ≤ 50 através da expressão [7].

kPaq ivikis 200'. ,;; ≤= σβ [7] onde βi é um factor adimensional, calculado através das equações seguintes, com valor compreendido entre 0,25 e 1,20 e σ’v,i é a tensão efectiva vertical no ponto médio da camada i.

50N15 se .245,05,1 605,0 <≤−= ii zβ [8]

( )( ) 15N se .245,05,1.15/ 60

5,060 <−= ii zNβ [9]

onde zi é a distância do ponto médio da camada i à superfície do terreno, em metros. Para solos granulares com NSPT > 50 (IGM), a resistência lateral unitária é calculada através da expressão [10].

iiivkis tgKq '..' ,0,;; φσ= [10]

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onde K0,i é o coeficiente de impulso em repouso na camada i e φ'i é o ângulo de resistência ao corte na camada i. Os valores de φ'i e K0,i podem ser estimados respectivamente a partir das equações [11] e [12].

34,0

,

,60

'.3,203,12

'

⎟⎟⎟⎟⎟

⎜⎜⎜⎜⎜

⎟⎟⎠

⎞⎜⎜⎝

⎛+

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Narctg

σφ [11]

isen

iv

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NpsenK

'

,

,60,0 '

..2,0).'1(

φ

σφ

⎥⎥⎦

⎢⎢⎣

⎡−= [12]

2.3. Aspectos específicos do método do LCPC Este método, proposto por Bustamante e Gianeselli, é igualmente baseado em ensaios de carga, realizados em mais de 400 casos práticos em maciços distintos, tendo já sido alvo de actualizações. Diferencia-se do método da FHWA nas expressões utilizadas para calcular as resistências de ponta e lateral unitárias, mas também na forma de aplicar os factores de segurança e na possibilidade de fazer avaliações em Estado Limite de Serviço (ELS) e Estado Limite Último (ELU), de acordo com a metodologia expressa nos Eurocódigos. Em estado limite de serviço (ELS), para combinações raras e métodos de execução de estacas em que não existe deslocamento do terreno, são preconizados factores de segurança γb = 2,2 e γs = 1,65. As resistências de ponta e lateral unitárias são calculadas respectivamente através das equações [13] e [14], quando são utilizadas correlações com valores de ensaio com cone-penetrómetro (CPT):

cckb qkq .; = [13]

[ ]max;; ;/min sckis qqq β= [14] onde qc é a resistência de ponta obtida pelo CPT, kc e β são factores adimensionais dependentes da natureza do solo e do método de execução da estaca. No caso de estacas moldadas em areia, estes dois últimos parâmetros tomam o valor kc = 0,15 e β = 200. O valor máximo da resistência lateral unitária é, nestas condições, qsmax = 120 kN/m2. 3. APLICAÇÃO DOS MÉTODOS E COMPARAÇÃO DOS RESULTADOS Os dois métodos foram aplicados a vários perfis representativos das condições encontradas ao longo do traçado. Na aplicação do método de Bustamante foi necessário correlacionar a resistência de ponta do cone com o NSPT. Usou-se a correlação proposta por Robertson e Campanella (1983).

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Na Figura 2 apresenta-se a evolução da resistência unitária lateral e de ponta, com a profundidade, com base na sondagem SC3, representada na Figura 1. Como se pode observar, o método proposto por Reese e O’Neill prevê neste caso um valor mais elevado para a resistência lateral do que o método de Bustamante. O inverso acontece no cálculo da resistência unitária de ponta.

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Resistência lateral unitáriaqs (kPa)

Reese & O'Neil

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Resistência unitária de ponta qb (kPa)

Reese & O'Neil

Bustamante

Figura 2 – Evolução das resistências unitárias, lateral e de ponta, com o comprimento, com base na sondagem SC3 Como base nestes valores, a Figura 3 apresenta a previsão da resistência última por ambos os métodos, para uma estaca com 800 mm de diâmetro, para várias profundidades da ponta. Verifica-se que o método de Reese e O’Neill, para estacas com comprimento superior a 12 m, prevê capacidade de carga substancialmente superior. Tal deve-se ao maior peso que o atrito lateral tem na capacidade de carga, para estacas compridas, quando comparadas com a resistência de ponta. De salientar que para o valor de cálculo da resistência à compressão, em condições de serviço, as diferenças entre os dois métodos são menores. Para estacas com comprimento não superior a 15 m, o método de Bustamante resulta em maior capacidade, mas a partir desse comprimento o valor resistente é idêntico nos dois casos. A aproximação dos resultados deve-se aos coeficientes de segurança mais elevados adoptados pelo método de Reese e O’Neill (γb=γs=3,0) do que os propostos no método de Bustamante (γb=2,2 e γs=1,65).

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)Rc (kN)

Reese & O'Neil (ELS)Bustamante (ELS)Reese & O'Neil (Rck)Bustamante (Rck)

Figura 3 – Evolução da capacidade axial de uma estaca φ800mm, com o comprimento, com base na sondagem SC3 4. ENSAIOS DE CARGA Foram realizados ensaios de carga estáticos e dinâmicos com o objectivo de avaliar a capacidade de carga de estacas sacrificiais. Foi realizado um ensaio de carga estático sobre uma estaca executada para o efeito, com 0,80m de diâmetro e 25m de comprimento, com recurso a 4 macacos hidráulicos fazendo reacção num maciço suportado por quatro estacas. A carga aplicada foi medida através de células de carga, tendo sido medidos os deslocamentos no topo da estaca e a extensão axial em cinco secções da mesma. Foi aplicada uma carga máxima igual ao dobro da carga de serviço, o que correspondeu a uma tensão compressão máxima de 12 MPa. O carregamento foi feito em 8 escalões de 25% da carga de dimensionamento. Por seu turno, a descarga faz-se em 4 escalões de 50% da carga de dimensionamento. O ensaio de carga dinâmico foi executado, sobre uma estaca de 1000mm de diâmetro e 29 m de comprimento, dos quais 27,4m enterrados, através da queda de um martelo com 30 toneladas, de altura variável, tendo sido medidos a deformação axial através de um par de extensómetros e a velocidade das partículas através de um par de acelerogramas. A interpretação dos resultados foi feita através dos programas GRLWEAP e CAPWAP, ambos baseados na equação da onda. 4.1 Resultados dos ensaios A Figura 4 apresenta a curva carga-assentamento obtida no ensaio estático. Observa-se que o assentamento máximo atingido é igual a 1,9% do diâmetro da estaca, não se tendo atingido a carga de rotura.

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Assen

tamen

to (m

m)

Carga axial  (kN)

Ensaio de carga estático

Figura 4 – Resultados do ensaio de carga estático A instrumentação interna através de cinco pares de extensómetros de corda vibrante permitiu a medição do esforço axial noutras tantas secções, localizadas a profundidade crescente. A Figura 5 apresenta a distribuição do esforço axial ao longo do comprimento da estaca, para os diferentes escalões de carga. Os resultados dos extensómetros colocados a 15 m de profundidade apresentaram deficiências pelo que não são representados. Verifica-se que praticamente toda a carga é transferida ao terreno por resistência lateral, não chegando carga à ponta da estaca. A mobilização da resistência lateral com o assentamento está representada na Figura 6, pelo seu valor médio, para três secções da estaca. É possível observar que a resistência lateral se encontra completamente mobilizada no topo da estaca (qs=117 kN/m2, nos primeiros 4m) e na secção entre os 16 e 20 m (qs=100 kN/m2). Na secção intermédia, entre os 4 e 16m foi atingido qs=130 kN/m2, mas a resistência ainda não foi completamente mobilizada. Note-se também que nos 5m inferiores e também na ponta não foi mobilizada qualquer resistência.

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Profun

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)

Carga axial  (kN)

Ensaio de carga estático

1 (0,25 DL)

2 (0,50 DL)

3 (0,75 DL)

4 (1,00 DL)

5 (1,25 DL)

6 (1,50 DL)

7 (1,75 DL)

8 (2,00 DL)

0.0% 0.5% 1.0% 1.5% 2.0%

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s/B (%)

Atrito lareral m

édio (kPa)

Assentamento (mm)

Ensaio de carga estáticoMobilização do atrito lateral

qs (0‐4 m)

qs (4‐16 m)

qs (16‐20 m)

Figura 5 – Distribuição da carga em profundidade Figura 6 – Mobilização do atrito lateral unitário

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Quanto ao ensaio dinâmico, foi selecionada uma pancada provocada por uma massa de 30 ton caindo de 1,50 m de altura e que causou um assentamento final de 9 mm. A interpretação dos resultados através do programa CAPWAP permitiu determinar uma resistência lateral de 12 MN, não tendo sido mobilizada a resistência de ponta, o que resulta numa resistência lateral unitária média igual a qs=133 kN/m2. Este valor enquadra-se razoavelmente com os valores obtidos no ensaio estático. A comparação entre os valores medidos e os estimados é apresentada na Figura 7. É possível concluir que a resistência lateral prevista pelo método de Bustamante é ligeiramente inferior ao valor medido, apresentando no entanto melhor concordância do que o método de Reese e O’Neill. Este segundo método sobrestimou a resistência lateral sobretudo em zonas onde o número de pancadas NSPT é superior a 50. Em relação à resistência de ponta, dado que não foi mobilizada para o nível de carregamento atingido nos ensaios, não é possível avaliar as estimativas obtidas pelos métodos apresentados.

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Resistência lateral unitáriaqs (kPa)

Reese & O'NeilBustamanteEnsaio estáticoEnsaio dinâmico

Figura 7 – Valores previstos e medidos do atrito lateral unitário 5. CONCLUSÕES No presente trabalho foram apresentados dois métodos frequentemente utilizados no dimensionamento de estacas moldadas, tendo sido aplicados a um caso de obra. As estimativas da capacidade de carga axial, através do método de Bustamante e de Reese e O’Neill, são consideravelmente diferentes, embora essas diferenças se atenuem quando se comparam os valores de cálculo para condições de serviço, através das combinações raras de acções. A razão para esse facto resulta dos diferentes coeficientes de segurança propostos para cada método.

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A realização de ensaios de carga, quer estático quer dinâmico, permite concluir que a carga de serviço será fundamentalmente absorvida por resistência lateral e que o método de Bustamante aproxima melhor a distribuição desta resistência medida nos ensaios, embora de modo conservador. As conclusões aqui apresentadas são, obviamente, válidas para este caso de estudo em concreto. A realização de novos ensaios de carga, em curso, permitirá complementar os dados e as conclusões apresentadas neste artigo. No âmbito de novos estudos a realizar procurar-se-á verificar até que ponto os resultados obtidos fazem ou não parte de uma tendência clara correspondente ao comportamento relativo dos dois métodos. AGRADECIMENTOS Os autores agradecem ao consórcio LBCD e à Tecnasol-FGE a colaboração na realização dos ensaios. REFERÊNCIAS NP 1997-1:2009 – Eurocódigo 7: Projecto geotécnico – Parte 1: Regras gerais Reese, L.C. e O’Neill, M.W. (1999), Drilled Shafts: Construction Procedures and Design

Methods, Report No. FHWA-IF-00-025, Federal Highway Administration. Ministère de l'Équipment, du Logement et des Transports (1993). Règles techniques de calcul et

de conception des fondations des ouvrages de génie civil. Cahier des clauses techniques générales applicables aux marchés de travaux. Fascicule nº. 62, titre V. Textes Officieles, nº 93-3, 182 p.

Robertson, P.K. e Campanella, R.G. (1983), “Interpretation of cone penetration tests. Part I: Sand”, Canadian Geotechnical Journal, Vol. 20, pp. 718-733.