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O MUNDO DA SAÚDE — São Paulo, ano 29 v. 29 n. 4 out./dez. 2005 491 ARTIGO ORIGINAL / RESEARCH REPORT / ARTÍCULO Novas perspectivas em cuidados paliativos: ética, geriatria, gerontologia, comunicação e espiritualidade New perspectives in palliative care: ethics, geriatrics, gerontology, communication and spirituality Nuevas perspectivas en cuidados paliativos: ética, geriatria, gerontologia, comunicación y espiritualidad RESUMO: Este artigo objetiva realçar a importância e a necessidade de compreendermos melhor as dimensões da vida humana, destacando a dimensão no cuidado da dor e do sofrimento humanos. Destacamos os cuidados paliativos sob diferentes aspectos: conceituais, princípios, trajetória nos cenários mundial e brasileiro, pontuando as informações atualizadas em cuidados paliativos para proporcionar ao idoso e sua família uma melhor qualidade de vida. Em nível mundial existem programas institucionais, associações publicações e eventos sobre esta temática; destacando-se duas mulheres luminares Cicely Saunders e Elizabeth Kübbler Ross, como referências expressivas no processo da conscientização crescente da relação entre os estados físicos e mentais, trazendo para o campo geriátrico um conceito mais compreensivo do sofrimento e da arte de cuidar no final da vida. Nos perguntamos quais devem ser as abordagens em cuidados de saúde nos contextos geriátrico e gerontológico, bem como, suas valiosas contribuições na manutenção das capacidades funcionais do idoso e no resgate de suas competências. Reafirmamos a importância da reflexão sobre as questões de natureza ética, científica, humana, espiritual e sócio-cultural a cerca dos programas dirigidos ao cuidado do idoso na sua multidimensionalidade. Neste contexto valorizamos a comunicação que persona- liza o encontro e a leitura afetiva entre o idoso, seus familiares, e á equipe de saúde. Finalizamos apontando alguns desafios em termos de resgatar a sabedoria de viver, com dignidade e qualidade de vida, bem como a elegância no adeus á vida. DESCRITORES: Cuidados Paliativos, Bioética, Comunicação ABSTRACT: This article aims to emphasize the importance and the necessity of a better understanding of the dimensions of human life, focusing on the dimension of care of human pain and suffering. We bring palliative care to the fore under different aspects: conceptual ones, their principles, the trajectory in Brazilian and world levels, examining up-to-date information on palliative care to provide old people and their families a better quality of life. In the world level there are institutional programs, associations, publications and events on this theme; being distinguished two sage women, Elizabeth Kübbler-Ross and Cicely Saunders as expressive references on the process of increasing awareness on the relation between the physical and the mental states, bringing for the geriatric field a more comprehensive concept of suffering and the art to take care of people in the end of life. We ask ourselves which must be the approaches on health cares in the geriatric and gerontological contexts, as well as their valuable contributions in the maintenance of the functional capacities of old people and in the rescue of their abilities. We reaffirm the importance of the reflection on questions of ethical, scientific, human, socio-cultural and spiritual nature and about the programs directed to the care of the elderly in its multidimensionality. In this context we put a great value on the communication that personalizes the meeting of persons and the affective reading between the elderly, her family and the health team. We finish pointing to some challenges directed to rescue the wisdom of living, with dignity and quality of life, as well as the elegance in the good-bye to life. KEYWORDS: Palliative Care, Bioethics, Communication RESUMEN: Este artículo tiene el objetivo de realzar la importancia y la necesidad de un mejor entendimiento de las dimensiones de la vida humano, acentuando la dimensión del cuidado del dolor y del sufrimiento humanos. Realzamos los cuidados paliativos bajo diversos aspectos: conceptual, principios, trayectoria en las escenas mundiales y brasileñas, recogiendo la información actualizada acerca de los cuidados paliativos para proporcionar al envejecido y su familia una mejor calidad de vida. Existen en el nivel mundial programas, asociaci- ones, publicaciones y eventos con este tema; siendo distinguidas dos mujeres luminares, Cicely Saunders y Elizabeth Kübbler-Ross, como referencias expresivas en el proceso del conocimiento creciente acerca de la relación entre los estados físicos y mentales, trayendo para el campo geriátrico un concepto más comprensivo del sufrimiento y el arte de ofrecer cuidados en el final de la vida. Nosotros nos interroga- mos sobre cuáles deben ser los abordajes de los cuidados de salud en los contextos geriátricos y gerontológicos, así como sus contribuciones valiosas en el mantenimiento de las capacidades funcionales de los viejos y en el rescate de sus competencias. Reafirmamos la importancia de la reflexión sobre las cuestiones de naturaleza ética, científica, humana, espiritual y socio-cultural respecto los programas dirigidos al cuidado del envejecido en su multidimensionalidad. En este contexto valoramos la comunicación que personaliza el encuentro y la lectura afectiva entre el envejecido, sus familiares e el equipo de salud. Señalamos igualmente algunos desafíos en términos del rescate de la sabiduría de vivir, con dignidad y calidad de vida, así como la elegancia en el adiós a la vida. PALABRAS-LLAVE: Cuidados Paliativos, Bioética, Comunicación Leo Pessini* Luciana Bertachini** * Teólogo. Doutor em Teologia Moral — Bioética. Superintendente da União Social Camiliana. Vice-reitor do Centro Universitário São Camilo. Membro da Diretoria da Associação Internacional de Bioética. ** Fonoaudióloga. Mestre em Distúrbios da Comunicação Humana pela Unifesp (Universidade Federal de São Paulo). Docente do curso de Fonoaudiologia do Centro Universitário São Camilo. Coordenadora da área de Fonoaudiologia do curso de Especialização em Gerontologia da Unifesp-EPM. Fonoaudióloga do Ambulatório de Neuropsiquiatria e Gerontologia do Instituto de Geriatria e Gerontologia da Universidade Federal de São Paulo. Especialista em Voz e em Motricidade Oral pelo Conselho Federal de Fonoaudiologia. Estagiou na Marquette University, na área de Speech and Hearing Clinic, em Milwaukee (WI/EUA). Consultora na área de fonoaudiologia empresarial. 03_Novas perspectivas cuida.p65 28/12/2005, 08:36 491

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ARTIGO ORIGINAL / RESEARCH REPORT / ARTÍCULO

Novas perspectivas em cuidados paliativos:ética, geriatria, gerontologia, comunicação e espiritualidade

New perspectives in palliative care:ethics, geriatrics, gerontology, communication and spirituality

Nuevas perspectivas en cuidados paliativos:ética, geriatria, gerontologia, comunicación y espiritualidad

RESUMO: Este artigo objetiva realçar a importância e a necessidade de compreendermos melhor as dimensões da vida humana, destacandoa dimensão no cuidado da dor e do sofrimento humanos. Destacamos os cuidados paliativos sob diferentes aspectos: conceituais, princípios,trajetória nos cenários mundial e brasileiro, pontuando as informações atualizadas em cuidados paliativos para proporcionar ao idoso e suafamília uma melhor qualidade de vida. Em nível mundial existem programas institucionais, associações publicações e eventos sobre estatemática; destacando-se duas mulheres luminares Cicely Saunders e Elizabeth Kübbler Ross, como referências expressivas no processo daconscientização crescente da relação entre os estados físicos e mentais, trazendo para o campo geriátrico um conceito mais compreensivodo sofrimento e da arte de cuidar no final da vida. Nos perguntamos quais devem ser as abordagens em cuidados de saúde nos contextosgeriátrico e gerontológico, bem como, suas valiosas contribuições na manutenção das capacidades funcionais do idoso e no resgate de suascompetências. Reafirmamos a importância da reflexão sobre as questões de natureza ética, científica, humana, espiritual e sócio-cultural acerca dos programas dirigidos ao cuidado do idoso na sua multidimensionalidade. Neste contexto valorizamos a comunicação que persona-liza o encontro e a leitura afetiva entre o idoso, seus familiares, e á equipe de saúde. Finalizamos apontando alguns desafios em termos deresgatar a sabedoria de viver, com dignidade e qualidade de vida, bem como a elegância no adeus á vida.DESCRITORES: Cuidados Paliativos, Bioética, ComunicaçãoABSTRACT: This article aims to emphasize the importance and the necessity of a better understanding of the dimensions of human life,focusing on the dimension of care of human pain and suffering. We bring palliative care to the fore under different aspects: conceptual ones,their principles, the trajectory in Brazilian and world levels, examining up-to-date information on palliative care to provide old people and theirfamilies a better quality of life. In the world level there are institutional programs, associations, publications and events on this theme; beingdistinguished two sage women, Elizabeth Kübbler-Ross and Cicely Saunders as expressive references on the process of increasing awareness onthe relation between the physical and the mental states, bringing for the geriatric field a more comprehensive concept of suffering and the artto take care of people in the end of life. We ask ourselves which must be the approaches on health cares in the geriatric and gerontologicalcontexts, as well as their valuable contributions in the maintenance of the functional capacities of old people and in the rescue of their abilities.We reaffirm the importance of the reflection on questions of ethical, scientific, human, socio-cultural and spiritual nature and about theprograms directed to the care of the elderly in its multidimensionality. In this context we put a great value on the communication thatpersonalizes the meeting of persons and the affective reading between the elderly, her family and the health team. We finish pointing to somechallenges directed to rescue the wisdom of living, with dignity and quality of life, as well as the elegance in the good-bye to life.KEYWORDS: Palliative Care, Bioethics, CommunicationRESUMEN: Este artículo tiene el objetivo de realzar la importancia y la necesidad de un mejor entendimiento de las dimensiones de la vidahumano, acentuando la dimensión del cuidado del dolor y del sufrimiento humanos. Realzamos los cuidados paliativos bajo diversosaspectos: conceptual, principios, trayectoria en las escenas mundiales y brasileñas, recogiendo la información actualizada acerca de loscuidados paliativos para proporcionar al envejecido y su familia una mejor calidad de vida. Existen en el nivel mundial programas, asociaci-ones, publicaciones y eventos con este tema; siendo distinguidas dos mujeres luminares, Cicely Saunders y Elizabeth Kübbler-Ross, comoreferencias expresivas en el proceso del conocimiento creciente acerca de la relación entre los estados físicos y mentales, trayendo para elcampo geriátrico un concepto más comprensivo del sufrimiento y el arte de ofrecer cuidados en el final de la vida. Nosotros nos interroga-mos sobre cuáles deben ser los abordajes de los cuidados de salud en los contextos geriátricos y gerontológicos, así como sus contribucionesvaliosas en el mantenimiento de las capacidades funcionales de los viejos y en el rescate de sus competencias. Reafirmamos la importanciade la reflexión sobre las cuestiones de naturaleza ética, científica, humana, espiritual y socio-cultural respecto los programas dirigidos alcuidado del envejecido en su multidimensionalidad. En este contexto valoramos la comunicación que personaliza el encuentro y la lecturaafectiva entre el envejecido, sus familiares e el equipo de salud. Señalamos igualmente algunos desafíos en términos del rescate de lasabiduría de vivir, con dignidad y calidad de vida, así como la elegancia en el adiós a la vida.PALABRAS-LLAVE: Cuidados Paliativos, Bioética, Comunicación

Leo Pessini*Luciana Bertachini**

* Teólogo. Doutor em Teologia Moral — Bioética. Superintendente da União Social Camiliana.Vice-reitor do Centro Universitário São Camilo. Membro da Diretoria da Associação Internacional de Bioética.

** Fonoaudióloga. Mestre em Distúrbios da Comunicação Humana pela Unifesp (Universidade Federal de São Paulo).Docente do curso de Fonoaudiologia do Centro Universitário São Camilo. Coordenadora da área de Fonoaudiologia do curso de Especialização em Gerontologia

da Unifesp-EPM. Fonoaudióloga do Ambulatório de Neuropsiquiatria e Gerontologia do Instituto de Geriatria e Gerontologia da Universidade Federalde São Paulo. Especialista em Voz e em Motricidade Oral pelo Conselho Federal de Fonoaudiologia. Estagiou na Marquette University,

na área de Speech and Hearing Clinic, em Milwaukee (WI/EUA). Consultora na área de fonoaudiologia empresarial.

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NOVAS PERSPECTIVAS EM CUIDADOS PALIATIVOS:

ÉTICA, GERIATRIA, GERONTOLOGIA, COMUNICAÇÃO E ESPIRITUALIDADE

Introduzindo

Hoje são muitas as iniciativas emnível mundial de desenvolvimentodos cuidados paliativos e Hospice. NoBrasil, também já temos algumasiniciativas pioneiras, em termos decuidado, programas institucionais,publicações e eventos sobre essatemática. Uma das últimas novida-des em âmbito internacional é acomemoração do Dia Mundial dosCuidados Paliativos em 8 de outubro,a partir de 2005.

Uma das mais interessantes ini-ciativas da atualidade vem da Co-munidade Européia. O Conselho daEuropa, por meio da sua Comissãode Ministros, aprovou em 12 de no-vembro de 2003 a Recomendação 24sobre a organização dos cuidadospaliativos no contexto dos estadosmembros da União Européia. Entreoutras razões apresentadas para ela-boração desse documento para osgovernos dos Estados membros daComunidade Européia, destacam-se as necessidades de: a) adoção depolíticas e legislações e outras me-didas necessárias para a elaboraçãode uma política nacional coerenteem cuidados paliativos; b) promo-ção de redes internacionais entre asorganizações, instituições de pes-quisa e outras entidades ativas nocampo dos cuidados paliativos. So-mente no Reino Unido existem 253hospices que disponibilizam 3.411leitos para a população. Destes, 33serviços são para crianças com a dis-ponibilidade de 255 leitos.

Dados da Organização Mundialde Saúde estimam que mais de 50milhões de pessoas morrem porano; em 2004, 4,9 milhões de pes-soas foram infectadas com o vírusHIV; 3,1 milhões de pessoas morre-ram de aids; e 39,4 milhões de pes-soas são portadores do vírus HIV/aids; a cada ano o câncer causa 6milhões de mortes, e tem-se maisde 10 milhões de novos casos. Esti-ma-se que para 2020 teremos 15

milhões de novos casos/ano. É dian-te dessa realidade dificílima que oscuidados paliativos e hospices seapresentam como uma forma ino-vadora de cuidado na área da saúde.

A Organização Mundial da Saú-de também salienta o aumento daexpectativa de vida em diversas re-giões do mundo como uma das con-quistas da humanidade. Reconheceque o mundo está experimentandouma transformação demográficasem precedentes e que em 2050 apopulação maior que 60 anos pas-sará de 600 milhões para quase 2bilhões, prevendo-se um aumentode 10% para 21% do total da popu-lação. O aumento será maior e maisrápido nos países em desenvolvi-mento, onde se espera que a popu-lação idosa seja quadruplicada du-rante os próximos 50 anos. Na De-claração Política da II AssembléiaMundial da ONU sobre Envelheci-mento (Madri, 2002), foram reitera-dos os princípios e recomendaçõesdo Plano Internacional para o Enve-lhecimento 2002, apontados pelaAssembléia Geral da ONU 1982, eos Princípios das Nações Unidas emfavor das pessoas Idosas, adotadospela Assembléia Geral de 1991, quedefiniram diretrizes nas áreas de in-dependência, participação, cuidado,dignidade e auto-realização.

O roteiro do presente texto ini-cia-se com alguns aspectos históri-cos relacionados com o surgimentodos hospices e cuidados paliativos (I),a seguir apresenta a definição da Or-ganização Mundial da Saúde sobrecuidados paliativos (II) e comentaalguns princípios fundamentais des-sa filosofia de cuidados da vida hu-mana (III). Apresenta então algunstraços biográficos dos dois maioresluminares na arte de cuidar da vidahumana em seu final, Cicely Saun-ders e Elizabeth Kübbler Ross (IV),introduz algumas questões éticas(V), alguns aspectos relacionadoscom geriatria (VI), destaca a impor-tância da comunicação (VII), da es-

piritualidade (VIII) e finaliza comalgumas provocações em termos desabedoria de viver e morrer.

Essas reflexões situam-se na li-nha de atualização, seguimento eincorporação de sugestões críticasde leitores da obra por nós organi-zada, Humanização e cuidados palia-tivos (Pessini, Bestachini, 2004).

Algumas balizashistórico-conceituais

Desde os tempos mais remotos,as sociedades oferecem apoio e con-forto a seus membros doentes e aosque estão morrendo. Normalmen-te, uma profunda reverência e mís-tica envolvem esses acontecimen-tos. O período que sucede à mortede um ente querido é via de regramarcado pelo seguimento de rituaisreligiosos culturais bem definidos.A necessidade de chorar a perda deum ente querido é reconhecida pormuitas sociedades, embora as ma-nifestações pela perda e o períodoformal de luto variem de uma cul-tura para outra.

Num rápido relance em buscadas raízes históricas do atual mo-vimento de Hospices, percebemosque nos tempos medievais o ter-mo hospice era usado para descre-ver o lugar de acolhida para pere-grinos e viajantes, uma hospeda-ria. Mais próximos de nós, cons-tatamos que desde o início do sé-culo XIX ocorreram numerososdesenvolvimentos no cuidado dosdoentes em fase final, lideradospor mulheres entre as quais me-recem destaque Jeanne Garnier naFrança, Mary Aikenhead na Irlan-da e Rose Hawthorne nos EstadosUnidos. Vejamos objetivamente aação inovadora dessas pioneiras.

Jeanne Garnier, uma jovemviúva e mãe enlutada, fundou em1841 a L’Association dês Dames duCalvaire em Lyon, que abriu umacasa para os que estavam na fasefinal de vida em 1843. Sua lide-

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ÉTICA, GERIATRIA, GERONTOLOGIA, COMUNICAÇÃO E ESPIRITUALIDADE

rança levou à fundação de outrosestabelecimentos para o cuidadodos que estavam enfrentando afase final de vida (Paris em 1874e Nova York em 1899).

Mary Aikenhead foi importan-te fundadora das Irmãs Irlandesasda Caridade e direta colaborado-ra para a abertura do St. VincentHospital, em Dublin em 1834.Após muitos anos de doença crô-nica, Mary morreu em 1958. Oconvento onde ela passou seusúltimos dias de vida tornou-se oOur lady´s Hospice para os pacien-tes em fase final de vida, em 1879.As Irmãs da Caridade posterior-mente abriram outros hospices naAustrália, na Escócia e, em 1907,o famoso St. Joseph´s Hospice naInglaterra.

Rose Hawthorne, nos EstadosUnidos, experimentou a dor daperda de uma criança e acompa-nhou sua amiga, a poetisa EmmaLazarus, falecer de câncer. No fi-nal dos anos 1890 organizou umgrupo de mulheres conhecidascomo Servas do Alívio do CâncerIncurável (Servants of Relief ofIncurable Câncer) e após o faleci-mento de seu marido optou portornar-se religiosa. Em 1900, jácomo Madre Afonsa fundou as Ir-mãs Dominicanas de Hawthorne,que abriram o St. Rose´s Hospice emManhattan e hospices em outraslocalidades dos Estados Unidos.Como marco referencial na con-temporaneidade, o primeirohospice norte-americano foi esta-belecido em New Haven, Connec-ticut, em 1974.

Embora essas três mulherespioneiras não se conhecessempessoalmente, tiveram como obje-tivo comum cuidar das pessoasque estavam morrendo, e em par-ticular dos pobres. Enraizadas emvalores filantrópicos e religiosos,essas primeiras casas de acolhidapara pacientes em fase final repre-sentam o prólogo para um perío-

do de desenvolvimento após a IIGuerra Mundial.

Em meados do século XX, im-portantes mudanças ocorreram naMedicina ocidental e no âmbito dasaúde, como o crescimento de es-pecializações, o surgimento denovos tratamentos e uma ênfasecrescente em cura e reabilitação.A cena da despedida da vida, queantes ocorria predominantemen-te no ambiente familiar, deslocou-se de lugar, passando a acontecerno hospital. Os pacientes em fasefinal ou os casos sem esperançaeram freqüentemente vistos comofalhas da prática médica. O cres-cente interesse pela eutanásia noReino Unido e Estados Unidosdeve-se em muito à falta de co-nhecimento aprofundado dequestões relacionadas aos cuida-dos do final da vida.

No início dos anos 50 no Rei-no Unido, a atenção se voltou àspessoas que estavam na fase finalde vida e praticamente “negligen-ciadas” pela medicina; já nos Es-tados Unidos a reação à medicali-zação da morte começou a ganharforça (Metzger, Kaplan, 2001).Quatro inovações podem serapontadas: a) a inserção sistemá-tica de questões vinculadas aoscuidados paliativos na literaturaprofissional; b) uma nova visãodos pacientes em fase terminal de-sencadeou estudos mais aprofun-dados sobre o processo do mor-rer, incluindo a discussão sobre atéque ponto os pacientes devem sa-ber de sua condição terminal; c) aadoção de uma abordagem ativade cuidados, contrariando a tra-dicional postura passiva. Nessecontexto emergiu uma determi-nação de encontrar caminhos no-vos e imaginativos de “cuidado”no final da vida e, além dele, ocuidado dos enlutados; d) umaconsciência crescente da relaçãoentre os estados físicos e mentaistrouxe um conceito mais compre-

ensivo do sofrimento, que desa-fiou os fundamentos sobre osquais a prática médica até entãose sustentava.

Foi o trabalho de Cicely Saun-ders, inicialmente desenvolvidono St. Joseph´s Hospice, emHackney, Londres, que introduziuuma nova filosofia de cuidadosdiante da terminalidade da vida.Por meio da atenção sistemáticadas narrativas dos pacientes, ou-vindo cuidadosamente as históriasda doença e sofrimento, ela de-senvolveu o conceito de “dor to-tal”. Essa visão da dor moveu-separa além da dimensão física, en-globando a dimensão social, emo-cional e espiritual do sofrimento.Quando Cicely Saunders fundouo St. Christopher´s Hospice, em Lon-dres, em 1967, ele imediatamen-te se tornou uma fonte de inspi-ração para outras iniciativas des-sa natureza; e, ao combinar trêsprincípios-chave (cuidados clíni-cos de qualidade, educação e pes-quisa), tornou-se uma instituiçãode referência mundial em termosde cuidado, pesquisa sobre dor eeducação para profissionais dasaúde de todo o mundo.

Em muitas instituições quecuidavam de pacientes com doen-ças avançadas e incuráveis, esfor-ços para controlar a dor e outrossintomas não foram adiante emvirtude da falta de compreensãoda natureza desses sintomas etambém pela não-eficácia da me-dicação. Por volta dos anos 50 éque surgiu uma gama importantede drogas, incluindo psicotrópicos,fenoliasinas, antidepressivos, an-tiinflamatórios, entre outros. Apartir de então, teve-se uma com-preensão mais aprofundada danatureza da dor e do papel dosopióides no controle da dor on-cológica. A disponibilidade dessanova medicação criou a possibili-dade do “cuidado e da adminis-tração da dor”.

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ÉTICA, GERIATRIA, GERONTOLOGIA, COMUNICAÇÃO E ESPIRITUALIDADE

Temos claras evidências de queprogramas de hospices e cuidadospaliativos estão em franca expan-são em termos mundiais. Apresen-tam-se associações nacionais ati-vas, realizam-se eventos mundiaise regionais, bem como foram cria-das redes de apoio internacionaispara divulgação e educação ao pú-blico, além de assessoria científicana implantação de novos progra-mas de cuidados paliativos. Valelembrar que já foram realizadasduas cúpulas globais de associaçõesnacionais de hospice e cuidados pa-liativos, e a terceira está programa-da para 2007, na África, em paísainda a ser definido. A primeira cú-pula global ocorreu em Hague (Ho-landa), de 30 de março a 1 de abrilde 2003, em conexão com a Asso-ciação Européia de Cuidados Palia-tivos. Nesse evento se reuniramtrinta organizações de cuidados pa-liativos de todo o mundo, incluin-do organizações nacionais e regio-nais, órgãos intergovernamentais,organizações não-governamentais,bem como pioneiros e fundadoresde programas de cuidados paliati-vos no contexto internacional. Asegunda cúpula global de associa-ções nacionais de hospice e cuidadospaliativos ocorreu na Coréia, emSeul, em 15-16 de março de 2005.

Vale registrar alguns pontos daDeclaração da Coréia, documentofruto desse evento internacional(cf. www.hpc-association.net). Ogrande desafio que existe: em ter-mos mundiais, mais de 52 milhõesde pessoas morrem anualmente,incluindo adultos, crianças e jo-vens. Aproximadamente uma emcada dez mortes é causada pelocâncer. Mais de 40 milhões de pes-soas, das quais mais de 29 milhõessão africanas, estão infectadas com

o vírus HIV/aids e estão vivendocom a doença. Também existe umnúmero crescente de pessoas comoutras doenças crônicas e em con-dições ameaçadoras de vida. Todasessas pessoas necessitarão de cui-dados paliativos e hospice num de-terminado momento. É impera-tivo que todos os governos apói-em e desenvolvam planos de açãoque sejam de apoio, prevenção,tratamento e cuidados paliativos.Setenta por cento dos pacientescom câncer sentem dor, e entre70 e 90% dos que estão em está-gio avançado de aids têm a dornão-controlada.

Em termos de ação, estabele-ceu-se o Dia Mundial de CuidadosPaliativos, a ser celebrado anual-mente sempre no dia 8 de outubro.

O conceito de cuidadospaliativos

O termo “paliativo” deriva do la-tim pallium, que significa manto, ca-pote. Aponta-se para a essência doscuidados paliativos: aliviar os sinto-mas, a dor e sofrimento em pacien-tes portadores de doenças crônico-degenerativas ou em fase final,objetivando o paciente em sua glo-balidade de ser e aprimorar sua qua-lidade de vida. Etimologicamente,significa prover um manto paraaquecer “aqueles que passam frio”,uma vez que não podem mais serajudados pela medicina curativa.

Os cuidados paliativos não di-zem respeito primordialmente acuidados institucionais, mas cons-tituem-se fundamentalmente deuma filosofia de cuidados quepode ser utilizada em diferentescontextos e instituições, ou seja,no domicílio da pessoa portadorade doença crônico-degenerativa

ou em fase terminala,na institui-ção de saúde onde está internadaou no hospice, uma unidade espe-cífica dentro da instituição de saú-de destinada exclusivamente aessa finalidade.

Segundo Cicely Saunders, pio-neira da concepção do modernohospice, os “cuidados paliativos seiniciam a partir do entendimentode que cada paciente tem sua pró-pria história, relacionamentos, cul-tura e que merece respeito comoum ser único e original. Esse res-peito inclui proporcionar o melhorcuidado médico disponível e dis-ponibilizar a ele as conquistas dasúltimas décadas, de forma que to-dos tenham a melhor chance deviver bem o seu tempo (Saunders,199-).

O conceito de “cuidados palia-tivos” evoluiu ao longo do tempoà medida que essa filosofia de cui-dados de saúde foi se desenvol-vendo em diferentes regiões domundo. Os cuidados paliativosforam definidos tendo como refe-rência não um órgão, idade, tipode doença ou patologia, mas an-tes de tudo a avaliação de um pro-vável diagnóstico e possíveis ne-cessidades especiais da pessoadoente e sua família.

Tradicionalmente, os cuidadospaliativos eram vistos como apli-cáveis exclusivamente no momen-to em que a morte era iminente.Hoje eles são oferecidos no estágioinicial do curso de uma determi-nada doença progressiva, avança-da e incurável (Sepulveda, 2005).

Em 1987, a medicina paliativafoi reconhecida como uma especia-lidade médica, sendo definida co-mo “o estudo e gestão dos pacien-tes com doença ativa, progressivae ultra-avançada, para os quais o

a. Muito se discute hoje a respeito da definição de paciente terminal, ou então sobre qual é o conceito de enfermidade terminal. A Associação Espanhola deCuidados Paliativos (Secpal), em seu Guia de cuidados paliativos, aponta para uma série de características importantes não somente para definir o que seja enfermi-dade terminal, mas também para estabelecer adequadamente a terapêutica. Os elementos fundamentais são os seguintes: “1) Presença de uma enfermidadeavançada, progressiva e incurável; 2) Falta de possibilidades razoáveis de respostas ao tratamento específico; 3) Presença de inúmeros problemas ou sintomasintensos, múltiplos, multifatoriais e cambiantes; 4) Grande impacto emocional no paciente, família e equipe de cuidados, estreitamente relacionado com a presen-ça, explícita ou não, da morte; 5) Prognóstico de vida inferior a seis meses” (cf. http://secpal.com/guacp/index).

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ÉTICA, GERIATRIA, GERONTOLOGIA, COMUNICAÇÃO E ESPIRITUALIDADE

prognóstico é limitado e o enfoquedo cuidado é a qualidade de vida”(Dolyle et al, 2005). Inicialmente,esse conceito surgiu atrelado à prá-tica médica. No entanto, quandooutros profissionais, como enfer-meiras, terapeutas ocupacionais, fi-sioterapeutas, fonoaudiólogos oucapelães, são envolvidos, refere-secomo sendo cuidados paliativosantes que medicina paliativa, por-que tal cuidado é quase sempremultiprofissional ou interdiscipli-nar. O Manual de medicina paliativade Oxford (2005), em sua terceiraedição, embora faça essa distinçãoconceitual, utiliza os dois concei-tos como sinônimos.

Hospice, antes de ser um lugarfísico, é um conceito. Trata-se deuma filosofia e modelo de cuida-do, bem como uma forma orga-nizada de proporcionar cuidadosde saúde. As duas expressões sãofreqüentemente consideradas si-nônimos, visto que a filosofia dohospice expandiu seu âmbito deatuação no decorrer do tempo, aoincluir pessoas que estão morren-do não somente de câncer mas demuitas outras doenças com prog-nósticos de menos de seis mesesde vida, além daquelas que passampelo processo do morrer longo,crônico e imprevisível.

A Organização Mundial daSaúde (OMS) em 1990 definiucuidados paliativos como “o cui-dado ativo total de pacientes cujadoença não responde mais ao tra-tamento curativo. Controle da dore de outros sintomas e problemasde ordem psicológica, social e es-piritual são prioritários. O objeti-vo dos cuidados paliativos é pro-porcionar a melhor qualidade devida para os pacientes e seus fa-miliares” (WHO, 1990).

Essa definição é louvável aocentrar-se no paciente para enfati-zar a natureza multifacial da condi-ção humana e identificar a qualida-de de vida como seu objetivo últi-

mo. Sendo assim, o uso do termo“curativo” não se justifica, uma vezque muitas condições crônicas nãopodem ser curadas, mas podem sercompatíveis com uma expectativade vida por várias décadas.

A OMS em 1998 definiu cui-dados paliativos para crianças esuas famílias, cujos princípios apli-cam-se também a outras desordenspediátricas crônicas, como “o cui-dado ativo total para o corpo, men-te e espírito, assim como o apoiopara a família; tem início quandoa doença é diagnosticada, e conti-nua independentemente de adoença da criança estar ou não sen-do tratada. Os profissionais da saú-de devem avaliar e aliviar o estressefísico, psíquico e social da criança;para serem efetivos, exigem umaabordagem multidisciplinar queinclui a família e a utilização dosrecursos disponíveis na comunida-de; os cuidados paliativos podemser implementados mesmo se osrecursos forem limitados, e reali-zados em centros comunitários desaúde, até mesmo nas casas dascrianças” (WHO, 2005).

Essa mesma organização inter-nacional em 2002 redefiniu o con-ceito de cuidados paliativos, enfa-tizando a prevenção do sofrimen-to. Eis o novo conceito: “Cuidadospaliativos é uma abordagem queaprimora a qualidade de vida dospacientes e famílias que enfrentamproblemas associados com doen-ças ameaçadoras de vida, atravésda prevenção e alívio do sofrimen-to, por meios de identificação pre-coce, avaliação correta e tratamen-to da dor e outros problemas deordem física, psicossocial e espiri-tual” (WHO, 2002).

É importante notar que os cui-dados paliativos não devem servistos hoje como essencialmentediferentes de outras formas ouáreas de cuidados de saúde. Issotornaria difícil, se não impossível,a sua integração no curso regular

dos cuidados de saúde. Muitosaspectos cruciais dos cuidados pa-liativos aplicam-se perfeitamenteà medicina curativa, bem como,por outro lado, o desenvolvimen-to dos cuidados paliativos podeinfluenciar positivamente outrasformas de cuidados de saúde, aovalorizar aspectos que ficaram emsegundo plano a partir do domí-nio da medicina chamada cientí-fico tecnológica, tais como as di-mensões humanas e ético-espiri-tuais da pessoa humana.

Sob essa perspectiva concei-tual, segue-se abordando a filoso-fia dos cuidados paliativos, nosseus princípios fundamentais.

Alguns princípiosfundamentais doscuidados paliativos

A partir da definição de cuida-dos paliativos da OMS de 2002, te-mos os seguintes princípios funda-mentais (Council of Europe, 2005):

Os cuidados paliativos:

a) valorizam atingir e manterum nível ótimo de dor e administra-ção dos sintomas. Isso exige umacuidadosa avaliação de cada doen-te, levando em conta sua históriadetalhada, exame físico e pesqui-sas. Os doentes devem ter acessoimediato a toda medicação neces-sária, incluindo uma gama deopióides e de formulações.

b) afirmam a vida e encaram omorrer como um processo normal. Oque todos partilhamos em comumé a realidade inexorável de nossamorte. Os pacientes que solicitamcuidados paliativos não devem servistos como resultantes de falhasmédicas. Os cuidados paliativos vi-sam assegurar aos doentes condi-ções que os capacitem e encorajema viver sua vida de uma forma útil,produtiva e plena, até o momentode sua morte. A importância da rea-bilitação, em termos de bem-estar

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físico, psíquico e espiritual, nãopode ser negligenciada.

c) não apressam nem adiam a mor-te. Intervenções de cuidados palia-tivos não devem ser para abreviara vida “prematuramente”. Da mes-ma maneira que as tecnologias dis-poníveis na moderna prática mé-dica não são aplicadas para prolon-gar a vida de forma não-natural. Osmédicos não são obrigados a conti-nuar tratamentos considerados fú-teis e excessivamente onerosos paraos pacientes, da mesma forma queos pacientes podem recusar trata-mentos médicos. Em cuidados pa-liativos, o objetivo é assegurar amelhor qualidade de vida possível;logo, o processo da doença conduza vida a um final natural, por meiodo qual os doentes devem receberconforto físico, emocional e espiri-tual. Especificamente, presta-seatenção ao fato de que a eutanásiae o suicídio assistido não estão in-cluídos em nenhuma definição decuidados paliativos.

d) integram aspectos psicológicose espirituais dos cuidados do paciente.Um nível elevado de cuidado físi-co é certamente de vital importân-cia, mas não suficiente em si mes-mo. A pessoa humana não deveser reduzida a uma mera entida-de biológica.

e) oferecem um sistema de apoiopara ajudar os pacientes a viver tãoativamente quanto possível, até o mo-mento da sua morte. É importanteressaltar que o paciente estabele-ce os objetivos e prioridades. Nes-se sentido, o papel do profissionalda saúde é capacitar e assistir opaciente em atingir seu objetivoidentificado. É evidente que asprioridades de um paciente po-dem mudar dramaticamente como tempo. O profissional deve es-tar consciente dessas mudanças e,conseqüentemente, respondê-las.

f) ajudam a família a lidar com adoença do paciente e no luto. Em cui-dados paliativos a família é uma

unidade de cuidados; para tanto, asquestões e dificuldades dos mem-bros da família devem ser identifi-cadas e trabalhadas. O cuidado como luto se inicia bem antes do mo-mento da morte do doente.

g) exigem uma abordagem emequipe. Fica evidente que nenhu-ma pessoa ou especialidade por sisó prepara adequadamente profis-sionais para lidar com a complexi-dade das questões pertinentes aoperíodo dos cuidados paliativos.Embora a equipe central consistaem um médico, enfermeira, assis-tente social com o fim de prover ocuidado necessário, faz-se neces-sário contar com a colaboração deuma equipe ainda maior de pro-fissionais da área médica, enferma-gem, fisioterapeutas, terapeutasocupacionais, entre outros. Paraque esse grupo trabalhe de formacoesa, é crucial estabelecer e parti-lhar metas e objetivos comuns,bem como utilizar meios rápidos eefetivos de comunicação.

h) buscam aprimorar a qualidadede vida. A questão da qualidade devida tem atraído grande interessede pesquisa nos últimos anos, umavez que é importante reconhecerque tal fato não é simplesmenteuma medida de conforto físico oude capacidade funcional. Trata-se,antes, de algo que somente podeser definido pela pessoa doente, eque pode ser alterado significati-vamente ao longo do tempo.

i) são aplicáveis no estágio inicialda doença, concomitantemente com asmodificações da doença e terapias queprolongam a vida. Ao longo da his-tória, os cuidados paliativos foramassociados aos cuidados oferecidosaos doentes de câncer adiante damorte iminente. Reconhece-seque os cuidados paliativos têmmuito a oferecer aos pacientes efamiliares no estágio inicial docurso da doença, tendo em vistaa possibilidade do avanço dadoença e da não-contenção de sua

progressão Dessa forma, exige-seque os serviços de cuidados palia-tivos estejam intimamente inte-grados aos demais serviços de saú-de, seja no hospital ou em insti-tuições comunitárias.

A partir dos princípios acimadescritos, constata-se que os cui-dados paliativos não são definidossomente a partir de um determi-nado tipo de doença; potencial-mente, aplicam-se a pacientes detodas as idades, com base em umaavaliação de seus prováveis diag-nósticos e necessidades específi-cas. Além do mais, os serviços decuidados paliativos têm como fococentral atingir a melhor qualida-de de vida possível para cada pa-ciente e sua família, o que envol-ve: atenção específica em relaçãoao controle dos sintomas e a ado-ção de abordagem holística queleve em conta as experiências devida da pessoa e a situação atual.Trata-se de um cuidado que abar-ca tanto a pessoa que está mor-rendo como as que lhe são próxi-mas, familiares e amigos, exigin-do uma especial atenção na práti-ca de uma comunicação aberta esensível junto aos pacientes, fami-liares e cuidadores.

Duas grandes mulheres,luminares naarte de cuidados no finalde vida: Cicely Saunderse Elizabeth Kübler-Ross

Não podemos deixar de regis-trar algumas anotações, ainda queintrodutórias, a respeito das duasmaiores personalidades da con-temporaneidade que “revolucio-naram” a arte de cuidar dos pacien-tes que estão na fase final de vida:Cicely Saunders, que introduziuno contexto dos cuidados de saú-de uma filosofia de cuidados pa-liativos institucionais, e ElizabethKubler-Ross, que inovou ao des-

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crever todo o processo pelo qualpassa a pessoa na fase final de vida.Apresentamos sucintamente al-guns dados biográficos, bem comosua contribuição original.

a) Dame Cicely Saunders

Aos 87 anos, no dia 14 de ju-lho de 2005, Cicely Saunders(1918-2005) despediu-se da vida,no St. Christopher´s Hospice, porela fundado em 1967. No dizer deBarbara Monroe, Diretora Admi-nistrativa dessa instituição: “A vi-são e o trabalho de Cicely Saun-ders transformaram o cuidado dosque estão morrendo e a prática damedicina no Reino Unido e ao re-dor do mundo. Ela é uma inspira-ção para todos nós. Nós cuidamosde Cicely no St. Christopher´sHospice como uma paciente poralgum tempo. Sentiremos sua fal-ta. Sua influência continuará nomundo à medida que trabalhar-mos juntos em cuidados paliativose hospice ao apoiarmos as pessoasque estão morrendo e seus entesqueridos” (St. Christopher’s Hos-pice, 2005).

Cicely Saunders começou suacarreira profissional primeiro comoenfermeira e assistente social. De-pois estudou medicina, para se-gundo ela mesma “cuidar bem dospacientes terminais, esquecidospelos médicos tradicionais”. Ela éreconhecida como a fundadora domovimento moderno de hospice. OSt.Christopher’s Hospice por elafundado foi o primeiro hospice que,numa visão holística da pessoahumana e cuidados integrados, li-gou o alívio da dor e controle desintomas com o cuidado humani-zado, o ensino e a pesquisa clíni-ca. Essa nova filosofia de cuidadosdirecionada aos pacientes fora depossibilidades terapêuticas influen-ciou muito os cuidados em saúde

ao redor do mundo, bem comogerou novas atitudes em relação àmorte, ao morrer e diante da dorda perda de um ente querido, istoé, o período do luto.

Mais de 50 mil estudantes esti-veram em treinamento no St.Christopher’s Hospice ao longodesses anos para se tornarem líde-res em cuidados paliativos, comomédicos, enfermeiras e outros pro-fissionais, com o estabelecimentode programas em cuidados palia-tivos em mais de 120 países.

Cicely Saundersb, como já su-blinhamos no início deste traba-lho, cunhou o conceito de “dortotal”, uma combinação de ele-mentos das dimensões física, psí-quica, social e espiritual da pes-soa humana. Assim relata comochegou a esse conceito: “Logo fi-cou claro que cada morte era tãoúnica como a vida que a prece-deu e que toda experiência daque-la vida estava refletida no mo-mento do morrer. Isso levou-nosao conceito de ‘dor total’, que foiapresentado como um complexode elementos físicos, emocionais,sociais e espirituais. Toda essa ex-periência para o paciente incluiansiedade, depressão e medo;preocupações com a família quepassará pelo luto e freqüentemen-te a necessidade de encontrar al-gum sentido na situação, uma rea-lidade mais profunda em que con-fiar. Isso tornou-se a tônica deensino e escritos sobre assuntostais como a natureza, o cuidadoda dor terminal e a família comouma unidade de cuidados” (Saun-ders, 1996).

Diante da mentalidade utilita-rista de eliminar o sofredor porcausa do sofrimento, Saunderspropõe que “o sofrimento somen-te é intolerável se ninguém cui-da”. Podemos lembrar Victor

Frankl, ao afirmar que “o homemnão é destruído pelo sofrimento,mas pelo sofrimento sem sentido”.Difícil não emocionar ao ouvir-mos Saunders dizer: “Como ohospice moderno começou ouvin-do os pacientes, deixemos que umpaciente tenha a última palavra:´Solidão não é tanto uma questãode estar sozinho, como de nãopertencer’” (Saunders, 2005).

Sempre nos lembraremos deCicely Saunders, do seu humanis-mo profissional ao anunciar que,“ao cuidar de você no momentofinal da vida, quero que você sin-ta que me importo pelo fato devocê ser você, que me importo atéo último momento de sua vida, efaremos tudo o que estiver ao nos-so alcance não somente para aju-dá-lo a morrer em paz, mas tam-bém para você viver até o dia desua morte” (Saunders, 1976).

b) Elizabeth Kübler-Ross

Elizabeth Kübler-Ross (1926-2004), psiquiatra suíça radicadanos Estados Unidos, ficou mun-dialmente conhecida por seus es-critos e trabalho com pacientes nafase final de vida. Faleceu aos 78anos de idade em Scottsdale, Ari-zona. Em 1969, escreveu seu li-vro mais importante, que a pro-jetou internacionalmente, cau-sando grande impacto na área doscuidados de saúde: On death anddying (Sobre a morte e o morrer),no qual descreve os estágios pe-los quais as pessoas passam quan-do estão na fase final de vida: ne-gação, raiva, barganha, depressãoe aceitação. Kübler-Ross introdu-ziu o estudo da tanatologia na áreamédica e também impulsionou oshospices nos Estados Unidos. Au-tora de mais de 20 livros, traduzi-dos em 26 idiomas, foi escolhidaem Time Magazine em 1999 como

b. Para conhecer mais profundamente o trabalho de Cicely Saunders, confira em: Clark, D. Cicely Saunders — Founder of the Hospice Movement. Selected Letters 1959-1999. New York: Oxford University Press; 2002.

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“um dos 100 mais importantespensadores do século XX”.

Em um de seus últimos livros,em co-autoria com Kessler, LifeLessons (2000)c, registramos um deseus depoimentos mais contun-dentes, que nos permite refletirsobre a dimensão de finitude denossas vidas:

“... Durante este período cha-mado Vida todos temos lições aaprender. Esse fato fica muito cla-ro quando trabalhamos com osque estão à beira da morte. Essaspessoas aprendem muito no finalda vida, geralmente quando já émuito tarde para que apliquemesses conhecimentos.

Depois que me mudei para odeserto do Arizona, em 1995, so-fri um derrame no dia das mãesque me deixou paralítica. Passeios anos seguintes à beira da mor-te. Às vezes eu achava que iriaviver poucas semanas. Freqüen-temente fiquei desapontada por-que isso não aconteceu, pois eume sentia pronta. Mas não morriporque ainda estou aprendendo aslições da vida, minhas últimas li-ções. Elas contêm verdades essen-ciais a respeito da nossa vida, sãoos próprios segredos da vida. Porisso quis escrever mais um livro,não sobre a morte e o morrer, massobre a vida e o viver.

Cada um de nós tem dentro desi um Gandhi e um Hitler. O Gan-dhi corresponde ao que há de me-lhor em nós, nosso lado capaz damaior compaixão, enquanto oHitler corresponde ao que há depior, nossos aspectos negativos emesquinhos. Nosso crescimentoconsiste em trabalhar os aspectosnegativos, livrando-nos de suasmanifestações, descobrir e desen-volver o que há de melhor em nóse nos outros. Aprender as lições devida capazes de curar nosso espíri-to — nossa alma — e de trazer à

tona a pessoa que realmente so-mos. Estamos na Terra para curaruns aos outros e a nós mesmos.

Quando falo em aprender nos-sas lições, eu me refiro a resolveras questões inacabadas. Essas ques-tões dizem respeito à vida e às nos-sas indagações mais essenciais,como: ‘Será que de fato investimeu tempo para viver o mais ple-namente possível? Será que colo-quei minha realização em ganhardinheiro e prestígio? Muitas pes-soas existiram, mas na verdadenunca viveram’. E gastaram umatremenda quantidade de energiapara não tomar conhecimento deseus assuntos inacabados.

Como as questões inacabadassão o maior problema da vida, étambém com elas que lidamosquando enfrentamos a morte. Amaioria de nós morre com umagrande quantidade de questõesinacabadas. Há tantas lições a se-rem aprendidas na vida que é im-possível dominá-las em uma úni-ca existência. Mas quanto mais li-ções aprendemos, mais assuntosconcluímos e mais plenamenteviveremos. Então, quando chegarnossa hora, poderemos exclamarfelizes: ‘Meu Deus, eu vivi’”(Kübler-Ross, Kessler, 2004).

No dia 25 de agosto de 2004,jornais noticiavam a morte de Eli-zabeth Kubler-Ross, comentandoseus últimos momentos de vida,testemunhados por seu diletoamigo David Kessler e familiares.Seu filho mais velho disse que suamãe, nos últimos meses de vida,estava colhendo os frutos do mo-vimento que ela ajudou a fundar,encontrando conforto de amigose familiares provenientes de todasas partes do mundo, em e-mails,cartas e telegramas e que cente-nas vieram para visitá-la.

“... Esperar pela morte não eraum grande desafio para ela”, disse

o filho. “Seu único problema aoenfrentar a morte era a paciência”.

Numa entrevista a Reuters em1997, ao falar a respeito de suaprópria visão sobre a vida e o vi-ver, Elisabeth disse: “Eu semprefiz o que senti que fosse o certo,não o que as outras pessoas espe-ravam de mim. Nunca ouvi a opi-nião das outras pessoas”. E, per-guntada se tinha algo de que selamentar em sua vida: “Sinto nãotocar um instrumento. Amariatocar e cantar. Quando eu morrervou dançar primeiramente emtodas as galáxias... Vou tocar, dan-çar e cantar” (Schwaartz, Kübler-Ross, 199-).

“Sem sombra de dúvida, sei quenão existe morte da forma como acompreendemos, o corpo morre,mas não a alma”, dizia ela. Nuncatemendo a morte, ela simplesmen-te seguiu aquilo em que acreditou,ou seja, “a vida não termina quan-do você morre, mas começa”. Da-vid diz que sua amiga “morreu comaceitação em sua face” (Noble,Kübler-Ross, 2004).

Algumas questões éticasem cuidados paliativos

As questões éticas envolvidasem cuidados paliativos baseiam-seno reconhecimento do fato de queo paciente incurável ou em faseterminal não é um resíduo bioló-gico por quem nada mais pode serfeito, um ser necessitado de anes-tesia, cuja vida não deve ser pro-longada desnecessariamente. Esta-mos sempre diante de uma pessoae, como tal, capaz — até o momen-to final — de relacionamento, detornar a vida uma experiência decrescimento e de plenitude.

Os profissionais devem, porém,reconhecer os limites da medicinae evitar o excesso de tratamento, achamada distanásia, ou o tratamen-

c. Kubler-Ross, E., Kessler, D. Life lessons (2000) recebeu na versão em português o título Os segredos da vida. São Paulo: Sextante; 2004.

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to fútil e inútil. É importante desa-fiar a ilusão de que existe somenteuma forma de lidar com a dor e osofrimento: eliminando-os. É ne-cessário enfatizar que a chamada“dor total”, conceito cunhado porCicely Saunders, que se expressa nomedo da morte, na ansiedade daseparação, na solidão, no lidar comdifíceis questões existenciais, o sen-tir-se um peso para os outros comoum dependente inútil, não pode sertratada ou cuidada somente pormeio do instrumental técnico-cien-tífico. No caso da “dor total”, a efi-cácia dos analgésicos está relacio-nada com a possibilidade de incluiro tratamento médico, no contextode relacionamentos humanos sig-nificativos, afetivos.

Seguindo os quatro princípiosdefinidos por Beauchamp e Chil-dress (2002) , ou seja, o respeitopela autonomia, beneficência,não-maleficência e justiça, bemcomo em todas as outras áreas doscuidados médicos, os médicos eoutros profissionais do cuidadodevem respeitar a autonomia dopaciente, ao concordar com asprioridades e objetivos do cuida-do com os pacientes e cuidadores,não esconder a informação dese-jada pelo paciente e respeitar osdesejos do paciente de não ser tra-tado, quando o tratamento sim-plesmente nada mais faz que pro-longar o processo do morrer.

Os cuidadores devem cuidado-samente medir os benefícios e oônus do tratamento (beneficên-cia) e avaliar os riscos e benefí-cios de cada decisão clínica (não-maleficência), para evitar o trata-mento fútil e inútil, a distanásia(Pessini, 2001), que não se coa-duna com os objetivos de preven-ção, cura, cuidado, reabilitação ealívio da dor.

Deve-se observar que essaperspectiva da bioética principia-lista norte-americana pode serinsuficiente nesta área de cuida-

dos de saúde. Uma ética do cui-dado e das virtudes apresenta-secomo apropriada e necessária emcuidados paliativos. A ética do cui-dado enfatiza essencialmente anatureza vulnerável e dependen-te dos seres humanos. Portanto,enfatiza que a ética não somentediz respeito ao processo de deci-dir, mas também envolve a quali-dade das relações, tais como con-tinuidade, abertura e confiança. Aética das virtudes critica o enfo-que ético baseado nas decisões apartir do caráter, enfatizando aimportância de ações virtuosas(Pessini, 2004).

Os pacientes com doençasavançadas ou em estado terminaltêm fundamentalmente os mes-mos direitos que os outros pacien-tes, tais como o direito de recebercuidados médicos apropriados,apoio pessoal, direito de ser infor-mados, mas também o direito derecusar procedimentos diagnósti-cos e/ou tratamentos quando estessimplesmente nada acrescentamdiante da morte prevista. A recusade tratamento não deve influenciara qualidade dos cuidados paliati-vos. O mais importante é que ospacientes em cuidados paliativostêm o direito ao grau máximo derespeito por sua dignidade, aomelhor analgésico de dor disponí-vel e ao alívio do sofrimento.

Embora a realidade de cadapaís tenha sempre suas peculiari-dades sociopolíticas e culturaisúnicas, é enriquecedor considerarcomo fonte de inspiração o queacontece e se faz em outros paí-ses. É nesse sentido que olhamospara o que a Associação Húngarade Hospices e Cuidados Paliativospreconiza em termos de princípioséticos em cuidados paliativos(Council of Europe, 2003):

1. Os membros da equipe decuidados devem respeitar a auto-nomia dos pacientes, ao concordarcom suas prioridades e objetivos,

bem como conversar sobre as op-ções de tratamento. Conjuntamen-te formular o plano de cuidados,sem nunca esconder a informaçãoque o paciente deseja receber,atendendo as suas necessidades deinformação sobre qualquer trata-mento e respeitando a opção dopaciente, se este optar por aban-donar o tratamento proposto.

2. A equipe de cuidados deveavaliar os benefícios e riscos dotratamento (beneficência), avaliaros riscos em relação aos benefíciosde cada decisão clínica (não-ma-leficência), compreender que opaciente tem o direito ao mais altonível de padrão de cuidado nocontexto dos recursos disponíveise entender as decisões em contex-to de alocação e uso de recursos.

3. Os direitos fundamentais dospacientes que estão no final da vidasão os de: receber cuidados médi-cos necessários, ser respeitados emsua dignidade, ser apoiados e cui-dados em suas necessidades. Alémdo mais, os pacientes têm direitoao alívio da dor e do sofrimento, aser informados, à autodetermina-ção e recusa de tratamentos.

4. O paciente tem o direito dereceber informações detalhadas arespeito de seu estado de saúde.Inclui-se aqui qualquer avaliaçãomédica, exames e intervençõespropostas para considerar vanta-gens potenciais e riscos, bem comodecisão sobre tais exames e inter-venções. Além disso, o pacientetam direito de receber informa-ções a respeito de qualquer pro-cedimento e método alternativo,bem como o processo de trata-mento e os resultados esperados.

5. Os pacientes têm o direitode participar nas decisões relacio-nadas aos seus cuidados de saú-de, isto é, exame e tratamentoproposto. A obtenção do consen-timento informado do paciente éuma exigência anterior a qualquerintervenção médica.

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6. Caso o paciente sofra deuma doença considerada incurá-vel e terminal, que segundo o co-nhecimento médico atual prova-velmente levará à morte num cur-to período de tempo, intervençõesde suporte de vida ou de salva-mento de vida podem ser etica-mente recusadas, deixando adoença seguir seu caminho natu-ral. O que se deseja evitar é a dis-tanásia. O paciente pode nomearoutra pessoa para o exercício des-se direito, em caso de vir a se tor-nar incapaz. Essa declaração podeser anulada a qualquer momen-to, se o paciente assim o desejar.Não se deve esquecer que, quan-do os pacientes optam por inter-romper o tratamento, sua dor esofrimento devem continuar sen-do aliviados.

7. Cada ato e decisão devem serdocumentados de forma escrita.

Uma das obras clássicas maiscompletas e respeitadas em Medi-cina e/ou cuidados paliativos, o fa-moso Oxford textbook of palliativemedicine (2005)d, em sua terceiraedição, dedica inteiramente a tercei-ra parte às questões éticas. Emboratenhamos como objetivo do presen-te texto somente introduzir de for-ma sintética as questões éticas, nãodeixa de ser importante e até ne-cessário encaminhar ao leitor inte-ressado em aprofundar ulterior-mente as questões específicas deética em cuidados paliativos a rela-ção dos temas abordados bem comode seus autores. Uma introduçãojustifica a importância de uma vi-são ética em cuidados paliativos,apresentando os conceitos-chave deética, sobre os quais discorremosanteriormente, o processo de lidare decidir perante situações confli-tivas (Calman, K.). As seguintesquestões são aprofundadas em ar-

tigos específicos, a saber: a) confiden-cialidade na pesquisa e no exercícioprofissional (MacDonald, N.); b) aquestão da verdade e o consentimento:quanto de verdade?, dizer a verda-de e habilidades de comunicação,consentimento e competência, re-ceber e compreender a informação(Downie, R. e Randall, F.); c) edu-car para a competência profissional emmedicina paliativa (Buckley, G. eSmyth, A.); d) a medicina paliativa ecrianças: questões éticas e legais(Doyal, L., Goldman, A., Larcher,V. e Chantler, C.); e) questões éticasde pesquisa em cuidados paliativos(Mac Donald, N. e Weijer, C.) e, fi-nalmente, f) eutanásia e a não-imple-mentação de tratamento (Roy, D. J.)(Doyle et al, 2005).

Um destaque especial faz-senecessário em relação à pesquisaem cuidados paliativos, já que des-de seu início a pesquisa é parte in-tegrante do desenvolvimento decuidados paliativos. Graças às des-cobertas em pesquisas, tivemos im-portante progresso no campo da dore da gestão dos sintomas. Muitaspráticas paliativas baseiam-se emevidências históricas, e em muitoscasos sem a necessária fundamen-tação em métodos científicos.

É claro que o recrutamento depacientes para um determinadoestudo é difícil e exige muito tem-po em virtude da própria nature-za dos cuidados paliativos. Alémdisso, existem determinadas ca-racterísticas clínicas que compli-cam a pesquisa nesse campo. Ospacientes freqüentemente sãopessoas idosas sofrendo de algu-ma condição que afeta muitos sis-temas no corpo, e não somenteum órgão, que é comumente se-vera e acompanhada de muitossintomas simultâneos. A doençaé progressiva, e seus sintomas

mudam muito rapidamente, so-bretudo nos estágios finais. O tem-po de sobrevivência é limitado, eo uso de múltipla medicação é fre-qüente. A pesquisa em pacientesem fase terminal tem sido questi-onada eticamente, especialmentepor causa da vulnerabilidade dessegrupo de pacientes e sua inabili-dade de tomar parte no processo dedecisão, pois existe alta incidênciade desordens cognitivas e dificul-dades em se conceder seu consen-timento livre e informado, uma vezque existe dependência da insti-tuição em que são cuidados, sen-timentos de gratidão, entre outroselementos intervenientes.

Tais desafios não são específi-cos da área de cuidados paliativos,mas também se encontram emoutras áreas da medicina, como naGeriatria e Medicina Intensiva. Pordecorrência, não existe razão parainserir os cuidados paliativos numacategoria especial. A pesquisa nes-sa área deve atender aos princípioséticos consagrados internacional-mente que governam toda e qual-quer pesquisa clínica. Contudo,deve-se prestar atenção ao proces-so de avaliação dos riscos e benefí-cios de um determinado projeto depesquisa, cuja interpretação podediferir muito, segundo o estágio daprogressão da doença. Os objetivosde cuidado freqüentemente mu-dam nos estágios finais, com a qua-lidade de vida se tornando a prio-ridade maior a ser honrada (Coun-cil of Europe, 2003).

Cuidados Paliativos emGeriatria/Gerontologia

O relatório Europeu da Orga-nização Mundial da Saúde sobreCuidados Paliativos enfaticamen-te afirma que “existe considerável

d. Ver especialmente a terceira parte da obra: Doyle, D., Hanks, G., Ghemy, N., Calman, K. Oxford Textbook of palliative medicine; 2005, que apresenta o seguinte roteirode conteúdo: 3. Ethical issues. 3.1. Introduction (Kenneth Calman), p. 55-57; 3.2. Confidentiality (Neil MacDonald), p. 58-61; 3.3. Truth-telling andconsent (Robin Downie and Fiona Randall), p. 61-65; 3.4. Educating for professional competence in pallitive medicine (Grahm Buckley and Ann Smyth),p. 65-70; 3.5. Palliative medicine and children: ethical and legal issues (Len Doyal, Ann Goldman, Vic Larcher, and Cyril Chantler), p. 70-76; 3.6. Ethicalissues in palliative care research (Neil MacDonald and Charles Weijer), p. 76-83; 3.7. Euthanasia and withholding treatment (David J. Roy), p. 84-97.

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evidência de que as pessoas idosassofrem desnecessariamente, porcausa de uma falta de avaliaçãogeneralizada e tratamento de seusproblemas e falta de acesso a pro-gramas de cuidados paliativos”(Bertachini, 2005).

Alguns questionamentos le-vantados pelo médico geriatra ca-nadense, Dr. S. Lawrence Librach,no último Congresso Mundial deGerontologia, no Rio de Janeiro(junho de 2005), nos fazem refle-tir. Parte de uma afirmação: Opapel da geriatria/gerontologiacomo especialidade tem se preo-cupado com a pobre avaliação efalta de tratamento das doençasnos idosos, bem como com restau-ração das funções e qualidade decuidado e vida para os idosos. Per-gunto: “Os que cuidam dos ido-sos podem reconhecer que a mor-te é o resultado mais comum paratodos os seus pacientes? A geron-tologia pode aceitar cuidados pa-liativos de qualidade como umanecessidade básica e essencial paraos pacientes?” No Canadá, somen-te 15% dos pacientes podem teracesso a cuidados paliativos e namaioria pacientes de câncer. NoReino Unido, 50% de todos ospacientes recebem algum tipo decuidados paliativos durante o cur-so de sua doença, mas o númerosdos que recebem cuidados palia-tivos em doenças que não sejamo câncer é muito menore.

E no Brasil? Sabemos que apopulação brasileira está envelhe-cimento, mas não temos informa-ções registradas em relação a pro-gramas de cuidados paliativos eidosos especificamente.

Para a abordagem dessa ques-tão, baseamo-nos nas reflexões deCassel, ao introduzir a obra pionei-ra Cuidados paliativos em geriatria(Geriatric palliative care). Essa espe-

cialista destaca que a convergênciade dois conceitos radicais, histori-camente distantes — de um lado,cuidados paliativos; de outro, me-dicina geriátrica — “convergem,cada um ampliando o objetivo erevigorando o outro, e passam a tergrande potencial no aprimoramen-to da qualidade dos cuidados (Mor-rison, Meier, 2003).

A medicina geriátrica emergiua partir do extraordinário aumen-to da expectativa de vida da popu-lação e continua a crescer na atua-lidade. Esse significativo aumentodo tempo de vida é uma grandeconquista, atribuída em parte aosavanços da civilização, padrão devida, saúde pública e à crescenteintervenção de cuidados médicos.

A medicina geriátrica reconhe-ceu os processos fisiológicos fun-damentais do envelhecimento;porém, os médicos especialistas noacompanhamento e cuidados depessoas idosas necessitavam iralém do sistema de doença e ór-gão único, ou seja, superar a abor-dagem sob a ótica de uma únicaespecialidade, para considerar aintervenção a partir de múltiplasdoenças crônicas e medicações,além de um status fisiológico alta-mente variável. Há um quarto deséculo, os geriatras freqüente-mente afastavam os especialistas,argumentando que as tecnologiasinvasivas não beneficiariam osidosos e que os pacientes e fami-liares preferiam uma abordagemmais conformista de aceitação damortalidade.

Esse cenário mudou muito nacontemporaneidade, de tal formaque o papel mais freqüente dosgeriatras tem sido conversar comespecialistas relutantes ou inter-vencionistas, afirmando que umamulher aos 95 anos tem uma boachance de se beneficiar de um pro-

cedimento cirúrgico ou de umaintervenção de reabilitação. A ge-riatria diz mais respeito à sobrevi-vência e ao processo de convenceros clínicos a não serem fatalistasquando estão diante de pacientesidosos, mas em buscar de formaassertiva por meio dos problemastratáveis o aprimoramento da qua-lidade de vida e seu funcionamen-to, enfatizando que o fundamentode tudo é o paciente, em sua hu-manidade e dignidade.

Os cuidados paliativos ironica-mente também são uma “nova”especialidade que surge do reco-nhecimento das conquistas damoderna tecnologia médica. Esta,embora tenha salvado muitas vi-das, não pode simplesmente des-considerar a dimensão mortalida-de e finitude humanas. Os pionei-ros em cuidados paliativos reco-nhecem a importância das raízeshistóricas da medicina e enferma-gem no cuidado dos que estãomorrendo, aliviando a dor e o so-frimento, procurando na aborda-gem responder às questões e in-cluindo a família como uma uni-dade única de cuidados junto aospacientes em final de vida. Esseobjetivo é atualíssimo e tão impor-tante hoje quanto o foi no iníciodo século passado.

Em suas origens, os cuidadospaliativos enfocavam principal-mente o objetivo de aprimorar aqualidade de vida dos pacientes nofinal de seus dias. Seu foco era aqualidade de vida para os poucosdias ou semanas remanescentesde vida que um paciente poderiater, respeitando a dignidade indi-vidual e a humanidade. Na últi-ma década, superou-se a perspec-tiva de que os cuidados paliativossomente são moralmente relevan-tes quando “nada mais pode serfeito para prolongar a vida”.

e. S. Lawrence Librach, The quest to die with dignity: issues and challenges in end of life care for the elderly. Conferência apresentada no XVIII Congresso Mundial deGerontologia, Rio de Janeiro, junho de 2005. Apresentação em PowerPoint.

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A filosofia de cuidados paliati-vos hoje reconhece que existe umatransição gradual e a necessidadede equilíbrio entre as tentativaslegítimas de prolongar a vida quan-do se têm chances reais de recu-peração e a gestão paliativa dos sin-tomas e aceitação de um processoque não tem mais cura. Isso émuito verdadeiro no cuidado depacientes em estágios avançadosde doenças, tais como Alzeimer,Parkinson, e assim por diante.

Atualmente, mais de 80% dosnorte-americanos morrem commais de 65 anos, e aumenta signifi-cativamente o número dos que vi-vem bem mais de 80 anos, chegan-do a um número expressivo de pes-soas que celebram seu centenáriode vida. A maioria destas não mor-re de uma forma rápida, caracterís-tica de um câncer metastático, mascomo conseqüência da acumulaçãode múltiplas doenças degenerativas,além da crescente fragilidade ine-vitável do processo biológico huma-no. Embora essa trajetória seja me-nos previsível, o prognóstico últi-mo permanece muito claro.

No centro de toda a questão doaumento da “expectativa de vida”estão o paciente, o clínico e o impe-rativo de estabelecer uma relaçãocomunicativa que permita umaparceria significativa num dos mo-mentos mais profundos da vida.Cresce muito a responsabilidade doclínico em criar um relacionamen-to com pacientes e familiares nosentido da ajudar no enfrentamen-to desse complexo cenário, ouvire acolher as expressões de senti-mentos de sofrimento. Esse cui-dador torna-se um fator-chave emajudar as pessoas a encontrar umsentido no final da vida.

Cuidados paliativos em geriatriaé uma obra pioneira, que conta

com a colaboração de uma sele-ção de mais de vinte especialistasna área e é estruturada em cincopartes, que enumeraremos a se-guir. Também elencamos as ques-tões mais relevantes em relação aessa temática:

– O contexto social e cultural doenvelhecimento e fragilidade (avalian-do a qualidade de vida e do mor-rer nos idosos; O lugar do amor nocuidado de pessoas com demênciaavançada; Hidratação e alimenta-ção artificial; Idade, custos e cui-dados paliativos, aspectos éticos emcuidados paliativos em geriatria,respeitando diversidade);

– Doença e síndrome — aspectosespecíficos dos cuidados paliativos: Afragilidade e suas implicações nocuidar, doença cardíaca, câncer,demência e doenças neurode-generativas, doença crônico-pul-monar e câncer pulmonar; está-gio final de doença renal e inter-rupção da diálise;

— Sintomas de estresse em pacien-tes idosos: dor, dispnéia, sintomasgastrointestinais, fadiga, delírio,ansiedade e depressão;

- Comunicação: planejando ocuidado antecipadamente com osidosos, comunicação médico-pa-ciente, decidir para os cognitiva-mente comprometidos;

– Estruturas de cuidado para oscronicamente doentes com necessida-des de cuidados paliativos: Podemosfazer o sistema de saúde funcio-nar?, cuidados paliativos em ca-sas de repouso, cuidados em do-micílio para idosos e cuidados pa-liativos no hospital.

No Brasil, começamos a terpublicações de referência na área,com destaque para a obra Geria-tria — fundamentos, clínica e terapêu-tica, em que para além de umaabordagem biológica do processo

de envelhecimento avança para ostemas ligados ao cuidado, huma-nização e ética. Assim é que seabre espaço para questões como:O doente idoso terminal: consideraçõesgerais e cuidados paliativos; Proble-mas éticos em geriatria; O idoso e adignidade no processo de morrer (Car-valho Filho, Papaléo Netto, 2005).

No XVIII Congresso Mundial deGerontologia, realizado no Rio deJaneiro (26-30/6/2005), pratica-mente houve um silêncio total emrelação a essas questões ligadas aofinal da vida, cuidados paliativos edor. Somente um workshop sobrecuidados no final da vida, do qualparticipamosf, somente um semi-nário sobre dor — embora um dossintomas mais comuns nos idososseja a dor — e uma conferênciasobre “a busca do morrer com dig-nidade: questões e desafios no cui-dado de final da vida para osidosos”g. Pergunta-se S. LawrenceLibrach, professor de CuidadosPaliativos e controle da dor da Uni-versidade de Toronto e diretor doCentro de Cuidados Paliativos doMount Sinai Hospital (Canadá), sea geriatria ou gerontologia não es-tariam tentando negar a morte.Além desse sinal evidente no maiorevento mundial da área, que basi-camente silencia em torno dotema, pesquisando artigos noJournal Geriatrics dos últimos dozeanos, encontrou somente sete ar-tigos sobre cuidados paliativos ecuidados de final de vida e sobre amorte e o morrer. Na quase totali-dade, são relatórios de casos e edi-toriais. Outra pesquisa realizadacom artigos do Journal Archives ofGeriatrics and Gerontology dos últi-mos dez anos encontrou somentesete artigos sobre cuidados de fi-nal de vida, incluindo relatórios decasos, estimativas de sobrevivên-

f. Os temas e os apresentadores desse worshop sobre End of life care foram os seguintes: 1) Palliative care for dementia: making the case — Amitai S. Oberman, MD,Departament of Geriatrics, Home Hospice in the Valleys, Nazareth — Israel; 2) The ten things everyone should know about pain management in the elderly palliative carepatient, S. Lawrence Librach MD, Professor of Palliative Care, University of Toronto, Canadá; 3) Dysthanasia (futile treatment): Key Ethical Questions, Leo Pessini, Ph.D,Saint Camillus University Center — São Paulo (SP).g. S. Lawrence Librach, The quest to die with dignity: issues and challenges in end of life care for the elderly. Apresentação em Powerpoirt.

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cia, mas nenhum artigo especifi-camente sobre cuidados paliativosou hospice (Librach, 2005).

Numa perspectiva integradora,os cuidados paliativos e os valoresfundamentais da geriatria coinci-dem: o paciente está no centro doscuidados, a perspectiva é de umaabordagem interdisciplinar, holísti-ca e compreensiva, além de pacien-te e família serem vistos como umaúnica unidade de cuidados. Umaprioridade é garantir na medida dopossível a independência funcionale qualidade de vida, avaliação re-gular e formal que assegure a iden-tificação e tratamento das intercor-rências no momento certo. Ambasas especialidades, Medicina Geriá-trica e Cuidados Paliativos, vãomuito além de proporcionar cuida-dos somente num local específico.O cuidado é prestado onde o pa-ciente se encontra, seja em sua casa,no hospital ou na casa de repouso,em qualquer estágio da doença equalquer que seja o diagnóstico. “Oobjetivo é prestar cuidado certo,para o paciente certo no momentocerto” (p. 12).

Comunicação entrepacientes, familiares eprofissionais da saúde

A habilidade para estabeleceruma boa comunicação é parte es-sencial em todas as áreas dos cui-dados de saúde, não exclusiva-mente em cuidados paliativos(Council of Europe, 2003). A co-municação envolve muito maisque o processo de simplesmentedar uma informação. É um pro-cesso que envolve muitas pessoas,em que os objetivos incluem tro-ca de informação, compreensãomútua e apoio, enfrentamento dequestões difíceis e freqüentemen-

te dolorosas, além de lidar com oestresse emocional associado a to-das essas questões (Paes da Silva,2004). Exige tempo, compromis-so e desejo sincero de ouvir e com-preender as preocupações do ou-tro. Trata-se de “prover resposta”quando não existem respostas e,em grande parte, de “simplesmen-te” estar com a pessoa onde está eser uma presença empática comela na sua dor.

A comunicação no âmbito doscuidados de saúde não é um mero“opcional”, um “extra”, mas é umcomponente vital, inerente e ne-cessário, razão pela qual no currí-culo de formação dos profissionaisde saúde cada vez mais se inclui oaprofundamento de questões re-lacionadas à comunicação. A co-municação não envolve somenteos cuidados dos profissionais dasaúde e paciente, mas também arelação entre os profissionais dasaúde e família, pacientes e suafamília, entre outros âmbitos(Bertachini, Gonçalves, 2002)h.

Comunicação entre pacientes eprofissionais da saúde

Os pacientes encontrarão di-versos profissionais da saúde du-rante o curso de uma doença típi-ca. Cada encontro provê umaoportunidade de comunicação.Muito do que comunicamos é pormeio da linguagem, mas muitotambém comunicamos pela lin-guagem não-verbal. Em geral, ospacientes exigirão honestidade,precisão, acessibilidade e informa-ção consistente em relação à suadoença e suas implicações. Commuita freqüência, profissionais efamiliares sentirão a necessidadede ocultar ao paciente a verdadepor causa do desejo de manter aesperança, estratégia que, embo-ra bem-intencionada, pode trazer

muitas dificuldades com o avan-çar da doença. Más notícias sãosempre más notícias, mas a ma-neira como ela é comunicada, equanto os pacientes se sentirãoapoiados, aceitos e compreendi-dos, terá um impacto significati-vo em sua habilidade de vivernesta nova realidade.

Logo após o comunicado deuma má notícia, informações adi-cionais em geral não são ouvidas;portanto, espaçar a informação,dando aos pacientes e famílias otempo necessário para digeri-la, éfundamental. Aos pacientes deve-se oferecer uma informação a res-peito de sua doença, tratamento,opções e prognósticos, de umamaneira sensível, que comuniqueapoio, honestidade e calor huma-no. Em termos de autonomia erespeito pela escolha do paciente,é importante que estes tenham ainformação necessária por meioda qual possam fazer uma esco-lha informada. Diante de dificul-dades cognitivas é importante queos profissionais da saúde avaliemregularmente até que nível existecompreensão do que é comunica-do e busquem quando da mani-festação de impedimentos alterna-tivas viáveis (Kovács, 2004).

Comunicação entre pacientee familiares

Em cuidados paliativos, pa-cientes e familiares com muita fre-qüência vivem sob intenso estres-se, o que faz com que não raroexista pouca comunicação entreas várias partes envolvidas, geran-do espaços para desentendimen-to e ressentimento. As pessoassentem que estão carregando in-justamente o peso de cuidar. Ve-lhas rivalidades e ciúmes podemvir à tona, e o processo pode rapi-damente escapar do controle.

h. Ver especialmente a seção 4, exclusiva sobre comunicação, que apresenta o seguinte conteúdo: Section 4: Communication and palliative medicine. 4.1.Communication with the patient and family in palliative medicine (Lesley Fallowfield), p. 101-107; 4.2. Communication with professionals (David Jeffrey), p.107-112); 4.3. Communication with the public, politicians, and the media (Kenneth Caman), p. 112-115.

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Os profissionais de saúde têmo dever de cuidar, identificar es-sas dinâmicas e responder a essarealidade. Ao menos podem “mo-delar” o fato de modo que a in-formação seja partilhada e que aspessoas manifestem “sincerida-de” com elas próprias e com osoutros, a despeito de seus senti-mentos e emoções.

Nesse sentido, merecem aten-ção especial as necessidades dascrianças e adolescentes. Em situa-ções familiares muito tensas, crian-ças são por vezes excluídas do pro-cesso numa tentativa bem-inten-cionada de “protegê-las”. Do mes-mo modo que os adultos, as crian-ças necessitam também de umaoportunidade para serem ouvidase compreendidas e integradas nocoração da família, o quanto forpossível. Enquanto necessitadas deapoio e explicação, elas podem sertambém fonte de muito confortoe apoio a seus pais e outras pes-soas adultas (Kovács, 2004).

Comunicação entre os profissionaisda saúde

Profissionais de diferentes espe-cialidades podem ser envolvidos nocuidado de um único paciente; porconseqüência, é absolutamentenecessário que o local de cuidadosfacilite o processo de troca de in-formações de forma rápida, acura-da, destacando o que realmente érelevante. Além das questões liga-das às limitações de tempo, proce-dimentos comuns de comunicaçãocolaboram também na definição depapéis, limites e nas diferentes con-cepções de cuidado.

Como em família, a questão nãoé simplesmente a mera troca de in-formação; antes, é necessário com-preender o ponto de vista do ou-tro, particularmente quando exis-

tem diferenças de opiniões em re-lação às estratégias apropriadas detratamento. Em tais circunstâncias,um estudo de caso pode proporcio-nar a oportunidade para mútuoentendimento, com a expectativade se chegar a um consenso e coe-rência de ações para com o pacien-te. É aconselhável criar uma opor-tunidade para troca aberta de opi-niões, preferencialmente com umfacilitador externo, ou seja, nãopertencente à instituição local.

Sendo assim, os profissionaisda saúde necessitam cada vez maisde uma formação educativa emrelação aos dilemas éticos vincu-lados aos cuidados dos pacientesna fase final de suas vidas, quelhes possibilite uma visão alargadadessas questões para discuti-lasadequadamente com os pacientese familiares, quando necessário.

Com muita freqüência, dile-mas éticos surgem no tratamentopaliativo, quando por exemplo otratamento da dor com altas do-sagens de morfina pode ter comoconseqüência a abreviação ou oprolongamento da vida, comoefeito indesejado, ou quando umpaciente insistentemente desejamorrer, mesmo no caso de aindaexistirem opções paliativas.

Espiritualidade emCuidados Paliativos

A palavra “espírito” deriva dohebraico ruah, que significa “so-pro”. Sopro está associado comvida; assim, literalmente espiritua-lidade é “o sopro de vida”. De umponto de vista existencial, espíri-to é o que nos move para fora denós mesmos para encontrar sen-tido de vida. Contudo, a dimen-são espírito continua a existir emnós quando a vida parece ter per-

dido sentido — embora em tem-pos de crise as energias espirituaisnecessitem ser redirecionadas paraa vida. “Espiritualidade” é um ter-mo muito mais amplo que “reli-gião”. Este deriva da palavra lati-na religare, significando “religar”,e diz respeito a determinadas tra-dições espirituais, enquanto ga-nham expressão concreta em ritose celebrações codificadas, culturale historicamentei.

Existem muitas definições deespiritualidade, mas nenhuma de-las esgota a riqueza de um con-ceito tão abrangente e profundo,principalmente no âmbito da saú-de, quando na atualidade come-çam a surgir muitos escritos so-bre a incidência da fé, da religião,da espiritualidade no processo decura, recuperação da saúde ebem-estar humano e no final davida (Dunne, 2001). Bryson, apartir de estudo sobre espirituali-dade na perspectiva da enferma-gem, destaca cinco temas centraisque permeiam a definição de es-piritualidade: 1) tendência inataem direção a um sentido; 2) a di-mensão espiritual expressa-se noâmbito temporal; 3) a espirituali-dade é uma dimensão transcen-dente; 4) é um movimento parase conseguir unidade, verdade ebondade (compaixão); e 5) a es-piritualidade expressa-se em esfe-ras, ou seja, no nível pessoal, comoutras pessoas, no meio ambien-te natural e na ordem não-visível.Nesse sentido, espiritualidade édefinida como “uma tendênciainata em direção a Deus ou a umaForça Superior”. Ela surge de nos-sa relação entre nossa busca porsentido e transcendência (Deus ouuma Força Superior). A existên-cia de uma dimensão transcen-dente num relacionamento dá o

i. Cf. Wald, F. S. (ed.). In quest of the spiritual component of care for the terminally ill. Proceedings of a colloquium. May 3-4, 1996, Yale University School of Nursing. Trata-se de textos de autores que apresentaram nesse simpósio. Destacamos, entre outros: In search of the spiritual component of hospice care (Florence S. Wald); The modernhospice (Dame Cicely Saunders); The role of the interdisciplinary team in providing spiritual care: an attitudinal study of hospice workers (Patrice O´Connor and Morajorie P.Kaplan); The arts as an avenue to the spirit (Sally Bailey); Spiritual help from judaic and psychiatric perspectives (Samuel C. Klagsbrun); Spirituality for whom (Inge B.Corless); Hospice care and faith: a christian perspective (Carleton J. Sweetser); Social action as spiritual component: the relevance of Nicaragua (Morris A. Wessel).

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sentido de pertença a algo maiorque o próprio ser humano. Per-mite-nos sair de nós mesmos emtempos de crise, o que justificana hierarquia das necessidadesde Maslow, como o ponto culmi-nante, a busca de transcendência(Bryson, 2004).

A atenção às necessidades físi-cas, psicológicas e espirituais dospacientes no final da vida tem sidoidentificada como prioridade, tantopor organizações profissionais mé-dicas como pelos próprios pacien-tes que enfrentam uma determina-da doença crônico-degenerativaou estão no final de sua jornadade vida. Seguimos aqui de perto opensamento de William Breitbart,que trabalha no Memorial Sloan-Kettering Cancer Center, em NovaYork (Breitbart, 2005). Num re-cente relatório denominado: Mor-te próxima: melhorar os cuidados nofinal da vida (1997), o Instituto deMedicina dos Estados Unidos iden-tificou as seguintes dimensões deexcelência dos cuidados de final devida: qualidade geral de vida; obem-estar e o funcionamentos fí-sicos; o bem-estar e o funciona-mento psicossociais; o bem-estarespiritual; a percepção que o pa-ciente tem dos cuidados que lhesão proporcionados; e o bem-estare o funcionamento dos familiares(Breitbart, 2004).

Puchalsky e Romer (2000) de-finem “espiritualidade como aqui-lo que permite que uma pessoavivencie um sentido transcenden-te na vida. Trata-se de uma cons-trução que envolve “fé” e “senti-do” (Puchalski, Romer, 2000). Féé crer numa força transcendentalsuperior; não se identifica neces-sariamente com Deus, nem se vin-cula necessariamente com a par-ticipação em rituais ou crenças dedeterminada religião. Essa fé podeidentificar tal força como externaà psique humana ou internaliza-da. É o relacionamento e ligação

com essa força ou espírito que écomponente essencial da expe-riência espiritual, vinculado como sentido.

O sentido ou julgamento deque a própria vida faz sentido en-volve a convicção de que se estárealizando um papel e um propó-sito inalienáveis na vida, que é umdom. O componente “fé” da espi-ritualidade é um conceito o maisdas vezes associado à religião e àscrenças religiosas, ao passo que ocomponente “sentido” é um con-ceito mais universal, que existeindependentemente de as pessoasse identificarem com determina-da religião.

Victor Frankl, psiquiatra quesobreviveu ao campo de concen-tração de Auschwitz, e seus con-ceitos de logoterapia e psicotera-pia baseada no sentido da vida nosiluminam nessa questão de espi-ritualidade e sentido da vida. Al-guns de seus conceitos básicos são:1) sentido da vida — a vida temsentido e nunca cessa de ter; mes-mo no último momento, ele podesofrer alterações, mas nunca ces-sa; 2) desejo de encontrar sentido— o desejo de descobrir sentidona existência humana é um ins-tinto primário e uma motivaçãobásica do comportamento huma-no; 3) liberdade de vontade — terliberdade de descobrir significadona existência e tomar uma atitu-de perante o sofrimento; 4) as trêsprincipais fontes de sentido davida são: a) criatividade (o traba-lho, as boas ações, dedicação àspessoas); b) experiência (a arte, anatureza, o humor, o amor, rela-cionamentos, papéis que desem-penhamos na vida); c) atitude(atitude que se tem diante do so-frimento e dos problemas existen-ciais) (Breitbart, 2004).

Frankl dizia que existem trêsproblemas existenciais inevitáveis:o sofrimento, a morte e a culpa,isto é, a culpa existencial por não

ter realizado todo o potencial quepossuímos. Outros de seus concei-tos fundamentais são: o conceitode vida como um dom, a idéia deque temos a responsabilidade deviver da maneira mais plena pos-sível e a noção de que o sentido,o significado ocorre no contextoda pessoa, da família, do seu povo.

Segundo John Hardwig, “espi-ritual” diz respeito à preocupaçãosobre o significado fundamental eos valores que dão sentido à vidahumana. Não implica necessaria-mente a crença num ser superiorou numa vida após a morte. Espi-ritual não significa religioso. Nes-se sentido, os que se dizem ateusou agnósticos têm preocupaçõesespirituais como qualquer outrapessoa. Na verdade, esse sentidodo conceito nos obriga a pergun-tar como efetivamente as religiõesorganizadas lidam com as neces-sidades espirituais de seus mem-bros. Harding se posiciona de for-ma provocativa diante de seu pró-prio fim de vida: “tenho absolutacerteza de que as questões funda-mentais para mim não serão seestão me colocando um respiradorartificial, tentando uma ressus-citação cardiorrespiratória quan-do meu coração pára ou se estourecebendo alimentação artificial.Embora cada uma dessas medidaspossa ser importante, tenho quasecerteza de que cada uma elas serábastante periférica. Minha preo-cupação fundamental será comodevo encarar a minha morte, co-mo encerrar a minha vida e qualserá a melhor forma de ajudar mi-nha família a prosseguir sem mim.Um respirador artificial não meajudará a fazer essas coisas, a me-nos que tudo o que eu precise paraisso, seja um pouco mais de tem-po para terminar minha tarefa”(Hardwig, 2000).

O Canadá recentemente criouum Comitê Nacional com o objeti-vo de “desenvolver um guia para

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cuidados de final de vida para ido-sos”. O documento que resultoudesse trabalho coordenado por Ro-ry Fisher (Universidade de Toron-to) e Margaret M. Ross (Universi-dade de Ottawa) dedica à espiri-tualidade uma seção inteira, o capí-tulo 7 (p. 135-150)j. Vale destacaro que é dito na conclusão desse ca-pítulo: “No final, a busca por umsentido diante de uma doençaameaçadora de vida e subseqüenteperda é algo crítico. Alguns idososterão suas preocupações fortaleci-das e reafirmadas. Outros podemser incapazes de encontrar sentido,levando para um duro sentimentode desespero. Tal resultado noslembra que uma espiritualidadenão-desenvolvida pode ser um fa-tor crítico quando lutamos comuma doença ameaçadora de vida.O não ter refletido sobre os misté-rios da vida, pelo menos ainda quenum nível bem básico, deixa a pes-soa despreparada para confrontara morte. Mas para outras esse mo-mento é um evento transformadorque lhes oferece um novo sentidopara compreender a vida, doençase morte. Essas redescobertas, oureconstituição de sentidos, permi-tem aos idosos, mesmo no meio deuma crise devastadora e peranteuma consciência alarmante da pró-pria mortalidade, experimentarnovas descobertas, encontrar reno-vadas forças e conquistar cresci-mento pessoal” (A Guide to End-of-life Care for Seniors, 199-).

Oferecer cuidados paliativoscom qualidade significa implemen-tar ações inovadoras que evitem osofrimento físico, espiritual, a des-moralização e a perda de sentido,tão comuns no final da vida. A de-finição da OMS de cuidados palia-tivos evidencia uma preocupaçãocom as necessidades espirituais dos

pacientes e seus familiares, tanto éque a abordagem global fundamen-ta-se no entendimento de que apessoa é uma entidade indivisível,um ser físico e espiritual. A buscapor sentido, por algo maior em queconfiar, tem sido expressa de mui-tas maneiras, diretas e indiretas, emmetáforas ou em silêncio, em ges-tos ou símbolos ou, talvez mais quetudo, numa interação terapêuticae numa nova experiência de criati-vidade. Quem trabalha em cuida-dos paliativos é também desafiadoa enfrentar essa dimensão em re-lação a si próprio. Muitos vivemnuma sociedade secularizada e nãotêm uma linguagem religiosa; mes-mo assim, é possível para um pro-fissional da saúde colaborar juntoao paciente nessa busca de senti-do. “Contudo, se nos aproximamospara além de nossa capacidade pro-fissional, com nossa comum huma-nidade vulnerável, pode ser quenão vá haver necessidade de pala-vras de nossa parte, mas somenterespeito profundo e um ouvir aten-to” (Saunders, 2005).

A Associação de Capelães deHospice e Cuidados Paliativos doReino Unido diz sobre a naturezae o objetivo de cuidados espiri-tuais: Os cuidados espirituais sem-pre estiveram no centro da filo-sofia e prática dos cuidados palia-tivos. Os cuidados paliativos pro-curam implementar uma aborda-gem holística no cuidado de pes-soas com doenças ameaçadoras devida e integrar as dimensões físi-ca, social, psicossocial e espiritual,de modo que os pacientes e cui-dadores possam enfrentar a expe-riência do morrer de forma maisamadurecida possível. No mundoocidental de hoje, a dimensão es-piritual do ser humano é ampla-mente interpretada como se refe-

rindo ao que dá um sentido trans-cendente e que pode ou não in-cluir Deus ou religião. A espiritua-lidade diz respeito a tudo que en-volve a existência da uma pessoacomo pessoa, com tudo o que issoimplica em termos de capacidadede nós como seres humanos deautotranscendência, relaciona-mentos, amor, desejo e criativida-de, altruísmo, auto-sacrifício, fé ecrença. É a dinâmica de integra-ção da pessoa em relação à suaidentidade única e original, e apartir dessa perspectiva segue-seque todas as pessoas têm necessi-dades espirituais. Tais necessida-des e preocupações adquiremuma importância muito maiorquando as pessoas têm de enfren-tar a própria morte (Associationof Hospice Palliative Care Cha-plaino, 200-).

À guisa de conclusão

Os cuidados paliativos se cons-tituem hoje numa importantequestão de saúde pública. Lida-secom o sofrimento, a dignidade dapessoa, o cuidado das necessidadeshumanas e a qualidade de vida daspessoas portadoras de uma doen-ça crônico-degenerativa, ou queestão na fase final de vida. Preo-cupa-se também com o apoio àsfamílias e amigos como uma uni-dade de cuidados, diante do sofri-mento potencial ou iminente deperda de entes queridos, bemcomo no período do luto. Nossosistema de saúde é negligente emrelação a essas necessidades huma-nas. O próximo estágio será a in-trodução dos cuidados paliativosno curso principal da medicina eem programas de educação na áreada saúde, quer para os profissio-nais ou para o público em geral.

j. A guide to end-of-life care for seniors. Manual de cuidados para idosos no final da vida, trabalho coordenado por especialistas da Universidade de Toronto e daUniversidade de Ottawa (Canadá), publicado no ano 2000. No intuito de estimular que surja também no nosso país algo nesse sentido para educar e conscientizarprofissionais da saúde, familiares e população idosa, a título de inspiração destacamos as questões abordadas nesse manual de cuidados para idosos: Toward optimalcare (cap. I); Living and dying well in later life (cap. 2); Maintaining comfort (cap. 3); Ethical issues (cap. 4); Delivery of end-of-life care (cap. 5); Care for the cregiver(cap. 6); Spirituality (cap. 7); The cultural context for pallitive and end-of-life for seniors (cap. 8); aboriginal issues (cap. 9); Continuing challenges (cap. 10).

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Cicely Saunders (199-) afirmaque isso exige “mudanças de ati-tudes e educação de todos os pro-fissionais envolvidos com pacien-tes que têm uma doença crôni-co-degenerativa. Isso exige com-promisso humano antes que me-dicações e intervenções caríssi-mas e deve ser uma preocupaçãode todos os governos”.

Os cuidados paliativos visamaliviar, especialmente nos pacien-tes portadores de doenças crônico-degenerativas ou em fase terminal,uma vasta gama de sintomas desofrimento de ordem física, psíqui-ca, mental e espiritual. Por isso,exige-se a ação de uma equipemulti e interdisciplinar de especia-listas com competências específicasem termos de cuidados, em sinto-nia entre si, para cuidar (Pessini,2005).

À medida que os cuidados pa-liativos se desenvolvem, cresceum reconhecimento de que comas drogas e técnicas atualmentedisponíveis e com a crescente ha-bilidade em utilizá-las é relativa-mente fácil proporcionar confor-to físico ao paciente. No entanto,mesmo com isso, a pessoa podeestar sentindo medo, solidão oucom baixa auto-estima. Os quetrabalham no campo percebemagora que, para além da gestão dossintomas físicos, a filosofia dos cui-dados paliativos se preocupa fun-damentalmente com a qualidade,valor e sentido de vida.

Em termos de qualidade de vida,muitos são os instrumentos de ava-liação específicos da área de cui-dados paliativos, que agora estãodisponíveis para todos os profissio-nais da saúde. Pesquisas confir-mam o que já de longe se suspei-tava, que os pacientes que não sãoinformados sentem mais sofrimen-to físico e psicossocial e falam deum nível inferior de qualidade devida, em relação aos que são infor-mados segundo sua vontade.

Com relação ao valor da vida.À medida que as pessoas se apro-ximam do final da vida, elas seperguntam se suas vidas tiveramalgum valor para os outros, paraa comunidade, e se elas ainda têmalgum valor como pessoas, prin-cipalmente quando estão inca-pacitadas por uma determinadadoença fatal, dependentes dos ou-tros, e sendo despesa em termosde cuidado. Pesquisas nos EstadosUnidos mostraram que a perda daindependência e o medo de se tor-nar um peso para os outros, antesque a dor física, freqüentementesão as motivações primeiras quelevam as pessoas a solicitar o sui-cídio assistido ou eutanásia. Res-peitando-se a própria avaliação dopaciente sobre o valor de sua vida,enquanto ainda conscientes dosefeitos da depressão ou isolamen-to social, sem dúvida estamosdiante um dos mais profundos de-safios clínicos e éticos em cuida-dos paliativos.

A terceira preocupação é o sen-tido da vida. Somente quando seusofrimento físico foi aliviado e suasfamílias cuidam delas, é que aspessoas em fase terminal começama fazer perguntas existenciais.Embora tenha diminuído no mun-do ocidental secularizado o núme-ro de pessoas que têm uma fé reli-giosa profunda que dê significadoa suas vidas, setenta e cinco porcento das pessoas que estão na fasefinal expressam o desejo de con-versar sobre o sentido da vida, so-frimento e morte, e elas podem fi-car desapontadas caso ninguém seinteresse em ajudá-las. Um servi-ço de pastoral atento a essas ne-cessidades será de grande valia naajuda que pode ser prestada pararesgatar o sentido da vida das pes-soas. Não é à toa que o cuidadodas necessidades psicossociais eespirituais está no centro da filo-sofia dos cuidados paliativos(Doyle, Bernard, 1971).

João Paulo II, pouco antes desua própria morte (2/4/2005), numdiscurso aos participantes da XIXConferência Internacional promo-vida e organizada pelo PontifícioConselho da Pastoral da Saúde so-bre Cuidados Paliativos (11-13/11/2004) destacou: “... sobretudo nafase da enfermidade em que já nãoé mais possível realizar terapias pro-porcionadas e eficazes, impõe-se aobrigação de evitar toda forma deobstinação ou terapêutica. Tornam-se necessários os ‘cuidados palia-tivos que, como afirma a EncíclicaEvangelium Vitae, destinam-se a tor-nar mais suportável o sofrimentona fase final da enfermidade e, aomesmo tempo, assegurar ao pacien-te um acompanhamento humanoadequado’” (n. 65) (Doletium Ho-minum, 2004).

O próprio papa no momentofinal de sua vida recusou voltarpara o hospital, a Policlínica Ge-melli de Roma, optando por per-manecer seus últimos momentosem seus próprios aposentos. Teste-munho claro de recusa da distaná-sia e aceitação sábia da finitude emortalidade humana.

O desafio ético no contexto depaíses em desenvolvimento, comoo Brasil, é considerar a questão dadignidade no adeus à vida, paraalém da dimensão físico-biológi-ca e para além da perspectiva mé-dico-hospitalar, ampliando o hori-zonte e integrando a dimensãosócio-relacional. Existe muito quefazer no sentido de levar a socie-dade a compreender que o morrercom dignidade é uma decorrênciado viver dignamente, e não me-ramente sobrevivência sofrida. Senão existem condições de vidadigna, no fim do processo garan-tiríamos uma morte digna? Antesde existir um direito à morte hu-mana, há que se ressaltar o direi-to de que a vida já existente possater condições de ser conservada,preservada e que desabroche ple-

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namente. Chamaríamos a isso di-reito à saúde. É chocante e até irô-nico constatar situações em que amesma sociedade que negou opão para o ser humano viver ofe-rece-lhe a mais alta tecnologia pa-ra “bem morrer!”

Não somos doentes nem víti-mas da morte. É saudável sermos

peregrinos. Não podemos passiva-mente aceitar a morte como con-seqüência do descaso pela vida,causado pela exclusão, violência,acidentes e pobreza. Nasce umasabedoria a partir da reflexão, acei-tação e compromisso com o cui-dado da vida humana no adeusfinal. E isso entre dois limites opos-

tos: de um lado, a convicção pro-funda de não abreviar a vida; deoutro, a visão de não prolongar aagonia, o sofrimento e a morte. Aonão abreviar a vida e ao não pro-longar, inutilmente, situa-se o ama-rás... Como fomos ajudados paranascer, também precisamos ser aju-dados no momento do adeus.

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Recebido em 21 de março de 2005Aprovado em 12 de abril de 2005

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