A JUVENTUDE PERDIDA NO BRASIL: DESIGUALDADES ... · primeiro período, 6.494.960 anos no segundo e...

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ANA EDIMILDA AMADOR A JUVENTUDE PERDIDA NO BRASIL: DESIGUALDADES SOCIOECONÔMICAS E ESPACIAIS NA MORTALIDADE DE JOVENS POR VIOLÊNCIA NATAL/RN 2018 www.posgraduacao.ufrn.br/ppgscol [email protected] 55-84-3342-2338 CENTRO DE CIÊNCIAS DA SAÚDE PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM SAÚDE COLETIVA

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ANA EDIMILDA AMADOR

A JUVENTUDE PERDIDA NO BRASIL: DESIGUALDADES SOCIOECONÔMICAS

E ESPACIAIS NA MORTALIDADE DE JOVENS POR VIOLÊNCIA

NATAL/RN

2018

www.posgraduacao.ufrn.br/ppgscol [email protected] 55-84-3342-2338

CENTRODECIÊNCIASDASAÚDEPROGRAMADEPÓS-GRADUAÇÃOEMSAÚDECOLETIVA

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ANA EDIMILDA AMADOR

A JUVENTUDE PERDIDA NO BRASIL: DESIGUALDADES SOCIOECONÔMICAS E

ESPACIAIS NA MORTALIDADE DE JOVENS POR VIOLÊNCIA

Dissertação apresentada ao Programa de Pós-

Graduação em Saúde Coletiva do Centro de

Ciências da Saúde da Universidade Federal do

Rio Grande do Norte, como requisito para a

obtenção do título de Mestre em Saúde Coletiva.

Orientadora: Profª. Dra. Isabelle Ribeiro Barbosa

Natal/RN

2018

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Universidade Federal do Rio Grande do Norte - UFRN

Sistema de Bibliotecas - SISBI

Catalogação de Publicação na Fonte. UFRN - Biblioteca Setorial Prof. Alberto Moreira Campos -

Departamento de Odontologia

Amador, Ana Edimilda.

A juventude perdida no Brasil: desigualdades socioeconômicas

e espaciais na mortalidade de jovens por violência / Ana

Edimilda Amador. - 2018.

122f.: il.

Dissertação (Mestrado em Saúde Coletiva) - Universidade

Federal do Rio Grande do Norte, Centro de Ciências da Saúde,

Programa de Pós-Graduação em Saúde Coletiva, Natal, 2018.

Orientadora: Profa. Dra. Isabelle Ribeiro Barbosa.

1. Violência - Dissertação. 2. Adulto jovem - Dissertação. 3.

Distribuição espacial da população - Dissertação. 4. Anos

potenciais de vida perdidos - Dissertação. I. Barbosa, Isabelle

Ribeiro. II. Título.

RN/UF/BSO BLACK D585

Elaborado por Hadassa Daniele Silva Bulhões - CRB-313/15

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DEDICATÓRIA

Dedico este trabalho a minha mãe Ana Milda da Cunha Amador, irmãs e irmão, aos

meus sobrinhos e sobrinhas, a Marilane, a minha orientadora Dra. Isabelle Ribeiro, aos meus

amigos de vida e de academia, aos mestres desde o início do percurso. A família Amador e a

família Cunha. Ao meu pai José Amador Filho (in memoriam), e a minha avó Maria Mili da

Cunha (in memoriam) e para os dois deixo este escrito,

Talvez

Talvez entre estrelas da galáxia

Esteja seu brilho

Que ilumina em noites de insônia meu coração partido

E no silêncio absoluto meus sentidos captam mensagens

A saudade é tanta, mas não faz alarde

Talvez entre os montes mais elevados

Esteja seu puro ar

Que faz mais leve meu respirar

Talvez quem sabe

Na tempestade sejas um raio

Ou pra o frio o calor do agasalho

Embora os dias nunca mais tenham sido como antes

Em nenhuma cena... Em nenhum instante

Todo o tempo que estive sozinha

Nunca estive solitária

Você sempre caminhou lado a lado a minha alma.

Ana Edimilda Amador

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AGRADECIMENTOS

Agradeço a Deus, autor da minha vida, que guia meus passos, que é lâmpada para o

meu caminho. A minha avó Maria Mili da Cunha (in memoriam), ela que sempre foi um amor

e esperava que eu trilhasse por caminhos melhores. Ao meu maior incentivador, meu pai José

Amador Filho (in memoriam), aquele que deixou em meu coração minha eterna maior

saudade, o meu amor sem medida.

A minha mãe Ana Milda da Cunha Amador, por ser exemplo de mãe, minha artista, a

ela entrego esse título, junto com minha gratidão.

As minhas irmãs e irmão: Eliete, Etiene (Que sempre foi uma professora para mim),

Edimilza (Que é um exemplo nos estudos e na profissão), Aparecida e Raulindo. Aos meus

sobrinhos amados que enchem de orgulho essa tia: Edilson, Edilene, Edileide, João Victor,

Juan Pablo, Camylly, Gerlier, Emanuel, Ana Cecília e José Ricardo.

A Isabel Vilela Marques, Márcia Marques, Marilda Marques e Elaíza Vilela, Mônica

Marques e Yasmim, Marileide Marques e a Janaína Vilela pelas orações e apoio.

A Marilane Vilela Marques pelas parcerias, pelo incentivo, pela fé, pela criatividade,

pelo teatro, pela música e poesia que me recuperam dos embates e emboscadas nos dias.

Agradeço a minha orientadora desse Mestrado, Dra. Isabelle Ribeiro Barbosa por todo

seu envolvimento com a pesquisa e tornar mais próximo os caminhos da ciência.

A minha primeira professora Maria Célia da Cunha, que viu meus primeiros rabiscos

de palavras e me direcionou ao caminho do saber.

A professora Vilani Gonçalves de Oliveira Fonsêca, do ensino fundamental, que foi

exemplo de professora para mim.

A professora Maria da Guia Lopes, que foi um diferencial durante o ensino médio, e

um exemplo edificante para a jornada.

As professoras do curso de Serviço Social da Universidade Potiguar – UNP: Regina

Maria dos Santos, Sheyla Paiva Pedrosa Brandão, Adna Rejane, Iris Lima, Karmen, Ednara,

Cláudia Gabriele, Keyla Mafalda e Mariano Azevedo, exemplos pra vida.

Agradeço as amigas irmãs: Andreza de Souza Regis, Késia Kalina da Silva e Patrícia

Maria de Lima, especialmente por entenderem os motivos das minhas ausências.

Agradeço a Secretária Municipal de Saúde, Maria da Saudade Azevedo Machado, que

muito me apoiou com a liberação para as aulas do mestrado. De igual modo agradeço ao

Marcelo Bessa, assim como a Isabelle Grilo, secretária Adjunta de Gestão Participativa do

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Trabalho e da Educação na Saúde (SAD/GS); a Adriana Medeiros, diretora do Departamento

de Gestão, Trabalho e Educação na Saúde (DGTES); a Nádia Rocely Souto de Lima Almeida,

chefe do Setor de Educação Permanente e Articulação Ensino-serviço (SEPAES). Aos amigos

do trabalho: Walkiria Oliveira, Madga Dantas, Gorete Barbosa, Lidiane Montenegro, Samara

Nobre, e Thuysa Guerra, que sempre socorrem uns aos outros seja pelas caronas sagradas de

cada dia ou em situações difíceis como problemas de saúde, e aos demais colegas de trabalho,

aqueles que sabem enxergar com empatia. Estendo os agradecimentos aos estagiários que

colaboraram e aos que colaboram com o SEPAES e vão sempre apreendendo e ensinando.

Agradeço aos professores do curso de Análise de Situação de Saúde, sobre a

coordenação geral da profª. Dra. Marta Rovery de Souza e do Prof. Dr. Otaliba Libânio de

Morais Neto, ao prof. Júlio Henrique de Oliveira (que muito colaborou comigo inclusive extra

curso ASIS). Aos professores Dr. José Constantino, Dr. Walter Ramalho, pelas aulas

brilhantes. A minha tutora Gabriella Morais Duarte Miranda. Agradeço a Leila Pires Simeão e

Luciana Dias dos Santos pelo apoio infinito.

Agradeço aos professores do Programa de Pós Graduação em Saúde Coletiva da

UFRN: Dr. Angelo, Dra. Elizabethe, Dra. Angela, Dra. Clelia, Dr. Dyego, Dr. Kênio, Dra.

Grasiela, Dr. Antônio Jr, Dra. Iris, Dra. Alice, Dra. Jacileide, Dra. Socorro, Dr. Luiz Noro.

Assim como ao secretário do PPGSCol Lucas Araújo pela disponibilidade em colaborar.

Outrossim, aos colaboradores da biblioteca que estão sempre à disposição para nos ajudar.

Agradeço infinitamente aos amigos das turmas de Mestrado e Doutorado da Saúde

Coletiva: Ulicélia, Yonara, Aryelly, Monique, Ana Patrícia, Anderson, Pedro, João Paulo

Teixeira, João Paulo Damásio, Jonatas, Lannuzya, Bárbara, Danyllo, Dayane, Diogo,

Yasmine, Laércio, Camila Santos, Nila, Genyklea, Heloísa, Carina, Eder, Karla, Natércia,

Lyane, Paula, Denise, Hanieri, Amanda, Haroldo, Daniel, Jonia, Brunna Lucena, Fátima

Lucena, Natércia, Andiara, Adala, Ana Clara, Carla, Camila Resende, Osvaldo.

Agradeço a Dra. Rosimery Cruz de Oliveira Dantas que na fase final do seu doutorado

esteve o tempo todo colaborando com atividades de várias disciplinas.

A Emelynne Santos, a amiga que pensa nas mesmas questões de pesquisas, nos

eventos, concursos, etc.

A todos que, direta ou indiretamente, contribuíram para a realização desta Dissertação.

Por fim, agradeço a quem conseguiu driblar milhões de embates, que levantou-se

quando não tinha força para tanto, que superou a dor, que despertou para cumprir o que estava

prometido pelo seu DEUS, ela que sou eu: Ana Edimilda Amador.

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A juventude perdida

Num Brasil violento

Sangrento!

A vida virou “coisa” morta

E ninguém mais se importa

Há muito, eu, você e outros mais (sem saber)

Temos sido trocados ou vendidos

Em mercados ilegais

Por governos desleais

Muitos envelheceram

E não estamos percebendo

Que os mais jovens já não estão envelhecendo

A violência está matando!!!

E quantos de nós apertamos (indiretamente) o gatilho?

E quantos morrem sem perceber de onde veio o tiro?

Neste país, a violência é coisa corriqueira

Acostumaram-se!

A morte já tem cara brasileira

Crimes são justificáveis: “Estava na hora errada”, “no dia errado”

Ou foi “falta de cuidado!”

Vida, já não tão preciosa, vida!

Como num dilúvio chorarão os dias, a juventude perdida!

Ana Edimilda Amador

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RESUMO

O objetivo desse estudo foi analisar a mortalidade de jovens por violência no Brasil,

considerando importantes indicadores socioeconômicos e espaciais para esta análise. Trata-se

de um estudo ecológico nas 482 nas Regiões Imediatas de Articulação Urbana (RIAU) do

Brasil. A distribuição espacial das mortes violentas, a intensidade e significância foram

avaliadas através do índice de Moran Global e Local, sua correlação com variáveis

socioeconômicas e pelo indicador Anos Potenciais de Vida Perdidos (APVP) para o período

de 2001 a 2015 por quinquênios. Foram registrados 425.180 óbitos de jovens por violência no

Brasil. Os óbitos foram obtidos de forma secundária do Sistema de Informação sobre

Mortalidade e os indicadores socioeconômicos da PNUD. As RIAU que apresentaram as

maiores Taxas de Mortalidade Padronizadas de 2001 a 2005 foram: Foz do Iguaçu (48.45

óbitos/100 mil jovens), Recife (42.26 óbitos/100 mil jovens) e Vitória (37.18 óbitos/100 mil

jovens); de 2006 a 2010: Foz do Iguaçu (48.12 óbitos/100 mil jovens), Maceió (43.95

óbitos/100 mil jovens) e Porto Seguro (40.40 óbitos/100 mil jovens). De 2011 a 2015: São

Miguel dos Campos – AL (53.29 óbitos/100 mil jovens), Porto Seguro – BA (48.74

óbitos/100 mil jovens) e Maceió – AL (45.13 óbitos/100 mil jovens). O teste de Moran Global

apontou padrão de dependência espacial na distribuição das taxas para as regiões norte,

nordeste e sudeste. Estas mortes determinaram perdas de APVP de 6.435.042.5 anos no

primeiro período, 6.494.960 anos no segundo e 7.216.005 no terceiro. A idade média de

ocorrência do óbito é aos 22 anos de idade, resultando a média de APVP/óbito de 47 anos. A

Razão da Taxa de APVP por sexo foi de 15.09 de 2001 a 2005 e de 15.22 no período de 2011

a 2015. Observa-se a sobremortalidade masculina para todos os quinquênios, assim como para

a população negra se comparando à branca. A análise bivariada mostrou que, dentre os 9

indicadores socioeconômicos selecionados, todos se correlacionaram significativamente com

a Taxa de Mortalidade Padronizada por RIAU (p<0,05). Conclui-se que a mortalidade por

violência está desigualmente distribuída nas regiões imediatas, formando clusters no norte,

nordeste e sudeste do país. Embora com fraca correlação com os fatores socioeconômicos foi

observada distribuição desigual no território, assim como diferenciais de APVP por sexo e

raça/cor.

Palavras-chave: Mortalidade. Violência. Jovens. Distribuição Espacial. Anos Potenciais de

Vida Perdidos.

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ABSTRACT

The objective of this study was to analyze the mortality of young people due to

violence in Brazil, considering important socioeconomic and spatial indicators for this

analysis. This is an ecological study in the 482 in the Immediate Regions of Urban

Articulation (RIAU) of Brazil. The spatial distribution of violent deaths, intensity and

significance were assessed using the Global and Local Moran index, their correlation with

socioeconomic variables, and the Years of Life Lost (YLL) indicator for the period from 2001

to 2015 for five years. There were 425,180 deaths of young people due to violence in Brazil.

Deaths were obtained in a secondary way from the Mortality Information System and the

socioeconomic indicators of UNDP. The RIAUs that presented the highest Standardized

Mortality Rates from 2001 to 2005 were: Foz do Iguaçu (48.45 deaths/ 100 thousand young

people), Recife (42.26 deaths/ 100 thousand young people) and Vitória (37.18 deaths/ 100

thousand young people); from 2006 to 2010: Foz do Iguaçu (48.12 deaths/ 100 thousand

young people), Maceió (43.95 deaths/ 100 thousand young people) and Porto Seguro (40.40

deaths/ 100 thousand young people). From 2011 to 2015: São Miguel dos Campos - AL

(53.29 deaths/ 100 thousand young people), Porto Seguro - BA (48.74 deaths/ 100 thousand

young people) and Maceió - AL (45.13 deaths/ 100 thousand young people). The Moran

Global test pointed to a pattern of spatial dependence in the distribution of rates for the north,

northeast and southeast regions. These deaths resulted in a loss of YLL of 6,435,042.5 years

in the first period, 6,494,960 years in the second and 7,216,005 in the third. The mean age of

death is at 22 years of age, resulting in a mean PWL/ death of 47 years. The ratio of YLL to

sex ratio was 15.09 from 2001 to 2005 and from 15.22 from 2011 to 2015. Male overmortality

is observed for all quinquennia, as well as for the black population, compared to the white

population. The bivariate analysis showed that, among the 9 selected socioeconomic

indicators, all correlated significantly with the RIAU Standardized Mortality Rate (p <0.05).

It is concluded that violence mortality is unevenly distributed in the immediate regions,

forming clusters in the north, northeast and southeast of the country. Although with a weak

correlation with the socioeconomic factors, there was an unequal distribution in the territory,

as well as differentials of YLL by sex and race/ color.

Keywords: Mortality. Violence. Young. Spatial distribution. Years of Life Lost.

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LISTA DE FIGURAS E QUADROS

Figura 1 – Tipologia e natureza da Violência, segundo a Organização Mundial

de Saúde, 2002.......................................................................................

19

Figura 2 – Modelo ecológico da violência, proposto pela Organização Mundial

de Saúde, 2002.......................................................................................

20

Figura 3 – Modelo de determinação social da saúde proposto por Dahlgren e

Whitehead..............................................................................................

23

Figura 4 – Marco conceitual dos determinantes sociais da saúde........................... 24

Figura 5 – Rede de Atenção Integral e Proteção às Pessoas em Situação de

Violência................................................................................................

38

Figura 6 – Modelo de camadas em um SIG relacionada ao evento/ agravo

violência.................................................................................................

47

Figura 7 – Divisão Urbano Regional/ Regiões Imediatas de Articulação Urbana.. 53

Quadro – 1 Distribuição dos óbitos por violência segundo a CID – 10.................... 54

Quadro – 2 Método de cálculo dos APVP entre as idades de 15 a 29 anos,

distribuídas em três faixas......................................................................

56

Quadro – 3 Descrição das variáveis independentes individuais do estudo............... 57

Quadro – 4 Variáveis independentes contextuais socioeconômicos por RIAU........ 58

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LISTA DE ABREVIATURAS E SIGLAS

AEDE Análise Exploratória de Dados Espaciais

ADS Atlas do Desenvolvimento Humano

APVP Anos Potenciais de Vida Perdidos

CID CID-10 - Classificação Estatística Internacional de Doenças e Problemas

Relacionados à Saúde- 10ª Revisão

CMDCA Conselhos Municipais dos Direitos das Crianças e dos Adolescentes

CNDSS Comissão Nacional sobre Determinantes Sociais em Saúde

CONAPIR Conferência Nacional de Promoção da Igualdade Racial

CNJ Conselho Nacional de Juventude

CRAS Centro de Referência de Assistência Social

CREAS Centro de Referência Especializado de Assistência Social

CT Conselho Tutelar

DANT Doenças e agravos não transmissíveis

DATASUS Departamento de Informática do Sistema Único de Saúde

DSS Determinantes Sociais da Saúde

DO Declaração de Óbito

ECA Estatuto da Criança e do Adolescente

ESF Estratégia Saúde da Família

EUA Estados Unidos da América

FIOCRUZ Fundação Oswaldo Cruz

FAT Fundo de Amparo ao Trabalhador

HAF Homicídios por Arma de Fogo

IBGE Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística

IDHM Índice de Desenvolvimento Humano Municipal

IML Instituto de Medicina Legal

IPEA Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada

IVJ Índice de Vulnerabilidade Juvenil

IVS Índice de Vulnerabilidade Social

MS Ministério da Saúde

MP Mortalidade Proporcional

OMS Organização Mundial de Saúde

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ONU Organização das Nações Unidas

OPAS Organização Pan-Americana da Saúde

PNRH Pacto Nacional pela Redução de Homicídios

PRONASCI Programa Nacional de Segurança Pública com Cidadania

PRONATEC Programa Nacional de Acesso ao Ensino Técnico e Emprego

PROEJA Programa Nacional de Integração da Educação Profissional com a

Educação Básica na Modalidade de Educação de Jovens e Adultos

PROJOVEM Programa Nacional de Inclusão de Jovens

PNUD Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento

PSE Programa Saúde na Escola

PVT Projeto Vida no Transito

RM Regiões Metropolitanas

RIAU Regiões Imediatas de Articulação Urbana

RIPSA Rede Interagencial de Informações em Saúde

SGPR Secretaria-Geral da Presidência da República

SNJ Secretaria Nacional de Juventude

SIG Sistema de Informação Geográfica

SIS Sistema de Informação em Saúde

SUS Sistema Único de Saúde

TBM Taxa Bruta de Mortalidade

TMP Taxa de Mortalidade Padronizada

SIM Sistema de Informação sobre Mortalidade

SIH - SUS Sistema de Informações Hospitalares do SUS

SINAN Sistema de Informação de Agravos de Notificação

SINAJUVE Sistema Nacional de Juventude

SINAPIR Sistema Nacional de Promoção da Igualdade Racial

UDH Unidades de Desenvolvimento Humano

VIVA Vigilância de Violências e Acidentes

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SUMÁRIO

1 INTRODUÇÃO........................................................................................... 14

2 REFERENCIAL TEÓRICO...................................................................... 18

2.1 A VIOLÊNCIA COMO FENÔMENO MULTIDIMENSIONAL............... 18

2.2 DETERMINANTES SOCIAIS: DETERMINAÇÃO SOCIAL DA

SAÚDE E A VIOLÊNCIA...........................................................................

21

2.3 MORTALIDADE POR CAUSAS VIOLENTAS NO BRASIL.................. 25

2.4 MORTALIDADE DE JOVENS: A JUVENTUDE PERDIDA.................... 30

2.5 POLÍTICAS DE COMBATE À VIOLÊNCIA E À CULTURA DA PAZ

NO BRASIL..................................................................................................

35

2.6 A GEOGRAFIA DA SAÚDE E A CONTRIBUIÇÃO PARA A

EPIDEMIOLOGIA.......................................................................................

42

3 OBJETIVOS................................................................................................ 50

3.1 OBJETIVO GERAL..................................................................................... 50

3.2 OBJETIVOS ESPECÍFICOS........................................................................ 50

4 MÉTODO..................................................................................................... 52

4.1 DELINEAMENTO DO ESTUDO................................................................ 52

4.2 OBJETO DA ANÁLISE............................................................................... 52

4.3 ÁREA DO ESTUDO.................................................................................... 52

4.4 POPULAÇÃO E FONTE DE DADOS........................................................ 53

4.5 CRITÉRIOS DE INCLUSÃO E EXCLUSÃO............................................. 55

4.6 VARIÁVEIS................................................................................................. 55

4.6.1 Variáveis dependentes................................................................................ 55

4.6.2 Variáveis independentes individuais......................................................... 57

4.6.3 Indicadores socioeconômicos...................................................................... 57

4.7 ANÁLISE DOS DADOS.............................................................................. 58

4.7.1 Análise descritiva dos dados....................................................................... 59

4.8 ANÁLISE ESPACIAL.................................................................................. 59

4.8.1 Índice de Moran.......................................................................................... 60

4.8.2 Moran Global.............................................................................................. 60

4.8.3 Moran Local................................................................................................ 60

4.8.4 Moran Bivariado......................................................................................... 61

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4.9 ANÁLISE DA ESTATÍSTICA CLÁSSICA................................................ 61

4.10 RISCO RELATIVO...................................................................................... 61

4.11 ASPECTOS ÉTICOS.................................................................................... 62

5 RESULTADOS E DISCUSSÃO................................................................ 64

5.1 ARTIGO 1: DISTRIBUIÇÃO ESPACIAL DA MORTALIDADE DE

JOVENS POR VIOLÊNCIA POR REGIÕES IMEDIATAS DE

ARTICULAÇÃO URBANA NO BRASIL..................................................

64

5.2 ARTIGO 2: A JUVENTUDE PERDIDA NO BRASIL: ANOS

POTENCIAIS DE VIDA PERDIDOS POR VIOLÊNCIA NAS

REGIÕES IMEDIATAS DE ARTICULAÇÃO URBANA NO BRASIL...

78

5.3 ARTIGO 3: MORTALIDADE DE JOVENS POR VIOLÊNCIA NO

BRASIL: DESIGUALDADE ESPACIAL E SOCIOECONÔMICA...........

95

6 CONCLUSÕES........................................................................................... 111

REFERÊNCIAS.......................................................................................... 114

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“E é como se eu descobrisse que a força esteve o tempo todo em mim

E é como se então de repente eu chegasse ao fundo do fim

De volta ao começo...”

Nana Caymmi

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A juventude perdida no Brasil: desigualdades socioeconômicas e espaciais na mortalidade de jovens por

violência 14

1 INTRODUÇÃO

Para a Organização Mundial de Saúde (OMS), a violência é caracterizada como o uso

intencional da força física ou do poder, real ou em ameaça, contra si próprio, contra outra

pessoa, ou contra um grupo ou uma comunidade, que resulte ou tenha grande possibilidade de

resultar em lesão, morte, dano psicológico, deficiência de desenvolvimento ou privação (OMS,

2002). No Brasil, a mortalidade por violência interpessoal (homicídios) tem se destacado de

forma expressiva, sendo uma preocupação para as esferas, políticas e sociais. Sendo assim,

um problema social e de saúde pública.

A violência é um fenômeno sobre o qual existe responsabilidade dos sujeitos

individuais e coletivos, uma vez que as ações violentas se realizam por meio de pessoas

dentro de sua cultura (MINAYO, 2006). Num território onde a localização dos serviços

essenciais é deixada à mercê da lei do mercado, tudo colabora para que as desigualdades

sociais aumentem (SANTOS, 2012). Território e violência são conceitos para se compreender

em seu conjunto. A violência não se explica sozinha, ela é apenas mais um elemento desta

sociedade complexa, dinâmica e contraditória (PATRÍCIO, 2014). A sociedade civil é,

também, território, e não se pode definir fora dele. Há desigualdades sociais que são, em

primeiro lugar, desigualdades territoriais, porque derivam do lugar onde cada qual se encontra.

(SANTOS, 2012). A superação dessas desigualdades torna-se um exercício em três direções:

uma questão teórica/conceitual, uma problemática metodológica e um desafio político

(BRASIL, 2015a).

Buscando intervir sobre a violência interpessoal, o Ministério da Saúde, lançou a

Portaria MS/GM nº 737 de 16/05/2001, que contempla a Política Nacional de Redução da

Morbimortalidade por Acidentes e Violências (BRASIL, 2001). Esta Política trata da temática

da violência como um problema social e histórico e com isso busca programar ações e

políticas de promoção da saúde, procurando diminuir as vulnerabilidades às violências

(PATRÍCIO, 2014).

Sobre a ótica que as violências e acidentes exercem grande impacto social e

econômico, sobretudo no setor saúde, o Ministério da Saúde por meio da Portaria MS/GM nº

1.356 de 23 de junho de 2006, implantou o Sistema de Vigilância de Violências e Acidentes

(VIVA), o qual é constituído pelos componentes de Vigilância de violência interpessoal e

autoprovocada do Sistema de Informação de Agravos de Notificação (VIVA/SINAN) e

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A juventude perdida no Brasil: desigualdades socioeconômicas e espaciais na mortalidade de jovens por

violência 15

Vigilância de violências e acidentes em unidades de urgência e emergência (VIVA Inquérito)

(BRASIL, 2006a).

Na perspectiva da sociedade brasileira, os homicídios são causas de morte

predominantes no conjunto das causas externas (HORTA; SAWYER; CARVALHO, 2006),

com riscos diferenciados em função do gênero, raça/cor, idade e espaço social, com

crescimento das taxas de criminalidade em regiões metropolitanas do país ocorrem devido à

falta de oportunidades e perspectivas, sobretudo para a população jovem (BRASIL, 2005a).

Para Waiselfisz (2011), o homicídio é um fenômeno urbano, mas que já há fortes indícios de

sua interiorização (SOARES, 2008), afetando cada vez mais a população masculina e adulta

jovem, pelas ausências de políticas sociais voltadas para os jovens, principalmente os de

classes menos favorecidas na sociedade (ABRAMOVAY et al., 2002).

No Brasil, o Estatuto da juventude, através da Lei no 12.852/2013, que dispõe sobre os

direitos dos jovens, os princípios e diretrizes das políticas públicas de juventude e o Sistema

Nacional de Juventude (SINAJUVE), são consideradas jovens as pessoas com idade entre 15

(quinze) e 29 (vinte e nove) anos de idade (BRASIL, 2013). Segundo recentes estimativas,

para o ano de 2012, o Brasil contava com um contingente de 52,2 milhões de jovens na faixa

dos 15 aos 29 anos de idade, representando 26,9% do total de habitantes do país. Se a

magnitude de homicídios correspondentes ao conjunto da população já pode ser considerada

muito elevada, a relativa ao grupo jovem adquire caráter de verdadeira pandemia. Os 30.072

homicídios de jovens que o DATASUS registrou para o ano de 2014 representaram 53,4% do

total de homicídios do país, indicando que a vitimização juvenil alcança proporções

extremamente preocupantes (WAISELFISZ, 2014).

Tem se observado que o jovem se relaciona com a violência, de maneira geral e,

especificamente no caso dos homicídios, de forma ambivalente. “Ora são vítimas, ora são

autores desses eventos. Essa relação complexa suscita a necessidade de compreender a

dinâmica do fenômeno dos homicídios nesse grupo específico” (OMS, 2002, p. 17).

Assim, as análises de situação em saúde, no que se refere às análises da distribuição

dos eventos e dos recursos de saúde em relação aos grupos sociais, têm sido úteis para

mensurar tais desigualdades em saúde. As análises com foco nas desigualdades em saúde têm

sido apoiada pela utilização de diferentes Sistemas de informação em saúde e de inquéritos e

pesquisas em saúde no país. Essas fontes têm grande potencial por, usualmente, apresentarem

ampla cobertura, acesso público e gratuito, oportunidade e universalidade dos dados.

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A juventude perdida no Brasil: desigualdades socioeconômicas e espaciais na mortalidade de jovens por

violência 16

Este estudo se calca pela relevância acadêmica e social, e através deste, possibilitar

maiores entendimentos acerca da evolução da violência contra jovens no Brasil analisando

três quinquênios (2001 a 2005, 2006 a 2010 e 2011 a 2015), e discutir os resultados com

outros estudos e com políticas que tratem a violência como objeto de estudo/ atenção/

enfrentamento, como a Política Nacional de Redução da Morbimortalidade por Acidentes e

Violências (Portaria GM/MS n. 737, de 16 de maio de 2001), e a Lei das Armas de Fogo (Lei

nº 10.826 de 22 de Dezembro de 2003). Assim, justifica-se este estudo, com o intuito de

possibilitar novas descobertas sobre o comportamento e caracterização do fenômeno violência

e provocar gestores quanto à importância de intervenções intersetoriais, apontando a

dimensão territorial que este fenômeno afeta e os distintos padrões epidemiológicos

desenhados no Brasil.

Diante da problemática abordada, são pertinentes as seguintes questões que orientam

este estudo: Qual o perfil dos jovens vítimas da mortalidade por violência por Região

Imediata de Articulação Urbana? Como os óbitos estão espacialmente distribuídos por Região

Imediatas de Articulação Urbana? Qual a carga dos anos potenciais de vida perdidos em

decorrência da mortalidade por violência por Região Imediata de Articulação Urbana? Existe

desigualdade na mortalidade por violências por Região Imediata de Articulação Urbana?

As hipóteses levantadas para esse estudo é que a violência tem migrado dos grandes

centros urbanos para áreas de menor porte populacional no Brasil, com expressiva

desigualdade territorial na distribuição entre as Regiões Imediatas de Articulação Urbana,

bem como a desigualdade social, tendo a maior parcela da violência acometendo jovens do

sexo masculino e negros (pretos e pardos).

Diante do exposto, o objetivo dessa pesquisa é analisar a mortalidade de jovens por

violência no Brasil, considerando importantes indicadores socioeconômicos e espaciais para

esta análise.

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“Eles não pegam em armas

Só em canetas e papéis

Mas matam mais com suas leis

Que atiradores cruéis...”

Arnaldo Antunes

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A juventude perdida no Brasil: desigualdades socioeconômicas e espaciais na mortalidade de jovens por

violência 18

2 REFERENCIAL TEÓRICO

Para melhor compreensão da problemática da violência e sua estrita relação com a

saúde pública, realizou-se levantamento bibliográfico que embasasse o objeto de estudo.

Apresentando-se nesta seção, inicialmente a subseção: 2.1, que expõe a violência

como fenômeno multidimensional, numa discussão dos teóricos sobre a violência de forma

ampla e transversal. Segue o texto com a subseção 2.2, apontando a determinação social da

saúde e da violência, que promove discussão do fenômeno como matéria de saúde e

intersetorial. A subseção 2.3 apresenta-se a epidemiologia da mortalidade por causas violentas

no país, evidenciando resultados de pesquisas recentes. A mortalidade de jovens, com enfoque

na juventude perdida é o tema da 2.4. Segue-se com a subseção 2.5 – com o histórico das

políticas de combate à violência e estímulo à cultura de paz no Brasil, que trata do arcabouço

jurídico legal de prevenção e enfrentamento da violência a nível nacional. Continua-se com a

subseção e da vigilância da violência no Brasil, como ferramenta que possibilita o

monitoramento deste agravo e subsidia políticas de prevenção e combate, via análise de

situação de saúde a partir dos Sistemas de Informações em Saúde – SIS. Encerra-se o

referencial teórico com a subseção: 2.6 - onde se apresenta o potencial da geografia da saúde e

sua contribuição para a compreensão da epidemiologia da violência, como forma de

identificar as áreas de risco de um agravo e de se intervir em tempo oportuno frente ao evento.

2.1 A VIOLÊNCIA COMO FENÔMENO MULTIDIMENSIONAL

Historicamente, a violência esteve vinculada principalmente à criminalidade, objeto de

estudo das ciências jurídicas e sociais. Todavia, devido às amplas dimensões que assume nos

cenários da vida moderna, esse evento tornou-se objeto multidisciplinar e interdisciplinar de

estudo de outras áreas do conhecimento (GAWRYSZEWSKI; KAHN; MELLO JORGE,

2005). Algumas teorias sociais se dedicaram a discutir a questão da violência, especialmente a

urbana. Mas foi na década de 1980 que surgiu um maior incremento desses estudos

interpretativos sobre a temática (MINAYO et al.,1989)

A violência precisa ser analisada na perspectiva da sociedade que a produziu, pois o

fenômeno se nutre de fatos políticos, econômicos e culturais traduzidos nas relações

cotidianas que, por serem construídos por determinada sociedade, e sob determinadas

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A juventude perdida no Brasil: desigualdades socioeconômicas e espaciais na mortalidade de jovens por

violência 19

circunstâncias, podem por ela ser desconstruídos e superados (MINAYO; SOUZA, 1999).

Para o Ministério da Saúde, a violência não é uma, é múltipla (BRASIL, 2005a).

Segundo Abramovay et al. (2002), o fato de se tentar conceituar a violência em uma definição

fixa e simples é correr o risco de reduzi-la, a compreender mal sua evolução e sua

especificidade histórica. Segundo a OMS, a violência pode ser classificada em três grandes

categorias conforme quem comete o ato violento: violência contra si mesmo, violência

interpessoal e violência coletiva (DAHLBERG; KRUG, 2007).

A violência contra si mesmo (autoinfligida) refere-se ao comportamento suicida ou

autodestrutivo. A violência interpessoal pode ocorrer entre membros da mesma família

(intrafamiliar) e parceiros íntimos (violência familiar e íntima) ou entre indivíduos sem laços

de parentesco que podem ou não ser conhecidos entre si (violência comunitária). A violência

coletiva é aquela exercida por pessoas que se identificam como membros de um grupo contra

outro grupo ou conjunto de indivíduos. Os atos violentos podem ainda ser de natureza física,

sexual, psicológica, econômica e institucional (incluindo a negligência, carência ou abandono),

e estabelecem uma relação com a natureza do ato violento (DAHLBERG; KRUG, 2007;

OMS, 2002). O Relatório Mundial sobre a Violência e Saúde da OMS (2002) destaca as

seguintes tipologias e natureza da violência, sistematizadas na Figura 1.

Figura 1 – Tipologia e natureza da Violência, segundo a Organização Mundial de Saúde, 2002.

Fonte: OMS, 2002.

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A juventude perdida no Brasil: desigualdades socioeconômicas e espaciais na mortalidade de jovens por

violência 20

Com vistas a compreender a magnitude da violência, a OMS propõe um modelo

ecológico para explicar suas raízes, considerando-se fatores multicausais, resultante da

complexa interação dos fatores individuais, relacionais, sociais, culturais e ambientais. O

primeiro nível apresenta fatores biológicos e pessoais que cada indivíduo apresenta em seu

comportamento, e que podem influenciar na ação de ser vítima ou praticante de atos violentos.

No segundo nível, evidenciam-se os fatores relacionais a partir de interações sociais. O

terceiro nível traz fatores comunitários (locais de trabalho, a escola e a vizinhança) e sua

influência na dinâmica da violência. Enquanto o quarto nível, aponta os fatores sociais mais

amplos no contexto dos índices de violência (conflitos; machismo; interesses políticos e

econômicos que apoiam conflitos políticos e as políticas de educação, saúde, econômicas e

sociais que colaboram para a manutenção das desigualdades) (OMS, 2002). Este modelo está

explicitado na Figura 2.

Figura 2 – Modelo ecológico da violência, proposto pela Organização Mundial de Saúde, 2002.

Fonte: Organização Mundial de Saúde (OMS, 2002).

O Ministério da Saúde acrescenta a ‘violência estrutural’, que se refere aos processos

sociais, políticos e econômicos que geram a fome, a miséria e as desigualdades sociais, de

gênero, de etnia e mantêm o domínio adultocêntrico sobre crianças e adolescentes (BRASIL,

2005a).

Para Minayo (2003, p. 25), a violência é resultado de processos sócio históricos de

causalidade complexa, não se tratando de evento único e sim múltiplo, cujas “manifestações

Social

Comunitário

Relacional

Individual

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A juventude perdida no Brasil: desigualdades socioeconômicas e espaciais na mortalidade de jovens por

violência 21

são aprovadas ou desaprovadas, lícitas ou ilícitas segundo normas sociais mantidas por usos e

costumes ou por aparatos legais da sociedade”.

Não há um consenso acerca das causas associadas aos agravos violentos. São fatores

relacionados à ocorrência de morte: socioeconômicos, constituição familiar, ambiente

doméstico, idade e as características de personalidade, sexo da vítima, etnia da vítima, uso de

bebidas alcoólicas e de substâncias químicas, fatores biológicos e fatores multicausais.

Quanto aos fatores demográficos, adolescentes e jovens têm sido frequentemente

identificados como as principais vítimas das diversas tipologias da violência, indicando que a

idade guarda estreita relação com as causas externas (MARTINS, 2013).

A violência está inscrita e arraigada não só nas relações sociais, mas, principalmente, é

construída no interior das consciências e das subjetividades. Portanto, esse fenômeno não

pode ser tratado apenas como uma força exterior aos indivíduos e aos grupos (MINAYO,

1994). E como fenômeno complexo, multifacetário e resultante de múltiplas determinações

articula-se intimamente com processos sociais que se assentam, em última análise, numa

estrutura social desigual e injusta (MACEDO et al., 2001).

2.2 DETERMINANTES SOCIAIS: DETERMINAÇÃO SOCIAL DA SAÚDE E A

VIOLÊNCIA

As mais importantes entre as causas reais dos problemas de saúde são as condições

sociais nas quais as pessoas vivem e trabalham, refletindo a posição ocupada pelas pessoas na

hierarquia do status, do poder e do acesso aos recursos. Proveniente de uma sociedade onde as

oportunidades não são iguais, a saúde tem como fatores determinantes e condicionantes,

segundo a lei 8080/90, a alimentação, a moradia, o saneamento básico, o meio ambiente, o

trabalho, a renda, dentre outros que expressam a organização social e econômica do Brasil

(OLIVEIRA; SANTO, 2013).

A versão brasileira da teoria da determinação social do processo saúde-doença dá

maior ênfase explicativa ao modo de vida, considerando nele englobados tanto os aspectos

materiais quanto os aspectos simbólicos que refletem as características sociais de produção,

distribuição e consumo, às quais cada grupo social está relacionado através do modo de vida.

Ao mesmo tempo, busca articular as diferentes esferas da organização social, o conceito de

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A juventude perdida no Brasil: desigualdades socioeconômicas e espaciais na mortalidade de jovens por

violência 22

modo de vida reúne em um mesmo marco teórico as condições coletivas dos grupos e os

comportamentos dos indivíduos que compõem esses grupos (BARATA, 2009).

Na área da saúde pública, a violência vem sendo abordada como fenômeno social com

múltiplas determinações. Nesse contexto,

Na América Latina a discussão sobre as desigualdades sociais vem sendo feita

principalmente à luz da teoria da determinação social do processo saúde-doença.

Essa teoria analisa a constituição do próprio sistema capitalista de produção e suas

formas particulares de expressão nas diferentes sociedades, dando maior ênfase aos

mecanismos de acumulação do capital e à distribuição de poder, prestígio e bens

materiais deles decorrentes. A posição de classe e a reprodução social passam a ser

vistas como os principais determinantes do perfil da saúde e doença. Nessa

abordagem o problema deixa de ser tratado como uma questão de pobreza absoluta

ou relativa e passa a ser visto da perspectiva da inclusão ou exclusão social

(BARATA, 2009, p. 18).

A questão social é composta pelas múltiplas expressões das desigualdades sociais.

Apreendida como o conjunto das expressões das desigualdades da sociedade capitalista,

madura, onde “a produção social é cada vez mais coletiva, o trabalho torna-se mais

amplamente social, enquanto a apropriação dos seus frutos é privada, monopolizada por parte

da sociedade” (IAMAMOTO, 2006).

De acordo com Barata (2009), igualdade e desigualdade são conceitos dimensionais

relativos a quantidades mensuráveis, e referem-se a quantidades equivalentes ou distintas de

atributos estudados. Assim como, equidade e iniquidade são conceitos políticos que

expressam, além da igualdade ou desigualdade quantitativa, uma avaliação moral relacionada

com a noção de justiça social. As iniquidades são desigualdades injustas ou decorrentes de

alguma forma de injustiça. A maioria das desigualdades sociais em saúde é injusta porque

reflete a distribuição dos determinantes sociais da saúde na sociedade, remetendo, portanto, à

distribuição desigual de poder e propriedade.

Para Barreto (2003), discutir saúde no modo de produção capitalista implica

caracterizar a relação capital e trabalho, que redimensionada pelo Estado capitalista, como

representante da classe e de frações da classe dominante, cuja base política objetiva, a partir

de um discurso de representação social, é manter e justificar sua dominação. A relação de

poder que o Estado exerce sobre a sociedade é submetida aos interesses econômicos e

políticos dominantes (OLIVEIRA; SANTO, 2013). E diante de políticas concentracionistas de

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A juventude perdida no Brasil: desigualdades socioeconômicas e espaciais na mortalidade de jovens por

violência 23

capital, renda e poder no país resultaram no agravamento da questão social, que tem no

desemprego e no subemprego suas mais nítidas expressões (IAMAMOTO, 2006 p. 9).

Nesse contexto, a Declaração das Organizações e Movimentos de Interesse Público da

Sociedade Civil do ano 2010 expõe o cenário de crise do desenvolvimento sustentável

decorrente do neoliberalismo, do individualismo e do consumismo, levando à exacerbação da

violência e de conflitos, ao desemprego estrutural, às desigualdades na distribuição das

riquezas que levam ao declínio da proteção dos direitos sociais (NOGUEIRA, 2011).

Os indicadores sociais devem responder às preocupações quanto à dinâmica social, ou

seja, as mudanças significativas que estão em curso na sociedade capitalista atravessada pelo

conflito de classes; elucidar as questões que não se atenham somente ao que pode ser

mensurado, mas ir além da informação quantitativa e desta forma aproximar-se, dos conflitos

de interesse que são o motor do processo social (SANTAGADA, 2007).

Para melhor explicar os DSS, tem-se os modelos de Dahlgren e Whitehead, que são

amplamente discutidos e que dispõe os DSS em diferentes camadas, segundo seu nível de

abrangência, desde uma camada mais próxima até a camada mais distal, estabelecendo níveis

de influência entre os fatores que determinam as desigualdades, inclui fatores

comportamentais, sociais e institucionais (Figura 3).

Figura 3 – Modelo de determinação social da saúde proposto por Dahlgren e Whitehead

Fonte: Comissão Nacional sobre Determinantes Sociais da Saúde (CNDSS), (2008).

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A juventude perdida no Brasil: desigualdades socioeconômicas e espaciais na mortalidade de jovens por

violência 24

Neste sentido, são inúmeras as hipóteses e construções teóricas que versam sobre os

determinantes da violência urbana, mas uma, em especial chama a atenção: aquela que associa

a incidência criminal urbana a formas diversas de desorganização e falta de coesão social.

Esta abordagem parte do princípio de que a criminalidade emerge como consequência de

problemas associados a mecanismos de controle social. Neste contexto, as comunidades locais,

marcadas por um complexo sistema de associações formais e informais, de relações de

amizade e parentesco, contribuem para o processo de socialização do indivíduo. Tais relações

seriam condicionadas por fatores sociais como status econômico, heterogeneidade étnica,

mobilidade residencial e, sobretudo, taxas de urbanização e migração (DINIZ, 2005).

Esses processos produzem impactos sobre a saúde e a doença dos indivíduos,

representando, cada um deles, um conjunto de determinações e mediações cujo resultado final

será a preservação da saúde ou a ocorrência da doença/ agravos à saúde. As desigualdades nas

condições de vida, decorrentes de diferenças substantivas nesse processo de reprodução social,

terão reflexos nas situações de saúde então identificadas como iniquidades (BARATA, 2009).

O desenvolvimento de abordagens, tais como, as análises multiníveis para dar conta da

complexidade da determinação social das doenças e das desigualdades têm ampliado

sobremaneira as possibilidades analíticas, que respeitam os diferentes níveis de determinação

como o marco adotado no relatório final da Conferência Mundial sobre Determinantes Sociais

da Saúde (Figura 4) (BRASIL, 2015a).

Figura 4 – Marco conceitual dos determinantes sociais da saúde

Fonte: Brasil, 2015.

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violência 25

No entanto, apesar dos avanços observados nas últimas duas décadas, o Brasil ainda

figura entre os 12 países mais desiguais do mundo. As desigualdades sociais refletem também

nas condições de vida e de saúde do povo brasileiro. Isso porque os riscos e os recursos em

saúde podem também ser distribuídos de forma desigual a depender do acesso aos bens e

serviços, e das posições ocupadas pelos indivíduos na sociedade (BRASIL, 2015a).

Assim, as desigualdades naturais podem ou não definir as desigualdades sociais em

saúde. As desigualdades naturais em saúde ocorrem quando há diferenças ou dessemelhanças

nos desfechos em saúde entre os indivíduos devido a atributos de estratificação tais como

sexo, etnia, idade, força física, inteligência, habilidade inatas, entre outros (SILVA; BARROS,

2002). Enquanto, as desigualdades sociais em Saúde referem-se a diferenças, variações e

disparidades nos padrões de saúde de grupos sociais distintos (BRASIL, 2015a).

Segundo Kawachi, Subramanian e Almeida-Filho (2002), iniquidades são diferenças

nos níveis de saúde de grupos populacionais distintos socialmente (desigualdades sociais),

consideradas injustas ou emanadas de alguma forma de injustiça.

Reconhecer as desigualdades sociais em saúde, buscar compreender os processos que

as produzem e identificar os diferentes aspectos que estabelecem a mediação entre os

processos macrossociais e o perfil epidemiológico dos diferentes grupos sociais é uma

condição indispensável para que seja possível buscar formas de enfrentamento, sejam elas no

âmbito das políticas públicas, sejam elas no âmbito da vida cotidiana (BARATA, 2009).

2.3 MORTALIDADE POR CAUSAS VIOLENTAS NO BRASIL

A violência é um dos eternos desafios da teoria social e da prática política e relacional

da humanidade. Não se conhece nenhuma sociedade onde a violência não tenha estado

presente (MINAYO, 1994). E tendo como característica essencial o fato de ser fenômeno

social, travado em nível das relações sociais, a violência é também responsável, em suas

manifestações específicas, por uma série de agravos à saúde (MINAYO; SOUZA, 1993).

Nos últimos anos, a violência vem se constituindo em importante problema de saúde

pública, não só pelos danos físicos e psíquicos que ela impõe, como também pelo número de

óbitos ocasionados (FREITAS et al., 2000).

Dentre as principais causas de morte causas de mortes no Brasil, destacam-se as

causas externas. Na CID 10, a categoria “causas externas” inclui os homicídios, os suicídios e

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violência 26

os acidentes (de todas as espécies). “Nos traumas que provocam enfermidades ou

incapacidades a Organização Mundial da Saúde inclui as lesões físicas e psíquicas, os

envenenamentos, os ferimentos, as fraturas, as queimaduras e as intoxicações” (MINAYO,

2013, p. 27). A categoria “causas externas” tem servido para as organizações internacionais

de saúde e sociais efetuarem perfis, comparações e, assim, emitirem observações e sugestões

aos governos nacionais e locais a respeito do fenômeno social da violência que provoca a

morte, podendo então ser alvo de intervenções e comparações (MINAYO, 2009).

Atualmente, cerca de um terço dos homicídios do mundo acontece na América Latina,

apesar da região concentrar apenas 8% da população mundial. Com quase 60.000 assassinatos

por ano, o Brasil responde sozinho por 11% do total global de homicídios. A maioria desses

crimes ocorre em zonas urbanas, onde 80% dos latino-americanos e 85% dos brasileiros

residem. Nesse contexto, não é de surpreender que “41 das 50 cidades mais violentas estejam

mapeadas em países latino-americanos, segundo o último ranking da ONG Mexicana

Seguridad, Justicia y Paz. Em 2016, dentre as cidades mais violentas, 21 são brasileiras” (42%)

(CARBONARI et al., 2016). Nisso,

Em um primeiro grupo encontram-se os países com altas taxas de homicídio durante

o período de 2003 a 2012: Colômbia, Venezuela e Brasil. Com taxas médias

nacionais acima do dobro do considerado epidêmico pela Organização Mundial de

Saúde (igual ou superior a 10 homicídios por 100 mil habitantes). Em 2003, a

Colômbia registrou 53,8 homicídios por 100 mil habitantes, enquanto em 2012 a

taxa equivaleu a 30,8 por 100 mil, o que reflete uma redução de 42,8 % entre os dois

anos. No caso da Venezuela, a taxa aumentou de 44,0 para 53,7 por 100 mil

habitantes em 2012, um aumento de 22,0% entre 2003 e 2012. Já o Brasil em 2006,

a taxa chegou a 22,3 homicídios por 100 mil habitantes, considerando-se o ano de

2012, a taxa de 25,2 homicídios por 100 mil habitantes reflete um aumento de 13%

no período. Ressalta-se que a taxa média subregional corresponde a 22,7 homicídios

por 100 mil habitantes, patamar inferior ao exibido por esses países. Um grupo de

países com taxa de homicídios mais baixa em relação aos já mencionados, são

Paraguai, Equador e Guiana, cujas taxas variam entre 10 e 20 por 100 mil habitantes.

O Chile é o país com os níveis mais baixos de homicídio na sub-região, e no

contexto latino-americano em geral, com taxas de homicídio no período de 2003 a

2012, média de 3,5 homicídios por 100 mil habitantes. (TOBAR, 2015, p. 91-92).

No processo de transição epidemiológica brasileira, as causas externas que

registravam de 3% dos óbitos em 1930, passaram a ser responsáveis por 12,6% em 2009.

Enquanto na população geral ocupam a terceira posição como causa de mortes, na faixa etária

de 1 a 39 anos as causas externas são a primeira no ranking. Sendo o sexo masculino

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violência 27

identificado com 83,1% das mortes, e o feminino, por 16,9%. Entre 1980 e 2009, a

composição da mortalidade por causas externas registrou um aumento de 269,8% das mortes

por agressões, que passaram de 13.910 para 51.434 óbitos (FIGUEROA et al., 2013).

A evolução histórica da mortalidade violenta no Brasil impressiona pelos quantitativos

implicados. O Mapa da violência (2014), mostra que entre os anos 1980 e 2012, morreram no

país 1.202.245 pessoas vítimas de homicídio, 1.041.335 vítimas de acidentes de transporte, e

216.211 suicidaram-se. Somando-se as três causas totalizam 2.459.791 vítimas. A causa que

mais contribui para o aumento dessas taxas são os homicídios, que crescem 148,5%, em

segundo lugar, os suicídios, que crescem 62,5% e também os óbitos por acidentes de

transporte terrestre (que aumentam 38,7%). Em 2012, nenhuma capital do Brasil esteve

abaixo do nível epidêmico; a que apresentou níveis mais baixos foi Florianópolis, com 15,0

homicídios por 100 mil habitantes, taxa ainda grave segundo os cânones internacionais

(WAISELFISZ, 2014).

O perfil da mortalidade por causas externas no Brasil segue a tendência mundial, em

termos de maior incidência sobre o sexo masculino e faixas etárias jovens, estando mais

concentrada em regiões metropolitanas (MINAYO, 1994), sendo essas causas campeãs de

anos potenciais de vida perdidos (FIGUEROA et al., 2013).

No ano de 2015, o homicídio como causa de mortalidade da juventude masculina, de

15 a 29 anos, correspondeu a 47,8% do total de óbitos, uma tragédia que traz implicações na

saúde, na dinâmica demográfica e, por conseguinte, no processo de desenvolvimento

econômico e social (CERQUEIRA et al., 2017). O problema é mais preocupante pelo fato da

população de adolescentes e jovens a maior vítima da violência, pondo em risco os ganhos

obtidos na esperança de vida brasileira nos últimos tempos (GAWRYSZEWSKI; MELLO

JORGE, 2000).

No cenário brasileiro, “observa-se quase uma exclusiva masculinidade das vítimas dos

Homicídios por Arma de Fogo (HAF): 94,4% na média nacional” (WAISELFISZ, 2016, p.

46). Vários estudos no país têm mostrado que a violência afeta a população de modo desigual,

gerando riscos diferenciados em função de gênero, raça/cor, idade e espaço social (SOUZA;

LIMA, 2007). Ainda mais perversa e preocupante é a seletividade racial dos HAF, além de

sua tendência crescente. Entre 2003 e 2014, as taxas de HAF de brancos caem 27,1%, de 14,5,

em 2003, para 10,6, em 2014; enquanto a taxa de homicídios de negros aumenta 9,9%: de

24,9 para 27,4. Com esse diferencial, a vitimização negra do país, que em 2003 era de 71,7%,

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A juventude perdida no Brasil: desigualdades socioeconômicas e espaciais na mortalidade de jovens por

violência 28

em poucos anos mais que duplica: em 2014, já é de 158,9%, ou seja, morrem 2,6 vezes mais

negros que brancos vitimados por arma de fogo (WAISELFISZ, 2016).

Tem-se observado o crescimento dos índices de violência entre jovens de todos os

estratos sociais, nos quais tomam parte, sobretudo como vítimas, mas também como

infratores (SOUZA, 2005). Esse fato é relevante, pois atinge a maioria da população jovem

em idade produtiva, trazendo consequências graves que envolvem altos custos sociais,

emocionais e econômicos necessários ao tratamento e reabilitação, além de trazer danos

incalculáveis para a vítima e as famílias (SOUSA; SILVA; CAVALCANTE, 2016).

Na atualidade, cada vez mais, o crime organizado opera segundo moldes empresariais

e com bases transnacionais, vai-se impondo, colonizando e conectando diferentes formas de

criminalidade (crimes contra a pessoa, contra o patrimônio, contra o sistema financeiro, contra

a economia popular). Seus sintomas mais visíveis compreendem emprego de violência

excessiva mediante uso de potentes armas de fogo (daí a função estratégica do contrabando de

armas), corrupção de agentes do poder público, acentuados desarranjos no tecido social,

desorganização das formas convencionais de controle social. Essas mudanças repercutem

também no domínio do crime, da violência e dos direitos humanos (ADORNO, 2002).

Em todas as capitais do país, a arma de fogo é o instrumento preferencial para dirimir

conflitos e produzir a morte entre as pessoas – sobretudo entre os homens. Atualmente, não se

pode falar de homicídio no Brasil e no mundo sem que venha à tona a evidência do

envolvimento e da contribuição das armas de fogo, que movimentam um dos maiores

mercados da economia global (MINAYO, 2009).

O acesso a armas de fogo tem sido tópico de discussões na cena acadêmica e política.

“No Brasil, 71% dos homicídios são perpetrados com o uso de armas de fogo, legais ou

ilegais. A letalidade e o fácil acesso a este instrumento, quando associados a uma sociedade

violenta, potencializam o risco de que conflitos de ordem diversa terminem em mortes”

(BRASIL, 2015b, p 16).

A Lei de armas de fogo nº 10.826/2003, conhecida como “Estatuto do desarmamento”

ou “Lei do desarmamento,” no Brasil não conseguiu atender aos preceitos expressos em tal

legislação, onde seu objetivo maior seria a redução da criminalidade por arma de fogo. Um

dos fatores associados a este fracasso aponta-se:

“A legislação brasileira pertinente à regular a utilização, porte e posse de armas de

fogo, sempre foi bastante controversa, ininteligível, e passível de diversas emendas

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A juventude perdida no Brasil: desigualdades socioeconômicas e espaciais na mortalidade de jovens por

violência 29

ao longo de sua vigência, sendo assim modificada consideravelmente ao longo dos

anos, gerando certa insegurança jurídica no que tange à utilização, posse e porte de

armas de fogo” (VIEIRA, 2012, p. 21).

No Brasil, o uso da arma de fogo como instrumento para perpetrar homicídios atingiu

uma dimensão apenas observada em poucos países da América Latina. Somente em 2015,

41.817 pessoas sofreram homicídio em decorrência do uso das armas de fogo, o que

correspondeu a 71,9% do total de casos (CERQUEIRA et al., 2017). Assim,

“Enquanto pais derem armas de brinquedo ou reais a seus filhos do sexo masculino e

incentivarem neles a competitividade e o individualismo tão amplamente

disseminados socialmente, ao invés da solidariedade; enquanto não for permitido

aos homens expressarem suas fragilidades, sem que isso signifique a perda de sua

masculinidade, estar-se-á contribuindo para a reprodução e perpetuação desse estado

de coisas e os jovens continuarão morrendo pelas armas e pelo trânsito (SOUZA,

2005). Não obstante o potencial efeito da difusão das armas de fogo para fazer

aumentar a taxa de homicídio na sociedade, está em curso na Câmara dos Deputados

o Projeto de Lei 3722/12, que visa revogar o Estatuto do Desarmamento, permitindo

que até indivíduos que respondam a processos judiciais por crimes violentos possam

não apenas ter o registro de até seis armas de fogo, mas possam portá-las livremente

no espaço público” (CERQUEIRA et al., 2017, p. 43).

Por sua vez, as medidas tímidas adotadas contribuíram para um entendimento fatalista

em relação a esse fenômeno e fortaleceram ideias de enfraquecimento do Estado e suas

instituições diante da criminalidade, gerando medo e sensação de insegurança nos sujeitos e

no imaginário coletivo (SOUZA; LIMA, 2007).

Ao analisar a evolução dos homicídios no Brasil por Unidade Federativa, verifica-se

que houve situações bastante distintas. Chama a atenção seis Unidades Federativas que

sofreram aumento nesse indicador superior a 100% e estão situadas nas regiões Norte e

Nordeste. Outros seis estados tiveram aumento das taxas de homicídios entre 50% e 100%,

dentre estas 5 estão nas regiões Norte e Nordeste. Mais seis estados sofreram aumento de até

50% e nove Unidades Federativas lograram diminuição das taxas de homicídios, tendo sido

observado a difusão dos homicídios nas grandes regiões metropolitanas para os municípios do

interior do país, sobretudo no Norte, Nordeste, no estado de Goiás e no norte de Minas Gerais.

O que mais chama atenção nos resultados é o aumento da taxa de mortalidade de homicídio

de jovens foi de 292,3% quando se compara 2001 a 2015 (CERQUEIRA et al., 2017).

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A juventude perdida no Brasil: desigualdades socioeconômicas e espaciais na mortalidade de jovens por

violência 30

2.4 MORTALIDADE DE JOVENS: A JUVENTUDE PERDIDA

Numa formação social, marcada pela divisão de classes e por uma complexa rede de

organização social, a adolescência tem que ser compreendida dentro das especificidades

históricas, socioeconômicas, políticas e culturais (MINAYO, 2009).

O drama da juventude perdida possui duas faces. De um lado a perda de vidas

humanas e do outro, a falta de oportunidades educacionais e laborais que condenam os jovens

a uma vida de restrição material e de anomia social, que terminam por impulsionar a

criminalidade violenta (CERQUEIRA et al., 2017). A forma como um adolescente vê a si

próprio, seus valores, sua competência e o mundo que o cerca pode ser afetada pelo grau de

violência a que é submetido ao longo de sua vida (ASSIS et al., 2004).

Entretanto, é nesta fase também que os jovens se abrem para o mundo e por isso se

tornam mais expostos e vulneráveis aos riscos de serem vítimas de eventos violentos. Nessa

ambiguidade, os jovens vivenciam, por um lado, as tensões e ansiedades geradas por uma

identidade constantemente ameaçada e que necessita ser reforçada por meio de

comportamentos reafirmadores, viris e agressivos, tornando-os agentes de violência, e por

outro, a exposição a agressões e outras formas de violência que estes comportamentos

propiciam transformam-nos em alvo da violência (SOUZA, 2005).

Jovens estão imersos em contextos nos quais se manifestam distintas violências. A

violência estrutural submete os jovens a situações de extrema desigualdade e exclusão pela

falta de acesso à escola, educação de qualidade e profissionalização, o que os impede de

integrar-se ao mercado de trabalho formal possibilitando a sua inserção no mercado informal,

em situações de subemprego ou mesmo a ociosidade (SILVA, 2014).

A morte violenta de jovens, sobretudo nos grandes centros urbanos, é um problema

que vem desde a década de 1980 (RUOTTI et al., 2014). Nas faixas etárias que compreendem

os adolescentes e os adultos jovens, dos 15 aos 29 anos, as taxas são extraordinariamente mais

altas do que as verificadas na população geral (SOUZA; LIMA, 2007).

Está em curso no país um processo gradativo de vitimização letal da juventude, em

que os mortos são jovens cada vez mais jovens. Os dados mostram um recrudescimento do

problema, uma vez que, entre 2005 e 2015, observou-se um aumento de 17,2% na taxa de

homicídio de indivíduos entre 15 e 29 anos. A taxa de homicídios de jovens em 2015 foi de

60,9 para cada grupo de 100 mil jovens (CERQUEIRA et al., 2017).

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A juventude perdida no Brasil: desigualdades socioeconômicas e espaciais na mortalidade de jovens por

violência 31

Algumas publicações mostram que a mortalidade de jovens no Brasil acontece de

forma seletiva. De acordo com o Relatório de Vulnerabilidade Juvenil à Violência, 2014, “o

panorama nacional apresenta taxa de homicídio entre jovens negros 155% maior que de

jovens brancos” (BRASIL, 2015c, p. 23). Segundo o atlas da violência 2017, a taxa de

homicídios de negros teve aumento de 18,2% entre 2005 e 2015. De cada 100 pessoas que

sofrem homicídio no Brasil, 71 são negras. Jovens e negros do sexo masculino continuam

sendo assassinados todos os anos como se vivessem em situação de guerra (CERQUEIRA et

al., 2017).

Dessa maneira, as políticas públicas voltadas a esses jovens têm sido marcadas pela

repressão, prisão e extermínio. É, portanto, uma juventude pobre comumente criminalizada e

estigmatizada, colocada na chamada situação de risco, ou seja, culpabilizada e

responsabilizada pela sua saúde e segurança, de tal modo a isentar as instâncias sociais e as

políticas públicas como agentes de atuação frente às demandas das juventudes

(SINHORETTO, 2014). A associação entre violência, pobreza e cidadania, passando pela

dimensão territorial, tem interrompido vidas de uma geração de jovens no país (MEDEIROS;

MALFITANO, 2015).

O Índice de Vulnerabilidade Social (IVS), construído a partir de indicadores do Atlas

do Desenvolvimento Humano (ADH) no Brasil, destaca diferentes situações indicativas de

exclusão e vulnerabilidade social no território brasileiro. Assim,

“O IVS traz dezesseis indicadores estruturados em três dimensões, a saber,

infraestrutura urbana, capital humano e renda e trabalho, permitindo um

mapeamento singular da exclusão e da vulnerabilidade social para os 5.565

municípios brasileiros (conforme malha municipal do Censo demográfico 2010) e

para as Unidades de Desenvolvimento Humano (UDHs) das principais regiões

metropolitanas (RMs) do país. Varia entre 0 e 1. Quanto mais próximo a 1, maior é a

vulnerabilidade social de um município. Para os municípios que apresentam IVS

entre 0 e 0,200, considera-se que possuem muito baixa vulnerabilidade social.

Valores entre 0,201 e 0,300 indicam baixa vulnerabilidade social. Aqueles que

apresentam IVS entre 0,301 e 0,400 são de média vulnerabilidade social, ao passo

que, entre 0,401 e 0,500 são considerados de alta vulnerabilidade social. Qualquer

valor entre 0,501 e 1 indica que o município possui muito alta vulnerabilidade social”

(IPEA, 2015c, p. 12).

Em 2000, o Brasil apresentava IVS igual a 0,446. Este valor indica que o país

encontrava-se na faixa da alta vulnerabilidade social. Passados dez anos, a vulnerabilidade

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A juventude perdida no Brasil: desigualdades socioeconômicas e espaciais na mortalidade de jovens por

violência 32

social é reduzida a 0,326, trazendo o país para a faixa do médio IVS, num avanço equivalente

a 27% em direção a níveis mais baixos de vulnerabilidade social (IPEA, 2015).

Na região Norte, 41,9% dos municípios estão no grupo de IVS muito alto. O estado

que apresenta maior percentual de municípios nessa faixa do IVS é o Amazonas, com 80,6%.

Na região Nordeste, quase metade dos municípios (47,7%) estão agrupados na faixa do IVS

alto. Outros 32,4% estão na faixa de muito alta vulnerabilidade social. Alagoas e Maranhão

apresentam maior percentual de alta vulnerabilidade, 96,1% e 95,4%, respectivamente. A

região Centro-Oeste tem a maioria dos municípios (48,5%) na faixa de baixa vulnerabilidade

social. Apenas três municípios (0,6%) estão na faixa da muito alto IVS. No sudeste, a maior

parte dos municípios (48,8%) está na faixa de baixa vulnerabilidade social. A região Sul é a

região que apresenta a maior quantidade de municípios na faixa de muito baixa

vulnerabilidade social. Ao todo são 341 municípios, ou 28,7% (IPEA, 2015).

Especialistas do Fórum Brasileiro de Segurança Pública apontaram que “o acúmulo de

vulnerabilidades sociais e a ausência de políticas públicas representam fatores de risco

associados à violência homicida” (BRASIL, 2015d, p. 21).

Já o Índice de Vulnerabilidade Juvenil (IVJ) é uma síntese dos indicadores: taxa de

frequência à escola, escolaridade, inserção no mercado de trabalho, taxa de mortalidade por

causas externas, taxa de mortalidade por causas violentas, valor do rendimento familiar

mensal e risco relativo de brancos e negros serem vítimas de homicídio (BRASIL, 2015c). Os

resultados desse índice mostram que a situação de vulnerabilidade dos jovens da Região Norte

é menor se comparados os índices aos dos estados do Nordeste. Enquanto nesta região o

índice varia entre 0,38 e 0,60, na outra a variação é entre 0,037 e 0,49. No Centro-Oeste, o

Distrito Federal apresenta o menor índice de vulnerabilidade (0,294), seguido por Mato

Grosso do Sul (0,377), e Goiás (0,384). A mais grave situação de vulnerabilidade juvenil

encontra-se no Mato Grosso, com índice de 0,439. Na Região Sul, os valores do índice se

assemelham aos do Centro-Oeste, que variam entre 0,294 e 0,439. Assim, o estado do Rio

Grande do Sul (0,230) tem o menor índice, seguido por Santa Catarina (0,252). Com situação

de maior vulnerabilidade juvenil encontra-se o estado do Paraná (0,408). O estado de São

Paulo apresenta o menor Índice de Vulnerabilidade (0,200), seguido por Minas Gerais (0,280)

e Rio de Janeiro (0,309). A mais grave situação de vulnerabilidade juvenil, no entanto,

encontra-se no Espírito Santo, aonde o IVJ chega a 0,496.

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Os perfis de vulnerabilidade e vitimização no Brasil são bem característicos. Os

negros (somatória de pretos e pardos) representam 50,7% da população do país e

corresponderam a 72,0% das mortes, a despeito dos 26,0% de mortes de brancos e amarelos,

num total de 50.715 mortes em 2013 com o campo raça/cor preenchidos. Nisso,

“Os jovens com idade entre 15 e 29 anos estão no topo da pirâmide das mortes

causadas por homicídio no país e o percentual de mortes dessa parcela da população

chega a 52,9% do cômputo geral (dados do MS/Datasus). Quando os dados sobre os

jovens são desagregados por cor/raça, esse percentual é ainda maior e mostra

desproporção, com grande concentração de mortes para jovens negros, cuja taxa por

100 mil habitantes é 79,4. Nas regiões NE e N, cujos percentuais somados

representam 50,6% do total de homicídios do país em 2013, os jovens negros

representaram 83,3% dos jovens vitimados nessas regiões. (dados do MS/Datasus)”

(BRASIL, 2015c, p. 36-37).

A questão racial também tem reflexos no encarceramento brasileiro. Segundo o atual

‘Mapa do Encarceramento: os jovens do Brasil’, aumentou gradativamente a população negra

aprisionada em relação à branca. Segundo esta publicação, em 2005 havia 92.052 negros

presos para 62.569 brancos; considerando-se a parcela da população carcerária para a qual

havia informação sobre cor disponível, 58,4% era negra. Já em 2012 havia 292.242 negros

presos e 175.536 brancos, ou seja, 60,8% da população prisional era negra (BARBOSA;

COELHO, 2017).

É a violência invisível ou original que se codifica na violência visível, cujas

expressões devem ser entendidas, pois, como formas de vocalização dos sujeitos não

reconhecidos, rejeitados e marcados pela exclusão e pela discriminação social (MINAYO,

2006).

Qualquer forma de violência, porém, tem que ser vista em rede. O assassinato de

adolescentes supostamente delinquentes tem que ser articulado com a violência estrutural que

lhes limita o "possível social"; com a violência do Estado cuja face repressiva é quase a única

que esses jovens conhecem; com a violência organizada dos grupos de narcotráfico que lhes

oferecem vantagens imediatas; com a violência individual de cada um que tenta se defender,

numa sociedade onde os direitos humanos e civis são quase um sonho a conquistar (MINAYO,

2009).

A implantação de políticas alternativas, integradoras e sobretudo inclusivas, dirigidas

para os jovens poderia diminuir os índices de violência e, portanto, resolveria parcela

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violência 34

considerável do problema. Entretanto, também é necessário realizar uma profunda reflexão

sobre os valores, as formas de socialização e a construção das identidades masculina e

feminina nas sociedades atuais (SOUZA, 2005).

A magnitude e o crescimento nas taxas de mortalidade por homicídio entre jovens é de

especial importância, dado o seu forte impacto social. Já em 1997 os homicídios constituíram-

se na primeira causa de anos potenciais de vida perdidos (APVP) no País, responsáveis por

17,8% do total de causas mortis (PERES, 2004).

Segundo Cerqueira et al (2013), cálculos mostraram que as violências podem fazer

reduzir a expectativa de vida ao nascer em até quase três anos para os homens. E apresenta

um custo anual com vitimização violenta dos jovens pode corresponder até 6% do PIB

estadual. No quadro geral, a morte prematura de jovens devido às violências custa ao país

cerca de R$ 79 bilhões a cada ano, o correspondente a cerca de 1,5% do PIB nacional.

A importância da violência em nossas cidades não se resume a uma questão

quantitativa pelo número de pessoas atingidas - é a abrangência e a complexidade do

fenômeno, na atualidade, o que mais preocupa. É a nova faceta da criminalidade ligada ao

crime organizado que gera insegurança nos cidadãos, interfere no território e se torna um

poder paralelo ao do Estado (FERREIRA; PENNA, 2005).

Segundo Abramovay et al. (2002), a pobreza e a distribuição de renda tão somente não

medem as consequências das mortes violentas, há outros motivos causadores. Falta uma

política de segurança no território brasileiro compatível com as problemáticas (SOARES,

2007).

Estimativas sobre o custo da violência são importantes, pois dão a dimensão

econômica do problema e constituem um elemento crucial para o planejamento das políticas

públicas. Para além dos custos agregados da violência, contudo, uma política de segurança

pública orientada para a racionalidade e eficácia deveria ainda considerar o custo-efetividade

ou o benefício-custo dos programas de prevenção e controle ao crime e violência, da forma

como são pensadas as intervenções estatais nos países desenvolvidos, uma realidade,

infelizmente, muito distante da brasileira (CERQUEIRA et al., 2013).

O custo para os países das perdas desses jovens são imensuráveis e irreparáveis. É

uma perda para as famílias e para a sociedade de forma geral, e expressivamente para a

economia do país. Enquanto as representações governamentais não reagirem com políticas

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violência 35

consistentes, se continuará a assistir a esse extermínio movido pela violência como forma de

expressão.

2.5 POLÍTICAS DE COMBATE À VIOLÊNCIA E À CULTURA DA PAZ NO BRASIL

As políticas públicas sociais configuram-se como uma resposta do Estado à demanda

de enfrentamento da questão social e suas múltiplas expressões e para o estímulo a uma

cultura de paz na sociedade.

Construir uma Cultura de Paz é gerar transformações necessárias para que a paz seja o

norteador das relações humanas e sociais, no sentido de promover a convivência com a

diferença e o respeito. Desenvolver uma Cultura de Paz de forma integrada no “intuito das

grandes mudanças desejadas pela maioria da humanidade – justiça social, igualdade entre os

sexos, eliminação do racismo, tolerância religiosa, respeito às minorias, educação e saúde

integral, equilíbrio ecológico e liberdade política” (BRASIL, 2009a, p. 3).

Neste sentido, em 1999, a Assembleia das Nações Unidas proclamou a Declaração

sobre uma Cultura de Paz, com o objetivo de promover e fortalecer uma cultura de paz no

novo milênio. Conforme a Declaração,

A Organização das Nações Unidas (ONU) definiu cultura da paz, em 1999, como

“um conjunto de valores, atitudes, tradições, comportamentos e estilos de vida de

pessoas, grupos e nações baseados no respeito pleno à vida e na promoção dos

direitos humanos e das liberdades fundamentais, na prática da não-violência por

meio da educação, do diálogo e da cooperação, podendo ser uma estratégia política

para a transformação da realidade social” (BRASIL, 2009a, p. 5).

Em 2002, a OMS, num gesto histórico, publicou um Relatório Mundial sobre

Violência e Saúde, abrangendo seus mais diferentes aspectos, os mais variados grupos

afetados e propostas de atuação. Ademais, essa Organização Internacional colocou este

problema como uma das cinco prioridades para as Américas nos anos iniciais do século XXI

(OMS, 2002).

O Ministério da Saúde, ao longo dos anos vem se articulando com as Secretarias

Estaduais e Municipais de Saúde, e tem promovido, coordenado, financiados, apoiados e

executados várias ações de vigilância e prevenção das violências e de promoção da saúde e da

cultura de paz.

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A Política Nacional de Redução da Morbimortalidade por Acidentes e Violências

institui no âmbito do SUS os princípios e diretrizes para a estruturação e o reforço de ações

intersetoriais de prevenção das violências, de assistência às vítimas de causas externas e de

promoção de hábitos e comportamentos seguros e saudáveis – Portaria GM/MS nº 737, de

16/05/2001 (BRASIL, 2001).

O Projeto de Redução da Morbimortalidade por Acidentes de Trânsito mobiliza a

sociedade e promovendo a saúde, que foi implantado através da Portaria nº 344, de

19/02/2002. Este projeto foi implantado em 5 capitais em 2003 e 2004 com recursos do

DPVAT. Em 2006 ele foi expandido para mais 11 capitais, estando atualmente implantado em

16 capitais do país (BRASIL, 2002).

Enquanto a Política Nacional de Atenção às Urgências implantada através da Portaria

GM/MS nº 1.863, de 29/09/2003, orienta o componente assistencial do plano de

enfrentamento das causas externas, com previsão de aprimoramento e expansão dos

atendimentos pré, intra e pós-hospitalares das vítimas de violências. Atualmente, o SAMU –

Serviço de Atendimento Móvel de Urgência, principal componente desta política, apresenta

cobertura de 62 milhões de brasileiros em 266 cidades (BRASIL, 2003).

A Rede Nacional de Núcleos de Prevenção das Violências e Promoção da Saúde

instituída pela Portaria GM/MS nº 936, de 19/05/2004, implantou nos estados e municípios

Núcleos de Prevenção das Violências e Promoção da Saúde, em âmbito local. Estes núcleos,

financiados pelo MS, são os responsáveis por articular e coordenar ações intersetoriais

promotoras de saúde e da cultura da paz no âmbito local (BRASIL, 2004).

Outra importante iniciativa foi a Agenda Nacional de Vigilância, Prevenção e Controle

dos Acidentes e Violências aprovada em outubro de 2005, durante a I Conferência Nacional

de Vigilância, Prevenção e Controle de Doenças e Agravos Não Transmissíveis. Esta Agenda

define prioridades e metas de prevenção das violências e acidentes para o período 2005/2007

a serem seguidas pelos três níveis de gestão (BRASIL, 2005a).

A Política Nacional de Promoção da Saúde, através da Portaria GM/MS nº 687, de

30/03/06, contribui com ações efetivas para a prevenção de acidentes e violências, atuando

sobre os fatores de risco e de proteção, promovendo ambientes e entornos seguros e saudáveis,

como também comportamentos e hábitos saudáveis por parte da população (BRASIL, 2006).

Outra iniciativa do MS foi a Vigilância de Violências e Acidentes em Serviços

Sentinela – VIVA implantada através da Portaria GM/MS nº 1.356, de 23 de junho de 2006.

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O MS repassou incentivo financeiro para secretarias estaduais e municipais de saúde para a

implantação da notificação da violência doméstica, sexual, outras violências interpessoais e

autoprovocadas, e a vigilância de acidentes. Este sistema visa melhorar a qualidade das

informações sobre violências, proporcionando um conhecimento melhor da magnitude e

natureza das violências, e do perfil da vítima e do agressor (BRASIL, 2006).

O Projeto Vida no Transito (PVT), implantado em 2011 através da Portaria 3.023, em

todas as capitais do Brasil com financiamento do fundo nacional de saúde, o projeto foi criado

para o fortalecimento de políticas de prevenção de lesões e violência no trânsito (BRASIL,

2011).

No Brasil, como política social, a educação é compreendida como a “política universal

para os jovens, eixo central no qual podem se estruturar outros programas mais focados e

diversificados, complementares do processo educativo” (SILVA; LOPES, 2009, p. 101). E

tem empreendido esforços no sentido de contribuir com a sociedade e com a cultura de paz.

Nesse sentido, o Ministério da Educação tem promovido, políticas educacionais no Brasil

com enfoque transversal (promoção da saúde, prevenção de violência e cultura da paz)

conforme segue:

A Lei nº 11.129/2005, institui o Programa Nacional de Inclusão de Jovens (ProJovem);

cria o Conselho Nacional da Juventude (CNJ) e a Secretaria Nacional de Juventude; altera as

Leis nos 10.683, de 28 de maio de 2003, e 10.429, de 24 de abril de 2002; e dá outras

providências. Art. 9º Fica criado, no âmbito da estrutura organizacional da Secretaria-Geral da

Presidência da República, o CNJ, com a finalidade de formular e propor diretrizes da ação

governamental voltadas à promoção de políticas públicas de juventude, fomentar estudos e

pesquisas acerca da realidade socioeconômica juvenil e o intercâmbio entre as organizações

juvenis nacionais e internacionais (BRASIL, 2005).

A Lei nº 11.692/2008 dispõe sobre o Programa Nacional de Inclusão de Jovens –

Projovem, instituído pela Lei n° 11.129, de 30 de junho de 2005. Em seu artigo 2º, o

Projovem, destinado a jovens de 15 (quinze) a 29 (vinte e nove) anos, com o objetivo de

promover sua reintegração ao processo educacional, sua qualificação profissional e seu

desenvolvimento humano (BRASIL, 2008).

No ano de 2008, por uma Cultura da Paz, Promoção da Saúde e a Prevenção da

Violência, considerando que a saúde e a segurança são necessidades que precisam ser

satisfeitas para que as pessoas vivam com dignidade, os Ministérios da Justiça e da Saúde

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violência 38

assinaram um Acordo de Cooperação Técnica, que visa ao desenvolvimento de ações

conjuntas e coordenadas da Estratégia Saúde da Família (ESF), e do Programa Nacional de

Segurança Pública com Cidadania (Pronasci), na prevenção da violência e na promoção da

segurança pública nas áreas de abrangência das equipes de Saúde da Família (BRASIL,

2009a).

Na articulação em Rede de Atenção Integral e Proteção às Pessoas em Situação de

Violência, embora mais frequentemente a escola estabeleça contatos com serviços de saúde e

com Conselhos Tutelares, quando se vê diante de situações de violência que envolvam seus

educandos, mas essa rede de proteção às vítimas pode ser ampliada (BRASIL, 2015).

A Rede de atenção integral às vítimas de violência nos municípios (figura 5) vem se

consolidando e garantindo o acesso aos serviços, cabendo enfatizar a importância da

“articulação do Sistema de Saúde com a Rede de Atendimento e Defesa dos Direitos, diante

do desafio de identificar, notificar e encaminhar os casos, ampliando a resolutividade e

garantindo proteção e defesa de direitos, nos grupos mais vulneráveis” (SOUZA; PINTO;

SOUZA, 2014, p. 782).

Figura 5 – Rede de Atenção Integral e Proteção às Pessoas em Situação de Violência.

Fonte: Brasil, 2015, p. 14.

A construção de uma política efetiva de segurança pública é um pleito que se renova a

cada ano. Todavia, a elaboração e implementação de políticas públicas requerem a capacidade

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A juventude perdida no Brasil: desigualdades socioeconômicas e espaciais na mortalidade de jovens por

violência 39

de reunir informações para a produção de diagnósticos e indicadores que possam subsidiar o

processo de formulação, execução, monitoramento e avaliação das ações governamentais

(FIGUEIRA, 2015).

Consequentemente, a equiparação de categorias entre as duas fontes pode servir para

identificar subregistros de um ou de outro lado.

Do ponto de vista legal no Brasil, pode-se citar dentre muitas leis sobre a proteção da

pessoa à violência e que orientam sobre a garantia dos direitos (BRASIL, 2013), como:

O Estatuto da Criança e do Adolescente – ECA Lei nº 8.069, de 13/07/90. Que garante os

direitos da população infanto-juvenil.

A Notificação Compulsória de Violência contra a Mulher Lei nº 10.778, de 24/11/03. Que

estabelece a notificação compulsória de violência contra a mulher para os casos, atendidos

em serviços de saúde públicos ou privados, de qualquer ação ou conduta que lhe cause

morte, dano ou sofrimento físico, sexual ou psicológico, tanto no âmbito privado como no

público.

A Lei Maria da Penha, nº 11.340, de 07/08/2006, coíbe a violência doméstica e familiar

contra a mulher. Tipifica a violência doméstica como uma violação dos direitos humanos.

Altera o Código Penal e possibilita aos agressores serem presos em flagrante ou terem

prisão preventiva decretada quando ameaçarem a integridade física da mulher.

O Estatuto do idoso. Lei nº 10.741, de 01/10/03. Que garante direitos dos(as) cidadãos(ãs)

acima de 60 anos de idade. Elaborada após anos de debates na sociedade e no poder

público, representa um avanço inegável para a legislação e uma das mais importantes

ferramentas de inclusão social no Brasil.

Estatuto da Juventude - lei no 12.852/2013, dispõe sobre os direitos dos jovens, os

princípios e diretrizes das políticas públicas de juventude e o Sistema Nacional de

Juventude – SINAJUVE.

O Estatuto da Igualdade Racial, Lei nº 12.288, de 20 de Julho de 2010, Institui o Estatuto

da Igualdade Racial e que estabelece diretrizes para a garantia de oportunidades à

população negra brasileira e é uma importante ferramenta na construção de condições para

a promoção da igualdade racial, o documento possibilita a correção de disparidades

históricas, no que se refere aos direitos ainda não plenamente desfrutados.

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A juventude perdida no Brasil: desigualdades socioeconômicas e espaciais na mortalidade de jovens por

violência 40

“Dentre as ações do governo federal que merecem destaque no enfrentamento ao

problema da violência contra os jovens negros, cabe detalhar o Plano Juventude

Viva – Plano de Prevenção à Violência Contra a Juventude Negra. O Plano

Juventude Viva se constitui como uma iniciativa, coordenada pela SEPPIR e pela

Secretaria Nacional de Juventude (SNJ), vinculadas à Secretaria-Geral da

Presidência da República (SGPR), que promovem ações de prevenção para reduzir a

vulnerabilidade de jovens negros. Em 2012, o Plano Juventude Viva foi lançado

pelo Governo Federal. Esse plano reúne ações de prevenção para reduzir a

vulnerabilidade de jovens negros a situações de violência física e simbólica, a partir

da criação de oportunidades de inclusão social e autonomia para os jovens entre 15 e

29 anos, da oferta de equipamentos; serviços públicos e espaços de convivência em

territórios que concentram altos índices de homicídio; e do aprimoramento da

atuação do Estado por meio do enfrentamento ao racismo institucional e da

sensibilização de agentes públicos para o problema” (BRASIL, 2015d, p. 57).

O Sistema Nacional de Promoção da Igualdade Racial (SINAPIR) foi instituído pelo

Estatuto da Igualdade Racial (Lei nº 12.288/2010), e regulamentado pelo Decreto n°

8136/2013, na abertura da III Conferência Nacional de Promoção da Igualdade Racial (III

CONAPIR), que ocorreu de 5 a 7 de novembro de 2013, e pela Portaria SEPPIR n.º 8, de 11

de fevereiro de 2014. O SINAPIR representa uma forma de organização e articulação voltadas

à implementação do conjunto de políticas e serviços para superar as desigualdades raciais no

Brasil, com o propósito de garantir à população negra a efetivação da igualdade de

oportunidades, a defesa de direitos e o combate à discriminação e as demais formas de

intolerância (BRASIL, 2015d).

“A prevenção dos eventos em saúde representa um grande desafio pela necessidade de

resposta e articulação com diferentes áreas, demandando uma ação interdisciplinar, além do

envolvimento dos vários setores da sociedade civil e das organizações governamentais”

(NEVES et al., 2011, p. 594). O desafio, para os sistemas de informação de saúde no Brasil, é

criar uma interface de comunicação entre si e transformá-los em sistemas ágeis que permitam

desencadear ações imediatas e realizar análises em tempo oportuno (BRASIL, 2009).

Apesar dos avanços através das Políticas, especialmente de saúde faz-se premente que

estas estejam articuladas intra e intersetorialmente. O que se percebe no cenário brasileiro é

que as mazelas sociais estão cada vez mais presentes. E nisso a saúde está apenas

reproduzindo o esquema de desigualdade que se perpetua por alguns séculos no Brasil. Sendo

assim, desvendar o que está por trás da debilidade dos seus serviços é uma forma de

compreendermos algo importante acerca da nossa sociedade: que ela segrega e classifica seus

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A juventude perdida no Brasil: desigualdades socioeconômicas e espaciais na mortalidade de jovens por

violência 41

membros de forma a valorizar uns em detrimento de outros, refletindo a lógica de operação de

nossas instituições (SOUZA, 2009).

A discussão sobre a violência e suas causas torna-se imperativa. No Relatório lançado

em 2014 pela Organização das Nações Unidas (ONU) com o tema da prevenção global da

violência apontou que 10% dos homicídios ocorridos no mundo são cometidos no Brasil

(BRASIL, 2015d).

O combate à vulnerabilidade social também implica a superação dos enfoques

setoriais e desarticulados de grande parte das políticas sociais. Problemas como a exclusão,

desigualdades sociais, discriminações e a violência decorrem de uma multiplicidade de fatores

que interagem entre si formando complexas redes causais. Entretanto, e em relação direta com

a ausência de uma coordenação insterinstitucional, um traço inerente às políticas,

especificamente àquelas voltadas para a juventude, refere-se justamente à ausência de uma

percepção integrada sobre os problemas sociais e suas raízes multicausais (ABRAMOVAY,

2002).

Com efeito, o próprio Estado atua em grande parte como violador direto ou indireto do

direito. A ausência de esforços políticos na concretização de políticas públicas voltadas à

garantia do direito à vida revela uma conjuntura de omissão. Em confluência com esses

fatores está a desigual estrutura social e econômica do País, na qual a população mais

desfavorecida é vítima preferencial da violência (MALTA, 2017).

Para garantir que um sistema de saúde esteja adequadamente alinhado com os

verdadeiros desafios de saúde de uma população, os formuladores de políticas devem

comparar os efeitos de doenças que matam prematuramente as pessoas ou causam falta de

saúde (IHME, 2013). O homicídio, sobretudo o que acomete a juventude, tem sido

considerado pelos estudiosos um evento marcador da violência social, embora,

contraditoriamente, não seja tratado como tema prioritário pela sociedade nem pelo Estado

brasileiro (COSTA et al., 2017).

É preciso superar esta questão da desarticulação entre as diversas instituições do setor

público que lidam com os problemas sociais e dos jovens (ABRAMOVAY, 2002).

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A juventude perdida no Brasil: desigualdades socioeconômicas e espaciais na mortalidade de jovens por

violência 42

2.6 A GEOGRAFIA DA SAÚDE E A CONTRIBUIÇÃO PARA A EPIDEMIOLOGIA

A Geografia da Saúde busca identificar na estrutura espacial e nas relações sociais que

ela encerra, associações plausíveis com os processos de adoecimento e morte nas

coletividades, enquanto a Epidemiologia tem como preocupação compreender e explicar o

processo saúde-doença nos indivíduos e em populações (BRASIL, 2006).

No Brasil, os estudos em Geografia Médica consideravam aspectos socioculturais e

econômicos, ligados à polarização e ocupação do território, baixo nível de vida da população

e aspectos ligados à mobilidade, que se inserem nas pesquisas, como fatores que contribuem

para a ocorrência, ou agravamento de doenças (PEREHOUSKEI; BENADUCE, 2007). Neste

sentido,

Precisamos cuidar do território, da ‘saúde do município’, além da saúde das pessoas,

e, para que isso aconteça, exige-se que as pessoas que lá vivem participem da

definição dos problemas prioritários e de sua resolução, incluindo aqui também o

reconhecimento das suas potencialidades. É a partir do fortalecimento da

solidariedade local que podemos pensar as intervenções, tomando a população como

sujeito, inserindo-a nos processos, estimulando o compartilhamento de decisões e a

responsabilidade cidadã. (PEREIRA, 2009, p. 196).

Segundo Santos (2000, p. 108), “os atores hegemonizados têm o território como um

abrigo, buscando constantemente se adaptar ao meio geográfico local, ao mesmo tempo que

recriam estratégias que garantam sua sobrevivência nos lugares”.

A “categoria território deve ser empregada na orientação da aplicabilidade de

estratégias de coleta e organização de dados sobre ambiente e saúde e de que os processos

sociais e ambientais não estão limitados por estes” (PEREIRA, 2009, p. 199). “O território

usado, visto como uma totalidade é um campo privilegiado para a análise, na medida em que,

de um lado, nos revela a estrutura global da sociedade e, de outro lado, a própria

complexidade do seu uso” (SANTOS, 2000, p. 108). Nisso,

A adoção da categoria território com célula de delineamento das ações de análise e

planejamento no campo da gestão territorial urbana, representa a superação de um

modelo de gestão pautado em políticas únicas que, em casos não raros, não atendiam

as diversidades e particularidades inerentes ao local e aos diferentes processos de

territorialização. (PEREIRA, 2009, p. 205).

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Nesse sentido, a vigilância em saúde deve estar atenta a todos os tipos de problemas,

em todas as escalas em que eles se manifestam, sejam globais, regionais ou locais (BRASIL,

2006a). Assim, o território como lócus para o entendimento de problemas ambientais e de

saúde, associado ao empoderamento de suas populações, pode levar a configuração de

espaços saudáveis, onde a promoção da saúde ambiental possa ser tomada como pilhar para o

desenvolvimento, e não como consequência deste (PEREIRA, 2009). Com isso,

Estudos referentes ao campo da saúde humana, desenvolvidos numa perspectiva

multicausal e multi-interdisciplinar, vêm ganhando cada vez mais destaque, posto

que apostam na previsão e na promoção da saúde das populações. Esta temática

retoma lugar e ganha importância no âmbito da geografia brasileira das duas últimas

décadas, configurando-se num importante testemunho da inovação e

interdisciplinaridade evidente na Geografia Plural do presente momento.

(MENDONÇA; ARAÚJO; FOGAÇA, 2014, p. 42).

Em relação à saúde, quanto ao planejamento, notam-se intervenções no território.

Nisso, os estudos têm se desenvolvido de tal maneira que a Geografia tem contribuído em

muito, com os estudos geográficos no âmbito da saúde no Brasil (PEREHOUSKEI;

BENADUCE, 2007, p. 35).

O MS em parceria com a Organização Pan-Americana da Saúde (OPAS) vem

articulando a Rede Interagencial de Informações para a Saúde (RIPSA), objetivando a

integração de inúmeras instituições que desenvolvem projetos dentro da produção e análise de

dados, buscando parcerias e intercâmbios para o aprimoramento dos diversos estudos no

Brasil (PEREHOUSKEI; BENADUCE, 2007). Então,

“A análise da situação de saúde permite a definição de perfis de necessidades e

problemas com a identificação de uma hierarquização de prioridades a partir do

conhecimento dos diferentes atores sociais (da comunidade e das instituições), bem

como das respostas sociais que estes são capazes de organizar e articular frente aos

problemas apontados. Isso é importante porque os perfis de morbidade e mortalidade

resultam da interação entre a presença de situações-problema e a capacidade de

resposta de cada população a partir da sua organização social frente a estas

necessidades” (BRASIL, 2006b, p. 29).

São muitos os estudos realizados para diagnosticar áreas de riscos à violência, e dentre

eles, os estudos de distribuição e análise espacial, tem sido ferramentas úteis e podem

contribuir cada vez mais com as politicas públicas, e mais diretamente à vigilância em saúde.

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A análise de dados distribuídos pelo espaço geográfico vem sendo cada vez mais

valorizada na gestão de saúde, por apontar novos subsídios para o planejamento e a avaliação

das ações baseadas na análise da distribuição espacial das doenças, a localização dos serviços

de saúde e dos riscos ambientais, entre outros (BRASIL, 2006).

As análises espaciais ampliam o campo da vigilância epidemiológica, no

monitoramento e colaboração para o planejamento de ações em áreas de riscos e intervenções

de forma articulada com outros setores. Nisso,

A epidemiologia espacial também permite reconhecer que a frequência, a

distribuição e a importância dos diversos fatores que influem no aumento de

determinados riscos para a saúde não são, necessariamente, os mesmos em todos os

grupos populacionais. E identificar grupos que compartilham determinantes de risco

similares. O reconhecimento desses grupos facilita a identificação de intervenções

sociais e de saúde para diminuir ou eliminar os determinantes específicos de risco

para a saúde. Essa aplicação da epidemiologia implica uma reorganização dos

serviços de saúde que responda não apenas às demandas de atenção, mas também,

fundamentalmente, às necessidades de saúde não atendidas (OPAS, 2002 apud

MASULLO; RANGEL, 2010, p. 8).

São diversos fatores que se fazem presentes nas escalas que se representa o espaço, e

as “variáveis culturais apresentam maiores diferenciais. Estes contrastes, estão presentes na

escala nacional, regional e local” (BARCELLOS; BASTOS, 1996, p. 390-391).

O espaço deve ser considerado como um conjunto indissociável de que participam,

de um lado, certo arranjo de objetos geográficos, objetos naturais e objetos sociais, e,

de outro, a vida que os preenche e os anima, seja a sociedade em movimento. O

conteúdo (da sociedade) não é independente, da forma (os objetos geográficos), e

cada forma encerra uma fração do conteúdo. O espaço, por conseguinte, é isto: um

conjunto de formas contendo cada qual frações da sociedade em movimento As

forma, pois têm um papel na realização social. (SANTOS, 1988, p. 10).

Compreender a organização do espaço possibilita uma maior aproximação dos fatores

relacionados ao desenvolvimento das doenças e da sua distribuição entre os diversos grupos

sociais. As desigualdades espaciais precisam ser identificadas para que se possa qualificar e

organizar os serviços de saúde de acordo com as particularidades de cada área geográfica.

Certamente, o desafio atual para a epidemiologia é desenvolver trabalhos centrados na

perspectiva da valorização do espaço, explorando as potencialidades de métodos inovadores

do ponto de vista das intervenções em saúde pública (BONFIM; MEDEIROS, 2008). Nisso,

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“O espaço não é nem uma coisa, nem um sistema de coisas, senão uma realidade

relacional: coisas e relações juntas. Eis por que sua definição não pode ser

encontrada senão em relação a outras realidades: a natureza e a sociedade,

mediatizadas pelo trabalho” (SANTOS, 1988, p. 10).

“O espaço urbano reúne áreas com os mais diversos conteúdos técnicos e

socioeconômicos” (SANTOS, 2006, p. 209). A busca por uma nova abordagem territorial em

saúde, que contemple múltiplos olhares, apresenta-se ainda mais necessária em escala urbana,

onde tudo se torna mais complexo. Obviamente as relações sociais mais intensas, os conflitos,

os fluxos e os usos diferenciados produzem territórios e territorialidades as mais variadas.

Nesses territórios urbanos diferenciados, o processo saúde-doença pode ser investigado como

um evento diferenciado ou particular. O fenômeno biológico, como um fenômeno social, pode

ser entendido em sua dependência territorial urbana (FARIA; BORTOLOZZI, 2009).

Assim, os Sistemas de Informação Geográfica (SIG) são usados para capturar,

armazenar, gerenciar, analisar e apresentar informações geográficas. A utilização de SIG

possibilita realizar análises espaciais complexas, permite integração de dados de diversas

fontes, manipulação de grande volume de dados e recuperação rápida de informações

armazenadas (BRASIL, 2006). “Para a área de saúde, o mapeamento de doenças, a avaliação

de riscos, as redes de atenção e o planejamento dos serviços, são alguns dos benefícios dos

métodos e tecnologias utilizados nos SIGs” (PEREHOUSKEI; BENADUCE, 2007, p. 42).

De maneira geral, os SIGs permitem realizar diversas funções, que serão utilizadas

conforme os objetivos de análise (BRASIL, 2006). No Brasil, iniciativas estão sendo

introduzidas para incorporação do SIG na área de saúde, através de parcerias entre órgãos do

sistema único de saúde (SUS), prefeituras e universidades: intercâmbio de bases cartográficas,

técnicas, metodologias e capacitação de pessoal” (PEREHOUSKEI; BENADUCE, 2007, p.

42).

“A construção de indicadores depende de um conjunto de sistemas de informação,

compreendido como meios que permitem a coleta, armazenamento, processamento e

recuperação de dados” (BRASIL, 2006, p. 31). Assim,

“A distribuição de eventos, relacionados ou não à produção de saúde ou doença,

sempre ocorre em um determinado espaço geográfico, e pode ser representada em

mapas de diferentes formatos e conteúdos. Esses mapas serão sempre simplificações

de fatos e fenômenos da realidade, localizados sobre uma base cartográfica”

(BRASIL, 2006, p. 23).

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A grande oferta de indicadores, bases cartográficas, o desenvolvimento de programas

de computadores com interface amigável, bem como de equipamentos de baixo custo e alta

capacidade de memória, possibilitaram a difusão do geoprocessamento no Brasil e

possibilidades de sua utilização no cotidiano das instituições. Mas para compreender o

território, e toda a complexidade que nele se desenvolve, é preciso aplicar algumas técnicas e

conceitos sobre espaço geográfico e geoprocessamento (BRASIL, 2015a). Neste propósito,

O geoprocessamento pode ser definido como um conjunto de técnicas

computacionais necessárias para manipular informações espacialmente referidas.

Aplicado a questões de Saúde Coletiva permite o mapeamento de doenças, a

avaliação de riscos, o planejamento de ações de saúde e a avaliação de redes de

atenção. Pode-se considerar que é uma área de conhecimento que envolve diversas

disciplinas, como a Cartografia, Computação, Geografia e Estatística. Algumas das

técnicas de geoprocessamento mais utilizadas são: o sensoriamento remoto, a

cartografia digital, a estatística espacial e os Sistemas de Informações Geográficas

(BRASIL, 2006, p. 47).

O geoprocessamento é, neste quadro, um poderoso instrumento a serviço da

pesquisa em saúde (BARCELLOS; BASTOS, 1996). Além da localização geográfica

definida, que qualifica os dados como georreferenciados, “os dados de um SIG

caracterizam-se por possuir dois componentes fundamentais: gráfica e não-gráfica”

(BRASIL, 2006, p. 50).

A Análise Exploratória de Dados Espaciais (AEDE) trata de um conjunto de

abordagens com intuito de averiguar fenômenos de aglomerações com valores

estatisticamente próximos, sinalizando possível existência de fatores espaciais

significativos em contraposição de uma distribuição espacial aleatória, e podem sugerir

forma e dependência entre observações (BRASIL, 2015a). A arquitetura de dados em forma

de camadas permite que várias informações sejam visualizadas simultaneamente e estejam

acessíveis sobre um determinado evento, como por exemplo, a violência (Figura 6).

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Figura 6 – Modelo de camadas em um SIG relacionada ao evento/ agravo violência.

Fonte: Adaptado de Brasil, 2015, p. 236.

Considerando-se o ponto de vista segundo Santos (2006, p. 61) sobre um evento, “é o

resultado de um feixe de vetores, conduzido por um processo, levando uma nova função ao

meio preexistente. O evento só é identificável quando é percebido, quando se perfaz e se

completa. E somente se completa quando integrado no meio” (SANTOS, 2006, p. 61).

E nisso, permeado por diferentes usos, o território acaba por produzir e reproduzir

territorialidades distintas, são nesses espaços que se estabelecem a formação de

diferentes graus de riscos e vulnerabilidades dos indivíduos perante a violência, uma

vez que entendemos que apesar de atingir toda a sociedade, cada grupo social é

diferentemente vulnerável ao fenômeno (PATRÍCIO, 2014).

“O espaço é formado por um conjunto indissociável, solidário e também contraditório,

de sistemas de objetos e sistemas de ações, não considerados isoladamente, mas como o

quadro único no qual a história se dá” (SANTOS, 2006, p. 39).

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“Enquanto os homens exercem seus podres poderes

Morrer e matar de fome, de raiva e de sede

São tantas vezes gestos naturais...”

Caetano Veloso

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3 OBJETIVOS

3.1 OBJETIVO GERAL

Analisar a distribuição espacial da mortalidade por violência de jovens nas Regiões

Imediatas de Articulação Urbana do Brasil de acordo com indicadores socioeconômicos.

3.2 OBJETIVOS ESPECÍFICOS

Caracterizar o perfil da mortalidade de jovens por violência nas Regiões Imediatas

de Articulação Urbana do Brasil;

Analisar a distribuição espacial da mortalidade de jovens por violência nas

Regiões Imediatas de Articulação Urbana do Brasil;

Calcular os Anos Potenciais de Vida Perdido pela mortalidade de jovens por

violência nas Regiões Imediatas de Articulação Urbana do Brasil;

Correlacionar espacialmente a mortalidade por de jovens por violência com

indicadores socioeconômicos para as Regiões Imediatas de Articulação Urbana do

Brasil.

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“O que será, que será?

Que todos os avisos não vão evitar

Por que todos os risos vão desafiar

Por que todos os sinos irão repicar

Por que todos os hinos irão consagrar

E todos os meninos vão desembestar

E todos os destinos irão se encontrar

E mesmo o Padre Eterno que nunca foi lá

Olhando aquele inferno vai abençoar

O que não tem governo nem nunca terá

O que não tem vergonha nem nunca terá

O que não tem juízo...”

Chico Buarque

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4 MÉTODO

4.1 DELINEAMENTO DO ESTUDO

Trata-se de estudo ecológico de múltiplos grupos. Os estudos ecológicos usam dados

agregados e tem como unidade de análise “grupos”, e não o indivíduo. Estudos ecológicos

comparam indicadores em que determinada população foi submetida, utilizando-se medidas

agregadas através de taxas, indicadores, proporções, médias e outros tipos de estatísticas

(ROUQUAYROL; GURGEL, 2013).

4.2 OBJETO DE ANÁLISE

Como objeto tem-se a mortalidade de jovens de 15 a 29 anos que foram a óbito,

vitimados pela violência, no período de 01 de janeiro de 2001 a 31 de dezembro de 2015. A

definição da população jovem é pautada no Estatuto da Juventude, marco significativo em

agosto de 2013 através da Lei nº 12.852, que institui o Estatuto da Juventude e dispõe sobre

os direitos dos jovens, e em seu art. 1º, § 1º estabelece que são considerados jovens as pessoas

entre 15 e 29 anos de idade (BRASIL, 2013).

4.3 ÁREA DO ESTUDO

A área deste estudo são as 482 Regiões Imediatas de Articulação Urbana (RIAU). A

divisão urbano regional delimita regiões de modo a obter agregados coesos de municípios

resolvendo suas múltiplas vinculações (IBGE, 2013).

As regiões imediatas referem-se à área vivida pela população, acessibilidade e seu

deslocamento cotidiano para fornecimento e busca de bens e serviços. Optou-se em utilizar as

RIAU com intuito de estabilizar as taxas de mortalidade entre os municípios considerando as

diferenças regionais existentes, minimizando flutuações aleatórias devido à ocorrência dos

eventos ao acaso. Essas RIAU visam estabelecer relações de busca por bens e serviços e

gestão de modo que apresentam vinculações fortemente divididas entre mais de um município.

Assim sendo, as regiões imediatas analisadas neste estudo extrapolam os limites de unidades

da federação (Figura 7).

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A juventude perdida no Brasil: desigualdades socioeconômicas e espaciais na mortalidade de jovens por

violência 53

Figura 7 – Divisão Urbano Regional - Regiões Imediatas de Articulação Urbana.

Fonte: IBGE, 2013.

4.4 POPULAÇÃO E FONTE DE DADOS

Os dados de população por Região Imediata de Articulação Urbana, por sexo e por

faixa etária foram obtidos das informações do Censo 2010 e das projeções intercensitárias e

estimativas no sítio do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE).

Os dados óbitos foram obtidos de forma secundária, provenientes do Sistema de

Informações sobre Mortalidade – SIM/Datasus do Ministério da Saúde, contabilizados

segundo as declarações de óbito. Para Medronho et al., (2009) o SIM é fonte de dados mais

confiável e sólida base em todo o território nacional.

Foram extraídos os dados de óbitos que constituem a somatória das categorias X85-

Y09 e Y35-Y36 (Agressões e Operações de guerra) de acordo com o capítulo XX da 10ª

Revisão da Classificação Estatística Internacional de Doenças e Problemas Relacionados à

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A juventude perdida no Brasil: desigualdades socioeconômicas e espaciais na mortalidade de jovens por

violência 54

Saúde (CID-10), dos anos 2000 a 2015, sendo trabalhados em três quinquênios, de 2001 a

2005, 2006 a 2010 e de 2011 a 2015.

Quadro 1 – Distribuição dos óbitos por violência segundo a CID - 10

CÓDIGO DESCRIÇÃO

X85 Agressão por meio de drogas, medicamentos e substâncias biológicas

X86 Agressão por meio de substâncias corrosivas

X87 Agressão por pesticidas

X88 Agressão por meio de gases e vapores

X89 Agressão por meio de outros produtos químicos e substâncias nocivas especificados

X90 Agressão por meio de produtos químicos e substâncias nocivas não especificadas

X91 Agressão por meio de enforcamento, estrangulamento e sufocação

X92 Agressão por meio de afogamento e submersão

X93 Agressão por meio de disparo de arma de fogo de mão

X94 Agressão por meio de disparo de espingarda, carabina ou arma de fogo de maior calibre

X95 Agressão por meio de disparo de outra arma de fogo ou de arma não especificada

X96 Agressão por meio de material explosivo

X97 Agressão por meio de fumaça, fogo e chamas

X98 Agressão por meio de vapor de água, gases ou objetos quentes

X99 Agressão por meio de objeto cortante ou penetrante

Y00 Agressão por meio de um objeto contundente

Y01 Agressão por meio de projeção de um lugar elevado

Y02 Agressão por meio de projeção ou colocação da vítima diante de um objeto em

movimento

Y03 Agressão por meio de impacto de um veículo a motor

Y04 Agressão por meio de força corporal

Y05 Agressão sexual por meio de força física

Y06 Negligência e abandon

Y07 Outras síndromes de maus tratos

Y08 Agressão por outros meios especificados

Y09 Agressão por meios não especificados

Y35 Intervenções legais

Y36 Operações de Guerra

Fonte: Classificação Internacional de Doenças- CID10

As variáveis socioeconômicas foram oriundas do IBGE, disponíveis em publicações e

no Atlas de Desenvolvimento Humano do Programa das Nações Unidas para o

Desenvolvimento (PNUD). (Disponível em <http://www.pnud.org.br/atlas/>).

A escolha do período se deu pela relevância acadêmica e social do tema, que pode

possibilitar maiores entendimentos acerca da evolução da violência contra jovens no Brasil no

período (2001 a 2015), e discutir os resultados com outros estudos e com políticas que tratem

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A juventude perdida no Brasil: desigualdades socioeconômicas e espaciais na mortalidade de jovens por

violência 55

a violência como objeto de estudo/ atenção/ enfrentamento, como a Política Nacional de

Redução da Morbimortalidade por Acidentes e Violências (Portaria GM/MS n. 737, de 16 de

maio de 2001), e a Lei das Armas de Fogo (Lei nº 10.826 de 22 de Dezembro de 2003).

4.5 CRITÉRIOS DE INCLUSÃO E EXCLUSÃO

Como critério de inclusão tem-se o número de óbitos ocorridos no período de 01 de

janeiro de 2001 a 31 de dezembro de 2015 classificados na CID-10, a saber: X85-Y09 e Y35-

Y36 (Agressões e Operações de guerra).

Como critério de exclusão os dados de óbitos com informações ignoradas referentes ao

município de residência da vítima, assim como informações incompletas relacionados ao sexo,

faixa etária e local de ocorrência do óbito.

4.6 VARIÁVEIS

As variáveis podem ser compreendidas como aspectos, propriedades ou fatores reais

que possuem valores mensuráveis e discerníveis em um determinado objeto de estudo

(CERVO; BERVIAN; SILVA, 2007).

4.6.1 Variáveis dependentes

Como variáveis dependentes ou variáveis de respostas foram utilizadas a taxa de

mortalidade por violências, representada pela Taxa de Mortalidade Padronizada (TMP) e os

Anos Potenciais de Vida Perdidos (APVP).

Para os cálculos das taxas foram utilizados o número de óbitos ocorridos no período de

2001 a 2015, comparando-se três quinquênios, sendo o primeiro quinquênio de 01 de janeiro

de 2001 a 31 de dezembro de 2005, o segundo de 01 de janeiro de 2006 a 31 de dezembro de

2010 e o terceiro de 01 de janeiro de 2011 a 31 de dezembro de 2015.

O processo de padronização direta faz para eliminar o efeito de estrutura etária é

estimar um valor para a Taxa Bruta de Mortalidade (TBM). Para isso é utilizado nos cálculos

das taxas brutas de mortalidade, uma estrutura etária comum, ou seja, uma população padrão,

na qual é escolhida para se trabalhar em todos os anos da série, que neste caso é de 2001 a

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A juventude perdida no Brasil: desigualdades socioeconômicas e espaciais na mortalidade de jovens por

violência 56

2015. As taxas de mortalidade serão padronizadas considerando a população padrão

brasileira do ano de 2008 (população do meio do período) e expressas por 100.000 habitantes

por ano. Para realização dos cálculos fez-se necessário o número de Óbitos na faixa etária de

15 a 29 anos; a população local na faixa etária de 15 a 29 anos; e a população padrão do

Brasil na faixa etária de 15 a 29 anos, assim como a população total. Para o cálculo da taxa

padronizada calcula-se primeiramente a TBM, através da fórmula:

TBM =Nº de óbitos na faixa (15 a 29 anos)𝑥 100.000 Habitantes

População na faixa (15 a 29 anos)

Após encontrar a TBM, calcula-se os óbitos esperados, através da fórmula:

OE =TBM 𝑥 População padrão na faixa (15 a 29 anos)

100.000 Habitantes

Depois de encontrar a TBM e óbitos esperados, calcula-se a TMP, através da fórmula:

TMP =Óbitos esperados 𝑥 100.000 Habitantes

Total da população padrão

Para a obtenção do número de APVP é feita a distribuição dos óbitos por

agrupamentos de idade. Em seguida, multiplica-se o número de óbitos em cada intervalo de

idade pelo número de anos que faltam para atingir a idade limite de 70 anos. Essa diferença é

obtida a partir do ponto médio de cada faixa etária (ARAÚJO et al., 2009).

Quadro 2 – Método de cálculo dos APVP entre as idades de 15 e 29 anos, distribuídas em três

faixas.

Faixa etária

(anos)

Anos restantes

αi

Nº de mortes

𝑑i

APVP estimado

αi 𝑥 𝑑i

15-19 anos 52,5

20-24 anos 47,5

25-29 anos 42,5

Total APVP - - ∑ αi 𝑥 𝑑i

αi = diferença entre o limite superior de idade (70 anos) e o ponto médio de cada faixa etária.

𝑑i = número de óbitos em cada faixa etária.

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A juventude perdida no Brasil: desigualdades socioeconômicas e espaciais na mortalidade de jovens por

violência 57

Os coeficientes de APVP são calculados dividindo-se o número total de APVP pela

população dentro dos limites de idade utilizados e exprimem a estimativa do risco de perder

anos potenciais de vida. Para realizar comparações entre diferentes locais ou num mesmo

local em diferentes anos utilizam-se os coeficientes padronizados por idade, que reduzem a

influência das diferentes estruturas etárias (ARAÚJO et al, 2009).

O total de APVP foi calculado por sexo, por RIAU. Para aumentar a comparabilidade

do indicador, além de expressar os APVP sob forma de números absolutos (Total de APVP

igual ao somatório dos Anos Potenciais de Vida Perdidos), também foi calculado os APVP

por proporções em relação ao total (Total de APVP dividido pelo total de óbitos menores de

70 anos).

4.6.2 Variáveis independentes individuais

Para as variáveis independentes individuais foram incluídas conforme descritas no

quadro 3.

Quadro 3 – Descrição das variáveis independentes individuais do estudo.

Nome da variável Descrição Fonte de dados

Sexo Caracterização genética e anátomo-fisiológica dos

seres humanos, que os classifica em feminino ou

masculino.

SIM

Raça/Cor Característica declarada pelas pessoas de acordo

com as seguintes opções: branca, preta, amarela,

parda ou indígena.

SIM

Local de ocorrência Área física onde ocorreu o óbito SIM

4.6.3 Indicadores socioeconômicos

Os indicadores socioeconômicos serão coletados do Atlas de Desenvolvimento

Humano no Brasil do Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento (PNUD)

(www.atlasbrasil.org.br).

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A juventude perdida no Brasil: desigualdades socioeconômicas e espaciais na mortalidade de jovens por

violência 58

Quadro 4 – Variáveis independentes contextuais socioeconômicas por RIAU

Variáveis independentes contextuais socioeconômicas

Nome da variável Descrição Fonte de

dados

Índice de Desenvolvimento

Humano Municipal (IDH-M)

Inclui três componentes, IDHM Longevidade, IDHM

Educação e IDHM Renda. PNUD

Razão de dependência

Razão entre o segmento etário da população definido

como economicamente dependente (os menores de 15

anos de idade e os de 60 e mais anos de idade) e o

segmento etário potencialmente produtivo (entre 15 e 59

anos de idade), na população residente em determinado

espaço geográfico, no ano considerado.

PNUD

Percentual de crianças de 6 a 14

fora da escola

Percentual de crianças de 6 a 14 anos fora da escola num

determinado espaço geográfico, no ano considerado. PNUD

Taxa de analfabetismo de 15

anos ou mais

Percentual de pessoas com 15 anos ou mais de idade que

não sabem ler e escrever pelo menos um bilhete simples,

no idioma que conhecem, na população total residente da

mesma faixa etária, em determinado espaço geográfico,

no ano considerado.

PNUD

Percentual de pobres Percentual de pessoas pobres num determinado espaço

geográfico, no ano considerado.

PNUD

Índice de Gini

Mede o grau de concentração da distribuição de renda

domiciliar per capita de uma determinada população e

em um determinado espaço geográfico.

PNUD

Taxa de desocupação -18 anos

ou mais

Percentual da população desempregada em determinado

espaço geográfico, no ano considerado. PNUD

Taxa de trabalho infantil

(IDB)

Trata-se do percentual das crianças de 10-14 anos de

idade que trabalham ou procuram trabalho na Analisar

variações geográficas e temporais na distribuição do

trabalho infantil semana de referência, em determinado

espaço geográfico, no ano considerado.

PNUD

Percentual de pessoas de 15 a

24 anos que não estudam, não

trabalham e são vulneráveis,

na população dessa faixa.

Percentual de pessoas de 15 a 24 anos que não estudam,

não trabalham e são vulneráveis, na população dessa

faixa num determinado espaço geográfico, no ano

considerado.

PNUD

4.7 ANÁLISE DOS DADOS

Inicialmente, apresenta-se a análise descritiva dos óbitos, dentro da série temporal

de 2001 a 2015 apresentada em 3 quinquênios. Seguindo-se com a análise das variáveis

dependentes e independentes de contexto. E, a apresentação da análise espacial com

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A juventude perdida no Brasil: desigualdades socioeconômicas e espaciais na mortalidade de jovens por

violência 59

apresentação de mapas e discussão.

4.7.1 Análise descritiva dos dados

Para as variáveis individuais, apresenta-se sua frequência absoluta e relativa,

segundo raça e cor, estado civil, escolaridade, local de ocorrência do óbito, variáveis

presentes na DO. Além disso, traz-se a análise de tendência para traçar a evolução dos

óbitos por violência em jovens, assim como para conhecer se os óbitos na faixa etária de

interesse, possui crescimento, estabilização ou redução no decorrer dos anos. Analisou-se a

Mortalidade Proporcional (MP) por categoria CID-10, agregada para o país, entre os anos

2001 a 2015 dividindo em três quinquênios.

Para o cálculo da Mortalidade Proporcional, faz-se a razão do número de óbitos

devido a uma causa y e a relação total de óbitos na mesma área e período.

MPy =Número de óbitos devido à causa y, da área A no período P

Número de óbitos por todas as causas, da área A no período P 𝑥 100

4.8 ANÁLISE ESPACIAL

Para a análise espacial dos dados foram utilizadas a Taxa de mortalidade

padronizada e os Anos Potenciais de Vida Perdidos (APVP), bem como a razão entre os

resultados obtidos, a saber: a razão de sexo, de faixa etária, de cor/ raça e de meio utilizado

para perpetrar a morte por violência (arma de fogo versus outro tipo de arma).

Com o intuito de apresentar os resultados a partir da localização geográfica dos óbitos,

foram utilizados o índice de Moran, o Moran Global e local.

As técnicas de estatística espacial de áreas foram aplicadas para tentar identificar

regiões onde a distribuição dos valores possa apresentar um padrão específico associado a sua

localização geográfica. Segundo Almeida (2004) na literatura existe um conjunto de

estatísticas que investigam a presença da autocorrelação espacial, isto é, se existe a

coincidência da similaridade de valores de uma variável com a similaridade da localização

dessa variável.

Essas análises foram realizadas utilizando o software GeoDa 1.6.61 (Spatial Analysis

Laboratory, University of Illinois, Urbana Champaign, Estados Unidos) e o Terra view 4.4.2.

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A juventude perdida no Brasil: desigualdades socioeconômicas e espaciais na mortalidade de jovens por

violência 60

4.8.1 Índice de Moran

O índice de Moran é um coeficiente de correlação que mede a associação existente

entre o espaço e a variável de interesse. O índice tem o objetivo de identificar a estrutura de

correlação espacial que melhor descreve os dados.

4.8.2 Moran Global

Os indicadores globais de autocorrelação espacial, como o Índice de Moran, fornecem

um único valor como medida da associação espacial para todo o conjunto de dados de área,

que é útil como caracterização de toda a região de estudo.

Neste trabalho, se examinou os padrões numa escala de maior detalhe, para verificar se

a hipótese de estacionariedade do processo verifica-se localmente. A análise de dependência

espacial foi executada utilizando-se o índice de Moran Global que estima a autocorrelação

espacial, podendo variar entre -1 e +1, além de fornecer a significância estatística do mesmo

(valor de p). Para testar a significância do índice de Moran, foi realizado o teste de pseudo-

significância no qual através de simulações é calculada a probabilidade de o valor observado

pertencer a uma distribuição espacial aleatória. Neste trabalho para a validação do Índice de

Moran Global, foi utilizado o teste de permutação aleatória, com 99 permutações.

4.8.3 Moran Local

O Índice de Moran Local foi proposto por Luc Anselin (1994) como uma ferramenta

estatística para testar a autocorrelação local e para detectar objetos espaciais com influência

no indicador Moran Global. Esta família estatística trabalha a partir da estimativa de segunda

ordem do comportamento dos seus dados, ou seja, a partir da análise das covariâncias entre as

diferentes unidades de área.

A avaliação do padrão de distribuição do evento foi realizada por meio do Moran local

(Local Indicators of Spatial Association – LISA). Para tanto, foram construídos os BoxMap e

MoranMap relativos às taxas de Mortalidade. O BoxMap apresenta os clusters, independente

da significância estatística, enquanto o MoranMap apenas aqueles com valor de p < 0,05. Para

a validação do Índice de Moran Global, foi utilizado o teste de permutação aleatória, com 99

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A juventude perdida no Brasil: desigualdades socioeconômicas e espaciais na mortalidade de jovens por

violência 61

permutações. Para a produção dos mapas temáticos em quintis e o cálculo do Índice de Moran

Global e Local foi utilizado o software Terraview 4.2.1.

4.8.4 Moran Bivariado

Na análise da autocorrelação espacial global bivariada, o objetivo é descobrir se o

valor de um atributo observado numa dada região está relacionado espacialmente com os

valores de outra variável observada na mesma região (ALMEIDA, 2012).

Com o software GeoDa 1.6.61 (Spatial Analysis Laboratory, University of Illinois,

Urbana Champaign, Estados Unidos) e Ipeageo - 2.1.15. foi realizada a análise bivariada

LISA para avaliação da correlação espacial entre a variável desfecho (Taxas de Mortalidade)

e as variáveis independentes. Para tanto, foram construídos os mapas temáticos com cada par

de variáveis e verificado a sua significância estatística.

4.9 ANÁLISE DA ESTATÍSTICA CLÁSSICA

Para avaliar a relação entre os indicadores socioeconômicos selecionados e a

mortalidade por violência no Brasil, foram aplicados os testes de correlação de Pearson. Para

o processamento e a análise estatística foi utilizado o programa IBM SPSS statistics 23.0.

4.10 RISCO RELATIVO

O risco relativo é uma comparação entre o risco sofrido por dois grupos sociais,

criados a partir de uma dimensão. Nesse estudo, contrasta-se o risco que dois grupos possuem

de se tornarem vítimas de violência/ homicídio. Em suma, o risco relativo pode ser definido

como a razão entre a probabilidade de ser vítima de homicídio para dois grupos diferentes,

definidos de acordo com uma variável. Deve-se interpretar o resultado como a quantidade de

vezes em que o risco de vitimização é maior para o primeiro grupo (numerador) em relação ao

segundo grupo (denominador).

Utilizando o Microsoft Excel, os riscos relativos calculados neste trabalho são

referentes aos jovens na faixa de 15 a 29 anos, para os quinquênios (2001 a 2005, 2006 a 2010

2 2011 a 2015), de acordo com o sexo, cor da pele e meio utilizado.

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violência 62

Neste estudo, os riscos relativos foram calculados de acordo com quatro dimensões:

1_Sexo: (homens versus mulheres);

2_Cor ou Raça (negros [pretos e pardos] versus brancos;

3_Idade da vítima (indivíduos de 20 a 24 anos, versus 15 a 19 anos e de 20 a

24 anos, versus 25 a 29 anos);

4_Meio utilizado (armas de fogo versus arma branca).

Os cálculos de risco relativo foram realizados com base nas taxas de mortalidade por

violência para a população com idade entre 15 e 29 anos nos municípios e por RIAU.

4.11 ASPECTOS ÉTICOS

Essa pesquisa utilizou dados secundários disponíveis em sites oficiais do Ministério da

Saúde do Brasil sendo dispensado de apreciação em comitê de ética em pesquisa, em

conformidade com a Resolução 466∕12 do Conselho Nacional de Saúde.

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“Nas noites de frio é melhor nem nascer

Nas de calor, se escolhe: é matar ou morrer

E assim nos tornamos brasileiros...”

Cazuza

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A juventude perdida no Brasil: desigualdades socioeconômicas e espaciais na mortalidade de jovens por

violência 64

5 RESULTADOS E DISCUSSÃO

5.1 ARTIGO 1

DISTRIBUIÇÃO ESPACIAL DA MORTALIDADE DE JOVENS POR VIOLÊNCIA

POR REGIÕES IMEDIATAS DE ARTICULAÇÃO URBANA NO BRASIL

Título resumido: Espacialização das mortas violentas de jovens no Brasil

Periódico de submissão: Revista Ciência & Saúde Coletiva

Resumo

OBJETIVO: Analisar a distribuição espacial da mortalidade de jovens por causas violentas

nas Regiões Imediatas de Articulação Urbana (RIAU) do Brasil. MÉTODOS: Trata-se de

estudo ecológico cuja unidade de análise foram as 482 RIAU em três períodos (2001 a 2005,

2006 a 2010 e 2011 a 2015). Analisou-se a distribuição espacial, a intensidade e a

significância dos aglomerados através do índice de Moran Global, MoranMap e LisaMap.

RESULTADOS: as regiões que apresentaram as maiores taxas no primeiro período foi Foz

do Iguaçu – PR (47,03 óbitos/100 mil hab.), Recife – BA (41,03) e Vitória – ES (36,57), no

segundo: Foz do Iguaçu – PR (48,12), Maceió – AL (43,95) e Porto Seguro – BA (40,40) e no

terceiro: São Miguel dos Campos – AL (56,47), Porto Seguro – BA (51,65) e Maceió – AL

(47,83). Os valores do Índice de Moran Global foram positivos e com testes significativos,

sendo mais expressivos, no período de 2011 a 2015, representando para ambos os sexos (I=

0.54438, p=0.01), para o sexo masculino (I= 0.546006, p=0.01), e para o feminino (I=

0.329374, p=0.01). CONCLUSÕES: A mortalidade por violência está desigualmente

distribuída nas RIAU, com formação de clusters no norte, nordeste e sudeste do país e

apresentando autocorrelação espacial.

Descritores: Mortalidade. Violência. Jovens. Distribuição Espacial.

Abstract

OBJECTIVE: To analyze the spatial distribution of youth mortality due to violent causes in

the Immediate Regions of Urban Articulation (RIAU) in Brazil. METHODS: This is an

ecological study whose unit of analysis was 482 RIAU in three periods (2001 to 2005, 2006

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A juventude perdida no Brasil: desigualdades socioeconômicas e espaciais na mortalidade de jovens por

violência 65

to 2010 and 2011 to 2015). The spatial distribution, intensity and significance of the clusters

were analyzed using the Moran Global, MoranMap and LisaMap index. RESULTS: the

regions that presented the highest rates in the first period were Foz do Iguaçu - PR (47.03

deaths/ 100 thousand inhabitants), Recife - BA (41,03) and Vitória - ES (36,57), in the

second: Maceió - AL (43,95) and Porto Seguro - BA (40,40) and in the third:. (56.47), Porto

Seguro - BA (51.65) and Maceió - AL (47.83). The values of the Moran Global Index were

positive and with significant tests, being more expressive in the period from 2011 to 2015,

representing for both sexes (I = 0.54438, p = 0.01), for males (I = 0.546006, p = 0.01), and for

the female (I = 0.329374, p = 0.01). CONCLUSIONS: Mortality due to violence is unevenly

distributed in the RIAU, with clusters in the north, northeast and southeast of the country and

presenting spatial autocorrelation.

Keywords: Mortality. Violence. Young. Spatial distribution.

Introdução

Para a Organização Mundial de Saúde, a violência é caracterizada como o uso

intencional da força física ou do poder, real ou em ameaça, contra si próprio, contra outra

pessoa, contra um grupo ou uma comunidade, que resulte ou tenha grande possibilidade de

resultar em lesão, morte, dano psicológico, deficiência de desenvolvimento ou privação1. No

Brasil, a mortalidade por violência tem se destacado de forma expressiva, sendo uma

preocupação para as esferas políticas e sociais, não só pelos danos físicos e psíquicos que ela

impõe, como também pelo número de óbitos ocasionados.

Atualmente, cerca de um terço dos homicídios do mundo acontece na América Latina,

apesar da região concentrar apenas 8% da população mundial. Com quase 60.000 assassinatos

por ano, o Brasil responde sozinho por 11% do total global de homicídios. A maioria desses

crimes ocorre em zonas urbanas, onde 80% dos latino-americanos e 85% dos brasileiros

residem. Nesse contexto, não é de surpreender que 41 das 50 cidades mais violentas do

mundo estejam mapeadas em países latino-americanos. Em 2016, dentre as 50 cidades mais

violentas, 21 eram brasileiras.2 A evolução histórica da mortalidade violenta no Brasil

impressiona pelos quantitativos implicados. O Mapa da violência (2014) mostra que entre os

anos 1980 e 2012, morreram no país 1.202.245 pessoas vítimas de homicídio. Em 2012,

nenhuma capital do Brasil esteve abaixo do nível epidêmico.3

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violência 66

No Brasil, a violência afeta a população de modo desigual, gerando riscos

diferenciados em função de gênero, raça/cor, idade e espaço social.4 Está em curso no país um

processo gradativo de vitimização letal da juventude, em que os mortos são jovens cada vez

mais jovens. Os dados mostram um recrudescimento do problema, uma vez que, entre 2005 e

2015, observou-se um aumento de 17,2% na taxa de homicídio de indivíduos entre 15 e 29

anos. A taxa de homicídios de jovens em 2015 foi de 60,9 para cada grupo de 100 mil

jovens.5 De acordo com o Relatório de Vulnerabilidade Juvenil à Violência, 2014, o

panorama nacional apresenta taxa de homicídio entre jovens negros 155% maior que de

jovens brancos.6 No cenário brasileiro, observa-se quase uma exclusiva masculinidade das

vítimas, sendo estes vítimas principalmente dos homicídios por arma de fogo.7

Devido às amplas dimensões que assume nos cenários da vida moderna, esse evento

tornou-se objeto multidisciplinar e interdisciplinar de estudo de outras áreas do conhecimento8,

já que a violência é resultado de processos sócio históricos de causalidade complexa, não se

tratando de evento único e sim múltiplo9, e como fenômeno complexo, multifacetário e

resultante de múltiplas determinações articula-se intimamente com processos sociais que se

assentam, em última análise, numa estrutura social desigual e injusta.10

Os jovens estão

imersos em contextos nos quais se manifestam distintas violências. A violência estrutural

submete os jovens a situações de extrema desigualdade e exclusão pela falta de acesso à

escola, educação de qualidade e profissionalização, o que os impede de integrar-se ao

mercado de trabalho formal possibilitando a sua inserção no mercado informal, em situações

de subemprego ou mesmo a ociosidade.11

Tem se observado que o jovem se relaciona com a violência, de maneira geral e,

especificamente no caso dos homicídios, de forma ambivalente. Ora são vítimas, ora são

autores desses eventos. Essa relação complexa suscita a necessidade de compreender a

dinâmica do fenômeno dos homicídios nesse grupo específico.1

Buscando intervir sobre a violência interpessoal (agressões/homicídios), o Ministério

da Saúde, lançou a Portaria MS/GM nº 737 de 16/05/2001, que contempla a Política Nacional

de Redução da Morbimortalidade por Acidentes e Violências (BRASIL, 2001). Esta Política

trata da temática da violência como um problema social e histórico e com isso busca

programar ações e políticas de promoção da saúde, procurando diminuir as vulnerabilidades

às violências.12

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violência 67

As análises de situação em saúde, no que se refere às análises da distribuição dos

eventos de saúde em relação aos grupos sociais e no espaço geográfico têm sido úteis para

mensurar tais desigualdades em saúde. Essas análises buscam identificar na estrutura espacial

e nas relações sociais que ela encerra associações plausíveis com os processos de adoecimento

e morte nas coletividades. Os estudos realizados para diagnosticar áreas de riscos à violência

têm sido ferramentas úteis que podem contribuir cada vez mais com o campo da vigilância

epidemiológica, no monitoramento e colaboração para o planejamento de ações em áreas de

riscos e intervenções de forma articulada com outros setores.

Diante do exposto, o objetivo dessa pesquisa é analisar a distribuição espacial da

mortalidade de jovens por causas violentas nas Regiões Imediatas de Articulação Urbana do

Brasil.

Métodos

Trata-se de estudo ecológico de múltiplos grupos, cuja unidade de análise foram as

482 Regiões Imediatas de Articulação Urbana do Brasil (RIAU). O objeto deste estudo foi à

mortalidade por violência na população jovem. No Brasil, o Estatuto da juventude, através da

Lei no 12.852/2013, são consideradas jovens as pessoas com idade entre 15 (quinze) e 29

(vinte e nove) anos de idade (BRASIL, 2013).

Foram analisados os ocorridos de 01 de janeiro de 2001 a 31 de dezembro de 2015,

decorrente das categorias X85-Y09 e Y35-Y36 (Agressões e Intervenção legal e Operações de

guerra) de acordo com o capítulo XX da 10ª Revisão da Classificação Estatística Internacional

de Doenças e Problemas Relacionados à Saúde (CID-10). O número de óbitos foi obtido de

forma secundária, coletados do Sistema de Informação sobre Mortalidade (SIM) do

Departamento de Informática do Sistema Único de Saúde (Datasus).

Os dados de população por município e por idade foram obtidos das informações do

Censo 2010 e das projeções intercensitárias, no sítio do Instituto Brasileiro de Geografia e

Estatística. As taxas brutas de mortalidade foram padronizadas pelo método direto,

considerando a população padrão brasileira e expressas por 100.000 habitantes por ano.

As taxas brutas foram padronizadas pelo método direto, considerando a população

padrão brasileira na metade do período e são expressas por 100.000 habitantes por ano. A

Taxa de Mortalidade Padronizada (TMP) foi calculada para três quinquênios (2001 a 2005,

2006 a 2010 e 2011 a 2015).

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A juventude perdida no Brasil: desigualdades socioeconômicas e espaciais na mortalidade de jovens por

violência 68

A análise de dependência espacial foi executada utilizando-se o índice de Moran

Global que estima a autocorrelação espacial, podendo variar entre -1 e +1. A avaliação do

padrão de distribuição do evento foi realizada por meio do Moran local (Local Indicators of

Spatial Association – LISA). Para tanto, foram construídos os BoxMap e MoranMap relativos

às TMP. O BoxMap apresenta os clusters, independente da significância estatística, enquanto

o MoranMap apenas aqueles com valor de p<0,05. Para a validação do Índice de Moran

Global e Local, foi utilizado o teste de permutação aleatória, com 99 permutações.

Os riscos relativos calculados neste trabalho são referentes TMP para os jovens na

faixa de 15 a 29 anos, para os quinquênios (2001 a 2005, 2006 a 2010 e 2011 a 2015), de

acordo com o sexo, cor da pele e meio utilizado. Neste estudo, os riscos relativos foram

calculados de acordo com quatro dimensões: 1_Sexo: (masculino versus feminino); 2_Cor da

pele (negros: pretos e pardos versus brancos); 3_Idade da vítima (indivíduos de 20 a 24 anos,

versus 15 a 19 anos e de 20 a 24 anos, versus 25 a 29 anos); 4_Meio utilizado (arma de fogo

versus arma branca).

Essa pesquisa utilizou dados secundários disponíveis em sites oficiais do Ministério da

Saúde do Brasil sem identificação de sujeitos, sendo dispensado de apreciação em comitê de

ética em pesquisa, em conformidade com a Resolução 466∕2012 do Conselho Nacional de

Saúde.

Resultados

A mortalidade de jovens em decorrência de violência por RIAU do Brasil para o sexo

masculino registrou TMP de 27,64 óbitos/100 mil habitantes no primeiro quinquênio (2001 a

2005) e 30,29 óbitos/100 mil habitantes para o terceiro (2011 a 2015); para o sexo feminino,

apresentou TMP de 1,82 óbitos/100 mil habitantes (2001 a 2005) e de 2,00 óbitos/100 mil

habitantes para o período de 2011-2015.

Quanto à medida do tipo razão, foi maior na faixa de 20 a 24 anos: com razão de 17,03

(2001 a 2005), 16,14 (2006 a 2010) e 16,80 (2011 a 2015); para ambos os sexos foi maior na

população de cor de pele negra/parda em relação à branca: 1,80 (2001 a 2005), 2,65 (2006 a

2010) e 3,41 (2011 a 2015). Já a razão por tipo de arma, apresentou 6,45 (2001 a 2005), 6,01

(2006 a 2010) e 6,54 (2011 a 2015), segundo a razão arma de fogo/ arma branca (Tabela 1).

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A juventude perdida no Brasil: desigualdades socioeconômicas e espaciais na mortalidade de jovens por

violência 69

Tabela 1 – Caracterização da mortalidade de jovens em decorrência de violência por RIAU do Brasil

nos quinquênios: 2001 a 2005, 2006 a 2010 e 2011 a 2015. Brasil, 2018.

VARIÁVEL CATEGORIA 2001 a 2005 2006 a 2010 2011 a 2015

TAXA

Sexo (TMP)

Masculino 27,64 27,12 30,29

Feminino 1,82 1,84 2,00

Ambos 14,60 14,36 16,02

Faixa Etária

15 a 19 anos 44,46 44,78 54,19

20 a 24 anos 65,81 65,06 73,23

25 a 29 anos 58,74 55,66 60,65

Raça/ Cor Branca 9,91 7,68 6,99

Negra 44,46 44,78 54,19

RAZÃO

Sexo (Masculino/

Feminino por faixa

etária)

15 a 19 anos 13,20 13,55 14,37

20 a 24 anos 17,03 16,14 16,8

25 a 29 anos 14,19 13,54 13,32

15 a 29 anos (ambos sexos) 14,89 14,47 14,83

Faixa etária por sexo

Masc (20 a 24/ 15 a 19 anos) 1,44 1,43 1,23 Fem (20 a 24 / 15 a 19 anos) 1,12 1,20 1,05

Ambos (20 a 24 / 15 a 19 anos) 1,42 1,41 1,22

Raça/ Cor

(Pretos/ brancos)

Feminino 1,24 1,67 2,37

Masculino 1,85 2,74 3,51

Ambos os sexos 1,80 2,65 3,41

Tipo de objeto (Arma

de fogo/ Arma branca)

Feminino 3,09 2,60 2,47

Masculino 6,85 6,45 7,13

Ambos os sexos 6,45 6,01 6,54

Fonte: Datasus, Sistema de Informação sobre Mortalidade – SIM.

A análise espaço-temporal da TMP (óbitos/100 mil habitantes) apresentou diferenças

expressivas em relação ao sexo. Para o sexo masculino, de 2001 a 2005 as taxas padronizadas

foram mais elevadas em Foz do Iguaçu (91,34), Recife (80,30) e Vitória com (69,23); de 2006

a 2010, destacaram-se Foz do Iguaçu (92,83), Maceió (86,86) e São Miguel dos Campos

(77,08); e de 2011 a 2015, São Miguel dos Campos – AL (111,02), Porto Seguro – BA

(99,72) e Maceió – AL (94,73).

Para o sexo feminino, as maiores TMP no primeiro quinquênio foi em Vila Rica – MT

(11,47), Palmas – TO (7,00) e Foz do Iguaçu – PR (5,89); no segundo quinquênio, em

Linhares – ES (6,89), Foz do Iguaçu – PR (6,34) e Aracruz – ES (5,93); no terceiro

quinquênio: Quirinópolis – GO (6,28), Porto Seguro – BA (6,13), e Jussara – GO (5,46).

Os valores do I de Moran foram positivos para todos os períodos estudados e com

testes significativos, sendo mais expressivo no período de 2011 a 2015, representando para

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A juventude perdida no Brasil: desigualdades socioeconômicas e espaciais na mortalidade de jovens por

violência 70

ambos os sexos (I = 0.54438, p= 0.01), para o sexo masculino (I = 0.546006, p= 0.01), e para

o feminino (I=0.329374, p=0.01), podendo-se assegurar que existe um padrão de dependência

espacial na distribuição das taxas para as regiões. Verifica-se, também, um aumento na força

de correlação de quinquênio a quinquênio (Figura 1).

Figura 1 – Espacialização da Taxa de Mortalidade Padronizada (100.000 habitantes) por

RIAU. Brasil, 2018.

A1= 1º Quinquênio – TMP para ambos os sexos; A2= 2º Quinquênio – TMP para ambos os sexos; A3= 3º

Quinquênio – TMP para ambos os sexos;

B1= 1º Quinquênio – TMP para o sexo masculino; B2= 2º Quinquênio – TMP para o sexo masculino; B3= 3º

Quinquênio – TMP para o sexo masculino;

C1= 1º Quinquênio – TMP para o sexo feminino; C2= 2º Quinquênio – TMP para o sexo feminino; C3= 3º

Quinquênio – TMP para o sexo feminino.

Fonte: Datasus, Sistema de Informação sobre Mortalidade – SIM.

Na análise do BoxMap (Figura 2), observa-se que durante os três quinquênios

destacam-se áreas no norte, nordeste e sudeste do Brasil, aglutinando regiões cujos valores

para a média das TMP são altas e cercadas daqueles que também apresentam valores altos,

principalmente no período de 2011 a 2015. Na região nordeste, formaram clusters de elevadas

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A juventude perdida no Brasil: desigualdades socioeconômicas e espaciais na mortalidade de jovens por

violência 71

taxas as RIAU de Natal, Santa Cruz e João Câmara, no Rio Grande do Norte; no Ceará, as

RIAU de Fortaleza, Canindé e Quixadá; na Paraíba, João Pessoa e Campina Grande; em

Pernambuco, Recife com Limoeiro, e Caruaru; em Alagoas, Maceió com Arapiraca; na Bahia,

Salvador com Feira de Santana. Na região sudeste, destaque para as RIAU de Vitória, Aracruz

e Colatina Espírito Santo; no Rio de Janeiro, a capital Rio de janeiro, com Macaé, Cabo Frio,

Volta Redonda.

Figura 2 – Box Map da Taxa de Mortalidade padronizada (TMP) por violência (agressão) por

RIAU no Brasil de acordo com o sexo e por quinquênio. Brasil, 2018.

A1– Box Map da TMP para ambos os sexos no período de 2001-2005; A2– Box Map da TMP para

ambos os sexos no período de 2006-2010; A3– Box Map da TMP para ambos os sexos no período de

2011-2015; B1– Box Map da TMP para o sexo masculino no período de 2001-2005; B2– Box Map da

TMP para o sexo masculino no período de 2006-2010; B3– Box Map da TMP para o sexo masculino

no período de 2011-2015; C1– Box Map da TMP para o sexo feminino no período de 2001-2005; C2–

Box Map da TMP para o sexo feminino no período de 2006-2010; C3– Box Map da TMP para o sexo

feminino no período de 2011-2015. Fonte: Datasus, Sistema de Informação sobre Mortalidade – SIM.

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A juventude perdida no Brasil: desigualdades socioeconômicas e espaciais na mortalidade de jovens por

violência 72

O Índice de Moran Global obteve valor superior a zero e p-valor inferior a 0,05 para

todos os períodos analisados, rejeitando a hipótese nula de aleatoriedade dos dados e

concluindo que as regiões imediatas seguem a tendência de agrupamentos. O MoranMap da

TMP por RIAU, mostra na cor mais escura as áreas consideradas significantes (>95%).

Evidenciou-se polarização em áreas periféricas principalmente na espacialização da TMP

masculina. Já para as taxas femininas, observam-se aglomerados de áreas de elevadas taxas

nas regiões Centro Oeste e Norte do Brasil (Figura 3).

Figura 3 – Moran Map da Taxa de Mortalidade padronizada (TMP) por violência (agressão)

por RIAU no Brasil de acordo com o sexo e por quinquênio. Brasil, 2018.

A1– Moran Map da TMP para ambos os sexos no período de 2001-2005; A2– Moran Map da TMP

para ambos os sexos no período de 2006-2010; A3– Moran Map da TMP para ambos os sexos no

período de 2011-2015; B1– Moran Map da TMP para o sexo masculino no período de 2001-2005; B2–

Moran Map da TMP para o sexo masculino no período de 2006-2010; B3– Moran Map da TMP para o

sexo masculino no período de 2011-2015; C1– Moran Map da TMP para o sexo feminino no período

de 2001-2005; C2– Moran Map da TMP para o sexo feminino no período de 2006-2010; C3– Moran

Map da TMP para o sexo feminino no período de 2011-2015. Fonte: Datasus, Sistema de Informação sobre Mortalidade – SIM.

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A juventude perdida no Brasil: desigualdades socioeconômicas e espaciais na mortalidade de jovens por

violência 73

Os resultados do presente estudo indicam grandes disparidades regionais quanto à

distribuição das taxas de mortalidade juvenil por violência quando analisadas sob a

perspectiva de gênero e cor da pele, acometendo prioritariamente jovens de 20 a 24 anos,

negros e pardos do sexo masculino. Destaca também que a maior proporção desses

homicídios acontece com a utilização de armas de fogo.

O estudo intitulado “Mortalidade de jovens brasileiros: perfil e tendências no período

2000-2012” mostrou que do total dos óbitos de jovens por causas externas ocorridos no

período de 2000 a 2012, 54,6% foram por agressões.13

No estudo que analisou os dados do

inquérito VIVA, os adultos jovens, entre 20 a 29 anos (34,8%), representaram o principal

perfil das vítimas de violência atendidas em serviços de urgência/emergência do Sistema

Único de Saúde durante 2009.14

O crescente aumento nas taxas de mortalidade por causas externas entre os jovens

pode representar a confirmação de que estes estão mais expostos a uma série de fatores de

risco que não se apresenta em outras faixas etárias. O drama da juventude perdida possui duas

faces: De um lado a perda de vidas humanas e do outro, a falta de oportunidades educacionais

e laborais que condenam os jovens a uma vida de restrição material e de anomia social, que

terminam por impulsionar a criminalidade violenta.15

Esse fato é relevante, pois atinge a

maioria da população jovem em idade produtiva, trazendo consequências graves que

envolvem altos custos sociais, emocionais e econômicos, além de trazer danos incalculáveis

para as famílias e para o país. Enquanto as representações governamentais não reagirem com

políticas consistentes, se continuará a assistir a esse extermínio dos jovens brasileiros movido

pela violência como forma de expressão.

Os resultados do presente estudo apoiam a assertiva de que está em curso no Brasil o

genocídio da população jovem e negra. Os números se destacam e revelam que a morte

sistemática de jovens negros é uma realidade.16

No Brasil a cada 100 pessoas vítimas de

homicídio, 71 são negras. Esse dado confirma que apesar dos avanços quanto a indicadores

socioeconômicos e das condições de vida da população brasileira entre 2005 e 2015, o país

permanece desigual e que a população negra ainda é a principal vítima da violência.15

23,5% mais chances de um cidadão negro sofrer assassinato que pessoas de outras

raças/cores.17

A Região Norte seguida da Região Nordeste, evidenciaram maior crescimento

no número de homicídios negros: 125,5% e 96,7% respectivamente, entre os anos 2002 e

2010.18

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A juventude perdida no Brasil: desigualdades socioeconômicas e espaciais na mortalidade de jovens por

violência 74

A condição de saúde pregressa e atual da população negra no Brasil delineia-se a partir

da construção histórica do país e sua estreita relação com perfil econômico e produtivo

evidenciado desde os primórdios de sua colonização. As desvantagens da população negra se

propagam até os dias atuais, são significativas e refletem na capacidade de inserção dos

negros na sociedade colocando barreiras no projeto de construção de um país democrático

com oportunidades iguais para todos.19

De acordo com o último censo demográfico, de 2010,

a população brasileira é constituída majoritariamente de negros: são 15 milhões de pretos

(7,6%) somados a 82 milhões de pardos (43,1%), totalizando mais de 50% da população

brasileira.20

Entre os indicadores socioeconômicos, os números comprovam estas

desigualdades: entre os estudantes de 18 a 24 anos, 66,6% dos estudantes brancos

frequentavam o ensino superior, enquanto apenas 37,4% dos jovens estudantes pretos ou

pardos cursavam o mesmo nível21

; os negros possuem nível de renda per capita familiar

menor que os brancos, sendo mais numerosos nas faixas de rendimento com menos de 0,5

salário mínimo de renda mensal per capita familiar; famílias chefiadas por brancos

apresentam maior incidência de moradias em situação adequada, se comparadas com as

moradias chefiadas por negros22

; na avaliação de sua situação de saúde como negativa, os

brancos tem menor proporção de autoavaliação negativa (27,75%), em comparação com

pretos (40,07%) e pardos (34,97%).23

Esse acúmulo de vulnerabilidades sociais e a ausência

de políticas públicas representam fatores de risco associados à violência homicida.6

As desigualdades nas taxas de mortalidades por violência observadas neste estudo são

expressas na distribuição espacial entre as regiões brasileiras no Brasil. A região norte e em

toda faixa litorânea do nordeste do país se destacam com as maiores taxas de mortalidade.

Segundo o Índice de vulnerabilidade juvenil à violência e desigualdade racial 2014, as quatro

unidades da federação que apresentam maior IVJ – Violência e Desigualdade Racial estão no

Nordeste, sendo elas, em ordem: Alagoas, Paraíba, Pernambuco e Ceará. Os resultados do

presente estudo refletem em boa medida a tendência já verificada na última década de

expressivo crescimento da violência letal entre os estados do Nordeste.6

Ainda sobre expansão da violência, nota-se a difusão dos homicídios das grandes

regiões metropolitanas para os municípios do interior do país, sobretudo no Norte, Nordeste,

no estado de Goiás, no norte de Minas Gerais e outros polos regionais.15,17

Este estudo aponta

Alagoas como a região imediata que lidera no terceiro quinquênio com as maiores taxas de

mortalidade no Brasil. Reforçando esse achado, o mapa da violência 2011 aponta que Alagoas

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A juventude perdida no Brasil: desigualdades socioeconômicas e espaciais na mortalidade de jovens por

violência 75

como um estado que em pouco tempo passou a liderar o triste ranking da violência do país.11

No Estado de Alagoas, período 2004/2012, houve um crescimento de 97,6% nos casos de

homicídios juvenis.25

A magnitude e o crescimento nas taxas de mortalidade por homicídio entre jovens, em

especial o jovem do sexo masculino no Brasil segue a tendência mundial. A implantação de

políticas alternativas, integradoras e sobretudo inclusivas, dirigidas para os jovens poderia

diminuir os índices de violência e, portanto, resolveria parcela considerável do problema.

Entretanto, também é necessário realizar uma profunda reflexão sobre os valores, as formas

de socialização e a construção das identidades masculina e feminina nas sociedades atuais.26

O presente estudo demonstrou que a utilização de armas de fogo desponta como a

principal forma utilizada para o desfecho de um homicídio. Atualmente, não se pode falar de

homicídio no Brasil e no mundo sem que venha à tona a evidência do envolvimento e da

contribuição das armas de fogo, que movimentam um dos maiores mercados da economia

global.27

O acesso a armas de fogo tem sido tópico de discussões na cena acadêmica e política

brasileira e mundial. No Brasil, 71% dos homicídios são perpetrados com o uso de armas de

fogo, legais ou ilegais. A letalidade e o fácil acesso a este instrumento, quando associados a

uma sociedade violenta, potencializam o risco de que conflitos de ordem diversa terminem em

mortes.6

A Lei de armas de fogo nº 10.826/2003, conhecida como “Estatuto do desarmamento”

ou “Lei do desarmamento,” no Brasil não conseguiu atender aos preceitos expressos em tal

legislação, onde seu objetivo maior seria a redução da criminalidade por arma de fogo. Por

sua vez, as medidas tímidas adotadas contribuíram para um entendimento fatalista em relação

a esse fenômeno e fortaleceram ideias de enfraquecimento do Estado e suas instituições diante

da criminalidade, gerando medo e sensação de insegurança nos sujeitos e no imaginário

coletivo.4

A distribuição espacial da violência homicida, tem se revelado uma fonte

particularmente profícua de descobertas para a análise dos fatores que incidem na produção e

reprodução da violência homicida. Este estudo permitiu identificar importantes características

relacionadas às mortes por violência bem como as mudanças nos padrões de distribuição

espacial verificados nos 15 anos analisados. A violência apresenta um caráter epidêmico no

Brasil, com migração das grandes cidades e das capitais brasileiras para as regiões de menor

porte, corroborando a teoria da interiorização da violência no Brasil. Além disso, mostrou o

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violência 76

aprofundamento das desigualdades sociais apontando que a população negra é a principal

vítima da violência letal, e que esse quadro se aprofundou nas últimas décadas. Ademais, a

violência imposta contra os jovens do sexo masculino com utilização de armas de fogo impõe

novos desafios à sociedade brasileira, considerando o momento atual em que se discutem as

políticas de desarmamento no país.

A limitação desse estudo está relacionada à utilização de dados secundários sobre

mortalidade que está sujeito ao subregistro, apesar de nos últimos anos reconhecer-se que o

Sistema de Informação sobre Mortalidade (SIM) no Brasil obteve ganhos significativos

quanto à qualidade da informação do registro de óbito no sistema.

As contribuições deste estudo, por sua vez, referem-se aos subsídios gerados para

políticas públicas com ênfase nas ações preventivas, territorialmente determinadas, que

poderão ser usadas como critério para repartição mais equânime dos recursos públicos, com

políticas orientadas para a priorização das regiões que apresentam os piores indicadores.

Referências

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2002.

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A juventude perdida no Brasil: desigualdades socioeconômicas e espaciais na mortalidade de jovens por

violência 77

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A juventude perdida no Brasil: desigualdades socioeconômicas e espaciais na mortalidade de jovens por

violência 78

5.2 ARTIGO 2

A JUVENTUDE PERDIDA NO BRASIL: ANOS POTENCIAIS DE VIDA

PERDIDOS POR VIOLÊNCIA NAS REGIÕES IMEDIATAS DE ARTICULAÇÃO

URBANA DO BRASIL

Título resumido: A juventude perdida no Brasil

Artigo submetido: Revista Cadernos Saúde Coletiva

Resumo

Objetivo: Analisar os Anos Potenciais de Vida Perdidos (APVP) devido às mortes violentas

de jovens nas Regiões Imediatas de Articulação Urbana (RIAU). Métodos: Trata-se de estudo

ecológico nas 482 RIAU, onde foram analisados dados sobre óbitos por violência,

considerando o indicador APVP para a distribuição espacial. Resultados: As mortes violentas

de jovens no Brasil determinaram 6.435.042,5 APVP de 2001 a 2005, 6.494.960 de 2006 a

2010 e 7.216.005 de 2011 a 2015. O número médio de APVP/óbito foi 47,5 anos, com idade

em média do óbito de 22,5 anos. A Razão da Taxa de APVP por sexo foi de 15,16 de 2001 a

2005, 14,76 de 2006 a 2010 e de 15,14 de 2011 a 2015. Observa-se a sobremortalidade

masculina para todos os quinquênios, assim como para a população negra se comparando à

branca, com concentração das maiores taxas nas regiões norte e nordeste do Brasil.

Conclusões: O Brasil apresentou um elevado número de anos de vida perdidos por violência,

indicando grandes disparidades regionais, por sexo e por cor da pele para a mortalidade por

estas causas.

Descritores: Mortalidade. Violência. Jovens. Anos Potenciais de Vida Perdidos.

Abstract

Objective: To analyze the Years of Life Lost (YLL) due to the violent deaths of young

people in the Immediate Regions of Urban Articulation (RIAU). Methods: This is an

ecological study in 482 RIAU, where data on violence deaths were analyzed, considering the

YLL indicator for the spatial distribution. Results: Violent youth deaths in Brazil determined

6,435,042.5 PYLL from 2001 to 2005, 6,494,960 from 2006 to 2010 and 7,216,005 from

2011 to 2015. The mean number of YLL / deaths was 47.5 years, with an average age of 22.5

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A juventude perdida no Brasil: desigualdades socioeconômicas e espaciais na mortalidade de jovens por

violência 79

years. The ratio of YLL to sex ratio was 15.16 from 2001 to 2005, 14.76 from 2006 to 2010

and 15.14 from 2011 to 2015. Male overweight is observed for all quinquennia, as well as for

black population compared to white, with concentration of the highest rates in the northern

and northeastern regions of Brazil. Conclusions: Brazil presented a high number of years of

life lost due to violence, indicating large regional disparities, by sex and skin color, for

mortality from these causes.

Keywords: Mortality. Violence. Young. Years of Life Lost.

Introdução

A evolução da mortalidade violenta no Brasil impressiona pelos quantitativos

implicados. Entre os anos 1980 e 2012, morreram 1.202.245 pessoas por homicídio e

nenhuma capital do país em 2012, esteve abaixo do nível epidêmico1.

Se a magnitude de homicídios correspondentes ao conjunto da população já pode ser

considerada muito elevada, a relativa ao grupo jovem adquire caráter de verdadeira pandemia.

A morte violenta de jovens, sobretudo nos grandes centros urbanos, é um problema que vem

desde a década de 1980 suscitando preocupações no cenário nacional2.

Nas faixas etárias que compreendem os adolescentes e os adultos jovens, dos 15 aos

29 anos, as taxas de homicídios são extraordinariamente mais altas do que as verificadas na

população como um todo3. No ano 2015, o homicídio como causa de mortalidade da

juventude masculina correspondeu a 47,8% dos óbitos; uma tragédia com implicações na

saúde, na dinâmica demográfica e no processo de desenvolvimento econômico e social do

país4. Embora esses números impressionem, as taxas de mortes violentas só refletem uma

parte do problema cuja magnitude dos eventos não letais é ainda muito maior3.

O drama da juventude perdida possui duas faces. De um lado a perda de vidas

humanas, e do outro a falta de oportunidades educacionais e laborais que condenam os jovens

a uma vida de restrição material e de anomia social, que terminam por impulsionar a

criminalidade violenta4. É nesta fase que os jovens se abrem para o mundo e por isso se

tornam mais expostos e vulneráveis aos riscos de eventos violentos. As tensões e ansiedades

geradas por uma identidade constantemente ameaçada e que necessita ser reforçada por meio

de comportamentos reafirmadores, viris e agressivos, torna-os agentes de violência e das

agressões que os transformam em alvo da violência5.

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A juventude perdida no Brasil: desigualdades socioeconômicas e espaciais na mortalidade de jovens por

violência 80

Vários estudos no país têm mostrado que a violência afeta a população de modo

desigual, gerando riscos diferenciados em função de gênero, raça/cor, idade e espaço social.

Não há um consenso acerca das causas associadas aos agravos violentos, sendo apontando

como um evento multicausal6. Dentre estas causas está a violência estrutural que submete os

jovens a situações de extrema desigualdade e exclusão pela falta de acesso à escola, educação

de qualidade e profissionalização, o que os impede de integrar-se ao mercado de trabalho

formal possibilitando a sua inserção no mercado informal, em situações de subemprego ou

mesmo a ociosidade7.

O custo para os países das perdas dos jovens são imensuráveis e irreparáveis. É uma

perda para as famílias e para a sociedade de forma geral, e expressivamente para a economia

do país. A prevenção das mortes violentas representa um grande desafio pela necessidade de

resposta e articulação com diferentes áreas, demandando uma ação interdisciplinar, além do

envolvimento dos vários setores da sociedade civil e das organizações governamentais8.

O objetivo deste trabalho foi analisar os anos potenciais de vida perdidos devido às

mortes de jovens por violência nas Regiões Imediatas de Articulação Urbana do Brasil.

Métodos

Trata-se de estudo ecológico de múltiplos grupos, cuja unidade de análise foram as 482

Regiões Imediatas de Articulação Urbana do Brasil (RIAU).

A mortalidade por violência, cujos óbitos constituem a somatória das categorias X85-

Y09 e Y35-Y36 (Agressões e Intervenção Legal e Operações de guerra) de acordo com o

capítulo XX da 10ª Revisão da Classificação Estatística Internacional de Doenças e

Problemas Relacionados à Saúde (CID-10), representada pela Taxa de Mortalidade

Padronizada (TMP). Para o cálculo da TMP foi utilizada o número de óbitos na população da

faixa de 15 a 29 anos ocorridos no período de 01 de janeiro de 2001 a 31 de dezembro de

2015, distribuídos em três quinquênios (2001 a 2005, 2006 a 2010 e 2011 a 2015). A TMP foi

analisada de acordo com o sexo, a cor da pele e a região geográfica.

O número de óbitos foi obtido de forma secundária, coletados do Sistema de

Informação sobre Mortalidade (SIM) do Departamento de Informática do Sistema Único de

Saúde (Datasus). Foram excluídos os dados de óbitos referentes a municípios ignorados,

assim como informações incompletas relacionados ao sexo, faixa etária e local de ocorrência

do óbito. Os dados de população por município e por idade foram obtidos das informações do

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A juventude perdida no Brasil: desigualdades socioeconômicas e espaciais na mortalidade de jovens por

violência 81

Censo 2010 e das projeções intercensitárias, no sítio do Instituto Brasileiro de Geografia e

Estatística. As taxas brutas foram padronizadas pelo método direto, considerando a população

padrão brasileira e expressas por 100.000 habitantes por ano.

Para o indicador Anos Potenciais de Vida Perdidos – APVP por Morte Prematura, que

quantifica o número de anos de vida não vividos quando a morte ocorre em determinada idade

abaixo da qual se considera a morte prematura. Por esse estudo se tratar da mortalidade por

violência de jovens com idade de 15 a 29 anos, para o cálculo dos APVP por faixa etária fez-

se a distribuição em três faixas, a saber: faixa etária de 15 a 19 anos, de 20 a 24 anos e de 25 a

29 anos. Realizou-se a comparação dos valores de APVP entre grupos de indivíduos

classificados segundo raça/cor da pele (preta + parda, branca), residentes por RIAU, que

foram a óbito por violência no período de 2001 a 2015, dividido nos três quinquênios (2001 a

2005, 2006 a 2010 e 2011 a 2015). Os registros referentes a pretos e pardos foram avaliados

conjuntamente, denominados de população negra. Os indivíduos de raça/cor da pele amarela

ou indígena foram excluídos devido ao baixo número de ocorrências nesses grupos.

Na análise dos dados foram empregados como indicadores: número absoluto e número

médio de APVP, idade na qual, em média, os óbitos ocorreram e a taxa de APVP por 100.000

habitantes, especificados segundo sexo, faixa etária e raça/cor da pele (estimativas brutas e

padronizadas por idade, adotando-se o método direto e, como padrão, a população do Brasil,

do ano do meio de cada quinquênio utilizada como denominador, sendo para o quinquênio

2001 a 2005, a população do ano 2003, para o quinquênio 2006 a 2010, a população de 2008

e para o quinquênio 2011 a 2015, a população do ano 2013).

Para a obtenção do número de APVP é feita a distribuição dos óbitos por

agrupamentos de idade. Em seguida, multiplica-se o número de óbitos em cada intervalo de

idade pelo número de anos que faltam para atingir a idade limite de 70 anos. Essa diferença é

obtida a partir do ponto médio de cada faixa etária9.

O valor total de APVP foi obtido pela soma dos APVP em cada grupo etário

aplicando-se a fórmula: ∑ = αi 𝑥 𝑑i onde: ∑ = somatório, αi = diferença entre o limite superior

de idade (70 anos) e o ponto médio de cada faixa etária (15 a 19 anos – 52,5 anos restantes, de

20 a 24 anos – 47,5 anos restantes e de 25 a 29 anos – 42,5 anos restantes); 𝑑i = número de

óbitos por violência em cada faixa etária. No presente estudo, foram estipulados 15 e 70 anos

de idade, respectivamente, como limites inferior e superior para o cálculo do APVP.

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A juventude perdida no Brasil: desigualdades socioeconômicas e espaciais na mortalidade de jovens por

violência 82

Para o cálculo do número médio de APVP, que expressa a quantidade de anos que, em

média, cada óbito por violência subtraiu de uma pessoa (anos não vividos), dividiu-se o

número de APVP relativo a violência pelo número de óbitos ocorridos devido a essa mesma

causa. A idade em que, em média, a morte ocorreu foi obtida subtraindo-se o número médio

de anos não vividos por óbito por violência da idade máxima estipulada (70 anos). Por maior

praticidade operacional e pelos dados não diferirem daqueles obtidos diretamente, optou-se

por calcular a idade em que, em média, os óbitos ocorreram segundo a fórmula utilizada por

Peixoto & Souza10

.

Para a Taxa de APVP Padronizada por idade (TAPVPP) foi utilizado o método direto

de padronização de taxas. A necessidade de padronização deve-se à influência da composição

etária da população no cálculo dos indicadores10,11

. A população padrão utilizada foi a

população do Brasil (2003, 2008 e 2013) expressas por 100.000 habitantes por ano. As taxas

de APVP padronizadas por RIAU foram comparadas entre os quinquênios (2001 a 2005, 2006

a 2010 e 2011 a 2015). Para o cálculo das taxas de APVP Padronizada foram considerados os

seguintes grupos etários: de 15 a 19 anos, de 20 a 24 anos, de 25 a 29 anos e o total a

somatória dos APVP das referidas faixas etárias.

Calculou-se o número médio de APVP por óbito (APVP/óbito), que expressa o

número de anos que, em média, cada óbito por determinada causa subtraiu de uma pessoa

(anos não vividos), dividiu-se o número de APVP por violência pelo número de óbitos

ocorridos devido a essa mesma causa. Também foi calculada a Idade média de ocorrência do

óbito (idade média do óbito), ou seja, a idade em que, em média, a morte ocorreu foi obtida

subtraindo-se o número médio de anos não vividos devido à morte por violência da idade

máxima estipulada, 70 anos.

Para a Razão da taxa padronizada de APVP, segundo gênero (Razão TAPVPP),

calculou-se a TAPVPP do gênero masculino em relação ao feminino. E a razão do número

absoluto de APVP, segundo cor/ raça (Razão N APVP), pela cor da população negra em

relação à população branca.

Para a análise espacial, foi utilizado o software TerraView 4.2.2 para a elaboração dos

mapas temáticos com representação dos seguintes indicadores: Valores absolutos de APVP,

para ambos os sexos, para o sexo masculino e para o sexo feminino e por cor/raça por

quinquênios; Taxas padronizadas de APVP, por gênero e cor/ raça.

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A juventude perdida no Brasil: desigualdades socioeconômicas e espaciais na mortalidade de jovens por

violência 83

Essa pesquisa utilizou dados secundários disponíveis em sites oficiais do Ministério da

Saúde do Brasil sem identificação de sujeitos, sendo dispensado de apreciação em comitê de

ética em pesquisa, em conformidade com a Resolução 466∕2012 do Conselho Nacional de

Saúde.

Resultados

Foram registrados 127.232 (2001 a 2005), 128.586 (2006 a 2010) e 142.303 (2011 a

2015) óbitos por violências para o sexo masculino; para o sexo feminino apresentou 8.545

registros de óbitos para o primeiro quinquênio, 8.888 para o segundo e 9.595 para o terceiro.

As mortes violentas de jovens no Brasil determinaram 6.435.042.5 anos potenciais de vida

perdidos de 2001 a 2015, 6.494.960 para 2006 a 2010 e 7.216.005 para 2011 a 2015,

representando altas taxas de APVP padronizadas. O número médio de APVP/óbito de 47,5

anos/óbito e com idade média dos óbitos os 22,5 anos de idade. Observa-se a

sobremortalidade masculina para todos os quinquênios, assim como para a população negra se

comparando à população branca (Tabela 1).

As taxas de APVP padronizadas (105 habitantes) foi 1.309,65 para o sexo masculino e

de 86,38 para o sexo feminino no período de 2001 a 2005. A Razão da Taxa de APVP foi de

15.16 para este período. No segundo quinquênio, as taxas foram de 1.281,46 para o masculino

e 86.80 para o feminino, com razão de 14.76; para o terceiro quinquênio, de 1.439,32 para o

sexo masculino e 95,01 para o feminino com razão de sexo de 15,14.

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A juventude perdida no Brasil: desigualdades socioeconômicas e espaciais na mortalidade de jovens por violência 84

Tabela 1 – Anos Potenciais de Vida Perdidos por violência e indicadores relacionados para ambos os sexos, para o sexo masculino e para o sexo feminino para os

quinquênios 2001 a 2005, 2006 a 2010 e 2011 a 2015 por RIAU. Brasil, 2018.

Indicador 2001 a 2005 2006 a 2010 2011 a 2015

Masculino Feminino Ambos Masculino Feminino Ambos Masculino Feminino Ambos

Nº óbitos 127.232 8.545 1.357.86 128.586 8.888 1.374.83 142.303 9.595 1.519.11

Proporção de óbito por violência 44.12 11.42

37.38 43.66 11.83

37.19 46.12 13.08

39.77

Nº APVP 6.029.205.0

405.837.5 6.435.042.5

6.075.200.0

419.760.00

6.494.960.0 6.761.312.5 454.692.5

7.216.005.0

TAPVPP(105 Habitantes) 1.309.65

86.38

712.60 1.281.46

86.80 678.25

1.439.32

95.01

760.96

Nº médio APVP/óbito 47.39

47.49

47.39 47.25 47.23 47.24 47.51 47.39

47.51

Idade média do óbito 22.61

22.51

22.61 22.75 22.77 22.76 22.49 22.61

22.49

APVP População Negra 3.740.950.5

212.575.5

3.953.526.0

4.309.128.0

254.770.5

4.563.898.5

5.044.776.0

310.012.0

5.354.788.0

APVP População Branca 2.024.390.0

170.574.5

2.194.964.5

1.573.631.0

153.405.5

1.727.036.5

1.442.099.0

131.386.5

1.573.485.5

Razão APVP População Negra/

Branca

1.85

1.25

1.80

2.74 1.66 2.64 3.50 2.36 3.40

Nº óbitos: número total de óbitos; Nº APVP: número total de APVP; TAPVPP: taxa de APVP padronizada/100.000 habitantes.

Fonte: Datasus, Sistema de Informação sobre Mortalidade – SIM.

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A juventude perdida no Brasil: desigualdades socioeconômicas e espaciais na mortalidade de jovens por

violência 85

De 2001 a 2005, destacam-se as taxas de APVP de Foz do Iguaçu – PR (2.254,97/100

mil jovens), Recife – PE (1.951,17 /100 mil jovens) e Vitória – ES (1.743.41/100 mil jovens).

No segundo quinquênio, destacaram-se: Foz do Iguaçu – PR (2.314,64/100 mil jovens),

Maceió – AL (2.090,21 /100 mil jovens) e Porto Seguro – BA (1.925,42/100 mil jovens). No

terceiro quinquênio, as maiores taxas padronizadas foram registradas para a RIAU de São

Miguel dos Campos – AL (2.716,72/100 mil jovens), seguido por Porto Seguro- BA (2.490,65

/100 mil jovens) e Maceió-AL (2.299,73/100 mil jovens). Este cenário apresenta a região

nordeste com os piores resultados (Figura 1).

Observa-se a razão entre os sexos mais elevadas nas regiões imediatas da região

nordeste do país. As maiores razões de taxa de APVP padronizada por sexo, no primeiro

quinquênio foram Itabaiana – SE (de 100,26), Surubim – PE (de 44,16) e Nossa Senhora da

Glória-SE (de 41,44). No segundo quinquênio, as maiores razões foram observadas nas

regiões de Itamaraju-BA (69,03), Goiana-PE (de 56,91) e Propriá-SE (50,59). No terceiro

quinquênio, destacaram-se Ipiaú-BA, com razão de 56.76, São João del Rei – MG com 56.07

e Acaraú – CE com 52.11 (Figura 1).

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A juventude perdida no Brasil: desigualdades socioeconômicas e espaciais na mortalidade de jovens por

violência 86

Figura 1 – Taxa de Anos Potenciais de Vida Perdidos padronizadas para o sexo masculino (A1, A2,

A3) e feminino (B1, B2, B3) e a razão de sexo para os quinquênios 2001 a 2005 (C1), 2006 a 2010

(C2) e 2011 a 2015 (C3) por RIAU. Brasil, 2018.

A1= TAPVPP para o sexo masculino no 1º Quinquênio; A2= TAPVPP para o sexo masculino no 2º Quinquênio;

A3= TAPVPP para o sexo masculino no 3º Quinquênio;

B1= TAPVPP para o sexo feminino no 1º Quinquênio; B2= TAPVPP para o sexo feminino no 2º Quinquênio;

B3= TAPVPP para o sexo feminino no 3º Quinquênio;

C1= Razão de TAPVPP 1º Quinquênio por sexo (Masculino/Feminino); C2= Razão de TAPVPP 2º Quinquênio

por sexo (Masculino/Feminino); C3= Razão de TAPVPP 3º Quinquênio por sexo (Masculino/Feminino).

Fonte: Datasus, Sistema de Informação sobre Mortalidade – SIM.

A Espacialização dos APVP para o sexo masculino segundo cor/raça por RIAU

demonstrou formação de agregados de elevadas taxas nas regiões norte, nordeste, e sudeste,

padrão observado para os três quinquênios desse estudo. No primeiro quinquênio os números

mais expressivos de anos perdidos foram nas regiões imediatas do Rio de Janeiro – RJ com

(594.173,5 anos), São Paulo – SP (568.856,5 anos) e Recife – PE (346.193 anos). No segundo

quinquênio, os maiores valores de APVP foram registrado para o Rio de Janeiro – RJ

(460.265 anos) e Salvador (334.747 anos). E no terceiro quinquênio, foi o Rio de Janeiro – RJ

(376.069 anos), Salvador – BA (352.886 anos) e Recife – PE (224.070 anos) (Figura 2).

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A juventude perdida no Brasil: desigualdades socioeconômicas e espaciais na mortalidade de jovens por

violência 87

Figura 2– Espacialização dos Anos Potenciais de Vida Perdidos para o sexo masculino pela categoria

cor/ raça para os quinquênios 2001 a 2005, 2006 a 2010 e 2011 a 2015 por RIAU. Brasil, 2018.

A1= 1º Quinquênio; A2= 1º Quinquênio para a população negra; A3= 1º Quinquênio para a população branca.

B1= 2º Quinquênio; B2= 2º Quinquênio para a população negra; B3= 2º Quinquênio para a população branca;

C1= 3º Quinquênio; C2= 3º Quinquênio para a população negra; C3= 3º Quinquênio para a população branca; Fonte: Datasus, Sistema de Informação sobre Mortalidade – SIM.

Na distribuição dos APVP para o sexo feminino, poucas as regiões apresentaram

valores acima de 10.000, a saber: no primeiro quinquênio, São Paulo – SP (30.555 anos), Rio

de Janeiro – RJ (27.354 anos), Recife – PE (15.859,5 anos). No segundo quinquênio, Rio de

Janeiro – RJ (18.963,5 anos), Belo Horizonte (17.266 anos), Recife (17.072 anos). No terceiro

quinquênio, Salvador – BA (19.254,5, anos), Rio de Janeiro-RJ (16.490 anos), e Belo

Horizonte-BH (14.598,5 anos). Os valores mais elevados de APVP para a população negra

foram registrados no nordeste, centro-oeste e sudeste do país. Já para a população branca,

observa-se que não houve formação de agregados de mortalidade, apresentando valos

inferiores à da população negra, o que mostra que esta é bem menos atingida pela violência

(Figura 3).

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A juventude perdida no Brasil: desigualdades socioeconômicas e espaciais na mortalidade de jovens por

violência 88

Figura 3 – Espacialização dos Anos Potenciais de Vida Perdidos para o sexo feminino pela categoria

cor/ raça para os quinquênios 2001 a 2005, 2006 a 2010 e 2011 a 2015 por RIAU. Brasil, 2018.

A1= 1º Quinquênio; A2= 1º Quinquênio para a população negra; A3= 1º Quinquênio para a população branca.

B1= 2º Quinquênio; B2= 2º Quinquênio para a população negra; B3= 2º Quinquênio para a população branca;

C1= 3º Quinquênio; C2= 3º Quinquênio para a população negra; C3= 3º Quinquênio para a população branca; Fonte: Datasus, Sistema de Informação sobre Mortalidade – SIM.

Para evidenciar a desigualdade de raça/cor na mortalidade por violência no Brasil,

apresentou-se a distribuição espacial da razão de cor (População negra/ população branca).

Várias RIAU se destacaram por apresentar a razão acima de 10:1. No primeiro período do

estudo, destacam-se: Belém – PA, Castanhal – PA, Macau – RN, João Câmara – RN, João

Pessoa – PB, Campina Grande – PB, Recife – PE, Maceió – AL, Salvador – BA, Alagoinhas

– BA, Feira de Santana – BA, Ilhéus – Itabuna – BA, Porto Seguro – BA, Teófilo Otoni –

MG, Bambuí – MG, Piumhi – MG. Manaus – AM. No segundo período, somam-se as RIAU

citadas, Manaus – AM, Dianópolis – TO, Patos – PB. E no terceiro período, acrescentam-se

as RIAU de Boa Vista – RR, Vitória da Conquista – BA e Linhares – ES (Figura 4).

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A juventude perdida no Brasil: desigualdades socioeconômicas e espaciais na mortalidade de jovens por

violência 89

Figura 4 – Razão dos Anos Potenciais de Vida Perdidos pela categoria cor/ raça para ambos os sexos

(A1, A2, A3), para o sexo masculino (B1, B2, B3) e para o sexo feminino (C1, C2, C3) para os

quinquênios 2001 a 2005, 2006 a 2010 e 2011 a 2015 por RIAU. Brasil, 2018.

A1= 1º Quinquênio para ambos os sexos; A2= 2º Quinquênio para ambos os sexos; A3= 3º Quinquênio para

ambos os sexos.

B1= 1º Quinquênio para o sexo masculino; B2= 2º Quinquênio para o sexo masculino; B3= 3º Quinquênio para

o sexo masculino;

C1= 1º Quinquênio para o sexo feminino; C2= 2º Quinquênio para o sexo feminino; C3= 3º Quinquênio para o

sexo feminino;

Fonte: Datasus, Sistema de Informação sobre Mortalidade – SIM.

Discussão

Os resultados do presente estudo mostram que existem diferenciais na mortalidade por

violência entre as regiões imediatas de articulação urbana do Brasil, segundo sexo e cor da

pele. As regiões imediatas no nordeste se destacaram pelo maior número de perdas de anos

potencias, sendo estas perdas agravadas ao longo dos quinze anos estudados.

De acordo com a ONU (2013), houve um incremento dos anos de vida perdidos por

morte ou incapacidade na América Latina e na África Subsaariana, em decorrência de

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A juventude perdida no Brasil: desigualdades socioeconômicas e espaciais na mortalidade de jovens por

violência 90

homicídios12

. Nos anos 2000, países de baixas e médias rendas apresentaram taxas de

mortalidade por violência de 32,1/100 mil habitantes, enquanto países de alta renda

apresentaram taxas de 14,4 por 100 mil13

.

Atualmente, cerca de um terço dos homicídios do mundo acontece na América Latina,

apesar da região concentrar apenas 8% da população mundial. Com quase 60.000 assassinatos

por ano, o Brasil responde sozinho por 11% do total global de homicídios14

.

Comparativamente, a taxa brasileira de 24,3 por 100 mil habitantes supera os níveis de

homicídio observados no Quênia (20,1), Camarões (19,7), Angola (19,0) e Ruanda (17,1),

países reconhecidos internacionalmente como muito violentos. No ranking de 154 países com

dados disponíveis para 2012, o Brasil aparece entre os 12 com maiores taxas de homicídios

por 100 mil habitantes15

. A violência tem enraizamentos nas estruturas sociais, políticas e

econômicas do Brasil, assim como na consciência individual. A estrutura da sociedade

brasileira é hierarquizada, marcada por violência e autoritarismo generalizados, presente em

toda a sociedade como algo estrutural. Não se tratam de violências pontuais, mas de um

comportamento aceito, reproduzido e tido como aceitável, comum16

.

A idade média do óbito encontrada no presente estudo foi de 22,5 anos. Esses achados

corroboram os dados brasileiros que indicam que mais de 75% das mortes por agressão no

Brasil estão concentradas na faixa dos 15 aos 39 anos1. Um estudo realizado em São Paulo em

1999 mostrou que as idades entre 15 a 29 anos concentravam, mais do que qualquer outra, o

maior número de homicídios e os maiores coeficientes, determinando, assim, maiores perdas

precoces de vida17

. Indivíduos em plena capacidade produtiva e reprodutiva, com

consequências familiares (quer econômicas, quer afetivas) e de impacto na produção de

trabalho e riqueza no Brasil1.

O presente estudo dá notoriedade para o crescimento da violência na região nordeste e

para áreas externas aos grandes centros urbanos, que tradicionalmente concentravam o maior

número de mortes. Como descrito por Andrade & Diniz (2013)18

, de 1980 a 2010, houve uma

concentração dos homicídios nas capitais brasileiras. Porém, a partir da década de 1990,

houve a expansão da violência para as Regiões Metropolitanas, mesmo as capitais

continuando a registrar as mais elevadas taxas de homicídio. Segundo esses autores, a partir

do ano de 2010, o Brasil apresentou arrefecimento da mortalidade homicida nas capitais e

regiões metropolitanas e a expansão da violência para os demais municípios brasileiros.

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A juventude perdida no Brasil: desigualdades socioeconômicas e espaciais na mortalidade de jovens por

violência 91

A redução da mortalidade por violência nos grandes centros urbanos já foi destacado

em outros estudos. Em uma pesquisa realizada em São Paulo, foi verificado um significativo

decréscimo de 179.976 anos de vida perdidos entre 2000 e 2010, assim como a redução da

razão entre sexo pela taxa de APVP, de 13,87 no ano de 2000 para 7,91 em 201019

. Por outro

lado, alguns estudos destacaram a elevação das taxas em importantes centros urbanos no na

região nordeste do país. Na análise do ranking dos Disability-Adjusted Life Years (DALYs)

por causas externas no Brasil, as taxas mais elevadas de homicídios se concentram em

Alagoas e Pernambuco20

. Um estudo que analisou a mortalidade por agressão no estado do

Rio Grande do Norte, verificou uma variação de 350% no aumento das taxas de mortalidade

entre os anos 2000 e 201421

.

Uma das hipóteses que versam sobre os determinantes da violência urbana associa a

incidência criminal às formas diversas de desorganização e falta de coesão social. Neste

contexto, as comunidades locais, marcadas por um complexo sistema de associações formais

e informais, de relações de amizade e parentesco, contribuem para o processo de socialização

do indivíduo. Portanto, elementos que promovam a ruptura da coesão social e,

consequentemente, do controle social, estariam, indiretamente, incitando práticas criminais22

.

Neste ponto, é importante destacar a atuação do crime organizado, que opera segundo

moldes empresariais e com bases transnacionais, impondo, colonizando e conectando

diferentes formas de criminalidade. Seus sintomas mais visíveis compreendem emprego de

violência excessiva mediante uso de potentes armas de fogo, corrupção de agentes do poder

público, acentuados desarranjos no tecido social e da desorganização das formas

convencionais de controle social23

.

Nos estudos sobre a violência letal, destaca-se também a diferença entre as taxas de

mortalidade entre homens e mulheres. O presente estudo enfatiza que a mortalidade por

agressões ocorre em mais de 90% dos casos em homens, com proporção e 15:1. Embora

tenham sido detectadas maiores taxas para o sexo masculino, a violência tem despontado nos

últimos anos como uma importante causa de morte para as mulheres, sendo a violência

doméstica uma das principais formas de violência infligida contra o sexo feminino. É

amplamente conhecido que a violência doméstica e familiar contra a mulher é de natureza

multicausal e inclui fatores sociais, culturais, familiares, da relação entre os parceiros e

individuais24

. No Brasil, no período de 2001 a 2011, estima-se que ocorreram mais de 50 mil

feminicídios, o que equivale a, aproximadamente, 5.000 mortes por ano. Acredita-se que

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A juventude perdida no Brasil: desigualdades socioeconômicas e espaciais na mortalidade de jovens por

violência 92

grande parte destes óbitos foi decorrente de violência doméstica e familiar contra a mulher,

uma vez que aproximadamente um terço deles teve o domicílio como local de ocorrência25

.

No que diz respeito à cor/raça, algumas questões devem ser salientadas. O presente

estudo demonstrou que a violência letal ocorre predominantemente contra indivíduos pretos e

pardos. Esses dados coincidem com a realidade brasileira atual, de que está ocorrendo um

genocídio da população negra masculina e jovem relacionada às mortes por homicídios, e que

estas questões raciais estão mais acirradas nas áreas mais empobrecidas do país. Segundo o

Índice de vulnerabilidade juvenil à violência e desigualdade racial 2014, em Alagoas o risco

de morte de um jovem negro é 8,75 vezes maior do que o observado para um jovem branco.

Em Pernambuco, o risco é 11,57 vezes, na Paraíba de 13,40 e no Ceará de 4,01. Por outro

lado, os estados do Rio de Janeiro (2,3), Minas Gerais (2,2), Mato Grosso (2,0), Rio Grande

do Sul (1,7), São Paulo (1,5) e Paraná (0,7) apresentam indicador inferior à média nacional33

.

O mapa da violência no Brasil 2013 associou a violência estrutural e o consequente aumento

da taxa de mortalidade aos jovens negros e pardos por estarem estes inseridos em contextos

sociais desfavoráveis26

.

Cálculos mostram que as violências podem fazer reduzir a expectativa de vida ao

nascer em até quase três anos para os homens. E apresenta um custo anual com vitimização

violenta dos jovens pode corresponder até 6% do PIB estadual. No quadro geral, a morte

prematura de jovens devido às violências custa ao país cerca de R$ 79 bilhões a cada ano, o

correspondente a cerca de 1,5% do PIB nacional27

. A implantação de políticas alternativas,

integradoras e sobretudo inclusivas, dirigidas para os jovens poderia diminuir os índices de

violência e, portanto, resolveria parcela considerável do problema. Entretanto, também é

necessário realizar uma profunda reflexão sobre os valores, as formas de socialização e a

construção das identidades masculina e feminina nas sociedades atuais.

A limitação desse estudo relaciona-se ao uso de dados secundários sobre mortalidade

que está sujeito ao subregistro, ainda que se considere que o Sistema de Informação sobre

Mortalidade (SIM) no Brasil é dentre os sistemas o mais completo e que atualmente apresenta

qualidade reconhecida de seus dados, com melhora da cobertura ao longo das duas últimas

décadas11

.

Apesar desta limitação, os dados permitiram compreender a estrutura espacial e a

dinâmica da mortalidade decorrente das violências por Regiões Imediatas de Articulação

Urbana. Reconhecer a magnitude da violência no Brasil por meio de pesquisas de base

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A juventude perdida no Brasil: desigualdades socioeconômicas e espaciais na mortalidade de jovens por

violência 93

populacional, uso do APVP como indicador na análise da mortalidade precoce, facilita a

compreensão e contribui com subsídios para que sejam direcionadas políticas públicas

intersetoriais e que as propostas de intervenção sejam pautadas em diagnósticos que levem em

consideração as características específicas de cada região, priorizando as regiões que

apresentam os piores indicadores, e através dessa priorização prevenir perdas evitáveis.

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violência 94

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A juventude perdida no Brasil: desigualdades socioeconômicas e espaciais na mortalidade de jovens por

violência 95

5.3 ARTIGO 3

MORTALIDADE DE JOVENS POR VIOLÊNCIA NO BRASIL: DESIGUALDADE

ESPACIAL E SOCIOECONÔMICA

Título resumido: Desigualdade na mortalidade de jovens por violência no Brasil

Periódico de submissão: Epidemiologia e Serviços de Saúde

Resumo

OBJETIVO: Analisar a distribuição da mortalidade de jovens por violência no Brasil de

acordo com indicadores socioeconômicos. MÉTODOS: Trata-se de estudo ecológico cujas

unidades de análises foram as 482 Regiões Imediatas de Articulação Urbana (RIAU) no

Brasil. A variável dependente foi Taxa de Mortalidade Padronizada por violência em jovens

(15-29 anos). Foi realizada a análise bivariada LISA para avaliação da correlação espacial

entre a variável desfecho e as variáveis independentes e a significância dos clusters. Também

foi aplicdo o teste de correlação de Pearson entre as variáveis. O número de óbitos foi obtido

do SIM e os dados de população do IBGE. RESULTADOS: Foi constatada fraca

dependência espacial entre as variáveis contextuais e a TMP nas RIAU, com valores de

Moran próximos de zero. A fraca correlação foi constatada pela correlação de Pearson

(r<0,3). Entretanto, observou-se a formação de clusters de altas taxas de mortalidade e piores

condições socioeconômicas na região norte e litoral do nordeste. CONCLUSÕES: Foi

observada uma distribuição desigual da mortalidade por violência no Brasil, mesmo com fraca

correlação com as variáveis socioeconômicas selecionadas.

Descritores: Mortalidade; Violência; Determinantes Sociais da Saúde; Distribuição

socioeconômica.

Abstract

OBJECTIVE: To analyze the distribution of youth mortality by violence in Brazil according

to socioeconomic indicators. METHODS: This is an ecological study whose units of analysis

were the 482 Immediate Regions of Urban Articulation in Brazil (RIAU). The dependent

variable was the Mortality Rate Standardized for violence in young people (15-29 years). The

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A juventude perdida no Brasil: desigualdades socioeconômicas e espaciais na mortalidade de jovens por

violência 96

bivariate LISA analysis was performed to evaluate the spatial correlation between the

outcome variable and the independent variables and the significance of the clusters. The

Pearson correlation test was also applied between the variables. The number of deaths was

obtained from the SIM and the IBGE population data. RESULTS: There was a weak spatial

dependence between the contextual variables and ASW in RIAU, with Moran values close to

zero. The weak correlation was verified by the Pearson correlation (r<0.3). However, it was

observed the formation of clusters of high mortality rates and worse socioeconomic

conditions in the northeast and coastal region. CONCLUSIONS: There was an unequal

distribution of mortality due to violence in Brazil, even with a weak correlation with selected

socioeconomic variables.

Keywords: Mortality; Violence; Social Determinants of Health; Socioeconomic distribution.

Introdução

Historicamente, a violência esteve vinculada principalmente à criminalidade, objeto de

estudo das ciências jurídicas e sociais. Contudo, devido às amplas dimensões que assume nos

cenários da vida moderna, esse evento tornou-se objeto multidisciplinar e interdisciplinar de

estudo de outras áreas do conhecimento.1

Algumas teorias sociais se dedicaram a discutir a

questão da violência, especialmente a urbana. Porém, foi na década de 1980 que surgiu um

maior incremento de estudos interpretativos sobre a temática2.

Não há um consenso acerca das causas associadas aos agravos violentos. São fatores

relacionados à ocorrência de morte: socioeconômicos, constituição familiar, ambiente

doméstico, idade e as características de personalidade, sexo da vítima, etnia da vítima, uso de

bebidas alcoólicas e de substâncias químicas, fatores biológicos e fatores multicausais.

Quanto aos fatores demográficos, adolescentes e jovens têm sido frequentemente

identificados como as principais vítimas das diversas tipologias da violência, indicando que a

idade guarda estreita relação com esta causa3.

A violência está inscrita e arraigada não só nas relações sociais, mas, principalmente, é

construída no interior das consciências e das subjetividades. Portanto, esse fenômeno não

pode ser tratado apenas como uma força exterior aos indivíduos e aos grupos4. E como

fenômeno complexo, multifacetário e resultante de múltiplas determinações articula-se

intimamente com processos sociais que se assentam, em última análise, numa estrutura social

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A juventude perdida no Brasil: desigualdades socioeconômicas e espaciais na mortalidade de jovens por

violência 97

desigual e injusta5. E quando se fala em desigualdade social geralmente refere-se a situações

que implicam algum grau de injustiça, isto é, diferenças que são injustas porque estão

associadas a características sociais que sistematicamente colocam alguns grupos em

desvantagem com relação à oportunidade de ser e se manter sadio6.

A discussão sobre a violência e suas causas torna-se imperativa no Brasil. No

Relatório lançado em 2014 pela Organização das Nações Unidas (ONU) com o tema da

prevenção global da violência apontou que 10% dos homicídios ocorridos no mundo são

cometidos no Brasil. Dentre as macrocausas de homicídios no Brasil destacam-se o crime

organizado e o tráfico de drogas, violência patrimonial, violência interpessoal e violência

doméstica, conflitos entre policiais e população e presença escassa do Estado nos territórios7.

A vulnerabilidade dos jovens é tida como fatores de risco para a morte violenta. Os

jovens são mais suscetíveis ao aliciamento paro o tráfico de drogas, sendo uma consequência

evidente que serão os mais vitimados também. Além disso, percebe-se que existe uma

fragilidade específica em relação aos jovens negros7.

Neste sentido, são inúmeras as hipóteses e construções teóricas que versam sobre os

determinantes da violência urbana, mas uma, em especial chama a atenção: aquela que associa

a incidência criminal urbana a formas diversas de desorganização e falta de coesão social.

Esta abordagem parte do princípio de que a criminalidade emerge como consequência de

problemas associados a mecanismos de controle social. Nisso, elementos que promovam a

ruptura da coesão social e, consequentemente, do controle social, estariam, indiretamente,

incitando práticas criminais. Tais relações seriam condicionadas por fatores sociais como

status econômico, heterogeneidade étnica, mobilidade residencial e, sobretudo, taxas de

urbanização e migração8.

Diante do exposto, o objetivo desse estudo é analisar a distribuição da mortalidade de

jovens por violência no Brasil de acordo com indicadores socioeconômicos nas Regiões

Imediatas de Articulação Urbana no Brasil.

Métodos

Trata-se de estudo ecológico de múltiplos grupos, cuja unidade de análise foram as

Regiões Imediatas de Articulação Urbana do Brasil. A área deste estudo são as 482 Regiões

Imediatas de Articulação Urbana (RIAU). A variável dependente ou resposta foi a

mortalidade por violência, cujos óbitos constituem a somatória das categorias X85-Y09 e

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A juventude perdida no Brasil: desigualdades socioeconômicas e espaciais na mortalidade de jovens por

violência 98

Y35-Y36 (Agressões – Intervenção Legal – Operações de guerra) de acordo com o capítulo

XX da 10ª Revisão da Classificação Estatística Internacional de Doenças e Problemas

Relacionados à Saúde (CID-10) representada pela Taxa de Mortalidade Padronizada (TMP).

Para o cálculo da TMP foi utilizada o número de óbitos na população da faixa de 15 a 29 anos

ocorridos no período de 01 de janeiro de 2001 a 31 de dezembro de 2015, distribuídos em três

quinquênios (2001 a 2005, 2006 a 2010 e 2011 a 2015). O número de óbitos foram obtidos de

forma secundária, coletados do Sistema de Informação sobre Mortalidade (SIM) do

Departamento de Informática do Sistema Único de Saúde (Datasus).

Os dados de população por município e por idade foram obtidos das informações do

Censo 2010 e das projeções intercensitárias, no sítio do Instituto Brasileiro de Geografia e

Estatística. As taxas brutas foram padronizadas pelo método direto, considerando a população

padrão brasileira da metade do período e expressas por 100.000 habitantes por ano.

As variáveis independentes, representadas pelos indicadores socioeconômicos dos

municípios brasileiros, foram: (V1) Índice de Desenvolvimento Humano Municipal (IDH-M);

(V2) Razão de dependência; (V3) % de crianças de 6 a 14 fora da escola; (V4) Taxa de

analfabetismo de 15 anos ou mais; (V5) % de pobres; (V6) Índice de Gini; (V7) Taxa de

desocupação; (V8) % de pessoas de 15 a 24 anos que não estudam, não trabalham e são

vulneráveis, na população dessa faixa; (V9) Taxa de Trabalho Infantil. Os indicadores

socioeconômicos referentes ao ano 2000 e 2010 foram coletados do Atlas de

Desenvolvimento Humano no Brasil do Programa das Nações Unidas para o

Desenvolvimento (PNUD) (www.atlasbrasil.org.br).

Foi procedida a análise descritiva das variáveis utilizadas no estudo e para avaliar a

relação entre os indicadores socioeconômicos selecionados e a TMP por violência no Brasil

foi aplicado o teste de Correlação de Pearson, considerando a significância de 0,05. Para o

processamento e a análise estatística foi utilizado o programa IBM SPSS statistics 22.0. Para

análise do primeiro quinquênio, utilizou-se as variáveis contextuais da PNUD ano 2000 por se

aproximar mais do quinquênio em estudo (2001 a 2005), no segundo (2006 a 2010) e terceiro

(2011 a 2015) quinquênios utilizou-se as variáveis da PNUD ano 2010

Foi realizada a análise bivariada LISA para avaliação da correlação espacial entre a

variável desfecho (Taxas de Mortalidade padronizada por violência) e as variáveis

independentes. Para tanto, foram construídos os mapas temáticos com cada par de variáveis e

verificado seu valor de autocorrelação. Essas análises foram realizadas utilizando o software

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A juventude perdida no Brasil: desigualdades socioeconômicas e espaciais na mortalidade de jovens por

violência 99

GeoDa 1.6.61 (Spatial Analysis Laboratory, University of Illinois, Urbana Champaign,

Estados Unidos).

Essa pesquisa utilizou dados secundários disponíveis em sites oficiais do Ministério

da Saúde do Brasil sem identificação de sujeitos, sendo dispensado de apreciação em comitê

de ética em pesquisa, em conformidade com a Resolução 466∕2012 do Conselho Nacional de

Saúde.

Resultados

A tabela 1 apresenta a estatística descritiva para as variáveis dependente e

independentes. Observa-se pela taxa de média que a mortalidade por violência no Brasil tem

aumentado nos últimos 15 anos, tanto para o sexo masculino quanto para o feminino e que a

Razão entre os sexos é cerca de 12:1. A análise das variáveis contextuais demonstra que o

Brasil ainda apresenta baixas condições sociais e econômicas, apesar de ter apresentado uma

melhora considerável em todos os indicadores nas últimas décadas. A elevação do IDH, e

redução de jovens fora da escola, a redução da taxa de analfabetismo, a redução do percentual

de pobres demonstram o avanço social que o Brasil obteve. Todavia, ainda há a persistência

de elevadas taxas de alguns indicadores, como o trabalho infantil e o número de vulneráveis à

pobreza.

Na análise estatística clássica utilizando a Correlação de Pearson, verificou-se fraca

correlação entre as variáveis independentes e a TMP (r<0,3). (Tabela 2).

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A juventude perdida no Brasil: desigualdades socioeconômicas e espaciais na mortalidade de jovens por violência 100

Tabela 1 – Análise descritiva dos indicadores socioeconômicos e da TMP por violência (100.000 hab), de acordo com o sexo para as Regiões

Imediatas de Articulação Urbana do Brasil. Brasil, 2018.

VARIÁVEIS* MÉDIA MEDIANA DESVIO PADRÃO Percentis 25 Percentis 75

1Q 2Q 3Q 1Q 2Q 3Q 1Q 2Q 3Q 1Q 2Q 3Q 1Q 2Q 3Q

TMP_MASC_FEM 7.59 8.92 10.2 5.53 6.45 8.48 6.40 7.56 8.52 3.17 3.99 4.67 9.32 11.77 14.39

TMP_MASC 13.8 16.37 20.05 9.86 11.41 15.26 12.26 14.60 16.61 5.23 6.74 7.93 17.11 21.64 27.09

TMP_FEM 1.37 1.53 1.70 1.11 1.26 1.60 1.15 1.11 1.07 0.55 0.79 0.92 1.82 2.06 2.31

IDHM 0.56 0.69 0.58 0.70 0.10 0.07 0.47 0.62 0.64 0.74

DEPENDÊNCIA 61.87 51.16 60 49.93 10.11 7.33 54.12 45.79 67.83 55.32

FORA ESCOLA 7.61 2.88 6.6 2.54 4.56 1.82 4.86 1.91 8.99 3.22

ANALFABETISMO 21.14 15.63 18.76 13.99 10.20 7.89 12.49 8.87 29.48 22.14

POBRES 39.54 22.34 37.1 18.75 18.68 14.75 23.42 9.03 57.39 36.13

GINI 0.54 0.49 0.55 0.49 0.05 0.05 0.52 0.46 0.57 0.52

DESOCUPAÇÃO 9.54 6.18 9.54 5.94 3.30 2.44 7.19 4.77 11.52 7.68

TRABALHO INFANTIL 55.04 55.9 54.82 55.72 6.03 6.6 50.91 51.25 58.37 59.74

VULNERÁVEIS 18.5 14.22 19.1 14.12 6.05 6.68 14.31 8.26 22.82 19.63

Fonte: Sistema de Informação sobre Mortalidade – SIM; Atlas Brasil, 2017.

*Para o período de 2001 a 2005, foram utilizadas variáveis contextuais referente ao ano 2000; para 2011 a 2015 foram utilizados referente ao ano 2010.

** período de 2001 a 2005 (1Q), 2006 a 2010 (2Q) e 2011 a 2015 (3Q).

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A juventude perdida no Brasil: desigualdades socioeconômicas e espaciais na mortalidade de jovens por violência 101

Tabela 2 – Correlação entre a TMP por violência (100.000 hab) para ambos os sexos e as variáveis socioeconômicas para Regiões Imediatas de

Articulação Urbana do Brasil no período de 2001 a 2005 (1Q), 2006 a 2010 (2Q) e 2011 a 2015 (3Q). Brasil, 2018.

VARIÁVEIS*** QUINQUÊNIO TMP IDHM DEPENDÊNCIA FORA

ESCOLA ANALFABTISMO POBRES GINI DESOCUPAÇÃO

TRABALHO

INFANTIL VULNERÁVEIS

TMP

1º 1 0.123** -0.075 -0.029 -0.068 -0.065 -0.106* -0.002 0.032 -0.056

2º 1 -0.089* 0.016 0.024 -0.008 0.048 -0.013 0.008 -0.031 0.023

3º 1 -0.200** 0.097* 0.037 0.052 0.094* 0.086 0.137** -0.106* 0.108*

IDHM

1º 1 -0.322** -0.209** -0.296** -0.353** -0.255** -0.151** 0.326** -0.319**

2º 1 -0.323** -0.208** -0.296** -0.354** -0.256** -0.153** 0.327** -0.319**

3º 1 -0.323** -0.225** -0.304** -0.353** -0.280** -0.255** 0.345** -0.384**

DEPENDÊNCIA

1º 1 0.754** 0.832** 0.885** 0.549** 0.104* -0.625** 0.761**

2º 1 0.751** 0.833** 0.885** 0.544** 0.104* -0.625** 0.760**

3º 1 0.619** 0.773** 0.893** 0.705** 0.418** -0.691** 0.820**

FORA ESCOLA

1º 1 0.599** 0.625** 0.475** 0.001 -0.451** 0.629**

2º 1 0.597** 0.624** 0.469** -0.001 -0.450** 0.628**

3º 1 0.415** 0.505** 0.475** 0.195** -0.391** 0.476**

ANALFABETISMO

1º 1 0.924** 0.462** 0.060 -0.681** 0.790**

2º 1 0.924** 0.458** 0.059 -0.679** 0.789**

3º 1 0.909** 0.612** 0.501** -0.766** 0.869**

POBRES

1º 1 0.551** 0.060 -0.686** 0.821**

2º 1 0.548** 0.059 -0.684** 0.819**

3º 1 0.758** 0.545** -0.788** 0.931**

GINI

1º 1 0.113* -0.434** 0532**

2º 1 0.110* -0.430** 0.526**

3º 1 0.441** -0.592** 0.704**

DESOCUPAÇÃO

1º 1 -0.392** 0.300**

2º 1 -0.392** 0.301**

3º 1 -0.687** 0.655**

TRABALHO

INFANTIL

1º 1 -0.848**

2º 1 -0.848**

3º 1 -0.885**

VULNERÁVEIS

1º 1

2º 1

3º 1

Fonte: Sistema de Informação sobre Mortalidade – SIM; Atlas Brasil, 2017.

*Correlação significativa no nível 0,05; **Correlação significativa no nível 0,01; ***Para o período 2001- 2005 e 2006 -2010, foram utilizadas variáveis do PNUD para o ano 2000;

para 2011-2015, as variáveis referentes ao ano 2010.

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A juventude perdida no Brasil: desigualdades socioeconômicas e espaciais na mortalidade de jovens por

violência 102

Com a análise do Índice de Moran Local Bivariado (LISA), foi verificada fraca

correlação espacial entre as variáveis socioeconômicas do estudo e a TMP por violência em

jovens, apresentando valores negativos ou positivos próximos de zero. Entretanto, observa-se

a formação de clusters de alto-alto, baixo-alto e alto-baixo nas regiões imediatas pertencentes

às regiões norte, nordeste e sudeste do Brasil, especialmente no terceiro quinquênio (2011 a

2015). (Figuras 1, 2 e 3).

Figura 1 – Moran bivariado LISA (Moran’s I) entre as Taxas de Mortalidade Padronizada por

violência (agressão) e as variáveis socioeconômicas das Regiões Imediatas de Articulação Urbanas.

Brasil, 2001-2005.

A- Analfabetismo; B- Crianças fora da escola; C- % de pobres; D- Razão de dependência; E- Taxa de

desocupação; F- Gini; G- IDHM; H- Trabalho infantil; I- % de vulneráveis.

Fonte: Sistema de Informação sobre Mortalidade – SIM; Atlas Brasil, 2013.

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A juventude perdida no Brasil: desigualdades socioeconômicas e espaciais na mortalidade de jovens por

violência 103

Figura 2 – Moran bivariado LISA (Moran’s I) entre as Taxas de Mortalidade Padronizada por

violência (agressão) e as variáveis socioeconômicas das Regiões Imediatas de Articulação Urbanas.

Brasil, 2006-2010.

A- Analfabetismo; B- Crianças fora da escola; C- % de pobres; D- Razão de dependência; E- Taxa de

desocupação; F- Gini; G- IDHM; H- Trabalho infantil; I- % de vulneráveis.

Fonte: Sistema de Informação sobre Mortalidade – SIM; Atlas Brasil, 2013.

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violência 104

Figura 3 – Moran bivariado LISA (Moran’s I) entre as Taxas de Mortalidade Padronizada por

violência (agressão) e as variáveis socioeconômicas das Regiões Imediatas de Articulação Urbanas.

Brasil, 2011-2015.

A- Analfabetismo; B- Crianças fora da escola; C- % de pobres; D- Razão de dependência; E- Taxa de

desocupação; F- Gini; G- IDHM; H- Trabalho infantil; I- % de vulneráveis.

Fonte: Sistema de Informação sobre Mortalidade – SIM; Atlas Brasil, 2013.

Discussão

Os resultados do presente estudo apontam que não há uma forte correlação espacial

entre a violência e as condições socioeconômicas, todavia há formação de clusters de altas

taxas de mortalidade e piores condições socioeconômicas nas regiões norte, nordeste e sudeste

do país, evidenciando que o contexto socioeconômico é um dos fatores explicativos para a

distribuição da violência letal no Brasil.

Foram evidenciados os padrões de mortalidade na região norte do país, sendo em

grande medida relacionados pelos conflitos sociais associados à exploração de recursos

naturais, conjugados com o avanço da fronteira agrícola. Na Região Sudeste, áreas

consolidadas com altas taxas de homicídios, como as Regiões Metropolitanas do Rio de

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A juventude perdida no Brasil: desigualdades socioeconômicas e espaciais na mortalidade de jovens por

violência 105

Janeiro e de Vitória com um corredor criminal que se estende por toda a faixa litorânea

fluminense9.

Dentre as regiões brasileiras, a Região Nordeste destaca-se por registrar nos últimos

anos as maiores taxas de homicídio do Brasil. A taxa média de homicídios na Região

Nordeste é de 33,76 por 100 mil habitantes. Quando comparada com países com históricos de

guerra civil, como o Congo (30,8), e com altas taxas de homicídio associadas ao narcotráfico,

como a Colômbia (33,4), esses países possuem taxas menores que a do Nordeste brasileiro7.

Na Região Nordeste, grande parte dos municípios experimentou aumento nas taxas de

homicídio, com intensificação do fenômeno em Salvador e no sul da Bahia, formado por

Porto Seguro, Vitória da Conquista e Itabuna, catalisado pela expansão da atividade turística e

recomposição da economia do cacau, que gera oportunidades econômicas, atrai migrantes,

evidencia problemas sociais e acirra o potencial de conflitos. Destacam-se o entorno dos

municípios maranhenses com a mancha de criminalidade, assim como o interior do Ceará, e

cidades litorâneas dos estados de Pernambuco e Alagoas, comandado por Recife e Maceió.

O homicídio, sobretudo o que acomete a juventude, tem sido considerado pelos

estudiosos um evento marcador da violência social, embora, contraditoriamente, não seja

tratado como tema prioritário pela sociedade nem pelo Estado brasileiro10

. Uma forma de

notar as consequências da sociabilidade violenta é a falta de instâncias do Estado que

ofereçam alternativas pacíficas para a mediação e a resolução de conflitos7, enquanto o Estado

está cada vez mais voltado aos ajustes estruturais sob a preponderância do mercado financeiro

que afetam de maneira direta o mundo do trabalho e todas as dimensões da vida na medida em

que produz a banalização do humano11

.

Especialistas do Fórum Brasileiro de Segurança Pública apontaram que o acúmulo de

vulnerabilidades sociais e a ausência de políticas públicas representam fatores de risco

associados à violência homicida7. Em estudo realizado em Foz do Iguaçu – PR, a ocupação no

setor informal e a ocupação no setor formal apresentaram correlação espacial negativa (I = –

0,2574; P = 0,0360) e positiva (I = 0,2574; P = 0,0310), respectivamente, indicando que

quanto maior o número de empregos informais em uma determinada área menor a taxa de

homicídios nas áreas vizinhas12

. Outro estudo realizado em Maringá – PR foram observadas

que a distribuição espacial da violência se deu predominantemente na periferia da cidade.

Com moradores de áreas pobres e com escassos serviços urbanos sendo os mais expostos à

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A juventude perdida no Brasil: desigualdades socioeconômicas e espaciais na mortalidade de jovens por

violência 106

morte violenta; em contrapartida, as classes sociais privilegiadas, residentes em lugares mais

favorecidos da cidade, são as que estão mais protegidas desse tipo de violência13

.

Todavia, a melhoria dos indicadores sociais e econômicos registrados para o Brasil

não foram suficientes para reduzir as taxas de homicídio no país. Em um estudo realizado no

nordeste no período de 2001 a 2005, percebeu-se que os impactos do Gini e da renda

domiciliar per capita em relação às taxas de homicídio juvenil são insignificantes.

Independente de nos últimos anos existir uma redução razoável da desigualdade de renda,

sobretudo atribuída à melhoria do índice de Gini, os homicídios permaneceram sendo

praticados e, em muitos casos, tendo incremento positivo em suas taxas e números na região

nordeste14

.

Esse fato demonstra que o combate à violência não requer exclusiva atenção ao

combate à vulnerabilidade social. Também implica a superação dos enfoques setoriais e

desarticulados de grande parte das políticas sociais e de combate à violência no país. Em

confluência com a desigual estrutura social e econômica do país está a ausência de esforços

políticos na concretização de políticas públicas voltadas à garantia do direito à vida, revelando

uma conjuntura de omissão na qual a população mais desfavorecida, em especial o jovem, é

vítima preferencial da violência15

.

Dentre as políticas que merecem destaque na discussão dessa temática é a Lei de

armas de fogo nº 10.826/2003, conhecida como “Estatuto do desarmamento” ou “Lei do

desarmamento,” que no Brasil não conseguiu atender aos preceitos expressos em tal

legislação, onde seu objetivo maior seria a redução da criminalidade por arma de fogo16

. No

Brasil, 71% dos homicídios são perpetrados com o uso de armas de fogo, legais ou ilegais. A

letalidade e o fácil acesso a este instrumento, quando associados a uma sociedade violenta,

potencializam o risco de que conflitos de ordem diversa terminem em mortes7.

Além do Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA Lei nº 8.069, de 13/07/90), uma

importante medida que está em discussão é o Projeto de Lei nº 2438 de 2015, que institui o

Plano Nacional de Enfrentamento ao Homicídio de Jovens7. Essas medidas, que garantem os

direitos da população infanto-juvenil, buscam contribuir para a proteção e minimização da

violência nessa população, já que em geral, as políticas no Brasil têm sido marcadas pela

repressão, prisão e extermínio, sendo a juventude pobre comumente criminalizada e

estigmatizada, culpabilizada e responsabilizada pela sua saúde e segurança, de tal modo a

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A juventude perdida no Brasil: desigualdades socioeconômicas e espaciais na mortalidade de jovens por

violência 107

isentar as instâncias sociais e as políticas públicas como agentes de atuação frente às

demandas das juventudes17

.

Dentre os fatores associados ao crescimento da violência a partir dos anos 2000,

refere-se ao aumento do consumo de drogas psicoativas proibidas, em particular do crack, que

ensejou o crescimento de mercados ilícitos, principalmente nos estados do Nordeste18

. A

existência de gangues, bem como o consumo e o tráfico de drogas, têm sido apontados em

diferentes perspectivas como causadores de homicídios19

. O tráfico de drogas é um dos

elementos que faz o ciclo das guerras se renovar através de novos conflitos20

.

Reconhecer as desigualdades sociais em saúde, buscar compreender os processos que

as produzem e identificar os diferentes aspectos que estabelecem a mediação entre os

processos macrossociais e o perfil epidemiológico dos diferentes grupos sociais é uma

condição indispensável para que seja possível buscar formas de enfrentamento, sejam elas no

âmbito das políticas públicas, sejam elas no âmbito da vida cotidiana6.

Portanto, são necessários estudos e políticas públicas voltadas aos processos que

garantam os direitos de cidadania, em especial dos jovens, homem, negro, pobre e morador da

periferia, principais vítimas da violenta letal no Brasil. A associação entre violência, pobreza

e cidadania, passando pela dimensão do territorial, tem interrompido vidas de uma geração de

jovens no país. Faz-se urgente abordar as questões da desigualdade social para que,

efetivamente, se discuta estratégias de acesso aos direitos e à cidadania dessa geração21

.

A limitação desse estudo está relacionada à utilização de dados secundários sobre

mortalidade que está sujeito ao subregistro, apesar de nos últimos anos reconhecer-se que o

Sistema de Informação sobre Mortalidade (SIM) no Brasil obteve ganhos significativos

quanto a qualidade da informação22

. Outra limitação refere-se ao delineamento do estudo, a

possibilidade do viés ecológico é sempre lembrada como uma limitação para o uso de

correlações ecológicas. As contribuições deste estudo, por sua vez, referem-se aos subsídios

gerados para políticas públicas com ênfase nas ações preventivas, territorialmente

determinadas, que poderão ser usadas como critério para repartição mais equânime dos

recursos públicos, priorizando as regiões que apresentam os piores indicadores.

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A juventude perdida no Brasil: desigualdades socioeconômicas e espaciais na mortalidade de jovens por

violência 108

Referências

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integração com o setor saúde e segurança pública. Revista Saúde Pública, 2005; 39(4).

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“E o fim é belo, incerto, depende de como você vê...”

O Teatro Mágico

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A juventude perdida no Brasil: desigualdades socioeconômicas e espaciais na mortalidade de jovens por

violência 111

6 CONCLUSÕES

A distribuição espacial da violência homicida, tem se revelado fonte profícua de

descobertas para a análise dos fatores que incidem em sua produção e reprodução. Este estudo

permitiu identificar importantes características relacionadas às mortes por violência bem

como mudanças nos padrões de distribuição espacial verificados nos 15 anos analisados. A

violência apresenta um caráter epidêmico no Brasil, com migração das grandes cidades e das

capitais brasileiras para as regiões de menor porte, corroborando a teoria da interiorização da

violência no Brasil. Além disso, mostrou o aprofundamento das desigualdades nas mortes por

violência, apontando que a população negra é a principal vítima da violência letal, e que esse

quadro se aprofundou nas últimas décadas. Ademais, a violência imposta contra os jovens do

sexo masculino com utilização de armas de fogo impõe novos desafios à sociedade brasileira,

considerando o momento atual em que se discutem as políticas de desarmamento no país.

Transcorridos 17 anos da homologação da Política Nacional de Redução da

Morbimortalidade por Acidentes e Violências (Portaria GM/MS n. 737, de 16 de maio de

2001), 15 anos da Lei de desarmamento (Lei nº 10.826/2003) e duas décadas de

transformações sociais e econômicas pelas quais o Brasil passou, não foram suficientes para

observar uma significativa redução nos números de vítimas da violência, que a cada ano tem

sido crescentes, o que denota a importância de se buscar articulação intersetorial.

Além de articulação intersetorial e de mudanças profundas na estrutura da sociedade

brasileira, é necessário trabalhar com inteligência coletiva para entender a complexa situação

de violência, e pensar numa estrutura social mais igualitária e justa, com redução das

iniquidades sociais. Lograr esse objetivo perpassa inclusive pelo desenvolvimento de uma

Cultura de Paz de forma integrada em consonância com as grandes mudanças desejadas –

justiça social, igualdade entre os sexos, eliminação do racismo, tolerância religiosa, respeito

às minorias, educação e saúde integral, equilíbrio ecológico e liberdade política.

A implantação de políticas alternativas, integradoras e sobretudo inclusivas, dirigidas

para os jovens poderia diminuir os índices de violência e, portanto, resolveria parcela

considerável do problema. Entretanto, também é necessário realizar uma profunda reflexão

sobre os valores, as formas de socialização e a construção das identidades masculina e

feminina nas sociedades atuais. Enquanto as representações governamentais não reagirem

com políticas consistentes, se continuará a assistir a esse extermínio dos jovens brasileiros.

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A juventude perdida no Brasil: desigualdades socioeconômicas e espaciais na mortalidade de jovens por

violência 112

A Geografia da Violência destaca-se como um importante instrumento de gestão para

os setores como a Saúde, a Assistência Social, a Defesa Social, a Previdência Social, a

Educação e outros que através da análise dos resultados obtidos poderão discutir e propor

intervenções estratégicas com planejamento baseado em diagnóstico. A identificação da

transição epidemiológica da violência através do processo de interiorização destaca a

importância que as áreas menos populosas e as regiões norte e nordeste ganharam nos últimos

anos. Diante dessa grave escalada da violência nestas áreas, aponta-se a urgente necessidade

da organização de ações sistemáticas e sustentadas, a despeito das ações pontuais e escassas,

seja na área de segurança pública, seja nas áreas social e de justiça.

Esse estudo reforça a importância da análise espacial, de indicadores

socioeconômicos, de APVP como indicador na análise da mortalidade precoce, com

espacialização dos anos perdidos que facilita a compreensão, pois leva em consideração

características específicas de cada região e contribui com subsídios para que o direcionamento

das políticas públicas possa ser pautado em diagnóstico de situação de saúde.

Recomenda-se estudos com maior profundidade, em que levem em consideração além

dos APVP outros fatores, como por exemplo o indicador DALY (Disability Adjusted Life

Years - Anos de vida perdidos ajustados por incapacidade) que mede simultaneamente, o

efeito da mortalidade e dos problemas de saúde que afetam a qualidade de vida dos

indivíduos, incorporando conceitos de morte prematura e anos vividos com incapacidade.

A limitação desse estudo relaciona-se ao uso de dados secundários sobre mortalidade

que está sujeito ao subregistro, ainda que se considere que o Sistema de Informação sobre

Mortalidade no Brasil é dentre os sistemas de informação em saúde, o mais completo

(MEDRONHO et al., 2009).

Os resultados do presente estudo facilitam a compreensão das características da

violência no Brasil e contribui com subsídios para que sejam direcionadas políticas públicas

intersetoriais e que as propostas de intervenção sejam pautadas em diagnósticos que levem em

consideração as características específicas de cada região, priorizando as regiões que

apresentam os piores indicadores, e através dessa priorização prevenir perdas evitáveis.

Como contribuição, a partir dos resultados desse estudo será realizado um relatório

técnico e com este, buscar-se-á contato com instâncias do governo e social para discutir a

temática da mortalidade por violência contra a população jovem.

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“Olho os jornais e estremeço

Todo final tem seu começo

Taças amargas derramadas

Profecias confirmadas...”

Roberto Carlos

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