Abaixo o blá-blá-blá

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Mães escrevem cartas para seus filhos no primeiro encontro do ano no colégio Santa Amália (zona leste de São Paulo) saber ab SEGUNDA-FEIRA, 31 DE JANEIRO DE 2011 cotidiano C7 o Q ABAIXO O REUNIÃO DE PAIS Encontros mudaram e agora incluem bate- bate- bate- papo papo papo com especialistas e atividades atividades atividades com os próprios alunos ANÁLISE FABIANA REWALD DE SÃO PAULO Importantes, mas chatas. É assim que grande parte dos pais descreve as reuniões or- ganizadas pelas escolas de seus filhos. Para mudar essa visão e despertar o interesse das famílias, alguns colégios resolveram inovar. A reunião tradicional de início do ano, quando a esco- la apresenta proposta peda- gógica, objetivos e explica seu funcionamento, ainda existe. Ao longo do ano, po- rém, o modelo pode mudar. Nos encontros de escolas como a Carlitos (zona oeste de São Paulo), é comum ha- ver a presença de especialis- tas que discutem diferentes temas de acordo com a faixa etária dos estudantes. “Para a reunião das tur- mas do 1º ano, chamamos um psicanalista para conver- sar com os pais sobre a auto- nomia das crianças, pois sen- timos a dificuldade deles em deixar que seus filhos cres- çam”, diz Laura Piteri, coor- denadora pedagógica. Outro formato muito co- mum é o do plantão de pro- fessores. Funciona assim: em datas previamente agenda- das, todos os professores fi- cam na escola à disposição dos pais, que têm entre dez e 30 minutos, em média, para cada conversa. “Muitas vezes, a dúvida é individual, então o plantão é mais prático”, afirma An- dressa Ruiz Barbosa, orienta- dora educacional do Frans- carmo (zona leste). Outros colégios decidiram usar os estudantes como aliados para trazer suas famí- lias às escolas. Organizam atividades conjuntas, em que os filhos cobram a participa- ção dos pais e as duas partes dialogam entre si. É o caso das redes Dom Bosco e Pueri Domus e de co- légios como o Renovação, que tem unidades na zona sul de São Paulo e em Indaia- tuba, no interior do Estado. “Alguns pais vêm para fa- zer a matrícula e depois não aparecem mais”, conta Cláu- dia Baratella, vice-diretora do Renovação de SP. Segundo Silvio Barini Pin- to, diretor do colégio São Do- mingos (zona oeste), a pre- sença dos pais na escola é mais comum até o ensino fundamental 2 (6º a 9º anos). “Quando as crianças come- çam a adquirir autonomia, os pais vêm menos.” Por isso, os colégios tam- bém se esforçam para criar eventos ao longo do ano que exijam a presença dos pais. Nesses casos, normalmente os filhos apresentam traba- lhos, cantam músicas, ence- nam peças. Tudo para cha- mar a atenção da família. No Consa (zona sul), ver os filhos cantando é um dos exemplos de surpresas feitas aos pais que vão à reunião. No Santo Américo (zona oeste), é comum os pais par- ticiparem de atividades co- mo fazer um presente para o filho ou até repetir uma pes- quisa que ele fez em aula, no laboratório da escola. Essas iniciativas são mais comuns em momentos de mudança, como na passa- gem do 1º ano (antigo pré- primário) para o 2º (antiga 1ª série) ou do 9º ano para o en- sino médio. No colégio alemão Hum- boldt (zona sul), ao final do 1º ano, as famílias fazem cones de papelão recheados de do- ces para “adoçar” o primeiro dia de aula do 2º ano. “É uma tradição alemã”, conta Ma- riane Bischof, coordenadora do ensino infantil e do 1º ano. ANGÚSTIAS Gisela Wajskop, presiden- te do Instituto Singularida- des, que forma professores, explica por que muitas vezes as reuniões são vistas como chatas. “A expectativa do pai não é ouvir, mas falar.” Segundo ela, o que eles mais querem é buscar uma resposta para suas angústias a fim de saber se estão dando uma educação correta. Por isso, diz ela, a tendên- cia é a escola se transformar em um fórum de apoio, onde deve haver discussões de te- mas como drogas ou limite para o uso do computador. Daniella Freixo de Faria, psicóloga especializada em atendimento a crianças e fa- mílias, vê uma tendência por trás das mudanças nas reu- niões. “As escolas hoje olham as crianças como úni- cas. Estão percebendo que vale mais a pena abrir essa reunião para [a ideia de] construir junto.” Nem sempre as reuniões são momentos de troca efetiva blá-blá-blá LUCIANA BITTENCOURT FEVORINI ESPECIAL PARA A FOLHA Família e escola são hoje as duas principais institui- ções responsáveis pela edu- cação de crianças e jovens. Cabe à escola estabelecer uma parceria produtiva com as famílias e, assim, possibi- litar que elas se comprome- tam com o acompanhamento da aprendizagem e com o de- senvolvimento integral de seus filhos. A reunião de pais é um es- paço privilegiado para isso. Mas nem sempre as escolas conseguem transformar es- ses encontros em momentos de troca efetiva. A percepção de muitos pais é que as reuniões são im- portantes, porém chatas. Quais os principais erros co- metidos pelas escolas para que essa percepção seja pre- dominante? Há pelo menos três mais frequentes: permi- tir que questões individuais prevaleçam sobre as de inte- resse de todos; focar em ex- plicações de normas e proce- dimentos internos da escola; e apresentar os conteúdos de aprendizagem como se os pais fossem os estudantes. Como evitar esses proble- mas? Informar a pauta da reunião previamente, solici- tando sugestões dos pais. No início da reunião, deixar cla- ro os assuntos abordados, es- clarecendo quais tópicos fo- ram planejados pela escola e quais foram incluídos pelas sugestões dos pais. Seguir o que foi planejado de forma que se conquiste um espaço coletivo de discussão. As questões particulares de cada família devem ser en- caminhadas para reuniões individuais. Importante tam- bém seria enviar normas e procedimentos por escrito às famílias e dedicar as reu- niões para falar sobre como os alunos estão interagindo com o grupo-classe, com o conhecimento e com a escola como um todo. Os pais se interessam pelo dia a dia dos estudantes. Quanto mais a escola conse- guir mostrar isso com traba- lhos feitos por eles, melhor. A presença dos docentes também é muito valorizada pelos pais, para que eles te- nham sua própria impressão dos professores e do trabalho que eles desenvolvem. As reuniões, quando bem conduzidas, não só permi- tem que os pais acompa- nhem o estudo dos filhos de forma mais contextualizada, como também podem ser im- portantes espaços de refle- xão e de formação para os pais. Afinal, a capacidade de ser pai ou mãe não é dada com o nascimento dos filhos, mas é aprendida na relação com eles e também construí- da socialmente. LUCIANA BITTENCOURT FEVORINI, doutora em psicologia escolar pela USP e diretora escolar do colégio Equipe. Carlos Cecconello/Folhapress Alguns pais vêm para fazer a matrícula e depois não aparecem mais CLÁUDIA BARATELLA vice-diretora do Renovação de SP A expectativa do pai não é ouvir, mas falar GISELA WAJSKOP presidente do Instituto Singularidades, que forma professores Adaptação no ensino infantil serve para tranquilizar o pai e a criança ADAPTAÇÃO DOS PEQUENOS Algumas orientações que os colégios Builders e Garatuja dão para os pais Permaneça no mesmo ambiente que a criança só nos dois primeiros dias e, a partir do terceiro, aguarde na recepção Procure não segurar a criança; deixe-a livre para participar das atividades Nunca rejeite a criança nem a force a acompa- nhar os colegas; os professores irão chamá-la Procure falar pouco e baixo para que a voz do professor se sobressaia Desligue ou deixe o celular no modo silencioso Traga livros ou algo que o mantenha ocupado para a criança perceber que não poderá contar com sua atenção na escola Cumpra o que foi combinado com a criança para ela se sentir segura DE SÃO PAULO Qual é a mãe que não fica com o coração apertado ao ver o filho chorando no pri- meiro dia da escolinha? É justamente para acalmar pais e filhos angustiados com essa separação que as esco- las infantis realizam no início das aulas o processo de adaptação dos novos alunos. Nos primeiros dias, pai, mãe ou outra pessoa próxi- ma é convidada a acompa- nhar a criança na escola. “Isso funciona como uma via de mão de dupla. A crian- ça vai se adaptando e o acompanhante vai vendo co- mo é o funcionamento da es- cola”, diz Vânia de Almeida Salek, autora de “A Criança Até 4 Anos - Um Guia Des- complicado para Educadores (e Pais Curiosos)”. O papel desse acompa- nhante não é distrair o aluno, mas dar conforto para que ele possa, aos poucos, se in- tegrar à classe e realizar as atividades com os colegas. “Quando a família acata as regras direitinho, a adapta- ção é muito mais fácil”, diz Ana Paula Mariutti, diretora de relacionamento das esco- las Builders e Garatuja.

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Folha de São Paulo SEGUNDA-FEIRA, 31 DE JANEIRO

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Mães escrevemcartas para seus filhosnoprimeiro encontrodo anono colégio SantaAmália (zona leste de SãoPaulo)

saberab SEGUNDA-FEIRA, 31 DE JANEIRO DE 2011 cotidiano C7o Q

ABAIXOOREUNIÃO DEPAIS

Encontrosmudarame agora incluembate-bate-bate-papopapopapo com especialistaseatividadesatividadesatividades comos próprios alunos

ANÁLISEFABIANA REWALDDE SÃO PAULO

Importantes, mas chatas.É assimquegrandeparte dospais descreve as reuniões or-ganizadas pelas escolas deseus filhos. Para mudar essavisão e despertar o interessedas famílias, alguns colégiosresolveraminovar.A reunião tradicional de

início doano, quandoaesco-la apresenta proposta peda-gógica, objetivos e explicaseu funcionamento, aindaexiste. Ao longo do ano, po-rém,omodelopodemudar.Nos encontros de escolas

como a Carlitos (zona oestede São Paulo), é comum ha-ver a presença de especialis-tas que discutem diferentestemas de acordo com a faixaetáriadosestudantes.“Para a reunião das tur-

mas do 1º ano, chamamosumpsicanalista para conver-sar com os pais sobre a auto-nomiadascrianças,pois sen-timos a dificuldade deles emdeixar que seus filhos cres-çam”, diz Laura Piteri, coor-denadorapedagógica.Outro formato muito co-

mum é o do plantão de pro-fessores.Funcionaassim:emdatas previamente agenda-das, todos os professores fi-cam na escola à disposiçãodos pais, que têmentre dez e30 minutos, em média, paracadaconversa.“Muitas vezes, a dúvida é

individual, então o plantão émais prático”, afirma An-dressaRuizBarbosa, orienta-dora educacional do Frans-carmo(zonaleste).Outros colégios decidiram

usar os estudantes comoaliadospara trazer suas famí-lias às escolas. Organizamatividadesconjuntas,emqueos filhos cobram a participa-ção dos pais e as duas partesdialogamentresi.É o caso das redes Dom

Bosco ePueriDomus e de co-légios como o Renovação,que tem unidades na zonasulde SãoPaulo e emIndaia-tuba,nointeriordoEstado.“Alguns pais vêm para fa-

zer a matrícula e depois nãoaparecemmais”, conta Cláu-dia Baratella, vice-diretoradoRenovaçãodeSP.Segundo Silvio Barini Pin-

to, diretor do colégio São Do-mingos (zona oeste), a pre-sença dos pais na escola émais comum até o ensinofundamental 2 (6º a 9º anos).“Quando as crianças come-çamaadquirirautonomia,os

paisvêmmenos.”Por isso, os colégios tam-

bém se esforçam para criareventos ao longo do ano queexijam a presença dos pais.Nesses casos, normalmenteos filhos apresentam traba-lhos, cantam músicas, ence-nam peças. Tudo para cha-maraatençãodafamília.NoConsa (zonasul), ver os

filhos cantando é um dos

exemplos de surpresas feitasaospaisquevãoà reunião.No Santo Américo (zona

oeste), é comum os pais par-ticiparem de atividades co-mo fazer um presente para ofilho ou até repetir uma pes-quisa que ele fez em aula, nolaboratóriodaescola.Essas iniciativas são mais

comuns em momentos demudança, como na passa-gem do 1º ano (antigo pré-primário) para o 2º (antiga 1ªsérie) ou do 9º ano para o en-sinomédio.No colégio alemão Hum-

boldt (zonasul),ao finaldo1ºano, as famílias fazem conesde papelão recheados de do-ces para “adoçar” o primeirodia de aulado2º ano. “Éuma

tradição alemã”, conta Ma-riane Bischof, coordenadoradoensinoinfantiledo1ºano.

ANGÚSTIASGisela Wajskop, presiden-

te do Instituto Singularida-des, que forma professores,explica por quemuitas vezesas reuniões são vistas comochatas. “Aexpectativa dopainãoéouvir,masfalar.”Segundo ela, o que eles

mais querem é buscar umaresposta para suas angústiasa fimde saber se estãodandoumaeducaçãocorreta.Por isso, diz ela, a tendên-

cia é a escola se transformarem um fórumde apoio, ondedeve haver discussões de te-mas como drogas ou limite

paraousodocomputador.Daniella Freixo de Faria,

psicóloga especializada ematendimento a crianças e fa-mílias, vêuma tendência portrás das mudanças nas reu-niões. “As escolas hojeolham as crianças como úni-cas. Estão percebendo quevale mais a pena abrir essareunião para [a ideia de]construir junto.”

Nemsempre asreuniões sãomomentos detroca efetivablá-blá-bláLUCIANA BITTENCOURT FEVORINIESPECIAL PARA A FOLHA

Família e escola são hojeas duas principais institui-ções responsáveis pela edu-caçãodecriançase jovens.Cabe à escola estabelecer

uma parceria produtiva comas famílias e, assim, possibi-litar que elas se comprome-tamcomoacompanhamentodaaprendizageme comode-senvolvimento integral deseusfilhos.A reunião de pais é um es-

paço privilegiado para isso.Mas nem sempre as escolasconseguem transformar es-ses encontros em momentosdetrocaefetiva.A percepção de muitos

pais équeas reuniõessão im-portantes, porém chatas.Quais os principais erros co-metidos pelas escolas paraque essa percepção seja pre-dominante? Há pelo menostrês mais frequentes: permi-tir que questões individuaisprevaleçam sobre as de inte-resse de todos; focar em ex-plicações de normas e proce-dimentos internos da escola;e apresentar os conteúdos deaprendizagem como se ospais fossemosestudantes.Como evitar esses proble-

mas? Informar a pauta dareunião previamente, solici-tando sugestões dos pais. Noinício da reunião, deixar cla-roosassuntosabordados,es-clarecendo quais tópicos fo-ram planejados pela escola equais foram incluídos pelassugestões dos pais. Seguir oque foi planejado de formaque se conquiste um espaçocoletivodediscussão.As questões particulares

decada famíliadevemseren-caminhadas para reuniõesindividuais. Importante tam-bém seria enviar normas eprocedimentos por escrito àsfamílias e dedicar as reu-niões para falar sobre comoos alunos estão interagindocom o grupo-classe, com oconhecimentoe comaescolacomoumtodo.Os pais se interessam pelo

dia a dia dos estudantes.Quanto mais a escola conse-guir mostrar isso com traba-lhosfeitosporeles,melhor.A presença dos docentes

também é muito valorizadapelos pais, para que eles te-nham sua própria impressãodosprofessoresedo trabalhoqueelesdesenvolvem.As reuniões, quando bem

conduzidas, não só permi-tem que os pais acompa-nhem o estudo dos filhos deforma mais contextualizada,como tambémpodemser im-portantes espaços de refle-xão e de formação para ospais. Afinal, a capacidade deser pai ou mãe não é dadacomonascimentodos filhos,mas é aprendida na relaçãocom eles e também construí-dasocialmente.LUCIANABITTENCOURT FEVORINI,doutora empsicologia escolar pelaUSPediretora escolar do colégio Equipe.

Carlos Cecconello/Folhapress

“Alguns paisvêmpara fazer amatrícula e depoisnão aparecemmaisCLÁUDIA BARATELLAvice-diretora do Renovação de SP

“A expectativado pai não é ouvir,mas falar

GISELAWAJSKOPpresidente do Instituto Singularidades,que forma professores

Adaptaçãono ensino infantil servepara tranquilizar o pai e a criança

ADAPTAÇÃO DOS PEQUENOSAlgumas orientações que os colégios Builders e Garatuja dão para os pais

Permaneça nomesmo ambiente quea criança só nos doisprimeiros dias e, apartir do terceiro,aguarde na recepção

Procure não segurar acriança; deixe-a livrepara participar dasatividades

Nunca rejeite a criançanem a force a acompa-nhar os colegas; osprofessores irão chamá-la

Procure falar pouco ebaixo para que a voz doprofessor se sobressaia

Desligue ou deixe ocelular nomodosilencioso

Traga livros ou algoque omantenhaocupado para acriança perceber quenão poderá contarcom sua atençãona escola

Cumpra o que foi combinadocom a criança para ela sesentir segura

DE SÃO PAULO

Qual é a mãe que não ficacom o coração apertado aover o filho chorando no pri-meirodiadaescolinha?É justamenteparaacalmar

paise filhosangustiadoscomessa separação que as esco-las infantis realizamnoiníciodas aulas o processo deadaptaçãodosnovosalunos.Nos primeiros dias, pai,

mãe ou outra pessoa próxi-ma é convidada a acompa-nharacriançanaescola.“Isso funciona como uma

via demãode dupla. A crian-ça vai se adaptando e o

acompanhante vai vendo co-mo é o funcionamento da es-cola”, diz Vânia de AlmeidaSalek, autora de “A CriançaAté 4 Anos - Um Guia Des-complicadoparaEducadores(ePaisCuriosos)”.O papel desse acompa-

nhantenãoédistrairoaluno,mas dar conforto para queele possa, aos poucos, se in-tegrar à classe e realizar asatividadescomoscolegas.“Quandoa famíliaacataas

regras direitinho, a adapta-ção é muito mais fácil”, dizAna Paula Mariutti, diretorade relacionamento das esco-lasBuilderseGaratuja.