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UNIVERSIDADE DO SUL DE SANTA CATARINA
WILLIAM ROBERTO PERES GARCIA
A INFLUÊNCIA DAS FALSAS MEMÓRIAS NA PRODUÇÃO
DOS ELEMENTOS PROBATÓRIOS NO PROCESSO PENAL
Araranguá-SC
2017
WILLIAM ROBERTO PERES GARCIA
A INFLUÊNCIA DAS FALSAS MEMÓRIAS NA PRODUÇÃO
DOS ELEMENTOS PROBATÓRIOS NO PROCESSO PENAL
Trabalho de Conclusão de Curso apresentado
ao Curso de Graduação em Direito da
Universidade do Sul de Santa Catarina, como
requisito parcial à obtenção do título de
Bacharel em Direito.
Orientador: Prof. Jeã Pierre Lopes Toledo, Esp.
Araranguá-SC
2017
A minha filha Antonella. Sua existência faz-
me crescer diariamente. Encontrei nela o
verdadeiro significado do amor.
A minha mãe Eliane (in memoriam). Sempre
batalhou pela minha educação. Mesmo com
pouca escolarização me incentivava a estudar.
Estas mulheres me dão inspiração para buscar
o conhecimento e a sabedoria.
AGRADECIMENTOS
Durante estes cinco anos de universidade fiz três amizades importantíssimas:
Indiana, Gustavo e Renata. Além de dividirmos carona diariamente dividimos alegrias e
tristezas, vitórias e derrotas. "O verdadeiro amigo é aquele que nos transforma num ser
humano melhor." (Johnny De Carli)
―Não é a morte que me importa, porque ela é um fato. O que me importa é o que
eu faço da minha vida, enquanto a minha morte não acontece, para que essa vida não seja
banal, superficial, fútil e pequena.‖ (Mario Sergio Cortella).
RESUMO
Neste artigo propomos analisar as influências das falsas memórias (FM‘s) na
produção das provas no sistema penal brasileiro. Essas influências podem vulnerabilizar os
depoimentos das testemunhas, dos acusados e das vítimas e ainda no reconhecimento de
pessoas ou coisas. Dessa maneira, ao estudarmos o princípio da ―verdade real‖, isto é, a busca
da verdadeira história do fato delituoso, vimos a necessidade de analisarmos as questões
relativas à memória. Durante a entrevista forense os entrevistados usam do processo
mnemônico para reconstruir os fatos. Nessa retroalimentação a memória pode sofrer com
influências internas e externas. De forma interna (autossugerida) quando o próprio
entrevistado pode adulterar as informações dos acontecimentos que presenciou. De forma
externa (sugerida) quando pode ser sugestionada por terceiros. Não obstante apresentaremos
uma hipótese preventiva no que tange a Entrevista Cognitiva, que tende a minimizar as
manifestações das falsas memórias. Em que pese, nossa metodologia de estudo foi
bibliográfica: livros, revistas, anais e homepage’s; e documental: livros, documentos oficiais,
leis, acórdãos, jurisprudências, doutrinas, revistas jurídicas, etc.
Palavras-chave: Prova penal. Verdade real. Memória. Falsas memórias. Entrevista Cognitiva.
ABSTRACT
In this article we propose to analyze the influence of false memories on the
production of evidence in the Brazilian penal system. These influences can make the
testimonies of witnesses, accused and victims vulnerable and even recognize people or things.
In this way, when we study the principle of "real truth", that is, the search for the true history
of the criminal act, we have seen the need to analyze the questions concerning memory.
During the forensic interview the interviewees use the mnemonic process to reconstruct the
facts. In this feedback memory can suffer from internal and external influences. Internally
(self-hosted) when the interviewee himself may adulterate the information of the events that
he witnessed. External (suggested) when it can be suggested by third parties. Nevertheless we
will present a preventive hypothesis regarding the Cognitive Interview, which tends to
minimize the manifestations of the false memories. In spite of that, our methodology of study
was bibliographical: books, magazines, annals and homepage's; and documents: books,
official documents, laws, judgments, jurisprudence, doctrines, legal journals, etc.
Keywords: Criminal evidence. Real truth. Memory. False memories. Cognitive Interview.
SUMÁRIO
1 INTRODUÇÃO ............................................................................................................ 11
2 CONSIDERAÇÕES SOBRE O SISTEMA PROBATÓRIO NO PROCESSO PENAL
BRASILEIRO .................................................................................................................... 13
2.1 CONCEITO E FINALIDADE ..................................................................................... 13
2.2 EVOLUÇÃO HISTÓRICA DO SISTEMA PROBATÓRIO ........................................ 14
2.3 PRINCÍPIOS RELACIONADOS AO SISTEMA PROCESSUAL PROBATÓRIO
BRASILEIRO ...................................................................................................................... 16
2.3.1 Liberdade de prova ................................................................................................. 16
2.3.2 ...................................................................... 17
2.3.2.1 Ilícitas .................................................................................................................... 17
2.3.2.2 Ilícita por deriva o ................................................................................................ 18
2.3.2.3 Ilegítimas ............................................................................................................... 19
2.3.3 Autorresponsabilidade das partes .......................................................................... 19
2.3.4 .......................................................................................... 19
2.3.5 ................................................................................................ 20
2.3.6 ........................................................................................................... 20
2.3.7 Oralidade ................................................................................................................. 21
2.3.8 Publicidade .............................................................................................................. 21
2.3.9 Livre-convencimento fundamentado ...................................................................... 21
2.3.10 Imediatidade ............................................................................................................ 22
2.3.11 .......................................................................................... 22
2.3.12 Verdade real ............................................................................................................ 22
2.4 SISTEMA DE VALORAÇÃO .................................................................................... 24
2.5 DAS PROVAS EM ESPÉCIES NO SISTEMA PROCESSUAL CRIMINAL
BRASILEIRO ...................................................................................................................... 25
2.5.1 Prova pericial .......................................................................................................... 25
2.5.2 Prova documental ................................................................................................... 25
2.5.3 Prova testemunhal................................................................................................... 26
2.5.4 Interrogatório do acusado ...................................................................................... 27
2.5.5 Perguntas ao ofendido ............................................................................................. 28
2.5.6 Reconhecimento de pessoas e coisas ....................................................................... 28
2.5.7 Acareação ................................................................................................................ 29
2.5.8 Da busca e apreensão .............................................................................................. 30
2.5.9 Indícios .................................................................................................................... 30
3 FORMAS DE APREENSÃO DO CONHECIMENTO .............................................. 32
3.1 IMAGINAÇÃO ........................................................................................................... 33
3.2 PENSAMENTO .......................................................................................................... 33
3.3 PERCEPÇÃO .............................................................................................................. 34
3.4 LINGUAGEM ............................................................................................................. 35
3.5 MEMÓRIA ................................................................................................................. 36
3.5.1 As falsas (FM’ ) ..................................................................................... 38
3.5.1.1 Teoria construtivista ............................................................................................... 40
3.5.1.2 Teoria dos esquemas............................................................................................... 40
3.5.1.3 Teoria do monitoramento da fonte .......................................................................... 41
3.5.1.4 Teoria do traço difuso (TTD) .................................................................................. 41
4 A INFLUÊNCIA DAS FALSAS MEMÓRIAS NA PRODUÇÃO DOS ELEMENTOS
PROBATÓRIOS NO PROCESSO PENAL ..................................................................... 43
4.1 FATORES GERADORES DE FALSAS MEMÓRIAS ................................................ 45
4.1.1 Fatores internos (endógenos) .................................................................................. 47
4.1.1.1 Emoções ................................................................................................................. 47
4.1.1.2 Tempo .................................................................................................................... 51
4.1.1.3 Subjetivismo do magistrado .................................................................................... 52
4.1.2 Fatores externos (exógenos) .................................................................................... 53
4.1.2.1 Mídia ...................................................................................................................... 53
4.1.2.2 Viés do entrevistador .............................................................................................. 56
4.2 A MINIMIZAÇÃO DAS FALSAS MEMÓRIAS NA PRODUÇÃO DOS
ELEMENTOS PROBATÓRIOS NO PROCESSO PENAL.................................................. 57
5 CONCLUSÃO .............................................................................................................. 63
REFERÊNCIAS ................................................................................................................. 65
11
1 INTRODUÇÃO
As entrevistas forenses é uma das mais importantes e usuais maneiras de produção
probatória no processo penal brasileiro. Doutrinadores e operadores do Direito discutem e
questionam a fragilidade dos métodos usados na entrevista forense, que muitas vezes sendo o
único meio de prova possível de ser produzido em determinados processos. Contudo, redobra-
se o cuidado de como se colhe as informações necessárias baseadas nas memórias dos
entrevistados, pois não são inteiramente confiáveis.
Muitas influências confundem o entrevistado no momento de relatar/relembrar os
fatos delituosos. Trazem, assim, uma equivocada ―verdade real‖, que se mescla com outros
relatos de testemunhas, acusados e vítimas, tornando a decisão do magistrado mais complexa.
O resultado disto pode ser a condenação de um inocente ou até majoração de penas.
A memória humana é objeto de estudos da psicologia e neurociência. Constata-se
que são diversas as formas de contaminação do mundo externo e até mesmo de interpretação
interna do indivíduo. A memória subjetiva inteiramente as imagens percebidas e é passível de
diversas formas de contaminação que podem afastá-la da verdadeira história do evento
relembrado.
Nos processos que tentam a reconstrução do fato criminoso, podem existir
artimanhas do cérebro, informações armazenadas que se dizem verdadeiras, no entanto, não
condizem com a realidade. O indivíduo carrega consigo sua ética, moral, interpretação dos
fatos, experiências de vida, emo ões, traumas, etc., atribuindo sua ―didática‖ particular de
como interpretar os fatos presenciados, ou seja, de modo interno o sujeito sofre distorções na
reconstrução mnemônica. Não obstante, há também as distorções externas, que podem basear-
se na influência da mídia, do viés do entrevistador e de uma coação de terceiro que tenha
interesse em distorcer informações do delito. Estas distorções internas e externas chamaremos
de Falsas Memórias (FM‘s).
Diante deste contexto, as questões que guiarão a pesquisa serão de que maneira as
FM‘s influenciam a produ o dos elementos probatórios no processo penal brasileiro? Quais
as provas que sofrem mais incidência de FM‘s no processo penal? De que forma podemos
minimizar a incidência das FM‘s no recolhimento das provas penais?
Em que pese, nossa metodologia de estudo foi bibliográfica: livros, revistas, anais
e homepage’s; e documental: livros, documentos oficiais, leis, acórdãos, jurisprudências,
doutrinas, revistas jurídicas, etc.
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Este trabalho de conclusão de curso será dividido em três capítulos. Veremos no
primeiro capítulo as considerações sobre o sistema probatório penal brasileiro. Delimitaremos
seu conceito, finalidade e evolução histórica. Relacionaremos os princípios do sistema penal
brasileiro. Explicaremos o sistema de valoração das provas penais adotado no Brasil. E por
fim, elencaremos as espécies de provas da legislação penal.
No segundo capítulo apresentaremos as principais formas de apreensão do
conhecimento. Dentre elas: imaginação, pensamento, percepção, linguagem e a mais
significativa que é a memória. É através desta que temos a capacidade de lembrar e recordar
dos fatos, ideias e/ou conhecimentos adquiridos ao longo da nossa vida. Contudo, a mente não
reconstituirá absolutamente todo o fato que se tenta lembrar, por isso surgem as FM‘s. Por
esta razão, dentro deste capítulo esclareceremos sua conceituação e teorias.
No ápice deste trabalho, no terceiro capítulo, abordaremos a influência das FM‘s
na produção dos elementos probatórios no processo penal. Ponderaremos os fatores internos e
externos influenciadores no recolhimento das provas penais. Ao final sugeriremos para
minimiza o das FM‘s na entrevista forense a denominada Entrevista Cognitiva.
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2 CONSIDERAÇÕES SOBRE O SISTEMA PROBATÓRIO NO PROCESSO
PENAL BRASILEIRO
2.1 CONCEITO E FINALIDADE
Analisando etimologicamente a palavra ―prova‖ temos a origem de ―probatio‖,
significando ensaio, verificação, inspeção, exame, argumento, razão, aprovação ou
confirmação. Deriva-se dele o verbo latino ―probare‖ que traduz-se ―provar‖ e tem o
significado de ensaiar, verificar, examinar, reconhecer por experiência, aprovar, estar
satisfeito com algo, persuadir alguém a alguma coisa ou demonstrar. (NUCCI, 2015)
Podemos distinguir três sentidos para o termo ―prova‖ no processo jurídico,
segundo Nucci (2015).
(i) prova como ato de provar: é o processo pelo qual se verifica a exatid o ou a
verdade do fato alegado pela parte no processo (ex.: fase probatória); (ii) prova
como meio: trata-se do instrumento pelo qual se demonstra a verdade de algo (ex.:
prova testemunhal); (iii) prova como resultado: é o produto extraído da análise dos
instrumentos de prova oferecidos, demonstrando a verdade de um fato
No processo busca-se reconstruir, ideologicamente, os fatos ocorridos para poder
assim retirar as consequências daquilo que ficar demonstrado. Utiliza-se a prova para
demonstrar a ―verdade‖ dos fatos. Esta prova é a que contribui para o convencimento do
magistrado.
Por meio desta apreciação das provas nos autos o julgador decidi pela condenação
ou absolvição do réu. (T VORA; ASSUMP O, , p. 17). Lembrando que: ―[...] juízes
são seres humanos como quaisquer outros e, primeiro, guiam-se pela intuição; pela simpatia
ou antipatia, e por outras considerações não expressamente confessadas para, mais tarde, dar
forma silogística à fundamentação (ABELLÁN, 1999 apud NUCCI, 2015).
Pacelli ( 7) ressalta: ―A prova judiciária tem um objetivo claramente definido:
a reconstrução dos fatos investigados no processo, buscando a maior coincidência possível
com a realidade histórica‖, ou seja, tenta-se reconstruir a veracidade dos fatos como realmente
ocorreu no espaço-tempo. Reconstruir a verdade, entretanto, não é tarefa fácil, quiçá
impossível.
Nucci (2015) nos explica que o objetivo da parte durante o processo não é
construir a verdade objetiva, pois é quase impossível e por uma atividade complexa. A meta
da parte é produzir no espírito do julgador que os fatos alegados em sua peça correspondem
com a verdade, ou seja, por meio dos instrumentos legais previstos a parte convence o
julgador que a prova é a confirma o lógica da realidade. ―Desde logo, porém, um necessário
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esclarecimento: toda verdade judicial é sempre uma verdade processual. E não somente pelo
fato de ser produzida no curso do processo, mas, sobretudo, por tratar-se de uma certeza de
natureza exclusivamente jurídica.‖ (PACELLI, 2017)
Nucci (2015) distingue a verdade objetiva e subjetiva:
Em suma, ter certeza é, sempre, aspecto subjetivo, gerando, pois, uma verdade
igualmente subjetiva, que pode não ser compatível com a realidade (aquilo que
efetivamente ocorreu no mundo naturalístico).
Por outro lado, a verdade objetiva é a exatidão da noção da realidade com o que
efetivamente aconteceu. Ex.: é verdade que Fulano faleceu (há laudo necroscópico
comprobatório).
Quando a verdade coincide exatamente com a realidade, temos a verdade objetiva.
Quando se diz ter certeza, temos a verdade subjetiva, pois pode não ter exatidão com a
realidade.
2.2 EVOLUÇÃO HISTÓRICA DO SISTEMA PROBATÓRIO
O processo penal e o sistema de provas foram, durante suas histórias, ―exata
medida‖ de evolu o. A história do processo se mesclou com a história do sistema de prova.
Isto é, ―a maneira pela qual os sistemas de prova foram evoluindo ao longo do tempo foi
definindo também os vários tipos de processo que a história conheceu.‖ (MACHADO, 2014,
p. 462)
[...] o modo pelo qual os hebreus, egípcios, gregos, povos da Idade Média e povos
modernos, em diferentes lugares e épocas, foram imaginando e instituindo os seus
mecanismos de apura o e julgamento dos crimes, ou seja, os seus mecanismos de
prova, foi determinando também os tipos de processo que cada um desses povos
adotaram ao longo da história. (MACHADO, 2014, p. 462)
No período republicano de Roma e também da polis na Grécia antiga, o modelo
de processo penal adotado por ambos foi acusatório. Julgamentos e debates públicos tal como
provas baseadas, sobretudo, em testemunhos. (MACHADO, 2014, p. 462)
Foi no período imperial, sob forte intervenção do direito germânico e das invasões
bárbaras, queo exercício probatório do processo penal passou a inserir fundamentos
irracionais e religiosos, incomuns ao processo.
Machado ( 4, p. 463) lembra da ―ordálias de Deus‖, que foi uma cren a ―na
interven o divina para se estabelecer a verdade nos julgamentos.‖ Por exemplo, o acusado
era posto à prova passando por cima de brasas, caso saísse ileso ao final do percurso, era
considerado inequivocamente inocente. Contudo, assim como as torturas e as ordálias tais
práticas foram extintas em 1215, com o Concílio de Latrão.
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Percebemos que nesta irracionalidade em sistematizar as provas, surgia o sistema
de convicção íntima do julgador. Não era necessário motivar fundamentos e convicções sobre
suas decisões, pois este usava de sua autoridade fundamentando-se no misticismo, ainda sem
nenhum tipo de controle racional. (MACHADO, 2014, p. 463)
Este sistema probatório se harmonizou inteiramente ao processo inquisitivo da
Idade Média, que tinham como principais características apurações sigilosas e juízes com
perfis absolutistas.
Machado (2014, p. 463) nos explica sobre este sistema medieval:
Ainda na Idade Média, além da influência do direito germ nico (que deu também
contribui ões importantes para a evolu o do processo como a incorpora o do
direito de defesa e o modelo acusatório), juntou-se a contribui o do direito
can nico, quando ent o foram mantidos alguns dos meios irracionais de prova e se
estabeleceu o chamado sistema de provas taxadas, ou provas legais. Por esse
sistema, o processo medieval passou a estabelecer regras tanto para a produ o e
quantidade de provas, quanto para a avalia o delas pelo juiz. Pelo sistema das
provas taxadas, levado s ltimas consequências durante o absolutismo monárquico,
o juiz ficava completamente atado espécie e quantidade de prova permitida pela
lei, bem como ao valor que esta ltima viesse a conferir a cada uma das provas legalmente previstas.
O julgador se mantinha inerte e impotente perante o conjunto de provas. Não
possuindo condições para apreciá-la livremente a partir de critérios racionais. Muitas vezes os
julgamentos não eram justos e distantes da verdade, porque o julgador devia extrema
obediência às provas legais produzidas nos autos, e mesmo assim, poderia estar totalmente em
desacordo com as suas convicções pessoais. (MACHADO, 2014, p. 463-464)
Baseados nos ideais Iluministas, na Idade Moderna, por volta do século XVIII,
houve uma transição do misticismo para o método racional de apreciação das provas e
punições.
Na Modernidade, acalentada pelas ideias do Iluminismo que no século VIII
real ou a import ncia da raz o como meio de se superar o obscurantismo, as
crendices e as várias formas de misticismos do período medieval, sobretudo a partir
do importante esfor o realizado pelo marquês de eccaria, que propunha a
racionalidade das provas e dos métodos de puni o, o processo penal assumiu
definitivamente o modelo das provas racionais, adotando a inteira liberdade de
produ o e avalia o das mesmas, exigindo apenas que, livre para determinar a
realiza o de provas e livre para avaliá-las, o juiz doravante passasse a fundamentar
as suas decisões. (MACHADO, 2014, p. 464)
O sistema chamado de persuasão racional ou do livre convencimento motivado
surgiu desta necessidade de fundamentar as decisões e da liberdade da apreciação das provas.
Ou seja, o momento que o processo moderno se consolida como sistema avaliativo das provas
de modo racional ele adentra, em definitivo, na ―era do processo acusatório‖. O sistema
probatório se alicerça no método de descobrir a verdade a partir do raciocínio livre, baseado
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na lógica e da ciência. Descartam-se a interferência do misticismo e irracionalidade,
características dos sistemas probatórios antigos. (MACHADO, 2014, p. 464)
O sistema de persuas o racional, ―garante certa flexibilidade dos julgamentos, de
modo que se possa evitar decisões injustas, e s vezes até mesmo esdr xulas, proporcionadas
pela ‗ado o cega do sistema da prova legal‘‖, isto é, este sistema sempre proporcionará
controle externo e interno da legalidade diante das decisões dos julgadores, evitando a
possibilidade de ―arbítrio judicial decorrente da ado o do sistema de livre convencimento do
juiz‖.(MACHADO, 2014, p. 464)
Em síntese, pode-se ressaltar que no decorrer da história surgiu diferentes
maneiras de valorar e produzir as provas. Atualmente, no processo penal brasileiro, assim
como as modernas nações civilizadas, adota o sistema das provas racionais, que fica explícito
no artigo 155, do CPP: ―o juiz formará sua convic o pela livre aprecia o da prova‖.
(BRASIL, CPP, 2017)
Ao final, percebemos que, no nosso processo penal brasileiro, que decorre do
modelo de processo acusatório, ―vigora uma ampla liberdade na produ o da prova pelas
partes e na sua valora o pelo juiz, exigindo-se apenas, como controle dessa liberdade, que as
provas sejam lícitas e que as decisões judiciais sejam fundamentadas (art. 93, IX, da CF), ou
seja, no que diz respeito a prova, este baseia-se firmemente ao sistema de persuasão racional
ou livre convicção motivada. (MACHADO, 2014, p. 465)
2.3 PRINCÍPIOS RELACIONADOS AO SISTEMA PROCESSUAL PROBATÓRIO
BRASILEIRO
2.3.1 Liberdade de prova
A liberdade das provas deriva da verdade real, e por intermédio dela, ampara-se
que devem ser permitidos todos os meios de provas, previstos em lei. (MAGNO, 2013, p.
438)
Marcão (2016, p. 444) afirma que ― omo o próprio nome diz, é ampla a liberdade
probatória das partes‖.
Para Magno ( 3, p. 438), é evidente que ‖a liberdade para a produ o da prova
esbarra nos preceitos constitucionais. A liberdade, portanto, n o é plena.‖ O autor ainda
afirma que mesmo que não especificados na legislação, podem ser aproveitados quaisquer
meios de prova no processo penal. Noutras palavras, ―a lei estabelece expressamente o rol de
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provas existentes em processo penal. No entanto, n o se trata de ‘numerus clausus’, mas sim
‘numerus apertus’, ou seja, não é rol taxativo e sim rol exemplificativo. (MAGNO, 2013, p.
438)
2.3.2 I
Para entendermos o que são provas ilícitas inadmissíveis, devemos distinguir
primeiramente o que são provas ilegais, que dividem-se em ilícitas, ilícitas por derivação e
ilegítimas.
Avena (2017) nos detalha sobre o assunto:
A expressão prova ilegal corresponde a um gênero, do qual fazem parte três espécies
distintas de provas: as provas ilícitas, que são as obtidas mediante violação direta ou
indireta da Constituição Federal; as provas ilícitas por derivação, que correspondem
a provas que, conquanto lícitas na própria essência, se tornam viciadas por terem
decorrido de uma prova ilícita anterior ou a partir de uma situação de ilegalidade; e,
por fim, as provas ilegítimas, assim entendidas as obtidas ou produzidas com ofensa
a disposições legais, sem nenhum reflexo em nível constitucional.
Marcão (2016, p. 444) também introduz o assunto da inadmissibilidade das provas
ilícitas distinguindo-as:
Decorre do disposto no art. 5º, LVI, da F, segundo o qual s o inadmissíveis no
processo as provas obtidas por meios ilícitos. Também o art. 57 do PP dispõe a
respeito, determinando sejam desentranhadas do processo as provas consideradas
ilícitas e também as ilícitas por deriva o.
Não longe disto, Manzano (2013, p. 357) lembra que Ada Pelegrini Grinover
inaugurou a teoria Nuvolone, explicando que a ―prova ilícita é aquela que viola normas ou
princípios constitucionais, ou normas de direito penal, material; prova ilegítima é aquela que
fere normas de direito processual penal.‖
Vejamos agora as peculiaridades destas três provas citadas pelos autores.
2.3.2.1 Ilícitas
Compreendemos como ilícitas as provas auferidas através do descumprimento de
normas de conteúdo material, e necessariamente, essa violação provoque, direta ou
indiretamente, ferimento a garantia ou a princípio constitucional. (AVENA, 2017)
O mesmo autor nos lembra da adequação do Código de Processo Penal junto a
Constituição Federal ante as provas ilícitas:
Dentro da sistemática do art. 5.º da CF, que estabelece as regras e princípios visando à proteção dos direitos fundamentais, sobressai a vedação ao uso de provas obtidas
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por meios ilícitos (art. 5.º, LVI). Objetivando adequar o Código de Processo Penal
de 1941 a esta normatização ditada pela Magna Carta, tal proibição foi introduzida
pela Lei 11.690/2008 no art. 157, caput, do CPP, passando a estabelecer que são
inadmissíveis, devendo ser desentranhadas do processo, as provas ilícitas.
Pacelli (2017) diz que ―a vedação das provas ilícitas atua no controle da
regularidade da atividade estatal persecutória, inibindo e desestimulando a adoção de práticas
probatórias ilegais por parte de quem é o grande responsável pela sua produção‖.
2.3.2.2 Ilícita por deriva o
As provas ilícitas por derivação são obtidas ilicitamente, contudo, lícitas em si
mesmas. Para exemplificar, tomemos um caso onde haja uma interceptação telefônica
clandestina, e que a autoridade policial descobre um local onde será efetuada a entrega de
uma droga ilícita e assim os policiais conseguem aprende-las.
Ora, nesse caso, na doutrina, a tendência majoritária é, do mesmo modo, no
sentido da contamina o e inadmissibilidade da prova derivada da ilícita, dentro de um
critério da proporcionalidade. (MANZANO, 2013, p. 359)
Avena (2017) explica o conceito e a derivação da teoria norte-americana dos
Frutos da Árvore Envenenada:
Provas ilícitas por derivação são aquelas que, embora lícitas na própria essência,
decorrem exclusivamente de uma outra prova, considerada ilícita, ou de uma
situação de ilegalidade, restando, portanto, contaminadas. Trata-se, enfim, da
aplicação da teoria norte-americana dos Frutos da Árvore Envenenada (fruits of the
poisonous tree), segundo a qual o defeito existente no tronco contamina os frutos.
Sobre a Teoria dos Frutos da Árvore Envenenada, Marcão (2016, p. 586) também
discorre:
Qualquer prova que decorra direta e essencialmente de prova ilícita, por
consequência lógica e inevitável, é considerada prova ilícita por deriva o. O nexo
de causalidade contamina de ilicitude a prova sequencialmente obtida. Aplica-se, in
casu, a doutrina da árvore dos frutos envenenados (fruits of the poisonous tree),
elaborada na jurisprudência norte-americana. Se determinada prova decorrer de
prova ilícita e também de outra fonte lícita independente, prevalecerá sua licitude.
No CPP aparece a conceituação no artigo 157, § 1o: ―S o também inadmissíveis
as provas derivadas das ilícitas, salvo quando n o evidenciado o nexo de causalidade entre
umas e outras, ou quando as derivadas puderem ser obtidas por uma fonte independente das
primeiras‖, assim, ―[...] a ilicitude de uma prova, uma vez reconhecida, causará a ilicitude das
provas que dela diretamente decorram.‖ (AVENA, 2017)
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2.3.2.3 Ilegítimas
Ao contrário das provas ilícitas, que violam conteúdo material constitucional, as
ilegítimas são elaboradas a partir da transgressão das regras de cunho processual. Avena
(2017) exemplifica:
É o caso da perícia realizada por apenas um perito não oficial: viola-se, com isso, a
regra geral do art. 59, § .º, do PP, determinando que, ―na falta de perito oficial, o
exame será realizado por 2 (duas) pessoas idôneas, portadoras de diploma de curso
superior preferencialmente na área específica, dentre as que tiverem habilitação
técnica relacionada com a natureza do exame‖. Ora, por que essa regulamenta o?
Porque assim entendeu o legislador. Quisesse, poderia ter estabelecido de modo
diverso, à semelhança do que fez no art. 50, § 1.º, da Lei 11.343/2006 (Lei de
Drogas), possibilitando a realização da perícia provisória por apenas um expert
(fala-se em ‗perito‘, no singular).
Como se percebe, diferentemente do que acontece com a ilicitude, a prova
ilegítima está em oposição a disposição à que contém, não ferindo qualquer norma
constitucional. (AVENA, 2017)
2.3.3 Autorresponsabilidade das partes
Durante o processo, as partes são responsáveis pelas consequências dos erros e
omissões, que por ventura venha a praticar na atividade probatória. (MARCÃO, 2016, p. 444)
Magno ( 3, p. 437) explica que ―cada parte é responsável pelas consequências
de sua inatividade probatória‖, ou seja, se as partes não exercerem sua faculdade probatória,
poderão acarretar consequências desfavoráveis.
No mesmo raciocínio, Marcão (2016, p. 444) discorre que ―conforme a
distribui o do nus da prova, cabe a cada parte dele desincumbir-se, e, se assim n o
proceder, arcará com as consequências que disso decorrem‖.
2.3.4 A
Origina-se do princípio do contraditório. Magno (2013, p. 438) reforça também
que ―é na fase instrutória que o princípio do contraditório ganha for a e concretude no
processo‖. O autor exemplifica: ―a defesa poderá reperguntar testemunha arrolada pela
acusa o; a acusa o poderá impugnar a perícia pleiteada pela defesa etc.‖, isto é, a parte
contrária sempre poderá contraditar as provas produzidas pela outra parte.
20
―Toda prova produzida nos autos deve ser levada ao conhecimento da outra parte
ou das partes (quando decorrer de iniciativa exclusiva do juiz) podendo ser questionada e
contrariada.‖ (MAR O, 6, p. 444-445).
2.3.5 C
Depois que a prova é introduzida ao processo, ela não pertencerá exclusivamente
a ninguém, podendo ser utilizada por qualquer das partes.
Uma vez incorporada ao processo, a prova n o pertence parte que dela se ocupou.
Independentemente de quem a produziu nos autos, toda prova pertence ao processo,
de maneira que o conjunto probatório pode ser utilizado indistintamente, por
qualquer das partes. Exemplos: um documento juntado pela defesa pode ser usado para sustentar tese da acusa o; um depoimento prestado por testemunha da
acusa o pode ser usado para fundamentar tese da defesa etc. (MARCÃO, 2016, p.
445)
Há duas consequências relevantes neste princípio da comunhão da prova:
Primeiro: a prova produzida por uma das partes, ou trazida ao processo por iniciativa
judicial, pode ser aproveitada pela parte contrária. Assim, nada impede que a defesa
sustente a absolvi o do réu com fundamento no depoimento das testemunhas de
acusa o, e vice-versa. Segundo: tendo sido apresentada a prova por uma das partes,
só poderá haver desistência com o consentimento da parte contrária. (MAGNO,
2013, p. 437-438)
Analisando este princípio, vemos que as provas não pertencem ao juiz ou tão
somente as partes, elas pertencem ao processo e podem ser utilizadas por qualquer das partes
deste processo. (MAGNO, 2013, p. 437)
2.3.6 C
Almeja-se eu uma única audiência recolher todas as provas orais, mas em caso
determinados e necessários, pode-se fragmentar e designar outra audiência. Assim discorre
Marcão (2016, p. 445)
A audiência é una, mas isso n o impede que em casos determinados, por for a da necessidade, ocorra seu desmembramento e seja designada outra em continua o.
Também n o é vedada a colheita de prova oral fora da comarca do processo (fora da
terra), como ocorre nos casos em que se faz imprescindível a expedi o de carta
precatória, carta rogatória ou carta de ordem.
Capez (2017, p. 411) reforça este princípio explicando que se tem o intuito de
reunir toda produção das provas em uma única audiência e que o princípio da concentração
advém do princípio da oralidade, que explicaremos no próximo tópico.
21
2.3.7 Oralidade
Em regra, a prova colhida em audiência deve ser produzida oralmente podendo ser
gravada em mídia (som e imagem) ou posteriormente reduzi-la a termo (transcrita em papel)
(MARCÃO, 2016, p. 445).
O Brasil adotou em seu processo penal o sistema alemão de colheita de provas,
que é designado sistema de oralidade. ―O magistrado julga melhor quando é ele quem preside
a colheita de provas e conhece o conte do fático que lastreia aquela determinada demanda‖,
ou seja, o magistrado deverá estar o mais próximo possível da colheita das provas, para assim
julgar melhor a causa. (MAGNO, 2013, p. 441)
2.3.8 Publicidade
Em regra, os atos processuais são públicos. Seguindo esta mesma regra a
produção de provas também será pública. Entretanto admite-se exceções a este princípio da
publicidade, podendo alguns processos seguir em segredo de justiça.
Capez (2017, p. 411) corrobora com esta explicação e nos lembra de que ―os atos
judiciais (e, portanto, a produ o de provas) s o p blicos, admitindo-se somente como
exce o o segredo de justi a.‖ N o obstante, Marc o ( 6, p. 445) também esclarece que
―excetuadas as situa ões excepcionais em que o juiz poderá decretar segredo de justi a, os
atos processuais s o p blicos, e, portanto, em regra a colheita da prova fica sujeita a tal
princípio.‖
2.3.9 Livre-convencimento fundamentado
Este princípio trás o entendimento que o juiz apreciará as provas produzidas nos
autos e formará, a partir destas, sua convicção para sentenciar este processo. Mesmo que seja
livre seu convencimento, o magistrado não poderá decidir contraditoriamente com as provas
levantadas nos autos. (MARCÃO, 2016, p. 445). Na mesma linha o autor nos lembra o
posicionamento do STF sobre este tema:
A exigência de motiva o dos atos jurisdicionais constitui, hoje, postulado
constitucional inafastável, que traduz poderoso fator de limita o ao exercício do
próprio poder estatal, além de configurar instrumento essencial de respeito e
prote o s liberdades p blicas. om a constitucionaliza o desse dever jurídico
imposto aos magistrados – e que antes era de extra o meramente legal – dispensou-
se aos jurisdicionados uma tutela processual significativamente mais intensa, n o
obstante idênticos os efeitos decorrentes de seu descumprimento: a nulidade
22
insuperável e insanável da própria decis o. A import ncia jurídico-política do dever
estatal de motivar as decisões judiciais constitui inquestionável garantia inerente
própria no o do Estado Democrático de Direito. Fator condicionante da própria
validade dos atos decisórios, a exigência de fundamenta o dos pronunciamentos
jurisdicionais reflete uma expressiva prerrogativa individual contra abusos
eventualmente cometidos pelos órg os do Poder Judiciário.
Este princípio é de grande relevância, pois trás garantia de segurança jurídica e
política ao Estado Democrático de Direito, evitando abusos exercidos pelo Poder Judiciário.
2.3.10 Imediatidade
Este princípio provém da proximidade que o julgador tem da prova que ele
colherá nos autos.
Quando procede ao interrogatório do acusado; tomada de declara ões da vítima ou
inquiri o de testemunha, pela imediatidade que haverá entre eles (proximidade
entre o juiz e a pessoa por ele ouvida em audiência), o juiz reunirá condi ões de
compreender melhor a cena em que os fatos se deram; o ambiente em que o delito
ocorreu; aferir o nível de cultura ou simplicidade dos envolvidos; o grau de con-
fiabilidade e seguran a das informa ões colhidas etc. (MARCÃO, 2016, p. 446)
Esta proximidade (imediatidade) do juiz com a prova (testemunhas, vítimas,
acusados, etc.) terá como consequência uma influência na valoração das provas que colhera e
reunirá melhor convicção e raciocínio no momento de confeccionar a sentença. (MARCÃO,
2016, p. 446)
2.3.11 I
Aplicava-se somente no processo civil este princípio. A identidade física do juiz
foi inserida com a parcial reforma do CPP que aconteceu com a Lei 11.719/2008, e encontra-
se no art. 399, § 2o, nos seguintes termos: ―O juiz que presidiu a instru o deverá proferir a
senten a‖. Visivelmente que o magistrado reunirá melhores condições de proferir sentença se
foi ele mesmo que presidiu a audiência e colheu as provas. (MARCÃO, 2016, p. 446 – 447)
2.3.12 Verdade real
O princípio da verdade real ―É aquela a que chega o julgador, reveladora dos fatos
tal como ocorreram historicamente e não como querem as partes que apareçam realizados.‖
(MANSOLDO, 2010, p. 7). Diferente da formal que será verdade somente o que ser incluído
nos autos do processo a real preocupa-se com a veracidade do fato discutido, ou seja, por
23
todos os meios cabíveis haverá a tentativa de trazer ao processo a verdadeira história do fato
discutido.
O juiz para proferir julgamento justo, buscará reconstruir, o mais próximo
possível, a verdade real ou substancial dos fatos. (MARCÃO, 2016, p. 446)
Ferrajoli (2002 apud RIBEIRO, 2006, p. 19) alerta sobre o ideal inalcançável de
busca da verdade real:
A impossibilidade de formular um critério seguro de verdade das teses judiciais
depende do fato de que a verdade ‗certa‘, ‗objetiva‘ ou ‗absoluta‘ representa sempre
a ‗expressão de um ideal‘ inalcançável. A idéia [sic] contrária de que se pode
conseguir e asseverar uma verdade objetiva ou absolutamente certa é, na realidade,
uma ingenuidade epistemológica.
Para o autor, a verdade real, também referida como absoluta é totalmente
inacessível. Esta verdade chegará tão somente à aproximação do que realmente aconteceu, ou
seja, verossimilhança.
Por esta raz o, adentraremos na discuss o que confronta ―verdade real‖ e
―verdade processual‖. Reconstituir um fato criminoso que já n o existe mais é uma tarefa que
nem sempre será possível. O crime não constitui mais a realidade, é pretérito e fica a cargo da
reconstrução da memória das partes do processo. A reconstrução de um fato a basear-se na
memória ficará suscetível ao subjetivismo dos sujeitos processuais.
Machado (2014, p. 461) disserta sobre o tema:
Deve-se considerar, porém, que a busca de uma verdade real nem sempre será uma
empresa possível. Primeiro, porque n o há como reconstituir no processo um fato
criminoso que já n o existe mais, que pertence ao passado e que, portanto, n o se
constitui mais numa realidade. Logo, só será possível representá-lo na memória, no
plano mental e na imagina o dos sujeitos processuais. E essa representa o, como
toda representa o, é sempre suscetível de subjetivismos, além do que os meios de
prova s o também suscetíveis de falhas, distor ões, manipula ões etc.
Diante disto, ao invés de falarmos ―verdade real‖, substitui-se por ―verdade
processual‖. Reconstruir dentro do processo o fato histórico do crime com auxílio das provas,
argumentações e demais instrumentos processuais. Assim teremos uma correspondência
razoável entre o que os autos apresentam, no presente, com o fato histórico, que pertence ao
passado. (MACHADO, 2014, p. 461)
O sentimento de justi a em dado caso concreto somente se aflora quando a verdade
processual (ou formal) corresponder verdade real (ou material). Quando houver
essa correspondência, pode-se concluir que o processo atingiu seu grau máximo de
eficácia. (MAGNO, 2013, p. 437).
Sabemos que a ―verdade processual‖ n o equivalerá ―verdade real‖, ou seja, os
fatos evidenciados no processo nem sempre corresponderá ao que realmente ocorreu. ―Todos
24
os atos do juiz criminal no contexto da instru o probatória devem estar voltados busca
incansável pela verdade real.‖ Em outras palavras, independentemente das circunstâncias
processuais, o julgador deve sempre prevalecer à busca da verdade real, mesmo sabendo que
não equivalerá ao que realmente aconteceu. (MAGNO, 2013, p. 437)
2.4 SISTEMA DE VALORAÇÃO
O Brasil adotou, ao processo penal, o sistema de livre convencimento do juiz,
conforme já explicitado neste trabalho no item anterior. Para Marc o ( 6, p. 44 ) ―Para a
generalidade dos casos, o PP adotou o sistema da livre-convic o do juiz, persuas o racional
ou livre-convencimento fundamentado‖.
O artigo 55 do PP diz que ―O juiz formará sua convic o pela livre aprecia o
da prova produzida em contraditório judicial, n o podendo fundamentar sua decis o
exclusivamente nos elementos informativos colhidos na investigação, ressalvadas, as provas
cautelares, n o repetíveis e antecipadas‖. Avena (2017) discorre sobre este artigo:
Da adoção deste critério de apreciação decorre a regra geral de que não está o juiz condicionado a valores predeterminados em lei, podendo valorar a prova como bem
entender, bastando, para tanto, que fundamente sua decisão. Exemplo disso
encontra-se no art. 182, estabelecendo que o juiz não está vinculado à prova pericial,
podendo dela discordar no todo ou em parte.
Ao juiz dispõe-se ampla liberdade para apreciar os elementos probatórios,
podendo valorá-las conforme seus entendimentos. Entretanto, o magistrado deve motivar suas
decisões, ―que há de estar pautada nos elementos de convencimento coligidos aos autos, não
podendo ignorar o conteúdo dessas provas e tampouco as razões aduzidas pelas partes nos
debates ou alegações finais, sob pena de proferir decisão absolutamente nula.‖
(DEMERCIAN; MALULY, 2014)
Vejamos as observações do jurista Bento de Faria apud Marcão (2016, p. 440):
N o é permitido ao juiz fundar a sua convic o na notoriedade do fato, assim
conceituado pelo seu próprio conhecimento, desde que tal notoriedade só faz prova
quando resultar das circunst ncias emergentes do processo pela forma legal. Seria,
realmente, admitir o testemunho do juiz, e ninguém pode, no mesmo processo, figurar como julgador e testemunha. O princípio da liberdade da prova resultaria no
da exclus o de toda a prova. A liberdade de aprecia o da prova há de ser, portanto,
limitada análise da que existir nos autos. O julgamento há de, pois, assentar na
prova e n o na consciência de quem o profere.
O jurista afirma ainda que, para impedir um regime de insegurança e
arbitrariedade, o magistrado não pode decidir livremente, deve, pois, se ater aos elementos
25
existentes nos autos e que dê sua valoração e crédito conforme seus conhecimentos,
exercendo sua faculdade de decidir baseada na sua livre convicção. (MARCÃO, p. 440)
2.5 DAS PROVAS EM ESPÉCIES NO SISTEMA PROCESSUAL CRIMINAL
BRASILEIRO
2.5.1 Prova pericial
Há algumas situações no decurso do processo penal que necessita de uma
certificação mais coerente e concreta de alguns fatos que se deseja provar. Para este tipo de
situação usa-se a prova pericial, que nada mais é que uma prova técnica, que deverá ser
desenvolvida por pessoas adequadamente habilitadas. (PACELLI, 2017).
Nucci ( 5) refor a que ―A perícia é o exame de alguma coisa ou de alguém,
realizado por técnicos ou especialistas, em determinados assuntos, que podem fazer
afirmações ou extrair conclusões pertinentes ao processo penal‖.
Nas palavras de Taruffo (2008 apud Nucci 2015):
Nem os juízes nem os jurados são oniscientes e este é um problema em todos os sistemas probatórios. (...) Por isso, todos os sistemas processuais têm que utilizar
algumas formas de prova pericial. Isto significa que se deve recorrer a peritos
expertos em diversos âmbitos para oferecer ao julgador toda a informação técnica e
científica necessária para decidir o caso.
O CPP em seu art. 6.º, VII ordena que quando ocorrer alguma infração penal que
vestígios materiais deixar, a autoridade policial deverá, logo tenha ciência da sua prática,
ordenar a realização do exame de corpo de delito. E caso não seja feito por alguma razão,
nessa fase, deve, posteriormente, ser determinado pelo magistrado (art. 156, II, CPP).
(BRASIL, CPP, 2017)
2.5.2 Prova documental
Tendo em vista a ascensão da tecnologia, não podemos de uma forma estrita
conceituar no processo penal um simples estrito de papel como sendo documento. Nucci
(2015) nos lembra de que:
Documento é toda base materialmente disposta a concentrar e expressar um
pensamento, uma ideia ou qualquer manifestação de vontade do ser humano, que
sirva para expressar e provar um fato ou acontecimento juridicamente relevante. São
documentos: escritos, fotos, fitas de vídeo e som, desenhos, esquemas, gravuras,
disquetes, CDs, DVDs, pen-drives, e-mails, entre outros. Trata-se de uma visão
26
moderna e evolutiva do tradicional conceito de documento – simples escrito em
papel – tendo em vista o avanço da tecnologia.
Távora e Assump o, (2012, p. 53) fortalece a ideia que temos duas visões diante
do conceito de documento: ―Na concep o restrita dada pelo caput do art. 232 do CPP,
consideram-se ‗documentos quaisquer escritos, instrumentos ou papéis, p blicos ou
particulares‘‖. Por outro lado temos uma concep o mais atual e ampla que ―em face da
interpreta o progressiva da lei, considera-se documento qualquer objeto representativo de
um fato ou ato relevante, e aí poderíamos incluir, v.g., fotos, desenhos, esquemas, planilhas,
e-mails, figuras digitalizadas.‖ (T VORA; ASSUMP O, , p. 95)
Dependendo do conteúdo que se queira provar o conceito de documento tem que
ser mais flexível possível. A originalidade da prova é que será relevante na hora de sua
apreciação durante o processo. Pacelli (2017) dispõe sobre isto:
Daí dispor o art. 232 que se consideram documentos quaisquer escritos,
instrumentos ou papéis, públicos ou particulares, reconhecendo-se o mesmo valor à fotografia (ou à reprodução, à cópia, enfim) do documento, desde que devidamente
autenticada (art. 232, parágrafo único).
Entende-se que o documento seja qualquer expressão materializada por meio de
desenhos, grafias, símbolos, isto é, qualquer forma de comunicação ou linguagem que seja
possível o discernimento do seu conteúdo. (PACELLI, 2017)
2.5.3 Prova testemunhal
Uma das mais usadas regularmente no processo penal é a prova testemunhal. São
as pessoas que acabaram obtendo ciência do acontecimento do delito e contribuem no
recolhimento dessas provas. Esta testemunha tem que ser ―pessoa desinteressada que declara
em juízo o que sabe sobre os fatos, em face das percep ões colhidas sensorialmente. Ganham
relevo a vis o e a audi o, porém nada impede que a testemunha amealhe suas impressões por
meio do tato e do olfato.‖ (T VORA; ASSUMP O, , p. 78)
Nucci ( 5) nos esclarece que a ―Testemunha é a pessoa que toma conhecimento
de um fato juridicamente relevante, sendo apta a confirmar a veracidade do ocorrido, sob o
compromisso de ser imparcial e dizer a verdade. Cuida-se de autêntico meio de prova.‖ Na
mesma linha de raciocínio, porém em outros termos, o testemunho nada mais é que:
A declaração de uma pessoa física, não acusada pelo mesmo delito, recebida no
curso do processo penal, acerca do que possa conhecer, por percepção de seus sentidos, sobre os fatos investigados, com o propósito de contribuir à reconstrução
conceitual destes. (NORES; HAIRABEDÍAN, 2013 apud NUCCI, 2015)
27
Pacelli (2017) alerta que devemos ter muito cuidado sobre este instrumento
probatório:
Todo depoimento é uma manifestação do conhecimento, maior ou menor, acerca de
um determinado fato. No curso do processo penal, a reprodução desse conhecimento
irá confrontar-se com diversas situações da realidade que, consciente ou
inconscientemente, poderão afetar a sua fidelidade, isto é, a correspondência entre o
que se julga ter presenciado e o que se afirma ter presenciado. Isso ocorrerá por uma razão muito simples.
O indivíduo quando portador do conhecimento dos fatos carrega junto de si
numerosas potencialidades e vulnerabilidades e usará dependendo da situação que lhe estiver
diante de si. Por este motivo que a noção de verdade buscada com a prova testemunhal muitas
vezes poderá ser equivocada. (PACELLI, 2017)
2.5.4 Interrogatório do acusado
O indivíduo que está sendo acusado tem oportunidade de apresentar sua versão
dos fatos ante o delito que lhe acusam. Pacelli ( 7) ressalta que ―Trata-se, efetivamente, de
mais uma oportunidade de defesa que se abre ao acusado, de modo a permitir que ele
apresente a sua versão dos fatos, sem se ver, porém, constrangido ou obrigado a fazê-lo‖.
O interrogatório do acusado somente se realizará após a apresentação escrita da defesa (art. 396, CPP), e, na audiência una de instrução (art. 400, CPP), após a
inquirição do ofendido, das testemunhas (de defesa e de acusação) e até dos
esclarecimentos dos peritos, acareações e demais diligências probatórias que devam
ali ser realizadas. (PACELLI, 2017)
Isto é, será no último ato da audiência de instrução que caberá o interrogatório ao
acusado, entretanto este poderá, por estratégia, preferir autodefesa que favoreça seus
interesses.
Nucci (2015) nos conceitua e lembra que também caberá o interrogatório na fase
extrajudicial:
O interrogatório é ato procedimental em que se propicia ao indiciado ou acusado o
momento formal e pessoal para fornecer a sua versão acerca da imputação criminal
formulada na investigação ou na ação penal. Pode realizar-se na fase extrajudicial,
durante o inquérito, perante a autoridade policial. Ocorre, também, na fase judicial,
em fase de instrução, perante a autoridade judiciária.
Não nos deixam de esclarecer sobre o interrogatório Távora e Assump o (2012,
p. 53): ―O interrogatório é a fase da persecu o penal que permite ao suposto autor da
infra o esbo ar a sua vers o dos fatos, exercendo, se desejar, a autodefesa.‖ E ainda, a
autoridade permitirá ao acusado ―indicar provas, confessar a infra o, delatar outros autores,
28
apresentar as teses defensivas que entenda pertinente, ou valer-se, se lhe for conveniente, do
direito ao silêncio.‖
2.5.5 Perguntas ao ofendido
O ofendido é a vítima do crime, isto é, a pessoa que teve essencialmente seu bem
jurídico ou interesse próprio violado por alguma infração penal. (NUCCI, 2015). Ainda nesta
conceituação, Távora e Assump o (2012, p. 74) nos descreve que ―O ofendido é o titular do
direito lesado ou posto em perigo, é a vítima, sendo que suas declara ões, indicando a vers o
que lhe cabe dos fatos, têm natureza probatória.‖
Pacelli (2017) bem nos lembra que:
[...] o ofendido não integra o rol de testemunhas da acusação, por não poder ser considerado, rigorosamente, testemunha. Em consequência, não tem o compromisso
de dizer a verdade (art. 203, CPP), prevendo a lei, entretanto, a sua condução
coercitiva se, quando regularmente intimado, não comparecer em juízo.
O mesmo autor ainda sugestiona:
Por isso, quando o ofendido atribui a alguém a prática de um crime, pensamos que
ele tem o dever de depor, sempre que intimado, pois, ao final, poderá vir a ser
apurada a sua responsabilidade penal pela falsa imputação de crime. É claro que, na
hipótese de vir ele a ser processado pela denunciação caluniosa ou qualquer outro
tipo resultante da falsa atribuição de crime a outrem, o direito ao silêncio naquele
processo lhe será assegurado, mas isso apenas na posição de acusado e não de
acusador. (PACELLI, 2017).
Pacelli atribui o dever do ofendido em manifestar-se quando for intimidado para
que assim, ao final do processo, seja analisado se caluniou ou não o suspeito do crime.
2.5.6 Reconhecimento de pessoas e coisas
É o ato formal e solene pelo qual uma pessoa afirma como certa a identidade de
outra ou a qualidade de uma coisa, para fins processuais penais. Cuida-se de um meio de
prova. (NUCCI, 2015)
Eventualmente poderá ser essencial para o esclarecimento da causa que algum
indivíduo ou objeto seja identificado e vinculado, direta ou indiretamente, ao delito. ―Nessa
lógica, a pessoa que tenha tido contato anteriormente com a coisa ou pessoa a ser reconhecida
será chamada a prestar sua contribui o, confirmando se realmente se trata da pessoa ou coisa
que se imagina ser. (T VORA; ASSUMP O, , p. 92-93).
O procedimento previsto no art. 226, III, do CPP, fundado no receio que a testemunha possa ter em relação à pessoa a ser reconhecida, é feito de modo
29
sigiloso, isto é, impedindo que o reconhecido possa ver aquele que o reconhece. Em
razão disso, a própria legislação estabelece não ser possível tal procedimento em
juízo (art. 226, parágrafo único), em obediência às exigências da ampla defesa.
(PACELLI, 2017)
Este procedimento pretende identificar pessoas ou coisas que de alguma forma
estavam intrometidas no fato delituoso, e que se provando sua veracidade serão relevantes
para o levantamento das responsabilidades.
2.5.7 Acareação
Buscando a verdade real, a autoridade judiciária ou policial, usufrui do ato
processual chamado acarea o. Segundo Nucci ( 5), este ato processual ―coloca frente a
frente depoentes e declarantes, confrontando-os, e comparando narrativas contraditórias ou
divergentes, no processo, visando à busca da verdade real.‖
No artigo 229 do CPP nos instrui que a acareação será realizada para solucionar
dúvidas pertinentes quando houver divergência entre as narrativas do acusado, testemunha e
ofendido. Serão feitas perguntas aos acareados sobre os pontos divergentes e depois o ato será
reduzido a termo.
―É importante ressaltar que só se justifica tal prova quando ocorrer divergência
sobre ponto relevante para a apuração da verdade real sobre o que estiver sendo apurado no
processo.‖ (DEMERCIAN; MALULY, 2014)
Nucci (2015) nos alerta que este meio de prova na maioria das vezes não é eficaz:
Acarear implica na ideia de afrontar ou enfrentar, significando embate entre opostos,
com a meta de triunfo do bem (verdade) sobre o mal (mentira). Certamente, não
passa de um ideal, pois, na prática, vê-se pouco resultado consistente no emprego da
acareação. O confronto entre pessoas cujos depoimentos, no processo, sobre o
mesmo fato, são divergentes, haveria de resultar em consenso, provocando a retratação de uma das partes acareadas, visto que a verdade não pode ter infinitas
versões.
O autor reforça que na maior parte das vezes, este meio de prova é de pouco valor
e que na prática, o acareado mantém suas posições original, não se preocupando que
eventualmente podem ser responsabilizados criminalmente por falso testemunho. (NUCCI,
2015)
30
2.5.8 Da busca e apreensão
Este princípio tem como objetivo investigar, descobrir e pesquisar algo que seja
interessante ao processo penal, podendo assim apreender pessoas ou coisas consideradas
elementos probatórios. (NUCCI, 2015).
O autor ainda faz distinção da busca como meio de prova ou medida
assecuratória:
Conforme o caso, a busca pode significar um meio de prova, quando se vincule à
autorização conferida pelo juiz para a realização de uma diligência ou uma perícia
em determinado domicílio. Pode simbolizar um meio assecuratório, quando se ligar
ao ato preliminar de apreensão de produto de crime, razão pela qual se destina à devolução à vítima. (NUCCI, 2015)
Se bem que a legislação interprete a busca e apreensão como meio de prova pode-
se também considerar como ―uma medida assecuratória e coercitiva que visa a evitar o
perecimento de alguma prova e sua apresentação à autoridade para a elucidação da infração
penal‖. (DEMERCIAN; MALULY, 2014).
2.5.9 Indícios
Para Pacelli (2017), o indício que é citado no artigo 239 do CPP não chega ser
devidamente um meio de prova. Vale-se da utilização de um raciocínio dedutivo, que,
baseado na valoração da prova de um fato chegará até a veracidade da existência de outro
fato. Em outras palavras:
Com efeito, pelo indício, afirma-se a existência do conhecimento de uma circunstância do fato delituoso, por meio de um processo dedutivo cujo objeto é a
prova da existência de outro fato. Parte-se, então, para um juízo de lógica dedutiva
para a valoração de circunstâncias que estejam relacionadas com o fato em apuração.
(PACELLI, 2017)
Não obstante, Nucci (2015) explana que ―O indício é um fato secundário,
conhecido e provado, que, tendo relação com o fato principal, autorize, por raciocínio
indutivo-dedutivo, a conclusão da existência de outro fato secundário ou outra circunstância.‖
Távora e Assump o (2012, p. 98) nos explica sobre o uso da presunção na
análise dos fatos delitivos, fazendo-se valer pelo silogismo:
Já a presun o é o conhecimento daquilo que normalmente acontece, a ordem
normal das coisas, que, uma vez positivada em lei, estabelece como verídico
determinado acontecimento. Assim, fazendo silogismo, temos: (i) premissa menor: é
o indício, ou seja, a circunst ncia conhecida e provada; (ii) premissa maior: é o
princípio de raz o ou regra de experiência, utilizados na análise daquilo que
normalmente acontece (presun o); (iii) conclus o: compara o entre as premissas,
31
que nos permite chegar ao resultado, ao denominador. Imaginemos o suspeito que é
encontrado, minutos depois do ocorrido, ao lado da vítima, com a arma na m o.
Colocando-nos como verdadeiro expectador, percebe-se que a circunst ncia
conhecida e provada é o fato de o indivíduo ter sido encontrado na cena do crime,
com a arma em punho (este é o indício – premissa menor). Ora, quem é
surpreendido nesta situa o, por uma premissa lógica, provavelmente é o autor do
crime (esta é a presun o – premissa maior).
Em suma, averiguando os fatos exemplificados acima, chegaremos a conclusão
que o resultado foi apanhado a partir da verificação das premissas.
Chegamos ao fim deste capítulo e iniciaremos o próximo estudando as formas de
apreensão de conhecimento, frisando suas conceituações, teorias e correntes.
32
3 FORMAS DE APREENSÃO DO CONHECIMENTO
Depois de analisarmos as considerações sobre a prova penal, elencaremos neste
capítulo formas de apreender conhecimento: imaginação, pensamento, percepção linguagem e
a mais importante para nosso trabalho, a memória. Importante se faz a explicação desta forma
de apreender conhecimento pois é a mais pertinente e corriqueira na produção dos elementos
probatórios do sistema penal brasileiro. Por este motivo vejamos primeiramente as
considerações sobre o Conhecimento.
Conforme séculos, diversas teorias surgiram no sentido de explicar como funciona
a relação sujeito-objeto da compreensão humana. Tendo sempre em mente que somos a
espécie que mais evolui dentre todas já catalogadas, uma das várias características que marca
o nosso processo de desenvolvimento, uma nos faz marcante: Somos natural e extintivamente
questionadores de tudo. O conhecimento nos move.
Muitas das indagações do passado, ainda são pertinentes. Quem somos? Para onde
vamos? Para que existimos? Entre vários questionamentos já realizados pelo homem ao longo
da história, um abordaremos nesse capítulo: Podemos conhecer tudo?
Reale, (1999, p. 29-30) também se questiona: ―Que é que se conhece? Como se
conhece? Até que ponto o conhecimento do real é válido e certo? Quais as atitudes de nosso
espírito diante daquilo que é conhecido? Eis aí uma série de perguntas que se põem quanto ao
problema do conhecimento‖.
Nos ltimos séculos de nossa história, a busca do ― onhecer‖ vêem sendo
buscada incessantemente. Reale (2002), discorre:
A necessidade de procurar explicar o mundo dando-lhe um sentido e descobrindo-
lhe as leis ocultas é tão antiga como o próprio Homem, que tem recorrido para isso
quer ao auxílio da magia, do mito e da religião, quer, mais recentemente, à contribuição da ciência e da tecnologia. Mas é sobretudo nos últimos séculos da
nossa História, que se tem dado a importância crescente aos domínios do
conhecimento e da ciência. (apud SANTOS, [20--?])
Nas primeiras teorias usou-se o sobrenatural, isto é, o divino, mito, religião para
darmos as respostas convincentes às nossas indagações. Atualmente ciência e tecnologia
desbravam em horizontes longínquos para encontrar respostas.
Vejamos a explicação de Conhecer dada por Reale:
Conhecer é trazer para nossa consciência algo que supomos ou pré-supomos fora de
nós. O conhecimento é uma conquista, uma apreensão espiritual de algo. Conhecer é
abranger algo tornando-nos senhores de um ou de alguns de seus aspectos. Toda vez
que falamos em conhecimento, envolvemos dois termos: — o sujeito que conhece, e
algo de que se tem ou de que se quer ter ciência. Algo, enquanto passível de
33
conhecimento, chama-se objeto, que é assim, o resultado possível de nossa atividade
cognoscitiva. (1999, p. 53)
Nesta senda, o sujeito terá formas de adquirir o objeto, ou seja, o conhecimento.
Vejamos a primeira forma de apreender conhecimento.
3.1 IMAGINAÇÃO
A imaginação, para Chauí (2000, p. 131), tem dois surgimentos: de um lado,
criação inteligente e inovadora, que consiste em acreditar e fazer aparecer algo que não existe.
De outro lado temos a característica de exagero, mentira e invencionice, que é incapaz de
reproduzir o que existe ou o que acontece.
Até porque se compreende que o imaginário não é um simples conjunto de imagens
que vagueia livremente na memória e na imaginação. Ele é uma rede de imagens na
qual o sentido é dado na relação entre elas; as imagens organizam-se de acordo com
certa lógica, certa estruturação, de modo que a configuração mítica do nosso
imaginário depende da forma como se arrumam nele nossas fantasias (GOMES, 2010, apud THROUP; GOMES, 2012, p. 47-48)
Na mesma linha, Eliade, (1991), afirma:
Ter imaginação é gozar de uma riqueza interior, de um fluxo ininterrupto e
espontâneo de imagens. Porém, espontaneidade não quer dizer invenção arbitrária. Etmologicamente, imaginação está ligada a ímago, representação, imitação, imitar,
reproduzir. Excepcionalmente, a etimologia responde tanto às realidades
psicológicas como à verdade espiritual. A imaginação imita modelos exemplares, as
imagens, reproduzindo-os, reatualizando-os, repetindo-os infinitamente. Ter
imaginação é ver o mundo na sua totalidade, pois as imagens têm o poder e a missão
de mostrar tudo o que permanece refratário ao conceito. (apud THROUP; GOMES,
2012, p. 46)
Imaginar e perceber são simultâneos, contudo os dois têm funções diferentes.
Quando visualizo a fotografia de uma pessoa amada percebo sua fisionomia, ou seja, as
características faciais e corporais. Ao mesmo tempo imagino a doçura do olhar, o sorriso
lindo, isto é, características pessoais idealizadas pelo indivíduo que vê a fotografia.
3.2 PENSAMENTO
Pesquisando em dicionários os significados de ―pensar‖ e ―pensamento‖,
depararemos com diversos sentidos. Chauí (2000, p.152)
A autora, na mesma linha de pensamento, resume bem os significados:
Pensar, dizem os dicionários, significa: 1. aplicar a atividade do espírito aos
elementos fornecidos pelo conhecimento; formar e combinar idéias [sic]; julgar,
refletir, raciocinar, especular; 2. exercer a inteligência; meditar, ver; 3. exercer o
espírito ou a atividade consciente de uma maneira global: sentir, querer, refletir; 4.
34
ter uma opinião, uma convicção; 5. supor, presumir, crer, admitir, suspeitar, achar;
6. esperar, tencionar; 7. preocupar-se; 8. avaliar; 9. cismar.
Pensamento, de acordo com os dicionários, significa: 1. o ato de refletir, meditar ou
pensar, ou o processo mental que se concentra em idéias [sic]; 2. a atividade de
conhecimento ou tendo por objeto o conhecimento; 3. consciência, mente, espírito,
entendimento, intelecto, razão; 4. poder de formular idéias [sic] e conceitos; 5.
faculdade de pensar logicamente, raciocínio, ponto de vista, formulação de um juízo;
6. aquilo que é pensado ou o resultado do ato de pensar: idéia [sic], ponto de vista,
opinião, juízo; 7. fantasia, sonho, devaneio, lembrança, recordação, cuidado,
preocupação, expectativa; 8. conjunto das idéias [sic] ou doutrina de um pensador,
de uma sociedade, de um grupo, de uma coletividade. (p. 152)
A mesma autora ainda lembra sobre a origem das palavras pensamento e pensar.
Vêm do verbo latino ―pendere‖, que significa: ficar em suspenso, estar ou ficar pendente ou
pendurado, suspender, pesar, pagar, examinar, avaliar, ponderar, compensar, recompensar e
equilibrar. (CHAUÍ, 2000, p. 153)
Chauí pondera sobre o objetivo do pensamento:
Pensar, portanto, é suspender o julgamento (até formar uma idéia [sic] ou opinião),
pesar (comparar idéias [sic], opiniões, pontos de vista), avaliar (julgar o valor de uma idéia [sic] ou opinião, ou seja, se é verdadeira ou falsa, justa ou injusta,
adequada ou inadequada), examinar (idéias [sic], opiniões, juízos, pontos de vista),
ponderar (isto é, pesar idéias [sic] e pontos de vista para escolher um deles),
equilibrar (encontrar o meio-termo entre extremos ou entre opostos). (2000, p. 153)
A mesma autora ainda define: ―Pensare, derivando-se de pendere, caracteriza-se
mais como uma atividade sobre idéias [sic], opiniões, juízos e pontos de vista já existentes do
que como criação ou produção de uma idéia [sic] ou ponto de vista‖. (2000, p. 153), ou seja,
pensar não ato de criar e sim atividade de refletir com as informações já adquiridas.
3.3 PERCEPÇÃO
À luz de Chauí (2000, p. 122), a percepção contém as seguintes características:
[...] é sempre uma experiência dotada de significação, isto é, o percebido é dotado de sentido e tem sentido em nossa história de vida, fazendo parte de nosso mundo e de
nossas vivências;
[...] o próprio mundo exterior não é uma coleção ou uma soma de coisas isoladas,
mas está organizado em formas e estruturas complexas dotadas de sentido. Uma
paisagem, por exemplo, não é uma soma de coisas que estão apenas próximas umas
das outras, mas é a percepção de coisas que formam um todo complexo e com
sentido [...]
Para exemplificar, tomemos a imagem de uma paisagem onde podemos identificar
rio, montanha, árvores, pedras, céu, etc. O tamanho da montanha será percebido porque há o
céu, árvores e um rio para fazermos o contraste. As cores da montanha será percebido, pois
observamos as cores do rio, do céu e vegetação, etc.
35
Depois de percebemos todos os detalhes julgaremos esta paisagem, como mero
espectador, um espetáculo de contemplação. Para a percepção de um pintor, uma maravilhosa
imagem para imprimi-la em sua tela de pintura. Para a percepção de um viajante, muitos
obstáculos a serem desbravados. ―Em resumo: na percepção, o mundo possui forma e sentido
e ambos são inseparáveis do sujeito da percepção;‖ (CHAUÍ, 2000, p. 122)
Chauí continua explicando o significado de percepção: (2000, p. 123)
A percepção envolve toda nossa personalidade, nossa história pessoal, nossa
afetividade, nossos desejos e paixões, isto é, a percepção é uma maneira
fundamental de os seres humanos estarem no mundo. Percebemos as coisas e os
outros de modo positivo ou negativo, percebemos as coisas como instrumentos ou como valores, reagimos positiva ou negativamente a cores, odores, sabores, texturas,
distâncias, tamanhos. O mundo é percebido qualitativamente, efetivamente e
valorativamente.
Ou seja, percebendo outro indivíduo, por exemplo, verificamos sua fisionomia e
intrinsecamente a julgamos agradável ou desagradável, sedutora ou repelente, serena ou
agitada, bela ou feia, sadia ou doentia, assim definiremos um modo de relacionamento com
ela.
Para Merleau-Ponty (1999 apud LIMA, 2012 p. 34), ―[...] é a percepção, como ato
inaugural, e não o sujeito da consciência representativa que nos abre o sentido dos dados
percebidos‖, isto é, não há uma ideia de realidade já estabelecida, a priori, na consciência do
indivíduo, é a percepção que abrirá o primeiro juízo de valor do objeto percebido, conforme
experiências já adquiridas pelo sujeito observador.
3.4 LINGUAGEM
Definir linguagem é uma problemática que há muito tempo estudiosos tentam
defini-la. Sausurre (2004) exprime:
O signo linguístico une não uma coisa a uma palavra, mas um conceito a uma
imagem acústica. O conceito reflete o que o objeto é em si, em termos gerais e
universais; suas propriedades e características o diferem de outros objetos. Os signos
são instrumentos de comunicação e representação dos objetos e da realidade. Assim,
a comunicação humana passa por esse processo de associação de ideias. Esse
processo é intrínseco à característica da língua, e a língua é uma regra livremente
consentida e adotada por uma coletividade. (apud LOPES; CUSTÓDIO, 2015, p.
218)
Ou seja, traduzimos objetos e ideias de nosso mundo interior e exterior com o
auxílio verbal (acústico) e/ou através dos signos ou sinais.
Com a ajuda de Chauí (2000, p. 141) podemos definir linguagem como um
sistema de sinais com função indicativa, comunicativa, expressiva e conotativa.
36
Na mesma linha de raciocínio a autora subdivide os significados de linguagem:
1. a linguagem é um sistema, isto é, uma totalidade estruturada, com princípios e leis
próprios, sistema esse que pode ser conhecido; 2. a linguagem é um sistema de sinais ou de signos, isto é, os elementos que formam
a totalidade linguística são um tipo especial de objetos, os signos, ou objetos que
indicam outros, designam outros ou representam outros. Por exemplo, a fumaça é
um signo ou sinal de fogo, a cicatriz é signo ou sinal de uma ferida, manchas na pele
de um determinado formato, tamanho e cor são signos de sarampo ou de catapora,
etc. No caso da linguagem, os signos são palavras e os componentes das palavras
(sons ou letras);
3. a linguagem indica coisas, isto é, os signos linguísticos (as palavras) possuem
uma função indicativa ou denotativa, pois como que apontam para as coisas que
significam;
4. a linguagem tem uma função comunicativa, isto é, por meio das palavras entramos em relação com os outros, dialogamos, argumentamos, persuadimos,
relatamos, discutimos, amamos e odiamos, ensinamos e aprendemos, etc.;
5. a linguagem exprime pensamentos, sentimentos e valores, isto é, possui uma
função de conhecimento e de expressão, sendo neste caso conotativa, ou seja, uma
mesma palavra pode exprimir sentidos ou significados diferentes, dependendo do
sujeito que a emprega, do sujeito que a ouve e lê, das condições ou circunstâncias
em que foi empregada ou do contexto em que é usada. Assim, por exemplo, a
palavra água, se for usada por um professor numa aula de química, conotará o
elemento químico que corresponde à fórmula H2O; se for empregada por um poeta,
pode conotar rios, chuvas, lágrimas, mar, líquido, pureza, etc.; se for empregada por
uma criança que chora pode estar indicando uma carência ou necessidade como a
sede.
Assim afirma Hjelmslev (1975 apud DALGALARRONDO, 2008, p. 233) sobre
linguagem: "instrumento graças ao qual o homem modela seu pensamento, seus sentimentos,
suas emoções, seus esforços, sua vontade e seus atos, o instrumento graças ao qual ele
influencia e é influenciado, a base mais profunda da sociedade humana", ou seja, o homem se
torna social e cívico pelo fato de dominar a linguagem.
3.5 MEMÓRIA
Segundo Crook e Adderly (2001, p. 23): ―A memória pode ser definida a partir de
três perspectivas distintas: pela dura o; pelo conte do; e pelo processo de sua forma o.‖
Os mesmos autores dividem a memória de duração em quatro tipos: Memória
Imediata: a de curto prazo. Alguém cita-lhe um número de telefone, depois de discá-lo sua
memória esquece-o. Memória para fatos recentes é além do curto prazo. Registra-se na mente
por um período maior por ter uma importância mais relevante, porém esta tem uma função
temporária, ou seja, a informa o é ―apagada‖ da mente dentre minutos ou algumas horas.
Memórias de fatos antigos: caracteriza-se por estar em um ―banco de dados‖ com status de
―permanente‖. (CROOK; ADDERLY, 2001, p. 24-25)
37
Porém este permanente pode ser esquecido pelo fator tempo, por isto usamos entre
aspas por ser difícil de apagar. Memória remota é aquela que pode ser considerada
inesquecível, que acompanha o indivíduo por toda vida. Memória de infância, seu próprio
nome, data de aniversário, etc. importante frisar que todos os tipos de memórias citados estão
sujeitos a declínio conforme idade e características biológicas de cada indivíduo.
No que tange ao conteúdo, dividem-se em: Eventos e fatos, Conhecimento e
Memória Processual. O primeiro, eventos e fatos, ele explica que: ―é a capacidade de lembrar
peda os isolados de informa o‖, isto é, eventos traumáticos, experiências alegres da vida,
casamentos, enterros, etc. (CROOK; ADDERLY, 2001, p. 28-29)
onhecimento: ―Assim, o conhecimento é de fato uma síntese de um conjunto
incomensuravelmente grande de fatos, sua soma se fundindo no amálgama da memória, que
nos dá a capacidade de discernir, julgar e, esperemos, até sabedoria.‖; e a memória processual
é a mais básica dentre todas as memórias. Nossa existência é baseada nesta, ou seja, os
movimentos de caminhar, dirigir, escrever não serão esquecidos até o final da vida do
indivíduo. (CROOK; ADDERLY, 2001, p. 29-30)
A última divisão da memória, diz respeito a sua forma o. ―Prestar a aten o‖ é a
primeira subdivis o. ―É o esfor o consciente para prestar aten o‖, ou seja, se n o decoramos
no nome de alguém que nos é apresentado é porque não focamos nesta apresentação, caso
contrário, lembraríamos posteriormente do nome desta pessoa. Seletividade é outra
característica da formação de memória. (CROOK; ADDERLY, 2001, p. 31)
A capacidade de selecionar o que realmente nos interessa, isto é, prestar atenção
nas coisas que achamos úteis e dignas de serem relembradas. A terceira subdivisão é
Lembranças e esquecimentos adaptativos. Tem teor de seletividade, mas é de caráter
inconsciente. Eventos traumáticos são esquecidos ou distorcidos inconscientemente enquanto
momentos eufóricos e de alegria são relembrados com mais prazer. Última subdivisão diz
respeito a Lembran as incorretas: ―As memórias n o s o registros exatos de uma
experiência‖. (CROOK; ADDERLY, 2001, p. 31-34)
De certo modo, usamos nosso conhecimento do mundo e experiências
semelhantes para preencher informações incompletas ou faltantes em nossa memória. Fazer
um exercício de relembrança de alguma experiência vivida faz com que o sistema nervoso
busque preencher as ―falhas‖ (lacunas) dos detalhes deste fato, isto é, a mente n o
reconstituirá absolutamente todo o fato que se tenta lembrar. (CROOK; ADDERLY, 2001, p.
31-34)
Chauí discorre sobre as lembranças:
38
[...] podem ser trazidas ao presente tanto espontaneamente, quanto por um trabalho
deliberado de nossa consciência. Lembramos espontaneamente quando, por
exemplo, diante de uma situação presente nos vem à lembrança alguma situação
passada. Recordamos quando fazemos o esforço para lembrar. (2000, p. 130).
Ou seja, é através da memória que temos a capacidade de lembrar e recordar dos
fatos, ideias e/ou conhecimentos adquiridos ao longo da nossa vida.
Entretanto, até que ponto a memória é confiável? ―Qu o confiável é a memória
humana? Você julgaria possível que a memória sobre alguns fatos relevantes da sua história
seja falsa?‖ (STEIN et al., 2010, p. 19). Diante desta incógnita entraremos no instituto das
FM‘s.
3.5.1 As falsas memórias (FM’ )
Em 1881, um rapaz chamado Louis, de 34 anos, morador de Paris, despertou a
atenção de médicos, em razão de que estava lembrando de fatos que nunca haviam
acontecido. Theodule Ribot, psicólogo francês, intitulou este caso de FM‘s. A partir daí
surgiram as primeiras pesquisas sobre episódios de FM‘s. (STEIN et al., 2010, p. 22-23).
Ainda na França, em 1900 e na Alemanha, em 1910, Alfred Binet e Stem,
respectivamente, foram os precursores nos estudos acerca das FM‘s onde procederam
pesquisas sobre sugestionabilidade da memória. As pesquisas foram mais específicas em
crianças, onde conseguiram distinguir eventos espontâneos de origem interna e eventos
sugeridos de origem externa. (STEIN et al., 2010, p. 23)
Loftus, Miller e Burns (1978) frisa a importância dos estudos de Alfred Binet:
Uma das importantes contribui ões deste pesquisador foi categorizar a sugest o na
memória em dois tipos: autossugerida (isto é, aquela que é fruto dos processos
internos do indivíduo) e deliberadamente sugerida (isto é, aquela que provém do ambiente). As distor ões mnem nicas advindas desses dois processos foram
posteriormente denominadas de FM espont neas e sugeridas (apud STEIN et al.,
2010, p. 23)
A pesquisa feita em adultos partiu de arlett em 93 , na Inglaterra. ― artlett
demonstrou que a memória é influenciada pelas perspectivas individuais e culturais, sendo um
processo de compreens o e entendimento pessoais‖ (STEIN et al., 2010, p. 23-24).
Entretanto, foi por volta de 1970 que uma especialista chamada Elizabeth Loftus,
expôs ao mundo o que é, e como ocorrem as FM‘s. Loftus desenvolveu uma técnica intitulada
de ―Procedimento de Sugest o de Falsa Informa o‖. aseava-se em introduzir à uma
experiência vivenciada ou não uma informação não verdadeira. A pessoa acreditava
verdadeiramente ter passado por esta falsa informa o. ―[...] a partir da influência de um
39
agente externo, a pessoa passa a recordar fatos que na verdade não foram vivenciados por ela,
ou que foram, mas a partir dessa indução alheia, o ocorrido se destorce.‖ (GESU, 2014, p.
127-128).
[...] a memória das pessoas não é somente a soma de tudo aquilo que fizeram, mas
talvez algo mais: as memórias são também a soma daquilo que as pessoas pensaram,
de tudo o que lhes foi dito, e de todas as suas crenças. Aquilo que somos pode ser
enquadrado nas nossas memórias, mas as nossas memórias estão dependentes
daquilo que somos e de tudo o que somos levados a acreditar. (LOFTUS, 2006 apud
IRIGONHÊ, 2014, p. 34)
―Nossa memória é suscetível distor o mediante sugestões de informa ões
posteriores aos eventos. Além disso, outras pessoas, suas percepções e interpretações podem
influenciar a forma como recordamos dos fatos‖ (STEIN et al., 2010, p. 26).
Aprofundando neste cenário, devemos frisar que há diferenças entre mentiras e
FM‘s. A mentira consiste em manipular e inventar os fatos que narra, ou seja, o sujeito sabe
que o que está relatando é inventado propositalmente. Nas FM‘s―[...] a pessoa acredita
veemente e de boa fé que o que lhe foi sugestionado realmente aconteceu, independe do
querer do sujeito[...]‖ (LOPES JÚNIOR, 2013, apud MORGENSTERN; SOVERAL,
[2014?])
Também explica Stein (et al., 2010, p. 22) a distin o entre mentira e FM‘s:
abe ressaltar que as FM n o s o mentiras ou fantasias das pessoas, elas s o
semelhantes s MV (Mentiras Verdadeiras), tanto no que tange a sua base cognitiva
quanto neurofisiológica. No entanto, diferenciam-se das verdadeiras, pelo fato de as
FM serem compostas no todo ou em parte por lembran as de informa ões ou
eventos que n o ocorreram na realidade. As FM s o frutos do funcionamento
normal, n o patológico, de nossa memória.
Quando a sugestão da falsa informação decorre do meio externo (exógeno) ao
indivíduo, denomina-se FM sugerida. Após o evento ter ocorrido, o sujeito acata uma falsa
informação externa e incorpora junto à memória original (LOFTUS, 2004 apud STEIN, 2010,
p. 26). A implantação da informação falsa pode ter ou n o o objetivo de gerar FM‘s de forma
proposital.
Na mesma linha, Brainerd e Reyna (2005) seguem o raciocínio:
Esse fen meno, denominado efeito da sugest o de falsa informa o, pode ocorrer
tanto de forma acidental quanto de forma deliberada. Nas FM sugeridas, após
presenciar um evento, transcorre-se um período de tempo no qual uma nova
informa o é apresentada como fazendo parte do evento original, quando na
realidade n o faz. [...] O efeito da falsa informa o tende a produzir uma redu o
das lembran as verdadeiras e um aumento das FM. (apud STEIN et al., 2010, p. 26)
A introdução da FM acontece quando a sugestão for depois do evento lembrado e
o sujeito n o tem ciência desta inten o de sugest o. ―Não se trata, portanto, de uma
40
simulação, mas de algo em que a pessoa passa verdadeiramente a acreditar, uma lembrança de
algo que não ocorreu.‖ (MASI, 2015)
Em se tratando de influência interna (endógena), temos a FM autossugerida ou
espontânea. As falsas informações são alteradas internamente no indivíduo, sem nenhuma
influência externa. (STEIN et al., 2010, p. 25) A memória sofre distorções no seu próprio
funcionamento, isto é, ― ela pode decorrer de uma simples confus o mental, de uma distor o
de um fato inicialmente verdadeiro [...] meros erros da própria memória [...]‖ (MASI, 2015)
Vejamos no próximo tópico as Teorias relacionadas às FM‘s. Existem quatro
teorias que esclarecem a ocorrência e mecanismos das FM‘s: Teoria onstrutivista, Teoria
dos Esquemas, Teoria do Monitoramento e a Teoria do Traço Difuso.
3.5.1.1 Teoria construtivista
A teoria construtivista e dos esquemas estão no mesmo parâmetro do Paradigma
Construtivista, que compreende a memória ―como um sistema nico que vai sendo construído
a partir da interpreta o que as pessoas fazem dos eventos.‖ (STEIN et al.; 2010, p. 27).
Stein (et al., 2010) nos explica que para a Teoria Construtivista:
[...] as novas informações são unidas as informações mais antigas que a pessoa já
tem arquivada em memória, e por essa ‗integra o de memórias‘ o resultado muitas
vezes é a distorção, tanto dos fatos passados quanto dos fatos atuais, levando o
individuo a ter uma falsa memória. (apud MORGENSTERN; SOVERAL, [2014?],
p. 13)
A memória está sujeita às mudanças e será produzida ao longo da vida com base
na interpretação que o indivíduo fará sobre os eventos que presenciará. ―Assim, o que resulta
do processo de reconstrução é o significado que foi atribuído pela pessoa à experiência, e não
a experiência propriamente dita‖. (GESU, 2014 apud IRIGONHÊ, 2014, p. 47)
Assim, entende-se que, o que o sujeito recorda é produto da compreensão e
entendimento que colheu do fato que presenciou e que depois reorganizou de maneira
estruturada em sua memória. (STEIN et al., 2010, p. 27)
3.5.1.2 Teoria dos esquemas
Semelhante a Teoria Construtivista, a Teoria dos Esquemas sustenta, segundo
Stein (et al., 2010, p. 28-29):
[...] que a memória é criada a partir de esquemas mentais, os quais, por sua vez, são
como informações pré-existentes na mente e que quando uma nova informação entra
41
ela é direcionada a um esquema que a defina, fazendo com que haja a compreensão
e o entendimento da situação vivenciada.
Com o redirecionamento errado das informações novas à memória surgem as
FM‘s sugeridas e espont neas, isto é, ―quando uma informação nova chega à memória ela é
interpretada segundo os esquemas que já est o fixados nela.‖ (STEIN et al., 2010 apud
MORGENSTERN; SOVERAL, [2014?], p. 14). Depois desta interpretação, a informação que
recém chegou irá ser inserida ao esquema que condiz à sua categoria. É dessa maneira que
acontece o ―erro‖, gerando assim as FM‘s. (STEIN et al., 2010, p. 29)
3.5.1.3 Teoria do monitoramento da fonte
Esta teoria tem como intuito diferenciar a fonte da memória verdadeira e outras
fontes, podendo ser interna e externa. As fontes internas referem-se, por exemplo, a
sentimentos, emoções, pensamentos próprios da memória do sujeito. As externas podem ser
relacionados aos fatos vivenciados pelo indivíduo. (STEIN et al., 2010, p. 31).
Irigonhê ( 4, p. 48) também dispõe que, ―Por sua vez, a Teoria do
Monitoramento da Fonte, explica que ‗a fonte de uma informação refere-se ao local, pessoa
ou situação de onde ela provém.‖
Desta forma ―uma vez que, por um descuido apenas, a pessoa deixa de monitorar
a fonte, informações novas se confundem com outras já vividas, ou até mesmo com
sentimentos, pensamentos, ocasionando assim, as falsas memórias‖ (STEIN et al., 2010, p.
31).
3.5.1.4 Teoria do traço difuso (TTD)
Nesta teoria trabalha-se com o conceito de que a memória não é constituída por
apenas um traço e sim múltiplos, tendo assim a divisão de dois sistemas da memória: literal e
de essência: ―A memória literal tem a fun o de armazenar detalhes específicos e superficiais
sobre algum acontecimento, já a memória de essência registra a compreensão do que
significou algum evento (GESU, 2014, p. 140).
Portanto, ―para a TTD a memória n o é um sistema unitário e sim composta por
dois sistemas, nos quais o armazenamento e a recuperação das duas memórias são
dissociados.‖ (STEIN et al., 2010, p. 34).
42
Discorremos neste capítulo as formas de apreender conhecimento. A mais
pertinente é a memória. Percebemos que a memória sofre influências interna e externa,
gerando as FM‘s. Entraremos no próximo capítulo no que tange a explanação das influências
que as FM‘s proporcionam ao apreciarmos as provas no processo penal.
43
4 A INFLUÊNCIA DAS FALSAS MEMÓRIAS NA PRODUÇÃO DOS
ELEMENTOS PROBATÓRIOS NO PROCESSO PENAL
Dentro do processo penal, no que tange o recolhimento probatório, percebemos a
necessidade de analisarmos as FM‘s, mais especificamente nas provas testemunhais,
interrogatório do acusado, perguntas ao ofendido e reconhecimento de pessoas e coisas. São
nestas modalidades de provas que inúmeras complexidades afetarão a memória em xeque a
busca da verdade real no processo penal.
Recapitulando o posicionamento de Ferrajoli (2008 apud RIBEIRO 2006, p. 19)
sobre o ideal inalcançável de busca da verdade real:
A impossibilidade de formular um critério seguro de verdade das teses judiciais
depende do fato de que a verdade ‗certa‘, ‗objetiva‘ ou ‗absoluta‘ representa sempre
a ―express o de um ideal‖ inalcançável. A idéia [sic] contrária de que se pode
conseguir e asseverar uma verdade objetiva ou absolutamente certa é, na realidade,
uma ingenuidade epistemológica.
Na mesma linha de raciocínio, Machado (2014, p. 461) disserta sobre o tema:
[...] n o há como reconstituir no processo um fato criminoso que já n o existe mais,
que pertence ao passado e que, portanto, n o se constitui mais numa realidade. Logo,
só será possível representá-lo na memória, no plano mental e na imagina o dos
sujeitos processuais. E essa representa o, como toda representa o, é sempre
suscetível de subjetivismos, além do que os meios de prova s o também suscetíveis
de falhas, distor ões, manipula ões etc.
Percebemos as complexidades envolvidas no decorrer do processo penal e que se
tornam ainda mais evidentes quando compreendemos que, na prática forense brasileira, existe
uma dependência da prova cujo conteúdo é fundamentalmente a memória. Estas possíveis
distorções da memória no recolhimento probatório podem acarretar condenações injustas,
acarretando efeitos desastrosos ao condenado.
Ávila (2016) lembra que não possuímos no nosso país uma estatística do número
de quantas pessoas foram condenadas baseadas nas FM‘s. Porém, existe um projeto nos EUA
baseado nisto. Vejamos alguns dados:
Nos EUA existe uma Organização não governamental chamada The Innocence
Project que analisou uma série de casos ocorridos fundamentalmente na década de
70 e se fez uma comparação do material genético daquela pessoa que está
cumprindo pena hoje com material genético que existia na década de 70 mas em
função de ainda não termos o avanço da técnica de DNA não se conseguir analisar por exemplo, aquele fio de cabelo que estava na cena do crime. E o Innocence
Project chegou a resultados bastante importantes. Essas ações são chamados nos
EUA de ações de Exoneração e nesse caso do Innocence Project que são utilizadas
fundamentalmente as baseadas no DNA. Alguns dos resultados do Innocence
Project chegou a conclusão que em média as pessoas exoneradas pelo Innocence
Project passavam 13 anos na prisão antes de serem libertadas. Em 70% dos casos a
pessoa exonerada era um membro de um grupo de minoria racial. Os erros de
identificação das testemunhas oculares contribuem em mais de 75% dos casos de
44
prisão indevida nos EUA. Esses dados não podem ser ignorados, eles precisam ser
aplicados, apesar das realidades serem diferentes, eles precisam ser estudados e
levados a sério não só nos EUA mas também no Brasil. (ÁVILA, 2016)
―No rasil n o temos, ainda, nenhuma iniciativa semelhante ao [The Innocence
Project], portanto é difícil dizer com certeza o número de pessoas cujas condenações
criminais restaram equivocadas por erros originários da memória.‖ (CARVALHO; AVILA,
2015, p. 557)
Entretanto, Chaves (2017) nos recorda sobre um trabalho financiado pelo IPEA,
encomendado pelo Ministério da Justiça:
[...] feito em 2014 e publicado em 2015. Foram entrevistadas 87 pessoas, entre policiais militares e civis, defensores públicos e privados, promotores de justiça e
juízes, nas cinco regiões brasileiras na primeira instância e em varas criminais. As
entrevistas mostraram, por exemplo, que o reconhecimento é tido como de ‗muita
import ncia‘ para 69,2% dos entrevistados. Já os testemunhos são considerados de
‗muita importância‘ para 90,3% dos ouvidos.
Esta pesquisa nos dá um parâmetro similar ao do projeto The Innocence Project e
percebemos a importância que os operadores jurídicas dão ao recolhimento de provas
baseados na memória dos entrevistados.
Há uma tendência predominante no sistema de investigação criminal no Brasil que
a memória humana é fotográfica, contudo, estudos de área psicológica, vem há muito tempo
discordar sobre esta afirmação e que há diversos fatores que influenciam a memória.
(CHAVES, 2017)
Assim, é de extrema importância estudarmos as FM‘s no Direito Penal.
Como se sabe, para condenar um acusado exige-se absoluta certeza. Na maioria
das vezes esta ―certeza‖ é baseada no depoimento de testemunhas, principalmente das
vítimas, nos crimes de esfera privada, ou seja, os elementos probatórios estão fundados na
memória dos entrevistados.
É corriqueiro na atividade forense, que uma vítima ou testemunha conceda uma
narrativa não verdadeira, baseada em uma recordação falsa. Desta maneira, percebemos o
comprometimento integral da confiabilidade do testemunho, que por consequência gera um
grande prejuízo ao imputado no processo. (GESU, 2014 apud PRECISAMOS... 2015)
Nesta mesma senda, Ávila (2013) esclarece a problemática das FM‘s no sistema
penal:
[...] certamente existem pessoas presas em decorrência de problemas de memória da
testemunha/vítima, pois são justamente estas as provas mais utilizadas em matéria
criminal. Como a memória e seu funcionamento segue sendo um mistério para as
ciências, temos mais um motivo para levarmos a sério a radical redução das
respostas penais. (apud PRECISAMOS... 2015)
45
Irigonhê (2015) nos alerta sobre a gravidade da influência que as FM‘s têm na
etapa de reconhecimento de pessoas e na prova testemunhal no processo criminal: "[...] entre
a verdade fidedigna e a mentira deliberada, surge o tema das FM‘s enquanto espinha dorsal da
prova testemunhal e de toda a atividade probatória que dela derive, tal qual o reconhecimento
de pessoas.‖ (apud PRECISAMOS... 2015)
Por certo, que existem uma série de peculiaridades da memória humana que se
intensificam no momento de reconhecer algo ou alguém. A má condução dos meios de provas
durante o processo agrava as FM‘s, aumentando a incidência de reconhecimentos errôneos,
tornando estes casos preocupantes. (IRIGONHÊ, 2015 apud PRECISAMOS... 2015).
Seger e Lopes Junior ([2012?] p. 8), levantam a preocupação de estudar as FM‘s
no âmbito jurídico, mais especificamente quando utilização a memória humana para obtenção
de provas:
Os atuais questionamentos referentes à habilidade de crianças e adultos – sejam eles
depoentes como vítimas de abuso físico (ou sexual) ou como testemunhas oculares
de crimes e contravenções em geral – de relatar fidedignamente os fatos vividos têm
aberto as portas para o estudo científico das falsas memórias, que constituem,
resumidamente, um fenômeno cujo efeito é nos lembrarmos de eventos que, na
realidade, não ocorreram.
Reconhecemos que no processo penal necessitamos da memória dos entrevistados
para constituirmos provas, e se plausíveis, usarmos para condenações. Entretanto, com o
decorrer dos estudos e constatações de doutrinadores vemos que a memória humana sofre
inúmeras influências, e que neste mesmo raciocínio Loftus ( 996) nos afirma que ―[...] a ideia
mais assustadora é que aquilo em que nós acreditamos com todo nosso coração pode não ser
necessariamente a verdade‖. (apud STEIN et al., 2010, p. 21).
Elencaremos no próximo capítulo, os fatores geradores das FM‘s para melhor
entendermos sua influência no recolhimento das provas penais.
4.1 FATORES GERADORES DE FALSAS MEMÓRIAS
Ao analisarmos o estudo do depoimento testemunhal e suas consequências
percebemos uma grande ligação aos estudos referentes a memória. Ao questionarmos a
testemunha pedimos para ela reconstruir a história, voltar para trás para reaver os fatos que
ocorreram no passado para enfim, trazê-los para o processo, já dizia Carnelutti (1995 apud
HENRIQUES; POMPEU, 2014, p. 8).
A prova testemunhal é uma das provas mais usadas constantemente no processo
penal brasileiro. Mas deve se ter um cuidado redobrado para com sua avaliação. A maioria
46
dos processos penais no nosso país são submetidos a ela. (OLIVEIRA, 2009 apud
HENRIQUES; POMPEU, 2014, p. 8).
A testemunha pode em seu depoimento transmitir credibilidade, já que acredita
fielmente e jura dizer a verdade baseando-se em sua memória. Diante disto ―deve-se analisar
detidamente o seu conteúdo e a sua incorporação aos autos do processo‖. (HENRIQUES;
POMPEU, 2014, p.8)
Não podemos descartar que além das provas testemunhais, há outras espécies de
provas penais que podem sofrer influência das FM‘s: interrogatório do acusado, perguntas ao
ofendido e reconhecimento de pessoas ou coisas. As testemunhas cabais de um crime sofrem
distorções em suas memórias, e isto desponta no momento de recolher suas versões nas
entrevistas processuais. Entretanto, não podemos deixar de lado as versões do acusado e das
vítimas, pois estas também poderão ser influenciadas interna ou externamente por FM‘s.
Todos os envolvidos processualmente colocarão em sua reconstrução mnemônica do fato
delituoso sua carga emocional e traumática, ou seja, cada indivíduo terá uma visão
subjetivista do fato que narrará.
Lopes Júnior e Gesu nos orienta que ―[...] que dentre os indivíduos que são mais
propícios à ocorrência das falsas memórias, estão aqueles que sofreram algum tipo trauma ou
alguma falha de memória.‖ ( 6, p. 64). Nesta mesma linha ymrot esclarece que ―certos
acontecimentos, fatos traumáticos [...], podem servir para comprovar uma fantasia do sujeito e
para que ele a torne poderosamente real e justifique suas a ões.‖ ( apud
MORGENSTERN; SOVERAL, [2014?], p. 17)
Pessoas com capacidade intelectual reduzida apresentam maior ocorrência das falsas
lembranças, devido à falta de confiança no seu próprio juízo de valor, enquanto que
as pessoas com necessidade de desejabilidade social apresentam as falsas memórias
devido às tendências de distorção de auto-relatos para uma direção favorável,
negando traços e comportamentos socialmente indesejáveis (GOUVEIA et al., 2009
apud HENRIQUES; POMPEU, 2014, p. 10)
Compreende-se então, que o indivíduo que comete um fato criminoso, poderá
justificá-lo argumentando que em sua infância ou até mesmo na vida adulta agiram desta
maneira para com ele. ontudo, ―quem sofreu, foi ofendido, torturado n o precisaria criar
mentiras, se desculpar, ser castigado; mas a vergonha, o sofrimento vivido contribui para as
alterações de suas histórias.‖, isto é, n o só o criminoso sofre altera o da memória, mas as
vítimas também sofrem esta alteração com efeito dos traumas sofridos. (CYMROT, 2010
apud MORGENSTERN; SOVERAL, [2014?], p. 17)
47
É possível constatar que há uma gama de fatores de contaminação no decorrer do
processo probatório. E que todos os indivíduos envolvidos no processo poderão sofrer
distorções em sua memória. Conforme a abordagem feita no título 3.5.1 (As Falsas
Memórias), faremos a conexão deste estudo com os fatores internos e externos que
influenciam o processo de recolhimento das provas penais.
4.1.1 Fatores internos (endógenos)
Estes fatores surgem da forma autosugerida, ou seja, o surgimento da FM‘s será
intrínseca ao sujeito de forma que emoções, humor, subjetivismo, tempo,etc. influenciará na
recorda o da memória, corroborando com a manifesta o das FM‘s.
4.1.1.1 Emoções
A memória está sujeita a várias influências. Em que pese ressaltar que as
emoções, ansiedade e ânimo são fatores que produzem distorções na memória, ou seja, ocorre
o surgimento das FM‘s. (IZQUIERDO, 2011 apud LEMBERG, 2016, p. 46),
Stein afirma que recentes estudos sobre memórias e sua ligação com as emoções
apresentam que os eventos emocionais são mais lembrados pelos indivíduos. Porém, noutros
estudos, percebeu-se que quando envolve um elemento desagradável e por terem uma carga
emocional envolvida, aumenta-se o índice de FM‘s, como, por exemplo, o uso de arma. (et
al., 2010 apud LEMBERG, 2016, p. 46)
Trazendo para o procedimento penal, Pergher (et al., 2006) nos esclarece:
O depoimento se dá, muitas vezes, em virtude de crimes traumatizantes, que abalam
de alguma forma o estado emocional das testemunhas, o que poderia levantar a
questão da influência da emoção na recordação de um evento. [...]
A emoção é compreendida como possuindo um caráter de reatividade, geralmente
breve, intensa e circunscrita, relacionada a um evento ambiental específico.
‗Humor‘, por sua vez, é concebido como sendo uma característica mais estável e constante, tendendo a ser mais abrangente e não tão vinculado a circunstâncias
específicas [...] (apud HENRIQUES; POMPEU, 2014, p. 9)
O autor nos lembra que os impactos da emoção sobre a memória devem ser
analisados na rela o em que ―o aumento dos níveis de estresse melhoraria a memória até
certo patamar e, passando deste ponto, os efeitos prejudiciais se intensificariam, provocando
uma piora nas lembranças, possivelmente relacionada à sua fragmentação.‖, ou seja, a
intensidade da emoção em decorrência do fato é que determinará uma facilidade de
recorda o ou o surgimento de FM‘s. (apud HENRIQUES; POMPEU, 2014, p. 9)
48
Os estudos apresentados pelos autores apontam ―que a memória pode depender do
humor e que há um aumento da probabilidade do indivíduo recordar fatos que foram
aprendidos em um estado particular de humor quando ele se encontra novamente nesse
estado.‖, isto é, se o indivíduo se depara com um crime, num momento de um funeral, ele
estará, de humor triste ou depressivo, e futuramente lembrará deste acontecimento mais
facilmente quando novamente estiver de humor triste ou depressivo. (apud HENRIQUES;
POMPEU, 2014, p. 9)
Nessa perspectiva, para Gesu ( 4), ―o delito certamente gera uma emoção e o
que se pode perceber é que as testemunhas têm uma tendência a armazenar mais a emoção do
que os detalhes que seriam interessantes ao processo, uma situação bastante prejudicial ao
testemunho‖. (apud LEMBERG, 2016, p. 46).
Corroborando com isto, Kaplan (2015) elucida:
[...] as pessoas pensam e recontam eventos emocionais mais frequentemente do que
eventos neutros, assim cada um destes processos (pensar e recontar) melhora a
memória para a informação emocional. Além disso, confirma que o envolvimento
emocional prejudica a memória aumentando a suscetibilidade às falsas memórias.
(apud LEMBERG, 2016, p. 46).
A emoção facilita a recordação dos fatos, porém esta carga emocional sobrepõe-se
sobre os detalhes mais atinentes ao fato, ou seja, recorda-se de modo geral os principais
momentos em que a emoção floresceu, contudo surge as lacunas onde os mínimos detalhes a
memória não armazena e que podem ser estes o que resolveriam ou ajudariam a resolver um
caso delituoso.
Assim, as memórias verdadeiras dos eventos emocionais estressantes são mais
lembradas do que as memórias dos eventos neutros, mas, ainda nesses casos, as
falsas memórias também podem ocorrer, principalmente nas situações de estímulo
negativo, como um assalto ou algo que cause sofrimento. Haveria, então, um
aumento de falsas memórias para conteúdos emocionais negativos e uma diminuição
da memória verdadeira para os seus detalhes periféricos. (HENRIQUES; POMPEU,
2014, p. 10)
Os indivíduos tendem a relembrar com riqueza de detalhes dos acontecimentos
logo após sua ocorrência, contudo vão se apagando com o decorrer do tempo, onde
permanecerão na memória somente os momentos dramáticos. (IZQUIERDO, 2011 apud
LEMBERG, 2016, p. 46).
Vejamos o exemplo dado por Lopes Junior (2015 apud VALLE, 2016, p. 55) de
um processo de Embargos Infringentes no 70016395915:
[...] o réu foi acusado pelo delito de estupro, sendo que após a realização de exame
de conjunção carnal, constatou-se a virgindade da ofendida, direcionando-se para a
existência do delito de atentado violento ao pudor. A suposta ofendida vivia num
49
ambiente de promiscuidade, pois sua mãe se dedicava à prostituição, advindo assim
os estímulos que contribuíram para a falsa memória, sendo que em juízo a menor
descreveu que a ‗cobra‘ colocada pelo réu em sua vagina, tinha aproximadamente
1,20cm, era cinza com preto e branco, tinha olhos, mas não tinha boca, tinha pés,
parecia uma lagartixa e que em seguida o réu cortou a cobra em pedacinhos e
preparou um risoto para ela comer. Por oportuno, o tribunal concluiu pela
inveracidade da imputação, numa demonstração clara da existência de falsa memória
infantil.
A ofendida convivia num ambiente não favorável, pois sua mãe se dedicava a
prostitui o. A menina ―armazenou‖ em sua memória exemplos que sua m e praticava. O
ambiente de promiscuidade pode ter sido de grande influência na memória da menor que ao
relatar o possível delito, o estupro, percebe-se muita fantasia e imaginação.
Forte indício que suas emoções tenham influenciado a sua imaginação e quando
buscou a recordação dos fatos narrou com detalhes na sua entrevista processual. Porém sua
narrativa foi de forma fantasiosa, demonstrando-se claramente o surgimento e consequências
das FM‘s.
Atentemos à exemplificação de outro caso explanado por Stein (et al., 2010, p.
22):
hamado para fazer uma corrida, um taxista foi vítima de um assalto, no qual sofreu
ferimentos, e foi levado ao hospital. O investigador do caso mostrou ao taxista, que
ainda estava em fase de recupera o, duas fotografias de suspeitos. O taxista n o
reconheceu os homens apresentados nas fotos como sendo algum dos assaltantes.
Passados alguns dias, quando foi delegacia para realizar o reconhecimento dos
suspeitos, ele identificou dois deles como sendo os autores do assalto. Os homens
identificados positivamente eram aqueles mesmos das fotos mostradas no hospital. Os suspeitos foram presos e acusados pelo assalto. Ao ser questionado em juízo
sobre seu grau de certeza de que os acusados eram mesmo os assaltantes, o taxista
declarou: ‗eu tenho mais certeza que foram eles, do que meus filhos s o meus
filhos!‘. Todavia, alguns meses depois, dois rapazes foram presos por assalto em
uma cidade vizinha, quando interrogados, confessaram diversos delitos, incluindo o
assalto ao taxista.
No caso deste taxista, deparemo-nos com uma das espécies das provas penais
chamada de reconhecimento de pessoas ou coisas. O taxista recebeu duas fotos de dois
supostos suspeitos. Em primeira mão não os reconheceu, contudo dias depois afirmou
categoricamente em juízo serem os dois suspeitos que lhe foram apresentados por fotos os
assaltantes.
Há possibilidade de que o taxista tenha se deixado levar pela emoção. A sede de
―justi a‖ (na maioria dos casos se traduz em ―vingan a‖) de encontrar um responsável pelo
assalto e ferimentos que lhe cometeram acabou acusando os sujeitos baseando-se em sua
memória.
Ainda na fase de recuperação, com um trauma psicológico ocorrido pelo assalto,
ainda não tinha recordação de quem foram os sujeitos do assalto. Ao mostrar-lhe as fotos,
50
pode-se interpretar que a memória do taxista buscou encontrar os verdadeiros culpados,
inserindo a fisionomia dos suspeitos apresentados nas fotos em sua memória, preenchendo-se
assim a lacuna que faltava: a identifica o dos ―criminosos‖.
Gesu (2014) apresenta-nos uma Apelação Crime nº 70017367020 do caso de um
suposto estupro:
Nessa Apelação, os eméritos julgadores mantiveram a absolvição do réu, ora
padrinho da suposta vítima, pelo crime de atentado violento ao pudor. As acusações tiveram início em certa noite em que a menina, na época com 8 anos, assistia com a
sua mãe ao programa televisivo Globo Repórter, no qual passava reportagens sobre
abusos sexuais contra crianças. A suposta vítima ficou impressionada, em
específico, com a passagem de uma das reportagens que contava sobre um pai que
engravidou a filha e vivia normalmente com ela na mesma residência. A partir daí,
extremamente nervosa e chorando diz para a mãe que não queria engravidar, ao
mesmo passo em que esta pergunta se alguém a tocou, ao que a filha responde que
sim, acusando seu padrinho de tê-la beijado e feito carícias quando ia à sua casa. A
menina antes de depor em juízo, contou o fato a uma delegada em sua casa, a uma
psicóloga, aos policiais na Delegacia de Polícia. Ressalta-se que houve intervalos
significativos de tempo entre um relato e outro. Enfim, em juízo, ficou claro que toda essa situação não passou de um mal entendido e fantasias do psicológico da
própria menina, uma vez que, em depoimento, alegou que na creche que
frequentava, ela e as colegas já haviam insinuado comportamentos sexuais, bem
como em sua própria casa, já havia visto seu pai nu e por diversas vezes, como
confirmado pela mãe, beijado – por carinho – o irmão na boca. Restou comprovado
que o padrinho raras vezes esteve em casa quando a menina a frequentava e que
geralmente a madrinha a convidava para ir lá justamente quando o suposto agressor
estava viajando. (apud MORGENSTERN; SOVERAL, [2014?], p. 20)
A menina ao assistir uma reportagem em que se tratava de abuso sexual se
espantou com o caso que foi apresentado. Ficou extremamente nervosa e impressionada, ou
seja, uma elucidação de forte emoção, porém de cunho negativo. O maior problema que pode
ter induzido as FM‘s vítima foi quando a m e pergunta para filha se alguém havia a tocado,
ou seja, tentado estuprá-la. Esta abordagem foi feita erroneamente, pois a menina estava em
estado de choque.
A mãe deveria esperar sua filha se acalmar e fazer perguntas abertas e não
indutivas, isto é, não sugerir a ideia de estupro num momento em que o sistema psicológico
da vítima estava abalado. Vemos neste caso, forte possibilidade de que por falta de
experiência em lidar com a situação e querendo descobrir o motivo de sua filha ter se abalado
tanto com o caso televisivo, a mãe tenha sugerido uma ideia de estupro e influenciado as
FM‘s de sua filha.
Para Norman (1973 apud LEMBERG, 2016, p. 46) ―O cérebro, então, atua de
forma seletiva, codificando só o que lhe parece mais importante ou o que se encaixa mais
facilmente s memórias já existentes‖ e Altavilla (2003) ―[...] que o ato de narrar é fazer uma
interpretação de maneira que, ao passar pelo prisma da personalidade, se deforma um
51
acontecimento. (apud LEMBERG, 2016, p. 46). As provas penais que estão baseadas na
memória não estão escapes do subjetivismo do entrevistado, em outras palavras, as vítimas e
testemunhas irão incluir em suas narrativas suas emoções, experiências de vida, personalidade
em busca de relembrar e reconstituir o fato litigado em juízo.
4.1.1.2 Tempo
Um dos fatores que mais influenciam as FM‘s no processo penal brasileiro. O
espaço-tempo entre o delito e o recolhimento da narrativa das vítimas e testemunhas pode ser
de meses até anos. Assim afirma Stein e Nygaard:
[...] os avanços das pesquisas em Psicologia Experimental Cognitiva, na última
década, possibilitaram a confirmação cientifica e, hoje em dia, inquestionável, de
que o transcurso do tempo pode transformar as lembranças. Essas recordações sobre
eventos vividos podem ser distorcidas internamente ou por sugestões externas
(intencionais ou acidentais).
[...] duração do intervalo de tempo entre o fato delituoso e as declarações das vítimas
e das testemunhas é diretamente proporcional à possibilidade de haver
esquecimentos e/ou influências externas na memória do depoente. (2003 apud
SEGER; LOPES JUNIOR, [2012?], p. 10)
A memória das testemunhas e vítimas sofrem grandes sequelas ocasionadas pelo
tempo, ou seja, ―a correspondência entre o que a testemunha viu, a imagem que registrou na
consciência e o que v o relatar ao juiz sofrem forte influência do tempo‖. (CARVALHO;
AVILA, 2015, p. 557)
O cérebro n o funciona como uma ―gaveta‖ onde conseguimos buscar nela a
memória que desejamos relembrar tal como ela realmente aconteceu. A memória tem um
funcionamento bastante complexo. ― om efeito, o transcurso do tempo é fundamental ao
esquecimento, pois além de os detalhes dos acontecimentos desvanecerem-se no tempo [...] a
cada evoca o da lembran a, esta acaba sendo modificada‖. (GESU; GIACOMOLLI, 2008,
p. 4346)
No seu artigo 5º, LXXVIII, a Constituição Federal garante razoável duração do
processo, ou seja, o processo não pode ser demasiadamente rápido, porém não pode ter
protelações indevidas.
Em que pese este assunto, Lopes Junior e adaró ( 6) afirmam que ―[...]
embora o processo não seja um instrumento apto a fornecer uma resposta imediata àqueles
que dele se valem, isto não pode levar ao extremo oposto de permitir que tal resposta seja
dada a qualquer tempo.‖ Isto é, o órg o julgador n o terá tempo ilimitado para proporcionar
uma resposta aos litigantes do processo. (apud GESU; GIACOMOLLI, 2008, p. 4346)
52
4.1.1.3 Subjetivismo do magistrado
Espera-se do magistrado sua imparcialidade na apreciação, condução e sentença
no processo. Porém, o julgador não é meramente reprodutor de textos das leis. Vale lembra
que ―imparcialidade n o é sin nimo de neutralidade‖. (SEGER; LOPES JUNIOR, [ 2?], p.
14)
A neutralidade pode ser considerada utópica, pois o julgador não conseguirá se
desvencilhar de seus sentimentos, experiências e vivências pessoais. ―Seria utópico pensar a
prolação de decisões judiciais dissociadas de valores sociais, de paradigmas históricos,
filosóficos e psicológicos‖, já dizia Gesu e Giacomolli (2008, p. 4349).
[...] os fatos nunca são observados diretamente pelo juiz, que tem deles um conhecimento indireto, através dos depoimentos das testemunhas, da análise dos
documentos, das opiniões dos peritos, etc. [...] o juiz, ao analisar um depoimento,
deixa-se influir, inconscientemente, por fatores emocionais de simpatia, de antipatia,
que se projetam sobre as testemunhas, os advogados e as partes. As experiências
anteriores do julgador também podem acarretar reações inconscientes favoráveis ou
desfavoráveis a respeito de mulheres ruivas ou morenas, de homens com barba, de
italianos, ingleses, padres, médicos, de filiados a determinado partido político, por
exemplo [...] (PRADO apud SEGER; LOPES JUNIOR, [2012?], p. 14)
O julgador proferirá uma sentença de cunho imparcial, por causo do fato de não
ser parte no processo. Não significa que não sendo parte proferirá sentença neutra, pelo
contrário, o magistrado colocará inconscientemente seu subjetivismo sobre o processo, ou
seja, uma senten a ―aquela projetada sobre o processo que diz das vivências pessoais do juiz,
seus gostos e desgostos, suas paixões, seu eu, seu modo de ser no mundo, pois o sentido da
compreensão não acontece sem a sobreposição sobre o objeto a ser analisado [...]‖. (GESU;
GIACOMOLLI, 2008, p. 4349)
Para Seger e Lopes Junior, entende-se que ―se deve abandonar por completo a
ideia de ‗juiz infalível‘ e reconhecer o aspecto humano do julgador, sem olvidar do princípio
limitador da discricionariedade do magistrado, qual seja o princípio do livre convencimento
motivado ou da persuasão racional. ([2012?], p. 15)
Deste modo, nota-se que o julgador carrega dentro de si preconceitos e
subjetivismos de modo inconsciente ou involuntário e que ―podem afetar a memória ou a
atenção do juiz de tal maneira que, invariavelmente, influenciarão sobre a credibilidade das
testemunhas ou das partes no processo judicial‖ (SEGER; LOPES JUNIOR, [ ?], p. 15)
53
4.1.2 Fatores externos (exógenos)
Estes fatores surgem da forma sugerida, ou seja, o surgimento da FM‘s será
extrínseca ao sujeito. O que influenciará na recorda o da memória e induzirá as FM‘s nos
indivíduos será a apelação da mídia, o modo de como os entrevistadores judiciais conduzirão
os depoimentos e interrogatórios e pessoas que possam, de alguma forma, sugerir FM‘s s
testemunhas ou vítimas. Explicaremos detalhadamente cada uma delas.
4.1.2.1 Mídia
No que pese os telejornais, grande parte de sua programação televisiva se
preocupam com conteúdo criminal. Muitas vezes acompanham por semanas todas as etapas
processuais de um caso, podendo, por exemplo, ser operações da Polícia Federal ou
investigações da Polícia Civil. (GESU; GIACOMOLLI, 2008, p. 4346)
Seger e Lopes Junior ([2012?], p. ) destaca a liga o das FM‘s com a influência
da mídia:
Já no que se refere à influência da mídia na formação das falsas memórias, deve-se destacar que o cenário veiculado pelos meios de comunicação acerca de determinado
fato delituoso pode, indubitavelmente, confundir a testemunha, fazendo-a emaranhar
aquilo que percebeu no momento do delito com o que leu, viu ou ouviu sobre o
evento posteriormente.
A mídia tende a induzir a população da forma que repassa de forma parcial
trechos dos processos, ou seja, não se tem todo o conhecimento acerca do realmente acontece
dentro do processo, gerando assim um alto grau de contaminação. O contexto demonstrado
pela mídia pode embaralhar a testemunha sobre aquilo que realmente percebeu no momento
do delito, com o que posteriormente ouviu ou o que leu sobre o fato delituoso. (GESU;
GIACOMOLLI, 2008, p. 4349)
Nos lembra Carnelutti (1995) que, devemos ainda, considerar a testemunha como
um ser humano, diferente de um documento, onde sua narrativa e depoimento estarão
carregados de juízo de valor e subjetivismo:
[...] um homem com seu corpo e com sua alma, com seus interesses e com suas
tentações, com suas lembranças e com seus esquecimentos, com sua ignorância e
com sua cultura, com sua coragem e com seu medo. Um homem que o processo
coloca numa posição incômoda e perigosa, submetido a uma espécie de requisição
para a utilidade pública, afastando de seus afazeres e sua paz, pesquisado,
espremido, inquirido, suspeitado. (apud GESU; GIACOMOLLI, 2008, p. 4349)
54
Nessa perspectiva, a mente humana, mais especificamente a memória, não
consegue se desatar das experiências vividas, razão e emoção. Não obstante lembra que não
há estudos psicológicos acerca do tema, mas não podemos negar que os impactos da mídia e
da imprensa influenciam, de alguma maneira, a colheita dos atos investigativos, ―quer seja
sugestionando elementos em relação ao crime, quer seja insuflando preconceitos de classe e
de raça, o que terminou por execrar publicamente inocentes através dos meios de
comunicação. (SEGER; LOPES JUNIOR, [2012?], p. 12)
Os mesmos autores nos recordam do conhecido caso, identificado como um
―crime de imprensa‖ pelo jornalista arlos Dorneles ( 7), ― ar odega‖:
[...] o caso trata-se de um crime de latrocínio, ocorrido no Bar Bodega (São Paulo/SP), que resultou na morte de dois jovens locais de classe média alta. Pouco
tempo depois, a polícia, sob intensa pressão jornalística e em plena eleição para a
Prefeitura local, anunciou a prisão de dois supostos autores do delito: adolescentes
pobres, negros, barbaramente torturados para confessar crime que, depois se saberia,
não haviam cometido. O promotor Eduardo Araújo da Silva, chamado
posteriormente para acompanhar o caso, encontrou uma série de irregularidades no
procedimento do inquérito policial, e, em uma análise de indícios que já não admite
qualquer dúvida, requereu o relaxamento da prisão temporária, face à manifesta
insuficiência de provas e inocência dos acusados. (SEGER; LOPES JUNIOR,
[2012?], p. 12)
Este caso é uma exemplificação de que a mídia exerceu influência direta no caso.
Uma busca inconsequente e desenfreada pelos esclarecimentos dos fatos além das fortes
veiculações tendenciosas das notícias que contaminaram o recolhimento da prova penal do
fato delituoso. (SEGER; LOPES JUNIOR, [2012?], p. 12)
Ainda, para exemplificar a influência da mídia no processo penal, analisemos a
Apelação Criminal n° 10024043490044001:
[...] Segundo a exordial acusatória, no dia 09 de maio de 2003, por volta das
15h10min, as vítimas Geraldo Flávio Batista, Jacqueline Furtado de Oliveira e João
Raimundo dos Santos encontravam-se no interior do estabelecimento comercial da
Tripominas Comércio de Trigos e Salgados Ltda., sociedade empresária integrada
pelos dois primeiros e para a qual o último trabalha, situado na Avenida Nossa
Senhora de Fátima, nº. 1.787, loja B, Bairro Carlos Prates, nesta Capital, quando o
apelante e o seu comparsa Jonathas Benedito Simplício chegaram ao local, em uma motocicleta.
Consta que Jonathas Benedito Simplício, que portava uma arma de fogo, obrigou os
ofendidos a deitarem-se no chão e, ato contínuo, subtraiu os 02 (dois) celulares, da
marca Nokia; o telefone, da marca Vesper; os 03 (três) relógios de pulso; os R$
7.400,00 (sete mil e quatrocentos reais) em pecúnia; e os diversos cheques que
encontrou no local. Como se não bastasse, o mencionado indivíduo agrediu a vítima
Jacqueline Furtado de Oliveira com um chute antes de deixar o local dos fatos, com
o seu assecla, na mencionada motocicleta.
Os ofendidos anotaram a placa do veículo utilizado por Glaysson Alves de Oliveira
e seu cúmplice, mas tal sinal identificador fora clonado de outro veículo. Em
setembro do mesmo ano, a Polícia Militar logrou êxito em localizar o apelante e Jonathas Benedito Simplício.
55
‗In casu‘, o conjunto probatório não conduz à certeza de que Glaysson Alves de
Oliveira subtraiu, mediante violência e grave ameaça, os objetos descritos na
denúncia. Por isso, pedindo vênia ao ilustre Juiz de primeiro grau, vou reformar a
respeitável decisão guerreada.
Ora, o apelante negou veementemente, nas duas oportunidades em que foi ouvido, a
prática do fato narrado na denúncia. Disse que adquiriu a moto utilizada para
praticar o crime apenas um dia antes da sua prisão e que nada sabia acerca do
ocorrido.
Na época dos fatos, as vítimas Jaqueline Furtado de Oliveira e Geraldo Flávio
Batista da Cruz disseram que não sabiam descrever bem os seus algozes, pois ambos
usaram capacetes durante a prática do delito (fls. 10 e 11). Cerca de 04 (quatro) meses depois, após verem, pela imprensa, que o apelante, que prestara serviços para
eles meses antes, fora preso com a moto utilizada na empreitada delituosa, os
ofendidos disseram, todavia, que reconheciam Glaysson Alves de Oliveira como um
dos autores do crime sob análise.
‗Permissa venia‘, a insegurança inicial das vítimas, aliada ao fato de a prisão do
apelante ter sido amplamente noticiada (fl. 12), torna plausível a tese de que
Jaqueline Furtado de Oliveira e Geraldo Flávio Batista da Cruz, inconscientemente,
aliaram a informação divulgada pela mídia, de que Glaysson Alves de Oliveira foi
encontrado com o veículo utilizado no cometimento do crime, ao que efetivamente
viram no dia dos fatos, tendo, por isso, e só por isso, certeza de que ele praticou o
delito sob análise. Não se está afirmando que os mencionados indivíduos agiram de má-fé, mesmo
porque não há qualquer indício de que eles têm algum interesse na condenação do
apelante. É possível, todavia, que as suas declarações estejam comprometidas por
uma ‗falsa memória‘. [...] (MINAS GERAIS, 2013)
Neste suposto crime de roubo, os ofendidos na época do fato não reconheceram os
supostos criminosos pelo motivo de que no momento do crime estes usavam capacetes. Cerca
de quatro meses após o delito, as vítimas viram pela imprensa ―que o apelante, que prestara
serviços para eles meses antes, fora preso com a moto utilizada na empreitada delituosa‖ e
consequentemente reconheceram-o este como sendo o responsável pelo fato delituoso.
Percebemos que as vítimas com o intuito de encontrar os responsáveis pelo fato
criminoso que lhe cometeram, foram influenciados pela notícia disseminada pela imprensa de
sua localidade e que num forte indício de FM‘s ―reconheceram‖ o criminoso.
Carnelutti (1995 apud GESU; GIACOMOLLI, 2008, p. 4346) nos lembra deste
velho problema. O fato delituoso não terá importância somente para as partes do processo e o
Estado. Por tornar-se uma forma de divertimento é considerada assim do interesse de todos.
Teremos o risco de contaminações das provas e sugestionamentos conforme aumentam
gradativamente os comentários e notícias sobre os fatos criminosos.
Uma das formas de reduzir o grau de contaminação nos casos de grande
repercussão midiática é a prova ser desenvolvida num prazo razoável no processo, ou seja,
quanto mais o tempo passa, maior contaminação terá.
Desta forma, para Gesu e Giacomolli, ―a exatid o da recorda o pode ser
gravemente afetada pela influência de fatos sabidos posteriormente através da televisão e dos
jornais, sem falar nos comentários de familiares e vizinhos. (2008, p. 4349)
56
4.1.2.2 Viés do entrevistador
A coerência da narrativa do relato da testemunha ou da vítima muitas vezes será
decisivo conforme o viés do entrevistador. A maneira que o entrevistador formula sua
entrevista, não raro pode estar ligada ao seu interesse em receber respostas que deseja
alcançar. (SEGER; LOPES JUNIOR, [2012?], p.13)
Como esclarece Gesu (2014):
[...] há uma tendência, por parte daquele que interroga o imputado e colhe
declarações das vítimas e das testemunhas, se houver, em explorar unicamente a
hipótese acusatória, induzindo os questionamentos. E, na maioria das vezes, diante
da ausência de demais elementos probatórios o magistrado profere a sentença com base unicamente na palavra do (a) ofendido (a). Com isso, não sequer desacreditar
essa prova, mas demonstrar que, dependendo do contexto, ela não é suficiente a
derrubar a presunção de inocência. (apud PRECISAMOS... 2015)
Um dos maiores perigos, segundo Carnelutti (1995) é querermos julgar o que a
outra pessoa compreendeu, sentiu ou quis fazer segundo nossa maneira de querer, sentir ou
compreender. O autor continua explicando que as técnicas penais de entrevista às testemunhas
s o preocupantes. ―A testemunha é espremida, inquirida e suspeitada‖, isto é, coloca-se a
testemunha em situação desconfortável para a inquirição de perguntas. (apud HENRIQUES;
POMPEU, 2014, p. 11)
Observemos o que Henriques e Pompeu dizem sobre as inquirições:
A metodologia, a linguagem, a repetição e a reelaboração das perguntas, além de
servirem como pretexto para se descobrir a ‗verdade real‘, podem interferir no teor
dos relatos da testemunha ao intensificar a memória não do fato testemunhado, mas
da narrativa do fato contido nas perguntas do próprio entrevistador. (2014, p. 11)
Os mesmo autores acreditam que por despreparo o entrevistador pode
acidentalmente enviesar suas perguntas e eventualmente gerar FM‘s. N o obstante, de forma
intencional, o entrevistador busca em sua entrevista confirmar suas hipóteses, pois acredita ter
um papel punitivo em consequência do sentimento de impunidade e violência que a sociedade
vive atualmente. (2014, p. 11)
Como exemplificação para esta problemática, vejamos uma das mais tendenciosas
e geradoras de FM‘s nas inquiri ões judiciais: os depoimentos infantis.
Para Seger e Lopes Junior, no que diz respeito aos depoimentos infantis, o seu
testemunho pode ser perigosamente manchado conforme a maneira pela qual a criança é
interrogada. Na infância somos mais propícios à sugestão externa e portanto é nesta fase da
vida que as crian as est o mais suscetíveis gera o de FM‘s, ([ 2?], p.13)
57
Stein e Nygaard (2003) discorre sobre os estudos de Binet acerca da
sugestionabilidade da memória infantil:
[...] Os estudos pioneiros sobre a sugestionabilidade da memória de crianças do
francês Alfred Binet (1900) levaram-no a concluir que as crianças respondem com
falta de acuidade porque elas esquecem a informação originalmente experimentada.
Ainda, as crianças podem se sentir pressionadas a dizer alguma coisa para responder
à pergunta feita pelo entrevistador. Ele também estudou os efeitos da conformidade das crianças ao grupo. Assim, num grupo de crianças, a tendência é que a resposta
dada pelas primeiras a serem questionadas, geralmente, é repetida pelas últimas
crianças. (SEGER; LOPES JUNIOR, [2012?], p. 13)
Há de se destacar que a criança tem um desejo de corresponder as perspectivas
dos adultos, que no caso do processo judicial, se atém ao entrevistador. Ao ser questionado
sobre determinado assunto, raramente a crian a responde ―n o saber‖, muito menos reconhece
n o compreender a proposta da pergunta. Percebemos uma ―clara tentativa de coopera o e
correspondência às expectativas do entrevistador, o que torna carecedor de muito cuidado o
depoimento infantil, pois, caso contrário, corre-se o risco de que a interpretação do
interrogador se torne a própria memória da crian a.‖ (SEGER; LOPES JUNIOR, [ ?], p.
13-14)
Vimos então que, o depoimento infantil como meio de prova judicial se torna
perigoso e frágil, suscetíveis aos erros de condenação, merecendo um cuidado redobrado
quanto a sua apreciação no procedimento processual. Não obstante, melhorar a entrevista
judicial, para que n o seja tendenciosa e influenciadora de FM‘s.
4.2 A MINIMIZAÇÃO DAS FALSAS MEMÓRIAS NA PRODUÇÃO DOS
ELEMENTOS PROBATÓRIOS NO PROCESSO PENAL
Depois de analisarmos especificamente os fatores que influenciam as FM‘s
buscaremos uma maneira de minimizá-las. Como envolve uma compreensão no que tange a
memória dos indivíduos, dificilmente conseguiremos afirmar com precisão se determinados
casos foram maculados por FM‘s. Porém de forma preventiva podemos aperfei oar a
inquirição de perguntas nos procedimentos processuais.
Para Henriques e Pompeu, um dos principais aspectos geradores de FM‘s no
recolhimento das provas penais é o viés do entrevistador, que buscam de múltiplas maneiras
influenciar a resposta do entrevistado através de suas perguntas.
[...] o tipo da pergunta influencia demasiadamente na resposta do entrevistado. Exemplificando: as perguntas abertas possibilitam mais informa ões (‗O que você
viu no mercado naquele dia?‘); as fechadas limitam a resposta (‗Era de madrugada
quando o fato ocorreu?‘); as múltiplas confundem, estressam e tolhem as respostas
58
(‗Você viu o rosto do acusado?‘-‗ om quem ele parece?‘-‗Ele estava com uma arma
na m o?‘); as tendenciosas conduzem o entrevistado a responder conforme a
orienta o do entrevistador (‗Se o acusado era preso foragido no dia do crime, então
poderia ser ele o autor?‘); as confirmatórias/inquisitivas podem confirmar o que o
entrevistador pensa sobre o assunto (A testemunha fala que o acusado parece com o
seu cunhado e o entrevistador pergunta: ‗Então você me disse que seu cunhado
estava na cena do crime, n o é mesmo?‘). (2014, p. 12)
Nestes exemplos citados vimos que nas entrevistas as perguntas elaboradas pelos
operadores jurídicos s o tendenciosas. Há uma espécie de ―batalha‖ de quem quer incriminar
e defender o(s) acusado(s) ou (des) favorecer a vítima do fato delituoso.
Os entrevistadores elaboram perguntas conforme suas convicções para conquistar
respostas que venham afirmar estas convicções. Diante disso os depoimentos que foram
maculados com FM‘s sugeridas s o os que o magistrado apreciará e decidir o o destino do
acusado. (STEIN et al., 2010 apud HENRIQUES; POMPEU, 2014, p. 12)
O ato de prestar depoimento, para Stein (2010), não é algo corriqueiro para a
grande parte das pessoas. Os entrevistados ao serem inquiridos carregam uma demanda de
emoções e por esta razão, usar técnicas inapropriadas no recolhimento de informações pode
prejudicar na qualidade do depoimento. Apesar que, raramente os entrevistados recordarão
com exatidão de detalhes o que realmente é importante ao processo. (apud HENRIQUES;
POMPEU, 2014, p. 12)
Regularmente no sistema penal brasileiro adota-se a denominada ―entrevista
standar‖, divididas em dois momentos: narrativa e interrogativa. Na fase narrativa corre-se o
risco de respostas induzidas por parte das perguntas dos entrevistadores, pois ela caracteriza-
se por formulação de perguntas abertas, como por exemplo, ―o que aconteceu?‖.
Já na fase interrogativa também teremos perguntas abertas, mas há a inclusão das
fechadas e identificadoras, que são exatamente nestas que há grande probabilidade das
memórias serem contaminadas, tendo em conta que ―quanto mais se restringe a pergunta,
maior a probabilidade de sugestão, e, portando, de indu o da reposta.‖ (SEGER; LOPES
JUNIOR, [2012?], p. 16)
Como forma de sugestão para a diminuição dos erros das entrevistas cometidas
pelos atores judiciais veremos a abordagem da autora Stein (et al., 2010) no que tange a
Entrevista Cognitiva (EC).
Esta forma de entrevista é uma das técnicas mais pesquisadas mundialmente.
Originalmente criada em 984 por Ronald Fischer e Edward Geiselman ―a pedido de policiais
e operadores do Direito norte-americano, para maximizar a quantidade e a precis o das
59
informa ões colhidas de testemunhas ou vítimas de crimes. (MEMON, 1999 apud STEIN, et
al., 2010, p. 210).
Os autores apontam as 10 principais falhas mais comuns cometidas nas entrevistas
forenses:
. n o explicar o propósito da entrevista
. n o explicar as regras básicas da sistemática da entrevista
3. n o estabelecer rapport
4. n o solicitar o relato livre
5. basear-se em perguntas fechadas e não fazer perguntas abertas
6. fazer perguntas sugestivas confirmatórias
7. n o acompanhar o que a testemunha recém disse
8. n o permitir pausas
9. interromper a testemunha quando ela está falando
. n o fazer o fechamento da entrevista (STEIN, et al., 2010, p. 210)
A EC vem com sua principal finalidade angariar melhores informações, riqueza
de detalhes e precisão na narrativa, baseando-se nos conhecimentos científicos da Psicologia
Social e Cognitiva. Ao conhecermos cientificamente o funcionamento da memória chegamos
a conclus o que n o só os entrevistadores, mas nós mesmos ―somos suscetíveis a distorcer
nossas lembran as‖ (STEIN, et al., , p. )
Contudo, Memon, Vrij e Bull (1998 apud STEIN, et al., 2010, p. 212) reforça que
EC não tem a mesma eficácia com os suspeitos. Para a inquirição de perguntas exigem-se
técnicas mais específicas focada nestes indivíduos. ―Via de regra, ao se entrevistar um
suspeito, este tende a ser pouco colaborativo, o que prejudica o uso das técnicas da E .‖
(MEMON, 1999 apud STEIN, et al., 2010, p. 212)
O procedimento da E é baseado em 5 etapas: ―rapport‖, recriação do contexto
original, relato livre da testemunha, questionamento e fechamento. Tem como principais
características as perguntas de cunho não sugestiva, menor número de encontros possíveis
para n o haver repeti ões e assim evitar a ocorrência das FM‘s. (STEIN et al., 2010 apud
HENRIQUES; POMPEU, 2014, p. 12-13)
A primeira etapa, o rapport, inicia-se com o início do depoimento. O entrevistador
constrói um ambiente favorável e acolhedor para que estabeleça uma relação de empatia com
a testemunha. Estabelecer este vínculo facilitará na narrativa do entrevistado que
provavelmente vivenciou uma situação incomum, podendo ser de teor traumático, ou dolorosa
e terá que relatar minuciosamente o evento à uma pessoa que lhe é estranha, neste caso o
entrevistador. (STEIN et al., 2010, p. 212-213)
60
Fischer e Geiselman (1992) lembra que quando uma testemunha está apreensiva e
interage com o entrevistador que demonstre acolhimento, segurança e tranquilidade tende a
agir da mesma forma. (apud STEIN et al., 2010, p. 215)
Stein aconselha principiar o rapport com:
[...] um agradecimento autêntico pela participa o da testemunha, o que transmite,
desde os primeiros momentos, a mensagem de que sua presen a é importante. Além
do agradecimento, o entrevistador deve iniciar com perguntas sobre alguns assuntos
neutros, sem rela o direta ou indireta com o evento em quest o. (et al., 2010, p.
214)
O entrevistador tem a função de explicitar de modo direto ao entrevistado o
objetivo daquele momento e o papel que cada um cumprirá. (FISHER; SCHREIBER, 2006
apud STEIN et al., 2010, p. 215)
Na segunda etapa temos a recriação do contexto original. A memória armazena
as informações conforme o contexto em que foram apreendidas. Para recuperar estas
informações que estão armazenadas na memória convém reconstituir o contexto original para
obter pistas e assim auxiliar a recordação do maior número de informações do evento que o
entrevistado presenciou. (FISHER; GEISELMAN, 1992, apud STEIN et al., 2010, p. 216-
217)
Para Stein, cabe ao entrevistador orientar explicitamente o entrevistado para que
consiga recriar o contexto original do evento, podendo utilizar de quaisquer sentidos
possíveis, ou seja, auditivos, olfativos, táteis, visuais ou gustativos. Desta maneira aumentam-
se as chances de serem fornecidas pistas relevantes à memória. (et al., 2010, p. 217)
A autora exemplifica uma orientação na abordagem da recriação do contexto
original:
Neste momento eu gostaria de te ajudar a lembrar tudo o que conseguir sobre (referir o evento em quest o). Você pode fechar os olhos, se preferir. Tente voltar
mentalmente ao exato momento em que aconteceu essa situa o. [pausa] Você n o
precisa me dizer nada ainda, apenas procure observar o local ao seu redor [pausa]. O
que você consegue ver? [pausa] Que coisas você consegue escutar? [pausa] Que
coisas passam pela sua cabeça? [pausa] Como você está se sentindo? [pausa] omo
está o clima nesse momento? [pausa] Tem algum cheiro que você consiga sentir?
[pausa] Quando você achar que estiver pronto, pode contar tudo que conseguir se
lembrar sobre o que aconteceu, do jeito que achar melhor. (p. 217)
Na mesma linha de raciocínio, Stein lembra que se por ventura o entrevistador
fornecer as instruções rapidamente e sem pausas, o entrevistado, provavelmente, não
detalhará pistas suficientes e assim não alcançará a reconstituição da situação em foco,
restando infrutífera a técnica aplicada. (et al., 2010, p. 217)
61
Após esta etapa temos o relato livre da testemunha, onde o indivíduo é
requisitado a contar da sua maneira, de forma livre e sem interrupções o que puder relembrar
de informações acessando sua memória. Durante o relato da testemunha, quiçá o entrevistador
ficará em dúvida sobre alguns pontos da narrativa. Entretanto, deverá deixar para depois do
relato qualquer tipo de pergunta ou esclarecimento. (STEIN et al., 2010, p. 217-218)
Para Ceci e Bruck (1995) a postura que deverá ser adotada pelo entrevistador
neste momento é de demonstração de interesse, escuta e atenção ao que a testemunha está
relatando e anotar tópicos que lhe sejam necessários em retomá-los posteriormente para
dirimi-los. (apud STEIN et al., 2010, p. 218)
Stein refor a que ―nessas anota ões é importante que os mesmos termos e
informa ões trazidas pela testemunha sejam mantidos sem acréscimos e edi ões por parte do
entrevistador‖, isto é, o entrevistador n o deve interpretar ou escrever com suas palavras o
que o entrevistado relatou, para assim não haver contaminação nesta narrativa. (et al., 2010, p.
218)
Seguiremos com o raciocínio de Stein para a próxima etapa da EC, o
questionamento, “na qual o entrevistador fará perguntas baseadas nas informa ões trazidas
no relato livre, buscando coletar informa ões adicionais‖. (et al., 2010, p. 218)
Inicia-se esta etapa com os agradecimentos à testemunha pelas informações
expostas e pelo seu esforço até esta etapa. Enaltecer o entrevistado pelo seu esforço é de
grande valia para mantê-la comprometida com a proposta da entrevista.
Antes de fazer qualquer pergunta, o entrevistador antecipa que haverá uma nova
etapa da entrevista, na qual ele fará perguntas sobre alguns pontos, de modo a
compreender melhor o que ocorreu na situa o em quest o. Além de avisar sobre as
perguntas, o entrevistador retoma algumas das regras básicas. Em particular, refor a
que a testemunha pode dizer ‗n o sei‘ ou ‗n o entendi‘ diante de quaisquer questões.
(STEIN et al., 2010, p. 218)
Hall ( ) nos esclarece que ―é natural do ser humano dirigir sua aten o para
evidências que corroborem suas próprias cren as. Em fun o disso, os entrevistadores podem
acabar assumindo um viés confirmatório na etapa de questionamento‖, isto é, far o somente
questionamentos que possam confirmar suas hipóteses do fato em foco. (apud STEIN et al.,
2010, p. 218)
Para Stein, é necessário que durante a entrevista o entrevistador monitore-se para
não coletar somente as informações que corroborem com a sua versão do fato que tenha
ocorrido, ou seja, deverá coletar todas as informações na íntegra sem o seu viés. (et al., 2010,
p. 219-220)
62
Chegamos à última etapa da EC, o fechamento. Neste momento será sintetizado
todos os dados relatados e por fim o encerramento da entrevista. Oferece-se ao entrevistado
última oportunidade de se necessário de incluir detalhes que tenha lembrado e seja de
importância à entrevista. (PINHO, 2006 apud STEIN et al., 2010, p. 222).
O entrevistador orientará o entrevistado que durante o momento da síntese ele
poderá interrompê-lo de imediato caso ele identifique alguma distorção no resumo ou até
mesmo de lembrar-se de algum detalhe que não fora relatado (FISHER; SCHREIBER, 2006
apud STEIN et al., 2010, p. 222). Ao finalizar o resumo retoma-se o rapport para encerrar a
entrevista de modo positivo, ou seja, o encerramento através de uma atmosfera positiva
deixará a última impressão também positiva da EC ao entrevistado. (FISHER; GEISELMAN,
1992 apud STEIN et al., 2010, p. 222)
Vimos até aqui que a EC possui cinco procedimentos bem delimitados e
funcionais. Preocupa-se com a obtenção de um ambiente favorável ao entrevistado para que
este consiga de modo livre fazer uma busca em sua memória dos detalhes do fato sem
nenhuma influência exógena (externa) e que de maneira preventiva vêm para minimizar as
influências dos vieses dos entrevistadores e operadores forenses.
Contudo, evidente que ainda sim poderá haver nesse processo interno de
recordação dos fatos influências endógenas (internas), pois não há possibilidade do
entrevistador conseguir distinguir o que é a ―verdade real‖ e o que é FM‘s.
Este tipo de entrevista, deveras, exige-se um grande espaço de tempo para poder
aplicá-la de modo efetivo, ou seja, a entrevista demandaria mais tempo do que a tradicional é
realizada hoje no nosso modelo processual.
Mas corroborando com Loftus ( 997) e Stein ( ) que afirma que ―em longo
prazo, a aplicação da EC poderia contribuir para um procedimento mais confiável, preciso e
ágil, ao se colher informações verossímeis e importantes e ao se evitar a repetição de provas.‖
(apud HENRIQUES; POMPEU, 2014, p. 14), isto é, desde já inserir algumas etapas da EC
nas entrevistas adotadas atualmente, para assim, de forma preventiva, evitar ao máximo as
FM‘s sob influência e indu o dos vieses dos entrevistadores.
63
5 CONCLUSÃO
Expomos no primeiro capítulo as considerações sobre o sistema probatório penal
brasileiro. Delimitamos seu conceito e finalidade. Relacionamos os princípios do sistema
penal. Importante lembrar o da ―verdade real‖, que nada mais é a preocupa o de buscar a
veracidade do fato discutido através de todos os meios cabíveis, ou seja, a tentativa de trazer
ao processo a verdadeira história do fato discutido. Ainda neste capítulo, elencamos as
espécies de provas do sistema penal, que para nosso trabalho são mais pertinentes a
testemunhal, interrogatório do acusado, perguntas ao ofendido e reconhecimento de pessoas e
coisas, pois estas se apóiam na memória do sujeito.
No segundo capítulo apresentamos as principais formas de apreensão do
conhecimento. Dentre elas: imaginação, pensamento, percepção, linguagem e a mais
significativa ao nosso trabalho, que é a memória. É através desta que temos a capacidade de
lembrar e recordar dos fatos, ideias e/ou conhecimentos adquiridos ao longo da nossa vida.
Fazer um exercício de relembrança de alguma experiência vivida faz com que o
sistema nervoso busque preencher as ―falhas‖ (lacunas) dos detalhes deste fato, isto é, a mente
não reconstituirá absolutamente todo o fato que se tenta lembrar, por este motivo surgem as
FM‘s. Por esta razão, criamos este subtítulo esclarecendo sua conceituação e teorias.
No ápice deste trabalho, no terceiro capítulo, abordamos a influência das FM‘s na
produção dos elementos probatórios no processo penal. Ponderamos os fatores internos e
externos influenciadores no processo penal. Ao final sugerimos para minimiza o das FM‘s
na entrevista forense a denominada Entrevista Cognitiva.
Diante do exposto, iremos responder aos questionamentos pertinentes à este
trabalho. Percebemos que a produção dos elementos probatórios no sistema penal sofrem
influências. Mais especificamente nas espécies probatórias que se baseiam da reconstituição
mnemônica, ou seja, baseiam-se na memória dos entrevistados, que podem ser as
testemunhas, acusados, vítimas e ainda no reconhecimento de pessoas ou coisas atinentes ao
fato delituoso.
Observa-se a fragilidade destas provas quanto à memória dos entrevistados pois
através de influência interna e externa há grande possibilidade de surgirem FM‘s no momento
da entrevista, ou seja, a FM podem ser a maior influenciadora na produção das provas.
om intuito de minimizar as FM‘s na produção das provas sugerimos a Entrevista
Cognitiva. Uma alternativa plausível para o recolhimento dos depoimentos dos entrevistados.
As técnicas implantadas são meticulosas e baseadas em estudos científicos tornando a
64
entrevista consistente e eficaz. Assim de forma preventiva evitar influências interna e externa
geradoras de FM‘s.
Diante de todas as problemáticas estudadas sugerimos para futuros trabalhos o
estudo e pesquisas de campo casos específicos de erros judiciais causados por FM‘s. A
importância da averiguação dos casos de condena ões injustas baseados nas FM‘s promoverá
mais políticas preventivas e trará mais segurança jurídica ao sistema criminal brasileiro.
65
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