Identidade, cultura e regionalismo: um estudo de caso com ...
16459918 o Estudo Da Identidade No Ambito
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O ESTUDO DA IDENTIDADE NO MBITO DA PSICOLOGIA SOCIAL BRASILEIRA
Wilson Jos Alves Pedro*
* Doutor em Psicologia Social (PUC/SP) Professor Universitrio reas Psicologia Social e Administrao de Recursos Humanos. Coordenador Curso Ps-Graduao Lato Senso em Administrao de Recursos Humanos da Uniara. Pesquisador do Ncleo de Pesquisa em Identidade Jos Roberto Malufe (PUC/SP), Polticas e Prticas em Sade (Ufscar) e Psicologia Social e Trabalho (Uniara). Bolsista FUNADESP. E-mail: [email protected].
Apresentao
No h coisa alguma que persista em todo o universo. Tudo flui, e
tudo s se apresenta uma imagem passageira. O prprio tempo
passa como um movimento contnuo, como um rio... O que foi antes
j no , o que no tinha sido , e todo instante uma coisa nova.
In: Ovdio (poeta romano) Metamorfoses.
Pensar a Psicologia Social contempornea implica pensar a diversidade de
correntes, sua perspectiva histrica, os desafios da indissociabilidade terica e
metodolgica. Pensar a Psicologia Social contempornea, implica tambm enveredar
pelas especificidades de suas categorias de anlise, seus pressupostos, bem como suas
modalidades de interveno. Acreditamos ser este, um dos desafios postos s
investigaes e intervenes psicossocias. Afinal, a que se destina o trabalho do
Pesquisador Social? No seria pesquisar/intervir nas relaes e interaes homem-
sociedade? desta interao que emerge as preocupaes com a construo da
identidade humana.
Neste contexto, o presente artigo prope refletir especificidades da categoria
identidade, resgatando alguns de seus pressupostos epistemolgicos, elementos
conceituais, tericos e metodolgicos das recentes produes brasileiras. O que
apresento remete ora um pouco das investigaes realizadas durante o meu processo
de capacitao ao nvel de Mestrado e Doutorado junto ao Ncleo de Pesquisa sobre
Identidade, do Programa de Estudos Ps-Graduados em Psicologia Social, da PUC/SP;
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ora nossa prtica de professor-pesquisador social e que tem encontrado na Psicologia
Social/Gesto de Pessoas um fecundo campo de produo de conhecimentos. Centrados
na realidade brasileira, incio do sculo XXI, entre os paradoxos da globalizao e das
grandes transformaes tecnolgicas, poltico, econmicas e sociais, com certeza muito
temos por descobrir e desvelar, especialmente sobre a constituio da identidade
humana. Afinal, quem sou eu, quem somos ns neste mundo de constantes e aceleradas
transformaes?
Para melhor contextualizar, gostaria de destacar a relevncia do Programa de
Estudos Ps-Graduados em Psicologia Social da PUC/SP no mbito dos estudos da
Psicologia Social. Pioneiro nos estudos psicossociais brasileiro, consolidou duas
grandes linhas de pesquisas nas ltimas dcadas: 1) anlise crtica das categorias
presentes na Psicologia Social (dialtica incluso/excluso, emoo e linguagem na
constituio do psiquismo, histria da psicologia e identidade); aportes da psicologia
social na compreenso dos problemas sociais (adolescente brasileiro, organizao,
psicanlise e sociedade, psicologia da sade, trabalho e tecnologia, psicologia e
movimentos sociais, relaes de gnero, raa e idade). dentro deste contexto que
tenho refletido e investigado a temtica Identidade e a seguir passo a perscrut-la.
Breve contextualizao
Procurando superar a viso dicotmica, fragmentada que se tem do ser humano e
compreend-lo em sua totalidade, a Identidade, enquanto uma categoria cientfica,
ocupa hoje um locus privilegiado na psicologia social brasileira contempornea.
Captando no apenas a igualdade do sujeito - pois em sua etimologia -identitate (do
latim escolstico) a qualidade de idntico (Ferreira, 1995, p.349); inmeros so os
estudos que visam apreender a identidade em sentido amplo: as metamorfoses
humanas, a diferena, a singularidade.
A cada momento, em cada ao, em cada relao com o mundo social, a
conscincia desenvolvida pelo indivduo sobre quem sou eu? (a questo central para
quem pesquisa identidade), acompanha, no somente sua trajetria individual, mas o
movimento da realidade, construdo socialmente. Bem sabemos das polissemias e
ambiguidades das diversas apropriaes e utilizaes da palavra identidade. Vamos
portanto, nos empenhar para explicitar o que que compreendemos por identidade.
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Para a Psicologia Social, a Identidade representa e engendra sentimentos que o
indivduo desenvolve a respeito de si e que construda socialmente, a partir de seus
dados pessoais, sua histria de vida e seus atributos (conferidos por si mesmo e pelas
outras pessoas), acompanhando o movimento deste no mundo social. Uma questo
central no mbito da Psicologia Social como compreender a interao indivduo-
sociedade.
Pensar a identidade implica resgatar as atividades e o processo de conscincia do
indivduo. Implica nas mudanas processadas em sua histria pessoal e em suas elaes.
A identidade um processar contnuo da definio de si mesmo, das representaes este
e de seu estar no mundo. portanto, movimento e dialtica.
Nesta perspectiva, constatamos as origens desta categoria a partir de fins dos
anos setenta e incio dos anos oitenta, um momento de profundas reflexes tericas e
metodolgicas, denominado crise da psicologia social. Questionando-se a prxis dos
conhecimentos produzidos pela psicologia, diante da conjuntura scio-histrica e
poltica do Brasil e da Amrica Latina, agregado s influncias de estudos de Marx, dos
vrios marxistas e outros liberais, as produes da psicologia social apontam uma
significativa alterao epistemolgica tendo em vista a construo de uma psicologia
crtica.
Contemplando avanos tericos e prticos na rea da psicologia social, a
Identidade tem seus estudos preliminares realizados atravs do Programa de Estudos
Ps-Graduados em Psicologia Social da Pontifcia Universidade Catlica de So Paulo,
particularmente na dissertao de mestrado do Prof. Antonio da Costa Ciampa, em
1977, quando pesquisa sobre o tema A Identidade Social e suas relaes com a
ideologia.
Posteriormente na tese de doutoramento do Prof. Antonio da Costa Ciampa,
intitulada A Estria do Severino e A Histria da Severina - Um Ensaio de Psicologia
Social (1993), a categoria Identidade discutida a partir das influncias do
materialismo histrico de Hegel, Marx e Habermas, mostrando a sua complexidade. Ao
lado das categorias Atividade e Conscincia, a categoria Identidade firma-se como eixo
central de estudos e pesquisas da Psicologia Social brasileira. A identidade
considerada como um processo, ao qual o autor d o nome de metamorfose, que
descreve a constituio de uma identidade, que representa a pessoa e a engendra
(Ciampa, 1993, p.143)
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Identidade: alguns aspectos epistemolgicos Ao introduzir o conceito de Identidade, enquanto questo terica do ponto de
vista da Psicologia Social, afirma Ciampa (1993, p.127): Cada indivduo encarna as
relaes sociais, configurando uma identidade pessoal. Uma histria de vida. Um
projeto de vida. Uma vida-que-nem-sempre--vivida, no emaranhado das relaes
sociais. Uma identidade concretiza uma poltica, d corpo a uma ideologia. No seu
conjunto, as identidades constituem a sociedade, ao mesmo tempo em que so
constitudas, cada uma por ela. A questo da identidade, assim deve ser vista no como
questo apenas cientfica, nem meramente acadmica: sobretudo uma questo social,
uma questo poltica.
Para compreender a Identidade precisamos resgatar e desvelar algumas
referncias tericas e metodolgicas que embasam a construo deste conceito e que de
certa maneira deve nos facilitar a compreenso de sua abrangncia e complexidade.
Para fins de anlise exploro a seguir algums fragmentos da terceira parte da tese
de Doutorado do Prof. Ciampa (1993, p.121-244), denominada Livro III - Identidade -
Que trata da Identidade como questo terica, sob ponto de vista da Psicologia Social.
Desde o incio, devemos advertir quanto s limitaes e impossibilidades de elencar
todas as fontes de influncias que permearam a construo desta categoria. Por tratar-se
de uma leitura epistemolgica sobre identidade e metamorfose humana, ousamos
identificar e mapear algumas das principais influncias, cientes dos avanos tericos nas
pesquisas sobre Identidade nestes ltimos anos.
O ponto de partida para a compreenso da categoria Identidade o contexto
scio-histrico da prpria Psicologia Social. Da crise dos anos setenta, emerge a
necessidade de buscarmos novos referenciais tericos e metodolgicos que superassem
as contradies existentes, procurando avanos sistemticos e articulao entre teoria e
prtica.
A Identidade passa a ser concebida atravs de uma dialtica morte-evida,
que possibilita desvelar seu carter de metamorfose.
Em outro contexto Lane (1992, p.15-6) j advertia: dentro do materialismo
histrico e da lgica dialtica que vamos encontrar os pressupostos epistemolgicos
para a reconstruo de um conhecimento que atenha realidade social e ao cotidiano de
cada indivduo e que permita uma interveno efetiva na rede de relaes sociais que
define o indivduo.
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Ciampa (1993, p.147-151), por sua vez, declara a importncia do materialismo
histrico, refletindo as ambigidades e diversidades dos pontos de vista dos marxistas,
recorrendo Habermas (1983) para repensar esta corrente.
Em sntese, a trajetria proposta por Ciampa consiste em ver a progressiva
formao da Identidade partindo do nome (do sujeito), j que este nome o representa.
Implica portanto na predicao e personagens (conceito este extrado da metfora
teatral) estabelecendo elementos de igualdade e diferenciao que se articulam.
Tais personagens so fetichizados, modificam-se, apresentando-se como
misteriosos e fantasmagricos, objetivando-se situaes onde quase impossvel o
indivduo atingir condies de ser-para-si, ocultando a natureza da identidade
enquanto metamorfose. O ponto de partida a identidade pressuposta que d o ser
posto, que reposto.
A realidade sempre movimento e transformao. Recorre filosofia de Hegel
(1980) para quem conceito indivisivelmente o do pensamento e do ser para
estabelecer relaes entre Conceito, pensamento e ser. Sua unidade: o sujeito e
Identidade, conscincia e Identidade, refletindo a dificuldade do indivduo em atingir
a condio de ser-para-si, buscando a autodeterminao e portanto, a aproximao do
que chama identidade metamorfose, como a Aunidade da atividade, da conscincia e
da identidade (Ciampa, 1992, p.146); para esclarecer que no se trata de uma
tautologia. Recorre tambm Heidegger (1979) para quem o ser determinado a partir
de uma Identidade, como trao dessa identidade.
Resgata os conceitos de formao material - ao estudar um ser humano, deve
ficar claro que se est sempre estudando uma formao material determinada, qualquer
que seja o corte feito na universalidade das relaes recprocas em que se est inserido -
o que autoriza, sem ilogicidade, por exemplo, falar tanto em identidade pessoal com em
identidade(s) coletiva(s) no mbito das cincias humanas - e possibilidade, enquanto
categoria filosfica, opondo possibilidade realizada realidade potencial, para
introduzir o conceito de no-metamorfose.
A no-metamorfose compreendida como a manuteno da mesmice, ou seja, a
aparncia da no-mudana. Esto presentes nas marcas das condies scio-econmicas
desumanas, onde as pessoas so privadas ou impedidas de transformar-se, so foradas
a se reproduzir como rplicas de si, involuntariamente, a fim de preservar interesses
estabelecidos, situaes convenientes, interesses e convenincias que so, se
radicalmente analisadas, interesses e convenincias do capital (e no do ser humano que
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assim permanece um ator preso mesmice imposta (Ciampa, 1993:165); ou mesmo
naqueles em condies scio-econmicas favorveis, cuja mesmice insuportvel em si
mesmo e/ou no outro e caminham para autodestruio.
Esta aparente inalterabilidade, resulta de um esforo para a conservao de uma
condio prvia de um ser-posto, onde a reposio da identidade deixa de ser vista
como uma sucesso temporal, passando a ser vista como simples manifestao de um
ser sempre idntico a si mesmo na sua permanncia e estabilidade.
A estrutura social e o momento histrico so importantes para pensarmos os
padres de identidade: atravs da articulao de igualdades (equivalncias de fato) e
diferenas, cada posio minha me determina, fazendo com que minha existncia
concreta seja a unidade da multiplicidade, que se realiza pelo desenvolvimento dessas
determinaes. Em cada momento de minha existncia, embora eu seja uma totalidade,
manifesta-se uma parte de mim como desdobramento das mltiplas determinaes a que
estou sujeito (Ciampa, 1993, p.170).
A identidade hoje
Hoje, a categoria identidade, configura uma Linha de Pesquisa junto ao Conselho
Nacional de Pesquisa denominada Identidade Social e Metamorfose Humana, com os
seguintes objetivos:
1. Desenvolver fundamentos conceituais, metodolgicos e histricos para elaborar uma
proposta terica a respeito da identidade humana como metamorfose;
2. Analisar as condies e possibilidades de desumanizao no mundo contemporneo,
discutindo-as de forma prospectiva e considerando aspectos tanto emancipatrios
quanto regulatrios;
3. Estudar personagens sociais que, num contexto social e histrico, constituem-se
como referenciais identificatrios, analisando processos de construo e mudana de
identidades sociais caracterizadas como definidoras de - e definidas por - categorias
sociais;
4. Examinar produes simblicas (cosmogonias, universos simblicos, ideologias,
discursos, narrativas, etc) que se expressam como polticas de identidade, apresentadas
normativamente como discursos cientficos, ticos, estticos, jurdicos, teolgicos,
tcnicos, etc.
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Considerando as anlises das situaes concretas, bem com as especificidades
tericas e metodolgicas, vamos encontrar no contexto da Psicologia Social brasileira
ampla produo interdisciplinar, sendo a identidade individual/coletiva, eixo
estruturante de investigaes e intervenes sobre questes contemporneas de gnero,
trabalho, educao, sade, religiosidade, dentre outros.
guisa de uma concluso gostaria de finalizar, destacando que partilhamos da
premissa (Ciampa, 1997) que a questo central da Psicologia (ou pelo menos da
psicologia social que prope estudar a pessoa humana) compreender as
metamorfoses humanas. Nosso esforo tem sido buscar elementos tericos e
metodolgicos para compreender e promover, eticamente, a metamorfose humana.
Emancipao, autonomia e respeito diferena so princpios fundamentais deste
processo. Um exerccio que no se esgota, mas propicia o dilogo. Esses so aspectos
que nos tem proporcionado fecundas reflexes. Afinal, um dos papis fundamentais do
pesquisador social diante da realidade brasileira contempornea justamente desvelar
identidades individuais e coletivas, de modo dialgico e crtico. Um desafio contnuo,
instigante e apaixonante!
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_______. Homens em metamorfose. A identidade masculina na contemporaneidade. Taubat: Vogal, 1998.
Resumo:
O presente artigo prope refletir especificidades da categoria identidade-metamorfose, apresentando alguns de seus pressupostos espistemolgicos, tericos e metodolgicos. O que apresento remete concepo de identidade desenvolvida pelo Prof. Dr. Antonio da Costa Ciampa e que utilizei no decurso de minha capacitao junto ao Ncleo de Pesquisa sobre Identidade, do Programa de Estudos Ps-Graduados em Psicologia Social, da PUC/SP, bem como em minha prtica de professor-pesquisador social na Psicologia/Gesto de Pessoas. Nesta perspectiva discorro sobre a temtica Identidade explorando suas configuraes num importante campo de estudos e intervenes psicossociais, cuja finalidade compreender a interaes e as transformaes indivduo-sociedade.
Palavras-chave:
Identidade-Metamorfose; Psicologia Social; Gesto de Pessoas.
REVISTA UNIARA, n.16, 2005 115 116 O estudo da identidade no mbito...