As Sociedades Africanas

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As sociedades africanas A África Subsaariana, isto é, ao sul do deserto do Saara, costuma ser dividida em três grandes áreas: Ocidental, Centro-Ocidental e Oriental. A África Ocidental compreende os territórios entre os rios Senegal e Cross. Além desses, estão localizados nessa região os rios Gâmbia, Volta e Níger, todos considerados os mais importantes meios de comunicação, desaguando no oceano Atlântico. Também se insere nessa área as terras ao redor do lago Chade. Quanto à vegetação, a parte ocidental africana abarca uma faixa de estepes, ao sul do Saara, conhecida como Sael, as savanas (campos de poucas plantas rasteiras) e, em direção ao interior do continente, as florestas. A África Centro-Ocidental é entendida como a área que se estende entre o rio Congo e o rio Cuanza, cujas nascentes estão localizadas no interior de Angola e na floresta equatorial central, lançando suas águas também no Atlântico. E, por fim, a África Oriental abrange os territórios entre os rios Limpopo e o Zambeze, que deságuam no oceano Índico. Essas duas regiões são compostas por savanas e cerrados.

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Texto objetivo acerca das principais sociedades africanas da nossa Era.

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  • As sociedades africanas

    A frica Subsaariana, isto , ao sul do deserto do Saara, costumaser dividida em trs grandes reas: Ocidental, Centro-Ocidentale Oriental.

    A frica Ocidental compreende os territrios entre os rios Senegale Cross. Alm desses, esto localizados nessa regio os rios Gmbia, Voltae Nger, todos considerados os mais importantes meios de comunicao,desaguando no oceano Atlntico. Tambm se insere nessa rea as terrasao redor do lago Chade. Quanto vegetao, a parte ocidental africanaabarca uma faixa de estepes, ao sul do Saara, conhecida como Sael, assavanas (campos de poucas plantas rasteiras) e, em direo ao interior docontinente, as florestas.

    A frica Centro-Ocidental entendida como a rea que se estendeentre o rio Congo e o rio Cuanza, cujas nascentes esto localizadas nointerior de Angola e na floresta equatorial central, lanando suas guastambm no Atlntico. E, por fim, a frica Oriental abrange os territriosentre os rios Limpopo e o Zambeze, que desguam no oceano ndico.Essas duas regies so compostas por savanas e cerrados.

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    Mapa fsico da frica (vegetao).

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    A FRICA OCIDENTAL

    OS REINOS SUDANESES1

    Os povos que viviam no Sael (territrio de savanas ao sul do Saara)eram conhecidos como sudaneses, pois essa rea tambm era denominadaSudo (Bilad al-Sudan, que em rabe significa terra dos negros). Erambons agricultores, plantavam milhete (espcie de milho de gro mido),sorgo (cereal semelhante ao milho), arroz e cereais. Tambm caavam,pescavam e criavam gado. Conheciam a metalurgia, confeccionandopontas de lanas, enxadas e flechas com o ferro. Habitavam vilas comcasas de taipa ou palha, prximas s terras cultivadas. Organizavam-seem torno de linhagens e dos conselhos dos ancios, sendo estes osresponsveis pela resoluo das disputas nas aldeias.

    A formao de reinos no Sudo foi, em certa medida, incentivadapelo comrcio transaariano de cereais e outros produtos agrcolas, almde mbar, pimenta, marfim e escravos, que eram trocados por cavalos,sal, cobre, conchas, panos de algodo e tmaras. As aldeias que se tornarampontos comerciais entre os povos do deserto e os do Sael procura-ram controlar esse comrcio, passaram a cobrar tributos e desenvolveramatividades, como a fabricao de utenslios de carga de animais,manufaturas e hospedagem.

    As rotas comerciais na rea do deserto eram controladas pelosberberes, que ofereciam guias e camelos. O camelo era o meio detransporte de mercadorias mais utilizado, sobretudo ao norte do Nger.Depois, em certos trechos, os produtos eram transferidos para os burros,que comparativamente eram mais custosos, porque no podiam serutilizados nas estaes chuvosas, nem em reas infestadas pela moscats-ts. Por outro lado, o meio de transporte mais barato era o fluvial,feito em canoas.

    Os berberes dividiam-se em azenegues e asnagas. Os azeneguescomandavam, no sculo IX, a cidade de Audagoste, importante centrocomercial de sal, tmaras, cereais, jias e armas de ferro. O comrcio no

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    deserto tambm era realizado por mouros e tuaregues, povos nmadesque eram originrios dos berberes.

    Uma das rotas mais difceis era a que ligava o Mediterrneo aoSael, com durao em mdia de 2 meses, e os mercadores poderiam ficarat 14 dias sem encontrar gua pelo caminho.

    O comrcio transaariano proporcionou tambm o contato com oislamismo, religio monotesta, fundada por Maom (570-632) e baseadanas escrituras do Alcoro. Em muitos reinos sudaneses, sobretudo entreos reis e as elites, o islamismo foi bem recebido e conseguiu vrios adeptos,tendo chegado regio da savana africana, provavelmente, antes do sculoXI, trazido pela famlia rabe-berbere dos Kunta.

    O islamismo possua alguns preceitos atraentes e aceitveis pelasconcepes religiosas africanas. Incorporava amuletos, associava ashistrias sagradas s genealogias, acreditava na revelao divina, naexistncia de um criador e no destino. O que aconteceu de um modogeral na frica Ocidental foi uma harmonizao das crenas, incluindo-se Al no conjunto de deuses ou associando-o ao Ser Supremo, ecomparando as figuras de anjos e demnios s foras sobrenaturais. Oescritor rabe Ibn Batuta relatou, no sculo XIV, que o rei do Mali, numamanh, comemorou a data islmica do fim do Ramad e, tarde,presenciou um ritual da religio tradicional realizado por trovadores commscaras de aves. Esse fato demonstra a incorporao dessa crena e aconvivncia entre o islamismo e as religies tradicionais africanas. Emboraem alguns lugares os muulmanos parecessem no aceitar essa misturade crenas, pois se opunham a determinados rituais, como os sacrifcioshumanos em funerais.

    Do contato que alguns povos tiveram com o islamismo nasceramsistemas de sinais como o Nsibidi, utilizado pela sociedade secreta Ekpe,do sudeste da Nigria. Em Tombuctu existiram quase duzentas escolasque ensinavam as leis do Alcoro, mas essas eram memorizadas,prevalecendo o princpio da oralidade.

    Os principais reinos sudaneses foram: Gana, Mali, Songai, TecrurCanem e Bornu.

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    A IMPORTANCIA DA ORALIDADE

    At os dias atuais, a maior parte das sociedades africanassubsaarianas d grande importncia oralidade, ao conhecimentotransmitido de gerao para gerao por meio das palavras proferidascom cuidado pelos tradicionalistas os guardies da tradio oral,que conhecem e transmitem as idias sobre a origem do mundo, ascincias da natureza, a astronomia e os fatos histricos.

    Nessas sociedades de tradio oral, a relao entre o homem e apalavra mais intensa. A palavra tem um valor sagrado, sua origem divina. A fala um dom, no podendo ser utilizada de formaimprudente, leviana. Ela tem o poder de criar, mas tambm o deconservar e destruir. Uma nica palavra pode causar uma guerra ouproporcionar a paz.

    Alguns ofcios existentes nas sociedades africanas estorelacionados tradio oral, a um conhecimento sagrado, a ser reveladoe transmitido para as futuras geraes; o caso dos ferreiros,carpinteiros, teceles, caadores e agricultores. Os mestres que realizamessas atividades fazem-no ao mesmo tempo em que entoam cantosou palavras ritmadas e gestos que representam o ato da criao.

    Os griots ou animadores pblicos tambm so tradicionalistasresponsveis pela histria, msica, poesia e contos. Existem griotsmsicos, tocadores de instrumentos, compositores e cantores, os griotsembaixadores, mediadores em caso de desentendimento entre asfamlias, e os griots historiadores, poetas e genealogistas, estes so oscontadores de histria. Nem todos os griots tm o compromisso coma verdade como os demais tradicionalistas. A eles permitido inventare embelezar as histrias.

    O aprendizado de um tradicionalista ocorre nas escolas deiniciao e no seio familiar, no qual o pai, a me e os parentes maisvelhos tambm so responsveis pelos ensinamentos, por meio desuas prprias experincias, lendas, fbulas, provrbios e mitos sobre acriao do mundo, o papel do homem no Universo, a existncia domundo dos vivos e dos mortos.

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    GANA

    Gana era um desses reinos sudaneses, consolidado a partir do sculoIV. Era formado por vrias comunidades soninqus, isto , povos do grupolingstico mand, que habitavam o territrio localizado entre as baciasdo alto Nger e do Senegal.

    Os mercadores soninqus eram importantes chefes das caravanasde burros. Quando o reino do Mali se desenvolveu a ponto de sobrepujarGana, alguns soninqus formaram um grupo maior, de lngua mand emuulmano, chamado diula. Estes eram comerciantes de ouro, tecidos enoz-de-cola, que abasteciam os territrios desde o deserto, passando pelosda floresta at o pas dos haas.

    A noz-de-cola, obtida nas matas da regio entre o sul da Guin-Conacri e o rio Volta, tinha um valor alto no Senegal, no Sael e na fricado Norte. Era muito apreciada por suas propriedades medicinais eestimulantes, utilizada para combater a dor de cabea e a impotncia,reduzir o cansao, a fome e a sede.

    As primeiras informaes a respeito do reino de Gana foramencontradas na obra do escritor rabe Al-Fazari, no sculo VIII. Esse autorrelata que, no Marrocos, Gana j era conhecida como a terra do ourodesde o sculo VIII, por conta da existncia de reservas desse metal e docomrcio estabelecido com o Norte da frica, que trocava, entre outrosprodutos, o ouro por sal.

    Em Gana, a sociedade era dividida entre nobres, homens livres,servos e escravos. Alguns povos eram inteiramente sujeitados ao comandodo rei, outros estavam ligados a ele apenas pelo pagamento de tributosou militarmente, seguindo as determinaes dos conselhos de anciosou dos chefes tradicionais.

    O rei era rodeado de pompa. Quando chegava em determinadolugar seguido de sua comitiva, geralmente vestido com uma tnica,adornado com pulseiras e colares de ouro, era aplaudido por todos, quese curvavam at o cho e jogavam areia sobre suas cabeas.

    No sculo XI, o gegrafo Al-Bakri deixou um relato a respeito davenerao figura do rei e o ritual de seu sepultamento em Gana:

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    A audincia anunciada a golpe de tambor, fabricado com um grande tronco oco,que eles chamam daba. Quando a gente [...] se aproxima [do rei], caem de joelhose cobrem suas cabeas com p, que uma forma de mostrar respeito [...]. A religiodo povo de Gana o paganismo e o culto dos dolos. Quando seus reis morrem,constroem seu tmulo em forma de cpula de madeira de saj. Ento, levam-no emuma cama coberta com alguns tapetes e o introduzem dentro da cpula. Colocamjunto seus ornamentos, suas armas e a vasilha que usava para comer e beber, cheiade comida e bebidas diversas. Colocam ali tambm os homens que o serviam acomida, fecham a porta da cpula e a cobrem com esteiras e objetos; renem depoiso povo, que joga terra em cima dela at que se forma um monte. Cavam, ento, umcanal em torno, de tal modo que somente se possa penetrar por uma parte.Sacrificam vtimas por sua morte e fazem oferendas de bebidas txicas.

    O rei e seus sditos seguiam as convices religiosas tradicionais, pre-servando os bosques, por exemplo, como lugares especiais que abrigavam ossacerdotes e os tmulos dos reis. Existem relatos de que o rei governava vol-tado tanto para os adeptos das crenas tradicionais quanto para os islamitas.

    H vrios indcios de que o palcio do rei ficaria na cidade realGaba (ainda no localizada pelos arquelogos), bem prxima de KoumbiSaleh, importante cidade, centro comercial e capital do reino de Gana.

    O comrcio de sal, cobre e outros produtos era taxado com tributosque deveriam ser pagos em ouro, vindo das minas de Bambuk, entre osrios Falem e Senegal. O sal raro na regio das savanas, tendo quase omesmo valor do ouro e outras mercadorias eram trazidas do desertoem camelos e seguiam em burros ou na cabea de carregadores at asreas mineradoras de Bambuk, Bur e Lobi.

    De acordo com o escritor Al-Idrisi, Gana era, ainda no sculo XII, oreino que tinha o mais amplo controle comercial no Sudo. No entanto,um sculo mais tarde, Gana entrou em declnio ao perder o domnio docomrcio de ouro e em razo do crescimento de outros estados sudaneses:Tacrur, Zafum, Sosso. Este ltimo venceu militarmente, por volta de1203, os exrcitos de Gana.

    MALI

    Um dos reinos mais importantes da savana ocidental, sobretudoentre os sculos XIII e XV, era o Mali, localizado no alto do Nger. A origem

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    desse reino est nos povos de lngua mand, que viviam em um kafu conjunto de aldeias cercadas por terras cultivadas no vale do Nger, queformavam pequenos estados, governados pelos famas , donos da terra,descendentes dos primeiros habitantes da regio. Expandiram-se,estendendo o territrio at o deserto e a floresta, e incluindo provnciasconquistadas e vassalos semi-independentes.

    No sculo XIII, quando da expanso em territrios malinqus, os sossos(antigos vassalos de Gana) foram derrotados por um representante dosQueitas (provveis lderes de associaes de caadores, habitantes de aldeiasentre os rios Sancarani e Nger) de nome Sundiata, responsvel pela uniodas vrias comunidades malinqus, que o elegeram o grande rei do Mali.

    A organizao poltica do Mali abarcava desde reinos at aldeias sobinfluncia do grande rei, devendo-lhe tributos, mas eram dirigidas porconselhos de ancios. O Mali incorporou ao seu domnio o que teria sidoo Imprio de Gana, o pas sosso, os territrios compreendidos pelos riosGmbia, Senegal e o alto Nger e tambm as minas de ouro de Bambuk ede Bur. Contudo, preciso ressaltar que esses dois grandes produtores deouro eram territrios sob influncia do Mali, que no tinha o controle totaldas minas, nem conseguiu difundir o islamismo entre a sua populao.

    A sociedade dividia-se de forma hierrquica, estando no topo o reido Mali, denominado mansa, seguido da linhagem real, do cl dos Queitas,da nao mandinga e das demais naes. Em cada nao, existiam asfamlias reais, a nobreza, os homens livres, os mestres de ofcios tradicionais(ferreiros, carpinteiros etc.), os servos e os escravos. Estes ltimos podiamcompor as tropas de cavalaria e a guarda pessoal do rei, ocupar os cargosde funcionrios da corte e trabalhar como agricultores.

    A sucesso do reino poderia ser tanto patrilinear quanto fratilinear.Significa dizer que tanto o filho como irmo do rei poderia substitu-lono poder. Na segunda metade do sculo XIII, o filho de Sundiata, chamadoUli, sucedeu-o no reino do Mali e passou a controlar tambm os grandespontos comerciais do Sael: Ualata, Tombuctu, Jenn e Ga.

    Jenn, situada na regio do rio Bani, era um grande centroagropecurio e comercial, que ligava a savana, o cerrado e a floresta. Seus

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    habitantes criavam gado e produziam milhete, sorgo e arroz, e artesanatoem couro, ouro, cobre, ferro, algodo, madeira e barro. Esses produtoseram levados em canoas e comercializados ao longo do Nger.

    Tombuctu ficava a noroeste do Nger, prxima ao deserto. Surgiu,provavelmente, no sculo XII, tendo como origem uma comunidade detuaregues islamizados. Tornou-se um grande porto do comrcio transaariano.

    No sculo XIV, Tombuctu e Jenn desenvolveram-se ainda maiscom sua integrao ao comrcio transaariano. Valentim Fernandesdescreve que, em Tombuctu no sculo XVI, o sal, trazido em camelos,abastecia as almadias (grandes embarcaes feitas em um s tronco), quese dirigiam Jenn, onde era trocado por ouro, vindo da regio dos povosacs e de Lobi, no Volta Negro. De Jenn, o sal rumava savana e, dali, floresta, carregado em pedaos por escravos. Esse comrcio entre a savanae a floresta era realizado pelos soninqus e pelos mandingas, estes ltimosconhecidos tambm como ungaras ou diulas.

    No final do sculo XIV, o Mali comeou a se enfraquecer, devido,em grande medida, s lutas de sucesso entre os descendentes de SundiataKeita, gerando a desintegrao do reino em pequenos estados.

    TELLENS E DOGONS

    Uma regio muito habitada e que, no segundo milnio da eracrist, sofreu uma multiplicao de zonas de produo agrcola era aque se situava ao longo do Nger e ao sul do lago Chade. Um dosgrupos de agricultores que cultivavam essa regio eram conhecidoscomo tellens. Eles ocuparam, no sculo XI, a rea de escarpas deBandiagara, no Mali, perto do delta interior do Nger, onde passarama cultivar cereais. Esse povo deixou um conjunto de tecidos e objetosem madeira, tais como estatuetas, instrumentos musicais, enxadas,adornos, considerado um dos mais antigos da frica Subsaariana.

    Um povo que veio se juntar aos tellens, nos sculos XIV ou XV,foram os dogons, vindos do pas mandinga. Estes eram conhecidos(e ainda so at hoje) por produzirem esculturas e mscaras coloridasde madeira. Eram povos de tradio migratria e falavam muitas

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    lnguas. A chegada dos dogons provocou o deslocamento dos tellenspara a regio do Iatenga. Os dogons no se organizavam politicamenteem torno de um Estado centralizado, nem de um rei. Cadaagrupamento tinha o seu prprio chefe religioso, um ferreiro chamadohogom, escolhido entre os homens mais idosos. Os reinos do Mali e, maistarde, de Songai, tentaram subjugar os dogons, mas no tiveram xito.

    SONGAI

    Os denominados songais tm como origem a dominao dascomunidades de agricultores (ds) ou de caadores (gs) da margem dorio Nger pelos sorcos, vindos da regio de Dendi, entre as atuais Nigriae Repblica do Benin. Assim como os de Gana, os songais centralizaramo poder poltico, estimulados pelo controle do comrcio com os berberes.Cuquia era a capital de Songai no sculo VII e Ga era, nos sculos VIII eIX, um importante ponto de comrcio transaariano de escravos e ourotrocados por cobre, cavalos, tecidos, vidro, oriundos do Magrebe, do Egito,do Marrocos e da Europa.

    Songai foi sucessor do reino do Mali, expandindo-se 2.000 km aolongo do vale do Nger. Na segunda metade do sculo XV, o chefe SoniAli fez com que Songai atingisse o seu apogeu, explorando a agriculturae o comrcio com as cidades de Jenn e Tombuctu. Depois de sua morte,os membros da famlia real e da nobreza militar enfrentaram-se emconflitos pela sucesso, provocando a diviso do Estado.

    As religies tradicionais africanas mantiveram-se em muitos lugaresnos quais o islamismo penetrou. Os songais preservaram-se fiis as suastradies religiosas at o final do sculo XV, quando militares e clrigosmuulmanos dominaram o poder.

    Na crnica Tarikh al-Fattash, escrita por volta de 1665, h a descriode aldeias agrcolas em Songai. Eram compostas, em mdia, por duzentaspessoas, que ficavam sob a guarda de quatro feitores fanfas e um capataz-chefe, sendo todos escravos. As aldeias eram obrigadas a entregar umaproduo de arroz e milhete fixada anualmente. Muitas vezes, sobrava poucopara a sobrevivncia dos escravos. No entanto, nas aldeias agrcolas de

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    aristocratas e chefes militares, os escravos eram considerados servos, tendoque entregar ao proprietrio uma parte da produo, reservando o restantepara seu sustento e da sua famlia. Outras terras eram cultivadas por escravosde plebeus que conseguiram enriquecer na agricultura ou no comrcio e queas administravam com rigor.

    O arroz, o sorgo e o milhete eram comercializados na regio dodeserto e ao longo do Nger. Encaminhados ao palcio do rei ou aomercado nos ombros dos escravos, em embarcaes e em lombos deburros, eram trocados por sal vindo do Sael. Os escravos eram responsveispela produo, pelo transporte das mercadorias e aos de mais confiana ea algumas mulheres cabia o comrcio em mercados e feiras. Os escravos,sobretudo os eunucos (castrados), tambm compunham as grandescavalarias. Cerca de dois a quatro mil eunucos eram adquiridos entre osmossis e os gurmas, hbeis castradores.

    Desde o final do sculo XIII, os songais tentavam recuperar a suaindependncia dos domnios do reino do Mali, mas somente oconseguiram totalmente um sculo mais tarde, com o apoio de um exrcitoforte e de frotas de canoas, resgatando tambm o controle das rotascomerciais caravaneiras em Ga.

    J no incio do sculo XV, os songais atacaram e submeteram vriaslocalidades do Imprio Mali, entre elas as aldeias bambaras e o reino deMema. Essas conquistas foram o pontap inicial para a grande expansodo reino Songai, sob o comando de Soni Ali, que incorporaria as principaiscidades do comrcio transaariano: Tombuctu, Jenn, Ualata.

    Os hbeis cavaleiros mossis, habitantes das terras ao sul da curva doNger, que haviam invadido a cidade Ualata, por volta do sculo XV, tiveramque enfrentar as fortes tropas dos songais, saindo derrotados. Os songaispretendiam incorporar as terras dos mossis, fulas e dogons, que ficavamentre os antigos domnios do Imprio Mali, mas nunca o conseguiram.

    No final do sculo XV, com a morte de Soni Ali, seu filho, Abu BacreDao ou Baro, tornou-se rei de Songai, mas logo foi destitudo por MuhamedTur ou Mamari, um grande chefe militar. Com o ttulo de squia,Muhamed governou com base no islamismo, embora grande parte danobreza songai e dos seus sditos se conservassem fiis s crenas tradicionais.

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    O Imprio Songai, sob o governo do squia Muhamed, compreendiaos territrios de Dendi para alm de Jenn, com povos vassalos e umncleo de vrias provncias comandadas por parentes ou pessoas prximasao rei, chamados de fari, farma ou farima. A parte ocidental do reinoficava sob o governo de um vice-rei Curmina-fari ou Canfari. E a regiooriental sob o comando de outro vice-rei Dendi-fari.

    Alm desses governantes havia vrios outros funcionrios, como omordomo-real, o tesoureiro, o responsvel pelas florestas, guas e plantaes,o comandante das frotas de canoas e dos exrcitos.

    O squia Muhamed incorporou ao Imprio Songai a cidade deAgads, um ponto comercial caravaneiro entre Trpoli, Egito, Bornu,Haualndia e Ga. Venceu os fulas de Macina e os soninqus de Bagama,passando a controlar a rea entre Tombuctu e Jenn. Vrias outrasdependncias ou territrios de influncia do Mali foram incorporados,como Diala e Galam, lembrando que estavam nas suas mos o controledas principais cidades comerciais: Ga, Jenn, Tombuctu e Ualata.

    De acordo com as informaes de Leo Africano (mas nocomprovadas em outras fontes), no sculo XVI, o squia Muhamed voltousuas foras para conquistar os territrios haas, sobretudo Bornu,interessado no comrcio de ouro, noz-de-cola, escravos, produtos decouro, gado etc. Para tanto, invadiu e escravizou grande parte da populaode Katsina, Zria, Kano e Gobir.

    O governante de Kebbi, um estado a oeste de Sokoto, entre aHaualndia e o reino de Songai, Cunta Quenta, rebelou-se contra osquia e enfrentou suas tropas, tornando-se independente. Em 1528,Muhamed, j muito idoso, seria deposto por um de seus prprios filhos,Musa. A partir desse momento, iniciou-se a decadncia do Imprio Songai,que em 1591 foi conquistado pelo Marrocos.

    TACRUR

    Tacrur era um reino localizado nas margens do rio Senegal, umponto privilegiado de ligao entre o deserto e a savana, bem como olitoral atlntico e o interior. No sculo IX, esse reino era formado por

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    agricultores sereres, que deram origem aos tucolores, grandes comerciantesislamitas de ouro e escravos, e pelos pastores fulas, nmades de origemsaariana. Eram grandes cultivadores de milho e criadores de gado.

    A primeira dinastia de Tacrur, a de Diogo, era composta, provavel-mente, por fulas ou berberes. No final do primeiro milnio da era crist, adinastia de Diogo foi substituda pelos Manas, do estado de Diara,permanecendo no poder por trezentos anos. No sculo XI, o rei tucolor Uar-Jabe ibn Rabis converteu-se ao islamismo, difundindo essa doutrina pormeio da fora e pela catequese com a ajuda de mercadores tucolores.

    Os mercadores de Tacrur comercializavam ouro, escravos, mbar,cobre, goma, contas, l e sal pelas rotas do Atlntico ou por Audagoste,fazendo chegar esses produtos at Marrocos, Gana e Nger.

    Nos sculos XI e XII, Tacrur expandiu suas fronteiras at Barisa um ponto de comrcio de ouro sob influncia de Gana fazendo, assim,concorrncia com este reino.

    No entanto, no incio do sculo XIV, os Manas perderam o poderem Tacrur, dando lugar aos sereres e mands da dinastia de Tondions,que por sua vez, no sculo seguinte, foram substitudos pelos fulas deLam-Termes. Nessa poca, Tacrur foi invadido por guerreiros estrangeirose acabou dividido em pequenos reinos.

    Entre a segunda metade do sculo XV e o incio do sculo XVI, os fulasinvestiram na sua poltica expansionista. Comandados por Dulo Demba,Tenguel e Coli Tenguel, conquistaram as terras do Futa Jalom e do altoGmbia, dominaram os pequenos reinos que outrora formavam Tacrur ecriaram um grande Imprio, conhecido como o Imprio do Gro-Fulo.

    CANEM E BORNU

    As terras em torno do lago Chade foram escolhidas por vrios povosque se dirigiam para o sul, fugindo do ressecamento do Saara. Nessa rea,h vestgios de aldeias de agricultores, pescadores e criadores de gado mido,que deixaram machados, vasos de cermica e utenslios de pedra e de osso.Uma delas ficava prxima cidade de Boma, na Nigria, cujo stioarqueolgico chamaram de Borno 38. Outra aldeia, mais ao norte, que teria

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    sido ocupada a partir do primeiro milnio a.C., era Kursakata. Nesta, osmoradores talvez no cultivassem gros e utilizavam objetos de cermica eferro, em vez dos feitos de pedra e osso.

    Daima era outra aldeia, no nordeste de Bornu, surgida,provavelmente, em 550 a.C., e ocupada por mais de 18 sculos, deixandode ter uma concentrao populacional somente depois do sculo XIII. Seushabitantes consumiam gros, pescado e criavam cabras e bois. Estavamacostumados a trabalhar o ferro, desde o sculo I a.C., que havia,provavelmente, sido trazido de Mandara, ao sul. Utilizavam a cermica parafabricar vasos, ferramentas para trabalhar a madeira, assim como para reco-brir os pisos.

    Com o passar do tempo, as casas feitas de madeira e palha foramsubstitudas pelas de barro. Os moradores de Daima tambm deixaramde usar o osso e os machados de pedra. Paralelamente, houve um aumentoda produo de cereais e da criao de caprinos.

    As sepulturas revelam um perodo de riqueza. Os mortos, enterradosde lado ou em posio fetal e com as mos na cabea ou no rosto, levavamornamentos (brincos, colares, braceletes) em barro, bronze, ferro, cobre,vidro e cauri (espcie de concha). possvel que alguns desses materiaisou peas prontas tenham vindo de outras localidades e comercializadasem troca de sorgo, gado, marfim etc.

    Os habitantes da ltima etapa de ocupao em Daima eramchamados de sas, pessoas de grande porte e construtoras das grandesmuralhas ao sul e a sudeste do lago Chade. Utilizavam a argila para fabricardesde jias, panelas, pontas de flechas e fornos at na construo de casase muralhas. Mas foram as pequenas esculturas de cabeas humanas (de 3a 12 cm de altura) em terracota as peas mais importantes da cultura sa,criadas para celebrar o nascimento ou a morte de uma pessoa.

    Peas em bronze e ferro, como colares, anis, braceletes einstrumentos para a caa foram tambm fabricados pelos sas. A partirdo sculo XIII, os sas, que, muito provavelmente, dominavam o sul e osudeste do lago Chade, sucumbiram expanso de Canem. Muitosfugiram para territrios longnquos e outros tornaram-se escravos.

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    A fundao do reino de Canem atribuda aos zagauas, nmadesdo Sudo. Uma outra verso revela que Ibrahim, o filho de um grandeheri rabe Saife ibn Dhi Yazan viajou para o Sudo Central e tornou-se lder dos magumis, nmades do nordeste do lago Chade, conquistandovrios grupos dessa rea. Essa histria pode ter sido criada depois daconverso de Canem ao islamismo e ao advento da dinastia Sefaua.

    Existem vrias outras explicaes para a origem de Canem e todasinsistem na submisso de um povo mais fraco por outro mais forte, porpossuir supremacia militar, em virtude do conhecimento da metalurgiado ferro e do uso do cavalo, ou pela importncia estratgica do comrcio.

    O escravo era um dos produtos comercializados nessa regio, vendido,sobretudo no norte da frica, como concubina, eunuco, criado ou soldado.Os escravos tambm eram utilizados no prprio reino de Canem, para pagartributos, compor exrcitos, em trabalhos na agricultura e na criao deanimais. Eram obtidos por meio de seqestros e ataques s aldeias prximas.Esses ataques serviam para a expanso do reino, submetendo os povosvizinhos ou os tornando seus vassalos em troca de proteo.

    At a metade do sculo XI, o islamismo no era totalmente aceitoem Canem, com exceo de pequenos grupos de mercadores, apesar daexistncia de missionrios responsveis por propagar a f muulmananesse reino. O primeiro rei de Canem a se converter ao islamismo teriasido Hum, no final do sculo XI. A partir de sua converso, os sefauastornaram-se dominantes em Canem.

    No sculo XIII, ocorreu a grande expanso de Canem, sob o comandodo rei Dunama Dibalemi. Esse reino j controlava Kawar, um importanteprodutor de sal, comercializava tambm muitos escravos, panos, marfim,contas, objetos em ferro, estanho vindo de Bauchi, cavalos do norte dafrica, cobre de Takedda. Com o objetivo de assegurar esse comrcio, foinecessrio submeter Fezzan, um ponto de parada de caravanas entreCanem, Tunsia e Tripolitnia, e entre o Egito, Mali e Ga. Bornu, aoeste do lago Chade, tambm foi conquistada por Canem.

    No sculo XIV, Canem entrou em crise. Vrios reis morreram emguerras contra os sas. Fezzan conseguiu sua independncia. E os bulalas,

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    habitantes do reino da regio do lago Fitri, importantes no comrciotransaariano e fortes militarmente, com exrcitos compostos por homensa cavalo, invadiram Canem, que tambm estava sendo atacada por gruposrabes e tubus, que queriam escravizar a sua populao. Ao mesmo tempoem que Canem se protegia, no deixava de guerrear tambm com os sase outros vizinhos ao sul para obter mais escravos e engrossar seus exrcitos.

    O ento rei Umar ibn Idris abandonou Canem e seguiu com seuexrcito para Bornu, que possua terras frteis, tinha ao seu redor possveisfontes de escravos e era ponto de sada das rotas comerciais para a fricado Norte e o Egito.

    Em Bornu, a populao era predominantemente canri, isto , umamistura de canembus e sas. As aldeias mantinham seus chefes tradicionais bulamas que respondiam aos representantes militares do rei mana ouprncipes. O rei governava com o apoio desse conselho de militares e tambmera muito influenciado pela rainha-me magira e pela rainha-irm. Nessapoca, Bornu comercializava escravos em troca de cavalos, vindos da fricado Norte. Para tanto, precisava obt-los em guerras travadas contra povosvizinhos. Cada cavalo valia em torno de 15 e 20 escravos.

    Em Canem, os bulalas continuaram at o incio do sculo XV,quando foram finalmente derrotados pelos sefauas, comandados pelo reiOsm ou Bir ibn Idris.

    No entanto, apesar de retomarem o territrio de Canem, os sefauaspreferiram continuar em Bornu. No sculo XV, o rei Ali Gaji construiuentre Birni Gazargamu, o lago Chade e a Haualndia, a sede do reino,que permaneceu um grande Imprio at 1809, quando foi invadida pelosfulas e abandonada pelos seus habitantes.

    OS REINOS SUDANESESPRINCIPAIS

    REINOS POCA POVOS PRODUTOSCOMERCIALIZADOS

    Gana c. IV-XIII soninqus, diulas ouro, tecidos,noz-de-cola

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    Mali c. XIII-XV malinqus, queitas, ouromandingas

    Songai c. XV-XVI songais agrcolas (arroz,sorgo, milhete),ouro, escravos

    Tacrur c. IX-XIV sereres, tucolores, ouro, mbar,fulas goma, l

    Canem e Bornu c. X-XIV zagauas, sefauas escravosc.XIV-XIX canri

    (canembus + sas)

    A SENEGMBIA: OS SERERES E OS JALOFOS

    A rea entre o deserto do Saara e a floresta equatorial, nas bacias dosrios Senegal e Gmbia, era conhecida como Senegmbia. Habitada pelospovos sereres e jalofos, que no segundo milnio da era crist, vindos do valedo Senegal a se fixaram, fugindo das secas e da expanso do islamismo.

    At o sculo XIV, os jalofos estavam sob a influncia do reino doMali, quando, ento, o rei Andiadiane Andiaje se imps sobre outrosagrupamentos jalofos e sereres e formou o reino Jalofo. Algum tempodepois, esse rei incorporou como vassalos outros reinos: Ualo, Caior,Baol e Sine, este ltimo formado, essencialmente por sereres. Dessamaneira, os jalofos passaram a comandar um grande Imprio, que abarcavao territrio compreendido entre o litoral e a foz do rio Gmbia e cujacapital ficava a 300 km da costa.

    O grande rei do Imprio Jalofo, conhecido como burba, recebiados reinos vassalos tributos anuais, a venerao (como um ser sagradoque era) e a garantia de que nenhum outro reino lhe ocasionaria a guerra.

    A sociedade dos jalofos e sereres dividia-se de forma hierrquicaem famlias reais, linhagens aristocrticas, grandes homens livres,camponeses, trabalhadores em ofcios (ferreiros, msicos etc.) e, por fim, osescravos. Havia ainda uma distino entre os escravos do rei (tiedo), os escravosde nascimento (jam juundu) e os capturados (jam sayor). Os escravos dorei tinham uma vida estvel, formavam exrcitos ou ocupavam cargos na

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    administrao. Os capturados podiam ser vendidos, mortos e maltratados,diferentemente dos escravos de nascimento, que s eram vendidos sepraticassem algum delito, e eram incorporados de modo mais fcil famliado senhor.

    A maior parte da populao era adepta das religies tradicionais,oferecia sacrifcios aos ancestrais e participava de rituais para obter fertilidadee chuvas. Embora os reis e a nobreza tivessem aderido ao islamismo, parapreservar o poder, tambm praticavam os rituais tradicionais.

    Na metade do sculo XV, o Imprio Jalofo incorporou os estadosmandingas do lado esquerdo do rio Gmbia. No entanto, algumas dcadasdepois, o rei de Sine submeteu toda a rea que abarcava o Imprio Jalofo,originando as chefias sereres de Salum.

    FONTES PARA A HISTRIA DA FRICA

    O continente africano foi objeto de muitas obras de rabes,europeus e dos prprios africanos. Os rabes estabeleceram relaescomerciais durante muitos anos com as sociedades africanas e seinstalaram, em especial, na frica Ocidental e na costa da fricaOriental. Entre os sculos IX e XV, a histria dessas sociedades foidescrita nas obras de viajantes, gegrafos e historiadores, como Al-Masudi, Al-Bakri, Al-Idrisi, Yakut, Abul-Fida, alUmari, Ibn Battuta,Hassan Ibn Mohanmad al-Wuzzan (conhecido como Leo, oAfricano). O norte-africano de Tnis Ibn Khaldun (1332-1406)destacou-se como o grande historiador da frica, ao escrever sobre ahistria do Mali utilizando a tradio oral.

    Com a expanso do islamismo na regio ao sul do deserto do Saarae na costa oriental do continente, os africanos passaram a combinar aescrita rabe tradio oral. Assim, nasceram obras escritas, em suamaioria, pelas elites africanas de Kano, Tombuctu (frica Ocidental),Quloa, Kilwa (frica Oriental). Uma delas Tarikh-al-Sudan escrita nosculo XVII, por um habitante letrado de Tombuctu, Al-Sadi, que conta ahistria dos reinos sudaneses. Do mesmo sculo a crnica Tarikh-al-Fattash, de Mahamud Kati e Ibne al-Maktar.

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    A partir do sculo XV, os europeus tambm comearam a estabelecerrelaes comerciais com a frica, resultando em um conjunto de relatos,crnicas e descries, de autores como Alvise de Cadamosto, GomesEanes de Zurara, Duarte Pacheco Pereira, Joo de Barros, Rui de Pina,Andr lvares dAlmada. Nos dois sculos seguintes, os missionrioscatlicos foram os principais responsveis pelas obras escritas sobre aEtipia (Pedro Paez, Manoel de Almeida e Hiob Ludolf ). Para o baixovale do Congo e em Angola so importantes as obras de Filippo Pigafetta,Duarte Lopes, Cavazzi de Montecucculo e Antonio de OliveiraCadornega, pois trazem elementos histricos relevantes.

    H ainda relatos deixados pelos prprios africanos sobre as suasregies de origem e as experincias como escravos na Amrica e na Europa,como A narrativa da vida de Olaudah Equiano ou Gustavus Vassa, oAfricano, escrito em 1789.

    Chegado o sculo XIX, os europeus iniciaram a explorao da frica,direcionada conquista dos mercados consumidores africanos, aps ofim do trfico de escravos. Uma nova literatura foi produzida porexploradores que recolheram documentos escritos e testemunhos orais,tais como as obras de James Bruce, T. E. Bowdich, Joseph Dupuis, MungoPark, Gustav Nachtigal, Hugh Clapperton, Richard Burton, entre outros.

    Todas essas obras retratam as principais sociedades da fricaSubsaariana e contribuem, junto com a arqueologia e a histria oral,para a construo da Histria desse continente.

    HAUALNDIA

    Os povos de lngua haa ocupavam, no sculo XI, a faixa queabarcava o Air at o planalto de Jos, a curva do rio Kaduna at o vale doGulkin-Kebbi.

    Em cada comunidade haa, o poder poltico estava concentrado nochefe da linhagem. medida que ocorria a expanso das aldeias com aincorporao de novas pessoas, o poder tendia a se concentrar nas mos deum chefe. Um, dentre todos os chefes das aldeias, era escolhido como autori-dade maior, tendo como critrio a descendncia do fundador da comunidade.

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    Os haas eram grandes agricultores, teceles as terras erampropcias ao cultivo de algodo , artesos de couro e ferreiros. Kano erauma das principais cidades haas, com terrenos frteis para a produode cereais, algodo, e rica em minrio de ferro. Comercializavam escravosem troca de cavalos ao norte e ao sul.

    No sculo XV, Kano dedicava-se, essencialmente, ao cultivo de sorgo,arroz, milhete, algodo, pimentas e s manufaturas em couro (sandlias,rdeas, almofadas), algodo, cobre e ferro. O comrcio desses produtos,mais o sal, vindo de Bilma, o natro (um produto equivalente ao sal,utilizado para fazer medicamentos, sabo, curtir a carne e o couro, etingir tecidos), oriundo do Chade, os escravos, a noz-de-cola e o marfimera realizado com Air, Songai, Bornu, Nupe e com os cuararafas,conhecidos como o povo do sal, responsveis pela extrao e comrciodesse produto na regio entre Gongola e Benu.

    No sculo XVII, o sal chegou a ser o produto mais importantecomercializado na frica Ocidental. Os haas utilizavam mais decinqenta palavras para diferenciar os tipos de sal. Ele era produzido porescravos em grandes reservas no Saara e transportado para o sul, em especial,por tuaregues em caravanas de vinte a trinta mil camelos e vendido em trocade ouro e cereais da savana.

    O reino haa de Gobir, formado pelos gobirauas, habitantes dasmontanhas do Air que, a partir do sculo XI, foram para o sul, empurradospelos berberes, tornou-se um centro importante de comrcio de cobre,trazido de Takedda e de ouro de Zamfara. Outro Estado haa, tambmimportante centro comercial de ouro, escravos, marfim, noz-de-cola, eraZazau, ao sul. Sua capital era Dutsen-Kufena, atual cidade de Zria.

    Quanto religio, os haas acreditavam na existncia de um sersupremo Ubanjiji e em outros seres ou foras iscquis responsveispelo destino das pessoas. Em geral, os iscquis eram relacionados aoselementos da natureza, rvores, fontes dgua e bosques. Na cidade deKatsina, havia um santurio conhecido por Bauda e um centro de apren-dizagem das religies tradicionais, cujas cerimnias de entronizao erambaseadas nessas crenas.

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    Nos sculos XV e XVI, os haas sofreram vrias transformaes. Ospequenos estados integraram-se em reinos, talvez por influncias externas,sobretudo pelo contato com o reino do Mali. Cidades como Kano e Katsina,grandes centros comerciais e artesanais, foram cercadas por muralhas. Naprimeira, a muralha abarcava 7 km2. Administradores foram nomeados,mais cavalos foram importados, a pilhagem de escravos entre os povos dosul foi intensificada e a classe dominante passou a praticar o islamismo,gerando conflitos entre seus governantes adeptos ao Isl e os sditos quecontinuavam fiis s crenas tradicionais.

    Essas mudanas polticas tambm podem ter sido promovidas pornovas condies militares, sobretudo a partir do sculo XIII, com o uso decavalos de raas maiores. Os cavalos eram to importantes nessa regio querepresentavam status social, custando, em mdia, entre 9 e 14 escravos, nacosta da Senegmbia.

    A utilizao da cavalaria nas guerras promoveu o aumento donmero de escravos. Por um lado, porque os escravos eram utilizadoscomo moeda de troca pelos cavalos e, por outro, porque com os cavalosera mais fcil capturar escravos. A maior parte dos escravos eram mulheresdestinadas ao trabalho domstico, servindo tambm como concubinas.Os homens escravos trabalhavam como criados, artesos, soldados,carregadores, funcionrios pblicos e agricultores.

    OS ESTADOS DA FLORESTA OCIDENTAL

    OS ACS

    Na floresta, existiam pequenos agrupamentos de povos de lngua ac,que, a partir do sculo XVI, se expandiram formando estados. Essa expansofoi incentivada, sobretudo pela explorao do ouro, contribuindo para acompra de escravos utilizados na abertura da floresta. Begho, habitado j nosculo XI, era o centro comercial dos acs, ligando-os a Jenn e ao Mali.

    O reino mais antigo entre os acs era Bono, localizado numa reafrtil, povoado por volta do sculo XIII. E Bono Manso era a sua capital.Formado pelo povo brom, falantes de um dialeto ac, esse reino foi um

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    importante produtor e mercado de ouro, trocado por escravos jalofos,sereres, bambaras, dogons, fulas, haas, mossis, tucolores, grunces,baribas, trazidos pelos diulas.

    Entre os acs, o cobre era to importante quanto o ouro. Eraconsiderado mgico e utilizado em cerimnias importantes. Em troca doouro em p ou em pepitas, os acs recebiam bacias, jarras, panelas,bandejas e manilhas em cobre. Esses objetos eram derretidos e o cobretransformado em novas peas com desenhos trabalhados maneira ac,destinadas aos tmulos e santurios.

    As conchas vermelhas, vindas das Canrias, tambm eramprivilegiadas pelos acs, pois eles acreditavam no seu poder sobrenaturale na propriedade de afastar raios, sendo utilizadas no peito, nos barretese bainhas das espadas.

    Os acs recebiam, em troca do ouro, vinho branco, pimentas, mbar,gatas, coral em forma de contas e miangas, produzidas em Veneza, noMediterrneo, na Tunsia e em Barcelona. Os ungaras ou diulas utilizavamos escravos como moeda de troca pelo ouro. Com um nmero cada vezmaior de escravos, os acs expandiam-se, buscando mais ouro, derrubandoas matas e criando novas comunidades agrcolas.

    IF

    H milhares de anos, na rea ao sul, a sudeste e a sudoeste dos riosNger e Benu, habitavam povos de lnguas edo, idoma, iorubano, ibo,ij, igala, nupe, entre outras, originrias da famlia lingstica nger-congo.Esses povos agricultores, produtores de sorgo, milhete, quiabo, feijo,inhame, dend, organizavam-se fundamentados na linhagem, constitudapela famlia extensa com um antepassado comum. O conjunto de vriaslinhagens formava a aldeia, que tinha um chefe como representantepoltico, eleito entre os mais velhos ou por ser descendente do fundadorda comunidade. A unio das pequenas aldeias compunha, assim, umaespcie de miniestado, inexistindo um poder centralizado.

    As decises referentes vida coletiva no miniestado eram tomadas emconjunto pelos chefes das linhagens e pelos representantes dos grupos deidade e das associaes de titulados. Os homens dividiam-se socialmente em

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    grupos de idade (jovens, adultos e idosos). Os idosos eram os mais respeitadose responsveis pelas questes polticas, judicirias e religiosas. Por sua vez, nasassociaes de titulados, os homens que possuam uma quantidade maior debens ligados terra, como produtos agrcolas e animais, recebiam ttulos querepresentavam a sua riqueza e o seu poder na sociedade.

    Cada miniestado tinha um chefe (oba, onu, ovie, etsu, oche, nasdiferentes lnguas faladas na regio), escolhido entre aqueles que j haviampercorrido vrios estgios nos grupos de idade e nas associaes de tituladose pertenciam s linhagens mais importantes. Com o passar do tempo,esses miniestados expandiram o comrcio, novos grupos foram fixados,proporcionando o aumento do poder do seu chefe, dando origem a umacidade-estado.

    Os principais reinos nessa regio teriam se formado pela presso depovos imigrantes e fortes militarmente, objetivando a expanso de seusdomnios, invadiram e se impuseram aos miniestados, introduzindoinstituies polticas novas centralizadas na figura de um rei.

    H indcios arqueolgicos de que If foi formada desde o sculo VI,por pequenas aldeias agrcolas de modesto comrcio. Somente mais tardetornou-se um centro importante, em razo do desenvolvimento dametalurgia do ferro e tambm da sua localizao geogrfica na rota entreo alto Nger e Cotonu, passando a se configurar um entreposto comercialentre a savana, a floresta e o litoral. De If para Ga (ao norte), para ascidades haas e para os povos de Ijebu (ao sul) eram levados ouro, marfim,dend, sal, pimentas, noz-de-cola, inhame, escravos, contas de pedra evidro, peixe seco e gomas.

    If tambm era, alm de uma cidade-estado, um centro religioso querecebia tributos e congregava outros miniestados, que acreditavam na existn-cia de um ancestral comum o rei Odudua. De acordo com uma das vriasverses para a origem de If, o rei Odudua teria sido filho de um dos reis deMeca e o grande fundador do reino de Il If, depois de perseguido e expulsoda sua cidade natal por rejeitar o islamismo. Outra verso revela que Oduduaera lder de um grupo em expanso vindo da Haualndia, Bornu, Nupe ouCanem e que conseguiu centralizar o poder em suas mos e fundar If.

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    As imagens em bronze, cobre e, sobretudo, terracota produzidasem If, datadas por volta dos sculos XI ao XV, tornaram-se referncias daarte subsaariana. Essas esculturas sofreram a influncia da cultura Nok,datada do primeiro milnio a.C. As figuras humanas, que, provavelmente,representavam reis e cortesos, possuam traos perfeitos, harmoniosos,e eram adornadas com contas e panos em partes do corpo. Algumasesculturas traziam na face sinais, como se fossem linhas, que ligavam oscabelos ao queixo.

    Existiam tambm cabeas de animais com uma roseta saliente natesta, simbolizando a realeza, feitas em tampas para recipientes de barroutilizados em rituais religiosos. Esses potes eram enterrados, emhomenagem a um determinado deus, nos palcios e nas casas, em ptioscobertos por piso de cermicas e com altares circulares.

    If sofreu um declnio econmico e talvez tenha sido substituda,a partir do sculo XVI, por Oi nos contatos comerciais entre a savana e afloresta e, por Benin e Ijebu no comrcio com o sul. Contudo, continuoua figurar como um importante centro religioso.

    CULTURA NOK

    A cultura conhecida como Nok (cerca de 900 a.C. at os sculosII ou III d.C.) compreendia o territrio entre os rios Nger e Benu,aproximando-se do lago Chade. Os povos de cultura Nok eramespecialistas em metalurgia de ferro e cobre, fabricavam utensliosdomsticos, pontas para lanas e flechas, argolas como enfeites parabraos e tornozelos.

    Tambm dominavam a tcnica de esculturas em terracota comtamanhos de 9 cm a 1,20 m de altura, com penteados variados e colaresde contas e pulseiras de quartzo e estanho. H indcios de que essasesculturas eram fabricadas por pessoas que viviam em casas de taipaconstrudas em aldeias agrcolas e que cultivavam inhame, milhete, dend,sorgo e abbora. Ficavam distantes das rotas transaarianas, masprovavelmente participavam do comrcio entre a floresta e a savana.

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    BENIN

    Benin era um dos miniestados dos povos edos que habitavam, hmilhares de anos, a regio de florestas a oeste do rio Nger. Esse miniestadotinha um chefe (ovie ou ogie) que representava a unidade de vriascomunidades administradas pelas linhagens, associaes de titulados egrupos de idade.

    Diz a tradio que, entre o final do sculo XII e o incio do sculoXIV, teria Odudua, o rei de If, enviado a Benin Orani, seu filho maisnovo ou neto (depende da verso), a fim de resolver um entrave na sucessodo poder entre os chefes locais edos. Depois de algum tempo na regio,e casado com a filha de um chefe edo, Erinuinde, Orani teve um filho,Eueca, que deixou como ob (rei) do Benin, e voltou para If.

    No Benin, os mais velhos possuam o poder de legislar sobre asterras e os costumes das aldeias agrcolas e orientavam o trabalho dosoutros grupos. Reuniam-se nos santurios em homenagem aos seusancestrais para resolver os problemas e as disputas da comunidade. Osadultos cuidavam da proteo e das tarefas mais importantes e os jovens,por sua vez, ficavam encarregados de entregar ao ob os tributos.

    No Benin, a divindade mais adorada era o Olokun, que propiciavaa riqueza e contemplava as mulheres com filhos.

    Por volta do sculo XIII, o ob Euedo, descendente de Orani,expandiu os limites do reino e buscou concentrar o poder nas suas mos,indispondo-se com os chefes locais.

    Benin no era um grande produtor agrcola, pois as terras da florestano eram muito frteis, embora seus habitantes cultivassem inhame,melo, feijo, pimentas de rabo, anileiras e algodo. No entanto, ocomrcio era muito importante, pois Benin era um ponto de encontrode mercadores. Eles utilizavam como moeda barras e manilhas de cobre,pedaos de ferro e os cauris. A expanso tomou a direo das rotascomerciais com o objetivo de controlar as atividades mercantis e dominaroutros pontos, como Aboh, Onistsha, Eko, entre outros.

    A expanso do reino do Benin continuou por anos, conquistando-se, com a ajuda de um grande exrcito, mais de duzentas cidades ou

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    aldeias no norte do pas edo, na regio dos ibos (ao ocidente do rio Nger),e tambm no Iorubo, e cidades-estado como Owo.

    Owo estava localizada entre If e Benin, e tambm produzia esculturasem terracota, com formas e temas que mostram a influncia da artedo Benin. Mas, de forma diferente da arte de If, as esculturas em terracota doBenin representavam figuras humanas com traos fortemente marcados.

    No entanto, o reino do Benin no conseguiu controlar todas asregies habitadas pelos edos; o caso dos habitantes das montanhas donorte que mantiveram sua organizao poltica e seus miniestados.

    OUTROS POVOS IORUBS

    A tradio oral dos vrios reinos e cidades-estado formados porpovos conhecidos como iorubs conta que estes foram fundados pelosdescendentes de Odudua, como Akure (cidade-estado e entrepostocomercial do Benin), Ir (a 22 km de Ado), o reino de Ondo (entre If eEkiti) e o pas dos ijexs (ao norte de Ondo).

    O reino de Oi tambm teria sido criado por Orani, o j citadodescendente de Odudua, mas com a participao dos baribas e dos nupes.

    No final do sculo XV, Oi j era um grande reino com influnciasobre diversas cidades-estado, como Igobon, Ajasse-Ipo e Iresa, obtidapor meio da guerra ou em troca de proteo dos ataques dos nupes ebaribas. Alm da importncia comercial, Oi era grande especialista emtrabalhos em couro. A organizao poltica baseava-se na linhagempatrilinear. Cada linhagem formava uma comunidade de moradiasdelimitadas fisicamente por muros. O conjunto de vrias comunidadescompunha uma espcie de bairro com um chefe. O cargo de rei,provavelmente, era em parte controlado pelos chefes das linhagens maisimportantes, que o elegiam.

    O rei alafim tinha um poder sagrado, originrio dos orixs,aos quais se uniria depois de morto. Possua vrios escravos, muitos dosquais eunucos, e seu exrcito era comandado por soldados profissionais.Era tambm quem administrava a justia, somente ele determinava apena de morte.

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    Os nupes, tambm conhecidos como tapas, eram povos quehabitavam as terras de confluncia do rio Nger com Kaduna. Eramgrandes cavaleiros, que destruram a capital do reino de Oi. Produziamferro e comercializavam com os haas produtos como a cola, vinda dospovos do sul, com quem trocavam escravos eunucos por cavalos. Otrabalho em vidro era tambm valorizado.

    No sculo XV, formavam pequenos reinos, alguns tributrios dosigalas, povos habitantes entre os rios Nger e Benu. Os igalas viviam emaldeias que foram se juntando em pequenos estados e chegaram a formaro reino de Idah, que mantinha, nesse perodo, contatos freqentes comos iorubs e com Benin.

    Na atual cidade de Lagos, a sudoeste de If, habitavam os ijebusem aldeias-estado, cujo poder se concentrava num chefe e nos conselhosformados por representantes das linhagens. Mais tarde, formaram os reinosIdowa, Ijebu-Igbo, Owo-Ikija e o mais importante deles, Ijebu-Ode,especialista em objetos fabricados com metais preciosos.

    Os ijebus eram grandes agricultores, teceles e comerciantes depresas de elefante, escravos e tecidos, vendidos mais tarde no Brasil, comopanos da costa.

    Prximos aos ijebus estavam os egbas, entre os rios Oba, Ebute-Meta, Oxum e Yewa, reunidos em cidades-estado, que formavam umaconfederao. Nessa sociedade no existiam famlias reais. De acordocom as tradies, o rei era eleito ou indicado num ritual de adivinhao,entre aqueles que compunham uma elite de homens bons, originriade Oi ou de If.

    Entre os iorubs, as divindades eram conhecidas como orixs. Cadaindivduo deveria cultuar um orix especfico, revelado por um adivinho.A adivinhao era conhecida por ifa e o especialista mencionava um verso,dentre inmeros que memorizava, apropriado para a situao de quem oprocurava. Quem tinha a devoo por um mesmo orix, formava umtemplo para o seu culto com imagens e praticava rituais de devoo.

    Os ibos, povos que ocupavam a regio a leste do rio Nger, habitavamaldeias e se dedicavam pesca, ao comrcio, ao cultivo de dend, feijo,

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    banana e inhame e criao de animais de pequeno porte, como cabras egalinhas. No chegaram a formar um Estado centralizado, nem tiveram afigura do rei. Organizavam-se em linhagens, associaes de titulados egrupos de idade, cujas decises eram tomadas depois de consultado umorculo. Produziram vrias peas em bronze, ferro, cermica e cobre, tecidos,bem como contas de pedra e vidro, como revelam as escavaesarqueolgicas feitas no sculo XX na cidade de Igbo-Ukuwu.

    Formavam suas comunidades tendo como centro os locais dereunio e de mercados. Em torno destes eram construdas as moradias,cercadas por palmeiras, depois por terras cultivadas e, por fim, pela floresta,que acreditavam habitada por espritos maus e caadores guerreiros.

    De maneira diferente da arte de If, na qual a maior parte dos objetosera em lato, os ibos faziam suas peas em bronze e os braceletes e pulseirasem cobre. Os indcios arqueolgicos apontam para a produo dessas peasentre os sculos VIII e XI, e da metade do sculo XIV ao sculo XV.

    OS ESTADOS DA FLORESTA OCIDENTAL

    ESTADOS POCA POVOS PRINCIPAIS PRODUTOSCOMERCIALIZADOS

    Bono c. XIII acs ouro

    If c. VI edo, ibo, nupe, ouro, marfimij, igala, iorub noz-de-cola, escravos

    Benin c. XII-XIV edos pimentas de rabo,anileiras e algodo

    Oi c. XV iorubs couro

    nupes (tapas) ferro, cola, vidro

    Idah igalas agrcolas

    Ijebu-Ode, ijebus metais preciosos, escravos,Idowa, tecidos (pano-da-costa)

    Ijebu-Igbo,Owo-Ikeja

    egbas, ibos objetos em bronze, ferro,

    cobre, contas em pedra e vidro

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    Principais reinos, Estados e cidades da frica.

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    A FRICA ORIENTAL

    AS CIDADES-ESTADO DA COSTA DO NDICO

    O comrcio na costa do ndico, conhecida como Aznia, data deantes dos primeiros sculos da nossa era e tinha a participao de rabes,persas e romanos, que traziam machados e lanas de ferro, tecidos,cermicas e acar, e levavam marfim, peles de pantera, tartarugas, incensoe chifres de rinocerontes.

    No sculo VI, nas terras prximas ao rio Juba ou a Lamu, existia oreino Xunguaia, que talvez tenha originado a cultura suali. Seus habitanteseram caadores e agricultores bantos e pastores cuxitas. Outros afirmamque os sualis seriam agricultores bantos, vindos dos Grandes Lagos e dasmontanhas de Kwale, que desde o ano 500 se expandiram pela costa.

    Em vrias cidades-estado da frica Oriental, como Quloa, Mogadixo,Mombaa, Moambique, Zanzibar, Mafia, Melinde, a organizao polticaconcentrava-se na figura de um sulto ou xeque, que governava com oapoio de um conselho, aparentemente com base nas leis islmicas.

    Os negros eram a maioria dos habitantes nessa regio, mas j haviamuitos mestios. Joo de Barros descreve as impresses da frota de Vascoda Gama ao chegar ao rio Quelimane:

    O gentio que habitava borda dele, deu grande nimo a toda a gente, paraquo quebrado o levava, tendo tanto navegado, sem achar mais que negrosbrbaros como os de Guin, vizinhos de Portugal. A gente deste rio perque tambm fosse da cor e cabelo como eles eram, havia entre eles homensfulos que pareciam mestios de negros e mouros, e alguns entendiampalavras de arvico.

    Nessas cidades-estado os exrcitos no eram fortes, nem muitograndes. Tinham como armas lanas, arco e flecha. As cidades noapresentavam muralhas, levando a crer que no precisassem ou evitassementrar em guerra com os povos vizinhos, preferindo as alianas. Seushabitantes dedicavam-se, essencialmente, s atividades mercantis.Comercializavam com vrias localidades do interior e as mercadorias eram

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    levadas para vrios pontos da costa, embarcadas em zambucos ou pangaios(embarcaes feitas com pedaos de madeira presos por cordas). Ocomrcio era realizado da seguinte forma: do interior vinha o marfim, aspeles e o ouro, em troca as cidades localizadas prximas ao litoral ofereciamo ferro, contas, panos e cauris. Os escravos tambm eram trocados,raramente obtidos em ataques s aldeias vizinhas.

    De fora do continente africano chegavam, sobretudo em grandesnavios rabes e indianos, mercadorias de luxo, entre elas contas de vidroe cauris das Maldivas. Os mais abastados faziam suas refeies em tigelasde loua chinesa ou persa. J os mais pobres comiam em torno de umagrande panela comunitria, em geral, de cermica.

    J no sculo IX, a cidade de Quloa tinha um comrcio significativo,apesar do aspecto rstico de suas moradias de barro e telhados de folhasde palmeiras. Sobre essa cidade h uma das mais antigas narrativas escritassobre a frica Oriental: A crnica de Quloa, da primeira metade do sculoXVI. Seus habitantes eram pescadores bantos, conhecedores da metalurgiado ferro e do cobre e produziam objetos de cermica vermelha.Estabeleceram o comrcio de peixe seco, frutas, cereais, sal e gado comos povos do interior e com outros pontos do litoral, utilizando cauriscomo moeda. Mais tarde, talvez por influncia dos contatos commercadores muulmanos, o comrcio em Quloa tenha includo outrosprodutos, como marfim e peles destinadas Arbia, ndia, Prsia e China.

    Existiam, na cidade, vrios prdios de trs ou quatro andares,construdos uns juntos aos outros, e casas, em geral com duas salas seguidasde quartos. As portas eram trabalhadas em pedra-coral, com desenhos quesimbolizavam espinhas de peixe. Havia quase sempre um ptio abaixo donvel principal, uma sala e uma varanda entre esses dois ambientes. Nasparedes colocavam-se vasos e at os muros eram trabalhados em madeira.A maior parte dos habitantes era negra e possua escarificaes no rosto.Cultivavam algodo, legumes, cebolas, milhetes, laranjas, limes, coco,feijes, pimentas, jambos, bananas, roms e cana-de-acar. Completavama alimentao com peixes, galinhas, cabras, bois e carneiros.

    A partir dos sculos XII ou XIII, Quloa desenvolveu-se ainda mais e sefirmou como ponto comercial. Mercadores de Mogadixo, uma outra cidade

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    mercantil, estabeleceram-se em Quloa. Os habitantes de Mogadixo viviamsobretudo do cultivo de arroz, legumes e da criao de gado. Faziam pratosabundantes, como o pur de bananas verdes com leite ou coalhada com li-mo, pimenta, gengibre e manga. Vestiam tnica e manto e usavam turbantena cabea. Mogadixo produzia tecidos em algodo, muito requisitados eexportados para o Egito. Escravos e marfim eram para l exportados.

    As influncias da Arbia, da Prsia e da ndia, proporcionadas, emgrande medida, pelas relaes comerciais no ndico podem ser notadasem vrios aspectos, na arquitetura das construes, das fachadas, dostmulos etc. Desse perodo so as construes em pedra unidas por massade cal, caractersticas dos templos religiosos com tetos planos e de pilaresde madeira em Mfia, e da grande mesquita de Quloa.

    Na segunda metade do sculo XIV, Quloa sofreu um pequenodeclnio, talvez por conta da concorrncia e da conseqente perda domonoplio do comrcio de ouro com Sofala. Mas, j no incio do sculoXV, com um novo crescimento do comrcio a distncia, a partir dasnavegaes no ndico, Quloa voltou a progredir.

    Depois dessa retomada de fora, o poder em Quloa passou a seconcentrar no conselho dos notveis, gerando problemas na sucesso dossultes e, conseqentemente, acarretando crises polticas. Por outro lado,muitas outras cidades desenvolveram-se, como Mombaa, Zanzibar,Melinde. J no incio do sculo XV, Mombaa teve um ntido crescimentoeconmico. Desde o sculo XII, Melinde e Mombaa eram conhecidas porconta de suas minas de ferro, cuja produo era exportada para a ndia.

    O GRANDE ZIMBBUE E O REINO DO MONOMOTAPA

    Os povos bantos chegaram regio dos rios Zambeze e Limpopopor volta da metade do primeiro milnio, trazendo consigo a prtica daagricultura, do pastoreio e da metalurgia. Em Mabveni, Gocomere eMalapati encontraram-se sinais de aldeias dos sculos II, IV, VI e IX, comdepsitos de cereais e casas de pau-a-pique e de argila com cascalho,pedaos de ossos de impala, bfalo, zebra e caprinos. Havia tambm

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    utenslios de cermica, vasos decorados com relevos, tigelas e enfeites.Essas peas faziam parte da cultura Goncomere.

    Prximo s montanhas de Inianga e na regio do rio Mozo surgiu,entre os sculos IV e XI, uma cultura semelhante Goncomere, conhecidapor Zua. Em tmulos e restos de construes, descobriram-se utensliosde cermica, cobre e ferro, alm de gros e cauris.

    Na regio localizada entre os rios Zambeze e Limpopo, havia muitasjazidas de ouro, datando do sculo XIII os primeiros indcios da exploraodesse metal. O trabalho era realizado em poos com mais de 30 m deprofundidade, com a participao de homens, mulheres jovens e crianas.A exportao de ouro chegava a mil quilos por ano.

    Entre os sculos X e XI, um grupo formado pelos xonas estabeleceu-se num monte de terras frteis, sem a presena da mosca ts-ts, prximoao rio Lndi e que daria origem ao Grande Zimbbue. Os xonas teriamescolhido esse monte por consider-lo sagrado. At hoje eles vivem nessarea e reverenciam, nos montes, o deus supremo Muri atravs dosancestrais, que so os intermedirios entre os homens e o divino. Com oprestgio religioso que tinham e o recebimento de tributos de povos vizinhos,conseguiram se desenvolver e estabelecer redes comerciais.

    Muitos acreditam que os xonas se fixaram nessa regio devido liderana que assumiram por meio de seus numerosos rebanhos e daproduo de armas, com as quais promoviam guerras. Alm disso,cobravam tributos dos mercadores que por ali passavam e, mais tarde,controlaram as rotas comerciais de ouro entre as minas e o litoral. OGrande Zimbbue contava com uma localizao geogrfica privilegiada,estando prximo s reas mineradoras e no caminho direto para a costa.Atingiu uma populao total entre 11 e 18 mil habitantes.

    Eram grandes construtores de muralhas de blocos de granito, quecercavam as moradias dos governantes feitas de sap e daga (massa resistentefeita da mistura de argila, cascalho, esterco e cupinzeiro triturado). No sculoXIII, existiam dois conjuntos de muralhas no alto do monte, conhecido comoAcrpole, onde ficavam os governadores. Um desses amuralhados eracomposto por 14 moradias construdas de daga. O outro recinto era reser-

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    vado aos rituais religiosos com terraos, nos quais eram colocadas esculturasem pedra-sabo de, mais ou menos, 40 cm de altura, com imagens depssaros, gavies e falces, em homenagem aos ancestrais.

    Esses cercados de pedra tambm existiam nas terras abaixo do montee serviam para delimitar a rea de casas de uma mesma famlia. Outrasmajestosas construes de granito foram feitas pelos xonas: uma torre deaproximadamente 9 m de altura, um recinto circular com cinco casas,um paredo no concludo, uma grande muralha elptica de 240 m decircunferncia e 7 m de altura, que cercava esses dois ltimos monu-mentos, sendo esta a maior construo da frica Subsaariana anterior chegada dos portugueses.

    Prximos ao Grande Zimbbue, no planalto entre os rios Zambeze eLimpopo, existiam grupos habitacionais menores, chamados zimbabus, quesignifica corte, casa de pedra ou casa do chefe, na lngua dos xonas. Cadarecinto amuralhado continha cerca de oito moradias. Nesses lugares talvezficassem os chefes de reinos tributrios ou capitais de reinos independentes,mas originrios do Grande Zimbbue. Os zimbabus localizavam-se, maisespecificamente, nos planaltos prximos ao rio Mozo, dos afluentes doLndi e do Save e ainda em Manhiquene, em Moambique. E fora deles aindaexistiam vrias outras cabanas que compunham a vila ou a cidade.

    Entre os sculos XIII e XV, havia um intenso comrcio de cermicas,produtos agrcolas, de cobre vindo da Zmbia e de Chaba, sal, ouro emarfim, enviados at a costa. De fora, chegavam tecidos indianos,porcelana da China e da Prsia, peas em vidro da Sria e outrasmercadorias de luxo. O Grande Zimbbue era o principal centro mercantildo ndico, pois tinha o monoplio do comrcio de ouro que era levadopara Sofala e de l embarcado para Quloa.

    O gegrafo Al-Masudi, que viajou a costa oriental at o atualMoambique, por volta do ano 922, j destacava a importncia docomrcio de ouro e marfim que eram embarcados para Sofala e da paraa ndia e China. O soberano desse grande Estado possua ttulos comoo filho do grande chefe, o deus da terra e do cu e, provavelmente, foio responsvel pelas primeiras construes em pedra do Grande Zimbbue,que datam aproximadamente do sculo IX.

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    Por volta do sculo XV, o Grande Zimbbue entrou em decadnciapor vrios motivos: a diminuio das guas do rio Save, que davam acessoao litoral, a presena da ts-ts, prejudicando a criao de gado, crescimentopopulacional, esgotamento dos solos e de animais para a caa. Tudo issolevou o soberano Niatsimba Mutota a estabelecer, na segunda metade dosculo XV, uma nova capital do reino mais ao norte, na regio do Dande,entre os rios Mazo e Hunyani. Uma outra verso revela que nessa rea foramcriadas vrias dinastias carangas, ligadas ao Grande Zimbbue, que viajaramem busca de melhores terras para a agricultura e a pastagem, e de ouro, sale cobre, prximas aos afluentes do rio Zambeze.

    Os reis carangas eram conhecidos como monomotapa, que queriadizer o senhor dos cativos, o senhor de tudo, o senhor das terrasdevastadas, o senhor de todos os vencidos na guerra ou ainda o filhoda terra. O monomotapa era considerado por todos um rei divino e quepossua o poder de se comunicar com o ser superior atravs dos mdiuns.Alm destes, era cercado e deveria governar em consenso com os grandeschefes e os funcionrios (governadores dos reinos, mordomo-mor,sacerdotes, comandantes dos exrcitos) e de acordo com os costumes dasociedade. O rei teria uma espcie de conselho formado por nove esposas(nesse caso, a palavra esposa representava um ttulo), duas das quais eramsuas irms ou parentes e exerciam funes polticas. Uma outra esposadestinava-se aos deveres sexuais e as demais atuavam como ministras. Osfilhos dos reis eram gerados com as concubinas.

    A corte e a nobreza vestiam-se com uma tnica de seda ou algodoimportados e bordada a ouro; alm disso, usavam colares, braceletes epeles de leopardo. O monomotapa vestia-se com uma bata de algodo,produzida em suas terras, para que ningum pudesse causar-lhe mal algumpor meio de suas vestimentas. A populao em geral usava tangas de pelede animais ou de entrecasca de rvores.

    O reino ficava restrito ao territrio dos rios Zambeze, Mazo,Luenha, Dande e Huambe e cordilheira de Unvucu e ao vale doZambeze. Existiam ainda os territrios de povos tributrios chefiadossob a influncia do monomotapa.

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    A principal cidade era Ingombe Ilede, que fazia concorrncia como Grande Zimbbue, localizada sobre o rio Zambeze, alm do Cafu.Nela, h vestgios de habitaes desde o segundo milnio, mas foi nosculo XIV que, com uma populao maior, tornou-se um importantecentro produtor de sorgo, algodo, sal, de criao de bois e cabras, demanufatura de cobre e cermica e, claro, ponto comercial na regio dorio Zambeze, em que o sal era trocado pelo marfim de Guembe e o cobrede Urungu. Com o Grande Zimbbue comercializava, essencialmente,o cobre e o sal, em troca dos quais recebia ouro e ferro. Na costa, o cobree o marfim eram trocados por miangas e tecidos.

    No final do sculo XV, Ingombe Ilede foi abandonada pelo reiMutota, que se transferiu para Dande, promovendo a sua decadncia.

    FRICA CENTRO-OCIDENTAL

    OS REINOS LUBA E LUNDA

    Nas terras ao longo do rio Zaire e nas savanas ao sul da florestaequatorial, os povos bantos predominavam, desde o fim do primeiromilnio da nossa era.

    Os vestgios arqueolgicos em Sanga e Katoto, no alto rio Lualaba,apontam que nessa regio, por volta do sculo XIII, surgiu o Estado Luba.Trs sculos depois, esse estado expandiu-se, incorporando mais aldeias,que passaram a integrar um Imprio.

    O reino era composto por vrias aldeias, que elegiam um representante(quilolo), entre aqueles da linhagem de senhores da terra, cujo poder era here-ditrio. Cada aldeia era comandada pelo patriarca da linhagem ou, se formadapor mais de uma linhagem, o mais importante delas. A figura do rei era sagrada.Dotado de uma grande fora (bulpue), possuda somente pelos descendentesde Calala Ilunga e Congolo (grandes chefes guerreiros, criadores do ImprioLuba), o rei era responsvel pela proteo, fertilidade e prosperidade de todos.Comandava, com o apoio dos governadores das provncias, escolhidos porele dentre os descendentes dos grandes chefes guerreiros.

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    Os lubas cultuavam seus ancestrais por meio de mdiuns e produziamas famosas esculturas em madeira para homenage-los.

    No vale do Kalany, no rio Bushimai, viviam, em pequenas aldeiastambm formadas por linhagens, grupos de agricultores e pescadores deorigem lunda. Os chefes de cada aldeia (cabungu) eram senhores daterra, respeitados pelos seus poderes espirituais e pela sua idade.

    Quando a populao da aldeia crescia, um grupo formava outra aldeia,chefiada por um filho, um irmo ou um outro parente do cabungu. A novacomunidade preservava os vnculos polticos com a aldeia de origem. Porexemplo, uma comunidade fundada por um irmo do cabungu mantinhaesse lao de parentesco e seus futuros chefes continuavam sendoconsiderados irmos do cabungu, mesmo no existindo de fato essa relaoconsangnea. Assim, formava-se uma espcie de confederao, na qualcada chefe se relacionava com os outros, com base num parentesco perptuo,sendo tido como irmo, pai ou filho deles, ainda que no existissemnecessariamente laos consangneos entre eles.

    Por volta do sculo XV, depois de vrias disputas entre as diferentesfaces lundas, a confederao das linhagens centralizou o poder. Apoiadapor um rei luba, instituiu uma nova estrutura poltica com base na figurade um rei divino. A centralizao do poder promoveu a expanso doslimites do reino, com a incorporao de novas aldeias, no obrigato-riamente lundas, entre os vales do Kalany, o Cassai e o Lulua.

    Alguns grupos de opositores, que no estavam contentes com a novaestrutura poltica, abandonaram o Imprio Lunda em busca de um novoterritrio e se impuseram, militarmente ou pelo seu prestgio, aos povos jestabelecidos, como os quiocos e os songos. Um desses grupos dirigiu-se aoeste, em direo Angola, levando a cultura e a tradio das chefias lundaspara essa regio.

    O REINO DO CONGO

    Na regio do baixo rio Zaire havia, desde os primeiros sculos dosegundo milnio da nossa era, ao menos, trs formas de representao dopoder. Uma delas era a chamada canda, baseada nos ancestrais, nos

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    primeiros ocupantes do territrio, e representada pelas linhagens. Existiamtambm as organizaes em torno do solo, cujo chefe era o quitome(iniciado) ou zimba (zumba, calunga), que quer dizer senhor da terra econhecedor do ofcio de ferreiro. Reconhecia-se nele o poder de propiciara fertilidade, a prosperidade e de chamar a chuva. E uma outra forma depoder era o originrio dos espritos celestes. Os detentores desse poder(cariapemba) eram conhecidos como gangas e poderiam utiliz-lo paraconseguir proteo, riqueza, sade, mas tambm para promover adestruio, por meio de objetos (fetiches ou inquices), como conchas,pedras, esculturas em madeira, saquinhos de pano com ervas, no qualficava guardada essa fora sobrenatural.

    As religies da rea equatorial da frica Ocidental, dos povos de lnguabanta, acreditavam em um ser criador, em espritos de ancestrais e danatureza, possuam amuletos e praticavam rituais encabeados por espe-cialistas. No reino do Congo, no sculo XV, as linhagens matrilineares comu-nicavam-se com os ancestrais em rituais realizados nos tmulos. Os espritosda natureza controlavam a fertilidade da terra, to importante para a sobre-vivncia, e comunicavam-se com os humanos por meio de rituais de possesso.

    Tudo o que no era natural, como a infelicidade, as doenas e ainfertilidade, poderia ser provocado por feitiarias, e seus praticantes eramperseguidos. No reino do Congo, no sculo XVI, os feiticeiros e os bruxoseram divididos entre os que tinham uma fora maligna inata ou estavamsob a possesso de um esprito maligno e os que utilizavam proposi-talmente o poder dos espritos para fazer o mal.

    Por volta dos sculos XIV e XV, o chefe de uma canda ao norte do rioZaire, Antino-Uene ou Nimi a Luqueni, decidiu com o seu grupo fundarBanza Congo. Nesse local havia um quitome (senhor da terra) que permitiuque Antino se casasse com sua filha e lhe atribuiu o ttulo de manicongo(o senhor do Congo).

    O manicongo vestia-se ricamente com panos de rfia e peles deanimais, adornado com braceletes de cobre e um barrete de cetim esandlias de fibra de palmeira. Com o mesmo requinte vestia-se a nobreza,ao contrrio da populao em geral, que utilizava panos menos nobres eno fazia uso de calados.

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    As casas eram feitas de barro e o telhado de palha. O conjunto decasas que formavam a aldeia era cercado por espinheiros. A habitao domanicongo, que ficava na capital, era bem maior. Havia vrias cabanas,com ptios e pomares, decoradas com panos de rfia.

    O manicongo possua uma guarda militar composta por escravos eestrangeiros, mas que no chegava a formar um exrcito forte paracombater uma guerra. Nesse caso, era preciso solicitar aos chefes dasprovncias o envio de mais homens e armas.

    Na regio do reino do Congo, as terras eram frteis, plantavam-se coco,banana, dend, sorgo, milhete, inhame, cola. Tambm se extraa o sal,pescava-se, caava-se, criavam-se porcos, cabras, galinhas e ces. Os homenstrabalhavam como escultores, feitores de cestarias, ferreiros e teceles. Aespecializao tambm era empregada na indstria txtil. Muitos povosteciam vegetais como a rfia, cujos panos eram muito apreciados e utilizadoscomo moeda. O algodo tambm era fiado em fuso, no se utilizando a roda,o que implicava uma pequena produo, em sua maioria, realizada pormulheres. O zimbo, uma pequena concha cinza ou perolada e retirada da ilhade Luanda, tambm era utilizado como moeda e enriquecia os tesouros dorei para eventuais pagamentos de favores.

    Ao final do sculo XV, os domnios do reino do Congo, mesmo queesses fossem apenas restritos influncia sob os chefes das linhagens,abarcavam os territrios da costa do Atlntico (a oeste), do rio Zaire atLuozi (ao norte), do rio Inquisi (a leste), do rio Loje ou rio Dande (aosul) e a ilha de Luanda, a mais de 240 km ao sul da capital, Banza Congo.

    O rei era escolhido entre os descendentes de Antino-Uede e, depreferncia, entre os herdeiros das filhas dos antigos reis, pois a sociedade eramatrilinear. A eleio do monarca ficava nas mos de quatro representantesdos mussicongos, isto , de uma elite de grandes da terra, formados porindivduos das 12 candas principais.

    Por sua vez, o rei elegia os governadores das provncias do reino doCongo: Umpemba, Sundi, Soio, Umbamba, Umpangu, Uembo, Uandu,com exceo de Umbata.

    Todos deveriam pagar tributos ao rei, desde os chefes das aldeiasat os governadores das provncias, em troca de proteo e de bens

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    materiais raros em suas terras. Com esses tributos, o rei conseguia manter-se e tambm a sua corte, pajens, funcionrios e guardas.

    O REINO DE LOANGO

    Loango era outro reino dessa regio, localizado ao norte do rioZaire, na bacia do rio Kouilou-Niari, entre a floresta de Maiombe e olitoral. Os vilis eram os habitantes desse reino e tinham o rei como umser divino, cujo smbolo era o fogo. O monarca era responsvel por todasas esferas da vida, desde a justia at o controle das foras naturais, comoas chuvas. Assim como o reino do Congo, Loango era formado porprovncias, divididas hierarquicamente, cujos chefes faziam parte de umacasta ligada ao rei. Dessa forma, quando o monarca morria, o chefe daprovncia mais importante sucedia-o. As mulheres tinham um lugardestacado no reino e eram representadas por uma corte chefiada pelaesposa, irm ou me do rei.

    Os vilis eram, em especial, agricultores, mas tambm caavam,pescavam e exploravam o sal. O comrcio era feito com os pigmeus e osbantos, trocando o sal, os panos de rfia e o cobre retirado de Teke (norte dobaixo Zaire) por marfim e outros produtos.

    REINOS DA FRICA CENTRO-OCIDENTAL

    REINOS POCA POVOS PRINCIPAIS PRODUTOSCOMERCIALIZADOS

    Luba e Lunda c. XIII lubas, lundas agrcolas

    Congo c. XIV-XV congos agrcolas, sal, tecidosde algodo e de rfia, zimbo

    Loango c. XIV vilis agrcolas, sal,panos de rfia, cobre

    Tios c. XIV tios agrcolas(tequs ou angicos)

    Andongo c. XVI ambundos agrcolas (milhete, sorgo),(Angola) (subgrupo andongo) ferro e sal

    Libolo c. XVI ovimbundo agrcolas

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    O REINO DOS TIOS

    Os povos tios, conhecidos tambm por tequs ou angicos, formavamum reino que abrangia a regio ao norte do lago Malego e os territriosdas margens do Cassai. Esse reino, cuja capital era, no sculo XV, Mbe,era muito antigo, como o Congo e o Loango. De acordo com os relatosportugueses, era at mais poderoso do que o primeiro. Formado por vriasaldeias com seus chefes locais, dos quais o poder, inclusive o do rei,adivinha da relao com o esprito da terra (anquira).

    Os tios dividiam-se socialmente entre nobreza e homens comuns.O rei era eleito entre aqueles que pertenciam nobreza e passavam porum ritual de iniciao para entrar em contato com o mais importantedos anquira Anqu Umbale e ser aprovado pelos ancestrais. A partirdesse momento, tornava-se a maior autoridade religiosa.

    O REINO ANDONGO

    Na regio entre o baixo Cuanza e o mdio Cuango viviam osambundos, falantes da lngua quimbundo. Eram vizinhos dos congos,ovimbundos, quiocos, angangelas, quissamas, sumbes, seles e mundombes.Os ambundos eram povos agricultores, cultivavam milhete, sorgo e frutos,criavam cabras, carneiros, bois e galinhas, caavam e pescavam. Eramconhecedores da metalurgia do ferro, que traziam do vale do Nzongeji edo planalto de Benguela. Tambm extraam o sal das terras de Quissama,do Libolo, da Baixa do Caanje e prximo aos rios Quiongua e Lutoa.

    A sociedade ambunda era matrilinear, embora os homensconservassem a maior autoridade. As mulheres e seus filhos pertenciam ssuas prprias famlias. Quando casavam, as mulheres passavam a morar naaldeia de seu marido, mas quando seus filhos homens chegavam puberdadedeviam se mudar para a aldeia materna e permanecer junto aos seus tios.As filhas podiam ficar na aldeia paterna at o casamento, mas quando sedivorciassem ou ficassem vivas, deviam voltar para a famlia de sua me.

    Cada aldeia era formada por uma linhagem (angundu), que possuaterras para o cultivo e pastagem. Alguns membros das linhagens recebiam

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    ttulos, como, por exemplo, o homem mais velho da linhagem, querepresentava o fundador da aldeia, ganhava o ttulo de lemba dia angundu.Era encarregado de realizar rituais de prosperidade e fertilidade, utilizandoum pedao de caulim (pemba) e p de madeira vermelha como instrumentosde fora que o ligava aos seus ancestrais e aos espritos da terra. Outros gruposimportantes no interior de cada linhagem eram o dos adivinhos ecurandeiros (quimbanda) e o dos caadores, que deviam tambm terhabilidade, dominar o arco-e-flecha, bem como poderes sobrenaturais.

    Desde o final do sculo XIII, provavelmente, os chefes de algumaslinhagens ambundas recebiam uma boneca de madeira, denominada lundaou calunga, tendo o poder de se comunicar com as foras sobrenaturais nelaexistentes. Cada lunga dominava um territrio banhado por um determinadorio ou riacho, e por conseqncia, a linhagem que a recebia passava a serresponsvel por aquela rea, dispondo das terras e recebendo tributos. Essesistema de poder, baseado no curso dgua e na terra, era hierarquizado, isto, a importncia da linhagem estava relacionada ao tamanho ou naturezado curso dgua, o qual a lunga representava. Por exemplo, a linhagem maisimportante era aquela que detinha a lunga do rio principal.

    Alguns chefes de linhagens que detinham a lunga tornaram-se reis,como aqueles das reas de Iongo (na Baixa de Caanje), do rio Moa e dobaixo Luhanda. No entanto, esses reis governavam com um poder nomuito centralizado, restringindo sua atuao aos rituais de prosperidadee fertilidade e resoluo de conflitos entre as diferentes linhagens.

    Outro objeto dotado de fora e representativo de poder entre osambundos, sobretudo do subgrupo andongo, era um pedao de metalem forma de faca, lmina ou ponta de lana, conhecido por angola. Esseobjeto, trazido supostamente pelos sambas do norte, das nascentes doLucala, no reino do Congo, pertencia linhagem e no ao territrio,como a lunga. A pessoa que guardava a angola tornava-se o chefe maisimportante da aldeia. Com o passar do tempo, o poder do detentor daangola foi se centralizando na figura do rei. J no incio do sculo XVI,esses reis com o ttulo de angola a quiluanje ampliaram ainda mais suainfluncia poltica, distribuindo partes de angolas s linhagens, tornando-as, assim, dependentes e subordinadas ao seu poder.

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    A partir desse momento, formou-se o reino andongo do angola aquiluanje, possuidor do controle da extrao de sal de Quissama e dasminas ferro do rio Nzongeji, da qual a capital ficava prxima.

    O REINO DE LIBOLO

    Outro grupo dessa regio era o ovimbundo, formado peloshabitantes ao sul do rio Cuanza, no planalto de Benguela, e falantes deumbundo. Eram agricultores, mas, em especial, criadores de bois e grandesrebanhos. Conheciam tambm a metalurgia do ferro ao menos desde osculo VIII. Muito provavelmente foram os ovimbundos os formadoresdo reino de Culembe, no planalto de Benguela, que, por sua vez, originouo reino de Libolo, ao norte dessa regio.

    Esse reino surgiu na rea do rio Ngango, afluente do Cuanza, e seexpandiu, no incio do sculo XVI para o norte, nas nascentes do rio Camboe para o sul da Baixa de Caanje. O poder na maioria desse territrio,com exceo da provncia de Haco, que seguia as diretrizes ambundas desucesso de ttulos, ligados ao parentesco e ao poder das linhagens, estavacentralizado nas mos de um rei (hango dia culembe).

    Neste captulo foi possvel notar a diversidade das sociedadesafricanas subsaarianas. Algumas delas formavam pequenas aldeiasagrcolas, outras constituam grandes unidades territoriais com poderpoltico centralizado e participavam intensamente do comrciotransaariano. Vrias sociedades professavam apenas as religiestradicionais, enquanto outras, por conta dos intercmbios comerciais,foram influenciadas pelo islamismo. Contudo, todas as sociedadesafricanas organizavam-se em torno das linhagens e dos conselhos dosancios, nas quais davam-se grande importncia aos homens mais velhosda comunidade e aos ancestrais mortos. A maioria delas praticava aescravido domstica para aumentar o nmero de membros da famliaou da linhagem. Mas, outras j incluam seus cativos no comrcio de longadistncia. Dessa maneira, foram destacadas aqui as especificidades dassociedades africanas subsaarianas e a complexidade de suas tcnicasartsticas e de suas organizaes sociais e polticas.

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    A FAMLIA NA FRICA OCIDENTAL

    Em grande parte da frica Ocidental, as famlias eram formadaspelo chefe o Homem Grande acompanhado pelos filhos, esposas,irmos mais novos e outros parentes que necessitassem de apoio,contendo entre dez e quarenta pessoas, que compunham as aldeias.Aos ancestrais mortos e aos homens mais velhos da comunidade eraatribuda grande importncia, devendo-se respeito e obedincia.

    Uma das formas de casamento era por meio de rapto demulheres nas suas aldeias. Em geral, a famlia do futuro marido pagava famlia da noiva um dote. A maior parte dos casamentos erapolgamo. As mulheres casavam-se muito jovens, ainda na adoles-cncia, e os homens um pouco mais velhos, por volta dos 30 anos. Asmulheres cuidavam dos trabalhos agrcolas e, em alguns lugares, comonas savanas e nas florestas meridionais da frica Ocidental, tambmdo comrcio. O trabalho mais pesado, como a abertura de caminhosnas florestas, ficava reservado aos homens. As colheitas eram feitaspelos dois.

    Os povos da frica Ocidental davam grande importncia gerao de filhos. Um provrbio iorub dizia que sem filhos ests nu.Os filhos eram a garantia de uma boa velhice dos pais e, depois, quandoda sua morte, eles dariam continuidade famlia.

    A ESCRAVIDO NA FRICA SUBSAARIANA

    Antes do estabelecimento do comrcio europeu na bacia doAtlntico Sul e no oceano ndico, entre os sculos XV e XVI, a escravidoocupava um espao importante nas sociedades da frica Subsaariana. Osescravos eram utilizados no interior das sociedades, nas funes de criados,soldados e concubinas, mas tambm eram vendidos no comrcio realizadocom o Saara, o Egito e o ndico.

    Entretanto, a maior parte das sociedades africanas praticava aescravido domstica, caracterizada como uma forma de dependncia

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    pessoal. Em se tratando de pequenas comunidades, a escravido serviapara aumentar o nmero de componentes da famlia ou da linhagem,que, em mdia, tinha de um a quatro escravos. Em sociedades comcaractersticas urbanas, como a dos iorubs e a dos haas, havia maisescravos do que naquelas basicamente rurais.

    A principal fonte de escravos era a guerra. Os derrotados tinham,em particular, suas mulheres e crianas tornadas cativas.

    Os reinos de Canem e depois o de Bornu acometiam, desde osculo IX, os povos ao sul do lago Chade para escraviz-los. Reinoscomo Gana, Mali, Songai, os haas e reinos fulos de Futa Toro e FutaJalom atacavam os inimigos logo aps a poca das colheitas, matavamos idosos e os homens que sobreviviam e capturavam mulheres e crianas,unindo-as pelo pescoo com um instrumento chamado libambo ou comuma corda.

    Alm da guerra, os seqestros eram comuns. A escravido poderiaser tambm imposta como castigos penais por assassinato, adultrio eroubo. Respaldado em seu poder, um rei, um chefe ou mesmo ummembro da famlia de maior respeito, tornava escravo algum que lhecontrariasse ou ambicionasse um bem. Para se saldar uma dvida ouadquirir um emprstimo, no raro uma pessoa da prpria famlia eraentregue a outra comunidade para ser escravizada. Alm disso, a fome,em conseqncia das grandes secas ou da perda da colheita por invasode gafanhotos, por muitas chuvas ou por incndios, obrigava, para garantira sobrevivncia, a prpria escravizao ou a de um familiar.

    Alguns escravos conseguiam fugir e retornar a sua terra de origem.Outros formavam novas comunidades compostas, essencialmente, porfugitivos. Andr lvares dAlmada menciona, no sculo XVI, a existnciade um desses agrupamentos de escravos fugidos na Guin. O reverendoSamuel Johnson relatou que os ijebus eram considerados descendentesde um escravo que iria ser sacrificado, mas fugiu escondendo-se na floresta.

    O destino do escravizado era estabelecido no momento da capturaou da compra. Mesmo que raramente, o escravo poderia at enriquecere adquirir escravos, mas no possua mobilidade social.

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    Na frica Subsaariana, a terra no era escassa, mas o trabalho sim, pois,proporcionalmente, existiam poucos indivduos para ocup-la e cultiv-la. Ecomo a terra pertencia a todos, mas o seu uso era controlado pelos reis e chefes,que a cediam ao grupo que tivesse braos suficientes para trabalh-la, eranecessrio a obteno de um grande nmero de escravos.

    Os tributos aos reis e chefes eram pagos em servios (dias detrabalho, construo de casas, poos, muros), produtos (cereais, gado,tecidos) e com escravos. Estes tambm eram utilizados como moeda.

    Em alguns casos de acusaes, como as de feitiaria, os escravospoderiam ser punidos ou mortos no lugar do seu senhor. No raro eramoferecidos em sacrifcios s divindades e ancestrais, nas cerimniaspropiciatrias das chuvas e das colheitas, no sepultamento de reis, chefese seus proprietrios. H vrios relatos e resqucios arqueolgicos desepultamento de escravos junto aos seus senhores.

    Valentim Fernandes revelou que entre os povos beafadas, no rioGrande, na Guin, o chefe era enterrado com a sua mulher principal e omaior privado e o melhor escravo e escrava que ele tinha e o melhor cavalo eassim algumas vacas, ces, cabras e galinhas.

    O nmero de escravos que acompanhavam o proprietrio no mo-mento da morte dependia da riqueza e do tamanho da sua escravaria. Nosculo XVI, os ibos costumavam enterrar com o morto um ou dois escravos,mas no caso de proprietrios mais ricos, eram enviados at seis escravos.

    As imolaes de escravos tambm eram realizadas em rituaispreparatrios s guerras, na poca das colheitas, para saudar os mortos,chamar as chuvas e para dar fora espiritual ao chefe da comunidade. Emescavaes na cidade do Benin foi encontrado um poo com 41 esqueletosde mulheres, que teriam sido, no sculo XVIII, ali jogadas num ritual.

    EXERCCIOS1. Quais eram as diferentes formas de organizao poltica das sociedades africanas subsaarianas? E qual era o

    papel da religio em cada uma delas?2. Com a orientao do(a) professor(a), forme pequenos grupos com seus colegas e monte um painel com as

    principais sociedades africanas subsaarianas, organizando-as cronologicamente e incorporando ascaractersticas econmicas e culturais.

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    3. Identifique os materiais utilizados em obras de arte africanas e os relacione com as atividades econmicasdas diferentes sociedades que as produziram. Consulte alm deste captulo, sites de museus nacionais einternacionais e sistematize os dados em um texto.

    4. Depois de realizar uma leitura em grupo do captulo, pesquise em outros livros e na internet imagens queretratem as for