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JEFERSON MOREIRA DE CARVALHO
A SUPREMACIA (IN) CONSTITUCIONAL DOS PODERES DO PRESIDENTE DA REPÚBLICA E A TEORIA DA SEPARAÇÃO DOS PODERES.
DIREITO.PONTÍFICIA UNIVERSIDADE CATÓLICA.PUC/SP.SÃO PAULO 2005.
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JEFERSON MOREIRA DE CARVALHO
A SUPREMACIA (IN) CONSTITUCIONAL DOS PODERES DO PRESIDENTE DA REPÚBLICA E A TEORIA DA SEPARAÇÃO DOS PODERES.
DIREITO. PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA. PUC/SP. SÃO PAULO 2005. Tese apresentada à Banca Examinadora da Pontifícia Universidade Católica de São Paulo, como exigência parcial para obtenção do título de Doutor em Direito, área Direito do Estado, sob a orientação da Professora Doutora Maria Garcia.
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A SUPREMACIA (IN) CONSTITUCIONAL DOS PODERES DO PRESIDENTE DA REPÚBLICA E A TEORIA DA SEPARAÇÃO DOS PODERES.
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Dedico este trabalho ao Professor Doutor CELSO BASTOS,in memoriam,
reconhecendo sua inigualável defesa da Constituição Federal e pelo
agradecimento aos seus ensinamentos. Também dedico a Professora MARIA
GARCIA, que mesmo com sua cultura invejável mantém simplicidade de
comportamento e por isto a todos encanta. Devo também registrar sua
disponibilidade para transmitir conhecimentos e o respeito que dispensa aos seus
alunos.Muito obrigado!
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RESUMO O objetivo da tese que segue, é mostrar que mesmo tendo a Constituição Federal adotado a Teoria da Tripartição dos Poderes, conforme a idéia de Montesquieu, prevendo a existência dos Poderes Legislativo, Executivo e Judiciário, independentes e harmônicos, mas com certo tipo de controle de um para com o outro, com o fim de impedir a concentração de poderes em uma só pessoa ou um só órgão, de fato, a própria Constituição ao prever os poderes do Presidente da República permite que ele interfira nos demais Poderes, portanto, o posiciona em plano se supremacia em relação ao Legislativo e o Judiciário. Justifica-se o estudo diante da história do Brasil, em que se percebe que o Presidente da República, usando os poderes constitucionais que lhe são conferidos, legisla mais que o Poder Legislativo nomeia membros para Tribunal de Contas, que é órgão auxiliar do Legislativo com a função de fiscalizar as contas do Presidente.No tocante ao Poder Judiciário a história mostra a nomeação de integrantes dos Tribunais, de pessoas oriundas de partidos políticos, fato que não se admite no Poder Judiciário que não pode ter compromissos com ideologias partidárias. Ainda, a criação de um órgão de controle externo do Poder Judiciário o coloca em posição de inferioridade em relação aos demais Poderes, que não sofrem este tipo de controle, reconhecendo mais uma vez a interferência do Presidente da República que nomeia os integrantes do órgão de controle externo. Não se impõe o afastamento do presidencialismo, mais que esta forma de governo não permita o absolutismo presidencial. Partindo-se de teoria de Montesquieu e fazendo uma leitura da Constituição Federal chega-se à conclusão da necessidade de alterações no texto Constitucional para o fim de afastar a supremacia dos poderes do Presidente da República e posicionar os Três Poderes do Estado em um mesmo patamar constitucional, considerando-se que a experiência e a história mostram que as forças reais e vivas de poder que constituem o Estado Brasileiro não aceitam a concentração de poderes em uma só pessoa ou um só organismo.
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ABSTRACT
The purpose of the following thesis is to show that even the Federal Constitution had adopted the Theory of power’s division, as according to the idea of Montesquieu, foreseeing the existence of the Executive, Legislative and Judiciary, independents and harmonics, although with an certain control of each other to prevent the concentration of powers in only one person or only one organ, in fact the Constitution itself by preventing the power of the President allows him that he interferes on others powers, therefore, puts him in supremacy related to the Legislative and to the Judiciary. The study in front of the history in Brazil justifies itself, where is noted the
President, using the constitutionals powers that are given to him, legislates more than
the Legislative name members to the Audit Court, which is Legislative´s aid organ
with the function of inspect the President’s accounts. What is respected to the
Judiciary, the history shows the nomination of integrants of the Courts, who are
derived from political parties, fact that is not accepted by the Judiciary that members
have compromises with ideologies from a political party. Therefore, the creation of an
organ with outer control of the Judiciary, puts him in a lower position in relation to the
others powers, which not suffer this kind of control, once more recognizing the
interference of the President that name the members of the outer control.
Withdraw the presidential is not impose, also this form of government do not
allow the absolutism presidential.
Basing on Montesquieu´s theory and reading the Constitution there is the
conclusion of the necessity in modifications on the Constitutional Text in order to
repel the supremacy of powers from the president and locate the Three Powers of
the State on the same constitutional level, considering that the experience and the
history show that the real and alive forces of powers that constitutes the Brazilian
State do not accept the concentration of powers in only one person or only one
organism.
7
SUMÁRIO
CAPITULO I. A CONSTITUIÇÃO E OS PODERES DO ESTADO . 1
1.1. Sociedade. 1
1.2. Estado. 6
1.3.Constituição. 11
1.3.1. Constitucionalismo e divisão de Poderes na visão de Canotilho. 16
1.4. Poderes do Estado. 18
CAPITULO II.
MONTESQUIEU E A TEORIA DA TRIPARTIÇÃO DOS PODERES. 28
2.1. Antecedentes a Montesquieu. 28
2.2. Tripartição das funções estatais. 35
2.3. A titularidade do exercício das funções. 47
2.3.1. Poder Legislativo. 48
2.3.2. Poder Executivo. 50
2.3.3. Poder Judiciário. 52
2.3.3.1. Órgãos do Poder Judiciário. 55
CAPITULO III. AS FUNÇÕES ESTATAIS NAS CONSTITUIÇÕES BRASILEIRAS. 59
3.1. Constituição de 25 de março de 1.824. 59
3.2. Constituição de 24 de fevereiro de 1.891. 63
3.2.1. Emendas de 1926. 65
3.3. Constituição de 16 de julho de 1.934. 66
3.4. Constituição de 10 de novembro de 1.937. 70
3.5. Constituição de 18 de setembro de 1.946. 74
8
3.6. Constituição de 24 de janeiro de 1.967. 78
3.7. Constituição de 05 de outubro de 1.988. 82
CAPITULO IV- DO PODER EXECUTIVO-
PARLAMENTARISMO/PRESIDENCIALISMO 89
4.1.Parlamentarismo. 90
4.2. Parlamentarismo racionalizado. 99
4.2.1. Vantagens do regime. 100
4.3. Presidencialismo. 102
4.3.1. O absolutismo presidencial. 106
4.3.2. Vantagens do regime. 109
CAPÍTULO V.
FUNÇÕES ATÍPICAS DO PRESIDENTE DA REPÚBLICA. 111
5.1.Medidas Provisórias. 113
5.2.Leis Delegadas. 120
5.3.Nomeação ao Tribunal de Contas. 123
5.4.Nomeação ao Poder Judiciário. 126
5.4.1. Nomeação para o Supremo Tribunal Federal. 131
5.4.2. Nomeações para os Tribunais Superiores. 133
5.4.2.1. Outras nomeações para o Poder Judiciário. 136
5.5.Poder sobre os Poderes. 138
CAPÍTULO VI.
CONTROLE EXTERNO DOS PODERES DA REPÚBLICA. 141
6.1. Controle externo do Poder Judiciário. 142
6.1.1. Inconstitucionalidade da Emenda 45/2004. 148
9
6.1.2. Conselho Nacional de Justiça. 153
6.2. Conselho Nacional do Legislativo. 156
6.3. Conselho Nacional do Executivo. 158
CAPÍTULO VII.
O EQUILÍBRIO DO PODER E A SOBERANIA POPULAR. 160
7.1.Extinção ou modificação das Medidas Provisórias. 163
7.2.Extinção ou modificação das Leis Delegadas. 165
7.3.Outro método de nomeação ao Tribunal de Contas. 166
7.4.Outro método de nomeação ao Poder Judiciário. 169
CAPÍTULO VIII. PROPOSTA DE ALTERAÇÃO CONSTITUCIONAL COM O FIM DE MANTER O
EQUILIBRIO ENTRE OS PODERES. 176
CONCLUSÕES. 186
BIBLIOGRAFIA. 189
10
CAPITULO I
A CONSTITUIÇÃO E OS PODERES DO ESTADO.
Os estudiosos das mais diversas áreas das ciências há muito
tempo afirmam que o homem, além da necessidade de viver em sociedade,
também exige que esta sociedade seja organizada, a fim de que os direitos sejam
preservados e os deveres sejam cumpridos.
Qualquer estudo destinado a conhecer a Constituição do
Estado ou de seus Poderes se faz necessário partir do próprio Estado para que se
compreenda o funcionamento do sistema estatal e sua finalidade destinada ao
bem estar de seu povo.
1.1. Sociedade.
Antes do aparecimento do Estado, surgiu na vida humana, da
mesma forma que na vida dos outros animais, a sociedade, que deve ser
entendida como um agrupamento de pessoas que por idéias comuns acabaram se
unindo.
O ser humano, de início, vive no seio de sua família e, a partir
daí e dos anos, vai vivendo em outros grupos e por conseqüência em sociedade
e, portanto no Estado. O que nos interessa é a sociedade em que o ser humano
desenvolve seus vários papéis sociais, e fixando seu modo e de seus
semelhantes, fundam aquilo que é jurídico, a organização estatal.
11
Sobre a sociabilidade do homem, CELSO BASTOS ensinou
que: “É um truísmo afirmar-se que o homem é um animal social. Com efeito, tem
sido esta sua situação em todos os tempos, a de viver em sociedade. Quer nos
parecer que nunca será possível identificar uma razão específica para a formação
da sociedade. Ela se confunde com o próprio evoluir do homem, perdendo-se,
portanto, nas origens da própria espécie humana.”1 Ensinou ainda que além da
responsabilidade pela sobrevivência individual surgiu a responsabilidade pela
solução dos problemas do grupo social, uma função voltada aos interesses da
coletividade, com problemas transpessoais, coletivos. Trata-se do aparecimento
político.
O evoluir do homem confunde-se com a formação da
sociedade. A mais antiga das sociedades, a única natural é a família, conforme
pensamento de ROUSSEAU: La plus ancienne de toutes les sociétés et la seule
naturelle est celle de famille.
La famille est donc si l´on veut le premier modèle des
sociétés politiques; le chef est l´image du père, le peuple est l´image des enfants,
et tous étant nés égaux et libres n´aliènent leur liberte que pour leur utilité.2
Sociedade é o conjunto de grupos fragmentários, de
“sociedades parciais”, em que, do conflito de interesses reinantes, só se pode
recolher a vontade de todos (volonté de tous).”, conforme mostra PAULO
BONAVIDES afirmado que “a sociedade vem primeiro; o Estado, depois. A
sociedade é algo interposto entre indivíduo e o Estado, é a realidade
intermediária, mais larga e extensa, superior ao Estado, porém inferior ainda ao
indivíduo, como medida de valor”.3
A sociedade assim é um instituto extremamente antigo que se
confunde com a evolução do homem. A sociedade mais antiga e a única natural,
modelo de sociedade política; é a família.
Ao nascer o ser humano integra-se em uma família sem sua
escolha. Trata-se de uma sociedade porque se deve obedecer a volontés de tous
posto que todos apresentam os mesmos objetivos e traçam a mesma trajetória.
1 BASTOS, Celso Ribeiro - Curso de Direito Constitucional, p. 3. 2 ROUSSEAU, Jean-Jacques- Du contrat social, p.46 – (Tradução livre do autor: “A mais antiga de todas as sociedades e a única natural é a família. A família é onde se vê o primeiro modelo de sociedade política; o chefe é a imagem do pai, o povo é a imagem dos filhos e todos nasceram iguais e livres não alienando a liberdade por sua utilidade”).
12
Existe uma ordem de comando e os esforços são conjugados para a finalidade
comum.
Esta sociedade natural e as outras “sociedades parciais”
formam a Sociedade que é o conjunto de grupos fragmentários, apresentando-se
como um liame entre indivíduo e Estado, porque, representando interesses do
grupo, projeta-se no Estado para ocupar um espaço determinado e atingir a
finalidade comum.
Interessante perceber que a família é sociedade natural
porque se institui e se constitui de maneira diferente das outras.
A sociedade familiar nasce pelos sentimentos das pessoas
que lhe dão início, pela necessidade de procriação, pelo instinto e inúmeros outros
motivos, mas como os outros grupos, formados por interesses de defesa de
direitos ou para conquista, apresentam ao final a mesma finalidade, ou seja, o
bem estar de seus integrantes. Mesmo com a diferença para a formação o
comportamento é idêntico, porque ao final todas as “sociedades parciais” se unem
e aparecem para o Estado como um espelho, refletindo a vontade de seus
integrantes, e mais do que este reflexo, a sociedade impõe e exige o acatamento
da vontade de todos.
Como um todo, a sociedade apresenta-se perante o Estado
voltada aos interesses da coletividade, à resolução dos problemas que
transcendem o de seus integrantes considerados individualmente.
O interesse está voltado para a solução dos problemas
transpessoais, isto é, dos problemas coletivos.
Cada grupo fragmentário se une por interesses que lhes são
próprios, entretanto existem interesses que são próprios para todos os grupos, por
mais distintos que sejam, na formação, nos objetivos, no comportamento, na
trajetória, etc. O interesse de respeito aos princípios, aos direitos às conquistas
são de todos os grupos. Assim, o interesse da sociedade é um só para todos seus
integrantes.
Para cada sociedade formada, os interesses que brotam da
união dos grupos fragmentários e que se transformam em princípios e direitos são
interesses de todos, independente da vontade individual. Por isso esta sociedade
3 BONAVIDES, Paulo - Ciência Política, pp. 28/29.
13
deve refletir e lutar para conquista, exercício e respeito aos seus princípios e seus
direitos.
Deste contexto resta verificar o que é a sociedade
doutrinariamente.
Sabe-se que vários filósofos estudaram a questão e várias
teorias e pensamentos surgiram. Entre as doutrinas temos do organicismo social e
as voluntaristas, como se verifica na obra de BENJAMIM DE OLIVEIRA FILHO,
nos termos que segue4.
Aceitando-se a teoria do organicismo social deve-se verificar
muitas questões e entender que a sociedade seria um organismo,um ser
vivo,verdadeira individualidade fisiológica, mas não de simples hipótese, de
imagem ou comparação ou analogia; trata-se de autêntica realidade. A sociedade
é um animal cujas células são os indivíduos.
O grupo não vive senão por seus membros em seus membros,
por conseqüência não pode viver senão para seus membros; portanto a questão
de saber se o indivíduo vive para a sociedade ou se a sociedade para o indivíduo,
pode-se responder que um vive para o outro, porque se a vida dos membros é
positiva a sociedade também é. Se a vida da sociedade for positiva a vida de cada
membro também será.
Se o indivíduo é sociedade enquanto tende para a sociedade,
enquanto a sociedade existe virtual e concretamente nele, enquanto ela constitui
seu meio próprio e natural, enquanto não pode existir indivíduo fora e
independente da sociedade, e como a sociedade não tem existência concreta
senão nos indivíduos que a compõem, os que possuem verdadeira personalidade,
dotados de consciência e vontade, pode-se concluir que indivíduo e a sociedade
existem concomitantemente, um para o outro.
Ao mesmo tempo porque o indivíduo surge na sociedade
natural, a família, e vive para a sociedade porque tende naturalmente para ela e a
sociedade vive para ele porque só o indivíduo tem a verdadeira personalidade.
Enfim, a sociedade corresponde a um organismo que
imprescinde de todos os seus integrantes, cada qual desenvolvendo seu papel
social para o bem estar de toda a sociedade. Do outro lado tem-se que o indivíduo
4 OLIVEIRA Fº, Benjamim - Introdução à Ciência do Direito, pp. 15/23.
14
também necessita da sociedade, porque sua vida só se realiza se desenvolvida no
interior do grande grupo social.
Seguramente, pode-se pensar na existência de uma simbiose
entre sociedade e cada um de seus integrantes.
Para as teorias voluntaristas, a formação da sociedade deu-se
por processos meramente contratuais, tácitos ou expressos, tendo a natureza
humana como a causa primeira, todavia o assentimento do homem seria a causa
imediata. Também se coloca o contrato nas origens da sociedade, quando sua
formação se processou na noite impenetrável dos tempos, devendo-se antes
admitir a existência de um contrato, tácito ou expresso, mas incessantemente
renovado, entre os membros de determinada sociedade, pois a sociedade não
subsiste, de fato, senão pelo acordo constante de todos os seus membros.
ROUSSEAU, ao tratar do pacto social, mostra com clareza o
acordo constante de seus membros na defesa de interesses comuns, quando
afirmou que: “Or comme les hommes ne peuvent engendrer de nouvelles forces,
mais seulement unir et dirigir celles qui existent, ils n´ont plus d´autre moyen pour
se conserver, que de former par agrégation une somme de forces que puissu
l´emporter sur la resistance, de les mettre em jeu par um seul mobile et de les faire
agir de concert. Cette somme de forces ne peut naître que du concours de
plusieurs: mais la force et la liberté de chaque homme étant les premiers
instruments de sa conservation, comment les engagera-t-il sans se nuire, et sans
négliger les soins qu´il se doit? Cette dificulté ramenée à mon sujet peut
s`énoncer em ces termes. “ Trouve une forme d´association qui défend et protège
de toute la force commune la personne et les biens de chaque associé, et par
laquele chacun s`unissant à tous n´ obéisse pourtant qu` à lui-même et reste aussi
libre qu`auparavant?””5
Por fim, o que importa é que a sociedade existiu, existe e
existirá, talvez de outra forma, e que seus integrantes, por um assentimento tácito
ou expresso, estão juntos neste organismo vivo e real que atua para os seus
5 Op.cit. pp. 55/56 (Tradução livre do autor: “Então como os homens não podem engendrar novas forças, mas somente unir e dirigir as que existem, eles não têm outro meio de se conservar, senão que formar pela agregação uma soma de forças que permite triunfar sobre a resistência, de criar ações com um só fim e fazer agir de acordo. Esta soma de forças não pode nascer senão que do concurso de várias: mas a força e a liberdade dos homens sendo os primeiros instrumentos de conservação como os assumirá sem prejudicar e sem negligenciar os sonhos que eles se devem? Esta dificuldade retornou a meu pensamento e pode se exprimir nestes termos. “Achar uma
15
membros como estes atuam para ela. Se a sociedade foi importante para as
conquistas de direitos, hoje ela é muito mais importante para que se mantenham
vivas as conquistas, porque a perda de um direito é mais prejudicial do que nunca
tê-lo conquistado.
Como todos os grupos sociais afirma GOFFREDO TELLES
JUNIOR, a sociedade política tem a idéia de assegurar as condições para
aproximar-se de seus respectivos fins.6
Por isso é certo afirmar que qualquer sociedade tem o mesmo
fim que é a felicidade de seus integrantes. ARISTÓTELES ensinando Nicômanos
afirmou “... a felicidade é algo final e auto-suficiente, e é o fim a que visam às
ações.”7
Seja na sociedade familiar seja na sociedade estatal a
felicidade deve ser a busca comum.
1.2. Estado.
Conceituar o Estado exige enxergá-lo como comunidade social
e como ordem jurídica. Exige-se porque a sua formação advém, primeiro de
movimentação social, para em seguida surgir juridicamente.
De acordo com a teoria tradicional o Estado, compõe-se de três
elementos: a população, o território e o poder, que é exercido por um governo
estadual independente. Estes elementos definidos juridicamente somente podem
ser apreendidos como vigência e domínio de vigência (validade) de uma ordem
jurídica.
O Estado da mesma forma que um ser vivo, nasce,
desenvolve-se, transforma-se e desaparece. O nascimento do Estado é um fato
forma de associação que defenda e proteja de toda a força comum a pessoa e os bens de cada sociedade, e pela qual qualquer um se unindo a todos se submete a ele mesmo e fica assim livre como antes?) 6 TELLES Júnior- Goffredo- O Povo e o poder, p.29. “ Como todos os grupos sociais, a sociedade política se constitui para realizar determinada idéia. Qual será a idéia em razão da qual a sociedade política existe? A resposta se encontra na definição de tal sociedade: grupo social cuja idéia a realizar consiste na de assegurar a condição necessária para que as entidades,que ela encerra, melhor possam aproximar-se de seus respectivos fins.” 7 ARISTOTELES - Ética a Nicômanos, p.24.
16
histórico não jurídico, como preleciona HILDEBRANDO ACCIOLY8, expressando,
ainda, que diversos são os modos por que o Estado pode surgir.
Considerando-se o nascimento do Estado como fato histórico
tem-se que concluir que após sua formação, com os três elementos necessários,
é que surge a necessidade de organizar-se politicamente para ser considerado
também como ordem jurídica.
São várias as teorias que tentam justificar a origem do
Estado, mas pode-se constatar que todas elas mostram que o Estado surge de
movimentação social.
A movimentação social dá origem ao Estado e com esta
própria movimentação se percebe a necessidade imperiosa de organização.
A fim de perceber o Estado como ordem jurídica, deve-se
lembrar que a sociedade é um organismo vivo e real que atua para seus membros
e estes para ela, e ainda que a sociedade reflete os interesses dos indivíduos,
sendo um elo entre eles e o Estado.
A sociedade é viva e real dentro do instituto denominado
Estado. Ela vive e tem realidade no seio de uma organização jurídica chamada
Estado que foi criado exatamente para dar feição legal para uma organização
anterior, a própria sociedade.
Escreve DE PLÁCIDO E SILVA que Estado no sentido do
Direito Público, segundo conceito dado pelos juristas, é o agrupamento de
indivíduos, estabelecidos ou fixados em um território determinado e submetidos à
autoridade de um poder público e soberano, que lhe dá autoridade orgânica9.
Para OSVALDO FERREIRA DE MELO, Estado é uma
instituição destinada a manter a organização política de um povo e assegurar o
bem comum, utilizando mecanismos de controle coercitivo sobre toda a sociedade
e exercendo jurisdição sobre determinado espaço10.
Encontramos na doutrina francesa que: “Juridiquement, l’Etat
est une entité politique constituée par la réunion de trois éléments: un territoire,
une population, un governement. Le droit international em définit le statut. En
principe, l’Etat est souverain: à l’intérieur de ses frontières, il est libre d’agir comme
8 ACCIOLY, Hildebrando - Manual de Direito Internacional Público, p. 26. 9 SILVA, De Plácido - Vocabulário Jurídico, Forense, vol. II. 10 MELO, Osvaldo Ferreira - Dicionário de Direito Político.
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il l’entend; ses relations avec les autres membres de la société internationale sont
fondées sur une égalité évidemment théorique”.11
Por sua vez, HOBBES afirmou que “Diz-se que um Estado foi
instituído quando uma multidão de homens concordam e pactuam, cada um com
cada um dos outros, que a qualquer homem ou assembléia de homens a quem
seja atribuída pela maioria o direito de representar a pessoa de todos eles (ou
seja, de ser seu representante), todos sem exceção, tanto os que votaram a favor
dele como os que votarem contra ele, deverão autorizar todos os atos e decisões
desse homem ou assembléia de homens, tal qual como se fossem seus próprios
atos e decisões, a fim de viverem em paz uns com os outros e serem protegidos
dos restantes homens.”12
Não se pode deixar de consignar a posição de DUGUIT que
se expressa sobre a doutrina democrática do Estado, no sentido de que “ Nous
appelons démocratiques toutes les doctrines que placent l´origine du pouvoir
politique dans la volonté collective de la societé soumise à ce pouvoir est qui
enseignent que lê pouvoir politique, parce que est seulement parce qu´il este
instituié par la collectivité qu’ il regit.”13
Assim, podemos conceituar o Estado como a sociedade
politizada e devidamente organizada. Fixada em um território, havendo jurisdição
e poder de coerção por parte de um poder soberano, e também, como se verá a
diante à procura do bem de todos.
Pode-se concluir também que a sociedade é a base para a
formação do Estado, porque ela antecede o Estado.
Existe assim um poder soberano que é formado por
integrantes da própria sociedade que por sua vez deu origem ao Estado, e por
isso têm-se governantes e governados que surgem da atividade política. Aqueles
que assumem o controle do Estado tomam uma posição diferente na sociedade e
11 BARRILLON, R, et all - Dictionaire de la Constitution, p. 211 (Tradução livre do autor: Juridicamente o Estado é uma entidade política pela reunião de três elementos: um território, uma população, um governo. O direito internacional define o estatuto. Em principio o Estado é soberano: no interior de suas fronteiras, ele é livre para agir com entende; suas relações internacionais com outros membros da sociedade internacional são fundadas sobre uma igualdade evidentemente teórica.). 12 HOBBES - Clássicos da Política 1, p. 63. 13 DUGUIT, Leon – Manuel de Droit Constitutionnel, , p.18. (Tradução livre do autor. “ Chamamos democráticas todas as doutrinas que dão origem do poder político na vontade coletiva da sociedade submetida a este poder e que reconhece que o poder político é legitimo, porque somente por ele é instituído para a coletividade que ele rege.”
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tornam-se responsáveis pelo destino de todo o grupo social. O governante ou
governantes podem levar o Estado ao ponto desejado por todos ou ao caos,
quando então serão afastados das funções pelas forças políticas atuantes.
Da mesma maneira que a sociedade acompanha a evolução
do homem, pode-se dizer que o Estado acompanha a evolução da sociedade e
por isso o Estado contemporâneo é diferente do Estado de épocas passadas e
possivelmente será diferente no futuro.
Em razão desta evolução do homem, da sociedade e do
Estado, o conceito desta organização jurídica também vem evoluindo desde a
Antigüidade, a partir da Polis grega e da Civitas romana. A própria denominação
de Estado, com a exata significação que lhe atribui o direito moderno, foi
desconhecida até ao limiar da Idade Média, quando as expressões empregadas
eram rich, imperium, land, terrae etc. Teria sido a Itália o primeiro país a empregar
a palavra Stato, embora com uma significação muito vaga. A Inglaterra, no século
XV, depois a França e a Alemanha no século XVI, usaram o termo Estado com
referência à ordem pública constituída. Foi Maquiavel, criador do direito público
moderno, quem introduziu a expressão, definitivamente, na literatura científica14.
Com a evolução, temos um Estado moderno, mas preso à
teoria tradicional, que conforme MANOEL GONÇALVES FERREIRA FILHO, é
uma associação humana (povo), radicada em base espacial (território), que vive
sob comando de uma autoridade (poder) não sujeita a qualquer outra(soberana)15,
o que demonstra que as assertivas anteriormente mencionadas estão na mesma
linha de pensamento. Estes três elementos, povo, território e poder, só podem ser
definidos juridicamente e são mostrados por KELSEN.
Em sua conhecida Teoria Pura do Direito sob vários enfoques
se estudou o Estado, e pode-se extrair que o direito existente depende da forma
do Estado que vai produzir as normas de maneira estabelecida. Havendo um
dualismo de Estado e Direito este o afirma como uma entidade jurídica, ela (a
teoria) estrutura esta sua idéia considerando o Estado como sujeito de deveres
jurídicos e direitos, quer dizer, como pessoa, atribuindo-lhe ao mesmo tempo uma
existência independente da ordem jurídica. Pressupõe-se que o Estado é
independente do Direito e até preexiste o mesmo.Em sua missão, cria o Direito o
14 MALUF, Said -Teoria Geral do Estado, p. 35. 15 FERREIRA Fº, Manoel Gonçalves - Curso de Direito Constitucional, p. 45.
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“seu” Direito, e como entidade metajurídica é pressuposto do Direito e ao mesmo
tempo, sujeito jurídico que pressupõe o Direito porque está submetido, é por ele
obrigado e dele recebe direitos.
O Estado é transformado, de um simples fato de poder, em
Estado de Direito que se justifica pelo simples ato de fazer o Direito. Como
organização política, o Estado é uma ordem jurídica. Mas, nem toda ordem
jurídica é um Estado. Nem a ordem jurídica pré-estadual da sociedade primitiva,
nem a ordem jurídica internacional supra-estadual (interestadual) representam um
Estado. Para ser um Estado, a ordem jurídica necessita ter o caráter de uma
organização no sentido estrito da palavra, quer dizer, tem de instituir órgãos
funcionando, segundo o princípio da divisão do trabalho para criação e aplicação
das normas que a formam; ter de apresentar um certo grau de centralização. O
Estado é uma ordem jurídica relativamente centralizada.
Assim, para que haja um Estado como ordem jurídica,
precisa-se da criação desta ordem.
O próprio Estado que se formou cria a ordem a que ele
próprio fica subordinado.
A população que formou o Estado fica subordinada a este
ordenamento criado pelo Estado e ao poderes criados pela ordem jurídica.
Na verdade, há uma simbiose da população, do Estado e da
ordem jurídica, que fixados em determinado território vivem uma vida em comum,
mas formada por um Poder fundamentado na mesma ordem jurídica.
Criado o Estado juridicamente, surge a autovinculação, isto é, o
Estado fica vinculado ao Direito por ele próprio criado. O Direito não é criado para
os cidadãos apenas, e sim para o Estado também.
Formado um Estado em sua plenitude, surge para este
organismo político poderes previstos pela ordem jurídica e que devem ser
exercidos para manutenção da vida estatal perante os indivíduos e perante outros
Estados, por isso, para resumir, pode-se copiar o já citado MANOEL
GONÇALVES FERREIRA FILHO, para dizer que “o Estado é uma ordem jurídica
relativamente centralizada, limitada no seu domínio espacial e temporal de
vigência soberana e globalmente eficaz”.16
16 Op.cit. Curso de Direito Constitucional, p. 46.
20
É importante lembrar que Estado e Governo não se
confundem, porque governo é o conjunto de cargos executivos do Estado, ou seja,
o conjunto de cargos que atuam decisória e temporariamente no campo político,
imprimindo os rumos e procedimentos da Administração Pública. O Estado é
perene, contínuo e permanente e o Governo é temporário; o Estado é geral e o
Governo particularizado; o Estado tem delegação permanente da Nação enquanto
o Governo tem delegação temporária de uma parte do eleitorado; o Estado tem
funções Administrativas, Legislativas e Judiciárias enquanto o Governo somente
exerce a função executiva. A estes ensinamentos de PAULO NAPOLEÃO
NOGUEIRA DA SILVA17, pode-se acrescer que o Estado é antes de tudo, uma
formação histórica enquanto o Governo é uma formação jurídica.
A importância do Estado é tão grande que ARISTÓTELES em
A Política já dizia que na ordem da natureza, o Estado se coloca antes da família
e antes de cada indivíduo, pois que o todo deve, forçosamente, ser colocado
antes da parte.18
1.3. Constituição.
Conceituar Constituição não é tarefa fácil diante da
complexidade da própria idéia.
O verbo constituir e o substantivo constituição aparecem em
todos os ramos do saber. Na vida se constitui elementos abstratos e concretos a
todo momento.
A constituição de algo corpóreo é, em regra, de fácil
percepção. A constituição de uma idéia pode ser dissecada, ampliada e alterada.
Tudo é constituído.
Quanto a Constituição de um Estado não podemos
simplesmente ter a idéia de um caderno escrito que contenha regras
extremamente abstratas, ou mesmo que seja uma simples idéia de como o Estado
é formado.
17 SILVA, Paulo Napoleão Nogueira da - Curso de Direito Constitucional, p. 38. 18 ARISTÓTELES - A Política, p. 19.
21
Constituição de um Estado deve ser compreendida na sua
essência, deve ser vista e aceita como a demonstração de como o Estado está
estruturado e a que fim se dispõe. A Constituição de um Estado deve se ser
compreendida como sendo a vontade da Nação.
FERDINAND LASSALLE apresenta pensamento sociológico.
“... em síntese, em essência, a Constituição de um país: a soma dos fatores reais
do poder que regem uma nação”.19
Afirma o autor a relação desta Constituição com a
Constituição jurídica. A relação dos conceitos mostra que a união destes fatores
reais do poder postos em uma folha de papel ganham expressão escrita. A partir
deste momento, incorporados a um papel, não são simples fatores reais do poder,
mas sim verdadeiro direito- instituições jurídicas.
Qualquer atentado contra estes fatores reais do poder não
são mais simples atentados, mas atentados contra a norma jurídica, contra o
Direito.
De fato, antes de a Constituição ser um documento formal ou
mesmo costumeiro se apresenta como a união de todos os fatores de força que
regem os destinos de um povo.
Uma Nação é, sem dúvida, constituída por todos os
segmentos vivos que buscam o mesmo fim, e com esta vontade de constituir
formam o Estado e a Constituição política e jurídica.
Antes, da criação da Constituição como documento jurídico,
há a Constituição vista por Lassalle, como a união dos fatores reais do poder que
em razão da união formam ou constituem aquilo que vai gerar o Estado.
Se apresenta a Constituição em vários sentidos e na ótica
CELSO BASTOS em seus Comentários à Constituição do Brasil, temos o que
segue.
Constituição no sentido material de um Estado trata-se do
conjunto de forças políticas, econômicas, ideológicas etc., que conforma a
realidade social de um determinado Estado, configurando sua particular maneira
de ser.Embora mantenha relações com o ordenamento jurídico a ela aplicável,
esta realidade com ele não se confunde. Ela é do universo do ser, e não do dever
19 LASSALLE, Ferdinand- A Essência da Constituição, p.17.
22
ser, do qual o direito faz parte.Ela se desvenda através de ciências próprias, tais
como a sociologia, a economia, a política, que formulam regras ou princípios
acerca do que existe, e não acerca do que deve existir como se dá com o direito.
No sentido material, então, a Constituição corresponde a
união dos fatores reais de poder, que são as forças políticas,econômicas,
ideológicas etc. A soma dos organismos sociais é que forma a Constituição no
sentido material de um Estado.
Este conjunto é que vai dotar o Estado de um estatuto, que
vai estabelecer a auto-organização e auto-regulação do próprio Estado.Assim, no
sentido material a Constituição de um Estado vai se conformando com o passar
do tempo à maneira em que mudar os fatores reais de poder.
Observa-se que de tempos em tempos as forças de uma
Nação transitam de grupos dominantes para grupos até então dominados. Grupos
em evidência vão para o ostracismo e outros surgem. Toda esta movimentação
dos grupos parciais vai modificando a Constituição material de um Estado.
Em seguida, no sentido substancial, é o conjunto de regras
ou princípios que têm por objeto a estruturação do Estado, a organização de seus
órgãos supremos e a definição de suas competências, ou ainda, é um complexo
de normas jurídicas fundamentais, escritas ou não, capaz de traçar linhas mestras
de um dado ordenamento jurídico.
A substância de Constituição é que mostra a formação do
Estado, sua administração e qual seu fim. O conteúdo sofre conseqüência e vai
ser alterado na medida em que houver alteração na Constituição material.
A mudanças nos fatores reais do poder faz alterar a
substancia constitucional.
Em sentido formal, trata-se de um conjunto de normas
legislativas que se distinguem das não-constitucionais em razão de serem
produzidas por um processo legislativo mais dificultoso, vale dizer, um processo
formativo mais árduo e mais solene.20Apresenta-se neste sentido como uma
garantia à Nação que os governantes não alteram a Constituição substancial
como se altera qualquer lei. Os direitos e garantias constitucionais reconhecidos
20 BASTOS, Celso Ribeiro et all – Comentários à Constituição do Brasil, pp.274/277.
23
pelo Poder Constituinte Originário não podem ser relegados às mudanças
oriundas de simples vontade dos exercentes do Poder.
Reformar a Constituição é algo muito sério e por isto justifica
processo dificultoso e consulta popular. Escreveu SIEYÈS “que la nation est
toujours maitresse de réformer sa constitution”21, então como se tornou impossível
reunir a Nação para reformar sua Constituição, a maneira de se aproximar da
afirmação é a consulta popular por meio do referendo
ARISTÓTELES deixou seu pensamento que “A constituição
de um Estado é a organização regular de todas as magistraturas, principalmente
da magistratura que é senhora e soberana de tudo. Em toda parte o governo do
Estado é soberano. A própria constituição é o governo. Quero dizer que nas
democracias, por exemplo, é o povo que é soberano.” 22
Reconhece o filósofo a soberania do povo e quando afirmou
que a própria Constituição é o governo, afirmou que o governo não pode se
afastar da Constituição. O governo tem como limite o bem comum e alcançar o
bem significa cumprir a Constituição.
O governo é a Constituição e não a Constituição é o governo;
assim as ações governamentais só são legítimas e legais se conforme a
Constituição.
Para JORGE MIRANDA, “É o estatuto do Estado, seja este
qual for, seja qual for o tipo constitucional de Estado”23. É com este Estatuto que o
governo vai dirigir a vida da Nação, isto é, obedecendo-se às normas
constitucionais para alcançar os fins desejados pela Nação e positivados pelo
Estado.
Mostra também que qualquer Estado seja qual for o tipo
histórico envolve a institucionalização jurídica do poder e que as normas
fundamentais são o assentamento de todo o ordenamento; entretanto somente a
partir do século XVIII é que a Constituição passou a ser encarada como um
conjunto de regras jurídicas definidoras das relações do poder político, do estatuto
de governantes e governado, sendo este o alcance inovador do constitucionalismo
moderno.
21 SIEYÈS, Emmanuel – Qu´est-ce que le Tiers État? p.69 (tradução livre do autor: A nação é sempre a autoridade para reformar sua Constituição). 22 Op.cit. p. 112
24
Então, a Constituição é documento político e jurídico que faz
relação entre o poder (governo) e a população. Considerando que as normas
constitucionais foram elaboradas por um poder constituinte é dever constitucional
do governo cumprir exatamente as disposições que lhes são impostas.
A Constituição deve ser o documento de garantia da
população que seus direitos fundamentais e escolhidos pelo poder constituinte,
conforme a vontade da Nação, sejam efetivamente respeitados.
O Estado e o governo têm direito, mas precedem os direitos
da população, porque é a população que funda o Estado e que por meio das
regras constitucionais concede o exercício do poder a determinadas pessoas.
Enfim, a Constituição é o estatuto do Estado e a Carta de
Direitos da população,não havendo Estado que não tenha Constituição, que deve
refletir sempre a vontade da Nação, sob pena de perder a legitimidade.
Importante é ter consciência que a Constituição de um país é
a prática e não o texto existente. Na obra atualizada de GERALDO ATALIBA
sobre República e Constituição, encontramos na Introdução que “para Tércio
Sampaio Ferraz Jr., “uma Constituição não apenas o seu texto, mas é
principalmente,uma prática”. Dizia Ruy Barbosa que, ainda que a Constituição
fosse tão perfeita como se tivesse sido baixada dos Céus, o país haveria de ser
julgado não pelo seu texto, mas sim segundo o modo pelo qual a pusesse em
prática. Importa,assim,conhecer a Constituição, para assegurar-lhe a
eficácia,realizando seus princípios como forma de tornar efetivos os desígnios que
– bem ou mal- o povo nela expressou.24
Conclui-se, por conseguinte, que em nosso país temos a
Constituição em texto que prevê a adoção da teoria de Montesquieu com três
Poderes independentes e harmônicos e temos na prática um Poder Executivo que
por competência do Presidente da República tem supremacia sobre os demais
afastando a independência propalada e querida pela Nação.
23 MIRANDA, Jorge - Manual de Direito Constitucional, p. 20. 24 ATALIBA,Geraldo- República e Constituição, p.16
25
1.3.1. Constitucionalismo e divisão de poderes na visão de
Canotilho.25
Hoje, tende-se a considerar que a teoria da separação dos
poderes engendrou um mito. Consiste este mito a um modelo teórico com três
poderes rigorosamente separados, atribuindo-se a idéia a Montesquieu.
Por esta doutrina todo bom governo deve reger pelo princípio
de divisão dos poderes: legislativo, executivo e judiciário.
O executivo (o rei e seus ministros), o legislativo (1ª câmara e
2ª câmara, câmara alta e câmara baixa) e o judicial (corpo de magistrados). Cada
poder deve exercer sua função própria livre de qualquer interferência de qualquer
outro.
Consiste, portanto, a separação na independência de cada
um exercer sua função sem receber interferência de outro.
Canotilho mostra entendimento de que esta teoria de
separação dos poderes nunca existiu em Montesquieu, porque reconheceu-se o
direito do executivo interferir no legislativo, através do direito de veto do rei. De
outro lado o legislativo exercendo a vigilância sobre o executivo porque controla
as leis que votou podendo exigir prestação de contas aos ministros. Há a
interferência do legislativo no poder judicial quando julga os nobres pela Câmara
dos Pares, na concessão de anistias e nos processo políticos.
Na verdade não há separação, mas sim combinação dos
poderes: os juízes eram apenas a boca que pronuncia as palavras da lei; o poder
executivo e o legislativo distribuíam-se por três potências: o rei, a câmara alta
representando a nobreza e a câmara baixa representando a burguesia.
A questão essencial, portanto, é combinar os poderes, de
modo que não haja um favorecido em relação aos demais.
Não há efetivamente divisão de poderes, posto que o poder é
um só, e é da Nação. Mas, há e deve haver a divisão quanto ao exercício dos
poderes. Assim, a combinação dos poderes é primordial para que cada um seja
25 Op.cit. p.260/261
26
reconhecido no mesmo grau constitucional, todavia a divisão no exercício é
essencial para que não haja um déspota agindo em nome de um dos poderes, em
detrimento dos demais e, em última análise, em detrimento dos direitos e
garantias fundamentais dos cidadãos.
Para que não haja favorecimento de um poder sobre o outros
as funções devem estar perfeitamente delineadas na Constituição; entretanto
prevendo e permitindo mecanismos de combinação, de modo que um poder não
seja mais favorecido mas que também um controle o outro.
Aliás, a Declaração dos Direitos do Homem e do cidadão de
26 de outubro de 1789 apresenta o art.16º como dogma, no sentido de que toda
sociedade a qual a garantia dos direitos não está assegurada, nem a separação
dos poderes determinada, não há constituição.Então, se não há expressamente a
determinação da separação dos poderes, entendendo separação do exercício,
não há que se falar em existência de constituição. Por sua vez, sem constituição
não há Estado.
Mas, não basta que a Constituição determine a separação
dos poderes formalmente, o que se exige é que a separação no exercício do
poderes seja real, seja de fato também.
Prevê a Constituição do Brasil a independência dos poderes,
entretanto leitura do texto faz perceber que o Executivo através do Presidente não
só limita a ação dos demais como uma maneira de controlar para se evitar
desmandos, mas sim interfere de maneira afrontosa exercendo diariamente a
função legislativa e formando os Tribunais com pessoas comprometidas com a
vida político-partidária.
Além de exercer a administração do Estado, o Presidente tem
força constitucional para exercer a função de legislar, bem como formar o poder
de julgar com pessoas adeptas ao seu modelo político-partidário e não
comprometidas com o ordenamento jurídico constitucional conforme a vontade da
sociedade.
Com a previsão constitucional da separação dos poderes cuja
redação está incluída como cláusula pétrea é possível afirmar que para este
Estado Brasileiro a separação dos poderes é um dogma; entretanto a
possibilidade constitucional atribuída ao Presidente da República em legislar,
nomear julgadores, inclusive o seu julgador, nomear o fiscalizador de suas contas
27
acaba por trincar este dogma colocando o Poder Executivo através do Presidente
da República como um Poder privilegiado em relação aos demais.
1.4. Poderes do Estado.
O Estado como ente politicamente organizado é sujeito com
direitos e deveres que são estatuídos pela ordem jurídica estadual que para serem
exercidos precisa ele, o Estado, usar de seu Poder. Como a vida social se
desenvolve no Estado, temos o Poder Social, que é um fenômeno presente nas
mais diversas modalidades do relacionamento humano. Ele consiste na faculdade
de alguém impor a sua vontade a outrem, nos termos de CELSO BASTOS.26
Há o Poder Político que é exercitado pelo Estado, porque este
cuida da polis, cuida da organização estatal e dos direitos fundamentais de seus
cidadãos, e para isto se faz necessário um poder com autoridade e este encontra
fundamento na própria formação estatal.
Para cumprimento de seus deveres, o Estado precisa utilizar-
se de seu Poder.
Os deveres do Estado para com a sociedade são incontáveis
e entre eles pode-se catalogar o dever de dar a cada cidadão um Poder Judiciário
forte, independente, eficaz e rápido; em outras palavras, uma justiça verdadeira.
Todo cidadão que luta por seu direito com os instrumentos legais, luta pelo bem
da sociedade, porque cada qual é um lutador nato pelo direito, no interesse da
sociedade, como preleciona IHERING27.
Outro dever é manter um Poder Legislativo jurídico e de fato
independente, que exerça a função legiferante ouvindo os reclamos da população
e exercendo a função fiscalizatória das contas públicas sem nenhum tipo de
pressão.
Deve o Estado manter o Poder Executivo realizando tão
somente ações de administração e não se imiscuindo nas funções típicas dos
outros Poderes, como uma forma de mostrar o poder de mando.Deve o Estado
26 Op.cit. Curso de Direito Constitucional, p. 12. 27 IHERING, Rudolf Von - A Luta pelo Direito, p. 48.
28
possibilitar que o Poder Executivo pratique atos de administração que são
exigidos pela população, com o fim de buscar melhores condições de vida.
O Poder Político deve dar condições para os Poderes
Legislativo, Executivo e Judiciário exerçam suas funções com a independência e o
controle necessário, sem privilegiar ou menosprezar este ou aquele Poder.
O Poder do Estado deverá sempre ser exercido no
cumprimento dos deveres e na exigência dos direitos, e, em última análise, o
exercício do Poder faz cumprir a função estatal de existir para o bem da
sociedade.
Nas palavras de PAULO BONAVIDES, o poder “é elemento
essencial constitutivo do Estado, o poder representa sumariamente aquela energia
básica que anima a existência de uma comunidade humana num determinado
território, conservando-a unidade, coesa e solidária”28.
O que se pode concluir com certeza é que o Estado tem seu
Poder e este representa a vida da sociedade, representa a vida que anima a
sociedade a cumprir suas obrigações e exigir seus direitos perante a organização
estatal. O Poder do Estado é essencial a sua formação e ao desenvolvimento de
seus objetivos, isto porque todo poder deve ter força de coerção para que se valha
como poder. Em uma sociedade, o Estado só consegue impor sua autoridade
através do poder que tem.
Modernamente é inconcebível a vida fora do Estado e para
esta vida a sociedade organizou-se e formou o Estado com o seu poder. A
necessidade do poder está demonstrada na individualidade de cada cidadão,
porque, mesmo vivendo no Estado, cada um tem sua vida própria, tem seus
objetivos, tem sua intimidade e sua crença, entretanto como a vida conjunta exige
uma reciprocidade de concessões e exige respeito ao direito e crença de cada
cidadão, somente o poder é que apresenta condições de organizar todo o sistema
e impor normas de condutas e normas de validade que afetem todos cidadãos de
maneira total.
O Poder de Estado como um todo deve ser entendido como
aquele capaz de organizar o Estado e impor normas de conduta e de validade que
atinjam todos os cidadãos, sem uma única exceção, atingindo inclusive o próprio
28 Op.cit. p. 59
29
Estado que se auto-organiza, porque a criação do Estado pressupõe, por parte de
seus criadores, a formação de um ente organizado que também se subordine ao
direito posto. Inaceitável que uma população funde um Estado para não cumprir
as normas gerais e que somente esta população fique subordinada ao direito
Sendo o Estado uma organização política que tem como
elementos, povo, território e governo, deve ser considerado como organização
una, isto é, sem qualquer divisão. Não pode haver a divisão porque a cada divisão
que se faça, funda-se um novo Estado e se houver a falta de um dos elementos
não se tem Estado. Assim, este Estado indivisível apresenta como corolário um
Poder indivisível. Se o Estado é uno, seu Poder é uma unidade.
A essencialidade do Poder está demonstrada por
PAULO HAMILTON SIQUEIRA Jr, ao afirmar que “O direito e o poder encontram-
se ligados no âmbito da esfera estatal. A ordem jurídica surge do poder, e este é
ao mesmo tempo garantido pela ordem jurídica.Assim, costuma-se afirmar que o
Estado é a manifestação de um poder institucionalizado. A institucionalização do
Poder e a organização do próprio Estado surgem do denominado Poder
Constituinte”.29
O Poder é do Estado e ele o exerce conforme as normas de
sua organização, portanto há um único titular deste Poder, que é o próprio Estado.
Todavia, em última análise, o titular deste Poder é a Nação porque o Estado vive
para a Nação, e esta foi quem deu inicio ao Estado através do denominado Poder
Constituinte.
Entretanto, há titular para o exercício do poder, que são
aqueles órgãos investidos em função pública para exercitar a vontade do Estado.
A Nação exercita o poder de escolha quando o povo por meio
do voto livre e secreto escolhe aqueles que vão escrever a Carta de
Direitos.Depois, com fundamento nesta Carta, escolhem aqueles que vão legislar,
administrar e exercer jurisdição, conforme as regras democraticamente
estabelecidas.
Aqueles que são investidos no Poder, ante a escolha direta
ou pelos meios previstos pelo ordenamento jurídico constitucional, são investidos
para exercitarem o Poder em nome do Estado.
29 SIQUEIRA Jr, Paulo Hamilton – O Estado e o Poder, p.24.
30
Percebe-se que o poder é indivisível quanto a sua
titularidade, mas divisível quanto ao seu exercício, quanto às atividades básicas
da organização estatal.
Para verificarmos esta divisão do exercício, devemos
observar a obra de MONTESQUIEU, aqui com tradução de Pedro Vieira Mota
extraindo-se o que segue:
Em cada Estado há três espécies de poderes: o Legislativo;
o Executivo das coisas que dependem do Direito das Gentes; e o Executivo das
que dependem do Direito Civil. O primeiro poder faz leis, o segundo administra e o
terceiro julga.
A liberdade política do cidadão é uma tranqüilidade de
espírito, por isso quando, na mesma pessoa ou no mesmo corpo, o poder
Legislativo é reunido ao Executivo, não há liberdade, porque pode temer-se que o
mesmo executor faça leis tirânicas para executá-las tiranicamente. Também não
há liberdade se o Poder de Julgar não estiver separado do Legislativo e do
Executivo, porque inaceitável que o mesmo corpo que faz a lei julgue, ou o
mesmo que execute, julgue.
Tudo estaria perdido se um corpo, ou um homem exercesse
os três poderes: o de fazer leis; o de executar as resoluções públicas; e o de julgar
os crimes ou as demandas dos particulares. Com este trecho, Montesquieu
fundamenta a necessidade da divisão dos poderes, como conclui o tradutor
responsável pela obra.
Demonstrando a necessidade da separação dos poderes,
Montesquieu, ao escrever sobre o grande conselho de Veneza, assim integrado:
Legislação; o prégadi, a Execução; os quaranties e o Poder de Julgar expressou
que o mal é que esses diferentes tribunais são formados por Magistrados de um
mesmo corpo social; o que constitui quase um mesmo poder30.
Bem claro está que o Poder de Estado é único e com único
titular, o próprio Estado, mas que há uma divisão para o seu exercício, e que esta
divisão deve prevalecer para manter no cidadão a tranqüilidade de espírito
necessária para viver na organização política.
30 MONTESQUIEU - O Espirito das Leis (tradução de Pedro Vieira Mota) pp. 164/167.
31
Mantendo-se o Poder nas mãos de um único corpo, ou de
uma só pessoa, a intranqüilidade passa a reinar, porque aquele que faz a lei será
o responsável pela administração e pelo julgamento. Em suma, estabelece regras,
acusa e decide.
A unidade no exercício do Poder fere os objetivos daqueles
que fundam o Estado, pois o que se pretende é uma organização com normas
para serem cumpridas por todos os integrantes, inclusive pelo próprio Estado, e
que o descumprimento por qualquer dos integrantes, aqui também o Estado,
receba a aplicação da justiça pronta e eficaz, o que significa que não pode haver
unidade no exercício.
Somente a divisão no exercício do poder atende aos
interesses dos cidadãos em ter vida equilibrada e justa, com respeito aos seus
princípios e direitos fundamentais.
Com PAULO BONAVIDES, pode-se citar o escrito no sentido
de que a “indivisibilidade do poder configura nota característica do poder estatal.
Significa que somente pode haver um único titular desse poder, que será sempre
o Estado como pessoa jurídica ou aquele poder social que em última instância se
exprime, segundo querem alguns publicistas pela vontade do monarca, da classe
ou do povo... Com a noção de unidade e indivisibilidade do poder, aufere o Estado
moderno um de seus postulados essenciais que, desprendendo o poder do
Estado do poder pessoal do governante, permite compreender a comunidade
regida fora das concepções civilistas do direito de propriedade, dominantes no
período medievo. ... O poder do Estado na pessoa de seu titular é indivisível; a
divisão só se faz quanto ao exercício do poder, quanto às formas básicas da
atividade estatal.”31
A partição no exercício de funções foi tratada também por
ARISTÓTELES que concluiu que “geralmente se pensa que as diversas funções
públicas podem ser acumuladas, e que um mesmo cidadão pode ser ao mesmo
tempo guerreiro, lavrador, artesão, senador e juiz; todos os homens proclamam
sua parte de capacidade política e julgam-se em condições de exercer a maior
parte das magistraturas. Mas não é possível que os indivíduos sejam ricos e
pobres ao mesmo tempo”.32
31 Op.cit. pp. 61/62 32 ARISTÓTELES – A Política. p. 236
32
Como se vê, não é nenhuma novidade tratar da indivisibilidade
e unidade do Poder, que é divisível apenas para exercício de suas funções. A
tripartição de poderes ocorre porque não se pode ao mesmo tempo um só exercer
as funções básicas do Estado.
Não obstante o estudo não seja novo, a preocupação deve
ser constante com o fim de sempre mostrar a população, e de forma especial às
forças dominantes, que é inadmissível a concentração de poderes em um só
corpo ou uma só pessoa.
Esta questão da tripartição ou divisão dos poderes ou das
funções estatais será tratada adiante com visão Montesquieu e de seus
antecessores.
Os poderes do Estado só emergem porque surge o Estado
como uma forma de organização política que almeja encontrar o bem estar ou a
felicidade de seus membros.
Quando se pensa em elementos constitutivos do Estado
naturalmente vem à mente, população, território e governo, mas é interessante a
posição de L.CABRAL DE MONCADA que assim se expressa: “Não é preciso ser-
se um grande idealista para imediatamente reconhecer que o elemento ôntico
mais importante do Estado é a idéia desse Estado, e não a população ou o
território.”33
Partindo deste pensamento ensina que é a idéia ou conjunto
de idéias que os cidadãos de um Estado, fazem da realidade humana social que
eles constituem; isto é a idéia do porquê, do como e do para que do fato da sua
convivência.
Todas as pessoas que vivem em um Estado ou qualquer
grupo têm de maneira consciente ou até mesmo inconsciente um conjunto de
idéias, crenças, concepções e representações. Este conjunto diz respeito aos
interesses, fins e valores que justificam o agrupamento.
Para o Professor da Faculdade de Direito de Coimbra tudo
isto é a idéia, mas não em um sentido exclusivamente intelectual, mas também
vital e existencial; portanto uma idéia com características de concretude.
33 MONCADA, L.Cabral de – Filosofia do Direito e do Estado- II-Doutrina e Crítica-, p.168.
33
Dissecando o Estado JOSÉ GERALDO BRITO FILOMENO
expressa como elementos materiais à população e o território, como elementos
formais o governo soberano (Poder) e ordenamento jurídico e o elemento final que
é o bem comum.34
Então, algumas palavras sobre os elementos população,
território, governo e bem comum são necessárias.
Como já exposto, a sociedade antecede o Estado, sendo
este a sociedade politicamente organizada; então para se formar o Estado há
necessidade da população.
“A população é o primeiro elemento formador do Estado, o
que independe de justificação. Sem essa substância humana não há que cogitar
da formação ou existência do Estado”35; assim SAHID MALUF começa tratando
os elementos constitutivos.A reunião da população com a idéia de fundar um
Estado é o primeiro passo para se concretizar o Estado real, que pode se
apresentar com unidade étnica; ou seja, grupos de uma mesma nação, ou ainda
formado de indivíduos de várias origens.
Então população corresponde ao conjunto de todos os
habitantes de determinado território, distinguindo-se do povo que é o conjunto de
cidadãos, pessoas ou parte da população que mantém vínculos de natureza
política com o Estado, além dos vínculos jurídicos.
A população deve estar fixada em um território que é um
espaço delimitado. HANS KELSEN afirmou que “O chamado território do Estado
apenas pode ser definido como o domínio espacial de vigência de uma ordem
jurídica estadual.”36 É o espaço de terra em que a população se assenta com
ânimo definitivo diante da idéia de fundar o Estado.
A essencialidade deste elemento constitutivo está em que a
ordem jurídica só é possível ser exercida desde que haja limite espacial de
imposição.
Uma Nação ou grupo de pessoas que tenha espaço territorial
não pode ser compreendido como Estado porque não há assentamento e,
portanto, local para imposição do ordenamento jurídico.
34 FILOMENO, José Geraldo Brito-Manual de Teoria Geral do Estado e Ciência Política, p.65. 35 MALUF, Sahid-Teoria Geral do Estado, p.39. 36 KELSEN, Hans – Teoria Pura do Direito, p.319.
34
Não obstante, existirem defensores dos Estados Nômades ou
de Estados sem território, se não houver área geográfica a população está
ameaçada de dispersão e a imposição das regras jurídicas se torna impraticável.
Afirma MANOEL GONÇALVES FERREIRA FILHO que
território “é o domínio espacial de vigência de uma ordem jurídica estatal. É
também por ela definido, tanto no tocante às terras como às águas, tanto no
concernente às profundezas quanto às alturas. Não há dúvida que, na delimitação
do território, internacional”.37
Fixada em um território, a população precisa de um comando,
de uma ordem.Ensinando sobre o Estado como ordem jurídica o já citado HANS
KELSEN explica que para ser ordem jurídica o Estado precisa de organização no
sentido restrito da palavra. Deve ter órgãos funcionando segundo o principio da
divisão do trabalho para criação e aplicação de normas que a formam; tem de
apresentar um certo grau de centralização. Como comunidade social constituída
por uma ordem normativa, compõe-se de três elementos: a população, o território
e o poder.
Sobre o elemento poder, expressou que o poder do Estado
que é exercido por um governo (g.n.) sobre uma população residente dentro do
território do Estado não é simplesmente qualquer poder que qualquer indivíduo
tem sobre outro indivíduo, e que consiste em o primeiro ser capaz de conduzir o
segundo a observar uma conduta por aquele desejada.
“O chamado poder estadual é a vigência de uma ordem
jurídica estadual efetiva. Dizer que o governo estadual, que exerce o poder de
Estado, tem de ser independente, significa que ele não pode juridicamente ser
vinculado por qualquer outra ordem jurídica estadual, que a ordem jurídica
estadual só está subordinada à ordem jurídica internacional, se é que se
subordina a qualquer outra ordem jurídica”.38
O exercício do poder de Estado é uma manifestação de força
que o governo mostra através dos órgãos que exercem o poder.
O poder de Estado para ser exercitado exige a constituição do
governo, e este só existe e atua se houver poder; por isso preferimos adotar a
idéia de governo como um dos elementos clássicos. 37 Op.cit. Curso de Direito Constitucional, p.46 38 Op.cit. p.320
35
Além dos elementos constitutivos do Estado já lembrados
desde o início aparece um outro de extrema importância.
A razão da criação do Estado só pode ser a procura da
felicidade ou do bem comum de todos os seus integrantes. O Estado não pode
viver para si ou para os governantes, deve viver para a Nação. O limite de toda
sua ação deve ser o bem comum.
Sobre bem comum JACY DE SOUZA MENDONÇA
expressa que “A idéia de fins da vida enquanto a vida é convívio corresponde à
idéia de bem comum, definível como o conjunto de situações ou condições de vida
individual ou social que asseguram a realização dos fins humanos.”39
Se bem comum é o conjunto de situações ou condições na
vida de todos que asseguram a realização dos fins humanos, é correto que o
Estado tenha como objetivo fundamental atingir o bem comum perseguido por sua
população.
Está o Estado tão vinculado a obrigação de atingir o objetivo
que o autor citado linhas atrás afirma que “Bem comum é uma força que limita a
tendência absorvente do Estado ditatorial, pois, no momento em que se faz o
aprisionamento indevido da liberdade do homem, impossibilitando-o de realizar os
valores, é o bem comum que está sendo agredido”.40
Com efeito, mesmo se não estiver positivado, deve ser
obrigação do Estado perseguir o bem comum, possibilitando desta forma atingir o
bem de todos, isto também porque deve haver uma harmonia entre os objetivos
do Estado e os objetivos da pessoa humana.
NICOLA MATTEUCCI em obra conjunta com Norberto Bobbio
e Gianfranco Pasquino ao tratar do bem comum expressa que “Toda atividade do
Estado quer política quer econômica, deve ter como objetivo criar uma situação
que possibilite aos cidadãos, desenvolverem suas qualidades como pessoas;
cabe aos indivíduos singularmente impotentes, buscar solidariamente em conjunto
este fim.”41
39 MENDONÇA, Jacy de Souza – O Curso de Filosofia do Direito do Professor Armando Câmara, p.219. 40 Nota anterior. 41 BOBBIO, Norberto et all-Dicionário de Política, p.106.
36
Considera o autor bem comum, ao mesmo tempo, o princípio
edificador da sociedade humana e o fim para que ela deve se orientar do ponto de
vista natural e temporal. Como o bem comum busca a felicidade tem valor político
por excelência.
O bem comum é dos indivíduos por serem membros de um
Estado; trata-se de um valor comum que os indivíduos podem perseguir somente
em conjunto, na concórdia.
Só há bem comum porque os indivíduos vivem no Estado,
pois se não estivessem juntos só haveria o bem individual.
Aceitando o bem comum como um dos elementos
constitutivos do Estado é correto afirmar que toda ação estatal deve ser dirigida à
população com o fim de alcançar a felicidade de cada um, que é o bem
perseguido.
O tratamento que o governo deve dispensar a população não
pode estar eivado de desigualdade sob pena de se afastar do bem comum.
Em suma, os titulares do exercício do poder do Estado estão
atrelados a este elemento finalistico, o que impõe a obediência irrestrita à teoria
da tripartição dos poderes para que não se corra o risco de concentração de poder
em uma só pessoa ou um só órgão.
Deduz-se em término que os Poderes do Estado devem estar
precisamente previstos na Constituição escrita ou na mente das pessoas em
sendo Constituição costumeira; entretanto não se permite olvidar que a
Constituição é de fato uma prática e não um texto ou a consciência.
O mundo fenomênico é que demonstra como
verdadeiramente é a Constituição de um país, que deve aproximar-se o máximo
possível do texto ou da consciência da Nação porque refletem a vontade daqueles
que exerceram o ato de constituir o Estado.
37
CAPÍTULO II
MONTESQUIEU E A TEORIA DA TRIPARTIÇÃO DOS PODERES
Antes de Montesquieu, os filósofos Platão e Aristóteles já
lançaram a idéia de que na vida em sociedade cada homem deveria exercer a
atividade para qual estava preparado, não devendo haver acumulação de
atividades, sob pena de não ser realizada a contento. Depois veio John Locke, já
na época de Montesquieu, com o mesmo pensamento.Cada homem deve estar
preparado para uma atividade.
2.1 Antecedentes a Montesquieu.
Dos diálogos que compõem a República de Platão vamos
encontrar a idéia de necessidade de se exercitar somente uma atividade.
Ao tratar do nascimento do Estado, encontramos que um
Estado nasce quando as pessoas não mais se auto-abastecem, sendo que
necessitam de muitas coisas.
Um homem se associa a outro por uma necessidade, com
outro por outra necessidade. Havendo necessidade de muitas coisas, chegam a
congregar-se em uma só morada, muitos homens, para associar-se e auxiliar-se.
Esta casa é o Estado.
Após estabelecer as necessidades, como alimentos, moradia,
vestimenta e outras, bem como que deve haver homens para realizá-las, surge a
pergunta: Um homem é apto para realizar uma tarefa e outro homem outra tarefa?
38
A resposta com outra pergunta é: “será mejor que uno solo
ejercite muchos ofícios o que ejercite uno solo? Que ejercite uno solo.”42
De maneira enfática está que cada um exercendo suas
atribuições dentro da vida estatal deve exercitar um só oficio, ou uma só função,
ou ainda um só poder.
Adiante, no Capítulo III, ao tratar de música encontramos que:
“... en nuestro Estado el hombre no se desdobla ni se multiplica, ya que cada uno
hace uma sola cosa.”43
No Estado tratado na República, o sapateiro fabrica sapato
sem ser piloto além de sapateiro, o lavrador é lavrador e não juiz ao mesmo tempo
em que é lavrador, e o militar que é militar não é comerciante além de ser militar, e
assim acontece com todos os outros homens.
Por fim, tratando das qualidades do Estado, de artesanato, de
negócios e dinheiro encontramos que: “... cuando la misma persona trata de hacer
todas estas cosas a la vez, este intercambio y esta dispersión en multiples tareas,
creo, serán la perdición del Estado”.44
A idéia é firme no sentido de que o Estado será
desestruturado quando as funções se unirem sob a responsabilidade de uma só
pessoa ou só corpo.
O Estado para ser forte e defender as necessidades de
interesses fundamentais da população exige que suas funções sejam repartidas e
que cada um a exerça com exclusividade, não havendo possibilidade de um só
homem ou corpo realize todas as funções.
A concentração de poderes somente causa malefícios ao
Estado e ao final a Nação.
Platão deixou bem claro a necessidade da existência de
inúmeras funções que devem ser exercitadas no Estado com o fim de garantir o
bem estar da população, mas deixou também bem esclarecido que cada pessoa
tem aptidão e deve exercer uma única função.
42 Platão – República, p. 123 (Tradução livre do autor: Será melhor que um só exercite muitos ofícios ou que exercite um só? Que exercite um só.). 43 Nota anterior, p.168 (Tradução livre do autor: em nosso Estado o homem não se desdobra nem se multiplica, já que cada um faz uma só coisa.). 44 Nota 42 p.225 (Tradução livre do autor: quando a mesma pessoa trata de fazer todas estas coisas a sua vez, creio, será a perdição do Estado.).
39
Transportando a idéia para o Estado atual temos que concluir
que o Executivo deve exercer a sua atividade, o Legislativo a sua atividade e o
Judiciário a sua atividade; isto, é cada qual deve exercer unicamente sua
atividade, porque a dispersão de múltiplas tarefas, acredita Platão, será a perdição
do Estado.
Com efeito, a concentração de poderes, seja de maneira
explícita ou mesmo engenhosa nas mãos de uma só pessoa, será a perdição do
Estado, como afirmou Platão. Ademais, é possível afirmar, com certeza, que as
forças reais do poder, os grupos fragmentários que constituem o Estado não
desejam os Poderes do Estado centralizados.
Em A Política, Aristóteles analisou a estrutura da sociedade.
Mostrou que o caráter essencial de qualquer organização é a divisão dos ofícios e
a convergência de esforços, além de estabelecer que o homem é um animal
social.
A essencialidade da divisão dos ofícios já indica a pensar que
na organização social, no Estado, as principais funções devem ser repartidas, não
ficando elas sob a responsabilidade de um único homem ou uma única instituição.
A cidade não é uma multidão de homens tomada ao acaso,
mas bastando-se a si mesma para as necessidades da vida. Se um elemento
faltar, é absolutamente impossível que tal associação se basta a si mesma. “Por
conseguinte é preciso, lavradores para fornecerem os víveres, artesãos, soldados,
ricos, padres e juízes encarregados de julgar sobre o direito dos cidadãos e sobre
o interesse geral do Estado”.45
Transportando para hoje, a sociedade e o Estado devem se
bastar, mas para isto exigem-se inúmeras funções que devem ser exercitadas por
pessoas diversas, sendo que cada qual deve exercer a sua e não a dos outros.
Mais uma vez aparece à indicação da necessidade de se
colocar na sociedade e no Estado uma certa que divisão de ofícios, a fim de que
seja possível se alcançar o bem comum.
Do pensamento de JOHN LOCKE, também se pode perceber
dos malefícios que estão presentes quando as três funções estatais - legislar,
administrar e julgar- estão concentradas em uma só pessoa ou em um só corpo.
45 Aristóteles – A Política, p. 170.
40
No sistema presidencialista brasileiro, as funções não estão
explicitamente concentradas nas mãos do Presidente da República, no entanto, a
Constituição Federal permite ao Presidente interferir ou no mínimo influir nos
Poderes Legislativo e Judiciário, na medida em que legisla e nomeia integrantes
de órgão auxiliar do Poder Legislativo e quanto ao Poder Judiciário nomeia os
integrantes da Corte Constitucional e de outros órgãos.
No estado de natureza, o ser humano tem concentrado em si
o atributo da liberdade e por isto é o administrador, o legislador e o julgador. Cada
homem exerce pelo estado da natureza todas as funções exclusivamente em
defesa de si próprio.
Ao entrar para a sociedade civil, o homem renuncia a seus
poderes inclusive o de punir quem comete delitos. Esta renúncia causa a
transferência ao corpo político do poder de fazer leis, do direito do uso de força,
do direito de punir e do direito do uso de força para a execução dos julgamentos.
Para o autor, esta transferência é a origem dos Poderes
Legislativo e Executivo da sociedade civil, que julgam, segundo as leis vigentes,
em que medida devem ser punidos os delitos cometidos no meio social.
Pode-se afirmar então, para os dias de hoje, que a
transferência dos poderes da natureza de cada ser humano é a origem ou
fundamento dos Poderes Legislativo, Executivo e Judiciário.
O estado de natureza difere da sociedade civil porque nesta o
homem transfere seus poderes ao corpo político e naquele estado o homem retém
todos os poderes em suas mãos. Em razão desta retenção de poderes a
monarquia absoluta é incompatível com a sociedade civil porque, como no estado
de natureza, concentra poderes.
“Pois supondo-se que ele enfeixe tudo, tanto o poder
legislativo como o poder executivo, unicamente em si próprio, não haverá nenhum
juiz nem haverá apelo algum possível para qualquer pessoa, capaz de decidir com
eqüidade, imparcialidade e autoridade, e de cuja decisão se possa esperar alívio e
reparação por qualquer injúria ou inconveniência causados pelo príncipe ou por
ordem deste”.46
46 LOCKE, John – Dois Tratados Sobre o Governo, p.461
41
Ao tratar da extensão do poder legislativo, o escritor inglês
afirmou que não pode o legislativo transferir o poder de elaborar leis para outras
mãos, pois, não sendo ele senão um poder delegado pelo povo, aqueles que o
detém não podem transmiti-lo a outros. Uma vez que o poder do legislativo deriva
do povo, por uma concessão ou instituição positiva e voluntária, não pode ser ele
diverso do poder transmitido por tal concessão positiva, que é apenas o de
elaborar leis e não de fazer legisladores, de sorte que não pode ter o legislativo
nenhum poder de transferir sua autoridade de elaborar leis e colocá-la em mãos
de terceiro.47
A idéia é clara no sentido de que não se pode transmitir o
poder que não se tem. Assim, ao aceitar a teoria da tripartição dos poderes, o
Povo transfere a cada Poder as funções que lhes são próprias ou típicas, por isto
qualquer transmissão de função de um Poder para outro é um desvirtuamento no
exercício da representação.
O limite da ação legislativa, como de qualquer outra ação
estatal, é o bem público, e neste limite está inserido a proibição de transferir o
poder recebido.
Os Poderes estão expressos na Constituição e a teoria da
tripartição das funções foi aceita pelo constituinte originário; isto é, pelo povo,
assim, em razão disso não, é aceitável que o Presidente da República, no
exercício da função executiva, tenha concentrado em suas mãos o poder de
interferir ou influir nos Poderes Legislativo e Judiciário.
No decorrer das obras citadas, constata-se que os homens
são importantes, mas que cada qual deve exercer suas atividades e que é
necessário à existência e o exercício de atividades distintas.
As atividades não podem estar acumuladas em uma única
pessoa ou uma só instituição.
Aristóteles, tratando da virtude do homem de bem e do bom
cidadão, mostra o pensamento que se pode dizer que o cidadão é como uma das
pessoas que viajam a bordo de um navio. Estão em uma sociedade e cada um
tem valor diferente, visto que um é remador, outro piloto e outros com outras
47 Op.cit. p.513
42
funções, no entanto, a salvação da equipagem depende da ocupação de todos
nas suas funções, e a salvação é o desejo de todos.
O navio não navega e não está salvo senão dependendo da
ação individual de cada um de seus tripulantes, sendo que cada qual tem sua
função muito bem definida, não havendo ingerência de um tripulante na função do
outro.
O Estado não caminha em direção a seu fim, o bem comum,
senão pelo exercício correto de seus poderes ou funções estatais, sendo que
cada um deve ter sua função bem definida e exercer sem a interferência do outro.
A indicação da pessoa do soberano tem que significar o Rei,
mas aquele que deve exercer a administração do Estado.
Encontramos que o soberano não é um juiz, um senador, ou
um membro da assembléia, isto é, o Presidente da República não é um Juiz e
nem um Legislador; logo não deve exercer a jurisdição e nem imiscuir-se no Poder
Judiciário. Não deve exercer a função legislativa e nem se intrometer no Poder
Legislativo.
O soberano deve ser a multidão, o povo, porque este tem um
poder maior. Só o povo através dos mecanismos constitucionais e legais pode e
deve interferir na composição de cada um dos Poderes do Estado.
O Poder é da Nação e um só, por isso, na titularidade de
exercício, deve haver posição de igualdade em âmbito constitucional. Igualdade
não admite diferença alguma entre aqueles que são iguais.
Havendo igualdade constitucional, cada Poder de Estado,
cada titular deve exercer sua titularidade sem supremacia em relação aos demais.
O que se vê em detrimento dos Poderes Legislativo e
Executivo é uma forma de absolutismo do Poder Executivo através das ações do
Presidente da República.
Chamou-se de monarquia absoluta aquela na qual o rei
dispõe de tudo segundo a sua vontade como senhor absoluto.
É contrário a natureza centralizar em uma só pessoa um
poder absoluto, porque o Estado é composto de pessoas iguais, por isso se a
todos estão incorporados os mesmos direitos e deveres de cidadania não pode
um ser senhor absoluto.
43
É inaceitável que um dos Poderes ou seu representante seja
senhor absoluto do Estado exercitando a titularidade de todas as funções estatais,
ou influindo de maneira preponderante. O homem do Estado não aceita que uma
só pessoa dirija os comandos da Nação porque é preciso que haja equilíbrio nas
condutas, que não haja mistura de funções.
Necessário que haja objetivos definidos a serem perseguidos
pelo Estado, mas não é justo para a Nação que um só Poder ou um só titular
busque, como senhor absoluto, tais objetivos.
O absolutismo importa dar superioridade a quem o exerce e
dar superioridade ao homem é dá-la ao mesmo tempo ao homem e à fera.48
A fera não age com consciência e lucidez, mas sim por
impulso e vontade desenfreada.
Tratando das classes sociais após relatar sobre os tecelões,
os lavradores, os sapateiros, os pedreiros e outros, Aristóteles apresenta a sétima
classe.
Esta será aquela formada por aqueles que contribuem com a
sua fortuna para os diferentes serviços públicos e são os chamados ricos.
Na oitava classe estão os chefes, os administradores do
Estado e aqueles que exercem as diversas magistraturas. Restam ainda as
funções de deliberar sobre interesses gerais e a de resolver, em caso de disputa,
sobre o direito dos cidadãos.
Mostrou o filósofo a existência necessária de inúmeras
classes e funções, cada qual com suas denominações. A simples denominação
faz pensar na existência das particularidades de cada função, que exige de seu
titular comportamento diverso.
Afirmou que geralmente se pensa que as diversas funções
públicas podem ser acumuladas, e que um mesmo cidadão pode ser ao mesmo
tempo guerreiro, lavrador, artesão, senador, juiz.
Há uma idéia individual de capacidade no sentido de que
todos se julgam capazes de exercer todas as funções, o que não deve ser aceito,
porque cada função tem sua peculiaridade e importância. Cada um na sua função.
Esta é a medida correta para a organização social.
48 Aristóteles – A Política, p.144.
44
2.2. Tripartição das funções estatais.
Para dar uma visão geral sobre a divisão ou tripartição dos
poderes na concepção de Montesquieu vamos nos socorrer na tradução de
PEDRO VIEIRA MOTA, deixando para depois o estudo da obra na sua versão
original.
Deve haver uma liberdade política que consiste a não ser
constrangido a fazer coisas que a lei não obrigue, ou não fazer as que a lei
permita. Também, é de se considerar que todo homem que tem Poder é levado a
abusar dele, vai até encontrar os limites.
No exercício do Poder, brota no homem, por ser inerente ao
ser humano, o ímpeto de agir cada vez mais. Não havendo limites, mesmo que
involuntário, o homem passa do ponto racional da ação e chega a praticar
condutas inaceitáveis.
O limite que deve ser imposto a quem exerce o Poder
configura-se como direito fundamental da população de um Estado.
Aliás, Aristóteles já afirmou que o poder assanha a ambição e
multiplica a cobiça49, portanto a limitação do Poder deve ter, também como meta,
conter a ambição e a cobiça daquele que pretende exercer sozinho o Poder do
Estado, porque do contrário, a Nação será sempre prejudicada em seus direitos.
Deste pensamento é que surge a necessidade da divisão dos
Poderes, a fim de que, no seu exercício, um impeça o outro de cometer os
inevitáveis abusos.
Na doutrina tripartida surge então os Três Poderes do Estado:
o Legislativo, o Executivo e o Judiciário.
A função legislativa, ou seja, a elaboração de normas jurídicas
deve estar a cargo do Poder Legislativo.
49 Op.cit. A Política, p.242
45
Cabe ao Poder Executivo ser o executor das leis. Administrar
o Estado e dotando de meios capazes de propiciar o bem comum.
Ao Poder Judiciário restou a função de julgar os casos
concretos, sempre com o fim de harmonizar a vida social; isto é, também
procurando atingir o bem comum.
Para o equilíbrio do três Poderes, conforme o tradutor
mencionado, Montesquieu prelecionou: Para formar um Governo Moderado,
precisa combinar os Poderes, regrá-los, temperá-los, fazê-los agir; dar a um
Poder, por assim dizer, um lastro, para pô-lo em condições de resistir a um outro.
É uma obra-prima de legislação, que raramente o acaso produz, e raramente se
deixa à prudência produzir.50
Os três Poderes cada qual com o estabelecimento de suas
funções, com regras a serem cumpridas e com contraposição dos outros devem
caminhar necessariamente juntos perseguindo os objetivos fundamentais do
Estado.
A fim de que haja a independência de cada Poder e cada um
tenha instrumentos para limitar o outro, é imprescindível que a Constituição
estabeleça garantias a cada Poder e àqueles que o exercem. Somente com
garantias constitucionais invioláveis e que não sejam preteridas é que o equilíbrio
dos Poderes se concretiza da teoria para a realidade.
O desequilíbrio gera desorganização estatal podendo até
fazer surgir o regime de ditadura constitucional, que ocorre quando o texto da
Constituição coloca os Poderes em patamares diferenciados, de superior para
inferior.
Esta anormalidade constitucional que ocorre no Brasil, tem
como efeito prejudicar a população porque ditadura seja constitucional ou não,
coloca o Poder sob a regência de uma só pessoa que manda e desmanda
conforme seus interesses pessoais.
A segurança para a população, que é elemento essencial na
formação do Estado, deve ser que cada Poder tenha sua função e que um não
exercite a função do outro.
50 Montesquieu-O Espírito Das leis, tradução Pedro Vieira Mota, p.25.
46
Os Poderes devem ser independentes, não isolados, a fim de
que cada um possa exercer sua função conforme as regras previstas pelo Poder
Constituinte, que deve sempre refletir a vontade da Nação, que sabemos foge e
teme a ditadura.
Entretanto, a repartição, independência e equilíbrio não é tão
correta como deveria ser. A afirmação de MANOEL GONÇALVES FERREIRA
FILHO é certa que “Já se acentuou que esse equilíbrio está rompido em favor do
Executivo que assumiu em toda a parte uma insofismável preponderância”.51
A teoria é tratada por Montesquieu no Livro XI Capitulo VI em
De l´Espirit des lois com o título De la Constitution d`Anglaterre.
Em cada Estado há três tipos de poderes: dos assuntos
legislativos, dos assuntos executivos das coisas dos direitos das gentes, e dos
assuntos executivos das coisas que dependem do direito civil.
Pelo primeiro são feitas leis temporárias ou para sempre, bem
como corrige revoga as que estão feitas. Pelo segundo, se faz a guerra, envia e
recebe embaixadas, estabelece a segurança e previne invasões. Pelo terceiro se
pune os crimes e se julgam questões entre particulares. Ao último chamamos
poder de julgar e o segundo simplesmente Poder Executivo do Estado.
Então, temos os três Poderes: Poder Legislativo o que tem a
incumbência de fazer as leis, a função primordial de legislar. Poder Executivo que
unicamente deve administrar as coisas do Estado e Poder Judiciário que deve
exercer somente a função de julgar as questões litigiosas que lhes são
apresentados.
Observa-se que cada Poder tem uma função que não se
confunde com a do outro.
De maneira objetiva LUIZ ALBERTO DAVID ARAUJO e
VIDAL SERRANO JUNIOR expressam que “A independência e a harmonia entre
os Poderes do Estado indicam, como princípio, que cada um deles projeta uma
esfera própria de atuação, cuja demarcação tem por fonte a própria norma
constitucional”.52
Continuam no enfoque de a Constituição apresentar
desdobramentos que se apresentam como reflexos ao princípio da separação dos
51 FERREIRA Fº, Manoel Gonçalves Ferreira – Comentários a Constituição Brasileira (EC nº1/69) p.63. 52 ARAUJO, Luiz Alberto David et all – Curso de Direito Constitucional, p. 81.
47
poderes. Citam as imunidades parlamentares, que, entre outras finalidades,
asseguram a função fiscalizatória do Poder Legislativo. Também, no mesmo
caminho, as prerrogativas funcionais dos membros do Poder Judiciário e citam até
do Ministério Público, que objetivam imunizar seus membros de injunções
externas incompatíveis com o exercício independente das funções. Ainda, a
prerrogativa do Poder Legislativo de sustar os atos normativos do Poder Executivo
que exorbitem do poder regulamentar ou dos limites de delegação legislativa
(art.49,V, da Constituição Federal).
Mostram os autores que a divisão indica independência, mas
que não se trata de algo absoluto, ao contrário, o texto constitucional contém
normas que atenuam esta independência, criando o sistema de freios.
Para poder bem viver no Estado, o cidadão precisa ter
tranqüilidade de espírito e segurança no sentido mais amplo do vocábulo.
A liberdade política de cada cidadão é a tranqüilidade de
espírito que provém do pensamento quanto a sua própria segurança; e para ter
esta segurança é necessário que o governo seja tal que um cidadão não tema o
outro cidadão.
O cidadão só está seguro quando tem a tranqüilidade
espiritual que brotou do seu pensamento no sentido que o governo se comporta e
propicia acreditar que não há motivo para temer.
O governo deve passar a cada cidadão uma tranqüilidade de
espírito para que o cidadão não tenha medo viver naquele Estado.Deve o cidadão
estar seguro porque não deve ter o que temer.
“Lorsque, dans la même persone ou dans le même corps de
magistrature, la pusissance législative est réunie à la puissance exécutrice, il n`a
point de liberté; parce qu`on peut craindre que lê même monarque ou le même
sénat ne fasse des lois tyranniques pour les exécuter tyranniquement”.53
A afirmação é enfática. Quando na mesma pessoa ou no
mesmo corpo o Poder Legislativo está reunido ao Poder Executivo, não há ponto
de liberdade; porque as pessoas temem que a pessoa ou o corpo façam leis
somente tirânicas para que sejam executadas tiranicamente.
53 MONTESQUIEU – De l´Esprit dês lois, I , , p.328 (Tradução livre do autor: Quando na mesma pessoa ou no mesmo corpo de magistratura, o poder legislativo está reunido ao poder executivo não há ponto de liberdade;
48
Também, “Il n´y a point enconre de liberté si la puissance de
juger n`est pas séparée de la puissance legislative et de l´executrice. Si elle était
jointe à la pusissance législative, le pouvoir sua la vie et la liberté des citoyens
serait arbitraire: car le juge serait legislateur. Si elle était joiente à la puissance
exécutrice, le juge pourrait avoir la force d´un oppresseur”.54
De maneira firme está claro que não há liberdade quando o
poder de julgar não está separado do poder de executar e do poder de legislar. Se
o poder de julgar estiver reunido com o poder de legislar, o poder sobre a vida e a
liberdade das pessoas será arbitrário. O juiz será o legislador, o que é inaceitável,
porque poderá fazer leis conforme sua vontade de julgar e não leis de caráter
geral destinada a todos os cidadãos.
De outro lado, se o poder de legislar estiver junto com o poder
de administrar, o juiz será um opressor, pois vai executar ou administrar suas
próprias decisões.
Os dois trechos transcritos mostram a essência da
necessidade da separação no exercício dos Poderes do Estado. Não há
combinação aceitável em por nas mãos de uma só pessoa ou mesmo um grupo
de pessoas, o exercício dos três Poderes.
As pessoas que constituem o Estado transferem seus
poderes do estado de natureza para a sociedade e não para uma só pessoa ou
uma só instituição. A transferência dos poderes para uma só pessoa seria uma
conduta de total aniquilamento de toda a população, situação de afronta a
natureza humana.
Ocorrendo esta anormalidade que pode ocorrer não de
maneira afrontosa e direta, mas com a aceitação de interferências nas mais
diversas modalidades, o cidadão que está longe do exercício do poder perde,
mesmo sem saber, sua liberdade política.
Nasceu o homem para ser livre e viver em sociedade
conforme as regras positivadas, mas submissas ao direito transcendental, que não
porque há o receio que o mesmo monarca ou o mesmo senado não faça senão leis tirânicas para as executá-las tiranicamente.). 54 Idem nota anterior (Tradução livre do autor: Não há então ponto de liberdade se o poder de julgar não estiver separado do poder legislativo e do executivo. Se está junto ao poder legislativo, o poder sobre a vida e a liberdade dos cidadãos será arbitrário: o juiz será legislador. Se o poder estiver junto ao poder executivo o juiz poderá ter a força de um opressor.).
49
admite que um único ser humano fique submetido à vontade ilimitada de um outro
seu semelhante ou pequeno grupo.
O Estado deve ser administrado lato senso com fundamento
na Constituição e nas leis, mas tanto a norma fundamental como as outras
normas devem estar direcionadas pelas regras do direito natural do ser humano,
que como expresso, não admite a retirada da liberdade por vontade tirânica.
O ingresso no homem no Estado foi à procura de liberdade e
tranqüilidade, por isto não se pode admitir o desvirtuamento do Estado para
entregá-lo a um único comandante.
Tudo estará perdido, se o mesmo homem, ou o mesmo grupo,
seja de nobres ou do povo, exercer os três poderes: fazer as leis, executar as
disposições legais e julgar os crimes e as questões particulares.
Importante é notar a contundência do autor: Tudo estará
perdido.
A imprescindível liberdade política, aquela tranqüilidade de
espírito que emerge do pensamento, quanto à convicção de segurança, não se
acha senão nos governos moderados.
Escrevendo sobre a época, Século XVIII, Montesquieu
afirmou que na maior parte dos reinos da Europa os governos são moderados.
Mas na Turquia, onde os três poderes estão reunidos e sob a vontade do Sultão,
reina um abominável despotismo.
Nas repúblicas da Itália, onde os três poderes estão reunidos,
a liberdade é menor do que nas monarquias.
Veja como pode ser a situação de um cidadão destas
repúblicas. O mesmo corpo de magistrado (entendido aqui como quem exerce
funções do Estado) tem como executor das leis, todo o poder que ele lhe dá como
legislador. Ele pode destruir o Estado com suas vontades gerais, e como ainda
tem o poder de julgar, ele pode destruir cada cidadão com sua vontade particular.
Assim, todos que querem ser despotas começam por reunir
na sua pessoa todos os poderes.
Em Veneza, havia lê grand conseil para legislação, lê prégady
para execução e lês quaranties com o poder de julgar. Mas o mal era que estes
órgãos diferentes eram formados por pessoas do mesmo grupo social.
50
O que se vê no Brasil, no momento histórico em que vivemos,
são pessoas oriundas do mesmo corpo social e políticos vindos do Poder
Executivo atuando no Poder Legislativo e no Poder Judiciário.
Membros do Legislativo aceitam cargos no Poder Executivo,
mas quando o Executivo pretende votar determinada matéria no Congresso
Nacional a pessoa retorna ao Legislativo para garantir a aprovação, e depois volta
ao cargo executivo. Outros, da mesma origem são nomeados para o Tribunal de
Contas, ou seja, vão apreciar e julgar as contas públicas de quem nomeia.
No Judiciário a situação não é diferente. A história tem
mostrado que pessoas oriundas de partidos políticos, com intensa atuação
político-partidária são beneficiadas com cargo vitalício no poder de julgar,
trazendo, portanto, alta de carga de compromisso partidário, e também porque
são nomeados pelo Chefe do Poder Executivo.
A situação brasileira não é diferente da contada como de
Veneza, por isso não se pode esquecer do pensamento de PINTO FERREIRA
que tratando do tema expressa: Tais órgãos são justamente o Legislativo, o
Executivo e o Judiciário, funcionando em regime de freios e contrapeso, que são
o suporte das liberdades...(g.n.).55
É necessário que seja o Poder Executivo que regule o tempo
de duração das assembléias legislativas. Se o Poder Executivo não tiver direito de
controlar as atividades do Legislativo este será despótico. Ele poderá lhe dar
todos os poderes que imaginar, ele destruirá a ponto de nada sobrar, aos outros
poderes.
Agora, a contundência é quanto aos Poderes todos nas mãos
do Legislador, porque o texto apresenta o verbo anéantir que é traduzido como
destruir ao ponto que não reste nada. “Si la puissance exécutrice n`a pas le droit
d´arrêter les entrepsises du corps législatif, celui-ci sera despotique; car, comme il
pourra se donner tout le pouvoir qu´il peut imaginer, il anéantira toutes les autres
puissances”.56
Podemos afirmar, para os dias de hoje, que uma maneira de
controle do Poder Executivo ao Legislativo se dá através do veto, em que o
55 FERREIRA, Pinto-Curso de Direito Constitucional, p.97.
51
Presidente da República pode impedir leis casuísticas. Se dá através de
mobilização político-partidário para tentar impedir que as pessoas fiquem no
exercício do Poder por mais tempo, através de alterações constitucionais, para as
quais o povo não é consultado.
Mas o que se vê no Brasil é o inverso.
No passado recente foi o Poder Executivo forçando e
convencendo o legislador constituinte derivado a permitir a reeleição do
Presidente da República. Agora vivemos momento em que o Poder Executivo
atuou para que os Presidentes da Câmara dos Deputados e do Senado Federal
tivessem direito à reeleição.
Ficou evidente o interesse do Poder Executivo em formar a
chefia do Poder Legislativo conforme os seus interesses.
O controle deve existir, mas como meio de impedir
desequilibrio entre os Poderes, e nunca para interferir na composição e direção do
Legislativo.
No entanto, não é necessário que o Poder Legislativo tenha
reciprocamente a faculdade de parar ações do Poder Executivo. Quando as ações
são limitadas pela própria natureza é inútil limitar.
As ações do Poder Executivo acontecem a cada instante, é
um atuar constante.
Continua o texto afirmando que se em um Estado livre o
Poder Legislativo não deve ter o direito de limitar o Poder Executivo, ele tem o
direito, e deve ter a faculdade de examinar de qual maneira as leis que ele fez
estão sendo executadas.
Nos dias de hoje, temos a fiscalização do Poder Legislativo
que se dá através dos Tribunais de Contas, temos a fiscalização constante que
deve acontecer todos os dias pelos membros do Legislativo. Há ainda a
possibilidade de derrubada do veto, que é uma forma de limitar a ação.
O Poder Legislativo limita a ação do Poder Judiciário quando
toma para si a atribuição de também julgar. “Quoinqu´en général la puissance de
juger ne doive être unie à aucune partie de législative, cela est sujet à trois
56 Op.cit. p.336 (Tradução livre do autor: Se o poder executivo não tiver o direito de parar os empreendimentos do corpo legislativo, este será despótico: então, como ele poderá se dar todo o poder que imaginar, ele destruirá todos os outros poderes.)
52
exceptions, fondées sur l´intérêt particulier de celui qui doit être jugé.”57 Assim,
após afirmar categoricamente que o poder de julgar não deve estar unido a
qualquer parte do Legislativo, prevê que há exceções no interesse particular de
quem vai ser julgado.
Os grandes estão sempre expostos a invejas e se julgados
pelo povo, eles poderiam estar em perigo, eles não teriam o privilégio que tem o
menor dos cidadãos, em um Estado livre, de ser julgado por seus pares.
Os nobres devem ser julgados pela parte do Legislativo
composta pelos nobres.
É possível que a lei seja clarividente e cega ao mesmo tempo,
sendo em certos casos muito rigorosa. Como os juízes da Nação são apenas a
boca que pronuncia a lei, seres inanimados que não podem moderar e nem forçar
a lei, neste caso parte do corpo legislativo pode em alguma situação ser um
tribunal a fim de moderar a lei em favor da própria lei, com um pronunciamento
menos rigoroso.
Também, é possível que qualquer cidadão dos negócios
públicos viole direitos povo, e pratiquem crimes que os magistrados em exercício
não possam ou não queiram punir.
Com estas três situações o Poder Legislativo atua julgando,
ou seja, atua em lugar do Poder Judiciário que tem a função jurisdicional. Esta
atuação judicial do Poder Legislativo é forma especifica de reter, de conter ou de
liminar o Poder Judicial.
Como já afirmado para a formação constitucional do Estado
brasileiro se adotou a teoria da Tripartição dos Poderes; então necessário uma
visão geral em relação à federação, mas sempre voltado para o objetivo do estudo
que é a supremacia constitucional dos poderes do Presidente da República.
De acordo com a vontade constituinte o Estado brasileiro se
apresenta como república federativa formada pela união indissolúvel dos Estados
e Municípios e do Distrito Federal, constituindo um Estado Democrático de Direito.
Consoante o ensinamento de NORBERTO BOBBIO, “O
princípio constitucional no qual se baseia o Estado federal é a pluralidade de
centros de poder soberanos coordenados entre eles, de modo tal que o Governo
57 Op.cit. p.337 (Tradução livre do autor: Em geral o poder de julgar não deve estar unido a qualquer parte do legislativo, estando sujeito a três exceções; fundadas no interesse particular do que deve ser julgado).
53
federal, que tem competência sobre o inteiro território da federação, seja conferido
uma quantidade mínima de poderes, indispensáveis para garantir a unidade
política e econômica, e aos Estados federais, que tem competência cada um
sobre o próprio território, sejam assinalados os demais poderes”.58
Então, o Brasil com a pluralidade de centros de poder –
Estados federais, Municípios e Distrito Federal –autônomos e coordenados,
devem conferir a União competência em quantidade mínima com o fim de garantir
a unidade política e econômica; deixando as demais atribuições ao outros entes
federativos.
O que se vê é que o modelo escolhido pelo legislador
constituinte é oposto, em que a União através do Governo Federal com
competência máxima e, portanto com força arrecadadora de tributos ao ponto
máximo que se possa pensar.
O modelo federal deve dividir o poder soberano de base
territorial, por isso o equilíbrio constitucional para todos os entes da federação só
pode ser mantido com a primazia da Constituição em todos os poderes.
A Constituição como Carta de Princípios, e como Carta
Orgânica, deve respeito ao modelo adotado pela Nação; por isto deve conter
normas de equilíbrio dos entes federativos e dos Poderes de Estado.
É inerente ao Estado Federal que seus entes tenham
competência e, portanto mais ação do que a União ou Governo Federal. A fim de
que isto ocorra, é imprescindível o fortalecimento dos Poderes do Estado e dos
entes federativos, por meio de Constituição clara, objetiva e concisa.
Escrevendo sobre o necessário equilíbrio no Estado Federal,
o autor citado expressa que a autonomia do modelo se traduz em que o poder de
decidir não pertence ao governo central e nem ao governo dos Estados, mas sim
a um poder neutral que são os tribunais. Somente em virtude das próprias
decisões o poder judiciário é capaz de restabelecer o equilíbrio entre os poderes,
definido pela Constituição.
O que nos emana do escrito é que o Poder Judiciário que
atua aplicando as leis ao caso concreto, é o Poder que restabelece o equilíbrio
entre os Poderes.
58 BOBBIO, Norberto et all – Dicionário de Política, Vol.1, p.481.
54
Se de fato as leis refletirem a vontade da Nação, é certo que
sua aplicação aos casos apresentados gera equilíbrio constitucional; por isso é
fundamental se manter o Poder Judiciário na condição neutral, que significa ser
formado por pessoas que não sejam oriundas da atividade político-partidário e por
isso sem compromisso com ideologias partidárias, mas tão somente em
comprometimento com a Constituição e o sistema normativo.
Depende o equilíbrio federativo também da eleição para o
Chefe de Estado e Chefe de Governo, bem como da formação de um Poder
Legislativo representando a comunidade federal bem como o povo de cada
federação.
Desta idéia temos a Câmara dos Deputados representando o
povo e o Senado Federal representando igualmente cada Estado Federal.
Do pensamento de JEFFERSON temos que “A verdadeira
teoria de nossa Constituição é, seguramente, a mais sábia e a melhor, a de que
os Estados são independentes quanto a tudo dentro de si mesmos e unidos
quanto a tudo que diz respeito às nações estrangeiras. Limite-se o Governo Geral
tão-só aos negócios estrangeiros e fiquem nossas questões desemaranhadas das
de outras nações, exceto quanto ao comércio que os negociantes dirigirão melhor
se deixados livres para fazê-lo eles mesmos, e nosso Governo Geral poderá ficar
assim reduzido a uma organização muito simples e pouco dispendiosa, cujas
funções também simples serão exercidas por poucos funcionários”59
Quão diferente é nosso Brasil.
O Poder Executivo que exerce o Governo Federal não está só
responsável por questões estrangeiras, ao contrário atua em quase todas as
matérias que influem nos entes federativos. Em razão disto, a estrutura do
governo não é simples e sim numerosa demais e, portanto, dispendiosa.
Funções e cargos são criados aos milhares o que torna a
organização do Governo Federal como algo incontrolável.
O Poder Executivo Federal, além da interferência nos demais
Poderes do Estado, também dirige por meio da legislação, da arrecadação de
tributos, de posicionamentos políticos-partidários os Estados-membros, Municípios
e Distrito Federal.
59 JEFFERSON, Thomas-Jefferson Federalistas, Os pensadores, p.37.
55
De fato, os demais Poderes e os entes da federação, todos
dependem do Poder Executivo da União, ou seja, do Presidente da República.
Enfim, o Estado brasileiro escarneceu da idéia de
Montesquieu que afirma ter adotado e a federação brasileira não se coaduna com
o federalismo que designa a teoria do Estado federal.
De uma maneira ou outra, os Poderes do Estado que estão
previstos na Constituição executam suas funções e, portanto há titulares para o
exercício. Titular do Poder é o povo, mas titular do exercício do Poder depende da
previsão constitucional.
Dispõe o art. 2º da Constituição Federal que são Poderes da
União, independentes e harmônicos entre si, o Legislativo, o Executivo e o
Judiciário.
Com efeito, são Poderes do Estado e não somente da União,
como leitura apressada pode indicar.
Seguindo assim a teoria tripartite o Estado brasileiro prevê em
sua Constituição os Poderes que devem ser independentes entre si; entretanto
harmônicos.
Sobre a independência já falamos, no sentido de mostrar que
o Poder Executivo tem se comportado, por ordem constitucional, como um Poder
que torna os demais não tão independentes.
Harmônicos entre si têm que significar que os três Poderes
devem, cada um, exercer sua função constitucional, buscando sempre o bem
comum da Nação.
O Estado existe para a Nação, por isso os três Poderes são
os instrumentos do Estado para o alcance do bem comum da Nação.
Comentando o artigo CELSO BASTOS, expressa que “Vale,
entretanto, notar que, qualquer que seja a forma ou o conteúdo dos atos do
Estado, eles são sempre fruto de um mesmo poder. Daí ser incorreto afirmar-se a
tripartição de poderes estatais, a tomar essa expressão ao pé da letra. É que o
poder é sempre um só, qualquer que seja a forma por ele assumida. Todas as
manifestações de vontade emanadas em nome do Estado, reportam-se sempre a
um querer único, que é próprio das organizações políticas estatais.”60
60 BASTOS, Celso at all – Comentários a Constituição do Brasil, 1º Volume, p.430.
56
Claro então que há unidade de poder com separação em
titularidade de exercício para cada uma das funções; legislativa, executiva e
judicial.
2.3. A titularidade do exercício das funções.
Tripartida as funções é necessário fixar os titulares para o
exercício de cada uma em obediência a teoria adotada, no sentido de não
concentrar todas elas em uma só pessoa ou um só organismo.
A Constituição Federal fixa precisamente os titulares do
exercício para os Três Poderes, mas permite a ingerência, além do controle
necessário, do Presidente da República nos outros Poderes.
Em beneficio da Nação, os titulares devem exercitar suas
funções sempre em harmonia e com o fim voltado para o bem comum porque a
tripartição tem como fim dar segurança às pessoas de que não haverá condutas
tirânicas.
Aliás, CANOTILHO e VITAL MOREIRA apresentam
pensamento lapidar afirmando que “os titulares dos órgãos do poder devem
respeitar-se mutuamente e renunciar práticas de < guerrilha institucional>, de
abuso de poder, de retaliação gratuita ou de desconsideração grosseira. Na
verdade, nenhuma cooperação constitucional será possível, sem uma
deontologia política , fundada no respeito das pessoas e das instituições e num
apurado sentido de responsabilidade de Estado(statesmanship)”.61
Esclarecem os autores a exigência de ação combinada de
todos os titulares de órgãos do poder, o que deve ser compreendido que cada
titular deve exercer sua função sem a prática do abuso, sem guerrilha, sem
desconsideração; isto é cada titular deve exercer a função de seu Poder e não
imiscuir-se na função do outro.
Para que isto ocorra, não basta o comportamento dos
titulares. É imprescindível que a Constituição, que adota a teoria de Montesquieu,
61 CANOTILHO, J.J. Gomes et all – Os poderes do Presidente da República, p.71
57
de fato estabeleça normas que possibilitem cooperação constitucional a
concretizar o bem comum, fazendo valer a teoria que se diz adotar.
No exercício das funções, devem os titulares dar atenção
ilimitada aos princípios fundamentais eleitos pela comunidade. O afastamento de
qualquer titular de exercício de poder dos princípios escolhidos pelo povo quebra
o relacionamento político que é fundamental para sustentação das condutas
públicas.
Os titulares do exercício devem aderir à vontade popular
porque sua ação deve corresponder à vontade imposta; todavia não é isto que
sempre ocorre. “A presente preocupação geral com os problemas institucionais
culmina, necessariamente, com a grave questão – mais sociológica que jurídica-
da eficácia constitucional. Não temos encontrado, ao longo do tempo,
generalizada adesão intelectual e afetiva às nossas instituições, em grau que leve
à sustentação sólida das mesmas. Se é verdade que os princípios fundamentais
têm da comunidade nacional, razoável adesão – embora não explícita,nem
consciente-, como é o caso de república,federação, autonomia
municipal,tripartição do poder e legalidade, as regras,entretanto,que lhes
asseguram a eficácia são ignoradas,desprezadas, mal cumpridas. E isto com
aquiescência de uns, a indiferença de outros, a complacência de muitos; com a
acomodação dos órgãos de promoção do Direito e a preocupação de poucos”.62
Não basta a adesão inconsciente da comunidade aos
princípios fundamentais, exige-se a adesão consciente a estes princípios daqueles
que exercem a titularidade dos Poderes do Estado, porque só assim a vontade da
Nação estará sendo cumprida.
2.3.1. Poder Legislativo.
No Estado Federal o Poder Legislativo é composto por dois
órgãos legislativos. O Senado Federal que atua como representante dos Estados-
membros e a Câmara dos Deputados que representa o povo.
62 idem nota 24.
58
O sistema bicameral conforme J.CRETELLA JUNIOR “permite
assegurar significativa representação aos Estados-membros,elegendo, ao lado da
Câmara escolhida pela população,uma Câmara eleita pelos cidadãos de cada
estado, cada um destes representado pelo mesmo número de Senadores”.63
Assim no nosso caso os Estados são representados por um
mesmo número de Senadores havendo proporcionalidade de representação na
Câmara dos Deputados tomando por base a população de cada Estado-membro.
Estabelece a Constituição em seu art.45 e parágrafos que a
Câmara dos Deputados compõem-se de representantes do povo, eleitos pelo
sistema proporcional, em cada Estado, em cada Território e no Distrito Federal.
Lei complementar deve fixar o número total de deputados,
fazendo-se ajustes conforme a mudança da população, mas fixa a Constituição o
número mínimo de oito e máximo de setenta.
Cada Território elege quatro deputados.
O art.46 e parágrafos cuidam do Senado prevendo eleição
pelo princípio majoritário.
Cada Estado e o Distrito Federal elegem três Senadores, com
mandato de oito anos, que é o dobro do mandato dos Deputados Federais. A
renovação acontece de quatro em quatro anos, alternadamente por um e dois
terços.
Possibilita esta norma que os Estados e Distrito Federal
sempre estejam representados, em cada legislatura, por Senadores oriundos da
legislatura anterior, seja um ou sejam dois. Depende da renovação de um ou dois
terços.
Esta forma de composição tem seu lado positivo porque
permite que o Senador que ingressa em nova legislatura, vindo da anterior,
continue tratando dos interesses do Estado que representa sem que haja quebra
de continuidade, caso haja renovação total dos concorrentes.
A importância do Poder Legislativo está caracterizada pela
necessidade de um órgão próprio, que representando o povo e os Estados-
membros, exerça o processo legislativo. No Dicionário da Constituição Francesa
de R.BARRILON encontramos que “... le pouvoir législatif exercé par les
63 CRETELLA Jr, José – Elementos de Direito Constitucional, p.130.
59
representants du peuple devait constituer l´elément essentiel, au sein de la
nouvelle répartion des compétences, entre les trois “pouvoirs”.64
Então, o Poder Legislativo que é exercido por representantes
do povo deve constituir o elemento essencial ao sentido da nova repartição de
competência entre os três Poderes, no caso foi considerado o espírito
revolucionário de 1789.
A essencialidade do Poder Legislativo exercendo sua função
sem intromissão é indiscutível, ficando estabelecido pela Constituição que a
assunção ao cargo de legislador se dá através da escolha popular e é temporário.
2.3.2. Poder Executivo.
A composição deste poder varia de acordo com o sistema de
governo. “Se levamos com consideração o parlamentarismo, teremos um
executivo dual, com o Primeiro Ministro chefe do governo e o Presidente da
República ou Monarca, chefe do Estado e seu representante. Ao considerarmos o
presidencialismo, teremos na mesma pessoa, a do Presidente da República, as
duas funções”, como escreve DIRCÊO TORRECILLAS RAMOS.65
A função do Executivo é aplicar a lei elaborada pelo
Legislativo.
“O Poder Executivo tem por principal desígnio constitucional a
realização da função administrativa.Nesse sentido, sua tarefa consiste em
aprimorar, em nível imediatamente infralegal, os comandos normativos. É um
aplicador da lei, na gerência dos negócios públicos”66, como afirma LUIZ
ALBERTO DAVID ARAÚJO.
No nosso caso o Poder Executivo é exercido pelo Presidente
da República, que é auxiliado pelos Ministros de Estado, nos termos da redação
do art.76.
64 BARRILON, R. et all- Dictionaire de la Constitution, p.271 (Tradução livre do autor: o poder legislativo exercido pelos representantes do povo deve constituir o elemento essencial, ao sentido na nova repartição das competências entre os três “poderes”.) 65 RAMOS, Dircêo Torrecilas-O Federalismo Assimétrico, p.127. 66 Op.cit. p.280
60
Temos então o sistema presidencialista em que na pessoa do
Presidente da República está reunido a função de Chefe de Governo e a função
de Chefe de Estado, estando a seu cargo a responsabilidade pela Administração
Pública em nível federal e a representação do País perante à comunidade
internacional.
A eleição do Presidente e do Vice-Presidente da República
realiza-se simultaneamente, no primeiro domingo de outubro, em primeiro turno, e
no último domingo de outubro, em segundo turno, do ano anterior ao término do
mandato presidencial vigente.
Estabelece a Constituição a necessidade de segundo turno
quando nenhum candidato alcançar a maioria absoluta na primeira votação,
concorrendo os dois candidatos mais votados e considerando-se eleito aquele que
obtiver a maioria dos votos válidos.
A posse será sessão do Congresso Nacional.
O mandato que tem inicio em 1º de janeiro do ano seguinte ao
da eleição tem duração de quatro anos.
O art. 83 apresenta uma ação de controle do Poder
Legislativo ao Poder Executivo, porque o Presidente e o Vice-Presidente da
República não poderão, sem licença do Congresso Nacional, ausentar-se do País,
por período superior a quinze dias, sob pena de perda do mandato.
O administrador da coisa pública deve ser pessoa presente na
vida nacional, por isso o dispositivo se apresenta como uma forma de estancar a
vontade de ausência do País por longos períodos, o que certamente geram
problemas e até perda de identidade quanto a quem governa.
Em prazo inferior não há necessidade da licença do
Congresso Nacional, podendo então o Presidente ou o Vice-Presidente da
República ausentar-se do País livremente. Esta desnecessidade,nos mostra a
história, que em passado recente e também nos dias em que vivemos se tornou
conduta ordinária viajar incontáveis vezes para várias partes do Mundo.
Quanto ao exercício do poder, há que se lembrar que muito
se fala dos limites constitucionais que são impostos aos titulares; mas o que se
constata na Constituição Brasileira é que os limites impostos ao Presidente da
República como titular da função executiva está muito longe de ser alcançado,
61
porque como sempre lembrado além de administrar legisla e faz a composição de
órgãos legislativo e judiciário.
Os limites constitucionais para o Presidente da República
praticamente inexistem.
2.3.3. Poder Judiciário.
O terceiro Poder é o que se apresenta com mais
complexidade, com uma estrutura diversificada e num grau de independência
discutível em relação aos demais.
Ao tratar sobre o papel tradicional do Judiciário JOSÉ
RENATO NALINI, ensina que: “Na repartição das funções estatais, reservou-se ao
Judiciário aquela de aplicar contenciosamente a lei. ... Essa a clássica função do
Judiciário, reafirmada por toda a doutrina, comprovada pela praxe e ainda
exercida pelo braço estatal que resolve conflitos e impõe sanções.No sistema de
controles recíprocos presentes na concepção de Montesquieu, cada poder estatal
tem delimitada a sua área de atuação. Campo em regra imune à interferência dos
demais poderes. Cada qual deles zeloso para que essa distância não se elimine,
nem se reduza”.67
No mesmo texto afirma, também, que sem perder a função
tradicional, com o advento da Constituição de 1988 o Poder Judiciário foi provido
de poderes de controlador da legitimidade, com feição moderadora.
O que enfatiza o autor, e aqui interessa, é que cada Poder
Estatal tem limitado sua área de atuação, cujo campo está imune à interferência
dos demais Poderes, sendo que cada qual zela para manter uma distância que
não se elimine e nem se reduza.
Em suma, cada Poder é zeloso para que seja mantida a
independência, que deve ser real e não apenas textual.
Para manter a independência e exercitar a função de aplicar
contenciosamente a lei o art. 92 dispõe os órgãos do Poder Judiciário.
67 NALINI, José Renato - O Judiciário e a Constituição de 1988 – in Constituição Federal de 1988, Dez Anos, p.314.
62
São órgãos do Poder Judiciário, portanto instituições ou
pessoas que exercem a função jurisdicional: o Supremo Tribunal Federal; o
Superior Tribunal de Justiça; os Tribunais Regionais Federais; os Juízes Federais;
os Tribunais do Trabalho; os Juízes do Trabalho; os Tribunais Eleitorais; os Juízes
Eleitorais; os Tribunais Militares; os Juízes Militares; os Tribunais dos Estados e
do Distrito Federal e Territórios e os Juízes do Estados, do Distrito Federal e dos
Territórios.
Com a Emenda Constitucional 45,de 08 de dezembro de
2004, foi incluído entre os órgãos do Poder Judiciário o Conselho Nacional de
Justiça, órgão de controle e que não tem função jurisdicional; portanto um órgão
estranho as funções judicantes.
De maneira diversa aos demais Poderes, o cargo de
Magistrado é vitalício e assunção se dá por concurso público ou nomeação pelo
Chefe do Poder Executivo.
Justifica-se a vitaliciedade porque a sociedade deve ter a
segurança que suas questões serão julgadas por alguém, aquele que está
exercendo a titularidade do Poder, que não precisa fazer pender a balança da
Justiça para um ou outro lado, como uma forma de se manter no Poder.
A vitaliciedade antes de ser uma garantia ao Magistrado é
uma garantia da sociedade.
Assunção por concurso público tem sua justificativa porque
este Poder é técnico-jurídico. Evidente que tem sua feição política, mas a
capacidade técnica do julgador é essencial para que o direito positivo seja
fielmente aplicado aos casos postos em julgamento.
Quanto às nomeações por escolha do Chefe do Poder
Executivo não se encontra justificativa, a não ser sob a máscara de controle, uma
forma de se nomear pessoas de seu relacionamento.
A partir do art. 93, há uma série particularidades que regulam
a vida funcional dos Magistrados, mas nem todas interessam nesta oportunidade.
Descreve a Constituição uma carreira aos Magistrados que
ingressam após concurso público no cargo de Juiz Substituto e a seguir será
promovido de entrância para entrância pelos critérios de antiguidade e
merecimento, alternadamente.
63
O acesso aos tribunais de segundo grau acontece da mesma
maneira, ou seja, promoção pelos critérios de antiguidade e merecimento.
Como maneira de prestar contas e permitir o controle dos atos
judiciais não só pelos demais Poderes, mas também por toda a sociedade,
determina o inciso IX do art.93 que todos os julgamentos serão públicos, e
fundamentadas todas as decisões, sob pena de nulidade.
A nulidade dos julgamentos é atingida não só por falta de
fundamentação, mas também se houver a retirada da publicidade, com exceção
das previsões legais pelo interesse público.
Uma das maneiras de acesso ao Poder Judiciário
independente de concurso público e diretamente nos Tribunais, portanto sem o
exercício do cargo de Juiz nas entrâncias, é o chamado Quinto Constitucional.
Determina o art. 94 que um quinto dos lugares dos Tribunais
Regionais Federais, dos Tribunais dos Estados, e do Distrito Federal e Territórios
será composto de membros, do Ministério Público, com mais de dez anos de
carreira, e de advogados de notório saber jurídico e de reputação ilibada, com
mais de dez anos de efetiva atividade profissional, indicados em lista sextupla
pelos órgãos de representação das respectivas classes. Recebidas as indicações,
o Tribunal formará lista tríplice, enviando ao Poder Executivo, que, nos vinte dias
subseqüentes, escolherá um de seus integrantes para nomeação.
O que temos aqui é a ingerência do Chefe do Poder Executivo
nomeando pessoas para integrarem Tribunais Federais, dos Estados-membros,
do Distrito Federal e dos Territórios. Em suma, o Poder Executivo participa do
modo de formação do Poder Judiciário.
Pode-se pensar em inferioridade em relação aos demais
Poderes quando seus membros praticamente não sofrem nenhuma limitação na
vida particular, enquanto os Magistrados estão proibidos de exercer qualquer
outra função, salvo uma de magistério e nem dedicar-se à atividade política-
partidária.
Não obstante, a inferioridade é perfeitamente compreensível
às vedações porque dada à particularidade o Magistrado deve dedicar-se
integralmente a função estatal e sem pender para um ou outro partido-político. Em
contrapartida o Estado deve oferecer aos Magistrados as condições necessárias
para que possa haver de fato a dedicação integral.
64
2.3.3.1. Órgãos do Poder Judiciário.
Diante da estruturação complexa do Poder Judiciário em
relação aos outros dois Poderes necessário se faz simples verificação de cada
órgão, mas sem afastar da idéia de demonstrar a intromissão do Presidente da
República.
O Supremo Tribunal Federal como órgão superior do Poder
Judiciário é composto por onze Ministros, escolhidos dentre cidadãos com mais de
trinta e cinco e menos de sessenta e cinco anos de idade, de notável saber
jurídico e reputação ilibada.
Estes Ministros são nomeados pelo Presidente da República,
depois de aprovada a escolha pela maioria absoluta do Senado Federal.
Percebe-se que a Corte que tem como competência
primordial defender a Constituição Federal é formada integralmente por pessoas
escolhidas pelo Presidente da República, com concordância do Senado Federal.
Não há nenhuma participação do Poder Judiciário na escolha
dos integrantes de seu órgão máximo.
Tem-se o Superior Tribunal de Justiça que é composto de
no mínimo por trinta e três Ministros. Da mesma forma que para o Supremo
Tribunal Federal serão nomeados pelo Presidente da República exigindo-se os
mesmos requisitos e a aprovação por maioria absoluta do Senador Federal.
Um terço será escolhido dentre Juízes dos Tribunais
Regionais Federais e um terço dentre Desembargadores dos Tribunais de Justiça,
indicados em lista tríplice elaborada pelo próprio Tribunal.
Outro terço, em partes iguais, dentre advogados e membros
do Ministério Público Federal, Estadual, do Distrito Federal e territórios,
alternadamente, indicados de forma idêntica ao quinto constitucional.
A redação do art. 104 permite a participação do Poder
Judiciário, mas mesmo assim a decisão final é do Presidente da República que
também faz ingressar no Superior Tribunal de Justiça, advogados e membros do
Ministério Público.
65
Os Tribunais Regionais Federais são compostos de no
mínimo por sete Juízes nomeados pelo Presidente da República dentre brasileiros
com mais de trinta e cinco e menos de sessenta e cinco anos de idade.
Um quinto escolhido dentre advogados com mais de dez anos
de efetiva atividade profissional e membros do Ministério Público Federal com
mais de dez anos de carreira.
Os demais, mediante promoção de juízes federais com mais
de cinco anos de exercício, por antiguidade e merecimento alternadamente.
Em outro segmento, há a justiça especializada em nível
federal, que são: Justiça do Trabalho; Justiça Eleitoral e Justiça Militar, órgãos que
também sofrem a ação do Chefe do Poder Executivo.
O Tribunal Superior do Trabalho é composto por dezessete
Ministros, togados e vitalícios, escolhidos dentre brasileiros com mais de trinta e
cinco e menos de sessenta e cinco anos de idade, nomeados pelo Presidente da
Republica, após aprovação pelo Senado Federal, dos quais doze escolhidos
dentre juízes dos Tribunais Regionais do Trabalho, integrantes da carreira da
magistratura trabalhista, três dentre advogado e três dentre membros do Ministério
Público do Trabalho.
Listas tríplices são enviadas ao Presidente da República,
observando-se quanto ao advogados e membros do Ministério Público o que
consta para o quinto constitucional.
A situação não muda nos Tribunais Regionais do Trabalho
que são integrados por juízes do trabalho, escolhidos por promoção, pelos
critérios já mencionados, bem como por advogados e membros do Ministério
Público, também da forma já mencionada.
São, portanto, nomeados pelo Presidente da República.
Compõe-se o Tribunal Superior Eleitoral de, no mínimo, sete
membros.Três juízes, mediante eleição, pelo voto secreto, dentre Ministros do
Supremo Tribunal Federal e dois dentre os Ministros do Superior Tribunal de
Justiça. Por livre nomeação do Presidente da República dois juízes dentre seis
advogados de notável saber jurídico e idoneidade moral, indicados pelo Supremo
Tribunal Federal.
66
Neste Tribunal há participação do Poder Judiciário, no
entanto, não se pode esquecer que os eleitos são nomeados pelo Presidente da
República com aprovação do Senado Federal.
A Presidência e a Vice-Presidência serão exercidas dentre os
Ministros do Supremo Tribunal Federal e a Corregedoria Eleitoral dentre os
Ministros do Superior Tribunal de Justiça.
Instalados na Capital de cada Estado-membro e no Distrito
Federal os Tribunais Regionais Eleitorais são compostos de dois juízes eleitos
pelo voto secreto dentre desembargadores do Tribunal de Justiça, de dois juízes
de direito escolhidos pelo Tribunal de Justiça.
Por nomeação do Presidente da República, dois juízes dentre
seis advogados de notável saber jurídico e idoneidade moral, indicados pelo
Tribunal de Justiça.Aqui a participação do Poder Executivo limita-se a nomeação
dos advogados.
Dentre os desembargadores serão eleitos o Presidente e o
Vice- Presidente.
O Tribunal Militar é composto de quinze Ministros vitalícios,
nomeados pelo Presidente da República, depois de aprovada a indicação pelo
Senado Federal, sendo três dentre oficiais-generais da Marinha, quatro dentre
oficiais-generais do Exército, três dentre oficiais-generais da Aeronáutica, todos da
ativa e do posto mais elevado da carreira.
Cinco civis escolhidos pelo Presidente da República dentre
brasileiros maiores de trinta e cinco anos, sendo três dentre advogados de notório
saber jurídico e conduta ilibada, com mais de dez anos de efetiva atividade
profissional e dois, por escolha paritária, dentre juízes auditores e membros do
Ministério Público da Justiça Militar.
Por fim, tem-se o Conselho Nacional de Justiça que como
afirmado é órgão do Poder Judiciário, mas que não exerce a função jurisdicional.
Composto de quinze membros entre magistrados, membros
do Ministério Público, advogados e cidadãos todos nomeados pelo Presidente da
República após a aprovação por maioria absoluta do Senado Federal.
Assim, conforme a Constituição Federal a composição dos
Tribunais mencionados e do órgão de controle do Poder Judiciário depende da
vontade do Presidente da República com aprovação do Senado Federal.
67
Como um Poder inferiorizado, o Judiciário executa sua função
sem que tenha a propalada independência dos Poderes para formar sua própria
composição. Está sua composição atrelada à vontade do Presidente da República
que por essencialidade do sistema político está vinculado aos compromissos de
ideologia partidária. Por isto, a composição do Poder Judiciário, por seus
membros, está carregada de ideologias político-partidárias emergentes de quem
faz a escolha dos magistrados.
A titularidade do exercício dos Poderes Legislativo e
Executivo independe de ingerência do Poder Judiciário, mas a titularidade de
exercício do Poder Judiciário, nos Tribunais, depende da ingerência dos Poderes
Legislativo e Judiciário.
Arremata-se com CELSO BASTOS quando afirmou que “O
traço importante da teoria elaborada por Montesquieu não foi o de identificar estas
três funções, pois elas já haviam sido abordadas por Aristóteles, mas o de
demonstrar que tal divisão possibilitaria um maior controle do poder que se encontra
nas mãos do Estado. A idéia de um “sistema de freios e contrapesos”, onde cada
órgão exerça as suas competências e também controle o outro, é que garantiu o
sucesso da teoria de Montesquieu.”68
68 BASTOS, Celso – Curso de Direito Constitucional, p. 159.
68
CAPITULO III
AS FUNÇÕES ESTATAIS NAS CONSTITUIÇÕES BRASILEIRAS
O Estado brasileiro já experimentou inúmeras transformações,
por isto é necessário verificar em cada época da história como as funções e os
Poderes estavam previstos nas respectivas Constituições.
A leitura de cada Constituição vai mostrar o quadro
constitucional para cada Poder preocupando-se basicamente na maneira de
assunção aos cargos e também a posição de cada Poder no formato
constitucional.
3.1. Constituição de 25 de março de 1.824.
Antecede a Constituição o Decreto de 13 de novembro de
1823 em que o Imperador expressa haver dissolvido no dia anterior a Assembléia
Geral Constituinte para em seguida criar um Conselho de Estado, formado por
seus seis Ministros mais quatro pessoas que nomeia com fim de apresentar um
projeto de Constituição.
A primeira Constituição foi outorgada pelo Imperador,
entretanto houve consulta às Câmaras Municipais de todo o país e só após o
decurso de certo prazo é que a mesma foi apresentada pela Comissão nomeada,
por isto, pode-se falar que houve algum consenso com o texto.
No ano de 1.824, o Brasil era um Império sendo conceituado
como associação política de todos os cidadãos brasileiros. Formam, expressa o
art. 1º da Carta de Lei de 25 de março, uma Nação livre e independente que não
69
admite com qualquer outra laço algum de união ou federação, que se oponha à
sua independência.
Este artigo inicial da primeira Constituição, mostra a vontade
de que o Brasil seja sempre um Império e a preocupação com a soberania.
O Governo era monárquico hereditário, constitucional e
representativo.
Embora com monarquia hereditária, a Constituição começou
bem, pois se apresentou como regra primeira a ser obedecida. Estabeleceu
representatividade, o que supõe-se de algum modo à participação popular.
Antes mesmo antes de estabelecer os Poderes a
Constituição, em seu art. 9º, traça a divisão e a harmonia, pois expressa que a
divisão e a harmonia dos poderes políticos é o princípio conservador dos direitos
dos cidadãos e o mais seguro meio de fazer efetivas as garantias que a
Constituição oferece.
Já no Império Dom Pedro reconheceu que os poderes devem
ser divididos, mas harmônicos, que a divisão e a harmonia formam o principio
conservador dos direitos dos cidadãos. Os direitos e garantias constitucionais só
se efetivam se observado o principio conservador. Em suma, divisão e harmonia
dos Poderes se apresentam como garantia aos cidadãos de que seus direitos e
garantias constitucionais serão respeitados.
O art. 10 reconhece quatro poderes políticos, que em seguida
são considerados como delegações da Nação. São eles: o Poder Legislativo, o
Poder Moderador, o Poder Executivo e o Poder Judicial.
Com estes poderes políticos alguns afirmam a instauração do
sistema parlamentar de governo no Brasil, mas também há posicionamentos
contrários. As palavras de SERGIO RESENDE DE BARROS mostram posição
contrária: “O parlamentarismo não tem raiz entre nós. Alguns querem provar que
se praticou um governo parlamentarista no Brasil imperial. Na verdade, aí não
houve senão um atípico governo de gabinete, consentido pelo imperador, mas
submetido de tal modo ao seu poder, que mais de descaracterizou do que se
caracterizou como parlamentarismo”.69
69 BARROS, Sergio Resende – Parlamentarismo ou Presidencialismo? In Revista FMU, Ano 3, p.15.
70
Se é que houve este parlamentarismo, chamado de bastardo
o mesmo não teve penetração histórica.
O Poder Legislativo é delegado à Assembléia Geral com a
sanção do Imperador. A Assembléia compõe-se de duas Câmaras; Câmara de
Deputados e Câmara de Senadores ou Senado.
Naquela época os membros do Poder Legislativo já gozavam
de imunidades durante o mandato porque eram invioláveis pelas opiniões que
emitissem no exercício da função, e se fossem pronunciados, o Juiz deveria
suspender todo o ulterior procedimento comunicando a respectiva Câmara, a qual
deveria decidir se o processo deveria continuar e o membro ser ou não suspenso
do exercício de suas funções.
Tinha a Assembléia Geral atribuições que influíam no Império
e no Poder Moderador, como, por exemplo, reconhecer o Príncipe Imperial,
nomear tutor ao Imperador, menor, caso seu pai o não tenha nomeado em
testamento, escolher nova dinastia em caso de extinção da Imperante.
Era atribuição privativa da Câmara dos Deputados a iniciativa
sobre escolha da nova dinastia no caso de extinção da Imperante. Também,
decidir sobre a admissibilidade de acusação contra Ministros de Estados e
Conselheiros de Estado.
O Senado, que era composto por membros vitalícios, ao
contrário da Câmara dos Deputados cujos mandatos eram temporários era
organizado por eleição provincial.
Além dos eleitos por província, os Príncipes da Casa Imperial
eram Senadores por direito e com assento ao Senado ao atingirem 25 anos de
idade, nos termos do art.46.
Como atribuição exclusiva podemos mencionar conhecer dos
delitos individuais cometidos pelos membros da Família Imperial, Ministros de
Estado, Conselheiros de Estado e senadores; e dos delitos dos Deputados
durante o período da Legislatura.
Causando desequilíbrio entre as duas Casas do Poder
Legislativo, os subsídios dos Senadores eram de tanto e mais metade, do que
tiverem os Deputados.
Dando uma conotação de superioridade a este Poder, o art.
98 expressa que o Poder Moderador é a chave de toda a organização política, e é
71
delegado privativamente ao Imperador, como Chefe Supremo da Nação e seu
primeiro representante, para que, incessantemente vele sobre a manutenção da
independência, equilíbrio e harmonia dos mais poderes políticos.
Da disposição constitucional se percebe que a pessoa do
Imperador, e não o Poder, é a peça superior, porque ele é o Chefe Supremo da
Nação e seu primeiro representante. Se era Chefe Supremo estava acima dos
demais Poderes Políticos. Era de responsabilidade dele manter o equilíbrio e a
harmonia entre dos demais poderes políticos.
Sua supremacia está de forma categórica no art.99 que
expressa que a pessoa do Imperador é inviolável e sagrada, como se fosse um
ser divino. Não estava sujeito a nenhuma responsabilidade.
Exercendo o Poder Moderador, o Imperador podia prorrogar
ou adiar a Assembléia geral, bem como dissolver a Câmara dos Deputados, bem
como convocar outra para substituir.
Interferindo no Poder Executivo podia nomear e demitir
Ministros de Estado e no Poder Judicial podia suspender Magistrados. Ainda,
podia perdoar ou moderar penas impostas, além de conceder anistia.
Na verdade o Imperador não interferia no Poder Executivo
porque ele o exercitava através dos Ministros de Estado. Assim, o Imperador
exercitava o Poder Moderador e o Poder Executivo; tínhamos então em uma só
pessoa a reunião constitucional do exercício de dois Poderes do Império.
A função executiva tinha dentre as principais atribuições,
convocar nova Assembléia Geral ao terceiro ano da Legislatura existente e
nomear Magistrados.
Estabelecia a Constituição que o Poder Judicial é
independente e será composto de Juízes e Jurados.
Dispunha o art. 153 que os Juízes de Direito eram perpétuos;
o que, todavia, não impedia que fossem mudados de um lugar para outro pelo
tempo e maneira que a lei determinar.
O Imperador tinha o poder de suspender os Juízes por
queixas contra eles, mas somente por sentença podiam perder o lugar.
A simples leitura mostra que, no Império do Brasil, o
Imperador era constitucionalmente e de fato o Chefe Supremo.
72
Inviolável e sagrado exercia o Poder Moderador e o Poder
Executivo. Podia adiar ou prorrogar a Assembléia geral, bem como dissolver a
Câmara dos Deputados e nomear outra.Nomeava e suspendia Magistrados.
Enfim, o Imperador era o Chefe Supremo.
3.2. Constituição de 24 de fevereiro de 1.891.
Antes da Constituição de 1.891 o Decreto nº 1, de 15 de
novembro de 1.889 proclama provisoriamente a República Federativa,
constituindo os Estados Unidos do Brasil.
Em 15 de junho de 1.890 o Governo Provisório chefiado pelo
Marechal Deodoro da Fonseca expediu o Decreto, nº 510, de 22 de junho de
1.890 apresentando uma nova Constituição, mas expressando que o Congresso a
ser eleito julgará a Constituição, no entanto vigorando de imediato e unicamente
no tocante à dualidade das Câmaras do Congresso, à sua composição, à sua
eleição e à função, que são chamadas a exercer, de aprovar a dita Constituição e
proceder em seguida na conformidade de suas disposições, nos termos de seus
três artigos.
O Congresso Constituinte, eleito na data de 24 de fevereiro de
1.891, apresenta, como representante do povo, uma outra Constituição, com o fim
de organizar um regime livre e democrático.
Nas disposições preliminares da Organização Federal dispõe
o art. 15 que São órgãos da soberania nacional o Poder Legislativo, o Executivo e
o Judiciário, harmônicos e independentes entre si.
Assim, a Constituição da República há pouco proclamada
reconhece que a soberana nacional exige os três clássicos Poderes, bem como a
harmonia e a independência.
Instala-se também com a proclamação da República o
sistema presidencialista que mereceu criticas da MEDEIROS DE ALBUQUERQUE
da Academia Brasileira, nos seguintes termos: “O regimem presidencial não foi
73
instituído no Brasil depois de uma propaganda que tivesse mostrado suas
vantagens e desvantagens.Ele foi uma surpresa e um logro” 70.
O Poder Legislativo é exercido pelo Congresso Nacional com
a sanção do Presidente da República e composto de dois ramos: a Câmara dos
Deputados e o Senado Federal.
A Câmara dos Deputados formada por representantes do
povo e o Senado por representantes do Estado e do Distrito Federal.
Cabe a Câmara dos Deputados declarar sobre a procedência
ou improcedência da acusação contra o Presidente da República e Ministros de
Estado, nos crimes conexos com os do Presidente da República.
No art. 32 o Senado sofre ingerência direta do Poder
Executivo porque o Vice-Presidente da República é o Presidente do Senado.
Ao Senado, privativamente, compete julgar o Presidente da
República.
Ao Congresso incumbia, não privativamente, velar pela
guarda da Constituição, o que de certa forma lhe dava um caráter de Poder
Judiciário, cuja Corte Suprema deve velar como atribuição pela guarda da
Constituição Federal.
Nas Disposições Gerais a Constituição previa a instituição de
um Tribunal de Contas para liquidar as contas da receita e despesa e verificar sua
legalidade, antes de serem prestados ao Congresso. Os membros deveriam ser
nomeados pelo Presidente da República, após aprovação pelo Senado.
O Tribunal de Contas já se apresenta como um auxiliar do
Congresso Nacional, porque antes do Congresso receber as contas estas já
passavam por uma análise técnica.
O Poder Executivo é exercido pelo Presidente da República,
como chefe eletivo da Nação, como dispõe a redação do art.41.
Dentre as atribuições do Poder Executivo, compete
privativamente ao Presidente da República, dar conta anualmente da situação do
País ao Congresso Nacional, o que mostra que o administrador deve dar contas
ao povo.
70 ALBUQUERQUE, Medeiros e – Parlamentarismo e Presidencialismo no Brasil, p.11.
74
Compete nomear os membros do Supremo Tribunal Federal e
os magistrados federais mediante proposta do Supremo Tribunal.
A redação constitucional dá ao Presidente da República o
poder de compor o Poder Judiciário, que então tem sua independência
chacoalhada.
O Presidente da Republica nomeia os magistrados federais
que são indicados pelo Supremo Tribunal, entretanto os membros de mencionado
Tribunal são nomeados pelo Presidente; assim o Poder Judiciário passa a ter sua
composição conforme a vontade e os compromissos do Presidente da República.
A mais alta Corte de Justiça depende do Presidente da
República para sua composição.
Tem o Presidente da República a garantia que nos crimes
comuns, se a Câmara dos Deputados entender procedente a acusação, ser
julgados pelos integrantes do Supremo Tribunal Federal, isto é, por aqueles
magistrados nomeados pelo Poder Executivo.
Dispõe o art.55 que o Poder Judiciário da União terá por
órgãos um Supremo Tribunal Federal e tantos Juízes e Tribunais Federais,
distribuídos pelo País, quantos o Congresso criar.
Evidente que a criação de cargos e tribunais compete ao
Congresso Nacional diante da dependência de lei, no entanto a verificação da
necessidade deve caber ao Poder Judiciário, pois é ele que tem conhecimento da
situação judicial.
Os membros do Supremo Tribunal Federal, em casos de
crimes de responsabilidade, eram julgados pelo Senado Federal, que então
exercia a função judicante.
Por fim, concedeu a Constituição o poder ao Congresso
Nacional, após a promulgação, de eleger o Presidente e o Vice-Presidente da
República, por maioria absoluta.
Quanto aos Juízes estabeleceu apenas a necessidade de
nomeações para a nova organização judiciária.
3.2.1. Emendas de 1.926.
75
A Constituição de 24 de fevereiro sofreu emendas em 1926,
merecendo destaque o que segue.
O Governo Federal teve sua atuação limitada quanto à
intervenção nos Estados, mas permitindo para assegurar a independência e
harmonia dos poderes, a inamovibilidade, vitaliciedade e irredutibilidade de
vencimentos dos magistrados.
O texto coloca o governo federal como defensor dos demais
poderes em caso de sofrerem medidas que retirem as garantias constitucionais.
Ao Congresso Nacional foi dado a competência de organizar
a Justiça Federal, o que transfere atribuição de assunto interno de um Poder para
outro.
O que é preciso ressaltar é que a cultura de centralizar
poderes na União em detrimento dos Estados membros e dos Municípios, e
portanto em mãos do Presidente da República está sempre presente nas entre-
linhas constitucionais.
Aliás, MARIA GARCIA já reconheceu esta concentração
quando escreveu sobre a Constituição de 1891, afirmando que “a pessoa União
irá prevalecer, efetivamente nos textos constitucionais brasileiros, demonstrando a
sua prevalência, não obstante a declaração federativa...”. Enfatiza também a
autora que na cultura brasileira há subserviência ao poder central, acentuado pelo
sistema presidencialista de governo.71
3.3. Constituição de 16 de julho de 1.934.
Em 11 de novembro de 1.930 Getulio Vargas edita o Decreto
nº 19.398 e institui o Governo Provisório dos Estados Unidos do Brasil.
71 GARCIA, Maria – As Constituições Brasileiras, p.19 “A propósito da proclamação da União dos Estados, ressalta-se a figura do “Estado da União”, do modelo norte-americano, e a pessoa da União irá prevalecer, efetivamente, nos textos constitucionais brasileiros, demonstrando a sua prevalência, não obstante a declaração federativa, por todas as formas e meios e a despeito da Constituição –
76
Dispõe o art. 1º que o Governo Provisório exercerá,
discricionariamente em toda sua plenitude as funções e atribuições, não só do
Poder Executivo, como também do Poder Legislativo, até que eleita a Assembléia
Constituinte, estabeleça a reorganização constitucional do País.
Agora se tem o afastamento e a reunião de dois Poderes em
um só órgão, o Governo Provisório.
Dispôs o art. 3º que o Poder Judiciário deveria continuar
sendo exercido na conformidade das leis em vigor, mas com as modificações que
vierem a ser adotadas de acordo com o Decreto que era editado.
Enfim, o Governo Provisório tinha nas mãos os três Poderes
reconhecidos pela Constituição anterior.
O Decreto chamado de lei em alguns seus artigos passou a
ser o documento jurídico máximo, pois todas as demais normas deviam
obediência às suas regras.
As garantias constitucionais foram suspensas, menos a
apreciação de casos pelo Poder Judiciário, mas conforme o Decreto e suas
modificações.
Posteriormente, agora pelos representantes do povo reunido
em Assembléia Nacional Constituinte, é promulgada a Constituição de 16 de julho.
Expressa o art. 3º que São órgãos da soberania nacional,
dentro dos limites constitucionais, os Poderes Legislativo, Executivo e Judiciário,
independentes e coordenados entre si.
Interessante observar que o texto coloca os Poderes
submissos aos limites constitucionais, estando, portanto, a Constituição como
norma reguladora dos Poderes.
Importante proibição está no parágrafo primeiro que veda aos
Poderes delegar suas atribuições. Assim, se cada Poder tem função que é
originária da teoria de Montesquieu, cada um deve exercer a sua sem delegar a
qualquer outro.
A delegação de atribuições significa postar aquele que delega
em posição de inferioridade, por isso cabe a Constituição precisamente definir as
como resquício do unitarismo estatal, de um certo vezo da cultura brasileira, de subserviência ao poder central, acentuado pelo sistema presidencialista de governo, adotado nessa oportunidade.”
77
atribuições de cada um e impedir que haja delegação, seja de forma expressa ou
por meios indiretos.
Seguindo determina que o cidadão investido na função de um
Poder não poderá exercer a do outro, o que significa que também não deve por
meios ardilosos permitir que quem não é legislador legisle.
O desrespeito a estas duas imposições importa em causar
uma certa desorganização estatal, porque desvirtua o sistema de controle.
Nesta Constituição, certa ênfase é dada a Câmara dos
Deputados, porque o art. 22 expressa que o Poder Legislativo é exercido pela
Câmara dos Deputados com a colaboração do Senado Federal.
De acordo com a redação, o Senado colabora o que faz
concluir que não exerce por si.
Faculta à Câmara dos Deputados a convocar qualquer
Ministro de Estado para prestar informações sobre questões do respectivo
Ministério. A falta injustiçada importa em crime de responsabilidade.
Dentre as atribuições está a de julgar as contas do Presidente
da República, o que dispensa comentários posto que efetivamente o povo, através
de seus representantes deve efetivamente vistoriar e julgar o gasto público.
Dispõe o art. 51 que o Poder Executivo é exercido pelo
Presidente da República e dentre suas obrigações está a de prestar contas
anualmente da situação do País, à Câmara dos Deputados.
Em caso de julgamento, o Presidente da República será
processado e julgado nos crimes comuns pela Corte Suprema e nos crimes de
responsabilidade por um Tribunal Especial.
Esta Constituição não dá a todos os integrantes do Poder
Legislativo ou a todos os integrantes de uma Casa a competência privativa de
julgar o Presidente da República nos crimes de responsabilidade, diante da
composição de um Tribunal Especial. Este Tribunal tem como Presidente o da
Suprema Corte, três membros são do Senado Federal e três da Câmara dos
Deputados.
A exacerbação de poderes nas mãos do Presidente da
República é reconhecida por ANNA CANDIDA DA CUNHA FERRAZ ao dizer que
“Destarte, o Poder Executivo era novamente atribuído a uma só pessoa, investida
como presidente da República; a alteração de maior monta fica por conta do
78
desaparecimento da figura do vice-presidente da República. De resto, a despeito
das críticas ao sistema presidencial de 1891, e ao exacerbamento do poder
pessoal do primeiro mandatário da República , e do quadro político europeu, de
composição tendencialmente parlamentar, voltava intacto o presidencialismo, e o
Poder Executivo vinha investido ainda de maiores poderes”. 72
Diante da redação do art. 63 o Poder Judiciário na
Constituição de 1934 tinha como órgãos: a Corte Suprema; os Juízes e Tribunais
Federais; os Juízes e Tribunais Militares e os Juízes e Tribunais Eleitorais.
Afastando os Juízes da vida político-partidária, a Constituição
proibia esta atividade, bem como o conhecimento de questões exclusivamente
políticas.
Os Magistrados, então, exerciam, como acontece hoje,
somente direitos políticos ativos, posto que votam, mas não podem receber votos.
A Corte Suprema era composta por onze juízes nomeados
pelo Presidente da República, com aprovação do Senado Federal, dentre
brasileiros natos de notável saber jurídico e reputação ilibada alistados eleitores,
não devendo ter, salvo os magistrados, menos de 35, nem mais de 65 anos de
idade.
Cumpre observar que a aposentadoria compulsória era aos
75 anos de idade.
Em caso da prática de crimes de responsabilidade, os
membros da Corte Suprema deveriam ser julgados pelo tribunal Especial
competente para julgar o Presidente da República.
Dentre sua competência estava processar e julgar
originariamente o Presidente da República nos crimes comuns, como já visto.
Ainda, cabia ao Presidente da República nomear os Juízes
Federais, depois de indicação da Suprema Corte na forma da lei e por escrutínio
secreto.
A Justiça Eleitoral era composta pelo Tribunal Superior de
Justiça Eleitoral, um Tribunal Regional na Capital de cada Estado, Território do
Acre e Distrito Federal, Juízes Singulares além de Juntas Especiais.
72 FERRAZ, Anna Cândida de Cunha – As Constituições Brasileiras, p.29
79
O Tribunal Superior era composto de um terço, sorteado
dentre os Ministros da Corte Suprema, outro terço, sorteado dentre os
Desembargadores do Distrito Federal e o terço restante pelo Presidente da
República, dentre seis cidadãos de notável saber jurídico e reputação ilibada,
indicados pela Corte Suprema.
Em suma, o Presidente da República nomeava os Ministros
da Suprema Corte e depois os membros da Justiça Eleitoral.
A Constituição só trata do Senado Federal quando vai cuidar
da coordenação do Poderes; isto é, depois de regular os três Poderes.
O art.88 expressa que imcumbe ao Senado Federal, que é
composto por dois representantes de cada Estado e do Distrito Federal eleitos por
sufrágio universal, promover a coordenação dos Poderes Federais entre si,
manter a continuidade administrativa, velar pela Constituição, colaborar na feitura
de leis e praticar demais atos de sua competência.
Em linhas gerais, cabia ao Senado Federal coordenar os
Poderes, mantendo a continuidade administrativa que é uma função executiva,
velar pela Constituição que é uma função jurisdicional em última instância e
quanto à função legislativa apenas colaborar.
Dentre suas atribuições está a de aprovar as nomeações de
magistrados e dos Ministros do Tribunal de Contas, bem como a organização
judiciária federal.
Cabia propor ao Poder Executivo, mediante reclamação
fundamentada a revogação de atos das autoridades administrativas, quando
praticados contra a lei ou eivados de abuso de poder.
O Tribunal de Contas é mantido, devendo diretamente, ou por
delegações organizadas de acordo com a lei, acompanhar a execução
orçamentária e julgar as contas dos responsáveis por dinheiros ou bens públicos.
Seus Ministros eram nomeados pelo Presidente da República
com aprovação do Senado Federal.
Funcionando como auxiliar do Poder Legislativo, deveria dar
parecer prévio sobre as contas apresentadas anualmente pelo Presidente da
República à Câmara dos Deputados.
80
3.4. Constituição de 10 de novembro de 1.937.
Agora o Presidente da República dos Estados Unidos do
Brasil, Getulio Vargas, com a justificativa de defender o País e a Nação da
infiltração comunista decreta uma nova Constituição. Sem legitimidade porque não
foi posta pelo Poder Constituinte Originário, mas sim pelo Chefe de um dos
Poderes e seus companheiros.
Dando atribuição legislativa ao Presidente da República, o art.
12 prevê a possibilidade dele expedir decretos-leis, desde que autorizado pelo
Parlamento.
No período de recesso parlamentar ou dissolução da Câmara
dos Deputados, diante de necessidade, livre estava para editar os decretos-leis
com exceção a algumas matérias, nos termos do art.13.
Nas matérias de organização do Governo, da Administração
Federal e o comando supremo e a organização das forças armadas o Presidente
da República não necessitava de autorização do Parlamento, devendo apenas
observar a Constituição e a dotação orçamentária.
Conforme a previsão, o Poder Legislativo é exercido pelo
Parlamento Nacional com a colaboração do Conselho da Economia Nacional e do
Presidente da República.
Demonstrando a vontade de agir no Parlamento, o Presidente
da República fez esta previsão, ou seja, atuar em outro Poder.
O Parlamento era composto de duas Câmaras: A Câmara dos
Deputados e o Conselho Federal.
Ordinariamente o Parlamento deveria funcionar por quatro
meses, e em caso de prorrogação ou convocação do Presidente da República
estava limitado a deliberar a matéria por ele indicada.
A Câmara era composta de representante do povo,
entretanto, por eleição indireta. Eram eleitos pelos vereadores às Câmaras
Municipais.
O Conselho Federal era composto de representantes dos
Estados e de dez membros nomeados pelo Presidente da República. Os
81
representantes dos Estados eram escolhidos pelas Assembléias Legislativas, com
possibilidade de veto pelo Governador do Estado (Poder Executivo), que poderia
ser derrubado por dois terços da totalidade dos membros.
Cabia ao Conselho Federal aprovar as nomeações de
Ministros do Supremo Tribunal Federal e do Tribunal de Contas.
A presidência do Conselho estava a cargo de um Ministro de
Estado nomeado pelo Presidente da República.
Quanto ao Executivo, é importante observar o caráter
individualista da Constituição porque não se trata do Poder Executivo, mas sim do
Presidente da República.
Tomando todo o Poder o art.73 expressa que O Presidente da
República, autoridade suprema do estado, coordena a atividade dos órgãos
representativos, de grau superior, dirige a política interna e externa, promove ou
orienta a política legislativa de interesse nacional, e superintende a administração
do País.
Como autoridade suprema cabia ao Presidente da República
coordenar as atividades dos órgãos representativos de grau superior, isto é, cabia
coordenar tudo.
Dentre suas prerrogativas estava dissolver a Câmara dos
Deputados, caso ele não aprovasse a medida de estado de emergência, o que
mostra o exercício ditatorial. Também de adiar e prorrogar o Parlamento,
cabendo-lhe então estabelecer o tempo de mandato.
No tocante a responsabilidade, o Presidente da República era
julgado pelo Conselho Federal, depois de declarada por dois terços de votos da
Câmara dos Deputados à procedência da acusação. Vale lembrar que o
Presidente da República nomeava dez membros para o Conselho e podia adiar ou
prorrogar o Parlamento.
Mais grave é que durante o exercício o Presidente da
República não podia ser responsabilizado por atos estranhos às suas funções.
A partir do art. 90 começa a Constituição a organizar o Poder
Judiciário estabelecendo seus órgãos: o Supremo Tribunal Federal, os Juízes e
Tribunais dos Estados, do Distrito Federal e territórios e os Juízes e Tribunais
Militares.
82
Diversamente da Constituição de 1.934, agora não há
previsão da Justiça Eleitoral como órgão do Poder Judiciário e há a inclusão dos
Tribunais Estaduais.
O art. 94 veda o conhecimento por parte do Poder Judiciário
de questões exclusivamente políticas.
Trata o art. 96 da declaração de inconstitucionalidade de lei
ou de ato do Presidente da República, mas o parágrafo único dá força ao
Presidente da República e ao Parlamente de ignorarem a decisão jurídica do
Poder competente para a decisão.
Dispõe o parágrafo que declarada a inconstitucionalidade de
uma lei que, a juízo do Presidente da República, seja necessária ao bem estar do
povo, à promoção ou a defesa de interesse nacional de alta monta, poderá o
Presidente da República submetê-la novamente ao exame do Parlamento, e se
este confirmar por dois terços dos votos de cada uma das Câmaras, ficará sem
efeito a decisão do Tribunal.
Em suma, uma decisão exclusivamente política afasta
decisão jurídica.
Dispôs a Constituição sobre a composição do Supremo
Tribunal Federal com onze Ministros nomeados pelo Presidente da República,
com aprovação do Conselho Federal, dentre brasileiros natos de notável saber
jurídico e reputação ilibada, não devendo ter menos de trinta e cinco, nem mais de
cinqüenta e oito anos de idade.
No caso de crimes de responsabilidade, os Ministros do
Supremo Tribunal Federal deveriam ser processados e julgados pelo Conselho
Federal que como visto era formado por representantes dos Estados e mais dez
pessoas nomeadas pelo Presidente de República.
A competência do Supremo Tribunal Federal está exposta no
art. 101 e não consta julgar o Presidente da República e nem membros do
Parlamento.
Prevê o art. 114 o Tribunal de Contas composto por membros
nomeados pelo Presidente da República, com aprovação do Conselho Federal,
com o fim de acompanhar, diretamente ou por delegações organizadas de acordo
com a lei, a execução orçamentária, julgar as contas dos responsáveis por
dinheiros ou bens públicos e da legalidade dos contratos celebrados pela União.
83
Nas disposições finais e transitórias, a Constituição
demonstrou a superioridade do Presidente da República com poderes
constitucionais escritos na Constituição, mas inconstitucionais perante a
Constituição filosófica porque com certeza, não refletiam a vontade da Nação em
concentrar poderes nas mãos de uma única pessoa.
Por primeiro foi renovado o mandato presidencial até
realização de plebiscito que não aconteceu.
Os Governadores poderiam ter seus mandatos confirmados
ou não pelo Presidente da República. Não confirmação importava em intervenção
no Estado.
Todo o Poder Legislativo da Federação foi dissolvido, ficando
o Presidente da República com o poder de expedir decretos-leis sobre todas as
matérias da competência legislativa da União.
Por fim declarou o estado de emergência que permitia a
suspensão de direitos fundamentais, nos termos do art. 166 e seguintes.
Com a despudorada prevalência do Poder Executivo, o
Legislativo e o Judiciário foram colocados em grau subalterno.
3.5. Constituição de 18 de setembro de 1.946.
Com a queda de Getulio Vargas, assumiu o Poder José
Linhares que editou lei providenciou a elaboração de nova Constituição.
A Lei Constitucional nº 13, de 12 de novembro de 1.945
expressou que os eleitos a 2 de dezembro de 1945 para a Câmara dos Deputados
e o Senado Federal reunir-se-ão no Distrito Federal, sessenta dias após as
eleições, em Assembléia Constituinte, para votar, com poderes ilimitados, a
Constituição do Brasil.
No Titulo I, Capítulo I, mas somente no art. 36 é que está
escrito que São Poderes da União o Legislativo, o Executivo e o Judiciário,
independentes e harmônicos entre si. Ainda, que o cidadão investido na função de
um deles não poderá exercer a do outro, salvo as exceções previstas na
Constituição, e também que é vedado à delegação de atribuições a qualquer dos
Poderes.
84
A previsão constitucional mostra que a separação dos
Poderes no tocante ao exercício não é absoluta, porque impede que quem
exercite a função de um dos Poderes exerça a do outro, no entanto ressalva
disposições constitucionais em contrário.
O Poder Legislativo é exercido pelo Congresso Nacional, que
se compõe da Câmara dos Deputados e do Senado Federal.
O art.45 dá proteção aos membros do Poder Legislativo
porque só admite a prisão dos mesmos em flagrante de crimes inafiançáveis e só
podem ser processados criminalmente após a prévia licença de sua Câmara.
Ainda, havendo a prisão, cabia a respectiva Câmara decidir
por mantê-la ou não.
Dentre as atribuições estava julgar as contas do Presidente
da República.
Como já constava de Constituições anteriores, a Câmara dos
Deputados era composta de representantes do povo e o Senado Federal de
representes dos Estados e Distrito Federal.
Cabia privativamente a Câmara dos Deputados decidir sobre
a procedência ou improcedência da acusação contra o Presidente da República
tanto em crimes comuns como de responsabilidade. Também a iniciativa de
tomada de contas do Presidente da República quando não fossem prestadas no
prazo de sessenta dias a contar da abertura da sessão legislativa.
No tocante ao Senado Federal o Vice-Presidente da
Republica exercia a presidência, com voto de qualidade.
Competia privativamente julgar o Presidente da Republica nos
crimes de responsabilidade, bem como os Ministros do Supremo Tribunal Federal.
Também competia privativamente aprovar a escolha de
magistrados nos casos estabelecidos na Constituição.
Exercido pelo Presidente da República, o Poder Executivo
tinha, entre outras, atribuições prestar anualmente ao Congresso Nacional contas
relativas ao exercício anterior.
Quanto à responsabilidade do Presidente da República era
julgado pelo Senado Federal nos crimes de responsabilidade e pelo Supremo
Tribunal Federal quanto aos crimes comuns, diante de prévia aprovação da
Câmara dos Deputados quanto à procedência da acusação.
85
Com a renúncia do Presidente da República, Jânio Quadros,
conta à história que uma das condições para que o Vice-Presidente da República
assumisse fosse a aceitação da instituição do sistema parlamentar de Governo.
Através da Emenda Constitucional nº 4, de 02 de setembro de
1.961 a Mesa da Câmara dos Deputados e Mesa do Senado instituíram o
Parlamentarismo no Brasil.
Por este sistema, o Presidente da República perdeu muito de
seus poderes.
Após estabelecer que o Poder Executivo é exercido pelo
Presidente da República e pelo Conselho de Ministros, cabendo a este a direção e
a responsabilidade da política do Governo, assim como da Administração Federal,
cuida a emenda de fixar as competências.
O art. 1º já deixa claro que ao Conselho cabe a direção e a
responsabilidade da política do governo além, da administração federal.
Percebe-se pela disposição do art. 3º que os atos do
Presidente estavam, na maioria, atrelados ao Congresso Nacional e ao Presidente
do Conselho de Ministros.
Competia ao Presidente da República nomear o Presidente
do Conselho de Ministros e por indicação deste os demais Ministros de Estado.
Celebrar tratados e convenções internacionais ad referendum
do Congresso Nacional; declarar a guerra depois de autorizado pelo Congresso
Nacional bem como fazer a paz; permitir, só depois de autorizado pelo Congresso
Nacional, que forças estrangeiras transitem ou permaneçam no território nacional;
exercer através do Presidente do Conselho de Ministros o comando das forças
aramadas.
Até para nomear ou exonerar o Prefeito do Distrito Federal e
membros do Conselho de Economia, o Presidente da República precisava de
aprovação, neste caso do Senado Federal.
Todos os atos do Presidente da República para sua validade
dependiam do referendo do Presidente do Conselho de Ministros e do Ministro da
respectiva área.
Interessante que o Presidente do Conselho e os Ministros
podiam participar das discussões em qualquer das Casas do Congresso, não
havendo esta previsão ao Presidente da República.
86
O artigo 18 expressa que ainda compete ao Presidente do
Conselho: ter a iniciativa de leis do governo; manter relações com Estados
estrangeiros e orientar a política externa; exercer o poder regulamentar; decretar o
estado de sítio e intervenção federal; enviar a Câmara dos Deputados e proposta
de orçamento e prestar anualmente ao Congresso Nacional as contas relativas ao
exercício anterior.
Por fim, a emenda extinguiu o cargo de Vice-Presidente da
República.
Enfim, com a instituição do sistema parlamentar, os poderes
do Presidente da República se retraíram e ele passou a ter aprovação do Poder
Legislativo ou do Presidente do Conselho para muitos de seus atos, perdendo a
função da administração federal.
Os órgãos do Poder Judiciário são ampliados para constar:
Supremo Tribunal Federal, Tribunal Federal de Recursos, Juízes e Tribunais
Militares, Juízes e Tribunais Eleitorais e Juízes e Tribunais do Trabalho.
Mesmo em disponibilidade, aos Juízes ficou vedado exercer
outra função pública, salvo de magistério secundário e superior.Proibido também
exercer a atividade político-partidária.
Prevê o art. 98 a composição por onze Ministros, estes
nomeados pelo Presidente da República, depois de aprovada a escolha pelo
Senado Federal, dentre brasileiros maiores de trinta e cinco anos, de notável
saber jurídico e reputação ilibada.
Em caso de crimes de responsabilidade deveriam ser
processados e julgados pelo Senado Federal.
Dentre a competência estava previsto processar e julgar o
Presidente da República nos crimes comuns.
Composto por nove juízes nomeados pelo Presidente da
República, depois da aprovação pelo Senado Federal, houve a previsão do
Tribunal Federal de Recurso. Dois terços deviam ser escolhidos entre magistrados
e um terço entre advogados e membros do Ministério Público, maiores de trinta e
cinco anos, de notável saber jurídico e reputação ilibada.
Quanto aos juízes e Tribunais Eleitorais, a composição se
dava por escrutínio secreto de dois juízes escolhidos pelo Supremo Tribunal
Federal, dente seus Ministros; dois juízes escolhidos pelo Tribunal Federal de
87
Recurso, dentre seus juízes e um juiz escolhido pelo Tribunal de Justiça do
Distrito Federal dentre seus desembargadores.
Havia a participação do Presidente da República que
nomeava dois, dentre seis cidadãos de notável saber jurídico e reputação ilibada,
indicados pelo Supremo Tribunal Federal.
Nos Tribunais Regionais Eleitorais além dos membros
escolhidos entre Desembargadores e Juízes de Direito o Presidente da república
nomeava dois dentre seis cidadãos, indicados pelo Tribunal de Justiça do
respectivo Estado.
Pretendeu-se, com esta Constituição, restaurar o sistema
democrático de 1891 e 1934; entretanto, após o Golpe Militar de 1964, ela foi
muitas vezes ignorada a e Nação passou a ser governada pelos chamados Atos
Institucionais, forma que o Poder Executivo encontrou de governar à margem da
vontade constitucional.
3.6.Constituição de 24 de janeiro de 1.967.
Através do Ato Institucional nº 4, de 7 de dezembro de 1966 o
Presidente da República oriundo do regime militar implantado pela Revolução de
31 de março de 1964, convocou o Congresso Nacional para se reunir
extraordinariamente de 12 de dezembro de 1966 a 24 de janeiro de 1967 com o
fim de discutir, votar e promulgar o projeto de Constituição por ele apresentado,
fixando o dia 24 de janeiro para promulgação.
Posteriormente, em 17 de outubro de 1969, é promulgada
pelos Ministros Militares, que dias antes declararam vago os cargos de Presidente
e Vice-Presidente da República, em razão de enfermidade do primeiro, a Emenda
Constitucional nº 1 que apresenta redação integral para a Constituição de 1.967.
Seguindo a tradição, prescreve que são Poderes da União,
independentes e harmônicos, o Legislativo, o Executivo e o Judiciário.
Salvo previsão constitucional é vedado a qualquer dos
Poderes delegar atribuições, e quem for investido na função de um deles não
poderá exercer a do outro.
88
O Poder Legislativo, exercido pelo Congresso Nacional, se
compõe da Câmara dos Deputados e do Senado Federal.
À Câmara dos Deputados compete privativamente declarar,
por dois terços dos seus membros, a procedência de acusação contra o
Presidente da República e proceder à tomada de contas quando o Presidente da
República não apresentar ao Congresso Nacional dentro de sessenta dias após a
abertura da sessão legislativa.
Ao Senado compete privativamente julgar o Presidente da
República e os Ministros do Supremo Tribunal Federal nos crimes de
responsabilidade.
Aprovar, previamente, por voto secreto, a escolha de
magistrados, nos casos determinados pela Constituição, bem como de membros
do Tribunal de Contas.
Tratando de espécies normativas, a Constituição previu as
leis delegadas e os decretos-leis.
Estas duas espécies normativas previstas no art.46 estão
compreendidas no processo legislativo, mas são elaboradas pelo Presidente da
República, o que importa concluir o Executivo exercendo a função do Legislativo.
Por meio de resolução do Congresso Nacional ao Presidente
da República, está previsto receber a delegação de elaborar leis; com exceção de
algumas matérias que são vedadas a delegação.
No caso dos decretos-leis, com fundamento em urgência ou
interesse público relevante e desde que não haja aumento de despesa, poderia o
Presidente da República expedi-los, mas somente em se tratando de segurança
nacional, finanças públicas, inclusive normas tributárias e criação de cargos
públicos e fixação de vencimentos, como dispõe o art.55.
Sobre este poder extraordinário de legislar, MANOEL
GONÇALVES FERREIRA FILHO comentando a Constituição de 1967 expressa
que: “O decreto-lei é um típico ato normativo primário e geral. Edita-o o Presidente
da República no exercício de uma competência que lhe vem, sem qualquer
intermediário, da Constituição. Manifesta assim a existência de um poder
89
normativo primário, próprio do Presidente da República e independente de
qualquer delegação.”73
Exercido pelo Presidente da República, com auxilio dos
Ministros de Estado encontra-se o Poder Executivo. Dentre as atribuições está a
de prestar contas anualmente ao Congresso Nacional.
Pelos crimes comuns, estava sujeito a processo perante o
Supremo Tribunal Federal e pelos crimes de responsabilidade perante o Senado
Federal.
Seguindo as Constituições anteriores, o art.112 dispõe quais
órgãos do Poder Judiciário. Aqueles que exercem a jurisdição: Supremo Tribunal
Federal; Tribunais Federais de Recursos e Juízes Federais; Tribunais e Juízes
Militares; Tribunais e Juízes Eleitorais; Tribunais e Juízes do Trabalho e Tribunais
e Juízes Estaduais.
Posteriormente a Emenda Constitucional nº 7 incluiu como
órgão o Conselho Nacional da Magistratura, composto por membros do Supremo
Tribunal Federal.
Repete as vedações anteriores quanto ao exercício de outra
função pública, salvo uma de magistério e a atividade política-partidária.
O Supremo Tribunal Federal se apresenta composto por onze
Ministros nomeados pelo Presidente da República, depois de aprovada a escolha
pelo Senado Federal, dentre cidadãos maiores de trinta e cinco anos de idade, de
notável saber jurídico e reputação ilibada.
Ao Supremo Tribunal na Constituição de 1967 compete
processar e julgar originariamente, nos crimes comuns, o Presidente da
República, o Vice-Presidente da República, os Deputados e Senadores.
Nos crimes comuns e de responsabilidade, os membros dos
Tribunais Superiores da União e dos Tribunais de Justiça dos estados, dos
Territórios e do Distrito Federal, além dos Ministros do Tribunal de Contas.
Compõe-se o Tribunal Federal de Recursos de treze Ministros
vitalícios nomeados pelo Presidente da República, depois de aprovada a escolha
pelo Senado Federal, sendo oito entre magistrados e cinco entre advogados e
membros do Ministério Público.
73 FERREIRA Filho - Manoel Gonçalves - Comentários à Constituição Brasileira, p.264.
90
A Emenda Constitucional nº 7 alterou o número de Ministros
para vinte e sete, nomeados pelo Presidente da república, sendo quinze dentre
Juízes Federais indicados em lista tríplice pelo próprio Tribunal, quatro dentre
membros do Ministério Público Federal, quatro dentre advogados e quatro dentre
magistrados ou membros do Ministério Público dos Estados e do Distrito Federal.
Os juízes federais são nomeados pelo Presidente da
República dentre os Juízes Federais Substitutos, alternadamente por antiguidade
e por escolha em lista tríplice de merecimento, organizada pelo Tribunal Federal
de Recursos.
Com a mencionada emenda, o art. 123 fez constar à
nomeação desses juízes pelo Presidente da República, escolhidos, sempre que
possível, em lista tríplice, organizada pelo Tribunal Federal de Recursos.
O Superior Tribunal Militar era composto por quinze Ministros
vitalícios, nomeados pelo Presidente da República, depois de aprovada a escolha
pelo Senado Federal, sendo três entre oficiais-generais da ativa da Marinha,
quatro entre oficiais-generais da ativa do Exército, três entre oficiais-generais da
ativa da Aeronáutica e cinco entre civis.
Os civis eram escolhidos pelo Presidente da República dentre
cidadãos maiores de trinta e cinco anos, sendo três de notório saber jurídico e
idoneidade moral, com prática forense de mais de dez anos e dois auditores e
membros do Ministério Público da Justiça Militar de comprovado saber jurídico.
O Tribunal Superior Eleitoral era composto mediante eleição,
pelo voto secreto, de três Juízes, entre Ministros do Supremo Tribunal Federal, de
dois Juízes entre os membros do Tribunal Federal de Recursos da Capital da
União. A emenda retirou “da capital da União”.
Completava a composição a nomeação pelo Presidente da
República de dois entre seis advogados de notável saber jurídico e idoneidade
moral, indicados pelo Supremo Tribunal Federal.
Seguindo a mesma linha de conduta a composição dos
Tribunais Regionais Eleitorais apresentava membros do Poder Judiciário
completada por nomeação de dois Juízes pelo Presidente da República, diante de
lista sextupla indicada pelo tribunal de Justiça.
O Tribunal Superior do Trabalho era composto por dezessete
Ministros, sendo onze togados e vitalícios nomeados pelo Presidente da república,
91
depois de aprovada a escolha pelo Senado Federal. Sete entre magistrados da
Justiça do Trabalho, dois entre advogados no efetivo exercício da profissão e dois
entre membros do Ministério Público da Justiça do Trabalho.
Seis classistas e temporários em representação paritária dos
empregadores e dos trabalhadores, nomeados pelo Presidente da República.
3.7. Constituição de 05 de outubro de 1.988.
Em 27 de novembro de 1.985 foi promulgada a Emenda
Constitucional nº 26 da Constituição Federal de 1.967, que em seu artigo 1º
declarou: Os Membros da Câmara dos Deputados e do Senado Federal reunir-se-
ão, unicameralmente, em Assembléia Nacional Constituinte, livre e soberana, no
dia 1º de fevereiro de 1987, na sede do Congresso Nacional.
Assim, efetuada a passagem pelas Constituições do Brasil,
chegamos a que está em vigor, que não obstante ser classificada como rígida
apresenta seis emendas constitucionais de revisão nos termos do art.3º do Ato
das Disposições Constitucionais Transitórias e mais de quatro dezenas de
emendas, e ainda tramitando várias propostas.
Com efeito, a Constituição que foi promulgada em 1988 já não
existe e diante da facilidade como é reformada, já se antevê que em breve será
necessária a convocação de outra Assembléia Nacional Constituinte.
Dispõe o art. 2º que São Poderes da União, independentes e
harmônicos entre si, o Legislativo, o Executivo e o Judiciário.
Teoricamente, portanto, a Constituição adota a teoria da
tripartição dos Poderes como criada por Montesquieu.
Independência e harmonia não significam distanciamento
radical de um Poder em relação ao outro, mas sim que cada um exerça a sua
função de maneira independente e que ao mesmo tempo os três Poderes estejam
harmônicos na procura de alcance do bem comum, conforme a vontade e
objetivos da Nação.
Por uma questão de sistematização a composição e maneira
de composição dos Poderes do Estado na Constituição de 1988 foram tratadas no
92
Capitulo anterior quando foi vista a teoria da separação dos poderes, com o fim de
constatar a situação do Estado Brasileiro; deste modo, agora, só resta verificar no
texto constitucional as atribuições de cada Poder.
O Poder Legislativo é exercido pelo Congresso Nacional, que
se compõe da Câmara dos Deputados e do Senado Federal, como consta da
redação do art. 44.
As atribuições do Congresso Nacional, portanto, do Poder
Legislativo estão enumeradas no art. 48 e 49.
No primeiro enumera as atribuições legislativas porque no
caput expressa a necessidade de sanção do Presidente da República, para dispor
de matérias de interesse da União.
Já no art.49 há previsão de atribuições que demonstram um
controle sobre atos do Poder Executivo, tais como sustar atos normativos que
exorbitem o poder regulamentar ou dos limites de delegação legislativa; julgar
anualmente as contas prestadas pelo Presidente da República e apreciar os
relatórios sobre a execução de planos do governo; fiscalizar e controlar
diretamente, ou por qualquer de suas Casas, os atos do Poder Executivo,
incluídos os da administração indireta.
No art.50, há outra forma de controle de atos do Poder
Executivo porque permite a qualquer das Casas ou qualquer de suas comissões
convocarem Ministro de Estado ou quaisquer titulares de órgãos subordinados
diretamente à Presidência da República para prestarem, pessoalmente,
informações sobre assunto previamente determinado, importando em crime de
responsabilidade a ausência sem justificativa adequada; além da faculdade de
requisitarem informações por escrito.
A atribuição legislativa, função típica do Poder Legislativo,
através do Congresso Nacional está tratada a partir do art. 59, que adiante será
visto no tocante a interferência do Poder Executivo que toma para si a função de
legislar.
Em um só artigo está a atribuição da Câmara dos Deputados
que agora toma para si, o que é complementado pelo Senado Federal, parte de
função que seria do Poder Judiciário por tratar de ato de julgar.
93
Compete privativamente a Câmara dos Deputados autorizar,
por dois terços de seus membros, a instauração de processo contra o Presidente
da República e o Vice Presidente da República e os Ministros de Estado.
Cabe observar que a competência privativa não especifica a
espécie de crime, por isto o processo por crime comum ou de responsabilidade
contra o Presidente da República, o Vice-Presidente da República e contra o
Ministro de Estado depende, primeiro, de autorização da Câmara dos Deputados.
Realizam os Deputados Federais um juízo de admissibilidade
com o fim de constatarem se há elementos que indicam justa causa para
instauração de um processo e que tenha, por conseguinte, possibilidade de
tramitação até seu termo final.
Este juízo de admissibilidade é ato judicial através de uma
decisão em que o Juiz profere recebendo ou não determinada ação. Neste juízo
se analisa os indícios existentes com o fim de aferir se há justa causa para
propositura da ação e se há elementos que possibilitem a tramitação processual
até o fim.
Na atribuição em comento o juízo de admissibilidade como
função da Câmara dos Deputados se mostra como um juízo político e jamais
técnico-jurídico.
Da previsão do art. 52, se percebe que o Senado Federal tem
competência constitucional para exercer efetivamente a função de julgar, entrando
assim na esfera do Poder Judicial.
Compete privativamente ao Senado Federal processar e
julgar o Presidente e o Vice-Presidente da República nos crimes de
responsabilidade, bem como os Ministros de Estado e os Comandantes da
Marinha, do Exército e da Aeronáutica nos crimes da mesma natureza conexos
com os praticados pelo Presidente e o Vice-Presidente da República.
Aqui a Constituição deu competência para julgar aqueles que
exercem o Poder Executivo, seus auxiliares diretos e até militares, não se
contentando o Constituinte em somente julgar quem exerce Poder.
O inciso II do mesmo artigo 52, expressa que compete
privativamente ao Senado Federal processar e julgar os Ministros do Supremo
Tribunal Federal, o Procurador Geral da República e o Advogado Geral da União
nos crimes de responsabilidade.
94
Da mesma maneira, a competência para julgar extrapola
quem exerce Poder para atingir o Procurador Geral da República e o Advogado
Geral da União.
Depois de dispor sobre outras competências, que seriam até
discutíveis, mas não nesta oportunidade, o parágrafo único determina que nos
julgamentos funciona como Presidente o do Supremo Tribunal Federal, limitando-
se a condenação, que somente será proferida por dois terços dos votos do
Senado Federal, à perda do cargo, com inabilitação, por oito anos, para o
exercício de função pública, sem prejuízo das demais sanções judiciais cabíveis.
O Senado Federal tem para si a função de julgar
determinadas pessoas ocupantes de cargos de Poder e outros, em crimes de
responsabilidade, no entanto, a Presidência dos trabalhos de julgamento é de
competência exclusiva do Presidente do Supremo Tribunal Federal, que não tem o
direito a voto, mas tão somente de conduzir os trabalhos decidindo as questões
divergentes.
Percebe-se então, o Poder Legislativo controlando atos do
Poder Executivo e exercendo atos do Poder Judiciário.
No sistema presidencialista, o Poder Executivo é exercido por
uma só pessoa, que como vimos exerce a função de Chefe de Governo e Chefe
de Estado. Talvez por isto a Constituição em seu art.84 tenha previsto as
atribuições do Presidente da República em detrimento de as atribuições do Poder
Executivo.
A atribuição não está prevista para o Poder Executivo, mas
sim para a pessoa que exerce o Poder Executivo. Comparando-se aos Poderes
Legislativo e Judiciário observa-se que para estes as atribuições são para os
Poderes e não para os exercentes dos cargos.
O texto mostra uma certa superioridade do Presidente da
República sobre os Legisladores e os Julgadores.
Da leitura se observa à função administrativa, mas também se
observa atribuição de influência dos demais Poderes.
É atribuição do Presidente da República, além da participação
no processo legislativo, nomear os Ministros do Tribunal de Contas que por força
do art.71 trata-se um órgão técnico auxiliar do Congresso Nacional, ou seja, do
Poder Legislativo.
95
Lato senso é função do Tribunal de Contas apreciar
tecnicamente as contas do Poder Executivo a fim de que o Congresso Nacional
exercite o controle externo fiscal, contábil e orçamentário, no entanto, quem
nomeia seus integrantes é o Presidente da República.
Mais à frente voltaremos ao assunto.
Também, é atribuição do Presidente da República nomear,
após aprovação do Senado Federal, os Ministros do Supremo Tribunal Federal e
dos Tribunais Superiores.
Nesta disposição, o Presidente da República interfere no
Poder Judiciário. A história também tem mostrado que nomeação se transformou
em presente a amigos, que com compromissos políticos-partidários são galgados
ao Poder de Julgar.
No art.85 e seguintes cuidou a Constituição impor ao
Presidente da República certas regras para seu julgamento.
Nos crimes de responsabilidade, aqueles praticados em razão
do exercício da função, após a admissão da acusação por dois terços da Câmara
dos Deputados, ele será submetido a julgamento perante o Senado Federal.
Em caso da prática de infrações penais comuns, após a
admissão pela Câmara dos Deputados, ele será submetido a julgamento pelo
Supremo Tribunal Federal.
De qualquer forma, o Presidente da República para ser
julgado, precisa que os representantes do povo, reunidos na Câmara dos
Deputados, por dois terços admitam a acusação.
A função do Poder Judiciário, como se sabe, é a jurisdicional;
isto é dizer o direito aos casos concretos postos em julgamento.
Os diversos órgãos do Poder Judiciário exercem a mesma
função, com exceção do Conselho Nacional de Justiça, mas conforme a
competência de cada um fixado pela própria Constituição Federal.
O art. 102 da Constituição Federal expressa qual a
competência do órgão superior do Poder Judiciário, afirmando a competência
precípua de guardar a Constituição.
Assim, de acordo com a redação o Supremo Tribunal Federal
deve funcionar também como Corte Constitucional, isto é, a ele cabe apreciar e
julgar as questões suscitadas sobre constitucionalidade, e fazer sempre valer a
96
supremacia da Constituição e jamais decidir em contrário às suas disposições,
seja qual for o argumento.
O inciso I expressa que lhe compete processar e julgar a ação
direta de inconstitucionalidade de lei ou ato normativo federal ou estadual e a ação
declaratória de constitucionalidade de lei ou ato normativo federal.
Em seguida mostra outras matérias de sua competência,
incluindo o julgamento do Presidente, Vice-Presidente da República, membros do
Congresso Nacional, seus próprios Ministros e o Procurador Geral da República
nos crimes comuns.
Na esfera recursal é competente para julgar mediante recurso
extraordinário, as causas decididas em única ou última instância, quando a
decisão recorrida contrariar dispositivo da Constituição; declarar a
inconstitucionalidade de tratado ou lei federal e julgar válida lei ou ato de governo
local contestado em face da Constituição.
Compete ao Superior Tribunal de Justiça processar e julgar
originariamente nos crimes comuns, os Governadores dos Estados e do Distrito
Federal. Nos crimes comuns e de responsabilidade, os desembargadores dos
Tribunais de Justiça dos Estados e do Distrito Federal, os membros dos Tribunais
de Contas dos Estados e do Distrito Federal, os dos Tribunais Regionais federais,
dos Tribunais Regionais Eleitorais e do Trabalho, os membros dos Conselhos ou
Tribunais de Contas dos Municípios e os do Ministério Público da União que
oficiem perante os Tribunais.
Segue a Constituição com outras matérias de competência.
Aos Tribunais Regionais Federais e Juízes Federais cabe
destacar apenas a competência para processar e julgar originariamente os juízes
federais da área de sua jurisdição, incluídos os da Justiça Militar e da Justiça do
Trabalho, nos crimes comuns e de responsabilidade, e os membros do Ministério
Público da União, ressalvada a competência da Justiça Eleitoral.
Aos juízes federais destaca-se a competência para processar
e julgar as causas em que a União, entidade autárquica ou empresa pública
federal forem interessadas na condição de autoras, rés, assistentes ou oponentes,
exceto as de falência, as de acidentes de trabalho e as sujeitas à Justiça Eleitoral
e à Justiça do Trabalho.
97
Compete à Justiça do Trabalho conciliar e julgar os dissídios
individuais e coletivos entre trabalhadores e empregadores, abrangidos os entes
de direito público externo e da administração pública direta e indireta dos
Municípios, do Distrito Federal, dos Estados e da União, e, na forma de lei, outras
controvérsias decorrentes da relação de trabalho, bem como os litígios que
tenham origem no cumprimento de suas próprias sentenças.
Quanto a Justiça Eleitoral dispõe o art. 121 que lei
complementar disporá sobre a organização e competência dos tribunais, dos
juízos de direito e das juntas eleitorais.
O que cabe a lei é organizar a competência eleitoral
distribuindo entre os órgãos previstos na Constituição.
A Justiça Militar compete processar e julgar os crimes
militares definidos em lei, conforme disposição da lei.
Cumpre observar que o Poder Executivo é centralizado na
pessoa do Presidente da República que, sem dúvida alguma, fortalece à pessoa
física que exerce o Poder porque suas ações praticamente independem do
concurso de vontades ou de alguma revisão interna do próprio Poder Executivo.
Diferentemente o Poder Legislativo é bicameral o que exige para o exercício da
função estatal o acordo de vontade a fim de que o ato legislativo emanado tenha
força como ato de Poder. Agora, de maneira bem mais diversa se posiciona o
Poder Judiciário que é formado por diversos órgãos, sendo que cada um tem sua
função delimitada pela Constituição e pelas leis, e ainda há a possibilidade que o
ato judicial seja revisto internamente,isto é, no próprio Poder por algum órgão
superior em questões jurisdicionais
Os três Poderes apresentam suas perceptíveis diversidades,
mas todos eles devem estar voltado ao cumprimento dos objetivos fundamentais
previstos pela Constituição Federal em sua parte inicial.
98
CAPÍTULO IV
DO PODER EXECUTIVO-
PARLAMENTARISMO/PRESIDENCIALISMO
Está evidente que o Poder Executivo na pessoa do Presidente
da República é o que se apresenta com forte supremacia em relação aos demais.
Constata-se também que a própria figura do Presidente da República parece
posicionar-se em plano superior ao próprio Poder Executivo.
É inadmissível que a pessoa do Presidente da República,no
sistema organizacional do Estado,tenha posicionamento superior ao próprio Poder
que ele representa. Os Poderes aí estão a mostrar a vontade da Nação e que os
direitos de todos sejam respeitados, o que de fato só é possível se houver a
verdadeira tripartição no exercício das funções estatais.
Entretanto, não é só o Presidencialismo que se apresenta
como uma forma de governo. Dos ensinamentos de MARIA GARCIA tem-se
“Presidencialismo e parlamentarismo são formas de organização e
desenvolvimento de governo, ficando desde logo ressalvado que as duas formas
se compatibilizam com a ordem federativa de Estado: tanto no regime
presidencialista, quanto no parlamentarista as esferas de competência da
União,dos Estados e dos Municípios(no caso brasileiro) são delimitadas na
Constituição,bem como fica nesta definida a natureza das relações entre o
governo central e os governos locais.”74
Exige-se, então, estudo sobre os dois sistemas:
Parlamentarismo e Presidencialismo a fim de constatar suas particularidades.
74 GARCIA,Maria – Presidencialismo e Parlamentarismo in Parlamentarismo ou Presidencialismo?, p.118.
99
Evidente que os dois sistemas de governo apresentam suas
vantagens e suas desvantagens, mas o que não pode ser esquecido é que cada
Poder tem sua função definida pela teoria da tripartição, por isso só se admite a
ingerência de um no outro, como forma de controle, no mínimo possível. No
momento em que um Poder passar a exercer a função do outro, o que se tem é a
usurpação de Poder e por conseqüência coloca os Poderes em um
escalonamento em que um fica em grau superior ao outro.
A usurpação afeta o equilíbrio desejado no exercício das
funções estatais. Deste modo, seja sistema Presidencialista ou seja sistema
Parlamentarista, o que se deve preservar é a independência de cada Poder
conforme a vontade da Nação.
4.1. Parlamentarismo.
Dos ensinamentos de NORBERTO BOBBIO podemos
aproveitar que as instituições parlamentares surgiram da estrutura policêntrica do
Estado medieval. A descentralização da autoridade, resultado da organização
feudal, fez surgir a necessidade da ação de um elemento unificador.
Inicialmente esta função pacificadora foi desempenhada pelo
próprio entourage do soberano, isto é, aquela assembléia bastante restrita de
feudatários leigos e eclesiásticos, que receberam o nome de cúria outras
consilium Regis até chegar a Parlamentum.
O século XIX se apresenta como o grande período do
desenvolvimento dos novos parlamentos. Na Inglaterra, na França, na Bélgica, na
Holanda e na Itália, o Parlamento constitui-se o centro do debate político,
estendendo progressivamente a sua influência ao Governo que até então era
expressão de poder Real.
Prossegue o pensador italiano expressando que a monarquia
constitucional cede lugar ao regime parlamentarista, que tem como fulcro a
responsabilidade do governo perante o Parlamento.
100
Dentre suas funções, o Parlamento tem a representativa,
devendo funcionar como um órgão, entre o povo e os órgãos do Governo, por isso
a escolha de seus membros deve ser pelo método eletivo a fim de se tentar
impedir que os integrantes por um motivo ou outro fiquem dependentes do
Governo.
Formado por pessoas de origens e classes heterogêneas, o
Parlamento deve conseguir criar uma unicidade de objetivos para possibilitar
representar o povo nas suas aspirações.
Inserido na teoria da separação dos poderes ao Parlamento
está atribuído à função legislativa, no sentido de legislar normas gerais. Ao
Governo está atribuído à função executiva, ou seja, atender aos casos conforme
estabelecido pela legislação.
Esta separação de atribuições não apresenta a nitidez que
deveria. O Governo legisla na sua atividade de administrar e também quando
mantém um bloco ou base de apoio com maioria junto ao Parlamento, a normas
gerais acabam por serem elaboradas conforme sua vontade.
Além da função legislativa, como primordial ao Parlamento, o
controle que exerce sobre o Governo e seus órgãos é uma característica bem
definidora.
Exercendo a função de controle, o Parlamento pode declarar
a queda de confiança no Governo, o que vai exigir a substituição da cúpula
administrativa.
Mas, a forma mais comum e menos drástica está em tornar
notória e apontar à opinião pública, por meio de solicitação de explicações,
interpelações e inquéritos, a atuação do Executivo.
Diante desta visão ampla sobre o Parlamento e Sistema
Parlamentarismo é forçoso concluir que não basta a mera instituição do sistema,
devendo sim ser dotado de instrumentos jurídicos e políticos que permitam
realizar efetivamente a função parlamentar.
Para que tenha um papel significativo no Estado o Parlamento
deve ser o local onde se travam as grandes discussões e decisões nacionais. Os
temas nacionais não devem ser negociados entre Governo e sindicatos, entidades
corporativas, grandes empresas, mas sim na sede do Parlamento local em que
devem estar reunidos os representantes da Nação.
101
A importância de um Parlamento forte está bem delineada
quando se afirma que é na sede do Parlamento que se devem discutir os grandes
problemas nacionais, bem como tomar as decisões que se exigem.Aqueles que
exercem as funções no Parlamento devem e podem fortalecer este órgão na
medida em que impeçam pressão do Governo – Poder Executivo -, bem como dos
diversos segmentos da sociedade e principalmente das entidades financeiras.
Evidente que o Parlamento não deve se portar como um
órgão ilhado, ao contrário, deve sim ouvir as forças vivas da Nação; mas apreciar,
discutir e decidir com independência e com fundamento na Constituição e nas leis
vigentes.
O Parlamento deve mostrar a vontade da Nação por suas
pessoas e seus Estados. Com o fim de administrar o Estado e haver uma relação
com a função legislativa surgiu o Parlamentarismo.
O sistema parlamentarista foi elaborado através dos tempos,
sendo, então um resultado histórico que apresenta hoje variações que dependem
do Estado em que está implantado; entretanto há um denominador comum capaz
de abranger as características gerais.
Enuncia ARTHUR MACHADO PAUPÉRIO que “baseia-se o
parlamentarismo, fundamentalmente, sobre a igualdade de prestigio dos dois
poderes do Estado, o Executivo e o Legislativo. Governo e Parlamento, em
colaboração íntima, dentro das atividades do Estado, passam a exercer, um sobre
o outro limitações recíprocas.”75
Estas limitações fundamentais ao sistema são obtidas através
de ação do Conselho de Ministros, que é órgão do Governo, mas em ação direta
com o Parlamento.
O Parlamento e o Governo devem estar presentes em todas
as funções estatais, em graus diversos, derivados da estrutura da cada um, que
passam, então, a influir diversamente nas funções do Estado.
Do enunciado pode-se afirmar que o parlamentarismo exige
um funcionamento correto das instituições. Exige que os dois Poderes, Executivo
e Legislativo, em colaboração, façam o cumprimento da Constituição, ou seja,
façam prevalecer o senso de legalidade.
75 PAUPÉRIO, Arthur Machado – Teoria Democrática do Poder, p.208.
102
Deve haver então uma coincidência de vontades.
“Os poderes políticos, ou seja, o Executivo e o Legislativo,
ainda que de forma diferente, trabalham com a mesma matéria prima, participam
das funções de Estado que tratam dos mesmos problemas, embora sob ângulos
aparentemente contraditórios, mas de qualquer forma, diferenciáveis.”.Este é o
pensamento de PAULO BROSSARD.76 Mostra que os poderes devem atuar
juntos, logo, devem ter igualdade de prestígio. O Parlamentarismo Executivo e
Legislativo ocupam o mesmo patamar constitucional. Um controla o outro, mas um
não se sobrepõe ao outro.
Se trabalham ou atuam com a mesma matéria e há
necessidade de um consenso ao final, é certo concluir que a competência se dilui
o que, por conseqüência, faz gerar o equilíbrio entre os Poderes.
Mostrando as diferenças sobre o velho tema MANOEL
GONÇALVES FERREIRA FILHO ensina que “o parlamentarismo é caracterizado
como um sistema de colaboração de poderes. Há, distintos, Legislativo, Executivo
e Judiciário, mas apenas este último é independente em relação aos demais.
Legislativo e Executivo estão intimamente relacionados. O Executivo, em tudo o
que tange a seus poderes, é o gabinete que é criado pela maioria parlamentar e
vive enquanto goza de sua confiança. O Legislativo, em contrapartida, se pode
destituir o gabinete, pode ser dissolvido a pedido deste, para que o eleitorado,
pelo voto, resolva eventual conflito entre os poderes.” 77 Por esta afirmação, a
relação entre o Executivo e o Legislativo é extremamente sólida, como que se
formasse um bloco com funções distintas mas simultaneamente havendo um
embaralhamento.
Como não há nitidez na separação das funções, é certo que o
Parlamento tem funções legislativas, mas também tem executiva, quando, por
exemplo, decide sobre orçamento ou matéria não legislativa. Por sua vez, o
Executivo também acaba por ter alguma atuação legislativa, quando propõe
projeto de lei e participa na sua elaboração lato senso com a sanção e
promulgação.
76 BROSSARD, Paulo – Presidencialismo ou Parlamentarismo in Cadernos APAMAGIS 6, p.92. 77 FERREIRA Fº, Manoel Gonçalves - Presidencialismo “versus” Parlamentarismo-Considerações sobre um velho tema – idem nota anterior, p.111.
103
Ao Governo entende-se como uma de suas principais, ou
mesmo a principal atribuição, a de convocar os eleitores para proceder à eleição
da parte eletiva do Parlamento, a de convocar, adiar, prorrogar e encerrar as
sessões parlamentares e, sobretudo, a de dissolver a parte eletiva do Parlamento
e convocar novas eleições.
A faculdade de dissolução do Parlamento por parte do
Governo tem, em contrapartida, a controle exercido pelo Parlamento sobre os atos
do Governo com poder de responsabilizar os Ministros. Ainda, se houver
desaprovação da política seguida pelo Governo, este deve renunciar.
O sistema de responsabilização no Parlamentarismo não
exige que o Chefe do Governo pratique uma conduta considerada criminosa. A
discussão está voltada para o acerto de sua linha política, a utilidade de sua
conduta; enfim é uma responsabilização de atos políticos e não criminal.
A fim de evitar o dever de renúncia pode o Gabinete, órgão
que representa o Governo, pedir ao Parlamento o voto de confiança e mudar a
linha política de ação.
No sistema Inglês o poder do rei, ou da rainha é inviolável e
irresponsável. Exerce atribuições jurídicas, enquanto o poder político está
concentrado nos Ministros e Gabinete de Ministros.
Surge a figura do Premier ou Primeiro Ministro porque o Rei
ou o Presidente está acima dos partidos políticos, sendo elemento permanente do
Governo. Os Ministros, sob a presidência do Primeiro Ministro, formam o Gabinete
e dirigem a política geral do País.
Então, no sistema parlamentarista vamos encontrar três
órgãos: Um Parlamento eleito; um Chefe de Estado politicamente irresponsável e
um Gabinete de Ministros responsável perante o Parlamento.
Como escrito anteriormente, o Parlamentarismo vai
apresentar suas variantes conforme o Estado em que esteja implantado.
O Parlamentarismo, a partir da Inglaterra, começou a se
espalhar pela Europa de depois para outras partes do Mundo. Acabou por ficar
registrado como duas formas: o Inglês e o estabelecido da França, sendo que
cada País o mantém com suas particularidades.
104
Na Inglaterra há a máxima de que “O Rei não pode errar”,
sendo assim a unidade do Estado, representando a irresponsabilidade do
Executivo.
Os Ministros são sempre responsáveis pelos atos, de início
individualmente, mas com o decorrer dos anos esta responsabilidade passou a ser
solidária e politicamente perante a Câmara dos Comuns. Por isso, os atos reais
passaram ser referendados por Ministros.
Na conduta de colaboração com o Governo, o Parlamento
traça a diretriz política geral e o Ministério governa, autonomamente, dentro da
diretriz, cabendo, evidentemente, interpelações para se saber como o plano
orientativo está sendo seguido.
O que valoriza o Parlamentarismo Inglês é que todos os
assuntos de interesse nacional passam por ampla discussão, com conhecimento
de todos, portanto com observação da população.
Deve-se lembrar que seu surgimento se deu das correntes
ideológicas que movimentaram a civilização na luta contra o absolutismo. Assim, a
mudança do sistema precisava apresentar concretude, o que se mostrou com a
ampla discussão dos assuntos de interesse nacional.
Cabe deixar expresso que nos primeiros decênios do século
XIX houve o apogeu do parlamentarismo dualista que havia se desdobrado no
Século XIII: O Conselho de Ministros ou Gabinete eram responsáveis perante o rei
e as Casas do Parlamento (Câmara dos Lordes e a Câmara dos Comuns). Em
caso de conflito entre a Câmara dos Comuns e o Governo, deveria requerer ao
Rei que dissolvesse a Câmara a fim de que os eleitores decidissem.
A consolidação do sistema fez que, na atualidade, a influência
decisiva política seja da Câmara dos Comuns ao invés da Câmara dos Lordes.
Aquela é integrada por pessoas eleitas e esta por hereditariedade ou nomeação
da Coroa.
Interessante deixar consignado que a Câmara dos Lordes é o
mais alto órgão do Judiciário, que por força de tradição aprecia recursos na ordem
civil e criminal.
O que caracteriza efetivamente o parlamentarismo, nos
termos de obra citada de MARIA GARCIA é a distinção entre Chefe de Estado e
Chefe de Governo, sendo que o Chefe de Estado tem fundamentalmente funções
105
de representação estando acima dos conflitos políticos. Indica o Chefe de
Governo que vai exercer o Poder Executivo. O Chefe de Governo, Primeiro
Ministro, tem responsabilidade política e exerce as funções sem mandato,
podendo ser afastado se perder a maioria parlamentar ou for aprovado o voto de
desconfiança pelo Parlamento. Outra característica é a possibilidade da
dissolução do Parlamento, quando o Primeiro Ministro conta com pequena maioria
e pretende ampliar mediante eleições gerais, ou ainda, quando o Chefe de
Governo solicita ao Chefe de Estado nova eleição justificando que o Parlamento
não corresponde mais à vontade popular.78
Agora, quanto ao Parlamentarismo Francês, que surgiu para
dar aperfeiçoamento à liberdade tão defendida por seu povo, houve mais
relevância em razão do temperamento francês ao contrário do inglês, marcado por
formas rígidas e frias.
A introdução do sistema foi por volta de 1.814 por Luiz XVIII
que observou o funcionamento do sistema criado da Inglaterra, onde estava
exilado, mas a estabilização só ocorreu a partir de 1871 com a queda da
monarquia.
Os poderes do Parlamento surgiram com amplitude, e
inicialmente, o Presidente da Republica era eleito por um período de sete anos por
um colégio eleitoral composto de membros do Parlamento, dos conselhos gerais e
das assembléias territoriais. Hoje, diante da redação do art.6º, o Presidente é
eleito por sete anos,pelo sufrágio universal direto.
Por sua vez, o Primeiro Ministro é nomeado pelo Presidente
da República, entretanto, depois da nomeação, o Presidente não pode
simplesmente tirá-lo do cargo, podendo o Parlamento impor sua manutenção.
De FORMERY tiramos que “... le président de la Republique
ne dispose pás constitutionnellement du pouvoir de révoquer le Premier ministre”.
Ainda, Em effet, le départ du Premier ministre, comme as nominations, doit être
envisagé em relation avec as responsabilité devante lê
78 Op.cit. Parlamentarismo ou Presidencialismo,p.126. “Cabe observar que a partir dessas características decorrem outros sistemas que são variações do parlamentarismo inglês: ora admitindo-se ao Chefe de Estado algumas funções políticas(forma dualista,em oposição à forma monista tradicional),ora como um regime de Gabinete quando o sistema é como que um representante da maioria do Parlamento- hipótese que corresponde ao regime parlamentar bipartidário. O denominado regime de Assembléia,quando o Chefe de Governo “é uma espécie de delegado do Parlamento e atua de comum acordo com ele, o que seria típico do parlamentarismo num sistema pluripartidário.”
106
Parlement(v.art.20).Lorsque le Premier ministre est le chefe d`une majorité em
désacord avec le presidente(situation de < cohabitiation> réalisée em 1986,em
1993,puis en 1997),le Parlement pourrait, em fait, imposer son maintien.”79
Então, o Presidente da República é a unicidade do Estado e o
Primeiro Ministro, que se torna seguro no cargo, é ator que governa, e por isso é
responsável perante o Parlamento que pode mantê-lo no cargo contra a vontade
do Presidente da República, situação esta denominada pelos franceses com
situação de coabitação.
Os demais Ministros são nomeados diante de proposição de
seus nomes pelo Primeiro Ministro, mas o Conselho de Ministros é presidido pelo
Presidente da República.
Na sua ação de controle, o Presidente da República pode,
após consulta ao Primeiro Ministro e dos Presidentes das Assembléias, pronunciar
a dissolução da Assembléia Nacional, que junto com o Senado formam o
Parlamento.
O regime parlamentar francês da Constituição de 1958 está
sob a forma de um equilíbrio entre o Governo (não o Executivo) que determina a
política da Nação e o Parlamento diante do qual ele, Governo, é responsável.
O art.49 da Constituição Francesa apresenta disposições
referentes à responsabilidade do Primeiro Ministro perante o Parlamento.
São quatro hipóteses:
A primeira exige que o Primeiro Ministro, após deliberação do
Conselho, peça a Assembléia Nacional a aprovação de seu programa ou de uma
declaração de política geral. É o pedido do voto de confiança.
Pode também, a Assembléia Nacional apresentar uma moção
de censura ao Governo, o que deve ser entendido como uma repreensão sobre a
política geral ou sobre uma conduta que está sendo tomada.
A terceira hipótese se dá quando o Primeiro Ministro, após a
deliberação do Conselho de Ministros, assume expressamente a responsabilidade
do governo perante a Assembléia Nacional sobre o voto de um texto. Neste caso
79 FORMERY, Simon-Louis- La Constitution Commentée Article par Article,Hachette,p.27 (Tradução livre do autor: ...o presidente da República não dispõe constitucionalmente do poder de destituir o Primeiro Ministro. Com efeito, a demissão do Primeiro Ministro, como a nomeação, deve ser considerada em relação com a responsabilidade diante do Parlamento (art.20). Quando o Primeiro Ministro é o chefe de uma maioria em
107
o texto é considerado como adotado, salvo se houver uma moção de censura. A
Assembléia Nacional não é chamada a discutir ou pronunciar sobre o texto, ela
somente dispõe, se não concordar com o texto, em retorná-lo ao Governo votando
uma moção de censura. Última hipótese é quando o Governo requer ao Senado a
aprovação de uma declaração de política geral. Esta hipótese funciona apenas
como um reforço à ação do Governo, porque não há na Constituição nenhuma
conseqüência em caso de decisão desfavorável.
Por fim, quando a Assembléia Nacional adotar uma moção de
censura ou desaprovar o programa ou uma declaração de política geral do
Governo, o Primeiro Ministro deve remeter ao Presidente da República a
demissão do Governo.
A responsabilidade política do Governo perante o Parlamento
é a característica do Parlamentarismo. HUGUES PORTELLI ensina que “Le
regime parlamentaire repose sur la confiance accordée par le parlement au
gouvernement.Cette confiance est à l`origine de sa constitution mais doit être
également vérifiée par la suíte”.80
Exige o sistema parlamentar que haja confiança entre o
Parlamento e o Governo, sendo, portanto, a confiança a origem da instituição do
sistema, que deve sempre ser mantida para a continuidade.
A quebra da confiança faz desmoronar o sistema, exigindo a
queda do Governo ou a dissolução do Parlamento, dependendo das regras
estabelecidas.
Não é demais lembrar da Itália que depois do período de
Mussolini retornou ao parlamentarismo e basicamente se apresenta da seguinte
forma:
O Parlamento é bicameral, sendo que as duas Câmaras estão
em situação de igualdade no tocante ao processo legislativo, à definição do
orçamento, à tomada de contas e ao controle da Administração. Ambas podem
ser dissolvidas pelo Presidente da República.
desacordo com o presidente (situação de coabitação vivida em 1986,em 1993 depois em 1997) o Parlamento poderá, de fato, impor sua manutenção.) 80 PORTELLI, Hugues-Cours Droit Constitutionnel, Dalloz, p. 66 (Tradução livre do autor: O regime parlamentar repousa na confiança aceita pelo Parlamento ao Governo. Esta confiança é a origem de sua constituição, mas deve ser igualmente constatada sempre.).
108
O Executivo é dual, integrado pelo Presidente da República e
pelo Parlamento que tem representantes de cada Região.
O Governo é composto do presidente do Conselho e dos
Ministros, que, em conjunto, constituem o Conselho de Ministros, sendo que ao
Presidente da República cabe dirigir a política geral do Governo e nomear o
Presidente do Conselho que indica os demais Ministros.
O Presidente da República desempenha suas atribuições,
mas com referendo de um Ministro; portanto não administra isoladamente. É o
Governo que administra.
Por sua vez o Judiciário não foge ao modelo Ocidental, sendo
que completa a Corte Constitucional com a competência do julgamento de
constitucionalidade, conflitos de atribuição e crimes cometidos pelo Presidente da
República ou pelos Ministros de Estado.
4.2. Parlamentarismo racionalizado.
A partir do Parlamentarismo Inglês e do Francês, espalhou-se
o sistema pela Europa que no decorrer do tempo veio, a se firmar em um
parlamentarismo racionalizado.
Racionalização do parlamentarismo significa que o sistema
deve estar fincado em bases bastante explícitas, a fim de afastar quaisquer
dúvidas de seu funcionamento.
Em linhas gerais, a composição dos órgãos essenciais, a
confiança, a moção de censura, a queda do Governo e a dissolução do
Parlamento são matérias que devem estar bem explicitadas pela exigência da
racionalização.
Quanto à legislação, a racionalização exige que fique bem
esclarecido o domínio da lei, no sentido de que a norma é produto do Parlamento,
possibilitando alguma atuação do Governo mas, de forma preponderante, é o
Parlamento quem deve exercer a função legislativa.
109
Deve estar bem definida a iniciativa na propositura das leis,
prevendo também sobre as normas que afetam mais o Executivo do que o
Parlamento, como é o caso das leis que tratam do orçamento.
Enfim, o parlamentarismo racionalizado que prevalece é
aquele que bem define os seus órgãos, suas funções e especialidades, buscando
assegurar a estabilidade do Gabinete ou Conselho para garantir a necessária
eficiência governamental.
Em seminário sobre o tema, o Deputado WALDIR PIRES fez
comentários que mostram que o parlamentarismo moderno é o racionalizado, isto
é, aquele que bem define as funções de cada Poder. Após expressar que deve
haver uma reformulação no conceito de separação de poderes, “salvo para a
realização de tarefas e missões que correspondam especificamente a um e a
outro mostrou de forma objetiva a necessidade de normas bem definidas.À
medida que toda sociedade puder participar, pelo exercício da cidadania, nas
regras do processo democrático, poderemos constituir um Estado definindo seus
deveres, seus limites; um Estado que respeite a representação e possa conviver
com a estabilidade. Nesse particular, parece-me desejável a idéia de um
parlamentarismo que o mundo, nesta segunda metade do século XX, começa a
construir, um parlamentarismo que não parta de pressupostos rígidos e
preestabelecidos, que inclua, por exemplo, a figura de um presidente da República
como a grande personalidade interlocutora da Nação, análoga ao que foi
inicialmente o nascimento do parlamentarismo nos regimes monárquicos, em que
havia a figura do príncipe ou rei, assentada em direitos divinos, com todos os seus
privilégios.”81
Refere o pensamento à idéia de que o parlamentarismo
contemporâneo não pode estar arraigado às suas origens de maneira radical, mas
sim um sistema que privilegie o exercício da cidadania e não imacule o Presidente
da República; ou seja, um sistema que posicione os Poderes em mesmo patamar
e privilegie a Nação que é soberana, a titular de todos os Poderes.
4.2.1. Vantagens do regime.
81 PIRES, Waldir- Debate sobre o tema Modelos de Presidencialismo e Parlamentarismo in Presidencialismo ou Parlamentarismo, p.116.
110
A partir das características do parlamentarismo, pode-se
concluir quais as suas vantagens.
O órgão que de fato administra, o Ministério, para agir deve
ter a confiança do Parlamento, porque se houver a perda da confiança deve haver
a demissão. Essa questão é importante, porque só se mantém na administração
um Ministério que tenha respaldo político.
Ser o Executivo dual, com Chefe de Estado e Chefe de
Governo permite ao administrador da coisa pública dispensar toda sua ação
efetivamente na questão administrativa, sem outra preocupações.
Não obstante a esta particularidade, o parlamentarismo
apresenta a divisão funcional clássica, distinguindo o Executivo, o Legislativo e o
Judiciário. Executivo e Legislativo são interdependentes, na medida em que o
Conselho de Ministros, que de fato exerce as funções executivas depende do
apoio da maioria parlamentar para ser constituído, e depois se manter. Se perder
o apoio deve deixar o Poder.
Em contrapartida, o Chefe de Estado pode dissolver o
Parlamento pondo fim aos mandatos, mas convocando novas eleições.
O Judiciário está separado do Executivo e do Legislativo,
posto que estes combinam a atuação.
Há quem sustente que a possibilidade da queda do Governo
gere instabilidade e que isto seja prejudicial ao regime; entretanto MEDEIROS E
ALBUQUERQUE pensa exatamente ao contrário ao afirmar que “O regimem
parlamentar tem exatamente a vantagem de permitir, por um lado, a permanência
no poder “enquanto bem servirem”, por tempo indefinido, e “ sem período algum”
dos bons governos; por outro lado a eliminação dos maus”.82
O que é visto como desvantagem é pelo autor apontado como
vantagem o que pode ser aceito, porque, para o Estado e para a Nação, é
importante poder afastar os maus governantes a partir do momento em que o
afastamento se justifica.
82 Op.cit.p.50
111
Manter os maus governantes por um período certo e
determinado é apenar o titular do Poder que deve impor sempre sua vontade.
De outro lado se o Governo é bom é vantajoso que continue a
exercer a função que lhe cabe, não justificando uma data certa para deixar a
função.
4.3. Presidencialismo.
A leitura do art. 76 e seguintes da Constituição Federal mostra
que o Estado Brasileiro continuou adotando a partir de 05 de outubro de 1988 o
sistema presidencialista.
Posteriormente, o plebiscito realizado em 7 de setembro de
1993, por ordem do 3º do Ato das Disposições Constitucionais Transitórias, firmou
o que o povo decidiu: República com o sistema de governo presidencialista.
Temos então um sistema presidencialista que a leitura da
Constituição mostra ser um presidencialismo exagerado, o que, aliás, é o mote
desta tese.
Nos livros e obras de Direito Constitucional e matérias afins
encontramos a origem do sistema presidencialista na Constituição Americana de
17 de setembro de 1.787, tendo sido idealizado na Convenção de Filadélfia. Deste
modo tem-se um sistema que foi modelado nos e para os Estados Unidos e
depois se alastrou para outros Estados.
Neste alastramento acabou por surgir duas formas de
presidencialismo: o puro e o misto.
Presidencialismo puro é o americano em que o Presidente
não tem iniciativa de projetos de lei e os Ministros não comparecem ao
Parlamento. Misto é o brasileiro em que o Presidente, além de ter iniciativa ao
processo legislativo, o mesmo de fato legisla, no caso das Medidas Provisórias e
Leis Delegadas, contrariando a idéia de Montesquieu. Além disso, os Ministros do
Poder Executivo podem ser convocados pelo Parlamento para prestarem
informações. Difere do Parlamentarismo, que como vimos corresponde a um
resultado histórico.
112
O rompimento das Colônias com o Reino da Inglaterra fez
surgir um sistema novo em que o Governo foi depositado nas mãos de uma
pessoa para atuar como executivo, ou seja, administrando o novo Estado que
estava nascendo.
Surge, então, o sistema presidencialista como se observa no
pensamento de ALEXANDER HAMILTON a necessidade de um Poder Executivo
forte e com unidade. Defendeu que a energia do Poder Executivo é um dos
principais caracteres de uma boa Constituição. O vigor do Poder Executivo é que
mantém e segura a liberdade contra o furor das facções e contra os projetos da
ambição. Poder Executivo sem força supõe fraca execução das leis e do governo
e execução fraca é o mesmo que má execução. A energia do Poder Executivo
consiste na sua duração, na sua unidade, na suficiente extensão dos seus
poderes, nos meios de prover suas despesas e as suas necessidades. Afirmou
que Os homens mais hábeis, os jurisconsultos mais célebres pela exatidão e
firmeza de seus princípios, todos concordam em exigir unidade do Poder
Executivo, apesar de não terem dúvida em deixar a autoridade legislativa a um
grande número de pessoas.83
Naquela oportunidade, nascimento do presidencialismo, o
sistema foi visto como a salvação e também como uma forma de rompimento ao
sistema da Inglaterra, de quem se separava.
Só foram enxergado pontos positivos no Poder Executivo forte
através de competências ou atribuições ao Presidente. Não houve o pensamento
de supor que o Presidente, com excesso de poderes e considerando sua unidade,
poderia extrapolar e passar a agir como se ele fosse o Poder.
A crítica ao sistema ou ao Presidente já recebeu em Portugal,
como relata CANOTILHO vários rótulos: “Embora nas Constituições de 1911
tivesse havido uma forte corrente contra a existência de um Presidente da
República -<instituição desarmônica com a natureza do regime democrático>, <
título sem poder real>, <simulacro coroado>, <dignidade sem autoridade>,
<caminho directo para a ditadura e para a tirania> - reconheceu-se a
necessidade de, na estrutura do poder político, haver um elemento
<coordenador>”.84 (g.n.)
83 ALEXANDER Hamilton – O Federalista – O Pensadores, Abril Cultural, p.156. 84 CANOTILHO, J.J.Gomes –Direito Constitucional, Almedina, p.322.
113
Então, esta maneira de administrar importa em conceder ao
Presidente o poder de escolher, por vontade única e exclusiva sua, a política de
governo, bem como administrar o Estado como lhe aprouver.
O Estado vai mostrar sua feição política interna e
externamente variando com a vontade e objetivos do Presidente, considerando
que as Constituições são documentos que permitem esta acomodação, desde que
se justifique com os fundamentos e objetivos que se pretendem alcançar.
Neste sistema, o Presidente, em regra deve, ser eleito, seja
por modo direto ou não. Se coloca em plano de igualdade com o Poder
Legislativo, pois recebem um mandato a ser cumprido e exercido temporariamente
conforme as regras constitucionais.
Na sua atribuição, o Presidente pode constituir seu Ministério
independente da vontade do Parlamento, tendo então liberdade; pode ter iniciativa
no processo legislativo, sendo que tem iniciativa exclusiva para determinadas
matérias que digam respeito preponderante ao Executivo e, também no processo
legislativo, tem poder de veto quanto a projetos de lei.
Somente estas condutas não ferem a independência do Poder
Legislativo; no entanto, somadas às outras condutas que vão surgindo nas
Constituições, acabam por dar primazia ao Presidente da República em prejuízo
ao Poder Legislativo.
O já citado MANOEL GONÇALVES FERREIRA FILHO, no
trabalho mencionado sobre os dois sistemas em comento ensina que o
presidencialismo se confunde com o próprio sistema de separação de poderes. E
não é para menos, já que em seu nascedouro a Convenção de Filadélfia em 1787
foi montada como o governo que Locke teorizara, substituíndo o monarca de
direito divino por um monarca temporário. Com efeito, no presidencialismo, os três
poderes: Legislativo, Executivo e Judiciário são independentes entre si. Cada um
tem sua função e a deve exercer, em princípio, sem a interferência de outro.
É certo que a atuação dos poderes se inter-relaciona, mas o
que não pode ser aceito é que um deles, em regra o Poder Executivo, invada
tanto a atuação de outro ou até mesmo dos outros dois, a ponto de relegá-los a
notável grau de inferioridade.
Continuando, o autor expressa que na época presente o
Executivo tem inegável primazia sobre o Legislativo. Contudo, nos Estados
114
Unidos, como revela a história contemporânea, não esmaga o Congresso, que
continua com o poder de controlá-lo, sobretudo em matéria financeira, que serve
de contrapeso. E, o Judiciário, a seu turno assegura a guarda da Constituição, que
interpreta evolutiva e construtivamente.
Em suma, há o presidencialismo que é um sistema que dá
ênfase ao Presidente, que é a pessoa que exercita as funções do Poder
Executivo. Difere do Parlamentarismo em que o Executivo e o Legislativo são
poderes colaboradores enquanto no Presidencialismo esses dois Poderes são
forças antagônicas.
ORLANDO SOARES enfatiza que “sob o sistema
presidencialista, verifica-se acentuada predominância do Poder Executivo, em que
os ministros de Estado são de livre escolha do presidente da República, enquanto
sob o sistema parlamentarista os ministros que compõem o Gabinete, ou
Conselho de Ministros, são escolhidos dentre os membros do Parlamento, com
variantes em cada país, que adota tal sistema”.85
Esta acentuada predominância do Poder Executivo, e como
pensamos do Presidente, também se pode extrair dos ensinamentos de PINTO
FERREIRA que, após afirmar que o sistema deve ser definido como a forma de
governo em que o presidente da República orienta com independência a vida
política nacional, expressa: “Pode-se conseguir uma compreensão mais exata do
seu conteúdo pelo contraste com o governo parlamentar, porque no regime
parlamentarista o governo é uma dependência da maioria congressual do
Parlamento, sendo revocável pela vontade deste. Ao contrário, no regime
presidencialista, o governo independe da maioria congressual, que não poderá
mediante uma moção de desconfiança, destituí-lo de suas funções políticas”.86
A mencionada predominância pode ser entendida como a
independência necessária para o exercício de suas funções, o que é o desejável;
no entanto, como se constata de todo o texto a independência ou acentuada
predominância tem colocado o Presidente da República em situação de
superioridade aos demais Poderes.
Aliás, críticas ao sistema presidencialista não é novidade,
AFONSO ARINOS mostra que “Em 1788 Hamilton escrevia no Federalista que
85 SOARES, Orlando-Comentários a Constituição ad República Federativa do Brasil, p. 417. 86 FERREIRA, Pinto – Curso de Direito Constitucional, p.421.
115
nenhuma parte da organização política do seu país tinha encontrado tantas
dificuldades quanto a Presidência da República”.87
4.3.1. O absolutismo presidencial.
O que se percebe é que o sistema presidencial acaba por dar
ênfase especial ao Presidente, colocando-o até em uma situação privilegiada em
demérito ao Poder Executivo, do qual deve ser representante.
Cabe observar, no nosso caso, que a Constituição Federal
fixa a competência do Poder Legislativo e de suas Casas. Quanto ao Poder
Judiciário estabelece o que compete a cada órgão, entretanto, ao tratar do Poder
Executivo não expressa o que cabe ou compete ao Poder, mas sim o que cabe ou
qual é a atribuição do Presidente da República. Há desta forma confusão entre
Poder Executivo e Presidente da República. O representante do Poder se
confunde com o próprio Poder. O presidencialismo se apresenta assim como um
sistema que organiza constitucionalmente o governo pessoal e não a função do
Poder. Há um exagero presidencial e nas palavras de MANOEL GONÇALVES
FERREIRA FILHO “surge o absolutismo presidencial”88; há uma supremacia
pessoal.
Temos, então, um sistema em que a figura do Presidente da
República, como é a nossa situação, se apresenta constitucionalmente na
Constituição formal como uma figura que prepondera sobre os Poderes Legislativo
e Judiciário. Até se prepondera sobre o Poder Executivo porque a Constituição
não estabelece a competência ou atribuição do Poder Executivo, mas sim do
Presidente da República.
87 FRANCO, Afonso Arinos de Melo – Estudo de Direito Constitucional, Forense, p.34. “Os críticos tinham exagerado descompassadamente e as afirmações sobre os excessos de autoridade e sobre as práticas ditatoriais. Tinha afirmado que um Executivo enérgico é incompatível com o governo republicano. Mas tinham esquecido as vantagens da unidade de comando,de energia e rapidez do poder; assim como tinham esquecido que a Federação era o freio necessário aos excessos do presidencialismo,era a defesa e a garantia da liberdade;como também,que a temporariedade dos mandatos e a responsabilidade do Presidente (impeachment) diminuíam consideravelmente os riscos do seu autoritarismo( Le Féderaliste,trad.fr.,introduções de Jèze e Esmein, 1902,págs.432,559,572,582,583).” 88 Vide nota 77, p.110.
116
O presidencialismo brasileiro, com segurança impõe, o
absolustimo presidencial, porque são inúmeras as interferências nos Poderes
Legislativo e Judiciário como será visto adiante.
Além de exercer as funções do Poder Executivo, o Presidente
da República legisla e faz a composição de órgão auxiliar do Poder Legislativo.
Quanto ao Poder Judiciário faz a composição dos Tribunais Superiores.
Concentrado em uma só pessoa, constitucionalmente, há o
poder de exercitar a função administrativa, há o poder de interferir na função
legislativa quando legisla e quando faz a composição de órgão fiscalizador e há o
poder de fazer a composição dos órgãos judiciais que julgam as questões
constitucionais, eleitorais, trabalhistas e militares.
Além disto, no sistema presidencial, se exige de uma pessoa
que seja o representante de seu partido político e ao mesmo tempo o
representante da Nação. É representante da parte e do todo.
Ao contrário do Parlamentarismo, neste sistema, o Presidente
da República concentra as atribuições de Chefe de Estado e Chefe de Governo, e
acaba por ter função política quando, por exemplo, decreta estado de sítio ou
intervém nos Estados; exerce função legislativa quando edita medidas provisórias;
exerce função administrativa quando faz a gestão dos negócios públicos e ainda
tem a atribuição representativa quando, constitucionalmente, representa o país
interna e externamente.
O absolutismo presidencial pode chegar a manobras de
governo tirano, porque a concentração dos Poderes, seja de forma explicita ou por
sutilezas constitucionais, encaminha ao ser humano a tentar tomar para si todo o
comando da Nação.
Não se pode afirmar, categoricamente, que no Brasil, o
Presidente da República tenha em suas mãos os Três Poderes, mas certamente é
possível dizer que, além exercitar a função do Executivo, ele participa em excesso
junto aos Poderes Legislativo e Judiciário.
As palavras de JAMES MADISON são que “a acumulação dos
poderes Legislativo, Executivo e Judiciário nas mãos de um só indivíduo, onde
117
uma só corporação, seja por efeito de conquista ou de eleição, constitui
necessariamente a tirania”.89
A concentração dos Três Poderes nas mãos de um só
indivíduo ou possibilitar que, este indivíduo, influa de maneira que importa nos
demais Poderes, que não o Executivo, leva ao sistema tirânico.
O Presidente não deve ser visto como um soberano que
encarna o próprio Estado, mas tão somente como representante de um dos
órgãos de soberania estatal.
O mesmo MANOEL GONÇALVES FERREIRA FILHO em
outra obra já afirmou que “Outro mal do presidencialismo encontra-se na tentação
do abuso, própria à natureza humana, que acha terreno propício num sistema que
atribui tamanho poder a um homem só.”90
Situação concreta e reconhecida é que o Poder Executivo tem
sob sua responsabilidade o volume de dinheiro do Estado, então, com o capital
em mãos o Presidente da República tem como subjugar os demais Poderes.
Aliás, NELSON JOBIM em debates sobre Parlamentarismo e
Presidencialismo expressou a idéia de que os poderes do Presidente não podem
ser reduzidos e que ele manda porque tem os recursos em mãos. Afirmou que “É
evidente que a discussão não é teórica, é discussão de poder, porque se
privilegiarmos os municípios e os governadores, estaremos evidentemente
reduzindo o poder do presidente da República. O problema tributário, a repartição
das receitas e das funções, não é questão meramente técnica. É questão de
poder.Manda quem tem recursos”.(g.n.).91
A afirmação é cristalina em mostrar que o Presidente da
República é o todo poderoso porque tem em mãos os recursos públicos. Permite o
regime concentrar, na pessoa do Presidente da República, a Chefia do Estado, a
Chefia do Governo, legislar, nomear para o Poder Legislativo para o Poder
Judiciário e ainda controlar todos os recursos públicos.
Há quem não enxergue o absolutismo presidencial e até
conclua por uma igualdade de Poderes.
89 Idem nota 83, p.124. 90 FERREIRA Filho, Manoel Gonçalves – O Parlamentarismo, p.15. 91 JOBIM,Nelson- Presidencialismo ou Parlamentarismo, p.112.
118
O presidencialista MARCO MACIEL afirmou que “Temos um
novo presidencialismo, caracterizado por uma equipotência de
poderes,concebido pela Constituição de 1988, que foi avanço, porque temos pela
primeira vez um presidencialismo moderno”.92
O equívoco da afirmação só é justificável por ser seu autor
defensor do presidencialismo. Não há a chamada equipotência de poderes,
quando o Presidente atua ou influi nos três Poderes em detrimento das funções
legislativas e judiciárias.
O presidencialismo concebido pela Constituição de 1988 não
tem modernidade; ao contrário apresenta ranço do passado. Basta constatar o
abuso na edição das Medidas Provisórias, bem como a nomeação de pessoas
comprometidas com ideologias político-partidárias para integrar o Poder Judiciário.
A Constituição de 1988 neste ponto é mais para imperial do
que moderna e leva ao absolutismo presidencial.
No passado DUGUIT, embora sobre o parlamentarismo, já
afirmava que “ Le président de la Republique personnifie le gouvernement”93 , o
que mostra que o Poder Executivo concentra em uma só pessoa uma série de
poderes que leva a uma situação de equipotência.
4.3.2. Vantagens do regime.
Com efeito, o presidencialismo como o parlamentarismo
apresenta suas vantagens e desvantagens, encontrando-se, então, um ou outro
sistema que traga bons resultados ao Estado e a Nação.
No estudo sobre o tema com mais facilidade se encontra
posicionamentos contrários ao sistema, chegando até a afirmativa de ditadura
legal.
92 MACIEL, Marco – Presidencialismo ou Parlamentarismo, 98. 93 Op.cit. p.501 . Tradução livre do autor- “ O presidente da República personifica o governo.”
119
Não há dúvida de que em questões de grande relevância e
que exija tomada de decisões rápidas, a presteza somente aparece de maneira
imediata quando um só órgão tem a competência para decidir.
A concentração do Poder Executivo nas mãos do Presidente
da República pode ser um bom sistema quando as ações são tomadas sem abuso
de poder e sem preocupações pessoais.
A seu favor argumenta-se. Mostra DALMO DE ABREU
DALLARI, “com a rapidez com que as decisões podem ser tomadas e postas em
prática.”94
Entretanto, como regra, o presidencialismo leva ao chamado
absolutismo que é extremamente prejudicial a Nação e ao Estado. O titular passa
a agir como um ditador, isto é, sem estar atrelado as regras e aos limites.
Durante os debates travados na Assembléia Constituinte de
1946 o então Senador Luiz Carlos Prestes afirmou que o “presidencialismo no
Brasil tem sido sinônimo de ditadura, alertando que isso continuaria, a julgar pelo
Projeto de Constituição, que manteria o presidencialismo atribuindo ao presidente
da República uma vasta gama de competências, tais como: a nomeação dos
Ministros do Supremo Tribunal Federal, dos Tribunais de Recursos, juízes da
Justiça Eleitoral; o poder de veto, com dificuldades enormes para ser rejeitado
pelo Congresso Nacional; a intervenção nos Estados-membros da Federação, em
boa parte entregue ao Chefe do Executivo, e encarregado de nomear, livremente
os interventores; a nomeação dos cargos públicos, e assim por diante”, como
relata ORLANDO SOARES.95
Como se constata não há dificuldades em encontrar críticas
ao presidencialismo porque nota-se uma tendência a abusos por parte de quem
exerce o poder quando tudo se concentra em um único titular.
Enfim, é possível um sistema presidencial que apresente bons
resultados que deve ser aquele que não admita o absolutismo, ou seja, reconheça
posição de independência dos Poderes do Estado.
94 DALLARI, Dalmo de Abreu – Elementos da Teoria Geral do Estado,p.244. “Além disso, cabendo ao Presidente da República decidir sozinho, sem responsabilidade política perante o parlamento,existe unidade de comando, o que permite um aproveitamento mais adequado de possibilidades do Estado, sem a necessidade de transigências e adaptações que deformam qualquer diretriz política. Por último,alega-se que o presidencialismo assegura maior energia nas decisões,pois sendo o responsável pela política e tendo os meios para aplicá-la, o Presidente da República naturalmente interessado no êxito de sua política, tudo fará para que o Estado atue com o máximo de suas possibilidades.”
120
CAPÍTULO V
FUNÇÕES ATIPICAS DO PRESIDENTE DA REPÚBLICA.
É de fácil percepção na Constituição Federal, com simples
leitura, que funções atípicas reservadas ao Presidente da República têm como
condão a ingerência no Poder Legislativo, bem como no Poder Judiciário.
Na esfera do Poder Legislativo, esta interferência consiste
exatamente na função típica do Poder, pois a Constituição permite ao Presidente da
República legislar.
Não obstante, o exercício desta atividade seja posto como
exceção, o que a história tem mostrado é uma atividade desenfreada com extremo
abuso da concessão constitucional.
Na medida em que o Presidente da República passa a ser um
legislador ordinário, está presente sua interferência efetiva no Poder Legislativo. De
fato o poder constitucional de legislar se mostra como uma usurpação do Poder. A
Constituição Federal retira função típica do Poder Legislativo e transfere ao
Presidente da República como função atípica. Esta usurpação enfraquece o Poder
Legislativo.
Interfere também quando nomeia as pessoas que vão integrar o
Tribunal de Contas, que apesar de ser órgão de auxilio do Poder Legislativo para
fiscalizar tecnicamente as contas da Administração Pública, de forma especial do
Poder Executivo, sua composição depende da vontade do Presidente da República.
Enfim, o Presidente da República faz a composição de órgão auxiliar do Poder
Legislativo.
No tocante ao Poder Judiciário, a Constituição concede ao
Presidente da República o poder de nomear os membros do Supremo Tribunal
Federal além de outros Tribunais. Linhas atrás já mostramos posição totalmente
95 Op. cit. p.342
121
contrária, de Luiz Carlos Prestes, quanto a este poder do Presidente da República
que o torna um ditador.
Não tem o Presidente da República nenhum instrumento
constitucional que lhe dê o poder de julgar, no entanto a história também tem
mostrado, que não obstante a capacidade jurídica, grande parte dos nomeados, seja
para a mais alta Corte de Justiça seja para outros Tribunais, são pessoas vinculadas
ao Presidente por laços de amizade-partidária.
Tem-se percebido que alguns nomeados são pessoas oriundas
de partidos políticos e cargos eletivos, que por um motivo ou outro são presenteados
com cargos no Poder Judiciário.
Esta maneira de nomeação desvirtua o critério objetivo que deve
inspirar a nomeação de qualquer julgador.
A atividade político-partidária exige da pessoa a necessária e
responsável parcialidade aos objetivos do partido político, o que não combina com o
Poder Judiciário, que ao contrário exige a necessária e responsável imparcialidade
que empurra o julgador à obediência somente aos preceitos constitucionais e legais
existentes.
A nomeação de um ativista político para um cargo de Julgador
exige um rompimento brusco da parcialidade para a imparcialidade, comportamento
quase que impossível ao ser humano.
Aquele que está comprometido com ideologia partidária não
consegue de um dia para outro despir suas idéias de parcialidade e passar a ter
comportamento imparcial, esquecendo-se de toda a carga direcionada e de seu
passado. Este julgador comprometido com partido político,traz sérios perigos para a
Nação.
Estando o Presidente da República com o poder de compor
Poder Judiciário, é evidente que está interferindo e por isto mostrando sua
supremacia.
O que mais agrava é que a visível supremacia nem é do Poder
Executivo, mas sim do Presidente da República, ou seja, de uma só pessoa.
Destoando do Poder Constituinte que criou três Poderes e afirmou que são
independentes e harmônicos.
122
É certo que o Poder Executivo se encarna na pessoa do
Presidente da República porque é o único dos Poderes, conforme nossa
Constituição Federal, que é exercido por uma só pessoa.
A redação em relação aos outros Poderes vem mostrar as
atribuições e competências de cada Poder mas, quando trata do Poder Executivo a
Constituição não prevê as atribuições ou competências do Poder Executivo, mas sim
do Presidente da República.
Não se trata apenas de questão de redação, e sim de posicionar
uma pessoa acima dos Poderes da República, inclusive do próprio Poder que
representa.
Deste modo, deve ficar afirmado que a Constituição formal
prevê a existência dos Três Poderes e dispensa um tratamento de supremacia ao
Presidente da República que é o representante de um dos Poderes. A redação
constitucional mostra a adoção do sistema presidencialista carregado de
característica absolutista.
5.1. Medidas Provisórias.
Precede a Medida Provisória a espécie normativa que foi
denominada por Decreto-lei como se observa da Constituição de 1967 em seu
art.49,V ao tratar do Processo Legislativo e que já mereceu atenção.
Esta espécie normativa foi muito criticada sob o argumento de
que o Presidente da República abusava de sua edição não obedecendo às
exigências constitucionais, sendo por isso o País governado pelo Decreto-lei.
No art.58 consta que o Presidente da República, em casos de
urgência ou se de interesse público relevante e desde que não cause aumento
de despesa, poderá expedir decretos com força de lei(g.n).
A redação deixa bem assentado que a faculdade estava
vinculada a urgência ou interesse público, no entanto cabia ao Presidente da
República decidir quando estava presente a urgência ou o interesse público, ficando
assim à sua vontade editar o Decreto-lei.
123
O texto proibia o decreto causasse aumento de despesa e nos
incisos enumerava somente suas matérias suscetíveis de tratamento pela norma:
segurança nacional e finanças públicas.
Assim, não obstante prevalecesse à vontade do Presidente da
República a norma só podia tratar das matérias previstas pela Constituição.
Publicado o texto a vigência era imediata e a função do
Congresso Nacional, Poder Legislativo, era somente de aprovar ou rejeitar, sendo
considerado aprovado se em sessenta dias não houvesse deliberação.
A Constituição de 1967 chegou ao ponto de proibir o Poder
Legislativo de legislar, não admitindo emendas no texto do Decreto-lei.
Apesar de tudo isto a Constituição Federal de 1988 continuou
permitindo a usurpação de função, ao dar ao Presidente da República mais poderes
com a previsão da Medida Provisória como uma verdadeira transferência da função
legislativa.
As mesmas críticas do abuso na edição dos Decretos-leis
surgiram com a Medida Provisória, constatando que o abuso é maior,
principalmente, como veremos diante da ausência de fixação de matérias.
Dispõe o art. 59 que o processo legislativo compreende a
elaboração, entre outras espécies normativas primárias, das leis delegadas e das
medidas provisórias.
Afirmou CELSO BASTOS que o legislador constituinte houve
por bem retirar das mãos do Presidente da República um instrumento de poder
extremamente forte como era o decreto-lei, no entanto não o deixou de mãos
atadas, pois em caso de relevância e urgência poderá editar medidas provisórias.
Disse que “a medida provisória, embora seja ato normativo com força de lei, não
pode ser considerada lei em sentido formal, já que não é ato nascido no Poder
Legislativo.”96
A afirmativa deixa enfatizado que Medida Provisória, embora
seja ato típico da função legislativa não é espécie normativa que provém do Poder
Legislativo, mas sim do Presidente da República.
96 Op.cit. Curso de Direito Constitucional, p.360
124
Em suma, o Presidente da República perdeu um instrumento
forte, mas ganhou outro, mais poderoso porque consegue legislar em praticamente
todos os temas nacionais. Legisla e administra.
Dispõe o art. 62 da Constituição Federal que em caso de
relevância e urgência, o Presidente da República poderá adotar medidas provisórias,
com força de lei, devendo submetê-las de imediato ao Congresso Nacional, que,
estando em recesso, será convocado extraordinariamente para se reunir no prazo de
cinco dias.
“Constitui espécie normativa. Compõe o processo previsto no
art. 59 da Lei Maior: Tem força de lei. É ato normativo primário”, assim LUIZ
ALBERTO DAVID ARAUJO e VIDAL SERRANO NUNES JÚNIOR iniciam os
ensinamentos sobre Medida Provisória.97
A partir do texto constitucional e dos ensinamentos pode-se
conceituar Medida Provisória como a espécie normativa primária que integrante do
processo legislativo é editada pelo Presidente da República, com força de lei,
quando houver necessidade diante de relevância e urgência.
O reconhecimento por parte do Presidente da República dos
requisitos constitucionais deve estar atrelado ao principio da proporcionalidade, com
a constatação da indispensabilidade na edição da medida, porque, como afirma
HUMBERTO BERGMANN ÁVILA a “a atuação só é legítima quando nenhuma outra,
menos restritiva, possa ser adotada”.98
Como ato oriundo do Poder Público que tem o dever de agir
como determina a lei a Medida Provisória também é passível de controle
jurisdicional.
97 Op.cit. p.328. 98 ÁVILA,Humberto Bergmann- Medida Provisória na Constituição de 1988, p.49. “Conexo ao princípio do Estado de Direito, e como limite à atuação legislativa do Poder Executivo,está o princípio do proporcionalidade que, entre outras determinações,impõe a atuação que seja absolutamente indispensável, e a escolha do meio menos restritivo, dentre os abstratamente disponíveis. Nesse sentido, a atuação legislativa do Poder Executivo só é legítima quando nenhuma outra,menos restritiva possa ser adotada.Quanto ao conteúdo do princípio da proporcionalidade,afirma Gonzáles: “ El principio de proporcionalidad de la actuación obliga aqui a proceder según un doble objetivo: a) elección de instrumentos jurídicos adequados a la situación de hecho, para la consecución del determinado fin previsto em la norma. Con esta operación se pretende principalmente, aislar y desechar aquelos médios inadecuados, que no guardan una justa correspondência, proporcionalidad y congruencia com los hechos y el fin concurrentes en el caso concreto; b) elección del médio más idóneo y de menor restricción posible,de entre los vários instrumentos adecuados para la obtención de un fin.”
125
É certo que os pressupostos constitucionais da relevância e
urgência são discricionários ao Presidente da República e por isto submissos a
subjetividade, como se verá adiante. Todavia o que não pode gerar dúvida é estar a
medida afetada pelo controle do Poder Judiciário, conforme a teoria da tripartição
dos Poderes.
Afirmou CELSO BASTOS que “o controle jurisdicional das
medidas provisórias no Brasil pode ocorrer em três níveis: a) primeiro um controle
dos pressupostos de habilitação (se afinal estão ou não presentes); b) depois, um
controle da matéria tratada pela medida provisória (se suporta regramento legislativo
provisório ou não); c) finalmente, um controle da constitucionalidade da matéria
propriamente dita (se atende, não sob a ótica formal, mas sim substancial, as
normas e princípios adotados pelo constituinte”.99
Percebe-se que cabe ao Presidente da República decidir
quando há relevância e urgência o que lhe dá a possibilidade de agir com ampla
liberdade, o que tem sido mostrado pela história.
Diante deste poder deve ser justificada a edição de toda e
qualquer Medida Provisória quando houver motivo fático e jurídico relevante; isto é
que exija providências por um ato normativo. Concomitantemente deve ser
justificado pela urgência na edição da medida, o que significa que o País não pode
esperar o ordinário procedimento de elaboração de uma lei para regular aquela
matéria. Os fatos exigem edição imediata.
A subjetividade de relevância e urgência tem sido a responsável
pela edição de inúmeras Medidas Provisórias que se afastam da exigência
constitucional.
A edição das Medidas Provisórias à vontade do Presidente da
República tem gerado a situação esdrúxula do Executivo invadir de vez a esfera do
Legislativo e legislar mais do que este Poder e ainda em situações que não se
apresentam como urgentes.
O jornal o Estado de São Paulo fez publicar matéria em que
mostra que no primeiro ano de mandato Presidente da República Fernando
Henrique Cardoso editou 30 Medidas Provisórias e o Presidente da República Luiz
Inácio Lula da Silva no primeiro ano editou 57.
99 Op.cit. Curso de Direito Constitucional, p.364.
126
Na mesma matéria está exposto a supremacia do Presidente da
República sobre o Poder Legislativo. A maioria parlamentar do governo Lula no
Congresso não é tão ampla, mas o resultado final das votações confirma o poder do
Palácio do Planalto:o Legislativo gasta a maior parte do seu tempo e de seu
esforço trabalhando para o Executivo.O que mais contribui para tornar pesada
esta carga de trabalho é a edição de medidas provisórias pelo presidente Luiz
Inácio Lula da Silva. (g.n).100
Também na mesma matéria há manifestação do Parlamentar
Renato Casagrande no sentido de que há um desequilíbrio no processo legislativo
porque efetivamente o Executivo legisla mais do que o Legislativo.
Em outra edição do mesmo jornal, o Presidente do Congresso
Nacional Senador José Sarney afirmou que o excesso de Medidas Provisórias
inflaciona o Legislativo. O Senador Jefferson Perez chegou a afirmar que “o poder
de legislar do Congresso foi usurpado pelo Poder Executivo com a omissão e a
cumplicidade do Congresso e que É uma hemorragia de MPs, sendo que 90%
delas não atendem aos princípios de relevância e urgência” (g.n.).101
Se a grande maioria das Medidas Provisórias não atendem as
exigências da relevância e urgência, elas são inconstitucionais e por isto deveriam
ser rejeitadas de plano pelo Congresso Nacional.
Está evidente que a espécie normativa vem sendo editada de
acordo com a vontade única do Presidente da República. A relevância e urgência é
definida por uma pessoa.
No mesmo caminho a Revista Veja, apresenta artigo intitulado A
Ágil Caneta do Presidente e no primeiro parágrafo está escrito: “Lula acaba de bater
um incômodo recorde: nunca um presidente da República, desde a Constituição de
1988, fez uso tão intensivo de Medidas Provisórias, as MPs- papeluchos que,
basta o presidente assinar e mandar ao Congresso Nacional, passam a ter
força de lei como se o chefe do Executivo fosse, sozinho, a personificação de
594 deputados e senadores.”(gn)102
Na mesma matéria está mostrado que o uso abusivo na edição
da Medida não é conduta exclusiva do atual Presidente. Fernando Collor editou
100 Jornal o Estado de S. Paulo,Nacional, Edição de domingo, 30 de maio de 2004, p.A8. 101 Jornal o Estado de S.Paulo, Nacional, edição de Quarta-Feira,31 de março de 2004, p.A6. 102 Revista Veja, Editora Abril, edição 1884, ano 37, edição de 15 de dezembro de 2004, p.46
127
Medida provisória para comprar automóvel para o Vice. Fernando Henrique Cardoso
assinou Medida para comprar latas de goiabada.
Exemplo de inconstitucionalidade está no pronunciamento do
Procurador Geral da República CLAUDIO FONTENELES que afirmou ser
inconstitucional a Medida provisória 207, que deu status de Ministro ao Presidente
do Banco Central, Henrique Meirelles, garantindo-lhe foro privilegiado. Concluiu o
Procurador em seu parecer que a medida é casuística porque foi tomada no
momento em que o beneficiado estava sendo investigado e por isto afronta o
princípio da moralidade pública.103 Não obstante, a demonstração da
inconstitucionalidade o Congresso Nacional aprovou essa Medida Provisória.
Inúmeros são os posicionamentos mostrados pela Imprensa
contra o uso abusivo das Medidas Provisórias, mas o que se vê é a falta de vontade
política do Poder Executivo em respeitar a Constituição Federal e a inércia do
Congresso Nacional que aceita a conduta do Presidente da República.
A questão é tão grave que chegou ao Supremo Tribunal
Federal.
Embora não deva ser a regra discutir no Poder Judiciário a
existência dos pressupostos necessários, isso é possível. Na ação direta da
inconstitucionalidade 1753, de 16 de abril de 1998, do Distrito Federal, tendo como
Relator o Ministro Sepúlveda Pertence, consta da ementa: “1. Medida provisória:
excepcionalidade da censura jurisdicional da ausência dos pressupostos da
relevância e urgência à sua edição”.
Em outra ação direta de inconstitucionalidade, esta de 04 de
fevereiro de 2002, de nº 2213 o Ministro Celso de Mello fez constar que a “edição de
medidas provisórias, pelo Presidente da República, para legitimar-se juridicamente,
depende, dentre outros requisitos, da estrita observância dos pressupostos
constitucionais da urgência e relevância(CF,art.62, “caput”). Os pressupostos da
urgência e relevância, embora conceitos jurídicos relativamente indeterminados e
fluidos, mesmo expondo-se, inicialmente, à avaliação discricionária do Presidente da
República, estão sujeitos, ainda que excepcionalmente, ao controle do Poder
Judiciário, porque compõem a própria estrutura constitucional que disciplina as
103 Jornal o Estado de S. Paulo, Edição de 09de novembro de 2004, p.A5
128
medidas provisórias, qualificando-se como requisitos legitimadores juridicamente
condicionantes do exercício, pelo Chefe do Poder Executivo, da competência
normativa primária que lhe foi outorgada, extraordinariamente, pela Constituição da
República.”
Portanto, conforme nossa estrutura constitucional com o sistema
de controle de um poder em relação ao outro, o excesso de edição de Medidas
Provisórias que usurpa a função do Poder Legislativo e a edição sem que haja os
pressupostos constitucionais de relevância e urgência, são passíveis de apreciação
pelo Poder Judiciário, embora não se apresenta como questão simples, mas ao
contrário de enorme complexidade.
O poder de legislar conferido constitucionalmente ao Presidente
da República é excepcionalíssimo, por isso seu exercício deve ser comedido e com
a estrita observância aos pressupostos constitucionais de relevância e urgência.
O excesso na edição mostra que o Poder Executivo cria a
urgência e relevância para os temas que têm interesse, desvirtuando desta forma a
razão da espécie normativa e praticando com freqüência atos inconstitucionais.
Os pressupostos não podem ser criados pelo Presidente da
República, eles devem emergir da própria questão a ser tratada.
Em outra ação, agora com redação um pouco mais restritiva, o
Ministro Ilmar Galvão expressou que os requisitos de relevância e urgência para
edição de medida provisória são de apreciação discricionária do Chefe do Poder
Executivo, não cabendo, salvo os casos de excesso de poder, seu exame pelo
Poder Judiciário (Ação 2150, 11/09/2002).
Em resumo, é permitido concluir que o Poder Legislativo já
observou que o Presidente da República está legislando mais do que o Congresso
Nacional e que, em muitos casos as Medidas Provisórias, são editadas sem os
pressupostos constitucionais. Também, mesmo em caráter de exceção, é permitido
ao Poder Judiciário apreciar se determinada Medida está amparada pelo texto
constitucional.
De fato, então, o comportamento do Presidente da República
com a edição de Medidas Provisórias da maneira que lhe é permitido, causa uma
real usurpação de função, porque legisla mais que o legislador. Desta forma, uma
pessoa, o Presidente da República, passa a legislar em detrimento de um Poder, o
129
Legislativo. Ao ser editadas as Medidas Provisórias entram em vigor e por isto
passam a surtir efeitos, ressalvada disposição constitucional em contrário.
De imediato devem ser submetidas ao Congresso Nacional e
conforme a redação do § 5º do art.62 da Constituição Federal, a deliberação de cada
uma das Casas do Congresso Nacional sobre o mérito das medidas provisórias
dependerá do juízo prévio sobre o atendimento de seus pressupostos
constitucionais.
Assim, a primeira atitude técnica de cada Casa do Congresso
Nacional é de verificar se estão presentes os pressupostos constitucionais da
relevância e urgência.
Por isto, sem analisar o mérito, cada Casa pode rejeitar a
Medida Provisória posta em apreciação, se entender que não estão presentes os
pressupostos constitucionais.
Em conclusão, se muitas Medidas Provisórias foram editadas
sem que houvesse a relevância e a urgência e tramitaram no Congresso Nacional e
responsabilidade é de cada Casa que assim o permitiu.
É de se lembrar o questionamento do cientista político
FERNANDO ABRUCIO da Fundação Getulio Vargas: “Com a restrição do uso de
MPs, os parlamentares terão de aprovar mais leis e com mais rapidez. Será que eles
querem isso? Pelo visto, não”.104
Cabe lembrar o que consta em linhas atrás, que há um poder do
Palácio do Planalto sobre o Congresso Nacional.
5.2. Leis Delegadas.
104 Idem nota 102.
130
Com o poder de legislar através da edição de Medidas
Provisórias, sem que haja necessidade de autorização legislativa, o Presidente da
República de fato não faz uso da espécie normativa denominada Lei Delegada.
De acordo com PINTO FERREIRA, a lei delegada “é um ato
normativo elaborado e editado pelo presidente da República, devidamente
autorizado pelo Poder Legislativo e nos limites por este estatuído, ou ainda por
comissão especial do Congresso e por comissão de qualquer das Casas
legislativas”.105
Em suma, a elaboração desta espécie de lei implica na
delegação de poderes atribuída ao Congresso Nacional ao Presidente da República.
Está evidente que muito mais fácil ao Presidente da República
legislar por Medida Provisória do que por Lei Delegada pois, para a última ele
precisa solicitar autorização ao Poder Legislativo e para a primeira a própria
Constituição Federal já o autoriza legislar independente de solicitação.
Mesmo diante da necessidade da delegação para que o
Presidente da República elabore e edite uma Lei Delegada, há uma certa
interferência sua no Poder Legislativo.
Já afirmamos que “esta espécie demonstra uma certa amplitude
na ação do Poder Executivo, que além de ter a iniciativa para os projetos de lei,
ainda tem o poder de legislar sem atuação conjunta com o Poder Legislativo. Basta
simples delegação e o Poder Executivo investe-se também na função legislativa”.106
A previsão constitucional faz outra vez o reconhecimento da
supremacia do Presidente da República. O Parecer nº 69, de 1978 do Senado
Federal, sendo Relator o Senador Wilson Gonçalves, contém citação de José Afonso
da Silva que já concluía pelo fortalecimento do Poder Executivo diante da Lei
Delegada e da iniciativa. Consta que o fortalecimento do Executivo, aliás, é um fato
incontestável do Estado contemporâneo, em todos os sentidos... .107
Agora, diante de todo o conteúdo que está exposto, podemos
afirmar que a amplitude de ação é do Presidente da República. Além de exercer o
Poder Executivo investe-se também na função legislativa.
105 Op.cit. p. 388. 106 CARVALHO, Jeferson Moreira de – Leis Complementares, p.19 107 GONÇALVES, Wilson – Parecer 69/78, Processo Legislativo, p.113
131
Nos termos do art. 68 as Leis Delegadas serão elaboradas pelo
Presidente da República, que deverá solicitar a delegação ao Congresso Nacional.
Cumprindo as regras todas do mencionado dispositivo
constitucional, ao final, se houver determinação da Resolução que concede a
delegação, o Presidente da República deve enviar o projeto ao Congresso Nacional
para sua aprovação ou rejeição e dispõe o parágrafo 3º, na parte final, que é vedada
qualquer emenda.
O constituinte proibiu o Poder Legislativo de legislar, proibiu de
exercer a sua função típica. A Constituição Federal retirou do Poder Legislativo sua
função de legislar.
A aprovação ou rejeição deve ser em bloco não podendo o
Poder que deve exercer a função legislativa emendar um único artigo. Aceita o texto
imposto ou rejeita.
Com efeito, não obstante haja a delegação, a supremacia
presidencial está presente, porque transfere ao Presidente da República o poder de
legislar em detrimento do Poder Legislativo que fica proibido de legislar aquela
matéria naquele projeto.
A Lei Delegada pode ser útil porque permite a elaboração de um
texto de lei sem a burocracia exigível no Congresso Nacional, com discussão nas
Comissões e nas duas Casas; entretanto retirar do Poder Legislativo sua função
típica é dar ao Presidente da República o poder de exercitar a função executiva e a
legislativa.
É certo que a separação dos Poderes não se apresenta de
forma rígida, mas no caso de delegação ocorre a transferência da função típica, o
que descaractriza todo os sistema que se diz adotar.
Sobre a separação dos Poderes J. CRETELLA JUNIOR é bem
enfático em afirmar que Montesquieu faz desse princípio o instrumento ideal para
garantir a segurança do cidadão.
“Sabendo-se que as funções do Estado são três, a de fazer a lei,
a de aplicar a lei para a solução dos litígios, quer espontaneamente que por
provocação, Montesquieu entendia que se cada órgão exercesse sua própria
função,“ o poder controlaria o poder”, evitando o arbítrio, pois o legislador não
132
adaptaria a lei ao caso concreto que surgisse, nem o administrador modificaria
o texto, de acordo com as circunstâncias do momento” (g.n.).108
Em tese, com a delegação o Presidente da República pode
legislar de acordo com as circunstâncias do momento e por em vigor lei casuística.
Agindo assim, fica demonstrado o fortalecimento do Presidente
da República e o desrespeito ao princípio da separação dos Poderes, com
enfraquecimento da segurança do cidadão, que foi uma das preocupações de
Montesquieu.
5.3. Nomeação para o Tribunal de Contas.
A redação do art.70 da Constituição Federal mostra a atividade
de fiscalização do Poder Legislativo, que ao lado da função de legislar deve ser
entendida também como função essencial.
A fiscalização contábil, financeira, orçamentária, operacional e
patrimonial da União e das entidades da administração direta e indireta, quanto à
legalidade, legitimidade, economicidade, aplicação das subvenções e renúncia de
receitas, será exercida pelo Congresso Nacional, mediante controle externo, e pelo
sistema de controle interno de cada Poder.
Decorre do texto que a questão nuclear é a fiscalização quanto
ao uso dos recursos públicos, pois a operação é contábil, financeira, orçamentária e
patrimonial.
O Congresso Nacional exerce a fiscalização auxiliado pelo
Tribunal de Contas da União, como dispõe o art. 71 da Constituição Federal, sendo
este o chamado controle externo das contas públicas.
A conclusão é simples no sentido de que a função fiscalizatória
é exercitada pelo Congresso Nacional, isto é, pelo Poder Legislativo.
108 CRETELLA Jr. J. Elementos de Direito Constitucional, p124
133
Exerce, então, o Poder Legislativo fiscalização financeira e
orçamentária quanto aos atos do Poder Executivo, que significa em última análise
apreciar prestação de contas daqueles que tratam com o dinheiro público.
Toda administração pública está sujeita a este controle,
entretanto, é evidente que a fiscalização se mostra mais preponderante quanto ao
Poder Executivo porque é este que administra o Caixa do Estado.
O Poder Executivo ou o Presidente da República é quem tem a
chave do cofre, portanto o gasto do dinheiro público está sob a responsabilidade do
Presidente da República.
Conforme dispõe a Constituição Federal, o controle se dá por
meio interno e externo.
Sobre o controle externo da obra de HELY LOPES MEIRELLES
tiramos que “visa comprovar a probidade da Administração e a regularidade da
guarda e do emprego de bens, valores e dinheiros públicos, assim como a fiel
execução do orçamento. É, por excelência, um controle político de legalidade
contábil e financeira, o primeiro aspecto a cargo do Legislativo; o segundo, do
Tribunal de Contas.”109
Do texto se conclui que em última análise, todo o controle é do
Poder Legislativo, pois este o realiza diretamente ou com o auxilio do Tribunal de
Contas.
Estudando o órgão, ALEXANDRE DE MORAES mostra o
conceito, conforme citações que faz, na idéia de que “o Tribunal de Contas é órgão
auxiliar e de orientação do Poder Legislativo, embora a ele não subordinado,
praticando atos de natureza administrativa, concernentes, basicamente, à
fiscalização.”110
O Tribunal de Contas é órgão técnico de fiscalização e que,
exercendo atos de natureza administrativa, auxilia o Poder Legislativo. Não está
subordinado hierarquicamente ao Poder Legislativo, mas a nomeação de seus
membros depende da vontade deste Poder e do Presidente da República que deve
ser extraneu em relação as funções do Legislativo.
Dispõe o art. 73 da Constituição Federal que o Tribunal de
Contas da União é integrado por nove Ministros. Um terço dos integrantes são
109 MEIRELLES, Hely Lopes – Direito Administrativo Brasileiro, p.670 110 MORAES, Alexandre de - Curso de Direito Constitucional, p.376
134
escolhidos pelo Presidente da República com aprovação do Senado Federal. Não
obstante seja um número pequeno, três Ministros, a interferência do Presidente da
República no colegiado, e em última análise, no Poder Legislativo está presente.
Se o Tribunal de Contas é um órgão com autonomia, mas com
função constitucional de auxiliar o Poder Legislativo, e se esta função é
preponderante para fiscalizar as contas do Poder Executivo, não tem fundamento
que o fiscalizado escolha o fiscalizador.
O fato da exigência de aprovação do Senado Federal, portanto
somente de uma das Casas do Congresso, e de que os escolhidos devem ser a
partir de uma lista tríplice do próprio Tribunal dentre seus auditores e membros do
Ministério Público junto ao Tribunal, não afasta a interferência do Presidente da
República.
Como já afirmado, a função constitucional do Tribunal de Contas
é de auxilio ao Poder Legislativo, por isto em obediência à teoria da separação dos
Poderes e em obediência à independência dos Poderes como cânone constitucional,
a escolha pelo Presidente da República é perfeita ingerência.
O que se percebe é que o Presidente da República tem
participação ativa em todos os segmentos políticos do Estado. Além de exercer a
função administrativa, está entranhado na estrutura do Poder Legislativo, bem como
do Poder Judiciário.
Com esta situação temos um mal decorrente do
presidencialismo brasileiro, consistente em permitir a intromissão direta do
Presidente da República em órgão do Poder que deve fiscalizar tecnicamente suas
contas.
Aliás, em obra de Maria Garcia encontramos frase de RUY
BARBOSA com a seguinte ênfase sobre o presidencialismo: “o poder dos poderes, o
grande eleitor, o grande nomeador, o grande contratador, o poder da bolsa, o poder
dos negócios, o poder da força”.111
O Presidente da República, como grande nomeador, não
nomeia somente no Poder Executivo, mas sim nomeia no Poder Legislativo e no
Poder Judiciário.
111 GARCIA, Maria – Presidencialismo e Parlamentarismo in Parlamentarismo ou Presidencialismo?, p.133
135
5.4. Nomeação para o Poder Judiciário.
A situação em relação ao Poder Judiciário é mais gravosa
porque, além de compor o órgão Supremo, nomeia nos demais Tribunais e em toda
a Justiça Federal, além do Conselho Nacional de Justiça.
Ao nomear integrantes do Poder Judiciário, o Presidente da
República efetivamente compõe os órgãos deste Poder exclusivamente conforme a
sua vontade.
Estas nomeações, em muitos casos, tem gerado dúvidas quanto
à imparcialidade exigível de todo Julgador, fazendo com que Imprensa questione as
decisões.
Em ações de cunho nacional com grandes repercussões e
também as de matéria eleitoral têm possibilitado a Imprensa fazer prognósticos dos
Votos a partir dos antecedentes do Julgador como, por exemplo, sua atividade
político-partidária e qual Presidente da República o nomeou.
Se a Imprensa tem feito estes questionamentos é evidente que
a população também faz, pois a Imprensa, livre como deve ser, também reflete o
pensamento da sociedade, pois, como afirmou RUI BARBOSA “A imprensa é a vista
da nação.”112
Há uma preocupação de que as nomeações para o Supremo
Tribunal Federal, bem como para os Tribunais Superiores seja fundada apenas no
relacionamento de amizade.
O tema já foi por nós tratado quando da eleição Presidencial de
2002, diante de questionamentos da e na Imprensa, no sentido de que toda
reclamação de determinado candidato era aceita enquanto a de outro, o da oposição
não. Isto em relação ao Tribunal Superior Eleitoral. 113
112 BARBOSA, Rui – Discursos, Orações e Conferências, A Imprensa, Vol.1, p.29 – “ A imprensa é a vista da nação. Por ela é que a nação acompanha o que lhe passa ao perto e ao longe, enxerga o que lhe malfazem, devassa o que lhe ocultam e tramam, colhe o que lhe sonegam, ou roubam, percebe onde lhe alvejam,ou nodoam, mede o que lhe cerceiam,ou destroem, vela pelo que lhe interessa, e se acautela do que a ameaça.” 113 CARVALHO, Jeferson Moreira de- Escolha na Corte in Revista Eletronica Consultor Jurídico, 03/11/2002. “Não é bom para o Estado e para a Nação que o Supremo se transforme numa Casa de Justiça integrada somente por ex-ocupantes de cargos eletivos, comprometidos por natureza com ordens partidárias, de direita, de esquerda, centro-direita, seja lá o que for. O integrante de partido político por questão de fidelidade deve sempre estar atrelado as diretrizes partidárias, o que não pode ocorrer
136
Pode-se pensar em justificar as nomeações para dar
legitimidade ao Poder Judiciário; entretanto a legitimidade encontra respaldo na
Constituição Federal.
Considerando que a composição do Poder Judiciário carece da
vontade popular expressa através das urnas, ao contrário dos demais Poderes, é
importante deixar consignado que a legitimidade democrática do Poder Judiciário é
real, o que afasta qualquer pensamento da necessidade de participação do
Presidente da República para as nomeações previstas pela Constituição Federal.
Tratando sobre a Democratização do Poder Judiciário, CELSO
BASTOS mostra parte da lição de Konrad Hesse, após afirmar que o Poder
Judiciário passa a ser, sem dúvida, o intérprete da lei, mas aliado a vetores que o
meio social lhe impõe, porque o magistrado não deixa de captar estes fluidos
dominantes no meio social que são indispensáveis para o exercício da sua atividade,
no sentido de que “La Constitución se compone de normas. Estas contienen
requerimentos dirigido a la conducta humana, no aún condutcta humana misma; lãs
normas non son más que letra muerta sin eficácia alguna cuando el contenido de
tales requerimentos no se incorpora a la conducta humana. El Derecho
constitucional en este sentido, no puede ser desvinculado de la actuación y em dicha
actuación resulta `realizado`, alcanza el mismo la realidad de un orden vivido,
formador y conformador de realidade histórica, pudiendo cumplir su função em la
vida de la Comunidad.”
Seguindo, conclui que “Sem dúvida nenhuma reside neste
particular um dos mais salientes aspectos do caráter democrático do Poder
Judiciário.”114
Mais à frente, o autor ainda enfatiza que a evolução do direito e
do Estado liberal, que também é social, acabou por trazer o Poder Judiciário para
dentro do jogo político. Então, seu compromisso não pode deixar de ser
com o Magistrado, que afastado das paixões políticos-partidárias, deve estar atrelado a Constituição, às leis e aos fins sociais a que se destinam, sem preocupação com idéias partidárias. No sistema brasileiro não combina parcialidade de partido político, que deve existir para defender suas posições, com imparcialidade dos magistrados, que é imprescindível para decidir para a sociedade”. 114 BASTOS, Celso – A Democratização do Poder Judiciário e a Democratização do Direito in Democracia, Hoje , p. 185 ( Tradução livre do autor: A Constituição se compõe de normas. Estas contem requerimentos dirigidos à conduta humana, não há uma mesma conduta humana; as normas não são mais que letra morta sem eficácia alguma quando o conteúdo de tais requerimentos não se incorporam à conduta humana. O Direito constitucional, neste sentido, não pode ser desvinculado da atuação e em dita atuação resulta “realizado”, alcança a mesma realidade de uma ordem vivida, formadora e conformadora da realidade histórica, podendo cumprir sua função na vida da Comunidade).
137
democrático, na medida em que aplica a Constituição e as leis, como acontece com
o Estado brasileiro que é um Estado democrático de Direito. Assim, a ação judicial,
em sua independência, constitui a fonte de legitimação democrática do Poder
Judiciário.
DALMO DE ABREU DALLARI afirma que “superados o
feudalismo e o absolutismo, os juízes se tornaram agentes do povo” 115. Na condição
agentes do povo, evidente, o juízes agem em nome deste mesmo povo; por isto a
legitimidade do Poder Judiciário é indiscutível.
Se os juízes são agentes do povo, e a magistratura tem parcela
desse poder soberano, evidente a legitimidade democrática do Poder Judiciário.
Na obra Tribunal e Jurisdição Constitucional, ANDRÉ RAMOS
TAVARES também se preocupa com o tema e dedica o Capítulo IV116 para provar a
existência da legitimidade democrática do Tribunal Constitucional, portanto
socorrendo de seus ensinamentos transporta-se para todo o Poder Judiciário a
essência do que ministra.
A primeira idéia é que todos os nomeados pelo Presidente da
República para composição de Tribunais, assim o são com fundamento no poder
recebido pelo Presidente através das urnas que expressou a vontade popular. De
forma indireta, o povo está fazendo a composição dos Tribunais, seja o
Constitucional, os Superiores ou os Regionais. Esta idéia dá suporte para o
processo de nomeação previsto pela Constituição Federal e legitima o Poder
Judiciário.
115 DALLARI, Dalmo de Abreu – O Poder dos Juízes, p. 88. –“No momento em que foram superados o feudalismo e o absolutismo, os juízes deixaram de ser agentes do rei ou de aristocratas poderosos para se tornarem agentes do povo. Isso ficou definitivamente claro com o aparecimento das Constituições escritas, no século dezoito. Foi transferida para o Estado a soberania, que antes era um atributo pessoal do rei, e se consagrou a tripartição do poder do Estado, entregando-se a magistratura uma parcela desse poder soberano, essencialmente político. Esse é um ponto importante, que não tem sido suficientemente considerado e que pode explicar inclusive,certas divergências teóricas: as decisões judiciais fazem parte do exercício da soberania do Estado,que,embora disciplinada pelo direito, é expressão do poder político.” 116 TAVARES, André Ramos – Tribunal e Jurisdição Constitucional, p.71/94.- “Assim, esse ato de soberania popular, ou mais precisamente sua manifestação ( o poder constituinte),caracteriza-se como uma potência criadora por excelência, pelo que tudo que vier a se instituir se reveste da necessária legitimidade, que sob esse ponto de vista é considerada como uma legitimidade direta.” (...) “Francisco Rezek lembra que “ Para proverbial escândalo- hoje um tanto mais discreto- dos pregoeiros do dogma de que numa democracia não há forma alguma de legitimidade sem o suporte das urnas, ensinaram o mundo os norte-americanos que uma parcela do poder público deve, por sua própria natureza,revestir cidadãos independentes do sufrágio político, e comprometidos tão só com a ordem legal- cuja composição de resto, não lhe imcumbe, mas aos órgãos de representação popular.”
138
Ao nosso ver, outros são os fundamentos para a
legitimidade democrática e por que, com estas nomeações, o Presidente da
República se transforma em uma pessoa com super poderes.
Conforme LASSALLE, já citado117, em essência a Constituição é
a soma dos fatores reais do poder que regem uma Nação, por isto a questão que
surge é saber se os fatores reais, se o povo quer entregar o Poder do Estado nas
mãos de uma só pessoa. A história tem mostrado que não.
Com este pensamento a supremacia dos poderes do Presidente
da República seria inconstitucional ao viés da Constituição, entendida como a soma
dos fatores reais do Poder. Estando o poder concentrado nas mãos de uma só
pessoa não há como pensar em soma dos fatores reais.
As outras idéias que dão suporte à afirmativa de que há
legitimidade democrática ao Poder Judiciário, todas elas encontram validade no
sistema constitucional.
No exercício do Poder Constituinte Originário, os representantes
do povo, escolhidos de forma democrática, escreveram a Constituição e nela fizeram
inserir a maneira de ingresso do Poder Judiciário, que deve ser através de concurso
público118, diante da necessidade de pessoas com conhecimentos jurídicos e
políticos.
Todos os Poderes do Estado são democráticos, na medida que
os Três estão previstos na mesma Constituição.
A legitimidade democrática do Poder Judiciário emerge da
legitimidade do legislador constituinte originário, escolhido pelo povo; assim no
momento em que este legislador fez a previsão do Poder Judiciário a legitimidade se
fez presente. Em suma, o juiz recebe do povo, através da Constituição a
legitimidade119, que dá, portanto, validade popular às suas decisões.
117 Nota 19 118 Art.93 da CF: “ O ingresso na carreira,cujo cargo inicial será o de juiz substituto, mediante concurso de provas e títulos, com a participação da Ordem dos Advogados do Brasil em todas as fases,exigindo-se do bacharel em direito, no mínimo,três anos de atividade jurídica e obedecendo-se, nas nomeações,à ordem de classificação;” 119 DALLARI, Dalmo, citado por André Ramos Tavares – Tribunal e Jurisdição Constitucional. p.76, nota 99. “O juiz recebe do povo, através da Constituição, a legitimação formal de suas decisões, que muitas vezes afetam de modo extremamente grave a liberdade,a situação familiar, o patrimônio, a convivência na sociedade e toda uma gama de interesses fundamentais de uma ou de muitas pessoas. Essa legitimação deve ser permanente complementada pelo povo, o que só ocorre quando segundo a convicção predominante, os guises estão cumprindo seu papel constitucional, protegendo eficazmente os directos e decidindo com justiça. Essa legitmação tem especial importância pelos efeitos políticos e sociais que podem ter as decisões judiciais.”
139
Tudo o que está previsto na Constituição tem fundamento
democrático, porque o constituinte só agiu em razão da escolha popular que lhe
delegou poderes para escrever a nova Constituição dando formato jurídico ao novo
Estado.
Composto o Poder Judiciário, sua legitimidade democrática
também se realiza através da sujeição dos Magistrados à Constituição e às leis que
emanaram da vontade popular; assim tem-se uma composição conforme a vontade
popular que está sujeita a aplicar e respeitar o ordenamento jurídico que também
emanou da vontade popular. A legitimidade democrática está, portanto,
consubstanciada no texto constitucional conforme à vontade do legislador
constituinte que agiu com fundamento na representatividade popular recebida
através das urnas.
Por fim, o autor, André Ramos Tavares, tratando de decisões
democráticas, mostra que estas dependem de sua conformação com as próprias
razões do principio democrático.
Expressa que “Aqui a questão entronca com a necessidade de
pessoas aptas a decidir, pessoas melhor qualificadas para manter o sistema
democrático como tal. Despontam, assim, os Tribunais Constitucionais, e os
magistrados que os compõem. Como pretende a Constituição brasileira, na mesma
linha de outras tantas, devem ser especializados. Daí a importante condição de que
contem com “notável saber jurídico”.120
De todo o estudo pode-se concluir com segurança que todo o
Poder Judiciário está investido da legitimidade democrática que se exige para
qualquer dos Poderes do Estado; deste modo não há motivo constitucional e
democrático para que o Presidente da República tenha o poder de intromissão no
Poder Judiciário.
O comportamento, como já exposto, afasta a independência
como cânone constitucional e transforma o Presidente da República como um Poder
acima do Judiciário.
A legitimidade democrática do Poder Judiciário encontra
embasamento na própria previsão constitucional do Poder e na sujeição dos
120 Vide nota 116
140
membros do Poder ao ordenamento constitucional e legal elaborado conforme a
vontade popular por meio de seus representantes diretamente escolhidos.
O Poder Judiciário exerce sua função por meio dos juízes
conforme a emanação popular escrita na Constituição, portanto coberta da
legitimidade democrática.
Enfim, Poder Judiciário e Democracia formam um par perfeito,
exigindo um a presença do outro a fim de se alcançar os fins pretendidos. Por isto
correta a afirmação de ANTOINE GARAPON de que “A justiça passa a ser o
instrumento de emancipação e o último recurso contra a implosão da democracia”.121
5.4.1. Nomeação para o Supremo Tribunal Federal.
De acordo com o art. 92 da Constituição Federal, o Supremo
Tribunal Federal é órgão da cúpula do Poder Judiciário, com sede na Capital Federal
e jurisdição em todo território nacional.
Sua competência precípua, por ordem do art. 102 da
Constituição é a guarda da própria Constituição.
Assim, a Constituição Federal está entregue ao Supremo
Tribunal Federal para que ele a guarde, isto é, faça impor em todo o território
nacional, para todas pessoas e para todos os Poderes, todos os princípios e regras
insculpidos na Carta Constitucional.
Atua o Supremo Tribunal Federal como o guardião, o curador da
Constituição por vontade do constituinte originário.
A concretização da Constituição Federal exige ação firme,
pronta, rápida e descompromissada do Supremo Tribunal Federal, cujo único
compromisso exigível é com a própria Constituição.
Em razão desta competência constitucional é que o “Tribunal
tem, portanto, a natureza de Corte Constitucional, a par das competências ordinárias
especificas, como expressa PAULO NAPOLEÃO NOGUEIRA DA SILVA”.122
121 GARAPON, Antoine - O Juiz e a Democracia- O guardião das Promessas, p.173. 122 SILVA, Paulo Napoleão Nogueira da – Curso de Direito Constitucional, p.241
141
Tem o Supremo Tribunal Federal a importância de ser a Corte
Constitucional, o que deve ser encarado como atribuição de relevante importância
para o Estado de Direito e para a democracia, porque só havendo um órgão que
exija respeito a Constituição, é que teoricamente vamos ter a segurança jurídica
desejada.
Sua importância está enfatizada por ANDRÉ RAMOS TAVARES
quando afirma que “sobreleva, pois a importância de um órgão fiscalizador da exata
compreensão do Texto Magno quando de sua aplicação, bem como do respeito a
ele pelo Poder Público, quando do exercício de suas atividades. E dentre todas as
atividades atribuídas ao Tribunal Constitucional brasileiro, destaca-se em função da
importância enquanto revelador dos valores constitucionais, a competência para
exercer o controle da constitucionalidade”.123
Dos ensinamentos podemos afirmar que o Supremo Tribunal
Federal é o órgão de cúpula do Poder Judiciário que tem a competência
estabelecida na Constituição Federal, a qual lhe dá a natureza de Corte
Constitucional, mas atuando também em questões ordinárias.
Ao tratar da composição o art.101, da Constituição Federal
dispõe que o Supremo Tribunal Federal compõe-se de onze Ministros escolhidos
dentre cidadãos com mais de trinta e cinco e menos de sessenta e cinco anos de
idade, de notável saber jurídico e reputação ilibada. Os Ministros do Supremo
Tribunal Federal serão nomeados pelo Presidente da República, depois de
aprovada a escolha pela maioria absoluta do Senado Federal (g.n.).
Então, a Corte Constitucional é composta por pessoas de
agrado do Presidente da República, desde que esteja na faixa etária permitida,
tenha notável saber jurídico e reputação ilibada.
É permitido, então, que seja nomeado para Ministro da Corte
Constitucional qualquer pessoa que esteja ocupando um cargo eletivo,que esteja
como deve ser, verdadeiramente compromissado e vinculado com posições político -
partidárias.
123 Op. cit, p.16
142
Se a justiça não pode se colocar no lugar da política124, com
muito mais razão a política não pode ser colocada no lugar da justiça, porque abre o
caminho para decisões e comportamentos afastados do compromisso com a
Constituição e direito vigente em privilégio as ideologias e compromissos partidários.
A substituição da justiça pela política retira toda a segurança
que o povo precisa para bem viver a vida estatal.
Com efeito, é pouco pensar que há uma interferência do
Presidente da República no Poder Judiciário quando ele, Presidente, faz as
nomeações.Não há uma simples interferência, há sim uma atuação direta do
Presidente da República no Poder Judiciário, porque ele compõe o Poder conforme
a sua vontade pessoal.
Presente a sua supremacia quando se percebe que a Corte
Constitucional órgão de cúpula do Poder Judiciário tem seus Ministros nomeados
sem que haja a mínima participação no processo do próprio Poder Judiciário.
Em resumo, a cúpula do Poder Judiciário é composta de acordo
com a vontade do Presidente da República, sem nenhuma participação do próprio
Poder, o que mostra que a independência não é tão real como deveria ser.
5.4.2. Nomeação para os Tribunais Superiores.
Na organização do Poder Judiciário, como visto, temos o
Supremo Tribunal Federal, que como a própria denominação já indica está em
posição superior em relação aos demais órgãos. A Constituição também prevê
Tribunais Superiores para decidirem questões especificadas e de âmbito nacional,
dando também ao Presidente da República o poder de compor estes órgãos.
Expressa o art. 104 da Constituição Federal que o Superior
Tribunal de Justiça compõem-se de, no mínimo, trinta e três Ministros.
124 Vide nota 121, p.53- “A justiça não pode se colocar no lugar da política; do contrário, arrisca-se a abrir caminho para uma tirania das minorias, e até mesmo para uma espécie de crise de identidade. Em resumo o mau uso do direito é tão ameaçador para a democracia como seu pouco uso.”
143
Os Ministros do Superior Tribunal de Justiça serão nomeados
pelo Presidente da República, dentre brasileiros com mais de trinta e cinco e menos
de sessenta e cinco anos de idade, de notável saber jurídico e reputação ilibada,
depois de aprovada a escolha pela maioria absoluta Senado Federal.
Percebe-se aqui a mesma redação quando a Constituição
Federal trata do Supremo Tribunal Federal, no entanto, os incisos do artigo
mencionado mostra, agora sim, a interferência do Presidente da República, porque
sua vontade já não é livre e exclusiva quando nomeia para a Corte Constitucional.
Um terço deve ser nomeado dentre juízes dos Tribunais
Regionais Federais e outro terço dentre desembargadores dos Tribunais de Justiça,
indicados em lista tríplice elaborada pelo próprio Tribunal.
Assim a nomeação destes dois terços vincula o Presidente da
República a nomear dentre aqueles que integram a lista tríplice elaborada pelo
Superior Tribunal de Justiça. Agora, há a participação do Poder Judiciário na
nomeação, que embora não tenha o Tribunal o poder de decisão ou de escolha, há
uma participação efetiva.
O outro terço é nomeado pelo Presidente da República entre
advogados e membros do Ministério Público Federal, Estadual, do Distrito Federal e
Territórios, alternadamente, conforme indicação dos respectivos órgãos de classe.
Em resumo, a nomeação para o Superior Tribunal de Justiça
recebe influência decisiva do Presidente da República porque, em última análise o
escolhido vai depender de seu ato de nomeação.
A partir do art.111, a Constituição Federal passa a tratar da
Justiça do Trabalho, cuja jurisdição é exercida em todo o território nacional, pois a
Justiça do Trabalho é órgão do Poder Judiciário Federal. Assim, os Estados-
membros não podem decidir judicialmente as questões trabalhistas, como afirma
AMAURI MASCARO NASCIMENTO.125
O Tribunal Superior do Trabalho é o órgão máximo da
Justiça do Trabalho. Estabelece o art. 111-A que o Tribunal Superior é composto de
vinte e sete Ministros escolhidos dentre brasileiros com mais de trinta e cinco e
menos de sessenta e cinco anos, nomeados pelo Presidente da República, após
aprovação pelo Senado Federal.
125 NASCIMENTO, Amauri Mascaro - Iniciação ao Direito do Trabalho, p.395
144
Um quinto dos Ministros deve ser escolhido dentre advogados
com mais de dez anos de efetiva atividade profissional e membros do Ministério
Público do Trabalho com mais de dez anos de efetivo exercício.
Os demais dentre juízes dos Tribunais Regionais do Trabalho,
oriundos da magistratura de carreira, indicados pelo próprio Tribunal Superior.
Quanto a nomeação dos juízes, ficou o Presidente da República
vinculado a indicação pelo Tribunal Superior, o que mostra pequena participação de
órgão do Poder Judiciário para nomeação de membros que vão integrar o próprio
Poder Judiciário.
No tocante a Justiça Eleitoral, a Constituição Federal fixa no art.
118, o Tribunal Superior Eleitoral como órgão máximo.
É este, então, o Tribunal Superior para dirimir questões
eleitorais e funciona como um terceiro grau de jurisdição, como já exposto, e em
regra suas decisões não devem chegar ao Supremo Tribunal Federal como mostra
PINTO FERREIRA ao afirmar que o “Tribunal Superior Eleitoral constitui o
coroamento máximo da Justiça Eleitoral, daí a irrecorribilidade das suas decisões
como regra geral.”126 , o que é extraído da interpretação do art.121, § 3º da
Constituição Federal.
Sua composição está regrada pelo art. 119 da Constituição
Federal que expressa a composição mínima de sete membros.
Três juízes são escolhidos mediante eleição, pelo voto secreto,
dentre os Ministros do Supremo Tribunal Federal, portanto, por via indireta, tem-se a
atuação do Presidente da República, porque ele foi quem escolheu os Ministros do
Supremo Tribunal Federal à sua vontade, como já sustentado anteriormente.
Dois juízes são escolhidos mediante eleição, pelo voto secreto,
dentre os Ministros do Superior Tribunal de Justiça, que mostra outra vez a atuação
presidencial, porque os Ministros do Superior Tribunal de Justiça são escolhidos e
nomeados pelo Presidente da República.
Por fim, dois juízes são nomeados diretamente pelo Presidente
da República, dentre seis advogados de notável saber jurídico e idoneidade moral,
indicados pelo Supremo Tribunal Federal.
126 FERREIRA, Pinto- Código Eleitoral Comentado, p.54
145
Está claro na composição do órgão máximo da Justiça Eleitoral
que o Presidente da República tem sua vontade explicita e contida na forma de
escolha, e mais diretamente quando escolhe dentre os Advogados.
Em suma, o Presidente da República faz a composição do
Supremo Tribunal Federal e do Superior Tribunal de Justiça. Depois, estes
nomeados por ele integram a composição do Tribunal Superior Eleitoral que se
completa com sua participação direta ao nomear dois juízes.
Cabe registrar ainda que o mandato é temporário, por dois anos,
nos termos do art. 121, § 2º da Constituição Federal.
Ao dispor sobre a Justiça Militar o art.122 da Constituição
Federal prevê o Superior Tribunal Militar como órgão máximo.
O Tribunal deve ser composto de quinze Ministros vitalícios
nomeados pelo Presidente da República, depois de aprovada a indicação pelo
Senado Federal.
Três são nomeados dentre oficiais-generais da Marinha, quatro
dentre oficiais-generais do Exercito e três dentre oficiais-generais da Aeronáutica,
todos da ativa e do posto mais elevado da carreira.
São nomeados também cinco civis, sendo três dentre
advogados de notório saber jurídico e reputação ilibada, com mais de dez anos de
efetiva atividade profissional e dois, por escolha paritária, dentre juízes auditores e
membros do Ministério Público da Justiça Militar.
Não havendo diferença das nomeações dos outros Tribunais, o
Presidente da República exerce sua supremacia escolhendo os integrantes da
Justiça Militar.
Resumindo o Presidente da República faz a composição da
Corte Constitucional e dos Tribunais Superiores do Estado brasileiro conforme a sua
vontade, havendo em determinadas hipóteses a vinculação de sua vontade à lista
apresentada.
5.4.3. Outras nomeações para o Poder Judiciário.
146
O legislador constituinte não se contentou em dar ao Presidente
da República o poder de nomear para a Corte Constitucional e Tribunais Superiores.
Verifica-se, na Constituição Federal, o poder de também nomear para Tribunais
Regionais quando se trata da Justiça Federal.
É incompreensível a idéia porque os Tribunais Regionais estão
inseridos na estrutura do Poder Judiciário, por isto as nomeações devem ser atos do
Poder Judiciário e não do Presidente da República que encarna o Poder Executivo.
É nebuloso enxergar a independência de um Poder quando é o
Chefe de outro Poder que faz as nomeações.
Os Tribunais Regionais Federais são compostos de no mínimo
sete juízes nomeados pelo Presidente da República dentre brasileiros com mais de
trinta e cinco e menos de sessenta anos de idade.
Um quinto de seus membros deve ser escolhido dentre
advogados com mais de dez anos de efetiva atividade profissional e membros do
Ministério Público com mais de dez anos de carreira. Os demais serão mediante
promoção de juízes federais.
Consoante dispõe o art.115 da Constituição Federal, os
Tribunais Regionais do Trabalho são compostos de no mínimo sete juízes nomeados
pelo Presidente da República.
Um quinto dentre advogados com mais de dez anos de efetiva
atividade profissional e membros do Ministério Público do Trabalho com mais de dez
anos de efetivo exercício.
Os magistrados serão escolhidos por promoção.
Os Tribunais Regionais Eleitorais,conforme a redação do art
120, compor-se-ão, mediante eleição e voto secreto de dois desembargadores e
dois juízes de direito escolhidos pelo Tribunal de Justiça do Estado e Distrito
Federal.
Um juiz do Tribunal Regional Federal com sede na Capital do
Estado ou no Distrito Federal.
Dois dentre seis advogados de notável saber jurídico e
idoneidade moral, nomeados pelo Presidente da República.
A participação e interferência do Presidente da República é
notada porque ele faz as nomeações dos dois advogados, devendo ser considerado
147
também que o juiz do Tribunal Regional Federal que for escolhido, foi nomeado para
este Tribunal por ato anterior do Presidente da República.
Concluindo, a Corte Constitucional, os Tribunais Superiores e os
Tribunais Regionais Federais, bem como os Tribunais especializados têm sua
composição vinculada à participação direta do Presidente da República.
5.5. Poder sobre os Poderes.
Não é demais mencionar novamente RUI BARBOSA com a
idéia de que, no presidencialismo, o Presidente passa a ter ou ser “o poder dos
poderes, o grande eleitor, o grande nomeador, o grande contratador, o poder de
bolsa, o poder dos negócios, o poder da força”.127
Como já afirmado anteriormente, o Poder Executivo encarna a
pessoa do Presidente da República. Em razão disto, o exercente do cargo se
posiciona como uma pessoa super poderosa. Neste contexto quem tem poder sobre
os demais Poderes não é o Poder Executivo, mas sim o Presidente da República
que, além de administrar o Poder para o qual foi eleito, intromete-se de maneira
preponderante no Poder Legislativo e Poder Judiciário.
A permissão constitucional para o Presidente da República
legislar por Medida Provisória utilizando de pressupostos subjetivos e também a
possibilidade de legislar através de Lei Delegada, sem a possibilidade de alteração
do texto por parte do Poder Legislativo, que tem a função primordial de legislar,
mostra a escandalosa supremacia.
O poder de nomear integrantes para o Tribunal de Contas, que
basicamente fiscaliza as contas do Presidente da República, porque o Presidente
tem em suas mãos o Tesouro Nacional, é dar poder para o fiscalizado nomear o
fiscalizador, o que mostra a hipertrofia.
127 Idem nota 74, p.133
148
Com o forte poder de legislar e nomear Ministros em órgão de
auxílio do Poder Legislativo, se torna evidente o Poder Presidencial ou o
absolutismo presidencial.
Então, quanto ao Poder Legislativo, que muitos sustentam ser o
Poder mais forte porque tem a função legislativa, o Presidente da República usurpa
a função quando legisla desmedidamente por meio de Medida Provisória e também
enfraquece o Poder porque escolhe e nomeia Ministros para o órgão fiscalizador.
O poder presidencial também se mostra hipertrofiado em
relação ao Poder Judiciário, na medida em que mesmo, sendo pessoa estranha ao
Judiciário, é ele quem faz a composição do Tribunal de cúpula, dos Tribunais
Superiores e dos Tribunais Regionais; além de nomear os integrantes do órgão de
controle.
Seu necessário comprometimento político-partidário não dá
isenção para escolher e nomear integrantes de órgão judicial.
Esta conduta também usurpa função porque cada Chefe de
Poder deve ter a atribuição de nomear para o Poder que representa.
A independência do Poder Judiciário está atrelada à vontade do
Presidente da República em escolher e nomear os membros do Supremo Tribunal
Federal, que é o órgão de cúpula do Judiciário Nacional e que ainda exerce a função
de Corte Constitucional.
Fazer a composição dos Tribunais Superiores e até mesmo de
Tribunais Regionais, mostra o Chefe do Poder Executivo fazendo a composição do
Poder Judiciário, o Poder que tem como missão nacional julgar os casos concretos
que são apresentados sem qualquer tipo de parcialidade, com compromisso apenas
com a Constituição Federal e as leis vigentes.
Este poder de escolha e nomeação mostra o absolutismo
presidencial incontestável e injustificável.
Não se quer dizer com isto que o sistema presidencial de
governo seja prejudicial ou que deva ser afastado, mas tão somente que o sistema
brasileiro precisa ser revisto para estabelecer, de forma clara e objetiva, a
competência de cada Poder de Estado e fazer valer a independência de modo que
cada Poder respeitando a Constituição tenha vida própria.
A independência constitucional dos Três Poderes não pode ser
apenas textual, deve ser real, efetiva e perceptível. Se houver permissão para que
149
um Poder ou o Chefe de um Poder controle os demais teremos uma ditadura, que
não é o desejo da Nação.
A legitimidade democrática dos Três Poderes provém da
Constituição Federal, por isto o sistema se desorganiza quando uma só pessoa
passa a impor sua vontade em todos os Poderes.
Em resumo, conforme a redação constitucional, não há dúvida
que o Presidente da República exerce poder sobre os Poderes, o que levou
SERGIO VICTOR TAMER a afirmar que o presidencialismo brasileiro é sistema de
concentração de poderes no âmbito do executivo.128
De obra de GEORGES BURDEAU também se pode concluir
que o afastamento da independência e a hipertrofia do Executivo faz gerar o Poder
sobre os Poderes. Ensina o autor que o principio da separação dos Poderes se
compõe de duas regras distintas: regra da especialização e regra da independência,
que em combinação dão o resultado sonhado: a liberdade.
Sobre a especialização ensina que “ Dans une version
forte de la doctrine, on considere que chaque autorité ou organe est investi d´un
pouvoir spécifique, nécessaire à l´exercice de sa fonction et on le désignera par le
nom de ce pouvoir. Il y aura donc um pouvoir législatif, um pouvoir exécutif,um
pouvoir judiciaire” . Quanto a regra da independência afirma categoricamente que
autoridade de um Poder não pode nomear em outro Poder: “ Il faut donc que les
autorités ou organes soient mutuellement indepéndents, ce qui signifie em
pratique que lês individus qui composent chacune de ces autorités ne doivent pás
être nommés par lês autres organes et surtout qu´ils ne doivent pás être
discrétionnairement révocables par ex.”129
128 TAMER, Sergio Victor – Fundamentos do Estado Democrático e a Hipertrofia do Executivo no Brasil, p. 252. “O certo é que, com a enorme expansão das faculdades do Estado, sobretudo em face da complexidade atual da ordem econômica, e a despeito da formação política autoritária de nossa República, o Poder Executivo fortaleceu-se de tal maneira que hoje coloca-se em questão o princípio da separação dos poderes.” 129 BURDEAU,George set all – Droit constitutionnel, L.G.D.J., p.102 ( Tradução livre do autor: “ Uma versão firme à doutrina, considera que cada autoridade ou orgão está investido de um poder específico, necessário ao exercício da sua função e será designado pelo nome do poder. Haverá então um poder legislativo, um poder executivo e um poder judiciário.” “ É necessário que as autoridades ou órgãos sejam mutuamente independentes, que significa, na prática, que pessoas investidas em qualquer destas autoridades não devem ser nomeadas por outros órgãos, e sobretudo que elas não devem ser discricionariamente dispensadas por aqueles outros órgãos.”
150
CAPITULO VI-
CONTROLE EXTERNO DOS PODERES DA REPÚBLICA
O chamado sistema de freios e contrapesos, conseqüência da
teoria de Montesquieu, como afirma SERGIO TAMER, pode ser visto como uma
forma de controle externo porque permite que um Poder controle o outro.130
A existência deste tipo de controle dispensa qualquer outro
porque gera a interdependência, o que faz com que cada Poder exerça sua função
de maneira não ilimitada, mas sim controlada pela própria conduta dos demais. Em
suma o Poder controla o Poder.
Diante da situação atual, em que a Emenda Constitucional
45/2004 instituiu um órgão de controle no Poder Judiciário, que embora inserido na
sua estrutura orgânica, na verdade se apresenta como órgão externo porque em
parte é composto por pessoas estranhas e oriundas também de vontades externas,
é de se exigir também, aceitando-se sua constitucionalidade, que os demais poderes
da República experimentem o mesmo tipo de controle.
Constitui tremenda falácia afirmar que o Poder Executivo e o
Poder Legislativo são controlados externamente através do voto, porque a história
tem mostrado que o povo brasileiro não tem condições e meios de exercer o controle
da conduta dos eleitos. Em diversas situações políticos renunciam a seus cargos
para se livrarem de processo de cassação; entretanto em eleições futuras o povo
novamente os elegem para os mesmos cargos. O carente povo brasileiro não tem
condições culturais para o exercício desta forma de controle.
É oportuno lembrar pensamento de WALDEMAR
ZVEITTER do ano de 1993, no item que trata de Independência e Autonomia entre
130 TAMER, Sergio – O controle externo e a separação do poderes in www.jornalpequenonet/ - “ ... sendo que o princípio de Montesquieu acabou por dar origem ao conhecido “sistema de freios e contrapesos”2 pelo qual os atos gerais, praticados exclusivamente pelo Poder Legislativo,consistente na emissão de regras gerais e abstratas,limitam o Poder Executivo que só pode agir mediante atos especiais,decorrentes da norma geral. Para
151
os Poderes do Estado, afirmando que a independência dos poderes no Estado
moderno, envolve, necessariamente, responsabilidade e mutua limitação, mas o
controle deve ser estabelecido sem que haja quebra na necessária autonomia.131
Deste modo, se não há conformismo com o sistema de freios e
contrapesos para que o controle dos Poderes da República seja efetivo, a criação do
Conselho Nacional de Justiça exige que seja criado, também, o Conselho Nacional
do Legislativo e o Conselho Nacional do Executivo.
Em última análise, o sistema de controle dos Poderes é um
sistema de auto-controle do Estado, que deve sofrer limitação em seu poder a fim de
que o direito de liberdade do povo seja efetivamente reconhecido e respeitado. E,
sobre a limitação dos Poderes do Estado, DUGUIT expressa que “ Ce n’est pas lê
pouvoir exécutif ou le pouvoir legislatif qui sont limites par le droit, c’este je le repete,
l´Etat lui-même, qu´il manifest son action par la loi ou par um acte d´administration
ou um acte jurisdictionnel.” 132
6.1. Controle externo do Poder Judiciário.
O controle externo do Poder Judiciário independente da criação
do Conselho Nacional de Justiça é fato que se realiza todos os dias por pessoas e
coibir a exorbitância de qualquer dos poderes de seus limites e competências,dá-se a ação fiscalizadora do Poder Judiciário.” 131 ZVEITTER,Waldemar – O Controle do Poder Judiciário in Informativo Jurídico da Biblioteca Ministro Oscar Saraiva do Superior Tribunal de Justiça, p.30. “Há de se reconhecer a procedência da assertiva que a independência dos poderes, no Estado moderno, envolve,necessariamente, sua responsabilidade e mútua limitação. E, desde que sofre o Legislativo o controle do Judiciário, que invalida leis tidas como inconstitucionais,submetendo-se, ainda, ao controle do Executivo pelo direito de veto e de iniciativa, certo que este, por sua vez, tem a legalidade de seus atos também controlada pelo Judiciário,vendo,ainda, sua atuação disciplinada pelo Legislativo, e esse controle não se há de imunizar o Judiciário como estranhável e injustificada exceção,quando nos países democráticos dispõem-se de formas de controle, como soe acontecer com o Executivo e o Legislativo.Contudo,penso, esse controle há de ser estabelecido sem a quebra da sua necessária autonomia e com a preservação da soberania jurisdicional, indispensáveis para o desempenho de sua missão constitucional.” 132 DUGUIT, Leon – Leçons de Droit public général, E.de Boccard,Editeur, p.254. Tradução livre do autor- “ Não é o poder executivo ou o poder legislativo que são limitados pelo direito, e eu repito, o Estado mesmo que manifesta sua ação pela lei, ou por um ato administrativo ou um ato jurisdicional.” . Ainda, “Falando de uma regra que limite os poderes do Estado, não espero falar de uma regra fixando um limite ao poder de certos órgãos do Estado, mas sim uma regra que restrinja os poderes do Estado nele mesmo, qualquer que seja de seus órgãos agindo.”
152
instituições que estão vinculadas às ações em tramitação, além de outras formas
previstas pela Constituição Federal.
Ao escrever sobre o tema, LUIZ FLÁVIO GOMES mostra
argumentos favoráveis a instalação do controle externo: “afirmam que o juiz não é
controlado por ninguém, que está isento de freios, que no Estado de Direito nenhum
órgão pode ficar sem controle etc.”133
Em entrevista, ALVARO LAZZARINI, quanto ao
controle externo do Poder Judiciário e sumula vinculante respondeu: “Quanto à
súmula vinculante sou favorável, mas contrário ao controle externo. A corregedoria,
o Conselho Superior da Magistratura e o órgão especial do Tribunal de Justiça são
atuantes. Não há razão para o controle externo. Por que não há controle externo na
OAB, no Ministério Público? Não interessa aos governantes um Poder Judiciário
forte?134
Em artigo conciso e objetivo, SAULO RAMOS conta como a
idéia nasceu no Brasil e o que ocorreu na França. “Um advogado irritou-se com a
lentidão do andamento de suas poucas causas perante determinado juiz federal de
São Paulo. Dias depois, ficou furioso porque uma de suas jovens estagiárias foi
maltratada pelo mesmo juiz. Corria o ano de 1990. O Plano Collor inundava o
Judiciário federal de ações e mais ações. Dez mil processos, por dia, para cada
magistrado. Mas o nobre colega queria saber das“suas”causas e da “sua”estagiária.
Movido por esta fúria, descobriu no “sebo”, velhos livros franceses com a receita do
remédio: o controle externo do Judiciário.135
133 GOMES,Luiz Flávio- A questão do controle externo do Poder Judiciário, p.33. “ Que seu controle precisa ser aprimorado e democratizado parece muito evidente. Mas não é correto afirmar que ele não em controle. O primeiro e fundamental controle do juiz consiste em que ele só pode aplicar a legislação aprovada pelo Poder Político. O juiz, desse modo,decide os conflitos que lhe apresentam e acordo com as pautas jurídicas traçadas em outro âmbito de poder. Tudo que invocar como fundamento da decisão tem que encontrar apoio no ordenamento jurídico vigente,sob pena de perda da sua legitimidade democrática. O orçamento da Magistratura, de outro lado, não é elaborado e executado imediatamente por ela: só depois de aprovado pelo Legislativo é que pode ser executado. A autonomia financeira do Judiciário é limitada por orçamentos elaborados em conjunto com os demais poderes. As unidades administrativas do Judiciário estão sujeitas à fiscalização contábil, financeira,orçamentária,operacional e patrimonial dos Tribunais de Contas,que são órgãos auxiliares do Poder Legislativo.No concurso de ingresso para a carreira de Juiz há a obrigatória e salutar participação da Ordem dos Advogados do Brasil. De todos os Tribunais, um quinto de seus ocupantes são oriundos das classes dos Advogados e do Ministério Público. Do Tribunal do Júri participam juízes leigos. Os Ministros do Supremo Tribunal Federal, órgão de cúpula do Poder Judiciário, são nomeados pelo Presidente da República, depois de aprovada a escolha pelo Senado Federal. Um terço do Superior Tribunal de Justiça é composto de Advogados e membros do Ministério Público.” 134 LAZZARINI, Alváro- A reforma de que o Judiciário precisa é a do processo in Informativo InterAção, p.4/5. 135 RAMOS, Saulo- renault e reynald, controle externo pelo lado de dentro in diálogos & debates, p.18.
153
Continuando, afirma que o controle externo na França era
exercido pelo Conselho Superior da Magistratura composto de políticos e
magistrados, incluindo-se o Ministério Público. No entanto, em razão do desastre,
política e politicalha tomaram conta do processo de controle, apadrinhamentos,
perseguições, bajulações, revoltas - tudo menos eficiência, a composição foi
alterada a fim de afastamento dos políticos ficando a composição somente de
magistrados. Esta situação fática se sobrepôs a qualquer fundamento jurídico ou
político de sustentação da idéia para o tipo de controle criado.
Tratando especificamente do assunto, LUIZ FLÁVIO GOMES
mostra que a experiência estrangeira de controle externo amargou séria decepção
porque os Conselhos mais parecem órgão do Governo do que órgão de governo da
Magistratura, por instrumentalizar o processo de movimentação dos Magistrados.136
O texto esclarece que, na França, em 1988 e 1990, o Poder Político aprovou leis de
anistia de todos os delitos cometidos para o financiamento ilegal das campanhas
eleitorais. Na Itália a situação não foi diferente. Em 20 de novembro de 1991, o
Conselho Superior Italiano foi impedido de discutir a independência do Ministério
Público em relação ao Poder Executivo, porque o Presidente da República proibiu a
discussão. Acompanhou a reunião por sistema de TV e mandou policiais ao local.
Efetivamente, o Estado de Direito não suporta a criação de um
Conselho que permite ao Presidente da República controlar, a fim de anistiar crimes
de políticos e proibir a discussão de um tema.
De acordo com o que já foi afirmado anteriormente, o Poder
Judiciário é o Poder mais controlado da República. Controle diário e de vários
segmentos. O Judiciário não está submisso a um órgão de controle, mas sim a
vários mecanismos, que até formam um sistema de controle. O controle é
perceptível sob vários enfoques137, como mostra SERGIO TAMER; de sorte que
136 Idem nota 133, p.23 . “Mais que órgão de Governo da Magistratura, os Conselhos externos, na verdade, mais parecem órgãos do Governo na Magistratura, com a função de instrumentalizar o controle tanto do acesso, da promoção,da aposentadoria etc. dos juízes, como da inteira política judicial. Essa foi a forma encontrada para que o Poder Executivo continue exercendo seu controle sobre o Poder Judiciário, seja de forma direta ( no que se relaciona com parte econômica e muitas vezes administrativas),seja de forma indireta (através dos Conselhos Superiores externos). E quando altos interesses do Poder Político entram em jogo é que se nota mais claramente o quanto é pernicioso para o verdadeiro e igualitário Estado Democrático de Direito esse controle externo partidarizado dos juízes e da Magistratura.”. 137 Op.cit. O controle externo e a separação de poderes. “ Convém lembrar,dentro desse panorama,que o Judiciário já é o mais controlado dos poderes pois a Constituição de 88 estabeleceu pelo menos seis mecanismos de controle: o ingresso na carreira mediante concurso público,com a participação da OAB; os julgamentos públicos públicos e as decisões fundamentadas para expor o ato judicial ao acompanhamento
154
além do controle diário praticado pelas partes em litígio,pelos Advogados que as
representam, pelo Ministério Público e pela publicidade das audiências e sessões, a
Constituição Federal prevê mecanismos específicos para atividade de controle.
Afora todos estes enfoques e mecanismos há o controle
processual que é aquele exercido pelas partes litigantes ou interessados.
É garantia de cada cidadão que julgada a questão que não lhe
atenda os interesses, há a possibilidade de um segundo julgamento, agora por
juízes de outro grau, isto é, com mais experiência e sempre por uma turma
julgadora.
A decisão de primeiro grau, dependendo da vontade da parte
sucumbente, sofre um controle judicial e passa por reexame em um colegiado.
O principio de recorribilidade também se apresenta como um
tipo de controle, na medida em que analisa constitucionalidade e legalidade dos atos
processuais porque “as lides ajuizadas devem submeter-se a exames sucessivos,
como garantia de boa solução”138 , conforme J.C.BARBOSA MOREIRA.
Exames sucessivos significam que as decisões estão sendo
controladas,ou seja, a função jurisdicional também experimenta este tipo de controle.
Com todo este sistema de controle a previsão de mais um
mecanismo externo tem o caráter de desequilibrar o mandamento constitucional de
independência dos Poderes,considerando que o Judiciário vai perdendo sua
autonomia.
A redação do art.2° da Constituição Federal induz a concluir que
o Poderes do Estado estão em mesmo plano constitucional139 por vontade do Poder
Constituinte originário, por isto qualquer mudança ou interpretação exige redobrada
cautela, a fim de que a ordem do Povo seja respeitada.
A primeira observação é que a Constituição determina são
Poderes, o que força concluir que estão no mesmo patamar de importância
constitucional, no sentido de que um Poder não está acima do outro, devendo todos
público; a destinação de 1/5 dos lugares em Tribunais de 2° grau a profissionais oriundos do Ministério Público e da advocacia; o controle do orçamento pelo Executivo e inspeção pelo Tribunal de Contas que também pode realizar inspeções e auditorias nas unidades administrativas do Judiciário; a indicação dos ministros do Supremo Tribunal Federal pelo Executivo e aprovação dos seus nomes pelo Legislativo”. 138 MOREIRA, J.C.Barbosa- Comentários ao Código de Processo Civil, p.270. 139 Art.2° da CF. – “ São Poderes da União, independentes e harmônicos entre si, o Legislativo, o Executivo e o Judiciário.”
155
eles, cada um agindo na sua função constitucional, procurar atingir o bem comum da
Nação.
Com a idéia de concretizar esta importância e igualdade
constitucional, o texto afirma que são independentes e harmônicos entre si.
Dando enfoque ao princípio da independência de cada Poder,
nos termos da Constituição originária, se percebe a ausência de combinação com
controle externo. Independência e controle externo estão em posições opostas.
A necessária independência advém da teoria da tripartição dos
poderes, que não admite que um Poder fique subjugado ao outro; todavia admite e
até impõe que um Poder controle o outro através do exercício da função típica de
cada um conforme o ordenamento constitucional. Esta independência se projeta
numa esfera própria de atuação, cuja fonte é a Constituição Federal.140
Escrevendo sobre a posição jurídico-constitucional dos
Tribunais, J.J.GOMES CANOTILHO afirma que a “função jurisdicional deve constituir
< monopólio> dos juízes, pelo que jurisdição e magistratura são conceitos
relacionados e reciprocamente considerados. A função jurisdicional exige
determinadas características aos magistrados: independência, inamovibilidade
(cfr.art.218.°).Do mesmo modo, a decisão jurisdicional caracteriza-se pela
imparcialidade e estrita juridicidade dos juízos”.141
No exercício da função jurisdicional, o magistrado deve se portar
e sentir-se independente das influências de órgãos internos do Poder Judiciário e
com mais razão de órgãos externos, sob pena de estar ameaçada a defesa dos
interesses e direitos protegidos dos cidadãos, violando a legalidade democrática e
os princípios fundamentais impostos pelo direito transcendental.
Como se verá adiante, a Emenda Constitucional nº 45 encontrou
uma fórmula de confundir independência interna com independência externa, porque
140 Vide nota 52. 141 Op.cit. 758. “A independência dos juízes,constitucionalmente assegurada, pressupõe: (1) uma independência externa,isto é, independência em relação a órgãos ou entidades estranhas ao < poder judicial>;(2) uma independência interna, ou seja independência perante os órgãos ou entidades pertencentes à organização judicial.” (...) “ Exige-se, por isso: (1) existência de várias instâncias judiciais e de recursos legalmente definidos(cfr.art.211.°); (2) a possibilidade da intervenção de juízes sociais no julgamento de questões de trabalho, de infracções contra a saúde pública e de pequenos delitos(CRP,art.210°/2); (3) fundamentação das decisões dos tribunais(cfr.208.°1). A exigência da < motivação de sentenças> excluo o carácter voluntaristico e subjetivo do exercício da actividade jurisdicional,possibilita o conhecimento da racionalidade e coerência da argumentação do juiz e permite as partes interessadas invocar perante as instâncias competentes os eventuais vícios e desvios das decisões dos juízes.”
156
instalou um órgão na estrutura do Poder Judiciário, mas inseriu na sua composição
membros estranhos ao Poder Judiciário.
Encontrou-se uma maneira de fraudar a independência que é
violada por um órgão que se diz interno, mas que é composto por estranhos e
nomeados pela atuação político-partidária.
A independência não pode ser textual, deve ser real.
Sobre a necessária independência do Poder Judiciário,
BURDEAU expressa que a inamovibilidade dos magistrados não é suficiente para
assegurar a independência, sendo que há risco de pressão do poder político: “ Mais
l´inamovibilité n´est pas une garantie suffisante por assurer l´indépendance dês
magistrates. En effet ceux-ci,comme lês autres fonctionnaires, ont vocation à faire
une carrière, c’est-a-dire à occuper dês post plus em plus eleves à l´intérieur de la
hiérarchie judiciaire. Le risque existe donc que le pouvoir politique tente de faire
pression sur les magistrats, et en particulier sur les magistrats du si`ege, em leur
promettant des promotions interessantes et rapides”;142 então, é reconhecida a
possibilidade de pressão política nos magistrados que são nomeados pelo
Presidente da República, e que diante dos sistema existente possam receber algum
tipo de promoção.
A existência desta pressão política já restringe a independência,
por isso é inaceitável outros mecanismos que diminuam ainda a mais a idealizada e
necessária independência.
Conclusão objetiva que se tira é que a teoria de Montesquieu
está fundamentada na repartição quanto ao exercício das funções estatais, de modo
que no exercício típico os Poderes se interdependem, o que impede que se
estabeleça um órgão paralelo que cause o surgimento de alguma espécie de
dependência.
Assim, a previsão de órgão de controle externo, somente para o
Poder Judiciário, importa no afastamento de sua independência, causando
desequilíbrio entre os Poderes do Estado. Só se admite esse afastamento de
142 Op.cit, p.685 Tradução livre do autor – “A inamovibilidade não é uma garantia suficiente para assegurar a independência dos magistrados. Com efeito, eles como os outros funcionários,com vocação a fazer uma carreira, quero dizer, ocupar os cargos mais e mais elevados no interior da hierarquia judiciária. O risco existe de que o poder político tente fazer pressão sobre os magistrados, e em particular sobre os juízes, prometendo promoções interessantes e rápidas”
157
independência do Poder Judiciário se houver a previsão de mecanismos
semelhantes para os outros Poderes.
6.1.1. Inconstitucionalidade da Emenda 45/2004.
De início cabe afirmar que o conceito de emenda contém a idéia
de alteração parcial, como mostra GUILHERME CALMON NOGUEIRA DA GAMA143,
então tem por fim promover uma alteração parcial na Constituição e de modo que
não modifique a estrutura básica na organização do Estado, porque do contrário cria
uma outra Constituição, um outro Estado e uma outra organização, o que foi
concretizado pela Emenda 45/2004, como se verá.
Não obstante, a decisão do Supremo Tribunal Federal que
julgou improcedente a Ação Direta de Inconstitucionalidade n° 3.367-1 proposta pela
Associação dos Magistrados Brasileiros, considerando constitucional a criação do
Conselho Nacional de Justiça e sua composição através de emenda constitucional,
em sede de estudos, como a presente tese, é cabível a discussão sobre o tema.
A Constituição Federal ao fazer previsão do Poder Constituinte
derivado, ou Poder de reforma tem o cuidado de eleger determinadas matérias como
de competência exclusiva do Poder Constituinte originário.
Cuidou a Constituição Federal de impor limites à ação do
legislador ordinário que se investe na função reformadora,com o fim de manter
intacta a estrutura do Estado e a segurança do povo.
O art.60, § 4º, III da Constituição Federal apresenta redação
categórica quanto à proibição de se tentar por emenda constitucional abolir a
separação dos Poderes.144. Com efeito, a leitura com mais afinco permite a
interpretar que a Constituição veda a deliberação de proposta que reduza a
143 GAMA, Guilherme Calmon Nogueira da – Alterações Constitucionais e Limites do Poder de Reforma, Ed.Juarez de Oliveira, p.46. “ A emenda pode ser uma das espécies de reforma da Constituição, mas pode também ter um sentido mais genérico,que abarque o que seria o objeto de revisão.O conceito de “emenda”contém a idéia de alteração parcial, mas não vinculado a menor importância ou reflexo da alteração.” 144 Art.60, § 4°,III da CF. “ Não será objeto de deliberação a proposta de emenda tendente a abolir: III- a separação dos Poderes;”
158
separação dos Poderes, quando expressa tendente a abolir; isto porque por fim à
separação dos Poderes começa-se pela redução desta separação.
Da leitura se percebe a importância que se deu ao tema porque
proíbe a deliberação da emenda,isto é, está proibida a discussão e votação de
emenda que verse sobre determinados e fechados temas.Em seguida, ratifica-se a
importância quando impõe a proibição não da emenda que cause a separação dos
poderes, mas da emenda que apenas demonstre a tendência da separação.
Deste modo, qualquer emenda em que se perceba a tendência
de afastar a separação dos Poderes, como criando controle do Poder Judiciário de
forma externa, é inconstitucional porque afronta o citado art.60 que faz a proibição.
Contudo, o entendimento do Supremo Tribunal Federal é
diverso do que pensamos, com argumentos sólidos constantes no Voto do Ministro
Cezar Peluso que decidiu pela improcedência da Ação Direta de
Inconstitucionalidade 3.367-1 proposta pela Associação dos Magistrados Brasileiros-
AMB, que tinha por fim o reconhecimento da inconstitucionalidade de criação do
Conselho Nacional de Justiça e sua atuação.
Expressou o Ministro CEZAR PELUSO antes de aprofundar-se
na questão que: “Não renuncio às minhas reservas cívicas, nem me retrato das
críticas pré-jurídicas à extensão e à heterogeneidade da composição do Conselho”,
isto em razão de sua oposição viva a um órgão de controle, quando era integrante
do Tribunal de Justiça de São Paulo, para em seguida expressar que julga a causa
perante a Constituição da República.
A preocupação legítima demonstrada na ação é a regra da
separação dos Poderes com o corolário da independência e por isto consta do Voto
que a separação está guardada pela Constituição da República, e que sob o prisma
constitucional não se vê como a criação do Conselho Nacional de Justiça possa
ofender o sistema de separação, porque o Conselho se trata de órgão do próprio
Poder Judiciário.145
145 PELUSO,Cesar – Voto na ADIN 3.367-1. “ Retomarei logo mais o tema, bastando por ora reavivar esta inconcussa verdade político-jurídica: é na exata medida em que aparece como nítida e absolutamente necessária a garantir a imparcialidade jurisdicional, que a independência do Judiciário e da magistratura guarda singular relevo no quadro da separação dos Poderes e, nesses limites, é posta a salvo pela Constituição da República. De modo que todo ato, ainda quando de cunho normativo de qualquer escalão, que tenda a romper o equilíbrio constitucional em que se apóia esse atributo elementar da função típica do Poder Judiciário, tem de ser prontamente repelido pelo Supremo Tribunal Federal,como guardião de sua inteireza e efetividade.” (...) “ Sob o prisma constitucional brasileiro do sistema de separação dos Poderes, não se vê a priori como possa ofendê-lo a criação do Conselho Nacional de Justiça. À luz da estrutura que lhe deu a
159
Nos termos do Voto, o poder constituinte derivado não profanou
os limites constitucionais da independência do Judiciário ao outorgar ao Conselho
Nacional de Justiça o proeminente papel de fiscal das atividades administrativas e
financeiras. Expressou que são antigos os anseios da sociedade pela instituição de
um órgão superior, capaz de formular diagnósticos, tecer críticas construtivas e
elaborar programas que dêem respostas dinâmicas e eficazes aos múltiplos
problemas comuns em que se desdobra a crise do Poder.
Não se pode esquecer que o Conselho criado integra
constitucionalmente o Poder Judiciário; entretanto não tem função jurisdicional e é
integrado também por pessoas que não são Magistrados; além da nomeação partir
do Presidente da República e da indicação do Senado Federal, que certamente tem
caráter político-partidário.
Incluir o Conselho na estrutura do Poder Judiciário foi o jeito
encontrado para se afirmar que não se trata de controle externo; afinal é órgão do
Judiciário, restando estranho sua composição por pessoas que não são Magistrados
e não exercer a função jurisdicional. Enfim, um órgão do Poder Judiciário que não
exerce a função do Poder Judiciário.
Quanto aos membros estranhos ao Poder Judiciário o Voto
apresenta a afirmação de que serve para erradicar o corporativismo.146
Enfim, o Voto mostra a constitucionalidade, de acordo com o
entendimento de seu Relator, do Conselho Nacional de Justiça, órgão integrante do
Poder Judiciário, que não exerce a função jurisdicional, com membros nomeados
pelo Presidente da República e parte deles estranhos à carreira da Magistratura.
Do assunto, em sede doutrinária. tratou IVES GANDRA DA
SILVA MARTINS em artigo de onde se tira que o “Poder Legislativo, o Poder
Emenda Constitucional n°45/2004,trata-se de órgão próprio do Poder Judiciário (art.92,I-A),composto, na maioria, por membros desse mesmo Poder (art.103-B),nomeados sem interferência direta dos outros Poderes, dos quais o Legislativo apenas indica, fora de seus quadros e, pois sem laivos de representação orgânica,dois dos quinze membros.” 146 Idem nota anterior- “Longe, pois de conspirar contra a independência judicial, a criação de um órgão com poderes de controle nacional dos deveres funcionais dos magistrados responde a uma imperfeição contigente do Poder, no contexto do sistema republicano de governo.Afinal, “regime republicano é regime de responsabilidade. Os agentes públicos respondem por seus atos. E os mesmos riscos teóricos de desvios pontuais, que se invocam em nome justas preocupações, esses já existiam no estado precedente de coisas, onde podiam errar, e decerto em alguns casos erraram, os órgãos corregedores. Nem embaraça a conclusão, o fato de que tenham assento e voz, no Conselho, membros alheios ao corpo da magistratura. Bem pode ser que tal presença seja capaz de erradicar um dos mais evidentes males dos velhos organismos de controle, em qualquer país do mundo: o corporativismo, essa moléstia institucional que obscurece os procedimentos investigativos,debilita as medidas sancionatórias e desprestigia o Poder.”
160
Executivo, o Poder Judiciário, o Ministério Público e a Advocacia Pública e a Privada
compõem o leque que Montesquieu defendeu para que, na separação do poderes, o
poder controlasse o poder”.147
Evidente na afirmação que o controle foi instaurado por
Montesquieu, mas no sistema de freios e contrapesos e não com mecanismo que
estabeleça a dependência de um dos Poderes em relação aos demais.
LUIZ FLÁVIO GOMES faz a pergunta e em seguida responde:
“Caso ocorresse violação do limite material imposto pelo art.60,§ 4º da CF, por
emenda ou até mesmo pela revisão constitucional, seria possível declarar a
inconstitucionalidade daquela ou do ato da revisão? A resposta é, sem sombra de
dúvida, positiva. Uma vez que a revisão constitucional está sujeita a limites (formais
e materiais), a não observância, pelo poder de revisão (ou pela emenda), dos limites
estabelecidos na Constituição, coloca-nos, consoante Gomes Canotilho, “perante o
problema da desconformidade constitucional das leis de revisão, problema esse que
não é substancialmente diferente do problema da inconstitucionalidade das leis
ordinárias, dado que o poder de revisão é um poder constituído e não uma novação
do poder constituinte.”148
Entende-se por desconformidade constitucional a apresentação,
discussão e votação de emenda constitucional que esteja em desconformidade com
a Constituição. A desconformidade constitucional apresenta substancialmente o
mesmo problema da inconstitucionalidade, isto é, existência de norma contrária aos
ditames constitucionais.
A questão dos limites da revisão constitucional foi enfrentada
por JORGE MIRANDA com a idéia de que deve-se garantir a intangibilidade de
certos princípios, porque é de princípios que se trata,não de preceitos avulsos. “Os
princípios garantem a essência da Constituição.”149 Os limites constitucionais de
147 MARTINS, Ives Gandra da Silva- Separação de poderes e controle externo na administração da justiça in Carta Forense, p.4. “O controle externo do Ministério Público, portanto, seria tão inconstitucional,como seria o controle externo do Poder Judiciário ou do Conselho Federal da Ordem dos Advogados do Brasil- que agrega advogados privados e os advogados da Advocacia Geral da União, os procuradores do Estado e do Município e as defensorias públicas.” 148 Op.cit. p.54/55 “ A teoria de que existem normas(emendas) constitucionais inconstitucionais ,difundida pelo jurista alemão Bachof, acaba aliás,de ser reconhecida uma vez mais pelo Supremo Tribunal Federal,que julgou inconstitucional a emenda Constitucional que havia criado o IPMF.” 149 Op.cit. p.180,185/186- “Por detrás destas divergências, o sentido fundamental revela-se contudo, o mesmo:garantir, em revisão, a intangibilidade de certos princípios – porque é de princípios que se trata,não de preceitos avulsos (os preceitos poderão ser eventualmente modificados,até para clarificação ou reforço de princípios , o contrário seria absurdo)(2).Mesmo quando a Constituição proíbe a revisão de artigos sobre a
161
revisão se apresentam, do mesmo modo que a separação dos Poderes, como
garantia da liberdade do cidadão. A única segurança que o povo tem que a estrutura
orgânica de seu Estado não será modificada são as cláusulas pétreas previstas pelo
Poder Constituinte originário.
Continua explanando sobre a doutrina no sentido de que o
poder de revisão, porque criado pela Constituição e regulado por ela quanto ao
modo de se exercer, porque poder constituído tem, necessariamente, de se
compreender dentro dos seus parâmetros; não lhe compete dispor contra as opções
fundamentais do poder constituinte originário. A faculdade de reformar a
Constituição é a faculdade de substituir uma ou várias regras constitucionais por
outras, no pressuposto de que fiquem garantidas a identidade e a continuidade da
Constituição considerada como um todo.
A faculdade do poder de revisão não é de fazer uma nova
Constituição, mas sim defendê-la na sua estrutura e alterar os preceitos que podem
ser alterados. As bases constitucionais não podem ser afetadas pelo poder de
revisão, sob pena deste extrapolar o poder que lhe foi confiado.
O que não pode o poder de revisão é mover os princípios
fundamentais.
Então, pode-se afirmar que a inconstitucionalidade não só atinge
as normas infraconstitucionais, mas também as emendas constitucionais que
oriundas do Poder derivado deve subordinar-se ao Poder originário.
Os representantes da Nação não podem agir além dos poderes
que receberam pela via democrática. Se estão investidos no poder reformador,
devem observar as regras e limites estabelecidos pelo poder inicial conforme
estabelecido no momento em que se previu este poder secundário.
Admitir a possibilidade de se afastar dos limites materiais é
também admitir a possibilidade de se afastar do procedimento imposto, por isso
revisão,são os princípios que visa defender,proventura aparelhando um mecanismo mais complexo para o efeito.” (…) “ Partindo do pressuposto da inalterabilidade do artigo, foi dito que < com isto não são apenas as conquistas revolucionárias do povo trabalhador que ficam consagradas na Constituição.Ficam também consagradas como principios fundamentais e esencia da própria Constituição, na medida em que são insuscetóveis de revisão constitucional(…)>(4) e que < se(…) todos os Srs.Deputados votaram de coração puro e sem qualquer espécie de pensamento reservado esse artigo sobre os limites materiais da revisão em Portugal terminou qualquer possibilidade de se dar um golpe de Estado constitucional.>(1).” “ Mais mitigadamente disse-se também que aquelas sucesivas alíneas < definem aquilo que é para nós o conteúdo esencial da Constituição,aquilo que marca a sua estrutura fundamental,aquilo que não pode ser alterado sob pena de esta Constituição deixar de ser a mesma Constituição.Eventualmente,poderia haver uma modificação formal deste precepto, mas nesse caso deixaria de ser a mesma Constituição em sentido material>.”
162
poderemos ter emenda constitucional votada em um só turno ou aprovada com
maioria absoluta ou até mesmo simples, ao invés de 3/5.
Os princípios da soberania popular, o democrático e o da
legalidade exigem que os representantes da Nação só possam emendar a
Constituição com a obediência restrita às condições estabelecidas no pacto
fundante.
O processo de elaboração da Emenda Constitucional nº 45/2004
contrariou frontalmente a Constituição Federal e conforme dispõe o art. 60,§ 4º não
deveria ser objeto de deliberação; entretanto o legislador constituinte derivado
extrapolando seu poder, ignorando a vontade do poder fundante, alterou a
Constituição na sua essência.
Com a promulgação da Emenda, na essência o que temos hoje
é uma nova Constituição, em que o Poder Judiciário está subjugado a um órgão
superior de controle.
O resultado foi a inserção, no art.92 da Constituição Federal,
como um dos órgãos do Poder Judiciário, o Conselho Nacional de Justiça com sede
na Capital Federal, da mesma maneira que o Supremo Tribunal Federal e os
Tribunais Superiores.
6.1.2. Conselho Nacional de Justiça.
No art.103-B a Constituição Federal passou a tratar do Conselho
Nacional de Justiça prevendo sua composição e competência.150
O Conselho assim está composto: um Ministro do Supremo
Tribunal Federal; um Ministro do Superior Tribunal de Justiça; um Ministro do
Tribunal Superior do Trabalho; um desembargador de Tribunal de Justiça; um juiz
estadual;um juiz do Tribunal Regional Federal;um juiz federal;um juiz de Tribunal
Regional do Trabalho e um juiz do Trabalho.
150 Art.103-B da CF. “ O Conselho Nacional de Justiça compõe-de de quinze membros com mais de trinta e cinco e menos de sessenta e seis anos de idade, com mandato de dois anos,admitida uma recondução,sendo:” - § 4°. “ Compete ao Conselho o controle da atuação administrativa e financeira do Poder Judiciário e do cumprimento dos deveres funcionais dos juízes, cabendo-lhe, além de outras atribuições que lhe forem conferidas pelo Estatuto da Magistratura:”
163
Cabe lembrar que o Ministro do Supremo Tribunal Federal; do
Superior Tribunal de Justiça; do Tribunal Superior do Trabalho; o juiz do Tribunal
Regional Federal e o juiz do Tribunal Regional do Trabalho, para estes cargos já
foram nomeados pelo Presidente da República.
Completa-se com um membro do Ministério Público da União,
um membro do Ministério Público Estadual, dois advogados e mais dois cidadãos
um indicado pela Câmara dos Deputados e outro pelo Senado Federal.
A inconstitucionalidade da emenda é muito clara, porque se
insere no Poder Judiciário pessoas oriundas do Ministério Público, que de certa
forma são dependentes do Poder Executivo. Depois advogados e pessoas de livre
escolha das Casas do Congresso Nacional.
Inadmissível integrar o Poder Judiciário pessoas de instituições
que não exercem poder e não receberam parcela da soberania e por isto não estão
investidas constitucionalmente da função jurisdicional.
Através destas pessoas nomeadas pelo Presidente da
República, estranhas ao Poder Judiciário, instituiu-se o controle externo do Poder
Judiciário que se apresenta inconstitucional por retirar a independência, que é um
dos princípios norteadores do equilíbrio que deve existir entre os Poderes do Estado.
No contexto, a nomeação pelo Presidente da República
demonstra a continuidade de sua supremacia sobre o Poder Judiciário, e como
afirma RICARDO CUNHA CHIMENTI, pode suscitar indagação acerca da violação
ao princípio da separação dos poderes.151
Compete ao Conselho o controle da atuação administrativa e
financeira do Poder Judiciário, além do cumprimento dos deveres funcionais dos
juízes.
Está incluído em suas atribuições, verificar legalidade dos atos
administrativos praticados por membros ou órgãos do Poder Judiciário, podendo
desconstituí-los ou revê-los, além fixar prazo para que providências sejam tomadas.
Ferindo drasticamente a autonomia dos Estados, um dos pilares
do pacto federativo e afirmado no art. 18 da Constituição Federal, cabe receber e
151 CHIMENTI,Ricardo Cunha at all- Curso de Direito Constitucional, p.369. “Questão que já assume grande importância diz com a norma do § 2° do art.103-B,que confere ao Presidente da República a competência para a nomeação dos membros do Conselho Nacional de Justiça,após aprovação pela maioria absoluta do Senado Federal. Por se tratar de um órgão de controle do Poder Judiciário, a nomeação de seus integrantes pelo Presidente da República pode suscitar indagação acerca da violação ao principio da separação dos poderes.”
164
conhecer das reclamações contra membros ou órgãos do Poder Judiciário, podendo
avocar processos disciplinares em curso e determinar a remoção, a disponibilidade
ou a aposentadoria. Também, rever de ofício ou mediante provocação, os processos
disciplinares de juízes e membros de tribunais julgados há menos de um ano.
Retomando o Voto do Ministro Cezar Peluso, encontramos que
o pacto federativo não se desenha nem expressa, em relação ao Poder Judiciário,
posto que tem caráter nacional.Trata-se de poder com unicidade e o mesmo
tratamento orgânico.152
O pacto federativo se impõe como convenção essencial da
República Brasileira, por isso os todos os Poderes do Estado estão a ele
subjugados. A unicidade do Poder Judiciário está centralizada na ação jurisdicional
que está submissa ao mesmo sistema jurídico; entretanto a União e cada Estado-
membro tem sua organização judiciária própria com fundamento na autonomia
constitucional.
A emenda, quanto ao Conselho, apresenta dois aspectos de
inconstitucionalidade.
A primeira, como visto, quebra a separação dos Poderes e por
isto afasta a independência do Poder Judiciário, impondo um controle externo com
aparência de órgão interno, que vai controlar a atuação administrativa, financeira e
disciplinar do Poder Judiciário, com o drástico poder de afastar juízes de suas
funções.
O afastamento da autonomia dos Estado quebra o pacto
federativo. O Conselho pode interferir em qualquer Estado-membro e determinar
afastamento de magistrado estadual, aprovado por concurso público.
O mesmo art.60, agora no inciso I do §4º, expressa que não
será objeto de deliberação a proposta de emenda tendente a abolir a forma
federativa de Estado. Este modelo escolhido pelo legislador constituinte originário
mostra a verdadeira intenção de conceder aos Estados-membros o poder de se
auto-organizar e por isto ter vida própria com fundamento constitucional. A
152 Idem nota 134. “O pacto federativo não se desenha nem expressa, em relação ao Poder Judiciário, de forma normativa idêntica à que atua sobre os demais Poderes da República. Porque, a Jurisdição, enquanto manifestação da unidade do poder soberano do Estado, tampouco pode deixar de ser uma e indivisível, é doutrina assente que o Poder Judiciário tem caráter nacional, não existindo senão por metáforas e metonímias, “Judiciários estaduais” ao lado de um “Judiciário federal”.”
165
pluralidade de centros de poder soberanos caracteriza o Estado Federal.153 Mais
esta interferência da União, que deveria ter quantidade mínima de poderes,
desrespeita a ordem constitucional.
Tem-se, com a competência do Conselho, um órgão federal,
portanto da União, intervindo nos Estados-membros, como que a União estivesse
em posição hierárquica superior frente aos demais entes federativos, quando neste
sistema, como aponta ANDRÉ RAMOS TAVARES, não se pode falar em hierarquia
entre os organismos de estrutura do modelo.154
Em resumo, de tudo que foi exposto a partir de teoria de
Montesquieu que teoricamente foi adotado pelo Poder Constituinte Originário de
1988, a Emenda Constitucional nº 45/2004 se apresenta em desconformidade com a
Constituição, portanto, inconstitucional, e por isto não deveria ter sido objeto de
deliberação porque centraliza o Poder, e de forma arrogante rompe a separação dos
Poderes ao subjugar o Poder Judiciário a um órgão integrado por pessoas estranhas
e também repugna o pacto federativo quando permite a este órgão atuar contra a
autonomia dos Estados-membros, interferindo no poder regional.
6.2. Conselho Nacional do Legislativo.
A idéia de controle está, evidentemente, ligada aos limites que
são impostos a cada Poder. Órgão controlado é órgão limitado.
Para o Legislativo, o pensamento que segue é importante: “O
Poder Legislativo é limitado e limitador dos demais poderes. Limitado pela
Constituição, porque só pode elaborar leis constitucionais; limitador porque no
153 Vide nota 58. 154 TAVARES,André Ramos- Curso de Direito Constitucional, p 784 e 808. “ Havia grande preocupação por parte dos autores da Constituição dos E.U.A.,observa Bernard Schwartz,de que “ o Governo nacional que estavam criando não fosse tão poderoso que, na pratica,tragasse os estados(...) procuraram conseguir isto limitando o Governo Federal a uma lista especifica de poderes enumerados(...) ao mesmo tempo que reservavam todo o resto de autoridade aos estados.” (...) “O constituinte realizou uma opção pela descentralização do poder(arts.22,23,24,25 e 30 da CF).Não por outro motivo se pode afirmar que o Estado brasileiro é federativo(art.18 da CF). A adoção desse modelo estrutural implica a admissão de autonomia para as entidades integrantes da federação.Portanto, não se pode falar em hierarquia entre tais organismos estruturantes do modelo federativo nacional.”
166
estado de direito não há um poder que possa decidir a não ser de conformidade com
o dispositivo de uma lei anterior” 155, conforme J.PINTO ANTUNES.
O Poder Legislativo como os demais Poderes sofre limitações
impostas pelas regras constitucionais e além disto sofre limitação oriunda do
exercício da função típica do Executivo e do Judiciário.
A teoria da Tripartição dos Poderes fez surgir o controle de um
Poder sobre o outro por meio do exercício das funções, o que impede o
estabelecimento de outras formas de controle porque acabam por desequilibrar o
posicionamento dos órgãos e extingue, ou ao menos, diminui a necessária
separação dos Poderes.
Em um mesmo plano Constitucional, diante da regra do art.2° da
Constituição Federal, que prevê a independência dos Poderes, se há a instituição de
um mecanismo de controle externo para um dos Poderes para o outro deve
haver,também, a instituição de algo semelhante.
Diante da Emenda Constitucional 45/2004 que inseriu na
estrutura do Poder Judiciário, o Conselho Nacional de Justiça em obediência ao
mencionado art.2° impõe a criação do Conselho Nacional do Legislativo.
Com a adequação necessária ao §4° do art.103-B da
Constituição Federal, a este Conselho caberia o controle da atuação administrativa e
financeira do Poder Legislativo e do cumprimento dos deveres funcionais dos
legisladores.
Afastado da função típica de legislar, o Conselho poderia
determinar que o legislador federal cumpra a Constituição fazendo elaborar as
inúmeras normas infraconstitucionais necessárias a dar efetividade às normas
constitucionais sem eficácia plena. Poderia convocar membros de CPI para
explicação sobre os motivos de estardalhaços na imprensa sobre o fato que se
apura.
A fim de afastar o alegado corporativismo poderia avocar
processos disciplinares contra legislador; enfim exercer funções que não sejam
típicas do Legislativo.
155 ANTUNES, J.Pinto – Da Limitação dos Poderes, p.25/26. “Até mesmo o Poder Legislativo é sujeito à lei elabora. Pode derrogá-la ou abrogá-la e até substituir a lei antiga por uma lei nova;mas enquanto ela existe,está submetido ao seu império,não podendo tomar decisão que seja contrária ao seu mandamento. A lei limita,pois,até o Poder Legislativo, que é o seu poder criador.”
167
Com composição híbrida e formado por quinze membros
escolhidos com a participação do Chefe dos Três Poderes o Conselho Nacional do
Legislativo, integrado na estrutura constitucional do Poder Legislativo, faz cumprir a
ordem constitucional de posicionar os Poderes em um plano de igualdade.
6.3. Conselho Nacional do Executivo.
Como o Poder que detém em suas mãos o poder financeiro do
Estado e como função típica à administração, o Poder Executivo na pessoa do
Presidente da República é o que mais justifica, aceitando sua constitucionalidade,
ser controlado por um órgão externo.
A hipertrofia do Poder Executivo tem a seu lado a hipertrofia da
União quem em razão de ter o poder econômico sob seu controle exerce uma
ditadura política156 sobre os demais entes da federação, o que seria mais uma
justificativa para instituição de um órgão superior de controle externo.
Atuando em todo o território nacional, o Conselho Nacional do
Executivo, de composição híbrida, integrado por quinze pessoas escolhidas por
atuação dos Chefes do Três Poderes, poderia fiscalizar as obras públicas, os
programas sociais de distribuição de dinheiro e questões federativas.
Poderia convocar o Chefe do Poder Executivo e Ministros de
Estado para que expliquem contratações dispensadas de concurso público e que
beneficiam pessoas do mesmo partido-político.
Caberia indagar por que não há a nomeação de interventor após
o Poder Judiciário determinar a intervenção estadual por falta de cumprimento de
normas constitucionais.
156 Vide nota anterior., p.161 “ A autonomia é fundamenalmente econômica;sem autonomia econômica não há autonomia política. É o caso brasileiro onde a Federação está de fato desaparecendo porque a União exerce uma verdadeira ditadura econômica sôbre os Estados-membros.” (...) “ A ditadura econômica da União condiciona e leva à ditadura política.”
168
Controlar a oportunidade e a conveniência das ações do
Executivo é o grande desafio157,ou seja, saber e entender por que houve a
construção de uma área de lazer quando naquele local a população carece de
escola, mas mesmo assim o Conselho poderia apurar os motivos determinantes e
depois dar conhecimento ao povo e ainda tomar as medidas cabíveis.
Desta forma, criado o Conselho Nacional do Executivo existiriam
inúmeras atribuições que poderiam ser reservadas e desta maneira os três Poderes
se equilibrariam.
Maneira de abandonar o controle pelo sistema dos freios e
contrapesos e manter os Poderes no mesmo nível constitucional é criar Conselho só
para um dos Poderes, o mais fraco politicamente. Aquele que não tem o poder
financeiro e nem o poder de legislar.
A situação não é simples como pode parecer porque no futuro
alguns poderão pensar em criar Conselhos para controlar os Conselhos existentes.
Se isto vier ocorrer, em razão do absolutismo presidencial
presente no Brasil, certamente o Chefe de um Conselho Maior será o Presidente da
República.
Enfim, para se adotar de maneira real e não somente textual a
independência e harmonia dos Poderes, conforme a vontade popular, é premente
que seja observado a ordem do constituinte originário e, para tanto, seja inserido em
cada respectiva estrutura o Conselho Nacional do Legislativo e o Conselho Nacional
do Executivo para atuarem ao lado do Conselho Nacional de Justiça.
Um Governo que é legítimo diante de escolha popular deve se
pautar por condutas harmonizadas com a mesma vontade popular e insertas no
Texto Maior, pois conforme GOFFREDO TELLES JÚNIOR “a Governo legítimo só
compete declarar o Direito natural, ou seja, o Direito harmonizado com a
ordenação ética,sonhada e querida pelo povo.”158
157 Vide nota 155, p.44 –“ O controlo da oportunidade, da conveniência da ação do Poder Executivo é, ainda hoje, o grande problema para a garantia das liberdades. Há, somente, meios indiretos de conter o discricionarismo do Presidente da República quando dele discorda o povo.”
169
CAPÍTULO VII
O EQUILÍBRIO DO PODER E A SOBERANIA POPULAR.
Como constatado e afirmado várias vezes o Poder é do povo. A
teoria da Tripartição, além da identificação das funções, fixa o campo de atuação de
cada um e permite o controle de um Poder sobre o outro.
A teoria,apesar de sua complexidade é muito bem delineada o
que não determina dificuldade em sua compreensão e aplicação.
O equilíbrio entre os Poderes, a separação entre eles, a
independência e harmonia sucede da vontade popular, porque o povo, através do
Poder Constituinte Originário, elegeu a teoria de Montesquieu para organizar os
Poderes e assim organizar o Estado conforme a redação do art. 2º da Constituição
Federal.
A Nação é soberana, a vontade do povo deve ser respeitada,
por isto os Poderes não podem se posicionar em patamares diferentes, ao contrário,
devem estar no mesmo plano constitucional, e muito menos o Presidente da
República, que não é Poder, mas sim exerce um dos Poderes.
A soberania deve ser sempre observada e presente
porque está arraigada da vontade popular, aliás, já afirmamos em outra
oportunidade que soberania existe em razão da vontade popular.159
No exercício das funções, aqueles que exercem o poder
indivisível do Estado não podem se afastar da vontade popular, porque esta é
soberana. A vontade popular que está inserida na Constituição impõe que seja
158 Op.cit, p.66. “Ao Governo legítimo,deve repugnar a promulgação dos Direito artificial, isto é, a promulgação de mandamentos em conflito com a normalidade ambiente; de mandamentos que sejam a contrafação do Direito,embora levem,muitas vezes, o rótulo de Direito.” 159 CARVALHO, Jeferson Moreira de – Poder Constituinte, Funções e Limites, p. 20. “O Estado moderno abandonou, salvo algumas exceções, as teorias teocráticas, por isso deve-se concluir que a soberania existe em razão da vontade popular, que é a fonte de criação do Estado,do poder do Estado e portanto da soberania. Se esta fonte é a vontade dos cidadãos,eles são titulares da soberania do Estado, e a soberania é imposta pela vontade firme dos cidadãos,por intermédio daqueles que exercem o poder indivisível do Estado”.
170
mantida a independência dos Poderes, não estando, portanto, um sujeito à vontade
do outro, seja na função típica, seja no sistema de composição, seja através de um
controle diverso do admissível.
Não deve ser admitido que o Presidente da República no
exercício de sua função constitucional pratique atos que efetivamente interferem nos
Poderes Legislativo e Judiciário porque em cada conduta com esta força, afasta a
independência constitucional abandonando de vez a vontade popular.
Manter o equilíbrio entre os três Poderes significa que cada um
exerça sua função sem o medo de influências externas de qualquer outro;
precisamente significa possibilitar que o Poder Legislativo e o Poder Judiciário
exerçam suas funções sem a interferência do Presidente da República.
No entendimento de ANTONIO JOSÉ MIGUEL FEU ROSA
sobre o equilíbrio entre os Poderes, a Constituição Federal de 1988 causou um
enfraquecimento do Poder Executivo e do Poder Judiciário em comparação com a
Constituição de 1967. Após identificar as várias condutas do Poder Executivo que
exige aprovação do Poder Legislativo, expressa que a “nova Constituição, como
demonstram os textos analisados, trouxe inegavelmente, um espantoso
enfraquecimento do Executivo, não apenas em comparação ao que gozava pela
Carta revogada, mas mesmo em relação à de 1946”.160
Ao tratar do enfraquecimento do Poder Judiciário mostra que
este sofreu ação do Poder Executivo e do Poder Legislativo.Mostra o
enfraquecimento, como por exemplo, na forma de listagem do quinto constitucional
que agora é elaborada pelos órgãos de classe, a ausência de verdadeira autonomia
financeira além de imposições diretas as pessoas dos magistrados 161 e concluiu que
160 ROSA,Antonio José Miguel Feu- Direito Constitucional, p.310 – “ Acabada a Segunda Guerra Mundial, com a vitória das democracias contra o totalistarismo, o vento liberalismo voltou a soprar, e as Constituições de então,inclusive a nossa,de 1946, retrataram essa tendência.A esta altura,alguns passaram a defender até mesmo o fim do Estado, definido como “ uma grande ficção,através do qual todo mundo se esforça para viver às custas de todo mundo.Nossa Constituição atual, findo o período autoritário em que vigorou o modelo “ De Gaullista” de governo, com um Executivo forte, promove notório enfraquecimento do Executivo, que perde muitas de suas atribuições,sem ganhar nenhuma.” 161 Art.95, Parágrafo único da CF. “ Aos juízes é vedado: I- exercer, ainda que em disponibilidade,outro cargo ou função,salvo uma de magistério; II- receber, a qualquer título ou pretexto,custas ou participação em processo; III- dedicar-se a atividade político-partidária; IV- receber, a qualquer título ou pretexto, auxílios ou contribuições de pessoas físicas, entidades públicas ou privadas,ressalvadas as exceções previstas em lei; V- exercer a advocacia no juízo ou tribunal do qual se afastou,antes de decorridos três anos do afastamento por aposentadoria ou exoneração.” - Art.36 da Lei Complementar 35/79 . “ É vedado ao magistrado: I- exercer o comércio ou participar de sociedade comercial,inclusive de economia mista, exceto como acionista ou quotista; II -exercer
171
a Constituição Federal trouxe um ostensivo enfraquecimento ao Poder Judiciário,
que perdeu atribuições e sofreu invasões em sua esfera de competência exclusiva.
Com a Constituição Federal de 1988 o Poder Judiciário só perdeu.162
A nosso ver, como é possível constatar do conteúdo do trabalho,
o Poder Executivo não teve enfraquecimento.
Com relação ao Poder Judiciário, não há dúvida que hoje
é um Poder enfraquecido em relação ao Poder Executivo precisamente em relação
ao Presidente da República. Em relação ao Poder Legislativo, na verdade a situação
do Judiciário não é tão diferente, pois este, na função reformadora da Constituição
Federal, legisla sem que haja participação ativa do Judiciário.
Por fim, se o povo fez uma escolha, esta deveria ser observada
porque a segurança do povo é a suprema lei, como ensina MARIA GARCIA ao falar
sobre o pensamento de Hobbes.163 A segurança do povo deve sim estar assentada
na suprema lei, na medida em que esta só foi elaborada por determinados
constituintes em razão da escolha eletiva pela vontade do povo.
Então, o respeito a vontade do povo exige o equilíbrio dos
poderes e não a supremacia de um deles ou do Presidente da República em
detrimento dos demais. A segurança do povo está na tripartição do Poder do qual é
titular e no equilíbrio que deve haver entre os Poderes resultantes da tripartição.
Para que isto possa ocorrer, alterações constitucionais devem
ser propostas com o fim de adequar atribuições e competências para melhor
posicionar os Poderes e permitir que o controle de um sobre o outro seja
cargo de direção ou técnico de sociedade civil, associação ou fundação, de qualquer natureza ou finalidade, salvo de associação de classe, e sem remuneração; III- manifestar, por qualquer meio de comunicação,opinião sobre processo pendente de julgamento,seu ou de outrem,ou juízo depreciativo sobre despachos, votos ou sentenças,de órgãos judiciais,ressalvada a crítica nos autos e em obras técnicas ou no exercício do magistrado.” 162 Op.cit. p.312/315. “O Legislativo, em sua tarefa demolidora do equilíbrio que deve reinar entre os três Poderes do Estado, açoitou-se impiedosamente, e o Executivo cortando-lhe competências, e prerrogativas a torto e a direito, não se esqueceu, por outro lado, de arrancar algumas das já reduzidas atribuições do Judiciário.”(...) “d) A alegada “ autonomia financeira” consistirá na elaboração, pelos tribunais,de suas propostas orçamentárias, “ dentro dos limites estipulados conjuntamente com os demais Poderes na lei de diretrizes orçamentárias”,e “o encaminhamento da proposta” será feito ao Poder Legislativo, que,naturalmente, a aprovará,ou não.”(...)“ Houve, incontestavelmente ,ostensivo enfraquecimento do Judiciário, que perdeu atribuições, sofreu invasões na área de sua competência exclusiva e ganhou pouco, nada ou quase nada na nova Constituição.” 163 GARCIA, Maria – Desobediência Civil , p.130. “A segurança do povo é a suprema lei(...) tal como a segurança do povo dita a lei através da qual os príncipes aprendem qual é o seu dever, também ela lhes ensina uma arte que haverá de proporcionar benefícios a eles próprios; pois o poder dos cidadãos é o poder da cidade,isto é, daquele que tem a suprema regra da cidade.”
172
efetivamente exercido conforme a construção de Montesquieu e não com o
absolutismo do Presidente da República.
7.1. Extinção ou modificação das Medidas Provisórias.
Seria simples propor uma emenda constitucional que previsse a
extinção das Medidas Provisórias; entretanto esta pode não ser a solução porque é
sabido que a morosidade do Poder Legislativo em legislar pode causar sérios danos
às questões nacionais de relevância.
Com o fim de preservar a função típica do Poder Legislativo e
lhe restituir o prestígio que deve ter, a extinção das Medidas Provisórias é a
providência mais justa, devendo ser considerado também como já foi esplanado o
abuso na edição desta espécie normativa.
Deve ser relevado, também, a dificuldade no controle dos
requisitos constitucionais, porque o requisito de relevância mais se aproxima de um
entendimento subjetivo do que objetivo, tornando-se difícil a verificação da
configuração objetiva, conforme conclui HUMBERTO BERGMANN ÁVILA ao fazer
comparações entre o antigo Decreto-lei e a Medida Provisória.164
O interessante a ser observado é que o Poder Legislativo, que
tem em mãos o Poder Constituinte derivado, não toma nenhuma providência para
barrar os abusos cometidos pelo Presidente da Republica.
No momento histórico atual, os próprios governistas afirmam
que há abuso, mas não tomam providências legais.
O Senador ALOISIO MERCADANTE (PT-SP) líder do governo
no Senado Federal protestou contra votações a toque de caixa de seis medidas
provisórias que estavam prestes a perder a validade, reclamando: “Como vou ser
líder do governo nesta condição? Mostrou o líder governista um relatório minucioso
para informar que das 65 Medidas Provisórias assinadas pelo Presidente da
164 Op. cit. p.29. “No que concerne aos requisitos materiais para edição, o decreto-lei podia ser expedido em casos de urgência ou de interesse público. A alternatividade dos requisitos deflagradores da competência para a edição do decreto-lei, se comparada à sistemática adotada pela CF para a expedição das medidas provisórias, demonstra diversidade atinente aos requisitos materiais. A edição da medida provisória depende da verificação
173
República no ano de 2004, apenas 31 foram consideradas indispensáveis. Afirmou
ainda: Chegamos ao limite e a situação está insustentável”. 165
A indignação está fundamentada no abuso consistente em
considerar qualquer assunto relevante e urgente, o que em tese justifica até ação
perante o Supremo Tribunal Federal com o fim de coibir a conduta, mas sem
esquecer que “a regra é a não apreciação pelo Supremo da urgência mas,em casos
flagrantementes não urgentes, há prestação jurisdicional para reconhecer a
inconstitucionalidade da espécie em comento.166
Pensamos que o correto é a extinção da espécie normativa por
simples emenda constitucional restituindo assim o poder de legislar a quem deve
efetivamente exercê-lo, entretanto se aceitarmos a necessidade de certa
maleabilidade, o instituto da Medida Provisória deve de fato ser encarado como algo
excepcional e não como uma regra de conduta do Presidente da República.
Para se tornar exceção e afastar o abuso nas edições, deve
haver emenda constitucional que estabeleça taxativamente quais as matérias podem
ser tratadas pelas Medidas Provisórias e não como consta da redação do art. 62, §
1º que veda a edição para determinadas matérias.167
Estabelecido o campo de atuação ou as matérias que podem
ser tratadas, o Presidente da República já tem delimitado sua conduta.
Também, é importante que haja emenda constitucional
afastando o direito de reedição, isto é, admitir somente uma única edição.
Legislar é atribuição do Poder Legislativo, por isto as Medidas
Provisórias retiram este poder do Legislativo e transferem ao Presidente da
não só de um requisito material de difícil configuração objetiva(relevância),como também de um requisito temporal(urgência).” 165 MERCADANTE, Aloisio -Jornal O Estado de S. Paulo, Sexta feira,26/11/2004, p.A10- Nacional. 166 Idem nota 97 . “O Presidente da República diante de urgência e relevância,pode expedir medidas provisórias, que possuem força de lei pelo período de sessenta dias.A questão da urgência,em regra, fica a cargo da decisão do Poder Executivo, deixando o Supremo Tribunal Federal de apreciar a matéria. No entanto, em caso de evidente inexistência da alegada urgência,o Pretório Excelso adentra em sua análise e reconhece a inconstitucionalidade da utilização da medida provisória em face da carência de urgência. Assim, a regra é a não-apreciação pelo Supremo da urgência, mas,em casos flagrantemente não urgentes, há prestação jurisdicional para reconhecer a inconstitucionalidade da espécie em comento.” 167 Art.62, § 1° da CF. “ É vedada a edição de medidas provisórias sobre matéria: I- relativa a: a) nacionalidade,cidadania,direitos políticos, partidos políticos e direito eleitoral; b) direito penal, processual penal e processual civil; c) organização do Poder Judiciário e do Ministério Público, a carreira e a garantia de seus membros; d) planos plurianuais, diretrizes orçamentárias,orçamento e créditos adicionais e suplementares,ressalvado o previsto no art.167,§ 3°; II- que vise a detenção ou seqüestro de bens, de poupança popular ou qualquer outro ativo financeiro; III- reservada a lei complementar; IV- já disciplinada em projeto de lei aprovado pelo Congresso Nacional e pendente de sanção ou veto do Presidente da República.”
174
República, que sem nenhum constrangimento se torna o maior legislador no território
brasileiro.
Manter o Poder Legislativo com seu prestígio, dar-lhe a função
que lhe pertence e cumprir a vontade popular significa retirar do Presidente da
República o poder de legislar de maneira ilimitada, ou, se entender que há
necessidade de o Presidente legislar, sua conduta deve ser excepcional, portanto,
somente para matérias previamente fixadas e por uma única vez de maneira
provisória.
7.2. Extinção ou modificação das Leis Delegadas.
Esta espécie normativa primária não alcançou êxito porque ao
Presidente da República é muito mais prático legislar por Medida Provisória com o
poder que lhe é dado pela Constituição Federal do que solicitar delegação ao
Congresso Nacional para elaborar a norma.
Da praticidade na expedição da Medida Provisória, a Lei
Delegada se tornou inútil e também porque para elaborar um projeto de lei
ordinária,como anotado por VICENTE PAULO, o Presidente da República não
necessita de delegação, haja vista já possuir delegação ampla.168
Se não tem utilidade, o melhor que se faz é simplesmente
expurgar a espécie normativa do processo legislativo.
O que se vê é que o Presidente da República tem em mãos
duas espécies para legislar, o que mostra sua supremacia e forte ingerência na
função legislativa.
Entretanto, com a mesma idéia, se há necessidade de se
manter a espécie a mesma precisa seja modificada para permitir que o Congresso
Nacional ao receber o texto da lei possa fazer emendas.
168 PAULO,Vicente et all- Aulas de Direito Constitucional, p.319. “Ora, essa previsão constitucional,em verdade é dotada de pouca utilidade, haja vista, que, para elaborar um projeto de lei e submetê-lo à apreciação do Congresso Nacional, o Presidente da República não necessita de delegação, haja vista já possuir legitimação ampla, fixada no art.61 da Constituição Federal. A nosso ver, a vantagem desse procedimento,por meio de
175
Dispõe o art. 68, § 3º da Constituição Federal que se a
resolução determinar a apreciação do projeto pelo Congresso Nacional, este a fará
em votação única, vedada qualquer emenda.
Esta disposição constitucional chega a ponto de impedir que o
Poder Legislativo exerça sua função típica: legislar. Entretanto, para coibir eventual
extrapolação do Presidente da República, cabe ao Congresso rejeitar in totum o
texto apresentado ou sustar a referida lei delegada, “paralisando seus efeitos
normais” como indica ALEXANDRE DE MORAES.169
Como uma maneira de não expurgar do Poder
Legislativo a função que é essencial à sua existência, deve-se reconhecer o direito
de, na sessão única, fazer emendas ao texto apresentado pelo Presidente da
República.
Desta forma, se mantém o controle de um Poder em relação ao
outro e não afasta o Poder Legislativo de sua função primordial que é legislar.
Se de fato há necessidade de se prever uma espécie normativa
que produza efeito rápido, basta extinguir a Medida Provisória e manter a Lei
Delegada com fixação de prazo exíguo para a edição de Resolução e depois, se o
caso, apreciação do texto elaborado.
É evidente que muitas idéias surgem para alterar o Texto Maior
e podem com outros mecanismos aperfeiçoar as espécies normativas da Medida
Provisória e da Lei Delegada, entretanto o que importa é que deve haver, por parte
do legislador constituinte, uma tomada de posição e fazer valer a vontade popular.
7.3. Outro método de nomeação para o Tribunal de Contas.
delegação legislativa atípica,seria a impossibilidade de apresentação de emenda parlamentar ao projeto de lei delegada, elaborado pelo Executivo.” 169 Op.cit. p.545. “Dessa forma, extrapolando o Presidente da República os limites fixados na resolução concedente da delegação legislativa, poderá o Congresso Nacional, através da aprovação de decreto-legislativo, sustar a referida lei delegada,paralisando seus efeitos normais. A sustação não será retroativa,operando,portanto,ex nunc, ou seja, a partir da publicação do Decreto Legislativo,uma vez que não houve declaração de nulidade da lei delegada,mas sustação de seus efeitos.”
176
Como visto, além de atuar como legislador, o Presidente da
República também interfere no Poder Legislativo quando nomeia os Ministros do
Tribunal de Contas que é órgão de auxílio do Legislativo, com a função principal de
tomar as contas do Presidente da República, ou seja, ele nomeia quem vai fiscalizar
o gasto público.
Dispõe o art. 73 da Constituição Federal que o Tribunal de
Contas da União é integrado por nove Ministros, sendo que um terço será escolhido
pelo Presidente da República e dois terços pelo Congresso Nacional.
Adequar a escolha de modo a manter o equilíbrio entre os
Poderes e afastar a interferência do Presidente da República depende da ótica que
se tenha da questão.
Havendo entendimento de que o Tribunal de Contas é órgão
auxiliar do Poder Legislativo, conforme se extrai da redação do art.71 da
Constituição Federal, com objetivo de exercer o controle externo na fiscalização
contábil, financeira, orçamentária, operacional e patrimonial. Então, a fim de manter
a independência seus membros, deveriam ser escolhidos somente pelo Poder
Legislativo, ou seja, pelo Senado Federal e pela Câmara dos Deputados.
Deste modo, com um raciocínio lógico o Poder Legislativo deve
escolher e nomear os integrantes deste órgão que lhe é auxiliar, e também porque,
mesmo não sendo um Poder, o Tribunal de Contas deve ter sua independência
funcional reconhecida e preservada.
Leciona JOSÉ F.F.TAVARES que “toda a actividade de gestão
exige, para sua eficácia, um bom sistema de controlo, podendo, mesmo considerar-
se indissociáveis os sistemas de gestão e de controlo”. Mesmo havendo o sistema
de controle interno “foi surgindo a necessidade dos Estados, de criar um órgão de
controlo financeiro externo e independente.” 170
Agora, com o entendimento de que, embora sendo, o Tribunal
de Contas, um órgão auxiliar do Poder Legislativo, mas que exerce a função da
tomada de contas dos Três Poderes o princípio da igualdade dá fundamento para
que os Ministros deste Tribunal sejam escolhidos com a participação do Poder
Legislativo, Executivo e Judiciário.
170 TAVARES, José F.F. – O Tribunal de Contas, p.22.
177
Para fundamentar esta idéia, tem-se a lição de CASTRO
NUNES, citado por Orlando Soares, que embora sobre a Constituição de 1946, pode
ter aplicação perante a Constituição de 1988, no sentido de que o Tribunal de
Contas está entre os Poderes, não pertencendo a nenhum deles.171
Está definido pela Constituição e pela legislação
infraconstitucional como deve ser o controle orçamentário de todos os Poderes do
Estado, portanto, considerando que os Poderes estão no mesmo patamar
constitucional, os Três devem participar da escolha dos membros do órgão auxiliar.
Em resumo, a escolha deve ficar somente a cargo do Poder
Legislativo porque é o Poder que tem também a função de fiscalizar ou deve ficar a
cargo dos Poderes Legislativo, Executivo e Judiciário, porque os Três são
fiscalizados e estão na mesma posição constitucional.
Não se encontra motivo que justifique a permissão ao
Presidente da República de interferir na nomeação de órgão auxiliar do Poder
Legislativo, quando o Poder Judiciário que também é fiscalizado não faz nenhuma
escolha.
A primazia do Presidente da República desequilibra os Poderes,
estando evidente que mesmo cumprindo os requisitos constitucionais ele age de
acordo com sua conveniência, não se olvidando de que, como salienta HELIO SAUL
MILESKI172, em comparação com o sistema constitucional anterior houve uma
evolução com natureza democrática diante da participação do Executivo e do
Legislativo. Assim, a evolução só se completa com a participação também do
Judiciário.
171 Op.cit. p.405. “Na opinião de Castro Nunes, o Tribunal de Contas, estruturado nos moldes da Carta Política de 1946, é órgão autônomo e independente e não como Delegação do Parlamento, aduzindo que dito órgão está entre os Poderes, “a nenhum deles pertence propriamente, nem ao Judiciário nem à administração como jurisdição subordinada, porque já então seria absurdo que pudesse fiscalizar-lhe os atos financeiros; nem mesmo ao Legislativo,com o qual mantém maiores afinidades”(Teoria e Prática do Poder Judiciário,p.25). 172 MILESKI, Helio Saul – O Controle da Gestão Pública, p.216. “ Como se vê, a escolha dos membros do Tribunal de Contas evoluiu para um aspecto de natureza democrática,com a participação do Executivo e do Legislativo, cabendo ao Parlamento, de forma justa, o maior número de indicações, por ser este, na qualidade de representante de todos os segmentos sociais, o detentor do controle externo. Contudo, há também um indubitável realce do caráter técnico, uma vez que a escolha deve ocorrer entre Auditores e membros do Ministério Público, profissionais qualificados,com ingresso mediante concurso público; ou entre pessoas que
178
7.4. Outro método de nomeação para Poder Judiciário.
Além de nomear integrantes de órgão auxiliar do Poder
Legislativo, o Presidente da República tem o poder nomear integrantes do próprio
Poder Judiciário como amplamente mostrado anteriormente.
Esta concentração de poder nas mãos do Presidente da
República o coloca em posição superior aos três Poderes, sendo certo que ele
encarna o Poder Executivo que já experimenta hipertrofia.
Para manter o equilíbrio esperado pela Nação, não se admite
que o Poder Judiciário tenha cargos para que o Presidente da República presenteie
amigos vinculados a partidos políticos e que usem do Poder Judiciário como um
trampolim e retorno posterior às atividades partidárias, como mostra a imprensa.
Exige-se uma mudança radical a fim de manter a imparcialidade
e a independência do Poder Judiciário que vai resultar no equilíbrio tão desejado.
Como órgão de cúpula e Corte Constitucional, o Supremo
Tribunal Federal representa todo o Poder Judiciário perante a ordem interna e
externa. De certa forma representa a Justiça Federal e a Justiça dos Estados
membros.
Nesta condição não se pode admitir que sua formação seja de
vontade do Presidente da República com simples homologação do Senado Federal,
como nos mostra a história.
A redação do art. 101 da Constituição Federal173 assegura ao
Presidente da República o exercício da sua vontade.
Na prática, o Presidente da República escolhe alguém que
preencha os requisitos da idade, capacidade jurídica e honestidade e o nomeia para
integrar outro Poder, que de acordo com a Constituição Federal é independente.
Manter o equilíbrio entre os Poderes e fazer valer a
independência impõe-se que os nomeados para o Supremo Tribunal Federal sejam
pessoas oriundas da classe da Magistratura Federal e Estadual.
sejam detentoras de formação profissional adequada e possuam experiência comprovada no exercício dessas atividades...” 173 Art.101 da CF. “ O Supremo Tribunal Federal compõe-se de onze Ministros,escolhidos dentre cidadãos com mais de trinta e cinco e menos de sessenta e cinco anos de idade,de notável saber jurídico e reputação ilibada.
179
Os juízes federais e estaduais, de maneira bem mais acentuada
os estaduais, são pessoas com experiência de julgar questões locais e, portanto
sabem a necessidade das pessoas simples do povo. São pessoas com experiência
nas atividades correicionais de cartórios, delegacias de polícia, entidades que
abrigam menores, etc.
Estes magistrados vivem as dificuldades financeiras do próprio
Poder, das pessoas que procuram o Judiciário e das diversas entidades.
Com efeito, ao julgarem questões nacionais, esta experiência
vivida por dezenas de anos vai influenciar em aplicar a legislação com justiça e
equidade.
Não obstante a mais alta capacidade jurídica do nomeado,
permite a Constituição Federal que o Presidente da República escolha uma pessoa
que não tenha tido nenhuma experiência de julgar e, portanto não experimentou os
efeitos de sua decisão na vida das pessoas nas grandes e pequenas cidades e
também aquelas decisões de efeitos nacionais.
Não basta impor ao Judiciário um Ministro de mais alto
conhecimento técnico, mas sim também deve ter tido a experiência de ser julgador.
Diferente de outros sistemas jurídicos o órgão máximo do Poder
Judiciário no Brasil atua também como Corte Constitucional, por isto a nomeação de
seus membros apresenta maior complexidade e exige satisfazer as necessidades do
Judiciário e da Corte Constitucional.
Encontramos na Constituição da República Portuguesa que o
Tribunal Constitucional é composto por treze juízes, mas havendo uma combinação
do requisito técnico com o político, porque seis de seu membros, obrigatoriamente
são oriundos da carreira da Magistratura.174
Esta disposição constitucional permite ao Poder Judiciário a
participação na vida política e organizacional do Estado.
Parágrafo único. Os Ministros do Supremo Tribunal Federal serão nomeados pelo Presidente da República, depois de aprovada a escolha pela maioria absoluta do Senado Federal. 174 Art.224° da Constituição da República Portuguesa. “1. O Tribunal Constitucional é composto por treze juízes,sendo dez designados pela Assembléia da República e três cooptados por estes. 2. Seis entre os juízes designados pela Assembléia da República ou cooptados são obrigatoriamente escolhidos dentre juízes dos restantes tribunais e os demais entre juristas”.
180
Para CANOTILHO, a composição do Tribunal Constitucional é
problema central da organização do Estado e envolve transparência política e
legitimação.175
Na Espanha a situação não é diferente. O Poder Judiciário tem
sua participação na formação do Tribunal Constitucional conforme a redação do art.
159.
O Tribunal Constitucional é formado por doze membros
nomeados pelo Rei, com participação do Congresso, do Senado, do Governo e do
Conselho Judicial, devendo ainda a nomeação recair também entre magistrados.176
A participação do Poder Judiciário na escolha e nomeação dos
integrantes da mais alta Casa de Justiça, com efeito, significa cumprir a teoria da
Tripartição do Poderes, reconhecendo independência e equilíbrio entre os Poderes.
É certo, entretanto, que o Conselho é órgão híbrido, mas deve se considerar que a
Espanha está regida pelo sistema parlamentarista.
Há que se transportar a teoria para a realidade e dar efetividade
na separação do Poder Judiciário em relação ao Poder Legislativo e Poder
Executivo sob pena de não haver respeito à liberdade conforme afirmou
Montesquieu: il n’ y a point de liberté si la puissance de juger n’ est pas separée de
la puisance législatife et de l’ executrice.
Em palestra na Associação Paulista de Magistrados o Senador
PATRICE GÉLARD da República Francesa afirmou que “tenho receio em relação
175 Op.cit. Direito Constitucional, p.765. “A composição de um tribunal constitucional, dadas as funções jurídico-políticas a ele atribuídas, é sempre problema central da organização do Estado, independentemente das dimensões acentuadas na escolha concreta dos juízes( preparação técnica, capacidade funcional do órgão, função de integração da jurisprudência constitucional,representação das várias <sensibilidades políticas>,distanciação perante os poderes político-partidários, exigência de legitimação democrática. De um modo geral, em todos os tribunais constitucionais criados no após guerra teve-se em conta a necessidade de legitimação democrática dos juízes através da participação dos órgãos de soberania directa ou indirectamente legitimados, na eleição ou escolha de seus membros. A favor desta <transparência política> argumenta-se com o facto de ser preferível emanarem os juízes constitucionais de órgãos democraticamente legitimados,embora com indiscutível cunho político, do que de outros órgãos com uma mundividência política também irrecusável, mas disfarçada num aparente <apartidarismo institucional>. Assente a necessidade de uma legitimação democrática, o problema desloca-se para este outro campo: o modus de escolha dos juízes constitucionais. Este deve corresponder ao padrão político-organizatório constitucionalmente consagrado.O equilíbrio e interdependência dos órgãos de soberania terá de encontrar expressão adequada na composição do órgão considerado como o <arco de volta> da estrutura organizatória da Constituição.” 176 Artigo 159 da Constitución española .- Tradução livre do autor- “ 1. O Tribunal Constitucional compõe-se de 12 membros nomeados pelo Rei, sendo quatro por proposta do Congresso por três quintos de seus membros, quatro por proposta do Senado com idêntica maioria; dois por proposta do Governo e dois por proposta do Conselho Geral do Poder Judicial. 2. Os membros do Tribunal Constitucional deverão ser nomeados entre Magistrados e Fiscais, Professores de Universidade, funcionários públicos e Advogados, todos eles juristas de reconhecida competência com mais de quinze anos de exercício profissional.
181
aos Tribunais Constitucionais cujos membros são nomeados pelo Presidente da
República”.177, porque o hábito é a nomeação de pessoas com comprometimento ao
nomeador.
A afirmação mostra que a preocupação também acontece em
outros sistemas, mas que se assemelha ao nosso, como se extrai do texto de
PIERRE AVRIL e JEAN GICQUEL expondo que “ conformément au modele
européen, lesjuges constitutionnels ne son pás de magistrats de carrière. Au nombre
de neuf,ils sont designes par dês autorités politiques: le Président de la Republique,
le président du Sénat et le président de l´Assemblée nationale(art.56 de la
Constitution) (C).”178
O temor se estende quando a nomeação não é somente ao
Supremo Tribunal Federal como Tribunal Constitucional, mas sim para todos os
Tribunais Superiores, além da Justiça Federal.
Da preocupação do Senador francês se observa que o zelo
deve ser em manter a independência da Corte Constitucional em relação aos demais
Poderes; para nós o objetivo é maior, porque se funda em manter a independência
de todo o Poder Judiciário e não somente da Corte Constitucional
Para se manter a independência, o equilíbrio e afastar qualquer
influência do Presidente da República no Poder Judiciário, importa em que os
nomeados para o Supremo Tribunal Federal o sejam pelo Presidente do próprio
Supremo Tribunal Federal após receber a listagem de nomes.
A fundamentalidade da proposta está em manter a
independência do Poder Judiciário na medida em que ele escolhe seus integrantes,
observando-se evidentemente os requisitos constitucionais.
177 GÉLARD, Patrice – Transformações do Direito Constitucional na sociedade contemporânea in Tribuna da Magistratura, p.24. “Atualmente não existe Constituição Moderna que não possua uma jurisdição constitucional assegurando a proteção a esses direitos. No entanto, é preciso estar muito atento à leitura do texto Constitucional, é preciso zelar para que o Tribunal Constitucional seja efetivamente independente em vista dos outros órgãos do poder, o que não é sempre o caso. Tenho receio em relação aos Tribunais Constitucionais cujos membros são nomeados pelo Presidente da República porque sabemos que quando se nomeia,não temos o hábito de nomear pessoas que nos são advsersários ou hostis.” 178 AVRIL, Pierre et al – Lê Conseil constitutionnel, Montchrestien, p.66 ( Tradução livre do autor. “ Conforme o modelo europeu, os juízes constitucionais não são magistrados de carreira. Ao número de nove, eles são designados por autoridades políticas: O Presidente da República, o presidente do Senado e o presidente da Assembléia nacional” . Ainda, “ Eles atuam colegialmente e não em câmara distinta como na Alemanha. Entretanto sua origem foi posta em consideração, em matéria contenciosa de eleições paralemtares: O Conselho forma, para sua função, três seções de instrução,composta de três membros designados por à sorte entre os escolhidos por alguma das autoridades nominadas. Mas o Conselho julgará cada caso, em formação plenária, para tomar a decisão.”
182
Surge a complexidade se a escolha for recair em somente em
integrantes da Magistratura Nacional, o que exigiria, talvez, a edição de lei
complementar para prestigiar a justiça federal e a estadual bem como as regiões do
País.
Também, pode-se pensar em nomeação com a participação dos
três Poderes sob o argumento de que a Corte Constitucional exige conhecimentos
técnicos-jurídicos, mas também conhecimento de política interna e externa.
Esta idéia considera que o Supremo Tribunal Federal tem como
competência precípua a guarda da Constituição, mas também que é obrigação dos
demais Poderes respeitar e fazer respeitar a Constituição.
Considerando que a nomeação é para integrar a Corte
Suprema, caberia ao Presidente da República indicar lista tríplice, e aquela
escolhendo um nome indicaria ao Senado Federal que faria a audiência pública
prevista pela Constituição.
Aprovado o nome o Supremo Tribunal Federal, seria
comunicado, e seu Presidente providenciaria a nomeação.
Por esta forma, os três Poderes, independentes e harmônicos,
estariam participando da formação do órgão de cúpula do Poder Judiciário que
também atua como Corte Constitucional.
Haveria a união do poder técnico-político que é o Judiciário, do
poder administrador-político: o Executivo, e do poder estritamente político, o
Legislativo (Senado) que representa os Estados, e em última análise o povo
também.
Outra maneira seria aproveitar o procedimento atual alterando
apenas o poder de escolha.
Caberia ao Supremo Tribunal Federal, como faz hoje o
Presidente da República escolher os nomes; por isto poderia a escolha recair em
pessoas fora da carreira da Magistratura Federal ou Estadual ou poderia recair
obrigatoriamente dentre os integrantes do Superior Tribunal de Justiça.
Em escolha livre, o Supremo Tribunal Federal teria conduta
semelhante a atual do Presidente da República. Mas se a escolha estiver vinculada
aos integrantes do Superior Tribunal de Justiça teremos um fortalecimento do Poder
Judiciário.
183
Ainda, inspirado na Constituição Portuguesa e na Constituição
Espanhola, a origem dos indicados e nomeados poderia ser de parte estranha a
Magistratura e outra parte de integrantes da Magistratura Federal e Estadual.
Com esta origem binária se prestigia a Magistratura e os
Juristas estranhos ao Poder Judiciário, com uma combinação técnica-política.
Várias maneiras existem para a alteração do texto
constitucional, de modo que seja afastada a ingerência do Presidente da República
e ainda mostrar a população de que fato o Poder Judiciário é independente.
A segurança política e jurídica do povo, que no momento
histórico em que vivemos está abalada, como mostra SILVANA DE FREITAS no
jornal Folha de São Paulo: Por sua vez, Jobim encerrou a cerimônia deixando claro
que Lula contará, nos próximos dois anos, com uma espécie de aliado político no
principal cargo do Judiciário179 , precisa ser readquirida a fim de cumprir a ordem
constitucional de separação dos Poderes.
O Presidente do Supremo Tribunal Federal não poder ser aliado
político do Presidente da República, deve ser somente aliado da Constituição e das
leis.
Sofre o Poder Judiciário a crise da descrença por este e por
outros motivos, como lentidão, por exemplo. Por isto tudo, o que leva aumentar esta
descrença deve ser afastado, porque o ideal é manter os três Poderes equilibrados e
fortes, com o fim de dar liberdade à Nação.
Consta do Editorial do Boletim da Associação dos Advogados de
São Paulo que “Entre nós, como é público e notório, há um sem-número de
disposições constitucionais que não passam de meras declarações pomposas. E
disso não passam porque, desrespeitadas, o Poder Judiciário não as faz valer. São
peças de ficção.” 180
O que leva a este e outros entendimentos é o sistema. Portanto,
para que haja o equilíbrio e a crença de independência e harmonia, a forma de
nomeação exige que seja revista.
Se não há justificativa para o Presidente da República nomear
os Ministros do Supremo Tribunal Federal, muito menos estão presentes para a
179 FREITAS, Silvana de – Jobim defende Lula de ataque da OAB ao assumir o Supremo in Folha on line, 04/06/2004. 180 Boletim da Associação dos Advogados de São Paulo, p. 1.
184
nomeação de outros magistrados. Os órgãos judiciais que exercem e realizam a
jurisdição são afetados pelo sistema jurídico em seu aspecto técnico; deste modo a
preponderância na escolha destes magistrados deve se fundar na combinação
jurídico-política,o que impõe que a atribuição de escolha e nomeação deva ser do
Poder Judiciário e não do Presidente da República.
Por fim, resta a nomeação para o Quinto Constitucional.
Não cabe neste estudo a análise sobre a justificativa da
necessidade do Quinto Constitucional, consignando apenas o que consta da lição de
MANOEL GONÇALVES FERREIRA FILHO que com isto se pretendeu injetar nos
tribunais o fruto da experiência haurida em situações outras que a do juiz.181
O art.94 da Constituição Federal emite a ordem de que um
quinto dos membros dos Tribunais Regionais Federais, dos Tribunais do Estados, e
do Distrito Federal e Territórios devem ser compostos por integrantes do Ministério
Público,e de Advogados, que são nomeados pelo Presidente da República ou
Governador.182
Nesta hipótese, a interferência não é só do Presidente da
República, mas também do Governador do Estado e do Distrito Federal.
A existência do Poder Judiciário como órgão independente por
ordem da Constituição, impõe que seus membros, incluindo-se os oriundos do
Quinto Constitucional, sejam nomeados pelo Chefe do Judiciário. No âmbito dos
Estados-membros, a atribuição de nomeação deve recair sobre o Presidente do
respectivo Tribunal de Justiça.
Não há justificativa para que o Governador do Estado ou do
Distrito Federal tenha esta atribuição diante das normais pressões partidárias que
recebe, detalhe que não se coaduna com assuntos judiciais.
Manter o equilíbrio e a independência importa em que o Poder
Judiciário Federal e Estadual adquira ou resgate o seu direito e poder natural de
nomear todos os seus integrantes incluindo, portanto, os magistrados oriundos da
classe dos advogados e do Ministério Público.
181 FERREIRA Fº, Manoel Gonçalves - Comentários à Constituição Brasileira de 1988, Vol.2, p.200. 182 Art.94 da CF. “Um quinto dos lugares dos Tribunais Regionais Federais, dos Tribunais dos Estados, e do Distrito Federal e Territórios será composto de membros do Ministério Público, com mais de dez anos de careira, e de advogados de notório saber jurídico e de reputação ilibada, com mais de dez anos de efetiva atividade profissional, indicados em lista sêxtupla pelos órgãos de representação das respectivas classes. Parágrafo único- Recebidas as indicações, o tribunal formará lista tríplice,enviando-a ao Poder Executivo,que,nos 20 dias subseqüentes,escolherá um de seus integrantes para nomeação.”
185
CAPÍTULO VIII
PROPOSTA DE ALTERAÇÃO CONSTITUCIONAL COM O FIM DE
MANTER O EQUILÍBRIO ENTRE OS PODERES.
De tudo o que foi exposto desde o início do texto ao seu final,
está bem claro a idéia de que o País vive no estado do chamado absolutismo
presidencial que colide frontalmente com a teoria da tripartição dos Poderes ou das
funções.
Não há dúvida de que a teoria não pode ser adotada em sua
rigidez; entretanto a flexibilização necessária deve ser a mínima, com o objetivo
único de um poder controlar o outro em defesa dos interesses da Nação, mas
inadmissível, que um Poder ou o Chefe de um Poder se posicione em patamar
constitucional superior aos demais poderes.
A maneira de corrigir esta distorção e estabelecer a Constituição
Federal de acordo com os seus fundamentos, principalmente com a disposição do
art.2º, que com todo o conjunto dos Princípios Fundamentais funcionam como
vetores para todas as demais regras constitucionais, é alterar a redação dos artigos
que estão conflitando com a máxima “São Poderes da União, independentes e
harmônicos entre si, o Legislativo, o Executivo e o Judiciário.”
Com o objetivo de garantir o prestigio do Poder Legislativo, a
proposta de alteração atinge as Medidas Provisórias e as Leis Delegadas, bem
como altera o procedimento de nomeação dos Ministros do Tribunal de Contas.
A fim de garantir a independência do Poder Judiciário, a redação
concentra as nomeações dos Magistrados na pessoa do Presidente do Supremo
Tribunal Federal, isto é, transfere do Presidente da República para o Presidente do
Judiciário.
Com todos os fundamentos que foram apresentados segue a
redação, porque como previu MONTESQUIEU “quando na mesma pessoa ou no
mesmo corpo de magistratura, o poder legislativo está reunido ao poder executivo
186
não há ponto de liberdade; porque há o receio que o mesmo monarca ou o mesmo
senado não faça senão leis tirânicas para as executá-las tiranicamente.”183
DA ORGANIZAÇÃO DOS PODERES
Art.44. O Poder Legislativo é exercido pelo Congresso Nacional e é composto pelos
seguintes órgãos: Câmara dos Deputados, Senado Federal e Conselho Nacional do
Legislativo.
Art.44-A. O Conselho Nacional do Legislativo compõe-se de quinze membros com
mais de trinta e cinco e menos de sessenta e seis anos de idade, com mandato de
dois anos, admitida uma recondução, sendo:
I- um Deputado Federal, indicado pela respectiva casa;
II- um Senador, indicado pela respectiva casa,
III- um Deputado Estadual indicado pelo Congresso Nacional;
IV- um vereador de Capital indicado indicado pelo Congresso Nacional;
V- um vereador indicado pelo Congresso Nacional
VI- um Deputado Distrital indicado pelo Congresso Nacional;
VII- um membro da Câmara Legislativa do Distrito Federal indicado pelo
Congresso Nacional;
VIII- um membro do Ministério Público da União, indicado pelo Procurador
Geral da República;
183 Vide nota 53.
187
IX- um membro do Ministério Público Estadual, escolhido pelo Procurador
Geral da República dentre os nomes indicados pelo órgão competente de
cada instituição estadual;
X- dois advogados indicados pelo Conselho Federal da Ordem dos
Advogados do Brasil;
XI- dois cidadãos,de notável saber de direito público e reputação ilibada
indicados pelo Supremo Tribunal Federal;
XII- dois cidadãos ,de notável saber de direito público e reputação ilibada
escolhidos pelo Poder Executivo.
§ 1º - O Conselho será presidido pelo Deputado Federal que votará em caso de
empate, afastando das atividades na Câmara dos Deputados.
§ 2º- Os membros do Conselho serão nomeados pelo Presidente da
República,depois de aprovada a escolha pela maioria absoluta do Senado
Federal.
§ 3º - Não efetuadas, no prazo legal, as indicações previstas neste artigo, caberá
a escolha ao Congresso Nacional.
§ 4º - Compete ao Conselho o controle da atuação administrativa e financeira do
Poder Legislativo e do cumprimento dos deveres funcionais dos congressistas,
cabendo-lhe além de outras atribuições que forem conferidas por lei
complementar:
I- zelar pela autonomia do Poder Legislativo e pelo cumprimento das normas
que regulamentam a atividade parlamentar, podendo expedir atos
regulamentares, no âmbito de sua competência, ou recomendar
providências;
II- zelar pela observância do art.37 e apreciar, de ofício ou mediante
provocação, a legalidade dos atos administrativos praticados por membros
ou órgãos do Poder Legislativo, podendo desconstituí-los, revê-los ou ficar
prazo para que se adotem as providências necessárias ao exato
cumprimento da lei, sem prejuízo da competência do Tribunal de Contas
da União e do Poder Judiciário;
188
III- receber e conhecer das reclamações contra membros ou órgãos do Poder
Legislativo, inclusive contra seus serviços de atendimento ao
público,contra todas suas secretárias, gabinetes e todos os órgãos que
atuem em serviços auxiliares, incluindo o Tribunal de Contas, sem prejuízo
da competência disciplinar e correicional das Mesas ou Comissões do
Congresso Nacional, da Câmara dos Deputados e Senado
Federal,podendo avocar processos ou procedimentos disciplinares em
curso e determinar a remoção, a suspensão, ou a aposentadoria com
subsídios ou proventos proporcionais ao tempo de serviço, havendo o
tempo mínimo como determinado em lei, e aplicar outras sanções
administrativas, assegurada ampla defesa.
IV- Representar ao Ministério Público, no caso de crime contra a
administração pública ou de abuso de autoridade;
V- rever,de ofício ou mediante representação,os processo disciplinares de
parlamentares julgados há menos de um ano.
VI- Elaborar semestralmente relatório estatístico sobre projetos de lei
apresentados, por unidades da Federação, incluindo os Municípios;
VII- Elaborar relatório anual,propondo as providências que julgar
necessárias,sobre a situação do Poder Legislativo no País e as atividades
do Conselho, o qual deve integrar mensagem do Presidente do Congresso
Nacional a ser remetida ao Poder Executivo e Supremo Tribunal
Federal,por ocasião da abertura no ano judiciário.
§ 5º- O Senador exercerá a função de Senador-Corregedor e ficará
afastado de suas funções do Senado Federal, conferindo além das atribuições que
lhe forem conferidas por lei complementar,as seguintes:
I- receber as reclamações e denúncias,de qualquer interessado, relativas ao
membros do Poder Legislativo e aos seus serviços;
II- exercer as funções executivas do Conselho,de inspeção e de correição
geral;
III- requisitar e designar parlamentares delegando atribuições no Conselho, e
requisitar servidores de qualquer órgão do Poder Legislativo, inclusive nos
Estados, Distrito Federal e Territórios.
189
§6º- Junto ao Conselho oficiarão o Procurador Geral da República e o Presidente do
Conselho Federal da Ordem dos Advogados do Brasil.
§7º- A União, inclusive no Distrito Federal e nos Territórios, criará ouvidorias
legislativas,competentes para receber reclamações e denúncias de qualquer
interessado contra membros ou órgãos do Poder Legislativo, ou contra seus serviços
auxiliares, incluindo o Tribunal de Contas,representando diretamente no Conselho
Nacional do Legislativo.
Art.59. O processo legislativo compreende a elaboração de:
I- emendas à Constituição;
II- leis complementares;
III- leis ordinárias;
IV- leis delegadas;
V- decretos legislativos;
VI- resoluções
Art. 62 (revogado).
Art.68. …
§ 3º Elaborado o projeto será encaminhado ao Congresso Nacional para sua
discussão, apreciação e votação em única sessão no prazo de 30 dias.
I- Não havendo a votação como determinado o Presidente da República promulgará
o texto legal.
Art.73 Os Ministros do Tribunal de Contas da União serão escolhidos:
I- um terço pelo Presidente da República e um terço pelo Presidente do
Supremo Tribunal Federal, com aprovação do Senado Federal, sendo dois
alternadamente dentre auditores e membros do Ministério Público junto ao
190
Tribunal,indicados em lista tríplice pelo Tribunal, segundo critérios de
antiguidade e merecimento.
II- um terço pelo Congresso Nacional.
Art.76. São órgãos do Poder Executivo, o Presidente da República, que o exerce
com auxilio dos Ministros de Estado e o Conselho Nacional do Executivo.
Art.76 A. O Conselho Nacional do Executivo compõe-se de quinze membros com
mais de trinta e cinco e menos de sessenta e seis anos de idade, com mandato de
dois anos, admitida uma recondução, sendo:
I- dois Ministros de Estado escolhidos pelo Presidente da República.
II- um Deputado Federal, indicado pela respectiva casa;
III- um Senador, indicado pela respectiva casa,
IV- um Deputado Estadual indicado pelo Congresso Nacional;
V- um Governador de Estado escolhido pelo Presidente da República.
VI- um Prefeito de Capital escolhido pelo Presidente da República;
VII- O governador do Distrito Federal
VIII- um Prefeito Municipal.
IX- um membro do Ministério Público da União, indicado pelo Procurador Geral
da República;
X- um membro do Ministério Público Estadual, escolhido pelo Procurador Geral
da República dentre os nomes indicados pelo órgão competente de cada
instituição estadual;
XI- dois advogados indicados pelo Conselho Federal da Ordem dos Advogados
do Brasil;
XII- dois cidadãos de notável saber de direito público e reputação ilibada
indicados pelo Supremo Tribunal Federal;
§ 1º - O Conselho será presidido por um dos Ministros de Estado que votará em
caso de empate.
191
§ 2º- Os membros do Conselho serão nomeados pelo Presidente da
República,depois de aprovada a escolha pela maioria absoluta do Senado
Federal.
§ 3º - Não efetuadas, no prazo legal, as indicações previstas neste artigo, caberá
a escolha ao Presidente da República.
§ 4º - Compete ao Conselho o controle da atuação administrativa e financeira do
Poder Executivo e do cumprimento dos deveres funcionais dos agentes políticos
do Poder Executivo, cabendo-lhe além de outras atribuições que forem
conferidas por lei complementar:
VIII- zelar pela autonomia do Poder Executivo e pelo cumprimento das normas
que regulamentam a atividade administrativa, podendo expedir atos
regulamentares, no âmbito de sua competência, ou recomendar
providências;
IX- zelar pela observância do art.37 e apreciar, de ofício ou mediante
provocação, a legalidade dos atos administrativos praticados por membros
ou órgãos do Poder Executivo, podendo desconstituí-los, revê-los ou fixar
prazo para que se adotem as providências necessárias ao exato
cumprimento da lei, sem prejuízo da competência do Tribunal de Contas
da União e do Poder Judiciário;
X- receber e conhecer das reclamações contra membros ou órgãos do Poder
Executivo, inclusive contra seus serviços de atendimento ao público,contra
todos seus Ministérios, suas secretarias, departamentos e todos os órgãos
que atuem em serviços auxiliares, sem prejuízo da competência disciplinar
e correicional do Presidente da República,podendo avocar processos ou
procedimentos disciplinares em curso e determinar a remoção, a
suspensão, ou a aposentadoria com subsídios ou proventos proporcionais
ao tempo de serviço, sendo o caso, e aplicar outras sanções
administrativas, assegurada ampla defesa.
XI- representar ao Ministério Público, no caso de crime contra a administração
pública ou de abuso de autoridade;
192
XII- rever,de ofício ou mediante representação,os processo disciplinares de
agentes politicos julgados há menos de um ano.
XIII- elaborar semestralmente relatório estatístico sobre as atividades
administrativas, por unidades da Federação, incluindo os Municípios;
XIV- elaborar relatório anual,propondo as providências que julgar
necessárias,sobre a situação do Poder Executivo no País e as atividades
do Conselho, o qual deve integrar mensagem do Presidente da República
a ser remetida ao Congresso Nacional na instalação da sessão legislativa
e Supremo Tribunal Federal,por ocasião da abertura no ano judiciário.
§ 5º- Um Ministro de Estado exercerá a função de Ministro-
Corregedor , conferindo além das atribuições que lhe forem conferidas por lei
complementar,as seguintes:
IV- receber as reclamações e denúncias,de qualquer interessado, relativas ao
membros do Poder Executivo e aos seus serviços;
V- exercer as funções executivas do Conselho,de inspeção e de correição
geral;
VI- requisitar e designar funcionários da União delegando atribuições no
Conselho, e requisitar servidores de qualquer órgão do Poder Executivo,
inclusive nos Estados, Distrito Federal e Territórios.
§6º- Junto ao Conselho oficiarão o Procurador Geral da República e o Presidente do
Conselho Federal da Ordem dos Advogados do Brasil.
§7º- A União, inclusive no Distrito Federal e nos Territórios criará ouvidorias
executivas,competentes para receber reclamações e denúncias de qualquer
interessado contra membros ou órgãos do Poder Executivo, ou contra seus serviços
auxiliares,representando diretamente no Conselho Nacional do Executivo.
193
Art.94. ...
Parágrafo único. Recebidas as indicações, o tribunal no prazo de 20 dias fará a
nomeação.
Art.101. ...
Parágrafo único. Os Ministros do Supremo Tribunal Federal serão nomeados pelo
Presidente do respectivo tribunal, depois de aprovada a escolha pela maioria
absoluta do Senado Federal.
Art.104. ...
Parágrafo único. Os Ministros do Superior Tribunal de Justiça serão nomeados pelo
Presidente do Supremo Tribunal Federal, dentre brasileiros com mais de trinta e
cindo e menos de sessenta e cinco anos, de notável saber jurídico e reputação
ilibada,depois de aprovada a escolha absoluta do Senado Federal.
Art. 107 Os Tribunais Regionais Federais compõem-se de, no mínimo, sete juízes,
recrutados,quando possível, na respectiva região e nomeados pelo Presidente do
Supremo Tribunal Federal dentre brasileiros com mais de trinta e menos de sessenta
e cinco anos, sendo:
Art.111A. O Tribunal Superior do Trabalho compor-se-á de vinte e sete Ministros,
escolhidos dentre brasileiros com mais de trinta e cinco e menos de sessenta e cinco
anos,nomeados pelo Presidente do Supremo Tribunal Federal após aprovação pela
maioria absoluta do Senado Federal, sendo:
Art.115. Os Tribunais Regionais do Trabalho compõem-se de, no mínimo, sete
juízes, recrutados,quando possível, na respectiva região, e nomeados pelo
194
Presidente do Tribunal Superior do Trabalho dentre brasileiros com mais de trinta e
cinco anos e menos de sessenta e cinco anos,sendo:
Art.119. O Tribunal Superior Eleitoral compor-se-á, de sete membros escolhidos.
II-.por nomeação do Supremo Tribunal Federal, dois juízes dentre seis advogados
de notável saber jurídico e idoneidade moral.
Art.120. Haverá um Tribunal Regional Eleitoral na Capital de cada Estado e no
Distrito Federal.
II- por nomeação do Presidente do Tribunal Superior Eleitoral de dois juízes
dentre seis advogados de notável saber jurídico e idoneidade moral,
indicados pelo Tribunal de Justiça.
Art.123. O Superior Tribunal Militar compor-se-á de quinze Ministros vitalícios,
nomeados pelo Presidente do Supremo Tribunal Federal,depois de aprovada a
indicação pelo Senado Federal, sendo três dentre oficiais-generais da
Marinha,quatro dentre oficiais generais do Exercito,três dentre oficiais da
Aeronáutica, todos da ativa e do,posto mais elevado da carreira, e cinco dentre civis.
Parágrafo único. Os Ministros civis serão escolhidos pelo Presidente do Supremo
Tribunal Federal dentre brasileiros maiores de trinta e cinco anos, sendo: . . .
195
CONCLUSÕES
1.- O Poder Constituinte originário elegeu a Teoria de Montesquieu para organizar
o Estado brasileiro quanto aos seus Poderes, como se vê da redação do art.2° da
Constituição Federal; entretanto de todo o conteúdo constitucional se percebe que
o Poder Executivo, encarnado na pessoa do Presidente da República, está
resguardado por uma expressa hipertrofia, na medida que suas atribuições
extrapolam, em regra, as atribuições do Poder Executivo.
2.- O poder do Presidente da República em legislar, nomear para o Tribunal de
Contas, nomear para o Tribunal Constitucional e outros órgãos do Poder Judiciário
reduz a independência do Poder Legislativo e do Poder Judiciário, porque retira
destes Poderes atribuições que, por idéia lógica da teoria adotada, a eles
deveriam ser reservadas
3.- O modo de respeitar a teoria da tripartição impõe ao afastamento das
ingerências extrapoladas do Presidente da República no Poder Legislativo e no
Poder Judiciário. O afastamento destas ingerências não causa desprestigio ao
Presidente da República, porque tão somente organiza a conduta de cada Poder.
4.- Exigência constitucional e mesmo natural é que os Poderes sejam limitados, o
que importa afirmar que um Poder deve controlar o outro, a fim de impedir
desmandos e hipertrofia de um em prejuízo dos demais; por isto é essencial que
os limites fiquem estabelecidos,bem como o controle de um Poder sobre o outro.
As próprias funções típicas, quando exercidas, já operam o controle de um Poder
sobre os demais.
5.- Aceitando que os Três Poderes estão em um mesmo patamar constitucional, a
forma de um controle adotada para um Poder deve ser a mesma adotada para os
outros; guardadas evidentemente as particularidades de cada um. O sistema de
196
controle deve ser constitucional, isto é, não se admite que por meio do controle
haja o enfraquecimento ou desprestigio de qualquer um dos Poderes. A
organização estatal só vai funcionar equilibradamente quando os Três Poderes
estiverem, cada um, individualmente exercendo suas funções sem ingerência do
outro.
6.- O Conselho Nacional de Justiça, como criado, é inconstitucional porque surgiu
através do Poder Constituinte derivado e por isto causa uma ruptura na
necessária separação de Poderes, na medida em que seus integrantes são
nomeados pelo Presidente da República e parte é estranha ao Poder Judiciário.
Inconstitucional também, porque afasta o pacto federativo ao excluir a autonomia
dos Estados-membros, quando lhe é permitido intervir no Poder Judiciário
Estadual. Os argumentos de constitucionalidade mais se afinam a questões
políticas do que ao texto constitucional.
7.- Havendo aceitação da constitucionalidade do Conselho Nacional de Justiça,
órgãos semelhantes devem ser criados para o controle do Poder Legislativo e do
Poder Executivo, os correspondentes Conselho Nacional do Legislativo e
Conselho Nacional do Executivo. A teoria não prestigia um Poder em relação aos
outros; deste modo o tratamento deve ser igualitário, e foi desta forma que decidiu
o Constituinte originário.
8.- Exige também a igualdade constitucional que a Constituição Federal seja
reformada a fim de que o Poder Legislativo recupere sua função típica de legislar
e sua atribuição de nomear integrantes para seu órgão auxiliar na função
fiscalizadora, e que seja reformada para que o Poder Judiciário conquiste sua
independência quanto à nomeação de seus integrantes. A força de cada Poder
para o exercício de sua função típica está assentada na independência que deve
ter.
9.- A supremacia constitucional do Presidente da República não se adequa à
Constituição considerada como a soma de fatores reais do Poder, porque de fato
o povo não suporta a concentração de poderes em uma só pessoa ou um só
organismo; por isto com relação a este conceito de Constituição, a supremacia
197
presidencial se apresenta inconstitucional e por conseqüência desconsidera a
teoria de tripartição dos Poderes que foi eleita como um dos Princípios
Fundamentais do República Federativa.
198
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