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Segunda parte do curso – Aspectos da Teoria da Sintaxe (Chomsky, 1965) 1) Preliminares metodológicos O livro “[t]ratará da componente sintática da gramática gerativa, isto é, das regras que especificam as sequências bem formadas de unidades mínimas com função sintática (formativos) e que associam informação estrutural de vários tipos não a essas sequências, como também às sequências que se desviam da construção ótima em certas maneiras” (p. 83). Objeto da teoria linguística: falante-ouvinte ideal, situado numa comunidade linguística homogênea, que conhece sua língua perfeitamente. Competência: conhecimento que o falante-ouvinte tem de sua língua. Desempenho: uso efetivo da língua em situações concretas. Objetivo da teoria linguística: a partir dos dados do desempenho chegar ao sistema de regras subjacente dominado pelo falante que ele põe em uso no desempenho. É uma teoria mentalista, pois procura uma realidade mental que subjaz ao comportamento. “A distinção que assinalo aqui (competência x desempenho) está relacionada com a distinção langue-parole de Saussure; mas é necessário rejeitar o seu conceito de langue como sendo meramente um inventário sistemático de itens e regressar antes à concepção humboldtiana de competência subjacente como um sistema de processos gerativos” (p. 84). A gramática é entendida como uma descrição da competência linguística de um falante- ouvinte ideal. Se a gramática for explícita – fornecer uma análise explícita do seu contributo –, será chamada de gramática gerativa. Para Chomsky, uma das qualidades essenciais das línguas naturais é o seu aspecto criativo. As gramáticas tradicionais eram lista de exceções; mas o aspecto criativo da língua está naquilo que é universal entre as línguas. A linguística tradicional (na verdade, o pensamento linguístico dos séculos XVIII e XIX) chamava esse aspecto comum entre as línguas de gramática universal. Assim, o trabalho da linguística, para ser completo, deve avançar para além da descrição das gramáticas particulares (as exceções) e se voltar para os aspectos universais ou para a gramática universal – que dão conta do aspecto criativo das línguas. Para chegarmos à competência linguística do falante – o objetivo da empreitada – devemos não só olhar para as particularidades de uma dada língua, mas também para a gramática universal. Nesse ponto, Chomsky reconhece uma série de limitações das visões tradicionais para o desenvolvimento de uma gramática universal – ou, por outros termos, o desenvolvimento de uma teoria sobre o aspecto criativo da língua. Em parte, porque os linguistas modernos (século XX) preocuparam-se em somente descrever as exceções ou particularidades das línguas, em parte porque os filósofos da tradição achavam certos aspectos da gramática refletiam o processo de pensar e isso desfavorecia a descrição desses aspectos (por exemplo, a ordem dos elementos sintáticos no francês refletindo a ordem dos pensamentos), e principalmente por dificuldades técnicas, pois até pouco antes da

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Segunda parte do curso – Aspectos da Teoria da Sintaxe (Chomsky, 1965)

1) Preliminares metodológicos

O livro “[t]ratará da componente sintática da gramática gerativa, isto é, das regras que especificam as sequências bem formadas de unidades mínimas com função sintática (formativos) e que associam informação estrutural de vários tipos não a essas sequências, como também às sequências que se desviam da construção ótima em certas maneiras” (p. 83).

Objeto da teoria linguística: falante-ouvinte ideal, situado numa comunidade linguística homogênea, que conhece sua língua perfeitamente.

Competência: conhecimento que o falante-ouvinte tem de sua língua.

Desempenho: uso efetivo da língua em situações concretas.

Objetivo da teoria linguística: a partir dos dados do desempenho chegar ao sistema de regras subjacente dominado pelo falante que ele põe em uso no desempenho. É uma teoria mentalista, pois procura uma realidade mental que subjaz ao comportamento.

“A distinção que assinalo aqui (competência x desempenho) está relacionada com a distinção langue-parole de Saussure; mas é necessário rejeitar o seu conceito de langue como sendo meramente um inventário sistemático de itens e regressar antes à concepção humboldtiana de competência subjacente como um sistema de processos gerativos” (p. 84).

A gramática é entendida como uma descrição da competência linguística de um falante-ouvinte ideal. Se a gramática for explícita – fornecer uma análise explícita do seu contributo –, será chamada de gramática gerativa.

Para Chomsky, uma das qualidades essenciais das línguas naturais é o seu aspecto criativo. As gramáticas tradicionais eram lista de exceções; mas o aspecto criativo da língua está naquilo que é universal entre as línguas. A linguística tradicional (na verdade, o pensamento linguístico dos séculos XVIII e XIX) chamava esse aspecto comum entre as línguas de gramática universal. Assim, o trabalho da linguística, para ser completo, deve avançar para além da descrição das gramáticas particulares (as exceções) e se voltar para os aspectos universais ou para a gramática universal – que dão conta do aspecto criativo das línguas. Para chegarmos à competência linguística do falante – o objetivo da empreitada – devemos não só olhar para as particularidades de uma dada língua, mas também para a gramática universal.

Nesse ponto, Chomsky reconhece uma série de limitações das visões tradicionais para o desenvolvimento de uma gramática universal – ou, por outros termos, o desenvolvimento de uma teoria sobre o aspecto criativo da língua. Em parte, porque os linguistas modernos (século XX) preocuparam-se em somente descrever as exceções ou particularidades das línguas, em parte porque os filósofos da tradição achavam certos aspectos da gramática refletiam o processo de pensar e isso desfavorecia a descrição desses aspectos (por exemplo, a ordem dos elementos sintáticos no francês refletindo a ordem dos pensamentos), e principalmente por dificuldades técnicas, pois até pouco antes da

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publicação desta obra, não havia recursos para a formulação de processos recursivos, oriundos dos estudos sobre os fundamentos da matemática.

O que é um processo recursivo? Uma regra se aplica a A e o resultado da aplicação dessa regra sobre A permite que a regra se aplique de novo sobre esse resultado – ad infinitum. Por exemplo, para gerar os números naturais, eu preciso de três afirmações, uma delas é uma regra recursiva (ii):

(i) 1 é um número natural (ii) Se x é um número natural, então x + 1 é um número natural (iii) Nada mais é um número natural.

Há vários exemplos nas línguas. Por exemplo, encaixes de relativas: meu tio comprou um gato/meu tio comprou um gato que gostava de presunto/meu tio comprou um gato que gostava de presunto que era fabricado por sua fábrica de embutidos/meu tio comprou um gato que gostava de presunto que era fabricado por sua fábrica de embutidos que ficavam em Barra do Piraí... Na morfologia: Mário marcou um encontro com Maria/ Mário mudou de ideia e desmarcou seu encontro com Maria/Mário mudou de ideia de novo e desdesmarcou seu encontro com Maria...

Voltando... O que é uma gramática gerativa? “[P]or gramática gerativa entendo simplesmente um sistema de regras que, de modo explícito e bem definido, atribui descrições estruturais a frases” (p. 89).

Importante dizer que as regras que supostamente estão representadas na mente dos falantes (o que ele sabe) não precisam ser acessíveis a sua consciência. Muito pelo contrário – é comum que as afirmações acerca do conhecimento linguístico que os falantes fazem não correspondam aos sistemas de regras que fazem parte, com efeito, de seu conhecimento linguístico.

O foco é o conhecimento linguístico, não o modo como os falantes constroem frases. Essas coisas estão no âmbito do desempenho, não da competência, que é o que uma gramática gerativa visa a caracterizar.

Chomsky distingue aceitabilidade de gramaticalidade: aceitabilidade, que tem graus e pode estar atrelada a inúmeras dimensões, é um conceito que pertence ao estudo do desempenho; gramaticalidade também tem graus, mas é um conceito que pertence ao estudo da competência. Ou seja, as escalas de ambos não são as mesmas, e uma coisa pouco aceitável pode ser perfeitamente gramatical (mas o contrário não se verifica).

Como se organiza uma gramática gerativa? Chomsky propõe três componentes: sintaxe, fonologia e semântica. A componente sintática “especifica um conjunto infinito de objetos formais abstratos, cada um dos quais incorpora toda a informação relevante para uma interpretação única duma frase particular” (p. 97)

A componente fonológica determina a forma fonética das frases geradas pela componente sintática. A componente semântica determina a interpretação de uma frase gerada pelas regras da componente sintática. As duas componentes são, portanto, interpretativas.

“Consequentemente, a componente sintática duma gramática deve especificar, para cada frase, uma estrutura profunda que determina a sua interpretação semântica e uma

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estrutura de superfície que determina a sua interpretação fonética. A primeira delas é interpretada pela componente semântica; a segunda, pela componente fonológica” (p. 98).

Base da componente sintática: sistema de regras que gera as sequências de base contendo cada uma uma descrição estrutural – essas sequências são chamadas de Indicadores sintagmáticos de base. Nenhuma ambiguidade é introduzida pela base.

Além da componente de base uma gramática tem uma componente transformacional. Chomsky separa sentenças ou frases nucleares (já vimos isso em Estruturas sintáticas) de indicadores sintagmáticos de base, que são gerados somente pelas regras de base (sem transformações).

Chomsky dá um exemplo interessante de frases que têm a mesma estrutura de superfície mas interpretações distintas, o que sugere terem estruturas profundas distintas:

I persuaded a specialist to examine John ≠ I persuaded John to be examined by a specialist

I expected a specialist to examine John = I expected John to be examined by a specialist

Proposta: estruturas profundas distintas:

I – persuaded – a specialist – a specialist will examine John ≠ I – persuaded – John – a specialist will examine John

I – expected – a specialist will examine John = I – expected – a specialist will examine John.

Outra evidência de que as estruturas são diferentes: I persuaded John that frase; *I expected John that frase.

Uma gramática será descritivamente adequada na medida em que descrever a competência intrínseca do falante-ouvinte ideal.

É interessante pensar em uma teoria da aquisição da linguagem: como as crianças adquirem a língua? A criança é exposta aos dados linguísticos primários, exemplos de desempenho linguístico compostos de frases bem-formadas, exemplos de não-frases, etc. A partir de um número pequeno de dados primários bem-formados a criança adquire a língua e, para tal, deve possuir uma teoria linguística que especifica da gramática duma língua humana possível, e uma estratégia para selecionar uma gramática da forma apropriada que seja compatível com os dados linguísticos primários.

“Na medida em que uma teoria linguística consegue selecionar com êxito uma gramática descritivamente adequada com base nos dados linguísticos primários, podemos dizer que ela satisfaz a condição de adequação explicativa. Isto é, na medida em que alcança este objetivo, oferece uma explicação para a intuição do falante nativo com base numa hipótese empírica acerca da predisposição inata da criança em desenvolver um certo tipo de teoria para tratar as informações que lhe são apresentadas” (p. 108).

A criança possui conhecimento tácito dos universais linguísticos. De que tipos são os universais? Substantivos – por exemplo, traços de uma teoria de traços fonológica, ou algumas categorias gramaticais que encontramos em todas as línguas, como Nomes e Verbos. Formais - condições formais sobre as gramáticas de todas as línguas: por

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exemplo, o fato de a sintaxe de uma língua ter uma componente transformacional, ou o fato de algumas regras na componente fonológica se aplicarem ciclicamente em qualquer língua.

Ainda a respeito da teoria da aprendizagem, Chomsky faz uma discussão fundamental sobre as bases históricas de suas posições, diferenciando os empiristas (que defende que os mecanismos de aquisição se limitam a “determinados mecanismos de processamento periféricos” – além de mecanismos analíticos básicos de dados e princípios indutivos. “Assume-se, então, que se obtém uma análise preliminar da experiência através dos mecanismos de processamento periféricos, e que, para além disso, os conceitos e o conhecimento do indivíduo são adquiridos pela aplicação dos princípios indutivos de que se dispõe sobre a experiência analisada inicialmente” (p. 131)) dos racionalistas (para além dos mecanismos periféricos “existem ideias e princípios inatos de vários tipos que determinam a forma do conhecimento adquirido dum modo que pode ser considerado bastante restritivo e altamente organizado” (p. 131))

Apresentando diversos pontos de vista clássicos racionalistas, Chomsky cita passagens de Descartes, dos gramáticos de Port Royal, de Leibnitz, em que fica clara a posição de que a experiência no máximo deflagra ideias que já estão na mente, não é capaz de produzi-las. Particularmente Humboldt (1836) “conclui que não se pode realmente ensinar uma língua, mas apenas apresentar as condições nas quais ela se desenvolverá de modo espontâneo na mente, com sua especificidade própria. Assim, a forma de uma língua, o esquema para sua gramática, é, numa larga medida, dado, ainda que não se possa pôr em uso sem a experiência apropriada que ponha em funcionamento os processos de formação linguística” (p. 134).

A discussão feita anteriormente, e a teoria apresentada até aqui, que defende a existência de universais formais e substantivos, se enquadram dentro da tradição racionalista. Feitas essas considerações, Chomsky afirma que as teorias de base empirista, particularmente o que ele chama de linguística taxinômica, não tiveram sucesso em explicar aquilo que se conhece a respeito da linguagem; por outro lado, a aproximação transformacional, racionalista, tem tido sucesso nessa empreitada.

Particularmente, há restrições sobre os tipos de regras que se aplicam sobre estruturas linguísticas. Por exemplo, as transformações gramaticais são dependentes de estrutura (ou seja, levam em consideração a categoria à que pertence a sequência submetida à regra). Coisas como o sequenciamento linear não são levados em consideração. Isso quer dizer que, independente da complexidade de determinada sequência sob uma categoria, se uma regra de aplica sobre aquela categoria, tudo ou parte do que estiver ali será afetado pela regra, independentemente do tamanho dessa sequência – exemplo mais famoso: inversão do auxiliar em inglês. “Contudo, é impossível formular como uma transformação uma operação tão simples como a reflexão em espelho de uma sequência arbitrária (...), ou a inversão da palavra que ocupa o lugar (2n – 1) com a palavra que ocupa o lugar 2n ao longo de uma cadeia de comprimento arbitrário, ou ainda a inserção de um símbolo no meio de uma sequência de comprimento par” (p. 139). Ou seja, há restrições sobre a forma das regras transformacionais, e essas restrições são dadas, o que favorece, segundo Chomsky, a abordagem racionalista.

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2) Categorias e relações na teoria da sintaxe

Informações relevantes que qualquer gramática tradicional bem-feita pode oferecer, ainda que usando um outro vocabulário, para uma frase como sincerity may frighten the boy.

(i) A sequência é uma frase; frighten the boy é um SV, com o núcleo verbal frighten e um objeto direto the boy, que é um SN; o SN é formado por um Determinante (Det) e um nome comum N; etc.

(ii) O SN sincerity funciona como sujeito da frase e SV é o predicado; o SN the boy é o objeto direto de SV; etc.

(iii) O N boy é um nome numerável em oposição a nomes massivos como butter e a nomes abstratos como sincerity, um nome comum em oposição a nomes próprios ou pronomes; etc. O verbo frighten é um verbo transitivo em oposição a intransitivos, admite aspecto progressivo em oposição a verbos de estado, admite sujeitos abstratos e objetos humanos, etc.

Em (i) temos uma subdivisão das sequências em subsequências contínuas, que pode ser representada por:

F 9

SN Aux SV | | |p N M V SN | | | 3 Sincerity may frighten Det N | | the boy

Isto é um indicador sintagmático de base da sentença. Envolve formativos (the, boy, etc.) e símbolos categoriais (F, SN, V, etc.). Os formativos se subdividem em itens lexicais, como sincerity, boy, etc., e itens gramaticais, como perfeito, possessivo, the etc.

Pressuposto: os formativos lexicais e os símbolos categoriais são selecionados a partir de um vocabulário universal determinado (como na teoria dos traços fonéticos). Portanto, não são meros elementos mnemônicos de uma teoria específica.

Os indicadores como a árvore acima são gerados por regras de reescrita. Uma regra de reescritura ou reescrita tem a forma A→Z/X_Y. Essas regras também inclui a inserção dos formativos ao final da derivação do indicador sintagmático.

“A um conjunto não ordenado de regras de reescrita, suscetível de se aplicar de maneira aqui imprecisamente descrita (...) damos o nome de gramática de estrutura de constituintes (ou gramática de estrutura sintagmática). A gramática designar-se-á, além disso, independente do contexto (ou simples) se em cada uma das regras da forma [A→Z/X_Y], X e Y forem nulos, de modo que as regras se aplicarão independentemente do contexto” (p.151). Ou seja, uma gramática não-transformacional, pois as regras transformacionais levam necessariamente em conta o contexto (e não têm necessariamente o formato A→Z/X_Y). Esse tipo de regra está implícito nas gramáticas

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estruturalistas (ou taxinômicas), e já vimos uma discussão sobre suas limitações nas aulas sobre Estruturas Sintáticas.

Para gerar a árvore acima, Chomsky propõe que o sistema envolva uma sequência de aplicação para as regras sintagmáticas. Teríamos então algo como:

(1i) F → SN⁀Aux⁀SV SV → V⁀SN SN → Det⁀N Det → the Aux → M (1ii) M → may N → sincerity Regras que introduzem formativos lexicais N → boy V → frighten

Com relação às funções sintáticas listadas em (ii) acima, Chomsky ressalta que já estão representadas relações sintagmáticas representadas nas estruturas sintagmáticas, e propor regras para representar essas funções que são relacionais complicaria em demasia o sistema, sem que houvesse nenhum ganho. Ou seja, as funções gramaticais não têm função na nossa história.

Com relação a (iii), Chomsky faz, principalmente, a seguinte afirmação: a componente semântica de uma gramática gerativa é puramente interpretativa. “Resulta daí que toda a informação utilizada pela interpretação semântica deverá ser apresentada pela componente sintática da gramática” (p. 160). Chomsky de fato está considerando aberrações como the boy may frighten sincerity ou the boy elapsed (e não coisas pragmaticamente anômalas como eu sabia que você viria, mas me enganei). Se quisermos colocar isso na conta da sintaxe, temos que pensar que a sintaxe precisa operar com restrições de seleção que levam em consideração conceitos como o de animado, abstrato, etc. A posição dele: “De momento, aceitarei a posição (...) em que se considera que a noção ‘escala de gramaticalidade’ é pertinente para a interpretação semântica, que [the boy may frighten sincerity e sincerity may frighten the boy] devem ser distinguidos por regras da componente sintática, e que às frases [the boy may frighten sincerity ou the boy elapsed] só serão atribuídos Indicadores sintagmáticos se houver afrouxamento de certas condições Sintáticas” (p. 165). Ou seja, haverá restrições sintáticas (contextuais) para a inserção de determinados formativos lexicais em determinados contextos sintáticos.

A solução para a representação dessas restrições usará matrizes de traços que serão discutidas mais adiante. A regras de reescrita no modelo tradicional não são viáveis para a representação dessas restrições – é preciso que as regras de reescrita para a inserção lexical envolvam matrizes de traços (como, por exemplo, [±animado], [±comum] etc.).

Como é então a componente de base? “[p]ara além das regras de reescrita que se aplicam aos símbolos categoriais e que geralmente implicam ramificação, haverá regras de reescrita (...) que se aplicam aos símbolos das categorias lexicais e que introduzem ou

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operam com símbolos complexos (conjuntos de traços sintáticos especificados). A gramática assim deixará de conter regras como as de [(1ii)], que introduzem os formativos pertencentes a categorias lexicais. Em vez dessas regras, a base da gramática conterá um léxico, que é simplesmente uma lista não ordenada de todos os formativos lexicais. Mais rigorosamente, o léxico será um conjunto de entradas lexicais, compreendendo-se por entrada lexical um par (D, C), em que D é uma matriz de traços fonológicos (...) e C é uma coleção de traços sintáticos especificados (um símbolo complexo)” (p.170).

A ideia é que as sequências pré-terminais contenham símbolos complexos Q com traços e que os itens lexicais só possam substituir Q se seus Cs forem não-distintos de Q.

Como é uma gramática deste tipo? Terá regras como (1i) acima, mais as regras (2) e um léxico como em (3):

(1i) F → SN⁀Aux⁀SV SV → V⁀SN SN → Det⁀N Det → the Aux → M

(2) (i) N → [+N, ±comum] (ii) [+comum] → [±numerável]

(iii) [+numerável] → [±animado] (iv) [-comum] → [±animado] (v) [+animado] → [±humano] (vi) [-numerável] → [±abstrato]

(3) (sincerity, [+N, -numerável, +abstrato]) (boy, [+N, +numerável, +comum, +animado, +humano]) (may, [+M])

Observação importante: o sistema não tem mais as regras de reescrita de itens lexicais, como as que estão listadas em (1ii). Isso simplifica o sistema de regras, pois idiossincrasias lexicais não mais precisam estar expressas nas regras de base – de fato, são irrelevantes para elas.

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As entradas lexicais conterão sua matriz fonológica (a parte não previsível por regras), propriedades que são pertinentes à componente transformacional (por exemplo, uma marcação em alguns verbos que permitem o apagamento do objeto, como ocorre com comer), propriedades pertinentes à interpretação (definição do dicionário), traços que determinam as posições em que determinado ocorrem numa sequência pré-terminal.

A teoria esboçada aqui sugere que a base não tem mais somente as propriedades de uma gramática sintagmática: não só as regras de reescrita são ordenadas, como a inserção dos itens lexicais se dá por regras quase transformacionais (pois as regras de inserção se aplicam a símbolos complexos, não a um único símbolo – lembre-se de que as regras de reescritura aplicam-se sobre somente um símbolo e o reescrevem em uma sequência de símbolos). Quando incluímos os símbolos complexos que permitem a inserção do verbo, o indicador sintagmático da frase sincerity may frighten the boy pode ser representado pela árvore a seguir.

Sobre os tipos de regras de base:

Regras de ramificação são regras na forma A → Z/X_Y onde nem A nem Z são símbolos complexos (arranjos de traços como os que vemos em alguns nós terminais da árvore acima). Regras de subcategorização introduzem traços sintáticos e criam símbolos complexos, como as regras em (2) acima. Esses dois tipos de regras podem ser independentes de contexto, quando X e Y são nulos, ou dependentes de contexto, no caso

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contrário. As regras de subcategorização se dividem em regras de subcategorização estrita e regras de seleção.

Mais adiante, Chomsky sugere que as regras de subcategorização deixem de ser regras de reescrita da componente categorial e passem a ser regras lexicais: ou de redundância lexical (no caso das não dependentes de contexto, como (2)) ou regras em que o contexto de inserção fica descrito na entrada lexical, como parte de suas propriedades sintáticas, ou seja, parte do conjunto de traços C do par (D, C). Temos então um tipo de regra transformacional que ocorre sobre os símbolos pré-terminais que possibilita a inserção desses formativos – ou seja, nessa proposta, os um tipo de regra transformacional serve à inserção dos itens nas estruturas sintagmáticas geradas pelas regras da componente categorial ainda na estrutura profunda. A implementação requer que uma regra de reescrita converta uma categoria pré-terminal A em um símbolo postiço Δ, e uma transformação de substituição substituirá o símbolo postiço pelo item lexical (D, C).

“Assim, a componente categorial poderá muito bem ser uma gramática de estrutura de constituintes independente do contexto (...), com um vocabulário terminal reduzido (quer dizer, com todos os itens lexicais projetados no símbolo único Δ). O léxico consistirá em entradas associadas com outras transformações de substituição que introduzem os itens lexicais em sequências geradas pela componente categorial. Todas as restrições contextuais na base serão compreendidas por estas regras transformacional do léxico. A função da componente categorial consiste em definir o sistema das relações gramaticais e em determinar a ordenação dos elementos nas estruturas profundas” (p. 211).

As regras da componente categorial da base têm duas funções: definem o sistema das relações gramaticais e a ordem dos elementos nas estruturas profundas. A primeira função é provavelmente universal; a segunda, provavelmente não. Há quem defenda que as regras da componente categorial não sejam da forma A → B⁀C, onde a ordem está definida, mas da forma A → {B, C}. Chomsky critica essa proposta; particularmente a ideia de que as regras de reescrita não produzem ordem coloca problemas para as formulações de inúmeras regras transformacionais, que operam sobre a ordem dos elementos gerados pelas regras da componente de base.

3) Estruturas profundas e transformações

“A base gerará (...) Indicadores Sintagmáticos de base. No número 1 do capítulo 1, definimos o substrato de uma frase como a sucessão dos Indicadores Sintagmáticos de base que lhe estão subjacentes. O substrato de uma frase é posto em correspondência com essa frase mediante regras transformacionais que, além disso, atribuem automaticamente à frase um Indicador Sintagmático derivado (e finalmente uma estrutura de superfície) neste processo” (p. 217).

Exemplo: the man who persuaded John to be examined by a specialist was fired.

A componente de base gera três Indicadores Sintagmáticos, apresentados abaixo:

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Transformações se aplicam na seguinte ordem: (3) sofre a transformação passiva (Tp); uma transformação generalizada de substituição (TE) insere (3) em F’ de (2), produzindo: “the man persuaded John of Δ John nom be examined by a specialist”. A este indicador, aplica-se uma transformação de apagamento do SN repetido (TA), e, em seguida, a transformação que substitui “of Δ John” por “to” (Tto), produzindo “the man persuaded John to be examined by a specialist”. Este Indicador é então encaixado por meio de uma transformação generalizada de substituição na posição F’ de (1). Ao Indicador gerado pela última transformação aplica-se a transformação relativa, “que permuta a frase encaixada com o N seguinte e substitui o sintagma repetido “the man” por “who” de onde resulta um Indicador Sintagmático para “Δ fired the man who persuaded John to be examined by a specialist by passiva” (...)”. A este último se aplica a transformação de apagamento do agente (TAA), que gera a forma superficial da frase acima.

O diagrama abaixo (p. 220) é uma representação informal (não completa, porque o que foi descrito acima omite diversas transformações) do Indicador Transformacional da frase do exemplo.

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“Uma estrutura profunda de um enunciado é integralmente dada pelo seu Indicador Transformacional, que contém o seu substrato. A estrutura de superfície da frase é o Indicador Sintagmático derivado, resultante das operações representadas no Indicador Transformacional. O substrato da frase é a sucessão de Indicadores Sintagmáticos de base que constituem os pontos terminais do diagrama em árvore (...)” (p. 221).

A teoria que está sendo desenvolvida neste livro segue as linhas gerais do que vimos acima? Não. Chomsky defende que a teoria deve ser mais restritiva do que o que vimos.

Chomsky cita Katz e Postal (1964), que defendem que a componente semântica do sistema pode ser simplificada se não tiver que interpretar todos os aspectos do Indicador Transformacional. Além do mais, o sistema como era permitia inúmeras ordenações de transformações que não eram observadas.

A proposta: eliminar completamente a noção de transformação generalizada e de Indicador Transformacional. Assim, no exemplo acima, as transformações que introduziam Indicadores nas posições F’ (transformações generalizadas de substituição) serão eliminadas da teoria, e as próprias regras de base vão gerar estruturas encaixadas. Qual é a ideia? No lugar dos F’ que encontramos em (1)-(3) acima, haverá #F#, os quais serão reescritos por regras sintagmáticas. Ou seja, dentro de (1) haverá um #F# que terá a estrutura de constituintes de (2), o qual, por sua vez terá #F# que terá a estrutura de constituintes de (3). Em cima desse Indicador Sintagmático (chamado de Generalizado) as transformações (singulares) se aplicam para gerar a forma superficial, mas aplicam-se do mais encaixado para o menos encaixado – ou seja, começam a aplicar-se sobre (3), e assim por diante, antes de cada uma dessas sentenças ser encaixada. Ao contrário do que ocorria antes, agora o encaixe se dá na base, não na componente transformacional – ou seja, a recursividade está agora na base, não mais na componente transformacional.

O Indicador Sintagmático generalizado será a estrutura profunda da sentença, gerada pela base, contendo a informação que é pertinente para a interpretação semântica. A estrutura de superfície será o resultado da aplicação das transformações singulares à estrutura profunda, e será interpretada pela componente fonética. “A finalidade última da uma gramática consiste, assim, em estabelecer uma relação entre uma interpretação semântica e uma representação fonética – isto é, em dizer como é que se interpreta a frase. Essa relação é mediada pela componente sintática da gramática, que constitui a sua única parte ‘criativa’” (p 225).

O desenho do sistema pode ser visualizado pelo esquema abaixo:

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Léxico Regras de estrutura de constituinte

BASE Estrutura profunda Interpretação

Regras transformacionais→

Estrutura superficial Fonologia

O sistema permite que a componente base gere Indicadores Sintagmáticos sobre os quais não possam ser aplicadas transformações. Tais Indicadores não serão estruturas profundas de uma frase qualquer – ou seja, a componente transformacional filtra os Indicadores Sintagmáticos que não podem ser estruturas profundas (o exemplo que Chomsky dá é um em que o Indicador (2) tem o SN “the boy”, não “the man”; nesse caso, transformação relativa não pode se aplicar, pois o apagamento de “the boy” não seria recuperável, e o Indicador generalizado não pode gerar uma estrutura de superfície).

A teoria parece absurda se for entendida como uma teoria de desempenho: como podemos primeiro formar estruturas sintagmáticas vazias, depois inserir os itens em símbolos postiços e depois verificar se o que fizemos é filtrado ou não pela componente transformacional? Na verdade, o absurdo está em achar que estamos desenvolvendo uma teoria de desempenho – ou seja, uma teoria de como construímos ou interpretamos frases. A verdade é que o que estamos propondo é uma teoria do conhecimento linguístico do falante – do que ele sabe, não do que ele faz.

4) Alguns problemas residuais

Chomsky começa separando problemas de subcategorização estrita (John elapsed that Bill will come) de problemas de seleção (colorless green ideas sleep furiously, the boy may frighten sicerity, etc.). “(…) o tipo de desvio ilustrado em [(John elapsed that Bill will come)] é muito diferente daquele ilustrado em [(the boy may frighten sicerity)]. As frases que violam regras de seleção podem ser interpretadas muitas vezes metaforicamente (...) ou alusivamente, de um modo ou de outro, se for fornecido um contexto apropriado de maior ou menor complexidade. (...) É evidente que seria

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necessário proceder de um modo inteiramente diferente se fôssemos forçados a atribuir uma interpretação a frases que violam regras de subcategorização estrita, por exemplo, as frases [como (John elapsed that Bill will come)]” (p. 241). A gramática apresentada aqui formaliza essa diferença.

O autor dá alguns exemplos, entretanto, de desvios mais severos de gramaticalidade envolvendo violação de regras de seleção (who you met is John, a very walking person appeared, etc.), e conclui que traços como [Humano], [Abstrato], etc., têm um papel na componente sintática. Haverá, portanto, uma hierarquia que impõe graus de agramaticalidade para uma sentença a depender do que é violado. Por exemplo, o formativo frighten tem associado o símbolo complexo [+V, + _NP, + [+Abstrato]..._...[+Animado]]. A ordem dos traços indica uma hierarquia de violações, do mais severo para o menos severo: o desvio será maior se o item inserido no lugar de frighten não for um verbo, um pouco menor se não for um verbo transitivo, menor ainda se não for um verbo com as seleções apontadas, etc. Isso explica os graus de desvio nas frases: sincerity may virtue the boy, sincerity may elapse the boy, sincerity may admire the boy.

Mais adiante, Chomsky conjectura sobre a componente semântica, aventando a hipótese de que ela é mais do que uma lista (pois o sistema de definições não é tão atomístico quanto parece), mas apresenta uma estrutura, com elementos universais. Menciona o que ele chama de propriedades de campos, que tomam grupos de itens. Por exemplo, o conjunto das cores, que se excluem mutuamente (como se fossem antônimos), e a relação “ter um”, como em “o homem tem um braço”, “o braço tem um dedo” e “o dedo tem uma unha”, mas não “o braço tem um homem”, “o dedo tem um braço” e “a unha tem um dedo”. Essas coisas não podem ser descritas de modo natural num quadro que pressupõe entradas lexicais independentes. Além disso, as transformações que dão conta de coisas como a relação entre “John is easy for us to please” e “it is easy for us to please John” não conseguem dar conta de relação entre, por exemplo, “John strikes me as pompous” e “I regard John as pompous”. Na transformação o objeto lógico de “please” se torna o sujeito gramatical da frase via uma transformação; no segundo caso, isso não é possível – parece haver uma noção mais abstrata, a de função semântica, para além de objeto ou sujeito gramatical e objeto ou sujeito lógico, que relaciona os elementos do par “I” e “me”, mas envolvendo verbos distintos.

Voltando à noção de léxico que vínhamos desenvolvendo, e deixando de lado os problemas mais espinhosos que se apresentam no parágrafo anterior, temos o léxico como uma lista de entradas lexicais consistindo numa matriz de traços distintivos D e um símbolo complexo C (em C temos “traços sintáticos e semânticos, traços que especificam quais os processos morfológicos ou transformacionais que se aplicam sobre as sequências contendo os itens em questão, traços que tornam certos itens isentos da aplicação de determinadas regras fonológicas, etc.” (p. 257).)

Como se dá a inserção dos itens neste cenário? Os indicadores sintagmáticos trazem símbolos complexos Q, desenvolvidos por regras de reescrita (isso quer dizer que a proposta adotada é a do diagrama da página 197 escaneada acima). O C do item lexical que será inserido ali é não-distinto de Q.

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Para simplificar as entradas lexicais, Chomsky propõe redundâncias levando em conta determinadas hierarquias. Por exemplo, se um item é [+Humano], e esse traço está hierarquicamente mais baixo em relação ao traço [+N], então a entrada que contenha [+Humano] não precisa especificar o traço [+N]. Assim, um nome como “boy” teria a seguinte entrada: (boy, [+Comum, +Humano, +Numerável, ...]), e essa matriz pode ser substituída por uma matriz enriquecida com o traço redundante no contexto pertinente. Esse tipo de redundância é universal, mas existem redundâncias específicas, como o fato de que todos os verbos ingleses que podem ocorrer com um objeto direto seguido de um advérbio de modo podem ocorrer apenas com o objeto direto, embora o inverso não seja verdadeiro. Assim, verbos que são especificados com traço [+_SN⁀Modo], também o serão como [+_SN] (ou seja, temos a redundância [+_SN⁀Modo] → [+_SN]), mas não é o caso de verbos com o traço [+_SN] serem necessariamente especificados com o traço [+_SN⁀Modo], como os verbos “resemble” e “cost”. Essas regras de redundância são chamadas de regras de redundância sintática.

Sobre processos flexionais: Chomsky começa mostrando que o sistema de traços descrito acima é compatível com a tradição de análise baseada em paradigmas. Depois afirma que a análise morfêmica, do tipo item e arranjo, é inadequada para uma gramática baseada em regras de reescrita e transformacionais, pois teria que especificar inúmeras regras contextualmente dependentes para gerar zeros morfológicos nas sequências de morfemas de várias palavras. Outro argumento a favor da abordagem baseada em paradigmas é a natureza supletiva dos sistemas flexionais.

Se o sistema paradigmático é o correto, temos que assumir que regras transformacionais podem enriquecer as matrizes de traços dos itens. Assim, por exemplo, a matriz de um artigo em português teria que ser enriquecida, por uma regra transformacional (aplicada depois de outras tantas regras transformacionais), com traços de gênero e número; já a matriz de um artigo em alemão teria que ser enriquecida com gênero, número e Caso. A matriz enriquecida seria convertida na forma fonológica correspondente.