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As novas Súmulas do Supremo Tribunal Federal em processo civil e em direito do trabalho – Breves anotações. INTRODUÇÃO O eminente CARLOS MAXIMILIANO, em obra que se tornou clássica — Hermenêutica e Aplicação do Direito —, assinalou que a jurisprudência traduz comprimidos de idéias. Os comentários a seguir são menos do que isso. De modo que, se bem não fizerem, mal certamente não irão fazer a quem tiver a paciência notória de conferi-los. Coube-me a tarefa de analisar ‘apenas’ as súmulas que envolvam aspectos do processo civil e do direito do trabalho. Utilizei, sempre que possível, das ementas de alguns dos precedentes que a compuseram. É possível que só isto baste para alcançar o sentido e alcance dos enunciados objeto dos breves comentários a seguir expendidos. 622 - Não cabe agravo regimental contra decisão do relator que concede ou indefere liminar em mandado de segurança. Legislação: Lei 1.533/51 (LMS). Já tive oportunidade de me manifestar sobre o tema em época recente, no VI Seminário Avançado – A Fazenda Pública em

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As novas Súmulas do Supremo Tribunal Federal em processo civil e em direito do trabalho – Breves anotações.

INTRODUÇÃO

O eminente CARLOS MAXIMILIANO, em obra que se tornou clássica — Hermenêutica e Aplicação do Direito —, assinalou que a jurisprudência traduz comprimidos de idéias. Os comentários a seguir são menos do que isso. De modo que, se bem não fizerem, mal certamente não irão fazer a quem tiver a paciência notória de conferi-los.

Coube-me a tarefa de analisar ‘apenas’ as súmulas que envolvam aspectos do processo civil e do direito do trabalho. Utilizei, sempre que possível, das ementas de alguns dos precedentes que a compuseram. É possível que só isto baste para alcançar o sentido e alcance dos enunciados objeto dos breves comentários a seguir expendidos.

622 - Não cabe agravo regimental contra decisão do relator que concede ou indefere liminar em mandado de segurança.

Legislação: Lei 1.533/51 (LMS).

Já tive oportunidade de me manifestar sobre o tema em época recente, no VI Seminário Avançado – A Fazenda Pública em Juízo. Permaneço, ainda, com o mesmo ponto de vista, que passo a reproduzir.

Regendo-se o processo do mandado de segurança por lei especial, o problema que se apresenta ao intérprete é o de saber se esta exauriu toda a matéria, inexistindo lacunas a ser preenchidas e, portanto, só admitindo os recursos que contempla, ou se é possível apelar para o Código de Processo Civil como direito comum e subsidiário, a permitir outros recursos além dos que foram previstos na Lei nº 1.533/51.

A doutrina hoje prevalecente advoga a aplicação subsidiária do CPC, já que as leis disciplinadoras do mandado de segurança são insuficientes em matéria recursal. Com efeito, a opinião que segrega o mandado de segurança, pondo à salvo da aplicação supletiva das normas do processo civil, embora anteriormente sustentada por parte da doutrina, e apesar da firme posição da jurisprudência, não encontra respaldo no ordenamento jurídico vigente. A propósito, esclarece BARBOSA MOREIRA, em mais de uma oportunidade:

“Antes de mais nada, convém reiterar asserto que há muito vimos como premissa de qualquer argumento em torno de problemas do mandado de segurança: esse instituto não é um monstrum sem parentesco algum com o resto do universo, uma singular esquisitice legislativa, uma peça exótica, uma curiosidade a ser exibida em vitrina ou em jaula para assombro dos passantes; é uma ação, uma espécie de gênero bem conhecido e familiar, cujas peculiaridades, sem dúvida dignas de nota, não a desligam do convívio das outras espécies, não a retiram do contexto normal do ordenamento jurídico, não a condenam a degredo em ilha deserta. À semelhança do que acontece com as figuras congêneres, o mandado de segurança está contido no âmbito normativo do processo civil e submete-se aos respectivos princípios e normas, sem prejuízo da regulamentação especial constante das leis que a ele especificamente dizem respeito. (...)

Se o Código constitui fonte subsidiária da disciplina do mandado de segurança, e se no sistema codificado as decisões interlocutórias comportam impugnação por agravo de instrumento, segue-se que o mesmo deve acontecer naquele processo (...).

A tese da irrecorribilidade das decisões interlocutórias no processo do mandado de segurança é errônea do ponto de vista técnico e inconveniente do ponto de vista político. Sua adoção em nada concorre para tornar mais eficiente a tutela dos direitos vindicáveis por meio do remédio hoje previsto no art. 5º, LXIX, da Constituição da República. Last but not least: dificilmente se harmoniza com a garantia estatuída no item LV, fine, do mesmo dispositivo constitucional, que no conceito de “ampla defesa” inclui “os meios e recursos a ela inerentes”.

Cumpre abandonar de uma vez por todas o vezo de pôr o Mandado de Segurança ao relento, de expulsá-lo sem dó nem piedade do recinto do sistema processual vigente” 1.

Disso não absona o não menos ilustre J. J. CALMON DE PASSOS, quando enfatiza, em mais de um lanço:

“Alça pelo absurdo, data venia, denominar-se de despacho de mero expediente a concessão de medida liminar, quando o legislador exige, para isso, o exame da relevância do fundamento (causa de pedir) e da ineficácia da medida (pedido), caso venha a ser deferida a segurança sem a concessão da liminar. Se irrecorrível for a decisão sobre liminar em mandado de segurança, teremos a irrecorribilidade das liminares em possessórias, das liminares em medidas cautelares, enfim, teremos um ato decisório que reclama, particularmente,

1. Recorribilidade das Decisões Interlocutórias no Processo do Mandado de Segurança, Revista de Direito Processual Civil, nº 72, pp. 7, 8 e 14

dada sua excepcionalidade, controle pronto e eficiente, transformado em decisão irrecorrível. Excessos dessa natureza preocupam, porque revelam, de modo alarmante, a desenvoltura com que se descarta a prescrição legal, que é a dimensão civilizadora da norma jurídica. Quando a lei for inútil no que prescrever e só valer o arbítrio dos que detêm o poder de julgar, teremos regredido, e muito, no tempo e na civilização. (...).

A decisão sobre liminar, em mandado de segurança, é concessão ou denegação de medida cautelar, e medida cautelar que se traduz em antecipação da tutela, decisão que envolve, necessariamente, o exame da lide, em seus aspectos de fato e de direito, portanto decisão recorrível. E hoje mais do que nunca recorrível, por força do mandamento constitucional (art. 5º, LV) que de uma vez por todas afasta o risco das decisões insuscetíveis de controle, mesmo do controle interno pelo próprio Poder Judiciário” 2.

Não obstante essa preciosas lições de dois dos mais respeitáveis ícones da processualística nacional, vigorava no Supremo Tribunal Federal a Súmula nº 506, que veio a ser cancelada, como se constata do Informativo nº 295 do STF, quando da apreciação da SS (AgR) 1945-AL, nesses termos:

“O Tribunal, por maioria, resolvendo questão de ordem suscitada pelo Min. Gilmar Mendes, decidiu pelo cabimento de agravo regimental contra despacho do Presidente do Supremo Tribunal Federal que indefere o pedido de suspensão de segurança, cancelando, portanto, o Verbete 506 da Súmula do STF ("O agravo

2. Mandado de Segurança Coletivo, Mandado de Injunção, Habeas Data, Editora Forense, Rio de Janeiro, 1989, pp. 48/49 e 52

a que se refere o art. 4º da Lei 4.348, de 26.06.1964, cabe somente, do despacho do Presidente do Supremo Tribunal Federal que defere a suspensão da liminar, em mandado de segurança, não do que a denega."). Vencido o Min. Sepúlveda Pertence, que rejeitava a questão de ordem e mantinha o Verbete da Súmula até que o Tribunal revisse o não-cabimento de agravo regimental contra decisão de relator que concede ou indefere liminar em mandado de segurança. Vencido, também, o Min. Marco Aurélio, Presidente, que não conhecia do agravo regimental por incabível. Em seguida, apreciando o mérito do agravo regimental, o Tribunal, por maioria, deu-lhe provimento para deferir o pedido de suspensão da segurança pela ocorrência de grave lesão à economia pública do Estado de Alagoas, vencido o Min. Marco Aurélio, que mantinha a decisão agravada”.

Imaginava-se, portanto, que o ponto de vista a ser adotado pela Excelsa Corte seria o cabimento do recurso de agravo inominado ou interno da decisão interlocutória de que se trata, concedendo ou não a suspensão pretendida. Assim, restaria placitado o entendimento de que, em sede de mandado de segurança, qualquer decisão desafiaria o recurso adequado, sobretudo diante da dicção constante da parte final do art. 5º, inciso LV, do Texto Maior.

Ao lado disso, o Superior Tribunal de Justiça, a despeito do teor da Súmula nº 2173, que sufraga o entendimento segundo o qual não cabe o recurso de agravo de decisão que indefere o pedido de suspensão da execução da liminar, ou da sentença em mandado de segurança, no julgamento do Agr. em SS nº 1166-SP, tendo por relator o Min. Nilson Naves, assentou o cabimento do agravo regimental tanto no caso de concessão, como no de denegação da suspensão requerida.

3. A Corte Especial do Superior Tribunal de Justiça cancelou, em 23.10.2003, a Súmula 217.

Em sentido semelhante, inclusive com base nos precedentes jurisprudenciais que indica, acórdão da 2ª Turma do Superior Tribunal de Justiça, prolatado no Ag 239836/SP, tendo por relatora a Min. Eliana Clamon, firme em que, segundo se infere do Informativo nº 161 daquela Corte, “a decisão denegatória ou que concede liminar em mandado de segurança pode ser impugnada por meio de agravo de instrumento. Considerou-se que as normas do CPC aplicam-se a todas as ações, a não ser àquelas com regras específicas contrárias. A Lei n. 1.533/1951 não descarta a aplicação subsidiária do citado Código. Precedentes citados: REsp 213.716-RJ, DJ 20/9/1999; REsp 264.555-MG, DJ 19/2/2001, e REsp 139.276-ES, DJ 19/11/2001”.

Todavia, o Supremo Tribunal Federal, apesar das manifestações apresentadas pelos Ministros CARLOS BRITTO e MARCO AURÉLIO4, editou a reportada Súmula nº 622 averbando a irrecorribilidade da decisão do relator que defere ou indefere medida liminar no mandado de segurança.

Diante da amplitude do teor do referido enunciado, passou a ser irrecorrível toda e qualquer decisão monocrática nos colegiados concessiva ou denegatória de liminar em sede de mandado de segurança, salvo a ressalva sempre implícita dos embargos de declaração.

Respeita-se o entendimento afinal agora adotado pelo Supremo Tribunal Federal, mas não se pode aceitar, sic et simpliciter, a solução preconizada, que está em testilha aberta e inexpugnável com a regra do art. 5º, LV, da Carta Política e com o disposto no § 3º, do art. 4º, da Lei nº 8.437/1992. Tanto porque, como asserido pelo Min. Marco Aurélio, o provimento detém a natureza de decisão interlocutória, quanto porque ao impetrante, por força do postulado da ampla defesa, deveria ser assegurado o direito de impugnar essa decisão monocrática quando lhe for

4. O Min. Carlos Britto aprovou o enunciado, apesar de discordar do seu conteúdo. De seu turno, o Min. Marco Aurélio, como se constata do site do STF, admite ter dificuldade de aceitar esse entendimento, uma vez que “o pronunciamento deferindo ou indeferindo liminar em Mandado de Segurança consubstancia, em si, decisão interlocutória e às vezes de repercussão ímpar, a ponto de prejudicar a pessoa jurídica de direito público de forma, até mesmo, irreversível”.

desfavorável, utilizando, para tanto, do recurso estabelecido na norma infraconstitucional (CPC, arts. 162, § 2º, 496, II, e 522).

Diz-se o impetrante, porque ao impetrado sempre será possível obter a suspensão da liminar, valendo-se do mecanismo inserto no art. 4º, da Lei nº Lei nº 8.437/1992. Basta, com efeito, que, além da interposição do agravo de instrumento, tenha concomitantemente agitado o incidente de suspensão da liminar, pois a tanto lhe faculta o § 5º, do art. 4º, da Lei nº 8.437/1992, com uma novidade ímpar: a denominada suspensão da suspensão (Lei nº 8.437/1992, art. 4º, § 4º; Lei nº 4.348/64, art. 4º, §§ 1º e 2º), que nada mais é do que um trampolim para acesso aos tribunais superiores. De típico incidente processual, a suspensão da sentença ou da liminar ganha ares de recurso, mas apenas para uma das partes da relação jurídica processual.

É certo que, à primeira vista, diante da irrecorribilidade da decisão monocrática, segundo estabelece o referido enunciado do Supremo Tribunal Federal, ao impetrante caberá, atendidos seus pressupostos constitucionais específicos, a impetração de outro mandado de segurança, a fim de obter a liminar denegada (LOMAN, art. 21, VI5). Esse expediente, porém, não foi o querido pelo legislador na reforma processual que impingiu ao recurso de agravo, com o objetivo preconcebido, como ninguém ignora, de reservar ao mandado de segurança o seu leito próprio e para o qual foi constitucionalmente instituído.

De sorte que, à administração pública compete agora agravar de instrumento as liminares deferidas no juízo de primeiro grau, e, ato contínuo, forrando-se contra a eventual decisão monocrática do relator, manifestar o incidente de suspensão, a fim de, posteriormente, já que a decisão porventura desfavorável em sede recursal em nada interfere nessa providência (Lei nº 8.437/1992, art. 4º, § 6º), manejar novo pedido de suspensão da liminar, assim alçando os Tribunais Superiores.

Caso, porém, a decisão monocrática tenha sido proferida em processos da competência originária de tribunal, o panorama não se altera para o impetrante: somente novo mandado de segurança seria o remédio possível para a obtenção da liminar denegada.

5. Art. 21. Compete aos tribunais, privativamente: VI – julgar, originariamente, os mandados de segurança contra seus atos, os dos respectivos presidentes e os de suas câmaras, turmas ou seções.

Como a decisão de que se cuida não cabe recurso, não será possível, em um primeiro momento, o incidente de suspensão, que pressupõe exatamente a existência de recurso dirigido ao órgão revisor competente. Nessa hipótese, também o impetrado terá o ônus de impetrar, caso presentes os seus pressupostos, mandado de segurança. Há, no entanto, a possibilidade do Poder Público, após o inexitoso julgamento desse mandado de segurança, interpor o recurso cabível e, nessa perspectiva, intentar perante o tribunal superior competente para conhecê-lo, em um segundo momento, o incidente de suspensão da liminar.

A preconizada irrecorribilidade da decisão monocrática leva a esse paradoxo e a tortuoso caminho, quando o correto, diante da sistemática recursal vigente, seria a possibilidade da interposição do recurso adequado, permitindo o exaurimento da ampla defesa. Nenhum argumento, portanto, autoriza tolher a revisão da decisão monocrática do juiz relator que concede ou denega liminar em mandado de segurança.

A corroborar esse raciocínio, lúcida, como de habitual, a lição do emérito BARBOSA MOREIRA, a realçar o manejo inteligente dos instrumentos técnicos:

“Ponhamos em relevo o papel fundamental da técnica; evitemos escrupulosamente quanto possa fazer suspeitar de que, no invocá-la, se esteja dissimulando mero pretexto para a reentronização do velho e desacreditado formalismo; demos a cada peça do sistema o lugar devido, na tranqüila convicção de que, no mundo do processo, há pouco espaço para absolutos, e muito para o equilíbrio recíproco de valores que não deixam de o ser apenas porque relativos.

E mais: quando porventura nos pareça que a solução técnica de um problema elimina ou reduz a efetividade do processo, desconfiemos, primeiramente, de nós mesmos. É bem possível que estejamos confundindo com os limites da técnica os

da nossa capacidade de dominá-la e de explorar-lhe a fundo as virtualidades. A preocupação com a efetividade deveria levar-nos amiúde a lamentar menos as exigências, reais ou supostas, imputadas à técnica do que a escassa habilidade com que nos servimos dos recurso por ela mesma colocados à nossa disposição”6.

Embora não tenha força vinculante, não se pode deixar de reconhecer que, presentemente, as decisões monocráticas dos relatores que concederem ou negarem medida liminar em mandado de segurança ensejaram, para desalento, entre outros, dos eminentes processualistas aqui aludidos, a interposição de outro mandado de segurança. Conceda-se que, a compulsória adoção desse procedimento, não traz segurança alguma para as partes, mas sério e indesejável tumulto processual.

623 - Não gera por si só a competência originária do Supremo Tribunal Federal para conhecer do mandado de segurança com base no art. 102, I, n, da Constituição, dirigir-se o pedido contra deliberação administrativa do tribunal de origem, da qual haja participado a maioria ou a totalidade de seus membros.

Legislação: CF, art. 102, I, n.

Dispõe o art. 102, I, n, da Constituição Federal que, compete ao Supremo Tribunal Federal, processar e julgar, originariamente, “a ação em que todos os membros da magistratura sejam direta ou indiretamente interessados, e aquela em que mais da metade dos membros do tribunal de origem estejam impedidos ou sejam direta ou indiretamente interessados”.

Informa LUÍS ROBERTO BARROSO7 que a jurisprudência do Supremo Tribunal Federal já se firmou no sentido de que a hipótese disciplinada no art. 102, I, n do Testo Maior “só se aplica quando a matéria versada na causa diz respeito a privativo interesse da magistratura como

6. Temas de Direito Processual – Sexta Série, p. 28. 7. Constituição da República Federativa do Brasil Anotada – Saraiva, 1998, p. 228.

tal, e não quando também interessa a outros servidores”.

Tratando-se, no entanto, de matéria administrativa, O STF, examinando questão de ordem na Petição nº 1.193, decidiu que “a letra n do inciso I do artigo 102 da Constituição deve ser interpretada estritamente, razão por que a palavra ‘ação’ nela constante se restringe à ação judicial, só transferindo para a competência desta Corte competências jurisdicionais e não atribuições de natureza administrativa”.

Por conseguinte, firma a Súmula nº 623 o entendimento de que apenas incide o disciplinado no art. 102, I, n, da CF, quando se cuida de ação judicial, em que há o exercício da jurisdição. Em matéria administrativa, em que inexiste o exercício dessa atividade jurisdicional, inaplicável o preceptivo constitucional em evidência.

De todo modo, reflete um dos precedentes da Súmula em comento que a incidência do disposto na alínea n do inciso I do art. 102 da CF não prescinde, inclusive na hipótese de mandado de segurança, de prévio debate sobre a suspeição ou o impedimento dos integrantes do tribunal de origem, ainda que dela haja participado a maioria ou a totalidade dos seus membros, para, uma vez julgada procedente, estabelecer-se a competência do STF para julgar originariamente a causa, desde que não se trate, portanto, de matéria administrativa. Confira-se:

“CONSTITUCIONAL – COMPETÊNCIA ORIGINÁRIA DO STF MANDADO DE SEGURANÇA IMPETRADO CONTRA ATO DO TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DE RORAIMA – CF, ART. 102, I, N – 1. Mandado de segurança impetrado contra ato do Tribunal de Justiça do Estado de Roraima que determinou a instauração de procedimento administrativo contra magistrado, afastando-o de suas funções. 2. A competência para o julgamento do mandado de segurança é do próprio Tribunal, por isso que não ocorrente, no

caso, a hipótese inscrita no art. 102, I, n, da Constituição. 3. No caso de ter sido oposta exceção de suspeição dos juízes do Tribunal local, reconhecendo a maioria dos membros do Tribunal a suspeição, firma-se a competência do STF, na forma do art. 102, I, n, da Constituição. Recusada a suspeição, ao STF incumbe julgar, originariamente, a exceção de suspeição. Acolhendo o STF a referida exceção, então estará configurada a competência originária da Corte Suprema, na forma do art. 102, I, n, da Constituição. 4. A exceção de suspeição dever ser proposta em processo de natureza jurisdicional, não em procedimento administrativo. Não compete ao STF examinar, originariamente, o incidente (exceção de suspeição) em procedimento administrativo (AOR 238-PE, Relator Min. Sydney Sanches, DJ de 24.03.1995). 5. Precedentes do STF: MS 21.306-DF, Velloso, MS 20.969 (AGRG)-SP, Velloso, RTJ 133/260, AOR 146-(AGRG)-RJ, Pertence, (RTJ 140/361, MMSS 21.193 (AGRG)-DF, 21.337 (AGRG)-RS E 21.338 (AGRG)-MS, Celso de Mello (RTJ 146/114, 138/110 E 137/675), AOR 238-PE, Sydney Sanches, DJ de 24.03.1995” (STF – AO 214 – RO – T.P. – Rel. Min. Carlos Velloso – DJU 16.06.1995).

624 - Não compete ao Supremo Tribunal Federal conhecer originariamente de mandado de segurança contra atos de outros tribunais.

Legislação: CF, art. 102, I, d e § 1º e LOMAN, art. 21, VI.

A competência originária do STF, para julgar e processar casos em que, como adverte ALEXANDRE MORAES8, “os direitos fundamentais das mais altas autoridades da

8. Direito Constitucional, 14ª edição, Atlas, p. 466.

República estiverem sob ameaça ou concreta violação, ou quando estas autoridades estiverem violando direito fundamentais do cidadão”, que, nessa última hipótese, poderá se valer, entre outras providências, do mandado de segurança, está restrita às hipóteses prefiguradas no art. 102. I, d, do Texto Maior, assim redigido:

“Art. 102. Compete ao Supremo Tribunal Federal, precipuamente, a guarda da Constituição, cabendo-lhe:

I - processar e julgar, originariamente:

d) o habeas-corpus, sendo paciente qualquer das pessoas referidas nas alíneas anteriores; o mandado de segurança e o habeas-data contra atos do Presidente da República, das Mesas da Câmara dos Deputados e do Senado Federal, do Tribunal de Contas da União, do Procurador-Geral da República e do próprio Supremo Tribunal Federal”.

Não cabe na espécie, portanto, interpretação ampliativa. E, no caso, a LOMAN tem norma expressa (art. 21, VI), ao disciplinar que compete aos tribunais, privativamente, “julgar, originariamente, os mandados de segurança contra seus atos, os dos respectivos presidentes e os de suas câmaras, turmas ou seções”.

Um dos precedentes específicos da Súmula sob comentário está assim ementado:

“MANDADO DE SEGURANÇA – IMPETRAÇÃO CONTRA ATO DE TRIBUNAL JUDICIÁRIO ESTADUAL – NEGATIVA DE SEGUIMENTO – AGRAVO REGIMENTAL – O mandado de segurança impetrado contra ato de Tribunal deve ser resolvido no âmbito do próprio Tribunal (LOMAN, art. 21, VI), não havendo que se falar em competência

originária do Supremo Tribunal Federal, restrita as hipóteses referidas no art. 102, I, d, da Constituição Federal. Entendimento da Corte reafirmado após a Constituição vigente” (STF – AGRMS 21.735 – CE – T.P. – Rel. Min. Ilmar Galvão – DJU 11.03.1994).

Portanto, não apenas em razão da qualidade das pessoas, mas da relevância de certas demandas e da matéria debatida — in casu, ato invectivado, oriundo do tribunal — o legislador atribui a competência originária não ao juízo de primeiro grau, mas a certos colegiados.

Por conseguinte, poderá o Supremo Tribunal Federal, uma vez atendidos seus pressupostos constitucionais específicos, julgar, em recurso extraordinário, o acórdão proferido pelo tribunal, em sede de mandado de segurança, contra ato por este emitido. E não julgar, originariamente, a causa.

Necessária, portanto, a existência de causa, assim entendida, de acordo com o magistério de JOSÉ FREDERICO MARQUES9, como sendo todas as questões que se tratam em juízo, seja de jurisdição contenciosa, seja na denominada jurisdição voluntária. Causa, portanto, é a lide deduzida no processo.

625 - Controvérsia sobre matéria de direito não impede concessão de mandado de segurança.

Legislação: Lei 1.533/51 (LMS).

A Súmula, apesar da obviedade manifesta do conceito nela emitido, vem em boa hora. Muitos conhecem decisões sofríveis, que negam a prestação jurisdicional buscada, a pretexto de que o tema debatido em mandado de segurança seria de ‘alta indagação’, expressão que pela vacuidade que lhe é ínsita, nada esclarece, sem embargo da lição precisa constante do voto proferido pelo Min. Costa Manso no MANDADO DE SEGURANÇA nº 333/1936, cantado em prosa e verso em diversas publicações destinadas ao tema mandado de segurança.

9. Instituições de Direito Processual Civil, vol II, p. 21.

Em breve resumo, esclareceu o mencionado Ministro que ‘direito’, no particular, é sinônimo de poder ou faculdade, decorrente da lei ou norma jurídica (direito subjetivo). Não aludiu à própria “lei ou norma” (direito objetivo). O remédio judiciário não foi criado — prossegue — para a defesa da lei em tese. Quem requer o mandado de segurança defende o “seu direito”, isto é, o direito subjetivo reconhecido ou protegido pela lei. O direito subjetivo, o direito da parte, é constituído por uma relação entre a lei e o fato. A lei, porém, é sempre certa e incontestável. A ninguém é lícito ignorá-la, e com o silêncio, a obscuridade, a indecisão dela não se exime o juiz de sentenciar ou despachar (Código Civil, art. 5º, Lei de Introdução). Só se exige prova do direito estrangeiro ou de outra localidade, e isso mesmo se não for notoriamente conhecido.

O fato, portanto, é que o peticionário deve tornar certo e incontestável, para obter mandado de segurança. O direito será declarado e aplicado pelo juiz, que lançará mão dos processos de interpretação estabelecidos pela ciência para esclarecer os textos obscuros ou harmonizar os contraditórios. Seria absurdo admitir se declare o juiz incapaz de resolver “de plano” um litígio, sob o pretexto de haver preceitos legais esparsos, complexos ou de inteligência difícil ou induvidosa. Desde, pois, que o fato seja certo e incontestável, resolverá o juiz a questão de direito, por mais intrincada e difícil que se apresente, para conceder ou denegar o mandado de segurança.

Afinal, o conceito de direito líquido e certo é tipicamente processual, pois atende ao modo de ser de um direito subjetivo no processo: a circunstância de um determinado direito subjetivo realmente existir não lhe dá a caracterização de liquidez e certeza; esta só lhe é atribuída se os fatos puderem ser provados de forma incontestável, certa no processo. E isto normalmente se dá quando a prova for documental, pois esta é adequada a uma demonstração imediata e segura dos fatos.

Como realçado pelo Min. Sepúlveda Pertence, em voto proferido no RE nº 117.936-8, “a existência ou não de direito líquido e certo, enquanto pressuposto de cabimento do mandado de segurança, é requisito de ordem processual — atinente à prova induvidosa dos

fatos onde se assenta a pretensão do impetrante —, nada tendo a ver com o mérito da pretensão ajuizada”.

626 - A suspensão da liminar em mandado de segurança, salvo determinação em contrário da decisão que a deferir, vigorará até o trânsito em julgado da decisão definitiva de concessão da segurança ou, havendo recurso, até a sua manutenção pelo Supremo Tribunal Federal, desde que o objeto da liminar deferida coincida, total ou parcialmente, com o da impetração.

Legislação: Lei 4.348/64, art. 4º; Lei 8.038/90, art. 25, § 3º e RISTF, art. 297, § 3º.

Na Rcl 718/PA, que constitui um dos precedentes da Súmula nº 626, o Min. MAURÍCIO CORRÊA assinalou que a “eficácia da decisão do Presidente do Supremo Tribunal Federal, proferida no exercício do poder de contracautela (Lei nº 4.348/64, art. 4º), não obstante inicialmente limitada à suspensão de liminar mandamental, também paralisa, por efeito da prospectividade que lhe é inerente, todas as conseqüências jurídicas decorrentes da ulterior concessão do mandado de segurança, desde que o conteúdo daquele provimento liminar revele-se idêntico ao do acórdão que deferiu o ‘writ’ constitucional. Esse efeito prospectivo — que inibe a produção da carga eficacial resultante do deferimento do mandado de segurança — perdurará até que sobrevenha o trânsito em julgado do acórdão que concedeu a ordem mandamental”.

Há, portanto, a disciplina de duas hipóteses bem distintas:

a) coincidindo, total ou parcialmente, o conteúdo da liminar com o do pedido formulado no writ, a suspensão do provimento initio litis determinada no tribunal, inclusive no julgamento do respectivo incidente de suspensão, subsiste até o trânsito em julgado da decisão de mérito de procedência do pedido, salvo decisão em contrário que expressamente restabeleça a liminar então suspensa;

b) concedida a segurança, no mérito, mas havendo pedido de suspensão da liminar perante o Supremo Tribunal Federal, inclusive em sede de medida cautelar, que constitui provimento jurisdicional que se exaure em si mesmo, uma vez que essa providência – “que se qualifica como simples incidente peculiar ao julgamento do apelo extremo – não mantém qualquer vinculação com o litígio material subjacente à causa principal” (STF – Pet-AgR 2662 – PR – 2ª T. – Rel. Min. Celso de Mello – DJU 16.08.2002 – p. 90), subsiste a decisão da Suprema Corte que venha a tolher a eficácia da liminar, até a prolação do acórdão definitivo do mérito, desde que, como ressalvado na Súmula nº 626, “o objeto da liminar coincida, total ou parcialmente, com o da impetração”.

Na hipótese a supra, o prejuízo a ser suportado pelo impetrante afigura-se ostensivo, caso o tribunal, quando do julgamento do mérito, em que se concluiu pela procedência do pedido, não venha a restabelecer a liminar então suspensa. Em conseqüência, ainda que vitorioso o interessado, sem que tenham sido alteradas as circunstâncias de fato que determinaram a concessão da liminar, esse provimento inicial então suspenso somente poderá produzir efeitos, caso a decisão de mérito o restabeleça, apesar do efeito devolutivo do eventual recurso a ser interposto pelo impetrado. Ao impetrante, nessa hipótese, cabe oferecer embargos de declaração, a fim de que o tribunal se manifeste, no julgamento do mérito do mandamus que lhe foi favorável, sobre o restabelecimento da liminar então suspensa.

Já na hipótese b, houve recurso do impetrado ao Supremo Tribunal Federal admitido pelo tribunal de origem. A suspensão da liminar poderá ser concedida pela Suprema Corte na medida cautelar ali intentada, uma vez adimplidos os pressupostos que a informam – plausibilidade jurídica da pretensão de direito material deduzida pela parte interessada e o periculum in mora – e permanecerá até a solução final da causa, excetuada a hipótese da liminar não coincidir, total ou parcialmente, com o pedido formulado no mandado de segurança.

Isto porque, como se deduz do voto do e. Min. CELSO DE MELLO (Pet-AgR 2662), o procedimento cautelar, instaurado com o objetivo de conferir efeito suspensivo ao apelo extremo, rege-se, no Supremo Tribunal Federal, por norma especial, de índole

processual (RISTF, art. 21, V), que, por haver sido recebida, pela nova Constituição da República, com força e eficácia de Lei (RTJ 167/51), afasta a incidência – considerado o princípio da especialidade – das regras gerais constantes do Código de Processo Civil (art. 796 e seguintes).

627 - No mandado de segurança contra a nomeação de magistrado da competência do Presidente da República, este é considerado autoridade coatora, ainda que o fundamento da impetração seja nulidade ocorrida em fase anterior do procedimento.

Trata-se de hipótese em que o ato de nomeação de juiz constitui ato complexo, que somente se completa com o decreto do presidente da república que, acolhendo a lista tríplice, nomeia o magistrado (STF – MS 22.323-5 – SP – TP – Rel. Min. Carlos Velloso – DJU 19.04.1996).

Cuidando-se, portanto, de ato complexo, este somente passa a existir após a conjugação de vontades de igual teor e conteúdo emitidas por órgãos distintos. Nesta condição de direito reside, com efeito, a natureza complexa do ato administrativo, que, na sua formação, apenas ingressa no plano da existência, quando há a conjugação de vontades de órgãos diversos emitidas em igual sentido. Enquanto isto não ocorrer, o ato inexiste.

Este, em rigor, o ponto de vista prevalecente na doutrina especializada em Direito Administrativo. Vale citado, por todos, escólio de HELY LOPES MEIRELLES10, quando, em mais de um lanço, assevera:

“Ato complexo é o que se forma pela conjugação de vontades de mais de um órgão administrativo. O essencial, nesta categoria de atos, é o concurso de vontades de órgãos diferentes, para a formação de um ato único. Não se confunda ato complexo com procedimento administrativo. No ato complexo integram-se as vontades de

10. Curso de Direito Administrativo, Ed. Revista dos Tribunais, 9ª edição, p. 125 – os destaques não são do original

vários órgãos para a obtenção de um mesmo ato; no procedimento administrativo praticam-se diversos atos intermediários e autônomos para a obtenção de um ato final e principal. (...). Essa distinção é fundamental para saber-se em que momento o ato se torna perfeito e impugnável: o ato complexo só se aperfeiçoa com a integração da vontade final da Administração e a partir deste momento é que se torna atacável por via administrativa ou judicial; o procedimento administrativo é impugnável em cada uma de suas fases, embora o ato final só se torne perfeito após a prática do último ato formativo. Advirta-se, ainda, que para a obtenção de um ato (simples ou complexo) pode haver necessidade de um procedimento administrativo anterior a sua prática, como ocorre nas nomeações precedidas de concurso”.

Há, portanto, no aperfeiçoamento de um ato administrativo complexo, um itinerário de etapas que se sucedem paulatinamente, devendo ser percorrido sem qualquer tropeço, como elos que compõem, de modo uniforme e indissolúvel, uma sólida corrente, a fim de assim reunidos, sem a exclusão de nenhuma das fases preestabelecidas pelo sistema, vir a emergir o ato final único, decorrente do concurso de vontade coincidentes de órgãos diversos, apto a produzir seus idôneos efeitos, para, somente após isso, ingressar no mundo do Direito.

As precedentes considerações até aqui expendidas, que têm assento na doutrina dos administrativistas, recebem apoio expresso dos civilistas. De fato. Em casos dessa natureza, como assinala ORLANDO GOMES11, invocando lição de MESSINEO:

“O principal fato condicionante da perfeição de um ato jurídico é a existência

11. Novíssimas Questões de Direito Civil, Saraiva, 1984, p. 282/283– os destaques foram acrescidos.

de uma condicio juris ou condição de direito. Trata-se, como se sabe, de uma condição imprópria. Não é seguramente uma cláusula do negócio jurídico que subordine sua eficácia a um evento futuro e incerto; é, sim, um pressuposto lógico, de natureza legal, ou um requisito objetivo, a que fica sujeita a própria EXISTÊNCIA jurídica do ato, ou sua validade, ou sua eficácia. A função própria da verificação da condicio juris é, antes de tudo, o aperfeiçoamento do negócio jurídico, até aquele momento imperfeito e incompleto, como preleciona o autor citado, influindo ab extra e não ab intus como a condição própria, e mediatamente, a atribuição de eficácia ao mesmo negócio (...).

A condicio juris a cuja observação estava adstrito o advento das alterações tencionadas não se verificou; conseqüentemente é indiscutível que o respectivo negócio jurídico não se completou e que, portanto, não ingressou no universo jurídico”.

Como o requisito objetivo do decreto de nomeação de magistrado é necessário para o aperfeiçoamento do ato, sendo competente, para tanto, o Presidente da República, claro está que ele diz com a própria EXISTÊNCIA. Assim, uma vez expedido o decreto presidencial, é contra esse ato final que cabe a impetração da segurança. E, no caso, competente para examinar o writ o Supremo Tribunal Federal (CF, art. 102, I, letra d).

628 - Integrante de lista de candidatos a determinada vaga da composição de tribunal é parte legítima para impugnar a validade da nomeação de concorrente.

Legislação: Lei nº 1.533/51, art. 1º, § 2º.

De forma objetiva, consigna a Súmula em comento um asserto lógico incontornável: está legitimado a impugnar nomeação de concorrente, o candidato integrante da lista para a composição de vaga existente no tribunal. Além de ser parte legítima, porque titular do interesse afirmado na pretensão, esse candidato é quem detém interesse na impugnação, e não qualquer outro candidato que não compusesse a lista correspondente, uma vez que a decisão a ser proferida ser-lhe-á útil e necessária, com vistas a escoimar o ato de nomeação acoimado de nulidade na sua formação e em seu aperfeiçoamento.

O precedente específico abaixo transcrito, só por si, esclarece, em sua ementa, o que veio a ser disciplinado na referida Súmula nº 628:

“MANDADO DE SEGURANÇA – NOMEAÇÃO DE JUIZ TOGADO DE TRIBUNAL REGIONAL DO TRABALHO – VAGA RESERVADA A ADVOGADO – LISTA TRÍPLICE COMPOSTA A PARTIR DE LISTA SEXTUPLA APRESENTADA PELA OAB-RJ – Alegação de nulidade do ato de nomeação pelo Presidente da República, porque ilegítima a inclusão do nomeado na lista tríplice, visto ter participado, da deliberação do Órgão Especial do TRT, juiz dessa Corte, pai do candidato incluído em terceiro lugar, na lista, com apenas um voto a mais do que os sufrágios obtidos por outro dos candidatos, vindo, entretanto, a ser nomeado. 2. Ato complexo. Legitimidade passiva ad causam do Presidente da República, juntamente com o Órgão Especial do TRT, que elaborou a lista tríplice, nela incluindo o litisconsorte passivo que segundo se alega, não podia integrá-la. A nomeação pelo chefe do Poder Executivo de quem não podia figurar na lista tríplice, por vício na formação desta, torna o autor do ato impugnado parte passiva legítima na Ação de Segurança. 3. Competência do STF, para processar e

julgar o Mandado de Segurança (Constituição, art. 102, I, letra d). 4. Legitimidade ativa do impetrante, que foi o segundo colocado na lista tríplice. O componente de lista tríplice está legitimado a impugnar a presença de qualquer dos dois outros, pelo fundamento da ilegal inclusão na lista. 5. É materialmente administrativo e não jurisdicional o ato de Tribunal relativo a composição de lista tríplice, a ser encaminhada ao Poder Executivo, com vistas ao provimento de cargo do colegiado. Dá-se, nessa hipótese, exercício de competência que se insere entre as atribuições referentes a autonomia administrativa e autogoverno dos Tribunais, na forma da Constituição. 6. A autonomia administrativa não autoriza, entretanto, em nenhuma hipótese, atos do judiciário contrários a Constituição ou a lei, os quais devem, ao contrário, trazer, sempre, a marca indelével dos atos de magistrado. Disso resulta que, se no exercício da atividade jurisdicional o juiz possui, em certos casos, por vezes, inibições provenientes das leis processuais (Código de Processo Civil, arts. 134 e 135), em feitos contenciosos ou de jurisdição voluntária, para exercer suas funções, – não é admissível entender que esses limites não subsistem, em se cuidando de atividades materialmente administrativas, inerentes ao autogoverno dos Tribunais. 7. Impedimentos e suspeição. Presunção juris et de jure de parcialidade. Sendo a própria imparcialidade que se presume atingida, não é possível ao juiz, enquanto tal, praticar ato de seu ofício, jurisdicional ou administrativo, sem essa nota que marca, essencialmente, o caráter do magistrado. Se se desprezarem esses

impedimentos, o ato administrativo infringira os princípios da impessoalidade e moralidade previstos no art. 37, da Constituição. 8. Não é, desse modo, cabível reconhecer legitimidade a um juiz, integrante de Tribunal, para praticar ato de seu ofício, participando de eleição destinada a compor lista tríplice, em que seu filho seja um dos candidatos. 9. Hipótese em que os integrantes da lista tríplice foram escolhidos em escrutínios sucessivos para cada vaga. 10. Mandado de Segurança concedido para anular o ato de nomeação do litisconsorte passivo, filho de juiz do Tribunal que participou de sua eleição, quando foi incluído na lista tríplice, em terceiro lugar, sendo de registrar, ainda, que obteve apenas um voto a mais em confronto com o outro concorrente. Ilegítima a inclusão na lista tríplice do litisconsorte passivo, que foi nomeado, o vício contamina o ato de nomeação. 11. Anulado como fica o ato presidencial de nomeação, deve o Tribunal, em nova eleição, proceder a complementação da lista, escolhendo o terceiro nome a integra-la, sendo elegíveis os remanescentes da lista sextupla organizada pela OAB-RJ, para a vaga, inclusive o litisconsorte passivo. Não poderá participar do ato de escolha o juiz impedido, pai de um dos candidatos” (STF – MS 21.814 – RJ – T.P. – Rel. Min. Néri da Silveira – DJU 10.06.1994).

629 - A impetração de mandado de segurança coletivo por entidade de classe em favor dos associados independe da autorização destes.

Legislação: CF, art. 5º, XXI e LXX, b.

Disciplina a Súmula típica hipótese de substituição processual da entidade de classe, de resto prevista na alínea b, do

inciso LXX , do art. 5º, da Magna Carta, que, por isso mesmo, prescinde da autorização dos substituídos para que o substituto atue em juízo, em nome próprio, na defesa de direito alheio.

Vale citado, entre outros, o magistério de WALDEMAR MARIZ DE OLIVEIRA JÚNIOR12, forte em ZANZUCCHI e CARBAGNATI, ao assinalar que a legitimação do substituto processual é originária ou primária, sem prejuízo de seu caráter acessório ou instrumental, decorrente da sua finalidade de provocar uma decisão sobre o mérito da relação jurídica do substituído. Por conseguinte, diversamente do que ocorre na representação e na sub-rogação, “a atuação do substituto independe da vontade do substituído, isto é, do titular da relação jurídica material”, porque deriva de uma outra legitimação potencial do titular do direito material. Daí arrematar: “E tanto mais se configura ser ela primária, quando se recorda que pode surgir, não só independetemente da vontade do substituído, mas até contra sua vontade ou contra seus interesses”.

Remarcando o entendimento de se tratar de substituição processual a hipótese prevista na alínea b, do inciso LXX, do art. 5º, da CF, em que há a legitimação extraordinária autônoma, consigna CALMON DE PASSOS13 que basta “a só presença, no processo, do legitimado extraordinário, que para isso independe de autorização ou consentimento dos legitimados ordinários, para se ter o processo como regularmente instaurado”.

A ementa do aresto a seguir, do Pleno do Supremo Tribunal Federal, resume o assunto:

“MANDADO DE SEGURANÇA COLETIVO – SUBSTITUIÇÃO PROCESSUAL – AUTORIZAÇÃO EXPRESSA – DESNECESSIDADE – OBJETO A SER PROTEGIDO PELA SEGURANÇA COLETIVA – CF, ART. 5º, LXX, B – MANDADO DE SEGURANÇA CONTRA LEI EM TESE – NÃO

12. Substituição Processual, Editora Revista dos Tribunais, 1971, p. 132.13. O Mandado de Segurança Coletivo, Forense, 1989, p. 32.

CABIMENTO – Súmula 266-STF – I. A legitimação das organizações sindicais, entidades de classe ou associações, para a segurança coletiva, é extraordinária, ocorrendo, em tal caso, substituição processual. CF, art. 5º, LXX. II. Não se exige, tratando-se de segurança coletiva, a autorização expressa aludida no inc. XXI do art. 5º, CF, que contempla hipótese de representação. III. O objeto do mandado de segurança coletivo será um direito dos associados, independentemente de guardar vínculo com os fins próprios da entidade impetrante do writ, exigindo-se, entretanto, que o direito esteja compreendido nas atividades exercidas pelos associados, mas não se exigindo que o direito seja peculiar, próprio, da classe” (STF – MS 22.132 – RJ – T.P – Rel. Min. Carlos Velloso – DJU 18.11.1996).

Diante das precedentes e brevíssimas considerações, a entidade de classe detém legitimidade extraordinária autônoma para, em nome próprio, mas na cura dos direitos e interesses dos seus associados, independentemente do assentimento destes, e até contra sua vontade, impetrar mandado de segurança coletivo.

630 - A entidade de classe tem legitimação para o mandado de segurança ainda quando a pretensão veiculada interesse apenas a uma parte da respectiva categoria.

Legislação: CF, art. 5º, LXX.

Essa Súmula nada mais é do que o desdobramento da Súmula nº 639 anterior e aqui já objeto dos singelos comentários apresentados. Importa dizer que, embora a ação mandamental não albergue todos os associados da entidade de classe, mas apenas parte destes, essa circunstância puramente quantitativa não obsta a impetração e nem interfere, a fortiori, na legitimidade extraordinária autônoma, uma vez que nessa demanda coletiva parte significativa da classe ou do grupo poderá beneficiar-se da decisão de mérito a ser afinal prolatada.

631 - Extingue-se o processo de mandado de segurança se o impetrante não promove, no prazo assinado, a citação do litisconsorte passivo necessário.

Legislação: Lei nº 1.533/51, art. 19 com a redação da L. 6.071/74 e CPC, arts. 47 e 267, III e IV.

A Súmula em apreço realça o conceito de que o mandado de segurança é uma ação, por isso mesmo que as regras do Código de Processo Civil têm aplicação supletiva. Cuida-se da incidência da regra inscrita no art. 47, parágrafo único, da Lei Formal, que impõe ao autor que promova a citação de todos os litisconsortes necessários, dentro do prazo que o juiz assinar, “sob pena de declarar extinto o processo”.

Observe-se que, na espécie, tem o autor o ônus de promover a citação, e não de efetivá-la. Cumpre-lhe, portanto, adotar os atos necessários à sua realização. Basta, porém, para atingir a esse objetivo, que o impetrante venha a custear as despesas necessárias14.

Discorrendo sobre o tema, assinala CÂNDIDO DINAMARCO que muito pouco poderá fazer o impetrante para que a citação se realize. Daí concluir que, uma vez indicada com correção o nome e a qualificação dos demandados, “terá o ônus de adiantar recursos para esse fim. Fora disso, difícil atinar com algo mais que incumba ao autor fazer, no cumprimento do seu ônus de promover a citação”15.

A ementa a seguir, pertinente a um dos arestos que integram os precedentes da Súmula de que se cuida, assinala:

“MANDADO DE SEGURANÇA DO MP CONTRA DECISÃO JUDICIAL PENAL: LITISCONSÓRCIO PASSIVO NECESSÁRIO DO RÉU BENEFICIADO – A admitir-se mandado de segurança do Ministério Público contra decisão favorável à defesa, no processo penal, o réu é litisconsorte passivo e não

14. No sentido do texto, Moniz de Aragão, Comentários, Forense, vol. II, n. 239, p. 236.15. Litisconsórcio, Revista dos Tribunais, 1986, p. 182/183. Em igual sentido, Nery & Nery, CPC Comentado, Revista do Tribunais, 6ª edição, p. 353.

mero assistente litisconsorcial, impondo-se sua citação, pena de nulidade; de qualquer modo, a sua audiência, no processo do mandado de segurança tendente a afetar posição favorável que lhe decorrera da decisão impugnada resultaria das garantias do contraditório e da ampla defesa: conseqüente nulidade do processo de mandado de segurança deferido ao MP para conferir efeito suspensivo a recurso contra o deferimento ao condenado de progressão do regime de execução penal” (STF – HC 75.853 – SP – 1ª T. – Rel. Min. Sepúlveda Pertence – DJU 17.10.1997).

Portanto, tem o impetrante, bem como todo e qualquer demandante, na hipótese de litisconsórcio passivo necessário, o ônus de promover a citação dos demandados. Tal atividade, como visto, consiste em adotar a providências legalmente previstas de adiantar o numerário exigido para tanto, além de, facultativamente, providenciar as peças imprescindíveis para a realização do ato citatório.

632 - É constitucional lei que fixa o prazo de decadência para a impetração de mandado de segurança.

Legislação: CF, art. 5º, LXIX e Lei nº 1.533/51, art. 18.

É entendimento de há muito assente no Supremo Tribunal Federal que a regra inscrita no art. 18, da Lei nº 1.533/51 não ostenta qualquer eiva de inconstitucionalidade, tendo sido recepcionada pela Constituição vigente. Diz-se, mesmo, em vários julgados dessa alta Corte, que a circunstância de ser omisso o Texto Maior na fixação de prazo para o ajuizamento do writ não protrai indefinidamente a possibilidade do prejudicado valer-se, a qualquer momento, da ação mandamental — ressalvadas, é óbvio, as hipóteses de lesão continuada, de trato sucessivo, que se renovam no tempo —, podendo, portanto, manejar outra ação tendente à proteção dos seus interesses.

Enfim, como assinalou o Min. CELSO MELLO, após substancioso estudo em sentido oposto manifestado pelo Min. CARLOS VELLOSO16, “o prazo decadencial referido na norma legal em questão não tem o caráter de penalidade, pois não afeta o direito material eventualmente titularizado pelo impetrante e nem impede que este postule o reconhecimento de seu direito público subjetivo mediante adequada utilização de outros meios processuais. A consumação da decadência do direito de impetrar o mandado de segurança não confere juridicidade ao ato estatal impugnado, não tem o condão de convalidá-lo e nem a virtude de torná-lo imune ao controle jurisdicional” (RTJ 141/478).

Daí haver proclamado o Min. CELSO MELLO em acórdão da sua autoria, assim ementado:

“Não ofende a Constituição a norma legal que estipula prazo para a impetração do mandado de segurança. A circunstância de a Constituição da República nada dispor sobre fixação de prazo para efeito de ajuizamento da ação mandamental não inibe o legislador de definir um lapso de ordem temporal em cujo âmbito o writ deve ser oportunamente impetrado” (RTJ 145/189).

Parece-me, no entanto, que a hipótese não seria de decadência ou de preclusão. Naquela, que é uma sanção, impede-se o exercício do direito processual em qualquer processo. Nesta, que sanção não é, está confinada à relação processual em que ocorreu a perda de uma faculdade processual.

Cuida-se, em verdade, de prazo extintivo, como se infere do estatuído no art. 18 da Lei nº 1.533/51. “A idéia de prazo extintivo — consigna ALFREDO BUZAID17 — “é necessária e por si só suficiente para designar a

16. Temas de Direito Público, p. 155, 1994.17. Do Mandado de Segurança, Saraiva, vol. 1, p. 153 – os destaques são do original.

perda do direito de requerer mandado de segurança. Trata-se, na verdade, de um direito temporário que, pelo decurso do prazo legal, se extingue, sem, entretanto, prejudicar o direito material da parte lesada, que poderá pleiteá-lo por ação própria (arg. do art. 16 da Lei n. 1.533/51)”.

633 - É incabível a condenação em verba honorária nos recursos extraordinários interpostos em processo trabalhista, exceto nas hipóteses previstas na Lei 5.584/70.

Legislação: Lei 5.584/70.

Essa Súmula atrita-se, a meu modesto aviso, com os arts. 389, 395 e 404 do Código Civl/2002, de aplicação supletiva no processo do trabalho, sobretudo naquelas hipóteses em que o crédito alimentar vem a ser confirmado em decisão transitada em julgado.

Note-se que todos os precedentes jurisprudenciais que determinaram a edição da mencionada Súmula são anteriores ao novo Código Civil.

O entendimento sufragado sequer poderia ter assento no ius postulandi, pela óbvia razão de não poder o empregado, tampouco a empresa, sem a representação do advogado, agitar recurso extraordinário. E, no caso do empregado, a conhecida lição de CHIOVENDA de que a atuação da lei não deve representar uma diminuição patrimonial para a parte a cujo favor se efetiva, tem integral pertinência. Afinal, somente com a propositura da demanda trabalhista pode o hipossuficiente perceber as vantagens que lhe foram sonegadas ou supressas no curso da relação de emprego.

Incompreensível, portanto, que Código Civil imponha ao devedor inadimplente e ao que não cumpre suas obrigações, no prazo devido, inclusive quanto às obrigações de pagamento em dinheiro, a responsabilidade por perdas e danos, mais juros, atualização monetária, honorários advocatícios, e nada disso seja concedido ao empregado, compelido a ir a juízo em busca da tutela jurisdicional efetiva e justa dos seus interesses, segundo jargão atualmente difundido.

Ao lado disso, fazendo-se um paralelismo com a Lei nº 9.099/95, que, à semelhança do que ocorre na Justiça do Trabalho, dispõe que o acesso ao Juizado Especial independerá, em primeiro grau de jurisdição, do pagamento de custas, taxas ou despesas, estranha-se que havendo recurso — e a Súmula nº 633 trata justamente do recurso extraordinário — os honorários de advogado seriam devidos, observado o ali estabelecido (art. 55, da Lei nº 9.099/95), mas na Justiça do Trabalho, como se infere da referida súmula, seja indevida essa verba.

Na linha dos comentários aqui apresentados, traz-se a colação ementa de acórdão que integra um dos precedentes da súmula aqui examinada:

“RECURSO EXTRAORDINÁRIO – EMBARGOS DE DECLARAÇÃO – Distribuição proporcional dos ônus de sucumbência. Discussão acerca de condenação em honorários advocatícios. Jurisprudência assente do STF no sentido de que não são devidos honorários advocatícios em reclamação trabalhista, reservados que estão à condenação do empregador e não a do empregado. Embargos de declaração recebidos, em parte” (STF – REED 181725 – 2ª T. – Rel. Min. Néri da Silveira – DJU 04.06.1999 – p. 16).

Seja como for, ainda que a Súmula nº 633 se reporte à Lei nº 5.584/70, o alvitre não tem qualquer serventia, sobretudo diante do disciplinado na Lei nº 10.288/2001, que agora dispõe sobre o jus postulandi na Justiça do Trabalho, e na Lei nº 10.537/2002, que, na esteira do estatuído no art. 5º, LXXIV, da CF, faculta ao juiz a concessão dos benefícios da justiça gratuita aos empregados, independentemente da assistência sindical (§ 3º, do art. 790, da CLT). O esvaziamento da norma invocada na reportada súmula é notório, por isso mesmo reflete, d. v., o descabimento da conclusão nela exposta.

634 - Não compete ao Supremo Tribunal Federal conceder medida cautelar para dar efeito suspensivo a recurso extraordinário que ainda não foi objeto de juízo de admissibilidade na origem.

Legislação: C. Pr.Civ., art. 800, parágrafo único.

A posição adotada, no particular, pelo Supremo Tribunal é bem clara: a eventual concessão da tutela cautelar propugnada pelo recorrente implicaria, em rigor, dispensa do juízo de admissibilidade do recurso que interpusera no órgão de origem, tendo por conseqüência, que seria lógica, o imediato acesso do apelo excepcional. Essa providência, no entanto, estaria a caracterizar indébita invasão da competência atribuída à Corte a quo, a quem cabe o primitivo exame de acesso.

O mesmo raciocínio deve ser adotado em face do recurso ainda não interposto, e, portanto, inexistente. Com efeito, embora a parte recorrente consigne que, no prazo, irá agitar no tribunal a quo o apelo excepcional, inviáveis a pretensão e a concessão do provimento cautelar no tribunal ad quem, diante da ausência do respectivo recurso.

No entanto, o Superior Tribunal de Justiça, apesar do entendimento prevalecente da inadmissibilidade dessa providência, tem concedido, aqui e ali, a pretexto de excepcionalidade do caso concreto, medida cautelar em causa em que o recurso especial ainda não foi interposto (cf. a propósito, a MC 690, rel. Min. Humberto Gomes de Barros; o AGRMC – 5465, rel. Min. José Delgado; o AGRMC – 3968, relª Minª Eliana Calmon).

E, ao lado disso, o STJ tem concedido medida cautelar em recurso interposto, mas ainda não admitido no tribunal de origem, como se constata, entre várias decisões, da a seguir ementada:

“Conforme já decidido por este Tribunal, "A norma que elenca as hipóteses em que o recurso especial deve ficar retido na origem comporta exceções. A decisão que defere ou indefere a tutela antecipada provém de cognição sumária, eis que lastreada em juízo de probabilidade. Logo, nos casos em que o recurso especial desafia decisão interlocutória concessiva de tutela antecipada, é razoável determinar-se o seu imediato

processamento, sob pena de se tornar inócua a apreciação da questão pelo STJ." (MC 2.411/RJ). II – Presentes os pressupostos autorizadores da concessão da Medida Cautelar, defere-se a liminar para determinar o imediato processamento do recurso especial, que na origem restou retido” (STJ – MC 3229 – PR – 5ª T. – Rel. Min. Gilson Dipp – DJU 13.05.2002).

Com a edição da Súmula nº 634 do STF certamente o STJ irá alterar esse ponto de vista, sobretudo naquelas hipóteses em que o recurso ficar retido, por força do estatuído no art. 542, § 3º, do CPC.

Assim, a solução para o impasse, em caso de eventual possibilidade da decisão recorrida acarretar danos irreparáveis ou de difícil reparação, seria possibilitar ao Presidente do Tribunal a quo, a quem compete o primeiro exame de admissibilidade do recurso interposto, a concessão da liminar, desde que presentes os pressupostos indissociáveis para seu deferimento – o fumus boni iuris e o periculum in mora –, que subsistiria até o exame a ser realizado pelo tribunal ad quem, como veio a ser preconizado na Súmula nº 635 do STF.

Na linha desse entendimento, julgado da 1ª Turma do STF, da lavra do Min. MOREIRA ALVES, que constitui um dos precedentes da súmula em comento:

“MEDIDA CAUTELAR INOMINADA – QUESTÃO DE ORDEM – Esta Corte tem entendido que não cabe medida cautelar inominada para a obtenção de efeito suspensivo a recurso extraordinário que ainda não foi admitido no Tribunal de origem, não só porque a concessão dessa medida pressupõe necessariamente a existência de juízo positivo de admissibilidade do recurso extraordinário, mas também porque, em se tratando de recurso extraordinário, que demanda esse juízo de admissibilidade da competência da

Presidência do Tribunal que prolatou o acórdão recorrido, não se aplica o disposto no parágrafo único do artigo 800 do CPC. Pela singela razão de que, se fosse concedida a liminar para dar efeito suspensivo, pela relevância de sua fundamentação jurídica, a recurso dessa natureza ainda não admitido, a referida Presidência, em virtude da hierarquia jurisdicional, não poderia desconstituí-la com a não-admissão desse recurso, ficando, assim, adstrita – o que é incompatível com a sua competência para o juízo de admissibilidade – a ter de admiti-lo. A impossibilidade de esta Corte deferir pedido de liminar para dar efeito suspensivo a recurso extraordinário ainda não-admitido permite que, entre a interposição desse recurso e a prolação desse juízo de admissibilidade, não haja autoridade ou órgão judiciário que, por força de dispositivo legal, tenha competência para o exame de liminar dessa natureza. Para suprir essa lacuna que pode acarretar danos irreparáveis ou de difícil reparação em casos em que é relevante a fundamentação jurídica do recurso extraordinário, seria de atribuir-se ao Presidente do Tribunal a quo, que é competente para examinar sua admissibilidade, competência para conceder, ou não, tal liminar, e, se a concedesse, essa concessão vigoraria, se o recurso extraordinário viesse a ser admitido, até que essa Corte a ratificasse, ou não. Essa solução não encontra óbice em que, assim, haveria invasão na competência deste Supremo Tribunal, certo que, antes da admissão do recurso extraordinário e por causa do sistema do juízo dessa admissibilidade, não é possível a ele decidir esse pedido de liminar.

Questão de ordem que se resolve no sentido de indeferir o pedido de medida cautelar” (STF – PETQO 1863 – 1ª T. – Rel. Min. Moreira Alves – DJU 14.04.2000 – p. 32).

A parte recorrente que pretenda conferir efeito suspensivo ao recurso extraordinário ou especial, que apenas detêm efeito devolutivo — em rigor técnico, suspender a eficácia da decisão impugnada —, cumpre ajuizar no tribunal a quo a medida cautelar inominada para esse fim, e não ajuizá-la no tribunal ad quem, pois a este não compete conhecer de recurso ainda não admitido na Corte de origem.

635 - Cabe ao Presidente do Tribunal de origem decidir o pedido de medida cautelar em recurso extraordinário ainda pendente do seu juízo de admissibilidade.

Legislação: C. Pr.Civ., art. 800, parágrafo único.

Essa Súmula nº 635 complementa a anterior Súmula nº 634, remarcando a competência do Presidente do tribunal a quo, com vistas a conceder a medida liminar propugnada pela parte recorrente, em sede de recurso extraordinário, em que sua admissibilidade pende de julgamento. Descarta-se, assim, também a possibilidade, no tribunal de origem, da concessão de medida cautelar de recurso ainda não interposto.

Os singelos e despretensiosos comentários desdobrados em relação à Súmula nº 634 são, brevitatis causa, aqui reiterados, aditando-os com a ementa do julgado abaixo reproduzido, que, com finura, sintetiza o tema:

“MEDIDA CAUTELAR SUSPENSIVA DOS EFEITOS DA DECISÃO RECORRIDA – DEMARCAÇÃO DA COMPETÊNCIA PARA CONCEDÊ-LA, ANTES E DEPOIS DA ADMISSÃO DO RECURSO – 1. Durante algum período, o STF reservou-se, com exclusividade, a competência para decidir do pedido de medida cautelar suspensiva dos efeitos de decisão sujeita a recurso

extraordinário, subordinando, porém, a sua admissibilidade a já ter sido o RE admitido (cf. RCL 416, 3.12.92, Celso, RTJ 144/718). 2. Essa orientação, contudo – com vistas a obviar os riscos da demora entre a interposição e o juízo de sua admissibilidade -, passou a admitir que, nesse intervalo, o pedido cautelar fosse decidido pelo Presidente do Tribunal a quo (cf: voto Pertence, no AgRPet 535, 1ª T, Moreira, 11.02.92, RTJ 140/756; Pet 1872, 1ª T, Moreira, 07.12.99, DJ 14.04.00; AgRPet 1903, Pleno, Néri, 01.03.00, Inf. STF 180). 3. O poder cautelar do Presidente do Tribunal pode exercer-se até o despacho de admissão do RE, inclusive; mas finda com a prolação desse, que devolve ao STF a jurisdição sobre o caso, nela incluída a de conceder medida cautelar da eficácia da decisão futura do recurso extraordinário (RISTF, art. 21, IV e V). 4. Uma vez admitido o RE – com o que se instaura o poder cautelar do STF com relação a ele -, usurpa-lhe a competência a decisão do Presidente do Tribunal a quo que, reconsiderando despacho anterior de indeferimento, confere efeito suspensivo ao recurso: para preservá-la, julga-se procedente a reclamação, sem prejuízo de que o pedido seja endereçado ao STF, se for o caso, mediante petição instruída com as peças necessárias” (STF – RCL 1509 – TP – Rel. p/o Ac. Min. Sepúlveda Pertence – DJU 06.09.2001 – p. 00009).

Percebe-se, portanto, que o Supremo Tribunal Federal, sobretudo diante do disciplinado no art. 5º, XXXV, da CF, conferindo ao estatuído no art. 800 do CPC interpretação útil e consentânea com a finalidade nele preconizada, estabeleceu tema que deveria compor as atribuições do Presidente dos tribunais em sede recursal, preenchendo o vazio existente na legislação processual (CPC, Livro I, Título X, Capítulo VII).

636 - Não cabe recurso extraordinário por contrariedade ao princípio constitucional da legalidade, quando a sua verificação pressuponha rever a interpretação dada a normas infraconstitucionais pela decisão recorrida.

Legislação: CF, art. 5º, II.

A hipótese disciplinada pela Súmula nº 636 do STF diz respeito à suposta ofensa à norma constitucional, tendo por base mossa ao princípio da legalidade estrita, encartado no inciso II, do art. 5º, do Texto Maior. A ofensa, porém, deve ser direta e frontal, e não reflexa ou oblíqua. Não autoriza a interposição de recurso extraordinário, portanto, se, para aferir-se se houve contrariedade à norma constitucional, venha a ser necessária a intermediação da norma infraconstitucional.

A propósito, esclarece ALEXANDRE MORAES18 que se caracteriza a via reflexa “quando a apuração da ofensa à norma constitucional depender do reexame das normas infraconstitucionais aplicadas pelo Poder Judiciário ao caso concreto; ou ainda, quando para atingir a violação do preceito constitucional, houver necessidade de interpretação do sentido da legislação infraconstitucional”.

De modo que, se, para concluir que houve a violação de norma constitucional, teve de partir o recorrente da ofensa à norma infraconstitucional, a afronta ao Texto Maior exibe-se indireta, reflexa, e não frontal, porque intermediada por aquela outra norma de menor hierarquia. Tal circunstância inviabiliza o acesso do recurso extraordinário, com base na alínea a, do art. 102, III, da CF, tendo por preceptivo constitucional farpeado o disciplinado no inciso II, do art. 5º, da Lei Fundamental.

A ementa aqui trazida à colação, explicita o entendimento de há muito vigorante na Suprema Corte:

“DEDUÇÃO DA ANTECIPAÇÃO DO DÉCIMO TERCEIRO SALÁRIO – URV – ART. 24 DA LEI 8.880/94 – O que pretende a recorrente,

18. in op., cit., p. 474.

com a alegação de ofensa ao princípio da legalidade, é que a interpretação dada pelo acórdão recorrido ao artigo 24 da Lei 8.088/94 seja tida como errônea. Ora, saber se a interpretação de uma norma infraconstitucional está certa, ou não – e, no caso, o STJ, ao julgar o recurso especial, já decidiu no sentido afirmativo –, pressupõe, evidentemente, o exame prévio dessa norma, o que implica dizer que a alegação de ofensa ao princípio constitucional da legalidade é indireta ou reflexa, não dando margem, assim, ao cabimento do recurso extraordinário. Por outro lado, essa interpretação não conduz à redução do 13º salário com violação ao princípio da irredutibilidade do salário, até porque a dedução, com base nela, do adiantamento correspondente a 6/12 avos da gratificação natalina não é superior a 50% do valor global desta (12/12 avos) em URV, como bem demonstrou o aresto recorrido. Recurso extraordinário não-conhecido” (STF – RE 231085 – 1ª T. – Rel. Min. Moreira Alves – DJU 19.05.2000 – p. 21).

637 - Não cabe recurso extraordinário contra acórdão de Tribunal de Justiça que defere pedido de intervenção estadual em Município.

Legislação: CF, art. 34,VI.

A hipótese, guardada sua especificidade, é análoga à estatuída na Súmula nº 623. Ao Supremo Tribunal Federal somente compete o exame de recurso extraordinário nas causas decididas em única ou em última instância (CF, art. 102, III), e não em matéria administrativa. O pedido de intervenção não é causa, mas sim pedido de caráter político administrativo. E, como tal, ainda quando requerida a providência pela parte interessada, assim provocando o tribunal local a requisitar a intervenção estadual ou federal, a

hipótese não constitui exercício do direito de ação, mas sim de petição (CF, art. 5º, XXXIV).

Não havendo jurisdição, contenciosa ou voluntária, não há causa, pressuposto constitucional específico de admissibilidade do recurso extraordinário, razão do seu descabimento, no particular.

Transcreve-se, pelo seu didatísmo, modelar ementa do acórdão da lavra do Min. SEPÚLVEDA PERTENCE, que dilucidou o tema e constitui um dos precedentes da Súmula aqui abordada:

“Recurso extraordinário: descabimento: inexistência de causa no procedimento político-administrativo de requisição de intervenção estadual nos municípios para prover a execução de ordem ou decisão judicial (CF, art. 35, IV), ainda quando requerida a providência pela parte interessada. 1. O sistema constitucional não comporta se subordine a intervenção estadual nos municípios à iniciativa do interessado, que implicaria despir o Judiciário da prerrogativa de Poder de requisitar ex officio a medida necessária à imposição da autoridade de suas ordens ou decisões, a exemplo da que se outorgou claramente aos órgãos de cúpula do Judiciário da União, quando se cogite, sob o mesmo fundamento, de intervenção federal nos Estados. 2. Não se opõem os princípios a que, à parte interessada no cumprimento de ordem ou decisão judiciária, se faculte provocar o Tribunal competente a requisitar a intervenção estadual ou federal, conforme o caso: mas a iniciativa do interessado nesse caso não é exercício do direito de ação, sim, de petição (CF, art. 5º, XXXIV): não há jurisdição – e, logo, não há causa, pressuposto de cabimento de recurso extraordinário – onde não haja ação ou, pelo menos, requerimento de interessado,

na jurisdição voluntária: dessa inércia que lhe é essencial, resulta que não há jurisdição, quando, embora provocado pelo interessado, a deliberação requerida ao órgão judiciário poderia ser tomada independentemente da iniciativa de terceiro: é o que sucede quando – embora facultada – a petição do interessado não é pressuposto da deliberação administrativa ou político-administrativa requerida ao órgão judiciário, que a poderia tomar de ofício. 3. O caráter vinculado de uma competência administrativa não transforma em jurisdição o exercício dela; nem o faz a estrutura contraditória emprestada ao processo administrativo que a tenha precedido, por iniciativa do interessado” (STF – PETMC 1256 – 1ª T. – Rel. Min. Sepúlveda Pertence – DJU 04.05.2001).

638 - A controvérsia sobre a incidência, ou não, de correção monetária em operações de crédito rural é de natureza infraconstitucional, não viabilizando recurso extraordinário.

Legislação: CF, art. 2º.

A hipótese, à semelhança do estatuído na Súmula nº 636/STF, é de ofensa reflexa à norma constitucional. De modo que os argumentos ali alinhados se prestam para esclarecer o entendimento consubstanciado nessa Súmula nº 638, acrescentado do precedente jurisprudencial adiante reproduzido:

“RECURSO EXTRAORDINÁRIO – AUSÊNCIA DE PREQUESTIONAMENTO DA MATÉRIA CONSTITUCIONAL SUSCITADA – INCIDÊNCIA DA SÚMULA 282 DO STF – Hipótese em que o recurso não tem condições de apreciação. Questão relativa à correção monetária no crédito rural que, de resto, possui caráter infraconstitucional, inviabilizando a admissão do recurso

extraordinário, onde não têm guarida alegações de ofensa reflexa e indireta à Constituição Federal. Agravo regimental improvido” (STF – AGRAG 183.380 – MG – 1ª T. – Rel. Min. Ilmar Galvão – DJU 13.09.1996).

639 - Aplica-se a Súmula 288 quando não constarem do traslado do agravo de instrumento as cópias das peças necessárias à verificação da tempestividade do recurso extraordinário não admitido pela decisão agravada.

Legislação: CPC - Lei 5.869, de 11.1.73, com as alterações da Lei 8.950, de 13.12.94, art. 544 e Resolução nº 140, de 1.2.96.

A Súmula nº 288 a que se reporta o enunciado da de nº 639, está assim redigida:

“Nega-se provimento a agravo para subida de recurso extraordinário, quando faltar no traslado o despacho agravado, a decisão recorrida, a petição de recurso extraordinário ou qualquer peça essencial à compreensão da controvérsia”.

Na interposição do agravo de instrumento, não há qualquer juízo de admissibilidade pelo Presidente do tribunal de origem, diante da regra inscrita no § 2º do art. 544 do CPC, que impõe a imediata remessa após a resposta do agravado. De modo que a questão da tempestividade não poderá ser objeto de controle pelo Presidente do tribunal que inadmitiu o recurso que originou o agravo, competindo ao tribunal ad quem aferir se os pressupostos de acesso foram observados pelo agravante.

E, nessa hipótese, incide o rigor formal. Deve o agravante vigiar a formação do instrumento (art. 525, I, do CPC), a fim de verificar se as peças obrigatórias o integram, inclusive, e sobretudo, a certidão da respectiva intimação da decisão impugnada, a fim de ser aferida a tempestividade do recurso. Vale dizer: o traslado da certidão de publicação do acórdão recorrido é peça imprescindível à compreensão da controvérsia acerca da tempestividade.

Ademais, tratando-se de recurso excepcional, as Cortes Superiores, diversamente do que ocorre nas inferiores, não determinam a correção da falha na formação do instrumento.

A ementa abaixo reproduzida sintetiza o assunto:

“AGRAVO DE INSTRUMENTO – Traslado deficiente: falta da peça demonstrativa da tempestividade do RE, que não pode ser suprida por informação contida no parecer do Ministério Público: aplicação da Súmula 288, de acordo com o entendimento firmado em ambas as Turmas (V.g. AgRAg 149.722, 1ª T., Moreira; AgRAg 151.485, Néri, RTJ 158/252), cuja observância não é dispensada pela circunstância de haver jurisprudência do STF assentada na questão de fundo” (STF – AI-AgR 377439 – RS – 1ª T. – Rel. Min. Sepúlveda Pertence – DJU 16.05.2003 – p. 00102).

640 - É cabível recurso extraordinário contra decisão proferida por juiz de primeiro grau nas causas de alçada, ou por turma recursal de juizado especial cível e criminal.

Legislação: CF, art. 103, III; CPC, art. 528; Lei nº 7.244/84; Lei nº 6.830/80, art. 34 e Lei nº 9.099/95.

A Súmula nº 640 do STF está em harmonia com o conceito expresso na Súmula nº 203 do STJ: “Não cabe recurso especial contra decisão proferida por órgão de segundo grau dos Juizados Especiais”.

Assim, uma vez adimplidos seus pressupostos de admissibilidade, é cabível recurso extraordinário nas decisões prolatadas por turma recursal nos juizados especiais cíveis e criminais, mas não o recurso especial, uma vez que não se trata de acórdão prolatado por tribunal (CF, art. 105, III), mas sim por se tratar de causa decidida em última instância (CF, art. 102, III).

Expressivo, a propósito, o seguinte precedente da Suprema Corte:

“RECLAMAÇÃO – JUIZADO ESPECIAL DE PEQUENAS CAUSAS – RECURSO EXTRAORDINÁRIO INADMITIDO – AGRAVO DE INSTRUMENTO OBSTADO NA ORIGEM – INTERCEPTAÇÃO INADMISSÍVEL (CPC, ART. 528) – USURPAÇÃO DA COMPETÊNCIA DO STF – Cabe recurso extraordinário das decisões que, emanadas do órgão colegiado a que se refere a Lei nº 7.244/84 (art. 41, § 1º), resolvem controvérsia constitucional suscitada em processo instaurado perante o Juizado Especial de Pequenas Causas. – Denegado o recurso extraordinário em procedimento sujeito ao Juizado Especial de Pequenas Causas, caber agravo de instrumento, no prazo legal, para o STF, não sendo lícito ao Juiz negar trânsito a esse recurso que, sendo de seguimento obrigatório (CPC, art. 528), não pode ter o seu processamento obstado. – Cabe reclamação para o STF quando a autoridade judiciária intercepta o acesso à Suprema Corte de agravo de instrumento interposto contra decisão que negou trânsito a recurso extraordinário” (STF – RCL 459-7 – Goiás – TP – Rel. Ministro Celso de Mello – DJU 08.04.1994).

Na espécie, conquanto não estejam as decisões proferidas nos juizados especiais cíveis submetidas ao duplo grau de jurisdição, por expressa opção legislativa (Lei nº 9.099/95, arts. 41 e 48), uma vez que o sistema constitucional vigente não mais contempla essa garantia, é de ver-se que não pode haver limitação ao cabimento do recurso extraordinário, desde que — repita-se — verifiquem-se as presenças de seus pressupostos constitucionais de admissibilidade.

Por outras palavras: somente a Constituição Federal pode, com a exclusão de qualquer outra norma, restringir o acesso do recurso extraordinário, por isso mesmo que as hipóteses do seu cabimento

estão nela expressamente previstas (art. 102, III, alíneas a a c). Incorrendo a decisão prolatada no Juizado Especial em uma dessas hipóteses de admissibilidade ali previstas, cabível o recurso extraordinário.

641 - Não se conta em dobro o prazo para recorrer, quando só um dos litisconsortes haja sucumbido.

Legislação: CPC, art. 191.

Absteve-se o eminente CÂNDIDO DINAMARCO de discorrer sobre esse tema, em monografia dedicada ao litisconsórcio. A hipótese de que cuida a Súmula, porém, é de lógica invencível. Apesar da existência de litisconsórcio, ainda que cada um dos colegitimados estejam representados em juízo por advogados distintos, se apenas um deles veio a sucumbir, razão não há para a subsistência do prazo em dobro, que pressupõe a interposição de recurso da decisão que atinja a esfera jurídica de mais de um dos participantes da relação processual.

A ementa do julgado que integra um dos precedentes da Súmula em apreço, revela o sentido da inaplicabilidade, na hipótese ali descrita, do art. 191 do CPC:

“EMBARGOS DE DECLARAÇÃO CONHECIDOS COMO AGRAVO REGIMENTAL – É firme a jurisprudência desta Corte no sentido de que não cabem embargos declaratórios contra decisão monocrática, devendo esses embargos, quando possível – como é o caso –, ser conhecidos como agravo regimental. Não tem razão, porém, a agravante. Com efeito, não tem cabimento, por ir contra a finalidade desse benefício, a aplicação do prazo em dobro previsto no artigo 191 do Código de Processo Civil quando a decisão produzir sucumbência somente para um dos litisconsortes, que por isso mesmo foi o único a recorrer. Embargos conhecidos como agravo regimental, mas a este se

nega provimento” (STF – AGED 243832 – 1ª T. – Rel. Min. Moreira Alves – DJU 22.10.1999 – p. 78).

643 - O Ministério Público tem legitimidade para promover ação civil pública cujo fundamento seja a ilegalidade de reajuste de mensalidades escolares.

Legislação: CF. art. 129, III; Lei nº 8.078/90, art. 2º, parágrafo único; Lei nº 8.625/93, art. 25.

Os interesses ou direitos individuais homogêneos constituem novidade instituída no Código de Defesa do Consumidor, permitindo que esses interesses ou direitos individuais pudessem ser defendidos coletivamente em juízo. Não se cuida, portanto, de pluralidade subjetiva de demandas, mas sim de uma única demanda, embora de caráter coletivo, que objetiva a tutela dos titulares dos interesses ou direitos individuais homogêneos.

Assim, enquanto a defesa dos interesses difusos e dos interesses coletivos somente é possível coletivamente, a dos individuais homogêneos pode ser feita de forma coletiva (molecular), mas também na modalidade tradicional (atomizada), em que o próprio interessado tutela parcela do seu interesse, ainda que na hipótese outros tantos titulares detenham situações idênticas. O que diferenciará os acidentalmente coletivos dos essencialmente coletivos é justamente a indivisibilidade ou a incindibilidade, presente nestes e ausentes naqueles.

Houve e ainda há a discussão, em sede doutrinária e jurisprudencial, sobre a legitimidade do Ministério Público para o ajuizamento de ação civil pública com base nos interesses ou direitos individuais homogêneos, acidentalmente coletivos, tendo em vista as suas características: interesses ou direitos individuais cujo titular é perfeitamente identificável e cujo objeto é divisível e cindível, embora de origem comum.

Conforme assinala HUGO MAZZILLI19, “não está o MP legitimado à defesa em juízo de interesses de pequenos e de determinados consumidores, atingidos por danos variáveis e individualmente divisíveis”. Em

19. A Defesa dos Interesses Difusos em Juízo, Revista dos Tribunais, 4ª ed., p. 82.

tal emergência, legitimados são os prejudicados, mediante a propositura de ações individuais, ou as entidades a que se refere o inciso IV do art. 82 da Lei nº 8.078/90, que podem propor ações coletivas.

De todo modo, firmou-se o entendimento, afinal consubstanciado na Súmula nº 643, que os interesses ou direitos individuais homogêneos, que assumirem, segundo escólio de ALUISIO GONÇALVES DE CASTRO MENDES20, “pelas suas proporções, pela relevância do bem jurídico em litígio, pela condição das pessoas afetadas ou outro fator, uma dimensão social”, de modo a compatibilizá-los, nos termos do art. 127 do Texto Maior, como espécie de interesses ou direitos sociais e individuais indisponíveis, assim possibilitando a atuação do Ministério Público.

A ementa do acórdão do leading case está abaixo reproduzida, em que o Pleno da Suprema Corte ratifica o interesse social relevante, a bem autorizar, ainda que a hipótese diga respeito a interesse ou direito individual homogêneo, a legitimidade do Ministério Público para a propositura da ação civil pública, com base no art. 129, III, da Constituição Federal:

“RECURSO EXTRAORDINÁRIO – CONSTITUCIONAL – LEGITIMIDADE DO MINISTÉRIO PÚBLICO PARA PROMOVER AÇÃO CIVIL PÚBLICA EM DEFESA DOS INTERESSES DIFUSOS, COLETIVOS E HOMOGÊNEOS – MENSALIDADES ESCOLARES – CAPACIDADE POSTULATÓRIA DO PARQUET PARA DISCUTI-LAS EM JUÍZO – 1. A Constituição Federal confere relevo ao Ministério Público como instituição permanente, essencial à função jurisdicional do Estado, incumbindo-lhe a defesa da ordem jurídica, do regime democrático e dos interesses sociais e individuais indisponíveis (CF, art. 127). 2. Por isso mesmo detém o Ministério Público capacidade postulatória, não só para a

20. Ações Coletiva – no direito comparado e nacional, Revista dos Tribunais, 2002, p. 248.

abertura do inquérito civil, da ação penal pública e da ação civil pública para a proteção do patrimônio público e social, do meio ambiente, mas também de outros interesses difusos e coletivos (CF, art. 129, I e III). 3. Interesses difusos são aqueles que abrangem número indeterminado de pessoas unidas pelas mesmas circunstâncias de fato e coletivos aqueles pertencentes a grupos, categorias ou classes de pessoas determináveis, ligadas entre si ou com a parte contrária por uma relação jurídica base. 3.1. A indeterminidade é a característica fundamental dos interesses difusos e a determinidade a daqueles interesses que envolvem os coletivos. 4. Direitos ou interesses homogêneos são os que têm a mesma origem comum (art. 81, III, da Lei nº 8.078, de 11 de setembro de 1990), constituindo-se em subespécie de direitos coletivos. 4.1. Quer se afirme interesses coletivos ou particularmente interesses homogêneos, stricto sensu, ambos estão cingidos a uma mesma base jurídica, sendo coletivos, explicitamente dizendo, porque são relativos a grupos, categorias ou classes de pessoas, que conquanto digam respeito às pessoas isoladamente, não se classificam como direitos individuais para o fim de ser vedada a sua defesa em ação civil pública, porque sua concepção finalística destina-se à proteção desses grupos, categorias ou classe de pessoas. 5. As chamadas mensalidades escolares, quando abusivas ou ilegais, podem ser impugnadas por via de ação civil pública, a requerimento do Órgão do Ministério Público, pois ainda que sejam interesses homogêneos de origem comum, são subespécies de interesses coletivos, tutelados pelo Estado por esse meio

processual como dispõe o artigo 129, inciso III, da Constituição Federal. 5.1. Cuidando-se de tema ligado à educação, amparada constitucionalmente como dever do Estado e obrigação de todos (CF, art. 205), está o Ministério Público investido da capacidade postulatória, patente a legitimidade ad causam, quando o bem que se busca resguardar se insere na órbita dos interesses coletivos, em segmento de extrema delicadeza e de conteúdo social tal que, acima de tudo, recomenda-se o abrigo estatal. Recurso extraordinário conhecido e provido para, afastada a alegada ilegitimidade do Ministério Público, com vistas à defesa dos interesses de uma coletividade, determinar a remessa dos autos ao Tribunal de origem, para prosseguir no julgamento da ação” (STF – RE – 163231 – SP – TP – Rel. Min. Maurício Corrêa – DJU 29.06.2001 – p. 00055)

644 - Ao procurador autárquico não é exigível a apresentação de instrumento de mandato para representá-la em juízo.

Sem embargo do erro na redação da Súmula, uma vez que o procurador da autarquia não precisa exibir procuração para representá-la em juízo, cumpre distinguir a hipótese em que o profissional do Direito integra os quadros dessa entidade pública, após prévia aprovação em concurso público, daqueles que são contratados para exercer o munus da advocacia. A estes, e não àqueles, é exigível a apresentação do instrumento de mandato.

Justamente porque o procurador autárquico, assim entendido o integrante dos quadros da procuradoria da entidade pública, não está a cumprir mandato, e sim a exercer as atribuições próprias do seu cargo, como ocorre com todos os demais procuradores a que se reporta o inciso I, do art. 12 do CPC.

O precedente específico a seguir transcrito, revela o entendimento que veio a ser agora sumulado:

“RECURSO EXTRAORDINÁRIO – PROCURADOR AUTÁRQUICO – DESNECESSIDADE DE INSTRUMENTO DE DESIGNAÇÃO PARA ATUAR EM JUÍZO – Os procuradores autárquicos que atuam em juízo pela autarquia respectiva não cumprem mandato, mas exercem atribuição de seu cargo, podendo atuar em nome do órgão independentemente de ato de designação” (STF – RE 204.597 – AM – 1ª T. – Rel. Min. Ilmar Galvão – DJU 06.02.1998).

666 - A contribuição confederativa de que trata o art. 8º, IV, da Constituição, só é exigível dos filiados ao sindicato respectivo.

Legislação: CF, art. 8º, IV.

A razão da limitação constante dessa súmula, apenas permitindo a cobrança da contribuição confederativa dos associados da respectiva associação, tem por base o princípio da liberdade de sindical (art. 5º, XX, c/c o art. 8º, V, da CF/88).

A contribuição confederativa, uma vez instituída em assembléia geral dos trabalhadores, porque assim prevista no inciso IV do art. 8º da Constituição da República detém compulsoriedade apenas em relação aos filiados dos sindicatos, qualquer que seja o instrumento coletivo que a contemple — acordo ou convenção coletiva, ou sentença normativa. Entretanto, como não detém essa contribuição natureza de tributo, não pode ser estendida aos empregados não filiados da entidade sindical, sobretudo por força não apenas do princípio da liberdade sindical, mas também do estatuído no art. 149 do Texto Maior.

Em igual sentido, a Orientação Jurisprudencial nº 17 da SDC do TST e o Precedente Normativo nº 119 da SDC do TST21.

21. “Contribuições Sindicais - Inobservância de Preceitos Constitucionais (negativo): A Constituição da República, em seus arts. 5º, XX e 8º, V, assegura o direito de livre associação e sindicalização. É ofensiva a essa modalidade de liberdade cláusula constante de acordo, convenção coletiva ou sentença normativa estabelecendo contribuição em favor de entidade sindical a título de taxa para custeio do sistema confederativo, assistencial, revigoramento ou fortalecimento sindical e outras da mesma espécie, obrigando trabalhadores não sindicalizados. Sendo nulas as estipulações que inobservem tal restrição, tornam-se passíveis de devolução os valores

Veja-se, a seguir, ementa de julgado que compõe um dos precedentes da Súmula aqui examinada:

“CONTRIBUIÇÃO CONFEDERATIVA – ART. 8º, IV, DA CF – AUTO-APLICABILIDADE – LIMITAÇÃO AOS FILIADOS DO SINDICATO – Consolidou-se o entendimento, nesta Primeira Turma, de que a contribuição prevista no art. 8º, IV, da CF não depende, para ser cobrada, de lei integrativa, limitando-se, no entanto, sua exigibilidade aos filiados do sindicato. Precedentes: RREE 191.022, 198.092 e 189.443. Recurso extraordinário conhecido e parcialmente provido” (STF – RE 203.271-9 – RS – 1ª T. – Rel. Min. Octavio Gallotti – DJU 23.10.1998 – p. 10).

667 - Viola a garantia constitucional de acesso à jurisdição a taxa judiciária calculada sem limite sobre o valor da causa.

Legislação: CF, arts. 5º, XXXVI e 145; Lei nº 5.172/66 (C.T.N.), art. 97, § 2º.

Reafirma a Súmula em apreço a natureza de taxa das custas processuais, não podendo, por isso mesmo, ser confundida com outra espécie tributária: o imposto. Tratando-se, portanto, de taxa, impõe-se a observância dos princípios que a informam. É instituída com base no exercício do poder de polícia ou pela utilização, efetiva ou potencial, de serviços públicos específicos e divisíveis, prestados ao contribuinte ou postos a sua disposição (CF, art. 145, II).

Trata-se de tributo de natureza vinculada, cuja hipótese de incidência, como constitucionalmente disciplinado, é a prestação de um serviço público específico e divisível, que tem como requisito a possibilidade de ser destinado em unidades autônomas de intervenção, de utilidade ou de necessidade pública (art. 79, II, do CTN), além de ser suscetível de utilização, separadamente, por cada um dos usuários (art. 79, III, do CTN). A taxa, por via de conseqüência, somente poderá ser instituída como contraprestação de uma atuação estatal específica relativa ao contribuinte e divisível,

irregularmente descontados”.

assim propiciando ser mensurada a quantidade utilizada por parte de cada contribuinte.

É ínsito ao conceito de taxa a retribuição ou a remuneração do custo da atividade estatal especial que lhe dá causa, estando implícita a repartição dos custos dos atos estatais que a motivou.

Assim, os valores da taxa judiciária, a fim de atender ao princípio constitucional implícito de corresponder, para cada obrigado, a um pagamento que represente uma reposição, pelo menos aproximada ou estimada, do custo da atividade estatal provocada pelo exercício da prestação jurisdicional, deve corresponder, na medida do possível, ao serviço judiciário prestado aos jurisdicionados, sem que inviabilize o acesso à justiça (CF, art. 5º, XXXV).

Como essa atividade jurisdicional é prestada pela União e pelos Estados, há a competência concorrente para legislar sobre o assunto, ex vi do disposto no art. 24, IV, da Carta Política.

Em conseqüência, ainda que o valor da causa ou o valor da condenação sejam admissíveis como base de cálculo para efeito de apuração dessa espécie tributária, não pode haver desproporcionalidade, motivo determinante de propugnar a Súmula de que se trata pela inconstitucionalidade da norma que não limite essa incidência, sob pena de obstar aos interessados o acesso à jurisdição.

A ementa do aresto abaixo reproduzido, confere o exato sentido e alcance da Súmula aqui apreciada:

“AÇÃO DIRETA DE INCONSTITUCIONALIDADE – MEDIDA CAUTELAR – 1. Taxa Judiciária: sua legitimidade constitucional, admitindo-se que tome por base de cálculo o valor da causa ou da condenação, o que não basta para subtrair-lhe a natureza de taxa e convertê-la em imposto: precedentes (ADIn 948-GO, 09.11.1995, Rezek; ADIn MC 1.772-MG, 15.04.1998, Velloso). 2.

Legítimas em princípio a taxa judiciária e as custas ad valorem afrontam, contudo, a garantia constitucional de acesso à jurisdição (CF, art. 5º, XXXV) se a alíquota excessiva ou a omissão de um limite absoluto as tornam desproporcionadas ao custo do serviço que remuneraram: precedentes (Rp 1.077-RJ, 28.03.1984, Moreira, RTJ 112/34; Rp 1.074-, 15.08.1984, Falcão, RTJ 112/499; ADIn 948-GO, 09.11.1995, Rezek; ADIn MC 1.378-5, 30.11.1995, Celso, DJ 30.05.1997; ADIn MC 1.651-PB, Sanches, DJ 11.09.1998; ADIn MC 1.772-MG, 15.04.1998, Velloso). 3. ADIn: medida cautelar: não se defere, embora plausível a argüição, quando – dado o conseqüentes restabelecimento da eficácia da legislação anterior – agravaria a inconstitucionalidade denunciada: é o caso em que, se se suspende, por aparentemente desarrazoada, a limitação das custas judiciais a 5% do valor da causa, seria restabelecida a lei anterior que as tolerava até 20%. 4. Custas dos serviços forenses: matéria de competência concorrente da União e dos Estados (CF 24, IV), donde restringir-se o âmbito da legislação federal ao estabelecimento de normas gerais, cuja omissão não inibe os Estados, enquanto perdure, de exercer competência plena a respeito (CF, art. 24, §§ 3º e 4º). 5. Custas judiciais são taxas, do que resulta – ao contrário do que sucede aos impostos (CF, art. 167, IV) – a alocação do produto de sua arrecadação ao Poder Judiciário, cuja atividade remunera; e nada impede a afetação dos recursos correspondentes a determinado tipo de despesas – no caso, as de capital, investimento e treinamento de pessoal da Justiça – cuja finalidade tem inequívoco liame instrumental com o serviço

judiciário” (STF – ADIMC 1926 – TP – Rel. Min. Sepúlveda Pertence – DJU 10.06.1999 – p. 2).

Como, no processo do trabalho, na fase de conhecimento, diferentemente do que ocorre na de execução, as custas não têm limite máximo de valor, mas apenas limite mínimo (CLT, art. 789), viola, portanto, a garantia do acesso à jurisdição a taxa calculada sem qualquer delimitação e em valor inteiramente desproporcional ao serviço judiciário prestado.

675 - Os intervalos fixados para descanso e alimentação durante a jornada de seis horas não descaracterizam o sistema de turnos ininterruptos de revezamento para o efeito do art. 7º, XIV, da Constituição.

Legislação: CF, art. 7º, XIV.

Há perfeita harmonia entre o teor dessa Súmula nº 675 e o constante no Enunciado nº 360 do TST — “A interrupção do trabalho destinada a repouso e alimentação, dentro de cada turno, ou o intervalo para repouso semanal, não descaracteriza o turno de revezamento com jornada de 6 horas previsto no art. 7º, inciso XIV, da Constituição da República de 1988” — firmes em que a concessão de intervalo intrajornada, mas havendo o regime de revezamento em turnos, não o descaracteriza.

O que caracteriza o regime de revezamento em turnos de trabalho, portanto, é a alteração do horário dentro da semana, que impede a adaptação do organismo a horários fixos, tornando o trabalho penoso, inclusive diante da dificuldade que é imposta ao trabalhador de estabelecer uma rotina básica de vida, a ponto de justificar a jornada especial de seis horas.

Por conseguinte, a concessão de intervalos em meio à jornada atende à norma de ordem pública, que protege a saúde do empregado, mas não descaracteriza o regime de revezamento previsto no art. 7º, XIV, da Norma Fundamental.

676 - A garantia da estabilidade provisória prevista no art. 10, II, a, do ADCT, também se aplica ao suplente do cargo de direção de comissões internas de prevenção de acidentes (CIPA).

Legislação: ADCT, art. 10, II, a.

O Enunciado nº 339/TST dispõe de forma semelhante ao estatuído na Súmula nº 676 do STF, nesses termos:

“CIPA - SUPLENTE - GARANTIA DE EMPREGO - CF/88 – O suplente da CIPA goza da garantia de emprego prevista no art. 10, inciso II, alínea "a", do ADCT da Constituição da República de 1988”.

Tanto o Supremo Tribunal Federal quanto o Tribunal Superior do Trabalho conferiram ao art. 10, II, a, do ADCT a mesma interpretação — a de assegurar ao empregado eleito para cargo de direção de comissões internas de prevenção de acidentes, desde o registro de sua candidatura até um ano após o final de seu mandato, a estabilidade provisória no emprego.

Observe-se, para não passar por sobre o ponto, que art. 165 da CLT, de seu turno, é norma de igual conteúdo, uma vez que veda a despedida arbitrária dos titulares de representação dos empregados nas CIPA’s, entendendo-se como tal a que não se fundar em motivo disciplinar, técnico, econômico ou financeiro.

Não distinguem tais normas, com efeito, entre membros titulares e suplentes. Esta, portanto, a razão de desfrutarem da garantia de estabilidade não apenas os titulares, mas também os suplentes das comissões internas de acidente.

Um único reparo. Não seria, em rigor técnico, hipótese de estabilidade, mas sim de garantia no emprego. Não por outro motivo é que a dispensa do empregado titular ou suplente da CIPA, ao contrário do que ocorre com o dirigente sindical, dispensa a propositura de prévio inquérito judicial para apuração de falta grave.

A despedida, no entanto, não será válida e eficaz, mas sim considerada arbitrária, caso o empregador não venha a comprovar

em juízo o motivo disciplinar, técnico, econômico ou financeiro, que a determinou, nos precisos termos do art. 165 da CLT.

Transcreve-se a ementa de um dos precedentes que deram origem à Súmula nº 676 do STF:

“RECURSO EXTRAORDINÁRIO – CONSTITUCIONAL – TRABALHISTA – ESTABILIDADE PROVISÓRIA – MEMBRO DA CIPA – COMISSÃO INTERNA DE PREVENÇÃO DE ACIDENTE – ART. 10, II, A DO ADCT-CF/1988 – EXTENSÃO AO SUPLENTE – 1. A norma constitucional transitória não fez qualquer distinção entre o titular e o suplente, eleitos como representantes dos empregados para o exercício de cargo de direção de Comissão Interna de Prevenção de Acidente. 2. Estabilidade provisória. Extensão ao suplente. Indeferir a ele essa garantia e permitir a sua dispensa arbitrária ou sem justa causa é dar oportunidade a que o empregador, por via oblíqua, tendo em vista os interesses patronais, esvazie a atuação do representante dos empregados, frustrando a expectativa de direito daquele que, eventualmente, poderá vir a exercer a titularidade do cargo. Recurso extraordinário não conhecido” (STF – RE 205.701 – SP – 2ª T. – Rel. Min. Maurício Corrêa – DJU 27.02.1998).

677 - Até que lei venha a dispor a respeito, incumbe ao Ministério do Trabalho proceder ao registro das entidades sindicais e zelar pela observância do princípio da unicidade.

Legislação: CF, art. 8º, I e II.

A Constituição Federal conferiu liberdade aos interessados para a fundação de sindicatos, mas ressalva o “registro no

órgão competente”, sem esclarecer qual seria o órgão encarregado dessa incumbência. A hipótese, portanto, é de anomia.

Como ainda divergem, doutrina e jurisprudência, sobre o tema, mostra-se imperiosa a edição de lei que discipline integralmente o assunto, sobretudo com o intuito de evitar as disputas judiciais em torno do registro e da existência das entidades sindicais em uma mesma base territorial e a englobar idêntica categoria profissional ou econômica.

Diante disso, a Súmula nº 677 — que se espera tenha caráter provisório, uma vez que ela exorta a edição de norma que venha a reger o tema —, com vistas a prevenir esse estado de coisas, estabeleceu a competência do Ministério do Trabalho, não apenas para proceder ao respectivo registro das entidades sindicais, mas também para zelar pelo observância da unicidade sindical.

Transcreve-se, a propósito, um dos precedentes jurisprudenciais da Súmula em destaque:

“REGISTRO DE ENTIDADES SINDICAIS – RECEPÇÃO, EM TERMOS, DA COMPETÊNCIA DO MINISTÉRIO DO TRABALHO, SEM PREJUÍZO DA POSSIBILIDADE DE A LEI VIR A CRIAR REGIME DIVERSO – COMISSÃO DE ENQUADRAMENTO SINDICAL – INTERESSE DA IMPETRANTE NA CONTINUIDADE DE SEU FUNCIONAMENTO – INEXISTÊNCIA – 1. Conforme decidido pelo Plenário (MI 144, 28.05.1993), a função de salvaguarda da unicidade sindical induz a sediar, si et in quantum, a competência para o registro das entidades sindicais no Ministério do Trabalho, detentor do acervo das informações imprescindíveis ao seu desempenho. 2. Desde que as atividades de registro sejam retomadas pelo Ministério do Trabalho, pouco importa a impetrante que, internamente, o órgão encarregado de aferir a observância do requisito da unicidade sindical seja, ou não,

a Comissão de Enquadramento Sindical” (STF – RE 134.300 – DF – 1ª T. – Rel. Min. Sepúlveda Pertence – DJU 14.10.1994).

680 - O direito ao auxílio-alimentação não se estende aos servidores inativos.

Legislação: CF art. 40, § 4º.

O enunciado dessa Súmula atrita com a OJ nº 250 da SBDI-1/TST, que, especificamente quanto aos aposentados e pensionistas da Caixa Econômica Federal, estatui que “A determinação de supressão do pagamento de auxílio-alimentação aos aposentados e pensionistas da Caixa Econômica Federal, oriunda do Ministério da Fazenda, não atinge aqueles ex-empregados que já percebiam o benefício”.

Proporcionar auxílio alimentação a inativo, é o mesmo que a estes conceder férias anuais. Nada há de razoável que autorize esse despautério, sobretudo diante da norma inscrita nos §§ 4º e 8º do art. 40 da Constituição Federal22. Trata-se, em rigor, de parcela de natureza indenizatória destinada a cobrir os custos de refeição devida exclusivamente ao servidor que se encontrar no pleno exercício de suas funções, conquanto não se incorpore à remuneração, nem aos proventos de aposentadoria.

22.§ 4º. É vedada a adoção de requisitos e critérios diferenciados para a concessão de aposentadoria aos abrangidos pelo regime de que trata este artigo, ressalvados os casos de atividades exercidas exclusivamente sob condições especiais que prejudiquem a saúde ou a integridade física, definidos em lei complementar.

§ 8º. Observado o disposto no artigo 37, XI, os proventos de aposentadoria e as pensões serão revistos na mesma proporção e na mesma data, sempre que se modificar a remuneração dos servidores em atividade, sendo também estendidos aos aposentados e aos pensionistas quaisquer benefícios ou vantagens posteriormente concedidos aos servidores em atividade, inclusive quando decorrentes da transformação ou reclassificação do cargo ou função em que se deu a aposentadoria ou que serviu de referência para a concessão da pensão, na forma da lei”.

Elucidativa, no particular, a seguinte ementa, na esteira do entendimento prevalecente no STF:

“AUXÍLIO-ALIMENTAÇÃO – Esta Corte tem entendido que o direito ao vale- alimentação ou auxílio-alimentação não se estende aos inativos por força do § 4º do artigo 40 da Constituição Federal, porquanto se trata, em verdade, de verba indenizatória destinada a cobrir os custos de refeição devida exclusivamente ao servidor que se encontrar no exercício de suas funções, não se incorporando à remuneração nem aos proventos de aposentadoria (assim, a título exemplificativo, nos RREE 220.713, 220.048, 228.083, 237.362 e 227.036). – E ainda em face do § 8º do artigo 40 na redação dada pela Emenda Constitucional n. 20/98, o Plenário deste Tribunal, ao julgar a ADI 575, manteve o entendimento de que a regra de extensão aos inativos das melhorias da remuneração dos correspondentes servidores em atividade (CF, art. 40, § 8º, cf. EC 20/98) não implica a permanente e absoluta paridade entre proventos e vencimentos, dado que nos últimos se podem incluir vantagens pecuniárias que, por sua natureza, só podem ser atribuídas aos serviço ativo” (STF – RE 318684 – 1ª T. – Rel. Min. Moreira Alves – DJU 09.11.2001).

688 - É legítima a incidência da contribuição previdenciária sobre o 13º salário.

Legislação: CF, art. 195, I e art. 201, § 4º.

A Súmula nº 688 ratifica o entendimento, que é o prevalecente em sede doutrinária e jurisprudencial, de ser o 13º salário — a gratificação natalina — parcela de natureza salarial, nunca

indenizatória, e, portanto, sujeita as mesmas incidências aplicáveis aos salários.

Afinal, a Constituição Federal, ao disciplinar sobre as contribuições previdenciárias a cargo do empregador, estatui que as respectivas bases de incidências só podem ser a folha de salário, demais rendimentos do trabalho pagos ou creditados, a qualquer título, à pessoa física que lhe preste serviço, mesmo sem vínculo empregatício, o faturamento e o lucro (art. 195, I, alíneas a, b e c). Deixou claro, no entanto, que estão excluídas da incidência de contribuições previdenciárias verbas trabalhistas de natureza não salarial, a exemplo do aviso prévio indenizado e das férias indenizadas.

Bem por isso é que o STF, como se observa do acórdão a seguir, sempre sustentou a natureza salarial do 13º salário, por isso mesmo submetido à incidência da respectiva contribuição previdenciária:

“CONTRIBUIÇÃO PREVIDENCIÁRIA – 13º SALÁRIO – A incidência da contribuição previdenciária sobre o 13º salário não ofende o art. 195, I, da Constituição, uma vez que a primeira parte do § 4º do art. 201 da mesma Carta Magna determina que os ganhos habituais do empregado, a qualquer título, serão incorporados ao salário para efeito de contribuição previdenciária, e a Súmula 207 desta Corte declara que as gratificações habituais, inclusive a de Natal, consideram-se tacitamente convencionadas, integrando o salário. O mesmo entendimento foi perfilhado pela Segunda Turma, ao julgar o RE 219.689. Recurso extraordinário não conhecido” (STF – RE 287.427-2 – AL – 1ª T. – Rel. Min. Moreira Alves – DJU 10.08.2001 – p. 19).

689 - O segurado pode ajuizar ação contra a instituição previdenciária perante o juízo federal do seu domicílio ou nas varas federais da Capital do Estado-Membro.

Legislação: CF, art. 109, §3º.

A Súmula faculta ao segurado optar pelo ajuizamento da ação em face da instituição previdenciária no juízo federal do seu domicílio ou nas varas federais da Capital de Estado-Membro. De modo que, não está o segurado obrigado, diante da existência de vara federal em seu domicílio, a ajuizar a ação nesse foro, mediante interpretação restritiva da regra inscrita no § 3º do artigo 109 da Constituição Federal, assim redigido:

“Serão processadas e julgadas na justiça estadual, no foro do domicílio dos segurados ou beneficiários, as causas em que forem parte instituição de previdência social e segurado, sempre que a comarca não seja sede de vara do juízo federal, e, se verificada essa condição, a lei poderá permitir que outras causas sejam também processadas e julgadas pela justiça estadual”.

Prevaleceu, portanto, o entendimento sustentado pelo Min. MOREIRA ALVES, segundo o qual a norma constitucional prevê uma faculdade em benefício do segurado. A ementa abaixo reproduzida, bem explicita o assunto:

“AÇÃO PREVIDENCIÁRIA – Competência para processá-la e julgá-la originariamente. – Ambas as Turmas desta Corte (assim, a título exemplificativo, nos RREE 239.594, 222.061, 248.806 e 224.799) têm entendido que, em se tratando de ação previdenciária, o segurado pode ajuizá-la perante o juízo federal de seu domicílio ou perante as varas federais da capital do Estado-membro, uma vez que o artigo 109, § 3º, da Constituição Federal prevê uma faculdade em seu benefício, não podendo esta norma ser aplicada para prejudicá-lo. Dessa orientação divergiu o acórdão recorrido. Recurso extraordinário

conhecido e provido” (STF – RE 284516 – 1ª T. – Rel. Min. Moreira Alves – DJU 09.02.2001).

O constituinte, como visto, visou proteger o segurado da previdência social, ampliando seu acesso à justiça (CF, art. 5º, XXXV), motivo precípuo de facultar-lhe a opção do foro entre o do seu domicílio e o da Capital do Estado-Membro.

CONCLUSÃO

Estas as breves e simples considerações sobre as recentes Súmulas editadas pelo Supremo Tribunal Federal.

Espera-se, agora, pela aplicabilidade dos conceitos nela emitidos, ainda que não se adira integralmente, como revelam os argumentos aqui emitidos em traços largos, com vários deles, embora representem o entendimento da mais alta Corte de justiça deste país.

Em verdade, assim como veio a ocorrer no Tribunal Superior do Trabalho, há a necessidade de revisão de várias Súmulas do Supremo Tribunal Federal, notadamente aquelas pertinentes a matérias que hoje são da competência do Superior Tribunal de Justiça, inclusive a fim de conferir harmonia ao sistema.

Salvador, 04 de novembro de 2003.

Dalzimar G. Tupinambá

Advogado