Alto Sertão - SE

309
Desenvolvimento Territorial no Alto Sertão Sergipano: diagnóstico, assentamentos de reforma agrária e propostas de política. INCRA - SE CENTRO DE CAPACITAÇÃO CANUDOS VERSAO SUJEITA A MODIFICAÇÕES Aracaju, janeiro de 2006

Transcript of Alto Sertão - SE

Page 1: Alto Sertão - SE

Desenvolvimento Territorial no Alto Sertão Sergipano: diagnóstico, assentamentos de reforma

agrária e propostas de política.

INCRA - SECENTRO DE CAPACITAÇÃO CANUDOS

VERSAO SUJEITA A MODIFICAÇÕES

Aracaju, janeiro de 2006

Page 2: Alto Sertão - SE

Desenvolvimento Territorial no Alto Sertão Sergipano: diagnóstico, assentamentos de reforma agrária e propostas de

política.

“... cena de natureza, em que não raro o belo

sobreleva o útil”.Teodoro Sampaio sobre o

trecho Pão-de-Açúcar a Piranhas1

Equipe Técnica:Fernando Gaiger Silveira – Coordenador (IPEA e Doutorando IE-UNICAMP)José Juliano de Carvalho Filho (FEA-USP)Bernardo P. Campolina Diniz (Doutorando IFCH-USP e Cebrap)Betina Ferraz (Doutorando IE-UNICAMP)Eduardo José Monteiro da Costa (Doutorando IE-UNICAMP)Osvaldo Aly JuniorPaula Yaguiu (UFS)Silvana Lúcia da Silva Lima (Doutoranda NPGEO-UFS)

Equipe da Pesquisa de Campo – Entrevistadores:Ailton Demésio PereiraAriana Maria CostaArnaldo Santos NetoCarlos Barreto JúniorFerline de Oliveira RodriguesIrandi Silva de JesusWillames Almeida Santos

Assistentes de Pesquisa:Fabio Andrey Pimentel São Mateus (UFS)Jorge Enrique Montalván Rabanal (UFS)Lucas Novais Bonini

Colaboradores:Acácia Maria Feitosa Daniel – MST-SEGismário Ferreira Nobre – Articulador Territorial e UFBATheresa Cristina Zavaris Tanezini – UFSHebert Rodrigues Pereira – INCRA-SE

Apoio:INCRA-SEEMBRAPA Tabuleiros Costeiros e EMBRAPA Semi-Árido

1 O Rio São Francisco e a Chapada Diamantina. São Paulo: Companhia das Letras, 2002, livro-diário das viagens do Eng. Teodoro Sampaio pelo Rio São Francisco, entre 1879 e 1880, desde a foz até a cidade de Pirapora-MG.

Page 3: Alto Sertão - SE

Aracaju, janeiro de 2006

Decidimos utilizar por epigrafe essa citação do livro, onde o autor comenta a paisagem do Alto Sertão Sergipano, vista do Rio São Francisco. Citamos essas duas cidades alagoanas como pontos de referência, assim como faz o autor. Fica claro, portanto, que a região ultrapassa os limites sergipanos, ou seja, que as fronteiras atuais do território restringem-se à uma parte do que se pode denominar Semi-Árido do Baixo São Francisco. Espaço geográfico que se caracteriza, grosso modo, pelo rio não ser navegável, pelo clima ser extremamente seco, pela ocupação de suas terras pela pecuária, pela presença do cangaço, pela extrema pobreza dos pequenos agricultores e, mais recentemente, pelas disputas pelas riquezas advindas da instalação de usinas hidroelétricas. Região que ilustra nosso subdesenvolvimento, pois ao lado de grandes reservatórios de água encontram-se localidades com os mais baixos graus de desenvolvimento humano do país e cujas populações não tem acesso à água e energia.

Se os povoados ribeirinhos perderam sua importância com a interiorização da vida econômica, tal alteração ao contrário de ter implicado em diminuição de importância da água, alterou sim sua forma de disputa. E, no caso de Sergipe, a disputa pela água esta intimamente associada a luta pela terra. O que se deseja sublinhar é que o Território do Alto Sertão Sergipano é cenário de um grande embate pelo uso da água, ou melhor, por modelos de desenvolvimento territorial. Esse embate se reflete na variada gama de demandas sociais e políticas, com a expressiva participação do MST, de associações, ONGs, do movimento sindical e com a presença de toda gama programas governamentais voltados às regiões rurais, pobres, do semi-árido e com elevada concentração de assentamentos. Mas, no que concerne, aos investimentos em infra-estrutura hídrica produtiva, verifica-se uma clara clivagem: os de maior porte apontam sempre para a internalização de empresários, enquanto para as populações locais empobrecidas, resta a distribuição para consumo humano e/ou cisternas e a construção de pequenas barragens, pequenos açudes, etc.

Concluindo, atualmente é no lado sergipano do Semi-Árido do Baixo São Francisco em que se observa uma clara disputa por terra e água, com importantes limitantes ao crescimento e desenvolvimento da região: a baixa sustentabilidade econômica da atual base tecno-produtiva (leite, cultura anuais e pecuária de corte); a restrição da água de qualidade ao rio e seus reservatórios; e a fragilidade do setor publico (educação, saúde, pesquisa e assistência técnica agrícolas, desenvolvimento local, financiamento a produção e a comercialização).

E o que cabe a essa região - periferia da periferia -, é de receber o aporte de políticas sociais focalizadas para suas populações pobres e de ser beneficiária de financiamento multilateral para a constituição de um empreendimento em agricultura irrigada para uns poucos empresários, grande parte, de fora da área.

Há, todavia, esperança, uma vez que as duas marcas da pobreza do Semi-Árido tem na região as soluções ao alcance das mãos: para a falta e insuficiência de terras, há a reforma agrária sendo feita, e, para a falta de água, o lago de Xingó. A recuperação dos assentamentos do sertão sergipano passa necessariamente pelos recursos hídricos, sendo, portanto, capital que o governo federal, tendo em vista a envergadura da reforma agrária e da pequena propriedade na região e as potencialidades do reservatório de Xingo, busque constituir uma área reformada com disponibilidade de terra, água, trabalho, caatinga, cidadania, educação, saúde, cultura.

Assim, chegaremos ao belo e não ao útil ...

Page 4: Alto Sertão - SE

ÍNDICE

Introdução.................................................................................................... 7I.Alto Sertão dos 70’s a hoje: continuidades e rupturas...............................9II.O Território do Alto Sertão Sergipano...................................................16

II.1. Localização e Caracterização do Sertão Sergipano................................ 16II.2. Povoamento e móveis de ocupação........................................................ 20

III.População: estrutura social, dinâmica econômica e finanças municipais no Território do Alto Sertão Sergipano......................................... 29

III.1. Estrutura demográfico-social................................................................. 29III.1.1. Dinâmica populacional.............................................................................. 29III.1.2 A hierarquia interna do território................................................................ 38III.1.3. Trabalho e composição da renda nos municípios...................................... 43III.1.4. Renda e pobreza.........................................................................................56III.1.5. Educação....................................................................................................62III.1.6. Condições de Saúde e Habitação............................................................... 69

III.2. A dinâmica econômica do Território do Alto Sertão Sergipano............ 71III.2.1. Estrutura Fundiária e Pequena Agricultura................................................72III.2.2. A produção agropecuária........................................................................... 85III.2.3. Os arranjos produtivos............................................................................. 105

III.3. Perfil da Gestão e Fôlego das Finanças................................................125III.3.1. Marcos da estrutura federativa: tendências e evidencias no território....126III.3.2. Fôlego das finanças municipais no território...........................................132III.3.3. Perfil da gestão municipal no TASS .......................................................140

IV.Políticas Públicas no Território do Alto Sertão Sergipano.................155IV.1. Ministério do Desenvolvimento Agrário............................................. 158

IV.1.1. Incra – Reforma Agrária..........................................................................159IV.1.2. Secretaria de Desenvolvimento Territorial: o Pronaf Infra-estrutura......161IV.1.3. Secretaria de Agricultura Familiar: o Pronaf Crédito..............................163

IV.2. Ministério da Integração...................................................................... 169IV.3. Ministério do Meio-Ambiente..............................................................172IV.4. Previdência Social................................................................................172IV.5. Ministério do Desenvolvimento Social – Programas de Transferência de

Renda.............................................................................................. 172IV.6. Governo do Estado...............................................................................174

IV.6.1. Projeto Santa Maria................................................................................. 174IV.6.2. Secretaria da Agricultura......................................................................... 174

IV.7. Educação e Saúde (SUS) – Municípios............................................... 174V.Os Assentamentos de Reforma Agrária na realidade do Território do

Alto Sertão Sergipano.................................................................. 177V.1. Assentado: novo personagem no cenário rural sergipano..................... 178

V.1.1. Assentamentos rurais no cenário nacional................................................179

Page 5: Alto Sertão - SE

V.1.2. Assentamentos rurais: novo móvel de ocupação do Alto Sertão Sergipano................................................................................................................. 181

V.1.3. O impacto dos assentamentos: síntese de seus impactos sócio-produtivos................................................................................................................. 188

V.2. A dinâmica socioeconômica do Alto Sertão: síntese da pesquisa qualitativa....................................................................................... 198

V.2.1. Perfil dos Entrevistados: identificação, origem e trajetória...................... 199V.2.2. Formação, Características e Dinâmica Socioeconômica do Território.....202V.2.3. Aspectos Fundiários e Agrícolas.............................................................. 210V.2.4. Políticas Públicas e seus Impactos............................................................212V.2.5. O Desenvolvimento.................................................................................. 214

V.3. Sistemas Agrários em Sergipe e no Alto Sertão: implicações ao desenvolvimento dos assentamentos.............................................. 214

V.3.1. Introdução................................................................................................. 214V.3.2. Sistemas de produção da agricultura familiar base para a elevação da

produtividade nos assentamentos.............................................................216V.3.3. Sistemas agrários e os assentamentos de reforma agrária no Alto Sertão

Sergipano................................................................................................. 220V.4. Sugestões e Propostas para os Assentamentos do Alto Sertão..............226

V.4.1. Impacto das ações governamentais nos assentamentos e no território..... 227V.4.2. Proposições para a produção agropecuária nos assentamentos;............... 229a. A Importância de uma Agricultura Diversificada............................................232b. A questão hídrica: água para todos.................................................................. 234c. Pecuária de Leite..............................................................................................237d. Sistemas Agro-silvo-pastoris .......................................................................... 237e. Bolsa Caatinga e Reordenamento e Regularização Fundiárias........................238h. Parcerias com a Embrapa: tecnologia e inovação............................................239i. Políticas públicas complementares ao desenvolvimento rural......................... 239j. Formação e capacitação....................................................................................241j. Indicações de Diretrizes para a atuação da Ates;..............................................242

VI.À guisa de conclusão: agenda propositiva..........................................247VII.Bibliografia........................................................................................253VIII.Anexos............................................................................................. 257

VIII. 1. Relatório Parcial de Osvaldo Aly Junior - Oficina de Capacitação dos Técnicos do CECAC para a realização da Pesquisa Qualitativa sobre Desenvolvimento Territorial do Alto Sertão Sergipano................. 257

VIII. 2. Roteiro de Entrevistas.......................................................................270VIII. 3. Entrevistas transcritas.......................................................................272VIII. 4. Caderno de Campo de Bernardo Campolina – viagem de 11 a 17/05

de 2005........................................................................................... 272VIII. 5. Relatório Visitas Técnicas a assentamentos rurais...........................282

Page 6: Alto Sertão - SE

Desenvolvimento Territorial no Alto Sertão Sergipano: diagnóstico, assentamentos de reforma agrária e propostas de

política2.

Introdução

O relatório final do Plano de Desenvolvimento Territorial está dividido em três partes. A primeira é um diagnóstico da região, centrado na análise de suas dinâmicas sociopolítica, demográfica e econômica, o que permitirá apontar os limites e as potencialidades da região bem como a dos assentamentos existentes. A segunda trata da problemática dos projetos de assentamentos, onde se procurou apontar propostas e as recomendações que permitam recuperar e desenvolver tais projetos, chamando a atenção, de modo particular, para os aspectos tecno-produtivos e as ações ligadas à pesquisa e à assistência técnica.

Por fim, a última parte do trabalho, a partir da identificação das questões centrais ao desenvolvimento da região e dos assentamentos, apresenta indicativos para a elaboração de políticas públicas e de ações governamentais. As sugestões aqui apresentadas, ainda que tenham por âmbito do território do Alto Sertão Sergipano3, se dirigem aos assentados, aos sem-terras, aos posseiros, aos produtores agrícolas de baixa renda, excluídas e marginalizadas do circuito socioeconômico e político.

O que norteou a realização deste trabalho foi o entendimento de que na região existem alguns elementos a partir dos quais é possível a “implantação” de um projeto de desenvolvimento. Vale destacar que a região é objeto da ação governamental de diferentes órgãos (municipais, estaduais e federais) contando com recursos humanos e financeiros de relativa envergadura; disponibilidade de água no reservatório de Xingó; variado leque de tecnologias e de experiências produtivas; e a existência de movimentos sociais e outras formas de organização social.4

O trabalho busca investigar de que forma esta realidade sócio-econômica pode ou não levar a um processos de desenvolvimento que incorpore as populações acima citadas. Nesta direção, cabe mencionar o potencial que as diversas políticas levadas a cabo pelo Ministério do Desenvolvimento Agrário, através de seus órgãos (INCRA, SDT, SRA, SAF), poderiam ter no desenvolvimento da região. Nesse sentido, pode-se citar como exemplo, a importância da convergência das ações da reforma agrária, da regularização fundiária e do reordenamento fundiário.

Se por um lado a região tem vários elementos que dão a ela a possibilidade de desenvolvimento, como já mencionado, existem vários problemas a serem superados. A 2 Este trabalho é resultado do convênio CV/SE n˚ 14.000/2004 celebrado entre o INCRA – Superintendência de Sergipe – e o Centro de Capacitação Canudos - CECAC.3 “Adota-se como território um determinado espaço geográfico onde se expressa a totalidade concreta do processo de produção, distribuição, circulação/consumo, e suas articulações e mediações políticas, ideológicas, simbólicas, etc. Portanto, um produto concreto da luta de classes travada pela sociedade no processo de produção e reprodução de sua existência. É a contínua luta das classes sociais pela socialização, construção, manutenção e transformação do espaço/natureza”. (Umbelino apud in Mançano, 1999)4 Estão presentes na região o Movimento dos Sem Terra (MST), movimento sindical, diversas as associações de produtores agrícolas, de artesãs e bordadeiras e comunitárias reunidas na FEACOM, as ONGs e o Movimento dos Pequenos Agricultores – MPA.

Page 7: Alto Sertão - SE

existência de uma sobreposição e em muitos casos um conflito nas ações desenvolvidas por órgãos governamentais, de diferentes esferas, movimento social, ONGs e iniciativa privada. Esta sobreposição de ações e conflito é resultado do modelo neoliberal adotado no país nos últimos anos. A privatização, a terceirização e descentralização conjugadas a ausência de um planejamento de curto e longo prazo tiveram um impacto mais negativo sobre a região do Alto Sertão, pois a presença do Estado já era precária.

Um tema essencial para o desenvolvimento da região, localizada no semi-árido, é a água. Constatou-se a existência de conflitos no que tange a população a ser beneficiada, bem como a sua utilização. Há uma disputa entre um modelo de perímetros irrigados, cujo foco é a agricultura capitalista em larga escala e altamente tecnificada (por exemplo, a fruticultura), em detrimento de um modelo onde os principais beneficiários seriam os assentados, os posseiros e os pequenos agricultores, cujo foco seria à universalização do acesso à água, e a integração da agricultura de irrigada com a produção agropecuária no sequeiro.

A disputa pelo acesso e uso da água está no fato de que a única fonte disponível de água superficial de boa qualidade, para atender a população e a demanda da agropecuária, é o Rio São Francisco.

A diferença fundamental com relação ao uso da água no desenvolvimento da região está na posição dos atores envolvidos neste debate. Enquanto o INCRA e os Movimentos Sociais, e outros atores propõem um modelo que visa atender o mais universalmente possível as populações locais e as suas atividades produtivas, o Governo do Estado de Sergipe defende o modelo de perímetros irrigados, voltado para uma agricultura capitalista em larga escala.

As propostas apresentadas neste estudo conjugam ações já existentes com novas sugestões, procurando redirecionar e fortalecer as os instrumentos públicos e privados já existentes. Esta agenda propositiva está fundamentada no diagnóstico feito pelo trabalho. Assim, procura levar em consideração as potencialidades e os limites, bem como o embate entre as forças políticas e os diversos atores. Ressalte-se que as proposições têm como foco principal a inclusão das populações marginalizadas do meio rural.

Quadro síntese das questões centrais ao desenvolvimento do território

1. Água e Luta pela Terra: temas centrais no desenvolvimento do Alto Sertão - aumento do preço da terra - a disputa pela água-irrigação; - a insuficiência e precariedade no acesso à terra.

2. Território e Colegiado: a nova institucionalidade do Alto Sertão 3. Desafios: pressão demográfica, limites edafo-climáticos e modelos produtivos agropecuários

- esgotamento das fontes de renda alternativa: caça, pesca, várzeas; - ascendência das transferências na composição da renda; - a cultura tecno-produtiva, seus limites e potencialidades.

4. Políticas públicas - conflito - superposição - interação

Page 8: Alto Sertão - SE

I. Alto Sertão dos 70’s a hoje: continuidades e rupturas

Nos últimos trinta anos o Alto Sertão Sergipano teve sua população total duplicada e a domiciliada no meio rural cresceu 1,4 vez, tendo simultaneamente crescido o número de estabelecimentos sem a contrapartida no aumento da área por eles apropriada. Efetivamente, os estabelecimentos cresceram, entre 1970 e 1996, a uma taxa anual de 1,5%, similar ao desempenho da população rural no período 1970-2000. Em relação ao uso dos solos, assistiu-se a um crescimento das lavouras e das pastagens de, respectivamente, 3,3% e 0,5% ao ano. Em números absolutos a população, entre 1970 e hoje, passou de 60 mil para 120 mil, com a população rural respondendo por 1/3 desse crescimento. Verdade que a população rural de 2000 é semelhante a 1980, apontando, portanto, para a existência de inflexões no desempenho demográfico da região.

Nos anos 70, o crescimento populacional esteve associado à ocupação das fronteiras internas, enquanto na década anterior esse se baseou na ocupação das fronteiras externas. Já nos anos 80 assistiu-se a uma diminuição no crescimento populacional, decorrente, em grande medida, do refluxo da população rural. Concretamente, desde 1970, a área total dos estabelecimentos é da ordem de 400 mil hectares, após ter ocorrido a incorporação de 160 mil hectares nos anos 60. Já o número de estabelecimentos continuou crescendo nos anos 70 e na primeira metade dos anos 80, sendo que a diferença se situa no comportamento da população rural, que de um crescimento anual de 3,1%, nos anos 70, passou a diminuir anualmente a uma taxa de 0,6% na década seguinte.

A tabela 1 aponta claramente esses movimentos, mostrando que o Alto Sertão Sergipano passou de região de expansão agrícola, nos anos 60, para, nas duas décadas seguintes, primeiramente, incorporar essas terras à produção, e, em um segundo momento, sofrer processos de subdivisão das médias e pequenas propriedades e de êxodo das populações rurais. Nos anos 90, assisti-se a uma mudança radical nesse movimento, com o crescimento da população rural, processo que decorreu da instalação de projetos de assentamentos realizados em resposta às pressões e lutas do MST. Os dados fundiários ainda não se encontram disponíveis para a realização de um cálculo preciso, mas é evidente que tem havido um processo de desconcentração fundiária.

Tabela 1Taxas anuais de crescimento da população total e rural, do número de estabelecimentos

e da área ocupada, para períodos selecionados – Alto Sertão Sergipano.

Períodos PopulaçãoTotal Rural

Numero de Estabelecimentos

Área dos Estabelecimentos

Processo sociodemográfico

1970/60 4,93% 6,47% 5,23% fronteiras externas1980/70 3,82% 3,09% 2,47% 0,77% fronteiras internas

1991/80 e 1985/80 1,25% -0,61% 3,07% 0,11%minifundização e êxodo

2000/91 e 1995-96/85 2,14% 1,37% -0,40% -1,15%

desconcentração fundiária e pressão

demográfica

2000/60 e 1995- 3,08% 2,85% 1,33%2000/80 e 1995- 1,65% 0,28% 0,67% -0,76%Fonte: Censos Demográficos e Agropecuários do IBGE.

Page 9: Alto Sertão - SE

Os dados da tabela 2 mostram claramente o quão expressivo foi o assentamento de trabalhadores rurais na década de 90, com os 24 projetos criados representando 8,0% da área dos imóveis e as famílias assentadas respondendo por 13,0% dos domicílios rurais existentes em 2.000. Se agregarmos a esses projetos, os instalados nos anos 80, temos que 1/6 dos domicílios rurais eram, em 2000, de assentados da reforma agrária, que ocupavam 10% da área cadastrada pelo INCRA. Essa é a primeira grande ruptura entre os dias de hoje e os anos 70 no Alto Sertão Sergipano, ou seja, a presença de um expressivo contingente de assentados, resultado da organização social dos agricultores, de modo particular do MST. Ora, hoje se encontram acampados no Alto Sertão Sergipano cerca de 7 mil famílias, o que representa quase metade dos domicílios existentes no meio rural.

Tabela 2Projetos de Assentamento Instalados, Área e Capacidade de Famílias, para períodos

selecionados – Alto Sertão Sergipano.

Períodos Nº Projetos Capacidade % pop. rural(1)

Área assentamentos

% área total(2)

1985-1991 5 396 3,3 9.512 2,51992-2000 24 1.904 13,0 30.548 8,02001-2003 22 655 4,5 18.059 4,7

Fonte: SIPRA-INCRANotas: (1): Para o período 1985-1991 considerou-se os domicílios rurais de 1991, e para os outros

dois, o total de domicílios rurais de 2000.(2): No que se refere a área, utilizou-se para ambos os períodos o dado do cadastro do

INCRA, para outubro de 2003, de 382.991 ha.

Interessante notar que nas duas últimas inflexões – anos 80 e 90 – foram realizadas ações visando à instalação de perímetros irrigados. Pode-se afirmar que foram de fato reações ao crescimento da organização social e às iniciativas na realização da reforma agrária. Essa é a outra ruptura presente no território entre os dias de hoje e os anos 70: a disputa pela água. O Projeto Califórnia criado em meados dos anos 80 foi de fato uma antecipação desse embate cada vez mais acirrado! É emblemático que essa iniciativa tenha ocorrido contemporaneamente ao desenvolvimento das organizações sociais ligadas à luta pela terra, resultante tanto do trabalho pastoral da igreja no Baixo São Francisco como pelo processo de redemocratização. Vale, ademais, verificar que a ação da Igreja teve como um dos focos as conseqüências sobre os agricultores ribeirinhos da instalação das novas usinas hidrelétricas no complexo de Paulo Afonso. Hoje no Sertão Sergipano andam lado a lado a luta pela terra e pela água, com a disponibilidade de água ganhando significado pela presença dos grandes reservatórios das usinas.

Nos anos 90, mais uma vez se projetou na área um empreendimento empresarial em agricultura irrigada, que ocupado pelo MST é hoje o assentamento Jacaré-Curituba; responsável por cerca de ¼ dos assentados do território. Em seu esteio, foram conquistados novos projetos de assentamentos, que nos últimos 10 anos representaram quase três mil famílias, 85% de todas as famílias assentadas.

Hoje com os assentamentos representando 15% da área ocupada, mais uma vez o governo do estado toma a iniciativa de implementar um perímetro irrigado, denominando-o de maneira bastante contemporânea como “Plano de Desenvolvimento Sustentável do Semi-Árido

Page 10: Alto Sertão - SE

Sergipano” (PDS) ou popularmente “Projeto Nova Califórnia”. A principal diferença frente às iniciativas anteriores é a incorporação ao escopo do projeto de seis assentamentos da Reforma Agrária, entre os quais se encontra o Jacaré-Curituba, que, como dissemos, resulta da luta dos agricultores sem-terra contra a iniciativa anterior. Esse novo projeto abrange passivos das iniciativas anteriores: o projeto de assentamento Jacaré-Curituba, onde a irrigação após 7 anos de sua instalação ainda não se efetivou e a modernização do projeto Califórnia – a primeira iniciativa que, anterior à Usina de Xingó, já alcança vinte anos de existência. [

A não concretização do Projeto Jacaré-Curituba não se coaduna com a instituição de um novo investimento em irrigação, qualquer que seja o escopo do projeto e a paternidade dele. Interessante notar que os governos do estado e federal já acertaram e/ou desenvolveram, com o apoio das agências multilaterais, vários estudos, projetos, acertos, acordos para a concretização da irrigação no Jacaré-Curituba. Contudo, até o momento, a irrigação não foi efetivada. Vale se perguntar, porque se inicia um novo projeto-investimento, sem se ter finalizado o anterior. O pior é que esse descaso da ação publica, conta com o apoio e o financiamentos de agências multilaterais.

Fica claro o risco dessa iniciativa de grande porte, e que, na verdade, já vêm trazendo prejuízos ao processo de reforma agrária. Com a valorização e a especulação das terras há um aumento das alterações de beneficiários dos lotes dos assentamentos. Isso é corroborado, em parte, pelos dados da pesquisa “A Qualidade dos Assentamentos da Reforma Agrária Brasileira”5, , onde se observa que entre assentamentos instalados em mesma fase, a troca de lotes é mais pronunciada naqueles voltados6 a irrigação. Vem ao encontro disso o que se depreendeu da observação direta deste estudo – viagens, entrevistas, discussões em equipe –, quando foi reportada e/ou verificada a ocorrência de elevações nos preços da terra na região, o que, ademais, foi oficiosamente corroborada pela Superintendência do Incra.

Na verdade temos hoje 700 famílias imobilizadas pela expectativa da irrigação água no Jacaré-Curituba; 350 agricultores do Projeto Califórnia tendo, em sua grande maioria, por principal atividade o cultivo de quiabo, com elevado grau de obsolescência técnica - desperdício de água e riscos de salinização –, o aparecimento de pragas – mosca da fruta e nematóides - e a desorganização na comercialização; e 2,5 mil famílias acampadas e outras 2,0 mil assentadas na expectativa dos benefícios da irrigação, desconsiderando aquelas contempladas (sic) pelo PDS – Jacaré-Curituba, Mandacaru, Modelo, Florestan Fernandes, Cuiabá e João Pedro Teixeira.

A falta de água sempre marcou essa região, mas hoje tanto as reservas de água como sua distribuição são bem maiores e mais extensas, e houve uma mudança no “lócus” da disputa pela propriedade da terra e pelo acesso a água: das margens do Rio para o sertão propriamente dito. Na ocupação dessas terras, o Rio foi de fundamental importância, fazendo com que a população ribeirinha predominasse frente à domiciliada no sertão. O Rio era, com seu regime de vazantes, o centro da vida econômica dessa região, sendo que o sertão tinha sua dinâmica econômica e seu povoamento regido pelas secas, pela penetração e performance da pecuária e 5 SPAROVEK, Gerd. A qualidade dos assentamentos da reforma agrária. São Paulo: Páginas & Letras Editora e Gráfica, 2003. 6 O Jacaré-Curituba – salvo os dois subprojetos de sequeiro – e o Cuiabá foram o resultado da ocupação pelo Mst de áreas destinadas a instalação de projetos de irrigação. De outro lado, os assentamentos João Pedro Teixeira, Florestan Fernandes, Mandacaru e Modelo pela proximidade com os dois anteriores e com o Projeto Califórnia encontram-se no raio de alcance dos canais de irrigação, estando inseridos no Projeto Nova Califórnia. Iniciativa do Governo do Estado que abrange, em uma segunda etapa, assentamentos localizados em Poço Redondo, como o Pioneira, a Queimada Grande e a Barra da Onça.

Page 11: Alto Sertão - SE

pelo desenvolvimento, nas décadas de 70 e 80, dos cultivos comerciais do algodão e do feijão e, mais recentemente, pela a interiorização da pecuária leiteira7. Hoje a disputa pela água se espraia por toda a área, sendo que, como já dissemos, assisti-se atualmente a um aumento significativa da população rural, portanto, a um aumento da pressão demográfica. Processo esse bastante promissor, pois resulta da desconcentração fundiária revertendo o perverso movimento de minifundização e êxodo rural que se assistia anteriormente. Assim, consideramos ser imprescindível a qualquer projeto de investimento, particularmente os de irrigação, o tratamento dos minifundistas, dos assentados e dos sem-terras como populações alvos.

Deve-se, ademais, ser objeto das ações públicas o resgate dos passivos decorrentes da Usina Hidroelétrica de Xingó, bem como a universalização dos dois serviços que sua instalação gera: água e energia. O fim do regime de vazantes e a formação do lago de Xingó mudaram a importância e o foco da luta pela terra, com a valorização das terras do Sertão e o “abandono” das terras ribeirinhas. As pequenas várzeas do São Francisco, presentes, sobretudo, nos municípios de Gararu e de Porto da Folha, eram, anteriormente à instalação da Usina, importantes espaços produtivos – arroz e outras culturas temporárias –, encontrando-se hoje totalmente abandonadas. Perdeu, assim, a agricultura regional essa importante fonte de renda, particularmente os agricultores que as cultivavam, na grande maioria, em regime de meação, parceria e arrendamento. Assim, cabe se perguntar porque não foram adiantes os investimentos para a retomada produtiva dessas várzeas? E, no que concerne a água e a energia elétrica, é incabível que nas localidades contíguas a Usina e seu reservatório, seja comum a presença de domicílios sem água e energia. Chesf, Codevasf, Governos Estaduais e Municipalidades devem, urgentemente, retirar essa região da situação de se encontrar entre as regiões brasileiras de menor nível de desenvolvimento humano. Isso porque a pobreza local se deve, em grande medida, a ausência de oferta de água de qualidade e de energia elétrica, assim como da precariedade dos equipamentos e recursos humanos nas áreas da educação e saúde. Exemplo disso é a situação das escolas rurais do sertão sergipano, em que, como veremos adiante, 50% delas tem apenas uma sala de aula e não contam com energia elétrica e água encanada.

Resumidamente, com a retomada das ações de reforma agrária, em meados dos anos 90, concomitante com o fim das obras da Usina e com a maior presença do MST nas terras do Sertão, a luta pela terra ganhou destaque, fazendo-se acompanhar da luta pela água, água essa que revaloriza as terras sertanejas e, conseqüentemente, a própria luta pela Reforma Agrária. Assim, hoje na questão fundiária, a disponibilidade de água é variável central para o

7 José Carlos Barreto de Santana na introdução ao livro – diário da viagem pelo São Francisco - de Teodoro Sampaio, na mais recente edição por ele organizada, comenta a importância do Rio e as mudanças recentes. “Ao longo do livro vão se alternando observações sobre as cidades, vilas, povoados e sua gente, ... Em certos trechos, chamava a atenção do engenheiro o aumento da população nas cidades ribeirinhas por conta da migração, num momento em que a região enfrentava uma crise prolongada, devido à seca que se estendeu de 1877 e 1879. Então o rio torna-se um oásis no deserto, com suas margens povoadas e com muitas lavouras, mas o efeito da seca era devastador, como se constata na descrição da passagem pela cidade de Piranhas (AL), onde as habitações eram poucas para tanta gente ... A natureza pródiga não deixa haver a verdadeira pobreza, o rio é um enorme viveiro no qual nunca escasseia o peixe e as caatingas e matas marginais são um imenso e inesgotável tesouro.

(...)“Mais de cem anos após a realização da viagem, as inevitáveis mudanças ocorridas fizeram desaparecer trechos percorridos e cidades, sob as águas de barragens como as de Sobradinho, Itaparica e Xingó. O quase total desaparecimento da mata ciliar do rio São Francisco, ..., provocou o assoreamento de partes do rio ... Rodovias diminuíram a importância do São Francisco como sistema de viação interior e redefiniram as funções das cidades e vilas visitadas” (p. 32/33 e 37/38).

Page 12: Alto Sertão - SE

entendimento das atuais disputas no território, que ocorrem, evidentemente, em outras esferas, como nos investimentos e políticas para as agroindústrias, nas ações de apoio aos aglomerados produtivos, na criação e consolidação da infra-estrutura econômica e social e nas políticas de crédito e de combate à pobreza.

Árbitro e jogador nessas disputas pela terra, por água e pelos recursos, o setor público sofreu, nesses últimos trinta anos, importantes mudanças, especificamente na forma de gestão de suas políticas. Concretamente, o Estado vem permanentemente se afastando do planejamento, da gestão e, em alguns casos, até da oferta de bens e serviços públicos. O que se observa é que ganharam destaque os recursos nos projetos de transferência de renda, na folha salarial dos municípios e na previdência social rural. No caso dos municípios, o crescimento das suas despesas com pessoal se fez acompanhar da transferência para sua alçada da oferta dos serviços de saúde e da educação fundamental. Isso ocorreu, a nosso ver, sem que as municipalidades tenham capacidade gerencial para ofertarem esses serviços com qualidade e quantidade adequadas.

A assistência técnica, o crédito rural e os projetos governamentais – com apoio internacional – mobilizavam, até meados dos anos 80, recursos financeiros e, particularmente, humanos bem superiores aos atuais. Houve uma queda na qualidade dos serviços de assistência técnica e no escopo dos projetos de desenvolvimento, ou seja, diminuíram de envergadura. Passou-se a descentralizar e a terceirizar os serviços de assistência técnica, elaboração de projetos, capacitação e educação de agricultores, com o objetivo de diminuir gastos, ainda que se divulgue que tais medidas busquem, de um lado, aumentar a eficiência dessas ações e, por outro, permitam uma maior participação das organizações sociais em sua gestão. Afirma-se que o aumento da eficiência se deve a maior proximidade entre os gestores e prestadores dos serviços com a população alvo, cabendo ter presente, como já se apontou, que o planejamento e a concertação com outras políticas, assim como a qualidade dos serviços está correlacionada com outros fatores que não a da proximidade com os beneficiários. Aí entre a capacidade gerencial, as interfaces com outros serviços públicos, as especificidades da intervenção nas várias realidades regionais e sua inserção no conjunto das políticas públicas.

Assistiram-se, de fato, avanços na política de crédito, pois esta passou a contemplar os assentados da Reforma Agrária e os pequenos agricultores, contando, para tanto, com recursos de relativa envergadura, taxas de juros privilegiadas e adequação das normas de concessão dos empréstimos a esse tipo de público. Todavia, as principais decisões e os contornos da política de crédito para a agricultura familiar – normas, volumes, encargos, remuneração agentes financeiros, - são definidos pela esfera econômica governamental, cabendo, ademais, aos agentes financeiros públicos conceder os empréstimos. Assim, o respeito às boas práticas bancárias definem, na ponta, quem serão os beneficiários dos financiamentos, sendo que o desenho do Pronaf é regido pelas necessidades fiscais da atual política econômica. E, o volume dos recursos do Pronaf é bem inferior ao destinado para os maiores produtores, e o total do crédito rural hoje é substancialmente menor ao que se concedeu no passado. As políticas agrícola e regional não tinham, nas décadas de 70 e 80, as restrições fiscais atuais e contavam com planejamento, gestão e “concertação”, sendo, por outro lado, voltadas à modernização da grande e média propriedade. Essa é a outra diferença entre o ontem e o hoje: a fragilidade na ação pública, especificamente, na gestão, planejamento e, até mesmo, no montante aplicado.

Verdade que essa fragilidade da política publica passa a ser pela mudança na intervenção, em seus instrumentos e na gestão. Existem várias iniciativas e institucionalidades voltadas ao

Page 13: Alto Sertão - SE

desenvolvimento regional e que afirmam ter por eixo a participação da comunidade em suas gestões. Aquelas que se mostram efetivas, o são devido à pressão dos movimentos sociais.

Como resultado das transformações socioeconômicas e demográficas sofridas pela região nos últimos trinta anos ocorreu um processo de estreitamento das fontes de renda. Efetivamente, assistiu-se com a construção da Usina o fim das fontes de renda oriundas do regime de vazantes do Rio, bem como das relativas a pesca, pois a piscosidade do rio foi duramente afetada. No que concerne a agricultura, tivemos, de um lado, o fim da cultura do algodão com a disseminação do bicudo e, de outro, a crise no cultivo comercial de feijão decorrente do alto grau de endividamento dos grandes produtores. O crescimento populacional associados as práticas agrícolas não conservacionistas levou a um aumento bastante expressivo da degradação ambiental, o que significou a diminuição pronunciada da caça e da extração vegetal. Por fim a urbanização e, conseqüente, penetração dos bens de consumo industrializados significou a queda na demanda pelos produtos do artesanato local, seja de vestuário seja de alimentos. Não se pode esquecer que a construção da Usina transformou demográfica e economicamente a região, pois se, num primeiro momento, assistiu-se ao crescimento das oportunidades de emprego e de renda e à migração para a área de importantes contingentes populacionais, posteriormente, com o fim das obras, houve um estreitamento das perspectivas de trabalho e renda. Efetivamente, a Usina chegou a contar com 9.000 empregados, incrementando, portanto, em muito a demanda por bens de consumo e serviços – alimentos, vestuário, habitação, educação e saúde. Fica, assim, evidenciado que o crescimento populacional e a nova realidade nascida da construção da Usina são centrais no entendimento do estreitamento das fontes de renda para as populações do sertão.

Uma questão importante ainda permanece quanto à característica do território do Alto Sertão Sergipano: é ele uma área reformada? Considerando que uma área reformada é constituída pela ação concertada das políticas públicas, a resposta seria negativa. Isso porque as intervenções fundiárias restringem-se a desapropriação de terras, realizadas a reboque das pressões do movimento social, não se fazendo presente as outras modalidades de intervenção na realidade fundiária: regularização e reordenamento. As duas se mostram fundamentais, pois, com veremos, segundo os dados do cadastro do Incra, em setembro de 2003, quase 50% dos imóveis rurais eram de pequenos posseiros e, pelas informações do Censo Agropecuário de 1995-96, 60% dos estabelecimentos agropecuários enquadram-se no grupo B do Pronaf, tendo área média de 6 ha. Essas duas ações ocorrem ou de modo desvirtuado, como no caso do reordenamento, ou de maneira atomizada, particular e sob a gestão e planejamento da esfera estadual. No caso do reordenamento, o que se tem realizado é uma ação anti-reforma agrária, sendo, ademais, contrária ao que seria o escopo de uma política desse tipo. Isso porque o crédito fundiário não tem se dirigido a conceder empréstimos a taxas de juros privilegiadas para que os minifundistas possam ampliar suas áreas com a aquisição de terras vizinhas, mas sim para assentar precariamente, em lotes diminutos, trabalhadores rurais sem-terra, ou seja, instalar assentamentos sem a penalização do proprietário de terras absentista. Já na regularização fundiária o que ocorre é o repasse de recursos pelo Governo Federal para o Governo Estadual, a quem fica a responsabilidade pela realização dessa intervenção, ou seja, o controle e a gestão fogem das mãos de quem tem a responsabilidade de alterar o quadro fundiário. Por fim, as outras políticas públicas voltadas ao combate à pobreza rural, como as chamadas bolsas, a previdência social rural e os programas de combate a pobreza financiadas pelas agências multilaterais, desenvolvem-se sem articulação e sinergia, pois não existe um marco geral para todas essas iniciativas.

Page 14: Alto Sertão - SE

Pode-se, por outro lado, considerar o território como área reformada, tendo em vista a importância que os assentados, acampados, pequenos proprietários e posseiros tem na economia e na sociedade locais. Ora, como bem aponta a tabela 3, 40% da área dos imóveis rurais encontram-se ocupadas por essa população, respondendo por quase a totalidade dos domicílios rurais, que se estimou existirem em 2004. Não resta dúvida que o quadro fundiário esta se alterando de modo expressivo, havendo grande potencialidade para que o território atinja maiores níveis de desenvolvimento, com base em políticas que busquem a equidade de oportunidades e a democratização no acesso aos bens e serviços públicos.

Page 15: Alto Sertão - SE

Tabela 3Participação dos Assentados, Minifundistas, Pequenos Posseiros e Proprietários na

População Rural e na Área dos Imóveis.

Públicos da Reforma Agrária

nº famílias ou imóveis

% acumulada na população rural

(estimativa domicílios em 2004)

% acumulada da área organização

Assentados 2.955 18,48% 15,18% MstPosseiros e minifundistas 3.730 41,80% 27,87%Pequenos proprietários 1.999 54,30% 42,18%

Feacom, Sindicatos, Associações e Mpa

Acampados 7.074 98,54% 42,18% MstFonte: Censo Demográfico 2000, Estimativas Populacionais 2004 e Incra

II. O Território do Alto Sertão Sergipano- localização e condições naturais, diferenciações internas e móveis de ocupação

-

II.1. Localização e Caracterização do Sertão Sergipano

Dois elementos são cruciais na caracterização do Alto Sertão Sergipano e, por conseguinte, no seu desenvolvimento: o fator climático e a hidrografia. Quanto ao fator climático o que caracteriza a região é o regime de chuvas, escassas e irregulares, fator comum a todo semi-árido brasileiro. Assim, o semi-árido sergipano e sua circunvizinhança se destacam pela proximidade com o oceano e a presença do rio São Francisco. Como bem aponta Manuel Correia de Andrade, “em Sergipe é maior a intimidade entre o oceano e o continente”. Em outra passagem, o autor trata da região onde se insere o território do Alto Sertão, chamando a atenção justamente para a particularidade do Rio. “É bem caracterizado no conjunto sertanejo aquilo que podemos chamar de a ribeira do São Francisco. Na realidade, o grande rio nordestino atravessa áreas das mais secas do Nordeste. Próximo à sua margem direita, na Bahia, situa-se o famoso ‘Raso da Catarina’, conhecido por ser uma das áreas mais secas e despovoadas, hostis mesmo, ao homem dos nossos sertões.” 8

O território do Alto Sertão Sergipano situa-se na região da confluência dos estados nordestinos da Bahia, Pernambuco, Alagoas e Sergipe, onde o rio São Francisco não é navegável ou como bem caracteriza Teodoro Sampaio trecho em que o rio assume o formato de canhão, estendendo-se de Pão de Açúcar até Paulo Afonso. Em suas palavras, é o “trecho do rio ... para cima de Pão de Açúcar [que é], de fato, um estreito canhão de margens escarpadas, altas e pedregosas, onde o gnaisse e o micaxisto predominam e dão à paisagem esse tom áspero e enegrecido, das regiões estéreis e quase despidas de vegetação” (Sampaio, 2002: p. 71-2)

Vale a pena continuar citando o autor, pois sua descrição é bastante clara: “A população, nesse trecho, é, por isso, mais rara; as culturas quase desaparecem e, se acaso existem, ficam por detrás dos morros de acesso difícil. ... E subimos a corrente como quem percorre um

8 Correia de Andrade, 2004, paginas 42 e 55-6, respectivamente.

Page 16: Alto Sertão - SE

extenso corredor, semeado de obstáculos, e em que raro se descobre uma abertura por onde a vista se estenda, surpreendendo o aspecto da região mais vizinha” (Sampaio, 2002: 72). 9

O mapa climático do território do Alto Sertão Sergipano, apresentado na figura 1, o classifica como semi-árido, em que de 7 a 8 meses são secos e a temperatura é sempre superior aos 18ºC, com as chuvas não só se concentrando num período muito curto como sofrendo variações cíclicas aleatórias. Como bem aponta estudo da Emater-SE, de 1983, o problema da seca em Sergipe decorre mais da irregularidade das chuvas do que da sua escassez propriamente dita. 10

9 A citação segue com “e assim fomos sucessivamente passando pelos pequenos povoados do Boqueirão, Bom Sucesso, Sipoalha, Curralinho Velho, Curralinho Novo, Barra do Jacaré, Entre Montes ou Armazém, Colete até porto das Piranhas”, demonstrando a vitalidade da vida ribeirinha. Tais povoados perderam grande parte de sua vitalidade, tendo em conta o processo de ocupação do sertão e de interiorização da vida econômica, decorrente, entre outras coisas, pelo término do regime de vazantes do rio após a instalação das Usinas do Complexo Paulo Afonso e de Xingo.10 “No Nordeste, o elemento que marca mais sensivelmente a paisagem e mais preocupa o homem é o clima, através do regime pluvial e exteriorizado pela vegetação natural. Daí distinguir desde o tempo colonial a ‘Zona da Mata’ ... do Sertão, também quente, porém, seco, e não só seco, como sujeito desde a época colonial, a secas periódicas que matam a vegetação, destroçam os animais e forçam os homens a migração. Dessa diversidade climática surgiria a dualidade consagrada pelos nordestinos e expressa no período colonial em dois sistemas de exploração agrária diversos, que complementam economicamente, mas que política e socialmente se contrapõem: O Nordeste da cana-de-açúcar e o Nordeste do gado, observando-se entre um e outro, hoje, o Nordeste da pequena propriedade e da policultura e, ao Oeste, o Meio-Norte, ainda extrativista e pecuarista” (Correia de Andrade, 2004: p. 37/8).

Page 17: Alto Sertão - SE

Figura 1Mapa do Clima do Território do Alto Sertão Sergipano e Vizinhança

Semi-ÁridoTemperatura > 18ºC em todos os meses (quente)

11 meses secos

9 a 10 meses secos

7 a 8 meses secos

6 meses secos

ÚmidoTemperatura > 18ºC em todos os meses (quente)

1 a 2 meses secos

3 meses secos

Semi-úmidoTemperatura > 18ºC em todos os meses (quente) 4 a 5 meses secos

Semi-úmidoTemperatura entre 15ºC e 18ºC em pelo menos 1 mês (subquente) 4 a 5 meses secos

Fonte: IBGE

Explicitando melhor, o regime pluviométrico dessa região é do tipo “mediterrâneo”, tendo um período seco de primavera-verão e um período chuvoso de outono-inverno. A estação seca é de sete a oito meses e a chuvosa de cerca de quatro meses. O período chuvoso normalmente é entre abril e agosto. As precipitações pluviométricas médias anuais variam entre 368 mm e 630 mm. A irregularidade de pluviosidade de um ano para o outro, o baixo índice de precipitação e a má distribuição durante o ano é característica comum da região. A concentração de precipitação em curto período ocasiona a erosão do solo e a lixiviação, trazendo prejuízos para as terras férteis. A temperatura apresenta-se regular durante todo o ano, com médias térmicas anuais variando entre 24ºC e 26ºC, com médias mínimas entre 19ºC e 21ºC. A aridez acentua-se cada vez mais em direção à parte oeste da área.

A região do Sertão do Baixo São Francisco Sergipano tem 4.952,9 Km2, representa 20,3% do território sergipano e é formada por cinco sub-bacias do rio São Francisco. Abarca seis municípios sergipanos, quatro em sua totalidade - Canindé do São Francisco, Poço Redondo, Porto da Folha e Monte Alegre de Sergipe - e, parcialmente, Nossa Senhora da Glória e Gararu, bem como o de Santa Brígida, na Bahia.

Page 18: Alto Sertão - SE

A sub-bacia do Curituba abrange uma área de 679,9 Km2, sendo que 202,6 Km2 localizam-se no município de Canindé do São Francisco. A sub-bacia das Onças possui uma área de 403,2 Km2, situando-se nos municípios de Canindé do São Francisco e Poço Redondo. A sub-bacia do rio Jacaré tem 879,4 Km2, ocupando parte dos municípios de Canindé do São Francisco e Poço Redondo. A sub-bacia de Campos Novos com 1.092,7 Km2 abrange parte dos municípios de Poço Redondo e Porto da Folha. A maior das sub-bacias, a da Capivara, tem 1.897,7 Km2, contando com o maior número de municípios: Porto da Folha, Monte Alegre de Sergipe, Gararu e Nossa Senhora da Glória.

Vale ressaltar, como ilustrado no quadro 1, que a maior parte desses rios, ainda que perenes, apresentam águas salobras, impróprias para o consumo humano e para a irrigação, o que restringe em muito o desenvolvimento da região

Quadro1Principais rios da região do Alto Sertão Sergipano.

Nome Categoria de salinidade RegimeRepresa Xingó Doce Conexão de drenagemRio São Francisco Doce Conexão de drenagemRio Curituba Salobra PereneRio Jacaré Salobra IntermitenteRiacho do Mocambo Salobra PereneRio Campos Novos Salobra PereneRio Capivara Salobra PereneRio Gararu Salobra PereneFonte: Atlas Digital sobre Recursos Hídricos. SEPLANTEC, 2004.

No tocante às políticas públicas de fornecimento de água à região do sertão, observa-se uma grande quantidade de poços tubulares, dos quais, contudo, somente 11,1% se encontram em operação – quadro 2.

Page 19: Alto Sertão - SE

Quadro 2.Fornecimento de água na região do sertão sergipano (políticas públicas)

Descrição Quantidade* % do totalPoço tubular paralisado 22 14,4Poço tubular em operação 17 11,1Poço tubular abandonado 100 65,4Poço tubular dessalinizador 14 9,1Total ,0Fonte: Fonte: Atlas Digital sobre Recursos Hídricos. SEPLANTEC, 2004.* Valores aproximados para o território.Obs: Não existem informações sobre o estado de conservação dos poços citados acima, bem como das condições de operação dos dessalinizadores.

Predominam os relevos plano e suave ondulado, característicos da unidade morfológica Pediplano Sertanejo, ocorrendo, também, relevos ondulado e ondulado forte na zona de entalhe do rio São Francisco e nas áreas de drenagem de seus afluentes. Ocorrem de modo tópico, elevações decorrentes de áreas residuais do planalto no sudoeste da Serra Negra - ponto mais alto do estado, com 742 m de altitude, localizado no município de Poço Redondo -, além da Serra da Guia, com 646 m de altitude.

A vegetação da área é variada, com predomínio de formações arbustivas e herbáceas, havendo a presença de árvores, isoladamente ou em grupos de pequena extensão, cerrados e caatingas hiperxerófitas e hipoxerófitas, compondo o que se denomina o bioma caatinga.11

II.2. Povoamento e móveis de ocupação

O início da história de ocupação da região do Alto Sertão Sergipano se deu em função dos movimentos populacionais oriundos de dois focos: Salvador e de Olinda, centros açucareiros, que, em razão de suas necessidades por animais de trabalho e por gêneros alimentícios, estimularam o deslocamento de populações para o Sertão em busca de terra para a criação de gado e o cultivo de alimentos12. Esses movimentos de ordem econômica não contaram com uma política de interiorização por parte dos portugueses. Coube aos rios o papel de principais caminhos para o movimento de ocupação dos sertões, destacando-se, em especial, o rio São Francisco.

É precoce, portanto, a ocupação do alto sertão sergipano, tendo em conta o Rio São Francisco que, com sua posição intermediária e de divisor de terras entre Salvador e Recife, teve papel de destaque nos processos de interiorização das populações. Vale destacar a importância que 11 “Caatinga não é palavra que exprima uma associação vegetal uniforme, ..., mas uma gama enorme de associações, ora mais, ora menos densas, umas de maior e outras de menor porte. Nas zonas mais favoráveis e onde a densidade demográfica e mais elevada, domina a agricultura. Naquelas em que o manto de decomposição das rochas é pouco espesso e a agricultura não pode desenvolver-se, domina a pecuária e é mais baixa a densidade demográfica. Interessante é que na porção semi-árida, as áreas de solos arenosos constituem verdadeiros condensadores de população e são intensamente ocupadas pela agricultura” (Corrreia de Andrade, 2004: 47).12 “A margem direita do São Francisco foi objetivo perseguido por dois vetores de expansão: os criadores bahianos, que para lá se dirigiam após a conquista do Sergipe d’El Rey, em 1590, e os pernambucanos, no mais das vezes homens da Casa da Torre, ambos, entretanto, detidos pela resistência de negros e índios”. (Teixeira da Silva, 1981: 10)

Page 20: Alto Sertão - SE

tiveram as missões religiosas nas ocupações dos sertões, pois, em inúmeras situações e ocasiões, os índios e, posteriormente, os negros aquilombados eram obstáculos a efetiva ocupações das terras mais afastadas da zona da mata. Assim, “a Freguesia de São Pedro do Porto da Folha surgiu em torno de um antigo aldeamento de índios estabelecido no século XVIII, em uma ilha do São Francisco”. Do aldeamento estabelecido pelos capuchinhos franceses até a criação da freguesia são mais de cem anos, tendo importância as povoações de Porto Folha (originalmente denominada Fazenda do Buraco), Ilha do Ouro, São Pedro e Gararu (antiga Curral de Pedras). Nesse ínterim como bem detalhou Francisco Carlos Teixeira da Silva foi se constituindo uma infra-estrutura fundiária que, somente na metade do século XX, iria sofrer profundas alterações com a apropriação definitiva das terras e a modernização conservadora dos anos 70 e 80.

No século XVII é a luta pela abertura da fronteira sertaneja que se encontra fechada, ou melhor, bloqueada não só pelos índios, que se abrigavam nos catingais do São Francisco acuados pelo ímpeto colonizador, como pelos negros que “fugidos das áreas de plantagem, buscavam refúgio na região, onde chegavam a estabelecer uma ampla teia de mocambos”. Se “a fronteira para o povoamento ... estava fechada”, dois caminhos foram perseguidos: a guerra contra os índios e negros ou a destribalização levada a cabo pelos religiosos. Como bem diz Francisco Carlos Teixeira da Silva, “o extermínio ou a sobrevivência do gentio ... ambos ... pressupunham uma morte: ... homicídio etnológico”, no primeiro, “e de homicídio ontológico”, no segundo. “A este se dedicaram os capuchinhos forjadores, no Sergipe”.13

Efetivamente, o inicio do povoamento no alto sertão sergipano se deu nas primeiras décadas do século XVII com o aldeamento dos índios cariris na Ilha de São Pedro por padres capuchinhos franceses. Contemporâneo a esse núcleo de povoamento há a Ilha do Ouro, que, segundo Felisberto Freire, teve sua exploração iniciada, em 1682, por Gerônimo Taborda. Verdade que se assistiram a muitas idas e vindas no processo de consolidação desses núcleos de povoamento, em razão dos recorrentes ataques de indígenas e negros. O povoamento da região só veio de fato se consolidar mais de um século depois, aí já com os novos núcleos discriminados acima e a instalação da freguesia de Porto da Folha na terceira década do século XIX.

À medida que as distâncias dos principais centros açucareiros aumentavam, cresciam, também, as dificuldades de comunicação, gerando, assim, um espraiamento das áreas onde se desenvolviam a criação e as culturas alimentares. Essas por seu relativo isolamento, desenvolviam uma economia de subsistência, cuja dinâmica estava ligada aos avanços e recuos da economia açucareira. A pecuária foi o que permitiu a maior parte da ocupação do Sertão, enquanto, a agricultura foi uma atividade secundária (tendo expressão apenas no período de inverno), voltada principalmente para a subsistência, sendo comercializado o excedente. Ao largo da pecuária, as áreas mais favoráveis à agricultura foram cultivadas com mandioca, feijão, fava e milho, destacando-se, entre elas as zonas ribeirinhas do rio São Francisco que, com seu regime de cheias e vazantes, permitiam o desenvolvimento tanto das atividades agrícolas como da pesqueira. Nessas áreas somam-se àqueles cultivos, a cana-de-açúcar, o amendoim, o alho e a cebola. Assim, a principal atividade econômica da região do sertão sempre foi a pecuária - o boi – aliada, todavia, a outras culturas de subsistência.

A importância do gado na colonização do semi-árido é evidenciada por Manuel Correia de Andrade ([1970/1998]; 2005), quando aponta para a importância do couro na vida social e

13 Teixeira da Silva, 1981, p. 11.

Page 21: Alto Sertão - SE

econômica da população sertaneja. Os mais variados utensílios domésticos e móveis eram feitos de couro, a ponto de ser chamadas por alguns historiadores de a “civilização do couro”, para exemplificar: portas das cabanas, cama para os partos, as cordas, o alforje para levar comida, a mala, a mochila para milhar cavalo, a peia de prender cavalos, as bainhas das facas, a roupa de montar no mato, os bangüês para carregar sal, juntas de bois.

E, como bem qualifica, Andrade o sertão é o território onde o gado cria o homem em lugar do homem criar o gado, sendo a pecuária “indispensável tanto à indústria açucareira como ao abastecimento dos centros urbanos então [séc. XVIII] florescentes”. E, que “crescia de importância à proporção que se caminha para o sul, uma vez que essa era a atividade quase exclusiva na zona do São Francisco e no território sergipano”. (Andrade, 2005: 89 e 80)

Conclui-se a partir da leitura de autores clássicos, como Furtado (1959) e Caio Prado Jr. (2004b), além do já citado Andrade, que a pecuária foi o que permitiu a maior parte da ocupação do interior do Nordeste, cuja economia foi complementar à da área úmida. Complementar no processo de ocupação das terras e enquanto fornecedora de animais de trabalho e de carga e de alimentos. “O gado foi sempre um servo da cana; ocupava áreas pioneiras à sua espera e cada vez se distanciava mais do litoral, tendo, conseqüentemente, que ir alongando cada vez mais as suas caminhadas para chegar aos centros de consumo. Foi ele que desbravou e ocupou ... [n]o Vale do São Francisco e [n]os campos de Sergipe ...”. (Andrade, 2005: 105).

Há, contudo, que se levar em conta, como bem aponta Teixeira da Silva (1981 e 1997), a presença relativamente expressiva das pequenas posses e das terras indivisas, fato inconteste no sertão sergipano do são Francisco. Nessas terras se desenvolvem numerosas atividades agropecuárias, como os posseiros dedicando-se a criação de pequenos animais – suínos, especialmente – e ao cultivo de mandioca, fava, feijão, milho, nas áreas secas, e do arroz, abóbora e banana,- nas terras úmidas, ou melhor, nas várzeas do São Francisco. Essas criações e cultivos vão travar uma disputa pelas terras com o boi e, posteriormente, com o algodão.

Teixeira da Silva, na verdade, indaga se não é demasiada a ênfase que os autores concedem a pecuária e, posteriormente, ao algodão na ocupação dos sertões, o que esta associado, ademais, ao tipo de unidade produtiva onde se desenvolvem essas atividades: a grande propriedade – o latifúndio. Sua pesquisa aponta para o importante fato que não somente internamente as grandes propriedades desenvolviam-se atividades típicas de pequenos proprietários, mas que nos interstícios da grande propriedade – sesmarial outrora – havia as terras indivisas e as posses, onde pequenos agricultores desenvolviam a pequena pecuária e uma variedade de culturas alimentares. Indagação semelhante cabe ser feita hoje, ainda que em outros termos: resta somente ao sertão a solução da agricultura irrigada, não havendo a possibilidade do desenvolvimento das chamadas atividades agropecuárias tradicionais? A maior parte dos autores dirá que não, pois o tamanho mínimo sustentável para o desenvolvimento da pecuária mista tradicional da região, supera em muito a área media dos estabelecimentos e o tamanho dos lotes concedidos aos agricultores! Essa é a visão presente no trabalho de Maia Gomes (2001), onde, ademais, há uma visão crítica ao crescimento das rendas originárias do setor público e da seguridade social. Diferentemente desse enfoque, aqui se acredita que há espaço para o desenvolvimento das atividades agropecuárias tradicionais, desde que sejam feitas, de um lado, intervenções no campo fundiário na direção de ampliar e formalizar ao acesso a terra, e, de outro, investimentos em infra-estrutura hídrica que disseminem o fornecimento de água. Ou seja, ao invés de um quadro marcado, por um lado,

Page 22: Alto Sertão - SE

por um cipoal de minifúndios e, de outro, por um segmento relativamente restrito de médias propriedades irrigadas, isto é, com abundância de água, o que se propugna são pequenas propriedades com acesso a água suficiente ao desenvolvimento de uma pecuária mista – na verdade, um grande capeirão, uma grande capineira, como dizem os sertanejos. 14

Vale, nessa direção, reproduzir análise de Teixeira da Silva (1981: 22) de documento oficial, no caso o Ofício da Câmara Municipal do Porto da Folha ao Presidente da Província do Sergipe de 30 de Juno de 1856. No documento se lês que:

“‘... as terras deste Município são quazi extereis, infrutíveras por ser Sertão sujeito a muitas seccas; nem huma produção e nenhum genero de cultura hé aqui abundante e frorescente, por quanto a criação de gado vacum hé o ramo de que se serve a mor parte dos habitantes, o que faz algumas fortunas de alguns, e esto mesmo assas falivel ... nas margens do Rio São Francisco nos lugares de várzeas, e lagoas cultiva-se o arroz em grande quantidade cuja produção ... necessita de boas cheias ou grandes inundações ... e não hé tão perecedora com a de milho e feijao, que não obstante produz em pequena porção’

“O mesmo documento reafirma a importância da pecuária no local:

‘... e ao ser vaqueiro se entregarão a maior parte dos habitantes, além do uso da pesca nas margens do Rio, e da cassa os do centro...’”

Com o que conclui Teixeira da Silva: “Em verdade reconhecemos toda a importância da pecuária, apenas desconfiamos da extrema importância dada a criação e, paralelamente, o esforço em desprezar a agricultura, em particular a pequena produção. Vislumbramos aqui uma das pontas de um largo conflito entre plantadores e criadores, que parece perpassar toda a nossa duração [1820-1920]. O período entre a ocupação destes sertões, no século XVIII, e a primeira metade do século XIX teria sido o momento em que a pequena produção é, paulatinamente, submetida aos interesses pecuaristas”

Parece que esse esforço em desconsiderar, ou melhor, em desmerecer a produção dos pequenos agricultores e, atualmente, dos assentados ainda está presente, para o que, são utilizados os mesmos argumentos, qual sejam: a esterilidade das terras e sua vocação para a pecuária extensiva. E a irrigação, apontada como a principal solução para os problemas de sustentabilidade econômica da atividade agropecuária no sertão, deve ser desenvolvida e apoiada em empresários rurais e não nos pequenos agricultores.

A análise de Teixeira da Silva aponta, como já se pode notar, para a significativa presença das posses e do seu papel enquanto fornecedora de alimentos e de braços. O autor defende, diferentemente do que a maior parte dos estudos sustenta, que a formação do campesinato no alto sertão sergipano se processou, grosso modo, antes da constituição da grande propriedade que, ademais, não obstaculizou o desenvolvimento das pequenas posses. Assim, a seu ver, o que a concessão de sesmarias e morgados implicou foi a não concessão do acesso “formal” à terra a enorme gama de pequenos posseiros pobres. Nas palavras do autor (1981: 13-15) “Parece-nos ... que no caso do Porto da Folha, como em outros pontos do sertão, a grande propriedade não se constitui, inicialmente, em um entrave à expansão das formas camponesas. Na verdade, a pequena produção parece ter precedido o latifúndio. ...

14 E, diferentemente do referido autor, acredita-se, também, que a chamada economia sem produção não é um mal em si, ou melhor, que o crescimento das rendas do setor publico e da seguridade é sinal sim de desenvolvimento. O desenvolvimento econômico-social e do emprego nos países centrais, no pós-guerra, foi, em grande medida, tributário do aumento da maquina burocrática dos estados.

Page 23: Alto Sertão - SE

“... o quadro da ocupação marcado pelas sesmarias poucas vezes corresponde à realidade. Por um lado, porque há um movimento anterior de ocupação que precede a doação dos sesmos e compõem-se de uma variada gama de pobres:

...“E por outro, mesmo quando as doações erram efetivamente ocupadas, poucas vezes o senhor ia ao Sertão assumir suas terras.“No mais das vezes, deslocava negros, forros ou não, e brancos pobres para ocupar as terras ...“... prática bastante comum na região: tomar terras, em largos tratos, e as subdividir em pequenas explorações, ocupadas por aqueles que normalmente não teriam acesso as doações:

...“Áreas, como estas constituir-se-iam em pontos de partida para a formações de um vigoroso estrato de pequenos produtores, ...”

E mais adiante, indica com propriedade o papel da apropriação privada das terras em largas extensões, mesmo que não efetiva: “as sesmarias ... e o morgado tiveram ... este papel: impedir o acesso pleno à propriedade privada, de resto sem raízes locais, transformando a posse no meio único de chegar à terra. As conseqüências foram, simultaneamente, notáveis e dramáticas: a formação de uma comunidade de posseiros onde a propriedade privada da terra é desconhecida, et pour cause, a expropriação do camponês, sob a alegação de inexistência de título legal de possessão, tornou-se tarefa simples, embora não menos dolorosa”.

A presença do rio São Francisco tem importantes conseqüências na maneira como se processou a ocupação das terras do alto sertão sergipano, pois, de um lado, o rio servia de porta de entrada para os sertões e, de outro, permitia o desenvolvimento tanto de cultivos agrícolas em suas várzeas como de maiores e mais diversificadas criações, tendo em vista a maior disponibilidade de água. Correia de Andrade (2005: 55-6) discorre sobre a importância do rio e de seu regime de vazantes no desenvolvimento da agricultura nas povoações ribeirinhas, dentre as quais encontram-se aquelas localizadas no alto sertão sergipano. “..., é bem caracterizado no conjunto sertanejo aquilo que podemos chamar de a ribeira do São Francisco ... Com as cheias, as ilhas e terras marginais submergem, sendo fertilizadas pelo rio e, à proporção que as águas baixam, são utilizadas pelos agricultores ribeirinhos para a formação de roçados; estes aproveitam não só o húmus depositado pela cheia, com também a umidade deixada pelo rio, e novas áreas vão sendo descobertas e culturas continuam a expandir-se, formando o que chamamos de agricultura de vazante, que garante ao sertanejo o milho, o feijão, o amendoim, a fava, a cana-de-açúcar (...) a cebola ...”

Verdade que a agricultura de vazantes na ribeira do São Francisco no alto sertão sergipano não teve a mesma expressão que nas localidades mais próximas de Própria e da Foz, pois aí as várzeas são mais extensas e numerosas. De toda sorte, várias povoações nos municípios de Gararu, Porto da Folha e, até mesmo, de Poço Redondo, surgiram em função da agricultura de vazante que o regime de águas do São Francisco permitia. É isso que se pode depreender da leitura do livro-diário de Teodoro Sampaio. Em certo momento, Sampaio diz que “as povoações de Maria Pereira, Curral das Pedras15, Genipatuba, N. S. do Ó, Jacobina, N. S. Prazeres, Lagoa Funda, Limoeiro, S. Pedro e Mocambo, erguidas à direita e à esquerda, ora na margem alagoana, ora na sergipana, continuam a série pitoresca que atrás assinalamos”. Série essa que foi descrita pelo autor pouco antes, nos seguintes termos: “o trajeto rio acima é deveras interessantíssimo. O vapor (...) vence a corrente garbosamente como se singrasse por um lago de águas tranqüilas. As margens do rio muito povoadas, com muita lavoura pelas

15 Nome anterior da cidade de Gararu.

Page 24: Alto Sertão - SE

baixadas e pelas numerosas e pequenas lagoas deixadas pela enchente anterior, são como duas belas avenidas, onde as edificações se alternam com o verde da mata, o branco dos areais extensos, as escarpas rochosas dos montes, os tabuleiros louros dos arrozais de vazante, e as roças de milho por colher”. A diferença, como bem diz Sampaio, se deve ao “relevo mais acentuado da paisagem, até Pão de Açúcar, onde devíamos pousar”. (Sampaio, 2002: 70 e 68).

Vale notar que as povoações que salientamos em itálico no texto são homônimas às médias e pequenas várzeas para as quais a Codevasf vem desenvolvendo propostas e projetos de utilização tecno-produtiva. Conta-se, inclusive, com estudos de potencial produtivo e de custos de implantação. Duas delas no município de Gararu e uma em Amparo de São Francisco. São, também, citados a cidade de Gararu e o Povoado de Mocambo.

Como se pode notar, portanto, a ocupação do alto sertão sergipano não teve como único ou mesmo principal móvel a pecuária, mas, também, pelo apossamento de terras indivisas e/ou devolutas por agricultores, escravos e indígenas e pelo desenvolvimento da agricultura de vazante nas terras ribeirinhas do São Francisco.

Ao final do século XVIII e início do XIX o algodão ganha presença econômica no Nordeste brasileiro, sendo que, inicialmente, a maior parte de sua produção era realizada no agreste e consumida na própria região, através das tecedeiras - atividade artesanal exercida, sobretudo, por mulheres16. Nas primeiras décadas do século XIX, com a abertura dos portos e, posteriormente, nos anos de 1850 e 1860, com a introdução do algodão arbóreo e a guerra de secessão, o algodão se alastrou para os sertões. Cultura que, diferentemente, da cana e da pecuária era, também, desenvolvida por médios e pequenos agricultores, sendo que, mesmo, na etapa de beneficiamento o grau de concentração não era similar ao presente na fabricação do açúcar. No sertão sergipano, a cultura do algodão só passa a ganhar espaço no ultimo quartel do século XIX, sendo, ao lado da pecuária, atividade dos homens de posses. Como bem afirma Teixeira da Silva (1981: 60), na virada do século, “a pecuária associada com a cultura do algodão produzira, enfim, uma camada, ínfima é verdade, de homens ricos que passam a construir uma paisagem onde só há lugar para o boi as ramas brancas do algodão. As culturas de alimentos, mormente as que não produzem palhada deverão ceder lugar ao algodão, cujos campos, na época seca do ano, serão abertos ao gado”. Interessante a analise que a seguir faz o autor, onde aponta que se a riqueza provem do gado, os camponeses buscarão emular aos grandes fazendeiros, ou seja, buscarão de todos os meios transmutarem-se em criadores de gados. Nas palavras de Teixeira da Silva, “o efeito demonstração também terá seu papel: se os grandes pecuaristas ficavam ricos porque não o camponês? Muitos farão tudo para ter seu próprio gado (o que além do mais confere prestígio)”. Verdade que, como aponta o referido autor, serão tomadas as mais variadas medidas – posturas, fiscalização, impostos e policia – para dificultarem e/ou impedirem que os pequenos agricultores e posseiros desenvolvam a pecuária.

Mais uma vez o passado se apresenta hoje, pois se lança mão de instrumentos semelhantes para que assentados e pequenos agricultores não desenvolvam a pecuária leiteira. Ora se não é isso que praticam os agentes financeiros e os órgãos governamentais quando colocam em cheque as possibilidades da pecuária leiteira levada a cabo por esses agricultores.

16 O algodão arbóreo, destacando-se o “mocó” e o “verdão”, foi largamente cultivado e se constituiu numa atividade típica dos grandes e até de pequenos proprietários.

Page 25: Alto Sertão - SE

É nesse período da virada do século que, também, se assiste ao crescimento demográfico da região, ainda que se tornem mais agudas as secas. Concretamente, em 1872, a população do território era da ordem de 8,5 mil habitantes, chegando a pouco mais de 11 mil, em 1890, e atingindo, nos censos de 1900 e 1920, a 15.413 e 21.584, respectivamente. Os números, quando cotejados com os da Província de Sergipe e os da região Nordeste, são evidentes do maior dinamismo do território nessa época, que, no entender dos autores, se deve de que a crise por que passava os segmentos agroexportadores nordestinos - açucareiro e algodoeiro – implicou, de um lado, no re-direcionamento das atividades agropecuárias regionais para o mercado interno. Soma-se a isso, o fato da economia sergipana não apresentar laços tão estreitos com os mercados internacionais, já funcionando, desde muito, como espaço econômico mais autóctone. De toda sorte, “estamos frentes a uma sociedade de baixíssima densidade humana” (Teixeira da Silva, 1981: 120-122)

Essas alterações no quadro demográfico são bem descritas em outro trecho da dissertação de Teixeira da Silva (1981: 64-66), onde se lê que “inquérito respondido pela prefeitura de Porto da Folha e de Gararu, em maio de 1915, fornece informações mais detalhadas acerca das novas condições demográficas. Em toda a região existia apenas uma cidade, a de Porto da Folha, e uma vila que era a sede epônima do município de Gararu além de vinte povoados (cinco em Gararu e quinze em Porto da Folha). Entretanto grande parte desses povoados eram, em verdade, bairros rurais ... com uma área territorial bastante grande e laços de vizinhança frouxos. Muitos os quais tiveram origem em ‘fazendas’ que ocuparam a região na segunda metade do século XIX, e acabaram por condensar uma população que originaria futuros núcleos demográficos. Os principais ‘povoados’ eram os seguintes: no Porto da Folha, Mocambo, Curralinho, Ilha do Ouro, Restinga, Canindé, Brocotó, Poço Redondo, Araticu, Bom Sucesso, Lagoa das Marrecas, Tanquinhos de Dentro, Belém, Tapera, Furado, São; ... [em] Gararu, Providência, Lagoa Funda, Itans, N. S. da Glória, Tejuco e Lagoa Primeira ... A lista de povoados ... nos permite perceber um elemento novo quanto ao povoamento do Sertão do São Francisco. As áreas ‘velhas’ do Sertão, por onde o povoamento havia se iniciado, começam a se despovoar. Assim, São Pedro e Ilha do Ouro cedem lugar a centros novos instalados principalmente na área de ‘fronteira’ do Sertão junto a Poço Redondo e Canindé. Tal expansão em direção ao Norte árido não é estranha, muito pelo contrário, é a expansão do gado na região. Enquanto a atividade básica era agricultura voltada para a produção de alimentos a maioria da população se encontrava nas regiões mais úmidas junto ao rio de São Francisco”. Ainda assim, a população concentrava-se ao longo das margens do Rio São Francisco onde procurava evitar efeitos mais dramáticos da seca.

O Censo Agrícola de 1920 enumera 523 estabelecimentos agropecuários no território, sendo 322 em Gararu e 201 em Porto da Folha, ocupando uma área de 93,5 mil hectares. Área apropriada semelhante à registrada em 1940, devendo se considerar as alterações ocorridas no tamanho dos municípios, com o território apresentando, em 1940, uma superfície territorial inferior. Ou seja, parte da área considerada, em 1920, não se situava nos limites atuais do território. De toda sorte, o que se assistiu foi, entre esses dois censos, um desmembramento dos estabelecimentos, com a área media dos estabelecimentos diminuindo de 179 para 60 hectares. Como bem apontam os dados, já no inicio do século se observava uma clivagem na estrutura da posse da terra, com a pequena propriedade se situando nas partes sul e sudeste do território e as grandes fazendas no noroeste. É isso que Teixeira e Silva (1981: 67) aponta ao analisar os dados do Censo de 1920: “o numero mais elevado de estabelecimentos em Gararu, explicar-se-ia pela maior vitalidade da pequena propriedade camponesa em Gararu–Providência–Monte Alegre–N. S. da Glória e um maior número de fazendas de gado no Porto da Folha–Canindé– Poço Redondo”. Essa divisão se preservou até meados dos anos 90,

Page 26: Alto Sertão - SE

quando a luta pela terra e o a implantação de vários assentamentos modificou o desenho fundiário do território. Isso se refletia nas atividades agropecuárias predominantes com a “produção agrícola de Porto da Folha [sendo] bastante inferior a de Gararu no que toca a produção de aliemntos” (Teixeira e Silva, 1981: 72), isso apesar da área ocupada pelos estabelecimentos em Gararu representar tão somente 1/3 da apropriada em Porto da Folha. Chama a atenção ao referido autor, o desempenho da pecuária no Censo de 1920, com Porto da Folha se destacando nos efetivos bovinos e caprinos e Gararu nos ovinos, caprinos e suínos. Ademais, “se somássemos os dois rebanhos [bovinos], a região do Sertão do São Francisco ultrapassaria com grande facilidade o maior município pecuarista do Sergipe ... Um outro ponto relevante é que já podemos perceber um vigoroso aumento dos rebanhos caprinos e ovinos da região, menos exigentes em matéria de água e da qualidade de pastos e portanto menos visados pelos criadores. ... parece ter se dado uma nítida troca dos suínos da região por cabras e ovelhas mais aptas para as terras áridas ou semi áridas para onde as fazendas expulsavam os camponeses”. (Teixeira da Silva, 1981: 75).

A criação do município de Nossa Senhora da Glória, em 1928, é um marco na ocupação do Sertão Sergipano, uma vez que sua sede se localiza bastante distante da ribeira do São Francisco, indicando que o povoamento ultrapassava os limites da zona ribeirinha. Verdade que o território se caracterizava pelo isolamento, pela hostilidade e pela precária presença do aparato público, o que é evidenciado tanto pelo fato do cangaço ter tido na região seus últimos momentos e, de outro, pela proximidade com a região de Canudos. É isso que se pode depreender da leitura de artigo de Frederico Pernambucano de Mello, publicado, em setembro de 2005, em uma nova revista dedicada a historia brasileira, onde ele analisa a trajetória de Lampião, o ultimo representante dos cangaceiros. Senão vejamos como autor analisa o processo de enfraquecimento do cangaço, ao dizer que “em torno de meados do século XIX, começando a ordem pública a deitar seu longo braço no sertão, o que se vê é a paulatina condenação do viver pelas armas, no plano da administração da justiça, simultaneamente à arcaização nos planos histórico e sociológico. Data daí o emprego solto das expressões nativas cangaço e cangaceiro para revelar modo de vida e protagonista tornados incompatíveis com um tempo social em que já não mais se podia viver a existência selvagem que fora apanágio das gerações que sucederam o momento inicial de penetração das terras do leste setentrional brasileiro”.17

Nos anos 50 e 60, apesar da recorrência das secas e dos movimentos migratórios tanto para as cidades da zona da mata com para o sudeste brasileiro, observa-se uma mudança na geografia do território, com a construção das primeiras usinas do complexo de Paulo Afonso e a instalação dos municípios de Monte Alegre de Sergipe, Poço Redondo e Canindé de São Francisco, em 1953, todos com suas sedes na estrada entre Aracaju e Paulo Afonso. São dessa época, também, as primeiras obras do Dnocs na região, particularmente a construção de açudes. É isso que aponta o trabalho MDA-FAO, ao afirmar que “as políticas de construção da infra-estrutura, por parte do DNOCS, foi construída a BR-262, estrada de acesso permanente que une Canindé de São Francisco a Aracaju. Isso reorientou os fluxos comerciais da região, de Própria – via rio – para Nossa Senhora da Glória – via estrada. Também levou a 17 Interessante reproduzir outra passagem em que o referido autor coloca o cangaceiro com uma figura histórica de muito relevo e ligada às camadas marginalizadas que contestam o status quo da sociedade brasileira e nordestina. “É bem claro o lugar do cangaceiro em nossa história: ao lado dos que, como ele, se fizeram criminosos no epiderme e irredentos no mais fundo da carne, carregando por séculos, a ferro e fogo, o mito da vida primordial absoluta que o colonizador fez de tudo para extirpar ...e que na Canudos ... continuava a tentar destruir ... É ao lado do índio levantado, do negro em armas contra o cativeiro e do branco de tantas revoltas pagãs, ou de fundo místico, contra disciplinas abusivas ou novidades de governo, que o cangaceiro deve ser perfilado”. (Mello, 2005: p. 21 e 20, respectivamente)

Page 27: Alto Sertão - SE

uma maior presença institucional estadual e federal dentro da região, tendo sido criados escritórios regionais, primeiro em Nossa Senhora da Glória e posteriormente em Poço Redondo”.

Nas décadas de 70 e 80 são efetuadas na região intervenções governamentais no território no âmbito dos grande projetos de desenvolvimento da agricultura brasileira que, com apoio de agencias multilaterais, buscavam modernizar a agropecuária nacional, tendo em conta as particularidades regionais e aos diferentes públicos. Efetivamente, eram programas que se inseriam na lógica da chamada modernização conservadora da agricultura brasileira. Dentre esses cabe citar, de modo particular, o Projeto Sertanejo – Programa Especial de Transformação e Fortalecimento da Região Semi-Árida do Nordeste e o PRAMENSE – Projeto de Produção de Alimentos e Nutrição em Áreas Rurais de Baixa Renda no Nordeste. Como resultados desses projetos podem ser citados, seguindo o trabalho MDA-FAO: a) aumento da carga animal e crescimento dos rebanhos; b) desenvolvimento da pecuária leiteira no entorno de Nossa Senhora da Glória; c) incremento da ovinocaprinocultura no município de Poço Redondo; d) substituição vertiginosa da caatinga por pastagens; d) constituição de um segmento produtor de queijos artesanais articulado com a suinocultura; entre outras. Como bem aponta o referido trabalho, “o Projeto Sertanejo não provocou mudanças nas tendências de desenvolvimento da região, porem fortaleceu as iniciativas na década de 60, com a consolidação do espaço pecuário e o processo cumulativo de degradação ambiental”.

E o ultimo grande movimento de ocupação da região foi decorrente da construção do sistema hidroelétrico de Xingó, nos anos 80 e 90, quando se assiste a um grande movimento de migração populacional. Decorrente disso a economia regional atravessou uma fase de grande dinamismo, principalmente os municípios de Canindé (SE) e Piranhas (AL), dada a quantidade de empregos gerados direta e indiretamente pela construção da Usina. Contemporâneo a esse movimento populacional se assiste aos primeiros conflitos de terra na região e a chegada do movimento dos trabalhadores sem-terra à região.

Quando do início da construção da barragem, parcela da população de Canindé de São Francisco foi deslocada para Piranhas (AL). Foi em Piranhas onde se concentram as atividades de alimentação e lazer, enquanto, em Canindé ficaram localizados os serviços de hospedagem. Ambas as cidades foram dotadas de hospitais e escolas. O complexo hidrelétrico chegou a contratar 6000 trabalhadores, muitos deles com suas respectivas famílias, o que significou um incremento no consumo e na renda regional, já que esses trabalhadores significavam entre 10 a 15% da população economicamente ativa da região (MDA/FAO, 2003).

Se por um lado a construção da barragem significou uma dinamização da economia regional, impulsionando o entorno próximo, Paulo Afonso (BA); Pão de Açúcar (AL), através do incremento do comércio para suprir as necessidades dos trabalhadores, há também aspectos negativos que precisam ser destacados.

Dentre os aspectos negativos, um dos principais é o fim dos ciclos das cheias que representou uma mudança para a população ribeirinha. O município de Canindé que era praticamente uma vila de pescadores teve sua principal atividade econômica restringida. Para os municípios que se encontravam rio a baixo, o principal problema foi o impacto sobre o regime de cheias e conseqüentemente a eliminação das várzeas, o que afetou a agricultura da região. Além disso, com o fim das obras a demanda artificialmente por ela criada se exauriu, produzindo uma

Page 28: Alto Sertão - SE

massa de desempregados e de sem terra, que ali se encontravam para trabalhar na obra ou no suporte da mesma.

III. População: estrutura social, dinâmica econômica e finanças municipais no Território do Alto Sertão Sergipano.

III.1. Estrutura demográfico-social

III.1.1. Dinâmica populacional

A população do Alto Sertão Sergipano é de quase 120 mil pessoas em 2000, ou aproximadamente 7% da população do estado de Sergipe. Deste total, mais de 50% se encontrava em áreas rurais, o que faz da região do sertão sergipano uma das mais rurais do nordeste, sendo que o município de Poço Redondo tem mais de 70% de sua população na área rural, tornando-o um dos mais rurais do país. Três dos seis municípios concentram mais de 60% de toda a população da região, a saber: Nossa Senhora da Glória, Poço Redondo e Porto da Folha.

O Território do Alto Sertão Sergipano teve um crescimento populacional superior ao do Estado de Sergipe e ao do Brasil na maior parte das ultimas seis décadas, salvo nos anos 50 e 80. Já Sergipe apresentou até os anos 70 performances demográficas inferiores ao Brasil, superando-o desde então. Assim, somente em duas décadas, Sergipe e Território tiveram desempenhos próximos, nas décadas de 1950 e 1990.

Tabela 4

Região 1940's 1950's 1960's 1970's 1980's 1990'sTerritório 4,8 1,4 4,9 3,8 1,2 2,1Sergipe 1,7 1,6 1,8 2,4 2,5 2,0Brasil 2,3 3,2 2,8 2,5 1,9 1,6Fonte: IBGE. Censos Demográficos, vários anos. (Cálculos do autor)

Território, Sergipe e Brasil: taxa média anual de crescimento populacional para décadas selecionadas

Acreditamos que o comportamento do Sertão Sergipano esteve ligado, na década de 1950, a ocorrência de grandes secas, nos anos 80, ao esgotamento das fronteiras agrícolas internas simultaneamente à modernização da agricultura e pecuária e, nos 90, ao assentamento de famílias de trabalhadores sem-terras pela Reforma Agrária. Há que se ter presente que na década de 50, o estado de Sergipe exibiu uma taxa de crescimento demográfico bastante pífia, ou seja, o território acompanhou a um comportamento mais global relacionado à questão climática (Maia Gomes, 2001). Já nos 80’s, chama a atenção, de um lado, o desempenho do estado, especialmente a performance de sua população urbana e o quão profunda foi o êxodo rural no Sertão, após duas décadas de desempenhos expressivos da população rural.

Assim, a região atrai população nos anos 60 e 70, diferentemente do restante do Estado e do Nordeste. A explicação é a baixa ocupação da região e a disponibilidade de terras, ou seja, a ocupação das fronteiras externas e internas. Crescem inicialmente, ou seja, nos anos 60, junto com a população, a área e o numero de estabelecimentos. Nos anos 70, esgotam-se as novas

Page 29: Alto Sertão - SE

terras, mas a população rural e o número de estabelecimentos crescem, processo típico de ocupação das chamadas fronteiras internas.

Na década de 1980 é evidente o êxodo rural, pois a população rural decai 7 pontos percentuais e a população total cresce a um ritmo bem inferior ao do estado e do país. A população urbana cresce, quase que dobrando, mas as cidades não superam a faixa dos 10 mil habitantes, não alterando, portanto, seu caráter de região rural. Diferentemente do que ocorre no Estado, onde o crescimento da população urbana é onze vezes superior ao decréscimo da população rural. Ou seja, o Território concentra em uma década um expressivo êxodo rural, associado a uma intensa urbanização em todo o Estado. Isso tudo ocorre a despeito da instalação dos assentamentos da nova republica e da implantação do Projeto Califórnia no final da década. Já o crescimento da população urbana, principalmente da cidade de Canindé, deve-se às obras da Usina Hidrelétrica de Xingó.

Nos anos 1990 ocorre outra mudança abrupta no comportamento populacional, com a sua taxa de crescimento populacional superando a nacional e, como se disse, de magnitude similar a do Estado de Sergipe, que desde os 80’s cresce mais que o País. Agora o que chama a atenção é o excelente desempenho da população rural do Sertão, que é, em parte, responsável pelo descompasso no desempenho populacional entre o Estado e o Brasil. Como bem aponta o gráfico, nos anos 70 e 90 não se assistiu a decréscimos da população rural do estado, diferentemente do que ocorreu no país como um todo, devido em grande medida ao crescimento da população rural no território. Isso decorrente, nos 70’s, da ocupação produtiva de suas terras18 e, nos 90’s, da pressão dos trabalhadores rurais sem-terra.19

Chama a atenção que o Território quando tem uma performance superior na taxa de crescimento, ocorre em quatro das seis ocasiões no meio rural: nos anos 40, 70 e 90 e nos vinte anos entre 50 e 70. Nos anos 70 e 80 o que se sobressai é a performance da população urbana, com os anos 80 tendo mais destaque, pois vem associado ao êxodo e uma pequena mudança no quadro urbano. Nossa Senhora da Glória supera os 10 mil habitantes no meio urbano e, em Poço Redondo, ultrapassa aos 7 mil. Ora, como já se disse, caracterizar isso como urbanização é um pouco forte.

Vejamos, então, o desempenho dos municípios do território nesses últimos 60 anos, apresentado na tabela 5. Como se pode ver nas décadas de 40 e 50 era uma área bastante despovoada, seguindo a descrição feita por Manuel Correia de Andrade quando fala do povoamento dos sertões nordestinos e de determinadas características de sua ocupação como a baixa densidade demográfica, a extensão das propriedades e a base produtiva na pecuária extensiva. O que, a nosso ver, são permanências do povoamento sertanejo em Sergipe, pois 18 Tanto a ocupação das fronteiras internas dos estabelecimentos nos 70`s, como a posterior – 80’s - eliminação de postos de trabalho no campo se inserem no processo de modernização conservadora da agricultura brasileira, que faz parte do projeto de desenvolvimento vitorioso no golpe de 64. Ou seja, contou-se, nessas décadas, com ações públicas voltadas a modernização da grande propriedade, com a incorporação produtiva – subsidiada – das terras incultas e de apoio a modelos poupadores de mão-de-obra. Contava-se, também, com intervenções dirigidas a mitigar os efeitos “sociais” desse modelo de desenvolvimento.19 Nos noventa o sujeito é outro: a reforma agrária, mas a despeito do que verificou se nos 70, como dissemos na nota anterior, não conta com o concerto de políticas publicas para um estilo de desenvolvimento voltado a incorporação dos assentados, pequeno proprietários e posseiros. O estado na verdade vem transferindo responsabilidade na gestão e na oferta de serviços públicos, argumentando que com isso abre-se à participação da sociedade civil na gestão das políticas e de maior eficácia pela proximidade do gestor ao agente. Ora, ambos podem e melhor ocorrem quando se fortalece a maquina publica, pois a real participação ocorre quando a vontade dos movimentos sociais esta presente na gestão e no funcionamento das várias instâncias estatais e não quando a sociedade civil passa a desempenhar tarefas publicas.

Page 30: Alto Sertão - SE

em outras áreas o adensamento populacional, com êxodo rural e urbanização, já se verificava nos anos 50. Fato é que na ocupação do território de 80% da área, entre 1940 e 1980, a área média diminui de somente 60 para 43, sendo que, para o período 50-80, quando foram ocupadas 2/3 das terras, não houve alterações no tamanho dos estabelecimentos.

Page 31: Alto Sertão - SE

Tabela 5

AnoCanindé de São

FranciscoGararu

Monte Alegre de Sergipe

Nossa Senhora da Glória

Poço Redondo

Porto da Folha Total

1970 2.837 10.689 6.730 13.716 9.298 15.924 59.194 1980 6.157 11.284 8.599 20.432 16.741 22.863 86.076 1991 11.473 10.465 9.589 23.478 20.155 23.476 98.636 2000 17.754 11.363 11.587 26.910 26.022 25.664 119.300

1970 376 1.705 1.413 3.116 784 4.085 11.479 1980 360 2.081 2.957 8.076 1.808 6.114 21.396 1991 5.322 2.379 5.030 13.675 4.682 7.078 38.166 2000 9.303 2.988 6.468 17.137 6.360 8.712 50.968

1970 2.461 8.984 5.317 10.600 8.514 11.839 47.715 1980 5.797 9.203 5.642 12.356 14.933 16.749 64.680 1991 6.151 8.086 4.559 9.803 15.473 16.398 60.470 2000 8.451 8.375 5.119 9.773 19.662 16.952 68.332

Fonte: IBGE. Censos Demográficos, vários anos.

Região do Alto Sertão Sergipano, população total, urbana e rural, por município, 1970, 1980, 1991 e 2000

Rural

Total

Urbana

Os vinte mil habitantes só são ultrapassados, nos anos 80, por Nossa Senhora da Glória e por Porto da Folha. Nas décadas seguintes, Canindé e Poço Redondo têm desempenhos expressivos, com o segundo tornando-se o município mais populoso do território e, o segundo, atinge uma população urbana superior aos 10 mil habitantes, inferior somente a de Nossa Senhora da Glória Poço Redondo e Porto da Folha, este desde os sempre e o primeiro, recentemente, são grandes municípios rurais, cujas populações chegam próximo aos 20 mil habitantes –respectivamente, 19,7 e 17,0 mil habitantes. Já Gararu é, pode-se dizer, o mesmo município dos anos 70 e, menos precisamente, dos anos 50. Ele passa de segunda municipalidade do Sertão, nos 50, para para a última em 2000. Monte Alegre é o outro município cujo desempenho populacional não se sobressai positivamente.

Page 32: Alto Sertão - SE

Gráfico 1Evolução das populações total, urbana e rural no Território do Alto Sertão Sergipano e

contribuição de cada município - 1970, 1980, 1991, 1996 e 2000

0

10

20

30

40

50

60

70

80

90

100

110

120

1970 1980 1991 1996 2000 1970 1980 1991 1996 2000 1970 1980 1991 1996 2000

Rural Urbana T ot al

situação domicílios - ano

mil

habi

tant

es

GararuMonte Alegre de SergipeCanindé de São FranciscoPorto da FolhaPoço RedondoNossa Senhora da Glória

O gráfico 1 ilustra bem as idas e vindas populacionais do sertão Sergipano, com o crescimento constante da população urbana, particularmente as de Canindé de São Francisco e Nossa Senhora da Glória e das populações rurais de Poço Redondo, Porto da Folha e Canindé, particularmente o crescimento nos anos 90 e a relativa estabilidade nos anos 80. Mais o que melhor o gráfico ilustra é o surgimento de alguma urbanidade no território nos últimos anos, com a população urbana aumentando em quase 5 vezes e se aproximando da domiciliada no meio rural.

Poço Redondo e Porto da Folha são grandes municípios rurais na área do sertão nordestino, apresentado uma das maiores populações rurais em termos absolutos e relativos quando comparada com outros municípios brasileiros.

Page 33: Alto Sertão - SE

Tabela 6População total, rural e ocupada na agricultura, densidade demográfica, número de

estabelecimentos agropecuários, áreas total e média dos estabelecimentos, áreas total e de lavouras por pessoa ocupada no Território do Alto Sertão Sergipano – 1960, 1970,

1975, 1980, 1985, 1991, 1996 e 2000.

Anos Populaçãototal rural média ocupada

Densidade demográfica

Número de estabelecimentos

ÁreaTotal média AT/PO AL/PO

1960 36.579 6.097 7,59 4.362 243,70 55.91970 59.194 47.715 9.866 24.714 12,28 8.162 405,64 49.7 16.41 1.281975 31.653 10.710 378,31 35.335.3 11.9511.95 1.111.111980 86.076 64.680 14.346 37.966 17,86 10.415 437,84 42.0 11.53 1.731985 40.957 12.112 440,30 36.4 10.75 2.011991 98.636 60.470 16.439 20,461996 101.179 55.997 16.863 39.675 20,99 11.584 387,63 33.5 9.77 1.722000 119.300 68.332 19.883 24,75Fonte: Censos Demográficos e Agropecuários – IBGE.

Essa performance de crescimento no número de estabelecimentos associado à queda na população rural, nos anos 80, mostra que a subdivisão dos estabelecimentos não impediu a saída de famílias no campo; a minifundização veio acompanhada da queda das possibilidades de trabalho na agricultura – meio rural. Cabe destacar que os efeitos do abandono do cultivo de algodão, depois da vinda (sic) do bicudo, são posteriores ao Censo de 1985, assim como a instalação do Projeto Califórnia – 1986 - e de Projetos de Assentamentos – triênio 1986/88 - que abrangeram, respectivamente, 333 e 419 famílias. A queda populacional no meio rural foi de 4,2 mil pessoas. Assistiu-se, por outro lado, um crescimento expressivo da população urbana, com um taxa de crescimento anual de 6,0%, o que significou passar 20 mil para 38 mil pessoas.

Parcela importante do crescimento urbano da região nos anos 80 se deve ao desempenho de Canindé de São Francisco, ou seja, à construção da Usina Hidrelétrica. Em 1990, segundo o Rais haviam 2,7 mil ocupados na construção civil, em Canindé, de um universo de 4,8 mil empregados formais no Território; bem diverso do dado de 1991 do Censo, em que dos residentes contam-se somente 1,5 mil pessoas de 10 anos ou mais ocupadas na construção civil. Enquanto na Rais, de 2003, situam-se em dezenas os empregados na construção civil, no Censo de 2000, a PEA ocupada na Construção civil era da mesma ordem do anterior, ou melhor, de 1,6 mil.Já nos anos 90, o êxodo rural desaparece, com a população rural crescendo a 1,4% ao ano contra 3,3% da urbana. Também, entre 1997 e 2000, foram criados 22 projetos de assentamento com 1.581 famílias, o que é representativo frente ao aumento de 2.624 domicílios rurais entre os censos 1991 e 2000. Hoje, pelos dados do final do ano passado, a área ocupada pelos assentamentos representa cerca de 15% da área total dos estabelecimentos – 1995/96 – ou dos imóveis – situação do cadastro em out/2003.

Pressão demográfica aumentou muito, tendo em conta as condições naturais e o processo de povoamento e ocupação da área. Os movimentos sociais precisam tratar dessa questão consciente que a renda do trabalho agrícola é insuficiente, até mesmo, periférica se desejarmos uma renda total que forneça segurança alimentar. As transferências governamentais mais as rendas oriundas da seguridade e as do trabalho externo ao

Page 34: Alto Sertão - SE

estabelecimento, seja agrícola ou não, são decisivas para o desenvolvimento da pequena agricultura da região.

Page 35: Alto Sertão - SE

Tabela 7Indicadores populacionais selecionados das Microrregiões Geográficas do Semi-Árido Brasileiro com Crescimento Populacional Positivo da

População Rural - 1991/2000

Microrregião GeográficaDensidade

demográfica (hab/km2)

Superfície Territorial

População Total 2000

População Rural 2000

Grau Urbanização

População Total 1991

População Rural 1991

Taxa Crescimento População

RuralAlagoana do Sertão do São Francisco – AL 52 1.337 70.061 31.271 55% 62.086 24.638 2,7%Macau – RN 24 1.849 44.836 15.162 66% 42.275 12.725 2,0%Itapetinga – BA 18 11.388 210.229 70.378 67% 179.674 61.072 1,6%Petrolina – PE 23 14.981 349.098 129.033 63% 272.090 114.116 1,4%Sergipana do Sertão do São Francisco - SE 25 5.434 135.061 75.788 44% 113.063 68.599 1,1%

Território Alto Sertão Sergipano 29 4.820 119.300 68.332 43% 98.636 60.470 1,4%Baixa Verde – RN 28 1.999 56.667 20.940 63% 50.196 19.357 0,9%Paulo Afonso – BA 12 12.166 149.749 49.976 67% 131.554 46.702 0,8%Arapiraca – AL 150 2.464 369.647 167.278 55% 326.282 156.522 0,7%Caririaçu – CE 42 1.348 57.030 32.665 43% 48.492 30.714 0,7%Juazeiro – BA 7 55.560 407.501 163.889 60% 342.550 155.878 0,6%Santana do Ipanema – AL 54 3.067 164.537 94.103 43% 145.961 90.463 0,4%Brumado – BA 17 15.413 261.835 173.816 34% 237.637 167.516 0,4%Cariri – CE 114 4.109 467.392 111.385 76% 397.491 107.942 0,3%Jeremoabo – BA 13 8.275 105.468 74.965 29% 95.723 72.697 0,3%Vitória da Conquista – BA 33 18.693 607.314 233.237 62% 525.957 227.402 0,3%Nossa Senhora das Dores – SE 46 1.264 57.941 27.067 53% 51.570 26.526 0,2%Tobias Barreto – SE 49 2.052 99.958 45.142 55% 87.439 44.570 0,1%Traipu – AL 36 957 34.837 23.608 32% 33.406 23.393 0,1%Baixo Jaguaribe – CE 29 9.748 286.680 130.149 55% 250.174 129.778 0,0%

Page 36: Alto Sertão - SE
Page 37: Alto Sertão - SE

Tabela 8Evolução da Composição Etária da População do Território

1980 - 2000Faixas de idade 1970 1980 1991 2000

homens mulheres homens Mulheres homens mulheres homens Mulheres0 a 9 18.2 18.3 17.3 17.1 16.4 16.3 14.2 13.710 a 19 11.7 12.0 13.1 13.1 12.3 11.8 12.3 11.920 a 29 6.7 7.3 6.4 6.8 8.1 7.9 8.6 8.030 a 39 3.9 4.6 4.9 5.0 4.7 4.8 5.9 5.940 a 49 3.5 3.3 3.2 3.3 3.6 3.6 3.9 3.750 a 59 2.5 2.2 2.2 2.1 2.2 2.2 2.7 2.960 a 69 1.6 1.4 1.8 1.5 1.5 1.9 1.7 1.7mais de 70 1.5 1.5 1.2 1.2 1.5 1.1 1.4 1.5Fonte: microdados do Censos Demográficos 1991 e 2000

Tabela 9Idade, percentual de homens, taxa de alfabetismo e anos médios de estudo dos “chefes”

de domicílios - pessoas de referência1991 e 2000

Município Situação domicílio

Taxa de alfabetismo

(%)

Anos médios de estudo Idade média % de Homens

1991 2000 1991 2000 1991 2000 1991 2000

Crescimento Populacional

(%)

Canindé de São FranciscoGararuMonte Alegre de SergipeNossa Senhora da GlóriaPoço RedondoPorto da Folha

rural

21 38 0,5 1,6 44 43 89 87 5127 38 0,8 1,3 44 45 86 85 2215 37 0,6 1,0 40 44 86 90 2729 29 0,7 1,0 41 46 93 91 617 38 0,6 1,5 44 44 88 87 28

35 42 1,3 1,6 44 45 90 87 10

Território Alto Sertãourbano 49 63 2,3 3,2 45 44 80 75 50rural 25 38 0,8 1,4 43 45 89 88 21total 35 49 1,4 2,3 44 44 85 82 33

Estado de Sergipeurbano 68 77 4,4 5,2 44 45 76 68 42rural 30 43 1,0 1,7 46 46 84 82 15total 56 68 3,4 4,2 45 45 78 72 33

Fonte: microdados do Censos Demográficos 1991 e 2000

III.1.2 A hierarquia interna do território

Um aspecto fundamental na análise regional e importante também no caso do território é a análise da hierarquia interna do território do Alto Sertão Sergipano. A tabela 10 mostra a evolução da população urbana nos municípios da região. A trajetória dos municípios mostra claramente como alguns evoluíram enquanto outros permaneceram estagnados.

Page 38: Alto Sertão - SE

Tabela 10População domiciliada no meio urbano nos municípios do Alto Sertão Sergipano – 1970,

1980, 1991, 1996 e 2000

Municípios 1970 1980 1991 1996 2000Canindé de São Francisco 376 360 5.322 7.877 9.303Gararu 1.705 2.081 2.379 2.482 2.988Monte Alegre de Sergipe 1.413 2.957 5.030 5.682 6.468Nossa Senhora da Glória 3.116 8.076 13.675 15.448 17.137Poço Redondo 784 1.808 4.682 5.840 6.360Porto da Folha 4.085 6.114 7.078 7.853 8.712

No que diz respeito à população urbana, as taxas de crescimento são apresentadas para o ano de 1970 em diante, devido a precariedade das informações para os anos anteriores.

Tabela 11

1970's 1980's 1990'sCanindé de São Francisco -0,43 27,74 6,40Gararu 2,01 1,22 2,56Monte Alegre 7,66 4,95 2,83Nossa Senhora da Glória 9,99 4,90 2,54Poço Redondo 8,71 9,04 3,46Porto da Folha 4,12 1,34 2,33TASS 6,42 5,40 3,27Sergipe 4,05 4,50 2,69Brasil 4,44 3,27 1,00Fonte: IBGE. Censos Demográficos, vários anos. (Cálculos do autor)

Brasil, Sergipe e TASS: taxa média anual de crescimento da população urbana para décadas selecionadas

Observa-se que as taxas de crescimento da população urbana da região são muito acentuadas, parte explicada pelo pequeno denominador, ou seja, qualquer incremento na população urbana implica em elevado crescimento, outra parcela de responsabilidade do êxodo rural e de urbanização no país. Vale lembrar que paralelo ao êxodo rural da região há um processo de minifundização da posse da terra, claramente observado na primeira metade dos nos 80, quando o numero de estabelecimentos cresce em 20% - 2.000 estabelecimentos. Os dados do Censo de 1995-96 não diferem dos dados do censo anterior – 1985, sendo que os cuidados na comparação entre esses censos nos dão mais segurança em concluir que houve um crescimento do numero de estabelecimentos na primeira metade dos anos 80, não ocorrendo mudanças significativa até meados da década passada. Faltam infelizmente dados agropecuários mais recentes para se afirmar o que se alterou no campo nesses últimos dez anos.

Canindé de São Francisco chama atenção pelas exponenciais taxas de crescimento da população urbana nos anos 80 e 90, sendo que antes se resumia a um povoado de 300/50 casas. A construção da Usina de Xingo modificou totalmente o cenário demográfico, com os municípios de Canindé, Piranhas, Olho d’Água do Casado terem, respectivamente, sextuplicado, quadruplicado e triplicado de tamanho, tendo hoje todas ao redor de 20 mil habitantes. Chama a atenção que essas elevadas performances populacionais são tributarias ora da população urbana ora da rural.

Page 39: Alto Sertão - SE

Tabela 12Taxas de crescimento populacional de municípios selecionados

Unidade Geográfica 70's 80's 90's

Alto Sertão Sergipano 3,8 1,2 2,1

Porto da Folha 3,7 0,2 1,0Poço Redondo 6,1 1,7 2,9Canindé 8,1 5,8 5,0Monte Alegre de Sergipe 2,5 1,0 2,1Nossa Senhora da Glória 4,1 1,3 1,5Gararu 0,5 -0,8 0,8

Região Xingó (1) 1,9 3,5 2,2Pão de Açúcar 1,3 1,2 1,4Piranhas 2,7 8,4 3,7Olho d'Água do Casado 4,6 4,2 1,1

Municípios Alagoanos Vizinhos a Gararu 2,2 1,6 0,2Belo Monte 2,0 2,0 -0,4Traipu 2,2 1,5 0,7

Pólos RegionaisPaulo Afonso 4,4 1,8 1,2

Delmiro Gouveia 6,2 4,0 0,5

Arapiraca 3,7 1,8 1,4

Itabaiana 2,4 1,9 1,9Propriá 0,0 1,5 1,0Aracaju 4,8 2,9 1,5

Entorno Sergipe (3) 1,0 -0,2 0,9Entorno Bahia (4) 2,1 3,4 2,1Entorno Alagoas (5) 0,4 1,3 0,6

Semi-Árido do Baixo São Francisco (2) 2,9 1,8 1,4Fonte: IBGE.Notas: (1): consideramos os municípios alagoanos vizinhos a Canindé, Poço e Porto da Folha. Há que se associar a esse grupo Delmiro Gouveia, que pelo tamanho decidiu-se tratar de modo separado.

(2): Todos municípios anteriores, salvo Arapiraca, Itabaiana, Própria e Aracaju.(3): Carira, Nossa Senhora Aparecida, Feira Nova, Graucho Cardoso e Itabi.(4): Santa Brígida e Pedro Alexandre.(5): São José da Tapera, Monteirópolis, Jacaré dos Homens e Palestina.

Page 40: Alto Sertão - SE

Figura 2

Paulo Afonso

Delmiro Gouveia

Arapiraca-AL

Própria-SE

AracajU-SE

Itabaiana-SE

1

3

2

5

6

4

BA-1

BA-2

Al-1

AL-2

AL-3

AL-4

AL-5

AL-6 AL-7

AL-8

AL-9

SE-1

SE-2

SE-3 SE-4 SE-5

Rib eiróp olis -SE

Código Município Nome do Município

BA-1 Santa Brígida BA-2 Pedro Alexandre SE-1 Itabi SE-2 Graucho Cardoso SE-3 Feira Nova SE-4 Nossa Senhora

Aparecida SE-5 Carira AL-1 Olho d’Água do

Casado AL-2 Piranhas AL-3 São José da Tapera AL-4 Pão de Açúcar AL-5 Monteirópolis AL-6 Jacaré dos Homens AL-7 Palestina AL-8 Belo Monte AL-9 Traipu

Nº Municípios Alto Sertão Sergipano

Nome do Município

1 Canindé de São Francisco

2 Poço Redondo 3 Porto da Folha 4 Gararu 5 Monte Alegre de

Sergipe 6 Nossa Senhora

da Glória

Page 41: Alto Sertão - SE

Ainda em relação à população urbana é importante mesurar a evolução do Grau de Urbanização, ou seja, a relação entre a população urbana e a população total. A evolução do grau de urbanização mostra que o Estado de Sergipe e a região em especial possuem parcela expressiva de sua população concentrada na área rural – a analise dos dados da tab acima munic AL e SE, mostra a importância rural anos 90. Isso indica dois tipos de políticas a serem adotadas na região: a primeira é de reforçar as políticas capazes de assegurar a permanência do homem do campo em seu local de residência, e a segunda, a de reforçar a rede urbana local no sentido de garantir que parcela da renda rural que hoje vaza para outros centros urbanos do Estado e do Nordeste permaneça na região realimentando a economia local.

Tabela 13

Região 1970 1980 1991 2000Canindé de São Francisco 13,3 5,8 46,4 52,4Gararu 16,0 18,4 22,7 26,3Monte Alegre de Sergipe 21,0 34,4 52,5 55,8Nossa Senhora da Glória 22,7 39,5 58,2 63,7Poço Redondo 8,4 10,8 23,2 24,4Porto da Folha 25,7 26,7 30,1 33,9TASS 19,4 24,9 38,7 42,7Sergipe 46,1 54,2 67,2 71,4Brasil 55,9 67,6 75,6 81,2Fonte: IBGE, Censo Demográfico, vários anos. (Cálculos do autor)

Brasil, Sergipe e TASS: grau de urbanização, 1970, 1980, 1991 e 2000

Segundo os indicativos de grau de urbanização a primeira sugestão seria a de reforçar a capacidade de centro urbano dos municípios de Canindé de São Francisco e de Nossa Senhora da Glória, como pólos locais, capazes de articular a economia rural e urbana, pois esse conjunto de municípios tem baixa capacidade de polarização regional, e conseqüentemente, apresentam grande vazamento de suas rendas regionais, como procuraremos demonstra nos tópicos seguintes.

Assim, a primeira hierarquia urbana, advém de um exercício simples, que consiste basicamente em ordenar os municípios segundo a participação de sua população urbana no total da população urbana da região do TASS. A tabela abaixo foi classificada segundo os dados e a participação da população urbana do Censo Demográfico 2000. É apresentada também a posição dos municípios segundo o mesmo critério para os Censos Demográficos de 1970, 1980 e 1991. Alguns aspectos chamam atenção, o primeiro diz respeito a importância que Porto da Folha tinha nos anos 1970 e como a mesma é ultrapassada nos anos subseqüentes por Nossa Senhora da Glória e Canindé de São Francisco, respectivamente. Nossa Senhora da Glória que, em 1970, figura como segundo município em população urbana da região do Território, alça a condição de primeira cidade nos anos de 1980, o que condiz com aquilo que as pessoas na região chamam de “Capital do Alto Sertão Sergipano”. Canindé de São Francisco é o município que sofre a maior evolução saindo da última posição nos anos de 1970 e 1980 e passando para a 3° e 2° posições nos anos de 1991 e 2000, respectivamente. Resultado esse cuja explicação decorre, pelo menos em parte

Page 42: Alto Sertão - SE

do processo de implantação do Projeto de Irrigação Califórnia e da Construção da Usina Hidrelétrica de Xingó.

Tabela 14

Município 1970 1980 1991 2000Nossa Senhora da Glória 2 1 1 1Canindé de São Francisco 6 6 3 2Porto da Folha 1 2 2 3Monte Alegre de Sergipe 4 3 4 4Poço Redondo 5 5 5 5Gararu 3 4 6 6Fonte: Elaboração própria

Evolução e mudança na hierarquia urbana regional segundo a participação da população urbana na população urbana total

O complexo Xingo também proporcionou impacto na infra-estrutura regional, com destaque para as rodovias com a ligação via asfalto dos outros municípios com Nossa Senhora da Glória. Esse quadro mudou o eixo de desenvolvimento do Alto Sertão diminuindo a importância do município de Propriá nas relações sociais e comerciais devido à perda de importância do transporte fluvial.

III.1.3. Trabalho e composição da renda nos municípios

Um aspecto fundamental para na elaboração de políticas públicas de corte regional é a dinâmica do mercado de trabalho e da composição da renda na região. No caso aqui se analisam dados de emprego do Ministério do Trabalho, ou seja, são captados apenas os empregos formais, o que torna a pesquisa pouco representativa para o setor agrícola e sujeita a erros para o setor de serviços e comércio informal.

Apesar destes problemas, podemos constatar a evolução da região no período de 1990 a 2003, quando o emprego total salta de 4228 para 5698, o que equivale a um crescimento de cerca 34%. Crescimento este que foi semelhante ao do Estado de Sergipe.

Alguns setores chamam atenção: a indústria de transformação que já existia em 1990 cresce no período, mas ainda precisa evoluir e aumentar sua participação no emprego da região, ai no caso principalmente a indústria ligada ao beneficiamento de produtos agropecuários da região. Isso coloca em evidência dois tipos de política: uma de regularizar as indústrias já existentes (ex. Queijarias) e outra de construir algumas indústrias locais (abatedouro, beneficiamento de grãos).

Nota-se ainda o crescimento do setor de comércio e de serviços, sendo que alguns municípios praticamente não possuíam qualquer atividade regular nestes setores, como é o caso de “Alojamento e Alimentação”, “Profissionais da área de saúde”, “Ensino” e “Serviços de Utilidade Pública”. Além disso, chama atenção o crescimento das atividades de comércio que tem se tornado cada vez mais importantes para a região.

O aspecto negativo fica por conta do setor da Construção Civil, cuja explicação em

Page 43: Alto Sertão - SE

grande medida está ligada ao fim da construção da Usina Hidrelétrica de Xingó, assim com a atividade bancária que sofre redução expressiva no número de pessoas ocupadas, cuja explicação principal se deve ao avanço tecnológico do setor bancário ao longo dos anos 90’s.

Page 44: Alto Sertão - SE

Tabela 15

Município/Região/Estado Extrativa mineral

Ind. Transformaç

ão

Serviços de Utilidade Pública

Construção civil

Comércio Instituições financeiras

Administração e técnicos

profissionais

Tansporte e comunicações

Alojamento e alimentação

Médicos, dentistas,

veterinários e outros

profissionais

Ensino Administração Pública

Outros (ignorado e agricultura)

TOTAL

Caninde de Sao Francisco 0 0 0 2.703 23 4 3 3 0 0 0 0 217 2.953Gararu 0 0 0 0 0 15 0 0 0 0 0 0 0 15Monte Alegre de Sergipe 0 0 0 1 2 10 19 0 0 0 0 69 1 102Nossa Senhora da Gloria 0 125 0 2 122 50 3 3 15 0 0 267 4 591Poco Redondo 0 0 0 0 6 28 0 0 2 0 0 0 0 36Porto da Folha 0 2 0 0 26 29 0 2 3 0 0 469 0 531TASS 0 127 0 2.706 179 136 25 8 20 0 0 805 222 4.228Total 1.235 24.757 3.342 12.763 19.556 5.128 7.576 6.010 19.955 2.348 1.566 69.086 9.210 182.532Município/Região/EstadoCaninde de Sao Francisco 3 48 77 6 41 10 330 2 90 2 1 716 39 1.365Gararu 0 0 0 0 12 0 1 2 0 0 0 489 1 505Monte Alegre de Sergipe 0 6 9 8 26 3 0 2 1 0 0 328 1 384Nossa Senhora da Gloria 0 145 21 1 297 19 9 7 81 13 37 923 57 1.610Poco Redondo 0 6 1 11 38 4 0 1 0 0 0 758 4 823Porto da Folha 55 2 16 7 48 8 2 2 14 0 6 840 11 1.011TASS 58 207 124 33 462 44 342 16 186 15 44 4.054 113 5.698Sergipe 1.609 25.988 4.117 12.998 33.297 3.099 18.647 8.062 14.724 6.982 8.375 99.472 7.741 245.111

Fonte: RAIS/MTE. 1990 e 2003.

1990

2003

TASS e Sergipe: pessoal empregado segundo setores de atividade, para 1990 e 2003

Page 45: Alto Sertão - SE

Conclui-se que a região apresentou uma evolução razoável do seu setor de serviços e comércio o que, no entanto ainda não é capaz por si só de representar um dinamismo próprio local capaz de assegurar um crescimento sustentado para a região. Reforçar a agricultura familiar, articulando-a com uma indústria de beneficiamento local pode ser uma das políticas públicas a serem apoiadas no desenvolvimento do Território do Alto Sertão Sergipano.

Trabalhando com os dados da renda do trabalho principal disponíveis nos microdados dos Censos Demográficos de 1991 e 2000, analisam-se três aspectos. O primeiro relativo à evolução da renda no período 1991-2000. O segundo aspecto diz respeito à diversificação das atividades econômicas, que corrobora os dados analisados anteriormente. Por último avaliamos a evolução da concentração da renda do trabalho principal.

A perda de dinamismo econômico

O primeiro resultado que chama atenção são as diferentes taxas de crescimento que os municípios apresentam para a renda do trabalho principal entre os anos de 1991 e 2000. Com exceção de Porto da Folha que apresentou uma taxa de crescimento média anual de 0% no período, todos os demais municípios da região e o estado de Sergipe apresentam taxas positivas de crescimento da renda do trabalho principal. Este processo de aumento da renda do trabalho principal é fruto principalmente do aumento populacional da região e da dinamização do comércio. Entretanto, a tabela abaixo que mostra a participação dos setores indica uma perda da renda do setor agrícola, o que pode ser explicado por aspecto físico-geográficos da região, cujas características não contribuem para a mecanização e o plantio com alta produtividade, e além disso, a abertura econômica que possibilitou acesso a gêneros alimentícios com preços mais competitivos. Este último resultado, no entanto, em nada contribuiu para o desenvolvimento regional. Analisando a participação do setor agrícola, extrativo e de pesca, fica claro que para todos os municípios da região do Alto Sertão Sergipano, que a renda proveniente destas atividades representava em 1991 mais de 50% de toda a renda advinda do trabalho principal sofre queda vertiginosa entre 1991 e 2000. Perda esta que é generalizada tanto para dos os municípios da região quanto para o estado. Além da agricultura a expressiva queda do setor da construção civil e de outras atividades industriais indica que setores cujo potencial de geração de renda interna apresentou baixo dinamismo no período. No sentido inverso o aumento da renda da indústria de transformação é uma das características importantes a serem destacadas. Além disso, a região vê um aumento expressivo do setor de telecomunicações e transporte, fruto da construção e ampliação das estradas e da hidrelétrica de Xingó.

Analisando os municípios individualmente, Porto da Folha, Gararu e Poço redondo são os municípios que permaneceram mais estagnados. O que não é uma surpresa quando se observa que sua população envelheceu segundo os dados do Censo Demográfico.

Page 46: Alto Sertão - SE

Tabela 16

SetoresCanindé de

São Francisco

Gararu Monte Alegre

Nossa Senhora da

Glória

Poço Redondo

Porto da Folha Sergipe

Agropecuárias, ext. vegetal e pesca 0 -7 -1 -6 -5 -7 -2Indústria de transformação 10 29 8 5 27 1 4Indústria da construção civil -6 9 0 5 -8 8 3Outras atividades industriais -10 -4 -2 9 -5 9 -8Comércio de mercadorias 32 7 19 17 19 6 5Transporte e comunicação 18 10 10 3 24 0 5Serviços auxiliares da atividade 13 20 7 -1 12 0 16Prestação de serviços 6 -1 -2 13 15 -2 -1Social(educação, saúde e outros) 24 13 4 6 12 11 4Administração Pública 14 9 17 17 3 -4 7Outras atividades 16 12 14 -1 42 2 7Total 8 1 5 6 1 0 3Fonte: Elaboração própria a partir dos Microdados do Censo Demográfico, 1991 e 2000.

selecionados, 1991-2000.Sergipe e TASS: taxa média annual de crescimento da renda bruta do trabalho principal, segundo setores

Se a taxa de crescimento do rendimento bruto do salário foi razoável para o conjunto dos municípios, isso não significou necessariamente que a região apresentou uma evolução econômica. Quando analisamos a mudança estrutural na composição do rendimento do trabalho principal nota-se claramente que a região ainda tem a maior parcela de sua renda proveniente do setor agrícola, entretanto, devido a queda da produção que pode ser constatada analisando-se os dados das Pesquisas Agrícola e Pecuária do IBGE ao longo dos anos 90, essa composição muito se alterou no período analisado. Essa queda foi compensada com um aumento da participação da renda proveniente do comércio de mercadorias, o que reforça a idéia de que a região manteve certo vigor econômico durante a década. Ainda sim, este fato isoladamente não necessariamente representa a redenção econômica da região pelo comércio, ao contrário pode indicar também que a região se tornou cada vez mais dependente de produtos externos, tendo pouca ou baixa capacidade de internalizar os efeitos de um comércio mais vigoroso. Assim, por exemplo, a região aumentou o número de produtos comercializados de baixo valor agregado, para ao mesmo tempo também aumentar o consumo de produtos industrializados cuja renda acaba não permanecendo na região. Processo este, que é semelhante aquele já analisado por Furtado (1959) em “Uma política de desenvolvimento econômico para o Nordeste20”. Ou seja, os termos de troca são desfavoráveis à região do Alto Sertão Sergipano.

Não se pode, no entanto advogar a industrialização da região com base em setores da indústria de bens de consumo ou mesmo da indústria metal-mecânica, o que não impede, no entanto que se ressalte a necessidade de articular os pequenos produtores no sentido de agregarem valor aos produtos de origem animal e vegetal que a região dispõe. Assim, uma estratégia de desenvolvimento deve por um lado observar o meio ambiente e a capacidade de suporte do mesmo a ação antrópica, em especial em um ambiente como a Caatinga, cuja fragilidade e capacidade de recuperação é lenta.

No caso dos aspectos ligados ao setor urbano da economia, observa-se claramente um crescimento do setor de serviços. A administração pública tem seu papel reforçado ao

20 Furtado (1959) demonstra que a balança comercial entre o Nordeste e o Centro-Sul é desfavorável ao primeiro, principalmente nos anos favoráveis à agricultura da região (ou seja aqueles anos em que a seca não impede a produção agropecuária).

Page 47: Alto Sertão - SE

longo dos anos 90. Assim, como o setor educacional e de saúde. Este fato é importante pois reforça a presença do estado. Entretanto, não garante que as prefeituras e órgãos de governo estaduais e federais na região estejam desempenhando suas funções de forma satisfatória. O capítulo XX faz uma análise de aspectos ligados à finanças públicas e gestão municipal, a partir do qual tem-se uma idéia do comportamento das administrações municipais nos últimos anos no que diz respeito ao cumprimento de suas obrigações com a legislação.

Por outro, lado, um setor extremamente importante para a geração de emprego e renda, especialmente no meio urbano, e que reflete em parte a dinâmica econômica mais geral da economia da região permaneceu estagnado e em alguns casos teve sua participação na renda bruta do trabalho principal diminuída no período, foi o setor da construção civil.

Tabela 17

Analisando-se a participação dos municípios na renda do trabalho principal, segundo os setores, fica patente a concentração que ocorreu durante a década de 1990. Se em 1991 a participação da renda da região era mais bem distribuída entre os municípios que compõem o TASS, em 2000 essa distribuição se altera, e a concentração em Nossa Senhora da Glória se torna evidente, em parte explicada pelo crescimento desta

Sergipe e TASS: distribuição da renda bruta do trabalho principal segundo os setores de atividade, 1991 e 2000

Setor

Canindé de São

FranciscoGararu Monte

Alegre

Nossa Senhora da Glória

Poço Redondo

Porto da Folha Sergipe

Agropecuárias, ext. vegetal e pesca 52 74 51 40 60 54 17 Indústria de transformação 2 1 2 4 1 4 8 Indústria da construção civil 12 4 7 6 19 3 6 Outras atividades industriais 2 1 2 1 0 1 7 Comércio de mercadorias 4 2 9 11 4 8 15 Transporte e comunicação 2 1 7 8 1 4 6 Serviços auxiliares da atividade econômica 2 0 1 1 1 2 3 Prestação de serviços 14 4 7 8 1 6 11 Social(educação, saúde e outros) 2 6 7 9 4 8 15 Administração Pública 6 7 5 6 9 8 9 Outras atividades 1 2 1 6 0 2 4 Total 100 100 100 100 100 100 100

Setor Canindé de São

FranciscoGararu Monte

Alegre

Nossa Senhora da Glória

Poço Redondo

Porto da Folha Sergipe

Agropecuárias, ext. vegetal e pesca 24 34 33 14 31 26 9 Indústria de transformação 5 5 4 4 7 5 9 Indústria da construção civil 4 7 4 5 9 6 6 Outras atividades industriais 0 1 1 2 0 3 3 Comércio de mercadorias 25 3 19 29 15 14 18 Transporte e comunicação 6 3 11 7 12 5 7 Serviços auxiliares da atividade econômica 3 1 3 0 1 4 9 Prestação de serviços 12 4 4 14 5 6 8 Social(educação, saúde e outros) 8 20 5 8 9 22 13 Administração Pública 10 16 14 14 10 7 14 Outras atividades 3 7 2 2 1 3 6 Total 100 100 100 100 100 100 100

1991

2000

Fonte: Elaboração própria a partir dos Microdados do Censo Demográfico, 1991 e 2000.

Page 48: Alto Sertão - SE

última, enquanto os demais municípios apresentaram taxas de crescimento anual negativa no período.

Nossa Senhora da Glória reforçou seu papel enquanto pólo regional, concentrando a maior parcela da renda do trabalho principal e a maioria dos serviços, principalmente aqueles ligados a indústria e ao comércio.

No sentido inverso foi o município de Poço Redondo, que viu sua parcela da renda do trabalho principal encolher, passando de 21% em 1991, da renda total do trabalho principal para apenas 15% em 2000. Gararu e Porto da Folha também sofreram perda absoluta e relativa na renda proveniente do trabalho principal, mas de menor envergadura, de 3% entre 1991 e 2000.

Por sua vez Monte Alegre tive pequeno crescimento na suas participações, mais por reflexo das taxas altas taxas de crescimento e do pequeno crescimento dos demais municípios. Os municípios de Canindé de São Francisco e Nossa Senhora da Glória apresentaram as taxas de crescimento mais elevadas da região reforçando suas características polarizadoras. Os dois municípios juntos são responsáveis por mais de 50% de toda a renda do trabalho gerada na região.

Tabela 18Distribuição da renda bruta do trabalho principal segundo os municípios do TASS, para os setores de atividade, 1991 e 2000

SetorCanindé de São

FranciscoGararu Monte

Alegre

Nossa Senhora da Glória

Poço Redondo

Porto da Folha TASS

Agropecuárias, ext. vegetal e pesca 18 24 13 14 14 17 100 Indústria de transformação 20 5 12 31 4 28 100 Indústria da construção civil 29 8 11 16 30 6 100 Outras atividades industriais 31 10 18 16 4 21 100 Comércio de mercadorias 12 4 20 35 8 21 100 Transporte e comunicação 12 4 24 38 5 18 100 Serviços auxiliares da atividade econômica 27 2 14 20 9 28 100 Prestação de serviços 37 10 14 23 3 14 100 Social(educação, saúde e outros) 7 17 15 30 9 22 100 Administração Pública 17 18 11 17 18 20 100 Outras atividades 11 12 5 54 0 17 100 Total 19 18 13 20 13 17 100

SetorCanindé de São

FranciscoGararu Monte

Alegre

Nossa Senhora da Glória

Poço Redondo

Porto da Folha TASS

Agropecuárias, ext. vegetal e pesca 21 11 13 21 18 16 100 Indústria de transformação 20 8 8 30 19 16 100 Indústria da construção civil 14 9 8 33 21 16 100 Outras atividades industriais 6 3 8 45 2 35 100 Comércio de mercadorias 24 1 8 48 10 9 100 Transporte e comunicação 16 3 14 34 23 10 100 Serviços auxiliares da atividade econômica 35 3 13 8 10 31 100 Prestação de serviços 26 3 4 51 7 9 100 Social(educação, saúde e outros) 15 14 4 26 11 29 100 Administração Pública 17 10 11 41 12 8 100 Outras atividades 20 18 7 32 4 18 100 Total 20 7 10 35 14 15 100

2000

Fonte: Elaboração própria a partir dos Microdados do Censo Demográfico, 1991 e 2000.

1991

Setorialmente os resultados são distintos. Nossa Senhora da Glória, no entanto, com exceção das atividades agropecuárias, extrativa, pesca; de serviços auxiliares da atividade econômica, e serviços sociais (educação, saúde, etc.) detêm 30% ou mais da

Page 49: Alto Sertão - SE

renda do trabalho principal, nos demais setores, o que mostra o quão concentrador foi o período aqui em análise.

Canindé de São Francisco apresenta boa participação em praticamente todos os setores, oscilando em torno de 20%, em alguns casos atingindo 24%, 26% e 35%. O destaque fica por conta dos serviços auxiliares à atividade econômica, a prestação de serviços e o comércio de mercadorias.

Poço Redondo diminui a sua participação a renda do trabalho principal da região, passando de 17% em 1991 para 14% em 2000. Apesar do pequeno queda, o que chama mais atenção é que setorialmente o município vê sua participação aumentar em 7 dos 11 setores analisados.

Os destaques negativo ficam por conta de Gararu e Porto da Folha. O primeiro sofre uma queda, tendo sua participação na renda do trabalho principal na região passado de 10% em 1991 para 7% em 2000. Uma queda que reflete a queda real da renda do trabalho principal. Setorialmente, o município de Gararu tem oscila negativamente em quase todos os setores. Porto da Folha, também apresenta queda expressiva na participação do trabalho principal em relação à região, passa de 21% em 1991, para 15% em 2000. Apesar da queda, o município participa com 30% da renda do trabalho principal da região em pelo menos três setores: outras atividades industriais; serviços auxiliares da atividade econômica e serviço social (saúde, educação, etc).

Evolução do terciário

Quando se faz a análise clássica da economia, sub-dividindo a mesma em três setores econômicos: primário (agropecuário, extrativo e pesca), secundário (indústria) e terciário (comércio e serviços), observa-se que o setor terciário foi o que mais aumentou sua participação na renda do trabalho principal da região. Isso nos leva a seguinte pergunta: a evolução e crescimento econômico foi tal que esta economia já se encontra num patamar de desenvolvimento superior e com uma dinâmica própria e inerente a si mesma? ou por uma falha no modelo de desenvolvimento, esta economia passou por um processo de terciarização conduzido por forças externas a ela, as quais ela se encontrava e se encontra ainda subordinada?

Com certeza, o caso da região do Alto Sertão Sergipano não foi o primeiro, por uma série de fatores intrínsecos a ela mesma. A região por motivos histórico-estruturais e físico-geográficos não foi capaz de realizar um processo de acumulação de capital capaz de que a mesma adentrasse um ciclo virtuoso de desenvolvimento econômico. Processo este, que foi conduzido por forças externas à região e cujos objetivos nunca foram o de calcar à região e à parcela mais pobre da população a um patamar de desenvolvimento superior.

Do ponto de vista prático, nota-se pela tabela abaixo, que a região alcançou uma certa estrutura urbana, que no entanto não condiz com um processo de desenvolvimento adequado. Fazendo-se uma paródia, diríamos que a região não possui a base econômica suficientemente desenvolvida para suportar e garantir dinâmica adequada ao setor terciário, ou seja, uma cabeça maior do que o seu corpo consegue sustentar.

Falta assim, articular melhor o primário e o secundário de forma a garantir um melhor

Page 50: Alto Sertão - SE

equilíbrio entre os setores econômicos da região.

Page 51: Alto Sertão - SE

Tabela 19

SetorCanindé de São

FranciscoGararu Monte

Alegre

Nossa Senhora da Glória

Poço Redondo

Porto da Folha Sergipe

Agropecuárias, ext. vegetal e pesca 52 74 51 40 60 54 17 Indústria 17 5 11 11 20 8 21 Comércio e serviços 31 21 38 49 21 38 63 Total 100 100 100 100 100 100 100

SetorCanindé de São

FranciscoGararu Monte

Alegre

Nossa Senhora da Glória

Poço Redondo

Porto da Folha Sergipe

Agropecuárias, ext. vegetal e pesca 24 34 33 14 31 26 9 Indústria 9 13 9 11 15 14 17 Comércio e serviços 67 53 58 75 53 60 74 Total 100 100 100 100 100 100 100 Fonte: Elaboração própria a partir dos Microdados do Censo Demográfico, 1991 e 2000.

TASS e Sergipe: Participação dos grandes setores na renda do trabalho principal, 1991 e 20001991

2000

Composição Regional e Setorial da Renda

A evolução e a composição setorial da renda, entre 1991 e 2000, indicam que a renda média mensal cresceu para todos os setores, exceto para o setor agrícola e para outras atividades não especificadas. No caso do setor agrícola os aspectos macroeconômicos do período pós-Plano Real explicam em parte esta queda. No entanto, a queda da renda proveniente da agricultura e pecuária também está ligada a outros fatores como a seca cujo impacto sobre a renda deste setor é substantivo.

Por outro lado a população ocupada nos setores agropecuários aumentou em quase 3 mil pessoas, ou seja, a queda da renda aliado a um aumento na população ocupada no setor fez com que a renda per capita caísse ainda mais. A perda provocou uma queda na participação da renda agrícola em relação a renda total, que passou de 51% para 26%. Ressalte-se que apesar das taxas de crescimento não serem as maiores, a agropecuária representa sozinha o maior contingente de pessoal ocupado e a maior massa salarial em termos absolutos, o que torna o setor extremamente importante, a despeito da queda.

O aumento no número de assentamentos aliado a falta de políticas públicas capazes de suprir as necessidades e criar as condições para a inserção dos assentados nos mercados é um dos pontos que tem de ser atacados na tentativa de se criarem alternativas econômico-sociais para a região.

É surpreendente como a administração pública se tornou importante para a geração de emprego e renda local na região. A renda média mensal proveniente da aumentou em 50% e o aumento da população ocupada no setor mais do que dobrou, passando de 1221 para 2629 pessoas ocupadas, um aumento de mais de 100% no período. Quando tratarmos do crescimento da folha salarial dos municípios ficará ainda mais evidenciada a importância do setor público municipal na geração de emprego e renda.

Os setores de comércio e serviços, depois da administração pública e da agropecuária,

Page 52: Alto Sertão - SE

são os mais importantes. Numa região de crescimento econômico desigual e disforme não se observa um crescimento do conjunto das atividades, o que evidencia as precariedades econômicas regionais. Em termos de importância o setor de comércio responde por 20% da renda média mensal da região, só ficando atrás da agropecuária. Em termos de pessoal ocupado é o segundo maior setor, com quase 3 mil pessoas ocupadas em 2000.

O crescimento do setor de comércio pode ser explicado tanto pelo aumento da produção regional quanto pelo crescimento demográfico. No caso da região do Alto Sertão Sergipano a segunda explicação é a principal causa da expansão do comércio, pois a região tem pequena ou nenhuma produção industrial, sendo necessário que praticamente todos os bens de consumo duráveis e não-duráveis venham de outras regiões do país. Além disso, o crescimento do setor agropecuário, principalmente ligado ao beneficiamento do leite, mas também a produção de carne e outros produtos de origem vegetal/animal e em menor importância também ao artesanato necessitam de um suporte para sua comercialização. Juntamente com o comércio, cresceram também as atividades ligadas ao transporte.

O aumento do setor de serviços sociais (saúde e educação principalmente) também é explicado pelo crescimento demográfico da região na última década. No caso da educação, o aumento da população em idade escolar e a criação de projetos de assentamento explicam o aumento no número do pessoal ocupado.

Os assentamentos são importantes para o aumento do pessoal ocupado na área de educação pois possuem escolas, criando vagas para professores e outros quadros ligados ao setor.

Page 53: Alto Sertão - SE

Tabela 20Renda Pessoal, População Ocupada e Distribuição da Renda Total e dos

Ocupados por setores de Ocupação Principal – 1991 e 2000

Ocupação PrincipalRenda ocupados

média mensal crescimento distribuição população crescimento distribuição1991 2000 1991-2000 1991 2000 1991 2000 1991-2000 1991 2000

Administração Pública 228.51 340.72 49% 7% 12% 1,221 2,629 115% 4% 7%

Agropecuária, extração vegetal e pesca 113.69 94.98 -16% 51% 26% 17,707 20,446 15% 63% 55%

Comércio de mercadorias 209.86 495.52 136% 7% 20% 1,242 2,956 138% 4% 8%

Indústria da construção civil 218.43 230.25 5% 8% 5% 1,470 1,639 11% 5% 4%

Indústria de transformação 171.08 226.40 32% 3% 5% 709 1,544 118% 3% 4%

Outras atividades 227.74 133.55 -41% 2% 3% 408 1,489 265% 1% 4%

Outras atividades industriais 91.10 438.17 381% 1% 1% 523 188 -64% 2% 1%

Prestação de serviços 146.40 382.82 161% 8% 9% 2,060 1,713 -17% 7% 5%

Serviços auxiliares da atividade econômica 258.17 275.86 7% 1% 2% 225 473 110% 1% 1%

Social (educação, saúde e outros) 152.51 305.23 100% 7% 11% 1,847 2,570 39% 7% 7%

Transporte e comunicação 305.83 328.08 7% 5% 7% 647 1,527 136% 2% 4%

Todas 143.45 198.58 38% 100% 100% 28,059 37,173 32% 100% 100%

Fonte: microdados do Censos 1991 e 2000.Nota: deflacionado pelo INPC-A, seguindo as correções de Corseuil & Foguel e o diferencial regional.

A decomposição da renda pessoal segundo a ocupação principal reflete o a importância que as aposentadorias e as transferências adquiriram entre 1991 e 2000. Na média as aposentadorias e transferências representavam 2% da renda em 1991, tendo passado para 7% da renda em 2000. Decompondo a renda para os setores urbano e rural a importância das aposentadorias e pensões fica ainda mais evidente em 2000. Na área rural de Nossa Senhora da Glória, por exemplo, 35% da renda é decorrente de aposentadorias e pensões. As transferências estão agrupadas em outras rendas e sua importância na área rural também cresce, atingindo 18% e 15% para os municípios e Gararu e Porto da Folha.

O aspecto negativo é a queda em todos os municípios da participação da renda do trabalho principal na renda total. Negativo, pois a maior parcela da população da região em 2000 encontra-se na faixa etária considerada produtiva (10 a 65 anos de idade). A população em idade ativa desocupada é maior do que aquela que se encontra ocupada.

Page 54: Alto Sertão - SE

Tabela 21Componentes da Renda Pessoal, segundo a ocupação principal no Território do

Alto Sertão Sergipano – 1991 e 2000

OcupaçãoPrincipal

1991 2000Trabalh

o principa

l

Outros trabalhos

Aposentadorias e

transferências

Outras rendas

Trabalho principal

Outros trabalhos

Aposentadorias e

transferências

Outras rendas

Administração Pública 215.52 9.02 1.44 2.53 295.16 12.56 30.33 2.66

Agropecuárias, extração vegetal e pesca

104.36 3.64 3.31 2.39 75.03 1.30 16.71 1.94

Comércio de mercadorias 200.68 3.98 2.05 3.15 471.28 10.19 7.58 6.47

Indústria da construção civil 214.44 1.99 0.43 1.58 225.15 1.10 2.64 1.37

Indústria de transformação 163.56 6.27 1.26 - 201.63 8.95 14.92 0.90

Outras atividades 224.18 3.56 - - 119.53 7.14 3.40 3.48

Outras atividades industriais 86.67 2.47 1.81 0.15 437.62 0.55 - -

Prestação de serviços 125.11 6.38 5.77 9.14 359.30 4.00 10.16 9.36

Serviços auxiliares da atividade econômica

255.62 - 2.55 - 251.55 9.88 10.50 3.92

Social (educação, saúde e outros)

123.14 26.36 1.34 1.68 275.77 19.64 4.08 5.74

Transporte e comunicação 293.32 10.50 2.01 - 316.01 6.30 4.16 1.61

Todas 130.47 7.45 2.91 2.62 176.72 5.05 13.87 2.9591% 5% 2% 2% 89% 3% 7% 1%

Fonte: microdados do Censos 1991 e 2000.Nota: deflacionado pelo INPC-A, seguindo as correções de Corseuil & Foguel e o diferencial regional.

Page 55: Alto Sertão - SE

Tabela 22Evolução da Despesa com Folha Salarial nos municípios do Alto Sertão

Sergipano – 1991 a 2003

AnosDespesa com

pessoal (R$ de final de 2003)

MunicípiosTaxas de crescimento anual

1991-1995 1996-2001 2001-2003 1991-2003

1991 2.867.347 Canindé de São Francisco 29% 45% -10% 31%1994 5.055.512 Gararu 19% 21% 23% 21%1995 10.376.756 Monte Alegre de Sergipe 32% 10% 7% 19%1996 13.121.224 Nossa Senhora da Glória 33% 10% 10% 20%1997 19.020.315 Poço Redondo 41% 27% -16% 24%1998 22.785.713 Porto da Folha 21% 19% 12% 16%1999 24.663.3202000 33.175.290 Território 29% 26% -3% 22%2003 39.411.328 - pela média anual da inflação 9% 26% -4% 14%

Fonte: Secretaria de Tesouro-MFNota: Deflacionado pelo IGP-DI acumulado no ano, salvo para o conjunto do território para o qual se deflacionou, também, pela média anual.

Tabela 23População do território do Alto Sertão Sergipano, por segundo condição da

ocupação e setor de atividade, segundo local de residência – 1991 e 2000

Condição e Setor de Atividade 1991 2000Urbano rural total urbano rural total

Trabalho principal agrícola 2.749 14.957 17.707 3.238 17.208 20.446Trabalho principal não agrícola 7.559 2.794 10.353 12.553 4.175 16.727Não ocupados maiores 10 anos 17.603 23.745 41.348 23.790 27.796 51.586Menores 10 anos 10.254 18.974 29.229 11.387 19.154 30.541

Total 38.166 60.470 98.636 50.968 68.332 119.300

III.1.4. Renda e pobreza

Um dos aspectos mais importantes quando se faz o diagnóstico de uma região com a do Alto Sertão Sergipano é avaliar o a renda – seu perfil, composição e distribuição – e a pobreza. Esta avaliação mostra quão a margem do processo está a população da região, com grande parte da população extremamente pobre .

Observa-se que a renda rural domiciliar per capita da zona rural caiu para 3 dos seis municípios, entre 1991 e 2000, a saber: Nossa Senhora da Glória, Poço Redondo e Porto da Folha. Nos outros três municípios a renda subiu, sendo que em dois deles sua variação foi relativamente pequena, Canindé de São Francisco e Gararu. Monte Alegre de Sergipe foi o município que apresentou o maior crescimento da renda domiciliar per capita do setor rural para o período 1991/2000, tendo crescido 24%. A renda per capita da zona rural de Monte Alegre passou do penúltimo lugar em 1991 para a segunda maior da zona rural em 2000, só perdendo para Canindé de São Francisco (R$ 47,80 contra R$ 52,06).

Page 56: Alto Sertão - SE

As ressalvas negativas ficam por conta da queda de Poço Redondo que tem a menor renda domiciliar per capita em 2000 e a queda expressiva de Nossa Senhora da Glória que perde 13% da renda domiciliar per capita entre 1991 e 2000.

O comportamento negativo está restrito a zona rural. O que pode ser explicado por aspectos macroeconômicos, como a queda no valor das comodities agrícolas com o plano real e aspectos produtivos locais, em função do comportamento das safras agrícolas na região na segunda metade dos anos 1990. Analisando os dados de produção para a segunda metade dos anos 1990 nota-se claramente uma queda na produção das principais lavouras da região: milho e feijão; e também uma queda no efetivo bovino e na produção leiteira, que contribuíram negativamente para a renda do meio rural. Por outro lado, a desvalorização cambial ocorrida em 1999 teve impacto significativo na produção da região. Além disso, houve um incremento absoluto na população rural da região, que pode ser explicado pela pressão demográfica ocorrida em função dos assentamentos.

Assim, faz-se a ressalva de que é necessário olhar com cautela a queda e o pequeno crescimento da renda domiciliar per capita na zona rural ao longo dos anos 1990.

O Índice de Gini mede a concentração da renda. Quanto mais próximo de zero mais bem distribuída é a renda de uma determinada região, de forma inversa quanto mais próximo de 1 mais desigual é a distribuição da renda, sendo que no limite, se for igual a 1, isto significa que 1% da população detém 100% da renda, inversamente, se ele for igual a 0, a renda é igualmente distribuída entre a população.

Entre 1991 e 2000 o Índice de Gini piora para todos os municípios, tanto no setor urbano quanto no rural. A piora é significativa, com exceção da área urbana do estado de Sergipe cujo índice já era muito ruim em 1991.

A piora no Índice de Gini aliado a um baixo crescimento da renda domiciliar per capita da área rural fez com que o número de pobres aumentasse de forma significativa, chegando a quase 50% da população rural em 2000, ou seja, 34 mil pessoas. Contribuíram para a elevação do número de pobres, principalmente os municípios de Canindé de São Francisco e Poço Redondo, reflexo da deterioração da distribuição de renda. O Índice de Gini destes municípios atingiu, respectivamente, 0,635 e 0,690 em 2000, uma variação de 41% em relação a 1991.

A despeito do grande crescimento da renda urbana, o Índice de Gini piorou. O aumento do comércio, do serviços e da administração pública contribuiu para o crescimento da renda urbana. Mas, este crescimento pouco contribuiu para uma melhor distribuição da renda, tendo Índice de Gini piorado para a zona rural quanto para a urbana.

No que diz respeito a pobreza, apesar da significativa melhora relativa, o número de pobres permaneceu mais ou menos equivalente para a área urbana, tendo caído de 12595 pessoas em 1991 para 12232 em 2000, ou seja, uma queda absoluta de 362 pessoas, que deixaram de estar abaixo da linha de pobreza aqui considerada.

A pobreza rural cresceu tanto relativamente quanto em termos absolutos. Chama atenção o município de Canindé de São Francisco, cuja população rural pobre passou

Page 57: Alto Sertão - SE

de 30% em 1991 para 46% em 2000, ou seja, de 1845 pessoas para 3887, respectivamente. Entretanto, o município de Poço Redondo apresenta os piores números absolutos, pois é o município que apresenta a maior taxa de pobreza rural e também a maior população rural. O incremento absoluto no número de pobres é de 3555 pessoas, a despeito da variação ser pequena em quando comparado à Canindé de São Francisco. Porto da Folha a despeito do aumento no número de pobres tem baixo crescimento da população rural, o que se reflete em um aumento absoluto menor no aumento do número de pobres quando comparado com os dois municípios anteriores.

Assim, no computo geral da região, o número de pobres rurais passa de 44% da população rural para 49%, o que fez com que a população rural abaixo da linha de pobreza passasse de 26 mil pessoas em 1991, para 33 mil pessoas em 2000, um aumento de quase 7 mil pessoa abaixo da linha da pobreza, na área rural.

Assim, apesar da grande queda relativa na pobreza urbana, a pobreza rural mais do que compensou, fazendo com que o número de pobres na região aumentasse em termos absolutos, apesar da queda em termos relativos. O total de pobres na região passou de 38 mil pessoas em 1991 para 45 mil pessoas em 2000. Um incremento de 7 mil pessoas.

Page 58: Alto Sertão - SE

Tabela 24Comportamento da Renda, da Desigualdade de Renda e da Percentagem de Pobres no Alto Sertão entre 1991 e 2000.

Unidade Geográfica Situação domicílioRenda domiciliar per capita (R$

09/2000) Índice de Gini % pobres (1)

1991 2000 Variação 1991 2000 variação 1991 2000 variaçãoCanindé de São FranciscoGararuMonte Alegre de SergipeNossa Senhora da GlóriaPoço RedondoPorto da Folha

Rural

50,27 52,06 4% 0,450 0,635 41% 30 46 53%44,32 47,42 7% 0,503 0,570 13% 43 43 0%38,63 47,80 24% 0,444 0,548 23% 46 43 -7%53,87 46,66 -13% 0,498 0,551 11% 38 40 5%38,07 36,92 -3% 0,490 0,690 41% 52 59 13%42,20 41,48 -2% 0,454 0,555 22% 44 47 7%

Alto Sertão SergipanoUrbano 68,46 118,47 73% 0,516 0,625 21% 33 24 -27%Rural 43,87 43,42 -1% 0,481 0,608 27% 44 49 11%Total 53,39 75,48 41% 0,509 0,650 28% 39 38 -3%

SergipeUrbano 151,93 203,26 34% 0,620 0,637 3% 19 14 -26%Rural 50,74 59,79 18% 0,449 0,527 17% 32 31 -3%Total 118,02 162,08 37% 0,624 0,652 4% 23 19 -17%

Fonte: microdados dos Censos de 1991 e 2000.Nota: (1) Considerando-se os valores da linha de pobreza extrema de R$ 24,52 propostos por Rocha & Albuquerque para o Nordeste Rural e de R$ 28,23 para o Nordeste Urbano.

Page 59: Alto Sertão - SE

Analisando a participação das transferências em relação a renda das domiciliar per capita observa-se que as mesmas adquiriram importância significativa na composição da renda das famílias, principalmente na área rural. Na área rural de Nossa Senhora da Glória e de Gararu, a participação das transferências atingiu 1/3 da renda familiar em 2000.

É necessário levar em consideração que este aumento é reflexo do envelhecimento populacional e de duas políticas distintas. No que tange ao envelhecimento populacional o aumento da população com mais de 65 anos fez com que as aposentadorias e pensões crescessem em termos absolutos e relativos, resultado este que está ligado ao antigo programa do Fundo Rural, que aposentava os trabalhadores agrícolas após os 55 anos de idade. As outras políticas são decorrentes dos programas de transferência de renda adotados a partir dos anos 1990, como o Bolsa Escola, o Programa de Erradicação do Trabalho Infantil (PETI) e o Vale Gás, dentre outros.

Assim, quando se observa uma piora na produção agropecuária associada a um aumento da pressão demográfica, cujo resultado é um aumento do número de assentamentos rurais e uma maior presença do Governo Federal na região, a aumento da importância das transferências é algo esperado. No entanto, chama-se atenção para que outras têm de ser adotadas para que os programas de transferência de renda não se tornem programas assistencialistas de longo prazo. Ou seja, é preciso pensar programas de geração de emprego e renda que sejam capazes de alavancar e criar dinâmicas próprias dentro da região.

Ressalta-se que parte destas transferências é passageira. Parcela está ligada a pensões e aposentadorias e outra parcela que aumentou de forma significativa nos últimos anos, aquela ligada aos programas de erradicação do trabalho infantil e do programa bolsa escola também o são. Ou seja, no médio prazo estas transferências tendem a diminuir, o que coloca a necessidade urgente de se pensar programas que gerem emprego e renda e possibilitem a inserção desta parcela de crianças e jovens que estará entrando no mercado de trabalho nos próximos anos. Ou ser buscam alternativas econômicas e sociais para a região ou parcela da população jovem que hoje está na região em virtude de programas de transferência de renda irá migrar na busca de alternativas.

Uma das explicações da pobreza está liga a insuficiência de terra, que condicionam as possibilidades produtivas e obriga os assentados e pequenos produtores a buscarem alternativas para seu sustento. Isso provoca um crescimento da subocupação e do trabalho precário e/ou temporário em atividades cuja remuneração é baixa.

Assim, a primeira forma de combate a pobreza está ligada a posse da terra, o que, no entanto, não garante o sustento no ambiente semi-árido e sujeito a variações climáticas capazes de provocar secas de 3 anos ou mais. O aumento da área das propriedades se torna algo imprescindível se quiser pensar em melhorar a situação desta população no longo prazo, criando alternativas para o seu desenvolvimento econômico e social.

No que tange a subocupação e o trabalho temporário será somente através da dinamização econômica e com o apoio governamental, através da simplificação da burocracia, dos programas de assistência técnica e de capacitação que será possível que parcela desta população tenha alguma condição de se inserir no mercado de trabalho.

59

Page 60: Alto Sertão - SE

Ai temos um dos pontos mais importantes para se pensar o futuro da região. A criação de um mercado de trabalho passa por dois aspectos, um ligado a demanda de mão-de-obra através da dinamização da economia local e outro ligado à oferta de mão-de-obra minimamente qualificada. Assim o investimento em educação é de fundamental importância na busca de alternativas para a região, é talvez um dos gargalos que fica a margem do processo a despeito das melhorias que apontamos no tópico seguinte.

Tabela 25Renda mensal domiciliar per capita, tamanho das famílias e importância das

transferências na renda, Alto Sertão - 1991 e 2000

Município Situação do domicílio

Renda mensal domiciliar per capita (R$ set.

2000)

Participação Transferências

Tamanho da Família

1991 2000 1991 2000 1991 2000Canindé de São FranciscoGararuMonte Alegre de SergipeNossa Senhora da GlóriaPoço RedondoPorto da Folha

rural

50,27 52,06 7% 20% 5,1 4,644,32 47,42 9% 32% 4,9 4,338,63 47,8 7% 17% 5,2 4,653,87 46,66 6% 35% 4,8 4,638,07 36,92 11% 22% 5,0 5,0

42,2 41,48 11% 30% 5,0 4,7

Territóriourbano 68,46 118,47 12% 17% 4,5 3,9rural 43,87 43,42 9% 26% 5,0 4,7total 53,39 75,48 10% 20% 4,8 4,3

Estadourbano 151,93 203,26 13% 20% 4,4 3,9rural 50,74 59,79 11% 27% 4,7 4,3total 118,02 162,08 13% 21% 4,5 4,0

Fonte: microdados do Censos Demográficos de 1991 e 2000

A tabela de composição da renda indica que a agricultura perdeu importância nos últimos anos. A participação do trabalho agrícola como principal fonte de renda no meio rural caiu ao longo dos anos 1990, passando de 68% em 1991 para apenas 36% em 2000. Nota-se que o trabalho não agrícola ganhou importância no meio rural, ou seja, o trabalhador que mora no meio rural, mas tem atividades ligadas à outros ramos como construção civil, comércio e serviços.

Atente-se também para a importância que as aposentadorias e pensões adquiriram no meio rural neste mesmo período, passaram a 25% da renda daquelas pessoas que moram na área rural, ante 9% em 1991.

60

Page 61: Alto Sertão - SE

Tabela 26Composição da renda domiciliar per capita, segundo as principais fontes de

recebimento e situação de domicílio – 1991 e 2000

Fonte de Recebimento 1991 2000urbano rural total Urbano Rural total

Trabalho principal agrícola 15% 68% 42% 8% 36% 17%Trabalho principal não agrícola 65% 17% 41% 69% 29% 56%Outros trabalhos 4% 3% 4% 3% 1% 2%Aposentadorias 12% 9% 10% 16% 25% 19%Transferências - bolsas, seguro desemprego, etc. 0% 1% 1%Outras rendas 5% 3% 4% 4% 7% 5%

Hoffman e Ney (2003) ressaltam que um dos aspectos mais importantes da análise da pobreza no meio rural diz respeito à concentração de terra e a posição na ocupação. Segundo os autores, os dois principais condicionantes da desigualdade de renda entre os agricultores são a posição na ocupação e a área no empreendimento agrícola. O que chama atenção na região, ou seja, o tamanho da área é pequeno e a precariedade nas relações de trabalho no meio agrícola contribuem para reforçar a pobreza no meio rural.

Assim, concluem estes autores, sendo o capital físico, entendido como a terra, é a variável mais importante para explicar a renda na agricultura. Isso mostra a importância de políticas a favor da melhor distribuição da terra no sentido de melhorar a distribuição da renda no meio rural.

III.1.5. Educação

Em qualquer discussão sobre crescimento e desenvolvimento econômico independente do matiz ideológico que se faça parte, a educação tem papel fundamental.

No caso do Alto Sertão Sergipano há vários pontos positivos que merecem ser destacados, o que, no entanto, reforça a necessidade de se continuar investindo na melhoria da educação, não só do ponto de vista da alfabetização e da freqüência à escola como também na melhoria das condições físicas, didáticas e de capacitação dos professores.

Dentre os pontos positivos podemos mencionar a melhoria sensível nas taxas de alfabetismo e de freqüência ã escola; a melhora na freqüência do adolescente à escola; a quase universalização da freqüência à escola das crianças dos assentamentos e a redução da taxa de analfabetismo entre os jovens. Entretanto, há ainda vários problemas que continuam sendo obstáculo a melhoria do ensino, principalmente nas áreas rurais, dentre eles podemos destacar: dificuldade de acesso à escola; falta de merenda escolar; falta de material didático adequado; baixa capacitação do professor.

A taxa de alfabetização da região do Alto Sertão Sergipano melhorou muito na década de 1990. Passou de 38% da população em 1991 para 53% em 2000. A despeito da melhora, a região apresenta ainda uma da maiores taxas de analfabetismo do estado de Sergipe e do Brasil. Analisando-se a média dos anos de estudo desta população observa-se que a evolução a alfabetização não condiz com uma melhoria na estrutura educacional da população.

61

Page 62: Alto Sertão - SE

Não resta dúvida sobre a importância da necessidade de uma pessoa saber ler e escrever, entretanto, a taxa de alfabetização que aqui se analisa diz respeito somente ao fato da pessoa saber ler e escrever, o que muitos destes alfabetizados no que a literatura convencionou chamar de alfabeto funcional.

O contraste dos anos de estudo da área rural do TASS com a área rural do estado de Sergipe mostra claramente que a região tem um forte atraso no que tange a educação. A despeito da melhoria, a tabela 27 indica que ao longo da década de 1990 uma geração inteira foi perdida sem ter tido a oportunidade de acesso a escola e as condições mínimas para a formação básica de um cidadão.

Tabela 27Evolução dos principais indicadores educacionais da população adulta (25 anos e

mais) nos municípios do Alto Sertão - 1991 a 2000

Município Situação domicílio

Taxa de alfabetismo (%) Anos médios de estudo

1991 2000 1991 2000

Crescimento populacional

(%)Canindé de São FranciscoGararuMonte Alegre de SergipeNossa Senhora da GlóriaPoço RedondoPorto da Folha

Rural

24 42 0.7 1.7 48.333 42 1.2 1.6 23.620 39 0.8 1.2 36.133 39 0.9 1.4 20.621 40 0.7 1.6 37.5

38 46 1.4 1.8 16.9

Território Alto SertãoUrbano 49 65 2.5 3.6 50.4Rural 30 42 1.0 1.6 28.1Total 38 53 1.6 2.5 37.3

Estado de SergipeUrbano 70 79 4.8 5.6 44.2Rural 33 47 1.2 2.0 17.8Total 59 70 3.7 4.6 36.2

Há um ponto positivo que é a melhora da freqüência à escola das crianças de 7 a 14 anos (Tabela 28), taxa esta que cai a partir dos 15 anos. O aumento da freqüência a escola está ligado a vários fatores: a construção de novas escolas, melhoria das condições, incentivo criado com o programa bolsa escola. As taxas saltaram de um patamar no entorno de 40% em 1991 para 92% de freqüência a escola em 2000. Esta melhora foi significativa e é um passo importante no desenvolvimento da região, principalmente na formação de cidadãos.

62

Page 63: Alto Sertão - SE

Tabela 28Freqüência à Escola das Crianças do Sertão Sergipano - 1991/2000

Município Situação domicílio

Freqüência à escola das crianças de 7 a 14 anos

1991 2000

Crescimento Populacional

(%)Canindé de São FranciscoGararuMonte Alegre de SergipeNossa Senhora da GlóriaPoço RedondoPorto da Folha

rural

33 94 3746 93 -1435 85 -848 87 030 94 2449 92 -5

Território Alto Sertãourbano 75 94 14rural 41 92 6total 54 92 9

Estado de Sergipeurbano 80 94 6rural 54 91 -8total 71 93 1

Entretanto, a partir dos 15 anos a taxa de freqüência a escola cais substancialmente. A explicação para a queda a partir dos 15 anos está ligada a dois fatos: o primeiro diz respeito a necessidade de sustento da família, o adolescente a partir dos 15 anos passa a trabalhar para ajudar a família, não que ele não o fizesse anteriormente, mas a partir desta idade, ele já tem as condições físicas de desempenhar o trabalho como um homem adulto; a outra explicação, tirada a partir das conversas realizadas e das entrevistas de campo, está ligada a dificuldade de acesso as escolas que possuem o ensino médio ou segundo grau. As escolas dos assentamentos, em sua grande maioria só atendem até a 8ª série do ensino fundamental.

Reconhecemos a importância do programa bolsa escola na manutenção dos alunos na escola, entretanto, a combinação dos dois fatores acima detalhados coloca em xeque a eficácia do programa na faixa dos 15 anos ou mais de idade. Trabalhando em atividades esporádicas e/ou permanentes permite que os ganhos sejam maiores do que aqueles provenientes pelo programa governamental.

63

Page 64: Alto Sertão - SE

Tabela 29Desempenho dos Indicadores Educacionais da População de 15 a 18 anos do Alto

Sertão - 1991/2000

Município Situação domicílio

Freqüência à escola (%)

Taxa de alfabetismo (%) % de ocupados

1991 2000 1991 2000 1991 2000

Crescimento Populaciona

l (%)Canindé de São FranciscoGararuMonte Alegre de SergipeNossa Senhora da GlóriaPoço RedondoPorto da Folha

rural

29 53 46 77 38 20 1524 60 55 80 38 22 -217 58 41 76 46 20 -331 62 54 83 36 24 -1525 60 35 84 29 12 29

31 71 52 81 40 20 11

Território Alto Sertãourbano 51 67 73 89 21 22 22rural 27 62 47 81 37 18 8total 37 64 57 84 31 20 14

Estado de Sergipeurbano 62 77 87 94 24 19 30rural 31 61 57 83 42 27 6total 52 72 76 91 30 22 21

Dentre os problemas que afetam a freqüência escola a dificuldade de acesso, a falta de condições mínimas, a necessidade de se trabalhar contribuem para que o atraso escolar na região cresça. Segundo dados do ministério da educação, se o aluno não sofrer nenhum atraso escolar espera-se que a 8ª série do ensino fundamental seja concluída com 15 anos de idade, e o 3º ano do ensino médio com 18 anos. Entretanto, devido às dificuldades e as deficiências das condições de ensino e de estudo do aluno, a região apresenta uma taxa de atraso escolar que, com exceção de Gararu, já é de 1 ano na 1ª série do ensino fundamental, progredindo até atingir a média de 2 anos de atraso escolar ao final do ensino fundamental.

Um aspecto que contribui para o atraso escolar diz respeito a deficiência das condições físicas das escolas, principalmente no meio rural, em especial naquelas que atendem aos assentamentos. Não raras às vezes também a ausência de professores e material didático adequado. O que ocorre, segundo conversas e entrevistas realizadas por esta equipe, é que alunos de 1ª a 8ª série tem assistem aula na mesma sala, em muitos casos com a mesma professora coordenando todas as turmas.

64

Page 65: Alto Sertão - SE

Tabela 30Idade mediana dos Alunos do Ensino Fundamental e Médio - Brasil, Sergipe e

Municípios Alto Sertão, 2003

Abrangência Geográfica Fundamental Médio1ª 2ª 3ª 4ª 5ª 6ª 7ª 8ª 1ª 2ª 3ª

Brasil 7 9 10 11 12 13 14 15 17 17 18Sergipe 8 9 11 12 14 14 15 16 18 19 20

Canindé de São Francisco 8 10 11 13 15 16 16 17 19 20 19Gararu 7 9 10 11 14 15 16 17 19 20 20Monte Alegre de Sergipe 8 10 11 13 14 15 16 17 18 20 22Nossa Senhora da Glória 8 10 12 12 14 15 16 17 18 18 20Poço Redondo 8 10 11 13 14 14 15 17 18 19 21Porto da Folha 8 10 11 12 14 15 15 17 19 20 21Fonte: INEP - EDUDATABRASIL

No ensino médio o atraso escolar se amplia, chegando em muitos casos aos 3 anos de atraso. As explicações para o atraso já forma colocadas anteriormente, e possivelmente só não é maior pois aqui estamos tratando do total, e como ficará demonstrado abaixo a taxa de evasão é alta principalmente nesta faixa etária.

A despeito dos vários programas de progessão continuado que tem sido implementados pelos governos Federal, Estadual e Municipal, observamos uma melhora no percentual de distorção idade-série principalmente no que tange o ensino fundamental de 1ª a 4ª série, em menor grau também para os alunos de 5ª a 8ª séries. No caso do ensino médio há municípios que apresentam melhora significativa como é o caso de Nossa Senhora da Glória, e outros que praticamente permanecem estagnados, como Porto da Folha. Mais uma vez, a evasão contribui para a melhoria do percentual de alunos com distorção idade-série no ensino médio.

Tabela 31Evolução do percentual de alunos com distorção idade-série, para níveis selecionados

- Brasil, Sergipe e Municípios do Alto Sertão.

Abrangência Geográfica 1ª a 4ª Série 5ª a 8ª Série Médio1999 2001 2003 1999 2001 2003 1999 2001 2003

Brasil 39,2 33,0 27,1 50,7 46,8 42,1 54,8 53,3 49,3Sergipe 61,2 54,3 46,7 71,0 68,6 65,6 76,7 70,4 70,2

Canindé de São Francisco 72,4 57,8 54,5 83,1 70,4 78,7 86,0 79,7 78,6Gararu 57,9 53,8 35,2 76,2 81,2 71,6 85,3 82,9 77,6Monte Alegre de Sergipe 68,8 62,0 53,0 79,0 72,1 71,8 92,6 85,3 74,2Nossa Senhora da Glória 68,3 63,1 53,1 74,0 72,8 70,1 84,0 76,9 66,0Poço Redondo 65,6 62,6 53,9 73,3 75,0 67,6 85,9 84,2 71,4Porto da Folha 65,3 58,1 50,7 79,7 75,9 67,5 86,6 81,1 85,0Fonte: INEP - EDUDATABRASIL

Observando os dados de distorção idade-série para as escolas rurais, e comparando-os com os dados totais, fica evidenciado que a melhoria na progressão é mais lenta e mais restrita aos alunos da 1ª a 4ª série do ensino fundamental. Para os alunos de 5ª a 8ª série os resultados são muito distintos, mas a distorção cai pouco, e em alguns casos aumenta,

65

Page 66: Alto Sertão - SE

como por exemplo, em Nossa Senhora da Glória. Ressalte-se que o estado de Sergipe e o Brasil também apresentam uma evolução da distorção idade-série pouco significativa para as escolas do meio rural.

De positivo podemos evidenciar os municípios de Porto da Folha e Poço Redondo que conseguiram abaixar o percentual de alunos com distorção idade-série. O primeiro conseguiu se aproximar da média do estado de Sergipe e o segundo apresentou uma taxa de distorção próxima àquela observada para o Brasil.

Tabela 32Evolução do percentual de alunos com distorção idade-série, para níveis selecionados

e em escolas rurais - Brasil, Sergipe e Municípios do Alto Sertão

Abrangência Geográfica 1ª a 4ª Série 5ª a 8ª Série Médio1999 2001 2003 1999 2001 2003 1999 2001 2003

Brasil 59,1 53,0 45,4 65,9 66,1 61,5 62,0 67,1 62,7Sergipe 68,9 61,1 52,8 80,5 78,5 74,1 74,1 69,5 72,5

Canindé de São Francisco 74,8 67,0 60,5 88,3 64,0 81,9Gararu 58,8 54,5 36,2 74,1 89,0 84,9 87,5Monte Alegre de Sergipe 70,5 65,3 54,0Nossa Senhora da Glória 73,2 71,7 61,3 71,9 86,9 83,2Poço Redondo 71,1 63,9 53,9 71,1 71,4 62,4 61,7Porto da Folha 66,5 59,4 51,3 83,6 78,6 73,3 94,4 82,7 85,5Fonte: INEP - EDUDATABRASIL

Com poucas exceções as taxas de reprovação e abandono dos municípios do Alto Sertão estão acima daquelas observadas para Sergipe e Brasil, tanto para as áreas urbanas quanto para as áreas rurais. Há dois municípios que tem taxas baixas quando observados os outros indicadores (progressão, freqüência a escola e taxa de analfabetismo): Canindé de São Francisco e Gararu. Por exemplo, a taxa de reprovação na área rural de Canindé de São Francisco, de 5ª a 8ª série é 1/3 menor do que aquela observada para o Brasil, e 2/3 menor quando comparada com o resultado do estado.

No caso de Gararu, as incongruências são ainda maiores para os alunos de 5ª a 8ª série e os do ensino médio da área urbana. A taxa de reprovação, de 5ª a 8ª série é de apenas 4,3% contra 11% e 15%, para Brasil e Sergipe, respectivamente. No caso do ensino médio a taxa de reprovação é de surpreendentes 0,7% contra 9% para o Brasil e Sergipe. A taxa de abandono para o ensino médio também é surpreendentemente menor: 1/3 e 1/2, em relação ao Brasil e a Sergipe.

66

Page 67: Alto Sertão - SE

Tabela 33Taxas de reprovação e abandono nas escolas do Alto Sertão Sergipano, segundo a

localização - 2002,

Abrangência GeográficaRural Urbana

1ª a 4ª Série 5ª a 8ª Série Médio 1ª a 4ª Série 5ª a 8ª Série Médioreprov. aband. reprov. aband. reprov. aband. reprov. aband. reprov. aband. reprov. aband.

Brasil 18.6 10.6 9.9 12.9 5.8 14.8 10.3 5.7 10.9 10.7 9.0 15.1

Sergipe 27.4 10.9 14.3 14.9 6.7 13.6 21.3 10.7 15.4 16.5 8.9 17.2

Canindé de São Francisco 21.6 16.9 6.7 20.4 24.6 13.0 14.4 18.1 6.2 23.9

Gararu 32.6 8.6 22.2 11.1 18.2 7.9 4.3 11.7 0.7 9.2

Monte Alegre de Sergipe 21.0 13.4 23.5 17.1 13.1 15.1 4.7 21.1

Nossa Senhora da Glória 30.6 14.2 32.1 16.2 17.1 19.2 14.6 24.9 2.6 14.2

Poço Redondo 25.5 13.5 13.7 12.3 2.0 13.7 26.2 7.7 18.0 11.9 0.9 8.6

Porto da Folha 25.2 11.2 13.2 10.9 8.9 22.5 24.0 19.2 11.5 16.8 2.2 15.4Fonte: INEP - EDUDATABRASIL

A evolução do número de escolas na região foi pouco significativa entre 1999 e 2003, chegando a diminuir em alguns casos, principalmente no meio rural. Além do número de escolas não ter sofrido aumento significativo nos últimos anos as condições físicas das mesmas são de suma importância. Das 304 escolas presentes na região, 266 encontram-se na zona rural e 38 na zona urbana.

Das 266 escolas que se encontram na zona rural, 42% ou 112 escolas possuem apenas 1 sala, o que significa que possivelmente estas escolas têm problemas de salas multiseriadas, alunos de diferentes séries assistindo aula na mesma sala. Este número chega a 74% e 61% das escolas rurais com apenas uma sala de aula nas zonas rurais de Monte Alegre de Sergipe e Nossa Senhora da Glória. No que diz respeito a energia, 64% das escolas rurais apresentam energia, a ausência da mesma dificulta e impede por exemplo a realização de um turno noturno, necessário principalmente aos alunos mais velhos e do ensino médio. Este número cai para cerca de 50% no caso de Canindé de São Francisco e Porto da Folha.

O aspecto mais negativo é a inexistência de bibliotecas, na zona rural elas praticamente inexistem, apenas 0,8% das escolas tem biblioteca. Por sua vez 34% das escolas área urbana tem biblioteca. Comparando as escolas segundo sua localização (urbano X rural), fica evidenciada a precariedade das primeiras em relação as segundas.

67

Page 68: Alto Sertão - SE

Tabela 34Número de escolas, segundo o nível de ensino oferecido, por localização geográfica,

2003

Rural Urbana Rural Urbana Rural Urbana Rural UrbanaBrasil 41.258 81.538 95.737 61.490 14.406 41.013 1.126 21.992Sergipe 1.073 663 1.450 721 143 466 12 193Território 144 25 264 36 30 24 5 8

Canindé de São Francisco 22 4 25 6 3 4 1Gararu 19 2 42 2 2 2 1 1Monte Alegre de Sergipe 24 1 27 4 3 1Nossa Senhora da Glória 19 6 46 10 2 6 2Poço Redondo 19 4 63 4 7 4 1 1Porto da Folha 41 8 61 10 16 5 3 2

5a a 8a Série Ensino MédioAbrangência Geográfica

Pré-escola 1a a 4a Série

Tabela 35Indicadores de Qualidade das Escolas com Ensino Fundamental, segundo a

localização - 2003.

Abrangência Geográfica Nº total escolas% de escolas com

1 sala Energia Biblioteca ÁguaBrasil rural 97.036 49,9 64,4 6,1 96,2 urbano 72.039 0,6 99,8 59,5 99,9Sergipe rural 1.729 23,2 79,1 3,4 89,7 urbano 778 0,4 100,0 38,0 100,0Território rural 266 42,1 64,3 0,8 66,9 urbano 38 - 100,0 34,2 100,0

Rural:Canindé de São Francisco 25 24,0 48,0 - 44,0Gararu 42 35,7 54,8 2,4 33,3Monte Alegre de Sergipe 27 74,1 85,2 - 33,3Nossa Senhora da Glória 46 60,9 69,6 - 100,0Poço Redondo 65 15,4 78,5 1,5 100,0Porto da Folha 61 54,1 49,2 - 54,1

III.1.6. Condições de Saúde e Habitação

Juntamente com a educação as condições de saúde e habitação perfazem os principais problemas da região no que tange a ausência de políticas sociais. A evolução da taxa de mortalidade infantil entre 1991 e 2000 foi significativa. Em municípios como Canindé de São Francisco, Gararu e Poço Redondo a taxa de mortalidade infantil caiu de um patamar

68

Page 69: Alto Sertão - SE

99 para o grupo de 1000 crianças para algo no entorno de 60 por 1000. Em Porto da Folha e Monte Alegre de Sergipe a queda na taxa de mortalidade infantil foi menor.

De qualquer forma, comparada as taxas dos municípios do Alto Sertão com aquela observada para o estado de Sergipe, as do primeiro grupo são ainda muito altas.

Tabela 36Evolução da Taxa de Fecundidade e da Mortalidade Infantil nos Municípios do Alto

Sertão - 1991 e 2000

MunicípioTaxa de

FecundidadeMortalidade até um ano

(‰)1991 2000 1991 2000

Canindé de São Francisco 5,97 3,65 99,45 61,42

Gararu 4,88 3,37 96,48 60,41Monte Alegre de Sergipe 5,17 3,89 99,45 70,39

Nossa Senhora da Glória 4,87 3,21 66,93 52,67

Poço Redondo 5,41 4,25 99,45 66,18Porto da Folha 5,07 3,56 94,79 76,19

Estado de Sergipe 3,64 2,74 65,76 48,52Fonte: IPEA/PNUD/FJP - Atlas do Desenvolvimento Humano

No que diz respeito as condições de moradia o principal problema, do ponto de vista de da saúde pública é o baixo número de domicílios com banheiros e a inexistência qualquer forma de esgotamento. No primeiro caso o percentual de domicílios com banheiros na área rural é substantivo, entretanto, no caso do esgotamento, este praticamente inexiste.

A falta de energia elétrica atinge 51% dos domicílios da área rural e 3% na área urbana. O número de domicílios rurais com geladeira é baixo comparado à zona urbana, 23% contra 66%, respectivamente. Quando comparados os indicadores rurais da região com aqueles do estado as diferenças são significativas principalmente no que tange a energia elétrica e a presença de geladeira. No restante dos quesitos as diferenças praticamente inexistem.

No que diz respeito às condições de moradia, número de moradores por cômodo e número de moradores por dormitório, os valores observados para a região são muito satisfatórios, encontrando-se num patamar considerado razoável. A diferença principal está no tamanho das famílias, 4,4 pessoas por família nos domicílios do Alto Sertão contra 4,1 para o estado de Sergipe.

69

Page 70: Alto Sertão - SE

Tabela 37Indicadores habitacionais e de densidade de moradores nos domicílios do Alto Sertão

Sergipano2000

banheiros energia esgoto geladeira comodo dormitório famíliaCanindé de São Francisco 59 58 14 22 1,1 2,4 4,7 Gararu 31 42 0 24 1,0 2,1 4,3 Monte Alegre de Sergipe 27 27 8 14 1,1 2,5 4,7 Nossa Senhora da Glória 39 50 2 23 1,0 2,3 4,5 Poço Redondo 55 46 5 20 1,1 2,4 5,0 Porto da Folha 44 56 3 30 1,0 2,2 4,7

urbano 89 97 47 66 0,8 2,0 4,0 rural 45 49 5 23 1,0 2,3 4,7 Total 66 71 25 43 0,9 2,2 4,4 urbano 89 98 58 82 0,8 2,0 4,0 rural 45 76 5 41 0,9 2,2 4,3 Total 77 92 44 71 0,8 2,1 4,1

Fonte: microdados do Censo Demográfico de 2000.

rural

Território Alto Sertão

Estado de Sergipe

MunicípioSituação domicílio

Percentagem de domicílios com Moradores por

As condições de abastecimento de água melhoraram substancialmente nos domicílios rurais entre 1991 e 2000, para todos os municípios. O município que apresenta as melhores condições é Porto da Folha, em que cerca de 45% dos domicílios rurais possuem alguma forma de rede e/ou canalização. Mas para o conjunto dos municípios, mais de 50% dos domicílios não possuem qualquer forma de abastecimento de água canalizada, nestes casos a água é proveniente do poço e/ou rio.

Gráfico 3Condições do abastecimento de água nos domicílios rurais dos municípios do Alto

Sertão Sergipano – 1991 e 2000.

0%

10%

20%

30%

40%

50%

60%

70%

80%

90%

100%

1991 2000 1991 2000 1991 2000 1991 2000 1991 2000 1991 2000

Canindé de SãoFrancisco

Gararu Monte Alegre deSergipe

Nossa Senhora daGlória

Poço Redondo Porto da Folha

rede e canalização canalização in terna e poço rede sem canalização in terna poço sem canalização in terna

III.2. A dinâmica econômica do Território do Alto Sertão Sergipano

70

Page 71: Alto Sertão - SE

III.2.1. Estrutura Fundiária e Pequena Agricultura

O Semi-árido do Baixo São Francisco Sergipano exibe uma elevada concentração da posse da terra, com uma enorme presença de pequenos estabelecimentos – menores que 10 hectares – e as terras concentradas nos maiores estabelecimentos – maiores de 100 hectares. São esses os dados que o gráfico 4 mostra, onde se verifica que, no ultimo censo agropecuário, 57% estabelecimentos contam com área inferior a 10 hectares e os 6% maiores, com área superior a 100 hectares, se apropriam de 60% da área.

Gráfico 4Distribuição dos estabelecimentos e da área ocupada, segundo estratos de área

selecionados - Alto Sertão Sergipano, 1995-96.

estabarea

menos de 10

10 a 50 ha

50 a 100

mais de 100

0 %

1 0 %

2 0 %

3 0 %

4 0 %

5 0 %

6 0 %

menos de 10 10 a 50 ha 50 a 100 m ais de 100

Fonte: Censo Agropecuário 1995-96, IBGE.

Trabalhou-se com as duas principais fontes de informação sobre a estrutura fundiária do território: o Censo Agropecuário, que capta a estrutura de posse da terra; e o Cadastro do Incra, com a estrutura de propriedade da terra. As diferenças entre essas duas bases de dados não são expressivas para o conjunto do país e das unidades da federação, apresentando, todavia, discrepâncias maiores quando se “desce” ao detalhe municipal. Isto se deve à forma como as diferenças conceituais de coleta das duas bases se apresentam no espaço territorial especifico. No caso do Censo, trabalha-se com a unidade de coleta do empreendimento agropecuário, investigando, portanto, as informações relativas à posse da terra. Já o Cadastro do Incra trata de obter os dados da propriedade das terras, isto é, dos imóveis. Soma-se a isso, o fato do ultimo Censo Agropecuário ter coletado os dados para o ano agrícola de 1995/96, enquanto os dados do Cadastro referem-se à situação em meados de 2003 das informações prestadas pelos próprios agricultores e/ou proprietários.

As diferenças que dos números situam-se, particularmente, no total de estabelecimentos muito superior ao de imóveis rurais e na maior área média das propriedades. A olhos vistos, é parte da importante da atividade agrícola da região o trabalho em terras alheias nas mais variadas formas. Assim, os dados de propriedade e posse se diferenciam, mostrando que da estrutura de propriedade para a de posse – uso econômico – da terra se

71

Page 72: Alto Sertão - SE

aprofunda a desigualdade na distribuição da posse da terra, com a proliferação dos minifúndios, evidente na diferença entre os 1.961 imóveis e os 6.615 estabelecimentos desse tamanho. Diferença essa superior a diferença global entre estabelecimentos e imóveis.

Todavia, essas particularidades e diferenças não implicam em cenários fundiários muito diversos, e, como se pode derivar do dito acima, a diferença entre Censo e Incra exibe de maneira mais aguda a subocupação da população pelo acesso restrito e precário a terra. Assim, em ambas bases de dados, têm-se elevados níveis de concentração fundiária, com a predominância de agricultores com terra insuficiente, grande parte deles não proprietários.

Considerando o tão propalado limite de 100 hectares para o desenvolvimento rentável – mercantil e sustentável – da agricultura do semi-árido nordestino, dadas as condições ambientais, citado em Maia Gomes, Leite e ... é preocupante o percentual de agricultores com menos de 10 ha, que respondem por mais da metade dos estabelecimentos. Associando-se os estabelecimentos com área entre 10 e 50 ha, a participação alcança a 86% dos estabelecimentos e pouco mais de 1/4 da área. Já nos dados do INCRA, a participação dos imóveis menores que 50 ha são muito semelhantes ao dos Censos Agropecuários mais recentes, chamando a atenção que se invertem a importância dos imóveis com menos de 10 ha e os com área entre 10 e 50 ha. Sobressaem-se os maiores que representam mais da metade e ocupam mais de 1/5 da área. Assim, parece-nos que há um parcelamento das pequenas propriedades para o trabalho agrícola, com os imóveis entre 10 e 50 ha subdividindo-se em menores parcelas para o desenvolvimento das atividades agro-pastoris.

Tabela 38Evolução da Estrutura de Distribuição da Posse da Terra – 1960, 1970, 1975, 1980,

1985 e 1995;96 – e dos Imóveis Rurais, em 2003 no Alto Sertão Sergipano.

AnosMenos de 10 ha De 10 a 50 ha De 50 a 100 ha Acima de 100 ha Acima de 1000 ha

estab. área estab. área estab. área estab. área Estab. área1960 28,7% 2,5% 48,1% 21,8% 12,6% 17,3% 10,7% 58,4% 0,3% 7,8%1970 45,7% 3,2% 35,5% 17,3% 10,1% 14,5% 8,7% 65,0% 0,4% 22,0%1975 59,6% 4,4% 26,5% 18,6% 7,1% 14,1% 6,8% 62,8% 0,3% 18,9%1980 51,1% 4,5% 32,5% 18,7% 8,9% 14,9% 7,6% 61,9% 0,4% 22,9%1985 58,3% 5,0% 27,8% 18,8% 7,1% 13,9% 6,8% 62,3% 0,3% 19,1%

1995/96 57,1% 5,0% 30,4% 22,0% 6,6% 14,0% 5,9% 59,0% 0,2% 14,9%

Imóveis 2003 27,4% 2,9% 52,6% 24,8% 11,1% 14,8% 8,9% 57,5% 0,5% 16,5%

Fonte: Censos Agrícolas e Agropecuários e Cadastro do Incra (ago/2003)

É fato que a razão entre população rural e terras agricultáveis mostrem-se bastante elevada no semi-árido nordestino considerando o tamanho mínimo para a atividade agro-pastoril em 100 ha e a densidade limite, segundo o GTDN, de 20 hab/km2. Seguindo a contabilidade de Maia Gomes, ou seja, dividindo a área agriculturável (no caso aqui, para facilitar a área dos imóveis) pelo numero de domicílios rurais, tem-se, no Alto Sertão Sergipano, esta razão em 26 ha – 80 tarefas, sendo a área média dos estabelecimentos de 35 ha, ou seja, 4 e 3 vezes inferior ao limite dos 100 ha. Já a pressão demográfica atinge a 29 hab/km2, com 60% da população rural. Agora, se é verdade que a irrigação amplia consideravelmente a produtividade do trabalho e, portanto, se coloca como um caminho

72

Page 73: Alto Sertão - SE

evidente para o problema da subocupacao, resta se perguntar: como faze-lo tendo em conta que somente 20% da área é irrigável para culturas permanentes e olerícolas, ou melhor, nos moldes dos perímetros irrigados do médio são Francisco. Não seria razoável pensar a irrigação como o fornecimento de água para o consumo humano, animal e de manejo de pastagens, que permitisse uma diminuição da área média requerida para um modelo de pecuária mista com lavouras de subsistência A pressão demográfica, por outro lado, não é tão superior ao limite, considerando, de um lado, o peso das populações rurais, e, de outro, que o crescimento do setor público vem ampliando as fontes de renda urbanas e não agrícolas – comercio e serviços.

É estranho que no sertão sergipano os pequenos queiram fazer pecuária, apesar a insuficiência de área, e sejam considerados inaptos para a irrigação, pois esta é de caráter empresarial. Assim, as possibilidades da agricultura de baixa renda são a marginalidade, tornando-se demanda social, e o emprego fora da propriedade – particularmente, nos empreendimentos irrigados. Mas, porque não atender ao sonho dos pequenos, conceder 100 tarefas de terra com água para a formação e manejo de pastagens (capoeiras) para a alimentação animal, transformando-os em pequenos pecuaristas; isso em área inferior aos tão discorridos 100 ha. Isso nos parece que inclui sócio e economicamente essa população, possibilitando aproveitar melhor ainda o aumento da economia do setor publico que resulta da descentralização das ações publicas, com o aumento das transferências aos pequenos municípios, da conquista e do crescimento da previdência social rural, da criação massiva de assentamentos rurais e do incremento, mais recente, dos programas de transferência de renda, particularmente o Bolsa Família.

A evolução da estrutura da posse da terra – tabelas 38 e 39 – não apresenta grandes alterações após a apropriação total das terras nos anos 60. Desde então, o Índice de Gini e as participações na área total dos 50% mais pobres e dos 10, 5 e 1% mais ricos são bastante semelhantes, havendo um subdivisão generalizada dos estabelecimentos durante os anos 70, ou seja, a queda da área media dos estabelecimentos. Depois de 1970, há diminuição de participação dos estabelecimentos com área superior a 10 ha, ou seja, é minifundização e nos estratos superiores a preservação da área apropriada com ganhos no estrato dos pequenos estabelecimentos, com área entre 10 e 50 ha.

Tabela 39Número e Área Total, Média e Mediana dos Estabelecimentos e dos Imóveis Rurais, Índice de Gini e Parcelas apropriadas da área total pelos 50% mais pobres e pelos

10%, 5% e 1% mais ricos.Alto Sertão Sergipano, 1960, 1970, 1975, 1980, 1985 e 1995-96 (estabelecimentos) e

2003 (imóveis)

Anos Numero Área Parcela apropriadaTotal Média Mediana 50- 10+ 5+ 1+ Índice de Gini

1960 4.362 225.462 51,7 19,2 8,5 57,1 43,2 18,2 0,6841970 8.162 405.638 49,7 12,5 4,1 67,4 55,5 31,5 0,7801975 10.710 378.312 35,3 5,2 2,4 70,2 56,8 31,0 0,8101980 10.415 437.830 42,0 9,6 4,2 67,0 54,6 31,9 0,7791985 12.112 440.294 36,4 6,6 3,1 69,8 56,6 31,6 0,802

1995/96 11.584 387.627 33,5 6,9 3,2 68,7 56,0 30,0 0,793

INCRA 7.164 382.999 53,5 20,5 9,2 59,5 48,2 24,7 0,688Fonte: Censo Agrícolas e Agropecuários IBGE e Cadastro do Incra (julho 03)

73

Page 74: Alto Sertão - SE

Ora nessa situação a desapropriação dos grandes imóveis deve, sem dúvida, ter afetado a estrutura fundiária e de posse da terra na região. Infelizmente parece que o Censo Agropecuário não mais ocorrerá, impedindo se ter, no caso do Alto Sertão, um retrato mais apurado da nova realidade fundiária após vinte anos de luta pela terra. Os dados do Cadastro do Incra, de meados de 2003, podem ser manuseados, de maneira a imaginar o cenário posterior a implantação de grande parte dos assentados. Mas, como vimos, ha entre o Cadastro e os dados do Censo uma mudança bastante profunda, com o “aparecimento” de cinco mil minifúndios, o que é de se esperar a Reforma Agrária tenha seus efeitos, pois parte desses “novos” minifundistas é beneficiária da Reforma Agrária. Assim a simples adição do numero de famílias assentadas e a retirada dos imóveis situados nos estratos superiores – acima de 1000 ha – deve ser interpretada com cuidado. No caso do Cadastro, o exercício incorre em menos arbitrariedades, pois se esta trabalhando com conceitos semelhantes, o lote da reforma agrária e o imóvel rural. Já no Censo, a incorporação dos assentados como novos estabelecimentos, sem nenhuma contrapartida além da diminuição dos grandes, é problemática, há entre os estabelecimentos parcela importante do publico beneficiário da reforma agrária. Ora, é de se esperar que junto ao incremento dos imóveis entre 10 e 20 ha – tamanho dos lotes - e à queda dos maiores imóveis com mais de 1000 ha, ocorra queda nos estabelecimentos com menos de 10 ha, pois parcela deles - parceiros, ocupantes e arrendatários – tornam-se assentados. As estimativas dos impactos da reforma agrária no território, apresentadas a seguir, são avaliadas com a cautela necessária, mas, vale adiantar, que elas mostram que a alteração do quadro fundiário, visando eliminar a sub-utilização das terras e o minifúndio, passa pelos instrumentos da desapropriação, da compra, da regularização e de reordenamento fundiários.

Tabela 40Estimativa dos efeitos da Reforma Agrária nos Indicadores de concentração da posse

e da propriedade da terraAlto Sertão Sergipano

Fontes Censo Cadastro Incra1995-96 estimativa RA 2003 Estimativa RA

Numero estabelecimentos 11.584 14.122 7.164 9.701

Áreatotal 387.627 387.627 382.999 382.991media 33,5 27,4 53,5 39,5mediana 6,9 14,7 20,5 19,9

Parcela apropriada

50- 3,2 6,6 9,2 14,310+ 68,7 60,2 59,5 52,65+ 56,0 47,5 48,2 41,01+ 30,0 22,1 24,7 19,6

Índice de Gini 0,793 0,710 0,688 0,604

Abaixo de 10 ha % estab 57,1 46,8 27,4 20,2% area 5,0 5,0 2,9 2,9

Acima de 1000 ha % estab 0,2 0,1 0,5 0,1% área 14,9 2,4 16,5 3,8

Fonte: Censo Agropecuário 1995-96, do IBGE, e Cadastro do Incra, consulta em junho 2003.Hipóteses: foram considerados os projetos criados entre 1995 e 2005, eliminando-se os estabelecimentos ou os imóveis maiores que 1000 hectares e agregando-se novos produtores ou proprietários. Desses restam no Censo 7 estabelecimentos e no Cadastro 11 imóveis. Todos os assentados tornaram-se produtores ou proprietários na faixa de 10 a 20 hectares, mais especificamente 19 ha de área média.

Na rica analise apresentada por Gustavo Maia Gomes há momentos em que o autor erra na mão ao buscar mostrar quão forte são os limites ao crescimento no semi-árido brasileiro,

74

Page 75: Alto Sertão - SE

tendo a agricultura como base econômica e com uma pressão demográfica relativamente elevada dada às condições naturais. Ora para apontar que não ha terras para toda a população rural no semi-árido hoje, ou seja, preservando-se a base técnica, assim o tamanho mínimo de 100 ha, o autor diminui a importância da concentração fundiária como determinante da pobreza regional. A distribuição de terras é de fundamental importância, haja vista o tamanho da população rural e, como veremos, da pequena propriedade e, principalmente, dos pequenos estabelecimentos - a agricultura de baixa renda.

O Professor Rodolfo Hoffmann em seguidos artigos, ao longo dos últimos anos, vem mostrando as inter-relações entre desigualdade na terra e desenvolvimento social e entre pobreza e insuficiência de terra. No primeiro caso, investigou-se a associação entre os indicadores de concentração fundiária e os de grau de desenvolvimento humano, como mortalidade infantil e freqüência a escola.

Já nos trabalhos mais recentes a questão é mostrar o quão são importantes as variáveis de capital físico e status socioeconômico na determinação dos rendimentos, o que diminui o evidente e fundamental impacto da escolaridade na renda e pobreza.

“ ... a posse da terra está, em grande medida, associada à área herdada e o capital físico é o fator de maior efeito na conformação da renda. No modelo mais completo, o qual inclui proxies para a riqueza das pessoas, as contribuições marginais da posição na ocupação (6,3%) e do logaritmo da área do empreendimento (7,2%), para a explicação das variações no logaritmo da renda de todos os trabalho das pessoas ocupadas na agricultura, são maiores do que as das demais variáveis. O valor da contribuição marginal do capital físico (posição na ocupação e área do empreendimento) é de 19,4%, o quádruplo do valor da contribuição da escolaridade (4,8%). Isso pode ser, em parte, atribuído à enorme concentração fundiária.“O coeficiente da área do empreendimento indica um aumento, em média, de 0,14% na renda, quando ocorre um crescimento de 1% na área do empreendimento. ... Se não for descontado o efeito da área, ou seja, se não for incluído o logaritmo da área na equação de rendimentos, o ganho dos conta-própria tende a ser 10,1% superior ao da categoria de empregados”.

“Podemos ainda observar que a inclusão das duas proxies do capital físico na equação de rendimentos para a agricultura provocou uma forte redução do valor do rendimento esperado dos agricultores residentes em cada região em comparação aos residentes no Nordeste. A redução se deve ao fato de a área média dos empreendimentos das pessoas residentes no Nordeste ser muito inferior à área média das pessoas residentes nas demais regiões. A região ainda assim é um condicionante importante do rendimento agrícola, por causa dos diferenciais de nível técnico e produtividade, entre outros aspectos ligados às disparidades regionais”.

“Na agricultura, a posse da terra está associada à área herdade e o capital físico é o principal determinante da renda. O peso da escolaridade na conformação da renda agrícola, por sua vez, é bem menor. Podemos então considerar que a influência direta da condição socioeconômica da família de origem sobre o rendimento, provocada pela transferência intergeracional da riqueza, é significativa, e que a inclusão da escolaridade do pai, da escolaridade da mãe e do SSE ocupacional do pai, ao reduzir o coeficiente da escolaridade, o aproximou do seu valor real.

75

Page 76: Alto Sertão - SE

“A superestimação do efeito da escolaridade nas equações de rendimentos ajustadas para as pessoas ocupadas a economia brasileira como um todo também ocorre [ver Lam e Schoeni (1993) e Ueda (2001)]. Isso pode levar a uma exagero na avaliação da eficácia de uma política de democratização do acesso ao ensino na redução da desigualdade na distribuição da renda. De qualquer maneira, a educação, seja na agricultura, seja nos outros setores de atividade, é, sem dúvida, um dos principais determinantes da renda. A expansão do sistema de ensino, aliada a uma redução da heterogeneidade educacional, representa um instrumento bastante eficaz no combate à desigualdade e à pobreza no Brasil”.

“O valor da contribuição marginal do capital físico (posição na ocupação e área do empreendimento) é de 19,4%, o quádruplo da contribuição da escolaridade (4,8%). Isso mostra a enorme eficácia potencial de políticas a favor da redução da desigualdade na distribuição da posse da terra ao reduzir a desigualdade de rendimentos na agricultura, em combinação com uma regulamentação mais eficiente das relações de trabalho no setor”.

“Com base em equações de rendimentos ajustadas a dados da PNAD de 1997, Hoffmann (2000) verifica que para pessoas ocupadas na indústria e nos serviços a contribuição marginal da escolaridade é cerca de sete vezes maior do que a contribuição da posição na ocupação, ao passo que para pessoas ocupadas na agricultura a contribuição marginal da posição na ocupação é quase duas vezes maior do que a contribuição da escolaridade”.

“..., a importância das diferenças na área dos empreendimentos na parcela explicada da renda, nas regressões para todas as pessoas ocupadas na agricultura, é 9,2%, a maior de todos os fatores analisados. O coeficiente da área é a elasticidade do rendimento em relação à quantidade de terra. ..., ele indica que 1% a mais na área do empreendimento eleva a renda esperada, em média, 0,16%.

“Com a inclusão da área dos empreendimentos na regressão, também há uma forte redução no valor do rendimento esperado dos agricultores residentes em cada região,em relação aos residentes no Nordeste, o qual é tomado como base. A queda pode ser explicada pelo fato de a área média dos empreendimentos das pessoas residentes no Nordeste (21,5 ha) ser muito inferior à área média das pessoas residentes na região Norte, Centro-Oeste, Sudeste exceto o estado de São Paulo, Sul, e o estado de São Paulo. Ainda assim a região é um condicionante importante do rendimento agrícola, por causa dos diferenciais de nível técnico, produtividade, entre outros aspectos ligados às disparidades regionais”.

Del Grossi (ano) ao discutir a pobreza rural brasileira, , após definir o valor da linha de pobreza, investigar os tipos de pobreza, na sua nomenclatura “subgrupos das famílias rurais pobres”. Seleciona algumas variáveis socioeconômicas da população pobre, ou melhor: o acesso a terra – sem terra, a insuficiência de área – pouca terra; o tipo, grau e remuneração da ocupação – procurando emprego, sub-ocupadas e mal remuneradas; a formalização do trabalho – carteira assinada - e a concessão de aposentadorias. Sobressaem-se negativamente a insuficiência das terras, a precariedade no acesso, a baixa remuneração tanto das jornadas de trabalho reduzidas (conceito de subocupação) com nas extensas (conceito de má remuneração). e positivamente as aposentadorias.

A nosso ver dois fatores, ligados a estrutura de distribuição da posse da terra, são de fundamental importância na determinação das situações de pobreza no semi árido sergipano: a insuficiência e precariedade do acesso a terra e sucedâneo disso a sub-ocupação da população rural. Como atacá-los: distribuindo terras, pois ao atender a

76

Page 77: Alto Sertão - SE

demanda de terras da massa trabalhadora rural, cujo emprego na grande propriedade e o trabalho como parceiro e arrendatário ano é insuficiente na ocupação “plena” dessa força de trabalho, serão ampliadas as possibilidades de trabalho, seja o ligado diretamente à produção seja o externo à propriedade. Agora há de se notar que o número de minifúndios é um grande problema, cuja solução não se esgota na desapropriação de grandes proprietários e no assentamento de trabalhadores rurais, uma vez que somente uma parcela dos minifundistas - os posseiros, parceiros e arrendatários – foi beneficiado direta ou indiretamente – filho que trabalhava junto recebeu lote –, havendo aqueles que desejam – e necessitam - que sua área fosse maior e não outra área. Assim, uma das políticas que deveriam ser implementadas era de terminar com o minifúndio, com a ampliação das áreas pela aquisição de terras, ou seja, de reordenamento do espaço fundiário: ao lado de um assentamento, uma comunidade reorganizada – com sua ampliação física pela compra de terras de médios proprietários, da saída de alguns, que é vizinha da pequena e média propriedade local. Isso, contudo, não seria suficiente para resolver o complicado obstáculo no semi-árido brasileiro: relativamente populoso dado seu caráter rural e agrícola. Há que se buscar outras soluções para a baixa ocupação. A irrigação é sem duvida um caminho, pois amplia enormemente a produtividade do trabalho e o rendimento da terra. Agora cabe colocar em debate qual o modelo de irrigação que será desenvolvido, pensando em projetos que abranjam maiores áreas para usos menos intensivos água. Não cabe pensar num grande capoeirão do sertão ao invés de perímetros irrigados isolados e com dúvidas quanto à sua capacidade distributiva.

Na tabela 41 encontram-se resumidas as informações acerca da distribuição dos imóveis rurais, segundo estratos de área e condição de acesso a terra, tanto para o território do Alto Sertão Sergipano como para o conjunto do estado. Os imóveis rurais com menos de 50 hectares perfazem, no Alto Sertão e no estado de Sergipe, 80% e 89% do total dos imóveis, respectivamente, Apropriam-se, no entanto, de somente 28% e 31% da área cadastrada. No outro extremo, os estabelecimentos com mais de 100 hectares respondem por 9% do total dos imóveis do Alto Sertão e por 5% no caso do estado, apropriando-se, respectivamente, por 58% e 55% da área cadastrada. Esses dados mostram o quão concentrada é a propriedade da terra no Alto Sertão e no Estado de Sergipe.

Tabela 41Número de imóveis rurais e área total, segundo condição de domínio e por estratos de

área total, no alto sertão sergipano e no estado de Sergipe – 2003.

Variáveis

Imóveis Área

Total Propriedade

MistaPosse e

Propriedade

Posse Total Propriedade

MistoPropriedad

e

MistoPosse Posse

Território Alto Sertãoaté 10 ha 1.961 395 12 1.554 11.033 2.465 66 32 8.47010 a 50 ha 3.768 1.999 136 1.633 95.016 54.810 2.586 1.526 36.09550 a 100 ha 797 641 74 82 56.543 45.379 3.884 1.549 5.731100 a 500 ha 539 452 55 32 109.705 93.060 7.923 2.659 6.064mais de 500

ha 99 87 9 3 110.694 97.893 7.675 3.176 1.951

Total Território 7.164 3.574 286 3.304 382.991 293.606 22.133 8.941 58.310

77

Page 78: Alto Sertão - SE

part. % estado 12 11 15 14 23 23 29 28 24

Estado de Sergipeaté 50 ha 51.552 27.270 1.358 22.924 506.477 313.512 14.568 9.524 168.87250 a 100 ha 3.163 2.571 263 329 222.373 181.230 13.170 5.596 22.377mais de 100 ha 2.931 2.479 237 215 901.647 782.183 47.919 16.733 54.813

Total Estado 57.646 32.320 1.858 23.468 1.630.496 1.276.925 75.656 31.853 246.062Fonte: Cadastro do Incra – situação em agosto de 2003.

Interessante notar que a importância do território em termos da participação no número de imóveis e na área apropriada, independente da condição de acesso a terra, situa-se ao redor de 13% e 24%, respectivamente.

Observa-se pelos dados da tabela 42 que os imóveis localizados no Alto Sertão Sergipano apresentam áreas médias superiores às do estado, qualquer que seja a forma de acesso a propriedade. É fato, também, que as áreas médias das posses são significativamente inferiores as de propriedade, principalmente, no território do Alto Sertão Sergipano.

Tabela 42Área média dos imóveis rurais, segundo tipo de domínio e estratos de área, no alto

sertão sergipano e no estado de Sergipe – 2003.

Tipo de imóvel Total Propriedade Posses-mistas PossesAlto Sertão

até 50 ha 19 24 28 1450 a 100 ha 71 71 73 70mais de 100 ha 345 354 335 229

total 53 82 109 18

Estado de Sergipeaté 50 ha 10 11 18 750 a 100 ha 70 70 71 68mais de 100 ha 308 316 273 255

total 28 40 58 10Fonte: Cadastro do Incra, situação em agosto de 2003.

Os dados do Cadastro do Incra apontam, também, para o fato do acesso precário a terra ser muito mais comum nos imóveis menores, o que fica patente ao se comparar a participações dos imóveis desse tamanho no universo de todos imóveis e no subconjunto das posses. Concretamente, os imóveis com área inferior a 10 hectares perfazem 27% de todos os imóveis e 47% das posses. Ademais, 96% das posses do território do Alto Sertão Sergipano têm área inferior a 50 hectares, com uma área média de 14 hectares (tabela 42).

Vejamos, agora, a importância do segmento familiar na agropecuária do território. Para tanto, lançaremos mão das estimativas realizadas em estudos desenvolvidos, em 2001, no âmbito do convênio FAO/INCRA. Em ambos estudos 21, com base no Censo 21 Guanziroli, Carlos Enrique & Cardim. Silvia E. de C. S. (coord.). O Novo Retrato da Agricultura Familiar no Brasil: O Brasil Redescoberto.Ministério do Desenvolvimento Agrário – Projeto de Cooperação Técnica INCRA/FAO. Brasília, fevereiro de 2000. Di Sabbato, Alberto. O público-alvo do crédito rural do

78

Page 79: Alto Sertão - SE

Agropecuários, identificaram-se os agricultores familiares e o público potencialmente beneficiário do Pronaf, a partir do emprego de critérios que delimitasse esses públicos. Consideraram-se agricultores familiares àqueles estabelecimentos em que predomina o uso de mão-de-obra familiar, contasse com área inferior a 15 módulos fiscais regionais e que a administração do empreendimento fosse realizado por membro da família residente nos estabelecimentos. Quanto aos pronafianos, aplicaram-se os critérios delimitadores dos grupos de beneficiários, ou seja, restringiu-se o limite de área a quatro módulos e a utilização de mão-de-obra assalariada – permanente e temporária – e os níveis de renda aos parâmetros constantes do Plano Safra 1999/2000.

A tabela 43 mostra claramente a predominância da agricultura familiar, de modo especial dos estabelecimentos familiares mais pobres, quais sejam, os delimitados no grupo B. Esses, cuja renda bruta anual é inferior à R$ 1.500, representavam 53% de todos os estabelecimentos agropecuários existentes em 1995/96. Agregando-se os agricultores classificados no grupo C, tem-se que 84% dos agricultores do alto sertão sergipano contam com renda anual bruta inferior à R$ 8.000. Por outro lado, os agricultores dos grupos B e C apropriam-se de tão somente 11% e 25% da área total, respectivamente.

Tabela 43Estabelecimentos e área total dos estabelecimentos agropecuários, segundo tipos de

produtores, nos municípios do alto sertão sergipano – 1995/96.

MunicípiosEstabelecimentos Área

Total Familia-res Pronaf Gr. B Gr. C Gr. D Total Família

-res Pronaf Gr. B Gr. C Gr. D

Canindé de São Francisco 1.363 1.260 1.204 777 374 53 70.074 22.695 13.264 2.814 7.659 2.790

Gararu 2.196 2.004 1.824 1.195 566 63 52.766 36.076 30.731 6.976 18.052 5.702Monte Alegre de Sergipe 1.042 980 950 530 359 61 33.839 20.532 18.751 4.015 10.001 4.735

Nossa Senhora da Glória 2.738 2.523 2.459 1.715 647 97 69.263 37.818 32.171 9.400 16.189 6.583

Poço Redondo 2.071 1.931 1.813 1.059 688 66 87.502 41.879 37.494 10.417 22.177 4.900Porto da Folha 2.493 2.245 2.225 1.065 1.022 138 74.182 47.576 40.780 7.309 24.115 9.355

Total Território 11.903 10.943 10.475 6.341 3.656 478 387.626 206.577 173.190 40.932 98.194 34.065

Total Estado 99.774 89.983 84.510 61.277 20.923 2.310 1.702.628 780.282 595.263 231.530 284.695 79.038

Participação % território 12 12 12 10 17 21 23 26 29 18 34 43

Fonte: Di Sabbato, 2000.

A importância do território no estado em termos do número e da área ocupada pelos estabelecimentos situa-se, respectivamente, em 12% e 23%, não se alterando muito quando de considera o segmento familiar e pronafiano. Sobressai-se quando se consideram os agricultores pronafianos dos grupos C e D, especialmente para esses últimos. Nesse caso – grupo D, o território responde por 21% dos estabelecimentos do estado e por 43% da área por eles ocupada. Situação semelhante se verifica para os agricultores pronafianos do grupo C. Pode-se creditar isso ao fato de que, nessa região, para que os agricultores familiares sejam mais capitalizados e integrados aos mercados nessa região é fundamental que possuam áreas maiores, tendo em vista as piores condições edafo-climáticas.

PRONAF: estimativa a partir dos dados do Censo Agropecuário do IBGE de 1995-1996. Projeto de Cooperação Técnica INCRA/FAO. Brasília, setembro de 2000, mimeo.

79

Page 80: Alto Sertão - SE

Depreende-se que se correta tal hipótese deve ter prioridade tanto os investimentos em irrigação para os agricultores familiares e assentamentos, como políticas de reordenamento agrários, com o intuito de ampliar as áreas dos estabelecimentos de agricultores familiares e o tamanho dos lotes concedidos aos assentados. Em outras palavras, os estabelecimentos agropecuários familiares não apresentam as mínimas condições de sustentabilidade com a extensão de terras que possuem, ainda que se efetive a irrigação de suas terras.

Quando se analisam os dados municipais, sobressai-se a situação de Canindé de São Francisco, pois se a participação dos estabelecimentos de agricultores familiares no total de estabelecimentos é semelhante à observada nos outros municípios, a parcela da área total por eles apropriada é muito inferior ao que se verifica no restante da região. Efetivamente, enquanto a participação dos estabelecimentos de pronafianos no município é de 88% e nos outros se situa entre 83% e 91%, a área por eles apropriada é de somente 19%, bastante diferente do intervalo entre 43% e 58% que se situam para o restante dos municípios. Esse quadro fica melhor caracterizado ao se observar as áreas médias dos diferente tipos de estabelecimentos, apresentadas na tabela 43. Verifica-se que Canindé de São Francisco apresenta a maior média para o conjunto dos estabelecimentos agropecuários e as menores no caso dos estabelecimentos classificados como potencialmente beneficiários do Pronaf. Ora, isso significa que os estabelecimentos “patronais”, nessa localidade, têm tamanhos bastante superiores aos localizados nos municípios vizinhos – 552 hectares contra 184 hectares.

O quadro de concentração fundiária, em que chama a atenção a expressiva presença de estabelecimentos agropecuários de pequeníssimo porte, é o que caracteriza o território, mesmo quando se desconsidera o caso extremo de Canindé de São Francisco. É alarmante observar que a área média de 90% dos estabelecimentos agropecuários da região situa-se, dependendo do município, entre 9 hectares e 19 hectares. Não resta dúvida que os baixos indicadores sociais e econômicos do território, que serão apresentados a seguir, decorrem da insuficiência de terra da quase totalidade dos agricultores aí localizados.

Tabela 44Área média dos estabelecimentos agropecuários, segundo tipos de produtores

agrícolas, nos municípios do alto sertão sergipano – 1996.

Município Total Familiares Pronaf Grupo B Grupo C Grupo DCanindé de São Francisco 51 18 11 4 20 53Gararu 24 18 17 6 32 91Monte Alegre de Sergipe 32 21 20 8 28 78Nossa Senhora da Glória 25 15 13 5 25 68Poço Redondo 42 22 21 10 32 74Porto da Folha 30 21 18 7 24 68

Total Global 33 19 17 6 27 71Fonte: Di Sabbato, 2000.

Os dados da distribuição da área e dos estabelecimentos pronafianos, segundo os grupos de beneficiários, apresentados no Gráfico 5, mostram que os agricultores pobres são a grande maioria, atingindo a mais de 60% dos estabelecimentos pronafianos nos municípios de Nossa Senhora da Glória, de Gararu e de Canindé de São Francisco. Nos outros três – Porto da Folha, Poço Redondo e Monte Alegre do Sergipe – a participação do grupo B nos estabelecimentos pronafianos situa-se entre 48% e 58%. Por outro lado, esses estabelecimentos são responsáveis por no máximo 29% da área ocupada pelos agricultores

80

Page 81: Alto Sertão - SE

potencialmente beneficiários do Pronaf. No outro extremo, encontram-se os agricultores familiares capitalizados que respondem, na média da região, por 5% dos estabelecimentos pronafianos, apropriando-se, todavia, por 1/5 da área desses estabelecimentos.

81

Page 82: Alto Sertão - SE

Gráfico 5Estrutura de distribuição dos agricultores familiares potencialmente beneficiários do

Pronaf, nos municípios do alto sertão sergipano – 1996.

a) área total

15% 30% 45% 60% 75% 90%

Canindé de São Francisco

Gararu

M onte Alegre de Sergipe

Nossa Senhora da Glória

Poço Redondo

Porto da Folha

B C D

b) estabelecimentos

40% 50% 60% 70% 80% 90% 100%

Canindé de São Francisco

Gararu

M onte Alegre de Sergipe

Nossa Senhora da Glória

Poço Redondo

Porto da Folha

Fonte: Di Sabbato, 2000.

Outro aspecto muito importante na estrutura fundiária do território diz respeito à precariedade no acesso a terra, ou seja, grande parte dos agricultores familiares não é proprietária de seus estabelecimentos, como se pode observar pelas informações constantes na Tabela 45. De todos os estabelecimentos agropecuários do território 28% são de não proprietários, sendo que essa participação é bem mais elevada conforme se decresce no nível de renda bruta dos agricultores. Assim, dos estabelecimentos classificados no grupo B de beneficiários potenciais do Pronaf, 45% deles são de agricultores não proprietários, os quais se apropriam de tão somente 10% da área desse grupo. Como se pode notar, ademais, as áreas médias dos estabelecimentos de não proprietários são bem inferiores aos dos estabelecimentos proprietários. São para os casos dos grupos B e C de 1,4 hectares e 6,8 hectares, respectivamente. Aqui se localiza mais uma das razões para a pobreza de grande parte dos agricultores da região, a precariedade no acesso da terra, que, ademais, é muito insuficiente para o desenvolvimento de uma agricultura minimamente sustentável.

82

Page 83: Alto Sertão - SE

Tabela 45Participação e área média dos estabelecimentos de não proprietários, segundo tipos

de produtores agrícolas, no alto sertão sergipano – 1995/96.

Tipo de produtor Participação (%)Estabelecimentos Área

Área média(ha)

Total 28 2 2,3Pronafianos 30 4 2,0Grupo B 45 10 1,4Grupo C 7 2 6,8Grupo D 2 2 56,3

Fonte: Di Sabbato, 2000.

Até o momento foram apresentados os dados do Censo Agropecuário, que captam a estrutura de posse da terra, cabendo incorporar as informações do Cadastro do Incra, que abrange as informações da propriedade das terras. As diferenças entre essas duas bases de dados não são expressivas para o conjunto do país e das unidades da federação, apresentando, todavia, discrepâncias maiores quando se “desce” ao detalhe municipal. Isso se deve tanto à unidade de coleta das informações, que, no caso do Censo, é o empreendimento agropecuário, coletando-se, portanto, informações relativas à posse da terra. Já o Cadastro do Incra trata de obter os dados da propriedade das terras, isto é, dos imóveis. Além disso, o Censo Agropecuário levantou informações sobre os estabelecimentos no ano agrícola de 1995/96, enquanto os dados do Cadastro referem-se à situação em meados do ano passado das informações prestadas pelos próprios agricultores e/ou proprietários. Essas particularidades e diferenças não implicam em cenários fundiários diversos, apontando, ambas bases de dados, para uma alta concentração da estrutura fundiária, com a predominância de agricultores com terra insuficiente, grande parte deles não proprietários.

Na tabela 42 encontram-se resumidas as informações acerca da distribuição dos imóveis rurais, segundo estratos de área e condição de acesso a terra, tanto para o território do Alto Sertão Sergipano como para o conjunto do estado. Os imóveis rurais com menos de 50 hectares perfazem, no Alto Sertão e no estado de Sergipe, 80% e 89% do total dos imóveis, respectivamente, Apropriam-se, no entanto, de somente 28% e 31% da área cadastrada. No outro extremo, os estabelecimentos com mais de 100 hectares respondem por 9% do total dos imóveis do Alto Sertão e por 5% no caso do estado, apropriando-se, respectivamente, por 58% e 55% da área cadastrada. Esses dados mostram o quão concentrada é a propriedade da terra no Alto Sertão e no Estado de Sergipe.

“Da mesma forma, a visão tradicional de fazendas perdidas no Sertão deve ser matizada. Um relato de 1697 nos dá uma idéia aproximada da distância entre uma fazenda e a seguinte, com o termo médio em torno de três léguas. Tal constatação corrobora a informação sobre a existência de uma légua de terra de uso comunal entre uma fazenda e outra, ...”.“A grande propriedade de origem sesmarial ou as terras arrendadas, no interior da sesmaria, não eram as únicas formas de acesso à terra nos sertões. Ao longo do Sertão do São Francisco constituíra-se, desde cedo, uma ampla área de terras indivisas, ‘possuídas em comum com outros eréus (sic)’.”

83

Page 84: Alto Sertão - SE

III.2.2. A produção agropecuária

O território do Alto Sertão Sergipano atravessou nos anos 40 e 50 um intenso processo de apropriação de suas terras, baseado na pecuária, o que se consubstanciou em incremento no uso dos solos, particularmente das pastagens em detrimento das matas. Assim, enquanto, em 1940, 50% da área dos estabelecimentos eram de matas, em 1960, essa participação caiu para 27%, com a parcela das pastagens passando de 17% para 35%. Esse movimento continuou durante os anos 60, com as pastagens passando a responder por mais da metade da área dos estabelecimentos, que, ademais, aumentou em cerca de 170 mil hectares.

Gráfico 6Evolução na Utilização das Terras no Alto Sertão Sergipano – 1940 a 1995-96

0%

10%

20%

30%

40%

50%

60%

70%

80%

90%

100%

1940 1950 1960 1970 1975 1980 1985 1995/96

incultas matas pastagens lavouras

Fonte: Censos Agrícolas e Agropecuários do IBGE

Desde então as pastagens passam a responder por cerca de 2/3 da área dos estabelecimentos, sendo que, para 1980, os números são díspares, como bem aponta o gráfico 7. Pode-se creditar essa diferença aos últimos movimentos de apropriação das terras, uma vez que, nos últimos cinco anos da década de 70, foram incorporados cerca de 60 mil hectares à área dos estabelecimentos. Fica patente, portanto, o quão profundo foi o processo de pecuarização do território, que teve, por contrapartida, um enorme desmatamento, indicando que o processo de degradação das caatingas é bastante anterior à implantação maciça de assentamentos na segunda metade dos anos 90. Pode-se, inclusive, acreditar que com a constituição dos assentamentos a recuperação das caatingas ocorra, tendo em conta a maior ...

Em relação às áreas com lavouras, sua participação situou-se ao redor de 10%, entre 1950 e 1975, o que significou, portanto, um incremento na área cultivada ao manter sua parcela na área total durante o movimento de incorporação de novas terras. Assim, as terras com lavouras que, em 1950, somavam 13 mil hectares atingiram, no ano de 1975, à 34 mil hectares. A partir de então, sua participação alcança novo patamar, ao redor de 20%, o que representa cerca de 60 mil hectares. Milho e feijão são os principais cultivos, respondendo pela quase totalidade da área cultivada e pela maior parcela do valor bruto de produção das

84

Page 85: Alto Sertão - SE

lavouras. Em segundo plano, se encontram a mandioca e a melancia e, dentre as culturas permanentes, a banana. Vale notar que a cultura do quiabo não é examinada pelas pesquisas agropecuárias do IBGE, sendo que os dados que apresentamos, quando analisamos o Projeto Califórnia, foram coletados e divulgados pela Secretaria da Agricultura do Estado de Sergipe. Melancia e Banana devem sua produção ao projeto Califórnia e os esforços de irrigação a beira do Rio.

Outras duas culturas tiveram importância econômica no território, o algodão, cujo desenvolvimento está além da região, faz parte da história do nordeste, especialmente do agreste e do semi-árido. E o arroz, cultivo ligado ao regime de águas do São Francisco, importante, sobretudo, nos municípios de Gararu e Porto da Folha. Tanto em um como em outro, o território tem uma importância restrita quando comparado ao algodão do semi-árido nordestino e ao arroz do Baixo São Francisco.

O algodão na região data, assim como no nordeste, do final do século XVIII e início do XIX, e, na rica e instigante dissertação do Prof. Francisco Carlos Teixeira da Silva, está presente nos inquéritos e documentos, como atividade que, juntamente, com a pecuária fazia a riqueza da região, os melhor dos homens ricos da região. Importa muito reter a conclusão que o Prof. Alcança, na seguinte passagem, quando analisa os documentos entre o final do século XVIII e início do XIX, especialmente Inquérito Municipais de 1877 e o de 1905.

“A pecuária associada com a cultura do algodão produzira, enfim, uma camada, ínfima é verdade, de homens ricos que passam a construir uma paisagem onde só há lugar para o boi as ramas brancas do algodão. ...“O efeito demonstração também terá seu papel: se os grandes pecuaristas ficavam ricos porque não o camponês? Muitos farão tudo para ter seu próprio gado (o que além do mais confere prestígio)”. (itálicos nossos) (SILVA, 1981: 60)

Os dados mais recentes, isto é, dos Censos Agrícolas de 1970, 1975, 1980, 1985 e 1995-96 e das Pesquisas Agropecuárias do IBGE, especificamente a Pesquisa Agrícola Municipal e a Produção da Pecuária Municipal, mostram o abandono definitivo do algodão em meados da década passada, após a expressiva queda nos anos 80, em decorrência do aparecimento do bicudo e da perda de competitividade para cobrir os custos do controle da praga.

Outros cultivos que aparecem na lista dos contribuintes ao Valor Bruto da Produção Vegetal do território são as hortaliças, o tomate e a melancia, dentre aqueles produtos que tem os dados coletados, respondendo por 4% do VBP total. Agora, não resta duvida que cultivos com essas características já importância até maior quando o regime de vazantes do rio foi afetado pela construção das barragens. É o que se observa para o Arroz, que nos anos 80 ocupava 700 hectares de várzeas, passou a 500 hectares na primeira metade dos anos 90, com uma queda abrupta para 50 hectares, em 1996, e desaparecendo, em 2001. Já as lavouras permanentes não têm nenhuma expressão econômica, restringindo-se a 100 hectares de banana e alguns hectares de côco e manga.

85

Page 86: Alto Sertão - SE

Tabela 46Participação percentual das principais atividades VPB Total da Agropecuária do

Território do Alto Sertão Sergipano – 1995/96

Atividade agropecuária

Participação percentual no VPB total

Leite 33,6%Corte 19,3%Milho 10,4%Feijão 9,0%Palma 7,2%Milho forrageiro 6,9%Galinhas 5,1%Hortaliças 3,0%Suínos 1,4%Extração vegetal 0,7%Tomate 0,5%Melancia 0,1%Ovinos 0,1%

Subtotal 97,5%Fonte: Censo Agropecuário 1995-96 (Di Sabatto, 2000)

Gráfico 7Quantidade Produzida das Principais Culturas Temporárias

1970-1985 e 1990 a 2003

1970

1975

1980

1985

1990

1991

1992

1993

1994

1995

1996

1997

1998

1999

2000

2001

2002

2003

-

5.000

10.000

15.000

20.000

25.000

30.000

35.000

40.000

ton

milho

feijão

mandioca

Fonte: Censos Agrícolas e Agropecuários do IBGE

86

Page 87: Alto Sertão - SE

Gráfico 8Evolução da Produção Leiteira do Sertão Sergipano

1970 - 1985 e 1990 a 2003

5.000

12.500

20.000

27.500

35.000

42.500

50.000

57.500

1970 1975 1980 1985 1990 1991 1992 1993 1994 1995 1996 1997 1998 1999 2000 2001 2002 2003

mil

litro

s

Glória Porto da Folha Poço RedondoCanindé Gararu Monte Alegre

Fonte: Censos Agrícolas e Agropecuários do IBGE

A agropecuária sergipana e sua pequena produção

Uma importante contribuição ao estudo da agropecuária sergipana e, particularmente, a pequena produção, é realizada por José ... Diniz. Verdade que ele lança mão do conceito de agricultura familiar, e no presente texto, tomamos a liberdade de atualizar os dados, para o censo de 1995-96, e preservando sua argumentação, que lançava foco sobre a importância na ocupação da pequena produção, ou, seguindo sua nomenclatura a agricultura familiar, que, trata, acertadamente, com muito heterogênea econômica e socialmente.

Em 1996, a agricultura familiar, em Sergipe, englobava cerca de 90,0 mil estabelecimentos, ocupando quase 780 mil hectares, o que correspondia, respectivamente, a 90% das unidades e a 46% da área. Desse total, 61 mil agricultores viviam e produziam à margem de um processo modernizador da agricultura e das cadeias mais estabilizadas de comercialização, reproduzindo um círculo de baixos níveis de renda e, conseqüentemente vivendo em precárias condições.

É evidente, por outro lado, a importância das unidades familiares na geração e manutenção do emprego. Os estabelecimentos familiares respondiam por 86% do pessoal ocupado na agricultura, empregando 1 pessoa para cada 2,9 hectares, enquanto os patronais precisam de 24,9 hectares para empregar uma pessoa. Ademais, os familiares de menor renda, empregam 1 pessoa para cada 1,8 hectares.

É importante salientar que, o rótulo “agricultura familiar” esconde uma profunda desigualdade, produto das diferenças de área, da forma de ocupação da terra, das técnicas, da composição e do número de membros da família, das suas estratégias de reprodução,

87

Page 88: Alto Sertão - SE

dos níveis de eficiência e produtividade, etc. Mapeando-se os diferentes principais tipos e certas tendências espaciais, foram identificados cinco grupos de agricultores familiares em Sergipe, sendo que no Alto Sertão encontram-se dois deles:

1) No baixo São Francisco, na região de Itabaiana e em projetos governamentais, os agricultores familiares que desenvolvem lavouras irrigadas (Projeto Califórnia e Açude Macela);

2) Áreas de pecuária camponesa tendendo à bovinocultura melhorada, com pastagens plantadas, complementação alimentar do rebanho e certa seleção animal. Há lavouras subsidiárias de produtos alimentícios e trabalho intensivo na época das chuvas. Este tipo é encontrado, sobretudo, no Sertão Noroeste, entre Nossa Senhora da Glória e Canindé de São Francisco.

A fragmentação e a redução das áreas dos estabelecimentos se assemelha a uma onda que se difunde na região do Agreste a partir da região de Itabaiana em direção a Umbaúba e Própria. As unidades familiares são mais numerosas no Agreste e Sertão com presença também marcante no Litoral Sul.

Vale destacar que a tendência, entre 1970 e 1985, de expansão acentuada da agricultura familiar no Sertão noroeste, concomitantemente às dificuldades que atravessou a agricultura familiar no restante do Estado, dada a falta de terras para a sua reprodução. Os dados da tabela 47 mostram que no Alto Sertão houve nos anos 70 e primeira metade dos 80, crescimento no numero de estabelecimentos associado a estabilidade na área total e incremento na área de lavouras. Ora, o exame dos dados por classes de tamanho e atividade predominante, mostra que a pequena produção cresce no período, tendo importância no aumento da área de lavouras, particularmente o milho. Cabe, todavia, notar que na segunda metade dos 80, a área de pastagens cresce mais do que as lavouras e continuam a surgir novos estabelecimentos. Assim, a pecuariazação que comentamos ocorrer na região, além de se fazer presente na pequena produção, não esgota todo o movimento da pequena produção, de incremento na área das lavouras. Há que ter presente, que, nos anos 70, o cultivo do algodão e comercial de feijão se destacam na região. O Feijão, em 2003, conta com cerca de 2/3 da área determinada no Censo de 1975, sendo que a produção teve um desempenho muito expressivo no triênio 1994/96. Os dados indicam que houve nesse momento safras positivas, sem ocorrência de secas, o que auxilia a recuperação dos efetivos, ocorrida em período semelhante. Pode-se creditar, também, esse movimento a construção de Xingó, que incrementou o mercado local, diminuindo, em uma primeira etapa, os efetivos bovinos, os quais, em seguida, recuperam-se, no momento em que não ocorrem secas e as lavouras têm bons desempenhos. Que, infelizmente, desde então não se sustentaram, com péssimos desempenhos na seca de 1998 e no biênio 2001/02.

88

Page 89: Alto Sertão - SE

Tabela 47Taxas de crescimento anual do Número de Estabelecimentos, da População Ocupada

e das Áreas Total, Lavouras, Pastagens e Matas1970/60, 1980/70, 1985/80, 1995-6/85

Períodos Estabelecimentos Áreatotal lavouras pastagens matas

Populaçãoocupada

Anos 60 6.5% 5.6% 4.9% 9.8% -3.9%Anos 70 2.5% 0.8% 6.9% 0.3% 12.5% 4.4%Primeira metade 80’s 3.1% 0.1% 4.6% 5.0% -16.4% 1.5%1985-1995/96 0.9% -0.8% -1.8% -1.5% 1.8% -0.3%

Fonte: Censos Agrícolas e Agropecuários 1960, 1970, 1980, 1985 e 1995-96

Em Canindé do São Francisco, pequenos pecuaristas trabalham diretamente o gado e cedem anualmente terra para formação de pasto, aproveitando o período das chuvas. Há, em tudo isso, um grande problema, que é a escassez de terra produzida pela substituição do “sempre verde” por gramíneas mais resistentes à seca. No extremo Sertão noroeste, ainda há terras disponíveis, mas, pouco a pouco, os pastos permanentes tendem a ocupar todo o espaço utilizável. A roça itinerante continuará, então, sua migração para oeste, ocupando as áreas ainda vazias do Sertão baiano.

No Sertão, embora, a maior parte das terras vinculadas à agricultura familiar estivesse ocupada com pastagens, o valor da produção extraído das lavouras teve papel destacado, sobretudo das temporárias. Efetivamente, enquanto a agricultura é responsável por 40% do VBP, a pecuária responde pelo restante. Na verdade, a pecuária passou a representar a maior parcela do VBP da agricultura familiar, entre 85 e 96, naquilo que estamos denominando de a pecuarização da agricultura familiar do sertão sergipano. A pecuarização talvez seja um mecanismo de defesa do pequeno produtor diante das incertezas climáticas, das variações de preços dos alimentos e da inflação. A venda diária do leite ou esporádica de algumas cabeças é sempre uma garantia. O avanço da pecuarização, é um processo tão nítido e intenso que, já em 1985, nos lotes dos projetos de assentamentos do INCRA localizados no Sertão (Pedra Grande e Barra da Onça) ocupavam-se as terras com plantio de pasto e de palma forrageira para alimentação de um pequeno criatório.

É preciso ressaltar que, no caso dos pequenos, o movimento da pecuarização não é feito nos mesmos moldes e com os mesmos objetivos da que ocorre na agricultura empresarial. Woortmann (1995) observa que faz parte do dote das filhas casados dos camponeses de Lagoa da Mata (Ribeirópolis), e que há uma hierarquia social ligada ao tipo de animal criado.

Em Canindé e em outras áreas do Sertão, encontram-se pequenos pecuaristas voltados à pecuária leiteira com vacas mestiças holandesas e fazendo uso de larga complementação alimentar para compensar as deficiências das pastagens, sobretudo durante as estiagens.

A produção familiar de vegetais é muito variada, não só para atender às necessidades do autoconsumo, como para buscar diferentes oportunidades de comercialização. Na produção agrícola familiar, em Sergipe, há um trinômio básico que sempre aparece na maior parte das unidades: mandioca, milho e feijão. Outro conjunto bastante freqüente é o das frutas, sobretudo banana, jaca, manga e goiaba.

89

Page 90: Alto Sertão - SE

As combinações são as mais diversas possíveis, às vezes com o desaparecimento de alguns produtos básicos e o surgimento de outros, como batata-doce, amendoim, batatinha, algodão, fava, caju, mamão, abóbora, jabuticaba e até café. Sendo importante destacar o arroz, no Baixo São Francisco, dentre outros quando se analisa a especialização regional.

Há uma indústria rural intimamente associada à produção familiar. É muito freqüente a fabricação caseira de manteiga e de queijo, reduzindo sobremaneira a venda de leite in natura, e nas zonas rurais também ocorrem as “casas de farinha”.

A lavoura desenvolvida nas unidades de produção família é basicamente feita num sistema consorciado que varia espacialmente em termos dos produtos cultivados juntos na mesma terra. Em parte a consorciação de cultivos se explica pela limitação da terra. Além disso, o consórcio aumenta a renda do lavrador por unidade de área e isso é nítido nos menores estabelecimentos. Esta prática permite uma oferta mais variada de produtos para a comercialização e para o autoconsumo. E o consórcio, ainda, reduz a carga de trabalho, pois os tratos culturais são simultâneos.

No Sertão e no Baixo São Francisco o uso de arado de tração animal e mecânico se destaca nas unidades produtivas onde os cultivos anuais modernos exigem mecanização. Nesta região apesar de haver uma mescla do uso do trator com o arado animal, não restam dúvidas de que houve um salto direto da enxada (que é usada exclusivamente por 37,0% dos camponeses entrevistados) para a máquina.

A partir dos dados do IBGE é possível observar que a carga humana nos estabelecimentos familiares mais pobres – grupo B do Pronaf - chega a 2,6 por hectare, o que demonstra que tais unidades familiares funcionam como residência, terra de morada, inclusive para os membros da família com trabalho fora da agricultura. Anteriormente aos movimentos advindos do crescimento do movimento de luta pela terra no Alto Sertão, assistia-se a processos migratórios tanto do Sertão Sergipano para o Baiano, como das Alagoas para o Alto Sertão Sergipano.

Data dos anos 80 uma migração para oeste do Sertão Sergipano, em busca de terras mais abundantes e baratas, com os focos de imigração passando de Nossa Senhora da Glória para Canindé do São Francisco e chegando, atualmente, a Santa Brígida, na Bahia. Essa onda migratória, quase uma frente de ocupação, segue adiante na modernização, que substitui as pastagens tradicionais por gramíneas mais resistentes à seca e que faz escassear a terra para plantio.

Em pesquisa realizada em meados dos anos 90, constatou-se que 34,7% das famílias entrevistas desenvolviam alguma atividade remunerada fora da ocupação agrícola do próprio estabelecimento ou trabalhavam fora dele, em ocupações agrícolas ou não. Essa incompreensão do papel do trabalho complementar é um risco sério para a reprodução do próprio campesinato aí localizado. O trabalho externo também ocorre em atividades não-agrícolas.

Os sistemas agrários identificados no território

Dois estudos nos fornecem uma rica caracterização do sertão sergipano, ainda que não incorporem os efeitos do aprofundamento da Reforma Agrária no território e as iniciativas

90

Page 91: Alto Sertão - SE

em agricultura irrigada a dez anos atrás, o hoje Jacaré-Curituba, e as ´de hoje, no Plano de Desenvolvimento Sustentável do Semi-árido do Governo do Estado. De modo bem diverso ao que se apreendeu do comentário ao trabalho de DINIZ e aos movimentos de ocupação das terras.

De acordo com Fonseca e Bastos (1998), com base nos dados da primeira metade dos 90, o setor primário da economia na região do sertão apresenta-se como principal gerador de renda, embora com pequena representatividade quando comparado às outras regiões do Estado. O sertão tem sua economia baseada na pecuária e no cultivo de lavouras temporárias.

O tamanho médio dos estabelecimentos rurais é relativamente pequeno, com grande predominância de estabelecimentos com menos de 50 hectares em toda região, voltados basicamente para a produção de alimentos (lavouras temporárias).

De forma geral, o nível de renda é baixo em toda a região e a maioria da população economicamente ativa está agregada ao setor primário da economia, atividade sujeita aos períodos cíclicos de seca e que se caracteriza pelo uso de tecnologia rudimentar, com ênfase nas culturas de subsistência.

Esse quadro se agrava pelo aumento das deficiências na área social e pelo desmatamento de caatingas e matas ribeirinhas, que provocam problemas como: a acentuação das condições de semi-aridez, o quase desaparecimento de cursos de água, a salinização da água e do solo, erosão e aumento da intensidade dos ventos. Isso tudo reflete não apenas na diminuição da área agricultável, mas na produção e produtividade agrícolas.

Os municípios que compõe a região do sertão são descritos no rico quadro abaixo, que tem a qualidade de buscar sintetizar a situação econômica observada nos âmbitos dos setores primário e secundário, especialmente.

91

Page 92: Alto Sertão - SE

Quadro 3. Caracterização Econômica a Nível Municipal

Município Situação geral Setor primário Setor secundário

N.S. da GlóriaAgricultura de subsistência e

pecuáriaDestaque rebanho bovino e

produção leiteira.

70% da área útil das grandes propriedades voltadas para

pecuária leiteiraMilho, feijão, algodão e mandioca em pequenas

propriedades.

Fábrica de laticínios.No verão a produção chega a

cair 40%

Monte Alegre de Sergipe

Economia predominante é a rural, com forte concentração

fundiária e predomínio da pecuária e rebanho pequeno.

Presença da suinocultura.

Rebanho em torno de 1.800 cabeças de gado e produção leiteira de 15.000 litros/dia

(1997)

Cerca de 80 fabriquetas de manteiga e requeijão no

município. Produção comercializada em feiras

livres ou com intermediários.

Gararu

Apenas 35% de sua área territorial estão dentro da sub-

bacia do rio Capivara.A principal atividade

econômica está ligada ao setor primário, onde a pecuária tem lugar de

destaque.

A pecuária é realizada nas grandes e médias

propriedades

O setor é inexpressivo, com duas fábricas de

beneficiamento de arroz e algumas fabriquetas de queijo.

Porto da Folha

Abrange as sub-bacias dos rios Capivara e Campos

Novos, tem economia voltada para o setor primário,

destacando-se gado leiteiro e com menor importância a

criação de porcos e galinhas. A agricultura apresenta certo

destaque na produção de feijão, algodão, arroz e

manga.

Apresenta grande expressão regional, com níveis de

produção relativamente altos.

O setor secundário é pouco expressivo, embora haja uma

fábrica de arroz de médio porte que atende a produção

regional.

Poço Redondo

Incluído nas sub-bacias dos rios Jacaré e Onça, destaca-se

como a bacia leiteira do Estado e por ter a maior área

de assentamentos de agricultores feita pelo Incra

(6.899 ha em 1997).

Além da produção de leite, produz milho, feijão, algodão,

arroz além da criação de porcos e de galinhas. Parte da área é ocupada pelo Projeto Hidroagrícola Califórnia.

O setor secundário é quase inexistente, com uma pequena

fábrica de artesanato em cimento e fabriquetas de

manteiga e requeijão.

Canindé do São Francisco

Tem sua área dentro de 3 sub-bacias hidrográficas: rio

Curituba, rio das Onças e rio Jacaré.

Esse município vem passando por muitas modificações

desde meados da década de 80, refletindo

significativamente no setor econômico. A implantação do

Projeto Hidroagrícola Califórnia, a construção da

Hidrelétrica de Xingo e o seu funcionamento, o

recebimento de impostos da geração de energia fazem

com que o setor econômico do município tenha alternado

períodos de grande dinamismo e de recessão.

Neste setor trabalha a maioria da população, tanto na

agricultura irrigada quanto na de sequeiro e na criação de

gado.O Projeto Hidroagrícola

Califórnia produz hortaliças, olerícolas e frutas,

comercializadas no Estado e fora dele. Como produção

agrícola, destaca-se a banana, quiabo, tomate, milho,

manga, mamão, melão e outras frutas. Ocorreu a

introdução do cultivo do café e da pimenta do reino.A pecuária leiteira é

importante, realizada em áreas de caatinga e pastos

plantados, desenvolvida por grandes, médios e pequenos

produtores.

Conta com uma indústria de beneficiamento e fabricação de derivados do leite, que faz

o recolhimento e beneficiamento do leite produzido no próprio

município e em municípios vizinhos. Conta com

fabriquetas de queijo e manteiga. Deve ser citada a

Usina Hidrelétrica de Xingo, geradora de recursos, embora não empregue mão de obra

local.

Fonte: Estudo UFS/CODEVASF (1997)

92

Page 93: Alto Sertão - SE

Ora o setor terciário foi o que mais se desenvolveu nos últimos dez anos, com o crescimento da administração pública, na esteia das alterações constitucionais e de sua regulamentação e do crescimento no território das políticas, ou melhor, das ações nas áreas da educação e saúde decorrente, em grande medida, do nível de organização dos movimentos sociais e da ampliação da reforma agrária. Que, junto ao crescimento do crédito para a agricultura familiar, potencializam o crescimento de outros setores do terciário, como o comércio e transporte.

Já no âmbito do setor primário, ocorreu o crescimento da pecuária leiteira, o sempre errático comportamento da produção de feijão e milho, a diminuição do efetivo bovino e o crescimento no dos pequenos animais. Ora, como já apontamos, o território se assenta na pecuária mista, com destaque para o letie, associada a uma variedade de cultivos temporários. Uns destinados ao consumo animal, outros ao autoconsumo.

O Diagnóstico e Planejamento do Desenvolvimento Sustentável do Baixo São Francisco Sergipano (2003), documento elaborado pelo Ministério do Desenvolvimento Agrário (MDA) em parceria com a Organização das Nações Unidas para a Agricultura e Alimentação (FAO), de certa forma, acompanha a proposta do documento da Codevasf-Ufs, pois, também, tipificou e caracterizou a região do sertão do baixo São Francisco Sergipano, segundo zonas associadas às sub-bacias e os seis municípios: a zona ribeirinha, a pecuária leiteira, o sequeiro degradado e as áreas irrigadas.

Os critérios considerados para a determinação das zonas foram: disponibilidade de água (sequeiro e irrigante [água e produção], conservação de fontes naturais de água ou desertificação [água e meio ambiente]); atividades econômicas (agropecuários, Serviços, agroindústria); e condições ambientais (topografia, hidrografia, solos e cobertura vegetal), dentro das lógicas territoriais de micro-bacias hidrográficas. São bastante próximas as abordagens dos dois trabalhos.

As referidas zonas podem ser assim descritas:

A Zona Ribeirinha do São Francisco se localiza ao longo do rio São Francisco, começando com o cânion do São Francisco no município de Canindé até as praias de Gararu. Apresenta uma unidade ambiental/cultural com os municípios ribeirinhos de Alagoas. Como vemos, aqui se situam os primeiros locais de povoamento, tendo sido importantes as várzeas e as áreas vizinhas as fozes dos afluentes do Rio São Francisco. Fora essas áreas, poucas no trecho de Poço Redondo a Canindé de São Francisco, a topografia é fortemente ondulada, com solos pobres e pedregosos e várzeas ao leste. Ainda conserva uma boa parte da caatinga original nas suas ladeiras.

Historicamente, essa região esteve ligada ao desenvolvimento da pesca artesanal, contando com uma agropecuária marginal de autoconsumo. As construções das barragens trouxeram uma queda significativa da atividade de pesca e um incremento na atividade agropecuária, na procura de uma maior segurança alimentar, trazendo como conseqüência a degradação ambiental à margem do rio. Embora alguns pescadores ainda se mantenham ativos, a pesca artesanal não dá mais suporte à economia local e, apesar da tentativa de desenvolvimento de produção industrial de peixe em tanque rede, as diferentes experiências têm apresentado resultados limitados, pois enfrentam dificuldades de mercados, de organização da produção e de gestão, entre outros.

93

Page 94: Alto Sertão - SE

Uma outra atividade que desapareceu da região, tendo tido importância em Gararu e Porto da Folha, foi o arroz, sendo que as várzeas, também, passaram a ter um uso com muito menos rendimento. Aspecto esse negligenciado no referido documento e que, vale, adiantar que a proposta da Codevasf é para que o uso das várzeas se destine às culturas temporárias, banana e piscicultura.

A zona ribeirinha é caracterizada, segundo o documento, por apresentar potencialidade turística, sendo subdividida em duas subzonas. Uma primeira, que vai de Canindé ao início de Porto da Folha, com uma topografia dominada pelo cânion e roteiros turísticos baseados nas condições ambientais e história; e uma segunda de Porto da Folha a Gararu, com várzeas e praias resultantes do assoreamento do rio, mais para um turismo de lazer,

As cidades de Canindé do São Francisco e Gararu são as ribeirinhas de fato, representando juntas mais de 20% da população urbana da região e 10% da população total. Cabe observar que esses dois municípios contam com características sócio-demográficas e econômicas bastantes diversas, com Canindé tendo um crescimento expressivo de sua população e de suas finanças, enquanto Gararu está estagnada demograficamente. Canindé foi altamente prejudicada pela Usina, uma vez que suas várzeas perderam sua melhor utilização produtiva e a pesca artesanal ficou muito restrita.

Com relação a tipologia dos produtores desta zona, observa-se a organização nos seguintes sistemas produtivos:

1. Quatro produtos estratégicos para seus objetivos econômicos e financeiros: piscicultura, leite, bordados e pesca artesanal. As três últimas desenvolvidas por unidades econômicas familiares e a primeira principalmente via associações. No item de APLs estes três importantes atividades serão tratados mais amiúde .

2. Duas atividades geradoras de rendas, porém complementares: a ovino/caprinocultura; e apicultura. Ambas as atividades dependem da boa condição da caatinga.

3. Duas atividades como estratégia de segurança alimentar: milho e feijão. Ambas com baixas produtividades, o que pressiona sobre a rotação de solos, que são escassos e pobres.

A denominada Zona do Sequeiro Degradado se localiza sobre a Bacia do Rio Curituba, no município de Canindé e sobre a Bacia do Rio Jacaré, em Poço Redondo e numa área fortemente ondulada, no Município de Gararu. Apresentam limitações de água para o consumo humano e animal e para as atividades agrícolas. Tem uma forte presença de grandes propriedades e de atividades de reforma agrária, com praticamente 19 assentamentos em Poço Redondo (com 1667 famílias) e Canindé do São Francisco com 7 assentamentos (343 famílias).

Vale tecer aqui algumas considerações sobre essa zona e, mais especificamente, sua delimitação e nomenclatura. É cabível ligar a agricultura de sequeiro em um semi-árido degradado de modo tão íntimo a espaços geográficos e contíguos fundados em microbacias. A nosso ver a reforma agrária mostrou que existe espaço produtivo nessas áreas, com a interiorização da pecuária leiteira e o crescimento da área cultivada. Evidente que as terras mais a noroeste no território sofrem ainda mais com a falta de chuvas e com suas potencialidades edáficas. De outra parte, são nela que se localizam as iniciativas de irrigação de ontem – Califórnia – e de hoje – Jacaré-Curituba e Nova Califórnia -, o que

94

Page 95: Alto Sertão - SE

segundo essa tipologia e a arquitetura dos projetos de irrigação é a delimitação de outro espaço produtivo, a zona dos perímetros irrigados. A integração entre sequeiro e irrigado nas áreas de perímetros irrigados é muito frágil, inexistente, implicando na criação de enclaves produtivos em regiões onde a pobreza rural é expressiva. Existem propostas e discussões sobre modelos produtivos com a associação entre agricultura irrigada e as atividades de sequeiro, onde a pecuária se sobressai. Existe, por outro lado, propostas na direção de fornecer água para um espaço geográfico bem maior, mas, evidentemente, com disponibilidade hídrica bem inferior.

Mas, retornemos, a zona do Sequeiro Degradado, que se subdivide em três subzonas: a subzona da bacia do rio Curituba (Canindé do São Francisco) que possui pastagens naturais, com presença de caatinga densa e baixa, com águas superficiais, porém apresenta solos pobres e susceptíveis a degradação com a retirada da cobertura vegetal. A pecuária de leite, associada a de corte e lavouras de subsistência são as principais atividades produtivas, sendo, por outro lado, importante fonte de renda para os pequenos produtores, o trabalho assalariado fora.

A subzona da bacia do rio Jacaré (Poço Redondo) apresenta um avançado grau de deterioração ambiental, com alguns pontos em desertificação com total ausência vegetal e processo de arenização, com solos fortemente degradados, com afloramentos rochosos e carência de água, com fortes restrições para agricultura e carga animal (pecuária). Nesta zona, encontra-se a Cidade de Poço Redondo, cuja economia depende do desempenho das atividades agropecuárias. A diferença no grau de degradação entre as bacias do Curituba e do Jacaré é dada fundamentalmente pela diferença na pressão de ocupação do espaço e na forma de exploração.

A terceira subzona está localizada na região sudeste a noroeste do município de Gararu, com solos fortemente degradados, com afloramentos rochosos, topografia fortemente ondulada, com carência de água e restrições para agricultura e pecuária. Ou seja, é uma área, em Gararu, com fortes restrições topográficas. Os produtores encontram-se numa situação de desacumulação econômica, porém mantendo os meios técnicos e orientando suas estratégias, principalmente a segurança alimentar.

Segundo o documento, na zona do sequeiro degradado, a atividade econômica agropecuária é basicamente sustentada pela atividade do leite e da carne, sendo que, com o atual processo de desertificação que estas zonas começam a apresentar, é provável que a carga animal como os índices de produtividade tendam a cair pela falta ou restrições de alimentos e água para os animais. Apesar do tom exagerado do documento, pois não há estudos sobre o grau de degradação e de desertificação no território, quanto mais em suas sub-regiões ou subzonas, o incremento da carga animal e da pressão demográfica em terras que, como vimos, tiveram suas caatingas substituídas por pastos, pode significar uma queda na produtividade da pecuária do território, especialmente a leiteira. Ou seja, podem ser etéreos os ganhos ocorridos com a interiorização da pecuária leiteira se não forem buscados modelos produtivos que comportem a pecuária mista, os pequenos animais, o uso e a recuperação das caatingas e a produção de lavouras para o autoconsumo produtivo e humano.

A produção de pequenos animais tem-se diferenciado pela alimentação animal. Com o crescimento das áreas de pastagem resultante da redução das áreas de caatinga, os ovinos contam com uma base alimentar maior que os caprinos, sendo, portanto, significativamente

95

Page 96: Alto Sertão - SE

maior que a caprinocultura. Os médios produtores vêm desenvolvendo atividades de produção de queijo em conjunto com a criação de porcos. Na sua maioria, as pequenas instalações de queijarias, pelo seu baixo nível tecnológico, não têm controle dos dejetos destas produções tendo um duplo impacto ambiental: contaminação de solos pelos resíduos e a proliferação de moscas. Sem duvida os problemas fitossanitários da produção de queijo regional devem ser sanados definitivamente, o que, contudo, pode passar por diferentes processos, logo propostas de intervenção. A concentração da produção em novas empresas de processamento é um dos caminhos que se observa, verdade que o crescimento da produção leiteira regional tem gerado novos espaços de ganhos na distribuição, que vêm sendo ocupados pela NatVille, pela retomada da Usina de Capim Grosso, pelas unidades em assentamentos e nos povoados. Agora, sabe-se que associado a processos de concentração econômica está a diferenciação dos produtores. A dificuldade das iniciativas de implantação de usinas de beneficiamento é clara e indica o quanto são restritivos e diferenciadores os mecanismos de mercado.

Os autores do estudo MDA-FAO apontam três atividades de renda importantes na região ligadas a cada um dos tipos de agricultores. Em primeiro, as chamadas atividades estratégicas na geração de renda, presentes nas grandes propriedades patronais ou empresariais, com a bovinocultura com fins de corte e leite, e no segmento empresarial do processamento e da distribuição do leite. Já os médios produtores contam com pequenas fabriquetas de queijos junto à cria e à engorda de porcos. O processamento quase artesanal, com baixo nível sanitário impede a expansão desta atividade para mercados extra-regionais.

Em segundo lugar, as atividades econômicas complementares, como as criações de ovinos e caprinos. Assim como nas outras zonas, essas atividades têm se desenvolvido de forma excludente pelas técnicas de alimentação. Por fim, o milho e o feijão que, como em todas as áreas do território se volta ao autoconsumo humano – passando, por vezes, pelo consumo animal.

A Zona da Bacia Leiteira está localizada na sub-bacia do rio Capivara na sub-bacia do rio Campos Novos, abrangendo os municípios de Monte Alegre de Sergipe, Nossa Senhora da Glória, Porto da Folha e Gararu. Apresentam os melhores solos da região, com relativamente boa retenção de água. Apresenta fontes de água superficial ao longo do ano. Topografia de plana a suavemente ondulada, com manchas de caatinga espalhada ao longo da zona.

Esta zona apresenta os melhores índices de produtividade agropecuária devido à qualidade dos solos.Tem a maior concentração populacional e a cidade de Nossa Senhora da Glória é um centro comercial regional, com uma infra-estrutura de serviços de insumos financeiros e de comercialização relativamente forte. Várias das instituições presentes na região têm seus escritórios regionais sediados nesta cidade, como o Banco do Nordeste e SEBRAE/SE, entre outras.

As atividades agrícolas, assim como na zona 2, encontram-se orientadas a objetivos de segurança alimentar das unidades produtivas com venda dos excedentes. A atividade artesanal nesta zona é significativa. Principalmente a de mantas e bordados produzidos no município de Porto da Folha, por grupos de mulheres.

A zona da Bacia Leiteira é subdividida em 4 subzonas: da Pecuária Intensiva, que

96

Page 97: Alto Sertão - SE

apresenta um uso mais intensivo do solo, com maior carga animal, maior área agrícola, com as culturas de milho e feijão para alimentação dos bovinos de leite e corte, e conseqüentemente a maior densidade populacional. Já a Subzona a Pecuária Semi – intensiva zona apresenta solo com maior restrição que a subzona anterior, menor carga animal, agricultura menos intensificada (milho e feijão). Está localizada na região oeste dos municípios de Monte Alegre e Nossa Senhora da Glória.

A partir de então o divisor entre as outras duas subzonas é a topográfica. A terceira é a área de Topografia Suave a Moderada, subzona que se caracteriza por solos degradados com fortes restrições a agricultura e esgotados pelo intensivo pastoreio. Topografia moderadamente ondulada, com afloramentos rochosos. Apresenta; eventualmente, carência de água. A outra é a Subzona de Topografia Forte a Moderada que possui solos com afloramentos rochosos e a presença de aluviões (várzeas) em Porto da Folha, com maior fertilidade. Com a produção menos intensa das áreas da Bacia Leiteira, com grande parte da área coberta por vegetação nativa.

Por fim, a Zona do Perímetro Irrigado, com sua área definida pelas ações governamentais em espaços de solos favoráveis à irrigação e não pela configuração das sub-bacias. Atualmente, estes perímetros irrigados se encontram localizados na sub-bacia do rio da Onça. Conta com o Projeto Califórnia com 1.600 hectares irrigados, e em fase de expansão territorial com a implantação do perímetro irrigado no assentamento Jacaré/Curituba, com 3.150 hectares irrigáveis.

Pelas mudanças que historicamente representou a inserção desse modelo produtivo, numa região historicamente de sequeiro, tem-se enfrentado inúmeras dificuldades, sendo a mais gritante o problema dos mercados consumidores, o que implicou na especialização na produção de quiabo, que responde por cerca de 3/4 da área. Em segundo lugar, há os problemas de capacitação e profissionalização dos produtores, que ao passarem de sequeiro para irrigantes podem inviabilizar a sua sustentabilidade gerencial nos perímetros. A falta de eficácia da assistência técnica e da capacitação se reflete na na perda de fertilidade e na salinização dos solos, bem como nos problemas com pragas, nematóides e moscas da fruta. Verdade que parcela importante desses problemas é a situação de mercado do Projeto Califórnia, que se submete a produzir um olerícola para um mercado regional em área irrigada, sendo que o custo da água – por sua quantidade - requer atividades de maior valor agregado. A pergunta é que modelo de irrigação priorizar: a implantação de perímetros irrigados que podem e devem buscar integrar o a produção de sequeiro aos ganhos da irrigação; a concessão de água em menor volume para uma quantidade maior de agricultores, buscando fortalecer uma pecuária mista, um grande capoeirão. Haverá, assim, espaço para as lavouras de subsistência, a diversificação das fontes de alimentação animal e o uso produtivo das caatingas. Essa parece ser a proposta do Canal Xingó da Codevasf, de perfil e amplitude diversa e superior ao do Plano de Desenvolvimento Sustentável Governo do Estado – BID.

A pequena agricultura no sertão

A tabela 48 responde à questão de quais são as principais atividades agropecuárias desenvolvidas no Alto Sertão Sergipano e no segmento familiar especificamente. A pecuária leiteira é a principal atividade agropecuária, em termos de Valor Bruto da Produção, no território, o que não ocorre quando se consideram os agricultores familiares pobres. Nesse caso, o posto de destaque cabe ao cultivo do feijão, salvo em Nossa Senhora

97

Page 98: Alto Sertão - SE

da Glória e em Monte Alegre de Sergipe, onde milho e leite, ocupam, respectivamente, essa posição.

98

Page 99: Alto Sertão - SE

Tabela 48Principal produto, em valor bruto da produção, da agropecuária territorial e de sua

agricultura familiar – Alto Sertão Sergipano, 1995/96.

Município Tipo produtorTotal e familiares grupo B grupo C e D

Canindé de São Francisco Pecuária de leite Feijão HortaliçasGararu Pecuária de leite Feijão Pecuária de leiteMonte Alegre de Sergipe Pecuária de leiteNossa Senhora da Glória Pecuária de leite Milho Pecuária de leitePoço RedondoPorto da Folha

Pecuária de leite Feijão Pecuária de leite

Fonte: Di Sabbato, 2000.

A pecuária leiteira responde por cerca de 1/3 do Valor Bruto da Produção tanto na agropecuária territorial com um todo, como no segmento familiar. Nos agricultores familiares classificados no grupo C esta participação atinge a 40%, enquanto nos mais pobres – do grupo B – é menor, pouco mais de 1/5. O que se depreende dos dados da estrutura produtiva dos grupos de agricultores familiares, apresentados na tabela 49, é que os agricultores familiares de menos renda apresentam uma maior diversificação produtiva, sendo que as lavouras do feijão e do milho representam metade do VBP total do grupo B. Já os agricultores do grupo C e D têm na pecuária leiteira e de corte as atividades mais importantes, representando mais de 50% do VBP. Sobressaem-se, no caso dos agricultores familiares classificados no grupo D do Pronaf, aqueles cultivos relacionados à alimentação animal.

Tabela 49Participação no Valor Bruto da Produção das Principais Atividades Agropecuárias,

segundo tipos de estabelecimentos, no Alto Sertão Sergipano, 1995/96.

Produto Participação no Valor Bruto da Produçãototal familiares grupo B grupo C grupo D

Pecuária de leite 34% 35% 22% 41% 36%Pecuária de corte 20% 17% 6% 14% 21%Milho 11% 11% 22% 12% 7%Feijão 9% 12% 28% 12% 5%Palma 7% 7% 2% 7% 11%Milho forrageiro 7% 5% 0% 1% 8%Galinhas 5% 6% 13% 6% 3%Hortaliças 3% 4% 1% 4% 5%

Sub total 97% 96% 94% 96% 96%Fonte: Di Sabbato, 2000.

É evidente, pela analise da tabela, que a agropecuária territorial tem uma estrutura produtiva semelhante a que se observa no grupo D dos pronafianos. O que se observa é que os grupos C, D e os agricultores patronais apresentam estruturas produtivas bastante próximas, especialmente no que diz respeito à importância da produção leiteira.

É importante observar que a agricultura familiar no Alto Sertão Sergipano, principalmente os estabelecimentos familiares medianamente e totalmente integrados e capitalizados –

99

Page 100: Alto Sertão - SE

grupos C e D – têm um peso muito expressivo na produção territorial, respondendo juntos por metade do VBP. Os estabelecimentos patronais, por outro lado, são responsáveis por pouco menos que 1/3 do VBP territorial. Inversamente ao que ocorre em termos de área, pois enquanto os estabelecimentos patronais se apropriam de quase metade da área, aos familiares desses grupos cabe pouco mais de 1/3.

Os dados indicam, por outro lado, que os agricultores familiares do grupo D tem um perfil em termos de suas participações no VBP, no pessoal ocupado e no total de estabelecimentos próximo ao do segmento patronal. O diferencial é em termos da área ocupada. No outro extremo, observa-se que os agricultores familiares do grupo B – pobres e marginalizados economicamente – respondem por mais da metade dos estabelecimentos, empregam 40% do pessoal ocupado, mas ocupam tão somente 11% da área, gerando apenas 10% do VBP – gráfico 9.

Gráfico 9Estrutura de participação no total de estabelecimentos, na área total, no pessoal

ocupado e no valor bruto da produção, segundo tipos de agricultores, no Alto Sertão Sergipano – 1995/96.

0% 20% 40% 60% 80% 100%

estabelecimentos

área total

VBP

pessoal ocupado

patronais familiares não pronafianos grupo d grupo c grupo b

Fonte: Di Sabbato, 2000.

Deve-se, no nosso entender, se indagar qual a sustentabilidade desses agricultores familiares mais capitalizados em vista do elevado grau de especialização na atividade leiteira, onde as mudanças têm sido profundas, caracterizadas pela concentração produtiva e pelo aumento nas exigências em qualidade e sanidade na produção, comercialização e beneficiamento do leite. Já nos agricultores do grupo B é extremamente precária sua situação produtiva, tendo em conta os padrões técnicos utilizados nos cultivos de milho e feijão frente às condições edafo-climáticas. Há que se buscar a irrigação, a utilização de variáveis precoces e o aumento de suas áreas para que sua diversificação produtiva tenha reais possibilidades de se desenvolver.

A passagem dos 90 ao século XXI na agropecuária no território

Depois da pecuarização do território no século passado, desde 1915 até os anos 80, veio a pecuária leiteira, no esteio da urbanização do estado e da região, no momento da construção da Usina, e do aprofundamento da RA. O salto da pecuária leiteira de 1980 para hoje é de grande envergadura, tendo ocorrido o cenário, situação o que ocorre paralelo a outra alteração de grande profundidade a Usina de Xingó, em um momento de crise

100

Page 101: Alto Sertão - SE

econômica, os primeiros anos da década de 90.

A descrição das zonas acima permite relatar que muitas semelhanças são observadas entre os pequenos produtores e os assentamentos dessas áreas (ou zonas). À exceção da Zona 4 (Perímetro Irrigado), nas demais zonas encontram-se inseridos assentamentos de reforma agrária, que apresentam semelhanças tanto nas questões ambientais (solo, clima, relevo, pluviosidade), como também nos sistemas de produção. Como a maioria dos assentados é originária dessa mesma região (mais especificamente ao município do assentamento), observa-se que a questão cultural (tradição) influenciou (e ainda influencia) na forma com que os assentados procuram desenvolver as atividades agrícolas nos lotes.

O que de fato ocorreu foi um processo de interiorização da bacia leiteira em consonância com o crescimento da reforma agrária em Canindé e Poço; como Porto, Gloria e Monte Alegre já tinham produções relativamente importantes, a região tem um crescimento expressivo na produção leiteira.

A litragem vaca/ano saiu de 843 litros em média para a região do Alto Sertão, situando-se em torno de 1160 litros na segunda metade dos anos 1990. Em 2003, último ano com dados disponíveis a litragem média da região teve um salto para 1143 litros. Não é possível que a região mantenha seu esforço pecuarista para abate pois além de ser difícil o acesso a comida farta e região perde em termos de disponibilidade de recursos para competir com outras regiões pecuaristas, onde a idade de abate dos animais está sendo reduzida para menos de 2 anos. É possível sim aceitar a cria de aniamais como sub-produto da produção leiteira, por isso o perfil do gado gir-nelore se adequa a esta situação.

A litragem vaca/ano saiu de 843 litros em média para a região do Alto Sertão, situando-se em torno de 1160 litros na segunda metade dos anos 1990. Em 2003, último ano com dados disponíveis a litragem média da região teve um salto para 1143 litros.

A construção da Usina de Xingó implicou um crescimento expressivo da demanda por alimentos, o que, com o assentamento dos primeiros assentamentos na época da Nova Republica e da instalação do Projeto Califórnia, significou a emergência de um mercado local. Intensificaram-se, portanto, os sistemas de produção presentes e o aparecimentos de outras atividades, particularmente das olerícolas no perímetro irrigado e o crescimento e interiorização da produção leiteira.

101

Page 102: Alto Sertão - SE

Gráfico 10Evolução do Efetivo Bovino no Alto Sertão Sergipano

1970-1985 e 1990 a 2003Fonte: Censos Agrícolas e Agropecuários do IBGE

40.000

60.000

80.000

100.000

120.000

140.000

160.000

180.000

200.000

1970

1975

1980

1985

1990

1991

1992

1993

1994

1995

1996

1997

1998

1999

2000

2001

2002

2003

cabe

ças

Fonte: Censos Agrícolas e Agropecuários do IBGE

Os dados do IBGE revelam que, entre 1990 e 2003, houve uma redução da ordem de 16% do rebanho na região do Alto Sertão, sendo que as maiores quedas foram em Gararu (31%) e Porto da Folha (23%), seguidas de Poço Redondo (18%) e Glória (17,5%), o único município que apresentou crescimento foi Canindé com um aumento de 7,5%. três movimentos: construção Usina e mercado consumidor (citar Fao), recurperação rebanhos com os assentamentos e perdas decorrentes da recorrência das secas e degradação ambiental, com troca por ovinos

Do total de cabeças de gado existentes na região apenas ¼ ou 25% delas é ordenhada, isso pode significar a persistência da tradição da região ser um grande produtor de carne. É importante ressaltar que no caso do gado leiteiro houve um incremento da quantidade de litros por animal ordenhado mostrando uma evolução técnica.

102

Page 103: Alto Sertão - SE

Gráfico 11Quantidade Produzida de Lenha e Carvão no Alto Sertão

1990 a 2003

30.000

40.000

50.000

60.000

70.000

80.000

90.000

100.000

110.000

120.000

130.000

1990 1991 1992 1993 1994 1995 1996 1997 1998 1999 2000 2001 2002 2003

m3

0.700

1.200

1.700

2.200

2.700

3.200

3.700

4.200

4.700

tone

lada

s

lenha carvão

Fonte: Pesquisa de Silvicultura e Extração Vegetal – IBGE

Gráfico 12Evolução do Efetivo Suíno, Caprino e Ovino Alto Sertão Sergipano

1970, 1975, 1980, 1985 e 1990 a 2003

1.000

5.000

9.000

13.000

17.000

21.000

25.000

29.000

33.000

37.000

1970

1975

1980

1985

1990

1991

1992

1993

1994

1995

1996

1997

1998

1999

2000

2001

2002

2003

cabe

ças

suínos ovinos caprinos

Fonte: Censos Agrícolas e Agropecuários do IBGE

103

Page 104: Alto Sertão - SE

Gráfico 13Evolução do Efetivo de Aves – galinhas, galos, frangos e pintos – no território do Alto

Sertão Sergipano, 1990 a 2003

50.000

100.000

150.000

200.000

250.000

300.000

350.000

400.000

450.000

1990 1991 1992 1993 1994 1995 1996 1997 1998 1999 2000 2001 2002 2003

anim

ais

galos, frangos e pintos galinhas

Fonte: Censos Agropecuário e PPM - IBGE

III.2.3. Os arranjos produtivos

De posse do quadro estrutural que foi exposto, pensar o planejamento do desenvolvimento na Região do Alto Sertão Sergipano é uma tarefa desafiadora e complexa que imperiosamente requer a ação efetiva, enquanto agente planejador e coordenador, do Estado nos seus três níveis de governo.

É neste contexto, que o apoio por parte do setor público ao desenvolvimento de APL’s e APT’s, deve entrar como parte integrante de um projeto mais amplo de desenvolvimento, mudança e modernização da estrutura produtiva e social da região. Não se deve imaginar que os APL’s se constituem como a panacéia para o desenvolvimento regional. Todavia, estes, estabelecem-se como importantes instrumentos auxiliares para o desenvolvimento econômico regional através do: (i) desenvolvimento das vocações microrregionais; (ii) agregação de valor aos produtos e verticalização da produção por meio de avanços nos elos prospectivos das cadeias produtivas regionais; (iii) diversificação da base produtiva e da pauta de exportações da região; (iv) avanço no indicador de inclusão social através da melhoria da qualidade do emprego, melhoria salarial, melhoria da qualificação técnica da mão-de-obra e, conseqüente diminuição da desigualdade social; (v) aumento do mercado interno regional; e, (vi) gestação de um processo sustentado de crescimento por meio da endogeneização das variáveis chaves, da integração do espaço econômico e do apoio às mudanças na estrutura sócio-econômica regional.

Portanto, com a finalidade de propiciar mais uma possibilidade de atuação do setor público no planejamento do reordenamento territorial da região, procurou-se nesta pesquisa levantar-se indícios sobre possíveis APL’s e APT’s localizados na Região do Alto Sertão Sergipano, esbarrando-se em dois problemas22. Em primeiro lugar, observou-se uma

22 A base deste levantamento foi a definição e a tipologia apresentada na primeira parte deste trabalho sobre APL’s e APT’s.

104

Page 105: Alto Sertão - SE

enorme carência de estudos sobre os APL´s na região. Em segundo lugar, e talvez o fato mais significativo, é a enorme confusão conceitual a respeito do termo, que muitas vezes está sendo confundido com o conceito de cadeias produtivas23 ou empregado de forma errada e indiscriminada.

Em decorrência disto, foi necessário um levantamento empírico sobre a existência de APL’s e APT’s na região, em virtude das metodologias freqüentemente utilizadas serem inapropriadas para uma região periférica com elevado índice de informalidade. Neste sentido, metodologicamente optou-se por uma ampla varredura literária, entrevistas com especialistas e técnicos da região, e visitas a entidades de classe, instituições de fomento e a secretarias de estado, na procura de algum indício sobre a existência de possíveis APL’s no estado24. Como resultado desta pesquisa, descobriu-se que não existe nenhum um APL Consolidado ou Maduro na Região do Alto Sertão Sergipano. Contudo, foram identificadas 17 aglomerações produtivas, conforme tabelas seguintes, com distintos graus de potencialidade para se consolidarem num APL.

Cumprida esta etapa, para que o escopo colimado por este trabalho fosse atingido, realizou-se um levantamento de informações sobre estas aglomerações através da elaboração de diagnósticos que contemplassem informações como: a localização geográfica; a história; a caracterização da cadeia produtiva principal apresentando os principais produtos; o grau de tecnologia incorporada nos produtos e no processo produtivo; informações sobre a qualidade e a imagem do produto; a associação entre o produto e a região; o tamanho e a importância do aglomerado para a economia local e regional; a distribuição das empresas por porte; a classificação quanto a sua estrutura (vertical ou horizontal); a classificação quanto ao seu grau de consolidação; os principais mercados atendidos; as fontes de vantagem competitivas; a presença de instituições públicas e privadas na formação, operação e desenvolvimento do aglomerado; as instituições externas e internas ao aglomerado; e, finalmente, as principais oportunidades, ameaças e desafios que se colocam para a consolidação do aglomerado enquanto um APL.

Em que pese a enorme carência de estudos e informações capazes de subsidiar a elaboração destes diagnósticos, levantou-se a existência de aglomerações de produtores nos setores da pecuária leiteira e derivados, apicultura, fruticultura irrigada, bordados e oleiro-cerâmico, conforme Quadros 4 e 5 seguintes. Logo em seguida são feitas breves diagnósticos setoriais com base nas informações levantadas.

23 Em diversos trabalhos tem se identificado cadeias produtivas regionais achando que estão trabalhando na identificação de APL´s.24 Nesta pesquisa procurou-se levantar informações: em publicações técnicas que apontassem para a existência de aglomerações produtivas no estado; através de entrevistas na Federação da Indústria do Estado do Pará e nos seus diversos sindicatos que compõem o sistema; e em visitas a Agência de Desenvolvimento da Amazônia, ao Banco da Amazônia S/A, e nas Secretaria Estadual de Gestão, Secretaria Estadual da Fazenda, Secretaria Estadual da Agricultura, Secretaria Estadual de Ciência Tecnologia e Meio Ambiente, Secretaria Estadual da Indústria e Comércio e a Secretaria Estadual de Modernização do Estado.

105

Page 106: Alto Sertão - SE

Quadro 4Potenciais APL’s Identificados na Região do Alto Sertão Sergipano

Nome do Potencial APL Localidade

Aglomerado Produtivo da Pecuária Leiteira e Derivados Município de Nossa Senhora da GlóriaAglomerado Produtivo da Pecuária Leiteira e Derivados Município de Monte Alegre de SergipeAglomerado Produtivo da Pecuária Leiteira e Derivados Município de GararuAglomerado Produtivo da Pecuária Leiteira e Derivados Município de Porto da FolhaAglomerado Produtivo da Pecuária Leiteira e Derivados Município de Poço RedondoAglomerado Produtivo da Pecuária Leiteira e Derivados Município de Canindé do São FranciscoAglomerado Produtivo da Apicultura Município de Porto da FolhaAglomerado Produtivo da Apicultura Município de Canindé do São FranciscoAglomerado Produtivo da Apicultura Município de GararuAglomerado Produtivo da Fruticultura Irrigada Município de Canindé do São FranciscoAglomerado Produtivo de Bordados Cidade de Porto da FolhaAglomerado Produtivo de Bordados Povoado da Lagoa do RanchoAglomerado Produtivo de Bordados Povoado da Lagoa da VoltaAglomerado Produtivo de Bordados Povoado da Lagoa RedondaAglomerado Produtivo de Bordados Povoado de Sítios NovosAglomerado Produtivo de Bordados Povoado de São RoqueAglomerado Produtivo Oleiro-Cerâmico Município de Porto da Folha

106

Page 107: Alto Sertão - SE

Quadro 6Análise Estrutural das Potenciais Arranjos Produtivos Territoriais do Alto Sertão

Sergipano

Características do APT Pecuária Leiteira e Derivados

Apicultura Bordados

Municípios ou Povoados Glória, Monte Alegre, Porto da Folha, Gararau, Poço Redondo e Canindé

Canindé, Gararu e Porto da Folha

Porto da Folha, Lagoa do Rancho, Lagoa da

Volta, Lagoa Redonda, Sítios Novos, São Roque

Conformação Estrutural HSEA** HSEA HSEAGrau de Consolidação Potencial APT Potencial APT Potencial APTSituação dos Imóveis Maioria Próprio Maioria Próprio Maioria PróprioGrau de Informalidade das Empresas

Elevado ]Total Total

Grau de Informalidade da Mão-de-Obra

Elevado Total Total

Dificuldade de Aquisição de Insumos

Sim Sim Sim

Qualidade do Produto Boa Relativa RelativaQualificação do Quadro Administrativo

Baixa Baixa Baixa

Qualificação da Mão-de-Obra

Baixa Baixa Baixa

Dificuldade na Aquisição de Maquinário

Elevada Elevada Elevada

Linhas de Crédito Específicas para o Setor

Inexistentes Inexistentes Inexistentes

Principais Mercados Estadual e Regional Local e Estadual Local e EstadualProdução Artesanal Artesanal ArtesanalTecnologia no Produto ou no Processo

Elementar Elementar Elementar

Desenvolvimento dos Produtos

Baixo Baixo Baixo

Grau de Institucioanalidade Baixo Baixo BaixoCanais Especializados de Divulgação de Informações

Inexistentes Inexistentes Inexistentes

Importância para a Economia Local

Elevada Relativa Relativa

Utilizam EPI* Não Sim -Local de Produção Adequado Adequado AdequadoGrau de Cooperação entre Produtores

Baixo Baixo Baixo

Grau de Satisfação com a Atividade

Elevado Elevado Baixo

Fonte: Elaboração Própria*EPI – Equipamentos de Proteção Individual** HSEA – Conformação Estrutural Horizontal sem Empresa Âncora

Arranjo Produtivo Territorial de Leite e Derivados

O Potencial APT de Leite e Derivados do Alto Sertão Sergipano é composto pelos Potenciais APL’s dos municípios de Monte Alegre de Sergipe, Porto da Folha, Poço Redondo, Canindé do São Francisco, Gararu e Nossa Senhora da Glória, com este último exercendo posição de centralidade setorial na região. Além destes é conveniente incluir na

107

Page 108: Alto Sertão - SE

análise os municípios de Itabi, Nossa Senhora de Lourdes, Canhoba, Carira e Feira Nova, que apesar de não pertenceram à região geográfica do Alto Sertão são capturados pelo seu entorno gravitacional-econômico (município de Nossa Senhora da Glória).

O leite mostra, também, que a região supera as fronteiras atuais no Estado, sendo, ademais, importante em municípios do estado de Alagoas. Ilustra, ademais, o caráter de pólo regional da cidade de Glória.

O setor de leite e derivados constitui-se, ao lado da agricultura de milho e feijão, como a principal atividade econômica da região e enquanto vetor de inserção dos pequenos produtores no mercado25. De acordo com levantamentos feitos pela SEPLAN e pela Emdagro existiam na região, em 2003, seis agroindústrias de beneficiamento do leite e 111 fabriquetas que, juntas, beneficiam, de acordo com as Tabelas 50 e 51 a seguir, algo em torno de 160 mil litros de leite por dia, produzindo queijo, mussarela, manteiga e requeijão, abastecendo diversos estados da Região Nordeste, como, por exemplo, Rio Grande do Norte, Paraíba, Alagoas, Sergipe e Bahia26.

Em que pese às inúmeras associações de produtores existentes nos municípios a grande maioria dos produtores atua de modo independente, o que reflete um estado cultural com elevada resistência ao cooperativismo e ao associativismo. Este fator explica a ausência de qualquer institucionalidade extramercado, ou capacidade de governança, que dê sentido a atuação dos agentes dos aglomerados ou que gere a criação de externalidades aglomerativas incidentais. Assim, em função dos agentes da região serem basicamente regulados pela ação do mercado, se atribui aos aglomerados à tipologia de Potenciais APL’s, e ao conjunto como um todo de Potencial APT.

Em que pese à alta relevância do setor na economia regional, já mencionada, a quase totalidade dos empregos gerados é de caráter informal. Dentre os fatores que podem explicar esta situação é possível destacar os elevados encargos tributários, baixa capitalização dos produtores, baixa produtividade e sazonalidade da produção, falta de informação, falta de interesse, falta de observância de aspectos fitossanitários, dificuldades na comercialização da produção e falta de políticas públicas adequadas. Como não poderia ser diferente a maior parte da força de trabalho também se encontra na condição de informalidade, o que pode ser explicada em função dos elevados encargos sociais, da maior parte da mão-de-obra ser do círculo familiar e do receio que os trabalhadores têm de receberem sanções em função de reivindicarem seus direitos trabalhistas. Já os poucos empregos formais do setor são gerados pelas agroindústrias de beneficiamento27.

Excetuando-se estas fábricas de maior porte, os locais de produção são inadequados para a atividade desenvolvida: inadequação de lay-out, de piso e de outros aspectos relacionados à higiene, problemas de recursos hídricos e inexistência de espaços adaptados à instalação de máquinas e equipamentos, estocagem de matéria-prima e/ou armazenamento do

25 De acordo com a Seplan (2005: 5), do total de pequenos produtores, possuidores de áreas inferiores a 150 ha, que por sua vez, representam 95% dos estabelecimentos rurais do Semi-Árido de Sergipe, 56% obtêm renda da produção de leite. Ademais, o relatírio da Secretaria destaca que estes produtores possuem uma grande diversidade de estruturas e formas de produção. 26 De acordo com levantamentos feitos pela SEPLAN (2005: 5), e confirmado pela Emdagro, existem atualmente na região 111 fabriquetas de queijos. 27 Há de se destacar que até o fim do ano deve estar entrando em operação a Embrasleite, uma fábrica que irá produzir leite em pó na localidade de Capim Grosso, município de Canindé do São Francisco.

108

Page 109: Alto Sertão - SE

produto. Além destes problemas é importante destacar que boa parte dos produtores de leite e derivados sofrem pela ausência de energia elétrica.

A qualidade dos produtos é baixa, excetuando-se novamente as empresas legalmente constituídas, observando-se, inclusive, uma expressiva presença de casos com contaminação por coliformes fecais. Como fatores explicativos a estes fatos foram apontados: o elevado grau de improvisação no processo produtivo, a falta de observância de cuidados fitossanitários, a inadequação no transporte da matéria-prima - o que facilita a contaminação do leite -, o despreparo da mão-de-obra no manuseio da matéria-prima, a falta de qualificação do proprietário para o gerenciamento da produção, o precário acesso a informações, a falta de linhas de financiamento para melhorias no processo de produção, a inexistência de um controle de qualidade dos produtos e processos e a existência de um mercado que, em sua maior parte, não apresenta maiores exigências em termos da qualidade do produto.

Outro ponto importante a ser destacado é que os produtores operam em um sistema de produção artesanal, com baixo nível de tecnologia incorporada e, em geral, com elevada capacidade ociosa, variando muito seu nível de produção ao longo do ano e deixando de produzir por algum tempo, principalmente em função da falta de capital de giro o que impede a compra de matéria-prima já que na maior parte das vezes esta é feita à vista pelos micros e pequenos produtores de derivados. Estes ainda encontram elevada dificuldade na compra de maquinários novos em função dos elevados custos, falta de linhas específicas de crédito, dificuldades quanto aos prazos de pagamento, falta de capital próprio, dificuldade quanto à operação de maquinários modernos (falta de mão-de-obra qualificada para operação), falta de assistência técnica na região, falta de escala que justifique a aquisição, falta de interesse e visão estratégica e, finalmente, falta de ações coordenadas entre os próprios produtores para este fim. Da mesma forma muitos produtores de derivados encontram dificuldades na compra da matéria-prima básica em função da necessidade de elevado nível de capital de giro já que a venda é feita geralmente à vista, da presença de intermediários, da dificuldade de transporte já que a maioria dos produtores de derivados não dispõe de veículos para a coleta do leite e da ausência de mecanismos de compra consorciada. Entrementes, o resíduo principal da produção de derivados, o soro, é aproveitado na alimentação dos animais, especialmente dos suínos, servindo como rica fonte de proteínas.

Outra fonte crescente de preocupação dos produtores de leite e derivados é a crescente dificuldade encontrada na contratação da mão-de-obra, oriunda, de acordo com eles, dos programas de complementação de renda do governo federal que faz com que muitos trabalhadores abandonem o mercado de trabalho ou exijam uma diária maior para trabalhar, da falta de mão-de-obra habilitada e do êxodo rural.

Em relação ao gerenciamento do processo produtivo, este é feito, na produção do leite in natura e nas pequenas e micro fabriquetas, pelo próprio dono que, na quase totalidade dos casos, não possui qualificação técnica para atividade. Ou seja, desconhece técnicas administrativas, gerenciais e contábeis. Somado a isto inexistem canais especializados e eficientes de informações no tocante a assistência técnica produtiva e administrativa28, manutenção de máquinas e equipamentos, fontes adequadas de financiamento, comportamento do mercado, potenciais mercados consumidores, processo de produção e

28 O Sebrae afirma desenvolver atividades neste sentido junto aos produtores, contudo, nas entrevistas in loco os produtores afirmaram desconhecerem as atividades executadas pelo Sebrae.

109

Page 110: Alto Sertão - SE

controle de qualidade e gestão, publicações técnicas, qualificação da mão-de-obra e quadro administrativo e parcerias e oportunidades de negócios. Esta dificuldade na obtenção de informações advém do desconhecimento dos centros e serviços de informação, falta de disponibilidade financeira, inadequação dos meios de divulgação, baixa qualificação educacional dos produtores com elevado nível de analfabetismo e desinteresse. Sem embargo, a pouca informação que os produtores recebem vêm de jornais, programas de rádio e televisão (Globo Rural) e de contato com outros produtores.

A comercialização da produção é feita diretamente com intermediários sem nenhum tipo de comprovante formal (contrato ou nota fiscal). Estes abastecem, como já ressaltado, o mercado estadual (Aracajú, Lagarto e Itabaiana, principalmente) e outros estados (Rio Grande do Norte, Alagoas, Paraíba, Pernambuco e Bahia), transportando os produtos de forma clandestina para burlar a fiscalização. A produção regional de leite e derivados não consegue ampliar seus níveis de comercialização com estes estados e nem de atingir a outros estados da federação em função de que seus produtos sofrem restrições mercadológicas decorrentes do fato dos produtores operarem na informalidade, de não existir um planejamento estratégico mercadológico, dos produtores não possuírem um local adequado para a venda dos seus produtos, da inexistência de uma marca capaz de trazer uma diferenciação aos produtos da região, da falta de capital para investimentos na melhoria dos processos e produtos, dos produtores não possuírem capital para investimento em campanhas de marketing, dos empresários não possuírem uma cultura de ação coletiva, da baixa qualidade dos produtos e da infra-estrutura de transporte regional ser bastante precária.

Cabe destacar que apesar deste quadro estrutural exposto os produtores revelaram um elevado grau de satisfação quanto à atividade que desenvolvem, não manifestando intenção de mudarem de atividade. Já no que se refere à ação pública nos níveis municipal, estadual e federal, os produtores são unânimes ao afirmar que nenhuma das três esferas de governo tem desenvolvido ações adequadas para o desenvolvimento do setor na região.

Finalmente, é de bom alvitre destacar as ações feitas em torno da criação do Centro de Vocação Tecnológica de Convivência do Homem com a Seca (CVT), em Nossa Senhora da Glória, um projeto orçado em R$ 944 mil e executado pelo ITPS/FAP. O Ministério da Ciência e Tecnologia entrará com R$ 500 mil e a Secretaria de Estado do Planejamento do Estado de Sergipe com R$ 440 mil e se responsabilizará pela futura gestão do CVT. O CVT terá como direcionamento de suas atividades o apoio ao desenvolvimento do setor ligado à pecuária leiteira e a ovino-caprinocultura na região. Para isto intenciona realizar diversos cursos de capacitação junto aos produtores tanto na área produtiva como na de gestão. Está projetado para ter em sua estrutura um laboratório para análise físico-química do leite e seus derivados29, um laboratório de microbiologia, uma sala de treinamento em informática, uma sala polivalente, um auditório e um laboratório móvel de atendimento à reprodução de ovinos e caprinos e sanidade de bovinos, ovinos, caprinos30.

29 Com equipamentos para contagem de células somáticas, identificação da presença de água, determinadores de componentes químicos, de pH e para análises microbiológicas do leite e seus derivados, este laboratório está projetado para preparar mão-de-obra para as 111 fabriquetas de queijo da região, prestar serviços de controle de qualidade para estas pequenas unidades que não têm condições de manter aparelhagem e reagentes para tal, apoiar pesquisas em relação ao sistema produtivo e a qualidade do leite e seus derivados e dar suporte a rede de educação escolar para as práticas de física, química e microbiologia.30 O laboratório móvel está projetado para ser um veículo adaptado para atendimento ao produtor de ovinos e caprinos em relação a práticas de inseminação artificial, identificação de prenhez, diagnóstico de problemas reprodutivos, exames parasitológicos de fezes, medições para avaliação genética por ultra-som e outras

110

Page 111: Alto Sertão - SE

práticas importantes para a criação mais tecnificada destas espécies que se constituem uma opção viável de desenvolvimento da região.

111

Page 112: Alto Sertão - SE

Tabela 50Dados de Produção de Leite e Derivados do Alto Sertão Sergipano – Setembro/2003

No

DEORDEM

MUNICÍPIONo DE

AGROINDUSTRIAS

QUANTIDADE

BENEFICIADA

(Litros/dia)

PRODUTOS FABRICADOS

DESTINO DA

PRODUÇÀO

O1

N. SRA. DA GLÓRIA 02

Laticínio Santa Maria 01 20.000 Requeijão, Manteiga, Mussarela, Queijo Prato

Sergipe, Bahia, Paraíba e Alagoas

Milk Life Produtos Lácteos 01 5.000

Leite Pasteurizado Tipo C, Bebidas Lácteas, Mussarela, Iogurte e manteiga

Sergipe

02POÇO REDONDO 01Lacínio União (Barra da onça) 01 6.000 Leite Pasteurizado Tipo C,

Manteiga e Mussarela Sergipe

03PORTO DA FOLHA 01Laticínio União/ ASPROCRIU 01 7.500 Leite Pasteurizado Tipo C,

Mussarela e Manteiga Sergipe

04

CANINDÉ DO SÃO FRANCISCO 02

Laticínio Xingó 01 3.000 Leite Pasteurizado Sergipe e Bahia

Laticínio ASPRAPIC (Escola) 2.000 Queijo Coalho, Requeijão,

Manteiga e Mussarela Sergipe

05CARIRA 01

B.B. LEITE 01 8.000 Resfriamento Leite Sergipe

06 MONTE ALEGRE 01CSL/DISLAC 01 4.000 Resfriamento Leite Sergipe

TOTAL 08 55.500

Fonte: Emdagro

112

Page 113: Alto Sertão - SE

Tabela 51Dados de Produção de Leite e Derivados – Fabriquetas – Setembro/2003

No DEORDEM MUNICÍPIO

No DE AGROINDUSTRIA

S

QUANTIDADE BENEFICIADA

(Litros/dia)

PRODUTOS FABRICADOS

DESTINO DA

PRODUÇÃO

01 N. SRA. DA GLÓRIA 27 32.500

requeijão, manteiga,

mussarela e queijo prato

Sergipe, Bahia e Paraíba

02 PORTO DA FOLHA 15 21.500

mussarela, requeijão e queijo pré-

cozido

Sergipe, Paraíba e

Bahia

03 POÇO REDONDO 08 6.800

mussarela, requeijão e

queijo

Sergipe, Paraíba e

Pernambuco

04 GARARU 18 10.100mussarela, requeijão e

queijoSergipe

05CANINDÉ DO SÃO

FRANCISCO01 1.080 mussarela e

queijo coalhoPernambuco e

Bahia

06 MONTE ALEGRE 05 4.750

queijo pré-cozido e requeijão

Sergipe e Paraíba

07 ITABI 21 7.400 queijo coalho e requeijão Sergipe

08 N. SRA. DE LOURDES 06 7.500

mussarela, queijo e manteiga

Sergipe

09 CANHOBA 06 5.100queijo coalho,

requeijão e manteiga

Sergipe

10 CARIRA 01 120 requeijão Sergipe

11 FEIRA NOVA 03 7.700 requeijão e

manteigaSergipe e Paraíba

TOTAL 111 104.500Fonte: Emdagro

Arranjo Produtivo Territorial de Bordados

O APT de Bordados do Alto Sertão Sergipano é composto por diversos Potenciais APL’s que produzem os mais diversificados produtos do ramo, passando desde os tradicionais panos bordados, como por calcinhas, sutiãs, camisas, cobertores, toalha de banho, rosto, prato e mesa. Vale dizer que não existe nenhum estudo prévio procurando mapear estes aglomerados produtivos, identificar o número de bordadeiras na região e diagnosticar os problemas setoriais. Assim, com base no levantamento feito in loco foi possível levantar as

113

Page 114: Alto Sertão - SE

seguintes informações. O município de Porto da Folha é o que tem o maior número de bordadeiras, dispersas em inúmeras localidades. Na própria sede do município31, onde seguramente encontram-se a maioria, e nos povoados de Linda França, Matuto, Ranchinho, Ilha do Ouro, Lagoa do Racho, Lagoa da Volta e Lagoa Redonda32, sendo que é nestes três últimos que, fora à sede municipal, encontra-se a maior concentração de bordadeiras. Não existe uma estimativa correta do número de bordadeiras no município. Algumas estimativas apontam para a existência em todo o município de algo em torno de meio milhar de bordadeiras. Outras estimativas afirmam que por volta de 90% das mulheres do município exercem a atividade.

Outra grande concentração de bordadeiras está no povoado de Sítios Novos no município de Poço Redondo. Contudo, é importante destacar que este povoado geograficamente encontra-se mais próximo de Porto da Folha do que de Poço Redondo. De acordo com estimativas feitas pela Cooperativa de Bordadeiras de Sítios Novos existem aproximadamente 300 bordadeiras no povoado. Porém, apenas 20 atuam na cooperativa. Finalmente, no povoado de São Roque, município de Gararu existem aproximadamente 45 bordadeiras exercendo a atividade.

Em que pese às associações de bordadeiras e as cooperativas existentes nos municípios a grande maioria das mulheres atua de modo independente, o que reflete um estado cultural com elevada resistência ao cooperativismo e ao associativismo33. Parte diminuta das mulheres atua de modo cooperado ou em associações, e assim mesmo com elevados entraves e restrições. Este fator, assim como na pecuária leiteira e derivados, explica a ausência de qualquer institucionalidade extramercado, ou capacidade de governança, que dê sentido a atuação dos agentes dos aglomerados ou que gere a criação de externalidades aglomerativas incidentais. Assim, em função dos agentes da região serem basicamente regulados pela ação do mercado, se atribui aos aglomerados apenas à tipologia de Potenciais APL’s, e ao conjunto como um todo de Potencial APT.

A grande maioria das bordadeiras, portanto, atua de modo independente e apresentam diversas restrições para com atividades em conjunto. Em que pese isto, elas são responsáveis por grande parte da renda familiar. Em alguns casos complementam a renda do marido e noutros são responsáveis pela maior parte, excetuando-se os períodos de colheita da lavoura. Sua atividade é importante porque garante uma renda perene ao longo do ano que acaba dando certa estabilidade às finanças domésticas. A totalidade das bordadeiras atua na informalidade, com a atividade se desenvolvendo usualmente na própria residência34, sendo qualificado como local adequado para o desenvolvimento da atividade ao possuir o espaço para a estocagem de matérias-primas e produtos acabados e ter boa iluminação. Entretanto, em alguns casos há dificuldade de acesso, principalmente nos povoados mais distantes da sede municipal, e boa parte das bordadeiras acabam tendo

31 Em Porto da Folha existe a Cooperativa das Bordadeiras Realizadas com 25 sócias, número pequeno em relação ao número de bordadeiras do município.32 Segundo estimativa feita pela Associação das Mulheres Rurais do Povoado de Lagoa Redonda existem no município aproximadamente 50 bordadeiras. Mas, destas, somente 10 participam da associação. 33 O Sebrae realizou algumas tentativas junto às mulheres da região no sentido de desenvolver o “espírito do cooperativismo”. Contudo, os resultados reais destas iniciativas foram magros ou nulos, já que não atacaram outros entraves que dificultam o desenvolvimento da atividade. Como resultado positivo da ação do Sebrae na região é possível destacar a melhora na qualidade final dos produtos, acabamento, entre as mulheres que participaram dos cursos ministrados.34 Parte das que pertencem a cooperativas desenvolvem suas atividades na cede da entidade.

114

Page 115: Alto Sertão - SE

que realizar alguma improvisação, principalmente na hora do acabamento do produto, em função de não terem máquinas específicas para esta finalidade.

A qualidade do produto é diversificada. Os produtos de maior qualidade são produzidos pelas bordadeiras que pertencem a cooperativas ou estão filiadas a associações. Estas, em geral, já participaram de alguns cursos e trocam experiências entre si. Porém são, como já salientado, a minoria. A grande maioria borda um produto de baixa qualidade, com acabamento inadequado. A tentativa de ministrar cursos para estas mulheres se viu fracassada principalmente em virtude delas serem a principal fonte de renda familiar o que inviabiliza sua participação nestes cursos, já que para isto, por um determinado tempo, elas teriam que parar de produzir. Isto desestabilizaria as finanças domésticas.

Além da baixa qualificação da força de trabalho outros fatores explicam a baixa qualidade dos produtos finais: baixa qualidade das matérias-prima, realização de improvisações no processo produtivo (principalmente no acabamento), dificuldade na obtenção de informações, falta de linhas de crédito para a produção e desenvolvimento35, inexistência de uma linha de produção definida na medida em que a maior parte da produção é feita por encomenda de intermediários e inexistência de normatização/especificação dos produtos.

A produção em que pese ser de cunho artesanal necessita da utilização de máquinas de costura para dar o acabamento final. Porém como já mencionado a grande maioria não possui este equipamento em função dos elevados juros cobrados nas linhas de crédito existentes, da falta de capitalização das bordadeiras, do elevado custo destas máquinas, da dificuldade quanto a prazos de pagamento disponibilizado, da falta de assistência técnica ao equipamento e da escala produtiva não justificar ou mesmo viabilizar a sua aquisição.

A atividade de bordados na região opera com elevada capacidade ociosa. As bordadeiras teriam condição de no mínimo dobrarem a sua produção. Contudo, um dos grandes empecilhos para isto é a falta de compradores. Em geral quem compra a produção são os intermediários. Eles, em alguns casos, fornecem a matéria-prima e pedem o comprometimento futuro da produção e noutros apenas encomendam os produtos. O pagamento não é feito à vista. Os intermediários levam os produtos para serem vendidos e somente após venderem pagam as bordadeiras. Em alguns casos as bordadeiras levam mais de 1 mês para receberem. Ademais, como os intermediários levam em grande quantidade os produtos e as bordadeiras não têm opção de venda, elas são obrigadas a venderem seus produtos por um preço extremamente baixo. Assim, o grosso da renda gerada fica na mão dos intermediários.

Outro fator que dificulta o desenvolvimento da atividade é a dificuldade encontrada na compra da matéria-prima. Além da distância que elas têm de percorrer em função da inexistência de matéria-prima na região – a maioria compra as linhas e tecidos em Aracajú, outros fatores dificultam a compra da matéria-prima básica da atividade: o elevado prazo que os intermediários levam para pagar pelos produtos, a falta de capital de giro, a dificuldade no transporte e o curto prazo de pagamento disponibilizado. Ademais, excetuando-se as bordadeiras que pertencem a cooperativas e associações, não existem mecanismos de compra consorciada da matéria-prima o que torna difícil a negociação de preços e de prazos de pagamento.

35 Em que pese o Banco do Brasil dispor de alguns canais de crédito as bordadeiras literalmente “sentem medo” de pegar empréstimos em função dos elevados juros cobrados e da falta de qualificação técnica e administrativa para gerenciar a atividade.

115

Page 116: Alto Sertão - SE

Há de se destacar que inexistem canais especializados e eficientes de informações no que se refere à assistência técnica produtiva e administrativa, fontes adequadas de financiamento, fornecedores de máquinas e equipamentos, fornecedores de matérias-primas e insumos, comportamento do mercado, potenciais mercados consumidores, processo de produção, controle de qualidade e gestão e manutenção de máquinas e equipamentos36.

Por fim, é conveniente destacar que ao contrário do que foi levantados nas outras aglomerações produtivas da região o grau de satisfação com a atividade é bastante baixo. A grande maioria das artesãs manifestou interesse em abandonar a atividade. Só não o fazem por necessidade de sobrevivência. Ademais, em caráter geral há uma crítica a ação do Estado, em seus três níveis, no que se refere ao apoio que poderia ser dado para a atividade. As bordadeiras estão plenamente insatisfeitas com a atuação do governo em relação ao setor de bordados do Alto Sertão Sergipano.

Arranjo Produtivo Territorial da Apicultura

O Potencial APT da Apicultura da Região do Alto Sertão Sergipano é composto pelos Potenciais APL’s de Porto da Folha, Gararu e Canindé do São Francisco. No município de Porto da Folha existe um setor produtivo de mel com relativa importância para a economia local. De acordo com levantamentos feitos há no município algo em torno de 100 micro e pequenos produtores envolvidos na atividade, que possuem aproximadamente 700 colméias e que no período entre janeiro a julho de 2005 produziram por volta de 5 toneladas de mel . Esta produção está centrada basicamente no cunho familiar, não havendo a incidência de nenhuma empresa âncora, e a grande maioria dos produtores exerce sua atividade de forma independente, apesar de haverem duas entidades que procuram aglutinar os produtores de mel do município, a Associação dos Produtores Rurais da Lagoa do Rancho e a Associação de Apicultores do Município de Porto da Folha (Apifolha).

Já no município de Canindé do São Francisco existem 32 produtores de mel, sendo que destes 12 participam da Associação dos Apicultores de Canindé de São Francisco (Fapise) que funciona num regime de cooperativismo. Os produtores do município possuem 52 colméias, sendo 40 de propriedade dos produtores do perímetro irrigado do Projeto Califórnia e 12 do Povoado de Cuiabá. A quantidade mensal de mel produzida gira em torno de 400 litros/mês . Neste momento é importante diferenciar o caráter da atividade desenvolvida em Canindé da que é exercida em Porto da Folha. Neste, os produtores se dedicam, em sua maior parte, a apicultura como fonte principal da renda familiar. De modo diferente, os produtores de mel do Projeto Califórnia fazem da atividade uma forma de complementação da renda familiar, já que todos, excetuando-se os produtores do Povoado de Cuiabá, exercem a agricultura como atividade principal.

Já no município de Gararu, em que pese a existência de um setor produtor de mel com relativa importância para a economia local, não existem informações sobre o número de apicultores existentes no município. Assim, o diagnóstico feito a seguir baseia-se em informações coletadas sobre os produtores dos municípios de Canindé do São Francisco e Porto da Folha.

36 Há de se ressaltar que entre as produtoras cooperadas houve uma menção a atuação do Sebrae como fonte de algumas informações setoriais.

116

Page 117: Alto Sertão - SE

Em função do baixo grau de associativismo e cooperação dos produtores, com exceção é claro dos membros da Fapise, e da baixa institucionalidade dos aglomerados, já que as ações das associações não conseguiram ainda contrarrestar a “cultura do individualismo” predominante na região, estes aglomerados configuram-se apenas enquanto Potenciais APL’s. Da mesma forma, o conjunto como um todo apenas pode se tipificado enquanto Potencial APT.

O terreno no qual é realizada a produção, na maioria das vezes, não é de propriedade dos produtores, é cedido, alugado ou, ainda, são utilizadas áreas de preservação ambiental. Em que pese isto, a região é bastante adequada para a produção do mel em função da sua proximidade com o Rio São Francisco e com matas nativas ainda preservadas. Ainda sobre o local da produção é importante destacar que este no geral possui fácil acesso, iluminação adequada e oferece segurança para os trabalhadores. Contudo, apresenta lay-out inadequado para a atividade desenvolvida e piso inadequado para a produção, instalação de máquinas, estocagem de insumos e matéria-prima e armazenamento da produção. Sem embargo, a qualidade do produto é considerada boa, os acidentes de trabalho são quase nulos na medida em que os produtores utilizam equipamentos de proteção e há uma cultura no que tange o aproveitamento de resíduos.

Há de se destacar também o papel exercido pelo Instituto Xingó junto aos produtores do Projeto Califórnia, no que tange a assessoria produtiva, treinamento e enquanto canal de acesso a informações.

Torna-se relevante destacar que a produção é basicamente voltada para o mercado local. Contudo, boa parte dela é adquirida por intermediários que compram a produção para revendê-la noutro mercado sem nenhum tipo de comprovante formal. O fato de a produção atender basicamente o mercado local decorre da não existência de nenhum planejamento estratégico mercadológico na elaboração dos produtos para o atendimento a determinados mercados e a segmentos de mercado, dos produtores não possuírem uma loja própria, da inexistência de uma marca capaz de trazer diferenciação, da falta capital para investimentos na melhoria dos processos e produtos, refletindo num melhor qualidade dos produtos finais, dos produtores não possuírem capital para o investimento em campanhas de marketing, dos produtores carecerem de meios de transporte próprios para levarem sua produção até o mercado consumidor, o que encarecem o preço final da mercadoria e dificultam sua colocação no mercado, dos produtores não possuírem uma cultura de atuação coletiva e da infra-estrutura de transporte regional ser bastante precária.

Em que pese todos este pontos de estrangulamento levantados os produtores, em geral, possuem uma relativa satisfação com suas atividades e não pensam em abandonar a produção de mel por outro tipo de produto. É de fundamental importância destacar que esta atividade emerge como alternativa altamente viável de geração de renda e de utilização de áreas de caatinga preservadas. É na verdade a única atividade autorizada pelo IBAMA para operar em áreas de reserva ambiental, o que torna o seu desenvolvimento como uma das principais alternativas na gestação de um processo de desenvolvimento sustentável na região, através da geração de emprego, renda, melhoria no padrão de vida e preservação das áreas ambientais. Por fim, cabe salientar que está sendo construída no município de Porto da Folha a Casa do Mel, uma fábrica que irá processar e beneficiar o mel produzido na região, o que pode trazer um incentivo ao setor.

117

Page 118: Alto Sertão - SE

Arranjo Produtivo Territorial da Fruticultura Irrigada

A aglomeração de produtores de frutas do Projeto Califórnia desponta enquanto um potencial APL. O Projeto Califórnia é um projeto de irrigação que começou suas atividades no ano de 1986. Segundo dados da Secretaria Estadual de Agricultura de Sergipe no ano de 2003 o projeto já possuía uma área total de 1.214,36 hectares irrigados e 1.800 hectares sequeiros, que atualmente divide-se em 333 lotes de produtores, sendo que deste, 253 são lotes 4.29 hectares irrigados, 19 são lotes maiores também irrigados, os chamados lotes empresariais, e 61 são chamados de sequeiros37. A principal produção do projeto é o quiabo que ocupava em 2003 uma área plantada de 558,61 hectares que produziram naquele ano mais de nove mil toneladas, abastecendo principalmente o mercado da Bahia.

Recentemente tem despontado enquanto atividade promissora o cultivo da goiaba em função da implantação de uma fábrica que irá beneficiar a goiaba, produzindo uma massa que será exportada para fábricas da Associação Brasileira de Goiaba (Goiabrás)38. Trata-se de um empreendimento realizado em parceria entre o Governo do Estado de Sergipe e a Goiabrás, que está estimado em torno de R$ 700 mil. O Governo do Estado entrará com 80% e a Goiabrás com o restante, além de fornecer as mudas, dar assistência técnica produtiva e administrativa e garanti a comercialização. O início da atividade da fábrica está previsto para os primeiros meses de 2006.

A área atual plantada de goiaba é de 200 hectares com previsão de se atingir 300 hectares até o fim do ano. Quando a fábrica estiver em pleno funcionamento sua capacidade de processamento será de 2.500 kg por dia. Estima-se que serão necessários aproximadamente 500 hectares plantados de goiaba para suprir a fábrica com a matéria-prima básica39. Neste sentido, existe uma expectativa de que o assentamento do Jacaré-Curituba, outra área com provável irrigação, também, venha produzir goiaba para a fábrica40. Ademais, existe um projeto da fábrica vir a produzir o Guatchup, uma espécie de catchup feito de goiaba41.

O restante da área do Projeto Califórnia divide-se entre os cultivos de uva, maracujá, acerola, ambi, aipim, cajá, manga, limão, mamão, pimentão, tomate, coco, abóbora, milho, feijão-de-corda, pinha, graviola, entre outras.

37 A água utilizada no projeto é bombeada diretamente do Rio São Francisco. Em média são bombeados 4.400 m3 por hora para o sistema de irrigação do projeto. A maior parte da irrigação é convencional, porém o sistema de irrigação localizada e micro-aspersão já começam a serem desenvolvidas. Os produtores pagam uma taxa de R$ 256,00 a cada quatro meses por este serviço.38 A goiaba plantada no Projeto Califórnia é do tipo Paluma que tanto pode ser utilizada na fabricação da pasta de goiaba como pode ser destinada para o consumo in natura.39 De acordo com o planejamento da Secretaria de Agricultura do Estado de Sergipe 122 lotes serão destinados para a produção de goiaba.40 É importante destacar que existe uma pequena fábrica de polpa de frutas, a Frutec, que opera no município e é abastecida com a produção do projeto. Esta fábrica é operada por 12 mulheres de produtores do projeto. 41 Com pequenas modificações na linha de produção outros cultivos podem ser também beneficiados, como: banana, acerola, maracujá, pinha, graviola, abacaxi e umbu.

118

Page 119: Alto Sertão - SE

Tabela 52Demonstrativo da Área Plantada e Produção das Principais Culturas do Perímetro

Irrigado Califórnia

Principais culturas

1997 1998 1999 2000

Área(ha)

Produção

(ton.)

Área(ha)

Produção

(ton.)

Área(ha)

Produção

(ton)

Área(ha)

Produção

(ton.)Abóbora 58,53 180,95 75,73 350,66 10,46 115,56 0,0 0,0Feijão Anão 28,57 13,74 106,06 53,19 87,28 63,30 59,26 26,18Feijão de Corda 225,98 307,62 310,45 573,19 150,84 232,66 102,25 115,88Milho 213,64 350,95 427,40 761,28 414,38 732,69 298.39 642.25Quiabo 963,88 9.091,85 888,95 10.801,8

9 782,57 10.133,05 770.52 8.965,57

Tomate 40,74 644,65 27,14 159,06 9,67 81,38 4,42 44,20Outras Culturas 157,11 1.569,83 151,51 1.276,51 217,78 1.446,48 149,48 3.05,77

TOTAL 1.688,45

12.159,59 1.987,24 13.975,7

8 1672,98 13.216,66

1.384,32

12.839,85

Fonte: Secretaria de Agricultura do Estado de Sergipe

119

Page 120: Alto Sertão - SE

Tabela 53Área Plantada e Quantidade Produzida do Projeto Califórnia - 2003

Principais culturas Área Plantada(ha)

Produção(ton.)

Abóbora 38,44 135,32Aipim 92,59 933,67Feijão Anão 121,62 185,05Feijão de Corda 86,40 263,80Milho 215,61 557,34Quiabo 558,61 9.105,71Goiaba - 36,86Banana - 346,51Outras Culturas 101,09 1.118,08

TOTAL 1.214,36 12.682,34Fonte: Secretaria de Agricultura do Estado de Sergipe

Existem na área do projeto três associações de produtores e uma cooperativa: a Associação dos Produtores Irrigados de Canindé do São Francisco (ASSAI), a Associação dos Pequenos Produtores Irrigados do Projeto Califórnia (APICAL), a Associação dos Pequenos Produtores da Área de Sequeiros (APRASPIC) e a Cooperativa de Fomento Rural e Comercialização do Perímetro Irrigado Califórnia (COFRUCAL). Em que pese isto, a participação dos produtores nas associações e na cooperativa é muito baixo o que caracteriza uma da baixa institucionalidade do aglomerado. Assim, em função destas iniciativas ainda não terem suplantado a propensão que os produtores têm de atuarem individualmente, este aglomerado configuram-se apenas enquanto um Potencial APL.

Sem embargo, o setor de fruticultura é muito importante para a economia de Canindé do São Francisco abastecendo o mercado regional, principalmente os estados de Alagoas, Sergipe e Bahia. De acordo com estimativas do Conselho Municipal do desenvolvimento Rural Sustentável (CMDES) a atividade emprega algo em torno de 2.000 empregos diretos e 4.000 empregos indiretos42.

A maioria dos produtores está registrada na Dehidro, porém raros são os empregos formais gerados pela atividade. Isto é explicado em parte pela maioria da mão-de-obra ser centrada no cunho familiar e, por outra, devido à falta de conhecimento tanto dos produtores como dos trabalhadores de seus direitos enquanto empregados, dos elevados encargos sociais, da pretensão salarial está acima das possibilidades do empregador43, do medo que os trabalhadores têm de ao reivindicarem os seus direitos ficarem desempregados e da sazonalidade da atividade em decorrência da existência de períodos de plantio e de colheita.

Os locais de produção são considerados adequados para a atividade desenvolvida pois possuem um sistema de irrigação que fornece água o ano inteiro e iluminação em abundância. Em que pese isto algumas coisas devem ser consideradas para o melhoramento da infra-estrutura produtiva. Alguns lotes não possuem acesso fácil para o 42 Há uma reclamação dos produtores em relação a crescente dificuldade que eles estão encontrando para contratação de mão-de-obra em função dos programas governamentais de complementação de renda. Muitos beneficiados preferem não trabalhar mais ou passam a exigir uma diária maior. 43 A remuneração paga por um dia de trabalho é de R$ 10,00, o que no fim do mês representa menos do que um salário mínimo já que em um mês não há 30 dias úteis de trabalho.

120

Page 121: Alto Sertão - SE

escoamento da produção, não possuem energia elétrica, não utilizam o sistema de plantio em nível e, em alguns casos, excesso de irrigação, o que causa alagamentos. Ademais, muitos produtores não utilizam adequadamente técnicas de manejo e utilizam sem o mínimo conhecimento e orientação agrotóxicos em grande quantidade.

A produção do projeto é, em geral, considerada de média qualidade. Isto ocorre em função basicamente a ausência de maquinários adequados para o manejo do plantio, de grande parte da mão-de-obra não ter nenhum preparo técnico que lhe qualifique lhe dar com o cultivo de modo adequado, da ausência de assistência técnica aos produtores, dos produtores não possuírem conhecimentos técnico-produtivos e nem gerenciais adequados e das dificuldades que os produtores têm de terem acesso a informações setoriais. Além disto, existem vários entraves para a compra de máquinas e equipamentos, podendo-se destacar o elevado custo destas máquinas, a falta de linhas de crédito específicas, a baixa capitalização dos produtores, o curto prazo de pagamento disponibilizado, a falta de mão-de-obra treinada para operação, a falta de assistência técnica aos equipamentos, a elevada capacidade ociosa da produção, a ausência de uma cultura que propicie aos produtores uma ação coletiva e a baixa lucratividade setorial. Da mesma forma, existem dificuldades na compra de insumos produtivos em função dos elevados preços cobrados, da falta de capital de giro, da insuficiência de oferta no mercado, das dificuldades no transporte, do curto prazo de pagamento disponibilizado e da distância que muitos têm de percorre para a compra – alguns insumos somente são encontrados em Aracajú.

O gerenciamento da produção é feito pelo próprio produtor que, na maior parte dos casos, desconhece técnicas administrativas, gerenciais e contábeis. Muitos deles são inclusive analfabetos. Somado a isto, inexistem canais especializados e eficientes de informações no que se refere a: assistência técnica produtiva e administrativa; fontes adequadas de financiamento; fornecedores de máquinas e equipamentos; fornecedores de matérias-primas e insumos; comportamento do mercado; potenciais mercados consumidores; parcerias, oportunidades de negócios e terceirização; processo de produção, controle de qualidade e gestão; manutenção de máquinas e equipamentos; extensão tecnológica (projeto, diagnóstico e resolução de problemas); publicações técnicas; e qualificação da mão-de-obra e do quadro administrativo44. As dificuldades na obtenção de informações advém principalmente do desconhecimento dos centros e serviços de informação, do baixo nível de instrução dos produtores e do próprio desinteresse manifestado. Sem embargo, a informação obtida pelos produtores é oriunda de acessórias prestadas pela Dehidro e pelo Instituto Xingó; de cursos, palestras, congressos, feiras, exposições e seminários; do contato com outros produtores, principalmente os de Petrolina e Petrolândia; e de programas de rádio e televisão.

É importante destacar que existem diversos intermediários atuando na região. Alguns deles financiam a produção, ou fornecem insumos, sementes e adubos, exigindo em troca o comprometimento futuro da produção. Por outro lado é fundamental destacar que a produção do projeto poderia atingir novos mercados. Isto não ocorre basicamente devido ao fato de não existir nenhum planejamento estratégico mercadológico; de não haver ainda uma marca capaz de trazer diferenciação; da falta capital para investimentos na melhoria dos processos e produtos, refletindo num melhor qualidade dos produtos finais; dos produtores não possuírem capital para o investimento em campanhas de marketing; dos

44 É de bom alvitre destacar que a Dehidro estabelece um canal de comunicação freqüente com os produtores no sentido de dar apoio técnico e administrativo, bem como fornecer informações que julgue pertinente. Contudo, de acordo com os próprios produtores ainda de maneira insatisfatória.

121

Page 122: Alto Sertão - SE

produtores carecerem de meios de transporte próprios para levarem sua produção até o mercado consumidor, o que encarecem o preço final da mercadoria e dificultam sua colocação no mercado; dos produtores não possuírem uma cultura de atuação coletiva; e da infra-estrutura de transporte regional ser bastante precária. Apesar disto, é importante salientar que o grau de satisfação com a atividade desenvolvida é relativamente alto. Há uma perspectiva de melhora na situação em função da fábrica que a Goiabrás e o Governo do Estado está implantando na região.

Finalmente, é importante mencionar a existência do Centro de Difusão de Tecnologia em Agricultura Irrigada (CDT), implantado em 2003 no Perímetro Irrigado Califórnia sob a coordenação do Departamento Estadual de Desenvolvimento Agropecuário de Sergipe (DEAGRO), vinculado à Secretaria de Estado da Agricultura45. O CDT tem por finalidade apoiar o desenvolvimento da atividade agrícola na região - Projeto Califórnia, Projeto Nova Califórnia (Cuiabá, Pedro Teixeira, Modelo, Florestan Fernandes e Mandacaru), Jacaré-Curituba e municípios circunvizinhos e região, através de ações que visem: validar tecnologias para a modernização tecnológica dos sistemas produtivos atuais e futuros, compreendendo o reordenamento da produção agrícola e da pecuária; capacitar técnica e gerencialmente os irrigantes, através da difusão de tecnologias, acompanhamento contínuo dos sistemas de produção aplicados, através de cursos, palestras, intercâmbios, dias de campo e eventos técnicos; gerar um efeito multiplicador em toda a região, induzindo a exploração de culturas de retorno econômico; inserir os produtores e grupos de interesse de forma competitiva no mercado; e capacitar técnicos e instituições parceiras para serem multiplicadores.

Arranjo Produtivo Territorial Oleiro-Cerâmico

O aglomerado produtivo local oleiro-cerâmico de Porto da Folha apresenta uma importância relativa para a economia do município com cerca de 30 famílias envolvidas na produção de telhas e tijolos e uma associação de produtores – Associação dos Oleiros de Porto da Folha, contudo desativada. As telhas variam de tamanho indo de 45cm até 48cm e os tijolos, do tipo maciço, apresentam tamanho médio de 18cm por 9cm. Semanalmente são produzidos aproximadamente pelo aglomerado 4.000 telhas e 5.000 tijolos, vendido o milheiro ao preço médio de R$ 100,00 e R$ 40,00 respectivamente. Esta produção é direcionada basicamente para a classe E em função da baixa qualidade dos produtos, bastante inferior ao que é produzido em outras regiões de Sergipe.

O aglomerado apresenta uma conformação estrutural horizontal na qual não há ascendência hierárquica de nenhuma empresa âncora. Os produtores aproveitam nas suas atividades a existência abundante da matéria-prima e se assentam numa tradição familiar. Porém, a totalidade dos produtores atua informalmente devido a falta de interesse, falta de informações, elevados encargos sociais, falta de capital, elevada carga tributária e elevada burocracia.

Estes produtores estão, na sua maioria, em imóveis próprios. Contudo, as condições técnicas das instalações não são satisfatórias à atividade desenvolvida. Apresentam um layout sem preocupações com a iluminação e disposição inadequada das prateleiras, fornos e prensas. Ademais, em períodos de forte chuva os locais nos quais realizam-se as 45 Atualmente o CDT conta com uma equipe técnica composta de 02 engenheiros agrônomos, 02 técnicos agrícolas, 16 trabalhadores braçais e 02 vigilantes, numa área física de 300 m². Os principais parceiros do CDT são: Deagro, Dehidro, Sebrae, Embrapa, Codevasf e o Instituto Xingó.

122

Page 123: Alto Sertão - SE

produções ficam alagados e os produtores passam a recorrer unicamente da ajuda do governo municipal para sua sobrevivência.

A produção anda é feita manualmente. Os produtos são comercializados no município pela maioria dos produtores, porém o destino final dos produtos é o mercado estadual – Itabaiana, Canindé do São Francisco, Nossa Senhora da Glória, Gararu e Lurdes, e o Estado de Alagoas – Pão de Açúcar, Belo Monte e Barra do Ipanema. Na maioria das vezes este comércio é realizado através de uma cadeia de intermediários, que servem como elo entre os produtores que não têm condições de escoar seus produtos e o consumidor final.

O controle de qualidade se resume em análise visual da argila durante a extração e no abastecimento da maromba, sendo realizado pelo proprietário ou por outra pessoa com experiência. A secagem natural é utilizada pela totalidade dos oleiros, sendo que durante o período da estação das chuvas a secagem é bem mais demorada e ocorre uma queda na produção. Esta secagem é feita em prateleiras de madeira, levando até quatro semanas para que os produtos percam um significativo teor de umidade, adequando os mesmos à etapa posterior do processo produtivo. Após a secagem das peças, é realizada a queima em fornos. O forno, em geral, é inadequado para a atividade desenvolvida, o que causa um elevado consumo de lenha, contribuindo para o desmatamento acelerado da caatinga. A energia gerada pela combustão nos fornos, durante o processo de queima dos produtos ainda não é utilizada, mas poderia ser aproveitada na pré-secagem dos produtos que se encontram nas prateleiras, através de uma câmara de secagem (estufa). Os resíduos de produção surgem principalmente após a queima, quando se observa a importância de uma secagem eficiente, pois se o produtor não tiver uma secagem adequada, o produto tenderá a trincar com maior facilidade, apresentando alteração nas peças e resultando numa queima não uniforme.

A dificuldade para compra de maquinários novos é elevada. Dentre as principais dificuldades para sua aquisição destacam-se, por ordem de relevância: falta de capital dos produtores, falta de linhas específicas de crédito, custo elevado do equipamento, falta de escala de produção e problemas com insumos para a produção.

Até o momento não há exploração racional das jazidas46. A maioria dos oleiros realiza a extração de sua própria matéria-prima47. As dificuldades mais comuns durante a extração é o mau aproveitamento das jazidas, a dificuldade de transporte e a qualidade da argila. Outro insumo utilizado no processo produtivo é a lenha, que serve como combustível no aquecimento dos fornos, por ocasião da queima das peças (tijolos e telhas). Esta lenha provém em sua maioria da caatinga, porém possuem um baixo poder energético, gerando assim, um grande consumo.

Os produtores nunca consultaram nenhuma entidade que fornecesse informações tecnológicas relativas à atividade. Pode-se, em grande parte, atribuir este fato à característica dos produtores que apresentam elevado índice de analfabetismo. Isto é notório, pois tais produtores não fazem um controle de perdas e ganhos na sua produção, desconhecendo informações básicas referente à gestão de seu negócio. Dentre os poucos

46 Não há preocupações com questões ambientais, com o aproveitamento das argilas consideradas impróprias para uso nas olarias e com daquelas que se encontram em maiores profundidades.47 A de extração de matéria-prima é considerada a mais dura das etapas do processo produtivo, onde o barreiro se expõe integralmente ao perigo, correndo risco de vida.

123

Page 124: Alto Sertão - SE

que buscaram por algum tipo de informação, as mais requisitadas, por ordem de importância são: fontes de financiamento; fornecedores de máquinas e equipamentos; processo de produção e controle de qualidade; fornecedores de matéria-prima e insumos; mercados de atuação e oportunidades de negócios; extensão tecnológica; assistência técnica; treinamento de recursos humanos; transferência de tecnologia e normas técnicas; e, publicações técnicas. As principais dificuldades na obtenção destas informações, segundo o grau de importância são: falta de divulgação das informações existentes; desconhecimento dos centros/serviços de informação; desinteresse ou demora no atendimento; excesso de burocracia; pessoal de atendimento não qualificado; baixo nível de instrução dos produtores; disponibilidade financeira; volume de produção não justificar e inadequação dos meios de divulgação.

Por fim é importante destacar que existe um certo descontentamento dos produtores com a atividade realizada, pois não há nenhuma proposta concreta que proporcione melhorias na estrutura econômica setorial. Este quadro assume uma relevância considerável para a localidade e se nenhuma medida for tomada, no sentido de viabilizar condições de trabalho satisfatórias ao setor, a mudança de atividade torna-se inevitável.

III.3. Perfil da Gestão e Fôlego das Finanças- desafios ao desenvolvimento nos municípios do alto sertão sergipano -

No Brasil, a observação do convivo a concentração populacional em meio a espaços vazios, a condensação espacial e pontual de atividades produtiva versus a atrofia econômica na maioria dos territórios, entre outras, é a marca de cinco séculos de existência. Essas realidades sociais e econômicas dos territórios, marcadas por profundas disparidades intrarregional e interrregional e mal caracterizadas como “problemas regionais” inseridos no limitado alcance da moldura que padroniza a divisão macrorregional em vigor, lançam desafios na busca por uma concepção de desenvolvimento que: i) seja capaz de traduzir a diversidade; ii) em formas oportunas e criativas de inserção; iii) e que no plano das idéias possibilite a conexão entre boas políticas e boas instituições.

A bússola de orientação do escopo deste diagnóstico, ao traçar uma radiografia do território combinada por uma visão temática ampla e específica , tem tido a preocupação constante em ajustar o exercício de construção do trabalho à percepção heterogênea da superestrutura e das estruturas de base que incidem, articulam e compõem o Território do Alto Sertão Sergipano – TASS . Parte-se da idéia de considerar o TASS como parte e reflexo de uma estrutura maior nacional/ regional e como território formado pela composição de partes menores. Essas considerações permitem de partida uma utilidade metodológica ao trabalho pelas seguintes razões: i) a idéia de considerar que a superestrutura exerce uma influencia determinantes sobre o território; ii) e que, vis-à-vis, o território também manifesta pressões das estruturas de base local.

Como método de trabalho específico deste subitem, ao desenvolver o tema “Perfil da Gestão e Fôlego das Finanças: Desafios ao Desenvolvimento nos Municípios do Alto Sertão Sergipano a partir do acima referido referencial, optou-se por incorporar e articular uma leitura de tipologias de indicadores até um passado próximo ignoradas: ora por descaso; ora por falta de informação confiável e homogeneizada para o território nacional e suas divisões federativas.

124

Page 125: Alto Sertão - SE

Desta forma, o conjunto de indicadores debatidos nesta sessão, com o objetivo mapear a heterogênea realidade em movimento, articula a apresentação de: i) indicadores de resultados; ii) combinados a indicadores de esforço e processo institucionais e políticos. Foi com este referencial que se elegeu uma concepção audaciosa ao apresentar os aspectos do desenvolvimento da gestão e das finanças dos municípios do TASS a partir da compreensão de três dimensões: resultados de curto prazo; esforços realizados pelas gestões nos municípios na direção da melhoria dos indicadores; e participação, que significa, sobre tudo gerar mecanismos institucionais que permitam a transparência das ações sociais.

III.3.1. Marcos da estrutura federativa: tendências e evidencias no território

A partir sobre tudo dos anos 90, a idealização do desenvolvimento passou a ser pautado pela noção de sustentabilidade, seja esta financeira, econômica, ambiental, política, etc; exigindo do local capacidade de solucionar problemas de forma autônoma, valendo-se do conhecimento da própria realidade, das relações entre seus integrantes, das vocações, das potencialidades e dos recursos disponíveis ou passíveis a serem construídos ou atraídos para o território em questão.

Todas essas mudanças mantêm uma forte correlação, no campo das reformas institucionais implementadas pela supre-estrutura, com as diretrizes mundiais das últimas décadas, motivadas pela crise dos Estados Nacionais, resultando em movimentos de descentralização política e um conjunto bem definido de reformas. Nos países como o Brasil, a crise de ordem econômica-financeira levou o Estado a organizar um brutal esforço em busca da estabilização econômica, do ajuste fiscal e da harmonia financeira dos seus entes federativos. Com isso, apesar dos governos locais e suas atribuições constitucionais os deixarem muito próximos da população, a efetividades de suas ações têm sido díspares.

Um dos principais marcos na estrutura federativa municipal evidenciada no país recentemente – a descentralização política, proporcionou efeitos diversos. Na sua concepção mais ampla o processo de descentralização sacramentou e reforçou o que era uma realidade a muito: a evidencia do poder político local. Importantes movimentos atuaram no início da Assembléia Constituinte de 1984 em defesa dos municípios. O grupo político da frente municipalista empenhou-se nas proposições de revisão dos mecanismos das leis tributárias, com o propósito direto de rever a redistribuição dos recursos da federação e a eliminação dos mecanismos políticos de controle aos repasses. No plano tributário, a nova Constituição instituiu em vários artigos dispositivos que dotaram os municípios de novas fontes de arrecadação e limitaram ações clientelistas do governo central.

Dentre o conjunto amplo de reformas positivas, a partir de 1988, o poder municipal passou obrigatoriamente a incorporar a dimensão social nos Planos Diretores, que no passado se ocupavam prioritariamente da estruturação do espaço físico nos municípios. As Câmaras Municipais passaram a ser responsáveis pela elaboração das Leis Orgânicas Municipal – LOM, que por sua vez garantiu a instauração dos Conselhos Municipais como forma de garantir a descentralização do poder e o incentivo à participação da sociedade civil e de classes na administração do município.

Foi introduzia à agenda municipal um conjunto instrumentos legais, como: o Plano Plurianual de Investimentos; a Lei de diretrizes Orçamentárias – LDO; a Lei de Orçamento

125

Page 126: Alto Sertão - SE

Anual – LOA; e o Plano de Governo. De forma complementar, um conjunto de instrumentos ao planejamento do município foi incorporado, sendo sem dúvida a mais importante normatização constitucional que obrigou a elaboração e a implantação dos Planos Diretores por todos os municípios com mais de 20.000 habitantes, no presente alterada tornando-se obrigatória para todos os municípios brasileiros até o ano de 2006. Outro aspecto importante, diz respeito à articulação entre os Planos Plurianual e os Planos Diretores, definindo dotação orçamentária e diretrizes de planejamento que englobem todo o território municipal. Também foram assegurados direitos à participação das associações representativas da sociedade na elaboração dos Planos Diretores, com direitos a fiscalização e controle da execução destes planos.

Paralelamente, este movimento pós Constituição Federativa de 1988, que descentralizou a gestão em direção das esferas federativas municipais no Brasil, passou ao poder local de responsabilidades na oferta e provisão dos bens públicos. Como fonte orçamentária representativa os municípios fortaleceram-se com os recursos oriundos do Fundo de Participação dos Municípios; o que levou um conjunto de autores a classificar o processo de descentralização dos recursos tributários, acima de tudo, como um processo de municipalização da receita.

Diferentemente da tese defendida correntemente, deve-se ressaltar que este movimento, que em tese trabalhou com a formatação de uma nova institucionalidade federativa, não recebeu a atenção formal de instrumentos gradativos de planejamento, resultando em um processo desordenado de descentralização de encargos. Sobretudo nos municípios de pequeno e pequeno-médio porte, como no caso dos municípios que compõem o TASS. Conseqüentemente, sob o ponto de vista da gestão e dos recursos disponíveis a fazer frente aos desafios colocados, os municípios enfrentam, como unidades federativas independentes, condições desiguais e apesar deste novo paradigma se materializar através de instituições e de instrumentos à realização do desenvolvimento de forma homogênea, estes são, na maioria das vezes, apropriados apenas pos alguns.

O movimento municipalista consolidou a tendência à descentralização fiscal e o aumento da participação dos municípios na receita disponível. Mas, num exemplo claro de guerra hobbesiana, concomitantemente os critérios de partilha dos recursos do Fundo de Participação dos Municípios (FPM) estimularam a criação de novos municípios, sem que os valores da composição do fundo fossem ampliados. A instalação dos novos municípios no Brasil, possibilitou a formação de unidades federativas classificados majoritariamente como pequenas ou micro, com populações oscilando entre 5.000 e 20.000 habitantes. Assim, no Nordeste, a exemplo das demais macrorregiões do país, entre no entre 1970-1980, apenas um município havia sido instalado, este número sobe para 134 entre 1980-2000 e para 276 na década seguinte.

No caso específico de Sergipe e do TASS a estratégia de criação de novos municípios, com forma de apropriação de parcelas do FPM, não foi verificada. Na composição dos municípios que formam o TASS, os dados demonstram que ano de criação desses municípios oscilam entre a primeira metade do séc. XIX e a primeira metade do séc. XX, conforme dados da tabela 54.

126

Page 127: Alto Sertão - SE

Tabela 54

Ano de instalação dos municípios do TASS

Município

Porto da

Folha Gararu

Nsa Sra. da

Glória Poço Redondo

Canindé de São

Francisco

Monte alegre

de Sergipe

Ano de instalação 1835 1877 1928 1953 1953 1953Fonte: SIDRA, IBGE.

Paralelamente, nas estruturas de base o que se consolidou no Brasil ao longo das três últimas décadas foi um processo de urbanização acelerado, caracterizando por originar situações de heterogeneidade e pressão sobre partes do território nacional e sobre uma frágil estrutura da malha municipal, destacando-se: i) a interiorização do fenômeno urbano; ii) a acelerada urbanização de áreas de fronteira econômica; iii) o crescimento das cidades médias; iv) a periferização dos centros urbanos; e v) a formação e consolidação de aglomerações urbanas metropolitanas e não-metropolitanas, que não se restringiram apenas a movimentos pendulares centrípetos dentro das fronteiras regionais.Os estudos recentes evidenciam aspectos fundamentais da conformação da rede nacional de municípios, tais como:

• diferenciação, tanto na configuração territorial como no ritmo de desenvolvimento, entre os diversos sistemas que compõem a rede;

• disparidades nas condições de vida e de acesso aos serviços públicos por parte da população, que se manifestam na própria estruturação do sistema urbano;

• adensamento populacional no entorno de núcleos urbanos de grande porte e a tendência à conformação de novos sistemas a partir da consolidação de centros de polarização emergente;

• metropolização da rede urbana nacional, com diferenciações regionais importantes; e

• dispersão espacial de pequenos centros urbanos, que assumem importância fundamental na organização do território em áreas agrícolas.

Num esforço de síntese, pode-se afirmar que as características atuais e as deformações da rede municipal na Região Nordeste podem ser ainda reforçadas comparativamente ao quadro nacional apresentado. As disparidades entre os diversos grupos de municípios se acentuam, em decorrência sobre tudo da perda de dinamismo dos centros regionais. A organização territorial tende ainda a ser mais desequilibrada, devido à intensificação do processo de urbanização em direção apenas a determinados espaços nacionais e sub-regionais, num fenômeno caracterizado pela litoralização da ocupação. Essa recomposição do território constitui a resposta espacial ao caráter seletivo dos investimentos que privilegiam espaços específicos.

O fluxo e movimento da população regional obedeceram a esses estímulos. Assim, a participação da população do Nordeste no total da população brasileira apresenta uma queda entre 1980 e 1991, repetindo a mesma tendência entre 1991 e 2000 (vide tabela 55). E enquanto em 2000 a taxa de urbanização Brasil foi de 81%, o grau de urbanização no Nordeste foi de 69%, reafirmando uma tendência mais lenta a urbanização do território, constatada pelos dados do Censo 2000, IBGE, que classifica a Região Nordeste como a macrorregião brasileira com maior concentração populacional em áreas rurais.

127

Page 128: Alto Sertão - SE

Os dados do Censo Demográfico 2000 (IBGE) mostram que a taxa de crescimento anual da população nordestina acentua uma tendência declinante, passando de 1,83% (na década de 1980) para 1,30% (na década de 1990), acompanhando de certa forma a tendência da taxa de crescimento brasileira no período.

Uma análise mais detalhada permite constatar que alguns municípios registraram taxa média geométrica de crescimento anual da população, no período 1991-2000, superior à média nacional. Na mesma década, populações em determinados municípios do Maranhão, Piauí, Ceará, Alagoas, Sergipe e Bahia cresceram acima da média nacional. Assim, é possível identificar manchas de crescimento como sendo fruto essencialmente de um processo de imigração e/ou retorno de mão-de-obra qualificada. As maiores taxas de crescimento no período 1991-2000 foram registradas em municípios considerados de tipologia pequeno-médio e médio, como as apresentadas pelos municípios que compõem o TASS48, e cuja taxa de crescimento populacional no período registrada foi de 2,1 , frente as taxas de crescimento de 2,0 e 1,6 para Sergipe e Brasil respectivamente.

Já o desenho da malha municipal da região Nordeste revela uma população regional distribuída em 1.787 municípios, aproximadamente 32% do total de municípios brasileiros, correspondendo a 28% da população nacional. No Nordeste, a Bahia é o estado com o maior número de municípios, correspondendo a 24% do total, sendo Sergipe o estado com menor número de municípios (4%). Os demais estados, individualmente, contribuem aproximadamente com 12% para o total de municípios da região.

Essa malha regional tem por características mais evidentes: i) a grande concentração populacional no eixo litorâneo, frente a uma intensa malha municipal constituída por pequenos municípios de baixa densidade populacional; significativas disparidades intra-regionais e inter-pessoais de produtividade, renda, instrução; e perfil ambientais heterogêneas, com alguns subespaços apresentando condições adversas, essas sobre tudo presentes em grande parte do território ocidental da região – o semi-árido nordestino.

Gráfico 14Perfil Municipal Nordeste, 2000.

1787

29

0 500 1000 1500 2000

Total municipios NE

Total municipios NE com + de150.000 hab.

Fonte: Censo Demográfico 2000, IBGE.

Gráfico 15Crescimento populacional nos estados da Região Nordeste, 1970-2000.

48 O TASS é composto pelos seguintes municípios: Canindé de São Francisco, Gararu, Monte Alegre de Sergipe, Nossa Senhora da Glória, Poço Redondo e Porto da Folha.

128

Page 129: Alto Sertão - SE

0

3000000

6000000

9000000

BA PE MA CE PB PI AL RN SE

1970 1980 1991 2000

Fonte: Censo Demográfico 2000, IBGE.

129

Page 130: Alto Sertão - SE

Tabela 55População e taxas de urbana/ rural Brasil e Nordeste, 1970-2000.

1970 1980 1991 2000BrasilPopulação total 93.134.846 119.011.052 146.825.475 169.799.170Urbana 52.097.260 80.437.327 110.990.990 137.953.959Rural 41.037.586 38.573.725 35.834.485 31.845.211Urbana % 55,94 67,59 75,59 81,25Rural % 44,06 32,41 24,41 18,75NordestePopulação total 28.111.551 34.815.439 42.497.540 47.741.711Urbana 11.756.451 17.568.001 25.776.279 32.975.425Rural 16.355.100 17.247.438 16.721.261 14.766.286Urbana % 41,82 50,46 60,65 69,07Rural % 58,18 49,54 39,35 30,93

Fonte: Censo Demográfico 2000, IBGE.

De acordo com dados do Censo IBGE de 2000 (vide gráfico 16.), dos 1787 municípios existentes na região, apenas 29 puderam ser classificados49 como grande e médio-grande. Esses 29 municípios respondem por 32% da população total da região. No outro extremo, dos 1787 municípios da região, 1248 foram classificados como pequenos, cuja população oscila até 20.000 habitantes. Para o mesmo ano no estado de Sergipe a malha municipal apresentou os seguintes contornos, vide classificação do IBGE: i) apenas um município foi classificado como grande; ii)cinco municípios foram classificados como médios; sendo os demais classificados como pequeno-médios e pequenos (12 e 57 municípios respectivamente).

Gráfico 16Região Nordeste: peso relativo (%) do número total de municípios por Estado

24,24

12,91

12,68

10,81

10,75

9,70

5,90

4,38

13,03

0,00 5,00 10,00 15,00 20,00 25,00 30,00

BA

PB

PI

M A

PE

CE

RN

AL

SE

número relativo (%) de municípios

SEALRNCEPEMAPIPBBA

Fonte: Censo Demográfico 2000, IBGE.

49 Classificação dos municípios por faixa populacionalTipoPorteFaixa PopulacionalIPequenoaté 20.000 hab.IIPequeno - médiode 20.001 até 50.000 hab.IIIMédiode 50.001 até 150.000 hab.IVMédio - grandede 150.001 até 300.000 hab.VGrande e capitaisacima de 300.000 hab.Fonte: PNAFM (1998), IBGE.

130

Page 131: Alto Sertão - SE

No TASS, a malha municipal composta seis municípios pode ser dividida em duas estruturas hierárquicas, no que tange a observação classe tamanho: i) Nossa Senhora da Glória, Poço Redondo e Porto da Folha são município de porte pequeno-médio; ii) Canindé de São Francisco, Gararu, Monte Alegre de Sergipe são municípios de porte pequeno - sendo Canindé de São Francisco um forte candidato a ser classificado como pequeno-médio de acordo com a tendência apontada pelas estimativas populacionais do IBGE. Importante observar que dentro da estrutura da malha municipal do estado de Sergipe, composta em no ano 2000 por 75 municípios, apenas um município recebeu a classificação de grande, cinco municípios receberam a classificação de médios, 12 municípios receberam a classificação de pequeno-médios e 57 municípios receberam a classificação de pequenos. Ou seja, na estrutura hierárquica da malha municipal do estado, o TASS concentra aproximadamente um quarto dos municípios de porte médio-pequeno, revelando, de acordo com a realidade territorial descrita, a concentração de uma matriz municipal consolidada na hierarquia estadual.

Gráfico 17Municípios do Nordeste por classe-tamanho, 1970-2000.

0 200 400 600 800 1000 1200 1400

Grande ou Capital

M édio Grande

M édio

Pequeno M édio

Pequeno

Cla

sse

-ta

ma

nh

o

ano 2000 13 16 114 396 1248

ano 1991 15 12 108 402 974

ano 1980 11 9 86 352 919

ano 1970 5 10 57 309 995

Grande ou Capital M édio Grande M édio Pequeno M édio Pequeno

Fonte: Censo Demográfico 2000, IBGE.

III.3.2. Fôlego das finanças municipais no território

No que tange à configuração da situação das finanças municipais e aspectos relacionados ao fôlego da capacidade de investimento dos municípios, o quadro é muito fragmentado, e uma análise detalhada para o Nordeste e os municípios do TASS são um bom exemplo.

A partir da observação da Base de Informação FINBRA para 2000, 521 municípios (29%) no NE não haviam sequer declarado as informações no cadastro contábil dos municípios. Daqueles que cumpriram tal obrigação, o grau de dependência frente às transferências do Fundo de Participação dos Municípios (FPM) representou 31% em relação aos valores das Receitas Correntes. Analisando este mesmo dado, mas sem considerar os 29 maiores municípios (as capitais e grande-médios municípios na região), o grau de dependência frente às transferências do FPM alcançam 40% do total das Receitas Correntes. Também aqui a média Brasil configura-se em patamares mais baixos, estando esta e demais correlações retratadas no gráfico 18 abaixo. Nele a média Brasil comparada à média NE configura-se em patamares inferiores (16,39% Brasil em contraste com 30,51% NE),

131

Page 132: Alto Sertão - SE

seguindo o mesmo padrão já identificado para os indicadores sócio-econômicos. Já a média Brasil FPM/Receita Corrente comparada à mesma média nos 29 municípios identificados como sendo as capitais e médio-grandes municípios da região é muito próxima. Para os demais municípios que somam 1758 (classificados como médios, pequeno-médios e pequenos) a relação de dependência FPM/Receita Corrente é ainda mais intensa.

Gráfico 18Brasil e Nordeste: (%) FPM /Receita Orçamentárias e Receita Corrente, 2000

38,43

15,65 16,07

28,73

40,51

30,51

17,2516,39

10

15

20

25

30

35

40

Brasil 29 municípios* Nordeste Demais 1758municípios do NE

FPM/ReceitaOrçamentária

FPM/ReceitaCorrente

Fonte: MuniNet 2003. Dados Brutos Sistema FINBRA, Secretaria do Tesouro Nacional, 2000.

No gráfico 19 o grau de dependência se expande ainda mais por terem sido construídas correlações que levam em consideração o total das transferências correntes para os municípios do Nordeste, aqui ordenados por classe tamanho de municípios, e não apenas das transferências oriundas do FPM, como detalhado no gráfico anterior. Interessante verificar que o grau de dependência dos municípios frente às transferências cresce à medida que as classes tamanho de municípios na região decrescem. Para os municípios de pequeno porte, ou seja de até 20mil habitantes, o total da receita corrente dos municípios depende em 95,76% das transferências da União e dos estados.

Gráfico 19Nordeste: (%) Transferências Correntes/ Receitas Orçamentárias e Correntes, 2000

95,75838338 93,91198268

89,8200171485,23897268

60,24992926

89,66084221 89,6468810786,31446821

80,6141141

55,941347465459

6469

7479

8489

9499

Pequenos PequenosMédios

Médios Médios Grandes Grandes ouCapitais

Transferência Corrente / Receita Corrente

Transferência Corrente/Receita Orçamentária

Fonte: MuniNet 2003. Dados Brutos Sistema FINBRA, Secretaria do Tesouro Nacional, 2000.

Seguindo a mesma tendência da Região Nordeste, a situação das finanças municipais da malha do TASS também é caracterizada pela precariedade. O total dos municípios que compõem o TASS conta, em 2001, com uma receita orçamentária de R$ 71 milhões, em média de R$ 12 milhões ano por município. Comparativamente aos demais municípios do

132

Page 133: Alto Sertão - SE

Estado Sergipe, excetuando-se daqui para frente sempre a capital Aracaju e os municípios que compõem o território em análise, a situação apresenta um leve melhor desempenho (vide tabela 56 e 57).

Tabela 56Peso da composição das receitas municipais do TASS e Sergipe (valores em R$

correntes), 2001.TASS (%) Sergipe (%)

Receita Própria 5.007.848,00 6,99 14.213.419,31 2,52Transferências 66.608.309,00 93,01 549.495.993,70 97,48Total Receita 71.616.157,00 100,00 563.709.413,01 100,00

Fonte: Balanços Gerais dos Municípios in FINBRA 2001 - Secretaria do Tesouro Nacional/MF.

Tabela 57Composição das receitas no TASS e Sergipe (valores em R$ correntes), 2001.

Receita TASS media TASS* Sergipe* * media SergipeReceita Própria 5.007.848,00 834.641,33 14.213.419,31 225.609,83IPTU 50.820,00 8.470,00 1.015.971,24 16.126,53

ISS 942.818,00 157.136,33 5.413.114,20 85.922,45

ITBI 45.098,00 7.516,33 749.866,40 11.902,64

Taxas 12.274,00 2.045,67 2.392.928,56 37.982,99

Poder de Polícia 9.568,00 1.594,67 1.776.556,30 28.199,31

Prestação de Serviços 2.706,00 451,00 616.363,26 9.783,54

Outras Receitas 4.014.210,00 669.035,00 2.248.619,35 35.692,37

Transferências 66.608.309,00 11.101.384,83 549.495.993,70 8.722.158,63União 17.856.179,00 2.976.029,83 154.166.154,32 2.447.081,81

FPM 18.607.559,00 3.101.259,83 128.484.676,48 2.039.439,31

IRRF 595.423,00 99.237,17 2.992.332,18 47.497,34

ITR 35.660,00 5.943,33 174.420,07 2.768,57

Desoneração das X 576 96,00 200.491,75 3.182,41

FUNDEF 2.254.595,00 375.765,83 10.063.288,14 159.734,73

SUS 332.681,00 55.446,83 12.250.945,70 194.459,46

Estado 33.002.407,00 5.500.401,17 76.889.085,03 1.220.461,67

Cota-parte ICMS 30.454.834,00 5.075.805,67 50.802.306,62 806.385,82

Cota-parte IPVA 130.570,00 21.761,67 1.784.172,53 28.320,20

FUNDEF 2.747.623,00 457.937,17 24.301.287,88 385.734,73

SUS 0 - 759.559,00 12.056,49

Outras Transfer. 7.643.583,00 1.273.930,50 89.627.274,00 1.422.655,14

Total da Receita 71.616.157,00 11.936.026,17 563.709.413,01 8.947.768,46(-) saldo não disponível. *Nesta coluna não foi possível incluir informações exatas para o município de Porto da Folha.** Foram considerados valores para os municípios do Estado de Sergipe, excetuando-se a capital e os municípios do TASS.Fonte: Balanços Gerais dos Municípios in FINBRA 2001 - Secretaria do Tesouro Nacional/MF.

Assim, o total da receita dos municípios do Estado de Sergipe, que apresentaram os seus balanços em 2001 (R$ 560 milhões), demonstra que estes representam 97% de suas receitas oriundas das transferências da União e do Estado. Já nos municípios que compõem o TASS, esta relação cai para 93%. Em ambos os casos, realçando a fragilidade da estrutura das receitas dos municípios do Estado e dos municípios que compõem o território.

133

Page 134: Alto Sertão - SE

Tabela 58Peso (%) das receitas municipais na composição final da receita total do TASS

ReceitaCanindé de

São Francisco

Porto da Folha Gararu Nossa Senhora

da GloriaMonte Alegre

PoçoRedondo TASS

Total da Receita 35.9 9.2 4.3 9.2 3.7 8.5 71.08

Total da Receita (%)

50,57 13,00 6,09 13,07 5,25 12,01 100

Neste subconjunto de 6 municípios que integram a TASS, o município de Canindé de São Francisco efetivamente se diferencia, na medida em que a sua receita corresponde a 50% da receita total dos municípios do TASS e, mais significativamente ainda, a sua receita própria representa 85% da receita própria do território. O enorme diferencial na capacidade de tributação dos municípios da TASS fica mais evidente quando se compara a receita própria de Canindé de São Francisco frente aos demais municípios.

Mesmo considerando Canindé de São Francisco no cômputo da receita própria dos municípios da TASS, constata-se a grande dependência destes em relação às transferências da União e do Estado do Sergipe. Em média, a participação da receita própria foi de 12%, o que indica que 88% dos recursos disponíveis dessa municipalidade tiveram sua origem nas outras esferas de governo. Este indicador se agrava na medida em que comparamos os demais municípios que compõem o TASS. Outra característica marcante não só nos municípios d território, como também nos demais municípios do Sergipe, é que essa dependência é altamente concentrada nos recursos repassados pela União, excetuando o caso de Canindé de São Francisco, cuja principal parcela de recursos de transferência tem origem no estado de Sergipe (vide tabela 58). Comparando as médias do TASS com as médias encontradas para Sergipe, mais uma vez excetuando-se o município de Canindé de São Francisco, o grau de dependência dos repasses federais é evidente.

Uma análise mais detalhada da composição da receita própria dos municípios do TASS revela que a arrecadação do IPTU é irrisória e, fato interessante, não é o município de Canindé de São Francisco que apresenta melhor desempenho. Em termos reais, ao compararmos a receita obtida em 2001 com esse imposto, dos 6 municípios do território é o município de Nossa Senhora da Glória quem melhor arrecadou. Em Gararu, seguido por Monte Alegre, a arrecadação é irrisória. Registra-se, contudo, que a arrecadação do IPTU apesar de ser insignificante para o Estado de Sergipe, tem um melhor desempenho quando comparado ao desempenho do TASS. Observava-se aqui que os municípios, tanto do Estado de Sergipe como do TASS, no que se refere ao IPTU, ainda não cumprem um dos requisitos essenciais da responsabilidade na gestão fiscal, que consiste em recolher todos os impostos municipais. Notadamente, sem capacidade para fazer frente à nova institucionalidade imposta pela Lei de Responsabilidade Fiscal, seja por aspectos que se relacionam com o desempenho econômico dos seus municípios, seja por questões que encontram base nos valores culturais locais.

Já a receita de ISS dos municípios da TASS consegue ter representatividade na composição das receitas no município de Canindé de São Francisco, principalmente, e com relativa importância no município de Nossa Senhora da Gloria, sendo inclusive ambas as

134

Page 135: Alto Sertão - SE

participações superiores à registrada nos demais municípios do Sergipe. Os demais municípios do TASS têm desempenho inferior frente à média estadual.

Como assinalado anteriormente (vide tabela 58), a importância das transferências na receita dos municípios da área do TASS é muita elevada (em média, 93% da receita disponível) e chegou a ser de 99% no caso dos municípios de Porto da Folha e 98% no município de Gararu, para os anos em análise. O Fundo de Participação dos Municípios representou o maior peso dos recursos do território, mas tem uma ponderação ainda mais significativa em 5 municípios do TASS. Em seguida, pela ordem de importância, destacaram-se os recursos do FUNDEF-Estado, a cota-parte do ICMS (com peso significativo sobretudo para o município de Canindé de São Francisco devida à localização da Usina Hidrelétrica de Xingó). Já os repasses do SUS foram apenas observados no município de Gararu. Além disso, as outras transferências (não identificadas nos dados dos balanços) são significativas e sobressaem-se quando comparadas ao montante recebido pelos municípios do TASS.

135

Page 136: Alto Sertão - SE

Tabela 59

Receita dos municípios da TASS. Sergipe e Brasil, 2001(valores em R$ correntes).Receita Canindé de

São Francisco Porto da Folha Gararu Nossa Senhora da

GloriaMonte Alegre Poço

RedondoTASS

Receita Própria 4.285.915,00 138.447,00 80.263,00 252.226,00 79.400,00 171.597,00 5.007.848,00IPTU 1.792,00 2.046,00 101,00 41.491,00 469,00 4.921,00 50.820,00ISS 676.185,00 20.597,00 29.983,00 96.036,00 28.281,00 91.736,00 942.818,00ITBI 5.080,00 - 4.716,00 29.132,00 5.350,00 820,00 45.098,00Taxas 3.592,00 - 1.529,00 0,00 4.447,00 2.706,00 12.274,00Poder de Polícia 3.592,00 - 1.529,00 0,00 4.447,00 0,00 9.568,00Prestação de Serviços 0,00 - 0,00 0,00 0,00 2.706,00 2.706,00Outras Receitas 3.607.938,00 115.804,00 50.179,00 114.699,00 50.650,00 74.940,00 4.014.210,00Transferências 31.678.101,00 9.101.812,00 4.558.216,00 9.051.043,00 3.660.243,00 8.558.894,00 66.608.309,00União 3.150.228,00 - 2.405.794,00 4.912.595,00 2.179.954,00 5.207.608,00 17.856.179,00FPM 2.942.134,00 3.904.262,00 2.002.880,00 4.021.741,00 2.143.393,00 3.593.149,00 18.607.559,00IRRF 203.634,00 66.053,00 51.828,00 122.415,00 35.136,00 116.357,00 595.423,00ITR 4.460,00 - 17.829,00 4.950,00 1.425,00 6.996,00 35.660,00Desoneração das X 0,00 0,00 576,00 0,00 0,00 0,00 576,00Salário-educação 0,00 0,00 0,00 0,00 0,00 0,00 0,00FUNDEF 0,00 - 0,00 763.489,00 0,00 1.491.106,00 2.254.595,00SUS 0,00 - 332.681,00 0,00 0,00 0,00 332.681,00Estado 27.253.263,00 - 537.891,00 2.304.397,00 1.169.051,00 1.737.805,00 33.002.407,00Cota-parte ICMS 27.238.877,00 626.086,00 533.869,00 802.271,00 632.963,00 620.768,00 30.454.834,00Cota-parte IPVA 14.386,00 10.183,00 4.022,00 84.217,00 7.328,00 10.434,00 130.570,00FUNDEF 0,00 - 0,00 1.417.909,00 526.811,00 802.903,00 2.747.623,00SUS 0,00 - 0,00 0,00 0,00 0,00 0,00Outras Transferências 1.267.998,00 1.167.439,00 1.326.059,00 1.839.001,00 310.808,00 1.732.278,00 7.643.583,00Total da Receita 35.949.658,00 9.240.259,00 4.685.644,00 9.289.529,00 3.734.663,00 8.783.491,00 71.082.475,00

(-) saldo não disponível.Fonte: Balanços Gerais dos Municípios in FINBRA 2001 - Secretaria do Tesouro Nacional/MF.

136

Page 137: Alto Sertão - SE

Já as despesas totais (vide tabela 60) do conjunto de informações disponível para os seis municípios da TASS atingiram R$59 milhões em 2001, dos quais R$48 milhões foram despendidos em custeio, o que corresponde a 81% do total. Apesar deste percentual de comprometimento das despesas com custeio ter sido muito elevado para o ano em análise (2001), ficou abaixo da média do Estado de Sergipe de 83%, mas acima da média dos municípios brasileiros 72%. Do montante total do gasto no TASS, 13% das despesas correspondem a investimentos, similar à média de 12% nos demais municípios do Sergipe.

Os gastos com custeio estão concentrados no pagamento de salários do pessoal ativo, que absorveu 37% dos gastos total no TASS, valor próximo aos 32% da média dos demais municípios do Sergipe. Ainda assim há situações, como a de Nossa Senhora da Glória e Poço Redondo, onde o gasto alcançou aproximadamente o total de R$4 milhões com o pagamento de ativos, comprometendo 41% e 44% do total da despesa respectivamente. Importante observar para o TASS que, se adicionarmos ao gasto com pessoal ativo a contratação de serviços de terceiros, os quais configuram substituição de funcionários , mais o montante despendido com encargos sociais, no ano de 2001 o total de comprometimento dos gastos chega a 64% do total da despesa . Vale lembrar que a análise da despesa com pessoal de acordo com os parâmetros da Lei de Responsabilidade Fiscal, estipula um limite para esse gasto na proporção de 60% Receita Corrente Líquida – RCL, como demonstrado a seguir na tabela 60.

137

Page 138: Alto Sertão - SE

138

Tabela 60

Despesa dos municípios da TASS, Sergipe e Brasil, 2001 (valores correntes).Despesas Canindé de

São FranciscoPorta da Folha Gararu Nossa Senhora

da GloriaMonte Alegre Poço Redondo TASS

Despesas Correntes

Custeio 25.248.965,00 - 3.641.620,00 8.250.293,00 3.198.798,00 8.131.421,00 48.471.097,00

Pessoal Ativo 11.975.881,00 - 1.138.405,00 3.786.528,00 1.240.019,00 3.957.954,00 22.098.787,00

Obrigações Patronais 1.695.420,00 - 185.718,00 487.328,00 291.548,00 319.012,00 2.907.026,00

Terceirização e Outras 0,00 - 0,00 0,00 0,00 0,00 0,00

Serviços de Terceiros 7.485.653,00 - 1.463.589,00 1.895.220,00 933.573,00 1.874.662,00 13.652.697,00

Outros Custeios * 4.092.011,00 - 729.846,00 2.081.217,00 718.923,00 15.208,00 7.637.205,00

Transferências 2.286.037,00 - 254.697,00 225.688,00 120.961,00 43.352,00 2.930.735,00

Aposentados e Pensionistas 0,00 - 0,00 149.484,00 1.986,00 0,00 151.470,00

Salário-Família 0,00 - 0,00 0,00 49.680,00 0,00 49.680,00

Contribuição PASEP 0,00 - 30.421,00 41.003,00 23.628,00 36.466,00 131.518,00

Demais 0,00 - 124.062,00 0,00 14.735,00 1.964.585,00 2.103.382,00

Despesas de Capital 5.788.449,00 - 841.835,00 478.736,00 332.338,00 530.235,00 7.971.593,00

Investimentos 5.788.499,00 - 841.835,00 476.236,00 309.388,00 516.735,00 7.932.693,00

Inversões 0,00 - 0,00 2.500,00 22.950,00 13.500,00 38.950,00

Amortizações 0,00 - 0,00 0,00 0,00 0,00 0,00

Despesa Total 33.323.501,00 - 4.738.152,00 8.954.717,00 3.652.097,00 8.705.008,00 59.373.475,00

(-) saldo não disponível.Fonte: Balanços Gerais dos Municípios in FINBRA 2001 – Secretaria do Tesouro Nacional/MF.Outros Custeios podem referir-se a sentenças judiciais ou despesas de exercícios anteriores.

Page 139: Alto Sertão - SE

III.3.3. Perfil da gestão municipal no TASS

A distribuição espacial dos municípios do TASS configura uma rede heterogênea que apresenta desafios à gestão dos municípios. Nesse contexto, embora existam problemas de extrema relevância relacionados ao financiamento do desenvolvimento propriamente dito, à luz dos dados da estrutura das receitas e despesas detalhados no capítulo anterior, há outra ordem de problemas associados à falta ou inadequação de políticas e instrumentos que permitam melhorar tanto a orientação do crescimento quanto o enfrentamento dos problemas. Estes problemas se relacionam, entre outros, com: i) a estrutura administrativa encontrada nos municípios e o volume de recursos disponíveis para operação da gestão; ii) a legislação e os instrumentos de planejamento municipais em uso; e iii) a descentralização e desconcentração administrativas.

Estrutura administrativa dos municípios da TASS

Informações levantadas para Brasil, da Pesquisa de Informações Básicas Municipais 2001 do IBGE, indicam que em média 53,5% dos municípios empregam um máximo de 300 funcionários na administração direta. A pesquisa estimou que os municípios brasileiros dispunham em 2001, em média, de 31 funcionários por grupo de 1.000 habitantes. Embora este valor não aparente ser elevado, qualquer avaliação sobre sua dimensão e magnitude depende do elenco e dos serviços prestados pelas administrações. O mesmo dado para os municípios da TASS e Estado do Sergipe (exclusive Aracaju) pode ser observado na tabela 61 para o ano de 2001. Como a avaliação do desempenho deste indicador para a TASS e a média do Estado de Sergipe disponível permite comparações, por se tratar dos mesmos anos de observação, assim sugere-se a comparação com a média Sergipe como parâmetro. Canindé de São Francisco é o município que, de longe, dispõe da média mais alta: 14,9 habitantes para cada funcionário ativo, ou seja, aproximadamente o dobro de funcionários por habitantes se comparados à média TASS e à média Sergipe, assim como a média que se apresenta para os demais município. Observa-se que, por este critério, o município de Poço Redondo dispõe de um funcionário para cada 35,8 habitantes, configurando a menor relação entre os municípios da TASS.

Tabela 61Relação população dos municípios do TASS e funcionários na ativa, 2001.

Canindé de São Francisco

Porta da Folha

Gararu

Nossa Senhora da Gloria

Monte Alegre

Poço Redondo

TASS Sergipe 1

Habitantes 18.520 25.90

0

11.47

4 27.338

11.82

2 26.728

121.78

2

1.322.94

1Funcionários Ativos 1.242 916 386 874 450 746 4.614 43.8912

Habitantes/ Funcionários Ativos 14,9 28,3 29,7 31,2 26,3 35,8 26,4 30,1Fonte: Balanços Gerais dos Municípios, FINBRA 2001. Secretaria do Tesouro Nacional/MF e Censo

2000 - IBGE.Nota: 1. Dados para o Sergipe excluem Aracaju. 2. Funcionários ativos da administração direta.

139

Page 140: Alto Sertão - SE

Os gastos com funcionários ativos (vide tabela 62), já no item anterior sob ótica fiscal, quando analisado na intenção de decompor a estrutura administrativa da TASS, encontra espelho nos dados para Brasil. Em 2001, segundo a Pesquisa de Informações Básicas Municipais do IBGE, a média nacional refletia a seguinte situação: 44% dos municípios comprometiam entre 20% e 40% dos seus gastos com o pagamento dos funcionários ativos. Já 48% dos municípios gastavam entre 40% e 60% com a folha de funcionários ativos. Os dados de despesa com ativos no TASS para o ano 2001, fonte Balanços Gerais dos Municípios – Secretaria do Tesouro Nacional/MF, onde se destacam por mau desempenho, sob a ótica fiscal, os municípios de Nossa Senhora da Glória e Porto Redondo. Em melhor posição encontram-se os municípios de Gararu, e Monte Alegre, que comprometem 24% e 34% , respectivamente, das suas despesas com funcionários ativos. Neste indicador, a média do Estado de Sergipe encontra-se abaixo da média Brasil e a média TASS acima da média Sergipe e média Brasil. A importância da análise que envolve a relação entre as despesas com os funcionários ativos e inativos e as receitas totais das prefeituras fornece a este estudo elementos para reflexão sobre o peso da folha salarial nas receitas municipais.

Tabela 62

Despesa como % da despesa total do TASS, Sergipe e Brasil, 2001.

Canindé de

São Francisco

Porta

da

Folha

Garar

u

Nossa

Senhora da

Gloria

Monte

Alegre

Poço

Redondo

TAS

S

Sergipe 1

Brasil 2

Custeio 78% - 77% 92% 87% 93% 81% 83% 72%Pessoal Ativo 36% - 24% 42% 34% 45% 37% 32% 34%Obrigações

Patronais5% - 4% 5% 8% 4% 5% 7% 5%

Terceirização e

Outras 0% - 0% 0% 0% 0% 0% 0,3% 2%

Serv. De Terceiros 22% - 31% 21% 25% 21% 23% 26% 21% Outros Custeios 3 12% - 15% 23% 20% 0,2% 13% 13% 11%Transferências 7% - 5% 2% 3% 0,5% 5% 3% 12%Aposentadorias-

Pensões0% - 0% 2% 0,05% 0% 0,2% 0,5% 3%

Salário-Família 0% - 0% 0% 1% 0% 0,08% 0,1% 0%Contribuição

PASEP0% - 0,6% 0,4% 0,6% 0,4% 0,2% 0,7% 1%

Demais 0% - 3% 0% 0,4% 22% 3% 4% 3%Capital 17% - 18% 5% 9% 6% 13% 13% 12%Investimentos 17% - 18% 5% 8% 6% 13% 13% 10%Inversões 0% - 0% 0,02% 0,6% 0,1% 0,06% 0,2% 0%Amortizações 0% - 0% 0% 0% 0% 0% 0% 2%Despesa Total 100% - 100% 100% 100% 100% 100% 100% 100%Fonte: Balanços Gerais dos Municípios in FINBRA 2001 – Secretaria do Tesouro Nacional/MF.

Nota: 1. Dados para o Sergipe abrangem 70 municípios que apresentaram o balanço e excluem a despesa de Aracajú e a despesa dos 6 municípios do TASS. 2. Informações que referem-se a 4.860 municípios (exclusive as capitais). 3. Outros Custeios podem referir-se a sentenças judiciais ou despesas de exercícios anteriores.

Legislação e instrumentos de planejamento municipais

140

Page 141: Alto Sertão - SE

A Constituição de 1988 tornou obrigatórios alguns instrumentos básicos de planejamento e, ao lado destes, outros têm sido utilizados para um melhor desempenho das ações de planejamento municipal. O objetivo de se levantar tais informações para os municípios do TASS, com base na pesquisa Perfil dos Municípios Brasileiros 2004, é de verificar com quais instrumentos os municípios efetivamente estão trabalhando com a finalidade de melhor elaborar o planejamento municipal. Foram levantadas informações sobre um conjunto de instrumentos importantes para o planejamento municipal (vide quadros 6-11). A idéia aqui desenvolvida foi traçar um perfil dos municípios a partir da aplicabilidade dos seguintes instrumentos: Lei de Diretrizes Orçamentárias (LDO), Lei de Orçamento Anual (LOA), Plano Diretor, Lei de Perímetro Urbano, Lei de Parcelamento do Solo, Lei de Zoneamento ou equivalente; Cadastro do IPTU; Cadastro de ISS ; e Taxas Instituídas.

Quadro 7Canindé de São Francisco

Legislação e Instrumento de Planejamento no Município

Lei de diretrizes orçamentárias (LDO) – existência Sim

Lei de orçamento anual (LOA) – existência Sim

Plano Diretor – existência Não

Lei de perímetro urbano – existência Não

Lei de parcelamento do solo – existência Não

Lei de zoneamento ou equivalente – existência Não

Cadastro do IPTU

Cadastro imobiliário – existência Sim

Cadastro imobiliário informatizado – existência Sim

O cadastro tem:

Unidades prediais e territoriais cadastradas Separadamente

Total de unidades prediais no cadastro 4280

Total de unidades territoriais no cadastro 677

Ano da última atualização da planta de valores para o IPTU 2003

Ano de realização do último recadastramento 2003

Cadastrado de ISS

Cadastro de prestadores de serviço – existência Sim

Cadastro de prestadores de serviço informatizado Sim

Ano do último recadastramento 2003

Contribuintes inscritos:

Número de contribuintes – empresas 135

Número de contribuintes – outros 575 Taxas Instituídas

Taxa de iluminação pública – existência Sim

Taxa de coleta de lixo – existência Não

Taxa de limpeza urbana – existência Não

Taxa de incêndio ou combate a sinistros – existência Não

Taxa de poder de polícia – existência Sim

Outros tipos de taxas – existência Sim Fonte: IBGE, Perfil dos Municípios Brasileiros - Gestão Pública 2004

141

Page 142: Alto Sertão - SE

142

Page 143: Alto Sertão - SE

Quadro 8Perfil do Município de Gararu

Legislação e Instrumento de Planejamento no Município

Lei de diretrizes orçamentárias (LDO) - existência Sim

Lei de orçamento anual (LOA) - existência Sim

Plano Diretor - existência Não

Lei de perímetro urbano - existência Sim

Lei de parcelamento do solo - existência Não

Lei de zoneamento ou equivalente - existência Não

Cadastro do IPTU

Cadastro imobiliário - existência Sim

Cadastro imobiliário informatizado - existência Sim

O cadastro tem:

Unidades prediais e territoriais cadastradas Separadamente

Total de unidades prediais no cadastro 560

Total de unidades territoriais no cadastro 41

Ano da última atualização da planta de valores para o IPTU 2001

Ano de realização do último recadastramento 2001

Cadastrado de ISS

Cadastro de prestadores de serviço - existência Não

Cadastro de prestadores de serviço informatizado Não aplicável

Ano do último recadastramento Não aplicável

Contribuintes inscritos:

Número de contribuintes – empresas Não aplicável

Número de contribuintes – outros Não aplicável Taxas Instituídas

Taxa de iluminação pública – existência Não

Taxa de coleta de lixo – existência Não

Taxa de limpeza urbana – existência Não

Taxa de incêndio ou combate a sinistros – existência Não

Taxa de poder de polícia – existência Sim

Outros tipos de taxas – existência Sim Fonte: IBGE, Perfil dos Municípios Brasileiros - Gestão Pública 2004

143

Page 144: Alto Sertão - SE

Quadro 9Perfil do Município de Monte Alegre

Legislação e Instrumento de Planejamento no Município

Lei de diretrizes orçamentárias (LDO) - existência Sim

Lei de orçamento anual (LOA) - existência Sim

Plano diretor - existência Não

Lei de perímetro urbano - existência Sim

Lei de parcelamento do solo - existência Não

Lei de zoneamento ou equivalente - existência Não

Cadastro do IPTU

Cadastro imobiliário - existência Sim

Cadastro imobiliário informatizado - existência Sim

O cadastro tem:

Unidades prediais e territoriais cadastradas Em conjunto

Total de unidades prediais no cadastro Não aplicável

Total de unidades territoriais no cadastro Não aplicável

Ano da última atualização da planta de valores para o IPTU 2002

Ano de realização do último recadastramento 2002

Cadastrado de ISS

Cadastro de prestadores de serviço - existência Não

Cadastro de prestadores de serviço informatizado Não aplicável

Ano do último recadastramento Não aplicável

Contribuintes inscritos:

Número de contribuintes - empresas Não aplicável

Número de contribuintes - outros Não aplicável Taxas Instituídas

Taxa de iluminação pública - existência Não

Taxa de coleta de lixo - existência Não

Taxa de limpeza urbana - existência Não

Taxa de incêndio ou combate a sinistros - existência Não

Taxa de poder de polícia - existência Sim

Outros tipos de taxas - existência Sim Fonte: IBGE, Perfil dos Municípios Brasileiros - Gestão Pública 2004

144

Page 145: Alto Sertão - SE

Quadro 10Perfil do Município de Nossa Senhora da Glória

Legislação e Instrumento de Planejamento no Município

Lei de diretrizes orçamentárias (LDO) - existência Sim

Lei de orçamento anual (LOA) - existência Sim

Plano diretor - existência Não

Lei de perímetro urbano - existência Sim

Lei de parcelamento do solo - existência Não

Lei de zoneamento ou equivalente - existência Não

Cadastro do IPTU

Cadastro imobiliário - existência Sim

Cadastro imobiliário informatizado - existência Sim

O cadastro tem:

Unidades prediais e territoriais cadastradas Separadamente

Total de unidades prediais no cadastro 6300

Total de unidades territoriais no cadastro 1000

Ano da última atualização da planta de valores para o IPTU 1997

Ano de realização do último recadastramento 2001

Cadastrado de ISS

Cadastro de prestadores de serviço - existência Sim

Cadastro de prestadores de serviço informatizado Não

Ano do último recadastramento 2001

Contribuintes inscritos:

Número de contribuintes – empresas 60

Número de contribuintes – outros 0 Taxas Instituídas

Taxa de iluminação pública – existência Não

Taxa de coleta de lixo – existência Não

Taxa de limpeza urbana – existência Não

Taxa de incêndio ou combate a sinistros – existência Não

Taxa de poder de polícia – existência Sim

Outros tipos de taxas – existência Sim Fonte: IBGE, Perfil dos Municípios Brasileiros - Gestão Pública 2004

145

Page 146: Alto Sertão - SE

Quadro 11Perfil do Município de Poço Redondo

Legislação e Instrumento de Planejamento no Município

Lei de diretrizes orçamentárias (LDO) - existência Sim

Lei de orçamento anual (LOA) - existência Sim

Plano diretor - existência Não

Lei de perímetro urbano - existência Sim

Lei de parcelamento do solo - existência Não

Lei de zoneamento ou equivalente - existência Não

Cadastro do IPTU

Cadastro imobiliário - existência Sim

Cadastro imobiliário informatizado - existência Sim

O cadastro tem:

Unidades prediais e territoriais cadastradas Separadamente

Total de unidades prediais no cadastro 2311

Total de unidades territoriais no cadastro 120

Ano da última atualização da planta de valores para o IPTU 2000

Ano de realização do último recadastramento 2002

Cadastrado de ISS

Cadastro de prestadores de serviço - existência Sim

Cadastro de prestadores de serviço informatizado Sim

Ano do último recadastramento 2004

Contribuintes inscritos:

Número de contribuintes - empresas

Número de contribuintes - outros 189 Taxas Instituídas

Taxa de iluminação pública - existência Sim

Taxa de coleta de lixo - existência Não

Taxa de limpeza urbana - existência Não

Taxa de incêndio ou combate a sinistros - existência Não

Taxa de poder de polícia - existência Sim

Outros tipos de taxas - existência Sim Fonte: IBGE, Perfil dos Municípios Brasileiros - Gestão Pública 2004

146

Page 147: Alto Sertão - SE

Quadro 12Perfil do Município de Porto da Folha

Legislação e Instrumento de Planejamento no Município

Lei de diretrizes orçamentárias (LDO) - existência Sim

Lei de orçamento anual (LOA) - existência Sim

Plano diretor - existência Não

Lei de perímetro urbano - existência Sim

Lei de parcelamento do solo - existência Não

Lei de zoneamento ou equivalente - existência Não

Cadastro do IPTU

Cadastro imobiliário - existência Sim

Cadastro imobiliário informatizado - existência Sim

O cadastro tem:

Unidades prediais e territoriais cadastradas Em conjunto

Total de unidades prediais no cadastro Não aplicável

Total de unidades territoriais no cadastro Não aplicável

Ano da última atualização da planta de valores para o IPTU 2002

Ano de realização do último recadastramento 2001

Cadastrado de ISS

Cadastro de prestadores de serviço - existência Não

Cadastro de prestadores de serviço informatizado Não aplicável

Ano do último recadastramento Não aplicável

Contribuintes inscritos:

Número de contribuintes - empresas Não aplicável

Número de contribuintes - outros Não aplicável Taxas Instituídas

Taxa de iluminação pública - existência Sim

Taxa de coleta de lixo - existência Sim

Taxa de limpeza urbana - existência Não

Taxa de incêndio ou combate a sinistros - existência Não

Taxa de poder de polícia - existência Sim

Outros tipos de taxas - existência SimFonte: IBGE, Perfil dos Municípios Brasileiros - Gestão Pública 2004

Esperava-se encontrar no TASS, assim como nos demais municípios brasileiros passados mais de quinze anos do processo de autonomia federativa, um alto percentual destes instrumentos em funcionamento, o que realmente apenas ocorreu com relação às Leis de Diretrizes Orçamentárias e do Orçamento Anual, que apresentam elevados percentuais de implantação. Embora não sejam de implementação obrigatória, a Lei de Perímetro Urbano e Parcelamento do Solo são desejáveis no sentido de propiciarem um melhor planejamento governamental. Nos municípios do TASS o instrumento Lei de perímetro urbano existe em cinco dos seis municípios e a Lei de Parcelamento do Solo apenas em um.

Já em relação à análise dos instrumentos de gestão urbana em uso no TASS, uma síntese do quadro geral pode ser visualizada nos quadros 7-12. Na verdade, este grupo de informações objetiva verificar a situação dos municípios relativamente à gestão

147

Page 148: Alto Sertão - SE

urbana, através da situação dos diversos instrumentos de regulação: desde os mais gerais, como plano diretor, perímetro urbano, zoneamento, parcelamento, como já analisados, até os mais específicos, como a legislação sobre áreas de interesse especial e social, o IPTU progressivo, o cadastro do ISS e a instituição de taxas, entre outros.

A expectativa com relação aos dados sobre os instrumentos de gestão urbana no TASS era de que seriam mais freqüentes nos municípios de maior porte populacional, onde os problemas de gestão urbana tendem a ser mais críticos e, portanto, instrumentos de regulação são mais necessários. De uma maneira geral esta expectativa não foi verificada. Portanto, os dados encontrados para o TASS revelam a necessidade de se estender à regulação para gestão urbana das prefeituras do TASS.

Outro importante componente a ser observado na estrutura administrativa dos municípios da TASS é a inexistência dos consórcios municipais. Apesar de estar prevista desde a Constituição de 1937, a formação de consórcios intermunicipais intensificou-se apenas a partir dos anos 80, ganhou mais força após a Constituição de 1988 devido ao crescente processo de descentralização administrativa. Recentemente, um maior número de consórcios intermunicipais tem sido organizado como uma forma de organizar a gestão, objetivando reunir recursos de duas ou mais administrações municipais. No que tange este tema em particular, as informações neste trabalho foram coletadas da pesquisa Perfil dos Municípios Brasileiros 2001, último ano para qual o dado está disponível, e o quadro precário da utilização deste instrumento pode ser analisedo com base nas informação apresentadas no quadro 13:

148

Page 149: Alto Sertão - SE

Quadro 13Existência do Instrumento Consórcios Municipais no TASS, 2001.

Municípios do TASS Canindé de São Francisco

Porto da Folha Gararu Nossa Senhora da Glória

Monte Alegre

Poço Redondo

Descentralização e Desconcentração Administrativa 2001 2001 2001 2001 2001 2001

Consórcio para atendimento na área de educação - existência Não Não Não Não Não NãoConsórcio para habitação - existência Não Não Não Não Não NãoConsórcio para aquisição e/ou uso de máquinas e equipamentos – existência Não Não Não Não Não NãoConsórcio para serviços de abastecimento de águas - existência Não Não Não Não Não NãoConsórcio para serviços de esgotamento sanitário - existência Não Não Não Não Não NãoConsórcio para limpeza urbana - existência Não Não Não Não Não NãoConsórcio para coleta de lixo - existência Não Não Não Não Não NãoConsórcio para coleta seletiva de lixo - existência Não Não Não Não Não NãoConsórcio para reciclagem de lixo - existência Não Não Não Não Não NãoConsórcio para remoção de entulhos - existência Não Não Não Não Não NãoConsórcio para coleta de lixo especial - existência Não Não Não Não Não NãoConsórcio para tratamento ou disposição final do lixo - existência Não Não Não Não Não NãoConsórcio para processamento de dados - existência Não Não Não Não Não NãoConsórcio para atendimento na área de saúde - existência Não Não Sim Sim Sim SimNúmero de consórcios na área de saúde Não Aplicável Não Aplicável 1 1 1 1

Participação de recursos financeiros do Estado ou do Governo Federal nos consórcios de saúde Não Aplicável Não Aplicável

Apenas do Governo Federal

Apenas do Governo Estadual

Apenas do Governo Estadual

Nenhum

Fonte: IBGE, Perfil dos Municípios Brasileiros , 2001.

149

Page 150: Alto Sertão - SE

Descentralização e desconcentração administrativas

A presença e formas de atuação dos Conselhos Municipais foram obtidas, para o ano de 2001, com o objetivo de apresentar não só a existências dessas instâncias de participação da sociedade civil, como sobretudo de verificar se essas se traduzem por instâncias paritárias de decisão nos municípios do TASS. A existência e a operação destes se traduzem pela ampliação da participação da sociedade civil, qualificando as demandas locais. Tornaram-se eles, também, importantes para a elaboração e o acompanhamento de políticas públicas setoriais, muitas vezes sendo a sua existência um dos pré-requisitos para o aporte de recursos. O crescente significado dos Conselhos Municipais para a inserção política e para a gestão local também pode ser aferido por algumas de suas características, tais como: regulamentação e instalação, paridade, função deliberativa e administração de recursos.

A Pesquisa de Informações Básicas Municipais 2001 contabilizou para o Brasil 26,9 mil Conselhos Municipais, uma média de 4,9 conselhos por município, o que é um primeiro indicador da sua magnitude. Alguns Conselhos têm cobertura nacional, como o caso de Saúde, Assistência Social e Educação (acima de 90% dos municípios). São as dimensões sociais básicas que refletem a formação da maioria destas instâncias participativas.

A situação dos municípios do TASS, quando analisados os dados referentes à existência e formas de operação dos Conselhos Municipais, não se caracteriza por uma situação que espelha a média Brasil (vide quadro 14.). Para fim analítico desta sessão, foram observadas informações referentes a todos os tipos de conselhos existentes no Brasil, com o objetivo de traçar um paralelo da presença dessas instâncias no TASS. Assim, foram observados os seguintes conselhos temáticos: i) educação; ii) saúde; iii) assistência social; iv) direito das crianças e adolescentes; v) emprego e trabalho; vi) turismo; vii) cultura; viii)habitação; ix) meio ambiente; e x) transporte; xi) política urbana ou desenvolvimento urbano; xii)promoção do desenvolvimento econômico; e, xiii) orçamento . Os dados referentes à existência desses conselhos no TASS também estão demonstrados a partir da apresentação das seguintes características: a)existência; b) sistematização de reuniões; c) periodicidade de reuniões; d) situação da participação; e, e)existência de fundo municipal específico. Essas últimas são de vital importância, pois retratam a efetividade do funcionamento dessas instâncias participativas.

Assim, para os principais conselhos do TASS, com base em comparação frente à média Brasil, a situação configura o seguinte quadro:

• Conselho de Educação – quatro municípios registraram a existência do Conselho, portanto, observa-se a ausência desta instância em dois municípios do TASS. Vale a pena ressaltar que nos quatro municípios onde o Conselho está presente as instÂncias de efetividade são quase nulas;

• Conselho de Saúde –100% dos municípios do TASS registram a existência de Conselhos nesta área. Em 100% dos municípios a situação registra a instância regulamentada e instalada. Em 100% dos municípios as instâncias de participação são efetivas, e cinco entre os seis municípios apresentam a existência de Fundo Municipal de Saúde;

150

Page 151: Alto Sertão - SE

• Conselho de Assistência Social - 100% dos municípios do TASS registram a existência de Conselhos nesta área. Em 100% dos municípios a situação registra a instância regulamentada e instalada. Em 100% dos municípios as instâncias de participação são efetivas, e cinco entre os seis municípios apresentam a existência de Fundo Municipal de Assistência Social;

• Conselho de Direito das Crianças e Adolescentes - 100% dos municípios do TASS registram a existência de Conselhos nesta área. Em 100% dos municípios a situação registra a instância regulamentada e instalada. Em 100% dos municípios as instâncias de participação são efetivas, e três entre os seis municípios apresentam a existência de Fundo Municipal de Direito das Crianças e Adolescentes;

Os demais Conselhos Municipais (emprego e trabalho; turismo; cultura; habitação; meio ambiente; transporte; política urbana ou desenvolvimento urbano; promoção do desenvolvimento econômico; e, orçamento) com base nas informações disponíveis da pesquisa Perfil do Municípios Brasileiros, 2001 não eram instâncias efetivas de participação nos municípios do TASS.

151

Page 152: Alto Sertão - SE

Quadro 14Situação geral de existência e funcionamento dos Conselhos Municipais no TASS, 2001.

Municípios do TASS Canindé de São Francisco

Porto da Folha Gararu Nossa Senhora da Glória

Monte Alegre

Poço Redondo

Descentralização e Desconcentração Administrativa 2001 2001 2001 2001 2001 2001

1. Conselho de educação - existência Sim Sim Não Não Sim SimConselho de educação - realizou reuniões Sim Sim Não Aplicável Não Aplicável Sim SimConselho de educação - periodicidade das reuniões Irregular Mensal Não Aplicável Não Aplicável Mensal MensalConselho paritário de educação - existência Sim Sim Não Aplicável Não Aplicável Sim SimFundo municipal de educação - existência Sim Não Não Aplicável Não Aplicável Não Não

2. Conselho de saúde - existência Sim Sim Sim Sim Sim SimConselho de saúde - realizou reuniões Sim Sim Sim Sim Sim SimConselho de saúde - periodicidade das reuniões Mensal Mensal Mensal Mensal Mensal MensalConselho paritário de saúde - existência Sim Sim Sim Sim Sim SimFundo municipal na área de saúde - existência Sim Sim Sim Sim Sim Não

3. Conselho de assistência social - existência Sim Sim Sim Sim Sim SimConselho de assistência social - realizou reuniões Sim Sim Sim Sim Sim SimConselho de assistência social - periodicidade das reuniões Bimestral/Tri

mestral Mensal Mensal Mensal Mensal Mensal

Conselho paritário de assistência social - existência Sim Sim Sim Sim Sim SimFundo municipal de assistência social - existência Sim Sim Sim Sim Sim Não

4.Conselho de direito das crianças/adolecentes - existência Sim Sim Sim Sim Sim SimConselho de direito das crianças/adolecentes - realizou reuniões Sim Sim Sim Sim Sim SimConselho de direito das crianças/adolecentes - periodicidade das reuniões Irregular Bimestral/Tri

mestral Mensal Mensal Mensal Mensal

Conselho paritário de direito das crianças/adolecentes - existência Sim Sim Sim Sim Sim SimFundo municipal de direito das crianças/adolecentes - existência Sim Não Não Sim Sim Não

5.Conselho de emprego/trabalho - existência Não Não Não Não Não SimConselho de emprego/trabalho - realizou reuniões Não Aplicável Não Aplicável Não Aplicável Não Aplicável Não Aplicável SimConselho de emprego/trabalho - periodicidade das reuniões Não Aplicável Não Aplicável Não Aplicável Não Aplicável Não Aplicável MensalConselho paritário de emprego/trabalho - existência Não Aplicável Não Aplicável Não Aplicável Não Aplicável Não Aplicável SimFundo municipal de emprego/trabalho - existência Não Aplicável Não Aplicável Não Aplicável Não Aplicável Não Aplicável Não

6.Conselho de turismo - existência Sim Não Não Não Não SimConselho de turismo - realizou reuniões Não Não Aplicável Não Aplicável Não Aplicável Não Aplicável SimConselho de turismo - periodicidade das reuniões Não Aplicável Não Aplicável Não Aplicável Não Aplicável Não Aplicável MensalConselho paritário de turismo - existência Não Aplicável Não Aplicável Não Aplicável Não Aplicável Não Aplicável SimFundo municipal de turismo - existência Não Aplicável Não Aplicável Não Aplicável Não Aplicável Não Aplicável Não

152

Page 153: Alto Sertão - SE

7. Conselho de cultura - existência Não Não Não Não Não NãoConselho de cultura - realizou reuniões Não Aplicável Não Aplicável Não Aplicável Não Aplicável Não Aplicável Não AplicávelConselho de cultura - periodicidade das reuniões Não Aplicável Não Aplicável Não Aplicável Não Aplicável Não Aplicável Não AplicávelConselho paritário na área de cultura - existência Não Aplicável Não Aplicável Não Aplicável Não Aplicável Não Aplicável Não AplicávelFundo municipal de cultura - existência Não Aplicável Não Aplicável Não Aplicável Não Aplicável Não Aplicável Não Aplicável

8. Conselho de habitação - existência Não Não Não Não Não NãoConselho de habitação - realizou reuniões Não Aplicável Não Aplicável Não Aplicável Não Aplicável Não Aplicável Não AplicávelConselho de habitação - periodicidade das reuniões Não Aplicável Não Aplicável Não Aplicável Não Aplicável Não Aplicável Não AplicávelConselho paritário de habitação - existência Não Aplicável Não Aplicável Não Aplicável Não Aplicável Não Aplicável Não AplicávelFundo municipal de habitação - existência Não Aplicável Não Aplicável Não Aplicável Não Aplicável Não Aplicável Não Aplicável

9. Conselho de meio ambiente - existência Não Não Não Não Não NãoConselho de meio ambiente - realizou reuniões Não Aplicável Não Aplicável Não Aplicável Não Aplicável Não Aplicável Não AplicávelConselho de meio ambiente - periodicidade das reuniões Não Aplicável Não Aplicável Não Aplicável Não Aplicável Não Aplicável Não AplicávelConselho paritário de meio ambiente - existência Não Aplicável Não Aplicável Não Aplicável Não Aplicável Não Aplicável Não AplicávelFundo municipal de meio ambiente - existência Não Aplicável Não Aplicável Não Aplicável Não Aplicável Não Aplicável Não Aplicável

10. Conselho de transportes - existência Não Não Não Não Não NãoConselho de transportes - realizou reuniões Não Aplicável Não Aplicável Não Aplicável Não Aplicável Não Aplicável Não AplicávelConselho de transportes - periodicidade das reuniões Não Aplicável Não Aplicável Não Aplicável Não Aplicável Não Aplicável Não AplicávelConselho paritário de transportes - existência Não Aplicável Não Aplicável Não Aplicável Não Aplicável Não Aplicável Não AplicávelFundo municipal de transportes - existência Não Aplicável Não Aplicável Não Aplicável Não Aplicável Não Aplicável Não Aplicável

11. Conselho de política urbana ou desenvolvimento urbano - existência Não Não Não Não Não NãoConselho de política urbana ou desenvolvimento urbano - realizou reuniões Não Aplicável Não Aplicável Não Aplicável Não Aplicável Não Aplicável Não AplicávelConselho de política urbana ou desenvolvimento urbano - periodicidade reuniões Não Aplicável Não Aplicável Não Aplicável Não Aplicável Não Aplicável Não AplicávelConselho paritário de política urbana ou desenvolvimento urbano – existência Não Aplicável Não Aplicável Não Aplicável Não Aplicável Não Aplicável Não AplicávelFundo municipal de política urbana ou desenvolvimento urbano – existência Não Aplicável Não Aplicável Não Aplicável Não Aplicável Não Aplicável Não Aplicável

12. Conselho de promoção do desenvolvimento econômico - existência Sim Sim Não Sim Não NãoConselho de promoção do desenvolvimento econômico - realizou reuniões Sim Sim Não Aplicável Sim Não Aplicável Não AplicávelConselho de desenvolvimento econômico - periodicidade das reuniões Irregular Mensal Não Aplicável Mensal Não Aplicável Não AplicávelConselho paritário de promoção do desenvolvimento econômico – existência Não Sim Não Aplicável Sim Não Aplicável Não AplicávelFundo municipal de promoção do desenvolvimento econômico – existência Não Não Não Aplicável Não Não Aplicável Não Aplicável

Conselho de orçamento - existência Não Não Não Não Não NãoOutros conselhos de política setoriais - existência Sim Sim Sim Sim Sim SimAdministração distrital ou região administrativa - existência Não Não Não Não Não SimSubprefeituras – existência Não Não Não Não Não Não

Fonte: IBGE, Perfil dos Municípios Brasileiros , 2001.

153

Page 154: Alto Sertão - SE

IV. Políticas Públicas no Território do Alto Sertão Sergipano- agenda governamental e desempenho financeiro dos principais programas

“... a suspensão das ‘esmolas’ geraria grande tumulto. ..., aprisionados por suas formas de exploração da miséria, os grupos dominantes locais passam a pedir reforços policiais. Ao tentarem enquadrar a miséria em sua política, haviam conseguido criar em torno deles um exército de desvalidos, que não conheciam sua força, mas cuja presença física ameaçava a ordem latifundiária.Doravante o estado vai gerir a seca, não só porque os grupos sociais locais querem que ele pague, quase que todo ano, por um trabalho que lhes é gratuito, como também porque as multidões de flagelados vagando pelas ruas e pelo campo, constituem-se em massas perigosas que passam a ser controladas”

Sérgio Leite em sua ótima resenha sobre o quadro geral das políticas públicas agrárias, agrícolas e comerciais, de modo particular no meio rural nordestino, afirma que, com o Governo Lula, “... manteve-se praticamente a mesma estrutura ministerial, ... a novidade ... importante foi a criação do MESA ... que ... em janeiro de 2004 ... foi incorporado ao Ministério da Ação Social, que passou a se chamar Ministério do Desenvolvimento Social e Combate a Fome (MDS). No que se refere ao desenvolvimento rural, foi mantida a divisão existente anteriormente em dois ministérios: Ministério de Agricultura, Pecuária e Abastecimento (MAPA), tradicionalemente vinculado aos interesses dos grandes proprietários, e que continuou tendo este caráter, agora com as ‘cara’ do chamado ‘agronegócio’, e o MDA, responsável pela reforma agrária e pelo setor de agricultura familiar ... [que] teve como principais mudanças institucionais a criação de uma secretaria adicional, a Secretaria do Desenvolvimento Territorial (SDT) e a ‘aquisição’ do DATER”50. Assim o que se pode depreender é que as principais modificações, em nível federal, nos instrumentos de ação junto a pequena agricultura do Nordeste, foram, grosso modo, de se renomear as ações de assistência social como desenvolvimento social e de se criar no Ministério do Desenvolvimento Agrário, uma secretaria especifica para o desenvolvimento territorial. Confirma-se, portanto, uma vocação taxonômica pelo desenvolvimento na esfera publica, especialmente naqueles ministérios e órgãos voltados ao atendimento das demandas e necessidades sas populações marginais. Verdade que o Ministério da Indústria, ganhou, também, no governo anterior o adjetivo Desenvolvimento.

Parece mesmo que o desenvolvimento social, rural e territorial só existe na nomenclatura, e, ao que tudo indica, o desenvolvimento industrial vai pelo mesmo caminho. Isso porque os instrumentos e os recursos orçamentários ao resgate das populações marginalizadas encontram-se sob a gestão do núcleo duro do governo, qual seja: a política econômica, que tem privilegiado o ajuste fiscal com a correlata diminuição das responsabilidades da ação publica e governamental. De toda sorte, não resta dúvida que dado os compromissos históricos do presidente e de seu partido, assisti-se na reforma agrária e na agricultura familiar um expressivo aumento dos valores destinados a essas políticas e, no caso do INCRA, de movimentos de recuperação da sua capacidade gerencial.

Efetivamente quanto às ações, o que temos nas esferas do desenvolvimento social e do desenvolvimento agrário são, de um lado, o incremento da assistência social com a unificação dos programas de transferência de renda no Bolsa Família, e, de outro, o MDA, cujas políticas

50 Leite et al (2004: 116-7)

154

Page 155: Alto Sertão - SE

e ações preservam, grosso modo, o mesmo desenho do governo anterior. Preservou-se, inclusive, como já se apontou, a divisão das intervenções públicas junto ao segmento agropecuário em dois ministérios, com o da Agricultura, Pecuária e Abastecimento atendendo aos interesses do chamado agronegócio e o MDA respondendo pela reforma agrária e pelo segmento familiar da produção agrícola. E essa divisão entre políticas para a agricultura comercial e para a chamada pequena agricultura se reflete, também, no próprio MDA, uma vez que parcela relativamente expressiva do segmento familiar está intimamente articulada aos mercados agroindustriais, fazendo, inclusive, que parte expressiva dos recursos se destine à agricultores eminentemente comerciais, ou melhor, capitalizados, ainda que com ascendência do trabalho familiar e de pequena extensão física. Grosso modo, os avanços para se vencer essa falta na articulação entre os ministérios tem sido pequeno, e, no caso do MDA, são recorrentes as disputas entre as suas unidades, o que implica baixa efetividade na consecução do desenvolvimento agrário.

Examinemos, como exemplo, o Pronaf, carro chefe dessa responsabilidade do MDA pela agricultura familiar. Sua distribuição é definida, principalmente, pelo peso econômico dos distintos tipos de beneficiários, ou seja, o programa apresenta um vetor plutocrático. Não, como deveria ser em uma política de desenvolvimento, em que se deve levar em conta outras variáveis – com base em vetores democráticos - como a importância na oferta de trabalho, as participações regionais dos potenciais beneficiários, a presença de assentados da reforma agrária e o peso da pequena agricultura empobrecida. Isso porque quem decide os graus de subsídio, os custos da política, os parâmetros distributivos é a esfera econômica, mais especificamente o Tesouro Nacional e o Banco Central do Brasil. E os agentes distribuidores são os bancos públicos, para os quais, o que vale é a chamada boa prática bancária, que como se sabe privilegia àqueles com maior capacidade de pagamento.

E o principal instrumento da Secretaria de Desenvolvimento Territorial do MDA, em termos de recursos orçamentários, é o Pronaf Infra-estrutura, que frente ao Pronaf Credito – destinado aos assentados e aos pequenos produtores - e à ação do Incra, se mostra, como se verá, item secundário em um hipotético orçamento do gasto publico territorial. Cabe, na verdade, a outras políticas federais os papéis de protagonistas na política públicos territorial, sejam no volume de recursos seja no formato da intervenção. Assim tem ação destacada no território, além, do Pronaf Crédito e do Incra, a assistência social, a seguridade social, as políticas de educação e saúde e, por fim, o Programa de Combate a Pobreza Rural em Sergipe – hoje Projeto Santa Maria. O Pronaf Infra-estrutura vêm depois e tem se destacado frente às ações do Ministério da Integração – Codevasf e Programa Xingo, Conviver, DONCS, etc. – e do Ministério do Meio Ambiente e do próprio MDA. Isso devido, em parte, ao seu formato, mas também, pela parca presença de programas e políticas desses outros ministérios.

Vale aqui fazer uma pequena digressão sobre as dificuldades e os riscos de se construir políticas de desenvolvimento territorial, especificamente as de cunho agrário, com base, de um lado, na motivação dos atores sociais locais e na pactuação de seus interesses e, de outro, na maior sinergia entre os órgãos de governo e suas respectivas políticas. Soma-se a isso, ainda, as ações de descentralização que, com o pressuposto de ampliar o acesso dos beneficiários a gestão e realização das intervenções publicas, implica à transferência para entidades da sociedade civil de ações públicas voltadas ao fornecimento de bens e serviços, tais como educação, saúde e assistência técnica. Primeiramente, cabe sublinhar que as políticas agrárias, territoriais e sociais encontram-se subordinadas a outras políticas, mormente a macroeconômica. Macropoliticas essas que refletem as prioridades governamentais. Assim, ter-se-á o desenvolvimento rural como prioridade está além de se

155

Page 156: Alto Sertão - SE

buscar sinergias entre órgãos e políticas e/ou de se motivar as populações, mas sim em disputar, contra e dentro do aparelho de Estado, canais de pressão para que se façam valer as demandas e necessidade das facções mais fracas, marginais da sociedade. De outra parte, assumir tarefas de responsabilidade do Estado requer condições operacionais e gerenciais para tanto, o que, em grande parte dos casos, inexistem nos organismos e entidades ligadas aos movimentos sociais. Ademais, a descentralização implica em desobrigar aos órgãos do Estado pela qualidade dos serviços, ou seja, permite que seja transferida a responsabilidade pela ineficácia e pela ineficiência das ações para o próprio publico beneficiário. Assim, a chamada descentralização, feita em nome da democratização, pode resultar em falta de planejamento, desmonte do aparelho de estado, privatização das suas funções e maior ineficácia quanto a beneficiar o público, além do risco de cooptação das organizações sociais.

Não resta duvida alguma que a ação do Incra é central no território, cabendo notar que é o órgão cujas informações são as menos publicizadas e/ou divulgadas. Hoje se conta no país com um rico conjunto de informações administrativas de grande parte das ações governamentais e das políticas públicas. Assim, tem-se acesso aos dados de desembolso do Pronaf, discriminados por municípios, grupos de beneficiários e modalidade do empréstimo, na homepage da Secretaria da Agricultura Familiar. Já para os dados do Bolsa Família encontram-se disponíveis em pagima de consulta da Caixa Econômica, sendo, ademais, franqueadas informações na pagina do MDS dos outros programas de transferência de renda. Ademais, a Superintendência da Caixa nos repassou as informações relativas aos desembolsos nos programas de transferência de renda, de seguro desemprego e do Pronaf Infra-estrutura nos últimos três anos, em cada um dos municípios. Entre esses dados encontravam-se os do Garantia Safra, que, também, nos foram concedidos pela Secretaria de Agricultura Familiar, juntamente com os desembolsos do Pronaf Semi-árido. O Ministério da Previdência Social, por meio do SINTESE, nos repassou, com grande tempestividade, o comportamento dos benefícios previdenciários e assistenciais da seguridade nos últimos nove anos – 1996 a 2004 – discriminados pelas clientelas urbana e rural, pelos subtipos de benefícios e para cada um dos municípios. As finanças municipais e a situal das gestões municipais são dados públicos, que se encontram disponíveis, respectivamente, nas paginas da Secretaria do Tesouro Nacional e na do IBGE. Agora os dados básicos da estrutura agrária e da política fundiária nos municípios brasileiros, ou seja, o número e principais características das famílias assentadas, a situação - fase - que se encontra o Projeto de Assentamento, o número de famílias acampadas e a os dados da distribuição da propriedade da terra – cadastro -, não se encontram disponíveis. Isso sem contar a dificuldade em se ter os dados de dispêndio com a instalação - apoio, habitação e fomento - e com a infra-estrutura básica nos assentamentos e dos gastos relativos ao de auxilio alimentação para assentados e acampados. A equipe, felizmente, contava com os dados básicos de assentamentos e acampados e com as informações do cadastro de imóveis, bem como os microdados da pesquisa de qualidade dos assentamentos, acesso franqueado devido a participação de alguns membros na elaboração do PNRA. Cabe sublinhar que enviamos ofício, em julho do corrente, solicitando ao Superintendente várias informações, para o qual não contamos com resposta. Evidentemente, que o Incra muito cooperou, fornecendo todos os PDAs, franqueando espaço para debates, reuniões e discussões sobre o andamento do trabalho. Mas, isso, mostra as dificuldades operacionais desse órgão fundamental à efetivação de um plano de desenvolvimento para o Alto Sertão. Como esta área com imenso potencial pode se transformar efetivamente em uma área reformada, se um dos carros chefes da ação concertada do estado, apresenta significativas dificuldades operacionais e gerenciais.

156

Page 157: Alto Sertão - SE

Seguindo Leite, vamos apresentar resumidamente, para cada esfera de poder, os órgãos, programas e políticas presentes no território.Esse levantamento não pretendeu ser exaustivo no levantamento de todas as ações publicas e de ONGs, de um lado, devido a extensão dessa “rede”, mas pelo fato de que algumas políticas são decisivas na implantação em um território com essas características. O que ficará mais evidente é que os órgãos de planejamento do desenvolvimento territorial não estão presentes na área ou tem uma atuação secundária, mostrando o caráter dos últimos governos no campo desenvolvimento regional-territorial e, de seu pressuposto, o planejamento e a política publica. 51

IV.1. Ministério do Desenvolvimento Agrário

Dentre as agências governamentais, não resta dúvida que o Ministério do Desenvolvimento Agrário tem papel de destaque na região, seja pela envergadura da reforma agrária no território seja pela presença bastante expressiva das diversas políticas voltadas à pequena agricultura, de modo particular o Pronaf. E mesmo as outras agências federais, estaduais e municipais com ações e intervenções na área têm por foco e público a população domiciliada no meio rural e/ou ocupada nas atividades agropecuárias. Nessa direção, a previdência e a assistência social, a educação básica, as ações de saúde, a assistência técnica, as atividades de capacitação e as ações de combate a pobreza levadas a cabo pelas três esferas de governo tem seu desenho e escopo determinados pela ascendência do rural, agrícola e agrário na dinâmica socioeconômica do território. Soma-se a isso, o fato de que as entidades ligadas a chamada sociedade civil, sejam ONGs, sindicatos, movimentos sociais, sejam instituições com apoio público e/ou estatal, todas elas tem como foco de atuação as demandas sociais relacionadas às problemáticas agrária, ambiental, agrícola e rural.

Há que sublinhar, contudo, que alguns problemas do território vem sendo tratados de forma tangencial, uma vez que os instrumentos de intervenção se encontram bastante enviesados. Três ‘casos’ são bastante paradigmáticos: as políticas de regularização e reordenamento fundiário, o crédito para a pequena produção e as ações em infra-estrutura hídrica. No caso das políticas voltadas as mudanças no quadro fundiário, nota-se a presença quase que exclusiva da de reforma agrária com a desapropriação de grandes propriedades improdutivas. O combate ao minifúndio através da ampliação de suas áreas via a concessão de créditos é inexistente, sendo que a utilização do credito fundiário se dirige a contemplar aos outros demandantes por terra, que não se encontram associados aos movimentos sociais reivindicatórios ativos na área, no caso o MST. O credito fundiário torna-se ‘moeda de troca’ junto a agricultores organizados pelo movimento sindical e por lideranças políticas locais tradicionais. No que se refere a regularização fundiária, problema que, como vimos, é expressivo na área, as ações encontram-se em fase muito preliminar. E, o que é temerário, os primeiros ensaios de regularização fundiária tem sido realizado pelo governo do estado, com o apoio do Incra. Temerário, uma vez que o governo tem como principal projeto na região, a implantação de um perímetro irrigado com empresários, para o qual a desapropriação de terras é uma das principais ações. Ou seja, pode-se ter um processo de regularização visando a arrecadação de terras para a implantação do perímetro irrigado.

No que diz respeito à política de credito para a pequena agricultura, o que se depreende, em vista das características da agricultura familiar no território, são as suas incongruências e seus limites. Efetivamente, no território a quase totalidade dos agricultores se enquadra nos grupos 51 “Do ponto de vista das políticas existentes, um primeiro aspecto a ser ressaltado é que continua existindo uma enorme pulverização (e em alguns casos sobreposição) das políticas e ações do governo federal, isso sem falar nos problemas de articulação com as políticas dos governos estaduais e municipais”.

157

Page 158: Alto Sertão - SE

B e C do Pronaf, ou melhor, são pequenos agricultores com baixa capacidade de endividamento e pagamento. De outra parte, tais agricultores tem por principal atividade os cultivos do milho e feijão, que, em vista da recorrência das secas associada à precariedade da assistência técnica e da geração de tecnologias apropriadas, apresentam grandes riscos de perda. Qual a solução que se buscou no ano de 2005 a essa situação: não zonear milho e feijão no território, pois os custos para os agentes financeiros, ou melhor, para o Tesouro eram elevados. Não se computou, por outro lado, os avanços conquistados, nos últimos anos, na pesquisa de variedades superprecoces como na ampliação da assistência técnica, diminuindo os riscos da produção de milho e feijão no território. O zoneamento foi efetivado para o milho, conquista que, como se sabe, deveu-se a concertação de esforços entre os movimentos social e sindical, as lideranças políticas, a pesquisa e a assistência técnica. Concertação alcançada, em grande medida, pela ação governamental de fortalecimento das instâncias regionais, objeto da política territorial desenvolvida pelo Ministério do Desenvolvimento Agrário: Pronaf Infra-estrutura e Articuladores Territoriais. Ministério que paradoxalmente participou das tratativas para o não zoneamento do milho e feijão no território do Alto Sertão Sergipano. Decisão essa que foi avalizada baseada no pressuposto de que a diminuição de riscos e, conseqüentemente, de custos do Pronaf decorrentes da medida, abriria espaço para incrementos nos desembolsos em regiões cujos agricultores e produções encontram-se mais intimamente articuladas aos mercados.

Quanto às ações de infra-estrutura hídrica, verifica-se a inexistência de ações de envergadura voltadas para os agricultores familiares ou de baixa renda e, de outro, a baixíssima efetividade das ações conjuntas dos Ministérios da Integração Nacional e do Desenvolvimento Agrário na implantação de sistemas de irrigação nos projetos de assentamento na região. Se de um lado, avançam as negociações do governo estadual com as agencias multilaterais na implantação de um perímetro irrigado no território, de outro, não caminham os acordos e acertos para a implantação da irrigação no assentamento Jacaré-Curituba. E, na mesma direção, iniciativas voltadas a um fornecimento mais disseminado de água – logo, com volumes menores por beneficiário -, tal como na proposta do Canal Xingo não progride. Não avançam, também, as propostas de re-utilização das médias e pequenas várzeas do São Francisco, para as quais já se conta tanto com estudos de viabilidade como de previsão de custos.

IV.1.1. Incra – Reforma Agrária

Como tem sido dito reiteradamente, o que marca o território do Alto Sertão Sergipano é a extensão da reforma agrária aí desenvolvida. Nessa direção, ao Incra cabe um papel destacado na região, ainda mais que a concessão de um lote de terra às famílias é somente um dos vários aspectos e ações presentes em um assentamento. Educação, saúde, infra-estrutura, cultura, lazer, entre outros, fazem parte da vida do assentamento e se espraiam pelo território. Existem inúmeros estudos que apontam para o quão importante são os assentamentos, ainda mais quando são massivos, na dinamização da economia local. Implicam, de um lado, no crescimento do aporte de recursos públicos em crédito, infra-estrutura, serviços e aparato burocrático, e, de outro, no incremento da produção primaria, no comércio local, na construção e na industrial. Os números apresentados nos subitens renda e pobreza e trabalho e composição de renda são ilustrativos disso, ao apontarem para o crescimento das rendas originarias do setor terciário, especialmente da administração publica e do comercio de mercadorias, e da seguridade social. Assim, o Incra e a política de Reforma Agrária são de fato centrais no desenvolvimento do território, cabendo ao órgão assumir o papel de aglutinador das iniciativas de desenvolvimento.

158

Page 159: Alto Sertão - SE

Para se ter uma idéia do aporte de recursos do Incra no território, realizou-se uma estimativa, considerando que no processo de instalação de projetos de assentamento são realizados diversos investimentos na infra-estrutura social e produtiva, bem como a concessão de recursos para a habitação, à alimentação e o primeiro custeio dos assentados. Infelizmente não foi repassado, como se apontou mais acima, o orçamento realizado pelo Incra no território nas variadas rubricas de despesa.

Decidiu-se, então, com base nas informações de custos, presentes no Plano Regional de Reforma Agrária 2004-2006, estimar a parcela dos dispêndios realizados pelo Incra em algumas das rubricas e/ou despesas ligadas a implantação de projetos de assentamento. Concretamente, considerou-se, para o período 2001-2005, os valores do crédito de instalação – apoio a instalação, habitação e crédito do semi-árido - e os recursos destinados à infraestrutura – estradas, energia elétrica e água – e aos serviços – PDAs, assistência técnica e capacitação e topografia. No quadro abaixo, encontram-se discriminados os valores médios por família assentada em cada uma dessas rubricas de despesa.

Quadro 15Valores médios por família assentada das despesas em instalação, infra-estrutura básica

e serviços.

Rubrica de Despesa Valores- por família -

Crédito de Instalação 8.400- apoio 2.400- habitação 5.000- crédito semi-árido 1.000Infra-estrutura básica 5.500- estrada 2.500- energia elétrica 2.000- agua 1.000Serviços 1.000- PDA 200- Ates e Capacitação 400- Topografia 400TOTAL 14.900

Fonte: Plano Regional de Reforma Agrária – SR-23–INCRA/SE

Tendo em vista esses valores médios por famílias, considerou-se como parâmetro para se estimar os desembolsos do INCRA no território o numero de famílias assentadas no período 2001-2003 e as metas de assentamento para o biênio 2004 e 2005. Efetivamente, tendo sido assentadas, entre 2001 e 2003, 655 famílias, os gastos, com tais rubricas, atingiram a R$ 9,76 milhões, ou seja, R$ 3,25 milhões por ano. Já para o biênio 2004/2005, cujas metas eram de se assentar entre 1.500 e 2.000 famílias, os dispêndios do Incra nessas rubricas atingiriam entre R$ 22,35 e R$ 29,80 milhões. Vale notar que não estão sendo consideradas as despesas com a obtenção de terras e o pagamento de benfeitorias, bem como os empréstimos de Pronaf-A. Isso porque, no ultimo caso, se conta com dados bem discriminados dos desembolsos realizados.

Não se conta ainda, entretanto, com os dados efetivos dos desembolsos efetuados pelo Incra na instalação e constituição dos projetos de assentamento, bem como dos gastos efetuados pelo órgão na concessão de cestas básicas aos acampados e assentados. E, como se sabe, o Incra tem ampliado em muito o aporte de recursos na elaboração de Planos de Recuperação,

159

Page 160: Alto Sertão - SE

na melhoria da Infra-Estrutura Social e Produtiva, na contratação de serviços de assistência técnica e capacitação, entre outros. Pode-se, grosso modo, estimar, que no território, o Incra venha alocando recursos da ordem de R$ 10 milhões, o que coloca a reforma agrária entre as principais rubricas de despesa na região, como se pode depreender do cotejamento com outras políticas discriminadas na tabela 70.

IV.1.2. Secretaria de Desenvolvimento Territorial: o Pronaf Infra-estrutura

Criada no governo Lula, a Secretaria do Desenvolvimento Territorial do MDA assumiu ações que antes se encontravam sob gestão da Secretaria de Agricultura Familiar, especificamente as ligadas à articulação das políticas voltadas ao segmento familiar nos níveis regional e local e a política de financiamento da infra-estrutura municipal de fortalecimento desse segmento. Na visão de Leite et al (2004: 129), a instiuição marca “uma diferenciação com o governo anterior” ao ter por “objetivo ... promover e apoiar processos de construção e implementação de Planos Territoriais de Desenvolvimento, estabelecendo políticas públicas abrangentes e duradouras”. Para tanto, serão priorizadas regiões e áreas, ou na nomenclatura da secretaria, territórios onde a questão fundiária, a agricultura familiar e o meio rural tenham expressão, isto é, sejam centrais na dinâmica socioeconômica desses espaços geográficos. Como bem aponta Silva et al, o enfoque desse órgão é, selecionados os territórios, “discutir com [os] atores sociais a elaboração e execução de propostas de gestão, ... [os] arranjos institucionais ..., a elaboração de planos territoriais [e] integrar as políticas e atores. ... Sua estrutura é bastante enxuta e ao que parece a intenção não é que ela tenha programas próprios, mas que auxilie na integração de outros programas e ações existentes”.

É pouco exeqüível que se atinja ao desenvolvimento de regiões periféricas com base, de um lado, na motivação dos atores sociais locais e sua pactuação em torno de um Plano de Desenvolvimento e, de outro, na sinergia, articulação e integração das políticas públicas e das ações das organizações sociais. Ora, Plano de Desenvolvimento significa a capacidade de determinar prioridades, que para serem efetivadas se requer aparato burocrático, capacidade de planejamento, recursos orçamentários e instrumentos de gestão. Não é o que parece ter a SDT, restringindo-se a contar com o Pronaf Infra-estrutura e com a contratação de chamados articuladores territoriais para levar adiante esse esforço de articulação e de efetivação dos investimentos em escalar territorial, ampliando o perfil municipal que continha. Vale sublinhar que essa alteração do âmbito de atuação do Pronaf Infra-estrutura de municipal para territorial, bem como da incorporação de técnicos a nível regional e local para o acompanhamento, monitoramento e gestão das propostas de financiamento do Pronaf Infra-estrutura – os chamados articuladores territoriais -, significou um avanço ao diminuir a ingerência das prefeituras nas decisões quanto aos investimentos a serem realizados. Deve ter diminuído, o que é evidente no Alto Sertão Sergipano, a existência de Conselhos Municipais de Desenvolvimento Rural que nada mais eram que apêndices da Prefeitura Local. Assisti-se no caso do Alto Sertão a gestão compartilhada via Colegiado Territorial das decisões de investimento, sendo repartido pelas entidades, órgãos e prefeituras os recursos no atendimento tanto de demandas em obras e infra-estrutura física como na melhoria das condições de serviços das diversas entidades. Hoje além do financiamento de obras – estradas, armazéns, matadouros, resfriadores – conta-se com recursos para computadores, motocicletas, campos experimentais das entidades de assistência técnica e de pesquisa atuantes no território.

Grande parte disso se deve ao fato de no território do Alto Sertão Sergipano haver um elevado grau de organização dos movimentos sociais e sindicais e uma presença expressiva de várias

160

Page 161: Alto Sertão - SE

entidades de apoio a reforma agrária e a pequena agricultura, o que tem criando as condições para a constituição de uma nova institucionalidade: o colegiado do território. Tem, ademais, tido um papel destacado o Articulador Territorial que tem tornado possível dar conteúdo a essa nova institucionalidade, pois conseguir angariar apoio tanto dos órgãos públicos nos diferentes níveis (federais - Incra, Embrapa, BNB –, estaduais – Secretaria da Agricultura e Deagro – e municipais) como dos movimentos sociais e sindicais, ONGs e entidades da sociedade civil. Verdade, como se disse, que todas as entidades e órgãos públicos tem sido, contemplados com os recursos do Pronaf Infra-estrutura. Na 63, abaixo, onde estão elencados os investimentos contratados entre 1998 e 2005 e os propostos para 2006, fica evidente, de um lado, a predominância dos investimentos na agroindustrialização e comercialização e na questão hídrica e, de outro, o crescimento nos últimos anos dos recursos para capacitação dos agricultores, apoio às ações de assistência técnica e de difusão tecnológica. Efetivamente foram realizados investimentos, visando ao incremento na agregação de valor, em laticínios, matadouros, unidades de processamento e/ou beneficiamento de grãos e mel, resfriadouros, etc. e na implantação de açudes, barragens, adutoras. Não se deve esquecer a presença relativamente expressiva, nos primeiros anos, de recursos destinados à melhoria das estradas. Já no caso do aumento dos recursos para capacitação e serviços de assistência técnica, são de envergadura as aquisições de carros, motos e equipamentos de informática para as entidades ligadas a assistência técnica e na implantação de bancos de sementes em todos os municípios da região, sob a coordenação da Embrapa Tabuleiro Costeiros.

Tabela 63Valores e Tipos de Investimentos Realizados e Propostos junto ao Pronaf Infra-

estrutura no Alto Sertão Sergipano – 1998 a 2005

Ano (1)Investimentos Custeio

Tipo Valor R$ Tipo Valor

R$1998 Agroindústrias, abastecimento de água e estradas

(2) 571.878

1999 Infra-estrutura em povoados (3) 934.1802000 Escoamento produção e recursos hídricos 689.2122001 Escoamento à produção e recursos hídricos 626.657

2002 Agroindustrialização, patrola mecanizada, adutora e recursos hídricos à produção 424.234

2003 Agroindustrialização, recursos hídricos à produção e capacitação (4) 763.115

2004 Agroindustrialização 879.360

2005 Agroindustrialização e aquisição de carros e motos para serviços de ATES e ATER 979.500 Capacitação, projetos técnicos e

apoio às atividades do colegiado 144.200

2006Agroindustrialização, banco de sementes, centros de artesanato e aquisição de carros e motos para ATES e ATER (5)

1.129.260Capacitação de agricultores e técnicos 234.000

Fonte: Caixa Econômica Federal e Articulação TerritorialNotas: (1): Considerou-se o ano de assinatura do contrato e/ou de envio da proposta, cabendo salientar que, na

maioria dos casos, os desembolsos foram realizados no ano seguinte. Em 1998, se encontra contemplado um contrato assinado em dezembro de 1997.(2): Cabe destacar a presença de recursos para a recuperação de posto de saúde em Porto da Folha.(3): Infelizmente não se conta com maior discriminação de que obras em Infra-estrutura foram realizadas.(4): Nesse ano e no seguinte já surgem de modo recorrente gastos em capacitação e na aquisição de carros e motos, sem contudo estarem discriminados a parcelas relativas a cada um.(5): O montante destinado à aquisição de carros, motos e equipamentos para as diversas entidades de ATES e ATER é bastante significativo, estando presentes, também, em 2006, investimento na estruturação de Pólo Sindical.

161

Page 162: Alto Sertão - SE

É fundamental observar que grande parte dos investimentos voltada a agroindustrialização não conseguiu ter a efetividade e eficácia prevista, em vista da precariedade das avaliações de viabilidade técnica desses investimentos, particularmente quanto ao volume, qualidade e sazonalidade da oferta dos produtos a serem transformados e da potencialidade dos mercados de destino ou consumidores. Ou seja, as propostas primam por alto grau de voluntarismo, na crença de que a instalação de unidades de transformação é por si só suficiente para se atingir novo patamar de agregação de valor. A análise dos dados da Caixa Econômica Federal, das propostas colhidas pela articulação territorial e das entrevistas, visitas e viagens junto aos principais atores, produtores e assentamentos corroboram tais impressões e indicam, ademais, que, nos últimos anos, a preocupação em se resgatar esses investimentos com maior planejamento e com a capacitação dos produtores.

Conta-se no território com outra ação da Secretaria do Desenvolvimento Territorial que é o Projeto Dom Helder Câmara (PDHC), que teve suas atividades iniciadas no governo Fernando Henrique Cardoso, estando sediado em Recife e contando com o apoio financeiro do Fundo Internacional para o Desenvolvimento da Agricultura – FIDA. Tem sua atuação localizada em seis territórios do semi-árido brasileiro: Sertão Sergipano (SE), Pajeú (PE), Cariri (PB), Apodi (RN), Sertão Central (CE) e São João (PI). Nas palavras de Leite el al (2004: 130), para o projeto os “assentamentos são parte importante da atuação, mas o programa incide também sobre comunidades de agricultores familiares e áreas de remanescentes de quilombos. O projeto tem como meta unificar as políticas públicas nas áreas onde atua, bem como propiciar experiências-piloto que sirvam de exemplo para outras políticas”.

No território o PDHC tem ações em todas as suas áreas, a saber: segurança hídrica; produção e comercialização agrícola; capacitação tecnológica e de gestão; formação e organização; e gênero, geração e etnia. Efetivamente o projeto, que tem sua sede no território em Poço Redondo, atua, segundo informação coletada em sua homepage em outubro de 2005, nos Projetos de Assentamento de Pedrinhas, José Unaldo de Oliveira, Nova Esperança, Cachoeirinha, Paulo Freire, Bom Jardim, Nossa Senhora da Conceição, Florestan Fernandes, São Raimundo, Pioneira e Canadá, bem como no Quilombo Mocambo. Dentre suas ações, vale citar: a implantação de rede de abastecimento de água nos assentamento de Pedrinhas (ou Caldeirão) e José Unaldo de Oliveira; capacitação de assentamentos na gestão de recursos hídricos; implantação de unidades demonstrativas de palma consorciada com leucena, de bancos de proteínas de leucena e gliricícia, de produção de sorgo para silagem e de silos trincheira; implantação de piscicultura em tanques rede; oficinas de capacitação em manejo de ovinos e caprinos, em piscicultura de tanques rede, na produção orgânica e na criação de galinha caipira. O Programa conta, em várias dessas ações, com a parceria da Cáritas, entidade ligada a Igreja Católica, cuja atuação é histórica na região. Infelizmente não se pode ocultar o fato da ação do PDHC ser considerada deletéria por parcela importante dos movimentos sociais, particularmente o MST, o que demonstra a dificuldade do governo federal em pactuar com as diversas forças locais-territoriais consensos em termos de formas de atuação e intervenção e os respectivos investimentos, apoios e aportes orçamentários.

IV.1.3. Secretaria de Agricultura Familiar: o Pronaf Crédito

Vejamos, agora, como tem sido o desempenho da principal política de apoio a agricultura familiar, o Pronaf Crédito. De antemão, vale mencionar que o desenho do Pronaf é, a nosso ver, pouco adequado a realidade do território do Alto Sertão Sergipano, pois aí se concentram agricultores de baixíssima renda e baixo aporte tecnológico e assentado da reforma agrária,

162

Page 163: Alto Sertão - SE

que, ademais, contam com serviços de assistência técnica e de apoio à gestão insuficientes. Para essa realidade não pode ser eficiente a concessão de credito de custeio e investimento por meio de agentes financeiros, contando com a retaguarda do Tesouro Nacional e sob a normatização do Banco Central, pois os resultados possíveis serão ou o apartamento dessa massa de agricultores de baixa capacidade de pagamento ou a recorrência de custos para os cofres públicos, isso apesar dos esforços em conceder taxas de juros bastante privilegiadas e de garantir aos bancos expressivos níveis de remuneração52. De todo modo, como veremos o Pronaf Credito na região, especialmente para os grupos A e C e a modalidade do Semi Árido vem apresentando um desempenho bastante positivo, ainda que o grau de inadimplência e o nível de endividamento apontem para o esgotamento da tendência de crescimento dos últimos anos. Além desse cenário pouco otimista, outra preocupação é inexistência de empréstimos no Pronaf Florestal, o que indica que os esforços de recuperação da caatinga não se fazem presentes no âmbito do credito de investimento oficial.

A observação dos dados da tabela 64 permite afirmar que tem sido extremamente positivo a evolução do crédito do Pronaf. Isso porque, em 2005, atingiu a 10,4 mil contratos frente a um universo de cerca de 10 mil agricultores familiares e 3 mil assentados.Tal desempenho já era bastante positivo nos anos anteriores, sendo sempre superiores a 6 mil contratos e tendo já, em 2002, ultrapassado a marca dos 8 mil empréstimos. No que diz respeito ao montante financiado, o desempenho é ainda melhor, pois os recursos mais do que duplicaram entre 2000 e 2005, atingindo, em 2005, a cifra de R$ 21,7 milhões de reais. Valor muito significativo, tendo em vista que o PIB do território foi, em 2000, de R$ 211,0 milhões. E as receitas totais dos municípios do território eram, em 2003, de R$ 85,2 milhões.53

Tabela 64Evolução do Número de Contratos e do Volume Financiado do Pronaf Crédito no Alto Sertão Sergipano, 2000-2004.

52 Leite et al (2004: 152-154) assim analisam essas limitações. “No caso do Pronaf, as principais limitações, para que os recursos cheguem aos agricultores familiares do Nordeste, referem-se ao contexto institucional, especialmente aos problemas burocráticos e dificuldade operacional dos bancos. ... Um dos problemas importantes é o fato do Pronaf ser regido pelo Banco Central e ficar vinculado à legislação que rege o crédito comum. Assim, uma das reivindicações ... é a desvinculação do Pronaf em relação aos procedimentos normais do crédito bancário....“Um outro grave problema a ser enfrentado é a falta de assistência técnica, necessária para a elaboração do projeto, ... Em grande parte, a formatação dos projetos vem dependendo da assistência técnica governamental, que ... encontra-se bastante debilitada....“Uma crítica geral ao Pronaf é de que a lógica predominante continua sendo ‘por produto’, o que não está de acordo om a realidade da agricultura familiar. Também há denúncias de que ... o Pronaf acaba entrando ... no mesmo esquema do crédito convencional ... Assim, o grande desafio ... do Pronaf seja ... repensar sua lógica e modificar sua concepção, no sentido de adequá-lo à lógica de funcionamento da agricultura familiar”.53 Fontes: http://www.ipeadata.gov.br/ e http://www.tesouro.fazenda.gov.br, respectivamente. Cabe apontar que, nos anos mais recentes, o PIB do território teve um incremento expressivo - mais de 6 vezes -, devido, em grande medida, à contabilização da renda agregada pela Usina de Xingó.

163

Page 164: Alto Sertão - SE

AnoContratos Valores

nº Variaçãopercentual milhões R$ Variação

Percentual2000 6.409 9,162001 6.113 -5 6,00 -342002 8.211 34 10,95 822003 7.293 -11 10,80 -12004 9.711 33 22,53 1092005 10.437 7 21,75 -3

Fonte: SAF/MDA(1) Dados relativos ao período.

O território do Alto Sertão Sergipano foi responsável, em 2005, por cerca de ¼ do volume emprestado no Estado, tendo tido, no ano passado, uma participação da ordem de 1/3, ou seja, ainda maior. Participação que, grosso modo, sempre se situou nesses níveis, isto é, entrre ¼ e 1/3 dos recursos do crédito do Pronaf em Sergipe. Efetivamente, em 2002 e 2003, o território respondeu por, respectivamente, 31% e 25% do total financiado em Sergipe através do Pronaf.

164

Page 165: Alto Sertão - SE

Gráfico 20Evolução da Participação Territorial no Montante de Contratos e no Volume Financiado pelo Pronaf Crédito em Sergipe, 2000-2004

0%

5%

10%

15%

20%

25%

30%

35%

2000 2001 2002 2003 2004 2005

contratos valoresFonte: SAF/MDA

No que diz respeito ao número de contratos, a participação tem sido da ordem de 25%. Parece-nos que essa elevada participação do território no Pronaf Crédito no estado se deve, em grande medida, ao grande número de assentamentos existentes. Efetivamente, enquanto no território encontram-se 12% dos estabelecimentos pronafianos, a parcela das famílias aí assentadas é de 40%. Observa-se, também, o quão efetiva tem sido a organização dos pequenos agricultores da região em associações e grupos, o que se efetivar no acesso ao crédito, sem esquecer que, parte do crescimento da participação do grupo C, se deve à migração dos assentados para esse grupo após esgotarem os empréstimos que tinham direito no Pronaf-A (ver tabela 65).

O gráfico 21 ilustra essa distribuição dos recursos, mostrando que durante todo o período cerca de 80% dos recursos do Pronaf Crédito foram para os municípios de Poço Redondo e Canindé de São Francisco, onde se encontra a maioria das famílias assentadas, e para Porto da Folha,

165

Page 166: Alto Sertão - SE

onde os pequenos agricultores encontram-se bastante organizados. Nesta localidade existe a Federação das Associações Comunitárias – FEACOM – que, em agosto ultimo, completou 10 anos de existência. Assim, nos dois primeiros anos, destacam-se os empréstimos para os assentados – Pronaf A – e em Porto os empréstimos para o Grupo C. Efetivamente, em Poço Redondo e Canindé os financiamentos para os assentados e para o grupo A/C responderam, naqueles anos em que esses municípios se sobressaem, pela quase totalidade do volume de empréstimos concedidos. Cabe destacar que, em 2005, assistiu-se a uma desconcentração dos recursos, com incrementos na participação de Nossa Senhora da Glória e de Monte Alegre, o que se deve, em parte, ao aumento dos assentamentos nesses municípios e, de outro, ao espraiamento da organização dos movimentos sociais.

166

Page 167: Alto Sertão - SE

Gráfico 21Estrutura de Distribuição do Volume de Empréstimos do Pronaf Crédito nos Municípios do Alto Sertão Sergipano, 2000-2004.

0%

10%

20%

30%

40%

50%

60%

70%

80%

90%

100%

2000 2001 2002 2003 2004 2005Poço Redondo Porto da Folha Canindé de São Francisco Gararu Nossa Senhora da Glória Monte Alegre de Sergipe

Fonte: SAF/MDA

As informações coletadas mostram que, nos anos de 2001 e 2002, as participações dos empréstimos enquadrados nos grupos A/C mostram-se bastante expressivas, concentrando-se nos municípios de Canindé e Porto da Folha. Quanto aos empréstimos do grupo C, observam-se participações elevadas nos últimos dois anos – 2003 e 2004, com a migração dos assentados para o grupo C e um certo “refluxo” na criação de assentamentos. Já os agricultores familiares do grupo D têm uma participação no volume de recursos bem inferior a sua importância em termos de valor bruto da produção, o que vem de encontro com a realidade do Pronaf Crédito em outras regiões. Aí o grupo D tem tido uma posição destacada na absorção dos recursos, acompanhando sua importância econômica.

167

Page 168: Alto Sertão - SE

Quanto aos empréstimos para o grupo B verificou-se um crescimento expressivo no número de contratos, tendo esses passado de um patamar de mil contratos, nos anos de 2001, 2002 e 2003, para 2,2 mil, em 2004, atingindo, em 2005, a 3,3 mil financiamentos, melhorando, assim, em muito a cobertura do programa no microcrédito. Isso, associado à ampliação do valor dos empréstimos, implicou um crescimento, entre 2002 e 2005, de mais de 600% nos recursos aplicados.

168

Page 169: Alto Sertão - SE

Tabela 65Estrutura de Distribuição do Volume de Empréstimos do Pronaf Crédito, segundo grupos de beneficiários, no Alto Sertão Sergipano,

2000-2004.(%)

Grupo - ano 2000 2001 2002 2003 2004 2005Grupo A 64,2 2,5 24,1 17,7 30,3 2.8Grupo A/C 13,4 43,9 40,5 5,9 3.1Grupo B 5,4 11,3 4,9 9,8 7,2 15.1Grupo C 12,3 31,0 21,9 62,2 59,0 74.1Grupo D 4,6 11,2 8,6 4,3 3,5 4.9Grupo E 0,2 2.8

Fonte: SAF/MDA

O exercício realizado na tabela 66, de cotejar as estimativas do público potencialmente beneficiário do Pronaf, baseadas nos dados do Censo Agropecuário, com os empréstimos – número de contratos – realizados em 2003 e 2004, indica dos agricultores familiares do território o grau de cobertura tem sido bastante positivo, pois entre 2/3 e 4/5 dos agricultores familiares vem sendo contemplado com os financiamentos do Pronaf Crédito. Há, no entanto, que ter cuidado nessa avaliação, pois o que se observa é que os índices de cobertura ultrapassam a 100% nos grupos A e C, o que deve ser creditado, no caso do grupo A, ao fato dos empréstimos serem concedidos em mais de uma parcela, e, no C, a entrada nesse enquadramento dos assentados. Ou seja, o grau de atendimento deve ser bem menor, estando ao redor daquilo que se verifica no grupo D. Preocupante é o fato de que somente 1/3 dos agricultores mais pobres vêm sendo beneficiados pelos empréstimos do Pronaf, cabendo realizar um esforço de ampliação dessa linha de crédito. Esforço que, como foi dito, vem ocorrendo, pois houve, entre 2004e 2005, um incremento bastante expressivo da cobertura.

Tabela 66Estimativa do Índice de Cobertura do Pronaf Crédito (contratos/público) no Alto Sertão Sergipano, 2003.

Tipos deBeneficiários

Contratos

2003 2004Estimativa de

estabelecimentosÍndice de cobertura

2003 2004Grupo A (1) 3.633 2.794 130%Grupo A/C 323Grupo B 1.223 2.227 6.341 19% 35%Grupo C 5.351 6.842 3.656 146% 187%

169

Page 170: Alto Sertão - SE

Grupo D 168 194 478 35% 41%Grupo E 10

Total Global (sem A) 7.075 9.263 10.943 65% 85%Total (grupos B, C e D) 6.742 9.263 10.475 64% 88%

Fonte: SAF/MDA e Sabatto (2000)(1): Refere-se aos contratos efetuados no período 2000 a 2004 e são o número de famílias assentadas no território, segundo a Superintendência Regional do INCRA/SE.

Quanto à atuação dos dois agentes financeiros na concessão de financiamentos do Pronaf Crédito, verificou-se, em 2004, uma divisão dos volumes emprestas entre o Banco do Brasil e o Banco do Nordeste. Efetivamente,o primeiro respondeu por 47%, ficando o restante com o Banco do Nordeste. Tal desempenho é bastante diferente no que se refere a distribuição por contratos, com o Banco do Brasil respondendo por quase 2/3, uma vez que sua carteira é composta, em sua grande maioria, por financiamentos de custeio para o grupo C, enquanto o Banco do Nordeste assume a maior parte dos contratos dos assentados e os investimentos do grupo C. Vale notar que os empréstimos na modalidade de investimento Semi-árido, instituída em 2004, vem tendo um desempenho destacado na região. Isso fica evidente quando se verifica que, em 2004, os empréstimos do Pronaf Semi-árido foram responsáveis por 13% do volume de credito do Pronaf e por 20% dos recursos alocados em investimento. E, ademais, o território sozinho se apropriou, na safra 2004/2005, da metade dos financiamentos concedidos no país pelo Pronaf Semi-árido, tendo se sobressaído, de modo particular, Canindé de São Francisco. Já o Pronaf Florestal, que seria de grande valia para a recuperação das caatingas, seu manejo e uso econômico-produtivo, não apresentou nenhum financiamento, o que demonstra a pouca efetividade das ações de resgate ambiental.

Outra situação relativamente preocupante é o nível de inadimplência no Pronaf, ou melhor, é o relativo esgotamento da capacidade de endividamento dos agricultores e assentados. Explicitando melhor, a inadimplência não se mostra expressiva, salvo em determinados grupos e municípios, mas o que se observa é que a maioria dos agricultores já esgotou todas as possibilidades de financiamento de investimento e quando as carências forem vencidas, pode haver grandes dificuldades de quitação de suas dividas. Isso a depender dos resultados dos investimentos realizados, que, segundo se investigou, não parecem ter alavancado as unidades produtivas para outro patamar técnico-produtivo. Efetivamente, a inadimplência atinge níveis maiores no grupo A, especialmente em Monte Alegre de Sergipe, e, em menor grau, em Poço Redondo, Canindé de São Francisco e Nossa Senhora da Glória, situando-se nesses últimos na faixa de 15% a 20%. Já no grupo B, os níveis de inadimplência chegam a atingir a 40% nos municípios de Poço Redondo e Porto da Folha, caindo para 10% em Monte Alegre de Sergipe, Nossa Senhora da Glória e Gararu. Já os agricultores dos grupos C e D contam com elevados graus de adimplência, chamando a atenção negativamente os casos de Canindé de São Francisco e Porto da Folha, onde em alguns anos atinge ao redor de 15%.

De modo resumindo, parece-nos continuar valendo as análises de Leite et al (2004: 149) para a ação do MDA, ao afirmar que, no caso da Reforma Agrária, “as maiores dificuldades enfrentadas pelo Governo Lula estão no plano do contexto institucional”, ainda que os constrangimentos originários do ajuste fiscal tenham, também, uma parcela importante de responsabilidade no não cumprimento das metas.

170

Page 171: Alto Sertão - SE

Nesse particular, todavia, observa-se que, entre 2004, quando da analise dos autores, e hoje, os avanços foram bem significativos, em particular na recuperação dos quadros técnicos do Incra e na política de Assistência Técnica, onde foram alocados recursos bastante significativos. Já outra assertiva dos autores, parece-nos continuar valendo, pois os “problemas internos no ministério (de disputas entre Secretaria de Reordenamento Fundiário e Incra, ou ainda divergências entre a SAF e o Incra, ou ainda diferenças de lógica de atuação da SDT e a lógica de implementação dos assentamentos de reforma agrária)” continuam presentes e evidentes na baixa concertação e sinergia das intervenções do ministério no território.

IV.2. Ministério da Integração

As políticas e órgãos do Ministério da Integração com abrangência sobre o território podem ser resumidos em: a Transposição do Rio São Francisco e os Programas de Desenvolvimento Integrado e Sustentável do Semi-Árido (Conviver) e o Programa de Sustentabilidade de Espaços Sub-regionais-ProMeso/Xingó, e, em termos de órgãos, a Codevasf, o Dnocs e a Defesa Civil. A transposição vem tomando a agenda da questão nordestina e do semi-árido, podendo colocar, por outro lado, em evidencia a realidade ímpar das regiões circunvizinhas ao Rio São Francisco: falta de água, de energia, de terra e de trabalho, entre as quais, se destaca o Alto Sertão Sergipano. Nessa direção, a implantação de um Programa de Revitalização da Bacia Hidrográfica do Rio São Francisco, política sob gestão do MMA, é positiva e tem espaço de crescimento, contando com apoio no Ministério do Interior, do Desenvolvimento Agrário e da Embrapa.

O Programa Conviver e o Promeso-Xingó são os outros programas na área. O primeiro, surgiu no governo Lula, se resumindo, hoje, ao financiamento perdas da safra: os empréstimos (crédito) aos bancos e uma cobertura parcial da safra, espécie de “bolsa”, aos agricultores. Esse é o Garantia Safra, cujas informações estão hospedadas na SAF, ainda que os recursos sejam do fne e o MIN “hospede” essa ação no programa de convivência com a seca. Conviver não é mais do que pagar prejuízos financeiros e produtivos, o que na verdade vira Sobreviver.

Verdade que em sua concepção original buscava “reunir um conjunto de iniciativas que visam tornar a população do semi-árido menos vulnerável aos efeitos da irregularidade climática, identificando e ampliando o potencial produtivo da agricultura familiar, sua sustentabilidade ambiental, econômica e social e otimizando sua capacidade de desenvolver atividades geradoras de renda” Mas como aponta o autor, sendo“um dos principais instrumentos e o Garantia-Safra, sob responsabilidade do MDA” e “ ... não fica[ndo] claro nos documentos do Programa Conviver quais seriam as instancias responsáveis pela articulação dos programas e ações”, esse programa reduziu-se a um “mecanismo permanente e institucionalizado de garantia de renda”. Esteve em grande risco, no presente ano, com as medidas de zoneamento da produção agrícola no Nordeste, particularmente os cultivos de milho e feijão no território, com o primeiro, após, grande mobilização ter sido contemplado com zoneamento. O não zoneamento da região faz parte da disputa pelos recursos do credito rural – utiliza-se de recursos dos fundos constitucionais - e de aperto fiscal – o prejuízo “tem” impactos fiscais. Ora entreguemos os créditos de risco no semi-árido em troca de melhores condições para os empréstimos no centro-sul. E o semi-árido gaúcho.

171

Page 172: Alto Sertão - SE

Já o Promeso-Xingó se insere nos programas que se instituem sobre o arcabouço da política regional do governo anterior. Como se encontra no documento ..., onde se le, que “dar-se-á continuidade a implantação do Programa em sub-espaços que já vinham sendo trabalhados no âmbito da Secretaria de Programas Regionais: Águas Emendadas, Alto Solimões, Bico do Papagaio, Chapada do Araripe, Chapada das Mangabeiras, Grande Fronteira do Mercosul, Bacia do Rio Itabapoana, Vale do Jequintinhonha e do Mucuri, Metade Sul do Rio Grande do Sul, Vale do Ribeira/Guraraqueçaba, Vale do Rio Acre, Xingó e Zona da Mata Canavieira Nordestina”. Parte e resultado dos esforços para a instituição da meso Xingo, tem-se o Instituto Xingo, o Delis, o Instituto Palmas. Na homepage do Promeso-Xingo são apresentadas três intervenções no território, a saber: o projeto de Fortalecimento da Aqüicultura na Mesorregião de Xingó, em parceria com o Governo da Bahia, e de Implantação de Curtume para Beneficiamento de Peles Caprinas e Ovinas em Floresta-PE, com o Estado de Pernambuco e o Packing-House em Canindé. Esse projeto, desenvolvido pela Secretaria da Agricultura de Sergipe, tem por finalidade implantar unidade industrial de beneficiamento de frutas, especificamente para goiaba. Pressupõe que haverá oferta, tendo em conta o crescimento da área com goiaba no Projeto Califórnia e as possibilidades decorrentes da irrigação no Jacaré-Curituba e do Projeto Nova Califórnia, tema tratado com detalhe no item sobre Arranjos Produtivos.

Vale notar que o site do Promeso Xingó não foi atualizado nenhuma vez esse ano, sendo que todos esses três programas já foram finalizados – términos em fevereiro e maio de 2005. Cabe abrir um parêntese para o Instituto Xingo – designado, em 2001, o agente operacional do Programa Xingó -, que desde sua criação, em 1995, com o fim das obras da Usina, e hoje, atravessou diversas fases, encontrando-se, atualmente, em grande dificuldade. Isso porque seus principais financiadores e apoiadores foram gradativamente se retirando. O relatório de Seminário Prospectivo, realizado em meados do corrente, pelo Instituto Xingó, é claro quanto a atual situação do órgão, ao concluir que quando na retrospectiva, aponta que “a partir de 2004, o Instituto Xingó passou, basicamente, a contar só com recursos da CHESF, que ainda assim em março/2004 comunicou oficialmente que não mais se responsabilizaria pela sua manutenção”. E, continua, afirmando que “ ...o Instituto foi buscar outras parcerias para continuar com a Proposta do Programa Xingó

Seu período áureo foi no segundo governo FHC, quando, ao final de 2002, chegou a atender ao redor de 35 mil pessoas, contar com cerca de 120 bolsistas e ter aplicado R$ 21 milhões, repartidos da seguinte forma: SUDENE – R$ 7.7 milhões, CHESF – R$ 6.5 milhões, CNPq – R$ 5.6 milhões e outras fontes – R$ 890 mil reais. Desde então, os financiadores do projeto – SUDENE, CHESF e CNPq – vão se afastando, com retirada total das bolsas do CNPq, em dezembro de 2003, e a redução drástica dos recursos da SUDENE, particularmente quando de sua transformação em Agência. E, por fim, a própria CHESF vem diminuindo gradativamente o aporte de recursos no Instituto.

Na Secretaria da Infra-estrutura Hídrica dentro do Programa de Desenvolvimento da Agricultura Irrigada se encontra o Projeto de Irrigação Jacaré-Curituba que, como informa a homepage do Ministério, é uma parceria entre o Ministério e o Governo de Sergipe, celebrada em 1997. Para se ter uma idéia da total inoperância desta parceria e do descaso no andamento do projeto, os dados divulgados pelo Ministério em sua pagina na internet foram atualizados, pela ultima vez, em outubro de 2004. Sabe-se que as dificuldades na efetivação do projeto de irrigação

172

Page 173: Alto Sertão - SE

com a execução das obras estão relacionadas, em grande medida, com a disputa entre os governos federal e estadual na paternidade do projeto e na responsabilidade pelos custos de sua realização. O que de fato se assiste são dez anos de descaso com a população assentada, com o Incra e o MDA buscando repetidamente efetivar a parceria entre o Estado – Secretarias da Infra-estrutura e de Agricultura - e a União – Ministério da Integração e Codevasf, bem como procurar fontes orçamentárias para o custeio da obra, seja no orçamento do Incra e por emendas parlamentares seja por financiamentos internacionais.

Já no âmbito da Codevasf, existem duas importantes iniciativas que, infelizmente, ainda se encontram em compasso de espera, ou seja, não caminharam ou o fizeram muito pouco no últimos anos. O primeiro é o Canal Xingo tem por escopo a “construção” de um sistema de adutoras, com captação de água em Paulo Afonso ou Xingo, beneficiaria aos seis municípios do Alto Sertão Sergipano. As alternativas propostas se consubstanciam em um sistema adutor principal entre 180 e 290 km, com o sistema secundário (adutoras e canais) entre 230 e 35 km. Tem por objetivo fornecer água para variados sistemas produtivos, desde a agricultura irrigada, passando pela aqüicultura e por sistemas agropecuárias mistos - pecuária leiteira e ovinocapricultura com áreas irrigadas para produção forrageira – e atendendo a atividades tradicionais ou de sequeiro. Nesse sentido, o projeto visa muito mais a disseminação no fornecimento de água pela captação nos reservatórios ou de Paulo Afonso ou de Xingo do que a implantação de perímetros irrigados, privilegiando com público privilegiado aos assentados da reforma agrária e à pequena produção local. Deixa bastante evidente que as soluções hídricas baseadas nos aqüíferos existentes e na captação de águas pluviais ou dos cursos de água são inadequadas dadas as baixas precipitações e insuficiência dos aqüíferos, a ma qualidade das águas e as altas perdas por evapotranspiração.

A outra proposta é voltada à recuperação e revitalização das médias e pequenas várzeas do Baixo São Francisco, sendo que parte expressiva delas se situam em municípios do Alto Sertão Sergipano. Concretamente, a área total das pequenas várzeas atinge a 5.255 hectares, estimando-se serem utilizáveis ao redor de sendo 3.500 hectares, encontrando-se nos municípios de Gararu e Porto da Folha ao redor de 45% das várzeas. Cabe destacar que a Codevasf conta com estudos mais detalhados para 16 várzeas que somam 1.277 hectares, ou seja, ¼ do total das pequenas várzeas “catalogadas” no estado de Sergipe. Para estas várzeas conta-se como o número de famílias, propostas de exploração produtiva e as respectivas demandas por água, os custos médios de manutenção e o potencial valor bruto da produção.

IV.3. Ministério do Meio-Ambiente

- Revitalização Rio São Francisco• - ver outros: Bioma Caatinga, GEF, Cima .... etc. (site, Paulo e Luiz).

173

Page 174: Alto Sertão - SE

IV.4. Previdência Social

DIFERENCIAR PREVIDENCIA E ASSISTENCIA

Tabela 67Numero e Valor Total dos Benefícios Previdenciários e Assistenciais no Território do Alto Sertão Sergipano – 1996 a 2004

Variável Beneficio e Situação domicílio 1996 1997 1998 1999 2000 2001 2002 2003 2004

Valor (1)

Previdência Urbana 1.444 1.684 1.906 2.129 2.563 3.159 3.847 5.122 6.107Ben. Assistenciais Urbanos 278 789 919 887 1.071 1.402 1.764 2.461 2.907

Previdência Rural 11.087 10.615 11.436 12.248 13.808 17.223 21.715 30.883 34.768Ben. Assistenciais Rurais 589 499 510 503 523 578 597 705 710

Benefícios (2)

Previdência Urbana 683 710 744 786 851 902 1078 1.140 1.224Assistenciais Urbanos 391 612 509 572 636 688 855 912 1.012Previdência Rural 6.977 6.923 6.937 7.109 7.352 7.768 9.926 10.512 10.658Assistenciais Rurais 363 346 326 303 289 264 265 243 225

Total de benefícios 13.397 13.587 14.771 15.767 17.966 22.363 27.923 39.170 44.492Total de valores 8.414 8.591 8.516 8.770 9.128 9.622 12.124 12.807 13.119Fonte: Dataprev/Sintese(1) Em mil R$ correntes, acumulado no ano.(2) Quantidade de benefícios emitidos mensais – posição em dezembro de cada ano.

IV.5. Ministério do Desenvolvimento Social – Programas de Transferência de Renda

“Chegávamos exatamente na ocasião em que se distribuíam os socorros pela população faminta no barracão próximo à estação da estrada de ferro. O aspecto dessa gente não negava os sofrimentos por que tinha passado. As mulheres e as crianças macilentas, sujas, e com as roupas em farrapos, assentadas pelo chão, traíam um sofrimento que os primeiros socorros não lograram totalmente extinguir.

...

174

Page 175: Alto Sertão - SE

“..., quanta miséria, quanta desgraça, quanto infortúnio com esse minguado socorro se pouparam?” (Sampaio, 2002:.73)

Tabela 68Comportamento do Numero de Famílias Atendidas e dos Desembolsos Totais dos Principais Programas Sociais

Variável 2002 2003 2004quantidade valor quantidade valor Quantidade valor

Transferências - Total 312.228312.228 4.021 461.726461.726 8.659 435.074435.074 17.238% Garantia Safra sobre Transf-GS 0% 0% 1% 5% 9% 21%

Transferências (menos Gar. Safra) 312.228312.228 4.021 457.210457.210 8.227 396.344396.344 13.560

% Bolsa Família 0% 0% 3% 13% 29% 62%% Trabalho Infantil e Jovem 1% 1% 2% 4% 2% 2%% Auxilio Gás 39% 23% 39% 16% 28% 6%Bolsas "antigas" e Fome Zero 61% 76% 56% 67% 41% 29%Fonte: Caixa Econômica Federal – Superintendência Regional

Gráfico 22Evolução recente dos benefícios e desembolsos do Bolsa Família no Território

jan-2004 a set-2005

175

Page 176: Alto Sertão - SE

9.000

10.000

11.000

12.000

13.000

14.000

fev-04 abr-04 jun-04 ago-04 out-04 dez-04 fev-05 abr-05 jun-05 ago-05

fam

ilias

650

700

750

800

850

900

950

1.000

1.050

mil

R$

corr

ente

svalor (mil R$)familias

Fonte: www.caixa.gov.br

Cotejar com o numero de domicílios e com a percentagem de indigentes e pobres (IDH); ver os desembolsos mensais em setembro dos outros programas – baixar internet MDS

IV.6. Governo do Estado

AT, Programas Bird e BID – Pobreza Rural e PDS e Repasses Pronaf Infra-estrutura, Bolsas e Outros Programas, Saúde e Educação;

176

Page 177: Alto Sertão - SE

IV.6.1. Projeto Santa Maria

IV.6.2. Secretaria da Agricultura

foi tomada pelo Pronaf ... e ruim, sinal de conservadores e sindicatos juntos; regularização e banco da terra; Deagro, Cohidro.

IV.7. Educação e Saúde (SUS) – Municípios

Municípios: ver item especifico das receitas e despesas educação, saúde e folha salarial;

Tabela 69Despesas Orçamentárias Totais e com Rubricas Selecionadas - Pessoal, Saúde e Saneamento, Educação e Cultura, Agricultura – e

Valores das Transferências SUS, FUNDEF e FNDE

Tipo Despesa 1996 1997 2001 2002 2003Despesas Orçamentárias 35.925.138 49.633.591 94.053.405 84.528.143 84.375.782

Despesas Pessoal e Encargos 13.121.235 19.020.315 41.594.844 40.093.029 39.411.329% Orçamentárias 37% 38% 44% 47% 47%

Saúde e Saneamento 4.386.020 5.960.321 14.413.517 15.793.012 13.719.920Educação e Cultura 11.870.920 12.451.612 34.853.111 30.974.962 33.778.909Assistência e Previdência 3.569.463 1.035.197 4.297.634 2.346.288 2.454.048Agricultura 442.104 1.449.407 3.002.098 535.366 454.426% Orçamentárias 56% 42% 60% 59% 60%

TransferênciasSUS 1.273.025 2.966.087 4.764.770FUNDEF e FNDE 7.389.663 11.555.227 11.926.501

177

Page 178: Alto Sertão - SE

% no gasto da rubricaSUS/Saúde 9% 19% 35%FUNDEF e FNDE/Educação 21% 37% 35%Fonte: Secretaria do Tesouro Nacional – FINBRA e Ipeadata.

178

Page 179: Alto Sertão - SE

Tabela 70Desembolsos e empréstimos públicos selecionados, em 2004, no Território do Alto Sertão Sergipano.

Programa, política, despesa governamental (1) Valor mil R$Programas Transferência de Renda 2004 (CEF) (2) 13.559

Previdência Social 2004 Urbana 9.014

Rural 35.478

Pronaf Crédito 2004 21.378

Garantia Safra 2002_03 (desembolsos realizados em 2004) 3.939

Infra-estrutura 2004 (estimativa) 841

Programa de Combate a Pobreza Rural – 2004 39.411

Folha Salarial 2003 7.992

Total anual 131.613

Total mensal 10.430

População pessoas 2000 119.300

População domicílios 2000 26.987

População pessoas estimativa 2004 129.903

Dispêndio mensal per capita (pop 2000) 87,43

Dispêndio mensal domiciliar (pop 2000) 386,48

Dispêndio mensal per capita (estimativa pop 2004) 80,29Fontes: Caixa Econômica Federal, Secretaria da Agricultura Familiar – MDA, Secretaria de Previdência Social - MPS, Secretaria do

Tesouro Nacional – MF.(1): Encontram-se contemplados os seguintes programas: Bolsa Família, Bolsa Escola, Bolsa Alimentação, Bolsa Renda, Auxílio

Aluno, Cartão Alimentação (Fome Zero), Auxílio Gás.

179

Page 180: Alto Sertão - SE

Observa-se, no território, uma presença expressiva de iniciativas publicas e do chamado terceiro setor no território, mas que não se consubstanciam em uma ação concertada para o desenvolvimento, sendo que parte delas contam com grandes fragilidades em termos orçamentários, de quantidade e qualidade do pessoal, de gestão, portanto, de escopo e instrumentos. Isso é evidente pela precariedade de informações – ver, por exemplo, as homepages do Instituto Xingó, Instituto Palmas, Delis e quão reduzidos são os recursos orçamentários da SDT e as intervenções do Projeto Dom Helder Câmara e do Banco da Terra quanto a indicadores básicos de desempenho. Fogem disso, em termos orçamentários, as políticas previdenciária, de reforma agrária, de assistência social e de crédito rural para a agricultura familiar, que, contudo, ou não têm como objeto e escopo ou não se mostram incapazes de se constituir como instrumentos do desenvolvimento territorial.

V. Os Assentamentos de Reforma Agrária na realidade do Território do Alto Sertão Sergipano

Os estudos da Codevasf-UFS e do Projeto de Cooperação Técnica MDA/FAO foram de fundamental importância ao entendimento da região ao caracterizarem o território, particularmente, sua agricultura, na segunda metade dos anos 9054. Todavia, ambos estudos, ainda não haviam apreendido os impactos e as mudanças ocorridas no território com a implantação maciça, após 1996, de assentamentos rurais, bem como com a ampliação das políticas de transferência de renda, de seguridade social e do credito à pequena agricultura. Efetivamente, o assentamento de cerca de 2.500 famílias, entre 1996 e 2002, o desenvolvimento do Pronaf, que na região apresenta índices de cobertura, a concessão dos benefícios previdenciários rurais e das chamadas bolsas – programas de transferência de renda – alteraram profundamente o quadro econômico, social e demográfico do território. Assim sendo, viu-se a necessidade, de um lado, de se buscar os dados mais atuais possíveis, sejam secundários sejam os de caráter administrativo. Por outro lado, realizou-se uma pesquisa qualitativa junto aos principais atores sociais presentes no território e uma análise exaustiva dos Planos de Desenvolvimento dos Assentamentos, que, associados aos dados individuais da pesquisa realizada pela ESALQ-USP, com apoio do MDA-FAO, e aos levantamentos produtivos dos assentamentos, efetuados pelos técnicos do CECAC, possibilitaram caracterizam e apreender a realidade socioeconômica dos assentamentos.

No que concerne a pesquisa qualitativa de campo, esta teve como preocupação analítica a apreensão das relações que os assentados vem estabelecendo com a sociedade e o meio ambiente local. A montagem da equipe, a discussão sobre seus objetivos, sua concepção em termos dos agentes a serem entrevistados e o escopo das entrevistas foram realizados em fevereiro do corrente sob a responsabilidade de Silvana Lima e Osvaldo Aly Junior.

Soma-se a isso a realização de três seminários – oficinas – junto aos técnicos da assistência técnica e às lideranças de agricultores e assentados. O primeiro foi uma iniciativa conjunta do Cecac, Incra e Embrapa, realizado em 24 de fevereiro do corrente, na sede da Embrapa, com o objetivo de aprofundar a interlocução entre pesquisadores e técnicos da assistência técnica. A programação consistia em, pela manhã, os

54 Remeter as notas-paginas onde esses trabalhos foram citados pela primeira vez

180

Page 181: Alto Sertão - SE

pesquisadores da EMBRAPA apresentarem as pesquisas e os estudos que sejam direcionadas a agropecuária do território e, na parte da tarde, debate sobre a situação atual, desafios e perspectivas da assistência técnica.

O segundo foi realizado no Instituto Xingó, no período de 28 de fevereiro a 02 de março, tendo, grosso modo, três objetivos: apresentar o escopo e os objetivos do estudo – elaboração do Plano de Desenvolvimento Territorial; debater os primeiros resultados e o desenvolvimento da região; e capacitar uma equipe para a realização das pesquisas qualitativas com as lideranças locais e nos assentamentos da região. Efetivamente, durante os dois primeiros dias foram voltados para a discussão do escopo do Plano e das primeiras impressões/conclusões e propostas levantadas pela equipe, de um lado, e, de outro, para a realização de oficinas: inicialmente, de debate sobre a realidade territorial – problemas, soluções possíveis, entraves e potencialidades –; em um segundo momento, de caracterização da região, utilizando-se dos dados e informações do território disponíveis pelos órgãos de pesquisa (oficina de informática) e do conhecimento dos participantes (oficina de caracterização). No terceiro dia, a pesquisadora Betina Ferraz fez uma apresentação acerca do atual quadro das políticas públicas em sua dimensão regional e local e debateu a gestão municipal, tanto no aspecto das finanças quanto dos instrumentos de planejamento e controle.55 56

A terceira iniciativa foi uma atividade conjunta da equipe do Plano de Desenvolvimento Territorial com o Colegiado Territorial, tendo sido realizada em 30 e 31 e agosto, no Instituo Xingó, em Canindé de São Francisco. Nesse seminário, o tema foi a Pecuária Leiteira nos Assentamtos do Sertão, onde se buscou avaliar as possibilidades, os desafios e os limites da atividade leiteira no Alto Sertão Sergipano, contando, para tanto, com presença de pesquisadores das Embrapas Semi-Árido, Pecuária de Leite e Tabuleiros Costeiros e dos principais gestores das políticas de apoio aos assentados – Incra, Banco do Nordeste e Assistência Técnica.

Desse conjunto das informações sistematizadas a partir da revisão de literatura e das entrevistas com assentados, agricultores familiares e outros atores relevantes no desenvolvimento regional, bem como os levantamentos efetuados junto aos diversos órgãos públicos federais, estaduais e municipais, levaram-nos a configurar o presente tópico da seguinte forma:

1- Assentado: novo personagem no cenário rural sergipano;2- A visão dos atores: síntese da pesquisa qualitativa;

55 Maiores detalhes desses dois seminários encontram-se no relatório de atividades apresentado em maio ao Incra e no Anexo I.56 Aproveitou-se desse Seminário sobre o Plano para a montagem da pesquisa de campo, ou seja, nesse momento foram selecionados os pesquisadores dentre as equipes de produção e educação do MST que participavam dessa Ofinina. Ademais, sob a supervisão de Silvana Lima e Osvaldo Aly Junior, levantaram o rol de atores sociais a serem entrevistados, elaborou-se o roteiro das entrevistas, discutiram-se os objetivos da pesquisa de campo e os cuidados que se deve ter, isto é, como deve ser a forma de abordagem dos diferentes entrevistados, bem como foram feitas três entrevistas “testes” no dia seguinte à oficina.Concretamente, a pesquisa foi coordenada por Silvana Lima, contando com os seguintes pesquisadores: Arnaldo Santos Neto, Willames de Almeida Santos, Genivaldo, Irandi Silva de Jesus, Ailton Demésio Pereira, Ferline, Ariana Costa e Carlos Barreto Júnior.Em anexo, encontram-se o roteiro de entrevistas e as entrevistas transcritas.

181

Page 182: Alto Sertão - SE

3- Sistemas agrários em Sergipe e no Alto Sertão: implicações ao desenvolvimento dos assentamentos;4- Território e Assentamentos: ações governamentais, avaliação e proposições para produção agropecuária, sugestões para a ATES e

indicações de políticas complementares ao desenvolvimento.

É importante citar que quatro elementos se destacaram como fundamentais para pensar a consolidação produtiva e do desenvolvimento dos assentamentos e dos assentados: (i) capacitação e qualificação profissional; (ii) estimular a organização associativa e cooperativa dos assentados; (iii) acesso à água e; (iv) a garantia da renda mediante uma efetiva política de financiamento da produção (com custeio, investimento no lote e na agregação de valor, custeio da comercialização) e garantia da aquisição pelos governos.

V.1. Assentado: novo personagem no cenário rural sergipano

No ambiente rural do Alto Sertão Sergipano os assentamentos rurais vêm, dia-a-dia, se destacando, havendo com isso ganhos para o território, pois os assentados têm conquistado cada vez mais sua cidadania. Eles atuam sobre uma base territorial configurando, portanto, um novo momento na ocupação socioeconômica da região. Para compreender esse momento, apresenta-se abaixo uma reflexão sobre o novo personagem que está se formando no meio rural brasileiro, mais especificamente no sertão sergipano: os assentados.

V.1.1. Assentamentos rurais no cenário nacional

Nos últimos vinte anos, após a abertura política e, mais especificamente, nos anos 90, a luta pela terra produziu uma nova forma de ocupação econômica e social do meio rural: os assentamentos rurais. O assentamento rural é uma intervenção na estrutura fundiária, através de políticas públicas, modificando o modo de utilização econômica e social de uma determinada propriedade – imóvel. Dentre as ações desenvolvidas pelo governo federal na instalação de assentamento, cabe citar a desapropriação de imóvel rural ou a arrecadação de terras públicas, os investimentos em infra-estrutura e os financiamentos à produção.

A partir dos anos 80, os assentamentos rurais se formaram em diferentes regiões do território nacional, tendo por móvel a mobilização sem equivalentes dos trabalhadores rurais sem-terra. Esse momento é o período de transição do regime militar para o democrático, quando diversos movimentos sociais e sindicais passaram a organizar os pobres do campo (CPT, CUT, STR, etc.), levando ao surgimento do Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem-Terra (MST). Movimento Social que se consolidou como um dos mais importantes protagonistas na luta pela terra no país. Segundo Norder (2004:58), “a reforma agrária voltava à cena política nacional, mas protagonizada por atores sociais com um novo perfil ideológico e organizacional, e um novo contexto político e sócio-econômico”.

182

Page 183: Alto Sertão - SE

Os trabalhadores sem-terra inauguraram dois processos de luta pela terra no cenário rural: ocupação de latifúndios e acampamentos na beira da estrada. Esses processos são contínuos e permanentes, com os trabalhadores se utilizando ora das ocupações como forma de pressão para a realização de assentamentos, ora dos acampamentos que mostram a permanência do conflito e da espera pela terra. Assim, os acampamentos mantêm acesa a chama das ocupações, explicitando um demanda emergencial por terras e, conseqüentemente, pelo assentamento.

Medeiros e Leite (2004:17/18) caracterizam os diferentes personagens da luta pela terra no país:

a. Os posseiros, com longa história de permanência no campo, embora sem título formal de propriedade;b. Os filhos de produtores familiares pauperizados que, diante das dificuldades financeiras para o acesso à terra, optaram pelos

acampamentos e ocupações como caminho possível para se perpetuarem na tradição de produtores autônomos;c. Os parceiros em busca de terra própria;d. Os pequenos produtores, proprietários ou não, atingidos pela construção de hidrelétricas;e. Os seringueiros que passaram a resistir ao desmatamento que ameaçava seu modo de vida;f. Os assalariados rurais, muitas vezes completamente integrados no mercado de trabalho;g. As populações de periferia urbana, com empregos estáveis ou não, eventualmente com remota origem rural, mas que, havendo

condições políticas favoráveis, se dispuseram à ocupação;h. Os aposentados que viram no acesso à terra a possibilidade de um complemento de renda, entre outros.

O que se vem assistindo são as ocupações forçando intervenções governamentais, ou seja, essa forma de pressão social torna-se a medida da política pública da Reforma Agrária ou, mais especificamente, da criação de assentamentos rurais. Isso torna tal política pontual, atomizada e que contempla, efetivamente, as áreas de conflito e não todo o universo fundiário57. Fica, portanto, a ação do Estado a reboque da luta dos movimentos sociais, restringindo sua intervenção a atenuar os conflitos fundiários e não a levar a cabo uma política planejada de mudança do cenário agrário.

Nessa direção, os assentamentos resultam, de fato, da luta pela terra, sendo, portanto, conquistas dos sem-terra e não exatamente o resultado de uma política pública implementada pelo Estado.58 Constrói-se nesses processos de pressão, luta e conquista duas identidades: os sem-terras e os assentados. Para os primeiros o objetivo é a conquista da terra, já para os segundo, outra pauta se impõe com o acesso a terra: o que e como produzir, formas de organização, necessidades de infra-estrutura, crédito e assistência técnica.57 SCHNEIDER, Ingrid & SILVEIRA, Fernando G., Com ocupações e acampamentos fazem-se assentamentos, mas não Reforma Agrária. Indicadores Econômicos FEE, v. 19 (2), abril-junho de 1991, Porto Alegre.58 Deve-se ter o cuidado de não se concluir, em razão disso, que o perfil dos assentamentos seja a concretização daquilo que os movimentos sociais propugnam como reforma agrária, inclusive no que concerne aos padrões tecno-produtivas. Isso porque a situação dos assentamentos reflete, na verdade, as fragilidades das políticas fundiárias e agrícolas e o perfil conservador da pesquisa e da assistência técnica.

183

Page 184: Alto Sertão - SE

Os assentamentos podem ser considerados tanto como “ponto de partida”, ao tornarem trabalhadores sem-terra em produtores, como também “ponto de chegada”, pois ser assentado representa a concretização do acesso à terra e, conseqüentemente, da integração social (Leite, 1998:14).

Esses novos produtores representam, ademais, a fixação do homem a terra, contrarrestando os processos de êxodo rural. Agora os assentamentos, assim como a agricultura em geral, estão submetidos a processos de diferenciação social, que podem ser amenizados ou regulados pelas ações públicas. Reflexo do sucesso desse conjunto de intervenções públicas é a taxa de permanência dos beneficiários, que apesar de relativamente elevada no país – 70% - está bem aquém do que se observa nos meios rurais e urbanos. Já no território, as taxas de abandono são bem menores, salvo naqueles assentamentos em que a perspectiva da irrigação tem implicado em sua instabilidade e desestruturação.

Vale observar que o assentamento é uma comunidade em gestação, não se restringindo a lócus de produção e geração de renda, mas, também, como espaço de convivência social, de moradia e de acesso a bens e serviços públicos.

Em relação à caracterização dos assentamentos como “ponto de chegada”, vale notar que por serem o resultado da luta e não o fruto de uma política de reforma agrária, eles provocam um fluxo migratório em direção ao território em que estão localizados. A vitória da luta traz perspectiva de novas condições de vida e renda para o povo pobre, levando contingentes populacionais a se dirigem para esses territórios com concentração de assentamentos. É comum, então, pessoas/famílias do entorno desses territórios, de outras localidades e até de outros estados engrossarem os acampamentos aí existentes.59

Os assentamentos rurais tornam possível a moradia, a alimentação, o emprego, o lazer e cidadania para um contingente significativo de trabalhadores sem perspectiva, ou seja, que se encontram a margem dos circuitos mercantis, sociais e políticos. Trazem, então, em seu horizonte, alternativas econômicas e sociais para uma parte significativa da população brasileira, que se encontra marginalizada e excluída do processo de produção vigente.

Pode-se perceber que no plano da população pobre, os assentamentos rurais vão se formando como uma política pública de inclusão social e econômica em contraposição ao desemprego e a exclusão social.60 Neste contexto, vale dizer que os assentados se apresentam como uma espécie de segmento de produtores que o singulariza diante de outros segmentos de pequenos produtores agrícolas. Esse novo produtor é uma identidade coletiva, que atua sobre uma base territorial. A interação entre o assentamento e o território onde está inserido acontece por vários processos e relações sociais/econômicos/ambientais, que o antecedem, são concomitantes a ele ou o sucedem.59 Os dados dos PDAs mostram que a presença de beneficiários de outros regiões – sejam do próprio estado sejam de outros estados - não é desprezível, atingindo a 1/3 no caso daqueles PDAs que disponibilizaram essa informação.60 Os dados da evolução do Pronaf, dos gastos em educação e saúde pelos municípios, do comportamento dos programas de assistência e previdência social e os desembolsos pelos programas de transferência de renda – as chamadas bolsas – demostram o quão importantes são os assentamentos no acesso a recursos públicos pelo território

184

Page 185: Alto Sertão - SE

Os assentamentos representam um conjunto de espaços, onde se desenvolvem múltiplas experiências, não abstratas, mas sim projetos em construção e que apresentam uma série de relações intervenientes com atores sociais e locais.

V.1.2. Assentamentos rurais: novo móvel de ocupação do Alto Sertão Sergipano

O sertão teve e ainda mantém a sua economia baseada na pecuária e no cultivo de lavouras temporárias. Em relação à configuração fundiária regional não existe muita diferença entre a pecuária e agricultura nas pequenas, médias e grandes propriedades, a diferença notada é que na pequena propriedade a agricultura é predominantemente de subsistência com pequenos excedentes, com a baixa qualidade genética do gado se destacando. O que se observa, nos anos 80, e se aprofunda, nos 90, são transformações nesse quadro decorrentes, de um lado, da consolidação da pecuária leiteira, em Nossa Senhora da Glória e Porto da Folha, e, de outro, da reforma agrária e da organização dos pequenos produtores e de associações. Essas transformações se consubstanciam no aumento da área de pastagens, na carga animal, nas áreas cultivadas com lavouras temporárias e na pressão demográfica, o que já foi apontado anteriormente quando se tratou da dinâmica do setor primário.

Os Projetos Sertanejo (1976-1984) e Chapéu de Couro (1986) implicaram em alterações importantes no cenário produtivo da região, pois, o primeiro, grosso modo, consolidou a ocupação produtiva da área, com o incremento da carga animal, ou seja, o crescimento dos rebanhos bovino, ovino e caprino e, o segundo, foi responsável pela implantação do perímetro irrigado Califórnia. Decorrente desses projetos que fazem parte de iniciativas mais globais dos governos federal e estaduais, com apoio de agências multilaterais, para o desenvolvimento do semi-árido brasileiro. Verdade, como bem aponta o estudo MDA/FAO, que “o projeto sertanejo não provocou mudanças nas tendências de desenvolvimento da região”, vindo, de fato, reafirmar as escolhas produtivas regionais baseadas na pecuária mista - corte e leite. A bovinocultura de leite se desenvolveu nessa época no território devido as ações publicas de apoio à modernização da agricultura, onde se inserem tanto esses Projetos como a melhoria da infra-estrutura viária, o crédito rural subsidiado, a assistência técnica e as dificuldades nos cultivos comerciais de algodão e feijão em função, primeiro, da concorrência de outras regiões produtoras e, depois, dos problemas de ordem técnica.

A construção da Usina de Xingó é fato de grande significado para o território na passagem dos anos 80 para os 90, pois implicou o deslocamento para a área de grandes contingentes populacionais. Isso implicou o aquecimento da demanda por produtos alimentares e bens de consumo, bem como a pressão pela oferta de bens e serviços públicos. Nessa direção, os indicadores demográficos, socioeconômicos são ilustrativos, pois exibem, claramente, o crescimento das populações urbanas, especificamente de Canindé de São Francisco, e a ampliação das receitas e despesas

185

Page 186: Alto Sertão - SE

dos municípios. Já no âmbito da produção agropecuária é sintomática a diminuição dos efetivos animais durante o período de construção da Usina, pois pode-se considerar tal movimento como resultado do aquecimento da demanda por bens alimentares.61

O fim da obra de Xingó, com a contração dos empregos, e os reflexos da instalação do projeto Califórnia e dos primeiros assentamentos da reforma agrária, no bojo do I PNRA, provocaram forte pressão social pró reforma agrária, com a ocupação de terras e o surgimento de acampamentos de sem-terra, que logo se espraiaram por todo território. A ocupação das terras, em 1996, do projeto de irrigação Jacaré-Curituba pelos agricultores sem-terra marca a massificação da luta pela terra no sertão. Hoje são 2.955 famílias que, somadas as 7.074 acampadas, representam quase 2/3 dos domicílios rurais.62

Essa nova forma de luta deita, então, raízes nas conquistas dos agricultores sem-terra, nos anos 80, que resultaram, por exemplo, nos assentamentos Barra da Onça (1986), no município de Poço Redondo, e de Ilha do Ouro, em Porto da Folha, bem como nos efeitos demográficos da instalação da Usina de Xingó. Efetivamente, foram assentadas, nos anos 80, 396 famílias, sendo que, de outra parte, surgiram, entre os censos de 1980 e 1991, 4,4 mil novos domicílios no território.

Na medida em que garantem emprego, renda e acesso às condições básicas de cidadania para a população pobre, grande parte originária dos movimentos populacionais advindos com a instalação da Usina, os assentamentos tornaram-se um novo alento para o desenvolvimento regional. As tabelas 1 e 3 mostram a expansão de assentamentos rurais na região, evidenciando que a ocupação das terras do projeto Jacaré-Curituba, contemporaneamente ao fim das obras da Usina Xingó, massificou-se a instalação de novos assentamentos na região. É possível observar nas tabelas 70 e 71, que a criação de assentamentos ganha envergadura no triênio 1996-98, processo que se estende no segundo governo FHC, quando são criados 22 projetos de assentamento em 27 mil hectares.

61 “A grande demanda por alimentos exauriu os rebanhos menores da região, reduzindo, [em 1995], a 15% os caprinos e a menos de 30% os ovinos em relação ao tamanho [destes] em 1985, antes da construção da barragem” (MDA/FAO)62 Considerou-se que, em 2004, existiam cerca de 16 mil domicílios rurais, com base nas estimativas populacionais do IBGE para esse ano. Cabe salientar que, no Censo de 2000, não eram expressivos os domicílios improvisados, característicos da situação dos acampamentos de trabalhadores rurais sem-terra. Isso pode decorrer da dificuldade de enumeração dessa espécie de moradia, bem como do fato de, no período censitário, estarem sendo implementados vários assentamentos. Sabe-se que, em outros municípios brasileiros, com grande presença de acampamentos a população rural em domicílios improvisados é expressiva.

186

Page 187: Alto Sertão - SE

Tabela 71Número, Capacidade e Área dos Projetos de Assentamentos de Reforma Agrária no Alto Sertão Sergipano, segundo períodos de

instalação.

Períodos ProjetosCapacidade de assentamento

(famílias)

Área(ha)

1985-91 5 396 9.5121996-98 17 1.412 18.3281999-02 22 1.033 27.0542003-04 7 114 3.226

Fonte: Superintendência do Incra de Sergipe

A tabela 71 aponta, ademais, que, no primeiro governo FHC, os assentamentos criados se concentraram em Poço Redondo, uma vez que, neste município, se situa o Assentamento Jacaré-Curituba, que teve seis dos seus oito subprojetos instalados nesse triênio. Já no período governamental seguinte, o município Poço Redondo passa a dividir com Canindé o papel de “lócus” privilegiado na instalação de assentamentos de Reforma Agrária.

Tabela 72Distribuição da Capacidade de Assentamento – Famílias –entre os Municípios do Alto Sertão Sergipano, segundo períodos de instalação.

Município 1985-91 1996-98 1999-02 2003-04Poço Redondo 60% 76% 46%Canindé de São Francisco 16% 33%

Porto da Folha 24% 5%Monte Alegre de Sergipe 2% 3% 36%

Nossa Senhora da Glória

6% 6% 2% 44%

Gararu 10% 9% 20%Fonte: Superintendência do Incra de Sergipe

187

Page 188: Alto Sertão - SE

A diminuição na disponibilidade de áreas para desapropriação nos municípios de Canindé e Poço Redondo implicou, no período mais recente, na busca de terras para assentamento nos municípios de Nossa Senhora da Glória, Monte Alegre de Sergipe e Gararu. Assim, hoje são nesses municípios que se concentram os novos assentamentos de reforma agrária, ainda que neles a concentração fundiária seja de menor envergadura.

O Quadro 15 abaixo apresenta os principais dados dos projetos de assentamento - data de criação, capacidade de assentamento e área -, instalados até final do ano passado nos seis municípios do território.

188

Page 189: Alto Sertão - SE

Quadro 15Projetos de Assentamento no Território: capacidade de família, data de imissão de posse e município

Projeto de Assentamento Famílias(capacidade)

Datade criação Município Área

Cuiabá 200 30/12/1996 Canindé de São Francisco 2.023Modelo 30 16/4/1998 Canindé de São Francisco 873Mandacaru 60 21/6/2001 Canindé de São Francisco 1.710Florestan Fernandes 31 9/4/2002 Canindé de São Francisco 825Monte Santo I 14 16/6/2002 Canindé de São Francisco 354

Monte Santo 25 19/7/2002 Canindé de São Francisco/Poço Redondo 893

João Pedro Teixeira 145 21/10/2002 Canindé de São Francisco 3.740Santa Maria 16 18/11/2002 Canindé de São Francisco 456Maria Feitosa 45 25/11/2002 Canindé de São Francisco 1.272Santa Rita 32 25/11/2002 Canindé de São Francisco 1.143Nova Esperança 40 2/4/1991 Gararu 719Cachoeirinha 98 23/11/1999 Gararu 2.695Flora da Índia 10 20/10/2003 Gararu 301Maria Vitória 13 21/10/2003 Gararu 420Bom Jardim 28 31/12/1997 Monte Alegre de Sergipe 603São Raimundo 10 14/12/2000 Monte Alegre de Sergipe 266União dos Conselheiros 25 21/6/2001 Monte Alegre de Sergipe 627Raimundo Monteiro da Silva 21 22/12/2003 Monte Alegre de Sergipe 602

Josenilton Aves 14 17/11/2004 Monte Alegre de Sergipe 357RAimundo Monteiro I 6 14/12/2004 Monte Alegre de Sergipe 162Nossa Senhora Aparecida 24 2/4/1991 Nossa Sra da Glória 585Fortaleza 50 29/12/1997 Nossa Sra da Glória 922Nossa Senhora da Glória 28 9/9/1998 Nossa Sra da Glória 656Nossa Senhora da Boa Hora 25 12/4/2002 Nossa Sra da Glória 502

João do Vale 18 22/12/2003 Nossa Sra da Glória 559José Ribamar - Socorro Conceição 32 19/10/2004 Nossa Sra da Glória 824

Barra do Onça 211 1/10/1986 Poço Redondo 6.278Pedras Grandes 27 30/9/1988 Poço Redondo 610

189

Page 190: Alto Sertão - SE

Flor da Serra 41 18/3/1996 Poço Redondo 971Curralinho 50 27/12/1996 Poço Redondo 1.175Jacaré Curituba I 264 29/12/1997 Poço Redondo 1.320Jacaré Curituba II 71 (sequeiro) 29/12/1997 Poço Redondo 1.216Jacaré Curituba III 138 29/12/1997 Poço Redondo 735Jacaré Curituba IV 214 29/12/1997 Poço Redondo 1.367Jacaré Curituba V 55 (40desequeiro) 29/12/1997 Poço Redondo 889Jacaré Curituba VI 17 15/12/1998 Poço Redondo 430Jacaré Curituba VII - Dandara 45 (12desequeiro) 17/12/1998 Poço Redondo 299

Jacaré Curituba VIII 42 24/12/1999 Poço Redondo 605Pioneira 21 31/12/1997 Poço Redondo 513Queimada Grande 150 12/8/1998 Poço Redondo 4.087Novo Mulungu 10 17/12/1998 Poço Redondo 249São José do Nazaré 30 4/12/1999 Poço Redondo 743Cajueiro 112 29/12/1999 Poço Redondo 2.745Lagoa da Areia 160 29/12/1999 Poço Redondo 3.985Caldeirão 19 9/4/2002 Poço Redondo 508Nova Vida 14 20/6/2002 Poço Redondo 424Maria Bonita I 35 4/11/2002 Poço Redondo 1.092Novo Paraíso 40 25/11/2002 Poço Redondo 1.074Ilha do Ouro 94 26/5/1987 Porto da Folha 1.320Paulo Freire 40 20/11/2000 Porto da Folha 1.181José Unaldo de Oliveira 15 21/6/2001 Porto da Folha 212Total 2.955 58.290Fonte: INCRA-SE

A partir dos dados apresentados nas tabelas e no quadro acima, é possível verificar o peso que os assentados tem na população do território, particularmente em Canindé e em Poço Redondo, onde as famílias assentadas respondem por, respectivamente, 32% e 46% dos domicílios rurais. É devido a isso que nesses municípios as atividades dos assentados vão além dos limites dos assentamentos, contando com representantes de destaque na vida social e política de tais cidades.63.

Há que se observar ainda que, na tabela acima, os assentados estão formando no meio rural do sertão sergipano uma nova agricultura familiar, pois vêm possibilitando um outro patamar de habilitação64 a uma parte da população excluída, a qual mantinha algum tipo de inserção socioeconômica na região, mas, esta era feita em condições instáveis e precárias.

63 Informação da Pesquisa de Campo.

190

Page 191: Alto Sertão - SE

Segundo os atores locais, os trabalhadores sem-terra acampados e assentados estão contribuindo para o crescimento da população do Alto Sertão, com alguns apontando para o fato de que até o início dos anos de 1980 existiam “vazios demográficos” no sertão. “Era possível andar quilômetros em linha reta sem se encontrar uma casa”. Atualmente, o panorama é muito diferente, principalmente em função dos assentamentos rurais, que promoveram o maior povoamento da região, levando a abertura de novas estradas e a expansão da rede de energia e de água. Ficou evidente nas entrevistas o reconhecimento por parte de muitos dos atores locais da importância do MST (Movimento dos Trabalhadores Sem-Terra) na transformação fundiária, econômica e política da região.

Os dados acerca das condições de habitação e de acesso a serviços públicos nos assentamentos localizados no território, coletados pela pesquisa “A qualidade de vida nos assentamentos da reforma agrária brasileira”, mostram claramente o quão positiva tem sido a reforma agrária na melhoria da qualidade de vida das populações rurais pobres. Os dados relativos às condições de moradia, de infra-estrutura e de acesso a serviços públicos de 21 projetos de assentamento do território, presentes na tabela 73, são exemplares desse fato. Decidiu-se selecionar na base de dados da pesquisa as informações relativas àqueles assentamentos que foram contemplados com ações de recuperação. Tal situação ganha ainda mais destaque ao se comparar com indicadores semelhantes captados pelo ultimo Censo, onde, ademais, a melhora dos indicadores habitacionais deve ser, em parte, creditada a situação dos assentamentos.

64 Conceito de Amartya Sem, citado por Celso Furtado em “O subdesenvolvimento revisitado”, artigo publicado, em agosto de 1992, na Revista Economia e Sociedade do Instituto de Economia da Unicamp.

191

Page 192: Alto Sertão - SE

Tabela 73Indicadores de Qualidade de Vida em Assentamentos no Alto Sertão Sergipano 65

Indicador % FamíliasCasas boas 99%Energia Elétrica 54%Abastecimento de água de qualidade 23%Sanitários 59%Escola fundamental 69%Agente saúde 79%Assistência técnica 83%

Boas condições de acesso % projetos 81% % famílias 85%

Infra-estrutura básica implementada 29% em implantação 57% a implantar 14%

Tempo médio até à sede municipal 32 minutosFonte: Microdados da pesquisa “A qualidade dos assentamentos da reforma agrária brasileira”, coletados no segundo semestre

de 2002.Nota: Calculou-se a média ponderada de famílias, tendo como base a capacidade de assentamento de cada um dos projetos

examinados.

Há que se destacar que o período de massificação dos assentamentos rurais coincide com o crescimento dos empregos formais nos ramos industrial, comercial e de serviços, bem como das ocupações em geral. Efetivamente, segundo se apontou no item III.3.2., os dados do Ministério do Trabalho mostram que, entre 1991 e 2003, os empregos formais passaram de 4.228 para 5.698, crescimento de 38% bastante

65 Os dados referem-se a média ponderadas dos indicadores dos seguintes assentamentos: Nossa Senhora Aparecida, Fortaleza, Bom Jardim, Nossa Senhora da Glória, São Raimundo, União dos Conselheiros, Nossa Senhora da Boa Hora, Ilha do Ouro, Nova Esperança, Cachoeirinha, Paulo Freire, José Unaldo de Oliveira, Flor da Serra, Curralinho, Pioneira, Queimada Grande, São José do Nazaré, Cajueiro, Lagoa da Areia, Barra da Onça, Pedras Grandes. Esses 21 PAs compõem, juntamente com o PA Mandacaru e os dois PAs de sequeiro do Jacaré-Curituba, os projetos com Planos de Recuperação.

192

Page 193: Alto Sertão - SE

superior ao crescimento da população total e rural, entre os censo, de, respectivamente, 21% e 13%. Isso apesar do decréscimo expressivo dos postos de trabalho na construção civil que, decorrente do fim das obras da Usina, caíram de 2.706 para 33 postos de trabalho.

Já os dados de ocupação, exibem, também, um comportamento bastante promissor, dado que, entre 2000 e 1991, a PEA total no território cresceu a uma taxa anual de 3,2% frente a taxa anual de crescimento populacional de 2,1%. Mesmo as ocupações rurais agrícolas tiveram um crescimento positivo, pois superior ao aumento da população rural. Efetivamente, a PEA Rural Agrícola cresceu a uma taxa anual de 1,6% contra os 1,4% da população rural. O que de fato chamou a atenção foram as performances das ocupações ligadas a administração publica, ao comércio e ao transportes, o que parece estar relacionado à dinâmica imposta pela instalação de assentamentos rurais, pois estes amplificam as demandas por serviços e bens públicos e aquecem a economia local ao serem contemplados tanto com empréstimos para o financiamento de suas atividades como de benefícios sociais e previdenciários.

Assim, tanto a indústria existente na região - queijarias, beneficiamento de grãos, abatedouros - como o setor de serviços vem ampliando suas participações no emprego, como bem apontam os indicadores do Ministério do Trabalho e dos Censos Demográficos.

É de se esperar, ademais, que os assentamentos na região, ao romperem com o latifúndio, criam condições de inserção no sistema produtivo de indivíduos até então excluídos, gerando, portanto, melhoras na distribuição da renda local pelo acesso a terra. Infelizmente os dados disponíveis para essa avaliação não são conclusivos, uma vez que cobrem o período 1991-2000, quando grande parte dos projetos de assentamento encontrava-se em fases iniciais de implantação. Os dados apontam para um crescimento da renda associado a um aumento na desigualdade e a diminuição da pobreza, quando se considera o conjunto de toda a população. Já no meio rural, não se verifica o crescimento na renda e a diminuição da pobreza. Há, todavia, dois fatores que podem explicar, em parte, esse comportamento díspar do meio rural: o primeiro diz respeito às diferenças na maneira de coletar os dados de emprego e de trabalho nos dois últimos Censos; e o segundo ao comportamento da produção agropecuária e dos preços agrícolas nos anos dos Censos. Concretamente, em 2000, a área colhida com lavouras temporárias representou 1/3 da colhida em 1991, sendo que as produções de milho e feijão, em 2000, foram, respectivamente, 47% e 54% inferiores a quantidade colhida em 1991.

Em relação ao primeiro aspecto, vale lembrar que, enquanto, em 2000, as perguntas relativas ao trabalho e aos rendimentos tinham por referência uma semana, no Censo de 1991, essas perguntas cobriam os últimos doze meses. Isso, com certeza, implicou em rendimentos monetários menores, pois dada a sazonalidade da atividade agrícola, parcela dos ocupados não se encontrava em atividade laboral e, portanto, não foram investigados seus rendimentos. Soma-se a isso o fato de que no Censo de 2000 foram incorporados, corretamente, a PEA, aquelas pessoas que trabalharam entre 1 e 15 horas na semana de referencia, dedicando-se ao auto-consumo e a auto-construção. O que significou mais uma diminuição dos rendimentos quando comparados aos investigados em 1991.

193

Page 194: Alto Sertão - SE

A população até então excluída, ao promoverem a ruptura com o latifúndio, foram constituindo novas unidades familiares de produção, que, por sua vez, interagem com o território numa dinâmica que difere da anterior. Dinâmica essa determinada pela performance da grande propriedade e pelos ritmos impostos pelos ciclos de enchentes do rio São Francisco – para o caso das populações ribeirinhas66. Como viemos apontando, essas novas estruturas produtivas, além de proporcionarem a melhoria da qualidade de vida da população marginalizada nas diversas formas de integração com o local onde situam, vêm abrindo perspectivas de produção para as unidades familiares. Os dados relativos aos efetivos animais e a produção leiteira dos assentamentos levantados pela Assistência Técnica do Cecac são bastante ilustrativos da importância que os assentamentos vem angariando no território. Cotejando as informações levantadas, em 2005, em 20 assentamentos com os dados dos efetivos animais e de produção leiteira do IBGE para 2003, verifica-se que esses assentamentos respondem, grosso modo, por 6% dos efetivos bovinos, 8% dos ovinos e 9% da produção leiteira (tabela 74)

Isso mostra, por outro lado, quanto os assentados se encontram subordinados aos sistemas de produção vigentes na região – combinação de pecuária leiteira com lavouras temporárias (no período das chuvas), havendo, todavia, processos reivindicativos por outros sistemas e/ou modelos tecno-produtivos. Esses processos reivindicativos se somam e às vezes disputam com os desenvolvidos por outros agentes locais. Essa perspectiva produtiva está voltada, segundo os agentes locais entrevistados, para:

− Garantir um processo de capacitação e qualificação para o produtor rural e sua família;− Intensificar as ações de assistência técnica e acesso a informação sobre a produção, conservação do meio ambiente;− Melhorar a produtividade da pecuária leiteira;− Desenvolver projetos de irrigação, como também, formas de acesso a água de baixo custo;− Criar agroindústrias;− Desenvolver a diversificação da produção familiar com novas atividades agrícolas, incentivando a produção de piscicultura, de

pequenos animais (aves, caprinos e ovinos), de produtos orgânicos, entre outras;− Desenvolver atividades não agrícolas como turismo, o artesanato, entre outras;

As reivindicações imediatas de alternativas de produção passam pelo acesso a financiamentos, pela sustentabilidade e pelo uso racional da água, existindo uma clara demanda por acesso a informações e por políticas de assistência técnica e fomento, particularmente para a convivência com a seca e para a manutenção e uso da caatinga.

A ausência de políticas para a irrigação e para a recuperação da caatinga foi constantemente denunciada pelos assentados e atores entrevistados. E, no bojo dessas queixas, ressalta-se o fato do governo federal desapropriar áreas improdutivas e não aportar recursos necessários em termos de infra-estrutura de sorte garantir a produção, a inovação, a sobrevivência das famílias assentadas e o pagamento dos financiamentos. Os dados dos PDA’s (Planos de Desenvolvimento de Assentamento) do período de 1999 a 2002 exemplificam essa situação, sendo que a grande maioria dos 66 O ciclo das enchentes foi interrompido com a construção do complexo hidroelétrico de Paulo Afonso.

194

Page 195: Alto Sertão - SE

assentamentos rurais com PDAs não foram beneficiados com obras de infra-estrutura social: poços e rede de abastecimento de água; energia elétrica e estradas. Somente foram beneficiados com os recursos de crédito de implantação: alimentação, fomento e habitação. Os dados da pesquisa “A qualidade dos assentamentos da reforma agrária brasileira” apontam, também, para essa deficiência, evidenciada nos dados da tabela 73, onde somente 29% dos projetos contam com a infra-estrutura básica implantada.

Os assentamentos na região vêm se constituindo em novos espaços de relações de produção e de renda, as relações sociais que estão sendo construídas pelas famílias assentadas estão em bases diferentes e focadas numa outra perspectiva daquela que marcou períodos anteriores em suas vidas. Apesar da descontinuidade e/ou até da ausência de política pública em determinados momentos das trajetórias desses assentamentos, principalmente no que se refere à implementação das ações de infra-estrutura e de fomento às atividades de produção, os assentamentos rurais representaram uma perspectiva de vida.

V.1.3. O impacto dos assentamentos: síntese de seus impactos sócio-produtivos

O papel do Incra de formulador, planejador e gestor dos processos de instalação e desenvolvimento dos projetos de assentamento vêm, desde há muito, sendo dilapidado, tanto pela baixíssima renovação de seus quadros técnicos como pela constante restrição fiscal, opinião comum a vários dos entrevistados. Verifica-se, assim, que a política agrária, além de se encontrar a reboque das pressões e demandas do movimento social, apresenta dificuldades gerenciais e operacionais nas fases de implantação e desenvolvimento dos projetos de assentamento. Verdade que, no atual governo, houve avanços, particularmente, no quadro técnico, com a realização de processos seletivos, nos recursos financeiros, com um expressivo crescimento no orçamento do Incra, e na relação entre governo e assentados. Todavia, aprofundaram-se os processos de descentralização e terceirização nas ações e intervenções de implantação e desenvolvimento dos assentamentos, bem como na assistência técnica. Neste caso, cabe, por outro lado, salientar o crescimento dos recursos e as possibilidades abertas de uma gestão participativa dos assentados vias movimentos sociais, sindical e ONGs.

O que se tem assistido é a incapacidade do governo e dos próprios assentados em estabelecer dinâmicas produtivas alternativas aos modelos tecno-produtivos preexistente nas regiões, o que tem implicado em rendimentos físicos baixos, sub-ocupação da mão-de-obra familiar e inexistência de avanços tecnológicos significativos. O sistema de produção presente nos assentamentos está baseado na pecuária leiteira aliado ao cultivo de lavouras temporárias no período das águas e, em alguns casos, à criação de pequenos animais e ao extrativismo. Assim, no verão cultivam-se preferencialmente o feijão e o milho, que se destinam, respectivamente, ao autoconsumo e a alimentação animal. Os outros cultivos desenvolvidos como a mandioca, o algodão, a melancia e a abóbora são complementares, estando, em grande medida, relacionados às condições edáficas e topográficas dos assentamentos. No extrativismo, cabe citar, a pesca, na região ribeirinha, e de origem vegetal, ou seja, a exploração da caatinga com a retirada de lenha, estacas, madeira e carvão.

195

Page 196: Alto Sertão - SE

Desenvolve-se, também, como suporte forrageiro para os animais, a palma e o capim buffel, havendo muitos assentados e pequenos produtores que se especializam como fornecedores de palma forrageira, com casos, inclusive, de agricultores que não desenvolvem a produção leiteira com fins comerciais e sim a de palma.

A criação de pequenos animais se resume a criação de ovinos, caprinos67, suínos68 e aves, que são uma estratégia de subsistência, sendo comercializado o excedente no mercado local, principalmente, nas feiras do município onde estão inseridos.

Esse sistema produtivo, calcado na pecuária leiteria associado ao cultivo de lavouras temporárias, apresenta claros limites, entre os quais, cabe citar: as perdas constantes devido às secas; a necessidade do aporte de insumos externos à propriedade, particularmente para alimentação do gado; a degradação da caatinga; e a diminuição constante da piscosidade do rio. A degradação da caatinga implica em obstáculos crescentes ao desenvolvimento da caprinocultura e, até mesmo, da pecuária bovina, o que tem significado uma substituição dos efetivos caprinos por ovinos, cujas necessidades alimentares são mais adequadas a esse cenário. Já no caso da pecuária leiteira, assisti-se a uma dificuldade crescente em fornecer alimentação em quantidade e qualidade adequada aos rebanhos no período seco, isso devido, de um lado, as constantes perdas na lavoura de grãos – milho – e, de outro, na insuficiência de pastagens e de áreas destinadas a palma e outros cultivos para a alimentação animal.

A escolha pela pecuária leiteira é resultado tanto da cultura local como da inexistência de alternativas produtivas que contem com aporte tecnológico e assistência técnica. Logo, o que se verifica é o desenvolvimento da pecuária leiteira como resultado dos esforços dos assentados e não de políticas públicas de fomento. A bovinocultura, particularmente a leiteira, apresenta claros limites na região, dado que o consumo de água é bastante elevado, pois para o ganho de 1 kg de peso pelo animal é 1.000 litros de água e para a produção de um litro de leite são necessários 8,5 litros. É, em razão disso que, como apontam os agentes pesquisados, no período da seca as famílias gastam mais água com o gado do que com elas próprias. Vale sublinhar que a Embrapa vem desenvolvendo à muitos anos um modelo agroecológico de produção leiteira, onde se busca diminuir a dependência de insumos externos às propriedades, especificamente da complementação alimentar no período de seca. Tal modelo se fundamenta, de um lado, em sistemas agrossilvipastoris com adaptação à seca, isto é, a associação entre cactáceas forrageiras, leguminosas arbóreas e gramíneas tolerantes ao stress hídrico e., de outro em práticas de conservação das forragens e do uso de raças zebuínas leiteiras. Mas, como bem apontam os trabalhos divulgados e as enquetes junto aos produtores, os principais obstáculos a esse “modelo” são o tamanho mínimo requerido, as necessidades financeiras para sua implementação e a falta de água em quantidade e qualidade suficiente. 69

67 Os ovinos e os caprinos são criações secundárias para um grande número de famílias sertanejas, servindo como alimento e poupança para períodos difíceis (afirmação de agentes locais na pesquisa de campo).68 De acordo com gentes locais a produção de suínos está vinculada a produção de leite, com o soro - sub-produto da produção do queijo – servindo, juntamente com o milho, de alimento para os porcos.69 No que concerne a comercialização do leite, como já se apontou, esta é realizada nos mercados locais, destinando-se aos laticínios e queijarias. Segundo os atores locais, a região tem hoje uma produção de 70 mil quilos de queijo por semana, sendo que somente em Nossa Senhora da Glória, 68 mil litros de leite abastecem 25 laticínios aí localizados. Estima-se, ademais, que a região do Alto Sertão produza, atualmente, cerca de 260 mil litros/dia. As potencialidades e dificuldades que atravessa o setor na

196

Page 197: Alto Sertão - SE

A analise dos projetos de financiamento do Pronaf-A mostram claramente esse cenário, com os assentamentos reproduzindo os modelos produtivos dos médios e grandes produtores. Assim, não se verificam grandes diferenças entre as propostas, tendo todas elas perfis muito semelhantes. Efetivamente, os gastos são repartidos, grosso modo, em parcelas iguais, entre a aquisição de animais, especialmente de bovinos, a implantação de infra-estrutura para a criação, quase sempre cercas, silos e aguadas – e o cultivo de forragens e de milho. Raramente se verificam desembolsos em outros itens, salvo para a aquisição de ovinos e construção de apriscos e, no caso de assentamentos Não há, em nenhuma das 16 propostas examinadas, a implantação de bancos de proteínas – leucena e gliricídia – e do cultivo de milheto, sorgo e guandu, que adaptadas às condições do semi-árido são alternativas de alimentação animal bastante promissoras.

região encontra-se analisado do item sobre os APLs.

197

Page 198: Alto Sertão - SE

Tabela 74Perfil dos dos Projetos de Pronaf-A, segundo Assentamentos Selecionados

Assentamentos(Ano Projeto Pronaf-A)

Distribuição recursos Nº de animais Área

animais forragens infra Outras

culturas bovinos ovinos palma buffel milhotipo

José Unaldo de Oliveira - 2003 22% 30% 40% 8% 2 10 2,0 2,5 3,2 RibeirinhaMonte Santo – 2003 39% 32% 29% 0% 5 - 3,8 6,0 - RibeirinhaSanta Maria – 2003 40% 34% 26% 0% 3 10 4,2 5,5 3,0 SequeiroNovo Paraíso – 2003 40% 34% 26% 0% 3 10 4,2 5,5 3,0 SequeiroMonte Santo – 2003 40% 34% 26% 0% 5 - 3,8 6,0 - RibeirinhaMaria Feitosa – 2003 40% 34% 26% 0% 3 10 4,2 5,5 3,0 SequeiroMaria Bonita – 2003 40% 34% 26% 0% 3 10 4,2 5,5 3,0 SequeiroJoão Pedro Teixeira – 2003 40% 34% 26% 0% 3 10 4,2 5,5 3,0 SequeiroSanta Rita – 2003 40% 34% 26% 0% 3 10 4,2 5,5 3,0 SequeiroNossa Senhora da Boa Hora - 2002 33% 36% 31% 0% 4 - 2,0 6,0 2,6 Bacia Leiteira

Paulo Freire – 2002 38% 41% 20% 0% 2 30 4,1 3,5 - Bacia LeiteiraSão Raimundo – 2002 36% 43% 22% 0% 4 7 4,4 4,1 - Bacia LeiteiraCachoeirinhas – 2000 39% 45% 16% 0% 2 15 3,1 5,0 - Bacia LeiteiraMandacaru – 2002 27% 45% 28% 0% 2 14 3,0 3,3 5,0 SequeiroFlorestan Fernandes – 2002 26% 45% 29% 0% 2 14 3,0 3,3 5,0 SequeiroSão Raimundo - 2002 30% 45% 25% 0% 4 7 4,4 4,1 - Bacia LeiteiraFonte: CECAC.

Outra ausência presente em todos os projetos refere-se a ações de recuperação da caatinga, o que permitiria, com manejo adequado, o fornecimento de produtos madeireiros - lenha, carvão, estacas, material para construção, etc. -, o desenvolvimento da apicultura e de outros produtos, como frutas e plantas medicinais, sendo, também, extremamente importante na manutenção da pequena pecuária – caprinos e ovinos. Verdade que os investimentos com o objetivo de recuperar a caatinga tem longo prazo de maturação e os órgãos de pesquisa e de assistência técnica, bem como os próprios produtores, não contam com capacidade gerencial e técnica na difusão de modelos tecno-produtivos com esse escopo. Assim, faz-se urgente que os órgãos de pesquisa, de assistência técnica e os gestores públicos busquem construir projetos e iniciativas que tenham por escopo a recuperação, o manejo e a utilização econômica da caatinga. Interessante observar, inclusive, que o Pronaf-Florestal, linha de financiamento para investimentos na produção agrossilvícola, não teve nenhuma contratação por agricultores familiares do semi-árido nordestino.

198

Page 199: Alto Sertão - SE

O presente estudo, considerando tais recorrências e ausências, propõe alterações e incorporações aos futuros projetos e financiamentos aos assentados e agricultores familiares do território. O quadro 16 sintetiza, para aqueles assentamentos que se contava com as propostas de Pronaf-A, algumas dessas sugestões. Em primeiro lugar, para os assentamentos ribeirinhos, devem ser apoiados os investimentos para a irrigação – Pronaf-Semi-Árido – associada a medidas de recuperação das matas ciliares e da caatinga, que estão contempladas no Programa de Revitalização do Rio São Francisco. Nos outros assentamentos avaliados, deve se buscar, em primeiro lugar, o incremento dos financiamentos para suporte forrageiro, ampliando, todavia, o leque de cultivos e de pastagens a serem implantadas. Em segundo lugar, a pecuária de pequenos animais deve ter preferência na aquisição de novos animais, o que requer, também, a recuperação da caatinga.

Em terceiro lugar, para aqueles assentamentos de maior porte, a agroindustrialização da produção, especificamente da leiteira é medida que deve ser tomada, o que demanda, para tanto, esforços na cooperação entre os assentados.

Quadro 16Proposta de Novos Projetos-Financiamentos nos Assentamentos com Perfis de Pronaf-A

Projeto Perfil do Pronaf-A Propostas de Novos FinanciamentosJosé Unaldo de Oliveira - 2003 alta % em infra Pronaf Semi-Árido e Florestal

Viveiros

Monte Santo - 2003 baixa % com forragens Pronaf Semi-Árido e FlorestalViveiros

Santa Maria - 2003 baixa % com forragensPronaf Florestal e Recuperação centrada em ovinos e

alimentação animal (milheto, guandu e leucena)Bolsa Caatinga (Garantia-Safra)

Novo Paraíso - 2003 baixa % com forragensPronaf Florestal e Recuperação centrada em ovinos e

alimentação animal (milheto, guandu e leucena)Bolsa Caatinga (Garantia-Safra)

Monte Santo - 2003 baixa % com forragens Pronaf Semi árido e FlorestalViveiros

Maria Feitosa - 2003 baixa % com forragensPronaf Florestal e Recuperação centrada em ovinos e

alimentação animal (milheto, guandu e leucena)Bolsa Caatinga (Garantia-Safra)

Maria Bonita - 2003 baixa % com forragensPronaf Florestal e Recuperação centrada em ovinos e

alimentação animal (milheto, guandu e leucena)Bolsa Caatinga (Garantia-Safra)

João Pedro Teixeira - 2003 baixa % com forragensPronaf Florestal e Recuperação centrada em ovinos e

alimentação animal (milheto, guandu e leucena)Bolsa Caatinga (Garantia-Safra)

199

Page 200: Alto Sertão - SE

Santa Rita - 2003 baixa % com forragensPronaf Florestal e Recuperação centrada em ovinos e

alimentação animal (milheto, guandu e leucena)Bolsa Caatinga (Garantia-Safra)

Nossa Senhora da Boa Hora - 2002

infra em nível bom e baixa % animais Ampliar a área com forragens

Paulo Freire - 2002 infra com baixa %Pequenos animais e Bolsa caatinga

Tamanho assentamento é limitante para a agroindustrialização da produção leiteira

São Raimundo - 2002 infra com baixa %Pequenos animais e Bolsa caatinga

Tamanho assentamento é limitante para a agroindustrialização da produção leiteira

Cachoeirinhas - 2000 infra com baixa % Agroindustrialização produção leiteria possibilitada pelo tamanho do assentamento

Mandacaru - 2002 infra em nível bom e baixa % animais

Aumento do Efetivo AnimalAgroindustrialização produção leiteria possibilitada pelo

tamanho do assentamento

Florestan Fernandes - 2002 infra em nível bom e baixa % animais

Aumento do Efetivo AnimalAgroindustrialização produção leiteria possibilitada pelo

tamanho do assentamentoSão Raimundo - 2002 infra em nível bom e baixa

% animaisPequenos animais e Bolsa caatinga

Tamanho assentamento é limitante para a agroindustrialização da produção leiteira

Fonte: elaboração equipe técnica

No quadro é citado o que se denominou de Bolsa Caatinga, ligado ao já existente Garantia Safra, que teria por escopo remunerar os assentados e agricultores familiares que levassem a cabo ações de recuperação de áreas degradadas da caatinga. Efetivamente, dado o “longo” período de maturação dos investimentos em recuperação da caatinga e os riscos e dificuldades em obter retornos com sua utilização, defende-se que, junto a concessão de empréstimos do Pronaf-Florestal, voltados esses, especificamente, ao resgate da caatinga, seja concedida remuneração – ao estilo das bolsas – para aqueles agricultores e assentados que contratassem esses empréstimos. Essa remuneração se estenderia durante o período de maturação do investimento, ou seja, até que se tornasse possível a utilização produtiva da caatinga recuperada, com a extração de produtos florestais e animais, o desenvolvimento da apicultura e como suporte alimentar auxiliar. Relacionou-se essa proposta ao Garantia Safra, tendo em vista que esse programa se insere nas ações de convivência com a seca, objeto da proposta do Bolsa Caatinga e que não parece caracterizar o programa como hoje ele se desenvolve. Isso porque o Garantia Safra tem sido empregado quando ocorrem prejuízos expressivos nas lavouras temporárias em função da profundidade da estiagem e não de medidas que busquem melhorar a convivência dos agricultores com as condições do semi-árido. A recuperação da caatinga e seu manejo e uso econômico permitirão, diferentemente, a recuperação de parcela expressiva das fontes originais de renda das populações rurais do semi-árido, além dos potenciais efeitos em atenuar as secas e melhorar as condições de armazenamento das águas.

200

Page 201: Alto Sertão - SE

A implantação desse conjunto expressivo de assentamentos, ainda que reproduzindo os modelos produtivos regionais, cuja sustentabilidade é bastante frágil, significou um crescimento bastante expressivo da produção leiteira, dos efetivos animais e das áreas cultivas com lavouras temporárias. Ou seja, houve, de um lado, um melhor aproveitamento das terras com lavouras e, de outro, um incremento na utilização das pastagens, o que demonstrou o grau de sub-utilização das terras do território, que, com se apontou, tiveram sua apropriação “produtiva” com o desmatamento das matas de caatinga e sua transformação em pastagens. Evidentemente a massificação dos assentamentos de reforma agrária resultou no aumento da pressão demográfica e da carga animal, aprofundando os processos de degradação ambiental, uma vez que os poderes públicos não aportaram aos novos agricultores os meios financeiros, técnicos e educacionais para a constituição de um modelo tecno-produtivo adaptado e adequado às condições – limites – sócio-ambientais.

A importância dos assentamentos de reforma agrária no território é, em grande medida, corroborada pelos dados apresentados na tabela 74, onde se encontram algumas informações produtivas de projetos localizados em Canindé de São Francisco e Poço Redondo, coletadas, no inicio do corrente ano, por técnicos do Cecac que prestam assistência técnica nesses projetos por meio do convênio da ATES. É de fato surpreendente que 15% e 25% dos efetivos bovino e caprino e 27% da produção leiteira desses dois municípios sejam de responsabilidade de alguns dos assentamentos neles situados. Para melhor verificar o quão importantes os assentamentos têm sido para a agropecuária do território, vale notar que os projetos aqui considerados respondem por cerca de 17% da área dos imóveis rurais desses dois municípios.

201

Page 202: Alto Sertão - SE

Tabela 75Efetivos animais, produção leiteira diária – verão – e área com palma forrageira, em 2005.

Assentamentos nos municípios de Canindé do São Francisco e Poço Redondo

Assentamentos Bovinos Caprinos Ovinos Aves Leite/Dia Palma

Município de Canindé do São FranciscoCanadá (1) 437 107 505 755 141Cuiabá 265 65 94 604 218 123Florestan Fernandes 293 8 128 436 486 77João Pedro Teixeira 1.135 1 1.159 1.206 1.772 107Mandacaru 458 597 376 790 134Maria Feitosa 249 21 473 36Modelo 114 20 69 157 204 227Monte Santo I 161 245 243 36Santa Maria 197 18 129 328 21Santa Rita 265 22 531 451 45

Município de Poço RedondoCajueiro 817 27 80 588 1369 222Curralinho 81 85 56 83 69Lagoa das Areias 490 11 107 159 410 240Maria Bonita 168 13 29 549 54Nova Vida 67 43 233 21Novo Mulungu 86 35 153 21Novo Paraíso 191 3 26 712 44Pioneira 134 26 205 35Queimada Grande 1.294 383 2.315 356São José do Nazaré 160 5 10 77 168 29

Total 7.062 238 3.010 5.013 11.917 2.038% dois municípios (2) 5,5 3,5 8,1 1,1 9,0% território (2) 15,3 6,4 24,7 3,7 27,4Fonte: Cecac e IBGE (www.sidra.ibge.gov.br)(1): Grupo de assentados do PA Jacaré Curituba XX

202

Page 203: Alto Sertão - SE

(2): Considerou-se os dados da Pesquisa Pecuária Municipal de 2003.

Ora, a “simples” colocação dos sem-terras nos projetos de assentamento, com todas as dificuldades na implantação de projetos produtivos sustentáveis - atraso nas liberações de financiamento, reprodução dos modelos produtivos dependentes de insumos externos, fragilidade na oferta de infra-estrutura e de serviços de assistência técnica, gargalhos/problemas na comercialização e/ou escoamento da produção – levaram os assentados a aprofundar as atividades extrativistas, provocando, por conseguinte, tanto a degradação do ambiente como a substituição da vegetação da caatinga pelo plantio de lavouras temporárias e de pastagens, destacando-se com grande freqüência as áreas de queimadas para formação de roças e fabricação de carvão. Assim, os assentados retiram madeiras da caatinga para o fabrico de carvão e venda da lenha, tendo impactos negativos ao meio-ambiente e prejudicando as espécies que poderiam servir de suporte alimentar para o rebanho.

Quanto ao comércio dos produtos agrícolas, se destacam as feiras livres que acontecem semanalmente em todos os municípios da região, com destaque para o fato de que a maior parcela das verduras e frutas comercializadas nas feiras locais é proveniente de Itabaiana, dos perímetros irrigados de Pernambuco e Bahia e da CEASA de Aracaju. Logo, vários dos produtos agrícolas “in natura” são oriundos de outras regiões, com a agropecuária local tendo destaque no comercio de carnes, que é controlado pelos feirantes locais. Os dias de feira são os dias de maior movimentação do comércio formal e do setor de serviços de cada município, evidenciando que a vida econômica municipal gira entorno da movimentação dessas feiras e, em certa medida, pelas atividades agropecuárias locais. A feira de Nossa Senhora da Glória, que acontece nos sábados, é a maior de todo o sertão, atraindo comerciantes e compradores de outros lugares, como: Itabaiana, Carira, Feira Nova, Aparecida, São Miguel do Aleixo, Itabi, Dores e Graco Cardoso, o que é facilmente observado pela movimentação de ônibus oriundos desses lugares. Por isso é chamada de feira regional da capital do sertão. A feira de Canindé de São Francisco, que acontece aos sábados, também tem um porte regional, atraindo público de Monte Alegre e Poço Redondo – SE, Paulo Afonso e Santa Brígida – BA, e Piranhas, Pão de Açúcar e Delmiro Gouveia – AL. Enquanto as feiras de Poço Redondo, Porto da Folha e Monte Alegre atraem comerciantes locais, com um público mais localizado (Informações da Pesquisa de Campo).

Os Planos de Desenvolvimento de Assentamentos (PDA’s) que, realizados no período de 1999 a 2004, abrangeram 1.286 famílias em 28 projetos de assentamento, compõem a outra importante fonte de informações. O Quadro 17 traz o rol desses assentamentos, sua localização e o ano de realização do PDA.

Através de questionários aplicados nos assentamentos para a elaboração dos PDA’s, foram construídas tipologias de produção agropecuárias, que serviram para a caracterização e o agrupamento dos assentamentos segundo a semelhança encontrada entre eles. Todavia, deve-se ressaltar que essas tipologias descritas nos PDA’s representam uma ‘fotografia’ do que estava ocorrendo no momento das entrevistas (diagnóstico). Pode-se afirmar que, em grade parte dos casos, as combinações produtivas que os assentados levavam a cabo se inseriam nas estratégias de sobrevivência desenvolvidas naquele momento. De toda sorte, observou-se que os assentamentos próximos apresentaram tipologias de produção bastante semelhantes, o que se justifica pela origem dos assentados que por serem, na sua grande maioria, provenientes daquela região

203

Page 204: Alto Sertão - SE

preservam suas tradições culturais de produção.

204

Page 205: Alto Sertão - SE

Quadro 17Assentamentos do Sertão Sergipano com PDAs

MUNICÍPIOSPOÇO REDONDO

Assentamentos Número de assentados (1) Ano do PDAQueimada Grande 150 1999Cajueiro 107 2000Novo Mulungu 10 2002São José do Nazaré 26 2002Caldeirão 19 2003Maria Bonita I 39 2003Nova Vida 14 2003Novo Paraíso 40 2003

CANINDÉ DO SÃO FRANCISCOModelo 30 1999Florestan Fernandes 31 2002Mandacaru 60 2002Boa Esperança (2) 35 2003Cuiabá 200 2003João Pedro Teixeira 145 2003Monte Santo 25 2003Monte Santo I 14 2003Santa Maria 16 2003Santa Rita 39 2003

GARARUCachoeirinha 98 2000Arrastador (3) 10 2003Maria Vitória 13 2003

MONTE ALEGRESão Raimundo 10 2002União dos Conselheiros 25 2002

NOSSA SENHORA DA GLÓRIANossa Senhora da Glória 28 2002João do Vale 22 2003Nossa Senhora da Boa Hora 25 2003

205

Page 206: Alto Sertão - SE

PORTO DA FOLHAJosé Unaldo de Oliveira 15 2002Paulo Freire 40 2002

Fonte: Incra – SR/SE e Cecac(1): O numero de assentados não coincide com a capacidade de assentamento, uma vez que foram contabilizados nos PDAs as famílias

efetivamente assentadas.(2): PA que passou a ser denominado de Maria Feitosa, sendo esse o nome do imóvel desapropriado.(3): PA denominado de Flora da Índia, sendo esse o nome do imóvel desapropriado.

É importante ressaltar que 11 assentamentos analisados não apresentaram tipologia de produção descrita em seu PDA, em função de ausência de produção seja porque os lotes ainda não haviam sido delimitados seja pelo fato de terem ocorrido perdas na produção. Perdas essas decorrentes da estiagem e/ou do plantio fora de época, o que ocorre tendo em conta o atraso na liberação dos créditos.

A análise dos PDA’s indica a existência de 33 tipologias de produção, que podem ser consideradas, grosso modo, como sistemas agropecuários. Observa-se, entretanto que a maioria das tipologias descritas se inserem, como já se apontou, nas estratégias de sobrevivência criadas pelos assentados, devido, principalmente, ao fato de que a elaboração dos PDA’s ocorre nas etapas iniciais de implantação dos assentados, ou seja, quanto esses ainda não conseguiram desenvolver suas atividades e/ou essas ainda não tiveram tempo de maturarem. A análise detalhada das tipologias produtivas e/ou sistemas de produção mostra que esses se resumem a discriminação das culturas desenvolvidas e dos efetivos animais que cada assentado possui, sem considerar a envergadura – magnitude – dos cultivos e criações, sua finalidade – comercial ou para subsistência – e a presença ou não de relações de input-output entre as atividades. O que se observa é que os assentados desenvolvem, grosso modo, sistemas agrícolas de subsistência, isto é, os cultivos temporários alimentares e a criação de pequenos animais. Em vários casos se busca implantar a pecuária leiteira, estando, portanto, presentes um efetivo animal maior e o cultivo de milho e palma, que juntos com as pastagens, servirão de suporte alimentar.70 Essas tipologias podem ser resumidas, grosso modo, em quatro sistemas produtivos: agricultura de subsistência; pecuária

70 Estão presentes no quadro abaixo todas as tipologias descritas nos PDAs. Vale sublinhar que, em alguns casos, a presença de somente um animal já era considerado suficiente para inserir a atividade com parte do sistema produtivo. Com exemplo, vale citar o caso do tipo agricultura+bovinos+suínos+aves no PA Cachoeirinha, onde um assentando aí foi incluído, tendo o seguinte efetivo animal: 1 bovino, 1 suíno e 10 aves, cultivando, ademais, milho, feijão e palma. Ora isso na verdade é agricultura de subsistência com a criação de pequenos animais.

Tipologias de produção descritas nos PDA’s1Agricultura18Agricultura+Caprinos+Aves2Agricultura + Aves19Agricultura+Ovinos3Agricultura+ Suínos20Agricultura+Ovinos+Aves4Agricultura+Bovinos21Agricultura+Ovinos+Caprinos5Agricultura+Bovinos+Aves22Agricultura+Ovinos+Caprinos+Aves6Agricultura+Bovinos+Caprinos23Agricultura+Ovinos+Suínos7Agricultura+Bovinos+Ovinos24Agricultura+Suínos8Agricultura+Bovinos+Ovinos25Agricultura+Suínos+Aves9Agricultura+Bovinos+Ovinos+Aves26Aves10Agricultura+Bovinos+Ovinos+Caprinos27Bovinos11Agricultura+Bovinos+Ovinos+Caprinos+Aves28Bovinos+Aves12Agricultura+Bovinos+Ovinos+Suínos29Bovinos+Ovinos13Agricultura+Bovinos+Ovinos+Suínos+Aves30Bovinos+Ovinos+Aves14Agricultura+Bovinos+Ovinos+Suínos+Caprinos31Caprinos15Agricultura+Bovinos+Suínos32Ovinos16Agricultura+Bovinos+Suínos+Aves33Suínos17Agricultura+CaprinosFonte: Incra – SR/SE e Cecac.

206

Page 207: Alto Sertão - SE

leiteira associada a culturas temporárias; predomínio da pecuária leiteira; e o “mix” pequenos animais, agricultura e leite para consumo com o excedente para a venda. Essas associações dependem, de um lado, da etapa de desenvolvimento que se encontra o projeto e, de outro, da importância das fontes de renda externas ao lote, sejam de transferências governamentais sejam de trabalho assalariado.

Foi possível verificar, de forma genérica, que quanto mais diversificado for o sistema de produção, isto é, associação da pecuária leiteira com cultivos no período das águas e com pequenos animais, maior a renda obtida pelos assentados. Entretanto, deve-se ressaltar que a renda proveniente dos sistemas agropecuários não apresenta apenas a venda dos produtos, mas também o autoconsumo e a reserva de capital (efetivo da pecuária). Outras fontes de renda de grande importância para os assentados são as originarias dos auxílios governamentais: Benefício de Prestação Continuada, Bolsa Escola, Aposentadoria, Programa de Erradicação do Trabalho Infantil, Vale Gás, bem como as rendas de prestação de serviços na forma de diárias fora do assentamento e da ajuda de parentes. A tabela 75 aponta para a importância das outras fontes e o fato dos animais serem uma espécie de poupança/reserva estratégica.

Tabela 76Capacidade de Assentamento, Renda Familiar Anual, Participação das Rendas não Agrícolas e Importância dos Efetivos Animais

Assentamento Famílias Valor anual familiar

Valor mensal(% salários mínimos)

% Outras fontes(diárias e

transferências)

Valor Efetivo Animal(% da renda anual)

Cachoeirinha 98 859,69 47,44 84,96Caldeirão 19 1.259,58 43,74 69,45Florestan Fernandes 31 1.510,29 62,93 98,19José Unaldo 15 1.485,74 61,91 58,69Mandacaru 60 1.764,94 73,54 48,17Modelo 30 512,10 31,38 61,04Monte Santo 25 1.712,48 59,46 91,28Monte Santo I 14 1.464,64 50,86 91,98N. S. Boa Hora 25 1.253,36 43,52 68,28N. S. Glória 28 600,13 25,01 -Nova Vida 14 1.090,71 37,87 59,02Novo Mulungu 10 1.098,15 45,76 40,98Novo Paraíso 40 891,75 30,96 84,09Paulo Freire 40 520,39 21,68 84,28

207

Page 208: Alto Sertão - SE

Queimada Grande 150 691,76 42,39 68,96S. J. Nazaré 26 944,85 39,37 50,93São Raimundo 10 460,80 21,33 66,67União dos Conselheiros 25 535,80 24,81 25,53Fonte: PDAs

Os assentados da região quando comparados com os produtores familiares locais possuem vantagens no campo da organização da produção, vários assentamentos apresentam formas associadas de produção. Além disso, em vários assentamentos ainda permanecem organizados junto ao MST, que para muitos entrevistados contribuiu para uma articulação regional e estadual para resolver problemas comuns a todos. Outro fator diferencial entre os assentados e os outros produtores está na questão da assistência técnica prestada pela CECAC, que tem uma atuação em todo o território, em quase todos os assentamentos. Por exemplo, o convênio Prefeitura, CECAC e FEACOM em Porto da Folha tem conseguido atender a contento os assentados, como nos demais municípios.

V.2. A dinâmica socioeconômica do Alto Sertão: síntese da pesquisa qualitativa

Este trabalho tem por objetivo apresentar a síntese das informações obtidas mediante o trabalho de campo. A finalidade do trabalho de campo foi fazer um levantamento da realidade social, econômica, política e ambiental do território, esclarecer algumas questões pertinentes aos processos investigados e levantar e aprofundar propostas para desenvolvimento territorial a partir da interlocução com atores sociais representantes de entidades ou pessoas de destaque nos municípios do Território do Alto Sertão Sergipano.

As interlocuções aconteceram em dois momentos a saber: 1. Nos contatos específicos para entrevistas; 2. Em visitas conjuntas com a equipe técnica responsável pela elaboração do plano de desenvolvimento.

As entrevistas foram orientadas por um roteiro previamente elaborado pela equipe responsável por aplicá-las. O roteiro de entrevistas indagou sobre questões referentes a: 1. identificação dos entrevistados; 2. origem e trajetória dos entrevistados; 2. caracterização do território do Alto Sertão Sergipano; 3. aspectos fundiários e produtivos dos estabelecimentos rurais; 5. ações e resultados das políticas públicas, dos movimento sociais e ONG’s atuantes no território.

A equipe foi orientada, inicialmente, por Osvaldo Aly Júnior e coordenada por Silvana Lúcia da S. Lima, responsável por maior parte das entrevistas. O trabalho contou com a participação dos técnicos do CECAC, empresa de assistência técnica do Alto Sertão: Arnaldo Santos Neto, Willames de Almeida Santos, Genivaldo, Irandi Silva de Jesus, Ailton Demésio Pereira, Ferline, Ariana Costa e Carlos Barreto Júnior.

208

Page 209: Alto Sertão - SE

As visitas técnicas71 tinham por objetivo conhecer as experiências produtivas do território, suas potencialidades e dificuldades; conhecer alguns assentamentos ligados ou não aos projetos de irrigação projetados para o Alto Sertão, bem como, as condições de suas vias de acessos, as feiras livres e laticínios. Para tanto, se conversou com prefeitos, representantes de entidades, gerentes de laticínios, presidentes de associações comunitárias e feirantes.

V.2.1. Perfil dos Entrevistados: identificação, origem e trajetória

Foram realizadas 68 (sessenta e oito) entrevistas com representantes da vida econômica, social e política do território do Alto Sertão e realizadas visitas técnicas em nove assentamentos rurais de reforma agrária, três laticínios e duas feiras livres. As pessoas entrevistadas foram indicadas pelos representantes de entidades, identificadas como conhecedoras da realidade local e/ou regional.

Foram realizadas entrevistas (estruturadas e semi-estruturadas) com 10 (dez) representantes do município de Nossa Senhora da Glória; 15 (quinze) em Canindé de São Francisco; 9 (nove) em Poço Redondo; 11 (onze) em Monte Alegre; 9 (nove) em Porto da Folha; 5 (cinco) em Gararu e 4 (quatro) em Aracaju. Ao considerarmos as atividades por eles desenvolvidas teremos entrevistas com três prefeitos; três ex-prefeitos; cinco secretários municipais de agricultura; cinco secretários ou representantes municipais da educação; quatro gerentes de bancos; um representante do SEBRAE; quatro presidentes de STR; dois técnicos da DEAGRO; um técnico do Instituto Xingo; um técnico da DEHIDRO; quatro presidentes de associações (e Cooperativa) do Projeto de Irrigação Califórnia; dois apicultores; quatro representantes dos Conselhos Municipais; dois comerciantes; três dirigentes do MST; dois dirigentes da MPA; dois representantes da FEACOM; quatro laticínios; quatro representantes da Igreja Católica; um representante da Igreja Evangélica; um presidente do PT e ASA; duas representantes de associação de mulheres; uma agente de saúde e seis pessoas antigas na comunidade ou nas lutas sociais sertanejas.

ENTREVISTAS:

1. Prefeito do Município de Nossa Senhora da Glória: José Israel / Zico;2. Prefeito do Município de Porto da folha: Manoel de Rosinha;3. Prefeito Municipal de Monte Alegre: Aragão4. Secretário municipal de Agricultura de Nossa Senhora da Glória: Márcio Rangel;5. Secretário municipal de Agricultura de Canindé de São Francisco: Everaldo Nunes Lima6. Secretário municipal de Agricultura de Poço Redondo: José Fernando da Silva;7. Secretário municipal de Agricultura de Monte Alegre: Fábio Weber;8. Secretário Municipal de Agricultura de Gararu: Jorge Luiz de Carvalho;

71 Ver relatório de visitas (parte II) e roteiros de visitas em anexo

209

Page 210: Alto Sertão - SE

9. Ex-prefeito de Poço Redondo: Frei Enoc Salvador de Melo;10. Ex-Prefeito de Poço Redondo: José Alcino;11. Ex-prefeito de Monte Alegre: José Correia12. Secretário Municipal de Educação: José Aribaldo (Poço Redondo);13. Representante da Secretaria Municipal de Educação: Paulo Roberto Caetano (Canindé):14. Secretária Municipal de Educação: Maria das Graças (Porto da Folha);15. Secretário Municipal de Educação: Valduílho Vieira (Gararu);16. Secretário Municipal de Educação: Valfran (Monte Alegre);17. Gerentes do Banco do Brasil – Agência Glória/Monte Alegre: Luciano Alves;18. Gerentes do Banco do Brasil – Agência Porto da Folha: Paulo Eduardo Rezende;19. Gerentes do Banco do Nordeste do Brasil – Agência Glória: Edson do Amor Cardoso;20. Gerentes do Banco do Nordeste do Brasil – Agência Gararu: Antônio Carlos da Silva;21. Secretário Executivo do PRONAF/Governo do Estado: Sérgio Santana de Menezes;22. Articulador Territorial do Alto Sertão, Gismário Nobre;23. SEBRAE de Nossa Senhora da Glória, José Aumiro Feitosa;24. Presidentes do Sindicato dos Trabalhadores Rurais - STR: Manoel Jerônimo (Poço Redondo); 25. Presidentes do Sindicato dos Trabalhadores Rurais - STR: Maria Helena (Canindé);26. Presidentes do Sindicato dos Trabalhadores Rurais - STR: José Emídio (Porto da Folha);27. Presidente do Sindicato dos Trabalhadores Rurais – STR: Luiz Oliveira neto;28. Técnico da DEAGRO: Valmor (Glória);29. Técnico da DEAGRO: Maria Lúcia de Oliveira (Monte Alegre);30. Técnico da Chesf e Programa Luz para Todos: Paulo Roberto G. de Souza;31. Técnico da Chesf e Programa Luz para Todos: Damasceno; 32. Coordenador do Projeto Califórnia/Dehidro: Antônio Carlos Teodoro;33. Presidente da Cooperativa de Fomento Rural e Comercial do Perímetro Irrigado Califórnia: José dos Santos;34. Presidente da Associação dos Apicultores de Canindé de São Francisco – APICASF: Almir Victor Coutinho (Instituto Xingo);35. Presidente da Associação dos Agricultores Irrigantes do Califórnia – ASAI: José Felix Neto (Presidente do Conselho Municipal

de Desenvolvimento Rural Sustentável – CMDRS);36. Presidente da Associação dos Pequenos Produtores da Área de Sequeiro do Projeto Califórnia – APRASPIC: Marciano Mariano;37. Associação dos Apicultores de Canindé de São Francisco – APICASF: José Airton Barros;38. Apicultor e ex-presidente da Associação dos Apicultores de Porto da Folha: Cícero Caetano;39. Associação dos Pequenos Produtores Rurais e Piscicultores de Canindé – APRAPIC: Jerry Sandro B. Feitosa;

210

Page 211: Alto Sertão - SE

40. Comerciante e médio produtor de leite: Erivan Márcio / Nengo;41. Membro do Conselho Estadual de Desenvolvimento Rural Sustentável: José Moraes (Glória);42. Representante do Conselho de Desenvolvimento do Município - CONDEM: Jorge Gomes dos Santos (Canindé);43. Presidente da Cooperativa Regional do Alto Sertão - COPRASE e dirigente do MST: João Gomes da Silva / Neguinho

(Assentamento Jacaré-Curituba);44. Dirigente do MST por Poço Redondo: Sival Lima de Jesus (Assentamento Barra da Onça);45. Coordenador da Assistência Técnica - parceria prefeitura/CECAC/FEACOM: Jocei Francisco dos Santos (Assentamento Nova

Esperança – Gararu e dirigente do MST);46. Dirigente Estadual do Movimento dos Pequenos Agricultores - MPA: Haroldo José Silva;47. Dirigente do MPA e presidente de associação comunitária: Manoel de Barros Lima Neto (Manoel Poeta);48. Presidente da Federação das Associações Comunitárias de Porto da Folha: Zezé – José Lima dos Santos;49. Federação das Associações Comunitárias de Porto da Folha: Solange Maria Pereira (secretária e técnica agrícola);50. Laticínios União: Michel Dessy (Guido);51. Laticínio Irmãos Santos: José Newton (Glória);52. Usina de Beneficiamento de Leite de Cabra: Ancelmo;53. Laticínio do Sr. Miguel Alves (Gararu);54. Padre aposentado da Igreja Católica: Pe. Gregório (Glória);55. Padre de Porto da Folha: Pe. Antônio Rodrigues de Souza56. Padre de Canindé de São Francisco: Pe. Roberto;57. Ex-bancário, ex-agricultor e contador, José Rui (Monte Alegre/Aracaju);58. Pessoa mais antiga do município de Canindé: Almerinda Filgueiras dos Santos;59. Presidente do Partido dos Trabalhadores – PT e representante da Articulação do Semi-Árido - ASA: Edmilson Balbino Santos

(Canindé);60. Ex-diretora de escola municipal: Delfina F. Alves (Canindé); 61. Presidente da Associação de Mulheres Trabalhadoras Rurais de Lagoa Redonda: Benedita Ferreira;62. Comerciante de material de construção: Jailton Gomes;63. Dono do Cartório de Monte Alegre: José Soares;64. Oficial de Justiça: Eloy Gonçalves da Silva (Monte Alegre);65. Agente de Saúde de Monte Alegre: Ana Selma Góes (Monte Alegre);66. Associação Evangélica da Assembléia de Deus (Monte Alegre): José Soares da Costa;67. Missionário da Igreja Católica e professor aposentado: Eloy A. de Santana (Monte Alegre);68. Inicio a luta por água em Poço Redondo: Luiz Caetano.

211

Page 212: Alto Sertão - SE

VISITAS TÉCNICAS:

Representantes e/ou Presidentes de Associações dos Assentamentos Rurais de Reforma Agrária: a. Boa Hora (José Donizete) e Fortaleza – Glória; b. Florestan Fernandes (Gerdine) - Canindé; c. Ilha do Ouro (Júlio), Paulo Freire (Luizão) e José Unaldo (Cícero Franco) - Porto da Folha;d. Nova Esperança (José Sé e Antônio crente) – Gararu;e. José Francisco (Bom Jardim) - Monte Alegre;f. Jacaré-Curituba (João Neguinho e Irandi) – Poço Redondo

Laticínios:a. União (Assentamento Barra da Onça, Poço Redondo);b. Irmãos Santos (Nossa Senhora da Glória);c. Do Sr. Miguel da manteiga (Gararu);d. De Leite de Cabra – Sr Ancelmo.

Feira Livre:a. Feira Livre de Nossa Senhora da Glória: Mercado de carnes; mercado de animais; feira de manufaturados; feira de

verduras;b. Feira Livre de Monte Alegre: Mercado de animais; comércio de Frutas e manufaturados.

V.2.2. Formação, Características e Dinâmica Socioeconômica do Território

Formação Territorial

O Alto Sertão é um conjunto de municípios identificados pelo domínio do clima semi-árido sendo submetidos às secas periódicas. A cobertura vegetal é do tipo xerófila, com predomínio da caatinga arbóreo-arbustiva. A sua base econômica é a pecuária leiteira e as culturas de milho e feijão para subsistência e para o mercado.

212

Page 213: Alto Sertão - SE

Quanto a sua constituição geopolítica é formado por seis municípios: Nossa Senhora da Glória, Monte Alegre de Sergipe, Porto da Folha, Gararu, Poço Redondo e Canindé de São Francisco, sendo estes dois últimos, os municípios onde a semi-aridez se manifesta com mais intensidade.

Para 11 (onze) dos entrevistados, o território do Alto Sertão é constituído por apenas os seis municípios citados acima, ficando a entrada de outro município condicionada a um estudo prévio.

Segundo 17 (dezessete) entrevistados o território tem que ser ampliado, ora com a entrada do município de Feira Nova e Itabi ou Graco Cardoso, Nossa Senhora de Lurdes, Carira, São Miguel do Aleixo, Nossa Senhora das Dores ou Nossa Senhora Aparecida por serem municípios que apresentam semelhanças nas dificuldades e potencialidades sociais e econômicas. Nove dos entrevistados afirmaram que não existem diferenças edafo-climáticas e socioeconômicas entre os municípios de Feira Nova e Itabi e os demais do Alto Sertão. Os dois foram freqüentemente citados como possíveis integrantes do território do Alto Sertão.

Dez dos entrevistados apresentaram outras referências para a definição do que seja o Alto Sertão Sergipano: um fez menção a atuação do Colegiado Territorial como mecanismo de articulação dos municípios; outro afirmou que corresponde aos municípios não banhados pelo rio São Francisco; outro afirmou que o Alto Sertão é sinônimo de pobreza, de exploração, de capitalismo selvagem e falta de trabalho, porém, o fato de estar no semi-árido não justifica todas estas características. Os demais fizeram referência as condições climáticas (semi-árido), de vegetação (caatinga) e produtivas (leite, milho e feijão).

Para 4 (quatro) dos entrevistados o Alto Sertão possui outra regionalização, ou seja, é composto apenas por Canindé de São Francisco e Poço Redondo, dado que os demais possuem um clima mais úmido e uma caatinga mais densa. Apenas para 1 (um) dos entrevistados, os municípios de Santa Brígida, Coronel Sá e Paripiranga no estado da Bahia deveriam ser incluídos no território do Alto Sertão, dado a sua relação com esta porção do estado de Sergipe. Vinte e seis dos entrevistados não responderam ou não foram argüidos sobre a questão.

Dinâmica econômica

O Alto Sertão Sergipano é, segundo todos os entrevistados, um território eminentemente agropecuário, com destaque para a pecuária leiteira e as culturas do milho e feijão. As demais culturas são complementares a atividade central.

A pecuária leiteira, principal fonte de renda dos pequenos e médios produtores, maioria no território, configurando a maior bacia leiteira do estado de Sergipe. Tal atividade sustenta as famílias sertanejas durante todo o ano.

213

Page 214: Alto Sertão - SE

As culturas desenvolvidas nos períodos chuvosos visão o abastecimento alimentar e também a produção de suporte forrageiro para o gado durante o segundo semestre, quando as condições climáticas inviabilizam o pastore iro natural.

Para beneficiar o leite produzido, o território conta com inúmeros laticínios, sendo a maioria de pequeno porte (familiares) e algumas de médio porte. Os laticínios de médio porte estão localizados em Nossa Senhora da Glória que conta com aproximadamente 23 laticínios entre eles a Natividade e Irmãos Santos, em Poço Redondo tem-se o laticínio União, entre outros de menor porte e, em Canindé do São Francisco destaca-se, atualmente a Embrasleite. O leite produzido em Gararu e Porto da Folha é beneficiado em sete usinas, incluindo o laticínio de propriedade do Sr. Miguel da manteiga (1.000 l/dia) e a ASPROCRIO - Associação dos Pequenos Criadores de Porto da Folha. Uma das empresas localiza-se em Própria.

Algumas das médias empresas tendem a monopolização do mercado regional. Segundo os entrevistados de Monte Alegre de Sergipe, seu leite finda por ser monopolizado pelas usinas de beneficiamento em Glória que absorve quase a metade do leite produzido em todo o território, ou seja, aproximadamente 100.000 litros/dia (fonte: Sr. Erivan Márcio). Os subprodutos do leite são a manteiga e o queijo.

Conforme todos os entrevistados, a bacia leiteira sofreu uma queda significativa. Uma das maiores empresas que beneficiavam o leite, a Companhia Sergipana do Leite – CSL fechou no território.De acordo com o Sr. Erivan Márcio, o Alto Sertão Sergipano já teve 115 fabriquetas em funcionamento que beneficiavam mais de 260 mil litros de leite por dia. O endividamento crescente levou os produtores a reduzirem sua atividade. O beneficiamento do leite alimentava o funcionamento de inúmeras pocilgas (hoje abandonadas) e um comércio de aproximadamente 70 carretas de soja por mês, enquanto hoje só chegam cinco carretas a cidade e funcionam menos de 90 fabriquetas.

A segunda atividade mais importante do território é a agricultura de subsistência, predominante em áreas de sequeiro, destacando-se as culturas de milho e feijão, sendo o primeiro destinado, também para subsistência dos animais. A perda destas culturas afeta a alimentação humana e pode significar a perda dos animais e de sua fonte de renda central, a pecuária leiteira.

No Alto Sertão existem duas zonas para produção em sequeiro: uma faixa onde o solo é muito arenoso, zona do feijão que inclui o lado oeste de Porto da Folha, parte de Monte Alegre e fragmentos do espaço de Nossa Senhora da Glória e todo o município de Poço Redondo e; uma faixa de terra argilosa, própria para o milho. A zona do milho é mais úmida e engloba o lado sudoeste de Porto da Folha, Monte Alegre e Nossa Senhora da Glória. O assentamento Nossa Senhora da Boa Hora, localizado em Nossa Senhora da Glória, chegou a produzir 800 sacas de milho (fonte: Donizete).

214

Page 215: Alto Sertão - SE

É importante esclarecer também que, a farinha de milho faz parte da dieta alimentar cotidiana de no mínimo duas vezes ao dia, do povo sertanejo. No cultivo de forrageiras destacam-se a palma e o capim. Para alguns produtores, a palma é também uma fonte secundária de renda, dado que ela é vendida para alimentar o gado de terceiros no período de estiagem.

Segundo o Sr. Manoel Jerônimo, sindicalista em Poço Redondo, os ovinos e caprinos são criações secundárias para um grande número de famílias sertanejas, servindo também como alimento e poupança fácil para os períodos difíceis. Exigem menos alimentos que os bovinos, se reproduzem com mais rapidez e uma venda mais fácil. Para a maioria dos entrevistados, a prioridade aos bovinos é uma questão cultural que pode e precisa ser alterada..

Mesmo frente a todas as facilidade, o Sr. Alcelmo revelou que se sentiu obrigado a fechar seu laticínio de leite de cabra por falta de fornecedores da matéria-prima, de financiamento e das condições de escoamento. Contudo, em Nossa Senhora da Glória existe uma Associação dos Produtores de Ovinos e Caprinos – ASCA que tem por meta inserir sua produção na dieta das escolas municipais.

A suinocultura é uma atividade complementar para os produtores de leite que recebem o soro em troca da venda do leite. O destino da criação é o autoconsumo e o mercado local. A associação entre as duas atividades advém do fato de que ao se beneficiar o leite, produz-se soro, base da alimentação dos suínos. Na feira de animais de Nossa Senhora da Glória são vendidos, em média, de 25 a 30 cabeças por dia (sábado) entre aproximadamente 20 (vinte) comerciantes.

A agricultura irrigada se limita a algumas áreas como: perímetro irrigado Califórnia, as áreas molhadas do Jacaré-Curituba e as várzeas irrigadas do rio São Francisco. No projeto Califórnia as principais culturas são quiabo e goiaba.

No projeto de irrigação Califórnia existem três associações (ASAI, APICAL e APRASPIC)72 e uma cooperativa (COFRUCAL)73. Cada associação trabalha com um grupo de irrigantes sendo que a APICAL trabalha também com apicultura, a APRASPIC congrega os produtores da área de sequeiro e a ASAI possui uma indústria de polpa de frutas, hoje sob o controle das mulheres associadas. A COFRUCAL tem por meta a comercialização integrada.

De acordo com os presidentes de associações entrevistados o maior problema consiste na ausência de uma política de preço mínimo e falta de condições para os produtores escoarem sua própria produção embora que consorciada.

72 ASAI – Associação dos Agricultores irrigantes do Projeto de Irrigação Califórnia; APICAL – Associação dos Pequenos Produtores e Apicultores do Califórnia e APRASPIC – Associação dos Produtores Rurais da Área de Sequeiro do Projeto de Irrigação Califórnia.73 COFRUCAL – Cooperativa de Fomento Rural e Comercilização do Projeto de Irrigação Califórnia LTDA

215

Page 216: Alto Sertão - SE

Está em processo de implantação a Goiabras – Associação Brasileira de Produtos de Goiaba. Esta poderá reduzir o papel do atravessador na região. Para alguns entrevistados de fora do projeto de irrigação ela trará malefícios por ter o monopólio da produção, incentivar a monocultura e o controle sob os preços impedindo o crescimento dos produtores e da região.

As principais culturas são: quiabo, banana, coco, acerola, goiaba, pimentão, alface e tomate. O quiabo é o carro-chefe da produção, chegando-se a três colheitas na semana e sendo comercializado principalmente para Bahia.

As várzeas do rio São Francisco também são importantes zonas agrícolas, embora tenha entrado em decadência após a construção da Usina Hidroelétrica de Xingo. Lá é cultivado o maracujá e a banana irrigada (assentamento José Unaldo, Porto da Folha), o arroz (Ilha do Ouro) e o milho e feijão. A possibilidade de expansão das áreas irrigadas tem provocado inquietação, expectativas e a movimento de um mercado de terras no Alto Sertão, o que precisa ser melhor investigado.

O artesanato não apareceu como atividade central, porém, em viagem de campo, foi possível observar o grande número de rendeiras em todos os municípios. Segundo a FEACOM existem três associações de mulheres que trabalham com artesanato e corte e costura em Porto da Folha. A mais antiga é sediada no povoado de Lagoa Redonda com 130 mulheres da zona rural e urbana. O Sr. Eduardo, gerente do Banco do Brasil de Porto da Folha destacou as ações do banco frente a produção artesanal do município. A Gerência de Exposições Internacionais tem se empenhado em divulgar este trabalho que é realizado especialmente por mulheres.

A apicultura apareceu muito mais como alternativa econômica do que como produção efetiva. No entanto, todos os secretários de agricultura destacaram o potencial do território e a importância da produção atual. De acordo com as informações do Sr. Cícero Caetano, ex-presidente da Associação dos Apicultores de Porto da Folha, 10 (dez) colméias rende mais do que 10 (dez) vacas de leite e, apesar do intenso desmatamento do território, ainda existem áreas bem conservadas próprias para a realização desta atividade. Há possibilidades concretas para se ampliar, de imediato, a produção existente em Porto da Folha, Glória e Monte Alegre, para tanto, se faz necessário criar uma estrutura para a conquista de novos mercados.

A piscicultura, junto com a cultura de vazantes, já foi a principal fonte de renda das populações ribeirinhas. A construção da Usina Hidroelétrica de Xingo inviabilizou o crescimento desta atividade ao reduzir o volume d’água e a reprodução dos peixes no rio. Para alguns dos entrevistados, a piscicultura só possível como atividade econômica rentável mediante a sua criação em cativeiro (tanques e barragens).

Quanto ao comércio, o se destacam as feiras-livres que acontece semanalmente em todos os municípios. Vale lembrar que a maior parcela das verduras e frutas comercializadas em todas as feiras vêm de Itabaiana, município serrano de Sergipe e dos perímetros irrigados de Pernambuco e Bahia, adquiridos muitas vezes no Centro de Abastecimento Agrícola de Aracaju - CEASA. Poucos são os produtos que saem do projeto

216

Page 217: Alto Sertão - SE

Califórnia. Já o comércio de carnes, de animais e de roupas e manufaturados, é controlado por feirantes da própria região. Os dias de feira são também os dias de maior movimentação do comércio formal e nas casas que prestam serviços em cada sede municipal, evidenciando que a vida econômica dos municípios gira em torno da movimentação na feira livre e, por conseguinte, da agricultura.

A feira livre de Nossa Senhora da Glória, que acontece aos sábados, é a maior de todo o sertão, atraindo comerciantes e compradores dos municípios também externos ao território do Alto Sertão como: Itabaiana, Carira, Feira Nova, Aparecida, São Miguel do Aleixo, Itabi, Dores e Graco Cardoso, facilmente observado pela movimentação dos ônibus oriundos destes lugares. Por isso, é chamada de feira regional da capital do sertão.

A feira livre de Canindé de São Francisco acontece aos sábados e também tem um porte regional, atraindo um público de Monte Alegre e Poço Redondo – SE, Paulo Afonso, Santa Brígida - BA, Piranhas, Pão de Açúcar e Delmiro Gouvêa – AL. A existência de um projeto de irrigação no município não fez aumentar a participação dos feirantes de frutas e verduras naturais do lugar nesta feira.

A feira livre de Monte Alegre acontece aos domingos e atrai comerciantes e compradores de Glória e Porto da Folha. Enquanto as feiras de Poço Redondo (segunda), Porto da Folha (segunda) e Gararu (terça) têm um público mais localizado.

Dinâmica sócio-demográfica

A população do Alto Sertão apresenta algumas características que são comuns a todos os municípios: grande percentual de emigrantes; uma população total e rural em crescimento, baixo nível de vida (educação de qualidade, precariedade no acesso a saúde, moradia e ao saneamento básico), baixa renda, elevado índice de matrícula das crianças e adolescentes no ensino fundamental e a produção agropecuária como principal fonte de renda.

Ao se perguntar a cerca dos motivos que levaram ao crescimento populacional, apenas dois entrevistados fizeram alusão ao crescimento natural, os demais se dividiram entre as respostas: 1. há uma grande mobilidade dos trabalhadores a procura de melhores condições de vida; 2. a instalação de água encanada e energia fizeram diminuir o êxodo; 3. a reforma agrária foi um mecanismo de garantia da terra para produção de alimentos; 4. no sertão existem reis possibilidades na geração de renda e assim, de manutenção da vida; 5. fizeram considerações sobre a qualidade de vida e; 6. não responderam ou não foram indagados sobre a questão.

Em geral, os migrantes que se instalaram no território são oriundos, principalmente, de Alagoas, Bahia e Pernambuco. Muitos vieram em função da construção da Usina Hidroelétrica de Xingo em Canindé do São Francisco, em função do projeto de irrigação Califórnia e outros em função dos assentamentos rurais de reforma agrária.

217

Page 218: Alto Sertão - SE

Entre os entrevistados, 33 (trinta e três) optaram por caracterizar socialmente o Alto Sertão fazendo referência às questões inerentes a qualidade de vida. Neste aspecto, uns ressaltaram a questão o nível de pobreza dos sertanejos e um entrevistado afirmou que a pobreza referida ao município de Poço Redondo não corresponde à realidade, dado que no município ninguém pede esmola e todos possuem casa para morar. Para outros a miséria é a principal característica do Alto Sertão.

Os entrevistados em geral, observam as melhorias especialmente na educação, na saúde, na habitação, no transporte, na energia e na água encanada. Mesmo assim, estes ainda são as problemáticas centrais do território, sendo a saúde e o transporte os problemas mais graves e que, juntamente com a educação são fatores que incentivam o processo de mobilidade rumo as cidades. Por outro lado, a implantação e ampliação da rede elétrica e hidráulica ajudaram na fixação do homem no campo.

Para 9 (nove) das pessoas entrevistadas, a saída em massa para os grandes centros econômicos do país já não existe mais, sendo possível observar uma migração de retorno. Para outros 11 (onze) entrevistados, a reforma agrária é que tem feito a diferença. Segundo eles, os trabalhadores rurais sem terra acampados e assentados são atores que contribuem para o crescimento da população do Alto Sertão. Sobre este aspecto, alguns afirmaram que até o início dos anos de 1980, só existiam vazios demográficos no sertão e que era possível andar quilômetros em linha reta até se encontrar uma casa. Hoje o panorama é muito diferente, principalmente em função dos assentamentos rurais e do parcelamento da terra que promove o povoamento, abre estradas e expande a rede de energia e água para as zonas rurais mais distantes. Apesar de ser citado apenas por 11 (onze) entrevistados, todos os demais reconheceram a importância do MST na transformação fundiária, econômica ou política da região.

Meio ambiente - clima, vegetação, água e solo

As respostas em relação a questão ambiental podem ser apresentadas sob três aspectos: 1. o tipo de degradação ambiental; 2. o que a provoca ou a provocou e; 3. os seus impactos sob o território.

Os tipos de degradação ambiental identificada pelos entrevistados são o desmatamento e a alteração no regime de chuvas citadas por quase todas as pessoas entrevistadas; a morte do rio São Francisco em função construção da usina Hidroelétrica de Xingo relatado, especialmente, pelos entrevistados oriundos dos municípios ribeirinhos e; a escassez da fauna nativa em conseqüência dos dois primeiros processos anteriores.

Em geral os entrevistados afirmaram que o desmatamento é fruto da ação dos latifundiários, dos assentados e acampados e das políticas públicas. 10 (dez) pessoas, entre políticos e agricultores mais antigos da região, concordam que foi, principalmente, a ação governamental a grande responsável pelo desmatamento, em especial, o projeto Sertanejo quando no início da década de 1970 incentivaram a pecuária extensiva como

218

Page 219: Alto Sertão - SE

modelo de desenvolvimento econômico para o Alto Sertão. Neste processo o desmatamento fora financiado com recursos públicos mediante a compra de máquinas e para contratação de trabalhadores. Atualmente, o problema do desmatamento persiste com a ausência de fiscalização pelos órgãos públicos frente a uma situação cotidiana que todos conhecem: a transformação da vegetação em carvão.

Alguns entrevistados fizeram referência a retirada de lenha pelos acampados, no entanto, os mesmos reconhecem que tal ação é conseqüência das péssimas condições socioeconômicas em que vivem. Eles avaliaram que a ação dos assentados é decorrente da abertura dos assentamentos que transformou propriedades improdutivas com mata fechada em áreas de habitação e produção para os agricultores. Contudo, é fundamental que se preserve melhor as reservas ambientais que estão entre as poucas existentes no território e que se melhore a assistência técnica.

O solo também se encontra bastante degradado no Alto Sertão e tem várias motivações: o desmatamento, o uso de herbicidas, pesticidas e as práticas inadequadas durante a irrigação. Entre os impactos provocados pelo desmatamento tem-se a redução e alteração do período chuvoso. Segundo os entrevistados, o Alto sertão tem dois períodos chuvosos: as trovoadas e o período invernoso (verão da zona intertropical). A 20 (vinte) anos atrás as trovoadas se iniciavam no mês de outubro e se estendiam até janeiro. Hoje, quando acontecem são restritas aos meses de janeiro e fevereiro. O período chuvoso que antes iniciava em março, hoje só começa em maio e se estende até o mês de julho.

Conforme as afirmações de 9 (nove) entrevistados, a retirada da vegetação também afetou o sistema de criação animal. Antes se tinha um rebanho de ovinos e caprinos bem maior do que hoje. Isso acontecia porque era possível a criação do gado solto e que se alimentava na própria floresta.

Outro tema ao qual se fiz muitas referências foi a questão dos impactos da Usina Hidroelétrica Xingo. Para o seu funcionamento, a usina represou um grande volume de água do rio São Francisco, reduzindo o seu volume entre os estados de Alagoas e Sergipe. Com isso a pesca artesanal e as várzeas praticamente desapareceram.

Outro impacto observado durante o trabalho de campo é a ocupação e privatização das várzeas por residências e empresas agropecuárias. De acordo com três entrevistados vastas áreas das várzeas estão sendo ocupadas por bananais.

Principais características dos municípios

Os municípios do Alto Sertão não são homogêneos e apresentam distinções quanto a produção e a produtividade econômica, bem como em relação ao padrão de organização dos trabalhadores rurais e sua qualidade de vida.

219

Page 220: Alto Sertão - SE

Canindé de São Francisco: é o município mais rico do Alto Sertão em função de sua arrecadação tributária junto a CHESF/Usina Xingo. Outro diferencial é o projeto de irrigação Califórnia que consegue mudar a paisagem do sertão. Em épocas de seca, em meio ao cinza da caatinga destaca-se o verde das culturas irrigadas de quiabo coco-da-baía, banana, goiaba. Contudo, o quadro de miséria é muito grande e a política de distribuição de renda, ou seja, repasse de uma bolsa renda de R$ 80,00 mensais por família, tem um caráter assistencialista. Este município tem água, terra fértil e recursos financeiros para se desenvolver, faltando uma política eficiente para tanto. Como tem uma arrecadação tributária maior, possui uma dívida maior com a população.

Gararu: é um município dos quais os entrevistados tem pouco conhecimento. É conhecido pela existência das várzeas do rio São Francisco, pela pesca e pelo baixo dinamismo econômico.

Nossa Senhora da Glória: foi identificado por todos como a capital do sertão, boca da mata ou porta do Alto Sertão. Seu cartão de visitas é a feira livre de porte regional e o comércio local. O destaque comercial é maior em função de sua localização geográfica. Possui um número maior de obras de infra-estrutura: CEASA, CONAB (desativada) e um hospital regional. Juntamente com Monte Alegre e Porto da Folha, é um município de maior índice pluviométrico, de maior produção de milho, leite e derivados.

Monte Alegre de Sergipe: é marcado pelo atraso político e pela miséria do seu povo. É mais úmido e mais produtivo na agricultura que Poço Redondo e Canindé.

Poço Redondo: município de menor IDH do Alto Sertão e de maior concentração de assentamentos e acampamentos do MST. A ocupação pelo movimento Sem Terra foi em decorrência das áreas não beneficiadas, ou seja, produtivas, como afirmou Manoel Jerônimo (STR de Poço Redondo). Por isso é o município onde possui o maior crescimento da população rural. As três áreas destaques do município são Sítio Novos, Santa Rosa e as áreas ribeirinhas.

Porto da Folha: possui o maior número de associações comunitárias, com destaque para FEACOM. Possui uma área de elevada umidade, propícia a produção de milho e outra zona do feijão. As várzeas do rio (culturas irrigadas do arroz e banana) e as matas preservadas (usadas na apicultura) também ajudam a constituir sua riqueza. Possui uma equipe de assistência técnica e organização política elogiada por todos os entrevistados no município. Segundo um dos entrevistados lá não existe terra ruim. É um dos municípios mais promissores do Alto Sertão.

Meio Rural: dinâmica e problemas

Para os entrevistados o rural é sinônimo de interior, de campo, ou seja, aqueles espaços que se localizam fora da sede municipal. De acordo com as entrevistas, o rural é mais dinâmico do que o mundo urbano porque é de lá que sai a maior parte da riqueza e renda produzida no Alto Sertão:

220

Page 221: Alto Sertão - SE

o leite e derivados, o milho, o feijão e pequenos animais. Mesmo os povoados que lutam pela emancipação como Lagoa da Volta em Porto da Folha, sua base econômica é eminentemente rural. É a produção rural que dinamiza o comércio no urbano. O crescimento da população atribuiu uma nova dimensão e dinâmica para a bacia leiteira.

A organização política dos trabalhadores rurais em associações, no MST e no MPA reduziu o êxodo rural e transformou fazendas em povoados. Os maiores responsáveis por este processo são os assentamentos rurais de reforma agrária a exemplo dos povoados: Queimada Grande, Alto Bonito, Barra da Onça, Fortaleza e Curralinho.

O campo no Alto Sertão saiu da situação de vazios demográficos para um sertão intensamente povoado. Para aqueles que possuem casa e terra para trabalhar, mesmo considerando as condições precárias de acesso a saúde, a educação e ao transporte, alguns entrevistados apontaram que no campo é melhor para se viver do que na cidade.

Meio Urbano: dinâmica e problemas.

O urbano é, segundo os entrevistados, sinônimo do espaço da sede municipal e da cidade. O mundo urbano é ligado ao rural, principalmente porque a origem da sua população é rural e é de lá que sai a os produtos e maior parte dos consumidores do Alto Sertão, responsável pela dinâmica do comércio e dos serviços prestados nas sedes.

A base econômica de todos os municípios do Alto Sertão é a produção econômica rural e, os postos de trabalho oferecidos pelo comércio, pelo setor de serviços (clínicas, borracharias, locadoras etc.) e nas prefeituras não são suficientes para sustentar economicamente as cidades e os municípios. As prefeituras reclamam que a folha de pagamento é maior que a arrecadação mensal.

A limitada capacidade de oferta de trabalhos urbanos torna a população urbana dependentes dos favores dos prefeitos e políticos locais. Apesar do número reduzir a cada ano, muitos jovens continuam a migrar para a capital em busca de melhores escolas e universidades.

A relação do mundo urbano com o rural também é fundada na relação espaço de moradia e espaço de trabalho, o que significa dizer que existe um número significativo de trabalhadores rurais que moram nas cidades, ou seja, têm as sedes municipais como áreas para se viver e o campo como áreas de trabalho.

É necessário se construir um projeto que garanta uma relação de complementaridade entre campo e cidade, rural e urbano e não uma complexa relação de dependência.

221

Page 222: Alto Sertão - SE

Relação Alto Sertão – Estado de Sergipe

Ficou claro que a maioria dos entrevistados considera o Alto Sertão como uma área promissora onde faltam políticas estruturais para viabilizar o seu crescimento econômico e social e que o estado de Sergipe parece conhecer mais os problemas do que as potencialidades do território.

Todos os entrevistados concordam que o Alto Sertão é responsável por mais de 60% do leite e derivados produzidos no estado, bem como pelo milho e o feijão.

Apesar de precária, a qualidade de vida garantida pela produção impede que sua população se dirija em massa para a capital do estado ou para os grandes centros econômicos dos país. Suas histórias de vida formou uma população mais resistente aos impactos das secas periódicas. No entanto, a ausência de tecnologias torna-os ainda dependentes das chuvas.

A chegada do MST alterou a correlações de forças e o estado de Sergipe passou a ver o território com outros olhos, direcionando para lá mais projetos produtivos sem, contudo, reduzir a construção de relações de dependência política. É fundamental romper esta relação de dependência de projetos, de semente e assistência técnica.

V.2.3. Aspectos Fundiários e Agrícolas

Propriedade e Produção Agropecuária.

O Alto Sertão tem uma estrutura fundiária predominantemente constituída por pequenas propriedades, onde a estrutura econômica estar atrelada a primeira. De acordo com os entrevistados, as propriedades apresentam características diversas, onde a partir do tamanho da propriedade pode indicar a quantidade de leite produzido.

Pequenas Propriedades

Os entrevistados tiveram opiniões variadas quanto ao tamanho da pequena propriedade, predominando as indicações de até 100 tarefas. Segundo todos eles, são áreas de produção de milho, feijão, leite, e capim ou palma. Os proprietários possuem em média de 3 a 10 cabeças de gado bovino, e retiram de 20 a 100 litros de leite por dia, tendo ainda alguns suínos, caprinos, ovinos e/ou aves, sendo mantido pelo trabalho familiar e por uma agricultura para subsistência.

Médias Propriedades

222

Page 223: Alto Sertão - SE

Em geral, a média propriedade foi indicada como maior que 100 e menor que 400 tarefas. Os proprietários são produtores de leite, possuem em média mais de 20 cabeças de gado bovino e produzem mais de 100 litros de leite por dia, contratam diaristas e cultivam palma e capim. Em muitos casos o suporte forrageiro é cultivado por arrendatário como na grande propriedade.

Grandes Propriedades

São as propriedades acima de 400 tarefas. Quando é produtiva, tem gado de corte e de leite. O pasto é produzido preferencialmente mediante exploração por arrendamento. Para três dos entrevistados as grandes propriedades diminuíram consideravelmente em função da reforma agrária, transformando-a em pequenas propriedades.

Crédito Rural

Indiscutivelmente o PRONAF é o principal sistema de crédito para os pequenos produtores do Alto Sertão. Ele fundamental na ampliação da produção, na geração renda e com isso, na fixação as famílias dos agricultores no campo. O Garantia Safra é limitado.

Entretanto, a maioria dos produtores permanece endividada. Além de ter que enfrentar as limitações climáticas, os pequenos agricultores têm que se submeter aos atrasos na liberação dos recursos, o que retarda o prepara do solo e plantio, prejudicando a colheita. Não saindo na época certa, o crédito rural pode ser um mecanismo de desagregação entre os pequenos produtores.

Os médios produtores se queixam de não possuírem linhas de crédito com a mesma facilidade que os pequenos. Uma política estrutural ampla incluindo a capacitação dos produtores rurais poderia possibilitar a superação da dependência do crédito rural.

Terra

A terra é o fundamento da vida e do trabalho no território já que os seus municípios são eminentemente agropecuários.

A melhoria por infra-estrutura no território e o conflito por água tem valorizado o preço da terra. Antes era possível comprar terra com o trabalho e hoje não mais diz o Sr. Zezé (presidente da FEACOM).

Somente a conquista da terra permitiu que mais de mil famílias assentadas e duas mil famílias acampadas se fixassem na zona rural do Alto Sertão, fazendo sua população crescer.

223

Page 224: Alto Sertão - SE

Água

A água é um dos bens mais preciosos no Alto sertão Sergipano, no entanto, adquiri-lo no campo e mais caro que na cidade. A água é um elemento determinante na vida do sertanejo e fator de conflito nos povoados na disputa por adutoras ou barragens, na luta por irrigação e nas áreas ribeirinhas.

As áreas de conflito mais evidentes são as áreas de irrigação e as zonas ribeirinhas. As zonas ribeirinhas tiveram suas várzeas destruídas com a construção da barragem do rio São Francisco, mediante a instalação da Usina Hidroelétrica de Xingo. Houve um decréscimo significativo das áreas produtoras de arroz e das possibilidades de pesca em toda região do baixo São Francisco.

As áreas irrigáveis se localizam preferencialmente em Canindé e Poço Redondo. A expectativa da ampliação dos projetos de irrigação gerou um clima de desconforto no assentamento Jacaré-Curituba em Poço Redondo e de incerteza para os pequenos produtores que estão na área a ser desapropriada para o projeto Nova Califórnia.

Tecnologia:

O uso de tecnologias é restrito aos perímetros irrigados e a alguns produtores que têm acesso a tratores e alguns adubos, pesticidas e/ou herbicidas. Nesta última safra foram usadas sementes melhoradas pela Embrapa.

V.2.4. Políticas Públicas e seus Impactos

Governo Federal

O governo federal tem agido na linha certa com os pequenos produtores, principalmente quando negociou as dívidas. Foi sensível neste aspecto.

Governo Estadual

Para os entrevistados em geral, a maior insatisfação é quanto ao desmantelamento das estatais Cohidro e Deagro. Com tal política o governo do estado desarticulou a assistência técnica destinada ao pequeno e médio produtor. Para os assentados a insatisfação é quando a não conclusão das obras de irrigação no assentamento Jacaré-Curituba, projeto de irrigação que, originalmente era destinado aos empresários, mas em 1996 foi ocupado Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra.

224

Page 225: Alto Sertão - SE

Governo Municipal

Em relação aos governos municipais os entrevistados foram mais cautelosos aos fazerem uma avaliação. Contudo, os gestores de Porto da Folha e Monte Alegre de Sergipe são os que apresentam as melhores expectativas de uma boa gestão dado os compromisso históricos com os movimentos sociais.

Ações das Organizações Não Governamentais: Cáritas, PDHC

CÁRITAS: é uma entidade que possui atuação limitada a alguns municípios do Alto Sertão. Um dos trabalhos que mais se destaca é o projeto fazenda Esperança em Gararu, coordenado por Dom Mário (recuperação de drogados) da Diocese de Própria. Dado a sua atuação, alguns entrevistados disseram que não a conhece, muitos afirmaram que sabe que existe, mas não conhecem os seus objetivos no território.

PDHC – Projeto Dom Helder Câmara: é uma entidade com muitos recursos, mas que não estrutura as entidades parceiras. Também tem uma atuação limitada a alguns municípios. Dado a sua atuação, alguns entrevistados disseram que não a conhece, muitos afirmaram que sabe que existe, mas não conhecem os seus objetivos no território.

Ações dos Movimentos Sociais: MST e MPA.

MPA: é uma entidade nova, por isso pouco conhecida no território.

MST: é uma entidade conhecida por todos os entrevistados que possuem opiniões diversas sobre o mesmo. Para uns foi responsável pelo fim da estrutura fundiária concentrada no território, levando os trabalhadores rurais a se organizar. Tal organização gerou conquistas que se traduzem em melhores condições de vida quanto a habitação, o acesso a água encanada, a energia e ao crédito rural com mais facilidade. Para alguns outros o MST incentivou a entrada de um número muito grande de migrantes oriundos de outros estados no Alto Sertão acentuando os problemas sociais nos municípios. Todavia, o MST muito mais contribuiu do que prejudicou o desenvolvimento socioeconômico dos municípios por ter possibilitado uma maior integração entre os movimentos sociais e uma articulação regional e estadual para se resolver problemas comuns a todos.

Ações de Assistência técnica: DEAGRO, COHIDRO e CECAC

DEHIDRO: Sua atuação é restrita ao projeto de irrigação Califórnia. Tem boa aceitação junto aos agricultores irrigantes, mas compreendem que o departamento foi sucateado.

225

Page 226: Alto Sertão - SE

DEAGRO: Teoricamente presta assistência técnica a todos os produtores fora dos assentamentos rurais de reforma agrária e a mais a seis assentamentos no Alto Sertão. Contudo, a DEAGRO se encontra fragilizada pelo excesso de trabalho e sucateamento do órgão. Ao elaborarem os projetos produtivos, o atendimento é seletivo, pois só conversam com os agricultores aptos a adquirirem o crédito. São responsáveis pelos laudos técnicos de todas as unidades produtivas, função de fiscalização. Para tantas atividades faltam técnicos e menos compromisso com a política partidária.

CECAC: Empresa ligada ao MST, tem uma atuação em todo o território, em quase todos os assentamentos rurais de reforma agrária. O convênio Prefeitura/CECAC/FEACOM em Porto da Folha tem conseguido atender a contento as famílias de agricultores, mas é preciso melhorar no trabalho de campo. Estes parceiros possuem um campo experimental para as sementes melhoradas das culturas tradicionais (milho e feijão) e outras possíveis (sorgo, algodão, mamona). Nos demais municípios existem bons técnicos, contudo, precisa avançar na interlocução e na interação com os problemas cotidianos dos agricultores. Em geral, o número de técnicos é insuficiente para a demanda.

Bolsas (família/fome zero, escola, vale gás, PET)

São obras da Ação Social que tem conseguido amenizar a situação de miséria de muitas famílias. Paras estas, é a única fonte de renda. Todavia, gera dependência e provoca de escassez de trabalhadores de baixa renda. Dado o preço das diárias pagas aos trabalhadores, alguns consideram melhor viver das bolsas do que do seu próprio trabalho. Também tem ocorrido desvios e pessoas não necessitadas entraram nas listas de beneficiários.

Conselhos Municipais

Em sua origem, sua função era de fiscalização das ações das prefeituras municipais. Porém, os conselhos não possuem plena autonomia e submetem-se as prioridades das lideranças políticas locais.

Infra-estrutura: estradas/energia/água/saneamento básico

Em geral as comunidades rurais e urbanas são bem atendidas quanto a energia elétrica, mesmo considerando que muitas outras não são beneficiadas. A água só chega a lugares restritos, mas juntamente com a energia elétrica passa por um processo de ampliação. Ela não tratada, é somente clorada e o saneamento básico é restrito a algumas sedes municipais como Glória e Canindé.O esgoto é jogado nos rios sem nenhum tratamento.

As estradas constituem o principal problema no quesito infra-estrutura. Falta pavimentação e não há máquinas necessárias para mantê-las com as mínimas condições de acesso. Sua ausência dificulta o fluxo de pessoas e mercadorias.

226

Page 227: Alto Sertão - SE

V.2.5. O Desenvolvimento

A idéia de desenvolvimento vem ligada a idéia de progresso técnico, melhorar as condições produtivas e avanço na qualidade de vida da população. Tais idéias tiveram presentes nas alternativas propostas para o Alto Sertão:

• Garantir um processo de capacitação e qualificação para o produtor rural e sua família;• Educação • Trazer para o território mão-de-obra especializada;• Desenvolver pequenos projetos de irrigação;• Criar agroindústrias;• Incentivar a apicultura;• Incentivar e melhorar a infra-estrutura para piscicultura;• Incentivar a criação de pequenos animais (aves, caprinos e ovinos);• Incentivar o uso de produtos orgânicos;• Criar cooperativas de comercialização;• Incentivar o turismo nas feiras livres, aproveitar o potencial do rio São Francisco e a cultura do cangaço;• Elaborar uma política estruturante para o Alto Sertão;• Criar uma certificação alternativa para as fabriquetas.

V.3. Sistemas Agrários em Sergipe e no Alto Sertão: implicações ao desenvolvimento dos assentamentos.

V.3.1. Introdução

Nos anos 90, produto da crise de financiamento do Estado e do conseqüente refluxo das políticas de apoio e suporte à produção agropecuária, o setor passou a se relacionar de modo muito mais integrado com os sistemas de transformação e de distribuição, composto por setores agro-industriais, cadeias de supermercados varejistas e com os fornecedores de insumos e de serviços (Dias e Amaral, 2001).

227

Page 228: Alto Sertão - SE

Estes segmentos passaram a liderar e coordenar os processos produtivos de grandes segmentos da agricultura, imprimindo-lhes procedimentos padronizados e maior eficiência74. Neste novo sistema, todos os produtores com produtividade abaixo da média devem estar se descapitalizando e sendo gradualmente eliminados do setor. Ocorrem, também, processos de marginalização de espaços geográficos e de seus segmentos de atividade, com o território do Alto Sertão e sua agricultura tornam-se regiões excluídas dos circuitos agroindustriais e agroalimentares. Isso para a grande propriedade pecuária, que perde espaço na produção de carne, algodão e feijão, sendo que, no caso da pecuária leiteira, assisti-se, nos anos 80 e 90, o fechamento das grandes empresas processadoras de leite no território, o crescimento do setor e perspectivas de reconcentração do processamento e, quiçá, da produção primaria.

As mudanças tecnológicas que ocorreram nos últimos trinta anos tiveram forte influência sobre a produtividade no setor agropecuário, forçada pelo movimento de preços relativos que, somado a redução do programa de crédito oficial, discriminou fortemente os produtores de tecnologia tradicional e de pequeno porte, dando-lhes poucas chances de sobrevivência. Os agricultores de pequeno porte passaram a depender de programas oficiais e subsidiados de financiamento que apresentam limites e restrições nos valores financiados (Dias e Amaral, 2001).

“Na década dos 90 se inicia a configuração de um novo modelo de financiamento e coordenação a partir do sistema de distribuição das cadeias de supermercados varejistas e através do sistema agroindustrial exportador” (DIAS E AMARAL, 2001: p. 6).

Ocorreram, também, inovações que contribuem, de diferentes maneiras, para a elevação da produtividade geral dos sistemas produtivos da agricultura familiar, o que possibilita uma maior absorção da força de trabalho e a melhoria da renda obtida no conjunto do sistema produtivo.

Localizadas nos interstícios da grande propriedade, ou em áreas marginais, excluídas das principais políticas agrícolas que levaram ao desenvolvimento do agro, a agricultura familiar e os assentamentos sergipanos se vêm espremidos entre os movimentos de expansão e crise que afetam as principais atividades exploradas pela grande produção, bem como pelo movimento da especulação fundiária. Todavia, nos últimos dez

74 Vale reproduzir a seguinte passagem de DIAS & AMARAL (2001: p. 13/4):“A partir de 1983, com o desaparecimento do principal mecanismo de compensação da agricultura (subsídio no crédito rural), aparecem fortes pressões políticas do setor

rural contra os elementos de discriminação dados pelas intervenções governamentais. Essas pressões do setor se somam a outras de organismos internacionais, em especial do Banco Mundial que as expressa nas salvaguardas contidas nos projetos de ajuda setorial. Começa então a configurar-se com maior clareza novo modelo que tomaria forma a partir de meados dos anos 80. A agricultura passará a se relacionar de modo muito mais integrado, de um lado, com o sistema de distribuição, composto por setores agro-industrial e por cadeias de supermercados varejistas e de outro lado, com os fornecedores de insumos e serviços. A nova estrutura de abastecimento acompanha de perto o ritmo acelerado de urbanização do país e imprime nova configuração no comércio de alimentos e outros produtos agrícolas e passa a liderar e coordenar processos produtivos de grandes segmentos da agricultura, imprimindo-lhes procedimentos padronizados e maior eficiência. Essa força coordenadora tem base na liquidez concentrada nas cadeias de supermercados, nas indústrias de alimentos, nos traders e também na indústria de insumos. No período em que o sistema de crédito rural oficial se esgota, essas novas fontes financiamento começam a ocupar espaço. Os supermercados concentram liquidez porque operam através de compras à prazo e vendas à vista, em grande escala. Os traders/processadores detém acesso privilegiado ao crédito externo através de importações financiadas e ou antecipações de recursos sobre exportações. Nesse novo ambiente mais integrado com outros setores da economia, a agricultura experimenta talvez o fato explicativo mais importante para se entender a sua dinâmica de crescimento positivo no período: o crescimento sistemático da produtividade”.

228

Page 229: Alto Sertão - SE

anos, a reforma agrária e o crédito rural para a agricultura familiar e os assentados avançaram bastante, com melhoras expressivas, nos últimos anos, nos gastos orçamentários da Reforma Agrária e do Pronaf. Os valores destinados a fomento e instalação, assim com os do Pronaf – A, B, C, D e E, vem sendo constantemente ajustados Esse bom desempenho da Reforma Agrária está ligado a pressão do Movimento dos Trabalhadores Sem-Terra e o avanço do Pronaf às do Movimento Sindical. No ultimo governo, houve um aumento nos esforços em Assistência Técnica, Infra-estrutura e Planos de Desenvolvimento e Recuperação, com vistas a melhorar qualitativamente os assentamento. Agora, não se pode aqui defender a atual política de credito para a agricultura familiar, pois ela destina a maior parte dos recursos para agricultores e regiões que se encontram inseridos nos circuitos mercantis e tecno-produtivos. E, como já vimos, esses circuitos se transformaram profundamente nos últimos anos, aumentando os processos de diferenciação e de eliminação dos produtores. Ora, ainda que valoroso, o que o Pronaf alcançou de fato foi melhorar a inserção dos agricultores familiares mais avançados tecnicamente, economicamente e socialmente.

Vale sublinhar o desenvolvimento e crescimento das parcerias entre as diferentes instituições federais, estaduais e municipais relacionadas ao desenvolvimento rural. O que não se observa é poder decisório e de arbitragem dessas institucionalidades, que passam servir como forma de gestão de políticas definidas e específicas.

V.3.2. Sistemas de produção da agricultura familiar base para a elevação da produtividade nos assentamentos

O sistema de produção pode ser entendido como o conjunto de combinações de culturas e criações dentro de uma unidade de produção. De acordo com Rockenbach,75 um sistema é o arranjo de componentes físicos, unidos ou relacionados de tal forma que funcionam como uma unidade, se caracterizando pela presença de cinco elementos: entradas, componentes, limites e interações entre componentes e saídas.

Dentro desse enfoque, as propriedades agrícolas podem ser caracterizadas como sistemas que tem como entradas: dinheiro, materiais, insumos, radiação, precipitação e informação; como saídas: produtos de plantas, animais ou produtos de animais. Estes sistemas têm diferentes componentes que se organizam enquanto subsistemas: o sócio-econômico e o agro-ecossistema com plantas e animais. Estas propriedades têm limites espaciais definidos e apresentam uma imensa rede de interações internas entre seus diferentes componentes que interagem com os subsistemas do meio físico e o sócio-econômico do seu entorno. No território do alto sertão sergipano as atividades agropecuárias mais importantes e estratégicas são a pecuária leiteira – seus pastos e culturas para alimentação do efetivo, onde se destaca a palma e o buffel e – e o cultivo de lavouras temporárias de subsistência, em especial milho e o feijão, mas, também, fava, mandioca, abóbora, banana, O leite, o milho e o feijão, três principais atividades da agricultura territorial apresentam dificuldades dentro dessa ótima de sistemas de produção. O leite por apresentar, atualmente, grandemente dependente do recurso externo e, ademais, requerer um tamanho mínimo acima da concessão dos lotes da reforma agrária. O uso de rações no período seco e recorrente e os efetivos animais - bezerros, ovinos, suínos e aves – servem de “reserva monetária” para a alimentação das vacas. E pecuária leiteira requer muita água que é o principal obstáculo ao desenvolvimento das lavouras

75 ROCKENBACH 1985: p. 209-210.

229

Page 230: Alto Sertão - SE

temporárias, pois a escassez e a irregularidade das chuvas são grandes limitantes. Verdade que a pesquisa agropecuária levada a cabo na Embrapa vem disponibilizando variedade superprecoces – o que pode significar a diminuição de perda nas safras. As dificuldades de acesso à água para consumo humano, animal e produtivo na região têm ao alcance das mãos sua solução, pois o Rio e os Reservatórios de Paulo Afonso – Itaparica – e de Xingó são vizinhos da região.

Os pequenos agricultores, bem como os assentados da reforma agrária, desenvolvem sistemas produtivos que são, na verdade, estratégias de sobrevivência como produtores rurais, pois com o objetivo de garantir a continuidade, preservação e desenvolvimento da unidade familiar, eles diversificam as atividades produtivas e as fontes de renda, diminuindo os riscos econômicos. Nesse sentido, o que marca a agricultura familiar, no território, de baixa renda, é o desenvolvimento de complexos sistemas de produção, onde se combinam várias culturas, criações animais e transformações primárias, visando tanto o autoconsumo como a comercialização. Soma-se a isso, as fontes de renda externas a produção agropecuária na própria unidade, sobressaindo-se os trabalhos não agrícolas dentro e fora do estabelecimento, o assalariamento em outras propriedades agrícolas, as rendas oriundas da seguridade e da assistência social governamental.

Os sistemas de produção são um resultado da interação entre o agricultor, o entorno econômico, social, ambiental e cultural. “Um sistema de produção reflete não apenas as potencialidades e restrições sócio-ambientais e agronômicas particulares de cada local, mas também a história local e das famílias que o adotam. ... A agricultura familiar é particularmente sensível às condições do meio ambiente. Estes agricultores, dispondo em geral de poucos recursos externos que possibilitem a transformação ‘radical’ do meio ambiente e sua adaptação às exigências do mercado ... são obrigados a conviver de forma mais intensa com as “restrições” associadas ao meio ambiente”. (GUANZIROLI et al, 2001: p. 116)Como a agricultura de baixa renda vem convivendo com as duras restrições ambientais: a aridez, o precário acesso a terra e água - em quantidade e qualidade, e de fauna e flora, grandemente afetada pelo desmatamento dos anos 60 e 70. Hoje, com a ocupação das terras improdutivas, assisti-se a um aumento da pressão demográfica e de uma carga animal relativamente elevada, mas que vem melhorando seu rendimento – leite – ano após ano. Há que se recuperar parte da caatinga, fazendo, o que é imprescindível, seu uso econômico e sustentável. Que, para tanto, requer apoio da ação do estado, em estudos, pesquisa, difusão, recursos e financiamentos. Há, por outro lado, dois aspectos a serem relembrados: a insuficiência de terras deve ser atacada com políticas de outro perfil do que as atuais empreendidas. Os programas de Credito Fundiário funcionam, erradamente, como política complementar ou para alguns, entre os quais nós, contratria a Reforma Agrária. De fato conceder lotes via crédito fundiário, quando o estoque de terras para desapropriar e arrecadar mostra-se suficiente para o assentamento dos agricultores sem ou com pouca terra, não atende ao seu publico preferencial, que é a expressiva parcela de minifundistas que desejam regularizar e ampliar o seu pedaço de terra. Já no que respeita a água, há que se buscar modelos de irrigação que contemplem maiores populações e espaços produtivos, ainda que abrindo mão das possibilidades de agregação de valor e de mercados que o modelo de perímetros irrigados permite.

230

Page 231: Alto Sertão - SE

Verdade que irrigação atende ao que preconiza o Estatuto da Terra, pois ao dar relevo aos cultivos exigentes em mão-de-obra e intensivos no uso do solo (horticultura e fruticultura), permite melhor distribuir a terra e diminuir os excedentes de população migrante. A estratégia deve ser gerar a maior renda possível por hectare, mesmo que a produtividade do trabalho das produções não seja das mais elevadas. Daí a importância da produção diversificada no desenvolvimento dos assentamentos. Dessa afirmação redunda a importância de se implementar estratégias de melhoramento dos sistemas produtivos dos estabelecimentos, principalmente para os assentados em processo de re-inclusão econômica, social e produtiva, que contam com recursos limitados e que necessitam de acompanhamento técnico. Este quadro revela a necessidade de esforços de se desenvolver a assistência e a capacitação mais especializada, particularmente para a pecuária leiteira, as culturas de milho e feijão, as pastagens e cultivos forrageiros e, em menor grau, para a mandioca, a fruticultura e olericultura. A diversificação no Alto Sertão já é um fato e para gerar maior renda na produção primária é fundamental ampliar o espectro de lavouras e de forragens cultivadas nas parcelas, mas, para tanto, são necessários a pesquisa, o investimento, o crédito e a assistência técnica para um programa de desenvolvimento de sistemas agrossilvipastoris para o alto sertão sergipano, com base no mix produtivo: pecuária leiteira, ou melhor, mista – corte e pequenos animais – e lavouras temporárias para autoconsumo.

É importante destacar que o desenvolvimento tecnológico da agropecuária brasileira seguiu o padrão americano que implica em níveis elevados de investimento e de gastos de custeio, bem como uma área mínima relativamente grande, revelando que as barreiras de entrada são elevadas. (Romeiro, 1994) Neste quadro, a reforma agrária estaria inviabilizada, pois não existem recursos financeiros para reproduzir esse modelo no âmbito dos assentamentos e dos agricultores familiares. Como decorrência do padrão tecnológico adotado em nosso país, a produção agrícola e pecuária vem se concentrando cada vez mais em um número relativamente menor de estabelecimentos com um valor de produção crescente.

Na busca da inserção dos assentados e contando com o apoio governamental em crédito, sistema de pesquisa, extensão rural, estrutura de comercialização, etc; torna-se possível pensar o aumento da renda desse público, de sorte a gerar um custo de oportunidade mais alto e que seja produto da melhora da produtividade. Mais que pensar na especialização em atividades sofisticadas do ponto de vista tecnológico que produzem para os “nichos” de mercado que são insuficientes para absorver a capacidade produtiva dos assentados é preciso buscar a melhoria dos sistemas produtivos hoje existentes, assim como reter maiores valores no processo da sua comercialização.

Assim, a melhoria dos sistemas produtivos existentes deve estar baseada em alternativas tecnológicas “neutras” do ponto de vista da escala de produção. Ela deve ser um processo progressivo de elevar a capacidade de produção e das exigências de investimentos. A proposta está baseada no fato de o sistema agrícola ser o único em que a geração de empregos por unidade de capital investido apresenta certa flexibilidade, podendo absorver relativamente uma maior quantidade de pessoas, sem a conseqüente queda na produtividade do trabalho e na qualidade do produto, através da intensificação do uso da terra (Romeiro, 1994).

231

Page 232: Alto Sertão - SE

As alternativas tecnológicas hoje existentes tornam plenamente possível a proposição acima apresentada. Trata-se de intensificar progressivamente a produção através da utilização combinada de insumos e equipamentos modernos com a exploração dos recursos ofertados pelo próprio ecossistema agrícola quando manejado de acordo com certas regras agronômicas. Nessa direção, defendemos que se desenvolvam, no território, ações de envergadura tanto na preservação e manejo das caatingas como no acesso a água. Há água e terras para que a população territorial alcance bons níveis de renda, o que falta são ações públicas que combatam a segmentação excessiva dos estabelecimentos e que distribua, forneça água para maior numero de domicílios rurais e de estabelecimentos agropecuários. Já para a recuperação e, posterior, uso econômico das caatingas é que devem se buscar recursos que remunerem aos pequenos agricultores durante o período de maturação do investimento. Investimento que poderia ser financiado pelo Pronaf-Florestal – que, como dissemos, não teve nenhum operação no Semi-Árido Nordestino – mas cuja rentabilidade é desconhecida pela inexistência de estudos dos potenciais rendimentos econômicos de catingais –apicultura, madeira, forragens e frutas.

As práticas agrícolas modernas convencionais desperdiçam esse potencial, na medida em que se baseiam no uso intensivo de fontes exógenas, de nutrientes e de energia, as quais em grande parte são empregadas justamente para compensar este desperdício. É o que ocorre hoje na pecuária leiteria, pois sua rentabilidade esta intimamente associada ao comportamento dos custos dos recursos externos a propriedade – rações e adubos. A água, por outro lado, é recurso escasso que na época das secas torna-se um item de despesa bastante importante. O setor público deve melhorar o fornecimento de água e apoiar os sistemas produtivos diversificados dos agricultores e que buscam diminuir a dependência com insumos externos ao estabelecimento.

Na natureza a diversidade é um sinônimo de estabilidade. Quanto mais um ecossistema for simplificado, maior será a necessidade de transferências exógenas de energia para mantê-lo em equilíbrio. Portanto, ao se evitar a monocultura através de um sistema inteligente de rotações de culturas, integrado com a criação animal, eliminar-se-á parte significativa dos gastos com investimento e custeio necessários para tornar rentável o padrão tecnológico considerado moderno (Romeiro, 1994).

Além disso, a produtividade total de diversas culturas integradas entre si e com a criação animal é maior do que aquela obtida com uma só cultura. Isto se deve ao fato de que num sistema integrado se consegue uma combinação positiva das complementaridades e das simbioses naturais entre as diversas espécies vegetais e animais, resultando uma utilização mais eficiente dos recursos naturais disponíveis. As barreiras à entrada deste padrão alternativo são menos financeiras do que de ausência de informações técnico-científicas. O sistema de pesquisa e os serviços de extensão rural foram montados e atuaram tendo como modelo o padrão tecnológico da agricultura americana. Isto atendia plenamente aos interesses dos grandes produtores dedicados à monocultura de exportação ou matérias-primas para a indústria (Romeiro, 1994). Os projetos do Pronaf-A mostram claramente isso, ou seja, a precariedade técnico-científica das propostas, pois se baseiam em modelos para os médios e grandes produtores especializados de leite.

232

Page 233: Alto Sertão - SE

Desse modo, não se tratou de um processo neutro de escolha tecnológica em torno do padrão mais eficaz. A escolha se deu em função dos interesses das elites agrícolas do país. Posteriormente em função das críticas recebidas, a Embrapa, importante elemento na reprodução desse modelo americano no país, abriu um espaço para a pesquisa destina à pequena produção, partindo da disponibilidade do trabalho familiar para tornar mais complexo e intensivo os seus sistemas produtivos. (Romeiro, 1994)

É perfeitamente possível, portanto, apoiar técnica e cientificamente os pequenos produtores, de modo que estes elevem progressivamente, em termo de valor, a sua produção, embora em áreas relativamente pequenas. O importante a ressaltar nesse processo é o seu caráter progressivo, este padrão alternativo e relativamente neutro em termos de escala de produção (Romeiro, 1994).

V.3.3. Sistemas agrários e os assentamentos de reforma agrária no Alto Sertão Sergipano

Como vimos, Fonseca e Bastos (1998) afirmaram que o setor primário da economia na região do sertão apresenta-se como principal gerador de renda, embora com pequena representatividade quando comparado às outras regiões do Estado. O sertão tem sua economia baseada na pecuária e no cultivo de lavouras temporárias. A presença da Usina Hidroelétrica de Xingó, do crescimento da previdência social, especialmente a rural, da assistência social e do setor publico municipal transformou totalmente o cenário econômico da região. Os dados do PIB são bastante ilustrativos disso, chamando a atenção à importância da Usina de Xingó no PIB territorial, tendo em vista que 84% cabe ao setor secundário de Canindé de São Francisco. Canindé é o 140° município de maior PIB, em 2003 e com uma posição de causar inveja no quesito PIB per capita, pois neste rol é o 14° maior do país. Verdade que quanto ao IDH ocupava, em 2000, a 4.978° posição para um total de 5.507 (e no PIB, 5.560 municípios). Em termos de Sergipe, é o segundo PIB e o 20º no Nordeste.

233

Page 234: Alto Sertão - SE

Tabela 77Evolução Produto Interno Bruto Territorial, de sua Participação no Estadual e da Composição entre os setores econômicos

– 1970, 1975, 1980, 1985, 1996, 1999, 2000, 2001 e 2002 –

INDICADORES 1970 1975 1980 1985 1996 1999 2000 2001 2002PIB Total Territorial (1) 50.102 58.278 85.315 126.300 220.768 211.715 210.971 1.230.039 1.308.944% Industria Canindé 0% 0% 0% 1% 39% 2% 3% 83% 84%% Construção Civil 3% 4% 3% 7% 39%

Participação no EstadoPIB Total 4% 3% 3% 2% 4% 4% 4% 16% 16%PIB Primário 3% 8% 9% 11% 14% 14% 13% 14% 10%

Distribuição

Retirando a indústria de Canindé de São Francisco (UHE Xingó)Agrícola 16% 40% 52% 50% 52% 32% 26% 28% 24%Industria 4% 9% 8% 15% 2% 6% 7% 10% 11%Serviços 79% 51% 40% 35% 46% 62% 67% 63% 66%

Sem restriçõesPrimário 16% 40% 52% 50% 32% 31% 26% 5% 4%Indústria 5% 9% 8% 15% 41% 7% 9% 85% 86%Serviços 79% 51% 40% 35% 28% 61% 65% 11% 10%Fontes: www.ipeadata.gov.br e ftp:\\ftp:ibge.gov.br/Pib_Municiipios/2003/(1) São os dados do Ipeadata do PIB, em R$ de 2000. Para a distribuição dos anos mais recentes – 1999 a 2002 – foram utilizados os dados fornecidos pelo IBGE para download, que estão em valores correntes.

Agora se desconsiderarmos o segmento industrial de Canindé, observa-se que o setor primário responde por 1/4 do PIB territorial o terciário por 2/3, com a agricultura tendo perdido espaço nos anos 90, reduzindo pela metade a sua participação. Já o setor de serviços e o da industria cresceram, com o terciário voltando a predominar em outro grau de ocupação das terras e a indústria alcançando a 10% do PIB. Com vimos na analise da renda, a administração publica, o comercio e a industria apresentaram incrementos expressivos na população ocupada e, em alguns casos, nos rendimentos. Soma-se a isso o aumento substancial na parcela da renda pessoal originaria dos benefícios previdenciários, especialmente os rurais, e o crescimento, mais recente, dos programas de transferência de renda – as chamadas “bolsas”.

234

Page 235: Alto Sertão - SE

Houve, decorrente da pressão social, uma retomada das políticas agrárias e das agrícolas voltadas para a pequena produção, desde meados dos anos 90, sendo que tanto as despesas orçamentárias com Reforma Agrária quanto os volumes de crédito rural para os pequenos produtores e a reforma agrária vem tendo um desempenho bastante positivo. Agora mudou a realidade do território, com a agricultura perdendo sua centralidade no desenvolvimento e na geração de riqueza, pois a Usina de Xingó, o aumento no produto público, a ampliação da seguridade social e o crescimento das políticas de transferência de renda passam a responder por importante parte do produto, o que se fez acompanhar de crescimento populacional, baseado no estancamento do êxodo rural nos 90’s.

Vemos com bons olhos o crescimento das rendas do setor publico, ou via folha ou via políticas de crédito, previdência, assistência. Saúde e educação são também fundamentais nesse movimento. Há que ter presente que parte do crescimento no território se deve ao maior grau de organização do movimento social, bem como ao aumento das políticas focalizadas de combate a pobreza, para as quais o semi-árido nordestino é espaço privilegiado.

Agora na agricultura, continua sendo um empecilho ao seu desenvolvimento o enorme contingente de pequenos estabelecimentos, que se reflete em uma área media relativamente pequena. No estudo da Codevasf-UFS (Barros & Fonseca), esses numerosos estabelecimentos com menos de 50 hectares, espalhados por toda região, voltam-se basicamente para a produção de alimentos (lavouras temporárias). Onde o gado começa a predominar, o tamanho médio das propriedades vai aumentando. Hoje com o aprofundamento da reforma agrária na região, as áreas maiores, ou seja, onde havia o predomínio da pecuária de corte, passaram a ser trabalhadas por agricultores na produção de alimentos e de leite. O segmento produtor de leite, que teve um grande desenvolvimento nos anos 80 e princípio dos 90`s, foi bastante estudado, pois desperta interesse seu baixo nível de concentração, a presença da suinocultura, como atividade complementar, e seu baixo nível tecnológico. Mas esses estudos - ... – se concentraram nos municípios de Glória, Gararu e Porto da Folha, particularmente no primeiro. Hoje a abrangência da atividade leiteira supera e, em muito, a esses municípios; houve uma interiorização da produção leiteira, catalisada pelo crescimento dos assentamentos no território.

Como bem dizem os autores, a agropecuária está sujeita a períodos cíclicos de seca e se caracteriza pelo uso de tecnologia rudimentar, com ênfase nas culturas de subsistência. Esse quadro vem se agravando pelo aumento das deficiências na área social e, pelo desmatamento de caatingas e das matas ribeirinhas. Como conseqüência tem provocado problemas como a acentuação das condições de semi-aridez, o quase desaparecimento de cursos de água, a salinização da água e do solo, erosão e aumento da intensidade dos ventos. Isso leva a uma diminuição da área agricultável, da produção e da produtividade agrícola. A origem agrestina de muitos dos agricultores familiares e assentados do Alto Sertão pode em parte explicar o aumento da área agrícola e do esforço produtivo em se cultivar grãos. E não somente grãos, mas também desenvolver a pecuária leiteira, como bem aponta Sonia Menezes e, para tempos mais remotos, Francisco Carlos Teixeira da Silva

235

Page 236: Alto Sertão - SE

Através da análise dos dados pode-se concluir que os projetos de assentamento têm seus parceleiros desenvolvendo a seguinte combinação de atividades: leite, autoconsumo alimentar humano e animal, pequenos animais e extração vegetal Ou nos termos dos PDAs, “a tipologia de produção predominante nos assentamentos é Pecuária Leiteira + Agricultura de Autoconsumo (também produtora de excedentes, é o caso do milho e do feijão) + Pequenos Animais + Extração de Madeira (lenha ou carvão)”. Considerando que a regionalização do estudo MDA-FAO e, em menor medida, encontra-se limitada pelo processo de interiorização da atividade leiteira e de crescimento produtivo da zona do Sequeiro Degradado. Há que se considerar que a zona ribeirinha e as áreas “antigas” de produção leiteira ainda tem sua validade, e que a questão da degradação é uma problema geral e tem suas raízes na pecuariazação dos anos 70 e 80. E, o mais importante, é que a pecuária leiteira, que se estendeu a todo território, e as lavouras de milho e feijão são desenvolvidas em parcelas de terras pequenas e com escassez de água. A ampliação das parcelas de terras dos agricultores de baixa renda com a melhoria desse sistema de produção – leite, autoconsumo humano e animal, pequenos animais e extração vegetal – pelo fornecimento de água – em outros moldes que a grande irrigação – e pela ampliação dos estudos em sistemas agrossilvipastoris, o nome para pecuária mista e agricultura de auto-consumo no semi-árido.

Notou-se que os assentamentos da Zona Ribeirinha têm outro perfil produtivo, evidenciado quando da leitura dos PDAs e, até mesmo, no fato de que dentre as propostas do Pronaf-A, a única que se sobressai é a do PA José Unaldo de Oliveira, localizado na margem do rio. Há em gestação dentro de revitalização do São Francisco projeto de implantação de viveiros e recuperação das matas ciliares. Há para os assentamentos localizados nessa zona um leque ainda maior de atividades, como a piscicultura, a apicultura, a caprinocultura e a irrigação – várzeas principalmente. Verdade que os outros dois projetos ribeirinhos que tivemos acesso as propostas de Pronaf-A não apresentam diferenças em relação ao outros. O padrão é: vacas, ovelhas, palma, milho, tanque de água e cilo. Destacam-se os assentamentos Cajueiro (Poço Redondo) e Cachoeirinha (Gararu) por terem sugerido a implantação da piscicultura, justificado, entretanto, pela disponibilidade dos recursos hídricos existentes nesses assentamentos (rio São Francisco e rio Capivara, respectivamente).

Além dos nomeados no quadro 18, onde sumariamos os limites e as potencialidades dos assentamentos, segundo as zonas definidas no estudo do MDA-FAO, os Projetos de Assentamento de Ilha do Ouro, em Porto da Folha, e de Curralinho e Lagoa da Areia, em Poço Redondo também são ribeirinhos. Eles não estão no quadro, pois as informações nele presentes foram extraídas dos PDAs.

Já nos assentamentos Zona Degradada, chama a atenção o fato dos projetos repetirem o mesmo perfil produtivo, independente de suas fragilidades ambientais, não se observando alternativas, seja em suporte forrageiro seja em agua. Os assentamentos devem buscar, particularmente, nas áreas de solos mais pobres e condições ambientais mais adversas, apoio para a recuperação das caatingas e ampliar o leque de atividades produtivas, como forma de diluir os riscos. Os assentamentos da região estão fazendo crescer a produção agropecuária do território e, com maior apoio, para o acesso à água e de tecnologias de manejo das caatingas, poderiam aumentar em muito a produção agropecuária e o comércio.

236

Page 237: Alto Sertão - SE

Na zona da bacia leiteira, a reforma agrária é mais recente e é um dos focos de pressão por terra hoje; o outro é a área de Santa Brígida. Nessa zona, a concentração de terra é menor, pois as grandes propriedades são mais escassas, havendo, por outro lado, um grande numero de pequenos produtores cujas potencialidades econômicas são limitadas pela insuficiência de terras e, por outro lado, a concentração da atividade leiteira, que parece se avizinhar, eliminara ou marginalizará parcela dos minifundistas.

A composição – leite, autoconsumo, pequenos animais e extração vegetal - sofre variações que vai desde a ausência da produção agrícola até a ausência da produção animal (gado bovino e pequenos animais). Na parte de pequenos animais, destaca-se, primeiramente, a criação de ovinos, seguida, em ordem decrescente de importância, as aves, os suínos e os caprinos. Fazendo-se um levantamento e análise conjunta (cruzamento dos dados obtidos nos diagnósticos) dos fatores tipologias de produção e de renda, foi possível concluir que, de maneira geral, quanto mais diversificado for o sistema de produção (“mix” de culturas e animais de médio e grande porte), maior a renda obtida pelos assentados. Ressalta-se que a renda proveniente dos sistemas agropecuários não representa apenas a venda dos produtos, mas também o autoconsumo familiar e produtivo, bem como a reserva de capital, especificamente os efetivos pecuários.

Outro fator de extrema relevância e que se destaca é que a maior parte da renda dos assentados é proveniente de auxílios governamentais (bolsas, aposentadorias), de prestação de serviços na forma de diárias fora do assentamento e da ajuda de parentes. Alguns produtores, não muitos, se destacaram por apresentar a maior parte da renda oriunda da agropecuária.

De toda sorte, a pecuária leiteira é o principal elemento que responde pela renda dos assentados durante o ano, mas também é o principal responsável pelo tencionamento de suas vidas durante o período da seca. Esta situação obriga o assentado a vender o seu gado ou a buscar água para alimentá-lo. Era o que acontecia quando a soja esteve com o seu preço baixo e era possível adquiri-la, juntamente com a água, para alimentar o gado. Observou-se que o sucesso desses assentados está ligado à sua origem, ou seja, eram pequenos agricultores daquela região que já tinham experiência de produção e comercialização dos produtos.

Quadro 18Agrupamento dos assentamentos nas zonas agrícolas e sub-bacias do território

Zona 1. Ribeirinha do São FranciscoSub-bacia: Rio das Onças, Rio Capivara, Rio GararuMunicípios: De Canindé a GararuAssentamentos: Monte Santo, Monte Santo I, Cajueiro, José Unaldo de Oliveira

Potencialidades Limitações

237

Page 238: Alto Sertão - SE

• Expansão da criação de animais de médio porte, como: ovinos, caprinos para a produção de carne;

• Proximidade a outros assentamentos, podendo assim se unir para atividades agrícolas, econômicas, comerciais, etc.;

• Proximidade com o canal de irrigação em fase de construção, o que possibilitará um futuro programa de irrigação (Monte Santo e Monte Santo I)

• Presença Usina de beneficiamento de leite bovino, localizada no P.A. Barra da Onça (Monte Santo e Monte Santo I);

• Área de fácil acesso e em boas condições, facilitando assim, o escoamento da produção.

• Mercado consumidor próximo e diversificado;• Clima propício para a criação de caprinos e

ovinos;• Solos com fertilidade natural, com elevadas

taxas de potássio;• Proximidade ao rio São Francisco;• Boa insolação média mensal;• Vegetação nativa com aproveitamento na

alimentação animal;• Oferta de matéria-prima pela vegetação nativa

(mel, plantas medicinais e frutos);• Busca por fontes de renda alternativas na

agropecuária;• Patrimônios produtivos satisfatórios,

considerando-se a aquisição de diversos implementos agrícolas individuais.

• Experiência de trabalho dos assentados;

• Inexistência de energia elétrica;• Falta de infra-estrutura básica;• Baixos índices pluviométricos da região;• Áreas com alta pedregosidade;• Pouca disponibilidade de água;• Curto tempo e má distribuição das chuvas;• Solos rasos e propensos à erosão;• Faixas de solos com drenagem moderada a

imperfeita;• Solos com consistência dura a extremamente dura

quando secos;• Lençol freático profundo;• Caça predatória e indiscriminada;• Falta de capacitação na área de comercialização;• A agricultura não é associada ao beneficiamento da

produção;• Manejo indiscriminado dos solos e conseqüente

degradação ambiental;• Dificuldade de escalonamento da produção;• Falta de capacitação técnica;• Falta de tecnologias específicas aos sistemas de

criação;• Renda média anual estagnada e insuficiente para a

sobrevivência dos produtores;• Fauna em processo de extinção no local devido a

caça;• Inexistência de um sistema de transporte eficiente

(tanto externo, como interno).•

238

Page 239: Alto Sertão - SE

Zona 2. Sequeiro DegradadoSub-bacia: Rio Curituba, Rio JacaréMunicípios: Poço Redondo, Canindé do São Francisco, GararuAssentamentos: Queimada Grande, Novo Mulungu, São José de Nazaré, Cuiabá, Maria Bonita I, Caldeirão, Novo Paraíso, Boa Esperança, João Pedro Teixeira, Modelo, Florestan Fernandes, Mandacaru, Nova Vida, Santa Maria, Santa Rita, Maria vitória

Potencialidades Limitações• Boas condições das vias de acesso;• Mercado consumidor próximo e diversificado;• Proximidade a vários assentamentos;• Clima propício para a criação de caprinos e

ovinos;• Solos com fertilidade natural, com elevadas

taxas de potássio;• Boa insolação média mensal;• Fauna diversificada;• Vegetação nativa com aproveitamento na

alimentação animal;• Mão-de-Obra disponível;• Acompanhamento da Equipe Técnica na área;• Experiência de trabalho dos assentados;• Produção de insumos naturais;• Oferta de matéria-prima pela vegetação nativa

(mel, plantas medicinais e frutos);• Boa infra-estrutura;• Busca por fontes de renda alternativas na

agropecuária;• Sistemas agropecuários diversificados;• Patrimônios produtivos satisfatórios,

considerando-se a aquisição de diversos implementos agrícolas individuais;

• Rusticidade das espécies existentes;• Várias linhas de créditos;• Crédito Custeio anual;

• Má distribuição das chuvas;• Taxa elevada de evaporação;• Solos rasos e propensos à erosão;• Faixas de solos com drenagem moderada a

imperfeita;• Solos com consistência dura a extremamente dura

quando secos;• Áreas com elevada pedregosidade;• Lençol freático profundo;• Pouca tomada d’água;• Manejo indiscriminado dos solos e conseqüente

degradação ambiental;• Água salobra;• Riachos temporários;• Exploração indiscriminada da flora;• Caça predatória e indiscriminada;• Falta de capacitação na área de comercialização;• Dificuldade de escalonamento da produção;• Falta de capacitação técnica;• Falta de tecnologias específicas aos sistemas de

criação;• Produção insatisfatória e conseqüente inexistência

do beneficiamento da mesma;• Processo de comercialização deficiente, ocorrendo

basicamente em feiras livres;• Renda média anual estagnada e insuficiente para a

sobrevivência dos produtores;• Venda de mão de obra para complementar a renda

familiar;

239

Page 240: Alto Sertão - SE

• Irregularidade na distribuição anual da força de trabalho;

• Culturas implementadas sem referencia de pesquisa de mercado.

• Pouca área explorada;• Irregularidade e atraso no repasse dos

financiamentos;• Falta de planejamento no tocante aos investimentos

coletivos e globais a médio e longo prazo;• Desconhecimento sobre o funcionamento das

operações de financiamento;• Uso de técnicas artesanais arcaicas nos cultivos

implementados;• Falta de recursos coletivos para viabilizar

equipamentos e estrutura;• Falta de transporte (Externo e interno);• Ausência de água encanada (alguns

assentamentos);• Ausência de energia elétrica (alguns

assentamentos);• Acesso ruim ao assentamento (alguns

assentamentos);

Zona 3. Bacia LeiteiraSub-bacia: Rio Capivara, Rio Campos NovosMunicípios: Monte Alegre, N.S. da Glória, Porto da Folha, GararuAssentamentos: União dos Conselheiros, São Raimundo, N.S. da Glória, N.S. da Boa Hora, João do Vale, Paulo Freire, Arrastador, Cachoeirinha

Potencialidades Limitações• Boas condições das vias de acesso;• Mercado consumidor próximo e diversificado;• Proximidade a vários assentamentos;• Clima propício para a criação de caprinos e

ovinos;• Solos com fertilidade natural, com elevadas

taxas de potássio;• Proximidade ao rio São Francisco (alguns

• Má distribuição das chuvas e por curto tempo;• Taxa elevada de evaporação;• Solos rasos e propensos à erosão;• Alguns apresentam solos em boas condições,

permitindo a mecanização;• Faixas de solos com drenagem moderada a

imperfeita;• Solos com consistência dura a extremamente dura

240

Page 241: Alto Sertão - SE

assentamentos);• Boa insolação média mensal;• Fauna diversificada;• Vegetação nativa com aproveitamento na

alimentação animal;• Mão-de-Obra disponível;• Acompanhamento da Equipe Técnica na área;• Experiência de trabalho dos assentados;• Oferta de matéria-prima pela vegetação nativa

(mel, plantas medicinais e frutos);• Busca por fontes de renda alternativas na

agropecuária;• Patrimônios produtivos satisfatórios,

considerando-se a aquisição de diversos implementos agrícolas individuais;

quando secos;• Manejo indiscriminado dos solos e conseqüente

degradação ambiental;• Lençol freático profundo;• Pouca disponibilidade de recursos hídricos (alguns

assentamentos);• Caça predatória e indiscriminada;• Falta de capacitação na área de comercialização;• A agricultura não é associada à agregação de valor;• Dificuldade de escalonamento da produção;• Falta de capacitação técnica;• Falta de tecnologias específicas aos sistemas de

criação;• Produção insatisfatória e conseqüente inexistência

do beneficiamento da mesma;• Renda média anual estagnada e insuficiente para a

sobrevivência dos produtores.

Zona 4. Perímetro IrrigadoSub-bacia: Rio da OnçaMunicípios: Canindé do São FranciscoAssentamentos: Não contempla assentamento (Projeto Califórnia)

V.4. Sugestões e Propostas para os Assentamentos do Alto Sertão

Fazer proposições para o desenvolvimento da agropecuária e economia do território requer, antes de tudo, ter por pressupostos os limites a sustentabilidade da agricultura no semi-árido, já analisados e apontados por diversos autores. O primeiro diz respeito à pressão demográfica, que, como foi apontado, atingiu, em 2000, a 25 hab/km2, valor superior aos 20 hab/km2, que, segundo o trabalho pioneiro do GTDN, seria já bastante elevada, tendo em vista as condições edafo-climáticas da região e o fato de sua economia ser de base agropecuária. O outro limite diz respeito ao tamanho mínimo para o desenvolvimento da pecuária no semi-árido, ou melhor, de um sistema criação animal com manejo de caatinga, que, segundo estudo da EMBRAPA, requereria área próxima a 100 ha. Por ultimo, a tão propalada solução via a agricultura irrigada, tem seus limites tanto na oferta de água como de solos aptos à irrigação, restringindo-se, segundo estimativas otimistas, a 18% do semi-árido. Isso, sem esquecer de que nessas áreas, tendo em vista sua base geológica, as ações no armazenamento de água, por meio de açudes, pequenas barragens e barragens subterrâneas, poços requer estudos e planejamento, tendo em conta o risco da água tornar-se salobra.

241

Page 242: Alto Sertão - SE

Nessa direção, vale citar Leite et all, que aponta outros aspectos e problema ao desenvolvimento do semi-árido, quando afirma que “pensar um novo modelo de desenvolvimento para o Nordeste, especialmente o semi-árido, é um enorme desafio. A caatinga sofre um grave processo de degradação ambiental, além do problema fundiário, com minifúndios figurando lado a lado de latifúndios. A instabilidade da produção é enorme: a cada 10 anos, têm-se apenas 2 ou 3 com boas safras. Um sistema que busque a convivência do homem com o semi-árido deve envolver um conjunto de aspectos e não pode ser pensado em termos de uma única estratégia, nem de uma única cultura comercial, ou de algumas políticas compensatórias. Aspectos que precisam ser levados em conta: uso da água (gerenciamento dos recursos hídricos), manejo adequado do solo, evitando degradação e salinização. A predominância de terrenos cristalinos e rasos, com drenagem insuficiente é outro limitante, e a manutenção da vegetação nativa é aspecto importante”.

V.4.1. Impacto das ações governamentais nos assentamentos e no território

Acredito que tenhamos conseguido mostrar que o território ainda que não possa ser considerado como área reformada, pois, de um lado, não existem atualmente ações governamentais que possam vir a instituir uma política para zonas reformadas, onde a alteração do quadro fundiário mostra-se fundamental para a diminuir a pobreza, aumentar a ocupação e desenvolver a agricultura. Não há, como temos dito, concertação das políticas públicas de modo especifico para áreas como alta concentração de assentamentos e de pequenos produtores. De outro, as políticas de regularização e de reordenamento fundiário, que são, no primeiro caso, pouco efetivas e coordenadas, isso, em grande medida, pelo fato de caber aos estados papel de destaque na regularização e arrecadação de terras. E, como se sabe, a força dos proprietários de terras, ou melhor, de grileiros é bastante pronunciada junto à administração pública e à justiça, conforme vai diminuindo o nível de poder.

Já o reordenamento fundiário tem um papel complementar e, em nosso ver, contrário a Reforma Agrária, pois o credito fundiário deve se dirigir aos minifundistas e parceleiros de determinadas zonas onde a aquisição de médias propriedades permite o crescimento produtivo desses agricultores que contam hoje com áreas insuficientes a uma renda mínima.

E como apontamos na discussão das Políticas Públicas, os esforços atuais e recentes em políticas regionais e agrárias – que contam com interfaces regionais bastante pronunciadas – não tem alcançado autonomia e poder discricionário suficiente para alavancarem experiências de desenvolvimento regional, imprimindo-lhe características e dinamismos próprios. O que se tem é a ampliação da oferta de bens e serviços públicos, ainda que com baixa qualidade em grande parte dos casos, decorrente, em parte, das pressões dos movimentos sociais e das populações rurais. Aí estamos considerando a educação publica, a saúde e os serviços de assistência técnica e capacitação profissional. Soma-se a essas políticas as de implantação dos projetos de assentamentos e de crédito a sua produção, as de apoio e financiamento da agricultura familiar e as de transferência de renda e combate a pobreza, que apresentam públicos bem definidos. A previdência social e, em segundo plano, as ações de assistência desenvolvidas no âmbito do Ministério da Previdência são de grande envergadura na região, rivalizando com a folha salarial das

242

Page 243: Alto Sertão - SE

prefeituras, somando mais de 35 milhões, em 2004. Essas duas rubricas - Previdência e Assistência Social e Folha Salariais – somam 75 milhões, frente ao um PIB total em torno de R$ 250 milhões, quando se retira o secundário de Canindé de São Francisco, objetivamente, a Usina Hidroelétrica de Xingó.

Em termos orçamentários, o Garantia Safra se sobressai com um desembolso de 4 milhões de reais, em 2004. É uma das ações do Pronaf, se constituindo do repasse de recursos - até R$ 700,00 - aos agricultores que tiveram perdas devido a seca, com o objetivo de cobrir aos potenciais ganhos da safra. Faz parte dos instrumentos do Programa Conviver, que é um programa de convivência com a seca, voltado para o semi-árido, sendo executado pelo MDA, inclusive por fazer parte dele, também, o Pronaf Semi-Árido. Pode-se considerar que todas essas iniciativas, dirigidas aos agricultores nordestinos e, mais especificamente, do semi-árido, como o Garantia Safra e o Pronaf Semi-Árido do Programa CONVIVER e o Pronaf B e A, do MDA, quando dirigidos aos assentados e pequenos agricultores localizados nessa região, são financiados pelo FNE e, portanto, geridos pelo Ministério da Integração. São créditos e programas de garantia de renda ligados aos resultados da atividade agrícola que, normatizados pelo Banco Central e executados pelo MDA, tem seu desempenho balizado pelo ajuste fiscal desses seis, sete últimos anos.

Essas ações tiveram um bom desempenho na área intimamente ligado a força dos MST e dos pequenos produtores, organizados em associações e federações, bem como aos sindicatos locais. Não resta duvida que os programas mais recentes e específicos - Garantia Safra e Semi-Árido - e os mais antigos do Pronaf – A para assentados, B e C para agricultores familiares muito pobres e pequenos – tiveram desempenhos bastante positivos, o que, junto com a ampliação da previdência social e dos programas assistenciais previdenciários e focalizados, amplia as possibilidades de desenvolvimento do território. Possibilidades que não tendo sido aproveitadas, pois, de um lado, os agricultores de baixa renda em regiões com limites ambientais não se enquadram no formato convencional de crédito rural, tendo em vista sua baixa capacidade de pagamento e as dificuldades tecno-produtivas que atravessa.

Hoje o nível de inadimplência não é expressivo, mas os agricultores familiares e assentados encontram-se sem capacidade de pagamento para novos financiamentos de investimento. E, há que reafirmar, que é costumeiro o atraso na liberação dos recursos, que, em regiões com escassez de chuvas, pode significar a perda da safra, por não ter sido feito o plantio no momento mais adequado.

O outro motivo para que as possibilidades abertas pelo maior afluxo de recursos para as populações marginalizadas do segmento agrário, no caso no território do Alto Sertão Sergipano, é resultado da baixa eficácia e eficiência da oferta de bens públicos, especialmente os ligados a geração e difusão de tecnologias e a educação e capacitação da população. O quadro funcional das Prefeituras é de baixa qualificação, a Deagro e o Incra tem seu quadro funcional bastante reduzido, a Embrapa conta com poucos recursos e os Bancos não mostram interesse em ampliar os quadros técnicos ligados ao Pronaf e Reforma Agrária.

243

Page 244: Alto Sertão - SE

Já as políticas de desenvolvimento regional que contam com ações na região pelos programas das da Secretaria de Desenvolvimento Territorial do MDA e os da Secretaria de Programas Regionais e da Secretaria de Infra-estrutura Hídrica do Ministério da Integração. No caso da SDT temos no território o Pronaf-Infraestrutura e as alterações em sua gestão e o Projeto Dom Helder Câmara. A instituição de instancias territoriais de decisão do Pronaf-Infraestrutura e da contratação de consultores e técnicos para desenvolver e incentivar essas instancias e, também, de buscar sinergia das ações públicas. Ainda que a experiência do colegiado no Território valide o formato da ação da SDT, sabe-se que esse é um caso ímpar, dado o elevado grau de organização e cooperação dos movimentos sociais e sindical. Agora, a SDT não consegue alterar o quadro de ação publica em potenciais territórios reformados, pois não conta com recursos e nem poderes discricionários sobre qualquer política, sustentando-se na motivação dos atores, o que parece apontar para a insuficiência de instrumentos. Assim, o Pronaf-Infraestrutura que movimenta anualmente cerca de R$ 1 milhão de reais, frente aos R$ 21 milhões do Pronaf, sem considerar os R$ 4 milhões do Garantia Safra, e aos R$ 8 milhões do PCPR (Projeto Santa Maria do Pronese).

Assim, a incapacidade dos instrumentos de credito alterarem o quadro econômico da produção primaria regional esta ligado ao seu formato, incongruente com o publico, e a fragilidades das políticas de pesquisa, difusão e assistência técnica e as educacionais no território. Fragilidade que anda lado a lado com a política de terceirização e descentralização das ações publicas na oferta de serviços técnicos e educacionais, que, ao mesmo tempo, permite uma maior ingerência dos movimentos sociais e sindical no tipo de oferta desses serviços. Agora, isso de fato não ocorre, pois a nova assistência técnica se sustenta sobre os preceitos tecno-produtivos da revolução verde, que já estão internalizados nas normas legais e bancárias e na cultura técnica e, até mesmo, no saber dos agricultores.

Importa, resumir que, de um lado, os assentados possuem vantagens, entre as quais, o tamanho dos seus lotes de produção – superior, em média, aos 17 ha dos agricultores pronafianos -, as boas condições da via de acesso, a proximidade de outros assentamentos, a fertilidade natural do solo, a mão-de-obra disponível e a existência de vegetação nativa como suporte para a alimentação animal e para o desenvolvimento de atividades alternativas.

V.4.2. Proposições para a produção agropecuária nos assentamentos;

É interessante analisar o trabalho da EMATER-SE, de 1983, onde é apresentada uma proposta para a implementação de sistemas de produção em pequenas propriedades, com e sem a disponibilidade de recursos hídricos. Da discussão dessa proposta podemos apontar alguns caminhos para o crescimento da produção agropecuária dos assentados e pequenos agricultores do território, pois tal proposta tem um enfoque sistêmico, ao analisar a totalidade dos sistemas de exploração, considerando a área total da propriedade, seus recursos humanos e naturais disponíveis e a interação com alguns fatores externos à propriedade, de forma a interagir todo o processo produtivo, e proporcionar a melhor alternativa econômica da exploração.

244

Page 245: Alto Sertão - SE

De acordo com esse trabalho, foram propostas as seguintes sistematizações das áreas, levando-se em consideração a disponibilidade dos recursos hídricos e o tamanho da propriedade:

245

Page 246: Alto Sertão - SE

Quadro 19Sistemas de exploração propostos para áreas de 10 hectares, variando com a disponibilidade de recursos hídricos na propriedade.

Utilização da área

Recursos HídricosDisponível Escasso Ausente

% área atividade % área atividade % área atividade

Agricultura irrigada 20%

Consórcio milho x feijão; hortaliças e fruteiras

15 a 25%

A depender das condições topográficas, nos períodos de chuvas, sugere-se milho x feijão, e/ou guandu

- -

Agricultura de

sequeiro20%

Milho ou sorgo x feijão de corda e/ou algodão herbáceo; e/ou mandioca x feijão; e/ou milho x feijão

25%

Milho ou sorgo x feijão de corda ou algodão herbáceo; e/ou mandioca x feijão; e/ou milho x feijão; e/ou milho x feijão x algodão herbáceo

30%

Sorgo x feijão de corda; ou mandioca x feijão; ou milho x algodão herbáceo; ou milho x feijão; ou milho x feijão x algodão

Produção animal

50% (bovinos e/ou ovinos

e/ou caprinos e animais de tração (média

de 1,0 U.A/ha/ano)

20% - sorgo x algaroba x palma forrageira;20% - capim buffel (ou outra adaptada) x algaroba;5% - capim elefante ou careron irrigado;5% - leucena e/ou guandu

45%(bovinos e/ou ovinos e/ou caprinos e animais de

tração (média de 0,7

U.A/ha/ano)

20% - sorgo x algaroba x palma forrageira; 20% - capim buffel (ou outra adaptada) x algaroba;5% - leucena ou guandu suplementação protéica

60% (ovinos e/ou caprinos e animais de tração (média

de 0,7 U.A/ha/ano)

20% - sorgo x algaroba x palma forrageira;35% - capim buffel (ou outra adaptada) x algaroba;5% - leucena e/ou guandu para pastoreio como suplementação protéica

Vegetação 5% Plantio e 5% Plantio e 5% Plantio e

246

Page 247: Alto Sertão - SE

nativapreservação de espécies nativas e/ou exóticas

preservação de espécies nativas e/ou exóticas

preservação de espécies nativas e/ou exóticas

Sem exploração 5% Benfeitorias 5% Benfeitorias 5% Benfeitorias

Nota-se dois aspectos interessantes desse estudo, um positivo e um negativo à proposta. Comecemos pela má notícia: 5% de vegetação nativa é muito pouca área. Acreditamos que a área de caatinga tenha de ser maior, e o que propomos é que os assentados e pequenos agricultores sejam remunerados pela caatinga preservada e, apoiados, para que com o seu manejo possam retirar renda e passar a amortizar os empréstimos. Manejada no sentido de atender atividades como a apicultura, o extrativismo, a caça e o pastoreio, ou seja, sistemas agro-florestais-pastoris, elaborados pela pesquisa, difusão, extensão e assistência técnica e sustentados por transferências diretas de renda e empréstimos pelo Pronaf Florestal. A capacitação da assistência técnica, a mobilização da pesquisa e dos órgãos e instituições públicas nessa política é fator decisivo no sucesso dessa iniciativa. Cabe adiantar que os Bancos Públicos que emprestam Pronaf e repassam recursos de programas de transferência de renda, entre os quais o Garantia Safra, devem investir nesse programa com aporte de recursos para assistência técnica, elaboração de projetos e pesquisas. Hoje há na Embrapa iniciativas nessa direção, havendo muito a crescer nos estudos de sistemas ecológicos de produção leiteira no Semi-Árido Sergipano.

Mas já que falamos de pecuária leiteira, notamos que a área piloto da proposta da Embrapa para a produção leiteira – chamado modelo ecológico de produção leiteira – é de 35 hectares, com vistas a gerar um renda mensal da ordem de 2 a 3 salários mínimos. Modelo que, como já se apontou, tem como base a produção de gliricídia e de leucena – banco de proteínas, o cultivo de palma forrageira, o uso de sabiá para cercamento dos campos, práticas de conservação das forragens, o uso de raças zebuínas leiteiras, bem como o cultivo de grãos mais adaptados ao semi-árido – guandu, sorgo e milheto. Verifica-se, portanto, que o tamanho mínimo é relativamente elevado frente ao tamanho do lote concedido para os assentados e quase o dobro da área dos agricultores pronafianos do território. E, ademais, há que se ter presente que a proposta da EMATER para a produção leiteira não é defendida para as áreas de recursos hídricos escassos e ausentes. Isso porque, considerando a suplementação nutreíca na produção animal um claro gargalho que, está presente tão somente na produção animal com bovinos e pequenos animais em áreas com recursos hídricos escassos. Indica, a nosso ver, claramente o limite da produção leiteira em locais com deficiência de recursos hídricos. Ora, mas essa demanda de água não é de tão alto calibre, o que se deseja á água para capineiras. Aqui se observa como é fundamental avaliar toda a demanda de água e seus interligados segmentos: consumo humano, consumo animal e produção, sendo que na produção refere-se, em grande medida, a alimentação do efetivo pecuário. Como buscar que a distribuição de recursos hídricos seja a mais disseminada possível. Pode-se, como defendem alguns, construir sistemas integrados de produção irrigada e de sequeiro, esta ultima ligada a produção animal.

247

Page 248: Alto Sertão - SE

Fazendo-se uma análise global das potencialidades e limitações descritas nos PDA’s e observadas in loco, foi possível perceber as semelhanças existentes entre os diferentes assentamentos, mesmo pertencendo a diferentes municípios. Basicamente, potencialidades como as boas condições da via de acesso, a proximidade de outros assentamentos, a fertilidade natural do solo, a mão-de-obra disponível e a existência de vegetação nativa como suporte para a alimentação animal e para o desenvolvimento de atividades alternativas, foram as mais evidentes observadas nos assentamentos pesquisados. O clima característico do sertão sergipano pode ser considerado, por um lado, como uma potencialidade, pois permite a criação de caprinos e ovinos, adaptados à região. Por outro lado, para a agricultura, apresenta limitações como a baixa pluviosidade e a má distribuição das chuvas, bem como a elevada taxa de evaporação. Isso implica a perda das culturas implantadas ou uma baixa produtividade devido a forte estiagem, percebendo-se nitidamente a necessidade de técnicas alternativas de cultivo. O que se observa, também, é que os produtores dessa região foram capazes de desenvolver “técnicas de sobrevivência”, através da diversificação da produção agropecuária. Aqui, há hoje uma aposta nas variedades superprecoces de milho – ver comunicado -, com a implantação de unidades demonstrativas e, também, de unidades de produção de sementes de milho em assentamentos e em pequenos agricultores. Essas duas iniciativas da Embrapa e o zoneamento do território para as variedades superprecoces e precoces estão a prova, sendo que na atual safra não houveram problemas graves de seca, se sim de “excesso” de chuva.

Os solos dessa região são característicos por apresentar elevada taxa de potássio e fertilidade natural, porém, tratam-se de faixas de solos rasos (70 cm), o que dificulta a mecanização, sendo, portanto, propensos à erosão. Sua drenagem é considerada moderada a imperfeita e possui consistência dura a extremamente dura quando seco.

A vegetação, por ser bastante diversificada, possibilita a existência de espécies medicinais, favorecendo a geração de renda, bem como, a presença de plantas nativas com frutas exóticas e o aproveitamento de algumas espécies para a alimentação animal. Porém, esta sofre com a exploração indiscriminada. O mesmo ocorre com a fauna da região, que também possui uma grande diversidade de espécies, com significativa rusticidade, porém, são também sujeitas à caça indiscriminada.

a. A Importância de uma Agricultura Diversificada

Os levantamentos e as análises realizadas a partir do cruzamento dos dados obtidos nos diagnósticos e das tipologias de produção e renda, permite concluir ou indicar que, de maneira geral, quanto mais diversificado for o sistema de produção (mix de culturas e animais de médio e grande porte), maior a renda obtida pelos assentados. Ressalta-se, entretanto, que a renda proveniente dos sistemas agropecuários não representa apenas a venda dos produtos, mas também o auto-consumo e a reserva de capital, principalmente no caso do efetivo pecuário.

248

Page 249: Alto Sertão - SE

O que se observou em todos os assentamentos, independente do município, é que na proposta produtiva encontram-se os cultivos de milho e feijão, com as outras culturas como abóbora, melancia e mandioca sendo arroladas, porém em menor quantidade e em áreas com melhor disponibilidade de água e melhores condições dos solos. Para o suporte forrageiro, a palma e a algaroba são as forragens mais citadas, bem como a implantação de alguns tipos de capim, particularmente, o buffel.

Independente da zona, sub-bacia ou município em que se encontram, na região do baixo sertão do São Francisco, de maneira geral, os pequenos agricultores e assentados têm na produção de culturas de subsistência, basicamente o milho e o feijão, como uma atividade central. Já, para a pecuária, as propostas dirigem-se, sempre, para criações de animais de pequeno porte como ovinos, suínos, aves (corte e postura) e caprinos. Não obstante a isso, há uma intenção, generalizada, de se inserir na atividade leiteira, utilizando como suporte forrageiro a palma forrageira e o capim buffel e, em segundo plano, a algaroba, o sorgo e outras variedades de capim próprias para o semi-árido. O modelo ecológico de produção leiteira, desenvolvido pela Embrapa, na Estação da Mesinha, em Nossa Senhora da Glória, agrega o banco de proteínas de gliricídia e de leucena e o uso de sabiá para cercamento dos campos. O objetivo de tornar-se um produtor de leite na região esta ligado, de um lado, na freqüência nos recebimentos e nas atividades complementares como a suinocultura e a criação de animais e, para seu desenvolvimento aos pequenos produtores do território, é fundamental aumentar ainda mais a diversidade produtiva, particularmente os cultivos ligados ao suporte forrageiro. Assim, é ainda reduzida a diversificação para suporte forrageiro da pecuária leiteira, sendo muito reduzidas as áreas destinadas a milheto, guandu, sorgo e bancos de proteínas e, comuns, por outro lado, o uso de rações e a compra de água.

Nos PDAs é possível analisar de maneira mais apurada as potencialidades tecnoprodutivas dos assentados, pois neles são detalhadas as propostas produtivas, o que indica o grau de conhecimento das tecnologias e das alternativas produtivas. Nessa direção o que o que se sobressai dos PDAs é a diversificação produtiva como o melhor caminha para a geração de renda. Milho, feijão, palma, buffel, vacas e ovinos são comuns em todos os Planos, mas aí, também, se encontram, como já se disse, outros cultivos alimentares e forrageiros, outros capins, a consorciação de culturas, os bancos de proteínas e outras criações animais – caprinos, suínos e aves.

É claro, também, da analise das propostas produtivas dos PDAs, o peso das tradições e costumes nas escolhas produtivas dos assentados, o que não significa dizer que outros tipos de sistemas, que incluem a implantação de novas culturas e criações adaptadas a essa região, não possam ser sugeridas pela equipe técnica ou pelos elaboradores dos planos. Aqui se defende o fortalcimento das estratégias de sobrevivência dos pequenos agricultores e assentados, buscando a pesquisa, difusão e assistência técnica potencializa-las pela agregação de valor – leite, mel, carnes, couros, farinhas e rações.

Rockenbach cita que a melhor da eficiência dos sistemas diversificados de produção deve ser tentada via rearranjo dos componentes internos e não via aumento das entradas artificiais. Isto implica em esgotar todas as possibilidades de ganhos internos para depois tentar a complementação dos fatores limitantes da produção através do abastecimento de fontes externas. Citamos, dentre os aspectos fundamentais para a viabilização dos

249

Page 250: Alto Sertão - SE

sistemas diversificados de produção enumerados pelo autor, os seguintes: uso mais eficiente da biomassa de plantas tanto da parte comestível como dos restos de culturas; consorciação, associação e sucessão racional de culturas anuais e perenes; fixação biológica de nitrogênio através de leguminosas; associação racional entre plantas e animais; melhorar a fertilidade do solo através da conservação, fertilização e manejo integrado solo/planta; uso de máquinas adequadas ao tipo e tamanho da exploração; conservação de alimentos através de sua industrialização caseira; seleção de linhas de exploração compatíveis em termos de quantidade, complexidade e exigências quanto aos fatores de produção; atentar para aspectos referentes à estabilidade da produção biológica das espécies cultivadas; reduzir ao mínimo as entradas artificiais ao sistema; uso mais intensivo dos fatores de produção disponíveis. Dentro desses parâmetros, um sistema diversificado de produção teria como resultado uma produção também diversificada, o que lhe confere características de estabilidade. A possibilidade de aproveitamento das vantagens das interações positivas, que se estabelecem entre componentes, garante a melhor eficiência do sistema. Assim sendo, os produtos resultantes da aplicação de uma tecnologia moderna integrada e adaptada aos sistemas diversificados de produção deverão ter seus custos sempre competitivos com os custos de produção resultantes da aplicação das tecnologias de alto uso de insumos energéticos.

Quando se analisam as propostas de Pronaf-A se nota uma relativa padronização, com oitos itens resumindo, grosso modo, o total dos empréstimos: aquisição de vacas e de ovinos (1 e 2), os cultivos de milho e palma (3 e 4), a implantação de capim buffel (5), a construção de cilo e de tanque de água (6 e 7) e o cercamento (8). Isso se deve, de um lado, as regras e formatos dos empréstimos bancários, que, reduzem, grosseiramente, essa agricultura diversificada de baixa renda em um empreendimento agrícola, dificultando o “gerenciamento” do pequeno agricultor. Os empecilhos a consorciação de culturas – milho e feijão, por exemplo – e a restrição ao financiamento de custeio a uma cesta reduzida de cultivos é ilustrativo disso, bem como a descrença na possibilidade dos assentados e pequenos produtores tornarem-se produtores de leite. Não é considerado aquilo que se tem de mais importante no pequeno produtor que é ser policultor, ter na produção para autoconsumo uma atividade central e utilizar os efetivos pecuários como reserva monetária, ou seja, construir uma estratégia de sobrevivência ligada a diversificação produtiva e, também, a fontes de renda externas ao estabelecimento, pois nela se inserem o assalariamento e o trabalho não agrícola. Pode-se, ademais, considerar que a ampliação dos benefícios previdenciários aos agricultores de economia familiar e o desenvolvimento de políticas assistenciais focalizadas vem reforçando as escolhas produtivas dos pequenos agricultores e assentandos ao dirigirem-se, por vezes, ao custeio da atividade agropecuária.

Uma proposta que pouco foi citada nos planos – PDAs -foi o desenvolvimento da agricultura orgânica nos assentamentos, pois se observa que, pela própria falta de recursos para a compra de adubos e agrotóxicos, os assentados já produzem (de maneira geral) organicamente. Aliado a isso, a própria filosofia de produção que inclui, dentre outras coisas, o uso da mão-de-obra familiar na produção é fato indiscutível nos assentamentos. Ou seja, pouco resta a fazer para a total conversão da produção para a forma orgânica. Quanto à certificação dos produtos, pode-se criar um selo próprio do MST, com o aval das certificadoras cadastradas (Instituto Demeter, IBD), possibilitando a capacitação de técnicos para a verificação e acompanhamento da produção.

250

Page 251: Alto Sertão - SE

Ainda quanto à produção agrícola, deve ser pensada uma forma de aproveitamento e agregação de valor ás fruteiras nativas da região, como o umbú, o figo da índia (fruto da palma), não apenas comercializando-as de forma in natura, mas através do outros produtos que podem ser desenvolvidos através da implantação de agroindústrias, como o vinho de umbu, os doces, passas etc, agregando valor ao produto, eliminando o atravessador e gerando tecnologia nos assentamentos.

b. A questão hídrica: água para todos

Vale antes de apontarmos sugestões e propostas para a questão hídrica, sintetizarmos o perfil produtivo do setor primário no território, com o objetivo de apreender as demandas por água dos diferentes agricultores e cotejarmos com os investimentos e ações hídricas que vendo realizadas e/ou propostas.

Como se viu, médios proprietários desenvolvem a pecuária de leite, com os maiores associando ao leite a pecuária de corte Os limites mínimos apontados para a pecuária mista de 100 ha e o utilizado no desenvolvimento do modelo ecológico de produção leiteira da Embrapa em 35 ha, mostram como há problemas de escala, ou melhor, tamanho nos pequenos agricultores. Agora, esses pequenos, que tem no feijão e no milho fundamental fonte de renda, e os assentados, desejam e criar gado leiteiro junto a algumas ovelhas, galinhas e porcos. Querem ser produtores de leite. O que falta: terra e água? Que limitam a alimentação dos animais! Essa demanda por agua dos pequenos produtores, que se articula com a ampliação das pequenas propriedades, é bastante inferior ao que se propõe nos perímetros irrigados, com as pequenas barragens e açudes apresentando expressivas dificuldades, dado os riscos de salinização e a alta evapotranspiração. Já para o consumo humano, as adutoras, em primeiro plano, e as cisternas contam com dificuldades, devido, de um lado, a baixa captação de água e de outro a insuficiência das cisternas para atender o consumo familiar e animal. Essas se tornam, cada vez mais, reservatórios de água, grande parte, fornecida por carros pipas, sejam pagos sejam distribuídos pelo poder público.

E a demanda por água dos médios e grandes pecuaristas foi sendo relativamente atendida, com a construção de açudes e pequenas barragens através de investimentos públicos diretos ou a concessão de financiamentos rurais. A presença dos reservatórios de Xingó e de Paulo Afonso-Itaparica alteraram profundamente as demandas por água e, algumas das intervenções no território dirigem-se a constituição de projetos (perímetros) de irrigação de pequenos e médios produtores, no Califórnia, de empresários no Jacaré-Curituba, que foi abortado, e de um mix empresários e reforma agrária, com a primeira de responsabilidade do estado e a segunda do governo federal através do Incra. Há candente uma luta pelo formato desse mix seja em participação na área, seja pelos modelos produtivos a serem desenvolvidos. A integração produtiva entre a agricultura de sequeiro e a irrigada passa a margem das preocupações do programa de desenvolvimento sustentável, cujo desenho ao que parece aprofundará os processos de eliminação e diferenciação dos pequenos agricultores e assentados, ao ter por modelo a especialização produtiva das áreas irrigadas, preferencialmente em culturas permanentes, na fruticultura. Isso porque o custo da água requer atividades de alto valor agregado, que no caso das frutas está associado às especificidades ambientais e à qualidade dos frutos aí produzidos. O mercado de frutas tropicais é

251

Page 252: Alto Sertão - SE

considerado bastante promissor, tendo em conta os potenciais mercados que podem ser conquistados e a potencialidade que o país possui para essa atividade.

Agora a que ter presente que as áreas irrigadas no semi-árido representam 20% do total, dada a qualidade dos solos e/ou a disponibilidade d’água. Pode-se pensar para integração do sequeiro com o irrigado na associação entre pecuária mista – leite, carne e pequenos animais – e as áreas irrigadas como fornecedora de alimentação animal. Agora, o potencial de irrigação se amplia consideravelmente se passamos a considerar a “irrigação” para forragens e capins, pois essas capineiras podem ser implantadas com fornecimento de quantidades bem menores de água em terras de bem pior qualidade. Com essa água, as pequenas e médias produções teriam abertas reais possibilidades de se desenvolver um sistema de produção diversificado com pecuária de leite e de corte, criação de pequenos animais e amplo leque de cultivos temporários para a alimentação animal, o autoconsumo e a venda.

E o projeto Califórnia mostra o quão são difíceis entrar nos canais de comercialização e distribuição de frutas e olerícolas no país e, mais especificamente, no semi-árido. A ausência de capitais comerciais de maior envergadura nos segmentos do processamento e, principalmente, na distribuição impede que os projetos de irrigação ampliem seus rendimentos, com efeitos para o crescimento da renda territorial, continuando subordinado ao capital comercial e mercantil tradicional.

Há que se construir, ou melhor, implementar um modelo de abastecimento de água que tenha a mais ampla cobertura, possibilitando o mais amplo acesso seja para a demanda domiciliar seja para uso produtivo. Há que considerar que é pouco exeqüível discriminar o consumo humano e o produtivo, especialmente, o voltado as criações, pois a agricultura familiar se caracteriza, inclusive, por não distinguir a unidade familiar da unidade produtiva; ocorre de se implantar soluções para o consumo humano que se mostram ineficazes, pois parcela da água disponibilzada passa a ser empregada para o consumo animal e o uso nas lavouras. Isso vêm ocorrendo com as cisternas que não se destinam ao consumo domiciliar, mas sim aos animais, que, ademais, respondem pelo maior consumo. Cisternas de 15 a 20 mil m3 que são suficiente para o consumo de uma familiar por 3 a 4 meses, se esgotam em 1 mês ao se compartilhar a água com os animais. Ampliar o tamanho das cisternas pode ser um dos caminhos para atender ao consumo humano e parcela do produtivo, cabendo, no entanto, ter presente que as possibilidades de captação são restritas, ou seja, muitas vezes não é possível preencher as cisternas, mesmo as restritas a demanda humana. Assim a construção de adutoras e de sistemas de distribuição é, efetivamente, a solução para o problema da escassez de água para o consumo domiciliar.

Quanto às soluções alternativas ou, em outros termos, de pequena envergadura para o consumo produtivo, mesmo o de baixa demanda, tais como pequenos açudes, barragens subterrâneas, poços e tanques contam com grandes restrições dado alto risco de salinização das águas, bem

252

Page 253: Alto Sertão - SE

como da insuficiência de precipitação. Deve-se, portanto, concentrar os esforços nos grandes reservatórios de água – Xingó, Paulo Afonso e o Rio São Francisco -, como bem apontam as propostas do Canal Xingó e o Plano de Desenvolvimento Sustentável do Semi-Árido76.

E existe a possibilidade de fornecer água para superar as limitações ao desenvolvimento da pecuária mista no território, pois a distribuição de volumes de menor envergadura para áreas menos extensas, ou seja, para 1 a 2 hectares destinados a produção de forragens e de grãos significaria a diminuição do consumo de insumos externos – particularmente de rações. Essa é a proposta que o Canal Xingó defende, sem, todavia, esquecer que se deve em manchas selecionadas e de grande potencial produtivo desenvolver cultivos permanentes com grande demanda por água – frutas e olerícolas.

Tais decisões passam necessariamente pela discussão junto aos assentados e pequenos agricultores de qual é o modelo de produção que traz o melhor retorno (em produção e renda) para cada quantidade de água consumida. Ao se fazer essa discussão, as questões culturais terão de ser discutidas reavaliada, simultaneamente a um forte processo de formação e informação deve ser desenvolvido. Tendo em mente que a agricultura irrigada nos assentamentos de reforma agrária é uma coisa praticamente certa é importante preparar os assentados para tanto, uma vez que a sua tradição cultural e conhecimentos estão todos ligados a agricultura de sequeiro.

Pelas mudanças que a mudança de sistema de produção representa é preciso enfrentar as inúmeras dificuldades que por ventura possam surgir tais como:•obter uma produção diversificada e que tenha inserção no mercado; atualmente a produção de quiabo domina entre 70%-80% da área;•carência de conhecimento sobre as técnicas de produção e dos diferentes sistemas de produção irrigado, a situação de fragilidade que esta prática coloca os solos com riscos de salinização; isto pode dificultar e até impedir a permanência de irrigantes oriundos do sequeiro; •cuidado com os sistemas irrigados pois, uma vez mal manejados, eles poderão propiciar o desenvolvimento de pragas e doenças inviabilizando os cultivos.

É preciso desenvolver um intenso programa de capacitação e profissionalização desses assentados de sorte lhes oferecer as melhores chances de sucesso no desenvolvimento produtivo de seus lotes. Capacitar para a melhoria dos cultivos que atualmente estão em desenvolvimento, como quiabo, goiaba, tomate, banana, coco, acerola, pimentão, alface e daqueles que tem potencial para virem a ser produzidos na região.

Outra proposta que se encontra abandonada é a recuperação das pequenas e medias várzeas do São Francisco, assunto que é recorrente nas entrevistas e que, certamente, teria impactos extremamente positivos para a economia local ao permitir a produção contínua durante o ano.

76 Como bem afirma o documento do Projeto Nova Califórnia, do Governo do Estado, “... a única fonte disponível de águas superficiais de boa qualidade para atender tanto ao abastecimento da população regional como a projetos de irrigação, é o Rio São Francisco, através principalmente, do reservatório da UHE Xingó, localizado logo a montante da cidade de Canindé de São Francisco”

253

Page 254: Alto Sertão - SE

Ademais, diminuiria a pressão para o uso das encostas que destroem as áreas de caatinga e aumentam o assoreamento do rio São Francisco nesta região. A Codevasf tem capacidade técnica e levar adiante os projetos, cabendo sim decidir quais seriam os beneficiários desse programa: os atuais proprietários e/ou a compra das áreas pelo Incra com assentamento de agricultores. De toda sorte, nessas várzeas,s segundo os estudos, desenvolver-se-iam culturas irrigadas como o maracujá, a banana e o arroz, a psicultura e culturas forrageiras e de grãos para alimentação animal.

c. Pecuária de Leite

Os sistemas produtivos mais encontrados nos assentamentos são aqueles que unem pecuária leiteira, com culturas anuais e culturas para a alimentação dos familiares (grãos, mandioca e, olerícolas) dependendo do grau de capitalização ou de acesso aos mercados/comercialização.

A produção leiteira merece destaque pelo seu peso na economia dos assentamentos, por absorver volume significativo de trabalho familiar, por fornecer renda mensal. A região do Alto Sertão tornou-se uma importante bacia leiteira e a melhoria da renda das famílias está necessariamente vinculada com a melhoria da produtividade deste sistema de produção.

A pecuária leiteira teria grandes ganhos em termos dos custos ambientais e de produção se houvesse coincidência entre o período de partos e ordenha com o período do inverno. Ao que parece, o preço não se altera e, portanto, não haveria problemas de perda de rentabilidade. Dessa forma, os esforços para se buscar alimentação e água para não cair a produção leiteira não seriam tão grandes. Outro aspecto positivo é que a pressão que ocorre sobre os pastos e a caatinga no período da seca poderia diminuir permitindo uma melhor recuperação de ambos. Como os preços pagos pelo leite no verão estão próximos aos de inverno o aumento dos custos relativos à busca de água e alimentação para o gado não seria tão grande. Por ter um elevado custo em termos da necessidade de água necessária ao seu desenvolvimento, bem como sobre o esforço que é a busca de alimentos. O gado leiteiro deve ser um gado rústico, que se adapte às condições de alimentação oferecida pela região e às temperaturas vigentes. Também seria importante, discutir com os assentados, sobre a necessidade da restrição do número de cabeças de animais para ordenha. Isto deveria ter como contrapartida animais que produzam uma quantidade maior de leite. Neste caso isto ocorreria por meio da cruza genética com sangue gir ou girolanda.

O Pronaf Infra-estrutura poderia vir a financiar a tecnificação da ordenha e o resfriamento do leite em função dos constrangimentos legais que cada vez se fazem presentes. Cabe sublinhar que a Embrapa desenvolveu, também, pesquisas nessa área, visando diminuir os custos de implantação de ordenha mecânica com sanidade.

d. Sistemas Agro-silvo-pastoris

254

Page 255: Alto Sertão - SE

A visão da revolução verde nos anos 70 sobre os sistemas de produção da pecuária em geral recomendou e financiou a supressão da caatinga para o avanço do cultiva das pastagens. O sistema pecuário anterior, onde predominava o sistema de partos naturais com uma alimentação baseada na vegetação da caatinga, foi substituído por pastos cultivados e pela ampliação das áreas de pastos naturais. Esse crescimento se deu em cima das áreas incultas e sobre as áreas da caatinga.

Desde a ocupação “plena” do território, nos anos 70, assistiu-se a uma diminuição de 70 mil hectares na área de matas – caatinga -, ocorrida, particularmente nos anos 80. Essa diminuição representa cerca de 20% da área dos estabelecimentos agropecuários e significou, primeiramente, o crescimento das lavouras e, posteriormente, das pastagens. Isso porque, em uma primeira fase, foram utilizadas parcelas expressivas dessas áreas para os cultivos de algodão e feijão e para o plantio de pastagens. Com a crise dessas culturas comerciais e o esgotamento das facilidades creditícias e do apoio governamental ao segmento patronal em áreas periféricas do país, essas terras passaram a ser utilizadas como pastagens. Assim, a área de caatinga – matas e terras incultas - que representava, em 1970, cerca de 40% do total da área total, passou, em 1995-96, a responder por tão somente 20% da área ocupada pelos estabelecimentos.

No Sertão, neste sistema, em função da diminuição da área útil da caatinga conseqüência do cercamento e da diminuição do tamanho das propriedades, a substituição dos caprinos pelos ovinos, juntamente com os bovinos, tem sido mais condizente com esta nova situação.

A recuperação da caatinga ou o seu sombreamento em cima das áreas de pastagens permitiria manter a pecuária através dos sistemas silvo-pastoris ao mesmo tempo em que possibilita o uso múltiplo da área permitiria a produção de lenha, frutas, plantas medicinais, além da apicultura. A apicultura pode ser um elemento que apóie o desenvolvimento de um sistema múltiplo de exploração da área consorciada. Em alguns municípios do Alto Sertão ela já está despontando enquanto uma alternativa efetiva.

e. Bolsa Caatinga e Reordenamento e Regularização Fundiárias

A situação fundiária e o quadro demográfico do Alto Sertão Sergipano requerem e condicionam o escopo e formato de uma urgente política de resgate ambiental. Efetivamente, há uma grande massa de minifundistas na área e a população rural vem crescendo a taxas positivas e expressivas – o que foge totalmente da realidade rural brasileira. Para se ter uma idéia, a área média dos agricultores familiares é de 19 hectares, sendo que 58% deles situam-se no grupo B do Pronaf, apresentando uma área média de 6 ha. No que concerne a situação demográfica, tivemos na década de 90 um crescimento populacional de 5,1% ao ano. Isso leva a situar essa região dentre as localizadas no semi-árido brasileiro, de base rural e agrícola e com crescimento populacional rural positivo como a de maior densidade demográfica. Por fim, hoje temos na área cerca de 3 mil de famílias assentadas e o mesmo de famílias acampadas; isso significa 60% dos domicílios rurais.

255

Page 256: Alto Sertão - SE

Observa-se, dentro desse quadro, que várias das fontes alternativas de renda foram se estrangulando/escasseando: as oriundas do Rio – com o fim do regime de vazantes decorrente das barragens foram perdidas as várzeas e a pesca; o artesanato – a urbanização e o incremento da entrada de mercadorias “forâneas”; e a caça – desmatamento, decorrente da pressão demográfica e do crescimento dos rebanhos.

Como proposta para essa situação, propõe-se associar as seguintes políticas:

a. reorganização fundiária visa terminar com o minifúndio pela concessão de crédito fundiário para a ampliação/adequação das propriedade minúsculas. Há que se ter em conta que grande parte desses minifundistas não tem a propriedade da terra. Logo, a regularização fundiária é outra ação governamental que entra aí;

b. concessão de crédito para resgate da Caatinga – existe o Pronaf-Florestal e o Incra tem recursos para essa finalidade deve-se pensar em alterar o periodo de carência de três para cinco anos.

c. transferência de renda mensal para que seja preservada essa área durante o processo de consolidação da caatinga – o que dura quatro anos para começar a se retirar dela ganhos comerciais seria preciso fazer um esforço com a pesquisa – EMBRAPA – e a Assistência Técnica – INCRA, EMATERs-afins, MST, FETAGs e ONGs – para a criação/difusão de modelos florestais/agrosilvipastoris.

h. Parcerias com a Embrapa: tecnologia e inovação

- unidades de demonstração para introdução de variedades adaptadas e práticas agropecuárias sustentáveis para a região semi-árido sergipano (Embrapa Tabuleiros Costeiros e Semi-Árido);

- estimular a agroindustrialização e aproveitamento do umbu, do maracujá-do-mato, para a produção de picles, doces, sucos e geléias, agregando valor e elevando a renda (Embrapa Semi-Árido);

- divulgação de técnicas para a conservação da água de chuva, como as barragens subterrâneas (Embrapa Semi-Árido)- capacitar e criar unidades demonstrativas com culturas alimentares como o milheto, o guandu petrolina (Embrapa Semi-Árido);- capacitar e criar unidades demonstrativas para a alimentação animal com cultivares adaptados: maniçoba, mamãozinho de veado,

algaroba, guandu taipeiro, pormunça, leucena, cactáceas nativas (Embrapa Semi-Árido);- capacitação para a irrigação em sistemas adaptados à pequena produção e controle da salinização (Embrapa Semi-Árido);- aproveitamento dos resíduos de dessalinização para a alimentação de peixes (Embrapa Semi-Árido);- tecnologia para melhorar os sistemas produtivos da produção de mandioca contemplando os diversos elos da cadeia produtiva

(Embrapa Mandioca e Fruticultura);- incremento dos sistemas produtivos de caprinos e ovinos (Embrapa Caprinos);

256

Page 257: Alto Sertão - SE

- estimular a melhoria da produção de caprinos mediante estágio para os assentados que tenham concluído o segundo grau e para os seus filhos que tenham concluído curso técnico ou o segundo grau na Embrapa Caprinos, em Sobral;

- manejo da caatinga para aumentar a capacidade de suporte da mesma para a criação de animais através de sistemas agrossilvopastoris (Embrapa Caprinos);

- diversificação da produção com culturas mais adaptadas ao semi-árido, como o amendoim e o gergelim –unidades demonstrativas, cursos de capacitação, dias de campo, manejo de pragas, colheita, processamento e comercialização- (Embrapa Algodão);

- promover o estágio para os assentados que tenham concluído o segundo grau e para os seus filhos que tenham concluído curso técnico ou o segundo grau na Embrapa Gado de Leite, em Juiz de Fora.

i. Políticas públicas complementares ao desenvolvimento rural

Educação

É preciso integrar os conteúdos do ensino no meio rural com a realidade produtiva, ambiental e social do território do Alto Sertão, pois a educação voltada para o entendimento da realidade juntamente com a capacidade de mobilização da sociedade regional é que irá possibilitar um patamar diferente de desenvolvimento. Neste caso as diversas experiências que vêm ocorrendo com o uso da Metodologia da Educação do Campo revelam que o poder público em parceria com os movimentos sociais ainda pode avançar muito.

Turismo

A zona ribeirinha é caracterizada, também, pelas suas potencialidades turísticas, subdividindo-a em duas subzonas. Uma primeira, que vai de Canindé ao início de Porto da Folha, com uma topografia dominada pelo cânion e roteiros turísticos baseados nas condições ambientais e história; e uma segunda de Porto da Folha a Gararu, com várzeas e praias resultantes do assoreamento do rio, mais para um turismo de lazer,

Encontram-se assentamentos de reforma agrária ao longo da zona ocupando sítios privilegiados pelo seu significado histórico como a Gruta do Angico ou de lazer como Ilha do Ouro em Porto da Folha. Todos estes assentamentos encontram-se exclusivamente orientados à atividade de produção agropecuária.

Artesanato

257

Page 258: Alto Sertão - SE

A atividade artesanal nesta zona é significativa. Principalmente a de mantas e bordados produzidos no município de Porto da Folha, Gararu por grupos de mulheres. No entanto, quando da ida à campo para a realização da pesquisa qualitativa foi identificada a participação das mulheres na composição da renda familiar através de atividades de costura como a renda, bordados e, em alguns casos, costura.

Comercialização

As compras governamentais, sejam elas das prefeituras, governo estadual ou, federal, realizadas através da Conab e outras linhas do programa Fome Zero, podem ser um bom mecanismo para dar suporte em termos de mercado, preço e estímulo à consolidação e diversificação da produção. Explorar melhor o potencial das feiras, principalmente as de Canindé e Glória que tem importância regional e para onde se dirigem comerciantes de Sergipe, de Alagoas e Bahia. Nestas feiras e também nas dos demais municípios a produção de horti-fruti poderia vir a substituir produtos importados de outras regiões e estados.

Fomentar o associativismo e o cooperativismo

È preciso ficar claro para todos, funcionários ligados à ATES e outras áreas relacionadas com o desenvolvimento dos assentamentos, também para os movimentos sociais e, os assentados em geral, que o desenvolvimento econômico dos assentamentos não depende tanto da área como depende da sua capacidade de se organizar para adquirir insumos, produzir e comercializar.

É preciso transformar o acúmulo da experiência organizativa que permitiu vitórias como o acesso a terra e outras como que se traduziram em melhores condições de vida como foi o caso da habitação, o acesso a água encanada, energia e ao crédito rural.

Indústrias

O estímulo ao desenvolvimento da indústria de sorvetes na região poderia contribuir para a diversificação dos canais de escoamento da produção leiteira, bem como ampliar o canal de comercialização de frutas para além da comercialização in natura e da produção de polpas de frutas. Esta opção se aplica tanto para os produtos oriundos da agricultura irrigada, como para as frutas nativas da caatinga.

j. Formação e capacitação

A capacitação e formação de ser organizada com ênfase no protaganismo dos assentados na geração de emprego e renda no campo; sendo capaz de implantar ações das quais participem instituições públicas e privadas.

258

Page 259: Alto Sertão - SE

Missão:

Promover processos educativos e formativos capazes de contribuir com a construção e execução de estratégias de desenvolvimento sustentável do assentamento e seu entorno, centrado no fortalecimento dos assentados e suas organizações, por meio de metodologias participativas, integradas às dinâmicas locais, com objetivo de viabilizar as condições de melhoria de vida e renda dos assentados.

Objetivos

• Adotar processos educativos e formativos com um enfoque dialético e construtivista, buscando mudanças de atitudes e procedimentos dos assentados, os quais potencializem os objetivos desses atores sociais no que se refere à melhoria de vida, renda e promoção do desenvolvimento sustentável do assentamento e seu entorno.

• Estimular, animar e apoiar iniciativas educativas e formativas, que envolvam atividades agrícolas (das áreas de sequeiro/irrigadas) e não agrícolas, pesqueiras, extrativistas e outras, visando emprego e renda.

• Viabilizar ações formativas voltadas à construção da equidade social e valorização da cidadania, visando à superação da discriminação e da exclusão de categorias sociais, tais como as mulheres, os jovens, os negros.

• Promover parcerias entre instituições federais, estaduais, municipais, organizações não-governamentais e organização dos assentados, visando a construção de redes de cooperação e solidariedade.

Os processos educativos e de formação deverão ter conteúdos capaz de formar os assentados para atuarem como atores sociais que promovem o desenvolvimento do assentamento em si e do seu entorno, com condições de investigar, identificar e disponibilizar a esses agentes um conjunto de opções compatíveis com as necessidades dos assentados e com o território onde estão inseridos.

É preciso, ainda, integrar os conteúdos do ensino no meio rural com a realidade produtiva, ambiental e social do território do Alto Sertão, pois a educação voltada para o entendimento da realidade. Neste caso as diversas experiências que vêm ocorrendo com o uso da Metodologia da Educação do Campo/PRONERA revelam que o poder público em parceria com os movimentos sociais ainda pode avançar muito.

j. Indicações de Diretrizes para a atuação da Ates;

Este tópico propõe a delimitação de um marco institucional de integração e de cooperação da Ates dos assentamentos rurais do Estado de Sergipe. É um marco que articula com harmonia todos atores sociais que estão associados a Ates pública: os governos nas esferas federais e as legitimas representações dos assentados.

259

Page 260: Alto Sertão - SE

O principal desafio posto ao novo desenho institucional é superar as diferenças quanto a organização de cada uma das instituições associadas à Ates pública.A assistência técnica à agropecuária no Brasil é um instrumento de política agrícola e econômica, portanto, é resultante do desenvolvimento econômico do país.

A seguir procura-se mostrar uma breve trajetória histórica da assistência técnica, apresentando-a como um produto institucionalizado da evolução do sistema econômico e política da nação brasileira77.

Breve histórico da assistência técnica

As origens da assistência técnica ao setor agrícola no país são de tempos remotos, já que os primeiros órgãos foram criados no começo do século XIX, com a vinda da Corte portuguesa ao Brasil. Este foi o caso do Jardim Botânico do Rio de Janeiro, fundado em 1808, com finalidades científicas e econômicas. Tal entidade como outras serviram de base para a criação, em 1860, do Ministério da Agricultura, Comércio e Obras Públicas. Esse novo órgão estava plenamente afinado com os interesses da economia primária de uma agricultura cuja base eram o latifúndio e a escravidão.

Mais tarde, no período republicano, em 1906, ocorre à formulação do órgão, que passa a ser chamado de Ministério de Negócios da Agricultura, Indústria e Comércio. Tal reformulação tem como finalidade transferir para o Estado as funções de assistência técnica e regulamentação que até então eram exercidas pelos grandes proprietários e suas representações de classe. Surge uma nova modalidade de assistência técnica, o Fomento, com as seguintes finalidades:

a) Fornecimento de insumos para a produção estruturou-se serviços de distribuição de sementes, fertilizantes, inseticidas, etc.b) Prestação de serviços de mecanização, conservação de solo e água, obras de drenagem e irrigação, entre outros.c) Assistência técnica propriamente dita, orientada para determinados ramos de produção da agropecuária.

O fomento assim estruturado acabou sendo margem para acertos politiqueiros, na medida que propiciava a distribuição de favores pessoais às custas do erário público. A contribuição desse modelo com vistas a melhorar a produção de toda população rural praticamente nula, pois somente beneficiou os apadrinhados. A partir daí, quer através da criação de novos órgãos públicos, quer através da reestruturação dos existentes, a assistência técnica governamental tornou-se permanente para as grandes culturas, e para os grandes produtores que constituíam sua principal clientela.

Após a 2ª Guerra Mundial surge uma nova modalidade de assistência técnica, distinta do fomento, conhecida como Extensão Rural78, cujo objetivo é de desenvolver o fator humano da produção. Sua introdução visava a melhoria do padrão de vida da comunidade rural, com a elevação

77 Para tanto, se recorreu ao estudo realizado por Queda e Szmrecsányi (1976: 216/233).

260

Page 261: Alto Sertão - SE

da renda, mediante o aumento da produção e produtividade. Para tanto se criou um sistema de assistência técnica: Associação de Crédito e Assistência Rural – ACAR, que funcionou quase todo o país.

O sistema ACAR no início de suas atividades tinha a preocupação com os pequenos produtores rurais, através de programas de crédito supervisionado, onde se pretendia elevar o nível técnico das atividades rurais desse público. No entanto, ocorreu uma inadequação entre a teoria e a prática79 e o sistema ACAR acabou tendo que alterar sua forma de atendimento. A partir de então os programas de assistência técnica passaram assistir o agricultor que explora sua propriedade, ao invés dos pequenos e médios produtores, cuja evolução é demorada e retarda o avanço econômico do Estado. A assistência técnica80 agora em diante passa a preconizar o seguinte:

a) Os grandes proprietários devem ser orientados no sentido de fazerem melhor uso dos fatores de produção.b) Os pequenos e médios proprietários devem ser estimulados em suas necessidades e na maneira de satisfaze-las produtivamente.c) Os parceiros e assalariados devem ser levados a ingressar nos sindicatos rurais, aos quais está afeita sua assistência, promovendo

sua capacitação para virem a localizar-se nas cidades.

Em meados dos anos 70 e início dos anos 80 se constitui em todo território nacional o sistema de assistência técnica, EMATER. O Estado de São Paulo é o único Estado não integrado nesse sistema, tendo um serviço próprio. Outros Estados mesmo tendo serviços próprios vão ao decorrer do tempo se integrando ao sistema nacional, como o caso do Paraná. A rede EMATER de assistência técnica pública sofreu um imenso abalo com o desmonte dos serviços nos Estados e seus resultados nas áreas de assentamentos foram e são visíveis e desastrosos.

Neste quadro de desmantelamento81, no início dos anos 90 do século passado, surgiu o Projeto LUMIAR, que teve como objetivo constituir equipes técnicas para orientar o desenvolvimento sustentável dos assentamentos rurais. Este projeto promoveu a terceirização da Ates pública, abrindo a gestão desses serviços à participação das organizações dos trabalhadores rurais, em particular, as organizações dos assentados.

Esse processo de massificação dos serviços de Ates em todo território nacional, via terceirização, ao mesmo tempo em que estimulou a recuperação da extensão rural nos assentamentos do Estado, proporcionou a redução gradual da necessidade da ação do INCRA em funções típicas de assistência técnica.

78 O movimento extensionista tem suas origens no EUA, sendo que esta modalidade de assistência técnica começou a ser cogitada para países da América Latina, a partir de 1938, quando foi criado o Institute of Inter-American Affairs, que teve a tarefa de coordenar a ajuda econômica americana.79 No Brasil a pequena produção familiar era uma unidade supridora de mão-de-obra, característica bem diversa da que tem no EUA.80 Plano Diretor 1968/72 da ACAR.81 Anos 80 período de ressurgimento dos assentamentos rurais no território nacional, e anos 90, período de intensificação dos mesmos.

261

Page 262: Alto Sertão - SE

O INCRA ficou centrado na garantia das prerrogativas governamentais na gestão do projeto LUMIAR, particularmente no que diz respeito à aplicação dos recursos públicos, conforme as determinações legais e normativas. Apesar da abrangência em todo território nacional, sua cronologia de intervenção e funcionamento foi efêmera.

Mais recentemente, o INCRA vem desenvolvendo política de assistência técnica através de convênios/parcerias (entidades públicas e privadas), como também aumentado o efetivo de funcionários técnicos via concurso público. A assistência técnica na sua trajetória histórica foi orientada como uns dos principais instrumentos de modernização do mundo rural. Sempre teve por objetivo transmitir a população rural: técnicas, padrões de consumo e gestão de subsistemas agropecuários mais avançados, com vistas ao crescimento da produção propriamente dita e da produtividade e do trabalho. Por enquanto, mantém como estratégia o crescimento quantitativo da produção fundamentado no jogo dos mercados e na tecnologia mecânica e química vinculada à chamada “Revolução Verde”.

Contudo, muitos dos produtores ficaram marginalizados ao esforço público, sendo que desses, alguns foram atendidos por empresas privadas de insumos (químicos ou mecânicos) que visavam o aumento e a racionalização (via modernização) da produção agropecuária, e outros que não foram beneficiados com nenhuma dessas linhas de assistência técnica.

A não universalização da assistência técnica deve-se também ao fato do atendimento ser somente em alguns estabelecimentos rurais e não se destinar a todos, apenas alguns que foram considerados típicos – os que são capazes de servir de modelos para os demais. Há uma capacidade estrutural das instituições pública e privada (recursos físicos, financeiros e humanos) de se atender a todos, problema que é resolvido pelo conceito do estabelecimento típico. Toda atividade de assistência técnica, no decorrer dos anos, está baseada no pressuposto da difusão das inovações, ou seja, em efeito demonstrativo.

No Estado de Sergipe, mais especificamente na região do Sertão, a assistência técnica pública nos assentamentos está sendo prestada pela ENDAGRO e pela COHIDRO. Na pesquisa de campo observou-se que os assentados questionavam a maneira como era feita e da ausência prolongada dos técnicos nos assentamentos.

“Para os entrevistados em geral, a maior insatisfação é quanto ao desmantelamento das estatais Cohidro e Deagro. Com tal política o governo do estado desarticulou a assistência técnica destinada ao pequeno e médio produtor. Para os assentados a insatisfação é quando a não conclusão das obras de irrigação no assentamento Jacará-Curituba, projeto de irrigação que, originalmente era destinado aos empresários, mas em 1996 foi ocupado Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra.”“...Contudo, a empresa estadual se encontra fragilizada pelo excesso de trabalho e sucateamento do órgão. Ao elaborarem os projetos produtivos, o atendimento é seletivo, pois só conversam com os agricultores aptos a adquirirem o crédito. São responsáveis pelos laudos técnicos de todas as unidades produtivas, função de fiscalização. Para tantas atividades faltam técnicos .....”

262

Page 263: Alto Sertão - SE

A assistência técnica via tercerização nos assentamentos locais está sendo também prestada pela CECAC, via convênio desta com o INCRA, nos moldes similares de terceirização ao que foi o LUMIAR. Em diferentes momentos, essas instituições se depararam com situações de continuidade ao que há no entorno produtivo dos assentamentos, que impõe inovações nas suas políticas, programas e conceitos de assistência técnica. Entretanto, a assistência técnica oferecida ao mesmo tempo em que proporciona aos assentados acessos à tecnologia, não conseguiu atender as necessidades e aspirações de gestão e produtiva dos assentados. Prova disso é, de forma genérica, o crescente endividamento dos assentados junto às instituições financeiras; a redução da rentabilidade de trabalho deles; a continuidade tecnológica do pacote da Revolução Verde.

Os fatores de mudança da atuação dos serviços públicos de assistência técnica, voltada para as afinidades produtivas e de trabalho dos assentados, estão limitados na estrutura das instituições públicas e tercerizadas como também está limitada pela rigidez e pela resistência da estrutura fundiária, pela desigualdade da distribuição de renda e pelo baixo nível de vida da grande maioria da população rural do Estado.

Existe a necessidade de transformação do atual modelo de Assistência Técnica, para um novo modelo. Este novo modelo deve estar vinculado ao desenvolvimento do assentamento e se constituir numa rede de cooperação de cientistas e pesquisadores, direcionada ao uso racional dos recursos naturais e ao aumento da renda.

Eixo de Ação

Garantir o desenvolvimento sustentado dos assentamentos rurais do Estado de Sergipe, com base na geração de renda e na qualidade de vida dos assentados, considerando os aspectos técnicos, sociais, econômicos, ambientais e culturais dos assentamentos e do entorno onde estão inseridos; caracterizado pela parceria entre as instituições públicas (INCRA, de ensino e pesquisa) com as instituições dos assentados.

Princípios Orientadores

O novo desenho da Ates no Estado procura orientar suas ações considerando os seguintes princípios:• Princípio da Autonomia: a integração institucional é a coexistência de instituições públicas e dos assentados, consolidando um

relacionamento de assistência técnica às vezes de ação separada e às vezes conjunta, mas, mantendo suas identidades básicas.• Princípio da Apropriação do Conhecimento: apoiar, intensificar e preservar o caráter sistêmico da educação e da pesquisa,

buscando facilitar a adoção de novas técnicas e tecnologias; e ainda, estimular a criatividade e reforçar a crítica por parte do assentado.

263

Page 264: Alto Sertão - SE

• Princípio da Parceria: realizar as ações integração no âmbito do desenvolvimento sustentado do assentamento, em consonância com as instituições públicas e representativas dos assentados.

• Princípios norteadores do desenvolvimento local: deve levar em conta que esta idéia é ligada à idéia de progresso técnico, melhorar as condições produtivas e avanço na qualidade de vida da população. Elas estiveram presentes nas alternativas propostas para o Alto Sertão:

− Garantir um processo de capacitação e qualificação para o produtor rural e sua família;− Educação− Trazer para o território mão-de-obra especializada;− Desenvolver pequenos projetos de irrigação;− Criar agroindústrias;− Incentivar a apicultura;− Incentivar e melhorar a infra-estrutura para piscicultura;− Incentivar a criação de pequenos animais (aves, caprinos e ovinos);− Incentivar o uso de produtos orgânicos;− Criar cooperativas de comercialização;

Diretrizes da Ates

O modelo de Ates para se constituir numa rede pública de controle social, calcada no uso racional dos recursos naturais e no aumento de renda dos assentados deve ser vinculada com as seguintes diretrizes:

• Assegurar aos assentados da reforma agrária o acesso ao serviço de assistência técnica pública e gratuita, como a oferta permanente e contínua desses serviços, assim, atender a demanda dos assentados do Estado.

• Contribuir com o desenvolvimento sustentável dos assentamentos, com ênfase no uso racional dos naturais.• Adotar uma abordagem técnica multidisciplinar, estimulando métodos com enfoques participativos que contribuem para a construção

da cidadania, bem como, construindo um paradigma tecnológico baseado na apropriação de conhecimento.• Garantir nos processos de geração e apropriação de tecnologias e inovações uma relação sistêmica com instituições de pesquisa e

ensino.• Ter um modo de gestão com controle social.

Para o estabelecimento de um novo paradigma orientado ao desenvolvimento do assentamento e do seu entorno, com base nos princípios acima, tendo como norte a apropriação da tecnologia e uso racional dos recursos ambientais, requer uma formação dos agentes técnicos e sociais em

264

Page 265: Alto Sertão - SE

metodologias que sejam promotoras do envolvimento dos atores sociais com o objetivo proposto e fortaleçam suas capacidades produtivas tanto na forma individual quanto coletiva.

(i) Buscar abrir campos de estágio para alunos das escolas técnicas e faculdades nas áreas relativas ao desenvolvimento de assentamentos;

(ii) Integrar com instituições de estudos e pesquisa para promover o desenvolvimento dos assentamentos –Embrapa, Institutos Estaduais, Escolas Técnicas, universidades-;

(iii) Integrar a atuação dos órgãos federais que de uma forma ou outra possam promover o desenvolvimento dos assentamentos como a Conab, Energia, Embrapa, UFS, Funasa, Codevasf, entre outros;

(iv) Elaborar um Plano Diretor de Atuação da Ates que unifique os objetivos e metas dos diferentes órgãos e organizações que atuem no desenvolvimento do assentamento. É preciso recuperar o caráter público e universal da assistência técnica. Dessa forma deve-se partir do princípio que o assentado e o assentamento ganham quando mais órgãos e organizações estão presentes no desenvolvimento do assentamento;

(v) Constituir um Fórum em que estejam presentes os diferentes órgãos de Ates que atuam no assentamento, bem como as organizações dos assentados e a coordenação dos assentamentos. A junção de esforços permite atenuar o problema da falta de recursos financeiros e humanos;

VI. À guisa de conclusão: agenda propositiva

1. Abrangência da Região do Alto Sertão

Esteve inserido no presente trabalho o objetivo de dimensionar de fato o território que abrange os 06 municípios do chamado Alto Sertão Sergipano, tal se deveu ao fato de o trabalho estar embasado na definição de território de Umbelino de Oliveira:

O pressuposto implícito, na metodologia deste trabalho foi o de que existe profunda uma associação entre o processo de desenvolvimento sócio-econômico do território e o dos assentamentos rurais. O território conforma-se num espaço geográfico de referência onde se delimita e se configura a dinâmica dos assentamentos, ou seja, o território é um espaço geográfico onde os assentamentos se articulam com o ambiente e com os agentes sociais da economia local.

Conforme citamos no 2º Relatório a pesquisa qualitativa foi baseada no enfoque sobre o território e/ou a economia local como um espaço precisamente definido. Portanto se buscaria identificar em que medida o território administrativo e do Colegiado da SDT/MDA do Alto Sertão

265

Page 266: Alto Sertão - SE

Sergipano coincidiam ou não com esta região. Havia sido destacado que a delimitação do território poderia ir além da delimitação física da região inicial do estudo, na qual os assentamentos rurais estão localizados.

Em vista disso, buscou-se na percepção de determinados agentes locais qualificados a delimitação do território, onde os assentamentos rurais estão inseridos. Assim, das entrevistas qualitativas poderia surgir um novo território re-configurado estabelecido segundo a forma como cada um dos entrevistados se relaciona com o território, ou seja, a partir de elementos econômicos, políticos, produtivos, geográficos e sociais.

A base territorial dos assentamentos foi definida a partir da conjunção das percepções dos agentes locais. Isso significa que o território em que os assentamentos estão inseridos foi o resultado final obtido das entrevistas qualitativas e, portanto, ele não deveria ficar restrito ao espaço geograficamente definido anteriormente.

Conseqüentemente, a conclusão das entrevistas levou a uma extrapolação da região de inserção dos assentamentos do Alto Sertão para além dos 06 municípios inicialmente definidos. As relações estabelecidas por esta região ampliam a região de inserção para mais municípios: Feira Nova, Itabi, Graco Cardoso, Nossa Senhora de Lurdes, Carira, São Miguel do Aleixo, Nossa Senhora das Dores e Nossa Senhora Aparecida, em Sergipe.

Também devem ser incorporados municípios dos estados da Bahia e Alagoas. São eles: Santa Brígida, Coronel Sá, Paripiranga, Paulo Afonso no primeiro Estado e, Piranhas, Pão de Açúcar e Delmiro Gouveia de Alagoas. No caso do Sertão Baiano conforme Diniz, 1997, a região de Santa Brígida pode ser considera uma frente de expansão do processo de migração dos agricultores familiares na frente de expansão e, no caso alagoano a Bacia do São Francisco representa um eixo de unidade ambiental e cultural desses municípios ribeirinhos.

Este novo desenho da região de inserção deve ser levado em conta pelos órgãos públicos, movimentos sociais e suas associações e/ou cooperativas para a formulação das estratégias de desenvolvimento sustentado. No caso dos órgãos públicos federais esta redefinição é importante, ela permite a interação com órgãos de outros Estados construindo iniciativas em comum para facilitar o objetivo do desenvolvimento qualitativo dos assentamentos e do meio rural.

2. Avaliar e repensar as vocações produtivas locais: pecuária leiteira e os cultivos de milho e feijão.

Não há porque buscar outras soluções para o desenvolvimento da região sem antes reafirmar aquelas atividades que os agricultores vem desenvolvendo a décadas. Verdade que a pecuária leiteira se consolidou no final da década de 80 e inicio dos noventa, podendo se dizer que foi simultâneo ao fim do cultivo do algodão e da utilização das vazantes do Rio São Francisco com cultivos irrigados em várzeas.

266

Page 267: Alto Sertão - SE

As duas principais atividades agropecuárias desenvolvidas no território – pecuária de leite e os cultivos de milho e feijão – vem sendo, ademais, beneficiadas pelos esforços de pesquisa desenvolvidos pela EMBRAPA. As variedades superprecoces de milho – Caatingueiro, Assum Preto e Cruzeta – e o sistema agroecológico de produção de leite no semi-árido são exemplos de inovações tecnológicas que vem sendo difundidas junto aos agricultores e assentados da área.

Deve-se, nesse sentido, buscar aprofundar as relações com a pesquisa agropecuária, respondendo/fornecendo tecnologias, das quais poder-se-ia citar: suporte forrageiro – palma, leguminosas e outros cultivos forrageiras -, reservas estratégicas - ensilagem e fenação -, validação e multiplicação de cultivares - milho, feijão, feijão de corda, sorgo, milheto, girassol e mandioca – e melhoria no processo de ordenha.

3. Consolidar as conquistas na melhoria dos serviços públicos na educação, saúde e assistência técnica.

Chamaram a atenção no diagnóstico realizado alguns avanços em indicadores socioeconômicos – educação e saúde – e nos serviços públicos – assistência técnica, eletrificação, abastecimento de água.

Atualmente, a quase totalidade das crianças e cerca de 2/3 dos adolescentes estão na escola, demonstrando um grande avanço frente ao início dos anos. Na saúde, verificou-se, também, grande avanço nos indicadores de morbidade e mortalidade, decorrentes da constituição do SUS –agentes de saúde e postos de saúde. Deve-se, de um lado, assegurar esses avanços, buscando melhorar esses serviços.

A assistência técnica agropecuária foi outro campo que se assistiu a um grande avanço, de modo particular, no atual governo federal, pois aumentou os recursos destinados a esses serviços para os assentandos e agricultores familiares. Acredito que, hoje, se conta com cerca de 150 profissionais de nível médio e superior atuando no território ligados ao governo do estado, movimentos sociais e sindical, prefeituras e ONGs. Cabe, aqui, buscar ações de capacitação desse corpo técnico, bem como o aumento do numero dos profissionais de nível superior.

Outra ação que vem se espraiando no território é a eletrificação rural, em função do Projeto Santa Maria – PCPR – e, atualmente, pelo Luz no Campo, cuja amplitude é bem maior. Ou seja, há que se buscar junto ao Governo do Estado e a CHESF a universalização do acesso a energia elétrica no meio rural. Cabe, aqui, apontar para a necessidade de ações voltadas à instalação de rede trifásica para o atendimento de investimentos produtivos – laticínios, irrigação, abatedouros, etc.

4. Continuar os investimentos nas áreas da agroindustrialização, processamento e armazenagem dos produtos pecuários e agrícolas.

267

Page 268: Alto Sertão - SE

Os investimentos do Pronaf-Infra-Estrutura têm, em grande parte, se dirigido a agroindustrialização-processamento de produtos agropecuários: abatedouros, casa de mel, beneficiamento de milho e feijão, entre outros. Acredito que se deva continuar buscando esse tipo de investimento, pois agrega valor aos produtos agropecuários. Fica, no entanto, uma pergunta: esses investimentos têm sido efetivos e eficazes, ou melhor, há oferta suficiente para a capacidade instalada, existem mercados-canais de comercialização para os produtos processados, a infra-estrutura para seu funcionamento estava de acordo.

O Diagnostico do Plano aponta para a presença de um grande voluntarismo nas ações empreendidas no território e junto aos assentamentos. Não seria interessante realizar estudos de viabilidade para os investimentos previstos – isso não é custoso, e poderia se realizar em uma parceria prefeituras, colegiado e organizações sociais.

5. Soluções para a questão ambiental que afeta as potencialidades econômicas e a melhora na qualidade de vida.

Na questão ambiental, o diagnóstico do Plano apontou para três grandes questões-problemas: degradação da caatinga – valendo a pena citar o desmatamento das matas ciliares; a precariedade dos sistemas de esgotamento sanitário e de águas pluviais; e o descaso com os resíduos sólidos – lixo.

No que tange a degradação da caatinga, tal processo implica limites ao desenvolvimento da ovinocaprinocultura e da apicultura. Observa-se, ademais, que existe um conjunto de políticas que articuladas podem vir a dar solução a esse problema. Concretamente, o Pronaf-Florestal é uma linha de crédito que pode ser utilizada na recuperação da caatinga e há a possibilidade de agregar às políticas de transferência de renda uma destinada à remuneração do agricultor durante o período de “consolidação” da área recuperada antes de seu uso sustentável. Seria uma espécie de Bolsa Caatinga.

Agrego à proposta o enfrentamento da insuficiência de terra dos agricultores familiares, isto é, da elevada presença de minifúndios. Isso porque a degradação está diretamente vinculada à não sustentabilidade dos minifúndios. Assim, o que pretendemos é associar as seguintes políticas:

d. reorganização fundiária visa terminar com o minifúndio pela concessão de crédito fundiário para a ampliação/adequação das propriedade minúsculas. Há que se ter em conta que grande parte desses minifundistas não tem a propriedade da terra. Logo, a regularização fundiária é outra ação governamental que entra aí;

e. concessão de crédito para resgate da Caatinga – existe o Pronaf-Florestal e o Incra tem recursos para essa finalidade deve-se pensar em alterar o periodo de carência de três para cinco anos.

268

Page 269: Alto Sertão - SE

f. transferência de renda mensal para que seja preservada essa área durante o processo de consolidação da caatinga – o que dura quatro anos para começar a se retirar dela ganhos comerciais seria preciso fazer um esforço com a pesquisa – EMBRAPA – e a Assistência Técnica – INCRA, EMATERs-afins, MST, FETAGs e ONGs – para a criação/difusão de modelos florestais/agrosilvipastoris.

Há urgência de ações na constituição de redes de águas pluviais e de esgotamento sanitário, haja vista a situação de inúmeros povoados da região. Acredito que existam linhas de financiamento e de apoio no Ministério das Cidades. O problema do lixo – resíduos sólidos – é grave na região, cabendo buscar a implantação de sistemas de coleta e a conscientização das populações. Deve-se buscar recursos nos Ministérios das Cidades e do Meio Ambiente.

Vale, salientar, ainda nesse item, as possibilidades abertas pelo Programa de Revitalização do Rio São Francisco, onde se inserem ações de recuperação de áreas degradadas, recomposição da cobertura vegetal, saneamento básico, tratamento de resíduos sólidos e de qualificação ambiental dos assentados de Reforma Agrária.

6. Regularização e reordenamento fundiário

É urgente a realização de duas políticas na área: regularização fundiária e reordenamento agrário. Essa urgência se deve, de um lado, pelo fato de que 44,5 % dos imóveis rurais são posses de área inferior à 50 hectares e, de outro, pela existência de 6.341 estabelecimentos familiares com área média de 6ha. Esses são aqueles agricultore enquadrados no grupo B do Pronaf, que representam 53,3% dos estabelecimentos que existiam no território quando do Censo Agropecuário de 1995/6.

Há que se perguntar: quem irá realizar a política de regularização fundiária? A proposta é que o governo do Estado o faça com recursos repassados pelo Governo Federal-INCRA. Não seria mais adequado pensar em outro formato, tendo em vista as opções políticas do atual governo estadual. Exército, Codevasf, Prefeituras e Incra poderiam juntos realizar tarefa de tão grande importância.

E, nessa mesma direção, vale sublinhar que as políticas de reordenamento fundiário vêm sendo desvirtuadas pelo programa do Banco da Terra. Há que se combater o uso do crêdito fundiário como contraposição da Reforma Agrária, tendo em conta a necessidade de se utilizar desse instrumento para a “eliminação” do minifúndio e não para a criação de novos.

Ficou, no diagnostico do Plano, uma questão que é a sustentabilidade dos assentamentos da Reforma Agrária em razão do tamanho dos lotes atualmente concedidos. A área média dos lotes situa-se ao redor de 20 hectares, desconsiderando os projetos que foram implementados com parcelas irrigadas – Jacaré-Curituba e Cuiabá. Ora se os estabelecimentos familiares inseridos nos grupos C e D do Pronaf contavam com áreas médias de, respectivamente, 27 ha e 71 ha, fica a duvida quanto a fundamentação para a concessão de lotes nos tamanhos observados.

269

Page 270: Alto Sertão - SE

7. Utilização das pequenas várzeas e o modelo de irrigação

No quadro atual de embate sobre o desenho do Projeto Nova Califórnia do Governo do Estado, que se soma às idas e vindas quanto à retomada da obras do Jacaré-Curitubal, passa ao largo a não utilização das medias e pequenas várzeas do São Francisco. Interessante notar que existem atualmente mapeadas pela Codevasf 23 várzeas nos municípios de Porto da Folha e Gararu que somam cerca de 2,4 mil hectares utilizáveis. Algumas dessas várzeas encontram-se em Assentamentos e em áreas de pequenas propriedades, sendo que as outras poderiam ter seus imóveis adquiridos e/ou desapropriados por utilidade publica para a constituição de novos Projetos de Assentamento. Evidentemente, que o estoque de várzeas no território desse ser maior, uma vez que não foram discriminadas as localizadas no município de Poço Redondo, bem como de algumas ainda não estudadas pela Codevasf.

Outra questão importante é o modelo de irrigação que se deseja construir no Projeto Nova Califórnia. Há que se ter presente que os modelos empresariais levados a cabo até o presente momento em outra regiões do semi-árido não incluíram socioeconomicamente a maior parcela das populações residentes na áreas, beneficiando, sobretudo, os empreendedores “estrangeiros”. Qual o mix pequenos/médios/grandes produtores no perímetro e que ações devem ser tomadas visando a articulação com o sequeiro é assunto em aberto. Deve-se sublinhar, ademais, que a “promessa’ da água tem tido efeitos nefastos. De um lado, observa-se um processo de especulação fundiária, que como se sabe prejudica grandemente aos pequenos agricultores, especialmente os que não contam com o acesso formal à terra. Por outro lado, há uma imobilização das populações a serem beneficiadas, que ficam a esperar a “chegada” da água, sem buscar desenvolver atividades produtivas nas áreas de sequeiro e/ou demandar políticas/tecnologias de convivência com a seca de de articulação irrigado-sequeiro.

8. Água: consumo humano x animal

Há ainda muitos povoados e assentamentos que não contam com abastecimento de água para consumo humano, sendo, portanto, necessária a ampliação desse serviço. Pergunto: há pelo Colegiado um levantamento dessa demanda. Vale observar que a construção de cisternas tem sido uma ação de importância no território. Interessante notar que ainda assim os problemas de falta de água nos períodos secos persistem, pois as cisternas têm sido utilizadas como reservatório de água não somente para o consumo humano, mas o animal também. Assim, corre-se o risco de se perder todo esse esforço, pois se corre o risco de se perder as cisternas – rachaduras – caso elas fiquem secas. Assim, a construção de cisternas deve vir associada a ações para o fornecimento de água para o consumo animal – barragens subterrâneas, por exemplo.

9. Melhoria da qualidade educacional

270

Page 271: Alto Sertão - SE

Os indicadores da qualidade da educação no território estão bem aquém dos observados para o país como um todo e para o estado de Sergipe. Efetivamente, os indicadores de rendimento escolar, como as taxas de reprovação e abandono, a idade mediana de conclusão e a distorção idade-série, bem como os relacionados a oferta – alunos por classe e qualificação dos professores – estão aquém dos registrados em Sergipe e no País nos mesmos locais de moradia e níveis educacionais. Cabe, ademais, sublinhar que os indicadores em Sergipe e no País não se situam em patamares adequados. Logo, há muito para se melhorar na qualidade da educação. Para tanto, apontamos algumas ações que devem ser levados a cabo, tendo por base as entrevistas realizadas: diminuição da classes multisseriadas, diminuição do tamanho das turmas, capacitação do quadro docente e melhoria das condições de trabalho – remuneração, de modo particular.

10. Instrumentos de gestão consorciada dos municípios

Acredito que haja muito espaço para que os poderes públicos municipais aumentem sua eficácia na gestão das políticas publicas, através do compartilhamento das intervenções. Podem ser citados os investimentos em patrulha mecanizada, melhoria das vias de acesso, investimento em infra-estrutura de armazenagem e processamento agropecuário. Outro esforço que pode ser conjunto é a realização de estudos de viabilidade dos investimentos propostos.

Interessante buscar recursos conjuntamente nos Mininstérios do Meio Ambiente – Revitalização do Rio São Francisco -, Cidades – saneamento básico, coleta e tratamento do lixo -, Integração Nacional – pequenas várzeas, convivência com a seca – e Desenvolvimento Agrário – Pronaf Infra-Estrutura, Regularização Fundiária, Pronaf-Capacitação e Pronaf-Florestal.

11. Reforço e melhoria das políticas públicas – construção de metas;

Propomos que sejam propostos aos diversos organismos governamentais – federal, estadual e municipal – pelo Colegiado uma agenda mínima de desenvolvimento, ou seja, de metas que devem ser cumpridas nos próximos cinco/seis anos. Isso seria um caminho para que as ações e intervenções públicas tivessem maior sinergia. Permitiria, ademais, uma cobrança pelos movimentos sociais e sindical da real efetividade dessas ações e políticas.

O que fiou ausente ou com menor destaque do que comumente se observa:

i. A ovinocaprinocultura é de fato uma atividade com muita potencialidade, mas seu desenvolvimento encontra-se, em grande medida, obstaculizado pelo grau de degradação ambiental. Requerem-se, portanto, ações voltadas à recuperação da caatinga, para aí, então, dimensionar políticas de apoio e desenvolvimento a caprinocultura. No caso da ovinocultura, a situação é diferente, pois existe uma maior aceitação dessa criação, que vem tendo um expressivo crescimento;

271

Page 272: Alto Sertão - SE

ii. A piscicultura não se apresenta com destaque na economia local, havendo espaço para seu crescimento associado à utilização das pequenas várzeas. Os estudos preliminares da Codevasf de aproveitamento das várzeas dão grande destaque a piscicultura;

iii. No que tange ao turismo, tenho enormes duvidas quanto ao seu real potencial, particularmente se pensarmos em um turismo de inclusão social. Acredito que a recuperação ambiental nos moldes propostos pode impulsionar essa atividade econômica, pois o turismo na região está intimamente relacionado ao meio ambiente;

iv. O artesanato – bordados – encontra-se presente em vários povoados e associações da região, cabendo ações de capacitação das bordadeiras, seja na melhoria de seus produtos seja no âmbito da comercialização. Deve-se, no entanto, ter presente que as artesãs/bordadeiras não contam com tempo para a realização dessas atividades. As políticas de credito – Pronaf-Mulher – e de transferência de renda podem ser utilizadas.

VII. Bibliografia

ANDRADE, Manuel Correia de. A terra e o homem no Nordeste: contribuição ao estudo da questão agrária no Nordeste. 7 edição revista e aumentada, São Paulo: Cortez, 2005.

BARROS, Ricardo Paes de; MENDONÇA, Rosane; DELIBERALLI, Priscila P. & LOPES, Cristiana. Impactos da distribuição da terra sobre a eficiência agrícola e a pobreza no Nordeste. In: HENRIQUES, Ricardo (org.). Desigualdade e pobreza no Brasil. Rio de Janeiro: IPEA, 2000.

DANTAS, Francisco J. C. Cabo Josino Viloso. São Paulo: Editora Planeta, 2005.

DEL GROSSI, M. E. Pobreza Rural e agrícola. In: SUPERINTENDÊNCIA DE ESTUDOS ECONÔMICOS E SOCIAIS DA BAHIA. Pobreza e desigualdades sociais. Salvador:

DIAS, Guilherme Leite da Silva & AMARAL, Cicely Moitinho. Mudanças estruturais na agricultura brasileira: 1980-1998. Santiago do Chile: CEPAL - Série Desarrollo Productivo n° 99, 2001.

Di SABBATO, Alberto. O público-alvo do crédito rural do PRONAF: estimativa a partir dos dados do Censo Agropecuário do IBGE de 1995-1996. Projeto de Cooperação Técnica INCRA/FAO. Brasília, setembro de 2000, mimeo.

DINIZ, José A. F. Agricultura e Pequena Produção em Sergipe. 1ª edição, São Cristóvão: NPGEO, 1997.

272

Page 273: Alto Sertão - SE

______. Agricultura Familiar em Sergipe. In: Anais do II Encontro de Pesquisa sobre a Questão Agrária nos Tabuleiros Costeiros – Agricultura Familiar em Debate. Aracaju: EMBRAPA, 1997.

DINIZ, José A. F. & FRANÇA, V. L. A. (orgs.) Capítulos de Geografia Nordestina. 1ª edição, São Cristóvão: NPGEO, 1998.

FERNANDES, Bernardo Mançano. A questão agrária e sua nova configuração socioeconômica, política e territorial. In: EGLER, C.; MIRANDA, M.;CASTRO, I. (orgs.) Redescobrindo o Brasil: 500 anos depois. Rio de Janeiro: Bertrand do Brasil, 1999.

FONSECA, Vânia & BASTOS, Eduardo Alves (coords.) Sertão do baixo São Francisco sergipano: bacia hidrográfica como unidade de estudo. Universidade Federal de Sergipe-Codevasf-Cnp q. Aracaju, 1997. (em CD-Rom e Sumário Executivo)

______. Formação Econômica do Brasil. 18ª edição, Rio de Janeiro: Companhia Editora Nacional, 1982.

FURTADO, Celso. A operação Nordeste. Rio de Janeiro: ISEB, 1959.

______. O subdesenvolvimento revisitado. In: Economia e Sociedade, Campinas: IE-Unicamp, n° 1, agosto de 1992.

GERDAN, C. & SAUTIER, D. “Construção e Desenvolvimento dos Territórios Rurais: sistemas de produção de queijo em Sergipe”. In: SOBOURIN, E. & TEIXEIRA, O. A. Planejamento e desenvolvimento dos territórios rurais – conceitos, controvérsias e experiências. Brasília: Embrapa, 2002.

GOMES, G. M. Velhas secas em novos sertões: continuidade e mudanças na economia do Semi-Árido e dos Cerrados nordestinos. Brasília: Ipea, 2001.

GOVERNO DE SERGIPE. Programa para o desenvolvimento sustentável do Semi-Árido sergipano: avaliação ambiental estratégica. sl., sd., mimeo.

______.Atlas digital sobre recursos hídricos. Aracaju: Superintendência de Recursos Hídricos da Secretaria de Estado de Planejamento e da Ciência e Tecnologia – SEPLANTEC, agosto de 2004. CD-Rom.

GRAZIANO DA SILVA, José (coord.) A irrigação e a problemática fundiária do Nordeste. Campinas: Instituto de Economia da UNICAMP e PRONI, 1988.

GTDN (Grupo de Trabalho para o Desenvolvimento do Nordeste). Uma Política de Desenvolvimento Econômico para o Nordeste. 2ª ed. Recife: SUDENE, 1967.

273

Page 274: Alto Sertão - SE

GUANZIROLI, C. & CARDIM. S. (coords.). O Novo Retrato da Agricultura Familiar no Brasil: O Brasil Redescoberto.Ministério do Desenvolvimento Agrário – Projeto de Cooperação Técnica INCRA/FAO. Brasília, fevereiro de 2000.

GUANZIROLI, C. et al. Agricultura Familiar e Reforma Agrária no Século XXI. Rio de Janeiro: Garamond, 2001.

HOFFMANN, R. Desigualdade da distribuição da posse da terra e o desenvolvimento humano. In: Anais do XXXIX Congresso Brasileiro de Economia e Sociologia Rural, Recife, Brasília: SOBER, 2001.

KAGEYAMA, A. et al. Pluriatividade e ruralidade: aspectos metodológicos. Economia Aplicada. São Paulo; FIPE/FEA-USP, julho-setembro, 1998.

KAGEYAMA, A. & HOFFAMNN, R. Determinantes da renda e condições de vida das famílias agrícolas no Brasil. In: Economia, Niterói-RJ: ANPEC, v. 1, n° 2, jul./dez. 2000.

LEITE, S.; CINTRÃO, R.; CARARINE, C. Políticas agrárias, agrícolas e comerciais e seu rebatimento sobre a agricultura familiar no contexto nordestino. CPDA-UFRRJ, CD-ROM, julho de 2004.

LEITE, Sérgio. Impactos regionais da reforma agrária no Brasil: aspectos políticos, econômicos e sociais. Seminário sobre Reforma Agrária e Desenvolvimento Sustentável, Fortaleza, 1998. (disponível em http://www.nead.org.br/indexphp?acao=biblioteca&publicacaoID=27)

LIMA, José Fernandes de (coord.). Uma proposta de desenvolvimento sustentável para a região de Xingó. Canindé de São Francisco – SE: Instituto de Desenvolvimento Científico e Tecnológico de Xingó, 2003

MANÇANO, B. F. MST: formação e territorialização em São Paulo. São Paulo: Ed. Hucitec, 1999.

MEDEIROS, Leonilde & LEITE, Sérgio. Perspectivas para a análise das relações entre assentamentos rurais e regiões. In: SILVA, F. C. T. da; SANTOS, R.; COSTA, L. F. C. (orgs.) Mundo rural e política: ensaios interdisciplinares. 1ª edição, Rio de Janeiro: Campus, 1998.

MEDEIROS, Leonilde & LEITE, Sérgio (orgs.). Assentamentos rurais, mudança social e dinâmica regional. 1ª edição, Rio de Janeiro: Mauad, 2004.

MELLO, Frederico P. de. “O guerreiro do sol”. Revista de História da Biblioteca Nacional. Rio de Janeiro: Sociedade dos Amigos da Biblioteca Nacional, ano 1, n° 3, setembro 2005.

274

Page 275: Alto Sertão - SE

MINISTÉRIO DO DESENVOLVIMENTO AGRÁRIO (MDA) & ORGANIZAÇÃO DAS NAÇÕES UNIDAS PARA A AGRICULTURA E ALIMENTAÇÃO (FAO). Diagnóstico e planejamento do desenvolvimento sustentável do baixo São Francisco sergipano. Versão Preliminar, março 2003, mimeo.

NEY, M. G. & HOFFMANN, R. O efeito da posse da terra na renda dos agricultores conta própria e empregadores. In: Anais do XL Congresso Brasileiro de Economia e Sociologia Rural, Passo Fundo, Brasília: SOBER, 2002.

______. Desigualdade de renda na agricultura: o efeito da posse da terra. Economia, Recife-UFPE: ANPEC, v. 4, n° 1, jan./jun. 2003.

______. Origem familiar e desigualdade de renda na agricultura. Pesquisa e Planejamento Econômico, Rio de Janeiro: IPEA, v. 33, n° 3, dez. 2003.

NORDER, L. A. C. Políticas de assentamento e localidade: os desafios da reconstrução do trabalho rural no Brasil. Tese de Doutoramento em Ciências Sociais, Universidade de Wageningen, 2004.

PRADO JR., Caio. História Econômica do Brasil. 46ª reimpressão, São Paulo: Brasiliense, 2004.

______. Formação do Brasil Contemporâneo. 23ª edição, São Paulo: Brasiliense, 2004.

ROCKENBACH, O.C. Sistema diversificado de produção para pequenas propriedades. In: Anais do II Encontro Brasileiro de Agricultura Alternativa. Rio de Janeiro, 1985.

ROMEIRO, A. ;GUANZIROLI, C.; PALMEIRA, M. & LEITE, S. (orgs.) Reforma Agrária: produção, emprego e renda o relatório da FAO em debate. Petrópolis: Vozes, Rio de Janeiro: Ibase. 1994.

ROMEIRO, Ademar. “Renda e emprego: a viabilidade e o sentido da Reforma Agrária”. In: ROMEIRO, A. et al. Reforma Agrária: produção, emprego e renda o relatório da FAO em debate. Petrópolis: Vozes, Rio de Janeiro: Ibase. 1994.

SAMPAIO, Teodoro. O Rio São Francisco e a Chapada Diamantina. Organizado por José Carlos Barreto de Santana. São Paulo: Companhia das Letras, 2002.

SARACENO, E. Alternative readings of spatial differentiaton: the rural versus local economy approach in Italy. Europeam Review of Agricultural Economics, vol 21, 1994.

SCHNEIDER, Ingrid & SILVEIRA, Fernando Gaiger, Com ocupações e acampamentos fazem-se assentamentos, mas não Reforma Agrária. Indicadores Econômicos FEE, v. 19 (2), abril-junho de 1991, Porto Alegre.

275

Page 276: Alto Sertão - SE

SCHOR, Silvia M. A reprodução da desigualdade: um estudo sobre a pequena produção agrícola no Nordeste. Tese de Doutoramento em Economia, São Paulo, FEA-USP, 198x.

SILVA, Francisco Carlos Teixeira da. Camponeses e criadores na formação social da miséria – Porto da Folha no Sertão do São Francisco (1820-1920). Dissertação de mestrado em História, Rio de Janeiro, UFF, 1981.

______. “Pecuária e formação do mercado interno no Brasil-colônia. Estudos Sociedade e Agricultura. CPDA-UFRRJ, Rio de Janeiro, n° 8 , abril de 1997.

SILVEIRA NETO, Raul da Mota. Quão pró-pobre tem sido o crescimento econômico no nordeste? Evidências para o período 1991-2000. In: Anais do X Encontro de Economia Regional – ANPEC Nordeste, Fortaleza, 2005.

SPAROVEK, Gerd. A qualidade dos assentamentos da reforma agrária. São Paulo: Páginas & Letras, 2003.

VILLA, Marco Antonio. Vida e morte no sertão: história das secas no Nordeste nos séculos XIX e XX. São Paulo: Ática, 2000.

_____. “Que braseiro, que fornalha” Nossa História. Rio de Janeiro: Editora Vera Cruz, ano 2, n° 18, abril 2005.

WOORTMANN, E. F. Herdeiro, Parentes e Compadres: colonos do sul e sitiantes do nordeste. Brasília/São Paulo: EdUNB/Hucitec, 1995.

276

Page 277: Alto Sertão - SE

VIII. Anexos

VIII. 1. Relatório Parcial de Osvaldo Aly Junior - Oficina de Capacitação dos Técnicos do CECAC para a realização da Pesquisa Qualitativa sobre Desenvolvimento Territorial do Alto Sertão Sergipano

1- Metodologia para a Análise Qualitativa do Plano de Desenvolvimento Territorial

A metodologia para elaborar um Plano de Desenvolvimento Territorial, sob a ótica dos assentamentos rurais localizados no Alto Sertão Sergipano/SE, está relacionada com dois eixos de ação:

a. Levantamento da realidade social, econômica e ambiental do território82, onde os assentamentos estão presentes;b. Realização de um diagnóstico das políticas institucionais, de responsabilidade das diferentes esferas de governo e das ações dos

diversos organismos sociais (ONGs; Sindicatos; Igrejas; Movimentos Sociais; Cooperativas; etc.), presentes na economia local83, onde os assentamentos estão inseridos.

Esta metodologia possibilita que um Plano de Desenvolvimento Territorial seja formulado a partir de um diagnóstico do rumo da economia local e das possibilidades de desenvolvimento dos assentamentos selecionados e inseridos nesse território.

Esses dois eixos desta metodologia partem do princípio que a economia local é o reflexo do conflito de interesses dos atores sociais (frações do capital, trabalhadores, sindicatos, organizações sociais, órgãos públicos, entre outros) presentes num determinado território.

82 Adota-se como território um determinado espaço geográfico onde se expressa a totalidade concreta do processo de produção, distribuição, circulação/consumo, e suas articulações e mediações políticas, ideológicas, simbólicas, etc. Portanto, um produto concreto da luta de classes travada pela sociedade no processo de produção e reprodução de sua existência. É a contínua luta das classes sociais pela socialização, construção, manutenção e transformação do espaço/natureza.83 O enfoque da economia local está baseado na organização, na articulação e nas trocas do ambiente produtivo. Sendo assim, se incorpora o conceito de ambiente produtivo, unidade de referência em que uma combinação de fatores (históricos, sócio-econômicos, tecnológicos, ambientais e institucionais) a organiza e define sua competitividade, assim, esse contexto é que vai determinar a capacidade de desenvolvimento do território onde estão localizados os assentamentos. O ambiente produtivo é um lócus diversificado e contínuo por onde as transações dos assentamentos fluem de forma independente da localização das atividades econômicas, urbana ou rural. O conceito da economia local destaca um agrupamento espacial/geográfico, no qual se estabelece uma trama de relações entre os assentados e as atividades sociais, econômicas e institucionais. Nesses critérios as noções de meio rural e urbano, não são contraditórias, mas, complementares, visto cada vez mais se misturam no meio rural atividades econômicas e sociais, consumos, hábitos e culturas que antes eram típicas do urbano – o deslocamento da atividade “agrícola” do meio rural introduz um novo critério espacial, a economia local.

277

Page 278: Alto Sertão - SE

Nesta metodologia estão previstas atividades de capacitação. Serão atividades de caráter formativo, que buscará capacitar os participantes para realizar os procedimentos metodológicos, bem como analisar seus resultados, a fim de repassar os instrumentos necessários para a formulação do Plano de Desenvolvimento Territorial.

A partir desse aparato conceitual, os procedimentos metodológicos estarão centrados numa pesquisa qualitativa que abrangerá tanto um levantamento, processamento e análise de informações primárias e secundárias referentes: à economia nacional, estadual e regional; a relação dos assentamentos com estes ambientes, às políticas institucionais (públicas, privadas e do terceiro setor) presentes na região; bem como uma pesquisa de campo para compreender a articulação dos assentamentos com a economia local e a abrangência do território onde os assentados estão inseridos.

Assim, a pesquisa qualitativa será realizada em duas etapas. A primeira consiste na formação de uma base de dados estatísticos e bibliográficos e a segunda refere-se às viagens de campo, onde serão realizadas entrevistas qualitativas com diferentes agentes inseridos nos contextos das políticas institucionais, da economia local e da dinâmica dos assentamentos.

Estes procedimentos permitirão compreender: a economia local; em que medida a dinâmica dos assentamentos está articulada nesse contexto local e a abrangência do território a partir do impacto dos assentamentos no ambiente local.

O pressuposto implícito, nesta metodologia é que há uma associação entre o território e os assentamentos rurais. O território conforma-se num espaço geográfico de referência onde se delimita e se configura a dinâmica dos assentamentos, ou seja, o território é um espaço geográfico onde os assentamentos se articulam com o ambiente e com os agentes sociais da economia local. O enfoque território/economia local está baseado num espaço precisamente definido, que poderá ou não coincidir com a região administrativa – Alto Sertão Sergipano. A delimitação do território poderá até ir além da delimitação física dessa região administrativa, na qual os assentamentos rurais estão localizados no Estado.

Em vista disso, a delimitação do território, onde os assentamentos rurais estão inseridos, será resultado da percepção de determinados agentes locais qualificados. Assim, o território será configurado a partir de critérios subjetivos e específicos, a serem estabelecidos segundo a forma que cada um dos agentes qualificados se relacionam com o território, ou seja, a partir de elementos econômicos, políticos, produtivos, geográficos e sociais. Por exemplo, a delimitação do espaço territorial para um padre pode ser dada pela abrangência de sua paróquia ou diocese a qual pertence; para um empresário pode estar contida ou relacionada com a área de produção de sua matéria prima, enquanto, para outro empresário pode estar contida ou relacionada ao tamanho do mercado de seus produtos; para um político pode estar relacionada com o espaço em que se distribui suas bases de apoio eleitoral e/ou onde estão suas bases de votos, e assim por diante. Portanto, a compreensão das dinâmicas de inserção territorial dos assentamentos rurais será estabelecida pelas diferentes visões que os distintos agentes locais têm. A base territorial dos assentamentos será definida a partir da conjunção das percepções dos agentes locais.

278

Page 279: Alto Sertão - SE

Isso então significa que o território em que os assentamentos estão inseridos não será um espaço geograficamente definido a priori, mas sim, um resultado final obtido a partir das entrevistas qualitativas com os agentes locais.

Na etapa inicial, proceder-se-á a formação de uma base de dados secundários, constituindo-se em relatório preliminar, acerca: dos aspectos sócio-econômicos do Estado, da região do Alto Sertão Sergipano; das políticas institucionais; da estrutura produtiva rural da região do Alto Sertão Sergipano e dos assentamentos. Tendo como fonte de dados:

a. Censos Demográficos de 1991 e 2000. Deverão ser manuseados os dados individualizados da amostra do Censo, os chamados microdados, pois com eles será possível realizar uma radiografia das condições socioeconômicas e demográficas da população rural, bem como sua evolução na década de 90. Efetivamente serão analisados, entre outros, os seguintes indicadores: condições de habitação – tipo de domicílios, densidade de moradores, presença de banheiros, forma do abastecimento de água e de escoamento sanitário, educação – taxa de analfabetismo e anos médios de estudo da população adulta, freqüência a escola, estimativas de atraso escolar -, renda – renda domiciliar per capita, importância das transferências e das rendas não agrícolas no rendimento global, trabalho de crianças e adolescentes – características do chefe e da família – sexo, idade e raça da pessoa de referência, número de membros no domicilio, número de filhos, perfil etário domiciliar, participação de migrantes na população.

b. Atlas do Desenvolvimento Humano no Brasil, onde além dos índices sintéticos de desenvolvimento socioeconômico, disponibiliza uma rica gama de indicadores educacionais, de renda, de saúde, de condições habitacionais, etc. Vale salientar que esses dados abrangem o universo populacional total dos municípios, não existindo informações discriminadas para a população rural, o que será feito com os dados individualizados dos Censos, como apontado no item anterior.

c. Pesquisa Agrícola Municipal e Pesquisa Pecuária Municipal. Essas bases de dados fornecerão a evolução das principais culturas e criações no território durante os anos 90.

d. Bases de dados dos estudos realizados no âmbito do Projeto de Cooperação Técnica INCRA/FAO, em que informações municipais dos segmentos dos agricultores familiares e pronafianos. Além dos aqui apresentados, deverão ser analisados os indicadores acerca do uso de tecnologias, mão-de-obra ocupada, grau de especialização e de integração aos mercados, estrutura de despesas e ganhos, filiação a cooperativas e sindicatos, acesso a energia elétrica e assistência técnica, emprego de conservação de solos e manejo de praga, entre outros.

e. Dados do Pronaf: Crédito, do Pronaf-Infra-estrutura e Capacitação. A Secretaria da Agricultura Familiar divulga periodicamente o número de contratos e o valor financiado pelo crédito do Pronaf em cada municípios, segundo a modalidade, o enquadramento, o agente financeiro e a fonte dos recursos. Assim, cabe analisar a sua evolução no território, verificando, junto aos atores os efeitos na renda, no emprego e na produção, as limitações e obstáculos à ampliação dos beneficiários e as modificações necessárias para sua melhoria. Quanto ao Pronaf-Infra-Estrutura e Capacitação deve-se analisar, além dos Planos de Desenvolvimento Rural, os

279

Page 280: Alto Sertão - SE

planos de trabalho e respectivos projetos apresentados. Cabe, ademais, realizar um levantamento do histórico dos financiamentos já concedidos, das pendências e das principais dificuldades na gestão do Programa junto aos atores, conselhos, prefeituras e CEF.

f. O Censo Agropecuário de 1995/96, que fornecerá os dados da estrutura de posse da terra, bem como refinar a analise da estrutura produtiva agropecuária com base nos estudos do projeto INCRA/FAO.

g. Cadastro de Imóveis do Incra, que servirá de base para a análise da estrutura fundiária do território e para as estimativas das posses a serem regularizadas e do montante de terras devolutas ou passíveis de arrecadação pelo Estado de Sergipe.

h. Pesquisa de Informações Básicas Municipais do IBGE, que traz dados sobre oferta de serviços municipais, finanças públicas, aplicação de recursos, programas sociais, infra-estrutura urbana, estrutura administrativa, instrumentos de planejamento adotados.

i. Dados da Secretaria da Fazenda do Estado relativos a arrecadação de ICMS, IPVA, IPI, e repasse/transferência de receitas, visando caracterizar/dimensionar as economias dos municípios do Território.

j. Dados da ANEEL sobre Compensação Financeira Pela Utilização de Recursos Hídricos repassados pela Chesf para o Município de Canindé de São Francisco;

k. Informações da regularização fundiária que vem sendo levada a cabo pela Companhia de Desenvolvimento de Recursos Hídricos e Irrigação de Sergipe;

l. Dados do SIPRA sobre os assentamentos;m. Dados da pesquisa “A qualidade dos assentamentos da reforma agrária brasileira” realizada pelo Prof. Gerd Sparovek da USP,

que constam importantes dados sobre a situação produtiva, social, econômica dos assentamentos, permitindo avaliar os obstáculos ao desenvolvimento dos projetos localizados no território.

Nesta etapa buscará apresentar a configuração histórica do desenvolvimento das forças produtivas na economia regional e estadual, a realidade social e produtiva dos assentamentos, bem como o aparato de políticas públicas que se articulam na região do Alto Sertão Sergipano. O levantamento secundário a ser realizado deverá conter todas as diversas esferas de políticas públicas levadas a cabo na região.

A dificuldade encontrada na utilização das fontes secundárias citadas reside no fato de que essas não permitem traçar um perfil completo dos usos não agrícolas da zona rural, ou seja, não possibilitam mensurar a presença das atividades não agrícolas no meio rural. As fontes bibliográficas, por outro lado, ampliam as possibilidades para a obtenção dessas informações, importantes à medida que já não se pode considerar o meio rural apenas como o conjunto de atividades agropecuárias e agroindustriais.

A revisão do material bibliográfico, realizado conjuntamente com o levantamento dos dados estatísticos nesta primeira etapa buscará a compreensão dos elementos estruturais de maior impacto sobre as economias regional, estadual e nacional, como a relação entre a reorientação das políticas macroeconômicas e agrícolas e os ajustes macroeconômicos e o desempenho da agricultura brasileira. As informações advindas dessas leituras serão analisadas, interpretadas e fichadas com o propósito de serem utilizadas no andamento da pesquisa de campo, conforme se

280

Page 281: Alto Sertão - SE

afirmou. A continuidade do levantamento das informações bibliográficas poderá ocorrer de maneira associada às viagens ao campo, pois, no decorrer dela, ter-se-á oportunidade de contatar instituições (por exemplo: de ensino, de pesquisa, jornais, sindicatos ou outras), que atuam no território e geram informações.

Algumas atividades adicionais ao levantamento secundário, também serão realizadas nessa etapa. Será um momento de se compreender de as políticas institucionais na região. Para tanto, se propõe fazer as seguintes atividades de capacitação:

a. Levantamento das ações – de todas esferas de governo, de ONGs e outras instituições na região;b. Avaliação das finanças públicas municipais – financiamento público, investimento público, contas públicas;c. Analise da gestão das políticas publicas e da participação da comunidade;d. Síntese dos estudos, planos e diagnósticos existentes.

A segunda etapa dos procedimentos metodológicos consiste numa pesquisa de campo, com determinados agentes sociais do território em que os assentamentos estão inseridos.

Os agentes qualificados serão selecionados previamente de acordo com sua representatividade junto aos diferentes setores que compõem a vida social, econômica e política do território. A relação de entrevistados deve expressar a diversidade de opiniões sobre o território. A amostra dos entrevistados será determinada através da escolha intencional, buscando-se privilegiar os atores locais envolvidos diretamente com o universo da pesquisa. Antes de iniciar as entrevistas, contudo, o pesquisador deve confirmar se o entrevistado é, de fato, a pessoa mais indicada para responder as questões relacionadas ao objeto de estudo. Essa característica do entrevistado depende, basicamente, da inserção que esse possui na economia local. Caso o entrevistado não corresponda a esses quesitos, é importante que ele indique outras pessoas para participar da entrevista ou para serem entrevistadas em ocasião posterior.

Para as entrevistas elaborar-se-á um roteiro com questões de caráter abrangente e flexível, que possibilitem aos pesquisadores, quando necessário, a ampliação do objeto de seu estudo e a obtenção de diversos aspectos acerca desse.

A realização do trabalho de campo é um processo dinâmico que interage e que é complementado com os resultados obtidos na etapa anterior. Mesmo sendo que, na primeira etapa, os dados levantados sejam de uma região definida a priori – região do Alto Sertão Sergipano, visto que, só será definido o território de inserção dos assentamentos na segunda etapa. Isso significa que o andamento dessas etapas deve se dar em seqüência, pois, mesmo interagindo entre si, os resultados obtidos em cada uma delas fornecem elementos para a outra etapa.

281

Page 282: Alto Sertão - SE

Outras atividades formativas adicionais que antecedem a pesquisa de campo também serão realizadas. Será um momento de se apropriar dos procedimentos metodológicos da pesquisa de campo, bem como lhe dar forma: definir os agentes qualificados a serem entrevistados; elaborar o roteiro de entrevistas; definir a equipe de campo; treinar a equipe de campo.

Os procedimentos a serem adotados para a consecução da pesquisa de campo terão que ser definidos de tal forma a fornecer os recursos adequados para a discussão do objeto de estudo e ampliar as possibilidades de análise do mesmo, quando necessário, criando as condições adequadas para a compreensão da dinâmica territorial dos assentamentos rurais.

2- Descrevendo a Região

A denominação de Alto Sertão Sergipano se deve a localização geográfica desta região ao Norte e ao Oeste do Estado. Assim como a denominação de Baixo Sertão do São Francisco se deve a localização desta parte do Sertão com relação à nascente do rio São Francisco.

Caracterizam esta região o clima semi-árido, seco, a baixa precipitação anual (em torno de 450 mm) e sua mal distribuição durante o ano. O bioma da caatinga produto da condição climática que desenvolveu solos poucos profundos. A caatinga foi muito importante para a adaptação da população que ocupou esta região sendo importante fonte de alimentos para os humanos e animais, essa perda de importância está relacionada a diminuição da área de caatinga e à sua degradação.

Na região Centro-Norte de Sergipe é comum dizer-se que para cima do município de Própria tem início a região do Sertão, e que deste município seguindo em direção a foz do rio São Francisco está o Litoral. Esta região está localizada entre os estados de Alagoas, Bahia e Pernambuco e conta com uma boa rede de rodovias e, isto é encarado pela população regional como um potencial que pode ser melhor explorado do ponto de vista comercial.

As principais atividades econômicas são a agropecuária que tem no leite e na sua industrialização (mussarela, requeijão, queijo de coalho, manteiga, etc) o principal produto regional, que é vendido para a Paraíba, Bahia, Alagoas, e para o próprio Sergipe. Também foram citadas a ovinocultura, a caprinocultura, a apicultura (em crescimento), destaca-se ainda a produção de subsistência à base de grãos (milho e feijão).

Além da agropecuária foram citados como fontes de emprego e renda para as famílias da região: o serviço público (como principal empregador no meio urbano), a construção civil, o comércio, o trabalho de diarista, o artesanato e, a pesca artesanal. A aposentadoria rural e as políticas de transferência de renda como o bolsa alimentação, vale gás, bolsa escola, etc também foram destacadas como importante fonte de renda para as famílias.

282

Page 283: Alto Sertão - SE

A comercialização através das feiras também é uma fonte de emprego e renda, no entanto a comercialização nas feiras tem presença predominante de pessoas oriundas de Itabaiana. Na área da comercialização foi destacada a importância que no passado tiveram Própria e Pão de Açúcar. Hoje em dia sua importância é menor.

A construção da Hidrelétrica de Xingó teve grande importância para a economia regional, ela foi um grande consumidor da produção local e um grande gerador de postos de trabalho. A figura do “barrageiro” foi destacada por se tratar de pessoas que vivem das possibilidades de emprego e renda criadas pela construção de grandes obras. Uma vez terminada a obra e desativados os canteiros de obras eles seguem, como ciganos, para a próxima obra.

A construção da Hidrelétrica de Xingo criou uma condição diferenciada para Canindé do São Francisco por conta deste município receber o ICMS gerado pela usina hidrelétrica o que faz deste município um dos principais orçamentos municipais do Estado.

O Território do Alto Sertão foi sub-dividido pelos presentes em dois sub-territórios e isto está muito relacionado com uma maior e menor presença de chuvas:

1- o primeiro, com maior precipitação, permitiu o desenvolvimento de um sistema que inclui a agricultura de grãos (milho e feijão) como maior grau de sucesso e a pecuária leiteira. Este sub-território é formado por três municípios Nossa Senhora da Glória, Porto da Folha e Gararu;

2- o segundo, com menor precipitação, permitiu o desenvolvimento da pecuária leiteira mas existe um esforço produtivo dos agricultores de plantar lavoura de grãos com uma menor chance de sucesso, devido à menor precipitação. Isto acaba por elevar o risco das lavouras. Nesta região o governo estadual busca desenvolver a agricultura irrigada, motivo de disputa com os movimentos sociais, principalmente quanto ao público a ser beneficiado. Este sub-território é formado pelos municípios de Monte Alegre, Canindé de São Francisco e Poço Redondo.

Os participantes da oficina consideraram que o rural é o principal elemento do desenvolvimento da região. Eles destacaram três elementos como necessários para a democratização do acesso para que se promova um melhor desenvolvimento da região: a água, a terra e a tecnologia.

No caso da reforma agrária, foi destacada a influência que os grandes fazendeiros da região possuem com figuras políticas do Estado e isso historicamente tem bloqueado o avanço da desapropriação de imóveis.

No aspecto demográfico, populacional, foi apresentada aos participantes a indagação a respeito do contingente populacional e se a quantidade de área agricultável existente seria suficiente para promover o emprego e geração de renda para todos. As respostas não foram conclusivas.

283

Page 284: Alto Sertão - SE

A região é carente de infra-estrutura, apesar de ser um importante pólo produtor de energia elétrica, a maioria das residências rurais não possui acesso à energia elétrica. Segundo consta, e precisa ser melhor investigado, o estado de Sergipe possui a menor porcentagem de ligações elétricas no meio rural. È importante destacar que durante o evento houve uma reunião com o coordenador do Luz para Todos da região e este informou das dificuldades que ele está tendo em envolver a concessionária de Sergipe a aderir ao programa.

2.1 - Agricultura

A agricultura familiar da região se caracteriza pelo tamanho pequeno de área, uma forte presença de minifúndios, e pelo aumento do número de assentamentos e da população residente no meio rural.

Há 15 anos a produção de mandioca entrou em declínio na região o que levou a que muitas casas de farinha fossem abandonadas. Os participantes alegaram que houve uma mudança no clima. As chuvas de setembro que permitiam o plantio desta lavoura já não acontecem mais.

Crédito

Os presentes descreveram a dificuldade que possuem os assentados e agricultores familiares para acessar ao crédito rural; quando sai, ele é liberado após o período recomendado para o plantio. Nesse quadro os agricultores perdem o direito ao Proagro e o risco é por sua conta.

Aqueles que conseguiram renegociar o Procera e mesmo os créditos do Pronaf até 2000 não tiveram acesso a novo financiamento, a maioria continua devedor do tesouro nacional. A principal dificuldade é o acesso a novos financiamentos de investimento.

A agricultura familiar da região não tem acesso ao Proagro. A seca e o atraso na liberação dos recursos, que coloca a lavoura em situação de risco devido ao atraso no plantio, são os principais fatores que levam à inadimplência dos assentados e dos agricultores familiares.

Muitos agricultores não têm acesso ao financiamento porque faltam os documentos que comprovam a propriedade da terra, herança de pais e avós não dividida formalmente no cartório, que os impede de ter acesso aos financiamentos bancários. Situação que poderia ser resolvida pela regularização.

Ates

284

Page 285: Alto Sertão - SE

Houve uma queixa generalizada com relação aos serviços prestados pela assistência técnica oficial estadual, além de precária, ela não é constante. Na maioria dos casos as orientações técnicas vêm após a implementação das culturas ou dos projetos de investimento. Alguns consideraram que os projetos indicados para os assentados ou agricultores são equivocados.

Tecnologia e informação

Os depoimentos colhidos atestam que é grande a dificuldade, que possuem os agricultores familiares e os assentados, de se acessar novos conhecimentos e informações sobre a produção e a tecnologia. A presença da Codesvaf e da Embrapa, entre outros órgãos, neste Estado não se traduz em melhorias para a produção e a qualidade de vida.

Produção

O leite é o principal produto em termos de geração de renda para a agricultura familiar e a reforma agrária nesta região. Existe toda uma cadeia de produção que vai da produção a industrialização e aproveitamento do soro, sub-produto da industrialização do leite, para a criação de suínos. No entanto, esse queijo é produzido em fabriquetas clandestinas, que não possuem controle sanitário e sua comercialização se restringe à região. Quando este produto se dirige para outros estados isto ocorre forma clandestina.

Comercialização

Os agricultores da região ainda dependem da figura do atravessador para realizar a venda de suas mercadorias. Também a feira regional de Glória tem importância na formação da renda do produtor e na circulação das mercadorias. (Quem é que financia aqueles que não conseguem obter crédito junto aos bancos??)

2.2 - Meio Ambiente

A pressão de desmatamento sobre a caatinga, como fonte de renda para o pequeno produtor e para os assentados é muito grande. Ela é resultado da falta de políticas estruturantes que alterem a situação de pobreza ali existente, vender lenha passou a ser uma importante fonte de renda para abastecer a produção de cerâmica das regiões de Própria e Paulo Afonso??, na Bahia.

O aumento populacional e a carência de políticas públicas que apóiem a alteração do hábito de suprimir a caatinga como fonte de renda tem levado à mudanças de práticas e hábitos culturais como o da criação de caprinos.

285

Page 286: Alto Sertão - SE

A situação crítica da precipitação e do acesso à água é um elemento importante na caracterização desta região, interferindo em todos os aspectos da vida regional.

2.3-Ação de Estado

Existe uma desarticulação entre as políticas públicas desenvolvidas pelos diferentes órgãos e esferas de governo. A gestão social e o acompanhamento do desenvolvimento destas ações não são abertos à população interessada e suas organizações.A ausência de políticas públicas de garantia de renda para o produtor é um elemento importante na queda da renda e na dificuldade em se honrar com os compromissos ante os bancos. Não existe uma estabilidade de preços o agricultor compra caro e vende barato.

2.3.1-Políticas Sociais (Educação, Saúde, etc)

Os presentes descreveram que nos últimos anos, no meio rural, houve um incremento no acesso a alguns bens básicos como moradia, educação, energia, saúde, irrigação, etc, mas, entretanto, com isto não é possível afirmar que houve uma melhoria na vida das pessoas.

A falta de qualidade da educação é o aspecto mais destacado, somado ao elevado índice de pessoas analfabetas no meio rural. Houve uma afirmação geral de que a quantidade de salas de aula nos municípios da região cresceu.

No entanto, a prática de misturar diferentes séries (ensino multiseriado) numa mesma sala ainda permanece, sinal da carência de professores, do desprezo/descaso das autoridades públicas para a importância de se contratar mais professores para o meio rural ou da incapacidade financeira do município em arcar com o custo da contratação de novos professores.

A precariedade do transporte dos alunos que residem na zona rural e estudam na sede do município foi destacada pelos participantes. Ainda, aa área da educação a região possui as instalações construídas pelo governo do Estado para se instalar uma escola agrotécnica, mas isto não ocorreu e as instalações foram destinadas para instalar uma escola de ensino regular.

Foi destacado que através da reforma agrária e do PRONERA – Programa Nacional de Educação da Reforma Agrária - em Sergipe foram criados dois cursos de nível superior para os filhos dos assentados: magistério e agronomia. Estes cursos são desenvolvidos pela Universidade Federal de Sergipe.

Na área da saúde foi destacada a ação mais curativa que preventiva da medicina regional, e não se pode desvincular a qualidade da alimentação e a sua conseqüência sobre os problemas de saúde. Na região existe o médico de família que atende ao meio rural e os municípios possuem postos

286

Page 287: Alto Sertão - SE

de saúde. Mas em casos graves as pessoas têm que ser deslocadas para Glória ou Aracaju. No município de Glória existe um Hospital que é produto de um consórcio entre 11 municípios da região, mas sucede que ninguém tem contribuído financeiramente e o hospital está em crise.

2.4-Organizações da Sociedade Civil e Atores no Desenvolvimento Regional

A capacidade de organização dos agricultores familiares e assentados da região é tida como de baixa capacidade de influência nas decisões que afetam a vida dos moradores do meio rural. Os participantes consideraram que ela é tutelada pelas lideranças tradicionais e é imediatista, faltando uma visão de mais longo prazo.

Deagro - Departamento de agricultura do Estado de Sergipe, presta assistência técnica e divulgação de tecnologia, os presentes fizeram muitas críticas a atuação deste órgão e do governo de estado com relação a sua ausência na mobilização pelo retorno da região no caso do zoneamento agrícola para a ter acesso ao financiamento para o milho e o feijão. No entanto, muitos destacaram que a situação da Ates em Sergipe é melhor que em outros estados nordestinos.

MDA - Ministério do Desenvolvimento Agrário através da presença da Secretaria de Desenvolvimento Territorial - SDT e INCRA, que atuam na discussão do desenvolvimento regional, através do Pronaf infra-estrutura e do Colegiado do Território e o INCRA pela sua importância na desapropriação e assentamento dos acampados.

Também foi citado, mas sem muito destaque a Secretaria da Reforma Agrária e os problemas por ela criados devido à falta de articulação com as políticas de reforma agrária e com o colegiado do território.

Ainda foi citado o Projeto Dom Helder Câmara, que conta com recursos do FIDA (Fundo Internacional para o Desenvolvimento da Agricultura) projeto de combate à pobreza rural que tem apoiado a produção rural e a construção de cisternas.

Secretarias da Agricultura dos municípios - foi destacado que várias prefeituras possuem secretarias ou departamento de agricultura, que atuam no apoio a produção rural.

CECAC - Centro de Capacitação Canudos – Organização ligada ao MST que presta serviço de assistência técnica e capacitação de assentados e agricultores familiares.

MPA – Movimento dos Pequenos Agricultores, organização existente no município de Poço Redondo. Também presta assistência aos agricultores familiares.

287

Page 288: Alto Sertão - SE

Banco do Nordeste e Banco do Brasil – o acesso aos gerentes é muito ruim. As políticas de financiamento não chegam ao assentado, ocorrem problemas de diferentes tipos como a inadimplência que não consegue ser renegociada porque os recursos são do tesouro nacional e já foram inscritos na dívida pública; dificuldade de acesso ao Proagro mesmo com a frustração de safra.

CONAB – Companhia Nacional de Abastecimento- a empresa estatal no ano de 2003ou 2004 conseguiu realizar 860 contratos de compra antecipada.

3 - Alternativas em Andamento e a serem propostas:

Segundo os participantes uma proposta de desenvolvimento para a região deve necessariamente enfrentar dois entraves: o desemprego e a pobreza. Outro elemento destacado foi a necessidade de desconcentrar a propriedade da terra.

Um elemento determinante para que se promova algum tipo de desenvolvimento é ter acesso a políticas públicas desenvolvimentistas, no entanto, elas muitas vezes ocorrem de maneira dispersa, não integrando diferentes áreas. Neste sentido, é preciso analisar os impactos já ocorridos e aqueles que poderão advir, assim como apontar a possibilidade de correção de rumos, bem de inovações nestas ações.

Novo Modelo de Assentamento

É preciso pensar um novo modelo de desenvolvimento dos assentamentos, em que se leve em conta a realidade ambiental do sertão buscando aperfeiçoar as técnicas produtivas. Isto se aplica para a produção do leite, o convívio com a caatinga como elemento determinante nas opções tecnológicas e a influência que irá representar o advento da irrigação. É preciso levar em conta que a estratégia do desenvolvimento dos assentamentos nesta região deverão cuidar da segurança alimentar e fazer avançar a agroecologia.

Organização e mobilização social

Ao mesmo tempo em que os presentes descreveram a região como carente de organização e portanto força social e política para disputar e obter vitórias que resultem em melhorias para o desenvolvimento, destaco-se a presença do MST e do Colegiado do Território, como estruturas e instituições que contribuem no processo de mobilização e organização e assim modificar esse panorama descrito.

288

Page 289: Alto Sertão - SE

Com relação ao Colegiado do Território, esta é uma estrutura resultante da ação da SDT/MDA (Secretaria de Desenvolvimento Territorial do Ministério do Desenvolvimento Agrário) para as regiões definidas pelos movimentos sociais como prioritárias para ação do desenvolvimento territorial. No caso do Colegiado do Alto Sertão Sergipano ele é composto por 27 membros (quais são eles).

Este Colegiado ganhou destaque pela sua atuação e mobilização contra a portaria do MAPA (Ministério da Agricultura) e do Banco do Brasil que deixou a região fora do zoneamento agrícola para o milho e possivelmente o feijão.

Através do Colegiado ocorreram manifestações de rua, com mais de 500 agricultores presentes e os seis prefeitos que conformam a região foram a Brasília discutir a situação junto ao MDA e ao MAPA.

Este fato permitiu a consolidação de alianças institucionais entre o conjunto do Colegiado e outros órgãos públicos, como foi o caso da Embrapa dos Tabuleiros Costeiros. A Embrapa possui um corpo técnico que vem pesquisando, juntamente com a Embrapa do Semi-Àrido situada em Petrolina, variedades de milho precoce capazes de obter boa produção em regiões com precipitação semelhante a que ocorre no ´semi-árido sergipano.

Este episódio é apresentado como mais um exemplo do preconceito contra o povo do semi-árido, uma vez que o mesmo fenômeno vem ocorrendo na região Sul do país e não recebe este tipo de tratamento.

Neste caso o Associativismo e o Cooperativismo foram destacados como casos a serem analisados sobre as suas possibilidades e o seu impacto sobre o desenvolvimento da agricultura familiar e dos assentamentos, principalmente nos aspectos produtivos e de comercialização.

Comercialização

O fluxo de comercialização dos produtos da região para as demais regiões do Estado e dos estados vizinhos deve ser um elemento central para se discutir as alternativas para o desenvolvimento da região e a partir daí elaborar-se propostas para a inclusão dos assentamentos em novos mecanismos de comercialização.

Neste particular a localização da região e a facilidade de acesso via estradas e também por água que criam meios de comunicação entre a região e outras localidades de estados com Bahia, Alagoas e o próprio Sergipe devem ser melhor aproveitadas como potencial produtivo.

Turismo

289

Page 290: Alto Sertão - SE

Com relação ao turismo a região possui atrativos que são os Canions do rio São Francisco, mas também é preciso identificar quem serão os principais beneficiários do desenvolvimento da indústria do turismo e como o meio rural poderá se beneficiar desta fonte de renda que poderá ser desenvolvida e disputa na região.

Foram destacados como pontos positivos ou importantes a serem levados em conta na potencialidade do desenvolvimento do turismo na região a presença da Caatinga, a Trilha do Cangaço, o município histórico de Piranhas, em Alagoas, o artesanato, a comida regional (foram citados a Doceira Dona Nena, os doces de Monte Alegre e Glória) e o rio São Francisco.

Um dos pontos destacados pelos participantes da oficina foi o de que as iniciativas nesta direção deverão considerar a importância da preservação da identidade cultural regional como um elemento constitutivo dessa política.

Convivência com o Semi-árido

É preciso buscar informações sobre experiências que mostrem um elenco de possibilidade de convivência com o semi-árido e que estes sejam os elementos a serem trabalhados pela assistência técnica. Abaixo são citados alguns exemplos:

Acesso ao conhecimento

É preciso divulgar e estimular a produção de novos conhecimentos sobre o semi-árido de forma a que isto gere se cumpra a meta de se chegar a uma produção sustentável no semi-árido.

Uso racional dos recursos hídricos

A região possui condições de acesso à água no entanto, faltam meios para utilizá-la, seja através da irrigação e do uso racional.

Na área da conservação de recursos hídricos uma tecnologia a ser melhor explorada é da barragem profunda, o sistema mandala, etc.

Alternativas produtivas

É preciso levar em consideração que o leite é principal elemento na construção de uma estratégia de desenvolvimento da reforma agrária e agricultura familiar regional, ele é a principal garantia de renda.

290

Page 291: Alto Sertão - SE

a. animais de pequeno porte

Aves rústicas da região e exóticas.

Em Cabaceiras na Paraíba, foi citada a experiência de criação de caprinos na caatinga com o manejo de plantas úteis. O Programa de caprinos promove o consumo de leite via merenda escolar. Ainda existe um abatedouro atrelado a um curtume cujos couros são curtidos com angico, uma espécie de árvore da caatinga.

b. agropecuária

É preciso melhor investigar a possibilidade de se desenvolver os SAF’s -Sistemas Agroflorestais-, a produção de sementes crioulas, etc.

4 - Hipóteses norteadoras para trabalho sobre o desenvolvimento do Sertão Sergipano ( a ser detalhada)

1- o papel do leite no impulso da economia local;2- a irrigação como um novo elemento do desenvolvimento;3- o convívio com o semi-árido como elemento de preservação da agricultura de sequeiro;4- a alta densidade populacional e a tendência de se manter na agropecuária a principal fonte de emprego;5- a presença do MST e a consolidação da sua hegemonia ante outros atores sociais (pequenos agricultores, partido dos trabalhadores,

embrapa, conab, universidade federal de Sergipe) como elemento de dinamização da organização social na região;6- localização da região e o potencial de comercialização em Sergipe, Paraíba, Alagoas e Bahia.7- O acesso ao conhecimento, informação e tecnologia são elementos determinantes no desenvolvimento dos assentamentos.

5 - O Diagnóstico para o Plano deverá conter as seguintes informações:

- entender os funcionamento da economia região;- caracterizar a região sob o ponto de vista fundiário e identificar qual a importância da reforma agrária nesta região;- descrever as principais atividades desenvolvidas no meio rural (a pecuária leiteira, a agricultura,etc), a relação entre elas e os demais

setores da economia;- identificar as principais cadeias produtivas e as suas interelações com os demais setores da economia e mesmo da agropecuária;- entender e descrever os demais segmentos (serviços, comércio, indústria, etc);- aspectos e indicadores sociais (saúde, educação, previdência, transferência de renda, etc);

291

Page 292: Alto Sertão - SE

- identificar e descrever as organizações sociais existentes, sua atuação e as que se destacam;- descrever quais são e como atuam as instituições do meio rural e da região e buscar identificar quais as que se voltam mais para as ações

assistencialistas ou desenvolvimentistas;- identificar como se encontra a motivação e quais as iniciativas que merecem destaque no sentido de promover o uso sustentável e a

preservação da caatinga e do semi-árido e dos recursos hídricos;- quais os principais elementos que se estacam ou que carecem ser desenvolvido em termos de infra-estrutura produtiva e de

comercialização;

VIII. 2. Roteiro de Entrevistas

Localidade:Município:Nome do entrevistador:Data:

A – IDENTIFICAÇÃO

Nome:Sexo:Idade:Local de nascimento:Grau de escolaridade:Formação:Tempo de moradia no município:

B – ORIGEM E TRAJETÓRIA

Objetivo: verificar se o entrevistado se identifica como um ator social importante na região. 1. Onde o senhor(a) nasceu? Como e por que veio para aqui?2. Quando foi que o Senhor(a) ingressou nessa organização/instituição (citar o nome) e qual foi o motivo?3. Se for empresário, comerciante ou grande produtor: o senhor(a) é membro de alguma associação ou cooperativa? Por que? Qual o papel

que o Senhor atribui as associações existentes?

292

Page 293: Alto Sertão - SE

Quando a trajetória do ator vier a melhor qualifica-lo ou tendo interesse para o diagnóstico da região continuar explorando o ator. caso contrário seguir para a próxima parte.

4. Qual a diferença da sua vida hoje comparada há vinte 20 anos atrás no que se refere à questão socioeconômica?

C – CARACTERIZAÇÃO DA REGIÃO

Objetivo: verificar como o ator compreende a dinâmica da região.1. O que você entende por região do Alto Sertão Sergipano?2. Caracterize a região:

a) Do ponto econômico b) Do ponto de vista socialc) O meio ambiente (clima, vegetação, água e solo)

3. Que características o senhor(a) destacaria em cada um dos municípios?4. Qual a importância do meio rural para seu município? Fale da sua dinâmica e dos seus problemas. 5. Qual a importância do meio urbano para seu município? Fale da sua dinâmica e dos seus problemas. 6. Quais seriam as atividades e os produtos mais importantes na geração de renda para a região?7. Você vê a região do Alto Sertão como uma região homogênea/uniforme? Além destes municípios que compõe a região algum outro

município do estado ou de outro estado deveria fazer parte da região.8. Qual a importância do Alto Sertão para o desenvolvimento do estado? (avaliar a importância do leite).

D – ASPECTOS FUNDIÁRIOS E AGRÍCOLAS

1. Qual a importância das atividades agrícolas e pecuária na economia da região?2. Em relação ao estado em que atividades a região se destaca?3. Há alguma especialização dos proprietários segundo o tamanho da propriedade? Se sim, diga qual a atividade de pequenos/médios e

grandes.4. Na sua visão a divisão da terra é importante para o desenvolvimento do Alto Sertão? Explique por que sim ou não?5. A pequena propriedade é homogênea ou existem grandes diferenças entre elas, ou seja, na agricultura familiar. 6. Quais seriam as alternativas produtivas a serem introduzidas na região (com ênfase na agricultura familiar).7. Quais os modelos de produção que se destacam na região? O que precisa ser feito para melhora-los em termos de crédito, terra, água,

tecnologia?

293

Page 294: Alto Sertão - SE

8. De que forma o homem e o meio ambiente podem se relacionar de forma mais equilibrada.9. Quais as possibilidades e os limites da irrigação? Levando em conta que não há água suficiente e nem todas as terras são próprias para

irrigar como vê a agricultura de sequeiro e a convivência do semi-árido?IMPORTANTE. Discutir os temas da importância da água, da mini-fundização e da degradação ambiental.

E – POLÍTICAS PÚBLICAS E SEUS IMPACTOS

Objetivo: identificar as políticas públicas que o entrevistado considera importante verificando o impacto delas na vida econômica.1. Quais as principais ações dos governos (federal, estadual, mnincipal) na região? O Sr (a) tem conhecimento da ação de outras

organizações que não governamentais? Tipo Cáritas, D. Helder, CECAC, etc2. Quais as principais deficiências destas ações? 3. As bolsas (bolsa família/fome zero, etc) e as aposentadorias são importante fonte de renda para a região. Como você vê isto? Ela tem

contribuído para diminuir a pobreza? As pessoas se acomodam recebendo bolsa?4. Há muito desvio/vazamento de recursos? Os critérios de seleção das famílias são bons?5. Qual a importância do PRONAF? É suficiente? Quais os problemas? Tem chegado na hora certa? O Banco é impecilho? Renegociou,

Está endividado?6. E o Garantia Safra?7. Na sua opinião qual o papel dos conselhos? O Sr (a) participa de algum? 8. Estes Conselhos têm ajudado no desenvolvimento da região? Eles tem autonomia? Qual a relação dos conselhos com as políticas da

prefeitura?9. Como você avalia a cultura política da região. Ela tem mudado nos últimos anos?10. Sobre a infra-estrutura? Como você avalia as estradas/ água/luz/saneamento básico/lixo?

F – O DESENVOLVIMENTO

1. Quais as instituições ou organizações que auxiliam ou atrapalham o desenvolvimento?2. Como elas tema atuado/ou não na região?3. Quais as políticas tem tido bom desempenho? E quais não são importantes?

VIII. 3. Entrevistas transcritas

294

Page 295: Alto Sertão - SE

- em arquivo digital anexo

VIII. 4. Caderno de Campo de Bernardo Campolina – viagem de 11 a 17/05 de 2005

Transcrição do Caderno de Campo da viagem realizada ao Sertão Sergipano no período de 11 a 17/05 de 2005.Dia 12/05

9 horas

Visita ao LATICÍNIO IRMÃOS SANTOS (Gerente: Nilton / Proprietário: Edmilson)

Pegamos o Sr. Erivaldo (Presidente do Sindicato Rural de Nossa Senhora da Glória) e fomos visitar um laticínio da região.

O laticínio processa 10 mil litros de leite/dia produzindo 1000 kg de queijo e manteiga/dia. O leite é coletado em latões. Segundo os entrevistados a existência de um tanque de resfriamento é inviável na situação que os produtores, a maioria pequenos, se encontram.

A fabriqueta compra leite dos pequenos e médios produtores, que abrangem cerca de 90 propriedades cuja produção varia de 20 a 500 litros/dia, devolvendo a eles o soro para a criação de suíno.

Segundo os Srs. Erivaldo e Nilton um dos maiores problemas é a falta de crédito.

O Mercado principal do queijo é a Paraíba, além do próprio Sergipe, Alagoas e Bahia. Depende de atravessadores pois não possui SIF ou qualquer outro selo – realidade da maioria das fabriquetas da região.

Atualmente emprega 12 pessoas. Apontou que a dívida é o grande empecilho ao desenvolvimento e engessou, principalmente os pequenos produtores.

O Prof. Juliano perguntou sobre o colegiado. Como funciona? Qual a composição? Qual a avaliação? O Sr. Erivaldo respondeu que não tem governo da sua composição. É formado em sua maioria por associações. Afirmou também que falta uma política de valorização do leite, que ocorreu com incentivo do BNB mas que o programa já não existe mais.

295

Page 296: Alto Sertão - SE

Dia 12/05 - 10:30 – INCRA (Nossa Senhora da Glória)Conversa com os Srs. Hebert e Luiz Jacques

Fomos pedir o questionário para avaliação da renda dos assentamentos que o INCRA tem conduzido além de conversar sobre o Projeto Nova Califórnia.

Inicialmente o Sr. Hebert fez um paralelo de um antigo projeto de Irrigação – o Platô de Neopolis, explicando porque o mesmo não deu certo. Segundo ele, o que ocorreu foi a desapropriação dos pequenos produtores e a instalação de grandes empresários. O primeiro problema é que não indenizaram os pequenos que acabaram se tornando mão-de-obra barata dos grandes. O projeto acabou não dando certo e hoje estão plantando feijão na área.

Discorrendo sobre o Projeto Nova Califórnia, o Sr. Herbet explicou que o mesmo consiste em um modelo fechado para a produção de goiaba para atender a uma fábrica de ketchup de goiaba que se instalará na região. O modelo de produção é monopolista e quebra o movimento social da região da forma como está sendo estruturado (percepção que tivemos a partir de interpretações).

Segundo os entrevistados, a região assiste hoje um processo de valorização e especulação imobiliária com uma quadrilha atuando na compra de lotes nos assentamentos, em valores que variam de 15 a 30 mil reais por lote.

Dia 12/05 - 14 horas – Visita ao PA Nossa Senhora da Boa Hora

Passamos na secretaria do MST em Nossa Senhora da Glória e pegamos o dirigente José Almir que nos acompanhou até o assentamento Nossa Senhora da Boa Hora.

O Sr. José Almir acredita que o Colegiado do Território tem funcionado bem e conseguido articular e promover o território.

Chegamos ao assentamento por volta da 15 horas. O projeto está com 3 anos e na agrovila todos já estão com suas casas construídas e possuem cisterna de captação de água. É um total de 25 famílias.

A escola mais próxima fica a 3 km e a saúde é somente indo a Glória. No que diz respeito à produção é basicamente feijão, milho, gado e leite.

296

Page 297: Alto Sertão - SE

História:Ficaram cerca de 2 anos e 7 meses debaixo da lona. Quando o assentamento foi criado primeiro vieram as casas e depois a divisão dos lotes.

Crédito:O grande problema é que chega atrasado. A burocracia impede que chegue no tempo certo, geralmente chega depois da chuva. Apesar do atraso, ano passado, colheram 800 sacas de feijão e mais ou menos 1000 sacas de milho.

Os projetos para o assentamento (infra-estrutura e investimento tem vindo via BNB). O custeio é via PRONAF no Banco do Brasil.

Ainda não tem problemas com o banco, estão em dia com os pagamentos. A produção é vendida na feira. As casas vieram via INCRA.

Comércio:A produção é vendida na feira. No caso do leite é vendido a pequenas fabriquetas locais na faixa de 40 centavos/litro.

Associação:A associação existe mas não há nenhum trabalho coletivo. Associação possui uma máquina de fazer forragem para o gado.

Assistência Técnica:Via os técnicos do CECAC – Centro de Capacitação Canudos. Os técnicos visitam o assentamento de 2 a 3 vezes por mês, e são responsáveis pela elaboração dos projetos técnicos para os pedidos de financiamento da produção (PRONAF e outras linhas de crédito disponíveis, quando for o caso).

O tamanho dos lotes varia de 55 a 60 tarefas (1 hectare equivale a 3,3 tarefas). O assentamento ainda tem infra-estrutura precária no que diz respeito a escola (mais próxima a 3 km e não há transporte), posto médico e energia elétrica.

Por volta das 15:30 os técnicos do INCRA chegaram ao assentamento para uma reunião já agendada, da qual, participamos como ouvintes. O Sr. Hebert, funcionário do INCRA, deu início a reunião apresentando a nova equipe que acompanhará os assentamentos do Alto Sertão e os novos projetos para a região. Falou a respeito dos trabalhos de levantamento da produção dos assentamentos (que tem conduzido – vide formulário) e de sua execução junto ao PA num futuro próximo. Em seguida passou a discutir as dúvidas a respeito do crédito do Semi-árido. O programa tem por objetivo apoiar os assentamentos no que tange a problemas hídricos (construção de adutoras, caixas d’água, açudes, etc.). Como o recurso disponibilizado não foi suficiente para atender a todos os assentamentos, o técnico do INCRA explicou que foram privilegiados os

297

Page 298: Alto Sertão - SE

assentamentos sem nenhuma infra-estrutura hídrica e que o segundo critério foi o de recuperar barragens. No, em questão o assentamento não foi contemplado, pois todas as casas já possuem captação de água da chuva e o mesmo ainda não possui barragem para que possa entrar no programa de recuperação.

Donizete (líder da associação do PA) enfatizou e ponderou sobre a necessidade de construção de uma adutora.

Vários assentados reclamaram que apesar da existência da cisterna em cada uma das casas, durante a seca não foram atendidos pelo caminhão pipa. Segundo vários assentados o caminhão só veio para quem pagou. Hebert esclareceu que a responsabilidade de abastecimento d’água durante a seca, quando for o caso, é de responsabilidade da Prefeitura (no caso aqui Nossa Senhora da Glória), que recebe recursos do Ministério da Integração via Defesa Civil para esse trabalho. Assim, sugeriu que os assentados e a associação se organizassem e fizessem pressão junto a Prefeitura e se fosse o caso, levassem denúncia a Ministério Público.

Dia 13/05 – Município de Porto da Folha

9:00 – Conversa na Secretaria do MST com o líder do movimento no município, o Sr. Jocei.

A primeira informação é que o município de Porto da Folha possui 13 acampamentos com cerca de 670 famílias acampadas.

Começamos falando sobre o convênio entre a Prefeitura (do PT) e o CECAC e a FEACOM para a prestação de assistência técnica junto aos assentamentos e pequenos produtores da região.

Discorreu inicialmente sobre o embate entre governo do Estado e Prefeitura e afirmou que o convênio firmado foi a solução encontrada para a ausência da DEAGRO no município. O convênio garantiu o trabalho de 10 técnicos. No início foi difícil em decorrência do desconhecimento em relação ao trabalho do CECAC que tem atuado junto aos assentados e aos Pequenos Produtores ligados a FEACOM.

A FEACOM é uma federação que envolve aproximadamente 60 associações de pequenos produtores do Município. A criação desta entidade está ligada ao PT e principalmente à figura do atual Prefeito de Porto da Folha – Manuel de Rosinha.

O Sr. Jocei falou ainda do “arrendatário de pá cheio” – que arrenda a terra, mas não possui nem emprego e nem terra. As médias propriedades usam sua mão-de-obra para plantar palma e capim. Ainda sim, o arrendatário que não possui nem emprego e nem terra depende muito dos programas de transferência de renda e das aposentadorias.

298

Page 299: Alto Sertão - SE

Os que tem lotes na beira do Rio São Francisco e tem condições de sobreviver no lote do assentamento arrendam seus lotes para outras pessoas, ao invés de trabalhar nos mesmos.

Diferença entre os grupos:Segundo Jocei, os assentados estão em melhores condições que os arrendatários e alguns pequenos produtores devido a possibilidade de acesso a crédito e outros benefícios decorrentes do assentamento.

Crédito:Os assentados tem mais acesso à crédito do que os produtores independentes. Segundo o líder o crédito total (incluindo todas as linhas de PRONAF disponíveis) pode chegar a até R$ 20.000,00. Em Porto da Folha nenhum assentamento encontra-se em atraso (estão todos em dia).

PA Paulo FreireDiscorrendo sobre um dos principais assentamentos do município e um assentamento considerado modelo em relação a outros, o Sr. Jocei disse que as principais fontes de renda eram o feijão e o leite. No que diz respeito ao crédito o trabalho dos técnicos do CECAC é fundamental na elaboração dos projetos para os Bancos (do Brasil e do Nordeste).

Há, entretanto alguns problemas graves no PA Paulo Freire. Segundo Jocei tem ocorrido especulação com lotes no assentamento. Já houve inclusive intervenção da PF (Polícia Federal). Os lotes começaram a ser negociados a R$ 10 mil e hoje há lotes sendo vendidos a R$ 30 mil.

Projetos de IrrigaçãoPerguntamos ao Sr. Jocei como ele avalia os projetos de irrigação (em especial o Nova Califórnia) que tem sido elaborados pelo Governo do Estado. Está preocupado com os projetos e se de fato iram beneficiar os pequenos produtores e os assentados.

Segundo a conversa o projeto irá beneficiar 5 mil empresários e 3 mil famílias (entre assentados e acampados), mas está preocupado que os assentados e os acampados sejam colocados em terras de baixa fertilidade. Outro aspecto que o preocupa é o reparcelamento de assentamentos.

Políticas públicas:A EMBRAPA possui um banco de sementes na região (demonstrativo) e é parceira. No que diz respeito a CONAB não tem feito compra antecipada devido à perda da safra nos últimos anos. O Garantia Safra tem atendido os produtores (3800) que contratam custeio agrícola (fora o PRONAF), entretanto é insuficiente para todo o município.

299

Page 300: Alto Sertão - SE

Relatou também que quem está inadimplente junto a CONAB não fica junto ao Banco.

Conselho Territorial:Avalia que a preocupação é municipal e não regional, o que é ruim para o conjunto do território. Não há preocupação em relação ao todo. Cada município tem sua proposta e defende seus interesses próprios, sem, entretanto haver preocupação com o coletivo.

Os projetos têm sido aprovados no Conselho do Território em função da capacidade de articulação do prefeito.

13 horas - Vista ao Projeto de Assentamento Ilha do OuroO Sr. Júlio (Presidente da associação) nos recebeu para uma conversa.

São 94 famílias assentadas. A ocupação ocorreu em 1986 e o PA foi criado em 1989. O povoado que dá nome ao assentamento foi desapropriado junto com a fazenda que deu origem ao PA – 4800 tarefas é a área total. Plantavam arroz na várzea, depois da construção da Barragem da Hidrelétrica de Xingó passaram a plantar milho – perderam os períodos de vazante e cheia do rio. O feijão é somente para consumo. Para o plano de recuperação do assentamento é necessário na visão do Sr. Júlio um projeto de irrigação que é extremamente facilitada pelo Rio São Francisco e pelo Rio Capivara.

Segundo o Sr. Júlio, o custeio para a safra do ano ainda não saiu e já está atrasado. Possuem dívida junto ao FNE (PRONAF) e estão em fase de renegociação. Esta associação não está ligada a FEACOM.

O povoado não possui escola e o posto de saúde encontra-se fechado.

Dia 13/05 - 15 horas – Visita ao Assentamento Paulo Freire (o técnico do CECAC William nos acompanhou)Conversamos com os Srs. Raimundo e Luisão (presidente e tesoureiro da associação do assentamento).

O PA começou em 2000 e tem 40 famílias, das quais 2 desistiram. O acampamento data de 1995. Segundo eles, este foi o assentamento onde houve o menor número de venda de lotes.

Crédito:Pegaram PRONAF A no valor de R$ 12 mil e já começaram a pagar o financiamento. O PRONAF C estão começando a pegar.

300

Page 301: Alto Sertão - SE

A grande produção do PA é o leite, da ordem de 600 litros/dia que vendem para um fazendeiro ou para fabriqueta. Recebem por semana. O plantel do PA é de 150 vacas de leite, 81 novilhas, 58 garrotes e 142 bezerros.

Em relação à semente, ano passado foi via CONAB, mas não conseguiram pagar em função da perda de safra. Contarão com o apoio do Pró-agro este ano. Todas as casas da vila têm cisterna que foi construída pelo Instituto Dom José de Castro (ligado a Comissão Pastoral da Terra – CPT). Cada uma cabe 16 mil litros e tem valor estimado de cerca de R$1500,00.

A luz tem menos de 1 ano e foi conseguida através do programa “Luz para Todos”. Entretanto, a fazenda já possuía energia e fizeram gambiarra desde o início até que a companhia energética os atendesse.

O PA possui escola que funciona na antiga sede da fazenda. O programa PSF tem funcionado e o médico vem ao assentamento 1 vez por mês.

O Conselho Territorial o senhor Luisão afirma nunca ter ouvido falar. O Sr. Luisão externou suas preocupações e refletiu sobre o atual governo: não está satisfeito com Lula, já trabalho em São Bernardo do Campo e crítica o governo, está insatisfeito. Acredita que perdeu o voto no 2º turno das eleições presidenciais. Diz que o governo não criou nada. Afirmou que o bolsa família já existia no governo FHC. Disse ainda que durante o governo FHC havia crédito, trabalho e terra.

Já se faziam 15 dias que o ônibus que leva as crianças maiores para a escola mais próxima não circulava sob a alegação de falta de pagamento (a prefeitura não pagou o responsável pelo serviço).

O PA tem ainda uma adutora que não tem funcionado devido a problemas (sub-dimensionalização da canalização).

Dia 13/05 - 18 horas – Visita a FEACOM/Porto da Folha Fomos recebidos na FEACOM pela Sra. Solange (esteve no Seminário no Instituo Xingo).

Ela iniciou contanto um pouco a história e quem faz parte da FEACOM. Hoje a entidade conta com 50 associações filiadas, basicamente de pequenos produtores. Envolvem cerca de 2000 produtores. Começou em 1995 quando cerca de 70% dos produtores estavam endividados e Manuel de Rosinha (atual prefeito) foi um dos fundadores. A FEACOM ainda conta com associação de mulheres produtoras (costureiras, etc.) em seu quadro.

301

Page 302: Alto Sertão - SE

Segundo ela, a grande vantagem da FEACOM é a capacidade de organizar e lutar por interesses comuns. Cita como exemplo o convênio entre PREFEITURA/FEACOM/CECAC para prestar assistência técnica aos pequenos e aos assentados.

A inadimplência melhorou muito devido a renegociação e/ou pagamento. No momento a FEACOM trabalha na elaboração dos projetos de custeio para a safra 2005. O publico envolvido na entidade é muito heterogêneo (tamanho 50 a 100 tarefas).

Em relação ao Conselho, começaram a participar em 2004. O MST deu apoio a entrada da FEACOM no Conselho, mas havia muita “gente” contra. Afirma que em Porto da Folha o conselho tem funcionado e conseguido o apoio da prefeitura. Entretanto, afirma que há muita desavença entre os municípios. Ela afirma que Nossa Senhora da Glória se posiciona como a “Capital do Sertão” e reivindica tudo. Isso gera um grande desconforto e muita briga entre os municípios.

Segundo a Sra. Solange que mais puxa o conselho é o MST. Se não fosse a atuação do movimento possivelmente o conselho não estaria andando para “frente”.

Políticas públicas:A CONAB tem participado e dado pouco apoio. Afirma que o Comitê de Gestão do Fome Zero é enviesado e tem sido utilizado de forma errônea – que segundo ela foi o de reaproveitar o cadastro anterior e/ou manter a malandragem. Afirma que o Comitê é utilizado de forma política e sujeito à manipulação

O Banco Mundial tem um projeto de combate a pobreza através do PRONESE/Governo do Estado atuando na região.

Vê os projetos de irrigação da pior forma possível. Segundo ela, se os projetos forem para frente, os pequenos produtores irão perder suas terras (70% não tem título), o que facilitaria a tomada da área (desapropriação). A FEACOM é contra o projeto de irrigação da forma como está colocado.

Dia 14/05 – 10 horas da manhã - Nossa Senhora da Glória Conversa com Gismário (articulador do território)Esta conversa ocorreu na casa da Sra. Silvana que estava nos auxiliando e tinha por objetivo compreender melhor o

funcionamento do Conselho do Território.

302

Page 303: Alto Sertão - SE

Gismário começou explicando que foi indicado como articulador em abril de 2004 por João Daniel (líder do MST-SE). Entretanto, a discussão sobre o território começou antes, logo no princípio do Governo Lula. Gismário apóia o movimento há 11 anos. Sua indicação ocorreu em uma plenária realizada pelo movimento.

No conselho estão representadas 27 entidades, sendo 2/3 ligadas a movimentos sociais e ONG’s e 1/3 ligadas a instituições governamentais.

Assim temos: MST; FETASE; CARITAS; COOPERATIVAS; LATÍCINIO BARRA DA ONÇA; FEACOM (SOCIAIS) e SECRETARIA DA AGRICULTURA (DEAGRO), BNB; INCRA (GOVERNO).

Quem mantém o colegiado é a SDT, ligada ao MDA, disponibilizando recursos para pagamento do articular e recursos para realização de outras atividades.

A função do colegiado (Conselho) é articular e discutir os problemas do território, ou seja, da região do Sertão. Discutem-se os projetos de investimento (PRONAF-INFRA-ESTRUTURA, por exemplo) para a região. Tem prevalecido que se encontra mais organizado, no caso o MST.

Gismário fala também sobre a necessidade e importância de se buscar investimentos e recursos em outros órgãos e mistérios para além daqueles disponibilizados via PRONAF. A relação com as prefeituras, segundo ele, é boa. No caso do Governo do Estado, a relação com o Colegiado é mais complicada, pois a política do Estado é contra aquela proposta pelo Governo Federal.

Segundo Gismário, o Colegiado é um espaço de disputa e de articulação que está ciente de sua fraqueza no que tange a execução de políticas públicas, não possui nenhuma capacidade de implementar política alguma – depende de alguma prefeitura ou outro órgão oficial.

Gismário afirma ainda que o próprio MDA age contra o colegiado na medida em que tem projetos conflitantes na área. Cita o projeto Dom Hélder Câmara - resultado de um convênio com a FIDA (BM) que tem interesses contrários àqueles do colegiado, na tentativa de incorporar o Território ao Projeto Dom Hélder.

Disse que o Plano que estamos elaborando deve ser um instrumento de luta, informação e formação (capacitação dos atores). De forma sintética afirma que: o fogo amigo vem da SDT e o fogo inimigo do Governo do Estado.

16/05 – Município de Canindé de São Francisco

303

Page 304: Alto Sertão - SE

9 horas – Visita à sede da associação do PA Jacaré Curituba. Tivemos a oportunidade de conversar com a Sr. Irandi e o Sr. João Neguinho.

A Sr. Irandi começou contando um pouco a história da luta pela terra na região e a ocupação da área. Iniciou junto com a luta em 12 de março de 1996 quando 2400 famílias ocuparam a CHESF. Depois da ocupação se dirigiram para a Fazenda Cuiabá que se tornou o 1º assentamento. O Jacaré-Curituba foi ocupado no final de 1996, seria um projeto de irrigação empresarial.

Ela (Irandi) veio de Ribeirão Preto para entrar no movimento. Foi a primeira educadora no assentamento e hoje é Coordenadora Local e Pedagógica. Conseguiu dentro do MST terminar o segundo grau e está se preparando para prestar vestibular em pedagogia.

Hoje o Jacaré-Curituba está com um Projeto de Consolidação em que as 846 famílias assentadas estão divididas em 37 grupos de 26 famílias (agrovilas). Ela afirma que sem água não há estabilidade na produção. E por que a água não chegou? Ssegundo ela por falta de verba e vontade política.

Quem esta fazendo a obra é o Governo do Estado com recursos do Governo Federal. Estão gastando com estudos e não tem implementado nada, mas há um comprometimento político para se fazer a obra (a Odebrech é a responsável pela obra – mas já avisou que não monta o canteiro de obra enquanto não tiver garantido os recursos).

Está preocupada com o Novo Califórnia (novo projeto de irrigação que tem sido capitaneado pelo Governo do Estado) prevê reparcelamento dos PA’s Cuiabá, Modelo, Florestan Fernandes e Mandacaru.

Segundo a Sra. Irandi já se observa um aumento no preço dos lotes e uma tentativa de compra dos mesmos. Com relação ao crédito tem tido muitos problemas, principalmente devido aos problemas de compra e venda de lotes, que inviabilizam o aval solidário. Há 4 anos não colhem praticamente nada. Muita gente cria gado e pequenos animais e as transferências são parte substancial da renda dos assentados (bolsa escola, pensões, aposentadorias e outros programas).

Hoje há 5 escolas dentro do assentamento e 1048 alunos. Alguns estudam em Canindé de São Francisco ou em Poço Redondo. Alguns já conseguiram entrar na Universidade . Hoje são 52 professores sendo 4 formado pelo próprio movimento.

Colegiado:Vê o mesmo como importante, pois através dele tem conseguido discutir os problemas da região através de uma grande articulação. A briga pelo zoneamento agrícola (feita em fevereiro) é que permitiu a consolidação do colegiado. A forma como ficou definido o zoneamento agrícola foi

304

Page 305: Alto Sertão - SE

apenas satisfatória, pois não permitiu o plantio consorciado. No caso do Jacaré-Curituba, 80% dos assentados estão com dívidas no STN em função dos empréstimos tomados, em 2000, junto ao BNB.

A associação possui 11 tratores e 2 caminhões que estão parados por falta de dinheiro. Recebem assistência técnica do CECAC (6 técnicos), tem ainda 1 agrônomo e 1 veterinário.

O assentamento tem 2 postos de saúde (1 na agrovila e 1 no assentamento) ligados as prefeituras de Canindé de São Francisco e Poço Redondo. Possuem ainda 22 salas de aula para educação de jovens e adultos.

Tem sido beneficiados do PRONERA, que vem via INCRA, que faz um convênio com universidades para as áreas de Agronomia, História, Ciências Agrárias, Pedagogia e Técnico Agrícola.

A relação com a cidade é muito mais intensa hoje do que a alguns anos atrás. Depende da cidade para fazer as compras, pagar as contas, comprar outros objetos e serviços necessários.

10 horas – PA Jacaré-Curituba Conversa com Sr. João Gomes da Silva (conhecido como João Neguinho).

Começou discorrendo sobre a obra do Projeto de Irrigação do Jacaré-Curituba. Explicou que a 8 meses o Governo Federal liberou R$ 4 milhões. Entretanto, a empresa responsável pela obra (Odebrech) não topa vir montar o canteiro de obras se não houver pelo menos R$ 15 milhões.

Houve um acordo para que o Governo Federal colocasse R$ 4 milhões, o BID mais R$ 5 milhões e em um segundo momento o GF mais R$ 4 milhões para que dessem início as obras.

Entretanto, segundo afirma o Sr. João, o Governo Estadual gastou 3 milhões de reais comprando tubos e ainda não prestou contas e outro 1 milhão de reais com estudos de solo. Modificaram o zoneamento anterior do projeto e redividiram os setores.

O Sr. João explicou que a “FAO” já havia feito um estudo em 1998. Ele alega que o estudo que está sendo feito novamente é o mesmo que a FAO já havia elaborado, ou seja, há um desperdiço de dinheiro.

305

Page 306: Alto Sertão - SE

A obra toda do projeto foi orçada em R $22 milhões, 1 anos depois, o orçamento subiu para R$ 48 milhões. A obra foi iniciada em 1999 e a previsão de gastos era de R$ 32 milhões com previsão de entrega para o final de 2000. O Sr. João diz que o Governo Federal já gastou mais de R$ 80 milhões e até hoje a obra não está pronta.

Vê o projeto Nova Califórnia com muito receio e não acredita na palavra do Governo do Estado, que logo após a assinatura do termo de compromisso, segundo diz, afirmou que o que estava escrito na verdade não valia. Prevê conflito na área caso o projeto não saia da forma como foi acordado. Vê o MPA como parceiro dos assentados.

Avalia o Colegiado como um avanço. Segundo ele, as prefeituras participam com duplo interesse – tentar obter recursos e canalizar segundos seus interesses. Por outro lado, sem a participação das prefeituras não é possível viabilizar projeto algum via Colegiado que não tem força administrativa alguma do ponto de vista jurídico.

Afirma que a Prefeitura de Canindé de São Francisco é um problema dentro do Colegiado, pois, apesar de ser a mais rica (em função de royalties da CHESF) diz que não tem recursos e condições de apoiar em nada a região e os outros municípios.

306

Page 307: Alto Sertão - SE

VIII. 5. Relatório Visitas Técnicas a assentamentos rurais

Assentamento José Unaldo – Porto da Folha

Localização e condições de acesso: a 7 km da sede do município segue 25 km em estrada de areia, a maior parte em péssimas condições de tráfego, até chegar à beira do rio São Francisco, local da agrovila.

Infra-estrutura social: casas de alvenaria, com dois quartos, sala, cozinha e banheiro sem vaso sanitário. Não possuem energia elétrica e água encanada. Cada família tem sua cisterna. O assentamento possui uma escola onde trabalham dois professores (regime multiseriado). Na segunda-feira, dia de feira na sede usam o trator do vizinho como única via de transporte.

Produção: há uma área de, aproximadamente, 50 tarefas boas para irrigação. Em 15 tarefas de várzeas, há produção irrigada e coletiva de milho e feijão de corda, em sistema de micro aspersão. Há também outros 03 ha, 10 tarefas, da banana e maracujá.

Cada assentado possui 35 tarefas em área de sequeiro onde se planta milho e feijão. Há também o cultivo unitário do milho (zoneado). No lote há, aproximadamente, 10 tarefas plantadas. A perspectiva é de vender milho e feijão verde.

Há criação de ovelhas e gado de leite. Tira-se 10 litros/dia e vende-se a 0,25 centavos para uma fabriqueta próxima ou na lancha que vai para Niterói.Projetos: compra de trator, ampliação da escola e conclusão da energia/trifásico para movimentar os três motores da irrigação. Atualmente já foram iniciadas a instalação dos postes com ligação monofásica. A Energipe fará a mudança, mesmo em conflito com o fazendeiro vizinho que quer a monofásica.

Dado a origem da maioria das famílias (Lagoa Redonda – área de feijão), os agricultores têm dificuldades em torna-se pescadores. Segundo Cícero, presidente da associação, poderia inviabilizar um projeto de piscicultura. O rio tem pouco peixe, mas há uma lagoa onde pode se iniciar um projeto. Dado as condições da reserva florestal, é possível um projeto de apicultura.

Situação do crédito: dívida renegociada.

Entidades atuantes: MST/CECAC e PDHC.

Obs: nada de concreto foi observado no assentamento. Perderam a unidade demonstrativa de leucena e gliricídia. As ovelhas do projeto do Governo do Estado não chegaram.

307

Page 308: Alto Sertão - SE

Assentamento Nova Esperança – Gararu

Localização e condições de acesso: apesar de situa-se no território de Gararu, fica a 15 km da sede de Porto da Folha. Da rodovia asfaltada, segue 5 km em estrada de chão, em boas condições de tráfego. A assentamento é localizado a beira do rio São Francisco, porém numa área elevada e acidentada, cheia de mares de morro, o que dificulta o acesso e o uso do trator.

Infra-estrutura social: todos possuem casas de alvenaria; uma quadra de esporte em processo de construção via PDHC; um telefone público e uma caixa d’água alimentada gratuitamente pela prefeitura municipal de Gararu, durante uma hora ao dia.

Há duas escolas, apenas uma em boas condições de uso e em funcionamento; os jovens estudam a noite, na sede municipal. Muitos dos filhos de assentados moram fora do assentamento.

Produção: milho, feijão e palma. Segundo depoimentos, alguns assentados nada produzem. A criação de galinha é para o consumo familiar e existe uma produção de 10 a 15 litros de leite/dia por família.

Projetos: possibilidade de apicultura; piscicultura e irrigação.

Entidades: possui um dirigente estadual/técnico agrícola do MST; um filho de assentado no curso de agronomia e uma educadora do EJA;O PDHC: desenvolve alguns projetos: quadra de esporte, unidades demonstrativas e projeto de galinhas para as mulheres. A única em plena realização é a quadra.

Assentamento Fortaleza – Nossa Senhora da Glória

Localização e condições de acesso: saindo da sede, são 50 km em estrada de chão em condições razoavelmente boas.

Infra-estrutura social: possui as casas de alvenaria; uma escola municipal com duas professoras em sistema multiseriado. Os jovens vão estudar no povoado vizinho.

Produção: milho, feijão e palma. A produção de leite é de 10 a 15 litros dia; poucos vendem leite na época chuvosa, o preço não compensa. No verão a produção é de 2 a 3 litros/dia, sendo suficiente só para o consumo familiar. As famílias também criam galinhas para consumo interno.

308

Page 309: Alto Sertão - SE

Projetos: há um sonho de uma granja e a possibilidade de utilização do tanque para a criação de peixes. Segundo eles, o tanque não seca no verão. Em geral, o maior problema é a estiagem. Neste período eles são obrigados a vender as poucas criações que possuem.

Situação do crédito: uns estão endividados; alguns acessaram o crédito e outros não o fizeram em função da situação de irregularidade junto ao INCRA.

Relação com o MST: reclamam a ausência da militância e o isolamento do MST, porém, reconheceram a presença do técnico. Registraram que viver no assentamento só não é melhor em função do verão.

Assentamento Bom Jardim – Monte Alegre de Sergipe

Obs:1. todos os chefes de famílias, homens e mulheres, estavam no Banco do Brasil de Canindé para receberam seus custeios;2. Existe um levantamento da produção que será disponibilizado pelos técnicos da área.

Localização e condições de acesso: localiza-se a 25 km da sede do município. A via de acesso é uma estrada de chão, em boas condições de circulação.

309