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CENTRO UNIVERSITÁRIO SALESIANO DE SÃO PAULO
UNISAL – CAMPUS MARIA AUXILIADORA
Flavio Marcos de Souza
A EDUCAÇÃO SOCIOCOMUNITÁRIA E A FISIOTERAPIA: PELA
HUMANIZAÇÃO DA COMUNICAÇÃO PROFISSIONAL X PACIENTE
AMERICANA
2018
Flavio Marcos de Souza
A EDUCAÇÃO SOCIOCOMUNITÁRIA E A FISIOTERAPIA: PELA HUMANIZAÇÃO
DA COMUNICAÇÃO PROFISSIONAL X PACIENTE
Dissertação apresentada ao Centro
Universitário Salesiano de São Paulo –
Campus Maria Auxiliadora como requisito
parcial para obtenção do título de Mestre
em Educação. Sob Orientação da
Professora Doutora Maria Luísa Amorim
Costa Bissoto.
AMERICANA
2018
FLAVIO MARCOS DE SOUZA
A EDUCAÇÃO SOCIOCOMUNITÁRIA E A FISIOTERAPIA: PELA HUMANIZAÇÃO DA COMUNICAÇÃO PROFISSIONAL X PACIENTE.
Dissertação apresentada ao Programa de Pós-Graduação Stricto Sensu do Centro Universitário Salesiano de São Paulo, como parte dos requisitos para a obtenção do título de Mestre em Educação – área de concentração: Educação Sociocomunitária. Linha de pesquisa:
Análise das Intervenções na Práxis Educadora
Sociocomunitária.
Orientadora: Profa. Dra. Maria Luisa Amorim Costa Bissoto
A sessão pública de Defesa de Dissertação foi realizada utilizando-se da ferramenta
virtual denominada Skype, defendida e aprovada em 08 de fevereiro de 2018, pela
comissão julgadora,
__________________________________________ Profa. Dra. Beatriz Akemi Takeiti – Membro Externo
Universidade Federal do Rio de Janeiro - UFRJ
__________________________________________
Profa. Dra. Lívia Moaris Garcia Lima – Membro Interno Centro Universitário Salesiano de São Paulo – UNISAL __________________________________________ Profa. Dra. Maria Luisa Amorim Costa Bissoto – Orientadora Centro Universitário Salesiano de São Paulo – UNISAL
Dedico este trabalho:
À Deus, que é a luz dos meus caminhos.
À minha mãe Neide, pelo apoio incondicional, por todos os ensinamentos e por ser minha inspiração, minha amiga, meu amor.
À meu irmão Fábio, meu ídolo, meu exemplo e eterno amigo, te amo.
A minha cunhada Ana Paula, pela amizade e torcida,
por dar à luz às maiores riquezas da família, Matheus e Heitor.
À Carina Spósito, eterna namorada e cúmplice, por ser paciente nos momentos difíceis e compreender minhas ausências.
AGRADECIMENTOS A minha família, meu alicerce.
A minha orientadora Professora Doutora Maria Luísa Amorim Costa Bissoto, minha fonte de energia e inspiração. Malu, obrigado por todo ensinamento, pela competência que sempre conduziu suas aulas, pela motivação contagiante e por me permitir trabalhar com você, foi uma honra ser seu orientando.
Aos professores que ofereceram seus talentos e habilidades para que eu pudesse me desenvolver intelectualmente e crescer profissionalmente, serei eternamente grato!
À secretária do PPGE Vaníria Felippe, pelo apoio e profissionalismo, por orientar as atividades do programa com brilhantismo e competência.
A todos os colaboradores do UNISAL, cada um em sua contribuição fizeram tudo acontecer, meu respeito a vocês!
À João Marcos Sardinha, pelo apoio incondicional, pelas palavras de incentivo e por ser um grande amigo, minha eterna gratidão.
Aos companheiros, mais que amigos, Leo Bruno e Luciano Munari, meus irmãos do coração, nossa convivência foi espetacular, obrigado por tudo! Aos amigos que construí no percurso acadêmico, em especial Daniela Suniga, Leila Fernandes, Patrícia Saladini, Clesio Geraldo, Mara Lima, Wellington Aires, Erica Belon, Adriano “Batata”, vocês fizeram a diferença em minha vida, obrigado pelo companheirismo. À Ana Carolina Medeiros, minha amiga e companheira de trabalho, obrigado por todo incentivo e torcida. Aos alunos, profissionais e pacientes que fizeram parte dessa pesquisa, obrigado pela confiança.
Aos membros da banca examinadora, Professora Doutora Maria Luísa Amorim Costa Bissoto, Professora Doutora Lívia Morais Garcia Lima e Professora Doutora Beatriz Akemi Takeiti, pelas contribuições que engrandeceram essa pesquisa.
À todos que contribuíram para que até aqui eu pudesse chegar.
RESUMO
A comunicação humanizada entre o profissional da saúde, no caso o fisioterapeuta e o sujeito das suas práticas, deve ser a base sobre a qual se constituirá a relação entre ambos. Humanizar a comunicação significa compreender o outro em sua subjetividade, considerando sua cultura, fatores socioafetivos, econômicos e sociais. A discussão sobre a humanização da comunicação no viés da educação sociocomunitária busca refletir como é possível que os profissionais da saúde, especialmente na prática da saúde coletiva, colaborem para a organização das comunidades, no sentido de envolverem-se ativamente nas discussões que abarcam saúde e qualidade de vida, no papel que o profissional da saúde pode aí assumir e também sobre as possibilidades de empoderamento dos sujeitos em relação aos seus contextos de vida. O objetivo dessa investigação, mediante o exposto, foi analisar a formação do fisioterapeuta naquilo que se refere à comunicação profissional X sujeitos de práticas e ao paradigma de humanização na saúde. A promoção da humanização em saúde ainda é um dos pontos nevrálgicos no campo da saúde, e consideramos que a comunicação é essencial para fazer avançar os propósitos de tal paradigma. Metodologicamente, trata-se de uma pesquisa qualitativa, realizada no contexto das práticas clínicas de estágio em saúde pública, com estudantes do nono semestre do curso de fisioterapia, em uma instituição privada de ensino. O desenho da investigação é interacionista simbólico, pois procurou-se conhecer os significados culturais atribuídos pelos estudantes à comunicação terapeuta-paciente. Os dados foram coletados por meio da pesquisa documental, da observação participante e de grupos focais. Como resultados, consideramos que as concepções dos estudantes sobre como se estabelece a relação profissional-paciente indicam, em maior ou menor grau, como concebem as relações de poder presentes na prática clínica. Sentindo-se a parte empoderada dessa relação, o futuro profissional acaba por estabelecer uma comunicação verticalizada, afastando-se dos princípios de humanização da saúde. Dada a relevância que a comunicação profissional-paciente tem para a qualidade de vida, para a adesão ao tratamento, e para a efetivação da humanização em saúde, consideramos a relevância de se implementar, na formação inicial do fisioterapeuta, estratégias que contemplem, mais incisivamente, essa questão, desenvolvendo a consciência acerca daquilo que desumaniza o profissional e a prática da saúde.
Palavras-chave: Educação Sociocomunitária. Fisioterapia. Comunicação. Humanização.
Abstract
Humanized communication between the health professional, in this case the physiotherapist and the subject of his practices, should be the basis on which the relationship between both will be constituted. Humanizing communication means understanding others in their subjectivity, considering their culture, socio-affective, economic and social factors. The discussion about the humanization of communication in the bias of socio-community education seeks to reflect how it is possible for health professionals, especially in the practice of collective health, to collaborate in the organization of communities in order to actively engage in discussions that cover health and quality of life, the role that the health professional can assume, and also the possibilities of empowering the subjects in relation to their life contexts. The purpose of this investigation, through the above, was to analyze the training of the physiotherapist in what refers to professional communication X subjects of practices and to the paradigm of humanization in health. The promotion of humanization in health is still one of the key points in the field of health, and we consider that communication is essential to advance the purposes of such a paradigm. Methodologically, this is a qualitative research, carried out in the context of the clinical practices of public health training, with students of the ninth semester of the physiotherapy course, in a private teaching institution. The design of the research is symbolic interactionism, because it was sought to know the cultural meanings attributed by students to the therapist-patient communication. Data were collected through documentary research, participant observation and focus groups. As results, we consider that students' conceptions of how the professional-patient relationship is established indicate, to a greater or lesser extent, how they conceive the power relations present in clinical practice. Feeling the empowered part of this relationship, the professional future ends up establishing a vertical communication, moving away from the principles of humanization of health. Given the relevance that the professional-patient communication has for the quality of life, adherence to the treatment, and for the effectiveness of humanization in health, we consider the importance of implementing, in the initial training of the physiotherapist, strategies that contemplate, more incisively, this issue, developing awareness about what dehumanizes the professional and the practice of health.
Keywords: Socio-Community Education. Physiotherapy. Communication. Humanization.
LISTA DE QUADROS
Quadro 1 Diversificação da oferta de cursos no ensino superior Brasileiro .................. 19
Quadro 2 Decreto de Lei 938 de 1969 ......................................................................... 21
Quadro 3 Regulamento de organização didática do primeiro curso de fisioterapia ....... 21
Quadro 4 Currículo mínimo aprovado pelo MEC em 1983 ........................................... 22
Quadro 5 Lei 6.316 de 1975 ......................................................................................... 23
Quadro 6 Transformações na regulamentação da fisioterapia e na área de saúde ...... 24
Quadro 7 A promoção da saúde e os níveis de prevenção .......................................... 36
Quadro 8 Modelos de relação médico-sujeito das práticas .......................................... 44
Quadro 9 Matriz curricular do primeiro semestre do curso de fisioterapia. ................... 116
Quadro 10 Matriz curricular do segundo semestre do curso de fisioterapia ................... 117
Quadro 11 Matriz curricular do quarto e quinto semestre do curso de fisioterapia. ........ 121
Quadro 12 Matriz curricular do nono semestre do curso de fisioteapia. ......................... 124
LISTA DE TABELAS
Tabela 1 Organização do ambiente de coleta da observação participante ........ 87
Tabela 2 Descrição da coleta por sujeitos participantes alunos, sujeitos das
práticas, data e horário e local do atendimento .................................. 89
Tabela 3 Organização do ambiente de coleta do grupo focal ............................ 101
Tabela 4 Distribuição dos participantes por subgrupos nos grupos focais ........ 102
Tabela 5 Características patológicas e socioeconômicas do sujeito das práticas
do G.1/SG.1......................................................................................... 103
Tabela 6 Características patológicas e socioeconômicas do sujeito das práticas
do G.1/SG.2........................................................................................ 104
Tabela 7 Características patológicas e socioeconômicas do sujeito das práticas
do G.2/SG.1........................................................................................ 107
Tabela 8 Características patológicas e socioeconômicas do sujeito das práticas
do G.2/SG.2........................................................................................ 108
Tabela 9 Características patológicas e socioeconômicas do sujeito das práticas
do G.3/SG.1........................................................................................ 110
Tabela 10 Características patológicas e socioeconômicas do sujeito das práticas
do G.3/SG.2........................................................................................ 112
LISTA DE FIGURAS
Figura 1 Representação esquemática do modelo de controle de danos ........... 27
Figura 2 Representação esquemática do modelo de riscos e danos ................ 28
Figura 3 Resolução do Conselho Nacional e Estadual de Educação ................ 31
Figura 4 Parecer do Conselho Nacional e Estadual de Educação .................... 38
Figura 5 Representação das dimensões individuais e coletivas do ser
humano ............................................................................................... 51
Figura 6 Representação dos temas transversais que compõem a PNH ........... 58
Figura 7 Representação esquemática do equilíbrio entre corpo, mente e
espírito na promoção da saúde ........................................................... 70
Figura 8 Representação esquemática dos fatores que afetam a qualidade
de vida. ................................................................................................ 77
Figura 9 Organização da triangulação dos dados ............................................. 79
Figura 10 Atendimentos realizados pelos participantes M.1 e M.2 ...................... 92
Figura 11 Atendimentos realizados pelos participantes F.1 e M.4 ...................... 93
Figura 12 Atendimentos realizados pelos participantes F.5 e F.6 ....................... 94
Figura 13 Atendimentos realizados pelos participantes F.7 e F.8 ....................... 95
Figura 14 Atendimentos realizados pelos participantes M.14, F.15 e F.16 ......... 95
Figura 15 Atendimentos realizados pelos participantes M.9, F.10, M.11,
M.12 e F.13 ......................................................................................... 99
SUMÁRIO
INTRODUÇÃO ...................................................................................................................... 14
PARTE I .................................................................................................................................. 18
1. DISCUTINDO A PROFISSÃO E A FORMAÇÃO DO FISIOTERAPEUTA ...... 18 1.1. BREVE HISTÓRICO DA FISIOTERAPIA NO BRASIL .......................... 18 1.2. CONCEPÇÕES SOBRE A FISIOTERAPIA E SUA
PRÁTICA NO BRASIL ................................................................................. 25 1.3. DA FORMAÇÃO DO FISIOTERAPEUTA ................................................. 30 1.4. CURRÍCULO ATUAL E PRINCÍPIOS DE FORMAÇÃO
NA FISIOTERAPIA ....................................................................................... 34 1.5. DA RELAÇÃO FISIOTERAPEUTA X SUJEITO DAS PRÁTICAS:
UM OLHAR SOBRE OS DIVERSOS MODELOS DE ATUAÇÃO PROFISSIONAL ................................................................. 42 PARTE II ............................................................................................................................................ 51
2. DA HUMANIZAÇÃO NO CAMPO DA SAÚDE .................................................... 51 2.1. A HUMANIZAÇÃO DA SAÚDE E SUAS INTERFACES COM A
FISIOTERAPIA .............................................................................................. 51 2.2. ESTADO DA ARTE NA RELAÇÃO FISIOTERAPIA X
HUMANIZAÇÃO EM SAÚDE ...................................................................... 59 2.3. A COMUNICAÇÃO ENTRE O PROFISSIONAL E O SUJEITO
DAS PRÁTICAS COMO FACE DA HUMANIZAÇÃO EM SAÚDE ....... 65 2.4. A CONCEPÇÃO DE CORPO DOENTE COMO BALIZADORA
DA COMUNICAÇÃO EM SAÚDE .............................................................. 71
PARTE III ................................................................................................................. 79
3. DESENVOLVIMENTO DA PESQUISA .......................................................... 79 3.1. DA METODOLOGIA, PROCEDIMENTOS E INSTRUMENTOS
UTILIZADOS PARA A COLETA DE DADOS ...................................... 79 3.2. DA CARACTERIZAÇÃO DO AMBIENTE E DOS
PROCEDIMENTOS DE COLETA DE DADOS ................................... 84 3.2.1. A OBSERVAÇÃO PARTICIPANTE ............................................... 84
3.3. DOS DADOS CONSTRUÍDOS A PARTIR DA OBSERVAÇÃO PARTICIPANTE .................................................................................. 87
3.3.1. DOS DADOS CONSTRUÍDOS A PARTIR DO GRUPO FOCAL...........................................................................................100
3.3.2. DOS ENCONTROS DOS GRUPOS FOCAIS ASSOCIADOS AO MICROENSINO.............................................................................102
3.4. DA TRIANGULAÇÃO DOS DADOS...................................................114 3.4.1. A RELAÇÃO ENTRE O PROFISSIONAL E O SUJEITO DAS
PRÁTICAS.....................................................................................114 3.4.2. A VERTICALIZAÇÃO DA COMUNICAÇÃO..................................120 3.4.3. A HUMANIZAÇÃO DAS PRÁTICAS DE SAÚDE..........................123
CONSIDERAÇÕES FINAIS.............................................................................................127
REFERÊNCIAS........................................................................................................130
ANEXO I – TERMO DE CONSENTIMENTO LIVRE E ESCLARECIDO (TCLE).....140
ANEXO II – PARECER CONSUBSTANCIADO DO CEP........................................141
Juro, por Deus e minha família, diante de meus mestres que me dedicarei à
Fisioterapia com honra e dignidade, respeitando a vida humana desde a
concepção até a morte, jamais cooperando em ato que voluntariamente se atente
contra ela, ou que coloque em risco a integridade física, psíquica e social do ser
humano; dispondo todo meu conhecimento, talento e inteligência para a
promoção, proteção e recuperação da saúde. Repassarei meus conhecimentos
sempre que se fizer necessário e agirei com humildade e honestidade.
Assim, eu juro.
14
INTRODUÇÃO “Para agir, é preciso ao menos localizar.
Como agir sobre um terremoto ou um furacão? É, sem dúvida, à necessidade terapêutica que se deve atribuir a
iniciativa de qualquer teoria ontológica da doença. Ver em qualquer doente um homem aumentado
ou diminuído em algo já é, em parte, tranquilizar-se. O que o homem perdeu pode lhe ser restituído;
o que nele entrou, pode sair.
Georges Canguilhem (2009).
O fisioterapeuta, como profissional da saúde, e originariamente formado no
modelo biomédico1 de atuação, tem imbuído, em seu processo de formação e no
repertório de conhecimentos dos quais se apropria, ao longo desse processo, a
convicção de ser o detentor da verdade sobre a doença que acomete o sujeito das
práticas e os modos de tratá-la e de preveni-la. Neste aspecto, não está sozinho, mas
integra uma forma de conceber a saúde e a doença/o doente, própria de uma tradição
médico-clínica “ortopédica”, que compreende a doença como ausência de saúde, que
requer métodos e técnicas específicas, para sua correção e estabelecimento da
normalidade. Com isso, pode-se identificar no fisioterapeuta, mas também em outros
profissionais da área médica, um comportamento “dominante”, e consequentemente,
no sujeito das práticas, um alguém “dominado”, fazendo dessa relação potencialmente
verticalizada.
Esta relação deixa suas marcas: conflitos entre os profissionais da saúde e
entre esses e o sujeito das práticas, degradação da qualidade das relações pessoais,
clima de animosidade, e de resistência às orientações profissionais, dentre outras,
incluindo negativamente quer no tratamento quer nas ações de cunho preventivo
(LIMA; BASTOS, 2007).
Para que se tenha uma relação de mais qualidade entre o profissional e sujeito
das práticas é importante, como será aqui argumentado, que tal relação seja
1 Por modelo biomédico, entende-se aquele que se caracteriza pelo tecnicismo, biologicista e curativa, hospitalocêntrica, estando centrado no modelo clínico individualista da prática médica, que prioriza uma postura autoritária e unidisciplinar do profissional, em detrimento daquela multidisciplinar, social e participativa (VERDI; DA ROS; CUTOLO, 2013). Conjuga os princípios do denomindado modelo flexneriano, proposto por Flexner, que defendia uma proposição de ensino em saúde pautada em concepções tecnicista, biologicista, fragmentada, curativa, hospitalocêntrica e mecanisicta, apropriadas ao planejamento de sistemas de saúde numa perspectiva de uma clínica altamente hospitalizada, numa vertente médico-industrial do capitalismo.
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horizontalizada, caso contrário, da parte dominante – em geral, aquela do profissional-
se explicita uma conotação de “poder” e o dominado – comumente o paciente se vê
em uma condição de inferioridade e obrigado a cumprir as diretrizes que lhe são
impostas. O que colabora para que as relações estabelecidas se perpetuem como
heterônomas.
Clavreul (1983) afirma que a relação médico-paciente, cujo modelo se estende
para os demais profissionais da saúde, veio se tornando crescentemente mecanizada
e, nessa perspectiva, excluem-se as particularidades e subjetividades do sujeito. À
partir de 1919, momento em que ocorre o início das práticas da fisioterapia, as funções
do fisioterapeuta foram construídas num perfil hegemonicamente reabilitador,
centrada em ações predominantemente intervencionistas, curativas e, em menor grau,
naquelas preventivas. Contemporaneamente, com a ampliação científica e
tecnológica, e através de iniciativas políticas voltadas para a promoção da saúde
numa perspectiva humanizada, pode-se constatar uma atuação que tende a ser
melhor distribuída por todos os níveis de atenção à saúde, desde a prevenção até à
intervenção. Mas que ainda se caracteriza pesadamente pela desumanização
(SIMONI et al., 2015, p. 13).
A presente pesquisa, na esteira dessas afirmações, tem por objetivo discutir a
formação do fisioterapeuta, fortemente pautada no modelo biomédico, analisando
especificamente como são ensinadas e construídas, pelos estudantes, as habilidades
de comunicação do profissional com os sujeitos das suas práticas, como os alunos
incorporam as relações de poder que permeiam tais práticas, e como isso se vincula
ao paradigma de humanização da saúde.
Nossa preocupação com esse tema se refere, de forma mais aguda, ao
contexto da saúde pública, pois é naqueles contextos de vulnerabilidade
socioeconômica, nos quais os sujeitos das práticas de saúde estão mais colocados
numa posição de subalternidade, frente aos profissionais clínicos, que exacerbam-se
as relações de dominação e a anulação de subjetividades. Partimos do pressuposto
de que no cerne da interação profissional-sujeitos das práticas de saúde está a
comunicação estabelecida entre ambos. Comunicação esta que tanto torna manifesta
como reproduz relações de poder, mas que também pode ser o meio para modificar
tais relações.
16
Sendo assim, fortalecendo o propósito pela busca de respostas à problemática
aqui posta, há que se perguntar: Como se estabelecem as relações de comunicação
profissional-sujeitos das práticas, ou com sujeitos que são alvo da atenção básica em
saúde, envolvendo aquelas de prevenção? Como se delineiam e caracterizam as
relações de poder, no âmbito dessas práticas? Há implicações destas relações para
a adesão ou o abandono do tratamento, ou na mudança de hábitos cotidianos, que
muitas vezes estão na base da prevenção em saúde? Como os estudantes de
fisioterapia se colocam na interação comunicativa com os pacientes e demais sujeitos
das práticas de saúde pública? Como lidam com as relações de poder, que permeiam
tal interação?
Entende-se que a comunicação em saúde está tradicionalmente enraizada
numa concepção de “corpo doente”, que caracteriza a continuidade das relações
estabelecidas entre o profissional e aqueles que são objeto da sua atenção. Ter
consciência desse ponto de partida é essencial para que os profissionais formadores
preparem e sensibilizem o futuro profissional fisioterapeuta para outros olhares,
possíveis de serem construídos em referência àqueles que serão por eles atendidos.
Tratou-se de uma pesquisa qualitativa, adotando-se por design metodológico
um enfoque interacionista simbólico, pois buscamos compreender os significados
conceituais e socioculturais atribuídos pelos participantes às suas práticas
profissionais. Como instrumentos de coleta de dados fizemos uso da observação
participante, da pesquisa documental e de grupos focais, utilizando a educação
sociocomunitária como pano de fundo para as discussões traçadas.
Os participantes foram 16 estudantes do curso de graduação em Fisioterapia,
de uma instituição privada de ensino, localizada na região administrativa de Bauru,
estado de São Paulo. Os estudantes, à época da coleta de dados, que se realizou de
junho a setembro do ano de 2017, cursavam o nono semestre letivo, e realizavam o
estágio supervisionado em saúde pública.
A presente dissertação está organizada em três partes: a primeira e a segunda
trazem uma revisão sistematizada de literatura, na qual se discutem a formação do
fisioterapeuta, do ponto de vista de sua historicidade, filosofia e documentos
direcionadores, bem como a questão do relacionamento profissional-sujeitos das
práticas de saúde. Na última parte apresenta-se o desenvolvimento da pesquisa
17
propriamente dito, com os pressupostos metodológicos, a descrição do contexto da
investigação, os dados e sua análise.
Como resultados, consideramos ser possível afirmar que a despeito da vigência
de discursos sobre a essencialidade da humanização no campo da saúde, tanto em
documentos oficiais de órgãos da saúde como no currículo de formação do
fisioterapeuta, a natureza da relação comunicativa entre o futuro fisioterapeuta e os
sujeitos da sua ação caracteriza-se ainda por constituir-se de forma verticalizada,
reafirmando modelos de subalternização profissional x pacientes, o que
possivelmente comprometerá uma atuação humanizada desses profissionais.
18
PARTE 1. DISCUTINDO A PROFISSÃO E A FORMAÇÃO DO FISIOTERAPEUTA
1.1 BREVE HISTÓRICO DA FISIOTERAPIA NO BRASIL
A iniciativa de um ensino superior voltado para as questões de saúde no Brasil
teve seu início no ano de 1808, com a chegada da Corte Portuguesa, com a criação
da Faculdade de Medicina da Bahia e da Escola de Cirurgia, no Rio de Janeiro. Outras
profissões da saúde, contudo, vieram se estabelecer na educação superior somente
após o país se constituir República, em 1889. Até a República, predominava no Brasil
a formação de pessoas com aptidões práticas para o exercício das profissões, para
isso, as formações outorgavam um “Certificado de Aptidão” que permitia o direito à
atuação, sem mesmo um ensino regulamentado e com parâmetros mínimos ou
pautados em diretrizes curriculares nacionais (CECCIM, 2009).
Sampaio (s/d, p. 01), identifica cinco marcos na história do ensino superior no
Brasil: 1808, 1898, 1930, 1968 e 1985. No primeiro destes marcos, o ensino pautou-
se pela dicotomia ensino e pesquisa, tendo caráter eminentemente técnico, como dito
acima. A formação acadêmica, que estava sob controle do Estado, diplomava
profissionais liberais, garantindo-lhes destaque social e mercado de trabalho, no
atendimento ou na prestação de serviço às elites.
Na virada do século XIX para o século XX, na esteira das grandes
transformações sociais, econômicas e políticas ocorridas (fim da Monarquia,
República, abolição da escravatura, imigração, cultura cafeeira, dentre outros), a
educação passa por importantes modificações. Há maior descentralização e abre-se
a possibilidade de instituições privadas oferecerem cursos superiores. Essas medidas
ampliaram em muito a oferta de opções para o ensino superior, entre os anos de 1889
e 1918. Dentre essas, na área da saúde houve o surgimento de escolas de Farmácia
e de Enfermagem.
Já nas primeiras décadas do século XX o ensino superior, reencontrou-se com
a pesquisa, e instituições fundamentais para o campo da saúde, como o Instituto
Butantã (inicialmente Instituto Vacino gênico de São Paulo) e o Instituto Soroterápico
de Manguinhos (atualmente, Instituto Oswaldo Cruz). Uma discussão central nesse
período foi a luta pela autonomia universitária, processo ainda em construção no
Brasil. O ensino superior, na década de 1930, embora tivesse sido contemplado por
um processo mais consistente de democratização, e em que pese uma maior
19
vinculação com a pesquisa, ainda manteve-se prioritariamente voltado para a
formação de profissionais liberais.
A década de 1960 foi conturbada pela Reforma Universitária, que contemplava
mudanças radicais nos modelos de ensino superior anteriores, como a flexibilização
da formação pelo sistema de créditos, pela maior abertura de vagas e de cursos,
principalmente pelas instituições privadas, prioritariamente confessionais, e pelo
cerceamento do regime militar. Nas palavras de Sampaio (s/d, p. 18):
As diferentes faces desse processo contribuiram para desvalorizar ainda mais os criterios academicos: pela absorcao de pessoal pouco qualificado; pela manipulacao de influencias clientelisticas e politicas nas contratacoes; e pela introducao de diferenciais de remuneracao e de condicoes de trabalho que nada tinham a ver com exigencias de competencia e desempenho. As bases academicas da carreira universitaria, instituidas pela reforma, foram solapadas. A regularizacao dessa situacao, em 1980, feita em termos de atender as demandas mais corporativas do corpo docente acabou por destruir, na pratica, todo o sistema de merito fundado na titulacao.
Finalmente, a década de 1980 em diante é marcada pela diversificação: só para
citar alguns exemplos, temos uma ampliação da diversidade de cursos, inclusive na
pós-graduação, de carreiras, de meios e recursos de gerir o conhecimento, como a
educação a distância, das formas de acesso às universidades, e do financiamento da
educação superior.
No quadro 01, abaixo, elaborado por Sampaio (s/d, p. 22), expõe-se a
expansão da oferta de tipos de cursos universitários no Brasil, podendo-se observar
também quando houve o surgimento ou a expansão daqueles das áreas da saúde:
Quadro 1. Diversificação da oferta de cursos no ensino superior brasileiro
Fonte: SAMPAIO, H. Evolução do ensino superior brasileiro, 1808-1990.
20
Mais especificamente em relação à fisioterapia, o ano de 1919 marcou o início
desta prática no Brasil, com a fundação do Departamento de Eletricidade Médica da
Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo. O Dr. Rolim de Moraes cria,
em 1951, o primeiro curso de Fisioterapia do Brasil, com a finalidade de formar
técnicos em fisioterapia (SANCHES, 1984).
O surgimento deste curso de fisioterapia foi potencializado pela demanda
epidemiológica da época, momento em que o Brasil transitava por um surto de
doenças como febre amarela, malária, poliomielite, tuberculose, doenças parasitárias
e infecciosas, que favoreciam o aparecimento de problemas motores e incapacidades
funcionais. E, ainda, devido ao avanço industrial e aumento da contratação de “mão
de obra” para as fábricas, pois o decorrente acometimento dos trabalhadores por
doenças laborais tornou-se crescente (SIMONI et al., 2015).
De acordo com Ceccim (2009), entre os anos 1960 e 1970, ocorre a
regulamentação das profissões da área da saúde que até então adotavam práticas
tratadas como técnico-profissionais, como a fisioterapia, a fonoaudiologia e a terapia
ocupacional. Que, a partir daí, ascendem para profissões técnico-científicas, gerando
uma explosão destes cursos nas escolas superiores, ofertando formação científica e
tecnológica, com uso de novos aparelhos, técnicas e formas de atuação, assistidos
pela expansão de um mercado promissor e necessário. Foi neste cenário que
surgiram e foram regularizados os cursos de fisioterapia e terapia ocupacional, através
da Portaria de GR 347 de 7 de abril de 1967 (Quadros 2 e 3).
De acordo com Souza et al., (2013, p. 177), após tal regulamentação
(...) mudanças constantes são disparadas no cotidiano das práticas nos mais diferentes espaços e principalmente nos núcleos de conhecimento existentes, dentre eles a Fisioterapia, que pela vivência no campo da reabilitação, em especial na média e alta complexidade, requer um redimensionamento das suas práxis para atender a essa realidade.
Desde o início da regulamentação profissional os fisioterapeutas e terapeutas
ocupacionais adotavam práticas embasadas na formação técnica, pautada pelo
modelo médico-clínico de atendimento, condizente com a denominação dessas
profissões, consideradas “paramédicas”.
21
Quadro 2. Decreto-Lei 938 de 1969 – Reconhece a fisioterapia e terapia ocupacional como profissões de nível superior
Fonte: Decreto-lei 938 de 13 de Outubro de 1969 publicado no Diário Oficial - Marques (1994, p. 9).
Quadro 3. Regulamento e organização didática do primeiro curso de fisioterapia.
Fonte: Portaria de GR 347 de 7 de abril e publicado no Diário Oficial em 1967 - Marques (1994, p. 9).
A reabilitação se constituía como a tônica profissional, feita de acordo com
critérios de diagnósticos e prescrições médicas. Essa concepção de atuação ficava
clara no currículo mínimo aprovado pelo MEC no início da década de 1980 (Quadro
4):
22
Quadro 4. Currículo mínimo aprovado pelo MEC em 1983.
Fonte: Currículo aprovado pelo MEC e publicado no Diário Oficial em 1983 - Marques (1994, p. 9).
Em meados de 1975 a fisioterapia e a terapia ocupacional conquistam seu
próprio conselho no âmbito federal (COFFITO) e nas esferas estaduais os
(CREFITOS), através da Lei 6.316 de 17 de dezembro de 1975 (quadro 5), decretada
pelo Congresso Nacional e sancionada pelo Presidente da República. Na ocasião,
pela baixa demanda de profissionais tanto da fisioterapia como da terapia
ocupacional, houve a necessidade de juntarem-se ambas as categorias profissionais
para que se lograsse êxito na aprovação de um conselho unificado. Atualmente as
duas profissões continuam sendo geridas conjuntamente por esses órgãos.
23
Quadro 5. Lei 6.316 de 1975.
Fonte: Criação dos conselhos, publicado no Diário Oficial em 1975 - Marques (1994, p. 8).
Nas décadas subsequentes à regulamentação dos cursos de fisioterapia e de
terapia ocupacional, os profissionais dessas áreas desenvolveram uma maior
autonomia de atuação, favorecendo com que o fisioterapeutas e os terapeutas
ocupacionais pudessem se estabelecer como profissionais competentes para produzir
diagnóstico cinético-funcional e de outros tipos, através de sua própria investigação
clínica e, a partir daí, passassem a traçar suas condutas (REBELATTO, 1999).
Cavalcante et al. (2011, p. 515), corroboram essa afirmação: “A Fisioterapia
apresentou mudanças no decorrer dos 40 anos legais de profissão. No início, a
profissão se baseava em livros de reabilitação e algumas técnicas, como Bobath,
Kabat, etc. Felizmente, essa tendência sofreu grandes mudanças”.
Contudo, para Bispo-Junior (2010, p. 1632), a marca característica dessas
profissões era (e ainda o é) o modelo biomédico:
A fisioterapia necessita romper com as barreiras do modelo biologicista-curativo em que sempre se apoiou e se aproximar da saude coletiva, que valoriza o social como categoria analitica do processo saude-doenca e propoe novas formas de organizacao do setor de saude.
A mudança de paradigmas na área da fisioterapia, ocorrida entre as décadas
de 1960-1980, pode ser observada abaixo (Quadro 6), com as respectivas influências
dos marcos legais e técnicos; e continuará a ser discutida mais adiante.
24
Quadro 6. Transformações na regulamentação da fisioterapia e na área da saúde.
Fonte: Rezende et al., (2009, pag. 1407).
Logo após a regulamentação da profissão de Fisioterapia no Brasil estavam
ativos apenas seis cursos de graduação, que lançavam no mercado de trabalho
algumas dezenas de fisioterapeutas. Decorridos quinze anos desta regulamentação
pode-se identificar dezesseis novos cursos, perfazendo um total de vinte e dois cursos
no ano de 1984 (SIMONI et al., 2015, p. 12). Ainda, de acordo com a mesma autora,
nos anos 1990 ocorreu um aquecimento na procura pelo ensino superior, devido às
políticas educacionais vigentes na época, o que, somado ao fato de que a fisioterapia
passara a ser uma profissão mais reconhecida socialmente, valorizada e respeitada
pela população, fez aumentar o números de cursos de fisioterapia no Brasil. Dados
do CNE/CES (2009) revelam que no Brasil existem atualmente 503 cursos de
graduação em fisioterapia, a maior parte deles distribuídos entre os estados de São
Paulo, com representação de 27%, Minas Gerais 10,3%, Rio de Janeiro 8,3% e Bahia
com 7,2% (MARÃES, 2015).
25
1.2. CONCEPÇÕES SOBRE A FISIOTERAPIA E SUA PRÁTICA NO BRASIL
Consideramos que embora as mudanças no ensino superior ocorridas no
Brasil, o ensino e as práticas de saúde que poderiam inserir-se no contexto da
educação sociocomunitária, entendida aqui como aquela que se preocupa com a
compreensão das necessidades básicas do ser humano no contexto comunitário, e
se dirige a desenvolver as atitudes relacionais e organizativas em/da comunidade,
visando a autonomia e o empoderamento desta, ainda precisam ampliar-se.
Estas ponderações incluem o profissional da fisioterapia, que através das suas
práticas carregam significados de compreensão do sujeito inserido na sociedade, no
campo da prevenção e da reabilitação, atentando-se para a divulgação e a produção
de conhecimento que levem à modificação de práticas cotidianas, ao design e a
implementação de políticas de saúde pública, e no que tange mais especialmente à
reabilitação, lançando olhares direcionados para a recuperação funcional de seus
pacientes, utilizando-se dos saberes profissionais na qualificação da saúde destes
sujeitos (ALMEIDA, 2009).
As competências do profissional fisioterapeuta, ao executar suas funções na
atenção à saúde, particularmente naquela da atenção primária, devem ultrapassar o
formato queixa-sintoma-ação curativa, que ainda caracteriza fortemente as práticas
dos profissionais da saúde. Com isso, constrói-se uma ótica totalizadora da atenção
com viés para a integralidade, equidade e universalidade no atendimento, como
estabelecido na lei orgânica da saúde (BRASIL, 1990).
A atuação do profissional fisioterapeuta não se restringe, nessa ótica, à
aplicação de técnicas próprias da reabilitação, pelo contrário, enfatiza-se a autonomia
dos sujeitos na promoção da saúde, sendo que o conceito de automomia indica: “uma
abertura à convivência com o outro, pautada em valores que respeitem a alteridade e
a livre escolha” (SUNDFELD, 2010, p. 1083). O que se baseia nas práticas de
comunicação em saúde, as quais promovem o fortalecimento da adesão ao
tratamento e à mudança no modo de perspectivar o cotidiano. Estas práticas
envolvem o saber lidar, o ouvir e o compreender o sujeito.
Subtil et al., (2011) descrevem o relacionamento entre fisioterapeuta e paciente
como “um fator fundamental para o sucesso da reabilitação, além de ser peça-chave
no processo de adesão ao tratamento”. Ainda, segundo Véras et al., (2004): “O
26
fisioterapeuta deve articular suas ações integrando a recuperação, a prevenção de
incapacidades e/ou doenças e a promoção da saúde”.
Para o profissional da fisioterapia, traçar um plano de tratamento para seu
paciente se trata, quase sempre de uma rotina. O fato de as doenças, suas
sintomatologias, a existência de procedimentos terapêuticos protocolares e o
comportamento, muitas vezes resistente e de negação dos pacientes, comporem a
usualidade do fisioterapeuta, favorece com que o profissional desenvolva um perfil
mecânico de atuação, fazendo com que sua atenção volte-se, principalmente, para as
queixas do paciente. Na mesma linha, não é comum observar-se, por parte do
profissional, expressões emotivas na presença da dor e da complexidade dos casos
dos pacientes (CANTO, 2009).
O binômio “fisioterapeuta-paciente” tem sido comumente encontrado e
amplamente difundido na área de saúde, e, embora devesse condicionar a relação
face a face entre o profissional e os sujeitos das práticas, implicando na identificação
de mecanismos comunicacionais que estabeleçam uma relação horizontalizada para
garantir o progresso do tratamento, com frequência não é isso que encontramos na
prática profissional cotidiana (BALDO, 2008, p.11). Canto (2009, p. 308) afirma ainda
que,
[...] é preciso considerar que a experiência de estar próximo ao sofrimento de outros (in)sensibiliza os profissionais que, por vezes, se recusam a conhecer as circunstâncias de vida do paciente, evitando o confronto com seus sentimentos, isso talvez pela crença de que sua formação profissional não abarque esses possíveis aspectos da vida humana.
De acordo com Maia et al., (2015, p. 111), a prática clínica do fisioterapeuta
atualmente está ancorada em pesquisas científicas e atenta em seus resultados para
a tomada de decisão, isso confere e reafirma o interesse desse profissional pela
prática baseada em evidências. Dessa forma, com uma específica e criteriosa
formação, o graduado em fisioterapia dispõe de conhecimentos técnicos relevantes
para atuar na prevenção e no tratamento de distúrbios de órgãos e sistemas, tanto
numa perspectiva clínica individual como na saúde pública, na atenção básica, junto
a grupos e populações.
27
Inserido em um contexto específico de reabilitação e manutenção da saúde, a
fisioterapia oficializa sua atuação em território nacional através do Decreto Lei nº
4638/69 e da Lei Federal nº 6.316/75. Já no ano de 1987, posteriormente à VIII
Conferência Nacional de Saúde, e à resolução nº 80 do Conselho Federal de
Fisioterapia e Terapia Ocupacional (COFFITO), buscou-se dimensionar e ampliar o
leque de serviços e competências inerentes à prática da fisioterapia, lançando-se
olhares para o modelo sanitarista de atenção à saúde. Neste modelo adota-se como
discurso uma fisioterapia aplicada, e que tem como objeto de estudo o movimento
humano em suas formas de expressão e potencialidades, seja em aspectos
patológicos, orgânicos ou psíquicos. Ainda, uma fisioterapia que adota por objetivos a
preservação, manutenção, restauração e integridade da saúde, não mais
compreendida como ausência de doença, mas como um conjunto de fatores, de várias
ordens, que favorecem a qualidade da vida. Assumindo-se a necessidade de passar-
se do modelo descrito abaixo, de controle de danos, (Figura 01):
Figura 01. Representação esquemática do modelo de controle de danos:
Fonte: Bispo-Junior (2010, p. 1630)
para outra concepção da fisioterapia, que engloba, além do controle de danos, o
controle de riscos (Figura 02):
28
Figura 02. Representação esquemática do controle de risco e danos.
Fonte: Bispo-Junior (2010, p. 1631)
A resolução (COFFITO nº 80/87) reforça essa transição de modelos,
destacando a importância do fisioterapeuta nos níveis de atenção e assistência no
campo da saúde, ao afirmar que por suas competências profissionais o fisioterapeuta
é um elemento estratégico na atuação preventiva em saúde pública (MAIA et al., 2015,
p. 112).
De acordo com Menegazzo (2010, p. 349) a presença do fisioterapeuta na
atenção aos sujeitos das práticas em condições de vulnerabilidade socioeconômica,
como é o caso daqueles atendidos pela atenção básica, possibilita maior
conscientização desses sobre os agentes de riscos, limitantes posturais, doenças
osteomusculares e articulares, e ainda, favorece o resgate do pensamento cidadão.
Sua presença pode mobilizar as pessoas (pacientes e familiares) a pensarem na
qualidade de atenção à saúde que vem recebendo e em estratégias para melhorá-la.
O fisioterapeuta torna-se, dessa forma, o agente corresponsável pelas práticas em
saúde quando tratada em contexto de saúde na coletividade, e sua atuação,
potencialmente interdisciplinar, favorece a convergência de saberes para o foco
principal da sua atuação: o ser humano e sua qualidade de vida.
De acordo com Bispo Junior (2009, p. 663),
29
[...] ao analisar o campo de atuação profissional, percebe-se clara contradição entre o número de profissionais existentes e as necessidades de assistência da população. De um lado, encontra-se grande contingente de profissionais aptos a prestar assistência; de outro, a população desassistida e com carência de oferta de serviços de saúde.
Ainda persistem no Brasil os entraves no acesso aos serviços públicos de
saúde, e o que se percebe, como marca geral, é o descaso do Estado diante das
complexas demandas de atenção às doenças, à infraestrutura, cuidados nutricionais,
preventivos e outros, e, sobretudo, as precárias condições de subsistência, que
dificultam ainda mais a qualidade de vida da população mais vulnerável
socioeconomicamente (PAIM, 2002).
A Lei Orgânica da Saúde (nº 8080/90) foi criada com o objetivo de enfrentar a
problemática da atenção à saúde pública, enraizando princípios norteadores para o
sistema único de saúde (SUS), com base na universalidade, integralidade e equidade
no acolhimento e assistência, e elege o Estado como regulador e mantenedor
financeiro das ações em saúde (BRASIL, 2003).
Para uma completa atuação e aproximação do SUS às questões de saúde
focada na atenção primária, meta principal da saúde pública, não se pode deixar de
levar em conta o histórico de atuação terciária da fisioterapia, que desde sua origem
trilha caminhos reabilitativos de sequelas e complicações biomecânicas. Por anos os
fisioterapeutas se distanciaram das ações coletivas de atenção à saúde, da atenção
primária, e segundo Bispo Junior (2009, p. 663), “... a atuação dirigida apenas para a
reabilitação impõe restrições à prática do fisioterapeuta, que se limita a intervir quando
a doença já está instalada...”.
Segundo Rebelatto (1999), a morosidade dos profissionais de transitar de um
modelo biomédico, ao qual as práticas da fisioterapia parecem inerentes, para outros
modelos, afastando-se do papel reabilitador, no qual a concepção de corpo-doente já
se encontra pré-estabelecido, denomina-se “inércia profissional”. Com isso,
restringem-se as intervenções fisioterapêuticas apenas ao âmbito da reabilitação,
empobrecendo-se as possibilidades de atuação e de transformação da qualidade de
vida social, para a qual o fisioterapeuta pode contribuir.
Ao analisar-se historicamente a forma de atuação e o modelo de formação do
fisioterapeuta, percebe-se que apesar dos discursos e das relativas mudanças
paradigmáticas, como acima já referido, as influências do modelo curativo-reabilitador,
30
fixando o contexto de aprendizagem do futuro profissional em lógicas biologicistas e
tecnicistas, na ótica privatista e assistencialista, própria à visão capitalista de atenção
à saúde (CAMPOS, 2008). Dessa forma, mesmo ampliando-se a oferta de cursos no
campo da fisioterapia, observa-se que a sistemática da formação, em nível de
graduação, está focada na formação para um mercado de trabalho, que privilegia e
reforça o modelo clínico biomédico, como anteriormente descrito, em detrimento da
formação para uma fisioterapia mais humanizada, de cunho mais social ou coletivo,
ou, ainda, de força mobilizadora da emancipação dos sujeitos.
De acordo como o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) em
2015, através da Pesquisa Nacional de Saúde (PNS), no Brasil, cerca de 12 milhões
das pessoas estão acometidas por algum tipo de deficiência. Se forem observadas as
deficiências físicas e que comprometem a motricidade, esse número representa 1%
da população e ao levar em consideração a intensidade e grau das limitações, esse
valor equivale a 46% do total das deficiências. Ainda, de acordo com o IBGE, das
pessoas acometidas por alguma limitação física, somente 18% são contempladas por
algum serviço de reabilitação (IBGE, 2015).
Para que os números melhorem e a saúde coletiva alcance bons resultados, é
significativo que se faça um dimensionamento da quantidade de fisioterapeutas por
número de pacientes atendidos, além disso, é relevante pensar em suas práticas no
que tange aos serviços prestados por este profissional, aqueles de reabilitação e
prevenção de doenças e agravos, como também os aspectos relativos à comunicação
com os sujeitos das práticas de saúde.
Atualmente, a formação do fisioterapeuta não prioriza as questões
condicionantes da desigualdade social, ainda mais em se tratando da população de
baixa renda e em condição de vulnerabilidade social (CONDRADE et. al., 2010). Isso
se deve ao fato das práticas educacionais no ensino superior privilegiarem outras
propostas de sociedade e de modelos de saúde.
1.3. DA FORMAÇÃO DO FISIOTERAPEUTA
Ao rever os elos entre formação e atuação profissional, observam-se pontos
que tradicionalmente parecem não estarem contemplados nas práticas e nos
currículos dos cursos de graduação em fisioterapia. As considerações acima
31
apontadas, quanto à vigência do modelo biomédico, é um destes pontos. A pouca
ênfase posta no desenvolvimento de habilidades de comunicação horizontalizada
entre o fisioterapeuta e o paciente, que colaboraria, por exemplo, para reduzir o
distanciamento provocado pelas relações interpessoais verticalizadas, o que acaba
interferindo negativamente no desenvolvimento de ações preventivas e educativas, é
outro ponto. Na elaboração do processo formativo do fisioterapeuta é considerável
levar em conta os mais diferenciados ambientes de trabalho que esse profissional
encontrará, e também, a diversidade de público que suas práticas contemplarão. Para
tanto, como defendemos aqui, a formação do fisioterapeuta deve ser a mais holística
e humanizada possível, pois somente partindo de concepções menos clínicas-
corretivas dos sujeitos é que tal formação poderá ser efetiva para atender às
necessidades dos atendidos (SOUZA et al., 2013, p. 180).
O campo da saúde é regulado por princípios que direcionam os profissionais
para uma atuação com base em seus moldes educativos, nesse sentido, balizar não
o tratamento, mas o “fazer saúde”, só é possível através da permanente mediação do
conhecimento entre os profissionais, os pesquisadores, produtores de conhecimento,
e os diversos participantes das práticas de saúde, que colaboram com os seus
saberes para consolidar este fazer.
Para que a formação do profissional se desenvolva e garanta embasamento
mínimo é necessário cumprir, conforme a legislação atual, requisitos mínimos,
respeitando as competências e habilidades descritas no artigo quarto da Resolução 4
de 2002 do Conselho Nacional de Educação (CNE) e Conselho Estadual de Educação
(CES) (Figura 03):
Figura 03. Resolução do Conselho Nacional e Estadual de Educação.
Fonte: Parecer CNE/CES 4/2002 e publicado no Diário Oficial em 2002 - Marques (1994, p. 9).
32
Destacamos, abaixo, algumas destas habilidades e competências, presentes
na legislação em vigor (RESOLUÇÃO CNE/CES 4, 2002):
I - Atenção à saúde: os profissionais de saúde, dentro de seu âmbito profissional,
devem estar aptos a desenvolver ações de prevenção, promoção, proteção e
reabilitação da saúde, tanto em nível individual quanto coletivo. Cada profissional deve
assegurar que sua prática seja realizada de forma integrada e contínua com as demais
instâncias do sistema de saúde, sendo capaz de pensar criticamente, de analisar os
problemas da sociedade e de procurar soluções para os mesmos. Os profissionais
devem realizar seus serviços dentro dos mais altos padrões de qualidade e dos
princípios da ética e bioética, tendo em conta que a responsabilidade da atenção à
saúde não se encerra com o ato técnico, mas sim, com a resolução do problema de
saúde, tanto em nível individual como coletivo;
II - Tomada de decisões: o trabalho dos profissionais de saúde deve estar
fundamentado na capacidade de tomar decisões visando o uso apropriado, eficácia e
custo efetividade, da força de trabalho, de medicamentos, de equipamentos, de
procedimentos e de práticas. Para este fim, os mesmos devem possuir competências
e habilidades para avaliar, sistematizar e decidir as condutas mais adequadas,
baseadas em evidências científicas;
III - Comunicação: os profissionais de saúde devem ser acessíveis e devem manter a
confidencialidade das informações a eles confiadas, na interação com outros
profissionais de saúde e o público em geral. A comunicação envolve comunicação
verbal, não verbal e habilidades de escrita e leitura; o domínio de, pelo menos, uma
língua estrangeira e de tecnologias de comunicação e informação;
IV - Liderança: no trabalho em equipe multiprofissional, os profissionais de saúde
deverão estar aptos a assumirem posições de liderança, sempre tendo em vista o bem
estar da comunidade. A liderança envolve compromisso, responsabilidade, empatia,
habilidade para tomada de decisões, comunicação e gerenciamento de forma efetiva
e eficaz;
V - Administração e gerenciamento: os profissionais devem estar aptos a tomar
iniciativas, fazer o gerenciamento e administração tanto da força de trabalho, dos
recursos físicos e materiais e de informação, da mesma forma que devem estar aptos
33
a serem empreendedores, gestores, empregadores ou lideranças na equipe de saúde;
e
VI Educação Permanente: os profissionais devem ser capazes de aprender
continuamente, tanto na sua formação, quanto na sua prática. Desta forma, os
profissionais de saúde devem aprender a aprender e ter responsabilidade e
compromisso com a sua educação e o treinamento/estágios das futuras gerações de
profissionais, mas proporcionando condições para que haja benefício mútuo entre os
futuros profissionais e os profissionais dos serviços, inclusive, estimulando e
desenvolvendo a mobilidade acadêmico/profissional, a formação e a cooperação
através de redes nacionais e internacionais.
De acordo com Souza et al., (2013, p. 181) a educação é parte fundante de
uma cultura, construída por conceitos empíricos e disseminada por vários canais de
comunicação e interações comunicativas, sendo assim, assegurar uma educação
superior voltada para a construção de uma saúde resolutiva e humanizada, deveria
ser parte integrante – e efetiva- dos currículos de formação. O profissional da
fisioterapia, em sua formação, deve considerar o direcionamento multivariado de suas
práticas e fazer a transposição desse aprendizado para sua rotina diária.
Bandura (2008), em seu livro sobre Teoria Social Cognitiva, afirma que as
pessoas se tornam agentes de suas próprias vidas através das suas experiências, ao
invés de estarem/serem sujeitas dela. Segundo Cloninger (1999, p. 31), a
aprendizagem deve acontecer de forma ativa, experiencial, e isso inclui a observação,
através da qual se permite a transformação cognitiva, provocando uma intensa
reflexão sobre o comportamento, tanto próprio como dos outros. A formação do aluno
no curso de fisioterapia deve estar ancorada na reflexão sobre os comportamentos
profissionais e as responsabilidades inerentes a esses, que esse aluno vai
aprendendo a desenvolver durante o curso. E isso vale tanto para o aluno como para
os professores formadores, que precisam rever constantemente sua prática, a luz dos
desafios que são postos aos profissionais, advindos das transformações sociais,
econômicas, culturais... Não numa ótica behaviorista, mas como um meio pelo qual
se favorecerá com que se entenda a complexidade do ser humano. Isso exige do
aluno empoderamento, sem o qual ele terá dificuldades para problematizar as
questões da sua época, e para interpretar criticamente a realidade, e, dessa forma,
também entender as lógicas da concepção e da atenção em saúde vigentes.
34
1.4. CURRÍCULO ATUAL E PRINCÍPIOS DE FORMAÇÃO NA FISIOTERAPIA
Na abordagem a seguir será discutido o currículo mínimo para a formação do
fisioterapeuta, sua matriz curricular e a constituinte do projeto político pedagógico de
um curso de fisioterapia, segundo a lei de diretrizes e bases da educação brasileira e
conforme recomendações do Ministério da Educação (BRASIL, 1996).
De acordo com a definição do COFFITO, a fisioterapia é uma ciência aplicada,
cujo objeto de estudos é o movimento humano em todas as suas formas de expressão
e potencialidades, quer nas suas alterações patológicas, quer nas suas repercussões
psíquicas e orgânicas, com objetivos de preservar, manter, desenvolver ou restaurar
a integridade de órgãos, sistemas ou funções (RESOLUÇÃO COFFITO, 1987).
As Diretrizes e Bases da Educação Brasileira estão estabelecidas na Lei nº.
9.394 de 20 de dezembro de 1996 (LDB) e conceituam a educação no âmbito nacional
da seguinte maneira:
Art. 1º A educação abrange os processos formativos que se desenvolvem na vida familiar, na convivência humana, no trabalho, nas instituições de ensino e pesquisa, nos movimentos sociais e organizações da sociedade civil e nas manifestações culturais.
Esta Lei de Diretrizes e Bases (LDB/96) busca validar, através das Diretrizes
Curriculares Nacionais, um novo currículo formativo para os profissionais graduados
na área da saúde, com a intenção de promover novos moldes formativos. O que se
dá face às necessidades de enquadrar os profissionais ao modelo de intervenção
instituído pelo Sistema Único de Saúde (SUS) que são, em tese, amparados pelas
demandas sociais (CHIESA et al., 2007). Também contempla os princípios da
Constituição de 1988, que defendem a saúde como direito de todo cidadão e
responsabilidade de toda a sociedade. As regulamentações do SUS estão descritas
em textos da Lei Orgânica n. 8.080 de 1990 e dissertam sobre os tipos e formas de
direcionar os atendimentos oferecidos à população brasileira, bem como, as formas
que os processos educativos devem acontecer no âmbito da educação permanente
em saúde (BRASIL, 1990).
Os cursos superiores no Brasil sofreram importantes reformulações nas últimas
décadas, em especial após a “Constituição Cidadã”, de 1988, e da Reforma da Saúde,
35
que se seguiu a essa, também em 1988. Esses foram pontos centrais, que
desencadearam a implantação das Diretrizes Curriculares Mínimas para o ensino
superior, principalmente na área da saúde. Tais diretrizes estabelecem disciplinas por
habilidades e competências próprias durante o curso, refazendo consideravelmente a
óptica desenvolvimentista do ensino superior, que em registros passados adotavam
modelos tecnicistas focados na atenção às demandas de uma saúde elitista.
De acordo com o PARECER CNE/CES nº 776/97 (MEC/CNE, 1997):
As Diretrizes Curriculares reúnem elementos de fundamentação essencial em cada área do conhecimento de forma a promover no estudante a capacidade de aprimoramento intelectual e profissional autônomo e permanente. Incluem, entre outras, dimensões éticas e humanísticas, visando ao desenvolvimento no aluno de atitudes e valores voltados para a cidadania.
Conforme Chiesa et al., (2007), ao identificar elementos determinantes do
processo saúde e doença, para além da concepção biologicista, o profissional da
saúde deve investigar os fatores contextuais (econômicos, de infraestrutura, políticos,
sociais, culturais) e aqueles patológicos para propor intervenções resolutivas. Para
isso, no caso do fisioterapeuta, é considerável compreender não só a eleição dos
mecanismos terapêuticos, mas a compreensão holística das pessoas, grupos e
populações que serão alvo da sua atenção, juntamente com a construção de
conhecimentos, que vão sendo apropriados no decorrer da formação. Tal formação
deve propor metodologias que visem a inserção do aluno em ambientes práticos e
teórico-práticos de aprendizagem, nos quais possam exercitar a capacidade para
resolução de problemas frente a “situações problematizadoras”. Isso contribuirá para
o amadurecimento profissional e para as tomadas de decisões no ambiente desafiador
da área da saúde.
Segundo Almeida (2003, p. 75), “o crescente desafio das instituições de ensino
consiste em preparar os profissionais para atuarem em diferentes níveis do sistema
de saúde”. Estes níveis de atuação, tratados por Leavell e Clark (1965) (apud
DEMARZO, 2008) são distribuídos em atenção primária, secundária e terciária, como
exposto no quadro 07:
36
Quadro 07. A promoção da saúde e os níveis de prevenção
Fonte: Modelo da História Natural das Doenças – (LEAVELL e CLARK, 1965) apud
(DEMARZO, 2008).
A complexidade de cada serviço incorre na adoção de concepções de saúde e
de ser humano, de teorias, técnicas e capacitações inerentes aos modelos de
atendimento. E, no interstício entre formação e atuação, o fisioterapeuta expressa
competências individuais que nem sempre são desenvolvidas nos bancos das
faculdades, sendo adquiridas através da vivência pessoal e profissional.
A educação em saúde, em uma perspectiva contemporânea, está ancorada no
processo pelo qual se dá a construção de saberes que serão aplicados
profissionalmente, e para a vida toda, permitindo conhecimentos direcionados acerca
do ser, do comportamento, da relação, da comunicação, das críticas, da cultura e das
influências ofertadas pelo meio (MACIEL, 2009). No entender de Silva:
A formação em saúde pressupõe a necessidade de formar profissionais habilitados a compreender e comunicarem-se adequadamente com os seus pacientes. Nesse sentido, coloca-se a necessidade de que os Projetos Políticos Pedagógicos – PPP dos cursos da área médica, bem como suas políticas formativas, atendam a necessidade de capacitar os acadêmicos uma boa compreensão do homem em seu contexto, social/cultural/econômico, a serem capazes de lidar com a alteridade, respeitando os indivíduos em suas particularidades, compreendendo o “outro” em sua singularidade (SILVA, 2015, p. 299).
37
Para que o fisioterapeuta pudesse, então, alcançar os vários requisitos
implicados nas suas práticas profissionais, nas diversas especialidades desta
profissão, houve a necessidade programar um currículo mínimo de ensino, amparado
em bases legais de direitos e deveres profissionais. Passa, assim, a vigorarem as
Diretrizes Curriculares Nacionais do curso de Fisioterapia, através do Parecer
CNE/CES nº 1,210/2001, de 12 de setembro de 2001 (Figura 04), que estabelecem
em seus artigos as Diretrizes Curriculares Nacionais para o Ensino do curso de
Graduação em Fisioterapia (SALBEGO, 2015). Nas diretrizes se definem os
princípios, fundamentos, condições e procedimentos da formação de fisioterapeutas,
estabelecidas pela Câmara de Educação Superior do Conselho Nacional de
Educação, para aplicação em âmbito nacional na organização, desenvolvimento e
avaliação dos projetos pedagógicos dos Cursos de Graduação em Fisioterapia das
Instituições do Sistema de Ensino Superior.
A carga horária mínima recomendada atualmente pela comissão CNE/CES é
de 4.000 horas para a completa formação acadêmica dos alunos do curso de
graduação em fisioterapia. Dessa carga, além das aulas teóricas, obriga-se à vivência
da prática nas áreas de atuação da fisioterapia no campo de estágio, supervisionado
por um profissional fisioterapeuta devidamente registrado em seu conselho de classe
(BRASIL, 2002).
De acordo com as Diretrizes Curriculares Nacionais (DCN) em seu artigo 3º, o
futuro fisioterapeuta deve compreender e estar habilitado para uma atuação
generalista, humanista, crítica e reflexiva, e deverá atuar em todos os níveis de
atenção à saúde, com uma visão focal, ampliada e globalizada das questões de saúde
e políticas públicas de saúde vigentes no país.
A atuação do fisioterapeuta deverá ser feito em conformidade com princípios
éticos e bioéticos, morais e culturais, respeitando-se o indivíduo em estado de doença,
em situação de vulnerabilidade e a coletividade, com o objetivo de preservar e
qualificar a vida humana, desenvolver ações de prevenção com enfoque na educação
do sujeito, restaurar a integridade de órgãos, sistemas e funções, sendo um
profissional voltado ao desenvolvimento científico continuado e permanente.
38
Figura 04. Parecer Conselho Nacional e Estadual de Educação.
Fonte: Parecer CNE/CES 1.210/2001 e publicado no Diário Oficial em 2001 (MARQUES, 1994, p. 10).
Como requisitos de formação, o fisioterapeuta deverá adquirir competências e
habilidades inerentes à execução de suas atividades. Os conhecimentos básicos para
sua formação compreendem o estudo aprofundado da constituição biológica do ser
humano, de sua gênese até os aspectos morfofuncionais, os processos
fisiopatológicos gerais e específicos dos órgãos e sistemas (BRASIL, 2002). Como
profissional que deve constituir uma concepção integrante e integrada do ser humano,
39
a formação precisa contemplar a associação dos conceitos humanísticos e sociais,
abrangendo o estudo do ser humano e suas relações, os processos de saúde-
doenças e seus desencadeantes multifatoriais, diferentes concepções de vida,
princípios motivadores, aspectos psicossociais, culturais, filosóficos, antropológicos e
deontológicos do ser (BRASIL, 2009).
De acordo com Bandura (2008, p. 46), “os agentes não são apenas
planejadores e prognosticadores, são auto-reguladores, pois adotam padrões
pessoais, monitorando e regulando seus atos”. O aprendente, entendido nessa
perspectiva de agente, e não como “receptor passivo” de informações, se torna autor
de suas próprias ações e coordena seus atos, dessa forma definindo-se o processo
pelo qual acontecerá o modus operandi da ação humana, inclusive aquela da
aprendizagem. Esta concepção, em nosso entender, é aquela que deve guiar o
processo formativo do futuro profissional, pois se o fisioterapeuta deve promover a
autonomia e o empoderamento dos sujeitos, esse processo também precisa ser por
ele aprendido na sua formação. Tal concepção nos parece, ainda, o caminho mais
efetivo para contemplar uma formação pautada em conhecimentos pertinentes ao
estado de atuação, pensados e estruturados nas diretrizes da saúde pública,
educação, gestão administrativa e acompanhando o avanço tecnológico. A formação
do profissional da fisioterapia abrange conhecimentos específicos de biofísica,
bioquímica, informática aplicada à saúde e metodologias científicas, que favoreçam a
incorporação de inovações e tendências tecnológicas próprias da prática clínica
(BRASIL, 2002).
São fundamentalmente importantes os conhecimentos das funções e
disfunções dos movimentos humanos, os recursos semiológicos, diagnósticos,
preventivos e terapêuticos, que instrumentalizam a ação fisioterapêutica nas
diferentes áreas de atuação e nos diferentes níveis de atenção fazem com que o
profissional seja habilitado para suas práticas clínicas e também na atuação
comunitária em saúde. Deve-se considerar as habilidades e conhecimentos do futuro
profissional e que ele precisará colocar-se à disposição da população, quer na
atenção básica como naquelas secundárias e terciárias, através dos recursos físicos
e tecnológicos, na expertise do pensamento preventivo e curativo, para a promoção
da saúde e melhoria da qualidade de vida.
40
De acordo com perspectivas contemporâneas de formação do fisioterapeuta
este deverá iniciar suas práticas clínicas e supervisionadas desde o início do processo
de formação. A experiência profissional é dependente da prática em que se origina, e
a práxis educativa voltada para o desenvolvimento da agência humana, como aqui
argumentado, permite ao discente estabelecer vínculos entre teorias, conceituações
e as práticas vivenciadas. Tal correlação incorpora a necessidade de experiências
advindas do meio, trabalhadas didaticamente por meio de exemplos, reflexões e de
outras metodologias, de caráter ativo (DÍAZ, 2011).
Quando o aluno é estimulado nesse processo de construção do conhecimento,
utilizando-se das mediações dos docentes e das metodologias ativas, o fator
aprendizagem se fundamenta na origem incentivadora da autonomia dos sujeitos, e
se torna contínua, ao longo da vida (SALBEGO, 2015). Os ingressantes no curso de
fisioterapia, nessa perspectiva, passarão por atividades que gradualmente ofereçam
maior complexidade, dentre estas aquelas que consistem na observação do
atendimento realizado por um fisioterapeuta já formado no ambiente clínico-
terapêutico, na atenção básica, hospitalar, dentre outros campos.
No precedente de formação fisioterapêutica, os alunos devem obrigatoriamente
passar por estágios supervisionados e devem completar no mínimo 900 horas de
atividades clínicas, hospitalares, unidades básicas de saúde e intervenções
preventivas. Todo este processo deverá seguir critérios próprios de acordo com o
regimento institucional dos cursos de fisioterapia e de órgãos reguladores, como o
conselho de classe profissional, bem como garantir um rigor avaliativo e metodológico
no desenvolvimento das atividades (BRASIL, 2009).
Durante o curso de graduação em fisioterapia, os alunos deverão aprimorar
seus currículos e repertório acadêmico através de atividades complementares, que
servirão para potencializar e garantir maior aproveitamento dos conhecimentos
adquiridos. As atividades complementares serão viabilizadas pelas instituições de
ensino que regularmente promovem cursos, monitorias, iniciação científica,
programas de extensão universitária, estudos complementares dentre outras
atividades.
Os concluintes do curso de graduação em fisioterapia, de acordo com as
diretrizes de cada instituição, deverão elaborar um trabalho de conclusão de curso,
através da orientação de um professor da instituição, que em conformidade com as
41
normas instituídas institucionalmente deverá garantir a seriedade exploratória e
condução dos dados e comportamento ético diante do fazer ciência.
Os cursos de graduação em fisioterapia devem construir coletivamente um
projeto político pedagógico, de forma que contemplem os requisitos básicos do
processo de ensino e deve ser centrado no aluno como sujeito ativo da aprendizagem,
o professor devendo figurar como facilitador desta.
O Projeto Político Pedagógico deve ser integralizado, articulado e alicerçado
no ensino, pesquisa e extensão. As Diretrizes Curriculares e o Projeto Político
Pedagógico deverão ser os fundamentos do curso. Os currículos poderão diversificar-
se, entretanto, deverão contemplar as diferentes áreas e níveis de abrangência da
atuação profissional para que se cumpra a devida formação generalista.
De acordo com Maia (2015, p. 111),
[...] os fisioterapeutas têm uma formação clínica generalista consistente, o que os habilita a atuar no atendimento de diversas áreas da saúde e nos diversos níveis de atenção (primária, secundária e terciária). Estes profissionais estão habilitados a intervir na prevenção de doenças, tratamentos, na referência e contra referência e na educação e promoção à saúde, sendo esta última à base prioritária em saúde pública.
No que pesem as questões formativas do curso de fisioterapia, observa-se, de
forma geral, o distanciamento dos conteúdos abordados no trajeto de formação
naquilo que se refere à necessidade social. Nesse sentido, Munhoz e Nascimento
(2017), propõem que a execução do Projeto Político Pedagógico esteja em
conformidade tanto com as demandas científicas da profissão como que seja capaz
de formar profissionais críticos e reflexivos, provocando no campo da ciência
transformações, por meio das produções acadêmicas incorporadas ao compromisso
das instituições de ensino superior com as questões sociais.
Ao analisar o campo de imersão da fisioterapia, Pivetta (2015, p. 75) relata,
[...] os currículos dos cursos superiores formam, em sua grande maioria, profissionais habilitados para a execução de técnicas de reabilitação, o que termina por motivar nesses mesmos profissionais, durante sua prática profissional, o questionamento do contexto formativo que receberam por perceberem que a realidade que os cerca compreende uma complexidade para a qual não estão preparados para atuar ativamente.
42
A formação profissional não pode estar enraizada apenas na identificação de
fatores diagnósticos, no acolhimento, no cuidado, nas intervenções, na visão
prognóstica, nos fatores etiológicos ou mesmo preventivos das patologias ou agravos
à saúde. Deve estar atenta aos fatores condicionantes do atendimento e na nas
demandas de qualidade de vida, bem-estar e saúde da população.
Para tanto, são necessárias metodologias que se difundam em uma gama de
recursos, que favoreçam a apropriação dos conhecimentos técnico-científicos numa
concepção humanizada de sujeito (ROBERTO, 2012). Barbosa (2013, p. 52)
complementa esta reflexão argumentando a favor das metodologias ativas de atuação
docente no ensino superior e acrescenta,
[...] mesmo que o sistema educacional forme indivíduos tecnicamente muito bem preparados, é indispensável que eles sejam capazes de exercer valores e condições de formação humana, considerados essenciais no mundo do trabalho contemporâneo, tais como: conduta ética, capacidade de iniciativa, criatividade, flexibilidade, autocontrole, comunicação, dentre outros.
O aprender, no campo da saúde, passa a ser mais que a composição de
disciplinas curriculares, preocupando-se com a maturidade profissional e pessoal do
aluno, numa vertente humanista, que coloca o ser humano integral no cerne da sua
prática, e sua sensibilização às problemáticas sociais. Permitindo aos estudantes
qualidades de um profissional generalista, humanista e crítico-reflexivo, como parte
da construção de seu perfil profissional.
1.5. DA RELAÇÃO FISIOTERAPEUTA X SUJEITO DAS PRÁTICAS: UM OLHAR
SOBRE OS DIVERSOS MODELOS DE ATUAÇÃO PROFISSIONAL
Nesta parte, serão tratadas as implicações estabelecidas na relação
fisioterapeuta/sujeitos das práticas, e em quais modelos vem sendo construída a
formação do fisioterapeuta. Ainda, serão abordados os aspectos da comunicação
profissional-sujeitos, fatores condicionantes do adoecimento e da adesão ao
tratamento, bem como as formas de correlacionar a tecnologia e a ciência em favor
da relação com o outro.
Os processos que devem envolver os modelos de atendimento no contexto de
saúde têm sido amplamente difundidos, enfatizando-se o equilíbrio dos pontos éticos,
43
humanizadores e sociais da atuação dos profissionais. Ao formular ações que
atendam às necessidades consideradas básicas para a (sobre)vivência, o profissional
de saúde precisa adentrar em um emaranhado complexo de concepções acerca do
sujeito, e nisso, entender os paradigmas culturalmente incutidos no comportamento
social, inclusive na sua própria formação.
De acordo com Silva (2011, p. 299), “A formação em saúde pressupõe a
necessidade de formar profissionais habilitados a compreender e comunicarem-se
adequadamente com os sujeitos das práticas”. Sendo assim, se torna imprescindível
que os mecanismos formativos para o sujeito ingressante na área de saúde contemple
os aspectos singulares de entendimento do “outro” enquanto ser humano, dotado de
sentimentos, e que seja horizontalizada qualquer forma de comunicação, pois a
singularidade do ser não deve ser sobreposta pela máquina tecnicista de atuação
profissional.
Para que se possam compreender quais implicações estão estabelecidas no
relacionamento entre fisioterapeuta e o sujeito das suas práticas, faz-se necessário
entender em quais condições essa relação se constrói. Diante do histórico
profissional, ético, técnico e comportamental em que se apresenta a área de
fisioterapia, vale pontuar a adesão ao papel reabilitador, do qual esses profissionais
vem tradicionalmente se apropriando em virtude tanto dos paradigmas biomédicos,
que vem marcando a concepção tanto do que significa ser fisioterapeuta como do que
significa ser “doente”, mas também do olhar focal das instituições de ensino, que vem
preservando esses paradigmas, incutindo em seus alunos a ideia de que a prioridade
na atuação profissional se dá em razão das demandas por ações curativas.
O ensino da saúde no Brasil tem-se enquadrado em um modelo de ensino
descrito como biomédico/flexneriano, como já anteriormente explicitado, construído
por uma forte influência do modelo de saúde vigente nos Estados Unidos, voltado para
fomentar a geração de negócios no campo da saúde, numa concepção não de saúde
pública, mas de práticas de saúde privadas e superespecializadas (SALMÓRIA,
2008). A fisioterapia, em seus mais diversos meios de atuação e protocolos de
tratamento, espelha-se também nesse formato de atuação, que estabelece em sua
forma de agir um papel focado numa ótica de reabilitação que entende que o paciente
se configura apenas como uma anomalia anatomofisiológica e/ou psicológica, a ser
corrigida. Neste sentido, os aspectos que definem o sujeito como “Ser Humano”, tais
44
quais sua singularidade, perspectivas de vida e de compreensão do que é ser/estar
doente, sua vontade, etc., não são levados em consideração.
Silva (2010, p. 542) classifica os modelos médicos de atuação (Quadro 08) e a
relação médico paciente, como: sacerdotal, engenheiro, colegial e contratualista.
No modelo sacerdotal, os autores consideram que há uma posição paternal na
relação entre médico e paciente, situação em que desconstrói qualquer tipo de
argumentação partindo do paciente. Neste modelo fica evidente a dominação do
profissional e a submissão do paciente.
No modelo engenheiro, o paciente tem participação ativa nas decisões,
entretanto, nessa condição, prevalece a acomodação do profissional e o paciente
assume uma posição controladora do processo.
No modelo colegial, as decisões são compartilhadas e não prevalece a decisão
do mais empoderado, mantêm-se preservados os direitos dos pacientes, entretanto,
exige-se que o paciente se aproprie de conhecimentos para além daqueles do senso-
comum, em relação às causas que o levaram ao atendimento profissional.
No modelo contratualista, o médico preserva sua autoridade e conhecimento,
se mantém responsável pelos pacientes e é quem faz as tomadas de decisões, por
outro lado, os valores e desejos dos pacientes são preservados, ocorrendo uma troca
de informações e saberes.
Quadro 08. Modelos de Relação Médico-Sujeito das Práticas.
Fonte: Revista Brasileira de Saúde Materno Infantil (SILVA, 2010).
Sampaio et al., (2002, p. 114) descreve o modelo médico como,
45
Um modelo direcionado para o entendimento da etiologia que afeta órgãos e tecidos e que resulta em sintomas físicos ou psicológicos. A lógica do modelo médico é baseada no diagnóstico ou descoberta dos sintomas relacionados a uma condição patológica e na adoção de uma terapia para a causa da doença.
O fisioterapeuta enquadra-se no modelo médico ao minimizar importantes
fatores de humanização e canalizar esforços para identificar e tratar a patologia como
objeto central do seu trabalho. Ao avaliar o paciente, o fisioterapeuta busca por dados
da história do sujeito, explorados através da anamnese, mas focando-se nos
antecedentes causais que mais lhe parecem próximos ao evento nosológico.
Entretanto, pouco se utiliza dessa busca para entender o sujeito como “um todo”, o
que contribuiria para um prognóstico consistente e uma conduta resolutiva, numa
perspectiva mais humanizada.
Os profissionais fisioterapeutas carregam em seu eixo formador certa
dificuldade de transpor o conhecimento adquirido no percurso de sua formação ao
ambiente prático de atuação, e percebe-se na trajetória formadora o distanciamento
das teorias em relação aos fatores, que emergentes dos contextos sociais, implicam
em deterioração da qualidade de vida. Partindo dessa ideia, Pivetta (2015, p. 78)
acrescenta que “o fisioterapeuta não consegue ter a sensibilidade de acompanhar e
compreender as diferentes indicações que surgem na relação terapeuta/paciente”.
A temática que envolve as implicações da relação terapeuta e paciente não é
nova no contexto da saúde, embora continue atual. O assunto já foi abordado por
vários autores, especialmente a partir de meados do século XX, que criticavam o
“caminho baseado exclusivamente na instrumentação técnica e na objetividade dos
dados” (CAPRARA; FRANCO, 1999, p. 648).
Segundo Caprara (2004, p. 140), “a tecnologia foi se incorporando no exercício
da profissão, deixando-se de lado os aspectos subjetivos da relação”. Apesar das
descobertas tecnológicas e científicas terem se mostrado eficientes no processo de
recuperação e reestabelecimento da saúde do sujeito, não se notavam importantes
mudanças na condição e qualidade de vida da população. Nessa lente, destaca-se a
intenção de aprimorar as ações de saúde pautadas na comunicação, observação e
execução de trabalhos em equipe, como requisito fundamental e no mínimo aceitável
para os valores estabelecidos na relação humana no campo das práticas de saúde. O
46
sujeito se torna o centro do processo, ao invés de sua maior representação ser a
patologia que o afeta.
Segundo Braga (2006, p. 307),
Existe um entendimento do processo terapêutico como um conjunto deliberado de intervenções do terapeuta, sendo o resultado da terapia dependente das suas habilidades, e os fatores relevantes nesse processo à escolha correta das técnicas e o treino do terapeuta no seu manejo.
Os aspectos intervencionistas dos terapeutas, como assim entendidos, revelam
verdadeiros executores de técnicas embasadas em conceitos científicos, e, nesse
sentido, Silveira (2000, p. 214) afirma que “tal pressuposto levou uma geração de
terapeutas comportamentais a adotar atitudes mecanicistas”.
Para Canto (2009, p. 308) a limitação encontrada pelo fisioterapeuta em
entender a relação corpo e mente do sujeito sob seus cuidados parte da compreensão
da segmentação do indivíduo em ser fisiológico e psicológico, e acrescenta:
[...] tratar o paciente representa, muitas vezes, uma rotina: ele já está familiarizado com as doenças, seus sintomas, as reações dos pacientes e as restrições do tratamento, o que o leva a preocupar-se somente com a solução da queixa física do paciente.
Entender os fatores causais incutidos no percurso de adoecimento é essencial
para que se tenha uma efetiva e direcionada promoção e assistência em saúde. O
sujeito, que no passado gozava de um estado biologicamente saudável, na ocasião
nosológica passa a conviver e a ter que vencer diariamente os percalços da transição
saúde-doença. Aqui, entenda-se sujeito doente como um ser físico, psíquico e social.
Canguilhem (2009, p. 47) descreve o equilíbrio harmonioso entre natureza,
sujeito e o estar doente e afirma que, “A doença não está em alguma parte do homem,
está em todo o homem e é toda dele. As circunstâncias externas são ocasiões, e não
causas”. Ao analisar os aspectos mais profundos do estar doente, percebe-se que a
condição “estar” conota algo transitório e não perpetuado. O autor (2009, p.54)
salienta, ainda, que “A doença não é somente desequilíbrio ou desarmonia; ela é
também, e talvez, sobretudo, o esforço que a natureza exerce no homem para obter
um novo equilíbrio”. Equilíbrio esse que não fica circunscrito à biologia, mas que, numa
47
ótica de saúde como qualidade de vida, envolve reorganizar situações e dinâmicas de
vida para outros equilíbrios: econômicos, socioculturais, políticos, comunitários, etc.
Entender as variáveis da relação do sujeito com sua doença é parte integrante
do olhar avaliativo do profissional de saúde, que sumariamente busca interpretar
sinais e sintomas, por vezes distantes do que realmente se apresenta. Starfield (2002,
p. 412), ao referir-se à relação profissional-paciente: “o vínculo pressupõe a existência
de uma fonte regular de atenção, e requer o estabelecimento de fortes laços
interpessoais, que reflitam a cooperação mútua entre as pessoas da comunidade e os
profissionais de saúde”.
É relevante que se estabeleça uma aproximação de confiança entre o
fisioterapeuta e o paciente, na complexidade de cada caso, permitindo uma abertura
para a troca de medos, anseios, saberes...para que possa haver diálogo na
construção das condutas e no executar das ações terapêuticas. Há que se permitir
autonomia do sujeito em processo de cura, dessa forma, participar ativamente dos
processos de prevenção, conscientização na/para a saúde, e de reabilitação se torna
um objetivo no planejamento e na proposta das ações (SUBTIL et al., 2011).
A relação fisioterapeuta/paciente está diretamente atrelada à relação que se
constrói durante o tempo em que ambos canalizam intenções para solucionar uma
problemática no campo da saúde. Nessa perspectiva, o agente facilitador e
determinante do sucesso ou insucesso das práticas é a relação, na qual oportunizam-
se eixos comuns de diálogo entre o fisioterapeuta e o sujeito/grupos/populações. O
fisioterapeuta assume um papel motivacional nesta relação. Através de seu repertório
técnico científico, impregnado por uma concepção humanizadora de suas práticas,
sua capacidade de mostrar atenção, carinho e afeto, efetiva-se. Há um “permitir”, do
ponto de vista da confiança entre ambos, que favorece a efetivação das práticas e
melhora a adesão a essas.
De acordo com Subtil (2010), os estudos que tratam sobre a relação
profissional/sujeito são reduzidos, porém, o autor ressalta e argumenta que um ponto
forte do processo de reabilitação, e, acrescentamos, em todos os níveis de atenção
em saúde, nos quais o fisioterapeuta pode estar inserido, consiste em trabalhar as
implicações bilaterais inseridas na convivência. Isso sugere um contrabalançar de
comportamentos e responsabilidades inerentes aos papeis no seio da relação, que
poderão resultar em melhora da qualidade de conexão entre os envolvidos. Portanto,
48
ao passo em que há um envolvimento interpessoal, há também um selar de afetos
que refletem e condensam robustamente os objetivos estabelecidos e explicitados nas
práticas propostas.
Conhecer o contexto de vida dos sujeitos é a peça chave na promoção da
saúde, e o fisioterapeuta, ao levar em consideração os aspectos socioeconômicos,
estruturais, culturais, educacionais e as crenças e saberes, consegue planejar e
orientar uma forma de abordagem mais compartilhada, horizontalizada. Desde que
favoreça que também o sujeito o conheça não só como terapeuta, mas como ser
humano. Isso não significa superexposição das partes, algo que parece muito
presente na cultura contemporânea, com a facilidade de “vitrinização” das vidas das
pessoas nas redes sociais. Mas desenvolver a comunicação horizontalizada, que se
baseia em trocas e no mútuo respeito. Nesta chave de leitura, pode-se perceber o
caráter social e humanizado da atuação fisioterapêutica. Silveira (2000, p. 122)
descreve o ambiente social em que a fisioterapia está inserida e esclarece,
[...] os fisioterapeutas por suas práticas, que carregam significados relacionados com a forma de compreender a sociedade, com sua visão de saúde, com as relações de poder estabelecidas no seu espaço. O conceito de lugar enquanto espaço relacional oferece elementos da reprodução da vida social, portanto, da reprodução da fisioterapia na sociedade. Compreender e refletir sobre esse lugar social é fundamental como parâmetro de reorientação dos caminhos da profissão.
O fisioterapeuta, como ser social e parte integrante de uma classe profissional
que articula iniciativas fecundas no contexto reabilitativo e de prevenção em saúde,
deve orientar suas ações de maneira ética e construtiva na relação com os sujeitos.
Sua conduta deve representar elevado grau de transparência e competência na
execução de suas práticas, de forma que favoreça a qualidade de vida- observando
que a autonomia e a organização dos contextos de vida e da própria comunidade para
a promoção da emancipação e da cidadania ativa também são inerentes à ideia de
qualidade de vida com os sujeito/s.
A figura dominante do profissional da saúde sugere uma falsa ideia de
“controle” de situações, e, com a ideia de deixar clara a autoridade do fisioterapeuta,
adota-se uma postura controladora, detentora da verdade absoluta dos temas
relacionados à saúde. Nesta perspectiva, o fisioterapeuta leva a crer (e é levado a
crer, em seu processo formativo) que tal postura favorecerá a recuperação do
49
paciente. No entanto, o que se percebe é a evasão da terapia, o abandono do
processo de tratamento, pois há a negação da pessoa, nesse processo de
verticalização das relações. Considera-se, contudo, que nem sempre a adoção de
uma postura controladora se trata de algo intencional: acreditamos que, na verdade,
há uma carência no processo formativo inicial dos estudantes de fisioterapia, e na
educação permanente em saúde, em estimular habilidades comunicacionais e
relacionais nos fisioterapeutas.
Britto (2010, p. 80) descreve a comunicação como um mecanismo de troca de
ideias, sentimentos e emoções, e acrescenta que essa “ocorre mediante o uso da
palavra escrita e falada, além de mecanismos não verbais que podem ou não
influenciar no comportamento das pessoas que, por sua vez, reagirão a partir de suas
crenças, valores, história de vida e cultura”.
Os modelos de comunicação profissional e paciente estão construídos em um
conjugar de ideias e comportamentos que refletem o contexto científico, metodológico
e tecnicista em que a formação acontece. Entender a relação entre ciência e a prática
clínica é um desafio, que tem origem no passado histórico das profissões da saúde.
A comprovação científica acerca dos impactos das relações interpessoais
profissional da fisioterapia-sujeitos era escassa até meados do final do século XX,
quando as discussões envolvendo essa temática começam a despontar no campo da
fisioterapia. Desde as concepções iniciais de formação no campo da saúde o
fisioterapeuta construiu seu perfil profissional em plataformas tecnicistas e
racionalistas, como aqui já argumentado. Reconhecer e valorizar as contribuições das
relações interpessoais empregadas nos processos fisioterapêuticos têm sido
desafiador para todos envolvidos nesses processos, o que exige uma compreensão
bilateral, ambos devem compreender que ao fortalecer a relação comunicativa estão
construindo laços de empatia e, consequentemente, potencializando o alcance, a
durabilidade, a extensão e a efetividade das práticas desenvolvidas. E vivificando a
humanização em saúde.
Ao correlacionarmos os modelos de ensino e de atuação do fisioterapeuta, às
habilidades profissionais, que incluem uma determinada compreensão de corpo
doente, podem-se observar um comportamento empoderado do fisioterapeuta. E uma
consciência de pertencimento a uma classe de profissionais que se utiliza de uma
roupagem dominadora, por meio de seus conhecimentos no campo médico-clínico.
50
Diante disso, torna-se ilusório esperar um papel ativo dos sujeitos, uma vez que esse
vai aprendendo, ao longo de sua história de vida, que suas percepções e opiniões
pouco significam para o profissional da saúde, e, em assim sendo, também serão
pouco consideradas pelo fisioterapeuta.
A temática das relações dos fisioterapeutas com as pessoas que participam
das suas práticas continuará a ser discutida abaixo, no contexto da humanização da
saúde.
51
PARTE 2. DA HUMANIZAÇÃO NO CAMPO DA SAÚDE
2.1. A HUMANIZAÇÃO NA SAÚDE E SUAS INTERFACES COM A FISIOTERAPIA
Na parte que se segue será tratada a questão da humanização no contexto
geral da saúde, e, mais especificamente na fisioterapia, abordando-se quais as
percepções, abordagens e importância são dadas ao tema e quais diretrizes são
implementadas pelo Estado para garantir uma equilibrada prática de humanização, de
acordo com a Lei Orgânica da Saúde (8.080/9) e a Política Nacional de Humanização
(MATHEUS, 2003).
Observamos que só se discute a humanização em saúde porque antes se
percebe uma desumanização social: as pessoas que trabalham na área de saúde,
antes, são sujeitos que pertencem a uma sociedade, os pacientes que se utilizam do
sistema também fazem parte da mesma sociedade e ambos trazem da própria cultura
os problemas, as frustrações, as limitações e também as dificuldades em relação à
humanização. A (des)humanização em saúde é, assim, uma face de um todo mais
amplo, que é aquele da (des)humanização da sociedade (Figura 05).
Figura 05. Representação das dimensões individuais e coletivas do ser humano.
Fonte: Próprio autor (2017).
Se a sociedade está desumanizada, então, consideramos que seja preciso
buscar respostas sobre as razões disso e como seria possível colaborar para a
transformação desse quadro. Que é fundamental, pelo fato de que para se construir
uma saúde mais humanizada, antes, se faz necessário debater a qualidade dos
vínculos sociais na contemporaneidade, a dificuldade em entender a complexidade do
todo social, caindo-se em reducionismos que acentuam os preconceitos e os
52
radicalismos, reconhecer o individualismo exacerbado, a transformação do outro em
mercadoria, enfim, comportamentos que hodiernamente parecem dominantes, e
marcam as decisões cotidianas, que culminam na perda do afeto e respeito pelo ser
“humano”.
Os profissionais da área da saúde precisam estabelecer contato direto com
aqueles que estão sob seus cuidados. É preciso entender que o sujeito não se
incorpora apenas de uma patologia a ser tratada, são seres humanos em
singularidade e complexidade, que necessitam de uma atenção especial, quer seja no
campo da prevenção, quer seja naquele da reabilitação. A relação entre fisioterapeuta
e os sujeitos se configura no marco central da busca pela qualidade de vida. Entender
e aprimorar a comunicação, para que essa busca seja personalizada – única forma
de ser efetiva- é uma das chaves de leitura da humanização.
A ideia de humanizar a relação entre os profissionais da saúde e os sujeitos
perde força ao nos depararmos com as elevadas demandas de doenças que atingem
a população, em especial aquela que vive em contexto de vulnerabilidade
socioeconômica, frente ao pouco dimensionamento de profissionais, recursos
materiais e estruturas disponíveis. Ainda, a prejudicar tal humanização está a
necessidade destes profissionais cumprirem metas de atendimentos nos mais
variados níveis de complexidade, dificuldade de infraestrutura, insumos e materiais,
que também atingem mais fortemente as periferias. Tudo isso coloca em risco a
relação humanizada profissional e sujeitos, a comunicação e, por conseguinte, a
qualidade da atenção em saúde.
O propósito de se promover a humanização no campo da saúde, em especial
naquele da saúde pública, parte do reconhecimento de que nas práticas desse campo
subsistem sérios problemas, decorrentes tanto da dinâmica capitalista dos serviços
de saúde, já anteriormente mencionada, como do descaso do Estado em relação à
saúde da população mais economicamente vulnerável. Tais práticas tendem a anular
o sujeito como figura central das ações do sistema de saúde. Sendo assim, humanizar
o atendimento considera a possibilidade de mudanças diversas, inclusive culturais,
que vão desde a gestão até o cuidado, mas culminam, ao menos da parte dos
profissionais, em esforços para viabilizar, na relação com os sujeitos, uma postura
ética e de cuidado dialógico respeitoso.
53
A humanização passa pelo acolhimento do usuário do sistema de saúde, de
modo a fazer com que as práticas de saúde possam ter um novo sentido, tanto para
os profissionais como para s sujeitos. E um primeiro passo é mudar a mentalidade de
que o sujeito doente não se trata apenas de uma patologia a ser tratada, nem do
objeto de uma relação de consumo entre o sistema de saúde e o cliente. A mudança
da mentalidade é que favorecerá com que a relação comunicativa possa ser
horizontalizada (FORTES, 2004, p. 24). No entender de Silva:
A humanização, atualmente, é entendida como a capacidade de ofertar atendimento de qualidade, articulando os avanços tecnológicos, com acolhimento, com melhoria dos ambientes de cuidado e das condições de trabalho dos trabalhadores (SILVA, 2011, p. 1537).
Segundo Rios (2009, p. 8) o tema humanização é um assunto frequente no
campo da saúde pública, nesse sentido, abordar tal tema significa reviver
comportamentos que deixaram de ser valorizados, e, de alguma forma criar a
consciência de que necessitamos aprimorar as relações pessoais para uma
convivência compatível com o bem de todos e em conformidade com os preceitos de
justiça social. Ainda de acordo com Rios (2009, p. 9) existem várias lentes para
compreender o cerne da proposta de humanização, são eles:
Princípio de conduta de base humanista e ética
Movimento contra a violência institucional na área da Saúde
Política pública para a atenção e gestão no SUS
Metodologia auxiliar para a gestão participativa
Tecnologia do cuidado na assistência à saúde
Nas questões que envolvem o respeito e a valorização do sujeito, e
extrapolando os aspectos reducionistas da relação humana e suas singularidades,
encontra-se a humanização. De acordo com Rios: “No campo das relações, a perda
de suportes sociais e éticos, somada ao modo narcísico de ser, cria as condições de
intolerância à diferença, e o outro é visto não como aliado, mas ameaça” (RIOS, 2009,
p.8).
Oliveira (2006, p. 278) descreve a ideia de humanidade como o funcionamento
de toda a espécie, que tem em comum as indigências que necessitam ser sanadas,
54
da mesma forma, que cada um possa desenvolver suas habilidades e capacidades.
Nas palavras do autor (2006, p. 280),
Humanizar é, ainda, garantir à palavra a sua dignidade ética. Ou seja, o sofrimento humano, as percepções de dor ou de prazer no corpo para serem humanizadas precisam tanto que as palavras com que o sujeito as expressa sejam reconhecidas pelo outro, quanto esse sujeito precisa ouvir do outro, palavras de seu reconhecimento. Pela linguagem fazem-se as descobertas de meios pessoais de comunicação com o outro, sem o que se desumaniza reciprocamente.
Os acordos éticos e morais que norteiam as relações sociais complementam
as atitudes coletivas e definem o fazer humanização como o processo que regularia
as ações que interconectam os sujeitos, considerando suas singularidades. Em
relação aos usuários do Sistema Único de Saúde, quando tratados em contexto de
vulnerabilidade, o conceito de humanização abre precedentes de igualdade, equidade
e no anteparo solidário, buscando enfrentar as problemáticas imersas nos fatores
condicionantes da desumanização, dentre eles a exclusão social.
De acordo com Silva (2011, p. 28), vários fatores revelam a desumanização na
saúde, podendo serem agrupados em três categorias que se interligam, tendo como
produto final o descaso à pessoa.
Na primeira categoria, trata-se das falhas na organização do atendimento,
como longas filas de espera, adiamentos de consultas e exames, ausência de
regulamentos e rotinas para acolhimento, precárias instalações e equipamentos
obsoletos ou parados por falta de manutenção e, ainda, acrescenta-se o atraso para
realização de exames complementares e emissão de laudos.
Na segunda categoria pode-se evidenciar especificamente a relação entre o
profissional da saúde e o paciente, fatores que comprometem a integridade moral e
física do paciente, como a aglomeração de pessoas no momento do atendimento e a
falta de privacidade, a ausência de preparo psicológico e ético dos profissionais, e de
informações precisas para auxiliar os usuários do sistema de saúde a entender o que
está se passando com ele, o processo de tratamento, onde buscar apoio social,
emocional e financeiro, e mesmo os locais para realizar exames e terapias
complementares, etc.
Na terceira e última categoria estão a falta de condições de trabalho dos
profissionais, considerando os baixos salários, jornadas dupla ou tripla, que confluem
55
para a sobrecarga e consequente cansaço físico e psíquico, principalmente se
observado o ambiente tenso e muitas vezes belicoso, que desfavorece a qualidade
do ambiente de atuação.
A fragmentação da saúde, que se reflete nos serviços oferecidos pelo sistema
único de saúde desperta grande discussão sobre as reais necessidades de se ter uma
relação estreita entre os campos de atuação da saúde, de seus profissionais e dos
sujeitos que por eles são assistidos. Mesmo com a instituição de políticas que têm
como finalidade a redução da desigualdade e o acesso aos serviços de saúde de
forma gratuita, igualitária, integral e equanimemente distribuída, nomeadamente o
SUS, ainda é preciso reger os processos de humanização da saúde. E, consideramos,
desde o processo formativo dos profissionais.
A criação do Sistema Único de Saúde (SUS) se deu através da Lei nº 8.080,
de 19 de setembro de 1990, que “dispõe sobre as condições para a promoção,
proteção e recuperação da saúde, a organização e o funcionamento dos serviços
correspondentes”. Primeira lei orgânica do SUS, essa detalha os seus objetivos e
atribuições, princípios e diretrizes, a organização, direção e gestão, a competência e
atribuições de cada nível (federal, estadual e municipal); a participação complementar
do sistema privado; os recursos humanos; financiamento e gestão financeira e
planejamento e orçamento. Em 1990 cria-se a lei nº 8.142, que dispõe sobre a
participação da comunidade na gestão do SUS (particularmente participando nas
Conferências de saúde e nos Conselhos de saúde) e sobre as transferências
intergovernamentais de recursos financeiros (BRASIL, 1990).
A lei orgânica da saúde é de importância fundamental, pois regula em todo o
território nacional as ações e serviços voltados para as práticas em saúde, seja ela
em seus níveis primários, secundários ou terciários, e ainda, executada de forma
individualizada ou coletiva, em caráter permanente ou eventual, e sua abrangência
inclui o atendimento à pessoas naturais ou jurídicas (BRASIL, 2003). É por meio desse
dispositivo legal que se vivifica os preceitos constitucionais da saúde como um direito
fundamental do ser humano, sendo que o Estado deve ser seu provedor, garantindo
a formulação e execução de políticas que visem o controle de riscos, doenças e
agravos. O artigo terceiro da lei registra os fatores relevantes para a garantia da saúde
e qualidade de vida, e revela,
56
[...] a saúde tem como fatores determinantes e condicionantes, entre outros, a alimentação, a moradia, o saneamento básico, o meio ambiente, o trabalho, a renda, a educação, o transporte, o lazer e o acesso aos bens e serviços essenciais; os níveis de saúde da população expressam a organização social e econômica do País (BRASIL, 2003).
A humanização na saúde, conjugada à ideia de direitos humanos, tem por
finalidade conseguir que “a todos seja dado acesso ao que precisam segundo suas
necessidades e a cada um as condições para desenvolver e exercitar suas
capacidades” (OLIVEIRA, 2006, p. 280). Dessa forma, estar atento aos sinais
apresentados pelos pacientes, oferecer condições de escuta e propor resolutividade
para as questões postas pelos sujeitos que procuram o sistema de saúde público, é
mais que simplesmente agir com generosidade, é fazer valer a proteção do oprimido
ao promover a consciência de corresponsabilidade humana. Somos elementos ativos
na sobrevivência do outro, quando este se encontra em estado de risco, enfermo,
vulnerável aos insultos multifatoriais da vida.
É necessário humanizar as práticas em saúde, haja vista a desigualdade social,
o crescente e acelerado desenvolvimento científico e tecnológico, que tende a suprimir
as crenças e o valores individuais, pois esses são banidos da relação dos sujeitos
com a ciência, a aceleração da vida nas sociedades urbanas modernas e a ênfase
no ter, que obscurece a singularidade das pessoas, dentre outros, que poderíamos
citar, e que acabam desumanizando a assistência e estabelecendo uma crise na
relação com o outro (CASATE, 2005). Silva corrobora esta afirmação, esclarecendo
que
A humanização surge como um desafio no novo século para os trabalhadores de saúde, pois há a preocupação com a complexidade tecnológica, fragmentação do cuidado em visões isoladas, especialização dos saberes, considerando também que nos serviços de saúde há situações “desumanizantes”, como a racionalização, a mecanização e a burocratização excessiva do trabalho, além do impedimento de que o trabalhador desenvolva sua capacidade crítico-criativa (SILVA, 2011, p. 1544).
Com base na evolução desse cenário, nas últimas décadas surgiu a
necessidade da criação de uma política que minimizasse os efeitos deletérios da
desumanização, o que foi buscado na implantação da Política Nacional de
Humanização (PNH). De acordo com Pasche (2011, p. 4542) a PNH foi criada em
2003 pelo Ministério da Saúde e pactuada na Comissão Intergestores Tripartite e
57
Conselho Nacional de Saúde da atenção e da gestão do SUS, propondo-se trabalhar
para consolidar quatro metas específicas:
1. Serão reduzidas as filas e o tempo de espera com a ampliação do acesso e
atendimento acolhedor e resolutivo baseado em critérios de riscos.
2. Todo usuário do SUS saberá quem são os profissionais que cuidam de sua
saúde e os serviços de saúde se responsabilizarão por sua referência territorial.
3. As unidades de saúde garantirão as informações aos usuários, o
acompanhamento de pessoas de sua rede social, e os direitos previstos no
código dos usuários do sistema público de saúde.
4. As unidades de saúde garantirão gestão participativa e educação permanente
aos seus trabalhadores e usuários.
A PNH pressupõe a atuação em vários eixos, que objetivam a
institucionalização e a difusão das suas estratégia e, principalmente, a apropriação de
seus resultados pela sociedade. Nesse sentido, observam-se seis eixos próprios para
integralizar as ações promotoras da humanização, são elas:
1. No eixo das instituições do SUS pretende-se que a PNH faça parte do plano
nacional, dos planos estaduais e municipais dos vários governos, sendo
pactuada na agenda de compromissos da saúde, pelos gestores e pelo
conselho de saúde correspondente.
2. No eixo da gestão do trabalho, propõe-se a promoção de ações que
assegurem a participação dos trabalhadores no processo de discussão e
decisão, fortalecendo e valorizando os trabalhadores, sua motivação, o
autodesenvolvimento e o crescimento profissional.
3. No eixo do financiamento, propõe-se a integração de recursos vinculados a
programas específicos de humanização e outros recursos de subsídios à
atenção, unificando-os e repassando-os fundo a fundo mediante o
compromisso dos gestores com a PNH.
4. No eixo da atenção, propõe-se uma política incentivadora do protagonismo
dos sujeitos e da ampliação da atenção integral à saúde, promovendo a
intersetorialidade.
58
5. No eixo da educação permanente, indica-se que a PNH componha o conteúdo
profissionalizante na graduação, pós-graduação e extensão em saúde,
vinculando-a aos polos de educação permanente e às instituições de
formação.
6. No eixo da informação/comunicação, indica-se por meio de ação de mídia e
discurso social amplo a inclusão da PNH no debate de saúde.
7. No eixo da gestão da PNH, indica-se o acompanhamento e avaliação
sistemática das ações realizadas, estimulando a pesquisa relacionada às
necessidades do SUS na perspectiva da humanização.
Para a construção de uma política de qualificação do SUS, a humanização deve
ser vista como uma das dimensões fundamentais (Figura 06), não podendo ser
entendida como apenas um “programa” a mais a ser aplicado aos diversos serviços
de saúde, mas como uma filosofia e uma política, que opere transversalmente em toda
a rede SUS.
Figura 06: Representação dos temas transversais que compõem a PNH.
Fonte: Ministério da Saúde. Cadernos Temáticos PNH: formação em humanização. Brasília-
DF, 2010.
Entenda-se transversalidade como parte da política de humanização, não como
projeção de pontos a serem abduzidos do sistema de saúde, mas sim como a tratativa
59
pontual de questões que fortalecerão as estratégias para se criar uma saúde mais
humanizada.
Com base no artigo 2º da Cartilha dos Direitos do Paciente, desenvolvida pelo
Conselho de Saúde do Estado de São Paulo, em estudos relativos aos direitos dos
usuários dos serviços e das ações de saúde no Estado:
[...] as normas garantem aos usuários do sistema de saúde o direito ao atendimento digno, atencioso e respeitoso; a ser identificado e tratado pelo seu nome ou sobrenome; a não ser identificado ou tratado por números, códigos ou de modo genérico, desrespeitoso, ou preconceituoso; a ter resguardado o segredo sobre seus dados pessoais, através da manutenção do sigilo profissional, desde que não acarrete riscos a terceiros ou à saúde pública; a poder identificar as pessoas responsáveis, direta e indiretamente, por sua assistência; receber informações claras, objetivas e compreensíveis sobre hipóteses diagnósticas, diagnósticos realizados, exames solicitados e ações terapêuticas; a consentir ou recusar, de forma livre, voluntária e esclarecida, com adequada informação, procedimentos diagnósticos ou terapêuticos a serem nele realizados; a acessar, a qualquer momento, o seu prontuário médico (FORTES, 2004, p. 32).
O risco de se tomar a humanização como mais um “programa” seria o de
aprofundar relações verticais, em que estão estabelecidas, pelos profissionais,
normativas que devem ser aplicadas e operacionalizadas, pelos sujeitos aos seus
cuidados. O que significa, grande parte das vezes, efetuação burocrática,
descontextualizada e dispersiva, ações pautadas em índices a serem cumpridos e
metas a serem alcançadas, independentemente de sua resolutividade e qualidade.
Ou numa visão biomédica, de que o corpo, enquanto doente, pertence ao
profissional/sistema, sendo coisificado.
2.2. ESTADO DA ARTE NA RELAÇÃO FISIOTERAPIA X HUMANIZAÇÃO EM SAÚDE
O texto a seguir propõe abordar mais pontualmente a problemática da
humanização no campo da fisioterapia, e como está se constrói no percurso formativo
do curso de fisioterapia.
Dentre as diversas áreas que incorporam a saúde, predominantemente aquelas
com perfil mais tecnicista e mecanicista como forma de trabalho, a fisioterapia se
destaca, pela sua proximidade ao modelo médico. E, apesar da especificidade dos
textos que direcionam a prática profissional, voltada à fisioterapia, adota em seu
60
percurso formativo uma postura que pouco discute ou pratica uma conduta
humanizada, pautada nas tratativas verticalizadas com os pacientes, numa adesão ao
modelo flexneriano. Num discurso de dominação, para que a crença na
autoridade/autoritarismo do profissional seja parte constituinte do processo de cura.
Para que se tenha humanização no atendimento, contrapondo-se ao modelo
biomédico, o profissional da fisioterapia precisa considerar na relação com o sujeito
os fatores que o levaram até ali, quais as queixas apresentadas por ele, considerando-
as em sua complexidade, quais os possíveis motivos que originaram o processo
patológico, também do ponto de vista do sujeito e, ainda, promover a autonomia e o
empoderamento na busca pelo tratamento. Deve-se considerar a possibilidade da
negação da doença e, principalmente, a rejeição espontânea do tratamento. O
convencimento, para que o doente tenha adesão ao tratamento, passa pela
capacidade de persuasão do fisioterapeuta, mas que não pode ser falsa ou “sedutora”,
mas deve estar baseada, sobretudo, nas trocas que se estabelecem entre sujeito e o
profissional. Que se baseiam numa confiança provinda do diálogo, o que pressupõe,
por sua vez, o reconhecimento do outro como ser produtor de valor moral, científico,
cultural, dentre outros. Não devendo nunca extrapolar ou anular a decisão pessoal do
sujeito: “Humanizar na atenção à saúde é entender cada pessoa em sua
singularidade, tendo necessidades específicas, e, assim, criando condições para que
tenha maiores possibilidades para exercer sua vontade de forma autônoma”
(FORTES, 2004, p. 31).
Ainda, de acordo com Fortes (2004), humanizar tem como precursor a ética
estabelecida nas relações, o que deveria ser próprio da condição humana e
apresentar-se nos interesses comuns, pautados em valores emergentes e que estão
enviesados no caráter da subjetividade, mesmo estando o sujeito em sociedade. A
humanização, para o profissional de saúde, deve considerar as disparidades sociais
e propor formas de enfrentá-las, sensibilizar-se para as desigualdades, utilizando-se
da consciência cidadã, ética e educativa.
A educação é um dos elementos cruciais entre o saber, o ser e o fazer a
humanização, quando está conjugadas em práticas de inclusão sólidas e pautadas no
respeito aos direitos humanos. Contudo, Penha (2003, p. 14) acrescenta que “É
particularmente na educação que se depositam todas as esperanças de superação
das contradições que se descortinam”.
61
Em uma visão casuística de humanização, seria legitimo associar o
comportamento desumanizador do sujeito à evasão do convívio social e formativo?
Esta concepção deixaria rasas as indagações acerca da problemática da
humanização, sociedade e educação. Nem sempre o sujeito sociável e formalmente
educado se comporta nos padrões do que se considera humanização, por outro lado,
tampouco o sujeito pouco social e pouco formalmente educado age com transgressão
à humanização. Humanizar deveria estar na essência das práticas cotidianas dos
sujeitos, e apesar de sofrer influências da socialização e da educação formal, não se
reduz à essas, não são as suas únicas determinantes. Embora, claramente, sejam
importantes.
É perceptível o agir usurpador do corpo doente por parte do fisioterapeuta, ao
fazer prevalecer seu conhecimento científico sobre aquele do sujeito, na execução
das suas práticas diante do paciente. O profissional age promovendo o afastamento
do sujeito quando se detém apenas nos conhecimentos técnicos e científicos,
negligenciando os aspectos comunicacionais da relação com aqueles sob seus
cuidados. Estabelece-se nessa conjunção uma regulação unilateral de poder e as
condutas se tornam ditatoriais e expressamente obrigatórias para serem cumpridas
pelo paciente. Reconhecer quais implicações estão estabelecidas nessa relação, para
além das condutas técnicas, constitui o marco dessa investigação, buscando
conhecer como se delineiam as relações de poder na prática profissional, e o papel
que a comunicação tem nesse processo.
É importante salientar que a formação do aluno que está cursando a fisioterapia
está ancorada na manipulação de estruturas cadavéricas ou modelos anatômicos
para identificação dos sistemas muscular, esquelético e todos os outros pertinentes à
composição e entendimento do corpo humano, bem como simuladores realísticos que
provocam situações próximas aos quadros patológicos reais. Entretanto, embora não
se desconsidere a relevância deste conhecimento na formação do profissional
argumenta-se, por sua vez, que somente este conhecimento não satisfaz uma prática
no campo da fisioterapia que se mostre efetiva.
Se a formação do profissional for embasada na separação das características
singulares do sujeito (razão e emoção) em relação ao corpo (material) poderá causar-
lhe danos, pois se enxergará o paciente apenas como um simples pedaço de um
quebra cabeça. Ainda:
62
[...] o futuro profissional é formado a partir de uma visão que privilegia unicamente os aspectos técnico-científicos e de uma metodologia que prioriza o controle e a manipulação do corpo e descarta a subjetividade do paciente. Aspectos humanos e sociais são desvalorizados e/ou descartados. Os futuros profissionais serão preparados para aprender a consertar ou a reparar os danos e as avarias de um determinado corpo por meio da utilização de equipamentos, tecnologias e materiais diversos. O paciente é desconsiderado em sua totalidade e singularidade (CONDRADE et al., 2010, p. 27).
Ao somar-se o modelo biomédico, de matriz relacional verticalizada, a uma
formação profissional tecnicista, pautada em recursos didático-metodológicos que
pouco contemplam a complexidade do ser vivente, propor um tratamento humanizado,
como preconizado pela PNH, pode não se sustentar. As revisões de conceitos e
paradigmas acerca da humanização precisam ser trabalhadas desde a formação
inicial dos futuros profissionais. Mas também na formação/educação das próprias
pessoas: a sociedade também deve interessar-se pela problemática da humanização,
organizando-se para favorecê-la tanto em nível de reivindicá-la como naquele de
executá-la, mesmo nos pequenos atos cotidianos. Assim como, também é preciso que
se modernizem e aprimorem a estrutura e a dinâmica dos serviços de saúde, e o
respeito aos usuários.
Pensar em uma reestruturação na base de formação do fisioterapeuta seria o
caminho para favorecer um comportamento mais humanizado, efetivado na/pela
horizontalização das relações com os sujeitos que estarão sob seus cuidados? Se nos
primeiros anos de formação houvesse maior exposição e interação do aluno com
situações clínicas reais, mesmo que observacionais, os conceitos de humanização
poderiam ser mais amplamente difundidos? Entendemos que sim, desde que o
profissional formador esteja sensível a essa necessidade formativa, de já ensinar com
o espírito da PHN em mente. Dessa forma poder-se-ia desenvolver competências
relacionais entre o fisioterapeuta e o paciente desde o princípio de formação, por meio
de uma prática didática ela mesma já pautada em uma relação docente-discente mais
horizontalizada.
Condrade et al., (2010, p. 26) assim se coloca em relação aos discursos sobre
a humanização na saúde “destacam a necessidade de os profissionais da saúde se
lembrarem de que os pacientes são pessoas e, como tais, também têm interesses e
desejos. E, portanto, a subjetividade está presente em ambos os lados”. E o mesmo
vale para a relação professor-aluno, pois é nessa relação que o aluno começará a
63
aprender a respeitar a subjetividade do outro, a ser empático, no ambiente
profissional.
Para Bazon (2004, p. 45) no vínculo entre profissional e sujeito há que se ter a
ampla compreensão daquele que está em situação vulnerável por uma doença,
favorecendo nesse vínculo a emersão da empatia, para que haja a transposição da
condição de “caso” ou “número” para o de “ser” enquanto pessoa: “isso é possível
pela disposição do profissional em relacionar-se de forma mais personalizada, menos
objetificada e mais humanizada, características do profissional aberto para a
exploração dos relacionamentos humanos (...)”.
Para Deslandes (2004, p. 8), ao analisar os documentos que tratam sobre a
humanização no campo da saúde, observam-se pontos que norteiam o entendimento
preciso dessa temática, dentre eles:
a. Democratização das relações que envolvem o atendimento – nesse sentido, as
decisões são tomadas em comum acordo, partindo do princípio que o paciente
é parte integrante das decisões clínicas e do contexto da
prevenção/reabilitação. As verticalizações dão espaço à horizontalidade no
atendimento.
b. Reconhecimento dos direitos do paciente, de sua subjetivação e referências
culturais – entender as diferenças de modos de pensar e de viver talvez seja
um dos maiores desafios do ser humano, e quando se transpõe essas
diferenças ao campo da saúde pode haver vários agravantes, em virtude das
crenças populares sobre o corpo, seu funcionamento, o adoecimento e formas
tradicionais de cura. Que influenciarão a relação entre o profissional e o sujeitos
do processo terapêutico.
c. Reconhecimento das expectativas de profissionais e pacientes como sujeitos
do processo terapêutico – o caminho até a cura envolve o comprometimento
bilateral dos envolvidos no processo. Existem vários consensos na literatura
que defendem a coparticipação do fisioterapeuta – e de outros profissionais - e
do paciente na reabilitação; os esforços são indissociáveis, ambos devem se
comprometer para que a condição ativa do paciente melhore.
d. Maior diálogo e melhoria da comunicação entre profissional e paciente – um
dos maiores desafios da humanização está impressa no fator diálogo e na
64
comunicação. Estampa-se no ser humano um rótulo de “ser de linguagem”, que
busca no diálogo e nos processos comunicacionais meios para expressar-se.
Contudo, as barreiras postas à comunicação são múltiplas, e de diferentes
naturezas, variando desde aquelas socioculturais até às decorrentes de déficits
articulatórios e cognitivos. É razoável afirmar que há dificuldades para o
fechamento de diagnósticos mais precisos devido à falha comunicacional:
ouve-se menos e fala-se demais, em especial por parte do profissional2. Outro
fator relevante nesse contexto é que as expressões e instruções complexas,
utilizadas na área de saúde, são claras apenas para os profissionais que as
detêm. E um dos problemas da comunicação em saúde é a de que estes
profissionais não se certificam da compreensão dessas expressões e
instruções pela outra parte, ou seja, os pacientes e suas famílias/cuidadores.
Diante da dificuldade de acompanhar tais preceitos, que observamos no campo
da fisioterapia, consideramos que as principais obstáculos para isso, em especial no
campo da saúde pública, estão no cruzamento dos fatores “concepção de corpo
doente X poder X demanda por atendimento X tempo X carência material”. E no não
levar em consideração os benefícios da proximidade do fisioterapeuta ao ambiente
em que o sujeito está inserido, sendo que o distanciamento dessa realidade
impossibilita a formulação de intervenções e trocas mais precisas e necessárias.
Segundo Silva (2011, p. 495) “tal proximidade do profissional com o ambiente familiar
e domiciliar proporciona, além dos cuidados diretos no tratamento da doença, uma
visão do contexto todo”.
É relevante que os profissionais da saúde aprendam a estabelecer uma
aproximação de confiança com os sujeitos, na complexidade de cada caso, e vice-
versa. Criando condições para uma abertura em que possa haver diálogo na
construção das condutas e no planejar e executar as ações terapêuticas, pois dentre
os direitos dos pacientes está aquele de compreender o que se passa com ele, e de
saber das possibilidades terapêuticas, consequências, enfim, há que se constituir a
prática da saúde com a autonomia do sujeito (SUBTIL et. al., 2011).
2 Ver Oliveira e Gomes (2016).
65
2.3. A COMUNICAÇÃO ENTRE O PROFISSIONAL E O SUJEITO DAS
PRÁTICAS COMO FACE DA HUMANIZAÇÃO EM SAÚDE
Na etimologia da palavra comunicar, expressa no latim “communicare”, significa-se
“por em comum”. Nas relações sociais, e como meio para sobrevivência, a
comunicação se torna um elemento crucial para o estabelecimento de vínculos,
relações e contatos com outras pessoas. Sendo assim, através da comunicação nos
revestimos de símbolos e significados, que serão úteis para outras trocas simbólicas
e de (re)construção de significados (SILVA, 2002).
De acordo com Gaspar (2015, p. 734) ao levar em consideração a comunicação
no campo da saúde pode-se entender que se trata do fator condicionante para que
aconteçam práticas humanizadas. O autor afirma que “é por meio da comunicação
que o paciente exterioriza seus sentimentos, suas necessidades e interage com os
profissionais de saúde facilitando a identificação de sinais e sintomas, e ainda,
possíveis problemas ou desconfortos físicos”.
Também para Guerreiro: “A comunicação é um processo mais amplo que
somente falar, envolve outros recursos como linguagem corporal, gestos e
sinalização” (GUERREIRO, 2010, p. 36). Ela pode ser utilizada na forma verbal, não
verbal, mas é sempre mediada pelas trocas simbólicas. Comunicar requer daqueles
envolvidos nesse processo a materialização dos pensamentos através dos signos,
que deve ser parte integrante do contexto dos envolvidos. Isso é muito dificultado
quando os sujeitos partem de vivências culturais díspares, como é o caso dos
profissionais da Saúde e dos sujeitos usuários do sistema público de saúde. Exigindo
um esforço comunicativo que priorize, de fato, o entendimento da posição do outro.
A comunicação se caracteriza pela expressão de um pensamento ou fato com
a finalidade de compreender as situações de vida, e é acompanhada por emoções,
expressões faciais e corporais, vocalização, gestos, os signos, etc (ARAÚJO; SILVA,
2012). Na lente sociológica, a comunicação tem um papel importante na transmissão
de significados entre os sujeitos sociais para que se tenha um alicerce organizacional
e estruturante da sociedade. Constantemente o ser humano se comunica e isso
permite a interação necessária para a sobrevivência, e ainda, quanto maior o contato
entre as pessoas, maior parece ser a necessidade de comunicação. Silva (2002, p.
75) acrescenta:
66
[...] o conteúdo da comunicação está intimamente ligado ao referencial de cultura, e o profissional de saúde tem uma cultura própria, diferente do leigo, por isso é importante saber que quanto mais informações se adquirem sobre alguém, e quanto maior a habilidade de correlacionar os saberes, melhor será o desempenho no aspecto da transmissão de informações e conteúdo.
Sobre os aspectos comunicacionais do profissional de saúde, nem sempre se
tem a percepção de que a comunicação não está atrelada apenas às palavras
expressas durante a verbalização, e sim em todos os ensejos não verbais, como
expressão corporal, incluindo de gestos a manifestações fisionômicas, questões
posturais, e a maneira como o sujeito/profissional se deslocam, se situam um em
relação ao outro. Ao observar-se, por exemplo, a forma com que o sujeito deambula
podemos perceber muito sobre a intensidade da disfunção, seu ânimo, como se
coloca na relação doente/profissional, sinais comumente desprezados no percurso da
anamnese, ou que mascaram outros, tantas vezes emitidos pelo sujeito na expectativa
de não exteriorizar suas limitações. Como afirma Silva: “A comunicação pressupõe a
informação e o domínio sobre o que queremos comunicar, a nossa intenção, emoção
e o que pretendemos quando nos aproximamos do nosso paciente” (SILVA, 2002, p.
75).
Outro ponto não menos importante são os meios dos quais o profissional se
utiliza para estabelecer uma comunicação mediada eficiente, neste caso, seria
pertinente adotar recursos para assegurar que o sujeito compreendeu as orientações
acertadas entre ambos no momento do atendimento, por meio de anotações,
lembretes, figuras ou até mesmo demonstrações práticas de uma determinada
conduta:
A comunicação no âmbito dos cuidados de saúde não é um mero “opcional”, um “extra”, mas é um componente vital, inerente e necessário, razão pela qual no currículo de formação dos profissionais de saúde deve-se aprofundar as questões relacionadas à comunicação. A comunicação não envolve somente os cuidados dos profissionais da saúde e paciente, mas também a relação entre os profissionais da saúde e família, pacientes e sua família, entre outros âmbitos (PESSINI, 2005, p. 503).
O Manual de Cuidados Paliativos (2012), desenvolvido pela Academia Nacional
de Cuidados Paliativos, estabelece que uma das habilidades chave da comunicação
entre profissionais e pacientes é a escuta. Através da escuta, o profissional consegue
67
compreender melhor as queixas do paciente e, após, permite a elaboração de um
diagnóstico mais preciso, mais participativo, e o tratamento, na sequência, torna-se
mais efetivo.
Teixeira (2012, p. 51) define assim a comunicação em saúde: “diz respeito ao
estudo e utilização de estratégias de comunicação para informar e para influenciar as
decisões dos indivíduos e das comunidades no sentido de promoverem a sua saúde”.
Tais percepções são importantes para o pensamento contemporâneo de saúde como
bem precioso, e promoção da boa qualidade de vida, e o alcance disso está vinculado
à qualidade das comunicações interpessoais:
De fato, comunicação em saúde inclui mensagens que podem ter finalidades muito diferentes, tais como: Promover a saúde e educar para a saúde - evitar riscos e ajudar a lidar com ameaças para a saúde - prevenir doenças, sugerir e recomendar mudanças de comportamento (TEIXEIRA, 2012, p. 53).
Segundo Souza (2012, p. 11) “Todos os profissionais de saúde,
independentemente de sua formação básica, têm como a base de seu trabalho as
relações humanas, e por isso, necessitam aprimorar as habilidades de comunicação”.
Com base na concepção do autor, a comunicação estreitada entre os profissionais de
saúde e os sujeitos de suas práticas deve ser perene para que se tenha profundidade,
confiança e ajuda mútua. Além disso, deve ser transparente e perspicaz, saber
quando expor ou omitir a fala, e no momento pertinente oferecer mais do que palavras,
gestos de segurança e apoio emocional:
Profissionais da saúde que tratam de pacientes que perderam o recurso da fala, por qualquer que seja o motivo, têm como técnica de comunicação disponível a linguagem não verbal que permite se expressar por meio do gesto, do toque, da linguagem corporal; permitindo ao paciente manifestar e compartilhar suas dúvidas, sentimentos e sofrimento, contribuindo com seu bem estar. A habilidade de comunicação é uma ferramenta fundamental na relação humana e um essencial componente no cuidado ao paciente (SOUZA, 2012, p. 11).
Para materializar os aspectos comunicacionais na relação com o paciente,
Spagnuolo (2007, p. 1605) classifica quatro diferentes modelos do processo de
comunicação, são eles:
68
1. Modelo Unilinear – a comunicação acontece em sentido unidirecional,
após a emissão da informação ocorre apenas a recepção desta pelo
sujeito receptor.
2. Modelo Dialógico – permite o diálogo entre o emissor e receptor, nessa
condição, ambos modelam e expressam seus pensamentos.
3. Modelo Estrutural – faz dos emissores e receptores objetos da
comunicação, ambos estão ideologicamente envolvidos no meio da
ação.
4. Modelo Diagramático – transmissor e receptor são os sujeitos envolvidos
na comunicação como uma “grande rede”.
O modelo diagramático é predominantemente defendido no campo da saúde
coletiva, pois esse modelo valoriza as práticas em “rede”, na qual todos são
socialmente corresponsáveis pela saúde. Desta forma, deve-se valorizar a relação
com o outro, pois o outro faz parte efetiva do processo comunicativo, sem o qual não
se pode ascender à humanização. Ceccim (2009, p. 534) faz uma ressalva acerca das
ações de governos quando se referem a programas de humanização: “o equívoco dos
programas de humanização como lugares a humanizar, era pela ausência desse tipo
de rede, a ausência da noção de sistema de saúde, a opção por uma dimensão
local/individualizante”. Contudo, a observação da prática profissional cotidiana nos
revela a predominância do modelo unilinear.
Várias explicações são possíveis para a compreensão da prevalência do
modelo unilinear na comunicação em saúde. Uma delas pode ser encontrada no
avanço do cientificismo das práticas e das relações sociais, a partir do século XIX, e
com as descobertas das formas de contágio das doenças. O que fez com que os
profissionais da saúde, ao longo do tempo, fossem construindo suas práticas
baseadas nas regulamentações de biossegurança. Com isso, o contato físico com os
pacientes foi aos poucos sendo abolido nos protocolos de tratamentos, com a
finalidade de preservar a integridade física do profissional de saúde, e dos pacientes.
Diante dos riscos potencialmente contaminantes e danosos à condição de saúde, o
contato com o outro passa a ser o mínimo necessário, provocando situações de
distanciamentos e influenciando na comunicação, bilateralmente. O que pode ser
entendido como um desajuste necessário, que por um lado amplia as questões de
69
segurança e por outro produz um efeito distanciador da afetividade entre os
envolvidos. Outra, está no “jogo” de poder que existe nas sociedades urbanas
modernas, na qual os saberes e as profissões vinculados ao cientificismo são
valorizados, colocando outras formas de saber, e os sujeitos que não se apropriam do
cientificismo, sob a “autoridade” dos primeiros.
Subtil et al. (2011, p. 746) ponderam que no campo da fisioterapia, mesmo com
a escassa produção científica acerca da temática “relacionamento interpessoal entre
fisioterapeutas e pacientes”, há que se evidenciar nos achados a concordância da
necessidade de se ter boa relação com o paciente para a efetividade das condutas e
adesão ao tratamento. Mas não somente com o objetivo de aumentar a efetividade,
e, sim, pelo respeito mútuo que deve existir entre os sujeitos que compartilham uma
relação de atenção à saúde. Os mesmos autores (2011, p. 746) acrescentam: “o
tratamento em questão apresenta fatores favoráveis ao surgimento de um
relacionamento interpessoal, por haver: longo período de convivência, estímulos táteis
prolongados e comunicação verbal em boa parte do atendimento fisioterapêutico”.
O fisioterapeuta é um profissional que deveria ter competências técnicas e
comunicativas para assegurar uma relação de prevenção e de reabilitação física dos
sujeitos sob seus cuidados, pois estabelece e trabalha com relações afetivas e
empaticamente, que precisariam ser motivadoras. E, acrescentamos, que a motivação
é tanto maior quanto mais o sujeito se sente empoderado em relação ao seu próprio
corpo.
A adesão ao tratamento/a prevenção na fisioterapia constitui uma rede
complexa de fatores, que em diferentes lentes promovem uma ampla discussão. Ao
serem analisados tais fatores, percebe-se que aderir ou não ao tratamento não se
trata apenas de uma questão de vontade do paciente, das suas limitações
musculoesqueléticas ou tampouco à proposta de recuperação funcional: se trata do
todo, corpo, mente e espírito.
O ser humano é integrado pelo corpo, mente e espírito (Figura 07), da interação
dentre essas esferas resultando a saúde/doença. Porém, é importante que se pense
nesse tripé de forma estendida, considerando que a cultura, as relações sociais, a
economia, são fatores que o integram (mente/espírito). Portanto, não se deveria
dissociar o corpo da mente e do espírito no processo de atenção à saúde. O
comportamento psicossomático das doenças caracteriza o indivíduo como “SER
70
acometido”, não se atribui ao conjunto apenas partes doentes, é o “todo” que está
doente. E, quando se trata da comunicação, é importante que o profissional de saúde
compreenda o “todo” do sujeito, não somente a “parte” que deverá ser restituída de
funcionalidades. Entendendo que o próprio profissional passa compor este todo.
Figura 07. Representação esquemática do equilíbrio entre corpo, mente e espírito na promoção da
saúde.
Fonte: O próprio autor (2017).
A comunicação entre o fisioterapeuta e o sujeito deve ser parte ativa da relação
interpessoal, considerando as particularidades de cada caso, como cultura, fatores
socioeconômicos e outros, que influenciarão no acesso ao serviço, motivação para o
tratamento e desejo de recuperação, de forma global. Para Subtil e colaboradores:
“Cuidar integralmente de um indivíduo significa percebê-lo como um ser social, físico
e emocional, que carrega consigo todos os medos, angústias e frustrações por estar
doente naquele momento” (SUBTIL et al., 2011, p. 750).
Neste contexto, de acordo com Oliveira (2004, p. 460): “A comunicação tem
como funções: transmitir mensagens, obter informações, deduzir novas conclusões,
reconstruir o passado, antecipar fatos futuros, iniciar e modificar processos fisiológicos
corporais, e influenciar outras pessoas e acontecimentos externos”.
Utilizar-se da comunicação para expressar os sentimentos, receios e medos é
essencial para aqueles que são acometidos por uma limitação funcional, entender
como os processos de limitação acontecem e buscar compreender os motivos pelos
quais ocorrem, contribui para a aceitação e adesão ao tratamento. Também para
negociá-lo com o profissional. O fisioterapeuta é a peça chave para lidar com essas
AUTONOMIA
DO SUJEITO
71
questões, ao promover e integralizar as técnicas fisioterapêuticas à comunicação,
numa perspectiva humanizada de atenção à saúde, contribui para que se obtenham
resultados positivos no tratamento. Que incluirão o empoderamento dos sujeitos, pois
a autonomia e as trocas de saberes ocorridas ao longo do processo de reabilitação,
ou das práticas de prevenção, não se encerrarão com o fim destes.
Nogueira (2015) recomenda, através de reflexões sobre a comunicação, que
os profissionais da saúde, incluindo médicos, enfermeiros, fisioterapeutas, técnicos
de enfermagem e todos os outros que atuam direta ou indiretamente na abordagem
em serviços de saúde, que fortaleçam suas habilidades de comunicação através de
treinamentos e capacitações. Mas, principalmente, se sensibilizando e
conscientizando da relevância da comunicação para processo de humanização da
saúde, e do pensamento humanizado, em saúde.
A finalidade de se aprimorar a comunicação está ancorada nas boas práticas
de atendimento, nivelando os diversos nichos de atuação para a promoção de uma
saúde mais humanizada e resolutiva. Contudo, olhar sistematicamente o outro como
um “Ser” que tem direito ao respeito, ao empenho profissional, à dedicação, à empatia,
à solidariedade e à competência técnica, fará do fisioterapeuta e dos demais
profissionais de saúde, por sua vez, também pessoas mais humanizadas.
2.4. A CONCEPÇÃO DE CORPO DOENTE COMO BALIZADORA DA
COMUNICAÇÃO EM SAÚDE
Na escrita que segue serão tratadas as concepções de corpo e a importância
destas para a distinção do normal e do patológico. Não se pode conceber o anormal
se o normal não tiver sido anteriormente concebido. A discussão, então, está nos
parâmetros que levam à concepção de normalidade. Como ponto central da
argumentação serão observados os elementos relevantes da ideia de corpo doente
como mecanismo articulador na comunicação entre paciente e profissional de saúde.
Em suma, qual a imagem de corpo e de doente que se constrói na fisioterapia?
Segundo Spagnuolo (2007, p. 1604), a comunicação utilizada nas práticas de
saúde pode ser definida como “função vital”, e, esta, pode ser entendida como o meio
pelos quais as pessoas se relacionam e permitem a interpretação de informações, que
serão transformadas em diagnósticos e tratamentos. Pode-se, então, observar no
72
fazer saúde que as habilidades comunicacionais são determinantes para o
entendimento do outro em sua concepção de corpo. E, assim, de corpo doente.
É comum na rotina dos profissionais de saúde entender que suas práticas estão
pautadas na abordagem específica para a recuperação de um corpo doente, todas as
ações e atendimentos clínicos estão tomados pela ideia de um “corpo sede de
órgãos”, que não estão “funcionando dentro da normalidade”. E, para corrigir a
disfunção, o profissional tem o “direito” de governar o paciente (CECCIM, 2009).
No corpo encontram-se as referências necessárias para aproximação ou
distanciamento na relação interpessoal, com base nas imagens e molduras
representativas entre sujeitos, construídas por estes ao longo de suas vidas. Dessa
forma, a ideia de corpo doente também é construída e, via de regra, o é pela negação.
Ou seja, do ser/estar doente não advém nada de positivo. O que torna a correção, via
tratamento, ainda mais urgente e necessária. Nessa perspectiva, não é imprescindível
haver compatibilidade e empatia com o outro: basta que o profissional seja o mais
competente possível na seleção e aplicação dos métodos diagnósticos e das técnicas
adequadas.
O corpo humano representa a identidade das pessoas, simbolicamente, nele,
estão determinadas as diferentes constituições identitárias e, acompanhado delas,
suas concepções de mundo, suas crenças e culturas. De acordo com Alves (1994, p.
103),
[...] o corpo é pensado, representado e passível de leituras diferenciadas de acordo com o contexto social, tornando-se assim um importante objeto de estudo dentro das ciências sociais. O corpo é um reflexo da sociedade, não sendo possível conceber processos exclusivamente biológicos, instrumentais ou estéticos no comportamento humano. Ao corpo se aplicam sentimentos, discursos e práticas que estão na base de nossa vida social. Por sua vez, o corpo é emblemático de processos sociais.
A autoimagem desenhada no contexto patológico se diferencia à medida que
as incapacidades aumentam, e nesse ritmo do acometimento a tendência a não
aceitação da própria imagem torna-se constante. Quando o paciente encontra-se em
estágios avançados da doença, pode-se perceber sua recusa na exposição de sua
imagem, seja no espelho, registros de vídeos ou fotografias, e em situações extremas,
tal dificuldade se transfere para a interação social, e pode evoluir para o
enclausuramento.
73
Entender as questões estéticas ou mesmo as de ordem egocêntricas passa a
ser um desafio a ser vencido pelo profissional da saúde, visto que esse profissional
se relaciona diariamente com as recusas dos sujeitos de aceitar seu próprio corpo e
mesmo na tentativa de ser o elemento motivador de uma mudança de atitude, acaba
por extrapolar a linha demarcatória do bom senso e pode acabar agindo
impositivamente. Negando a dor do sujeito.
Segundo Campos (2007, p.8) o corpo liga o ser humano à história, e
acrescenta:
[...] a condição humana é fundamentalmente corporal, o que significa que falar de homem e mundo seria quase impossível sem que se tratasse do corpo enquanto carne e osso, corpo cognitivo, corpo espírito, corpo afeto etc. É com o corpo que lemos e produzimos imagens de nós mesmos e do outro. É ele quem dita exatamente o que fomos, somos e seremos, ou seja, a nossa história é resultado de um constante diálogo com nossa experiência corporal.
Todo corpo é suscetível de experimentar boas ou más sensações ou de ser
objeto de certas ações, suas necessidades podem ser moduladas de várias formas,
dependendo da condição em que se encontra. Ainda para Campos: “O corpo é flexível,
construído por hábitos, práticas e valores variados, inscrevendo-se, portanto, na
história ao longo de séculos e de sociedades distintas” (CAMPOS, 2007, p. 9).
O corpo humano ao longo dos tempos foi sendo descoberto e discutido por
diversas lentes, os modelos corporais foram ditados em cada geração por um requisito
específico, conforme as exigências da época, em relação a que se considerava fosse
o essencialmente humano. As influências religiosas, de diversas gêneses,
consagravam o corpo como morada do espírito e atribuíam a ele um conceito sagrado
de intocabilidade, sendo que aquele que o violasse, se não por meio do cumprimento
das regras sacramentadas, cometia graves pecados. Mais moderna e
mercadologicamente, o corpo é destituído de suas formas sagradas e incorporado na
sociedade como objeto de desejo, suas formas e contornos servem ao comércio da
beleza e da sensualidade (CAMPOS, 2007).
O corpo só passa a ter sentido quando lhe são atribuído significados, estes por
sua vez, devem emergir das regras que socialmente foram estabelecidas. No campo
da saúde, coexistem perspectivas sobre a valoração atribuída ao corpo e o como isso
impacta nas representações sociais da doença/saúde.
74
Nas ciências da saúde, o corpo é geralmente concebido como constituído por
estruturas anatômicas e fisiológicas, quando em homeostase mantém-se em estado
funcionalmente capaz de suprir as necessidades vitais. Nesse discurso, o corpo se
torna alvo do mercado da saúde, quando entram em cena os produtos fitness, desde
roupas, calçados, alimentos, suplementos alimentares, equipamentos e ferramentas,
e atividades físicas com promessas milagrosas de alto desempenho e perfeito
equilíbrio entre corpo, saúde e bem estar. E, também, padronizando a concepção de
doença como a falha da homeostase. Pois, quando o corpo encontra-se em
desequilíbrio, abrem-se as portas para o processo patológico. Nessa lente, justifica-
se a ideia de que saúde é a ausência de doença, conceito que fora desconstruído pela
Lei Orgânica da Saúde n. 8.080/90 e que amplia o conceito de saúde a partir do
momento em que as necessidades básicas do indivíduo, em não sendo supridas,
impactam negativamente a sua qualidade de vida.
De acordo com Polak (1996, p. 5) existem três fatores que interligam as
condicionantes da doença: o corpo, o conhecimento da doença e, por fim, as
repercussões que o estar doente causa na vida. Nesse sentido, o autor salienta a
dificuldade de se compreender o corpo quando está saudável/doente, pelo fato de ser
profundamente complexa a forma com que se encara a doença/saúde. Neste caso,
asseguram-se na relação corpo e doença quatro fases distintas:
1. A divinização da doença – ao deparar-se com o desequilíbrio
homeostático o paciente passa a encarar a doença como fator reinante
em sua vida.
2. A relação entre doença e natureza – fatores desencadeantes, a cura
desenvolvida a partir dos achados naturais e o corpo como parte
constituinte da natureza.
3. A realização e exames clínicos e laboratoriais.
4. Atos de prevenção e diagnósticos através da alta tecnologia.
As experiências corporais experimentadas pelos sujeitos e interpretadas pela
semiologia dos profissionais de saúde emergem de um conjunto de significados
bastante restrito, construído no campo médico e no qual se encaixam, dentre outros,
75
as concepções atribuídas culturalmente pelo sujeito àquilo que percebe que não vai
bem no seu corpo. E no momento em que este necessita expressar aquilo que sente.
Ao ser abordado pelo fisioterapeuta, no momento da investigação clínica, o
paciente se depara com a necessidade de revelar o que está lhe causando
desconforto. A interpretação dos signos atribuídos ao que se sente e à parte do corpo
que está acometida, torna-se um desafio. Utilizar-se de uma linguagem técnica
específica para traduzir o que se sente não se trata de uma tarefa fácil, ainda mais
quando o paciente não detém o repertório próprio para esse tipo de comunicação, o
que acaba dificultando a coleta de informações pelo profissional de saúde. Situação
ainda mais complexa no caso de sujeitos desprovidos de recursos de linguagem
verbal, pois, nestes casos, interpretar o corpo passa a ser seu maior desafio. Torna-
se dificultoso expressar algo, e se a concepção do profissional for restrita na forma de
compreender esse corpo, os resultados não serão favoráveis.
Segundo Pereira et al., (2004, p. 1014) “a transformação do indivíduo em
paciente inclui a vivência de uma série de separações marcadas, frequentemente, por
experiências de fragmentação e perda de autonomia sobre o próprio corpo”.
É comum notar-se, particularmente nos sujeitos que se utilizam do sistema
público de saúde, em especial aqueles de contextos de maior vulnerabilidade
socioeconômica, que a forma pela qual os sujeitos relatam o que estão sentindo
baseiam-se no conhecimento popular e na cultura local do grupo em que estão
inseridos. Longe das terminologias técnicas e muito próximo, empiricamente, dos
conhecimentos de matriz popular. A concepção de horizontalidade na comunicação
implica reconhecer e validar esta linguagem, que expressa os saberes por ele, sujeito,
constituídos. É, assim, no diálogo entre saberes do profissional e dos sujeitos que os
processos de prevenção/de intervenção na saúde vão acontecendo.
Na relação entre linguagem e significados, o fisioterapeuta se depara com a
necessidade de interpretar fatos através das conceituações feitas pelo paciente e para
isso deve contar com a experiência previamente adquirida sobre a sintomatologia,
características visíveis à inspeção como alterações cutâneas, diferenças volumosas
de órgãos e tecidos, sinais flogísticos como dor, calor, rubor, dentre outras formas de
comunicação, como a expressão facial e as compensações corporais. A experiência
do profissional, neste caso, é determinante para a completa e eficaz avaliação clínica,
entretanto, não se pode desprezar a necessidade de aprimorar as habilidades
76
comunicacionais e relacionais do profissional, visto que, parte desse diagnóstico se
deve a essas habilidades. Por outro lado, o profissional precisa estar consciente de
que também ele comunica-se com ou sujeitos de suas práticas o tempo todo, quer
pelas suas posturas corporais, pelas suas expressões fisionômicas, o tipo de toque,
dentre outros.
Nesta vertente, pode-se destacar a comunicação e atribuição de signos para
queixas como fator fundamentalmente importante para a conclusão diagnóstica e
conduta de tratamento. Alves (1994, p. 102) esclarece que “a função do signo é
comunicar ideias, por intermédio de mensagens, ou seja, o signo tem o objetivo de
transmitir uma informação, fazendo parte assim de um processo de comunicação”. E
completa
Aproprio-me desta noção ao referir-me ao corpo como signo, à medida que, através de determinadas mensagens emitidas pelo corpo, os sintomas experienciados pelo indivíduo e os sinais observados no exame clínico levam a um significado, a doença. O signo só tem valor enquanto tal se compartilhado pelo grupo social. Este caráter eminentemente social do signo é percebido pelo fato da necessidade de que a cultura tenha definido elementos reconhecíveis com base em algumas características emergentes, de forma que possam ser compartilhados por todos os seus componentes (ALVES, 1994, p. 103).
O corpo doente está carregado de códigos e incorpora nessa direção várias
designações preponderantes ao grupo em que se insere. Segundo Ferreira (2001), o
corpo humano está marcado por significados e expressões sociais que não
essencialmente estão ligados à biologia, mas a conceitos estruturados em culturas,
representações sociais diversas. Dentre estas, as concepções de incapacidade,
invalidez e morte, essenciais para a forma como sujeitos e profissionais encararão as
práticas de prevenção/ intervenção.
A saúde remete ao pensamento preventivo, à prática de atividades físicas, boa
qualidade de vida, hábitos saudáveis e boa relação com o corpo, enquanto a doença
segue o sentido oposto. Para Vieira (2004, p. 270) a qualidade de vida é definida como
“o estado ou condição benéfica de vida em que os componentes que interferem no
bem estar físico, mental, emocional e social estão devidamente controlados”. O estado
de saúde qualifica o sujeito e o enquadra na condição normal ou anormal de vida, por
outro lado, o comportamento em estado “saudável” difere do “patológico”, logo, a
doença está no sujeito, em seu comportamento e na qualidade com que se vive.
Dessa perspectiva, a saúde é tanto um conceito biológico como um conceito social e
77
político-econômico. Essa perspectiva multidimensional da saúde é aquela que deve
prevalecer.
Spirduoso (2005), em seu livro Dimensões Físicas do Envelhecimento,
caracteriza os fatores condicionantes para que o sujeito possa ter qualidade de vida
(Figura 08), dentre as citações encontram-se os fatores cognitivos e emocionais, a
condição financeira estrategicamente organizada e efetivamente definida, os aspectos
sociais recreativos e de lazer, alimentação saudável, acesso aos serviços de saúde,
atividade física, moradia e trabalho. O corpo é o meio de comunicação entre o Eu
interno e o mundo, através dele as manifestações mais íntimas acontecem e permitem
expressar as particularidades do sujeito.
Figura 08. Representação esquemática dos fatores que afetam a qualidade de vida.
Fonte: (SPIRDUSO, 2005, p.52)
E, se por um lado a concepção de corpo influência nos conceitos do que é
normal e anormal, por outro lado tal concepção também recebe influência das
transformações sociais. É com base nas concepções de corpo, e de suas
transformações sociohistóricas, que discutem-se os nossos comportamentos quando
na presença de uma pessoa com deficiências, ou que se definem quais seriam as
suas “necessidades especiais”, o mesmo valendo para nossas condutas diante de
alguém doente. Pode-se observar, por exemplo, o pré-conceito do observador ao
deparar-se com um sujeito doente, pois, dependendo do contexto sociocultural,
podem haver manifestações de negação, medo, repulsa, curiosidade ou até mesmo
sentimento de empatia, dó, consternação ou benevolência para com o outro.
78
Assim, debater as concepções de corpo como balizadoras das práticas de
saúde é deparar-se com arquétipos impregnados nas diferentes roupagens sociais,
presentes num grupo social. Toda relação saúde-doença é, dessa forma,
eminentemente simbólica, mediada pela comunicação dos envolvidos nessa relação,
que acontece através das mais variadas expressões, sejam elas de expressão
corporal, cultural, revestidas por conceitos pré-estabelecidos. Estes pontos,
infelizmente, têm sido pouco abordados na formação inicial do profissional da saúde,
que têm priorizado concepções mecanicistas e patologizantes do corpo.
79
PARTE 3. DESENVOLVIMENTO DA PESQUISA
Nessa parte são tratados os componentes metodológicos, procedimentos e
instrumentos utilizados para a coleta de dados, o resultados são apresentados,
analisados e discutidos por meio da triangulação dos dados e à luz do referencial
teórico na perspectiva da educação sociocomunitária.
3.1. DA METODOLOGIA, PROCEDIMENTOS E INSTRUMENTOS UTILIZADOS
PARA A COLETA DE DADOS
A investigação pautou-se numa abordagem qualitativa, e buscou compreender
como se constrói a relação entre o profissional fisioterapeuta e os sujeitos das
práticas, ao longo do processo de formação inicial desse profissional, pela perspectiva
da comunicação, e discutir a relevância que uma comunicação de boa qualidade nas
práticas de saúde assume para favorecer a humanização. Consideramos que a
importância da pesquisa está em analisar e promover a reflexão sobre o processo de
formação do fisioterapeuta, marcado historicamente pelo modelo biomédico, que se
mostra presente ainda hoje nos moldes de formação do campo da saúde.
Adotou-se como pressuposto epistemológico para o design metodológico o
interacionismo simbólico, tendo como instrumentos de coleta de dados a análise
documental, a observação participante e o grupo focal. Para análise dos dados
utilizou-se a triangulação entre as seguintes categorias: a. a relação profissional e
sujeito das práticas, b. a comunicação e c. a humanização (Figura 09). Como pano de
fundo teórico empregamos a perspectiva da Educação Sociocomunitária.
Figura 09: Organização da triangulação dos dados
Fonte: O próprio autor (2017).
80
De acordo Isaú (2007), ao se referir à educação sociocomunitária, “é muito
difícil conceber a educação sem que ela seja por si mesmo também comunitária e
social, se definimos o homem como um ser social. A educação precisa se adequar à
própria natureza do homem”. A educação sociocomunitária, ao tratar da questão da
qualificação da saúde, propõe a participação ativa da sociedade civil, de forma
autônoma e emancipada, na organização da atenção à saúde, entendendo como
fundamental o papel que a comunidade assume para a regulação do Estado em
relação à gestão dos serviços essenciais à vida e à garantia da qualidade de vida.
Portanto, acompanhando Azevedo (2007, p.75), a educação sociocomunitária é
aquela que se preocupa com a construção e a manutenção do
processo de coordenação da acção dos diferentes actores sociais em cada comunidade local, resultante da interacção, conflito e compromisso dos diferentes interesses, racionalidades e estratégias em presença, pode também ser descrita como regulação sócio-comunitária. Esta regulação, em complemento da acção reguladora do Estado central, torna-se nevrálgica nos processos de mudança social, na medida em que só ela dá conta dos actores, das situações sociais concretas, das dinâmicas de articulação territoriais (perspectiva horizontal), e das medidas e políticas geradas e desencadeadas pela administração (perspectiva vertical).
Acreditamos que essa concepção de Educação Sociocomunitária, por alinhar
a mobilização social com a regulação do Estado, é adequada para tratar da questão
da saúde, que, constitucionalmente, se estabelece como prerrogativa do Estado. Mas
que requer a participação ativa da sociedade civil para sua regulação:
A regulação sócio-comunitária da educação implica esta perspectiva de responsabilidade social, compromisso e solidariedade e este protagonismo sustentado no saber-se e reconhecer-se como protagonista da, porque a educação é sempre um compromisso com o desenvolvimento humano e com a cidadania cooperante e solidária (AZEVEDO, 2008, p. 128).
Segundo Gomes (2008), a educação sociocomunitária se caracteriza por
constituir-se numa estratégia voltada para a intenção de organizar a comunidade em
grupos, que teriam em comum desarranjos que danificam a organização social,
predominantemente, ainda, regulada pelo Estado. Para isso, adota-se como recursos
transformadores estratégias com caráter emancipatório e que fortalecem a autonomia
dos sujeitos para uma ampla atuação conjunta e favoravelmente ajustada por aqueles
que se organizam.
81
No bojo dessas concepções consideramos que a pesquisa qualitativa, num viés
interacionista simbólico, era a abordagem mais adequada para a realização dessa
investigação. Uma pesquisa é classificada como qualitativa, de acordo com Flick
(2009), quando se dirige à interpretação dos significados daquilo que está sendo
estudado e que estão presentes nos processos que caracterizam as relações entre
sujeitos envolvidos em determinado fenômeno, através da fundamentação teórica,
das formas de construir e de organizar os dados. Nessa perspectiva, o propósito não
é aquele de contabilizar quantitativamente os resultados, ou de analisar os produtos
resultantes de determinado evento, mas, sim, de buscar a compreensão do processo
pelo qual determinado grupo passou, tendo em vista certo fenômeno, como
“recortado” pelo pesquisador e pelo próprio grupo.
Os métodos qualitativos não devem ser separados do processo de pesquisa e
do assunto estudado, e ainda, segundo Flick (2009, p. 203),
[...] as ideias centrais que conduzem à pesquisa qualitativa diferem daquelas empregadas na pesquisa quantitativa. Os aspectos essenciais da pesquisa qualitativa consistem na escolha correta de métodos e teorias oportunos, no reconhecimento e na análise de diferentes perspectivas, nas reflexões dos pesquisadores a respeito de sua pesquisa como parte do processo de produção de conhecimento, e na variedade de abordagens e métodos.
Em relação ao interacionismo simbólico, para Carvalho (2010, p. 148) esse viés
epistemológico se apoia numa perspectiva de que as pessoas constroem suas ideias
de mundo com base em suas próprias percepções, experiências, relações sociais e
pela sua ação sobre esse:
De um modo geral, pode-se dizer que o interacionismo simbólico constitui uma perspectiva teórica que possibilita a compreensão do modo como os indivíduos interpretam os objetos e as outras pessoas com as quais interagem e como tal processo de interpretação conduz o comportamento individual em situações específicas.
O autor (2010, p. 149) ainda salienta que “o interacionismo simbólico é,
potencialmente, uma das abordagens mais adequadas para analisar processos de
socialização e também para o estudo de mobilização de mudanças de opiniões,
comportamentos, expectativas e exigências sociais”. Na perspectiva da investigação
aqui realizada, levando em conta que se trata de um estudo sobre a formação do
profissional fisioterapeuta, especialmente quanto ao modo como se constrói a relação
82
comunicativa profissional-paciente, compreender a (con)formação das concepções e
entendimentos que os alunos têm dessa relação nos pareceu primordial.
Quanto aos instrumentos de coleta de dados. A análise documental é uma
técnica consistente para o desenvolvimento de pesquisas, e necessariamente deve
ser composta por documentos historicamente relevantes, ou tornados relevantes pelo
próprio processo de pesquisa, como aqueles de caráter oficial, empregados nessa
dissertação, a saber, legislações e normatizações, dentre outros. Trata-se do
processo de transformar documentos em dados, a partir de sua interpretação,
sistematizando seu estudo e conferindo-lhes cientificidade. Torna-se parte importante
do processo de investigação, pois, quase sempre, formam a base da pesquisa,
conferindo autenticidade à investigação. Para Chartier (2002) a análise documental
constitui-se uma técnica significativa quando se trata de pesquisa qualitativa, tanto
para a complementação de outras técnicas como para desenvolver novos temas.
A observação participante, outro instrumento aqui empregado, é descrita na
literatura como “a descrição sistemática de eventos, comportamentos e artefatos, no
contexto social escolhido para o estudo” (MARSHAL, 1989, p. 79). Segundo Gold
(1958), o observador participante é aquele que se envolve com as atividades
desenvolvidas pelo grupo estudado, que está consciente da sua presença e identifica
no observador alguém com a função de “coletor de dados”. Ainda nesse sentido:
Na observação participante, portanto, o pesquisador obrigatoriamente encontra-se na zona intersticial entre os dois polos, mas nunca alcançando a plenitude de um deles, pois o famoso bias, ou “viés”, sempre estará presente nas investigações. Mas isso não é algo para se lamentar, pois faz parte de nossas vidas, o tempo inteiro. Cabe, sim, ao pesquisador, torná-lo seu aliado na compreensão do seu objeto por meio do rigor metodológico, e não tratá-lo como inimigo ou elemento indesejável que “contamina” a investigação (FERNANDES; MOREIRA, 2013, p. 521).
Já os grupos focais, também por nós empregados, são descritos por Hattum-
Jassen; Caires e Sánchez-Fernández (2016, p. 187) como “uma metodologia de
recolha de informações acerca das percepções, atitudes, sentimentos e/ou opiniões e
conhecimentos em torno de um determinado tema”. De acordo com Stain-Backes
(2011, p.439) os estudos com grupos focais representam uma forma de viabilizar o
acesso à compreensão interativa e dinâmica dos integrantes de um grupo acerca de
um determinado fenômeno, ou de pessoas envolvidas com um fenômeno, pois através
83
dessa técnica possibilita-se a expressão e a (re)formulação concepções, com foco na
análise de um tema/problema, por meio da relação discursiva, verbal e não verbal,
estabelecida entre os sujeitos participantes. O autor ainda acrescenta
[...] desenvolve-se a partir de uma perspectiva dialética, na qual o grupo possui objetivos comuns e seus participantes procuram abordá-los trabalhando como uma equipe. Nessa concepção, há uma intencionalidade de sensibilizar os participantes para operar na transformação da realidade de modo crítico e criativo.
Num grupo focal espaços de discussão podem acontecer, e, nesse sentido,
levar em consideração as experiências trazidas pelos sujeitos participantes possibilita
algumas problematizações, que na interação individual do pesquisador com um
participante da pesquisa, não ocorreria. Para Stain-Backes: “Os participantes, de
modo geral, ouvem as opiniões dos outros antes de formar as suas próprias e,
constantemente, mudam de posição, ou fundamentam melhor sua opinião inicial”
(STAIN-BACKES, 2011, p. 440).
No grupo focal existe, dessa forma, a possibilidade da abordagem de temas
pouco trabalhados, por exemplo, num processo formativo, como o aqui analisado, ou
até mesmo socialmente evitados, como o é a questão das habilidades de
comunicação em saúde. E, com isso, o debate de certo tema por um grupo se torna
mais crítico, e pode ser mais envolvente. Conforme aponta Gondim (2003, p. 152) “o
moderador de um grupo focal assume uma posição de facilitador do processo de
discussão, e sua ênfase está nos processos psicossociais que emergem”. De acordo
com Debus (1997, p. 26) “o grupo focal em seu caráter subjetivo de investigação é
utilizado como estratégia metodológica qualitativa, caracterizada pela busca de
respostas acerca do que as pessoas pensam e quais são seus sentimentos”. O
conjunto das características do grupo focal como forma de coleta de dados foi o que
nos levou a adotá-lo nessa investigação.
84
3.2. DA CARACTERIZAÇÃO DO AMBIENTE E DOS PROCEDIMENTOS DE
COLETA DOS DADOS
3.2.1 A OBSERVAÇÃO PARTICIPANTE
A observação participante foi desenvolvida em uma Unidade de Estratégia de
Saúde da Família (ESF), em um bairro situado na periferia da cidade de Bauru,
localizada à noroeste do estado de São Paulo. Distante 340 km da capital do estado,
possui uma área de 674 mil Km² e uma população de aproximadamente 367 mil
habitantes (IBGE, censo de 2017), tendo economia diversificada, mas mais
concentrada na agropecuária, comércio e polos industriais. Em 2015, o salário médio
mensal era de 2.9 salários mínimos e a proporção de pessoas ocupadas em relação
à população total era de 38.5% (IBGE, 2017). A cidade foi fundada em 1896,
impulsionado pelo progresso e ocupação da região central do Brasil, proposto pelo
governo do então Presidente Getúlio Vargas, e ganhou notoriedade no contexto
nacional com a chegada da ferrovia, expansão da indústria cafeeira e cana de açúcar.
Conhecida como a “Cidade Sem Limites”, Bauru, no campo da saúde, é reconhecida
por abrigar o Hospital Centrinho - USP, referência internacional no tratamento de
pacientes com fissuras labiopalatais.
Na unidade de Estratégia de Saúde da Família em que a observação
participante foi desenvolvida, atualmente encontram-se em atividade duas equipes
multidisciplinares, compostas por médicos, fisioterapeuta, dentistas, enfermeiros,
técnicos de enfermagem, nutricionista, assistente social e agentes comunitários de
saúde, encarregados de atender aproximadamente 10 mil usuários.
Dos serviços prestados, além das consultas de rotina, há coleta de exames
laboratoriais, realização de testes diagnósticos, de curativos, e, dentre outras práticas,
dispõe-se de atendimentos no campo da fisioterapia, em regime de convênio com uma
instituição universitária de ensino superior, desde o ano de 2014. O pesquisador
acompanha os estudantes nesse campo de estágio desde o ano de 2014, havendo
ainda outros docentes que realizam acompanhamento de estágios dos alunos nos
campos de Saúde do Trabalhador, Saúde do Idoso, Fisioterapia em Terapia Intensiva,
Fisioterapia Hospitalar e Ambulatorial, Fisioterapia em Hidrocinesioterapia,
Fisioterapia em Neurologia Adulto e Infantil e Fisioterapia em Ortopedia e
Traumatologia. Os pacientes encaminhados para esse tipo de atendimento são
85
avaliados pelo fisioterapeuta (professor da referida instituição de ensino) e pelos
alunos (estagiários) do nono semestre do curso de fisioterapia, da mesma instituição,
a fim de estabelecer um prognóstico fisioterapêutico e a partir daí traçar uma conduta
de tratamento.
A instituição universitária de ensino superior, que foi participante dessa
pesquisa, localiza-se na cidade de Bauru, iniciou suas atividades na cidade no ano de
2007, e atualmente possui 23 cursos de graduação, 08 de especialização, 4.800
alunos, 110 professores. Conforme o site institucional, sua missão é melhorar a vida
das pessoas por meio da educação responsável e de qualidade, formando cidadãos
e preparando profissionais para o mercado, contribuindo para o desenvolvimento de
seus projetos de vida. Sua visão, é ser referência em educação, atuando de forma
inovadora e sustentável, e a melhor escolha para estudar, trabalhar e investir, líder
nos mercados onde atua. Seus valores são: Paixão por Educar: somos educadores
movidos pela paixão em formar e desenvolver pessoas, Respeito às
Pessoas: Promovemos o respeito à diversidade e aos compromissos assumidos,
cultivando relacionamentos, Honestidade e Responsabilidade: Agimos com
integridade, transparência e assumimos os impactos de nossas ações, Fazer
Acontecer: Somos ágeis em transformar ideias e desafios em realizações, Foco em
Geração de Valor Sustentável: Trabalhamos para gerar impactos positivos e
sustentáveis para a sociedade, Trabalhar e Aprender Juntos: Unimos esforços para
o mesmo propósito.
Em relação ao curso de fisioterapia, há a seguinte grade curricular: Ciências
moleculares e celulares, ciências morfofuncionais do aparelho locomotor – membros
inferiores e coluna vertebral, ciências morfofuncionais do aparelho locomotor –
membros superiores, cabeça e tronco, ciências morfofuncionais dos sistemas
digestório, endócrino e renal, ciências morfofuncionais dos sistemas imune e
hematológico, ciências morfofuncionais dos sistemas nervoso e cardiorrespiratório,
ciências morfofuncionais dos sistemas tegumentar, locomotor e reprodutor,
cinesioterapia aplicada, cinesioterapia geral, diagnóstico cinético-funcional e
imaginologia - membros inferiores e coluna vertebral, diagnóstico cinético-funcional e
imaginologia – membros superiores, cabeça e tronco, estágio curricular
supervisionado ambulatorial I, estágio curricular supervisionado ambulatorial II,
estágio curricular supervisionado hospitalar, estágio curricular supervisionado na
86
atenção básica, ética e deontologia, ética, política e sociedade, fisioterapia
cardiopulmonar na saúde do adulto, fisioterapia e inovações, fisioterapia em unidade
hospitalar, fisioterapia musculoesquelética na saúde do adulto, fisioterapia na saúde
da criança e do adolescente, fisioterapia na saúde da mulher, fisioterapia na saúde do
adulto na atenção primária, fisioterapia na saúde do adulto na atenção secundária,
fisioterapia na saúde do adulto na atenção terciária, fisioterapia na saúde do atleta,
fisioterapia na saúde do idoso, fisioterapia na saúde do neonato, fisioterapia na saúde
do trabalhador, formação integral em saúde, homem, cultura e sociedade,
metodologia científica, práticas fisioterapêuticas atenção secundária e terciária,
primeiros socorros e prótese e órtese.
O curso dispõe de laboratórios de práticas fisioterapêuticas em ortopedia,
neurologia, neuropediatria, cardiorrespiratória, anatomia humana, microscopia,
microbiologia e ginásio de práticas clínicas, as turmas são formadas por 80 alunos e
a média de conclusão do curso é de 45 estudantes.
As práticas no campo da fisioterapia, inserida no contexto da saúde pública, e,
assim, também nessa ESF, incluem:
Avaliar e prescrever condutas fisioterapêuticas nos diversos quadros de
incapacidades funcionais no atendimento domiciliar.
Avaliar pacientes com mobilidade reduzida para prescrição de órteses e meios
para locomoção.
Desenvolver atividades em grupos de Idosos, Gestantes, Hipertensos e
Diabéticos com objetivos que consistem na melhora da força muscular,
mobilidade das articulações, equilíbrio, desenvolvimento da marcha e
socialização.
Realizar atividades de educação e prevenção nos diversos eixos temáticos que
contemplam a saúde pública nos moldes da Estratégia de Saúde da Família.
Atuar em equipe multiprofissional na ótica da assitência ao usuário do Sistema
Único de Saúde.
Os atendimentos acontecem semanalmente, e os alunos, juntamente com o
professor, realizam visitas domiciliares aos pacientes uma vez por semana, sendo que
87
a quantidade de sessões é determinada pelo grau de complexidade de cada caso.
Além disso, algumas atividades em grupo são desenvolvidas na própria ESF, como o
trabalho com gestantes, hipertensos, diabéticos e idosos.
3.3. DOS DADOS CONSTRUÍDOS A PARTIR DA OBSERVAÇÃO
PARTICIPANTE
Nesse item serão apresentados os resultados a partir da observação
participante, realizada no campo de estágio em Saúde Pública. A caracterização dos
procedimentos da observação participante está organizada por período, locais de
atendimentos, identificação do pesquisador, dos sujeitos participantes e dos sujeitos
das práticas (Tabela 01).
A observação participante teve por finalidade investigar o como ocorrem os
processos comunicativos na relação entre os alunos do nono semestre do curso de
fisioterapia e seus pacientes, aqueles atendidos pelo Sistema Único de Saúde, na
unidade de Estratégia de Saúde da Família. O observador, nesse caso, o próprio
pesquisador, levou em consideração alguns aspectos da comunicação
profissional/sujeito, retirados da literatura e da sua própria experiência profissional,
desde a abordagem do sujeito pelo futuro profissional, até a escuta, a proposição de
atividades e as orientações para a vida diária e para a continuidade do tratamento.
Tabela 01. Organização do ambiente de coleta da observação participante.
Período da Coleta 05 de Junho de 2017 a 18 de Agosto de 2017
Locais de
Atendimento
Unidade de Estratégia de
Saúde da Família e
Domicílios situados na região leste
da cidade de Bauru.
Pesquisador Professor do curso de
fisioterapia e
supervisor de estágio curricular no
campo da saúde pública.
Sujeitos Participantes 16 alunos (07 do sexo
masculino e 09 do sexo
feminino), com idades
variando entre 22 e 36
anos.
cursando o nono semestre do curso
de fisioterapia de uma Faculdade
situada na região administrativa da
cidade de Bauru.
88
Sujeitos das Práticas 05 pacientes, conforme
descrição abaixo.
Domiciliados e que necessitam de
cuidados especiais, dependentes
ou parcialmente dependentes.
06 gestantes Integram o grupo de
acompanhamento gestacional
estabelecido pelo Programa de
Humanização de Pré-Natal e
Nascimento.
Fonte: O próprio autor (2017).
Os alunos foram antecipadamente contatados, avisados de que o professor
estava também realizando uma investigação com os objetivos já aqui enunciados, as
fases, procedimentos e os instrumentos de coleta de dados, o que isso demandaria
deles e, por meio de um termo de consentimento livre e esclarecido3, convidados a
comporem a pesquisa, na condição de “participantes”, e orientados de que nenhum
prejuízo adviria a eles, em momento algum, caso não quisessem participar. Todos
concordaram em fazê-lo. Os procedimentos da investigação foram submetidos ao
comitê de ética do Unisal e aprovado sob o número 2.198.800 (Anexo II).
Os participantes alunos foram identificados pelo gênero, idade e números
sequenciados, aleatoriamente atribuídos pelo pesquisador. Entendemos que as
variáveis gênero e idade poderiam colaborar para a compreensão da construção da
relação profissional-paciente, pois incorporam modos de ser socialmente delineados.
Os sujeitos das práticas estão identificados por gênero, idade, acometimento
patológico e comprometimento funcional, já o local do atendimento está caracterizado
pelo ambiente e condições de higiene e saneamento (Tabela 02). Consideramos
esses dados relevantes porque, de acordo com dados do Ministério da Saúde (2010),
a desnutrição e as condições precárias de higiene e moradia, incluindo as carências
de saneamento básico, afetam principalmente a população de baixa renda, agravando
as condições de saúde, das deficiências e a qualidade de vida. No mesmo documento
acrescenta-se que as “doenças relacionadas à sistemas precários de água e esgoto
e a deficiências de higiene causaram a morte de mais de 1,6 milhão de pessoas em
3 Encontra-se nos anexos.
89
países pobres, de acordo com a Organização Mundial de Saúde (OMS)” (2010).
Requerem, dessa maneira, um olhar diferenciado por parte do profissional da saúde,
tanto do ponto de vista técnico, das práticas específicas da fisioterapia, como daquele
de colaborar para com a organização da população para que se mobilize na
participação, reivindicação e efetivação de melhorias na sua comunidade. Também
isso, consideramos, passa pelas habilidades de comunicação e de humanização da
saúde.
Tabela 02. Descrição da coleta por sujeitos participantes alunos, sujeitos das práticas, data e
horário e local do atendimento.
SUJEITOS
PARTICIPANTES/ALUNOS
SUJEITOS
DAS PRÁTICAS
DATA E
HORÁRIO
LOCAL DO
ATENDIMENTO
M.1 (24) e M.2
(28)
Homem, 69 anos, acometido por um Acidente Vascular Encefálico (AVE) há 3 anos, encontra-se acamado, totalmente dependente de cuidados de terceiros. Não deambula e apresenta dificuldade na articulação da fala.
05 de Junho de
2017 às 9h.
Domicílio. O local apresenta
condições precárias de higiene, esgoto não canalizado e acumulo de lixo no interior da
residência.
F.3 (22) e M.4(30) Homem, 36 anos, acometido por politrauma em virtude de um acidente automobilístico, ocorrido há 5 meses. Parcialmente dependente e deambula com dificuldade. Capacidade de articular a fala preservada.
14 de Junho de 2017 às 8h45.
Domicílio. O local apresenta boas condições de
higiene e saneamento. O ambiente encontra-
se organizado e o
sistema de água e
esgoto são
encanados.
F.5 (25) e F.6(29) Homem, 67 anos, acometido por um quadro de Erisipela e limitações funcionais em membros inferiores há 5 anos. Deambula com dificuldade e utiliza-se de meio auxiliar para locomoção, reside sozinho.
16 de Junho de 2017 às
10h.
Domicílio. O local apresenta
condições precárias de higiene, ambiente desorganizado e com
acúmulo de lixo.
90
F.7 (25) e F.8(24) Mulher, 78 anos, acometida por um quadro de artrose de quadril, joelho e tornozelo, perda da visão e diabetes há 10 anos. Deambula com dificuldade e apresenta déficit de equilíbrio.
21 de Junho de
2017 às 9h.
Domicílio. A residência é constituída por
madeira, e mesmo com o desgaste provocado pelo tempo, o local
apresenta boas condições de higiene,
organização e saneamento.
M.9(25), F.10(24),
M.11(27), M.12(27) e
F.13(28)
Grupo de gestantes com idades entre 15 e 22 anos, integrantes do Programa de Humanização de Pré-Natal e Nascimento.
09 de Agosto de 2017 às 9h30.
Unidade de Estratégia de Saúde da Família.
O local apresenta boas condições de
higiene e saneamento.
M.14(36), F.15(26), e
F.16(29)
Mulher, 72 anos, apresenta um quadro de artrose de joelho, déficit de equilíbrio e perda significativa de força muscular, perda de visão há 2 anos. Deambula com auxílio do familiar.
18 de Agosto de 2017 às 9h40.
Domicílio. O local apresenta
condições precárias de higiene e
saneamento. A residência apresenta
acúmulo de lixo e aparente
desorganização. Fonte. O próprio autor (2017).
No percurso da observação, levou-se em consideração o comportamento do
participante aluno em relação aos sujeitos das práticas, sua linguagem expressa
corporalmente e verbalizada, a escuta do paciente, a capacidade de expressão no
sentido de realmente querer se fazer entender, a empatia e ainda, como se
manifestavam as relações de poder. Para direcionar a observação participante, o
pesquisador utilizou-se de um “Guião” de questões, já descritas anteriormente, mas
abaixo retomadas para favorecer o acompanhamento pelo leitor.
a. O aluno oferece ao paciente explicação sobre o que será feito durante a
sessão?
Durante as abordagens realizadas pelos participantes (M.1 e M.2) e (F.3 e M.4),
o observador identificou, em suas verbalizações, um imperativo “comando de voz”
para que as atividades fossem realizadas pelos sujeitos das práticas, conforme
observado nas seguintes falas “O senhor tem que puxar o ar antes de contrair, da
91
forma que mandei”, ou ainda, “O senhor não está fazendo direito, vamos lá, sem corpo
mole”. Os sujeitos, por sua vez, cumpriram rigorosamente as proposições
estabelecidas, em alguns momentos, com manifestações fisionômicas e corporais
expressando dor, tentaram sinalizar o desconforto de várias maneiras, ao franzir a
testa e os olhos, apresentar sudorese intensa e esboçar sinais de fadiga ao falar,
contudo, foram desconsiderados pelos estagiários, fortalecendo a ideia do
comportamento tecnicista de atuação (o que importa é a “cura” e não o que o sujeito
sente, faz ou mostra pensar). Pode-se observar também que o posicionamento
adotado pelos sujeitos participantes ao estabelecerem uma comunicação com o
sujeito das práticas (Figuras 10 e 11), desfavoreceu o contato visual,
significativamente importante para o estabelecimento de uma comunicação eficiente.
Como observam Taylor e colaboradores (2014), o contato visual é um tipo de
comunicação não verbal em que há muitas variáveis culturais, que interferem na
qualidade da relação. O contato visual direto pode ser visto como invasivo ou pouco
educado pelos orientais e seus descendentes, por exemplo, havendo também
variáveis como idade e gênero. Contudo, explorar o contato visual de maneira
respeitosa, ainda mais em um caso no qual há a dificuldade da comunicação verbal,
é uma importante abertura para a horizontalidade da comunicação. Na fisioterapia o
contato entre as pessoas é muito próximo, e o fato dos alunos (não somente esses,
mas os demais também) não se aperceberem da relevância do contato visual, suas
diferenciações culturais, é preocupante, por talvez indicar que essa relevância parece
não estar sendo evidenciada ao longo do curso.
Na interface entre os protocolos de fisioterapia utilizados pelos alunos e a
compreensão das orientações e instruções, por parte dos sujeitos, pode-se observar
um carente repertório de práticas voltadas para as questões instrucionais. Isso é, a
observação dos alunos evidenciou que esses não são ensinados a como explicitar
para os sujeitos o que devem fazer, como, ou mesmo se há atividades e “exercícios”
alternativos. O que deveria ser parte integrante da relação entre profissionais e
sujeitos envolvidos em um processo de reabilitação, caso não prevalecesse o modelo
biomédico, no qual se evidencia a verticalização relacional e o empoderamento do
profissional como aquele que detém as possibilidades de “cura”. Na atenção primária,
na prevenção ou na educação para evitar agravos à saúde, o agir instrucional diretivo
também prevalece, igualmente sem uma preparação para discutir a eficácia ou
92
modelos alternativos visando ampliar a efetividade das práticas abordadas, para as
quais a adesão das pessoas é tão indispensável quanto o é ao processo terapêutico,
no caso das patologias já instaladas.
O que se parece esperar do profissional envolvido no processo de reabilitação
– e o que o próprio profissional parece esperar de si- é que se faça uso de recursos
técnicos da fisioterapia, sem adentrar em explicações que seriam mais do “domínio”
da área médica, ou consideradas “desnecessárias” à consecução das atividades, ou,
ainda, “incompreensíveis” ao “nível cultural/intelectual” dos sujeitos. Assim, o
profissional da fisioterapia restringe o acesso dos sujeitos à informação aos princípios
técnicos das condutas fisioterapêuticas, como se maiores explicações não se
fizessem necessárias, e o profissional acaba por estabelecer uma barreira na relação
com o outro, favorecendo a não cooperação e até mesmo a evasão do tratamento. O
pesquisador identificou que os sujeitos participantes não ofereceram explicações
sobre seus procedimentos e conduziram a fisioterapia de maneira estritamente
protocolar.
Figura 10. Atendimento realizado pelos participantes M.1 e M.2.
Fonte: O próprio autor (2017).
93
Figura 11. Atendimento realizado pelos participantes F.3 e M.4.
Fonte: O próprio autor (2017).
Enfatizamos também que conforme o parágrafo oitavo, do segundo capítulo
do Manual dos Direitos do Paciente estabelecido pela Portaria do Ministério da Saúde
nº1286 de 26/10/93, o paciente tem direito a informações claras, simples e
compreensivas, adaptadas à sua condição cultural, sobre as ações diagnósticas e
terapêuticas, o que pode decorrer delas, a duração do tratamento, a localização de
sua patologia, qual o instrumental a ser utilizado e quais regiões do corpo serão
afetadas pelos procedimentos. O que foi reforçado pela Recomendação do Conselho
Federal de Medicina N. 01/20164 , que afirma a essencialidade dos profissionais
médicos (mas também de forma estendida aos demais profissionais da saúde)
considerarem o consentimento livre e esclarecido dos pacientes, nas práticas de
saúde. Ênfase é colocada também no assentimento informado, no caso daquelas
pessoas que em sendo deficientes intelectuais, com perdas cognitivas, crianças e
menores de 18 anos, ou outros, também têm o direito de se manifestar em relação
aos procedimentos que serão adotados em relação à sua saúde. Ou seja, reconhece-
se o direito dos pacientes terem disponibilizados, de forma transparente, as
informações e explicações sobre seu estado de saúde, prognóstico, procedimentos
possíveis, etc., e de manifestar-se em relação a isso. Práticas que se afastem disso,
tanto na formação do profissional como na sua atuação, caminham na contramão da
humanização da saúde, dos direitos dos pacientes e dos próprios direitos humanos.
4 Disponível em https://portal.cfm.org.br/images/Recomendacoes/1_2016.pdf
94
b. O aluno realiza orientações sobre atividades que deverão ser realizadas
pelo sujeito até a próxima sessão e de que forma se propõem tais
orientações? E ainda, quais recursos ele se utiliza para deixar registradas
as informações necessárias para a compreensão do paciente?
Nesse ponto, a abordagem realizada pelos participantes F.5 e F.6 (Figura 12)
ao sujeito 3 (S3), o observador pôde identificar que ao finalizar a conduta de
tratamento os alunos elaboraram e realizaram orientações para a realização mais
correta das atividades de vida diária. As orientações foram dadas diretamente ao
sujeito. Dentre essas, orientaram também alongamentos e fortalecimentos
musculares variados, fizeram a composição da prescrição de maneira tecnicamente
correta, do ponto de vista fisioterapêutico. Entretanto, não se certificaram da
compreensão das orientações, por parte do sujeito. Não houve qualquer tentativa de
averiguar se as orientações haviam sido entendidas, nem mesmo de usar recursos
visuais ou auditivos, como desenhos, escrita, áudio, etc., para o registro das
orientações, de modo a favorecer com que o sujeito pudesse, posteriormente,
consultar anotações, registros ou lembretes acerca do “que fazer”.
Figura 12. Atendimento realizado pelos participantes F.5 e F.6.
Fonte: O próprio autor (2017).
Na abordagem realizada pelos participantes F.7 e F.8 (Figura 13) ao sujeito 4
(S4) o pesquisador observou que não foram realizadas as devidas orientações, e se
levado em consideração as características desse sujeito, que incluíam dificuldades de
locomoção e perda da acuidade visual, as orientações seriam fundamentais para a
95
manutenção da qualidade de vida. De acordo com Silva (1988) orientar, no campo da
saúde, significa mediar ensinamentos que consistem em promover mudanças
atitudinais, comportamentais, e, ainda, estimular habilidades importantes para a
promoção, manutenção e recuperação da saúde.
Figura 13. Atendimento realizado pelos participantes F.7 e F.8.
Fonte: O próprio autor (2017).
As recomendações desenvolvidas pelos participantes M.14, F.15 e F.16, no
atendimento ao sujeito 5 (S5) foram precisas e pontuais, do ponto de vista da
fisioterapia. Utilizaram-se de um material descritivo e ilustrado para prevenção de
quedas, porém, não se deram conta da perda da acuidade visual sofrida pelo sujeito
(Figura 14), em decorrência de uma infecção no globo ocular.
Figura 14. Atendimento realizado pelos participantes M.14, F.15 e F.16.
Fonte: O próprio autor (2017).
96
Ao analisar o princípio da integralidade contida na Lei Orgânica da Saúde,
pode-se destacar as características implícitas na abordagem do profissional desse
campo, que deve exercer suas competências a fim de extrapolar as práticas curativas,
dimensionando os riscos à saúde e a partir daí promover ações preventivas e
educativas (SAMPAIO ALVES, 2004). Isso requer uma compreensão holística do
sujeito em seu contexto de vida, e não é possível se as características, necessidades,
desejos, angústias e medos dos sujeitos não são explorados via o estabelecimento
de relações de comunicação profissional-sujeitos. Exige também sensibilidade ao
outro, base do agir dialógico.
Na perspectiva da linguagem utilizada pelos alunos para a comunicação, e que
deveria permitir melhor compreensão por parte dos sujeitos atendidos, o que também
se observou foi a utilização de termos técnicos e científicos, sem a necessária
“tradução” desses para o conhecimento no senso-comum. No caso do aluno F.7, por
exemplo, uma das frases empregadas no atendimento foi “vamos aferir a pressão
arterial da senhora”, e M.2 assim se expressou para o S1: “o senhor tem uma
espasticidade acentuada nesse membro”. Seguindo nessa mesma lógica, em que a
utilização das terminologias da área médica foram empregadas nos atendimentos, e
pouco contribuíram para facilitar a comunicação, nem do estabelecimento de uma
proximidade comunicacional, o pesquisador registrou a fala do aluno F.3: “mantenha
o corpo ereto”, e “quando eu disser o senhor faz uma inspiração e depois uma
expiração bem lenta”. As falas relatadas eram pouco compreendidas pelos sujeitos
atendidos, que não correspondiam, assim, às solicitações dos estudantes. Segundo
Wolf (2003) para que a comunicação seja bem empregada, os interlocutores devem
estar em sintonia e nesse caso, os alunos deveriam, constantemente, monitorar a
competência linguística e cultural própria e aquela dos sujeitos atendidos. Numa via
de mão-dupla, buscando superar a separação entre os saberes científicos e aqueles
do senso-comum. Isso empoderaria todos os participantes da relação, pois os sujeitos
atendidos incorporariam, aos poucos, o pensamento científico e sua racionalidade, o
que se mostra de valor para uma compreensão mais acurada do processo saúde-
doença. E, por outro lado, os estudantes, em apropriando-se de outras formas de
linguagem, também apreenderiam os saberes e outras lógicas, próprias ao senso-
comum, que também compõem esse processo de saúde-doença. O domínio sobre tal
97
processo não é de um ou de outro campo de saberes5: as questões envolvendo a
saúde e a doença perpassam e são perpassadas por todos os aspectos da vivência
humana como um todo. Essa compreensão deveria fundamentar a base do agir
relacional e comunicativo dos profissionais da saúde e dos sujeitos por eles atendidos.
c. O aluno considera a fala e deixa espaço para as manifestações verbais e
não verbais do sujeito? Há algum tipo de resistência em relação ao
sujeito, como condições de moradia, higiene e comportamento?
Nesse quesito, a abordagem realizada pelos participantes F.3 e M.4 a S2 foi
marcada pela anulação do sujeito atendido no que concerne à abertura para as
manifestações e expressões desse. O pesquisador observou esse comportamento de
anulação, por parte dos estudantes, quando S2 tentava se expressar, de várias
maneiras, e mesmo com insistência, mas era barrada ou impedida de fazê-lo, pelos
alunos. Tal anulação ficou também evidenciada quando na execução de outras
práticas, por parte de outros alunos, quando esses não davam atenção ou não
formulavam respostas às falas dos sujeitos. A total absorção na execução das tarefas
de reabilitação marca a atuação mecanizada do profissional, que ao não interagir com
o sujeito, acaba contribuindo para minar a subjetividade dos atendidos.
Ao realizar a abordagem a S3, os participantes F.5 e F.6 (Figura 17) iniciaram
direcionando uma grande quantidade de perguntas ao sujeito, com a intenção de
estabelecer uma causa para a disfunção apresentada por esse. O pesquisador
observou que tais questões era simultaneamente proferidas pelos participantes,
ficando pouco claras, o que causou embaraço e confusão ao sujeito, que não sabia a
quem ou o que responder. O equívoco comunicacional gerou respostas desconexas
por parte de S3, e que não contemplavam os questionamentos propostos. Dessa
forma, além da compreensão do quadro ficar prejudicada, a qualidade das respostas
pode gerar a ideia de que o sujeito atendido possui algum déficit cognitivo ou cultural,
levando o profissional a concepções errôneas, e a tomadas de decisão terapêuticas
5 Oliveira (2002, p. 64), referindo-se a estudos de Knauth (1991), afirma que entre 70-90% dos “episódios de doença são manejados fora desse sistema (aquele formal de cuidados à saúde), por autocuidado ou busca de formas alternativas de cura (...). Ou seja, o modelo biomédico é apenas um entre tantos disponíveis no “mercado” da saúde”.
98
mal formuladas. Ressalta-se, pela reflexão sobre essas observações, o imperativo de
considerar-se, efetivamente, a bagagem cultural dos sujeitos atendidos. Como afirma
Oliveira (2002, p. 65): “Portanto, quando mencionamos “comunicação”, também
queremos dizer que há produção de significados de ambos os lados e que a cultura
de cada grupo social estará igualmente presente”. Embora não igualmente
representada, como nos casos acima exemplificados.
É importante salientar, ainda, que a qualidade da prestação de serviços pelo
profissional de saúde não se define apenas por equipamentos, materiais e
conhecimento técnico. “A qualidade do serviço também está intimamente ligada às
relações estabelecidas pela equipe de saúde com o usuário, derivadas das técnicas
interativas e comunicacionais” (TORALLES-PEREIRA et al., 2004).
Na abordagem dos participantes M.9, F.10, M.11, M.12 e F.13 (Figura 15),
atuando junto ao grupo de gestantes, o pesquisador pôde observar uma postura de
certa “superioridade” dos alunos durante as interações com as jovens em estado
gestacional. Houve, no percurso das atividades desenvolvidas, algumas falas que
expressavam julgamento, comparação e pré-concepções, dos alunos em relação às
gestantes. Algumas puderam ser destacadas, como aquela de F.10: “Nossa, você tem
a minha idade e já está grávida?” e aquela de M.12: “Não penso em ter filhos agora,
acho muito cedo, prefiro estudar” e, ainda, aquela de F.13: “Como você irá sustentar
seu filho sem um bom futuro?”. Nesse sentido, a postura dos estudantes parece seguir
as concepções também mostrada por outros profissionais da saúde quando exercem
suas atividades junto a mães adolescentes. Estudo de Bocardi (2004) revela que, no
entender dos profissionais da saúde as adolescentes grávidas são vistas como: a.
desprovidas de uma parceria sexual fixa ou de um relacionamento estável,
aumentando as possibilidades de preconceito moral e, em decorrência, de uma atitude
desumanizada e de anulação de subjetividades; b. desprovidas de conhecimentos
diversos (sobre contracepção, como cuidar do filho, como se prevenir de doenças
sexualmente transmissíveis, etc), a serem “supridos” pelos conhecimentos das
equipes de saúde, numa relação de pouca escuta das jovens e um discurso excessivo,
muitas vezes de cunho moral, da parte dos profissionais; c. carecendo de apoio
familiar, ou vindas de “famílias desestruturadas”, nas quais falta o “controle” sobre as
filhas, ou havendo o controle, essas jovens são vistas como “transgressoras” e, dessa
forma, “merecedoras” dos problemas decorrentes da gestação e da maternidade e d.
99
a gravidez não foi planejada, o que revelaria certa irresponsabilidade e
“comportamentos de risco”, que, por sua vez, seriam “típicos” da adolescência.
A ênfase no desenvolvimento da comunicação e na qualidade das relações dos
profissionais da saúde com os sujeitos de suas práticas, já no processo de formação,
não colaboraria para uma visão menos preconceituosa e mais próxima da realidade
das adolescentes? Uma outra compreensão das razões e expectativas (ou falta
dessas) das adolescentes, ao engravidarem? Acreditamos que seria possível, com
uma formação mais humanizada, e menos preconceituosa, que os profissionais da
saúde colaborassem para o empoderamento dessas adolescentes.
Figura 15. Atendimento em grupo realizado pelos participantes M.9, F.10, M.11, M.12 e F.13.
Fonte: O próprio autor (2017).
d. O aluno levou em consideração os fatores econômicos do sujeito para
solicitar atividades extra atendimento (Quebra da lógica da saúde
privada)?
Levar em consideração os fatores socioeconômicos para prescrever
tratamentos e atividades extra atendimentos parece ser um desafio constante para o
profissional do campo da saúde. Não é incomum identificar disparidades entre as
solicitações dos profissionais da saúde e a realidade do sujeito das suas práticas. Para
que se tenha adesão ao tratamento e aos complementos de terapia extra ambiente
clínico, faz-se necessário, ao profissional da saúde, a compreensão das condições
socioeconômicas em que o sujeito das suas práticas está inserido. De acordo com
Fortes (2004) a adesão ao tratamento pode ser descrita como “o desempenho de
100
atividades que satisfaçam as exigências terapêuticas dos cuidados à saúde, aceitação
do decurso do tratamento prescrito pelo prestador do cuidado ou apoiante”.
Durante a execução da conduta fisioterapêutica para alongamento das
estruturas musculares dos membros inferiores, os participantes F.7 e F.8, no
atendimento a S4, identificaram a necessidade da utilização de um faixa elástica
denominada Theraband. Como se trata de um material de custo elevado, foi
apresentado a S4 a possibilidade de substituir o referido material por uma “meia calça
de nylon”. Dessa forma, os objetivos seriam alcançados e não haveria a necessidade
de desembolsar qualquer valor mais expressivo, pois poderia ser usada qualquer meia
calça, mesmo já gasta. Ao deparar-se com essa situação, o pesquisador observou
que houve a intenção dos participantes em não sugerir uma conduta que tivesse a
necessidade de materiais de alto custo, visto que o sujeito dispunha do material
sugerido. O que indicou sensibilidade ao sujeito atendido e ampliou as possibilidades
desse aderir ao tratamento.
Durante as atividades com o grupo de gestantes, por outro lado, os alunos M.11
e M.12 falaram sobre a necessidade da gestante se alimentar bem nesse período da
gravidez, com dietas equilibradas, diversificadas e rica em nutrientes. No transcorrer
de tais recomendações, percebeu-se que os participantes mostravam-se distantes da
realidade dos sujeitos. Conceber que os sujeitos pudessem não ter como se alimentar,
ou mesmo, alimentar-se com qualidade, ou, ainda, seus hábitos alimentares, pareceu
estar distante de suas experiências de vida, pautadas numa lógica de pessoas com
mais poder aquisitivo.
3.3.1. DOS DADOS CONSTRUÍDOS A PARTIR DO GRUPO FOCAL
Nessa parte serão abordados os dados obtidos através da realização dos
grupos focais, e desse relato constam o período da coleta, locais dos encontros,
quantidade e duração dos encontros e quais foram os sujeitos participantes (Tabela
04). Para Stein Backes e colaboradores: “O grupo focal representa uma técnica de
coleta de dados que, a partir da interação grupal, promove uma ampla
problematização sobre um tema ou foco específico” (STEIN BACKES et al., 2011) .
Trata-se de uma discussão, centrada em determinado tema, realizada em grupo, e
que pode estar agregada a outros instrumentos de coleta de dados ou de
101
investigação-ação. No caso da presente pesquisa utilizou-se como recurso agregado
ao grupo focal o microensino. A técnica de microensino foi descrita por Oliveira (2013)
como “uma metodologia pedagógica útil na formação e desenvolvimento de
competências docentes, pois promove o treinamento de habilidades de ensino,
discussões sobre desempenho em classe e a autocrítica”. E Hansford (1977, p. 232)
o descreve como “a filmagem e o feedback controlado de um breve episódio de ensino
em um ambiente de laboratório”. Essa opção foi feita considerando-se que uma
investigação que tem por cerne processos de ensino-aprendizagem e de formação
profissional poderia, no âmbito da pesquisa qualitativa, na qual está implícita a
transformação da realidade concomitantemente à investigação, contribuir já para
tratar, com os estudantes, a importante questão da comunicação nas relações com os
sujeitos das suas práticas e membros das equipes multiprofissionais.
Durante as discussões direcionadoras dos grupos focais, associadas ao
microensino, o pesquisador atuou como mobilizador e observador, e adotou, como
guião, as seguintes questões: Como ocorre a comunicação e a escuta entre os alunos,
representando o papel de fisioterapeuta, o papel de cuidador e aquele do sujeito das
práticas? Existe a preocupação com as questões sociais e de humanização?
As tabelas 03 e 04, abaixo, apresenta a organização e distribuição dos
subgrupos por grupo focal, os participantes que fizeram a composição dos papeis de
sujeitos das práticas, cuidador e fisioterapeuta.
Tabela 03. Organização do ambiente de coleta do grupo focal.
Período da Coleta 14, 21 e 28 de Agosto de 2017 às 14h.
Local dos Encontros Clínica Escola de uma instituição de ensino superior na
Região de Bauru.
Quantidade e duração dos
encontros
Foram realizados 3 encontros, com duração de 40
minutos cada.
Sujeitos Participantes 16 alunos do nono semestre do curso de fisioterapia, os
mesmos que foram sujeitos da observação participante
quando do momento dos estágios na saúde pública, mas
agora divididos em 2 grupos (SG 01 e SG 02), para
favorecer a dinâmica dos grupos focais.
Fonte. O próprio autor (2017).
102
Tabela 04. Distribuição dos participantes por subgrupos nos grupos focais.
GRUPO
FOCAL
SUBGRUPOS
PAPEL DE SUJEITO DAS
PRÁTICAS
(S)
PAPEL DE
CUIDADOR
(C)
PAPEL DE
FISIOTERAPEUTA
(FIS)
1 SG.1 F.3 (S.1) M.2 (C.1) M.1 (FIS.1)
SG.2 F.6 (S.2) F.5 (C.2) M.4 (FIS.2)
2 SG.1 F.7 (S.1) F.15 (C) F.8 (FIS.1)
SG.2 M.14 (S.2) F.16 (FIS.2)
3 SG.1 M.9 (S.1) F.10 (C) M.11 (FIS.1)
SG.2 M.12 (S.2) F.13 (FIS.2)
Fonte. O próprio autor (2017).
3.3.2. DOS ENCONTROS DOS GRUPOS FOCAIS ASSOCIADOS AO
MICROENSINO
O primeiro encontro do grupo focal (G.1) foi realizado no dia 14 de agosto de
2017 às 14h em um laboratório de práticas clínicas de uma instituição universitária na
cidade de Bauru (Tabelas 5 e 6). Neste primeiro encontro estavam presentes 6
participantes, de ambos os sexos, que já haviam sido sujeitos da observação
participante na fase anterior da coleta de dados (Observação participante). Ao
chegarem ao laboratório, o pesquisador solicitou que se organizassem em subgrupos
com três participantes cada (SG.1 e SG.2), e que em cada subgrupo fosse eleito um
participante para assumir o papel do sujeito das práticas (denominados S.1 e S.2),
outro no papel de cuidador (denominados C.1 e C.2) e, por último, um no papel de
fisioterapeuta (denominados FIS.1 e FIS.2).
Para propiciar que as questões que direcionaram as discussões do grupo focal
fossem feitas de maneira mais aprofundada, o pesquisador criou uma narrativa, de
forma que cada papel tivesse características que mobilizassem o debate. Essas
narrativas “reproduziam” os casos com os quais os alunos estavam trabalhando no
estágio em saúde pública. Os participantes tinham, assim, que simular um processo
de atendimento, sendo livres para “complicarem” a situação, colocando obstáculos
que, de acordo com a experiência que já tinham (quer como estagiários, quer como
usuários de práticas de saúde), dificultam a atuação profissional e o diálogo
103
profissional-cuidador-família. E era sobre tal simulação que os debates do grupo focal
se davam.
PRIMEIRO ENCONTRO DO GRUPO FOCAL (G.1/SG.1 – 14/AGO/2017).
Tabela 05. Características patológicas e socioeconômicas do sujeito das práticas do G.1/SG.1.
GRUPO
FOCAL
SUBGRUPOS SUJEITO DAS PRÁTICAS
(S)
CUIDADOR
(C)
1 SG.1 Mulher, 40 anos, desempregada,
acometida por um Acidente
Vascular Encefálico (AVE),
hipertensa, faz uso de meio
auxiliar para locomoção
Esposo, desempregado,
cuida da esposa e dos 3 filhos
menores. Não recebe auxilio
doença, reside em uma casa
alugada e utiliza o transporte
público urbano para chegar
até a clínica.
Fonte: O próprio autor (2017).
FIS.1. No desenvolvimento da simulação do primeiro subgrupo, o participante M.1 no
papel de fisioterapeuta, adotou uma abordagem voltada para as práticas
hospitalocêntricas e tecnicista em sua atuação. Ao elaborar questões para colher
dados da patologia e do sujeito, para seguir com o diagnóstico e posteriormente traçar
a conduta adequada, o participante concentrou seus esforços no cuidador,
desprezando a capacidade cognitiva, a compreensão e a subjetividade do sujeito das
práticas, que segundo o roteiro, estava preservada. E, mesmo que não estivesse,
como já visto aqui, anteriormente, o paciente deve ter a garantia de ser tratado com
transparência e de ser ouvido em tudo aquilo que se refere ao que será feito com ele.
Outro ponto importante nessa abordagem é que as características socioeconômicas
apresentadas no início do grupo focal, não foram questionadas pelo participante,
reafirmando o caráter não humanizado do atendimento, pois a preocupação do
profissional estava canalizada para a “solução” de problemas de ordem física e
fisiológica, escamoteando-se a compreensão do todo, e a influência do contexto, para
o processo de reabilitação. Ao interagir com o fisioterapeuta M.1 (FIS. 1), o
participante M.2 (C.1), não propositadamente, negligenciou categoricamente a fala e
a participação do sujeito das práticas, no caso F.3 (S.1) que se manteve calada e
suscetível às práticas daquele que se posicionou como fisioterapeuta.
104
De acordo com Silva (2011), a relação entre profissionais e sujeitos, para
construir-se em possibilidades de práticas no eixo da saúde, requer o diálogo. E ainda,
[...] a humanização depende da capacidade de falar e de ouvir. As coisas do mundo só se tornam humanas quando ocorre o diálogo, tornando viáveis as relações e interações humanas, não somente pela técnica de comunicação verbal, mas através do conhecimento que se constrói sobre o outro.
Após a simulação, no debate do grupo focal, discutiu-se a atuação do
participante M.1, suas crenças na existência de práticas humanizadas em saúde, sua
concepção de fisioterapia, dentre outras. No desenvolver do seu raciocínio, o
participante declara: “Eu acredito que tenha humanização na saúde sim, não podemos
generalizar, há profissionais e profissionais”, e ainda acrescenta, “a relação com o
paciente é uma questão de empatia”. O que se pode considerar é a existência de uma
consciência da necessidade de se humanizar, entretanto, no processo de formação,
parecem faltar recursos capazes de desenvolver no aluno um comportamento mais
humanizado. O discurso é coerente com a necessidade de se estabelecer relações
mais horizontalizadas, porém, o que se observa no desenrolar da simulação, é um
comportamento oposto.
PRIMEIRO ENCONTRO DO GRUPO FOCAL (G.1/SG.2 – 14/AGO/2017).
Tabela 06. Características patológicas e socioeconômicas do sujeito das práticas do G.1/SG.2.
GRUPO
FOCAL
SUBGRUPOS SUJEITO DAS PRÁTICAS
(S)
CUIDADOR
(C)
1 SG.2 Mulher, 20 anos, profissional de
telemarketing, sofreu uma queda
de motocicleta e fraturou o fêmur,
faz uso de meio auxiliar para
locomoção e seu principal meio
para deslocamento até a clínica é
o transporte público urbano.
Irmã, vendedora, conseguiu
dispensa do trabalho para
acompanhar sua irmã nos
atendimentos, residem juntas
em um bairro periférico da
cidade.
Fonte: O próprio autor (2017).
105
FIS.2. Ao recepcionar a “paciente”, M.4 se identificou como fisioterapeuta, pediu para
que ela se direcionasse até um tablado existente no local onde estava sendo realizado
o grupo focal, e que se colocasse na posição sentada. Ao iniciar os procedimentos
iniciais, como a aferição da pressão arterial e posterior aplicação da conduta
fisioterapêutica, a “irmã” mencionou que a “paciente” não colaborava com o
tratamento, pois, segundo ela, os exercícios prescritos pelo “fisioterapeuta” não eram
executados em casa. O "fisioterapeuta”, tomando conhecimento dessa fala, se
direcionou à “paciente” de forma incisiva, dando-lhe uma “bronca”, e dizendo que se
não cooperasse de nada adiantaria fazer fisioterapia.
O pesquisador observou que não houve uma tentativa de diálogo do
“fisioterapeuta” com a “paciente”, nem tampouco a tentativa de compreender o porquê
dos exercícios não estarem sendo executados. Dessa forma, pode-se evidenciar,
também no participante M.4, a anulação da subjetividade do sujeito-paciente,
deixando transparecer, ainda uma vez, o caráter flexneriano da atuação
fisioterapêutica. A forma com que o participante estabeleceu sua comunicação com o
sujeito das práticas evidencia um comportamento dominador, comumente encontrado
nos profissionais do campo da saúde. E destacamos que essa tentativa do profissional
da saúde de intimidar o paciente por “broncas” ou outros atos de violência simbólica,
como ignorá-lo ou olhar ameaçadoramente, é, via de regra, assumida quando o
paciente não se mostra “colaborador” do profissional. Nas palavras de Baptista:
Alguns autores discutem que, por serem detentores de conhecimento específico, os profissionais de saúde desenvolveram uma concepção estereotipada na qual o paciente é um ser desprovido de conhecimento. Por essa razão, o considera incapaz de compreender o que acontece em seu corpo, relegando-o à categoria de objeto submisso aos cuidados profissionais e reafirmando paciente como objeto, com risco de construir a heteronomia como "iatrogênese social" caracterizada pela disseminação do papel de doente como comportamento apassivado e dependente da autoridade (BAPTISTA et al., 2017).
Ao finalizar a simulação, adentrando a discussão do grupo focal, debateu-se
acerca do papel dominador do profissional da saúde, que muitas vezes adota esse
perfil na tentativa de ser obedecido, para que os objetivos propostos possam ser
alcançados. Na fala do participante M.4: “Se o paciente fizer o que eu digo, há uma
grande possibilidade dele melhorar, estudamos para isso!” e ainda, “Eu faço minhas
orientações para o paciente desenvolver em casa, e muitas vezes o acompanhante
106
relata que ele não quer fazer, isso não ajuda”. A fala deixa clara a construção do
comportamento empoderado do fisioterapeuta, construído no percurso formativo, e
que impactará diretamente em uma relação pouco humanizada, com baixa qualidade
comunicativa, com o sujeito das práticas de reabilitação ou de prevenção. A
participante F.6, no percurso das discussões, deixa claro seu desconforto diante da
situação em que lhe foi chamada a atenção, e acrescenta a seguinte fala “Eu tenho
que escutar, nesta situação, eu que estou errada” e finaliza “Mas é assim em todos os
lugares, a saúde no Brasil é assim”. Observamos que ao aluno parece restar poucas
opções, que não aquela de ser incisivo e, por vezes, mesmo violento, quando o
paciente se recusa a seguir as prescrições. Isso porque essas situações, embora
recorrentes na realidade que ele enfrentará, não são discutidas ao longo do processo
formativo. Como escutar o paciente, buscar compreender as razões da não adesão
às prescrições, nada disso é geralmente abordado. Uma das razões é que isso leva
tempo, mas, também, parece já haver um enquadramento do futuro profissional em
um modelo de saúde mercantilista, no qual também não “haveria tempo” para o
diálogo, para a relação humanizada.
SEGUNDO ENCONTRO DO GRUPO FOCAL (G.2/SG.1 – 21/AGO/2017).
O segundo encontro do grupo focal (G.2) foi realizado no dia 21 de agosto de
2017 às 14h (Tabelas 7 e 8). Neste segundo encontro estavam presentes 5
participantes de ambos os sexos, que já haviam sido observados na fase anterior
(Observação participante). Ao chegarem no laboratório, o pesquisador solicitou que
se organizassem em subgrupos, um com três participantes e outro com dois
participantes (SG.1 e SG.2). No SG.1 foi solicitado que elegessem um participante no
papel do sujeito das práticas (S.1), outro no papel de cuidador (C) e por último um no
papel de fisioterapeuta (FIS.1). No SG.2, um seria o sujeito das práticas (S.2) e o outro
o fisioterapeuta (FIS.2).
107
Tabela 07. Características patológicas e socioeconômicas do sujeito das práticas do G.2/SG.1.
GRUPO
FOCAL
SUBGRUPOS SUJEITO DAS PRÁTICAS
(S)
CUIDADOR
(C)
2 SG.1 Mulher, 81 anos, aposentada,
senil, apresenta postura antálgica,
diminuição do equilíbrio e
dificuldade para locomoção,
ainda, apresenta redução da
capacidade auditiva e faz uso de
meio auxiliar para locomoção.
Cuidadora, autônoma, não
possui vínculos familiares e
está desempenhando sua
função há 3 semanas.
Fonte: O próprio autor (2017).
FIS.1. A participante F.8, em sua abordagem no papel de fisioterapeuta, se identificou
ao sujeito das práticas e logo foi advertida pela cuidadora para que utilizasse um tom
de voz mais alto, visto que a “paciente” não possuía boa capacidade auditiva.
Seguindo tais recomendações, a “fisioterapeuta” iniciou sua anamnese e o que se
observou foi uma tentativa de estabelecer uma relação de proximidade com a idosa,
utilizando-se de frases com palavras no diminutivo como “A senhora está boazinha?”
ou “Tomou o cafezinho da manhã?”. Após a cuidadora mencionar a dificuldade da
idosa em se alimentar, a fisioterapeuta infantilizou o diálogo da seguinte forma “Tem
que papar tudinho viu, pra ficar fortinha”. Nota-se uma tentativa de estabelecer uma
boa relação, mesmo afetiva, com o sujeito das práticas, na perspectiva de favorecer
a empatia e a adesão ao tratamento. Outro ponto importante a ser discutido foi a
intensidade e frequência com que os toques entre a “profissional” e a “paciente”
aconteceram. No campo da fisioterapia, o contato físico é inerente às práticas, e, no
caso do atendimento à pessoa com idade mais avançada, pela própria natureza das
limitações, tal contato acaba sendo mais recorrente. Para Subtil,
[...] à medida que os pacientes se envolvem no tratamento fisioterapêutico, relações interpessoais marcadas pela afetividade se desenvolvem e podem afetar o curso e a qualidade do tratamento em questão. Nesse panorama, o desenvolvimento do relacionamento entre fisioterapeuta e paciente
108
apresenta-se como algo natural e muito provável de acontecer entre essas partes, visto que o tratamento em questão apresenta fatores favoráveis ao surgimento de um relacionamento interpessoal, tais como: longo período de convivência, estímulos táteis prolongados e comunicação verbal em boa parte do atendimento fisioterapêutico (SUBTIL, 2011).
Ao finalizar suas condutas, a “fisioterapeuta” certificou-se verbalmente de que
a “cuidadora” tinha entendido suas recomendações. Entretanto, não utilizou-se de
recursos para registrar tais orientações, como anotações e demonstrações práticas.
No debate do grupo focal discutiu-se sobre as formas com que os profissionais da
saúde realizam suas orientações, em geral, sucintas e pouco didáticas. E, na fala de
F8: “Eu acho que o paciente entende minhas orientações, ele diz que faz os exercícios
que eu peço pra fazer durante a semana”, e ainda “Faço minhas recomendações e o
paciente cumpre, pois ele sabe da importância disso para sua recuperação”. Pode-se
notar certa resistência na compreensão da relevância de uma comunicação cuidadosa
profissional-paciente como balizadora para as boas práticas na saúde, sejam elas
intervencionistas, preventivas ou educativas. E a crença de que o conhecimento
científico, prerrogativa do profissional da saúde, por ser “verdadeiro”, é (deve ser)
aceito pelos pacientes e seus cuidadores de forma absoluta, isso é, sem admitir
senões.
SEGUNDO ENCONTRO DO GRUPO FOCAL (G.2/SG.2 – 21/AGO/2017).
Tabela 08. Características patológicas e socioeconômicas do sujeito das práticas do G.2/SG.2.
GRUPO
FOCAL
SUBGRUPOS SUJEITO DAS PRÁTICAS
(S)
CUIDADOR
(C)
2 SG.2 Homem, 25 anos, motoboy,
atualmente está afastado de suas
funções, reside com os pais em
uma apartamento no centro da
cidade. Sofreu queda da própria
altura e fraturou tornozelo, faz uso
de meio auxiliar para locomoção.
Não tem.
Fonte: O próprio autor (2017).
109
FIS.2. Ao identificar-se como “fisioterapeuta”, a participante F.16 iniciou sua
investigação (anamnese) ainda em pé e ao questionar o sujeito sobre o ocorrido a sua
fala foi acompanhada de afirmações como “Caiu de moto, né?” e “Foi jogando bola?”.
Ao negar tais afirmações, o “paciente” segue dizendo “Escorreguei no tapete e cai,
fraturando o tornozelo”. O que se observou nessa tentativa de “adivinhação” por parte
da "fisioterapeuta”, foi a falha na escuta do sujeito, pois antes mesmo deste apresentar
a justificativa para o ocorrido, a “profissional” fez suposições – que podem até ser
entendidas como preconceituosas, pois “andar de moto” e “jogar futebol” podem
assumir, no senso comum, o sentido de atividades que, se forem feitas sem cuidado,
resultam em acidentes. Reiterando a ideia, que parece bastante vigente entre os
profissionais da saúde, de que o paciente é responsável pela sua própria dor, e que o
tratamento, nesse sentido, é “expiação”. As “adivinhações” podem inibir os pacientes,
fazendo com que não expressem com qualidade dialógica, o que de fato ocorreu.
O pesquisador identificou várias lacunas comunicacionais durante a aplicação
das condutas fisioterapêuticas, pois, na tentativa de demonstrar domínio sobre a
proposta de tratamento, a “fisioterapeuta” tentou explicar o passo a passo daquilo que
estava executando. A proposta de fazer com que o paciente participe do processo de
reabilitação é plausível e, sem dúvida, um passo desejável para a comunicação eficaz.
Mas o que aconteceu, de fato, foi um emaranhado de explicações técnicas e
científicas sobre o protocolo fisioterapêutico a ser seguido para uma fratura no
tornozelo. E, ainda, de acordo com a visão do pesquisador, no momento das
explicações, não se observou na “fisioterapeuta” a tentativa de se fazer entender pelo
paciente. Conforme descreve Souza (2012) sobre a instituição da relação entre
profissional e sujeito das práticas,
[...] é fundamental que a comunicação estabelecida entre os profissionais de saúde e o paciente e sua família seja uma relação de ajuda efetiva, dentro de um ambiente que haja confiança mútua, onde o paciente e sua família possam revelar seus medos e anseios. É necessário que os profissionais de saúde sejam sinceros e se façam entender, fornecendo informações concretas, claras e reais, para que a relação que está sendo construída seja de total confiança.
Na discussão após a simulação, debateu-se a comunicação do profissional com
o sujeito das práticas e, de acordo com a fala de F.16: “Em muitos casos, o paciente
nos vê em situação superior à deles e acaba se inibindo e travando”, e ainda, “Nós
110
sabemos o que é bom para a reabilitação do paciente, pra ele melhorar, pra voltar a
fazer as atividades diárias, pra trabalhar”. Já o participante M.14 (S.2) não sentiu-se
incomodado com as asserções do fisioterapeuta, e não percebeu a tentativa de
cercear suas falas ao reportar o fato ocorrido. Pode-se perceber a carência de uma
formação focada nas questões de horizontalidade dos processos comunicativos, para
configurar uma adequada relação com o sujeito das práticas, com as condicionantes
da patologia, e também, com o percurso do tratamento.
TERCEIRO ENCONTRO DO GRUPO FOCAL (G.3/SG.1 – 28/AGO/2017).
O terceiro encontro do grupo focal (G.3) foi realizado no dia 28 de agosto de
2017 às 14h (Tabelas 9 e 10). Neste terceiro encontro estavam presentes 5
participantes de ambos os sexos, que já haviam sido observados na fase anterior
(Observação participante). Ao chegarem no laboratório, o pesquisador solicitou que
se organizassem em subgrupos, um com três participantes e outro com dois
participantes (SG.1 e SG.2). No SG.1 foi solicitado que elegessem um participante no
papel do sujeito das práticas (S.1), outro no papel de cuidador (C) e por último um no
papel de fisioterapeuta (FIS.1), no SG.2, um seria o sujeito das práticas (S.2) e o outro
o fisioterapeuta (FIS.2). Após, o pesquisador entregou para cada subgrupo um roteiro
para que simulassem uma situação de atendimento, cada um no papel anteriormente
estabelecido.
Tabela 09. Características patológicas e socioeconômicas do sujeito das práticas do G.3/SG.1.
GRUPO
FOCAL
SUBGRUPOS SUJEITO DAS PRÁTICAS
(S)
CUIDADOR
(C)
3 SG.1 Homem, 28 anos, metalúrgico,
afastado do trabalho, sofreu uma
fratura no joelho esquerdo em
decorrência de um acidente de
trabalho, faz uso de meio auxiliar
para locomoção (Cadeira de rodas
emprestada).
Esposa, 27 anos, assumiu a
maternidade aos 15 anos,
está tentando recolocação no
mercado de trabalho, não
completou o ensino
fundamental I, produz
bombons para complementar
a renda familiar.
Fonte: O próprio autor (2017).
111
FIS.1. Ao recepcionar o “paciente”, M.11, no papel de “fisioterapeuta” deu início ao
procedimento de avaliação e anamnese. Ao se deparar com a necessidade de
transferir o sujeito da cadeira para a maca, o “fisioterapeuta” imediatamente começou
a manipular a cadeira de rodas, sem o consentimento do “paciente”, sendo que esse
expressou seu desconforto com essa atitude. A cadeira de rodas é uma extensão do
corpo do sujeito, não devendo o profissional apropriar-se dessa sem a permissão da
pessoa com deficiência. Conforme cita Prestes (2011) “a cadeira de rodas é
verdadeiramente uma extensão do corpo do usuário; portanto ela deve satisfazer as
expectativas e preferências de acordo com as necessidades físicas e funcionais de
seus usuários”. Após a transferência da cadeira para a maca, o “fisioterapeuta” deu
sequência às investigações da anamnese, direcionando seus questionamentos aos
aspectos clínicos da lesão. Mesmo tendo recebido o briefing do caso, no qual estavam
expostas as características socioeconômicas do “paciente” e sua família, não se
observou a intenção do “profissional” em aprofundar a investigação para colher outras
informações nesse sentido, ainda que tais informações sejam importantes subsídios
para o entendimento da pessoa no contexto do processo de recuperação/reabilitação.
Ao finalizar sua conduta de tratamento, o “fisioterapeuta” ofereceu importantes
orientações para que o sujeito desenvolvesse uma série de exercícios em sua
residência. O pesquisador observou que o “profissional” dispunha de recursos para o
registro por escrito das atividades orientadas, mas que não fez uso desses. Ainda, os
participantes que adotaram os papeis de sujeitos das práticas e cuidador não
estabeleceram qualquer vínculo durante a sessão, não houve articulação de falas
entre fisioterapeuta/sujeito das práticas e fisioterapeuta/cuidador.
Na discussão do grupo focal debateu-se se os aspectos sociais são
significativos para as tomadas de decisão, em fisioterapia. Em sua fala, M.11 afirmou
que “Tenho uma boa compreensão da situação em que o paciente se encontra, isso
ajuda quando preciso traçar meus objetivos de tratamento” e ainda, “Muitas vezes o
fisioterapeuta não analisa o paciente individualmente, temos receitas prontas, não
levamos em consideração sua particularidade”. Fica evidenciado, à semelhança de
outras falas, a dicotomia entre os discursos e a prática dos estudantes. Isto é, parece
haver o conhecimento de qual seria o comportamento profissional ideal na relação
112
com profissional-paciente, mas esse conhecimento não chega a materializar-se em
práticas de humanização, ou de uma relação comunicativa mais horizontalizada.
TERCEIRO ENCONTRO DO GRUPO FOCAL (G.3/SG.2 – 28/AGO/2017).
Tabela 10. Características patológicas e socioeconômicas do sujeito das práticas do G.3/SG.2.
GRUPO
FOCAL
SUBGRUPOS SUJEITO DAS PRÁTICAS
(S)
CUIDADOR
(C)
3 SG.2 Homem, 24 anos, auxiliar de
limpeza, apresenta um quadro de
hérnia discal e refere dores
intensas. Reside em um bairro
periférico da cidade, considerado
de vulnerabilidade econômica e
suas atividades profissionais
exigem intenso esforço físico.
Não tem.
Fonte: O próprio autor (2017).
FIS.2. Durante a anamnese, a participante F.13, no papel de “fisioterapeuta” solicitou
que o “paciente” contasse sua história, e mostrou-se atenta às informações
oferecidas. Em todo o processo de avaliação, o pesquisador observou a preocupação
da “fisioterapeuta” em colher dados sobre a rotina de vida diária do “paciente”,
estabelecendo uma relação comunicativa de troca de informações, inclusive com
várias recomendações posturais para a execução das suas atividades laborais.
Recolher dados acerca do ambiente em que o sujeito está inserido é um fator
determinante no processo de reabilitação, e poderá contribuir significativamente para
a o resultado do tratamento. Ao finalizar sua conduta, F.13 procurou demonstrar na
prática suas orientações, pedindo que o “paciente” as realizasse logo em seguida,
verificando a compreensão das orientações feitas. O participante M.12 (S.2) buscou
compreender as falas do fisioterapeuta e agradeceu as informações oferecidas, se
113
dizendo favorável às mudanças em sua rotina, e acrescentou a seguinte fala “Eu
preciso melhorar, senão, não posso trabalhar”. Utilizar-se de mecanismos para
certificar-se que houve entendimento por parte do sujeito é uma forma de humanizar
a comunicação em saúde, é um princípio para romper com modelos de atuação
mecanizados, resultantes tanto da alta demanda de atendimentos como pelo
pensamento biomédico, que caracteriza a prática em saúde no Brasil. Inclusive,
podendo ser responsável, dentre outros fatores, pela própria alta demanda de
atendimentos, pois o foco não está na prevenção, na atenção primária em saúde, ou
mesmo na educação na/para a saúde, que oferecem pouco retorno monetário às
empresas que lucram com a venda de serviços médicos, diagnósticos, tratamentos,
etc.
Giddens (2004) discute a ótica das especializações, que marca tanto as
profissões da saúde, seus métodos tecnicistas de atendimento, formado na base do
modelo biomédico de atuação, fazendo com que o corpo humano seja visto como uma
máquina composta por peças, que ao entrarem em colapso devem ser ajustadas.
Ainda, no qual o paciente é visto como um sujeito passivo, e que se apresenta em um
“corpo doente”, que deve ser tratado separadamente dos aspectos sociais, ambientais
e mentais (afetivos e cognitivos).
Ao terminar a simulação, na discussão do grupo focal, debateu-se a abordagem
mais horizontalizada de atuação/comunicação e sobre estratégias para executar
orientações mais pontuais e assertivas. Na fala de F.13: “Não me acho melhor que
meu paciente, somos pessoas diferentes” e ainda “Eu gosto de ver aquilo que aprendi
sendo colocado em prática pra melhorar a vida de alguém, meu objetivo é que o
paciente se reabilite em um espaço curto de tempo”.
Ao buscar uma relação comunicativa de melhor qualidade com o “paciente”,
pautada na compreensão mais equânime entre a figura do profissional e do doente,
F.13 reflete aquilo que é colocado por Oliveira (2002, p. 67), acerca da relação
profissional-paciente: “Os pacientes e os agentes de cura são componentes básicos
do sistema, estando imersos num contexto de significados culturais e de relações, não
podendo ser entendidos fora dele”. Ou seja, os padrões de comportamento dos
sujeitos que vivenciam um processo de saúde-doença emergem dos padrões culturais
existentes numa comunidade, mediados simbolicamente. O agir terapêutico, incluindo
a comunicação e a relação interpessoal, depende das interpretações que profissional
114
e paciente fazem desse simbolismo, envolvendo marcadores como tipo de
conhecimentos, classe social, gênero, raça, nível de escolaridade, etc. Descortinar
esse horizonte para os alunos (e mesmo para os professores) é essencial se
pretendemos formar profissionais capazes de efetivar práticas comunicativas mais
humanizadas em saúde. Mas também na educação. Como é o caso das metodologias
ativas, são recursos inovadores que reconhece e permite a atuação docente em um
cenário de estratégias que viabilizem o alcance dos discentes, utilizando-se de meios
que desenvolvam as habilidades de análise, avaliação, comparação, tornando-o
crítico-reflexivo e corresponsável por sua formação
3.4. DA TRIANGULAÇÃO DOS DADOS
Na parte que se segue serão tratados os pontos que interligam as discussões
acerca da relação estabelecida entre o profissional da saúde, no caso o fisioterapeuta,
e o sujeito das práticas, a humanização nos serviços de saúde e a comunicação como
parte integrante do processo de humanização. Para a fundamentação dessa
triangulação serão utilizados os documentos que direcionam a formação do
profissional da fisioterapia, os documentos reguladores da profissão, a observação
participante e os dados colhidos nos grupos focais. As categorias elegidas para essa
análise foram a relação, a humanização e a comunicação entre fisioterapeuta e sujeito
das práticas.
3.4.1. A RELAÇÃO ENTRE O PROFISSIONAL E OS SUJEITOS DAS PRÁTICAS
A fisioterapia, historicamente marcada pela atuação biomédica, ainda hoje
utiliza-se desse modelo para constituir o processo de formação dos futuros
profissionais, com práticas voltadas para a reabilitação calcadas numa concepção do
corpo enquanto “ser doente” e, seguindo a tradição hospitalocêntrica na forma de
intervir nesse corpo. Mesmo com o advento do SUS, e a possibilidade de ampliação
dos segmentos de atuação, a fisioterapia se manteve com marcas intervencionistas
clínicas. Ainda que com o apelo à importância da prevenção e da atenção primária,
atualmente reconhecidas como os caminhos mais efetivos para uma justiça social na
saúde e à contribuição que poderia ser dada para a saúde pública com uma
115
perspectiva de uma fisioterapia coletiva, no sentido de comunitária, os passos nessa
direção ainda são tímidos nas práticas e no pensamento fisioterapêutico. Continua a
ignorar-se a necessidade de aprimorar os aspectos relacionais e humanísticos
incutidos no arcabouço de atividades do fisioterapeuta, com pouco destaque sendo
dado, tanto na formação inicial como naquela continuada, para esses temas
(BERTONCELLO; PIVETTA, 2015). No entender de Silva, isso está na contramão do
que a reforma sanitária propôs:
A criação do Sistema Único de Saúde - SUS, a partir dos movimentos de Reforma Sanitária, recoloca os limites da formação tradicional e reforça a necessidade de um modelo formativo que priorize uma formação generalista, humanista e crítico-reflexiva, pois o novo modelo de saúde demanda um profissional que atente não apenas para as dimensões técnicas do trabalho, mas também para as dimensões políticas e éticas implicadas na práxis (SILVA, 2015).
Durante a pesquisa documental, e ao observar o Projeto Político Pedagógico
(PPP) do curso de fisioterapia da instituição na qual foi desenvolvida a pesquisa, pode-
se notar que as habilidades relacionais não estão no horizonte das ações formativas,
e não fica patente a importância, nem as formas didático-pedagógicas, de promover
uma formação com olhares humanistas para a subjetividade dos sujeitos das práticas.
Contrariamente, privilegia-se ainda como o lado mais forte de atuação do
fisioterapeuta o cenário reabilitador.
Os objetivos do curso de Fisioterapia, de acordo com os documentos legais,
foram concebidos para serem implementados em uma modalidade sistêmica e global,
buscando a coerência entre o perfil do profissional e o contexto educacional. De
acordo com a Resolução CNE/CES 4/2002, o curso deverá formar profissionais
fisioterapeutas imbuídos de práticas preventivas e promotoras da manutenção da
qualidade de vida do ser humano, na reabilitação cinético funcional, e para isso o
profissional deverá deter os conhecimentos próprios da motricidade humana e intervir
nas incapacidades funcionais com métodos e técnicas específicas da fisioterapia, bem
como na sua prevenção (BRASIL, 2002). O fisioterapeuta deverá elaborar o
diagnóstico cinético-funcional, identificando as limitações e disfunções do corpo
humano, e nesse sentido, deverá considerar os aspecto clínicos, científicos, éticos e
sociais da doença. Sua atuação deverá ser direcionada para a prevenção do agravo,
através da educação e promoção da saúde, e para isso deverá assegurar a
116
integralidade da pessoa, individual e coletiva. Isso converge para a perspectiva da
argumentação aqui defendida, de que a formação inicial do fisioterapeuta deveria
caracterizar-se também pelos princípios de uma educação sociocomunitária, no
sentido de que esse profissional, como um agente da saúde, pode contribuir
importantemente para com que as pessoas se organizem em prol da qualificação dos
serviços de saúde, agindo mais proativamente em sua comunidade, organizando-se
politicamente, etc. De acordo com Gomes (2008)
[...] a proposta da investigação em Educação sociocomunitária surgiu do estudo da identidade histórica de uma prática educativa, a educação salesiana. Em suas origens históricas, ela se fundava na articulação de uma comunidade civil - de religiosos e cidadãos comuns - em torno de um projeto educacional, que participou e promoveu transformações sociais em seu tempo e lugar histórico.
Ao analisar a matriz curricular do primeiro semestre do curso de fisioterapia
(Quadro 09) da instituição em que a pesquisa foi realizada, pode-se perceber que não
há qualquer intenção de promover discussões acerca das relações dos futuros
profissionais e dos sujeitos das práticas, principalmente se for levado em
consideração a capacidade do fisioterapeuta de viabilizar nos sujeitos a autonomia
para organizar-se socialmente.
Quadro 09. Matriz curricular do primeiro semestre do curso de fisioterapia.
Fonte: Projeto Político do Curso da instituição na qual foi feita a pesquisa (2016).
No primeiro semestre a disciplina que poderia contemplar uma abordagem mais
profunda dos aspectos relacionais entre o profissional e os sujeitos seria aquela
117
intitulada “Homem, Cultura e Sociedade”. Na ementa, a proposta de abordagem está
centrada na formação do pensamento ocidental, na discussão acerca do homem
enquanto sujeito pertencente ao contexto social, produto e produtor de cultura, e
ainda, as relações étnico-raciais e a luta antirracista dos movimentos negros no Brasil.
No segundo semestre do curso de fisioterapia (Quadro 8), pode-se notar a
intenção de promover as questões éticas, políticas e sociais em uma disciplina
também interativa denominada “Ética, Política e Sociedade”.
Quadro 10. Matriz curricular do segundo semestre do curso de fisioterapia.
Fonte: Projeto Político do Curso da instituição na qual foi feita a pesquisa (2016).
Nessa disciplina abordam-se as questões da formação moral e política
praticada no ocidente, e ainda tenta-se contextualizar a construção de uma sociedade
coletiva e globalizada. É significativo observar que a preponderância do tema está na
teorização das discussões sociais, não existindo direcionamentos práticos para os
aspectos inter-relacionais, seja ele profissional-sujeito, sujeito-sujeito e profissional-
profissional. Isso parece ficar a cargo dos professores responsáveis pelas disciplinas,
quer presenciais, quer a distância. Contudo, a proposta didática, em qualquer das
modalidades, não contempla a discussão das temáticas para além da generalização.
Ademais, nas matrizes dos semestres posteriores, não existe registro de disciplinas
com enfoque social, somente conteúdos relacionados às intervenções clínicas nas
diversas especialidades que caracterizam a profissão. E, nessas, também as
questões de organização social, ou de humanização, ficam subjacentes, à mercê do
professor encarregado de lecioná-las. Mas não há um planejamento do grupo de
118
docentes, ou mesmo institucional para que essas questões sejam efetivamente
abordadas. Nem, fica claro, perspectivas didáticas que permitissem contemplá-las.
Rosa (2012, p. 61), em estudo sobre as representações de docentes e
discentes de um curso de fisioterapia, apoiando-se no pensamento de Rocha e
colaboradores (2007), expõe que
existe uma desarticulação dos docentes, com vínculos frágeis aos cursos, o predomínio da medicalização de problemas de ordem social, a abordagem clínica compartimentalizada e a doença prevalecendo sobre uma abordagem sistêmica, sendo que a academia tem mantido seus currículos com característica de séculos passados, ou seja, centrado no ensino de patologias. (...) não se pode restringir a formação dos profissionais ao modelo hegemônico médico-centrado, pois isso resultaria em uma distância cada vez maior dos profissionais das necessidades de saúde das pessoas e da sociedade na qual elas se encontram inseridas.
O que tem perpetuado o currículo da fisioterapia no estudo das sequelas das
lesões/patologias, sendo que pelos achados da autora acima referida a representação
dos profissionais e futuros profissionais da área é que, de fato, a função primordial do
fisioterapeuta é a reabilitação, escanteando-se a aproximação com a realidade social
da população mais economicamente vulnerável, com a organização comunitária das
pessoas para o envolvimento com as políticas de saúde, com a prevenção, com a
preocupação e a crítica quanto aos fatores que estão subjacentes ao adoecimento da
população, ou com a humanização da saúde, etc. Achados que foram corroborados
pelo estudo aqui relatado.
Durante a observação participante, o pesquisador pode verificar que as
questões relacionais não estão no eixo norteador das práticas desenvolvidas pelos
alunos. Estão distantes do raciocínio clínico, embora apareçam nos discursos dos
alunos. As colocações dos estudantes são expressas nos moldes estabelecidos na
matriz curricular do curso de fisioterapia. As condutas adotadas pelos estagiários são
normativamente técnicas, tendendo a mecanizadas, havendo pouca margem para a
exploração da subjetividade dos sujeitos das práticas. Que dirá para o
empoderamento desses.
De acordo com Bispo Junior (2009, p. 1630), no campo da fisioterapia ainda
predomina o modelo flexneriano-biologicista-privatista de atuação e, nesse aspecto,
privilegia-se o tecnicismo e se fragmentam as especialidades em face do corpo
doente. O autor ainda chama a atenção para o fato de que,
119
[...] o fisioterapeuta, além de estar inserido no mesmo contexto dos demais profissionais da saúde com formação direcionada para a doença, padece desse infortúnio de forma mais acentuada, já que é visto como ‘o profissional da reabilitação’, ou seja, aquele que atua exclusivamente quando a doença, lesão ou disfunção já foi estabelecida.
Sendo assim, reafirmando o tecnicismo e mecanicismo no modo de operar a
fisioterapia, como os demonstrados durante a observação participante, o pesquisador
salienta que tais práticas são inerentes ao ambiente em que a formação ocorre, e para
modificá-las, propondo concepções mais humanistas, nas quais se privilegie também
os aspectos comunicativos, para além daqueles técnicos, é necessário intervir nos
componentes curriculares do curso. Além da preparação dos docentes.
No grupo focal foi possível identificar disparidades semelhantes entre discursos
e práticas acerca da atuação dos participantes. Os documentos que regulam a
profissão, embora atenuem a ênfase no modelo biomédico e a perspectiva
mercantilista de saúde, revelam direcionamentos no sentido de uma formação
engessada e tecnicamente rigorosa nos preceitos biomédicos, e pouca ênfase nos
princípios da humanização, da saúde pública, nas habilidades de comunicação e da
relevância da horizontalidade da relação profissional-paciente, do empoderamento
desse, inclusive do ponto de vista da organização social, para envolverem-se no
pensar a saúde nas comunidades, participando dos conselhos de saúde, por exemplo.
Destaca-se a falta de preparo dos futuros profissionais na prescrição das
atividades de vida diária ou na forma de realização dos “exercícios” fisioterapêuticos,
que com raras exceções não partiam de nenhum pressuposto didático, nem usavam
de bom senso, como registrando-os ou verificando o nível de compreensão dos
sujeitos e seus cuidadores. Espera-se mesmo que os pacientes cumpram as
instruções? E essa questão não se refere apenas aos estudantes, que ainda têm a
seu favor a inexperiência, mas aos próprios profissionais, professores, que não
preparam os alunos para essa importante parte do tratamento/prevenção,
provavelmente porque também não o fazem.
Na observação participante, assim como no grupo focal, os alunos revelaram a
apropriação das habilidades estabelecidas nos documentos reguladores, apesar dos
discursos serem coroados por pensamentos que, se revelavam pontos em
consonância com uma prática mais humanizada, mostravam claramente uma atuação
robotizada e com reduzidas iniciativas de humanização ou preocupação com as
120
subjetividades do sujeito das práticas/cuidadores. O grupo focal revelou, durante as
discussões, que apesar dos participantes notarem a necessidade de se refazer o
modelo de atuação, no que tange às questões relacionais, acreditavam que pouco se
poderia fazer, seja por falta de recursos estratégicos ou mesmo por falta de interesse,
da instituição, dos profissionais ou dos próprios alunos, pois predomina o interesse
pelo modelo clínico capitalista de atuação.
3.4.2. A VERTICALIZAÇÃO DA COMUNICAÇÃO
A ausência de horizontalidade no tratamento entre os sujeitos envolvidos no
processo saúde-doença, a relação de poder, caracterizada pelo domínio do
profissional sobre o paciente, própria ao modelo biomédico e os desajustes entre
formação profissional, políticas públicas, falta de estrutura no sistema público de
saúde, e deficiência no desenvolvimento de habilidades comunicacionais, se
apresentaram, no estudo feito, como pontos nevrálgicos na efetivação de uma saúde
mais humanizada.
De acordo com a análise documental, ao buscarem-se os aspectos formativos
da comunicação entre profissionais da fisioterapia e os sujeitos das práticas, pode-se
notar que existe uma ineficiência no desenvolvimento de tais habilidades, quando se
trata das matrizes curriculares e disciplinares do curso de fisioterapia. Observe-se, no
quarto e quinto semestre (Quadro 9) do curso estudado, algumas disciplinas que
poderiam desenvolver as habilidades comunicacionais, sendo elas “Formação Integral
em Saúde”, que discorre sobre as bases da saúde coletiva, suas bases legais,
planejamento e modelos assistenciais de saúde, conforme diretrizes do SUS, e a
“Psicologia Aplicada à Saúde”, que aborda a construção do desenvolvimento humano,
no campo da psicologia social e saúde.
Contudo, em que pese a existência dessas disciplinas na grade curricular, tanto
a observação participante como os grupos focais evidenciaram a falta de preparo
comunicacional dos alunos, na prática profissional. Em nosso entender, isso se deve
ao pouco valor que os próprios profissionais docentes da área da saúde atribuem ao
processo de comunicação, à horizontalidade da relação profissional-paciente e à
própria questão da humanização da saúde.
121
Quadro 11. Matriz curricular do quarto e quinto semestre do curso de fisioterapia.
Fonte: Projeto Político do Curso da instituição na qual foi feita a pesquisa (2016).
Acompanhando o pensamento de Oliveira (2002, p. 70), o que se afigura é que
os docentes levam para a sala de aula a concepção de que o atendimento em saúde
é organizado pelos técnicos para ser simplesmente “usufruído” pelos pacientes, que assumiriam uma posição um tanto quanto passiva diante do que lhes é ofertado (...) os serviços de saúde são “equipecêntricos”, um tipo particular de etnocentrismo, em que a equipe de saúde passa a julgar seus usuários a partir da visão dos seus membros, estabelecendo unilateralmente o que é certo ou errado, adequado ou inadequado, em relação ao cuidado com a saúde.
Isso apesar do próprio SUS representar um avanço na questão da
comunicação e humanização em saúde, defendendo a orientação adequada do
profissional ao sujeito das práticas como essencial na promoção da saúde. Segundo
Moraes (2013),
A comunicação em saúde deve ser entendida de forma integralizada, considerando o sujeito na sua totalidade, suas dificuldades, seus anseios, e não meramente como o repasse de informações rebuscadas com o uso de termos técnico. Os sujeitos precisam ser os protagonistas, capazes de compreender a dinâmica do sistema de saúde, e que o mesmo possa usufruir
122
destas informações de forma a viabilizar o acesso e a efetivação dos seus direitos.
No ano de 2011 foi realizado o XIV Conselho Nacional de Saúde e um dos
pontos centrais desse conselho foi a discussão sobre a necessidade do debate acerca
da informação e comunicação em saúde. Na ocasião, foi apontada a comunicação
como importante ferramenta para qualificar e divulgar informações sobre os tipos de
atendimentos oferecidos pelo sistema de saúde, bem como melhorar a relação do
sujeito das práticas com os profissionais e serviços de saúde (BRASIL, 2012).
Mesmo diante das necessidades de implementação de uma comunicação
eficiente no campo da fisioterapia, levando em consideração a Lei Orgânica da Saúde
(8.080/90), e as tratativas durante o XIV Conselho Nacional de Saúde, pode-se ainda
observar uma distância entre formação do fisioterapeuta e as exigências do Sistema
Único de Saúde. No que se apresenta durante a análise documental aqui realizada, é
relevante observar que mesmo fazendo parte de políticas e estratégias
governamentais, a formação desse profissional (mas também de outros, da área da
saúde) está aquém da ideal para a integração do fisioterapeuta nos moldes da saúde
pública.
Nesse sentido, uma formação profissional balizada nos princípios de uma
educação sociocomunitária poderia ser a balizadora para uma construção e
organização participativa da sociedade no pensar a saúde, nesse caso, fortalecendo
a formação do futuro fisioterapeuta, propondo uma educação pautada na promoção
da sustentabilidade social, viabilizando através desse profissional (e de outros
profissionais da saúde) a possibilidade de organização social, de autonomia e de
emancipação dos sujeitos. Nesse sentido, tal formação deveria contemplar o estímulo
para que as comunidades se preocupassem em promover e proteger os direitos das
pessoas naquilo que se refere ao acesso e às práticas de saúde. Nessa perspectiva,
os princípios centrais de uma educação assim pensada se baseariam, de acordo com
Osorio (2004, p. 03)
na construção de sentidos e possibilidades de um pensamento crítico (fonte hermenêutica); construção de sujeitos atuando em diversos espaços e movimentos (fonte crítica) e ruptura do claustro do pensamento único e reinvenção do poder cidadão (fonte cidadã).
123
Durante a observação participante, o pesquisador identificou nos participantes
uma comunicação deficiente na condução de suas práticas. Nas conversações, o que
pode ser notado foram as verticalizações das falas, deixando evidente a relação de
poder impresso nos comportamentos de dominação do sujeito participante sobre o
sujeito das práticas. Diante dessas expressões, verdadeiramente de cima pra baixo,
há que se questionar, seria a ausência do desenvolvimento das habilidades
comunicacionais no percurso de formação o elemento promotor da verticalização? E
ainda, ao verticalizar a comunicação entre os sujeitos participantes e os das práticas,
estaria o futuro fisioterapeuta fortalecendo um perfil profissional ditatorial e
desumanizador? E por fim, ao estabelecer uma comunicação unilateralmente
dominante, o fisioterapeuta contribuiria para uma saúde menos igualitária e mais
evasiva?
Nas atividades desenvolvidas durantes os encontros dos grupos focais, o
pesquisador registrou alguns comportamentos que expressam a tônica do
empoderamento e dominação do profissional, ao manifestarem-se diante dos “sujeitos
das práticas” como o único detentor dos conhecimentos e recursos capazes de
reabilitar e promover a cura, com expressões verdadeiramente tecnicistas, sem
considerar a subjetividade do outro, portanto, a atuação do fisioterapeuta está
marcada pela deficiente estrutura curricular formativa, que não contempla os aspectos
e habilidades comunicacionais, relacionais e que estão longe da humanização
necessária.
3.4.3. A HUMANIZAÇÃO DAS PRÁTICAS DE SAÚDE
Pensar a humanização em saúde é reconhecer a realidade em que os sujeitos
das práticas vivem e considerar a sua cultura. O profissional da saúde, nesse caso o
fisioterapeuta, deve adotar mecanismos de abordagens focadas no entendimento do
outro como ser singular e que necessita ser compreendido, no processo saúde-
doença, em suas diversas manifestações clínicas e sociais.
Segundo Silva (2015, p. 298), “o paciente precisa ser compreendido como ser
biopsicossocial, suscetível às alterações em seu meio ambiente ou em sua mente” e,
ainda acrescenta, que o profissional da saúde deve compreender as implicações
estabelecidas nessa relação e distanciar-se das condutas mecanicistas e tecnicistas
124
de atuação. Nesse sentido, Canguilhem (2009) desconstrói o pensamento entre o que
se tem por normalidade e o que se classifica por patológico, afirmando não existir uma
regra irrefutável para tal separação, e que generalize os sujeitos como “saudáveis” e
“doentes”, nem via de regra para as ações intervencionistas e preventivas em saúde,
pautadas nessa dicotomia.
Ao analisar os documentos formativos (PPC do curso em questão e currículo),
no que se refere ao ato humanizador no campo da saúde, pode-se identificar que as
práticas que deveriam promover o pensamento acerca da humanização não são
priorizadas nas disciplinas curriculares do curso de fisioterapia, nem naquelas
pertencentes às práticas supervisionadas no campo de estágio. O aluno que cursa o
nono semestre do curso de fisioterapia deverá cumprir 120 horas de estágio em saúde
pública, como parte integrante dos atendimentos em atenção básica (Quadro 10).
Quadro 12. Matriz curricular do nono semestre do curso de fisioterapia.
Fonte: Projeto Político do Curso da instituição na qual foi feita a pesquisa (2016)
Neste campo de atuação, os alunos devem integrar-se das questões voltadas
para a historicidade da saúde pública no Brasil, dos documentos produzidos nas
conferências nacionais e internacionais que discutem questões como reforma
sanitária, modelos de saúde, processos de saúde-doença, devem apropriar-se dos
marcos históricos da Fisioterapia no SUS e do desenvolvimento da profissão no
contexto nacional, como também dos princípios e diretrizes que são regulamentados
pela lei orgânica da saúde.
Os futuros fisioterapeutas necessitam tomar conhecimento da atuação
profissional no campo da Estratégia de Saúde da Família (ESF) e do Núcleo de
Atenção à Saúde da Família (NASF). No campo de estágio, os alunos ainda deveriam
125
conhecer as atribuições do fisioterapeuta na Atenção Básica, em ações individuais e
coletivas/comunitárias na atenção à saúde do homem, da mulher, do idoso, da
criança, da pessoa com deficiência e nos Programas governamentais, como o
HIPERDIA6, Hanseníase, Tuberculose e doenças sexualmente transmissíveis, dentre
outros. Contudo, baseado tanto nesse como em outros estudos (conforme aquele de
Rosa (2012), aqui já citado; Simoni e colaboradores (2015), que discorrem sobre a
historicidade da perspectiva clínica e especialista na formação do fisioterapeuta no
Brasil, e de Ribeiro, Alves e Maia Filho (2016), que aborda a percepção de estudantes
da fisioterapia de que não são formados para trabalhar na rede pública), concluímos
que a formação para a atenção à saúde pública e comunitária não recebe o mesmo
valor no processo formativo, em referência à prática clínica. Dessa forma, não são
preconizados durante as abordagens terapêuticas a questão da relação humanizada
entre profissional e sujeitos das práticas, mesmo que isso esteja subentendido nas
práticas apresentadas aos alunos, ou nas disciplinas curriculares, a discussão central
da temática não está regulada pelo projeto político do curso, corroborando também
achados de Mattos (2006). Distorção que ainda se agrava, pois parece ficar entendido
que a questão da humanização, e da relação comunicativa horizontalizada se coloca
somente para a população econômica e culturalmente “carente”. Como se no
consultório ou nas clínicas particulares de fisioterapia o paciente já “falasse a língua”
dos profissionais, estabelecendo-se uma relação já por si mais horizontalizada por
estarem em “diálogo” pessoas com nível de empoderamento semelhante. O que não
se verifica, em nosso entender, e nem reflete a profundidade das discussões no
campo da saúde que devem ser estabelecidas à luz das relações de poder contidas
nas práticas profissionais desse campo. Colaborando para que não vejamos avanços
numa mudança do paradigma biomédico, centrado no profissional, para um centrado
no sujeito das práticas de saúde.
No percurso da observação participante o pesquisador pode identificar, nas
abordagens realizadas pelos sujeitos participantes, algumas falas que caracterizavam
certos sentimentos de consternação, empatia, e até mesmo piedade em relação aos
6 Destina-se ao cadastramento e acompanhamento de portadores de hipertensão arterial e/ou diabetes
mellitus atendidos na rede ambulatorial do Sistema Único de Saúde – SUS, permitindo gerar informação para aquisição, dispensação e distribuição de medicamentos de forma regular e sistemática a todos os pacientes cadastrados. O sistema envia dados para o Cartão Nacional de Saúde, funcionalidade que garante a identificação única do usuário do Sistema Único de Saúde – SUS.
126
sujeitos das práticas, como observado na fala do participante M.1 “Eu sinto muito por
ele estar nessa situação, quero o melhor para meu paciente, por isso sou exigente em
minhas condutas”. As falas contrapunham-se às ações, nos discursos era possível
notar certa condescendência com a situação do outro, entretanto, o comportamento
mecanizado, técnico e ditatorial desconstruía a coerência entre a lógica, a teoria e a
prática.
Acerca da humanização, ainda foi possível notar que de acordo com as
propostas estabelecidas pelo SUS existe um enfoque nas questões comunicacionais
como balizadora da humanização, como aqui já referido (FORTES, 2004). Neste caso,
a comunicação estabelecida pelos participantes, no momento das abordagens, não
contribuíram para o estabelecimento de uma relação de poder mais horizontalizada,
como discutido anteriormente. Mas, por outro lado, fizeram ampliar a distância entre
profissional e pacientes, na relação estabelecida, o que prejudica tanto a recuperação
dos sujeitos das práticas como impacta negativamente a transposição do gap entre
saberes científicos e do senso-comum, que é uma forma de empoderamento
(SANTOS, 2010).
No grupo focal, as intenções também se apresentavam contraditórias, o
discurso utilizado fazia jus às questões de humanização, mas a configuração dos
atendimentos robusteciam o caráter desumanizado do profissional, principalmente, ao
fazerem as recomendações para que os sujeitos realizasses as atividades de vida
diária, não considerando as possibilidades socioeconômicas, dificuldade de
compreensão do ponto de vista de se fazer entender pelo sujeito e ainda, a dominação
presente nas falas descontruía qualquer intenção de humanizar a relação.
127
CONSIDERAÇÕES FINAIS
A pesquisa teve por intenção investigar através da análise documental, da
observação participante e do grupo focal o processo de formação inicial do
fisioterapeuta, naquilo que concerne ao desenvolvimento de habilidades de
comunicação e de relacionamento profissional-paciente e da apropriação de uma
prática humanizada e comunitária, no sentido de colaborar, como agente da saúde,
com a organização da população para a garantia e a promoção do direito à saúde,
regulando o papel do Estado. Partimos do princípio de que a formação desses
profissionais está imbuída por práticas formativas pautadas no modelo biomédico de
atuação, ou seja, como um padrão de atuação marcado pela concepção
hospitalocêntrica/clínica, especializada, baseada na verticalização da comunicação
entre os envolvidos no processo saúde-doença e centrado no profissional, pois
fundamenta-se no estabelecimento de relações de poder nas quais o profissional age
como dominador e espera-se que o sujeito das práticas assuma um papel de
passividade.
No percurso da análise documental, ao investigar o Projeto Político de Curso
da instituição na qual foi realizada a pesquisa, a Lei Orgânica da Saúde e as Diretrizes
Curriculares Mínimas estabelecidas pelo Ministério da Educação, e outros, que
regulamentam a formação e a atuação do fisioterapeuta, pôde-se perceber que na
construção do perfil profissional as questões sobre a relação, a comunicação e a
humanização em saúde não estão bem alinhadas no aporte teórico das disciplinas e
tampouco nas práticas desenvolvidas em campo, ao menos da forma como são
didaticamente conduzidas. O que favorece a aquisição de um perfil profissional
verticalizado e com comportamentos desumanizantes, fortalecendo a lógica da
relação de poder inerente ao modelo clínico de atuação. E o desempoderamento dos
pacientes.
Ao correlacionar a análise dos documentos regulamentadores e o percurso da
observação participante pôde-se evidenciar a maneira com que os estudantes
participantes delineavam sua forma de agir diante do sujeito das práticas, sua forma
128
de se comunicar impositivamente na condução das condutas de tratamentos e
recomendações, no desprezar a subjetividade do outro em prol da execução de
atividades protocolares mecanizadas e ao construir uma barreira relacional entre o
fisioterapeuta como “dominador” e o sujeito das práticas como “dominado”.
Através do microensino e das discussões nos grupos focais, o pesquisador
verificou a falta de harmonia entre o pensamento, o raciocínio clínico que foi
construído pelos alunos e a prática por esses executada. No momento das
discussões, foi identificado nos participantes certa contradição ao apropriar-se dos
conceitos sobre a comunicação humanizada para o estabelecimento de uma relação
de qualidade, e alguns posicionamentos se revelaram humanizadores. Porém, em
suas práticas, não se notavam expressões efetivas na intenção de considerar o outro
em sua subjetividade. Pode-se afirmar que os estudantes de fisioterapia da instituição
investigada seguem a tradição mais comum nesse campo, de considerar o sujeito das
práticas da atenção fisioterapêutica numa perspectiva de verticalização das relações
de poder, pouco fazendo para distanciar-se de uma prática clínica, em direção a uma
que se pudesse dizer social e emancipatória.
Como seria possível romper com tal tradição, que também foi observada em
outros estudos aqui citados? Algumas chaves de leitura se destacaram ao longo da
pesquisa. Uma delas, é trabalhar a formação inicial com didáticas diferenciadas,
fazendo uso de metodologias ativas e participativas de ensino, que favorecem com
que os estudantes – mas também os professores- repensem a prática profissional
trazendo-a para ser refletida e investigada no ambiente universitário. Nesse sentido,
o microensino e os grupos focais mostraram-se promissores, pois favoreceram a
dinâmica de aprendizagem à partir da simulação, e oportunizaram momentos de
discussão sobre as práticas verticalizadas, próprias do modelo biomédico, e neste
caso, como é possível construir um modelo mais humanizado, centrado na
comunicação e na relação entre o profissional fisioterapeuta e o sujeito das práticas.
Outra dessas chaves aponta para a necessidade dos docentes revisitarem suas
posições profissionais e pessoais a respeito dos paradigmas que devem direcionar a
fisioterapia na sociedade brasileira. O modelo biomédico/clínico, hospitalocêntrico,
especializado, afigura-se como o mais sustentável para a nossa sociedade? Ou esse
modelo deve ser equilibrado com outros paradigmas, como aquele da fisioterapia
comunitária? Argumentamos que mais ênfase deva ser dada a esse modelo se
129
pretendemos ter mais justiça social na saúde. Para isso os princípios de uma
educação comunitária na formação do fisioterapeuta seria essencial, perpassando
pelas concepções de negociação cultural dos elementos envolvidos no processo
saúde-doença, pela discussão das políticas públicas de saúde, e da organização da
comunidade para participarem ativamente dessas políticas, encarando a luta pela
qualidade em saúde como direito e dever de todos, o debate do saber-científico como
instrumento de poder e de exclusão. Envolvida em todos esses processos está a
comunicação. Pelo estabelecimento de relações dialógicas – que exigem reconhecer
o outro em sua alteridade e subjetividade- é que se faz possível articular as práticas
profissionais ao juízo crítico da realidade, capacidade de interpretação e de fazer
sentidos do que aí transcorre, deliberar com base numa leitura de mundo mais
sistêmica e ética, no sentido de responsabilidade social e cidadã.
Por fim, a formação do profissional, sem invalidar a identidade desse
profissional em seus saberes, precisa voltar-se para a horizontalidade e o
reconhecimento do outro como pessoa. Isso significa significá-lo (valorizá-lo) em seu
contexto sociocultural, o que está imbuído na filosofia da humanização em saúde.
O estudo aqui realizado enseja outros caminhos para a pesquisa sobre a
formação inicial e continuada no campo da fisioterapia, para considerar-se uma maior
vinculação entre os documentos que regulam a formação e a atuação do
fisioterapeuta e os projetos políticos de curso e a didática empregada nas instituições
universitárias, cuidando-se do desenvolvimento das habilidades de comunicação
profissional-sujeitos das práticas, além de perseverar na busca por uma mudança
paradigmática que enfatize a formação do fisioterapeuta para a saúde pública e a
atenção comunitária.
130
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140
ANEXO I – Termo de Consentimento Livre e Esclarecido
Termo de Consentimento Livre e Esclarecido (via do participante)
A EDUCAÇÃO SOCIOCOMUNITÁRIA E A FISIOTERAPIA: PELA HUMANIZAÇÃO DA
COMUNICAÇÃO PROFISSIONAL X PACIENTE
Estamos realizando uma pesquisa com a proposta de investigar o como se processa a
construção da relação comunicativa profissional/paciente dos estudantes de fisioterapia.
Os objetivos que nortearam essa pesquisa foram fixados na análise da construção da relação
profissional/paciente, com foco nas habilidades de comunicação, visando aprimorar e formar o futuro
profissional fisioterapeuta numa perspectiva de humanização de sua atuação>. Para tanto, suas
respostas são importantes e bem vindas. Caso queira participar da pesquisa sob a responsabilidade
do pesquisador Flavio Marcos de Souza do PPG em Educação do Centro Universitário Salesiano de
São Paulo, solicitamos que assine este termo de consentimento, estando ciente que:
- Os procedimentos aplicados oferecem riscos mínimos à sua integridade moral, física, mental ou efeitos colaterais conhecidos e não é esperado que esse projeto venha a causar algum constrangimento;
- Você será convidado(a) a participar de um grupo focal para a discussão de temas que envolvem o processo formativo do fisioterapeuta e as implicações estabelecidas na comunicação e relação com o paciente.
- A participação na pesquisa poderá ser interrompida a qualquer momento que você desejar;
- Seus dados pessoais serão mantidos em sigilo e os resultados gerais obtidos por meio da pesquisa serão utilizados apenas para alcançar os objetivos do trabalho acima exposto, cujos dados poderão ser publicados em periódicos científicos;
- Você poderá entrar em contato com o responsável pelo estudo – Flavio Marcos de Souza – sempre que julgar necessário, pelo email: [email protected]
- Você concorda ter recebido todas as informações necessárias para poder decidir conscientemente sobre sua participação nessa pesquisa;
- Este termo de consentimento é feito em duas vias sendo que uma delas ficará em seu poder e a outra com o pesquisador responsável.
Eu, ___________________________ , RG, _____________dou o
consentimento livre e esclarecido para participar desta pesquisa.
Bauru, ______ de _________________ de ___________. _____________________________________
Assinatura do Voluntário ou Responsável Legal
141
ANEXO II – Parecer Consubstanciado do CEP
142