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13 1 INTRODUÇÃO As explorações das áreas de uso comum, originariamente, surgem no Brasil, com as concessões, por parte da coroa portuguesa, de terras, que na época eram denominadas de sesmarias. Isso ocorre logo após o descobrimento (Prezia & Hoomeat, 2000). A partir desse momento, introduz-se, uma modalidade de exploração da terra, que já existia no continente europeu e que em virtude das circunstâncias histórica não obteve êxito em sua aplicabilidade, pois, muitos dos que recebiam as terras abandonavam-na, sem explora-las. Assim ela pertencia a quem a ocupasse, ou seja, ao posseiro (Porto, S/D). Os posseiros eram pequenos agricultores que não dispunham de recursos financeiros para aquisição da terra e que utilizavam as áreas das sesmarias, que estavam abandonadas, para realizarem o cultivo de subsistência. Eram vários núcleos familiares, ligados por laços de parentesco que seguiam regras e determinações específicas, que muitas vezes refere-se estritamente àquele grupo. As decisões e orientações normalmente eram dadas pelas pessoas mais idosas da comunidade (Silva, 1996). Em estudos sobre comunidades tradicionais pesqueiras, denominadas de neotradicionais, realizado na região de Mata Atlântica, Begossi (2001), verificou que os caiçaras seguem os mesmos preceitos organizacionais, de cultivo e exploração da terra, de manifestações culturais e até mesmo nas tomadas de decisões.

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1 INTRODUÇÃO

As explorações das áreas de uso comum, originariamente, surgem no

Brasil, com as concessões, por parte da coroa portuguesa, de terras, que na

época eram denominadas de sesmarias. Isso ocorre logo após o

descobrimento (Prezia & Hoomeat, 2000).

A partir desse momento, introduz-se, uma modalidade de exploração

da terra, que já existia no continente europeu e que em virtude das

circunstâncias histórica não obteve êxito em sua aplicabilidade, pois, muitos

dos que recebiam as terras abandonavam-na, sem explora-las. Assim ela

pertencia a quem a ocupasse, ou seja, ao posseiro (Porto, S/D).

Os posseiros eram pequenos agricultores que não dispunham de

recursos financeiros para aquisição da terra e que utilizavam as áreas das

sesmarias, que estavam abandonadas, para realizarem o cultivo de

subsistência. Eram vários núcleos familiares, ligados por laços de

parentesco que seguiam regras e determinações específicas, que muitas

vezes refere-se estritamente àquele grupo. As decisões e orientações

normalmente eram dadas pelas pessoas mais idosas da comunidade (Silva,

1996).

Em estudos sobre comunidades tradicionais pesqueiras,

denominadas de neotradicionais, realizado na região de Mata Atlântica,

Begossi (2001), verificou que os caiçaras seguem os mesmos preceitos

organizacionais, de cultivo e exploração da terra, de manifestações culturais

e até mesmo nas tomadas de decisões.

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Desse modo as explorações das áreas de uso comum seguem

normas que ordenam a própria manutenção da subsistência dos agricultores

tradicionais, garantindo assim, seus objetivos básicos, que segundo Reijntjes

et al (1994), são: “a produtividade, a segurança, a continuidade e a

identidade”.

Essa prática de exploração da terra, que ocorre ocorrido no Brasil,

possui grande importância, pois, apresenta inúmeros aspectos positivos,

quanto suas formas de exploração e às relações sociais que envolvem a

comunidade.

O uso comum das áreas é estabelecido por regras e condições muito

restritas a cada grupo e local. Normalmente é realizado por pequenos

agricultores, que tomam suas decisões apoiadas na subsistência. O baixo

uso de insumos externos e o cultivo estritamente para atender as

necessidades familiares, aliados à rotatividade das roças, são fatores que

contribuem fortemente para um baixo impacto ambiental, pois a regeneração

dessas áreas cultivadas, denominadas de capoeiras, é um elemento que

pode ser observado e mensurado.

O uso comum das áreas, como forma de exploração, constitui uma

modalidade que está presente no sistema de produção brasileiro desde o

período do descobrimento, porém, sofreu desestruturação em conseqüência

da expansão do capitalismo (Diegues, 2002). A capacidade de

reorganização desses grupos, que andam na contra-mão das formas

tradicionais de ocupação espacial, como: a propriedade privada e a estatal

contrariam os argumentos de Hardin (1968), e apontam para situações que

viabilizam a prática de uso comum. Além disso, enfoca aspectos pertinentes

à conservação ambiental e étnocultura (Lescure et al, 2002).

Segundo Diegues (2002), no Brasil, o uso comum das áreas pode

ocorrer de várias maneiras, por exemplo: 1) as formas antigas: sesmarias e

sistemas faxinais: 2) formas mais recentes: as RESEX – Reservas de

extrativistas e os cultivos das áreas de várzea na região amazônica; os

caiçaras com a sua pesca na região litorânea do sudeste (Mata Atlântica); as

associações dos desabrigados de barragens e os exploradores dos

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manguezais, na região nordeste. Além disso, observa-se que vários

assentamentos agrários, promovidos por instituições governamentais ou

resultado de lutas de movimentos de trabalhadores rurais, vêm optando pelo

uso comum das terras.

As áreas de sesmarias, pelas suas características, asseguram as

mesmas prerrogativas da prática de uso comum. Isso motivou o

desenvolvimento deste trabalho de pesquisa, na sesmaria de Santana, por

se saber dessa prática de exploração da terra realizada por esses

agricultores.

O trabalho centrou em responder as seguintes perguntas: 1. Que

aspectos caracterizam a exploração de uso comum da terra e qual a

ocorrência nesta área de sesmaria? 2. Como e quais áreas ocorrem as

práticas de uso comum da terra? 3. Qual o espaço geográfico ou territorial

utilizado pelos agricultores tradicionais com roças nas unidades produtivas?

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2 REVISÃO DE LITERATURA

2.1 Sesmarias: como surgiram e o uso comum dessas áreas

Uso comum é uma expressão, que transmite a concepção de

comunitário. No sentido etimológico a palavra uso vem do latim usu, que

significa: ato ou efeito de usar; costume; prática consagrada pela tradição;

utilização; conhecimento adquirido pela experiência. A palavra comum vem

do latim commune, que significa: feito em comunidade ou que pertence

simultaneamente a mais de uma pessoa.

A expressão uso comum é abordada neste trabalho dentro da

concepção de: utilização dos espaços e os bens de forma comum ou

comunitária.

Os primeiros habitantes do Brasil tinham espaço suficiente para

plantar, pescar e caçar, e assim manter a sua sobrevivência. No entanto,

com a chegada do estrangeiro, no caso os portugueses, têm início os

conflitos sociais e ambientais e, conseqüentemente, a desestruturação

desse modo de vida. Primeiro, com as Capitanias Hereditárias,

posteriormente com a doação das sesmarias e, mais tarde, com a criação da

Lei da Terra de 1850. Todos esses mecanismos foram artifícios legais,

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criados pelo próprio Estado, para doar as terras às pessoas da corroa

portuguesa.

A partir de 1500, o rei de Portugal, que pelas perspectivas da época,

julgava-se dono da terra, passou a doá-la em forma de sesmarias a quem

tivesse condições de explorá-la, geralmente pessoas das classes mais

abastadas. Contudo, muitas vezes, após tentativas infrutíferas de ocupação,

a terra era abandonada. Assim ela pertencia, de fato, a quem a ocupasse,

isto é, ao chamado posseiro, Prezia & Hoomaet, (2000).

Em um primeiro momento, as terras doadas como sesmaria,

representavam grandes extensões de áreas, que segundo Porto (S/D),

eram: “... sesmarias de 6, 8 e mais léguas quadradas ...” A medição era

realizada em braças, ou seja, eram contadas seis léguas de comprimento

por duas léguas de terra de largura. Levando-se em consideração que cada

légua corresponde a 6.000 metros ou a 6 km, isso proporcionaria uma área

equivalente a 1200 hectares. Se, a princípio, as áreas de sesmaria foram

doadas com o objetivo de produzir alimentos, para abastecer a população,

essas grandes áreas e a dispersão desses agricultores pelo território

brasileiro não significaram o alcance desse objetivo, tanto que a Lei da Terra

de 1850, busca retomar essas áreas de terras novamente para o Estado.

“... Que todas as terras dadas por

sesmarias e não ... cultivadas, entrem,

outra vez, na massa dos bens nacionais,

deixando somente aos donos das terras

meia légua quadrada, quando muito, com

a condição de começarem logo a cultivá-

las em tempo determinado, que parece

justo (Porto, S/D).

O que normalmente ocorria com essas áreas de sesmaria, em termos

de exploração, seguindo o objetivo principal de produção de alimentos, fato

abordado por Proto, (S/D), por Diegues Jr. (1959) e por Prezia & Hoomaet,

(2000), é que eram áreas utilizadas por famílias numerosas e que ao longo

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do tempo passaram a serem exploradas e ocupadas por um contingente

cada vez maior de pessoas.

A organização dos grupos sociais que passaram a explorar essas

áreas, com o objetivo de manter a sua subsistência, nem sempre foi vista

como forma digna e proveitosa à sociedade. Essa prática de uso comum,

atribuída a essas comunidades, muitas vezes fechada por laços de

parentesco, que se organizam e obedecem regras que às vezes dizem

respeito somente a esse grupo de pessoas, pode ser analisada sob ótica

bastante controvertida, como é o caso em que, Hardin (1968), que analisa a

utilização de áreas exploradas comunitariamente. Mesmo buscando

argumentos junto à Teoria Mathusiana ou em fatos, em que há o surgimento

do processo de poluição, nas áreas de exploração comunitária, tentando

demonstrar a ineficiência e o prejuízo que essa prática de uso comum da

terra traz à sociedade, observa-se que existem inúmeros aspectos positivos

(Almeida, 1989). Hardin, (1968), sugere a extinção do uso comum das

terras, no entanto essa é uma decisão extrema e contrária ao que dizem

Mckean & Ostronm, (2001).

Nos dias de hoje, o uso comum das terras, possuem aspectos

extremamente relevantes:

1. Fixa o homem no campo;

2. Produz alimentos, mesmo que de subsistência, pois de

qualquer forma o excedente chega à cidade;

3. Preserva os mananciais e as áreas verdes;

4. Utiliza baixíssima quantidade de produtos químicos, como

por exemplo, os agrotóxicos;

5. Contribui para a promoção de formas socialmente justas de

uso da terra Anderson & Loris, (2001).

Os problemas relacionados à prática de exploração da terra

comunitária existem da mesma forma que os problemas relacionados à

produção comercial. Os exemplos estão em todos os lugares e das mais

variadas formas possíveis. Alguns aspectos podem ser tomados como

exemplos:

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1) Na produção de subsistência, o uso comunitário da terra, vale

também para as áreas de sesmaria:

• Uso da queimada para realizar a limpeza das roças de toco. Essa

prática, comum à categoria de agricultores tradicionais, talvez seja um

dos aspectos mais combatidos, inclusive por Hardin (1968), pois,

provoca poluição do ar e destrói em demasia a vegetação. Em

contrapartida o uso por alguns anos e o descanso dessa área,

deixando-a transformar em capoeira, provoca o processo de

regeneração e conseqüentemente menor dano ao ambiente, pois,

segundo, Dubois (1996):

“Várias espécies arbóreas e arbustivas de

capoeiras têm raízes que atingem

camadas mais profundas do solo. Dessa

forma, estas espécies vão buscar

nutrientes que não podem ser alcançados

pelas raízes de espécies agrícolas

cultivadas. Os nutrientes retirados das

camadas mais profundas do solo se

concentram nas folhas e ramos das

espécies arborescentes e arbustivas a

capoeira. Quando essas folhas e ramos

caem no chão, se decompõem aos

poucos e enriquece a terra em nutrientes

e matéria orgânica. Assim a capoeira

acumula progressivamente, na superfície

do solo, nutrientes e húmus e favorece, dessa maneira, uma boa reciclagem de

nutrientes, a qual preenche um papel

importante na recuperação do solo

aumentando sua porosidade, sua

capacidade de absorver a chuva e o ar,

diminuído, também, o risco de erosão.”

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2) Na produção comercial, em alta escala, com uso de alta tecnologia,

defendida por Hardin (1968):

• Uso demasiado ou intensivo de máquinas agrícolas provoca a

compactação do solo, isso pode interferir tanto na condição de

conservação do solo, como na própria degradação da estrutura do

solo. Em conseqüência disso, poderá interferir na rentabilidade

econômica da produção, ocasionar maior probabilidade do processo

erosivo, criando voçorocas e até contribuindo para o processo de

desertificação. Nos trabalhos realizados por Gupta & Allmanaras

(1987),

“... a compactação do solo possui efeitos

adversos como: Limitação de adsorção

ou absorção de nutrientes; dificuldades

de infiltração e redistribuição de água;

dificuldades nas trocas gasosas e no

desenvolvimento do sistema radicular

das plantas”. A prática de usar comunitariamente a terra faz parte do processo

histórico, datado desde o surgimento da agricultura. Verificando a origem do

modo de produção agrícola nota-se que desde o surgimento da agricultura,

já se compartilhavam a terra em muitos aspectos. Essa prática nem sempre

foi constituída de princípios pacíficos, em muitos casos a disputa entre os

que produziam e os que criavam entrava em conflitos de interesses.

Segundo Primavesi (1997):

“Quando o homem passou de caçador e

colecionador para agricultor ... os

pecuaristas continuaram nômades ... Isso

causou intermináveis guerras porque

nenhum país agrícola queria permitir a

passagem de grandes rebanhos por seus

campos plantados.”

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A estratégia de manejo dentro das áreas de uso comum, que também

está relacionada diretamente à prática desenvolvida pelos agricultores

tradicionais, possui primordialmente caráter de autoconsumo, no entanto,

não se pode associar a maneira de exploração, de uso da terra ou mesmo

daquilo que se produz, como meramente uma fórmula de se ganhar dinheiro

e assim obter cada vez mais o lucro. A lógica dessa prática vai muito além

do que apregoa Hardin (1968). Segundo Khatounian (2001):

“... a produção para consumo doméstico

contribui para mudar a relação das

pessoas envolvidas na propriedade com a

terra. A terra deixa de ser um meio de

fazer dinheiro, transformando-se na fonte

primária de alimento da vida. Transforma-

se na ‘Mão Terra’, a ‘Pacha Mama’, ‘o pó

de que fomos criados e para o qual

voltaremos’. Essa transformação

contribui para alimentar também o nosso

espírito e a nossa autoconfiança”.

Outros aspectos de tal relevância também têm que ser levados em

consideração, que segundo Khatounian (2001):

“Nas propriedades que incluem várias

famílias trabalhando, a produção de

consumo interno contribui para o

sentimento de pertencimento ao grupo,

para a solidificação dos laços afetivos e

sociais. Esse sentimento age como um

cimento, solidificando e dando coesão ao

empreendimento que passa a ser

percebido como um objetivo coletivo. (...)

pode facilitar a resolução de conflitos, por

proporcionar relações mais solidárias no

interior do grupo”.

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Na conceituação da agricultura tradicional, na qual um dos objetivos

abordado é a Identidade, nota-se que também há relevantes aspectos sobre

a lógica da prática do uso da terra, que segundo Reijntjes et al (1994):

“Identidade, é definida como o grau em

que o sistema de produção do

estabelecimento agrícola e as técnicas

específicas se harmonizam com a cultura

local e com a visão que as pessoas têm

de seu lugar na natureza. Embora

aspectos como as preferências pessoais

(por exemplo, a posse de muitos animais,

de modo a demonstrar riqueza ou para

emprestar aos mais necessitados); as

tradições (a realização de cerimônias); as

normas sociais (os papéis masculinos e

femininos) e as satisfações espirituais (o

sentimento de unidade com a natureza e

com Deus)”. Dessa forma o uso comum das áreas apresentam uma complexidade

de abordagens, que a própria história da agricultura tem demonstrado ser

objeto de inúmeras discussões e variados pontos de vistas. Segundo

Reijntjes et al. (1994):

“Os sistemas agrícolas tradicionais

continuam a se desenvolver numa

constante interação com a cultura e a

ecologia local. Na medida em que as

condições para a realização da

agricultura mudam por causa do

crescimento populacional ou da

influência de valores de fora (externos)

os sistemas agrícolas também mudam”.

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Os sistemas agrícolas tradicionais se mostraram sustentáveis durante

séculos, no que diz respeito à manutenção de sua capacidade em nível

estável e contínuo de produção (TAC/CGIAR, 1998). Esse sistema continua

a ser desenvolvido, mesmo em área de maior concentração urbana,

contrariando Hardin (1968), como, por exemplo, os que ocorrem em

assentamentos rurais no sul do Brasil. Tendo em vista que a organização da

exploração, tanto em áreas de uso comum, como a realização de algumas

atividades também de forma comum, propiciaram aos agricultores maior

satisfação pessoal e melhorias nas condições de vida.

Os problemas relacionados a categorias dos agricultores tradicionais,

são inúmeros. Porém, Hardin (1968), em sua analogia, maximizou

problemas que podem ser solucionados. A ênfase em determinada

problemática não é motivo suficientemente grande para que se possa

justificar ou encerrar o assunto de forma condenatória. Existem diversas

correntes filosóficas que em analogias refletem pontos contrários a Hardin

(1968), ressaltando a importância do uso comum, da diversidade e a

complexidade de elementos relacionados a essa categoria de agricultores.

A própria biodiversidade é elemento suficientemente importante para

delinear os trabalhos sobre os agricultores tradicionais, pois a manutenção

da diversidade biológica tornou-se, nos anos recentes, um dos objetivos

mais importantes da conservação. A biodiversidade é definida pela

Convenção sobre a Diversidade Biológica1 como sendo:

“a variabilidade entre os seres vivos de todas as origens, inter alia, a terrestre, a

marinha e outros ecossistemas

aquáticos e os complexos ecológicos

dos quais fazem parte: isso inclui a

diversidade no interior das espécies,

entre as espécies e entre espécies e

ecossistemas” (Art. 2). 1Conferência realizada no Rio de Janeiro-Brasil, em 1992.

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Conforme Diegues (2000), a diversidade biológica não é

simplesmente um conceito pertencente ao mundo natural. É também uma

construção cultural e social. As espécies são objetos de conhecimento, de

domesticação e uso, fonte de inspiração para mitos e rituais das sociedades

tradicionais e, finalmente, mercadoria nas sociedades modernas. Assim,

Brookfield & Stocking (1999), propõem o conceito de agrodiversidade, em

que, a idéia de biodiversidade não se restringe aos organismos e aos

ambientes nos quais esses organismos estão inseridos, mas considera

também os sistemas de produção dos agricultores, que dá sentido a essa

diversidade.

Diegues (2000), Brookfield & Stocking (1999), reconhecem na

agrodiversidade os seguintes componentes:

(a) Diversidade biofísica – aquela relativa ao ambiente

natural, incluindo entre outras, as características do solo, as

espécies, cultivadas ou criadas, a biota do solo e a

diversidade microclimática.

(b) Diversidade de manejo – aquela relacionada às

diferenças entre as técnicas empregadas na condução dos

sistemas de produção. Nesse particular, é importante

ressaltar que a utilização dos recursos pelos agricultores,

incluindo os recursos genéticos, está inserida na lógica de

seus sistemas de conhecimento.

(c) Diversidade organizacional – refere-se à diversidade de

modos de inserção socioeconômica dos agricultores.

A biodiversidade está associada às diversas práticas que envolvem o

conhecimento das comunidades tradicionais, tais como os sistemas de

plantios, manejo, conservação de materiais genéticos (bancos de

germoplasmas – conservação in situ), tradições e/ou aspectos culturais.

Azevedo (2003), relaciona três aspectos principais sobre as causas

da perda dos recursos genéticos na agricultura: (a) a transformação das

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paisagens naturais, especialmente pela ocupação agropecuária, eliminando

tanto espécies como variedades relacionadas aos pools gênicos das

espécies cultivadas, o que é especialmente grave nos centros de

diversidade; (b) a diminuição e perda dos territórios ocupados pelas

comunidades tradicionais de agricultores, reconhecidamente conservadores

da agrodiversidade e (c) a desestruturação dos sistemas agrícolas

tradicionais existentes, por ações das pressões econômicas e culturais que

os forçam à adoção de novos procedimentos técnicos. (d) Complementando

estas situações, atualmente, em se tratando das áreas de sesmaria, há

outros elementos lesivos às comunidades tradicionais, como se pode

observar: 1) não há o reconhecimento da parte governamental, dessas áreas

como sendo legitimamente ocupada e legalmente pertencente a seus

ocupantes originais, por direito e merecimento; 2) a falta de uma política ou

de regras claras sobre essa categoria de terras possibilitou invasões e brigas

entre posseiros e grileiros, resultando quase sempre em expulsões de seus

verdadeiros proprietários.

A quantidade e a diversidade de justificativas atribuídas à categoria

dos agricultores tradicionais, juntamente com a sua maneira peculiar de se

relacionar com o meio em que vivem, provoca incômodo às novas formas de

exploração e relações do homem com a terra, principalmente dos que estão

envolvidos com maior uso de pacotes tecnológicos.

Quem não está envolvido com as relações que se dão entre os

agricultores tradicionais e seu meio tem a impressão que o sistema é

extremamente inviável. Mesmo quando se estuda a agricultura tradicional e

busca nos números maior compreensão dessa situação, encontram-se

contradições, pois, os números acabam indicando a impossibilidade da

manutenção, no campo, dessa categoria de agricultores. Para essa situação

há uma pergunta a se fazer: Por que esses agricultores têm conseguido sua

sobrevivência por tantos anos, inclusive nos dias de hoje? A resposta a esta

pergunta é muito complexa, pois, somente os indicadores econômicos não

são suficientes para tal resposta. Dados de natureza social, histórica,

religiosa, filosófica e cultural também terão que ser analisados e levados em

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consideração. Isso dá a idéia da dimensão e complexidade dos fatores que

estão envolvidos no assunto.

As críticas negativas sobre a maneira de exploração do uso comum

das terras, mesmo nas áreas de sesmaria, que são feitas de forma direta e

indireta em comparação à agricultura tradicional, sendo direcionadas quase

sempre aos aspectos financeiros, esbarra também, no Brasil, em problemas

históricos, e com tonalidade “cultural”. No caso, a questão da posse e

concentração das terras.

A concentração de terras nas mãos de poucos é uma constante e,

cada vez maior, sua contrapartida é a crescente a pobreza no campo. Essa

situação que tem provocado graves conflitos. Além disso, a maneira de

aquisição da terra, também tem contribuído para aumentar a violência rural.

A falta de definição da titularidade da posse da terra gera preocupação entre

os agricultores, já que o assunto é bastante melindroso, pois envolve

questão de sobrevivência dassas pessoas.

Segundo Silva, (1996):

“Uma das principais distorções do nosso

sesmarialismo – fruto em grande parte, do

descaso em ignorar as peculiaridades da

capitania, aplicando-lhe o disciplinamento

imaginado para a metrópole – ocorreria

de respeito à estrutura fundiária e cuja

síntese seria esta: enquanto em Portugal

dos fins do século XVI, a prática do

sesmarialismo gerou, em regra, a

pequena propriedade, no Brasil foi à

causa principal do latifúndio”.

A questão da posse da terra, da legitimidade dessa posse tem

provocado grandes conflitos no campo. Essa situação se arrastao desde os

tempos do império, ainda com as doações das sesmarias, segundo Silva

(1996):

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“Em 1795, o Conselho Ultramarino,

alarmado com os abusos, irregularidades

e desordens ... resolve elaborar meios de

resolver o problema. ... Reafirmava-se a

necessidade de evitar doar terras já

ocupadas por moradores para prevenir a

ocorrência de novos conflitos”.

Na época os posseiros eram normalmente constituídos por

pequenos agricultores que não dispunham de recursos financeiros para

aquisição da terra e que normalmente utilizavam as áreas das sesmarias,

que não produziam para realizarem o cultivo de subsistência.

A situação não mudou muito nos dias de hoje e essa mesma questão

da legitimidade da posse, tem sido motivo de vários conflitos. A maneira

como agem os grileiros e todo o seu aparato logístico, com advogados,

influência política, condição financeira favorável e conhecimento da

legislação em detrimento do parco conhecimento e da simplicidade dos

camponeses. Normalmente esse processo adquiriu uma lógica favorável aos

grileiros, que levam grande vantagem nas disputas (Silva, 1996). Essa

mesma situação pode ser observada em relação à sesmaria de Santana,

pois os agricultores que fizeram uso do direito de comercializar a área que

lhes pertencia foram envolvido em artifícios jurídicos sendo levados a

assinarem documentos que resultaram em ordem de despejo. O comprador

aproveitou-se da ingenuidade e ignorância jurídica dos agricultores cercou

um grande espaço, expulsando-os em seguida.

A Sesmaria de Santana constitui-se como um “Latifúndio”, pois

possui aproximadamente 4.600 hectares. Na década de 50, já havia se

formado um aglomerado urbano, formado por 45 famílias, que somavam

aproximadamente 450 pessoas. Essa sesmaria possuía características

próprias de exploração comunitária da área. O uso comum das áreas

destinadas à criação extensiva de bovinos e das construções das roças de

toco, ambas destinadas ao autoconsumo, fortalece a justificativa para as

dimensões territoriais. Além disso, esses grupos de pessoas possuíam

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outros aspectos que os uniam, como por exemplo: laços de família, tradições

culturais, práticas religiosas e místicas e o próprio gosto pela terra em que

vivem.

O modo de exploração comunitária, realizado nas áreas de sesmaria,

em particular, como ocorreu na Sesmaria de Santana, apresenta fortes

traços das relações de produção típica de uma exploração familiar. Segundo

Lamarche (1997),

“A exploração familiar, tal como

conhecemos, corresponde a uma unidade

de produção agrícola onde propriedade e

trabalhos estão intimamente ligados à

família”.

Esse fato de inter-relação, onde a propriedade, o trabalho e a família

se manifestam, em conjunto, podem ser observados naquilo que essa

categoria de agricultores vem realizando. Para isso, foram levados em

considerações para análise seus principais procedimentos:

1. Existem inter-relações entre os núcleos familiares e as

necessidades de produção desses grupos.

2. Existem inter-relações entre a quantidade de produção e a

necessidade de consumo familiar.

3. Tudo aquilo que produzem, tem como objetivo básico, atender

às necessidades familiares, ou seja, o autoconsumo;

4. A produção para subsistência está acima da valoração

econômica do que se produz, do local que produz e da própria

mão-de-obra.

5. Em razão da necessidade de subsistência, ocorre o fator da

ajuda mútua. Sempre que um individuo está passando por

algum tipo de necessidade é ajudado por aquele que está em

melhores condições.

Esse modo de exploração de forma comum está estruturado em um

modelo complexo de funcionamento. Essa estrutura, ocorrida na sesmaria

de Santana, foi desestabilizada com o surgimento de uma outra força

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concorrente a esse modo de vida, qual seja, aquela estabelecida pelo

sistema capitalista de produção. Pois, apresentou maior vigor e

agressividade na forma como vem se ramificando e se impondo junto aos

agricultores.

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3 MATERIAL E MÉTODOS

A área objeto de estudo é a sesmaria de Santana (Figura 1),

localizada no Estado de Mato Grosso, município de Cáceres, na Região da

Morraria, distantes aproximadamente 55 km da sede do município.

3.1 Caracterização da Área de estudo Aspectos físicos

A sesmaria de Santana encontra-se em uma área intermontana, ou

seja, em um vale, que está encaixado entre dois prolongamentos, ou braços

da Serra das Araras, que segundo Miranda & Amorim (2000), é uma faixa de

dobramentos (Proterozóico). A região caracteriza-se por apresentar relevo

FIGURA 1. Localização da área de estudo – Cáceres-MT.

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bastante desgastado, em função da ação dos agentes internos e externos

que contribuem para a modelagem.

A conformação estrutural e o fato da sesmaria de Santana estar em

uma região de morraria, possuindo em seus vales, áreas relativamente

planas ou com pouco aclive, possibilita aos agricultores a permanência e

conseqüentemente sua sobrevivência, nesta localidade. As características

de relevo e o longo período de subsistência desses agricultores, nesta

região, são fortes indícios de que as tomadas de decisões, desses

agricultores tradicionais tem sido elemento importante para a permanência

nesta localidade.

O clima encontrado na região é do tipo tropical típico, quente semi-

úmido, com duas estações bem definidas, uma chuvosa e outra seca,

apresentando de quatro a cinco meses de seca, ou seja, Aw, segundo

Köppen (Miranda & Amorim 2000).

No período da estação chuvosa, a região recebe forte influência da

massa de ar equatorial continental (mEc), proveniente da região amazônica,

caracterizada pela grande quantidade de água que carrega (Piaia, 1999).

No período da estação seca, a massa de ar que atua com mais

freqüência é a tropical continental (mTc), proveniente da região do chaco

argentino e boliviano, que forma uma área de baixa pressão (ciclonal),

dando origem aos ventos quentes e secos que ficam estacionados sobre a

região (Piaia, 1999). Também neste período, ocorre a penetração da massa

polar atlântica (mPa), causando queda na temperatura, conhecida como

frentes frias e/ou como o fenômeno da friagem.

A região da morraria está incluída na microrregião do pantanal mato-

grossense, em área de transição. A região possui vegetação de cerrado,

com todas as características típicas do cerrado brasileiro, apresentando:

estratificação diferenciada, com campos, cerrados limpos, cerradão,

caracterizada também pela presença de arbustos e árvores retorcidas, de

pequeno porte, casca grossa, permeadas com gramíneas, folhas que no

período da estação seca estão em queda, adaptadas a altas temperaturas,

provenientes de fatores climáticos e antrópicos – as queimadas. De acordo

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com as observações de Miranda et al (1996) e Rodrigues (1996) o fogo pode

influenciar o processo reprodutivo da vegetação do cerrado.

A maior evidência desse processo verifica-se nas decisões dos

agricultores tradicionais em colocarem o fogo, durante o período da estação

seca, para estimular a rebrota e assim fornecer o capim para o gado.

O cerrado é um bioma rico em biodiversidade, apresentando,

importantes potencialidades. Segundo Felfili et al, (2004):

“Essa diversidade manifesta-se também

na grande quantidade de espécies

potencialmente econômica que inclui as

alimentícias, medicinais, ornamentais,

forrageiras, apícolas, produtoras de

madeiras, cortiças, fibras, óleos, tanino e

material para artesanato”.

A imensa riqueza do cerrado constitui também fonte alternativa de

renda contribuindo para a complementação da subsistência das

comunidades tradicionais (Felfili et al, 2004).

É possível observar, também, que na área de estudo, junto as

nascentes e aos canais de água, há um tipo de vegetação diferenciada,

denominada de mata ciliar, que por receber maior oferta de água, possui

maior exuberância em relação às demais vegetações de cerrado. Esse tipo

de vegetação é muito importante para a preservação e manutenção dos

recursos hídricos do cerrado.

A região apresenta várias nascentes formadoras dos afluentes da

Bacia do Paraguai, o qual tem grande importância, na estrutura hidrográfica

brasileira, além disso, contribui para a formação de uma das áreas mais

ricas em biodiversidade: a bacia pantanal.

A região é banhada pela micro bacia do ribeirão Água Branca, um

pequeno riacho que nasce dentro da sesmaria de Santana, em sua porção

leste e corre em direção ao norte. O ribeirão Água Branca é perene e possui

água cristalina, no entanto, apresenta sabor salgado acentuado, sendo

classificado pelos agricultores, de água salobra, a qual é dispensado pelos

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agricultores no consumo diário. Aliás, segundo informações dos agricultores,

todas as nascentes que estão em sua margem direita são possuidoras

dessas características. A água destinada ao consumo doméstico vem de

uma pequena nascente que está dentro da propriedade do senhor Catulino

Lopes Viana, morador da margem esquerda do Ribeirão Água Branca. Toda

a região é regida pelo regime pluvial.

No período da estação seca, os pequenos riachos tornam-se

intermitentes, permanecendo apenas com água nas proximidades da

nascente. Em uma outra situação, as nascentes menores secam totalmente.

As duas comunidades: Sagrado Coração de Jesus/Santana e Água

Branca possuem sistemas canalizados de abastecimento de água, a qual é

retirada de nascentes próximas, após isso é feita a distribuição para as

residências, através de canos plásticos, que ocorre por gravidade.

As nascentes d’água que abastecem as residências não estão

protegidas, nem por cercas, que possa impedir o acesso de animais

domésticos e silvestres, nem por outros tipos de proteção que impeça a

entrada e o acúmulo de detritos externo que possam vir através das

enxurradas das chuvas.

Em ambas comunidades, a utilização da água vem de nascentes que

possui boa potabilidade. Altiere (2002), observa que a condição que esse

componente apresenta é de fundamental importância, para a manutenção de

todo o sistema de produção.

Aspectos humanos

Em 1908, um grupo de pessoas, formada por seis famílias, adquiriria,

por meio de contrato de compra e venda uma área de 1.592 hectares, que

era parte do desmembramento da sesmaria de Inhumas, e que passou a ser

denominada da sesmaria de Santana. Atualmente, a população que ocupa a

área da sesmaria de Santana é constituída basicamente de descendentes.

Em sondagem, verificou-se que essa população tem origens remotas,

desde o processo de ocupação de Mato Grosso. Os antepassados dos

atuais moradores, da área em estudo, são descendentes de pessoas que se

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estabeleceram na região desde o descobrimento do ouro em Cuiabá, pelo

bandeirante Miguel Sutil, por volta do ano de 1722.

As descobertas de Miguel Sutil estimularam a migração para o estado

de Mato Grosso, provocando um adensamento populacional, contribuindo

para colocar a cidade de Cuiabá, como uma das mais populosas do país

(Piaia, 1999). Essa situação se expandiu para as regiões vizinhas, inclusive

Cáceres, que vai se tornar na época cidade de grande importância, tanto

pela sua localização estratégica como pela condição administrativa que

acabou ocupando devido às circunstâncias da época.

O arraial de Santana chegou a ter cerca de quarenta e cinco núcleos

familiares distintos, com residências independentes e um contingente

populacional de aproximadamente 450 pessoas. Porém, hoje, restam dos

remanescentes, vivendo na área da sesmaria de Santana, apenas quatorze

núcleos familiares distintos, com contingente populacional de sessenta e

cinco pessoas.

Em virtude das invasões e grilagem das terras da sesmaria de

Santana, existem formações de novos núcleos familiares, constituídas de

pessoas que vieram de outras partes do Brasil e que, portanto, não são

remanescentes do antigo arraial de Santana. Essas pessoas são

originariamente de Minas Gerais, Santa Catarina e do próprio estado de

Mato Grosso. As pessoas que estão chegando na região adquirem as terras

mediante a compra de direito de posse, de pessoas que já haviam entrado,

anteriormente, nesta área de terra, e reclamado-a como sendo de seu

direito.

3.2 Procedimentos Metodológicos Os procedimentos metodológicos tiveram como base, o levantamento

de dados mediante a utilização de entrevistas estruturadas e semi-

estruturadas e o mapeamento das áreas mediante a utilização do Sistema

de Posicionamento Geográfico. Além disso, foram utilizadas sobreposições

das espacializações com a utilização de SIG (Sistema de Informação

Geográfica).

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35

As entrevistas estruturadas consistiram em perguntas que seguiram

um roteiro previamente estabelecido, sendo aplicado aos representantes de

cada residência, sem alteração das perguntas e sua seqüência (Marconi &

Lakatos, 1990). As entrevistas foram realizadas de acordo com o formulário

elaborado (Apêndice A), sendo aplicada nas comunidades de Santana e

Água Branca, também com informantes chaves dentro dessas comunidades.

As entrevistas semi-estruturadas, (Apêndice B) que buscam obter

uma visão geral do problema (Gil, 1987), foram realizadas com informantes

chaves dentro das comunidades de Santana e Água Branca. Esse

procedimento metodológico é uma forma de explorar mais amplamente uma

questão (Marconi & Lakatos,1990). Neste procedimento, foi detectada certa

dificuldade de compreensão de algumas perguntas, por parte dos

entrevistados. Neste caso, o pesquisador procurou esclarecer de maneira

mais simples tais perguntas, de acordo com o entendimento de cada

informante, tendo o cuidado de não alterar o teor do que estava sendo

indagado.

Para as entrevistas foram estabelecidos os seguintes critérios para a

escolha dos informantes chaves dentro das comunidades:

1. Os líderes da comunidade (segundo informações da

própria comunidade);

2. As pessoas mais idosas da comunidade, que

conseqüentemente possuem maior conhecimento dos

fatos ocorridos nessa comunidade;

3. Os chefes de famílias;

4. As pessoas que apresentassem o menor índice de

contradições quando ocorriam as entrevista, aspecto

que fortalece a confiabilidade;

5. Disponibilidade de tempo e aceitação para acompanhar

os trabalhos;

Cada fase dos trabalhos realizados dentro a sesmaria de Santana,

podem ser observados na Figura 2.

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Esta pesquisa foi desenvolvida por etapas. Na primeira fase foi feita a

escolha e definição da área de estudo, em seguida passou-se a elaborar o

guia de assuntos a serem abordados com os entrevistados. O passo

seguinte foi a realização das visitas às unidades produtivas com o intuito de

marcar as entrevistas. Na medida em que as entrevistas foram marcadas,

concomitantemente, realizava-se também a coleta de dados para o

mapeamento dessas unidades produtivas, mediante a utilização do Sistema

de Posicionamento Geográfico.

FIGURA 2. Fluxograma retratando a sistematização dos procedimentos metodológicos.

Visitas para marcar as entrevistas

Mapeamento das unidades

produtivas Entrevista

Ordenamento dos dados coletados em campo

Análise e interpretação da ocupação espacial nas unidades produtivas

Descrição das unidades

produtivas

Sobreposição do mapeamento das

unidades produtivas

Guia Auxiliar/ Banco

de dados

Elaboração do Guia de Entrevista

Área de Pesquisa

Visitas complementares

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Para a realização do mapeamento, que necessita da identificação dos

pontos extremos da sesmaria de Santana, utilizou-se de um informante da

comunidade com maior conhecimento da área, pois, a localização dos

agricultores, buscando descrevê-las, quanto aos aspectos históricos de

cultivo e ao seu deslocamento ao longo de sua história. As entrevistas foram

marcadas com antecedência, adequando-se à disponibilidade de cada

FIGURA 4. Demonstra a linha que delimita o norte da sesmaria de Santana, em área próximo a serra, porém já desmatada e cultivada com capim braquiarão (Brachiária brizantha cv. Maranduva).

Foto

: R. S

. Bas

tos,

200

4.

marcos que delimitam o

local, constitui aspecto

importante no processo

de identificar a

abrangência de toda a

área. (Figuras 3, 4, 5, 6

e 7).

Posteriormente,

com os dados dos

pontos extremos da

sesmaria de Santana, o

próximo passo foi a

elaboração do mapa da

área total da sesmaria.

Logo após a esse

processo de

mapeamento, também

com a utilização de um

guia da comunidade, foi

realizado levantamento,

com o auxilio do

Sistema de

Posicionamento

Geográfico, das

unidades de cultivo dos

FIGURA 3. Marcos de pedras encontrados na linha que delimita o norte da sesmaria de Santana, dispostos em forma de um triângulo.

Foto

: R. S

. Bas

tos,

200

4.

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produtor, pois, muitos deles estavam na lida de seus afazeres, em atividades

de seu cotidiano.

desenvolvendo, ocorreram necessidades de novas informações, quando se

buscou apoio no banco de dados do ProSA2. Quando o banco de dados não

atendia às reais necessidades, foram necessárias novas visitas à

comunidade, buscando complementar a deficiência de informações.

2 ProSa – Programa de Estudos de Sistemas Agrícola da FAMEV – Faculdade de Agronomia e Medicina Veterinária da Universidade Federal de Mato Grosso.

A cada entrevista

realizada, realizava-se

análise parcial das

respostas, com o intuito

de verificar possíveis

discrepâncias ou

contradições.

Após as

entrevistas e coleta de

dados para o

mapeamento, a etapa

seguinte consistiu na

ordenação de todos os

dados.

Após a ordenação dos

dados, foram realizadas

as descrições as

análises do uso comum

dos espaços, bem

como a elaboração dos

respectivos mapas das

unidades produtivas.

Assim que os trabalhos

foram se

FIGURA 6. Marcos de pedras encontrados na linha que delimita o sul da sesmaria de Santana. Devido ao desmatamento só restam dois marcos.

Foto

: R. S

. Bas

tos,

200

4.

FIGURA 5. Marcos de pedras encontrados na linha que delimita o sul da Sesmaria de Santana.

Foto

: R. S

. Bas

tos,

200

4.

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39

momento, todos os pontos, coletados em campo e identificados, foram

transferidos para o computador, interligando-os de acordo com as

informações de campo. Além disso, o Sistema de Posicionamento

Geográfico, utilizado em campo foi trabalhado com o Datum de WGS-84. A

fase de construção dos mapas foi desenvolvida com a utilização do

programa Autocad 2004.

Este processo de mapeamento foi registrado em dois momentos

distintos:

Para a

elaboração dos

mapas, tomou-se

como referência

básica, uma carta

topográfica do DSG –

Diretoria de Serviços

Geográficos –

Ministério do Exército,

denominada de Serra

das Palmeiras,

identificada com

índice de

nomenclatura SD-21-

Y-D-IV, com escala

de 1:100.000. Em

seguida, a carta e a

imagem do satélite

Landsat, fornecida

pelo INPE – Instituto

Nacional de

Pesquisas Espaciais

foram georeferencia-

das. A partir desse

Foto

: R. S

. Bas

tos,

200

4.

FIGURA 7. Marco de pedra encontrado na linha que delimita o sul da sesmaria de Santana. Devido ao plantio do capim e ao desmatamento, só resta um único marco, os outros já se perderam em meio às inúmeras ações do homem para trabalhar a terra, e nela se estabelecer.

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1. Mapeamento referente a toda espacialização encontrado

na unidade produtiva, no ano de 2004, identificando as

áreas de pastagens, de cultivo e de reserva florestal

(cerrados, capoeiras, matas e matas ciliares).

2. Procurou-se mapear as áreas de produção do ano

seguinte, 2005, buscando delinear o comportamento

dessa espacialização, em comparação com o ano

anterior, bem como a progressão e espacialização da

produção agrícola.

É importante salientar que este trabalho, realizado na sesmaria de

Santana teve como base todos os agricultores considerados remanescentes,

ou seja, todos aqueles que estão ligados diretamente ao processo de

aquisição de terras, na área da sesmaria, através de parentesco (herança).

Esse trabalho foi realizado nas localidades de Água Branca e do Sagrado

Coração de Jesus (Santana), com dezesseis núcleos familiares de

agricultores tradicionais. Desse total, apenas os moradores da localidade do

Sagrado Coração de Jesus (Santana) tiveram mapeamento e detalhamento

de sua unidade produtiva, a fim de realizar a sobreposição do uso dos

espaços desses agricultores. Em razão da proposta de mapear apenas os

agricultores remanescentes, nesta localidade não foram realizados o

mapeamento em duas unidades produtivas, S-10 e S-11 em virtude desses

agricultores terem adquiridos suas propriedades, mediante contrato de

compra e venda de terceiros. Portanto, não são agricultores remanescentes

(Tabela 1).

As unidades produtivas da localidade de Água Branca não foram

mapeadas.

Nas discussões enfoca-se o modo do uso comum dos espaços dos

agricultores tradicionais, abordando principalmente a maneira de lidar com a

terra, destacando a dualidade entre aquilo que foi uma área de sesmaria,

com todas as suas características e prerrogativas, e a realidade vivida pelos

agricultores nos dias de hoje.

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Pesquisa realiza nas safras –2003/2004 e 2004/2005.

TABELA 1. Propriedades pesquisadas na sesmaria de Santana.

SESMARIA DE SANTANA

LOCALIDADE CÓDIGO DA UP

PROPRIETÁRIO ATIVIDADE

S01 Catulino Lopes Viana E/M S02 Benedito Lopes Viana E/M S03 Máximo Lpes Viana E/M S04 Cecílio Lopes Viana1 E/M S05 Liduvino Lopes Viana1 E/M S06 Armindo Lopes Viana1 E/M S07 Antônio dos Santos Martins E/M S08 Paulo dos Santos Martins E/M S09 Gonçalo Martins Viana E/M S10 Antônio Viriato da Silva2 E

SAG

RA

DO

CO

RA

ÇÃ

O D

E JE

SUS

S11 Dielson Viriato da Silva2 E

S12 André Santana Lopes E S13 Liduvino Lopes Viana E S14 Cassiano Lopes Viana E S15 Luiz Corrêa E

ÁG

UA

BR

AN

CA

S16 Angelino da Silva E M – Mapeadas ·· E – Entrevista· 1 Esses agricultores foram considerados para efeito de estudo como grupo familiar. 2Propriedades não mapeadas, por serem consideradas de pessoas não remanescentes, pois adquiriram suas terras mediante compra de terceiros.

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4 RESULTADOS E DISCUSSÃO

4.1 Caracterização e descrição das unidades produtivas 4.1.1 Localidade de Santana – Comunidade Sagrado Coração de Jesus

A sesmaria de Santana possui duas localidades distintas: a localidade

de Santana formada pela comunidade do Sagrado Coração de

Jesus/Santana e a localidade de Água Branca formada pela Comunidade

Todos os Santos. A formação dessas duas comunidades distintas ocorreu

em virtude da grande pressão efetuada pela pessoa que se dizia dono de

todas as terras dessa área, conhecida na região por senhor Mário Japonês,

denominação dada pelos remanescentes da sesmaria de Santana.

Apesar das unidades produtivas estarem situadas em uma mesma

área territorial com características climáticas: de solo, relevo, vegetação

semelhantes e banhadas pela mesma rede hidrográfica (micro bacia do

ribeirão Água Branca), cada uma possui características peculiares que

possibilitam uma diferenciação ímpar, pois tais diferenças estão ligadas

diretamente ao manejo estabelecido pelo ocupante de cada propriedade,

com suas limitações naturais e constituições culturais.

4.1.1.1 Unidade produtiva – (UP-S01), do senhor Catulino Lopes Viana.

A unidade produtiva do senhor Catulino Lopes Viana, denominada de

Sítio Três Corações, não possui documentação, sendo parte de uma área da

sesmaria de Santana com área total de 145,2 hectares, localizada em uma

topografia em aclive abrangendo o sopé de uma montanha, a Serra

Morraria, possuindo vegetação de cerrado em sua grande maioria, com

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áreas de campos e de várzea com pequenas nascentes d’água, além de

uma vegetação mais vigorosa, a mata ciliar, acompanhando o curso do

Córrego Água Branca, que drena a propriedade, cortando-a em sentido de

sul para norte (Apêndice G). A unidade produtiva está voltada a atender

estritamente as necessidades de sobrevivência de sua família, pois as áreas

de cultivos são pequenas. Em períodos de pico chega a aproximadamente

1,5 hectares. O cultivo consorciado é uma forma de tornar o uso da terra

mais eficiente, produzindo mais por área. Além disso, verifica-se que

vizinhos ocupam áreas com roças de banana e mandioca – como é o caso

do filho do senhor Armindo Lopes Viana, o Ailton Lopes Viana, seu sobrinho,

que utiliza esse espaço como forma de complementação da produção de

alimentos para sua família.

O uso, a distribuição das atividades e o manejo agrícola englobam

áreas com a produção de roças de arroz, milho, mandioca, banana, feijão;

áreas de pastagens e capoeiras; áreas de campo, utilizadas principalmente

no período das secas quando as áreas de pastagens cultivadas estão ruins

devido à escassez de água (falta de chuvas).

As pastagens nativas constituídas de campos cerrados estão

localizadas nas áreas de maior proximidade da serra, abrangendo várias

nascentes com solos não muito apropriados para se tocar uma roça, pois

segundo informa o senhor Catulino Lopes Viana, nessa área, a produção

somente é possível com a utilização de máquinas e de adubação, devido à

terra ser muito fraca.

As pastagens nativas são constituídas basicamente por um tipo de

capim, popularmente conhecido pelo nome de Fura Bucho, (Paspalum

carinatum). Na região encontram-se outros tipos de capim nativo, como por

exemplo, o capim Barba de Bode (Paspalum lineares), porém com menor

freqüência. Mesmo assim, ambos são aproveitados pelo gado somente

quando ocorrem a rebrota, após a queimada. Pois, esses tipos de capim

nativos quando amadurecem tornam-se amargo, característica que afeta o

paladar dos bovinos (EMBRAPA, 1987 e 1997).

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Segundo informações colhidas junto aos agricultores, esse tipo de

capim possui pouca capacidade de suporte de gado. Além disso, o capim no

período da estiagem (seca), se torna muito duro e o gado deixa de comê-lo,

fato que os obriga a colocar o fogo para forçar a rebrota do capim e assim

servir de alimento para o gado, no período da estação seca. Outro aspecto

verificado nas áreas de pastagens de capim nativo, principalmente nas áreas

Foto

: R.S

. Bas

tos,

200

5.

FIGURA 8. Pastagens nativas – capim Fura Bucho, (Paspalum carinatum) - área com pisoteio do gado.

estudadas, é que

muitos desses locais

são próximos de

nascentes (Figura 9), e,

com o cercamento das

propriedades, está

ocorrendo maior

pisoteio do gado

(Figura 8) o que coloca

em risco a conservação

desse bioma (Felfili et

al, 2004).

FIGURA 9. Pastagens nativas – capim Fura Bucho, (Paspalum carinatum) - área sem pisoteio do gado.

Foto

: R.S

. Bas

tos,

2005

.

Para os

agricultores

tradicionais, as

pastagens nativas

têm assegurado a

possibilidade de

manutenção do gado

nos períodos de seca,

e, ao mesmo tempo

apresenta baixo

custo, neste tipo de

operacionalização.

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O senhor Catulino Lopes Viana tem procurado não utilizar o fogo, nos

últimos anos, porém a necessidade de alimentar o gado pode obrigá-lo a

colocar fogo nas áreas de pastagens nativas. Essa é uma decisão, que o

agricultor vê como a última saída.

Apesar do desgaste, que o fogo provoca ao ambiente, para os

agricultores desta região constitui numa alternativa mais econômica, pois

nem sempre conseguem manter o gado em pastagens cultivada ou

complementar a alimentação do gado com forrageiras.

É importante salientar o fato que na área do senhor Catulino Lopes

Viana está sendo utilizada com roças de mandioca e de bananas

pertencentes a um de seus vizinhos, o senhor Ailton Lopes Viana, seu

sobrinho, filho do senhor Armindo Lopes Viana (Apêndice H), que utiliza a

referida roça como parte do sustento de si e de seus familiares, e nesse

caso não há nenhum tipo de ressarcimento ao proprietário da terra, o senhor

Catulino Lopes Viana, que dá a concessão do uso sem pedir nada em troca.

TABELA 2. Produtos cultivados, para o autoconsumo, pelo senhor Catulino

Lopes Viana e suas respectivas áreas, safras – 2003/2004 e

2004/2005.

TIPOS DE PRODUTOS ÁREA CULTIVADA

safra 2003/2004 (Em hectares)

ÁREA CULTIVADA safra 2004/2005 (Em hectares)

Arroz 1,6 -

Milho 0,30 1,02

Mandioca 0,84 0,84

Banana 0,20 0,20

Outros1 (abóbora, maxixe, quiabo,

batata doce e mamão) - -

Total da área em produção 2,94 2,04 1 Estes produtos são cultivados em consórcio, sem uma quantidade de área específica. Neste caso planta-se estritamente para o consumo. 2 Área cultivada fora de sua unidade produtiva.

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Tanto o bananal como o mandiocal, segundo o proprietário da terra,

irá ficar naquele lugar enquanto a produção for satisfatória. Isso irá ocorre

até o momento em que a limpeza ou sua manutenção for compensatória.

Os produtos cultivados pelo senhor Catulino Lopes Viana nas safras

2003/2004 e 2004/2005, bem como as respectivas áreas de produção, estão

na Tabela 2. Nela podemos observar que as áreas de cultivo são

relativamente pequenas, levando-se em consideração que somente o senhor

Catulino Lopes Viana e sua esposa, a senhora Cecília Mendes Viana,

trabalham na propriedade. Todo o trabalho realizado está direcionado para o

autoconsumo.

Na safra 2004/2005, o agricultor cultivou 1,0 hectare de milho em

terras fora de sua unidade produtiva, que foram cedidas por um fazendeiro

que estava renovando suas pastagens e, como troca, ofereceu a área

preparada para o plantio e tendo em contra partida o plantio do capim.

A produção agrícola do senhor Catulino Lopes Viana, mesmo sendo

pequena tem conseguido manter sua subsistência:

“Todo ano aquilo que a gente planta, a

gente colhe menos. A terra parece que

está cansada. (...) Tem ano que não dá,

falta um pouquinho, ai a gente completa

com a venda de um animal; um porquinho

(...) um bezerro (...) empresta do vizinho

que tem (...) ou quando não tem jeito

mesmo a gente fica sem”.

A unidade produtiva do senhor Catulino Lopes Viana conta também

com a criação de gado leiteiro, sem raça definida, que contribui com uma

pequena renda mensal para a família. Essa criação é constituída de seis

vacas, todas paridas (três bezerras e três bezerros) e duas novilhas

solteiras, sendo que uma dessas novilhas encontra-se em outra propriedade.

No processo de reprodução foi utilizado um touro do vizinho como

reprodutor. O gado é utilizado para a produção de leite, que tem uma

produção média diária em torno de oito a dez litros de leites. Normalmente,

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essa variação da quantidade de leite ocorre em função do horário em que

ocorre a apartação dos bezerros e da oferta de pasto durante o ano. No

período da estação seca acentuam-se os problemas na produção, pois, o

informante dispõe de pouca oferta de produtos como forrageiras, para que

possa complementar a alimentação. Segundo o agricultor, os produtos que

utiliza como forrageiras para o gado são: as palhas do arroz, após ser

batido; as palhas do milho e as folhas da cana. O reflexo desses aspectos é

a baixa produtividade do leite. Ao final de cada ano o informante diz que

possui renda extra na venda dos bezerros.

A criação de galinhas, que serve para abastecer a família com carne

e ovos, é realizada no sistema extensivo, soltas no quintal. São alimentadas

logo ao amanhecer e ao entardecer, com milho em grãos. Também existe

uma pequena criação de porcos, no sistema extensivo, soltos e alimentados

com milho e com outros subprodutos, como abóbora, mandioca, mamão e

restos de alimentos. Essas criações servem para a produção de carne e

banha. Normalmente, o excedente desses animais é comercializado.

4. 1.1.2 Unidade produtiva – (UP-S02) do senhor Benedito Lopes Viana

A unidade produtiva do senhor Benedito Lopes Viana está situada em

uma área pertencente ao Luciano Silva, casado com a irmã do senhor

Catulino Lopes Viana. O senhor Luciano Silva comprou a parte de terra que

pertencia à senhora Mariana Lopes Viana Lopes Viana, tia do senhor

Catulino Lopes Viana.

O senhor Benedito Lopes Viana, vivia na comunidade de Barreiro

Preto, localidade próxima à sesmaria de Santana, na mesma região da

morraria. Sua vinda para a comunidade de Santana, ocorreu em virtude de

convite de senhora Mariana Lopes Viana Lopes Viana. Esse pedido consistia

para que o senhor Benedito Lopes Viana viesse viver em suas terras. Esse

convite não ocorreu com vista à obtenção de algum lucro financeiro por parte

de dona Mariana Lopes Viana e sim com o intuito de ter os familiares

próximos a si. Posterior a esse convite a senhora Mariana Lopes Viana

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Lopes Viana vendeu seu direito de posse ao senhor Luciano Silva, que é tido

como sobrinho, já que é casado com sua sobrinha.

A senhora Mariana Lopes Viana, para vender suas terras para o

senhor Luciano Silva, exigiu que não houvesse a retirada das pessoas que

ocupavam a área, que por sinal foram convidadas a utilizarem as terras de

acordo com suas necessidades. O senhor Benedito Lopes Viana e o senhor

Máximo Lopes Viana utilizam a área cultivando roças de toco em sistema

itinerante. A intenção é permanecer enquanto durarem as exigências da

senhora Mariana Lopes Viana.

Mesmo sabendo que o senhor Luciano Silva não reside na área, e

que no momento ele possui emprego em um frigorífico em Cáceres, o

senhor Benedito Lopes Viana está disposto a desocupar área, sem nenhum

conflito assim que houver o pedido por parte do proprietário.

Quando aceitou o convite e veio para Santana com a família, o

primeiro local em que ficou foi a residência do seu cunhado, que ficava

localizada próxima, onde hoje, é a igreja católica. Ali viveram poucos anos,

pois achava o cunhado muito sistemático, além disso, as crianças mexiam

muito nos pertences pessoais e o cunhado não gostava. Percebendo que

isso poderia vir a causar algum tipo de atrito, saiu a procura de um lugar

mais afastado para construir uma nova casa. O local, onde hoje é a sua

residência, foi escolhido em função de uma série de fatores favoráveis,

como: disponibilidade de madeiramento para a construção da casa; de água

e de palha de indaiá (Orbignya eichleri Drude), para cobertura da casa. Além

disso, o senhor Benedito Lopes Viana buscou no relevo aspectos que

pudessem dar mais segurança à família. A altitude é um fator importante,

pois nesta região, algumas áreas, no período da estação chuvosa acabam

inundando; um outro aspecto levado em consideração foi a densidade da

mata, condição importante na hora de se fazer uma boa roça.

Na unidade produtiva do senhor Benedito Lopes Viana, existem duas

casas (Figura 10): uma principal, destinada ao dormitório da família e a

receber as visitas e a outra funciona a cozinha e a despensa. Ainda, há

também um pequeno galpão cercado de pau-a-pique, normalmente

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destinado a guardar algum produto de utilidade, como: arreios; máquina de

plantar arroz, milho e feijão, conhecida como matraca; bicicletas e sacarias

em geral.

As paredes da casa principal são feitas com pau-a-pique, presas com

Taboca ou Taquara (Guadua weberbaweri ) e barroteada com, uma mistura

de barro e areia, coletadas nas imediações da própria construção; a

cobertura é feira com palhas de Indaiá (Orbignya eichleri Drude) coletada na

mesma região. A cozinha é feita também seguindo os mesmos moldes da

casa principal, ou seja, retangular com duas águas, cobertura com palha de

Indaiá (Orbignya eichleri Drude), porém, as paredes são apenas feitas de

pau-a-pique, sem reboco.

O senhor Benedito Lopes Viana é casado com a senhora dona Maria

Santana Lisboa, conhecida como dona Cotinha e possuem dois filhos que

moram em sua companhia, ambos solteiros, os senhores Basílio e Gonçalo.

FIGURA 10. Residência do senhor Benedito Lopes

Foto

: R. S

. Bas

tos,

2004

.

A residência do

senhor Benedito

Lopes Viana (Figura

10) é feita com

esteios de madeira de

lei – as aroeiras

(Myracrodruon

urundeuva Fr. All), as

vigas e as travessas

também são de

madeira resistente,

como Carijó, também

conhecido como Aricá

(Physocalymma

scaberrimum Pohl).

Esta mesma madeira

também é utilizada

como caibro.

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O Gonçalo Lopes Viana, filho mais novo, possui um emprego em uma

empresa de reflorestamento, a Floresteca, vindo a casa dos pais somente

nos finais de semana ou nos feriados, mas contribui para com as despesas

da casa. O senhor Benedito Lopes Viana, não possui escolaridade, assim

como à senhora sua esposa, dona Cotinha e seu filho mais velho, Basílio

Lopes Viana. O filho mais novo, Gonçalo Lopes Viana possui a oitava série

do primeiro grau. Este ano de 2004 teve que parar de estudar, pois não

estava compatibilizando o tempo de estudo e o trabalho, mesmo trabalhando

durante o dia na empresa e só retornando a noite, para a Vila Aparecida,

onde possui escola de segundo grau, seu esforço físico no trabalho é muito

grande, e quando chega a sua casa na vila, não consegue mais se sentar

em um banco de escola para enfrentar mais quatro horas de estudos.

O agricultor planta as roças nas capoeiras da propriedade em que

vive, em alguns casos introduz o capim para o gado, pois já possui cabeças

de gado, sendo um touro e quatro vacas, além disso, possui também três

éguas, destinadas a tração, pois são mansas de carroça, para o transporte

de carga e também para a lida no campo.

O senhor Benedito Lopes Viana utiliza terras em torno de sua

residência para cultivar milho, arroz e feijão, normalmente planta sozinho. O

seu filho mais velho, o Basílio, também cultiva roças, porém, em separado,

mas coloca a produção a disposição das despesas da família, comercializa

somente o excedente. O senhor Benedito Lopes Viana trabalha fora de sua

unidade produtiva para o senhor João Batista, como tirador de leite,

ganhando R$ 120,00 reais mensais. Nesta propriedade do senhor João

Batista, ele vai pelo menos duas vezes ao dia, sendo que de manhã, tira o

leite e coloca-o para o caminhão e na parte da tarde, retorna para apartar os

bezerros. Além disso, está sempre cuidando dos animais para que não

peguem nenhum tipo de doenças ou bicheiras. A unidade produtiva ainda

conta com criação de porcos e galinhas, ambos para as despesas da casa

no que diz respeito à alimentação.

O senhor Benedito Lopes Viana cultiva qualquer área de roça que

esteja disponível para o plantio, podendo ser aquelas que estão em volta de

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sua casa ou um pouco mais distantes, porém sempre em pequenas áreas,

variando em torno de 0,55 hectare. No ano agrícola de 2003/2004, chegou a

ter cinco roças em locais diferentes, sempre com a finalidade de abastecer a

família.

O arroz, o milho, o feijão, a mandioca e a banana são os produtos

mais cultivados em sua unidade produtiva e são destinados ao consumo

familiar. A preferência é o plantio da banana de fritar, pois além do consumo

também pode ser comercializada com maior facilidade, pois é um produto de

bastante aceitação e de bom preço no mercado. A área de plantio da

banana (Tabela 3) só perdeu para o arroz na safra 2003/2004. No ano

seguinte, a área de banana mantém-se e a área de arroz sofre diminuição. O

agricultor manifestou a intenção em aumentar a área da produção de

banana, justamente pela condição atrativa de mercado. Segundo o senhor

Benedito Lopes Viana, isso só não ocorreu porque as condições das

estradas são ruins, deixando a região praticamente isolada e isso atrapalha

na hora da comercialização.

A criação de animais também está voltada a atender as necessidades

básicas de subsistência da família (Tabela 3), por isso há pequena

quantidade de animais. Todas as vezes que a família está passando por

eventuais necessidades, seja na saúde, no abastecimento de alimentos ou

de qualquer outra natureza, são os animais domésticos, que atendem essas

necessidades, mediante sua comercialização.

O começo do plantio do milho ocorre em novembro e dezembro, na

lua crescente, para ser colhido em fevereiro e março. O plantio do arroz

ocorre nos meses de dezembro e janeiro, também na lua crescente, se o

plantio do arroz ocorrer no mês de janeiro, a colheita será no período

favorável, pois estará no período das secas. No entanto, se a área escolhida

for uma área propensa a ser alagada ou sujeita a ter muita umidade, então o

plantio será mais cedo, ou seja, nos meses de novembro ou dezembro. O

plantio do feijão ocorre nas áreas que se plantou o arroz ou milho,

normalmente planta-se na lua crescente, na primeira quinzena de março. A

área destinada ao plantio do feijão tem que ser novamente limpa, isso ocorre

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com a utilização da enxada. Além disso, após o plantio a área passa

novamente por mais uma limpeza, para se ter uma boa colheita chamada

demão3.

TABELA 3. Produtos cultivados, para o autoconsumo, pelo senhor Benedito

Lopes Viana e suas respectivas áreas, safras 2003/2004 e

2004/2005.

TIPOS DE PRODUTOS

ÁREA CULTIVADA

Safra 2003/2004

(Em hectares)

ÁREA CULTIVADA

Safra 2004/2005

(Em hectares)

ANIMAIS DE

CRIAÇÃO

QUANTIDADE

Arroz 1,60 0,70 Bovinos 5

Milho 0,30 0,30 Eqüinos 3

Mandioca 0,40 0,40 Suínos 8

Banana 1,10 1,10 Aves

(galinhas) 35

Feijão 0,40 0,30 Cães 4

Cana-de-açúcar - 0,15 Gatos 2

Outros1 (milha

pipoca, abóbora, cará,

maxixe, melancia,

quiabo, abacaxi,

batata doce e

inhame).

- -

Animal

silvestre

(papagaio)

1

Total da área em produção

3,80 2,95 Total da

criação de animais2

58

1 Estes produtos não possuem uma quantidade de área específica. Nestes casos planta-se estritamente para o consumo. 2 Dados referentes ao ano de 2005.

3 Demão – expressão usada entre os agricultores tradicionais que possui vários significados. (1) ajuda a um vizinho; (2) para se referir à limpeza efetuada em uma determinada área de terra; (3) medida, relativo ao período que levou para realizar a limpeza de uma determinada área. Exemplo: O indivíduo levou dois dias ajudando seu vizinho, logo, ele diz que: “tenho duas demãos com meu vizinho”.

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Nos meses de junho e julho plantam-se bananas e mandioca. Além

disso, tem que sobrar tempo para a limpeza do quintal, em volta da casa,

isso ocorre principalmente nos meses que estão mais frios. Ainda como

produtos complementares, o senhor Benedito Lopes Viana planta cana,

milho pipoca, abóbora, cará, maxixe, melancia, quiabo, abacaxi, batata doce

e inhame (Tabela 3).

O Basílio Lopes Viana, na safra 2003/2004, plantou roça de arroz em

terras do senhor João Batista. Em troca da roça, teve que plantar capim

baquearia. Toda a produção foi trazida para a residência da família, e

destinada estritamente ao autoconsumo.

O quintal do senhor Benedito Lopes Viana é muito diversificado, com

plantas medicinais, ornamentais, e árvores frutíferas, como: jambo, manga,

laranja, mexerica poncã, lima, limão, coqueiro da baia, fruta de conde,

laranja de fazer doce, caju e café. Essa constatação pode ser confirmada

por Godoy (2004):

“Os índices encontrados neste trabalho

são considerados altos. A alta

diversidade de citações de plantas

obtidas nas comunidades revela por parte

das famílias amplo conhecimento de

plantas e de usos de espécies vegetais, e

ainda, revela que o quintal representa um

espaço estratégico da unidade produtiva,

atuando na manutenção da diversidade

de plantas, sendo de grande importância

para as famílias”.

Segundo o senhor Benedito Lopes Viana, todos esses produtos não

têm finalidade comercial. O destino em primeiro lugar é para o consumo da

família e depois para atender os vizinhos ou mesmo servindo-lhe de um

pequeno agrado.

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4. 1.1.3 Unidade produtiva – (UP-S03), do senhor Máximo Lopes Viana A unidade produtiva do senhor Máximo Lopes Viana, denominado de

Sítio Serra Linda, não possui documentação e nem delimitação que

assegure sua permanência na terra, sua unidade produtiva está dentro da

área do senhor Luciano Silva, juntamente com a propriedade do senhor

Benedito Lopes Viana. O senhor Máximo Lopes Viana, também recebeu

convite da senhora Mariana Lopes Viana para vir morar em suas terras.

Hoje, está na mesma situação do senhor Benedito Lopes Viana. O novo

proprietário da área não estando no momento ocupando a referida área e

nem tão pouco necessitando desta para a sua sobrevivência, continua

cedendo sua exploração.

O senhor Máximo Lopes Viana planta arroz, milho, mandioca,

abóbora e banana, todos esses produtos são destinados a sua

sobrevivência (Tabela 4). Além disso, realiza serviços de empreita, em

roçados de pastagens e de capina em áreas de roças dos vizinhos.

Apesar de ser remanescente do antigo arraial de Santana, vive uma

situação bastante complicada. Quando da primeira visita a sua unidade

produtiva, em fevereiro de 2004, desenvolvia suas atividades corriqueiras

que atendiam suas necessidades de subsistência, plantando pequenas

áreas de roças próximo a sua casa e fazendo pequenas empreitas, já que

sua família é composta apenas de sua filha, a senhorita Francelina Lopes

Viana, que cuida dos afazeres da casa e estuda em uma escola primária na

comunidade de Santana. Quando se realizou a segunda visita para coleta

de dados, em outubro de 2004, tomou-se conhecimento que o senhor

Máximo Lopes Viana sofrerá um acidente, sendo mordido por uma cobra e

que como conseqüência desse acidente ficou cego. Essa complicação,

segundo informações levantadas na própria comunidade ocorreu devido à

procura por recursos hospitalares tardios. Em conversa com o próprio

senhor Máximo Lopes Viana, a primeira procura por recurso foi a benzedura

de uma moradora da localidade. A procura por recurso médico hospitalar só

ocorreu dias após o acidente.

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TABELA 4. Produtos cultivados, para o autoconsumo, pelo senhor Máximo

Lopes Viana, com suas respectivas áreas, safras 2003/2004 e

2004/2005.

TIPOS DE PRODUTOS ÁREA CULTIVADA

safra 2003/2004 (Em hectares).

ÁREA CULTIVADA safra 2004/2005

(Em hectares).

Arroz 0,2 - Milho 0,3 - Mandioca 0,2 - Banana - - Outros1 (abóbora, moranga,

quiabo, maxixe, melancia, abacaxi.) - -

Total da área em produção

0,7 -

1 Produtos sem área específica, cultivados em consórcio com outras culturas, destinadas estritamente para o autoconsumo e para alimentar animais domésticos.

Em dezembro de 2004, quando realizava a terceira visita a campo,

certificou que a situação do senhor Máximo Lopes Viana tornou-se bastante

preocupante, pois a falta da visão afetava sua capacidade de suprir as

necessidades básicas da família, mesmo porque para ele a adaptação a

essa situação ainda era uma novidade. Entretanto, ele já consegue admitir

que o alimento que vinha das suas roças e da força de seu trabalho em

empreitas não será possível na mesma forma que antes. A sobrevivência do

Senhor Máximo Lopes Viana naquela localidade só está acontecendo por

que seus vizinhos, que também são familiares estão ajudando-o com a

alimentação.

4.1.1.4 Unidade produtiva – (UP-S06), do grupo familiar do senhor Armindo Lopes Viana

A propriedade do senhor Armindo Lopes Viana está localizada na

extremidade norte da sesmaria de Santana, fazendo divisa com a sesmaria

da Inhuma. O Sítio recebe o nome de Santo Antônio. Atualmente vivem

consigo, sua esposa, a senhora Ana Lopes Viana, e quatro filhos. Desses,

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dois solteiros e dois casados. Os solteiros são: Ailton Lopes Viana e

Benedito Lopes Viana. Os casados são: o senhor Cecílio Lopes Viana e o

senhor Liduvino Lopes Viana, os quais constituem núcleos familiares

independentes e que serão abordados como unidades familiares distintas,

mesmo estando dentro de uma mesma área territorial.

O senhor Armindo Lopes Viana é nascido e criado na sesmaria de

Santana, sua propriedade é fruto de herança de seus pais. Mesmo tendo

recebido a área nestas condições, o senhor Armindo Lopes Viana não

possui documentação que a legitime. A princípio morava na colônia da

sesmaria de Santana, e com a entrada de pessoas de fora da comunidade,

mudou-se da colônia vindo para o local onde se encontra hoje.

para a plantação. Possui também um curral feito de lasca de madeira

encaixada uma sobre as outras e com dois mourões servindo de apoio para

cada lance de cerca (Figura 11).

O curral possui duas divisões e um brete com embarcador de gado,

feito de tábuas, retiradas na propriedade, com o auxilio de uma moto serra.

A residência é constituída por duas casas: sendo uma menor,

destinada à cozinha e a outra o dormitório e sala da visitas (Figura 12). A

casa menor, que é a cozinha, é feita de pau a pique, sem reboco, tendo

cobertura de palha de Indaiá (Orbgnya eichleri Drude), suas paredes são

A propriedade

possui benfeitorias,

como cercas de arame

farpado, cercas de

madeira, principalmente

as que cercam a roça;

que está próxima da

casa, que constitui uma

maneira de

reaproveitamento da

madeira derrubada

FIGURA 11. Curral do senhor Armindo Lopes Viana. Fo

to: R

. S. B

asto

s, 20

04.

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feitas de madeira retiradas dentro de sua propriedade. Já a casa maior, ou

casa principal, também é feita em madeira (pau a pique), porém encontra-se

rebocada com barro proveniente de suas proximidades, a cobertura é feita

com palha de Indaiá (Orbgnya eichleri Drude). Os móveis da casa são

No sítio sempre foram utilizados métodos tradicionais no manejo de

sua propriedade, entretanto, ultimamente, principalmente nos últimos cinco

anos vem introduzindo a utilização do trator para o desmatamento, pois,

após, o primeiro plantio, logo em seguida, planta-se o capim e assim ocorre

a substituição de uma área destinada a virar capoeira em pastagem. Em

alguns casos planta-se a semente de capim logo após o plantio do produto

agrícola, causando de certa forma uma concorrência entre os produtos.

Porém, segundo o senhor Armindo Lopes Viana, se o objetivo principal for a

formação de pastagem compensa tal prática, mesmo tendo baixa

produtividade. A propriedade está voltada a atender as necessidades básicas de

subsistência da família, com: criação de gado, que também produz o leite;

criação de porcos e galinhas. Também, cultivam-se roças de milho, arroz,

feijão, abacaxi, café, abóbora, amendoim e uma pequena horta (Tabela 5).

Foto

: R. S

. Bas

tos,

2004

.

FIGURA 12. Residência do senhor Armindo Lopes Viana.

simples,

constituídos de

mesas e bancos de

madeira,

confeccionados no

próprio sítio com a

utilização de uma

moto-serra e de

ferramentas

manuais, como o

formão, machado e

facas.

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Na tabela 5 estão descritos o que foi cultivado pelo grupo familiar do

senhor Armindo Lopes Viana, nela estão incluídos as produções dos

senhores Cecílio Lopes Viana e Liduvino Lopes Viana.

TABELA 5. Produtos cultivados, para o autoconsumo, pelo grupo familiar do

senhor Armindo Lopes Viana e suas respectivas áreas, safras

2003/2004 e 2004/2005.

TIPOS DE PRODUTOS ÁREA CULTIVADA

safra 2003/2004 (Em hectares)

ÁREA CULTIVADA safra 2004/2005 (Em hectares)

Arroz2 1,10 2,07

Milho3 1,15 1,59

Mandioca 1,58 0,96

Banana 4,88 3,31

Batata doce 0,04 -

Cana de açúcar 0,01 0,01

Outros1 (abóbora, quiabo,

maxixe, moranga, amendoim,

café, mamão) - -

Total da área em produção

8,76 7,94

1 Estes produtos são cultivados em consórcio, sem uma quantidade de área específica. Neste caso planta-se estritamente para o consumo. 2 O arroz está consorciado com a banana. 3 O milho está consorciado com a banana.

O modo de produção nesta unidade produtiva ocorre de forma

comum, onde o patriarca congrega a sua volta os seus descendentes,

mesmo aqueles que já constituíram núcleos familiares independentes.

Porém, nas atividades de manejo, estabelecem relação comunitária de

trabalho. Aqui se verificou que as roças recebem a denominação de quem

está à frente dos trabalhos e que escolheu o local para o plantio. É possível

observar que entre esses agricultores, se diz que a roça do Ailton ou a roça

do senhor Armindo está precisando de nova demão. No entanto, isso não

significa que tal indivíduo seja o dono, de forma estrita ou ainda que ele não

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deva atender primeiramente às necessidades do grupo familiar. Na safra

2004/2005, tanto o senhor Armindo Lopes Viana como o senhor Cecílio

Lopes Viana, seu filho, plantaram áreas de arroz, em ambos os casos

qualquer umas das áreas seria capaz de atender as necessidades do grupo

familiar. Nesta situação, retira de forma proporcional o suficiente para o uso

doméstico e após atender as necessidades de cada núcleo familiar permiti-

se a comercialização do excedente. Os dividendos dessa comercialização

ficam para aquele na qual a roça recebeu seu nome.

Na safra 2003/2004, o grupo familiar do senhor Armindo Lopes Viana

utilizou a consorciação de culturas para aumentar a área produzida,

principalmente de banana. Isso porque é o produto que tem maior aceitação

na hora da comercialização.

Para a safra 2004/2005, o grupo familiar do senhor Armindo Lopes

Viana preparou áreas para o plantio em novos locais, que constitui área de

expansão. Este trabalho foi realizado no braço, ou seja, primeiramente

escolheu-se a área, uma capoeira com mais de oito anos de descanso, onde

foi roçada a foice, derrubada a machado, e depois de um período em

repouso para a secagem da vegetação, colocou-se o fogo, para fazer a

limpeza da área. O plantio foi realizado assim que as chuvas começaram,

com arroz e milho e posteriormente, o feijão (Apêndice J).

4.1.1.4-A Unidade produtiva – (UP-S04), do senhor Cecílio Lopes Viana A unidade produtiva do senhor Cecílio Lopes Viana está localizada

dentro da propriedade de seu pai, o senhor Armindo Lopes Viana, distante a

poucos metros. Inclusive recebe a mesma denominação, para efeitos de

pagamentos de tributos, junto aos órgãos governamentais, como é o caso de

informações prestadas, junto ao INDEA – Instituto de Defesa Agropecuária

do Estado de Mato Grosso, quando das informações de vacinações de febre

aftosa, do rebanho bovino.

Esta unidade produtiva está incluída dentro do espaço territorial

pertencente ao senhor Armindo Lopes Viana, este tem utilizado de forma

comum os espaços e os recursos naturais, como a madeira, para a

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construção de curral, chiqueiro de porcos, cercas de divisões de pastos,

lenha para geração de energia no dia-a-dia, e para a construção de casa e

depósitos, como tulhas e paióis. As pastagens são utilizadas de forma

comum, entre os membros da família, pois todos possuem gado e as

pastagens são para atender a todos.

No entanto, para a safra 2004/2005, fez-se uma roça de arroz e milho

(Figuras 13 e 14) em áreas dentro da propriedade de seu pai. Esta roça foi

feita em área de mata ciliar, constituindo em uma área de expansão agrícola

(Apêndice N).

O senhor Cecílio

Lopes Viana também

utiliza áreas próximas,

em propriedades de

vizinho, para o cultivo

de roças destinadas à

manutenção de sua

família. Normalmente,

todo o sustento de sua

família é oriundo da

produção das roças que

ficam tanto em área

dentro como fora da

propriedade de seu pai,

o senhor Armindo

Lopes Viana. Além

disso, o sustento de

sua família é

complementado com a

força de seu trabalho,

quando está realizando

empreitas para outros

FIGURA 13. Local, onde se bate o arroz – safra 2004/2005.

Foto

: R. S

. Bas

tos,

200

5

FIGURA 14. Roça de arroz do senhor Cecílio Lopes Viana, safra 2004/2005.

Foto

: R. S

. Bas

tos -

200

5

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proprietários da região, da produção do leite, no dia-a-dia e com a venda dos

bezerros, ao final do desmame. Às vezes, comercializa os animais que são

para descarte (animais velhos e defeituosos) e o excedente da produção,

arroz, milho, feijão, banana, e mandioca. Em situações esporádicas também

comercializa o excedente proveniente dos suínos e de suas aves (galinhas).

O núcleo familiar é constituído: pelo senhor Cecílio Lopes Viana,

viúvo e pelos seus quatros filhos; Luzia Auxiliadora Pereira Viana, Benedito

Pereira Viana, Joaquim Pereira Viana e Divino Pereira Viana. Apenas dois

de seus filhos estudam no momento.

4.1.1.4-B Unidade produtiva – (UP-S05), do senhor Liduvino Lopes Viana

A unidade produtiva do senhor Liduvino Lopes Viana não é

constituída de documentação que a legitime. A área que ocupa está dentro

de uma outra pertencente a seu pai, o senhor Armindo Lopes Viana. Nesta

área está vivendo, com o consentimento de seu pai, podendo produzir para

a subsistência de sua família.

Este agricultor, ao longo de sua história nunca saiu da região da

sesmaria de Santana e nem residiu fora dos seus limites. Desde o seu

nascimento sempre esteve ao lado de seu pai ajudando-o na lida do dia-a-

dia.

A residência está na propriedade do senhor Armindo Lopes Viana,

Sítio Santo Antônio, a poucos metros da casa de seu pai. Ali, redide com

toda a sua família: a esposa, a senhora Florentina Lopes Viana e quatro

filhas. Natalina Lopes Viana, Rosenil Lopes Viana, Rosilene Lopes Viana e

Elenice Lopes Viana. Apesar de residir em uma área territorial que pertence

a seu pai e explorando a terra de forma comum, mantém como área de uso

restrito, o quintal. Há também a utilização, para a subsistência familiar, dos

produtos derivados das criações, como por exemplo, o leite e a venda dos

bezerros quando ocorre a desmama. Este agricultor mantém, de forma

individual, a criação de porcos e de aves (galinhas), estritamente para a

subsistência familiar. Além disso, para complementar a subsistência de sua

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62

família, na unidade produtiva, realiza trabalhos fora de sua área domiciliar

como empreiteiro e em roças de vizinhos, cultivando ou mesmo na limpeza

dessas áreas.

4.1.1.5 Unidade produtiva – (UP-S07), do senhor Antônio de Souza Ribeiro

A unidade produtiva do senhor Antônio de Souza Ribeiro, mais

conhecido pelo seu apelido de Totó, é denominando de Sítio São Jorge,

sem documentação, possui área de 250m x 500m, perfazendo um total de

12,5 hectares. Este local foi escolhido e demarcado pela pessoa que grilou a

sesmaria de Santana, o senhor Mário japonês. Isso aconteceu numa época

em que o senhor Antônio de Souza Ribeiro trabalhava para o senhor Mário

em 1984 e que num desentendimento cobrou uma antiga promessa, que

consistia neste pedaço de terra, por conta de um acordo de trabalho.

O núcleo familiar é constituído de sua esposa Zilda Mendes dos

Santos e de suas três filhas: Simone dos Santos Ribeiro, Silmara dos Santos

Ribeiro e Sirlene dos Santos Ribeiro. Todas estão estudando, inclusive sua

esposa.

O senhor Antônio de Souza Ribeiro nasceu na comunidade de

Santana, vivendo aí até os 15 anos de idade, quando sua mãe veio a

falecer, mudando em seguida para a cidade de Cáceres, onde viveu por oito

anos, e depois indo para Mirassol D’oeste, morando mais oito anos e

posterior a isso volta para a fazenda do Mário japonês, em Santana em

1984, passando a trabalhar por mais seis anos.

A propriedade está situada em um local que abrange partes de terra

de cerrado, com campo e várzeas e outra parte de terra de mata,

constituindo as mais férteis, porém é muito pequena. Praticamente toda a

unidade produtiva foi desmatada e cultivada com capim, do tipo grama

Humidícola (Brachiaria humidícola), destinado à criação de gado. Existe

ainda uma pequena parte da propriedade, 1,45 hectare que se tornou uma

capoeira e mais 1,7 hectare de mato. Segundo o informante serão

introduzidas máquinas tão logo a condição financeira o permita, para se

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63

fazer o plantio de arroz, milho e feijão e, posteriormente, a introdução de

capim.

Na propriedade existem duas casas, uma delas não está sendo

ocupada atualmente, pois até o ano de 2003 moravam pessoas da família e

que mudaram para a cidade de Cáceres, em busca de melhores condições

de vida. A sua casa é construída de pau-a-pique, coberta com telhas de

barro, sendo que a cozinha fica em separado da casa principal, ou seja, dos

quartos e da sala de visita. Além disso, no ano de 2004, construiu uma

pequena varanda, ou como o agricultor a chama: de uma área coberta.

Ainda em sua propriedade encontra-se um curral de arame liso, galinheiro e

um chiqueiro de porco feito com tela. A área de pastagens apresenta duas

divisões.

O agricultor planta poucos produtos em sua propriedade, apenas um

pequeno canavial em consórcio com arroz e uma horta. A produção que

proporciona o sustento para si e a família é proveniente das áreas de

cultivos que ficam fora de sua unidade produtiva.

Para o sustento familiar, planta áreas de roça em propriedades de

vizinhos, como, por exemplo, a do senhor Ademar, que doa a área para o

plantio sem exigir nada em contrapartida. Essa área, que começou a ser

trabalhada na safra 2003/2004, será utilizada pelo menos mais um ano.

Serão cultivados: milho, arroz, mandioca, amendoim, abóbora, moranga e

milho pipoca (Apêndice O). Além disso, para complementar o sustendo de

sua família, trabalha em uma fazenda vizinha, por empreitada, roçando

pastagens e plantando capim, chegando a ganhar R$ 300.00, por mês.

Porém, esse trabalho de empreita só ocorre em alguns meses do ano,

principalmente no período das chuvas. Os produtos cultivados pelo senhor

Antônio de Souza Ribeiro, bem como suas respectivas áreas, estão

representados na Tabela 6. Estas culturas são referentes às safras

realizadas nos anos 2003/2004 e 2004/2005, nela podemos observar que

cada produto possui áreas de cultivo muito pequenas, que segundo o

agricultor são destinadas estritamente para o cunsumo familiar.

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TABELA 6. Produtos cultivados, para o autoconsumo, pelo senhor Antônio

de Souza Ribeiro, safras 2003/2004 e 2004/2005.

TIPOS DE PRODUTOS ÁRAE CULTIVADA

safra 2003/2004 (Em hectares)

ÁRAE CULTIVADA safra 2004/2005 (Em hectares)

Arroz 0,50 -

Milho 1,01 -

Mandioca 0,15 0,20

Banana 0,39 0,39

Cana-de-açúcar2 0,19 0,19

Outros1 (Milho pipoca,

abóbora, mamão, maxixe,

moranga, cará.) - -

Total da área em produção

2,24 0,78

1 Estes produtos são cultivados em consórcio, sem uma quantidade de área específica. Nestes casos planta-se estritamente para o consumo. O milho pipoca aparece circundando toda a roça do agricultor nos limites de uma cultura e outra. 2 A cana está em consórcio com arroz em uma pequena área.

Outro aspecto que pode ser observado é a diminuição significativa da

área de cultivo na safra 2004/2005 (Tabela 6). As roças de arroz e milho,

produtos essenciais na mesa do agricultor, deixaram de ser cultivadas.

Segundo o informante, a falta de estimulo é o principal motivo por esta

situação. Entretanto, as necessidades de subsistência da família serão

supridas com os trabalhos de empreitas, nas fazendas vizinhas.

As áreas de atividade agrícola que o agricultor utiliza reforçam a

característica de produção de autoconsumo, inclusive as que estão fora de

sua unidade produtiva (Apêndice O), e que constituem prolongamentos de

sua área territorial, as quais são essenciais à manutenção da subsistência,

sendo abordado por Azevedo (2001), como espaço funcional.

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4.1.1.6 Unidade produtiva – (UP-S08), do senhor Paulo dos Anjos Martins

O senhor Paulo dos Anjos Martins morava no retiro da sesmaria de

Santana, onde nasceu em 1949 e permaneceu na localidade do retiro até

1978. Depois se casou com a senhora dona Margarida Viana Martins, e

tiveram 11 filhos: Maria José Martins de Oliveira, hoje casada; Sandrinei

Viana Martins; Adriana Viana Martins; Carlos Viana Martins Joani Viana

Martins; Alessandro Viana Martins; Vera Luzia Viana Martins, esta também

já se casou; Gilson Viana Martins; Marilene Viana Martins; Valdirene Viana

Martins; Juliano Viana Martins. Hoje, reside no Sítio São José, uma pequena

propriedade de 6,6 hectares, adquirida através de contrato de compra e

venda, efetuada com a senhora Mariana Lopes Viana Lopes Viana, tia do

senhor Catulino Lopes Viana. No entanto, não possui documento de

escritura que lhe dê a legitimidade da terra. O agricultor possui apenas o

direito de posse. A situação só não é mais grave porque o tempo de

permanência no local é bastante extenso.

Neste local já mora há dezessete anos. No início, a propriedade foi

aberta no braço, ou seja, na foice e no machado, desmatando e queimando

para plantar as roças. Porém como a propriedade é muito pequena, resolveu

abrir com máquina, para plantar o capim, logo após a lavoura. Hoje, sua

propriedade está formada com pastagens, onde cria gado, destinado ao

abate e a produção do leite para o consumo familiar. Essa criação é de 51

animais entre bovinos e eqüinos4. Um fato importante está na distribuição

desses animais, pois, cada membro da família possui entre dois e quatro

animais. O senhor Paulo dos Anjos Martins é o que possui menor

quantidade de animais.

O vizinho, Luciano Silva, possui também área de terra, adquirida

através da compra da dona Mariana Lopes Viana. Como no momento, não

está necessitando de usufruir dessas terras, ele desmatou uma pequena

área de terra, com a utilização de máquina de esteira, arou-a com trator e

plantou milho e capim, a partir do momento que retirou o milho, a área de

4 Dados referentes ao ano de 2003.

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terra ficou toda formada com capim braquiarão (Brachiária brizantha cv.

maranduva).

A propriedade do senhor Luciano Silva faz divisão com as terras do

senhor Paulo dos Anjos Martins, que além de cuidar do gado de ambos,

realiza as tarefas de manutenção das cercas e de roçado da pastagem.

Neste local, o Paulo dos Anjos Martins também utiliza a mesma área como

extensão de suas pastagens, para a criação de todo o gado da família.

Em vista da unidade produtiva do agricultor ser muito pequena, de

apenas 6,6 hectares; da necessidade de se fazer correção de solo, pois,

este não consegue atingir alta produtividade; e da necessidade de priorizar

alimentação para o gado, através do plantio de pastagens, acabou forçando-

o a optar por não cultivar nenhum tipo de produto agrícola em sua unidade

produtiva. Sempre buscou suprir as necessidades alimentares da família

fazendo roças em áreas de terras que consegue com vizinhos, amigos e

conhecidos. O vizinho que mais tem atendido suas necessidades neste caso

é o senhor Ademar, que não tem utilizado suas terras e acaba concedendo a

exploração (Apêndice P).

TABELA 7. Produtos cultivados para o autoconsumo, pelo senhor Paulo dos

Anjos Martins com suas respectivas áreas, safras 2003/2004 e

2004/2005.

TIPOS DE PRODUTOS ÁREA CULTIVADA

safra 2003/2004 (Em hectares)

ÁREA CULTIVADA safra 2004/2005

(Em hectares) Arroz 0,98 0,49

Milho - 1,32

Mandioca 0,36 0,85

Outros1 (abóbora,

amendoim, milho pipoca,

quiabo, maxixe, melancia). - -

Total da área em produção

1,34 2,66

1 Estes produtos são cultivados em consórcio, sem uma quantidade de área específica. Nestes casos planta-se estritamente para o consumo.

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Na Tabela 7 encontram-se os produtos cultivados pelo senhor Paulo

dos Anjos Martins e suas respectivas áreas, nas safras 2003/2004 e

2004/2005. Como referimos anteriormente, este agricultor não possui

nenhum tipo de produto agrícola cultivado em sua unidade produtiva. Todos

são em áreas fora de sua unidade produtiva (Apêndices P e Q).

Como troca do favor que recebe do senhor Ademar, seu vizinho, para

trabalhar a terra e dela retirar o sustento de sua família, o senhor Paulo dos

Anjos Martins cuida de toda a área sem cobrar por isso. O senhor Ademar é

um técnico agrícola funcionário da Empaer – Empresa Mato-grossense de

extensão rural. Segundo informações do agricultor, a aquisição desta área

de terra, pelo senhor Ademar, foi através de compra do senhor Mário

Japonês.

4.1.1.7 Unidade produtiva – (UP-S09), do senhor Gonçalo Martins Viana A unidade produtiva do senhor Gonçalo Martins Viana está localizada

na mesma área territorial do senhor Catulino Lopes Viana que é seu irmão.

A exploração dessa área está ocorrendo em duas frentes, ou seja, o senhor

Catulino Lopes Viana vem explorando a região oeste, considerada pelos

agricultores como sendo o fundo do lote, margeando a serra; já o senhor

Gonçalo Lopes Viana vem explorando a região leste, que para os

agricultores é considerada como a frente do lote, margeando a rodovia. O

ribeirão Água Branca que corta a sesmaria de Santana está servindo de

linha divisória entre as duas áreas, que constituem propriedades

independentes apenas em acordo verbal entre os agricultores, que exploram

essas terras.

O senhor Gonçalo Lopes Viana possui uma família numerosa,

constituída por treze pessoas: a senhora sua esposa, Maria de Lourdes

Lopes e seus onze filhos: Odair Lopes Viana de vinte anos e que sofre de

deficiência mental, Leandro Viana Martins de dezoito anos, Rosana Viana

Martins de dezessete anos, os gêmeos Maria de Lourdes Lopes Viana filha e

Odailson Lopes Viana de quinze anos, Elizângela Lopes Viana de treze

anos, Flaviano Lopes Viana de nove anos, Fabiano Lopes Viana de sete

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anos, Vando Lopes Viana de cinco anos, Adilson Lopes Viana de três anos e

Lucas Lopes Viana de um ano.

A promoção da subsistência familiar ocorre de forma variada, pois o

agricultor cultiva produtos destinados estritamente ao autoconsumo, que

ocorrem tanto em sua unidade produtiva como em outras áreas. Além disso,

busca trabalhos de empreitas em fazendas da região. Essas empreitas são

de qualquer tipo, sendo roçados de pastagens ou de roças, derrubadas a

machado ou mesmo à moto-serra, na lida com animais (vacinação e

cuidados diários), construção e consertos de cercas e na aplicação de

venenos em pastagens. Este último tipo de empreita é a que apresenta

maior rentabilidade, pois na aplicação de inseticidas, pode-se obter diárias

de trinta e cinco reais5, dependendo da negociação como o proprietário da

fazenda. Este é um fator muito atraente, principalmente para uma região que

dispõe de poucas ofertas de emprego e para um chefe de uma família

numerosa. Porém, a maneira como ocorrem as aplicações, sem nenhum tipo

de proteção, os danos à saúde são inevitáveis.

Em sua unidade produtiva são encontrados produtos como: o arroz, o

milho, a mandioca, a banana, a abóbora e a moranga (Tabela 8). Verificou-

se que a área destinada ao plantio do arroz é maior do que as outras áreas

destinadas aos outros produtos. Isso ocorre em virtude deste produto ter

maior consumo doméstico. A área destinada ao plantio de mandioca está

constantemente sendo renovada, ou seja, assim que colhe, mesmo que uma

pequena quantidade, planta-se imediatamente a mesma área. Essa

estratégia proporciona ao agricultor uma renovação constante de seu

mandiocal e a oferta do produto em diferentes períodos do ano, contribuindo

de forma positiva para a subsistência familiar.

A Tabela 8 revela outros dados importantes, como: a manutenção do

tamanho das áreas cultivadas de mandioca e banana. A mandioca pelo fato

de renovar a plantação constantemente, a banana, por ser uma cultura que

apresenta maior ciclo de produção, quando não apresenta doenças. Além

disso, para a safra 2004/2005, o agricultor deixou de plantar o arroz, pois

5 Dados referentes a dezembro de 2005.

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achou melhor buscar trabalhos de empreita em propriedades vizinhas e por

considerar que a produção do ano anterior alcançaria a safra do ano

subseqüente (safra 2005/2006). Não acontecendo o esperado pelo menos

ficará muito próximo. Essa possível falta do arroz poderá ser suprida, com a

aquisição do produto mediante a compra. Esta certeza vem do possível

ganho financeiro dos trabalhos de empreitas.

TABELA 8. Produtos cultivados, para o autoconsumo, pelo senhor Gonçalo

Lopes Viana e suas respectivas áreas, safras 2003/2004 e

2004/2005.

TIPOS DE PRODUTOS ÁREA CULTIVADA

safra 2003/2004 (Em hectares)

ÁREA CULTIVADA safra 2004/2005 (Em hectares)

Arroz 1,02 -

Milho 0,61 0,50

Mandioca 0,28 0,28

Banana 0,20 0,20

Outros1 (abóbora, quiabo,

maxixe, moranga). - -

Total da área em produção

2,11 0,98

1 Estes produtos são cultivados em consórcio, sem uma quantidade de área específica. Neste caso planta-se estritamente para o consumo.

Todo o processo de produção desse agricultor constitui-se na força

física/braçal, com que realiza todas as etapas da produção. Neste processo,

roça o mato ou a capoeira na foice, derruba a vegetação de maior porte com

o machado, depois de algumas semanas em descanso, para a vegetação

secar, coloca-se fogo. Depois disso, se a queimada não estiver a contento e

ainda ficar muita vegetação sem queimar, faz-se a descoivara, ou seja, retira

essa vegetação que ainda não queimou, amontoado-a em locais dentro do

próprio roçado e coloca-se fogo novamente, limpando assim por completo a

área. Logo em seguida realiza-se o plantio.

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Em virtude da escassez de emprego na região, da baixa

produtividade e da grande despesa com alimentação familiar, o senhor

Gonçalo Lopes Viana busca quase sempre trabalho em propriedades

vizinhas ou mesmo em localidades distantes, passando meses sem

comparecer em casa. Com isso, as roças que estão próximas à residência,

como bananal e o mandiocal, ficam na responsabilidade dos filhos mais

velhos, para limpá-los e garantir nas despesas do dia-a-dia da casa.

4. 1.1.8 Unidade produtiva – (UP-S10), do grupo familiar do Antônio Viriato da Silva

A unidade produtiva do senhor Antônio Viariato da Silva foi adquirida

através de compra do senhor José Norberto da Costa, conhecido como

“Teco”, ou seja, de terceiros, pessoa que não faz parte da comunidade de

Santana. Portanto não são remanescentes do antigo Arraial de Santana. Por

ocasião da compra, o negócio foi realizado em contrato de compra e venda,

tendo como documentação principal apenas o Direito de Posse, portanto,

não há escritura da propriedade. O total da área é de 26,4 hectares, sedo

que 4,4 hectares do senhor Antônio Viriato da Silva e os outros 22 hectares

distribuídos entre os seus dois filhos, o Dielso Viriato da Silva, o Duda com

11 hectares e o Valter Viriato da Silva com os outros 11 hectares. Porém

essa divisão não está registra, documentada ou mesmo formalizada, ela é

informal, e ocorre somente entre os membros da família.

A família do senhor Antônio Viriato da Silva é constituída pela sua

esposa, a senhora Maria Vieira da Silva e por mais oito filhos, sendo que

apenas quatro moram consigo, e desses um é casado. Dos filhos solteiros

que morando com o pai são: o Valter Viriato da Silva, o Ivan Viriato da Silva

e o Vandir Viriato da Silva.

O agricultor só trabalha em sua unidade produtiva, porém seus filhos,

o Valter Viriato da Silva, o Ivan Viriato da Silva e o Vandir Viriato da Silva,

constantemente estão trabalhando fora para complementar a renda da

família, quando estão de folga ou sem emprego passam a ajudar o pai nos

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afazeres diários da propriedade, com a limpeza (capina) das roças de

mandioca, banana, milho, arroz e feijão.

O histórico de vida, que este agricultor possui, é de intensas

mudanças, sempre saindo de um lugar em busca de outro que lhe

oferecesse melhores condições de vida. Ao longo de seus 69 anos de

idade, nasceu em Pernambuco, na cidade de Timbaúba de Mocói, vivendo

na cidade até 1954, depois veio para Rio de Janeiro, onde arrumou emprego

de empreiteiro na Prefeitura, ganhando uns 50,00 cruzeiros, na época.

Porém logo em seguida vai para o interior do Estado de São Paulo, em

Presidente Prudente, mais precisamente no distrito de Ameliópolis, onde se

casou com a senhora Maria Vieira da Silva. Em Presidente Prudente

arrendou uma terra de um japonês, trabalhou uns dois anos, e saiu

novamente, vindo para a Cidade de Jaciara em Mato Grosso, onde comprou

11 hectares de terra, passando a cultivar, milho arroz e algodão, com isso

conseguiu comprar mais terras, chegando a 39,6 hectares. Em 1975 vende

tudo, e novamente vai buscar outro local para morar, desta vez o destino é

Salto do Céu, também em Mato Grosso, onde comprou 88 hectares, porém

neste local ficou só quatro (04) anos. Em 1979 veio para Cuiabá, capital

mato-grossense, onde fez casa, tocou um bar e trabalhou de carpinteiro. Em

1981 vai para Guanandi, município de Cáceres, em Mato Grosso, para ser

administrador de uma fazenda. Logo em seguida, nesta mesma região

compra 22 hectares de terra, onde fica por quase nove anos. Depois vende

tudo novamente e vai para a Agrovila das Palmeiras, Município de Santo

Antônio de Leverger, em Mato Grosso, onde comprou duas (02) Chácaras,

passando a cultivar verduras. Novamente, vende tudo e se muda, em 2003,

para a região da morraria, em Santana, onde permanece até nos dias de

hoje em seu Sítio. Em todas as mudanças, do senhor Antônio Viriato da

Silva, os filhos tiveram em sua companhia, mesmo os que estão casados, as

exceções são as filhas que decidiram seguirem seus maridos.

A unidade produtiva ainda não possui nome definido, a propriedade

possui delimitação com cercas de arame liso, no limites norte, sul e leste. O

limite oeste, considerado pelo agricultor, como o fundo da propriedade, é

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delimitado naturalmente pelo ribeirão Água Branca. Com relação às divisões

internas, são inexistentes.

Quando a propriedade foi adquirida, havia uma área

desmatada e plantada de capim, que fica bem nos fundos, próximo ao

ribeirão Água Branca. No mesmo ano mandou gradear com máquina e

passou a plantar nesta área. Hoje segue um calendário de plantio, assim

distribuído: na primeira quinzena de março realiza o plantio das favas e do

feijão; na primeira quinzena de maio planta-se o feijão de corda; no mês de

junho efetua a limpeza da roça; em julho começa a realizar as primeiras

colheitas das favas e do feijão; no mês de outubro fica destinado ao plantio

de banana e milho, se não estiver muito seco, caso contrário o milho passa a

ser plantado em novembro. Quando a roça tem que ser preparada no braço,

começa a roçar no mês de agosto, para que em outubro esteja tudo pronto,

para a queimada.

Na unidade produtiva, cultiva-se produto destinado primeiramente à

subsistência da família e posteriormente comercializa-se o excedente. No

quintal de casa cultiva-se uma pequena horta, com: alface, couve, cebolinha,

pimentão e plantas medicinais. Além disso, cultiva-se árvore frutífera, como

laranja, manga, mamão, caju, jambo, abacate e limão. Já nas roças cultiva-

se: arroz, milho mandioca, banana, feijão carioca, fava branca, feijão fava,

feijão de corda, melancia, abóbora, moranga, e cará.

Em relação à criação de animais, o grupo familiar cria galinhas,

porcos, vacas. É importante ressaltar que, por não possuir nenhuma divisão

interna em sua propriedade, os animais bovinos ficam em uma propriedade

do vizinho, em pasto alugado, em um total de quatro animais.

A residência da propriedade é constituída de uma casa feita de

tábua e coberta com telha eternit (fibrocimento). Ainda como benfeitoria, a

propriedade conta com um galpão de tábua, um pequeno paiol, galinheiro,

chiqueiro de porcos e uma garagem para o carro, uma caminhonete D-10.

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4.1.1.8-A Unidade produtiva – (UP-S11), do senhor Dielso Viriato da Silva

A unidade produtiva do senhor Dielso Viriato da Silva está na mesma

área territorial de seu pai, o senhor Antônio Viriato da Silva, porém com área

maior que a de seu pai, ou seja, com 11 hectares. Todo o sistema de

produção é aplicado em um espaço de exploração e de uso comum entre

grupo familiar. A produção e sua distribuição ocorrem de acordo com as

necessidades das duas famílias.

A área foi adquirida mediante contrato de compra e venda, não possui

escritura, o único documento que lhe proporciona a sua ocupação é o

direito de posse. Esse foi feito em nome do senhor Dielso Viriato da Silva,

que inclusive inclui toda as demais áreas de seus familiares.

A família do senhor Dielso Viriato da Silva, o Duda, como é

conhecido, é constituída pela sua esposa, a senhora Lourença da Silva,

seus dois filhos, o Leandro Viriato da Silva e o Diego Viriato da Silva; moram

em uma casa construída com tábuas e cobertura de telhas de eternit. A

cozinha foi construída em separado, parte está fechada com tábuas e parte

está aberta, com cobertura também de eternit. Em sua unidade produtiva

possui outras construções como: chiqueiro de porcos, feito com madeira

roliça, apoiada uma sobre a outra e presas entre dois troncos fixados ao

solo; o galinheiro é feito de tela e taboca (Guadua weberbaweri ); o paiol é

feito de madeiras roliças e tabocas (Guadua weberbaweri ) com cobertura de

palha do capim sapé (Imperata brasiliensis).

O agricultor trabalha muito fora de sua unidade produtiva, durante os

meses de outubro/2004, por exemplo, estava trabalhando no município de

Tangará da Serra, na construção civil, como pedreiro. Também o seu filho

mais velho, o Leandro Viriato da Silva, trabalha em uma empresa de

reflorestamento, que fica próxima a região, porém só retorna para a casa

nos finais de semana.

Todos os aspectos que envolvem o sistema de produção, como por

exemplo, os tipos de produto a ser cultivado, o calendário e até mesmo a

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área a ser plantada seguem as determinações de seu pai, o senhor Antônio

Viriato da Silva.

Toda a produção está voltada a atender as necessidades de

sobrevivência da família. A intenção é comercializar apenas aquilo que

exceder ao consumo familiar.

4.1.2. Caracterização das unidades produtivas da localidade de Água Branca A localidade de Água Branca constitui uma pequena comunidade de

moradores instalada ao sul na sesmaria de Santana. Todas as unidades

produtivas estudadas são constituídas por pessoas remanescentes do

arraial ou retiro de Santana. Essas pessoas, bem como as que formam a

comunidade de Sagrado Coração de Jesus/ Santana, foram expulsas de

suas residências e orientadas a residirem nestas localidades pelo próprio

indivíduo que estava expulsando-as.

Todas as pessoas que estão ocupando o espaço na localidade de

Água Branca estiveram, sob ordem de despejo. As pessoas foram colocadas

em um caminhão com todos os seus pertences. O ato de despejo só não se

concretizou em virtude de uma pessoa amiga dos familiares da região

embargar essa ação com mandado de segurança. Em virtude desse litígio

entrou-se em acordo, através do qual os moradores acabaram se

estabelecendo esta localidade.

A localidade de Água Branca é constituída por cinco núcleos

familiares, que estão distribuídos em cinco pequenos sítios: Sítio Três

Irmãos, Sítio São Sebastião da Água Branca, Sítio São Luiz, Sítio Água

Branca. Este último sítio, Água Branca, corresponde respectivamente ao

nome de dois núcleos familiares.

4.1.2.1 Unidade produtiva – (UP-S12), do senhor André Santana Lopes A unidade produtiva do senhor André Lopes Viana é de

aproximadamente 44 hectares, essa é uma metragem estimada, pois não

possui qualquer tipo de documentação que assegure a posse de terra e nem

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75

essa delimitação espacial. O André Lopes Viana é aposentado, casado com

a senhora Maria Aparecida Marques Rodrigues e atualmente moram cinco

pessoas na residência: sua netinha, Ana Tália Marques Rodrigues, a filha

Aparecida Marques Rodrigues e o filho Marcos Aurélio Rodrigues de

dezesseis anos de idade, que atualmente não estuda, mas está trabalhando

na propriedade do pai, ajudando no sustento da família.

Na unidade produtiva cultiva-se banana, mandioca, abóbora, milho,

arroz, feijão, batata doce e cará. Nos últimos quatro anos, a sua produção de

arroz foi muito pequena, sendo necessário comprar quase todo o produto na

vila, assim o dinheiro de sua aposentadoria complementou a compra da

alimentação da família. Aliás, esse é um recurso que se tornou muito

importante para a manutenção da família. Por conta disso, a senhora dona

Maria Aparecida Marques Rodrigues está entrando com a documentação de

sua aposentadoria, junto ao INSS – Instituo de Seguridade Social, pois já

possui idade exigida por lei, para se aposentar.

O senhor André Lopes Viana segue o seguinte calendário agrícola:

nos meses de outubro e novembro, planta-se o milho, condicionado à

existência das chuvas. Em caso de atraso das chuvas, o plantio do milho

passa para a primeira quinzena de dezembro. No mês de dezembro planta

arroz, mandioca, banana e os produtos de pequeno porte consorciados,

como o cará, a abóbora, a moranga, o maxixe e o quiabo. Quando ocorre o

atraso ou diminuição das chuvas, o plantio fica para a primeira quinzena do

mês de janeiro, pois neste mês as chuvas são de maior regularidade. No

mês de março dobra-se o milho e em abril colhe. Ainda no mês de abril,

colhe-se o arroz. Logo após a colheita do milho e do arroz limpa-se a terra

para o plantio do feijão; em maio e junho colhe-se o feijão, neste mês bate o

arroz que está empilhado na roça; no mês julho, agosto e setembro preparo

da terra para plantar, onde começa com o roçado depois a derrubada, em

seguida a queimada, a destoca e a descoivara. Outro aspecto que influencia

o calendário agrícola, desse agricultor, são as fazes da lua, que condiciona

todo o plantio.

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76

Na safra 2003/2004, o senhor André Lopes Viana cultivou uma área

de dois hectares, sendo que desse total, apenas a metade foi cultivada em

sua unidade produtiva, com milho, mandioca e banana.

TABELA 9. Produtos cultivados, para o autoconsumo, pelo senhor André

Lopes Viana, com suas respectivas áreas, referentes às safras

2003/2004 e 2004/2005.

TIPOS DE PRODUTOS ÁREA CULTIVADA

safra 2003/2004 (Em hectares).

ÁREA CULTIVADA safra 2004/2005

(Em hectares). Arroz 1,0 0,3

Milho 0,3 0,3

Mandioca 0,3 0,3

Banana 0,4 0,4

Outros1 (abóbora, batata doce,

quiabo, maxixe e cará) - -

Total da área em produção 2,0 1,3 1 Produtos sem área específica, cultivados em consórcio com outras culturas, destinadas estritamente para o autoconsumo e para alimentação dos animais domésticos.

A Tabela 9 representa as áreas e os produtos cultivados na safra

2003/2004. Nela verifica-se maior destaque para dimensões da área

cultivada com arroz, porém isso ocorreu em virtude de ter sido cultivada em

terras de um vizinho, o senhor José, uma das pessoas que adquiriu suas

terras mediante a compra de terceiros. Esse plantio foi realizado tendo em

contrapartida o empenho da palavra e o trabalho do senhor André Lopes

Viana em plantar o capim para o proprietário da área, mesmo antes de

retirar o arroz que havia sido plantado.

A roça da safra 2004/2005 é pequena sendo 60 braças de

comprimento por 20 braças de largura (medidas fornecida pelo informante,

que não permitiu que fosse feito por outra pessoa que não ele), ou seja, 132

metros por 44 metros, que corresponde a uma área de 5.808 m2, pouco mais

de meio hectare. Nesta área serão cultivadas: metade de arroz e metade de

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milho e após a colheita do milho, a área será limpa e em seguida, cultivada

com feijão. As roças de banana e mandioca vem sendo cultivadas desde

anos anteriores, que correspondem a 0,3 hectare de mandioca e 0,4 hectare

de banana. Ainda cultiva outros produtos de uso estritamente para a

subsistência, como por exemplo: a batata doce, a abóbora, maxixe, quiabo,

abacaxi e o cará.

Os moradores da região utilizam diversos tipos de medidas (Apêndice

F). Essas medidas fornecidas por eles constituem uma prática comum na

região, pois segundo o agricultor, como não têm pretensões com a

comercialização esses valores de metragem não necessitam de exatidão. A

averiguação só ocorre de forma mais criteriosa quando se emprega mão de

obra remunerada, em tarefas de empreitadas.

Em épocas de maior dificuldades, ocasionadas por qualquer

eventualidade ou mudanças climáticas, como uma seca prolongada, ou por

baixa produção, esse agricultor tem recorrido à comercialização dos animais

de criação, como os bovinos, os suínos e as aves, para garantir sua

sobrevivência no meio rural. Outro fator que contribui para a sobrevivência,

já dita anteriormente, é o uso da aposentadoria para complementar a renda.

Em anos anteriores, os cultivos desses produtos seguiam os mesmos

modelos dos que estão sendo cultivados, nos dias de hoje. As áreas de

produção apresentam pouca ou quase nenhuma variação quanto ao

tamanho. O que apresenta variabilidade é a quantidade dos produtos

colhidos, pois em alguns anos essa produtividade chega a comprometer a

sobrevivência desses agricultores.

Mesmo tendo um acréscimo em até 65%, na área cultivada, na safra

de 2003/2004 em relação à safra 2004/2005, isso não representou grande

significado econômico para a família, pois a produtividade foi muito baixa,

não conseguindo nem manter a subsistência durante o ano.

A área cultivada, principalmente a de arroz, na safra 2003/2004 foi

muito maior do que a que a cultivada na safra 2004/2005 (Tabela 9), isso

poderia significar aumento na produção e conseqüentemente maior

quantidade de recursos para suprir as necessidades da família, no entanto,

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78

não foi isso que aconteceu. Segundo informações, os agricultores que

plantaram nas terras do vizinho, em troca do plantio do capim, tiveram baixa

produtividade em virtude de dois fatores: a) seca prolongada, em um período

não normal (fenômeno conhecido como veranico); b) concorrência do arroz

com o capim, pois ambos foram plantados praticamente no mesmo período.

Outros produtos, utilizados na subsistência da família, tiveram a

mesma área cultivada. A mandioca e a banana são culturas que ocupam

grande importância como produtos de subsistência e tiveram suas áreas de

cultivo sem variação (Tabela 9), isso se deu em virtude de serem culturas de

ciclo mais longo que as demais. No caso da mandioca, o agricultor adota a

estratégia de renovar a plantação tão logo ela seja colhida, pois assim que

colhe um pé ou talhão, limpa e planta-se imediata a mesma área. Essa

estratégia tem garantido a utilização, inclusive, por um período maior da

mesma área.

O agricultor possui criação de gado, com total de nove animais; trinta

galinhas, aproximadamente, entre todos as idades (a quantidade de animais

é flutuante, pois se usa com freqüência para o autoconsumo); um casal de

patos e um cavalo. Possui também um porco para engorda. Em se tratando

de suínos não gosta de criar, prefere comprar os animais dos vizinhos para

engorda-los. A produção de leite é destinada apenas para o consumo da

família.

As benfeitorias da propriedade são constituídas de duas casas, sendo

uma, com sala e quartos, servindo de dormitório e a outra de cozinha e

despensa. Essas construções são feitas de madeira (pau-a-pique),

barroteada6 e tem como cobertura a palha do Indaiá (Orbgnya eichleri

Drude). A cozinha é feita de madeira (pau-a-pique), porém não é barroteada.

Na propriedade existem duas tulhas, construídas no mesmo processo das

residências, porém com 30 centímetros de elevação da superfície. Na

unidade produtiva há um curral feito de arame e um chiqueiro de porcos,

destinados à engorda, feito com madeiramento entrelaçado retirados na

própria unidade produtiva. 6 Palavra que segundo os agricultores, significa espécie de reboco de paredes, feito com uma mistura de argila, arreia e estrume fresco de bovinos.

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79

4.1.2.2 Unidade produtiva – (UP-S13), do senhor Liduvino Lopes Viana A unidade produtiva do senhor Liduvino Lopes Viana, conhecido

também como Lidu Branco, isso porque também existe outra pessoa com o

mesmo nome, na comunidade de Santana. O outro homônimo é o senhor

Liduvino Lopes Viana, filho do senhor Armindo Lopes Viana. Sua

propriedade é denominada de Sítio Três Irmãos, possui área estimada de

quarenta e quatro hectares de terra, não possui documentação, que

assegure sua legitimidade como proprietário. Porém, o fato de residir nesta

localidade há mais de quinze anos, plantando e trabalhando a terra como

forma de sustentar a sua família possibilita ao trabalhador rural certos direito,

e um deles é o uso capião da terra, que o assegura como proprietário.

O agricultor nasceu e criou na região, é oriundo do antigo Arraial da

sesmaria de Santana. O deslocamento para essa localidade ocorreu em

virtude de uma ordem de despejo, promovido pelo senhor Mário Japonês.

Essa ordem de despejo era para ter expulsado todos os agricultores para

fora da sesmaria de Santana, porém em virtude de uma liminar os

agricultores puderam ficar e se instalar nesta localidade, transformando-a

em um pólo de resistência.

O senhor Liduvino Lopes Viana é casado com a senhora Vitorina

Lopes Martins, com quem tivera quatro filhos: Antônio Lopes Martins Viana,

Luiz Lopes Martins Viana, Aloísio Lopes Martins Viana e Jorgina Lopes

Viana Martins, ambos os filhos estão estudando em uma escola localizada

na Vila Aparecida. Apesar dos filhos estudarem, ainda ajudam os pais, nos

finais de semana e em parte do período da manhã, nas atividades cotidiana

do sítio, como: roçar a pastagem, carpir as roças de milho, arroz, banana e

mandioca. Cuidam dos animais, tiram o leite, além de buscar a lenha para o

fogão. No período das férias, os rapazes saem para trabalhar em

empreitadas, de roçado de pastagens nas proximidades, assegurando assim

a complementação de renda para a toda a família.

O senhor Liduvino Lopes Viana cultiva pequenas áreas de terra

destinadas à subsistência da família, a cada ano derruba o mato para plantar

o arroz, o milho, o feijão, a mandioca, a banana, e a cana-de-açúcar. Essas

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áreas de terra chagam a medir uma quarta de terra (1/4), o que equivale

50m X 50m, ou seja, 2.500m2 de área, o que equivale a 0,25 hectare

(Apêndice F).

Nas safras 2003/2004 e 2004/2005 a complementação do que faltou

foi suprida com a venda da força de trabalho dos três filhos e do seu

Liduvino Lopes Viana, em trabalhos de empreitas que se realizaram

principalmente no período das férias escolares, período em que os filhos têm

maior disponibilidade de colaborarem com a família.

Na safra 2004/2005, houve pouca variação no tamanho das áreas de

produções e os produtos foram praticamente os mesmos, porém com a

introdução da cultura da cana-de-açúcar, que foi utilizada para a confecção

de rapaduras (Tabela 10).

TABELA 10. Produtos cultivados, para o autoconsumo, pelo senhor Liduvino

Lopes Viana, com suas respectivas áreas, referente às safras

2003/2004 e 2004/2005.

TIPOS DE PRODUTOS ÁREA CULTIVADA

safra 2003/2004 (Em hectares).

ÁREA CULTIVADA safra 2004/2005

(Em hectares). Arroz 2,2 0,3

Milho 0,4 2,2

Mandioca 0,4 0,4

Banana 0,3 0,3

Cana-de-açúcar - 0,2

Outros1 (abóbora, batata doce,

quiabo, maxixe, melancia e abacaxi) - -

Total da área em produção 3,3 3,4 1 Produtos sem área específica, cultivados em consórcio com outras culturas, destinadas estritamente para o autoconsumo e para alimentação dos animais domésticos.

Na safra 2004/2005, o senhor Liduvino Lopes Viana está esperando

outra área de terra na propriedade do senhor José Donato, de

aproximadamente 2,2 hectares, no entanto, este ano será plantado o milho.

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O arroz será plantado na área aberta em sua propriedade, que corresponde

a 0,3 hectare. A cana-de-açúcar terá área de 0,2 hectare e será em área de

palhada7 do milho da safra do ano anterior. As culturas de banana e

mandioca permanecem com a mesma área de cultivo.

De um ano para o outro, o tamanho da área cultivada

permanecera praticamente dentro dos mesmos parâmetros, sem alterações

significativas que pudesse interferir na subsistência da família (Tabela 10).

Nestas duas últimas safras, o senhor Liduvino Lopes Viana complementará

sua produção, cultivando em terras, cedidas por vizinhos. Essas terras

passaram por processos de aragem e gradagem e o cultivo do milho terá

como contrapartida o plantio de capim, para o proprietário da terra, seguindo

o mesmo modelo do que ocorrera no ano anterior. Essa estratégia constitui

em um mecanismo de melhorar as condições de subsistência da família.

A unidade produtiva do senhor Liduvino Lopes Viana conta com uma

casa principal, feita de madeira (pau-a-pique), barroteada e coberta com

palha de Indaiá (Orbignya iechleri Drude) (Figura 15). Conta também com

uma cozinha, separada da casa principal, feita também de madeira (pau-a-

pique), porém sem ser barroteada, com cobertura de palha de Indaiá

7 Palhada – Termo usado pelos agricultores para designar uma área que foi abandonada com restos de culturas. Difere da acapoeira por ser apenas por um curto período, normalmente inferior a um ano.

(Orbignya iechleri Drude).

O curral é feito com

lascas de madeira

encaixadas com duas

divisões (Figura 16). Há

na unidade produtiva um

engenho, feito em

madeira (Figura 17); um

galpão aberto com

cobertura de palha de

Indaiá (Orbignya iechleri

Drude), utilizado para

Foro

: R. S

. Bas

tos,

2005

.

FIGURA 15. Residência do senhor Liduvino Lopes Viana.

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guardar arreios, ferramentas e uma carroça (Figura 20); um paiol, feito de

pau a pique com cobertura de palha de Indaiá (Orbignya iechleri Drude);

uma tulha, feita de pau-a-pique com uma pequena elevação da superfície da

terra com o intuito de evitar a umidade, é barroteada e também possui

cobertura de palhas de Indaiá (Orbignya iechleri Drude); um galinheiro, feito

4.1.2.3 Unidade produtiva – (UP-S14), do senhor Cassiano Lopes Viana A unidade produtiva do senhor Cassiano Lopes Viana, que possui o

nome de Sítio Água Branca, não tem documentação e o informante não

sabe ao certo qual o tamanho de sua área. O agricultor é viúvo e mora

sozinho. É a pessoa mais idosa da comunidade com oitenta e sete (87) anos

FIGURA 17. Engenho de moer cana-de-açúcar e ao fundo Galpão aberto.

Foro

: R. S

. Bas

tos,

2005

.

FIGURA 16. Curral, construído com lascas de madeira.

Foro

: R. S

. Bas

tos,

2005

.

de varas e um

chiqueiro de porco,

feito de madeira.

As construções

são muito simples e

rústicas, porém

funcionais. O

desempenho dessas

construções atende

satisfatoriamente a

que foi proposto.

As construções

apresentam aspectos

rudimentares, porém

funcionais e são

feitas de acordo com

as tradições da

comunidade, as quais

foram adquiridas

através das gerações

passadas.

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de idade, é um dos que viveram no antigo Arraial da sesmaria de Santana.

Apesar da idade e sendo aposentado, ainda trabalha muito na roça para

retirar o seu sustento. Planta arroz, milho, banana, cana-de-açúcar,

mandioca, batata doce, cará e frutas, como: o abacaxi e mamão. Cuida das

galinhas e de dois animais de serviço, um cavalo e um burro. Os animais

são peças importantes no período de moagem da cana-de-açúcar, em seu

engenho, pois é através da tração animal que realiza a moagem e a retirada

da garapa para fazer a rapadura e o melado. Além disso, esses animais são

utilizados em carroças, que constitui o transporte. A pesar de não saber ler e

nem escrever, o senhor Cassiano Lopes Viana vendeu e assinou direito de

sua herança sem saber das implicações em que isso poderia acarretar. A

sua vinda para a localidade de Água Branca é fruto dessa venda, pois logo

em seguida foram expulsos do Arraial da sesmaria de Santana, mediante

ordem de despejo, impetrada

pelo advogado do senhor

Mário Japonês.

A unidade produtiva

está localizada próxima a de

sua filha, a senhora Vitorina

Lopes Martins, esposa do

senhor Liduvino Lopes

Viana, que estão sempre

olhando e zelando pelo

senhor Cassiano Lopes

Viana.

O senhor Cassiano

possui em sua propriedade,

uma casa principal feita de

madeira (pau-a-pique),

barroteada e com cobertura

de palha de Indaiá (Orbignya

iechleri Drude); a cozinha

FIGURA 18. Residência do senhor Cassiano Lopes Viana.

Foto

: R.S

. Bas

tos,

2004

.

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fica em separada, feita também de madeira (pau-a-pique), porém, sem ser

barroteada (Figura 18). Há também outras construções de grande

importância para auxiliar as atividades de seu dia-a-dia, como: tulha, paiol,

engenho de moer cana e chiqueiros de porcos. A tulha segue os mesmos

padrões de construção da casa, porém, possui certa elevação da superfície

terrestre (30 centímetros) como forma de evitar as enxurradas e

conseqüentemente o excesso de umidade (Figura 19); o paiol é feito de

madeira (pau-a-pique), também barroteada e com cobertura de palha de

Indaiá (Orbignya iechleri Drude); há outros tipos de construções, como por

exemplo, os galinheiros, os chiqueiros de porcos, que contribuem para

atender as necessidades e o bom andamento das atividades do agricultor.

FIGURA 19. Tulha, da unidade produtiva do senhor Cassiano Lopes Viana.

Foto

: R.S

. Bas

tos,

2004

.

O senhor

Cassiano Lopes Viana

planta apenas para o seu

sustento, com isso todas

as suas construções são

adequadas à capacidade

de sua força de trabalho,

refletindo em construções

relativamente pequenas,

na tulha cabe

aproximadamente vinte

sacas de arroz (Figura

19).

A construção

desses utensílios

desempenha papel de

extrema importância

dentro da vida dos

agricultores tradicionais,

em função da

possibilidade de

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mandioca, que servem para complementar a renda e também para a

alimentação dos animais domésticos, como por exemplo: os porcos e

galinhas.

TABELA 11. Produtos, para o autoconsumo, cultivados pelo senhor

Cassiano Lopes Viana, com suas respectivas áreas, referente

aos anos safra 2003/2004 e 2004/2005.

TIPOS DE PRODUTOS ÁREA CULTIVADA

safra 2003/2004 (Em hectares).

ÁREA CULTIVADA safra 2004/2005

(Em hectares). Arroz - -

Milho 0,6 0,4

Mandioca 0,4 0,4

Banana 0.3 0,4

Cana-de-açúcar - 0,3

Outros1 (abóbora, batata doce,

quiabo, abacaxi, moranga e maxixe). - -

Total da área em produção 1,3 1,5 1 Produtos sem área específica, cultivados em consórcio com outras culturas, destinadas estritamente para o autoconsumo e para alimentação dos animais domésticos.

FIGURA 20. Engenho na unidade produtiva do senhor Cassiano Lopes Viana.

Foto

: R.S

. Bas

tos,

2004

.

contribuir com a melhoria

da renda familiar. Neste

caso, temos como bom

exemplo o engenho de

moer a cana-de-açúcar

para a fabricação da

rapadura.

O senhor

Cassiano Lopes Viana

tem se dedicado

ultimamente ao cultivo da

banana, do milho e da

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As áreas destinadas ao cultivo são pequenas. Para a safra de

2003/2004, foi cultivado em sua unidade produtiva 0,3 hectare de banana,

0,6 hectare de milho e 0,4 hectare de mandioca. Para a safra 2004/2005,

foram cultivados 0,4 hectare de banana, 0,4 hectare de milho, 0,4 hectare de

mandioca e 0,3 hectare de cana (Tabela 11). O arroz e o feijão não têm sido

cultivados, a preferência é adquirir esses produtos na cidade. Isso ocorre

normalmente uma vez no mês, quando sai a aposentadoria. O agricultor

ainda cultiva outros produtos de consumo pessoal, como quiabo, maxixe,

diversos tipos de abóboras, abacaxi e melancia.

Em virtude da idade e a pouca resistência ao calor, seus netos, filhos

do senhor Ludivino Lopes Viana, sempre estão ajudando-o, nos trabalhos de

limpeza e até mesmo no preparo da terra para o plantio.

O senhor Cassiano Lopes Viana utiliza várias estratégias para

conseguir sua sobrevivência no campo. Ainda hoje, aos 87 sete anos,

continua a buscar formas alternativas de viver com dignidade e

tranqüilidade, sempre trabalhando.

4.1.2.4 Unidade produtiva – (UP-S15), do senhor Luiz Corrêa. A unidade produtiva do senhor Luiz Corrêa possui o nome de Sítio

São Luiz, que não tem documentação, que lhe assegure como proprietário,

somente a posse da terra. Segundo o informante a sua área é de

aproximadamente de trinta e sete hectares, porém não há documentos que

confirme isso.

O senhor Luiz Corrêa é casado com a senhora Maria Lopes Viana e

em sua companhia vivem o seu filho Lourenço Viana e o seu irmão Pedro de

Souza, que por sinal é deficiente físico e em vista disso foi aposentado.

Outros dois filhos trabalham em Cáceres e aos finais de semana vêm para o

sítio ajudar o pai, nos trabalhos que precisam ser realizados.

O senhor Luiz Corrêa, na safra 2003/2004, plantou nas terras do

senhor José, um dos vizinhos, posseiro, que adquiriu suas terras mediante a

compra de terceiros. Em depoimento, o agricultor, expõe sua preocupação

para a safra 2003/2004:

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“Neste ano plantei seis litros de arroz, foi

só pra despesa. Ta muito difícil a gente

mexer com o arroz, todo ano a gente

planta, mais não consegue colhê. Acho

que não vai dá nem pra despesa. (...) o

tamanho da roça deste ano não é muito

grande não, é pequena, dá quinze braças

de largura por trinta e cinco braças de

comprimento”.

Apesar dos agricultores tradicionais utilizarem várias formas de

medidas, não foi empecilho converte esses dados em uma única unidade.

O senhor Luiz Corrêa realizou o plantio de seis litros de arroz, que

correspondem ao equivalente para efetuar toda a cobertura da área

preparada para o plantio de quinze braças de largura por trinta e cinco de

comprimento. Isso equivale a 0,25 hectare.

Posteriormente, em meados de julho de 2004 soube-se que a sua

colheita foi irrisória, pois colheu apenas uma saca de sessenta quilos. Com

esse resultado de produção, o agricultor teve que comprar o produto de

vizinhos e da Vila Aparecida. O agricultor também plantou duas tarefas de

milho, o equivalente a 0,16 hectare. A mandioca e a banana tiveram uma

área total de 0,4 hectare. Durante o ano foram cultivados vários outros

produtos, complementares à subsistência, como a abóbora, a moranga, (que

são utilizados na alimentação de animais domésticos), o quiabo, o maxixe e

a batata doce (Tabela 12).

Na safra 2004/2005, foi desmatada uma área de cerradão, logo em

frente a residência (Figura 21), de setenta e três por trinta braças, ou seja,

1,07 hectares. Serão cultivados em consórcios: banana e arroz, banana e

milho.

Em meio às culturas de banana, arroz e milho serão introduzido

plantios de abóbora, melancia, maxixe, abacaxi.

Segundo o agricultor, a área que aparece na Figura 21, será utilizada

por aproximadamente quatro anos, por causa da banana, que vai sombrear

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A estratégia de se queimar a roça, constitui a forma que

tradicionalmente se executa e que nos dias de hoje vem sofrendo sérias

críticas e entrando em contradição com a legislação ambiental. No entanto,

ainda é uma forte tradição e segundo essa categoria de agricultores, o modo

mais econômico de se fazer à roça e assim garantir a subsistência da

família.

As dimensões das roças da safra 2004/2005 sofreram grandes

variações em relações à safra do ano anterior (Tabela 12).

Mesmo sendo um dos produtos com maior incidência de doenças,

na região, a banana foi o produto que teve maior área de crescimento, pois

consegue ter maior valor comercial e assim contribuir para a melhoria da

renda familiar.

O agricultor possui uma pequena criação de gado com seis animais,

sendo duas vacas, duas novilhas e dois bezerros, todos os animais são da

família, ou seja, pertencem aos filhos. Possui ainda criação de galinhas, que

muito e assim

inibir a

surgimento de

pragas1 e em

conseqüência

disso vai

requerer menor

tempo com

limpeza.

Porém, assim

que o bananal

começar a dar

prejuízo será

introduzido o

capim, para a

criação de

gado.

FIGURA 21. Área desmatada, preparada para o plantio.

Foto

: R. S

. Bas

tos,

2005

.

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89

corresponde aproximadamente a trinta aves. Os animais domésticos, como

por exemplo, as galinhas e os porcos possuem número flutuante, pois são

utilizados constantemente no consumo.

TABELA 12. Produtos, para o autoconsumo, cultivado pelo senhor Luiz

Corrêa, com suas respectivas áreas, referente às safras

2003/2004 e 2004/2005.

TIPOS DE PRODUTOS ÁREA CULTIVADA

safra 2003/2004 (Em hectares).

ÁREA CULTIVADA safra 2004/2005

(Em hectares). Arroz 0,25 0,54

Milho 0,16 0,53

Mandioca 0,2 0,4

Banana 0,2 1,27

Outros1 (abóbora, batata doce,

quiabo, maxixe) - -

Total da área em produção 0,81 1,27 1 Produtos sem área específica, cultivados em consórcio com outras culturas, destinadas estritamente para o autoconsumo e para alimentação dos animais domésticos.

A unidade produtiva do agricultor conta com duas casas: sendo uma

principal, onde se tem a sala e os quartos, feita de madeira (pau-a-pique),

barroteada e com cobertura de palha de indaiá; a outra, destinada à cozinha,

segue os mesmos padrões de construção, porém sem ser barroteada. Há

outras construções como curral de madeira encaixada, galinheiro e chiqueiro

para porcos.

Nos últimos anos a produção diminuiu de forma significativa,

chegando a ponto de não haver a necessidade de se guardar o que colhe

em lugar específico como, por exemplo, o paiol e a tulha. Ultimamente tudo

o que tem colhido consegue armazenar dentro da própria residência.

4.1.2.5 Unidade produtiva – (UP-S16), do senhor Angelino da Silva A unidade produtiva do senhor Angelino da Silva é denominada sítio

São Sebastião. A área esta localizada ao sul da sesmaria de Santana, na

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90

divisa com a Bocaina do Vão. O Sítio do agricultor não possui documentação

que assegure a posse definitiva da terra em que vive. A área total estimada

de sua propriedade é de 67,2 hectares.

O núcleo familiar é constituído por oito pessoas, sendo sua esposa, a

senhora Ilda Oliveira Viana e seis filhos: Sebastiana Viana da Silva, Zita

Aparecida Viana da Silva, Maria José Viana da Silva, Meire Viana da Silva,

Fátima Viana da Silva e Silvio Viana da Silva.

A maior parte da unidade produtiva do agricultor está destinada à

pastagem, onde se cultivada capim Braquearão (Brachiária brizantha cv.

Maranduva) para o sustento do gado, formado por cinqüenta animais. Todo

esse gado se destina a manutenção da família.

Na unidade produtiva cultiva-se: arroz, milho, mandioca, banana,

feijão, abóbora, moranga, abacaxi, quiabo, mamão, cana-de-açúcar e

maxixe (Tabela 13). Todos os produtos estão voltados a atender às

necessidades de subsistência da família. Comercializa-se apenas o

excedente, quando há algum. Na safra 2003/2004, a área cultivada foi

destinada estritamente ao sustento da família e correspondeu a 2,1

hectares, assim distribuída: 0,3 hectare de arroz, 0,5 hectare de milho, 0,4

hectare de mandioca, 0,4 hectare de banana, 0,2 hectare de cana-de-açúcar

(Tabela 13).

Outros produtos, como: a abóbora, o quiabo, o maxixe, o mamão e o

abacaxi também foram plantados, entretanto, em meio às outras culturas,

como às de milho e banana. O cultivo do feijão ocorreu na mesma área em

que o milho foi cultivado, porém em menor área de plantio, 0,3 hectares.

Para a safra 2004/2005, a nova área aberta para o cultivo

corresponde a 2,2 hectares, com isso houve um aumento da área cultivada,

situação que pode refletir em maior oferta no momento de suprir as

necessidades alimentícias da família. Entretanto, se porventura faltar algum

produto à manutenção da subsistência, será suprida com a comercialização

dos animais, principalmente os bezerros. Além disso, o agricultor, conta

também com a sua aposentadoria e também com eventuais trabalhos de

empreitas que porventura possam surgir.

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TABELA 13. Produtos, para o autoconsumo, cultivados pelo senhor

Angelino da Silva, com suas respectivas áreas, referente as

safras 2003/2004 e 2004/2005.

TIPOS DE PRODUTOS ÁREA CULTIVADA

safra 2003/2004 (Em hectares).

ÁREA CULTIVADA safra 2004/2005

(Em hectares). Arroz 0,3 0,3

Milho 0,5 0,6

Mandioca 0,4 0,4

Banana 0,4 0,4

Feijão 0,3 -

Cana-de-açúcar 0,2 0,2

Outros1 (Abóbora, batata doce,

quiabo, maxixe) - -

Total da área em produção 2,1 2,2 1 Produtos sem área específica, cultivados em consórcio com outras culturas, destinadas estritamente para o autoconsumo e para alimentação dos animais domésticos.

Na safra 2004/2005, serão cultivados: 0,3 hectare de arroz, 0,6

hectare de milho, 0,4 hectare de mandioca, 0,4 hectare de banana e 0,2

hectare de cana-de-açúcar (Tabela 13). Tão logo se realizar a colheita do

milho a pretensão é plantar o feijão.

Entre as safras 2003/2004 e 2004/2005 há pequena variação no

tamanho total da área cultivada. Também pode ser observado que ocorre

pouca variação de área quando se trata dos produtos cultivados (Tabela 13).

Segundo informações da senhora Ilda Oliveira Viana, esposa do

senhor Angelino, não há grandes preocupações em relação ao

abastecimento de alimentos à família. Pois, é dessa maneira que

sobrevivem. Plantam estritamente o necessário para a sobrevivência em

pequenas áreas de roças.

4.2 As migrações internas da sesmaria de Santana A maneira da utilização das terras e o processo migratório dentro da

sesmaria de Santana foram estabelecidos de acordo com as necessidades e

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92

circunstâncias do momento em que viviam as populações desta área de

sesmaria. O Apêndice G representa o local onde esse contingente

populacional vivia, ou seja, em uma área de concentração populacional,

constituindo assim um vilarejo, ou Arraial, pois, contava com infra-estrutura

modesta. Como exemplo dessa infra-estrutura, foram citadas uma igreja e

uma escola. O Arraial de Santana está localizado praticamente no centro da

sesmaria de Santana, a fim de facilitar o deslocamento e o cuidado com os

animais. As áreas propícias ao cultivo das roças encontram-se

aproximadamente a 1500 metros afastadas do Arraial, isso para que os

animais domésticos, de pequeno porte, como por exemplo, os porcos e

galinhas, não causem nenhum prejuízo às culturas de subsistência, pois o

sistema de criação desses animais é de forma extensiva, soltos no ambiente

sem espaços definidos ou cercados. Essas áreas de cultivo ficam quase

sempre à margem esquerda do ribeirão Água Branca, onde as terras são de

melhor qualidade, segundo a observação dos próprios agricultores. Nestas

áreas, a mata possui maior vigor, exuberância e as terras eram mais escuras

e quando se plantava, a colheita sempre era abundante, além disso, podia-

se cultivar por mais de um ano a mesma área sem problema da redução da

produtividade. Isso deixava os agricultores mais tranqüilos em relação à

produção, pois a certeza de produzir para o sustento da família traduzia-se

em boa produção, ano após ano.

Outro aspecto importante é que a área se mantinha limpa por um

período de tempo bem maior do que nos dias de hoje. Quase sempre a

colheita acontecia com a roça limpa, sem ervas daninhas, praticamente só

encontrava as moitas provenientes das rebrotas.

Segundo relatos do senhor Cassiano Lopes Viana, a convivência no

Arraial de Santana sempre transcorreu de forma tranqüila e pacífica, sem

grandes conturbações. Porém, quando ocorriam alguns desentendimentos,

sem muita importância, como por exemplo, uma palavra mal compreendida,

desavenças entre as crianças, algum animal doméstico do compadre que

comia ou estragava a horta do outro, sempre havia interferência dos mais

velhos, contornando a situação. Essas pequenas desavenças provocaram a

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93

saída de uma, duas, três ou mais famílias, no entanto, a saída do Arraial,

não significa uma rixa permanente. É apenas uma maneira de prosseguir em

paz, sem brigas.

Foram encontrados vestígios do processo migratório em várias partes

da sesmaria de Santana, como esteios de casas, utensílios domésticos e

pedaços de engenhos (Figura 24).

Segundo o senhor Catulio Lopes Viana, existem inúmeros locais de

construções antigas, porém, em algumas situações a utilização de máquinas

Em alguns

locais, devido ao tempo

prolongado dos

acontecimentos e a

ação do fogo,

encontraram-se apenas

resquícios de

construções. Isso só foi

possível, sob

orientação de um guia

prático, que conhece os

locais com exatidão.

FIGURA 22. Vestígios de construções antigas e plantações de frutas – em terras do senhor Armindo Lopes Viana.

Foto

: R. S

. Bas

tos,

2005

. Fo

to: R

.S. B

asto

s, 2

005.

FIGURA 23. Construções antigas – esteios de casa.

para abertura de

pastagem, destruiu

quase por completo

esses vestígios,

dificultando sua

localização.

As Figuras 22,

23, 24, retratam, ainda

hoje, a permanência de

vestígios de

construções na

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94

dois momentos distintos. No primeiro momento ocorreram migrações

provocadas pela própria necessidade do grupo em preservar e manter as

relações sociais. O próprio grau de parentesco acaba por influenciar esse

processo.

Normalmente, essa migração não traz prejuízos ao grupo, no tocante

ao convívio ou na forma de se relacionarem. Segundo o senhor Catulino

Lopes Viana é uma forma de evitar maiores desavenças; um refúgio.

Em um segundo momento, ocorrem migrações provocadas pela

pressão exercida pelo grileiro. Essa é a segunda fase migratória dentro da

sesmaria de Santana, isso ocorre por volta da década de 1980. Essa ação

foi forçada em virtude das pressões que os agricultores tradicionais sofrem

pelo grileiro da área, o senhor Mário Japonês. Essa migração interna,

ocupando áreas dentro da sesmaria de Santana, ocorreu como forma de

defesa desses agricultores, pois, estavam na iminência de serem

despejados.

Nesta segunda fase, das migrações internas, dentro da sesmaria de

Santana, vão ocorrer basicamente em duas frentes: uma em direção ao

norte, onde é hoje a comunidade do Sagrado Coração de Jesus, localidade

de Santana; e outro em direção ao sul da sesmaria de Santana, onde é hoje

FIGURA 24. Vestígios de construções – antigo engenho. No detalhe engrenagens da moenda.

Foto

: R.S

. Bas

tos,

200

5.

sesmaria de Santana.

Muitas dessas

construções estão

localizadas em áreas

estratégicas de

produção, ou seja, em

locais onde há água em

abundância e mata

para produzir o

sustento familiar. As

migrações dentro da

área da sesmaria de

Santana ocorrem em

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95

a Comunidade de Todos os Santos, localidade de Água Branca (Apêndice

G).

O desmembramento dessa estrutura, que um dia chegou a ser

denominada de Arraial de Santana, ocorreu, segundo o senhor Catulino

Lopes Viana e o senhor Liduvino Lopes Viana, quando da chegada de um

indivíduo que adquiriu uma pequena parcela de terra de um dos herdeiros e

acabou cercando uma área bem maior do que aquela que havia adquirido e

que realmente lhe pertencia por direito. A atitude desse indivíduo, chamado

pelos agricultores tradicionais de grileiro “Mário Japonês”, foi além da

compreensão dos agricultores, pois, através de uma ordem de despejo, o

senhor “Mário Japonês” consegue retirar todos os agricultores, que após

muita confusão e interferência de uma outra pessoa com maior

esclarecimento jurídico, conseguem entrar em acordo, deslocando esse

contingente populacional para duas regiões dentro da sesmaria de Santana.

O Apêndice G retrata o deslocamento migratório interno. Um contingente,

formado por cinco famílias de agricultores tradicionais desloca-se para o sul

da sesmaria de Santana, onde hoje, é conhecido como, a localidade de

Água Branca. Neste local, as famílias se estabeleceram de forma mais

definitiva, permanecendo até os dias de hoje. Um segundo contingente

populacional, foi deslocado para a região mais ao norte da sesmaria de

Santana, localidade de Sagrado Coração de Jesus, próximo ao ribeirão

Água Branca, e que segundo o senhor Armindo Lopes Viana e o Senhor

Catulino Lopes Viana, foi empurrado para a margem esquerda do ribeirão

Água Branca, estabelecendo-se na região norte-noroeste da sesmaria.

O desmembramento do grupo em dois, ocorreu basicamente por dois

motivos: 1°) em uma única localidade, Água Branca ou Santana, não

suportaria esse número de pessoas; 2º) as áreas escolhidas não chamavam

a atenção do grileiro, pois até aquele momento constituíam áreas formadas

por relevo mais acidentado. Além disso, os dois grupos ficaram afastados

das pretensões de domínio territorial do grileiro.

O senhor Catulino Lopes Viana e o senhor Cassiano Lopes Viana,

relatam que houve também o deslocamento de um terceiro grupo de

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96

pessoas que se dirigiram para a cidade de Cáceres, buscando melhores

condições de vida, emprego e mais tranqüilidade. A partir desse momento, o

aglomerado populacional, Arraial de Santana, começou a se desmoronar.

No local onde se encontrava o arraial da sesmaria de Santana, há

apenas vestígios de antigas construções (Figura 25). Nem mesmo o trabalho

de demolições e as sucessivas aragens e gradagens para o plantio de capim

foram suficientes para apagar as marcas dessas construções. Nem o capim

consegue nascer e permanecer no local.

Foto

: R.S

. Bas

tos,

200

4.

FIGURA 25. Vestígios de construções – Local onde estava edificada a Escola do Arraial de Santana – “Escola João Ferreira Mendes”.

Os agricultores

tradicionais, que

construíram o Arraial

de Santana, possuem

tradições marcantes

em seu meio social,

como as danças de

cururu e siriri; festas

de santos; A divisão

dos cemitérios do

R. S

. Bas

tos,

200

5.

FIGURA 26. Cemitério dos anjos do Arraial de Santana.

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povoado em: cemitério dos anjos (Figura 26) e cemitério de adultos (Figura

27); reuniões de cultos religiosos (missas); e as benzeções. Além disso,

esse aspecto cultural também faz parte do cotidiano da produção, pois o

plantio apresenta fortes relações com esses aspectos culturais, como por

exemplo, o plantio e a colheita que só ocorrem em determinadas fases da

lua.

A utilização

do monjolo, era uma

prática comunitária,

que caracterizava

parte das tradições,

desses agricultores

tradicionais, que

residiam no Arraial

de Santana. O

monjolo era utilizado

para a realização

dos trabalhos de

limpeza do arroz, da

quebra do milho

para canjica e para

triturar outros

cereais. Hoje,

existem, apenas os

resquícios do que

um dia foi um

monjolo (Figura 28).

Essa prática não

existe mais dentro

dessa comunidade,

em virtude de vários

fatores, como: A

R. S

. Bas

tos

- 200

5

FIGURA 27. Cemitério do Arraial de Santana.

R. S

. Bas

tos

- 200

5

FIGURA 28. Pilão do monjolo, do antigo Arraial de Santana.

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98

desestruturação da comunidade, a delimitação espacial das propriedades,

pois os locais adequados para a implantação do monjolo são raros. Além

disso, a modernização ocorrida nos últimos anos, também tem contribuído

para o uso dessa prática tradicional.

4.3 Espacialização e uso comum na sesmaria de Santana

Em levantamento, para delimitar a área total da sesmaria de Santana,

foi constatado que a dimensão espacial da sesmaria de Santana é superior

do que aquela apresentada em documento de compra e venda, que é de

2300 hectares, e que é do conhecimento dos membros da comunidade.

Chegou-se a um cálculo aproximado de área territorial equivalente a

4.621,70 mil hectares de terra. Para chegar a esses cálculos, foram

utilizadas as cotas da carta topográfica de maior altitude em ambas as

serras (Apêndice G).

A sesmaria de Santana possui dimensão relativamente pequena em

relação ao tamanho de outras áreas de sesmarias existentes na região, no

entanto, isso ocorreu em virtude desta área de terra ter sido desmembrada

de uma outra, no caso, a sesmaria de Inhumas, conforme documento de

compra e venda, datado de 1908, em favor de Claudino Lopes Viana,

Estevão Satyro Lopes Viana, Ciryaco Lopes Viana, Irineu Lopes Viana,

Manoel Procópio Martins e Manuel Santana Lopes Viana.

A área destinada aos agricultores tradicionais, após as invasões

ocorridas com a chegada do senhor Mário Japonês, constitui uma pequena

parcela de toda a área (Apêndice G), e que antes da expulsão dos

agricultores estava destinada ao cultivo, à extração e a convivência mútua. A

Tabela 14 representa a distribuição das terras na sesmaria de Santana, após

a grilagem. É possível observar que os agricultores ocupam uma pequena

parcela de toda a área. Essa distorção de concentração de terras provoca

alterações na estrutura produtiva desses agricultores tradicionais, pois

estavam habituados a exercer suas atividades de produção e criação de

forma diferente da atualidade. As alterações na estrutura da sesmaria

forçaram os agricultores a buscarem mecanismos que possibilitassem suprir

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99

suas necessidade de subsistência. Uma das alternativas encontrada sem

dúvida é a produção agrícola fora de sua unidade produtiva. Essa estratégia

tem-se constituído numa prática comum entre os agricultores, garantindo a

subsistência e a permanência no campo.

TABELA 14. Área que cada agricultor tradicional ocupa dentro da sesmaria

de Santana – 2005.

CÓDIGO DA UP

PROPIETÁRIOS AREA DAS

PROPIEDADES (Em Alqueire)

AREA DAS PROPIEDADES

(Em hectares)

S01 Catulino Lopes Viana 66 145,2

S02 Benedito Lopes Viana2 07 15,4

S03 Máximo Lopes Viana2 07 15,4

S04 Cecílio Lopes Viana3 20 44

S05 Liduvino Lopes Viana3 20 44

S06 Armindo Lopes Viana 20 44

S07 Antônio dos Santos

Martins 5,5 12

S08 Paulo dos Santos Martins 03 6,6

S09 Gonçalo Martins Viana1 66 145,2

S10 Antônio Viriato da Silva4 10 22

S11 Dielson Viriato da Silva4 2 4,4

S12 André Santana Lopes 20 44

S13 Liduvino Lopes Viana 20 44

S14 Cassiano Lopes Viana 22,7 49,9

S15 Luiz Corrêa 28 61,6

S16 Angelino da Silva 28 61,6

Total da área ocupada 220,3 837,98 1 Ocupa a mesma área de terra do senhor Catulino Lopes Viana. 2 Ocupam uma mesma área de terra, que pertence ao senhor Luciano Silva. 3 Ocupam uma mesma área de terra, que pertence ao senhor Armindo Lopes Viana. 4 Agricultores tradicionais que não foram considerados remanescente da área da sesmaria.

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100

As terras configuradas e destinadas como áreas de sesmaria,

possuíam particularidades bem definidas sob vários aspectos. A sesmaria de

Santana também apresentou essas características, como por exemplo:

• O uso coletivo da área para a criação de bovinos de

forma extensiva formada por vários criadores.

• Construções de casas em torno de uma mesma área,

formando assim pequenos aglomerados populacionais, que na sesmaria de

Santana, era denominada de Arraial. Normalmente com alguma infra-

estrutura. No caso da sesmaria de Santana, essa infra-estrutura se resumia

em uma igreja e uma escola primária.

• Localização das roças em uma mesma área, para

favorecer os cuidados principalmente com o manejo e com as cercas contra

animais domésticos e também os silvestres.

• As roças eram feitas e cultivadas entre dois e três anos e

em seguida abandonadas para serem cultivadas em outro lugar, de forma

itinerante.

• Utilização de formas de trabalhos variadas, como:

mutirão, troca ou permuta de dias de serviços, empreitas, etc.

• Fabricação de vários produtos dentro da sesmaria,

basicamente como uma forma de auto abastecimento e para isso

fabricavam: farinha de mandioca e de milho, polvilho, rapadura e açúcar,

banha de porcos para uso alimentar.

• Fabricação de utensílios para uso doméstico, como

gamelas, colheres de pau, peneiras, engenhos para moer a cana-de-açúcar.

Além disso, havia a fabricação de utensílios destinados à utilização no

trabalho cotidiano da sesmaria, como: cochos para ração animal, carros de

bois e seus apetrechos (cambão, canga, canzil e cordas).

Na Figura 29, notar-se o trabalho de aprendizagem realizado desde

muito cedo pelas crianças da comunidade Sagrado Coração de

Jesus/Santana, isso constitui uma atividade comum, praticada no cotidiano

da comunidade.

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101

As habilidades que cada um pode desenvolver são incentivadas

desde cedo, como forma de superar as dificuldades que possam surgir no

dia-a-dia. Assim as crianças, mesmo brincando exercem um aprendizado

constante, absorvendo grande conhecimento dos antepassados, dando

prosseguimento às tradições.

alimentares. Assim, todas as atividades executadas dentro da sesmaria de

Santana estão voltadas a manter a subsistência e na medida do possível

produzir algum excedente para servir como base de troca ou de entrada de

algum capital para atender as necessidades de alguns produtos que vierem

a faltar na comunidade, como por exemplo: sal e remédios.

Segundo relatos do informante mais idoso da comunidade de todos

os Santos, na localidade de Água Branca, o senhor Cassiano Lopes Viana:

“Quando nossos pais utilizavam as terras

da sesmaria de Santana, para qualquer

coisa que fosse, sempre seguia as

orientações dos mais velhos. Não havia

nenhuma disputa entre as pessoas, nem

mesmo para produzir mais que o outro.

Nem para retirar da natureza qualquer

produto só por dinheiro. A criação do

As atividades

desenvolvidas dentro da

área da sesmaria de

Santana também

reforçam o caráter de

povoamento, no qual o

tipo de concessão que a

coroa portuguesa

possibilitou aos colonos

ou súditos, possuíam

características de auto-

suficiência e de provisões

Foto

: R. S

. Bas

tos,

200

5.

FIGURA 29. Crianças, da comunidade de Sagrado Coração de Jesus, confeccionando copos, em bambu.

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102

gado era na larga8, todas as famílias da

comunidade criavam o gado junto. Nessa

época os animais jovens, os bezerros,

eram sinalados9 na orelha e somente

depois de desmamados, já quase adultos

é que recebiam a marca do dono (...)

Quando, íamos plantar, a área era

escolhida em comum acordo, e cada um

já definia o que ia plantar e muitas vezes

também já havia acordos de cultivar a

roça em sistema de meia. (...) Isso tudo

sempre ocorria com a orientação dos

mais velhos”.

Adams (2000), Souza & Barrella (2004) e Mansano (2004), também

expõem as práticas de tomadas de decisões entre comunidades tradicionais

de caiçaras, onde se observa que vários pontos são idênticos,

principalmente, no que se refere à liderança. Neste aspecto os membros

mais idosos da comunidade possuem papel fundamental nas decisões.

A área da sesmaria de Santana teve a prática de uso comum desde o

início de sua aquisição, a qual, foi realizada por um grupo de pessoas que a

obtiveram mediante uma parceria na hora de realizarem a compra. Essa

união não ficou somente na forma da aquisição ela passou a ser inserida

dentro de todas as atividades exploratórias para a sobrevivência do grupo.

Outros agricultores remanescentes e descendentes dos pioneiros, da

ocupação desta área, são coesos, afirmando em seus relatos a prática do

modo de uso comum da sesmaria.

O uso comum ganhou formas mais abrangentes, pois, passou a fazer

parte do cotidiano e como necessidade de sobrevivência, ganhou aspectos 8 Na larga – Expressão usada pelos agricultores, que designa a criação de animais, no caso bovinos, de forma extensiva, sem a utilização de cercas. 9 Sinalados – expressão que designa, segundo essa categoria de agricultores, um pequeno sinal, feito na orelha do animal, para identificar o seu dono, pois cada criador escolhia um sinal, que poderia ser um pequeno corte em forma de ‘v' na orelha do animal, assim todo animal que tivesse com seu devido sinal, quando adulto receberia a marca definitiva de seu dono.

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103

diferenciados. Segundo o senhor Catulino Lopes Viana e o Senhor Cassiano

Lopes Viana, até as compras na cidade de Cáceres, que aconteciam mais

ou menos entre duas ou quatro vezes ao ano, ocorriam em forma de

caravana, com carros de bois e normalmente, cada família encomendava o

que ia precisar. Na viagem de ida, os carros de bois sempre estavam

carregados com mantimentos básicos, como: arroz, feijão, carne seca de

vaca, latas de banha de porco, toucinho de porco, rapadura, melado e em

alguns casos utensílios domésticos, como as gamelas, muito utilizada na

região. No retorno, realizavam-se as compras de acordo com as

encomendas de cada família, que normalmente, constituía grande

quantidade de carga. Os produtos mais comuns de compra eram: sal, café,

açúcar, ferramentas para a lida no campo, tecidos, calçados e remédios.

Outro aspecto importante a ser abordado está relacionado na maneira

da convivência dessa comunidade. Pois, segundo relatos do senhor

Cassiano Lopes Viana:

“Quando uma família estava em falta de

algum produto, como arroz, sal, café ou

açúcar, sempre era socorrido pelo

vizinho, que emprestava aquilo que lhe

faltava”.

Dessa forma o uso comum também se estendia inclusive aos

produtos que eram adquiridos na cidade de Cáceres. Continua o agricultor:

“Em uma próxima viagem à cidade, o

vizinho que emprestara qualquer

produto, tinha por obrigação restituir o

que lhe foi cedido”.

Essa prática possui reflexos, inclusive nos dias atuais. Ainda hoje, na

falta de um determinado produto, busca-se no vizinho mais próximo, a

resposta para o problema. Outra prática que ainda perdura nos dias atuais,

nestas comunidades, é a oferta ao vizinho mais próximo ou ao compadre, a

retribuição dos favores através de um pequeno agrado, que pode vir de

várias formas, como por exemplo: a doação de um frango, uma dúzia de

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104

ovos, um cacho de banana ou mesmo um pedaço de carne, quando se

abate um animal.

A exploração das áreas de uso comum segue normas que ordenam a

própria manutenção da subsistência dessa categoria de agricultores

tradicionais. A exploração ocorrida na sesmaria de Santana também segue

os mesmos preceitos que datam desde os primórdios da instituição desse

tipo de concessão de posse da terra no Brasil, essa maneira de uso da terra

está ligada diretamente a duas formas básicas de subsistência:

1. As áreas de construções das roças;

2. As áreas utilizadas na criação extensiva de bovinos e

eqüinos.

As normas de uso de exploração ocorridas na sesmaria de Santana

eram estabelecidas de acordo com as decisões tomadas pelos mais velhos,

ou seja, as pessoas de maior idade. Normalmente o local da roça era

escolhido pelas pessoas de maior idade da comunidade, onde roçavam,

derrubavam, queimavam e para só depois plantar seus mantimentos.

Normalmente, toda o trabalho que envolvia a construção da roça era

realizado em conjunto com os membros da comunidade, sempre orientado

pelos mais idosos, até mesmo a decisão sobre o tamanho da parte de roça

que cada membro poderia ficar. As famílias mais numerosas ficavam com

partes maiores e as famílias menores com as menores. Na colheita, os

trabalhos eram realizados em forma de mutirão. Atendendo assim as

necessidades de todas as famílias da comunidade.

Em relação às áreas onde ocorria a criação extensiva de bovinos,

também se seguiam normas de procedimentos voltados a proporcionar,

além do bom desempenho, um estado de harmonia entre toda comunidade,

pois, os animais eram constantemente acompanhados e seguidos de

cuidados que proporcionassem todos essas condições. A visita ao gado,

denominada pelos mais antigos de “campear o gado”, consistia em sair em

grupo de três ou mais cavaleiros à procura do rebanho bovino espalhados

por toda a área da sesmaria. Esse trabalho também era feito pelos membros

da comunidade, envolvendo várias famílias. Os animais jovens recebiam no

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105

próprio campo um corte na orelha, como sinal de identificação do

proprietário, até chegar o período da marcação, onde todo o rebanho era

levado ao curral a fim de realizar a identificação definitiva do proprietário

com um ferro quente, normalmente na perna direta do animal, região inferior.

O modo de uso comum, da área da sesmaria de Santana também

pode ser observado, na maneira de como essa categoria de agricultores

tratam e trabalham a terra. Esses agricultores possuem um processo de

rotação das áreas de cultivo, chamadas de capoeiras, que constitui a

maneira natural da reestruturação do ambiente ocupado pelo homem.

Segundo depoimentos de vários agricultores, como o senhor Cassiano

Lopes Viana, o senhor Catulino Lopes Viana e o senhor Armindo Lopes

Viana, que constituem os moradores de maior idade e mais antigos na

sesmaria de Santana. Não era raro o agricultor cultivar por dois a quatro

anos em uma mesma área, sem diminuir a produtividade e que a próxima

derrubada da mata para o plantio ocorria não porque aquela área de terra

diminui sua produtividade, mas sim porque a limpeza dessa área se tornava

muito mais trabalhosa. O fato é que as áreas de capoeira chegavam a ficar

por oito, dez e mais anos sem que esses agricultores voltassem a derrubá-

las novamente, condição que contribui em muito para o processo de

regeneração. Essa prática de construção itinerante das roças observadas

por Wagley (1988), por Adams (2000) e por Mckean & Ostronm (2001), é

fundamental para se restabelecer um novo equilíbrio neste ambiente, que

segundo Dubois (1996):

“(...) a capoeira acumula

progressivamente, na superfície do solo,

nutrientes e húmus e favorece, dessa

maneira, uma boa reciclagem de

nutrientes, a qual preenche um papel

importante na recuperação do solo

aumentando sua porosidade, sua

capacidade de absorver a chuva e o ar,

diminuído, também, o risco de erosão.”

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106

O ambiente passou por um processo traumático, ou seja, a derrubada

da mata e, em seguida, a queimada para dar lugar a um produto agrícola.

Ainda nos dias de hoje, o processo de exploração da terra para o

cultivo dos produtos agrícolas persiste em ocorrer sob a mesma forma que

ocorria quando da aquisição da área da sesmaria, em 1908, por parte dos

pioneiros.

Esse modo particular de exploração das áreas de uso comum dentro

da sesmaria Santana está ameaçado, em virtude de vários aspectos

externos e alheios a essa prática de subsistência. Hoje há grandes conflitos

envolvendo essa categoria de agricultores tradicionais. Dentre os principais

pontos conflitantes, há três que surgiram com maior ênfase nos últimos

anos, que são:

1. A delimitação das áreas, que cada agricultor possui,

imposta pelas próprias circunstâncias do momento, pois antes toda a área

era aberta e de uso comum. Hoje, cada agricultor está sobre uma área

delimitada e isso trouxe problemas imediatos. O mais grave é o pouco tempo

de regeneração que as capoeiras possuem, pois com a delimitação das

áreas, o uso dos espaços passou a ser mais intenso, como não há tempo

suficiente para que as capoeiras se regenerem, a conseqüência imediata é a

diminuição significativa da produtividade, sentida e reclamada por todos os

agricultores. Conforme o relato do senhor Cassiano Lopes Viana:

“Antigamente, com a planta de seis litros

de arroz, a gente chegava a colher até

dezoito volumes, o suficiente para

abastecer toda a família por um ano; e se

a família fosse pequena dava até para

emprestar um pouco pro vizinho ou

vender um pouco”. 2. Os aspectos culturais causam fortes interferências,

no dia-a-dia desses agricultores, caminhando lado-a-lado com o processo de

cultivo. Mckean & Ostronm (2001), também reforçam a influência

estabelecida entre a cultura e a maneira de produção. Nas comunidades de

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107

Santana e Água Branca observa-se que os agricultores deixam guiar por

aspectos culturais, que começa com a derrubada da mata até chegar à

colheita. O agricultor segue, por exemplo, o calendário lunar, plantando

somente na lua que tradicionalmente julgue correta, ou favorável a

determinado produto. Notadamente algumas vezes, esses agricultores

tiveram perdas relacionadas diretamente a esse aspecto cultural. O senhor

Catulino Lopes Viana, observa que:

“já houve ocasiões onde a demasiada

demora para realizar a colheita do arroz, a

espera da lua adequada, fez com que a

estiagem, fosse embora e se revertesse

em chuva e fazendo com que o arroz

viesse a ter quase que sua totalidade de

perdas, pois, acabou por arder”.

Dentre outros fatos observados, sobre esse aspecto, pode-se citar

como forte exemplo, aquilo que aconteceu com o senhor Máximo Lopes

Viana, quando, no final do ano de 2004 veio a ser mordido por um animal

peçonhento (cobra), e o primeiro recurso a procurar foi a benzedura e

somente dias depois que procurou recursos hospitalares. Porém, segundo

os médicos, a seqüela imediata foi a cegueira total, agravada pela catarata.

Hoje, o senhor Máximo Lopes Viana tornou-se uma pessoa extremamente

dependente de seus parentes para sobreviver, pois não consegue mais

realizar as tarefas mais corriqueiras de seu dia-a-dia.

3. O modelo externo de produtividade é tratado com

muita ênfase, aspecto que vem impondo, nova perspectiva de produção e ao

mesmo tempo vem moldando e servindo de espelho para essa categoria de

agricultores tradicionais. O problema é que esses agricultores não têm

conseguido seguir esse modelo e no primeiro momento a impressão que

fica, segundo depoimentos, é uma certa angústia e aflição por não se

adequar a esse modelo. Há fatos que exemplificam a situação em relação à

criação do gado bovino, em que a exigência do mercado vem introduzindo,

forçadamente a criação do gado da raça nelore. Essa exigência ocorre no

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momento da venda da produção, no caso os bezerros, pois o mercado

passou a diferenciar monetariamente os animais dessa raça em detrimento

das demais. Isso está fazendo com que esses agricultores, mesmo tendo no

leite uma opção a mais de renda, introduza de maneira cadenciada aquilo

que o mercado vem estabelecendo.

Essa situação enfrentada por essa categoria de agricultores

tradicionais é muito diferente da qual estavam habituados. Quando viviam

em uma comunidade fechada – o Arraial de Santana, não havia delimitações

de cercas na área da sesmaria e as exigências e necessidades de produção

também eram diferentes.

Hoje, em suas unidades de produções, os agricultores tradicionais,

mesmo enfrentando todas essas divergências, têm procurado ao longo de

sua jornada de trabalho, complementar seus rendimentos, com outras

atividades. Uma das alternativas encontradas por esses agricultores é a

utilização de espaços fora de sua unidade de produção. De certa forma um

suporte a mais para sua subsistência, pois nessas áreas que funcionam

como uma extensão de sua unidade produtiva, há possibilidades de

obtenção de vários produtos complementares à subsistência, como, por

exemplo, matéria prima para desenvolver outra atividade, como o

artesanato, ou mesmo áreas para realizarem o cultivo, que por sua vez pode

ocorrer em forma de arrendamento, parceria, meeiro ou mesmo cedida sem

qualquer pretensão financeira em troca. Essa busca do agricultor, fora de

seu espaço territorial, ocasionado pela sua necessidade de sobrevivêmcia é

uma característica do espaço necessário à manutenção da subsistência,

pois a ação do trabalho do agricultor está além dos limites territoriais de sua

propriedade. Nas relações resultantes da exploração espacial realizada

pelos agricultores tradicionais, que abrange todas as áreas de uso para sua

subsistência, é abordado por Azevedo (2001), como espaço funcional.

4.4 Os espaços funcionais dos agricultores tradicionais O espaço funcional utilizado por cada agricultor está sempre

condicionado a inúmeras variáveis, pois o agricultor está sempre buscando

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109

suprir suas necessidades básicas em todo espaço que encontre disponível.

Normalmente isso tem ocorrido em áreas próximas, pois assim facilita os

cuidados com o manejo de limpeza e cuidados com os animais silvestres e

os domésticos que por ventura possam atacar suas roças.

O conceito de espaço funcional constitui a soma de todas as áreas de

exploração pelos agricultores tradicionais, quer as áreas que estejam

delimitadas, como sendo de sua propriedade, quer aquelas que utilizem fora

de sua unidade produtiva como forma de complementar sua renda familiar

ou mesmo para atender suas necessidades de subsistência (Azevedo,

2001).

A ocupação do espaço dentro da área da sesmaria de Santana, pelos

agricultores tradicionais remanescentes da antiga colônia ou antigo Arraial

de Santana, apresenta-se como forma primordial de sobrevivência, pois a

cada instante há necessidade de buscar suprir suas necessidades em áreas

de terras fora de seu espaço delimitado. A importância dessa prática reflete

no modo de sobrevivência dos agricultores, que nos últimos anos tem

aumentado a incidência desse mecanismo. Esse fato é perceptível até pelos

agricultores, que afirmam unanimemente. Isso se deve a vários fatores, o

mais notório é a grilagem, pois, segundo o senhor Cassiano Lopes Viana:

“(...) eles, os grileiros desmatam de

forma indiscriminada, espremem a gente

para as furnas de serras e a gente não

tem outra saída, a não ser, se virar”.

Os espaços que os agricultores tradicionais vêm utilizando fora de

suas unidades de produção, como maneira de suprir ou complementar as

necessidades alimentares de suas famílias, constituem, em observação de

Azevedo (2001), como espaço de expansão de cada unidade produtiva.

Essa prática pôde ser observada em todas as unidades produtivas

estudadas: ela torna-se importante estratégia de sobrevivência para as

famílias das localidades – Água Branca e Santana, pois as famílias possuem

poucas ou quase nenhuma possibilidade de conseguir renda proveniente de

outras fontes.

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110

A diversificação da renda, que poderia ser gerada dentro das

unidades produtivas, é inexistente. Com isso passam a buscar esse tipo de

alternativa, para aumentar as possibilidades de renda e sobrevivência.

TABELA 15. Áreas cultivadas, para o autoconsumo, pelos agricultores

tradicionais em suas unidades produtivas e fora de sua

unidade produtivas.

ÁREA CULTIVADA

Código

das UPs

Proprietário NA UP

2003/2004 (Em hectares)

FORA DA UP

2003/2004

NA UP 2004/2005

(Em hectares)

FORA DA UP

(2004/2005)

S01 Catulino Lopes Viana 2,94 - 2,04 1,00

S02 Benedito Lopes Viana 2,40 - 1,21 -

S03 Máximo Lopes Viana 0,30 - - -

S04 Cecílio Lopes Viana1 - - - -

S05 Liduvino Lopes Viana1 - - - -

S06 Armindo Lopes Viana1 8,76 1,31 7,94 3,31

S07 Antônio de S. Ribeiro 2,77 2,39 0,73 0,59

S08 Paulo dos A. Martins - 1,35 - 2,67 S09 Gonçalo M. Viana 2,11 - 0,98 -

S10 Antônio V. da Silva2 2,91 - 2,87 -

S11 Dielson V. Silva2 - - - -

A12 André Santana Lopes 2,00 1,00 1,30 0,30

A13 Liduvino Lopes Viana 3,30 2,20 3,40 2,20

A14 Cassiano Lopes

Viana 1,30 - 1,50 -

A15 Luiz Corrêa 0,81 0,25 1,27 -

A16 Angelino da Silva 2,10 - 2,20 -

TOTAL 31,70 8,50 25,44 10,07 1 Produção do grupo familiar do senhor Armindo Lopes Viana (uso comum). 2 Produção do grupo familiar do senhor Antônio Viriato da Silva (uso comum).

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111

O uso da força física, como único processo para o funcionamento das

roças, restringe muito a utilização das terras; isso faz com que cada

agricultor tenha em média uma capacidade de aproximadamente 1,87

hectare/ano (Tabela 15).

Para essa categoria de agricultores, o tamanho dessas áreas é

extremamente importante por envolver vários fatores que podem interferir na

produção e na produtividade, como, por exemplo: o baixo uso de insumos

agrícolas, que inclui a não utilização de:

1. Máquinas agrícolas, para o preparo das terras,

2. Defensivos químicos, como: fungicidas e herbicidas, para

contenção de pragas nas roças,

3. Adubos para correção do solo, para o cultivo dos produtos

4. Recursos financeiros de maior vulto destinados ao cultivo.

Esses fatores acabam interferindo de forma negativa, para a

manutenção desses agricultores em suas terras. Entre os vários agricultores,

estudados verificou-se que essas áreas de terras vêm diminuindo em muito

sua capacidade de produtividade, comprometendo assim a sobrevivência

dessas famílias. Esses agricultores estavam habituados a cultivar a terra de

forma itinerante e comunitária, pois a própria área de sesmaria possibilitava

essa prática, hoje a nova conjuntura, que esses agricultores estão

vivenciando, estrangula todo esse processo de produção tradicional. O

surgimento dos grileiros e a delimitação das áreas com cercas de arame,

força-os a cultivar de forma mais sistemática a mesma área, ou seja,

fazendo com que as capoeiras passassem a ter menor tempo de

regeneração. Isso faz também com que se busquem alternativas de

produzir. Umas delas, encontrada é a utilização de espaços fora de sua

unidade de produção.

O espaço funcional não se resume estritamente na ocupação de

espaços fora de sua área delimitada para a produção de roças, com a

finalidade de produzir para o auto-sustento; entretanto, verifica-se maior

complexidade, quando os agricultores tradicionais, além da roça, utilizam

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112

espaços para a retirada de madeira, para a construção de cercas, casas,

chiqueiros de porcos; e palhas para cobertura de casas e de outras

atividades dentro de unidades produtivas, que os circunda. Além disso, o

uso desses espaços também complementa outras necessidades de que

necessitam no dia-a-dia, como lenha, destinada ao preparo dos alimentos,

ou ainda a madeira que é utilizada para a fabricação de utensílios

domésticos, como, cochos, gamelas, colheres de pau e pilões.

O espaço funcional proporciona aos agricultores tradicionais muitas

vantagens; a sua ausência colocaria em risco a própria sobrevivência do

agricultor. Um exemplo nítido é o sítio do senhor Antônio de Souza Ribeiro,

que apresenta as seguintes características: pequena propriedade, com 12,5

hectares, em área de cerrado apresentando partes de alagamento, no

período chuvoso, parte como reserva 1,7 hectares e 86,40% da área da

propriedade são cultivas com pastagens de capim humidícula (Brachiaria

humidícula). Essa situação ocorre basicamente por dois motivos:

1) Falta de recursos financeiros, que possibilitariam

investimentos na correção de solo, pois consideram o solo

muito fraco/ruim.

2) Falta de condições de escoamento da produção, pois a

região não é beneficiada com meios de transporte

satisfatórios.

Levando em consideração o tamanho da família do senhor Antônio de

Souza Ribeiro, constituída por cinco pessoas; o tamanho de sua área; a

qualidade do solo e a disponibilidade de recursos financeiros da família;

verifica-se que seu espaço territorial delimitado não oferece condições que

atenda às necessidades básicas de sua família, forçando o agricultor a

buscar espaços de expansão, para cultivar e prover a subsistência familiar.

Dentre os nove agricultores pesquisados, todos utilizam espaços fora

de sua unidade produtiva. No entanto, dois agricultores obtiveram maior

interação com essa prática: os senhores Antônio de Souza Ribeiro e Paulo

dos Santos Martins.

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O senhor Antônio de Souza Ribeiro cultivou na safra 2003/2004, 2,24

hectares, sendo que desse total apenas 0,19 hectares foram cultivados em

suas terras, as demais áreas de cultivos foram realizadas fora de sua

unidade produtiva. Essa situação é vivenciada por outros agricultores

tradicionais, na sesmaria de Santana. O senhor Antônio de Souza Ribeiro

retrata bem esta situação, pois 73,28 %, ou seja, mais da metade desta área

está destinada a pastagens, mesmo o agricultor possuindo apenas sete

animais bovinos. A sobra da pastagem é aproveitada para arrenda-la aos

vizinhos e com isso garantir uma renda extra para a família. A situação do

agricultor em relação à ocupação de espaços fora de sua unidade produtiva

é muito abrangente em termos de espacialização, uma vez que cultiva áreas

nas propriedades dos senhores Ademar e Gonçalo (Apêndice O).

O Apêndice O representa, graficamente e com clareza, que o senhor

Antônio de Souza Ribeiro, possui áreas de cultivo fora de seu espaço

territorial, o qual denomina-se de espaço que complementa a subsistência

do agricultor ou conforme Azevedo (2001), espaço expandido. O agricultor

explora mais de uma área, pois cultiva banana e mandioca, em terras de

exploração do senhor Gonçalo Lopes Viana. Cultiva ainda, milho, arroz,

milho pipoca e abóbora em terras do senhor Ademar. É importante salientar

que em ambos os casos as terras foram cedidas sem que nada fosse pedido

em contrapartida. No entanto, este espaço funcional é de vital importância

para o agricultor propiciar melhores condições de vida à sua família.

Outra opção encontrada pelo senhor Antônio de Souza Ribeiro refere-

se às inúmeras empreitas de roçados que realiza no decorrer do ano,

também como forma de complementar a renda familiar. O agricultor expôs,

que uma das pessoas para qual realiza trabalhos de roçada de pastagem na

forma de empreita, vem fazendo convites para que ele vá trabalhar no país

vizinho, a Bolívia, onde há mais oferta de emprego e melhores propostas de

remuneração. Segundo o agricultor, isso só não ocorreu ainda porque suas

filhas e sua esposa estão estudando. A preferência é ficar, mesmo

consciente que o local em que está vivendo com a sua família necessita de

muitas melhorias em infra-estruturas.

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114

Todo o desdobramento que o agricultor tem feito em busca de

trabalho, a fim de proporcionar melhorias em sua condição social ou mesmo

trabalhando e produzindo em áreas de terras que os vizinhos cedem; a

dedicação de seus filhos nos estudos, mesmo apresentando dificuldades

com a distância e falta de material escolar. Tudo isso contribui

negativamente, desestimulando o agricultor, porém acredita que as tão

sonhadas melhorias virão somente para os seus netos.

A produção que o senhor Antônio de Souza Ribeiro vem realizando

ao longo de sua vida, sem o auxilio de máquinas ou de financiamentos de

órgãos governamentais, dificilmente permitirá a saída do padrão de vida em

que se encontra. Isso porque sua capacidade de produção tanto em suas

terras como em áreas cedidas por vizinhos é de 2,24 hectares/ano, em se

tratando de produção de alimentos para a família (Tabela 6). Essa

capacidade aumenta a medida que o agricultora busca outras forma de

complementar sua subsistência, como por exemplo as empreitas.

Outro aspecto importante está relacionado às áreas que o agricultor

utiliza para o cultivo fora de sua unidade produtiva, que corresponde 2,05

hectares. Neste caso, verifica-se que há uma necessidade espacial maior

para complementar a renda e a alimentação de sua família (Apêndice L).

Além disso, o mapa representa os demais espaços funcionais utilizados para

manutenção de sua família, com destaque para as áreas de cultivo, fora de

sua unidade produtiva.

Na safra 2004/2005, o senhor Antônio de Souza Ribeiro deixou de

cultivar o arroz e o milho e manteve apenas as culturas de mandioca,

banana e cana-de-açúcar, que totalizam uma área de 0,78 hectare, sendo

que desse total, apenas 0,19 hectares estão em sua unidade produtiva, as

outras, 0,59 hectares estão em áreas fora dela, ou seja, em áreas que

denomina de espaço expandido (Azevedo, 2001), fundamental à

manutenção da subsistência desse agricultor.

A situação do senhor Antônio de Souza Ribeiro evidencia a situação

da busca de novos espaços, ou seja, espaço expandido (Azevedo, 2001),

pois, passou a cultivar áreas de terra fora de sua unidade produtiva, onde

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115

plantou em áreas de terras do senhor Ademar e em áreas do senhor

Gonçalo Martins Viana (Apêndice O). A área de terra cultivada em sua

propriedade corresponde a uma parcela muito pequena em relação às

necessidades de consumo alimentar, a área per capita foi de 0,55 hectare

para a safra 2003/2004 e de 0,15 hectare para a safra 2004/2005.

A área plantada com arroz e cana-de-açúcar corresponde a 0,19

hectare de terra, que são cultivados sem a utilização dos defensivos

químicos, como: adubos, herbicidas e fungicidas, aspectos que

conseqüentemente interferem na produtividade, fazendo com que haja

diminuição dessa produtividade e interferindo na renda familiar. Isso reforça

a necessidade de buscar áreas de plantio fora de sua unidade produtiva.

O Senhor Paulo dos Anjos Martins possui uma pequena área de terra,

cerca de três alqueires, o que corresponde a 6,6 hectares. Toda a área está

beneficiada com máquina e cultivada com pastagens, onde se cria gado. A

sua produção alimentar vem em sua integralidade de áreas fora de sua

unidade produtiva, como na safra 2003/2004, em terras cedidas pelo senhor

Ademar. Nela cultivou mandioca e arroz. As áreas de abrangência do uso

dos espaços estão próximas à sua moradia, pois, para a safra 2003/2004 o

senhor Ademar cedeu uma área de 1,34 hectares, sendo que desse total,

destinou 0,36 hectare para o plantio de mandioca e 0,98 hectare para o

cultivo consorciado de arroz, abóbora e milho pipoca. Em virtude de não ter

cultivado o milho, neste ano, as despesas aumentaram, pois, a ração para

os animais domésticos, como: galinhas e porcos tiveram que ser adquiridas

através de compra, e isso pesou no orçamento doméstico. A área de cultivo

na safra 2003/2004 (Apêndice Q) está fora da unidade produtiva do

agricultor. O espaço de cultivo fora de sua unidade produtiva é a forma

encontrada pelo agricultor de suprir as necessidades de subsistência da

família.

Na safra 2004/2005, o agricultor, novamente, busca em áreas fora de

sua unidade produtiva novos espaços para realizar o cultivo de subsistência

da família. Para essa safra novamente o senhor Ademar cede outra área de

terra para a produção, com isso ocorre uma expansão da área de produção.

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116

No entanto, para que isso ocorresse, houve a necessidade de promover a

limpeza da área destinada à safra 2003/2004 de forma braçal, além de

realizar a limpeza desta nova área com maquinário, ou seja, com a utilização

de um trator que arou e depois nivelou a terra, onde foi destinada ao cultivo

de milho, que corresponde a 1,32 hectare (Tabela 7) e (Apêndice R). A área

total correspondente para a safra 2004/2005 a de 2,66 hectares (Tabela 7),

que segundo o agricultor, se produzir satisfatoriamente trará tranqüilidade

para a família e pensa em até comercializar o excedente. As áreas de

cultivos do agricultor são pequenas e destinadas à subsistência. A área per

capita foi de 0,10 hectares na safra 2003/2004 e de 0,20 na safra 2004/2005

(Apêndice E). Neste caso, o tamanho da família e a idade dos membros são

fatores que exercem forte influência sobre as dimensões da área per capita,

pois o agricultor cultiva áreas de roças em tamanhos similares a de outros

membros da comunidade.

Outros agricultores tradicionais também utilizam a prática de buscar

novos espaços para cultivar e assim garantir a subsistência.

O senhor Catulino Lopes Viana, no ano safra 2003/2004, cultivou

apenas em área de terra de sua propriedade, porém para o ano safra

2004/2005, utilizou áreas fora de sua unidade produtiva.

O senhor Catulino Lopes Viana, para a safra 2003/2004 cultivou uma

área de terra que totalizou 2,94 hectares, sendo que esse total foi assim

distribuído: 0,30 hectare com o cultivo de milho, 1,6 hectare com o cultivo de

arroz, 0,20 hectare com o cultivo de banana e 0,84 hectare com o cultivo de

mandioca (Tabela 2) e (Apêndice H). Para a safra de 2004/2005, deixou de

cultivar o arroz, porém manteve as mesmas áreas do bananal e do

mandiocal (Tabela 2) e (Apêndice F). Entretanto, nesta safra cultivou milho

em terras de um vizinho, que segundo acordo entre ambos, obteve a terra

preparada para o plantio e tendo em contrapartida, o plantio do capim para o

proprietário das terras. Essa área de cultivo correspondeu a 1,0 hectare

aproximadamente e foi cultivado com milho.

A área per capita foi de 1,47 hectares na safra 2003/2004 e de 1,02

na safra 2004/2005.

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117

Foto

: R. S

. Bas

tos,

200

5.

FIGURA 30. Casa abandonada da senhora Mariana Lopes Viana – tapera.

FIGURA 32. Palmeira indaiá (Orbignya eichleri Drude), utilizada na cobertura das residências.

Foto

: R. S

. Bas

tos,

200

5.

FIGURA 31. Madeira para o reaproveitamento em outras construções. Fo

to: R

. S. B

asto

s-20

05.

Ainda com

relação ao uso e

exploração do espaço,

o agricultor buscou nas

propriedades vizinhas a

disponibilidade da palha

do indaiá (Orbignya

eichleri Drude) (Figura

32), para a cobertura da

ampliação de sua

cozinha. Além disso,

parte do

madeiramento foi

adquirido do

reaproveitamento de

uma tapera, ou seja,

antiga casa

abandonada dentro da

área da sesmaria de

Santana, a casa da

senhora Mariana Lopes

Viana. (Figuras 30 e

31). Essa estratégia se

estende a outros

membros da

comunidade, como

é o caso do senhor

Gonçalo Lopes Viana,

irmão do senhor

Catulino Lopes Viana

que moram e exploram

a mesma área

territorial.

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118

No ano de 2005, o agricultor, começou a construir uma nova

residência, pois a que habitava estava comprometida, colocando em risco a

vida de seus familiares.

O senhor Gonçalo Lopes Viana também fez uso do reaproveitamento

do madeiramento da residência abandonada (Figura 31). Dela retirou esteios

de aroeira (Myracrodruon urundeuva Fr. All) e barrotes, para a nova

construção.

O senhor Gonçalo Lopes Viana passa a maior parte do tempo

trabalhado fora de sua unidade produtiva. Os trabalhos são variados, no

entanto, as empreitas de roçado são as que apresentam maior freqüência,

normalmente, são realizadas em área fora da sesmaria de Santana, que

contribui para o espaço expandido, pois quase sempre consegue pequenas

áreas para desenvolver o cultivo de algum produto, caracterizando-se como

espaço funcional, pois de certa forma, este espaço está contribuído para a

manutenção e sobrevivência de sua família.

A roça próxima a sua casa, produziu arroz, milho, banana e mandioca

(Apêndice S). Em virtude dos freqüentes trabalhos realizados pelo senhor

Gonçalo Lopes Viana, em outras unidades produtivas, seus filhos

contribuem para a manutenção da roça, principalmente na limpeza (capina).

Os produtos cultivados e o tamanho das áreas refletem na condição

alimentar dos agricultores tradicionais. Verifica-se que as áreas de cultivo

FIGURA 33. Tipos de coberturas encontradas nas residências.

Foto

: R. S

. Bas

tos,

200

5.

No detalhe, aspecto interno da cobertura das residências.

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119

são pequenas e que aliado aos inúmeros fatores que interferem na

produtividade, acabam comprometendo a subsistência desses agricultores.

Não houve a preocupação em mensurar a produtividade, porém verificou-se

que entre os agricultores entrevistados, todos foram unânimes a afirmar, que

de tudo o que plantam, sempre há falta na mesa, de um produto ou outro no

decorrer do ano. Isso ratifica a idéia de que esses agricultores em razão

daquilo que produzem e do tamanho das áreas, estão produzindo de forma

insatisfatória para sua subsistência, dessa forma, essa categoria de

agricultores tradicionais se vêem obrigados a buscarem formas alternativas

de suprirem suas necessidades de subsistência.

A Tabela 8 representa graficamente os produtos cultivados pelo

senhor Gonçalo Lopes Viana e suas respectivas áreas, nas safras

2003/2004 e 2004/2005, onde temos as áreas cultivadas, em duas safras

consecutivas. Considerando que a família do senhor Gonçalo Lopes Viana é

constituída por onze pessoas e que apenas três membros da família são

utilizados como força de trabalho; percebe-se que a área per capita, é

extremamente pequena, ou seja, 0,16 hectare na safra 2003/2004 e 0,07

hectare por pessoa na safra 2004/2005. Dessa forma, a manutenção da

subsistência da família desse agricultor só ocorre, tendo em vista, das

buscas de novas alternativas, como por exemplo, os espaços de cultivo fora

de sua unidade produtiva e nas empreitas.

O Senhor Armindo Lopes Viana, juntamente com seus filhos, também

realizam o cultivo em terras fora de sua unidade produtiva. O Ailton Lopes

Viana, seu filho, que ainda está vivendo em sua companhia, cultiva banana e

mandioca em terras do senhor Catulino Lopes Viana, sem ter que dar nada

em troca (Apêndice M). Os seus outros dois filhos, que constituem núcleos

familiares independentes e que moram em sua propriedade, os senhores

Liduvino Lopes Viana e Cecílio Lopes Viana também cultivam em terras de

conhecidos e amigos, inclusive até mesmo fora da área da sesmaria de

Santana. Segundo o senhor Liduvino Lopes Viana, o cultivo fora de sua

unidade produtiva é realizado até em propriedades de pessoas fora de seu

relacionamento. Para que isso aconteça, basta pedir e explicar a situação ao

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120

proprietário que cede a área; que pode ser em forma de arrendamento

(pagando percentagem), partilha da produção, ou somente cedida. Porém, o

tempo de permanência é menor do que quando a pessoa é conhecida,

talvez pelo medo da grilagem de terras.

O grupo familiar do senhor Armindo Lopes Viana é o que apresenta

as maiores roças, no entanto, a área per capita foi de 0,58 para a safra

2003/2004 e 0,52 para a safra 2004/2005 (Apêndice E). Novamente o

tamanho da família e a pouca contribuição de seus membros como força de

trabalho, pois, seus filhos ainda são menores de idade, foram fatores que

novamente exercem forte influência sobre a área per capita, provocando

diminuição da mesma.

A relação de exploração da terra observada entre essa categoria de

agricultores tradicionais ocorre por meio de mecanismos complexos, que nos

dias de hoje, dificilmente conseguiríamos compreender sob a lógica

capitalista, onde imperam as leis de mercado. A ocupação e a exploração de

uso, estabelecidas pela família do senhor Benedito Lopes Viana e seu

Irmão, o senhor Máximo Lopes Viana, exemplificam essa situação. As áreas

exploradas pelo senhor Benedito Lopes Viana e seu irmão são de

propriedade do senhor Luciano Silva, que não estabelece nenhum tipo de

exigência financeira, para que ambos explorem a área.

O senhor Luciano Silva adquiriu essas terras da senhora Mariana

Lopes Viana Lopes Viana, tia do senhor Catulino Lopes Viana. O senhor

Luciano Silva não faz uso dessas terras em benefício próprio, entretanto,

permite que as terras sejam exploradas, sem pedir nada em contrapartida.

Desse modo, tanto o senhor Benedito Lopes Viana como o seu irmão, o

senhor Máximo Lopes Viana, vivem explorando as terras, cultivando, arroz,

banana, milho, mandioca, abóbora e cana-de-açúcar. Além disso, criam

animais: bovinos, eqüinos, suínos e aves, ambos para suprir as

necessidades de subsistência da família. A Tabela 3 representa a área

cultivada pelo senhor Benedito Lopes Viana, nas safras 2003/2004 e

2004/2005, onde estão discriminados os produtos e o tamanho de cada área

de produção, incluindo todas as áreas cultivadas pelos membros da família

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121

(Benedito e Basílio Lopes Viana), pois tudo o que produz é destinado ao

consumo próprio. De forma geral, o espaço destinado à produção agrícola,

tanto aquele cedido pelo senhor Luciano Silva, como aquele que é utilizado

em áreas de vizinhos, são essenciais para promover a subsistência da

família. A área per capita foi de 0,60 hectare na safra 2003/2004 e 0,30 na

safra 2004/2005, apresentando diminuição de 50%. (Apêndice E).

É nesse espaço que se concentram os esforços para compreender a

lógica e a dinâmica que envolve o uso do espaço. Segundo o senhor

Benedito Lopes Viana:

“Se não fosse a boa vontade do senhor

Luciano Silva em ceder essas terras,

muito provavelmente, estaria encostado

nas cidades passando necessidade ou

em um acampamento de sem terras,

debaixo de uma lona preta. (...) se um dia

o senhor Luciano Silva pedir essas terras,

vou sair, pois, sei que não é minha e ele

já fez muito por mim, até hoje”.

O uso das terras pelo senhor Benedito Lopes Viana e sua maneira de

pensar sobre a propriedade retratam a fidelidade com que o agricultor trata

do cumprimento dos acordos estabelecidos entre a categoria. Isso expressa,

a demonstração de princípios que esse agricultor mantém sobre o uso e a

exploração comum da terra. O espaço de exploração para a subsistência,

inclusive aquele fora de sua unidade produtiva, tem acontecido graças ao

cumprimento desses acordos.

O Senhor Benedito Lopes Viana passou a introduzir de maneira lenta

o capim cultivado para alimentação bovina, pois já possui cinco cabeças de

animais voltados para produção de leite.

A área explorada pelo senhor Benedito Lopes Viana e o senhor

Máximo Lopes Viana aparecem com uma série de pequenas roças

(Apêndice J). A produção está voltada para o consumo de subsistência da

sua família, essas áreas são abertas em capoeiras antigas, que segundo o

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122

agricultor, possui entre dois e quatro anos de descanso. Esse tempo em

descanso vem a cada ano diminuído, pois o próprio tempo de permanência

cultivando, na mesma área, também tem diminuído. O Apêndice L

representa a áreas cultivadas do senhor Benedito Lopes Viana na safra

2004/2005.

O agricultor cultiva área de terra cedida pelo senhor Luciano Silva,

portanto, toda a produção ocorre em um espaço territorial que não lhe

pertence de fato. Mesmo assim, na safra 2003/2004, seu filho Basílio Lopes

Viana cultivou 1,0 hectare de roça de arroz, em terras do senhor João

Batista. Em contrapartida, o agricultor plantaria o capim, nesta área de terra

cedida. Apesar do senhor Benedito Lopes Viana não ser possuidor de terras,

foi considerado como um espaço de uso de sua unidade produtiva, pois, a

utilização dessa área, em função do tempo de exploração lhe garante esse

direito. De qualquer forma, o mais importante consiste na prática de uso

comum do espaço, pela família, que em sua abrangência caracteriza a forma

do espaço funcional, cuja abrangência espacial, é necessário para a família,

suprirem suas necessidades de subsistência.

As áreas exploradas pelo agricultor apresentam formatos irregulares,

algumas dessas roças não possuem cercas de proteção contra os animais

(Apêndices J e L). Além disso, cultivam vários produtos em consórcio,

utilizando assim, as áreas abertas de forma mais intensa e segundo o

senhor Benedito Lopes Viana: “de forma mais proveitosa”.

A unidade produtiva do senhor Armindo Lopes Viana é a que possui a

maior área de cultivo, 8,76 hectares na safra 2003/2004 e 7,94 hectares na

safra 2004/2005 , fato que pode ser justificado, tendo em vista que é

possuidor de três indivíduos em atividade de plena força de trabalho. Além

disso, seus outros dois filhos que moram em sua unidade produtiva e

constituem núcleos familiares independentes, permutam dias de serviço, em

períodos de maior necessidade. Mesmo assim, seu filho Ailton Lopes Viana,

que ainda mora na companhia do pai e que produz para a subsistência da

família, cultiva 0,49 hectare de mandioca em terras do senhor Catulino

Lopes Viana (Apêndices M e N).

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A utilização de espaços fora da unidade produtiva possui tendências

de se tornar uma prática cada vez mais forte, pois os agricultores

tradicionais vêm introduzindo, nas áreas de roças, o capim para a criação de

gado, assim sendo os espaços destinados à agricultura estão se tornando

mais escassos. A substituição das áreas de roças por capim é uma

modalidade que afeta de forma implacável a regeneração das matas através

das capoeiras, pois se não houver esse processo de regeneração,

conseqüentemente, o processo de produção e a subsistência ficam

ameaçados. O exemplo dessa situação pode ser encontrado na unidade

produtiva do senhor Paulo dos Santos Martins, que em função da plantação

integral de pastagens, hoje, se vê obrigado a cultivar em terras de vizinhos

(Apêndices Q e R), porque em sua unidade produtiva não consegue retirar

nem a lenha para preparar os alimentos.

Na localidade de Água Banca, os agricultores também utilizam a

prática de cultivar em terras fora de sua unidade produtiva. No entanto, o

registro dessa prática demonstrou que essas ocorrências estão mais ligadas

à utilização de áreas de vizinhos que estão em processo de formação de

pastagens. Pois, estes cedem as áreas já beneficiadas, ou seja, preparadas

para o plantio, em troca da força de trabalho dos agricultores, que realizam o

plantio da pastagem. A única exceção ocorrida é em relação ao senhor

Cassiano Lopes Viana, pois, sua aposentadoria e aquilo que produz na roça

considera suficiente para se manter. Segundo o senhor Cassiano Lopes

Viana: “Ainda atendo aos vizinhos, quando falta alguma coisa”.

Essa situação vivida pelos agricultores, ou seja, pequenas áreas e

sua delimitação com cercas, fazem com que busquem novos mecanismos

de se reestruturarem dentro de suas unidades produtivas, como forma de

assegurarem sua subsistência. Assim, mesmo tendo adquirido

conhecimentos de manejo estritamente dentro de suas terras, diga-se

sesmaria de Santana, hoje, o que se vê, é a busca incansável de

alternativas para garantir a sobrevivência. Sob essa ótica, o agricultor as

busca de maneira variada, como: o trabalho remunerado (na forma de

empreitas), a troca de dias de trabalhos com os vizinhos, mutirão, produção

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124

no sistema de meia, roças em terras de terceiros – cedidas, ou a extração de

produto em áreas adjacentes para as benfeitorias, como por exemplo, a

retirada de palha para a cobertura das casas; madeira para a construção de

cercas, casas currais e outras benfeitorias.

O espaço funcional é o processo de utilização dos recursos naturais

do espaço geográfico, tanto aqueles constituídos por delimitações de

fronteiras, como os que simplesmente são utilizados, de forma comum, pelos

agricultores tradicionais para atender às suas necessidades de subsistência.

A utilização comum do espaço funcional ocorre em toda a área da

sesmaria de Santana, tornando-se uma prática comum, sem distinção deste

ou aquele agricultor. Todos os agricultores tradicionais pesquisados têm

recorrido a essa prática.

4.5 Espacialização e sobreposição das unidades produtivas mapeadas O processo de mapeamento foi realizado com nove agricultores

tradicionais, sendo que destes; três estão explorando a mesma área, que

compreende a unidade produtiva, UP-S06, do grupo familiar do senhor

Armindo Lopes Viana, a qual foi a que maior complexidade apresentou nas

relações de ocupação do espaço, (Apêndices M e N).

Essa complexidade está ligada diretamente à convivência em um

mesmo espaço territorial de três núcleos famíliares. Essas famílias são

constituídas por seus filhos, os senhores Liduvino Lopes Viana e Cecílio

Lopes Viana, que exploram a mesma área de terra, buscando obter a

subsistência para suas respectivas famílias. Mesmo podendo haver conflitos

de interesses sobre as maneiras de explorações e a decisão sobre o que

será explorado nessas áreas, esses grupos de famílias trabalham em

harmonia, respeitando os acordos estabelecidos entre ambos. Segundo o

senhor Armindo Lopes Viana, quando o espaço fica comprometido por

alguma razão, busca-se em áreas de vizinhos a complementação para

garantir a subsistência das famílias.

Os filhos do senhor Armindo Lopes Viana, tanto o Cecílio Lopes Viana

como o Liduvino Lopes Viana, plantam em áreas separadas dentro da

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125

propriedade e quando exploram a produção de leite, também utilizam

rebanho próprio e pastagens separadas. A manutenção da pastagem ocorre

de acordo com a necessidade e é feita com a utilização de serviços de todos

os membros do grupo familiar.

Com 54,39 hectares a unidade produtiva do grupo familiar do senhor

Armindo Lopes Viana é a que apresenta a maior área aberta. Sendo que

desse total 7,94 hectares são cultivadas com produtos agrícolas e 46,45

hectares com pastagens. As pastagens são constituídas de capim

braquiarão (Brachiaria brizantha cv. Maranduva) e humidícola, (Brachiaria

humidícola).

A área destinada ao cultivo corresponde a 8,76 hectares na safra

2003/2004, desse total 1,31 hectares é cultivada em áreas fora de sua

umidade produtiva (Tabela 5). Na safra 2004/2005, a área destinada ao

cultivo é de 7,94 hectares, sendo que desse total 3,31 hectares são

cultivadas fora da unidade produtiva e 3,82 hectares constituem áreas de

expansão, ou seja, novas áreas abertas. Em sua unidade produtiva

praticamente toda a área encontra-se explorada (Apêndices N). As que

ainda não foram são:

1. Duas pequenas áreas de cerrado; uma localizada logo atrás

de sua residência e uma segunda localizada na parte sul da

propriedade. Segundo informações do senhor Armindo

Lopes Viana, a abertura das áreas de cerrado é mais

complicada, pois, normalmente são terras mais fracas, para

plantar o arroz e o milho, além disso, há maior dificuldade

na manutenção dessas áreas. A abertura dessas está

condicionada a utilização de máquinas. No entanto, como o

custo dessa operação é maior que aquele realizado de

forma braçal, o agricultor vem protelando a abertura e

utilização dessas áreas.

2. Partes da mata ciliar, mesmo sendo, áreas de preservação

permanente, já foram explorada, tendo em vista serem as

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126

terras de maior fertilidade, segundo informações dos

próprios agricultores.

3. Áreas de maior elevação que se encontram localizadas no

sopé da serra Morraria, constituindo área de preservação

permanente. Porém esse não foi o principal motivo dessas

áreas não terem sido abertas ainda. Essas áreas possuem

forte aclive e dificulta inclusive a formação, manutenção e a

própria efetivação como áreas de pastagens.

O Apêndice N representa a unidade produtiva do grupo familiar do

senhor Armindo Lopes Viana na safra 2004/2005. Representa três pequenas

áreas de expansão. A primeira área está localizada próxima a serra Morraria

e foi cultivada com milho, arroz e abóboras pelo senhor Armindo Lopes

Viana. A expansão agrícola na safra 2004/2005 é de 3,82 hectares. A

segunda e a terceira área de expansão agrícola estão em locais de mata

ciliar. A área que está próxima à residência do senhor Armindo Lopes Viana

foi cultivada com arroz pelo senhor Liduvino Lopes Viana e a que está mais

afastada, próxima à divisa da sesmaria de Inhumas, foi cultivada com arroz,

milho e abóboras pelo senhor Cecílio Lopes Viana. As escolhas dessas

áreas ocorreram em função desses agricultores terem considerado os solos

de maior fertilidade e a proximidade de suas residências. A intenção é

cultivar essas áreas o maior tempo possível e depois introduzir o capim para

alimentação do gado.

Os Apêndices M e N retratam grande irregularidades, na forma de

divisões de pastagens. As cercas são tortuosas e por várias ocasiões há

misturas de diferentes tipos de arames e alguns postes são de árvores

nativas, que servem como postes das cercas. Essa lógica provoca certa

conturbação no aspecto da propriedade. Porém, é justificável, tendo em vista

que esses agricultores são de baixo poder aquisitivo e o reaproveitamento é

uma prática importante, que se sobrepõe à estética. Além disso, a

funcionalidade não deixa de existir.

O Senhor Armindo Lopes Viana vem introduzindo o capim cultivado,

para alimentação bovina, já que as pastagens nativas têm diminuído muito

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127

nos últimos anos em razão do processo de delimitação das áreas pelas

cercas que ocorrem tanto por parte dos grileiros das terras da sesmaria

como pelos membros da própria comunidade. As delimitações das áreas

através de cercas ocorrem por vários motivos. Quando se refere aos

grileiros, estas cercas têm basicamente dois objetivos:

1) Demarcar a área de ocupação propriamente dita;

2) Delimitar as pastagens cultivadas, inclusive para favorecer

o próprio manejo dentro dessa área.

As delimitações efetuadas pelos agricultores tradicionais possuem

caráter semelhante aos dos grileiros:

1) Demarcar as áreas de ocupação, onde estão sendo

desenvolvidas suas atividades de subsistência e assim estabelecer

resistência à ocupação de grileiros.

2) Delimitar com cercas suas roças, como forma de proteção

dos animais. Os agricultores tradicionais realizam essa tarefa de duas

maneiras:

a) Com cercas de arame farpado, que normalmente são

provisórias, constituída por três fios de arames,

reaproveitando muitas vezes o madeiramento de antigas

cercas, ou ainda, aproveitando os troncos das árvores

que estão em pé entre as pastagens ou na mata e por

isso, apresentam aspectos tortuosos (Figura 34);

b) Outra maneira do agricultor realizar essa tarefa, ocorre

quando derrubam e queimam a roça, onde utilizam a

própria madeira que não foi queimada para construir a

cerca, e nesse caso possui caráter de proteção contra

os animais, inclusive os silvestres (Figura 35).

O senhor Armindo Lopes Viana, vem explorando suas terras e introduzindo o

capim cultivado, para alimentação bovina. Em vários locais verifica-se a

utilização de máquinas para trabalhar a terra. Porém essa utilização só

ocorre quando a área vai ser definitivamente ocupada com o capim, pois,

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128

dessa forma, os agricultores acreditam que irão ter menor custos em

manutenção dessas pastagens.

FIGURA 35. UP-S06 – Cerca de Madeira, reaproveitada da área desmatada, para proteção da roça conta animais domésticos e silvestres.

Foto

: R..S

. Bas

tos,

200

5.

Foto

: R..S

. Bas

tos-

2005

.

FIGURA 34. UP-S06 – Cerca de arame farpado, delimitando pastagens.

A unidade

produtiva do

senhor Catulino

Lopes Viana

apresenta igual

irregularidade

quanto aos

aspectos de

divisões de

pastagens e na

própria forma de

cultivo. No

entanto, isso não

interfere na

praticidade e

manutenção da

subsistência.

Essa lógica de

estruturação

irregular pode

ser encontrada

em todas as

unidades

produtivas. Pois

ela consiste em

praticidade para

atender às

necessidades

que surgem no

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129

dia-a-dia. A ocupação espacial da unidade produtiva do senhor Catulino

Lopes Viana segue a mesma forma de exploração e uso das demais áreas

de terras.

Entretanto, verifica-se que a abrangência das áreas abertas em

relação aquelas encontradas em outras propriedades, como por exemplo, a

do senhor Armindo Lopes Viana, apresenta áreas abertas com dimensões

menores (Apêndice I). A explicação para esse fato está centrada em três

aspectos:

1. O uso exclusivo da força física (trabalho braçal) para a

abertura das áreas de produção.

2. Falta de recursos financeiros para financiar a abertura de

novas áreas.

3. Menor intensidade do uso das áreas abertas, favorecendo

assim, a renovação das matas, através das capoeiras.

A não utilização de maquinários favorece o surgimento das capoeiras

e com isso a regeneração da mata. Portanto, a área do senhor Catulino

Lopes Viana apresenta um número maior de capoeiras com períodos de

regeneração superior às demais áreas. Este é uma aspecto importante para

o agricultor, que passa a ter, após alguns anos, nova possibilidade de

produção agrícola, em áreas já regeneradas, a um custo financeiro menor,

pois o ambiente se encarregou de recompor parte dos nutrientes exauridos

do solo.

As terras do senhor Catulino Lopes Viana apresentam grande parcela

de cerrado campo, ou seja, o capim nativo está provocando o adiamento a

introdução do cultivo do capim, situação vista em outras propriedades,

principalmente na Localidade de Água Branca. As características do cerrado,

encontradas na área do senhor Catulino Lopes Viana, contribuem para a

manutenção da vegetação de capoeiras, pois o agricultor remaneja o gado

para as áreas de capim nativo. Com isso o cultivo do capim nas áreas das

roças é realizado de forma mais lenta, retardando o a substituição da

vegetação nativa por capim.

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A área total aberta do senhor Catulino Lopes Viana, na safra

2003/2004 é de 6,10 hectares, sendo que desse total 0,49 hectare foi

destinado ao plantio da roças do vizinho (Ailton Lopes Viana, filho do senhor

Armindo Lopes Viana); 1,67 hectares destinados ao plantio de capim e o

restante 2,94 hectares ao cultivo de produtos agrícolas (Apêndice H). Na

safra 2004/2005, o senhor Catulino Lopes Viana, não abriu novas áreas de

terra, pelo contrário, deixou que as áreas de milho e arroz virassem

capoeiras (Apêndice I). Nesta safra, para não ficar sem produzir, a estratégia

foi o cultivo de 1,0 hectare de milho, fora de sua unidade produtiva. Em sua

unidade produtiva cultivou apenas mandioca, banana, abóbora, maxixe e

quiabo.

A unidade produtiva do senhor Benedito Lopes Viana também

apresenta grande quantidade de capoeiras em processo de regeneração

(Apêndices J e L). Suas roças são pequenas e isso provoca maior

rotatividade no cultivo dos produtos agrícolas, aspecto que favorece o

ambiente das capoeiras, esse mesmo aspecto é enfatizado por DUBOIS

(1996). As áreas de cultivo do senhor Benedito Lopes Viana são em locais

de capoeiras. Essa quantidade maior de capoeiras é em decorrência da

exploração mais antiga, cerca de vinte e cinco anos. Além disso, somente

nos últimos três anos é que passou a introduzir o capim para a criação de

gado. Este procedimento de cultivo itinerante, utilizando as capoeiras, tem

contribuído para o retardamento do processo de substituição da vegetação

nativa por capim.

As áreas de capoeiras estão espalhadas por todas a unidade

produtiva do agricultor, que vão desde o entorno de sua residência até áreas

mais afastadas (Apêndice J). Essas capoeiras apresentam vários estágios

de repousos, algumas chegam a oito anos, que pelo aspecto apresentado,

em função de sua exuberância, praticamente já se transformou em mata.

A unidade produtiva do senhor Antônio de Souza Ribeiro apresenta a

substituição da vegetação por capim cultivado em sua maior parte. O

agricultor utiliza o trator para o preparo da terra e com isso não se verifica a

existência de capoeiras em sua propriedade, a única área que possui

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131

características que se assemelha a uma capoeira, foi trabalhada com

máquina. Foi desmatada e posteriormente a arou e gradeou-a. Em virtude

da intensa agressão que a máquina provoca ao realizar seu trabalho, esta

pequena parcela possui apenas ramagens esparsas e de pequeno porte,

mesmo um ano de pousio.

Na safra 2003/2004, o senhor Antônio de Souza Ribeiro

cultivou em sua unidade produtiva, apenas 0,19 hectare, de cana-de-açúcar

consorciada com arroz (Apêndice O). As demais áreas de sua propriedade

são cultivadas com capim humidícola (Brachiária humidícola) destinado ao

consumo dos animais. Além disso, existe uma pequena área com mata

nativa que ainda não foi derrubada, no entanto, o madeiramento de maior

valor comercial e de melhor aproveitamento na propriedade, esses sim já

fora retirados desta área.

A produção agrícola do senhor Antônio de Souza Ribeiro está

centrada em sua grande maioria nas áreas fora de sua unidade produtiva

(Apêndices O e P). Na safra 2004/2005, o agricultor deixou de cultivar milho

e arroz, manteve apenas as áreas de mandioca, banana e cana-de-açúcar,

ambas por terem ciclo de maior duração. O agricultor depende das áreas

fora de sua unidade produtiva, para realizar o cultivo de subsistência, uma

vez que as condições de sua propriedade, não lhe garantem boa

produtividade e sua condição financeira não lhe permite realizar

investimentos constantes, na propriedade em vista de obter melhor

produtividade.

A unidades produtivas do senhor Paulo dos Anjos Martins, apresenta

em sua integralidade o cultivo de capim braquiarão (Brachiária brizantha cv.

Maranduva) (Apêndice Q). Toda a propriedade foi desmatada e cultivada

com capim para o gado. O agricultor se tornou extremamente dependente de

espaços territoriais fora de sua unidade produtiva. Essa dependência vai

desde a madeira para a lenha, que é utilizada para o preparo dos alimentos

até o próprio alimento que é consumido pela família. O senhor Paulo dos

Anjos Martins, não possui espaço territorial suficiente, em sua unidade

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produtiva, que suporte toda a criação bovina, que ultrapassa cinqüenta

animais, e ainda cultivar os produtos destinas à alimentação.

Nos Apêndices Q e R verifica-se que a unidade produtiva do

agricultor não apresentou nenhuma alteração, quanto à introdução ou

práticas de cultivos. A área aberta encontra-se ocupada com capim

braquiarão (Brachiária brizantha cv. Maranduva) e assim permaneceu.

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133

5 CONSIDERAÇÕES FINAIS

A complexidade das ações que envolvem o modo de exploração das

unidades produtivas dos agricultores tradicionais requer que se considere:

1. Os aspectos culturais que exercem forte influência sobre o

modo de produção agrícola;

2. A utilização das práticas de uso comum, dessa categoria de

agricultores tradicionais, mesmo estando com suas áreas

delimitadas;

Capoeira com 4 ano

Capoeira com 2 ano

Capoeira com 1 ano

Produto agrícola

Roça de toco

Mata

FIGURA 36. Síntese do ciclo de regeneração, da vegetação nativa, realizado pelas capoeiras.

3. A prática da

agricultura

itinerante, onde

ocorre a

renovação da

natureza através

das capoeiras

(Figura 36),

contribui de

maneira decisiva

para a

manutenção da

subsistência dos

agricultores;

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134

4. A constante busca dos agricultores tradicionais, de espaços

fora de sua área delimitada para suprir suas necessidades de

subsistência;

5. O cultivo de pequenas áreas, representados nos Apêndices H,

I, J, L, M, N, O, P, Q, R, S, e T;

6. Os agricultores, possuem estratégias diferentes e diversificadas

para conseguirem a subsistência.

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135

6 CONCLUSÃO

A pesquisa revelou que as unidades produtivas dos agricultores

tradicionais possuem uma estrutura de grande complexidade, por apresentar

relação muito forte com os conhecimentos empíricos e com aspectos

culturais que orientam o processo de produção. No entanto, essa

interferência, não revelou riscos ao modo tradicional de cultivo e nem

constitui ameaça à subsistência desses agricultores. No entanto, O uso

comum dentro da área da sesmaria de Santana está ameaçado, devido ao

cercamento, à modernização e aos fatores culturais.

As áreas de sesmaria possuem características peculiares de uso

comum, que refletem na manutenção e na promoção à sobrevivência dos

agricultores, apesar de ter sofrido danos à sua estrutura de funcionamento.

Essa categoria de agricultores tradicionais se mantém sobre

pequenas áreas de roças: a área per capita das roças foi de: 0,45 ha/hab na

safra 2003/2004 e 0,40 ha/hab na safra 2004/2005.

O espaço espandido constitui uma forma eficiente encontrada por

esses agricultores para atender suas necessidades de subsistência, uma

vez que as delimitações fronteiriças se tornaram práticas comuns, porém

contrárias à produção agrícola em área de uso comum.

A delimitação das áreas, com cerca, constitui entrave para a prática

de uso comum, porém não impediu essa ocorrência.

Há necessidade de acompanhamento da evolução comportamental

da ocorrência da prática de uso comum nesta localidade.

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10 APÊNDICES

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APÊNDICE – A

1UP – Unidade produtiva.

ROTEIRO PARA ENTREVISTAS DOS AGRICULTORES I – INFORMAÇÕES ESPECÍFICAS E DIRETAS

NOME DO AGRICULTOR (informante)

IDENTIFICAÇÃO DA UP1 1. 2. 3. 4.

CONSTITUIÇÃO FAMILIAR

5. RENDA FAMILIAR (2003/2004) ESCOLARIDADE DO INFORMANTE

1. 2. 3. 4.

ESCOLARIDADE DOS FAMILIARES

5. FORMA DE AQUISIÇÃO DA TERRA

QUE PRODUTOS CULTIVAM

ÁREA CULTIVADA NA UP ÁREA CULTIVADA FORA DA UP ÁREA TOTAL CULTIVADA NA UP

ESPÉCIES QUANTIDADE

TIPOS DE ANIMAIS DE CRIAÇÃO

ENTREVISTADOR DATA / /

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- Áreas de Cultivo - Capoeiras - Áreas de pastoreio

- senhor Catulino Lopes Viana - senhor Cassiano Lopes Viana

APÊNDICE – B

II. INFORMAÇÕES INDIRETAS (RESQUÍCIOS/SINAIS)

- do antigo Arraial de Santana 1. LOCALIZAÇÃO - das moradias antigas NA SESMARIA - das antigas unidades de manejo

2. LOCALIZAÇÃO DAS MORADIAS ATUAIS 3. LOCALIZAÇÃO DOS EQUIPAMENTOS E LOCAIS DE USO COMUM (Casa de farinha, engenho, currais, roças, escolas, igrejas,)

- Individual (com cada agricultor) 4. ROTA MIGRATÓRIA DENTRO DA SESMARIA DE SANTANA

- Com informantes chave -

5. FORMAS DE PROVER A SUBSISTÊNCIA FAMÍLIAR. 6. SISTEMA DE PRODUÇÃO/CULTIVO QUANDO A SESMARIA ÉRA EXPLORADA APENAS PELOS MEMBROS FAMILIARES. (USO COMUM)

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Continuação do Apêndice B

7. IDENTIFICAÇÃO E DESCRIÇÃO DO SISTEMA DE PRODUÇÃO/CULTIVO NOS DIAS ATUAIS.

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144

APÊNDICE – C

III. MAPEAMENTO DAS UNIDADES PRODUTIVAS (2003/2004)

1. LOCALIZAÇÃO DOS PONTOS EXTREMOS DA SESMARIA DE SANTANA

2. LOCALIZAÇÃO DOS PONTOS DE CADA UNIDADE PRODUTIVA.

3. LOCALIZAÇÃO E IDENTIFICAÇÃO DAS UNIDADES DE MANEJO DENTRO DA UNIDADE PRODUTIVA.

4. LOCALIZAÇÃO E IDENTIFICAÇÃO DAS UNIDADES DE MANEJO FORA DA UNIDADE PRODUTIVA.

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APÊNDICE – D

IV. MAPEAMENTO DAS UNIDADES PRODUTIVAS (2004/2005)

1. IDENTIFICAÇÃO NAS UNIDADES PRODUTIVAS, DAS ALTERAÇÕES SOFRIDAS PELAS UNIDADES DE MANEJO ENTRE UMA SAFRA E OUTRA.

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APÊNDICE – E

Representação da área cultivada, por cada agricultor, nas safras 2003/2004

e 2004/2005 e as respectivas áreas Per capita.

ÁREA CULTIVADA

Código

das UPs

Proprietário Safra

2003/2004 Em hectares

ÁREA Per Capita

2003/2004

Safra 2004/2005 Em hectares

ÁREA Per Capita

2004/2005

S01 Catulino Lopes Viana 2,94 1,47 2,04 1,02

S02 Benedito Lopes Viana 2,40 0,60 1,21 0,30

S03 Máximo Lopes Viana 0,30 0,15 - -

S04 Cecílio Lopes Viana1 - - - -

S05 Liduvino Lopes

Viana1 - - - -

S06 Armindo Lopes

Viana1 8,76 0,58 7,94 0,52

S07 Antônio de S. Ribeiro 2,77 0,55 0,73 0,15

S08 Paulo dos A. Martins 1,35 0,10 2,67 0,20

S09 Gonçalo M. Viana 2,11 0,16 0,98 0,07

S10 Antônio V. da Silva2 2,91 0,32 2,87 0,31

S11 Dielson V. Silva2 - - -

A12 André Santana Lopes 2,00 0,40 1,30 0,26

A13 Liduvino Lopes Viana 3,30 0,55 3,40 0,56

A14 Cassiano L. Viana 1,30 1,30 1,50 1,50

A15 Luiz Corrêa 0,81 0,20 1,27 0,32

A16 Angelino da Silva 2,10 0,26 2,20 0,27 1 Produção do grupo familiar do senhor Armindo Lopes Viana (uso comum). 2 Produção do grupo familiar do senhor Antônio Viriato da Silva (uso comum).

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APÊNDICE – F Unidade de medidas encontradas e utilizadas na sesmaria de Santana pelos

agricultores tradicionais.

Tipos de medidas (valores unitários)

Unidades de medidas correspondentes

Hectare 10.000 m2 (100 x 100 metros)

Alqueire 2,2 hectares

Braça 2,2 metros

Palmo 22 centímetros

Polegada 2,54 cm

Carro Medida utilizada para a cultura do milho – 1 carro

corresponde a 40 balaios, que equivale

aproximadamente a 11 sacas de 60 kg milho.

Jaca ou Balaio Medida utilizada para a cultura do milho, que

corresponde a 120 espigas de milho.

Mão Medida utilizada para a cultura do milho, que

corresponde 12 espigas de milho.

Litro Medida correspondente a 302,5 m2 (1 alqueire = 80

Litros)

Tarefa Áreas correspondentes a 12 m2 ou a 15 m2, essa tarefa

também pode ser correspondente em braças.

Uma quarta (1/4)

Medida correspondente a ¼ de hectare ou 2500 m2 (25

x 25 metros), quando se trata de hectares; ou a metade

de meio alqueire (75 x 73,35 metros), quando se trata

de alqueire.

Volume Não é uma medida que estabelece um valor

quantitativo específico. Corresponde a quantidade que

o recipiente consegue receber.

Saca 60 Kg