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ORGANIZAÇÃO DA JUSTIÇA E DO MINISTéRIO PúBLICO PRODUZIDO POR: CARLOS ROBERTO DE C. JATAHY E ANABELLE MACEDO SILVA ROTEIRO DE CURSO 2008.1 4ª EDIçãO

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  • ORGANIZAO dA justIAe dO mINIstRIO pblIcO

    produzido por: Carlos roberto de C. Jatahy e anabelle MaCedo silva

    ROTEIRO DE CURSO2008.1

    4 edio

  • SumrioOrganizao da justia e do ministrio pblico

    InTRODUO aO CURSO DE ORganIzaO Da JUSTIa E DO MInISTRIO PblICO .............................................................................4aUlaS 1 E 2: O PODER JUDICIRIO bRaSIlEIRO. a ORganIzaO JUDICIRIa. a MagISTRaTURa naCIOnal. O COnSElHO naCIOnal DE JUSTIa. ................................................................................................................................................6 1. O Poder Judicirio brasileiro ...................................................................................................... 6 2. A organizao judiciria ............................................................................................................. 7 3. A Magistratura nacional ............................................................................................................. 9 4. A independncia do Poder Judicirio e suas garantias ............................................................... 12 5. O Conselho Nacional de Justia ............................................................................................... 18

    aUla 3: SUPREMO TRIbUnal FEDERal .......................................................................................................................................... 33 1. Introduo .............................................................................................................................. 33 2. Organizao ............................................................................................................................. 33 3. Competncia............................................................................................................................ 36 4.Smula Vinculante .................................................................................................................... 45 5. Smula impeditiva de recurso .................................................................................................. 49

    aUlaS 4 E 5: O SUPERIOR TRIbUnal DE JUSTIa E a JUSTIa FEDERal ............................................................................................. 51 1. O Superior Tribunal de Justia ................................................................................................. 51 2. Composio ............................................................................................................................. 51 3. Organizao ............................................................................................................................. 54 4. Competncia............................................................................................................................ 56 5. Justia Federal .......................................................................................................................... 59 6. Tribunais Regionais Federais .................................................................................................... 62 7. Juizados Especiais Federais ....................................................................................................... 64 8. Federalizao dos crimes contra os direitos humanos e incidente de deslocamento de competncia .. 65

    aUla 6 E 7 - a JUSTIa COMUM ESTaDUal ...................................................................................................................................... 68 Estrutura do Poder Judicirio estadual. ......................................................................................... 68 Quinto constitucional .................................................................................................................. 71 Primeiro grau de jurisdio .......................................................................................................... 73

    aUla 8: JUSTIaS ESPECIaIS InDIVIDUalIzaDaS ............................................................................................................................ 79 1. Justia Militar .......................................................................................................................... 79 2. Justia do Trabalho ................................................................................................................... 87 3. Justia Eleitoral ........................................................................................................................ 94

    aUla 9, 10 E 11: O MInISTRIO PblICO bRaSIlEIRO...................................................................................................................... 98 1. Introduo ............................................................................................................................... 98 2. Princpios institucionais ........................................................................................................... 98 Competncias e principais atribuies constitucionais ............................................................... 101 Conselho Nacional do Ministrio Pblico .................................................................................. 104 Estatuto funcional do Ministrio Pblico .................................................................................. 106 A estrutura legislativa e organizacional do Ministrio Pblico .................................................... 111 A atuao do Ministrio Pblico na defesa dos interesses transindividuais .................................. 116 A investigao direta pelo Ministrio Pblico ............................................................................. 119

  • aUla 12 a POlCIa FEDERal ..................................................................................................................................................... 124 A Polcia Federal ........................................................................................................................ 124 Concluso .................................................................................................................................. 133

    aUla 13 aDVOCaCIa, DEFEnSORIa PblICa E aDVOCaCIa PblICa ........................................................................................... 135 Advocacia ................................................................................................................................... 135 Advocacia Pblica ...................................................................................................................... 138 Defensoria Pblica ..................................................................................................................... 142

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    ORGanIzaO Da jusTIa E DO mInIsTRIO pblIcO

    INtROduO AO cuRsO de ORGANIZAO dA justIA e dO mINIstRIO pblIcO

    A Constituio da Repblica Federativa do Brasil de 1988, visando evitar o arbtrio e o desrespeito aos direitos fundamentais do homem, previu a existncia dos poderes consti-tudos do Estado e da instituio do Ministrio Pblico, independentes e harmnicos entre si, repartindo entre eles as funes estatais e prevendo prerrogativas e imunidades para que bem pudessem exerc-las, assim como criando mecanismos de controles recprocos, sempre como garantia da perpetuidade do Estado Democrtico de Direito.

    a clebre Separao de Poderes, esboada pela primeira vez por Aristteles na obra Poltica, detalhada, posteriormente, por John Locke, no Segundo Tratado do Governo civil e, finalmente, consagrada por Montesquieu no O Esprito das Leis.

    no estudo de algumas dessas instituies que iremos nos ater neste semestre que se inicia.

    O curso de Organizao da Justia e do Ministrio Pblico tem como objeto o exame da estrutura constitucional e infraconstitucional das instituies que integram o Sis-tema da Justia Brasileira, ou seja:

    Poder Judicirio; Ministrio Pblico; e as demais Instituies constitucionalmente incumbidas das funes essenciais Jus-

    tia, que so: Advocacia Pblica, Advocacia e a Defensoria Pblica.

    O Poder Judicirio um dos Trs Poderes clssicos previstos na Constituio (Art. 2), e que tem como funo a administrao da Justia e como verdadeiro mister a guarda da Constituio.

    No se consegue conceituar um Estado Democrtico de Direito sem a existncia de um Poder Judicirio, autnomo e independente, para o pleno exerccio de suas funes. Da as garantias que seus membros gozam, asseguradas pela prpria Constituio, como a vitaliciedade, a inamovibilidade e a irredutibilidade de subsdios.

    J o Ministrio Pblico, consagrado em nossa Constituio e situado fora da estru-tura dos demais poderes da Repblica, instituio permanente, essencial funo juris-dicional do Estado, incumbindo-lhe a defesa da ordem jurdica, do regime democrtico de Direito e dos interesses sociais e individuais indisponveis (Artigo 127 da CF). Para tanto, tambm lhe foi conferida uma estrutura organizacional prpria, com autonomia, indepen-dncia e garantias.

    A Advocacia Pblica, inovao da Constituio de 1988, instituio que, direta-mente ou por intermdio de rgo vinculado, representa a Unio, os Estados e os Munic-pios, judicial e extrajudicialmente, cabendo-lhe as atividades de consultoria e assessoramen-to jurdico do Poder Executivo.

    A advocacia uma funo essencial justia, que visa garantia das liberdades e ao cumprimento da ordem jurdica vigente, solucionando conflitos com base em normas e princpios jurdicos pr-estabelecidos, atravs da mediao, ou por postulao perante os rgos administrativos ou jurisdicionais, sendo privativa de bacharel em cincias jurdicas,

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    atendidas as demais qualificaes exigidas em lei, que a desempenha com mnus pblico em atendimento a ministrio conferido pela Constituio Federal1.

    Por fim, a Defensoria Pblica, prevista na Constituio Federal como instituio essencial funo jurisdicional do Estado, est incumbida da orientao jurdica e a defesa em todos os graus, gratuitamente, dos necessitados.

    Este o panorama a ser vislumbrado. O curso foi montado com base na constatao de que um bom profissional do direito

    necessariamente precisa conhecer as instituies estatais que integram o sistema de Justia, a forma como operam, que funes institucionais desempenham e que competncias lhes foram atribudas pelo constituinte e pelo legislador.

    S assim, tendo o domnio desses conceitos tcnicos, o futuro profissional poder ma-ximizar a utilizao do sistema em todas as suas instncias, formando opinio e pensamento crtico para o aprimoramento e transformao das estruturas examinadas.

    Procura-se, por meio da utilizao de diferentes metodologias, uma abordagem anal-tica e uma viso crtica como elementos permeadores de todo o curso. O objetivo a intera-tividade dos alunos com o contedo apresentado e o carter cooperativo que deve propiciar uma aproximao maior entre alunos e professor.

    Como o programa incorpora contedos dos mais variados, como cincia poltica, di-reito constitucional, direito administrativo, teoria geral do processo e organizao judici-ria, algumas aulas sero mais expositivas enquanto outras sero mais abertas a discusses. Em todos os momentos, porm, iremos adotar uma postura de incentivo ao aluno no esta-belecimento de links com assuntos correlatos.

    Durante todo o curso, casos prticos sero apresentados aos alunos, como forma de aproximar a teoria estudada com a realidade social em que vivemos, mediante debates, construes ideolgicas e soluo dos mesmos.

    A Cincia do Direito, apesar de estudada de forma estratificada, requer uma viso global para ser potencialmente compreendida. O que se idealiza uma interdisciplinaridade entre todos os ramos do Direito.

    Durante o semestre, os alunos sero avaliados de acordo com os seguintes critrios:

    dois testes aplicados em sala de aula, abordando toda a matria do curso, um na metade e o outro ao final do semestre; e

    Programa Conhecendo as Instituies, que poder acrescer at um ponto nota final do semestre. Este programa de atividades complementares prope a realizao de visitas a algumas instituies que compem a Sistema da Justia em nosso Es-tado (Ministrio Pblico, Judicirio, Defensoria Pblica ou Procuradoria Geral do Estado), como instrumento de fixao e observao concreta do funcionamento das estruturas estudadas.

    Passemos, pois, ao contedo programtico do nosso curso!Sejam bem vindos e encarem com prazer o desafio de conhecer a estrutura do Poder

    Judicirio e demais instituies essenciais Justia!

    1 DVIla, Thiago cssio. Conceito e caractersticas da advocacia. Disponvel em jus2.uol.com.br. acesso em 07 de dezembro de 2007.

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    AulAs 1 e 2: O pOdeR judIcIRIO bRAsIleIRO. A ORGANIZAO judIcI-RIA. A mAGIstRAtuRA NAcIONAl. O cONselHO NAcIONAl de justIA.

    1. O PODER JUDICIRIO BRASILEIRO

    Historicamente, o Poder Judicirio, apesar de estar no mesmo plano dos demais po-deres, sempre teve uma menor participao nas decises do Estado, em comparao com o Executivo e o Legislativo. Isto porque, em muitos Estados da velha Europa, os juzes eram meros servos da nobreza, atuando como longa manus do soberano. Subordinado, no podia se desenvolver a contento.

    A instaurao do Estado de Direito (Estado Liberal, Constitucional) fez surgir a pri-meira gerao de direitos (direitos de liberdade, direitos civis e polticos), fazendo nascer tambm a linguagem jurdica. Esta, por conter termos rebuscados e imprecisos (como, por exemplo, boa f e mulher honesta), provocou um distanciamento entre o Judicirio e o povo, intermediado pelos advogados, que falavam a linguagem acessvel aos magistrados.

    Acrescente-se ainda que no Estado liberal e absentesta, as questes eram relativas s demandas individuais, em que somente se discutiam interesses particulares. No havia repercusso social nas decises do Judicirio, mas j havia uma maior participao do Judi-cirio nas questes diuturnas.

    Com a instituio do Estado Social, em que o Estado passou a ser prestador de obriga-es (direitos sociais), criando direitos que deveriam ser providos, a inrcia do Estado obri-gava o indivduo a buscar a soluo de seus conflitos no Judicirio. Decorre da o aumento da demanda judicial e um conflito entre os poderes.

    De fato, vamos assistir a conflitos entre o Executivo e o Judicirio na grande depresso americana (quando a Suprema Corte quis interferir nas aes do presidente Roosevelt) e na criao da Justia Constitucional, quando o Judicirio interfere na deciso do Parlamento, considerando uma lei inconstitucional.

    A par disto, vamos ver a sociedade industrial criar um novo tipo de conflito. O conflito meta-individual ou transindividual, com um nmero muito grande de interessados na sua soluo: as denominadas class actions. O Judicirio sai de uma posio secundria e subal-terna para uma situao de protagonista, sendo capaz de produzir conseqncias profundas nas relaes sociais, polticas e do cotidiano. O juiz, antes inerte, passa a adotar uma postura mais ativa, podendo, por exemplo, paralisar a construo de uma estrada que est afetando o equilbrio ecolgico em uma determinada regio; obrigando o Estado ao fornecimento de medicamentos bsicos aos hiposuficientes; determinando a Administrao Pblica a contra-tar mdicos e professores, visando a plena implementao de polticas sociais.

    No Estado Democrtico de direito hoje existente, em que o Estado, o direito e a sociedade assumem um compromisso com a Constituio, o Judicirio passa a ter uma importncia maior, diante de seu maior ativismo judicial.

    Conseqentemente, surge a necessidade de um maior controle sobre o Gigante ador-mecido. Afinal, controle faz parte da teoria dos checks and balances.

    A Constituio Brasileira de 1988, seguindo esta tendncia mundial dos pases demo-crticos, conferiu ao Poder Judicirio lugar de destaque, confiando-lhe a tutela de direitos subjetivos at mesmo contra o Poder Pblico e a funo de efetivar os direitos e garantias individuais, abstratamente inscritos em seu texto.

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    O Poder Judicirio, consoante o artigo 2 da CF, possui a funo precpua de julgar os conflitos de interesse que surgem na sociedade, fazendo aplicar a Lei e o Direito ao caso concreto. Deve, portanto, manter a paz social, impondo aos cidados o cumprimento das leis do pas, intervindo, quando provocado nos litgios existentes e solucionando os confli-tos de interesse.

    E como feita essa pacificao? Mediante a atuao da vontade do direito objetivo que rege o caso concreto. Assim, duas pessoas em conflito num processo judicial tero seus problemas solucionados por meio da aplicao da lei ao caso concreto. o juiz exercendo a jurisdio.

    Ressalve-se que a jurisdio una. Como expresso do poder estatal, ela eminen-temente nacional e no comporta divises. Porm, para uma distribuio racional do tra-balho, importante que se criem organismos distintos, para os quais sero destinadas de-terminadas espcies de causas. So diversos os critrios determinantes na distribuio dos processos: em razo da matria, da qualidade da pessoa etc. o Estado, fazendo a diviso das Justias, com vistas melhor atuao da funo jurisdicional. Trata-se da denominada ORGANIZAO JUDICIRIA.

    2. A ORGANIZAO JUDICIRIA

    Com efeito, a Organizao Judiciria tem como objetivo estabelecer normas sobre a constituio dos rgos encarregados do exerccio da jurisdio. Para anlise da matria, deve-se partir de trs premissas bsicas:

    (a) A estrutura judiciria brasileira definida basicamente pela Constituio, sendo o Captulo III (Arts. 92 a 126) do ttulo IV (Da Organizao dos Poderes) da Carta Maior o texto bsico para a compreenso e estudo do tema;

    (b) O Poder Judicirio brasileiro , em razo da forma de Estado federativo adotado pelo texto constitucional, dual. Com tal modelo, haver um ramo da Justia que administrado e mantido pela Unio e outro ramo administrado pelos Estados-mem-bros da Federao brasileira; e

    (c) A noo de que a ordem judiciria constitucional se estabelece em graus de jurisdio.

    De fato, a primeira premissa denota que para se conhecer a estrutura do Poder Judi-cirio brasileiro deve-se conhecer a Constituio Federal. Esta constatao conseqncia da garantia do Juiz Natural, tambm conhecida como Princpio da naturalidade do Juzo (HC 73.801-MG, Celso Mello, DJU 27.06.1997), positivada no texto constitucional no Artigo 5, LIII (Ningum ser processado nem sentenciado seno pela autoridade competen-te.). Esta expresso significa que o juiz natural ou a autoridade competente, no Brasil, o rgo jurisdicional cujo poder derive de fontes constitucionais, de competncia devidamen-te indicada pela Constituio Federal.

    Assim, s legtimo o juzo previsto pela Constituio e reconhecido por ela como natural, invalidando-se, em razo deste princpio, qualquer rgo jurisdicional criado margem da Carta Magna, tambm chamado de juzo de exceo (Art. 5, XXXVII, da CF: No haver Juzo ou Tribunal de exceo). Nesta dimenso, o Artigo 92 da Constituio estabelece a estrutura do Poder Judicirio brasileiro, integrado por diversos rgos, repu-

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    diando todos aqueles que ali no se encontrem como integrantes do Poder Judicirio, ainda que recebam a denominao de juiz ou tribunal. Logo, no integram esta estrutura e, por-tanto, no so rgos do Poder Judicirio o Tribunal Martimo, os Tribunais de Contas, da Unio e dos Estados e o Superior Tribunal de Justia Desportiva.

    A segunda premissa decorre do princpio do dualismo judicirio, por meio do qual convivem, no mesmo sistema, um Poder Judicirio organizado pela Unio e o Poder Judi-cirio organizado por cada Estado-membro da Federao. H, portanto, em decorrncia de tal premissa, o Poder Judicirio da Unio (tambm chamado por muitos de Federal) e diversos Poderes Judicirios Estaduais, formando o Poder Judicirio Nacional.

    A Unio organiza e mantm as Justias Especializadas (ou, Especiais) do Trabalho, Eleitoral e Militar da Unio; e a Justia Comum Federal e Comum do Distrito Federal e Territrios. de sua responsabilidade, tambm, o Supremo Tribunal Federal e o Superior Tribunal de Justia. Por sua vez, cada Estado-membro organiza, de acordo com sua Cons-tituio, o respectivo Poder Judicirio local (Art. 125 da Constituio Federal), composto da Justia Comum Estadual e da Justia Militar Estadual. Cabe ressaltar que as Justias administradas pela Unio possuem sua estrutura definida na Constituio Federal, sendo sua organizao judiciria definida em legislao federal. J as Justias Estaduais tm sua estrutura definida nas Constituies Estaduais, respeitadas as diretrizes fixadas na Consti-tuio Federal (Art. 125, caput). Sua organizao judiciria fixada por meio de legislao estadual, em regra denominada Cdigo de Organizao Judiciria.

    Finalmente, a terceira premissa, denominada princpio do duplo grau de jurisdio. Por tal princpio, toda causa que ingressa no Sistema Judicirio est sujeita a um duplo exame: o exame inicial, que o julgamento originrio da causa, e um exame posterior, que possui carter revisional do primeiro julgamento. Por este princpio, haver a possibilidade de duas decises vlidas e completas num mesmo processo, emanadas por juzes diferentes, prevalecendo sempre a segunda sobre a primeira. Consoante deciso do STF, a formulao do duplo grau de jurisdio exige que o exame inicial e o exame posterior, tambm cha-mado de reexame, sejam promovidos por rgos jurisdicionais diversos. Neste teor: Para corresponder eficcia instrumental que lhe costuma ser atribuda, o duplo grau de jurisdio h de ser concebido, moda clssica, com seus dois caracteres especficos: a possibilidade de um reexame integral da sentena de primeiro grau e que esse reexame seja confiado a rgo diverso do que a proferiu e de hierarquia superior na ordem judiciria.(ROHC n 79.785-7/RJ. Min.: Seplveda Pertence. DJU 22/11/2002).

    Esta terceira premissa, denominada duplo grau de jurisdio, possui os seguintes fundamentos:

    (a) Satisfazer o inconformismo do vencido. H uma relao de autoridade entre o

    juiz, que fala em nome do Estado, e a parte, como cidado, que tem que se curvar s decises da autoridade. Mas o inconformismo do vencido um fator grave de intranqilidade social. A finalidade da jurisdio no s atuar a vontade da lei, como tambm pacificar os cidados para que eles voltem, encerrado o litgio, a viver harmoniosamente num instinto de solidariedade. A instituio do recurso visa aten-der a esse clamor, a essa revolta, a essa insatisfao do vencido, dando uma segunda oportunidade de obter uma deciso favorvel e, portanto, contribuindo para que ao final dessa segunda deciso, mesmo que continue sendo desfavorvel, voltem a viver pacificamente.

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    (b) Coibir o arbtrio do juiz. O juiz que sabe que sua deciso pode ser reformada pelo tribunal superior, sente-se vigiado, controlado e cede com menos freqncia tentao do arbtrio. J o juiz que sabe que sua deciso irrecorrvel, possui maior tendncia ao arbtrio, at mesmo em busca de uma justia melhor que a justia da lei. Ele acaba vendo na irrecorribilidade, se no tiver um esprito crtico muito agu-ado, um poder absoluto, fazendo a melhor justia da sua conscincia, que no necessariamente a justia da lei.

    (c) Melhorar a qualidade das decises. O juiz pode ter examinado mal a prova, ou a matria ser muito complexa, ou ainda pode ter uma opinio jurdica que no a melhor, no aceita pelos tribunais superiores. Uma segunda oportunidade de julga-mento d ao tribunal de superior instncia a oportunidade de examinar a causa com base na motivao do juiz de primeiro grau e outros fundamentos, alm daqueles expostos pelo juiz na sua deciso. Dois julgamentos aumentam a probabilidade de acerto da deciso. Neste contexto, percebe-se que temos, portanto, na terminologia brasileira, juzos, que so rgos de primeiro grau, em regra monocrticos, ou seja, o julgamento realizado por um nico juiz, e temos tambm os tribunais, rgos de segundo grau, cujo julgamento, em regra, se d de forma colegiada. So rgos inferiores e superiores.

    Observe o Organograma na pgina a seguir, que representa a Organizao Judiciria brasileira, com fundamento em dispositivos da Constituio Federal:

    Este organograma acompanhar nosso estudo, quando analisarmos cada um dos ra-mos da Organizao Judiciria.

    Aps examin-lo, responda?

    Existe entre os juzos e os tribunais uma hierarquia?

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    3. A MAGISTRATURA NACIONAL

    A Magistratura o conjunto de juzes que integram o Poder Judicirio. Alm das disposies constitucionais acima descritas, que organizam a estrutura da

    Justia no Brasil, existe ainda a Lei Complementar n 35, de 14 de maro de 1979, mais conhecida como LOMAN, que estrutura a carreira da magistratura nacional, estabelecendo as garantias, prerrogativas, deveres, direitos, vencimentos, vantagens, forma de ingresso, dentre outras coisas. a Lei Orgnica da Magistratura Nacional.

    A magistratura organizada em carreira. A investidura se d por meio de concurso pblico, exigncia inserida no Artigo 37, II

    da Constituio, para todos os cargos iniciais da magistratura nacional. J para o Supremo Tribunal Federal e Tribunais Superiores, a forma de investidura

    diversa, como veremos nas prximas aulas.Para concorrer ao cargo de magistrado, o candidato dever preencher os seguintes

    requisitos:

    1. Nacionalidade brasileira aqui no existe distino entre brasileiros natos ou na-turalizados, sendo vedado somente o acesso aos estrangeiros.

    2. Diploma de bacharel em Direito curso de Direito em faculdade oficial ou reco-nhecida pelo Ministrio da Educao.

    3. Trs anos de atividade jurdica inovao trazida pela Emenda Constitucional n 45. Como a expresso atividade jurdica no muito precisa, logo aps a publica-o da Emenda, iniciou-se uma discusso a respeito de sua definio. A matria hoje se encontra regulamentadas pela Resoluo n 11 do Conselho Nacional de Justia, na forma que se coloca abaixo.

    Art. 1 Para os efeitos do artigo 93, I, da Constituio Federal, somente ser compu-tada a atividade jurdica posterior obteno do grau de bacharel em Direito.

    Art. 2 Considera-se atividade jurdica aquela exercida com exclusividade por ba-charel em Direito, bem como o exerccio de cargos, empregos ou funes, inclusive de magistrio superior, que exija a utilizao preponderante de conhecimento jurdico, vedada a contagem do estgio acadmico ou qualquer outra atividade anterior colao de grau.

    Art. 3 Sero admitidos no cmputo do perodo de atividade jurdica os cursos de ps-graduao na rea jurdica reconhecidos pelas Escolas Nacionais de Formao e Aperfei-oamento de Magistrados de que tratam o artigo 105, pargrafo nico, I, e o artigo 111-A, pargrafo 2, I, da Constituio Federal, ou pelo Ministrio da Educao, desde que integral-mente concludos com aprovao.

    Art. 4 A comprovao do tempo de atividade jurdica relativamente a cargos, em-pregos ou funes no privativos do bacharel em Direito ser realizada mediante certido circunstanciada, expedida pelo rgo competente, indicando as respectivas atribuies exercidas e a prtica reiterada de atos que exijam a utilizao preponderante de conheci-mento jurdico.

    Art. 5 A comprovao do perodo de trs anos de atividade jurdica de que trata o artigo 93, I, da Constituio Federal, dever ser realizada por ocasio da inscrio definitiva no concurso.

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    Art. 6 Aquele que exercer a atividade de magistrio em cursos formais ou informais voltados preparao de candidatos a concursos pblicos para ingresso na carreira da magis-tratura fica impedido de integrar comisso do concurso e banca examinadora at trs anos aps cessar a referida atividade de magistrio.

    Art. 7 A presente resoluo no se aplica aos concursos cujos editais j tenham sido publicados na data em que entrar em vigor.

    Art. 8 Esta resoluo entrar em vigor na data de sua publicao. Ministro NELSON JOBIMPresidente

    4. Regularidade no servio militar5. Estar no gozo dos direitos polticos comprovao por meio de certido fornecida

    pela Justia Eleitoral6. Integridade fsica e mental demonstrada por meio de um exame psicotcnico,

    bem como por uma entrevista pessoal com a Banca Examinadora.7. Boa conduta social o candidato deve ter conduta ilibada perante a sociedade, no po-

    dendo registrar antecedentes criminais que sejam incompatveis com o exerccio da funo. Mas veja! No se trata de qualquer antecedente. Para ser impeditivo ao cargo de juiz deve ser incompatvel com as funes que um juiz de Direito ir assumir. Assim, por exemplo, uma leso corporal culposa no trnsito, em regra, no ser causa impeditiva ao cargo.

    No que se refere s provas, normalmente, o concurso composto de quatro fases.A prova preambular, tambm chamada de provo, escrita, elaborada com questes

    dissertativas ou de mltipla escolha. No Rio de Janeiro, a tradio que a prova seja dis-sertativa. Aprovado nesta fase eliminatria, o candidato passa para a segunda fase, tambm eliminatria, onde responder a questes dissertativas.

    Vencidas essas duas fases, o candidato ser submetido ao exame psicotcnico para s ento ingressar na terceira fase. Trata-se de argio oral com a Banca do Concurso.

    Por fim, a quarta e ltima fase, com a apresentao dos ttulos que eventualmente o candidato possua, meramente classificatria, chegando-se ao final do concurso com a classificao final.

    Assim, os juzes iniciam a carreira em cargos inferiores, com possibilidade de acesso a cargos mais elevados, segundo critrios de promoo, por antiguidade e merecimento, alternadamente, conforme dispe o Artigo 93, II da CF.

    Se o magistrado desejar prosseguir na carreira, poder obter promoes e chegar ao segundo grau de jurisdio, quando passar a integrar o tribunal respectivo.

    A aferio de merecimento ser avaliada com base no desempenho, nos critrios obje-tivos de produtividade e presteza no exerccio da funo, bem como a freqncia e aprovei-tamento em cursos oficiais ou reconhecidos de aperfeioamento.

    Exemplo disso foi a introduo pela EC n 45 de um critrio impeditivo de promoo do magistrado. Trata-se do juiz que injustificadamente retiver autos em seu poder alm do prazo legal2.

    H, tambm, outra forma pela qual um profissional do Direito pode vir a integrar a magistratura. Por meio do instituto jurdico denominado Quinto constitucional.

    O quinto constitucional tem previso na Constituio Federal e estabelece a forma de integrao de advogados e membros do Ministrio Pblico aos quadros dos tribunais

    2 artigo 93, II, e da constituio Federal.

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    estaduais (Art 94 da CF) e federais (art. 107,I; 111-A,I; 115,I; 123, Pargrafo nico, I e II da CF). A partir de uma de uma lista trplice encaminhada pelo prprio Tribunal, o gover-nador do estado escolher um de seus integrantes para nomeao, matria que estudaremos mais profundamente no decorrer do curso.

    4. A INDEPENDNCIA DO PODER JUDICIRIO E SUAS GARANTIAS

    Como j estudado, o objetivo inicial da clssica separao das funes do Es-tado e distribuio entre rgos autnomos e independentes tem como finalidade a proteo da liberdade individual, dos direitos fundamentais e do Estado Democr-tico de direito.

    Para tanto, atribuiu-lhes um mecanismo de controles recprocos, denominado freios e contrapesos (checks and balances).

    A estes rgos (Legislativo, Executivo, Judicirio) a Constituio Federal confiou par-cela da autoridade soberana do Estado, garantindo-lhes autonomia e independncia.

    O legislador constituinte, no intuito de preservar este mecanismo recproco de con-trole e a perpetuidade do Estado democrtico, previu, para o bom exerccio das funes estatais, diversas prerrogativas, imunidades e garantias a seus agentes polticos.

    As garantias conferidas aos membros do Poder Judicirio tm, assim, o condo de conferir instituio a necessria independncia para o exerccio da jurisdio.

    Podemos ento dividir tais garantias, para melhor visualizao e estudo, em garantias institucionais e garantias aos membros.

    Ao Poder Judicirio como instituio, a Constituio assegura a prerrogativa do au-togoverno. E em que consiste o autogoverno? Consiste na autonomia funcional, adminis-trativa e financeira. o exerccio pelo Poder Judicirio de atividades normativas e admi-nistrativas de auto-organizao e auto-regulamentao. Compreende ainda a autonomia financeira, consistente na prerrogativa de elaborao de proposta oramentria e na gesto das dotaes pelos prprios tribunais.

    o prprio Judicirio ainda quem organiza suas secretarias e servios auxiliares, elege seus rgos diretivos e elabora seus regimentos internos, concede licenas, frias e afasta-mentos a seus membros e aos juzes e servidores, d provimento, por concurso pblico, aos cargos necessrios administrao da Justia etc.

    J as garantias conferidas aos membros do Poder Judicirio dividem-se em garan-tias de independncia e garantias de imparcialidade.

    As primeiras se destinam a tutelar a independncia do magistrado perante rgos ou entida-des estranhas ao Poder Judicirio ou at mesmo pertencentes prpria organizao judiciria.

    So elas: vitaliciedade, inamovibilidade e irredutibilidade de subsdios, todas elas dis-ciplinadas no Artigo 95 da Constituio.

    A vitaliciedade a impossibilidade de perda do cargo seno por sentena transitada em julgado, dentro de determinadas hipteses previstas em lei.

    No possvel, portanto, aps o vitaliciamento, a exonerao do magistrado de seu cargo por mero procedimento administrativo.

    Sua aquisio se d aps o chamado estgio probatrio, ou seja, aps dois anos de efetivo exerccio da carreira, mediante aprovao no concurso de provas e ttulos.

  • 14FGV DIREITO RIO

    ORGanIzaO Da jusTIa E DO mInIsTRIO pblIcO

    Durante este perodo de prova, o magistrado dever prestar conta de sua atuao por meio de relatrios peridicos, alm das correies a que ser submetido.

    A Emenda Constitucional n45 acrescentou mais um requisito. Trata-se da necessria participao do magistrado em cursos oficial ou reconhecido por escola nacional de forma-o e aperfeioamento de magistrados3.

    A inamovibilidade, por sua vez, consiste na impossibilidade de se remover membro da instituio do rgo onde esteja lotado, sem a sua manifestao voluntria.

    A inamovibilidade no sofre exceo sequer em caso de promoo, que no pode ocorrer sem a aquiescncia do magistrado. Em caso de interesse pblico, porm, reconhecido pelo voto da maioria absoluta do Tribunal ou do Conselho Nacional de Justia, dispensa-se essa anuncia.

    Por fim, a irredutibilidade de subsdios emerge da necessidade de se garantir ao juiz, para o bom desempenho de suas relevantes funes institucionais, imunidade a eventuais retaliaes dos governantes no que concerne diminuio de sua remunerao.

    Ressalte-se, porm, que tal garantia no impeditiva da incidncia de quaisquer tribu-tos sobre os vencimentos dos juzes.

    As garantias de imparcialidade so impedimentos constitucionais dos juzes que consistem em vedaes que visam a dar-lhes melhores condies de imparcialidade, repre-sentando, assim, uma garantia para os litigantes.

    O juiz impedido, consoante o Artigo 95, pargrafo nico da CF, de:

    I - exercer, ainda que em disponibilidade, outro cargo ou funo, salvo uma de magistrio;4

    II - receber, a qualquer ttulo ou pretexto, custas ou participao em processo;III - dedicar-se atividade poltico-partidria.IV - receber, a qualquer ttulo ou pretexto, auxlios ou contribuies de pessoas fsicas,

    entidades pblicas ou privadas, ressalvadas as excees previstas em lei; V - exercer a advocacia no juzo ou tribunal do qual se afastou, antes de decorridos trs

    anos do afastamento do cargo por aposentadoria ou exonerao.5

    Este inciso V mais uma inovao trazida pela Reforma do Judicirio EC n 45. Trata-se da quarentena, imposta aos juzes e membros do Ministrio Pblico6.

    A finalidade da norma preservar a imparcialidade-neutralidade dos juzes e tribunais nos quais o ex-juix ou ex-promotor tenha atuado. O trabalho, como sabido, cria laos de amizade e companheirismo entre colegas da profisso. Surge da a necessidade de se evitar o trfico de influncia que poderia ocorrer nestes casos.

    Parte dos estudiosos festeja a inovao, sendo um dos reclamos atendidos pelo constituin-te derivado, como garantia de uma maior imparcialidade nas decises do Poder Judicirio.

    Outros, porm, criticam a forma como isto restou estipulado:

    A norma no se apresenta apta a inibir o exerccio da advocacia nos termos estipulados, vez que juzes e promotores podero utilizar-se de outras pessoas para atuarem em seu nome. Ademais, no ser pelo mero decurso do perodo de trs anos (prazo temporal desacompa-nhado de qualquer outra exigncia mais firme) que os possveis laos de amizade e influncia de um magistrado desaparecero. Pelo contrrio, o comum que a mera passagem do tempo

    3 artigo 93, II, c da constituio Federal.

    4 O cnj aprovou a Resoluo 34, de abril de 2007, que regulamenta a atividade de magistrio pelo magistrado. basicamente, veda ao magis-trado o exerccio de atividade de magistrio ligada gesto.

    5 artigo 95, pargrafo nico da constituio Federal.

    6 artigo 128, 6 da constitui-o Federal.

  • 15FGV DIREITO RIO

    ORGanIzaO Da jusTIa E DO mInIsTRIO pblIcO

    os fortalea, se j existiam realmente. Se no existiam, o problema no se pe e a restrio inadmissvel. Assim, a medida no se mostra eficaz na prtica.

    H um pressuposto sinistro, alm disso, de que juzes e promotores, que at ento eram responsveis pela prestao da Justia, no dia seguinte passariam a adotar atitudes imorais e desonestas, para atender a interesses pessoais escusos.

    Por fim, impedir pura e simplesmente, o exerccio da advocacia, por juzes ou promo-tores que se aposentaram ou foram exonerados, significa restringir direitos individuais, o que s tem sentido se for para salvaguardar o interesse pblico, o que no parece ser facilmente demonstrvel no caso em tela.7

    A OAB dever passar a averiguar e controlar o trinio na atribuio da carteira funcio-nal aos ex-integrantes do Judicirio e Ministrio Pblico.

    Outro impedimento, previsto na LOMAN, veda ao magistrado se manifestar, por qualquer meio de comunicao, opinio sobre processo pendente de julgamento, seu ou de ou-trem, ou juzo depreciativo sobre despachos, votos ou sentenas, de rgos judiciais, ressalvada a crtica nos autos e em obras tcnicas ou no exerccio do magistrio.8

    O CNJ atravs da Resoluo n. 11, de 19 de dezembro de 2005, proibiu o exerccio pelo magistrado de funes nos Tribunais de Justia Desportiva e em Comisses Disci-plinares.

    Visa-se com todas estas vedaes obter a dedicao exclusiva do magistrado s suas funes constitucionais.

    O quadro abaixo elucidativo:

    Garantias

    da instituio autogoverno- autonomia funcional- autonomia administrativa- autonomia financeira

    dos membros

    Garantias deindependncia

    - vitaliciedade- inamovibilidade- irredutibilidade de subsdios

    Garantias deimparcialidade(vedaes)

    - exerccio de outro cargo ou funo, salvo uma de magistrio;- recebimento de custas e participaes em processos; - dedicar-se atividade poltico-partidria;- receber, a qualquer ttulo ou pretexto, auxlios ou contribuies de pessoas fsicas, entidades pblicas ou privadas, ressalvadas as excees previstas em lei; - exercer a advocacia no juzo ou tribunal do qual se afastou, antes de decorridos trs anos do afastamento do cargo por aposentadoria ou exonerao;- manifestar-se, por qualquer meio de comunicao, opinio sobre processo pendente de julgamento, seu ou de outrem, ou juzo depreciativo sobre despachos, votos ou sentenas, de rgos judiciais, ressalvada a crtica nos autos e em obras tcnicas ou no exerccio do magistrio;- exercer funes nos tribunais de Justia desportiva e em Comisses disciplinares.

    7 TaVaREs, andr Ramos. Re-forma do judicirio no brasil ps-88. saraiva, 2005, p.86.

    8 artigo 36, III da lei comple-mentar 35/79.

  • 16FGV DIREITO RIO

    ORGanIzaO Da jusTIa E DO mInIsTRIO pblIcO

    Finalmente, cabe ressalvar que os magistrados, face ao regime jurdico especial que possuem, tm ainda prerrogativas e deveres previstos na LOMAN, onde se destacam:

    Prerrogativas do MagistradoArt. 33 - So prerrogativas do magistrado:I - ser ouvido como testemunha em dia, hora e local previamente ajustados com a au-

    toridade ou Juiz de instncia igual ou inferior;II - no ser preso seno por ordem escrita do Tribunal ou do rgo especial competente

    para o julgamento, salvo em flagrante de crime inafianvel, caso em que a autoridade far imediata comunicao e apresentao do magistrado ao Presidente do Tribunal a que esteja vinculado (vetado);

    III - ser recolhido a priso especial, ou a sala especial de Estado-Maior, por ordem e disposio do Tribunal ou do rgo especial competente, quando sujeito priso antes do julgamento final;

    IV - no estar sujeito notificao ou intimao para comparecimento, salvo se expe-dida por autoridade judicial;

    V - portar arma de defesa pessoal.Pargrafo nico - Quando, no curso de investigao, houver indcio da prtica de crime por

    parte do magistrado, a autoridade policial, civil ou militar, remeter os respectivos autos ao Tribu-nal ou rgo especial competente para o julgamento, a fim de que prossiga na investigao.

    deveres do MagistradoArt. 35 - So deveres do magistrado:I - Cumprir e fazer cumprir, com independncia, serenidade e exatido, as disposies

    legais e os atos de ofcio;II - no exceder injustificadamente os prazos para sentenciar ou despachar;III - determinar as providncias necessrias para que os atos processuais se realizem nos

    prazos legais;IV - tratar com urbanidade as partes, os membros do Ministrio Pblico, os advogados,

    as testemunhas, os funcionrios e auxiliares da Justia, e atender aos que o procurarem, a qual-quer momento, quanto se trate de providncia que reclame e possibilite soluo de urgncia.

    V - residir na sede da Comarca salvo autorizao do rgo disciplinar a que estiver subordinado;

    VI - comparecer pontualmente hora de iniciar-se o expediente ou a sesso, e no se ausentar injustificadamente antes de seu trmino;

    VIl - exercer assdua fiscalizao sobre os subordinados, especialmente no que se refere cobrana de custas e emolumentos, embora no haja reclamao das partes;

    VIII - manter conduta irrepreensvel na vida pblica e particular.

    Todas estas garantias e deveres, que constituem uma blindagem para o exerccio pleno das atividades da magistratura, so imprescindveis democracia, perpetuidade da separao dos poderes e ao respeito aos direitos fundamentais, configurando suas ausncias, supresses ou mesmo redues, obstculos inconstitucionais ao Poder Judicirio, no exerc-cio do seu mister constitucional.

    Recentemente, em outubro de 2007, a Primeira Turma do Supremo Tribunal Federal decidiu afetar ao Plenrio o julgamento do recurso extraordinrio em que se discute se o

  • 17FGV DIREITO RIO

    ORGanIzaO Da jusTIa E DO mInIsTRIO pblIcO

    foro especial por prerrogativa de funo estende-se ou no queles que se aposentam em cargos cujos ocupantes ostentam tal prerrogativa. A matria, ainda est para ser julgada, agora pelo Plenrio do STF e devemos estar atento a esta deciso que poder inovar o en-tendimento da questo junto ao Pretrio Excelso.

    Juiz Aposentado: Vitaliciedade e Prerrogativa de ForoA Turma, em questo de ordem, decidiu, por maioria, afetar ao Plenrio julgamento

    de recurso extraordinrio em que se discute se o foro especial por prerrogativa de funo estende-se ou no queles que se aposentam em cargos cujos ocupantes ostentam tal prerro-gativa. Trata-se, na espcie, de agravo de instrumento convertido em recurso extraordinrio criminal interposto, por desembargador aposentado, contra deciso da Corte Especial do STJ que declinara de sua competncia, em ao penal contra ele instaurada, ao fundamento de que, em decorrncia de sua aposentadoria, no teria direito prerrogativa de foro pelo encerramento definitivo da funo. O ora recorrente sustenta a incidncia do art. 95, I, da CF, assegurador da vitaliciedade aos magistrados, sob a alegao de que esta somente pode-ria ser afastada por sentena judicial transitada em julgado, na qual consignada a perda do cargo. Alega, ainda, que a correta leitura do art. 105, I, a, da CF, incluiria tambm os de-sembargadores aposentados, uma vez que interpretao diversa desse dispositivo o colocaria em situao inusitada, pois, o submeteria, na qualidade de ex-presidente e ex-corregedor-geral, a juiz que eventualmente tenha recebido alguma sano disciplinar. Por fim, pleiteia o reconhecimento da negativa de vigncia aos artigos 5, XXXV, LIV, LV, e 2 e 93, IX, ambos da CF e, alternativamente, requer sejam tidos como transgredidos os artigos 94, I e 105, I, da CF. Vencidos, quanto ao deslocamento, os Ministros Carlos Britto e Crmen Lcia que, tendo em conta a existncia de precedentes da Corte, consideravam que a matria poderia ser decidida pela prpria Turma. RE 549560/CE, rel. Min. Ricardo Lewandowski, 23.10.2007. (RE-549560)

    Informativo n 485 do STF de 22 a 26 de outubro de 2007.

    Caso de sedimentao 1:

    Magistrado tem que se explicar em CPI?Aps ter estudado bastante para seu concurso pblico, relembrando todo o material

    da graduao da FGV (notadamente as aulas de Organizao da Justia e do MP!!) voc se encontra no exerccio da magistratura federal. Recentemente, atuou em processo rumoroso, que lhe rendeu bastante trabalho, tendo proferido 20 laudas de deciso para o deferimento de liminar em favor da Empresa X, a qual litigava contra a Caixa Econmica Federal acerca de expressivo numerrio que teria sido irregularmente utilizado por esta estatal com violao a direitos contratuais da Empresa X. Passados dois meses do deferimento da liminar, eis que surge uma correspondncia do Senado Federal em seu gabinete, convocando-o a prestar esclarecimentos perante a Comisso Parlamentar de Inqurito dos Bingos, tendo em vista ter voc proferido deciso contra a CEF, em favor da Empresa X, ambas sob investigao da CPI. Est voc obrigado a comparecer?Est obrigado a prestar esclarecimentos acerca de sua deciso? Em caso de respostas negativas, o que voc poderia fazer?

  • 18FGV DIREITO RIO

    ORGanIzaO Da jusTIa E DO mInIsTRIO pblIcO

    Leitura obrigatria

    HC 86581/DF. Rel. Min. Ellen Gracie, 23/2/2006, disponvel no stio eletrnico do Su-premo Tribunal Federal

    Caso de sedimentao 2:

    No dia 15 de junho de 2006, a polcia civil, por meio de interceptaes telefnicas devidamente autorizadas pelo Juiz de Direito da 34 Vara Criminal da Capital, para inves-tigao de organizao criminosa especializada no crime de falsificao de moeda (Artigo 289 do Cdigo Penal - Falsificar, fabricando-a ou alterando-a, moeda metlica ou papel-moeda de curso legal no pas ou no estrangeiro. Pena: recluso, de 3 a 12 anos, e multa), acaba por descobrir, fortuitamente, o envolvimento direto de um magistrado na referida organizao.

    A polcia prossegue com as investigaes, e no dia 13 de julho de 2006 logra xito em efetuar a priso em flagrante de toda a organizao, levando todos os acusados presos em flagrante para a Delegacia de Polcia, onde os presos so identificados, ouvidos e encaminha-dos imediatamente para a cela prisional local.

    O delegado de Polcia comunica imediatamente a priso ao Juiz de Direito da 34 Vara Criminal, e este, de ofcio, determina a priso preventiva de todos os presos.

    Pergunta-se: Foi correta a forma como agiram o Delegado de Polcia e o Juiz da 34 Vara Criminal?

    5. O CONSELHO NACIONAL DE JUSTIA

    Aps a anlise sobre o Poder Judicirio e a necessidade de sua imparcialidade e indepen-dncia, convm tratarmos da legitimidade de um controle externo sobre suas atividades.

    A recente Emenda Constitucional n 45, de 30 de dezembro de 2004, denominada Reforma do Judicirio, estabeleceu, como rgo do Poder Judicirio, o Conselho Nacional de Justia. Trata-se da implementao do controle externo da administrao da Justia em nosso ordenamento, como ocorre j de h muito tempo em alguns pases da Europa.

    Diversas motivaes nortearam o Congresso Nacional. Uma delas, de grande apelo popular, dizia respeito moralidade administrativa, sacrificada por atos de nepotismo, falta de concursos pblicos para contratao de assessores e abuso de poder encontrveis, em maior ou menor grau, na magistratura estadual e federal.

    As questes levantadas so tipicamente de administrao da Justia, encontrando no mbito do Conselho recm criado um foro adequado para a sua discusso ampla.

    Por isso, a competncia do Conselho para o controle do cumprimento dos deveres funcionais de juzes. Est previsto ainda o controle da atuao administrativa e financeira, com a conseqente elaborao anual de relatrio9, propondo as providncias necessrias so-bre a situao do Poder Judicirio no pas e da prestao do servio jurisdicional, sugerindo, inclusive, alteraes nas legislaes e na prpria Constituio10. Controle de atuao admi-nistrativa e financeira significam uma avaliao do servio prestado. O sistema de Justia e subsistemas que o integram so considerados atualmente no simplesmente como o exerccio

    9 Disponveis para consulta no site http://www.cnj.gov.br/index.php?option=com_content&task=blogcategory&id=95&Itemid=251

    10 Em exemplo disso, a Emen-da constitucional n. 50, que se originou da pEc 347/96, e que o cnj pediu, em seu rela-trio de 2005 a prioridade do poder legislativo para a sua aprovao (ver pgina 94 do relatrio).

  • 19FGV DIREITO RIO

    ORGanIzaO Da jusTIa E DO mInIsTRIO pblIcO

    de uma potestade pblica, mas como servios pblicos, suscetveis de serem organizados, dirigidos e avaliados da mesma maneira como podem s-lo a sade, a educao, o transporte etc. A transparncia essencial. Esta competncia teve como motivao a necessidade de o Estado brasileiro oferecer s cidads e cidados do pas uma administrao de Justia gil, transparente e eficaz para a proteo dos direitos e reparao das violaes.

    Neste cenrio, foi criado o Conselho Nacional de Justia (CNJ), rgo integrante do Poder Judicirio brasileiro, com atuao em todo o territrio nacional, instalado em 14 de junho de 2005, com sede em Braslia, e composto por 15 membros, nomeados pelo presi-dente da Repblica, depois de aprovada a escolha pela maioria absoluta do Senado Federal, para um mandato de dois anos, admitida uma reconduo. Em sua maioria (nove integran-tes), o CNJ composto por membros do prprio Poder Judicirio e pode ser dividido da seguinte forma:

    (a) MeMbros do Judicirio (9): um ministro do Supremo Tribunal Federal, indicado pelo respectivo tribunal; um ministro do Superior Tribunal de Justia, indicado pelo respectivo tribunal; um ministro do Tribunal Superior do Trabalho, indicado pelo respectivo tribunal; um desembargador de Tribunal de Justia, indicado pelo Supremo Tribunal Federal; um juiz estadual, indicado pelo Supremo Tribunal Federal; um juiz de Tribunal Regional Federal, indicado pelo Superior Tribunal de Justia; um juiz federal, indicado pelo Superior Tribunal de Justia; um juiz de Tribunal Regional do Trabalho, indicado pelo Tribunal Superior do Trabalho; um juiz do trabalho, indicado pelo Tribunal Superior do Trabalho;

    (b) MeMbros das Funes essenciais Justia (4):Ministrio Pblico (2):

    um membro do Ministrio Pblico da Unio, indicado pelo procurador-geral da Repblica;

    um membro do Ministrio Pblico estadual, escolhido pelo procurador-geral da Repblica dentre os nomes indicados pelo rgo competente de cada instituio estadual;

    Advocacia (2): dois advogados, indicados pelo Conselho Federal da Ordem dos Advogados do Brasil;

    (c) MeMbros da sociedade escolhidos Pelo legislativo (2): dois cidados, de notvel saber jurdico e reputao ilibada, indicados um pela C-

    mara dos Deputados e outro pelo Senado Federal.

    Para o Supremo Tribunal Federal, a existncia, no Conselho de membros alheios ao corpo da magistratura, alm de viabilizar a erradicao do corporativismo, estende uma ponte entre o Judicirio e a sociedade, permitindo a oxigenao da estrutura burocrtica do Poder e a resposta a crticas severas (STF Pleno ADIN n 3.367/DF Rel. Min. Csar Peluso, deciso: 13-4-2005).

    Doutrina e jurisprudncia muito divergiam a respeito da constitucionalidade da criao deste controle externo. A discusso passava principalmente por dois pontos: a independncia dos poderes (Art. 2 da CF) e a vulnerao das clusulas ptreas (Art. 60, 4 da CF).

  • 20FGV DIREITO RIO

    ORGanIzaO Da jusTIa E DO mInIsTRIO pblIcO

    Pense, medite e responda:

    Viola a criao do CNJ a independncia entre os poderes e as clusulas ptreas?At que ponto a criao desse rgo controlador no iria ferir a independncia

    dos poderes, to preservada em nossa Constituio e que veio inclusive coberta pelo manto da imutabilidade das clusulas ptreas?

    Ocorre que, como cedio, as estruturas do Poder Legislativo, Executivo e Judicirio

    vm sofrendo um grande desgaste nas ltimas dcadas. Questes relevantes precisam ser discutidas para a reestruturao do Estado e dos poderes pblicos. O Parlamento no mais, necessariamente, reflete a vontade popular, havendo necessidade de uma ampla reforma poltica, principalmente no tocante ao sistema eleitoral.

    No campo do Poder Executivo, problemas semelhantes se apresentam. A transforma-o do Estado Liberal para o Estado do Bem-Estar Social mudou completamente a relao Executivo Sociedade. So as privatizaes, as agncias reguladoras, a ingerncia cada vez maior do Estado na vida do particular...

    Da mesma forma, inegvel tambm a crise no Judicirio brasileiro. O nosso Judici-rio considerado lento, ineficaz e caro. O Judicirio tornou-se protagonista de uma srie de conflitos, mas no vem sendo capaz de dar as to almejadas respostas sociedade.

    Quais as causas para esta crise do Judicirio?

    Uma das solues encontradas para se acabar com a crise no Judicirio foi a sua Re-forma, ocorrida em 2004, com a EC n 45, que criou o ento rgo de controle externo, denominado Conselho Nacional de Justia.

    Tal criao j foi objeto de Ao de Declarao de Inconstitucionalidade, ADIN n 3367, julgada em abril de 2005, tendo como relator o ministro Cezar Peluso, tendo sido reconhecida a constitucionalidade do Conselho Nacional de Justia.

    Abaixo, a deciso da Suprema Corte:

    ADI 3367 / DF - DISTRITO FEDERALAO DIRETA DE INCONSTITUCIONALIDADERelator(a): Min. CEZAR PELUSOJulgamento: 13/04/2005 rgo Julgador: Tribunal Pleno(...) 2. INCONSTITUCIONALIDADE. Ao direta. Emenda Constitucional n 45/2004.

    Poder Judicirio. Conselho Nacional de Justia. Instituio e disciplina. Natureza meramente ad-ministrativa. rgo interno de controle administrativo, financeiro e disciplinar da magistratura. Constitucionalidade reconhecida. Separao e independncia dos Poderes. Histria, significado e alcance concreto do princpio. Ofensa a clusula constitucional imutvel (clusula ptrea). Inexis-tncia. Subsistncia do ncleo poltico do princpio, mediante preservao da funo jurisdicional, tpica do Judicirio, e das condies materiais do seu exerccio imparcial e independente. Prece-dentes e smula 649. Inaplicabilidade ao caso. Interpretao dos arts. 2 e 60, 4, III, da CF. Ao julgada improcedente. Votos vencidos. So constitucionais as normas que, introduzidas pela Emenda Constitucional n 45, de 8 de dezembro de 2004, instituem e disciplinam o Conselho Nacional de Justia, como rgo administrativo do Poder Judicirio nacional. (...)

  • 21FGV DIREITO RIO

    ORGanIzaO Da jusTIa E DO mInIsTRIO pblIcO

    Como se pode observar, trata-se de um rgo cuja natureza meramente administrati-va. rgo interno do Poder Judicirio de controle administrativo, financeiro e disciplinar da magistratura. No h infringncia nas funes tpicas do Judicirio. Preserva-se a imparciali-dade e a independncia do magistrado, apesar do mesmo passar a se submeter a um controle administrativo externo por parte do CNJ. Esta deciso inova no somente em relao ao CNJ, cuja constitucionalidade foi declarada, mas tambm refora e centraliza na fora do Supremo Tribunal Federal todo o ordenamento jurdico-constitucional brasileiro. Torna o STF no s a cpula jurisdicional do Poder Judicirio brasileiro, como j tradicionalmente estabelecido, como tambm, a partir da EC n 45/04, sua cpula administrativa, financeira e disciplinar, pois todas as decises do CNJ sobre o controle da atuao administrativa e financeira dos tribunais e sobre a atuao funcional dos magistrados sero passveis de con-trole jurisdicional pelo STF, que fixar o ltimo posicionamento. Leia a seguir o trecho da deciso acerca deste ponto:

    (...)4. PODER JUDICIRIO. Conselho Nacional de Justia. rgo de natureza ex-clusivamente administrativa. Atribuies de controle da atividade administrativa, financeira e disciplinar da magistratura. Competncia relativa apenas aos rgos e juzes situados, hierar-quicamente, abaixo do Supremo Tribunal Federal. Preeminncia deste, como rgo mximo do Poder Judicirio, sobre o Conselho, cujos atos e decises esto sujeitos a seu controle juris-dicional. Inteligncia dos art. 102, caput, inc. I, letra r, e 4, da CF. O Conselho Nacional de Justia no tem nenhuma competncia sobre o Supremo Tribunal Federal e seus ministros, sendo esse o rgo mximo do Poder Judicirio nacional, a que aquele est sujeito. (...)

    Seria constitucional um Estado da Federao criar um rgo similar ao CNJ no mbito estadual?

    Desta forma, trs so os pontos caracterizadores do CNJ que afastam a possibilidade de declarao de sua inconstitucionalidade sob alegao de interferncia na separao de Poderes:

    rgo integrante do Poder Judicirio; sua composio apresenta maioria absoluta de membros do Poder Judicirio;e existe possibilidade de controle de seus atos pelo rgo da cpula do Poder Judici-

    rio, o Supremo Tribunal Federal.

    Resta, portanto, agora, saber quais so as to discutidas atribuies do CNJ.A Constituio Federal trouxe, em seu Artigo 103 B, 4, um rol exemplificativo das

    mais importantes atribuies do CNJ. Passam elas pelo controle da atuao administrativa e financeira do Poder Judicirio e do cumprimento dos deveres funcionais dos juzes. Vejamos:

    4 Compete ao Conselho o controle da atuao administrativa e financeira do Poder Judicirio e do cumprimento dos deveres funcionais dos juzes, cabendo-lhe, alm de outras atribuies que lhe forem conferidas pelo Estatuto da Magistratura:

    I - zelar pela autonomia do Poder Judicirio e pelo cumprimento do Estatuto da Magis-tratura, podendo expedir atos regulamentares, no mbito de sua competncia, ou recomendar providncias;

    II - zelar pela observncia do art. 37 e apreciar, de ofcio ou mediante provocao, a legalidade dos atos administrativos praticados por membros ou rgos do Poder Judicirio,

  • 22FGV DIREITO RIO

    ORGanIzaO Da jusTIa E DO mInIsTRIO pblIcO

    podendo desconstitu-los, rev-los ou fixar prazo para que se adotem as providncias neces-srias ao exato cumprimento da lei, sem prejuzo da competncia do Tribunal de Contas da Unio;

    III - receber e conhecer das reclamaes contra membros ou rgos do Poder Judicirio, inclusive contra seus servios auxiliares, serventias e rgos prestadores de servios notariais e de registro que atuem por delegao do poder pblico ou oficializados, sem prejuzo da competncia disciplinar e correicional dos tribunais, podendo avocar processos disciplinares em curso e determinar a remoo, a disponibilidade ou a aposentadoria com subsdios ou proventos proporcionais ao tempo de servio e aplicar outras sanes administrativas, asse-gurada ampla defesa;

    IV - representar ao Ministrio Pblico, no caso de crime contra a administrao pblica ou de abuso de autoridade;

    V - rever, de ofcio ou mediante provocao, os processos disciplinares de juzes e mem-bros de tribunais julgados h menos de um ano;

    VI - elaborar semestralmente relatrio estatstico sobre processos e sentenas prolatadas, por unidade da Federao, nos diferentes rgos do Poder Judicirio;

    VII - elaborar relatrio anual, propondo as providncias que julgar necessrias, sobre a situao do Poder Judicirio no Pas e as atividades do Conselho, o qual deve integrar mensa-gem do Presidente do Supremo Tribunal Federal a ser remetida ao Congresso Nacional, por ocasio da abertura da sesso legislativa.

    Para uma maior aproximao do Conselho Nacional de Justia com a sociedade, ga-rantindo maior efetividade na sua atuao, a EC n 45/2004 previu ainda no Art. 103-B, 7, a criao de Ouvidorias de Justias, com competncia para receber reclamaes e de-nncias de qualquer interessado contra membros ou rgos do Poder Judicirio, ou contra seus servios auxiliares, representando diretamente ao CNJ.

    Questo que tem encontrado grande divergncia jurisprudencial e doutrinria diz respeito aos limites do poder normativo do CNJ. A Reforma do Judicirio lhe conferiu a importante atribuio de zelar pela autonomia do Poder Judicirio e pelo cumprimento do Estatuto da Magistratura, podendo expedir atos regulamentares, no mbito de sua com-petncia, ou recomendar providncias.

    Porm, quais os limites destes atos regulamentares? Seriam eles regulamentos au-tnomos? Teriam eles fora de lei?

    Por exemplo, no dia 18 de outubro de 2005, o CNJ expediu a Resoluo n 7, que disciplina o exerccio de cargos, empregos e funes por parentes, cnjuges e companheiros de magistrados e de servidores investidos em cargos de direo e assessoramento, no mbito dos rgos do Poder Judicirio, vedando a prtica de nepotismo no mbito de todos os rgos do Poder Judicirio, sendo nulos os atos assim caracterizados.

    Pode o CNJ, por intermdio de mera resoluo, coibir a prtica de nepotismo? No haveria necessidade de lei para tanto?

    H que se explicitar qual o real objetivo do constituinte ao conferir tal poder regulamen-tar ao CNJ. Seria um grande equvoco imaginar que a sociedade tivesse conferido ao CNJ o poder de, mediante resolues, substituir a vontade geral do povo, ou seja, substituir o Poder Legislativo. Da mesma forma, seria errneo o entendimento de que o CNJ poderia substituir o

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    ORGanIzaO Da jusTIa E DO mInIsTRIO pblIcO

    prprio Poder Judicirio, por meio de concesso de medidas liminares, por exemplo, de carter jurisdicional. No pode o CNJ romper com os princpios da reserva da lei e da reserva de juris-dio. O poder de expedir atos regulamentares tem um objetivo especfico, qual seja, o controle administrativo. Alis, essa a ratio essendi da criao do CNJ. Tratando-se de atos de fiscalizao administrativa, apenas podem dizer respeito situaes concretas. Essa a distino. A matria reservada lei, geral e abstrata, diz respeito a previso de comportamentos futuros. J a matria reservada aos atos regulamentares do CNJ diz respeito as diversas situaes que surjam da ativi-dade concreta dos juzes, exercendo o CNJ um controle destas. So dois os limites, portanto:

    nopodeexpediratosregulamentarescomcartergeraldeabstrato,emfacedare-serva de lei; e

    nopodeseingerirnosdireitosegarantiasfundamentaisdoscidados,faceaclu-sula de proibio de restrio a direitos e garantias fundamentais, que se sustenta na reserva de lei.

    Desta forma, os atos regulamentadores do CNJ esbarram assim na impossibilidade de inovar e na impossibilidade de restringir direitos e garantias pessoais, funcionais e institu-cionais. Deve se restringir, portanto, a emitir atos regulamentares de carrter fiscalizatrio, porm, somente em sede administrativa.

    Pode o CNJ, por meio de um Procedimento Administrativo, anular concurso p-blico para Juiz de Direito substituto? E mais, poderia faz-lo ex officio?

    Ainda sobre o tema concurso pblico, assim decidiu o CNJ a respeito de limitao de idade mnima para participar de concurso para ingresso na magistratura (www.cnj.gov.br):

    O Conselho Nacional de Justia decidiu afastar dispositivo que limita a idade mnima para participao no concurso de nmero 179, de provas e ttulos, para ingresso na magistratura no Estado de So Paulo. A deciso foi tomada no dia 14 de maro de 2007 em resposta ao pro-cedimento de controle administrativo nmero 347, relatora a Conselheira Ruth Carvalho.

    O requerente pedia a suspenso do dispositivo que limitava a participao no certame somente daqueles que j haviam completado quarenta e cinco anos no ltimo dia da inscrio. A conselheira Ruth Carvalho j havia deferido liminar favorvel ao requerimento e na sesso do dia 14 confirmou sua deciso no mrito, sendo acompanhada em unanimidade pelo Plenrio.

    A limitao de idade, em 45 anos, no coaduna com a interpretao sistmica do orde-namento jurdico ptrio e as disposies constitucionais, mais especificamente as do inciso I do Artigo 37 e inciso XXX do Artigo 7 da Constituio Federal, alm de representar afronta aos princpios da isonomia, da razoabilidade e da legalidade, como se ver.

    (...)Certo que a Constituio probe qualquer discriminao em razo da idade, notada-

    mente no que se refere insero dos indivduos no mercado de trabalho.(...)Assim, nota-se que, a legislao ordinria ou os editais de concursos pblicos s pode-

    ro fixar limites etrios para ingresso no servio pblico quando a natureza do cargo o exigir, conforme o artigo 39, 3. Ora, v-se que o constituinte estipulou de forma clara e inconteste que tais discriminaes esto condicionadas observncia do princpio da razoabilidade.

  • 24FGV DIREITO RIO

    ORGanIzaO Da jusTIa E DO mInIsTRIO pblIcO

    (...)Corroborando o exposto, o egrgio Supremo Tribunal Federal, aps reiterado exame da

    matria, editou a Smula n 683, in verbis:O limite de idade para inscrio em concurso pblico s se legitima em face do art. 7,

    XXX, da Constituio, quando possa ser justificado pela natureza das atribuies do cargo a ser preenchido.

    (...)Ao final, importa acrescer que, ainda que possvel em determinados casos estipulao

    de idade mnima ou mxima para ingresso em cargo pblico, tal exigncia depender de expressa previso legal, em razo do princpio da legalidade, consagrado no Artigo 37, caput da Constituio da Repblica.

    Por todo o exposto, julgo procedente o pedido para afastar, em definitivo, o disposto na letra bdo Edital de abertura do 179 Concurso de Ingresso na Magistratura do Estado de So Paulo, preservando-se o mais, at o final do concurso.

    Cumpre-nos ressaltar, porm, que o Supremo Tribunal Federal, apesar da criao do Conselho Nacional de Justia como rgo integrante do Poder Judicirio Brasileiro, con-tinua sendo a Corte mxima deste Poder, sendo o rgo legitimado para o julgamento de questes que envolvam decises tomadas pelo CNJ ou regulamentos por este expedidos.

    Em deciso recente, datada de 06 de julho de 2007, o Supremo Tribunal Federal suspendeu deciso do Conselho Nacional de Justia (CNJ) que, por suspeita de irregulari-dades, anulou concurso para juiz de direito em Rondnia. No caso, consta nos autos que o XVIII Concurso para ingresso no cargo inicial de Juiz de Direito da carreira da magistratura do Estado de Rondnia foi anulado pelo CNJ sob a alegao que a aprovao de duas candi-datas que exerciam cargo de assessoras de desembargadores teria desrespeitado os princpios da impessoalidade e da moralidade administrativa. Isto porque, alegou o CNJ em sua deci-so, estes desembargadores fariam parte da comisso organizadora do concurso.

    Segundo o ministro Ricardo Lewandowski, relator do Mandado de Segurana 26708 ainda que se admita afronta aos referidos princpios constitucionais, essa circunstncia, primeira vista, no contamina os 18 outros candidatos que lograram aprovao final no certame. Para o ministro, no se pode nem mesmo afirmar a existncia das irregularidades ou o favorecimento que embasaram a deciso do CNJ.

    Assim, lembrando que a Constituio Federal assegura a todos os cidados o direito de participao em concursos pblicos, desde que atendidos os requisitos legais, o Ministro deferiu em parte o mandado de segurana, suspendendo a deciso do Conselho Nacional de Justia. O relator ressalta, porm, que a nomeao e a posse dos 18 candidatos devem aguardar o julgamento de mrito do mandado de segurana.

    Outra importante deciso do Supremo Tribunal Federal foi proferida em sede de cog-nio sumria no dia 01 de junho de 2007, determinando que CNJ observe o devido pro-cesso legal em procedimento administrativo

    O ministro Ricardo Lewandoswki, relator dos feitos, analisou dois Mandados de Segu-rana (MS 26550 e 26663) contra o Conselho Nacional de Justia (CNJ), relativos ao Pro-cedimento de Controle Administrativo (PCA) 440. Este procedimento foi instaurado para apurar suposto descumprimento do teto constitucional pelo Tribunal de Justia do Mato Grosso. Segundo os autos das duas aes, o Conselho no estaria respeitando o preceito cons-titucional do devido processo legal ao no possibilitar o contraditrio e a ampla defesa.

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    ORGanIzaO Da jusTIa E DO mInIsTRIO pblIcO

    O Ministro ressaltou que o artigo 98 do RICNJ, que determina que seja ouvida a autoridade que praticou o ato impugnado e, por edital, a oitiva dos eventuais beneficirios de seus efeitos, no prazo de quinze dias. A jurisprudncia do Supremo no tem hesitado em reconhecer que as garantias do due process of law (devido processo legal) tambm so aplicveis aos processos administrativos , salientou tambm o ministro.

    Por fim, Ricardo Lewandowski lembrou que se o ato impugnado em mandado de segurana decorre de fatos apurados em processo administrativo, a competncia do poder Judicirio se limita ao exame da legalidade do ato, de possveis vcios formais ou dos que atentem contra os postulados constitucionais da ampla defesa e do devido processo legal. Dessa forma, o ministro deferiu o pedido em parte, apenas para garantir aos magistrados representados pela Amam o direito de manifestarem-se no prazo e nos termos do artigo 98 do RICNJ, antes que seja levado a julgamento o mrito do PCA 440.

    Com a deciso, o Ministro determina que seja garantido aos magistrados o direito de apresentar defesa escrita, antes que seja levado a julgamento pelo Conselho Nacional de Justia o PCA 440.

    Tendo em vista o material exposto a respeito do tema Conselho Nacional de Justia, examine o caso a seguir:

    Caso de sedimentao:

    Carla, estudante de direito e filha de um desembargador do Tribunal de Justia do Estado do Rio de Janeiro, trabalhava diariamente como assessora no gabinete de seu pai no Tribunal, ocupando um cargo em comisso, isto , de livre nomeao pelo Tribunal, sem a exigncia do concurso pblico.

    Ocorre que, em outubro de 2005, o Conselho Nacional da Justia editou a Resoluo nmero 07, vedando a prtica de nepotismo no mbito de todo o Poder Judicirio, concei-tuando ainda como nepotismo, dentre outras situaes, o exerccio de cargo de provimento em comisso ou de funo gratificada, no mbito da jurisdio de cada Tribunal ou Juzo, por cnjuge, companheiro ou parente em linha reta, colateral ou por afinidade, at o tercei-ro grau, inclusive, dos respectivos membros ou juzes vinculados.

    Irresignada, Carla foi obrigada a abandonar o cargo. Pergunta-se: Poderia o CNJ editar referida Resoluo, vinculando todo o Poder

    Judicirio? Anexo: Resoluo n 7 do CNJ

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    ORGanIzaO Da jusTIa E DO mInIsTRIO pblIcO

    RESOLUO N 07, DE 18 DE OUTUBRO DE 2005.

    Disciplina o exerccio de cargos, empregos e funes por parentes, cnjuges e compa-nheiros de magistrados e de servidores investidos em cargos de direo e assessoramento, no mbito dos rgos do Poder Judicirio e d outras providncias.

    O PRESIDENTE DO CONSELHO NACIONAL DE JUSTIA, no uso de suas atribuies,

    CONSIDERANDO que, nos termos do disposto no art. 103-B, 4, II, da Consti-tuio Federal, compete ao Conselho zelar pela observncia do art. 37 e apreciar, de oficio ou mediante provocao, a legalidade dos atos administrativos praticados por membros ou rgos do Poder Judicirio, podendo desconstitu-los, rev-los ou fixar prazo para que se adotem as providncias necessrias ao exato cumprimento da lei;

    CONSIDERANDO que a Administrao Pblica encontra-se submetida aos princ-pios da moralidade e da impessoalidade consagrados no art. 37, caput, da Constituio;

    RESOLVE:

    Art. 1 vedada a prtica de nepotismo no mbito de todos os rgos do Poder Judi-cirio, sendo nulos os atos assim caracterizados.

    Art. 2 Constituem prticas de nepotismo, dentre outras:I - o exerccio de cargo de provimento em comisso ou de funo gratificada, no mbi-

    to da jurisdio de cada Tribunal ou Juzo, por cnjuge, companheiro ou parente em linha reta, colateral ou por afinidade, at o terceiro grau, inclusive, dos respectivos membros ou juzes vinculados;

    II - o exerccio, em Tribunais ou Juzos diversos, de cargos de provimento em comis-so, ou de funes gratificadas, por cnjuges, companheiros ou parentes em linha reta, colateral ou por afinidade, at o terceiro grau, inclusive, de dois ou mais magistrados, ou de servidores investidos em cargos de direo ou de assessoramento, em circunstncias que caracterizem ajuste para burlar a regra do inciso anterior mediante reciprocidade nas nome-aes ou designaes;

    III - o exerccio de cargo de provimento em comisso ou de funo gratificada, no mbito da jurisdio de cada Tribunal ou Juzo, por cnjuge, companheiro ou parente em linha reta, colateral ou por afinidade, at o terceiro grau, inclusive, de qualquer servidor investido em cargo de direo ou de assessoramento;

    IV - a contratao por tempo determinado para atender a necessidade temporria de excepcional interesse pblico, de cnjuge, companheiro ou parente em linha reta, colateral ou por afinidade, at o terceiro grau, inclusive, dos respectivos membros ou juzes vincula-dos, bem como de qualquer servidor investido em cargo de direo ou de assessoramento; V - a contratao, em casos excepcionais de dispensa ou inexigibilidade de licitao, de pessoa jurdica da qual sejam scios cnjuge, companheiro ou parente em linha reta ou colateral at o terceiro grau, inclusive, dos respectivos membros ou juzes vinculados, ou servidor investido em cargo de direo e de assessoramento.

    1 Ficam excepcionadas, nas hipteses dos incisos I, II e III deste artigo, as nome-aes ou designaes de servidores ocupantes de cargo de provimento efetivo das carreiras

  • 27FGV DIREITO RIO

    ORGanIzaO Da jusTIa E DO mInIsTRIO pblIcO

    judicirias, admitidos por concurso pblico, observada a compatibilidade do grau de esco-laridade do cargo de origem, ou a compatibilidade da atividade que lhe seja afeta e a com-plexidade inerente ao cargo em comisso a ser exercido, alm da qualificao profissional do servidor, vedada, em qualquer caso, a nomeao ou designao para servir subordinado ao magistrado ou servidor determinante da incompatibilidade.

    2 A vedao constante do inciso IV deste artigo no se aplica quando a contratao por tempo determinado para atender a necessidade temporria de excepcional interesse pblico houver sido precedida de regular processo seletivo, em cumprimento de preceito legal.

    Art. 3 vedada a manuteno, aditamento ou prorrogao de contrato de prestao de servios com empresa que venha a contratar empregados que sejam cnjuges, compa-nheiros ou parentes em linha reta, colateral ou por afinidade, at o terceiro grau, inclusive, de ocupantes de cargos de direo e de assessoramento, de membros ou juzes vinculados ao respectivo Tribunal contratante, devendo tal condio constar expressamente dos editais de licitao.

    Art. 4 O nomeado ou designado, antes da posse, declarar por escrito no ter relao familiar ou de parentesco que importe prtica vedada na forma do artigo 2

    Art. 5 Os Presidentes dos Tribunais, dentro do prazo de noventa dias, contado da pu-blicao deste ato, promovero a exonerao dos atuais ocupantes de cargos de provimento em comisso e de funes gratificadas, nas situaes previstas no art. 2, comunicando a este Conselho.

    Pargrafo nico Os atos de exonerao produziro efeitos a contar de suas respectivas publicaes.

    Art. 6 O Conselho Nacional de Justia, em cento e oitenta dias, com base nas infor-maes colhidas pela Comisso de Estatstica, analisar a relao entre cargos de provimento efetivo e cargos de provimento em comisso, em todos os Tribunais, visando elaborao de polticas que privilegiem mecanismos de acesso ao servio pblico baseados em processos objetivos de aferio de mrito.

    Art. 7 Esta Resoluo entra em vigor na data de sua publicao.

    Ministro NELSON JOBIM

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    ORGanIzaO Da jusTIa E DO mInIsTRIO pblIcO

    Finalmente, importante um olhar crtico aos limites dos poderes do CNJ e de seu congnere, o CNMP.

    Para tanto, torna-se indispensvel a leitura do texto abaixo, dos professores Ingo Sarlet, Lenio Luiz Streck e Clmerson Clve, acerca do assunto.

    OS LIMITES CONSTITUCIONAIS DAS RESOLUES DO CONSELHO NACIONAL DE JUS-TIA (CNJ) E CONSELHO NACIONAL DO MINISTRIO PBLICO(CNMP)11

    Lenio Luiz Streck12

    Ingo Wolfgang Sarlet13

    Clmerson Merlin Clve14

    Os Conselhos Nacionais da Justia (CNJ) e do Ministrio Pblico (CNMP) foram introduzidos pela Emenda Constitucional n. 45/04, representando uma espcie de carro-chefe da assim denominada Reforma do Judicirio. Trata-se da implementao, stricto sensu, de controle externo do Poder Judicirio e do Ministrio Pblico. O CNJ est especificado no artigo 103-B da Constituio15, em que, exaustivamente, esto elencadas as atribuies do rgo. J o Conselho Nacional do Ministrio Pblico est regulado no art. 130-A16, seguindo, no seu ncleo essencial, as diretivas fixadas para o seu congnere CNJ. Criam-se, assim, dois importantes rgos que aproximam estrutural e organicamente as institui-es (Magistratura e Ministrio Pblico), como ocorre j de h muito em alguns pases da Europa.

    A constitucionalidade lato sensu de ambos os Conselhos j foi afirmada pelo Supremo Tribunal Federal. A discusso que se pe agora diz respeito aos limites do poder regula-mentar dos Conselhos, o que implica necessariamente discutir a natureza jurdica de suas resolues, isto , o questionamento acerca do poder de emitir resolues com fora de lei.

    O cerne da discusso est no pargrafo 4 e inciso I do art. 103-B e no pargrafo 2 e inciso I do art. 130-A:

    CONSELHO NACIONAL DE JUSTIA4 Compete ao Conselho o controle da atuao administrativa e financeira do Poder

    Judicirio e do cumprimento dos deveres funcionais dos juzes, cabendo-lhe, alm de outras atribuies que lhe forem conferidas pelo Estatuto da Magistratura:

    I zelar pela autonomia do Poder Judicirio e pelo cumprimento do Estatuto da Magis-tratura, podendo expedir atos regulamentares, no mbito de sua competncia, ou recomendar providncias;

    CONSELHO NACIONAL DO MINISTERIO PBLICO2 Compete ao Conselho Nacional do Ministrio Pblico o controle da atuao ad-

    ministrativa e financeira do Ministrio Pblico e do cumprimento dos deveres funcionais de seus membros, cabendo-lhe:

    I zelar pela autonomia funcional e administrativa do Ministrio Pblico, podendo expedir atos regulamentares, no mbito de sua competncia, ou recomendar providncias.

    Tendo a mesma ratio, as diretrizes que norteiam ambos os Conselhos so idnticas, registrando-se apenas a especificidade constante no Conselho Nacional de Justia, que es-

    11 In www.leniostreck.com.br, acesso em 20/06/06.

    12 procurador de justia-Rs; professor Titular da unIsInOs-Rs; Doutor em Direito (uFsc); ps-Doutor em Direito (univer-sidade de lisboa).

    13 juiz de Direito-Rs, professor Titular da puc-Rs; Doutor em Direito (universidade de mu-nique); ps-Doutor em Direito (Instituto max plank e univer-sidade de munique).

    14 advogado do escritrio clmerson merlin clve - ad-vogados associados. professor Titular das Faculdades de Direito da unibrasil e da uFpr. mestre e Doutor em Direito. ps-graduado pela universit catholique de louvain (blgi-ca).professor Titular das Facul-dades de Direito da uFpr e da unibrasil; Doutor em Direito pela puc-sp; ps-Graduado pela universit catholique de louvain blgica.

    15 art. 103-b. O conselho na-cional de justia compe-se de quinze membros com mais de trinta e cinco e menos de sessenta e seis anos de idade, com mandato de dois anos, admitida uma reconduo, sendo: (Includo pela Emenda constitucional n 45, de 2004)(...) 1 O conselho ser presidido pelo ministro do supremo Tri-bunal Federal, que votar em caso de empate, ficando exclu-do da distribuio de processos naquele tribunal. 2 Os membros do conselho sero nomeados pelo presi-dente da Repblica, depois de aprovada a escolha pela maioria absoluta do senado Federal. 3 no efetuadas, no prazo legal, as indicaes previstas neste artigo, caber a escolha ao supremo Tribunal Federal. 4 compete ao conselho o controle da atuao adminis-trativa e financeira do poder judicirio e do cumprimento dos deveres funcionais dos juzes, cabendo-lhe, alm de outras atribuies que lhe fo-rem conferidas pelo Estatuto da magistratura: I - zelar pela autonomia do poder judicirio e pelo cumpri-mento do Estatuto da magis-tratura, podendo expedir atos regulamentares, no mbito de sua competncia, ou recomen-dar providncias;

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    ORGanIzaO Da jusTIa E DO mInIsTRIO pblIcO

    tabelece a competncia de zelar pelo cumprimento do Estatuto da Magistratura, enquanto no caso do Conselho Nacional do Ministrio Pblico essa questo no est explicitamen-te estabelecida. Essa sutil diferena cujas conseqncias, podero ter reflexos em outros campos no significa que haja tratamento diferenciado do constituinte derivado no que diz respeito legitimidade de legislar por parte dos dois Conselhos, notadamente quando em causa restries a direitos e garantias constitucionais, inclusive e notadamente e isto sempre foi muito caro para ambas as Instituies (Poder Judicirio e Ministrio Pblico) as garan-tias funcionais e institucionais.

    Da a necessria discusso acerca dos limites para a expedio de atos regulamentares (esta a expresso constante na Constituio para os dois Conselhos). Com efeito, parece um equvoco admitir que os Conselhos possam, mediante a expedio de atos regulamen-tares (na especificidade, resolues), substituir-se vontade geral (Poder Legislativo) e tam-pouco ao prprio Poder Judicirio, com a expedio, por exemplo, de medidas cautelares/liminares. Dito de outro modo, a leitura do texto constitucional no d azo a tese de que o constituinte derivado tenha delegado aos referidos Conselhos o poder de romper com o princpio da reserva de lei e de reserva de jurisdio.

    Como se sabe, o que distingue o conceito de lei do de outros atos a sua estrutura e a sua funo. Leis tm carter geral, porque regulam situaes em abstrato; atos regulamenta-res (resolues, decretos, etc) destinam-se a concrees e individualizaes. Uma resoluo no pode estar na mesma hierarquia de uma lei, pela simples razo de que a lei emana do poder legislativo, essncia da democracia representativa, enquanto os atos regulamentares ficam restritos matrias com menor amplitude normativa.

    Este parece ser o ponto central da discusso. Se a atuao dos membros do Poder Judicirio e do Ministrio Pblico est regulada em leis especficas (LOMAN, LOMINs estadual e federal, postas no sistema em estrita obedincia Constituio), parece, de pron-to, inconcebvel que o constituinte derivado, ao aprovar a Reforma do Judicirio, tenha transformado os Conselhos em rgos com poder equiparado aos do legislador. Ou seja, a meno ao poder de expedir atos regulamentares tem o objetivo especfico de controle externo, a partir de situaes concretas que surjam no exerccio das atividades de judicatura e de Ministrio Pblico. Alis, no se pode esquecer que exatamente o controle externo que se constituiu na ratio essendi da criao de ambos os Conselhos.

    No Estado Democrtico de Direito, inconcebvel permitir-se a um rgo adminis-trativo expedir atos (resolues, decretos, portarias, etc) com fora de lei, cujos reflexos possam avanar sobre direitos fundamentais, circunstncia que faz com que tais atos sejam ao mesmo tempo legislativos e executivos, isto , como bem lembra Canotilho, a um s tempo leis e execuo de leis. Trata-se e a lembrana vem de Canotilho de atos que foram designados por Carl Schmitt com o nome de medidas. Essa distino de Schmitt sufragada por Forsthoff, que, levando em conta as transformaes sociais e polticas ocorridas depois de primeira guerra, considerava inevitvel a adoo, por parte do legislador, de medidas legais destinadas a resolver problemas concretos, econmicos e sociais. Da a distino entre leis-norma e leis de medida. Na verdade, as leis-medida se caracterizam como leis concretas. A base da distino nas leis concretas no a contra-posio entre geral-individual, mas entre abstrato-concreto (K.Stern). O interesse estar em saber se uma lei pretende regular em abstrato determinados fatos ou se se destina especialmente a certos fatos ou situaes concretas. Tambm aqui a considerao funda-mental radicaria no fato de uma lei poder ser geral, mas pensada em face de determinado

    II - zelar pela observncia do art. 37 e apreciar, de ofcio ou mediante provocao, a legali-dade dos atos administrativos praticados por membros ou rgos do poder judicirio, podendo desconstitu-los, rev-los ou fixar prazo para que se adotem as providncias necessrias ao exato cumpri-mento da lei, sem prejuzo da competncia do Tribunal de contas da unio;III - receber e conhecer das reclamaes contra membros ou rgos do poder judicirio, inclusive contra seus servios auxiliares, serventias e r-gos prestadores de servios notariais e de registro que atuem por delegao do po-der pblico ou oficializados, sem prejuzo da competncia disciplinar e correicional dos tribunais, podendo avocar pro-cessos disciplinares em curso e determinar a remoo, a dispo-nibilidade ou a aposentadoria com subsdios ou proventos proporcionais ao tempo de servio e aplicar outras sanes administrativas, assegurada ampla defesa;IV - representar ao ministrio pblico, no caso de crime con-tra a administrao pblica ou de abuso de autoridade; V - rever, de ofcio ou mediante provocao, os processos disci-plinares de juzes e membros de tribunais julgados h menos de um ano;VI - elaborar semestralmente relatrio estatstico sobre pro-cessos e sentenas prolatadas, por unidade da Federao, nos diferentes rgos do poder judicirio;VII - elaborar relatrio anual, propondo as providncias que julgar necessrias, sobre a situao do poder judicirio no pas e as atividades do conselho, o qual deve integrar mensagem do presidente do supremo Tribunal Federal a ser remetida ao congresso nacio-nal, por ocasio da abertura da sesso legislativa.(...)

    16 art. 130-a. O conselho nacio-nal do ministrio pblico com-pe-se de quatorze membros nomeados pelo presidente da Repblica, depois de aprovada a escolha pela maioria absolu-ta do senado Federal, para um mandato de dois anos, admi-tida uma reconduo, sendo: (Includo pela Emenda consti-tucional n 45, de 2004) (...)

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    ORGanIzaO Da jusTIa E DO mInIsTRIO pblIcO

    pressuposto ftico que acabaria por lhe conferir uma dimenso individual, porventura inconstitucional17.

    O fato de a EC 45 estabelecer que os Conselhos podem editar atos regulamentares no pode significar que estes tenham carta branca para tais regulamentaes. Os Conselhos enfrentam, pois, duas limitaes: uma, stricto sensu, pela qual no podem expedir regula-mentos com carter geral e abstrato, em face da reserva de lei; outra, lato sensu, que diz respeito a impossibilidade de ingerncia nos direitos e garantias fundamentais dos cidados. Presente, aqui, a clusula de proibio de restrio a direitos e garantias fundamentais, que se sustenta na reserva de lei, tambm garantia constitucional. Em outras palavras, no se concebe - e nesse sentido a lio do direito alemo regulamentos de substituio de leis (gesetzvertretende Rechtsverordnungen) e nem regulamentos de alterao das leis (gesetzn-dernde Rechtsverordnungen). neste sentido que se fala, com razo, de uma evoluo do princpio da reserva legal para o de reserva parlamentar18.

    Tratando-se, desse modo, de atos de fiscalizao administrativa, estes apenas podem dizer respeito situaes concretas. Neste caso, devero observar, em cada caso, o respeito aos princpios constitucionais, em especial, o da proporcionalidade, garantia fundamental do cidado enquanto asseguradora do uso de meios adequados pelo poder pblico para a consecuo das finalidades (previstas, como matriz mxima, na Constituio). H, assim, uma ntida distino entre a matria reservada lei (geral e abstrata) e aos atos regulamenta-res. A primeira diz respeito a previso de comportamentos futuros; no segundo caso, dizem respeito as diversas situaes que surjam da atividade concreta dos juzes e