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CHARLES LEITER

RegeneraçãoE

Caixa Postal 1601CEP: 12230-971São José dos Campos, SPPABX: (12) 3919-9999www.editorafiel.com.br

Justificação e RegeneraçãoTraduzido do original em inglêsJustification and regenerationpor Charles Leiter © 2009 Charles Leiter

Publicado originalmente em inglês por Granted Ministries Press, a Division of Granted MinistriesP. O Box 1348 Hannibal, MO 63401-1348 USA

Copyright © 2015 Editora FielPrimeira Edição em Português: 2015

Todos os direitos em língua portuguesa reservados por Editora Fiel da Missão Evangélica Literária

Proibida a reprodução deste livro por quaisquermeios, sem a permissão escrita dos editores,salvo em breves citações, com indicação da fonte.

Diretor: James Richard Denham IIIEditor: Tiago J. Santos FilhoTradução: Maurício Fonseca dos Santos JúniorRevisão: Ingrid Rosane de Andrade FonsecaDiagramação: Rubner DuraisCapa: Rubner DuraisISBN: 978-85-8132-316-9

Catalogação na publicação: Mariana C. de Melo – CRB07/6477

L533j Leiter, Charles Justificação e regeneração / Charles Leiter ; [tradução: Mauricio Fonseca dos Santos Júnior]. – São José dos Campos, SP : Fiel, 2015. 221 p. ; 21 cm. Tradução de: Justification and regeneration. ISBN 978-8581323169 1. Justificação (Teologia). 2. Regeneração (Teologia). I. Título.

CDD: 234.7

SUMÁRIO Agradecimentos ................................................................................9

Prefácio .........................................................................................11

Introdução ......................................................................................15

1 – Pecado: O problema final do homem.............................19

2 – Pode um homem ser justo diante de Deus? .................31

3 – Justificação: Suas características ......................................41

4 – Regeneração: Tudo se faz novo ........................................61

5 – Uma nova criação ................................................................67

6 – Um novo homem ................................................................73

7 – Um novo coração .................................................................79

8 – Um novo nascimento .........................................................89

9 – Uma nova natureza..............................................................97

10 – Crucificação e ressurreição..............................................103

11 – Uma mudança de reino: da carne para o espírito ......113

12 – Uma mudança de reino: da terra para o céu ................125

13 – Uma mudança de reino: do pecado para a justiça .....135

14 – Uma mudança de reino: da lei para a graça .................143

15 – Uma mudança de reino: de Adão para Cristo ............153

Apêndice A – Regeneração: um resumo ...............................165

Apêndice B – “Não pode pecar” .............................................177

Apêndice C – Romanos 7 .........................................................181

Apêndice D – Todas as bênçãos em Cristo ..........................195

Apêndice E – Perguntas frequentes .......................................207

AGRADECIMENTOS

Quero expressar minha gratidão especial a Paul Washer, da Sociedade Missionária HeartCry, por encorajar e apoiar a publicação deste livro, e também a Garrett Holthaus de Kirks-ville, Missouri, por oferecer tantas sugestões valiosas a respeito de seu conteúdo. Ainda devo um agradecimento especial aos meus muitos revisores por terem trabalhado cuidadosamente na correção dos meus erros, e — acima de tudo — à minha esposa, Mona, por ter lido alegremente o manuscrito para mim durante uma viagem de treze horas de volta do Colorado, suge-rindo-me uma série de modificações muito úteis.

PREFÁCIO

Parece haver um grande abismo separando os teólogos bíbli-cos e os crentes sentados nos bancos das igrejas. Embora os teólogos sejam capazes de escalar o Everest das verdades de Deus e serem transformados pela visão arrebatadora, eles fre-quentemente comunicam essa visão em uma linguagem que está além da nossa compreensão. Dessa forma, somos deixa-dos à mercê da literatura cristã popular que, em muitos casos, não é nada mais do que histórias pitorescas, pragmatismo e psicologia batizada.

A igreja contemporânea não precisa de mais estratégias, passos ou chaves para a vida cristã. A igreja precisa da verdade e, mais especificamente, das grandes verdades que são o funda-mento do cristianismo histórico. Nesta obra, o pastor Charles Leiter prestou um ótimo serviço à Igreja ao tomar duas das

12 – JUSTIFICAÇÃO E Regeneração

maiores doutrinas das Escrituras e dois dos maiores milagres na vida cristã, e explicá-los em uma linguagem simples sem perda de conteúdo.

Conforme lia o manuscrito deste livro, ficava maravilha-do com sua simplicidade e escopo. As grandes doutrinas da justificação e regeneração só podem ser consideradas apro-priadamente no contexto das outras grandes doutrinas da fé — o caráter santo e reto de Deus, a depravação humana, pro-piciação, arrependimento, fé e santificação, para citar apenas algumas. O pastor Leiter não apenas nos deu uma visão equili-brada de cada uma dessas doutrinas, mas também demonstrou como elas interagem para formar a fundação da vida cristã.

De particular interesse para mim foi a demonstração de uma visão apropriada da regeneração. Na evangelização dos dias modernos, esta preciosa doutrina foi reduzida a nada mais que uma decisão humana de levantar a mão, ir até à frente, ou fazer a “oração do pecador”. Como resultado, a maioria das pes-soas acredita que “nasceu de novo” (i.e., foi regenerada) mesmo que seus pensamentos, palavras e obras sejam uma contínua contradição à natureza e vontade de Deus. O pastor Leiter de-monstra que a regeneração é a obra sobrenatural de Deus por meio da qual o coração de pedra morto e depravado do peca-dor é substituído por um novo coração que tanto deseja quanto é capaz de responder a Deus em amor e obediência. Em segun-do lugar, o pastor Leiter trata Romanos 6 e 7 de forma lógica, consistente e com profunda simplicidade. A visão de nosso ir-mão concernente a esses dois grandes capítulos tem sido fonte de grande força, conforto e alegria para mim ao longo dos anos de minha própria peregrinação.

Prefácio – 13

Já li este livro muitas vezes antes de ter sido impresso. Fui grandemente beneficiado por seus ensinos e posso recomen-dá-lo de todo o meu coração. Que o Espírito de Deus possa iluminar seu coração e sua mente para que você possa não so-mente compreender as Escrituras conforme explicadas aqui, mas para que elas também se tornem uma realidade em sua vida.

Paul David Washer

Pois nós também, outrora, éramos néscios, desobe-

dientes, desgarrados, escravos de toda sorte de pai-

xões e prazeres, vivendo em malícia e inveja, odiosos e

odiando-nos uns aos outros. Quando, porém, se mani-

festou a benignidade de Deus, nosso Salvador, e o seu

amor para com todos, não por obras de justiça prati-

cadas por nós, mas segundo sua misericórdia, ele nos

salvou mediante o lavar regenerador e renovador do

Espírito Santo, que ele derramou sobre nós ricamente,

por meio de Jesus Cristo, nosso Salvador, a fim de que,

justificados por graça, nos tornemos seus herdeiros, se-

gundo a esperança da vida eterna.

Tito 3.3-7

INTRODUÇÃO

16 – JUSTIFICAÇÃO E Regeneração

Dois grandes milagres encontram-se bem no coração e no cerne do evangelho. O primeiro é a justificação, por meio da qual criminosos são considerados justos aos olhos de um Juiz santo e reto. O segundo é a regeneração, por meio da qual peca-dores malignos, escravizados e odiosos são transformados para amar a Deus e os homens. Seja direta ou indiretamente, esses dois milagres aparecem em toda parte no Novo Testamento. Eles são absolutamente a fundação para um entendimento apropriado tanto do evangelho quanto da vida cristã. Contudo, mesmo entre crentes genuínos, há muita confusão e ignorância a respeito dessas verdades preciosas e libertadoras da alma.

Nas páginas seguintes, você encontrará uma tentativa de demonstrar, à luz clara da Bíblia, a natureza e as características da justificação e da regeneração. Para fazê-lo, primeiro preci-samos considerar no Capítulo 1 por qual motivo todos os homens se encontram em tal necessidade desesperada desses dois atos divinos. Isso envolverá uma discussão tanto da culpa objetiva quando da corrupção interna causada pelo pecado.

Porque todos os homens são culpados e corrompi-dos pelo pecado, há um grande dilema moral no caminho da salvação do homem: Como pode um Deus justo justificar pe-cadores injustos sem ele próprio se tornar injusto? O Capítulo 2 examina esse dilema e como a sabedoria divina o solucionou por meio da Pessoa e obra do Senhor Jesus Cristo. No Capítulo 3, a natureza e as características da justificação são então ex-ploradas à luz das sete verdades sobre a justificação, conforme demonstradas na Escritura.

A Bíblia tem muito a dizer sobre regeneração. Em uma tentativa de obter uma visão clara do que é a regeneração, exa-

Introdução – 17

minaremos nove descrições bíblicas deste grande milagre nos Capítulos 4 a 13. Cada descrição olha para a mesma realidade gloriosa a partir de um ângulo diferente, iluminando suas dife-rentes facetas.

No Capítulo 14, tanto a justificação quanto a regenera-ção são consideradas nos termos das categorias mais amplas de “lei e graça” conforme apresentadas no Novo Testamento. E, finalmente, no capítulo de conclusão, ambas são consideradas como parte de uma realidade ainda maior e mais abrangente de nosso estar “em Cristo”. Cristianismo é Cristo. Toda bênção espiritual é encontrada “nele” — incluindo todas as bênçãos da justificação e regeneração — e nenhuma bênção espiritual existe longe dele.

Ao longo desse livro, deixei muitas referências importan-tes da Escritura nas notas de rodapé, colocadas ao final de cada página para facilitar a leitura.

Charles Leiter

Para uma compreensão apropriada tanto da justificação quanto da regeneração, precisamos começar por onde a Bíblia começa, ou seja, pelo pecado. Todo pecado flui do desejo perverso do homem de se colocar no lugar de Deus — de ser o centro e a medida de todas as coisas e “conhecer” por conta própria o que é bom e o que é mau.1 De acordo com Tito 3.3-7, os homens em seu estado natural são “néscios, desobedientes, desgarrados, escravos de toda sorte de paixões”. Suas vidas são caracteriza-das por “malícia, inveja e ódio”. Longe de reconhecerem essa situação, os homens perdidos se imaginam como “basicamen-te bons”, a menos que Deus em sua misericórdia lhes revele a verdadeira condição de seus corações endurecidos. O pecado é o problema final e, de fato, o único problema da humanidade. É

1 Gênesis 3.4-5

Capítulo 1

PECADOO PROBLEMA

FINAL DO HOMEM

20 – JUSTIFICAÇÃO E Regeneração

o meu problema final e meu único problema, e o seu problema final e seu único problema.

UMA VISÃO BÍBLICA DO PECADOA Bíblia tem muito a dizer sobre o pecado. Se quisermos compreender corretamente a verdadeira natureza do pecado, precisamos deixar que a luz desta revelação bíblica ilumine nossas mentes escurecidas e quebrante nossos corações en-durecidos. Apenas pense a respeito disso! De acordo com a Bíblia, o pecado é —

Absolutamente Universal

O pecado é absolutamente universal na raça humana. “Todos nós, tal qual ovelhas, nos desviamos, cada um de nós se voltou para o seu próprio caminho”.2 “Não há justo, nem um se-quer, não há quem entenda, não há quem busque a Deus; todos se extraviaram, à uma se fizeram inúteis; não há quem faça o bem, não há nem um sequer”.3 Você e eu podemos sequer nos conhecer, mas há uma coisa da qual podemos ter certeza antes mesmo de sermos apresentados — ambos somos pecadores. Todo homem, mulher e criança na face da terra, não importa o quão jovem ou velho seja, é um pecador. Mesmo as crian-ças pequenas, quando lhes é permitido andar em seu próprio caminho, são capazes das crueldades mais requintadas contra animais e umas contra as outras.

Raça e nacionalidade, da mesma forma, não oferecem imunidade ao pecado; mesmo as nações mais evoluídas cultural-

2 Isaías 53.6, NVI3 Romanos 3.10-12

Pecado: O problema final do homem – 21

mente são capazes de genocídios, assim como as mais bárbaras. As câmaras de gás dos “civilizados” são meramente formas mais sofisticadas dos facões empunhados pelos “não civilizados”.

Da mesma forma, não existe tal coisa como o “bom sel-vagem” ou o “pagão feliz”. Nas palavras de um missionário aposentado, “eu fui ao campo missionário para impedir um Deus mau de mandar homens bons para o inferno. Quando cheguei, descobri que eles eram monstros da iniquidade”. A questão aqui não é se os homens tiveram uma oportunidade de “aceitar Jesus”. A questão é se eles tiveram uma oportunidade de maltratar o missionário e rejeitar sua mensagem — pois, longe da obra espe-cial do Espírito Santo, certamente é isso que eles fariam.4

O pecado é universal na raça humana.

Ubíquo

Não somente o pecado é universal; ele é ubíquo. Todo aspecto da personalidade humana e da existência humana é afetado por ele:

A mente é cegada. “O deus deste século cegou o entendi-mento dos incrédulos, para que lhes não resplandeça a luz...”.5

A vontade é corrompida e incapacitada. “A maldade do homem se havia multiplicado na terra e... era continuamente mau todo desígnio do seu coração”.6 “Não quereis vir a mim para terdes vida”.7 “Ninguém pode vir a mim se o Pai, que me enviou, não o trouxer”.8

4 Mateus 22.1-65 2 Coríntios 4.46 Gênesis 6.57 João 5.408 João 6.44

22 – JUSTIFICAÇÃO E Regeneração

As emoções são confusas e pervertidas. Alguns corações ardem em constante raiva e ódio; outros são atormentados dia e noite por medos sem sentido. Multidões riem de coisas que deviam fazê-las chorar, enquanto outras se derramam em lágrimas sem razão aparente. Tais são as profundas e ubíquas perversões causadas à personalidade humana, seja direta ou in-diretamente, pelo pecado.

Irracional

O pecado é irracional. Muitos direitos de primogenitura sem preço foram trocados por um prato de sopa;9 muitos ca-samentos e famílias foram jogados de lado por uma noite de prazer ilícito. Pelo efeito temporário do uso de drogas ilegais, os maiores poderes do cérebro humano são rotineiramente e permanentemente destruídos. Um momento de reflexão sobre os pecados de nosso passado é suficiente para confirmar que nenhum deles faz o menor sentido. Tal é a insanidade das ações do filho pródigo que seu arrependimento envolveu nada me-nos que “cair em si mesmo”.10

Não existe pecado sábio.

Enganoso

O pecado é enganoso. A Bíblia fala sobre ser “endurecido pelo engano do pecado”.11 Assim como em todo engano, a víti-ma desconhece o seu estado de enganação. Ao mesmo tempo em que pensa que é “rico e abastado e não precisa de coisa al-

9 Hebreus 12.1610 Lucas 15.1711 Hebreus 3.13

Pecado: O problema final do homem – 23

guma”, o homem é, na realidade, “infeliz, sim, miserável, pobre, cego e nu”.12 Ele que “inculcando-se por sábio”, mas na realida-de tornou-se um “louco”.13

Endurecedor

Uma das coisas mais temíveis a respeito do pecado é seu poder de endurecer aquele que o pratica.14 Quanto mais fundo um homem mergulha no pecado, menos o pecado o incomoda. De acordo com a Bíblia, a própria consciência do homem se torna “cauterizada”.15 Todo pecador se encontra agora come-tendo aqueles pecados que antes desprezava, e os pecados que despreza agora, ele se encontrará cometendo algum dia. Deve-ria nos chocar a lembrança de que, um dia, Adolph Hitler foi um menino brincando com seus brinquedos, como qualquer outro menino. O homem conhece o início do pecado, mas ne-nhum homem jamais conheceu o fim do pecado.

Escravizador

O pecado escraviza aqueles que o cometem. “Todo o que comete pecado é escravo do pecado”.16 Ninguém pode se libertar a si mesmo ou escapar dos laços do pecado. O pecado “reina” sobre o pecador e monta em suas costas como um tirano até que eventualmente o atira no poço da destruição e morte.17 Se você não for cristão, você possui uma corrente em volta do seu

12 Apocalipse 3.1713 Romanos 1.2214 Hebreus 3.1315 1 Timóteo 4.216 João 8.3417 Romanos 5.21

24 – JUSTIFICAÇÃO E Regeneração

pescoço muito pior que qualquer corrente física. Você até pode conseguir abandonar um pecado específico, mas outro pecado imediatamente tomará o seu lugar — frequentemente o pecado do orgulho ou da justiça própria pelo que você imagina ter reali-zado ao mudar a si mesmo. O pecado é escravizador.

Degradante

O pecado afunda o mais distinto e mais nobre dos homens e das mulheres nas profundezas da vergonha e degradação. O jovem rapaz que antes vestia um terno fino e sentava-se em uma cadeira de couro em seu escritório agora se encontra com a bar-ba por fazer, deitado sobre o próprio vômito como resultado do pecado. A jovem moça que antes era limpa, bela e inocente agora é vulgar, sensual e suja — mais uma vez, por causa do pecado. Homens e mulheres feitos à imagem de Deus, criados para sonharem sonhos imortais e pensarem os longos pensa-mentos da eternidade, são reduzidos pelo pecado a seres que se chafurdam na lama como um porco por um reles pedaço de pão. O pecado transformou anjos em demônios;18 e transforma homens em “animais irracionais”.19 O pecado é degradante.

Pervertido

Finalmente, o pecado é pervertido.20 O pecado não é uma fri-volidade; o pecado não é “bonitinho”; o pecado não é divertido. O pecado é extremamente perverso e mau, é “sobremaneira maligno”.21 Todo pecado é depravado, feio e vil. Deveríamos nos chocar em ver 18 Mateus 25.4119 2 Pedro 2.12; Judas 1.1020 Marcos 7.20-2321 Romanos 7.13

Pecado: O problema final do homem – 25

como os homens perversos podem ser e o quão cauterizados po-demos nos tornar a tal perversidade. Nós nos acostumamos com ela! O primeiro bebê que nasceu no mundo cresceu para assassi-nar seu próprio irmão.22 E a história humana, desde então, tem sido um longo fluxo de constante guerra, concupiscência, ódio, tortura, estupro, perversão, abuso e brutalidade. É uma bênção para nós que não saibamos em detalhes os pecados que foram cometidos na noite passada em nossa própria cidade. Tal conhecimento seria por demais pervertido para alguém carregar.

Dessa maneira, precisamos admitir o fato de que o mun-do não é do jeito que é por ser habitado por algumas poucas pessoas tão más quanto Hitler; o mundo é do jeito que é por-que é composto de multidões de pessoas como você e eu! Há uma profunda perversidade em cada um de nós. Algumas vezes Deus usa coisas aparentemente “pequenas” para nos mostrar esta perversidade. Para Agostinho, não foi tanto seu estilo de vida imoral, mas o roubo despropositado das peras da árvore de um vizinho em sua juventude — não por fome, mas por es-porte — que lhe revelou a profunda depravação de seu próprio coração. O pecado, apenas pelo prazer de fazer o mal, sem qual-quer razão ou recompensa, flui de dentro do coração humano e corrompe a todos nós.

OS DOIS LADOS DO PROBLEMA DO PECADO DO HOMEM

O pecado é o problema final e, de fato, o único problema da humanidade. Mas este “problema do pecado” possui dois as-pectos distintos — um interno e outro externo.

22 Gênesis 4.8

26 – JUSTIFICAÇÃO E Regeneração

O Problema Interno — Um Coração Mau

De acordo com o Senhor Jesus Cristo, o próprio homem é corrupto e vil. “O que sai do homem, isso é o que o contami-na. Porque de dentro, do coração dos homens, é que procedem os maus desígnios, a prostituição, os furtos, os homicídios, os adultérios, a avareza, as malícias, o dolo, a lascívia, a inveja, a blas-fêmia, a soberba, a loucura. Ora, todos estes males vêm de dentro e contaminam o homem.”23 Essa é a condição de todo coração humano longe de Cristo. Se um filme, até mesmo de nossos pen-samentos passados, para não falar de nossas ações passadas, fosse projetado em um telão diante de nossa família e conhecidos, cada um de nós sairia correndo do cinema morrendo de vergo-nha. Todo não cristão é — em sua pessoa — mais repulsivo a um Deus santo do que ele jamais seria capaz de imaginar.

Mas o problema do homem com o pecado vai ainda mais fundo que isso. Suponha que, por algum milagre, um pecador pudesse se tornar uma nova pessoa e nunca mais pecasse pelo resto de sua vida. Ele ainda assim iria certamente para o infer-no. O assassino em série que sinceramente decide nunca mais matar precisa ainda assim pagar por seus crimes cometidos no passado. Em outras palavras, o problema do homem com o pe-cado possui outra dimensão além da interna. O homem não somente possui um coração mau; ele também possui um histó-rico mau aos olhos da lei de Deus.

O Problema Externo — Um Histórico Mau

Todo pecador é um fugitivo da justiça. A despeito da con-dição presente de seu coração, ele possui uma culpa objetiva, 23 Marcos 7.20-23

Pecado: O problema final do homem – 27

fora dele mesmo, aos olhos da lei de Deus. Talvez ele não tenha nenhum “sentimento de culpa”, mas ele se encontra “culpado” ou “condenado”, ainda assim. Todos os seus crimes passados clamam para que sua punição seja paga e que a justiça seja sa-tisfeita. Esse clamor encontra-se ancorado no próprio caráter e ser de Deus, em seu atributo de justiça ou equidade.

É por causa desse senso de equidade ou justiça que Deus colocou nas profundezas do coração humano que imediata-mente nos sentimos moralmente ultrajados quando se permite que o perpetrador de um crime saia sem punição. Por quê é errado que um estuprador assassino receba apenas uma multa de dez reais? Nós não podemos provar que ele merece punição pior, mas intimamente sabemos que sim. Esse conhecimento inescapável dentro de nós é algo mais fundamental e certo que qualquer “prova” teórica. É algo absolutamente básico à cons-tituição humana — um reflexo da própria natureza de Deus.

Muito poderia ser dito a respeito do atributo da justiça de Deus, especialmente nestes dias em que o próprio con-ceito de justiça parece ter se perdido na sociedade de forma geral. Há três razões básicas por que um crime deve ser pu-nido: em primeiro lugar, para a satisfação da justiça (ou seja, porque crimes merecem ser punidos e devem ser punidos); em segundo lugar, para o bem da sociedade (ou seja, para a prevenção de crimes futuros); e em terceiro lugar, para o be-nefício do ofensor (ou seja, para levá-lo a uma mudança de rumo na vida). Dessas três, a satisfação da justiça é a principal e mais fundamental que as outras duas. Se a punição de um crime não é por si própria justa e merecida, ela não deterá cri-mes futuros nem corrigirá o ofensor.

28 – JUSTIFICAÇÃO E Regeneração

Em nossos dias, a razão primária e mais fundamental para a punição — a satisfação da justiça — tem sido quase que completamente suprimida e negada. Apenas a segunda e a terceira razão permanecem, sendo que mesmo essas têm sido trocadas em ordem de importância. A “correção” do ofensor é atualmente a razão primária, e as prisões não são mais chama-das de prisões, mas de “centros de correção”. Mesmo aqueles que ainda acreditam que o crime deve ser punido pelo bem da sociedade mantêm a crença de que assassinos devem receber sua sentença não por terem cometido assassinato, mas apenas a fim de prevenir homicídios futuros.  Tal filosofia é perversa e falsa, e baseia-se na mentira de que homens e mulheres não são verdadeiramente responsáveis por suas ações.

Não é difícil de compreender como essa situação veio a se formar. Porque os homens querem eles próprios ser Deus,24 eles odeiam o pensamento de um Legislador sobe-rano a quem precisam prestar contas. Eles buscam suprimir essa verdade inescapável de que Deus está ao redor deles e dentro deles,25 afirmando o contrário, que Deus não existe.26 Essa negação da existência de Deus lhes facilita fingir que não existe tal conceito de certo e errado. Ao invés de serem pecadores culpados, homens e mulheres são vistos como víti-mas indefesas de suas circunstâncias. Em um cenário desses, a punição a fim de satisfazer a justiça torna-se impensável. O homem é livre para agir conforme lhe agrada e não responde a ninguém.

24 Gênesis 3.4-525 Romanos 1.18ss.26 Salmo 10.4; 14.1; 53.1

Pecado: O problema final do homem – 29

Mas não importa o quanto os homens tentem suprimi-la, ainda existe uma verdade indelével no coração humano de que certo e errado são reais,27 que os homens são responsáveis por suas transgressões, e que o pecado merece ser punido.28 Lá no fundo, todos os homens sabem que a balança da justiça precisa ser equi-librada no fim das contas.29 Se você não for cristão e estiver lendo essas linhas, a balança da justiça está muito desequilibrada em sua vida presente, e você pode estar certo — baseando-se no próprio ser e no caráter justo de Deus — de que se você continuar em sua condição atual, ele nunca descansará ou cederá até que você esteja no inferno. Todo o tecido moral do universo entraria em colapso caso ele não colocasse você no inferno.

É neste contexto que a Bíblia nos fala da “ira de Deus”. A ira de Deus não é uma perda temporária de autocontrole ou um ataque emocional egoísta. É o seu ódio santo e incandescen-te pelo pecado, a reação e o asco de sua natureza santa contra tudo que é mau. A ira de Deus está ligada diretamente à sua justiça. Ela tem a ver com sua determinação justa de punir todo pecado, de equilibrar a balança da justiça e endireitar tudo que está errado. É por isso que a ira de Deus “permanece” sobre todo incrédulo.30 Quanto mais o homem persiste no pecado, mais ele “acumula contra si mesmo ira para o dia da ira e da revelação do justo juízo de Deus”.31 A ira de Deus irá, afinal, ser “derramada”; ele é um juiz justo e não irá permitir que o pecado siga sem punição eternamente.

27 Romanos 2.14-1628 Romanos 1.3229 Atos 28.430 João 3.3631 Romanos 2.5

É neste ponto que encontramos o maior de todos os obstáculos imagináveis à salvação humana: Como um Juiz ab-solutamente justo e reto pode de alguma forma justificar (declarar justo) um criminoso absolutamente culpado e condenado? Como qualquer ser humano pode escapar da condenação do inferno? O próprio Deus nos diz que aquele “que justifica o perverso e o que condena o justo abomináveis são para o senhor, tanto um como o outro”.32 Suponha que um pai chegue em casa e encontre sua família assassinada. Depois de uma persegui-ção agonizante, ele consegue capturar o assassino. Quando o criminoso finalmente se apresenta diante do juiz, ele é inques-tionavelmente considerado culpado pelo crime. Mas quando chega a hora da sentença, o juiz faz a seguinte declaração: “Este

32 Provérbios 17.15

Capítulo Dois

PODE UM HOMEM SER

JUSTO DIANTE DE DEUS?

32 – JUSTIFICAÇÃO E Regeneração

homem cometeu um crime terrível, mas eu sou um juiz profun-damente amoroso e escolho declará-lo inocente. Na verdade, eu o declaro justo diante da lei”! Tal juiz seria corretamente considerado um criminoso tão grande quanto o assassino! Ele “justificou o perverso” e “é abominável para o senhor”.

Mas se isso pode ser considerado verdadeiro mesmo à luz da justiça humana, quanto mais verdadeiro não é quando trata-mos da justiça de Deus? Como os filhos perversos e culpados de Adão podem algum dia ter a esperança de se encontrarem diante de Deus, o justo Juiz do universo? Como Deus poderia de alguma forma “justificar o ímpio” sem ele próprio se tornar abominável? “O que disser ao perverso: Tu és justo; pelo povo será maldito e detestado pelas nações.”33 Como Deus pode dizer a pecadores como nós, “Tu és justo”, sem violar o seu pró-prio caráter? Como Deus pode de alguma forma salvar-nos dele próprio e de sua própria retidão e justiça?

Esse dilema criou misérias indizíveis para cada alma sensí-vel à culpa. Foi um problema terrível para o patriarca Jó. “Como pode o homem ser justo para com Deus? Se quiser contender com ele, nem a uma de mil coisas lhe poderá responder.”34 “Que é o homem, para que seja puro? E o que nasce de mulher, para ser justo? Eis que Deus não confia nem nos seus santos; nem os céus são puros aos seus olhos, quanto menos o homem, que é abominável e corrupto, que bebe a iniquidade como a água!”35 “Como, pois, seria justo o homem perante Deus, e como seria puro aquele que nasce de mulher? Eis que até a lua não tem bri-

33 Provérbios 24.2434 Jó 9.2-335 Jó 15.14-16

Pode um homem ser justo diante de Deus? – 33

lho, e as estrelas não são puras aos olhos dele. Quanto menos o homem, que é gusano, e o filho do homem, que é verme!”36

Ninguém sente a força desse dilema moral mais que o pecador arrependido. Ele sabe que merece ir para o inferno. Na esfera dos governos humanos, com alguma frequência, os criminosos se entregam às autoridades para que a justiça seja feita, ao invés de continuar vivendo com um senso insuportá-vel de culpa! Pecadores arrependidos sabem que merecem ser punidos, e que não seria justo que não o fossem. Eles sabem que Deus não pode simplesmente “varrer os seus pecados para debaixo do tapete” e simplesmente esquecê-los. Dessa forma, o clamor de seus corações é: “Como pode um Deus justo algum dia sorrir para mim? Como este fardo de culpa pode ser remo-vido? Como Deus pode pronunciar uma bênção sobre mim? Como um homem como eu pode ser justo diante de Deus”!

IMPUTAÇÃOSó existe uma única resposta para esse dilema. Alguém pre-cisa pagar pelos pecados dos pecadores. A justiça precisa ser satisfeita. Ou ela será satisfeita pelos sofrimentos do próprio pecador eternamente no inferno, ou ela terá de ser satisfeita por alguma outra pessoa no lugar do pecador.

Maravilha das maravilhas! Esse “Alguém” veio! O Senhor Jesus Cristo “carregando ele mesmo em seu corpo, sobre o ma-deiro, os nossos pecados”.37 “Certamente, ele tomou sobre si as nossas enfermidades e as nossas dores levou sobre si; e nós o reputávamos por aflito, ferido de Deus e oprimido. Mas ele foi

36 Jó 25.4-637 1 Pedro 2.24

34 – JUSTIFICAÇÃO E Regeneração

traspassado pelas nossas transgressões e moído pelas nossas ini-quidades; o castigo que nos traz a paz estava sobre ele, e pelas suas pisaduras fomos sarados.”38

Como essa grande transação acontece? Para compreen-dê-la, precisamos considerar a pequena palavra “imputar”. Ela também é traduzida como “reconhecer”, “contar”, “considerar”. Podemos começar a entender o que ela significa ao atentar para uma passagem da carta de Paulo a Filemon a respeito do retorno de seu escravo Onésimo: “Se, portanto, me consideras compa-nheiro, recebe-o, como se fosse a mim mesmo. E, se algum dano te fez ou se te deve alguma coisa, lança tudo em minha conta”.39 Aqui, Paulo instrui Filemon a “lançar em sua conta” [literal-mente, “imputar”] qualquer débito que Onésimo pudesse estar devendo a Filemon. Essa não era realmente uma dívida de Paulo, mas Paulo, por sua própria vontade, tomou para si aquele débito, e ele foi lançado em sua conta!

Agora, essa mesma palavra e suas variações são usadas para se referir a pecado. Por exemplo, a Bíblia diz que “o peca-do não é imputado (“lançado em nossa conta”), não havendo lei”.40 Novamente, em Romanos 4, Paulo diz: “Mas, ao que não trabalha, porém crê naquele que justifica o ímpio, a sua fé lhe é atribuída como justiça. E é assim também que Davi declara ser bem-aventurado o homem a quem Deus atribui (“impu-ta”) justiça, independentemente de obras: Bem-aventurados aqueles cujas iniquidades são perdoadas, e cujos pecados são cobertos; bem-aventurado o homem a quem o Senhor jamais

38 Isaías 53.4-539 Filemon 17-1840 Romanos 5.13

Pode um homem ser justo diante de Deus? – 35

imputará pecado”.41 Que transação gloriosa! Nossos pecados não são imputados a nós, porque foram imputados a Cristo, e, aceitando-os como se fossem seu próprio débito, ele os pagou completamente!

Podemos ver essa mesma realidade no conceito de “car-regar os pecados” do Antigo Testamento. No grandioso Dia da Expiação, dois bodes eram sacrificados — um derramava seu sangue para expiar os pecados,42 enquanto o outro bode (vivo) carregava esses pecados embora para um lugar solitário43: “Arão fará chegar o bode sobre o qual cair a sorte para o senhor e o oferecerá por oferta pelo pecado. Mas o bode sobre que cair a sorte para bode emissário será apresentado vivo perante o se-nhor, para fazer expiação por meio dele e enviá-lo ao deserto como bode emissário”.44 Aqui Deus utiliza dois bodes para nos ensinar uma verdade a respeito da obra expiatória do Senhor Jesus Cristo. Por um lado, ele morre por nossos pecados, e por outro — como resultado daquela morte —, ele eficazmente leva nossos pecados embora da presença de Deus.

Perceba a realidade gloriosa da imputação presente aqui! “Arão porá ambas as mãos sobre a cabeça do bode vivo e sobre ele confessará todas as iniquidades dos filhos de Israel, todas as suas transgressões e todos os seus pecados; e os porá sobre a ca-beça do bode e enviá-lo-á ao deserto, pela mão de um homem à disposição para isso. Assim, aquele bode levará sobre si todas as iniquidades deles para terra solitária; e o homem soltará o bode

41 Romanos 4.5-842 Levítico 16.1643 Levítico 16.2244 Levítico 16.9-10

36 – JUSTIFICAÇÃO E Regeneração

no deserto.”45 A pergunta que cada um de nós deveria fazer a si mesmo é a seguinte: “Será que eu já pus as mãos da fé sobre o Senhor Jesus Cristo e dei-lhe todos os meus pecados para que ele os levasse a uma terra solitária?

Nem todo o sangue de animais

Mortos sobre o judaico altar

Pode dar à consciência culpada paz,

Ou todas suas manchas lavar.

Mas Cristo, o Cordeiro celestial,

Leva todos os nossos pecados embora,

Um sacrifício de nome mais nobre

E sangue mais rico que eles.

Minha fé poria sua mão

Sobre aquela tua cabeça querida,

Enquanto como um penintente estou,

E lá confesso meu pecado.

Isaac Watts

Um substituto morreu em nosso lugar! “Todos nós an-dávamos desgarrados como ovelhas; cada um se desviava pelo caminho, mas o senhor fez cair sobre ele a iniquidade de nós todos.”46 É dessa forma que um Deus justo pode justificar cri-minosos de uma vida toda em seu tribunal celestial. Ele abre nossas contas e vê que o débito já foi imputado a seu Filho

45 Levítico 16.21-2246 Isaías 53.6

Pode um homem ser justo diante de Deus? – 37

amado. Mais do que isso, ele vê que o nosso débito foi real-mente pago por completo por ele. Aleluia! Deus, em seu grande amor,47 desenvolveu uma forma de nos salvar dele mesmo e de sua própria justiça! Ele o fez ao entregar seu único Filho para morrer em nosso lugar.

O CORAÇÃO DO EVANGELHOEssas realidades estão no próprio coração do evangelho. Elas são expostas pelo apóstolo Paulo em Romanos 3.21-26, uma passagem um tanto complexa que se torna clara à medida que compreendemos o significado da imputação discutida acima:

Mas agora, sem lei, se manifestou a justiça de Deus testemu-

nhada pela lei e pelos profetas; justiça de Deus mediante a

fé em Jesus Cristo, para todos [e sobre todos] os que creem;

porque não há distinção, pois todos pecaram e carecem da

glória de Deus, sendo justificados gratuitamente, por sua

graça, mediante a redenção que há em Cristo Jesus, a quem

Deus propôs, no seu sangue, como propiciação, mediante

a fé, para manifestar a sua justiça, por ter Deus, na sua tole-

rância, deixado impunes os pecados anteriormente cometi-

dos;  tendo em vista a manifestação da sua justiça no tempo

presente, para ele mesmo ser justo e o justificador daquele

que tem fé em Jesus.

Aqui, Paulo declara que Cristo morreu para pagar o nosso débito de pecado a fim de que Deus pudesse “justificar” pecado-res e ao mesmo tempo permanecer “justo”. Ao longo do Antigo

47 João 3.16; 1 João 4.9-10

38 – JUSTIFICAÇÃO E Regeneração

Testamento, os pecados foram meramente “deixados impunes”, o pagamento de sua culpa sendo postergado ano após ano, até que viesse o Cordeiro cuja morte os levaria verdadeiramente embora.48 Durante todo esse tempo, parece que Deus estava sendo injusto, visto que ele justificou homens (como Abraão e Davi) sem que a justiça fosse realmente satisfeita. Portanto, era necessário que Cristo morresse “publicamente”, manifes-tando abertamente a justiça de Deus para que todos a vissem, satisfazendo-a completamente na cruz pelos pecados cometi-dos. Nesse sentido, Cristo morreu não somente para justificar homens, mas para justificar Deus! Sua morte na cruz vindicou e manifestou a justiça absoluta de Deus ao justificar seu povo. Como uma “propiciação” (i.e., um sacrifício que remove a ira) pelos nossos pecados, Cristo tira de sobre nós a ira judicial de Deus. Somos “justificados gratuitamente” (a justificação é ab-solutamente de graça para nós), “mediante a redenção que há em Cristo Jesus” (a justificação custou muito caro para Deus). Somos justificados ao receber a “graça para a justificação”,49 “justiça de Deus mediante a fé em Jesus Cristo”.50

Você ainda está carregando o fardo de sua culpa e seus pecados? Você ainda está sob a ira de Deus? “Eis o Cordeiro de Deus que tira o pecado do mundo!”51 “Haverá uma fonte para remover pecado e impureza”.52 “O sangue de Jesus, seu Filho, nos purifica de todo o pecado”.53 Não importa quão terríveis

48 Hebreus 9.1549 Romanos 5.1750 Romanos 3.2251 João 1.2952 Zacarias 13.153 1 João 1.7

Pode um homem ser justo diante de Deus? – 39

sejam os seus pecados, eles não são nada comparados ao va-lor infinito do sangue de Cristo!54 “Onde abundou o pecado, superabundou a graça”.55 Venha a ele! Ele o convida e também ordena que venha; você não precisa temer estar sendo presun-çoso ao vir: “Aquele que tem sede venha, e quem quiser receba de graça a água da vida”.56 Venha a ele! Tome a água da vida! Lance seus pecados sobre ele e confie nele como quem levará seus pecados. “Crê no Senhor Jesus e serás salvo”.57

54 1 Pedro 1.18-19; Atos 20.2855 Romanos 5.2056 Apocalipse 22.17; Mateus 11.2857 Atos 16.31

Certamente, ele tomou sobre si as nossas enfermidades e as

nossas dores levou sobre si; e nós o reputávamos por aflito,

ferido de Deus e oprimido. Mas ele foi traspassado pelas

nossas transgressões e moído pelas nossas iniquidades; o

castigo que nos traz a paz estava sobre ele, e pelas suas pi-

saduras fomos sarados. Todos nós andávamos desgarrados

como ovelhas; cada um se desviava pelo caminho, mas o se-

nhor fez cair sobre ele a iniquidade de nós todos.

Isaías 53.4-6

Vimos que o maior problema do homem é o pecado. Mas esse problema do pecado possui dois aspectos: o primeiro é in-terno — o homem possui um coração mau. O segundo é externo — o homem possui um histórico mau. Dizendo isso de outra

Capítulo Três

JUSTIFICAÇÃO:SUAS

CARACTERÍSTICAS

42 – JUSTIFICAÇÃO E Regeneração

forma: para todo aquele que não é cristão, o pecado tanto o cor-rompe (o que tem a ver com aquilo que ele é) quanto o condena (o que tem a ver com aquilo que ele fez). Por um lado, o poder do pecado está reinando dentro dele; por outro lado, a punição do pecado está clamando pela morte dele. E, mesmo que ele não fosse impotente para se libertar do poder do pecado, ainda assim estaria desesperançado por conta da punição do pecado. Somente quando um homem vem a enxergar essas realidades terríveis que o nome “Jesus” passa a significar alguma coisa para ele. “E lhe po-rás o nome de Jesus [“Jeová é salvação”], porque ele salvará o seu povo dos pecados deles”.58 O Senhor Jesus Cristo salva seu povo dos pecados deles — tanto da punição por seus pecados quanto do poder de seus pecados. Ele realiza este na justificação e aquele na regeneração.

No Capítulo 2, começamos a considerar a justificação: Como um homem pode “estar justo” diante de Deus? Esse é o dilema que tem atormentado os homens ao longo da Histó-ria. Ele levou Martinho Lutero a rastejar de joelhos subindo os degraus da assim chamada Scala Sancta em Roma e levou monges a vestir camisas feitas de cabelo humano e anzóis em uma tentativa de pagar por seus pecados. Até os dias de hoje, ele leva os nativos das ilhas da Polinésia a sacrificar galinhas e aspergir seu sangue para os deuses. Em países mais “civili-zados”, muitos se contentam em “ir à igreja” ou com alguma outra forma de “boas obras” a fim de aplacar suas consciên-cias culpadas. E em todo lugar os homens estão tentando se “justificar”, racionalizando ou apresentando desculpas para seus atos perversos.

58 Mateus 1.21

Justificação: Suas características – 43

Como um homem pode ser justo diante de Deus? Existe ape-nas uma única resposta: um homem pode ser justo diante de Deus unicamente por meio da vida e morte do Senhor Jesus Cristo em seu lugar. “Carregando ele mesmo em seu corpo, sobre o madeiro, os nossos pecados.”59 “Aquele que não conhe-ceu pecado, ele o fez pecado por nós; para que, nele, fôssemos feitos justiça de Deus.”60 Somente Cristo pode nos fazer justos diante de Deus.61 Neste capítulo, consideraremos sete verdades que são ensinadas nas Escrituras a respeito desse grande tema.

A JUSTIFICAÇÃO É BASEADA NO SANGUE DE JESUS

“Logo, muito mais agora, sendo justificados pelo seu sangue, se-remos por ele salvos da ira.”62 “O sangue de Jesus, seu Filho, nos purifica de todo pecado.”63 O que significa dizer que a justifica-ção é baseada no sangue de Jesus? Significa que a justificação acontece com base no pagamento de um resgate; ela acontece com base na satisfação da justiça. Em outras palavras, quando Deus “justifica” uma pessoa, ele não está mais olhando para a própria pessoa. Ao invés disso, ele está olhando para o sangue de Cristo. Somos “justificados pelo seu sangue”! Deus não justifica um homem com base em qualquer coisa inerente ao próprio homem. Em particular, não é porque o homem é — de algu-ma maneira, forma ou modo — piedoso que Deus o justifica. Somos especificamente informados em Romanos 4.5 de que

59 1 Pedro 2.2460 2 Coríntios 5.2161 João 14.6; 1 Timóteo 2.5-6; Atos 4.1262 Romanos 5.963 1 João 1.7

44 – JUSTIFICAÇÃO E Regeneração

Deus “justifica o ímpio”! Essas palavras são verdadeiramente surpreendentes e maravilhosas. Você se sente indigno de rece-ber a justificação? Você é mesmo! Tudo a seu respeito clama por sua condenação. Longe do sangue e da justiça de Cristo, você não tem qualquer esperança.

Não há nada no homem que leve Deus a justificá-lo, incluindo seu arrependimento e fé. Arrependimento não paga pelos pecados. O remorso de um criminoso por seus crimes cometidos não satisfaz as justas demandas da lei. Da mesma forma, a fé não pode pagar pelos pecados! Somente o sangue de Jesus pode pagar pelos pecados! A Justificação é baseada no sangue de Cristo.

Será que meu zelo não conhecerá descanso,

Ou minhas lágrimas para sempre fluirão,

Tudo pelo pecado que não pode ser expiado;

Tu precisas salvar, e Tu somente.

Augustus Toplady

Isso explica porque uma pessoa pode ter uma fé muito fra-ca e ainda assim ser justificada. Imagine duas pontes cruzando um abismo: uma delas é muito fraca e duvidosa; a outra é muito forte. Um homem pode ter uma fé muito forte na ponte fraca e confiantemente passar por sobre ela. Sua fé forte não o poupará de despencar para sua própria morte. Por outro lado, um homem pode ter uma fé muito fraca na ponte forte e, apenas com muito medo e tremor, ser capaz de aventurar-se a passar por sobre ela. A ponte o manterá em segurança, a despeito de sua fraca fé. Tudo que é necessário é que ele tenha fé o suficiente para atravessar a

Justificação: Suas características – 45

ponte! Quando alguém disse a Hudson Taylor que ele deveria ser um homem de muita fé, ele respondeu: “Não, eu sou um ho-mem de fé muito pequena em um Deus muito grande”.

Quando o Anjo da Morte passou sobre o Egito na noite de Páscoa, Deus estava olhando apenas para uma coisa — o sangue nos umbrais das portas. “Quando eu vir o sangue, pas-sarei por vós.”64 Aqueles dentro das casas certamente estavam cheios de temor e tremor, mas isso não fez a menor diferença, contanto que o sangue estivesse no umbral da porta.

Em sua autobiografia Seen and Heard [Visto e Ouvido], o evangelista itinerante escocês James McKendrick nos conta da gloriosa conversão de George Mayes, conhecido por toda a região como o mais ultrajante dos pecadores. Quando, algum tempo depois, McKendrick retornou ao local onde Mayes vivia, encontrou-o, no entanto, em um estado de alma atormentado. “Já não pareço sentir-me como me sentia antes”, George lamentou. “George”, disse McKendrick, “se você tivesse um xelim em seu bolso e se sentisse maravilhosamente feliz por isso, por acaso esse xelim valeria quinze centavos apenas porque você estava se sentindo feliz?” “Não”, disse George. “Bem, quanto então o xelim valeria?” “Apenas doze centavos”, ele respondeu. “E supo-nha que você estivesse extremamente infeliz e ainda possuísse aquele xelim em seu bolso, por acaso ele valeria somente nove centavos por conta da sua infelicidade?” Novamente, George respondeu, “Não”. “Quanto valeria então?” perguntou McKen-drick. “Doze centavos”, disse George. “Bem, você é capaz de perceber que sua alegria não adiciona nada ao valor do xelim, nem sua infelicidade tira qualquer valor desse mesmo xelim, e

64 Êxodo 12.13

46 – JUSTIFICAÇÃO E Regeneração

que ele continuará valendo doze centavos independentemente de como você se sinta?” “Sim, eu creio nisso”, respondeu George. “Então, diga-me — são os seus sentimentos de felicidade ou o sangue de Cristo que afasta os seus pecados?” “Ah, é o san-gue de Cristo”, respondeu George. “Então, você não é capaz de enxergar que quando estiver feliz você não está mais seguro, e quando estiver infeliz não está menos seguro? É o sangue de Cristo que afasta os seus pecados, coloca-o em segurança e o mantém salvo ao longo do ano inteiro”, McKendrick concluiu. A respeito disso só podemos dizer, “Aleluia”!

Ouço as palavras de amor,

Contemplo o sangue,

Vejo o sacrifício poderoso,

E tenho paz com Deus.

Esta paz eterna!

Tão certa quanto o nome de Jeová;

Tão sólida quanto seu trono inabalável,

Para todo o sempre imutável.

As nuvens podem ir e vir,

E as tempestades podem varrer meu céu —

Esta amizade selada com o sangue jamais mudará;

A cruz sempre perto está.

Horatius Bonar

Cristão, você está olhando para dentro de si em busca de confiança? Assim você jamais a encontrará! Mesmo as imensas

Justificação: Suas características – 47

âncoras dos navios transatlânticos não servirão para nada se fi-carem guardadas em seus compartimentos. Elas precisam ser lançadas para fora do navio! Lance sua âncora sobre Jesus Cris-to! Coloque toda sua confiança nele! Somente a justiça dele é a sua confiança e esperança.

JUSTIFICAR SIGNIFICA “DECLARAR JUSTO”“Justificar” significa “declarar justo”; não significa “tornar justo”. Quando Deus nos justifica, ele declara que algo é verdadeiro sobre nós “no lado de fora” (i.e., “objetivamente”); Ele declara que somos justos (“retos”) à vista de sua lei. Justificação não nos torna bons por dentro. (Deus de fato nos torna bons por dentro, mas isso tem a ver com regeneração — o novo homem é “criado em justiça e retidão procedentes da verdade”65) Justi-ficação, em contraste, é uma afirmação (uma declaração) sobre nossa posição aos olhos da lei de Deus.

O fato de que a justificação é uma declaração a respeito de nossa posição pode se tornar mais claro quando considera-mos que o oposto de “justificar” é “condenar”. “Quem intentará acusação contra os eleitos de Deus? É Deus quem os justifica. Quem os condenará?”66 Quando um juiz “condena” um ho-mem, ele não muda aquilo que o homem é por dentro, mas “intenta uma acusação contra ele.” Ele o declara culpado aos olhos da lei. Igualmente, quando um juiz “justifica” um ho-mem, ele não muda aquilo que o homem é por dentro, mas apenas declara que ele é justo aos olhos da lei.

65 Efésios 4.2466 Romanos 8.33-34

48 – JUSTIFICAÇÃO E Regeneração

A JUSTIFICAÇÃO NÃO POSSUI GRADAÇÕES OU NÍVEIS

Ou um homem é 100% justo, ou está condenado. Se um as-sassino é acusado de sete homicídios, mas é condenado por apenas um, ele ainda assim é um homem condenado! Lei-tor, ainda que você tivesse que pagar apenas um pecado por conta própria, você estaria condenado ao inferno por toda a eternidade! Para o cristão já não há condenação. Nenhuma, qualquer que seja! “Agora, pois, já nenhuma condenação há para os que estão em Cristo Jesus.”67 Se você pertence a Cris-to, já está 100% justificado nele; não há nenhuma condenação para você. E a justiça que você possui aos olhos da lei de Deus não é simplesmente uma boa justiça; é a própria justiça de Cristo; é a “justiça de Deus”! “Aquele que não conheceu pe-cado, ele o fez pecado por nós; para que, nele, fôssemos feitos justiça de Deus.”68

A justificação não possui gradações! Ó, cristãos, lançai mão dessa verdade! O diabo tentará fazê-lo pensar que você está pelo menos um pouquinho condenado à vista da lei de Deus. Mas você não está! Maravilha das maravilhas! O apóstolo Pau-lo conhecia a Deus melhor do que nós, mas ele não estava nem um pouquinho mais justificado que nós! Nem mesmo o próprio Senhor Jesus era mais justificado que nós, pois sua própria justi-ça é nossa! Nossa justificação é perfeita e absoluta.

Jesus, teu sangue e justiça

Minha beleza são, minhas vestes gloriosas;

67 Romanos 8.168 2 Coríntios 5.21

Justificação: Suas características – 49

Em meio aos mundos flamejantes, assim vestido,

Com alegria levantarei minha cabeça!

Este manto imaculado parece o mesmo,

Quando a natureza arruinada afunda por anos;

Nem mesmo o tempo pode alterar sua matiz gloriosa,

O manto de Cristo está sempre novo.

Nicholas von Zinzendorf

JUSTIFICAÇÃO É MAIS DO QUE PERDÃOEm muitos governos, o presidente ou governante tem o po-der de perdoar criminosos. Isso é conhecido como “clemência executiva”. Presidentes têm sido conhecidos por perdoarem ex--presidentes, e governadores de estados têm sido conhecidos por perdoarem todos os criminosos no corredor da morte como último ato de seu governo. Algumas questões são levantadas: “Quando esses homens foram perdoados, os crimes cometidos por eles foram pagos”? A resposta é não! “Será que a sentença da lei sob ameaça foi cumprida?” Novamente, a resposta é não! “A justiça foi satisfeita?” Não! Todas essas negativas fluem do fato de que o perdão não tem como base o pagamento pelo pecado. O perdão deixa o criminoso “se livrar de uma boa”, por assim dizer. A sentença da lei nunca é cumprida. O perdão é um ato de autoridade por um governante.

Em contraste, a justificação é uma declaração de um juiz, e tem como base a justiça. Cristão, quando Deus o justifica, ele não está “deixando você se livrar de uma boa” com os seus pecados ainda pairando no ar. Ele não finge que os seus pecados já foram pagos. Em vez disso, ele vê que os seus pecados realmente já fo-ram pagos por Cristo, e então faz uma declaração baseada nesse

50 – JUSTIFICAÇÃO E Regeneração

fato. Ele faz uma declaração sobre a forma como as coisas de fato são. Se isso não fosse verdade, seria impossível a qualquer crente andar de cabeça erguida. Pense em Carol Everett, uma ex-pro-prietária de uma clínica de aborto responsável pela morte de dezenas de milhares. Pense em David Berkowitz, o famoso assas-sino em série, agora um crente em Cristo. Pense em si próprio!

A única maneira pela qual um pecador arrependido pode agora andar de cabeça erguida é saber que os seus pecados já fo-ram todos pagos! Se ele pensasse que simplesmente “se livrou de uma boa”, o pecador arrependido preferiria satisfazer a jus-tiça no inferno que viver com a culpa de seus crimes passados. Amado cristão, você pode ter memórias terríveis de seu passa-do pecaminoso, mas pode ter certeza de uma coisa: nenhum desses pecados está pairando no ar. Eles desceram… sobre o Senhor Jesus Cristo!69 E ele já pagou por todos eles! Ele levou seus pecados sobre seu próprio corpo na cruz.70

A JUSTIFICAÇÃO É TANTO POSITIVA QUANTO NEGATIVA

A justificação é tanto positiva quanto negativa. Vemos essa ver-dade claramente em Romanos 4.6-8:

E é assim também que Davi declara ser bem-aventurado o

homem a quem Deus atribui justiça, independentemente

de obras: Bem-aventurados aqueles cujas iniquidades são

perdoadas, e cujos pecados são cobertos; bem-aventurado

o homem a quem o Senhor jamais imputará pecado.

69 Isaías 53.670 1 Pedro 2.24

Justificação: Suas características – 51

Em primeiro lugar, há um aspecto negativo na justificação: Deus “não leva em consideração” nossos pecados. Nossos pe-cados foram “cobertos”, e ele “jamais imputará pecado” a nós (v. 7-8). Deus pode fazer isso somente porque nossa dívida de pecado foi imputada a Cristo e paga por ele. Aprendemos do ensinamento do Senhor Jesus Cristo que o pecado pode (de algumas formas) corretamente ser comparado a uma dívida fi-nanceira: “Perdoa-nos as nossas dívidas, assim como nós temos perdoado aos nossos devedores”.71 Cada um de nós possui uma imensa dívida com a justiça de Deus. Qual o tamanho dessa dí-vida? Em Mateus capítulo dezoito, Jesus conta uma parábola comparando nossa dívida com Deus à dívida de um homem que devia dez mil talentos ao seu rei. Isso era o equivalente a 164.000 anos de trabalho para um trabalhador comum, sem levar em consideração sábados, domingos e feriados! Nossa dívida com a justiça de Deus é verdadeiramente imensa, mas Cristo paga essa dívida pelo seu povo na cruz. Isso nos leva de volta ao zero a zero; não temos mais nenhuma dívida, mas ao mesmo tempo, não temos nenhum dinheiro na conta bancária.

Mas também há um aspecto positivo na justificação: Deus coloca sua “bênção” sobre nós “atribuindo-nos justiça” (v. 6). Em outras palavras, Cristo não somente paga nossa dívida; ele também deposita uma vasta fortuna em nossa conta bancária. Por meio de sua perfeita obediência como homem, ele compu-ta sobre nós e deposita em nossa conta uma justiça positiva aos olhos de Deus. Cristo tomou seu lugar como o “último Adão”72 e foi bem sucedido precisamente onde o primeiro Adão falhou:

71 Mateus 6.1272 1 Coríntios 15.45

52 – JUSTIFICAÇÃO E Regeneração

“Porque, como, pela desobediência de um só homem, muitos se tornaram pecadores, assim também, por meio da obediência de um só, muitos se tornarão justos”.73

Para compreender o significado disso, precisamos nos lembrar de que a Lei possui tanto um aspecto positivo quanto negativo. Por um lado, a lei ameaça que “a alma que pecar, essa morrerá”.74 Mas por outro lado, a lei promete que “aquele que observar os seus preceitos por eles viverá”.75 Essa promessa de “vida” tinha uma aplicação temporal aos judeus — enquanto obedecessem aos preceitos exteriores da Lei de Moisés, eles “viveriam” na terra que Deus havia dado a eles. Mas a promessa também possui um significado mais profundo — ela não está relacionada apenas com “vida na terra”, mas vida eterna. O Se-nhor Jesus deixou isso claro em mais de uma ocasião: “E eis que certo homem, intérprete da Lei, se levantou com o intuito de pôr Jesus à prova e disse-lhe: Mestre, que farei para herdar a vida eterna? Então, Jesus lhe perguntou: Que está escrito na Lei? Como interpretas? A isto ele respondeu: Amarás o Se-nhor, teu Deus, de todo o teu coração, de toda a tua alma, de todas as tuas forças e de todo o teu entendimento; e: Amarás o teu próximo como a ti mesmo. Então, Jesus lhe disse: Respon-deste corretamente; faze isto e viverás”.76

Da mesma forma, quando o “jovem rico” perguntou a Jesus: “Mestre, que farei eu de bom, para alcançar a vida eter-na”? Sua resposta foi, “Se queres, porém, entrar na vida, guarda os mandamentos”.77 Isso significa que aqueles que obedecem

73 Romanos 5.1974 Ezequiel 18.475 Gálatas 3.12; Levítico 18.4 76 Lucas 10.25-28 (compare Levítico 18.4)77 Mateus 19.16-17

Justificação: Suas características – 53

perfeitamente à lei podem merecer, ou ser dignos da vida eterna exercitando sua própria justiça aos olhos da lei.78 “Ora, Moisés escreveu que o homem que praticar a justiça decorrente da lei vi-verá por ela.”79 Somente uma pessoa na história humana foi capaz de fazer isso; todos os outros falharam miseravelmente. Somente o Senhor Jesus Cristo “cumpriu toda a justiça”.80 Ele não apenas pagou por nossos pecados; ele viveu uma vida de perfeita retidão que é creditada a nós, e tendo recebido o “dom” da sua justiça, temos o direito à vida!81 Não somente a maldição que cabia a nós caiu sobre ele, mas a bênção devida a ele caiu sobre nós.

Paulo expressa tanto os resultados positivos quanto os negativos da justificação em Romanos 5:1-2: “Justificados, pois, mediante a fé, temos paz com Deus por meio de nosso Senhor Jesus Cristo... e gloriamo-nos na esperança da glória de Deus.” O primeiro resultado da justificação é negativo: nós já não estamos mais debaixo de uma maldição. Temos paz com Deus — não somente paz de nossa parte, mas paz da parte de Deus. Quando um criminoso solta sua arma e se rende, o policial que o perseguia não faz a mesma coisa. Ele mantém sua arma apontada para o meliante até que ele tenha sido se-guramente encarcerado, e a justiça seja finalmente satisfeita. Somente então ele pode abaixar sua arma. A glória da justifi-cação é que Deus não é mais nosso inimigo — as demandas da justiça foram atendidas, nossos pecados foram pagos, e agora Deus pode “abaixar sua arma” no que diz respeito a nós. Ele está em paz conosco!78 Filipenses 3.979 Romanos 10.580 Mateus 3.1581 Romanos 5.17

54 – JUSTIFICAÇÃO E Regeneração

O segundo resultado da justificação é positivo: Agora mesmo podemos exultar em esperança (expectativa confiante) na glória de Deus (céu). Não somente não estamos mais debaixo de uma maldição; temos a vida eterna — agora mesmo. A vida eter-na não é algo que talvez recebamos algum dia no futuro, mas uma posse presente. “Em verdade, em verdade vos digo: quem ouve a minha palavra e crê naquele que me enviou tem a vida eterna, não entra em juízo, mas passou da morte para a vida.”82 Glória a Deus! A bênção merecida por Cristo foi dada a nós.

A JUSTIFICAÇÃO É DE UMA VEZ POR TODAS“Justificados, pois, mediante a fé, temos paz com Deus.”83 A jus-tificação é de uma vez por todas, um evento completado no passado com resultados que duram para sempre. Um homem não é primeiramente justificado, então condenado, e então justificado novamente. A justificação é de uma vez por todas. Isso significa que a justificação nos coloca em uma nova categoria, status ou posição diante de Deus. “Justificados, pois,... obtivemos igualmente acesso, pela fé, a esta graça na qual estamos firmes.”84 Os cristãos se encontram firmes em uma posição completa-mente nova, e é na graça que estão firmados.

A maravilha da justificação de uma vez por todas e de nos-sa nova posição firmes na graça pode ser ilustrada da seguinte maneira: suponha que um marido cristão se levante pela ma-nhã e seja grosseiro com sua esposa de alguma maneira, mas não perceba seu pecado até mais para o final do dia. Quando

82 João 5.2483 Romanos 5.184 Romanos 5.1-2

Justificação: Suas características – 55

percebe o que fez, pede perdão a Deus e à sua esposa. Seu com-portamento anterior foi verdadeiramente pecaminoso, ainda que ele não estivesse completamente consciente disso naquela hora. Agora suponha que este homem tenha morrido antes de perceber e confessar o seu pecado. Ele teria ido para o infer-no? Certamente não! Suas primeiras palavras de confissão ao perceber seu pecado mostram que sua posição diante de Deus tem sido uma relação de filiação o tempo todo: “Pai, perdoa-me pela minha grosseria”. Muitos concordam com essa análise, mas poucos pararam para perceber o que ela significa. E ela significa que o cristão permanece em um estado justificado mesmo durante o tempo entre o cometimento de um pecado e a confissão des-te mesmo pecado! Em outras palavras, o pecado não é imputado a ele durante o tempo entre seu cometimento e sua confissão.

Esse argumento pode ainda ser reforçado da seguinte maneira: suponha que este mesmo marido cristão levante-se pela manhã, tenha uma discussão com sua esposa e saiba que foi grosseiro com ela. Ao invés de confessar seu pecado, ele vai mal-humorado para o trabalho. Passa a manhã inteira muito aborrecido. Finalmente, não aguentando mais essa situação, ele curva sua fronte e pede perdão a Deus, em seguida liga para sua esposa e pede também o seu perdão. Suponha que esse homem tenha morrido antes de confessar o seu pecado. Ele teria ido para o inferno? Novamente, a resposta é “Certamente não!”. Afinal de contas, por que ele estaria se sentindo tão mal a manhã inteira, se não pelo fato de que ele permanece um filho de Deus com um coração renovado mesmo durante o tempo de sua rebelião?

Dizer isso é apenas afirmar que o verdadeiro cristão per-manece em um estado de justificação o tempo todo. Por quê?

56 – JUSTIFICAÇÃO E Regeneração

Porque ele possui toda uma nova condição diante de Deus. O cristão não é mais um criminoso sob a ira de Deus; ele é o filho debaixo do cuidado de um Pai amoroso.85 E, assim como qual-quer pai amoroso, às vezes Deus precisa disciplinar seus filhos, mas a disciplina é completamente diferente da punição judicial. Estritamente falando, a punição é o sofrimento infligido para a satisfação da justiça. A disciplina, por outro lado, é o sofri-mento infligido para o próprio bem do ofensor. Há uma vasta diferença entre as duas coisas!

A Justificação é de uma vez por todas. Se isso não fosse verda-de, todos nós perderíamos a salvação toda vez que cometêssemos ainda que um só pecado, e estaríamos expostos à condenação eterna até que chegássemos ao ponto de confessar aquele pecado e ser justificados (e convertidos) novamente! Essa não é a verda-deira natureza da justificação, ou mesmo da vida cristã.

A natureza de uma vez por todas da justificação é clara-mente ilustrada pelo escritor aos Hebreus:

Ora, visto que a lei tem sombra dos bens vindouros, não a

imagem real das coisas, nunca jamais pode tornar perfeitos

os ofertantes, com os mesmos sacrifícios que, ano após ano,

perpetuamente, eles oferecem. Doutra sorte, não teriam

cessado de ser oferecidos, porquanto os que prestam culto,

tendo sido purificados uma vez por todas, não mais teriam

consciência de pecados? Entretanto, nesses sacrifícios faz-

-se recordação de pecados todos os anos, porque é impos-

sível que o sangue de touros e de bodes remova pecados.86

85 Gálatas 4.4-786 Hebreus 10.1-4

Justificação: Suas características – 57

Perceba o argumento que é colocado aqui: “Sabemos que é impossível que o sangue de touros e de bodes remova os pecados, porque eles eram oferecidos todos os anos, vez após vez”. Alguém poderia responder dizendo: “O que isso prova? Eles precisavam ser oferecidos todos os anos porque novos pecados eram cometidos todos os anos. Os pecados de cada ano traziam nova condenação”. Mas, de acordo com Hebreus, esse tipo de resposta revela uma compreensão equivocada da verdadeira natureza da justificação. Quando o que presta culto é “purificado”, não há mais “consciência dos pecados”. Quando o sangue de Cristo é aplicado, somos “aperfeiçoados para sempre”! “Porque, com uma única ofer-ta, aperfeiçoou para sempre quantos estão sendo santificados. E disto nos dá testemunho também o Espírito Santo; por-quanto… acrescenta: Também de nenhum modo me lembrarei dos seus pecados e das suas iniquidades, para sempre.”87 Em ou-tras palavras, a promessa da Nova Aliança de que Deus “de modo nenhum se lembrará de nossos pecados”, significa que toda a categoria de “pecados” está para sempre longe dos olhos de Deus, no que diz respeito à lei e à satisfação da justiça. Os crentes foram “aperfeiçoados” em suas consciências,88 não tendo mais “consciência de pecados”89 no que diz respeito à ira de Deus! Nesse sentido, não há mais necessidade de uma “recordação de pecados”90 na Nova Aliança. “Ora, onde há remissão destes, já não há oferta pelo pecado.”91 “Temos sido

87 Hebreus 10.14-1788 Hebreus 9.9,13-1489 Hebreus 10.1-290 Hebreus 10.391 Hebreus 10.18

58 – JUSTIFICAÇÃO E Regeneração

santificados, mediante a oferta do corpo de Jesus Cristo, uma vez por todas.”92

O que isso tudo significa em nossa vida cotidiana? Significa que, como cristão, posso me levantar cedo pela manhã sabendo que sou aceito em Cristo. Deus se deleita em mim como seu fi-lho, e a culpa pelos meus pecados se foi para sempre. Se cometer um pecado, tenho “consciência” do meu pecado como um filho, não como um criminoso condenado, e confesso meu pecado a Deus como um filho confessa a seu pai, não como um criminoso confessa a um juiz. E, assim, entro com intrepidez no Santo dos Santos, pelo sangue de Jesus.93 “Quem intentará acusação contra os eleitos de Deus? É Deus quem os justifica. Quem os conde-nará? É Cristo Jesus quem morreu ou, antes, quem ressuscitou, o qual está à direita de Deus e também intercede por nós. Quem nos separará do amor de Cristo? Será tribulação, ou angústia, ou perseguição, ou fome, ou nudez, ou perigo, ou espada?”94

A JUSTIFICAÇÃO É RECEBIDA PELA FÉ“Justificados, pois, mediante a fé, temos paz com Deus.”95 O san-gue de Cristo é a base da justificação, mas a fé é o instrumento ou canal pelo qual recebemos o “dom da justiça”.96 “Que devo fazer para que seja salvo? Crê no Senhor Jesus e serás salvo.”97

O que é fé? Fé não é algum tipo de força ou poder que po-demos dominar para alcançar e realizar as coisas que queremos.

92 Hebreus 10.1093 Hebreus 10.19-2294 Romanos 8.33-3595 Romanos 5.196 Romanos 5.1797 Atos 16.30-31

Justificação: Suas características – 59

Igualmente, ninguém pode “liberar sua fé”, a despeito do que en-sinam alguns falsos mestres. A fé é simplesmente o oposto de tais conceitos equivocados. A justificação pela fé não é “fazer” algu-ma coisa; pelo contrário, ela é a desistência em fazer qualquer coisa e simplesmente descansar na misericórdia de Deus. Isso pode ser ilustrado pelo testemunho de uma irmã que passou por grandes tribulações antes de encontrar descanso em Cristo. Ciente de sua condição de perdida e tentando fazer tudo quanto possível para escapar do inferno, ela eventualmente se viu sem chão: “Eu me sentia como se estivesse pendurada na beira de um precipí-cio pela ponta dos meus dedos. Abaixo de mim estava o inferno. Eu não queria ir para o inferno e havia me esforçado à exaustão tentando me manter longe do inferno. Finalmente, não tive mais forças para continuar segurando. Soltei meus dedos e caí… direto nos braços amorosos de Jesus”. Isso é fé!

Perceba ainda que não somos salvos por uma fé genérica; mas somos salvos pela fé em Cristo. Algumas pessoas confiam em uma “decisão” feita no passado, mas uma “decisão” nunca poderá pagar os nossos pecados! Outras têm confiança no ba-tismo, em uma experiência emocional passada, ou mesmo em sua suposta “fé”. Certo homem idoso que não dava qualquer evidência de sua verdadeira conversão, quando perguntado se alguma vez havia sido incomodado pelo pensamento da eterni-dade, respondeu: “Não, jamais me incomodei com isso, porque a Bíblia diz que se você tem fé será salvo, e eu tenho um monte de fé”. No que esse homem estava confiando? Não era em Cris-to ou em seu sangue, mas em sua própria “fé”. A confiança de um cristão é completamente diferente. Se subitamente o chão se abrisse derrubando todos nós em um abismo nesse exato

60 – JUSTIFICAÇÃO E Regeneração

momento, cada verdadeiro cristão exclamaria: “Senhor Jesus”! Nenhum deles exclamaria: “Minha fé”!

Fé é o olho que não pode olhar para si mesmo. A fé está ocupada com seu objeto, e este objeto é o Senhor Jesus Cristo. “E do modo por que Moisés levantou a serpente no deserto, assim importa que o Filho do Homem seja levantado, para que todo o que nele crê tenha a vida eterna.”98 Aqui Jesus nos diz que a serpente na haste era na verdade uma sombra dele próprio na cruz. Como as pessoas foram salvas em relação à serpente? “Todo mordido que a mirar viverá.”99 O que, então, é crer? Crer é “olhar”! Olhe e viva! Coloque toda a sua esperança no Senhor Jesus Cristo e seja salvo.

‘Olhe e viva’, meu irmão, viva,

Olhe para Jesus agora e viva!

Está escrito em sua Palavra, Aleluia!

Basta que você ‘olhe e viva’.

W. A. Ogden

98 João 3.14-1599 Números 21.8

Já vimos que o pecado é o maior e, de fato, único problema da humanidade, e que o problema do homem com o pecado possui dois aspectos, um interno e outro externo: não somente todo filho caído de Adão possui um coração mau, mas também possui um registro negativo aos olhos da lei de Deus. O pecado tanto contamina quanto condena o homem; seu poder reina den-tro dele, e sua punição repousa sobre ele. O homem está tanto impotente quanto desesperançado — seu problema é realmente insolúvel. Nessa situação de trevas e desespero, uma grande luz brilhou.100 Jesus veio. Ele pode e irá salvar o seu povo101 tanto da punição quanto do poder de seus pecados. Ele realiza aquele na justificação, e este na regeneração.

100 Mateus 4.16101 Mateus 1.21

Capítulo Quatro

REGENERAÇÃOTUDO SE FAZ

NOVO

62 – JUSTIFICAÇÃO E Regeneração

No segundo e terceiro capítulo consideramos a grande doutrina bíblica da Justificação. Agora focaremos no tema da regeneração. A justificação acontece no céu, na corte de Deus. A regeneração, por outro lado, acontece na terra, no coração do homem. Justificação é uma declaração feita por um Juiz; rege-neração é um ato de criação feito por um Criador onipotente.

UMA PARÁBOLA UNIVERSITÁRIAEm toda faculdade e universidade, os alunos estudam muito para conseguir tirar a nota máxima no final do curso. Quando eu era estudante, fiz a mesma coisa. Mas havia uma aula que era diferente. Era uma matéria do último ano da faculdade, exi-gida apenas dos alunos do bacharelado de física e química, e havia apenas quatro ou cinco alunos na sala. No primeiro dia de aula, nosso professor nos surpreendeu com o seguinte anún-cio: “Vocês não precisam se preocupar com suas notas nesta matéria — todos já estão com dez. Agora nós podemos sim-plesmente nos tranquilizar e aproveitar a aula”.

É exatamente isso que Deus faz na justificação. Deus nos dá nota máxima logo no início da nossa vida cristã! Não temos de batalhar para merecer a vida eterna no final do ano letivo; já começamos com vida eterna.102 Agora mesmo podemos nos exultar no fato de que não passarão mais que algumas batidas do nosso coração e estaremos no céu!103

Homens religiosos, mas perdidos, costumam ter duas respostas básicas a esta doutrina. Por um lado, os legalistas a odeiam. Esse fariseu cheio de justiça própria só faz “boas

102 João 5.24103 Romanos 5.2

Regeneração: Tudo se faz novo – 63

obras” porque está tentando tirar nota máxima ao final de sua vida. Se pudesse, ele gostaria de viver em pecado, e ressente-se do fato de que não pode. Sua objeção é a seguinte: “Se Deus der aos homens vida eterna logo no início da vida cristã, o que os impedirá de continuar vivendo em pecado? Se ele der aos ho-mens nota máxima no primeiro dia de aula, ninguém estudará a matéria”.104

Por outro lado, o homem religioso sem a lei gosta da doutrina da justificação pela fé. “Bem, eu já tirei minha nota máxima! Agora posso jogar todos os meus livros na lata de lixo, ignorar o professor e viver minha própria vida.” Tais homens “transformaram em libertinagem a graça de nosso Deus”.105 Eles enxergam a “graça livre” como uma “licença para pecar”. Nesses dias de “evangelho barato”, igrejas de todo lugar estão cheias de tais pessoas não convertidas — homens perdidos que gostam de pensar de si mesmos como “crentes carnais”.

O que está errado tanto com o pensamento do legalista quanto do libertino? Por acaso Deus dá uma nota máxima logo no início do ano letivo simplesmente para nos dar a chance de matar aula e mesmo assim ficarmos com a melhor nota? Ou será que ele paga judicialmente pelos crimes de um criminoso na justificação apenas para que o criminoso continue a matar, estuprar e roubar, mas agora com imunidade da punição? Ab-solutamente não! O que Deus faz, então? Exatamente ao mesmo tempo em que nos dá nota máxima no início do nosso ano letivo, também nos muda por dentro para que amemos estudar aquela matéria! Em outras palavras, quando Deus justifica um homem,

104 Romanos 6.1105 Judas 4

64 – JUSTIFICAÇÃO E Regeneração

ele também o regenera. A regeneração é inseparável da justifi-cação, e uma nunca acontece sem a outra. E esta é a resposta de Paulo, tanto aos judeus legalistas que reivindicavam que o ensino de Paulo levaria os homens a “permanecerem em peca-do”, quanto aos libertinos que queriam usar seu ensinamento como uma oportunidade para a licenciosidade: “Que diremos, pois? Permaneceremos no pecado, para que seja a graça mais abundante? De modo nenhum! Como viveremos ainda no pe-cado, nós os que para ele morremos?”106 De acordo com Paulo, todo cristão passou por uma transformação radical que torna impossível para ele continuar em pecado. Essa transformação ocorre na regeneração. A verdadeira “graça” sempre nos educa “para que, renegadas a impiedade e as paixões mundanas, vi-vamos, no presente século, sensata, justa e piedosamente”.107 A marca invariável de todo homem que encontrou a genuína paz com Deus é que ele imediatamente começa uma jornada que vai até o fim de sua vida para conhecer e seguir o Deus que ele agora ama.108 (O homem com falsa paz, por outro lado, retorna aos seus próprios interesses egoístas tão logo se sinta seguro dos perigos do inferno.) O verdadeiro cristão jamais utilizará a graça como uma “licença para pecar”; ele naturalmente já peca mais do que gostaria!

Os cristãos realizam boas obras, então, não porque este-jam buscando merecer uma nota máxima de Deus, mas porque receberam novos corações que amam “estudar a matéria”. Isso provoca algumas questões que nos sondam: Será que leio a

106 Romanos 6.1-2107 Tito 2.11-12108 Filipenses 3.10

Regeneração: Tudo se faz novo – 65

Bíblia e oro porque é minha obrigação? Será que me sinto en-ganado por não poder correr atrás do pecado como o resto do mundo? Existe algo em mim que simplesmente ama a Deus por quem ele é e ama o que é bom apenas por ser bom? Tenho algum prazer nas coisas de Deus? A resposta a essas perguntas nos revelará muito a respeito da condição de nossas almas.

REPRESENTAÇÕES BÍBLICAS DA REGENERAÇÃOA Bíblia tem muito a dizer a respeito da regeneração. Nas pági-nas a seguir examinaremos nove representações bíblicas desse grande milagre. (Duas outras estão resumidas brevemente no Apêndice A). Cada uma delas mostra a mesma realidade glo-riosa, mas a partir de ângulos diferentes, iluminando diferentes facetas dessa realidade. Conforme consideramos as diversas representações das Escrituras a respeito da regeneração, é im-portante mantermos em mente que as coisas invisíveis que elas descrevem são tão reais quanto o mundo visível e temporal que enxergamos com nossos olhos físicos. Na verdade, o mundo invisível pode ser considerado ainda mais real que o mundo vi-sível, visto que as coisas da esfera espiritual são permanentes e eternas.109

109 2 Coríntios 4.18

O que é regeneração? De acordo com a Bíblia, é uma nova criação. Quando Deus regenera um homem, é um milagre da mesma ordem de quando Deus criou o universo!110 Na verdade, moralmente falando, é um milagre muito maior. Regeneração é um ato criativo de Deus.

TODO CRISTÃO É UMA NOVA CRIATURAE, assim, se alguém está em Cristo, é nova criatura; as coi-sas antigas já passaram; eis que se fizeram novas. Ora, tudo provém de Deus…

2 Coríntios 5.17-18

Vemos aqui que o cristão é descrito como uma nova criatu-ra. Em outras palavras, quando Deus faz o cristão, ele faz alguma 110 2 Coríntios 4.6

Capítulo Cinco

UMA NOVA CRIAÇÃO

68 – JUSTIFICAÇÃO E Regeneração

coisa nova, a partir do nada, que não existia antes! Ademais, a re-generação sempre envolve esse milagre criativo — “se alguém”, em qualquer lugar, está em Cristo, é uma nova criatura. Não há exce-ções; se alguém não é uma nova criatura, ele não está “em Cristo”! Isso não é simplesmente um quadro bonito, mas uma realidade: “As coisas antigas já passaram; eis que se fizeram novas”. “A antiga ordem já se foi, e uma nova ordem já começou.” Tudo é novo para o cristão; ele enxerga o mundo sob uma nova luz — mesmo os pedregulhos ao lado da estrada e as latinhas de cerveja nas valas!

O céu acima é de um azul mais suave,

A terra ao redor é de um verde mais doce;

Algo vive em cada tonalidade

Que olhos sem Cristo nunca viram.

G. Wade Robinson

Não temos qualquer participação em fazer esse milagre acontecer. (Algo não pode se criar por si próprio!) Deus faz todo o trabalho! “Tudo provém de Deus.” (v. 18) Que trabalho grandioso é este! A Bíblia se refere a ele como uma “criação” vez após vez.

CRIADO PARA BOAS OBRASPorque pela graça sois salvos, mediante a fé; e isto não vem

de vós; é dom de Deus; não de obras, para que ninguém se

glorie. Pois somos feitura dele, criados em Cristo Jesus para

boas obras, as quais Deus de antemão preparou para que

andássemos nelas.

Efésios 2.8-10

Uma nova criação – 69

É extremamente significativo que, quando Paulo pensa sobre salvação, nosso ser “salvo pela graça mediante a fé”, ele pensa em termos de uma obra criativa de Deus. Os cristãos são chamados especificamente de “feitura criada” de Deus. Se o nosso conceito de salvação é unicamente o de que alguém “toma uma decisão” — sai da fila daqueles que estão indo para o inferno e entra na fila dos que estão a caminho do céu — en-tão temos uma visão muito equivocada da salvação. Os cristãos foram “criados em Cristo Jesus”!

Qual a natureza dessa obra criativa? Em primeiro lugar, é “em Cristo Jesus”. Isto é, ela acontece na esfera da união com Cristo. Isso faz um paralelo com o que Paulo disse em 2 Co-ríntios 5.17, “Se alguém está em Cristo, é nova criatura.” Em segundo lugar, é para “boas obras”. O propósito desta obra cria-tiva é assegurar que as boas obras sejam o resultado final. Essas boas obras foram “preparadas de antemão” para que andás-semos nelas, e todos os cristãos de fato andam nelas, porque, como novas criaturas, foram especialmente projetados, desen-volvidos e criados por Deus para tanto!

A IGREJA É UMA NOVA CRIAÇÃOPara que dos dois criasse, em si mesmo, um novo homem,

fazendo a paz.

Efésios 2.15

A partir dessa importante passagem, aprendemos que Paulo usa a linguagem da “criação” para descrever a existência, não apenas de cristãos individualmente, mas da igreja como um todo. A igreja não é uma organização; ela é um organismo

70 – JUSTIFICAÇÃO E Regeneração

criado — uma coisa viva e uma coisa “nova”. Cristo tomou dois grupos completamente divergentes (judeus e gentios) e em “si mesmo” criou dos dois “um novo homem” — o “corpo de Cristo”. Esse corpo vivo é habitado por um único espírito — o Espírito Santo,111 e compartilha de uma vida comum — a pró-pria vida de Cristo.112

Tanto a igreja como um todo (todo o corpo de Cristo) quanto a igreja em suas manifestações locais (corpos indivi-duais de crentes) são criações miraculosas de Deus. Nenhum homem pode “começar uma igreja”; Deus precisa fazer o im-possível e criar algo do nada para que uma igreja possa existir. Ele faz isso, “criando” um número de cristãos individuais, feitos um pela virtude de sua vida comum.

O único fundamento da Igreja

é Jesus Cristo seu Senhor:

Ela é sua nova criação,

pelo Espírito e pela Palavra.

Do céu ele veio e a buscou,

para ser sua santa noiva;

Com seu próprio sangue a comprou,

e por sua vida morreu.

Samuel J. Stone

CRIADO EM JUSTIÇA E RETIDÃONo sentido de que, quanto ao trato passado, vos despojeis

do velho homem, que se corrompe segundo as concupis-

111 1 Coríntios 12.12-13112 João 15.4-5

Uma nova criação – 71

cências do engano, e vos renoveis no espírito do vosso en-

tendimento, e vos revistais do novo homem, criado segun-

do Deus, em justiça e retidão procedentes da verdade.

Efésios 4.22-24

De acordo com Paulo, não apenas a igreja, como um todo, é um “novo homem”, mas cada cristão individualmen-te é igualmente um novo homem. A coisa importante que devemos perceber aqui é que esse novo homem é descrito novamente como alguém que foi criado. Como ele é? Ele foi criado “segundo Deus, em justiça e retidão procedentes da verdade”. Essas são as características dessa “nova criatura”! Tais descrições deveriam nos dar um senso de quão real é essa obra criativa: o novo homem foi criado segundo Deus em jus-tiça e retidão! A linguagem de Paulo aqui não é a linguagem da imaginação poética, mas a linguagem da realidade concre-ta! Uma descrição paralela dessa obra criativa é encontrada em Colossenses 3.9-11:

Não mintais uns aos outros, uma vez que vos despistes do

velho homem com os seus feitos e vos revestistes do novo

homem que se refaz para o pleno conhecimento, segundo a

imagem daquele que o criou; no qual não pode haver grego

nem judeu, circuncisão nem incircuncisão, bárbaro, cita, es-

cravo, livre; porém Cristo é tudo em todos.

Mais uma vez encontramos nessa passagem a afirmação de que o novo homem já foi “criado” segundo a imagem de Deus. Portanto, como aqueles que se “revestiram do novo homem”,

72 – JUSTIFICAÇÃO E Regeneração

os cristãos são “santos e amados” (v. 12) aos olhos de Deus. Em resposta à pergunta “Quem sou eu?”, todo cristão deveria res-ponder: “Sou uma nova criatura, criada em justiça e santidade, santo e amado aos olhos de Deus”.

NADA MAIS IMPORTAPois nem a circuncisão é coisa alguma, nem a incircuncisão,

mas o ser nova criatura.

Gálatas 6.15

A partir de tudo o que foi dito nos parágrafos anteriores, não é surpreendente que Paulo considere a nova criação como algo da maior importância. Nada mais importa, exceto essa obra criativa de Deus! Nem circuncisão, nem batismo, nem qualquer outra ação humana externa ou ritual religioso é “coisa alguma” se a nova criação estiver ausente. Por outro lado, se Deus nos fez novas criaturas, a falta da circuncisão (“incircuncisão”) ou do batismo ou de qualquer outro ritual religioso também não é “coisa alguma”! A única coisa que importa para qualquer um de nós é isto: “Será que sou uma nova criatura, ou ainda sou a mesma pessoa que sempre fui?” Se sou a mesma pessoa que sempre fui, então não sou cristão, e a quantidade de vezes que vou à igreja participo das liturgias e cerimônias religiosas, “vou à frente após o apelo” ou “aceito Jesus” não significará coisa al-guma. O que é regeneração? É uma nova criação! Em resumo, é um milagre, não uma “decisão” ou algum tipo de ato humano, qualquer que seja.

Para que dos dois criasse… um novo homem.Efésios 2.15

No sentido de que… vos renoveis no espírito do vosso entendi-mento, e vos revistais do novo homem, criado segundo Deus, em justiça e retidão procedentes da verdade.

Efésios 4.22-24

Não mintais uns aos outros, uma vez que vos despistes do velho homem com os seus feitos e vos revestistes do novo homem que se refaz para o pleno conhecimento, segundo a imagem daquele que o criou; no qual não pode haver grego nem judeu, circunci-são nem incircuncisão, bárbaro, cita, escravo, livre; porém Cris-to é tudo em todos.

Colossenses 3.9-11

Capítulo Seis

UM NOVO HOMEM

74 – JUSTIFICAÇÃO E Regeneração

Conforme vimos no Capítulo 5, cada uma das passagens citadas acima é muito significativa em descrever a regeneração como um ato criativo de Deus. Mas outra faceta da regeneração também é esclarecida nessas passagens: Regeneração é a cria-ção de um novo homem.

Não somente a igreja como um todo é “um novo homem” (Efésios 2.15), mas cada cristão individualmente também é um novo homem! É muito importante perceber que, sob o pon-to de vista de Paulo, o cristão não é tanto um “velho homem” quanto um “novo homem”. Da mesma forma, ele também não possui um novo homem “vivendo dentro” dele. E nem mesmo possui tanto um velho homem quanto um novo homem viven-do dentro dele. O cristão é um novo homem.

Uma ilustração popular da experiência cristã fala do cren-te como alguém que possui tanto um “cachorro preto” quanto um “cachorro branco” vivendo dentro dele. Esses cachorros es-tão continuamente lutando um contra o outro, e “aquele que alimentarmos melhor será o que vencerá”. Tal ponto de vista pode ser sincero, mas é baseado em uma teologia muito incor-reta. O cristão não é alguém que meramente possui algo novo vivendo dentro dele que ele nunca teve antes; ele próprio é al-guém que nunca havia sido antes. O cristão é um novo homem.

“NÃO SOU EU!”Isso pode ser bem ilustrado por um relato que é contado a respeito de Agostinho de Hipona, que antes de sua conversão seguia um estilo de vida ímpio. Após sua conversão, ele foi vis-to por uma de suas antigas namoradas, que gritou chamando sua atenção: “Agostinho, Agostinho, sou eu”. “Sim”, respondeu

Um novo homem – 75

Agostinho solenemente, “mas não sou eu”! Essa deveria ser a confissão de todo cristão.

Na conversão, todo cristão recebe uma nova identidade. Saulo se torna Paulo; Simão se torna Pedro. Um dos primeiros desafios que um novo crente enfrenta ao retornar à sua família e seus antigos conhecidos é que todos insistem em chamá-lo por seu antigo nome: “Olá, Simão”. O novo convertido precisa tomar uma posição a respeito do milagre que aconteceu em sua vida e explicar, “Não mais amo as coisas que antes amei; não mais faço as coisas que antes fiz. não mais sou Simão; sou Pe-dro. Eu me tornei um novo homem”!

SEJA QUEM VOCÊ ÉO cristão é um novo homem. Essa é sua identidade essencial. E porque é um novo homem, ele é chamado a viver como um novo homem. Visto que o velho homem já foi “despido”, e o novo homem “revestido”,113 ele é exortado a crer nesse fato (ser renovado “no espírito de vosso entendimento”114) e a viver de acordo, “despojando-se do velho homem” (ou seja, de suas obras —“seu trato passado”115) e revestindo-se (na prática) “do novo homem, criado segundo Deus, em justiça e retidão pro-cedentes da verdade”.116 Esse é o método do Novo Testamento para ensinar o crescimento na graça: “Saiba quem você realmente é e, então, seja quem você é”. O chamado aos crentes não é, “Ten-te ser quem você não é”, como muitos cristãos supõem, mas sim, “Seja quem você é”! Cristão, a forma como você se enxerga 113 Colossenses 3.9-10114 Efésios 4.23115 Efésios 4.22116 Efésios 4.22,24

76 – JUSTIFICAÇÃO E Regeneração

como crente é muito importante. Se você estiver convencido de que ainda é essencialmente mau agora que se tornou cristão, então você tem adiante de si a perspectiva de toda uma vida lutando para ser algo que você não é, conforme tenta vivera vida cristã. Por outro lado, se estiver convencido de que, no próprio âmago do seu ser, você é tanto bom quanto mau, então o mau ainda possui um lugar legítimo em seu coração e sua vida. Em seu ser mais profundo, você realmente quer o mau, e dizer “Sim” a ele é, na verdade, dizer “Sim” a seus desejos mais profundos. Nenhuma dessas concepções é bíblica. A verdade essencial a respeito de cada cristão é que ele é um novo homem. No pró-prio centro de seu ser, ele foi “criado em justiça e retidão”.117 Quando ele diz “Não” para o pecado, está dizendo “Sim” para seu verdadeiro eu.

A CARNEA realidade final para todo cristão é que ele é um novo homem, mas essa não é a única realidade. Embora o cristão tenha se tor-nado uma nova pessoa no mais profundo de seu ser, ele ainda não foi completamente redimido. O pecado ainda tenta “reinar” em seu “corpo mortal”.118 Esse aspecto mais superficial da per-sonalidade do cristão é tratado no Novo Testamento como a “carne”, e será discutido nos capítulos seguintes. Por ora bas-ta dizer que a carne não representa quem o cristão “realmente é”, e que o poder da carne para reinar sobre o cristão foi que-brado.119 Quando nossos corpos mortais forem finalmente

117 Efésios 4.24118 Romanos 6.12119 Gálatas 5.16; Romanos 6.6-7

Um novo homem – 77

“redimidos”,120 todo traço de pecado remanescente será dissi-pado para sempre, e finalmente nos tornaremos perfeitamente “quem realmente somos”.

UMA NOVA IDENTIDADEA verdade a respeito da nova identidade do cristão, a despeito dos pecados remanescentes, foi ilustrada em termos de uma fábrica recém-comprada. Suponha que uma fábrica de gás ve-nenoso tenha sido comprada por uma empresa de oxigênio com o propósito de produzir o oxigênio que nos dá a vida. Tão logo a propriedade da fábrica passe para as novas mãos, sua identidade muda. Os novos proprietários colocam uma placa na frente, “Fábrica de Oxigênio”. No escritório do presidente, um novo diretor senta-se à mesa. O antigo presidente e novo presidente não compartilham o mesmo escritório nem ficam lutando um contra o outro pelo controle da companhia. O antigo presidente já se foi. Na verdade, a antiga fábrica já não existe mais. Uma fábrica de oxigênio tomou o seu lugar, ainda que leve algum tempo até que todos os equipamentos antigos tenham sido modificados para que funcionem completamente em toda a capacidade!

No momento da regeneração, cada cristão é feito radical-mente “novo” no próprio centro de seu ser. Deus coloca uma placa na frente da sua vida dizendo, “Santo”.121 É só uma ques-tão de tempo antes que essa transformação central e essencial passe a funcionar em cada faceta da experiência do crente. Um incidente na vida de Nicky Cruz, membro de uma gangue de

120 Romanos 8.23121 1 Coríntios 1.2; Efésios 5.3

78 – JUSTIFICAÇÃO E Regeneração

Nova York, ilustra a maravilha desse milagre. Famoso por sua sede de sangue e violência, a vida de Nicky foi repentinamente tocada por Deus. Em pé, em frente ao seu espelho algumas ho-ras após sua conversão — com seu revólver e sua faca ainda em sua posse — Nicky olhou para si mesmo e disse, “Então o Nick vai ser um anjo agora”! E é assim com cada cristão! Uma vez que o “novo homem” tenha sido criado, é só uma questão de tempo antes que as “armas e facas” do pecado que ainda fazem parte de nossas vidas inevitavelmente desapareçam. Aleluia!

Enquanto a justificação é uma declaração autoritativa feita por um Juiz Justo, a regeneração é um poderoso ato criativo feito por um Criador Todo Poderoso. Esse ato criativo é descrito na Bíblia em termos de realidades distintas, cada qual trazen-do diferentes facetas do que a regeneração é. Já vimos que a regeneração é descrita nas Escrituras tanto como uma nova criação quanto como um novo homem. Ela também é descrita de uma terceira maneira; ela é descrita como a entrega de um novo coração.

A PROMESSA DE UM NOVO CORAÇÃOEntão, aspergirei água pura sobre vós, e ficareis purificados;

de todas as vossas imundícias e de todos os vossos ídolos

vos purificarei.  Dar-vos-ei coração novo e porei dentro de

Capítulo Sete

UM NOVO CORAÇÃO

80 – JUSTIFICAÇÃO E Regeneração

vós espírito novo; tirarei de vós o coração de pedra e vos

darei coração de carne. Porei dentro de vós o meu Espírito e

farei que andeis nos meus estatutos, guardeis os meus juízos

e os observeis… vós sereis o meu povo, e eu serei o vosso

Deus. Livrar-vos-ei de todas as vossas imundícias… Então,

vos lembrareis dos vossos maus caminhos e dos vossos fei-

tos que não foram bons; tereis nojo de vós mesmos por cau-

sa das vossas iniquidades e das vossas abominações. Não é

por amor de vós, fique bem entendido, que eu faço isto, diz

o senhor Deus…

Ezequiel 36.25-32

Uma das promessas mais maravilhosas do evangelho é a promessa de “um coração novo e um espírito novo” (v. 26). Isso é algo que Deus “dá” (v. 26), e ele o dá para todo cristão. Em Gênesis 6.5, lemos que “a maldade do homem se havia mul-tiplicado na terra e que era continuamente mau todo desígnio do seu coração”. Novamente, é dito que “é mau o desígnio ínti-mo do homem desde a sua mocidade”.122 Em outra passagem, podemos ver que “enganoso é o coração, mais do que todas as coisas, e desesperadamente corrupto; quem o conhecerá”?123 Tais coisas não são verdadeiras a respeito do coração de um cristão! O cristão recebeu um novo coração. Ele se tornou “limpo de coração”124 e “um verdadeiro israelita, em quem não há dolo”.125 Tais afirmações não podem ser feitas a respeito daqueles cujos corações são “enganosos mais do que todas as coisas e desespe-

122 Gênesis 8.21123 Jeremias 17.9124 Mateus 5.8125 João 1.47

Um novo coração – 81

radamente corruptos!” A fim de que ninguém imaginasse que o crente possui tanto um coração velho quanto um coração novo, Deus especificamente diz, “tirarei de vós o coração de pedra e vos darei coração de carne” (v. 26). Ao invés de um coração duro, frio e insensível, o cristão possui um coração vivo, manso e ca-loroso, que é sensível às coisas de Deus.

Todos os Cristãos Vivem Vidas Transformadas

Além de dar um novo coração, Deus também promete “por dentro de nós o seu Espírito” e nos “fazer andar em seus estatutos” (v. 27). O resultado inevitável desse trabalho interno do Espírito Santo é que cada cristão “observará os juízos (man-damentos) de Deus e os guardará” (v. 28). Isso significa que é absolutamente impossível possuir um novo coração e continuar a viver em pecado.

Em nossos dias não é raro ouvir afirmações como esta: “Aquela pessoa é cristã, mas vive sua vida em desobediência a Deus”. Impossível! “Porei dentro de vós o meu Espírito e farei que andeis nos meus estatutos, guardeis os meus juízos e os observeis.”

“Aquela pessoa é cristã por tantos anos, mas nunca cresceu”. Impensável! “de todas as vossas imundícias e de todos os vos-sos ídolos vos purificarei… Livrar-vos-ei de todas as vossas imundícias”. Quando Deus “começa a boa obra em nós”,126 ele não descansa até que todo ídolo tenha sido destruído e toda imundícia tenha sido limpada de nossas vidas! Ele está deter-minado em ser o “nosso Deus”, e não nos dividirá com mais ninguém!

126 Filipenses 1.6

82 – JUSTIFICAÇÃO E Regeneração

Promessas, Não Exortações!

É muito importante perceber que as afirmações em Ezequiel 36 são promessas a respeito do que Deus fará, não exortações sobre o que os cristãos devem fazer. Essas promes-sas são incondicionais e sempre são cumpridas na vida de cada crente. Deus assegura os resultados, não o homem. Perceba no-vamente o que Deus promete nestes versos:

• “Aspergirei água pura sobre vós, e ficareis purificados.”• “De todas as vossas imundícias e de todos os vossos

ídolos vos purificarei.”• “Dar-vos-ei coração novo e porei dentro de vós espírito

novo.”• “Tirarei de vós o coração de pedra e vos darei coração

de carne.”• “Porei dentro de vós o meu Espírito e farei que an-

deis nos meus estatutos, guardeis os meus juízos e os observeis.”

• “Eu serei o vosso Deus.”• “Livrar-vos-ei de todas as vossas imundícias.”

Em resposta a tão “preciosas e mui grandes promessas”,127 todo cristão deveria levantar brados de louvores a Deus.

A NOVA ALIANÇAEis aí vêm dias, diz o senhor, em que firmarei nova aliança

com a casa de Israel e com a casa de Judá. Não conforme a

aliança que fiz com seus pais, no dia em que os tomei pela

127 2 Pedro 1.4

Um novo coração – 83

mão, para os tirar da terra do Egito; porquanto eles anula-

ram a minha aliança, não obstante eu os haver desposado,

diz o senhor. Porque esta é a aliança que firmarei com a

casa de Israel, depois daqueles dias, diz o senhor: Na men-

te, lhes imprimirei as minhas leis, também no coração lhas

inscreverei; eu serei o seu Deus, e eles serão o meu povo.

Não ensinará jamais cada um ao seu próximo, nem cada um

ao seu irmão, dizendo: Conhece ao senhor, porque todos

me conhecerão, desde o menor até ao maior deles, diz o se-

nhor. Pois perdoarei as suas iniquidades e dos seus peca-

dos jamais me lembrarei.

Jeremias 31.31-34

Essas promessas gloriosas são citadas no Novo Testa-mento a respeito da “Nova Aliança”, da qual todo cristão faz parte.128 Note que a justificação é uma das bênçãos prometi-das na Nova Aliança: “Perdoarei as suas iniquidades e dos seus pecados jamais me lembrarei” (v. 34). Mas, juntamen-te da justificação e inseparável desta, a regeneração também nos foi prometida: “Na mente, lhes imprimirei as minhas leis, também no coração lhas inscreverei” (v. 33). Justificação e re-generação estão juntas para sempre na Nova Aliança. Todos quanto desejarem usar sua suposta justificação como uma ocasião para continuar em pecado apenas estarão provando que não fazem parte da Nova Aliança. Mais uma vez vemos que Deus nunca dá a alguém a nota máxima no início de sua vida cristã sem simultaneamente dar-lhe amor pela matéria a ser estudada!

128 Hebreus 8.8-12

84 – JUSTIFICAÇÃO E Regeneração

Justiça Interna

Debaixo da Antiga Aliança, a lei havia sido escrita fora dos homens, em tábuas de pedra.129 Este sempre é o relacionamen-to entre a lei e o homem não regenerado. A lei chega a ele “pelo lado de fora” e impõe padrões que ele odeia.130 A lei diz o que ele precisa fazer, mas não lhe dá o desejo nem o poder de fazê-lo. Na melhor das hipóteses, a lei pode lhe dar uma justiça externa, como aquela que descreve a que os fariseus tinham. Jesus dis-se que eles eram como copos que haviam sido lavados apenas exteriormente — “semelhantes aos sepulcros caiados, que, por fora, se mostram belos, mas interiormente estão cheios de os-sos de mortos e de toda imundícia”.131

Em contraste, a Nova Aliança promete uma justiça interna: “Na mente, lhes imprimirei as minhas leis, também no coração lhas inscreverei”. Se pensarmos sobre isso, torna-se claro que esta é a mesma promessa encontrada em Ezequiel 36.26, a promessa de um novo coração que ama e deseja obedecer a Deus. Como o verdadeiro cristianismo é diferente da religião externa de todos os fariseus! O verdadeiro cristão segue a Deus porque possui um novo coração, um coração que possui a essência da lei de Deus — amar a Deus e ao homem132 — escrita nele!133

TRÊS GRANDES CERTEZASEles serão o meu povo, e eu serei o seu Deus. Dar-lhes-ei

um só coração e um só caminho, para que me temam todos

129 2 Coríntios 3.1-18130 Romanos 8.7131 Mateus 23.25-28132 Mateus 22.35-40133 1 Tessalonicenses 4.9

Um novo coração – 85

os dias, para seu bem e bem de seus filhos. Farei com eles

aliança eterna, segundo a qual não deixarei de lhes fazer o

bem; e porei o meu temor no seu coração, para que nunca se

apartem de mim. Alegrar-me-ei por causa deles e lhes farei

bem; plantá-los-ei firmemente nesta terra, de todo o meu

coração e de toda a minha alma.

Jeremias 32.38-41

Nesses versos Deus fala novamente da “aliança eterna” que fará com seu povo.134 As promessas dessa aliança são glo-riosas além do que as palavras podem descrever. Muito poderia ser dito sobre cada uma delas, mas preste atenção nestas em particular:

• “Dar-lhes-ei um só coração e um só caminho, para que me temam todos os dias, para seu bem.”

• “Não deixarei de lhes fazer o bem.”• “Porei o meu temor no seu coração, para que nunca se

apartem de mim.”

Todos os Cristãos Possuem Um Só Coração

Todos os cristãos possuem um só coração. Isso se torna absolutamente certo pelo fato de que Deus promete esse cora-ção como um presente: “Dar-lhes-ei um só coração.” Os cristãos não recebem uma ordem para que tenham todos um só cora-ção; eles recebem uma promessa de ter um só coração como um presente.

Todos os cristãos possuem o mesmo coração! Todos “ado-ramos a Deus no Espírito, e nos gloriamos em Cristo Jesus, e não

134 Jeremias 32.40; Hebreus 13.20

86 – JUSTIFICAÇÃO E Regeneração

confiamos na carne”.135 Todos os cristãos amam o Senhor Jesus Cristo,136 e todos amam outros cristãos.137 Esse “um só coração” explica por que dois cristãos podem se encontrar pela primei-ra vez em um avião ou ônibus e experimentar mais comunhão verdadeira um com o outro em trinta minutos do que poderiam com seus familiares incrédulos durante toda uma vida.

Todos os Cristãos Possuem Um Só Caminho

Todos os cristãos possuem um só caminho. Novamente, isso é uma promessa de Deus. Não somos informados de que todos os cristãos precisam seguir o mesmo caminho; somos in-formados de que o mesmo caminho será dado a todos eles (v. 39). Todos os cristãos estão se movendo na mesma direção — para cima e em direção a Deus. Alguns estão se movendo mais rápido que outros, e todos experimentam alguns reveses. Mas no curso geral de suas vidas, todos estão viajando pelo mesmo caminho e indo em direção ao mesmo objetivo.

Isso significa que qualquer um que viaje por um caminho di-ferente que leve a uma direção diferente simplesmente não é cristão. “Aquele que diz: Eu o conheço e não guarda os seus manda-mentos é mentiroso [e não um “crente carnal”], e nele não está a verdade”.138

Todos os Cristãos Perseveram em Santidade

Todos os cristãos perseveram em santidade até o final. Atente-se novamente para as promessas de Jeremias 32. Deus 135 Filipenses 3.3136 1 Coríntios 16.22137 1 João 3.14-15138 1 João 2.4

Um novo coração – 87

não somente prometeu que nunca nos deixaria (“não deixarei de lhes fazer o bem”); ele também prometeu realizar uma obra em nossos corações para garantir que nunca nos apartássemos dele (“e porei o meu temor no seu coração, para que nunca se apartem de mim”)! Novamente, essa é uma promessa, e é algo que Deus cumpre. No coração de cada cristão, ele coloca um te-mor santo e contínuo dele próprio que garante a sua fidelidade permanente a ele!

Essa é a verdadeira segurança bíblica, e é muito diferente do ditado superficial “uma vez salvo, salvo para sempre” que normalmente é ensinado em nossos dias. A segurança não é uma questão de “ser salvo” e, então, viver uma vida de peca-do e ainda assim ir para o céu. Nem mesmo é uma questão de ser atirado dentro de uma sala trancada na conversão e não ser mais capaz de sair dela, não importa o quanto se esmurre a por-ta tentando escapar. Não há restrições externas impedindo um cristão de retornar à sua vida antiga: “E, se, na verdade, se lem-brassem daquela de onde saíram, teriam oportunidade de voltar. Mas, agora, aspiram a uma pátria superior, isto é, celestial”.139 Você quer voltar para o mundo? Você é completamente livre para fazê-lo — ninguém o impedirá! Mas se você for cristão, voltar não é o seu desejo. Como poderia ser, uma vez que você recebeu um novo coração que ama e teme a Deus?

Dessa forma, a segurança do crente flui da própria natu-reza da Nova Aliança. O grande “defeito” da Antiga Aliança foi que “eles não continuaram” nela.140 A Nova Aliança foi es-tabelecida especificamente para remediar essa situação. E ela

139 Hebreus 11.15-16140 Hebreus 8.7-9

88 – JUSTIFICAÇÃO E Regeneração

o faz quando Deus coloca sua lei dentro de nós.141 Na Nova Aliança, Deus coloca dentro de nossos corações um amor por ele que nos leva a nos abrir para ele e ouvir atentamente suas admoestações.

Na época da Páscoa, os filhos de Israel foram alertados que ninguém deveria sair da porta de sua casa até a manhã, mas antes, deveriam permanecer sob o abrigo do sangue. O que te-ria acontecido se eles tivessem ignorado essa advertência? Eles certamente teriam perecido! Mas o fato é que eles não igno-raram a advertência! Eles tiveram medo de sair, de forma que todos permaneceram dentro de suas casas até o amanhecer, e nenhum deles pereceu. E da mesma forma acontece com todo cristão. Louvado seja o Senhor!

141 Hebreus 8.10

De acordo com a Bíblia, todo cristão é um milagre ambulante! Ele é um novo homem com um novo coração. Em poucas pa-lavras, ele é nada menos que uma nova criação por completo! Mas a “novidade” da regeneração não para por aqui. A regene-ração também é um novo nascimento.

NOVO NASCIMENTOA isto, respondeu Jesus: Em verdade, em verdade te digo que,

se alguém não nascer de novo, não pode ver o reino de Deus.

Perguntou-lhe Nicodemos: Como pode um homem nascer,

sendo velho? Pode, porventura, voltar ao ventre materno e

nascer segunda vez? Respondeu Jesus: Em verdade, em ver-

dade te digo: quem não nascer da água e do Espírito não pode

entrar no reino de Deus. O que é nascido da carne é carne; e

Capítulo Oito

UM NOVO NASCIMENTO

90 – JUSTIFICAÇÃO E Regeneração

o que é nascido do Espírito é espírito. Não te admires de eu te

dizer: importa-vos nascer de novo. O vento sopra onde quer,

ouves a sua voz, mas não sabes donde vem, nem para onde

vai; assim é todo o que é nascido do Espírito.

João 3.3-8

Nessa parte da Escritura, encontramos algumas das pala-vras mais maravilhosas e instrutivas jamais faladas pelo Senhor Jesus Cristo. É aqui que aprendemos que se tornar um cristão é, na verdade, “nascer” uma segunda vez! Ao descrever a re-generação nesses termos, nosso Senhor chama atenção para diversos aspectos importantes dela.

O NOVO NASCIMENTO É RADICALNada poderia ter um alcance maior ou ter mais implicações para nós pessoalmente que a nossa concepção e nascimento! Quando somos concebidos e nascemos, passamos a existir e a viver na esfera do mundo natural, e nada mais será o mesmo no-vamente — para sempre! E da mesma forma acontece na esfera espiritual: Quando “nascemos de novo”, passamos a existir e a viver no mundo espiritual, e para toda a eternidade nada mais será o mesmo novamente! Aleluia!

“Nascer de novo” é começar a existir. Em resumo, o novo nascimento não é algo adicionado às nossas vidas; é a própria vida! Nós começamos a viver! Dizendo isso de outra forma, nascer de novo não é receber alguma coisa que não pos-suíamos antes; é se tornar alguém que nunca havíamos sido antes. O novo nascimento está na raiz de nossa própria exis-tência como cristãos.

Um novo nascimento – 91

O NOVO NASCIMENTO É REALO novo nascimento não é como um nascimento; ele é um nasci-mento! Atente-se para as palavras de nosso Senhor no verso 6: “O que é nascido da carne é carne; e o que é nascido do Espírito é espírito”. O novo nascimento é um nascimento verdadeiro. As-sim como algo carnal é nascido no nascimento físico, de igual modo, algo espiritual é nascido em um nascimento espiritual! “O que é nascido… é espírito.”

Nesse nascimento, é Deus quem nos gera; somos “nasci-dos de Deus”. “Todo aquele que é nascido de Deus não vive na prática de pecado; pois o que permanece nele é a divina semente; ora, esse não pode viver pecando, porque é nascido de Deus.”142 João nos informa que a “semente” [grego: sperma] de Deus per-manece naqueles que foram nascidos de Deus. Nas palavras de Pedro, tornamo-nos “coparticipantes da natureza divina”.143 Tal terminologia é tão explícita que não ousaríamos usá-la a não ser pelo fato de ser o ensino direto da Palavra de Deus.

A realidade do novo nascimento possui implicações tremendas: em primeiro lugar, ela nos mostra por que um verdadeiro cristão não vive em pecado. João nos informa no verso citado acima que um cristão “não pode viver pecando”. (Veja Apêndice B.) A razão pela qual o cristão não pode viver pecando é encontrada em seu novo nascimento e na natureza divina que habita dentro dele: “Todo aquele que é nascido de Deus não vive na prática de pecado; pois o que permanece nele é a divina semente; ora, esse não pode viver pecando, porque é nascido de Deus”. O cristão possui a natureza de Deus nele e,

142 1 João 3.9143 2 Pedro 1.4

92 – JUSTIFICAÇÃO E Regeneração

portanto, não consegue tolerar viver da mesma forma que vivia antes. Qualquer verdadeiro crente que tente retornar aos seus antigos caminhos irá, em última análise, se encontrar incapaz de fazê-lo. O pecado vai contra sua própria natureza; ele o odeia.

Em segundo lugar, aprendemos a partir da realidade do novo nascimento a forma como todo verdadeiro cristão deve-ria se enxergar (i.e., pensar de si mesmo). O cristão não é mais um pecador,144 mas um santo.145 Novamente, isso não significa que o cristão nunca peque, ou que o pecado não seja sedutor à sua carne, mas sim que sua verdadeira natureza — o que ele verdadeiramente é lá no fundo — ama a Deus e a santidade. Um fato que torna óbvio o quanto isso é verdade é o de que todo verdadeiro cristão sente-se miserável e profundamente entristecido quando peca. Por qu ele se sente tão miserável? Precisamente porque sua verdadeira natureza ama a santidade!

Amado santo! Não permita que o diabo lhe diga que você não tem valor e é um cristão vil. Você é um filho de Deus — “santo e amado”146 aos olhos do Senhor! Sua própria natureza (“semente”) está dentro de você, e você carrega consigo os tra-ços da família! O novo nascimento é um nascimento real.

O NOVO NASCIMENTO É SOBERANOO novo nascimento depende, em última instância, da vontade de Deus, não do homem. Todos que foram nascidos de novo “não nasceram do sangue, nem da vontade da carne, nem da vontade do homem, mas de Deus”.147 O Senhor Jesus deixa isso 144 Lucas 6.32-34145 1 Coríntios 1.2; Efésios 5.3146 Colossenses 3.12147 João 1.13

Um novo nascimento – 93

muito claro no verso 8: “O vento [grego: pneuma: vento, Espí-rito, sopro] sopra onde quer”.

O vento sopra onde quer. Nenhum homem pode direcio-ná-lo, controlá-lo ou fazê-lo parar de soprar. Da mesma forma, o Espírito de Deus sopra onde quer. Isso significa que mesmo a pessoa mais improvável pode ser salva. Nem o coração mais endurecido ou o desejo mais teimoso pode impedir o vento de soprar. Se houve uma pessoa que a igreja primitiva sabia que não poderia ser convertida, essa pessoa era Saulo de Tarso. Mas as coisas que são impossíveis para o homem são possíveis para Deus!148 Uma rajada de vento do Espírito de Deus, e o homem que anteriormente andava “respirando ainda ameaças e mor-te”149 contra os crentes agora era um manso e humilde discípulo de Cristo perguntando: “Que farei, Senhor?”150

O novo nascimento é sempre uma obra soberana de Deus: “assim é todo que é nascido do Espírito”. Por que eu sou cristão e meu vizinho não é? Há somente duas possibilidades: ou a ex-plicação está no homem (“eu fui mais responsivo; meu coração não ficou tão endurecido; eu busquei a Deus por minha própria iniciativa”), ou a explicação está em Deus (“Ele escolheu ‘soprar’ seu Espírito, quebrantar meu coração endurecido e me tornar responsivo ao seu chamado”). A Bíblia deixa muito claro que a segunda alternativa é a correta: “Assim, pois, não depende de quem quer ou de quem corre, mas de usar Deus a sua misericór-dia”.151 Em nosso estado natural, “não há quem entenda, não há

148 Lucas 18.27149 Atos 9.1150 Atos 22.10151 Romanos 9.16

94 – JUSTIFICAÇÃO E Regeneração

quem busque a Deus”.152 “Mas Deus, sendo rico em misericór-dia, por causa do grande amor com que nos amou, e estando nós mortos em nossos delitos, nos deu vida juntamente com Cris-to.”153 Assim como o “vale de ossos secos” de Ezequiel, Deus fez com que o “espírito entrasse em nós para que vivêssemos”.154

A única razão pela qual qualquer um de nós é cristão é que o Vento de Deus soberanamente soprou em nossos corações. Eu não fazia a menor ideia, quando acordei no dia da minha conversão, que pela hora de me deitar eu seria uma nova cria-tura em Cristo Jesus! Eu não estava “buscando a Deus”; Deus não estava em meus pensamentos; não havia “temor de Deus diante dos meus olhos”.155 Mas, no fim do dia, um milagre havia acontecido, e fui para a cama naquela noite cheio da paz que “excede todo entendimento”156 e da “alegria indizível e cheia de glória”.157 O vento sopra onde quer! Aleluia!

O NOVO NASCIMENTO É CONHECIDOA obra do Espírito Santo na regeneração é sempre conhecida: “O vento sopra onde quer, ouves a sua voz” (v.8). O vento sem-pre possui movimento, vida, energia, som. Esse movimento pode vir na forma de um poderoso temporal que destrói tudo em seu caminho, ou pode vir na forma de uma brisa gentil que faz uma folha balançar suavemente num galho, mas sempre há mo-vimento. Se não houver movimento, não há vento.

152 Romanos 3.11153 Efésios 2.4-5154 Ezequiel 37.1-10155 Romanos 3.18156 Filipenses 4.7157 1 Pedro 1.8

Um novo nascimento – 95

Quem pode ver o vento?

Nem eu nem você:

Mas quando as folhas tremulam

O vento está passando por elas.

Quem pode ver o vento?

Nem eu nem você:

Mas quando as árvores se dobram ao chão

O vento está passando por elas.

Christina Rossetti

Assim é com o Espírito. O movimento do Espírito de Deus é evidenciado pelos efeitos que produz. Algumas vezes o Espírito Santo vem como um temporal poderoso varrendo três mil para dentro do reino em um só dia.158 Outras vezes vem como uma brisa gentil abrindo o coração de uma única pessoa a responder ao evangelho.159 Mas o mover do Espírito de Deus é sempre co-nhecido: “assim é todo que é nascido do Espírito”. Os efeitos da atividade divina são visíveis na vida de todo verdadeiro cristão.

O NOVO NASCIMENTO É MISTERIOSOO novo nascimento é misterioso: “não sabes donde vem, nem para onde vai” (v.8). Novamente, esse elemento de mistério está invariavelmente presente no novo nascimento: “assim é todo que é nascido do Espírito”!

Isso é uma coisa muito maravilhosa: Nós “não sabemos” quem pode ser o próximo! O Espírito Santo é uma Pessoa, e

158 Atos 2.37-41159 Atos 16.14

96 – JUSTIFICAÇÃO E Regeneração

não podemos predizer como ele trabalhará. Ele pode salvar uma alma, ou pode salvar três mil. Aqueles que mercadejam o evangelho pelo “evangelismo de telefone” afirmam serem ca-pazes de predizer com extrema precisão quantas “decisões por Cristo” serão obtidas. Tal predictabilidade prova apenas uma coisa: Aqueles “convertidos” são nada mais que produtos da psicologia aplicada; eles não são a obra do Espírito de Deus! O novo nascimento é misterioso!

Acautelai-vos dos falsos profetas, que se vos apresentam

disfarçados em ovelhas, mas por dentro são lobos roubado-

res. Pelos seus frutos os conhecereis. Colhem-se, porventu-

ra, uvas dos espinheiros ou figos dos abrolhos? Assim, toda

árvore boa produz bons frutos, porém a árvore má produz

frutos maus. Não pode a árvore boa produzir frutos maus,

nem a árvore má produzir frutos bons. Toda árvore que não

produz bom fruto é cortada e lançada ao fogo. Assim, pois,

pelos seus frutos os conhecereis.

Mateus 7.15-20

De acordo com esses versos, a regeneração não é somente um novo nascimento, mas é também o recebimento de uma nova natureza. É significativo que a palavra “natureza” nunca seja uti-

Capítulo Nove

UMA NOVA NATUREZA

98 – JUSTIFICAÇÃO E Regeneração

lizada nessa passagem, embora o conceito esteja evidente. Isso ocorre porque nossa “natureza” não é algo que “temos”, mas uma descrição daquilo que somos. O conceito correto de uma “natureza” é, desta forma, visto nas palavras de nosso Senhor a respeito dos dois tipos de árvores — árvores boas e árvores más. Essas simples palavras estão cheias de instrução gloriosa a respeito das realidades da regeneração. Quatro grandes verda-des de amplo alcance são imediatamente evidentes aqui:

HÁ SOMENTE DOIS TIPOS DE ÁRVORESDe acordo com o Senhor Jesus Cristo, uma árvore só pode ser “boa” ou “má”. Todo homem é um “espinheiro” ou uma “vi-deira”, uma “figueira” ou um “abrolho”. Não existe um grupo “intermediário” — metade figueira e metade abrolho. Nem mesmo podemos encontrar nesses versos qualquer tipo de ár-vore “híbrida”. Que uma árvore pudesse ter “duas naturezas” ao mesmo tempo é tão impossível quanto uma árvore que fos-se tanto um espinheiro quanto uma videira simultaneamente! Todo homem só pode ser um ou o outro.

AS ÁRVORES FRUTIFICAM DE ACORDO COM SUA NATUREZA

“Assim, toda árvore boa produz bons frutos, porém a árvore má produz frutos maus” (v.17). Em outras palavras, o tipo de fruto flui do tipo (“natureza”) de árvore. Videiras produzem uvas; es-pinheiros produzem espinhos. Perceba o modo absoluto com que nosso Senhor faz esta afirmação: “Toda árvore boa produz bons frutos”. Amado leitor, não deixe que ninguém o engane com palavras vazias160 e não se autoengane pensando que “algumas 160 Efésios 5.5-6

Uma nova natureza – 99

árvores boas produzem frutos maus”. De acordo com o Senhor Jesus Cristo isso nunca acontece! Embora o cristão ainda peque e caia de muitas maneiras,161 sua vida é inevitavelmente carac-terizada pelos bons frutos,162 e não por “espinhos e abrolhos”.163 E para que não houvesse qualquer sombra de dúvida sobre este ponto, o Senhor o reafirma ainda mais enfática e especi-ficamente no verso 18: “Não pode a árvore boa produzir frutos maus, nem a árvore má produzir frutos bons”.

Assim como a árvore boa não pode produzir frutos maus, da mesma forma aprendemos a partir da segunda metade do ver-so 18 que não é possível a um homem não regenerado produzir frutos bons. Você até pode amarrar uma maçã externamente em um espinheiro, mas elas não podem ser produzidas pelo espinhei-ro. Elas não podem fluir naturalmente daquilo que o espinheiro é em sua própria essência. No verso 19 aprendemos qual o destino de cada árvore que não produz bom fruto: “Toda árvore que não produz bom fruto é cortada e lançada ao fogo”.

O FRUTO DE UMA ÁRVORE REVELA SUA NATUREZA

O fruto de uma árvore não faz da árvore o que ela é; ele apenas revela o que a árvore é. O Senhor Jesus apresenta esse princípio geral em sua admoestação a respeito dos falsos profetas, “Pelos seus frutos os conhecereis” (v. 16). Então ele prossegue ensi-nando sobre as “árvores boas” e as “árvores más”, e conclui o pensamento repetindo essa grande verdade no verso 20: “As-sim, pois, pelos seus frutos os conhecereis”.161 Tiago 3.2162 João 15.16163 Hebreus 6.8

100 – JUSTIFICAÇÃO E Regeneração

O fruto de uma árvore não faz da árvore o que ela é: Nin-guém se torna uma videira ao tentar produzir uvas! Apenas um milagre da parte de Deus pode nos transformar naquilo que não somos! Pelo contrário, o fruto de uma árvore apenas revela o que a árvore é: a produção de uvas é a evidência de que esse milagre de Deus já aconteceu.

Esse princípio é muito bem ilustrado pelas palavras do nosso Senhor aos judeus em João 8.47: “Quem é de Deus ouve as palavras de Deus; por isso, não me dais ouvidos, porque não sois de Deus”. Perceba novamente que o fruto de uma árvore não faz dela o que ela é, mas ao invés disso, apenas revela o que ela é. Muitos pensam que é nossa resposta às “palavras de Deus” que nos tornam uma pessoa “de Deus”. Jesus afirma o oposto. Porque somos “de Deus”, respondemos apropriadamente às “palavras de Deus”. A mesma verdade é vista em João 10.26-27: “Mas vós não credes, porque não sois das minhas ovelhas. As minhas ovelhas ouvem a minha voz; eu as conheço, e elas me seguem”. Mais uma vez nosso Senhor deixa claro que os ho-mens não se tornam ovelhas ao crerem, como muitos supõem, mas que eles creem porque são ovelhas! Milagre glorioso! A regeneração é o recebimento de uma nova natureza!

ÁRVORES MÁS PODEM SER CONHECIDASAo contrário da opinião popular, é possível distinguir entre fal-sos e verdadeiros crentes. O Senhor Jesus Cristo nos dá essa certeza duas vezes nos versos citados acima: “Os conhecereis” (v.16). “Assim, pois, os conhecereis” (v.20). Para a pergunta, “Como os conheceremos?”, a resposta do nosso Senhor é sim-ples e inequívoca: “Pelos seus frutos”.

Isso não significa que podemos entrar em uma reunião de cristãos e em cinco minutos saber quem são todos os verda-

Uma nova natureza – 101

deiros crentes. Muitas vezes aqueles que parecem ser fortes e genuínos por um tempo, posteriormente caem. Da mesma for-ma, aqueles cujas conversões inicialmente parecem ser muito fracas e questionáveis são muitas vezes achados vinte anos de-pois firmes e fortes, e ainda caminhando com Deus. O tempo testa a genuinidade de cada profissão de fé. No entanto, perma-nece o fato de que mais cedo ou mais tarde — e muitas vezes mais cedo — o verdadeiro estado de alguém que falsamente professa fé em Cristo se tornará conhecido: “E, quando a erva cresceu e produziu fruto, apareceu também o joio”.164

Um dos primeiros versos citados em qualquer discussão a respeito da verdadeira conversão é, “Não julgueis, para que não se-jais julgados” (Mateus 7.1). Raramente a pessoa citando esse verso percebe que ele foi falado pelo Senhor apenas uns poucos versos antes de suas afirmações sobre conhecer os homens por seus fru-tos (v. 16). O mandamento para não “julgar”, portanto, não pode ser um mandamento para não “discernir”. Na verdade, nosso Se-nhor nos adverte no verso 6, “Não deis aos cães o que é santo, nem lanceis ante os porcos as vossas pérolas”. Como podemos saber quem são esses “cães” e “porcos” se não “julgarmos” no sentido de discernimos? Na verdade, o Senhor Jesus nos ordena julgar, ainda que “não segundo a aparência”, mas “pela reta justiça”.165

ÁRVORES BOAS SÃO REPRESENTANTES DO HOMEM

Ou fazei a árvore boa e o seu fruto bom ou a árvore má e o

seu fruto mau; porque pelo fruto se conhece a árvore. Raça

164 Mateus 13.26165 João 7.24

102 – JUSTIFICAÇÃO E Regeneração

de víboras, como podeis falar coisas boas, sendo maus? Por-

que a boca fala do que está cheio o coração. O homem bom

tira do tesouro bom coisas boas; mas o homem mau do mau

tesouro tira coisas más.

Mateus 12.33-35

Nesses versos, as quatro maiores verdades de Mateus 7.15-20 são repetidas pelo Senhor Jesus utilizando uma termi-nologia ligeiramente diferente. Além disso, uma quinta grande verdade que está implícita em Mateus 7 encontra sua plena expressão aqui: de acordo com o Senhor Jesus Cristo, é teo-logicamente apropriado falar de alguns homens como “bons” e outros como sendo “maus”.

Cristão, você se considera um “homem bom”? Claro que é verdade que longe de Cristo nenhum de nós possui qualquer bondade que seja. Nesse sentido, “Ninguém é bom senão um, que é Deus”.166 Mas, amado, não estamos longes de Cristo! A Bíblia descreve Barnabé como um “homem bom, cheio do Es-pírito Santo e de fé”.167 E Paulo fala dos cristãos romanos como “possuídos de bondade”.168 Se nossa teologia não permite es-paço para esse tipo de linguagem, então não é uma teologia bíblica. Deus realizou um milagre no coração de cada cristão! A regeneração é o recebimento de uma nova (e boa!) natureza.

166 Marcos 10.18167 Atos 11.24168 Romanos 15.14

Que diremos, pois? Permaneceremos no pecado, para que seja

a graça mais abundante? De modo nenhum! Como viveremos

ainda no pecado, nós os que para ele morremos? Ou, porven-

tura, ignorais que todos nós que fomos batizados em Cristo

Jesus fomos batizados na sua morte? Fomos, pois, sepultados

com ele na morte pelo batismo; para que, como Cristo foi res-

suscitado dentre os mortos pela glória do Pai, assim também

andemos nós em novidade de vida. Porque, se fomos unidos

com ele na semelhança da sua morte, certamente, o seremos

também na semelhança da sua ressurreição, sabendo isto: que

foi crucificado com ele o nosso velho homem, para que o cor-

po do pecado seja destruído, e não sirvamos o pecado como

escravos; porquanto quem morreu está justificado do pecado.

Romanos 6.1-7

Capítulo Dez

CRUCIFICAÇÃO E RESSURREIÇÃO

104 – JUSTIFICAÇÃO E Regeneração

Logo, já não sou eu quem vive, mas Cristo vive em mim; e

esse viver que, agora, tenho na carne, vivo pela fé no Filho

de Deus, que me amou e a si mesmo se entregou por mim.

Gálatas 2.20

Muitos leram esses versos e tentaram “imaginar” que eles próprios estavam sendo crucificados em uma cruz dois mil anos atrás. Outros falam de uma verdade “posicional” — um tipo de mundo sombrio de faz de conta onde as coisas que não são realmente verdade tornam-se verdade “posicionalmente”. Mas é somente quando passamos a ver que esses versos estão se referindo à realidade concreta do que acontece na regenera-ção que eles terão algum significado real para nós.

É verdade que todo benefício que o crente recebe foi com-prado dois mil anos atrás no Calvário quando Jesus morreu e ressuscitou como nosso representante. Mas esses benefícios se tornam nossos na realidade e na experiência somente quando nos unimos a Cristo na regeneração. Que Paulo está falando da regeneração em Romanos 6 torna-se claro quando ele se refe-re aos crentes como aqueles que foram “ressurretos dentre os mortos” (v. 13) e como aqueles que agora andam em “novida-de de vida” (v. 4). O mesmo pode ser dito a respeito de Gálatas 2.20. Foi no momento da regeneração de Paulo que o velho Sau-lo “não mais vivia” e Cristo começou a “viver” no novo Paulo.

Perceba que, de acordo com Romanos 6.2-7, todos os crentes foram crucificados, sepultados e ressuscitados com Cristo pela virtude de sua união com ele. A crucificação com Cristo acontece no momento de nossa regeneração. Não é um estado avançado de espiritualidade a ser buscado poste-

Crucificação e ressurreição – 105

riormente, mas uma realidade completa com a qual podemos contar (v. 6). Todo verdadeiro cristão pode dizer juntamente com Paulo, “Estou crucificado com Cristo; logo, já não sou eu quem vive, mas Cristo vive em mim”.

CRUCIFICAÇÃO E RESSURREIÇÃOO que é regeneração? É o novo nascimento de um novo homem que é uma nova criação com um novo coração e uma nova natu-reza! Mas é mais que isso: é a crucificação, morte e sepultamento de nosso velho eu (a pessoa que antes éramos em Adão) e a res-surreição de nosso novo eu (a pessoa que agora somos em Cristo) para que “andemos em novidade de vida”.

Cristão, o que significa que seu “velho homem” foi cruci-ficado, morto e sepultado? Significa que seu velho “você” — a pessoa que você já foi um dia — se foi para sempre. Você nunca mais será aquela pessoa. A maioria dos que leem essas linhas nunca conheceram o velho Charles Leiter, e sou grato porque vocês jamais o conhecerão, porque aquela pessoa morreu e se foi para todo o sempre! Glória a Deus! O cristão é um novo homem. Por meio de sua união com o Cristo ressurreto, ele foi “ressurreto dentre os mortos”,169 e porque ele vive, agora pode andar em novidade de vida!

Ao contrário do que normalmente é ensinado, a Bíblia nunca retrata nosso velho homem como se ainda estivesse vivo — quer seja esperneando e lutando na cruz ou se escondendo em algum lugar dentro de nós. O velho homem está morto, se-pultado e nunca mais voltará. “Estou crucificado com Cristo (meu velho eu, a pessoa que fui um dia); logo, já não sou eu quem vive”.

169 Romanos 6.13

106 – JUSTIFICAÇÃO E Regeneração

À luz desses fatos, imediatamente surge a seguinte questão: “Se isso tudo é verdade, por que ainda tenho tantos problemas com o pecado?” A Bíblia responde essa pergunta, não em termos de o “velho homem” que se foi para sempre, mas em termos da “carne” que ainda está presente em nós. O cristão enfrenta uma batalha constante com o pecado porque há um aspecto de sua personalidade que ainda não foi redimi-do — a carne. A carne é o corpo físico não redimido visto como o lugar onde o pecado ainda tenta se afirmar. O pecado ainda tenta “reinar” no “corpo mortal” do cristão.170

O Novo Testamento se refere à carne como o nosso “corpo do pecado”,171 “o corpo desta morte”172 e nosso “corpo mortal”.173 Neste contexto, o pecado (todos os pecados, mes-mo os pecados “mentais”) podem ser descritos como “feitos do corpo”174 e os cristãos são exortados a “mortificarem” (fa-zer morrer) os “membros de seu corpo ao pecado”!175 Isso não significa que o próprio corpo em si mesmo seja pecaminoso. Paulo faz essa afirmação maravilhosa em 1 Coríntios 6 de que o corpo é “para o Senhor, e o Senhor, para o corpo”.176 Isso é exa-tamente o oposto da ideia grega de que o corpo é a “prisão da alma”. Contudo, a Bíblia claramente representa o corpo mortal não redimido como o lugar onde o pecado ainda tenta reinar.

Como cristãos, ainda estamos aguardando pela redenção de nossos corpos177 na vinda do Senhor. Quando isso acontecer,

170 Romanos 6.12171 Romanos 6.6172 Romanos 7.24173 Romanos 6.12174 Romanos 8.13175 Colossenses 3.5; Romanos 6.13176 1 Coríntios 6.13177 Romanos 8.23

Crucificação e ressurreição – 107

estaremos completamente livres de todo o pecado. Mas no meio tempo, há duas verdades extremamente importantes que preci-samos compreender.

UMA NOVA IDENTIDADEA primeira delas é que nós temos uma nova identidade. Como cristãos, fomos vivificados dentre os mortos, ressuscitados para andar em novidade de vida. É isso que realmente somos, e é assim que seremos daqui dez mil anos! A carne não é quem realmente somos. É apenas um aspecto superficial e temporá-rio de nossa personalidade como um todo, e inclusive já foi condenada como algo que passará. Em pouco tempo, nossos corpos serão redimidos, e os obstáculos da carne serão remo-vidos para sempre.

O fato de que fomos “ressuscitados dentre os mortos” geralmente se faz sentir como uma realidade para nós em nossa conversão. No entanto, conforme o tempo vai passando e co-meçamos a perceber quanto mal ainda reside em nossa carne e como falhamos miseravelmente como cristãos, é comum que passemos a perder esse senso de “novidade”. Então, nada é ruim o suficiente para descrevermos a nós mesmos — somos “vis”, “miseráveis”, “desgraçados”. Claro que em um estado desses, é absolutamente impossível para nós nos “apresentarmos diante de Deus” com qualquer grau de alegria ou confiança: “Senhor, alegremente me apresento diante de ti — esse monte de de-pravação miserável e vil que sou — para servi-lo com alegria e confiança hoje”. Nunca! Nós jamais poderemos nos apresentar alegremente diante de Deus enquanto tivermos tal conceito a nosso próprio respeito. Mas essa não é a visão de Paulo de qual-

108 – JUSTIFICAÇÃO E Regeneração

quer cristão! Pelo contrário, Paulo nos exorta a nos oferecermos “a Deus, como ressurretos dentre os mortos, e os vossos membros, a Deus, como instrumentos de justiça”.178 Cristão, você é tão “novo” hoje e tão “ressuscitado dentre os mortos” quanto era no dia da sua conversão! A perversidade de sua carne está qua-se que além de qualquer descrição, mas a carne não é quem você realmente é, e em um período muito curto de tempo, ela não mais o perturbará! Confesse seus pecados para Deus, receba o seu perdão e limpeza, e então se ofereça a ele — alegre-mente e com confiança — neste exato momento, para servi-lo na “novidade de vida” que é sua em Cristo!

UM NOVO PODERA segunda verdade que precisamos compreender é que nós possuímos um novo poder. Não somente o cristão possui uma nova identidade, como também possui uma nova habilidade para derrotar o pecado. Embora nossos “corpos mortais” ainda não tenham sido redimidos, e o pecado ainda tente “reinar” ne-les, não precisamos permitir que ele o faça: “Não reine, portanto, o pecado em vosso corpo mortal, de maneira que obedeçais às suas paixões”.179 Não precisamos deixar o pecado reinar em nossos corpos mortais!

Essa garantia de vitória é repetida por todo o Novo Testamento: Em Gálatas 5, somos lembrados de que o Es-pírito Santo é muito mais poderoso que a carne. Embora a carne “milite contra o Espírito”,180 nós temos a promessa de

178 Romanos 6.13179 Romanos 6.12180 Gálatas 5.17

Crucificação e ressurreição – 109

que conforme “andarmos no Espírito”, “jamais satisfaremos a concupiscência da carne”.181

Novamente, os cristãos são assegurados em Romanos 8 de que possuem o poder “pelo Espírito” de “matar” o pecado: “se, pelo Espírito, mortificardes os feitos do corpo, certamente, vivereis”.182 E Romanos 6 proclama a mesma verdade repetida-mente. Por exemplo, no versículo 6, aprendemos que, por meio da morte de nosso velho eu, o poder da carne para reinar sobre nós foi destruído: “sabendo isto: que foi crucificado com ele o nosso velho homem, para que o corpo do pecado (a carne) seja destruído [literalmente, “se torne impotente”], e não sirvamos o pecado como escravos”. E no versículo 14, somos assegurados de que “o pecado não terá domínio sobre nós; pois não estamos debaixo da lei, e sim da graça”.

ABRAÇANDO A VERDADECristãos tanto possuem uma nova identidade quanto um novo poder. Essas coisas são fatos, quer acreditemos nelas ou não. Crer nelas não é o que as torna verdade, e não crer nelas não as torna falsas. A realidade não é modificada pela nossa falta de percepção dela. O que muda é nossa experiência da realida-de. De acordo com o Senhor Jesus Cristo, conhecer e crer na verdade é absolutamente vital para nossa liberdade da escravi-dão do pecado. “Se vós permanecerdes na minha palavra, sois verdadeiramente meus discípulos; e conhecereis a verdade, e a verdade vos libertará.”183 “Santifica-os na verdade; a tua palavra

181 Gálatas 5.16182 Romanos 8.13183 João 8.31-32

110 – JUSTIFICAÇÃO E Regeneração

é a verdade.”184 À luz dessas afirmações, é extremamente signifi-cativo que Paulo gaste os cinco primeiros capítulos e mais metade do capítulo seguinte de sua epístola aos Romanos assentando a fundação da verdade, e que Romanos 6.11 seja literalmente a primeira vez em toda a carta que ele instrua seus leitores a fa-zer alguma coisa! Quando essa primeira exortação finalmente chega, ela se centra em torno de crer e abraçar a verdade: “con-siderai-vos (conclua, reconheça) mortos para o pecado, mas vivos para Deus, em Cristo Jesus”.185 “Reconhecer” não é fingir que alguma coisa é verdade quando sabemos que não é; reco-nhecer é aceitar a realidade pelo que ela é.

A necessidade de entendermos e crermos na verdade, a fim de progredirmos na graça é um tema central nas cartas de Paulo: “E não vos conformeis com este século, mas trans-formai-vos pela renovação da vossa mente”.186 É apenas quando nossas mentes são renovadas – quando somos capacitados para ver a realidade como ela é –, que podemos “experimentar qual seja a boa, agradável e perfeita vontade de Deus”.187 Paulo diz a mesma coisa em Efésios 4 ao nos exortar para que nos “renove-mos no espírito do nosso entendimento, e nos revistamos do novo homem” (v. 23-24). Quando um cristão cede ao pecado, sem-pre é o resultado de sua incapacidade de crer e agir na verdade!

Mais uma vez, o método do Novo Testamento de ensi-nar a crescer na graça é, em primeiro lugar: Entenda quem você é!188 (i.e., creia e abrace a verdade), e segundo: Seja quem você

184 João 17.17185 Romanos 6.11186 Romanos 12.2187 Romanos 12.2188 Romanos 6.11

Crucificação e ressurreição – 111

é!189 (i.e., recuse ativamente o pecado e renda-se deliberada-mente à justiça). Amado cristão, você não precisa viver uma vida de miséria e derrota! Você não precisa viver dia após dia com a consciência de que é continuamente contaminado pelo pecado conhecido. Peça a Deus para abrir os seus olhos para a verdade!190 Abrace, pela fé, a realidade de quem você real-mente é. Em seguida, tome uma posição sobre o que Deus fez por você em Cristo. “Nem ofereçais cada um os membros do seu corpo ao pecado, como instrumentos de iniquidade; mas oferecei-vos a Deus, como ressurretos dentre os mortos, e os vossos membros, a Deus, como instrumentos de justiça.”191 “Andai no Espírito e jamais satisfareis à concupiscência da car-ne.”192 Seja quem você é!

UM INIMIGO DERROTADOAmado cristão, os dias de pecado em sua vida estão contados! O machado já foi posto à raiz do seu pecado. Como uma ár-vore que foi cortada ao nível do solo, suas folhas ainda podem ficar verdes por um tempo, mas o fato é que a vida dela aca-bou. É apenas uma questão de tempo até que cada folha seque e caia ao chão!

O pecado é um inimigo derrotado. A guerra contra o pecado já foi vencida. Como os focos de resistência que, por vezes, continuam a lutar na ignorância depois que o tratado de rendição já foi assinado, assim o pecado continua a lutar em nos-sas vidas sem esperança de vitória final. Embora o conflito do 189 Romanos 6.12-13190 Efésios 1.17-18191 Romanos 6.13192 Gálatas 5.16

112 – JUSTIFICAÇÃO E Regeneração

crente com o pecado possa ser feroz às vezes, o resultado final da batalha está assegurado.

Para o cristão, o pecado não é senão uma neve no início do verão. Tal neve cai ocasionalmente, mesmo nos climas mais quentes, mas é apenas o último suspiro de um inverno que é passado. Em um ou dois dias, ela derrete e se vai, e não tem po-der para deter o avanço inexorável do verão. Cristão, o pecado não tem a menor chance em sua vida! Você pode lutar contra ele com o conhecimento confiante de que o verão, não o in-verno, está se aproximando! Os resquícios de pecado que você ainda enfrenta são apenas vestígios do que você uma vez foi; eles não são expressão de quem você é agora, e em breve passarão para sempre!

Até aqui temos considerado seis representações bíblicas de regeneração, cada uma das quais nos deu uma visão mais aprofundada da natureza desse grande milagre. O que é regene-ração? É uma nova criação, um novo homem, um novo coração, um novo nascimento, uma nova natureza. É uma crucificação de nosso velho homem e uma ressurreição de nosso novo ho-mem. Mas regeneração é mais. É uma mudança de reino:

CARNE VS. ESPÍRITOPorque os que se inclinam para a carne cogitam das coisas

da carne; mas os que se inclinam para o Espírito, das coisas

do Espírito. Porque o pendor da carne dá para a morte, mas

o do Espírito, para a vida e paz. Por isso, o pendor da carne

é inimizade contra Deus, pois não está sujeito à lei de Deus,

Capítulo Onze

UMA MUDANÇA DE REINO DA CARNE PARA O ESPÍRITO

114 – JUSTIFICAÇÃO E Regeneração

nem mesmo pode estar. Portanto, os que estão na carne não

podem agradar a Deus. Vós, porém, não estais na carne, mas

no Espírito, se, de fato, o Espírito de Deus habita em vós. E,

se alguém não tem o Espírito de Cristo, esse tal não é dele.

Romanos 8.5-9

É claro a partir desses versos que a regeneração envolve uma mudança de reino. Homens não regenerados são chamados de “os que estão na carne”; homens regenerados “não estão na carne, mas no Espírito”.

Cristãos são aqueles que não estão mais “na carne”; eles agora residem permanentemente no reino do Espírito. Às vezes, ao  agirem impulsivamente ou  perderem a paciência, cristãos dizem: “Eu estou na carne”. Na realidade, porém, o cristão não pode temporariamente “ficar na carne” mais do que pode temporariamente “tornar-se não regenerado”!

O que Paulo quer dizer quando afirma que o homem não regenerado está “na carne”, e o cristão não está mais “na carne, mas no Espírito”? A resposta poderia ser colocada da seguinte forma: o homem natural (não regenerado) reside no domínio ou esfera carnal. A carne é a fonte e contexto de toda a sua vida. Ele não sabe nada da vida no Espírito Santo; ele vive intei-ramente no plano carnal. Ele habita o reino de hormônios e apetites físicos, de carros e computadores, de esportes e entre-tenimento, de cosméticos e aparência. “Entre os quais também todos nós andamos outrora, segundo as inclinações da nossa carne, fazendo a vontade da carne e dos pensamentos; e éra-mos, por natureza, filhos da ira, como também os demais.”193

193 Efésios 2.3

Uma mudança de reino: da carne para o espírito – 115

“O destino deles é a perdição, o deus deles é o ventre, e a glória deles está na sua infâmia, visto que só se preocupam com as coisas terrenas.”194

O homem não regenerado pode ter “religião”, mas ela também é carnal. Paulo nos fala de um tempo em que ele conhecia a Cristo “segundo a carne”.195 Esse é o Cristo da ima-ginação religiosa popular, sempre mudando com o tempo. (Em nossa época, ele é muitas vezes uma figura religiosa pálida e in-sípida que viveu há muito tempo carregando cordeiros por aí). No entanto, Paulo não mais conhece Cristo dessa maneira. Na verdade, ele já não conhece nenhum homem “segundo a carne”. Por que não? A resposta é dada no versículo seguinte – Pau-lo passou para um reino diferente! “Assim que, nós, daqui por diante, a ninguém conhecemos segundo a carne; e, se antes conhe-cemos Cristo segundo a carne, já agora não o conhecemos deste modo. E, assim, se alguém está em Cristo, é nova criatura; as coisas antigas já passaram; eis que se fizeram novas.”196

Esse contraste entre os dois reinos da “carne” e “Espírito” está na base das palavras de nosso Senhor à mulher samaritana em João 4: “Mulher, podes crer-me que a hora vem, quando nem neste monte, nem em Jerusalém adorareis o Pai... Deus é espí-rito; e importa que os seus adoradores o adorem em espírito e em verdade”.197 Normalmente, tomamos essas palavras no sentido de que as pessoas podem adorar a Deus em qualquer lugar – ou no monte ou em Jerusalém. Isso é certamente verdade. Mas Je-sus não diz “ou... ou”; ele diz “nem... nem”! Em outras palavras, 194 Filipenses 3.19195 2 Coríntios 5.16196 2 Coríntios 5.16-17197 João 4.21-24

116 – JUSTIFICAÇÃO E Regeneração

Deus não pode ser adorado nesse reino de maneira nenhuma; ele é acessível somente “no Espírito”. “Deus é espírito; e impor-ta que os seus adoradores o adorem em espírito e em verdade”. “Nós é que somos a circuncisão, nós que adoramos a Deus no Espírito, e nos gloriamos em Cristo Jesus, e não confiamos na carne.”198 “Porque, por ele [Cristo], ambos temos acesso ao Pai em um Espírito.”199 Cristãos estão “no Espírito”. Eles são capazes de “ver aquele que é invisível”200 e de “atentar as coisas que se não veem”.201

APENAS DOIS REINOSA primeira lição que devemos aprender com Romanos 8.5-9 é que Paulo pensa em termos de apenas dois reinos. Ou um homem está “na carne” ou “no Espírito”; ou ele é não regenerado ou re-generado. Não existe um terceiro reino “meio a meio”. Ou um homem é “carnal” (um não-cristão) ou é “espiritual” (vivo no reino do Espírito Santo – um cristão). Essa mesma dicotomia é vista em 1 Coríntios 2.14-16: “Ora, o homem natural não aceita as coisas do Espírito de Deus, porque lhe são loucura; e não pode entendê-las, porque elas se discernem espiritualmente. Porém o homem espiritual julga todas as coisas, mas ele mesmo não é julgado por ninguém... Nós, porém, temos a mente de Cristo”. Aqui, novamente, há apenas dois tipos de homens – o homem “natural” (não regenerado) e o homem “espiritual” (regenerado).

Esse fato é bastante importante para uma compreensão adequada do que Paulo diz nos quatro versos seguintes: “Eu, 198 Filipenses 3.3199 Efésios 2.18200 Hebreus 11.27201 2 Coríntios 4.18

Uma mudança de reino: da carne para o espírito – 117

porém, irmãos, não vos pude falar como a espirituais, e sim como a carnais, como a crianças em Cristo. Leite vos dei a beber, não vos dei alimento sólido; porque ainda não podíeis suportá-lo. Nem ainda agora podeis, porque ainda sois car-nais. Porquanto, havendo entre vós ciúmes e contendas, não é assim que sois carnais e andais segundo o homem? Quando, pois, alguém diz: Eu sou de Paulo, e outro: Eu, de Apolo, não é evidente que andais segundo os homens”?202 (A versão NVI da Bíblia traduz erroneamente o termo “carnais” nesses versos como “mundanos”).

O que Paulo está dizendo aqui? Ele está dizendo que os crentes de Corinto estão (em alguns aspectos) agindo como homens perdidos. “Eu não podia falar a vocês como cristãos; eu tinha que falar a vocês como ‘homens da carne’. Vocês estão agindo como meros homens. Vocês precisam ter a mente reno-vada para perceber quem realmente são”. É possível que um cristão aja em alguns momentos como um homem perdido, especialmente quando ainda é um “bebê em Cristo”, mas isso está muito longe de dizer que o verdadeiro cristão pode viver toda a sua vida como um homem perdido! Contrariamente a muitos ensinamentos populares, Paulo não está estabele-cendo aqui uma terceira categoria permanente de homens – o assim chamado “cristão carnal” – uma espécie de “diabo ce-lestial”, que vive sua vida com “Cristo no coração” e “consigo mesmo no trono”! Um cristão pode, por vezes, agir como um homem perdido, mas quando o faz, ele não está agindo de acordo com quem realmente é e não pode manter a fachada por muito tempo.

202 1 Coríntios 3.1-4

118 – JUSTIFICAÇÃO E Regeneração

CADA REINO TEM SUA PRÓPRIA MENTEA segunda lição que devemos aprender com Romanos 8.5-9 é que cada um dos dois reinos é caracterizado por certo tipo de “men-te”. “Porque os que se inclinam para a carne cogitam das coisas da carne; mas os que se inclinam para o Espírito, das coisas do Espírito.”203 Note que Paulo não está fazendo uma exortação aqui. (Ele não está dizendo o que “deve” ser). Ele está simplesmente afirmando um fato: aqueles que “se inclinam para a carne”, cogi-tam das coisas da carne; aqueles que “se inclinam para o Espírito”, das coisas do Espírito. Essa é apenas a realidade da situação.

Isso significa que, se alguém afirma ser cristão, mas não “cogita das coisas do Espírito”, está enganado. O cristão está vivo em um novo reino. Ele está “no Espírito”. Sua origem e esfera de vida é o Espírito Santo, e ele é “naturalmente” inclina-do para “as coisas do Espírito”! Ao sair da cama de manhã, ao receber alguns minutos para relaxar no trabalho, ao ter algum tempo de lazer, sua mente orbita ao redor das coisas de Deus.

CADA MENTE TEM SEU PRÓPRIO RESULTADOA terceira lição que devemos aprender com Romanos 8.5-9 é que cada tipo de mente leva a seu próprio desfecho – seja a morte ou a vida: “Porque o pendor da carne [lit. “mentalidade da carne”] dá para a morte”.204 A morte é sua característica final e seu término, independentemente de como as coisas pos-sam parecer agradáveis em seu início. Pense nisso! Tudo no reino carnal, até mesmo as “melhores” coisas, eventualmente nos deixará com nada além de vazio, decadência e corrupção –

203 Romanos 8.5204 Romanos 8.6

Uma mudança de reino: da carne para o espírito – 119

morte! Por quê? Porque Deus é a fonte da verdadeira vida, e ele é deixado de fora.

Não apenas Deus é deixado de fora, mas “a mentalidade da carne” é, na verdade, “inimizade contra Deus, pois não está sujeita à lei de Deus, nem mesmo pode estar”.205 Existe um ódio profundo por Deus e sua lei no coração de cada homem per-dido. É por esta razão que “os que estão na carne não podem agradar a Deus”.206

No homem perdido religioso essa inimizade é muitas ve-zes bem escondida, mas sob as circunstâncias certas ela atacará violentamente. Aqui precisamos apenas pensar na reação dos escribas e fariseus ao se depararem com a Bondade Encarnada: “Crucifica-o! Não queremos que ele reine sobre nós”!207 Talvez mesmo muitos desses líderes religiosos estivessem chocados com suas próprias ações e o ódio veemente que encontraram brotando em seus corações para com o Filho de Deus.

A mentalidade da carne é morte, mas, ao contrário, “a mentalidade do Espírito é vida e paz”.208 Que benção isso é! Todas as coisas que são boas, todas as coisas que são amáveis – “amor, alegria, paz, longanimidade, benignidade, bondade, fi-delidade, mansidão, domínio próprio” – pertencem e fluem do reino do Espírito!

ANDANDO NO NOVO REINODigo, porém: andai no Espírito e jamais satisfareis à concu-

piscência da carne. Porque a carne milita contra o Espírito, e

205 Romanos 8.7206 Romanos 8.8207 Lucas 19.14208 Romanos 8.6 (Gr.)

120 – JUSTIFICAÇÃO E Regeneração

o Espírito, contra a carne, porque são opostos entre si; para

que não façais o que, porventura, seja do vosso querer. Mas,

se sois guiados pelo Espírito, não estais sob a lei. Ora, as

obras da carne são conhecidas e são: prostituição, impure-

za, lascívia, idolatria, feitiçarias, inimizades, porfias, ciúmes,

iras, discórdias, dissensões, facções, invejas, bebedices, glu-

tonarias e coisas semelhantes a estas, a respeito das quais eu

vos declaro, como já, outrora, vos preveni, que não herdarão

o reino de Deus os que tais coisas praticam. Mas o fruto do

Espírito é: amor, alegria, paz, longanimidade, benignidade,

bondade, fidelidade, mansidão, domínio próprio. Contra

estas coisas não há lei. E os que são de Cristo Jesus cruci-

ficaram a carne, com as suas paixões e concupiscências. Se

vivemos no Espírito, andemos também no Espírito.

Gálatas 5.16-25

Nesses versos de Gálatas 5, os dois reinos da “carne” e “espírito” são fortemente contrastados. Paulo deixa claro que aqueles que praticam “as obras da carne... não herdarão o reino de Deus”. Por outro lado, “os que são de Cristo Jesus crucifi-caram a carne com as suas paixões e concupiscências”. Eles tiveram uma ruptura definitiva com o antigo reino e a vida de pecado por meio do arrependimento e da fé em Cristo. Agora é prometida vitória sobre a carne ao cristão à medida que ele “anda no Espírito”: “Ande pelo Espírito, e você não realizará o desejo da carne”.

De especial significado para o nosso presente estudo, no entanto, é o versículo 25: “Se vivemos no Espírito, andemos tam-bém no Espírito”. Note novamente o que já vimos em Romanos

Uma mudança de reino: da carne para o espírito – 121

8: o cristão é o que está “no Espírito”! Ele vive no reino do Espí-rito, e sua fonte de vida é o Espírito! “Agora”, diz Paulo, “perceba onde você está, e caminhe ali! – viva isso na prática”. “Se você vive no Espírito, então ande no Espírito”.

Há dois (e apenas dois) reinos, e como cristãos estamos vivos no reino do Espírito. Porque agora estamos vivos nesse novo reino, somos, pela primeira vez, capazes de andar pelo poder do Espírito disponível a nós no lugar onde estamos agora. Essa caminhada “no Espírito” envolve obedecer aos sus-surros do Espírito quando sentimos em nosso coração que ele está “entristecido” por algo que estamos prestes a fazer: “Não entristeçais o Espírito de Deus”.209 Quando o Espírito se entris-tece, devemos parar imediatamente! Por outro lado, “andar no Espírito” também envolve obedecer aos sussurros do Espíri-to quando ele nos incentiva a fazer algo de positivo – a falar por Deus, testemunhar ou orar: “Não apagueis o Espírito”.210 É à medida que “andamos no Espírito” que experimentamos o bom e amável “fruto do Espírito” discutido acima.

OS DOIS REINOS EM ROMANOS 7 E 8O conceito de regeneração como uma mudança de reino en-tre a carne e o Espírito é de grande importância para a nossa compreensão de muitas outras passagens. Em particular, é fundamental para uma compreensão adequada de Romanos 7. Note que Paulo apresenta toda a sua discussão em Romanos 7.7-25, referindo-se aos “dois reinos” nos versículos 5-6: “Por-que, quando vivíamos segundo a carne, as paixões pecaminosas

209 Efésios 4.30210 1 Tessalonicenses 5.19

122 – JUSTIFICAÇÃO E Regeneração

postas em realce pela lei operavam em nossos membros, a fim de frutificarem para a morte. Agora, porém, libertados da lei, es-tamos mortos para aquilo a que estávamos sujeitos, de modo que servimos em novidade de espírito e não na caducidade da letra”.

Mais uma vez, Paulo pensa em termos de dois e apenas dois grupos. Aqueles que estão “na carne” (não regenerados) são caracterizados por “paixões pecaminosas... operando em seus membros, a fim de frutificarem para a morte”. Essas pai-xões pecaminosas são “postas em realce pela lei”. Os cristãos, por outro lado, são caracterizados pela “libertação” da “sujei-ção” à Lei e pelo serviço “em novidade de espírito e não na caducidade da letra”. Não é difícil de descobrir a qual dos dois grupos o “homem de Romanos 7” pertence! Ele é “carnal, ven-dido à escravidão do pecado”.211 A Lei está “realçando” todo tipo de paixão pecaminosa nele.212 Ele é um “prisioneiro da lei do pecado que está nos seus membros”.213 Ele é um “homem desventurado”, procurando alguém para “livrá-lo” do “corpo desta morte”.214 Além disso, ele nunca faz menção do Espírito Santo, nem mesmo uma vez, em toda a passagem! É eviden-te que esse homem não está “no Espírito”, mas “na carne”. Um cristão recorrer a Romanos 7 por conforto quando é “derrota-do” é, portanto, imperdoável, mesmo que às vezes ele possa se sentir como se “pertencesse” ali! (Veja o Apêndice C).

É muito significativo que, assim que Paulo conclui sua consideração da Lei, pecado e carne em Romanos 7.7-25, ele imediatamente resuma tudo mais uma vez em termos de os 211 Romanos 7.14212 Romanos 7.7-14213 Romanos 7.23214 Romanos 7.24

Uma mudança de reino: da carne para o espírito – 123

“dois reinos”: “Agora, pois, já nenhuma condenação há para os que estão em Cristo Jesus. Porque a lei do Espírito da vida, em Cristo Jesus, te livrou da lei do pecado e da morte. Porquanto o que fora impossível à lei, no que estava enferma pela carne, isso fez Deus enviando o seu próprio Filho em semelhança de carne pecaminosa e no tocante ao pecado; e, com efeito, condenou Deus, na carne, o pecado, a fim de que o preceito da lei se cum-prisse em nós, que não andamos segundo a carne, mas segundo o Espírito”.215 Novamente, esses versos são simplesmente uma reafirmação ampliada da introdução anterior de Paulo a essa seção em Romanos 7.5-6. Observe que no versículo 4 os cris-tãos são descritos como aqueles que “não andam segundo a carne, mas segundo o Espírito”. Como vimos anteriormente em conexão com o versículo 5, isso não é uma exortação, mas uma declaração de um fato. Não é uma descrição de certos ti-pos avançados de cristãos, mas da caminhada geral de todos os cristãos.216 Os versos que se seguem a esse resumo (8.5-14) continuam a discussão de Paulo sobre “carne” e “Espírito” e já foram considerados acima.

215 Romanos 8.1-4216 Veja também Romanos 8.14.

Vimos que a regeneração é uma troca de reino: o cristão é alguém que não está mais “na carne”, mas “no Espírito”. Mas estes não são os únicos reinos trocados na regeneração. A oi-tava representação de regeneração que consideraremos tem a ver com a translação do cristão da esfera terrestre para a esfera celestial.

Se morrestes com Cristo para os rudimentos do mun-

do, por que, como se vivêsseis no mundo, vos sujeitais a

ordenanças: não manuseies isto, não proves aquilo, não

toques aquilo outro, segundo os preceitos e doutrinas

dos homens? Pois que todas estas coisas, com o uso, se

destroem.

Colossenses 2.20-22

Capítulo Doze

UMA MUDANÇA DE REINO DA TERRA PARA

O CÉU

126 – JUSTIFICAÇÃO E Regeneração

Portanto, se fostes ressuscitados juntamente com Cristo,

buscai as coisas lá do alto, onde Cristo vive, assentado à di-

reita de Deus. Pensai nas coisas lá do alto, não nas que são

aqui da terra; porque morrestes, e a vossa vida está oculta

juntamente com Cristo, em Deus. Quando Cristo, que é

a nossa vida, se manifestar, então, vós também sereis ma-

nifestados com ele, em glória. Fazei, pois, morrer a vossa

natureza terrena: prostituição, impureza, paixão lasciva, de-

sejo maligno e a avareza, que é idolatria; por estas coisas é

que vem a ira de Deus [sobre os filhos da desobediência].

Ora, nessas mesmas coisas andastes vós também, noutro

tempo, quando vivíeis nelas. Agora, porém, despojai-vos,

igualmente, de tudo isto: ira, indignação, maldade, maledi-

cência, linguagem obscena do vosso falar. Não mintais uns

aos outros, uma vez que vos despistes do velho homem com

os seus feitos e vos revestistes do novo homem que se refaz

para o pleno conhecimento, segundo a imagem daquele que

o criou.

Colossenses 3.1-10

De acordo com Colossenses 2.20-22, os cristãos não estão mais “vivendo no mundo”! Eles “morreram” para esse reino e passaram para um reino diferente. Esse mundo de coisas temporárias e materiais (coisas destinadas a serem des-truídas com o uso) não é mais a esfera da sua vida. Qual é a esfera da sua vida? A resposta é dada nos versos que se se-guem (3.1-10): “Fostes ressuscitados juntamente com Cristo;... morrestes, e a vossa vida está oculta juntamente com Cristo;... Cristo... é a nossa vida”.

Uma mudança de reino: da terra para o céu – 127

O cristão é aquele que “morreu”, e sua vida está “escon-dida com Cristo em Deus”. Ele vive no reino celestial. Quando a esfera de sua vida ainda era esta terra, ele andava de acordo com este reino terrestre. “Nessas mesmas coisas andastes vós também, noutro tempo, quando vivíeis nelas.”217 Mas agora, a esfera de sua vida é celestial, e ele é exortado a perceber esse fato e “pensar” nas “coisas do alto”.

Amado cristão, você pertence a lugares celestiais! Você não é mais parte deste mundo. Você foi “crucificado para o mundo”, e o mundo para você!218 Apenas o seu corpo mortal, que ainda não foi redimido, ainda está “aqui embaixo” nesse reino terres-tre. É por isso que Paulo nos exorta a “mortificar os membros que estão sobre a terra”!219 “Apresenteis o vosso corpo por sacrifício vivo,... não vos conformeis com este século, mas transformai-vos pela renovação da vossa mente, para que experimenteis qual seja a boa, agradável e perfeita vontade de Deus.”220

NÃO DESTE MUNDOVós sois cá de baixo, eu sou lá de cima; vós sois deste mun-do, eu deste mundo não sou.

João 8.23

Nessas palavras aos judeus, nosso Senhor fala novamente dos reinos terrestre e celestial. Como seria de se esperar, ele fala de si mesmo como pertencente à esfera celestial. O que não é de se esperar é o que ele diz alguns capítulos depois sobre to-dos os cristãos:217 Colossenses 3.7218 Gálatas 6.14219 Colossenses 3.5 (Gr.)220 Romanos 12.1-2

128 – JUSTIFICAÇÃO E Regeneração

Eu lhes tenho dado a tua palavra, e o mundo os odiou, por-que eles não são do mundo, como também eu não sou... Eles não são do mundo, como também eu não sou.

João 17.14,16

Os cristãos não são do mundo, como também Cristo não é do mundo! Como participantes de sua vida celestial, eles pertencem a um reino diferente. Eles são “nascidos de cima” e fazem parte de uma nova ordem. Eles desprezam as coisas que o mundo “al-tamente estima”221 e valorizam as coisas que o mundo despreza. A pedra que “os construtores” rejeitaram por ser inútil é preciosa e fundamental para eles.222 Seus motivos e ações são um enigma para o mundo. Eles olham para as coisas que são invisíveis223 e modelam suas vidas de acordo com as realidades invisíveis. Eles entendem a “sabedoria oculta” que é “loucura”224 para o mundo. Eles “têm a mente de Cristo”.225 “Por essa razão, o mundo não nos conhece, porquanto não o conheceu a ele mesmo.”226

À luz destas realidades, não é de se admirar que o mundo odeie os cristãos. “Se vós fôsseis do mundo, o mundo amaria o que era seu; como, todavia, não sois do mundo, pelo contrário, dele vos escolhi, por isso, o mundo vos odeia.”227

CIDADÃOS DO CÉUO destino deles é a perdição, o deus deles é o ventre, e a gló-

ria deles está na sua infâmia, visto que só se preocupam com

221 Lucas 16.15; Salmo 15.4 222 1 Pedro 2.4,7223 2 Coríntios 4.18224 1 Coríntios 2.6-10,14225 1 Coríntios 2.16226 1 João 3.1227 João 15.19

Uma mudança de reino: da terra para o céu – 129

as coisas terrenas. Pois a nossa pátria está nos céus, de onde

também aguardamos o Salvador, o Senhor Jesus Cristo.

Filipenses 3.19-20

Em nítido contraste com aqueles cujo deus é a carne e cujas mentes estão fixadas nas coisas terrenas, os cristãos já são cidadãos do céu. Eles vivem e se movem no reino celestial, e suas mentes estão colocadas nas coisas do alto.228 Seus corações estão nos céus, de onde aguardam ansiosamente o retorno de seu Salvador e Rei.

Ora, Agar é o monte Sinai, na Arábia, e corresponde à Je-rusalém atual [terrena], que está em escravidão com seus filhos. Mas a Jerusalém lá de cima é livre, a qual é nossa mãe.

Gálatas 4.25-26

Ora, não tendes chegado ao fogo palpável e ardente, e à es-curidão, e às trevas, e à tempestade,... Mas tendes chegado ao monte Sião e à cidade do Deus vivo, a Jerusalém celestial, e a incontáveis hostes de anjos, e à universal assembleia e igreja dos primogênitos arrolados nos céus, e a Deus, o Juiz de todos, e aos espíritos dos justos aperfeiçoados.

Hebreus 12.18,22-23

Vemos novamente nesses versos que os cristãos são cida-dãos livres nascidos da “Jerusalém lá de cima”. Eles não vieram para um monte que pode ser tocado fisicamente, mas para um invisível e celestial – monte Sião, a “cidade do grande Rei”.229

228 Colossenses 3.1-2229 Salmo 2.6-8; 48.1-2; 87.5; 110.1-2

130 – JUSTIFICAÇÃO E Regeneração

Eles agora são parte da “Jerusalém celestial, a cidade do Deus vivo”, juntamente com todos aqueles que já morreram e foram para o céu antes deles. Essa é a “cidade que tem fundamentos, da qual Deus é o arquiteto e edificador”.230 Porque seus corações estão colocados sobre essa Jerusalém celestial permanente, os cristãos estão dispostos a abandonar a segurança de todos os estabelecimentos terrenos temporais e ir a Cristo “fora do ar-raial, levando o seu vitupério”. “Na verdade, não temos aqui cidade permanente, mas buscamos a que há de vir.”231

Vi também a cidade santa, a nova Jerusalém, que descia

do céu, da parte de Deus, ataviada como noiva adornada

para o seu esposo. Então, ouvi grande voz vinda do trono,

dizendo: Eis o tabernáculo de Deus com os homens. Deus

habitará com eles. Eles serão povos de Deus, e Deus mes-

mo estará com eles.

Apocalipse 21.2-3

Vem, mostrar-te-ei a noiva, a esposa do Cordeiro; e me

transportou, em espírito, até a uma grande e elevada monta-

nha e me mostrou a santa cidade, Jerusalém, que descia do

céu, da parte de Deus, a qual tem a glória de Deus.

Apocalipse 21.9-11

Quem é a “cidade santa, a nova Jerusalém”? Ninguém mais do que “a noiva, a esposa do Cordeiro”! Essa cidade, a noi-va, agora reside no céu, mas na consumação “descerá do céu, da

230 Hebreus 11.10,16231 Hebreus 13.12-14

Uma mudança de reino: da terra para o céu – 131

parte de Deus”. O próprio Deus, então, para sempre “habitará com eles” e “a glória de Deus” descansará para sempre sobre eles. Oh, a bem-aventurança de ser, mesmo agora, parte dessa cidade celestial, a noiva, a esposa do Cordeiro!

Coisas gloriosas de ti são faladas

Sião, cidade do nosso Deus;

Aquele cuja palavra não pode ser quebrada

Formou-te para sua própria habitação.

Sobre a Rocha Eterna fundada,

O que pode abalar teu seguro repouso?

Com as paredes da salvação ao redor,

Podes sorrir a todos os teus inimigos.

Veja! As correntes de águas vivas,

Brotando do amor eterno,

Bem abastecem a teus filhos e filhas,

E todo o medo da seca removido.

Quem pode desfalecer enquanto tal rio

Sempre flui para sua sede amenizar?

Graça que, como o Senhor, o Doador,

Nunca falha de geração em geração.

Salvador, se da cidade de Sião,

Pela graça, membro sou,

Deixe o mundo zombar ou lastimar,

Gloriar-me-ei em teu nome.

Desvanecendo está o prazer do mundano,

Toda a sua pompa e ostentação alardeada;

132 – JUSTIFICAÇÃO E Regeneração

Alegrias sólidas e tesouros duradouros

Ninguém senão os filhos de Sião conhecem.

John Newton

ASSENTADOS COM CRISTOBendito o Deus e Pai de nosso Senhor Jesus Cristo, que nos

tem abençoado com toda sorte de bênção espiritual nas re-

giões celestiais em Cristo.

Efésios 1.3

Mas Deus, sendo rico em misericórdia, por causa do grande

amor com que nos amou, e estando nós mortos em nossos

delitos, nos deu vida juntamente com Cristo, — pela graça

sois salvos, e, juntamente com ele, nos ressuscitou, e nos fez

assentar nos lugares celestiais em Cristo Jesus.

Efésios 2.4-6

Porque estamos “em Cristo” e somos participantes de sua vida de ressurreição, encontramo-nos assentados com ele nos lugares celestiais. Nele, possuímos “toda sorte de bênção espi-ritual” e não nos falta nada; foi-nos concedido “todas as coisas que conduzem à vida e à piedade”.232 Os cristãos não têm neces-sidade de “algo a mais”, além de Cristo; sua grande necessidade é ver e entrar na realidade do que eles já têm nele. É a obra da graça do Espírito Santo que faz com que isso aconteça.233 Paulo, portanto, ora pelos Efésios para que os “olhos de seus corações sejam iluminados” pelo Espírito Santo, para que possam “sa-

232 2 Pedro 1.3233 João 14.16,20,26; 16.12-14

Uma mudança de reino: da terra para o céu – 133

ber... qual a suprema grandeza do poder de Deus” para com eles como crentes.234 Esse é o mesmo poder que ressuscitou Cristo dentre os mortos, também “fazendo-o sentar à direita de Deus nos lugares celestiais, acima de todo principado, e potestade, e poder, e domínio, e de todo nome que se possa referir não só no presente século, mas também no vindouro”.235

CONTINUE OLHANDO PARA BAIXOPor meio de todos esses versículos, fica claro que os crentes têm a sua esfera e fonte de vida nos lugares celestiais. Eles já não são desse mundo. Eles já não moram aqui,236 mas no céu.237 Em nossa experiência do dia-a-dia, faz muita diferença se nos vemos “aqui embaixo” nesse mundo – como um mergulhador no fundo do oceano com apenas uma corda conectando-o à superfície muito acima (céu), ou se nos vemos “assentados no céu” – olhando para baixo para as questões dessa vida! Faz uma grande diferença se o nosso lema é “Continue olhando para cima” (“para o reino ao qual você ainda não pertence”) ou “Continue Olhando para baixo” (“do reino onde já está, porque você morreu, e sua vida está escondida com Cristo em Deus”)!

Em termos práticos, isso significa que os cristãos não estão trabalhando para alcançar uma vida que eles ainda não têm ou para obter uma vitória que ainda não foi ganha. Eles são participantes da própria vida de Cristo e da vitória que ele já conquistou. Cristão, você é um participante da vida de ressur-reição de Cristo, e ele já derrotou e quebrou o poder do pecado 234 Efésios 1.15-19235 Efésios 1.19-21236 Colossenses 2.20237 Colossenses 3.3

134 – JUSTIFICAÇÃO E Regeneração

que você está enfrentando agora – por meio de sua morte, se-pultamento, ressurreição e ascensão! Como participante da vida dele, o seu chamado não é tentar conseguir algo para si mesmo que ele ainda não tenha alcançado, mas crer no que ele já fez por você e andar nisso. Desta forma, você estará ha-bilitado a combater “o bom combate da fé”238 ao invés da luta miserável da incredulidade!

O mesmo é verdade para a nossa batalha contra os po-deres das trevas. Precisamos constantemente ser lembrados do fato de que Satanás já foi derrotado por Cristo na cruz,239 e que “em Cristo” estamos sentados “acima”240 de todas as hostes do mal. Devemos ler Efésios 6.12 à luz dessa realidade atual: “Por-que a nossa luta não é contra o sangue e a carne, e sim contra os principados [derrotados] e potestades [destronadas], contra os dominadores [subjugados] deste mundo tenebroso, contra as forças espirituais [vencidas] do mal, nas regiões celestes”. Quando humildemente “nos sujeitamos a Deus e resistimos ao diabo”, temos a promessa de que esse mesmo leão que ruge “fu-girá” diante das ovelhas de Deus, que de outra forma estariam indefesas!241 Glória a Deus!

238 1 Timóteo 6.12239 Colossenses 2.15; João 12.31240 Efésios 1.20-21241 Tiago 4.7

A regeneração é uma troca de reinos. A nona e última repre-sentação de regeneração que consideraremos tem a ver com a passagem do cristão de um estado de escravidão do pecado para um estado de escravidão para a justiça. Devido a essa troca, cada cristão pode realmente confessar: “Eu costumava ser um escravo do pecado, mas não sou mais! Sou um servo da justiça”!

Sabendo isto: que foi crucificado com ele o nosso velho homem, para que o corpo do pecado seja destruído, e não sirvamos o pecado como escravos.

Romanos 6.6

Porque o pecado não terá domínio sobre vós; pois não es-tais debaixo da lei, e sim da graça.

Romanos 6.14

Capítulo Treze

UMA MUDANÇA DE REINO DO PECADO PARA

A JUSTIÇA

136 – JUSTIFICAÇÃO E Regeneração

Não sabeis que daquele a quem vos ofereceis como servos

para obediência, desse mesmo a quem obedeceis sois ser-

vos, seja do pecado para a morte ou da obediência para a

justiça? Mas graças a Deus porque, outrora, escravos do

pecado, contudo, viestes a obedecer de coração à forma de

doutrina a que fostes entregues; e, uma vez libertados do

pecado, fostes feitos servos da justiça. Falo como homem,

por causa da fraqueza da vossa carne. Assim como ofere-

cestes os vossos membros para a escravidão da impureza e

da maldade para a maldade, assim oferecei, agora, os vossos

membros para servirem à justiça para a santificação. Por-

que, quando éreis escravos do pecado, estáveis isentos em

relação à justiça. Naquele tempo, que resultados colhestes?

Somente as coisas de que, agora, vos envergonhais; porque

o fim delas é morte. Agora, porém, libertados do pecado,

transformados em servos de Deus, tendes o vosso fruto para

a santificação e, por fim, a vida eterna; porque o salário do

pecado é a morte, mas o dom gratuito de Deus é a vida eter-

na em Cristo Jesus, nosso Senhor.

Romanos 6.16-23

APENAS DOIS MESTRESDe acordo com tudo o que vimos até agora, não deveria ser surpresa que nessas passagens há dois, e apenas dois, mestres apresentados como possíveis proprietários de escravos. De um lado está o Pecado e, do outro, a Justiça. Esses dois proprietá-rios de escravos são diametralmente opostos um ao outro. A diferença entre eles não é um mero detalhe. É a diferença entre o que é imundo e o que é puro, o que é honroso e o que é vergo-

Uma mudança de reino: do pecado para a justiça – 137

nhoso, o que é nobre e o que é inferior. Em suma, é a diferença entre a vida e a morte, entre o céu e o inferno, e entre Deus e o diabo. Uma vez que esses dois senhores são tão completamen-te antagônicos entre si, é absolutamente impossível servir os dois ao mesmo tempo. “Ninguém pode servir a dois senhores; porque ou há de aborrecer-se de um e amar ao outro ou se de-votará a um e desprezará ao outro.”242

TODOS OS HOMENS SÃO ESCRAVOSPode ser um choque perceber que, de acordo com esses ver-sículos, todos os homens são escravos. Não há absolutamente nenhuma exceção. Tanto o escritor quanto o leitor dessas li-nhas são certamente escravos. Somos, nesse exato momento, ou escravos do pecado ou escravos da justiça. Não há nenhum lugar de neutralidade ou “meio-termo” entre esses dois extre-mos. Ninguém no mundo inteiro é “livre” no sentido de não ter nenhum mestre sequer. A questão não é se vamos ou não ter um mestre. A única questão é saber se vamos ter um mestre bom que nos abençoa com vida e paz ou um mestre mau que nos amaldiçoa com morte e destruição.

Satanás veio a Eva com a sugestão perversa de que Deus não era confiável. Quando Eva decidiu testar sua hipótese, tornando-se um “investigador neutro”, descobriu por meio da experiência amarga que não há lugar de neutralidade entre Deus e o diabo. Sair de debaixo da autoridade de Deus é colocar-se imediatamente sob o domínio do maligno – o “ladrão”, que “não vem senão para roubar, matar e destruir”.243 Como a lo-

242 Lucas 16.13243 João 10.10

138 – JUSTIFICAÇÃO E Regeneração

comotiva na estrada de ferro que cumpre sua razão para existir e encontra a verdadeira liberdade apenas ao permanecer dentro da limitação dos trilhos, o homem cumpre a sua razão de ser e encontra a verdadeira liberdade ao permanecer em submissão ao seu Criador.

ESCRAVOS DO PECADOOs versos citados acima deixam bem claro que, antes de nos-sa regeneração cada um de nós era “escravo do pecado” (v. 6,17,20). O que significa ser “escravo do pecado”? Significa viver sob o poder dominante do pecado. O pecado governa e “reina”244 sobre os seus súditos, exigindo a sua obediência. Eles não podem não obedecê-lo! Ilustrações dessa escravidão abun-dam tanto na Bíblia quanto na História da Igreja: antes de sua conversão, o evangelista Mel Trotter era um beberrão perdido. Chegando em casa após um acesso de bebedeira por dez dias seguidos, ele encontrou seu filho de dois anos morto nos bra-ços de sua esposa. Nas profundezas do remorso – convencido de que, com a sua ausência, ele havia assassinado seu único filho – Trotter jurou com lágrimas nunca mais voltar a beber. Porém, menos de duas horas após o funeral de seu filho, ele voltou para casa completamente bêbado mais uma vez! Essa é a natureza da escravidão do pecado.

Mas não é só o bêbado ou o viciado em drogas que é es-cravo do pecado. Todos os homens à parte de Cristo estão em cativeiro do pecado. Mesmo a “boa pessoa moral” que não tem vícios aparentes é escrava do pecado. Isso é evidente a partir do fato de que ela não crê nem adora o Deus vivo. Por que ela

244 Romanos 5.1

Uma mudança de reino: do pecado para a justiça – 139

não se curva diante do seu Criador em amor e adoração? Sim-plesmente porque o seu mestre não permitirá que o faça! O pecado tem um domínio sobre a sua vida e não permitirá que ela faça aquilo que é sensato, razoável e certo. “O deus deste século cegou o entendimento dos incrédulos, para que lhes não resplandeça a luz do evangelho da glória de Cristo, o qual é a imagem de Deus.”245

Nosso Senhor deixa bem claro em João 8.31-36 que ne-nhum escravo do pecado estará no céu: “Se vós permanecerdes na minha palavra, sois verdadeiramente meus discípulos; e conhecereis a verdade, e a verdade vos libertará. Responderam--lhe: Somos descendência de Abraão e jamais fomos escravos de alguém; como dizes tu: Sereis livres? Replicou-lhes Jesus: Em verdade, em verdade vos digo: todo o que comete pecado é es-cravo do pecado. O escravo não fica sempre na casa; o filho, sim, para sempre. Se, pois, o Filho vos libertar, verdadeiramente se-reis livres”. Nenhum escravo do pecado permanecerá na casa do Filho para sempre, mas a liberdade é o direito natural de to-dos os que são “verdadeiramente” discípulos do Senhor!

SERVOS DA JUSTIÇANo momento da regeneração cada cristão deixa de ser um es-cravo do pecado e torna-se um servo da justiça: “Mas graças a Deus porque, outrora, escravos do pecado, contudo, viestes a obedecer de coração à forma de doutrina a que fostes entre-gues; e, uma vez libertados do pecado, fostes feitos servos da justiça” (v. 17-18). Observe que nesses versos não é dito que os cristãos estão “livres do pecado”; mas sim que eles foram “liber-

245 2 Coríntios 4.4

140 – JUSTIFICAÇÃO E Regeneração

tos do pecado”. Paulo está falando aqui, não da perfeição sem pecado, mas da emancipação de um mestre (pecado) e escravi-zação por outro mestre (justiça).

De acordo com o Senhor Jesus Cristo, essa mudança de propriedade ocorre quando aquele que é “mais valente do que o homem valente” (Cristo) ataca o “homem valente” (Satanás) e toma posse de seus bens: “Quando o valente, bem armado, guarda a sua própria casa, ficam em segurança todos os seus bens. Sobrevindo, porém, um mais valente do que ele, vence-o, tira-lhe a armadura em que confiava e lhe divide os despo-jos”.246 Gloriosa transação – ser liberto do domínio de Satanás pelo Senhor Jesus Cristo e tornar-se seu grato servo por amor para sempre!

Todos os cristãos são servos da justiça. O que significa ser “servo da justiça”? Significa viver sob o poder dominante da justiça. A justiça governa e reina sobre os cristãos, exigindo a sua obediência. Mais uma vez, os exemplos abundam tanto na Bíblia quanto na História da Igreja. Jeremias encontrou-se interiormente compelido a pregar a mensagem de Deus, a des-peito da vergonha que lhe causou: “Porque, sempre que falo, tenho de gritar e clamar: Violência e destruição! Porque a pa-lavra do senhor se me tornou um opróbrio e ludíbrio todo o dia. Quando pensei: não me lembrarei dele e já não falarei no seu nome, então, isso me foi no coração como fogo ardente, encer-rado nos meus ossos; já desfaleço de sofrer e não posso mais”.247 Inúmeras vezes ao longo dos séculos, cristãos sentiram-se tão constrangidos por justiça que não eram capazes sequer de dor-

246 Lucas 11.21-22247 Jeremias 20.8-9

Uma mudança de reino: do pecado para a justiça – 141

mir até que tivessem testemunhado a um amigo perdido ou ajudado alguém em um tempo de necessidade especial. Eles alegremente se entregaram para serem queimados na fogueira ou destroçados por animais selvagens porque eram “controla-dos” pelo amor de Cristo.248 Por causa de sua servidão à justiça, os cristãos encontraram-se repetidas vezes incapazes de deixar de humilhar-se e pedir perdão quando erravam com o outro. É contada uma história de um avivamento nas Ilhas Britânicas, sob o ministério de W. P. Nicholson, quando multidões de ru-des trabalhadores portuários foram convertidos. Tantos bens roubados foram devolvidos por esses homens que os armazéns ficaram lotados, e uma ordem da empresa teve de ser emitida: “Por favor, não tragam de volta os bens roubados”! Tal é a es-cravidão do cristão à justiça, e que liberdade abençoada ela é! A maravilha da regeneração – uma troca da escravidão do pecado pela servidão à justiça!

248 2 Coríntios 5.14

Porque o pecado não terá domínio sobre vós; pois não es-

tais debaixo da lei, e sim da graça.

Romanos 6.14

Porque eu, mediante a própria lei, morri para a lei, a fim de

viver para Deus. Estou crucificado com Cristo...

Gálatas 2.19-20

Vimos nos capítulos anteriores que a regeneração é des-crita na Bíblia em termos de uma “mudança de reino” – da carne para o espírito, da terra para o céu, e da escravidão do pecado para a servidão da justiça. Mas a Bíblia fala de outra mudança de reino – de estar “debaixo da lei” para estar “debai-xo da graça”. Visto que essa mudança de reino engloba tanto a

Capítulo Catorze

UMA MUDANÇA DE REINO DA LEI PARA A GRAÇA

144 – JUSTIFICAÇÃO E Regeneração

justificação quanto a regeneração, é vital que certos aspectos dela sejam considerados em qualquer discussão sobre esses dois grandes milagres.

Nos versos citados acima, Paulo nos diz que os cristãos não estão “debaixo da lei” e “morreram para a Lei”. Em outras passagens, ele nos diz que os cristãos estão “libertos da lei”,249 e não estão mais “sujeitos”250 à lei, mas foram “libertos” por Cristo do “jugo da escravidão”251 da lei. A relação do homem perdido com Deus é uma questão da lei; para o cristão não é esse o caso. Ele mora em um estado de gloriosa “desobrigação” e “liberdade”.252

O que significa que os cristãos estão “debaixo da graça”? E o que significa que não estão “debaixo da lei” e “mortos para a lei”? Será que isso significa que não é mais errado aos cristãos roubar, cometer adultério ou continuar em pecado? A respos-ta de Paulo é um retumbante “De modo nenhum!”253. No que exatamente, então, a liberdade da lei implica? Tendo considera-do a natureza e as características da justificação e regeneração, estamos agora em condições de dar várias respostas a essa pergunta. As respostas são profundamente maravilhosas e de grande alcance em suas implicações.

A MALDIÇÃOEm que sentido os cristãos estão livres da lei? A primeira res-posta a essa pergunta é que os cristãos estão livres da maldição

249 Romanos 7.6250 Romanos 7.6251 Gálatas 5.1252 Gálatas 5.1,13253 Romanos 6.14-15

Uma mudança de reino: da lei para a graça – 145

da lei. Todos os perdidos vivem sob uma maldição: “Todos quantos, pois, são das obras da lei estão debaixo de maldição; porque está escrito: Maldito todo aquele que não permanece em todas as coisas escritas no Livro da lei, para praticá-las”.254 Não importa quão bem as coisas possam parecer estar indo em suas vidas, os não-cristãos vivem continuamente sob a maldi-ção de Deus. Embora seus filhos possam ser saudáveis, seus jardins prosperem e suas flores desabrochem de forma bela, a ira de Deus “permanece” sobre eles em todo tempo.255 Um dia eles ouvirão as terríveis palavras: “Apartai-vos de mim, maldi-tos, para o fogo eterno, preparado para o diabo e seus anjos”.256

O cristão, por outro lado, foi resgatado da maldição da lei: “Cristo nos resgatou da maldição da lei, fazendo-se ele próprio maldição em nosso lugar (porque está escrito: Maldito todo aquele que for pendurado em madeiro)”.257 Glória a Deus! Se você for um cristão, não está mais debaixo da maldição! Não há o menor pedaço de maldição restante sobre você, pois, “agora, já nenhuma condenação há para os que estão em Cristo Jesus”.258 Além disso, a maldição nunca virá sobre você novamente, por-que seus pecados se foram para sempre!259

Livre da lei, ó, feliz condição,

Jesus sangrou, e há remissão.

Amaldiçoado pela lei e ferido pela queda,

254 Gálatas 3.10255 João 3.36256 Mateus 25.41257 Gálatas 3.13258 Romanos 8.1259 Hebreus 8.12

146 – JUSTIFICAÇÃO E Regeneração

Graça nos redimiu, de uma vez por todas.

De uma vez por todas, ó, pecador receba-a,

De uma vez por todas, ó, irmão creia;

Atenha-se à cruz, o fardo cairá,

Cristo nos redimiu, de uma vez por todas!

Philip P. Bliss

BÊNÇÃO E FAVORNão apenas os cristãos estão livres da maldição da lei; eles es-tão livres do peso esmagador de ter de manter a lei como um meio de obter justiça e vida. Como visto nos capítulos anterio-res, a lei mantém a promessa de vida e de bênção para aqueles que estabelecem sua própria justiça ao mantê-la.260 “Faça isso e você viverá”, é o princípio da lei. Debaixo da lei, os homens se esgotam (e falham miseravelmente) tentando merecer o favor de Deus e obter a nota máxima no final de seu curso.

Para o cristão, tudo é diferente. Ele já tem a sua nota má-xima; ele já tem a vida eterna; ele já tem o sorriso e o favor de Deus – tudo por causa da obra de Cristo em seu lugar! Deus tem prazer nele e se alegra com ele como um noivo se alegra de sua noiva: “Como o noivo se alegra da noiva, assim de ti se alegrará o teu Deus”.261 “Naquele dia, se dirá a Jerusalém: Não temas, ó Sião, não se afrouxem os teus braços. O senhor, teu Deus, está no meio de ti, poderoso para salvar-te; ele se delei-tará em ti com alegria; renovar-te-á no seu amor, regozijar-se-á em ti com júbilo.”262 Sabendo como sabemos o quão pecado-

260 Gálatas 3.12; Lucas 10.25-28; Filipenses 3.9; Romanos 10.5261 Isaías 62.5262 Sofonias 3.16-17

Uma mudança de reino: da lei para a graça – 147

res e indignos do deleite de Deus ainda somos, é difícil para nós acreditar que ele possa realmente se sentir assim sobre nós. Mas ele sente! Ele não somente nos ama; ele nos ama além de nossa capacidade de compreender – o seu amor “excede todo o entendimento”!263

O cristão está livre da lei como uma exigência para a obtenção de vida. Cristo não apenas o livrou da maldição da lei; mas também obteve para ele todas as bênçãos da vida e da justiça. “Cristo nos resgatou da maldição da lei,... para que a bênção de Abraão chegasse aos gentios, em Jesus Cristo, a fim de que recebêssemos, pela fé, o Espírito prometido.”264 Isso significa que, em vez de viver sob uma maldição, o cristão vive agora sob a bênção perpétua de Deus. Embora seus filhos possam ficar doentes, seu jardim ser arruinado com a seca, e as suas flores murchem, ele vive continuamente sob o sorriso de Deus. Esse estado de bem-aventurança flui de sua justifica-ção: “Ora, tendo a Escritura previsto que Deus justificaria pela fé os gentios, preanunciou o evangelho a Abraão: Em ti, serão abençoados todos os povos. De modo que os da fé são aben-çoados com o crente Abraão.”265 “E é assim também que Davi declara ser bem-aventurado o homem a quem Deus atribui jus-tiça, independentemente de obras: Bem-aventurados aqueles cujas iniquidades são perdoadas, e cujos pecados são cobertos; bem-aventurado o homem a quem o Senhor jamais imputará pecado.”266 É infinitamente melhor definhar em uma cela de prisão sob a bênção de Deus, do que viver em um palácio sob a 263 Efésios 3.19264 Gálatas 3.13-14265 Gálatas 3.8-9266 Romanos 4.6-8

148 – JUSTIFICAÇÃO E Regeneração

sua maldição! “Então, dirá o Rei aos que estiverem à sua direi-ta: Vinde, benditos de meu Pai! Entrai na posse do reino que vos está preparado desde a fundação do mundo.”267

Você é cristão? Então a bênção de Deus repousa sobre você de formas maravilhosas demais para imaginar! “Nem olhos viram, nem ouvidos ouviram, nem jamais penetrou em coração humano o que Deus tem preparado para aqueles que o amam.”268 “Bondade e misericórdia certamente me seguirão todos os dias da minha vida; e habitarei na Casa do senhor para todo o sempre.”269

REGRAS EXTERNASComo vimos nas seções acima, alguns aspectos da “liberdade da lei” do cristão tem a ver com justificação. Ele está livre da maldição da lei, e está livre da lei como um meio de obter vida. Mas outro aspecto da liberdade do cristão quanto à lei é um resultado direto da regeneração: O cristão está livre da lei como um conjunto de regras externas que contrariam sua verdadeira na-tureza e desejos. Essa liberdade vem a ele por meio do milagre de um novo coração.

Para entender o que isso significa, precisamos apenas considerar a condição de cada incrédulo: A lei impõe-se sobre ele, a partir do exterior, e contradiz os seus verdadeiros desejos, mantendo-o em um estado de servidão contínua e frustração. Ela proíbe as coisas que ele ama e ordena as que ele odeia. Quando ele estende a mão para roubar, a lei diz: “Não furtarás”.

267 Mateus 25.34268 1 Coríntios 2.9269 Salmo 23.6

Uma mudança de reino: da lei para a graça – 149

Quando ele olha para uma mulher com lascívia, a lei diz: “Não adulterarás”. A condição do homem perdido é assim resumida pelas palavras populares, “Tudo o que eu gosto é ilegal, imoral ou engorda”. A lei limita e restringe o homem não regenerado por meio do medo e de ameaças, e ele odeia isso: “O pendor da carne é inimizade contra Deus, pois não está sujeito à lei de Deus, nem mesmo pode estar”.270

Cada cristão foi liberto desse estado de escravidão. Para ele, a lei não é mais um conjunto de regras externas que contrariam sua verdadeira natureza e desejos. Pelo contrá-rio, a lei é interna; foi “escrita em seu coração” no milagre da regeneração.271 Ele é constrangido pelo amor, não pela lei.272 Amor que flui do seu interior em conformidade com a lei e a cumpre automaticamente, pois “o amor é o cumprimento da lei”.273 Um cristão sendo quem ele realmente é nunca terá que se preocupar com entrar em conflito com a lei de Deus! “O fruto do Espírito é: amor, alegria, paz, longanimidade, benignidade, bondade, fidelidade, mansidão, domínio pró-prio. Contra estas coisas não há lei.”274 Se sois guiados pelo Espírito, não estais sob a lei.”275

Em consonância com essa realidade, Paulo diz que “não se promulga lei para quem é justo, mas para transgressores e rebeldes, irreverentes e pecadores, ímpios e profanos, parri-cidas e matricidas, homicidas, impuros, sodomitas, raptores

270 Romanos 8.7271 Hebreus 8.10272 2 Coríntios 5.14273 Romanos 13.10; Gálatas 5.14274 Gálatas 5.22-23275 Gálatas 5.18

150 – JUSTIFICAÇÃO E Regeneração

de homens, mentirosos, perjuros e para tudo quanto se opõe à sã doutrina”.276 O homem justo não tem necessidade de tais restrições externas, uma vez que é contido por sua própria natureza santa. Mesmo os mandamentos e exortações do Novo Testamento são necessários apenas porque os crentes ainda não completamente “tornaram-se quem são”. Visto que ainda estamos nesse “corpo mortal”, sujeitos ao “engano do pecado”277 e às “ciladas do diabo”,278 precisamos ainda de orientação para nos ajudar a discernir o certo e o errado. No entanto, à medida que crescemos na graça, nossas mentes são progressivamente “renovadas”, e, “pela prática, nossas facul-dades são exercitadas para discernir não somente o bem, mas também o mal”.279 Desta forma, estamos mais e mais capaci-tados para “experimentar a boa, agradável e perfeita vontade de Deus”.280

O cristão não está “debaixo” da lei; ele está (para usar a verdadeira terminologia de Paulo) “dentro da lei com Cristo”.281 Se todos os homens fossem cristãos, não haveria necessidade de cadeados nas casas ou placas em lojas proibindo furtos. E essa situação se tornará uma realidade no céu, onde todos sen-tirão absoluta liberdade para fazer o que quiser! Não haverá placas no céu, dizendo: “Não matarás” ou “Amarás o Senhor teu Deus com todo o teu coração” – não haverá nenhuma ne-cessidade delas!

276 1 Timóteo 1.8-10277 Hebreus 3.13278 Efésios 6.11279 Hebreus 5.14280 Romanos 12.2281 1 Coríntios 9.21 (Gr. “ennomos Christou”)

Uma mudança de reino: da lei para a graça – 151

OFERTA E DEMANDATodos os cristãos morreram para a Lei. Eles não estão “debaixo da lei, mas debaixo da graça”. Examinar o significado desses ter-mos mais plenamente nos faria ir além do escopo desse livro, mas talvez outro aspecto da nossa “morte para a lei” deva ser mencionado. Os cristãos morreram para a lei, na medida em que já não vivem no reino da “demanda”, mas no reino da “oferta”. Eles estão “debaixo” da graça, não da lei, como um poder do-minante, e vivem no reino onde a graça “reina”.282 Nesse reino nada depende, em última instância, do homem; tudo depende de Deus. Todo desejo de bondade e todo ato de obediência é graciosamente trabalhado no crente por Deus! “Porque Deus é quem efetua em vós tanto o querer como o realizar, segundo a sua boa vontade.”283

No reino onde a graça reina, Deus compromete-se a tra-balhar em mim, apesar de minhas fraquezas e falhas até que eu esteja perfeitamente conforme a imagem de Cristo. Embora eu possa ficar chocado com as minhas falhas enquanto cristão, Deus não fica! Ele já conhecia todos os meus pecados e fraque-zas antes mesmo de pôr o seu amor sobre mim, e ele realmente controla e direciona meus fracassos para o meu próprio bem – a fim de expor as minhas fraquezas e me livrar delas. (Lucas 22.31-32) Na Nova Aliança, Deus misericordiosamente deter-mina “nos purificar de todas as nossas imundícias e de todos os nossos ídolos.”284 e nunca descansará ou cederá até que o traba-lho seja finalmente cumprido! Aleluia!

282 Romanos 5.21283 Filipenses 2.13284 Ezequiel 36.25

152 – JUSTIFICAÇÃO E Regeneração

Segurança em tua graça santificadora,

Todo poderoso para restaurar —

De agora em diante — pecado e morte para trás,

E amor e vida adiante —

Ó, que minha alma abunde em esperança,

E louve-o mais e mais!

A. L. Waring

Mas vós sois dele, em Cristo Jesus, o qual se nos tornou, da parte de Deus, sabedoria, e justiça, e santificação, e re-denção, para que, como está escrito: Aquele que se gloria, glorie-se no Senhor.

1 Coríntios 1.30-31

Nos capítulos anteriores, consideramos um pouco dos milagres da justificação e regeneração. Deveria estar claro nes-te ponto que esses atos poderosos estão verdadeiramente no coração e no centro do evangelho. Que “boa-nova” poderia ser mais gloriosa do que a proclamação da comunhão restau-rada com Deus – que o mais irremediavelmente condenado pode se colocar sem vergonha na presença de Deus, revestido pela própria justiça de Cristo, e que o mais vil e o mais repugnante podem se tornar criaturas totalmente novas nele?

Capítulo Quinze

UMA MUDANÇA DE REINO:DE ADÃO

PARA CRISTO

154 – JUSTIFICAÇÃO E Regeneração

Mas por mais maravilhosas que sejam, tanto a justificação quanto a regeneração são apenas parte de uma realidade muito mais abrangente, a realidade de nosso ser “em Cristo”. Como cristãos, podemos dizer que somos justificados, que temos a perfeita justiça, que somos novas criaturas, que estamos assen-tados nos lugares celestiais, e que somos abençoados de todas as outras maneiras que consideramos nas páginas anteriores, ou podemos simplesmente dizer que estamos “em Cristo”! Pois es-tar em Cristo é ter todas as bênçãos espirituais imagináveis285 – incluindo justificação e regeneração, e todas as outras “boas e perfeitas dádivas”.286 (Ver Apêndice D.)

JUSTIFICADOS EM CRISTOTodas as bênçãos da justificação são nossas em Cristo. Em Cristo, temos perfeita justiça – a própria justiça de Deus: “Para eu... ser achado nele, não tendo justiça própria, que procede de lei, senão a que é mediante a fé em Cristo, a jus-tiça que procede de Deus, baseada na fé”.287 “Aquele que não conheceu pecado, ele o fez pecado por nós; para que, nele, fôssemos feitos justiça de Deus.”288 Assim, pode-se dizer que somos “justificados em Cristo”.289 Em Cristo, temos “o perdão dos pecados”,290 e “nenhuma condenação há para os que estão em Cristo Jesus”.291

285 Efésios 1.3286 Tiago 1.17287 Filipenses 3.8-9288 2 Coríntios 5.21289 Gálatas 2.17290 Colossenses 1.14291 Romanos 8.1

Uma mudança de reino: de Adão para Cristo – 155

NOVAS CRIATURAS EM CRISTOAssim como todas as bênçãos da justificação são nossas em Cristo, todas as bênçãos da regeneração são nossas nele: “E, as-sim, se alguém está em Cristo, é nova criatura; as coisas antigas já passaram; eis que se fizeram novas.”292 “Pois somos feitura dele, criados em Cristo Jesus para boas obras.”293 Fomos “san-tificados em Cristo Jesus”294, “nele, fomos aperfeiçoados”295 e estamos assentado “nos lugares celestiais em Cristo Jesus”.296

UMA VIDA DEPENDENTEA partir desses versos deveria ficar evidente que a justificação e regeneração não são bênçãos que possuímos em nós mesmos, independente de Deus. Deus não nos torna novas criaturas de maneira que nós mesmos nos tornemos fontes positivas de jus-tiça, capazes de produzir vida por nós próprios, à parte dele. Em vez disso, somos novas criaturas em Cristo Jesus. À parte de Cristo não somos nada nem podemos fazer nada.297 Tudo o que somos e temos, temos somente nele. Assim, a vida cristã é uma vida totalmente dependente. Esse é o ensinamento de nosso Senhor em João 15: “Permanecei em mim, e eu permanecerei em vós. Como não pode o ramo produzir fruto de si mesmo, se não permanecer na videira, assim, nem vós o podeis dar, se não permanecerdes em mim. Eu sou a videira, vós, os ramos. Quem permanece em mim, e eu, nele, esse dá muito fruto; porque

292 2 Coríntios 5.17293 Efésios 2.10294 1 Coríntios 1.2295 Colossenses 2.10296 Efésios 2.6297 João 15.5

156 – JUSTIFICAÇÃO E Regeneração

sem mim nada podeis fazer”.298 Não somos “por nós mesmos, capazes de pensar alguma coisa, como se partisse de nós; pelo contrário, a nossa suficiência vem de Deus, o qual nos habilitou para sermos ministros de uma nova aliança, não da letra, mas do espírito; porque a letra mata, mas o espírito vivifica”299

Esvaziado para que tu possas encher-me,

Um vaso limpo em tuas mãos;

Sem poder senão pelo que tu deste,

Graciosamente com cada mandamento.

Apenas canais, abençoado Mestre,

Mas com todo o teu maravilhoso poder,

Fluindo através de nós, podes nos usar

Todos os dias e todas as horas.

Mary Maxwell

“EM ADÃO” VS. “EM CRISTO”Isso nos leva a considerar uma “mudança de reino” final que é mais fundamental, profunda e abrangente do que qualquer outra – a mudança de reino de estar “em Adão” para estar “em Cristo”. De acordo com a Bíblia, toda a história humana pode ser resumi-da em termos de dois homens: Adão e Cristo. Todos os outros homens estão “em” um ou outro. Aqueles que estão em Adão morrem; aqueles que estão em Cristo vivem para sempre.

Visto que a morte veio por um homem, também por um ho-

mem veio a ressurreição dos mortos. Porque, assim como, em

298 João 15.4-5299 2 Coríntios 3.5-6

Uma mudança de reino: de Adão para Cristo – 157

Adão, todos morrem, assim também todos serão vivificados

em Cristo. Cada um, porém, por sua própria ordem: Cristo,

as primícias; depois, os que são de Cristo, na sua vinda.

1 Coríntios 15.21-23

Pois assim está escrito: O primeiro homem, Adão, foi feito

alma vivente. O último Adão, porém, é espírito vivificante.

Mas não é primeiro o espiritual, e sim o natural; depois, o

espiritual. O primeiro homem, formado da terra, é terreno;

o segundo homem é do céu. Como foi o primeiro homem,

o terreno, tais são também os demais homens terrenos; e,

como é o homem celestial, tais também os celestiais. E, as-

sim como trouxemos a imagem do que é terreno, devemos

trazer também a imagem do celestial.

1 Coríntios 15.45-49

Entretanto, reinou a morte desde Adão até Moisés, mesmo

sobre aqueles que não pecaram à semelhança da transgressão

de Adão, o qual prefigurava aquele que havia de vir... Se, pela

ofensa de um e por meio de um só, reinou a morte, muito

mais os que recebem a abundância da graça e o dom da justi-

ça reinarão em vida por meio de um só, a saber, Jesus Cristo.

Pois assim como, por uma só ofensa, veio o juízo sobre todos

os homens para condenação, assim também, por um só ato

de justiça, veio a graça sobre todos os homens para a justifica-

ção que dá vida. Porque, como, pela desobediência de um só

homem, muitos se tornaram pecadores, assim também, por

meio da obediência de um só, muitos se tornarão justos.

Romanos 5.14,17-19

158 – JUSTIFICAÇÃO E Regeneração

Perceba que, nesses versos, é dito que Adão é um “tipo” de Cristo, e Cristo é “o último Adão”. Adão foi o primeiro homem, o cabeça da raça humana natural. Por meio de sua queda, o pe-cado e a morte entraram na humanidade, e ela foi destruída. Cristo veio como “o último Adão” para iniciar uma nova raça humana e ser o cabeça de uma nova humanidade. Assim como Adão representou e está vitalmente unido a todos aqueles que estão nele, também Cristo representou e está vitalmente unido a todos os que estão nele. Aqueles que estão em Adão partici-pam de tudo quanto era verdadeiro em Adão; aqueles que estão em Cristo participam de tudo quanto era verdadeiro em Cristo.

AS CARACTERÍSTICAS DOS DOIS REINOSA mudança de reino entre Adão e Cristo é a mudança mais fun-damental e abrangente que qualquer homem pode sofrer. Ela inclui todas as outras mudanças de reino que a Bíblia associa à conversão, incluindo todas aquelas discutidas nos capítulos anteriores. Observe novamente os dois reinos e tudo o que está compreendido em cada um deles:

EM ADÃO EM CRISTOPecado (Rm 5.12,19)

Condenação (Rm 5.18)

Morte (Rm 5.17; 1Co 15.22)

Carne (Rm 8.9; 7.5)

O mundano (Cl 2.20)

Lei (Rm 6.14)

Maldição (Gl 3.10)

Escravidão (Rm 7.6)

Reinado do Pecado (Rm 5.21)

Justiça (Rm 5.18,19)

Justificação (Rm 5.18)

Vida (Rm 5.18; 1Co 15.22)

Espírito (Rm 8.9)

O celestial (Cl 3.1-3)

Graça (Rm 6.14)

Benção (Gl 3.14, 8–9)

Liberdade (Rm 7.6; 2Co 3.17)

Reinado da Graça (Rm 5.21)

Uma mudança de reino: de Adão para Cristo – 159

EM ADÃO EM CRISTO“Debaixo” do pecado (Rm 3.9; 7.14)

Escravos do pecado (Rm 6.17)

A morte reina (Rm 5.17)

Trevas (At 26.18)

Domínio de Satanás (At 26.18)

“Debaixo” da graça (Rm 6.14)

Servos da justiça (Rm 6.18)

Reinamos em vida (Rm 5.17)

Luz (1Ts 5.4-5)

Reino de Deus (Cl 1.12-13)

OS CRISTÃOS “MORRERAM” PARA O ANTIGO REINO

Sabedores de que, havendo Cristo ressuscitado dentre os

mortos, já não morre; a morte já não tem domínio sobre ele.

Pois, quanto a ter morrido, de uma vez para sempre morreu

para o pecado; mas, quanto a viver, vive para Deus. Assim

também vós considerai-vos mortos para o pecado, mas vi-

vos para Deus, em Cristo Jesus.

Romanos 6.9-11

Uma vez que tenhamos entendido quão abrangentes os “dois reinos” de Adão e Cristo são, estamos em condições de compreender a intenção de Paulo ao falar dos cristãos como ten-do “morrido” para várias coisas. Em Romanos 6.11, Paulo exorta os cristãos a crerem e a contarem com o fato de que eles “morre-ram” para o pecado. Terminologia semelhante é usada a respeito da relação do cristão com a Lei: “Porque eu, mediante a própria lei, morri para a lei, a fim de viver para Deus”.300 A relação do cris-tão com o mundo também é tratada em termos de crucificação e morte: “Mas longe esteja de mim gloriar-me, senão na cruz de nosso Senhor Jesus Cristo, pela qual o mundo está crucificado para

300 Gálatas 2.19; Romanos 7.4; Colossenses 2.20-21

160 – JUSTIFICAÇÃO E Regeneração

mim, e eu, para o mundo. Pois nem a circuncisão é coisa alguma, nem a incircuncisão, mas o ser nova criatura”.301 Observe que a nossa morte para o mundo está vinculada tanto a “ser nova cria-tura” quanto à nossa “crucificação” com Cristo.

O que Paulo quer dizer quando afirma que os cristãos “morreram” para o pecado, a Lei, e o mundo? Certamente ele não quer dizer que “morremos” para essas coisas no sentido de que já não somos afetados por elas. Isso é evidente a partir do fato de que Paulo nos exorta a não “deixar o pecado reinar em nossos corpos mortais”. Tais exortações seriam desnecessárias se os cristãos não estivessem ainda sendo afetados pelo pecado. Romanos 6.11 não significa: “Finja que você já não é mais afe-tado pelo pecado, mesmo sabendo que você é”! Em vez disso, a chave para entender o sentido da nossa “morte para o pecado” é encontrada no versículo 10, que fala da experiência do próprio Cristo: “Pois, quanto a ter morrido, de uma vez para sempre mor-reu para o pecado; mas, quanto a viver, vive para Deus”.

Perceba que, de acordo com Paulo, mesmo o próprio Cristo “morreu para o pecado”! Em que sentido Cristo “mor-reu para o pecado” ao morrer? Ele alguma vez esteve “vivo” para ele? E em que sentido Cristo agora “vive para Deus” desde sua ressurreição? Ele alguma vez não esteve “vivo para Deus”? A resposta é clara: Quando Cristo morreu na cruz, ele “morreu para o pecado”, no sentido de que ele morreu para esse reino, e ele agora “vive para Deus”, no sentido de que passou para o reino celestial no momento de sua ressurreição e ascensão! “Pois”, diz Paulo no versículo 11, os cristãos “morreram para o pecado” ao sair do seu reino, e estão “vivos para Deus” ao entrarem em seu

301 Gálatas 6.14-15

Uma mudança de reino: de Adão para Cristo – 161

reino! Eles deixaram um reino e entraram em outro. Quando Paulo diz que “morremos para o pecado”, ele está se referindo a algo que realmente aconteceu! O cristão não morreu para o pe-cado, no sentido de que não é mais afetado por ele, mas morreu para o pecado, no sentido de que não vive mais sob o reino do pecado. Na crucificação e morte do nosso velho homem, va-mos para fora do reino da carne, fora do reino do mundo, fora do reino da lei, e fora do reino do pecado e da morte.

Cristão, você realmente “morreu para o pecado”, no sentido de que saiu de seu reino. O pecado não “reina” mais sobre você; ele já não lhe “serve” mais; ele não mais “é” você; você não é mais seu escravo! Como aconteceu com o ímpio no Salmo 37, tam-bém acontece com o cristão quando seu “velho homem” morre: “Mais um pouco de tempo, e já não existirá o ímpio; procurarás o seu lugar e não o acharás”.302 O “homem mau” que uma vez fomos “não é mais”. Ele não é “mais encontrado” em “seu lugar”, e aque-les que vieram esperar sua presença, “estranham” sua ausência: “Porque basta o tempo decorrido para terdes executado a vonta-de dos gentios, tendo andado em dissoluções, concupiscências, borracheiras, orgias, bebedices e em detestáveis idolatrias. Por isso, difamando-vos, estranham que não concorrais com eles ao mesmo excesso de devassidão”.303 Como essa mudança inesperada aconteceu é explicado nos versículos anteriores: “... aquele que sofreu na carne [i.e., morreu] deixou o pecado, para que, no tempo que vos resta na carne, já não vivais de acordo com as paixões dos homens, mas segundo a vontade de Deus”.304

302 Salmo 37.10303 1 Pedro 4.3-4304 1 Pedro 4.1-2

162 – JUSTIFICAÇÃO E Regeneração

Cristão, sua morte para o pecado é uma realidade! Por isso, conte com o fato de que você está morto para o pecado, mas vivo para Deus em Cristo Jesus!

A CERTEZA DA VIDA EM CRISTOTalvez seja adequado concluir esse estudo considerando mais uma vez o futuro indizivelmente brilhante que está à frente de todos os verdadeiros crentes. Todo cristão deveria ter grande conforto no fato de que agora está “em Cristo” e unido a Cristo. Afinal, cada um de nós experimentou em primeira mão os re-sultados reais e devastadores de nossa união com Adão! Nossa união com Adão eficazmente assegurou pecado, condenação e morte para cada um de nós. “O pecado reina”305 e “a morte rei-na”306 sobre todos os filhos caídos de Adão, levando-os para o abismo do inferno e da destruição.

Mas se a união com Adão é poderosa assim para garantir a morte, quanto mais poderosa é a união com Cristo para garantir a vida! Esse é o argumento de Paulo em Romanos 5. Ele repe-tidamente fala da obra de Cristo como “muito mais” eficaz do que a obra de Adão: “Se, pela ofensa de um e por meio de um só, reinou a morte, muito mais os que recebem a abundância da graça e o dom da justiça reinarão em vida por meio de um só, a saber, Jesus Cristo”.307 “Onde abundou o pecado, superabundou a graça, a fim de que, como o pecado reinou pela morte, assim também reinasse a graça pela justiça para a vida eterna, mediante Jesus Cristo, nosso Senhor.”308 O pecado é um terrível tirano que 305 Romanos 5.21306 Romanos 5.14307 Romanos 5.17,15308 Romanos 5.20-21

Uma mudança de reino: de Adão para Cristo – 163

reina com tal poder sobre aqueles que estão em Adão que a mor-te para eles é inevitável. Mas o pecado já não reina sobre o cristão. A graça reina sobre o cristão, e ela reina com tal inexorável poder que nada pode ficar em seu caminho. Cristão, você pode ter sido tão fraco e pecador, pode ter toda a razão em si para perder as esperanças de algum dia chegar ao céu, mas “a graça reina” em sua vida, e ela nunca descansará ou cederá até que todo pecado seja vencido, e você esteja perfeitamente conformado à imagem de Cristo! Aleluia! A graça “reina” efetivamente “por meio da jus-tiça” em todo momento “até a vida eterna”!

Que minha alma se levante,

E esmague o tentador;

Meu Capitão me guia adiante

Para a conquista e a coroa:

O mais fraco dos santos será vitorioso no dia,

Embora a morte e o inferno obstruam o caminho.

Ainda que todas as hostes da morte,

E potestades desconhecidas do inferno,

Apresentem-se em suas formas mais terríveis

De fúria e destruição,

Estarei seguro, pois Cristo manifesta

Poder superior, e graça protetora.

Isaac Watts

No momento de nossa união com Cristo, tudo o que vem a seguir torna-se verdade para nós:

1. Nova Criação – a) as coisas velhas passaram, e b) tornamo-nos novas criaturas.

• 2 Coríntios 5.14-17 nova criatura• Gálatas 6.15 (cf. v.14) nova criatura• Efésios 2.10 feitura dele, criados em Cristo Jesus• Efésios 2.15 dos dois criasse, em si mesmo, um novo ho-

mem – um corpo (v.16)• Efésios 4.24 novo homem, criado segundo Deus..., porque

somos membros uns dos outros (v.25)• Colossenses 3.10 o novo homem que se refaz, segundo a

imagem daquele que o criou• Cf. também, todos os versos com palavras derivadas de

“novo” – p.ex. Tito 3.5 “renovador”

Apêndice A

REGENERAÇÃOUM RESUMO

166 – JUSTIFICAÇÃO E Regeneração

2. Novo Nascimento – “nascemos de novo”; um nascimen-to real acontece no reino espiritual.• João 3.6 o que é nascido é espírito• 2 Pedro 1.4 coparticipantes da natureza divina• 1 João 3.9  nascido de Deus, o que permanece nele é a divi-

na semente, esse não pode viver pecando, porque é nascido de Deus.

• Hebreus 2.11 um Pai (de verdade!), portanto, irmãos• 1 João 3.1 “e, de fato, somos filhos de Deus. Por essa razão...”

3. Novo Coração a) nosso coração de pedra é removido, e b) é dado a nós “um coração de carne”.

• Ezequiel 36.22-32 “coração novo”, “espírito novo”, “Porei dentro de vós o meu Espírito”

• Jeremias 31.33-34 “na mente”, “no coração”• Jeremias 32.38-41 Dar-lhes-ei um só coração e um só cami-

nho; porei o meu temor no seu coração, para que nunca se apartem de mim..

• Hebreus 8.10 inscreverei...• 2 Coríntios 3.1-3 pelo Espírito do Deus vivente, não em

tábuas de pedra, mas em tábuas de carne, isto é, nos corações.

4. Circuncisão Espiritual – nosso coração écircuncidado pelo Espírito.• Romanos 2.28-29 circuncisão do coração no Espírito• Colossenses 2.10-11 Nele, aperfeiçoados; Nele, circunci-

dados, não por intermédio de mãos, mas no “despojamento”

Apêndice A – Regeneração: um resumo – 167

do corpo da carne, que é a circuncisão de Cristo; (v.13) estávamos mortos pela “incircuncisão da nossa carne” (a condição física de todos os gentios)

• Efésios 2.11 aqueles que “se intitulam” circuncisos, na carne, “por mãos humanas” (Há uma alusão e contraste aqui com a verdadeira circuncisão dos cristãos.)

• Filipenses 3.3 a verdadeira circuncisão, de quem adora no Espírito, e não confia na carne

• Atos 7.51 incircuncisos de coração e de ouvidos, sempre resistindo ao Espírito Santo

• Deuteronômio 30.6 o Senhor circuncidará o seu coração para amar...

5. Nova Natureza – transformados de espinheiros para figueiras!• Mateus 12.33-37 “Ou fazei a árvore boa e o seu fruto bom

ou a árvore má e o seu fruto mau; porque pelo fruto se conhece a árvore”.

• Mateus 7.15-20 (esp. v.18 “não pode”)

6. Novo Homem a) despimo-nos do velho homem, e b) revestimo-nos do novo homem. (Adão vs. Cristo)

• Colossenses 3.8-11 uma vez que vos despistes do ve-lho homem com os seus feitos e vos revestistes do novo homem que se refaz para o pleno conhecimento, se-gundo a imagem daquele que o criou; no qual não pode haver grego nem judeu...; porém Cristo é tudo em todos.

168 – JUSTIFICAÇÃO E Regeneração

• Efésios 2.10,14-16 para que dos dois criasse, em si mesmo, um novo homem, e reconciliasse ambos em um só corpo com Deus,

• Gálatas 3.27-28 porque todos quantos fostes batizados em Cristo de Cristo vos revestistes,... não pode haver judeu nem grego...; porque todos vós sois um em Cristo Jesus.

• Romanos 13.13-14 não em dissoluções, não em contendas e ciúmes; mas revesti-vos do Senhor Jesus Cristo e nada dis-ponhais para a carne no tocante às suas concupiscências.

• Efésios 4.22-25 quanto ao trato passado, vos despojeis do velho homem, que se corrompe segundo as concu-piscências do engano, e vos renoveis no espírito do vosso entendimento, e vos revistais do novo homem, criado segun-do Deus, em justiça e retidão procedentes da verdade. Por isso, deixando a mentira, fale cada um a verdade com o seu próximo, porque somos membros uns dos outros.

7. Crucificação e Ressurreição – a) nosso “velho homem” é crucificado, “nós” morremos, somos sepultados, e b) ressuscitados em novidade de vida, e subimos aos céus, nos tornando coparticipantes da vida e poder de Cristo por meio da habitação do Espírito Santo.

Crucificados:• Romanos 6.6 nosso homem velho foi crucificado com ele• Gálatas 2.20 Já fui crucificado com Cristo; e já não sou eu

quem vive• Gálatas 6.14 estou crucificado para o mundo por meio da

cruz de Cristo.

Apêndice A – Regeneração: um resumo – 169

Mortos:• Romanos 6.2 nós que morremos• Romanos 6.7 Porquanto quem morreu• Romanos 6.8 já morremos com Cristo• Romanos 7.4 vós morrestes relativamente à lei• Romanos 7.6 libertados da lei, estamos mortos para aqui-

lo a que estávamos sujeitos• Gálatas 2.19 morri para a lei• Gálatas 2.20 já não sou eu quem vive• Colossenses 2.20 morrestes com Cristo• Colossenses 3.3 morrestes• 2 Timóteo 2.11 se já morremos com ele• 2 Coríntios 5.14 logo, todos morreram

Sepultados:• Romanos 6.4 sepultados com ele• Colossenses 2.12 tendo sido sepultados com ele no

batismo

Ressuscitados e elevados:• Romanos 6.4 como Cristo foi ressuscitado, assim tam-

bém andemos nós em novidade de vida.• Romanos 6.5 semelhança da sua ressurreição• Romanos 6.8 também com ele viveremos• Romanos 6.11 vivos para Deus, em Cristo Jesus• Romanos 6.13 como ressurretos dentre os mortos• Efésios 2.5-6 nos deu vida juntamente com Cristo, e nos

ressuscitou com ele, e nos fez assentar nos lugares celes-tiais; cf. 5.14!

170 – JUSTIFICAÇÃO E Regeneração

• Gálatas 2.19 a fim de viver para Deus• Gálatas 5.25 vivemos no Espírito• Colossenses 2.12 no qual igualmente fostes ressuscitados

mediante a fé no poder de Deus que o ressuscitou dentre os mortos.

• Colossenses 3.1-3 fostes ressuscitados juntamente com Cristo, buscai as coisas lá do alto, onde Cristo vive, assenta-do à direita de Deus, porque morrestes, e a vossa vida está oculta juntamente com Cristo, em Deus.

• 2 Coríntios 5.15  para que os que vivem vivam para aquele que por eles morreu e ressuscitou.

Coparticipantes de sua vida e poder:• João 4.14 nele uma fonte a jorrar para a vida eterna.• João 6.57 “como... eu vivo pelo Pai, também... [ele] por mim

viverá.”• João 15.4-5 permanecei em mim, e eu em vós. O ramo não

pode produzir fruto de si mesmo.• 2 Coríntios 4.11 que também a vida de Jesus se manifeste

em nossa carne mortal.• Gálatas 2.20 “já não sou eu quem vive, mas Cristo vive em

mim”• Efésios 3.16,20 fortalecidos com poder, mediante o seu Es-

pírito no homem interior; fazendo infinitamente mais do que tudo quanto pedimos ou pensamos, conforme o seu poder que opera em nós

• Colossenses 3.4 Cristo, que é a nossa vida• Filipenses 1.19,21 a provisão do Espírito de Jesus Cristo;

“o viver é Cristo”

Apêndice A – Regeneração: um resumo – 171

• Filipenses 4.13 “Tudo posso naquele que me fortalece.”• Muitos outros!

8. Carne/Espírito a) não estamos mais “na carne”, mas b) estamos “no Espírito”.

• Romanos 7.5 quando vivíamos...• Romanos 8.5-9 os que se inclinam para a carne; “o pendor

da carne dá para a morte”; os que estão na carne não po-dem agradar a Deus. Vós, porém, não estais na carne, mas no Espírito, se, de fato, o Espírito de Deus habita em vós. 

• 1 Coríntios 2.10–3.4 natural, carnal, “segundo os ho-mens”; em contraste com “espiritual” e “mente de Cristo” (i.e., estavam agindo como homens perdidos)

• 2 Coríntios 5.16 nós, daqui por diante, a ninguém co-nhecemos segundo a carne; e, se antes conhecemos Cristo segundo a carne, já agora não o conhecemos deste modo; nova criatura, as coisas antigas já passaram; (i.e., já não en-xergamos nada mais do ponto de vista carnal, porque não estamos mais vivendo lá!)

• Gálatas 5.25 vivemos pelo Espírito (Perceba o contraste carne/Espírito nos versos precedentes).

9. Terreno/celestial a) fomos transladados da esfera terrena, e b) colocados na esfera celestial.

• Colossenses 2.20 “como se vivêsseis no mundo”!• Colossenses 3.1-3 “coisas lá do alto” em contraste com

coisas “aqui da terra”

172 – JUSTIFICAÇÃO E Regeneração

• Filipenses 3.19b-20 “coisas terrenas” em contraste com “nos céus”; somos cidadãos agora

• Efésios 2.6 “juntamente com ele... nos fez assentar”, “nos lugares celestiais”, “em Cristo”

• Efésios 1.3 “nas regiões celestiais”, “em Cristo”• Gálatas 4.25-26 “Jerusalém atual” versus “Jerusalém lá de

cima”• Hebreus 12.22 tendes chegado à “Jerusalém celestial” ver-

sus “monte que se podia tocar”• Gálatas 6.14 crucificado para o mundo!• João 17.14,16 não do mundo, como também Cristo não do

mundo! Cf. João 8.23, 1 João 4.4-6

10. Trevas/luz – a) fomos tirados do reino das “trevas”, e b) colocados no reino da “luz”.• Efésios 5.7-14 outrora, éreis trevas, porém, agora, sois luz

no Senhor; andai como filhos da luz; obras das trevas; desperta, ó tu que dormes, levanta-te de entre os mortos, e Cristo te iluminará.

• Colossenses 1.12-13 idôneos à parte que vos cabe da herança dos santos na luz... ele nos libertou do império (reino) das trevas e nos transportou para o reino do Filho do seu amor.

• 1 Tessalonicenses 5.1-11 não estais em trevas; vós todos sois filhos da luz e filhos do dia; nós não somos da noite, nem das trevas; já que somos do dia, sejamos sóbrios...

• Romanos 13.11-14 despertardes do sono; vem chegando o dia. Deixemos, pois, as obras das trevas e revistamo-nos das armas da luz; andemos como em pleno dia

Apêndice A – Regeneração: um resumo – 173

• 1 João 2.7-11 as trevas se vão dissipando, e a verdadeira luz já brilha; “na luz” versus “nas trevas”; “as trevas lhe cega-ram os olhos”.

• Atos 26.18 para lhes converteres das trevas para a luz e da potestade de Satanás para Deus

• 1 Pedro 2.9 chamou das trevas para a sua maravilhosa luz• Cf. também Mateus 4.16; 5.14-16; Lucas 1.79; 11.33-36;

16.8; 22.53; João 1.5 (“trevas” = homens!), 3.19-21, 8.12, 12.35-36, 12.46; 2 Coríntios 4.1-6, 6.14; 1 João 1.5-7

11. Servos de Deus – a) fomos libertos da escravidão do pe-cado, e b) feitos servos da justiça.• Romanos 6.6-7 não mais escravos do pecado• Romanos 6.14 o pecado não terá domínio sobre vós• Romanos 6.16-23 éreis escravos do pecado; libertados do

pecado, fostes feitos servos da justiça; libertados do pecado, transformados em servos de Deus

• João 8.31-36 escravo do pecado; escravo não fica sempre na casa; verdadeiramente livres

• Perceba as implicações para a interpretação correta de Ro-manos 7, onde Paulo fala de um homem que está “vendido à escravidão do pecado” (v.14), “prisioneiro da lei do pe-cado” (v.23), “escravo” da lei do pecado (v.25), e ainda a necessidade de ser “livrado” do corpo da morte (v.24).

Na morte do velho e na ressurreição do novo, nós:• morremos para o pecado e vivemos para Deus. Romanos

6.1-14; 1 Pedro 2.24 (cf. 1 Pedro 4: 1-2)

174 – JUSTIFICAÇÃO E Regeneração

• morremos para a lei e vivemos para Deus. Romanos 7.4-6; Gálatas 2.19; Colossenses 2.20-22; Gálatas 6.12-15

• morremos para nós mesmo e vivemos para Deus. 2 Corín-tios 5.15 (cf. v.14-17)

• morremos para o mundo (como a esfera da lei e do pecado) e vivemos para Deus:◆ Colossenses 2.20 (o mundo como a esfera da lei – ver

v.16-17,20-23)◆ Colossenses 3.3 (o mundo como a esfera do pecado – ver

v.2,5ss).◆ Gálatas 6.14 (o mundo como a esfera da lei – ver v.12-15

e 4.3)

À medida que começamos a crer (i.e., “reconhecer”, contar com o fato – Romanos 6.11) que somos novas criaturas vivas na es-fera celestial, o “espírito de nossa mente” é progressivamente “renovado” (Romanos 12.2 ; Efésios 4.23, Colossenses 1.9), e somos capacitados cada vez mais a ver, pensar e agir a partir da perspectiva celestial:

• Visto que já “temos a mente de Cristo” (1 Coríntios 2.16; Romanos 8.6), estamos agora em condições de “deixar” sua mente reinar em nós (Filipenses 2.5) e nos “armar” com sua mente (1 Pedro 4.1-2). cf. Filipenses 3.15 (v.13-15)

• Visto que já fomos crucificados, somos agora capa-citados pela fé a “tomar a cruz e negar a nós mesmos” (Lucas 9.23) – verdadeiramente, não apenas “abnegação” hipócrita.

Apêndice A – Regeneração: um resumo – 175

• Visto que vivemos pelo Espírito, agora podemos andar pelo Espírito (Gálatas 5.25). Contraste Colossenses 3.7.

• Visto que fomos despojados do velho homem e revestidos do novo homem (Colossenses 3.9-10), somos exortados a viver de acordo, “despojando-nos do velho homem” (i.e., suas obras) (Efésios 4.22), “despojando-nos da ira... e revestindo-nos de ternos afetos de misericórdia...” (Co-lossenses 3.8,12), e “revestindo-nos das armas da luz” (Romanos 13.12; Efésios 6.10 -18; 1 Tessalonicenses 5.8).

• Nota: Algumas autoridades afirmam que os infinitivos de Efésios 4.22,24 não são imperativos, mas “infinitivos de resultado” e devem ser traduzidos como “...você deixou de lado o velho ... e revestiu-se do novo homem ...” (Veja John Murray, Princípios de Conduta, 214-18) Isto faria os v.22 e 24 serem declarações de um fato (como em Colossenses 3: 9-10) e os v.25-32 serem exortações baseadas nessas decla-rações de fato.

• Visto que já “fomos revestidos de Cristo” (Gálatas 3:27); estamos agora em condições de, na prática, nos “revestir-mos do Senhor Jesus Cristo” (Romanos 13:14).

• Visto que somos filhos da luz, devemos andar como filhos da luz (Efésios 5: 7-10; 1 Tessalonicenses 5: 4-10).

• Visto que somos escravos da justiça, podemos agora nos re-cusar a deixar o pecado “reinar” e podemos apresentar os nossos membros como instrumentos de justiça (Romanos 6:12, 19).

• Cf. também Tiago 3.10-12; Isaías 52.1-2; Isaías 60.1-5; Pro-vérbios 31.4; etc.

176 – JUSTIFICAÇÃO E Regeneração

Resumo de termos:• O “velho homem”: o nosso velho eu, que éramos em Adão,

a nossa eu não-regenerado• O “novo homem”: quem somos em Cristo, nova criatura,

nossa verdadeira identidade como cristãos• O “corpo do pecado”: a “carne”; o corpo físico não redimi-

do visto como o reino onde o pecado ainda tenta reinar. Cf. Romanos 6:12, 13, 19; Romanos 7: 5, 14, 18, 23, 24, 25; Romanos 8: 3, 10-13 (Nota: o pecado = “as obras do cor-po”!); Romanos 12: 1-2; Colossenses 3: 5-F. (Nota: v.5 lit. “fazer morrer os membros que estão sobre a terra”!); Gála-tas 5: 19f.

• “Reino”: a região ou esfera em que algo domina, “reina”, ou prevalece; mesmo que “reino” (Colossenses 1.13b). Veja também “império” (Colossenses 1.13a) e “potestade” (Atos 26.18): autoridade, jurisdição.

João nos diz em 1 João 3.4-9 que os cristãos “não vivem na prática” do pecado e “não podem” viver pecando. O que ele quer dizer com essas declarações? Várias respostas foram dadas a essa pergunta ao longo dos séculos, mas aqui consideraremos apenas duas delas.

1. Uma explicação popular desses versículos é que a nova natureza do cristão não pode pecar. A “semente de Deus” (que é perfeita) “permanece” no cristão, e nunca deseja nem comete nem mesmo um único ato de pecado. Embora haja muita verdade nessa visão, ela, no entanto, enfrenta objeções formidáveis.

Primeiro de tudo, João não diz que a nova natureza do cristão não pode pecar; ele diz que o próprio cristão não pode pecar: “[ele] não vive na prática de pecado; pois o que perma-

Apêndice B

“NÃO PODE PECAR”

178 – JUSTIFICAÇÃO E Regeneração

nece nele é a divina semente; ora, esse não pode viver pecando, porque é nascido de Deus” (1 João 3.9). O “ele” que “não pode viver pecando” é claramente o cristão como uma pessoa comple-ta – a mesma pessoa de quem se diz ser “nascido de Deus” na última parte do versículo.

Em segundo lugar, a proposta de que a “nova natureza” de um cristão não peca é na verdade uma afirmação sem sen-tido. Somente pessoas são capazes de pecar ou não pecar; uma natureza abstrata não pode desejar ou agir de maneira nenhu-ma. Como vimos no Capítulo 9, uma “natureza” não é algo que “possuímos” separadamente de nossas pessoas; é uma descri-ção de quem realmente somos em nosso íntimo.

Em terceiro lugar, “praticar o pecado” é contrastado nos versículos 7-8 com “praticar a justiça”. Certamente João está pensando aqui, não em um único ato de justiça, mas na prática da justiça. Então, da mesma forma, quando ele fala nessa passa-gem da impossibilidade de os cristãos “praticarem pecado”, ele provavelmente tem em mente, não um único ato de pecado, mas a prática do pecado.

Em quarto lugar, João está preocupado aqui em mostrar que as ações reais dos cristãos são diametralmente opostas às ações do não regenerado. Ele está falando sobre cristãos real-mente não pecando, não apenas cristãos “pecando e odiando isso” ou cristãos “pecando, mas não pecando a partir de sua nova natureza”. Tal ensinamento cairia como uma luva nas mãos dos próprios hereges que João está combatendo.

2. A melhor explicação para esses versículos é que o “pecado” que um crente “não vive na prática” e “não pode” viver na prática é o pecado habitual ou persistente. João está,

Apêndice B – “Não pode pecar” – 179

literalmente, dizendo que o cristão não “pratica o pecado”. Ou seja, o cristão não “vive na prática” do pecado. Pelo contrário, o cristão “pratica a justiça”: “Filhinhos, não vos deixeis enganar por ninguém; aquele que pratica a justiça é justo, assim como ele é justo” (1 João 3.7).

Por que o cristão se encontra incapaz de “praticar o pe-cado”? A resposta é dada no versículo 9: “Todo aquele que é nascido de Deus não vive na prática de pecado; pois o que permanece nele é a divina semente; ora, esse não pode viver pecando, porque é nascido de Deus”. Todos os cristãos têm uma nova natureza (a semente de Deus) como a sua identi-dade essencial. Essa nova natureza (que é perfeita) se coloca contra todo o mal, efetivamente impedindo o crente de viver em pecado. Ao contrário, a justiça é a principal característica de sua vida. A caminhada do cristão não é perfeita, no entanto, porque ele ainda tem a carne com a qual contender ao longo dessa vida. Quando o seu corpo mortal é redimido, então a nova vida já presente nele se manifestará em sua plenitude, e suas ações corresponderão perfeitamente aos desejos do seu coração renovado.

Essa compreensão das palavras de João é a única que dá um peso total ao tempo presente dos verbos envolvidos e é refletida nas melhores traduções modernas em inglês de 1 João 3.4-9.

Tentar lidar com as controvérsias em torno de Romanos 7 levaria um livro inteiro. Apenas algumas orientações para a sua interpretação podem ser sugeridas aqui:

1. Romanos 7 flui diretamente de Romanos 6, con-tinuando e expandindo os temas que são introduzidos ali. De acordo com Romanos 6, os cristãos “morreram para o pecado”309 em virtude de sua união com Cristo, pelo que foram “libertos”310 do pecado, de forma que já não tem “do-mínio”311 sobre eles. O resultado dessa morte para o pecado

309 Romanos 6.2,11310 Romanos 6.7,18,22311 Romanos 6.14 (Gr. “domínio”, “governo”)

Apêndice C

ROMANOS 7*

* Aos interessados em ler mais sobre esse assunto são indicados: Robert L. Reymond, A New Systematic Theology of the Christian Faith, Apêndice F, 1127-32; Martyn Lloyd-Jones, The Law: Its Functions and Limits; e Herman Ridderbos, Paul: An Outline of His Theology, 126-30.

182 – JUSTIFICAÇÃO E Regeneração

é “serviço”312 a Deus que traz “fruto”313 para a santificação. Paulo repete esse padrão de triunfo em Romanos 7: os cris-tãos “morreram para a lei”314 em virtude de sua união com Cristo, pelo que foram “libertos”315 dela, de forma que a lei já não tem “domínio”316 sobre eles. O resultado dessa morte para a lei é “serviço”317 a Deus que traz “fruto”318 para Deus. Em suma, Paulo estava “em terreno elevado” em Romanos 6, e continua a subir em Romanos 7!

O propósito real de Romanos 7 é explicar e expandir a declaração de Paulo em 6.14: “Porque o pecado não terá do-mínio sobre vós; pois não estais debaixo da lei, e sim da graça”. De acordo com esse versículo, a nossa libertação do domínio do pecado é um resultado direto do fato de que não estamos mais “debaixo da lei”. A primeira pergunta a ser respondida é: “Como foi que os cristãos passaram a não estar mais ‘debaixo da lei’”? Paulo responde a essa pergunta em 7.1-4. Os cristãos saíram do reino da lei, tendo morrido para ele em virtude de sua união com Cristo. A segunda pergunta a ser respondida é: “Por que a liberdade da lei é necessária para garantir a nos-sa libertação do reino do pecado?” Ou, invertendo, “Por que a liberdade do reino do pecado é impossível para todos os que ainda estão debaixo da lei?” Paulo responde a essa pergunta em 7.5-25. Todos os que ainda estão “debaixo da lei” também estão ainda “na carne” (v.5). Mas a lei realmente desperta e fortalece 312 Romanos 6.22313 Romanos 6.21-22 (Gr. “fruto”)314 Romanos 7.4315 Romanos 7.6, 2-3316 Romanos 7.1 (Gr. “domínio”, como em 6.14)317 Romanos 7.6318 Romanos 7.4

Apêndice C – Romanos 7 – 183

o domínio do pecado sobre aqueles que estão na carne, deixan-do-os em um estado de escravidão e de morte (v.5, 7-25).

2. É absolutamente vital perceber que Paulo pensa em termos de dois e apenas dois grupos – aqueles que estão “debaixo da lei” (“na carne”) e aqueles que estão “debaixo da graça” (“no Espírito”). As características desses dois gru-pos estão resumidas tanto antes (7.5-6) quanto depois (8.1-4) da discussão de Paulo em Romanos 7.7-25. Isso significa que nos versículos 14-25, Paulo não descreve um “cristão carnal” que ainda não “chegou a Romanos 8”, como uma visão “de vida mais profunda” de Romanos 7 estaria nos dizendo. Todos os cristãos estão “em” Romanos 8, assim como todos os cristãos estão “em” Romanos 6 e “em” Romanos 7.6.

3. Paulo já descreveu em detalhes o estado de cada cristão em Romanos 6 e em Romanos 7.1-6. Não podemos ignorar essa descrição quando chegamos à última parte de Romanos 7. De acordo com Romanos 6 e Romanos 7.1-6, todos os cristãos foram “libertos do pecado” e tornaram-se “servos da justiça”.319 “O pecado não terá domínio” sobre os cristãos, pois eles não estão “debaixo da lei, mas debaixo da graça”.320 Os cristãos pertencem a outro, “a saber, aquele que ressuscitou dentre os mortos, a fim de que frutifiquemos para Deus”.321 Eles são “ressurretos dentre os mortos”.322 Eles não es-tão mais “na carne”.323 Eles servem “em novidade de espírito e não na caducidade da letra”.324

319 Romanos 6.18320 Romanos 6.14321 Romanos 7.4322 Romanos 6.13323 Romanos 7.5324 Romanos 7.6

184 – JUSTIFICAÇÃO E Regeneração

A visão de que Romanos 7.14-25 é uma descrição de “o cristão no seu melhor, ou mesmo de Paulo no momento em que a carta foi escrita” vai, portanto, diretamente de encontro a tudo o que Paulo disse até esse ponto. Como podemos ler Romanos 6 e 7.1-6 e ainda afirmar que todos os verdadeiros cristãos são realmente “carnais, vendidos à escravidão do pecado”!325

É muito significativo que essa visão de Romanos 7 te-nha levado ao conceito de “homem miserável” da vida cristã, no qual a “miséria” e espiritualidade estão quase equiparadas, e quanto mais santos nos tornamos, mais “miseráveis” nós so-mos. Nas palavras de um escritor: “Esse lamento, ‘Miserável homem que eu sou’, expressa a experiência normal do cristão, e qualquer cristão que não lamente assim está em um estado anormal e insalubre espiritualmente. O homem que não pro-fere esse grito diariamente ou está tão distante da comunhão com Cristo, ou é tão ignorante quanto ao ensino das Escrituras, ou está tão enganado sobre sua condição real, que não conhece as corrupções do seu próprio coração e o fracasso abjeto de sua própria vida”.326 “Aquele que está verdadeiramente em comu-nhão com Cristo, proferirá esse lamento... todo dia e hora.”327

É verdade que nesses dias de “cristianismo água com açúcar” e arrependimento superficial, multidões de “cristãos” professos precisam desesperadamente de uma revelação de sua própria depravação e corrupção interior. No caso de muitos, isso levaria a um pranto amargo328 e conversão genuína. Mas qualquer verdadeiro filho de Deus que já viajou uma distância 325 Romanos 7.14326 A. W. Pink, “O Cristão em Romanos 7”327 Pink.328 Zacarias 12.10

Apêndice C – Romanos 7 – 185

considerável no caminho da peregrinação já sabe um pouco sobre a sua própria miséria e vileza à parte do poder transfor-mador de Cristo. Em vez de orar para que Deus nos dê “tal visão de [nossa] própria depravação e indignidade para que possamos realmente rastejar no pó diante dele”329, não seria mais bíblico pedir a Deus por tal visão sobre a vida de ressur-reição de Cristo em nós330 e nossa nova natureza nele331 para que possamos subir aos lugares celestiais e alegremente servi-lo em novidade de vida?

Alguns teólogos tentaram escapar dessa visão do “mi-serável cristão” de Romanos 7, dizendo que, embora Paulo esteja falando aqui de sua própria experiência presente como um crente, ele está apenas descrevendo o fato de que “nenhum cristão é tão santo quanto deseja ser”. Romanos 7, de acordo com esse ponto de vista, ensina apenas que “os olhos do cristão enxergam além do que ele pode alcançar” e que, durante seu tempo de vida, o cristão “não pode chegar à perfeição”. Todas essas afirmações são, sem dúvida, verdadeiras, mas elas não fazem justiça ao nível de fracasso e miséria evidente nessa pas-sagem. Paulo está claramente descrevendo aqui (para usar suas próprias palavras) um estado de “desventura”332, um estado de “escravidão”333 e um estado de incapacidade334 de “fazer o bem”. Em outras palavras, o homem de Romanos 7 não está apenas lutando com o pecado, mas está completamente derrotado por

329 Pink.330 Efésios 1.18-23; Efésios 3.14-21331 Colossenses 3.9-13332 Romanos 7.24333 Romanos 7.14,23-24334 Romanos 7.18-19

186 – JUSTIFICAÇÃO E Regeneração

ele, em forte contraste com a descrição de Paulo de todos os verdadeiros cristãos em Romanos 6 e Romanos 7.1-6.

4. Romanos 6 e 7 são estruturados em torno de qua-tro perguntas e de suas respectivas respostas. No final de Romanos 5, Paulo faz duas afirmações chocantes que exigem de-fesa e esclarecimento. A primeira é que “sobreveio a lei para que avultasse a ofensa”, e a segunda é que “onde abundou o pecado, superabundou a graça” (v.20). Paulo espera que essas declarações possam ser mal interpretadas e distorcidas por outros, assim, ele passa a esclarecê-las e defendê-las nos capítulos 6-7. Ele faz isso em termos de quatro perguntas e suas respectivas respostas (6.1; 6.15; 7.7; 7.13). Cada uma dessas seções de perguntas e respos-tas segue um padrão muito específico. Primeiro, Paulo coloca a antecipada má interpretação ou distorção de sua posição. Então, segue com uma forte negação (“De modo nenhum!”) e uma bre-ve resposta resumida à má interpretação. Essa breve resposta é então esclarecida e exposta nos versículos que se seguem. Este padrão é invariável ao longo de Romanos 6-7:

Romanos 6.1 – Pergunta: “Que diremos, pois? Perma-neceremos no pecado, para que seja a graça mais abundante?” Forte negação: “De maneira nenhuma”! Breve resposta: “Como viveremos ainda no pecado, nós os que para ele morremos?” Explicação completa da breve resposta: v.3-14.

Romanos 6.15 – Pergunta: “E daí? Havemos de pecar por-que não estamos debaixo da lei, e sim da graça?” Forte negação: “De modo nenhum”! Breve resposta: “Não sabeis que daquele a quem vos ofereceis como servos para obediência, desse mes-mo a quem obedeceis sois servos...?” Explicação completa da breve resposta: v.17-23.

Apêndice C – Romanos 7 – 187

Romanos 7.7 – Pergunta: “Que diremos, pois? É a lei pe-cado?” Forte negação: “De modo nenhum”! Breve resposta: “Mas eu não teria conhecido o pecado, senão por intermédio da lei; pois não teria eu conhecido a cobiça, se a lei não dissera: Não cobiçarás.” Explicação completa da resposta breve: v. 8-12.

Romanos 7.13 – Pergunta: “Acaso o bom se me tornou em morte?” Forte negação: “De modo nenhum”! Breve respos-ta: “Pelo contrário, o pecado, para revelar-se como pecado, por meio de uma coisa boa, causou-me a morte, a fim de que, pelo mandamento, se mostrasse sobremaneira maligno”. Explicação completa da breve resposta: v.14-25.

Esse é o contexto dos versículos 14-25! O versículo 14 não começa um tema novo totalmente aleatório, como alguns supõem. O assunto sendo tratado nessa seção não é “o fracas-so do cristão imaturo em andar no Espírito” ou “a luta constante do cristão maduro com o pecado remanescente”. Pelo contrário, o assunto aqui é “a bondade da lei, apesar de seus efeitos sobre aqueles que estão na carne”. Pensando nisso, é muito significativo que o versículo 14 comece com a palavra “porque” e seja imedia-tamente seguido pelas palavras “porque/pois” no versículo 15.

5. Romanos 7.14-25 flui de e é uma continuação da discussão de Paulo nos versículos 7-13 do “homem para quem o preceito sobreveio”. No versículo 5, Paulo descreve a condição dos que estão “na carne” e “debaixo da lei”: “Por-que, quando vivíamos segundo a carne, as paixões pecaminosas postas em realce pela lei operavam em nossos membros, a fim de frutificarem para a morte”. As palavras-chave são “lei”, “pecado” e “carne”. Essas três palavras do versículo 5 constituirão o núcleo da discussão de Paulo em todo o restante do capítulo.

188 – JUSTIFICAÇÃO E Regeneração

Nos versículos 7-12, Paulo começa a explicar sua declara-ção no versículo 5 fazendor referência à sua própria experiência antes da conversão. Houve uma época em que Paulo vivia em um estado de autossatisfação complacente: “Outrora,... eu vi-via” (v.9). Ele pensou que estava fazendo muito bem em manter a lei: “Quanto à justiça que há na lei, irrepreensível”.335

Mas, então, uma grande virada veio na vida de Paulo. Por meio do trabalho do Espírito de Deus, “o preceito sobreveio” a ele. Ele começou a perceber quão profundos e exigentes os requisitos da lei realmente são e como era impossível para ele cumprir esses requisitos. “O pecado reviveu”, e Paulo “mor-reu”, sob a terrível convicção de sua pecaminosidade. (Quanto tempo isso continuou, não sabemos, mas sabemos que, antes mesmo de ele encontrar o Cristo ressurreto no caminho de Damasco, já era “duro” para Paulo “recalcitrar contra os agui-lhões”336). A lei, que prometia a vida, resultou em morte para Paulo, não por falha em si própria, mas por causa da total peca-minosidade do pecado.

Até esse ponto em sua argumentação (v.13), Paulo des-creveu apenas a relação entre “lei” e “pecado”, mostrando como a lei realmente desperta o pecado e conduz à morte. Mas ele ainda não explicou por que a lei produz tais efeitos. Isso ele pode fazer apenas discorrendo sobre “a carne”!

Esse é o contexto de Romanos 7.14-25! O versículo 14 começa com a palavra “porque” e continua e avança a discussão de Paulo de “lei, pecado e carne”, descrevendo de forma dramática no tem-po presente o lugar do reino do pecado – “a carne”: “Porque bem

335 Filipenses 3.6336 Atos 26.14

Apêndice C – Romanos 7 – 189

sabemos que a lei é espiritual; eu, todavia, sou carnal, vendido à escravidão do pecado”. (Note que a transição para o tempo pre-sente ocorre naturalmente uma vez que Paulo dificilmente poderia dizer: “Sabemos que a lei era espiritual”). Paulo, em seguida, con-tinua no tempo presente até o final do capítulo, dando um relato em primeira mão da “escravidão do pecado” vivida por aqueles que estão “na carne”. Ele faz isso do ponto de vista de alguém que agora se tornou um cristão e pode ver claramente a natureza do conflito que antigamente se passava em sua vida. Por essa razão, a terminologia que Paulo usa nesses versos mostra muita influência cristã, embora seja descritiva de seu estado pré-cristão.

Lembre-se novamente da declaração a respeito do que controlava Paulo: “Porque, quando vivíamos segundo a carne, as paixões pecaminosas postas em realce pela lei operavam em nossos membros, a fim de frutificarem para a morte”. A “carne” é controlada pelo “pecado”, e, na presença de lei, as paixões pe-caminosas da carne sempre culminarão em “morte”. O fato de que a “carne” é a ênfase de Paulo ao longo dessa secção resulta da terminologia que ele usa: “carnal, vendido à escravidão do pecado”337, “nos meus membros, outra lei”338 e “da lei do peca-do que está nos meus membros”339. Essa escravidão ao “pecado nos membros” leva ao clamor desesperado: “Desventurado homem que sou! Quem me livrará do corpo desta morte (ou ainda: “este corpo de morte”)?”340

A resposta de Paulo a esse clamor é dada no versículo 25, “Graças a Deus por Jesus Cristo, nosso Senhor”. E, de 337 Romanos 7.14338 Romanos 7.23339 Romanos 7.23340 Romanos 7.24

190 – JUSTIFICAÇÃO E Regeneração

forma mais completa, em 8.1-4: “Agora, pois, já nenhuma condenação há para os que estão em Cristo Jesus. Porque a lei do Espírito da vida, em Cristo Jesus, te livrou da lei do pecado e da morte. Porquanto o que fora impossível à lei, no que estava enferma pela carne, isso fez Deus... a fim de que o preceito da lei se cumprisse em nós, que não andamos segundo a carne, mas segundo o Espírito”.

Perceba o resumo de Paulo aqui do que ele acabou de di-zer mais longamente em 7.14-25: “...o que fora impossível à lei, no que estava enferma pela carne”! E note novamente sua des-crição daqueles que são cristãos: “Porque a lei do Espírito da vida, em Cristo Jesus, te livrou da lei do pecado e da morte... a fim de que o preceito da lei se cumprisse em nós, que não anda-mos segundo a carne, mas segundo o Espírito”! O homem de Romanos 7 clama: “Quem me livrará”? O cristão responde, “a lei do Espírito da vida, em Cristo Jesus, me libertou”.

Isaac Watts resume o ensino de Paulo em Romanos 7, em um hino intitulado “A convicção de pecado pela lei – Romanos 7.8, 9, 14-24”:

Senhor, quão segura minha consciência estava,

E não sentia pavor interno!

Estava vivo sem a lei,

E pensava que meus pecados estavam mortos.

Minhas esperanças do céu eram firmes e brilhantes;

Mas, uma vez que o preceito veio

Com um poder convincente e luz,

Percebo quão vil eu sou.

Apêndice C – Romanos 7 – 191

Minha culpa parecia pequena antesAté que terrivelmente eu viQuão perfeita, santa, justa e pura,Era a tua lei eterna.

Então minha alma sentiu o fardo pesado;Meus pecados reviveram novamente;Eu havia provocado um Deus terrível,E todas as minhas esperanças eram vãs.

Sou como um prisioneiro indefeso, vendidoSob o poder do pecado:Não posso fazer o bem que gostaria,Nem manter a minha consciência limpa.

Meu Deus! Eu clamo com todo o fôlegoPor algum gracioso poder para salvar;Para quebrar o jugo do pecado e da morte,E, assim, resgatar o escravo.

TRÊS OBSERVAÇÕES FINAISPara concluir, três coisas devem ser observadas:

1. Apesar de semelhanças superficiais, Gálatas 5.16-25 não faz um paralelo com Romanos 7. Romanos 7.14-25 descreve a luta e derrota de um homem que ainda está “na carne” e “debaixo da lei”. O Espírito Santo está notavelmente ausente da linguagem e do pensamento desse homem. Na ver-dade, o Espírito Santo não é mencionado em nenhum lugar em toda a passagem.

192 – JUSTIFICAÇÃO E Regeneração

Gálatas 5.16-25, por outro lado, descreve o conflito inevi-tável que o Espírito Santo tem com a carne na vida de um crente verdadeiro. Um tom de vitória soa ao longo dessa passagem: o cristão “não está sob a lei”341. Ele definitivamente já “crucifi-cou a carne, com as suas paixões e concupiscências” por meio do arrependimento e da fé em Cristo.342 O poder do Espírito Santo em sua vida o impede efetivamente de seguir as incli-nações naturais da sua carne – ele não pode fazer “o que é do seu querer”.343 Visto que ele vive “no Espírito”, ele é capaz agora de “andar no Espírito”.344 E, à medida que “anda no Espírito”, ele está certo de que “jamais satisfará à concupiscência da car-ne”.345 Esses versos não são uma declaração de “miséria”, mas uma garantia de vitória!

O verdadeiro paralelo com Gálatas 5.16-25 é Romanos 8.12-14, em que “carne” e “espírito” são igualmente contras-tados: “Assim, pois, irmãos, somos devedores, não à carne como se constrangidos a viver segundo a carne. Porque, se viverdes segundo a carne, caminhais para a morte; mas, se, pelo Espírito, mortificardes os feitos do corpo, certamente, vivereis. Pois todos os que são guiados pelo Espírito de Deus são filhos de Deus”. De acordo com esses versículos, o cristão não está sob nenhuma obrigação de viver segundo a carne. Ele é capaz, pelo poder do Espírito Santo, de “mortificar os feitos do corpo”. Na verdade, ser “guiado pelo Espírito” é uma das características distintivas de todos os que são verdadei-

341 Gálatas 5.18342 Gálatas 5.24343 Gálatas 5.17344 Gálatas 5.25345 Gálatas 5.16

Apêndice C – Romanos 7 – 193

ramente “filhos de Deus”! Observe o paralelo aqui entre ser “guiado pelo Espírito” (Romanos 8.14) e “andar no Espírito” (Romanos 8.4; Gálatas 5.16).

2. O homem descrito em Romanos 7.7-25 não é o tí-pico “homem perdido da esquina” que não sabe nada da espiritualidade ou da real conveniência da lei. O homem em Romanos 7.7-25 é o homem para quem “o preceito sobreveio”. Ele faz declarações que o incrédulo típico nunca faria. O estado de miséria que ele está experimentando resulta de sua vinda a Cristo: “Graças a Deus por Jesus Cristo, nosso Senhor”.346 A partir disso, fica evidente que esse homem está sendo “ensi-nado por Deus” e está “ouvindo e aprendendo com o Pai”.347 “Todo aquele que da parte do Pai tem ouvido e aprendido”, esse vem a Cristo.348

3. Não há dúvida de que todo verdadeiro cristão sen-tiu, por vezes, como se estivesse “no meio” de Romanos 7. Mesmo o homem verdadeiramente justo “cai sete vezes”!349 A experiência cristã sempre envolve derrota excruciante como parte do processo de aprender a “andar no Espírito”. Como Pedro, muitas vezes temos que aprender, por meio do fracas-so amargo, a insuficiência da nossa própria determinação.350 A questão diante de nós, no entanto, não é: “O que os cristãos ex-perimentam muitas vezes?”, mas “O que Paulo está ensinando em Romanos 7?”

346 Romanos 7.25347 João 6.45348 João 6.45349 Provérbios 24.16350 Lucas 22.31-34

194 – JUSTIFICAÇÃO E Regeneração

(Aos interessados em ler mais sobre esse assunto são indicados: Robert L. Reymond, A New Systematic Theology of the Christian Faith, Apêndice F, 1127-32; Martyn Lloyd-Jones, The Law: Its Functions and Limits; e Herman Ridderbos, Paul: An Outline of His Theology, 126-30.)

Foi “em Cristo Jesus” que o propósito e a graça de Deus fo-ram concedidas a nós antes dos tempos eternos:• 2 Timóteo 1.9   “que nos salvou e nos chamou com santa

vocação; não segundo as nossas obras, mas conforme a sua própria determinação e graça que nos foi dada em Cristo Jesus, antes dos tempos eternos.”

• Efésios 1.4-6 “assim como nos escolheu, nele, antes da funda-ção do mundo, para sermos santos e irrepreensíveis perante ele; e em amor nos predestinou para ele, para a adoção de filhos, por meio de Jesus Cristo, segundo o beneplácito de sua vontade, para louvor da glória de sua graça, que ele nos concedeu gratuitamente no Amado.”

• Efésios 1.9-10 “desvendando-nos o mistério da sua vontade, segundo o seu beneplácito que propusera em Cristo, de fazer convergir nele, na dispensação da plenitude dos tempos, to-das as coisas, tanto as do céu como as da terra.”

Apêndice D

TODAS AS BÊNÇÃOS EM

CRISTO

196 – JUSTIFICAÇÃO E Regeneração

Em Cristo, os propósitos e promessas de Deus são cumpridos:• Efésios 3.11 “segundo o eterno propósito que estabeleceu

em Cristo Jesus, nosso Senhor.”• 2 Coríntios 1.19  “Porque o Filho de Deus, Cristo Jesus, que

foi, por nosso intermédio, anunciado entre vós, isto é, por mim, e Silvano, e Timóteo, não foi sim e não; mas sempre nele houve o sim.”

• 2 Coríntios 1.20 “Porque quantas são as promessas de Deus, tantas têm nele o sim; porquanto também por ele é o amém para glória de Deus, por nosso intermédio.”

• Efésios 3.6 “a saber, que os gentios são co-herdeiros, mem-bros do mesmo corpo e co-participantes da promessa em Cristo Jesus por meio do evangelho.”

• 2 Timóteo 1.1 “Paulo, apóstolo de Cristo Jesus, pela vontade de Deus, de conformidade com a promessa da vida que está em Cristo Jesus.”

A união com Cristo acontece na conversão:• 2 Coríntios 5.17 “E, assim, se alguém está em Cristo, é nova cria-

tura; as coisas antigas já passaram; eis que se fizeram novas.”• Romanos 16.7 “Saudai Andrônico e Júnias, meus parentes e

companheiros de prisão, os quais são notáveis entre os após-tolos e estavam em Cristo antes de mim.”

• 1 Pedro 5.14 “  Saudai-vos uns aos outros com ósculo de amor. Paz a todos vós que vos achais em Cristo.”

• 1 João 2.5 “  Aquele, entretanto, que guarda a sua palavra, nele, verdadeiramente, tem sido aperfeiçoado o amor de Deus. Nisto sabemos que estamos nele.”

Apêndice D – Todas as bênçãos em Cristo – 197

• 1 João 3.24 “E aquele que guarda os seus mandamentos per-manece em Deus, e Deus, nele. E nisto conhecemos que ele permanece em nós, pelo Espírito que nos deu.”

• 1 João 4.13 “Nisto conhecemos que permanecemos nele, e ele, em nós: em que nos deu do seu Espírito.”

• 1 João 4.15 “Aquele que confessar que Jesus é o Filho de Deus, Deus permanece nele, e ele, em Deus.”

• Romanos 16.3 “Saudai Priscila e Áquila, meus cooperadores em Cristo Jesus.”

• Romanos 16.9 “Saudai Urbano, que é nosso cooperador em Cristo, e também meu amado Estáquis.”

• 2 Coríntios 12.2 “Conheço um homem em Cristo que, há ca-torze anos, foi arrebatado até ao terceiro céu (se no corpo ou fora do corpo, não sei, Deus o sabe)”

• Gálatas 1.22 “E não era conhecido de vista das igrejas da Ju-déia, que estavam em Cristo.”

Em Cristo, nossa cegueira espiritual é removida:• 2 Coríntios 3.14 “Mas os sentidos deles se embotaram. Pois

até ao dia de hoje, quando fazem a leitura da antiga aliança, o mesmo véu permanece, não lhes sendo revelado que, em Cristo, é removido.”

Em Cristo somos novas criaturas, vivos em um novo reino:• 2 Coríntios 5.17 “E, assim, se alguém está em Cristo, é nova cria-

tura; as coisas antigas já passaram; eis que se fizeram novas.”• Efésios 2.10 “Pois somos feitura dele, criados em Cristo Jesus

para boas obras, as quais Deus de antemão preparou para que andássemos nelas.”

198 – JUSTIFICAÇÃO E Regeneração

• Colossenses 2.11 “Nele, também fostes circuncidados, não por intermédio de mãos, mas no despojamento do corpo da car-ne, que é a circuncisão de Cristo.”

Em Cristo, temos redenção:• Romanos 3.24 “sendo justificados gratuitamente, por sua

graça, mediante a redenção que há em Cristo Jesus.”• 1 Coríntios 1.30 “Mas vós sois dele, em Cristo Jesus, o qual se

nos tornou, da parte de Deus, sabedoria, e justiça, e santifi-cação, e redenção.”

• Efésios 1.7 “no qual temos a redenção, pelo seu sangue, a re-missão dos pecados, segundo a riqueza da sua graça.”

• Colossenses 1.14 “no qual temos a redenção, a remissão dos pecados.”

Em Cristo somos reconciliados com Deus:• 2 Coríntios 5.19 “a saber, que Deus estava em Cristo reconci-

liando consigo o mundo, não imputando aos homens as suas transgressões, e nos confiou a palavra da reconciliação.”

Em Cristo fomos aproximados:• Efésios 2.13 “Mas, agora, em Cristo Jesus, vós, que antes está-

veis longe, fostes aproximados pelo sangue de Cristo.”

Em Cristo temos perdão:• Efésios 4.32 “Antes, sede uns para com os outros benignos,

compassivos, perdoando-vos uns aos outros, como também Deus, em Cristo, vos perdoou.”

• Colossenses 1.14 “no qual temos a redenção, a remissão dos pecados.”

Apêndice D – Todas as bênçãos em Cristo – 199

Em Cristo temos justiça:• 1 Coríntios 1.30 “Mas vós sois dele, em Cristo Jesus, o qual se

nos tornou, da parte de Deus, sabedoria, e justiça, e santifica-ção, e redenção.”

• 2 Coríntios 5.21 “Aquele que não conheceu pecado, ele o fez pecado por nós; para que, nele, fôssemos feitos justiça de Deus.”

• Filipenses 3.9 “e ser achado nele, não tendo justiça própria, que procede de lei, senão a que é mediante a fé em Cristo, a justiça que procede de Deus, baseada na fé.”

Em Cristo somos justificados:• Gálatas 2.17 “Mas se, procurando ser justificados em Cristo,

fomos nós mesmos também achados pecadores, dar-se-á o caso de ser Cristo ministro do pecado? Certo que não!”

Em Cristo não temos nenhuma condenação:• Romanos 8.1 “Agora, pois, já nenhuma condenação há para

os que estão em Cristo Jesus.”

Em Cristo temos liberdade da lei do pecado e da morte:• Romanos 8.2 “Porque a lei do Espírito da vida, em Cristo Je-

sus, te livrou da lei do pecado e da morte.”

Em Cristo temos liberdade:• Gálatas 2.4 “E isto por causa dos falsos irmãos que se entre-

meteram com o fim de espreitar a nossa liberdade que temos em Cristo Jesus e reduzir-nos à escravidão.”

200 – JUSTIFICAÇÃO E Regeneração

Em Cristo, cerimônias religiosas não significam nada:• Gálatas 5.6 “Porque, em Cristo Jesus, nem a circuncisão, nem

a incircuncisão têm valor algum, mas a fé que atua pelo amor.”

Em Cristo temos circuncisão espiritual:• Colossenses 2.11 “Nele, também fostes circuncidados, não

por intermédio de mãos, mas no despojamento do corpo da carne, que é a circuncisão de Cristo.”

Em Cristo somos santificados:• 1 Coríntios 1.2 “à igreja de Deus que está em Corinto, aos

santificados em Cristo Jesus, chamados para ser santos, com to-dos os que em todo lugar invocam o nome de nosso Senhor Jesus Cristo, Senhor deles e nosso.”

• 1 Coríntios 1.30 “Mas vós sois dele, em Cristo Jesus, o qual se nos tornou, da parte de Deus, sabedoria, e justiça, e santifica-ção, e redenção.”

• Filipenses 1.1 “Paulo e Timóteo, servos de Cristo Jesus, a to-dos os santos em Cristo Jesus, inclusive bispos e diáconos que vivem em Filipos.”

• Filipenses 4.21 “Saudai cada um dos santos em Cristo Jesus. Os irmãos que se acham comigo vos saúdam.”

Em Cristo estamos mortos para o pecado e vivos para Deus:• Romanos 6.11 “Assim também vós considerai-vos mortos

para o pecado, mas vivos para Deus, em Cristo Jesus.”

Apêndice D – Todas as bênçãos em Cristo – 201

Em Cristo fomos aperfeiçoados:• Colossenses 2.10 “Também, nele, estais aperfeiçoados. Ele é

o cabeça de todo principado e potestade.”• Colossenses 1.28 “o qual nós anunciamos, advertindo a todo

homem e ensinando a todo homem em toda a sabedoria, a fim de que apresentemos todo homem perfeito em Cristo.”

Em Cristo temos ousadia e acesso com confiança:• Efésios 3.12 “pelo qual temos ousadia e acesso com confian-

ça, mediante a fé nele.”

Em Cristo temos salvação:• 2 Timóteo 2.10 “Por esta razão, tudo suporto por causa dos

eleitos, para que também eles obtenham a salvação que está em Cristo Jesus, com eterna glória.”

Em Cristo temos uma herança:• Efésios 1.10-11 “nele, digo, no qual fomos também feitos he-

rança, predestinados segundo o propósito daquele que faz todas as coisas conforme o conselho da sua vontade.”

Em Cristo está a eterna glória de Deus:• 1 Pedro 5.10 “Ora, o Deus de toda a graça, que em Cristo vos

chamou à sua eterna glória, depois de terdes sofrido por um pouco, ele mesmo vos há de aperfeiçoar, firmar, fortificar e fundamentar.”

Em Cristo somos selados com o Espírito Santo:• Efésios 1.13 “em quem também vós, depois que ouvistes a

palavra da verdade, o evangelho da vossa salvação, tendo

202 – JUSTIFICAÇÃO E Regeneração

nele também crido, fostes selados com o Santo Espírito da promessa.”

Em Cristo temos poder de ressurreição:• Efésios 1.19-20 “e qual a suprema grandeza do seu poder para

com os que cremos, segundo a eficácia da força do seu poder; o qual exerceu ele em Cristo, ressuscitando-o dentre os mor-tos e fazendo-o sentar à sua direita nos lugares celestiais.”

Em Cristo temos dons espirituais:• 1 Coríntios 1.5 “porque, em tudo, fostes enriquecidos nele,

em toda a palavra e em todo o conhecimento”

Em Cristo temos todas as bênçãos:• Efésios 1.3 “Bendito o Deus e Pai de nosso Senhor Jesus

Cristo, que nos tem abençoado com toda sorte de bênção es-piritual nas regiões celestiais em Cristo.”

• Gálatas 3.14 “para que a bênção de Abraão chegasse aos gen-tios, em Jesus Cristo, a fim de que recebêssemos, pela fé, o Espírito prometido.”

Em Cristo são encontrados o amor, a graça e a paz de Deus:• Romanos 8.39 “nem a altura, nem a profundidade, nem

qualquer outra criatura poderá separar-nos do amor de Deus, que está em Cristo Jesus, nosso Senhor.”

• 1 Coríntios 1.4 “Sempre dou graças a [meu] Deus a vosso res-peito, a propósito da sua graça, que vos foi dada em Cristo Jesus.”

• Efésios 1.6 “para louvor da glória de sua graça, que ele nos concedeu gratuitamente no Amado.”

Apêndice D – Todas as bênçãos em Cristo – 203

• Efésios 2.7 “para mostrar, nos séculos vindouros, a supre-ma riqueza da sua graça, em bondade para conosco, em Cristo Jesus.”

• 2 Timóteo 2.1 “Tu, pois, filho meu, fortifica-te na graça que está em Cristo Jesus.”

• Filipenses 4.7 “E a paz de Deus, que excede todo o entendi-mento, guardará o vosso coração e a vossa mente em Cristo Jesus.”

Em Cristo estamos nos lugares celestiais:• Efésios 1.3 “Bendito o Deus e Pai de nosso Senhor Jesus

Cristo, que nos tem abençoado com toda sorte de bênção es-piritual nas regiões celestiais em Cristo”

• Efésios 2.6 “e, juntamente com ele, nos ressuscitou, e nos fez assentar nos lugares celestiais em Cristo Jesus.”

Em Cristo há riquezas na glória:• Filipenses 4.19 “E o meu Deus, segundo a sua riqueza em

glória, há de suprir, em Cristo Jesus, cada uma de vossas necessidades.”

Em Cristo todas as coisas subsistem:• Colossenses 1.17 “Ele é antes de todas as coisas. Nele, tudo

subsiste.”

Em Cristo temos vida; Cristo é a nossa vida:• João 3.15 “para que todo o que nele crê tenha a vida eterna.”• Romanos 6.11 “Assim também vós considerai-vos mortos

para o pecado, mas vivos para Deus, em Cristo Jesus.”

204 – JUSTIFICAÇÃO E Regeneração

• Romanos 6.23 “porque o salário do pecado é a morte, mas o dom gratuito de Deus é a vida eterna em Cristo Jesus, nosso Senhor.”

• Romanos 8.2 “Porque a lei do Espírito da vida, em Cristo Je-sus, te livrou da lei do pecado e da morte.”

• 1 Coríntios 15.22 “... todos serão vivificados em Cristo.”• Colossenses 3.3-4 “porque morrestes, e a vossa vida está

oculta juntamente com Cristo, em Deus. Quando Cristo, que é a nossa vida, se manifestar, então, vós também sereis mani-festados com ele, em glória.”

• João 6.56 “Quem comer a minha carne e beber o meu san-gue permanece em mim, e eu, nele.”

• João 15.5 “Eu sou a videira, vós, os ramos. Quem permane-ce em mim, e eu, nele, esse dá muito fruto; porque sem mim nada podeis fazer.”

• Gálatas 2.20 “logo, já não sou eu quem vive, mas Cristo vive em mim; e esse viver que, agora, tenho na carne, vivo pela fé no Filho de Deus, que me amou e a si mesmo se entregou por mim.”

Os que estão em Cristo revestiram-se de Cristo:• Gálatas 3.27-28 “porque todos quantos fostes batizados em

Cristo de Cristo vos revestistes. Dessarte, não pode haver ju-deu nem grego; nem escravo nem liberto; nem homem nem mulher; porque todos vós sois um em Cristo Jesus.”

• Colossenses 3.9-11 “Não mintais uns aos outros, uma vez que vos despistes do velho homem com os seus feitos e vos revestistes do novo homem que se refaz para o pleno conhe-cimento, segundo a imagem daquele que o criou; no qual

Apêndice D – Todas as bênçãos em Cristo – 205

não pode haver grego nem judeu, circuncisão nem incircun-cisão, bárbaro, cita, escravo, livre; porém Cristo é tudo em todos.”

Em Cristo somos um:• João 17.21-23 “a fim de que todos sejam um; e como és tu, ó

Pai, em mim e eu em ti, também sejam eles em nós; para que o mundo creia que tu me enviaste. Eu lhes tenho transmitido a glória que me tens dado, para que sejam um, como nós o so-mos; eu neles, e tu em mim, a fim de que sejam aperfeiçoados na unidade, para que o mundo conheça que tu me enviaste e os amaste, como também amaste a mim.”

• Romanos 12.5 “assim também nós, conquanto muitos, so-mos um só corpo em Cristo e membros uns dos outros.”

• Gálatas 3.28 “Dessarte, não pode haver judeu nem grego; nem escravo nem liberto; nem homem nem mulher; porque todos vós sois um em Cristo Jesus.”

Como o ensino desse livro se relaciona com a ideia

de “perfeição sem pecado”?

Segundo a Bíblia, “não há homem que não peque”.351 Na verdade, “não há homem justo sobre a terra que faça o bem e que não peque”.352 “Porque todos tropeçamos em muitas coi-sas.”353 Em consonância com essa realidade, o Senhor Jesus ensinou seus discípulos a orar diariamente, “Perdoa-nos os nos-sos pecados”.354

Podemos entender imediatamente por que isso é assim apenas considerando um dos dois grandes mandamentos: “Amarás, pois, o Senhor, teu Deus, de todo o teu coração, de 351 2 Crônicas 6.36352 Eclesiastes 7.20353 Tiago 3.2354 Lucas 11.4

Apêndice E

PERGUNTAS FREQUENTES

208 – JUSTIFICAÇÃO E Regeneração

toda a tua alma, de todo o teu entendimento e de toda a tua força”.355 Qual de nós poderia dizer que alguma vez amou a Deus, mesmo que por uma hora, como ele merece ser ama-do? Para fazer isso, teríamos que amá-lo tão perfeitamente como o próprio Cristo ama. Mas nenhum de nós jamais fez isso, nem mesmo quando estávamos orando ou adorando! Mesmo as nossas orações e louvores estão incomensura-velmente aquém da perfeita fé, amor, fervor e devoção do Senhor Jesus Cristo. Outra maneira de dizer isso é que mes-mo as nossas orações e louvores são pecaminosos, ao ponto de não corresponderem adequadamente à perfeição total de Cristo. Por esta razão, é apenas “por intermédio de Jesus Cristo” e sua morte expiatória em nosso lugar que nossas orações e outros “sacrifícios espirituais” são “agradáveis a Deus”.356 Não podemos sequer “dar graças a Deus”, exceto “mediante Jesus Cristo”!357 De acordo com a Bíblia, mesmo pecados involuntários são ainda pecados358 e devem ser pa-gos pelo sangue da expiação.

Todo cristão que tem sido corretamente instruído pela Palavra e pelo Espírito de Deus sente o quão terrivelmente não consegue amar a Deus diariamente com todo o seu cora-ção, alma, mente e força. Ele poderia facilmente passar todo o seu tempo explorando e revendo as formas como falhou com Deus durante o curso de um único dia. Esse, no entanto, não é o foco da Bíblia em si. Encontramos, em vez disso, uma ênfase na Bíblia sobre a obra maravilhosa e poderosa da gra-355 Marcos 12.30356 1 Pedro 2.5357 Romanos 1.8358 1 Coríntios 4.3-4; Levítico 5.17-19; Números 15.22-25; Salmo 19.12-14

Apêndice E – Perguntas frequentes – 209

ça que Deus realizou em seus filhos. Por exemplo, o Senhor Jesus fala de Natanael como “um verdadeiro israelita, em quem não há dolo”!359 Ele fala do cristão como alguém que tem “um bom e reto coração”360 e se refere a ele como um “homem bom”, que “do bom tesouro do coração tira o bem”.361 Ele fala dos discípulos, apesar de todas as suas falhas, como aqueles que “permaneceram com ele nas suas tentações”362 e “guardaram a palavra de Deus”!363

Paulo, da mesma forma, ao narrar a história de Abraão, passa por cima dos tropeços de Abraão e caracteriza-o como um homem que “não duvidou por incredulidade”.364 Ele está “certo” de que os crentes romanos são “possuídos de bondade, cheios de todo o conhecimento, aptos para se admoestarem uns aos outros”.365 Ele descreve todos os cristãos como “santos e amados”366 e diz que eles “crucificaram a carne, com as suas paixões e concupiscências”.367 Exemplos como esses poderiam ser multiplicados.

Todo cristão deveria seguir essa ênfase da Bíblia. Ao per-ceber quão distante se encontra diariamente da perfeição, o cristão deveria, no entanto, fixar seu coração e mente sobre as coisas maravilhosas que Deus fez por ele em Cristo. Essa é a

359 João 1.47360 Lucas 8.15361 Lucas 6.45362 Lucas 22.28363 João 17.6364 Romanos 4.20365 Romanos 15.14366 Colossenses 3.12367 Gálatas 5.24

210 – JUSTIFICAÇÃO E Regeneração

atitude de fé. Em nós mesmos, somos “nada”368 e “não pode-mos fazer nada”369, mas em Cristo, “podemos todas as coisas”.370 A mentalidade contrária, por outro lado, foi bem ilustrada por um colega pastor:

Imagine visitantes chegando à casa de um homem. Quando

começam a comentar sobre as muitas mudanças e melho-

rias que ocorreram em sua casa, ele abaixa a cabeça enver-

gonhado e diz: “Ah, mas há algo que eu preciso mostrar a

vocês”. Em seguida, ele vai até a cozinha e arrasta para fora

a lata de lixo. (Toda casa tem uma!) Ele e seus convidados,

então, passam a noite examinando em detalhes o conteúdo

da lata de lixo, lamentando sobre a vileza e repúdio de cada

item. Eles fazem isso enquanto estão sentados em uma sala

de estar, recentemente reformada, mas estão tão absortos

em sua tarefa que se tornam completamente alheios aos

seus arredores!

Essa não é uma abordagem bíblica da vida cristã! Os cris-tãos, de fato, “tropeçam em muitas coisas”, mas, de acordo com a Bíblia, Deus se deleita em seus filhos e em suas expressões vacilantes de amor para com ele. Ele “exulta” e “regozija-se” ne-les com “júbilo”!371 Ele os vê como sua linda “noiva”,372 e suas ofertas e vidas são um “aroma suave”373 para ele.

368 Gálatas 6.3369 João 15.5370 Filipenses 4.13371 Sofonias 3.17372 Cantares de Salomão 4.1ss; Efésios 5.25373 Filipenses 4.18; 2 Coríntios 2.14-16

Apêndice E – Perguntas frequentes – 211

Qual é a diferença entre estar constantemente

aquém da perfeição de Cristo e ser constantemente

derrotado pelo pecado conhecido?Dizer que os cristãos estão constantemente aquém da per-

feição de Cristo é bem diferente de dizer que os cristãos têm que ser derrotados pelo pecado conhecido. É exatamente esse pecado óbvio e conhecido que João tem em mente em 1 João 2.1 ao dizer: “Filhinhos meus, estas coisas vos escrevo para que não pequeis. Se, todavia, alguém pecar, temos Advogado junto ao Pai, Jesus Cristo, o Justo”. Ao usar a palavra “se”, João deixa claro que os cristãos não devem ceder conscientemente ao pecado. Paulo tem a mesma coisa em mente ao nos exortar a não deixar “o pecado reinar em nosso corpo mortal, de maneira que obedeçamos às suas paixões”. Os cristãos não têm que deixar o pecado reinar em seus corpos mortais! Ao ser confrontado com o pecado óbvio, o crente tem a capacidade “pelo Espírito” de “mortificar os feitos do corpo”.374 À medida que ele andar no Espírito, não satisfará os desejos da carne.375 De fato, Paulo declara com segurança que o pecado não terá domínio sobre qualquer cristão, pois ele não está debaixo da lei, mas debaixo da graça.376 Cristo “a si mesmo se deu por nós, a fim de remir-nos de toda iniquidade e purificar, para si mesmo, um povo exclusivamente seu, zeloso de boas obras”.377

Nenhum cristão é perfeito nessa vida – longe disso! Mas todo cristão tem o poder em Cristo para romper com o pecado conhecido e viver uma vida de “justiça, e paz, e alegria no Es-pírito Santo”.378

374 Romanos 8.13375 Gálatas 5.16376 Romanos 6.14377 Tito 2.14378 Romanos 14.17

212 – JUSTIFICAÇÃO E Regeneração

Algumas pessoas dizem que Romanos 7.14-25 retrata

simplesmente a batalha em curso do cristão contra o

pecado – que a vida cristã é, basicamente, uma vida

de vitória, mas que os cristãos são profundamente

entristecidos por essas falhas e deficiências que ainda

permanecem em suas vidas. Como você responderia

a esse ponto de vista?

Em geral, estou de acordo com essas pessoas em relação à natureza da vida cristã. A vida cristã é, basicamente, uma vida de vitória, e os cristãos são profundamente entristecidos por essas falhas e deficiências que ainda permanecem em suas vi-das! Nem todo mundo que entende Romanos 7.14-25 como se referindo ao cristão tem uma visão de “homem miserável” ou “derrotista” da vida cristã, e não deveríamos supor que eles têm. A minha diferença comtais pessoas é basicamente em re-lação à interpretação (e eventual abuso) de uma passagem da Escritura, não necessariamente uma diferença sobre a natureza da vida cristã em si.

É um fato, no entanto, que uma grande quantidade de pessoas abusam realmente de Romanos 7 e recorrem a essa passagem por “conforto” quando estão miseráveis e derrotadas pelo pecado: “Afinal, nem mesmo o apóstolo Paulo conseguiu obter vitória, então por que eu deveria esperar algo diferente”? Mesmo aqueles que acreditam que a vida cristã é, basicamente, uma vida de triunfo são sutilmente tentados com o pensamen-to de que “este único pecado” pode ser aquele que eles, como Paulo, nunca serão capazes de vencer.

À luz deste abuso de Romanos 7, gostaria de salientar mais uma vez que o tema de Romanos 7 não é “o pecado que

Apêndice E – Perguntas frequentes – 213

habita no crente”, mas “a bondade da lei, apesar de seus efeitos sobre aqueles que estão na carne”. Romanos 7 tem a ver com o fato de que a lei, apesar de “espiritual” e “boa”, estava “enferma pela carne”.379 Isso retrata em detalhes a realidade de que “quan-do vivíamos segundo a carne, as paixões pecaminosas postas em realce pela lei operavam em nossos membros, a fim de fru-tificarem para a morte”.380 Deve-se salientar também (à luz da resposta dada anteriormente em relação a “perfeição sem peca-do”) que, em Romanos 7.14-25, Paulo está falando claramente, não do fracasso contínuo do mais santo dos cristãos para alcan-çar a perfeição de Cristo, como alguns supõem, mas da derrota consciente pelo pecado conhecido. Isso é evidente pelo fato de que o homem retratado nesses versículos deseja conscientemente fazer o bem, mas em vez disso, “faz” o que sabe ser “mal”,381 fa-zendo exatamente “o que detesta”.382 Essa derrota pelo pecado conhecido é descrita como consistente, não ocasional, e nada é dito sobre qualquer capacidade que esse homem pode ter, por meio do poder do Espírito Santo, para mortificar o pecado. Por outro lado, nós, como cristãos, podemos louvar a Deus diaria-mente porque “a lei do Espírito da vida, em Cristo Jesus, nos livrou da lei do pecado e da morte”!383 Fomos “libertados da lei, estamos mortos para aquilo a que estávamos sujeitos, de modo que servimos em novidade de espírito e não na caducidade da letra”.384

379 Romanos 8.3380 Romanos 7.5381 Romanos 7.19382 Romanos 7.15383 Romanos 8.2384 Romanos 7.6

214 – JUSTIFICAÇÃO E Regeneração

E quanto a Gálatas 5.17? Não está dizendo a mesma

coisa que Romanos 7?

Gálatas 5.17 (“Porque a carne milita contra o Espírito, e o Espírito, contra a carne, porque são opostos entre si; para que não façais o que, porventura, seja do vosso querer”) não é uma garantia de derrota, mas uma garantia de vitória. Paulo começa no versículo 16 com a promessa de que, se “andarmos no Espírito”, “jamais satisfaremos à concupiscência da carne”. Então, ele explica no versículo 17 porque isso é assim: o Espí-rito Santo, cujo caráter está em contradição direta com a carne, coloca-se contra ela e se opõe a ela, impedindo-nos efetivamente de viver de forma egoísta ou de seguir os ditames da carne. Após contrastar os “feitos da carne” com o “fruto do Espírito” nos versículos 19-23, Paulo então nos garante mais uma vez, no versículo 24, que “os que são de Cristo Jesus crucificaram a car-ne, com as suas paixões e concupiscências”.

Uma citação do comentarista Albert Barnes pode ser útil nesse momento:

Não há nenhuma razão para interpretar isso, aliás, como

sempre parece ser o caso, da tendência irresistível da mente

para o mal, como se ensinasse que o cristão estava desejoso

de fazer o bem, mas não podia, por causa da sua corrupção

interior. No que diz respeito à linguagem de Paulo ou o fato

em questão, pode se entender disso exatamente o oposto,

e pode significar, que tais são as restrições e influências do

Espírito Santo no coração, que o cristão não faz o mal que

ele de outra maneira faria ...

Apêndice E – Perguntas frequentes – 215

Ele (Paulo) os está exortando (Gálatas 5.16) a andar no Espírito, e assegura-lhes que, assim, eles não satisfarão os dese-jos da carne. Para encorajá-los a isso, ele lhes lembra que havia princípios contrários em suas mentes, as influências do Espíri-to de Deus, e uma tendência carnal e decadente da carne. Estes são opostos um ao outro; e tais são, de fato, as influências do Espírito sobre a mente, que o cristão não faz as coisas que ele de outra forma faria.385

Você não está sendo excessivamente literal em sua

compreensão das várias passagens que descrevem a

regeneração?

É óbvio que quando a Bíblia fala, por exemplo, sobre a “se-mente de Deus”386 permanecendo em nós e sobre termos nos tornado “participantes da natureza divina”,387 esses termos não devem ser entendidos em qualquer sentido carnal. Nem mesmo eles implicam em qualquer diminuição do abismo absoluto entre o Criador infinito e sua criação finita. No entanto, devemos ter sempre em mente que o Espírito Santo escolheu deliberadamente esses termos precisamente porque eles nos transmitem com pre-cisão a verdade sobre a realidade invisível. Não nos atrevemos, em nome da sofisticação teológica, a “explicar adiante” tais ter-mos, ao ponto de eles serem esvaziados de qualquer significado real. O cristão realmente é “nascido de Deus”. Ele realmente é uma “nova criação”, com um “coração novo”, “vivo dentre os mortos” e “sentado nos lugares celestiais”!

385 Albert Barnes, Notes on the New Testament, Gálatas 5.17386 1 João 3.9387 2 Pedro 1.4

216 – JUSTIFICAÇÃO E Regeneração

Se o cristão é um novo homem, e o corpo em si não

é pecaminoso, de onde vem o pecado no crente?

A Bíblia não nos dá uma descrição detalhada da psicologia do homem ou do funcionamento da personalidade humana. Em lugar disso, ela nos dá uma descrição funcional ou prática. Essa descrição deixa muitas questões metafísicas sem resposta, mas é mais do que suficiente para nos dar uma base firme para viver a vida cristã.

Os fatos básicos são claros:

1. A verdade mais profunda e definitiva sobre o cristão é que ele é um novo homem. Essa é a sua identidade essencial. O novo homem representa quem ele “real-mente” é no tempo presente e quem ele será mil anos a partir de agora.

2. O novo homem não é a única verdade sobre o cristão. Há um aspecto de sua personalidade que ainda não foi redimido – seu “corpo mortal”. De acordo com a Bíblia, a luta contínua do cristão com o pecado surge a partir desse fato. O pecado ainda tenta reinar em seu corpo mortal.388

Esse corpo mortal não redimido, visto como o lu-gar onde o pecado ainda tenta reinar, é referido na Bíblia como “a carne”. A Escritura fala repetida-mente dos “membros” do corpo (mãos, pés, olhos, etc.), como o lugar onde o pecado afirma a si mes-

388 Romanos 6.12-13

Apêndice E – Perguntas frequentes – 217

mo.389 A Bíblia se refere até mesmo aos pecados como “feitos do corpo”!390 Sabemos que, quando um cristão peca, não é só o seu corpo que peca, mas o próprio cristão como uma pessoa total. No entanto, a Bíblia deixa claro que, uma vez que o corpo for redimido, o pecado não será mais um problema para o crente.391

A carne é um aspecto da personalidade total do cristão, mas não é a verdade definitiva sobre ele. Ela não represen-ta quem ele realmente é ou o que ele realmente ama. Os “feitos do corpo” entristecem-no e vão de encontro a tudo o que é mais precioso para ele.

3. O cristão não precisa ser derrotado pela carne. À medida que sua mente é “renovada”392, ao crer nos fatos a res-peito de quem ele realmente é, e à medida que aprende a “andar no Espírito”, ele será cada vez mais capacitado a “mortificar os feitos do corpo”.

Qual a diferença prática entre o ensinamento de que

um cristão tem duas naturezas e o ensinamento de

que o cristão é um novo homem que tem que lutar

contra a carne?

A diferença básica é de identidade: Quem sou eu realmen-te? Qual é a verdade definitiva sobre mim? Se, no âmago mais profundo do meu ser, o mal ainda é uma expressão de quem 389 Romanos 6.13,19; 7.5,23; Colossenses 3.5; Tiago 3.6; 4.1390 Romanos 8.13391 Romanos 8.23392 Romanos 12.2; Efésios 4.23

218 – JUSTIFICAÇÃO E Regeneração

realmente sou e do que realmente amo, então a santificação tor-na-se um processo de tentar negar a realidade e de se tornar alguém diferente do que realmente sou.

Se, por outro lado, sou um novo homem que ainda preci-sa lutar contra a carne, cada vez que eu disser “não” ao pecado, estou dizendo “sim” a quem realmente sou e ao que realmente amo. A santificação é, então, um processo de abraçar a realida-de, de acreditar no que é verdadeiro e de se tornar, na prática, cada vez mais a pessoa que realmente sou.393

Quando Jesus diz em Marcos 7.21-22 que “de

dentro, do coração dos homens, é que procedem

os maus desígnios, a prostituição, os furtos, os

homicídios, os adultérios, a avareza, as malícias, o

dolo, a lascívia, a inveja, a blasfêmia, a soberba, a

loucura”, ele está falando de cristãos, bem como de

não-cristãos?

Visto que o Senhor está se referindo aqui a atos definidos que “saem” (v.20) dos homens e os contaminam, incluindo “prostituição, furtos, homicídios, adultérios” literais e “avareza e malícias”, é evidente que ele está descrevendo a humanidade perdida em geral, não cristãos.

Os cristãos, ao contrário, são referidos pelo Senhor como aqueles com “bom e reto coração”.394 De acordo com Jesus, o cristão é um “homem bom que do bom tesouro do coração tira o bem”.

393 Colossenses 3.9-10394 Lucas 8.15

Apêndice E – Perguntas frequentes – 219

Ou fazei a árvore boa e o seu fruto bom ou a árvore má e o seu

fruto mau; porque pelo fruto se conhece a árvore. Raça de

víboras, como podeis falar coisas boas, sendo maus? Porque

a boca fala do que está cheio o coração. O homem bom tira do

tesouro bom coisas boas; mas o homem mau do mau tesouro

tira coisas más.395

E sobre Mateus 7.11? Em que sentido os cristãos são

“maus”?

Quando Jesus diz aos fariseus em Mateus 12.34 (citado acima), “Raça de víboras, como podeis falar coisas boas, sendo maus?”, é claro que ele está usando a palavra “maus” para se re-ferir ao não-cristão – o “homem mau”, que do “mau tesouro tira coisas más” – em contraste com o cristão, o “homem bom”, que “do tesouro bom tira coisas boas”.

Em Mateus 7.11, por outro lado, Jesus está ensinando seus discípulos a respeito da oração. É óbvio, portanto, que quando ele lhes diz: “Ora, se vós, que sois maus, sabeis dar boas dádi-vas aos vossos filhos, quanto mais vosso Pai, que está nos céus, dará boas coisas aos que lhe pedirem?”, ele não está dizendo que eles são “homens maus” no mesmo sentido que os fariseus não convertidos são. No entanto, em comparação com o “vosso Pai, que está nos céus”, eles são de fato “maus”. Como vimos an-teriormente neste apêndice, até mesmo cristãos verdadeiros ficam incomensuravelmente aquém da perfeita bondade de Deus. Quando comparado a ele: “Ninguém é bom senão um, que é Deus”.396

395 Mateus 12.33-35396 Marcos 10.18

220 – JUSTIFICAÇÃO E Regeneração

Não é verdade que as passagens de Jeremias 31.31-

34 e Ezequiel 36.25-28 se referem a Israel, e não à

Igreja?

Muitas profecias do Antigo Testamento relativas a uma “Israel” renovada ou restaurada são vistas no Novo Testamen-to como tendo o seu cumprimento final na Igreja. A “nova aliança” é uma delas. Deus diz em Jeremias 31 que fará uma nova aliança “com a casa de Israel e com a casa de Judá”. O es-critor aos Hebreus deixa claro que essa promessa é cumprida, não na casa física de Israel e de Judá como tal, mas na Igreja.397 Todo cristão, seja judeu ou gentio, é um participante da Nova Aliança.398 Qualquer futura misericórdia de Deus para com os judeus resultará em serem enxertados na Igreja ao lado de cren-tes gentios.399

Ezequiel 36 também é citado no contexto de várias pro-messas da “nova aliança”. Por exemplo, Ezequiel 34.23-25 fala da vinda do Messias e da “aliança de paz” que Deus, então, fará com o seu povo, e Ezequiel 37.24-28 fala dessa “aliança de paz” como “aliança perpétua”. (Veja Hebreus 13.20).

Longe de ver as promessas do Antigo Testamento a Is-rael como não aplicáveis à Igreja, Paulo diz aos crentes gentios em Éfeso que, embora eles tenham sido “separados da comu-nidade de Israel e estranhos às alianças da promessa”, eles agora tornaram-se participantes (juntamente com os crentes judeus) dessas mesmas promessas, tendo sido “aproximados pelo sangue de Cristo”.400 Ambos judeus e gentios foram transformados em 397 Hebreus 8398 Lucas 22.20; 1 Coríntios 11.25399 Romanos 11.11-24400 Efésios 2.11-22

Apêndice E – Perguntas frequentes – 221

“um novo homem” – a igreja. “Porque ele é a nossa paz, o qual de ambos fez um; e, tendo derribado a parede da separação que estava no meio... para que dos dois criasse, em si mesmo, um novo homem, fazendo a paz, e reconciliasse ambos em um só cor-po com Deus, por intermédio da cruz...”. Paulo vai ainda mais longe a ponto de dizer que os gentios já “não são estrangeiros e peregrinos, mas concidadãos dos santos [crentes judeus], e da família de Deus”.

Essa visão das promessas do Antigo Testamento também é passada adiante por Pedro, que fala da Igreja, não de Israel, como o cumprimento do desejo401 do Deus do Antigo Testa-mento por uma “nação santa”: “Vós, porém, sois raça eleita, sacerdócio real, nação santa, povo de propriedade exclusiva de Deus, a fim de proclamardes as virtudes daquele que vos chamou das trevas para a sua maravilhosa luz; vós, sim, que, antes, não éreis povo, mas, agora, sois povo de Deus, que não tínheis alcançado misericórdia, mas, agora, alcançastes misericórdia”.402

401 Êxodo 19.5-6402 1 Pedro 2.9-10

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