Apostila 01 / Mídias Digitais: Panorama Histórico e Conceiitual
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Vivemos na Era da hiperconec-tividade, onde tudo e todos estão interliga-
dos à tudo e a todos, o tempo todo. Um mundo
onde não conseguimos mais nos imaginar sem
a Internet e a todo este novo comportamento so-
cial que surgiu a partir de sua democratização.
Estamos no meio de uma silenciosa revolução,
responsável por mudanças profundas na for-
ma como nos comunicamos, como nos infor-
mamos, como consumimos, como vendemos,
como nos entretemos, nos relacionamos e até
mesmo como trabalhamos. Mas, como toda re-
volução em andamento, ainda não temos o cha-
mado ‘distanciamento histórico’ para conseguir
compreender para onde estamos indo. A ques-
tão é que definitivamente estamos indo à algum
lugar, em uma velocidade nunca imaginada até
mesmo pelos mais engenhosos profetas.
O ritmo quase transcendental em que a Revolu-
ção Digital nortea as relações humanas no sé-
culo XXI não tem mais do que 20 anos de histó-
ria, apesar de sua gênese nos remeter à década
de 60 do século passado.
Enquanto a televisão e o rádio foram inventa-
dos há cerca de um século, a Internet - com sua
popularização a pouco mais de 20 anos - já al-
cança a marca de mais de 2 bilhões de pessoas
conectadas1, em um mundo com 7 bilhões de
habitantes. Isso sem contar a aceleração da mo-
bilidade da informação, a partir dos celulares e
smartphones, que podem chegar até 5 bilhões
de usuários. Só no Brasil, segundo a Agência
Nacional de Telecomunicações (Anatel), exis-
tem mais de 255 milhões de celulares ativos2
(algo como 1,20 celular por habitante, dados de
outubro de 2012), sendo que quase 20% desses 1.0
/ IN
TRO
DU
CÃO
03
1 Internet World Stats (http://www.internetworldstats.com/stats.htm) Acesso: novembro 20122 UOL Economia (http://economia.uol.com.br/ultimas-noticias/infomoney/2012/06/19/celulares-brasil-tem-quase-255-milhoes-de-linhas-ati-vas.jhtm) Acesso: novembro 2012
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R G
usta
vo S
anto
s
é compatível com o sistema 3G, tecnologia que
possibilita acesso à Internet.
Com a crescente difusão do acesso à Internet
por diversos meios, percebemos que a profun-
da domesticação das tecnologias digitais tende
a não só mais nos conectar uns aos outros mas
também aos objetos do nosso dia a dia, como
carros, roupas, eletrodomésticos, serviços pú-
blicos, etc, fazendo com que a Internet seja
o que já é para muitas pessoas: uma relação
de uso quase imperceptível e intrinsecamen-
te adaptada as suas rotinas, assim como é a
energia elétrica: não se nota sua presença até
a sua ausência.
Com tamanha naturalidade em que as tecno-
logias digitais estão no nosso dia a dia, não no-
tamos que interagimos com ela desde o ama-
nhecer até o anoitecer. Mas essa intimidade
corriqueira com o mundo digital precisa e deve
ser vista com olhos mais apurados para con-
seguir absorver e aproveitar o máximo de suas
possibilidades.
O escritor especializado em tecnologia Kevin
Kelly, editor da revista Wired, refletiu sobre a
velocidade das mudanças e, principalmente,
como não a enxergamos diante de tanta ‘nor-
malidade’ dos usos digitais nos dias de hoje:
“Tive de convencer a mim mesmo a acreditar no
impossível com mais regularidade (…) Vinte anos
atrás, se eu fosse contratado para convencer uma
plateia de pessoas sensatas e esclarecidas que
dali a vinte anos as ruas do mundo estariam ma-
peadas por fotos de satélites e à disposição em
nossos aparelhos portáteis – e de graça -, e com
vista para as ruas de muitas cidades, não teria
conseguido. Não saberia ilustrar as razões eco-
nômicas para que isso fosse oferecido “de graça”.
Eram completamente impossível naquela época3.”
04
3 CHATFIELD, Tom: Como viver na era digital. PP.11
Ou seja, vivemos num ‘tempo de milagres’, se-
gundo Tom Chatfield, filósofo da comunicação
digital. Num tempo de colaborações, intera-
ções e microrrevoluções com alcance mun-
dial e com possibilidades ainda inimagináveis,
principalmente pelo fato de que os telefones
com conexão à Internet são mais poderosos
que muitos computadores, e que temos aces-
so livre à informações o que antes era restri-
to apenas aos governos a menos de vinte anos
atrás.
Então, é preciso mais do que nunca refletir e
pensar sobre essas novas possibilidades. Ao
mesmo tempo em que nos sentimos livres por
ter acesso ilimitado à informações dstintas, de
várias fontes, uma grande ansiedade surge a
partir da tamanha liberdade que temos e por
não conseguir absorver todo esse conteúdo.
Sabemos que não é suficiente apenas saber
usar essas tecnologias. É preciso entender sua
linguagem e seus processos para criar um dos
elementos mais vitais de diferenciação de pro-
fissionais (e, por que não, de seres-humanos)
do século XXI: saber filtrar, interpretar e co-
municar todo esse conteúdo disponível da for-
ma mais clara possível e nos canais corretos.
A ideia básica desse módulo é resgatar o iní-
cio de toda essa revolução, seus processos e
fases, para compreender de uma forma mais
lúcida e crítica de como a comunicação digital
é hoje um elemento indispensável nas rela-
ções humanas mas também uma grande fonte
de possibilidades profissionais para, principal-
mente, criar um senso de discernimento de
como, quando, onde e por que usar as ferra-
mentas digitais disponíveis para cada objetivo
planejado e sua aplicação no mercado da co-
municação, seja para a publicidade de produ-
tos, marcas ou serviços, de criação de estra-
05
tégias de marketing digital ou mesmo para o
engajamento de pessoas em prol de uma cau-
sa ou movimento.
Para isso, esse módulo foi estruturado em 2
capítulos onde vamos entender os principais
elementos que sustentam a comunicação di-
gital do século XXI: 1. O passado não distante,
onde vamos refazer o trajeto da revolução di-
gital, desde a criação dos primeiros computa-
dores em rede até o fenômeno da tecnologia
móvel; 2. Da restrição ao acesso à informação,
onde veremos como em pouquíssimo tempo
temos acesso a mais informação em um dia
do que um homem do começo do século XX ti-
nha em toda sua vida, e como saber lidar com
tanto conteúdo, além de conhecer um pouco
mais sobre a profissão de Analista de Mídias
DIgitais. Por fim, esse módulo pretende então
refletir como essa visão holística do ambiente
digital (o conhecimento de seu passado para
entender o contexto do presente, saber lidar
com a linguagem do meio e com o excesso de
informação disponível para se tornar relevante
em um ambiente caótico e as técnicas e meto-
dologias de comunicação) pode contribuir para
a formação de um profissional completo e crí-
tico em um universo em eterna construção.
06
Pela primeira vez em toda a história, uma rede (prática humana muito
antiga) permite a comunicação de muitos com
muitos, em um momento definido e em escala
global. (CHATFIELD 2012)
Mas o que experimentamos hoje como co-
municação digital é fruto de um processo em
constante evolução, desde sua concepção
como uma poderosa ferramenta militar restri-
ta aos governos até uma tecnologia acessível a
bilhões de pessoas.
Tudo começou nos anos 1940, com a criação de
enormes e complexas máquinas, do tamanho
de quarteirões, operadas por cientistas extre-
mamentes capacitados para cumprir tarefas
ainda mais complexas como a decodificação
de mensagens cifradas dos alemães durante a
Segunda Guerra Mundial, por exemplo.
Já na década de 50 do século XX, começaram
os primeiros experimentos para aquilo que
hoje chamamos de computadores, presentes
principalmente em universidades norte-ame-
ricanas e instituições militares. Ainda eram
máquinas enormes, operadas apenas por es-
pecialistas. Durante esse período ainda não
havia a ideia de ‘rede’ e seu funcionamento era
07
2.0
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Sala de operações do Electronic Numerical Integrator Analyzer and Computer (ENIAC) em 1943, um dos primeiros computadores.
Foto: Microsoft Encarta Encyclopedia Online
basicamente por informações inseridas atra-
vés de comandos abstratos e as respostas que
não faziam sentido algum para quem não fosse
um cientista da computação.
Mas com o aumento da tensão da Guerra Fria,
onde dois blocos, politica e ideologicamen-
te antagônicos (Estados Unidos e União So-
viética), dominavam o cenário internacional,
percebeu-se que um eficaz controle e uso dos
meios de comunicação era uma ferramante
fundamental para a manutenção do status quo
de ambos os lados, ao mesmo tempo que havia
um temor mútuo de um ataque em suas bases
de informações, expondo conteúdos sigilosos
para o inimigo.
Uma forma de se prevenir de um possível ata-
que foi descentralizar a informação, a partir da
ideia de ‘rede descentralizada’ utilizando um
modelo de troca e compartilhamento de dados,
preservando sua integridade em caso de uma
guerra. O Pentágono, nos Estados Unidos, fo-
ram os primeiros a experimentar uma nova
tecnologia baseada em computadores chama-
da ARPANET, uma rede criada pela Agência de
Projetos Avançados em Pesquisa (ARPA em in-
glês) onde o objetivo era dividir as informações
sigilosas em ‘pacotes’ enviadas à diferentes
computadores que, quando conectados a par-
tir de uma chave específica, permitia a remon-
tagem da mensagem original.08
Mapa de distribuição de arquivos da ARPANET, 1971.
Foto: Atlas of Cyberspace
Paralelamente às tensões da Guerra Fria e do
desenvolvimento de uma rede de computado-
res para compartilhamento de informações,
uma outra revolução começava a se desenro-
lar com a chegada dos microprocessadores,
o que permitiu a considerável diminuição do
tamanho das máquinas e na queda dos pre-
ços, possibilitando a chegada dos primeiros
computadores pessoais às casas de cidadãos
comuns e não apenas mais restrito aos labo-
ratórios de pesquisa, apesar da descrença da
própria indústria quanto à sua popularização.
Com o lançamento do primeiro computador
pessoal em 1971, ainda em forma de Kit (o pro-
cessador deveria ser ligado à uma televisão),
poucos esperavam que o mercado doméstico
fosse além de alguns aficionados por tecnolo-
gia. Porém, já no final da década de 70, novas
empresas de tecnologia para consumidores
finais como a Apple, Commodore e Tandy es-
tavam vendendo centenas de milhares de uni-
dades, iniciando então a chamada revolução
digital.
09Exemplos de estrutura de redes centralizada, descentralizada e distri-buída.
Kenbak-1, o primeiro computador pessoal, produzido em 1971.
Como o crescimento do mercado doméstico
para computadores pessoais e a diminuição
da tensão entre os Estados Unidos e a URSS,
a chamada dètente ou coexistência pacífica, o
governo dos EUA permitiu que as universida-
des pudessem participar do desenvolvimento
de uma rede acadêmica e civil, dividindo a AR-
PANET em dois sistemas distintos: a MILNET,
rede específica para uso militar e a ARPANET,
que agora poderia ser usada para fins de pes-
quisa acadêmica. Essa descentralização mi-
litar da rede permitiu o seu desenvolvimento
em um ambiente livre, onde não só cientistas
e professores, mas alunos e amigos de alunos
pudessem participar desse processo de de-
senvolvimento de uma novo universo.
Os jovens da contracultura, envolvidos ideolo-
gicamente na difusão de uma informação livre,
começavam a se tornar empresários em um
ambiente extremamente fértil e para o empre-
ededorismo, rico culturalmente e tecnologica-
mente (o Vale do Silício, na Califórinia), foram
os grandes responsáveis pelo modelo de rede
que hoje conhecemos como Internet.
Ou seja, a descentralização do ambiente mili-
tar da tecnologia, o interesse do mercado in-
terno por computadores pessoais e, talvez o
elemento mais importante, o engajamento de
10
Steve Jobs, fundador da Apple e Bill Gates, fundador da Microsoft em foto de 1982.
Foto: George Lange/ Getty Images
jovens pesquisadores e empresários, que den-
tro de um contexto de democratização do co-
nhecimento e na preservação de um espírito
de liberdade, pano de fundo da contracultura
utópica da época, criaram um fenômeno que
transcendeu as barreiras técnicas e mecânicas
da tecnologia. Se criou uma nova realidade de
interações entre as pessoas e um novo com-
portamento. Segundo o sociólogo espanhol
Manuel Castells, a Internet é, acima de tudo
uma criação cultural4 . A partir dessas obser-
vações podemos concluir então que a liberda-
de é um dos principais elementos da criação
da Internet.
Desde então, a Internet vem passando por evo-
luções em sua tecnologia de acesso em gran-
de velocidade. Desde pequenas microrrevolu-
ções como a criação do protocolo de Internet
(IP), que permitia que o tráfego de informação
fosse encaminhado de uma rede para a outra,
passando pela concepção, em 1992, do WWW,
protocolo que inaugurou uma Internet visual
através de páginas (antes a troca de informa-
ção era feitra apenas por códigos e linguagens
específicas) até a constante melhoria na expe-
riência de conexão, possibilitado pela evolução
tecnológica dos computadores e da infraestr-
tura que, de um desktop em casa ou um laptop
na mochila está sendo gradualmente substitu-
ído por um smartphone na mão ou um tablet
na mesa, ligados e conectados o tempo todo.
Em sua origem, fora do âmbito militar, a In-
ternet tem como elemento fundamental a tro-
ca, o compartilhamento e o fluxo contínuo de
informações pelo mundo todo. Hoje, todas as
tecnologias intelectuais presentes em nossa
vida - de palavras, imagens, videos a músicas,
textos, livros, etc, podem ser supridas por um
11
4 CASTELLS, Manuel: A Galáxia da Internet. PP.32
único sistema integrado5 , o computador ou um
celular.
Mas essa radicalização do acesso à informação
que temos hoje é algo muito novo, mesmo em
unidade de tempo da Internet – que é sensivel-
mente mais rápida que o nosso tempo crono-
lógico - a rede passou por cerca de 5 fases de
evolução para chegar até onde estamos.
A primeira fase foi o que vimos no início do ca-
pítulo com a ARPANET, seu processo de des-
centralização militar, seu desenvolvimemto
civil, a difusão pelas universidades como uma
ferramenta de livre expressão de conheci-
mento, mas ainda muito restrita ao ambiente
acadêmico e necessitando conhecimentos de
informática avançados, mesmo que o fim não
seja apenas a troca de conteúdo científico. Sua
conexão dependia de mainframes e backbo-
nes, grandes infraestruturas mantidas pelo
governo que permitiam a conexão entre vários
computadores de redes distintas. Sua principal
característica nessa fases se resume a trocas
esporádicas de mensagens eletrônicas e leitu-
ras de fóruns técnicos, com baixa interativida-
de entre pessoas. Neste momento chamamos
de Fase ARPA.
Já o segundo momento veio com o barate-
amento e popularização dos computadores
12
Cientista manipulando um dos computadores de rede ARPA, 1969
Foto: prairiehill.org
5 CHATFIELD, Tom: Como viver na era digital. PP.24
pessoais, em meados da década de 80. Nes-
se período, a infraestrutura de rede já estava
difundida para fora das universidades e já era
possível ter acesso à Internet domesticamen-
te.
Porém seu acesso dependia de um aparelho
externo chamado Modem e de uma linha tele-
fônica, o que tornava-se extremamente caro.
Normalmente se tinha apenas uma linha nas
casas e enquanto se acessava à internet, a li-
nha mantinha-se ocupada. Seu valor era co-
brado por minuto de ligação, o que tornava a
Internet um artigo de luxo. Normalmente as
navegações eram rápidas, pois cada minuto
contava. Durante esse período se inicia a na-
vegação via web, com elementos multimídias e
as trocas de mensagem eletrônicas se conso-
lidam, mas ainda com baixo nível de interativi-
dade em tempo real. Este período a chamamos
de Fase Modem.
Na terceira fase vemos um alargamento da
infraestrutura de navegação através de novas
tecnologias de transmissão de dados, como a
fibra ótica e rádio, o que aumentou conside-
ravelmente sua velocidade. Nesse período, o
acesso à rede não depende mais de uma linha
telefônica e o seu custo é fixo, através de uma
assinatura mensal. Com a liberdade de aces-
sar sem se preocupar com os minutos e com
uma qualidade e velocidade de conexão con-
13Terminal Teleguide, sistema de incorporação de linha telefônica ao computador pessoal, meados de 1980.
Foto: wikipedia.org
sideravelmente maior, o comportamento do
usuário acompanha essas mudanças, onde ele
passa de espectador passivo para o produtor
de seus próprios conteúdos. É no final da dé-
cada de 1990 que surgem os prosumers, um
novo comportamento social onde o consumi-
dor e o produtor de conteúdo é muitas vezes
a mesma pessoa. Foi durante essa fase que
houve a explosão dos diários pessoais, os blo-
gs e video blogs, o início da interatividade entre
pessoas em tempo real através de programas
de mensagens instântaneas e uma maior ex-
periência na navegação, com sites recheados
de elementos multimídias.
É nesse período também que é lançado o em-
brião para a grande mudança de paradigma
nas comunições que são as redes sociais (ou
mídias sociais). Esse momento chamamos de
Fase Banda Larga.
A quarta fase tem uma característica muito-
clara de transformação profunda de hábitos e
comportamentos. É o momento onde os aplica-
tivos, pequenos programas para infinitas fun-
ções, se tornam protagonistas transformando
para sempre a forma como consumimos con-
14
ICQ, um dos primeiros softwares de bate-papo da década de 1990, pos-sível apenas após a difusão da internet em banda-larga.
teúdo. Aplicativos, softwares e plataformas de-
terminam novos modelos de negócios criando
um grande mercado digital.
Agora se compra música oficialmente pela
Internet, decretando a morte do CD e, conse-
quentemente, de toda indústria musical. Nos-
sos aparelhos de telefone se transformam em
uma central de entretenimento e uma estação
de trabalho portátil, podendo ser acessado
qualquer tipo de conteúdo de qualquer lugar. É
o momento também da consolidação das Re-
des Sociais (ou Mídias Sociais) onde tudo que é
consumido é compartilhado, onde os grandes
movimentos de colaboração se fortalecem e a
interatividade e a personalização da experiên-
cia de navegação se radicaliza. Esse ponto é o
que chamamos da Fase da Internet dos Apli-
cativos.
Por último mas não por fim, pois a Internet é
um processo de evolução constante, vemos a
desmaterialização da rede. Antes ela estava
apenas nos computadores. Agora ela está em
todos os lugares: no carro, nos eletrodomésti-
cos, nos relógios, nas televisões, no transporte
público, na nuvem! Hoje ela está no ar.
Não concebemos mais o mundo sem a sua pre-
sença. Ao mesmo tempo que ela se desmate-
rializou ela é física, pois está presente em ob-
jetos do dia-a-dia. E é essencialmente social.
15
Ilustração com infinidades de aplicativos disponíveis para computado-res e smartphones. Meados de 2004.
Foto: unicos.cc
Não se imagina uma Internet sem interações e
colaborações. É extremamente personalizada
mas maleável, pois é possível viver em vários
‘mundos’ distintos com avatares ou personali-
dades diferentes e, principalmente, é uma rede
que gerou uma superdependência. Tudo está
conectado: do caixa do banco à banca de revis-
ta, dos meios de pagamentos às transmissões
de TV a Cabo.
E todas nossas informações estão nelas, flutu-
ando em alguma nuvem mas sempre disponí-
vel. Hoje se consegue acessá-las de qualquer
aparelho conectado à rede e em qualquer can-
to do planeta.
E é também o fim da privacidade individual.
Com a extrema necessidade de ser social, esta
nova Internet exige que seus usuários digam
onde estão, com quem e o que estão fazendo.
É a Internet da Fase Nuvem.
Em resumo, percebemos que a história da re-
volução digital ainda está sendo criada, cami-
nhando para uma direção desconhecida mas
definitivamente sem volta. Evoluímos tecnolo-
gicamente mais em 20 anos do que toda a his-
tória da humanidade.
De todas as revoluções tecnológicas, a cha-
mada Terceira Revolução Industrial apresenta
16
Hoje todos os aparelhos estão concetados à internet, com acesso à conteúdos infinitos.
Ilustração: shutterstock
uma característica única mas extremamente
transformadora: a horizontalização do conhe-
cimento e da informação.
Nunca tivemos tanto acesso a tantos conteú-
dos distintos. E, o que nos apresenta como um
benefício sem precedentes (e realmente é),
tem o seu lado obscuro, de criar uma geração
ansiosa e muitas vezes superficial. E esse é o
tema que vamos tratar no próximo capítulo. 17
Durante muito tempo, o acesso à informação sempre foi privilégio de al-
guns, seja para o estabelecimento de um sis-
tema segregador, para a manutenção do poder
ou mesmo para controle das massas. Informa-
ção sempre foi um item caro. Quem a possuía
tinha uma grande mobilidade social enquanto
a grande massa desprovida de informação era
condenada a viver sem muitas perspectivas. O
século XX foi um período onde a humanidade
não tinha o poder de escolher que tipo de in-
formação receberia.
Foi a era da passividade, onde sentávamos
na frente da televisão ou do rádio e recebía-
mos todas as informações passivamente, sem
o poder de interagir, comentar, discordar ou
mesmo contribuir para fortalecer determinado
conteúdo. Grandes grupos de mídias decidiam
o que íamos ver e consumir, sem trocas ou in-
terações.
A partir do final do século XX, muito fomentado
pela geração da contracultura que pregava o
livre acesso à informação, começou se estabe-
lecer uma nova ordem mundial onde a Era da
passividade iria se tornar a Era da colaboração
e do compartilhamento. Com o surgimento da
Internet, era necessáro preenchê-la com con-
teúdo. Ao mesmo tempo que as mesmas gran-
des corporações que dominavam a mídia via
broadcast viram que essa nova rede possuia
um pontencial de propagação de informação
infinitamente mais rápida e eficaz do que os
tradicionais meios de comunicação, o cidadão
comum também realizou que esse novo canal
estava aberto e pronto para receber qualquer
tipo de conteúdo, independente da verba ou
estratégia de grandes empresas.
Mas, ao contrário dos processos tradicionais
de difusão de conteúdo (televisão, rádios, re-
vistas, jornais, que dependem de grandes
18
3.0
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infraestruturas e um complexa rede de lo-
gística e distribuição), a Internet permitia um
alcance de audiência absurdamente maior a
partir de uma estrutura mínima para a criação
desse conteúdo.
Ou seja, o que era caro antes se tornou sen-
sivelmente mais barato, onde todos poderiam
concorrer de igual para igual por audiência em
um ambiente sem o controle da informação.
Durante muitos séculos, criar conteúdo sem-
pre foi caro e demorado. Antes da invenção da
Prensa de Gutenberg6 , em 1450, produzir um
livro demandava centenas de horas de produ-
ção por pessoas com habilidades muito espe-
cíficas, como os monges copistas, que ficam
anos trancados em monastérios literalmente
copiando livros inteiros para serem distribuí-
dos à elite intelectualizada. Mas, mesmo de-
pois da criação do processo de produção de li-
vros em massa por Gutemberg, tanto o volume
quanto o custo do papel ainda limitava o conte-
údo a ser reproduzido. O cinema e a fotografia,
por exemplo, dependiam de matérias-primas
caras, frágeis e raras. O registro em áudio se
limitava a quantidade de tempo disponível de
cada mídia física, seja o vinil ou o CD.
Hoje podemos ter centenas de livros dispo-
níveis em nossos computadores ou celulares
19
Sala de controle para trasnmissão de conteúdo via broadcast.
Ilustração: shutterstock
6 Johannes Gutenberg, inventor e gráfico alemão que introduziu a moderna forma de reprodução em massa de livros através do processo de im-pressão de tipos móveis (tipografia) no século XV
sem a necessidade de lugares adequados para
armazená-los e estima-se que a cada minuto
é carregado no You Tube mais de 1 hora de ví-
deo7. A quantidade de informação disponível e
aberta que temos acesso é única na história da
humanidade, apesar de lidarmos com isso tão
corriqueiramente.
Como metáfora de uma Era saturada de infor-
mação podemos pensar que a edição de do-
mingo do New York Times, um dos maiores e
principais jornais do mundo e que custa algo
em torno de U$ 5 (R$ 10,00) - ou disponível
praticamente de graça na internet -, se equi-
vale à todo o conhecimento que um homem re-
ceberia durante toda sua vida no século XVIII.
Em 2008 se estimava que existia aproximada-
mente mais de um trilhão de páginas na Inter-
net. Em 2012, esse valor já deve estar na casa
dos muitos trilhões de páginas, o que alguns
afirmam haver mais páginas na rede do que
estrelas em nossa galáxia. Desde a invenção
da Prensa por Gutemberg no século XV, mais
de centenas de bilhões de livros foram publi-
cados durante esses quinhentos anos, o que
representa menos de um mês de conteúdo que
está sendo disponibilizado na Internet atual-
mente8.
20
7 Dados de 2011, Segundo Tom Chatfield (Como viver na Era Digital, PP. 26)8 CHATFIELD, Tom: Como viver na era digital. PP.26
Monge copista, início século XI.
Com essa constatação que a disponibilidade de
informação hoje é infinitamente maior do que
podemos absorver, naturalmente uma enorme
angústia é gerada em uma sociedade cada vez
mais aniosa. É perfeitamente proporcional a
equação de quanto menos tempo temos dis-
ponível, mais informação é gerada na rede, o
que caracteriza uma nova geração de ‘genera-
listas’, com muito acesso à tudo mas com pou-
quissíma profundidade nos assuntos. É o que a
escritora norte-americana Linda Stone chama
de ‘atenção parcial contínua’ para caracterizar
a possibilidade de acompanhar informações
distintas, ao mesmo tempo, mas superficial-
mente.
Em um cenário como esse, onde a produção
de conteúdo é imensa, um profissional de co-
municação digital deve ter como elemento
fundamental em sua formação a ideia de filtro
ou curadoria. Saber filtrar e escolher correta-
mente os conteúdos, saber aplicá-los a cada
mídia específica e com sua linguagem própria
é uma tarefa básica no dia a dia desse profis-
sional.
Mas, o mais importante que é preciso saber
para lidar da melhor forma possível com esse
novo mundo em transformação é que o que
está acima de tudo – de informação, de pro-
cessos, de empresas, etc - são as experiências
humanas. É o que o pensador Tom Chatfild
deixa claro nessa passagem:
“Se quisermos prosperar juntos a elas (as mídias
digitais), a primeira lição que devemos aprender
é que só podemos ter esperança de compreendê-
-las de uma forma construtiva falando não da tec-
nologia de modo abstrato, mas das experiências
que ela proporciona.” (Chatfield 2012)
21
Afinal, essa nova geração faz parte do que o es-
tudioso de Redes Sociais, Gil Giardelli, da hu-
manidade 5.0, composta por pessoas em plena
sinergia com a democracia absoluta existente
nas redes sociais.
Para Giardelli a Humanidade 1.0 era a agrícola,
de subexistência enquanto a 2.0 tinha o caráter
industrial, passando pela 3.0, com uma gran-
de veia tecnológica e a 4.0, uma humanidade
‘cyber-espiritual’, com uma conexão profunda
com as tecnologias. A 5.0 é uma mistura des-
sas todas, levando em conta que a ‘rede’ não é
mais um artigo para poucos mas uma ambien-
te aberto a todos. Que a rede não é mais o fim
e sim o meio.
Então, podemos deduzir que hoje não basta
apenas ter acesso a todo o tipo de informação
mas sim o que fazemos com ela, com a inter-
pretamos, como a tornamos relevante e, prin-
cipalmente, como comunicamos corretamen-
te para os nossos alvos, que antes de serem
consumidores, são seres-humanos da geração
5.0, com liberdade de questionamento, intera-
ção e participação nos processos de comuni-
cação das empresas ou marcas. Saber como
falar com essas pessoas é o mesmo que en-
tender a linguagem da rede: fundamental para
qualquer projeto de comunicação seja bem su-
cedido.
E, além desse discernimento básico do pro-
cesso evolutivo da Internet e da capacidade de
critério na curadoria de informação, é preci-
so entender também quais as ferramentas e
metodologias usadas para que essas informa-
ções ajudem na construção da imagem de uma
marca ou até mesmo na venda de um produto
ou serviço.
22
CASTELLS, Manuel. A Galáxia da Internet. Reflexões sobre a Internet, os negócios e a Sociedade.
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