Actas do I Congresso Ibero-Americano de História da Educação ...

609
Actas do I Congresso Ibero-Americano de História da Educação Matemática José Manuel Matos Universidade Nova de Lisboa, Portugal Manuel Saraiva Universidade da Beira Interior, Portugal Editores UIED – Coleção Educação e Desenvolvimento

Transcript of Actas do I Congresso Ibero-Americano de História da Educação ...

  • Actas do I Congresso Ibero-Americano de Histria da Educao Matemtica

    Jos Manuel Matos

    Universidade Nova de Lisboa, Portugal

    Manuel Saraiva

    Universidade da Beira Interior, Portugal

    Editores

    UIED Coleo Educao e Desenvolvimento

  • ii

    Actas do I Congresso Ibero-Americano de Histria da Educao Matemtica Jos Manuel Matos e Manuel Saraiva, Editores

    UIED, Unidade de Investigao Educao e Desenvolvimento

    1 edio: Outubro de 2011 Tiragem: 200 exemplares

    ISBN: 978-989-97487-1-2 Depsito legal: 338574/12

    UIED | Coleco Educao e Desenvolvimento

    Faculdade de Cincia e Tecnologia da Universidade Nova de Lisboa Campus da Caparica 2829-516 Caparica, Portugal Tel: +351 212948383 e-mail: [email protected]

    Este trabalho financiado por Fundos FEDER atravs do Programa Operacional Factores de Competitividade COMPETE e por Fundos Nacionais atravs da FCT Fundao para a Cincia e a Tecnologia no mbito do projecto PEst-OE/CED/UI2861/2011

    Capa: Cludia Carvalho Composio: Rodrigo Figueiredo

    Impresso e acabamento: Vrzea da Rainha Impressores SA. Estrada Nacional 8, n.6 2510-082 bidos, Portugal Tel: +351 262098008 Fax: +351 262098582

  • iii

    ndice Introduo / Introduccin 7

    Conferncias Plenrias/ Conferencias Plenarias

    Contribuies da histria da educao matemtica para a formao de professores, Neuza Bertoni Pinto 11

    Socioepistemologa da educao matemtica La Matemtica Moderna en Espaa, Ricardo Cantoral

    25

    Cogniciones petrificadas: el dilema de , Bernardo Gmez Alfonso 27 Alguns episdios da histria dos manuais escolares de matemtica em Portugal, Jaime Carvalho e Silva 43

    Comunicaes / Comunicaciones

    As primeiras aplicaes das derivadas nos manuais escolares do Ensino Secundrio, Ana Paula Aires e Ana Elisa Esteves Santiago 47

    Associao portuguesa de professores de matemtica - uma ideia com quarenta anos, Mria Almeida

    59

    Modelando um novo currculo a Matemtica Moderna no incio da Telescola, Mria Almeida e Jos Manuel Matos

    69

    l(CO) Roxo (1931) e Sangiorgi (1969) abordagens inovadoras em geometria dedutiva, Regina de Cassia Manso de Almeida

    85

    A Histria dos programas de Matemtica para a formao dos professores do 1 Ciclo do Ensino Bsico em Portugal O conceito fundamental de Medida, Ana Amaral, Elfrida Ralha e Alexandra Gomes

    95

    A anlise de textos didticos em Histria da Educao Matemtica, Mirian Maria Andrade e Fbio Donizeti de Oliveira

    110

    Metodologias e Materiais Estruturados para Ensinar Matemtica Moderna: um estudo histrico comparativo, Joseane Pinto de Arruda, Cludia Regina Flores e Jos Manuel Matos

    121

    Didticas e Manuais Pedaggicos do Brasil e de Portugal: um estudo da Matemtica Moderna nas sries iniciais, Rosimeire Aparecida Soares, Tnia Maria Mendona e Aparecida Rodrigues Silva Duatre

    132

    A introduo da teoria dos conjuntos nos programas do ensino primrio (1968 1980), Rui Candeias

    141

    Contributos para a criao de um movimento matemtico em pases ibrico americanos: o caso de Jos Morgado, Ceclia Costa e Paula Catarino

    154

    As fontes oficiais e a capacitao e aperfeioamento de professores que ensinavam matemtica no estado do Paran nas dcadas de 1960 e 1970, Reginaldo Rodrigues da Costa

    167

    O livro didtico de Matemtica da escola secundria brasileira na Primeira Repblica (1889-1930), Bruno Alves Dassie

    179

  • iv

    Paratextos editoriais e Histria da Educao Matemtica: uma leitura de livros didcticos, Bruno Alves Dassie

    188

    A Faculdade de Filosofia, Cincias e Letras de Minas Gerais: reconstruindo a histria da formao de professores de Matemtica em Minas Gerais, Ana Cristina Ferreira

    197

    Aspectos histricos da educao matemtica escolar indgena no Brasil, Eduardo Sebastiani Ferreira e Roseli de Alvarenga Correa

    207

    Livros didticos e a trajetria histrica da matemtica do colgio, Francisco de Oliveira Filho

    221

    Trs breves histrias sobre Malba Tahan, Moyss Gonalves Siqueira Filho 230

    Repercusses do movimento da Matemtica Moderna nas prticas escolares nos anos 1980, sul do Brasil, Beatriz T. Daudt Fischer e Maria Ceclia Bueno Fischer

    239

    Histrias da Educao Matemtica: sobre um grupo de pesquisa, Cludia Regina Flores e David Antonio da Costa

    248

    Ensino de geometria no secundrio: programas curriculares Omar Catunda e Georges Papy na dcada de 1960, Ins Anglica Andrade Freire

    256

    Histria Oral e Histria da Educao Matemtica: consideraes sobre um mtodo, Antonio Vicente Marafioti Garnica

    263

    Sobre o ensino da Aritmtica na Escola Nova: contribuies de dois escritos autobiogrficos para a Histria da Educao Matemtica, Maria Laura Magalhes Gomes

    272

    El Anlisis Matemtico en los libros de texto de Espaa, Maria Teresa Gonzlez Astudillo

    281

    Depois da Matemtica Moderna: passos do discurso curricular sobre a resoluo de problemas em Portugal, Henrique Manuel Guimares

    291

    Una comparacin entre las demostraciones de Pedro Nunes y Al-Khwrizm de los algoritmos de las formas cannicas de la ecuacin de segundo grado, Francisco Infante e Luis Puig

    301

    As provas de matemtica do exame de admisso no Colgio de Aplicao da Universidade da Bahia (1949 a 1973), Janice Cassia Lando

    320

    A formao de professores de Matemtica no Brasil: de temas possveis e do tratamento da periodizao na produo de um grupo de pesquisa, Maria Edneia Martins-Salandim, Dea Nunes Fernandes e Antonio Vicente Marafioti Garnica

    329

    Modelando um novo currculo a matemtica moderna nos estgio do Liceu Normal de Pedro Nunes, Jos Manuel Matos e Teresa Maria Monteiro

    337

    As origens da educao matemtica, Adriana Cesar Mattos e Marcelo Salles Batarce

    347

    Nmero: como ensinar? Orientaes metodolgicas nas publicaes da Secretaria Municipal de Educao de So Paulo (1976), Denise Medina

    354

    Histria na Educao Matemtica no Brasil: uma caracterizao dos seminrios nacionais, Iran Abreu Mendes

    364

  • v

    Formacin de Maestros en la Espaa del siglo XIX: la Aritmtica y el lgebra del Manual completo de instruccin primaria, elemental y superior, de Avendao, Carmen Lpez e Modesto Sierra

    374

    Matemtica em Portugal: marcos da histria do ensino e do ensino da histria, Catarina Mota e Maria Elfrida Ralha

    388

    A histria cultural: aporte terico-metodolgico para a escrita da histria da Educao Matemtica, Brbara Winiarski Diesel Novaes

    401

    A disciplina Histria da Matemtica no Curso de Licenciatura em Matemtica da Universidade Federal de Juiz de Fora UFJF, Maria Cristina Arajo de Oliveira e Wagner da Cunha Fragoso

    410

    Sistemas de Avaliao em Larga Escala e a disciplina Matemtica: um estudo sobre o Sistema Mineiro de Avaliao da Educao Pblica (SIMAVE), Maria Cristina Arajo de Oliveira e Carlos Renato Soares

    419

    Uma histria do ensino das cnicas na matemtica escolar no Brasil, Otlia T. Wiermann Paques e Eduardo Sebastiani Ferreira

    429

    La introduccin en espaa del sistema mtrico decimal: un estudio de los textos de Gabriel Ciscar y Jos Mariano Vallejo, Miguel Picado

    449

    O Arquivo Pessoal Luclia Bechara Sanchez e a formao de professores de Matemtica para as sries iniciais, na dcada de 70 do sculo XX, Nara Vilma Lima Pinheiro

    459

    A configurao do estgio supervisionado nos cursos de Licenciatura em Matemtica em trs instituies de ensino superior no Estado da Bahia, Maria Auxiliadora Lisboa Moreno Pires

    468

    Prticas de ensino de matemtica moderna na formao de normalistas no Instituto de Educao do Paran na dcada de 1970, Mariliza Simonete Portela

    477

    Matemtica ginasial de Euclides Roxo, Heloisa Hernandez de Fontes Salvador 485

    O nmero hoje e ontem: reflexes acerca da histria desse contedo, Maria Clia Leme da Silva

    491

    Escolas alems de Blumenau/SC Brasil: vivncias e o ensino de Matemtica, Viviane Clotilde da Silva e Rosinte Gaertner

    500

    Um lugar para educao matemtica na Academia Militar do Rio de Janeiro oitocentista, Circe Mary Silva da Silva e Ligia Arantes Sad

    504

    O ensino de Matemticana Escola Normal da Corte (1876-1889), Flvia Soares 518

    Zoltan Paul Dienes: um interesse histrico-cultural, Elenir Terezinha Paluch Soares 526

    Narrativas: um olhar sobre o exerccio historiogrfico na educao matemtica, Luzia Aparecida de Souza, Fernando Guedes Cury e Heloisa da Silva

    534

    A matemtica presente na formao de professores leigos: Projeto Inaj, Izolda Strentzke e Gladys Denise Wielewski

    542

    O que nmero? Intuio versus Tradio na histria da educao matemtica, Wagner Rodrigues Valente

    551

  • vi

    Profissionalizao das licenciaturas em matemtica? Estudo histrico do curso da UFSCar, Denise Vilela e Ana Claudia Casagrande Tacon

    565

    A matemtica de professores das sries iniciais no sculo XIX e a regio de Vassouras (RJ), Lucia Maria Aversa Villela

    577

    Conjuntos numricos em duas colees didticas: tradies e inovaes de um autor moderno, Elisabete Zardo Brigo

    590

    Posters

    Aventuras pantogrficas no ensino da matemtica, Ana Paula Aires, Helena B. Campos, Bruna Figueiredo e Maria de Ftima Silva

    601

    A Arquitetura do Mtodo Axiomtico dos Bourbakistas: Um Paradigma no Ensino, Eliene Barbosa Lima

    602

    Potenciar a demonstrao atravs do Teorema de Pitgoras, Alejandro P. Nicols e Patrcia D. Beites

    603

    Aula de Matemtica = No aula de Matemtica, Rosilda Santos Morais e Adriana Csar Mattos

    604

    Un diagnstico sobre los factores que inciden en la fobia hacia la materia ms temidamatemtica, Carmen D. Peraza Gonzlez

    605

    Histria da Matemtica no Programa Nacional do Livro Didtico: discusso sobre a contextualizao e a interdisciplinaridade, Guilherme Henrique Pimentel e Denise Villela

    606

    Uma histria de paixo: Estela Kaufman Fainguelernt e o ensino da Geometria, Marcelo Ferreira Martins Salvador

    608

    Alteraes do currculo brasileiro de matemtica no Ensino Mdio a partir de 1850, Miriam Sampieri Santinho e Rosa Maria Machado

    609

  • 7

    Introduo / Introduccin

    A realizao do I Congresso Ibero-americano de Histria da Educao Matemtica atendeu necessidade de aprofundar o intercmbio entre pesquisadores e a produo de conhecimento ligada histria da educao matemtica na Amrica Latina, na Espanha e em Portugal. O interesse pela temtica tem crescido enormemente no mbito da Educao Matemtica nesses diversos pases. Comisses internacionais, revistas com nmeros especiais sobre o assunto, grupos de trabalho, de pesquisa e tantos outros indicadores mostram o quanto se justifica um evento desta natureza.

    O encontro decorreu entre 26 a 29 de Maio nas instalaes da Universidade da Beira Interior, Covilh, Portugal. Participaram 79 investigadores de diversos pases: Brasil, Costa Rica, Espanha, Mxico e Portugal. Foram propostos 61 trabalhos. Aps um trabalho de apreciao e reviso da responsabilidade da Comisso Cientfica Promotora e de mais alguns investigadores, foram aceites 53 comunicaes. Aos restantes 8 trabalhos foi dada a possibilidade de os apresentarem em formato de poster.

    Este encontro no teria sido possvel sem o apoio da Universidade da Beira Interior, da Associao dos Professores de Matemtica e da Unidade de Investigao Educao e Desenvolvimento.

    Comisso Cientifica Promotora/ Comit Cientfico Promotor

    Adriana Mattos UNESP Rio Claro, Brasil Alexander Maz Machado U. de Crdoba, Espaa Ana Paula Aires U. de Trs-os-Montes e Alto Douro, Portugal Ana Santiago I. P. de Leiria, Portugal Andr Mattedi Dias UFBA, Brasil Angel Ruiz, U. de Costa Rica, Costa Rica Antnio Domingos U. Nova de Lisboa, Portugal Antonio Miguel UNICAMP, Brasil Antonio Vicente Garnica UNESP Bauru, Brasil Aparecida Rodrigues Silva Duarte UNIVAS MG, Brasil Bernardo Gomez U. de Valencia, Espaa Carlos Roberto Vianna UFPR, Brasil Carlos Snchez U. de la Habana, Cuba Ceclia Costa - U. de Trs-os-Montes e Alto Douro, Portugal Ceclia Fischer - UNISINOS, Brasil Ceclia Monteiro I. P. de Lisboa, Portugal Cludia Flores UFSC, Brasil Dolores Carrillo U. de Murcia, Espaa Eduardo Sebastiani Ferreira UNICAMP, Brasil Elfrida Ralha U. do Minho, Portugal Elisabete Burigo, - UFRGS, Brasil Gladys Denise Wielewski UFMT, Brasil Helena Henriques I. P. do Porto, Portugal

  • 8

    Henrique Manuel Guimares U. de Lisboa, Portugal Iran Abreu Mendes UFRN, Brasil Ivanete Batista dos Santos UFS, Brasil Jaime Carvalho e Silva U. de Coimbra, Portugal Joo Bosco Pitombeira de Carvalho UFRJ, Brasil Jos Manuel Matos - U. Nova de Lisboa, Portugal Julio Mosquera U. Nacional Abierta, Venezuela Lucia Maria Aversa Villela U. Severino Sombra, RJ, Brasil Luis Carlos Arboleda U. del Valle, Colmbia Luis Carlos Pais UFMS, Brasil Lus Rico Romero U. de Granada, Espaa M Teresa Gonzlez Astudillo U. de Salamanca, Espaa Manuel Saraiva U. da Beira Interior, Portugal Maria Clia Leme da Silva UNIFESP, Brasil Maria Cristina de Arajo Oliveira UFJF, Brasil Maria Laura Magalhes Gomes UFMG, Brasil Modesto Sierra U. de Salamanca, Espaa Neuza Bertoni Pinto PUC-PR, Brasil Ricardo Cantoral - Cinvestav, Mxico Srgio Nobre UNESP, Rio Claro, Brasil Ubiratan DAmbrosio UNIBAN, Brasil Wagner Valente UNIFESP, Brasil

    Os seguintes investigadores participaram na reviso dos textos / Los investigadores seguintes participaron en la revisin de los textos:

    Brbara Winiarski Diesel Novaes Catarina Mota Denise Medina Francisco de Oliveira Filho Ins Anglica Andrade Freire Janice Cassia Lando Joseane Pinto de Arruda Mria Cristina Almeida Rui Candeias Teresa Maria Monteiro

    Comisso Organizadora Local/ Comission Organizadora Local

    Alejandro P. Nicols Alexandra Rodrigues Antnio Domingos Cludia Carvalho Cristina Leiria Guida Dias Helder Vilarinho Isabel Cunha Jos Manuel Matos Manuel Joaquim Saraiva Patrcia Beites

  • Conferncia Plenrias / Conferencias Plenarias

  • 11

    Contribuies da histria da educao matemtica para a formao de professores

    Neuza Bertoni Pinto PUCPR, [email protected]

    Inicialmente queremos agradecer Comisso Organizadora do I Congresso Ibero-americano de Histria da Educao Matemtica, na pessoa do Professor Jos Manuel pelo convite para participar desta plenria e no temos dvidas que esse evento atesta o fortalecimento cada vez maior do intercmbio acadmico e cientfico entre as comunidades ibero-americanas da educao matemtica.

    Uma preocupao recorrente que me acompanhou durante a elaborao dessa comunicao foi compreender porque to difcil falar da formao do professor de matemtica? Como abordar esse campo permeado de embates epistemolgicos, de jogos de interesse e que por longa data tem acumulado dvidas sobre o espao ocupado na formao pelo conhecimento matemtico e o conhecimento pedaggico, sugerido distines entre o bacharelado e a licenciatura, entre o trabalho do matemtico e do professor de Matemtica, do professor de Matemtica e do educador matemtico?

    Foi a partir dessa preocupao que procuramos estruturar a comunicao que ora vos apresento. Trata-se de uma modesta reflexo que rene argumentos em torno da potencialidade da histria para esse conflituoso e complexo campo que a formao do professor de Matemtica.

    Nessa apresentao, tomaremos como pontos de anlise trs pressupostos que consideramos fundamentais para compreender o que a histria da educao matemtica tem a dizer aos professores de Matemtica da educao bsica: 1) o lugar social da histria educao matemtica a histria da educao; 2) o objecto da educao matemtica a matemtica escolar; 3) a prtica social do educador matemtico tem um passado histrico.

    A comunicao est organizada, portanto, em trs segmentos: o primeiro, aborda a ausncia/presena da histria na formao do professor de Matemtica; o segundo, trata das normas e prticas que do sentido histria da disciplina e cultura escolar; o terceiro, focaliza o passado profissional do professor de Matemtica. Ao final, ser destacada a dimenso formativa da histria para a construo da identidade profissional do educador matemtico.

    Ausncia/presena da histria na formao do professor de Matemtica

    Na explicao da operao historiogrfica, Certeau (1982) afirma que o historiador, ao fazer histria, produz alguma coisa para algum. Sobre a histria que o historiador fabrica, ele observa que todo historiador mantm relao com um lugar social, o lugar de onde fala para algum, do que produz.

  • 12

    Admitir como Certeau de que a histria uma fabricao supe reconhecer uma comunidade que tem um lugar prprio e uma produo especfica. Essa

    imagem da histria, como uma fbrica que tem um lugar prprio, nos remete s observaes feitas por Valente (2005a) de que a tarefa do historiador, ao produzir fatos histricos, a de escrever histria, historicamente e que ao perguntar sobre como questes do presente foram naturalizadas, o historiador da educao matemtica estaria definindo seu territrio de trabalho como sendo o da Histria da Educao ( p. 25).

    A histria da educao, s recentemente tem se voltado investigao de aspectos internos da escola, entre outros, as disciplinas e a cultura escolar. Como sublinha Julia (2002), o campo cientfico da histria da educao vem se modificando ao longo do tempo.

    A historia da educao foi, em suas principais linhas, uma histria poltica e institucional, no tempo em que as lutas entre as Igrejas e os Estados eram mais violentas: tratava-se ento de se posicionar pr ou contra os jesutas, pr ou contra a Revoluo Francesa e suas conquistas. A histria da educao modificou sua natureza no momento em que o ensino secundrio foi democratizado, a partir da dcada de 1960, passando a focalizar o problema da relao entre o sucesso escolar e a herana sociocultural. Porm, mesmo nessa perspectiva, o processo de transmisso de conhecimentos na escola permaneceu fora de anlise, como uma

    espcie de postulado geral estabelecendo, a priori, uma proximidade entre

    os valores e os habitus transmitidos pela escola (Julia, 2002, p. 37).

    Apesar de assinalar o pouco caso da histria da educao em questionar as prticas reais de ensino e os resultados por ela obtidos ao longo da histria, Julia reconhece que os conhecimentos macroscpicos foram importantes na medida em que serviram de antdoto contra falsas ideologias como, por exemplo, a lamentao dos professores sobre a queda do nvel dos alunos, referindo-se a uma idade de ouro ou mtica no qual o conjunto de alunos teria alcanado o domnio da lngua ou da matemtica (p. 38).

    No Brasil, a disciplina Histria da Educao ocupou a posio de um saber subsidirio nos cursos de formao de professores, segundo Warde (1990 ), ao ser instituda como disciplina nesses cursos foi ao mesmo tempo apartada do campo da histria, permanecendo subordinada filosofia e secundarizada em relao sociologia, psicologia e biologia, resultando como disciplina de carter moralizador. Para Carvalho (2005), a composio curricular dos cursos de formao de professores reservava disciplina a funo principal de fornecer matria para a reflexo filosfica sobre os fins da educao, ilustrando o pedagogo com fornecimento de um repertrio de ideias e valores corporificados em grandes sistemas pedaggicos( p. 34).

    Atualmente, essa prtica disciplinar vem sendo questionada frente s redefinies dos objetos, dos critrios de rigor cientfico que esto transformando a produo historiogrfica.

  • 13

    Fortemente radicada nas interrogaes e perplexidades que lhes so contemporneas, a histria da educao passa a tematizar a perspectiva dos sujeitos dos processos investigados, trabalhando com as representaes que os agentes histricos fazem de si mesmos, de suas prticas, das prticas de outros agentes, de instituies como a escola e dos processos que as constituem. Novos temas e novas abordagens ganham a preferncia dos historiadores da educao, dando origem a novos campos de pesquisa, articulados em torno de investigaes sobre prticas culturais seus sujeitos e seus produtos. Nesse processo der de reconfigurao, a histria da educao se multiplica em uma pluralidade de domnios, histria das disciplinas escolares, histria da profisso docente, histria do currculo, histria do livro didtico etc (Carvalho, 2005, p. 35).

    A renovao da histria da educao no s ampliou seu campo de investigao, como deu maior visibilidade historicidade de prticas e atitudes naturalizadas no decorrer do tempo. Esse avano veio acompanhado de uma intensa reflexo conceitual e metodolgica, como observa Carvalho.

    Como objeto da nova histria da educao, a histria da educao matemtica tambm foi desafiada a explicitar a concepo de histria que iria nortear sua prtica historiadora, a superar sua busca de verdade num passado esttico que tomava o fato histrico como j construdo, apenas espera de uma descrio pontual do historiador, sem ter que problematiz-lo a partir do presente.

    No Brasil, o hbrido campo da educao matemtica, constitudo por diferentes matrizes epistemolgicas, tem sido objeto de recentes reflexes, em relao s potencialidades de suas abordagens histricas para a formao dos professores de Matemtica.

    Numa anlise mais recente dessas abordagens, Valente (2010), aponta as vrias experincias de trabalho com o uso da histria da educao na formao do professor de Matemtica, ou seja, a Histria da Matemtica, Histria na Educao Matemtica, a Histria Oral e a Histria da Educao Matemtica, faz a seguinte observao:

    Assim, ao que tudo indica, j h vrias experincias de trabalho com o uso da histria da educao matemtica na formao do professor de Matemtica. Elas tm sido, como se viu, objeto de reflexo pelos pesquisadores da rea e suas concluses apontam para o papel importante da insero desse saber na formao docente. H, no entanto, ao que parece, uma questo ainda no respondida pelos trabalhos j realizados: que histria da educao matemtica deveria ser ensinada nos cursos de Licenciaturas? A pergunta resume as preocupaes em sistematizar um conjunto de conhecimentos que seriam considerados fundamentais para a formao docente

    (Valente, 2010, p. 130).

    No campo interdisciplinar da educao matemtica concorrem diferentes reas de conhecimento: a histria fornecendo ferramentas conceituais, a educao disponibilizando seu tempo histrico, a matemtica fornecendo seus contedos.

  • 14

    Para escrev-la historicamente, cabe ao historiador interrogar os vestgios deixados no presente, pelos cotidianos escolares passados, no a partir dos referentes da matemtica, mas com as ferramentas conceituais da histria.

    Uma das formas de fazer histria da educao matemtica de forma historicizada captar o movimento entre o dizer e o fazer, como diria Certeau, estabelecendo uma relao entre um discurso e uma prtica. Enquanto atividade humana, a histria uma prtica social que acompanha os passos de um grupo social, vai at os sujeitos procurar pelos significados que imprimiram s suas aes, busca pelas estratgias ou tticas por eles utilizadas na apropriao de um determinado objeto cultural. Compreendida como prtica discursiva da escola, as prticas de educao matemtica, expressam no s uma gramtica escolar, conjunto de normas que produzem uma cultura escolar, mas tambm o que a escola, em determinado perodo histrico, privilegiou como conhecimento matemtico necessrio para escolarizao dos sujeitos.

    Para os historiadores da educao matemtica, construir fatos histricos, interrogando fontes atravs de questes legtimas, que permitam fazer a crtica aos documentos e que transformem as marcas do passado em fatos histricos, no tarefa simples. A crtica a ser feita aos documentos, alm de um olhar minucioso s caractersticas do material e coerncia do espao histrico pelo qual se identifica, requer um bom conhecimento do contexto histrico-educacional do objeto investigado.

    Se analisarmos a produo histrica da educao matemtica brasileira, encontramos poucos estudos que tratam da recepo das reformas nas prticas escolares e de seus impactos na cultura escolar. Tambm, so recentes as anlises histricas de como os livros didticos foram apropriados por professores e alunos em diferentes perodos histricos.

    Em relao ao ensino, raros tambm so os projetos de formao que incluem a disciplina Histria da Educao nos currculos de Licenciatura em Matemtica. As implicaes dessa ausncia incidem no reforo da viso equivocada de que a histria no oferece qualquer contribuio para a formao de professores. Outra implicao seria a reificao da representao de que para ensinar Matemtica seria suficiente o domnio do conhecimento matemtico e da representao de que o conhecimento pedaggico no cientfico e at mesmo de que a educao no uma cincia.

    Ainda que os Cursos de Licenciaturas em Matemtica incluam em seu currculo a disciplina Historia da Matemtica, estudos recentes tm questionado a relevncia pedaggica desses estudos para o exerccio da profisso docente (Valente, 2002; Miguel e Miorim, 2004).

    Valente (2002) argumenta que muitas das alternativas que tm sido testadas na

    prtica dessa disciplina tendem a reforar o carter da formao para o ensino

    de matemtica e no para a educao matemtica (p.90). Como explica o autor, as Diretrizes Curriculares de 1999, ao recomendar que a disciplina Histria da Matemtica trate do desenvolvimento, origem e evoluo das idias matemticas, ao investir to somente na cultura matemtica do futuro professor,

  • 15

    acaba por reforar a idia de que o saber com o qual o professor trabalha diretamente o saber cientfico.

    [...] refora a idia de que o saber que o professor utiliza em sua prtica pedaggica com crianas e adolescentes o saber dos matemticos. Assim, apartados desse saber, o professor precisa primeiramente aprend-lo e, depois, aprender a ensin-lo.

    Estamos diante da velha frmula 3 +1, ou seja, Matemtica + Didtica. Permanecem os velhos objetivos de formao para o ensino de matemtica (Valente, 2002, p. 90).

    Ao investigar um objeto cultural, como a matemtica escolar, o historiador da educao matemtica levado a interrogar os vrios campos que deram significado esse componente curricular, as conexes mantidas com outras prticas culturais, considerando que sua histria no ocorre isoladamente no espao/tempo. Para tanto, necessita de um mtodo, para que presente possa dialogar com o passado, que permita a compreenso das continuidades e rupturas que marcaram a cultura escolar em diferentes momentos histricos.

    Esse mtodo, ao colocar o objeto em dilogo com o corpo social, expressa uma concepo de fazer histria que concebe toda cultura sempre como cultura de um grupo, o que significa colocar o objeto investigado na temporalidade educacional.

    De normas e prticas: a histria da disciplina e a cultura escolar

    Segundo Chartier (2007), o grande desafio que se apresenta histria cultural como pensar a articulao entre discursos e prticas (p.67).

    Na perspectiva da cultura escolar, fazer histria da educao matemtica requer, sobretudo, compreender como em determinados momentos histricos as reformas curriculares que se propunham alterar a matemtica escolar foram apropriadas por professores e alunos e quais sentidos as novas matrizes curriculares deram complexa cultura escolar. Como prtica social, culturalmente constituda, a histria nessa perspectiva tem mostrado que os protagonistas das reformas assumiram posies e agiram com intencionalidades. As prticas disciplinares da escola, como todas as prticas culturais, foram e so permeadas por mecanismos de controle e regramentos que do finalidades educao. Como lembra Chervel (1990, p.188), as complexas finalidades de uma disciplina escolar no esto desligadas da histria do seu ensino. Seu estudo

    comea no corpus da disciplina, na srie de textos oficiais programticos, discursos ministeriais, leis, decretos, acordos, instrues, circulares, fixando os planos de estudos, os programas, os mtodos, os exerccios etc.

    Uma histria assim construda fornece um novo olhar sobre a cultura profissional do professor de Matemtica, considerando que em seu fazer

    cotidiano esto presentes representaes culturais, heranas que do sentido sua prtica social.

  • 16

    Com o olhar atento na cultura escolar de tempos passados, os historiadores da educao matemtica analisando as reinvenes das reformas, tm procurado responder questes lacunares do presente, interrogando variadas fontes histricas. Orientando suas pesquisas a partir de conceitos tericos e procedimentos metodolgicos buscados no campo da histria cultural, os seguidores dessa abordagem histrica vm constituindo um dinmico laboratrio de aprendizagem da arte historiogrfica, sobretudo, voltado para a des-construo das representaes, naturalizadas ao longo da histria, nas prticas profissionais dos professores. Essas pesquisas tm destacado, nos contextos dos diferentes movimentos internacionais de modernizao da matemtica escolar, as aes de figuras centrais da educao matemtica brasileira, dentre outras, a de Euclides Roxo e do seu relevante papel na constituio da disciplina Matemtica, na dcada de 1930, da ao pioneira e empreendedora de Osvaldo Sangiorgi, na disseminao do Movimento da Matemtica Moderna, no s dando a conhecer iderios, polmicas e resistncias que marcaram a trajetria da matemtica escolar da educao bsica no Brasil.

    Conectadas aos acontecimentos internacionais, essas histrias tambm tm dado visibilidade do sentido que representantes de diferentes pases deram s suas aes ao investirem esforos em busca de uma educao matemtica de melhor qualidade. Os recentes projetos de cooperao internacional tm possibilitado aberturas de fronteiras, destacado espaos dinmicos de circulao de idias marcados por diferenas e convergncias entre a educao local e transnacional. Isto tem possibilitado compreender a histria como a leitura do tempo. Segundo Chartier (2007, p.81) para melhor vizualizar o presente, distanciar-se do espao/tempo concorre para a unio indissocivel do global e o local.

    Nessas histrias, um simples caderno escolar, um livro didtico e uma prova de Matemtica so discursos representativos de um passado que j no existe mas que deixou vestgios das formas de uso de um programa prescrito para atender um amplo projecto educativo de seu momento histrico. A produo material escolar sempre um testemunho ocular de um tempo que j passou e que deixou rastros de significados para serem interpretados pelas geraes futuras. O nmero e a qualidade dos exerccios, as formas didticas de apresentao da matria, as prticas avaliativas, so indcios importantes para a compreenso de um passado/futuro profissional, a partir de questes do presente. Examinando cadernos de Aritmtica, Geometria e lgebra de um aluno que cursava o ensino secundrio na dcada de 1940, o historiador pode indagar sobre qual finalidade cumpria aquele programa na formao do aluno? Analisando a Reforma Capanema verifica que os programas da escola secundria daquele perodo eram voltados para a formao da elite condutora do pas como havia anunciado o ministro Gustavo Capanema em seu clebre discurso que exaltava a cultura

    clssica do ensino secundrio da era Vargas. As matemticas ( a escola do autor do caderno ainda no assumira o que fora prescrito na Reforma Francisco Campos) cumpriam sua funo disciplinar de cultivar a mente da parte privilegiada da populao que tinha acesso escola secundria. Contextualizada nas prprias cincias, as matrias investiam na organizao mental, no raciocnio apurado, nas habilidades memorsticas consideradas importantes para a cultura cientfica almejada. Nas entrelinhas, os cadernos davam a conhecer indcios de

  • 17

    uma cultura profissional do professor, centrada no domnio de contedos que implicava no treino da mente por meio de exaustiva resoluo de exerccios (o livro de Noes de lgebra-Curso Elementar Parte do Mestre, continha 1000 exerccios). Ao reconstituir os fatos, o historiador busca compreender o perfil do professor do ensino secundrio no projeto republicano. O catedrtico, geralmente engenheiro era o detentor de um conhecimento matemtico que deveria ser transmitido ao aluno, com toda formalidade, rigorosidade e abstrao da cincia, com todas as caractersticas do capital cultural almejado no somente para seu acesso universidade, tambm para sua insero na elite condutora do pas.

    Como bem observou Chervel (1990), em cada poca, as disciplinas escolares esto a servio de uma determinada finalidade educativa, no se restringindo apenas aos ensinamentos explcitos e programados. Suas reais finalidades no se encontram apenas nos textos oficiais e para conhec-las preciso compreender por que a escola ensina o que ensina?, indo realidade pedaggica.

    Passadas duas dcadas, as prticas relatadas so intensamente contestadas. Em meio ao movimento de expanso e democratizao do ensino secundrio, a Matemtica passa a ser considerada uma linguagem das cincias e das tcnicas

    que deveria fazer seu prprio aggiornamento, atualizando e modernizando seu ensino, a partir das noes de conjunto e estrutura. A Matemtica Moderna surge com as marcas de Bourbaki e Piaget em meio a contexto de crise ideolgica, como um elemento fundamental da formao dos indivduos, num mundo marcado pela proeminncia da cincia e da tcnica, em oposio a uma sociedade agrcola e artesanal que vai vertiginosamente sendo suprimida pelos avanos do capital.

    Entretanto, ao que indicam os recentes estudos histricos realizados sobre o MMM, todo o aparato pedaggico idealizado para modernizar a matemtica escolar parece no ter sido suficiente para garantir a to desejada educao cientfica da populao, tida como indispensvel para preparar as novas geraes para os rpidos avanos da tcnica e da cincia.

    Ao tempo do declnio do Movimento da Matemtica Moderna, Piaget criticava alguns equvocos cometidos nas prticas de Matemtica Moderna: Embora seja 'moderno' o contedo ensinado, a maneira de o apresentar permanece s vezes arcaica do ponto de vista psicolgico, enquanto fundamentada na simples transmisso de conhecimentos ( Piaget, 1984, p.14). A nova matemtica parece no ter modernizado a cultura profissional do professor.

    Nesse sentido, os historiadores no podem subestimar o peso que as

    representaes jogam na cultura escolar. Nesse aspecto, os historiadores parecem ser mais categricos quando afirmam que as disciplinas escolares so uma das produes culturais mais criativas da escola o que implica no questionamento da concepo matemtica de fazer histria, em que a construo do objeto fica compartimentada na sua rea de referncia, sem estabelecer um dilogo com o corpo social.

    Conhecer o passado de uma disciplina escolar e suas marcas culturais permitem melhor visualizar o presente, compreender as continuidades e rupturas de nossa

  • 18

    cultura profissional em relao aquela do tempo de um Brasil agrcola que dava seus primeiros passos na industrializao. O que mudou em nosso modo de trabalhar os contedos matemticos, no modo de usar o livro didtico, de avaliar a aprendizagem dos alunos, em relao s prticas dos nossos antepassados profissionais?

    Ao conhecer o passado de sua profisso o professor de hoje, poder se perguntar que forma disciplinar emana de seus gestos profissionais. At que ponto estaria inscrevendo no presente, saberes profissionais de seus antepassados profissionais, modelizados para um mundo globalizado.

    A histria da educao matemtica, ao confrontar normas e prticas e apreender o movimento entre os discursos oficiais e suas apropriaes escolares, mostra que o saber profissional, enquanto produto cultural tem sua prpria forma de produo. Isso nos desafia a indagar sobre quais representaes do passado contriburam para nos tornar o professor que hoje somos.

    O passado profissional do professor de Matemtica

    Nvoa (1998) destaca que a legitimao do campo cientfico da educao foi marcada segundo os critrios das cincias exatas. O que justifica a necessidade de uma reflexo que possa elucidar no apenas o passado, mas a forma como esse passado chegou ao presente influenciando nossas linguagens, nossas categorias de pensamento e nossas maneiras de abordar os problemas educativos (p. 121).

    Lembra o autor, que so raros os trabalhos que procuram articular a histria das cincias e a histria da profissionalizao dos professores. No primeiro caso, os estudos se voltam para questes epistemolgicas do saber, sem abordar os contextos de poder que estruturam a elaborao histrica da educao. No segundo, so abordadas imagens sociais ou a identidade profissional dos professores, sem analisar suas relaes com os saberes, especialmente com os saberes pedaggicos. Essa lacuna nas pesquisas, segundo Nvoa, se deve aos conceitos ambguos que circulam na sociedade, referindo-se a uma semi-cincia quando se fala de pedagogia e de uma semi-profisso quando se refere aos professores.

    Mediante os diferentes discursos e representaes presentes na sociedade, o autor considera ser impossvel compreender o percurso histrico das cincias da educao sem uma referncia aos lugares de enquadramento institucional, de trabalho cientfico e da utilizao profissional dos conhecimentos (p. 123). Nesse sentido, no basta considerar a genealogia da difuso dos saberes sem compreender a relao entre esse saber e os diferentes poderes (acadmicos, profissionais, polticos).

    Em sntese, o autor considera que a profissionalizao dos professores deve ser analisada a partir dos saberes e poderes que so colocados em prtica num determinado perodo histrico.

    Na reconstituio da histria da profissionalizao do professor de Matemtica no Brasil, Valente (2005b) aponta duas etapas fundamentais que marcaram a

  • 19

    trajetria desses profissionais em nosso pas. A primeira, anterior criao das Faculdades de Filosofia, identifica o professor de Matemtica como o matemtico; a segunda, iniciada com o surgimento das referidas faculdades, diferencia o matemtico do professor de matemtica possuidor da formao pedaggica exigida para o exerccio do magistrio.

    At a dcada de 1930, a primeira referncia profissional de professor de matemtica no Brasil a do militar/engenheiro, preparado para ensinar a matemtica prtica requerida pelas artes militares e pela defesa do territrio nacional. Segundo Valente (2008) nosso tatarav profissional praticava seu magistrio ditando parte de sua obra didtica voltada s Aulas de Artilharia e Fortificaes. Com a entrada da Geometria nos cursos jurdicos, os contedos matemticos, antes considerados contedos tcnico-instrumentais alcanam a categoria de cultura geral, apropriada formao dos futuros bacharis, mdicos e engenheiros. Para ensinar essa nova matemtica a uma nova clientela, os professores (militares/engenheiros) aprendem a elaborar apostilas que facilitem a fixao dos pontos pelos alunos. Essa arte de ensinar do nosso bisav profissional caracterizou, segundo o autor, a formao do professor de Matemtica ao longo de um sculo. Como esse modelo profissional foi conformado ou transformado pelos professores das geraes posteriores?

    A gerao posterior, a do nosso av profissional, surge nos anos de 1930, com a criao das Faculdades de Filosofia, instituies que se tornaram responsveis pela formao dos professores do ensino secundrio. A substituio dos cursos preparatrios pelo sistema de ensino seriado, a proliferao de livros didticos nacionais com nova orientao didticopedaggica e a unificao da disciplina Matemtica, que passou a integrar as antigas Aritmtica, lgebra e Geometria, foram os principais determinantes da renovao da prtica profissional do professor de Matemtica do ensino secundrio. Tais fatores favoreceram para a ampliao do debate acerca do papel do conhecimento pedaggico na formao dos professores que desde a dcada anterior, vinha intensificando-se no Colgio Pedro II, com as polmicas discusses travadas entre os catedrticos Euclides Roxo e Joaquim Almeida Lisboa, em relao introduo de uma pedagogia moderna no ensino da matemtica escolar.

    Em meio aos debates, emerge entre ns, pela primeira vez, a idia de formao do educador matemtico, apesar da questo no ser descrita com esses termos. Em substituio ao professor de Matemtica, habilitado por sua cincia do contedo matemtico, do engenheiro que virou professor. Por outro lado, Euclides Roxo erige-se como um dos primeiros

    educadores matemticos de nosso pas

    (Valente, 2005b, p. 86).

    Como educador matemtico Euclides Roxo preocupava-se com aprendizagem do aluno, reconhecia seu processo de desenvolvimento mental, mostrava-se conhecedor dos princpios do ensino intuitivo. Tecendo crticas ao excesso de rigor e formalismo, dizia:

  • 20

    Do mesmo jeito que a humanidade no criou, de sbito a matemtica, em sua forma logicamente cristalizada, no pode o indivduo aprend-la pronta e acabada, para desse modo, adquirir uma nova faculdade o raciocnio. No com a apresentao brusca de um tipo formal de pensamento lgico que se h de educar a inteligncia da criana. Deve-se comear deixando que o aluno pense a seu modo sobre os problemas apresentados. Ser depois mais fcil moldar-lhe o pensamento em um tipo

    mais formal. (Roxo, 1937 apud Valente, 2003, p. 163).

    Roxo no deixava de lado o conhecimento didtico-pedaggico. Ao discorrer sobre a matemtica e o curso secundrio, mostrou ser um profundo conhecedor dos problemas desse segmento de ensino e tambm dos avanos que a psicologia disponibilizava aos professores em relao aprendizagem dos alunos.

    De forma diferente, os matemticos criavam sua prpria didtica a partir de suas experincias em sala de aula. J se tornou emblemtico o depoimento que Benedito Castrucci justificando que no fez o curso de Didtica porque havia seguido o conselho de seu mestre Fantappi que lhe dissera que a didtica s tem uma regra boa: saber a matria. Acreditava o matemtico que se o professor soubesse a matria, o resto era ser um bom artista. (Duarte, Oliveira, Pinto, 2010).

    O histrico papel secundrio, atribudo aos conhecimentos pedaggicos na formao do professor, no apenas reduzia a funo docente mera transmisso de contedos, mas reforava o modelo do nosso bisav profissional, segundo Valente (2008), muito bem assimilado no Brasil por muitas geraes de professores.

    Ubiratan DAbrsio, referindo-se ao seu tempo de aluno no Curso de Matemtica na Faculdade de Filosofia Cincias e Letras da Universidade de So

    Paulo, recorda os cursos magistrais que frequentou e que eram ministrados por matemticos estrangeiros que durante as aulas re-elaboravam os conceitos para melhor serem comunicados aos alunos. Segundo DAmbrsio, na dcada de 1950, a formao dos professores estava voltada para a formao do pesquisador e, como consequncia dessa slida formao em Matemtica, acrescida de algumas disciplinas de Didtica e Psicologia, o estudante poderia ser tambm professor (Oliveira, 2009, p. 218).

    No incio da dcada de 1960, com a disseminao do Movimento da Matemtica Moderna no Brasil, a crise que abalava a formao do professor de Matemtica ganha novos contornos. Era um tempo, segundo Catunda (1961) em que apenas 20% dos professores de Matemtica no Brasil possuam formao superior. Os demais eram autorizados por decretos ministeriais a obter registro para lecionar sem uma preparao especializada. Com o aumento de escolas secundrias, adotou-se no pas o exame de suficincia, porm, muitos dos reprovados ainda mantiveram-se em seus postos e nos concursos de ingresso era facultada a entrada de licenciandos de Fsica, Pedagogia, Cincias Sociais, desde que houvesse em seus programas de formao uma parte mnima de ensino de Matemtica. No extenso territrio brasileiro, a falta de professores para suprir as

  • 21

    necessidades dos ginsios instalados nos pequenos municpios era resolvida com a contrao a ttulo precrio de normalistas e profissionais liberais disponveis. Assim, mdicos, engenheiros, agrnomos, dentistas e farmacuticos transformaram-se em docentes do ensino secundrio.

    Para Catunda, o agravamento desse quadro crtico da profisso docente tambm se dava pela falta de valorizao da carreira docente, comparada a de outros profissionais da rea de exatas. Com um salrio precrio, o professor de Matemtica ainda enfrentava uma jornada de dez horas dirias de aulas, alm do tempo despendido com a preparao de lies, correo de provas, reunies etc

    (Catunda, 1961, p.64 apud Fehr, 1962).

    Simultaneamente expanso dos cursos secundrios, amplia-se tambm o nmero de cursos de Licenciatura em Matemtica, com a permanncia da matriz curricular 3+1 (trs anos de contedos especficos e um ano de contedos pedaggicos).

    Em 1966, o cenrio educacional brasileiro j apresentado com mais otimismo por Osvaldo Sangiorgi na Segunda Conferncia Iberoamericana, realizada em Lima, Peru. O Brasil contava nesse ano com 46 Faculdades de Filosofia, Cincias e Letras, sendo que 47% dos professores possuam formao superior (

    Sangiorgi, 1966, apud Fehr, 969, p. 78).

    medida que a Matemtica Moderna penetrava nas escolas brasileiras, inmeros cursos de capacitao e treinamento eram ofertados aos professores das redes estaduais e municipais de ensino. Em sua maioria, esses cursos centravam-se no programa de Matemtica Moderna, orientando os professores como a nova programao deveria ser trabalhada com os alunos. Ao mesmo tempo que procuravam suprir lacunas do conhecimento matemtico dos professores no licenciados, seus ministrantes ao restringirem-se matriz epistemolgica dos modernos contedos, acabavam reforando a cultura profissional oficializada. A ausncia de uma problematizao do como se ensina e do para quem se ensina, acabou por intensificar o lugar secundrio que a formao pedaggica vinha ocupando na cultura profissional do professor

    de Matemtica. Tanto os cursos ofertados pelas universidades (licenciaturas) e

    os emergentes cursos voltados capacitao de professores para a Matemtica Moderna foram, em grande parte, orientados pela lgica da racionalidade instrumental do ento projeto poltico do perodo ditatorial brasileiro, que contemplava o perfil do professor como um bom tcnico de ensino, um bom planejador de aulas e provas objetivas, enfim um moderno gestor do novo programa.

    Todavia, estudos mais recentes sobre o MMM mostram que nos anos setenta, apesar da aura tecnicista, inmeras experincias de formao de professores aliaram o ensino com a pesquisa e ousando romper com o modelo de racionalidade tcnica vigente na poca, abriram brechas na cristalizada cultura profissional dos professores de Matemtica.

    O potencial formativo da histria da educao matemtica

  • 22

    Na dcada de 1990, as pesquisas sobre formao de professores no Brasil acolheram amplamente o conceito de professor reflexivo, considerando sua fecundidade para a transformao das prticas pedaggicas e para a melhoria da qualidade da educao bsica.

    As anlises crticas advindas de diferentes pases, dissecaram o conceito sob vrios ngulos, mostrando que a prtica reflexiva propiciava, sim, uma crtica ao paradgma da racionalidade tcnica que fragmentava a formao do professor, ainda muito presente nas polticas neoliberais contemporneas. No entanto, a proposta tal como foi divulgada por Schn (1992) era reducionista por focalizar fazeres cotidianos individuais dos professores e ignorar os contextos mais amplos de uma prtica social concreta como a docncia. Como apontou Giroux (1997), mais que um artista e um tcnico, o professor um intelectual crtico e a mera reflexo sobre o trabalho docente de sala de aula no suficiente para a compreenso dos condicionantes de sua prtica profissional. Avanando o debate do professor reflexivo, Contreras (1997) questiona a indefinio do campo de reflexo e de seus limites.

    Pressupe-se que o campo de reflexo ajudar a reconstruir tradies emancipadoras implcitas nos valores de nossa sociedade. Entretanto, tais valores no so s os que representam emancipao, mas tambm a dominao. O que est aqui em dvida se os processos reflexivos, por suas prprias qualidades, dirigem-se conscincia e realizao dos ideais de emancipao, igualdade ou justia (Contreras, 1997, p. 110).

    A reflexividade que se tornou recorrente na atual formao dos professores, ao no tomar como objeto de reflexo a profisso enquanto prtica cultural, ao no dar abertura ao entendimento das representaes, alheias e distanciadas no espao e no tempo, pouco tm contribudo para desmistificar os elementos internos da prpria cultura profissional. Ao final do sculo passado, quanto mais os cursos de formao discutiram a importncia desse novo conceito, mais a histria era silenciada e levada a ocupar um no-lugar no processo de formao. Com isso, a identidade do professor adentrou ao sculo XXI, prosseguindo fragmentada. O professor que ensina Matemtica no sabe se um matemtico, um professor de matemtica, um educador matemtico. A nica certeza que no deseja ser um mero instrutor, um professor transmissor de contedos para preparar o aluno para os exames.

    Como educador matemtico e cidado comprometido com a qualidade da educao contempornea, v-se imerso na crise que assola a escola de massa e da globalizao que abala as estruturas estveis. Desesperanado em seu presente, mal consegue projetar para si um futuro profissional indito.

    A Histria da Matemtica pode ser um recurso didtico para reavivar o ensino de, mas a histria da educao matemtica mais psicanaltica. Vem com um propsito de mais longa durao. Ao conceber a formao como um processo de construo individual e coletiva da identidade profissional, a profisso como produo humana historicamente situada, traz consigo um potencial reflexivo de amplo valor formativo. Sua fecundidade disciplinar se volta para o eixo identitrio da profisso, auxiliando o futuro educador matemtico a reinventar-

  • 23

    se a si prprio num mundo saturado de cincia e tcnica. Essa contribuio,

    todavia, lhe impe desafios incmodos, um deles escuchar a los muertos

    com los ojos, como enfatizou Chartier (2007) em sua clebre aula inaugural no Collge de France em 11 de outubro de 2007. Ouvir as vozes que lhe chegam do passado, olhar o outro vendo-se a si prprio para compreender a temporalidade de uma construo social e individual que a profisso.

    Para finalizar queremos lembrar que no foi por acaso que nessa reflexo, procuramos enfatizar o papel dos historiadores. Afinal, nossa inteno era mesmo falar da fertilidade da histria para a formao do educador matemtico. Como disse Chartier: Apesar dos historiadores terem sido sempre os piores profetas, tambm podem nos ajudar, sem dvida, a compreender as heranas acumuladas que fizeram de ns, o que hoje somos (2007, p.16).

    Referncias

    Carvalho, M.M.CH.de. (2005). Consideraes sobre o ensino da histria da educao no Brasil. In: Gatti Jnior, D.; Incio Filho, Geraldo (orgs.). Histria da Educao em Perspectiva: ensino, pesquisa, produo e novas investigaes. Campinas/SP: Autores Associados; Uberlndia/MG: Edufu. (Coleco memria da educao), 33-46.

    Catunda, O. (1962). La preparacion de professores de matemticas. Fehr, H.F. (editor). Educacion de las Matematicas em las Amricas. Um informe de la Primeira ConferenciaInteramericana sobre la Educacion de las matemticas. Columbia University: Bureau os Publications, 64-78.

    Certeau, M. de (1982). A escrita da histria. Rio de Janeiro: Forense Universitria. Chartier, R. (1990). A histria cultural : entre prticas e representaes. Lisboa: Difel. Chartier, R. (2008). Escuchar a los muertos com los ojos. Buenos Aires: Katz Editores. Chartier, R. (2007). La historia o la lectura del tiempo. Barcelona: editorial Gedisa

    S.A. Chervel, A. (1990). Histria das disciplinas escolares: reflexes sobre um campo

    de pesquisa. Teoria & Educao. Porto Alegre: Pannonica, n. 2, 177-229.

    Contreras, D.J. (1997). La autonomia del profesorado. Madrid: Morata, 1997. Duarte, A. A; Oliveira, M.C. A; Pinto, N.B. (2010). A relao conhecimento

    matemtico versus conhecimento pedaggico na formao do professor de Matemtica: um estudo histrico. ZETETIK FE Unicamp v. 18, n. 33 jan/jun, 103-134.

    Giroux, H. A. (1997). Os professores como intelectuais: rumo a uma pedagogia crtica da

    aprendizagem. Porto Alegre: Artes Mdicas. Julia, D. (2002). Disciplinas escolares: objetivos, ensino e apropriao. In: Lopes,

    A.C.; Macedo, E. (orgs.). Disciplinas e integrao curricular:histria e polticas. Rio de Janeiro: DP&A, 37-72.

    Miguel, A; Miorim, M.A (2004). Histria na Educao Matemtica. Belo Horizonte: Autntica, 2004.

    Nvoa, A. (1998). Histoire et comparaison ( essais sur lducation). Lisbonne: Educa, 1998.

    Nvoa, A. (org.). (1992). Os professores e sua formao. Lisboa: Dom Quixote, 77-92.

  • 24

    Piaget, J. (1984). Para onde vai a educao? 8 ed. Rio de Janeiro: Jos Olympio Editora.

    Pinto, N.B.; Fischer, M.C.B. (2010). A formao dos professores de Matemtica em tempos de revoluo curricular. UFJF/MG: Anais do IX Seminrio Temtico: A matemtica moderna no Brasil e em Portugal: Estudos Histricos

    Comparativos. Roxo, E. M. G. (1937). A matemtica e o curso secundrio. In: Valente, W.R.

    (2003) (org.). Euclides Roxo e a modernizao do ensino de Matemtica no Brasil. So Paulo: SBEM. Biblioteca do Educador Matemtico. Coleo SBEM, v.1

    Sangiorgi,O. (1969) Progresso do Ensino da Matemtica no Brasil. In: Fehr, H.F.(Org.).Educao Matemtica nas Amricas. Relatrio da Segunda Conferncia Interamericana sobre Educao Matemtica. Traduo de Adalberto Bergamasco e L.H. Jacy Monteiro. So Paulo: Companhia Editora Nacional, 76-88.

    Schn, D. (1992) Formar professores como profissionais reflexivos. In: Nvoa,

    A. ( org.). Os professores e sua formao. Lisboa: Dom Quixote, 1992, 77-92. Valente, W.R (2002). Histria da Matemtica na Licenciatura: uma contribuio

    para o debate. Educao Matemtica em Revista. SBEM, ano 9, n.11, edio especial, 88-94.

    Valente, W.R (2005a). A matemtica na escola: um tema para a histria da educao. In: Matos, J.M; Moreira, D. ( Orgs.). Histria do Ensino da

    Matemtica em Portugal.Portugal: Sociedade Portuguesa de Cincias da Educao, 21-32.

    Valente, W.R (2005b). Do engenheiro ao licenciado: subsdios para a histria da

    profissionalizao do professor de Matemtica no Brasil. Dilogo educacional. Curitiba: Pontifcia Universidade Catlica do Paran, Champagnat, v.5, n.16, set/dez. 75- 94.

    Valente, W.R (2010). Histria da educao matemtica: consideraes sobre

    suas potencialidades na formao do professor de matemtica. Bolema. UNESP: Rio Claro/SP, vol.23, n.35A, abril, 123-136.

    Warde, M. J. (1990). Contribuies da histria para a educao. Em Aberto. Braslia, INEP, vol.IX, n.47, jul./set., 2-11.

  • 25

    Socioepistemologa da educao matemtica

    Prof. Ricardo Cantoral, PhD, Cinvestav, IPN Mxico , [email protected]

    Resumen

    El estudio de la construccin social del conocimiento matemtico plantea un anlisis sistmico. Cuatro dimensiones son fundamentales: los planos de lo cognitivo, la difusin institucional va la enseanza, la epistemologa y las prcticas sociales. En esta conferencia ejemplificaremos con temas del pensamiento y lenguaje variaciones.

    Presentacin

    El trmino socioepistemologa plantea un particular corrimiento al problema del saber, lo contextualiza y lo sita del lado de la sociedad. De lo cual podemos decir que la socioepistemologa es una aproximacin terica de naturaleza sistmica que permite tratar los fenmenos de produccin y difusin del conocimiento desde una perspectiva mltiple, al incorporar el estudio de las interacciones entre la epistemolgica del conocimiento, su dimensin socio cultural, los procesos cognitivos asociados y los mecanismos de institucionalizacin va la enseanza.

    Clsicamente, las aproximaciones epistemolgicas asumen que el conocimiento es el resultado de la adaptacin de las explicaciones tericas con las evidencias empricas, ignorando, sobremanera, el papel que los escenarios histricos, culturales e institucionales desempean en la actividad humana. La socioepistemologa por su parte, plantea el examen del saber social, histrica y culturalmente situado, problematizndolo a la luz de las circunstancias de su construccin y difusin (Cantoral, Farfn, 2003).

    Pensamiento y lenguaje variacional

    Antes de precisar el sentido del trmino variacional que usaremos en esta conferencia, se establecer la diferencia que se percibe entre las nociones de cambio y de variacin: La nocin de cambio, por un lado, denota la modificacin de estado dentro de un proceso, un cambio ya sea de apariencia, de comportamiento o de condicin de un cuerpo, de un sistema o de un objeto;

    mientras que la variacin, se entiende como una medida o cuantificacin del

    cambio, es decir, estudiar la variacin de un sistema significa conocer cmo y cunto cambia el sistema dado con base en un sistema de referencia preestablecido. En este sentido se hace referencia a los argumentos de tipo variacional. Se dice que una persona utiliza o comunica argumentos y estrategias de tipo variacional cuando hace uso de maniobras, ideas, tcnicas, o explicaciones que de alguna manera reflejan y expresan el reconocimiento cuantitativo y cualitativo del cambio en el sistema u objeto que se est estudiando (Cantoral, Molina, Snchez, 2005).

    En un sentido ms amplio, la categora del pensamiento y lenguaje variacional, constituye una lnea de investigacin insertada en la aproximacin

  • 26

    socioepistemolgica, que estudia las prcticas sociales que dan vida a la matemtica de la variacin y el cambio en los sistemas didcticos (Cantoral, Farfn, 1998).

    Consideraciones finales

    La aproximacin socioepistemolgica a la investigacin en matemtica educativa, centra su atencin en el examen de las prcticas sociales que favorecen la construccin del conocimiento matemtico, incluso antes que estudiar a los conocimientos mismos (Cantoral y Ferrari, 2004). En este sentido, se considera a lo largo de diferentes investigaciones que una de tales prcticas es la

    prediccin. La imposibilidad de controlar el tiempo a voluntad, obliga a los grupos sociales a predecir, a anticipar los eventos con cierta racionalidad (Cantoral y Farfn, 1998). Este enfoque centrado en prcticas debe entenderse en el marco de las dimensiones sociales. Se aboca al estudio de la interaccin y la convivencia en el ejercicio de las prcticas de referencia. Esta dimensin dota de autonoma al saber desligndolo de la escuela, del pensamiento y de su propia historia, para ubicarle al nivel de las instituciones en un sentido amplio. El saber se posiciona histrica, social y culturalmente en el campo de las instituciones.

    Referencias

    Cantoral, R., Farfn, R. (1998). Pensamiento y Lenguaje Variacional en la introduccin al Anlisis. Epsilon 42, 353 369.

    Cantoral, R., Farfn, R. (2003). Mathematics education: a vision of its evolution. Educational Studies in Mathematics 53(3), 255 270.

    Cantoral, R., Farfn, R. (2004). Desarrollo conceptual del clculo. Mxico: Thompson International.

    Cantoral, R., Ferrari, M. (2004). Uno studo socioepistemologico della previsione. La matematica e la sua didattica 2, 33 70.

    Cantoral, R., Molina, G., Snchez, M. (2005). Socioepistemologa de la prediccin. Acta Latinoamericana de Matemtica Educativa 18(1), 463 468.

  • 27

    Cogniciones petrificadas: el dilema de 1 Bernardo Gmez Alfonso, DDM, Universidad de Valencia, [email protected]

    Palabras clave: Historia y educacin matemtica, la raz cuadrada y el signo radical, cogniciones petrificadas, problemas matemticos y didcticos.

    Resumen

    Uno de los aspectos que hacen difcil la transicin de la aritmtica al lgebra es el uso diferente que se hace de los signos de las operaciones. En el caso del signo radical este uso diferente produce un dilema que suele pasar desapercibido. En este trabajo, que se sita en la lnea de investigacin histrica en educacin matemtica, se identifican las cogniciones petrificadas que sustentan este dilema. Finalmente, se discuten los problemas matemtico y didctico que se derivan de estas cogniciones.

    INTRODUCCIN

    Sobre la observacin y anlisis de los procesos de aprendizaje

    Hace 30 aos, Freudenthal (1981) formul los problemas principales en la educacin matemtica en forma de preguntas. La primera fue: Por qu Juanito o Mara no sabe matemticas? o por qu hay tantos nios que no saben las matemticas se espera que sepan? Las siguientes preguntas fueron: Cmo deberan aprender los nios? o cmo aprende la gente? y, qu es digno de ser enseando? o qu debiera ser enseado. Para l, una manera de responder podra ser: observando procesos de aprendizaje, analizndolos y documentado paradigmas.

    La observacin de los procesos de aprendizaje se puede hacer mirando a los estudiantes, a los profesores, o a lo que Freudenthal llam el ms grande de los procesos de aprendizaje, el de la humanidad, que tambin es un aprendiz (op. cit. p, 137). Para observar los procesos de aprendizaje de la humanidad es preciso regresar a la historia, y para ello los nicos documentos disponibles son los textos histricos. Una manera de hacerlo podra ser analizndolos como cogniciones, de la misma manera que analizamos las producciones de los estudiantes, que de hecho constituyen textos matemticos (Gallardo, 2008).

    El anlisis de textos de pocas pasadas permite identificar lo que Puig (2006) denomina cogniciones petrificadas: Petrificadas porque estn ah, en el texto que nos ha legado la historia, como en los monumentos de piedra de los que no cabe esperar que digan ms de lo que ya est en ellos. Cogniciones, porque lo que queremos leer en esos textos no es el despliegue de un saber, las matemticas, sino el producto de las cogniciones (matemticas) de quien se declara como su autor (Op., cit., p.113).

    1 Esta aportacin se sustenta en un proyecto de investigacin financiado por el MEC. Ref.: EDU2009-10599 (subprograma EDUC).

  • 28

    MARCO TERICO

    La investigacin precedente ha puesto de manifiesto que son varios los aspectos que hacen difcil para los estudiantes la transicin de la aritmtica al lgebra. Entre ellos, destacan los tres siguientes: la manera diferente en que los mismos smbolos se usan en aritmtica y lgebra, el cambio de significado de smbolos clave, como el signo igual; y la aceptacin de expresiones sin clausura como representacin, no solo de las operaciones, sino tambin del resultado de las operaciones (Kieran, 2006).

    En relacin con el signo radical, estos aspectos determinan una naturaleza dual, polismica y ambigua2, que es fuente de conflictos y malentendidos fuertemente arraigados y que pasan desapercibidos en los manuales de enseanza.

    Ante esta situacin cabe plantearse dos preguntas: Est clara la naturaleza dual, polismica y ambigua del signo de la raz cuadrada? y se es consciente de los problemas matemticos y didcticos inherentes a esa naturaleza?

    Para responder a estas dos preguntas se ha hecho un estudio exploratorio, cualitativo y descriptivo, que se sita en la lnea de investigacin histrica en educacin matemtica. Este estudio ha permitido identificar las cogniciones petrificadas del signo radical que sustentan una tradicin de enseanza que favorece la concepcin dual, polismica y ambigua de este signo.

    Rastros histricos del uso dual de los signos de las operaciones

    En los textos del lgebra sincopada, para expresar las operaciones calculables, como cuando se trata de sumar nmeros determinados, se usaban palabras de la lengua verncula: con y de. Pero cuando no eran calculables, como cuando se trata de sumar o restar cantidades algebraicas no homogneas, se usaban smbolos como p y m.

    Un ejemplo de este uso, se encuentra en el siguiente texto (imagen I) tomado de La Summa de Pacioli (di Burgo, 1494).

    Por esta poca, en los textos de los algebristas alemanes se usan con el mismo fin los signos + y , en vez de p y m, y con el mismo fin, el de expresar el resultado de operaciones no calculables. As aparece, por ejemplo, en el siguiente texto del alemn Marc Aurel (1552) (Imagen 2), que es el primer libro de lgebra impreso en Espaa

    2 Dualidad: Existencia de dos caracteres o fenmenos distintos en una misma persona o en un mismo estado de cosas. Ambiguo: Que puede entenderse de varios modos o admitir distintas interpretaciones y dar, por consiguiente, motivo a dudas, incertidumbre o confusin. Polisemia: Pluralidad de significados de una palabra o de cualquier signo lingstico (RAE).

  • 29

    4co con 3co diremos que hacen 7co, y 3co de 7co diremos que restan 4co, porqu son de la misma naturaleza. Pero si queremos conocer 3co con 4ce, diremos que son 3co p 4ce o 4ce p 3co

    Imagen 1 (op. cit. Distinctio octava. Tractatus Primus, fo. 112)

    As mesmo quiero sumar 3x con 2y no podemos decir que son 5x ni 5y: mas forzadamente diremos que son 3x, y mas 2y: o 2y, y mas 3x, pues no sabemos quanto vale la x ni el y. Por tanto para tales sumas de los caracteres no ser menester otor sino decir 3x+2y o 2y+3x, como veras

    Imagen 2 (op. cit. fo 71)

    En el mismo texto, Aurel tambin usa el signo radical3 (Imagen 3). Lo ms interesante para nuestro propsito es que lo hace de un modo dual, ya que lo usa para denominar de modo abreviado la operacin raz cuadrada de un nmero (imagen 3)

    3 Recordemos que la introduccin de este signo se atribuye a Cristofol Rudolf (Die Coss, 1525)

  • 30

    Declaracin de algunos caracteres, que para las rayces sern necesarios

    Para tratar de tales nmeros, y otros semejantes, sera cosa larga, y no galana, poner los tales nombres a la larga: mas deseando huyr esto y evitar toda prolixidad, procure poner aqu algunos que para en esta arte eran necesarios. Y son ()

    De los quales, el primero significa y quiere decir rayz cuadrada ().

    Exemplo, 4 quiere decir rayz cuadrada de 4, que es 2

    Imagen 3 (Op. cit. Libro VII, captulo III, fo 43)

    y tambin para expresar los nmeros irracionales (imagen 4).

    Otra manera de sumar irracionales

    De otra manera podrs sumar dos nmeros o rayzes irracionales, pues as como as vendr binomio

    Exemplo. Quiero sumar 6 con 2 diras simplemente que viene 6 + 2

    Imagen 4 (op. cit. Libro VII, captulo III, fo 44)

  • 31

    Sobre la dualidad proceso/objeto

    El doble uso del signo radical que hace Aurel, para expresar la operacin raz cuadrada y para expresar los objetos matemticos denominados nmeros irracionales, apunta a una dualidad inherente a los signos de las operaciones, que puede ser interpretada a la luz de diferentes teoras: proceso/producto (Kaput, 1979; Davis, 1975), proceso/concepto (Gray y Tall, 1994), o proceso/objeto (Sfard, 1991).

    Bajo estas teoras, lo que se da a entender es que cuando las operaciones no son calculables, como cuando se opera en lgebra con letras y no es posible cerrar la operacin, los signos de las operaciones se usan para expresar el resultado de esas operaciones; es decir, para representar objetos matemticos. As ocurre, por ejemplo, cuando se escribe que la suma de a y b es a+b.

    Por contra, cuando las operaciones son calculables, como cuando se trata de operar con nmeros determinados para los cuales hay un nmero que da respuesta a la operacin, ya no se necesitan signos para representar los resultados.

    En cierto modo, esta ausencia de necesidad de los signos cuando las operaciones son calculables, explica que se retrasara su uso generalizado en la Aritmtica hasta el siglo XIX (Cajori, 1993, p. 235), y que cuando la Aritmtica asumi los signos de las operaciones lo hizo en un sentido diferente al del lgebra, como es el de abreviar la manera de indicar la operacin; es decir, para representar pocesos matemticos. As ocurre, por ejemplo, en 2+4.

    En la enseanza, el recorrido histrico se invierte, los signos de las operaciones se ensean primero en la Aritmtica, como procesos; y cuando los estudiantes ya estn familiarizados con ellos se extienden al lgebra, como objetos. De esta manera la razn de ser algebraica queda en segundo plano y se ve oscurecida o eclipsada por la razn aritmtica sobrevenida.

    En relacin con esta inversin, Sfard (1991), dice que el tratamiento de una nocin matemtica como objeto conduce a un tipo de concepcin estructural, mientras que interpretar una nocin como proceso implica una concepcin operacional. Cuando una persona adquiere una nueva nocin matemtica, la concepcin operacional es normalmente la primera que desarrolla, mientras que la concepcin estructural sigue un largo y difcil camino que necesita de intervencin externa, ya sea de un profesor o de un libro de texto (op. cit., p.17), para ayudar a dar el salto, el cambio en la perspectiva, por medio del cual un proceso se reificacomo objeto (Kieran, 2007, p. 723).

    COGNICIONES PETRIFICADAS DEL SIGNO RADICAL

    En el caso del signo radical, la dualidad proceso/objeto, operacional/estructural, va acompaada de un fenmeno de polisemia y ambigedad que se puede rastrear a travs de las cogniciones petrificadas de los matemticos ms influyentes.

  • 32

    Euler

    En un texto histrico tan influyente como el lgebra de Euler, publicada por primera vez en 1770 bajo el ttulo de Vollstandige Anleitung zur Algebra [Instruccin completa de Algebra], se destila una concepcin del signo radical que es dual, polismica y ambigua (imagen 5):

    la raz cuadrada de

    cualquier nmero

    tiene siempre dos

    valores, uno positivo

    y el otro negativo;

    esto es que 4 , por ejemplo, es

    igualmente 2 y -2, y

    en general, se puede

    adoptar tanto a

    como a para la raz cuadrada de a.

    Imagen 5 Euler (1770, vol. I, p.62)

    En este texto de Euler, cuando el signo radical se aplica a un nmero concreto, 4, se asocia a un conjunto de dos valores numricos: +2 y -2; mientras que

    cuando se aplica a una letra, a, se asocia a un valor absoluto: , susceptible del doble signo + y -. En el primer caso, el sentido de uso del signo radical es el de proceso ya que indica la operacin raz cuadrada de 4; mientras que en el segundo caso, el sentido de uso es el de objeto, ya que expresa el valor absoluto del resultado de la operacin raz cuadrada de a. Esta dualidad, hace que se pueda decir que el signo radical es polismico ya que representa cosas diferentes: operacin o resultado, segn el contexto, que en este caso es numrico o literal.

    Pero, adems, el signo radical cuando se aplica a 4, es un signo de ambigedad,

    ya que expresa una operacin que no tiene un resultado, sino dos: 4.

    En definitiva, las cogniciones petrificadas de Euler plantean que el signo radical es dual, polismico y ambiguo.

    4 El trmino polisemia ha sido usado por Mamolo (2010), para referirse a las ambigedades que estn conectadas a definiciones que dependen del contexto. Por su parte, Filloy (1999), lo ha usado en lo que denomina polisemia de la x. l habla de la polisemia de la x cuando los estudiantes, a los que se les ha pedido que inventen un problema para las ecuaciones x + x/4 = 6 + x/4 x+5= x+x, interpretan que la incgnita no representa lo mismo en el contexto del problema, y le asignan valores distintos. La primera x es una incgnita y la segunda es un nmero generalizado (puede admitir ms de un valor).

  • 33

    Peacock

    En el siglo XIX, cuando se estn desarrollando las bases de las matemticas actuales, uno de los ms influyentes matemticos, Peacock (1791-1858), hace mencin a la ambigedad del valor de la raz cuadrada en estos trminos (Imagen 6): Al pasar del cuadrado a la raz cuadrada siempre encontramos dos races, que solo difieren en su signo (). Ya hemos tenido ocasin de observar estas ambiguas races cuadradas en el Algebra Aritmtica (Peacock, 1845, vol. II, p. 67).

    Captulo XVII

    De la extraccin de la raz cuadrada en el lgebra Simblica: origen de races ambiguas, y del signo

    Se sigue de la regla de los signos que en el lgebra Simblica, hay siempre dos races, que difieren una de otra solo en su signo, correspondientes a la misma raz ()

    Ya hemos tenido ocasin de encontrar estas ambiguas races cuadradas en el lgebra Aritmtica

    p. 67

    p. 67

    Imagen 6 (Op., cit., p. 67)

    Previamente ha establecido que a y tienen idntico significado, y que:

    . Llegado a este punto, en una nota a pie de pgina advierte que la raz cuadrada de a es tanto a como +a (op. cit. p. 62 y 64). Este

    ltimo prrafo es enigmtico, porque siembra la duda sobre si

    (Imagen 7)

  • 34

    Cul es el significado de a1/2?

    El producto de a1/2a1/2=a1/2+1/2 = a1=a, por el principio de los ndices: y asimismo aparece que aa=a. donde a denota la raz cuadrada de a: concluimos, por tanto, que a1/2 es idntico en su significado que a, puesto que cuando se multiplica por s mismo produce el mismo resultado-

    p. 62.

    Se sigue, por tanto,

    que

    *

    p.64

    La raz cuadrada de a2 puede ser tanto a como +a

    p. 64

    p. 62

    p. 64

    p. 64

    Imagen 7 (Op., cit., p. 62 y 64)

    Ms adelante la duda queda despejada, ya que Peacock escribe explcitamente

    que (Imagen 8).

  • 35

    De nuevo, ya que la raz cuadrada de un producto es igual al producto de as races cuadradas de los factores, se sigue que:

    Imagen 8 (Op., cit., p. 72).

    No obstante, no dice nada acerca de la incoherencia que supone aceptar que:

    , y al mismo tiempo que =a.

    Es ms, al trasladar la ambigedad de la raz cuadrada a la resolucin de las ecuaciones cuadrticas no respeta la prctica habitual, ya que de x2=q deduce

    , y no .

    En efecto, despus de establecer la equivalencia entre el proceso de extraer la raz cuadrada de un nmero q y la solucin de la ecuacin cuadrtica x2=q, Peacock dice: el valor de x determinado por esta ecuacin es q o la raz cuadrada de q, y esta raz, como ya hemos visto, posee dos valores que difieren solo en su signo, as, si a representa una raz, a representa la otra (imagen 9).

    En definitiva, las cogniciones petrificadas de Peacock plantean que hay

    ambigedad en la operacin raz cuadrada y en el signo: ; y adems, que en la resolucin de la ecuacin cuadrtica el doble signo no afecta al signo

    radical: x2=q .

    Lacroix

    Lacroix (1831, p. 123) tambin dice que la raz cuadrada es ambigua, pero adopta una posicin contraria a Peacock en cuanto al doble signo en la

    solucin de la ecuacin cuadrtica x2=q, ya que para l ; adems,

    tambin difiere en el valor de (Imagen 10).

  • 36

    Captulo XIX

    De la teora general y solucin de las ecuacin cuadrtica

    El proceso de extraccin de la raz cuadrada de un nmero q, es equivalente a la solucin de la ecuacin binomial cuadrtica

    x2=q, o x2-q=0

    El valor de x determinado por esta ecuacin es q o la raz cuadrada de q, y esta raz, como ya hemos visto, posee dos valores que difieren solo en su signo, as, si a representa una raz, a representa la otra

    Imagen 9 (Op., cit.,, p. 77)

    Entonces, se pregunta por qu x, que es la raz cuadrada de x2, no est afectado del doble signo? Es decir, por qu al resolver x2=b, y tomar la raz

    cuadrada a los dos trminos se escribe , y no

    Entonces dice que la respuesta que propiamente debera darse: , no aporta ninguna solucin nueva a la que usualmente se da: x=b, porque en el primer caso hay dos soluciones que son iguales a las otras dos (imagen 11)

    Aunque esta explicacin es discutible, ya que dota la ecuacin de segundo grado de cuatro races, aunque sean iguales dos a dos, ha sido aceptada por autores posteriores, como por ejemplo Cortazar (1852, p142 y 143) que la recoge literalmente (imagen 12)

  • 37

    En relacin con los signos, que pueden afectar a las cantidades, lo que queda despus de sacar la raz cuadrada es una ambigedad, como consecuencia de lo cual toda ecuacin de segundo grado admite dos soluciones.

    ()

    De esto se deduce que como regla general se debe considerar que el doble signo afecta a la raz cuadrada de cualquier cantidad cualquiera que sea.

    Imagen 10 (Lacroix, 1831, p. 122)

    si al resolver la ecuacin x2=b escribimos x =b, al arreglar esas expresiones de todas las formas posibles, a saber:

    +x = +b, -x = -b

    +x = -b, -x = +b

    no obtenemos ningn nuevo resultado que transponiendo todos los

  • 38

    trminos de las ecuaciones x=-b , -x = +b, o lo que es lo mismo, cambiando todos los signos, esas ecuaciones se vuelven idnticas a las primeras.

    Imagen 11 (op. cit. p. 123)

    El dilema

    Las cogniciones petrificadas en relacin con la raz cuadrada y el signo radical que se acaban de exponer ponen de manifiesto un dilema, representado por las dos posiciones contrarias de Peacock y Lacroix, ya que plantea una disyuntiva

    sobre el valor de .

    a)

    b)

    UN PROBLEMA MATEMTICO Y UN PROBLEMA DIDCTICO

    Esta disyuntiva tiene consecuencias ya que plantea un problema matemtico y un problema didctico. El problema matemtico es que desentraar el dilema acarrea complejidades y sutilezas que tienen que ver con los requisitos formales de la definicin de exponente racional y con la definicin de las operaciones en R y sus inversas (ver Even & Tirosh, 1995; Gmez y Buhlea, 2009; Gmez y Necula, 2011; Gmez, 2011); mientras que el problema didctico, que es el que interesa aqu, es que es una fuente de incoherencias e inconsistencias que suelen pasar desapercibidas en la enseanza prctica..

    El problema didctico: Incoherencias e inconsistencias

    La mayora de los estudiantes (Roach, Gibson y Weber, 2004), profesores, futuros profesores (Gmez y Buhlea, 2009, Gmez y Necula, 2011; Gmez, 2011), y autores de libros de texto (Anaya, 2004, SM, 2002, Santillana, 1999;

    Oxford, 2003), creen que , y tambin creen que . Lo sorprendente es que no se dan cuenta que esto es incoherente, porque ambas

    cosas no pueden ser ciertas a la vez, ya que para x=4=22 se tendra que

    .

    Pero adems, cada una de estas creencias, por si solas, llevan a nuevas incoherencias. Por ejemplo,

  • 39

    1. Si , entonces

    2. Si , entonces:

    Y

    ,

    Y de aqu

    para resolver la ecuacin ax2=b, dividiremos por a, y ser x2=b/a. Extrayendo ahora la raz cuadrada de ambos miembros, ser

    O bien

    Mudando en esta segunda ecuacin los signos de ambos miembros ser

    Y esta ecuacin nos da para x dos valores idnticos a los que da la ecuacin

  • 40

    Luego, al extraer la raz cuadrada de los dos miembros de una ecuacin, no hay necesidad de poner el signo mas que a un solo miembro.

    Imagen 12 (Cortzar, 1852, p. 142 y 143)

    Estas creencias tambin estn en el origen de algunas inconsistencias. Por ejemplo, la mayora de los estudiantes y profesores saben que la razn que justifica la regla para pasar al otro lado de la igualdad, en el proceso de despejar la incgnita, es que se aplica la misma operacin a ambos lados del signo igual, como se muestra en el siguiente ejemplo:

    x a= 0 x a +a = 0 +a x= +a.

    Esa justificacin tambin vale para la ecuacin cuadrtica x2=q. Sin embargo, cuando despejan la incgnita en esa misma ecuacin cuadrtica creen que el doble signo solo hay que ponerlo a uno de los dos miembros de la igualdad, de

    modo que escriben x= q y no , que sera ms consistencia con

    su forma de pensar.

    Otra inconsistencia, fcilmente observable, es que creen que , porque son radicales equivalentes, y al mismo tiempo creen que como el ndice del radical a la izquierda del signo igual es un nmero par tiene dos soluciones (una opuesta a la otra); mientras que como el ndice del radical a la derecha del signo igual es impar solo tiene una solucin. Entonces?

    Conclusiones

    La naturaleza dual, polismica y ambigua de la raz cuadrada y del signo radical se sustenta en cogniciones petrificadas que estn fuertemente arraigadas. Estas cogniciones plantean un dilema que se manifiesta en un problema matemtico y otro didctico.

    Los matemticos5 han decidido resolver el problema desde el punto de vista

    formal asignando a la expresin , x0, un solo valor, una de las dos races de x, la raz positiva o raz principal. Con esta restriccin lo correcto es escribir

    5 Cada nmero real no negativo a tiene una raz cuadrada no negativa nica. Nota: Si a0, su raz

    cuadrada no negativa se indicar por a1/2 o por a (Apostol, 1990. p. 36).

    El smbolo z para 0z denota aqul nmero no negativo cuyo cuadrado es z (Courant, R. y

    John, F., 1979, p. 38).

    Si A es un nmero real positivo, la nica raz positiva de 0Axn se escribe nn AAx1

    (Lentin, A., Rivaud, J., 1969, p. 164).

  • 41

    Igualmente

    Pero los matemticos no suelen dar las explicaciones del porqu de esta restriccin, por lo que aunque han resuelto el problema matemtico no se puede decir lo mismo del problema didctico, ya que al parecer la enseanza est tanto o ms influida por las cogniciones petrificas que por las definiciones formales de los desarrollos matemticos actuales.

    Esta observacin apunta a la necesidad de mejorar la enseanza de races y radicales teniendo en cuenta no solo las exigencias formales de la concepcin funcional de las operaciones y sus inversas, o de la definicin de exponente racional, sino sobre todo las incoherencias e inconsistencias que hay detrs de las cogniciones petrificadas que la enseanza tradicional arrastra.

    Conviene aadir que en matemticas el aprendizaje no debe confiarse exclusivamente a lo que est escrito en los manuales, ya que a menudo arrastran cogniciones, como las que se han discutido aqu, que producen confusin, por omisin de informacin o por la misma informacin que reproducen.

    Referencias

    Anaya (2004). Matemticas, 4 A, Secundaria.. Madrid: Autor (Colera, J.; Garca, R.; Oliveira, M. J. & Martnez, M. M.).

    Apstol, T. (1990). Calculus. Vol.1. Barcelona: Revert. Aurel, Marc (1552). Libro primero de Arithmetica Algebraica, en el qual se contiene el arte mercantil,

    con otras muchas reglas del arte menor, y la regla del algebra... / compuesto, ordenado y hecho imprimir por Marco Aurel... ; intitulado Despertador de ingenios. Valencia: En casa de Joan de Mey Flandro.

    Cajori, F. (1993). A History of Mathematical Notations. New York: Dover P. Courant, R. y John, F. (1979). Introduccin al clculo y al anlisis matemtico, Vol. I, Mxico:

    Limusa. Davis, R.B. (1975). Cognitive processes involving in solving simpe algebraic equations.

    Journal of Children Mathematical Behavior 1(3), 7-35. Euler, L. (1770). Vollstndige Anleitung zur Algebra, Vol I. Kays. Acad. der Wissenschaften,

    St. Petersburg. Even, R. and Tirosh, D. (1995). Subject-Matter Knowledge and Knowledge about

    Students as Source of Teacher Presentation of the Subject Matter, Educational Studies in Mathematic, 29, 1-19

    Filloy, E. (1999). Aspectos tericos del lgebra educativa. Mxico D. F.: Grupo Editorial Iberoamericana.

    Freudhental, H. (1981). Major Problems of Mathematics Education. Educational Studies in Mathematics, 12(2) 133-150.

    Acordamos denotar por a la raz cuadrada positiva, y llamarla simplemente raz cuadrada de a.

    As, 4 es igual a 2 y no -2, aunque (-2)2 = 4 (Lang, 1971. p. 10).

  • 42

    Gallardo, A. (2008) Historical Epistemological Analysis In Mathematical Education: Negative Numbers And The Nothing Ness, in Proceedings of the Joint Meeting of PME 32 and PME-NA XXX, pp. 1-17-29

    Gmez, B. (2011). Historical conflicts and subtleties with the radical sign in textbooks, in Proceedings of the 6th European Summer University - ESU-6 ON - History and epistemology in mathematics Education, Vienna: University of Technology

    Gmez, B. y Buhlea C., (2009). The ambiguity of the sign, in Proceedings of the Sixth Congress of The European Society for Research in Mathematics Education. (CERME 6), Lyon, France.

    Gmez; B. y Necula; C. (2011). Conflicts and subtleties with the radical sign: educational implications in Spanish and Romanian textbooks. Paper accepted in The First International Conference 'Teachers for the Knowledge Society'. (accepted for Journal of Educational Sciences ans Psychology)-Ploiesti, Rumana

    Gray, E. y Tall, D. (1994). Duality, ambiguity and flexibility: A proceptual view of simple arithmetic. Journal for Research in Mathematics Education, 25(2), 116-140.

    Kaput, j. J. (1979). Mathematics and Learning: Roots of epistemological status: in Lochhead, J. and Clement, J. (eds.), Cognitive Process Instruction, Franklin Institute Press.

    Kieran, C. (2007). Learning and Teaching Algebra at the Middle School Through College levels. En Frank, K. Lester (Ed.), Jr. Second Handbook of Research on mathematics Teaching and Learnig.. Charlotte: NCTM. IAP

    Kieran, C., (2006). Research on the learning and teaching of algebra. In A. Gutierrez & P. Boero (Eds.), Handbook of Research on the Psychology of Mathematics Education: Past, Present and Future (pp.11-49). Sense Publishers.

    Lacroix, S. F. (1831). Elements of Algebra. Translated from the French for the use of students of the University at Cambridge. By John Farr, Third edition, Boston: Hilliard, Gray, Little, and Wilkins.

    Lang, S., (1971). A first course in calculus. Third Edition, Massachusetts: Addison-Wesley, Readding.

    Lentin, A. y Rivaud, J. (1969). lgebra moderna, Madrid: Aguilar. Mamolo, A. (2010). Polysemy of symbols: Signs of ambiguity. The Montana Mathematics

    Enthusiast, ISSN 1551-3440, Vol. 7, nos.2&3, pp. 247- 262. Montana Council of Teachers of Mathematics & Information Age Publishing.

    Martinn A., Prez A., Sauret D. & Vsquez T. (1990). Nota sobre radicales y races. Nmeros, 20, 25-35.

    Oxford (2003). Matemticas 4 Secundaria. Proyecto Exedra. Juan Luis Snchez Gonzlez, Juan Vera Lpez. Estella: Oxford University Press Espaa, S. A

    Di Burgo, L. (1494). Suma de Arithmetica, Geometria, Proportioni et Proportionalit. Venezia Peacock, G. (1845). A Treatise on Algebra. Vol.II. On Symbolical algebra. Cambrigde: J.&J.J.

    Deighton. Puig, L. (2006). Vallejo Perplejo. En Alexander Maz, Manuel Torralbo y Luis Rico (Eds.).

    Jos Mariano Vallejo, El Matemtico Ilustrado. Una mirada desde la educacin matemtica, pp. 113-138. Crdoba. Servicio de Publicaciones. U. Crdoba

    Roach, D., Gibson, D. y Weber, K. (1994) Why Is Not 25=5. Mathematics Teacher,97-1. S.M. (2002). Matemticas, 3 Secundaria, Algoritmo, Madrid: Author (Vizmanos, J. & Anzola,

    M.). Santillana (1999). Matemticas, 4 B. Secundaria. Orbita. 2000. Madrid: Autor (Almodvar, J.;

    Garca, P.; Gil, J.; Vzquez, C.; Santos, D.; Nortes A.). Sfard, A. (1991). On the dual nature of mathematical conceptions: reflections on

    processes and objects as different sides of the same coin. Educational Studies in mathematics 22, 1-36.

  • 43

    "Alguns episdios da histria dos manuais escolares de matemtica em Portugal"

    Jaime Carvalho e Silva

    Resumo

    A histria do ensino da matemtica em Portugal est repleta de histrias interessantssimas relacionadas com a avaliao e o uso de manuais escolares, Uma das mais interessantes a que decorreu a partir de 1950 com o manual "Compndio de lgebra - 3 ciclo" da autoria de Antnio Augusto Lopes. Este manual foi acusado por Laureano Barros de "falta de cuidado na apresentao da maior parte dos assuntos" e que o autor "no pensou, suficientemente, sobre os elementos de estudo de que se serviu".

    Um ano depois Antnio Augusto Lopes reagiu a uma outra crtica, dizendo que a primeira no lhe merecera resposta porque o seu autor "no usou, a meu ver, das boas maneiras que so timbre das pessoas de educao."

    Apesar da violncia verbal da discusso, interessante seguir este debate de ideias que, alm do mais, traz para a ribalta a questo das vantagens e desvantagens da existncia de um livro nico. Laureano Barros afirma mesmo que o sistema de livro nico "vai dar uma maior possibilidade de esquecimento dessas poucas obras que deveriam ir entrando na ferramenta de trabalho de estudantes e professores."

  • 44

  • 45

    C