ARTETERAPIA
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UnP - UNIVERSIDADE POTIGUAR PR-REITORIA DE PESQUISA E PS-GRADUAO LATO SENSU
ALQUIMY ART ESPECIALIZAO EM ARTETERAPIA
ARTETERAPIA NO CONTEXTO EDUCACIONAL
DESVELANDO A CRIATIVIDADE POR MEIO
DA BRINCADEIRA E DOS JOGOS TEATRAIS
ANA CRISTINA CAMANO PASSOS
So Paulo
2005
-
ANA CRISTINA CAMANO PASSOS
ARTETERAPIA NO CONTEXTO EDUCACIONAL
DESVELANDO A CRIATIVIDADE POR MEIO DA BRINCADEIRA E DOS JOGOS TEATRAIS
Monografia apresentada Universidade Potiguar, RN e ao Alquimy Art, de So Paulo, como parte dos requisitos para obteno do ttulo de Especialista em Arteterapia.
Orientadora: Prof MsC. Deolinda F. Fabietti.
SO PAULO
2005
-
Passos, Ana Cristina Camano Arteterapia no contexto educacional. Desvelando a criatividade por meio
das brincadeiras e dos jogos teatrais / Ana Cristina Camano Passos. So Paulo; [s.n.],
2005.
84p.
Monografia (Especializao em Arteterapia) UnP - Universidade
Potiguar. Pr-Reitoria de Pesquisa e Ps-Graduao Lato Sensu (RN) e Alquimy Art
(SP).
1.Jogos teatrais 2. Brincadeira 3. Criatividade
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SP/BGFS CDV.51
UnP - UNIVERSIDADE POTIGUAR
PR-REITORIA DE PESQUISA E PS-GRADUAO LATO SENSU
ALQUIMY ART
ARTETERAPIA NO CONTEXTO EDUCACIONAL
DESVELANDO A CRIATIVIDADE POR MEIO DA BRINCADEIRA E DOS JOGOS TEATRAIS
Monografia apresentada pela aluna Ana Cristina Camano Passos, ao curso de
Especializao em Arteterapia em ___/___/___, e recebendo a avaliao da Banca
Examinadora constituda pelos professores:
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___________________________________________________________________ Prof. MsC. Deolinda M. C. F. Fabietti Orientadora e Coordenadora da Especializao.
Prof. Dra. Cristina Dias Allessandrini Coordenadora da Especializao.
Prof. Marisa Bianco - Leitora Crtica.
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Ao meu pai, que no percurso de suas grandes conquistas
ensinou-me a buscar com honestidade e competncia nossos objetivos.
minha me, o desafio de alinhar, em sua efmera passagem nesta vida,
amor, intuio, sensibilidade, conhecimento e carisma.
Ao Helder, meu companheiro,
por acreditar e participar do meu sonho.
Aos meus filhos, Philipe, Andria, Graziela e Rafael
pelo carinho e incentivo em todas as minhas realizaes.
Ao meu tio Joaquim
pela possibilidade de viabilizar este desejo.
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AGRADECIMENTOS
EMEE Anne Sullivan, pela oportunidade de tantas descobertas e realizaes.
Aos meus alunos que acreditaram na construo de um projeto inovador na escola e
muito se empenharam na descoberta do nosso SER, de nossas possibilidades e
limitaes.
s minhas amigas da escola, Flvia, Mrcia e Maria Matos que acompanharam e
intercederam na realizao desta reflexo por meio da escuta, da troca de
conhecimentos e de prticas realizadas.
Em especial a Ana Maria, pelo trabalho em equipe que conseguimos desenvolver e
ao carinho com que traduziu o resumo desta monografia para o Ingls.
A toda equipe docente do Alquimy Art que, direta ou indiretamente, conduziu o
nosso olhar para nossas possibilidades internas, alinhando nosso poder de
criatividade e conhecimento terico, com sabedoria e humildade, no processo da
cura teraputica.
s minhas amigas do Alquimy Art, pelo carinho e pela saudade.
A Priscila Rocha com carinho, minha amiga e companheira de estgio, a
possibilidade de discutir, trocar, criar, intuir, construir - destruir, planejar, organizar,
desorganizar para re-organizar e re-construir a nossa atuao nas oficinas
teraputicas.
E a Margaret Pela, que com seu olhar cauteloso e certeiro, atuou com preciso na
reviso deste texto.
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RESUMO
Esta monografia apresenta a importncia da arte para um grupo de adolescentes
surdos, alunos da Escola Municipal Educao Especial (EMEE) Anne Sullivan que
acreditavam que arte era coisa para beb. Na busca de processar a defesa da
importncia da arte para aqueles alunos, desvela-se um mundo inteiramente novo. O
trabalho vivenciado revelou os diversos olhares que compem um mesmo grupo e a
busca do educador, que sua maneira, tentou unir a teoria e a prtica sua histria
pessoal e profissional. A LIBRAS, a lngua de sinais desenvolvida e utilizada pela
comunidade de surdos no Brasil, foi utilizada como meio de comunicao para a
realizao e o desenvolvimento das atividades propostas. A LIBRAS a lngua
materna do surdo. O trabalho desenvolvido abordou principalmente os jogos teatrais
e teve como base a estrutura de orientao proposta pela metodologia de Viola
Spolin, (o qu, quem e onde) que contribuiu para organizar o pensamento do
surdo em funo do objeto, do personagem e do ambiente. Nossa inteno nesta
monografia foi contagiar a ao dos profissionais envolvidos na educao
encorajando-os a buscarem novos encaminhamentos no fazer pedaggico,
transformando as mesmices do dia a dia em prticas prazerosas e inovadoras.
Neste sentido, a proposta arteteraputica propiciou dinmicas em que a arte
facilitadora de novas aprendizagens.
Palavras-chave: jogos teatrais, brincadeira, criatividade.
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ABSTRACT
This paper presents the course of our work focusing the importance of art for a group of
hearing impaired children and adolescents who attended a public school - the EMEE Anne Sullivan, in the city of So Paulo, and believed art to be for babies. Searching for a process to support the importance of art for those students we came across an entirely new world. The
experienced work revealed to us different views of a same group and the search of the
educator, who in his own way, tried to join theory and practice to his own personal and
professional background. LIBRAS, the Brazilian sign language, was used as means of
communication to achieve and develop the proposed activities. LIBRAS is the sign language
developed and used by the deaf community in Brazil. LIBRAS is the deafs mother language. The orientation structure was based on drama exercises drawn from Viola Spolins methodology (what, who and where) and contributed to organize the deafs thinking having in mind the object, the character and the environment. This paper purpose was to
influence the professionals involved in educational actions encouraging them to look for new
ways in the pedagogical act, transforming the daily routine into new and joyful practices.
With this in mind, art therapeutic proposals prove that dynamics using the resource of art can
provide news ways of learning.
Key words: role play, games, creativity.
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SUMRIO
AGRADECIMENTOS.................................................................... 05
RESUMO....................................................................................... 06
ABSTRACT................................................................................... 07
INTRODUO
ABRINDO AS CORTINAS........................................................
09
CENA I
NOS BASTIDORES..................................................................
15
CENA II
NA COXIA.................................................................................
47
CENA III
NO PALCO................................................................................
61
CENA IV
ENTRE APLAUSOS E VAIAS..................................................
73
REFERNCIAS BIBLIOGRFICAS............................................. 83
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ABRINDO AS CORTINAS
Abro o primeiro captulo da minha monografia com o desejo de compartilhar a razo
pela qual escolhi a ARTETERAPIA como fundamento terico e prtico para
enriquecer minha prtica pedaggica com crianas com necessidades especiais.
Sou professora efetiva da Escola Municipal de Educao Especial Anne Sullivan, no
bairro de Santo Amaro (municpio de So Paulo) onde, em parceria com os alunos,
construmos e nos apropriamos da nossa prtica e, no convvio com o corpo
docente, pesquisamos e fundamentamos nossa ao pedaggica.
Apesar da Anne Sullivan ser uma escola especial para surdos ela tambm integra
crianas com outros comprometimentos fsicos e neurolgicos como, por exemplo,
surdos com problemas visuais, surdos com deficincia fsica, surdos autistas, surdos
com comprometimentos mentais etc.
Consideramos surdos aqueles indivduos que nasceram ou perderam a audio
antes de adquirir a linguagem oral de forma natural, ou seja, ouvindo-a. Dependendo
da perda auditiva, o surdo pode ouvir um pouco, muito pouco ou quase nada.
(MOURA, 2000).
Quando me formei, h mais ou menos 25 anos atrs, o surdo era considerado
deficiente auditivo. Deficiente e doente no sentido mdico do termo.
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O deficiente auditivo precisava ser treinado para adquirir a linguagem oral e para
isto, ele era equipado com aparelhos de amplificao sonoro individuais. Estes
aparelhos tinham por funo amplificar os sons da fala e do ambiente ajudando-os a
desenvolver a linguagem oral.
Naquela poca, na escola, acreditvamos na proposta oralista da educao de
surdos, ou seja, o foco do nosso trabalho baseava-se no desenvolvimento da leitura
orofacial e na crena de que a criana surda aprenderia a falar.
Desenvolvamos, nas reas de linguagem, a habilidade na criana de ler nos lbios
do interlocutor os sons da fala utilizando o treinamento auditivo como recurso para a
conquista de tal objetivo.
Algumas crianas se beneficiaram com a proposta oralista, geralmente aquelas que
possuam uma perda leve.
Ns, na maioria das vezes, nos frustrvamos com o resultado do nosso trabalho,
tendo em vista que, a maior parte dos alunos no conseguia desenvolver a
linguagem oral, e conseqentemente apresentava muitos problemas na escrita.
Por volta de 1974, mais ou menos, ocorreram os primeiros contatos, de estudiosos e
pesquisadores brasileiros, com a proposta americana que desenvolvia trabalhos com
a Comunicao Total. (MOURA, 2000).
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A Comunicao Total apresentava uma outra proposta para ensinar a criana
deficiente auditiva: inclua fala, leitura orofacial, treinamento auditivo, expresso
facial, mmica, e sinais. A proposta era utilizar toda forma que funcionasse para
transmitir vocabulrio, linguagem e idias entre o falante e a criana surda. No
oralismo, no era permitido utilizar sinais nem a expresso corporal.
Os sinais utilizados pela Comunicao Total passaram a representar objetos, aes
e idias. Uma revoluo na educao do surdo! Esse novo paradigma ampliou
consideravelmente a utilizao do uso dos sinais na comunicao entre surdos e
ouvintes, transformando nossa ao, que compreendia os sinais restritos aos gestos
de apoio ou mesmo mmica.
A criana passou a ter uma imagem visual da fala, ou seja, passamos a representar
objetos aes e idias por intermdio da configurao das mos. O rosto, a
expresso facial, o olhar e a expresso corporal passaram a ocupar papis
lingsticos importantes.
Passamos a enxergar a criana no mais como deficiente ou doentes que buscam a
cura por meio do desenvolvimento da fala. Abandonamos a condio do ouvinte
como parmetro no trabalho com o surdo e passamos a compreend-lo dentro das
suas especificidades lingsticas.
O desenvolvimento das crianas deficientes auditivas melhorou muito com a
Comunicao Total: elas passaram a se comunicar com mais facilidade, a
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comunicao oral no ficou to prejudicada quanto esperavam (opositores) e o
desempenho escolar melhorou bastante.
Nas escolas, a forma de comunicao era bimodal (utilizao da fala acompanhada
de sinais), mas a nfase de algumas escolas ainda era para o oralismo. A criana
ainda era vista como deficiente auditiva.
A Lngua de Sinais encaminhou uma nova viso poltica e ideolgica, relacionadas
identidade, ao conceito de cultura, grupos minoritrios, direito de cidadania e a uma
lngua. (MOURA, 2000).
Iniciou-se, ento um movimento nos Estados Unidos que reuniu as minorias dos
mais diversos tipos (minorias tnicas e pessoas com necessidades especiais) que
reivindicavam o movimento de uma cultura prpria, denunciando a discriminao
que sofriam. Este movimento foi denominado de multiculturalismo. Inseridos neste
contexto, os Surdos comearam a ser ouvidos pela comunidade ouvinte. Os surdos
passaram a reivindicar o direito de utilizar a sua lngua, que apesar de excluda pela
educao oralista, continuou viva entre os surdos. (MOURA, 2000).
Os surdos passaram a reivindicar o direito de serem ouvidos no mais na condio
de sua deficincia, mas na condio de pertencerem a um grupo minoritrio com
direito a serem respeitados pela sua diferena, com direitos de serem educados na
sua prpria lngua: a Lngua de Sinais. Hoje no mais nos referimos ao Surdo como
deficientes, mas como indivduos surdos. (QUADROS, 1997).
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A partir do final da dcada de 80, no Brasil, as escolas que possuam alunos surdos,
passaram a adotar uma abordagem mista. Apesar de acreditarmos nas mudanas e
apoiarmos o movimento de identidade da cultura surda, ainda tnhamos o oralismo
como nfase no trabalho. Algumas vezes, percebia-me agindo a favor de uma
pedagogia renovada, mista, bimodal, porm, em outras com atitudes arcaicas do
oralismo.
O movimento dos Surdos, aqui no Brasil, contou com o apoio de lingistas,
educadores, surdos de outros pases e estudiosos da questo. O resultado
conquistado pelas suas lutas e reivindicaes levou implantao de um sistema de
educao que considera a Lngua de Sinais a primeira lngua a ser adquirida pela
criana surda.
A equipe docente da escola precisou se reciclar e aprender a Lngua de Sinais
Brasileira para desenvolver no surdo, filho de pais ouvintes, a sua lngua materna.
Hoje, ns estamos reformulando o currculo da escola adequando-o a proposta
bilnge educao do surdo.
Esta proposta considera a Lngua de Sinais como a lngua natural do surdo e o
portugus escrito como a sua segunda lngua. Desta forma, desenvolvemos um
trabalho de consolidao da primeira lngua, para garantir o desenvolvimento
cognitivo, social e afetivo no surdo para depois apresentarmos o portugus escrito,
para que ele possa ter acesso ao conhecimento da cultura ouvinte.
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A nossa escola realiza um trabalho pedaggico que abrange desde a Educao
Infantil (1, 2 e 3 estgio) at o Ciclo II do Ensino Fundamental; ou seja, at o 8
ano. O corpo docente tem formao em pedagogia com especializao na rea de
educao para deficientes auditivos.
Uma das maiores dificuldades no exerccio da nossa prtica pedaggica com o
aluno surdo conhecer as suas especificidades e ser fluente em sua lngua
materna: a Lngua de Sinais Brasileira.
O surdo, filho de pais ouvintes, muitas vezes chega escola sem compreender seu
mundo porque a lngua que lhe exposta no lhe traz nenhum sentido.
no exerccio da convivncia social com outros surdos que eles vo se apropriando
da sua lngua materna, a Lngua de Sinais, e da cultura surda. A escola especial
um referencial na aquisio e no desenvolvimento da Lngua de Sinais.
Ns educadores temos que nos constituir interlocutores confiveis da sua Lngua,
para possibilitar o desenvolvimento de suas mltiplas inteligncias, o
reconhecimento e a ampliao de seus talentos, bem como, promover discusses e
reflexes sobre a diversidade de valores existentes na sociedade para que o aluno
possa, ao discutir, tomar conhecimento e opinar sobre o que foi apresentado
construindo assim, sua prpria identidade.
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CENA I
NOS BASTIDORES
No ano de 1999 eu estava na funo de Auxiliar de Direo na EMEE Anne Sullivan,
desenvolvendo atividades organizacionais e burocrticas na escola.
Neste mesmo ano, uma professora do perodo noturno entrou em licena
maternidade e como no havia professora para substitu-la eu assumi suas aulas de
arte com adolescentes surdos do 5 ao 8 ano do Ensino Fundamental.
Ao entrar na sala de aula, percebi o quanto a Arte estava distante e desprovida de
significados para os alunos. No havia interesse pela ARTE. Os alunos estavam
descontentes e desmotivados. Desenhar, pintar, trabalhar com massinha e argila
para eles era atividade de beb; eles queriam ir alm do que lhes era proposto, mas
no tinham claro o que realmente desejavam.
Para aqueles alunos, o importante era dar continuidade ao contedo de matemtica
e portugus, pois estes fundamentam e embasam seu conhecimento no ingresso ao
Ensino Mdio como tambm constituem ferramenta preciosa na seleo de
empregos.
Arte para eles era perda de tempo. Foi difcil intervir na maneira como eles sentiam e
presenciavam a Arte. Passamos ento a organizar os sentimentos que vinham
tona na calorosa discusso sobre o que Arte e o que ela significava para cada um.
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Durante alguns encontros ns refletimos sobre os descontentamentos e as
insatisfaes que os envolviam nas aulas de artes para reconstruir e reorganizar o
nosso trabalho com maior significado.
Tinha como preocupao inicial apresentar a Arte como uma expresso artstica que
nos permitisse vivenciar sonhos, emoes, prazer, descobertas e autoconhecimento
por meio da criao e do uso de diferentes linguagens numa abordagem mais
criativa da vida. Porm, nossa insero neste tema s foi possvel por meio do vis
cultural, histrico e econmico da Arte.
Iniciamos nossas reflexes revendo a Arte como um patrimnio cultural da
humanidade. na diversidade cultural de um povo que esto gravados seus sonhos,
sentimentos e desejos: msica, dana, pinturas, esculturas, folclore, casos, histrias
etc.
Com este objetivo, apresentei algumas esculturas do nordeste brasileiro, aos alunos,
com o propsito de ampliar e atribuir sentido Arte. Por intermdio das esculturas,
enumeramos algumas hipteses sobre a histria das famlias nordestinas: seus
sonhos, desejos, frustraes, realidade scio-econmica e cultural.
Discutir a Arte passou a fazer sentido para aquele grupo de alunos. Eles perceberam
que havia um valor cultural, social e econmico naquelas esculturas apresentadas e
que com a arte tambm se ganha dinheiro. Nesta fala, ficou clara a preocupao
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dos alunos em entrar no mercado de trabalho, buscar autonomia e independncia
econmica.
A Arte deixou de ser coisa de criana e passou a ser compreendida como uma
atividade social, um modo de compreender a construo e os contedos do
imaginrio de um povo, situado num determinado espao, com caractersticas
histricas e econmicas peculiares.
Observamos que o homem deixa seu registro, a sua presena, a sua leitura de
mundo, o seu prazer e seu descontentamento sobre o mundo que o rodeia, por meio
das diferentes formas de expresso, entre elas, a pintura, a escultura, a msica, a
dana, a representao cnica, a escrita, a poesia, etc.
Assim, amparada pelas possibilidades apresentadas pelos Parmetros Curriculares
Nacionais, PCNs, no que diz respeito Arte nos deparamos com as Artes Visual e
Musical, com o Teatro e a Dana.
A pedido dos alunos, preparei-me para desenvolver um projeto com a arte cnica
com o objetivo de evocar a percepo de si mesmo, do outro e do espao social
utilizando a representao como elaborao e sntese da realidade.
Na busca da construo do nosso saber procurei identificar o que os alunos
entendiam por teatro e o que conheciam sobre a rea a ser estudada.
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Teatro para aqueles alunos consistia nas proezas dos personagens Chaves e do
Chapolin Colorado1.
Eu desconhecia esse programa e com o objetivo de compreender suas elaboraes,
os alunos passaram a represent-los, mostrando-me a graa e o encanto daqueles
personagens. Ento, eles arrumaram um espao na sala de aula e se organizaram
apresentando algumas cenas engraadas para o grupo, caricaturando, por exemplo,
a graa e o charme da Chiquinha, as trapalhadas do Sr. Madruga e do Quico, as
enrascadas do Chaves, os tiques da Dona Florinda etc.
Durante algumas aulas, selecionamos alguns trechos do programa, que os alunos
trouxeram para a escola, para tomarmos conhecimento da histria que eles
realmente gostariam de representar.
O grupo passou a utilizar os personagens dessas histrias como referncia nas
elaboraes de suas cenas teatrais. Inicialmente, suas representaes estavam
coladas s imagens da televiso. Suas aes expressavam um amontoado de
situaes desordenadas, com cenas descontextualizadas, sem enredo e sem trama.
Na minha concepo, considero a trama o alinhavo de todos os acontecimentos na
representao cnica visando alcanar uma unidade. Desta forma, a criao de uma
histria no jogo teatral deve conter comeo, meio e fim.
1 Personagens de programa cmico infantil de origem mexicana televisionado pelo Sistema Brasileiro de
Televiso (SBT) com direitos de retransmisso cedidos pela emissora mexicana Televisa.
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Pelo desenvolvimento da histria, do encadeamento de seus fatos que nos
deparamos com o conflito de uma situao problema e com uma possvel resoluo
do mesmo.
Para que o leitor ou a leitora possa melhor compreender o meu percurso, gostaria de
situ-los no lugar de onde foco o meu olhar, esclarecendo que no sou especialista
na rea da Arte, como j esclareci no incio desta monografia mas, por meio dos
jogos de improvisao para o teatro, presenciei uma metodologia clara que tambm
possibilitou o desenvolvimento da narrativa no texto teatral.
Quando o aluno imita outro personagem ele escolhe gestos, tiques, comportamentos
e emoes que o caracterizam. O aluno passa a viver o problema do outro, a se
colocar na situao do personagem como se aqueles acontecimentos representados
estivessem acontecendo com ele.
Foi por meio da imitao que os alunos passaram a representar simbolicamente
outras situaes, outros contedos, que lhes permitiram entrar no mundo da
representao cnica.
No princpio, os alunos trouxeram fatos relacionados a sua vida diria para
dramatiz-la como por exemplo: o namoro proibido, situaes engraadas no
contexto escolar, brigas entre irmos, drogas, assaltos que observaram no nibus ou
mesmo nos entornos de seus bairros, aborto, violncia familiar e social , infidelidade
e estupro.
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O teatro passou a ocupar um lugar seguro para expressar e vivenciar suas emoes
mais profundas e, na tentativa de solucion-las, os alunos buscaram solues
criativas para o problema. importante destacar que na tentativa de solucionar um
problema, eles tinham a oportunidade de aprender a pensar sobre o fato em si.
O surdo, normalmente, recebe tudo pronto de seus familiares. Os pais, na tentativa
de ampar-lo ou mesmo neg-lo (pelo fato de terem gerado uma pessoa diferente
do padro normal) terminam super protegendo-o, ou o considera no capacitado
para solucionar problemas. Isto resulta em uma falta de oportunidade de pensar
sobre as coisas, sobre os fatos e de se colocar como indivduo com desejos e
opinies divergentes. Da a importncia de a instituio escolar desenvolver um
trabalho de parceria com os familiares informando-os que pela comunicao visual
(lngua de sinais) o surdo pode ver, sentir e participar da sociedade.
Na produo do texto teatral, percebi que os alunos criavam diferentes solues
para resolver os seus problemas: driblavam a rigidez da famlia que no autorizava o
namoro, elaboravam situaes simblicas para lidar com a violncia urbana, criavam
situaes que facilitavam a sua incluso na sociedade e muitas vezes, evidenciavam
situaes cmicas do dia-a-dia numa sociedade basicamente ouvinte.
Lembro-me de uma cena em que alguns alunos improvisaram a situao de um
surdo tocando campainha em um prdio:
O porteiro perguntava: Qual o andar? E eles no escutavam, claro!!!
Novamente o porteiro perguntava: Onde vocs vo? E eles tentando responder em
Lngua de Sinais, no conseguiam ser compreendidos pelo porteiro.
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Ou seja, o porteiro lhes perguntava onde iriam e eles em outra lngua respondiam
que eram surdos.
O porteiro bastante irritado com os toques constantes da campainha chega
portaria muito bravo, solicitando que os mesmos saiam dali porque aquele no
lugar de badernagem.
Naquela encenao ficou evidente a dificuldade e o pr-conceito que o surdo
enfrenta em uma sociedade ouvinte, onde a falta de conhecimento da populao
dificulta a sua incluso social.
A linguagem cnica ajudou o aluno a tomar conhecimento do real, a conhec-lo, a
refletir sobre si mesmo buscando sadas criativas para seus problemas. Nas
diversas representaes, os medos, os trauma, os desejos, as frustraes eram
enfrentadas, discutidas por meio do jogo e superadas criativamente.
Os jogos teatrais ampliaram a capacidade de dialogar, conviver, trocar informaes
do cotidiano, manifestar opinies e decepes, promover debates e respeitar a
opinio do outro.
Por intermdio das observaes, dos registros e das reflexes da nossa prtica com
os jogos teatrais, pude perceber que o jogo pde ser utilizado no s como lazer e
entretenimento, mas tambm na busca do autoconhecimento, da cidadania; da
identidade surda.
No teatro, os alunos produzem histrias que so improvisados pela ao coletiva do
grupo e socializados platia. As aes e imagens emergem fisicamente na
construo do texto teatral, enquanto que no texto literrio elas permanecem
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interiorizadas na mente do leitor (KOUDELA, 1998, p. 105) A histria teatral
materializada cenicamente por meio da produo esttica do grupo e compartilhado
com a platia.
Com o projeto do teatro ns resgatamos o ldico, a intuio, a auto-estima, a
expressividade, o autoconhecimento e o respeito pelo outro.
Nas representaes os alunos se sentiam livres para expressar suas idias, criativos
para solucionar e transformar sua realidade. Uma realidade que foi re-construda por
meio da vivncia e da interao com outros surdos.
Como sistemtica de trabalho e fundamentao terica utilizei a proposta de
trabalho de Viola Spolin (1998) contida em seu livro Improvisao para o Teatro e
de sua pesquisadora Ingrid Koudela (1998) na certeza de contagiar professores e
profissionais da educao com o fascinante percurso do desenvolvimento do fazer e
do pensar artstico e esttico dos alunos nas artes cnicas.
Spolin (1998) e Koudela (1998) concordam com a importncia do jogo teatral como
uma atividade social, uma experincia grupal que propicia envolvimento, interao,
liberdade e criao na realizao da tarefa.
Descobrimos por intermdio da leitura de Spolin (1998) e Koudela (1998) que os
nossos conhecimentos nas artes so aprendidos, experimentados, construdos e
assimilados desde a nossa infncia no convvio com os nossos familiares, vizinhos,
amigos de escola como tambm enriquecidos pelos meios de comunicao social.
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Ao ler Spolin (1998), algumas cenas da minha histria vieram tona, no meu
inconsciente, roubando o espao da leitura proposta pela autora.
Ler mobiliza nossa imaginao, relaxa nossas preocupaes, ativa o nosso
imaginrio desvelando significados at ento desconhecidos. Foi em uma dessas
viagens ao imaginrio, em que a prpria leitura nos encaminha o passaporte, que re-
lembrei as inmeras vezes que presenciei minhas filhas e sobrinhas organizando
jogos teatrais e transformando o espao existente em minha casa em cenrio.
Elas buscavam vestimentas nos nossos armrios para a apresentao do show,
que geralmente ocorria no final da tarde do domingo. O show, como denominavam,
era apresentado a ns, pais, avs e amigos; enfim a todos que estivessem
presentes.
Organizavam a sala de modo a nos colocar na posio de platia. O cenrio era
improvisado com almofadas, baldes ou bacias da lavanderia, brinquedos, e
pertences da cozinha.
As toalhas de banho se abriam para ns, platia, com a mesma magia das cortinas
do teatro, nos deixando perplexos e encantados. Havia um ritual em suas aes: a
apresentadora expunha a seqncia das atividades que seriam apresentadas no dia
dando incio apresentao, momento to esperado por todos ns. Elas criavam
coreografias, cantavam, contavam piadas, improvisavam pequenas histrias,
dublavam e, muitas vezes, tambm recitavam, divertindo e alegrando a todos. Foram
tardes gostosas, divertidas e muito prazerosas.
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24
Elas permaneciam to envolvidas com as prprias atividades, criando e organizando
suas aes, para nos apresentarem, que nem percebiam o tempo passar. Era como
se desligassem os botes de acesso realidade para permanecer no mundo do faz
de conta, no mundo da fantasia.
Representar e improvisar cenas e aes fazia parte das suas brincadeiras; de seus
jogos infantis. A energia mobilizada pelo brincar impulsiona a espontaneidade e a
liberdade de criar, inovar, transformar e de se aventurar sem medo na re-
apresentao das imagens absorvidas nos emaranhados das relaes vividas no dia
a dia. (SPOLIN, 1998).
Novas imagens ocuparam o espao das minhas lembranas. Mobilizada com a
leitura da autora e com as imagens que surgiam selecionei uma muito especial para
ampliar e enriquecer as reflexes que apresento neste trabalho.
Ao organizar os meus registros, minhas hipteses e observaes sobre os jogos
propostos por Viola descobri, conversando com minha av, que em 1915 ela j fazia
teatro no Collegio Immaculata Concezione, na cidade de Ivrea (Itlia), onde morava.
Era um colgio de freiras em regime semi-interno. As alunas saiam do colgio s no
final da semana para ficar com a famlia.
O teatro era utilizado nas aulas de italiano como um instrumento de aperfeioamento
da lngua. A proposta das educadoras, segundo a minha av, era com a escrita e
com a pronncia correta do italiano.
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25
Nas aulas de teatro as alunas escolhiam os temas que seriam abordados na
representao cnica e desenvolviam a trama por escrito. s vezes, as freiras
tambm determinavam o tema para ser desenvolvido. A classe escolhia a melhor
histria para ser representada e as freiras distribuam os papis e as falas dos
personagens para as meninas da classe. As freiras, segundo a minha av,
chegavam sala de aula com o texto todo recortado para ser entregue as alunas.
Elas determinavam os papis que cada uma iria desenvolver.
As narrativas da Dona Armida, minha av, (hoje com seus 99 anos de lucidez e
encantamentos) eram sempre escolhidas pela classe. Suas amigas gostavam das
suas histrias porque eram picantes e atrevidas.
O Collegio Immaculata Concezione obrigava a leitura sistemtica da Bblia e da
literatura italiana, porm o que a minha av mais apreciava era a literatura francesa.
No colgio havia uma biblioteca com uma grande variedade de livros. Ns
podamos escolher as duas literaturas. Os franceses descreviam as coisas como
elas realmente eram. Eles tinham temas mais corriqueiros, temas curtos de coisas
que acontecem no dia-a-dia.
A literatura enriqueceu muito seu repertrio. Os melhores textos da escola eram
enviados ao jornal de Turim. As freiras - dizia a minha av, sempre criticavam as
minhas histrias porque tinham um fim trgico, porque falavam de separao, morte
do cnjuge, traio, filhos deficientes etc., mas as minhas histrias sempre iam para
o jornal.
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A minha av escrevia as histrias, mas no podia participar representando os seus
personagens, opinando na distribuio dos papis, na evoluo da trama e na
direo da representao.
As freiras arrumavam os personagens. Traziam tudo pronto. Roupas, peruca e
adereos para cada uma. Ns no podamos falar nada.
Ela disse que tinha muita vontade de representar mas como j tinha escrito o tema,
tinha que permanecer sentada ao lado das educadoras. Elas dirigiam a pea e
vestiam as personagens.
No dia da apresentao as freiras ficavam sentadas no tablado corrigindo a
pronncia de cada uma e a maneira como se comportavam perante o grupo.
No final da pea, a concentrao para representar os personagens e a trama era to
grande que muitas vezes todos acabavam chorando. As pessoas choravam porque
se compenetravam. As pessoas mostravam realmente o que estava escrito. At eu
ficava emocionada quando via as minhas histrias tomarem vida e emoo.
Aos doze anos, com a morte precoce de sua me, minha av foi obrigada a voltar
para o Brasil. Chegando em So Paulo, ela veio morar com seu pai. Meu bisav era
pintor de igrejas e catedrais.
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Minha av, acostumada a escrever histrias para o jornal italiano pediu a seu pai se
poderia trabalhar para o jornal, aqui em So Paulo, escrevendo contos ou mesmo
relatando fatos e acontecimentos polticos da poca.
Naquela ocasio, no se concebia a possibilidade da presena da mulher
trabalhando e atuando na sociedade. Meu bisav no aceitava o fato de consentir
liberdade e permisso para minha av trabalhar fora, principalmente escrevendo
para a imprensa. Seria uma desonra para a famlia, dizia a minha av.
Dona Armida parou de escrever e passou a se dedicar s tarefas do lar passando
roupas, cozinhando, arrumando a casa e costurando. No entanto, juntava todos os
trocadinhos que seu pai lhe dava no final do ms, para comprar livros italianos e
franceses.
na reflexo e no fazer das nossas atividades que nos surpreendemos com o nosso
processo, com nossos insights, com nossas descobertas. Por meio do estudo dos
jogos teatrais de Spolin (1998), mobilizei minha sensibilidade, minha memria, minha
histria de vida. De repente, me dei conta que a arte de representar, o prazer pela
leitura e pela escrita correu pela nossa histria por trs geraes: Minha av
escrevendo histrias para o teatro, minhas filhas brincando de representar e eu no
processo de reflexo da minha ao prtica, resgato essa magia que transcende a
nossa carga gentica.
A literatura alimentou a criao esttica dos personagens, cenrios e trama e o
teatro resgatou a lucidez, a expressividade, a comunicao e a socializao da
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leitura de um mundo que a minha av possua. Estimulada pela representao
cnica ela buscou ampliar o seu acervo literrio na leitura e exercitou a fluncia da
sua lngua materna.
Na escola, presenciei, inmeras vezes, os alunos organizando jogos e brincadeiras
para serem socializados com o grupo. Tentamos resgatar os jogos que os divertiam
quando eram crianas.
Alguns jogos foram aprendidos por meio das brincadeiras de rua, outros no convvio
com a famlia e outros experenciados nas atividades da igreja de Vila Mariana
(Bairro da cidade de So Paulo).
Vrios jogos de rua ou brincadeiras de infncia foram resgatados em nossos
encontros. O aluno descrevia o jogo ou a brincadeira para o grupo, utilizando-se da
Lngua de Sinais e da dramatizao como meio para descrever as regras do jogo.
Neste momento, o aluno trabalha com a comunicao elaborando uma linguagem
interativa com seu grupo.
Segue abaixo, o registro de alguns jogos socializados pelos alunos em nossas
aulas.
- O jogo do palhao Todos em um crculo formando uma grande roda.
Um aluno se coloca no centro do crculo e aleatoriamente aponta para
outro aluno. Este deve colocar as suas mos fechadas sobre o nariz.
Imediatamente o seu vizinho da esquerda coloca a sua mo direita sobre a
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orelha esquerda do aluno palhao em forma de uma concha e o vizinho
da direita deve colocar a mo esquerda na orelha direita do aluno
palhao. Denominamos por aluno palhao quele que foi apontado pelo
jogador no centro do crculo. Esse jogo precisa ser executado com rapidez
e requer ateno dos participantes do grupo. O aluno que no prestar
ateno no jogo no acompanha a brincadeira. Quem errar sai do jogo.
- Jogo dos sinais. Todos em p em um grande crculo. Cada aluno
apresenta o seu sinal ao grupo e em seguida o seu colega do lado direito
repete o sinal apresentado, identificando o amigo ao lado. O jogo continua
at chegar no primeiro aluno que apresentou o sinal de identificao inicial.
Os ltimos devero repetir todas os sinais anteriores apresentados e por
fim o seu prprio sinal.
- Jogo da contao de histria. Todos em crculo. Um aluno comea
uma histria sobre qualquer coisa que desejar e os demais devero
continu-la com coerncia e coeso a partir do ponto em que o ltimo
aluno parou.
- Canes bblicas tambm apareceram nos jogos de aquecimento que
antecediam o teatro. Um aluno iniciava uma cano sinalizando ou mesmo
interpretando-a com a linguagem corporal e em seguida o amigo ao lado
dava continuidade a cano.
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Spolin (1998) explica que o jogo uma atividade em que as regras e os acordos so
aceitos pelo grupo que decide participar. Inseridos nas relaes de jogos, os
jogadores participam com entusiasmo e alegria respeitando o conjunto de regras
definidas, e o mesmo se d com a experincia de jogos teatrais.
Spolin (1998) e Koudela (1996) concordam com a importncia do jogo como uma
atividade social, que propicia envolvimento, interao, liberdade e criao na
realizao da tarefa.
No jogo, o aluno aprende a administrar a sua relao com o outro, desenvolve o
exerccio da escuta, aprende a fazer escolhas, toma decises, planeja situaes e
estratgias; desenvolvendo linguagem (SPOLIN, 1998).
Spolin (1998) sugere que o processo para atuao no teatro deve ser baseado na
participao em jogos. Categorias como jogos de observao, jogos de memria,
jogos de aquecimento, jogos sensoriais e jogos de comunicao no verbal
desenvolvem no aluno habilidades no teatro improvisado.
Ainda segundo a autora,
Improvisar a abertura para entrar em contato com o ambiente e o outro, atuar sobre o ambiente observando e refletindo a realidade de maneira espontnea expressiva e criativa compartilhar com o outro sua experincia de vida, seus desejos, sonhos; suas idias. (1998, p. 23).
Todo jogo tem um objetivo a vencer, um problema a ser solucionado e deve haver
acordo de grupo sobre as regras do jogo. Assim como os jogos de entretenimento,
os jogos teatrais tambm so constitudos por regras e acordos grupais que
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asseguram chegar no objetivo final do jogo. Spolin (1998) e Koudela (1996) utilizam-
se do termo jogador para identificar aquele que joga ou aquela pessoa que cria a
realidade teatral.
Meu objetivo era criar, a partir do jogo, um contexto em que a linguagem pudesse
ser contextualizada espontaneamente, onde o pensar, agir e sentir pudesse fluir
pela ao do grupo. Alm de utilizar situaes de linguagem espontnea, por meio
dos jogos, encontrei na metodologia de Spolin subsdios para ampliar o universo
lingstico dos alunos.
A estrutura de orientao proposta pela metodologia de Spolin (1998), O QU,
QUEM e ONDE, contribuiu para organizar o pensamento do aluno em funo do
objeto, do personagem e do ambiente, dando fundamento e coerncia s histrias
que desenvolviam em grupo.
O contedo da improvisao surge e se desenvolve sempre no grupo. O professor
orientador do trabalho estabelece o objeto do jogo, ou seja uma situao a ser
solucionada. Este o grande desafio para todos aqueles que participam do jogo.
Assim como todo jogo nos coloca um objetivo a vencer, os jogos de improvisao
para o teatro nos desafiam a solucionar objetivos ou dificuldades, mantendo todos
os participantes envolvidos na soluo do problema apresentado. (SPOLIN, 1998).
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Segue abaixo, o registro de alguns eventos, socializados pelos alunos nos jogos de
improvisao para o teatro, apresentados no Projeto de Pesquisa Integrao das
Tecnologias da Comunicao ao processo de Letramento do Surdo 2.
Este registro foi fruto de um trabalho realizado com os alunos surdos da 7 srie do
perodo noturno de 2000. Participaram deste projeto cnico duas classes totalizando
16 adolescentes.
Com o objetivo de preservar a identidade dos participantes utilizarei somente as
iniciais de seus nomes.
Utilizando a estrutura O QU
Apontamentos do nosso 3 encontro: 17/05/00
Proposta de trabalho individual: o jogo do tato.
Sentados, em crculo, cada aluno se concentra no tato de um objeto colocado em
uma sacola.
Pediu-se para os alunos deixar que suas mos sentissem o objeto: a textura, o peso,
a forma e a temperatura do objeto. Com os olhos vendados o aluno deve descrever
o objeto e suas caractersticas para o grupo.
2 Apresentao feita pela autora na FAPESP/ Escola do Futuro/ USP/ 2001.
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P. retirou da sacola um peso de um quilo, de fazer ginstica. Ele sinalizou conheo,
referindo-se ao objeto. leve, representando a atividade fsica de um esportista
fazendo exerccio para fortalecer os braos.
G. retirou o Pikachu3 - um bichinho de pelcia. Ela falou: Parece de brincar.
macio, pequeno e quentinho. Parece um coelho. Ao abrir os olhos ela falou:
Conheo da televiso. Como o nome dele? Eu respondi e ela no
compreendendo pediu para que eu escrevesse na lousa o nome do brinquedo.
D. retirou da sacola uma pedra ornamental, objeto de enfeite da minha casa. Ele
sinalizou: Pesado, duro e no conheo. Pediu se podia desenhar na lousa o objeto
porque ele desconhecia a palavra que o identificava.
Perguntei ao grupo se seria permitida essa possibilidade de desenhar o objeto caso
no soubessem identific-lo. O grupo aprovou a idia e D. representou, por meio do
desenho, o fundo do mar, corais e alguns peixes. Em seguida sinalizou ao grupo que
no fundo do mar havia muitos peixes coloridos e muitas pedras. Disse j ter visto em
uma revista o fundo do mar. L muito bonito.
O desenho de seus corais era muito parecido com as caractersticas fsicas da
minha pedra ornamental.
A. retirou uma chapinha de resistncia de rdio. Sinalizou: Coisa que fica dentro da
televiso, pequeno e leve. No sei o nome.
3 Nome de personagem de desenho animado.
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Os alunos utilizam diferentes linguagens para comunicar ao grupo o seu objeto:
dramatizam, sinalizam, falam, escrevem e desenham. Trabalham com a
comunicao elaborando uma linguagem descritiva do objeto.
Utilizando a estrutura QUEM
Apontamentos do nosso 6 encontro: 21/06/00
Proposta de trabalho individual: Jogo do exagero fsico.
Cada aluno deve assumir, durante a cena, uma qualidade fsica exagerada de um
personagem. Exemplo: um homem muito gordo, uma madame, um velhinho etc.
Durante um minuto cada aluno ir representar o seu personagem para o grupo. O
grupo, neste momento, atua como platia participando dos eventos, fazendo
perguntas, questionando etc.
J. R. representou um velhinho esperando o nibus. Ele no simulou a idade da
pessoa por meio da expresso corporal. Permaneceu no ponto de nibus com os
ps encostados na parede, como se fosse um adolescente.
A platia no identificou o personagem idoso que deveria ter sido representado pelo
aluno. Pedimos para J. reapresentar a sua cena dando maior expressividade ao seu
personagem. O aluno recomeou a cena mostrando ser um velhinho arcado, com
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bengala nas mos e com muita dificuldade para se locomover. Ele tremia muito ao
andar. Ficou cansado e esperou o nibus sentado.
D. simulou uma madame andando pela calada. Ela rebolava muito. Tinha um corpo
empinado e empurrava um carrinho de beb. Ela fez sinal para o nibus e subiu.
Entrando no nibus, pediu licena para passar e pagou a passagem.
A platia questiona ao jogador onde estaria o carrinho com o beb. Nesse momento
o jogador, D. percebe que havia esquecido o carrinho com o beb no ponto de
nibus. Ele recomea a cena. Novamente, faz sinal para o nibus e entra com o
beb no colo. Paga a passagem e pede lugar para sentar. O beb chorava muito e
ela, a madame, ficava balanando o beb.
A platia questiona, ao jogador D., o que foi feito com o carrinho? Voc esqueceu o
carrinho no ponto, falava G.
D. inicia a cena novamente, subindo no nibus com o carrinho e o beb.
Quando o aluno observa uma pessoa ele pode inferir vrias coisas sobre ela, por
exemplo, classe social, profisso, estado emocional, seus desejos, medos,etc. por
meio da ao desse personagem que o aluno comea a criar o texto em cena. O
texto compartilhado com a platia, grupo de alunos que observam a representao
do jogador, que tambm est envolvida com a histria.
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A platia participa dos eventos observando, buscando alternativas, antecipando
conseqncias, comparando atitudes e comportamentos. Ela argumenta, faz a
interveno e a crtica quele que desenvolve o texto.
Utilizando a estrutura ONDE
Apontamentos do nosso 12 encontro: 23/08/00
Proposta de trabalho em grupo. Jogo: trabalhando com imagens visuais.
Selecionei duas telas para serem representadas pelo grupo: uma de Van Gogh, Os
Comedores de Batata e outra de Portinari da Srie Trabalhadores Brasileiros, O
Fumo.
Dividi a classe em dois grupos. Cada grupo ficou com uma imagem para
representar. Combinamos que os grupos teriam dez minutos para criar uma
representao para as telas, cinco minutos para apresent-la platia, e dez
minutos para avaliarmos o nosso encontro.
Os grupos se dividiram para a improvisao do texto em ambiente diferentes com o
objetivo de fazer surpresa no momento da apresentao.
O grupo que ficou com a tela de Van Gogh, organizou a sala de leitura (espao fsico
da escola onde desenvolvemos o jogo teatral) colocando as cadeiras em um
pequeno crculo como se estivessem reunidos mesa de jantar. Iniciaram a cena.
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A me (G.) estava sentada mesa com as suas filhas (A. P. e R.). R. era muito
fresca, metida e exibida. A. P., segundo a famlia, era a filha mais normal. Ela no
queria ser melhor que as outras.
Bateram na porta. A me levanta e abre a porta. Entra o pai, o chefe da famlia,
muito cansado do trabalho. Todos se sentam mesa e o pai, J. R. comea a falar
sobre o trabalho, salrio baixo, dificuldade para viver porque tudo esta muito caro e
comenta sobre o nibus que estava lotado.
A., marido da Roseli, entra em cena. Ele bate na porta.(Ele bate na porta do armrio
para fazer o barulho). Entra totalmente bbado, tropeando em suas pernas, e cai
sentado na cadeira da mesa onde todos esto jantando. Todos desaprovam a sua
atitude (a expresso facial e corporal demonstram a rejeio atitude de A.). R.,
esposa de A., fica decepcionada e, muito envergonhada, se levanta da mesa.
O outro grupo, influenciado pela imagem de Portinari, utilizou o espao da sala de
leitura posicionando-se da mesma forma que os trabalhadores brasileiros da imagem
O Fumo.
F., chefe dos trabalhadores, era arrogante e bravo. Ele ganhava muito dinheiro.
Ficava vigiando o trabalho dos seus empregados para ver se os mesmos no
relaxavam no servio. Ele tinha nas mos um chicote (representado por um pedao
de pano) que era lanado sobre o empregado toda vez que este deixava o trabalho
para descansar.
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Os trabalhadores se aproveitavam das sadas momentneas do chefe para armar
uma rebelio contra a sua dominao.
Os trabalhadores combinavam para fugir noite, no escuro, levantaram a hiptese
de matar o chefe quando este volta ao local de servio e observa o motim. Ele
chicoteia todos os trabalhadores pelo no cumprimento das ordens deixadas. Os
trabalhadores voltam ao servio.
Neste encontro, ns no conseguimos cumprir com o nosso planejamento. No deu
tempo de avaliarmos o trabalho. Influenciados pela vivncia nas oficinas de teatro do
Sesc de Vila Mariana, os alunos, pela primeira vez, sentiram necessidade de utilizar
os adereos da escola para melhor caracterizar seus personagens. Esse movimento,
por parte dos alunos, de buscar no acervo da escola adereos para a representao
das suas cenas, tomou o nosso tempo da avaliao final.
Tenho observado, por meio dos jogos de improvisao, que o jogo realmente cria
eventos, conflitos e resoluo de problemas que so discutidos e elaborados pelo
grupo.
Os alunos tm histrias e casos que podem ser desenvolvidos e narrados no grupo.
Eles comunicam o seu texto e a sua histria pela sua expresso, pelo seu
movimento, pela sua sensibilidade. A pea o prprio texto representado.
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Os jovens vivem a vida ficcional nas histrias que criam. Eles querem ser bandidos,
soldados, drogados, viciados, agressivos, romnticos etc. Querem experimentar
diferentes papis, diferentes posies sociais.
A narrativa nasce do trabalho coletivo dos alunos que por intermdio da
improvisao atribuem significado e coerncia ao texto.
No teatro a comunicao direta, acontece no momento em que se joga. A idia
precisa ter coerncia para o texto fruir. Esse exerccio do pensar, criar e desenvolver
o texto em sinais no grupo para depois narr-lo muito importante, tanto para o
desenvolvimento lingstico do surdo como para o seu desenvolvimento como
sujeito.
Hoje, refletindo sobre a minha prtica com os jogos teatrais na escola, cheguei
concluso que compartilhar experincias pessoais a partir de uma situao problema
a ser solucionada em grupo foi um trabalho teraputico, que desvelou sentimentos,
emoes, valores e conhecimento por meio da expresso cnica.
Assumir diferentes papis, nos jogos teatrais, ajudou os alunos a reviverem sua
memria emocional, a se colocarem no lugar do outro, a elaborarem uma sntese
conjunta com os demais participantes buscando sadas criativas para seus
problemas. Os alunos passaram a ouvir e a observar o outro no contexto familiar e
social.
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O jogo teatral motivou-os a se perceberem como agentes no seu processo de
identidade, refletindo e se apropriando da sua histria e do seu processo de
crescimento pessoal na busca de solues criativas de convivncia social.
Momento de avaliao na relao PALCO/ PLATIA
Nos jogos de improvisao a turma separada em dois subgrupos. Enquanto o
primeiro subgrupo apresenta a cena, o segundo, na funo de platia aprecia a
representao da cena. Em seguida trocamos os papis: o subgrupo que apreciou a
primeira cena apresenta-se e o outro, agora platia, observa.
No final da atividade temos o momento da avaliao que tem como objetivo
desenvolver a argumentao e a contra-argumentao crtica e fundamentada tanto
na observao da platia como no desenvolvimento e aprimoramento da narrativa.
A avaliao ocorre, depois que os dois grupos se apresentaram. Todos participam
da avaliao, at o professor. O aluno da platia no est ali para atacar ou proteger
o amigo, mas para versar sobre o que realmente foi comunicado (VIOLA, 1998, p.
24).
Quando esta relao com a platia compreendida, os alunos perdem o medo do
julgamento do bom/mau e do certo/errado. O que nos propomos a fazer pensar,
refletir e melhorar esse processo de narrar fatos ou histrias tentando torn-las
compreensveis e interessantes. E isto aprendido.
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Com o objetivo de focar e analisar o que acontece no momento da avaliao dos
grupos no apresentarei o texto desenvolvido pelos alunos.
A turma foi dividida em dois grupos. Um grupo sorteou a comanda: cenas em um
avio e o outro, cenas que acontecem no velrio. No momento da apreciao da
platia, muitos elementos foram evidenciados:
Avaliao da platia para o grupo
que desenvolveu a cena em um
avio
Avaliao da platia para o grupo
que desenvolveu a cena no velrio
- faltou maior expressividade
para o piloto do avio
- o comissrio de bordo
carregava a bandeja na mo e
no avio existe um carrinho que
leva os lanches para os
tripulantes.... Eu j vi na
televiso. Ele fez errado.... Ele
parecia garom
- Faltou uma comissria para
trazer um pano para limpar a
cala da Roseli que estava suja
de suco. Tambm deveriam ter
limpado o cho do avio
- O tempo foi muito curto...
Poderiam ter pensado em mais
coisas para continuar a histria.
- O piloto no fez certo. Faltou
maior expressividade.
- Faltou expressividade na
encenao. O J.R. no ficou
nervoso nem saiu para
fumar.
-Ningum desmaiou no
velrio.
-A G. dava risada no velrio
e depois chorava. No pode
dar risada. Precisa ficar
direito.
-O M. no chorou nada.
- O J.R. nem pegou no leno
para assoar o nariz.
- O A. achou que foi um
choro pobre sem
expressividade.
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Na aula seguinte, ns trocamos os temas trabalhados. O grupo que desenvolveu a
histria do avio recebeu como proposta de trabalho, desenvolver e ampliar o tema
do velrio e o outro grupo a proposta de ampliar a histria no avio.
Os alunos concluram que houve introduo no tema, ampliao de eventos,
problematizao no decorrer do texto e resoluo dos problemas. (registro do 10
encontro/ 11 de agosto 2000).
Foi um trabalho desafiador construdo no prprio fazer e re-planejar de nossas
aes.
Desenvolver um trabalho sem ser especialista na rea me trouxe muitas dvidas,
questionamentos, ansiedade e medo. Medo pelo novo, pela continuidade do
desconhecido, do trabalho a ser desenvolvido nos prximos grupos.
Que fundamentos tericos eu deveria procurar para dar prosseguimento ao trabalho
com os jogos teatrais? Meu foco buscava uma base terica que me desse subsdios
para compreender com mais clareza, a enxurrada de contedos e sentimentos que
aos poucos foram sendo refletidos e redirecionados pelo grupo.
Senti que o nosso grupo se fortaleceu. Constitumos um vnculo muito forte porque o
trabalho mexeu com a estrutura interna dos alunos, com sua auto-estima e com a
sua valorizao pessoal.
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Foi nesse momento de busca que eu cheguei a Arteterapia.
Com as atividades prticas propostas pelo curso, ns ultrapassamos as barreiras
que a conscincia nos coloca impedindo-nos, muitas vezes, de nos aproximarmos
de ns mesmas.
A linguagem plstica tem a magia do poder de alcanar, tocar, re-viver e transformar
nossas emoes mais profundas.
A Arte consegue este dilogo interno com maior facilidade porque ela livre, corre
pela nossa histria sem rdeas e sem censura, percorre nossas emoes com
leveza, perspiccia e sabedoria. Ela perpassa pela nossa autocrtica, pelos nossos
pr-conceitos, pelas nossas atitudes cristalizadas no tempo; desenraiza a nossa
lgica linear e cartesiana de pensar e agir. Ela nos provoca, nos sensibiliza, nos
contagia ascendendo nossas emoes mais profundas. Ela nos coloca frente a
frente nossa verdade interior, ao nosso SER.
Muitas vezes, esse encontro dolorido e sofrido, porque evoca sensaes e
sentimentos que afogamos no decorrer da nossa vida; talvez, por no ter tido
coragem ou sabedoria para lidar com ele, naquele momento. Da o choro, a reflexo,
o contato com a dor, o re-pensar e o poder de transformar ou no a nossa histria.
Eu tambm me transformei no decorrer da construo desse nosso novo olhar. Hoje,
consigo atribuir novos significados Arte: Arte no apenas como meio de expressar
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pensamentos e sentimentos para outras pessoas, mas arte como instrumento de
transformao pessoal, de dilogo consigo mesmo, com o outro e com o mundo.
Por meio da Arte ns podemos refletir e transformar experincias passadas
tornando-as mais positivas para reviv-las em novas situaes do presente. Ns
somos, transformamos e constitumos a nossa histria.
Utilizei a fundamentao dos diferentes mdulos do curso de especializao em
Arteterapia para melhor compreender o meu SER: Ser-criana, Ser-razo, Ser-
sentimento, Ser-emoo, Ser-educadora, Ser-arteterapeuta, para melhor
compreender o outro SER.
Passei a compreender o potencial teraputico dos processos criativos que emergem
nas oficinas de arte.
Experincias riqussimas ocorreram nesse espao cnico. Os jogos teatrais
ampliaram a capacidade de dialogar, conviver, trocar informaes do cotidiano,
manifestar opinies sobre questes do dia-a-dia, promover debates; respeitar a
opinio, o sentimento e a emoo vivenciada pelo outro no grupo.
A linguagem plstica acessa nossas experincias internas, nossos desejos,
frustraes, angstias, receios... desvelando significados riqussimos para reviv-los
e transform-los na busca do autoconhecimento, da transformao pessoal e de
uma qualidade melhor de vida.
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por meio das diferentes linguagens artsticas que o indivduo se apropria da sua
realidade social; toma cincia do seu Ser.
Quando falamos em linguagem, para ns educadores, logo nos vem a mente a fala
e a escrita; ou seja, pensamos na linguagem oral e no registro escrito porque nos
constitumos como seres simblicos.
Nossa insero na realidade sempre mediada pela linguagem porque o homem
um ser simblico. Ele pensa, reflete, transforma, cria; inova. O homem se descobre e
se constri psquica e socialmente por meio da linguagem quer seja ela oral, grfica,
pictrica ou cnica. Porm, nos esquecemos que linguagem toda forma de pensar,
sentir, interpretar, refletir, re-organizar; re-construir, re-planejar; expressar uma idia,
um pensamento ou uma ao. Da, a importncia dos fundamentos e das oficinas de
arteterapia para compreendermos a extenso e a potencialidade criadora do nosso
fazer cotidiano no contexto escolar.
Aprendi a escutar o outro, a respeitar o limite de cada um, a compreender o
comportamento dos alunos para sobreviver em um mundo desigual, que dificilmente
integra e inclui o diferente. Contudo, descobri que existe um ser criativo que habita
em cada um de ns, capaz de levantar possibilidades inovadoras para sobre-viver
numa sociedade que exclui o idoso, o pobre, o deficiente, a mulher, o obeso...
Observei tambm que o trabalho com a arte propicia o poder da cura, num
movimento dialgico de transformao pessoal por meio do contato e da reflexo
das vivncias internas de cada um. Vivenciar, refletir e transformar os sentimentos
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negativos enraizados em nossa memria para transform-los em aes positivas de
mudana, ativa o nosso poder de cura pessoal e a possibilidade de sermos feliz.
Quando o aluno constri e atribui vida a um personagem no contexto teatral, ele, na
maioria das vezes, evoca e revive cenas ou imagens das suas experincias de vida,
como por exemplo, lembranas, medos, alegrias, tristezas, dificuldades, apuros,
desejos; sonhos tanto da infncia como da adolescncia. Nesse momento, a ao
do personagem se mescla com a imagem da histria do aluno e ela re-aparece em
cena transformada, como se a cena o ajudasse a evocar, refletir e transformar sua
prpria histria.
Apurei a representao cnica como um falar pleno que vai alm do discurso lgico,
linear e temporal. Experimentei a expresso do desejo, da dor, da frustrao, dos
acertos e desacertos na transformao do pensar e agir.
Acredito que, intuitivamente, existe um SER terapeuta dentro de cada um de ns
adormecido em nosso fazer. ELE precisa ser alimentado pelo estudo cientfico do
saber, lapidado pela ao reflexiva do fazer e socializado com os nossos pares mais
avanados na busca do conhecimento. Permitir... Sensibilizar... Querer... Pensar...
Refletir... Redirecionar... Reorganizar... Transformar... Registrar.... Teorizar...
Experimentar... Vivenciar... Pulsar... constituem alimentos indispensveis para
mobilizar o Ser terapeuta dentro de cada um de ns.
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CENA II
NA COXIA
Antes de relatar alguns recortes e reflexes sobre a Arteterapia no contexto escolar,
inserida em sala de aula, gostaria de salientar que essa vivncia fruto das
discusses e descobertas realizadas por meio das atividades desenvolvidas com os
alunos surdos do 2 ano da EMEE Anne Sullivan de So Paulo, com idades que
variam de 10 a 12 anos. 4
Esse projeto tambm foi construdo na interao do grupo, por meio de questes e
dvidas trazidas pelos alunos no decorrer de nossos encontros com o objetivo de
vivenciar e refletir sobre o corpo humano (semelhanas e diferenas) e sobre a
diversidade de gnero, incorporadas em suas falas e comportamentos.
fundamental que a escola possa ajudar na formao da identidade e possibilitar um desenvolvimento mais harmonioso, porque todo mundo sabe que a sexualidade fator essencial na questo da identidade: o ser menino ou ser menina, o que ser homem ou ser mulher, os comportamentos e aes de cada gnero. Essas so as primeiras questes que aparecem para as crianas na escola e tm a ver com essa identidade bsica, com a formao da sua identidade. importante trabalhar com um conceito amplo de relaes de gnero, que mostre que h infinitas formas de ser homem e mulher. E de expressar isso. (EGYPTO, 2003, p. 19).
Desde o nascimento, a famlia, a escola e a sociedade ensinam meninos e meninas
a se comportarem, sentirem e agirem com base nos papis e modelos de condutas
existentes em cada sociedade, em um dado momento histrico.
4 A escola e os pais autorizaram a divulgao das imagens das crianas para este trabalho. As autorizaes esto
arquivadas no Alquimy Art (SP).
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A sexualidade est presente desde o nascimento e ser constituda a partir das
relaes sociais, da interao do beb com a me, com a famlia, com os amigos;
com os valores culturais da sociedade. Cabe a ns, educadores, responder s
manifestaes da sexualidade infantil na medida em que elas aparecem em sala de
aula como tema de curiosidade e interesse entre as crianas. (EGYPTO, 2003).
O Projeto de Orientao Sexual fez parte da grade curricular desses alunos. Nossos
encontros, reflexes e questionamentos semanais tiveram como objetivo oferecer
espao para o dilogo, para a troca de experincias, para a discusso de valores;
para a reconstruo e ampliao do que j se sabe, dentro de um contexto ldico e
prazeroso.
Dentro deste contexto, o projeto de Orientao Sexual se estruturou em trs eixos
fundamentais, conforme orientao do Grupo de Trabalho e Pesquisa em Orientao
Sexual (GTPOS): o corpo humano, as relaes de gnero e a preveno s doenas
sexualmente transmissveis.
A transdisciplinariedade tem como referncia o pensamento hologrfico (a dinmica do todo e das partes) e a teoria da complexidade, e como referncia filosfica a fenomenologia e a viso ecolgica sistmica. Essa nova postura diante dos fenmenos implica numa busca de uma viso global, na dinmica entre as diferenas e na busca de identidades, que tenta resgatar o interjogo da complexidade dos fenmenos, numa compreenso em rede. (ABED, 2000, p. 39).
O movimento da cincia ps-moderna visa relao e ao dilogo entre as diferentes
disciplinas do saber. Essa proposta, no anula a particularidade de cada rea, mas
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pelo contrrio, lida com a dinmica de todas as partes, com a viso sistmica do
conhecimento, na busca de uma viso mais global do saber. (ABED, 2000).
Segundo a autora, essa busca reintegra construo do conhecimento o
imaginrio, recriando as pontes entre a Cincia, a Filosofia e a Arte (ABED, 2000, p.
40). na dinmica da relao entre a teoria e a prtica, o saber e a vida, a
objetividade e a subjetividade, que o indivduo reintegra no processo de construo
do seu conhecimento a sua identidade, o seu compromisso social, cultural e poltico.
neste movimento da reconstruo e da des-construo, do des-organizar para
organizar, que na dialtica do saber o indivduo se descobre, toma conscincia da
sua histria e se re-constri diariamente. (ABED, 2000).
A transdisciplinaridade, ainda segundo a autora, vai alm do limite racional e
cognitivo. Ela resgata o fazer, o sentir, o destruir para reconstruir, o intuir, o refletir
sobre o vivido para reformular e transform-lo.
A transdisciplinaridade rompe com o modelo do saber estagnado, fechado em si
mesmo.
Por que no ousar, extrapolar e transcender? Por que no integrar, incluir e
relacionar diferentes contedos numa rede dinmica de conhecimentos onde os
diversos saberes circulem com liberdade de expresso, com espontaneidade e
criatividade?
E assim, tudo comeou ...
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Na sala de leitura da escola o grupo pesquisava textos sobre bruxas, feitios e
magias. Ns havamos compartilhado a leitura de algumas lendas, na semana do
folclore e o sentimento de medo, terror e fantasia aguou a pesquisa para outros
tipos de textos.
Fantasmas, drculas, vampiros e bruxas visitaram o imaginrio dos alunos e dentro
desse contexto desenvolvemos nosso tema sobre diferenas de gnero.
Imersos na fantasia, eu os levei a participar de uma longa viagem. Contei aos alunos
que daquele momento em diante eles seriam os meus prisioneiros e eu me
transformaria em uma poderosa bruxa malfica.
Imaginariamente, utilizei meus poderes sobrenaturais para concretizar um caldeiro
no centro da sala. E to logo a magia se fez o caldeiro se constituiu no imaginrio
de todos. Colocamos ratos, sapos, perna de barata, rabo de lagartixa, olho de gato e
p de defunto. Saa muita fumaa do nosso caldeiro!!!
Falei ao grupo que estava preparando uma magia que tinha o poder de trocar o sexo
de todos eles, de modo que os meninos se transformariam em meninas e elas em
meninos.
Eu mexia o caldeiro lentamente com o objetivo de envolv-los de maneira
participativa na histria.
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No momento em que a poo estava pronta, chamei aluno por aluno para a troca
dos sexos.
Retirei do caldeiro o rgo genital feminino e com a ajuda da varinha mgica,
transformava meninos em meninas. Do mesmo modo, depois de mexer e remexer o
caldeiro, retirava do fundo daquele panelo, o rgo genital masculino e,
individualmente, transformei os rgos genitais femininos em masculinos.
As meninas se transformaram em meninos e estes em meninas.
Foi uma surpresa para todos de repente se depararem no papel do sexo oposto. Os
meninos comearam a rebolar e as meninas a pensar no papel que deveriam
desenvolver naquele momento. Um papel muito diferente daquele que vivem
diariamente.
Avisei ao grupo que eles seriam convidados para uma grande festa no palcio dos
bruxos.
Ento, nos dirigimos sala de leitura e eles se transvestiram para o grande evento.
Os meninos escolheram os vestidos mais rodados do armrio (do teatro) e as
meninas se preocuparam com a escolha das gravatas e palets. Eles tambm
pediram batom e sombra para passar nos olhos, elas pediram lpis para fazer barba
e bigode.
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As meninas pintaram os meninos como se estivessem se maquiando no cabeleireiro
e eles, com o lpis nas mos desenharam a barba e o bigode nas meninas. lgico
que no momento que antecedeu a grande festa todos pediram para ir ao banheiro
observar toda transformao!
Foto 1 - Momento da maquiagem.
Foto 2 - Apreciao da transformao pessoal.
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Dando continuidade a esse imaginrio, demos incio a grande festa.
Os meninos chegaram festa rebolando e mexendo os quadris, imitando as
meninas, sentaram nas cadeiras cruzando as pernas, arrumando o cabelo e
ajeitando a roupa.
As meninas tambm imitaram o andar dos meninos cruzando as pernas ao
sentarem-se como se fossem homens. Pediram cerveja, arrumaram o n da gravata
e algumas comearam a fumar.
Na nossa fantasia, a sala de aula j havia se transformado em um grande salo de
festas. Alguns meninos dirigiram-se ao centro da sala e comearam a rodar os seus
vestidos como se estivessem bailando pelo salo. Os outros aprovaram a idia e
tambm passaram a rodar e rodar pela sala com o propsito de levantar e armar os
seus vestidos rodados.
Foto 3 Vivenciando a grande festa.
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Lembrei muito das minhas filhas quando usavam vestidos rodados. Elas passavam
horas brincando de rodar e girar o corpo para levantar a saia do vestido.
Aos poucos, depois de muita risada por parte das meninas elas, que na brincadeira
eram os meninos, levantaram-se para tir-los para danar. Alguns pares danaram
juntos, outros frente a frente, outros levaram um copo de cerveja para a parceira
acompanh-lo em um breve bate-papo.
Foto 4 - Escolha dos parceiros.
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Foto 5 - Afinando o ritmo na parceria da dana.
Avisei que o nosso tempo havia terminado. Trouxe novamente a imagem do
caldeiro para a sala de aula e com a mesma varinha mgica retirei o rgo sexual
feminino dos meninos e o masculino das meninas devolvendo seus rgos genitais
de origem, e todos voltaram realidade.
Depois da vivncia conversamos sobre a diferena de gnero.
Os meninos gostaram de colocar vestidos e perucas, passar batom, lpis e sombra.
Apreciaram rodar com os vestidos e faz-los armar.
F. falou que no comeo ficou com vergonha porque parecia bicha.... mas que foi
gostoso brincar de trocar os sexos.
D. pediu se poderamos continuar com o jogo na prxima sexta-feira. Foi legal
colocar vestido e imitar mulher.
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As meninas tambm pediram para continuarmos o jogo simblico na prxima
semana. A. P. disse: Tem mais coisas que homem faz que no deu tempo de
fazer.
Eles esperaram ansiosamente a sexta-feira para darmos continuidade troca de
papis.
No dia do encontro, pediram o caldeiro, a varinha de condo e novamente
revivemos toda a experincia da troca dos sexos.
Desta vez, trouxe do nosso espao pedaggico para a sala de aula trs bebs
acoplados a uma placenta e uma maleta com recursos mdicos como seringas,
estetoscpios, termmetro etc. (materiais ldicos) para enriquecer e alimentar a
nossa vivncia.
Os meninos se transvestiram de meninas e estas de meninos e juntos, construram a
histria daquele encontro.
Naquele dia, o grupo definiu alguns papis para a brincadeira: tinha o padre, o
mdico, a enfermeira, as mulheres que dariam a luz e os homens que iriam trabalhar
fora para trazer dinheiro para a famlia.
Pedi ao grupo para definirem seus nomes, uma vez que os papis sexuais estavam
trocados.
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As meninas transformaram seu nome para o masculino mudando a letra a final em
o e os meninos transformaram seu nome para o feminino, mudando o final do
nome por a. Somente D. ficou irritado ao descobrir que seu nome terminava com
a e teve de adotar um outro nome feminino.
Eles escolheram o padre e este realizou dois casamentos: D. com E. e C. com P.
que experimentavam SER em outra funo de gnero.
W. foi mdica ginecologista que, com a ajuda do T., realizou duas cesreas. D. e C.
deram luz na maternidade. O parto da D. e de C. foi difcil. Elas no conseguiam
expulsar os bebs da barriga, respiravam rapidamente e gritavam pedindo ajuda s
enfermeiras W. e F.
Foto 6 - Preocupao com a respirao na hora do parto.
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Foto 7 - Primeiras contraes de T.
P. com o E. saram para trabalhar enquanto as mames D. e C. cuidavam da casa e
do beb.
Foto 8 - Visita ao pediatra.
O T. foi pescar.
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Nessa atividade, o brincar rompeu a barreira do preconceito. Os meninos
incorporaram a atividade da maternidade, do acolher e cuidar da prole, cozinhando,
lavando e arrumando a casa.
As meninas buscaram no trabalho a garantia do sustendo da famlia. P. era um
pintor de paredes e E. consertava liquidificadores. Para T. foi escolhido o papel de
pescador, talvez pelo fato de ser de origem japonesa, com o objetivo de trazer e
vender os peixes para a comunidade.
W. no papel de mdica, F. de enfermeira e R. ficou como consultor do Posto de
Sade.
No final do encontro discutimos os diferentes papis que desenvolvemos na famlia
como homens e mulheres e chegamos a concluso que:
- os homens tambm podem ajudar nos servios domsticos cuidando dos
filhos, fazendo a comida, lavando roupa ou mesmo limpando a casa.
- No trabalho de bicha - concluiu F.
- que ns podemos realizar qualquer tipo de trabalho, no interessa se ele
considerado pelos outros como sendo trabalho masculino ou feminino.
- Que gostoso brincar de assumir outros papeis - sinalizou D.
- -Foi legal brincar de dar a luz. Reflexo de T.
- legal cuidar dos filhos - sntese de D.
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- preciso respeitar os homens que se vestem de mulher e as mulheres que
se vestem de homens ou de mulheres para namorarem outras mulheres -
pensamento de P.
Novamente o jogo e a brincadeira entram em cena.
Por meio da brincadeira a criana comea a se perceber e a se distinguir das outras
crianas. Na fase dos 9 aos 10 anos de idade, mais ou menos, a criana j se
percebe como um ser distinto e diferente dos demais amiguinhos da classe, por ter
valores e algumas concepes de vida j diferenciadas pela sua prpria histria.
Eles comeam a tomar conscincia da diversidade de valores sociais que permeiam
a brincadeira, dando vazo a socializao de idias de uma maneira ldica e
prazerosa.
Uma vez, um aluno que brincava com miniaturas de bonecos de pano, no aceitou a
unio que estava sendo feita de uma mulher branca com um homem negro. Ele
disse que branco no pode se casar com preto... Os amigos levantaram a questo
do racismo e do preconceito com liberdade, espontaneidade e criatividade. Um dos
meninos falou que o seu pai era negro e a sua me era branca e no havia
problema nenhum em ter cores diferentes.
Uma outra falou que tinha um irmo pretinho filho de outro pai e algum mencionou
que na televiso tambm tem casamento de branco com preto...
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CENA III
NO PALCO
O trabalho de Spolin fascinou-me pela maneira delicada e mgica com que ela lidou
com a representao corporal, as emoes e a resoluo de problemas nos jogos
teatrais.
Sua metodologia surge nos anos sessenta, vinculada ao movimento de renovao
do teatro norte-americano, que re-aparece questionando o processo expressivo e
criativo do ator de comportamentos de palco mecnico e rgido5.
Ela acredita na experincia viva do teatro, onde qualquer pessoa possa atuar e
improvisar (crianas, idosos, profissionais ou amadores) criando a sua cena, sem
precisar ser dirigido por um dramaturgo ou por um diretor graduado. Sua proposta,
em seu sistema de ensino, parte de situaes problemas a serem devolvidos a
platia e solucionados durante a atuao do grupo.
Quando a criana tem a oportunidade de vivenciar e experimentar diferentes
habilidades como tocar um instrumento, danar, cantar, representar, nadar , jogar,
cozinhar, recitar etc., ela entra em contato com suas infinitas potencialidades.
Todos ns temos potencialidades a serem desenvolvidas, o que nos falta so
oportunidades para vivenci-las e experiment-las.
5 Expresso de Koudela em texto de sua autoria para a introduo do livro de Viola.
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Nos jogos teatrais os jogadores precisam se envolver intelectual, fsica e
intuitivamente para jogar. Segundo a autora, o intuitivo que o mais vital para a
situao de aprendizagem, negligenciado (1998, p. 4) porque apresenta uma
conotao mstica e sobrenatural. Na verdade no nada disso. Muitas vezes
damos respostas certeiras que simplesmente surgem do nada ou fazemos coisas
certas sem pensar.
Nos jogos teatrais trabalhamos com a espontaneidade, com o intuitivo no aqui e
agora.
No momento em que a criana ou o adulto jogam, a criatividade e a inventividade
aparecem para solucionar qualquer problema que o jogo apresente. O importante
para o jogador atingir o seu objetivo, solucionar a situao-problema obedecendo
sempre as regras do jogo.
O jogo psicologicamente diferente em grau, mas no em categoria, da atuao dramtica. A capacidade de criar uma situao imaginativamente e de fazer um papel uma experincia maravilhosa, como uma espcie de descanso do cotidiano que damos ao nosso eu, ou as frias da rotina de todo o dia. Observamos que essa liberdade psicolgica cria uma condio na qual tenso e conflito so dissolvidos, e as possibilidades so liberadas no esforo espontneo de satisfazer as demandas da situao. (SPOLIN, 1998, p. 5).
O objetivo do jogo, a resoluo da situao problema o foco da concentrao do
jogador. Resolver uma situao-problema evoca uma energia criativa dos jogadores
no grupo. Essa energia desperta a espontaneidade e a liberdade de criar, inovar,
transformar; de se aventurar sem medo nessa grande aventura.
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Os jogos de improvisao apresentaram caractersticas diferentes quando
trabalhadas com adolescentes e crianas. Com os adolescentes, ns conseguimos
compreender o papel da platia no como um amontoado de juzes crticos e chatos,
mas como um grupo com o qual eles compartilham suas experincias.
Sem platia no h teatro, sem pblico no h como reverenciar a arte dos
jogadores.
Minha experincia com os alunos do 2 ano no chegou ao refinamento de
apresentar e compartilhar experincias com a platia. Aqui, diferencio o jogo teatral
da brincadeira.
Meu objetivo era criar a partir do jogo um contexto em que a linguagem pudesse ser
contextualizada espontaneamente, onde o pensar, agir e sentir pudesse fluir por
intermdio da ao do grupo. Utilizando situaes de linguagem espontnea, por
intermdio dos jogos, os alunos se organizavam distribuindo papis, criando a
histria, encaminhando e solucionando as situaes problemas que criavam; porm
num estgio que antecede ao jogo teatral propriamente dito porque no existe a
necessidade da platia.
Observei ento, a necessidade do grupo em reviver o brincar. Existia participao e
colaborao de todos e material para desenvolver o jogo. Os alunos delimitaram o
espao onde desenvolveriam o jogo, distribuam funes e papis para desencadear
a histria coletiva com muita inspirao, espontaneidade e criatividade.
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Os alunos se organizavam distribuindo papis, criando a histria, encaminhando e
solucionando as situaes-problema que criavam; porm num estgio que antecede
ao jogo teatral propriamente dito, porque no existe a necessidade da platia.
Observei, ento, a necessidade do grupo em reviver o brincar. Existia participao e
colaborao de todos e material para desenvolver o jogo. Os alunos delimitaram o
espao onde desenvolveriam o jogo, distribuam funes e papis para desencadear
a histria coletiva com muita inspirao, espontaneidade e criatividade.
Existe o desejo de jogar, de entrar em contato com o outro e com o ambiente criado;
porm no existem subgrupos que definam a platia, no existe o olhar do outro
para compartilhar o problema. Todos participam e compartilham, juntos no brincar, a
resoluo do problema.
A brincadeira no contexto educacional foi bastante utilizada por Friedrich Froebel,
criador do jardim da infncia. Ele defendia o uso de brinquedos e jogos
organizadores em sala de aula como ferramentas e parceiros silenciosos que
desafiam a criana a expandir sua criatividade, possibilitando novas descobertas
sobre seu mundo.
no ato de brincar que a criana se apropria da realidade em que est inserida,
atribuindo-lhe novos significados. A gnese da brincadeira simblica est presente
nas primeiras relaes que a me, ou quem a representa, estabelece com a criana
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desde o nascimento. Portanto, a brincadeira aprendida por meio das relaes que
se estabelece no meio social em que vive. (KISHIMOTO, 1998).
Nas relaes com o outro ou com os objetos com os quais interage, ela vai
incorporando outros modelos ao seu repertrio, observando e internalizando-os
como sendo seus.
representando os diferentes papis pela imitao, que a criana vai incorporando
suas caractersticas prprias, modificando-as, ampliando-as ou mesmo
transformando-as.
Quando a criana brinca de esconder o rosto com as mos para ser descoberta pela
me, ela se engaja na brincadeira, descobrindo as regras e a seqncia de aes
que permeiam o brincar. Muitas vezes, alm de perceber as regras que esto sendo
utilizadas na brincadeira, a criana alterna a seqncia de aes inserindo novos
elementos na brincadeira. Ora ela esconde o rosto, ora ela procura o da sua me.
Essas brincadeiras interativas contribuem para o desenvolvimento cognitivo e para a
aquisio da linguagem. (KISHIMOTO, 2002).
A relao entre o brincar, a aquisio de regras e o desenvolvimento da linguagem
foi bastante evidenciada em vrias obras de Bruner que considera as brincadeiras
de esconder, como relevantes para o desenvolvimento cognitivo, estimulando a
aprendizagem da linguagem e a soluo de problemas (apud KISHIMOTO, 2002, p.
143).
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Segundo Kishimoto, o jogo visto como uma forma de violar os padres de
comportamento sociais da espcie (2002, p. 140). Por meio da observao e da
imitao, a criana experimenta situaes do dia-a-dia nos momentos ldicos, com
grande liberdade, sem medo do erro ou da punio do adulto. No brincar toda ao
pode ser experienciada, re-organizada e reconstruda por aquele que brinca. O
importante o prazer e a motivao na realizao da atividade. No existe uma
preocupao com o resultado final, o objetivo explorar a situao e ir alm,
arriscar-se ao novo e ao desconhecido.
Bruner entende que a criana aprende ao solucionar problemas (apud
KISHIMOTO, 2002, p. 145) e o brincar uma atividade que favorece esse processo.
Bruner caracteriza trs caractersticas que participam da aprendizagem: a aquisio
de nova informao, sua transformao ou recreao e avaliao (apud
KISHIMOTO, 2002, p. 144).
A aquisio de nova informao varia conforme metodologia empregada: aprendizagem dirigida, com informaes explicaes do professor ou ao da criana, visando a descoberta por meio de brincadeiras. [...] A transformao o processo de internalizao que reorganiza a informao dentro da estrutura de idias disponveis e a avaliao representa sua compatibilidade e possibilidade de expresso. (KISHIMOTO, 2002, p. 144).
Segundo a autora, em situaes de brincadeira a criana desenvolve a
intencionalidade no sentido de re-criar, re-organizar e re-constituir a ao observada
na sua vida diria para transform-la.
O brincar ajudou os alunos a tomar conhecimento do real, a vivenci-lo,
experimentando os diferentes papis que lhes eram atribudos pelo grupo: me,
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professora, costureira, empregada, cachorro, ladro, polcia, mdico, enfermeiro...
No brincar, os medos, os traumas, os desejos e as frustraes eram enfrentados
criativamente pelo grupo por meio do jogo coletivo.
Na morte do paciente, por exemplo, houve o enterro, a presena do motorista do
carro fnebre, o padre e a soluo da morte: o esprito do paciente subiu ao cu e
depois renasceu no grupo novamente. A angstia da morte foi vivenciada e re-
elaborada no brincar.
Na brincadeira a comunicao tambm direta, acontece no momento em que se
joga. A espontaneidade e a criao acontecem no aqui e agora.
A criana tem a oportunidade de vivenciar diferentes papis na brincadeira:
compartilha suas experincias com o outro, revive a me, a professora, o pai, o
mdico, o cachorro, a empregada ou qualquer outro personagem que deseja
representar. Ela assume integralmente o seu papel re-organizando seus
sentimentos, suas emoes, seus valores; sua histria.
O jogo simblico, e as brincadeiras favorecem a auto-estima das crianas e a
interao com seus pares, propiciando situaes que instigam a reflexo da sua
realidade.
Quando a criana experimenta um novo papel, ela se coloca na posio do outro,
imitando-o para compreend-lo, neg-lo ou reinvent-lo na busca da construo da
sua identidade.
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A brincadeira permite essa sntese interna, esse re-viver, essa busca interna da sua
identidade.
Toda ao pressupe relao factual ou simblica, entendendo-se por simblica a
relao com pessoas reais ou imaginrias, que tm sua presena representada.
(ALMEIDA et al., 1988, p. 49)
Na viso de Moreno, o homem possui como recursos internos a espontaneidade, a
criatividade e a sensibilidade para agir na cena da vida social. O homem na