Alem Da Esperanca Derrick Jensen

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  • 8/18/2019 Alem Da Esperanca Derrick Jensen

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    Além da esperança

    Derrick Jensen

    (Original em Inglês)As palavras mais comuns que ouço ditas por quaisquer ambientalistas em qualquer lugar

    são Estamos fodidos. A maioria desses ambientalistas estão lutando desesperadamente, usando

    todas as ferramentas que eles têm – ou melhor, todas as ferramentas legais que eles têm, o que

    significa que todas as ferramentas que os que estão no poder lhes concedem o direito de usar, o

    que significa que essas ferramentas serão em ltima an!lise inefica"es – para tentar proteger

    alguns pedaço de terra, para tentar parar o fabrico ou a liberação de venenos, para tentar

    impedir que os seres humanos civili"ados atormentem algum grupo de plantas ou animais. #s

    ve"es, eles estão redu"idos a tentar proteger apenas uma !rvore.

    Aqui est! como $ohn %sborn, um ativista e&traordin!rio e amigo, resume suas ra"'es para fa"er o

    trabalho *uando as coisas se tornam cada ve" mais ca+ticas, eu quero ter certe"a que algumasportas permanecem abertas. e os ursos-pardo ainda estão vivos em vinte, trinta e quarenta

    anos, eles ainda podem estar vivos em cinqenta. e eles se forem em vinte anos, eles terão ido

    embora para sempre./

    0as não importa o que os ambientalistas fa"em, nossos melhores esforços são insuficientes. 1+s

    estamos perdendo feio, em todas as frentes. Aqueles no poder estão firmemente decididos a

    destruir o planeta e a maioria das pessoas não se importa.

    2rancamente, eu não tenho muita esperança. 0as eu acho que isso 3 uma coisa boa. A esperança

    3 o que nos mant3m acorrentados ao sistema, o conglomerado de pessoas e ideias e ideais que

    est! causando a destruição da 4erra.

    5ara começar, h! a falsa esperança de que de repente, de alguma forma, o sistema pode

    ine&plicavelmente mudar. %u que a tecnologia nos salvar!. %u a 6rande 0ãe. %u seres da Alpha

    7entauri. %u $esus 7risto. %u 5apai 1oel. 4odas estas falsas esperanças condu"em 8 in3rcia, ou,

    pelo menos, a inefic!cia. 9ma ra"ão pela qual a minha mãe ficou com meu pai abusivo foi que

    não havia abrigos para acolhimento das mulheres agredidas nos anos :; e

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    provavelmente não nessa ordem. 4arde demais, ela fechou a tampa. Apenas uma coisa

    permaneceu na cai&a a esperança. Esperança, conta a hist+ria, foi o nico bem que a cai&a

    manteve entre muitos males, e permanece at3 ho?e como o nico consolo dessa humanidade em

    desgraça. em mencionar aqui a ação como sendo um conforto na desgraça, ou de realmente

    fa"er algo para aliviar ou eliminar a pr+pria desgraça.

    *uanto mais eu entendo a esperança, mais eu percebo que o tempo todo ela merecia estar na

    cai&a com as pragas, triste"a e corruptoresC que ela atende 8s necessidades de quem est! no

    poder, tão seguramente como a crença em um paraBso distanteC que a esperança 3 nada mais do

    que uma forma secular de nos manter na linha.

    A esperança 3, na verdade, uma maldição, uma desgraça. Digo isso não s+ por causa do belo

    prov3rbio budista Esperança e medo perseguem as caudas um do outro/, não s+ porque a

    esperança nos leva para longe do presente, longe de quem e onde estamos agora e para algum

    estado futuro imagin!rio. Digo isso devido ao que a esperança 3.

    2alamos sem parar e interminavelmente, em maior ou menor grau sobre esperança. ocê não iria

    acreditar – ou talve" você iria – quantos editores de revistas me pediram para escrever sobre oapocalipse, então me intimaram a dei&ar os leitores com um sentimento de esperança. 0as o

    que, e&atamente, 3 a esperança= Em uma palestra que dei na primavera passada, algu3m me

    pediu para defini-la. oltei a questão de volta para o pblico, e aqui est! a definição que todos

    n+s formulamos a esperança 3 um dese?o para uma condição futura sobre a qual você não tem

    nenhuma agênciaC o que significa que você 3 essencialmente impotente.

    Eu não vou, por e&emplo, te di"er que eu espero que eu coma alguma coisa amanhã. Eu apenas

    vou. Eu não espero que eu v! inspirar novamente agora, nem que eu v! terminar de escrever

    esta frase. Acabei de fa"ê-los. 5or outro lado, espero que a pr+&ima ve" que eu entrar em um

    avião, ele não caia. Esperar por algum resultado significa que você desistiu de qualquer agência

    que lhe di" respeito. 0uitas pessoas di"em que esperam que a cultura dominante pare de destruiro mundo. Di"endo isso, eles assumiram que a destruição vai continuar, pelo menos no curto

    pra"o, e eles se afastaram da sua pr+pria capacidade de participar de par!-la.

    Eu não espero que o salmão prateado sobreviva. Eu farei o que for preciso para garantir que a

    cultura dominante não os leve a e&tinção. e os salm'es querem nos dei&ar, porque eles não

    gostam de como eles estão sendo tratados – e quem poderia culp!-los= – eu vou di"er adeus, e

    eu vou sentir falta deles, mas se eles não querem ir embora, eu não vou permitir que a civili"ação

    os mate.

    *uando n+s percebemos o grau de ação que realmente temos, n+s não precisamos mais ter a

    esperança/. 1+s simplesmente fa"emos o trabalho. 1+s nos asseguramos de que o salmão

    sobrevive. 1os asseguramos de que os cães de padrarias sobrevivem. 1os asseguramos de que

    ursos sobrevivem. 1+s fa"emos o que 3 preciso.

    *uando paramos de esperar por a?uda e&terna, quando paramos de esperar que a terrBvel

    situação em que estamos, de alguma forma se resolver! so"inha, quando paramos de esperar

    que a situação de alguma forma não vai piorar, então estamos finalmente livres –

    verdadeiramente livres – para começar a trabalhar honestamente para resolvê-lo. Eu diria que

    quando a esperança morre, a ação começa.

    As pessoas 8s ve"es me perguntam e as coisas estão tão ruins, por que você não apenas se

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    mata=/ A resposta 3 que a vida 3 muito, muito boa. Eu sou um ser comple&o o suficiente que eu

    possa assegurar em meu coração a compreensão de que estamos muito, muito fodidos, e, ao

    mesmo tempo que a vida 3 muito, muito boa. Eu estou cheio de raiva, triste"a, alegria, amor,

    +dio, desespero, felicidade, satisfação, insatisfação, e milhares de outros sentimentos. Estamos

    realmente fodidos. A vida ainda 3 muito boa.

    0uitas pessoas têm medo de sentir o desespero. Eles temem que, se eles se permitirem perceber

    o quão desesperada a nossa situação 3 realmente, eles devem, então, ser eternamente infeli"es.

    Esquecem-se de que 3 possBvel sentir muitas coisas ao mesmo tempo. Esquecem tamb3m que o

    desespero 3 uma resposta totalmente adequada a uma situação desesperadora. 0uitas pessoas

    provavelmente tamb3m temem que, se eles se permitirem perceber como as coisas estão

    desesperadoras, elas podem ser forçados a fa"er algo a respeito.

    %utra questão que as pessoas 8s ve"es me perguntam 3 e as coisas estão tão ruins, por que

    você não apenas fa" festas=/ >em, a primeira resposta 3 que eu realmente não gosto de festa. A

    segunda 3 que eu ?! estou tendo uma grande dose de divertimento. Eu amo minha vida. Eu amo

    a vida. Fsto 3 verdadeiro para a maioria dos ativistas que conheço. 1+s estamos fa"endo o que

    amamos, lutando por aquilo que (e quem) amamos.

    1ão tenho paciência para aqueles que usam a nossa situação desesperadora como uma desculpa

    para a inação. Aprendi que se você privar a maioria dessas pessoas de uma desculpa particular

    elas irão simplesmente encontrar outra, depois outra, depois outra. % uso desta desculpa para

     ?ustificar a inacção – o uso de qualquer desculpa para ?ustificar a inação – revela nada mais nada

    menos do que uma incapacidade para amar.

    Em uma de minhas palestras recentes algu3m se levantou durante o momento de perguntas e

    respostas e anunciou que a nica ra"ão pela qual as pessoas se tornam ativistas 3 para se sentir

    melhor sobre si mesmas. Efic!cia na verdade não importa, ele disse, e 3 egoBsta pensar que ela

    importe.

    Eu lhe disse que eu discordo.

    Ativismo não fa" você se sentir bem= , perguntou ele.

    7laro, eu disse, mas não 3 por isso que eu faço. e eu apenas quero me sentir bem, eu posso

    apenas me masturbar. 0as eu quero fa"er algo no mundo real.

    5or que=

    5orque eu estou apai&onado. 7om o salmão, com as !rvores fora da minha ?anela, com as

    lampreias bebês que vivem em c+rregos de areia, com salamandras delgadas raste?ando. E sevocê ama, você age para defender seu amado. claro que os resultados são importantes para

    você, mas eles não determinam se você vai ou não fa"er o esforço. ocê não simplesmente

    esperar que sua amada sobreviva e floresça. ocê fa" o que for preciso. e meu amor não fa"

    com que eu prote?a aqueles que eu amo, não 3 amor.

    9ma coisa maravilhosa acontece quando você desiste da esperança, que 3 que você percebe que

    nunca precisou dela, em primeiro lugar. ocê percebe que desistir da esperança não te mata.

    1em sequer o fa" menos efica". 1a verdade isso te fa" mais efica", porque você dei&ou de confiar

    em algu3m ou alguma coisa para resolver seus problemas, você dei&ou de esperar que os seus

    problemas, de alguma forma serão resolvidos atrav3s da assistência m!gica de Deus, a 6rande

    0ãe, o ierra 7lub, valentes !rvore-sitters , salm'es cora?osos, ou at3 mesmo a pr+pria 4erra evocê s+ começa a fa"er o que for preciso para resolver os problemas por si pr+prio.

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    *uando você desiste da esperança, algo ainda melhor do que não te matar acontece a você, que

    3, em certo sentido, te matar. ocê morre. E h! uma coisa maravilhosa em estar morto, o que 3

    que aqueles que estão no poder não pode realmente te tocar mais. 1em atrav3s de promessas,

    nem por meio de ameaças, e nem atrav3s da pr+pria violência. 9ma ve" que de certa forma você

    est! morto, você ainda pode cantar, você ainda pode dançar, você ainda pode fa"er amor, você

    ainda pode lutar como o inferno – você ainda pode viver, porque você ainda est! vivo, mais vivo,

    de fato, do que nunca. ocê chegou a perceber que, quando a esperança morre, o você quemorreu com a esperança não era você, mas era o você que dependia de quem e&plor!-lo, o você

    que acredita que aqueles que o e&ploram de alguma forma parariam por conta pr+pria, o você

    que acreditava nos mitos propagados por aqueles que o e&ploravam, a fim de facilitar essa

    e&ploração. % você socialmente construBdo morreu. % você civili"ado morreu. % você

    manufaturado, fabricado, carimbado, moldado morreu. A vBtima morreu.

    E quem 3 dei&ado quando esse você morre= ocê 3 dei&ado. ocê animal. ocê nu. ocê

    vulner!vel (e invulner!vel). ocê mortal. ocê sobrevivente. % você que não pensa o que a

    cultura lhe ensinou a pensar, mas o que você pensa. % você que não sente o que a cultura lhe

    ensinou a sentir, mas o que você sente. % você que não 3 o que a cultura lhe ensinou a ser, mas

    quem você 3. % você que pode di"er que sim, o você que pode di"er não. % você que 3 uma parteda terra onde vive. % você que vai lutar (ou não) para defender sua famBlia. % que você vai lutar

    (ou não) para defender aqueles que você ama. % que você vai lutar (ou não) para defender a

    terra sobre a qual a sua vida e as vidas daqueles que você ama depende. % você, cu?a

    moralidade não 3 baseada no que lhe foi ensinado pela cultura que est! matando o planeta,

    matando você, mas em seus pr+prios sentimentos animais de amor e cone&ão com sua famBlia,

    seus amigos, sua terra – não para a sua famBlia como seres civili"ados auto-identificados, mas

    como animais que necessitam de uma terra, animais que estão sendo mortos por produtos

    quBmicos, animais que têm sido formados e deformados para atender as necessidades da cultura.

    *uando você desiste da esperança – quando você est! morto dessa maneira, e então sendo

    realmente vivo – você não se fa" mais vulner!vel 8 cooptação da racionalidade e do medo que os

    na"istas infligiram aos ?udeus e outros, que os abusadores como o meu pai infligem em suas

    vBtimas, que a cultura dominante inflige sobre todos n+s. %u seria esse o caso em que esses

    e&ploradores enquadram circunstGncias fBsicas, sociais e emocionais de maneira que suas vitimas

    se veem sem escolhas para infringir a essa cooptação=

    0as quando você desiste da esperança, essa relação e&ploradorHvBtima est! quebrada. ocê

    torna-se como os ?udeus que participaram da @evolta do 6ueto de ars+via.

    *uando você desiste da esperança, você se afasta do medo.

    E quando você para de depender de esperança, e em ve" disso começa a proteger as pessoas,

    coisas e lugares que você ama, você se torna muito perigoso para quem est! no poder.

    7aso você este?a se perguntando, isso 3 uma coisa muito boa.