1. O que é Ergonomia -...

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PUC Minas Virtual • 1 1. O que é Ergonomia Ergonomia é uma palavra de origem grega Ergo = trabalho Nomos = regras, leis naturais Ergonomia é o estudo do relacionamento entre o homem ou um coletivo de seres humanos com seu traba- lho, equipamento e ambiente, é particularmente a aplicação de conhecimentos de anatomia, fisiologia , psicologia da cognição e sociologia (psico patologias, relacionamentos interpessoais) á solução de pro- blemas que possam advir desse relacionamento. A ergonomia estuda diversos aspectos do comportamento humano, em particular os fatores presentes em uma situação real de trabalho ou convivência geral com o objetivo de intervir modificando, inovando e se possível melhorando esta situação através do desenvolvimento de projetos. É desejável que estas intervenções consigam abranger todos os componentes desta situação, mas podem ser centradas em um de seus componentes: O homem- características físicas, fisiológicas, psicológicas e sociais do homem inserido em uma de- terminada situação. A máquina- aqui se entende todos os objetos ou ajudas materiais que estão sendo usadas na situação determinada,como ferramentas, mobiliário, instalações etc. O ambiente- ambiente físico que envolve o homem na situação em questão, condições de temperatu- ra, umidade, ruído, vibrações, cores, luz, gases, agente poluente e outros. Informação- refere-se às qualidades ou deficiências na transmissão de conceitos importantes para o funcionamento do sistema em situação real que condicionam a tomada de decisões. Exemplos existem comunicações escritas (manuais), verbais (dialogo), gestuais e formais (textura, relevos, cores, subtra- ção ou adição em volumes, etc.). Organização- são o conjunto de regras formais ou informais pré-estabelecidas, com base nas quais se espera deva acontecer o comportamento dos seres humanos na situação real determinada. Conceitos básicos sobre ergonomia aplicada ao desenvolvimento de processos e produtos Professora Autora: Pia Coeli Rosciano Dsc

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1. O que é Ergonomia

Ergonomia é uma palavra de origem grega

Ergo = trabalho

Nomos = regras, leis naturais

Ergonomia é o estudo do relacionamento entre o homem ou um coletivo de seres humanos com seu traba-lho, equipamento e ambiente, é particularmente a aplicação de conhecimentos de anatomia, fisiologia , psicologia da cognição e sociologia (psico patologias, relacionamentos interpessoais) á solução de pro-blemas que possam advir desse relacionamento.

A ergonomia estuda diversos aspectos do comportamento humano, em particular os fatores presentes em uma situação real de trabalho ou convivência geral com o objetivo de intervir modificando, inovando e se possível melhorando esta situação através do desenvolvimento de projetos.

É desejável que estas intervenções consigam abranger todos os componentes desta situação, mas podem ser centradas em um de seus componentes:

O homem- características físicas, fisiológicas, psicológicas e sociais do homem inserido em uma de-terminada situação.

A máquina- aqui se entende todos os objetos ou ajudas materiais que estão sendo usadas na situação determinada,como ferramentas, mobiliário, instalações etc.

O ambiente- ambiente físico que envolve o homem na situação em questão, condições de temperatu-ra, umidade, ruído, vibrações, cores, luz, gases, agente poluente e outros.

Informação- refere-se às qualidades ou deficiências na transmissão de conceitos importantes para o funcionamento do sistema em situação real que condicionam a tomada de decisões. Exemplos existem comunicações escritas (manuais), verbais (dialogo), gestuais e formais (textura, relevos, cores, subtra-ção ou adição em volumes, etc.).

Organização- são o conjunto de regras formais ou informais pré-estabelecidas, com base nas quais se espera deva acontecer o comportamento dos seres humanos na situação real determinada.

Conceitos básicos sobre ergonomia aplicada ao desenvolvimento de processos e produtos

Professora Autora: Pia Coeli Rosciano Dsc

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2. Os pontos centrais da Ergonomia

Todos os fatores citados acima, além de outros, estão presentes nas situações de trabalho e não devem ser abordados isoladamente. As questões tratadas em ERGONOMIA dizem respeito às relações entre coisas e não de coisas separadas.

O ponto central da Análise Ergonômica do Trabalho (A.E.T) é a análise do fazer, da atividade real de trabalho que se desenvolve em um dado momento e é determinada ou condicionada pelas normas de trabalho, o ambiente físico e o mobiliário, as formas de comunicação,etc.

A atividade também sofre os efeitos de um quadro temporal e espacial bem definido, depende do estado de saúde, da capacidade e do conhecimento do trabalhador. Fundamentalmente depende também das regras, implícitas ou explícitas, impostas que definem as divisões das tarefas e as relações dos diversos atores sociais (empregado, clientes, colegas de trabalho, supervisores, instituição, etc).

MEDIÇÃO AVALIAÇÃO DE DESEM-

PE NHO

RELAÇÕES ENTRE AS PESSOAS

FLUXO DE PRODUÇÃO

LAY OUT

MÃO –DE-OBRA

CAPACITA-ÇÃO E CO-

NHECIMEN-TO/, SAÚDE

MATÉRIA-PRIMA

MÉTODO INSTUÇÕES SOBRE CO-MO FAZER

MEIO AM-BIENTE FÍ-

SICO

MÁQUINA

FERRA-MENTAS DE TRABALHO

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Para definir e dimensionar um projeto de local de trabalho é preciso antes entender a situação real de trabalho, ou seja o que esta atividade realmente é com todos os fatores atuando positivamente ou negati-vamente na sua conformação.

Esta compreensão é que irá nos ajudar a definir as diretrizes de projeto e evitar que se cometam os mes-mos erros do projeto anterior. Não se pode desenvolver uma análise ergonômica e definir intervenções com base em uma definição de local de trabalho utópica: como a atividade de trabalho deveria ser (si-tuação ideal). Esta é a principal causa dos erros de projeto que criam péssimas condições de trabalho.

A segunda maior causa é a análise superficial dos fatores que compõem uma situação real de trabalho. Por este motivo o primeiro passo na A.E.T é proceder a uma análise minuciosa das situações reais de trabalho e avaliar a contribuição de cada um dos fatores e os problemas e desvios que geram na situação de trabalho analisada. Somente a partir desta ponderação são estabelecidas as premissas da análise e a forma de intervenção capaz de eliminar ou pelo menos minimizar estes problemas chamados em ergono-mia de variabilidades do sistema de produção.

Variabilidades são inadequações no processo de trabalho que não se consegue controlar inicialmente e geram:

perdas de produção e de eficiência;

re-trabalho,

aumento da densidade da carga de trabalho,

stress e doenças ocupacionais.

Estes tópicos são os principais padrões de queixas e problemas apresentados ao ergonomista e aos quais, após a análise e estabelecimento de diretrizes de projeto, se espera dar uma solução.

Observa-se porém que estes tópicos (doenças ou perdas de produtividade) são apenas os efeitos dos problemas e não as causas. Estas devem ser determinadas analisando-se as condições reais de traba-lho.

Este procedimento metodológico é o primeiro e mais importante da A.E.T. e é chamado de ANÁLISE DA DEMANDA.

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GEOGRAFIA MEIO AMBIENTE MÃO-DE-OBRA MÉTODO

FLUXO MEDIDAS MATÉRIA-PRIMA RELAÇÕES PESSOAIS

Os fatores apresentados no diagrama espinha de peixe ou de causa e efeito acima são algumas das cau-sas mais comuns de problemas nas situações reais de trabalho. Da análise situada podem aparecer mui-tas outras como exemplo: falhas de comunicação.

A contribuição positiva ou negativa de cada um dos fatores depende da situação de trabalho analisada e irá variar a cada estudo de caso. É interessante ponderar e atribuir notas ou pesos para cada fator e apresentar os resultados ao contratante do serviço de A.E.T.

Ferramentas estatísticas como o gráfico de PARETO, gráfico de barras, ou MÉTODO G.U.T. podem ser utilizados para apresentar os resultados e ponderações da análise da demanda. (exemplos em anexo).

Para se fazer uma análise ergonômica se utiliza uma ferramenta metodológica da sociologia a “análise da ação situada”, tanto para a realização de projetos de:

reforma (ergonomia de correção), quanto para

projetos novos (ergonomia de concepção).

Quando se tratar de uma análise ergonômica de concepção é importante estabelecer situações similares à que se pretende atuar como referência, analisá-las em seus aspectos positivos e negativos antes da for-mulação das diretrizes do novo projeto. Esta ferramenta, em engenharia de produção é conhecida como benchmarking.

Quanto mais bem feita for a análise das situações de referência e maior for a compreensão e riqueza de detalhes mais fácil ficará fazer a transposição, com os devidos ajustes e correções sociais e tecnológicos, para a nova situação de projeto.

A metodologia de Análise ergonômica do trabalho A.E.T. será explicada de forma mais detalhada no tópi-co específico.

EFEITO PROBLEMA

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3. Trabalho Real e Trabalho Prescrito - Diferença entre tarefa e atividade

A análise ergonômica do trabalho A.E.T. tem como pressuposto que haverá sempre uma diferença entre o trabalho que é realmente feito por cada trabalhador ou coletivo de trabalho (trabalho real) e aquilo que o trabalho deveria fazer (trabalho prescrito), conforme as regras de funcionamento estabelecidas durante o projeto de funcionamento do sistema.

Esta distância é provocada pelas variabilidades do próprio processo produtivo.

Em última instância o objetivo final de toda análise ergonômica é determinar intervenções que possam eliminar ou pelo menos minimizar e tornar controlável as variabilidades.

Este é um processo de monitoramento e melhoria contínua do processo produtivo (meios de trabalho, ferramentas, máquinas,etc) e do trabalho humano (capacitação, treinamento, saúde,etc).

Em síntese, a A.E.T. pretende diminuir a distância entre trabalho prescrito (tarefa) e trabalho real (ativi-dade).

Para atingir este objetivo estabelece princípios metodológicos de intervenção que alcançam resultados favoráveis através da participação e validação de informações e resultados por parte de todas as pesso-as envolvidas com o processo de produção ou situação de trabalho analisada.

4. Observação participante

A análise ergonômica do trabalho do ponto de vista metodológico utiliza métodos de análise qualitativos que têm origem na sociologia e antropologia.

A observação participante é uma técnica de coleta de dados, capaz de fornecer uma compreensão abrangente de relações sociais construídas a partir de interações entre indivíduos e entre esses e seu ambiente físico-organizacional. Ressalta-se que situações de trabalho são relações sociais e que somente uma abordagem sociológica pode esclarecer certos aspectos da diferença entre trabalho prescrito e traba-lho real.

Poderia se chegar a afirmar que o trabalho real é o resultado da interpretação que as pessoas envolvidas num processo de trabalho tem da prescrição. Logo para entender os problemas e distorções que ocorrem no processo é preciso entender como as pessoas “vêem” o seu próprio trabalho.

A observação participante estabelece que o pesquisador para ter uma correta interpretação das relações sociais deve “ir a campo e ver o mundo através dos olhos do pesquisado”. Somente deste modo, com uma imersão total em uma realidade diferente da sua própria conseguirá captar o sentido encoberto da ação humana e entender o caráter peculiar dos seres humanos, seus comportamentos quando convivem em grupo.

Certas distorções, alguns comportamentos, podem parecer ao pesquisador absurdos e inimagináveis, irracionais. Mas sempre existirá uma explicação quando analisados dentro de um contexto social e de relações humanas reais.

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Observação é uma palavra que pressupõe uma atitude passiva do pesquisador. Observar é uma ativida-de de alguém que não está envolvido com o problema que está ocorrendo. È interessante o não envolvi-mento, a princípio, para a garantia de objetividade e neutralidade do pesquisador frente ao problema que observa.

Participante é um particípio presente cujo significado é o oposto do que foi dito acima sobre a observa-ção. Só se compreende o porque de certos comportamentos humanos e sociais quando se consegue as-sumir o papel do outro, se colocar no lugar do outro com todas as suas limitações de conhecimento, poder de ação, recursos disponíveis, emoções e necessidades, que são sempre diferentes daquelas do pesquisador.

O pesquisador precisa entender esta realidade antes de intervir, ou poderá incorrer no erro das metodo-logias não participativas tradicionais de estabelecer padrões e regras a partir da sua realidade de vida, seus conhecimentos e sua vida social.

A partir do momento que o pesquisador se dispõe a assumir o papel do outro e conviver um pouco dentro daquela realidade deixa de ter uma atitude meramente passiva, pois mesmo que a inserção social não seja total, passará a fazer parte daquele contexto. Passará a existir uma relação face-a-face, haverá um compartilhamento de experiências e um envolvimento maior com o seu objeto de pesquisa.

Logo a observação participante é um instrumento de pesquisa capaz de captar certos tipos de informação que o pesquisador jamais teria como saber se estivesse à distância. E quanto maior o tempo de convívio maior a compreensão da realidade e maior será o papel ativo do observador-pesquisador na modifi-cação do contexto.

A Observação Participante é uma forma de modificação do meio pesquisado, porque pressupõe trocas de informação e diálogo. Tudo o que o pesquisado diz pode ser validado observando em situação real de trabalho o que ele efetivamente faz. Divergências de informação podem ser corrigidas e redimensiona-das.

O pesquisador modifica o contexto, em primeiro lugar porque ao perguntar às pessoas sobre o que fazem e como fazem, produz uma reflexão sobre determinadas ações e comportamentos que se tornaram auto-matismos inconscientes ou conformismo com certos problemas que já eram dados como insolúveis e nor-mais.

Um segundo nível de intervenção do pesquisador acontece quando ao ver um problema ocorrendo e ten-do compreendido a causa do mesmo, passa a sugerir modificações, leva conhecimento, troca idéias ante-cipando futuras transformações que poderão ocorrer. (pré-treinamento).

Existem dois grandes riscos na utilização deste método de pesquisa:

o risco de obliteração dos dados por contaminação ideológica, sócio-cultural, emocional ou normativa. Isto ocorre quando o pesquisador projeta seus próprios valores, preconceitos e ideais so-bre a situação real que está analisando;

perda da neutralidade e objetividade por excesso de envolvimento com as pessoas e situações pes-quisadas.

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O que observar?

1. as formas de comunicação: oral, escrita e gestual;

2. os deslocamentos de pessoas e de objetos;

3. posturas sempre relacionadas a um contexto espaço-temporal;

4. tempos de execução /pausas;

5. nível de conhecimento prático e teórico sobre o próprio trabalho;

6. níveis de autonomia de decisão.

5. A Entrevista Direta

O que se pretende passar como técnica de entrevista aqui não é um roteiro de perguntas, pois as situa-ções de trabalho ou atividade pesquisadas podem ser muito diferentes e a cada uma irão ser pertinentes perguntas especificas.

A técnica de entrevista é mais a forma como o pesquisador deve proceder para obter o melhor resultado das informações e relatos que irá escutar das pessoas.

A entrevista é a técnica menos estruturada das ciências sociais, onde a objetividade é um ideal inatingível, pois tudo o que é dito pelo informante é uma sua interpretação da realidade filtrada e modificada por rea-ções e interesses pessoais.

A melhor forma de evitar desvios no que é dito pelo informante é entrevistá-lo durante a execução do pró-prio trabalho, aplicando o “brain storm” (tempestade cerebral = falar compulsivamente sobre algo sem muita reflexão) . Para isso é necessário criar uma situação onde o informante se sinta à vontade, deve-se perguntar e interromper o menos possível e permitir que o entrevistado fale o máximo de si e de seu traba-lho.

Como toda situação de trabalho ou relação social pode conter situações problemáticas e haver medo por punições. O pesquisador deve inicialmente se apresentar e como ética se comprometer a não divulgar nomes ou relatos escritos de forma a identificar claramente a pessoa do informante. Toda informação, após elaborada deve ser validada com o informante que deve autorizar sua divulgação ( aspectos deon-tológicos).

Para alcançar este objetivo o comportamento e as atitudes do pesquisador são muito importantes. Devem ser evitados riscos como:

1. quebra de espontaneidade: está diretamente ligada à figura do entrevistador e na forma como coloca em evidência diferenças de nível de cultura e educação, sexo, raça e principalmente classe social.

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2. conhecimento sobre o assunto: O pesquisador não deve ir a campo sem se informar e conhecer, mesmo que de maneira apenas teórica, a situação que pretende analisar, pois irá correr o risco de não entender o que o informante está falando. É importante conhecer os procedimentos de trabalho, as máquinas, os produtos e processo de fabricação. Quanto mais a realidade pesquisada for diferente da vivência do pesquisador maior será a necessidade de aprofundar na pesquisa prévia à entrevista.

3. evitar o desejo de agradar: são formas do pesquisador induzir certas respostas, ou forçar ao infor-mante falar sobre assuntos que ele deseja escutar, mas que necessariamente não são aqueles que o informante deseja colocar.

4. falhas de omissão : preparar roteiro para não esquecer de perguntar fatos que o informante deixou e abordar e que são importantes para esclarecer aspectos do funcionamento da atividade analisada.

5. motivos ulteriores: interesses particulares tanto do pesquisador quanto do informante que desviam o conteúdo da entrevista.

6. fatores idiossincráticos: o pesquisador deve ter em mente que não é apenas uma entrevista, mas várias ao longo de um certo tempo, logo entre uma entrevista e outro podem ter ocorrido modificações do contexto anterior, sendo todo ambiente de trabalho bastante dinâmico.

A entrevista direta sendo face-a face permite ao pesquisador “ler as entre linhas” do que está sendo dito. Para tanto é importante prestar atenção no estado emocional do informante, as ironias, as expressões não verbais e principalmente nas afirmações conflitantes. (contradições podem levar a importantes descober-tas. Exemplo: regras de procedimento ambíguas, falta de conhecimento sobre o próprio trabalho , etc).

Questionários ou entrevistas fechadas são adequados neste tipo de pesquisa em um segundo momento; como por exemplo para confirmar certas informações ainda não totalmente claras, ou para estender quan-titativamente a pesquisa que é inicialmente qualitativa. Mas esta fase requer que o pesquisador já tenha um domínio e conhecimento grande da atividade que está sendo analisada para determinar com precisão o que perguntar e evitar perguntas óbvias e questionários excessivamente longos.

6. Fases da Metodologia de Análise – Ergonômica do Trabalho

A metodologia adotada para a realização do trabalho será a Análise Ergonômica do Trabalho – AET (Gué-rin et al, 1991). Ela é um método de ação para a transformação das situações de trabalho. A partir de ob-servações do comportamento e compreensão dos modos operatórios elaborados pelos trabalhadores, pode-se chegar a modificações das representações do trabalho que predominam na concepção e adminis-tração de situações de trabalho, permitindo então a transformação ou concepção de situações a partir de representações mais pertinentes, contribuindo para a resolução de problemas de saúde dos trabalhadores e eficácia econômica da empresa.

A AET é constituída de etapas que ajudam a organizar o trabalho, que serão comentadas a seguir:

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1a etapa: Análise da demanda

Nesta etapa, acontecem as primeiras entrevistas com diretores, supervisores, trabalhadores, engenheiros de segurança, médicos do trabalho, enfim, com todos os envolvidos na situação de trabalho. Também ocorrem as primeiras observações da situação de trabalho, com a finalidade de se conhecer, ainda que superficialmente, o contexto produtivo e as pessoas envolvidas no mesmo. Para isto, também são realiza-dos levantamentos de informações sobre a situação de trabalho na forma de documentos, procedimentos de trabalho, projetos (arquitetônicos, estruturais, elétricos, hidráulicos, ar condicionado, detalhamentos, etc.), registros do histórico de acidentes e adoecimentos dos trabalhadores.

Durante esta etapa, os ergonomistas esclarecem o que é uma intervenção ergonômica, aproximam-se da população trabalhadora e procuram levantar as principais queixas e dificuldades enfrentadas pelos traba-lhadores, durante a realização de suas atividades. Neste momento, pode-se elaborar um check list para facilitar a coleta de dados.

Após a realização dessa coleta inicial de informações, é possível definir quais serão os postos que deve-rão ser avaliados por atividade, dimensionar a avaliação e definir qual será a ordem das prioridades, ou seja, definir um cronograma para a realização das avaliações. Consciente dos problemas e das ne-cessidades dos trabalhadores, é possível concluir a elaboração da demanda da Análise Ergonômica do Trabalho e iniciar a etapa seguinte da metodologia.

Neste momento, é possível formular e entregar o primeiro relatório parcial, constituído das informações até aqui coletadas.

FERRAMENTAS

ENTREVISTAS

OBSERVAÇÕES

PESQUISA DOCUMENTAL

BENCHMARKING

OBJETIVOS

EXPLICAR O QUE É A INTERVENÇÃO

LEVANTAR QUEIXAS E DIFICULDADES

DIMENSIONAR A AVALIAÇÃO

DEFINIR PRIORIDADES

CRONOGRAMA

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ENTENDER E AVALIAR:

EXPRESSÃO DO PROBLEMA

ORIGENS DE DEMANDAS

CONFLITOS DE INTERRESSES

NEGOCIAR PROPOSIÇÃO DE INTERVENÇÃO

COLOCAR A ATIVIDADE COMO MEDIAÇÃO ENTRE AS PESSOAS E OCONTEXTO DE TRABALHO

2a etapa: Análise do funcionamento da empresa, do processo produtivo e da força de trabalho

Esta etapa aborda os aspectos técnicos, organizacionais, econômicos, sociais e geográficos, podendo ser mais ou menos abrangente dependendo das exigências de cada intervenção. Esta investigação de fatos aparentemente distanciados do objetivo da intervenção favorece a indicação de fatos que podem ter rela-ções, às vezes bem estreitas, com a atividade dos trabalhadores.

Sobre o contexto econômico e comercial alguns fatores devem ser observados, tais como: tipos de produ-to e serviços oferecidos, duração da série de fabricação, as exigências de qualidade, a posição da empre-sa em relação à concorrência, as variações de demanda de produção. Estes indicadores do contexto eco-nômico podem revelar alguns determinantes das exigências do trabalho e fatores da situação de trabalho. É importante ressaltar que o funcionamento da empresa depende estreitamente dos determinantes co-merciais.

Conhecer aspectos da produção e de sua organização contribui para se compreender melhor as relações existentes entre os diferentes postos de trabalho. Certamente o ergonomista não precisa conhecer o pro-cesso de produção em detalhes, mas ter um conhecimento global que lhe permita entender os determi-nantes das atividades dos trabalhadores durante a etapa seguinte da metodologia.

Informações sobre os processos técnicos também permitirão aos ergonomistas compreender melhor o que ele observa, além de facilitar o diálogo com os trabalhadores de algumas questões que o guiem na esco-lha da situação de trabalho a ser analisada.

Além do conhecimento da empresa, é muito importante saber quem são as pessoas que constituem o quadro de trabalhadores da empresa. Para isso é necessário caracterizar a população trabalhadora em relação a sexo, idade, formação profissional, qualificação, história de vida, experiência adquirida, enfim, todas as informações que retratem os responsáveis pela realização do trabalho. Além de caracterizar a equipe de trabalhadores, é necessário saber sobre a quantidade de trabalhadores que cada setor da em-presa dispõe, a organização hierárquica e sobre as relações sociais.

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Os aspectos geográficos estão relacionados à caracterização qualitativa do espaço físico e das suas con-dições ambientais (se necessário). Implícito a esses dados, subentende-se caracterizar os postos de tra-balho, as máquinas, os equipamentos e as ferramentas de trabalho.

MERCADO ( CLIENTE)

PRODUTO (QUALIDADE,TIPO, MATERIAIS)

HISTÓRICO DA EMPRESA (ORIGEM, EVOLUÇÃO, POLÍTICA)

GEO-ECONOMIA (LOCALIZAÇÃO,TECIDO INDUSTRIAL E SOCIAL)

POPULAÇÃO (SEXO, IDADE, QUALIFICAÇÃO, SAÚDE )

ORGANIZAÇÃO DA PRODUÇÃO (PROCESSOS, FLUXO, LAYOUT E TECNOLOGIA)

ORGANIZAÇÃO DO TRABALHO (TURNOS, DIVISÃO DE TAREFAS, EQUIPES DE TRABALHO)

LEGISLAÇÃO (AMBIENTAL, SEGURANÇA, QUALIDADE)

TRAÇOS (PECULIARIDADES SOCIO-CULTURAIS)

EXPLICAR DETERMINANTES DA SITUAÇÃO

AMPLIAR PROBLEMAS E SEUS NEXOS CAUSAIS

ESPECIFICAR OBJETIVOS E CONFLITOS

3a etapa: Análise global da atividade

É nesta etapa que, através de técnicas que associam a observação dos comportamentos e a explicitação de seus determinantes, são descritas e analisadas as exigências reais das tarefas, as condições de sua realização e sua realização em si pelos trabalhadores, buscando-se respostas para as questões colocadas pela demanda.

Nesta etapa são realizadas observações abertas e entrevistas focadas na atividade, quando serão vistas na prática as questões relativas à produção, tecnologia utilizada e organização do trabalho. Ocorrem as primeiras confrontações entre as informações sobre o que deve ser feito (trabalho prescrito) e o que real-mente acontece (trabalho real). Nesta fase, os ergonomistas começam a perceber as dificuldades sentidas pelos operadores, podendo verificar também aspectos sobre a sua saúde.

É importante nesta fase validar as informações e relações de causa e efeito que foram evidenciadas nas fases anteriores da metodologia.

Validar significa apresentar a todas as pessoas envolvidas os resultados, hipóteses e reflexões obtidos sobre como são gerados e as causas dos problemas encontrados. Esta validação é um processo de auto-confrotação entre o que foi dito e observado e as conclusões geradas pelo ergonomista

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4a etapa: Pré-diagnóstico

O pré-diagnóstico é um conjunto de hipóteses elaborado pelos ergonomistas, que apontam as possíveis causas dos problemas determinados pela demanda ergonômica. A formulação do pré-diagnóstico tem um caráter operacional, pois evita a realização de observações e análises desvinculadas da problemática da intervenção.

O pré-diagnóstico abre a fase das observações sistemáticas, ou seja, observações realizadas com inten-ção de comprovar as hipóteses colocadas. Para que as observações realmente revelem elementos significativos para a intervenção ergonômica, torna-se necessário planejar previamente as mesmas, ou seja, prepara as sessões de observação: definir o local, o momento certo, a duração da observação, os fatos observáveis e equipamentos para realização dos registros (vídeo, tv, gravador, luxímetro, decibelí-metro, etc.).

Feito isto, deve ser realizada uma validação com todas as pessoas envolvidas na situação de trabalho. Este é um bom momento para os ergonomistas situarem os trabalhadores sobre o andamento da Análise Ergonômica e para confrontá-la com o ponto de vista dos trabalhadores. A Análise deve prosseguir, ape-nas com um consenso entre as partes.

5a etapa: Análise sistemática ou situação a analisar

Feito o planejamento da análise sistemática, inicia-se as observações dos “fatos observáveis”, que variam de acordo com as hipóteses do pré-diagnóstico. Estes estão relacionados aos comportamentos dos traba-lhadores e suas características: deslocamentos no espaço, posturas adotadas, direção do olhar, comuni-cações verbais e gestuais entre as pessoas, ações, tomadas de informações, tempo utilizado para realizar as tarefas, dados antropométricos, condições ambientais, etc.

Nesta fase é importante realizar um estudo de viabilidade, que significa levantar e confrontar o que você precisa para executar a intervenção e o que se dispõe como recurso, o que poderia se executado a curto, médio e longo prazo. É preciso avaliar as viabilidades :

Técnica (projetos correlacionados com a proposta de intervenção que se pretende apresen-tar,impactos da realização das reformas nas atividades rotineiras da empresa, equipamentos, máqui-nas, etc.)

Financeira (recursos financeiros disponíveis e os futuros –planejamento da obtenção e forma de apli-cação dos recursos segundo um cronograma de intervenção) e

Operacional (competências técnicas e pessoas internas e externas que necessitarão ser mobilizadas para executar as intervenções).

È também desejável sempre que possível oferecer á empresa e pessoas envolvidas mais de uma alterna-tiva de projeto de intervenção.

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6a etapa: Diagnóstico

Os dados coletados na análise sistemática devem ser analisados e organizados de forma sintética para apresentar, em forma de relatório, os resultados da análise ergonômica. Neste segundo relatório parcial, será apresentado um mapa de riscos ergonômicos por atividade analisada, com base nos resultados, os recursos técnicos, financeiros e operacionais necessário para realiza-las. A empresa contratante deverá fornecer um feed back dos envolvidos na situação de trabalho sobre este mesmo relatório. É o segundo processo de validação.

7a etapa: Recomendações

Nesta etapa são apresentadas orientações de transformação da situação de trabalho:

- Diretrizes para especificação técnica dos itens que concernem à solução dos problemas ergonômicos;

- Elaboração de critérios ergonômicos para a aquisição de mobiliários e ferramentas;

- Revisão dos procedimentos de trabalho, incorporando as modificações ergonômicas;

- Elaboração de um plano de ação definindo os resultados esperados e as prioridades para a empresa contratante executá-los;

- Diretrizes para programas de treinamento e elaboração de uma apostila para o curso de treinamento;

- Elaboração e entrega do relatório final.

8a etapa: Projeto de implementação das recomendações e acompanhamento

Assessoria, no que concerne a Ergonomia, durante a fase de elaboração e implantação dos projetos.

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ANEXO I: MODELO DE PLANO DE AÇÃO

PROJETO ANÁLISE ERGONÔMICA DO TRABALHO

FEVEREIRO 2006

PLANO DE AÇÃO- FONTES DE RISCOS ERGONÔMICOS DO XXXXXX DATA:

ELABORA-ÇÃO

Pia Coeli

AGENTE FOTO AÇÃO OBJETIVO RES-PONS

CUS-TO

PRAZO OK/

NOK

OBSERVA-ÇÕES

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7. Metodologia de análise ergonômica do trabalho para concepção de locais de trabalho ou novos equipamentos e produtos

O procedimento metodológico descrito para a concepção de novos locais de trabalho, em suas conota-ções básicas, foi definido por Daniellou (1985) em sua tese de doutorado onde propôs uma metodologia para a produção de “modelos da atividade de trabalho futura”.

Estes “modelos da atividade de trabalho futura” partem do pressuposto que, “uma situação por muito ino-vadora que seja, nunca é complemente inédita. A análise das “situações de referência” existentes que se aproximam da situação futura, podem pelo menos dar uma idéia dos tipos de problema a serem evitados” (Daniellou, 1985).

Para a produção de modelos da atividade futura, Daniellou (1985) propõe que sejam seguidas quatro eta-pas:

a) Análise do estado dos locais de referência,

b) Formação do quadro futuro da situação a ser concebida,

c) Previsão da atividade futura provável na situação a ser concebida e

d) Análise da atividade real já na nova situação.

Os pontos de interesse para cada uma destas etapas e a dinâmica da construção do modelo podem ser conferidos na figura abaixo:

Etapas da construção de modelos da atividade futura

ANÁLISE DO ESTADO DOS LOCAIS DE REFERÊNCIA

Características da

População trabalhadora Atividade

Tarefas prescritas

Tarefas reais

FORMAÇÃO DO QUADRO FUTURO

Decisões Sociais Descrição da

População futura

Descrição das Tarefas futuras

Escolhas Técnicas

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PREVISÃO DA ATIVIDADE FUTURA

Modelos mentais, projetistas

e Trabalhadores

Reconstituição previsional da atividade

futura provável

Conhecimentos em ergonomia

Avaliação Concepção

ANÁLISE DA ATIVIDADE REAL

População Atividade real Tarefas reais

Adaptado de Daniellou 1985, citado por TELLES, (1995).

Atualmente, na bibliografia sobre gestão de projetos, a avaliação de situações similares que se pretende projetar, tanto no que concerne a infra-estrutura de equipamentos, lay out e relações pessoais e de traba-lho é denominada de benchmarking.

A análise dos locais de referência possibilita entender e principalmente antecipar problemas que porão vir a interferir negativamente na nova proposta de projeto a ser desenvolvida.

Principalmente questões de transferência de tecnologia, que não consideram fatores ambientais e sócio-culturais contextualizados da nova situação de trabalho que se pretende construir.

8. Construção de modelos da atividade futura

Seguindo o esquema apresentado na figura anterior, que sintetiza as etapas da “construção de modelos da atividade futura”, procede-se à apresentação da metodologia proposta.

A primeira fase é a análise de situações de referência, que devem ser escolhidas de modo a possibilitar a antecipação de futuras dificuldades. Toda esta etapa foi bastante similar às etapas utilizadas nos estudos ergonômicos de correção, por este motivo a sua estruturação obedece às etapas constitutivas desta mo-dalidade de análise: análise da demanda, análise do funcionamento da empresa e da população trabalha-dora, análise das atividades, diagnóstico e recomendações.

É importantíssimo que a situação de referência seja o mais próximo possível da nova proposta de projeto. É indicado ter como base um estudo de caso de uma situação de trabalho que acontece na prática e que possibilite o conhecimento de vários tipos de problemas e principalmente o contato com as dificuldades enfrentadas pelos trabalhadores na execução de suas atividades.

O estudo de caso deve ser desenvolvido em um local de trabalho do mesmo porte, onde existe instalada a tecnologia de equipamentos que se pretende usar e com um perfil de população trabalhadora semelhante

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ao que se pretende utilizar na nova situação que está sendo projetada. Nesse caso, a coleta de dados deveria ser avaliada e interpretada frente a outro referencial que é a política de gestão da produção pró-pria da empresa para o qual se irá projetar.

Este cruzamento de dados e referenciais, seus prós e contras, a análise dos possíveis arranjos que possi-bilitem gerar uma compatibilização eficiente e com certos pré-requisitos de qualidade de vida produtiva, é que irá determinar as diretrizes do novo projeto.

Ressalta-se que para a concepção de projetos, a fase de determinação do referencial fundamenta-se na etapa “a análise da demanda” que necessita ser muito detalhada e abrangente. Não deve contemplar a expressão de apenas um ponto de vista, mas, ao contrário, deve advir de uma confrontação de opiniões divergentes sobre um mesmo problema. Deve contemplar o a expressão de um trabalhador sobre os pos-síveis defeitos de seu posto de trabalho, mas também a expressão das gerências e dos técnicos, ou seja, de todas as partes envolvidas no processo.

Não há determinação a priori de quais são as expressões e opiniões mais importantes, a princípio todas são importantes. Somente após a análise criteriosa dos fatos, das observações das atividades e de seus fatores determinantes é que se procederá a uma ponderação de importâncias que usa como base as no-ções de compatibilização dos critérios de produtividade e os critérios de qualidade de vida produtiva.

Existe subjacente às várias demandas, uma única demanda que é identificar e classificar, com referência ao processo produtivo o maior número possível de inadequações, a fim de propor soluções para que os mesmos problemas não se configurem na situação futura.

A etapa de análise da demanda é crucial para a explicação e negociação de como se procederá com o estudo, principalmente da negociação do acesso ao local de trabalho, à relatórios de produtividade , regis-tros de acidentes e doenças do setor e outros documentos, e principalmente à realização de entrevistas com os trabalhadores com garantia de sigilo das informações por eles concedida e retorno constante dos resultados da pesquisa também a eles .

Quanto à explicação do que é análise ergonômica e como esta seria conduzida, foi importante deixar claro que o objetivo central era compatibilizar produção e possibilidades de melhoria da qualidade de vida pro-dutiva dos trabalhadores, ou seja, adequar o trabalho às pessoas e não vice-versa.

Nesta fase inicial ocorrerão as primeiras visitas ao local de trabalho de referência e começa-se a levantar as primeiras ordens de problemas implícitos na generalidade da demanda. Começa-se a identificar quais seriam as situações mais críticas e o que deveria ser melhor esclarecido para se ter uma compreensão abrangente e imparcial da origem e conseqüências de cada problema.

Em outras palavras, esta-se sistematizando os problemas dentro de uma proposta de intervenção articula-da sob “o ponto de vista da atividade”, e incorporando-se à mesma critérios próprios da análise ergonômi-ca , como a valorização dos arranjos coletivos e dos critérios de organização do trabalho. (Por arranjos coletivos entende-se aqui os fenômenos de cooperação espontânea entre os trabalhadores para superar os problemas não previstos dos meios de produção e organização do trabalho).

A intervenção é então dimensionada. Podem existir problemas ambientais, problemas de organização do trabalho, problemas de gerenciamento dos recursos humanos e sua capacitação e problemas de dimensi-

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onamento da produção (número de equipamentos, de tempos de processamento, procedimentos não pre-vistos e espaço físico inadequado para execução das tarefas). Tudo isso deverá ser projetado para uma situação futura, quando poderá haver um aumento de xx% da demanda por serviços, a introdução de tec-nologia micro – processual .

Mas o mais importante é inserir estes dados na proposta, na política de gestão proposta pela empresa que irá gerir o novo negócio que se pretende projetar: nesta intenção já existe as conotações básicas da orga-nização da produção e do trabalho de cada setor, do tipo de população trabalhadora que se pretende con-tratar e dos respectivos treinamentos que se pretende ministrar, do espaço à disposição e suas caracterís-ticas ambientais e de infra-estrutura. Estas intenções podem tanto agravar quanto minimizar os problemas encontrados na situação de trabalho do estudo de caso usado como referência.

Deste dimensionamento resulta claro o campo de estudo e a delimitação das possibilidades de interven-ção. A análise da demanda é antes de tudo um processo de negociação onde entram em jogo interesses dos atores sociais da intervenção e disponibilidade de meios, tempo e recursos.

O que é realmente importante obter de todo este processo de análise do trabalho é a compreensão da forma de estruturação da atividade e dos fatores que determinam esta estruturação. A partir daí chega-se às “situações de ação característica” daquele posto de trabalho e para cada situação pode-se identificar as pessoas envolvidas, os objetivos a serem alcançados, o que interfere na situação, etc.

Podemos definir a noção de “situação de ação característica” como “o conjunto de determinantes cuja presença simultânea vai condicionar a estruturação da atividade” ( Daniellou, 1992 ).

O ergonomista fornecerá uma nova interpretação das dificuldades encontradas na situação de trabalho analisada sob a forma de um diagnóstico de causa e efeito, enfatizando as conseqüências sobre a produ-ção e a saúde dos trabalhadores daquele modo de trabalhar da situação analisada e fornecerá recomen-dações das possíveis correções a serem realizadas a fim de otimizar o processo produtivo.

Tem-se assim dados e informações suficientes para formar a segunda e a terceira fases da metodolo-gia de concepção que são a formação do quadro futuro e a previsão da atividade futura.

A análise de situações de referência deve levar à constituição de um “sistema classificatório” que relacio-na os espaços de trabalho às atividades.

É importante frisar a importância da palavra referenciar, esclarecendo que o princípio metodológico é es-tável , mas o sistema classificatório deve comportar uma dimensão dinâmica.

As situações de trabalho e suas relações são mutantes, dando origem sempre a novos problemas e re-querendo sempre uma reavaliação dos mesmos e conseqüentes novas soluções.

O sistema classificatório deve ser manipulável podendo dar origem a novos sistemas e com eles a novas concepções de locais de trabalho.

Em outras palavras, as situações de referência não devem se transformar em tipologias no sentido da mera cópia de soluções anteriores, sem reflexão e, principalmente sem uma reelaboração conceitual para

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adequar o projeto à nova realidade físico-organizacional do trabalho que irá se configurar na nova situação de proposta.

Outro ponto importante é não confundir o sistema classificatório com as diretrizes de projeto. O sistema é apenas uma referência, como exemplo pode-se referenciar toda uma ordem de problemas e suas causas que não se quer repetidos na nova situação; as subseqüentes diretrizes são uma reelaboração do modelo constituído, ou seja, são as propostas de soluções destes problemas, vistas diante de outros fatores con-dicionantes do projeto, como o local , a organização e/ou tecnologia que podem ser diferentes da situação referenciada. Essas diretrizes tendem e necessitam ter como característica a busca de soluções ad hoc, adaptar a referência o mais possível ao contexto próprio da nova situação de trabalho.

É essencial para a arquitetura dos locais de trabalho a contingência, a contextualidade de cada espaço de trabalho. Por este motivo não deve existir um sistema ou vários sistemas classificatórios associados a tipologias espaciais determinadas em senso estrito (Por contingência entende-se incorporar ao projeto fatos particulares, próprios da situação em análise, e às vezes não generalizáveis).

Os sistemas classificatórios não devem se transformar em uma gramática normativa, pois incorreriam no risco de determinar espaços funcionalmente equivocados em suas soluções de problemas relativos as atividades reais de trabalho. Os problemas que se relacionam a um determinado contexto encontrado na situação de origem, dado o caráter dinâmico das próprias situações e as características organizacionais endógenas de cada empresa, podem não ser mais os mesmos problemas a serem resolvidos na situação do novo projeto. Estes problemas podem encontrar-se transformados ou até totalmente modificados, tanto no que concerne à suas relações de hierarquia quanto às suas correlações.

A melhor solução é sempre permitir e não ignorar as variabilidades (humanas e tecnológicas), o que induz à concepção de um planejamento contínuo, ou seja, planejamento como um processo dinâmico ou cria-ção contínua de sistemas de referência. Somente após uma análise criteriosa da situação de trabalho se procederá à intervenção. A análise poderá apontar para variações que poderiam ser previstas e de alguma forma solucionadas, outras, inevitavelmente, continuarão a existir.

Fundamentalmente as propostas devem ter como objetivo:

- minimizar os efeitos negativos relacionados à existência de variabilidades que ocorrem em qualquer pro-cesso produtivo, tais como variações de matéria-prima, ocorrência de defeitos nos equipamentos, au-mento inesperado da demande por serviços, etc.

- oferecer uma margem físico-temporal para que novos rearranjos e estratégias possam ser realizados (espaços de auto-regulação),

- tentar continuamente aproximar o trabalho prescrito ao trabalho real, difundindo estratégias informais particulares à coletividade de trabalhadores,

- Redimensionar os equipamentos e processos de trabalho em função da atividade humana.

A quarta fase é a análise da situação real, após a implantação das modificações propostas em projeto, seria um acompanhamento da implantação dos projetos de concepção do local de trabalho que deve ser negociada previamente no ato da contratação do ergonomista.

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Esta é uma etapa essencial, um retorno de conhecimentos, que possibilita a constante auto-avaliação e auto-atualização dos procedimentos empregados na atividade profissional de qualquer projetista. É como diz o ditado popular a possibilidade de “aprender com os próprios erros”.

Entretanto, quando se trata de um local de trabalho, a análise da pós implantação do projeto se torna cada vez mais complicada, porque não se trata de uma análise, mas de um acompanhamento periódico e cons-tante, dado que a dinâmica de mudanças que ocorrem nos locais de trabalho é muito rápida e incerta.

Por este motivo, atualmente é comum que o ergonomista ministre cursos e treinamento dentro dos locais de trabalhos para potencializar os indivíduos envolvidos nas atividades de trabalho a intervir e melhorar o próprio ambiente de trabalho de maneira contínua e dinâmica. Esta potencialização tem como base a troca contínua de informações e conhecimentos sobre o processo produtivo e é realizada em seminários perió-dicos. No que concerne às soluções de projeto, estas também são pauta importante de discussão para avaliação e validação coletiva.

A participação contínua dos trabalhadores no remodelamento diário dos seus locais de trabalho gera a FLEXIBILIDADE necessária à possibilidade de adequação futura. É como se o processo de planejar fosse constituído por etapas macro e micro. O micro planejamento corresponderia às fases sucessivas e especí-ficas, aos casos onde a diversidade é avaliada e através de um processo de retorno de informações, re-formulada e readaptada a proposta de inovação de tecnologias organizacionais e físicas.

Através desta “incorporação” metodológica pretendemos garantir uma melhor adequação do método à “realidade da atividade de trabalho”, que é dinâmica por natureza e abrange constantes readaptações para além do controle e ação do projetista.

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