A Produção Artística Engajada de Carlos Zílio
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Universidade Federal do Espírito SantoPrograma Institucional de Iniciação Científica
Relatório Final de Pesquisa
A Produção Artística Engajada de Carlos Zílio: o artista como ativista
Identificação:Grande área do CNPq.: Linguística, Letras e ArtesÁrea do CNPq: Artes
Título do Projeto: O Acervo da Galeria de Arte Espaço Universitário e a atualização das
linguagens no ES: 1970-1990.Professor Orientador: Profa. Drª Almerinda da Silva LopesEstudante PIBIC/PIVIC: Marcelo Prado Soares
Resumo: Este subprojeto investigou as peculiaridades simbólicas e poéticas, bem como as articulações
metafóricas da linguagem e conteúdo ideológico, em um recorte específico que contemplou algumas das
séries temáticas produzidas pelo artista, professor e militante político carioca Carlos Zílio (1944), entre
1967 e 1980. Respaldado na ironia e na autonomia postuladas por Duchamp, o artista lançou um olhar
crítico sobre a realidade perversa do país, transformando seu fazer artístico em instrumento de
conscientização e de oposição ao regime militar, que transparece de diferentes maneiras nas séries
selecionadas. São elas: “Lute”, “Atensão” (sic) “Para um Jovem de Brilhante Futuro”, e “Equilíbrio”,
constituídas por pinturas, desenhos, objetos e fotografias. Busca-se compreender como o autor
transformou em agenciamento irônico referências extraídas da pop arte e da arte conceitual. A
investigação contemplou as obras doadas ao acervo da UFES, por ocasião da exposição individual que o
mesmo realizou na Galeria de Arte e Pesquisa, as quais integram a série “Para um jovem de brilhante
futuro”, uma das mais contundentes e engajadas de sua carreira.
Palavras chave: Ditadura militar, Arte Conceitual, Arte e política, Carlos Zílio.
1 – Introdução
A variedade de acontecimentos decorrentes do complexo quadro sócio-político vivenciado pela
população brasileira, a partir do estabelecimento da Ditadura (1964-1985) propiciou um solo rico e fértil
na produção artística nacional, trazendo consigo trabalhos engajados e revelando artistas e críticos, em
oposição ao intenso clima de sangue e horror. Potencializada crítica e ironicamente, a produção artística
desse período introduz conceitos importantes e peculiaridades que merecem um acurado estudo e
aprofundamento teórico, tendo o experimentalismo como principal alternativa para uma produção
brasileira que foge dos padrões dos chamados “ismos”, ou tendências que marcaram as vanguardas até à
década de 1960. Utilizando-se de uma enxurrada de materiais, artistas como Carlos Zílio, Carlos Vergara,
Antônio Dias, Rubens Gerchman destacaram-se com uma produção de caráter critico e irônico e quebram
o estatuto da arte tradicional, tornando a produção artística brasileira de difícil identificação neste
período, quanto a categorias artísticas e padrões tradicionais.
Sendo assim, o foco deste subprojeto foi o estudo de algumas séries de obras de autoria do artista
plástico e professor carioca Carlos Zílio (1944), em um recorte específico que contemplou algumas das
séries temáticas produzidas por ele entre 1967 e 1980. Sendo Zílio, considerado um dos medulares
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artistas brasileiro da contemporaneidade, sua produção artística desencadeada no período citado, tem se
colocado com o passar dos anos, como parte integral da história artística e política do país, devido suas
marcantes peculiariaridades simbólicas e poéticas, bem como as articulações metafóricas da linguagem e
conteúdo ideológico presente em muitos de seus trabalhos. Sua destacada produção no início de sua
carreira (1965), é considerada, por muitos críticos, tais como Otília Arantes e Mário Pedrosa, referência
de produção engajada, pois, de forma singular, ironizou as mazelas sociais e criticou a repressão, a
violência, a falta de liberdade, bem como o cerceamento e a interferência da censura na produção
artística.
Levando em conta que, a partir da década de 60, importantes mudanças começaram a acontecer no
sistema das artes plásticas em nível internacional, é de se considerar que o panorama artístico brasileiro
no mesmo período foi fortemente influenciado por aquelas. As décadas de 1960 e 1970 caracterizaram-se
pela experimentação artística, busca por novos meios e linguagens, avanços na tecnologia, que serão
utilizadas pelos artistas em suas produções e possibilidades de intercâmbio propostas pelas Bienais,
transformações essas que causaram relevantes mudanças em relação às décadas anteriores.
Segundo Glória Ferreira, esse momento “repotencializou a interpelação sistemática de valores
estéticos, éticos e políticos, que foi levado a cabo pelos artistas e que fez toda a diferença na produção
artística desse período” (Ferreira, 2007, p.21). Artistas como Helio Oiticica, Lygia Clarck e Lygia Pape,
que já faziam parte da vanguarda concretista, e lutavam pelo processo de rompimento com a arte do
passado, desde 1950, assimilaram as novas inovações artísticas e políticas e juntamente com novos
artistas, e iriam produzir uma arte experimental e engajada, em resposta à situação política e artística que
estavam vivenciando. Artistas como Carlos Zílio, Cildo Meireles, Nelson Leiner, Carlos Fajardo, Wesley
Duke Lee, Artur Barrio, entre outros, aderem em suas produções, de forma parcial ou integral, a
elementos que evidenciam o engajamento político e uma tomada de posição face à situação política. O
esforço desses artistas consistia dentre outras razões, na “criação de estratégias para trazer o cerco à
liberdade de expressão, a acusação contra a mercantilização da arte, apontar para a necessidade de
interação público-espectador, denunciar o aburguesamento social e o debate sobre a evanescência da arte
e a fragilidade da vida”. (Cavalcante, 2005, p.2).
Carlos Zílio foi um dos mais notáveis artistas que atuou nesse período . Durante toda sua trajetória
artística, iniciada em meados dos anos 1960, o artista participou ativamente de importantes mostras de
arte, bem como produziu marcantes obras e séries repletas de ironia. Utilizando-se de diferentes
linguagens, técnicas e suporte, e tendo o experimentalismo como uma das principais bases de suas
criações plásticas, este artista, possui ainda uma profunda pesquisa no campo teórico da arte, sendo autor
de artigos e livros. Produzindo há quase 50 anos e possuidor de uma extensa produção, o artista, segundo
Paulo Venâncio Filho, “nunca se perdeu na coerência de sua linguagem, e também soube transitar por
fases e vertentes das artes contemporâneas” (2006, p.07).
Sob um forte contexto de hesitação e dúvida, é que o artista inicia a sua trajetória artística. Apesar
de ser admirador confesso da pintura expressionista de Iberê Camargo e da do americano Barnett
Newman, ao obter sua formação artística (1965), inicia a sua carreira artística profissional, introduzindo
pinturas e objetos que refletem de forma direta a opressão militar. Sua opção pela arte com aproximação à
figuração se deu após visitar exposições como a “Nova Figuração” no MAM-RJ, em 1965 e Opinião 65.
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Em momento posterior a tais visitas, o artista elaborou obras que remetem à pop art, (que no Brasil
integra a corrente das novas figurações). Nessa mesma década, vários outros artistas brasileiros, que
participaram daquelas exposições, já se mostravam familiarizados em especial com essa linguagem
americana, entre eles Rubens Gerchman, Antônio Dias, Claudio Tozzi, Carlos Vergara. Segundo Zílio,
algumas obras desses artistas chamariam sua atenção e contribuíram para sua nova opção poética, entre
elas Time de Futebol, de Antônio Dias e Misses, de Gerchmam (Cocchiarale, 2006, p.36).
O artista acreditava que essa interação com formulações da nova figuração (pop art), possibilitava
adicionar códigos visuais em seus trabalhos, que ironizassem e denunciassem algumas situações que
estavam vivenciando, devido o regime militar. Ao utilizar tais códigos visuais, havia uma preocupação e
cuidado, para que fossem de certa forma camuflados, e assim minimizar o risco de ser preso, pela crítica
que imprimia a seus trabalhos. Além de sua participação em Opinião 66, a qual foi uma das mais
importantes mostras a demonstrar o descontentamento com relação ao governo, e que segundo as palavras
de Paulo Reis, “representou um momento no qual as discussões sobre a volta da figuração tomavam
corpo” (Reis, 2006, p.31), o artista participou na IX Bienal de São Paulo, com o emblemático o trabalho
LUTE (marmita). Trata-se de uma marmita de alumínio, em cujo interior se encontra um rosto moldado
em resina. E sobre o plástico que recobre a boca da figura inseriu o escrito “Lute”, fazendo assim uma
panfletagem direta contra o FMI, e incitando o trabalhador a lutar contra a opressão.
A participação do artista em Nova Objetividade Brasileira também foi um ponto marcante de
sua carreira, onde apresentou uma produção bem sedimentada: cabeças reunindo objetos, cabeças e
palavras, com implicações sociais e críticas (Peccinini, 1999, p.07).
Nessas já citadas séries, estão presentes trabalhos com algumas formulações e códigos de indicação
pop. Visão Total (1966), Massificação (João) 1966 e Reina Tranquilidade (1967). São exemplos de
pinturas dessa época, somadas a objetos que apresentam a marcante presença de rostos desfigurados.
Esses rostos, feitos de resina são postos em sequências, sempre apresentando um diferencial entre si: ora
os rostos estão vendados, ora estão com a boca tapada, ora estão numerados como gado ou prisioneiros.
Tais trabalhos podem representar as pessoas e as diversas situações que eram impostas pela ditadura.
O espírito de contestação por parte do artista intensificou-se com o passar do tempo, em especial
depois do estabelecimento do AI5 (dezembro de 1968). Concentrando-se em um olhar mais irônico sobre
as injustas ocorrências contra a sociedade e a liberdade, e desejoso em fazer algo mais pela democracia,
engaja-se no Movimento Revolucionário (MR-8). Atuando em combates armados, até ser ferido e preso
entre 1970-1972, Zílio continuaria a fazer sua produção artística mesmo estando encarcerado.
Algumas das séries produzidas nesse período, ironizam com clareza, momentos de tortura que o
artista vivenciou, além de, retratar também, aspectos do cotidiano na cela e suas esperanças de liberdade.
Um sentimento muito presente na vida do artista, nesse momento, é o de proximidade com a morte. Antes
mesmo de ser preso, ainda no hospital, o artista começa a se dedicar ao desenho e à pintura. Referente à
produção desse período, Carlos Zílio expressa: ”aí não é mais tanto o artista que age, mas o militante que
desenha e pinta” (Cocchiarale, 2006: 35).
A constante presença do vermelho como a representação do sangue é muito notada nas obras desse
período, elaboradas por Zílio: Autorretrato aos 26 anos, na qual o próprio artista se representou em sua
condição de prisioneiro. Suas digitais e a marcação em vermelho no seu coração registram, com grande
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ênfase, o personagem principal da obra. Na obra Fixação (1970), insere aparentemente vários
autorretratos do artista, pondo um ao lado do outro, envoltos em uma poça de sangue, em que faz menção
ao órgão genital do próprio artista. Já o trabalho Zé (1970) retrata, sob uma grande mancha de sangue, em
razão de um tiro a queima roupa, um indivíduo em uma aparente mostra de arte. A retratação da rotina na
prisão pode ser encontrada em trabalhos como: A cela, (1971). Trata-se do projeto de um grande caixote
negro, possuindo no centro uma abertura em que há duas mãos entregando (ou pegando um prato),
representando assim a rotina de entregar o prato de comida na cela, ou de devolvê-lo. Rotina Dilacerante
(1971) é uma espécie de calendário sobre uma representação de órgãos humanos , sendo esta uma possível
vívida lembrança de sua rotina na prisão. Trabalhos como a Quase Partida (1971) e Semana da Pátria
refletem a esperança de liberdade sentida pelo artista na prisão.
No período que se seguiu à prisão, em um clima de intensa ameaça, o artista parte para uma
produção menos direta, minimalista. Se sentindo derrotado, o questionamento se torna mais discreto,
porém, não menos engajado. Trabalhos que marcam este momento e que refletem bem sua situação de
certa maneira desorientada são: Identidade ignorada (1973) uma foto da sola de dois pés, sendo que em
um existe uma etiqueta com a inscrição: “identidade ignorada”. Autorretrato, 1973, consiste em uma
folha de papel em branco, apenas com uma gota vermelha espirrada no papel, com a Palavra
“autorretrato”. . Já a obra Atenção , 1973, um alicate apertando uma mancha vermelha lançada sobre a
superfície, com a inscrição “Atenção”, trocadilho para “Há tenção”, um importante símbolo do momento
em que vivia sob constante pressão. O perigo nesse momento era iminente. O artista teria sua obra
cerceada pela censura e passa a ser perseguido por órgãos da ditadura.
Ao participar da X Bienal de Paris, o artista se exila voluntariamente por muitos anos nessa capital, onde
deu continuidade a sua pesquisa. Sendo ele um pesquisador bem informado sobre a realidade que vivia e
sobre as novas linguagens em evidência, passa a se dedicar à produção de objetos e fotografias, nos quais
critica ainda mais a realidade do seu país de origem. Recorre a diferentes processos e materiais, tais
como fotografias, desenhos, objetos ou múltiplos, construídos com couro, madeira, plástico, metal, vidro,
resina, para produzir importantes trabalhos ao longo de sua carreia. Os trabalhos: Lute - apresentado na
IX Bienal de São Paulo (1969), Atensão (sic) – trocadilho para “há tensão” -, apresentada na exposição
realizada na sala experimental do Museu de Arte Moderna do Rio de Janeiro (1976), e na série Para um
Jovem de Brilhante Futuro e na série de objetos Equilíbrio trabalhos que destacaram-se na trajetória do
artista.
O Artista, expôs em 1978 na Galeria de Arte e Pesquisa da UFES, doando ao acervo da instituição
um conjunto de gravuras de uma das mais contundentes e irônicas séries de sua carreira: “Para um Jovem
de Brilhante Futuro”. As obras que foram doadas ao acervos são algumas gravuras que fazem parte da
série já citada. A série constitui também de objetos e fotografias em que o artista aparece travestido de um
bem sucedido executivo, rodeado de objetos ameaçadores ou de tortura, ou portando uma maleta.
Este subprojeto manteve estrita ligação com o projeto desenvolvido e coordenado pela Profª Dra.
Almerinda da Silva Lopes que tem por título: O acervo da Galeria de Arte do Espaço Universitário da
UFES e a atuação e diversificação das linguagens artísticas no ES: 1975-1990, constituindo-se em recorte
específico desse. Formado por doações dos artistas que expuseram nas citadas galerias de arte, a partir de
1976, quando se deu a criação da GAP, o estudo do acervo da UFES e da obra dos artistas que o integram
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ganha maior relevância e torna-se oportuno, principalmente no momento em que se discute a criação do
Museu de Arte Contemporânea da UFES, ao qual a referida coleção será integrada.
2 – Objetivos
Objetivo Geral
Analisar e refletir sobre a especificidade, estratégias e práticas conceituais e poéticas, bem como sobre o
teor político/crítico da produção engajada de Carlos Zílio, tomando como objeto de investigação um
recorte de quatro séries temáticas, produzidas por ele entre o final dos anos de 1960 e o início da década
de 1980.
Específicos:
Levantar e registrar da produção artística de Carlos Zílio, por meio de recorte específico
referente ao período da ditadura militar, que contemplará o acervo da UFES, analisando suas
características formais, técnicas, suportes e materiais.
Com base em bibliografia específica e catálogos de mostras, analisar a fortuna crítica do artista,
que permita compreender sua prática e propósitos estéticos.
3. Estabelecer comparações entre a produção do artista, com a de seus contemporâneos, no sentido
de ampliar a compreensão de seu engajamento político do período de abordagem da pesquisa.
4. Levantar as obras do artista pertencentes ao acervo da UFES, analisando suas peculiaridades
formais e críticas, como elas dialogam com os demais objetos que integram a série Para um jovem de
brilhante futuro (1973).
5. Colaborar para a compreensão do significado do acervo da UFES, oferecendo novas informações
tanto sobre esse conjunto de obras, quanto sobre o conjunto da produção de Carlos Zílio no período
da ditadura militar.
6. Contribuir para a compreensão da ampliação e diversificação das linguagens artísticas no contexto
dos anos de 1960 e 1970, tomando como referência a obra de Carlos Zílio em paralelo à de outros
artistas seus contemporâneos.
7. Ampliar e consolidar meus conhecimentos teóricos em história e crítica de arte no Brasil,
apresentando os resultados da pesquisa em congressos científicos e artigos.
8. Iniciar minha inserção na pesquisa artística, pesquisando a obra desse emblemático e engajado
artista brasileiro, visando dar prosseguimento e aprofundamento aos estudos de sua obra no mestrado
em Artes.
3 – Metodologia
Parte-se da hipótese que a obra de Carlos Zílio detém em suas metáforas e elementos simbólicos
referências estéticas e índices da memória histórica de um momento político que impôs o terror e o medo
e cerceou a liberdade de expressão e os direitos civis. Por essa razão, não houve até muito recentemente
estímulo e um clima mais propício à pesquisa e à análise da produção engajada deste e de outros artistas
brasileiros. Nesse sentido, e no caso específico de Carlos Zílio, os estudos publicados até o momento
sobre sua obra contemplam prioritariamente a chamada “retomada da pintura”, elaborada por ele, de
modo especial, a partir metade da década de 1980. Isso se explica por ter sido nessa época que o artista,
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pautado na euforia que tomava conta dos artistas, a partir da redemocratização do país, desviou-se - ou
pelo menos atenuou – o antigo viés crítico, centrando forças no que ele chama de “solução de problemas
da pintura”. Assim, o estudo proposto contempla justamente algumas das séries que englobam diferentes
processos e linguagens e nas quais se desvela mais intensamente o engajamento político do artista. Esta
pesquisa detém-se justamente na produção que foi muito pouco abordada e investigada, tanto no que diz
respeito ao conjunto de sua produção, quanto a recortes específicos ou mais pontuais.
Para atingir os objetivos propostos, a metodologia desta pesquisa compreendeu duas etapas distintas, mas
que se complementam: 1. Levantamento, registro fotográfico e organização de arquivos de imagens de
cada uma das séries de obras do artista estudadas, em catálogos de exposição, livros, sites e na reserva
técnica da Galeria de Arte e Pesquisa da UFES; 2. Levantamento, leitura e análise da fortuna crítica de
Zílio, e de bibliografia específica e complementar, que ajudou a compreender suas opões plásticas e
poéticas, bem como sua intencionalidade política. Para proceder a esse levantamento recorreremos às
seguintes instituições: Biblioteca Central da UFES, Biblioteca Setorial e Arquivo do Centro de Artes,
Biblioteca do Museu de Arte do Espírito Santo, Arquivo da Bienal de São Paulo (considerando que no
período de abrangência da investigação, o artista participou do evento em 1969).
Considerando que partimos da premissa que o período em que o artista atuou, explica de alguma maneira
tanto a particularidade, quanto as constantes transformações de sua gramática visual e conceitual,
estabeleceremos, em alguns momentos das análises propostas, comparação com formulações igualmente
engajadas de artistas que atuaram na mesma época.
Por tratar-se de pesquisa teórica, que buscou compreender tanto a trajetória de artista, quando o
significado e a articulação conceitual, poética e crítica da obra de Carlos Zílio, além da necessidade de
dialogar com a bibliografia específica, o discurso sobre a produção do artista será respaldado no
pensamento de teóricos contemporâneos brasileiros, entre eles Daisy Peccinine, Aracy Amaral, Fernando
Cocchiarale, Celso Favarreto, Glória Ferreira, dentre outros. Essa bibliografia encontra-se disponível nas
Bibliotecas da UFES e na biblioteca pessoal da orientadora da pesquisa. Mesmo que esses autores não
tenham escrito especificamente sobre a produção do nosso artista, ampliaram a compreensão sobre as
linguagens artísticas contemporâneas, bem como a reflexão que pretendemos traçar sobre o panorama
social, político e cultural do período, enfocado pela investigação, que contribuiu para a contextualização
da obra e do pensamento de Carlos Zílio.
4 – Resultados
Diversas foram as séries engajadas produzidas por Carlos Zílio, que intercalam o período contido
entre 1967 até 1980. Destacamos algumas que denotam um arraigado conteúdo ideológico e uma potente
crítica de oposição ao governo ditador. São elas: “Lute(1967)”, “Atensão” (sic) (1976)”,
“Equilíbrio(1977)” e “Para um Jovem de Brilhante Futuro(1974) .
Esses trabalhos revelam uma multiplicidade de articulações metafóricas, simbólicas e poéticas, e se
tornaram destaques na vida do artista, pontuando de diferentes maneiras sua crítica à Ditadura Militar. E
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foi por meio de tais produções, que o mesmo introduziu-se no mundo artístico, atiçou a censura e a
repressão, revelou penosos momentos que vivenciou antes e depois de ser perseguido, ferido, preso.
O contexto brasileiro quando da realização da IX Bienal de São Paulo foi agitado. Nesse mesmo ano,
a atuação do governo ditador gerou muita indignação. Entre outras medidas repressivas, o Congresso
Nacional do Brasil rejeitou a proposta para eleições diretas para presidente, e também sancionou a Lei de
Imprensa, a qual estabeleceu a censura prévia nas redações, emissoras de rádio e televisão. Ao observar
muitas das obras apresentadas na citada Bienal e tendo tal contexto em mente, fica clara a ligação que
houve entre muitos desses trabalhos e os acontecimentos vivenciados no período. Inúmeros artistas
utilizaram-se da Bienal para expressarem por meio de diversas linguagens o espírito de revolta, de
indignação e do descontentamento que estavam sentindo.
As situações difíceis proporcionadas pela Ditadura adentraram os muros da Bienal. Apesar de muitos
artistas acharem que a mostra seria um lugar neutro, e que poderiam se expressar de forma livre, isso não
aconteceu. Um exemplo disso foi o tratamento oposto dado a obras apresentadas no evento. Enquanto o
tema patriota estadunidense era aclamado pela crítica – a exemplo de “Tree Flags(1958)”, do americano
Jasper Johns, os símbolos nacionais presentes na série Meditação sobre a Bandeira Nacional(1966/67) de
Quissak Jr foram considerados subversivos a ponto de serem tirados da mostra. A situação causou a
revolta de muitos artistas, na ocasião, inclusive do próprio Zílio. Essa revolta (que já vinha sendo
construída mediante as inúmeras situações presenciadas por ele), desde o início da ditadura impulsionou
internamente, um espírito de luta e busca pela justiça, no artista, sendo que o trabalho que apresentou
poderia ser uma sutil, porém, direta referência a esse desejo, o de agir contra a situação.
Muitos trabalhos que foram selecionados para a IX Bienal de São Paulo eram de jovens artistas, e o
critério de seleção das obras foi muito criticado, sendo este outro problema ocorrido nessa Bienal. O
trabalho de Carlos Zílio foi aceito, e assim apresentou: Lute (marmita)1967.
(a)
Figura 1.(a)Carlos Zílio, Lute (marmita)(1966)Lute (marmita), 1967, alumínio, plástico, resina plástica, 18x10,5x6cm.
Fonte: Site Oficial Carlos Zílio.
Inicialmente, este trabalho foi projetado por Zílio com o intuito de ser reproduzido e distribuído na
porta de fábricas. A ideia inicial se assemelhava exatamente a uma panfletagem. O trabalho pode ser
classificado como um convite direto ao expectador. A marmita, que contém em seu interior um rosto
amarelo desfigurado de resina e uma película plástica escrita a palavra em vermelho LUTE condensa o
sentimento existente no interior de quem se posicionou contra as injustiças impostas pelo governo.
Sob a boca muda da máscara de resina, a palavra LUTE pode ser considerada uma sugestão para o
espectador. A obra incita um convite direto ao espectador para o combate, fazendo com que, o mesmo,
além de observador, pense na possibilidade de agir.
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Considerando que o rosto é símbolo de identidade, o artista, ao utilizar o rosto desfigurado cria a
possibilidade do mesmo poder ser qualquer pessoa, incluindo o espectador da obra, ou até o próprio
artista. O rosto, por si próprio já transporta a pessoa para dentro do combate, e a marmita passa a ideia do
popular e necessário, exatamente como a comida do trabalhador de cada dia.
Mas a obra Lute (1967) também representou muito na vida de Zílio. Segundo sua declaração, o
trabalho pontua o fim de uma fase inicial de sua trajetória, “o momento que viveu a dicotomia entre
artista e estudante, sendo este, o esforço final de juntar a arte e politica” (Cocchiarale, 2006, p.36).
A inscrição LUTE não foi exclusivamente utilizada pelo artista. Existe outro trabalho de arte, de
mesmo título, também do ano de 1967, de autoria de Rubens Gerchman que embora de material e
características diferenciadas da de Zílio, também pode se caracterizar com um trabalho que fez um direto
convite à luta e ao questionamento, sendo na verdade quase uma postura de ordem. A obra se constitui de
letras de tamanho gigante feita de madeira, formando a palavra LUTE. Tal palavra foi posta em uma
avenida central do Rio de Janeiro, de grande movimento, porém, a original ideia foi que “a palavra
passeasse a bordo de um caminhão pelo centro do Rio nos horários de pico, e na entrada e saída do
trabalho, ou seja no momento de maior fluxo de pessoas” (BASTOS, 2005,p.5).
Ambos os trabalhos, se unem pelo mesmo sentimento de convidar o público à luta, e também suas
estratégias iniciais se aproximam com o intuito de atingir a classe de trabalhadores. Segundo Cláudia
Porto “toda obra de arte contém um certo número de informações, de mensagens que o artista deseja
comunicar ao expectador”, e referente às obras citadas, a mensagem foi simples e direta: lute
(PORTO,2013,p.01)
(b)
Fígura 2 - (b) Carlos Zílio, (Atensão, 1976) (fotografia, 30x40cm)
Fonte: Site Oficial do Artista
Outra importante série realizada em 1976 por Zílio foi a série “Atensão”. Em 1976, acontecimentos
como mortes que repercutiram na mídia, como é o caso da morte dos dirigentes do partido comunista do
Brasil, do metalúrgico Manuel Filho, e a chacina da Lapa, o estabelecimento de leis injustas, como a do
controle e redução da propaganda de rádio e televisão (lei Falcão).
(c)
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Figura 3 - (c) Atensão, 1976, (vista parcial da instalação com as obras Por um fio e Sem título I, II e III)Fonte: Site Oficial de Carlos Zílio
A artista aceita convite para participar da Xª Bienal de Paris, que ocorreu no final da década de 1970 ,
no Museu de Moderna de Paris e passa a viver no país, permanecendo até 1980. Sua produção plástica
continua a sua produção acadêmica se intensifica. A produção que ganha destaque em sua trajetória nesse
momento é a série Equilíbrio(1976). Cildo Meireles, juntamente com Carlos Zílio divide espaço
participou da Bienal, exatamente como importantes outros nomes da arte intencional, como é o caso dos
artistas Laurie Anderson, Sandro chia, Francesco Clemente, Claudio Parmiggiani dentre muitos outros.
Basicamente as obras que o artista apresentou na Bienal foram feitas de materiais precários como:
madeira, tijolos e serras de metal. Utilizando-se do conceito de equilíbrio, o artista distribui os materiais
simplesmente equilibrando um sobre o outro (como é o caso de tábuas e lajotas) ou também criando
equilíbrios entre ripas de madeira ligadas a serras de ferro, como é o caso dos trabalhos: Equilíbrio I, II,
III e IV, (1976).
Fig.(e) – Carlos Zílio, Equilíbrio I, II, III e IV, 1976, Fig.(f) – Carlos Zílio. Equilíbrio I, II, III, (1977)
(madeira, tijolos, 270x10x2cm) (madeira, serras de metal, 500cmx30x2cm)Fonte: Site Oficial Carlos Zílio Fonte: Site Oficial Carlos Zílio
Já trabalhos como Equilibro I II III (1977) que apresentam duas madeiras iguais, sendo ligadas
apenas pelas serras, foram apresentadas em três pares de madeira que se encontram combinadas de
formas diferentes, formando diferentes pontos de equilíbrio. Diferentemente de seus trabalhos anteriores,
a ideia se torna mais condensada, o equilíbrio fica evidente nesses trabalhos.
Um importante ponto que pode ser observado nesses trabalhos está no fato das tábuas estarem
ligadas a serras, ironicamente a ligação se faz pelo instrumento que corta elas próprias. Ao mesmo tempo
o que se destrói é o que une. Apesar dos trabalhos apresentarem a estabilidade e a simplicidade, o perigo
se encontra ligado as tábuas, o objeto cortante.
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Fig.(g) – Para um jovem de brilhante futuro(1974)(Para um jovem de brilhante futuro, 1974, maleta de couro , pregos, múltiplo, 10 exemplares)
Fonte: Site Oficial Carlos Zílio
Um importante trabalho que se destacou na carreira de artista é a série é o já citado “Para um Jovem
de Brilhante Futuro(1973)”. Composta por performance, fotografias, objetos e gravuras. A série é
considerada uma das mais irônicas e contundentes produzidas pelo artista. Nesse trabalho, existe uma
sequência de fotografias de uma performance realizada pelo artista, sendo que o mesmo aparece
travestido de um bem sucedido executivo, caminhando pelas ruas do Rio, portando sempre uma maleta,
até chegar ao pretenso escritório.
A sequência de fotos em que aparece o artista sempre bem arrumado, encenando momentos da rotina
de um jovem executivo de sucesso. Ora no escritório atendendo ao telefone ou executando alguma rotina
administrativa, ora em contanto com outras pessoas, possíveis falando com clientes ou empregados, ora
entrando no carro, subindo escadas ou caminhando pela rua, o artista é fotografado em diversas cenas
desse cotidiano. Apesar das posições e lugares diferentes, todas essas fotografias possuem algo em
comum, a maleta presente. No contexto da foto, a maleta (que apresenta) ora aberta ou ora fechada,
possui pregos pontiagudos em seu interior, os pregos foram colados organizadamente e uniformemente.
A ironia presente nas fotografias pode ser contextualizada pelo perigo em virtude da realidade
política que o artista vivia. O estereótipo de um jovem de sucesso foi ironizado pelo artista, a ideia de que
todo jovem deve buscar esse brilhantismo pode ser uma das críticas que Zílio queria mostrar.
Nesse momento, o próprio artista, sendo ele, um recém formado na universidade, poderia ser o
jovem que busca o sucesso na carreira. Esse desejo, o do sucesso no trabalho é o mesmo desejo da
grande maioria dos jovens, e por trás da busca pelo sucesso, são incentivados a busca constante e
acirrada pelo brilhantismo pessoal e satisfação econômica, mesmo que de forma perversa ou alienada.
A busca perversa e alienada pelo sucesso pode ser representada pela maleta com pregos. O símbolo
que a maleta impõe, sendo ela sinônimo de seriedade, importância e respeito é posta em xeque ao ser
aberta. O que se esperava portar em uma maleta de um executivo são papéis importantes, e ao se deparar
com uma maleta com pregos, o simbolismo de prestigio é rapidamente trocado pelos sinônimos de perigo
e traição. É essa ironia que os simples pregos dentro da maleta podem simbolizar ou revelar.
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Fig.(h)- Para um jovem de brilhante futuro, (1974) Fig.(i)- Para um jovem de brilhante futuro, (1974)(múltiplo, serie fotográfica, 18x24) (múltiplo, serie fotográfica, 18x24)
Fonte: Site Oficial Carlos Zílio Fonte: Site Oficial Carlos Zílio
É interessante notar a constante presença do objeto prego em trabalhos de Carlos Zílio. A já citada
maleta que contêm a distribuição de pregos em seu interior que é uma representação eminente do
contexto perigoso pode fazer ligação com outros trabalhos do artista, que também possuem o prego como
principal indício de terror.
Também outro trabalho que integra a série e que se utiliza do objeto citado é Espaço vida (1974),
uma área retangular demarcada no chão, do qual no meio possui um amontoado de pregos. Ironicamente
parte do título do trabalho se chama vida, do qual não dialoga com a representação dos pregos, pois os
mesmos estão longe de representar vida, se encontram mais próximos de significar sofrimento e até de
morte.
Outro trabalho que também pode ser ligado aos já citados trabalhos é o Fragmento de Paisagem
(1974), um pote de vidro transparente que está cheio de uma grande quantidade de pregos. Ao reunir
fragmentos (os pregos) de uma paisagem (o ambiente da ditadura militar) em um pote, o artista pode
sugerir a reunião de lembranças de um período sombrio, levando em consideração que Zílio sofreu com a
perseguição, é fácil ligar tais a sua vida (FERREIRA, 2009, p.321).
Fíg. (j) – Carlos Zílio, Espaço-vida, 1974 Fig. (k) – Carlos Zílio, Fragmentos de Paisagem, 1974(vinil sobre eucatex, pregos, 122x276cm) (objeto, vidro, pregos, 12x6m, 8 exemplares)
Fonte: Site Oficial de Carlos Zílio Fonte: Site Oficial de Carlos Zílio Além da utilização de pregos nos dois citados trabalhos, outra relação existente entre eles é o termo
espaço (no Espaço Vida (1974)) e o termo paisagem (no Fragmento de Paisagens(1974)). Enquanto um
utiliza-se dos pregos para ironicamente retratar a vida, outro veda vestígios de uma paisagem (os pregos)
dentro de um pote de vidro com tampa. Uma direta representação de ambientes, que podem fazer ligação
com o ambiente ditador.
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Outra importante série produzida pelo artista que tem o símbolo do prego como principal elemento
da obra é a série Paisagens (1974), compostas exclusivamente por serigrafias que retratam paisagens de
pregos, sendo que apenas em uma das serigrafias os pregos projetam uma sombra. Daí o título de
paisagem com sombra. Estas gravuras, juntamente com outros trabalhos do artista encontram-se na
Galeria de Arte Espaço Universitário, na Universidade Federal do Espírito Santo. O artista doou as obras
para a Galeria na ocasião em que o mesmo realizou uma exposição em 1987.
Fig. (l) – Carlos Zílio, Paisagem, 1973 Fig. (m) – Carlos Zílio, Paisagem, 1973(gravura, 45x70cm) (gravura, 45x70cm)
Fonte: Acervo do GAEUFonte: Acervo do GAEU
Essa exposição ocorreu em dia 26 de Novembro ao dia 13 de dezembro de 1987, totalizando dessa
forma em torno de 20 dias de exposição. Essa importante exposição realizada pelo o artista na Galeria se
torna um marco (para a universidade) pelo fato de ajudar a incluir o Espírito Santo no eixo das exposições
dos artistas mais renomados da época. Não somente Zílio, mas outros artistas expuseram na Galeria.
Além da abertura da exposição, ocorrida em uma quinta feira, as 20:00 horas, aconteceu também um
encontro com o artista, no dia 10 de dezembro, no campus da Universidade, mais especificamente no
Centro de Artes (CEMUNI IV), em Vitória – ES.
A exposição cujo nome foi: Carlos Zílio – Pinturas. Essa exposição faz parte do projeto intitulado
Pinturas Brasil Tendências 1987/1988. O texto do catálogo intitulado Passado Presente, foi escrito por
Paulo Venâncio Filho. O jornal A Gazeta publicou uma matéria escrita pela jornalista Pupe Gatti escreveu
um artigo cujo o titulo é: Vivências na Capela de Santa Luzia, no mesmo dia que ocorreu a abertura da
exposição na galeria. Esta exposição antes de chegar na galeria, passou por Rio de Janeiro e São Paulo.
Além das já citadas obras de paisagens, o artista doou também a pintura : “Você se lembra...” (1986).
Inconfundivelmente, a “máscara democrática” do qual o regime militar apresentou, de certo modo,
algumas de suas vertentes foram desmascaradas pelas críticas contidas nos trabalhos de Zílio (ANSARA,
2007, p.17). O artista de forma objetiva soube, verdadeiramente, “representar ideias por elementos
suficientes a sua concretização, e deste modo estabelecer uma relação direta entre o real, a reflexão e a
economia de meios da representação” (FERREIRA, 2006, p.140).
Talvez, a soma da essência de cada trabalho engajado produzida por Zílio pode se resumir, dentre
muitas, na busca pela liberdade. O trabalho produzido por Zílio, mesmo que pequeno comparado às
atrocidades impostas pelo governo, somado aos trabalhos de outros artistas se torna uma corrente firme e
forte que liga as experiências do passado à condição de democracia que temos hoje.
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5– Discussão e Conclusões
Com os dados obtidos, com o levantamento e com o registro da produção artística de Carlos Zílio no
recorte específico referente ao período da ditadura, nota-se a forte participação que o artista teve na
crítica contra a o governo militar. O período inicial de sua carreira com sua posição direta e combativa
contra o governo, o período em que foi ferido e preso pelos militares na cadeira e o incerto clima pós
prisão foram bem representados por Zílio, por meio de pinturas, desenhos e objetos. Ao mesmo tempo em
que retratou experiências pessoais em seus trabalhos, o artista também apresentou questões que a
sociedade vivenciava naquele momento. Cabeças, malas, pregos, pedras dentre outros foram utilizados
pelo artista e transformados em ferramenta ideológica ou de crítica. Não deixando de desconsiderar a
experimentação utilizada pelo artista, talvez a principal característica de suas obras sejam as marcas que
expressam seu sofrimento pessoal, pois foi através da produção de muitas de suas obras que o artista
manifestou sua própria vivência (considerando que o mesmo foi o único artista a aderir de forma integral
à militância).
Além dos trabalhos citados nessa pesquisa, existem inúmeros outros produzidos pelo artista e que
carecem de serem devidamente estudados. Pontos específicos das difíceis situações propiciadas pela
ditadura militar significou para mim um conhecimento da numerosa produção artística engajada que o
artista realizou no período. Ao conhecer algumas de suas obras, por meio de fotos e tomar conhecimento
de suas características formais, técnicas, suportes e materiais, pude adquirir uma compreensão da
diversidade de métodos utilizados pelo artista, e assim a sua significativa participação na produção
experimental a partir da década de 60 no país. Pude também, tendo como base a bibliografia específica e
catálogos de mostras, analisar a fortuna crítica do artista, que permitiu compreender sua prática e
propósitos estéticos. Ao estabelecer comparações entre a produção do artista, com a de seus
contemporâneos, no sentido de ampliar a compreensão de seu engajamento político do período de
abordagem da pesquisa pode-se perceber que Zílio fazia parte de um grupo de artistas plásticos, que
interagiam e comunicavam-se entre si, fazendo com que o engajamento político pudesse ser influenciado
por outros artistas. As principais perspectivas de continuidade do trabalho consistem na análise e reflexão
mais aprofundada sobre a especificidade, estratégias e práticas conceituais e poéticas, bem como sobre o
teor político/crítico da produção engajada de Carlos Zílio, tomando como objeto de investigação um
recorte de quatro séries temáticas já citadas, pretendendo realizar essa pesquisa na pós graduação.
Também é importante salientar que existe a possibilidade de buscar novas informações tanto sobre esse
conjunto de obras, quanto sobre o conjunto da produção de Carlos Zílio no período da ditadura militar e
assim contribuir para a compreensão da ampliação e diversificação das linguagens artísticas no contexto
dos anos de 1960 e 1970. Referente à bibliografia existente sobre o artista, considerei o conteúdo restrito,
porém apesar do mesmo, a bibliografia presente na biblioteca, nos arquivos e na galeria ajudaram a
introduzir a obra engajada de Zílio. O conhecimento pessoal obtido com a realização do trabalho foi
importante, porém, reconhece a necessidade de ampliação e consolidação de meus conhecimentos
teóricos em história e crítica de arte no Brasil. Vê-se uma oportunidade de continuar a pesquisa artística
do emblemático e engajado artista brasileiro, visando dar prosseguimento e aprofundamento aos estudos
de sua obra no mestrado em Artes.
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6 – Referências Bibliográficas
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