1. Dissolução Parcial de Sociedades - artigo · Em face da forte concentração das sociedades de...
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Marcos Puglisi de Assumpção
1. DISSOLUÇÃO PARCIAL DE SOCIEDADES
Maio 2011
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SUMÁRIO INTRODUÇÃO – pg. 03 Capítulo 01 – SOCIEDADES - CONSIDERAÇÕES GERAIS – pg. 04 01.1 – SOCIEDADES - CLASSIFICAÇÃO – pg. 05 01.2 – SOCIEDADES DE PESSOAS vs SOCIEDADES DE CAPITAIS – pg. 07 01.3 – DA REGÊNCIA SUPLETIVA DAS SOCIEDADES – pg. 10 01.4 – A TEORIA DE FABIO ULHOA COELHO – pg. 14 01.5 – SOCIEDADES – RESUMO – pg. 16 Capítulo 02 – DA DISSOLUÇÃO PARCIAL DAS SOCIEDADES – CONSIDERAÇÕES GERAIS – pg. 17 02.1 – DAS CAUSAS DE DISSOLUÇÃO PARCIAL DAS SOCIEDADES – pg. 19 02.2 – DA DISSOLUÇÃO PARCIAL DA SOCIEDADE POR CAUSA MORTIS – pg. 20
02.2.a – Da Dissolução Parcial Causa Mortis na sociedade limitada e sociedade simples – pg. 20 02.2.b – Caso de falecimento de cônjuge de sócio – pg. 22 02.2.c – Da Dissolução parcial causa mortis na sociedade anônima – pg. 22 02.2.d – Do ‘marco zero’ da Dissolução Parcial causa mortis – pg. 23 02.2.e - Resumo da Dissolução Parcial causa mortis – pg. 24
02.3 – DA DISSOLUÇÃO PARCIAL DA SOCIEDADE PELO DIREITO DE RETIRADA – pg. 25 02.3.a – Considerações iniciais – pg. 25 02.3.b – Da dissolução parcial pelo direito de retirada nas sociedades simples puras – pg. 26 02.3.c – Da dissolução parcial pelo direito de retirada nas sociedades limitadas – pg. 26 02.3.d – Da dissolução parcial pelo direito de retirada nas sociedades anônimas – pg. 27 02.3.e - Do direito de retirada nas sociedades anônimas pela perda da affectio societatis - pg. 29 02.3.f – Especulações sobre o direito de retirada “ad nutum” nas sociedades empresárias limitadas de capital fechado (sociedades limitadas de vínculo estável) – pg. 30 02.3.g – Do ‘marco zero’ do direito de retirada – pg. 33 02.3.h – Resumo sobre a dissolução parcial pelo direito de retirada – pg. 35 02.3.i – Importante Acordão sobre o direito de retirada – pg. 36
02.4– DA DISSOLUÇÃO PARCIAL DA SOCIEDADE PELA EXCLUSÃO DE UM SÓCIO – pg. 39 02.4.a – Considerações iniciais – pg. 39 02.4.b – Das causas de dissolução parcial comuns às sociedades simples puras e às Limitadas – pg. 39 02.4.c – Da dissolução parcial pela exclusão de um sócio exclusiva das sociedades limitadas – pg. 41 02.4.d - Da dissolução parcial pela exclusão de um sócio nas sociedades anônimas – pg. 42 02.4. e – Do “marco zero” da exclusão de um sócio – pg. 43 02.4.f – Resumo sobre a dissolução parcial pela exclusão de um sócio – pg. 45
02.5– DA DISSOLUÇÃO PARCIAL DA SOCIEDADE PELA LIQUIDAÇÃO DE QUOTA A PEDIDO DE CREDOR DE UM SÓCIO – pg. 46
02.5.a – Considerações iniciais – pg. 46 02.5.b – Dos direitos reais e das cláusulas restritivas sobre quotas – pg. 47 02.5.c – Do ‘marco zero’ da liquidação de quota a pedido de credor de sócio – pg. 48 02.5. d – Resumo sobre a dissolução parcial da sociedade pela liquidação de quota a pedido de credor de sócio – pg. 49
02.6– DA DISSOLUÇÃO PARCIAL DA SOCIEDADE POR RENÚNCIA DE UM SÓCIO – pg. 50 02.6.a – Considerações iniciais – pg. 50 02.6.b – Do ‘marco zero’ da renúncia de um sócio – pg. 51 02.6.c – Resumo sobre a dissolução parcial da sociedade por renúncia de um sócio – pg. 53
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Capítulo 03 – DA APURAÇÃO DE HAVERES – CONSIDERAÇÕES GERAIS – pg. 54 03.1 – DA APURAÇÃO DE HAVERES NAS SOCIEDADES SIMPLES E LIMITADAS – pg. 56
03.1.a – Do pagamento de haveres pelo modo estabelecido no contrato – pg. 56 03.1.b – Do pagamento de haveres pelo modo convencionado pelas partes – pg. 57 03.1.c – Do pagamento de haveres pelo modo determinado na sentença – pg. 57 03.1.d – Do pagamento de haveres em dinheiro ou em bens – pg. 57 03.1.e – Coletânea de jurisprudência sobre a apuração e o pagamento de haveres – pg. 58
03.2 – DA APURAÇÃO DE HAVERES NAS SOCIEDADES ANÔNIMAS – pg. 60 CONSIDERAÇÕES FINAIS – pg. 62 BIBLIOGRAFIA – pg. 64
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INTRODUÇÃO Este artigo aborda as várias situações em que um sócio retira-se de uma sociedade,
quer por vontade própria, quer por vontade dos demais sócios, quer por disposições legais.
Discorre sobre as diferenças entre a saída de um sócio de uma sociedade simples
(não empresária) e de uma sociedade empresária (Limitada ou Anônima).
Trata também, de assuntos ligados a Apuração de Haveres do sócio retirante e do
“marco zero” para contagem de prazos e para o cálculo dos haveres.
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Capítulo 01 SOCIEDADES CONSIDERAÇÕES GERAIS A origem das sociedades remonta a priscas eras. Tipos embrionários de sociedades
foram identificados no direito babilônico, no direito fenício, no direito grego e em outros
mais. O Código de Hammurabi continha em seu art. 99, a regra de que "se um homem deu
a (outro) homem dinheiro em sociedade, o lucro e as perdas que existem, eles partilharão
diante de Deus, em partes iguais"; a qual foi reconhecida pelo direito romano, que a
estendeu a todos os tipos de sociedade.
E embora as sociedades tenham alcançado razoável desenvolvimento no direito
romano, remontando as primeiras, a duzentos anos antes de Cristo, verdade é que as
diversas formas de sociedades de comércio atualmente utilizadas em todos os países
civilizados possuem sua origem histórica nos estatutos das cidades comerciantes da Idade
Média, e especialmente das cidades italianas.
Foi, pois, o comerciante medieval que deu início ao desenvolvimento das
sociedades comerciais, que se aperfeiçoaram ao longo do tempo, resultando tais como hoje
as conhecemos.
De inicio as sociedades se constituíam com a responsabilidade ilimitada dos sócios
(sociedades em nome coletivo, em comandita simples, em conta de participação).
Apenas grandes sociedades constituíam-se como anônimas, onde a
responsabilidade dos sócios era limitada ao capital investido (Cia. das Índias orientais, Cia.
das Índias Ocidentais, etc.). Essas sociedades, no entanto, eram de difícil constituição,
muito dispendiosas, dependente de autorização superior e muito burocratizadas.
Seguindo os anseios dos pequenos e médios comerciantes, na segunda metade do
século XIX, surgiu na Alemanha e na Inglaterra, a sociedade Limitada, que simplificava o
processo de abertura da empresa e conferia limitação da responsabilidade dos sócios ao
capital investido.
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01.1 – SOCIEDADES – CLASSIFICAÇÃO
Em nosso direito existe expressa contraposição entre sociedades de fim econômico1
e sociedades de fim não econômico, para essas, reservado o nome de “Associação2”.
Como dito anteriormente, nosso estudo limitar-se-á às sociedades de fim
econômico.
O Código Civil Brasileiro classifica as sociedades que tenham um fim econômico,
em duas classes:
• sociedade empresária
• sociedade simples (não empresária)
Os ilustres projetistas de nosso Código Civil, não adotaram escorreita terminologia
para classificar as sociedades em duas classes, Empresária e Simples. Coerentemente com
a nomenclatura adotada haveriam de escolher um adjetivo que se opusesse ao utilizado
para a denominação “empresária” o que não ocorreu com o adjetivo “simples”. Deveriam
nossos legisladores ter escolhido a classificação “não empresária” que melhor se adequaria.
Assim, em uma classificação inicial, tem-se que:
• sociedade empresária é aquela que tem por objeto o exercício de atividade
própria de empresário3, ou seja: atividade econômica organizada para
produção de bens ou serviços (art. 966 CC).
• Sociedade simples (não empresária) é aquela que, embora tendo uma
atividade econômica, não se conceitua como uma sociedade empresária.
O Código adotou também classificação fundada na forma de constituição da
sociedade, assim, a sociedade anônima, independente de seu objeto, será sempre sociedade
empresária.
1 Art.981: Celebram contrato de sociedade as pessoas que reciprocamente se obrigam a contribuir, com bens ou serviços, para o exercício
de atividade econômica e a partilha, entre si, dos resultados. 2 Art.53: Constituem-se as associações pela união de pessoas que se organizem para fins não econômicos 3 Art. 982. Salvo as exceções expressas, considera-se empresária a sociedade que tem por objeto o exercício de atividade própria de
empresário sujeito a registro e, simples, as demais.
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Determina também o Estatuto Civil4 que, se a sociedade for empresária, terá que
adotar um dos cinco tipos regulados pelo Código (Nome Coletivo, Comandita Simples,
Limitada; Anônima, Comandita por Ações).
Já a sociedade não empresária (simples) pode constituir-se seguindo os três
primeiros tipos (Nome Coletivo, Comandita Simples, Limitada), ou não adotar nenhum
deles, quando então será regido pelo regime jurídico das sociedades simples (art. 997ss).
Em face da forte concentração das sociedades de nosso país ser do tipo Simples,
Limitada e Anônima, dirigiremos o objeto de nosso estudo, para esses três tipos
societários, quer sejam sociedades empresárias quer não empresárias.
Assim nosso estudo se concentrará em estudar:
• Sociedades não empresárias simples (simples puras);
• Sociedades não empresárias limitadas (simples limitadas);
• Sociedades empresárias limitadas (empresárias limitadas);
• Sociedades empresárias anônimas. (sociedades anônimas)
4 Art. 983. A sociedade empresária deve constituir-se segundo um dos tipos regulados nos arts. 1039 a 1092: a sociedade simples pode constituir-se de conformidade comum desses tipos, e, não o fazendo, subordina-se às normas que lhe são próprias.
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01.2 – SOCIEDADES DE PESSOAS vs. SOCIEDADES DE CAPITAIS
A doutrina, de há muito tempo, apesar da crítica de alguns autores, classifica as
sociedades como de pessoas (intuitu personae) ou de capitais (intuitu pecunae), de acordo
com o elemento preponderante de sua formação.
Uma sociedade constituída com intuitu personae possui as seguintes características:
• Os sócios, ao se associarem, escolhem-se mutuamente, justamente por já se
conhecerem;
• Os próprios sócios dirigem a sociedade, em cujo capital detêm quotas
representativas de sua parcela no capital;
• As quotas, em princípio não são cessíveis;
• Extingue-se a sociedade se morto ou interdito um dos sócios.
• Do princípio ao fim consideram-se as pessoas dos sócios, não o capital;
• Terceiros, ao se relacionarem com a sociedade, têm mais em linha de conta
as pessoas dos sócios.
Uma sociedade constituída com intuitu pecuniae possui as seguintes características:
• Os sócios, ao se associarem, destacam mais o capital aportado do que as
relações pessoais;
• O capital social é representado por ações, livremente subscritas, e cessíveis
sem restrições.
• Não são os sócios que obrigatoriamente dirigem a sociedade;
• A sociedade não se extingue com a morte, falência ou interdição de um
sócio.
• Os terceiros, ao se relacionarem com a sociedade, atentam antes para o
capital social do que para as pessoas dos sócios.
Classificam-se as sociedades Limitadas e as Anônimas como de pessoas ou de
capitais?
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Conforme vimos anteriormente, as sociedades de responsabilidade limitada
surgiram na Alemanha, por pressões dos pequenos e médios comerciantes, que, se de um
lado, pretendiam fugir à responsabilidade ilimitada das sociedades em nome coletivo, de
outro, não queriam adotar a forma das anônimas, de difícil constituição e de
funcionamento oneroso e burocrático.
A sociedade Limitada seria, portanto, uma sociedade Anônima simplificada!
Em virtude dessa sua origem embrionária híbrida, a sociedade limitada, ora afasta-
se, ora aproxima-se, da sociedade anônima.
Na doutrina nacional ainda não se encontra assentada a classificação das sociedades
limitadas como de pessoas ou de capital.
Por essa razão, no escólio de José Waldecy Lucena5, ao ser constituída, pode a
sociedade limitada estruturar-se segundo os elementos acima referenciados, que a doutrina
atribui à sociedade de pessoas, em que aflora o intuitu personae: unanimidade ou exigência
de quorum elevado nas deliberações sociais (arts. 1.061, l.063, §1º e 1.076); não
cessibilidade das quotas sociais a estranhos (art. 1.057); dissolução por morte ou
vicissitudes pessoais dos sócios (arts. 1.028 e 1.035); supletividade normativa pelas regras
da sociedade simples (art. 1.053); etc. Nesse caso, impondo-se a índole pessoalista da
sociedade, pode ela ser nominada de sociedade limitada fechada.
Pode também, a sociedade limitada, constituir-se sob as vestes de uma sociedade de
capitais, com predomínio do intuitu pecuniae, aproximando-se de uma sociedade anônima
fechada, quando então se fazem presentes os elementos desta: princípio majoritário nas
deliberações sociais (art. 1.076); livre cessibilidade, ou com restrições mitigadas, das
quotas sociais (art. 1.057); adoção de assembléia geral e de conselho fiscal (arts. 1.072 e
1.066); supletividade normativa pelas regras da sociedade anônima (art. 1053); etc. Ou
seja, identificada com a índole capitalística, pode a sociedade ser denominada sociedade
limitada aberta.
Já as sociedades anônimas, que serão sempre empresárias e sempre sociedades de
capital (intuitu pecuniae), poderão ser constituídas com capital fechado, aproximando-se da
5 Lucena, José Waldecy – Das Sociedades Limitadas – 6ª Ed., Renovar, 2005, pag. 63
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forma das sociedades limitadas abertas, ou com o capital aberto, com o intuitu pecuniae
puro.
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01.3 – DA REGÊNCIA SUPLETIVA DAS SOCIEDADES
O Código Civil, pelo seu art. 10536, reconhecendo o caráter híbrido da sociedade
limitada, permite que a autonomia privada molde-a conforme o interesse dos sócios.
Prevalecerá o caráter de uma sociedade de pessoas, no silêncio do contrato social.
(art. 1053 caput)
Terá a feição de uma sociedade de capitais, caso opte o contrato social pela
regência das regras da sociedade anônima. (art. 1053, § único)
A adoção da regência supletiva das limitadas pela lei das anônimas deve ser
interpretada com critérios de razoabilidade, não podem ser aplicadas às sociedades
limitadas as regras da sociedade anônima atinentes à constituição da sociedade; à limitação
de responsabilidade dos sócios; aos direitos e obrigações dos sócios entre si e para com a
sociedade; à emissão de títulos estranhos ao capital social, tais como debêntures, partes
beneficiárias e bônus de subscrição; à abertura do capital com apelo à poupança pública; à
emissão de quotas sem valor nominal; à emissão de certificados de quotas; e à subsidiária
integral.
Por outro lado, são plenamente aplicáveis às sociedades limitadas as regras da
sociedade anônima no que respeita, sobretudo, à sua estrutura organizacional, aos direitos,
deveres e responsabilidades dos administradores, as regras de organização e
funcionamento dos órgãos da administração, bem como aquelas que regem os pactos
parassociais, como o acordo de acionistas.
Importante observar que mesmo que o contrato social estipule a regência supletiva
pela lei das anônimas, na hipótese em que omissões das regras específicas sobre limitadas
não puderem ser supridas pela lei das anônimas, ou essas regras descaracterizarem o tipo
societário das limitadas, deve-se entender aplicáveis, diante da omissão da lei supletiva, as
regras da sociedade simples!
6 Art. 1.053. A sociedade limitada rege-se, nas omissões deste Capítulo, pelas normas da sociedade simples. Parágrafo único. O contrato social poderá prever a regência supletiva da sociedade limitada pelas normas da sociedade
anônima.
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Isso porque a Lei de Sociedades Simples é, por excelência, no Código Civil de
2002, a regra geral de regência das sociedades limitadas, conforme consta do caput do
artigo 1.053.
Essa regra somente é excepcionada pelo permissivo do parágrafo único desse
mesmo artigo, que permite a invocação subsidiária da Lei das Sociedades por Ações, por
expressa disposição contratual.
Porém, se essa lei, eleita como supletiva pelo contrato social, não puder aplicar-se
sob pena de afronta ou descaracterização do tipo societário da limitada, volta-se à regra
geral, para aplicar-se subsidiariamente às omissões da lei das Limitadas, as regras sobre as
sociedades simples.7
Temos como exemplos marcantes da aplicação subsidiária da regra das Simples às
Limitadas, mesmo que o contrato defina a aplicação supletiva da LSA: i) o art. CC 1028
caput, que trata da dissolução parcial da sociedade pela morte de um sócio; ii) o art. CC
1026 que trata da penhorabilidade da quota social; iii) o art. CC1027 que trata das quotas
do cônjuge do sócio; iv) o art. CC 1029 que trata do direito de saída imotivada de um
sócio; v) o art. CC 1033, IV que define prazo de 180 dias para a reconstituição da
sociedade que perde a pluralidade de sócios.
Ninguém, no estágio atual da jurisprudência pátria, duvidaria da aplicabilidade
dessas regras das sociedades simples às sociedades limitadas, mesmo que estas tiverem a
regência supletiva da LSA preconizada em seu contrato social.
O escólio de Modesto Carvalhosa nos lembra também que o art. 44 CC determina a
aplicação subsidiária das regras referentes às associações a todas as sociedades. Deve-se
entender, porém, que a supletividade das regras concernentes às associações para as
sociedades limitadas é secundária, incidindo apenas se silentes as regras primariamente
supletivas, indicadas no art. 1053 CC.8
7 Carvalhosa, Modesto – Comentários ao código civil – Vol. 13 – Saraiva, 2003, pag. 45 8 Carvalhosa, Modesto – Comentários ao código civil – Vol. 13 – Saraiva, 2003, pag. 46 - É preciso lembrar, porém, que
no Capítulo I (Disposições Gerais) do Título II (Das Pessoas Jurídicas) do Livro I (Das Pessoas) da Parte Geral do Código
Civil de 2002 está inserido o art. 44, que em seu parágrafo único determina a aplicação subsidiária das regras referentes
às associações a todas as sociedades que são objeto do Livro II da Parte Especial do Código de 2002.
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Com base no acima exposto sobre regência supletiva, pecando pelo exagero, a
cláusula de regência supletiva de uma sociedade empresária limitada deveria ser assim
redigida:
“Esta sociedade empresária é regida pelas normas das sociedades
limitadas, capítulo IV, subtítulo II, título II, do livro II, Do Direito de
Empresa, do Código Civil Brasileiro, artigos 1052 a 1087.
Parágrafo 1º: Nas omissões do capítulo IV acima citado, esta
sociedade será regida supletivamente, no que for aplicável, pelas normas
da sociedade anônima (lei 6404/76), caso a aplicação dessa lei não
descaracterize o tipo societário das limitadas.
Parágrafo 2º: Nas omissões do capítulo IV acima citado, e caso as
normas da sociedade anônima (lei 6404/76) não puderem ser aplicadas, por
omissão desta, ou no caso da aplicação dessa lei descaracterizar o tipo
societário das limitadas, esta sociedade será regida supletivamente pelas
normas das sociedades simples (artigos 997 a 1038 CC).
Parágrafo 3º: Na hipótese da inaplicabilidade das normas acima
citadas, aplicar-se-á as regras que regem as associações.”
No caso específico das sociedades limitadas, essa aplicação subsidiária das regras relativas às associações não pode
suplantar a aplicação supletiva das regras definidas como tais pela norma especial do art. 1.053. Assim, aplicar-se-ão
supletivamente às sociedades limitadas, primeiro as regras referentes à sociedade simples ou às sociedades anônimas,
conforme o caso. E, permanecendo a omissão, buscar-se-á nas disposições relativas às associações a regra supletiva.
Deve-se entender, portanto, que a supletividade das regras concernentes às associações para as sociedades limitadas é
secundária, incidindo apenas se silentes as regras primariamente supletivas.
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01.4 – A TEORIA DE FABIO ULHOA COELHO
Fabio Ulhoa Coelho em seu “Curso de Direito Comercial – Vol. II, Saraiva, 2010,
pag. 387” defende que existem duas espécies (ou subtipos) sociedades limitadas no direito
brasileiro.
Em suas palavras:
“O primeiro subtipo é o da sociedade limitada sujeita à regência
supletiva das normas da sociedade simples. Trata-se das sociedades em que
o contrato social não elege a LSA como norma de regência supletiva. Quer
dizer, sendo o instrumento contratual omisso quanto à disciplina supletiva
ou adotando expressamente as normas da sociedade simples por parâmetro,
a sociedade limitada será desse primeiro subtipo.
Proponho chamar as sociedades deste subtipo I de limitadas com
vínculo societário instável. Isso porque, quando contratadas por prazo
indeterminado, qualquer sócio pode dela se desligar, imotivadamente, por
simples notificação aos demais, a qualquer tempo. Aplica-se, com efeito, a
essa sociedade limitada o disposto no art. 1.029 do CC (do capítulo das
sociedades simples), que assegura ao sócio o direito de retirar-se da
sociedade sem prazo, mediante simples notificação aos demais, com
antecedência de 60 dias. O sócio retirante tem direito ao reembolso de suas
quotas pelo valor patrimonial.
O segundo subtipo de sociedades limitadas é o das sujeitas à
regência supletiva da LSA. Para tanto, é necessário que o contrato social
contemple cláusula expressa mencionando a opção dos sócios por essa
disciplina supletiva. Sem a expressa eleição pelos sócios da LSA como fonte
supletiva de regência da sociedade, submete-se ela às regras da sociedade
simples.
Proponho chamar as sociedades deste subtipo II de limitadas com
vínculo societário estável. Como, nesse caso, não se aplica o art. 1.029
acima mencionado, e não se encontra, por outro lado, na LSA, nenhuma
norma contemplando qualquer forma de dissolução parcial da sociedade,
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segue-se que não há fundamento legal para o sócio pretender desligar-se
imotivadamente do vínculo societário que o une aos demais. Mesmo sendo
contratada a limitada por prazo indeterminado, como a lei de regência
supletiva é a LSA, não há meios de o sócio se retirar da sociedade, a não
ser na hipótese do art. 1.077, também do CC (modificação do contrato
social, fusão ou incorporação).”
Em seu escólio, Fabio U. Coelho define quatro relevantes diferenças entre os dois
subtipo de sociedades limitadas:
• Dissolução parcial;
• Desempate;
• Destinação do resultado; e
• Vinculação a atos estranhos ao objeto social.
Em nosso estudo, interessa dissertar sobre a primeira diferença – Dissolução
Parcial.
Discorre o ilustre doutrinador sobre esse assunto:
“Dissolução parcial. As sociedades limitadas com vínculo societário
instável (subtipo I) podem ser parcialmente dissolvidas nas hipóteses de
morte (CC, art. 1.028), liquidação de quotas a pedido de credor de sócio
(art. l.026, parágrafo único), retirada imotivada (art. l.029, primeira parte),
retirada motivada (art. l.077) ou expulsão de sócio (art. l.085).
Já as sociedades com vínculo estável (subtipo II) só podem ser
parcialmente dissolvidas nas hipóteses de retirada motivada (art. l.077) ou
expulsão de sócio (art. l.085). Isso porque as três primeiras causas que
podem importar a dissolução parcial da sociedade limitada de subtipo I
estão previstas unicamente em regras referentes às sociedades simples, que
não se aplicam às limitadas de subtipo II, em que os sócios elegeram, no
contrato social, a LSA como fonte supletiva de regência.”
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Numa primeira análise, verifica-se que as sociedades limitadas de vínculo instável e
estável, da teoria de Fabio U. Coelho, muito se aproximam das sociedades limitadas
fechadas e abertas, conforme definição de José W. Lucena, acima citada.
No desenrolar de nosso trabalho teremos oportunidade de comparar esses dois
subtipos societários, face o tema de nosso estudo, qual seja: A resolução da sociedade com
relação a um dos sócios – Dissolução parcial da sociedade - É permitido a um sócio retirar-
se “ad nutum” de uma sociedade limitada de vínculo estável?
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01.5 – SOCIEDADES - RESUMO Do quanto exposto nos itens anteriores, podemos formar um quadro comparativo
entre as espécies de sociedades que incluiremos em nosso estudo, sejam elas empresárias
ou não empresárias, limitadas ou anônimas, sociedades de pessoas ou de capitais.
SOCIEDADE
NÃO EMPRESÁRIA
INTUITU REGÊNCIA
Simples pura Sociedade de pessoas com Intuitu personae puro
Lei das sociedades simples (art. 997 a 1038 CC)
Simples Limitada
Sociedade de pessoas com Intuitu personae puro
Lei das sociedades limitadas (art. 1052 a 1087 CC). Lei das sociedades simples funcionam como regra geral. (*)
SOCIEDADE EMPRESÁRIA
INTUITU REGÊNCIA
Limitada Fechada
Sociedade de pessoas com Intuitu personae puro. (não opção pela regência supletiva da lei das SAs)
Lei das sociedades limitadas (art. 1052 a 1087 CC). Lei das sociedades simples funcionam como regra geral. (*)
Limitada Aberta
Situação intermediária entre sociedade de pessoas e sociedade de capital. (opção pela regência supletiva da lei das SAs)
Lei das sociedades limitadas (art. 1052 a 1087 CC), com regência supletiva da lei das SAs (lei 6404/76). Lei das sociedades simples funcionam como regra geral. (*)
Anônima Fechada
Sociedade de capital com Intuitu pecuniae mitigado
Lei das sociedades anônimas
Anônima Aberta Sociedade de capital com Intuitu pecuniae puro
Lei das sociedades anônimas
(*) As normas sobre as sociedades simples (art. 997 a 1038) funcionam como
regras gerais para TODAS as sociedades limitadas.
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Capítulo 02 DA DISSOLUÇÃO PARCIAL DAS SOCIEDADES CONSIDERAÇÕES GERAIS O Código Comercial Brasileiro, datado de 1850, revogado parcialmente em 2002
pelo atual Código Civil, inspirando-se no direito francês impregnado de forte doutrina
individualista, ao disciplinar a dissolução da sociedade, deu ênfase à liberação do sócio,
sacrificando a sociedade, que deveria ser totalmente dissolvida.
Com o passar dos tempos, a doutrina individualista esmaeceu-se, definindo-se pela
natureza plurilateral do pacto societário e com o advento dos princípios da função social e
preservativo da empresa, os interesses coletivos passaram a sobrepujar aos interesses
individuais.
No Brasil, o “turning point” deu-se em 1979 com o antológico arresto do STF, que
teve como relator o Ministro Décio Miranda (RE 91044 RS)9, que permitiu que numa
sociedade por quotas, formada por três sócios, um dos sócios, que pediu a dissolução total
da sociedade, tivesse sua participação paga, continuando a empresa com os demais sócios.
O Código Civil de 2002 deu definitivo enfoque ao problema, pelo seu artigo 1029
que tratou da resolução da sociedade com relação a um sócio. A ruptura do vínculo
societário continua existindo, porém conduz, tão somente à liquidação da quota do sócio
retirante.
Com a constituição de 1988, deslocada a competência recursal da matéria para o
STJ, ficou consolidado o estágio atual do direito pretoriano sobre a matéria, em vários
julgados, sendo um dos mais evidentes, o seguinte:
“Na dissolução de sociedade de responsabilidade limitada, a apuração de haveres, no caso de sócio retirante ou pré-morto, ou ainda por motivo de
9 COMERCIAL. DISSOLUÇÃO DE SOCIEDADE LIMITADA. Pedida a dissolução total por um sócio, e a dissolução parcial pelos dois outros, o interesse social da conservação do empreendimento econômico, viável ou próspero, indica a adoção da segunda formula. Nesse caso, dar-se-á apuração de haveres do sócio dissidente de maneira que a aproxime do resultado que poderia ele obter com a dissolução total, isto e, de forma ampla, com plena verificação, física e contábil, dos valores do ativo, e atualizados os ditos haveres, em seu valor monetário, até a data do pagamento.
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quebra de affecttio societatis, há de fazer-se como de dissolução total se tratasse posto que, segundo a jurisprudência do STJ, essa linha de entendimento tem por escopo preservar o quantum devido ao sócio retirante, que deve ser medido com justiça, evitando-se, de outro modo, o locupletamento indevido da sociedade ou sócios remanescentes em detrimento dos retirantes.10”
10 REsp 38.160-6 SP Rel. Min. Waldemar Zweiter – DJU-I, 13.12.93
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02.1 – DAS CAUSAS DE DISSOLUÇÃO DAS SOCIEDADES Causas existem, que exigem a dissolução TOTAL da sociedade, entre elas
podemos citar:
• Término do prazo de duração;
• Falência;
• Mútuo consenso;
• Não atendimento ao objeto social;
• Existência de um único sócio;
• Causas previstas no contrato ou estatuto;
• Anulação do contrato ou da constituição da sociedade;
• Extinção da autorização para funcionar;
• Decisão administrativa governamental (Ato do príncipe).
Nosso estudo se prende, porém, às causas de dissolução PARCIAL da sociedade.
Nesse grupo incluímos as seguintes causas:
Causas de Dissolução Parcial de Sociedade
Código Civil Sociedades Simples e Limitadas
Lei das SAs Sociedades Anônimas
02.2 - Morte de Sócio 1028
02.3 - Direito de Retirada 1029, 1077 137, 221, 236, 256, 264
02.4 - Exclusão de Sócio 1030, 1085 107
02.5 - Liquidação de quota a pedido de credor de sócio
1026
02.6 - Renúncia 1275, II
Passemos a estudar cada uma delas individualmente:
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02.2 – DA DISSOLUÇÃO PARCIAL DA SOCIEDADE POR
CAUSA MORTIS 02.2.a – Da Dissolução Parcial Causa Mortis na sociedade limitada
e sociedade simples
Não há no Código Civil, no capítulo dedicado às Sociedades Limitadas (arts. 1052
a 1087), uma única linha que regule a matéria sobre a morte de um sócio, assim nas
sociedades LIMITADAS e SIMPLES, é o artigo 1028 CC11 (inserido nas normas da
sociedade simples) que regula o assunto relativo à morte de um sócio, reforçando a tese
anteriormente exposta de que as regras da sociedade simples prevalecem perante a lei das
anônimas, mesmo que o contrato social preconize a regência supletiva por essa lei, sob
pena de afronta ou descaracterização do tipo societário da limitada.
Caso assim não fosse, a propriedade das ações transmitir-se-iam diretamente aos
sucessores do sócio falecido, impedindo que o contrato social disciplinasse o assunto, o
que descaracterizaria o tipo societário da limitada, pois nessas sociedades a matéria que
regula a morte de um sócio é de livre disposição entre os sócios, ou seja, podem, os sócios,
dispor no contrato social da maneira que melhor convier aos seus interesses.
Assim, morto um dos sócios várias situações podem ocorrer:
a) Pagamento aos herdeiros dos haveres do sócio falecido – Regra Geral
conforme caput do art. 1028 (dissolução parcial):
A morte de um sócio, na falta de previsão diversa no contrato, conduz à liquidação
de sua quota social, com o pagamento dos haveres aos seus herdeiros, operando-se, neste
caso, a redução do capital da sociedade.
11 Art. 1.028 CC. No caso de morte de sócio, liquidar-se-á sua quota, salvo:
I - se o contrato dispuser diferentemente;
II - se os sócios remanescentes optarem pela dissolução da sociedade;
III - se, por acordo com os herdeiros, regular-se a substituição do sócio falecido.
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b) Substituição do sócio falecido pelos seus herdeiros:
É possível que o contrato social contemple a continuidade da sociedade, sem
redução de capital, com os sucessores do sócio falecido, é a chamada “cláusula de
continuação”, que garante aos herdeiros o ingresso na sociedade.
Importante ressaltar que essa cláusula de continuação não é uma via de mão dupla.
Não podem os sócios remanescentes, salvo justa causa, recusar os herdeiros do sócio
falecido (pacta sunt servanda), porém a cláusula já não obriga os herdeiros, os quais
somente ingressarão na sociedade se assim o desejarem, podendo, ao contrário, optar pelo
recebimento dos respectivos haveres, pois ninguém pode ser compelido, contra sua
vontade, a associar-se.
c) Aquisição das quotas do sócio falecido pela sociedade e/ou pelos demais
consócios (art. 1028, I):
Podem os sócios dispor que a sociedade e/ou os sócios supérstites adquirirão dos
herdeiros as quotas do falecido.
Neste caso não haverá redução de capital da sociedade. Pode-se, inclusive, ser
estabelecia uma ordem de prioridade para aquisição das quotas. Por exemplo: primeiro a
sociedade com fundos disponíveis, depois os sócios fundadores, seguindo uma ordem de
antiguidade ou segundo o número de quotas possuídas.
d) Liquidação da Sociedade (dissolução total):
Quando da morte de um sócio, podem os demais sócios, ou o contrato social, optar
pela dissolução total da sociedade, que entrará em liquidação.
Os sócios supérstites, mesmo em minoria (no caso da morte de um majoritário),
prestigiando o princípio da conservação da empresa, podem decidir dar continuidade à
empresa, introduzindo modificações no contrato original, alterando a cláusula de
dissolução total, para dissolução apenas do vínculo do sócio pré-morto, com o pagamento
de haveres aos herdeiros ou admissão destes em substituição ao falecido.12
12 REsp 61.278-SP, 4ª Turma, j. 25.11.97, DJU-1 de 06.04.98 pg. 121
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02.2.b - Caso de falecimento de cônjuge de sócio:
Interessante situação ocorre quando do falecimento do cônjuge de um sócio.
Exclui-se desde logo os casamentos sob a égide do regime da separação total, já
que a morte do consorte em nada refletirá sobre as quotas sociais que o sócio detenha na
sociedade.
O Código Civil 2002 regula totalmente a matéria pelo artigo 102713. Assim, o
cônjuge supérstite continuará normalmente como sócio da sociedade e somente quando da
liquidação da sociedade ou de sua quota social, estará obrigado a trazer à sobrepartilha o
que então lhe couber, caso já esteja o inventário encerrado.
Do ponto de vista prático, essa esdrúxula situação não é confortável para nenhuma
das partes. Por essa razão é aconselhável introduzir no contrato social cláusula que regule
esse fato: ou liquida-se de vez as quotas cabentes aos herdeiros ou cônjuge, ou define-se
quorum para aceitá-los como sócios.14
02.2.c - Da Dissolução Parcial Causa Mortis na sociedade anônima:
Na SOCIEDADE ANÔNIMA, a lei 6404/76 que regula a matéria não traz uma só
palavra com relação ao falecimento de um sócio, isso em virtude do caráter intuitu
pecuniae desse tipo de sociedade.
Ou seja, a propriedade das ações transmite-se diretamente aos sucessores do sócio
falecido seguindo o rito do direito das sucessões.
Apesar do artigo 36 da referida lei autorizar que os estatutos de companhias
fechadas imponham limites à livre circulação de ações nominativas, estes não prevalecem
13 Art. 1.027 CC. Os herdeiros do cônjuge de sócio, ou o cônjuge do que se separou judicialmente, não podem exigir desde logo a parte que lhes couber na quota social, mas concorrer à divisão periódica dos lucros, até que se liquide a sociedade. 14 DISSOLUÇÃO PARCIAL DE SOCIEDADE EM CURSO, COM APURAÇÃO DE HAVERES - Pretensão da esposa do autor, dele estando a judicialmente se separar, intervir no feito na condição de litisconsorte ativa - Indeferimento a gerar o presente agravo - Sócia não é, mas sim o marido - Daí porque, em princípio, dado não lhe seria intervir nos negócios sociais; os demais Integrantes da sociedade a tanto poderiam perfeitamente se opor - Agora, todavia, litiga-se apenas sobre os bens componentes acervo devido ao sócio retirante, dos quais a esposa tem metade em razão do regime de bens no casamento - Possibilidade, assim, de intervenção como assistente simples, meramente 'ad adjuvandum' - Agravo em parte provido para esse fim. - TJSP- AI nº 446.769.4/6-00
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nas hipóteses de sucessão; cessão entre sócios; liquidação de sociedade conjugal; cessão a
cônjuge, descendente ou ascendente.
02.2.d – Do “Marco Zero” da Dissolução Parcial Causa Mortis
Aberta a sucessão, a herança transmite-se desde logo aos herdeiros (art. 1784 CC).
O art. 993, § 1º CPC fala que “O juiz determinará que se proceda a apuração de
haveres se o autor da herança era sócio de sociedade que não anônima”.
Portanto, nas Limitadas e Simples, na hipótese dos herdeiros não continuarem
como sócios da sociedade (dissolução parcial), a data do falecimento é o ‘marco zero’ para
a apuração de haveres.
Porém, o espólio, representado pelo inventariante, continua com os direitos
políticos e patrimoniais junto à sociedade, até que sua saída seja registrada na Junta
Comercial e sejam pagos seus haveres.
Nas anônimas a herança transmite-se desde logo aos herdeiros (art. 1784 CC),
continuando o inventariante com os direitos políticos e patrimoniais junto à sociedade, até
que o formal de partilha distribua as ações para quem de direito, que passarão a deter os
mesmos direitos políticos e patrimoniais.
Assim, na dissolução parcial causa mortis, o ‘marco zero’ será:
Sociedade: “Marcos Zero” para cálculo dos haveres
“Marcos Zero” para cessação dos direitos políticos e patrimoniais
Simples Pura
Simples Limitada Limitada Fechada
Limitada Aberta
Data de falecimento do sócio Registro da alteração contratual na Junta Comercial e pagamento dos haveres aos herdeiros
Anônima Fechada
Anônima Aberta
Não há cálculo de haveres, pois as ações se transmitem aos herdeiros
O inventariante fica com os direitos até a partilha quando estes são transferidos aos herdeiros.
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02.2.e - Resumo da dissolução parcial Causa Mortis:
Sociedade: Dissolução Causa Mortis: Simples Pura Simples Limitada
Limitada Fechada Limitada Aberta
a) Regra Geral (art. 1028 caput - dissolução parcial com redução de capital): Pagamento aos herdeiros dos haveres do sócio falecido b) Substituição do sócio falecido pelos seus herdeiros: necessita cláusula específica, herdeiros podem renunciar e optar pela apuração de seus haveres; c) Aquisição das quotas do sócio falecido pela sociedade e/ou pelos demais consócios: sem redução de capital, necessita cláusula específica; d) Liquidação da Sociedade: dissolução total, demais sócios podem optar continuar com a sociedade.
Anônima Fechada
Anônima Aberta
As ações transmitem-se diretamente aos sucessores do sócio falecido seguindo o rito do direito das sucessões. Não há dissolução parcial da sociedade nem apuração de haveres.
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02.3 – DA DISSOLUÇÃO PARCIAL DA SOCIEDADE PELO
DIREITO DE RETIRADA 02.3.a - Considerações iniciais:
O Direito de Retirada ou Direito de Recesso é a prerrogativa que um sócio tem de
desligar-se da sociedade mediante recebimento de seus haveres do patrimônio social.
Pelo exercício do direito de retirada haverá redução do patrimônio da sociedade e,
consequentemente, do capital social pela liquidação das quotas do sócio retirante.
O Direito de retirada era um instituto desconhecido à época da promulgação do
Código Comercial de 1850.
Com o surgimento de mecanismos tendentes a frear o poder das maiorias, o código
comercial italiano em 1882, foi o primeiro diploma a legislar sobre o direito de recesso.
O direito de retirada foi introduzido no ordenamento jurídico brasileiro em 1919
com a lei das sociedades limitadas; as sociedades anônimas, somente em 1932, vieram a
conhecer o direito de recesso.
Hoje em dia o direito de retirada, objeto de críticas e restrições, está sendo
repensado. A tendência é mesmo vedá-lo para as companhias abertas, destinando-o apenas
para as anônimas de capital fechado e para as limitadas.
A lei das falências (lei 11.101/05) pelo seu art. 116, II suspende o direito de retirada
no caso de decretação de falência.
No Brasil, atualmente, tanto a lei das anônimas (arts. 136 e 137) como o Código
Civil (arts. 1029 e 1077) disciplinam a matéria.
O direito de recesso inscreve-se entre as prerrogativas fundamentais do acionista,
consoante o art. 109 da LSA. Trata-se de direito irrenunciável, uma vez que é norma de
ordem pública.
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A renúncia pelo acionista desse direito, ainda que somente para determinado caso, é
nula, como também será nula qualquer cláusula estatutária ou deliberação de assembléia
que exclua o direito de recesso e dificulte ou protele seu exercício.15
02.3.b - Da Dissolução Parcial pelo Direito de Retirada nas
Sociedades Simples puras:
Nas sociedades não empresárias SIMPLES PURAS é unicamente o artigo 1029
CC16 que regula o assunto do direito de retirada de um sócio.
Ou seja, nas sociedades Simples por prazo Indeterminado, o direito de retirada pode
ser exercido “ad nutum”, independente de qualquer justificativa, desde que anunciado com
60 dias de antecedência. É o que podemos chamar de “direito de retirada imotivado” ou
“denuncia vazia” do contrato social.
Já nas sociedades de prazo determinado, a saída de um sócio, antes do termino do
prazo contratual, só por “justa causa” e com decisão judicial.
02.3.c - Da Dissolução Parcial pelo Direito de Retirada nas
Sociedades Limitadas:
Nas sociedades não empresárias SIMPLES LIMITADAS e nas sociedades
empresárias LIMITADAS, o direito de retirada de um sócio pode ser exercido de duas
formas.
i. Direito de retirada imotivado (art. 1029 CC): Com base na assertiva
anteriormente exposta de que as regras da sociedade simples prevalecem
perante a lei das anônimas, mesmo que o contrato social da Limitada
preconize a regência supletiva por essa lei, nas sociedades Limitadas por 15 Carvalhosa, Modesto – Comentários à LSA, 1º vol. – Saraiva, 5ª ed. P. 444 16 Art. 1.029 CC. Além dos casos previstos na lei ou no contrato, qualquer sócio pode retirar-se da sociedade; se de prazo indeterminado, mediante notificação aos demais sócios, com antecedência mínima de sessenta dias; se de prazo determinado, provando judicialmente justa causa.
Parágrafo único. Nos trinta dias subseqüentes à notificação, podem os demais sócios optar pela dissolução da sociedade.
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prazo Indeterminado, o direito de retirada pode ser exercido
extrajudicialmente e “ad nutum”, independente de qualquer justificativa,
desde que anunciado com 60 dias de antecedência (denuncia vazia). Já nas
sociedades de prazo determinado, a saída de um sócio, antes do termino do
prazo contratual, só por “justa causa” e com decisão judicial17.
ii. Direito de retirada motivado (art. 1077 CC18): O direito brasileiro regula
no artigo 1077 CC, o direito de retirada motivado de um sócio, é a chamada
“denúncia cheia” do contrato social. Tem o sócio o direito de retirar-se da
sociedade quando “houver modificação do contrato social, fusão da
sociedade, incorporação de outra, ou dela por outra”. Neste caso o sócio de
sociedade limitada (tanto de prazo determinado como indeterminado) tem o
prazo decadencial de 30 dias após a reunião na qual ele dissentiu de
notificar a sociedade sobre o exercício de seu direito de recesso. Não
exercido neste prazo, o direito de retirada extingue-se.
A renúncia do direito de recesso não pode ser feita a priori (no contrato social, por
exemplo), por ser um direito irrenunciável (analogia com o art. 109 LSA), mas a lei não
veda a renúncia a posteriori (num caso concreto de incorporação, por exemplo).
Não veda também a lei que o contrato social aumente o elenco de causas que
permite o direito de retirada do sócio.
Sugere-se colocar cláusula de saída livre nas limitadas de prazo indeterminado, e
nas de prazo determinado pode-se colocar cláusulas específicas de saída.
02.3.d - Da Dissolução Parcial pelo Direito de Retirada nas
Sociedades Anônimas:
17 Esta justa causa, embora não definida em lei, não poderá ser o simples insucesso do empreendimento ou a simples quebra da affectio societatis, mas sim a alteração das circunstâncias que concretamente influem na atuação da sociedade, tais como: i) grave desentendimento; ii) prática e atos ilícitos; iii) inexequibilidade dos fins sociais; iv) incapacidade de sócio essencial às atividades 18 Art. 1.077 CC: Quando houver modificação do contrato, fusão da sociedade, incorporação de outra, ou dela por outra, terá o sócio que dissentiu o direito de retirar-se da sociedade, nos trinta dias subseqüentes à reunião, aplicando-se, no silêncio do contrato social antes vigente, o disposto no art. 1.031.
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Em princípio o direito de retirada nas sociedades anônimas somente pode ser
exercido motivadamente e em determinadas circunstâncias. Isto em virtude do caráter
intuitu pecunae dessas sociedades.
A LSA (6.404/76) em seus arts. 136, I a VI e IX, e 137, 236, 256, 264 e 221,
elencou, como causas de recesso, as seguintes: (numerus clausus):
1. criação de ações preferenciais ou aumento de classes de ações preferenciais
existentes, sem guardar proporção com as demais classes de ações
preferenciais, salvo se já previstos ou autorizados pelo estatuto;
2. alteração nas preferências de vantagens e condições de resgate ou
amortização de uma ou mais classes de ações preferenciais, ou criação de
nova classe mais favorecida;
3. redução do dividendo obrigatório;
4. fusão da companhia, ou sua incorporação em outra;
5. participação em grupo de sociedades (art. 265);
6. mudança do objeto da companhia;
7. cisão da companhia;
8. desapropriação de controle de sociedade de economia mista (art. 236 e
par.único);
9. incorporação de todas as ações, para conversão em subsidiária integral (art.
256, § 2°);
10. incorporação de companhia controlada (art. 264, § 3°);
11. transformação da sociedade (art. 221).
O Direito de retirada e o conseqüente reembolso da ação (apuração de
haveres19) deverá ser reclamado, pelo sócio, à companhia, no prazo de 30 (trinta) dias
contados da publicação da ata da assembléia geral da qual dissentiu.
O direito de retirada somente poderá ser exercido, no prazo previsto, pelo titular de
ações tenha se abstido de votar contra a deliberação ou não tenha comparecido à
assembléia.
19 A apuração de haveres das sociedades anônimas é regulado pelo art. 45 da LSA e será analisado no capítulo 3 adiante.
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Convém lembrar que o minoritário permanece como acionista da companhia até o
pagamento total do valor do reembolso e, como tal, continua com todos seus direitos
patrimoniais e políticos plenamente eficazes. Será inteiramente abusivo e ilícito à
companhia negar tais direitos, sob a alegação de que a retirada do quadro acionário opera-
se a partir da manifestação do acionista dissidente.20
02.3.e - Do Direito de Retirada nas Sociedades Anônimas pela
perda da Affectio Societatis.
A jurisprudência pátria tem aceitado o direito de recesso nas sociedades anônimas,
por perda da affecttio societatis, quando a sociedade, embora formalmente anônima,
funciona de fato como entidade familiar, semelhante à sociedade Limitada
É precisa a afirmação do eminente Ministro Aldir Passarinho Júnior,
em voto proferido no julgamento do REsp 111.294/PR: “(..) trata-se de uma sociedade
anônima, mas sem as características de uma ‘S/A’; na verdade, é uma sociedade limitada
travestida de sociedade anônima (..).”
Nesse recurso especial, leading case nesta questão, admitiu-se a
possibilidade de decretação da dissolução parcial de sociedade aparentemente anônima,
mas substancialmente limitada. Confira-se a ementa lavrada pelo eminente Ministro Cesar
Asfor Rocha, que proferiu o voto dissidente vencedor:
DIREITO COMERCIAL. SOCIEDADE ANÔNIMA. GRUPO FAMILIAR. INEXISTÊNCIA DE LUCROS E DE DISTRIBUIÇÃO DE DIVIDENDOS HÁ VÁRIOS ANOS. DISSOLUÇÃO PARCIAL. SÓCIOS MINORITÁRIOS. POSSIBILIDADE.
Pelas peculiaridades da espécie, em que o elemento preponderante, quando do recrutamento dos sócios, para a constituição da sociedade anônima envolvendo pequeno grupo familiar, foi a afeição pessoal que reinava entre eles, a quebra da affecttio societatis conjugada à inexistência de lucros e de distribuição de dividendos, por longos anos, pode se constituir em elemento ensejador da dissolução parcial da sociedade, pois seria injusto manter o acionista prisioneiro da sociedade, com seu investimento improdutivo, na expressão de Rubens Requião.
20 Carvalhosa, Modesto – Comentários à LSA, Vol. I, 5ª ed. p. 441
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O princípio da preservação da sociedade e de sua utilidade social afasta a dissolução integral da sociedade anônima, conduzindo à dissolução parcial.
Percebe-se que essa hipótese, excepcionalíssima, depende da existência de dois
requisitos:
1) existência de affecttio societatis como fator preponderante na
criação da empresa; e
2) quebra dessa affecttio, conjugada à inexistência de lucros ou falta
de distribuição dos dividendos por longo período, de forma a configurar que
a sociedade não consegue alcançar sua finalidade.
Em resumo: o relevante é que se forme verdadeira sociedade de pessoas, embora
formalmente constituída como se fosse de capitais.
Vários julgados nesse sentido, a exemplo do REsp nº 507.490 RJ – Rel. Min.
Humberto Gomes de Barros, que julgou:
Sociedade Anônima. Dissolução Parcial. Possibilidade Jurídica. Requisitos. 1) Normalmente não se decreta dissolução parcial de sociedade anônima. A LSA prevê formas específicas de retirada – voluntária ou não – do acionista dissidente. 2) Essa possibilidade é manifesta, quando a sociedade, embora formalmente anônima, funciona de fato como entidade familiar, em tudo semelhante à sociedade Limitada.
02.3.f - Especulações sobre o direito de retirada “ad nutum” nas
sociedades empresárias LIMITADAS de capital fechado (sociedades
limitadas de vínculo estável, da teoria de Fabio U. Coelho).
Discorre o ilustre doutrinador Fabio U. Coelho sobre esse assunto (vide item 01.4):
Dissolução parcial:
As sociedades limitadas com vínculo societário instável (subtipo I) podem ser parcialmente dissolvidas nas hipóteses de morte (CC, art. 1.028), liquidação de quotas a pedido de credor de sócio (art. l.026, parágrafo único), retirada imotivada (art. l.029, primeira parte), retirada motivada (art. l.077) ou expulsão de sócio (art. l.085).
Já as sociedades com vínculo estável (subtipo II) só podem ser parcialmente dissolvidas nas hipóteses de retirada motivada (art. l.077) ou expulsão de sócio (art. l.085). Isso porque as três primeiras causas que podem importar a dissolução parcial da sociedade limitada de subtipo I
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estão previstas unicamente em regras referentes às sociedades simples, que não se aplicam às limitadas de subtipo II, em que os sócios elegeram, no contrato social, a LSA como fonte supletiva de regência.”
A primeira grande discordância entre a tese defendida por Fabio U. Coelho e a tese
adotada por este estudo versa sobre a aplicabilidade das regras da sociedade simples nas
sociedades limitadas que optaram pela regência supletiva da lei das SAs em seu contrato
social.
Conforme repetido a exaustão nesta monografia nossa linha de pensamento adota a
tese exposta no item 01.3, que defende:
Que a lei das sociedades simples é a regra geral de regência das sociedades limitadas (art. 1053 caput). Essa regra somente é excepcionada pelo permissivo do parágrafo único que permite a invocação subsidiária da lei das SAs. Importante observar, portanto, que se a lei das SAs, eleita como supletiva, não puder ser aplicada sob pena de afronta ou descaracterização do tipo societário da limitada, volta-se à regra geral, para aplicar-se subsidiariamente às omissões da lei das limitadas, as regras sobre as sociedades simples.
Ou seja, as normas sobre as sociedades simples (art. 997 a 1038) funcionam como regras gerais para TODAS as sociedades limitadas.
Se assim não fosse, e como já citado no item 01.3, temos como exemplos marcantes
da aplicação subsidiária da regra das Simples às Limitadas, mesmo que o contrato defina a
aplicação supletiva da LSA: i) o art. CC 1028 caput, que trata da dissolução parcial da
sociedade pela morte de um sócio, não poderia ser aplicado para as sociedades limitadas de
vínculo estável, o que não é admissível, pois descaracterizaria esse tipo societário que
possui intuitu personae e pode admitir a chamada cláusula de continuação, impondo à
sociedade a recepção de herdeiros como sócios; ii) o art. CC 1026 que trata da
penhorabilidade da quota social; iii) o art. CC 1027 que trata das quotas do cônjuge do
sócio; iv) o art. CC 1029 que trata do direito de saída imotivada de um sócio; v) o art. CC
1033, IV que define prazo de 180 dias para a reconstituição da sociedade que perde a
pluralidade de sócios.
Conclui-se, portanto, que as normas sobre as sociedades simples (art. 997 a 1038)
funcionam como regras gerais para TODAS as sociedades limitadas.
32
Adotamos a teoria que nem a sociedade pode ser ad aeternum, nem o sócio pode
ser compelido a manter-se indefinidamente como sócio.
Ninguém pode ser forçado, contra sua vontade, a permanecer no estado de sócio, o
que feriria a liberdade do homem de dirigir o seu próprio destino.
O querer ou o não querer ficar vinculado a um contrato não é uma particularidade
do ajuste societário, mas da indeterminação de seu tempo de duração.
Mas, concordamos, deve haver um limitador para o exercício indiscriminado do
direito de retirada! Caso contrário, um sócio poderia se aproveitar de determinados
momentos da vida da empresa e prejudicar seriamente sua continuidade, com sua saída.
Quando ela está em sua fase de investimento, por exemplo, ou quando o retirante pretende
se apropriar de benefícios existentes naquele momento, mas que estavam planejados para
serem reinvestidos no futuro.
Esse limitador é o princípio geral da boa-fé e o da função social dos contratos (arts.
421 e 422 CC).
O direito de retirada de um sócio precisa estar afinado com esses princípios, que
hoje são a mola mestre em que se baseia nosso Código Civil.
Reforça esse nosso entendimento, Arnoldo Wald em “Comentários ao novo Código
Civil, Vol. XIV, Forense, 2ª Ed. 2011, pag. 211”, in verbis:
“Diante da análise da origem do direito de retirada, inserido no Código Civil de 2002, há que se indagar se é possível o seu exercício indiscriminado, uma vez que a retirada de um sócio muitas vezes pode acarretar a dissolução da sociedade, conforme, aliás, previsto e permitido pelo parágrafo único do artigo 1.029, prejudicando, portanto, a sua função social. Melhor dizendo, a retirada de um sócio pode acabar por comprometer ou impedir a empresa de cumprir o seu objeto social, inclusive sacrificando o direito de empregados e de outras pessoas que dependam direta ou indiretamente da atividade econômica desenvolvida pela sociedade (fornecedores, adquirentes de matéria prima etc.).
É fato que, para as sociedades de prazo determinado, a lei exige que se comprove, judicialmente, a justa causa para o efetivo desligamento do sócio e a liquidação da sua participação social, justamente para evitar tal efeito negativo e preservar a continuidade dos negócios sociais. Contudo, a lei não estabelece exigências para que o sócio de sociedade contratada por tempo indeterminado se retire, com a exceção de uma notificação prévia.
33
Seria possível, portanto, diante desta falta de exigência de apresentação de justificativa (uma vez que a notificação representa simplesmente uma obrigação formal), questionar uma eventual inviabilidade do exercício do direito de retirada de um sócio de sociedade por prazo indeterminado, quando este assim o fizer de má-fé?
Tal indagação decorre da análise do novo sistema trazido pelo Código Civil de 2002, que impõe à interpretação dos seus dispositivos os princípios da boa-fé (artigo 422) e da função social do contrato (artigo 421), considerados como conceitos chaves da nova legislatura. Ressalte-se que tais regras, constituindo normas interpretativas, são aplicáveis, inclusive, a atos anteriores à vigência do Código Civil, como se extrai do parágrafo único, do artigo 2.035. E ainda, conforme expressamente previsto no artigo 187 do Código Civil: “Também comete ato ilícito o titular de um direito que, ao exercê-lo, excede manifestamente os limites impostos pelo seu fim econômico ou social, pela boa-fé ou pelos bons costumes.”
Desta forma, entendemos, que o direito de retirada, para ser legítimo, deve ser exercido de boa fé pelo sócio, observando o fim social para o qual a sociedade foi constituída. Tanto mais porque na hipótese da retirada, o enfoque normativo e contratual dirige-se à conciliação dos interesses individuais e sociais.”
Ousamos, pois, discordar do mestre Fabio Ulhôa e declinar o que concluímos sobre
o direito de retirada nas sociedades limitadas de prazo indeterminado:
“O sócio de uma LIMITADA, de prazo indeterminado tem seu direito de
retirada preservado, sempre que estiver atendido os princípios da boa fé
objetiva e da função social dos contratos. Ele pode ser exercido
imotivadamente, seguindo as regras do art. 1029 CC, ou motivadamente,
quando deverá seguir as regras do art. 1077 CC”.
02.3.g – Do “Marco Zero” do direito de retirada
Para se determinar o ‘marco ‘zero’ da apuração de haveres da dissolução parcial
das sociedades pelo exercício do direito de retirada, há que verificar se esse direito foi
exercido judicial ou extrajudicialmente.
Nas Limitadas e Simples, o exercício extrajudicial do direito de retirada pode ser
exercido ‘ad nutum’ com aviso prévio de 60 dias (direito de retirada imotivado), data em
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que se calculará os haveres do retirante, bastando o pagamento dos haveres e o registro da
alteração contratual na Junta Comercial para que a saída do sócio tenha eficácia erga
omnes, até lá, o sócio tem íntegro seus direitos políticos e patrimoniais.
Também nas anônimas, o direito de retirada (motivado) previsto no art. 137, pode
ser exercido extrajudicialmente, caso em que a apuração de haveres se processará de
comum acordo ou seguindo as regras estatutárias, até que isto se efetive, o sócio terá
íntegro seus direitos políticos e patrimoniais.
Nos casos do exercício judicial do direito de retirada (direito de retirada motivado),
tanto nos casos de sociedades contratuais de prazo determinado, como nas Simples,
Limitadas e Anônimas de prazo indeterminado, a apuração de haveres será o da data da
citação da sociedade da ação de dissolução parcial e apuração de haveres, sendo que os
direitos políticos e patrimoniais se mantém até o trânsito em julgado da ação.
Assim, na dissolução parcial pelo direito de retirada, o ‘marco zero’ será:
Sociedade: “Marcos Zero” para cálculo dos haveres
“Marcos Zero” para cessação dos direitos políticos e patrimoniais
Simples Pura
Simples Limitada
Limitada Fechada
Limitada Aberta
Retirada extrajudicial (motivada ou imotivada): Data da notificação da sociedade. Retirada judicial (sempre motivada): Data da citação da sociedade da ação de dissolução parcial e apuração de haveres.
Retirada extrajudicial (motivada ou imotivada): Data do Registro da alteração contratual na Junta Comercial e pagamento dos haveres ao retirante. Retirada judicial (sempre motivada): Trânsito em julgado da ação de dissolução parcial e apuração de haveres.
Anônima Fechada
Anônima Aberta
Retirada extrajudicial (sempre motivada): Data da notificação à sociedade. Retirada judicial (sempre motivada): Data da citação da sociedade da ação de exercício de direito de recesso e apuração de haveres.
Retirada extrajudicial (sempre motivada): Data do pagamento dos haveres e registro no livro de ações. Retirada judicial (sempre motivada): Trânsito em julgado da ação de exercício de direito de recesso e apuração de haveres.
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02.3.h - Resumo sobre a dissolução parcial pelo Direito de
Retirada.
Sociedade de Prazo Indeterminado
Dissolução parcial pelo Direito de Retirada:
Simples Pura
Direito de retirada imotivado (exercido com 60 dias de antecedência) - Aplica-se o art. 1029 CC
Simples Limitada Limitada Fechada
Limitada Aberta
Direito de retirada imotivado (notificar a sociedade com 60 dias de antecedência) - Aplica-se o art. 1029 CC.
Direito de retirada motivado (notificar a sociedade 30 dias após o ato que dissentiu) – Aplica-se o art. 1077 CC.
Anônima Fechada Anônima Aberta
Direito de retirada somente motivada nas 11 situações previstas na lei 6404/76 (numerus clausus).
Nas sociedades Anônimas instituídas com intuitu personae há a possibilidade do direito de retirada ser exercido pela quebra da affectio societatis.
Obs 01: Nas sociedades Simples e Limitadas, ambas de prazo determinado, o direito de retirada somente pode ser exercido provando-se judicialmente a “justa causa”.
Obs: Em todos os casos de exercício do direito de retirada deve estar atendido os principio da boa fé objetiva e da função social dos contratos (arts. 421 e 422 CC).
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02.3.i – Importante Acordão sobre o Direito de Retirada: Apelação nº 994.08.054191-8
Comarca Ribeirão Preto/SP
Relator(a): Percival Nogueira
Órgão julgador: 6ª Câmara de Direito Privado
Data do julgamento: 19/08/2010
Outros números: 0607431.4/7-00, 994.08.054191-8
Ementa: DISSOLUÇÃO PARCIAL DE SOCIEDADE COMERCIAL - Quebra da "affectio societatis" bem caracterizada - Pagamento dos haveres - Previsão no contrato social de pagamento parcelado para "aquisições" de quotas pela sociedade, silente quanto ao reembolso na hipótese de retirada – Texto do qual se extrai a nítida intenção dos sócios de prever o parcelamento para se evitar o comprometimento das atividades empresariais e minimizar os efeitos da descapitalização? Disposição contratual pactuada, por ocasião de sua criação, com intenção de evitar efeitos desastrosos à sociedade, que deve ser observada na espécie - Viabilidade do pagamento dos haveres na forma parcelada, prevalecendo a preservação da empresa e incolumidade dos negócios - Balanço especial que deverá incluir como bens incorpóreos o valor das permissões de transportes de passageiros concedido pelo poder público? Particularidade indissociável da atividade explorada - Permissões Públicas que após a CF/88 assumiram contornos contratuais assegurando compensação financeira para fins de garantir o equilíbrio contratual - Equação financeira como centro das relações contratuais das permissões públicas que confere valor econômico - Necessidade de serem consideradas as "expectativas de lucros" por ocasião da liquidação de haveres - Permanência das sócias retirantes no quadro social até o trânsito em julgado da decisão? Sentença constitutiva dotada de efeitos "ex nunc", Sucumbência parcial bem reconhecida. Recursos parcialmente providos, apenas para o fim de determinar o pagamento dos haveres na forma parcelada.
Alguns excertos do Relatório e Voto, com nosso grifo:
A r. sentença apelada decretou a dissolução parcial da sociedade comercial Viação São Bento Ltda., em relação às sócias dissidentes, ora apeladas, detentoras de 33,33% do capital social da empresa. Entendeu desfeito o liame societário e irrelevante a perquirição de culpa, bem como pela necessidade de apuração de haveres de forma ampla, a considerar a situação física e contábil, fundo de comércio, passivo, bens sociais e valor das concessões de transportes conferidas à Viação São Bento, para pagamento a ser feito em uma única parcela. Assegurou que a condição de sócias cessará somente ao tempo do trânsito em julgado da declaração da dissolução.
Bem caracterizada a quebra da ofecctio societattis pela desarmonia instalada entre os sócios e a falta de ânimo de cooperação a inviabilizar a consecução do fim social, desnecessárias maiores ilações.
Reside o cerne da controvérsia basicamente em três questões a ser doravante verificadas, a saber: a) forma de pagamento de haveres; b) inclusão ou exclusão nos cálculos da liquidação das permissões ou concessões de transportes de passageiros; e c) permanência das sócias retirantes no quadro societário enquanto não transitada em julgado a decisão ou até efetivo recebimento dos haveres.
Conquanto o vocábulo "dissolução" seja empregado na lei civil apenas para a hipótese de extinção completa dos vínculos societários, tanto a doutrina como a jurisprudência admite falar-se em dissolução parcial quando há retirada voluntária ou por consenso de um sócio, ou de parte do quadro societário, priorizando-se a preservação das atividades empresariais.
É direito do sócio dissidente extinguir as relações que o vinculam à
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sociedade quando o relacionamento conflituoso com os demais impede uma harmoniosa participação nas atividades empresariais, promovendo sua retirada do quadro societário.
Exaurido o fim social, ou verificada sua inexequibilidade, o regramento do art. 1.034 do CC autoriza o pedido de dissolução parcial, ainda que como sucedâneo da dissolução total. Nesse caso, o sócio retirante levará consigo o montante de sua participação na empresa, ou seja, lhe é devido o reembolso de suas ações, considerado o valor patrimonial global. Como consequência inafastável, ter-se-á a diminuição do capital social.
Confira-se, a propósito, a lição de Manuel de Queiroz Pereira Calças:
"em qualquer hipótese de exclusão de sócio, terá ele direito de receber o reembolso do valor de suas quotas - ou do saldo no caso de liquidação - apurado com base na situação patrimonial da sociedade na data da exclusão, verificado em balanço especialmente levantado".
E na linha de entendimentos doutrinários e precedentes do Colendo Superior Tribunal de Justiça, a dissolução parcial de sociedade de responsabilidade limitada se dará da mesma forma como se dissolução total fosse, respeitando o quantum devido ao sócio retirante, de forma a impedir o enriquecimento ilícito da sociedade ou demais sócios remanescentes, a saber:
"Na dissolução de sociedade de responsabilidade limitada, a apuração de haveres, no caso de sócio retirante ou pré-morto, ou ainda por motivo da quebra da affectio societatis, há de fazer-se como de dissolução total se tratasse posto que, segundo a jurisprudência do STJ, essa linha de entendimento tem por escopo preservar o 'quantum' devido ao sócio retirante, que deve ser medido com justiça, evitando-se, de outro modo, o locupletamento indevido da sociedade ou sócios remanescentes em detrimento dos retirantes" (STJ, REsp nº 38160-SP, rel. Min, Waldemar Zveiter,j . 9/11/93).
Nesse compasso, adota-se como critério para estabelecer o quantum devido, o mesmo que seria utilizado no caso da dissolução total, procedendo-se à reavaliação, mediante balanço especial a ser realizado por perito, com levantamento técnico e fundamentado, de todo o patrimônio da sociedade com base no valor real de mercado, refutando-se mera apuração contábil.
Assim tem decidido esse E. Tribunal:
"Sociedade Limitada - Dissolução parcial - Reembolso - Apuração de haveres - Valor apurado com base na situação patrimonial da sociedade – Recurso improvido" (Apelação Cível n" 994.03.052579-2, 38 Câm. Dir. Privado, rel. Dese. Jesus Lofrano, j. 25.05.2010).
Assim, assegura-se ao sócio retirante a maior amplitude possível na apuração de seus haveres, a fim de restituir-lhe o valor patrimonial devido, através do balanço especial, no qual serão computados não só o ativo, mas todos os bens que compõe a empresa com base em valores reais de mercado, neles compreendido os bens corpóreos e incorpóreos, tudo atualizado até a data do efetivo pagamento, ficando eventuais controvérsias a respeito da perícia técnica relegada para a fase de liquidação.
........................................................................................
Bem de ver que decidiu com acerto a r. sentença ao determinar a apuração do patrimônio da forma mais ampla possível, neles refletindo-se o valor que representam os contratos de concessões ou permissões de transportes de passageiros em favor da Viação São Bento, principalmente ao considerarmos que a participação das apeladas no capital social permitiram o investimento para a obtenção das aludidas permissões.
........................................................................................
Sobre a importância de se prestigiar a forma de parcelamento, posicionou-se o C. STJ no REsp. n" 302.366/SP, com voto da lavra do e. Min, Aldir Passarinho Júnior:
“a dissolução parcial, é bastante elementar, causa trauma interno na empresa, a sua descapitalização, de modo que o pagamento parcelado atenua o impacto, desde que, é Claro, haja a correção das prestações, para não causar enriquecimento injustificado do sócio remanescente”.
........................................................................................
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Vale trazer à baila, ainda, o entendimento esposado por Waldo Fazzio Júnior, ao defender o princípio protetivo da continuidade empresarial produtiva e que a regra do pagamento de uma só vez foi amenizada pela jurisprudência, sendo o qual,
“Como assente pela maioria dos comercialistas. a dissolução parcial foi construída pela doutrina e adotada pela jurisprudência, precisamente para resguardar a estabilidade da empresa contra eventual instabilidade dos interesses dos sócios, suprindo assim as deficiências do individualismo do Código Comercial”.
Superadas tais questões, impõe-se reconhecer que as apeladas deverão permanecer na condição de integrantes do quadro societário até o trânsito em julgado da decisão que declarar dissolvido o vínculo societário.
É certo que enquanto o acionista não for reembolsado do valor de suas quotas, continua como titular das ações e, portanto, é membro indissociável da sociedade. Como titular, detentor de parcela do capital social, ele possui direitos sobre suas quotas, diferenciando-se, até então, da figura de um mero credor. A situação só atinge novos contornos com a prolação da decisão que modificou a relação jurídica entre as partes ao acolher o pedido de dissolução e determinou o pagamento dos haveres, ocasião em fica estabelecida a obrigação da empresa ao reembolso na forma determinada.
Tratando do tema com proficiência, assevera Modesto Carvalhosa que:
“O sócio retirante permanece como tal até o pagamento do valor do reembolso, continuando com todos os seus direitos patrimoniais e sociais, que são, assim, plenamente oponíveis à sociedade e aos demais sócios. Será inteiramente abusivo e ilícito a sociedade negar tais direitos, sob a alegação de que a retirada do quadro social opera-se a partir da manifestação do sócio dissidente. (... ) Assim, o sócio somente deixa de sê-lo quando efetivamente receber seus haveres. Enquanto tal não ocorrer, é pleno o exercício dos direitos de sócio. E não basta que a sociedade ponha à disposição do sócio retirante o valor dos haveres que entenda cabível. Será necessário que o sócio aceite e dê quitação desse recebimento”.
39
02.4 – DA DISSOLUÇÃO PARCIAL DA SOCIEDADE PELA
EXCLUSÃO DE UM SÓCIO
02.4.a - Considerações iniciais.
Se com o Direito de Retirada objetiva-se a proteção do sócio minoritário, com a
exclusão busca-se a proteção da sociedade.
Baseado no princípio da conservação da empresa, todos os casos de não
adimplemento de um sócio pelos deveres sociais, não importando se com ou sem culpa,
incluem-se como falta de dever de colaboração social caracterizadora de falta grave (art.
1030 CC) ou atos de inegável gravidade (art. 1085 CC), para supedanear a exclusão desse
sócio inadimplente.
Assim sendo, mesmo que o não cumprimento do dever de colaboração advenha de
vicissitudes pessoais de um sócio, tais como doenças degenerativas, interdição,
inabilitação, impossibilidade física, etc, ainda assim é possível de se pronunciar pela
exclusão desse sócio, se existe risco na prossecução dos objetivos sociais. Claro está se sua
impossibilidade não compromete os objetivos sociais não haverá justa causa para sua
exclusão.
A distinção entre sócio culpado e não culpado há de ser feita somente para efeito de
responsabilidade por perdas e danos.
O instituto da exclusão de sócios atinge mais amplamente as sociedades simples e
limitadas. Já para as sociedades anônimas, o instituto está restrito ao sócio remisso (LSA
arts. 106 e 107) como veremos adiante.
02.4.b – Das causas de Dissolução Parcial pela Exclusão de um
sócio, comuns às Sociedades Simples puras e às Sociedades Limitadas.
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Nas sociedades Simples puras os artigos 100421 e 103022 CC regulam a exclusão de
um sócio.
O capítulo do Código Civil que rege as sociedades Limitadas estabeleceu nos
artigos 105823 e 108524 as regras da exclusão de sócios, sem deixar de ressalvar que as
regras das sociedades Simples (artigos 1004 e 1030 CC), também se aplicam no caso,
passando aquelas normas a serem um complemento destas.
A lei define situações em que o sócio pode ser excluído extrajudicialmente, por
simples decisão dos demais sócios, e situações em que a exclusão só pode ser feita
judicialmente.
Extrajudicialmente o sócio pode ser excluído quando falta com o dever de
contribuir com bens ou serviços para o exercício da atividade econômica, com os quais
tinha se comprometido anteriormente. Nas Limitadas como nas Simples, o sócio remisso
pode ser excluído pelos demais sócios por simples decisão assemblear, reduzindo-se o
capital da sociedade. Existe a possibilidade dos sócios tomarem para si as quotas do sócio
remisso, sem necessidade de redução de capital, ou transferi-las para terceiros, como
21 Art. 1.004. Os sócios são obrigados, na forma e prazo previstos, às contribuições estabelecidas no contrato
social, e aquele que deixar de fazê-lo, nos trinta dias seguintes ao da notificação pela sociedade, responderá perante esta
pelo dano emergente da mora.
Parágrafo único. Verificada a mora, poderá a maioria dos demais sócios preferir, à indenização, a exclusão do sócio
remisso, ou reduzir-lhe a quota ao montante já realizado, aplicando-se, em ambos os casos, o disposto no § 1o do art.
1.031.
22 Art. 1.030. Ressalvado o disposto no art. 1.004 e seu parágrafo único, pode o sócio ser excluído judicialmente,
mediante iniciativa da maioria dos demais sócios, por falta grave no cumprimento de suas obrigações, ou, ainda, por
incapacidade superveniente.
Parágrafo único. Será de pleno direito excluído da sociedade o sócio declarado falido, ou aquele cuja quota tenha
sido liquidada nos termos do parágrafo único do art. 1.026.
23 Art. 1.058. Não integralizada a quota de sócio remisso, os outros sócios podem, sem prejuízo do disposto no art.
1.004 e seu parágrafo único, tomá-la para si ou transferi-la a terceiros, excluindo o primitivo titular e devolvendo-lhe o que
houver pago, deduzidos os juros da mora, as prestações estabelecidas no contrato mais as despesas.
24 Art. 1.085. Ressalvado o disposto no art. 1.030, quando a maioria dos sócios, representativa de mais da metade
do capital social, entender que um ou mais sócios estão pondo em risco a continuidade da empresa, em virtude de atos de
inegável gravidade, poderá excluí-los da sociedade, mediante alteração do contrato social, desde que prevista neste a
exclusão por justa causa.
Parágrafo único. A exclusão somente poderá ser determinada em reunião ou assembléia especialmente convocada
para esse fim, ciente o acusado em tempo hábil para permitir seu comparecimento e o exercício do direito de defesa.
41
também pode o capital ser reduzido na proporção que o sócio remisso deixou de
integralizar suas quotas, permanecendo ele ainda como sócio.
Também extrajudicialmente, pode ser promovida, por iniciativa dos outros
sócios, por simples alteração contratual, a exclusão do sócio declarado falido e daquele que
tenha suas quotas liquidadas para pagamento de dívidas (art. 1026).
Judicialmente, pode o sócio ser afastado da sociedade, por iniciativa dos demais
sócios, com fundamento em uma justa causa, que pode tanto ser uma falta grave como uma
incapacidade superveniente, que afetem a continuidade das atividades empresariais.
Observe-se que as hipóteses de exclusão de sócios, acima elencadas, atingem
qualquer tipo de sócio, majoritários, minoritários, capitalistas ou prestadores de serviços.
Também não há necessidade de previsão contratual. A exclusão opera-se ope legis.
A titularidade do direito de exclusão é da sociedade. A decisão dos “demais sócios”
apenas exprime a vontade social, não se trata portanto de vontade individual de cada sócio.
É portanto da sociedade a obrigação de pagar os haveres do sócio excluído. É a
sociedade que figura no pólo ativo da ação judicial de exclusão de sócio.
02.4.c - Da Dissolução Parcial pela Exclusão de um sócio exclusiva
das Sociedades Limitadas.
Válido unicamente para as Limitadas, o artigo 108525 inova, ao prever expulsão por
justa causa, quando a maioria dos sócios, representativa de mais da metade do capital
social, entender que um ou mais sócios estão pondo em risco a continuidade da empresa,
em virtude de atos de inegável gravidade.
A exclusão opera-se sem necessidade de provimento judicial, mediante alteração do
contrato social, desde que nele prevista, a exclusão por justa causa.
25 Art. 1.085. Ressalvado o disposto no art. 1.030, quando a maioria dos sócios, representativa de mais da metade
do capital social, entender que um ou mais sócios estão pondo em risco a continuidade da empresa, em virtude de atos de inegável gravidade, poderá excluí-los da sociedade, mediante alteração do contrato social, desde que prevista neste a exclusão por justa causa.
Parágrafo único. A exclusão somente poderá ser determinada em reunião ou assembléia especialmente convocada para esse fim, ciente o acusado em tempo hábil para permitir seu comparecimento e o exercício do direito de defesa.
42
A exclusão somente poderá ser determinada em reunião ou assembléia
especialmente convocada para esse fim, deliberada por sócios que representem mais da
metade do capital social, ciente o acusado em tempo hábil para permitir seu
comparecimento e o exercício do seu direito de defesa.
Definida a exclusão, os demais sócios têm a opção de adquiri-las, transmitir para
terceiros ou para a própria sociedade (em analogia ao art. 30 da LSA), ou reduzir o capital
da empresa.
O STJ tem entendido que a dissolução parcial pode se dar pela quebra da affectio
societatis, o que, porém, não é causa suficiente para a exclusão de um sócio26, a não ser
que se prove a quebra da affectio, inviabiliza a continuidade da sociedade.
02.4.d - Da Dissolução Parcial pela Exclusão de um sócio nas
Sociedades Anônimas.
Nas sociedades anônimas somente existe a possibilidade de exclusão do sócio
remisso (LSA artigo 10727), ou seja, daquele que não integraliza sua parte no capital.
26 Enunciado nº 67 do CEJ: “Em razão da exigência de justo motivo, a quebra da affectio societatis não é causa suficiente para a exclusão do sócio” – Teotônio Negrão, Código Civil Anotado, 23ª ed., Saraiva, 2004, p. 236. 27 Art. 107. Verificada a mora do acionista, a companhia pode, à sua escolha: I - promover contra o acionista, e os que com ele forem solidariamente responsáveis (artigo 108), processo de execução para cobrar as importâncias devidas, servindo o boletim de subscrição e o aviso de chamada como título extrajudicial nos termos do Código de Processo Civil; ou II - mandar vender as ações em bolsa de valores, por conta e risco do acionista. § 1º Será havida como não escrita, relativamente à companhia, qualquer estipulação do estatuto ou do boletim de subscrição que exclua ou limite o exercício da opção prevista neste artigo, mas o subscritor de boa-fé terá ação, contra os responsáveis pela estipulação, para haver perdas e danos sofridos, sem prejuízo da responsabilidade penal que no caso couber. § 2º A venda será feita em leilão especial na bolsa de valores do lugar da sede social, ou, se não houver, na mais próxima, depois de publicado aviso, por 3 (três) vezes, com antecedência mínima de 3 (três) dias. Do produto da venda serão deduzidos as despesas com a operação e, se previstos no estatuto, os juros, correção monetária e multa, ficando o saldo à disposição do ex-acionista, na sede da sociedade. § 3º É facultado à companhia, mesmo após iniciada a cobrança judicial, mandar vender a ação em bolsa de valores; a companhia poderá também promover a cobrança judicial se as ações oferecidas em bolsa não encontrarem tomador, ou se o preço apurado não bastar para pagar os débitos do acionista. § 4º Se a companhia não conseguir, por qualquer dos meios previstos neste artigo, a integralização das ações, poderá declará-las caducas e fazer suas as entradas realizadas, integralizando-as com lucros ou reservas, exceto a legal; se não tiver lucros e reservas suficientes, terá o prazo de 1 (um) ano para colocar as ações caídas em comisso, findo o qual, não tendo sido encontrado comprador, a assembléia-geral deliberará sobre a redução do capital em importância correspondente.
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Pelo comando desse artigo, a sociedade pode optar, à sua escolha, por promover
contra o acionista remisso, um processo de execução (extrajudicial ou judicial) para cobrar
as importâncias devidas, mantendo-o no estado de sócio.
Em vez de optar pela manutenção do status de acionista do subscritor em débito,
através de cobrança executiva, poderá a companhia promover medidas que visem a privar
o acionista de sua condição de sócio, mediante a venda de suas ações em leilão especial
realizado em Bolsa de Valores, devolvendo eventual sobra pecuniária ao mesmo.
Interessante observar, que nesse caso particular, mesmo as sociedades anônimas
fechadas, têm acesso aos mecanismos de leilão junto à Bolsa de Valores.
Tal procedimento, que será decidido extrajudicialmente pela administração,
acarreta a perda de participação acionária, em decorrência de uma forma de auto-execução,
pela qual a companhia credora, por si mesma (sine ministerio judicis), está autorizada a
proceder à expropriação do acionista devedor.28
Trata-se de uma espécie de embargo e venda do título, sem a intervenção da justiça,
autorizada pela lei.
Portanto, a companhia, por seus órgãos de administração, ao optar pela venda das
ações através de leilão especial, promove a exclusão do acionista devedor de seus quadros
e visa, com efeito, à sua substituição.
Se a companhia não conseguir a integralização das ações pelos meios acima
elencados, poderá integralizá-las com suas reservas de lucros (exceto a reserva legal).
Se não tiver lucros e reservas suficientes, após um ano, poderá a assembléia geral,
reduzir o capital da companhia.
02.4.e – Do “Marco Zero” da Exclusão de um sócio
Nas sociedades Limitadas e Simples, a exclusão extrajudicial de um sócio, pelo fato
da mesma se constituir numa proteção à própria empresa, torna-se eficaz perante o
28 Carvalhosa, Modesto – Comentários à lei de sociedades anônimas – 2º vol., 4ª Ed. 2009, p. 285
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excluído, tanto para a apuração de haveres como para a cessação dos direitos políticos e
patrimoniais, no momento do arquivamento da alteração societária na Junta Comercial,
quando se materializa tal deliberação e se reduz o capital correspondente. A parcela de
capital reduzido passa a integrar um fundo destinado a representar os haveres do sócio
excluído, que poderá concordar com os cálculos ou entrar na justiça para reclamar seus
haveres. Na exclusão judicial, a citação do sócio será a data para cálculo de seus haveres.
Seus direitos patrimoniais e políticos permanecerão até o trânsito em julgado da ação.
Nas anônimas, dada a prerrogativa legal, a exclusão do sócio opera-se
extrajudicialmente. A data do registro da assembléia geral que determina a exclusão é o
marco zero para a perda dos direitos políticos e patrimoniais. Não há apuração de haveres
pois os valores já são definidos no boletim de subscrição.
Assim, na Exclusão de Sócio o ‘marco zero’ será:
Sociedade: “Marcos Zero” para cálculo dos haveres
“Marco Zero” para cessação dos direitos políticos e patrimoniais
Simples Pura
Simples Limitada
Limitada Fechada
Limitada Aberta
Exclusão extrajudicial: Data do Registro da alteração contratual na Junta Comercial.
Exclusão judicial: Data da citação do sócio da ação de exclusão.
Exclusão extrajudicial: Data do Registro da alteração contratual na Junta Comercial.
Exclusão judicial: trânsito em julgado da ação de exclusão.
Anônima Fechada
Anônima Aberta
Exclusão extrajudicial: Não há apuração de haveres. Valores definidos no boletim de subscrição.
Exclusão extrajudicial: Data do Registro da Assembléia Geral que determinou a exclusão do sócio.
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02.4.f – Resumo sobre Dissolução Parcial pela Exclusão de um
sócio.
Sociedade Dissolução parcial pela Exclusão de um sócio: Causas comuns: Simples Pura
Simples Limitada Limitada Fechada
Limitada Aberta
Exclusão Extrajudicial por simples alteração contratual e deliberação dos “demais sócios”: do sócio remisso, do falido e daquele que tenha suas quotas liquidadas para pagamento de dívidas; Exclusão Judicial por decisão dos “demais sócios”: do sócio que cometer “falta grave” e por incapacidade superveniente de sócio. Obs: Os minoritários podem excluir judicialmente o majoritário
Exclusivamente: Limitada Fechada
Limitada Aberta
Exclusão Extrajudicial por alteração contratual e deliberação dos “sócios que representem mais da metade do capital social”: por atos de inegável gravidade, admitindo o direito de defesa e desde que haja previsão contratual (art. 1085 CC) Obs: Somente os majoritários podem excluir extrajudicialmente o minoritário
Anônima Fechada
Anônima Aberta
A sociedade tem 4 alternativas para tratar do caso do sócio remisso (art. 107 LSA):
a) Mantendo o estado de sócio: i) execução judicial ou extra;
b) Via exclusão extrajudicial do sócio através de: ii) venda da posição acionária via Bolsa de Valores; iii) aquisição da posição acionária utilizando-se de lucros e reservas; iv) redução do capital, após um ano.
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02.5 – DA DISSOLUÇÃO PARCIAL DA SOCIEDADE PELA
LIQUIDAÇÃO DE QUOTA A PEDIDO DE CREDOR DE SÓCIO.
02.5.a - Considerações gerais.
As regras da liquidação parcial da sociedade a pedido de credor de sócio (art. 1026
CC29) estão inseridas na disciplina da sociedade Simples e são integralmente aplicáveis às
sociedades Limitadas, ex-vi do que já abordamos anteriormente que as regras da sociedade
Simples são aplicáveis às Limitadas mesmo que estas adotem a supletividade da LSA, sob
pena de descaracterizar aquelas sociedades, pois que não há, nas Anônimas, nenhuma regra
que possa ser invocada.
A quota social de uma Limitada, por ser um bem móvel do sócio (CC art. 82), é
plenamente passível de penhora (CPC arts. 591 e 655, III), porém o legislador brasileiro
submete a penhora de quotas sociais a algumas condições prévias.
Como primeira condição, quis o legislador estipular que a penhora somente recairá
sobre as quotas sociais se houver “insuficiência de outros bens do devedor” para sofrer a
constrição.
A segunda condição é a de que, antes de liquidar a quota do sócio devedor,
primeiro se executem os lucros dessa sociedade, ou se a sociedade houver sido dissolvida,
executa-se a parte que lhe tocar na liquidação.
Finalmente, se inexistirem outros bens do devedor, se não houver lucros ou se esses
forem insuficientes para suportar a execução e se a sociedade não estiver dissolvida,
somente então dar-se-á a penhora das quotas sociais, as quais serão objeto de liquidação,
obedecendo ao disposto no art. 1031.
Com essas três condicionantes, antes de prestar um serviço à sociedade, o legislador
colocou mais um óbice na já tão dificultosa execução de bens de um devedor.
29 Art. 1.026. O credor particular de sócio pode, na insuficiência de outros bens do devedor, fazer recair a execução sobre o que a este couber nos lucros da sociedade, ou na parte que lhe tocar em liquidação.
Parágrafo único. Se a sociedade não estiver dissolvida, pode o credor requerer a liquidação da quota do devedor, cujo valor, apurado na forma do art. 1.031, será depositado em dinheiro, no juízo da execução, até noventa dias após aquela liquidação.
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Esse quadro poderia ser evitado com a eliminação desse esdrúxulo artigo 1026,
permitindo a penhora pura e simples da quota social do sócio devedor, como ocorre, sem
sobressaltos, na legislação italiana (art. 2480) e com as ações das sociedades anônimas.
No caso de liquidação da quota para pagamento de débito com terceiro, o sócio
permanece como tal até o término da liquidação, sua exclusão só se operará naquele
momento.
02.5.b – Dos Direitos Reais e das Cláusulas Restritivas sobre quotas
sociais.
Analisada a penhorabilidade da quota social, podemos estender nosso estudo para
analisar a cessibilidade de direitos reais e sobre cláusulas restritivas incidentes sobre as
quotas sociais e ações.
O penhor ou caução de quotas sociais dependem do que se estipulou no contrato
social.
Se livremente cessível a quota ou omisso o contrato, o penhor e a caução também
dão-se livremente.
Se dependente a cessão de algum requisito, a este também se submetem qualquer
outra restrição.
A lei 6404/76, nos artigos 39 e 40, regula a matéria, nas Anônimas, com grande
amplitude. Aí são admitidos: o penhor, a caução, o usufruto, o fideicomisso, a alienação
fiduciária, a promessa de venda de ações e a preferência para sua aquisição.
Por analogia, o mesmo deve ser admitido nas Limitadas até em face da redação
ampla do artigo 1026 CC.
O registro dessas “restrições” hão de ser feitas no contrato social ou no “livro de
registro de quotas” que tem sido adotado pela Limitadas constituídas à semelhança das
anônimas com grande número de sócios e livre transferência das quotas.
48
Ao fim, é de se mencionar que, atendidas as limitações legais, as quotas podem ser
gravadas com cláusulas de inalienabilidade, impenhorabilidade e incomunicabilidade tanto
pelo testador como pelo doador.
02.5.c – Do “Marco Zero” da liquidação da quota (ação) a pedido
de credor de sócio
A penhora e liquidação de bens móveis, no caso quotas ou ações, somente é
determinado judicialmente.
É pois o trânsito em julgado da ação de execução e penhora o marco zero para a
apuração de haveres e para a perda dos direitos do sócio.
Assim, na liquidação da posição de Sócio o ‘marco zero’ será:
Sociedade: “Marcos Zero” para cálculo dos haveres
“Marcos Zero” para cessação dos direitos políticos e patrimoniais
Simples Pura
Simples Limitada
Limitada Fechada
Limitada Aberta
Liquidação sempre judicial: Data do trânsito em julgado da ação de execução.
Liquidação sempre judicial: Data do trânsito em julgado da ação de execução.
Anônima Fechada
Anônima Aberta
Não há liquidação para cálculo dos haveres.
Não há redução de capital.
Não há dissolução parcial.
Os direitos políticos e patrimoniais transferem-se para o exeqüente com o trânsito em julgado da ação de execução.
49
02.5.d – Resumo sobre Dissolução Parcial da sociedade pela
Liquidação da Quota a pedido de credor de sócio.
Sociedade Dissolução parcial pela Liquidação da Quota a pedido de um credor de um sócio:
Simples Pura
Simples Limitada Limitada Fechada Limitada Aberta
A quota social é passível de penhora (CPC arts. 591 e 655, III), atendidas algumas condições prévias: 1ª condição: a penhora somente recairá sobre as quotas sociais se houver “insuficiência de outros bens do devedor” para sofrer a constrição. 2ª condição: antes de liquidar a quota do sócio devedor, primeiro se executem os lucros dessa sociedade, ou se a sociedade houver sido dissolvida, executa-se a parte que lhe tocar na liquidação. Somente depois de atendidas as condições acima dar-se-á a penhora das quotas sociais, as quais serão objeto de liquidação, obedecendo ao disposto no art. 1031 CC.
Obs 01: O penhor, a caução, o usufruto, o fideicomisso, a alienação fiduciária, a promessa de venda de quotas e a preferência para sua aquisição, são admissíveis se livremente cessível as quotas ou omisso o contrato à respeito. Se houver restrição essas devem estar atendidas. Obs 02: Cláusulas de inalienabilidade, impenhorabilidade e incomunicabilidade são sempre admitidas.
Anônima Fechada
Anônima Aberta
As ações são plenamente penhoráveis
Obs: O penhor, a caução, o usufruto, o fideicomisso, a alienação fiduciária, a promessa de venda de ações e a preferência para sua aquisição, são plenamente admissíveis, assim como cláusulas de inalienabilidade, impenhorabilidade e incomunicabilidade.
50
02.6 – DA DISSOLUÇÃO PARCIAL DA SOCIEDADE POR
RENÚNCIA DE UM SÓCIO.
02.6.a - Considerações gerais30.
Além do direito de se retirar da sociedade, na forma prevista em lei ou no contrato
social, o sócio tem o direito de renunciar à sua qualidade de sócio e, com isso, desligar-se
da sociedade.
Na renúncia, o sócio manifesta igualmente sua vontade de sair da sociedade, mas,
diferentemente da retirada, não passa a ter, com tal ato qualquer direito a receber a título de
haveres.
“Na renúncia, o sócio abdica do status socii e suas quotas passam a pertencer à
sociedade, sem que ocorra qualquer desembolso por parte dela e, portanto, sem a redução
do capital social” (Alfredo de Assis Gonçalves Neto, Lições de direito societário, v. 1, n.
120, p. 280).
Em certas situações, a renúncia é o meio mais célere e a solução para por fim à
deterioração do patrimônio pessoal, principalmente numa sociedade que está em derrocada
e na qual os demais sócios resistem à sua dissolução. É também o modo de manifestar
descontentamento com operações que podem comprometer o futuro da sociedade, sem
gerar, com isso, obrigações para ela e para os demais sócios.
O renunciante não se exime, contudo, das obrigações pessoais que assumiu durante
o período em que permaneceu como sócio (integralização do capital social, por exemplo),
bem como por aquelas que nesse período foram contraídas pela sociedade. Na primeira
hipótese, sua responsabilidade é direta, com prazo prescricional vinculado à natureza da
obrigação; na última, é subsidiária e ilimitada, como se sócio ainda fosse (arts. 1023 e
1024), até dois anos depois de formalizado o ato, contados da respectiva averbação à
margem da inscrição da sociedade no Registro Civil de Pessoas Jurídicas (art. 1032).
O fato de a renúncia não estar expressamente arrolada entre os casos de resolução
da sociedade em relação a sócio, não significa que tenha sido vedada. Além de tal figura
30 Conforme o escólio de Alfredo de Assis Gonçalves Neto – Direito de Empresa, RT, 2007, p. 241
51
não se enquadrar dentre os casos de resolução, no sentido técnico da expressão, a liberdade
de contratar, no âmbito do direito das obrigações, só encontra limites quando há
dispositivo expresso, o que não existe.
Aliás, relativamente aos direitos pessoais, é indiscutível o direito de o sócio
renunciar ao seu exercício; no que se refere aos direitos patrimoniais, há a previsão
expressa do art., 1275, II31 do Código Civil, capitulada como causa ou modalidade de
perda da propriedade de bens em geral.
A renúncia somente tem sentido prático nas sociedades por quotas (simples e
limitadas) onde a responsabilidade do sócio ainda perdura, mesmo que o sócio não seja
administrador, principalmente na Justiça do Trabalho.
Já nas sociedades anônimas, não sendo o sócio administrador, sua responsabilidade
patrimonial é inexistente. Mesmo assim, pode ele, nas sociedades fechadas, exercer sua
renúncia.
Nas sociedades anônimas abertas, o sócio dispõe do mecanismo das Bolsas de
Valores para sair de sua posição de acionista.
02.6.b – Do “Marco Zero” da renúncia
Para que cesse sua responsabilidade patrimonial, o sócio deve protocolar sua
renúncia tanto junto à sociedade como, principalmente, na Junta Comercial ou Registro
Civil correspondente.
Assim, na renúncia de Sócio o ‘marco zero’ será:
31 CC Art. 1.275. Além das causas consideradas neste Código, perde-se a propriedade:
I - por alienação; II - pela renúncia; III - por abandono; IV - por perecimento da coisa; V - por desapropriação. Parágrafo único. Nos casos dos incisos I e II, os efeitos da perda da propriedade imóvel serão subordinados ao
registro do título transmissivo ou do ato renunciativo no Registro de Imóveis.
52
Sociedade: “Marcos Zero” para cálculo dos haveres
“Marcos Zero” para cessação dos direitos políticos e patrimoniais
Simples Pura
Simples Limitada
Limitada Fechada
Limitada Aberta
Anônima Fechada
Não há cálculo de haveres Data do protocolo da renúncia perante a Junta Comercial.
Anônima Aberta Sócio deve se utilizar dos mecanismos da Bolsa de Valores.
Os direitos transmitem-se ao comprador da ação.
53
02.6.c – Resumo sobre a Dissolução Parcial das sociedades pela renúncia de um sócio:
Sociedade Dissolução parcial pela Renúncia de um sócio: Simples Pura
Simples Limitada Limitada Fechada Limitada Aberta
Anônima Fechada
Na renúncia, o sócio abdica do status socii e suas quotas passam a pertencer à sociedade, sem que ocorra qualquer desembolso por parte dela e, portanto, sem a redução do capital social. Base art. 1275, II CC.
Anônima Aberta
Mecanismo das Bolsas de Valores
54
Capítulo 03 DA APURAÇÃO DE HAVERES CONSIDERAÇÕES GERAIS O artigo 668 do Estatuto processual de 1939, ainda vigente, tem a seguinte dicção:
“Se a morte ou retirada de qualquer dos sócios não causar a dissolução da
sociedade, serão apurados exclusivamente seus haveres, fazendo-se o
pagamento pelo modo estabelecido no contrato social, ou pelo
convencionado, ou, ainda, pelo determinado na sentença”.
A norma, ao falar em ‘contrato social’ está se referindo às sociedades contratuais
(Simples e Limitadas). E, apesar de se referir à morte ou retirada, alcança todas as causas
de dissolução parcial da sociedade antes analisadas neste estudo.
A lei das anônimas, em seu artigo 4532, trata detalhadamente do ‘reembolso’
definido como a operação pela qual a companhia paga aos acionistas dissidentes de
deliberações da assembléia geral, o valor de suas ações.
32 LSA Art. 45. O reembolso é a operação pela qual, nos casos previstos em lei, a companhia paga aos acionistas dissidentes de deliberação da assembléia-geral o valor de suas ações. § 1º O estatuto pode estabelecer normas para a determinação do valor de reembolso, que, entretanto, somente poderá ser inferior ao valor de patrimônio líquido constante do último balanço aprovado pela assembléia-geral, observado o disposto no § 2º, se estipulado com base no valor econômico da companhia, a ser apurado em avaliação (§§ 3º e 4º). § 2º Se a deliberação da assembléia-geral ocorrer mais de 60 (sessenta) dias depois da data do último balanço aprovado, será facultado ao acionista dissidente pedir, juntamente com o reembolso, levantamento de balanço especial em data que atenda àquele prazo. Nesse caso, a companhia pagará imediatamente 80% (oitenta por cento) do valor de reembolso calculado com base no último balanço e, levantado o balanço especial, pagará o saldo no prazo de 120 (cento e vinte), dias a contar da data da deliberação da assembléia-geral. § 3º Se o estatuto determinar a avaliação da ação para efeito de reembolso, o valor será o determinado por três peritos ou empresa especializada, mediante laudo que satisfaça os requisitos do § 1º do art. 8º e com a responsabilidade prevista no § 6º do mesmo artigo. § 4º Os peritos ou empresa especializada serão indicados em lista sêxtupla ou tríplice, respectivamente, pelo Conselho de Administração ou, se não houver, pela diretoria, e escolhidos pela Assembléia-geral em deliberação tomada por maioria absoluta de votos, não se computando os votos em branco, cabendo a cada ação, independentemente de sua espécie ou classe, o direito a um voto. § 5º O valor de reembolso poderá ser pago à conta de lucros ou reservas, exceto a legal, e nesse caso as ações reembolsadas ficarão em tesouraria. § 6º Se, no prazo de cento e vinte dias, a contar da publicação da ata da assembléia, não forem substituídos os acionistas cujas ações tenham sido reembolsadas à conta do capital social, este considerar-se-á reduzido no montante correspondente, cumprindo aos órgãos da administração convocar a assembléia-geral, dentro de cinco dias, para tomar conhecimento daquela redução. § 7º Se sobrevier a falência da sociedade, os acionistas dissidentes, credores pelo reembolso de suas ações, serão classificados como quirografários em quadro separado, e os rateios que lhes couberem serão imputados no pagamento dos créditos constituídos anteriormente à data da publicação da ata da assembléia. As quantias assim atribuídas aos créditos mais antigos não se deduzirão dos créditos dos ex-acionistas, que subsistirão integralmente para serem satisfeitos pelos bens da massa, depois de pagos os primeiros. § 8º Se, quando ocorrer a falência, já se houver efetuado, à conta do capital social, o reembolso dos ex-acionistas, estes não tiverem sido substituídos, e a massa não bastar para o pagamento dos créditos mais antigos, caberá ação
55
Claramente o art. 45 da LSA trata apenas dos casos da utilização, pelo sócio
dissidente, do ‘direito de retirada’ estabelecido nos arts. 136 e 137 da LSA e tratado acima
no item 02.3.d, uma vez que no caso de sócio remisso (vide item 02.4.e) a companhia
promove a execução ou a venda da posição acionária pelo valor da integralização.
Por analogia, o mesmo art. 668 do Código de Processo de 1939, pode ser aplicado
para as sociedades anônimas, entendendo-se ‘contrato social’ por ‘estatuto social’.
revocatória para restituição do reembolso pago com redução do capital social, até a concorrência do que remanescer dessa parte do passivo. A restituição será havida, na mesma proporção, de todos os acionistas cujas ações tenham sido reembolsadas.
56
03.1 – DA APURAÇÃO DE HAVERES NAS SOCIEDADES
SIMPLES E LIMITADAS
Os modos de pagamento dos haveres das sociedades contratuais elencados no
supracitado art. 668, que passaremos a estudar, são os seguintes:
• Pagamento pelo modo estabelecido no contrato;
• Pagamento pelo modo convencionado pelas partes;
• Pagamento pelo modo determinado na sentença.
03.1.a – Do pagamento de haveres pelo modo estabelecido no
contrato.
Podem os sócios disciplinar, no contrato social, a forma como se efetivará o
pagamento dos haveres nos casos de dissolução parcial da sociedade, estabelecendo regras
que entendam manter o necessário equilíbrio social (art. 1031 CC33).
Podem os sócios estabelecer que os haveres sejam pagos em várias prestações e
com prazos alongados; podem, também, estabelecer regras para a apuração dos haveres,
por exemplo: Balanço de determinação, fluxo de caixa descontado, etc.
No silêncio do contrato, o pagamento se dará na forma estabelecida no artigo 1031
CC que determina que a apuração dos haveres do sócio retirante se dará “com base na
situação patrimonial da sociedade, à data da resolução, verificada em balanço
especialmente levantado”.
Sem importar a causa da dissolução parcial da sociedade, se o sócio retirante não
aceitar, por si ou pelos seus herdeiros, o último balanço apurado, outro deverá ser feito, o
33 Art. 1.031. Nos casos em que a sociedade se resolver em relação a um sócio, o valor da sua quota, considerada
pelo montante efetivamente realizado, liquidar-se-á, salvo disposição contratual em contrário, com base na situação patrimonial da sociedade, à data da resolução, verificada em balanço especialmente levantado.
§ 1o O capital social sofrerá a correspondente redução, salvo se os demais sócios suprirem o valor da quota. § 2o A quota liquidada será paga em dinheiro, no prazo de noventa dias, a partir da liquidação, salvo acordo, ou
estipulação contratual em contrário.
57
chamado Balanço de Determinação, com exata verificação física e contábil dos bens e
direitos da sociedade, inclusive dos bens intangíveis como marcas, patentes, direitos, etc.
A apuração de haveres na forma do último balanço aprovado, somente terá lugar, se
as partes envolvidas o aceitarem, isto é, em solução extrajudicial.
O interessado caso não concorde com o balanço apurado pela sociedade deverá
promover ação para que a apuração dos haveres seja feita judicialmente.
03.1.b – Do pagamento de haveres pelo modo convencionado pelas
partes.
Omisso o contrato social sobre o pagamento de haveres, podem os sócios acordar
sobre a forma como se efetivará o pagamento dos haveres nos casos de dissolução parcial
da sociedade (CC art. 1031, § 2º)
O modo convencionado pelas partes há de surgir depois de resolvidas as causas
determinativas da dissolução parcial da sociedade. Se as partes divergirem e recorrerem a
judiciário, pode ocorrer que elas convencionem a forma de apuração de haveres e encerrem
o processo de execução (CPC art. 794, II).
03.1.c – Do pagamento de haveres pelo modo determinado na
sentença.
Omisso o contrato social sobre o pagamento de haveres, e não chegando as partes a
um consenso sobre a forma como se efetivará o pagamento, estes serão pagos da forma
estabelecida pelo juiz em ação de apuração de haveres.
03.1.d – Do pagamento dos haveres em dinheiro ou em bens.
58
A legislação societária não exige forma especial para que se solenize o ato de
pagamento.
O pagamento dos haveres deve ser feito em dinheiro, mas se os sócios acordarem
ele pode ser feito em bens da empresa.
Não pode porém o sócio retirante exigir que a sociedade lhe devolva o exato bem
que ele eventualmente contribuiu como aporte de capital em algum momento da vida da
empresa.
03.1.e – Coletânea de Jurisprudência sobre a apuração e o
pagamento dos haveres.
Comercial - Sociedade constituída por sócios diversos - Dissolução parcial - Critério de apuração dos haveres.
I - Na sociedade constituída por sócios diversos, retirante um deles, o critério de liquidação dos haveres, segundo a doutrina e a jurisprudência, há de ser, utilizando-se o balanço de determinação, como se tratasse de dissolução total.
II - Precedentes do STJ (ReI. Min. Waldemar Zveiter, 3a T., un., REsp. nº 35-702-0-SP, DJU-I, 13.12.93, p. 27.454.
No que tange aos outros dispositivos legais, não demonstraram os recorrentes como
teriam sido violados pelo aresto, alicerçado inclusive em jurisprudência do Supremo Tribunal Federal no sentido de que a liquidação/apuração de haveres deve ser feita de forma a assegurar ao sócio retirante situação de igualdade na apuração de haveres, fazendo-se esta com a maior amplitude possível, com a exata verificação física e contábil dos valores do ativo. (ReI. Min. Sálvio de Figueiredo, desp. de 10.12.93, Agr. Inst. Nº 44.729-4-MG, DJU-I, 17.12.93, p. 28.154).
O ponto central da ratio iuris do acórdão recorrido foi a necessidade de que a indenização
à sócia excluída deveria representar o preço justo, não necessariamente consubstanciado no último balanço. Na espécie que se examina, agrava-se tal situação pela realização de um balanço especial, efetuado unicamente para esse fim, unilateralmente, pela sociedade que deliberou a exclusão da sócia retirante. Consentir-se com tal situação, sem facultar à sócia excluída a apuração judicial de seus haveres, seria dar à sociedade uma permissão irrestrita para deliberar sobre a exclusão de qualquer sócio, pagando-lhe pela participação acionária preço a seu arbítrio. (ReI. Min. Sálvio de Figueiredo, desp. de 18.12.93, DJU-I, 02.03.93, p. 2.624).
Comercial- Sociedade constituída por dois sócios - Sócio pré-morto - Critério de liquidação
dos haveres - Continuação da sociedade. I - Na sociedade constituída por dois sócios, pré-morto ou retirante um deles, o critério de
liquidação dos haveres, segundo a doutrina e a jurisprudência, há de ser, utilizando-se o balanço de determinação, como se tratasse de dissolução total. Tal medida se impõe porque, na dissolução parcial, garante-se ao sócio remanescente continuar com a sociedade, por si, com firma individual, ou com admissão de outro sócio (ReI. Min. Waldemar Zveiter, 3a T., un., REsp. nº 24.554-4-SP, DJU-I, 16.11.92, p. 21.138).
59
Trata-se de ação de dissolução de sociedade. O acórdão, apoiando-se no critério de que a dissolução ainda que parcial deve obedecer às regras dá dissolução total, concluiu ser devido ao sócio retirante exatamente o justo e igualitário, como se de dissolução plena se cuidasse. O Especial interposto contra esse lineamento foi indeferido com acerto, eis que o aresto hostilizado arrimou-se também na jurisprudência do STF que firmou entendimento no sentido de que a dissolução parcial (para o sócio retirante) é modalidade da dissolução total (RJTJESP, vol. 96/248). (ReI. Min. Waldemar Zveiter, Agr. lnstr. Nº 22.352-2-SP, DJU-I, 11.09.92, p. 14.782).
Comercial. Sociedade por quotas de responsabilidade. Transformação em Sociedade
Anônima por vontade do sócio majoritário. Retirada dos sócios dissidentes. Dissolução parcial, com pagamento dos haveres tal como se de dissolução total tratasse, em face das peculiaridades do caso concreto. Decisão que não implicou ofensa aos artigos 20 do Código Civil, 291 e 302 do Código Comercial e 668 do CPC de 1939. Ausência de dissídio jurisprudencial. (REsp. nº 35.285/93, 4a Turma - ReI. Min. Antônio Torreão Braz, j. 14.12.93 - DJU, 29.2.94, p. 2.892).
60
03.2 – DA APURAÇÃO DE HAVERES NAS SOCIEDADES
ANÔNIMAS
Igualmente, nas sociedades anônimas, a apuração de haveres do sócio retirante, é
feito com base no último balanço aprovado, porém, caso o estatuto social assim o
determine, o cálculo pode ser feito pelo chamado “valor econômico” da companhia, a ser
apurado em avaliação. (art. 45, § 1º)
Não havendo expressa disposição estatutária adotando o ‘valor econômico’,
prevalece a regra geral que determina que o cálculo do reembolso tenha por base o
patrimônio líquido da companhia.
Assim, uma vez introduzido no estatuto social, o critério de cálculo pelo ‘valor
econômico’ este prevalecerá sempre sobre o critério de apuração patrimonial.
Curiosamente, a alteração estatutária que introduz o critério de apuração do
reembolso pelo ‘valor econômico’ não figura entre os casos de direito de recesso na LSA.
O valor econômico que alternativamente dispõe a lei, e que deve ser objeto de
laudo de auditoria, equivale à perspectiva de rentabilidade da empresa (forecast profit). A
adoção desse critério de aferição de valor empresarial, em todo o mundo, decorre do
consenso de que o critério fundamental para a verificação do valor de mercado de uma
companhia é o de fluxo de caixa futuro trazido à valor presente, é o chamado “método do
Fluxo de Caixa descontado”. A empresa vale não mais por seu patrimônio líquido, mas
por sua capacidade de produção de dinheiro.
O valor de fluxo de caixa descontado requer previsões explícitas dos fluxos de
caixa livres à disposição dos acionistas de uma companhia. E o fluxo de caixa livre
assinala o lucro projetado da empresa, adicionando-se os itens que não representam mais
saída de caixa (depreciações e amortizações) e diminuindo-se as necessidades financeiras
de um investimento (fixo ou de capital de giro).
Assim, fazem parte dos fluxos de caixa livres os componentes do patrimônio da
empresa que possam ser realizados imediatamente, desde que não afetem a sua
61
operacionalidade. Esses itens livres entram pelo seu valor líquido de realização ajustado
pelos seus efeitos fiscais.
Assim, fluxo de caixa é igual à geração de caixa, ou seja: receitas da companhia
descontadas as despesas, exceto as que não representam saídas de caixa (depreciações e
amortizações).
A capacidade de fluxo de caixa demonstra o quanto a companhia é rentável e
saudável, daí resultando o laudo sobre o seu valor econômico.
E esse valor econômico será inferior ao do patrimônio liquido quando a
rentabilidade for muito baixa ou negativa e seu valor de liquidação for inferior ao contábil.
Caso a rentabilidade seja alta, o valor econômico daí decorrente, posto em confronto com o
do patrimônio líquido, será superior a este.
Não obstante correntemente aplicado em todo o mundo, a apuração do valor
econômico de cada companhia pressupõe uma considerável subjetividade. Daí ter o
legislador estabelecido normas de procedimento na indicação e aprovação dos auditores
que farão tal trabalho, cujo pressuposto é de absoluta independência com respeito à
administração e aos controladores da companhia.34
Por analogia, o pagamento dos haveres das sociedades anônimas, segue o elenco
previsto no supracitado art. 668 do Código Processual de 1939, já comentado no item 03.1
acima, e que é o seguinte:
• Pagamento pelo modo estabelecido no contrato (estatuto);
• Pagamento pelo modo convencionado pelas partes;
• Pagamento pelo modo determinado na sentença.
34 Carvalhosa, Modesto – Comentários à LSA – Vol. I, Saraiva, 5ª ed. p. 441
62
CONSIDERAÇÕES FINAIS DISSOLUÇÃO DA RELAÇÃO SOCIAL Analisada a Dissolução Parcial da Sociedade limitadamente a um sócio, podemos
concluir que a Doutrina e a jurisprudência pátrias, encaminham-se no sentido de considerar
que, em uma sociedade por prazo indeterminado, ninguém pode ser forçado, contra sua
vontade, a permanecer no estado de sócio, o que feriria a liberdade do homem de dirigir o
seu próprio destino. Para tal, a sociedade deve acatar o pedido de retirada do sócio e pagar
seus haveres.
Em contraponto com esse direito que o sócio tem de desligar-se da sociedade,
temos o princípio de conservação da empresa, onde há o interesse público para que a saída
de um sócio, não cause a interrupção da produção de riquezas e geração de empregos de
uma sociedade.
Assim, a prerrogativa que um sócio tem de sair de uma sociedade mediante
recebimento de seus haveres, não pode ser exercido indiscriminadamente. Ele só pode ser
exercido dentro dos princípios da boa-fé e da função social dos contratos (arts. 421 e 422
CC).
Dependendo do intuito societário, o direito que um sócio tem de desligar-se da
sociedade, segue determinados procedimentos, assim:
a) Nas sociedades onde impera o intuitu personae, o direito de retirada pode ser
exercido imotivadamente, sempre seguindo os princípios da boa-fé, sendo que
os haveres do sócio retirante devem ser pagos, em dinheiro, pela própria
sociedade, conforme sua capacidade financeira. Haverá redução do capital
social, a menos que os sócios remanescentes supram o valor.
b) Nas sociedades onde impera o intuitu pecunie, o direito de retirada somente
pode ser exercido conforme determina a LSA (numerus clausus), sempre
seguindo os princípios da boa-fé, sendo que os haveres do sócio retirante devem
ser pagos, em dinheiro, pela própria sociedade, conforme sua capacidade
63
financeira. Haverá redução do capital, a menos que os sócios remanescentes
supram o valor. Nas sociedades abertas, quando as ações da companhia são
negociadas no mercado, com liquidez e dispersão, o sócio tem suspenso seu
direito de retirada, devendo, para tal, utilizar-se dos mecanismos da Bolsa de
Valores.
MPA Maio 2011
64
BIBLIOGRAFIA
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WALD, ARNOLDO – Comentários ao Novo Código Civil – Do Direito de Empresa,
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COELHO, FÁBIO ULHÔA – Código Comercial e Legislação Complementar Anotados,
Saraiva, 7ª ed. 2005
GONÇALVES NETO, ALFREDO DE ASSIS – Direito de Empresa, RT, 2007
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CARVALHOSA, MODESTO – Comentários à Lei de Sociedades Anônimas, Saraiva, 5ª
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NERY JUNIOR, NELSON – Código Civil Comentado – RT, 7ª ed. 2009
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