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DIVERSIDADE CULTURAL: PANORAMA ATUAL E REFLEXES PARA A REALIDADE BRASILEIRA Darcy Mitiko Mori Hanashiro 1 Av. Consolao, 896 - 7 andar - Sala 76 CEP: 01302-907 So Paulo/SP Brasil Fone: 11 3236-8597 E- mail: [email protected] Sueli Galego de Carvalho 1 Rua Baronesa de Itu, 598 Apto 62 CEP: 01231-000 So Paulo/SP Brasil Fone: 11 3826-4991 3236-8143 E- mail: [email protected]

Universidade Presbiteriana Mackenzie Faculdade de Cincias Econmicas Contbeis e Administrativas CEP: 01231-000 So Paulo/SP Brasil Resumo No Brasil escassa a produo acadmica na rea de diversidade cultural. A fim de ampliar o conhecimento sobre o tema no contexto brasileiro, este artigo objetiva discutir o conceito de diversidade e de gesto da diversidade cultural encontrados na literatura estrangeira e uma reflexo do uso desses conceitos na realidade brasileira. O levantamento bibliogrfico foi a principal fonte de coleta de dados. Tendo em vista identificar as iniciativas em diversidade cultural desenvolvidas pelas organizaes, foram consultados peridicos cientficos internacionais publicados no perodo de 1998 a 2003. A anlise realizada reflete, preponderantemente, o contexto estadunidense, onde as Aes Afirmativas e a Oportunidade Igual de Emprego contriburam de forma efetiva na incluso de grupos culturais de minorias nas organizaes. Os resultados da pesquisa indicam que a complexidade, as ambigidades e as contradies pertinentes ao tema diversidade cultural e sua face multidimensional implicam em uma apropriao contextualizada da temtica, considerando as razes da cultura brasileira para entender luz da nossa realidade o sentido de diverso. A partir desse conhecimento, acredita-se na possibilidade de pensar a gesto da diversidade cultural como importante fator para a competitividade das empresas brasileiras.

Palavras-chave: diversidade cultural, gesto da diversidade, identidade cultural

REAd Edio 47 Vol. 11 No. 5, set-out 2005

Diversidade Cultural: Panorama Atual e Reflexes para a Realidade Brasileira

DIVERSIDADE CULTURAL: PANORAMA ATUAL E REFLEXES PARA A REALIDADE BRASILEIRA

Introduo

A globalizao econmica expandiu as fronteiras de negcio. A competitividade mais acentuada forou as empresas a buscarem novos mercados, implicando na necessidade de ofertar produtos que satisfaam as expectativas e gostos de pessoas diferentes do mercado regional e local. Alm disso, o desenvolvimento tecnolgico contribuiu efetivamente para quebrar as fronteiras organizacionais. A facilidade de comunicao em tempo real gerou avanos sem precedentes para o emprego de pessoas em qualquer parte do mundo para realizar um processo de trabalho 24 horas em cadeias contnuas. As organizaes do futuro, mais que as atuais, iro operar em um ambiente de negcio incerto, complexo e altamente competitivo. As organizaes cada vez mais trabalharo com equipes heterogneas em termos de raa, etnia, gnero e outros grupos culturalmente diversos (THOMAS JR.,2000). A sociedade, de uma forma geral, vem sofrendo mudanas. Mais que a metade da fora de trabalho americana j no incio da dcada de 90, constitua-se de minorias, imigrantes e mulheres, de forma que o homem branco, nativo, embora indubitavelmente ainda dominante, estatisticamente minoria (THOMAS Jr., 1990). H um discurso da diversidade enaltecendo os benefcios de grupos de trabalho mais heterogneos, principalmente para conquistar segmentos especficos de consumidores. Ng e Tung j apontavam em 1998 que o maior desafio para empresas estadunidenses e canadenses seria enfrentar a diversidade da fora de trabalho, exigindo uma competncia diferenciada dos gestores pertencentes s empresas mais heterogneas. No entanto, a diversidade constitui tambm um paradoxo para a realidade dessas empresas, na medida em que grupos formados por pessoas com diferentes dimenses de diversidade esto mais propensos em gerar conflitos intergrupais. Alm disso, a diversidade percebida de forma relativa e diferentemente entre os indivduos, em funo de diferentes fatores e seus efeitos tambm so diferenciados para os indivduos (MILLIKEN e MARTINS, 1996). Desafios e paradoxos fazem da diversidade um tema complexo, por vezes polmico, tratado de forma incipiente na literatura brasileira. Compreender e dar respostas a esses desafios implica na necessidade de adotar uma abordagem multidisciplinar, buscando a raiz fenmeno no campo da psicologia social, da sociologia e da antropologia. Assim, levantar a REAd Edio 47 Vol. 11 No. 5, set-out 2005 2

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bandeira da diversidade no significa assimilar conceitos consagrados em outras realidades; mas, pensar criticamente um prprio conceito, dentro das idiossincrasias de cada pas e das organizaes que percebem essa necessidade. O Brasil possui uma formao cultural diferente de pases da Amrica do Norte, fato a ser considerado nos estudos organizacionais. Em particular, a textura sociocultural da realidade brasileira complexa e multifacetada, influenciando as organizaes e a forma como so geridas (CALDAS e WOOD Jr., 1999). Portanto, os modelos estrangeiros nem sempre demonstram a mesma funcionalidade na realidade brasileira. A literatura no campo da diversidade predominantemente estadunidense e, em menor escala, canadense. Em ambos os pases a origem dos estudos de diversidade advm de dispositivos compulsrios (determinados pelo governo), em face da necessidade de lidar com fortes questes raciais e presses crescentes de grupos tnicos e de minorias. Esses estudos criaram uma base do que se convencionou chamar na literatura e nas empresas de Diversidade Cultural e Gesto da Diversidade Cultural. O carter multifacetado do assunto, vai alm da necessidade de se praticar um antropofagismo, o que equivale dizer uma adaptao criativa (CALDAS e WOOD Jr., 1999). Na verdade, requer uma compreenso do conceito para as empresas brasileiras, o que sugere conhecer, previamente, as prticas recorrentes recenseadas na literatura dominante. Assim, o objetivo central deste ensaio discutir o conceito de diversidade e gesto da diversidade cultural a fim de fazer uma reflexo dos mesmos para a realidade organizacional brasileira. Como objetivos especficos pretendeu-se levantar algumas prticas de diversidade cultural mencionadas na literatura internacional e brasileira e, ainda, indicar alguns caminhos para a pesquisa de Diversidade Cultural no Brasil. Esse ensaio procurou mostrar um panorama sobre o aspecto conceitual e o tratamento dado diversidade cultural pelas organizaes. Aponta-se como limitao a literatura consultada, que foi majoritariamente estadunidense, a mais disponvel nas bases de dados. No se pretende continuar os estudos somente com esse referencial. Existem revistas e centros de estudos de diferentes pases que esto sendo consultados. Alm disso, uma pesquisa de campo para complementar os resultados baseados em fo ntes essencialmente secundrias so imprescindveis para uma compreenso mais profunda do fenmeno. Ficou claro que a natureza do estudo requer uma viso multidisciplinar do assunto e contextualizada s especificidades da cultura brasileira.

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Referencial Terico

Diversidade Cultural: em busca de um conceito O tema diversidade cultural incorpora uma amplitude conceitual extensa, merecendo a crtica de Nkomo e Cox Jr. (1998, p.334) que apontam a falta de especificidade de conceito como um dos principais dilemas tericos nos estudos de diversidade, este, portanto, deficiente quanto a sua construo cientfica. Gilbert et al. (1999) tambm corroboram a carncia de cientificidade no assunto, afirmando que infelizmente muito da literatura pr-diversidade forte em retrica e fraca em resultados empricos. Essa falta de dados empricos tem tornado difcil aos administradores julgar se a ateno diversidade traz uma real vantagem competitiva. As definies atuais apresentam um escopo extremamente variado. Os conceitos variam de amplitude: de definies restritas, que enfatizam apenas raa, etnia e gnero, at s extremamente amplas que se referem a todas diferenas entre as pessoas, isto , todos indivduos so diferentes. Dotado de tradio na rea, Cox Jr. (1993, p. 5-6) aborda a diversidade cultural como a representao, em um sistema social, de pessoas com afiliaes a grupos claramente diferentes em termos de significado cultural. A questo da diversidade em um contexto de sistema social caracterizada por um grupo majoritrio e por grupos minoritrios, isto , aqueles grupos com menor representatividade no sistema social, comparados ao grupo majoritrio. Este grupo tambm corresponde queles membros que tm historicamente mais poder e recursos econ micos, quando comparados aos membros dos grupos minoritrios. Uma definio mais ampla apresentada por Thomas Jr. (1991, p.10) para o qual o conceito de diversidade inclui todos, no algo que seja definido apenas por raa ou gnero. um conceito que engloba a idade, histria pessoal e corporativa, formao educacional, funo e personalidade. Inclui, tambm, estilo de vida, preferncia sexual, origem geogrfica, tempo de servio na organizao, status de privilgio ou de no-privilgio e administrao e no-administrao. Loden e Rosener (1991) estabelecem distines entre dimenses primrias, que consistem em diferenas humanas imutveis: idade, etnia, gnero, raa, orientao sexual e habilidades fsicas; e diferenas secundrias mutveis: como formao educacional, localizao geogrfica e experincia de trabalho. Nkomo e Cox Jr. (1998) compreendem que para se ter clareza na linguagem e no significado de diversidade, h necessidade de estruturar o prprio conceito, pois o termo apresenta-se incomple to: diversidade em qu? Para os autores, apesar de haver uma confuso REAd Edio 47 Vol. 11 No. 5, set-out 2005 4

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sobre o que constitui o conceito de diversidade, parece haver uma compreenso comum no mundo acadmico de que se est falando de diversidade de identidade. Por esta tica os autores definem diversidade como um misto de pessoas com identidades grupais diferentes dentro do mesmo sistema social(p.337) . Esta definio est centrada no conceito de identidade social. As perspectivas intergrupais tm sido uma das principais estruturas para o entendimento das interaes humanas, envolvendo indivduos que percebem a si mesmos como membros de uma categoria social ou sendo percebidos por outros como pertencentes a uma categoria social (SCHNEIDER e NORTHCRAFT, 1999). Alguns trabalhos sobre identificao social foram feitos no campo da psicologia social (MARQUART, 1955; TAJFEL, 1972; BILLIG e TAJFEL, 1973) e discutem que os indivduos tendem a classificar a si prprios e aos outros em categorias sociais, e que essas classificaes tm efeito significativo sobre as interaes humanas. Alderfer e Smith (1982) desenvolveram uma teoria das relaes intergrupais, especificamente para as organizaes. Esta teoria postula dois tipos de grupos existentes no interior das organizaes: grupos de identidade e grupos organizacionais. Grupos de identidade so aqueles cujos membros compartilham alguma caracterstica biolgica comum, como gnero, que participaram de experincias de vida semelhantes, esto, atualmente, sujeitos a foras sociais similares e, como resultado, tm vises consoantes de mundo. Assim, os grupos de identidade mais comumente reconhecidos so os baseados em gnero, famlia, etnia e idade. Um grupo organizacional aquele em que os membros participam de cargos organizacionais comuns, compartilham de experincias de trabalhos equivalentes e, como conseqncia, tm vises de mundo harmnicas (ALDERFER e SMITH, 1982). A teoria de relaes intergrupais reconhece que os indivduos no abandonam suas identidades raciais, sexuais ou tnicas quando entram em uma organizao. Mas, a identidade das pessoas nas organizaes formada pela filiao ao grupo de identidade e ao grupo organizacional. Por essa tica terica as organizaes tentam administrar os conflitos potenciais que surgem da interao entre os grupos de identidade e grupos organizacionais. As organizaes estadunidenses esto se tornando crescentemente diversas em termos de gnero, raa, etnia e nacionalidade. Cox (1991) aponta que isso traz potenciais benefcios para as organizaes, em termos de melhor tomada de deciso, maior criatividade e inovao e um melhor atendimento mercadolgico de diferentes tipos de consumidores. Por outro lado, o autor aponta que existe tambm um custo potencial associado a uma fora de trabalho mais diversificada como a elevao de rotatividade, conflitos interpessoais e problemas de

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comunicao. Cox Jr. (1991) afirma que para capitalizar esses benefcios e minimizar os potenciais custos, os lderes necessitam encaminhar processos de mudana para tornar suas organizaes mais multiculturais. Isso indica que para atingir esse tipo ideal de organizao, existe um matiz multicultural a ser compreendido. Cox Jr. (1991), baseado em Milton Gordon, elaborou um modelo para caracterizar as organizaes em termos de estgios de desenvolvimento em diversidade cultural. Este modelo constitui-se de: 1. aculturao: modo pelos quais dois grupos se adaptam e resolvem diferenas culturais; 2. integrao estrutural: perfil cultural dos membros da organizao; 3. integrao informal: incluso dos membros da cultura minoritria em redes informais; 4. vis cultural: preconceito e discriminao; 5. identificao organizacional: sentimento de pertencer, lealdade e comprometimento organizao; 6. conflito intergrupal: atritos, tenses e lutas de poder entre grupos culturais diversificados.

A forma como as organizaes lidam com esses seis fatores, permite classific-las em trs tipos puros. As organizaes monolticas so altamente homogneas e poucas aes so efetivadas para integrar grupos de minorias no grupo majoritrio. J as pluralistas so mais heterogneas que as monolticas e adotam aes para integrar pessoas de diferentes grupos culturais que diferem do grupo dominante. Elas enfatizam as Aes Afirmativas e representam uma tpica empresa americana de grande porte da dcada de 90. Finalmente, as organizaes multiculturais no apenas possuem diversidade, mas as valorizam; apresentam total integrao estrutural, ampla integrao de redes informais, tendncia ausncia de preconceitos e discriminaes, mnima lacuna na identificao organizacional baseada na identidade cultural dos grupos e baixo nvel de conflito intergrupal.

Abordagens tradicionais: o caminho percorrido pela diversidade De acordo com Thomas Jr. (1999) pode-se descrever a seqncia de tratamentos histricos da diversidade como: 1) Negao; 2) Ao Afirmativa/Assimilao e 3) Compreenso das Diferenas. Negao

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A motivao para a prtica da negao tem sido legal (compulsria por lei governamental), moral ou responsabilidade social (a boa cidadania empresarial assim o determina). Sem levar em conta a motivao, o maior benefcio desta postura que as pessoas diferentes tm conseguido entrar nas organizaes na esperana de que no seriam prejulgadas. A qualidade das relaes interpessoais seria incentivada, o racismo, o sexismo e outras discriminaes abertas seriam desestimulados. Por outro lado, esta abordagem apresenta uma sria limitao. Ela exige que as pessoas diferentes aceitem ver negadas suas diferenas. Uma limitao adicional a hiptese de que a principal fonte de discriminao se situe nas relaes pessoais. Essa premissa ignora as capacidades discriminatrias, intencionais e no- intencionais embutidas nos sistemas e culturas organizacionais. Organizaes que adotam essa abordagem procuram mostrar que negros, mulheres e pessoas pertencentes a diferentes grupos tnicos so tratados todos iguais, ignorando suas identidades culturais. Significa que ser diferente como ter algum defeito ou desvantagem, por isso todos so tratados da mesma forma. Ao Afirmativa / Assimilao A Ao afirmativa (AA) e a Assimilao estiveram no centro da abordagem empresarial quanto diversidade dos empregados nos EUA (THOMAS Jr., 1991). A Ao Afirmativa permitiu criar uma fora de trabalho diversificada em termos de raa e gnero. Procurou-se, principalmente, uma mistura racial em que os novos empregados pudessem abandonar suas diferenas e serem moldados de acordo com as normas de comportamento organizacional existentes. A assimilao por meio da mistura racial se destinaria a assegurar a minimizao das diferenas e a conformidade de comportamentos. O resultado foi a diversidade assimilada, que de fato uma aparncia superficial de diversidade. Acreditava-se que esta abordagem seria o meio de criar uma fora de trabalho diversificada e facilitaria a mobilidade ascendente de minorias (negros, homossexuais, etc.) e mulheres. Um dos principais benefcios dessa alternativa foi a maior incluso destes grupos em grandes empresas. Mas esse progresso foi ilusrio e difcil de sustentar, apesar dos fortes motivos legais, morais e de responsabilidade social (THOMAS Jr., 1999). Compreenso das Diferenas (CD) O objetivo desta abordagem promover a conscincia, a aceitao e a compreenso de diferenas entre indivduos, com a expectativa de que os resultados sejam melhores relaes

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pessoais, maior apreo e respeito pelos outros, maior aceitao das diferenas e minimizao de manifestaes ostensivas de racismo, sexismo e outros preconceitos. E, de fato, muitos desses resultados se materializam com freqncia (THOMAS Jr., 1999). Thomas (op. cit.) discute que embora os resultados mostrem uma maior harmonia, no se pode deixar de se analisar as limitaes da CD. A mais crtica que a CD deixa intocados os sistemas e a cultura da organizao. O gestor, portanto, pode aceitar e entender as diferenas, no apresentar preconceitos em relao raa e opo sexual de seus funcionrios, ter excelentes relaes interpessoais, e ainda assim, no saber como gerenciar a diversidade isso implica em no saber como criar um conjunto de sistemas e uma cultura que capacitem naturalmente todos os empregados a conviverem cotidianamente com a diversidade cultural em seus locais de trabalho.

O que as organizaes entendem por Diversidade e Gesto da Diversidade? As Aes Afirmativas promoveram, sem dvida, uma diversidade no interior das organizaes americanas, funcionando como um passaporte para a incluso de determinados grupos minoritrios. No entanto, para maximizar o potencial dos grupos de identidade social diversa nas organizaes requerida a gesto de diversidade (THOMAS JR, 1991) Gerenciar a diversidade cultural um dos tpicos mais difceis para se tratar, pois envolve questes tanto de emoes quanto de negcios (OMARA, 1994). adequado distinguir-se entre o que existe nos Estados Unidos a respeito da diversidade - as Aes Afirmativas (AA) e Oportunidade Igual de Emprego (EEO) - e as prticas efetivas da Diversidade Cultural. Esses conceitos no so claramente equivalentes. As AA e EEO so programas de iniciativa legais (do governo) e baseados na obrigatoriedade de aplicao. Enquanto a gesto da diversidade so programas voluntrios e pr-ativos empreendidos para valorizar diferenas das pessoas e usar essas diferenas visando a obteno de uma vantagem competitiva (OMARA, 1994, p.105). Essa exigncia advm de uma sociedade mais demandante em defesa de seus direitos e orgulho de suas diferenas e, tambm, das estratgias de negcios que buscam cada vez mais um crescimento por meio de fuses e aquisies, transferindo para dentro das fronteiras organizacionais diferentes realidades e identidades. Isso implica em uma competncia especfica para atuar em contextos multiculturais, reconhecendo, valorizando e gerenciando a diversidade. Em um estudo realizado por Hayles e Russell (1997, p.11-13) os autores apresentam algumas definies de diversidade cultural adotadas por organizaes que possuem slidos programas de diversidade: REAd Edio 47 Vol. 11 No. 5, set-out 2005 8

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Diversidade respeitar nossas diferenas. maximizando nossos potenciais individuais e valorizar nossos singulares, enquanto sinergizamos nossas experincias e talentos coletivos para o crescimento da 3M. (3M) Diversidade a crena, filosofia e reconhecimento de que cada indivduo nico e valioso, mediando-se os conflitos com normas estabelecidas. (Honeywell) Diversidade incluso, respeito pelo indivduo [...], valorizando e capitalizando as diferenas para o benefcio do negcio, clientes, comunidade e funcionrios. (Northern States Power Co) Diversidade se refere a todos os modos pelos quais as pessoas diferem e o efeito dessas diferenas sobre o nosso pensamento e comportamento. (Monsanto Agricultural Group) Administrar diversidade significa promover um ambiente onde todos empregados possam contribuir com o mximo de seus potenciais para alcanar nossos objetivos do negcio. (The St. Paul Companies) Diversidade no local de trabalho abrange todas as diferenas que definem cada um de ns como indivduos nicos. Diferenas tais como cultura, etnia, raa, gnero, nacionalidade, idade, religio, incapacidade, orientao sexual, educao, experincias, opinies e crenas [...]. Compreendendo e valorizando estas diferenas, ns podemos capitaliz-las como benefcios que a diversidade traz para a Companhia. (Ford Motor Co) Para empreender uma fora de trabalho diversa, a Medtronic deve reconhecer, aceitar e respeitar as diferenas individuais e estar atento para o modo como essas diferenas afetam o trabalho dos empregados e interagem uns com os outros. Cada pessoa influenciada por caractersticas tais como idade, gnero, nacionalidade, habilidades fsicas, raa, orientao sexual, cultura, valores, atitudes e estilos comportamentais os quais fazem dele ou dela indivduos nicos e diferentes uns dos outros. (Medtronic, Inc ) Diversidade tem um significado interno, externo e global. Ela abarca as diferenas individuais e grupais, movendo-se alm de raa e gnero para a ampliao da definio e abrangendo a incluso de empregados, contratantes, abastecedores e clientes. A diversidade promove uma performance superior. (U.S. Department of Energy)

possvel se observar que o conceito de diversidade traz em seu cerne a valorizao do diverso e as suas implicaes para o negcio. As empresas desenvolvem internamente suas prprias definies, polticas e prticas de diversidade, adequando-as s suas respectivas condies e necessidades corporativas.

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Abordagens contemporneas sobre diversidade Vrias abordagens sobre diversidade esto em prtica atualmente nas organizaes. Diferem em amplitude e profundidade. OMara (1994) categorizou em: organizaes que utilizam uma abordagem estrutural e sistmica; organizaes que concentram esforos na promoo de treinamento de conscientizao; organizaes que focalizam reas especficas de problemas, tais como assdio sexual, cuidados especiais com crianas, etc. Qualquer que seja a abordagem adotada, Morrison (1996) declara que ela deve contemplar o envolvimento dos empregados e estar baseada nas necessidades especficas da organizao e de seu mercado de negcios. Ou seja, a diversidade cultural est longe de ser um modismo, mas uma necessidade para a organizao se manter competitiva. Complementando a abordagem de Thomas (1999) abordagens sobre diversidade distinguem-se em trs nveis progressivos, a compreenso, a valorizao e a gesto da diversidade (OMARA, 1994). Gerenciar a diversidade cultural significa planejar e executar sistemas e prticas organizacionais de gesto de pessoas de modo a maximizar as vantagens potenciais da diversidade e minimizar as suas desvantagens Cox Jr. (1993), adicionando valor organizao (FLEURY, 2000). Watson et al. apud Nkomo e Cox Jr. (1998) comparam as abordagens tradicionais com a Gesto da Diversidade (GD): A Ao Afirmativa pressupe assimilao, adaptao da pessoa que diferente ou que no se adapta. A GD pressupe que o gerente e todos os membros da organizao estaro dispostos a engajarem-se em um processo de adaptao mtua para criar uma relao produtiva entre os indivduos com conseqente resultado positivo para a organizao. A AA est focada no recrutamento, na mobilidade ascendente e na reteno, enquanto a GD trata da questo de obter benefcios a partir das diferenas entre os indivduos da organizao. A hiptese que na medida em que o potencial de uma pessoa seja canalizado de forma produtiva para o resultado do negcio, o gerente ter que se preocupar menos com mobilidade ascendente e reteno. Dada sua fundamentao no motivo legal, a AA exige que os resultados desejados sejam atingidos com a maior rapidez possvel. A GD, por outro lado, destaca que os resultados desejados devem ser alcanados de forma mais natural possvel.

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A AA destaca o fazer algo por aqueles que esto em desvantagem. A GD busca fazer algo pelo gerente que precisa melhorar sua habilidade em capacitar uma fora de trabalho cada vez mais diversa. A GD destaca o motivo de negcios (viabilidade) acima dos motivos legal, moral e social. Dada a magnitude das mudanas nas formas de fazer negcio associadas GD, essas motivaes tradicionais no so suficientes. A apresentao da perspectiva de ganhos com a GD um grande desafio porque a maioria dos gerentes no considera as tradicionais dimenses da diversidade de raa e de gnero como questes de negcios. OMara (1994) declara que muitas organizaes realizam a diversidade no porque a coisa certa a fazer como uma organizao cidad, mas porque faz sentido para os negcios. Existem quatro razes empresariais para gerenciar a diversidade cultural: 1) adicionar vantagem competitiva em recrutamento e reteno; 2) melhoria na produtividade, qualidade, times de trabalho, criatividade e satisfao no trabalho; 3) melhoria no servio ao consumidor e marketing; 4) reduo da discriminao e assdio sexual. O interesse pelo tema diversidade cultural no se deve apenas a uma questo ideolgica e igualitria, mas a uma vantagem estratgica para as organizaes. Atribuir vantagem competitiva gesto da diversidade cultural um aspecto comum na literatura e argumento forte no discurso gerencial, embora exista uma carncia de pesquisas empricas que efetivamente sustentem tal relao. Cox Jr. (1993) menciona os seguintes benefcios da gesto da diversidade: atrair e reter os melhores talentos; desenvolver os esforos de marketing, visando atender diferentes segmentos de mercado; promover a criatividade e a inovao; facilitar a resoluo de problemas; e, finalmente, desenvolver a flexibilidade organizacional.

Iniciando uma discusso sobre diversidade cultural no Brasil No Brasil a diversidade uma questo existente desde a poca de seu descobrimento, em 1500, at os dias atuais. Naquela poca, j habitavam no pas os povos indgenas que pertenciam a um grupo com significados culturais prprios. Vieram os colonizadores portugueses. Foram trazidos os negros da frica. No sculo XIX vieram os imigrantes da Europa e principalmente do Japo. O casamento entre raas diferentes provocou a grande miscigenao da populao atual (SILVA, 2000). As medidas governamentais brasileiras para combate da discriminao no emprego so recentes, se comparadas s da Amrica do Norte: nos Estados Unidos, a Affirmative

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Action foi promulgada no final da dcada de 60, e no Canad O Employment Equity Act na dcada de 70. A heterogeneidade presente na formao (tnica, cultural e social) da populao brasileira traz conseqncia direta na gesto das empresas brasileiras. plausvel de se pensar que esse impacto tende a ser maior pelos desafios impostos por uma fora de trabalho que est se tornando ainda mais diversificada e que os negcios, em escala global, fazem real um mundo do trabalho formado por uma miscigenao de diferentes culturas nacionais. Entender as diferenas culturais passa a ser uma questo central para a sustentabilidade dos negcios. No se tem notcia de estudos realizados no Brasil demonstrando resultados estratgicos da diversidade cultural. H que se considerar que uma diversidade maior pode criar problemas potenciais em termos de conflitos interpessoais, rotatividade de mo-de-obra, comunicao menos fluida (COX Jr., 1994). Isso significa que lidar com a diversidade requer uma gesto, a fim de agregar valor econmico organizao e s pessoas.

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Mtodo

Esta pesquisa, de natureza exploratria, elegeu como principal fonte de coleta de dados o levantamento bibliogrfico. Tendo em vista identificar as iniciativas em diversidade cultural desenvolvidas pelas organizaes, foram consultados artigos de peridicos cientficos provenientes de base de dados internacionais (Proquest e Ebsco). O perodo considerado para tal pesquisa foi de 1988 a 2003. Foram selecionados e analisados 55 artigos que abordavam a questo da diversidade cultural na perspectiva conceitual, emprica, de sua gesto e nos aspectos legais. Desses artigos, 45 (81,8%) foram publicados em peridicos estadunidense , 7 (12,7%) em peridicos canadenses e apenas 3 (5,5%) em peridicos europeus. Esta proporo espelha a hegemonia americana na literatura de diversidade cultural Apenas dois artigos de revistas cientficas brasileiras, voltados especificamente ao tema, foram analisados. Consideraram-se, tambm, matrias especficas sobre diversidade editadas na Revista Exame, Revista Veja, Jornal Valor Econmico e Jornal Gazeta Mercantil, a fim de conhecer melhor a importncia e o contedo manifesto em mdias voltadas para o pblico empresarial. Mesmo reconhecendo a procedncia gerencial dessas revistas, optou-se por consider- las, pois elas refletem o termmetro dos assuntos mais recorrentes do mundo empresarial. De certa forma, expressam como os gestores compreendem certos fenmenos organizacionais. Foram realizadas duas entrevistas, mediante um roteiro, com profissionais de RH de empresas reconhecidas pela mdia por suas atuaes com as questes da diversidade. Cabe ressaltar que essas entrevistas proporcionaram resultados limitados, muito aqum do esperado. Atribui-se, esse fato, ao desconforto dos profissionais em falar sobre polticas ainda incipientes em suas empresas. Em suma, analisou-se cada um dos artigos e todas as iniciativas de diversidade praticadas por organizaes mencionadas pelos autores desses artigos foram consideradas para efeito do levantamento. Esse material foi categorizado luz das dimenses de Milton Gordon para caracterizar o estgio de desenvolvimento em diversidade, apresentado por Cox Jr. (1991) e abordado no referencial terico. A dimenso identificao organizacional no foi objeto de anlise, pois a mesma se encontra disseminada nas demais dimenses (COX Jr, 1991).

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Anlise e interpretao dos Resultados

Dos artigos pesquisados foram analisadas somente as iniciativas de diversidade com meno explcita do nome da empresa. Tal procedimento se fez necessrio para evitar que a mesma prtica de diversidade fosse contada mais de uma vez. Assim, os valores apresentados na Tabela 1 expressam o nmero de empresas que adotam as diferentes ferramentas nas respectivas dimenses. Isso significa que a mesma empresa pode estar utilizando diferentes prticas voltadas diversidade. As organizaes citadas na literatura, naturalmente so aquelas que tm uma prtica relativamente consagrada e reconhecida no mercado. Pela Tabela 1 observou-se que a Integrao Estrutural a dimenso que mais tem contribudo para ampliar o nvel de diversidade cultural nas empresas pesquisadas. Programas de Ao Afirmativa (AA) ainda tm sido considerados os instrumentos mais efetivos para garantir o acesso de grupos de minoria nas organizaes. Tabela 1 Freqncia de iniciativas de diversidade cultural por dimenses Dimenses de Diversidade Cultural Aculturao Treinamento de gesto e valorizao da diversidade Programas de orientao de novos membros Treinamento de lnguas Diversidade representada em comits chaves Tratamento explcito de diversidade na declarao de misso ou estratgia Grupos consultivos para gerentes seniores Flexibilidade nos sistemas Integrao estrutural Programa de educao Programas efetivos de Ao Afirmativa Programas de desenvolvimento de carreiras Mudanas na gesto do desempenho e sistemas de recompensas Mudanas nas polticas de RH Integrao em redes informais Nmero 47 22 1 5 4 7 7 1 77 6 30 12 17 12 15 9,5 48,7 % 29,7

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Programas de mentoring Eventos sociais patrocinados pela empresa Vis cultural Seminrios de igual oportunidade Grupos de foco Treinamento de reduo de preconceito e discriminao Pesquisa interna Fora tarefa Conflito intergrupal Feedback de pesquisa Treinamento de Administrao de Conflito Grupos de foco TOTAL Fonte: elaborada pelas autoras.

6 9 14 1 10 1 2 5 3 1 1 158 100,0 3,2 8,9

As limitaes inerentes s AA, como fator de desenvolvimento, como j salientadas no referencial terico, buscam ser compensadas por programas voltados especificamente ao desenvolvimento de carreiras das chamadas minorias. Estas, na maioria dos casos, so formadas por negros e mulheres, em menor grau por hispnicos e asiticos (principalmente no Canad). As organizaes tambm mostram preocupao de expressar o tratamento da diversidade cultural nos sistemas de avaliao de desempenho e de recompensas. Isso, sem dvida, veicula um valor instrumental importante para sinalizar em que sentido a diversidade cultural efetivamente valorizada, fazendo parte do gerenciamento da organizao. Nesse aspecto, observou-se tambm que nessa dimenso Integrao Estrutural as organizaes procuram expressar sua valorizao da diversidade, promovendo mudanas nas polticas de RH que atendam mais especificamente as necessidades e caractersticas da fora de trabalho diversificada. Finalmente, verificou-se que as organizaes procuram promover um perfil mais diversificado por meio de esforos sistemticos em educao, a fim de garantir que diferentes grupos de identidade cultural estejam representados nos nveis hierrquicos, funes e grupos de trabalho. Vale lembrar que essa ferramenta foi apontada como a menos utilizada dentre outras na dimenso Integrao Estrutural.

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A acultura o, segundo Cox Jr. (1991, p.35), o mtodo em que diferenas culturais entre a cultura dominante e cultura de grupos minoritrios so resolvidos ou tratados. Os instrumentos mais amplamente utilizados pelas organizaes para promover o pluralismo foram os programas de treinamento de gesto e valorizao da diversidade, dos quais destacam-se aqueles voltados conscientizao (significados da diversidade) e

desenvolvimento de habilidades (informao sobre normas culturais de grupos diferentes e seu impacto no ambiente organizacional). Tambm chamou a ateno o fato de a diversidade ser alvo de meno em declarao de misso, ou ainda, de ser explicitada nas estratgias da empresa. Observaram-se, tambm, iniciativas para incentivar o treinamento de uma segunda lngua, mostrando que no s o ingls (no caso dos EUA) importante, mas o idioma das minorias tambm valorizado pela organizao. Essa questo se faz essencial quando se deseja ter na empresa pessoas que se comuniquem na lngua dos principais clientes/consumidores do negcio. Vrios programas esto voltados para que as minorias estejam representadas em comits chaves da empresa visando integrar seus pontos de vista aos da maioria dominante nas decises estratgicas da organizao. Para tanto, algumas aes tambm so endereadas aos gerentes seniores, com o desenvolvimento de planos que busquem melhorar a resposta da organizao para uma fora de trabalho cada vez mais diversificada. Grupos de minorias tambm so contemplados em acessos diretos com CEO. Pela dimenso Integrao em Redes Informais a organizao reconhece a importncia dos contatos de trabalho realizados fora do seu ambiente, promovidos para membros de grupos de minorias. Nesse sentido, as organizaes utilizam-se de Programas de mentoring para minorias e eventos sociais. Na dimenso Vis Cultural a iniciativa mais utilizada foi o treinamento de reduo de preconceito e discriminao em relao aos grupos de minoria, colocando em debate essas questes e suas implicaes no ambiente organizacional. A fora tarefa foi um instrumento importante citado por duas empresas para criar uma organizao mais isenta de Vis Cultural. O objetivo dessa atividade foi o de monitorar as polticas e prticas que evidenciassem injustias. Finalmente, na dimenso Conflito Intergrupal houve uma nfase maior na prtica de feedback de pesquisas, visando maior abertura e transparncia em relao aos grupos de minorias. Um instrumento pouco utilizado, o Treinamento da Administrao de Conflito foi mencionado por apenas uma empresa. Isso significa que essa questo, talvez por sua natureza complexa e delicada ainda no seja devidamente tratada pelas organizaes, como se fosse uma instncia ainda no abrangida pelas iniciativas mais tradicionais. No entanto, um REAd Edio 47 Vol. 11 No. 5, set-out 2005 16

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elemento essencial para minimizar conflitos intergrupais, que segundo Cox Jr. (1991) podem influenciar nos ndices de turnover e absentesmo. Alm dessas iniciativas cobertas pelo modelo de Cox Jr., a literatura aborda algumas outras identificadas na Tabela 2. Embora sejam poucas, importante ressaltar a preocupao de as organizaes com o equilbrio famlia-trabalho que vem do lidar e entender o diverso, ou seja, tratar grupos culturais diversos significa entender as especificidades destes e transferilos para o ambiente de trabalho, para que possam usar o melhor de seu potencial (COX Jr., 1991). Tabela 2 Outras iniciativas de diversidade cultural OUTRAS INICIATIVAS Equilbrio Famlia-trabalho Comunicao (booklet) Processo para medir a eficcia das iniciativas de Diversidade Cultural Incluso da diversidade em propaganda TOTAL Fonte: elaborada pelas autoras. Algumas organizaes demonstraram preocupao em usar a comunicao como estratgia para divulgar a importncia das diferenas culturais e as aes para capitalizar positivamente o grupo de minorias. Tambm se verificou que duas empresas incluram na gesto da diversidade um processo sistemtico de auditoria para medir a eficcia das iniciativas de Diversidade Cultural. Essa uma atividade de controle que mostra a importncia que a organizao atribui s questes de diversidade, no sentido de garantir a difuso dessas prticas em toda a organizao. Essa parece ser uma forma de inserir o valor diversidade na cultura da organizao. Uma ltima etapa da diversidade ultrapassar os muros organizacionais e fazer da diversidade um mote para propaganda, comunicando para os consumidores, clientes, fornecedores e parceiros estratgicos a maneira de ser e entender a diversidade. Os resultados acima analisados refletem, preponderantemente, o contexto dos EUA. As AA e as EEO contriburam de forma efetiva na incluso de grupos culturais de minorias nas organizaes americanas. Nmero 4 3 2 1 10 % 40,0 30,0 20,0 10,0 100,0

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No Brasil, como j observado anteriormente, rara uma literatura que trate diretamente a questo da diversidade cultural nas organizaes. Parece que as experincias ainda so incipientes e as poucas que existem, situam-se em um plano restrito perto das prticas adotadas em pases com uma tradio no tratamento desta questo. A Tabela 3 mostra o pouco que se conseguiu em revistas cientficas, artigos de fontes no acadmicas e duas entrevistas realizadas com profissionais de RH, responsveis pelas questes de diversidade nas empresas. Estas empresas foram selecionadas por serem reconhecidas na mdia pela sua opo diversidade. Naturalmente, no se pretende apresentar um retrato da situao brasileira. Mas apenas indicar alguns caminhos que comeam a ser trilhados por organizaes que compreenderam a importncia, social e estratgica, da diversidade cultural. Tabela 3 Iniciativas de diversidade cultural no Brasil INICIATIVAS NO BRASIL Recrutamento Desenvolvimento de carreira Treinamento Comunicao Mentoring TOTAL Fonte: elaborada pelas autoras. Retratando um caminho natural para quem est comeando a lidar com a diversidade cultural, a iniciativa mais utilizada no Brasil tem sido o recrutamento de minorias, particularmente mulheres, negros e profissionais de diferentes regies brasileiras. Tambm se verificou alguma ateno por parte de cinco empresas com o desenvolvimento de carreiras, no sentido de eliminar barreiras para a ascenso de grupos culturais minoritrios. O treinamento em diversidade e a comunicao tambm apareceram como aes importantes para conscientizar e esclarecer sobre diversidade na empresa. Apenas uma empresa declarou a figura do Mentor como recurso adicional para ajudar membros do grupo de minoria a compreender melhor sua situao e saber enfrent- la adequadamente. Nmero 13 5 2 2 1 23 % 56,5 21,8 8,7 8,7 4,3 100

Concluses e Consideraes Finais

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Aps o conhecimento adquirido por meio da literatura, analisadas as principais iniciativas praticadas pelas empresas consagradas em lidar de forma efetiva com a diversidade cultural, fica registrada uma grande interrogao: o que diversidade cultural no Brasil? Um estudo em diversidade precisa explicar o que ser diverso nas organizaes brasileiras, para no se correr o risco de cair na armadilha do modismo to comum no mundo empresarial, com seus discursos gerenciais eufricos e convincentes, porm recheados de vento. Tambm preciso pensar se um caminho adequado seria a prtica do antropofagismo organizacional (CALDAS e WOOD Jr., 1999) ou uma abordagem tipicamente brasileira. A complexidade, as ambigidades e as contradies que envolvem o tema diversidade cultural e sua face multidimensional implicam em estudos avanados para compreender a dimenso de diversidade que faz mais sentido para a nossa realidade intrinsecamente multicultural. A partir desse conhecimento, as chamadas iniciativas podero ser pensadas para criar um modelo de gesto da diversidade cultural para as empresas brasileiras. Alm dessas questes vale a pena saber qual a finalidade que as empresas no Brasil atribuem prtica da diversidade cultural. Na literatura, as empresas vem seus esforos para administrar a diversidade no somente como uma questo social e moral, mas tambm como uma estratgia para alavancar eficincia e competitividade. Elas querem ter os talentos que necessitam e busc- los onde eles estiverem. Desejam obter uma fora de trabalho mais efetiva, com moral mais elevado e ter a reputao de ser o melhor lugar para se trabalhar. Se a empresa consegue obter o total da contribuio que cada um pode oferecer, a empresa ser melhor e mais competitiva em tudo que fizer, acreditam as empresas que praticam a gesto da diversidade cultural. Um apelo mercadolgico tambm faz parte do discurso empresarial: ter um espelho da base de consumidores da empresa. Essa viso depende de uma mudana cultural, que crie um clima favorvel para a diversidade. Qualquer programa compulsrio no Brasil, a exemplo das AA e EEO, constituem-se em uma interveno artificial que cumpre a funo de corrigir um desequilbrio, uma injustia (defasagem numrica) na demografia organizacional. Contudo, essas aes, de efeito transitrio, ao servirem como um passaporte de entrada para o diverso, no lidam com uma tarefa remanescente de longo prazo, que se trata de criar um local de trabalho, cujas oportunidades de desenvolvimento no sejam bloqueadas pelas caractersticas pessoais, mas que as pessoas, independentemente de suas diferenas possam usar, da melhor forma possvel, seu potencial dentro da organizao.

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