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    P A U L M. S W E E Z Y

    Teoria doDesenvolvimento

    CapitalistaPrincpios de Economia Poltica MarxistaTraduo de

    W a l t e n s i r D u t r a

    quarta edio

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    BIBLIOTECA DE CIENCIAS SOCIAIS

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    Titulo original:

    The Theory of Capitalist DevelopmentPrinciples of Marxian Political Economy

    Traduzido da quarta edio, publicada em 1956 pelaMo n t h l y Re v e e w Pr e s s, Nova York, E. U. A.

    1976

    Direitos para a lngua portuguesa adquiridos porZ A H A R E D I T O R E S

    Caixa Postal 207, ZC-00, Rioque se reservam a propriedade desta verso

    N. Reg. ______/

    Or igem: OCfP ta

    Data M,____

    Bibl io teca

    I F C S - U F R J

    Impresso no Brasil

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    6 TEORIA DO DESENVOLVIMENTO CAPITALISTA

    4. Taxa da Mais-Valia ............................................................. 925. Composio Orgnica do Capital ................................... 95

    6. Taxa de Lucro ...................................................................... 96

    Segunda Pabt e - O PROCESSO DE ACUMULAO

    V A Acumulao e as Reservas .................................................. 103

    L Reproduo Simples ............................................................ 103

    2. Razes da Acumulao ...................................................... 107

    3. Acumulao e Valor da Fora de Trabalho Exposio do Problema ............................................................... 111

    4. A Soluo de Marx A Reserva do Trabalho .......... 115

    5. Natureza do Processo Capitalista .................................... 120

    '4 VI Tendncia Decrescente da Taxa de Lucro ......................... 124. 'f.

    1. Formulao Marxista da Lei ........................................... 124

    2. As Causas Contrabalanadoras............................................ 125

    3. Crtica da Lei ....................................................................... 128^ ' .

    | N) VII Transformao de Valores em Preos .............................. 1371. Exposio do Problema ..................................................... 137

    2. Soluo de Marx ................................................................ 140

    3. Soluo Alternativa . .......................................................... 143

    4. Corolrio do Mtodo de Bortkiewicz ........................... 1525. Significado do Clculo do Preo ................................ 154

    6. Por que no Comear com o Clculo do Preo ? . .. . 158

    Terceira Parte CRISES E DEPRESSES

    VIII A Natureza das Crises Capitalistas ................................... 163

    1. Produo de Mercadoria Simples e Crises ................... 164

    2. A Lei de Say ....................................................................... 166

    3. Capitalismo e Crises ............................................................ 168

    4. Os Dois Tipos de Crises ................................................. 175

    IX Crises Ligadas Tendncia Decrescenteda Taxa de Lucro 177

    X Crises de Realizao .................................................................. 186

    1. Crises Provocadas pela Desproporo ..................... 186

    2. Crises Provocadas pelo Subconsumo .............................. 192

    Apndice ao Captulo X .................................................. 215

    (

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    NDICE 7

    XI A Controvrsia do Colapso ................................................... 218

    1. Introduo ..........................................................................218

    2. Eduard Bemstein ............................................................... 220

    3. Contra-Ataque Ortodoxo ............................................... 2224. Tugan-Baranowsky ............................................................. 223

    5. Conrad Schmidt ................................................................. 224

    6. Posio de Kautsky em 1902 ......................................... 220

    7. Louis B. Boudin ............................................................... 229

    8. Rosa Luxemburgo ............................................................. 231

    9. Atitudes do Ps-Guerra ............................................... 236

    10. Henryk Grossmann ............................................................ 238

    XII Depresso Crnica? ................................................................. 243

    1. Introduo .............................................................................. 2432. Condies da Expanso Capitalista ................................ 245

    3. Foras Contrabalanadoras da Tendncia do Sub-consumo ............................................................................... 247

    4. Triunfar o Subconsumo ? ...........................................263

    Quarta Par te - IMPERIALISMO

    XIII - O Estado .................................................................................... 269

    1. O Estado na Teoria Econmica .................................... 269

    2. Funo Primordial do Estado ........................................ 270

    3. O Estado como InstrumentoEconmico .........................274

    4. A Questo da Forma de Governo...................................... 280

    5. Valor do Papel do Estado .................................................. 282

    XIV Desenvolvimento do CapitalMonopolizador ........................ 284

    1. Concentrao do Capital .................................................. 284

    2. Centralizao do Capital .................................................. 285

    3. Sociedades Annimas .......................................................... 2874. Cartis, Trustes e Fuses .................................................. 292

    5. O Papel dos Bancos ............................................................. 296

    XV O Monoplio e as Leis de Movimento do Capitalismo . . 301

    1. Monoplio e Preo ................................................................. 301

    2. Monoplio e Taxa de Lucro ........................................... 303

    3. Monoplio e Acumulao ................................................... 305

    4. Monoplio e Custos Crescentes de Distribuio .......... 309

    5. Concluso .............................................................................. 316

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    8 TEORIA DO DESENVOLVIMENTO CAPITALISTA

    XVI Economia Mundial ..................................................................... 318

    1. Consideraes Gerais ......................................................... 318

    2. Poltica Econmica no Perodo de Concorrncia ....... 325

    3. Transformao da Poltica Econmica ......................... 330

    XVII Imperialismo ............................................................................... 338

    1. Introduo ............................................................................ 338

    2. Nacionalismo, Militarismo e Racismo ........................... 339

    3. O Imperialismo e as Classes ............................................ 342

    4. O Imperialismo e o Estado ............................................ 348

    5. Guerras de Rediviso ........................................................ 351

    6. Limites do Imperialismo ................................................... 355

    XVIII - Fascismo ....................................................................................... 360

    1. As Condies do Fascismo ............................................. 360

    2. Elevao do Fascismo ao Poder ...................................... 363

    3. A Revoluo Fascista ..................................................... 366

    4. A Classe Dominante sob o Fascismo ........................... 3675. Pode o Fascismo Eliminar as Contradies do Ca

    pitalismo? ............................................................................. 373

    6. o Fascismo Inevitvel ? ............................................... 377XIX Perspectivas .................................................................................. 379

    1. Perspectivas da Reforma Liberal Capitalista ............... 379

    2. Declnio do Capitalismo Mundial .................................. 383

    A P N D I C E S

    Apndice A Sobre os Esquemas de Reproduo, por Shigeto

    Tsuru ............... ................................................................... 397Apndice B A Ideologia do Imperialismo, por Rudolf Hilferding 409

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    Prefcio

    iV o existe em ingls nenhum estudo analtico, razoa-

    velmente geral, da Economia Poltica marxista. Este livropretende preencher a lacuna, sem ser, porm, completoou exaustivo: muitos tpicos importantes foram total-mente omitidos e outros tratados apenas na forma debreve referncia. No obstante, espero que venha a con-tribuir para a melhor compreenso de uma importantemanifestao do pensamento social que no passado foifreqentemente vtima da ignorncia e do tratamentosuperficial. No procurei atenuar as dificuldades, mastambm no me afastei de meu caminho para tratar decomplexos problemas tericos, a no ser quando mepareceram diretamente ligados tarefa que me propus.

    No decorrer de todo o livro, cito com freqncia eextenso as obras de Marx e seus seguidores. Tratase,indubitavelmente, de uma forma de apresentao poucoelegante, mas que me pareceu inevitvel. No possvelter certeza de que o leitor conhecer a literatura do

    marxismo. Grande parte dos trabalhos mais importantes,at mesmo de Marx, no foi traduzida, e muitos livrose publicaes peridicas relevantes s so encontradosnas grandes bibliotecas. Alm disso, as interpretaesdas teorias marxistas tm diferido muito, e espero fer-

    vorosamente que as minhas, por mais que alguns leitoresdelas discordem, dem de qualquer forma a impressode se terem baseado na totalidade da obra. As citaesde O Capital foram feitas segundo a edio em trsvolumes publicada por Charles Kerr & Co., de Chicago.Tomei a liberdade de simplificar a pontuao dos tre-

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    TEORIA DO DESENVOLVIMENTO CAPITALISTA

    chos citados e em vrios casos todos registrados emnotas ao p das pginasalterei a traduo mesma, paraexpressar de forma mais precisa o sentido do originalalemo.

    Alm de apresentar, e analisar as ideias de outrosautores, tentei tambm resolver alguns problemas tericosque vm sendo h muito motivo de controvrsia e en-quadrar na moldura da teoria marxista vrias questesque me parecem ter recebido, at hoje, anlises inade-quadas. Quanto a este ltimo ponto, chamo a atenodo leitor particularmente para os Captulos X (Crises de

    Realizao), XII (Depresso Crnica?), XIV (Desenvolvimento do Capital Monopolizador), XV (O Monoplio e as Leis de Movimento do Capitalismo) e XVIII(Fascismo). A disposio do assunto seguiu um padrodeterminado, partindo do mais abstrato problema deEconomia Poltica a teoria do valor e passando,por sucessivas etapas, t os prementes problemas dasociedade do mundo de hoje.

    Muitos amigos e colegas tiveram a gentileza de lero original, no todo ou em parte, nas vrias fases deexecuo, e apresentar crticas e sugestes valiosas. Entreeles quero mencionar particularmente os Drs. Erich Roll,Lewis Feuer, Franz Neumann, AlanR. Sweezy, RobertK. Merton, Svend Laursen, Stanley Moore e Paul Baran.

    As crticas de minha mulher, Maxine Yaple Sweezy,foram especialmente teis, embora ela possa queixarse

    de que nem sempre foram aceitas. Meu maior dbito para com o Dr. Shigeto Tsuru, com quem tive a feli-cidade de conversar muitas vezes, durante vrios anos,no s sobre os assuntos apresentados neste livro, mastambm sobre muitos outros problemas correlatos. ODr. Tsuru leu todo o original e auxilioume, de muitasmaneiras, a melhorar tanto a forma como o contedo. para mim um grande prazer incluir um Apndice desua autoria, explicando e comparando os esquemas dereproduo de Quesnay, Marx e Keynes. Creio que tergrande interesse para os economistas.

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    PREFCIO 11

    No ser necessrio dizer que nenhuma das pessoasacima mencionadas tem qualquer responsabilidade pelasopinies aqui expressas, ou pelos erros de anlise quepossam continuar existindo neste livro.

    Inclu, como segundo Apndice, uma traduo devrias pginas do livro de Rudolf Hilferding, Das Finanz-kapital (publicado pela primeira vez em 1910), sob ottulo A Ideologia do Imperialismo. H uma supo-sio generalizada de que o marxismo foi incapaz decompreender e prever as tendncias ideolgicas queatingiram seu auge nos Estados fascistas. Apenas uma

    pequena amostra desse conhecido trabalho, anterior I Guerra Mundial, contribuir muito para apagar talimpresso errnea.

    P a u l M . Sw e e z y

    Dunster House,Cambridge, Mass.

    1. de agosto de 1942.

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    Prefcio Segunda Edio(1946)

    E o t a n o uma segunda edio, no sentido exato do termo:nenhuma modificao foi feita no texto, exceto a correo depequenos enganos e erros tipogrficos. No obstante, tanta coisa

    aconteceu desde a publicao deste livro em 1942 que no serialgico reimprimi-lo sem comentar o que ento escrevi sobre aposio e as perspectivas do capitalismo mundial. Quero, portanto, neste Prefcio adicional, reexaminar as sugestes e hipteses do captulo final (Perspectivas) luz da evoluo ocorrida durante e a partir da guerra.

    Para fazer isso de modo lgico e coerente, ser aconselhvelresumir, de incio, da forma mais breve possvel, as idias daquelecaptulo.

    A maior parte do livro dedicada anlise do capitalismoe de seus males. Argumenta-se que, na ausncia de tratamentocorretivo, esses males devem tomar-se progressivamente enfra-quecedores e levar ao declnio, e finalmente queda, do capi-lismo como ordem mundial. O captulo final se inicia com umbreve exame das doutrinas de uma escola de economistas decrescente influncia que, reconhecendo a exatido geral dessaanlise, sustenta que o Estado pode tomar medidas adequadaspara superar a fraqueza do capitalismo, e com isso prolongar

    indefinidamente sua existncia.O argumento desses reformistas recentes falha no tanto nos

    aspectos lgicos, mas na capacidade de apreciar a posio e funo do Estado na sociedade capitalista. Os prprios capitalistasso basicamente contra as reformas recomendadas, e como ainfluncia deles , em ltima anlise e necessariamente, a quepredomina, isso basta para destinar o programa ao fracasso.

    Surge ento a questo da forma que o declnio do mundocapitalista assumir. Houve poca em que os tericos do marxis-

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    mo estavam habituados a imagin-la em termos de uma revoluosimultnea em todos os pases mais avanados, que derrubaria

    de um golpe o capitalismo e colocaria em seu lugar uma novaordem socialista mundial. Na realidade, houve um momento,aps a I Guerra Mundial, quando isso no parecia absolutamenteimpossvel. A dcada de 1920, porm, testemunhou o aparecimento de uma situao totalmente nova. A revoluo teve xiton Rssia, mas em todos os demais grandes pases o capitalismosobreviveu e tomou-se relativamente estvel em meados dadcada.

    Essa nova situao sugeriu a teoria exposta por Stalin jem 1924 de que o declnio do capitalismo mundial se fariaaos poucos: medida que as condies se tornassem favorveis,hoje um pas, amanh outro, se afastariam da rbita do capitalismo para se aliarem Unio Sovitica. Dessa forma, aquiloque se iniciara como mera ilha no oceano do imperialismogradualmente se elevaria posio de ordem mundial rival, quedesafiaria o domnio e finalmente a existncia do capitalismo.

    Era opinio de Stalin que com o tempo esse processo levariapor fim a um conflito entre as duas ordens mundiais, e que talconflito encerraria o triunfo do socialismo e a derrota final edesaparecimento do capitalismo.

    Sustentamos neste livro que essa luta final entre o capitalismo e o socialismo que, em vista do progresso da arta blica,bem poderia levar destruio de ambos no inevitvel.Parece igualmente possvel que no perodo ora iniciado a supe

    rioridade inerente do socialismo como mtodo de controlar a produtividade da tcnica moderna no interesse da sociedade comoum todo se evidencie de tal forma que provoque modificaessignificativas na opinio pblica do mundo capitalista. Supondoque continuasse a vitalidade das instituies democrticas nospontos-chaves do capitalismo, Gr-Bretanha e Estados Unidos,essa modificao na opinio pblica seria de molde a tomar acruzada contra o socialismo uma aventura cada vez mais difcile menos proveitosa. Ao mesmo tempo, podemos prever que oncleo socialista crescer continuamente, medida que um pasaps outro verificar que seus problemas bsicos so insolveissob a constrio do domnio do capital. Finalmente, o momentodecisivo ter passado, e no nvel internacional o socialismo ter

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    PREFCIO .SEGUNDA EDIO 15

    vencido a batalha. Uma vez ocorrida essa transformao, umatransio relativamente tranqila tomar-se- finalmente possvel,mesmo nas mais fechadas cidadelas do capitalismo.

    Para traduzir esse raciocnio nas unidades e conceitos familiares ao cenrio poltico mundial, o captulo em questo terminacom um esboo ligeiro do possvel curso dos acontecimentosfuturos, que se enquadraria no padro terico proposto e confirmaria sua exatido substancial. Esse esboo no teve a intenode ser uma previso concreta do que realmente aconteceria; seuobjetivo foi antes o de focalizar a ateno sobre certas forasque esto atuando hoje e que tero influncia importante, emborano exclusiva, na formulao do futuro.

    O postulado inicial era, naturalmente, o esmagamento dofascismo alemo. Supunha-se que a isso se seguiria sem especificar o tempo para tanto necessrio a difuso do socialismopor quase todo o continente europeu. As tentativas anglo-americanas de impedir tal fato seriam frustradas pela oposio daclasse trabalhadora britnica. O socialismo, atuando ento numabase firme que iria do Atlntico ao Pacfico, entraria em alianacom os pases coloniais e semicoloniais da sia, assegurando comisso sua evoluo gradual na direo do socialismo e apressandoa eliminao da influncia imperialista estrangeira. A Gr-Bre-tanha poderia seguir as pegadas da Europa ocidental, ou poderiacair na rbita dos Estados Unidos, que de qualquer forma setomariam o centro e a fora diretora de um capitalismo mundialmuito reduzido em suas propores e muito enfraquecido. A ilimitada capacidade de expanso do socialismo e as contradiesdo capitalismo teriam tido a oportunidade de se revelarem ladoa lado. A soluo progressiva dos problemas econmicos provocaria o aumento do apoio poltico, dentro e fora dos limites do

    sistema socialista. Finalmente, as bases do domnio capitalistaestariam irremediavelmente minadas e, supond-se que a democracia continuasse a existir nos pases capitalistas que aindarestassem, a substituio pacfica da velha ordem, nos EstadosUnidos, seria ento ao mesmo tempo possvel e provvel.

    Examinemos agora essa anlise luz dos acontecimentos dosquatro ltimos anos.

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    Quanto possibilidade de curar as fraquezas do capitalismoatravs de reformas ou introduzir gradualmente o socialismo dentro das condies internacionais existentes o que do ponto de

    vista poltico vem a ser aproximadamente a mesma coisa quasenada h a acrescentar. certo, sem dvida, que um nmerocrescente de pessoas, tanto nos Estados Unidos como na Gr--Bretanha, acredita, ou procura convencer-se que acredita, napossibilidade desse programa. A grande vitria eleitoral do Partido Trabalhista britnico em julho de 1945 poderia levar a suporque uma experincia de reformismo de grande alcance esteja emprocesso. No h, porm, muitos indcios de que assim seja, e

    muito menos de que essa experincia pudesse ser bem sucedida,caso tentada. Os lderes do Partido Trabalhista no constituemum grupo muito radical nem muito poderoso, e evidente queesto deixando as posies administrativas, at nos nveis maisaltos, nas mos de pessos cuja lealdade ao status quo antedificilmente poderia ser posta em dvida. Nessas circunstncias,mesmo a nacionalizao de vrias indstrias importantes (quese pode realizar ou no) no modificaria seriamente a estruturado capitalismo britnico. O verdadeiro significado da vitria doPartido Trabalhista britnico outro. Assinala o fim de umapoca na histria poltica daquele pas, poca em que a classetrabalhadora britnica se podia unir com o objetivo de conquistaruma maioria parlamentar. E o resultado dever ser a destruioda iluso, profundamente enraizada na esquerda britnica e quedata do movimento cartista, de que o poder poltico formal eo poder social so idnticos. de esperar que o perodo imediatamente nossa frente testemunhe uma fermentao do mo

    vimento trabalhista britnico, possivelmente acompanhada peloaparecimento de novos lderes e por modificaes de grandeimportncia.

    Passando agora questo da forma que assumir o declniodo capitalismo mundial, evidente que os ltimos quatro anosforam um perodo de grande importncia e do qual muito podemos aprender. A teoria de que o socialismo crescer aos poucos,por acrscimos, e mutatis mutandisque o capitalismo se reduzir

    da mesma forma, repousa hoje em bases mais firmes do que em1942, quando (pelo menos para muitos) mesmo a sobrevivnciada Unio Sovitica era uma questo aberta. No pode haver

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    dvida de que o xito militar e econmico da U. R. S. S. durantea guerra, juntamente com o esmagamento dos dois imprios capitalistas mais agressivos, contribuiu muito para a fora relativa,

    material e poltica, do socialismo em escala mundial. Alm disso,o acrscimo de vrios novos pases socialistas do Leste e Sudesteda Europa ao bloco original pode ser considerado como um fatoconsumado. No momento em que escrevemos, a Iugoslvia e aAlbnia parecem ser os nicos pases em que os socialistas estofirmemente entrincheirados, mas a marcha dos acontecimentosnos Estados vizinhos inequvoca, e dificilmente poder seisustada. Isso no significa, decerto, que um sistema socialistapredomine ainda nessa regio: a introduo de novas relaes

    de produo exige tempo, especialmente numa economia predominantemente camponesa. Alm do mais, o fato de que o fatorinternacional mais importante na Europa oriental seja a UnioSovitica significa que esses pases podem proceder com cuidadoe no necessitam apressar-se para poder deter um movimentointernacional de restaurao da velha ordem. Assim, por exemplo, provvel que a coletivizao da agricultura venha a sergradualmente imposta aos camponeses pela educao e pela demonstrao prtica de sua superioridade sobre o sistema atrasadoe ineficente de pequenas propriedades, que nos primeiros estgiosde transio se est ampliando, pela diviso das grandes propriedades.

    Na Europa central e ocidental com a importante exceo da Tcheco-Eslovquia a tendncia dos acontecimentos muito menos evidente. De fato, podemos mesmo dizer que nenhuma tendncia definida se estabeleceu ainda. A expectativa,apresentada em nossa primeira anlise, de que o fim da guerra

    seria seguido da instalao de regimes socialistas na maior partedo continente europeu no se concretizou, nem seria justo dizerque esteja em vias de concretizar-se. evidente que o problemanecessita ser revisto para que cheguemos a uma estimativa corretadas foras que atuam nessa importante e talvez decisiva regio.

    Nosso primeiro raciocnio sobre esse assunto estava marcadopela suposio mais implcita do que explcita de que achave da evoluo na Europa central e ocidental estaria na Alemanha. Isso ocorrera por bem mais de meio sculo, e era fcil

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    supor que continuaria ocorrendo pelo menos por mais algunsanos. Para que assim fosse, porm, uma condio era essencial:

    uma revoluo bem sucedida contra o regime nazista deveria terocorrido antes do fim da guerra, tal como em 1918 uma revoltade xito derrubou o Kaiser. Seria incorreto dizer, conhecendo osfatos, que essa revolta no poderia ter ocorrido. O 20 de julho *poderia ter tido xito e, nesse caso, seus promotores no seteriam detido: todo o aspecto poltico da guerra se teria modificado quase que da noite para o dia. Mas no h nenhuma utilidade em especularmos hoje sobre o que poderia ter acontecido.O fato que os nazistas dominaram a tentativa, e a guerra continuou por mais dez meses. importante compreender que essesltimos dez meses foram os mais destruidores; no s material,mas tambm poltica e socialmente, a Alemanha foi derrubada:no fim, estava prostrada, totalmente ocupada por trs exrcitosinvasores, e era objeto da poltica, ao invs de fator ativo nela.

    Aps o 20 de julho de 1944 o centro de gravidade polticona regio em questo se deslocou para a Frana, transformada,pela primeira vez desde Bismarck, na mais forte nao puramente

    europia. Mas a fora real estava nas mos da Gr-Bretanha eEstados Unidos, que juntos dispunham de uma esmagadora superioridade militar e naval em toda a rea, do Mediterrneo aomar do Norte. Com uma exceo aparentemente menor crisebelga de novembro de 1944 essa fora armada no foi utilizadapara intervir na poltica interna dos pases europeus ocidentais;mesmo assim, seria impossvel superestimar sua influncia prtica. Ela estava no fundo dos clculos de todos os partidos, equem duvidasse de como seria usada no caso de uma emergnciapoderia ter certeza aps o incidente belga, e ainda mais aps osacontecimentos de dezembro na Grcia. Sob essa tcita proteoanglo-americana, a velha classe dominante pde reinstalar-se nopoder. Os movimentos de resistncia armada que, como o mo

    vimento correspondente na Iugoslvia, eram a guarda avanadapotencial de uma verdadeira revoluo social foram desarmados.O aparato estatal, cuja derrubada e substituio como Marxh muito ensinou dve ser o primeiro objetivo de toda revo

    luo, foi fortalecido e restaurado. A expectativa de que ao0 Aluso fracassada tentativa contra Hitler, organizada por um grupo de polticos

    e altos oficiais alemes e posta em prtica pelo Coronel Von Stauffenberg. (N. do T.)

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    PREFCIO SEGUNDA EDIO 19

    colapso do domnio nazista se seguisse o estabelecimento dosocialismo na Europa ocidental era, portanto, incorreta. Na perspectiva histrica mais ampla, foi uma vitria do capitalismo britnico e americano.

    necessria uma breve digresso para indagar por que asuposio parte de nossa primeira anlise de que a eficinciada interveno anglo-americana seria frustrada pela classe trabalhadora britnica no se confirmou. A razo bsica est na seqncia de acontecimentos militares que caracterizou o curso daguerra. As tropas britnicas e americanas estavam na Europaocidental com uma finalidade que tinha o apoio esmagador dostrabalhadores britnicos. Uma vez ali, porm, se transformaramem instrumento da poltica britnica e americana. Alm disso,como acima assinalamos, a fora no foi usada abertamente; ano ser por um breve perodo durante o incidente belga, as questes no foram dramatizadas no houve nunca ocasio paraprotestos. Isso contrasta agudamente com a situao predominante aps a I Guerra Mundial, quando os trabalhadores britnicos, passando sobre sua liderana oficial e com uma compreenso

    clara do que estava em jogo, tiveram um papel decisivo fazendofracassar os esforos do Governo de intervir a favor da contra--revoluo russa. Contrasta at mesmo com sua atitude e aesna crise grega, surgida simultaneamente com os acontecimentosna Europa ocidental que j examinamos. A ao brutal do Governo britnico contra o movimento de resistncia esquerdistagrego, em dezembro de 1944, sacudiu o Partido Trabalhista emsuas bases, pois era claro que as tropas britnicas na Grcia nadatinham a ver com a guerra contra a Alemanha. Se no tivesse

    sido bvio que uma crise governamental na Gr-Bretanha naquela poca, qualquer que fosse sua origem, repercutiria seriamente na conduo da guerra, provvel que a presso de baixopara cima teria forado os lderes do Partido a se retirarem dacoalizo governamental. Parece portanto justo dizer que o fracasso da classe trabalhista britnica em desempenhar um papelnos acontecimentos da Europa ocidental foi provocado antes peloque poderamos chamar adequadamente de acidente histrico do

    que por uma renncia s aspiraes e simpatias que a levarama ajudar seus irmos de classe russos em 1919.

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    Voltemos agora aos acontecimentos da Europa central eocidental. A Frana continua, claramente, a ser o pas-chave.Enquanto ela permanecer capitalista, todos os pases a oeste da

    Alemanha (inclusive a Itlia) continuaro capitalistas. Almdisso, a Alemanha provavelmente continuar como um tampoe um terreno experimental entre a Unio Sovitica socialista e ostrs grandes poderes capitalistas ocidentais. Uma Frana socialista alteraria, porm, fundamentalmente a situao. Os pases

    vizinhos mais fracos seriam poderosamente atrados na mesmadireo; e, o que- mais importante, a posio e o papel da

    Alemanha se transformariam. Ao invs de uma espcie de terrade ningum entre dois sistemas sociais, ela estaria praticamente

    cercada por pases socialistas. No fcil duvidar que numapoca semelhante a Unio Sovitica e a Frana juntas exerceriama influncia decisiva na evoluo da Alemanha. O poder americano na Alemanha na escala em que existiu no ps-guerra imediato talvez j pudssemos dizer mais adequadamente foi um fenmeno essencialmente temporrio, e a Gr-Bretanhasozinha no est, evidentemente, em posio de dominar o cursodos acontecimentos no continente. A Alemanha se moveria entona direo do socialismo, e com o tempo tomaria seu lugar numa

    comunidade europia de Estados socialistas embora, tendo emvista os danos infligidos pelo fascismo e pela guerra na estruturasocial alem, no seja de esperar que isso acontea logo.

    Vemos assim que muito depende do que acontecer na Franano perodo imediatamente nossa frente. No momento em que escrevemos, as foras opostas parecem estar bem equilibradas. Comoj dissemos, a velha classe dominante reinstalou-se nas posies--chaves na indstria, Governo e foras armadas. Por outro lado,o povo francs em sua maioria tende para a esquerda, e a classetrabalhadora bem organizada e conscientemente socialista.Qualquer reconciliao definitiva entre as foras opostas inadmissvel, e um Governo formado pela coalizo de irreconciliveis necessariamente transitrio e temporrio. Devemos esperar queocorra na Frana uma srie de crises governamentais e qualqueruma delas pode transformar-se numa crise poltica e social maisgeral. provvel que a certa altura a direita, apoiada pela novapseudo-esquerda, tente lanar uma nova aventura do genero bo-napartista, com a finalidade ostensiva de restaurar o direito e

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    a ordem. Quais os resultados dessa tentativa, impossvel dizer.Poder ter xito, ou poder abrir o caminho para um regime

    socialista. De qualquer modo, bom lembrar que as influnciasinternacionais, especialmente as oriundas da Gr-Bretanha e Estados Unidos, estaro entre os fatores mais importantes. Nessascircunstncias, a classe trabalhadora britnica pode ainda ter opapel decisivo que lhe atribumos em nossa primeira anlise.

    Quando nos voltamos da Europa para o Extremo Oriente,vemos que nenhum aspecto importante da perspectiva geral ea longo prazo traada em 1942 sofreu qualquer prova decisiva.

    Prevamos um firme crescimento da resistncia ao domnio imperialista nos pases coloniais, uma aliana entre esses movimentos nativos de independncia nacional e o bloco de Estadossocialistas da Unio Sovitica e Europa, e a expulso gradualdo domnio estrangeiro, evoluindo esses pases na direo dosocialismo. (No houve a inteno de sugerir, por uma afirmaoto sumria, que tais acontecimentos ocorreriam, ou poderiamocorrer, facilmente e sem derramamento de sangue. No obstante, no h razo para supor que eles devam provocar umaguerra entre as grandes potncias.) Embora a crescente resistncia ao domnio imperialista seja evidente a todos, aindamuito cedo para dizer se o curso dos acontecimentos se processar ou no dentro dessas linhas. No momento, a tendncia parece ser no sentido de uma restaurao do domnio imperialistaocidental. Os Estados Unidos, com o poder extremamente fortalecido em toda a rea do Pacfico, mantm a situao, enquantoos britnicos, holandeses e franceses sufocam os movimentos de

    independncia nativos e restauram seus velhos imprios. Aomesmo tempo, os Estados Unidos atuam vigorosamente paraestabelecer uma esfera de influncia to exclusiva quanto possvel e, no final das contas, tambm uma esfera de investimento e comrcio, sem dvida na China e no Japo. * O efeitode tudo isso poderia ser exatamente o oposto de nossas previsesanteriores.

    No entanto, seria um erro ir muito longe nas concluses

    provocadas por uma situao na qual as foras e tendncias

    No momento em que o Autor escrevia (1946) a luta entre comunistas enacionalistas na China continuava. O Governo de Chiang Kai Shek s se instaladaem Formosa a 7 de dezembro de 1949. (N. do T.)

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    subjacentes esto necessariamente obscurecidas e deformadaspelas grandes comoes d perodo de guerra. O domnio e ainfluncia ocidentais esto voltando ao Extremo Oriente, mas com

    uma diferena. Fazem-se concesses, e mais concesses seronecessrias no futuro, que fortalecero os movimentos de independncia e lhes proporcionaro meios de realizar seus fins. Aomesmo tempo, faltam aos imperialistas, como sempre, a vontadee a capacidade de resolver os problemas econmicos e sociais,cada vez mais srios, que de uma forma ou outra dominam opensamento e aes de todas as classes da regio. (Sobre isso,

    ver a anlise feita no item 6, Limites do Imperialismo, do

    Captulo XVII). Em si, isso poderia no ser decisivo, se o povofosse levado a crer que tais problemas so de natureza insolvel,e que necessrio sofrer neste mundo para obter uma recompensa no outro. sem dvida sob esse aspecto que as realizaesdo socialismo na U. R. S. S. adquirem um significado mximopara os povos coloniais do mundo. A sia Central, Sibria e oExtremo Oriente sovitico oferecem provas vivas de que as nacionalidades atrasadas, ajudadas, ao invs de exploradas, por seusirmos mais avanados, podem encontrar o caminho do progresso

    e de melhores padres de vida. medida que a compreensodesse fato se difundir e aprofundar, o domnio imperialista sergradualmente minado e as bases de um futuro socialista serolanadas firmemente. A validade desse raciocnio, numa perspectiva de longo tempo, parece hoje ainda mais certa do queem 1942.

    Nada do que aconteceu durante ou depois da guerra nospode ajudar a decidir a questo cuja natureza decisiva no necessrio acentuar se haver ou no um conflito final entrecapitalismo e socialismo como sistemas mundiais rivais. Segue-seportanto que os acontecimentos verificados desde ento no exigem a modificao de nossa anlise, segundo a qual tal conflitono s evitvel como improvvel. A anlise em si pode tererros, e quanto a isso uma crtica feita pelo Dr. Oscar Langeparece ser bastante importante e demanda exame.1

    1 Artigo publicado no The Journal of Philosophy 8 de julho de 1943, pp. 378-84.

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    Nosso raciocnio depende da proposio formulada noitem 3, O Imperialismo e as Classes, do Captulo XVII deque, exceto em circunstncias especiais e perodos relativamente

    curtos, os interesses da classe trabalhadora so contrrios aoimperialismo e da, por implicao, s polticas militaristas eagressivas, aspecto necessrio dele. Na democracia poltica, essaoposio se pode manifestar e exercer uma influncia altamentesignificativa, embora em grande parte negativa, no comportamento interno e externo do Estado capitalista. A organizao da

    vida da sociedade em tomo de um programa de agresso, queproporciona uma aparente soluo das contradies da economiacapitalista, obstruda. Ao mesmo tempo, essas contradies se

    tornam cada vez mais srias; as lutas polticas se centralizammais e mais em tomo delas. A classe trabalhadora, sobre quemrecai o fardo mais pesado, obrigada a procurar uma sada.Nosso argumento primitivo, reduzido sua essncia, de que oexemplo de uma sociedade socialista ampliada, que no sofrede nenhuma das contradies do capitalismo e pode expandir econtrolar a produo e o consumo de acordo com os interessesdas massas, exercer uma atrao crescente sobre os trabalha

    dores que ainda vivam no capitalismo. Finalmente, a combinaode modificaes externas e internas preparar a cena para umatransio ordeira e no-violenta para o socialismo.

    Examinando a natureza do fascismo, o Dr. Lange apresentaum argumento que atinge na base esse raciocnio:

    O desemprego em massa d a todas as classes da sociedade, inclusivea classe trabalhadora, uma interesse na expanso imperialista. Para a classetrabalhadora esse interesse... de oportunidades de emprego... Isso levaa uma teoria do imperialismo fascista totalmente diferente da teoria do im

    perialismo de Hilferding-Lnin, que est formulada em termos de exportaodo capital e descreve o imperialismo capitalista pr-fascista. Segundo a teoriasugerida, o fascismo adquire o carter de um imperialismo de um povo, queune todas as classes sociais e elimina a luta de classes dando aos membrosde cada classe uma participao na expanso imperialista. Isso explica osucesso ideolgico do fascismo alemo entre a classe trabalhadora, bem comoas razes pelas quais o fascismo no pode ser derrubado pelos conflitos declasses internos, mas apenas pela derrota provocada pela coliso militar comoutros Estados.

    A suposio fundamental desse argumento a de que, nascondies do desemprego em massa condies, note-se, que

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    tendem a ser normais numa sociedade capitalista avanada todas as classes tm um interesse comum na expanso imperialista. Se assim fosse, as conseqncias seriam muito mais amplas

    do que sugere o Dr. Lange. Qualquer pas capitalista que dispusesse da necessria fora armada e gozasse de liberdade suficientevisvis as potncias rivais teria facilidade em mobilizaro apoio popular para um programa de expanso imperialista.Um imperialismo do povo tanto poderia ser democrtico comofascista. Segundo essa interpretao, teramos que concordar comos tericos nazistas, que alegavam ser o fascismo alemo ummovimento puramente nacional, destinado a romper as limitaesdo sistema de Versalhes e devolver Alemanha uma grandemargem de liberdade de ao na esfera internacional. E o que mais importante para nosso ponto de vista aqui, seriamos obrigados a prever que a prxima depresso sria nos Estados Unidos,que no depende de restries impostas externamente aos armamentos, e facilmente se poderia expandir em meia dzia dedirees diferentes, dar origem a um movimento imperialistaagressivo e apoiado pelo povo. No necessrio seguir as conseqncias dessa opinio para demonstrar que sua aceitao nos

    foraria a alterar radicalmente nossa estimativa sobre o futuroprovvel do capitalismo, bem como a reexaminar a possibilidadede uma guerra entre os setores capitalista e socialista do mundo.

    Na verdade, porm, a premissa bsica da crtica do Dr.Lange parece insustentvel. perfeitamente certo que nas condies de desemprego em massa os trabalhadores tm interessena criao de empregos, e tambm certo que a expanso imperialista os cria. No se segue, porm, que os trabalhadorestenham interesse na expanso imperialista. Do ponto de vistadeles, h outras formas de criar emprego que no impem osfardos e pesados sacrifcios da expanso imperialista. por essarazo que os sindicatos livres e os partidos polticos da classetrabalhadora, ou seja, os verdadeiros representantes de seus interesses, sempre se opuseram expanso imperialista e apoiarama reforma ou derrubada do sistema capitalista. 2 (Devemos notarque tanto os reformistas como os revolucionrios so tipicamenteantiimperialistas.) Essa atitude flui naturalmente da posio do

    a O caso excepcional da Inglaterra no sculo XIX examinado no item 3,O Imperialismo e as Classes, do Captulo XVII.

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    trabalhador na sociedade capitalista. Ele v que perfeitamentepossvel criar empregos que serviro para elevar o padro de

    vida, e faltam-lhe as razes capitalistas para se opor soluo

    do problema dentro dessas linhas. Alm disso, v que pagar,com seus filhos, o preo da guerra em sangue, suor e lgrimas,enquanto outros colhem as glrias. No necessrio nenhumpreparo poltico especial, nem capacidade de formular longosraciocnios dedutivos, para que o trabalhador veja onde estoseus interesses.

    A experincia da Alemanha, longe de refutar essa opinio,vem confirm-la definitivamente. fato freqentemente esque

    cido ou deixado de lado que praticamente o primeiro ato doGoverno de Hitler foi esmagar as organizaes da classe trabalhadora alem. O imperialismo alemo tinha de reconquistar sualiberdade de ao no s das restries do sistema de Versalhes,mas tambm das restries internas impostas pela classe trabalhadora alem, e esta ltima condio foi a primeira de que oslderes nazistas se lembraram. certo que a posterior eliminaodo desemprego fortaleceu o regime e atraiu para ele elementosda classe trabalhadora, principalmente de trabalhadores antes no

    organizados e de recm-ingressos no mercado de trabalho, cujaopinio sobre seus interesses fora deformada pelas tcnicas educativas nazistas. Mas a proporo do apoio da classe trabalhadora facilmente exagerada. As provas sobre essa questo so quasetotalmente de carter negativo: os trabalhadores alemes em suamaioria produziram armamentos, lutaram bem nas foras armadas, quando convocados, e nunca se revoltaram. Mas tais fatospodem ser explicados de muitos modos, em termos das circunstncias especiais do desenvolvimento histrico da Alemanha, quedecerto deixou sua marca na classe trabalhadora bem como nasoutras classes. O fator mais importante, porm, foi sem dvidao terror sistemtico e sem limite do regime nazista, que caiu comtoda a fora, sobre os elementos da oposio, dentro da classetrabalhadora. 3

    8 provvel que no consigamos nunca estatsticas sobre o nmero de trabalhadores alemes mortos, aprisionados ou colocados em campos de concentrao porperodos vrios, durante os 12 anos de terrpr nazista. Minhas observaes, porm, feitas

    na Alemanha durante o vero de 1945 e baseadas em entrevistas pessoais comsindicalistas, democratas sociais e comunistas, em regies diferentes do pas levam-mea crer que esse nmero sobe casa dos milhes.

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    Em vista do que sabemos hoje sobre o fascismo alemo, falardele como faz o Dr. Lange, em termos de um imperialismo dopovo, que une todas as classes sociais e elimina a luta de classesdando aos membros de cada classe uma participao na expansoimperialista, parece, pelo menos, um afastamento da realidade.

    As relaes de tudo isso com o caso dos Estados Unidos onde, no final das contas, o destino do capitalismo mundialser finalmente selado so bastante claras. Enquanto a democracia existir naquele pas e a classe trabalhadora conservar sualiberdade de organizao, o imperialismo americano ser obstruido com eficiencia. Haver sem dvida expanso dos interesses

    americanos no exterior, e toda sorte de manobras sob a capa dadefesa nacional, mas no haver campanhas de conquistas e nemcruzadas para libertar o mundo de experincias sociais perigosas.Nesse meio tempo, o trabalhador americano continuar a procuraruma sada das contradies de um capitalismo decrpito, e serajudado a encontr-la pelo exemplo de uma sociedade socialistafuncionando com xito na Europa e sia.

    Enquanto a democracia existir esse o ponto-chave.

    Os grupos mais poderosos dos Estados Unidos tm hoje interessese idias que divergem dos interesses da classe trabalhadora americana, e na realidade dos interesses da grande maioria da classemdia. Tais grupos seguiro suas idias com vigor e inteligncia,e quando compreenderem que a democracia que lhes barra ocaminho tentaro destru-la. No podemos dizer se o conseguiro.De qualquer forma, a questo de importncia histrica decisiva.

    Wilton, N. H.

    18 de janeiro de 1946.

    P a u l M. S w e e z y

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    Prefcio Quarta Edio(1956)

    Q u a n d o es tte Liv Bo s e e s g o t o u , h vrios anos, nem 0editor original nem o autor julgaram que a procura viria

    justificar uma nova edio. As condies, porm, se modificaram. No mundo, a competio cada vez mais vivaentre os sistemas estimulou um renovado interesse pelasidias marxistas; internamente, aliviadas as tenses daguerra fria e da caa s feiticeiras, esse interesse pdemanifestar-se mais livremente do que no fim da dcada

    de 1940 e princpio da dcada de 1950. Em conseqncia, a necessidade de material introdutrio, til e fidedigno sobre o marxismo se fez sentir, aumentando comisso a procura da Teoria do Desenvolvimento Capitalista.Chegamos ao ponto em que uma nova edio se tomounecessria.

    Meu primeiro impulso foi o de preparar uma ediorevista e ampliada; pensando melhor, porm, resolvi o

    contrrio. No que faltem ao livro lacunas e deficincias longe disso. Mas me parece que uma tentativa sriapara remediar as mais importantes ultrapassaria o mbitode uma introduo e poderia prejudicar o valor do livrona consecuo da finalidade que lhe foi atribuda inicialmente. J que, pelo que sei, nenhuma obra semelhante se publicou em ingls no perodo entre a primeirae esta edio, conclu que a Teoria do DesenvolvimentoCapitalistaem sua forma original ainda tem uma funo

    til a desempenhar.

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    Introduo

    s o c i e d a d e mais do que uma reunio de indivduos. umareunio de indivduos entre os quais existem certas relaes definidas e mais ou menos estveis. A forma da sociedade determinada pelo carter e forma dessas relaes. As Cincias Sociaiscompreendem todos os ramos do conhecimento que tenham comoobjetivo o estudo e a compreenso dessas relaes e suas modificaes no curso do tempo.

    Tudo isso, diro os leitores, bvio ao ponto de ser banal,

    e assim , na verdade. Mas conveniente lembrar tambm queas coisas mais bvias so freqentemente as mais importantes.Os que negligenciam o bvio o fazem correndo um risco. Tomemos,, como exemplo, o caso da moderna Cincia da Economia.

    A Economia, todos o sabem, uma Cincia Social; bastaconsultar um catlogo universitrio para nos convencermos disso.Seus temas so tomados ao campo da produo e distribuiode mercadorias e servios de que as pessoas necessitam e desejam.Partindo dessas duas premissas, parecer legtimo concluir que a

    Economia estuda as relaes sociais (interpessoais) da produoe distribuio. Quais essas relaes, como se modificam, seu lugarno conjunto das relaes sociais, so os objetos de que se ocupa.

    Mas vero os economistas a questo sob tal prisma ? Examinemos rapidamente o trabalho do Prof. Lionel Robbins, TheNature and Significance of Economic Science, para nos esclarecermos. O livro do Prof. Robbins no escolhido como umexemplo extremo, mas apenas como um resumo adequado deopinies amplamente difundidas entre os economistas modernos.

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    Considera o Prof. Robbins a Economia como uma Cincia Socialno sentido de que se ocupa primordialmente com as relaesentre pessoas ?

    A definio de Economia que provavelmente reunir maiores adeptos... a que a relaciona com o estudo das causas dobem-estar material, diz-nos ele (p. 4). No se trata, certamente,de uma definio muito promissora, pois sugere todos os gnerosde Cincias Naturais e Aplicadas, que o economista dificilmentepoderia dominar. Podemos, portanto, regozijarmo-nos pelo fatode que o Prof. Robbins se decide a rejeitar tal definio. Parachegar essncia da questo, ele passa em seguida a examinar

    o caso do homem isolado que divide seu tempo entre a produoda renda real e o gozo do lazer (p. 12). Eis o nosso bom amigoRobinson Crusoe, e o Prof. Robbins considera muito instrutivo oseu comportamento. Sem voltar ao continente, o Prof. Robbinselabora uma definio de Economia: Economia a cincia queestuda o comportamento humano como uma relao entre finse meios insuficientes que tm usos alternativos (p. 15).

    Isso no se assemelha muito definio de uma cincia de

    relaes sociais. Parece ser antes a definio de uma cincia docomportamento humano em geral. No nos surpreendemos, portanto, ao verificar que essa cincia produz resultados geralmenterelevantes a todas as formas de sociedade, ou seja, sob as maisdiferentes condies quanto ao tipo de relaes existentes entreos membros da sociedade. As generalizaes da teoria do valor,segundo o Prof. Robbins, so aplicveis tanto ao comportamentodo homem isolado e autoridade executiva de uma sociedadecomunista como ao comportamento do homem numa economiade troca (p. 19). O mesmo se poderia dizer, sem dvida, dasgeneralizaes da Fisiologia. O Prof. Robbins no chega ao pontode afirmar que a Economia no uma Cincia Social, mas temevidente desprezo pela opinio em si. Se tomarmos o ponto devista dos economistas clssicos, diz ele, seria possvel consideraro assunto da Economia como algo social e coletivo. Com acompreenso mais recente da importncia da escolha individual,porm, essa interpretao se toma cada vez menos adequada

    (p. 69). Alm disso, diz-nos ele que ao invs de estudar a produo conjunta da sociedade e sua diviso ou seja, o resultadodas relaes sociais de produo consideramos [o sistema

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    INTRODUO 33

    econmico] como uma srie de relaes interdependentes, masconceptualmente distintas, entre homem e bens econmicos (p.69). (Ogrifo nosso.) Em outras palavras, o sistema econmico

    no analisado primordialmente em termos de relaes entrehomens e homens (relaes sociais), mas em termos de relaesentre homens e coisas.

    Seria um erro concluir que o economista moderno no seocupa absolutamente das relaes sociais da produo. Pelo contrrio, ele est continuamente empenhado em pesquisas que tm,evidentemente, um carter social. Ele talvez assinale essas pesquisas como prova de que as acusaes que lhe so feitas, sobtal alegao, no tm fundamento. Isso, porm, no representao ponto essencial que estamos tentando expressar. evidentemente certo que na aplicao ou utilizao do aparato conceptualda teoria econmica, as relaes sociais so inevitavelmente encontradas e devem participar da discusso. O ponto que.desejamos acentuar que_ se_aparajto conceptual se destina a serconstrudo de modo a transcender qualquer conjunto particularde relaes sociais. Conseqentemente, este s participa do quadro incidentalmente, e no nvel da aplicao prtica. Dizemosincidentalmente porque no necessita absolutamente participar.O fato de que se suponha ser a teoria econmica igualmenteaplicvel a Robinson Crusoe e aos vrios tipos de economia socialcomprova isso. Dando outra formulao questo, a teorizaoda Economia primordialmente um processo de construir e inter--relacionar conceitos dos quais todo o contedo social tenha sidoeliminado. Na aplicao prtica, o elemento social pode ser (ehabitualmente , pois Robinson Crusoe extremamente til einteressante nas fases preliminares da teorizao) introduzido

    por meio de uma suposio ad hoc, especificando o campo deaplicao.Vamos tentar tornar claro o que pretendemos dizer, exami

    nando o conceito de salrio, que parte de todas as teoriaseoonmcas modernas. O termo tomado linguagem comumdiria, na qual significa as somas de dinheiro pagas em determinados intervalos curtos por um empregador .a trabalhadorescontratados. A teoria econmica, porm, esvaziou essa expressodo seu contedo social, redefinindo-a para significar o produto,

    expresso em valor ou em termos fsicos, atribuvel atividade

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    humana empenhada num processo produtivo em geral. AssimRobinson Crusoe, o arteso que trabalha por conta prpria, eo pequeno campons proprietrio, bem como o trabalhador defbrica, todos ganham salrios nesse sentido, embora na linguagem comum somente o ltimo seja adequadamente consideradocomo receptor de salrio.j Em outras palavras, salrio toma-seuma categoria universal da vida econmica (a luta para superara escassez) ao,invs de uma categoria relevante a uma determinada forma histrica da sociedade,j

    Ao investigar o atual sistema econmico, os economistas in

    troduzem, explcita ou implicitamente, suposies institucionais esociais necessrias para que o salrio tome a forma de pagamentoem dinheiro feito pelos empregadores a trabalhadores contratados. O que est por trs dessa forma, porm, derivado dosteoremas de produtividade, que em si so inteiramente destitudos de contedo social. Partindo desse ponto de vista, fcile natural tratar o salrio como, realmente ou em essncia, aprodutividade marginal do trabalhador expressa pelo pagamento

    prtico do salrio como incidental e em si mesmo sem significadoparticular. assim que o Prof. Robbins afirma que a relaode troca [neste caso entre empregador e trabalhador] umincidente tcnico... subsidirio ao principal fato da escassez(p. 19).

    O assunto no termina, porm, a. Uma vez adotado o pontode vista acima, extraordinariamente difcil, mesmo para os maiscautelosos, evitar o hbito de considerar o salrio da produti

    vidade como de certa forma o salrio adequado, ou seja, o queo trabalhador receberia numa ordem econmica equilibrada e

    justa. No nos referimos s justificativas do atual sistema econmico que os velhos economistas tinham o costume de apresentar em termos da teoria da produtividade. Eram evidentes ebvias demais, e h muito saram de moda. Estamo-nos referindoa uma utilizao muito mais sutil da teoria da produtividadecomo padro de convenincia pelos crticos do status quo. Tantoo Prof. Pigou como Mrs. Robinson, por exemplo, afirmam que o

    trabalhador explorado quando recebe de salrio menos do queo valor do produto fsico marginal de seu trabalho. 4 Dessa forma,

    4 Pi g o u , A. C., The Economics of Welfare, Macmillan & Co., Londres, 1929,p. 556; Ro b i n s o n , Joan, The Economics of Imperfect Competition, Macmillan & Co.,Londres, 1933, pp. 281 e ss.

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    INTRODUO 35

    o atual sistema econmico criticado na medida que deixa dese conformar a um modelo construdo base de conceitos total

    mente destitudos de contedo social. Algo que tem surpreendente semelhana com a maneira de julgar a sociedade pela leinatural, peculiar ao sculo XVIII, assim introduzido pela portados fundos por aqueles que cuidadosamente evitariam traz-loabertamente pela porta da frente.

    Seria possvel fazer uma anlise desse tipo e chegar a resultados muito semelhantes, se nos dispusssemos a' examinar outrosconceitos centrais da teoria econmica, como renda, juros, lucros,capital, etc. Mas a questo j nos parece bastante clara. JEm

    cada caso, os conceitos so tomados linguagem cotidiana, ocontedo social eliminado, e as categorias universais resultantesso aplicadas indiferentemente a todas as formas de sistemaseconmicos! Estes so ento considerados como diferentes entresi principalmente em questes de forma sem importncia, noque interessa ao economista. E pode ainda ocorrer que, como

    j vimos, sejam considerados no em termos sociais, mas emreferncia a modelos abstratos, considerados como de principalimportncia lgica".

    Parece evidente que dessa folma o economista evita a explorao sistemtica dessas relaes sociais que so de tal modouniversalmente consideradas de relevncia para os problemas econmicos que esto profundamente enraizadas no linguajar diriodo mundo comercial. E ainda mais evidente que o ponto de

    vista bsico adotado pela Economia moderna a toma inadequadapara a tarefa mais importante de lanar luz sobre o papel doelemento econmico na completa totalidade de relaes entrehomem e homem que constitui o que chamamos de sociedade.

    Parece razovel supor que o estado de coisas rapidamenteresumido nos pargrafos precedentes tem algo a ver com o quepodemos classificar adequadamente de sentimento generalizadode descontentamento com os economistas e sua obra. Assim,parece que o processo mais proveitoso seria realizar uma detalhada investigao dos princpios e crenas centrais da Economiamoderna, do ponto de vista de suas deficincias como uma verdadeira Cincia Social das relaes humanas. A anlise crticadesse tipo , porm, na melhor das hipteses uma tarefa ingrata,

    estando sujeita acusao justificvel de fracasso, por no ofe

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    36 TEORIA DO DESENVOLVIMENTO CAPITALISTA

    recer nada de construtivo no lugar daquilo que rejeita. Decidimos, por isso, abandonar o terreno da doutrina recebida con

    vencidos que estamos de que h razes de insatisfao ali, e

    explorar outra abordagem do estudo dos problemas econmicos,ou seja, a interpretao ligada ao nome de Karl Marx.

    No decorrer dste livro, portanto, vamo-nos ocupar amplamente da Economia marxista. No se deve entender por isso quepretendamos revelar o que Marx realmente pensava. Fazemosa suposio simplificadora, embora talvez no bvia, de que elequis dizer o que disse, e nos propomos a tarefa mais modestade descobrir o que podemos aprender com Marx.

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    PRIMEIRA PARTE

    O VALOR E A MAIS-VALIA

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    C A P T U L O I

    O Mtodo de Marx

    discusso da metodologia na Economia, como em outrosassuntos, costuma ser cansativa e no-compensadora. Evit-la,porm, correr o risco de um desentendimento srio. Por isso,neste captulo tentaremos, da mais breve forma possvel, apresentar os principais elementos da interpretao de Marx Economia. No caso de Marx, um ponto dos mais importantes, poismuitas de suas contribuies novas e mais significativas so precisamente de carter metodolgico. Lukacs, um dos mais penetrantes marxistas contemporneos, chegou mesmo a afirmar que

    a ortodoxia em questes de marxismo se relaciona exclusivamente com o mtodo. 6

    1. O Uso da Abstrao

    Do ponto de vista formal, a metodologia econmica de Marxpode parecer surpreendentemente semelhante de seus predecessores clssicos e de seus sucessores neoclssicos. Ele era

    forte partidrio do mtodo abstrato-dedutivo, to caractersticoda escola ricardiana. Na anlise das formas econmicas, escreveu no Prefcio de O Capital,nem microscpios nem reagentesqumicos tm utilidade. A fora da abstrao deve substituirambos. Alm disso, Marx acreditava e praticava o que os tericos modernos chamam de mtodo de aproximaes sucessivas,e que consiste em passar do mais abstrato para o mais concreto,

    6 L u k a c s, Georg, Geschichte und Klassenbewusstsein, Der Malik-Verlag, Berlim*1923, p. 13.

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    40 TEORIA DO DESENVOLVIMENTO CAPITALISTA

    em fases sucessivas, afastando suposies simplificadoras nos sucessivos estgios da investigao, de modo que a teoria possaexplicar e levar em conta um nmero de fenmenos cada vez

    maior.Quando examinamos melhor a questo, porm, encontramos

    diferenas surpreendentes entre Marx e os representantes datradio clssica e neoclssica. O princpio da abstrao emsi impotente para proporcionar o conhecimento; tudo dependendoda forma de sua aplicao. Em outras palavras, preciso decidiro que se deve abstrair de que, e o que no se deve. Surgem,ento, pelo menos duas questes. Primeiro, que problema est

    sendo investigado ? E, segundo, quais os elementos essenciaisdesse problema ? Se tivermos de responder a essas duas perguntas, saberemos com certeza o que podemos abstrair ou no,e, dentro desses limites, enquadrar nossas suposies num critriode convenincia e simplicidade. Ora, no precisamos ir alm daprimeira pergunta para nos convencermos de que os economistasnem sempre estiveram de acordo nos seus objetivos. Os problemas que vrios economistas bem conhecidos se propuseram investigar podem ser mencionados: a natureza e causas da riqueza

    das naes (Adam Smith); as leis que regulam a distribuiodo produto da terra (Ricardo); a ao do homem na vida comercial comum (Marshall); o preo e suas causas e corolrios(Davenport); o comportamento humano como uma relao entrefins e meios escassos que tm usos alternativos (Robbins). Hsem dvida pontos de contato, mas pouco provvel que duasdessas afirmaes possam ser consideradas idnticas. Segue-seda que no h dois pesquisadores que tratem seu material inclusive o modo de aplicar o recurso da abstrao exatamentedo mesmo modo. Um deles pode abstrair-se de uma diferenaque outro tenta explicar, e cada um deles pode encontrar justificativa pelo ponto de vista do problema que examina. O estudante do marxismo deve ter sempre presente tal fato, pois oobjetivo de Marx desnudaiu a-_leL econmica - do movimentoda sociedade moderna 0 radicalmente diferente do propsitodas escolas de pensamento no-marxistas.

    Mesmo depois de determinada a tarefa do pesquisador, no

    dispe ele de uma frmula soberana para guiar-lhe os passos.6 Prefcio do Autor primeira edio de O Capital, I, p. 14.

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    Como Hegel observou acertadamente na Introduo de sua Filo-sofia da Histria:no processo de compreenso cientfica, importante que o essencial seja distinguido e posto em contraste

    com o chamado no-essencial. Mas para que isso seja possvel,devemos saber o que essencial...7 Colocar o essencial emrelevo e tomar possvel sua anlise: essa a tarefa especfica daabstrao. Mas onde comear ? Como distinguir o essencial dono-essencial ? A metodologia pode formular tais perguntas, masinfelizmente no lhes pode proporcionar respostas sob medida.Se assim fosse, o processo da compreenso cientfica seria muitomais uma questo de rotina do que na realidade . Na prtica, necessrio formular hipteses sobre o que essencial, desen

    volv-las e confrontar as concluses com os dados proporcionadospela experincia. Para compreender a realizao de um determinado cientista devemos, portanto, tentar identificar suas hip-teses-chaves, a origem delas e o desenvolvimento de suas implicaes. No ser necessrio dizer que essa tarefa nem sempre fcil, mas no caso de Marx sabemos o bastante sobre sua evoluointelectual para tentar.

    Quando estudante universitrio, Marx concentrou-se na Juris

    prudncia e na Filosofia, planejando ingressar no magistrio. Suasinclinaes radicais embora na poca no fosse nem socialista impediram-no de conquistar uma ctedra, e em 1842 aceitoua direo do recm-fundado Rheinische Zeitung. Foi como talque pela primeira vez entrou em contato prtico com problemassociais e com as novas idias sociais, particularmente as socialistase comunistas que fluam da Frana em grandes quantidades, nosanos de 1830 e 1840. Numa polmica com oAugsburger Zeitung,Marx viu-se um pouco embaraado ao descobrir que no sabiao que pensar do socialismo. Resolveu, pois, estudar seriamenteo assunto na primeira oportunidade, pois estava convencido deque valia a pena. A oportunidade no tardou muito; poucosmeses depois o Rheinische Zeitungera fechado pelas autoridades,e Marx viu-se desocupado. Imediatamente mergulhou no estudointensivo do socialismo e comunismo, da histria da Frana e daEconomia Poltica inglesa. Foi durante os anos que se seguiram,passados principalmente em Paris e Bruxelas, que rompeu com

    7 He g e l , G. W. F., A Filosofia da Histria, citado pela traduo americana deJ. Sibree, publicada pela Cooperative Publication Society, Nova York, 1900, p. 65.

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    acentuar, j que o contrrio tem sido afirmado com tanta freqncia, que Marx no procurava reduzir tudo a termos econmicos. Tentava, antes, descobrir as verdadeiras inter-relaes

    entre os fatores econmicos e no-econmicos na totalidade daexistncia social.

    Tendo chegado concluso de que a chave da transformaosocial est nos movimentos do modo de produo, Marx limitou-secom efeito a um estudo exaustivo da Economia Poltica do pontode vista das leis que governam as modificaes no modo deproduo. Desnudar a lei econmica do movimento da sociedade moderna tomou-se o objetivo cientfico a que dedicou oresto de sua vida.

    Como, dentro desse objetivo, seria possvel reconhecer osaspectos essenciais do problema ? Marx conservou porque pareciam destacar-se, sob penetrantes estudos da realidade do desenvolvimento histrico os elementos do pensamento de Hegelque davam importncia ao processo e desenvolvimento atravsdo conflito de foras opostas contraditrias. Ao contrrio deHegel, porm, atribuiu aos conflitos histricos decisivos razesno modo de produo; ou seja, descobriu que eles eram o que

    chamava de conflitos de classes. Assim, o Manifesto Comunista(1847), aps uma nota introdutria, comea: A histria de todaa sociedade que at hoje existiu a histria da luta de classes.

    As foras econmicas atuantes se manifestam em conflitos declasses sob o capitalismo, bem como sob as formas anterioresda sociedade. Segue-se que as relaes econmicas essenciais soas que sublinham e se expressam na forma de conflitos de classes.So esses os elementos essenciais qjie devem ser isolados e analisados pelo mtodo da abstrao.

    Mesmo essa hiptese, entretanto, pode levar a procedimentosdivergentes. Os economistas clssicos tambm se interessavammuito pelas razes econmicas dos conflitos de classes numcerto sentido, isso representa exatamente o que a distribuiodo produto da terra significava para Ricardo mas o antagonismo social que atraa sua ateno, tanto intelectual como emocional, era o conflito entre os capitalistas industriais e os senhoresde terras. Conseqentemente, davam grande importncia, por

    vezes predominante, terra e renda derivada de sua propriedade. Realmente, sem um conhecimento da verdadeira doutrina

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    da renda, afirmava Ricardo, impossvel compreender o efeitodo progresso da riqueza sobre os lucros e salrios, ou estabelecersatisfatoriamente a influncia dos impostos sobre as diferentes

    classes da comunidade...8 Marx reconheceu a tendncia dedar maior importncia terra e renda, mas considerou-a errnea.Nada parece mais natural, escreveu ele, do que comear coma renda, com a propriedade da terra, pois a ela est ligada afonte de toda produo e toda existncia, a primeira forma deproduo em todas as comunidades mais ou menos permanentes,ou seja, a agricultura.9 No obstante, acrescentou imediatamente, nada poderia ser mais errneo. Sua razo para adotar

    tal atitude explica seu procedimento posterior. Na sociedadecapitalista,

    a agricultura passa a ser, cada vez mais, apenas um ramo da indstria e completamente dominada pelo capital... Capital o poder que tudodomina na sociedade burguesa. Deve constituir o ponto de partida bemcomo a finalidade, e deve ser desenvolvido antes da propriedade da terra. ..

    Seria portanto pouco prtico e errneo dispor as categorias econmicasna ordem em que foram os fatores determinantes no curso da histria. Suaordem de seqncia determinada antes pela relao que mantm entre si

    na moderna sociedade burguesa, e que exatamente contrria ao que parececonstituir sua ordem natural ou a ordem de sua evoluo histrica. O quenos interessa no o lugar que as relaes econmicas ocupam na sucessohistrica das diferentes formas da sociedade . .. Estamos interessados emsua ligao orgnica dentro da moderna sociedade burguesa.10

    A frase grifada de particular importncia: o capital opoder que tudo domina na sociedade burguesa significava paraMarx, como teria significado para qualquer dos economistas clssicos, que a principal relao econmica se faz entre os capita

    listas e os trabalhadores. Tal como disse em outro local, a relao entre o trabalho assalariado e o capital determina o cartertotal do modo de produo.11 Antes mesmo de comear suaspesquisas para a Crtica e O Capital, havia expresso o mesmo

    8 Ri c a r d o , David, Principies of Political Economy and Taxation, editado por E.C. K. Gonner, G. Bell & Sons, Londres, 1929, p. 1.

    0 Critica da Economia Poltica. A citao feita da inacabada Introduo Crtica da Economia Poltica, no publicada como parte da Crtica na edio original(1859). Foi escrita por M arx em 1857 e publicada pela primeira vez por Kautskyem 1903. Foi includa como Apndice na edio americana, de Charles Kerr & Co.,

    Chicago 1911, de onde so feitas as citaes da Crtica.10 Ibid., pp. 303-4. O grifo nosso.11 O Capital, vol. III, p. 1025 da edio americana (Charles Kerr & Co., Chicago,

    1933).

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    julgamento no Manifesto: A sociedade como um todo divide-secada vez mais em dois grandes campos hostis, em duas grandesclasses que se enfrentam a burguesia e o proletariado. Essa

    relao deve constituir o centro da investigao; o poder deabstrao deve ser empregado para isol-la, para reduzi-la suamais pura forma, para permitir que possa ser submetida penosa anlise, livre de todas as perturbaes que no lherespeito.

    A tomada dessa posio requer um processo' que compreendepelo menos dois passos perfeitamente distintos.

    Primeiro, todas as relaes sociais exceto as existentes entre

    capital e trabalho devem ser provisoriamente afastadas, paraserem reintroduzidas, uma de cada vez, numa fase posterior daanlise.

    Segundo, a relao entre o capital e o trabalho em si mesmadeve ser reduzida sua forma ou formas mais significativas. Nose trata de uma questo quantitativa; no significa que as formasmais freqentes, ou modais, da relao devam ser escolhidas paraanlise. A significao, nesse contexto, uma questo das carac

    tersticas estruturais e tendncias de toda a sociedade. Marx,

    como bem se sabe, selecionou as formas de relao entre o capitale o trabalho que surgem na esfera da produo industrial comoas mais significativas da moderna sociedade capitalista. Os capitalistas e os trabalhadores so igualmente reduzidos a certos tipospadres, dos quais todas as caractersticas irrelevantes para arelao sob exame so excludas. Escreveu ele no Prefcio deO Capital: Os indivduos so tratados apenas como personificaes de categorias econmicas, representaes de determinadas

    relaes de classes e interesses de classes.Qual a natureza dessa relao entre capital e trabalho ? Na

    forma, uma relao de troca. O capitalista compra a capacidade de trabalho do operrio, e este recebe dinheiro do capitalista, com o qual adquire as coisas necessrias para viver. Comorelao de troca, evidentemente um caso especial numa amplaclasse de relaes semelhantes, que tm uma forma e estruturacomuns. claro, portanto, que o estudo da relao entre o capitale o trabalho deve comear com uma anlise do fenmeno geralda troca.

    . maisdizem I

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    Chegamos assim ao ponto de partida da Economia Polticade Marx. A Parte I do primeiro volume de O Capital, queresume a anterior Crtica da Economia Poltica, denominada

    Mercadorias. Tudo o que se destine habitualmente troca, eno utilizao direta, uma mercadoria. A anlise das mercadorias, portanto, envolve a anlise das relaes de troca e seuaspecto quantitativo (valor de troca) e inclui, alm do mais,uma anlise do dinheiro. Como mais adiante veremos, alguns dosresultados mais interessantes obtidos por Marx so oriundos doestudo das mercadorias.

    Tendo estabelecido a base necessria com a anlise das mer

    cadorias, Marx passa tarefa principal. Quase todo o restantedo primeiro volume de O Capital dedicado relao entrecapital e trabalho em suas formas isolada e purificada. Emoutras palavras, o volume I comea e continua num alto nvelde abstrao.

    difcil para os que no esto familiarizados com o mtodode Marx acreditar que afirmamos isso seriamente. Mencionama riqueza de material real e histrico que constitui uma caracterstica do volume I. No significa isso que Marx era, na verdade, exatamente o contrrio de abstrato ? Esse raciocnio no perfeito. A finalidade legtima da abstrao na Cincia Socialno jamais se afastar do mundo real, mas isolar certos aspectosdele para a investigao intensiva. Quando, portanto, dizemosque operamos num alto nvel de abstrao, queremos dizer queestamos tratando de um nmero relativamente pequeno de aspectos da realidade. No queremos dizer que tais aspectos nosejam suscetveis de investigao histrica e de ilustrao com

    fatos. Um exame superficial bastante para indiar que a grandemassa de material prtico colocada por Marx no volume I estdiretamente ligada relao entre o capital e o trabalho, e decarter ilustrativo ou histrico. Constitui, portanto, uma confirmao, e no uma contradio, da afirmao de que o volume Icomea e conserva um alto nvel de abstrao.

    A comprovao desse fato permite-nos tirar uma importanteconcluso, ou seja, a de que os resultados obtidos no volume Itm um carter provisrio. Em muitos casos, embora no necessariamente em todos, sofrem modificaes mais ou menos amplasnum nvel inferior de abstrao, ou seja, quando mais aspectos

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    da realidade so levados em considerao.12 Segue-se que astendencias ou leis enunciadas no volume I no devem ser interpretadas como previses diretas do futuro. Sua validade rela

    tiva ao nvel de abstrao no qual so formuladas e proporodas modificaes que devero sofrer quando a anlise for colocada num plano mais concreto. O reconhecimento desse fatoteria evitado muita controvrsia estril. Como exemplo, podemoscitar a famosa lei da crescente misria do proletariado, queMarx chamava de lei absoluta geral de acumulao capitalista.13Os antimarxistas sustentaram sempre a falsidade dessa lei e deduziram disso que a anlise marxista do capitalismo incorreta.14Alguns marxistas, por outro ldo, ocuparam-se igualmente de

    demonstrar a exatido da lei15 e com isso uma polmica, produzindo muito calor e pouca luz, perdurou por mais de meiosculo. Ambos os lados so culpados da mesma falta de percepo do mtodo de Marx. A lei em questo formulada numalto nvel de abstrao; o termo absoluta utilizado na sua classificao empregado no sentido hegeliano de abstrata; a leino constitui, em nenhum sentido, uma previso concreta dofuturo. Alm do mais, nesse caso particular, Marx diz isso emlinguagem perfeitamente clara, de forma que a m interpretaoparece extremamente difcil de tolerar. Tendo formulado a lei,ele imediatamente acrescenta: como todas as outras leis, esta modificada em sua atuao por muitas circunstncias, cujaanlise no nos compete aqui. Seria impossvel uma advertnciamais clara para no interpret-la como uma previso concreta.O exame adequado dos problemas de mtodo teria tomado essedesentendimento, juntamente com muitos outros, desnecessrio.

    No precisamos examinar todo o plano de O Capital. Para

    nosso objetivo no momento, necessrio apenas mostrar que afinalidade dos volumes II e III era levar em conta fatores quehaviam sido conscientemente excludos do volume I, ou seja,

    12 Esse aspecto do mtodo de Ma r x bem examinado por Henryk Gr o s s m a n n na introduo de seu livro Das Akkumulations und Zusammenbruchsgesetz des kapitalistischen Systems, Leipzig, 1929.

    18 O Capital, ed. cit., I, p. 707.14 Gr o s s m a n n , op. cit., menciona grande nmero de exemplos, pp. 23 e ss.15 Talvez o exemplo mais recente seja o folheto de Alex Bi t t e l m an n e V. J.

    Je r o m e , Leninism the Only Marxism Today, Workers Library Publishers, Nova York,

    1934. Esse folheto uma critica do Decline of American Capitalism, de Lewis Co r e y ,publicado por Covici Friede, Nova York, 1934.

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    levar a anlise a nveis cada vez mais baixos de abstrao. Aomesmo tempo, e de certa forma paradoxalmente, os volumes IIe III contm relativamente menos material prtico do que o

    volume I, o que se explica por terem ficado inacabados. Aocompil-los dos manuscritos de Marx, Engels encontrou grandecopia de material ilustrativo, que porm no estava nem mesmodisposto, e muito menos formulado.16 O volume I, por outrolado, foi preparado para a impresso pelo prprio Marx, queassim pde integrar o material real com o terico, coisa queEngels no poderia ter feito nos volumes posteriores sem ir muitoalm das funes de organizador, o que ele sabiamente evitou.

    Discutimos a utilizao da abstrao por Marx em termosgerais e no nos propomos, nesta altura, entrar em casos particulares. Ser bom notar, porm, que muitas crticas Economia de Marx so, conscientemente ou no, baseadas na rejeio desuposies com que ele argumenta. Nosso exame deve ajudar aestabelecer critrios pelos quais julgar a validade de tais crticas.Em cada caso, as trs perguntas seguintes deveriam ser formuladas sobre as suposies simplificadoras (ou abstraes) que doorigem crtica: I) Esto formuladas com a devida considerao

    do problema sob investigao? 2) Eliminam os elementos no--essenciais do problema ? 3) Deixam de eliminar os elementosessenciais ? Se todas as trs forem respondidas afirmativamente,podemos dizer que o princpio da abstrao adequada foi observado. Esse princpio de grande ajuda na comprovao da relevncia e validade de um considervel nmero de crticas a Marx.

    2. Carter Histrico do Pensamento de Marx

    O mtodo de Marx, diz Lukacs, , em sua mais ntimaessncia, histrico.17 Isso sem dvida certo, e qualquer examedo problema que deixe de acentuar tal aspecto pode ser considerado satisfatrio.18

    10 O Capital, ed. cit., vol. II, Prefcio do Organizador, p. 7.17 Op. cit., p. 7.

    18 Uma das melhores anlises desse aspecto do pensamento de Ma r x, bem comode todos os problemas tratados neste captulo, encontra-se em Karl Ko r s c h , Karl Marx,Chapman & Hall Ltd., Londres, 1938.

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    Para Marx, a realidade social no tanto um conjunto especfico de relaes e ainda menos um conglomerado de coisas. antes o processo de transformao inerente a um determinado

    conjunto de relaes. Em outras palavras, a realidade social o processo histrico, processo que, em princpio, no conhecefinalidade nem pontos de parada.19 Os sistemas sociais, comoas pessoas, atravessam um ciclo de vida e desaparecem de cenaquando de formas de desenvolvimento das foras da produoeles se transformam em suas cadeias. O proesso de transformao social, porm, no puramente mecnico, e sim antesproduto da atividade humana, mas atividade limitada pelo gnerode sociedade onde tem suas razes. Os homens fazem sua prpria histria, mas no como melhor lhes parece; no a fazem emcircunstncias por eles mesmos escolhidas, mas em circunstnciasencontradas, dadas e transmitidas pelo passado,20escreveu Marx.A sociedade tanto se modifica como, dentro de certos limites,pode ser modificada. A aceitao coerente dessa posio leva auma coerente interpretao histrica da Cincia Social. Alm domais e trata-se apenas de outro aspecto da mesma coisa leva abordagem crtica de qualquer forma de sociedade, inclusive

    a presente. A importncia desse ponto no pode ser exagerada.O pensamento no-marxista pode, caracteristicamente, compreender o carter transitrio de todas as ordens sociais anteriores,ao passo que a mesma faculdade crtica falha quando se tratado prprio sistema capitalista. Isso acontece, sem dvida, a todasas pocas histricas, at certo ponto. Como mais adiante veremos,porm, h razes especiais para que acontea de forma particularmente extremada em nossa prpria poca. Para o pensadormoderno tpico, como disse Marx, houve histria, mas j noh.21 A observao de Lukacs sobre isso notvel:

    Essa essncia no-histrica e anti-histrica do pensamento burgus surgeem sua forma mais evidente quando consideramos o problema do presentecomo um problema histrico. .. A incapacidade completa de todos ospensadores e historiadores burgueses de compreender os acontecimentos his-

    H um contnuo movimento de crescimento das furas produtivas, de destruiodas relaes sociais, de formao de novas idias; a nica coisa imutvel a abstraodo movimento mors immortalis. Ma r x, A Pobreza da Filosofia. Citado pela edioda International Publishers Inc., Nova York, sem data, p. 93.

    O 38 de Brumrio de Lus Bonaparte. Citado da edio da InternationalPublishers Inc., Nova York, sem data, p. 13.

    81A Pobreza da Filosofia, ed. citada, p. 102.

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    C A P T U L O II

    O Problema do Valor Qualitativo

    1. Introduo

    u p rim e ir o c a p t u l o de O Capital denominado Mercadorias. J dissemos que mercadoria tudo o que se produz paratroca, e no para uso do produtor. O estudo das mercadorias, portanto, o estudo das relaes econmicas de troca. Marx

    comea analisando uma produo de mercadorias simples, ouseja, uma sociedade na qual cada produtor dono de seus prprios meios de produo e satisfaz suas mltiplas necessidadespela troca com outros produtores em situao semelhante. Temosaqui o problema da troca em sua forma mais clara e mais elementar.

    Partindo da produo de mercadorias simples, Marx seguiauma tradio da teoria econmica, mas isso no deve obscurecer

    a diferena aguda que separava sua anlise da anlise da escolaclssica. No caso de Adam Smith, por exemplo, a troca estligada, da forma mais ntima possvel, ao principal fato tecnolgico da vida econmica, ou seja, a diviso do trabalho. SegundoSmith, essa diviso a base de todo aumento de produtividade; mesmo a base da economia humana, o que distingue esta davida dos animais. Mas Smith incapaz de conceber a divisodo trabalho independentemente da troca; esta , de fato, anteriore responsvel pela diviso do trabalho. O seguinte trecho resumea teoria de Smith sobre a relao entre a diviso do trabalho ea troca:

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    Essa diviso do trabalho, de onde derivam tantas vantagens, no efeito de qualquer sabedoria humana, que preveja e pretenda a opulnciageral, a que d ensejo. a necessria, embora muito lenta e gradual,conseqncia de certa propenso da natureza humana e que no tem em

    vista uma utilidade to ampla a propenso de barganhar, permutar e trocaiuma coisa pela outra. 23

    Essa propenso de barganhar, permutar e trocar , almdo mais, peculiar aos seres humanos: Ningum jamais viu umco fazer a troca justa e deliberada de um osso por outro, comalgum outro co.24 A troca e a diviso do trabalho esto, dessaforma, indissoluvelmente ligadas e constituem os pilares que sustentam a sociedade civilizada. As conseqncias dessa posio

    so claras: a produo de mercadorias, enraizada na naturezahumana, a forma universal e inevitvel de vida econmica; aCincia Econmica a cincia da produo de mercadorias.Desse ponto de vista os problemas da Economia tm um carterexclusivamente quantitativo: comeam com o valor de troca, arelao quantitativa bsica entre mercadorias, estabelecida atravs do processo de troca.

    Voltando agora a Marx, veremos logo de incio a diferenade interpretao que distingue sua Economia Poltica da formu

    lada por Adam Smith. Marx no nega a existncia de uma relao entre a produo de mercadorias e a diviso do trabalho,mas no a considera, absolutamente, como uma ligao ntima erpida que Smith quer. A diferena de opinies se evidenciaclaramente no trecho seguinte:

    Essa diviso do trabalho uma condio necessria para a produode mercadorias, mas no se segue da reciprocamente que a produo demercadorias seja uma condio necessria para a diviso do trabalho. Nascomunidades nativas primitivas h uma diviso social do trabalho, sem produo de mercadorias. Ou, tomando um exemplo mais prximo, em todafbrica o trabalho dividido segundo um sistema, mas essa diviso no provocada pela troca mtua, entre os operrios, de sua produo individual.Os produtos s se podem transformar em mercadorias, uns em relao aosoutros, quando oriundos de diferentes gneros de trabalho, cada gnerorealizado independentemente e por conta de diferentes pessoas.25

    28 Sm it h , Adam,An Inquiry into the Nature and Causes of the Wealth of Nations,2 vols. organizados por Edwin Cannan, Methuen & Co., Ltd., Londres, 1930, vol.I, p. 15.

    34 Ibid.

    25 O Capital, ed. cit., vol. I, p. 49. O grifo 6 nosso.

    (

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    O PROBLEMA DO VALOR QUALITATIVO 53

    A diviso do trabalho no perde nada da importncia quelhe atribui Smith, mas nega-se enfaticamente que esteja neces

    sariamente ligada troca. A produo de mercadorias, em outraspalavras, no a forma universal e inevitvel de vida econmica. apenas urna forma possvel de vida econmica, conhecida durante muitos sculos e que domina o perodo moderno, mas quenem por isso deixa de ser urna forma historicamente condicionadaque no pode, em nenhum sentido, pretender ser uma manifestao direta da natureza humana. As conseqncias dessa opinioso notveis. A produo de mercadorias em si retirada doreino dos fenmenos naturais e se toma o objeto vlido da investigao scio-histrica. O economista j no pode limitar suaateno s relaes quantitativas provocadas pela produo demercadorias deve tambm dirigir sua ateno para o carterdas relaes sociais que sublinha a forma da mercadoria. Podemos expressar isso dizendo que a tarefa da E