0. RUTKOSKI, M. O Papel Das Crises Para a Teoria de Marx Sobre a Derrocada Do Capitalismo
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Universidade Federal de Santa Catarina
Centro scio-Econmico
Programa de Ps-Graduao em Economia Mestrado
rea de Concentrao: Transformaes do Capitalismo Contemporneo
Dissertao de Mestrado
O PAPEL DAS CRISES PARA A TEORIA DE MARX SOBRE A DERROCADA DO
CAPITALISMO
Mrcio Moraes Rutkoski
Florianpolis, SC Brasil
Setembro de 2004
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MRCIO MORAES RUTKOSKI
O PAPEL DAS CRISES PARA A TEORIA DE MARX SOBRE A
DERROCADA DO CAPITALISMO
Dissertao apresentada ao Programa de Ps-
Graduao em Economia da Universidade
Federal de Santa Catarina, como requisito parcial
obteno do grau de Mestre em Economia, rea
de Concentrao: Transformaes do Capitalismo
Contemporneo.
Orientador: Prof. Nildo Domingos Ouriques
Florianpolis, SC Brasil
Setembro de 2004
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MRCIO MORAES RUTKOSKI
O Papel das Crises para a Teoria de Marx sobre a Derrocada do Capitalismo
Esta dissertao foi julgada adequada para obteno do ttulo de MESTRE EM ECONOMIA, rea de concentrao Transformaes do Capitalismo Contemporneo, e aprovada em sua forma final pelo programa de Ps-Graduao em Economia da Universidade Federal de Santa Catarina em 13 de setembro de 2004.
________________________________ Prof. Dr. Celso Leonardo Weydmann Coordenador do Mestrado em Economia
Comisso examinadora ________________________________
Prof. Dr. Nildo Domingos Ouriques
________________________________ Prof. Dr. Helton Ricardo Ouriques
________________________________ Prof. Dr. Paulo Tumolo
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RUTKOSKI, Mrcio Moraes. O Papel das Crises para a Teoria de Marx sobre a
Derrocada do Capitalismo. 2004. Dissertao (Mestrado em Economia) Programa de Ps-
Graduao em Economia (PPGE), UFSC, Florianpolis.
RESUMO
Essa dissertao desenvolve a hiptese de que na obra de Karl Marx, principalmente
em O Capital como registro mais completo de sua teoria, no existe de forma separada, seja
numa seo ou num captulo especfico uma teoria sobre as crises. O objetivo de Marx nos
seus escritos econmicos, e que alcana sua forma mais acabada em O Capital formular
uma teoria da derrocada do modo de produo capitalista, em que as crises ocupam destacado
papel. A teoria de Marx mesmo na sua forma mais abstrata, quando analisa o capital em geral,
em si uma teoria da derrocada do capitalismo, em que as crises representam os sintomas
peridicos e inevitveis do aprofundamento das contradies entre o desenvolvimento das
foras produtivas do trabalho social e das relaes sociais de produo e distribuio
capitalistas, determinando os limites para o desenvolvimento da produo capitalista,
evidenciando seu carter como modo de produo histrico e transitrio. Quando o modo de
produo capitalista atinge um grau de desenvolvimento mais elevado, as crises aparecem na
forma de crises de crdito, de subconsumo, de desproporo entre os setores produtores de
meios de produo e bens de consumo e como crises provocadas pela queda da taxa mdia de
lucro. Mas, na sua essncia so crises de superproduo de mercadorias, superacumulao de
capital, como resultado do rompimento dos limites impostos pelas relaes sociais de
produo expanso da capacidade de produo para alm das necessidades de valorizao
do capital. A crise apresenta um carter qualitativo duplo, ao mesmo tempo em que evidencia
as contradies do sistema, atua como contratendncia a derrocada ao restituir as condies
de valorizao do capital ao desvalorizar ou mesmo desativar parcela do capital existente,
centralizando a propriedade do capital e criando uma superpopulao trabalhadora relativa.
Ao superar os limites que lhe so imanentes, a produo capitalista transfere esses limites de
forma potencializada para o futuro, sem nunca poder super-los definitivamente.
Palavras-chaves: Teoria de Crises, Reproduo de Capital, Lei da Queda Tendencial da Taxa
de Lucro.
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SUMRIO
RESUMO................................................................................................................................ iv
CAPTULO 1 - INTRODUO
1.1 Problemtica................................................................................................................... 1
1.2 Objetivos......................................................................................................................... 10
1.3 Metodologia.................................................................................................................... 11
CAPTULO 2 - REPRODUO E DERROCADA DO CAPITAL EM GERAL.......... 13
2.1 Reproduo das Relaes Sociais de Produo Capitalistas.......................................... 15
2.2 Acumulao de Capital e Apropriao Capitalista......................................................... 18
2.3 Lei da Acumulao e as Contradies das Relaes Sociais de Produo Capitalistas. 24
CAPTULO 3 A CONTRADIO DO CAPITAL EXPRESSA NA QUEDA
TENDENCIAL DA TAXA DE LUCRO................................................... 33
3.1 A Transformao da Taxa de Mais-Valia em Taxa de Lucro e a Formao do Lucro
Mdio............................................................................................................................ 36
3.2 A Lei da Queda Tendencial da Taxa de Lucro............................................................. 44
3.3 A Atuao das Contratendncias Queda da Taxa de Lucro....................................... 49
CAPTULO 4 A CRISE COMO EXPRESSO DA EXPLOSO DAS
CONTRADIES DO MODO DE PRODUO CAPITALISTA..... 59
4.1 A Contradio Entre o Desenvolvimento das Foras Produtivas e as Relaes Sociais de Produo e Distribuio Capitalistas....................................................................... 61 4.2 As Formas em que Aparecem as Crises do Processo de Produo Capitalista............ 64 4.3 Como Marx e Engels analisaram as crises do seu tempo............................................ 73
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CAPTULO 5 CONCLUSO............................................................................................ 87
REFERNCIAS BIBLIOGRFICAS................................................................................. 90
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CAPTULO 1
1 INTRODUO
1.1 PROBLEMTICA
Engels na introduo obra As lutas de classes na Frana de 1848 a 1850 de Karl
Marx afirma (...)que a crise do comrcio mundial, ocorrida em 1847, fra a verdadeira me
das revolues de fevereiro e de maro e que a prosperidade industrial, que voltara pouco a
pouco, a partir de meados de 1848, e chegara ao seu apogeu em 1849-1850, foi a fora
vivificante na qual a reao europia hauriu renovado vigor.(MARX e ENGELS, Obras
Escolhidas.1999, vol. 1, p. 95.) No mesmo sentido, s que nas palavras do prprio Marx S
possvel uma nova revoluo em conseqncia de uma nova crise. Mas uma to certa
quanto a outra. (MARX, op. Cit., p. 189.) As afirmaes de Engels e Marx citadas acima
no deixam nenhuma dvida sobre o papel que as crises ocupam na sua teoria sobre o modo
de produo capitalista. Do ponto de vista poltico As lutas de classes na Frana de 1848-
1850 segundo Engels o primeiro texto em que Marx faz uso do mtodo materialista dialtico
da histria para analisar os desdobramentos polticos a partir das transformaes econmicas -
a anlise das crises e dos seus efeitos tanto econmicos quanto polticos interessa aos dois
pensadores justamente por serem momentos com possibilidades revolucionrias, em que as
contradies e os limites do modo de produo capitalista mostram-se de forma clara,
aumentando as possibilidades de sucesso dos movimentos revolucionrios.
A tese central que norteia todos os escritos de Marx sobre o modo de produo
capitalista e as suas relaes correspondentes de produo e circulao, com o objetivo de
descobrir a lei econmica do movimento da sociedade moderna,(MARX, O Capital.
Prefcio da Primeira Edio,1988, Livro I, vol.1 p.18-19.), fundamentada na concepo
materialista dialtica da histria, a do carter histrico e transitrio do modo de produo
capitalista. Da mesma forma que os modos de produo asitico, antigo e feudal, que
precederam o modo de produo burgus, foram levados derrocada em virtude da
intensificao das suas contradies internas e dos seus limites, provocados pelo seu prprio
desenvolvimento, o modo de produo capitalista no fugir a essa regra da progressiva
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formao econmica da sociedade; precisar alcanar seu fim para que a humanidade
ultrapasse essa etapa e como diz Marx encerre a pr-histria da sociedade
humana.(Prefcio de Para a Crtica da Economia Poltica, 1978, Os Pensadores, p. 130).
Por conseguinte, a anlise das crises parte imprescindvel para a teoria de Marx, que
essencialmente, ou seja, no seu carter mais puro, uma teoria sobre a inevitabilidade da
derrocada do modo de produo capitalista como resultado histrico das suas prprias
contradies. importante esclarecer com base no mtodo materialista dialtico da histria
desenvolvido por Marx e Engels, que a inevitabilidade da derrocada uma necessidade
histrica imprescindvel para o avano da humanidade, ao possibilitar o surgimento do novo
modo de produo das entranhas do modo de produo decrpito, como resultado da
intensificao das suas prprias contradies que anunciam seu fim. Essa transio do modo
de produo moribundo para o modo de produo superior no se faz de forma automtica, de
forma natural e pacfica, como resultado apenas das contradies entre o desenvolvimento da
base material e as relaes sociais de produo especficas, mas, se faz da sntese dos
elementos objetivos determinados pelas condies materiais com os elementos subjetivos do
processo, determinados pelos desdobramentos polticos da luta de classes.(GROSSMANN,
Ensayos sobre la teoria de las crisis. 1979, p.250.) Parafraseando Marx no 18 Brumrio de
Lus Bonaparte (1978, Os Pensadores, p.329), a lutas de classes e os movimentos
revolucionrios so possveis, mas nas condies histricas dadas, legadas e transmitidas
pelo passado, no apenas pela vontade dos homens. Da mesma forma, as crises no so por
si s momentos revolucionrios, mas, momentos em que as condies histricas possibilitam
uma maior liberdade de atuao da vontade dos homens, criando a possibilidade de
transformao.
Na obra O Capital, exposio mais desenvolvida e completa da sua teoria sobre o
funcionamento do modo de produo capitalista, Marx lana mo do mtodo cientfico de
investigao do objeto de anlise (no caso o capital) a partir de suas formas mais simples,
mais abstratas, at sua forma mais complexa como totalidade das mltiplas determinaes que
constituem o objeto, ou seja, sua forma concreta. A passagem da forma mais abstrata para a
forma mais concreta se d pela incorporao sucessiva de categorias que determinam a forma
de desenvolvimento do objeto, aproximando-se sucessivamente do concreto como expresso
da realidade, em que o objeto analisado em sua forma concreta, mais desenvolvida, a sntese
das mltiplas determinaes que o formam. O mtodo de investigao utilizado por Marx
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determinou a organizao da exposio da sua teoria sobre a lei econmica que rege o modo
de produo capitalista.
O plano original de 1857-58 de O Capital esboado nos Grundrisse, segundo Roman
Rosdolsky no livro Gnese e estrutura de O Capital de Karl Marx, previa a elaborao de 6
livros: sendo o primeiro o Livro Sobre O Capital, o segundo o Livro Sobre a Propriedade
de Terra, o terceiro o Livro Sobre o Trabalho Assalariado, o quarto o Livro Sobre o
Estado, o quinto o Livro Sobre o Comrcio Exterior e o sexto o Livro Sobre o Mercado
Mundial. O Livro Sobre o Capital seria dividido em quatro partes: O capital em geral,
Concorrncia, Sistema de crdito e Capital dividido em aes. A parte que trataria do capital
em geral seria ainda subdividida em O processo de produo, O processo de circulao e
Lucro e juros. Do plano original de 1857-58 s foi publicado de forma modificada o contedo
dos trs primeiros livros e um quarto livro sobre A histria das teorias da mais-valia, apesar
dos livros sobre o Estado, Comrcio exterior e Mercado mundial nunca terem sido
completamente descartados por Marx numa possvel continuao da obra. O plano da obra
que teve o primeiro livro publicado em 1867 por Marx e o segundo e terceiro livros por
Engels em 1885 e 1894 respectivamente, ilustra bem o mtodo de anlise e de exposio de O
capital. Assim como no plano original de 1857-58, a anlise parte do capital na sua forma
geral, ou seja, parte do processo de produo e do processo de circulao na sua forma pura,
sem as interferncias da concorrncia entre os diferentes tipos de capitais, a influncia do
sistema de crdito, do Estado, do comrcio exterior e do mercado mundial. Rosdolsky
comenta e reproduz no seu livro boa parte do trecho final da introduo dos Grundrisse em
que Marx trata do mtodo da economia poltica, definindo de forma bastante clara o mtodo
cientfico em que a anlise parte do abstrato para o concreto.
Marx demonstra aqui, antes de tudo, que ir do abstrato para o concreto o nico mtodo
cientfico adequado para apropriar-se do concreto, reproduzindo-o como um concreto pensado. Na
introduo, em uma passagem famosa, ele diz: O concreto concreto porque a sntese de mltiplas
determinaes e, portanto, a unidade do diverso. Por isso, o pensamento s pode compreender
plenamente o concreto em um processo de sntese, ou seja, pela reconstruo progressiva do concreto
a partir de suas determinaes abstratas mais simples. Se a anlise cientfica (econmica, no caso)
comea diretamente pelo real e concreto, pelas prprias condies reais por exemplo, a populao
ou o mercado mundial -, s poder enxergar uma imagem difusa e totalmente indefinida da realidade.
A populao uma abstrao se deixo de lado, por exemplo, as classes de que se compe. Essas
classes, por sua vez, so uma palavra oca se desconheo os elementos sobre os quais repousam, por
-
exemplo, o trabalho assalariado, o capital etc. estes ltimos pressupem a troca, a diviso do trabalho, o
capital etc. (...) Portanto, se comessemos pela populao, teramos uma representao catica do
conjunto. Buscando sempre maior preciso, chegaramos a conceitos cada vez mais simples: do
concreto representado, chegaramos a abstraes cada vez mais sutis, at alcanarmos as determinaes
mais simples. Atingido esse ponto, seria necessrio realizar uma viagem de volta, at reencontrar
novamente a populao. Agora, porm, no teramos a representao catica de um conjunto, mas sim
uma rica totalidade com mltiplas determinaes e relaes. Por isso, o mtodo cientificamente correto
na economia poltica deve elevar-se a partir do simples trabalho, diviso do trabalho, necessidade,
valor de troca at o Estado, o comrcio entre as naes e o mercado mundial, para poder examinar o
desenvolvimento do modo de produo capitalista como uma totalidade orgnica. (ROSDOLSKY, op.
cit. p. 39-40)
Marx demonstra no Livro Primeiro que trata do Processo de Produo do Capital e no
Livro Segundo que trata do Processo de Circulao do Capital, o processo de reproduo do
capital em geral como processo de produo de mais-valia, fundado em uma relao social de
produo de extrao de valor excedente dos no-proprietrios dos meios de produo pelos
proprietrios dos meios de produo. Processo de produo como sntese do processo de
trabalho e do processo de valorizao em que o desenvolvimento das foras produtivas entra
em choque com as relaes sociais de produo. A contradio insupervel j aparece na sua
forma mais abstrata, no capital em geral. No Livro Terceiro, Marx trata do Processo Global da
Produo Capitalista, incorporando a concorrncia entre diferentes tipos de capitais
individuais, que em funo do papel que representam no circuito de reproduo do capital
global se apropriam de formas distintas da mais-valia como lucro industrial, lucro comercial,
renda da terra e juros. O capital no est mais livre das interferncias da concorrncia e do
sistema de crdito no processo de reproduo, a anlise se aproxima do concreto, do
funcionamento do modo de produo capitalista na realidade. Essa aproximao da realidade,
do concreto, do capital em sua forma mais desenvolvida como sntese das suas mltiplas
determinaes, no elimina as contradies entre o desenvolvimento das foras produtivas e
as relaes sociais de produo, que lhe so inerentes j na sua forma mais abstrata, como
capital em geral. Em sentido contrrio, acentua ainda mais essas contradies ao impulsionar
o desenvolvimento do modo de produo capitalista para alm dos seus limites, determinados
pela necessidade de valorizao do capital, resultando em crises peridicas marcadas por crise
de crdito, superproduo, desvalorizao do capital existente e o surgimento de uma
superpopulao relativa de trabalhadores.
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As crises peridicas so a forma violenta como aparecem as contradies e os limites
inerentes ao desenvolvimento do modo de produo capitalista. So erupes da contradio
do processo de produo como processo de trabalho e processo de valorizao, so crises de
valorizao do capital; quando a magnitude de capital que est funcionando no processo de
produo produz mercadorias prenhes de mais-valia que no conseguem realizarem-se como
valor que se valoriza na produo. Em ltima instncia, a crise no causada pelo
subconsumo, pela expanso descontrolada do sistema de crdito, pela desproporo entre os
setores de produo de meios de produo e de bens de consumo ou mesmo pela queda em si
da taxa mdia de lucro, mas, uma crise causada pela contradio inerente do capitalismo
entre o impulso incessante para a ampliao da capacidade de produo atravs da crescente
unio dos homens no processo de trabalho e a limitao imposta a esse desenvolvimento das
foras produtivas pela necessidade de valorizao do capital. A gnese das sucessivas crises
que marcam o desenvolvimento do modo de produo capitalista e da sua derrocada como
resultado da intensificao das suas contradies em um grau insuportvel, nasce do prprio
trao fundamental que o impulsiona j na sua forma mais simples.
O desenvolvimento das foras produtivas ao aumentar a composio orgnica do
capital, elevando a parcela do capital constante em relao ao capital varivel no total do
capital adiantado, ou seja, reduzindo o trabalho vivo como substncia criadora do valor, da
mais-valia, por trabalho passado na forma de meios de produo, restringe sucessivamente a
valorizao do capital ao levar queda tendencial da taxa de lucro e a conseqente reduo da
taxa de acumulao, ao mesmo tempo em que as relaes sociais de produo fundadas na
explorao dos trabalhadores pelos proprietrios dos meios de produo impem a
valorizao incessante como movimento em si da reproduo do capital. A forma de
existncia do capital o movimento, o capital o movimento incessante de valorizao do
valor que tem como substncia a extrao de valor excedente da fora de trabalho no processo
de produo sem lhe dar nada em troca como equivalente, trabalho no-pago na forma de
mais-valia.
(...), medida que a taxa de valorizao do capital global, a taxa de lucro, o aguilho da
produo capitalista (assim como a valorizao do capital sua nica finalidade), sua queda retarda a
formao de novos capitais autnomos, e assim aparece como ameaa para o desenvolvimento do
processo de produo capitalista; ela promove superproduo, especulao, crises, capital suprfluo ao
lado de populao suprflua. Portanto, os economistas que, como Ricardo, consideram o modo de
produo capitalista como absoluto, sentem aqui que esse modo de produo cria uma barreira para si
-
mesmo e, portanto, atribuem essa barreira no produo, mas natureza (na doutrina da renda). O
importante, porm, em seu horror ante a taxa de lucro em queda, a sensao de que o modo de
produo capitalista encontra no desenvolvimento das foras produtivas uma barreira que nada tem a
ver com a produo de riqueza enquanto tal; e essa barreira popular testemunha a limitao e o carter
to-somente histrico e transitrio do modo de produo capitalista; testemunha que ele no um modo
de produo absoluto para a produo de riqueza, mas que antes entra em conflito com seu
desenvolvimento, em certo estgio.(MARX, O Capital. 1988, livro III, vol. 4 p. 174.)
As crises aparecem como crises de crdito, crises de superproduo de mercadorias e
subconsumo ou ainda como derivadas da desproporo entre os setores de produo de meios
de produo e bens de consumo, mas, na essncia so crises de superacumulao de capital
expressa pela queda tendencial da taxa mdia de lucro, cessando a realizao do capital-
mercadoria, impossibilitando a valorizao ao romper-se o processo de reproduo do capital
global. Segundo Marx, os perodos de crise so momentos de ajuste no processo de
reproduo do capital global ao desvalorizar e at mesmo inutilizar parcelas do capital
existente como forma de restabelecer as taxas mdias de lucro; da mesma maneira que por um
lado, aumentam a centralizao do capital existente expropriando os pequenos e mdios
capitalistas, enquanto por outro, criam uma superpopulao relativa ao reduzir ainda mais a
parcela do capital varivel em relao ao capital constante. Em suma, a crises a expresso
mxima da atuao das contratendncias queda da taxa de lucro; a crise apresenta um
carter qualitativo duplo ao explicitar as contradies do desenvolvimento do modo de
produo capitalista, ao aparecer como sintoma do seu carter degenerativo, ao mesmo tempo
em que funciona como contratendncia ao restabelecer as condies de valorizao do capital.
Fazendo analogia com o corpo humano, a crise funciona como um remdio, como um
anticorpo que aciona todas as formas de defesa possveis contra a doena, mas, traz a cura
temporria ao recolocar essas debilidades inerentes ao corpo em grau maior de intensidade e
prolongamento dos sintomas, exigindo cada vez mais anticorpos mais poderosos, at o
momento em que os anticorpos e at mesmo os remdios no conseguem mais defender o
corpo. A partir desse grau de desenvolvimento da doena se apresentam apenas duas
possibilidades, a morte ou a sua postergao ao manter-se o corpo em estado vegetativo a
espera do desligamento dos aparelhos que o mantm vivo artificialmente.
A contradio, expressa de forma bem genrica, consiste em que o modo de
produo capitalista implica uma tendncia ao desenvolvimento absoluto das foras
produtivas, abstraindo o valor e a mais-valia nele includos, tambm abstraindo as
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relaes sociais, dentro das quais transcorre a produo capitalista; enquanto, por outro
lado, ela tem por meta a manuteno do valor-capital existente e sua valorizao no
grau mais elevado (ou seja, crescimento sempre acelerado desse valor). Seu carter
especfico est orientado para o valor-capital existente, como meio para a mxima
valorizao possvel desse valor. Os mtodos pelos quais ela alcana isso implicam:
diminuio da taxa de lucro, desvalorizao do capital existente e desenvolvimento
das foras produtivas do trabalho custa das foras produtivas j produzidas. A
desvalorizao peridica do capital existente, que um meio imanente ao modo de
produo capitalista para conter a queda da taxa de lucro e acelerar a acumulao de
valor-capital pela formao de novo capital, perturba as condies dadas, em que se
efetua o processo de circulao e de reproduo do capital, e, por isso, acompanhada
por paralisaes sbitas e crises do processo de produo. A diminuio relativa do
capital varivel em relao ao constante, que transcorre lado a lado com o
desenvolvimento das foras produtivas, constitui um aguilho para o crescimento da
populao trabalhadora, enquanto cria continuamente uma superpopulao artificial.
(...) A produo capitalista procura constantemente superar essas barreiras que lhe so
imanentes, mas s as supera por meios que lhe antepem novamente essas barreiras e
em escala mais poderosa. A verdadeira barreira da produo capitalista o prprio
capital, (...) (MARX, op. cit., p. 179-180).
O entendimento da teoria de Marx sobre o funcionamento e o desenvolvimento do
modo de produo capitalista como essencialmente uma teoria da sua derrocada, no e nem
nunca foi consenso entre os marxistas e tambm entre os seus crticos. Um dos perodos mais
intensos desse debate sobre a existncia de uma teoria de Marx sobre as crises e a derrocada
do modo de produo capitalista, aconteceu entre o final do sculo XIX (por volta de 1890)
at a dcada de 30 do sculo XX. Em virtude dos acontecimentos histricos, a questo que
estava claramente posta para os partidos operrios nesse perodo era a opo pela reforma do
capitalismo ou o caminho da revoluo, por isso a importncia do debate sobre o carter da
teoria de Marx para os tericos da poca. Jorge Tula no prefcio do livro La ley de la
acumulacin y del derrumbe del sistema capitalista de Henryk Grossmann, distingue trs
fases do debate ao utilizar a periodizao elaborada por Giacomo Marramao em seu trabalho
Teoria del derrumbe y capitalismo organizado en las discussiones del extremismo histrico:
1) a primeira fase se inicia por volta de 1890 e marcada pela teoria da derrocada definida
como clssica dos tericos da II internacional, que classificam a teoria de Marx como
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catastrfica e sem comprovao histrica. Bernstein prope com base no seu trabalho As
premissas do socialismo e as tarefas da social democracia, o abandono pela social
democracia da teoria da derrocada de Marx em virtude da sua no comprovao histrica,
com vistas adaptao do programa do partido ao funcionamento da economia moderna; 2) a
segunda fase comea em 1905 e marcada pelo debate sobre qual o papel da luta de classes e
da organizao proletria para a derrocada inevitvel do modo de produo capitalista; 3) a
terceira fase comea em meados da dcada de 20 e se estende at a dcada de 30, e, marcada
pelo refluxo e derrota do movimento operrio europeu e pelo debate sobre a crise e o
capitalismo de Estado que se desenvolve nas dcadas de 20 e 30.
O ponto central da controvrsia entre os marxistas sobre a teoria de Marx sobre as
crises e a derrocada do modo de produo capitalista nesse perodo se situava na interpretao
dos chamados esquemas de reproduo do Livro Segundo de O Capital. Os tericos que
defendiam o carter ilimitado de reproduo do modo de produo capitalista lanavam mo
dos esquemas de reproduo para fundamentar sua tese de que as crises eram resultado da
desproporo entre os setores de produo de meios de produo e de produo de bens de
consumo. Se a produo e a acumulao nos setores fossem planejadas, mantendo a
proporo, se eliminariam os motivos econmicos das crises do capitalismo. Por conseguinte,
a passagem do capitalismo para o socialismo no se daria como resultado ltimo das suas
contradies de carter econmico, pelo colapso das suas leis econmicas, mas, da vontade
poltica das massas proletrias organizadas, que movidas por um sentimento de tica
promoveriam a transformao de forma pacfica. O capitalismo seria derrotado no pelas
contradies do seu prprio desenvolvimento econmico sendo o capitalismo do ponto de
vista econmico um sucesso para esses tericos mas, por causas ticas e morais. Com
diferenas de abordagem, muitas vezes em funo de disputas tericas e principalmente
polticas em seus pases, a gama de tericos que compartilhavam esse ponto de vista era
variada; dos sociais democratas alemes e austracos como Hilferding, Otto Bauer, Kautsky
aos tericos no-marxistas e marxistas russos como Tugan-Baranovski, Bulgakov, Bukharin e
at mesmo o jovem revolucionrio Lnin. No caso dos marxistas russos, a defesa dos
esquemas de reproduo como representativos da realidade resultado do debate sobre a
possibilidade de desenvolvimento do capitalismo na Rssia com os populistas que defendiam
a impossibilidade desse desenvolvimento.
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No lado oposto, tericos como Rosa Luxemburgo e Henryk Grossmann criticaram a
defesa do carter ilimitado de expanso econmica do modo de produo capitalista,
resgatando o sentido da teoria de Marx como teoria sobre a derrocada do capitalismo. No
livro Acumulao de Capital publicado em 1912, Rosa Luxemburgo questiona a validade
da aplicao dos esquemas de reproduo do Livro Segundo de O Capital, defendendo a
hiptese de que a reproduo do capital global s se realiza por meio do comrcio com as
chamadas terceiras pessoas, regies no capitalistas, que absorveriam a superproduo das
regies capitalistas. Com o desenvolvimento do processo de acumulao de capital, a
realizao do produto produzido estaria comprometida pela impossibilidade de realizao de
parte do valor criado que corresponderia a mais-valia. Em virtude de o consumo dos
trabalhadores, dos capitalistas e das camadas improdutivas ser restrito, estar contido por
limites estreitos, a frao do valor que foi produzida como mais-produto, correspondente
mais-valia, s poderia ser consumida via acumulao de capital atravs da compra de novos
meios de produo e a contratao de mais fora de trabalho. A contradio que se coloca
com o desenvolvimento do modo de produo capitalista, segundo Rosa Luxemburgo, estaria
no descompasso da expanso da capacidade de produo e do ritmo do crescimento da
acumulao de capital, por isso a necessidade de se ampliar o intercmbio atravs do
comrcio exterior. Nesse sentido, a luta imperialista entre as grandes potncias pela conquista
ou pelo controle das colnias seria impulsionada pela necessidade de novos mercados. J
Grossmann ao publicar La ley de la acumulacin y del derrumbe do sistema capitalista em
1929, faz a crtica da interpretao dos esquemas de reproduo de Marx feita tanto pelos
defensores da expanso econmica ilimitada modo de produo capitalista quanto a feita por
Rosa Luxemburgo. A crtica de Grossmann est centrada na incompreenso da importncia do
mtodo utilizado por Marx para a organizao de O Capital e para o melhor entendimento
da sua teoria. A incompreenso do mtodo, segundo Grossmann, explica o equvoco da
interpretao do papel dos Livros Primeiro e Segundo de O Capital e, portanto, do papel dos
esquemas de reproduo na anlise de Marx do capital em sua forma geral, cometido pelos
tericos da II internacional, pelos marxistas russos e por Rosa Luxemburgo. Para Grossmann,
uma interpretao mais cuidadosa do mtodo, evidencia a teoria de Marx como uma teoria
sobre a derrocada do modo de produo capitalista como resultado das prprias contradies
que aparecem j na sua forma abstrata, como capital em geral, reafirmando o seu carter
histrico e transitrio como modo de produo.
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O tema das crises tambm tratado por Marx e Engels nos seus escritos que tratam da
anlise dos acontecimentos histricos do seu tempo e de anlise da conjuntura econmica e
poltica. Obras como a As Lutas de classes na Frana, O 18 Brumrio de Lus Bonaparte, A
Guerra civil na Frana, A Situao da Classe Trabalhadora na Inglaterra, alm das notas de
Engels e de algumas partes de O Capital e de Teorias da Mais-Valia, nos remetem aos
desdobramentos mais concretos da teoria. Os artigos escritos por Marx e Engels para revistas
como a Nova Gazeta Renana e jornais como o New York Daily Tribune, com quem Marx
colaborou de 1851 a 1862 como correspondente internacional, so fundamentais para o
confronto da teoria de Marx sobre as crises e a derrocada do modo de produo capitalista na
sua forma mais abstrata com as anlises das diversas crises que marcaram sua poca,
aperfeioando a compreenso da teoria a partir da sua aplicao para a anlise dos fenmenos
que compem a realidade.
1.2 OBJETIVOS
OBJETIVO GERAL:
Demonstrar que a teoria econmica de Karl Marx, desenvolvida de forma mais
completa em O Capital, no seu conjunto uma teoria sobre a derrocada do modo de
produo capitalista, em que as diferentes formas em que aparecem as crises so a expresso
mais explcita da contradio original do capital.
OBJETIVOS ESPECFICOS:
1) Demonstrar que o capital em sua forma mais abstrata, capital em geral, j apresenta a
contradio entre o desenvolvimento das foras produtivas do trabalho social e as relaes
sociais de produo e distribuio capitalistas.
2) Demonstrar que a queda tendencial da taxa mdia de lucro explicita a contradio entre a
crescente magnitude de capital acumulado e a decrescente taxa de valorizao e de
acumulao. As crises peridicas surgem dessa contradio.
3) Analisar a atuao das causas contrariantes apontadas por Marx como freio ao
funcionamento absoluto da lei da queda tendencial da taxa de lucro.
4) Investigar as formas em que aparecem as crises no modo de produo capitalista.
Demonstrar que as crises de superproduo, subconsumo, desproporo entre setores, do
-
sistema de crdito e do mercado mundial so formas como aparece a contradio inerente
ao desenvolvimento do modo de produo capitalista.
5) Ressaltar a teoria de Marx como uma teoria sobre a derrocada do modo de produo
capitalista a partir das suas prprias contradies, que se acentuam com o seu
desenvolvimento.
6) Confrontar a teoria das crises e da derrocada do capitalismo de Marx com a sua prpria
interpretao das crises ocorridas no seu tempo, exposta em diversos textos e artigos
para jornais e revistas.
1.3 METODOLOGIA
Para que fossem alcanados os objetivos propostos, primeiramente, foi feita uma
pesquisa bibliogrfica sobre o tema, principalmente pelos escritos econmicos de Marx, em
que o tema das crises e da derrocada do capitalismo surge da anlise do desenvolvimento da
reproduo capitalista. A fonte principal da pesquisa foram os 4 livros de O Capital
(incluindo o livro Teorias da Mais-Valia), em virtude de ser o registro mais completo da
teoria de Marx. fundamentalmente com base em O Capital que se demonstra que no
existe uma teoria de crises em um trecho especfico da anlise de Marx, mas que a teoria de
forma completa uma teoria das crises e da derrocada do capitalismo. Para a anlise do
capital em geral, obras como Captulo VI Indito de O Capital e Para a Crtica da
Economia Poltica foram esclarecedoras de algumas passagens de O Capital. Da mesma
forma, obras de autores marxistas como Rosdolsky, Grossmann e o Suplemento ao Livro
Terceiro escrito por Engels foram fundamentais para o melhor entendimento do mtodo de
exposio utilizado por Marx. Para se investigar como Marx interpretou luz da sua teoria as
crises ocorridas no seu tempo, foi realizada uma anlise dos escritos em que Marx aborda a
conjuntura econmica e poltica, principalmente os artigos escritos juntamente com Engels
para revistas como a Nova Gazeta Renana e artigos para jornais como New York Daily
Tribune. Os escritos de Engels, como os artigos publicados em jornais e revistas, notas para O
Capital ou as vrias apresentaes s reedies das suas obras e as de Marx, foram
fundamentais para o entendimento e a sistematizao dos seus e dos escritos de Marx sobre as
crises verificadas no seu tempo.
-
O mtodo de exposio o mesmo utilizado por Marx. O trabalho parte da
demonstrao da contradio inerente ao capital na sua forma mais simples, capital em geral,
aproximando sucessivamente o funcionamento do capital de sua forma concreta, com as
diferentes categorias que o constituem em seu estgio mais desenvolvido. A anlise do capital
em geral e do capital em sua forma mais prxima do seu funcionamento na realidade,
incorporando a concorrncia entre diferentes tipos de capitalistas, desenvolvimento do sistema
de crdito e a formao do mercado mundial, demonstra que o seu desenvolvimento
potencializa a contradio que j estava em gnese na sua forma mais simples. As crises so a
manifestao dessa contradio inerente ao modo de produo capitalista em sua forma
desenvolvida.
No captulo primeiro feita uma introduo ao tema do trabalho seguida dos objetivos
geral e especficos - e da metodologia. No captulo segundo, demonstrado como o
processo de produo capitalista um processo de reproduo das relaes sociais
capitalistas. O desenvolvimento do processo de acumulao de capital ao mesmo tempo em
que desenvolve a classe capitalista e a classe trabalhadora como classes opostas, desenvolve a
contradio entre o avano da fora produtiva do trabalho social e as relaes sociais de
produo que so a sua base. Essa contradio, que inerente ao capital em geral,
explicitada com a centralizao de capital por um lado e a formao de uma superpopulao
relativa por outro. No captulo terceiro, o funcionamento do modo de produo capitalista
incorpora a transformao da taxa de mais-valia em taxa de lucro e, portanto, da repartio da
mais-valia social entre diferentes tipos de capitalistas. Com o aumento da composio
orgnica mdia do capital global, a lei da queda da taxa de lucro se impe como tendncia ao
funcionamento do capital. A atuao das causas contrariantes vigncia da lei apenas retarda
a sua ao de forma absoluta, sem anular o seu funcionamento como tendncia ao recolocar
os limites do modo de produo capitalista em um grau mais desenvolvido. O captulo quarto
trata da crise como exploso das contradies do modo de produo capitalista e que aparece
na forma de diferentes tipos de crise: crise de superproduo, subconsumo, desproporo
entre setores, do sistema de crdito e do mercado mundial. Todas essas formas so a
manifestao da contradio entre o desenvolvimento das foras produtivas do trabalho social
e as relaes sociais de produo e distribuio capitalistas. As anlises de Marx e Engels das
crises do sculo XIX comprovam essa tese. No captulo quinto so apresentadas as concluses
finais do trabalho.
-
A exposio dos argumentos do trabalho reforada com o seu confronto com a
citao de trechos originais, com base na bibliografia selecionada, que sintetizam a idia dos
autores. Essa forma de exposio refora a importncia de uma detalhada reviso
bibliogrfica das obras que tratam sobre o tema, principalmente O Capital e outros escritos
de Karl Marx, fundamentando de forma mais segura as concluses que so apresentadas no
trabalho.
-
CAPITULO 2
2 REPRODUO E DERROCADA DO CAPITAL EM GERAL
No plano da obra O Capital de Karl Marx, os Livros Primeiro e Segundo so
dedicados exposio do capital em seu carter mais abstrato, mais simples do seu
funcionamento; abstraindo a diviso da mais-valia entre diferentes tipos de capitalistas, a
concorrncia, o desenvolvimento do sistema de crdito e a existncia do mercado mundial. No
Livro Primeiro, Marx discute o processo de produo do capital como processo de produo e
de reproduo de capital e das relaes sociais de produo da sociedade capitalista. Como o
movimento de valorizao no se restringe esfera da produo, sendo preciso realizar a mais-
valia produzida na esfera da circulao, ao Livro Segundo consequentemente cabe a exposio
do processo de circulao do capital. Os 2 livros expem o movimento de circulao do capital
como ciclo indissolvel da esfera da circulao, nas suas 2 fases, com a esfera da produo
como locus da criao de valor e da relao direta de explorao da classe trabalhadora. Marx
mostra que o capital no seu funcionamento de forma pura, no carter estritamente especfico da
sua lei da acumulao, apresenta uma contradio crescente entre o desenvolvimento das foras
produtivas e as relaes sociais de produo e distribuio capitalistas. Essa contradio
evidencia-se, por um lado, na expanso contnua da capacidade do trabalho social via aumento
da massa dos meios de produo transformados em mercadorias com valor excedente por uma
massa de trabalhadores cada vez mais integrados no processo de trabalho em carter mundial; e
por outro lado, a formao de uma superpopulao relativa provocada pelo crescimento a taxas
decrescentes da demanda de trabalho humano, tornando uma parcela crescente da populao
trabalhadora intil, redundante para o processo de produo de capital. Junto com a elevao
crescente do trabalho morto em proporo ao trabalho vivo, ou seja, aumento da composio
orgnica do capital, cai tendencialmente a taxa de lucro mdio e a taxa de acumulao do
capital, embora a taxa de explorao (mais-valia) tendencialmente cresa. O aumento da
magnitude da riqueza produzida socialmente e apropriada em propores crescentes pela classe
capitalista, em contraste com o empobrecimento relativo e elevao do grau de explorao da
classe trabalhadora inerente ao capital na sua forma geral, abstrada da concorrncia entre
diferentes capitais, o sistema de crdito e o mercado mundial que potencializam o
desenvolvimento dessas contradies.
-
Marx na apresentao da seo VII , referente ao processo de acumulao de capital, no
Livro Primeiro, mostra de maneira clara o plano da obra e o mtodo de exposio fundado na
aproximao sucessiva do capital do seu funcionamento na realidade. No Livro Terceiro,
caberia analisar as modificaes no processo de acumulao de capital com a transformao
da taxa de mais-valia em taxa de lucro e a formao da taxa de lucro mdio, bem como, a
repartio da mais-valia social em diferentes formas (lucro comercial, renda da terra, juros..)
que cabem a diferentes tipos de capitalistas que concorrem entre si. Essa investigao do
processo de acumulao do capital em geral, necessita de alguns pressupostos que so
apresentados por Marx:
Supomos aqui, portanto, por um lado, que o capitalista que produz a mercadoria a vende por seu
valor, sem nos determos mais com a sua volta ao mercado nem com as novas formas que o capital assume
na esfera da circulao, nem com as condies concretas da reproduo ocultas nessas formas. Por outro
lado, consideramos o produtor capitalista como proprietrio da mais-valia inteira ou, se se quiser, como o
representante de todos os participantes no butim. Encaramos, portanto, de incio a acumulao em
abstrato, isto , como mero momento do processo direto de produo. De resto, na medida que a
acumulao se realiza, o capitalista consegue vender a mercadoria produzida e retransformar em dinheiro
o capital recebido por ela. Alm disso: o fracionamento da mais-valia em diversas partes nada muda em
sua natureza nem nas condies necessrias em que ela se torna elemento da acumulao. Qualquer que
seja a proporo da mais-valia que o produtor capitalista retm para si mesmo ou cede a outros, ele
sempre se apropria dela em primeira mo. O que, portanto, pressuposto em nossa apresentao da
acumulao, pressuposto do seu processo real. Por outro lado, o fracionamento da mais-valia e o
movimento mediador da circulao obscurecem a simples forma bsica do processo de acumulao. Por
isso, sua anlise pura exige a abstrao provisria de todos os fenmenos que escondem o jogo interno de
seu mecanismo. (MARX. O CAPITAL. 1988, Livro I, vol. 2, p. 143-144.)
Esse captulo est dividido em 3 sees; a primeira seo trata do processo de produo
do capital como processo de reproduo das relaes sociais capitalistas, como o processo de
produo de capital reproduz a classe capitalista e a classe trabalhadora como expresso das
relaes sociais de produo da sociedade burguesa. A segunda seo analisa como o
processo de acumulao converte as leis de propriedade da produo de mercadorias em lei da
apropriao capitalista, em que a classe trabalhadora dominada pelo prprio produto do seu
trabalho na forma de capital. Na terceira seo, so expostas as contradies do processo de
-
acumulao do capital em geral, contradies j presentes na sua forma abstrata e que so
desenvolvidas e potencializadas com a anlise do seu funcionamento de forma concreta.
2.1 REPRODUO DAS RELAES SOCIAIS DE PRODUO
CAPITALISTAS
Todo processo social de produo ao mesmo tempo processo de reproduo. O
funcionamento do processo social de produo, visto como processo global de reproduo
exige que uma parte do produto anual no seja consumida, mas que retorne produo no ano
seguinte como reposio das matrias primas e matrias auxiliares consumidas e da parcela
dos meios de trabalho desgastados no prprio processo de produo do produto anual total.
Para se manter a mesma escala de produo do perodo anterior ou at mesmo ampli-la,
preciso que uma parte da produo total seja na forma de meios de produo para o consumo
produtivo. No modo de produo capitalista, a produo e reproduo assumem forma
especfica. O processo de produo a sntese do processo de trabalho e do processo de
valorizao do capital; como meio essencial para a valorizao do capital adiantado em meios
de produo e fora de trabalho ao produzir um valor excedente na forma de mais-valia. Esse
processo de produo de capital de forma contnua um processo de reproduo ao criar
mais-valia como fruto do seu funcionamento como capital e ao mesmo tempo produzir e
reproduzir as suas relaes sociais de produo.
A anlise da reproduo do capital na sua forma mais abstrata, a partir dos seus
elementos mais simples, chamada por Marx de reproduo simples, j revela o carter
especfico das relaes sociais de produo capitalistas. O pressuposto de que o capitalista
consome toda a mais-valia produzida, mantendo a mesma escala do processo - por
conseguinte abstendo a aplicao da mais-valia em novos meios de produo e a contratao
de mais trabalhadores, ou seja, reproduo ampliada, acumulao de capital - desvela novas
caractersticas do processo ao sair-se da aparncia do fenmeno. A compra de fora de
trabalho para ser utilizada no processo de produo tambm se renova continuamente. Aps o
trmino do prazo de contratao da fora de trabalho, preciso sempre recontrat-la para que
a produo continue no mesmo ritmo. O trabalhador ao transformar os meios de produo em
mercadorias com um valor excedente, mercadorias prenhes de mais-valia, s recebe seu
pagamento aps ter efetivado seu valor de uso para o capitalista; ao ter produzido no montante
de mercadorias no apenas o valor do fundo para o pagamento do seu salrio, na forma de
-
capital varivel, mas tambm valor excedente, mais-valia, considerada como fundo de
consumo do capitalista no processo de reproduo simples.
O processo de produo como processo de reproduo transforma todo o capital em
capital acumulado, mais-valia capitalizada, valor apropriado sem equivalente como
materializao de trabalho alheio no-pago. Mesmo se a origem do capital aplicado no
processo de produo seja a propriedade acumulada em virtude do trabalho do seu possuidor,
a reproduo contnua do processo de produo retransforma o capital que foi fruto do seu
trabalho em mais-valia capitalizada como fruto da apropriao de trabalho alheio no-pago.
Se o capitalista consome toda a mais-valia gerada, ao transcorrer de alguns anos ele ter
consumido uma soma de capital igual ao montante do capital adiantado. O capital que lhe
resta mudou a sua qualidade, no mais o capital original, mas a soma da mais-valia que ele
se apropriou sem nada dar em troca. O trabalhador tambm muda sua qualidade no processo
de reproduo; fonte da criao de riqueza ao transformar com a sua capacidade de trabalho
os meios de produo em mercadorias com um valor excedente ao capital originariamente
adiantado, valor excedente como materializao de trabalho no-pago, transforma o produto
do seu prprio trabalho em capital objetivado que lhe estranho e o domina.
No processo de reproduo capitalista, o trabalhador produz a riqueza como propriedade
do capitalista e recebe uma parcela do prprio produto do seu trabalho na figura do salrio
que lhe pago. A parcela do produto produzido pelo trabalho do trabalhador na forma de
salrio no lhe paga em mercadorias, mas em dinheiro, como equivalente geral de valor que
d ao seu possuidor o direito de dispor de todas as mercadorias compradas e vendidas. A
iluso monetria criada pela forma como o salrio aparece, obscurece a relao social de
produo em que o trabalhador dominado pelo produto do seu trabalho; produzindo e
reproduzindo a riqueza social apropriada pelo capitalista e recebendo apenas uma parte dela
como salrio. Para Marx, a forma aparente do processo dissolve-se mais facilmente quando se
consideram no o capitalista individual e o trabalhador individual no processo produtivo de
uma unidade particular de produo, mas, a classe capitalista e a classe trabalhadora no
processo global de reproduo social. A classe capitalista entrega classe trabalhadora ttulos
sobre parcela do produto do seu trabalho na forma monetria, que lhe so restitudos quando a
classe trabalhadora compra os produtos necessrios para a sua subsistncia que foram
produzidos por ela mesma, mas que so propriedade dos capitalistas. A forma mercadoria e a
forma dinheiro que o capital precisa assumir no processo de produo confundem a
-
compreenso da relao social capitalista, fundada no carter social da produo da riqueza e
na sua apropriao de maneira privada.
A iluso, gerada pela forma monetria, desaparece imediatamente to logo sejam consideradas a
classe capitalista e a classe trabalhadora em vez do capitalista individual e do trabalhador individual. A
classe capitalista d constantemente classe trabalhadora, sob forma monetria, ttulos sobre parte do
produto produzido por esta e apropriado por aquela. Esses ttulos, o trabalhador os restitui, do mesmo
modo constante, classe capitalista e retira-lhe, com isso, aquela parte do seu prprio produto que
atribuda a ele. A forma mercadoria do produto e a forma monetria da mercadoria disfaram a transao.
(MARX, O CAPITAL. 1988, Livro I, vol. 2 p. 146)
Para que essa relao de compra e venda da fora de trabalho e dos meios de produo
como a primeira etapa do processo de produo e de reproduo do capital seja possvel,
necessrio do ponto de vista histrico, que a classe trabalhadora tenha sido separada das
condies objetivas do trabalho e do prprio produto do seu trabalho. Que se defronte com a
classe capitalista como vendedora da sua capacidade de trabalho, fora de trabalho como fora
subjetiva criadora de valor. A existncia do dinheiro que se converte em meios de produo
como propriedade privada do capitalista, condies objetivas do processo de trabalho,
separadas do trabalhador como condio subjetiva, s existem como capital latente, capital
potencial, se no so colocados no processo de produo. Meios de produo e fora de
trabalho, como propriedade de distintas figuras, o capitalista e o trabalhador, so a expresso da
relao social de produo capitalista. So o pressuposto para que no processo de produo se
produza capital, capital objetivado; que essa relao social se concretize, se objetive em capital
como propriedade privada do capitalista. O pressuposto para o funcionamento do processo se
transforma na prpria lei que rege e perpetua o processo. Na reproduo simples, essa relao
social de produo entre a classe capitalista e a classe trabalhadora tambm produzida e
reproduzida continuamente. O trabalhador quando produz mercadorias com valor acima do que
foi adiantado em meios de produo e no pagamento do seu prprio salrio, produz mais-valia
como fruto do funcionamento do capital; mas, produz tambm riqueza social objetivada como
capital que propriedade privada do capitalista. No entanto, no mesmo sentido que produz esse
Plus de riqueza como capital que se valoriza como propriedade privada do capitalista, o
trabalhador reproduz as relaes sociais de produo capitalistas ao reproduzir a sua no-
propriedade sobre as condies objetivas de trabalho e o prprio produto do seu trabalho. O
capitalista, que para valorizar o capital precisa ininterruptamente recontratar os trabalhadores
para ao serem colocados no processo de produo produzirem mercadorias prenhes de mais-
-
valia, tambm reproduz o trabalhador como trabalhador assalariado ao reproduzir as condies
da sua no-propriedade, utilizando parcela do prprio produto do trabalho do trabalhador como
salrio para comprar a sua fora de trabalho. O prprio consumo individual da classe
trabalhadora se converte em parte do processo social de reproduo do capital, se restringindo
ao estritamente necessrio para a sua subsistncia e procriao enquanto classe. Para o
capitalista, preciso que a riqueza social no se dissipe em consumo improdutivo pelos
trabalhadores, mas se converta o mximo possvel em capital que produzir mais riqueza. O
trabalhador para renovar suas energias vitais, sua capacidade de trabalho como fonte criadora
de valor, precisa constantemente produzir sempre novo montante de riqueza como capital de
propriedade privada do capitalista. E, o capitalista, para conservar e aumentar sua riqueza como
capital, ou seja, para conservar-se como capitalista, tambm precisa reproduzir o trabalhador
assalariado. A reproduo da classe capitalista e da classe trabalhadora representa as duas faces
do processo de reproduo das relaes sociais capitalistas, que com o desenvolvimento do
modo de produo capitalista centraliza a riqueza como propriedade privada de um nmero
cada vez mais reduzido de capitalistas e a aumenta a pobreza e misria da massa de
trabalhadores.
Mas o que era, no princpio, apenas ponto de partida, produzido e perpetuado sempre de novo, por
meio da mera continuidade do processo, da reproduo simples, como resultado prprio da produo
capitalista. Por um lado, o processo de produo transforma continuamente a riqueza material em capital,
em meios de valorizao e de satisfao para o capitalista. Por outro lado, o trabalhador sai do processo
sempre como nele entrou fonte pessoal de riqueza, mas despojado de todos os meios para tornar essa
riqueza realidade para si. Como, ao entrar no processo, seu prprio trabalho j est alienado dele, apropriado
pelo capitalista e incorporado ao capital, este se objetiva, durante o processo, continuamente em produto
alheio. Como o processo de produo , ao mesmo tempo, o processo de consumo da fora de trabalho pelo
capitalista, o produto do trabalhador transforma-se continuamente no s em mercadoria, mas em capital,
em valor que explora a fora criadora de valor, em meios de subsistncia que compram pessoas, em meios
de produo que empregam o produtor. O prprio trabalhador produz, por isso, constantemente a riqueza
objetiva como capital, como poder estranho, que o domina e explora, e o capitalista produz de forma
igualmente contnua a fora de trabalho como fonte subjetiva de riqueza, separada de seus prprios meios de
objetivao e realizao, abstrata, existente na mera corporalidade do trabalhador, numa s palavra, o
trabalhador como o trabalhador assalariado. Essa constante reproduo ou perpetuao do trabalhador a
condio sine qua non da produo capitalista. (MARX, O Capital. 1988, Livro I, vol. 2 p. 148.)
-
2.2 ACUMULAO DE CAPITAL E APROPRIAO CAPITALISTA.
Na seo anterior, foi visto que o processo de produo de capital, produo de valor
excedente na forma de mais-valia, no seu fluxo contnuo reproduz as relaes sociais de
produo capitalistas. A reproduo do capital reproduz o vnculo da classe capitalista com a
classe trabalhadora, como os dois lados opostos do processo de produo da riqueza social. No
processo de reproduo simples foi pressuposto que o capitalista consumia toda a mais-valia
produzida, mantendo a mesma escala de produo, apenas repondo os meios de trabalho
desgastados, as matrias primas e matrias auxiliares consumidas e recontratando o mesmo
nmero de trabalhadores. Quando se transforma a mais-valia em capital, abstraindo a parte da
mais-valia consumida pelo capitalista, comprando um volume adicional de meios de produo e
contratando mais trabalhadores, aumentando a escala do processo de produo, a reproduo do
capital assume a forma de acumulao do capital, reproduo em escala crescentemente
ampliada. Considerada concretamente, a acumulao se reduz reproduo do capital em
escala progressiva. O circuito da reproduo simples se altera e se transforma, na expresso
de Sismondi, em uma espiral (MARX, op. cit, p. 155-156.)
Na reproduo de capital de forma simples, a fora de trabalho transforma os meios de
produo em mercadorias com um valor excedente ao que foi adiantado, produz capital ao
conservar o valor adiantado e ainda produzir valor excedente na forma de mais-valia. A soma
de valor original do capitalista se transformou em capital real, capital objetivado como
concretizao da forma potencial do capital no volume de mercadorias prenhes de mais-valia.
Feita a realizao do valor dessas mercadorias, a forma mercadoria do capital se retransforma
em capital-monetrio, soma do valor originalmente adiantado acrescentado da mais-valia; no
importa se o capitalista consumir toda a mais-valia, o que importa para Marx nessa etapa
evidenciar que a produo de capital produo de mais-valia, a reproduo das relaes
sociais de produo capitalistas. Na reproduo em escala ampliada a mais-valia produzir mais
capital e mudar as condies de reproduo das relaes sociais de produo capitalistas. Com
o desenvolvimento do modo de produo capitalista, a aparncia, a forma do fenmeno, tm
transformado o seu contedo. A forma no explica o contedo, mas, o mistifica.
Para ampliar sua escala de produo, o capitalista precisa converter a mais-valia
realizada com a venda das mercadorias produzidas anteriormente em quantidades adicionais de
meios de produo e na contratao de mais trabalhadores. Desse retorno do capitalista esfera
-
da circulao como comprador de maiores quantidades de meios de produo e fora de
trabalho, o capital original e o seu rebento, o novo plus de capital se confundem ao assumirem a
forma de capital monetrio. Como o dinheiro no demonstra sua origem, a mais-valia ao se
transformar em capital produtivo adicional, apaga sua origem no mais-trabalho, trabalho no-
pago aos trabalhadores. Esse mais-trabalho realizado pelos trabalhadores se materializa num
volume de mais-produto produzido. Para que a mais-valia possa ser convertida em novas
mquinas e ferramentas, novas matrias primas e matrias auxiliares, foi preciso que a
produo total do perodo anterior no ficasse restrita ao necessrio para reposio dos meios de
produo consumidos e desgastados naquele perodo, mas que produzisse meios de produo
em quantidade excedente. Da mesma maneira, a produo de meios de subsistncia para o
consumo dos trabalhadores no pode se limitar apenas ao volume necessrio para reproduzir a
mesma quantidade da populao trabalhadora. O prprio carter do processo de produo
capitalista como processo de trabalho e processo de valorizao determina que a magnitude do
produto no possa se restringir ao equivalente da soma de capital adiantado, se no o capitalista
no valoriza seu capital, preciso produzir um mais-produto, uma mais-valia, que se converta
em uma soma maior de dinheiro. A necessidade de valorizao do capital impulsiona de
maneira contnua a produo capitalista para alm dos seus limites. O processo de produo
capitalista sempre est criando uma quantidade de mercadorias que precisa ser retransformada
em capital produtivo ou servir para o consumo individual da classe capitalista e da classe
trabalhadora. A concorrncia entre capitais, o sistema de crdito e o comrcio exterior, que no
so considerados por Marx na anlise do capital em geral, potencializam ainda mais a expanso
da escala de produo, potencializando tambm as contradies desse processo. A crise a
expresso mais aguda das contradies do processo de acumulao de capital.
A reproduo ampliada da escala de produo do capital necessita tambm reproduzir de
forma ampliada a classe dos trabalhadores como vendedora da sua fora de trabalho.
essencial reproduzir a populao trabalhadora - como fonte criadora de riqueza desprovida das
condies objetivas do trabalho - como trabalhadores assalariados. Mas, com a reproduo
ampliada do capital, a relao de compra e venda da fora de trabalho e a lei de propriedade da
produo de mercadorias mudam de qualidade. A origem do capital varivel, do fundo dos
salrios pagos aos novos trabalhadores contratados no o capital original adiantado pelo
capitalista, capital que se tornou propriedade do capitalista com base na compra e venda de
mercadorias com valores equivalentes. Da mesma maneira que o capital constante adicional,
materializado em novo montante de meios de produo, tambm perdeu a sua ligao com
-
aquela soma de capital original. O novo capital monetrio que se converte em novo capital
produtivo - montantes adicionais de meios de produo que sero transformados em novas
mercadorias por uma quantidade adicional de trabalhadores - tem a sua origem no mais-produto
produzido pelos trabalhadores sem receber nenhum valor equivalente em troca. Esse mais-
trabalho no-pago, mais-valia, que se materializou no mais-produto produzido, o prprio
produto do trabalho do trabalhador transformado em capital real, capital objetivado em meios
de produo e nos meios da sua subsistncia que so propriedade do capitalista e se voltam
contra ele. As condies objetivas do processo de trabalho e o prprio produto do trabalho do
trabalhador no so sua propriedade, ele s recebe uma parcela do valor do produto que
produziu na forma de salrio. Alm disso, no s o trabalhador no tem o direito de propriedade
sobre o que produziu, como esse produto produzido por ele o explora de forma crescente ao
necessitar do fornecimento de mais trabalho vivo para criar mais capital que o explorar ainda
mais. A lei da propriedade da produo de mercadorias, que para a Economia Poltica
fundamenta a acumulao de riqueza pelos capitalistas com base no prprio trabalho, torna-se
mera aparncia, uma forma que no diz nada sobre seu contedo. O desenvolvimento do
processo de produo capitalista transforma a compra/venda de mercadorias com valores
equivalentes e valores de uso diferentes, expresso do direito de propriedade desses produtores
sobre o produto do seu trabalho, em lei da apropriao capitalista, direito de apropriar-se de
maneira crescente do produto do trabalho alheio.
Mas a coisa totalmente diversa com capital adicional de 2.000 libras esterlinas. Conhecemos
exatamente o seu processo de surgimento. mais-valia capitalizada. Desde a origem, ele no contm
nenhum tomo de valor que no derive de trabalho alheio no-pago. Os meios de produo, aos quais a
fora de trabalho adicional incorporada, assim como os meios de subsistncia, com os quais ela se
mantm, no so mais do que componentes integrantes do mais-produto, o tributo que anualmente extrado
da classe trabalhadora pela classe capitalista. Quando esta, com parte do tributo, compra fora de trabalho
adicional daquela, mesmo por seu preo integral, de modo que se troque equivalente por equivalente
permanece sempre o velho procedimento do conquistador, que compra as mercadorias dos vencidos com seu
prprio dinheiro roubado. (MARX, op. cit. p. 156).
A relao social capitalista uma relao de valorizao do valor e ao mesmo tempo de
explorao do trabalho. A compra da fora de trabalho pelo capitalista aparece como uma troca
entre dois proprietrios de mercadorias com valores de uso diferentes e com valores de troca
iguais, uma troca de equivalentes. Mas, na essncia do fenmeno, a prpria existncia de
intercmbio desaparece. A forma de uma relao mercantil negada pelo seu contedo como
-
relao de produo capitalista. O trabalhador tem comprada a sua fora de trabalho com
parcela do prprio produto do seu trabalho na forma de salrio e o converte nos meios de
subsistncia que tambm so produto do seu trabalho. A forma monetria e a forma mercadoria
que a relao-capital assume na esfera da circulao escondem esse carter da produo
capitalista. A aparncia da relao de intercmbio obscurece a relao social de produo em
que o trabalhador produz a riqueza como propriedade privada do capitalista e recebe apenas
uma parte dessa riqueza para a sua subsistncia. Numa relao de troca simples, baseada na lei
de propriedade da produo de mercadorias, a relao se d entre proprietrios privados do
produto do seu trabalho que se relacionam atravs das suas mercadorias por meio da troca de
equivalentes. O carter social da produo, determinado pela diviso do trabalho, manifesta-se
no funcionamento da lei do valor, que confronta os proprietrios privados do produto do seu
trabalho e converte esses diferentes trabalhos em trabalho social na forma de mercadorias. A
relao social entre os produtores fetichizada, segundo Marx, pela relao de troca entre
mercadorias produzidas pelos homens. A relao social entre os homens aparece como relao
entre mercadorias.
O valor, que na produo de carter mercantil uma relao social entre diferentes
proprietrios privados das condies objetivas do trabalho e do produto do seu trabalho na
forma de mercadorias, no modo de produo capitalista, transubstancia-se numa relao entre
os proprietrios privados dos meios de produo e dos meios de subsistncia e os no-
proprietrios, que se relacionam atravs da compra/venda da fora de trabalho. Essa relao
social uma relao de extrao de mais-valia por meio da explorao do trabalhador no
processo de produo ao pagar-lhe como salrio pela sua capacidade de trabalho, um valor
inferior ao que ele gerou. Mas, o capitalista no roubou nada do trabalhador ao pagar-lhe o
salrio necessrio para a sua subsistncia. O nvel do salrio determinado no longo prazo pelo
nvel de subsistncia necessrio para a reproduo da fora de trabalho, flutuando no curto
prazo em torno desse nvel em virtude das oscilaes do mercado de trabalho. A motivao do
capitalista em comprar a fora de trabalho no est em pagar por ela um valor abaixo do que ela
vale, mas sim, de comprar uma mercadoria que tem um valor de uso especial; valor de uso de
quando posta na produo produzir um valor excedente ao que custou, valor adicional na forma
de mais-valia. Essa relao de intercmbio entre capitalista e trabalhador vista na esfera da
circulao por meio da compra e venda da fora de trabalho no uma relao desigual. O
capitalista realmente paga o que a fora de trabalho vale. Mas, do ponto de vista da relao
social de produo da classe capitalista com a classe trabalhadora essa uma relao de
-
apropriao, uma relao de explorao, que com o desenvolvimento do capitalismo torna-se
mais desigual para a classe trabalhadora ao centralizar a riqueza produzida socialmente como
propriedade privada de poucos. Na organizao jurdica e poltica da sociedade burguesa os
indivduos aparecem como iguais, abstraindo-se as classes sociais a que pertencem. A
sociedade burguesa se legitima no invlucro da propriedade como resultado do trabalho e na
troca como o exerccio da liberdade que a propriedade d. No entanto, no processo de
produo que essa relao entre iguais desmascarada pela relao de explorao direta dos
trabalhadores para a extrao de mais-valia. No processo de produo desaparece a liberdade do
trabalhador que substituda pela disciplina da fbrica e evidencia-se a relao de apropriao
do produto do seu trabalho pelo capitalista.
Propriedade de trabalho passado e no-pago aparece agora como a nica condio para a apropriao
presente de trabalho vivo no-pago, em dimenso sempre crescente. Quanto mais o capitalista houver
acumulado, tanto mais poder acumular. Na medida em que a mais-valia, na qual consiste capital adicional
nmero I, foi o resultado da compra da fora de trabalho por uma parte do capital original, compra que
correspondeu s leis do intercmbio de mercadorias e, juridicamente considerada, no pressupe mais do
que a livre disposio por parte do trabalhador sobre suas prprias capacidades, por parte do possuidor de
dinheiro ou mercadorias sobre os valores que lhe pertencem; na medida em que o capital adicional nmero
II etc. simples resultado do capital adicional nmero I, conseqncia, portanto, daquela primeira relao;
na medida em que cada transao isolada corresponde constantemente lei do intercmbio de mercadorias,
isto , o capitalista sempre compra a fora de trabalho e o trabalhador sempre a vende, e queremos mesmo
admitir que por seu valor real, a lei da apropriao ou lei da propriedade privada, baseada na produo de
mercadorias e na circulao de mercadorias, evidentemente se converte mediante sua prpria dialtica
interna, inevitvel, em seu contrrio direto. O intercmbio de equivalentes, que apareceu como a operao
original, se torceu de tal modo que se troca apenas na aparncia, pois, primeiro, a parte do capital que se
troca por fora de trabalho nada mais que uma parte do produto de trabalho alheio, apropriado sem
equivalente, e segundo, ela no somente reposta por seu produtor, o trabalhador, como este tem de rep-la
com novo excedente. A relao de intercmbio entre capitalista e o trabalhador torna-se portanto apenas
mera aparncia pertencente ao processo de circulao, mera forma, que alheia ao prprio contedo e
apenas o mistifica. A contnua compra e venda da fora de trabalho a forma. O contedo que o
capitalista sempre troca parte do trabalho alheio j objetivado, do qual se apropria incessantemente sem
equivalente, por um quantum maior de trabalho vivo alheio. Originalmente, o direito de propriedade
apareceu-nos fundado sobre o prprio trabalho. Pelo menos tinha de valer essa exposio, j que somente se
defrontam possuidores de mercadorias com iguais direitos, e o meio de apropriao de mercadoria alheia
porm apenas a alienao da prpria mercadoria e esta pode ser produzida mediante apenas o prprio
trabalho. A propriedade aparece agora, do lado do capitalista, como direito de apropriar-se de trabalho
alheio no-pago ou de seu produto; do lado do trabalhador, como a impossibilidade de apropriar-se de seu
prprio produto. A separao entre propriedade e trabalho torna-se conseqncia necessria de uma lei que,
-
aparentemente, se originava em sua identidade. Por mais que o modo de produo capitalista parea ofender
as leis originais da produo de mercadorias, ele no se origina de maneira alguma da violao mas, ao
contrrio, da aplicao dessas leis. (MARX, op. cit. p.157).
E no Captulo VI Indito de O Capital, Marx tambm deixa claro que (...) desaparece at a aparncia que a relao apresentava superfcie e segundo a qual se defrontam na circulao, no
mercado, possuidores de mercadorias dotados de prerrogativas iguais, os quais, como todos os demais
possuidores de mercadorias, s se diferenciam entre si pelo contedo particular das mercadorias de que
dispem para vender um ao outro. Ou ento, esta forma original da relao subsiste apenas como
aparncia da relao que lhe serve de base, da relao capitalista. (...) estes produtos transformados em
capital no so os seus produtos, so produtos do operrio. O capitalista vende-lhe constantemente uma
parte do seu produto meios necessrios de subsistncia em troca de trabalho, com vista conservao
e ao aumento da capacidade de trabalho, do prprio comprador, e cede-lhe constantemente outra parte do
seu produto, as condies objetivas do trabalho como meios de autovalorizao do capital, como capital.
(...) A relao entre meros vendedores de mercadorias implica que estes troquem mutuamente os seus
prprios trabalhos, encarnados em diversos valores de uso. A compra/venda da fora de trabalho como
resultado incessante do processo de produo capitalista implica que o operrio tenha que readquirir
constantemente uma parte do seu prprio produto em troca do seu trabalho vivo. Com isso se esfuma a
aparncia de mera relao entre possuidores de mercadorias. Esta compra/venda contnua da capacidade
de trabalho e a constante confrontao entre o operrio e a mercadoria por ele prprio produzida, como
comprador da sua capacidade de trabalho e como capital constante, apresentam-se apenas como forma
mediadora da sua sujeio ao jugo do capital, do trabalho vivo como simples meio para a conservao e o
aumento do trabalho objetivado que tornado autnomo com ele se defronta. (MARX, 1997, p. 136-37)
2.3 LEI DA ACUMULAO E AS CONTRADIES DAS RELAES SOCIAIS
DE PRODUO CAPITALISTAS
A acumulao de capital em escala crescente desenvolve as foras produtivas ao
impulsionar a capacidade social de produo e reproduzir de forma ampliada a relao-capital,
fortalecendo o poder da classe capitalista de um lado, essencialmente os grandes capitalistas, e
aumentar de outro, a massa de trabalhadores que ficam merc do capital para serem
explorados. O desenvolvimento incessante das foras produtivas entra em contradio com as
relaes sociais de produo que so a sua base, em virtude de esse aumento da capacidade
social de produo s ser possvel com a expanso contnua da composio orgnica do capital
aumento da composio tcnica com o aumento da proporo da massa dos meios de
produo em relao fora de trabalho necessria para transform-los em mercadorias, e,
-
aumento da composio valor com um momento do capital constante sobre a proporo do
capital varivel em relao ao capital total reduzindo a parcela da populao trabalhadora que
permanece em atividade, criando uma superpopulao relativa; e do lado do capital,
concentrando e centralizando a propriedade de capital atravs da fuso, incorporao ou
simples eliminao dos capitais concorrentes. A acumulao capitalista tem como lei geral que
regula seu movimento, o crescimento da composio orgnica do capital e o aumento do
montante de trabalho passado e a reduo da necessidade de trabalho vivo para valorizar o
capital. O desenvolvimento do modo de produo capitalista subsume a lei natural da populao
sua lei da acumulao, da mesma forma, que subsume a lei de propriedade da produo de
mercadorias em lei da apropriao capitalista. O destino da classe trabalhadora est amarrado
lei geral da acumulao capitalista; o grau da sua reproduo enquanto classe e a determinao
da parcela do prprio produto do seu trabalho que recebe na forma de salrio est confinado,
limitado pelas necessidades da continuidade do processo de acumulao. claro que essas
limitaes so menos rigorosas nos perodos de prosperidade e mais intensas nos perodos de
crise, mas, as condies da relao-capital so crescentemente desfavorveis para a classe dos
trabalhadores.
Nesse sentido, a acumulao de capital como transformao de mais-valia em capital
adicional, acrscimo no montante de meios de produo (trabalho morto ou passado) e em
fundo de salrios para a contratao de mais trabalhadores (trabalho vivo ou presente),
resultado da apropriao do produto do trabalho dos trabalhadores enquanto classe determina
limites aos nveis de variao dos salrios. Os limites da participao dos trabalhadores no
produto social, produto da sua capacidade social de produo, so postos pela lei da
acumulao. Como diz Marx, Produo de mais-valia ou gerao de excedentes a lei
absoluta desse modo de produo(op. cit. p. 182). A parcela de trabalhadores ocupados s
crescer se alm de conservarem os meios de produo como capital, reproduzirem o valor dos
seus salrios e ainda, principalmente, criarem um valor excedente, mais-valia, que convertida
em capital adicional expandir ainda mais a acumulao. As taxas de crescimento da demanda
de trabalhadores para serem empregados no processo de produo esto em funo da
composio orgnica do capital e da taxa de acumulao, que determinada pelo nvel da taxa
de lucro. Os salrios podem crescer, e, geralmente crescem nos perodos de prosperidade, mas,
o seu limite de crescimento est restringido pelo crescimento da acumulao de capital, pelo
crescimento das taxas de lucro; no podendo os salrios crescerem taxas maiores que as taxas
de lucro. Se isso acontece, e sempre acontece na fase que antecede as crises, acelerada a
-
queda da taxa geral de lucro que j vinham caindo como resultado da superacumulao,
implicando em reduo da procura de novos trabalhadores e posteriormente na demisso de
uma parte dos empregados, aumentando o exrcito de reserva em proporo ao exrcito da ativa
e por conseqncia baixando os salrios. Portanto, mesmo se mantida a mesma composio
orgnica do capital, o prprio processo de produo capitalista regula atravs da sua lei de
funcionamento, a participao da classe trabalhadora no produto social de maneira que no
ameace a acumulao de capital. Os nveis salariais e por conseqncia os nveis de consumo
da classe trabalhadora, esto restritos pelo funcionamento da lei que rege o processo de
acumulao aos limites necessrios para a reproduo da classe trabalhadora como parte do
processo de reproduo ampliada do capital. O subconsumo da classe trabalhadora, consumo de
uma parte cada vez mais reduzida do produto social no o causador das crises de acumulao,
mas o resultado do funcionamento normal do processo de produo capitalista. Nos perodos
de prosperidade, inclusive o consumo dos trabalhadores sobe como reflexo da alta dos salrios
e do crescimento das taxas de acumulao. O limite inerente da acumulao est na queda da
taxa de valorizao do capital, queda da taxa de lucro, que de forma geral resultado do
aumento da composio orgnica, aumento do trabalho passado em relao ao trabalho vivo.
Em sntese, essa relao entre acumulao de capital e o nvel dos salrios, uma relao entre
trabalho passado, meios de produo e os meios de subsistncia como materializao da
relao-capital, e a necessidade de trabalho vivo adicional, fora de trabalho, que lhe d um
sopro de vida ao no s conserv-lo como capital como ainda criar capital adicional.
A lei da produo capitalista, que subjaz a pretensa lei natural da populao, redunda
simplesmente nisso: a relao entre capital, acumulao e taxa de salrio no nada mais que a relao
entre trabalho no-pago, transformado em capital, e o trabalho adicional necessrio movimentao do
capital adicional. No , portanto, de modo algum uma relao de duas grandezas independentes entre si,
por um lado a grandeza do capital, por outro o tamanho da populao trabalhadora, mas , em ltima
instncia, muito mais a relao entre o trabalho no-pago e o trabalho pago, da mesma populao
trabalhadora. Se cresce a quantidade de trabalho no-pago fornecido pela classe trabalhadora e acumulada
pela classe capitalista de modo suficientemente rpido para s com um acrscimo extraordinrio de
trabalho pago poder transformar-se em capital, ento o salrio sobe e, permanecendo tudo mais constante,
o trabalho no-pago diminui proporcionalmente. Mas, assim que essa diminuio atinge o ponto em que o
mais-trabalho, que alimenta o capital, j no oferecido na quantidade normal, ento ocorre uma reao:
uma parte menor da renda capitalizada, a acumulao se desacelera e o movimento ascendente do
salrio sofre um contragolpe. A elevao do preo do trabalho permanece, portanto, confinada em limites
que no s deixam intocados os fundamentos do sistema capitalista, mas tambm asseguram a sua
reproduo em escala crescente. A lei da acumulao capitalista, mistificada em lei da natureza, expressa,
-
portanto, de fato apenas que sua natureza exclui todo decrscimo no grau de explorao do trabalho ou
toda elevao do preo do trabalho que poderia ameaar seriamente a reproduo continuada da relao
capital e sua reproduo em escala sempre ampliada. Nem poderia ser diferente num modo de produo
em que o trabalhador existe para as necessidades de valorizao de valores existentes, ao invs de a
riqueza objetiva existir para as necessidades de desenvolvimento do trabalhador. Assim como na religio
o ser humano dominado pela obra de sua prpria cabea, assim, na produo capitalista, ele o pela
obra de sua prpria mo. (MARX, op. cit. p. 184.)
O crescimento da fora de expanso do capital, resultado da prpria magnitude da
acumulao, impulsiona a necessidade de valorizao do capital global em escala sempre
crescente. O aumento da riqueza social via acumulao de capital como propriedade privada,
por um lado aumenta o montante dos meios de produo e de subsistncia sob controle da
classe capitalista. Por outro lado, aumenta a massa absoluta de trabalhadores ocupados por esse
volume crescente de meios de produo. A lei do processo de acumulao capitalista
desenvolve a classe capitalista ao expandir continuamente a riqueza social sob seu controle,
aumentando o nmero de capitalistas e, principalmente, o nmero dos grandes capitalistas.
Desenvolve tambm a classe trabalhadora, ao elevar de maneira absoluta o nmero de
trabalhadores ocupados pelo capital. Mas, essa apenas uma face do desenvolvimento do
processo. A outra face que tanto a classe capitalista quanto a classe trabalhadora se
reproduzem degenerativamente com o seu prprio desenvolvimento. A concorrncia entre os
capitais individuais leva a absoro dos menores capitais pelos grandes, centralizao de capital
social sob o controle de um nmero cada vez mais reduzido de capitalistas. Os pequenos,
mdios e at mesmo grandes capitalistas so expropriados de seus capitais, se transformando
em proprietrios de capital monetrio que lhes rendem juros, ou, at mesmo passando para as
fileiras da classe trabalhadora no caso de runa completa do negcio. O destino da classe
trabalhadora ainda mais trgico. Enquanto uma parte dos capitalistas se transforma em rentista
e uma outra parte menos afortunada em trabalhadores, uma parcela crescente dos trabalhadores
considerada redundante, exrcito industrial de reserva que permanece de prontido para ser
ocupado pelo capital. A parcela menos afortunada da classe trabalhadora j no serve nem mais
de reserva, entrando nas fileiras do exrcito de miserveis e para o mundo do crime. No incio
do Sculo XXI evidente o crescimento do exrcito de reserva em todas as formas apontadas
por Marx lquida, latente e estagnada em proporo aos trabalhadores ativos, e, tambm a
parcela dos que so rebaixados ao pauperismo e a degradao, chamados de
lumpemproletariado.
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A concentrao de capital, entendida como o crescimento do montante de meios de
produo e de fora de trabalho sob o controle da classe capitalista, determinada pela
acumulao de riqueza social, e, a centralizao de capital como a juno de muitos capitais
anteriormente fracionados sob o controle de um grande capitalista ou de uma sociedade por
aes, independente da expanso da riqueza social, impulsionam ainda mais o aumento da
composio tcnica do capital ao elevar a massa dos meios de produo que uma mesma massa
de fora de trabalho transforma em mercadorias. Esse aumento da composio tcnica ir se
refletir no aumento da composio valor do capital, ou seja, elevao do componente constante
em proporo ao componente varivel do capital. O crescimento da composio tcnica no
corresponde necessariamente ao mesmo nvel de crescimento da composio valor. O prprio
aumento da produtividade do trabalho social reduz o valor unitrio das mercadorias, se
refletindo tambm no barateamento dos meios de produo e dos meios de subsistncia dos
trabalhadores. Por conseguinte, o crescimento da composio valor tendencialmente menor
e quanto menor melhor para a acumulao que o crescimento da composio tcnica do
capital. Esse aumento de intensificao do trabalho social, expresso no maior grau de
produtividade do processo produtivo global como resultado da elevao do grau de explorao
na forma de mais-valia relativa, bem como, o prolongamento da jornada de trabalho (mais-valia
absoluta), a reduo do salrio abaixo do seu valor (superexplorao da fora de trabalho) e
ainda, o desgaste tecnolgico da maquinaria utilizada agem como fatores positivos para a
acumulao de capital; atuam como formas contrrias queda da taxa de acumulao. No Livro
Terceiro, quando Marx analisa o processo global de produo capitalista, com base na
concorrncia entre diferentes capitais, o desenvolvimento do sistema de crdito e a formao do
mercado mundial, esses fatores atuam como contratendncias lei da queda tendencial da taxa
de lucro. Embora no consigam revogar a vigncia dessa lei.
Mas claro que a acumulao, aumento paulatino do capital pela reproduo que passa da forma
circular para a espiral, um processo bastante lento, se comparado com a centralizao, que s precisa
alterar o agrupamento quantitativo das partes integrantes do capital social. O mundo ainda estaria sem
estradas de ferro, caso ficasse esperando at que a acumulao de alguns capitais individuais alcanasse o
tamanho requerido para a construo de uma estrada de ferro. No entanto, a centralizao mediante as
sociedades por aes chegou a esse resultado num piscar de olhos.