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Universidade Federal do Amapá Curso de Artes Visuais O artesanato amapaense: Reflexões sobre a incorporação da iconografia Maracá e Cunani como identidade na produção artesanal Acadêmicos: Genilson Lima Albuquerque Renata Sousa dos Santos Orientador: Profº. José de Vasconcelos Silva

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Universidade Federal do Amapá

Curso de Artes Visuais

O artesanato amapaense:Reflexões sobre a incorporação da iconografia Maracá e Cunani

como identidade na produção artesanal

Acadêmicos:

Genilson Lima Albuquerque

Renata Sousa dos Santos

Orientador: Profº. José de Vasconcelos Silva

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...as pessoas confundiam a cerâmica do Amapá com as peças marajoaras doPará. O Amapá não mostrava sua cara, nem consolidava sua imagem. Hoje,já se pode respirar com mais orgulho o sentimento de posse desse tão ricopatrimônio, o qual vai desencadear novas oportunidades e sustentabilidadepara as próximas gerações...

(Cristiano Sales, colaborador do SEBRAE-AP, 2006)

Introdução

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Objetivos

Analisar do ponto de vista teórico-metodológico, porque a proposta de se criaruma identidade para a produção artesanal amapaense, através do ProjetoIconográfico Maracá e Cunani, não obteve exito.

Identificar os pontos mais incisivos que determinaram o insucesso do projetogovernamental.

Propor a reedição do projeto de intervenção no design do artesanato local,sob nova metodologia de elaboração e execução.

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Metodologia

A revisão de literatura visa reconhecer e dar crédito à criação intelectual deoutros autores é uma questão de ética acadêmica, através dela abre-se umespaço para evidenciar que seu campo de conhecimento já está estabelecido,mas pode e deve receber novas pesquisas; ou ainda, emprestar ao texto umavoz de autoridade intelectual. Através da revisão de literatura, reporta-se eavalia-se o conhecimento produzido em pesquisas

(ZAHLOUTH e PAIVA, 2012, p. 01)

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Estrutura do trabalho

O primeiro capítulo aborda o artesanato na trajetória histórica na construçãode seu conceito e definição. O estudo dos elementos fundamentais para aelaboração dos conceitos de identidade e cultura são objetos do segundocapítulo. Mostrar os artefatos e biofatos como elementos característicos dacultura Maracá e Cunani são descritos no terceiro capítulo. Finalmente, noquarto capitulo, analisamos criticamente o insucesso da primeira experiênciaamapaense de construção identitária.

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História

O artesanato tem sua origem ligada à história da humanidade, pois os homenssempre tiveram a necessidade de produzir bens de utilidades e uso rotineiropara garantir sua sobrevivência e bem-estar individual e coletivo, produzindoobjetos com suas próprias mãos.

Artesanato

Com a desarticulação da ordem social e econômica do Mundo Antigo, houve umdesgaste das forças de sustentação de sua cultura material, pelo fato de, com osescravos libertados, passaram a sobreviver com o trabalho que sabiam fazer, “dandoorigem ao aparecimento das profissões – melhor configuradas como ofícios, os quais,depois no decurso da Idade Média, assumiram características bem definidas, sereorganizariam e atingiriam um plano de apogeu, [...] (PEREIRA, 1979, p. 29)

Segundo Pereira (1979, p. 43), os artesãos surgiram no Brasil com os donatários para asvilas das Capitanias, “[...] poucos e de ocupações não muito diversificadas [...], dandoorigem a um artesanato meio desconexo, de exclusivo atendimento às necessidadeslocais”.

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Conceitos

Tomada em sua acepção original, a palavra artesanato significa um fazer ou oobjeto que tem por origem o fazer ser eminentemente manual. Isto é, são asmãos que executam o trabalho. (LIMA, 2007, p. 01).

World Crafts Council (WCC)[1] ...toda atividade produtiva que resulte em objetos eartefatos acabados, feitos manualmente ou com a utilização de meios tradicionais

[1] O Conselho Mundial de Artesanato (WCC), fundado em 1964, é uma organização não governamental sem fins lucrativos que tem o propósito de fortalecer a posição do

artesanato como uma parte vital da cultura e da vida econômica, entre outros aspectos. Fonte: http://www.worldcraftscouncil.org/index.html.

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Definições

Para Barroso (2000, p. 03), o artesanato é “toda atividade produtiva de objetose artefatos realizados manualmente, ou com a utilização de meios tradicionaisou rudimentares, com habilidade, destreza, apuro técnico, engenho e arte”.

O artesanato pode ser diferenciado por categorias de finalidades, por “umaclassificação que se orienta pelo principio da operacionalidade, adotando afinalidade dos produtos como critérios distributivos das categorias” (PEREIRA,1979, p. 85)

Conceitual, objetos cuja finalidade é de externar contemplação por isso seaproxima das artes populares.

Decorativo, serve para enfeitar; sua principal motivação é a busca dabeleza utilizada no ambiente de convívio.

Litúrgico, utilizados em práticas religiosas. Lúdicos, relacionados a práticas folclóricas e tradicionais são em geral para

entretenimento.

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Cultura e Identidade

CulturaConjunto de práticas, comportamentos, ações e instituições pelas quais oshumanos se relacionam entre si e com a Natureza e dela se distinguem, agindosobre ela ou através dela, modificando-a. Este conjunto funda a organizaçãosocial, sua transformação e sua transmissão de geração a geração.

De acordo com Matta (1986, p.123), a cultura é “algo que está dentro e fora decada um de nós”, isto é, mesmo que ela não seja sempre perceptível de formaexposta e declarada, ela está presente em toda e qualquer sociedade.

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Cultura e Identidade

Identidade

Não temos conhecimento de um povo que não tenha nomes, idioma ou culturas em quealguma forma de distinção entre o eu e o outro, nós e eles, não seja estabelecida... Oauto conhecimento – invariavelmente uma construção, não importa o quanto possaparecer uma descoberta – nunca está totalmente dissociada da necessidade de serconhecido, de modos específicos, pelos outros. (CASTELLS, 2008, p. 22)

Neste processo de fricção as identidades se configuram como portadoras designificados em constante mutação, à medida que os indivíduos seapropriam e reelaboram tais conceitos e os devolvem à sociedade por meiode suas produções culturais (artesanais e industriais), considerando ascaracterísticas de seu contexto sócio-econômico-cultural. (BERGER (1976)apud OLIVEIRA, 2011, p. 01),

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Cerâmica Maracá

Localizada na região do Maracá no sudoeste do Estado do Amapá, no município deMazagão. Seus sítios arqueológicos são representado por uma série de grutas ondeforam encontradas urnas funerárias. O primeiro registro de um sitio arqueológicoMaracá foi feito em 1872 por Domingos Soares Ferreira Penna.

Aquelas em que aparecia claramente um índiosentado em seu banquinho, com indumentáriafestiva de audiência e conselho, dando umareprimenda. Pernas e braços de tubos ocos sãoencaixados na parte da frente de um grandecilindro de madeira, que deve representar otronco, enquanto a cabeça apresenta umaespécie de capacete parecido com uma gamelaou até mesmo um hemisfério, às vezeslembrando um antigo elmo de centurião romano,e eventualmente a modos de esfinge. (GOELDI(1906) apud SANJAD e SILVA, p. 106)

A Cerâmica Maracá Cunani

Fonte da imagem http://www.zonad.com.br/zonad/noticiasdazona/04/bancos/urna-maraca.jpg

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Cerâmica Maracá

Nas urnas antropomorfas as pinturas se concentram no tronco do corpo e na cabeça, emfaixas largas, nas cores branca, preta e amarela, em diferentes combinações, além deapresentar pinturas nas cores preta e branca e vermelha, em linhas paralelasconfigurando uma padronagem de listras.

Urna antropozoomorfaFonte: Bol. Mus. Para. Emílio Goeldi.

Urna CilíndricaFonte: Bol. Mus. Para. Emílio Goeldi.

Urna zoomorfaFonte: Bol. Mus. Para. Emílio Goeldi.

Urna AntropomorfaFonte: Bol. Mus. Para. Emílio Goeldi.

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A Cerâmica Maracá CunaniCerâmica Cunani

Encontra-se a Vila de Cunani, no município de Calçoene, na região norte do Amapá. Osprimeiros relatos de coletas de peças arqueológicas na região datam de 1883, no MonteCunani e 1888 na Vila do Cunani, mas somente em 1895 foi realizada uma expediçãoarqueológica no local, por Emilio Goeldi e Aureliano Pinto Lima Guedes.

As condições de conservação desses produtos deolaria são geralmente tão impecáveis que atéparece – sobretudo diante do aspecto fresco dastintas – que as vasilhas foram feitas dias atrás. E,contudo, sua idade deve ser avaliada em muitascentenas de anos. (GOELDI, 1906, p. 08)

Fonte da imagem: http://3.bp.blogspot.com

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A Cerâmica Maracá Cunani

A tradição Cunani chama a atenção pela grande habilidade no trabalho com a cerâmica epela riqueza da forma e ornamentos das peças, vemos que são usados, de um lado,desenho e pintura, e, de outro, adornos em alto e baixo relevo.

Grande tigela, semelhante a uma cartolaFonte: Bol. Mus. Para. Emílio Goeldi

Travessa quadrada com fundo furado e adornos artísticos nas laterais e nos cantos. Bol. Mus. Para. Emílio Goeldi.

Cerâmica Cunani

Urna mortuáriaFonte: Bol. Mus. Para. Emílio Goeldi.

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A campanha iniciou em 2003, e durantes três anos, equipes de arqueólogos, técnicos edesigners, entre longas pesquisas e estudos, reuniram documentos, imagens, urnasfunerárias, vasos, alguidares, encontrados nos sítios arqueológicos, que possibilitaram ocontato da equipe com a iconografia Maracá e Cunani.

A Iconografia Maracá e Cunani como identidade do artesanato amapaense.

• Identidade legitimadora – introduzida por instituições dominantes da sociedade, nointuído de expandir e racionalizar sua dominação em relação aos atores sociais, temaeste que está no cerne da teoria da autoridade e dominação de Sennet (1986) e seaplica a diversas teorias do nacionalismo.

• Identidade de resistência – Criada por atores que se encontram emposições/condições desvalorizadas e/ou marginalizadas pela lógica da dominaçãoconstruindo, assim, trincheiras de resistência e sobrevivência com base em princípiosdiferentes dos que permeiam as instituições da sociedade, ou mesmo opostos a estesúltimos conforme propõe Calhoun ao explicar o surgimento da política de identidade.

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• Identidade de projeto - Quando os atores sociais utilizando-se de qualquer materialcultural ao seu alcance, constroem uma nova identidade capaz de redefinir suaposição na sociedade e, ao fazê-lo, busca a transformação de toda a estrutura social.(CASTELLS, 2000, p. 24)

Mudanças no processo produtivo implicam mudanças comportamentais. Portanto, osartesãos, que são os atores deste processo, precisam de capacitação desde acomercialização, formação de preços, marketing, gestão, cultura da cooperação até ogerenciamento das relações interpessoais. (SEBRAE, 2004)

As intervenções de design no artesanato resultantes dos trabalhos realizados porartesãos sob a orientação de um profissional do design objetivam a criação do chamado“artesanato de referência cultural”, ... São em geral resultantes de uma intervençãoplanejada de artistas e designers, em parceria com os artesãos com objetivo dediversificar os produtos, porem preservando seus traços culturais mais representativos.(SIQUEIRA, 2008, p. 57)

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Uma das características mais marcantes dos artesãos é seu comportamentoindividualista. Acostumado ao trabalho isolado, na maioria das vezes realizado em suaprópria residência, comparte sua experiência e seus conhecimentos apenas com seusfamiliares ou algum aprendiz arregimentado na vizinhança... (NETO, 2012, p. 16)

O fato de o designer ter conhecimentos acadêmicos e ser contratado para criar produtosem comunidades produtivas de artesanato não os imbui de uma atitude autoritária naqual o aprendiz (leia-se artesão) é apenas um “receptáculo bocejante” (ROGERS, 1985).O artesão deve ser o protagonista do processo criativo que ocorre durante a atuação dodesigner junto aos grupos. (SIQUEIRA, 2008, p. 57)

O designer não pode achar que conhece tudo, porque, felizmente, isso é impossível aohomem. Como dizia Paulo Freire, “não há saber maior ou menor, há saberes diferentes”.Todas as pessoas são capazes de criar, e é importante que essa semente seja plantadapelo designer. O ser humano precisa de estímulo para viver, para criar ou desenvolverqualquer atividade artística. O estímulo é a mola propulsora para que o momento dacriação aconteça. (SIQUEIRA, 2008, p. 79)

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A tarefa de conceber e desenvolver um novo produto, ou atualizar um produtoexistente de acordo com as expectativas do mercado e respeitando-se as condições daprodução, é uma atividade altamente complexa que requer a colaboração deprofissionais experientes (como disigners, engenheiros de produção, arquitetos,antropólogos, entre outros) e para isto não basta ter talento e capacidade criativa. Énecessária, acima de tudo, uma atitude de respeito à cultura do artesão. (MASCENE,2010, p. 32)

Governos e instituições procuram muitas vezes utilizar elementos de um passadoglorioso como instrumento de marketing e autopromoção – mas, se os valores dosquais procuram se apropriar não encontram um substrato sólido a partir do qualpossam ser reproduzidos, é provável que os resultados desta tentativa de criar valorsimbólico para a produção local acabe, ao contrário, por levar a seu descrédito.(CASTRO e CORREA, 2012, p. 53)

...sofrer a dominação não significa necessariamente aceitá-la (Cuche, 1999, p. 146)

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Considerações Finais

Constatou-se que a intervenção no design do artesanato amapaense, idealizadapelo SEBRAE-AP e promovida pelo governo do Estado, com objetivo de criaruma identidade cultural e potencializar os produtos artesanais no mercadonacional, terminou por não alcançar seus objetivos.

No curso de nossas reflexões formulamos muitas questões e poucas respostas,muitas portas ficaram abertas visando posterior aprofundamento, contudopodemos considerar provisória e sinteticamente alguns pontos que foramdelineados ao longo deste estudo.

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Referências BibliográficasCASTELLS, M. O poder da identidade. Tradução Klauss Brandini Gerhardt. 2.ed. Coleção: A Era daInformação: Economia, Sociedade e Cultura. Vol 2. São Paulo, Editora: Paz e Terra, 2000.

HALL, Stuart. A identidade cultural na pós-modernidade. Rio de Janeiro: DP&A, 2011.

PEREIRA, Artesanato: Definições, evolução e ação do Ministério do Trabalho; programa nacionalde desenvolvimento do artesanato. Brasília : MTB, 1979.

NUNES FILHO, Edinaldo Pinheiro. Pesquisa Arqueológica no Amapá. 2ª Ed. Macapá: B-A-BÁ, 2005.

FRANCO, Silvia Cintra. Cultura: Inclusão e diversidade. São Paulo: Moderna, 2006.

MALAGUTI, Cyntya et al. O legado das civilizações Maracá e Cunani: o Amapá revelando suaidentidade. Macapá: SEBRAE-AP, 2006.

SIQUEIRA, Isolina Passos. A força do relacionamento entre artesão e designer no olhar de Carl rogers. Disponível no site: <http://www.biblioteca.sebrae.com.br> Acessado em 23 de Jan. 2013.

CUCHE, Denys. A noção de cultura nas ciências sociais. Tradução de Viviane Ribeiro. Bauru: Edusc, 1999.

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Colaborador José VincenteColaboradora Eleni Lima colaboradora Ezequiele Lima

Fonte das imagens: http://3.bp.blogspot.com

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Replicas de Urnas Maracá – Casa de ArtesãoAcervo: G. Albuquerque

Vaso - Maracá – Casa de ArtesãoFotos: Acervo G. Albuquerque

Vaso - Cunani – Casa de ArtesãoFotos: Acervo G. Albuquerque

Vaso - Maracá – Casa de ArtesãoFotos: Acervo G. Albuquerque

Vaso CunaniFonte: http://3.bp.blogspot.com

Vaso CunaniFonte: http://3.bp.blogspot.com

Vaso - Cunani – Casa de ArtesãoFotos: Acervo G. Albuquerque

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