Águas Emendadas, Resenha e Artigo

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    Relato sobre a visita à Estação Ecológica Águas Emendadas.

    Brasília, 2 de dezembro de 2015

    Disciplina: Conservação da biodiversidade e processo evolutivo

    Centro de Desenvolvimento Sustentável / Universidade de Brasília

    Aluna: Nathália Kneipp Sena

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    Paulo César Fonseca, coordenador de Águas

    Emendadas, profissional do Instituto Brasileiro

    de Meio Ambiente (Ibram), ministrou palestra

    sobre a história da região e demarcação dessa

    unidade de conservação. Relembrou a

    passagem de bandeirantes e tropeiros do

    século 18 que se depararam com as veredas de

    50km por 6km de extensão, onde têm origem

    duas bacias hidrográficas do país: Tocantins e

    Paraná.

    Fonseca apontou quais atividades são

    realizadas na Estação Ecológica que só permite

    o ingresso de pesquisadores, mas busca-se maior aproximação com as comunidades

    circunvizinhas para que estejam sensibilizadas quanto à importância de se cuidar desse local e

    das muitas espécies endêmicas que enriquecem a biodiversidade do Cerrado. Há atividades de

    educação ambiental, em que os alunos são sensibilizados a respeito da importância de práticas

    conservacionistas ao redor de Planaltina e utilizam metodologia de pesquisa de opinião do

    Nossa Escola Pesquisa Sua Opinião (NEPSO), do Instituto Brasileiro de Opinião Pública e

    Estatística (IBOPE) e do Instituto Paulo Montenegro (IPM).

    Em comparação à visita de 1986, em que fui para tirar as fotos da matéria publicada no

    “Campus”, jornal laboratório da UnB (ver anexo), a primeira alteração foi a ausência das emas

    que nos recepcionaram logo na entrada da EE. A ema é a maior espécie de ave existente no

    Brasil, do (grego) rhea = da mitologia grega, significa a grande mãe; e de americana,

    americanus  = referente ao continente da América do Sul. Ao inquirir sobre a presença dos

    animais, a resposta foi que os cães acabaram com elas. Logo, extinção local dessa espécie.

    Em 1986, Bráulio Dias, atual Secretário da CDB, foi o biólogo que nos acompanhou. Disse não

    haver problemas com incêndios, o que difere da narrativa de 2015, em que essa perspectiva

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    assombra muitos parques e reservas florestais brasileiros. Nessa época, Dias apontou a

    existência de “1500 espécies de plantas superiores que produzem flor, inclusive orquídeas”.

    Em 2015, para o reino vegetal a descrição foi de 738 espécies, 618 gêneros, 125 famílias, 250

    espécies para fins medicinais e 177 espécies de gramíneas”, segundo Fonseca.

    A estação continua a sofrer grande pressão por parte dos condomínios, grileiros, fazendas,estradas, pecuária e pastagens, espécies exóticas, fragmentações que fazem com que as

    espécies de maior porte vejam seu habitat original ser cada vez mais reduzido e adulterado, o

    que pode levar à diminuição das populações e mesmo a sua extinção. No caso da onça-

    pintada, a matéria de 86 já a menciona entre os animais presentes no local. Com Marina M. de

    Carvalho, aprendemos que graças à armadilha fotográfica foi possível confirmar a presença de

    onças em Águas Emendadas. Esse registro, feito no final de 2014, foi de grande impacto para

    os pesquisadores e comunidade circunvizinha pois há 30 anos não se via onça nessa localidade.

    A equipe do Ibram também se utiliza de vestígios diretos, como fezes, pegadas, arranhões,

    pêlos nas cercas, ranhuras em árvores deixados pelos animais para identificar as espécies e

    suas trilhas.

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    A importância do conhecimentonuma era de crise ecológica

    The Relevance of Knowledgein an Era of Ecological Crisis

    Resenha escrita por Nathália Kneipp Sena*

    *Doutoranda em Desenvolvimento Sustentável - Centro deDesenvolvimento Sustentável, Universidade de Brasília, Brasília, Distrito Federal, Brasil E-mail: [email protected]

     doi:10.18472/SustDeb.v6n3.2015.16750

    RESENHA

    Rodrigo T. Ponce Analfabesmo ecológico: el conocimiento en empos de crisis. Ciudad de

    Panamá: Ciudad del Saber, 2012. 144 p. Tabelas, mapas. ISBN 99990000888 1.

    Rodrigo Tarté Ponce (1936–2011), panamenho, foi professor e pesquisador na Faculdade deAgronomia do Panamá. Fez mestrado em ciências agrícolas e tonematologia na University ofCalifornia e doutorado em topatologia na Cornell University , ambas nos Estados Unidos. Idea-lizou e fundou a Cooperava Regional de Ensino e Pesquisa em Agricultura e Recursos Naturais(REDCAR). Dirigiu, entre 1984 e 1992, o renomado Centro de Ensino e Pesquisa em AgronomiaTropical (CATIE), na Costa Rica. Foi o principal arculador da iniciava do Panamá para a CúpulaMundial sobre Desenvolvimento Sustentável, Rio +10, em Johanesburgo, na África do Sul, eresponsável pela criação do Centro Internacional para o Desenvolvimento Sustentável (CIDES).

    Desde 2001, atuou como diretor das áreas acadêmica e de desenvolvimento sustentável naFundação Cidade do Saber, no Panamá.

    Em  Analfabesmo ecológico: o conhecimento nos tempos de crise, Ponce propõe uma ree-xão sobre as lacunas de inter-relação entre ciências e humanidades, tecnologia e consumo, eeconomia e ecologia. Analisa os aspectos mais destacados dos novos desaos que a humani-dade enfrenta como consequência das crises provocadas pela assimetria no uso dos recursosnaturais em escala planetária. Destaca a necessidade de empregar conhecimento e cooperaçãopara evoluir na direção do pensamento sistêmico e do desenvolvimento sustentável, premissasbásicas para garanr a vida das espécies e melhor interação entre os seres humanos e o mundonatural. Ao apontar a retomada de diálogo com a natureza como opção crucial para a sustenta-

    A importância do conhecimento numa

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    bilidade, indica o caminho da alfabezação ecológica das sociedades e idenca as estratégiasque podem ser adotadas para esse m.

    No prólogo e na introdução, o autor constata o rompimento do diálogo entre os humanos e anatureza, invocando a reexão de Ilya Prigogine – “sempre pensei que a ciência era um diálogocom a natureza”. Apresenta exemplos de avanços espetaculares das ciências, sob a óca da ca-pacidade de cooperação internacional: o Sistema de Transporte Espacial, seguido da construçãoda Estação Espacial Internacional, um esforço cooperavo sem precedentes, arculado entreagências espaciais, empresas e estados-nações; as iniciavas do Fórum Econômico Mundial,com as suas receitas economicistas, sugeridas há 40 anos, a serem aplicadas aos problemasde maior premência, sempre retomados com uma sensação de impotência para solucioná-los.Considerando esse estado de coisas, Ponce sugere estratégias de desenvolvimento embasadasna ecologia, ciência integradora e promotora do diálogo com a natureza.

    Entre alguns avanços tecnológicos que se aproximam da cção cienca, o autor destaca aconversão das células da pele em algo similar às células-mãe embrionárias; a regeneração detecidos dos órgãos por meio do uso de células da medula óssea; a descoberta do papel domicro RNA no sendo de “acender ou apagar” os genes e, em caso de falhas, o seu papel naocorrência de patologias; as descobertas feitas dentro do gene Foxp2, desvendando aspectosinerentes à nossa capacidade de falar; a criação do “zoológico genômico”, com 10 mil espéciesde vertebrados; as pesquisas de J. Craig Venter, que descobriu milhões de genes e milhares denovas famílias de proteínas; as surpresas geradas pelo sequenciamento do genoma do milho,que tem versalidades de adaptação que permirão a sua sobrevida em diferentes condiçõesambientais; o Laboratório Europeu de Biologia Molecular, sediado em Heildelberg, Alemanha,que revelou que uma simples célula da bactéria Mycoplasma pneumoniae alcança especicida-des funcionais inimagináveis para a sua pouca quandade de proteínas; as vastas áreas do DNAque, antes consideradas como “lixo” (por não construírem proteínas), têm funções reguladorasimportantes; a descoberta de água em Marte e na Lua; a construção do maior acelerador deparculas do mundo, iniciava franco-suiça, que permirá compreender melhor a origem do

    universo; Adipithecus ramidus, nome dado ao restos com 4 milhões de anos de idade, cujadescoberta permiu melhor compreensão sobre a arquitetura corporal e a ecologia de nossosantepassados; a potência de Watson, o supercomputador da IBM, ferramenta excepcional paraa gestão do conhecimento. Essas e muitas outras conquistas da inteligência humana compõemuma espécie de caleidoscópio das façanhas ciencas recentes, que o autor faz questão de in-vocar com o olhar provocavo da interdisciplinaridade.

    Ora fascinantes, ora assombrosos, Ponce esmiúça esses exemplos com o intuito de enfazar anecessidade de renar a compreensão da complexidade de nossas relações com o nosso entor-no. Aponta a barreira representada pela desconexão entre ciências e humanidades, espelhadana própria hierarquia das ciências, tal como concebidas atualmente. Física, química, biologia,ciências sociais e losoa se apresentam sem conexões, como se “viajássemos sem chegada”.

    Ponce discute o paradoxo de que muitos estão em situação de benecio, graças aos avanços daciência e tecnologia, enquanto grandes massas da população mundial não podem sasfazer assuas necessidades mínimas. À crise da gestão do conhecimento soma-se a crise do pensamen-to, dos valores e das percepções: o predomínio de um enfoque reducionista; as expectavasprematuras, como a de que o Projeto Genoma resultaria na cura de enfermidades complexas;a ênfase em pesquisas lucravas e nos direitos da propriedade intelectual; e a ausência de con-siderações écas.

    Conjugar os requisitos da biosfera com os nossos deveria estar incluído na produção de tecno-logias e inovações para aumentar a produvidade e compevidade dos negócios. Porém, asações parecem não considerar a nitude dos recursos. Ao estabelecer um ponto de parda para

    Nathália Kneipp Sena

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    a sua análise, Ponce detalha são os problemas e as forças motrizes da crise. Cunha a expressão“tricotomia não-resolvida” para tratar dos aspectos econômicos, sociais e ambientais, em quereconhece a falta de ações globais que tratem das interconexões que ocorrem dentro do siste-ma Terra.

    Ele sistemaza os sintomas da insustentabilidade em problemas pontuais, divididos em trêscategorias estreitamente relacionadas: (i) o consumo dos recursos naturais para o desenvolvi -mento de nossas avidades produvas; (ii) as carências do entorno social; e (iii) a gestão ina-dequada de instuições e polícas. A primeira categoria subdivide-se na intensicação de a-vidades produvas não-sustentáveis; na demanda crescente por matérias-primas; na pegadaecológica maior que a biocapacidade; na contaminação e degradação ambiental; e na perda debiodiversidade e nas mudanças do clima. A segunda categoria subdivide-se no desemprego esubemprego; na educação deciente; na pobreza e exclusão social; no incremento das doençasemergentes e reemergentes; na insegurança alimentar; na desnutrição e insalubridade; na inse-gurança social; nos conitos sociais e bélicos; e nas migrações. A terceira categoria subdivide-sena injusça social e corrupção; na carência de estratégias integradas para o desenvolvimento; ena fragmentação instucional de polícas.

    O autor alega que as forças motrizes da sustentabilidade emergem de relações antagônicasentre exigências biosféricas e os exigências humanas, São elas (i) a natureza da economia atual,que privilegia o crescimento econômico via consumo de recursos e bens; (ii) o crescimento po-pulacional; (iii) a ausência de equidade social (ou falta de obrigação moral para atendê-la); (iv)governança deciente; (v) ausência de uma éca global; e (vi) analfabesmo ecológico. Munidodesse arsenal teórico, ele invesga e explicita como o Panamá retrocedeu em vários indicadoresde desenvolvimento ambiental, seguindo um padrão similar ao de outras nações em desenvol-vimento. Sobre o Panamá ele comenta também o estudo – intulado Água Saúde – feito peloSmithsonian Instute of Tropical Research sobre a bacia do Canal do Panamá, um dos maioresdo gênero entre os que foram realizados nos trópicos.

    Resgatando o conceito de alfabezação ecológica, proposto por David W. Orr (1992) e FritjofCapra (1997) – autores que consideram a crise ecológica uma crise da educação – , Ponce ques-ona a maneira que pensamos: será de maneira sistêmica ou reducionista?; teremos perdidohabilidades de aprender e trabalhar colevamente, como as de nossos ancestrais caçadores ecoletadores? O que se segue à desumanização do mundo industrial, bases da ontologia da eramoderna, seria a aspiração por uma “Teoria do Todo”, uma tentava de incorporar todas as va-riáveis e combinações prováveis que podem ocorrer em disntas dimensões de espaço-tempo.Seria essa mais uma utopia, visto que é matemacamente inalcançável? Ou seria a esperançapor visualização e compreensão mais amplas das redes, das suas inter-relações, realimentações,autopoieses, caos, incertezas, sensibilidades e elascidades...? “Onde há vida, há redes” - o au-tor usa essa observação de Capra para ressaltar a inevitável unidade do todo, que é como dizerque o mar une as terras que ele separa.

    Pracando em toda a obra essa capacidade de zoom out e zoom in, o autor traça uma “brevehistória do pensamento sobre os serviços ecossistêmicos”, deixando de fora, dos autores sele-cionados, Raymond Dasmann (autor de Conservação Ambiental ) e Jean Dorst (autor de  Antesque a natureza morra), dois autores com abordagens muito ans à de Ponce, no quesito de bus-car um pensamento valorizador da unidade da vida e da reexão sobre o desenvolvimento sob aóca ecológica, com compreensão e respeito às caracteríscas especícas dos diferentes ecos-sistemas. Aponta os desacordos sobre a valoração desses serviços, que em vez de monetáriospoderiam ser medidos por “unidades de serviços ecossistêmicos”, lembrando que o mercadode carbono não está dirigido à preservação de um serviço ecossistêmico em parcular, e sim àmigação das mudanças do clima.

    A importância do conhecimento numa

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    As delimitações da sociedade da aprendizagem e da pesquisa cienca para o desenvolvimentosustentável são assim enunciadas por Ponce: “toda pesquisa formal é feita pelos países ricos,nem todos os ricos fazem pesquisa”. Essa observação teria amplo complemento em uma análisebibliométrica sobre os temas que fazem parte da agenda das nações hegemônicas e sobre os te-mas que exigem mais estudos, segundo o modelo conceitual de gestão integrada do desenvol-

    vimento sustentável. Ao reer sobre o mundo que queremos, Ponce dá algumas orientaçõessobre quais seriam os eixos centrais desses estudos e as suas interdependências ecológicas.Entre as muitas guras e tabelas, a que sinteza a sua proposta central é a dos sistemas e pro-cessos com um enfoque ecossistêmico - Figura 22, publicada na página 109.

    Este é certamente um livro concebido com erudição e didasmo. O autor conclui que o desaocooperavo global exige a alfabezação ecológica. A questão central, lançada pelo autor, é seestamos ou não empenhados nessa alfabezação e se estamos ou não em condições de assu-mi-la.

    Notas

    1  Esta obra está disponível para download gratuito em hp://www.ciudaddelsaber.org/sala-prensa/documentos-interes

    Nathália Kneipp Sena

    Sustentabilidade em Debate - Brasília, v. 6, n. 3, p. 168-171, set/dez 2015

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    Fronteiras: Journal of Social, Technological and Environmental Science Website: http://revistas.unievangelica.edu.br/index.php/fronteiras/

     v.4, n.1, jan.-jul. 2015, p. 275-285. –  ISSN 2238-8869275 

     Jamais Fomos AmbientalistasNathália Kneipp Sena 1 

    R ESUMO 

    Este trabalho corresponde ao exercício de conclusão da disciplina “Tópicos  Especiais em HistóriaSocial  –   Fronteira, Recursos Naturais e Conservação da Natureza”,  oferecida na Universidade de

    Brasília. Segue-se a proposta de inter-relacionar e buscar um posicionamento frente ao ideário dos

    textos debatidos em sala de aula. Abordam-se alguns aspectos a respeito de como as diferenças na

    construção do conceito de fronteira, ao longo do tempo, podem servir como demarcações para uma

    busca de posicionamento sobre se fomos, se procuramos ser ou se seremos ambientalistas algum dia.

    Palavras chave:  Fronteira; Ambientalismo; Conservação dos Recursos Naturais; Proteção do Meio Ambiente.

    1 Mestre em Comunicação pela Universidade Católica de Brasília, Brasil. [email protected].

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     v.4, n.1, jan.-jul. 2015, p. 275-285. –  ISSN 2238-8869276 

    conservação da natureza deveria ser um dos campos estratégicos para a perpetuação da vida

    na Terra ou, ao menos, uma preocupação comum a todas as nações para que se busquem

    soluções conjuntas de curto, médio e longo prazos em prol do bem comum. Pesquisadores

    (Adams 2004; Chapin III et al. 2000; Wilson 1992) acreditam que, atualmente, o ritmo de extinçõesocorre em uma velocidade de 100 a 1.000 vezes maior do que aquela observada nos períodos normais

    da história, ou seja, entre as grandes crises de extinção registradas, como foi a da queda do meteoro que

    eliminou os dinossauros da Terra há cerca de 65 milhões de anos (Brusatte 2012 p. 256)

    Neste trabalho, são abordados alguns aspectos a respeito de como as diferenças na construção

    do conceito de fronteira ao longo do tempo podem servir como demarcações para uma busca de

    posicionamento sobre se fomos, se procuramos ser ou se seremos ambientalistas algum dia,

    imiscuindo-se no comentário de Carlos Minc de que “muitas  pessoas se consideram ambientalistasporque não comem carne, não jogam papel no chão ou ainda porque são favoráveis ao controle da

    natalidade” (Minc 1992 pg. 8).

     Todos esses arremedos de engajamento ambiental estão emaranhados em uma procura

    complexa e incessante para situar o ambientalismo enquanto modo de vida, estado de espírito, atitude

    em relação à sociedade filosofia política, movimento social, militância radical, entre tantas iniciativas. O

    aprofundamento do debate sobre a sexta grande crise das extinções, com uma aceleração da

    “defaunação”  (Dirzo et all 2014)  –   perda tanto de espécies como de populações da wilderness   –  reposiciona a conservação da biodiversidade como estratégia de sobrevivência da espécie humana, o

    que não pode ocorrer de forma dissociada das outras espécies.

    A NATUREZA E SUAS FRONTEIRAS, A SERVIÇO DO HOMEM 

    Em cada continente, é possível encontrar narrativas sobre o auge e a derrocada de civilizações

    que sucumbiram em função da hubris , palavra que na Grécia antiga significava orgulho e presunção

    altivos e exagerados, que Ophuls (2012) chama de “grandeza  imoderada”  ( immoderate greatness  ). Esse

    autor aponta quatro limites biofísicos que seriam os responsáveis pela queda das civilizações, a saber, o

    esgotamento ecológico, o crescimento exponencial, a entropia acelerada e a complexidade excessiva. A

    esses, acrescenta ainda os erros humanos, subdivididos em morais e práticos.

    Pertence a Ophuls o questionamento sobre o porquê de vermos a natureza como

    cornucopiana   um banquete a ser devorado sem a imposição de limites. A civilização cai quando

    esgota seu capital moral e físico. Para esse autor, a nossa queda será estupenda e diretamente

    proporcional à complexidade que entrelaça nossas sociedades. “É  necessário um sofrimento

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     v.4, n.1, jan.-jul. 2015, p. 275-285. –  ISSN 2238-8869277 

    prolongado para que se acredite que o mundo anteriormente conhecido mudou de maneira

    irreversível”,  avisa. O remédio apontado seria “a  renúncia deliberada da grandeza em favor da

    simplicidade, da frugalidade e da fraternidade”, pois hubris  é sempre punida por Nêmesis (deusa grega

    da vingança e da ética).

    Os homens sábios dizem –  e não deixam de ter razão –  que aquele que quiser antever o futurodeve consultar os acontecimentos do passado, pois os eventos da humanidade sempreencontram similares naqueles que aconteceram anteriormente. Isso resulta do fato de que sãoproduzidos por homens que sempre foram e sempre serão guiados pelas mesmas paixões e,por isso, têm necessariamente os mesmos resultados. (Niccolò Machiavelli [s.d])

    Essa citação de Machiavelli foi escolhida por Ophuls para reforçar a ideia de que o que

    aprendemos com a história é que não conseguimos aprender com ela; e foi também selecionada por

    Koselleck (1985) para ilustrar justamente as divergências de percepção entre “apocalípticos  e

    integrados”, estando os primeiros convencidos de que há uma espécie de regra em que toda experiência

    prévia não conta em relação a outras possibilidades de desdobramentos no futuro. Koselleck lembra

    que coube ao filósofo Immanuel Kant inaugurar o conceito de progresso e, nesse sentido, a experiência

    do passado e a expectativa do futuro não se mantiveram mais em correspondência; pelo contrário,

    passaram a ser distintas, pela “instrução obtida via experiência frequente”, renovada. Com essa visão de

    avançar para o melhor, a história era vista como uma totalidade aberta a um futuro progressivo, onde

    localizamos a crença ambientalista de que podemos vir a fazer melhor com o acúmulo de nossas

    experiências.

     A noção de enaltecimento das capacidades trabalhistas em um contexto de progresso, a

    expectativa de conseguir estar em controle das mudanças desejáveis pelos seres humanos, ganhou a fé

    renovada de que somos nós que estamos no comando, com a natureza a nosso serviço. Aqui, vale o

    interlúdio:

    Segundo Fourier, o trabalho social bem organizado teria entre seus efeitos que quatro luasiluminariam a noite, que o gelo se retiraria dos polos, que a água marinha deixaria de sersalgada e que os animais predatórios entrariam a serviço do homem. Essas fantasias ilustram

    um tipo de trabalho que, longe de explorar a natureza, libera as criações que dormem, como virtualidades, em seu ventre. Ao conceito corrompido de trabalho corresponde o conceitocomplementar de uma natureza, que segundo Dietzgen, “está ali, grátis”. (Benjamin 1987)

     Tanto Koselleck, como Ophuls têm um aporte de base para ir à procura da capacidade de

    sermos ambientalistas  assunto do presente trabalho , pois contribuem com uma semântica original

    para o espaço e para a temporalidade da evolução do conceito de conservação. Ophuls, com o

    enunciado dos quatro limites biofísicos, que considera imperativos no processo histórico e de

    desenvolvimento ambiental, insinua a ameaça de que a conservação, em sentido amplo, pode ser

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     v.4, n.1, jan.-jul. 2015, p. 275-285. –  ISSN 2238-8869278 

    impedida pela simples existência da segunda lei da termodinâmica  –   a entropia acelerada  – , que

    considera incontestável e tem efeito potencializado pelos demais limites biofísicos que propõe. Quanto

    a Koselleck, com sua análise da inter-relação mutante entre “espaço de experiência” e “horizonte de

    expectativas”2, cabe a curiosidade de descobrir na construção do horizonte de expectativas despertadaspelo conceito de conservação, quais experiências podem ser identificadas e diferenciadas como

    pertencentes ao que se esperava e o que se pode aventar para o futuro da humanidade.

    Em relação à experiência do oposto da conservação  –   a destruição, ou o esgotamento

    ecológico  – , a colonização do continente americano gerou farta produção literária e acadêmica sobre

    esse tema. Ao reproduzir a expressão cunhada por Frederick Jackson Turner (1976):  free land , Walter

    Prescott Webb (1979) considerou o movimento de ocupação das fronteiras americanas como sinônimo

    de invadir uma terra que se pressupõe ser de ninguém. Essa terra, supostamente sem dono e semregistro, vista como paisagem selvagem e riqueza que se recebe como um presente de Deus para

    recompensa e melhoramento do ser humano, teria o mesmo sentido de fronteira. 

     A fronteira móvel americana do início da colonização era, portanto, uma terra gratuita a ser

    tomada por quem chegasse primeiro. Em seguida, Webb desenvolveu a ideia de fronteiras

    cornucopianas das Américas com o termo windfalls   (“caído  do céu”  e coletado sem restrições). Ele,

    então, dividiu as fronteiras tidas como windfalls  em primárias, que se relacionam à coleta das riquezas da

    natureza sem ônus ou trabalho, e secundárias, que são aquelas que se iniciam com o ocaso dasprimárias e envolvem recursos que não estão facilmente disponíveis, exigindo, assim, trabalho e

    investimentos para se materializarem em lucro. O trabalho de Webb expõe as surpreendentes cifras dos

    registros quantitativos de ouro e prata arrancados do Novo Mundo, transportados e entregues às

    metrópoles a partir do ano 1493. O boom  dos negócios na Europa. O auge da grandeza imoderada.

    O Brasil e sua Mata Atlântica servem como exemplos muito bem detalhados por Warren

    Dean (1996) nas fases tupiniquins das fronteiras windfalls primária e secundária. Dean conduz uma

    minuciosa descrição qualitativa e quantitativa do que e de como foi a destruição, tocada a ferro e fogo,que resultou em um desmatamento contínuo da mata, também denominada fronteira ou wilderness , no

    sentido americano, e paisagem selvagem, mato ou sertão, para alguns autores brasileiros. Ao comentar

    o livro de Dean, José Augusto Drummond (2000) tem uma observação que endossa a provocação do

    título do presente artigo: “a dura verdade é que nenhum país desenvolvido poupou as suas florestas

    2 Para Koselleck, não se trata de simples conceitos opostos e sim de uma tensão entre experiência e expectativa que “de uma

    forma sempre diferente suscita novas soluções, fazendo surgir o tempo histórico”. 

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    nativas –  e outros recursos naturais –  antes de se tornarem escassos ou poderem ser substituídos por

    commodities  importadas”. 

     Ao esmiuçar uma espécie de inconsciente coletivo ou história das ideias relacionadas ao

    conceito de wilderness, Roderick Nash (1982) a classifica como um estado de espírito ( state of the mind) e

    também condição ambiental.  Enquanto abstração, imageria, inclui representações míticas, religiosas,

    utilitárias, românticas, enunciados individuais e coletivos, até mesmo mesclados, expressos em

    semânticas e expectativas diferenciadas no avançar dos tempos históricos. Da encarnação do mal, do

    lugar de provações, sofrimento, morte e do que há de mais demoníaco e aterrador no mundo, a

    paisagem selvagem alçou-se aos sonhos românticos de intelectuais que faziam dela, no dizer de Nash,

    aquilo que queriam que ela fosse. Até se chegar à paisagem selvagem loved to death , cujos dizeres do

    cartaz na propriedade de Augusto Ruschi, quando estigmatizado por caçadores em pleno combateconservacionista no Rio de Janeiro dos anos 1970, expressam essa parcela de morrer-de-amor em uma

    cultura global naturalista: “Estas plantas valem mais que minha própria vida” (Dean 1996, p. 322).

    Hoje, existem 100 mil refúgios de recursos biológicos em todo o mundo (International Union

    for Conservation of Nature and Natural Resources 2010) que equivalem à soma da extensão territorial

    da China e da Índia. Ao redigir uma história das áreas protegidas, Franco e Schittini (2010)

    consolidaram uma revisão da literatura sobre o tema. Esses dois autores se posicionaram a favor de tais

    áreas que devem, ainda, promover o desenvolvimento sustentável e a inclusão social, a nosso ver umambientalismo pragmático ou mercantilismo ecossocial. Eles consideram que elas têm um papel

    urgentíssimo a desempenhar na luta contra a extinção de espécies, de populações  com seus  pools de

     variedades genéticas e de ecossistemas  com suas miríades de interações:

    Não adianta sobrecarregar as áreas protegidas com funções excessivas que, muitas vezes, elasnão podem cumprir. Trata-se, antes, de integrá-las em políticas públicas mais amplas, capazesde mobilizar aportes financeiros maiores, e de reconhecer-lhes as especificidades, valorizandoo conhecimento científico necessário para o processo de criação e manejo delas  –  oriundo dedisciplinas como a Biologia da Conservação –  e atitudes que valorizem os seres humanos como

    uma, ainda que única, dentre as milhões de outras espécies do planeta –  atitudes biocêntricas eecocêntricas. (Franco & Schittini 2010, p. 223)

    EM PROL DE EXPECTATIVAS INDIVIDUAIS EM RELAÇÃO À NATUREZA 

    Individualmente e coletivamente, o espaço de experiência das fronteiras, das representações

    sociais construídas como ancoragens e conceitos de wilderness , resultou em um conjunto de iniciativas de

    proteção e conservação antes mesmo de amadurecer a compreensão e as diferenciações sobre o que é

    um patamar satisfatório de consenso e controle sobre o que, como e para que ou quem, exatamente, se

    quer demarcar, proteger e conservar a natureza em seu todo, ou em parte. Mesmo porque, “as 

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    fronteiras são vivenciadas de maneira diferente, dependendo de quem você é e de qual é o seu

    posicionamento” (MCREERY 2006). Não houve registros históricos da visão dos primeiros ocupantes

    das fronteiras do continente americano. Muitos povos foram percebidos como elementos da paisagem,

    ora aliados, ora inimigos ferozes daqueles que ingressavam por último entre os “pioneiros desesperados”,  na alusão de Dean. Em termos de uma história dos olhares, proposta por Roland

    Barthes (1984), quais seriam as narrativas de “experiências” e “expectativas” das mil espécies de insetos

    que habitavam uma única copa de árvore na Mata Atlântica?

    Nos Estados Unidos, Henri David Thoreau e John Muir foram os mais sensibilizados por um

    olhar-demiurgo3, onipresente, da natureza. Esses dois autores teceram literaturas e descreveram suas

     vivências repletas de insights   em termos de um espaço de experiência estética da natureza, de sua

     valorização como fonte de preservação do mundo e de reconhecimento da divindade no mundonatural. Eles assentiram que nossas vidas carecem de um “alívio”  que só se encontra no que nós,

    brasileiros, invocamos como conceito de mata ou grandes sertões, palavras que não incluem o mar, os

    polos, desertos, céu, subsolo. Enquanto militantes do transcendentalismo e naturalismo, ambos

    edificaram um comportamento diferenciado entre aqueles do seu tempo, criando sentidos que poucos

    de seus contemporâneos puderam partilhar integralmente. Afinal, nem todos poderiam aventurar-se em

    certas fronteiras, em que pressupunha-se uma aproximação voluntária em relação à natureza, com a

     vontade de explorá-la como “metáfora da mente humana”, no dizer de Ralph Waldo Emerson, autorcaro a ambos. Fica difícil dizer se e quanto de ambientalismo há no transcendentalismo proposto por

    esses autores e na própria wilderness  como “the animal in us ” (Nash 1982, p. 94).

     Thoreau, especialmente, debatia com essa perspectiva de conciliação dos sentimentos de

    repulsa e atração por um amálgama entre o selvagem e o civilizado, unindo as vantagens de ambos,

    conforme propôs, o que gerou anima  para suas ideias, propostas, ações e até mesmo sua passagem pela

    prisão por desobediência civil (Thoreau 2008).

    Quais criaturas genuinamente “ambientalistas” se acercaram de John Muir no Sierra Club? Opresidente Theodore Roosevelt, por exemplo, com sua obsessão por game animals , sob a ótica do ideário

    dos direitos dos animais, com enfoque “abolicionista” do século 21, seria considerado uma espécie de

    psicopata do grupo, por ter matado, conservado e enviado para os EUA mais de 3 mil espécies da selva

    africana (Nash 1982). Nem mesmo a elegância de Martins (1997) em seu trecho “a bala de seu tiro não

    só atravessa o espaço entre ele e a vítima. Atravessa a distância histórica entre seus mundos, que é o que

    3  A palavra “demiurgo” foi utilizada em seu sentido figurado, conforme encontra-se no dicionário Houaiss da Língua

    Portuguesa –   “criador de qualquer obra grandiosa ou de importância”. 

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    os separa”  serviria de redenção para a caça recreativa e suas motivações sob o ponto de vista ético.

    Esses são posicionamentos diferenciados entre Brasil, que a proíbe no papel, invocando aversão à

    crueldade contra os animais, e Estados Unidos, que a têm legalizada e geradora de bilhões de dólares

    com a possibilidade de compra e fruição dessa “diversão”. 

    Outra passagem digna de menção nesse contexto de aquiescência dos ambientalistas quanto à

    caça dos animais selvagens é aquela em que Hardin (1968) faz a defesa de que a moralidade de um ato é

    a função do estado do sistema no tempo em que é realizado4. O exemplo dado por esse autor é o do

    homem da planície que há 150 anos podia matar um bisão somente para extirpar-lhe a língua como

    iguaria para o seu jantar, descartando o restante da carcaça. “Esse ato, naquele tempo, não representava

    qualquer tipo de desperdício”, segundo Hardin; porém, se ocorresse com algum dos poucos milhares

    de bisões da atualidade, o mesmo ato seria estarrecedor. Nesse contexto da moralidade system sensitive acondição de fronteira ( wilderness  ) eximia o caçador de uma reprovação moral por não haver o domínio

    público, o observador presente e disposto a julgar o ato. Ao comprar a sua licença de caça no ano 2015,

    está também incluída no pacote a moral system  sensitive  em que fica garantida a aquisição da absolvição

    moral, dado que o espaço e temporalidade de fronteira são recriados ou mantidos, com a solução

    técnica de controle quantitativo das presas, para que não haja escassez e observadores produtores de

    uma moral diferenciada.

    No Brasil, o nosso “Sierra Clube”,  se é possível encontrar alguma analogia, teve no MuseuNacional do Rio de Janeiro um núcleo de iniciativas de conservação em que nomes como Alberto José

    Sampaio, Armando Magalhães Corrêa, Cândido de Mello Leitão e Frederico Carlos Hoehne, cujas

    histórias e feitos foram detalhadamente narrados por Franco e Drummond (2009), demonstram que foi

    a inspiração, o fascínio e a devoção ao conhecimento científico, sobretudo as contribuições das áreas

    correlatas ao naturalismo, que conduziram essas pessoas a uma participação social mais destacada em

    prol da conservação da natureza.

    ESPAÇO DE EXPERIÊNCIA E HORIZONTE DE EXPECTATIVAS 

    Muitos dos espaços de experiência da wilderness,  aqueles dos nossos antepassados, se foram

    definitivamente e, com eles, alteram-se os horizontes de expectativas. A certeza é de que a natureza

    selvagem está fadada ao fim e pela mão dos quatro fatores biofísicos que Ophuls ressalta como

    responsáveis pela queda das civilizações. Nos Estados Unidos, somente 2% dos 48 Estados americanos

    4 Tradução da autora.

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    permanecem legalmente “selvagens”,  cifra atualizada, na ocasião do 50º aniversário de assinatura do

    Wilderness Act , como 109 milhões de acres, menos que 1% da área total dos EUA (Biello 2014).

    Há ilusões de que as novas “fronteiras  do ciberespaço”  estariam entre as tecnologias que

    servirão como atenuantes para essa derrocada inevitável. Até esse custo ecológico parece não ceder às

    previsões de Ophuls. Sabe-se que cada um de nossos cliques onera o meio ambiente. “Cada consulta no

    motor de busca do Google provoca a emissão de 0,2 grama de dióxido de carbono” (Lefèvre 2010 p.

    40). O próprio Google, que já conta com mais de um milhão de servidores, está buscando colocar as

    suas centrais (onde ficam os servidores) próximas a fontes de eletricidade abundantes, como a que foi

    instalada às margens do Rio Columbia, em Oregon (EUA), perto de uma usina hidrelétrica. Essa central

    consumirá uma quantidade de eletricidade comparável àquela necessária para abastecer uma cidade de

    40 mil habitantes. As tecnologias de comunicação e informação (TICs) são responsáveis por 2% a 3%

    das emissões de CO2 no mundo  equivalentes àquelas do transporte aéreo.

    Quando a revista Scientific American   ratificou a informação de que em 2070 os americanos

    estarão sendo cozidos em “verões-fornalha”,  “à  medida em que as concentrações de dióxido de

    carbono utrapassaram 400 ppm pela primeira vez em um milhão de anos” (Hamilton 2014), isso é um

    dos indicadores de que caminhamos para um espaço de experiência desconhecido até então, fruto da

    nossa contribuição para o planeta. Isso quebra a parceria entre o duo proposto por Koselleck, pois

    ficamos privados de ter um horizonte de expectativas que venha de experiências e certezas

    anteriormente vivenciadas   nossa ancoragem. Colocaremos, então, nossas incertezas na forma de

    ficção científica ou literatura de cenários, aberta a todos os palpites.

    Nesse contexto, pode-se buscar autores que há algum tempo já se libertaram do ideário de

    necessidade da “experiência  de wilderness”   e da defesa dos parques nacionais, algo visto como uma

    atitude herética entre naturalistas mais conservadores. William Cronon (1996) é um desses pensadores.

    Ele considera wilderness   e parques nacionais como noções antiquadas, elitistas, artificiais e até um

    empecilho para a interação dos seres humanos com os outros seres. Cronon defende uma ética que irá

    nos assegurar, em proporções equilibradas, a possibilidade de usar a natureza e também como e quando

    não usá-la.

    Com as incertezas em alta, Nash foi um dos que se aventurou a traçar três cenários para o

    nosso futuro: o cenário jardim, o cenário da destruição e o cenário de civilização-ilha. Os dois primeiros

    são opostos  ou tudo vai bem, ou tudo vai mal, respectivamente. Mas é no caminho intermediário que

    surge a ideia de que, a partir daqui, não é mais a wilderness  que deve ser contida, e sim a matriz civilizada.

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    Os seres humanos ocupariam várias centenas de habitações, dispondo do estado-da-arte tecnológico

    para produzir alimentos, água, energia e gerenciar o lixo. O restante das áreas seria deixado em estado

    selvagem e as fronteiras voltariam a existir de forma permanente, mas com uma interação

    supercontrolada. Nem assim, de volta ao começo e mantendo-se os refúgios, o grifo poderá recair nasuperação da alteridade em relação ao meio ambiente. Parece não haver um caminho de volta.

    REFERÊNCIAS 

     Adams WM 2004. Against Extinction : the story of conservation. Earthscan, London, 328 pp.

    Barthes R 1984.  A câmara clara : nota sobre a fotografia. Nova Fronteira, Rio de Janeiro, 185 pp. Available from: http://www.producaomultimidia.com.br/downloads/a_camara_clara.pdf  

    Benjamin W 1987. Sobre o conceito de história. In Benjamin W,  Ensaios sobre literatura e história dacultura . Brasiliense, São Paulo, p. 222-234. Available from: http://www.rae.com.pt/wb2.pdf  

    Biello D. Is There a Future for Wilderness? Sci Am . [serial on the Internet]. 2014 Sept [cited 2014 Sept12]. Available from: http://blogs.scientificamerican.com/observations/2014/09/03/is-there-a-future-for-wilderness/ 

    Brusatte SL 2012. Dinosaur Paleobiology . Wiley Blackwell, West Sussex, 320p. Available from:https://books.google.com/books?id=t8dwWakrlm0C&pgis=1 

    Cronon W 1996. The Trouble with Wilderness; or, Getting Back to the Wrong Nature. In Cronon W.Uncommon Ground : Rethinking the Human Place in Nature. Norton, New York, p. 69-90.

    Dirzo R, Young HS, Galetti M, Ceballos G, Isaac NJB, Collen B 2014. Defaunation in the Anthropocene. Science  345(6195):401 – 406. Available from: http://www.sciencemag.org/content/345/6195/401.full 

    Drummond JA 2000. Review of Dean, Warren, With Broadax and Firebrand: The Destruction of the Brazilian Atlantic Forest . H-Environment, H-Net Reviews. Available from:  http://www.h-net.org/reviews/showrev.php?id=4260 

    Franco JL, Drummond JA 2009. Proteção à Natureza e Identidade Nacional no Brasil, anos 1920-1940.Fiocruz, Rio de Janeiro, 272 pp.

    Hamilton C. The New Environmentalism Will Lead Us to Disaster. Sci Am . [serial on the Internet].2014 Jun [cited 2015 Jan 12]; Available from: http://www.scientificamerican.com/article/the-new-environmentalism-will-lead-us-to-disaster/ 

    Hardin G. 1968. The Tragedy of the Commons. Science   162:1243-1248. Available from:http://www.sciencemag.org/content/162/3859/1243.full 

    International Union for Conservation of Nature and Natural Resources 2010. 50 Years of Working forProtected Areas : A brief history Gland, 23 pp. Available from: http://cmsdata.iucn.org/downloads/history_wcpa_15july_web_version_1.pdf  

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    Lefèvre, L 2010. Le coût écologique d´Internet. Dossier Pour La Sience  66:41-42.

    Martins JS 1997. O Tempo da Fronteira: Retorno à controvérsia sobre o tempo histórico da frente deexpansão e da frente pioneira. In JS Martins Fronteira : A degradação do Outro nos confins do humano,Hucitec, São Paulo, p. 145-203.

    Mccreery D 2006. Frontier Goiás , 1822-1889. Stanford University Press, California, 297 pp.

    Minc C 1992. Prefácio à edição brasileira. In J Mccormick, Rumo ao paraíso: a história do movimentoambientalista. Relume Dumará, Rio de Janeiro, p. 5-6.

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    Ophuls W 2012. Immoderate Greatness : Why Civilizations Fail. CreateSpace Independent PublishingPlatform, South Carolina, 116 pp.

     Thoreau HD 2008. Civil Disobedience . Available from:  www.forgottenbooks.org  

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    Udall HS 1962. Primeira Conferência Mundial de Parques Nacionais , United States Department of theInterior.

     Webb WP 1979. The Great Frontier . University of Texas, Austin, 384 pp. WILSON, E. O. 1992. The diversity of life . Harvard Univ. Press, Boston, 440 pp.

    We Were Never Environmentalists

     A BSTRACT 

     This essay was presented at the University of Brasilia as a final assignment required in the course

    “Special  Topics in Social History  –  Frontier, Natural Resources and Environmental Conservation”.

    Students were supposed to elaborate an article with a critic view considering the ideas presented in the

    books and papers discussed in class. Therefore, the content of this work outlines several differences in

    the construction of the concept of frontier as time goes by and raises the question whether human

    beings were, have been or will ever be environmentalists.

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    Keywords:  Frontier; Environmentalism; Conservation of Natural Resources; Environmental

    Protection.

    Submissão: 06/01/2015

    Aceite: 19/05/2015

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