Post on 25-May-2020
UNIVERSIDADE METODISTA DE SÃO PAULO
ESCOLA DE COMUNICAÇÃO, EDUCAÇÃO E HUMANIDADES
CURSO DE CIÊNCIAS DA RELIGIÃO
WILSON FLÁVIO JECOV
IGREJA UNIVERSAL DO REINO DE DEUS:
MEMÓRIA E RELIGIÃO NO TEMPLO DE SALOMÃO
SÃO BERNARDO DO CAMPO
2.017
WILSON FLÁVIO JECOV
IGREJA UNIVERSAL DO REINO DE DEUS:
MEMÓRIA E RELIGIÃO NO TEMPLO DE SALOMÃO
Dissertação apresentada no curso
de pós-graduação à Universidade Metodista
de São Paulo, Escola de Comunicação, Educação e
Humanidades para obtenção do grau de Mestre.
Orientador: Prof. Dr. Dario Páulo Barrera Rivera
SÃO BERNARDO DO CAMPO
2.017
A dissertação de mestrado intitulada: “IGREJA UNIVERSAL DO REINO DE DEUS: MEMÓRIA E RELIGIÃO NO TEMPLO DE SALOMÃO”, elaborada por WILSON FLÁVO JECOV, foi apresentada e aprovada em 06 de Abril de 2.017, perante banca examinadora composta por Prof. Dr. Dario Paulo Barrera Rivera (Presidente/UMESP), Prof. Dr. Nicanor Lopes (Titular/UMESP) e Prof. Dr. Haller Schwnemann (Titular/Centro Universitário Adventista de São Paulo.)
__________________________________________
Profº. Dr. Dario Paulo Barrera Rivera Orientador e Presidente da Banca Examinadora
________________________________________
Profº. Dr. Helmut Renders Coordenador do Programa de Pós-Graduação
Programa: Pós-Graduação em Ciências da Religião
Área de Concentração: Religião, Sociedade e Cultura
Linha de Pesquisa: Religião e Dinâmicas Sócio-Culturais
Dedico este trabalho à minha mãe, Dirce Alves
Jecov e ao meu pai Vasílio Jecov (ZL).
Aos meus três filhos: Alexei Paulo, Tiffany Ariel e
Andrei Nathan.
Aos meus colegas de magistério estadual na E.E.
Stefan Zweig entre os anos de 2014-2017.
Aos meus diversos colegas de mestrado na área de
Ciências da Religião, independente do credo
religioso dos mesmos, pela oportunidade da boa
convivência na Universidade Metodista.
Aos professores de pós-graduação da área das
Ciências da Religião da UNIMESP, com os quais
fui aluno, em especial ao meu professor orientador,
Dr. Dario Paulo Barrera Rivera, pelo auxílio e
orientação precisos.
Agradecimentos:
À Rosimara Riva Jecov, que acompanhou o processo de ingresso, curso e
término do Mestrado.
Ao Prof. Dario Paulo B. Rivera, pela competência, confiança, e
dedicação.
Ao Prof. Júnior pelo seu auxílio técnico competente na elaboração da
dissertação.
As Pastoras, Ana Paula e Shirley da Igreja Metodista de Rudge Ramos,
São Bernardo do Campo, pelas orações individuais e comunitárias.
Ao Último, o mais honrado de todos os mencionados anteriormente,
HASHEM, O Eterno, Deus dos patriarcas, dos profetas, que durante todo
este período, sustentou a minha vida, proveu as minhas necessidades de
diversas maneiras conduzindo-me ora pelo deserto, ora pelo vale
irrigado. Amém.
Epígrafe:
“Guarda-te, NÃO ESQUEÇAS de HASHEM, teu Deus,... Antes, te LEMBRARÁS do
ETERNO teu Deus, porque Ele te dá força...
(Deuteronômio, Moisés)
“Quero trazer a MEMÓRIA o que me pode dar esperança.”
(Lamentações, profeta Jeremias)
“O ESQUECIMENTO é a origem do Exílio, e a MEMÓRIA é a fonte da Redenção “
(Baal Shem Tov – rabino chassidim europeu do século XVII)
SUMÁRIO
CAPÍTULOS PÁGINA
Resumo ........................................................................................................ 08
Abstract ...................................................................................................... 09
Introdução .................................................................................................. 10
Apresentação e Justificação ........................................................................ 10
Objetivos Gerais e Específicos .................................................................. 10
Capítulo 1 – A Memória Efêmera e o Pentecostalismo ............................. 16
1.0 – Introdução .......................................................................................... 16
1.1 – Memória ............................................................................................ 16
1.1.1 – Memória Religiosa ..................................................................... 18
1.2 – Memória Espacial ............................................................................. 23
1.3 – Tradição ............................................................................................. 47
Capítulo II - A IURD e a ocupação do espaço em São Paulo ................... 60
2.0 – Introdução ......................................................................................... 60
2.1 – Definição da IURD ........................................................................... 61
2.1.1 – A História da IURD ....................................................................... 66
2.2 – A IURD em São Paulo ...................................................................... 76
2.3 – O Templo de Salomão ........................................................................ 90
Capítulo III - “O Templo de Salomão: A Reconstrução da Memória
Religiosa” ..................................................................................................
114
3.0 – Introdução ......................................................................................... 114
3.1 - O Existir e o circuito da Conquista e da Superação .......................... 117
3.2 – Arquitetura e Monumentalidade ....................................................... 129
3.3 – A cultura Judaica e o Pentecostalismo Contemporâneo ................... 136
3.4 – O templo de Salomão e as memórias ............................................... 143
Considerações Finais ................................................................................. 161
Anexos ....................................................................................................... 167
Bibliografia ................................................................................................
Fontes .........................................................................................................
172
176
8
Resumo:
O Templo de Salomão – o espaço religioso maior, construído pela IURD (Igreja
Universal do Reino de Deus) em nossa cidade entre 2.010 e 2.014, é o objeto de nossas
análises a partir da relação entre a Memória e a Religião, abrigando simultaneamente, o
Lugar da Memória e a Memória do Lugar. Ora como Lugar da Memória da Religião
desta instituição pentecostal contemporânea, ora como a Memória dos Lugares
Religiosos, os espaços relacionados à cultura religiosa monoteísta abrahâmica (judaico-
cristã), reproduzidos por ela no complexo do bairro do Brás: o tabernáculo do deserto, o
Jardim das Oliveiras, o Memorial (Museu histórico cultural) e o templo de Salomão e o
seu santuário. Excetuando o Tabernáculo do deserto, todos eles relacionados à cidade de
Jerusalém que é conhecida como a cidade santa.
Os nossos estudos combinaram duas metodologias: a pesquisa bibliográfica (teoria)
relacionada com autores relacionados à Geografia, à Geografia da Religião, à
Sociologia da Memória e da história da Igreja Universal, constituindo os dois conceitos
importantes de nossas pesquisas: Memória da Religião e a Tradição Religiosa, pois
ambos são produtos de nossa sociedade. E o nosso trabalho de campo (geográfico
urbano), com visitas de caráter observatório a três espaços religiosos desta denominação
: o Templo de Salomão (Brás), a catedral da Universal em São Caetano do Sul (centro)
a Igreja comum localizada na periferia da Zona Leste (Vila Diva), e em outras
denominações pertencentes ao pentecostalismo contemporâneo no Brás em torno do
Templo de Salomão e em outros bairros da periferia na Zona Leste da cidade,
percebendo o pluralismo pentecostal no campo religioso paulistano.
Palavras chaves: São Paulo, Igreja Universal do Reino de Deus (IURD), Templo de
Salomão, Memória.
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Abstract:
The Temple of Solomon – the largest religious space built by the IURD (Universal
Church of the Kingdom of God) in our city between 2010 and 2014, is the object of our
analysis based on the relationship between Memory and Religion, of Memory and the
Memory of Place. Now as the Place of the Memory of the Religion of this
contemporary Pentecostal institution, now as the Memory of Religious Places, the
spaces related to the Abrahamic monotheistic religious culture (Judeo-Christian),
reproduced by her in the neighborhood of Brás: The Tabernacle of the Desert, the
Garden of Olives, the Memorial (Historical Cultural Museum) and the Temple of
Solomon and its Sanctuary. Except for the Tabernacle of the wilderness, all of them
related to the city of Jerusalem which is known as the holy city.
Our studies have combined two methodologies: bibliographic research (theory) related
to authors related to Geography, Geography of Religion, Sociology of Memory and the
history of the Universal Church, constituting the two important concepts of our
research: Memory of Religion and Religious Tradition, as both are products of our
society. And our field work (urban geography), with observatory visits to three religious
spaces of this denomination: the Temple of Solomon (Brás), the Universal Cathedral in
São Caetano do Sul (central) the common church located on the outskirts of East Zone
(Vila Diva), and in other denominations belonging to contemporary Pentecostalism in
Brás around the Temple of Solomon And in other suburban neighborhoods in the East
Zone of the city, perceiving Pentecostal pluralism in the religious field of São Paulo.
Keywords: São Paulo, Universal Church of the Kingdom of God (IURD), Temple of
Solomon, Memory, Narrative of visitors.
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Introdução:
O nosso trabalho de pesquisa pode ser denominado como um estudo dito cruzado,
porque trata-se de uma pesquisa acadêmica feita sobre um grupo religioso brasileiro,
pentecostal contemporâneo, por um não pentecostal, portanto por alguém que não
partilha de uma identidade religiosa comum com este grupo – a Igreja Universal do
Reino de Deus. Logo, isto significou desenvolver um processo de aproximação, de
empatia, para elaborarmos uma discussão geográfica, sociológica sobre o Templo de
Salomão, situado no complexo construído pela Igreja Universal no bairro do Brás.
Escolhemos a Universal não somente por ser a construtora e/ou idealizadora deste
complexo de edifícios, mas por ser uma instituição pentecostal contemporânea, que não
tem meio século de fundação, se tornando em ícone/modelo de sucesso para os outros
grupos religiosos contemporâneos dela. Uma denominação pentecostal que tem as suas
origens geográficas urbanas na cidade do Rio de Janeiro, bem sucedida em seu processo
de expansão e hegemonia dentro do campo religioso nacional e internacional
participando de modo ativo do processo de globalização da religião no mundo,
tornando-se num grupo religioso transnacional.
Escolhemos o Templo de Salomão como objeto de nossas pesquisas, porque mesmo já
tendo completado dois anos de sua inauguração, ele ainda favorece diversas leituras,
visto que a sua inauguração foi amplamente divulgada em diversos órgãos da mídia
nacional e internacional.. Sendo lido por nós como um fixo internacionalizado, receptor
de diversos fluxos humanos – os grupos que o visitam oriundos de diversas localidades
brasileiras e do mundo, principalmente dos países onde a Igreja Universal se encontra
sediada em conformidade com os registros presentes nas diversas edições do principal
órgão midiático da IURD, a Folha Universal (FU n° 1250, 20/03/2016, p. B-10, B-11;
FU nº 1.253,10/04/2016, p. B-10, B-11; FU n°1.262, 12/06/2.016, p. B-10, B-11; FU n°
1.281, 23/10/2.016, p. 4, 5).
Ele, o Templo de Salomão, como o nosso objetivo geral é contemplado como elemento
que fixa o Lugar da Memória da Igreja Universal do Reino de Deus a partir da cidade de
São Paulo para o Brasil e para o mundo globalizado através da visibilidade deste espaço
religioso, a partir da leitura de Norá (NORÁ, 1.992).
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Simultaneamente favorece a construção da memória de um lugar original – Israel ou a
Terra Santa, a partir de um processo de reconfiguração ou de reconstrução da memória
religiosa com a reprodução estética, geográfica dos diversos lugares reconhecidos como
sagrados ou santos pelo Cristianismo e pelo Judaísmo: o Jardim das Oliveiras dentro do
denominado jardim bíblico, como espaço da memória crista, e o templo, o tabernáculo
do deserto, e o Memorial, como espaços relacionados com a memória religiosa judaica
(NORÁ, 1.996). Portanto, tanto o Templo, como o denominado Jardim Bíblico, nos
favorece a análise, a leitura, deles e de seus subespaços, como reproduções de
localidades de uma memória religiosa distante geograficamente. E o emprego de
materiais importados do Oriente Médio na construção deste edifício específico: o
Templo, isto implica em garantir a autenticidade, a legitimidade do mesmo como uma
cópia fiel ao respectivo original.
Pois o discurso do bispo Edir Macedo de Bezerra (fundador da Igreja Universal) sobre o
projeto do Templo de Salomão alimenta a relação memória e religião como um espaço
concebido e percebido como um pedaço de Israel, da Terra Santa na cidade de São
Paulo (LEFEBVRE, 2.000). Se trata de espaços, de memórias previamente escolhidos
para o diálogo, conforme a relação existente entre a IURD e Israel mediada pela cultura
religiosa de longo prazo da Terra Santa para serem reformulados, ressignificados.
Os nossos estudos sobre o templo implicam em reconhecer este como um espaço
exótico e sagrado, a partir da interação dos diversos públicos com ele, tornando-o num
espaço vivenciado seja para os bispos, levitas e pastores, seja para os guias do tour no
Jardim Bíblico, ou para os grupos humanos que interagem com ele, na categoria de
freqüentadores, de visitantes comuns, ou de visitantes ilustres: as diversas autoridades
diplomáticas israelenses, as autoridades civis nacionais, e átomos relacionados à mídia
nacional que em diversas oportunidades visitaram o complexo.
Pois temos a nossa disposição os vários depoimentos destes agrupamentos citados à
mídia impressa oficial da instituição religiosa. E como um geo-símbolo desta
comunidade religiosa dentro da cidade, reforçando o processo de legitimação desta na
sociedade e no campo religioso, a partir do diálogo da Igreja Universal do Reino de
Deus com o Judaísmo, cultura religiosa monoteísta ancestral do cristianismo. Ele pode
ser lido por nós como um projeto arquitetônico do episcopado iurdiano que articula a
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história e a memória institucional em nome de uma hegemonia, visibilidade a serem
reconhecidas no campo religioso.
Dos espaços citados, destacamos aqueles relacionados com a cultura religiosa judaica e
cristã: o Templo e o seu subespaço interno, o santuário, o Tabernáculo do deserto e os
seus subespaços conforme as informações contidas nos diversos textos da bíblia
hebraica, o Jardim das Oliveiras, segundo os registros dos evangelhos. E o Memorial –
museu histórico cultural, e os seus dois subespaços: a área da exposição de bens
materiais (objetos miniaturizados tanto do tabernáculo, como dos antigos templos)
relacionados à história do Judaísmo antigo, e a área da comunicação multimídia
audiovisual – onde há uma tela de alta resolução na qual há a divulgação da narrativa
sobre os antigos espaços religiosos do monoteísmo judaico (o tabernáculo e os dois
templos construídos em Jerusalém).
Estes lugares no complexo são espaços planejados, produzidos de forma não aurática,
desterritorializados, destradicionalizados, que revelam a dimensão do processo de
apropriação dos símbolos pertencentes à cultura laica e religiosa judaica pelos diversos
grupos pentecostais contemporâneos nacionais e suas diversas conseqüências – a
questão da aura, da remitologização, e do misticismo emblemático.
Sendo assim, temos a Memória de um Lugar específico, a cidade de Jerusalém expressa
pelos seguintes edifícios, o templo, o Jardim das Oliveiras e a cúpula do Memorial.
Ele, o templo, permite a construção da relação entre a memória e a história da
instituição religiosa através da ação do episcopado da Universal reescrevendo-as em
busca da hegemonia dentro do campo religioso cristão, protestante, pentecostal em
nosso país.
Adotamos como marco teórico deste trabalho a relação entre a Memória e a Religião
dentro dos grupos religiosos pentecostais contemporâneos, pois são produtores de uma
memória efêmera, passageira, transitória em relação aos fatos relacionados à fundação
destes grupos modernos. No caso da Universal, o templo de Salomão nos permite ler a
preocupação do grupo em construir uma referencia de memória fundante para o mesmo.
Uma memória inspirada num fato religioso do passado monoteísta, apropriando-se deste
para recriar e dar ressignificação para tal evento de um passado longínquio em nossos
dias, segundo o pensamento de Halbwachs.
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Por ser um trabalho acadêmico cruzado, a nossa empatia com a instituição foi
construída a partir de um trabalho de campo (geográfico, religioso, urbano) de caráter
observatório em conformidade com as regras propostas pelo grupo religioso para aquele
espaço visitado por nós dentro do complexo: o tour religioso no Jardim Bíblico, e
assistir as reuniões da Igreja Universal do Reino de Deus no templo de Salomão,
ocupando dentro dele, locais diferenciados no interior do santuário. Simultaneamente,
fizemos a comparação ente os espaços religiosos da instituição, o templo, a catedral e
igreja comum, visitando estas últimas – a Catedral da Igreja Universal em São Caetano
do Sul, e a Igreja comum da Universal em Vila Diva, além de outros espaços religiosos
concorrentes do templo de Salomão no bairro do Brás, e da IURD na periferia da cidade
de São Paulo, portadoras da apropriação cultural religiosa de elementos simbólicos
pertencentes ao Judaísmo.
As fontes consultadas por nós foram diversos artigos publicados na Internet por vários
autores sobre a Universal e a construção do templo, o acesso aos órgãos midiáticos
pertencentes a instituição religiosa citada: o boletim Hora da Mudança publicado em
São Paulo, e a Folha Universal (FU), publicado no Rio de Janeiro e posteriormente
transferido para São Paulo, ao site da IURD – Universal. Org.br, e a partir deste o
acesso a outras fontes eletrônicas da denominação tais como: site do Templo de
Salomão, o blog do bispo Macedo etc.
Dividimos estas nossas pesquisas em três capítulos:
Capítulo I – “A MEMÓRIA EFÊMERA E O PENTECOSTALISMO”
No capítulo um estaremos criticando o pentecostalismo contemporâneo, fruto do
fenômeno do pluralismo em nossa sociedade, e a sua memória efêmera construída a
partir do emocionalismo e não do racionalismo, portanto distante de qualquer tradição.
Nele abordaremos as definições de Memória, da Memória Religiosa, da Memória
Espacial, da Tradição, das linhagens de crença religiosa, e a construção da relação o
espaço/lugar, a memória dentro da cultura religiosa da Igreja Universal do Reino de
Deus, o posicionamento crítico da Igreja Universal em relação a tradição religiosa. E a
relação efêmera entre o pentecostalismo e a memória a partir de sua definição
etmológica. Para nós, as linhas de crença, o lugar, a memória, a religião e as tradições
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são portadoras de diversas relações com o ser humano, pois estas são criações que tem
como seu artífice ou criador o Homem e as várias sociedades pelos séculos a fora.
A partir da relação construída entre a memória e a religião pretendemos responder uma
questão importante, a relação existente entre a memória religiosa e o pentecostalismo.
CAPÍTULO II – “A IURD EM SÃO PAULO”
Neste capítulo estaremos abrangendo: as origens da Universal na cidade do Rio de
Janeiro e sua trajetória, entre o final dos anos setenta e começo dos anos oitenta, quando
esta se instala na cidade de São Paulo.
Nele abordaremos a relação da IURD com a geografia – espaço/lugar, a ocupação física
destes no meio urbano, e com eles a constituição de espaços diferenciados: centro –
catedrais, igrejas suntuosas instaladas em espaços privilegiados nas diversas capitais, e
na grande São Paulo. E a periferia – composto por igrejas comuns em avenidas
movimentadas nos bairros da periferia da cidade.
Tomamos como ponto de partida a definição da Universal como um grupo religioso
pentecostal brasileiro contemporâneo que tem toda a sua gênese e expansão no meio
urbano nacional e que faz parte do pluralismo religioso no meio protestante pentecostal.
As razoes para a IURD fixar-se na cidade de São Paulo e a estratégia geográfica adotada
pela instituição.
A aplicação da teoria da mancha religiosa desenvolvida por Magnani (1.996)/e por Silva
(2.014) para explicar a formação do território da Igreja Universal do Reino de Deus no
Brás, e a construção do templo de Salomão neste bairro.
A relação do templo de Salomão e a cidade de São Paulo e as relações geográficas que
existem a partir do seu processo de construção. E as experiências humanas com este
espaço.
Capítulo III – “O TEMPLO DE SALOMÃO: MEMÓRIA E RELIGIÃO”
Para nós este capítulo trata da questão do templo de Salomão no Brás e o processo de
reconstrução da memória dentro do campo religioso.
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Sendo um espaço concebido, percebido e vivenciado para a fixação de um projeto
político hegemônico e de uma memória original e com ele as suas relações políticas.
O Templo é um instrumento que a materializa a existência do grupo religioso (ser
sujeito e exercitar o poder no mundo) e das teorias da IURD: o circuito da conquista e
da superação.
O templo sendo contemplado por nós como o lugar das diversas memórias – da Igreja
Universal e dos diversos lugares sagrados do Oriente Médio, e da religião dentro do
pentecostalismo iurdiano. A análise do templo pelas seguintes teorias – da apropriação
dos símbolos judaicos pelos grupos pentecostais contemporâneos, da remitologização
através da importação de materiais do Oriente Médio, e do misticismo emblemático, que
revela o processo de esvaziamento do conteúdo simbólico dos denominados símbolos
judaicos pelos grupos religiosos pentecostais – no caso a monumentalidade
arquitetônica.
Ele, o templo, e suas relações com as diversas memórias religiosas – Lugar da Memória
da Igreja Universal, e a Memória dos Lugares sagrados reproduzidos dentro do
complexo.Porque a Universal precisa de recriar uma memória?
Neste nosso trabalho de pesquisa não abordaremos a relação existente entre a economia
e a religião através da teologia da prosperidade, a especulação imobiliária promovida
pela construção do complexo naquele bairro central, e o complexo como um espaço de
lazer/turístico favorecendo ao chamado turismo religioso dentro dele, devido a
instituição construir para si um discurso contraditório sobre esta questão.
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Capítulo I – “A Memória Efêmera e o Pentecostalismo”
1.0 – Introdução:
Este capítulo tem como objetivo abordar a Memória e suas relações com o espaço e com
a religião, em especial com os grupos religiosos pentecostais contemporâneos nacionais.
Onde a ideia de lugar tem grande importância nesta relação articulada com a memória e
com a religião, tomando como referencia a Igreja Universal do Reino de Deus e os seus
espaços religiosos nos grandes centros urbanos.
E todo um debate entre a força da tradição dentro da religião e as reações em contrário a
esta, a partir da pluralidade religiosa em nossa sociedade..
1.1 – Memória:
Definimos a Memória como toda evocação, lembrança/recordação humana, voluntária,
coletiva ou individual, a qual articula uma determinada interpretação de uma lembrança
ou recordação. Estas evocações ou lembranças podem ser – crenças, experiências
(sensações, sentimentos), falas/palavras, narrativas, saberes enciclopédicos, técnicas de
trabalho etc, as quais foram acumuladas ao longo do tempo por um indivíduo ou por
uma determinada comunidade.
Podemos resumir a memória como a um ato de transmissão cultural, onde o papel do
Homem ou da sociedade é de interpretá-la (lê-la). Bem como a capacidade humana em
esquecer ou em lembrar determinados fatos relacionados à vida coletiva e/ou individual
(HERVIEU-LEGER; WILLAIME, 2.009)
Dentro da área das ciências humanas há diversos autores que se dedicaram aos estudos e
pesquisas relacionados à memória, tais como, Hobsbawn, Le Goff, Candau, Halbwachs,
Pollack. Ricoeur etc (CANDAU, 2014, p.213,214, 217). Em nossos estudos,
abordaremos o tema memória, a partir das contribuições elaboradas por Halbwachs
(1.877-1.945).
Segundo M. Halbwachs, a memória é a condição necessária para haver a construção de
identidades e da unidade de um agrupamento humano. Uma das formas de alienação do
Homem ou de um grupo étnico, religioso ou social e/ou de uma instituição é tornar
seres humanos, grupos e instituições, excluídos, expropriados do acesso às respectivas
memórias na sociedade. Quando estes esquecem o seu próprio passado, há a perda da
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identidade, e com ela, a capacidade de enfrentar simultaneamente, tanto o passado,
como o futuro (HERVIEU-LÉGER; WILLAIME, 2.009).
Toda memória vivencia duas leis na relação que esta constrói com os seres humanos:
A – a da recriação contínua,
B – do esquecimento parcial/total de uma determinada lembrança.
No primeiro caso temos a recriação contínua da lembrança/memória, a partir de
demandas, de significações atuais, provenientes de dados extraídos ou oriundos do
presente, tornando estas legítimas, pertinentes a uma respectiva coletividade.
(HERVIEU-LÈGER; WILLAIME, 2.009).
No segundo caso há um processo de condenação ao desaparecimento de uma
determinada lembrança, pois o esquecimento parcial e/ou total é a forma da coletividade
humana exprimir que ela não tem serventia atual para esta, que se tornou ao longo do
tempo, descartável, sem importante para a vida comunitária (HERVIEU-LÈGER;
WILLAIME, 2.009). Isto significa que a memória é um produto finito, podendo ser
apagada, extinta ou reativada.
Nesta relação construída com o Homem, a memória tem as seguintes propriedades:
1 – Permitir ao ser humano vivenciar um determinado acontecimento, ao ponto do
indivíduo sentir-se parte do mesmo, através dos diversos rituais sociais. Sendo que este
caso será exposto por nós, ao tratarmos da memória da religião.
2 – Ela é o instrumento de mediação entre a Humanidade e o mundo, revelando o modo
de vida que está enraizado no interior de um grupo humano. Este fato é comum ao
estudarmos as comunidades indígenas e quilombolas em nosso país e o seu território.
Pois os mecanismos, as técnicas de sobrevivência física, cultural e a religiosidade destes
grupos são reafirmadas no seu território através de diversas lembranças conservadas nas
práticas cotidianas.
Ele, Halbwachs, é o autor de uma subdisciplina da sociologia, denominada de
sociologia da Memória, cujas teorias foram escritas por ele a partir de 1.925, com o
livro: “Os Quadros Sociais da Memória.” Valorizando desta forma o lado positivo da
memória coletiva, que é a seleção de acontecimentos, dos fatos sociais, das
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interpretações do passado a partir do presente, por parte de uma determinada
comunidade, reforçando a adesão afetiva de um sujeito a um determinado grupo, através
dos sentimentos de pertencimento, a coesão social de um grupo (étnico, religioso,
social) ou instituição. Portanto, o papel da memória coletiva é da apreensão de crenças e
dos valores contidos nos diversos eventos. Assim, as lembranças ou os testemunhos se
convertem em mecanismos sócio-culturais de mobilização da memória (coletiva,
individual), que tem o poder de debilitar, enfraquecer ou de completar, fortalecer um
determinado evento ou fato dentro de uma determinada comunidade.
Para Halbwachs (HERVIEU-LÈGER; WILLAIME, 2.009, p. 220, 221), “a memória
coletiva é fruto de dois processos: a seletividade das diversas memórias individuais e a
harmonização das experiências, das lembranças, das observações feitas por terceiros”.
A partir da obra, Os Quadros Sociais da Memória, Halbwachs afirma a existência da
pluralidade de gêneros de memória em nossa sociedade, tais como: a individual, a
grupal – família, instituições educacionais, religiosas, sindicatos etc. Esta pluralidade de
gêneros de memórias é um produto construído pela Humanidade em diversos momentos
desta. Todas elas são dependentes da memória coletiva e podem ser convertidas em
memória social, isto é, uma memória coletiva que vivenciou ao longo do tempo um
processo de apagamento ou sendo colocada em segundo plano devido às experiências de
remanejamento/transformação.
Halbwachs em suas pesquisas trabalha com ela, com a memória não indiferente, aquela
que agrega os valores estéticos, humanos, simbólicos e sociais em sua transmissão, pois
neste modelo de memória os valores advindos do capitalismo e do mercado tem valor
de menor importância.
1.1.1– Memória Religiosa:
Dentre os gêneros de memória coletiva, podemos citar a memória religiosa, que é objeto
dos estudos de Halbwachs, como um importante mecanismo de inserção e do
pertencimento individual dentro de uma sociedade. Ela ganha importância nas pesquisas
deste, porque os diversos rituais religiosos são os mecanismos sociais de condução do
ser humano a participar deles e sentir-se parte de um determinado acontecimento,
vivenciando-o.
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Podemos tomar como exemplo, o seder de Pessach da comunidade judaica, a eucaristia
na cultura religiosa cristã do catolicismo romano e a santa ceia dentro da cultura cristã
protestante, incluindo neles, os grupos religiosos pentecostais. O que todas elas
possuem em comum?
São rituais caracterizados por refeições comunitárias que colocam os seus participantes
em contato com a memória de um passado religioso, reencontrando-o por meio de um
acontecimento/fato importante para estes (RIVERA, 2.010). Os judeus e os cristãos
devem nestas refeições assumir o processo de interação com estes fatos do passado,
sentirem-se parte do acontecimento ou do fato comemorado em cada grupo.
Por exemplo, a Hagadá de Pessach defende a teoria de que todo o judeu independente
da época na qual nasceu, e do espaço aonde ele vive, deve sentir-se membro da
comunidade ancestral escrava no antigo Egito, participando do processo de libertação
narrado no livro de Êxodo (fonte primária da memória religiosa), e na Hagadá (fonte
secundária de memória religiosa). O mesmo ocorre com os cristãos católicos e
protestantes, eles devem ver-se como discípulos de Jesus Cristo quando participam da
ceia do Senhor, anunciando a morte e a ressurreição do mesmo através desta refeição
comunitária, como afirma São Paulo em sua carta à Igreja localizada na cidade grega de
Corinto.
A letra do famoso cântico protestante/pentecostal: vem cear o mestre chama, vem
cear..., reforça esta ideia com tal convite1.
Através das leituras destes exemplos citados, podemos afirmar que a memória religiosa
além de ser um fenômeno social compartilhado entre os membros de um determinado
grupo humano, promotor de um sentimento comum - a comunhão de consciências. Ela
como importante referencia social procura manter viva, isto é não esquecida ou extinta,
a recordação do passado religioso dos grupos monoteístas mencionados. Tanto o Seder
de Pessach e sua narrativa na Hagadá, como a ocorrência da Eucaristia no catolicismo e
o seu correspondente, a Santa Ceia na versão protestante e pentecostal, são eventos do
passado aos quais não experimentamos de forma direta, porque fazem parte da memória
1 “Vem Cear”, Harpa Cristã n° 301.
20
religiosa destes grupos, mas existe todo um esforço destas comunidades para memorizar
estes eventos, imergindo nesta experiência vivida.
Segundo Hervieu-Lèger (HERVIEU-LÈGER; WILLAIME, 2.009, p. 229). “no caso da
memória religiosa há um processo de apreensão das crenças, de ações subjetivas de
determinados personagens, de rituais e de determinados valores.”
Desta forma, a Memória religiosa aborda o conceito de lembrança como, um
mecanismo de apendizado de fatos ou de movimentos já ocorridos, portanto,
relacionados ao passado.
A memória religiosa possui as seguintes características: ela tem como objetivo cultivar a
lembrança existente sobre a deidade/divindade ou o sagrado dentro de uma determinada
coletividade e/ou sociedade, a partir da relação entre o Homem, o seu mundo com o
transcendente, com o mundo espiritual.
Tomando a comunidade judaica como exemplo, o cultivo da lembrança, da memória é
contemplado como um mandamento divino a ser observado por este grupo humano,
sendo citado no texto bíblico cerca de novecentas vezes. Ela pode ser evocada a partir
de meios materiais, tais como, as biografias de fundadores de diversos grupos
religiosos, as crenças, as cerimônias, os dogmas, espaços religiosos produzidos para fins
devocionais, os rituais, etc.
Os quais estão relacionados a fé de uma determinada etnia ou grupo social. Toda
memória religiosa é uma memória pluralista, e portadora da aspiração de ser uma
memória coletiva, dominante e hegemônica, conforme os interesses vigentes. Logo, a
sua continuidade, como a sua imposição existe por causa dos diversos conflitos, da
concorrência entre elas, por serem simultaneamente, específicas e diferenciadas, ao
criarem espaços para a inclusão e pertencimento de grupos ou indivíduos.
Este confronto ou a luta entre memórias revela a pretensão delas em se converter numa
memória coletiva com aspiração conquistadora, dominante, hegemônica e os interesses
dos grupos sociais vigentes. Estes conflitos sociais geram dois grandes grupos de
memórias religiosas: a memória autorizada, legitimada, oficial, verdadeira, e a memória
desautorizada, ilegítima, marginal, condenada aos subterrâneos da cultura religiosa
dominante (HERVIEU-LÈGER; WILLAIME, 2.009). Podemos citar como exemplo
disto, as várias heresias que ocorreram dentro da história do cristianismo: o
21
montanhismo (Século II EC), o arianismo (Século V EC) e o nestorianismo (Século V
EC).
Segundo Hervieu-Lèger (2.009, p. 229), a memória desautorizada, vencida, dentro de
uma determinada cultura religiosa pode ser apropriada, invocada e/ou reativada, a partir
de novas aspirações de grupos em determinadas situações sócio-culturais, construindo
em contra partida um modelo novo de religião, tendo como fundamento desta uma
tradição imemorial – as antigas crenças marginalizadas pela memória religiosa oficial,
associada a novos dados culturais.
A dinâmica das relações sociais, a evolução dos saberes e das técnicas , as
relações que a sociedade mantém com seu meio ambiente, os interesses das
camadas dominantes em seu seio transformam as crenças antigas, e fazem
emergir ideias religiosos novas. O estudo das antigas religiões revela desse
modo a existência de diferentes extratos de crenças, que correspondem a
cultos distantes no tempo e de orientações opostas. Enquanto a sociedade não
pode se desembaraçar dessas crenças, ela deve se compor com elas,
integrando-as em uma síntese religiosa continuamente re-elaborada
(HERVIEU-LÈGER; WILLAIME, 2.009, p. 229).
Podemos citar como exemplo contemporâneo deste caso, a construção do Templo de
Salomão, no Brás, pela IURD, entre os anos de 2.010 e 2.014. O Templo reafirma a
ideia de um endereço fixo para a divindade manifestar-se e residir, como ocorria na
antiguidade entre os judeus e entre os povos pagãos. Trata-se de uma ideia que os
diversos grupos do cristianismo não esposam e condenam.
Reforçam esta condenação seja pela ocorrência do fato histórico religioso: a destruição
do antigo ‘templo judeu na cidade de Jerusalém pelas legiões do império romano em 70
AD, registrada por Flávio Josefo.
Seja pelo pensamento dos diversos bispos cristãos no início da Medievalidade, sobre os
judeus e sobre o Judaísmo, dentre eles, Agostinho de Hipona (Santo Agostinho), através
de sua obra: Tractatus Adversus Iudaeos. Este pensamento religioso procura tornar
marginalizada, ultrapassada e vencida a memória religiosa do Judaísmo em relação ao
Cristianismo.
Este modelo de crítica cristã condenatória da memória religiosa judaica na atualidade
nos é descrita por Beling em seu artigo tomando como referencia de sua crítica, a
postura controvertida da Igreja Universal do Reino de Deus no campo religioso cristão,
e no subcampo protestante/pentecostal, abordando questão referente a nomenclatura do
edifício religioso – Igreja ou Templo:
22
A designação correta ou adequada: templo ou igreja? Qual a importância
dessa distinção? Há várias contribuições teológicas ao se discorrer sobre tal
assunto. (...) o cristianismo não possui mais templos. A partir de Jesus e do
seu ato conhecido como a purificação do templo e poderíamos acrescentar a
profecia sobre a destruição do mesmo (Mc 11:15-19, e 13:1, 2) inaugurou-se
uma nova relação espacial entre as/os que seguiam e seguem a mensagem de
Cristo.
(..) Diremos simplesmente que deveríamos abolir o termo ‘templo’ em favor
do termo ‘igreja’, [...] porque a Igreja primitiva rejeitou o vocábulo ‘templo’:
são os judeus ou os pagãos que têm templos, ao passo que os cristãos não
têm, ou pelo menos não têm templos ‘feitos por mãos de homens’. Com
efeito, um templo contraria a ideia de que Jesus Cristo é o único ‘catholicum
Dei templum’, como dizia Tertuliano. Querer um templo na terra equivale a
tentar ‘trazer do alto o Cristo’ (Rm 10:6), a falsear a situação escatológica da
Igreja e, consequentemente, tentar aprisionar o Senhor” (BELING, 2.014, p.
6,7).
Todo este debate anteriormente citado por nós com Beling revela que a memória
religiosa é na prática uma memória de combate nas palavras de Halbwachs, pois temos
a ação de instituições religiosas defendendo a sua memória ou verdade oficial de
diversas formas de contestação, negando qualquer direito a reinterpretação subjetiva
destas, fazendo o que ele chama de ligação/oposição negativa. E no caso da relação
religiosa entre o cristianismo e o judaísmo, há uma relação de descontinuidade entre
eles (HERVIEU-LÈGER; WILLAIME, 2.009).
Portanto o que vemos hoje nas diversas religiões contemporâneas é um processo de
reativação, da retomada, de uma revivescência de ideias consideradas condenadas,
marginalizadas ou obsoletas do passado por grupos religiosos oficiais.
A este processo que mencionamos, Halbwachs denomina de crenças antigas ou de
fragmentos/resíduos que vem do passado, os quais são repaginadas no presente, a partir
de determinados interesses dentro do campo religioso cristão no Brasil (HERVIEU-
LÈGER; WILLAIME, 2.009).
Sendo que estes grupos religiosos contemporâneos a partir destas ideias marginais
procuram construir uma reinterpretação subjetiva da verdade oficial. E os espaços
religiosos que abrigam os diversos santuários, são formas de materializar a evocação de
uma determinada lembrança/memória religiosa, do mesmo modo que faz os dogmas.
No caso da Igreja Universal, o problema não está no emprego do substantivo templo em
si, mas nas palavras que qualificam este edifício com a evocação de uma memória
religiosa, pois há igrejas protestantes que designam os seus espaços religiosos como
templos. Exemplo: a Igreja Presbiteriana do Brasil situada na Mooca utiliza a expressão
23
templo presbiteriano. Portanto, o termo presbiteriano qualifica qual memória religiosa é
evocada pelo edifício – a reforma protestante/calvinismo.
Os únicos espaços dentro do complexo construído que fazem apologia à uma possível
memória cristã, é o poço de Jacó, cuja reprodução material tem como referencia bíblica
ao encontro entre Jesus e a mulher samaritana citada pelo evangelho de João (Jo. 4:4-9),
sendo que este local não faz parte do roteiro turístico de visitação dentro do denominado
Jardim Bíblico e a reprodução do Jardim das Oliveiras, que se situa em Jerusalém. Este
subespaço evoca a lembrança dos últimos momentos da vida do fundador do
cristianismo em conformidade com o relato dos quatro evangelhos (Luc. 22: 39).
1.2 – Memória espacial:
Tanto a memória como a religião articulam relações com os diversos espaços
geográficos, especialmente com o lugar, construindo o que chamamos de Memória
espacial. Mas para entender o papel da memória espacial, é preciso definir a expressão
geográfica lugar.
A – Lugar:
A geografia nos permite fazer leituras amplas e diferenciadas de suas categorias ou
conceitos chaves, e dentre eles podemos citar a expressão lugar, que em muitos textos é
apresentado como sinônimo de espaço, porém não o são. Logo, a expressão lugar é
portadora de diversas abordagens, interpretações, sentidos e significados. Ela, a
geografia estuda tanto os Homens, como os lugares, sendo que ambos estarão presentes
em diversos textos religiosos e sagrados da Humanidade.
Definimos a palavra lugar como: uma referência geográfica locacional, pois todo lugar é
uma posição no espaço. Exemplo, o complexo construído pela Igreja Universal é uma
referência locacional: um lugar que se encontra num determinado espaço urbano, a
cidade de São Paulo e num subespaço desta, o bairro do Brás.
O termo lugar não se reduz a uma referencia geográfica na produção espacial, pelos
seguintes motivos a seguir: primeiro, o lugar ganhou importância estratégica,
articulando uma série de conexões e trajetórias com o fenômeno da globalização, sendo
reconhecido desta forma como um espaço determinado ou específico. Este caso fica
bem explícito com as diversas caravanas internacionais em visita ao complexo
24
construído no Brás pela Igreja Universal do Reino de Deus, em especial, ao templo de
Salomão, conforme as diversas matérias publicadas sobre estas visitações pela Folha
Universal:
“É possível sentir a atmosfera de Jerusalém aqui: Diplomatas de Israel visitam o templo
de Salomão, e comentam a impressão que tiveram do local”. (FU, 1.240, 10/01/2016, p.
B-10, B-11).
“Caravanas de Peruanos e Suiços visitam o templo de Salomão: estrangeiros pisaram
em terras brasileiras exclusivamente para conhecer o santuário” (FU, 1.250, 20/03/2016,
p. B-10, B-11).
Segundo os geógrafos de diversas escolas, o lugar é contemplado como um espaço
diferenciado e singular. A singularidade de um lugar se expressa por meio das diversas
ações (as formas de agir) e experiências humanas presentes no nosso cotidiano, tais
como: as angústias, os delírios, os entendimentos, as projeções, os sentimentos, bem
como s identidades, os significados, os símbolos e valores propostos etc.
Pois o significado das experiências varia de acordo com o lugar, as épocas, a função
social e do grupo de indivíduos.
Para Tuan (1.983, p. 151, 152, 156, 198), “ o lugar é um pequeno mundo, um centro
gerador de significados subjetivos para cada pessoa e/ou sociedade. Ele afirma que os
lugares são núcleos de valor, os quais podem ser apreendidos pela Humanidade.” Pois
todo ser humano ao conhecer melhor o espaço que o rodeia, denomina este de lugar
graças as suas experiências.
Este processo de ordem subjetiva em converter um espaço num lugar pode ocorrer pelo
sistema de apropriação de duas formas: pela via afetiva e a partir da experiência de vida
com evento relacionando o local com a vida humana. Nestes dois casos temos um
espaço vivido sendo convertido em lugar.
O aspecto da diferenciação de um lugar é fruto da experiência humana, da cultura
(conjunto de ações, crenças, práticas e valores), dando a este uma determinada função.
Logo, a diferenciação espacial produz sensações, tais como: alegria, curiosidade,
25
depressão, espanto etc. Mas a ideia do lugar não se restringe ao aspecto dos estudos na
geografia humana, ele também pertence ao universo da religião2.
I – Aspecto da Singularidade:
Os aspectos da singularidade e da diferenciação fazem parte deste universo, pois todo
espaço religioso e/ou sagrado é simultaneamente um espaço geográfico. Exemplos:
Quando uma pessoa ao afirmar que a catedral da IURD situada no bairro do Brás, é a
minha igreja ou o nosso templo, estaremos observando um processo de apropriação
subjetiva a partir da afetividade, como instrumento da relação entre o sujeito e o
objeto/lugar – espaço religioso, a catedral. Ou quando alguém na mídia escrita e/ou
televisiva relaciona de forma subjetiva a relação sujeito e o objeto/lugar – espaço
religioso, a partir de uma experiência de vida pessoal, como por exemplo, ter sido
abençoado. Exemplo o relato da cura da síndrome de Guilain-Barré3.
II – Aspecto da Diferenciação:
Este aspecto da diferenciação também é construído pela subjetividade, as experiências
humanas em conjunto com a cultura e função do espaço concebido (espaço religioso).
Ao assistirmos na mídia televisiva a programação da IURD através do canal 21 da NET,
os diversos apresentadores (incluindo o próprio fundador da Universal, o bispo Macedo)
afirmam que os lugares religiosos da IURD, são espaços terapêuticos, pronto-socorro
espiritual etc (TAVOLARO, 2.007).
O qual é percebido pelas diversas experiências humanas que relacionam tais espaços
com a cultura, com as orientações dadas em consultoria por especialistas religiosos
daquela corrente/data, que refletem a associação das crenças e práticas com a vivência
do ser humano naquele lugar. O mesmo ocorre na mídia escrita, a Folha Universal4.
Além dos exemplos citados, a partir das nossas pesquisas há outros meios de relacionar
o lugar como algo pertinente a religião, as diversas narrativas orais, pois segundo elas,
2 A geografia da Religião é a disciplina da geografia que estuda as diversas relações existentes entre a
geografia e a religião. Nesta disciplina, o espaço ou o lugar religioso ou sagrado, são os objetos de
estudos deste ramo de conhecimentos (ROSENDAL, 1.996, p.13) 3 Depoimento de Priscila C. de Souza e do esposo, Elisvan V. de Souza, que freqüentou as correntes de
cura na Igreja Universal, em Cura: “Sem os movimentos do corpo,” in: Folha Universal, 20/11/2016, p.
10,11. 4 Depoimento de Bianca P. Galindo Sant’Ana e de Rodrigo Sant’Ana, que participaram da Terapia do
Amor, na IURD, em Capa: “Os cinco destruidores do amor”, in: Folha Universal, 20/11/2016, p. 18.
*Grifo e negrito nossos
26
existem determinados espaços considerados como propriedades de deidades específicas.
Ou o registro da ocorrência de uma hierofania – manifestação sobrenatural, criando uma
aura de sacralidade sobre um determinado local. E por último, a presença das
informações anteriormente mencionadas através de textos tanto os religiosos, como
sagrados, os quais foram escritos por uma comunidade de fiéis. Neste último caso,
podemos citar os textos sagrados, provenientes do monoteísmo judaico-cristão, que é
uma cultura religiosa que preza ou valoriza a escrita em três textos:
(...) Quando os céus se fecharem e não houver chuva, por terem pecado contra
ti, e orarem neste lugar* e confessarem o teu nome, e se converterem dos
seus pecados, quando tu os afligires,... Agora pois, ó meu Deus, estejam os
teus olhos abertos e os teus ouvidos atentos à oração deste lugar*. (Rei
Salomão, II Crôn.6: 26, 40).
Ou ainda: “Agora estarão abertos os meus olhos e atentos aos meus ouvidos à oração
deste lugar*.” (II Crôn. 7:15)5
Porque assim diz o Alto e o Sublime que habita na eternidade, cujo nome é
santo: Num alto e santo lugar* habito, como também com o contrito e com o
abatido de espírito, para vivificar o espírito dos abatidos, e para vivificar o
coração dos contritos.” (Isa. 57: 15)6
Logo, temos o registro de diversas procedências/épocas que associam os grupos
humanos com as práticas devocionais a uma divindade, com o espaço/lugar, onde tais
práticas espirituais devem ocorrer conforme a religiosidade de uma determinada cultura.
B – Memória Espacial:
Definimos a Memória Espacial como a impressão ou percepção histórica e mítica que
um agrupamento humano produziu em determinado momento a partir do espaço
organizado e vivido – lugar, onde este último é visto como uma contribuição cultural e
social do Homem que exerce a função de produtor/reprodutor de espaços e lugares. E a
grande conseqüência de tal impressão ou percepção é a construção subjetiva de uma
identidade subjetiva. A memória espacial tem duas grandes características: a primeira, a
subjetividade, isto é, o conjunto de possíveis condições que favorecem a existência do
Homem a partir de uma explicação, que pode ser: um acontecimento ou fato social,
5 Este texto encontra-se gravado na parede externa do Templo de Salomão em São Paulo, reforçando a
ideia de que este é local é um lugar sagrado. 6 Este texto encontra-se gravado na parede externa do Templo de Salomão em São Paulo reforçando a
ideia de que este é local é um lugar sagrado.
*Grifo e negrito nossos
27
coletivo ou individual. Exemplo: porque o templo de Salomão situa-se no bairro do
Brás?
Por que neste bairro instalou-se a primeira igreja da instituição, depois esta se tornou na
catedral do grupo religioso na cidade de São Paulo, este espaço religioso recebeu
historicamente o nome de catedral matriz do Brás dentro da cultura iurdiana. Logo, uma
explicação ancorada num acontecimento ou fato social anterior, pertinente aos anos
oitenta do século passado.
A segunda, a denominada lembrança espacial constrói relações com espaços ou lugares
vividos e memorizados por uma determinada coletividade através das experiências, do
tempo, bem como dos nomes, posições de atuação, regras etc. Exemplo: os diversos
registros escritos na Folha Universal sobre a visita de grupos estrangeiros provenientes
da África, das Américas, da Ásia e da Europa, para conhecer o templo de Salomão.
Ou a presença de autoridades locais ou de Israel ao complexo e especificamente ao
Templo, revelando a experiência física, material e espiritual deste grupo de pessoas que
vivenciaram naquele lugar, desde Julho de 2.014.
Todos os registros midiáticos escritos destes mais de dois anos estão acompanhados de
respectivas imagens, como a forma de evocar a lembrança/memória, tanto para a IURD,
como para os visitantes. No caso desta segunda hipótese, a memória espacial determina
com precisão, o espaço ou o lugar como o ponto de referencia de um acontecimento ou
de uma experiência familiar, mencionando o tempo, os nomes e posições de atuação no
meio social (HERVIEU-LEGER; WILLAIME, 2.009).
Podemos citar neste caso como exemplos, o primeiro, o segundo, e o terceiro capítulos
do evangelho escrito por Lucas, onde nos primeiros versículos dos capítulos acima, ele
apresenta um inventário de nomes e de indivíduos em determinadas posições sociais de
destaque, onde estes personagens favorecem a precisão espacial e temporal para
introduzir o acontecimento: o nascimento de Jesus. E o credo cristão ou niceano, criado
pelos cristãos a partir do século IV da EC, menciona nomes relacionados com a
biografia de Jesus de Nazareth, pertinente ao século IEC: Maria e Pôncio Pilatos.
O primeiro nome encontra-se relacionado ao nascimento de Jesus, o segundo nome está
relacionado à dominação política do Império Romano na província da Judéia, o
governador responsável pela morte por crucificação de Jesus. Tais dados citados tanto
28
no evangelho de Lucas, como no Credo Apostólico são importantes para se estabelecer
uma memória e uma futura tradição religiosa cristã, tornando relevante o aspecto da
precisão.
A memória espacial permite ao individuo/sujeito entrar em contato com determinados
espaços ou lugares, a possibilidade de ser transportado a momentos e lugares afetivos
(emocionais) pertencentes à memória comunitária do grupo ao qual esta pessoa
pertence. Um exemplo da existência da Memória Espacial fica evidente no depoimento
do bispo Domingos Siqueira, da Igreja Universal do Reino de Deus, sobre o complexo
que a instituição a qual ele pertence, construiu e inaugurou em dois mil e catorze no
bairro do Brás, no site Universal.org:
Quem visita o local é impactado pelo que vê e também pelo que ouve. A
pessoa é transportada no tempo, como se saísse do Brasil e viajasse em
pensamento para Jerusalém, e também por ali caminhasse. O Templo
realmente faz isso, ele nos transporta para a Cidade Santa (Bispo Domingos
Siqueira – Universal. Org.).
A entrevista concedida pelo bispo Domingos Siqueira ao site Universal.Org. em vinte e
cinco de setembro de dois mil e catorze, evidencia o lugar como um importante espaço
simbólico e investido de sentidos, com uma grande carga afetiva, emocional.
Mas a relação entre a geografia e a memória não fica restrita a lembrança/memória
espacial de uma etnia ou de um grupo religioso ou social e suas subjetividades, ela
construiu uma relação dialética – o lugar da memória e a memória do lugar a partir dos
estudos e pesquisas por parte de Pierre Norá. Estes estudos surgem graças ao interesse
em pesquisar aos grupos humanos marginalizados ou sem voz na história, dar a estas
comunidades o direito à memória. Ou seja, o lugar da memória é a forma de como uma
sociedade lê o seu passado, porque o lugar da memória não é a própria memória, mas
uma representação dela.
Definimos o Lugar da Memória como o espaço no qual a memória encontra para si
refúgio dentro de um momento particular. Pois ela tem o poder de enraizar-se no
concreto, que pode ser um espaço/lugar geográfico, uma imagem etc. Eles são
construídos ou existem porque as lembranças, as memórias vivenciam ameaças externas
e internas, porque a memória pode ser apagada, extinta na sociedade moderna etc.
Segundo Norá, a existência dos lugares da memória tem entre as suas causas, o processo
de aceleração histórica via globalização e com este, a percepção de rupturas com o
29
passado, considerando-o como algo desaparecido, morto. O papel ou a função de um
lugar da Memória é a de bloquear os esquecimentos, imortalizar, materializar o
imaterial, parar o tempo. Um espaço recebe este nome quando ele é investido por uma
aura simbólica da imaginação.
O lugar da Memória é possível de ser compreendido e entendido com duas formas de
explicação. A primeira associada à espacialidade, objetos se convertem em espaços,
estojos para abrigo de determinados conteúdos ou informações, as quais podem ser
costumes ancestrais, tradições etc. Estes estojos podem ser: um caderno, uma
correspondência, uma partitura musical, um periódico, uma pintura etc.
Exemplo, a Folha Universal, periódico oficial da IURD, ao noticiar sobre os vinte e um
anos da Rede Aleluia, e da programação radiofônica desta emissora de rádio pertencente
a Igreja Universal do Reino de Deus (Folha Universal, 06/03/2016, p. B1, B2),
converte-se num lugar desta memória no abrigo, envólucro ou estojo. .
A segunda encontra-se associada à ideia da Memória Espacial na qual o espaço
geográfico sustenta os significados da memória. Neste caso, o lugar da memória pode
ser identificado com um cemitério, uma praça ou um parque, um centro artístico
cultural, um arquivo histórico ou museu etc – logradouros públicos. Um santuário ou
um templo de uma determinada confissão de fé religiosa, a sede do sindicato de
trabalhadores urbanos de uma importante categoria profissional – logradouros privados.
Todos eles são marcos sociais construídos por coletividades específicas.
Estes espaços ou lugares pertencentes à memória recebem o nome técnico de
geossimbolos, porque são os olhos de certas etnias ou de determinados grupos culturais,
políticos, religiosos, sociais, cuja dimensão simbólica fortalece a identidade dos
mesmos. Dentro desta linha de interpretação, podemos contemplar o templo de
Salomão, como um geossimbolo religioso da comunidade religiosa iurdiana dentro da
cidade de São Paulo.
Todo lugar da memória reflete: uma localidade onde não há mais memória pois o tempo
perpetuou determinadas alterações ou mudanças, sobrando desta memória apenas restos,
os quais são celebrados de diversos modos dentre eles, a história e a tradição, portanto,
ele eterniza lugares distantes e passados de tal memória.
30
Exemplo: O atual templo de Salomão construído pela Igreja Universal em São Paulo,
procura eternizar de certa forma, este local distante na memória religiosa judaica. Ele se
enquadra neste processo de uma lembrança concreta: o antigo templo judeu existente
em Jerusalém destruído pelos romanos e cujo espaço em Jerusalém se encontra
atualmente ocupado pela esplanada das mesquitas.
Deste edifício antigo há restos, o muro externo do templo, o Kotel – o Muro das
Lamentações no qual os judeus fazem a sua devoção religiosa, por causa disto, os
judeus residentes em Jerusalém adotam o hábito em orar para esta localização por
considerarem-no sagrado. (Vide anexos/imagem 1)
Mas o lugar da memória é um eterno diálogo de memórias, entre o passado e o presente
a partir das questões construídas pelo último, convertendo estes mesmos espaços citados
em locais de rememoração, construindo os elos entre os espaços ou lugares e os eventos
ou fatos pertencentes ao passado, favorecendo desta forma as releituras do espaço, dos
fatos e dos sentidos.
Exemplos: A Folha Universal através de duas edições fez menção de dois fatos
importantes para a comunidade iurdiana – o aniversário de trinta e nove anos da IURD,
(Folha Universal, 31/07/2.016, capa, p.2, 4-7), e o segundo aniversário da construção e
inauguração do Templo de Salomão e do complexo de edifícios ao redor do mesmo
(Folha Universal, Agosto/2.016, p. 4, 5).
Além dos periódicos citados, estes aniversários celebrados de forma alegre se
convertem em lugares da memória da instituição, ao abrigarem: informações sobre a
fundação da IURD, e a inauguração do Templo. Portanto, memórias sociais, artificiais,
que estimulam os sentimentos para a construção de um pertencimento. Em
conformidade com este raciocínio, o lugar de uma memória específica é um depósito de
conhecimentos, de experiências que favorece o processo de apreensão e da discussão
dos sentidos inventados e produzidos, legitimando uma ordem cultural, um poder
simbólico na sociedade local ou junto a um determinado grupo comunitário.
A leitura do passado através do presente, não fica restrita ao lugar da memória urbana,
mas pode ser feita pela memória do lugar. Chamamos de Memória do Lugar, o
reencontro social da memória da com um determinado espaço. Logo, ela encarna as
aspirações e as experiências e sentimentos humanos, de uma realidade que forneceu
31
significados a partir de um passado enraizado de um lugar, articulado pela cultura.
Podemos ler a memória do lugar de duas formas:
A primeira, afirmando que a memória de um lugar é uma operação de exumação de
memórias esfaceladas, perdidas, pertencentes a um determinado passado, exemplo: os
espaços denominados de traumáticos numa sociedade e os sobreviventes desta
catástrofe ocorrida nos espaços mencionados, os quais converteram tais sobreviventes
em homens-memória, nos portadores de tais memórias dentro da sociedade maior.
Exemplo, os judeus sobreviventes do Shoá, que também são vítimas do Holocausto, e a
manutenção dos campos de concentração e de extermínio, dentro do contexto europeu.
A segunda, um espaço modificado, transformado, cujo passado não tem mais uma
existência concreta. Dela, há apenas as indicações, os resíduos, os vestígios, tornando
assim a memória do lugar numa representação construída e reinterpretada do passado.
Podemos citar como exemplo o Lanífício Paulista, cujo edifício foi demolido para dar
lugar ao templo de Salomão da IURD, ele foi um dos prédios que representou a
industrialização têxtil na cidade e no bairro a partir dos anos vinte do século passado.
As indicações ou resíduos, vestígios dele só existirão na memória oral dos funcionários
que trabalharam naquele prédio, nas fotografias de época existentes, quando a empresa
funcionava naquele endereço no Brás, nos registros desta empresa junto aos sindicatos
patronal e dos operários têxteis, nas fotos feitas antes de 2.010, ano da demolição do
edifício, e por último, na tese defendida por Ângela Rodrigues sobre o patrimônio fabri
e industrial na cidade de São Paulo, sendo citado por ela o Lanifício Paulista
(RODRIGUES, 2.011).
Este caso específico nos revela que a instituição religiosa é autora de um processo de
esquecimento constante do passado urbano, tornando-o transitório, sem nenhuma
preocupação com o passado dos lugares que ocupa e/ou transforma (MODES, 2.007).
Desta forma o passado contido no Lanifício Paulista dentro da história da
industrialização paulistana no bairro do Brás, se torna descontinuada, porque uma nova
história começa a ser escrita naquele antigo endereço ou espaço. O mesmo fenômeno
ocorre com as pessoas que venderam seus imóveis a IURD, seja na construção da área
que abriga o Complexo, seja nos apartamentos dentro do Condomínio Edifício Vidago.
(Vide Anexos/Imagem 2).
32
Uma das formas de se fazer a memória de um lugar na geografia é a reconstituição sutil de
lugares em terras distantes que existem na memória de alguns especialistas – os grupos
humanos que vivenciaram a experiência da circulação compulsória ou voluntária. Podemos
tomar como exemplo, os estudos e as pesquisas feitas por Halbwachs sobre a questão dos
lugares santos da cristandade ocidental no Oriente Médio durante o período medieval, através de
sua obra, “A Topografia dos evangelhos na Terra Santa” (1.941). Ela caracteriza-se pela
valorização da relação entre a memória e os lugares santos da cristandade situados no Oriente
Médio, levando desta forma a constituição do livro – “A Topografia dos evangelhos na Terra
Santa,” revelando a articulação cultural entre a geografia e a religião.
Todo acontecimento ou fato tem a sua localização numa determinada referência espacial
e temporal, porque reconstitui o ambiente no qual a lembrança se apresenta, criando o
que denominados de espaços/lugares sagrados ou santos. Nesta crítica sociológica,
Halbwachs defende que o espaço ou o lugar tem um peso material maior, mais decisivo
ou importante em relação a construção ou fixação da memória coletiva, como para os
grupos humanos. Halbwachs toma como princípio desta explicação, a existência da
memória coletiva religiosa cristã a partir das experiências e dos fatos registrados, dos
locais evocados em lembranças religiosas de diversos peregrinos ou dos viajantes
europeus do período medieval, cuja fonte escrita mais antiga pertence ao ano de 333
E.C, conhecido como o relato do peregrino de Bordeaux.
O mesmo cita este processo de reconstituição de uma memória espacial por causa dos
eventos ou fatos – as guerras religiosas entre cruzados e muçulmanos, que permitem
uma reinterpretação deste passado cristão, a partir de possíveis indicações ou dos
vestígios daqueles espaços considerados então sagrados pelos cristãos, ou reinventados
pela tradição como substitutos dos originais que perderam a sua exata localização no
tempo e as necessidades do presente (HERVIEU-LEGER; WILLAIME, 2.009).
As pesquisas nos revelam a relação entre: a memória cultural (que é uma corrente de
memória) através das lembranças e dos sentidos construídos a partir do passado de um
grupo concreto, e os espaços ou lugares onde ocorrem os diversos eventos presentes na
memória cultural. Deste modo, há a reconstrução do passado nos diversos grupos
humanos classificados por Halbwachs, como grupos concretos (HERVIEU-LEGER;
WILLAIME, 2.009).
33
No caso das instituições ou organizações religiosas históricas, elas, mantêm além de
uma relação com o passado (a referencia temporal) elas mantém relações com as suas
origens, com os locais de onde nasceram ou partiram (a referencia espacial)
(HERVIEU-LEGER; WILLAIME, 2.009), os denominados lugares sagrados, palco de
diversas experiências religiosas guardam a memória coletiva.
Halbwachs defende o valor dos espaços/lugares físicos na construção da memória e da
tradição religiosa. Segundo Halbwachs (RIVERA, 2.010, p.41) “toda verdade para
fixar-se na memória de um grupo quando se apresenta de forma concreta, por meio de
três elementos, um acontecimento/fato, a biografia de alguma figura pessoal, ou por
intermédio de um espaço ou lugar.”
Dentre eles, os espaços/lugares são contemplados por ele como o mecanismo sócio-
cultural que oferecem maior estabilidade para a fixação de uma verdade, de uma
lembrança, de uma memória (RIVERA, 2.010). Portanto, os espaços, os lugares ou os
territórios comuns de um grupo são importantes para construção de uma memória
religiosa, dando assim materialidade e certificação da existência aos lugares sagrados,
incentivando a peregrinação dos fiéis. Porque são lugares reais, espaços geográficos
concretos relacionados à fatos relacionados a origem destes grupos e instituições
religiosas – denominados de fatos fundadores de uma crença/memória/tradição
religiosas.
As peregrinações ou visitas destinadas aos lugares sagrados ou santos são estratégias
religiosas da ilusão da não mudança – estabilidade e permanência. Neste caso, o sagrado
se converte em espaço ou lugar, abrigando determinada memória devocional. Pois sem a
ideia do lugar, não há a construção da memória religiosa, das linhagens de crenças ou
tradições. Como afirma Halbwachs, os diversos lugares abrigam uma diversidade de
memórias que remetem conscientemente ou inconscientemente ao passado, revestindo-
os de grande importância na cultura religiosa.
C – Lugar , Memória e a IURD:
Desde a existência do Homem no planeta, a geografia e a religião tem acompanhando o
cotidiano deste em diversas oportunidades. A relação e interação entre elas estabelecem
como agentes protagonistas: o espaço, o lugar, as diversas crenças, os rituais praticados
pelas várias comunidades humanas, primitivas ou complexas ao longo do tempo.
34
A ideia do lugar na religião se desenvolve no nosso objeto de pesquisas: a Igreja
Universal do Reino de Deus. Nesta relação temos atualmente com grande visibilidade o
complexo que o grupo religioso construiu no bairro do Brás, mas ele será nosso assunto
específico no segundo capítulo. Mas antes da construção do templo de Salomão e do
complexo de edifícios que o cerca, esta relação já existia sendo comprovada nos estudos
de Campos sobre o marketing da Igreja Universal – “Aqui um milagre espera por você”
(CAMPOS, 1.996), como nas nossas pesquisas ao examinarmos os diversos
depoimentos/testemunhos veiculados pelas mídias escrita e televisiva desta instituição.
No caso da mídia escrita, tomamos como fundamento de nossos estudos sobre o lugar
na IURD, o acesso a estes dois periódicos, o boletim “A Hora da Mudança”, produzido
no bairro de Santo Amaro, São Paulo, e a Folha Universal (FU), impressa no bairro de
Inhaúma, Rio de Janeiro. Estamos cientes de que temos em nossas mãos duas fontes de
consulta já ideologizadas dentro dos interesses de marketing da IURD, e que estes
depoimentos ou testemunhos contidos nelas, são frutos de um processo de filtros e de
seletividade visando colocar em evidencia o discurso ou a mensagem desta instituição
religiosa junto à sociedade maior e seus adeptos – clientes e fiéis, visando atrair para si
um maior número de pessoas. Ao examinarmos cuidadosamente estes depoimentos não
estabelecemos como objetivos: construir os famosos perfis dos depoentes e dados
quantitativos para as análises socioeconômicas, devido haver em muitos deles, um
resumo sem estas informações. Muito menos sobre o gênero do discurso religioso, ou
ainda a relação existente hoje, entre a mídia e a religião. Para nós interessa dentro dos
momentos centrais – antes e depois, os lugares e os valores que o Homem através das
crenças atribui aos mesmos e com elas as diversas relações que a IURD e os depoentes
construíram com a geografia e suas teorias.
O acesso a estes dois órgãos da mídia escrita deve-se ao nosso contato com a IURD,
situada no bairro de Vila Diva, bairro da periferia da Zona Leste de São Paulo, cujo
espaço religioso foi objeto de nossas pesquisas de campo7.
A leitura das fontes nos permitiu concluir que: o depoente é um consumidor simbólico
moderno que procura organizar e pensar a sua experiência cotidiana, a partir da
combinação de diversas significações. A ideia de lugar existe junto à instituição
7 A IURD em Vila Diva, situa-se na av. Sapopemba, 3.665, e o acesso às fontes informativas nos foi
franqueada semanalmente porque elas encontram em disponibilidade de interessados e leitores no lado
externo do espaço religioso, à esquerda da porta de entrada.
35
religiosa e ao público que freqüenta aos espaços religiosos da IURD – igrejas, catedrais
e o templo, graças aos diálogos entre os seres humanos e o lugar (categoria geográfica).
Nos diversos depoimentos lidos identificamos como traço comum, a omissão proposital
das referências geográficas em relação aos espaços religiosos da IURD que os
depoentes freqüentaram: igrejas estabelecidas na periferia, catedrais ou o templo de
Salomão e os respectivos bairros nos quais estes espaços situam-se.
Há a citação intencional da união entre o espaço religioso e a instituição, pois em muitos
deles o espaço religioso é substituído pelo nome da instituição, ou pela
concentração/corrente, ou pelas expressões, “lá, aqui” sempre complementadas pela
corrente temática ou pela instituição religiosa.8
Há a menção explícita e implícita de dois locais emblemáticos relacionados à
experiência cotidiana e os valores que cada entrevistado atribui aos mesmos. O primeiro
termo espacial – o “fundo do poço”, e o segundo termo espacial, o “topo”, a conquista
do impossível pela fé, a mudança ou a virada de vida, relacionado com o espaço mítico
da felicidade em conformidade com a cultura religiosa da Igreja Universal. Para nós, o
“fundo do poço” e o “topo” são representações de lugares, imagens que podem ser
descritas a partir das experiências sociais de exclusão e de inclusão respectivamente, as
quais marcam a vida das pessoas por causa dos resultados obtidos.
Para que estes dois lugares concebidos no imaginário da Igreja Universal se convertam
de fato em lugares percebidos e vividos pelos fiéis segundo Lefebvre (LEFEBVRE,
2.000), a instituição religiosa dialoga com a teoria geográfica da espacialização. O que é
a espacialização? É a tese desenvolvida na geografia segundo a qual, os objetos, os seres
vivos, etc podem ser lidos como espaços (formas), abrigando dentro de si, uma
diversidade de objetos (conteúdos). Exemplos:
A história do profeta /Jonas cuja narrativa menciona o grande peixe que o traga no Mar
Mediterrâneo (Jn. 1:17), se converte em espaço ao engolir o profeta, e este no interior
deste animal, segundo esta teoria se converte em objeto, em um dos diversos conteúdos
existentes no interior deste ser vivo conforme o texto bíblico.
8 A narrativa do gaúcho José Ricardo revela a utilização da expressão ali, complementada pela
concentração/corrente que este freqüentava: o Congresso para o Sucesso. (Prosperidade in:Hora da
Mudança, Fevereiro/2.016, p. 4).
36
Um cinema transformado em um espaço religioso da Universal como é o caso das
catedrais situadas no bairro do Brás em São Paulo ou no centro da cidade de São
Caetano são outras formas da aplicação desta teoria. Estes antigos cinemas são espaços
considerados obsoletos para a lógica capitalista urbana, sendo incorporados pela
instituição religiosa e transformados num lugar diferenciado ao alterar as suas
características, dando a esta forma geográfica, uma nova função ou uso: celebrar as
concentrações diárias e abrigar os freqüentadores das mesmas.
Sendo os objetos do conteúdo deste espaço religioso: os especialistas – auxiliares e
oficiantes, o público freqüentador de cada corrente diária, a infra-estrutura técnica para
celebração da concentração e recepção do publico, os objetos religiosos relacionados de
forma específica com aquela reunião etc.
Os termos espaciais concebidos/criados pela IURD: fundo do poço e topo são
expressões simbólicas que tem esta qualidade geográfica: se tornarem em espaço ou
lugar ao serem descritas como tal, abrigando dentro de cada um deles, como conteúdo
ou objeto, a vida humana e sua dinâmica, ou seja, o lugar é concebido através das
experiências individuais na sociedade. Pois o espacializar implica em descrever através
das experiências as diversas ações, emoções, sentimentos dos depoentes. Cada um
destes lugares simbólicos criados pelo imaginário da IURD abriga não somente o
Homem e a sua vida, mas recebe a distribuição destes seres humanos a partir de um
conjunto de determinadas experiências de vida social.
Logo, estes lugares simbólicos – no fundo do poço e o topo são uma produção espacial
que refletem os diversos conflitos, as tensões geradas no cotidiano de cada pessoa, que
fazem parte da realidade humana, citadas em cada experiência relatada. Ao associar o
lugar simbólico como realidade social humana via experiência de vida, a Igreja
Universal do Reino de Deus, constrói um processo de valorização desigual entre eles,
como também a relação destes lugares com o Homem e com a denominação
pentecostal. Neste processo de valorização desigual, fundo do poço e topo terão valores
diferenciados, onde o primeiro no imaginário social religioso será um lugar de menor
valor do que o segundo. Este fato fica evidente não somente nos relatos que
pesquisamos, mas encontra-se presente na letra da canção “no fundo do poço”,
composta por Ed Wilson em 1.994, presente no cd “Minha Estrada”, o qual está
associado à IURD.
37
A Igreja Universal exerce a função de agente criador dos espaços abstratos, simbólicos,
bem como das crenças, do jargão, e das práticas culturais associadas aos mesmos. Eles
são expressões concretas da existência social da Igreja Universal na sociedade maior, e
no mundo. E os seres humanos que vivenciam as diversas experiências da realidade
social, são inseridos como objetos, nestes lugares concebidos pela denominação.
Ao conceber e organizar estes espaços diferenciados, a instituição religiosa exerce o
poder, a sua capacidade em alterar ou transformar os espaços/lugares. A IURD ao
conceber estes lugares simbólicos dialoga com o espaço social produzido dentro da
sociedade capitalista moderna, pois todo espaço ou lugar são produzidos pela sociedade
(LEFEBVRE, 2.000).
Isto significa que o fundo do poço e o topo são produtos sociais, pois nenhum espaço ou
lugar é uma realidade independente, ou seja: eles não existem por si mesmos, portanto,
encontram-se ancorados na realidade material e social humana, ainda que seja o fruto do
imaginário de um grupo religioso. São lugares sociais porque foram produzidos por uma
instituição ou coletividade religiosa: a Igreja Universal, e porque se encontram
associados às realidades sociais distintas, às ações, às experiências e a sentimentos
diferenciados, sendo representados como um lugar concebido, depois percebido e
vivenciado. Eles são representações de um mundo ideologizado e bi-polarizado, onde o
“fundo do poço” precisa do “topo” para se afirmar como um espaço/lugar negativo e
vice versa, dentro das práticas religiosas.
Em algumas destas narrativas percebemos o topo relacionado com a posse de bens
materiais/patrimônio econômico, casas, terrenos, em oposição ao fundo do poço, morar
de favor com parentes, ou num barraco da favela, etc. Isto fica evidente no depoimento
do casal Raul Lopes e Ení da Fonseca: “(...) antes de me casar, morava com a minha
mãe em um barraco numa favela. (...) conquistamos a nossa independência financeira e
hoje somos empresários bem sucedidos9
Ou conforme o depoimento feito em 16/12/2.016,na mídia televisiva, onde o fiel
menciona ao bispo Edson Costa, como o fundo do poço, residir num imóvel pequeno,
com telha quebrada, vivenciando o aspecto negativo das chuvas naquele local, com a
presença de um banheiro externo, sem vaso sanitário, convivendo com baratas e ratos. E
9 Hora da Mudança, Ano 3, n°35, Setembro/2.015, p. 3.
38
como o topo, um imóvel residencial com os benefícios culturais e materiais da
civilização amplo, situado em bairro nobre, tendo como vizinhos, a elite empresarial,
diversos veículos automotivos etc.
Nestes dois casos especificamente, como de tantos outros que pesquisamos, entendemos
que o topo está relacionado com as ações humanas que modelam ou qualificam o
espaço, e no fundo do poço, temos a inversão, o espaço modelando, qualificando as
ações dos personagens das narrativas. Este modelo de narrativa revela afinidades com a
teoria geográfica produzida por David Harwey, onde todo processo social – as diversas
práticas humanas, os comportamentos sociais são formas espaciais – um lugar. E tais
práticas comportamentais sociais do Homem constroem a relação posicional deste,
determinado a forma espacial na qual ele estará inserido (MOREIRA, 2.012).
No caso destes testemunhos, os comportamentos dos depoentes nos revelam: a posição
social e a forma espacial na qual eles estarão inseridos – fundo do poço e topo.
A Igreja Universal dialoga com os neologismos de Tuan: a Topofilia (topo: lugar, filia –
amizade/amor, amor incondicional a um local, o lugar abençoado ou bendito), e a
Topofobia (topo: lugar, fobia – medo, temor, o preconceito a um determinado local, o
lugar amaldiçoado ou maldito). A primeira revela de forma positiva os elos afetivos
entre as pessoas e o ambiente (TUAN, 1980), a segunda de forma negativa estes elos
afetivos entre o Homem e o meio onde está. A teoria de Tuan nos permite construir a
relação geografia-religião dentro da cultura da polarização espacial – o fundo do
poço/topofobia atribuindo a ele valores cultuais negativos (lugar maldito, digno de
críticas com os piores termos etc), e o topo/topofilia, atribuindo a ele os valores
culturais positivos (lugar bendito, louvado etc).
A denominação dialoga com M. Santos a partir da espaço/lugar valores
culturais/valorização e desvalorização, complementando as ideias desenvolvidas por
Tuan. Segundo Santos:
Cada homem vale pelo lugar onde está; o seu valor como produtor,
consumidor, cidadão depende de sua localização no território. Seu valor vai
mudando incessantemente, para melhor ou para pior, em função das
diferenças de acessibilidade (tempo, freqüência, preço) independentes de sua
própria condição. Pessoas com as mesmas virtualidades, a mesma formação,
até mesmo o mesmo salário, têm valor diferente segundo o lugar em que
vivem: as oportunidades não são as mesmas. Por isso, a possibilidade de ser
mais ou menos cidadão depende, em larga proporção, do ponto do território
onde se está." (SANTOS, 1987, 81)
39
Isto significa que cada ser humano vale pelo lugar onde ele está, seja morar num
apartamento de luxo num bairro elitista, seja residir num barraco na favela da periferia,
estar no fundo do poço tem um valor, encontrar-se no topo tem outro valor.
É a localização que define quem vale mais ou quem vale menos. Pessoas com as
mesmas condições/oportunidades de igualdade educacional, profissional etc, tem
valores diferenciados para melhor ou para pior, segundo o lugar onde estão e o espaço
social que ocupam ou passaram a ocupar. Santos complementa a tese de Tuan da
seguinte forma: a Topofobia/desvalorização humana e a Topofilia/valorização humana.
Desta forma a os opostos binários da cultura religiosa iurdiana podem ser lidos e
compreendidos por nós desta forma: fundo do poço/topofobia, experiências de vida
negativas, desvalorização do Homem (tem o pior valor). Topo/topofilia, experiências de
vida positivas, /valorização humana (tem o melhor valor). Logo, esta cultura religiosa
ratifica que: o Homem só consegue entender as suas relações com determinadas
situações de sua existência ou de realizar-se na vida quando está associado ou inserido
num lugar, quando se sente localizado porque isto é vital para ele construir
significações.
O que é o fundo do poço? Trata-se de uma figura de linguagem popular apropriada pela
religião junto à sociedade. Ela evoca a lembrança da existência do poço, o qual que já
foi uma importante realidade da vida das periferias das grandes cidades brasileiras,
devido a falta de atendimento estatal na distribuição de água tratada. A ideia do fundo
do poço evoca outra lembrança, a ausência de água dentro dele, fato que é registrado em
diversos textos bíblicos. Ele é um lugar relacionado com uma experiência negativa do
cotidiano de vida ou do mundo social que são lidas e adquirem outros sentidos e
significados: uma situação dita desoladora, e em muitos casos irreversível.
A nossa leitura dos periódicos consultados: Hora da Mudança, e Folha Universal
identificamos a presença de experiências humanas, realidades ou situações adversas que
se enquadram na categoria do fundo do poço segundo a cultura religiosa da IURD:
alcoolismo, tabagismo, o uso de entorpecentes e envolvimento com o tráfico de drogas,
dívidas e problemas financeiros, prostituição, depressão, problemas associados a
relacionamentos conjugais conturbados, doenças etc. Estas experiências de vida
reforçam a teoria construída por Harwey nos anos oitenta (MOREIRA, 2.012):
ação/comportamento indica uma posição e um lugar a ser inserido.
40
Todas elas são realidades e situações mencionadas por nós expressam a visão de Tuan
sobre experiência e sentimentos humanos, onde a dor/sofrimento, as doenças, e a morte,
são denominadas de situações limites da vida humana, indesejáveis e para as quais não
existe blindagem, porém, são os instrumentos para que o Homem conheça o mundo
(TUAN, 1.980).
Estar no fundo do poço é mais do que um jargão social religioso iurdiano ele está
vinculado a ideia da limitação dos movimentos e através da abertura, da boca deste
poço, é possível contemplar um pequeno pedaço do céu, e por conseqüência há o
desconhecimento da existência de um mundo imenso, maior. Em alguns destes
depoimentos que lemos, ele é citado de forma clara, explícita, ao passo que em outros
ele é omitido, mas subentendido dentro do contexto da narrativa. Para exemplificar o
que mencionamos anteriormente, escolhemos dos diversos periódicos que lemos dois
casos publicados no Boletim Hora da Mudança, e dois da Folha Universal, casos
diferenciados entre si, onde há a omissão do termo espacial, bem como a afirmação do
mesmo. Nestas análises discordamos da tese iurdiana em relacionar a experiência de
vida negativa do depoente e o espaço simbólico que ele ocupa de forma
respectivanaquele determinado momento da narrativa, com uma possível ação de
possessão demoníaca do autor do depoimento.
Ana Maria Boltrini, 62, gerente de eventos: osteoporose com dores e fratura na vértebra.
Desenganada pela medicina – os médicos não davam expectativa de cura10
Estar
acamado, doente, hospitalizado etc, implica na perda parcial ou total da liberdade de
locomoção do corpo humano pelos diversos espaços que existem no mundo, é uma
forma de excluir o Homem da liberdade de ir e de vir no mundo. Portanto, estar doente
é uma experiência espacializada, materializada com valores culturais negativos, ou de
uma prisão, as quais desvalorizam o sujeito que a vivencia.
O depoimento do atleta de futebol, Edno Roberto, 33: menciona que viveu o fracasso
em todas as áreas da sua vida. Primeiro, como ex-jogador de futebol de clube
catarinense da série B. Era um jogador que ninguém via futuro. Sem renovação de
contrato, viveu a condição de não ter meios financeiros para sustentar a família. O seu
10
Boletim Hora da Mudança, ano 2, n°24, Outubro/2.014, p. 2.
41
pior momento foi ter a esposa grávida pela segunda vez, e consumir mexerica porque
esta era o único alimento que dispunham em casa11
Maria das Graças, não tem nem idade e nem atividade/ramo profissional mencionados
no boletim: problemas de ordem econômica com a empresa. Ela cita a no respectivo
boletim o termo “fundo do poço”, por a causa do acumulo de dívidas, da venda de
patrimônio material para saldar os débitos em aberto, da necessidade em demitir os
funcionários e respectivo fechamento da empresa12
.
Leila Cristina Capistrano, 30: quis conhecer tudo que o mundo pode oferecer para quem
anseia uma vida sem disciplina ou sem limites. Tornou-se dependente química, ao ponto
de ser conhecida pelo apelido de pára-raios, ao ponto de se torna em traficante, de
envolver-se com a criminalidade – assaltos a mão armada. O fundo do poço desta jovem
era: a fuga diária da polícia, ser alvo de balas perdidas e de ameaças de morte do mundo
do crime. Este era o preço alto que ela pagava por um viver de supostos momentos de
alegria e aparência prosperidade material13
.
Os depoimentos escolhidos materializam as experiências adversas – a doença, a
osteoporose), desemprego e suas conseqüências: a falência econômica, e uma vida
inserida no submundo do crime, o fenômeno da exclusão e de desvalorização humana e
social, que o termo procura transmitir, por isto se apropriam dele. Mas nos revela que a
expressão “no fundo do poço”, tem uma pluralidade de situações, porque a topofobia
pode assumir diversas formas. Logo, toda experiência individual negativa na mídia
iurdiana é compartilhada com a coletividade.
O Topo é outra figura de linguagem interessante que a religião apropria-se da sociedade,
especialmente da cultura desportiva individual e radical. O que é estar no topo?
É ser o primeiro, o número um, nas diversas modalidades de esportes individuais,
obtendo destaque e visibilidade por sua excelente classificação.
Entre os esportes radicais, destacamos o alpinismo, é o ato humano de escalar
montanhas tendo como objetivo, atingir o lugar mais alto dela, isto é o seu topo,
ocupando este espaço, em ser premiado pela conquista: ver o mundo de outra forma, de
11
“Aconteceu na Fogueira Santa,” in: Capa, Folha Universal, 26/06/2.016, p. 5, 6. 12
Boletim Hora da Mudança, ano 2 , n° 42, Abril/2.016, p. 3. 13
Ela abandonou o mundo da criminalidade: Leila escolheu uma nova vida, depois de chegar ao fundo do
poço, in:Caderno Superação, Folha Universal, 24/05/2.016, p. B4
42
cima (visão panorâmica), e não mais debaixo. A ideia do alpinismo é aquele que mais se
identifica com a cultura da Igreja Universal, porque esta denominação através das
edições da “Fogueira Santa” valoriza as montanhas de Israel, e com elas, o ato de
escalá-las, de subir até o cume das mesmas em suas diversas edições. Nelas, o
episcopado iurdiano imita a determinados personagens bíblicos que fizeram o ato da
escala: Abraão, Moisés, Elias, Jesus etc.
Para a cultura religiosa de tal denominação, o topo é a conquista do impossível pela fé,
expressando o que existe de melhor neste mundo, a famosa expressão bíblica dos
profetas – comer o melhor desta terra. Ele está relacionado com a oferta de esperanças,
a superação de obstáculos inevitáveis na vida humana, a oportunidade um recomeço
através de uma transformação radical.
O topo como figura de linguagem não aparece na mídia escrita que consultamos: A
Hora da Mudança ou a Folha Universal, mas é amplamente citado na mídia televisiva,
através de diversos bispos da denominação construindo a oposição entre o fundo do
poço e o topo, podemos citar a programação da Igreja Universal que tivemos a
oportunidade em assistir em 16/12/2.016, onde o bispo Edson Costa articular esta
oposição binária e espacial.
O topo se materializa no depoimento dos personagens através de suas experiências de
conquista na mídia escrita: transformação no comportamento dos cônjuges, pais, filhos,
e a restauração da paz e da harmonia no casamento e no lar, motivação para
desenvolvimento de negócios e a realização econômica, a cura de diversos tipos de
enfermidades, dentre elas, a depressão, e a síndrome do pânico, a libertação da
dependência química (álcool, crack, cocaína, ecstasy, LSD, maconha, tabagismo etc), o
abandono do mundo do crime etc.
Dentro da interpretação dos opostos binários espaciais – fundo do poço e o topo, as
ações, os comportamentos, as experiências humanas determinam a posição do indivíduo
pois as ações, comportamento e experiências relacionadas ao estar no fundo do poço,
são opostas àquelas que determinam a posição do depoente no topo e vice-versa, onde
uma precisa da outra para construir a importância das respectivas explicações.
Nos diversos depoimentos encontramos em alguns um interessante aspecto da relação
entre o Homem e o Lugar, o uso dos sentidos – a audição, e do corpo – a locomoção.
43
Não há a transformação do fundo do poço no topo, mas temos o fluxo, o transito dos
depoentes entre estes dois lugares, intermediada de forma direta e indireta pela IURD.
Logo, temos nestes relatos a apologia indireta ao espaço mítico da felicidade, primeiro
como componente da visão de mundo, e procura fornecer segurança as práticas
humanas via valores locais (TUAN 1.983), e o segundo, a Igreja Universal é
contemplada como um espaço alternativo e diferenciado: um espaço mítico da
felicidade dentro do mundo cristão, e os milagres seriam a indicação da existência dele
no mundo. E porque ela pode ser contemplada como espaço mítico da felicidade?
Primeiro, porque a Igreja Universal do Reino de Deus é um espaço, um lugar, um
território humano, portanto pertencente ao universo do concreto/real, assegurando desta
forma a sua importância para a humanidade. Segundo, porque é uma resposta às
necessidades humanas de re-inclusão através da imaginação e dos sentimentos do
Homem. Ela como instituição se coloca como o espaço dito privilegiado para que este
processo de transformação venha a ocorrer, como afirma a Folha Universal: Portanto, a
Igreja Universal neste contexto se converte na visão de Lefebvre, num espaço de
representação, pois, é um lugar portador da dimensão simbólica do espaço, portador do
algo mais, a questão do divino/sagrado (SCHMID, 2.012). Exemplos:
O depoimento de Midian da Silva, 20, menciona: a utilização do corpo, os sentidos e a
liberdade de locomoção que Tuan valoriza em seu livro, Espaço e Lugar (1.983), ao
aceitar um convite de uma vizinha para ir até a Igreja Universal. Ela cita o processo de
transformação radical – largar a criminalidade x tornar-se numa nova pessoa. Ela cita de
forma indireta o papel dos especialistas com a seguinte frase: com perseverança aprendi
que poderia recomeçar.
O Topo se manifesta com a conquista de uma vida nova, feliz, com paz e qualidade,
sem a ocorrência das agressões no lar14
.
O depoimento de Chaiane e Rodrigo mencionam: a terapia do Amor como indicador
geográfico indireto da IURD (reunião que ocorre as quintas-feiras), e com ela a
mediação da Universal via especialistas, com a seguinte frase: colocamos em prática,
tudo o que era ensinado. Este papel dos especialistas implica em reconhecer a ação
14
Hora da Mudança, ano 3, n°38, Dezembro/2.015, p. 4. Este depoimento tem a sua versão completa na
Folha Universal: “Revoltados pelos Motivos errados,” in: Caderno Libertação, Folha Universal,
20/11/2.016, p. 29.
44
intermediária da IURD, intervindo na dura realidade para construir os fatos de uma nova
realidade. Mas é simultaneamente a apologia ao Espaço Mítico da Felicidade e seu
componente – os valores locais, tendo como objetivo, a transformação do casal, o
resgate do amor, do domínio próprio e do respeito. O Topo se expressa através da
conquista: o novo status do lar do casal com carinho respeito e união15
.
Tomando o depoimento já mencionado de Leila C. Capistrano, a jovem comenta como
foi a sua saída do fundo do poço e a sua ascensão em busca do topo. Este depoimento
cita: a Reunião de Libertação da Universal, onde conseguiu uma nova oportunidade de
vida, afastando-se das más companhias, libertando-se dos vícios, graças a sua mudança
e transformação interior. Hoje, ela vive uma vida feliz, plenamente realizada – com paz
interior suprindo a sua vida vazia que sentia, tornou-se numa empresária e formou uma
família16
.
Analisando estes depoimentos, cada personagem afirma a sua realidade existencial,
onde cada topo é uma experiência positiva diferenciada. Para uns, esta vida feliz implica
num lar em paz, sem agressões, para outros, a mudança de status dentro do lar, a
restauração do carinho, da paz e da união, para alguns, uma transformação interior
radical, tornando-se num cidadão de bem, empresária(o), pai ou mãe de família etc. Em
todos eles há ação da Igreja Universal como intermediária, sendo que esta mediação é
mencionada das seguintes formas: o espaço religioso iurdiano, a concentração ou
reunião de uma corrente temática (Terapia do Amor, Reunião de Libertação etc). E o
papel dos bispos e dos pastores como especialistas espirituais e seus ensinamentos.
Todos os depoimentos afirmam a IURD como o espaço mítico da felicidade a partir da
prática das orientações dadas neste espaço religioso pelos bispos e pastores, sendo esta
visão reforçada pelos milagres recebidos, principalmente aqueles relacionados com as
transformações comportamentais.
Esta ideia a IURD nutre de si mesma e a divulga na sociedade, que pode ser
comprovada através do artigo da Folha Universal: “Você quer construir ou deixar Deus
Reconstruir?”, abordando o testemunho de Paloma Andrezza, no mesmo. O autor deste
responde no final do artigo a questão que ele construiu no título do seu texto, e deixa a
15
Hora da Mudança, ano 4, n°41, Fevereiro/2.016, p.3 16
“Ela abandonou o mundo da criminalidade; Leila escolheu a uma vida nova, depois de chegar ao fundo
do poço”, in:Caderno Superação, Folha Universal, 29/05/2.016, p. B4.
45
seguinte mensagem: Como provocar a mudança? (...), compareça à Universal e seja um
forte candidato a ter a vida completamente refeita.” (Folha Universal, 26/01/2.014, p.
B1, B2).
A leitura que fizemos de depoimentos na IURD a partir de nosso trabalho de campo, no
Templo de Salomão, junto com as pesquisas feitas por Campos (CAMPOS, 1.996)
comprovam a prática da manipulação da memória nas concentrações. Temos um
processo de mobilização da memória coletiva para fins de dinamização de um processo
de comunicação com o público dentro das diversas reuniões seja através do ato de
inculcar nas lembranças dos ouvintes – slogans, palavras de ordem etc, ou em estimular
estas lembranças/recordações já alojadas ou presentes na memória do público presente.
Todos os depoimentos e testemunhos presentes na mídia escrita ou televisiva que
tivemos acesso constroem uma relação com a memória, pois tanto a topofobia, como a
topofilia, expressos pelos lugares simbólicos da cultura da Universal, são agentes
construtores de uma memória de longo prazo na vida das comunidades e dos indivíduos,
consolidando o imaginário negativo ou positivo sobre determinado espaço ou lugar. Nas
análises dos periódicos, percebe-se a articulação com a memória, a partir de dois
procedimentos básicos: a recriação contínua, e o esquecimento parcial ou total de uma
determinada lembrança, ocorrendo de forma simultânea.
A relação de recriação contínua é possível de ser detectada por nós, porque se trata da
reconstrução, da recriação de uma experiência relacionada ao passado a partir dos dados
existentes no presente.
Por exemplo, a apropriação dos lugares simbólicos que são parte do jargão desta igreja
pentecostal. Onde o presente de cada depoente está relacionado com a posição
simbólica de estar fora do poço, escalando a montanha em busca do topo.
Desta forma, os indivíduos descrevem de forma negativa as suas experiências com o seu
passado, com o estar no fundo do poço, a partir dos dados opostos de sua experiência de
vida atual, construindo a comparação e a valorização desigual entre elas.
Isto é muito significativo nas narrativas que mencionam tal distinção via posse de bens
materiais – no passado não tinha..., hoje tenho...Mas a relação do indivíduo com a
memória não fica restrita a reconstrução do seu passado com informações do presente,
ele vivencia o processo de apagamento da memória anterior relacionada ao lugar
46
simbólico social de origem, o fundo do poço, pela memória atual devido a sua relação
espacial com a figura do topo.
Este ato contínuo de esquecer parcialmente ou totalmente a memória anterior não se
restringe a esta situação de fluxo, de transito entre os locais abstratos que a IURD
administra, mas por um interessante ato formal de sua elite em relação aos depoentes e
suas narrativas na mídia televisiva, que pode ser lida como um incentivo ou motivação
espiritual em busca do sucesso, uma benção específica para eles, uma profecia
pronunciada sobre a vida dos diversos depoentes, mas pode ser lida como uma ação
proposital de construir no depoente o descontentamento pessoal com os últimos
resultados que ele conseguiu (CAMPOS, 1.996) – “vai ter muito mais, coisas novas e
grandes” (bispo Rogério Formigoni – 24/12/2016).
Esta expressão implica em: novas conquistas, novas narrativas, mas na constituição de
novas memórias por parte do fiel. O estabelecimento de uma nova memória significa
tornar a lembrança positiva vivenciada numa memória antiquada, que deve ser
descartada por não ser mais útil a comunidade e ao depoente após ser compartilhada
através do relato, e o exercício do esquecimento parcial ou total da memória anterior,
pelo advento de uma memória atual, substituta da primeira. Este exercício de uma nova
lembrança positiva foi lida por nós diante dos depoimentos na mídia televisiva, as quais
tomam como ponto de partida o sucesso material anterior, mostrando a atualidade, a
ampliação da benção recebida anteriormente.
Este ato revela-nos a fragilidade cultural do grupo em transmitir a memória do sagrado,
e a presença de uma cultura que torna a memória efêmera, sujeita a descartes e
substituições, não a preservando, porque tal grupo não observa o mandamento bíblico
de preservação da memória e de sua respectiva transmissão no meio social. A postura
dos bispos nas entrevistas – ainda vai ter mais, referenda um processo de sobreposição
de lembranças e das memórias individuais compartilhadas com a coletividade, onde a
memória do fato anterior pertence ao passado e encontra-se ultrapassada, havendo assim
a perda proposital destas lembranças em nome do imperativo da mudança (MODES,
2.007).
Concordamos com Modes em suas pesquisas sobre a relação IURD e memória, porque
as nossas análises sobre os periódicos confirmam a afirmação das abordagens dele: a
47
existência de uma memória rasa, sem profundidade a partir do excesso de informações
via depoimentos nos diversos meios da mídia escrita e/ou televisiva (MODES, 2.007).
1.3 – Tradição:
O termo tradição tem a sua origem na expressão latina - tradere, que significa entregar,
passar a diante, dar continuidade, permanência. Pois a tradição abriga o conjunto de
costumes, comportamentos, crenças, lendas, memórias, práticas, valores etc de uma
comunidade humana viva, formada por seres humanos reais. Logo, a tradição é um
elemento cultural produzido pela Humanidade que testemunha a existência desta no
mundo, porque ela é um mecanismo de organizar uma coletividade para celebrações
emotivas, em construir sociabilidades, e em preservar a memória de uma comunidade
ou grupo.
Mas a tradição é a leitura de dados culturais e sociais selecionadas e recebidas por um
grupo a partir do passado deste. É esta leitura que transforma as informações do passado
em herança recebida e consequentemente num padrão para o presente e futuro deste
agrupamento. A interpretação da palavra tradição como: entrega ou passar a diante,
permite que elas sejam lidas como o principal mecanismo de transmissão das memórias
– as narrativas ou os relatos dentro dos grupos e das sociedades humanas.
Para Halbwachs (RIVERA, 2.010, p.71), “a tradição pode ser definida como o exercício
da memória social de um grupo específico.”
Uma das leis ou regras dentro do universo das tradições construídas pela humanidade é
que as lembranças são o suporte natural herdado dos grupos anteriores ou mais antigos
(RIVERA, 2.010). Toda a tradição é específica seja esta associada a um determinado
estrato/grupo social, seja esta associada a determinadas experiências de grupos
humanos. Uma tradição só ganha legitimidade/reconhecimento quando aceita
socialmente por grupos humanos portadores de valores particulares, próprios.
Em nossos estudos concebemos as diversas tradições como elementos pertencentes à
cultura, como um produto elaborado pelos seres humanos, sujeito a modificações
quando parte do seu inventário original se torna desnecessário. Elas são finitas porque
podem vivenciar um processo de enfraquecimento junto à sociedade, que segundo
Durkheim é possível devido ao aspecto da fragilização do que ele denominou de
consciência coletiva/comum, o legado de gerações anteriores (RIVERA, 2.010).
48
Elas encontram-se presentes nas diversas relações sociais e responsáveis em fornecer
uma legitimação. Elas nos possibilitam a leitura e a interpretação do presente de uma
sociedade. Mas esta forma de compreender as tradições – como um produto da cultura
humana e necessária para fins de legitimação gera dois conflitos, o primeiro com
intelectuais, e o segundo com os grupos religiosos modernos. Esta oposição entre a
modernidade e tradição também é aceita e lida por alguns intelectuais simpatizantes da
modernidade que traduzem o conceito de permanência com um novo sentido: a
anacrônia – como expressão do anti-moderno, da desmodernização – uma regressão
cultural, um assunto pertinente ao passado e a sua simples repetição, construindo em
suas análises clássicas a oposição entre as sociedades pré-modernas ou tradicionais,
como imóveis, insensíveis as mudanças, e as sociedades modernas que valorizam o
imperativo da mudança constante, como a mola do desenvolvimento da sociedade. Para
estes, tradição é sinônimo da não existência de mudanças. Mas o conceito de
continuidade dentro das tradições admite a capacidade de incorporar as inovações, e as
reinterpretações.
Logo, o conflito modernidade e tradição, resulta do reducionismo da tradição,
associando esta a visão de continuidade com a conformidade, com a estática, com a
inércia, e negam a dinâmica da tradição nas diversas relações sociais.
Mas a ideia da continuidade gera por sua vez o confronto entre a tradição com os grupos
religiosos modernos deve-se ao fato de que eles não serem portadores de uma
memória/tradição a vêem como um bem cultural arcaico, negativo, em oposição a
modernidade, por a associarem indevidamente a ideia da continuidade à imobilidade e
não à das mudanças etc. Tal conflito revela como modernidade e tradição contemplam o
aspecto das alterações ou das mudanças no mundo.
A IURD – Igreja Universal do Reino de Deus é um exemplo de denominação religiosa
alinhada com a modernidade que adota uma posição crítica em relação às diversas
tradições, especialmente às tradições religiosas cristãs. Consultando o principal site da
Universal – o Universal. Org., especialmente a agenda na semana do Natal de dois mil e
dezesseis não encontramos registros relacionados a evento/reunião relacionado com a
data/fato fundante da história do cristianismo, entre os dias vinte e três até vinte e cinco
de dezembro, estão mantidas as tradicionais reuniões semanais de libertação (sexta-
feira), do jejum das causas impossíveis (sábado), e da felicidade (domingo). Nem no
49
periódico da instituição há alguma mensagem específica para esta questão, pois até o dia
trinta e um a IURD estará envolvida com a corrente temática da Fogueira Santa no
Monte Sinai. Portanto, o nascimento de Jesus Cristo não é o evento histórico cristão
importante para a Igreja Universal e seu episcopado.
Na Folha Universal, a instituição explora informações de caráter internacional sobre
dados estatísticos sociais sobre a religião em proveito próprio, reforçando a posição do
grupo sobre as tradições. Por exemplo, na edição de doze de junho de dois mil e
dezesseis, a IURD faz a crítica aos dados quantitativos sobre a existência dos sem
religião ou sem crença na Grã Bretanha. E qual a causa que ela aponta para este
problema? Dentre as causas elencadas, ela cita de forma negativa, o apego dos fiéis
desta região da Europa Ocidental à tradição religiosa (Folha Universal, 12/06/2.016, p.
B1, B2).
A sua principal liderança, o bispo Edir Macedo de Bezerra, deixa patente esta
confrontação entre o seu grupo religioso e as tradições no seu livro: “Orixás, Caboclos e
Guias, deuses ou demônios” (1.997). No capítulo dezesseis deste há menção da relação
de ações espirituais entre a Igreja e os demônios. Ele aponta o tradicionalismo dentro do
protestantismo histórico como o elemento que favorece o enfraquecimento espiritual
dos grupos evangélicos brasileiros. No mesmo capítulo ele faz a sua crítica às
denominações e grupos evangélicos pentecostais da primeira onda, a questão dos
costumes, normas eclesiásticas e usos dentro de tais instituições que geram o
enfraquecimento espiritual destes, faz a crítica ao catolicismo romano em nosso país, ao
citar o fenômeno do cerimonialismo e a construção de suntuosos templos, e por último
termina o seu discurso religioso crítico, demonizando a tradição religiosa em geral. Tal
demonização se faz introduzindo a figura sincrética espiritual dos exus, a partir da
umbanda, criando uma nova entidade religiosa carregada de negatividade – o Exu
Tradição (MACEDO, 1.997).
Macedo nestas críticas valoriza a oposição binária entre a modernidade e a tradição,
colocando estes em campos antagônicos, afirmando a incompatibilidade entre a
modernidade e as diversas tradições religiosas, critica de forma contundente a linhagem
de crença/religião dentro do cristianismo na sociedade brasileira. O veículo midiático
oficial desta instituição, corrobora com as palavras de seu bispo primaz, ao afirmar que
uma denominação que valoriza a religiosidade, o ritualismo e o tradicionalismo não são
50
igrejas realmente cristãs17
. Logo, a Universal e o seu episcopado são
descompromissados com a tradição religiosa anterior.
Outro aspecto interessante é contemplar este conflito está na formação das identidades
sociais, porque elas não são herdadas do passado, mas construídas a partir de outros
mecanismos, tais como, as experiências pessoais e sociais. Logo, a Modernidade e as
tradições não são expressões antônimas, como defendem alguns intelectuais ou
religiosos. Esta visão de contrapor modernidade às diversas tradições é criticada tanto
por Passos (2.015), como nas diversas obras de Herveu-Lèger (2.008 e 2.005).
Para Passos, este antagonismo é uma leitura sociológica que não contempla as tradições
como elementos responsáveis pela vitalidade das comunidades que vivem o presente,
com a possibilidade em construir ou em reconstruir o futuro. Mas favorece apenas a
leitura das tensões culturais existentes, tais como: o particular e o universal, o profano e
o sagrado, o privado e o público etc (PASSOS, 2.015).
Hervieu-Lèger elabora a sua crítica a este antagonismo por considerar este uma leitura
sociológica equivocada, negativa e superficial das tradições, devido a ausência de
melhores instrumentos de análise, pois as críticas sociológicas construídas entre os
séculos XIX e XX, as quais hoje encontram-se ultrapassadas.(HERVEU-LÉGER,
2.008)
As tradições perderam o monopólio sobre o cotidiano humano, mas este fato não
implica no fim delas (MODES, 2.007), e o imediatismo não invalida a construção das
tradições e o seu papel social de agente legitimador.
Pois todos os grupos sociais sejam eles, religiosos, sejam eles, seculares, buscam as
referencias do passado para justificarem as suas origens, garantindo desta forma a
preservação ou a sobrevivência social de grupos e instituições (HERVEU-LÉGER,
2.008,).
Devido ao fenômeno do pluralismo religioso em nossa sociedade, há por parte de alguns
grupos a busca de legitimidade social, através do processo de reativação de tradições
para si mesmos, ou de tradições reinventadas a partir do imaginário que são
17 Rangel, Marcelo – “Quais são as suas prioridades?” FU, n°1.270, Caderno Comportamento, 07-
13/08/2.016, p.30.
51
combináveis ao serem escolhidas e não herdadas por tais grupos. Segundo Herveu-
Lèger, tanto a modernidade como as diversas tradições, encontram-se influenciadas pelo
dinamismo, pela cultura da mobilidade, e não pela visão de mundo estático em nome de
uma continuidade, pelo contrário, elas são recriadas, reinventadas e remodeladas pelo
imperativo das mudanças, dialogando com as novas condições sociais da cultura da
Modernidade, em nome da continuidade, da sobrevivência de determinados
agrupamentos humanos (HERVIEU-LÈGER, 2.008).
A – Tradição Religiosa:
Toda religião é uma forma específica de crer, onde a sua principal característica é a
continuidade, a partir de produções simbólicas, as narrativas ou os relatos das origens –
as memórias. A esta capacidade dinâmica em organizar as crenças, os ritos, as memórias
pertencentes ao passado de um grupo, denominamos de tradição religiosa.
Logo, todo grupo humano, religioso institucional ou não para ter continuidade e
legitimidade apóia-se numa tradição anterior a sua existência por que ela é contemplada
como uma verdade fundadora por um determinado grupo religioso na sociedade local.
Podemos tomar como exemplos os discursos religiosos cristãos contidos no livro de
Atos dos Apóstolos, tanto de Santo Estevão, como de São Paulo que se ancoram em
textos sagrados mais antigos, as narrativas da Torá e dos Profetas, na tradição religiosa
judaica dentro do primeiro século de nossa era civil.
Definimos a tradição religiosa como:
I – Um código de significados coletivos, frutos das experiências diárias humanas que
tem como assunto, a transformação da ordem caótica numa ordem necessária para a
existência dos grupos humanos e indivíduos, mas ela é simultaneamente, a forma de
como o ser humano ou uma coletividade vivência a sua experiência com o sagrado.
Ela é fruto de um acontecimento místico, sobrenatural e construtor-produtor de sentidos
de um determinado grupo de seguidores de uma crença religiosa específica, a qual
influencia ao longo do tempo o cotidiano, a fé de tal comunidade.
II – Como fruto da experiência religiosa, a qual estabelece os mecanismos de
comunicação, a construção de hierarquias de autoridades a serem obedecidas, sendo que
52
ela pode ser expressa, interpretada ou lida através de dogmas escritos, ou por reflexões
teológicas de uma determinada coletividade de crentes ou fiéis.
Ao esposarmos a tese de que a religião é um produto humano, social e um agente
criador de um código de sentidos para o Homem e sociedade, afirmamos que ela é
portadora de uma história, como também um mecanismo de transformação da realidade,
e unifica o modo de viver dos seres humanos no mundo. Em conformidade com tal
raciocínio, estamos referendando a ideia da continuidade e com ela, a necessidade social
da tradição. E o papel das tradições dentro das instituições religiosas é a de postular a
continuidade de atos religiosos, de crenças e de ritos, dando a elas legitimidade.
Portanto, temos no discurso religioso, simbólico, a afirmação da ilusão da estabilidade
ou da imobilidade em relação as diversas transformações econômicas e sociais, que
além de mascarar a absorção destas alterações, as diversas tradições são evocadas para
justificar, legitimar tais mudanças em nome de uma continuidade – fidelidade as
origens.
Pois Hervieu-Léger, em suas pesquisas sobre a tradição religiosa em sua obra –
“Religião, filha da Memória” (2.005), afirma que todo ato religioso explicito ou
implícito, como também toda crença, carecem do suporte que uma tradição anterior
pode oferecer como apoio, pois a tradição invoca a autoridade e a legitimidade que estes
precisam (HERVIEU-LEGER, 2.005).
E todas as vezes que ocorre a existência de uma tradição desnaturada dentro de uma fé
religiosa temos a ocorrência de um importante mecanismo histórico de correção – as
reformas religiosas que são alterações/mudanças absorvidas pelas instituições em nome
da continuidade. Portanto, a continuidade é invocada tanto no discurso de intervenção
da ordem religiosa dominante pela permanência. Podemos citar como exemplo, a
Reforma Católica ou Contra Reforma ocorrida na Europa do século XVI.
Como no discurso da ruptura com esta mesma ordem pelos grupos ditos reformistas,
podemos tomar como exemplo a Reforma Protestante ocorrida na Europa do século
XVI. Nos casos citados, os dois grupos religiosos não se apresentam como os
construtores de uma nova religião, mas os discursos religiosos de ambos justificam para
si mesmos e para o outro como os portadores da continuidade, sendo o principal
53
fundamento social de um grupo religioso, o chamamento de uma missão (ideia da
eleição), ou de uma revelação específica e pessoal.
A tradição religiosa se impõe como regra para grupos e indivíduos porque é capaz de
evocar a continuidade via ilusão da estabilidade ou da imobilidade, através da sua
relação com a origem, com o passado dos mesmos, especialmente ao tratar de atos
fundadores que se localizam fora da história humana e do tempo. Dentro do
cristianismo temos este argumento construído a partir de determinados textos bíblicos:
“Jesus Cristo é o mesmo, ontem, hoje e eternamente” (Heb .13:8), e “(...) vem do Pai
das Luzes, em quem não há mudança, nem sombra de variação.” (Tia. 1:17).
Assim, as tradições religiosas desde a antiguidade são portadoras de autoridade e valor
social, preservando os modelos culturais e sociais, cuja permanência está enraizada no
interior da sociedade. Toda tradição religião constrói a sua autoridade a partir da
seguinte hipótese – como os nossos antepassados ou pais creram? Porque creram, nós
também cremos. Como também um determinado código de comportamentos coletivos e
individuais, de sentidos e de valores.
Tanto ela, como a memória religiosa exprimem a ideia da continuidade, da transmissão
através do tempo, de geração em geração. A ideia da continuidade dentro da sociedade
local implica em adotar o imperativo das mudanças, de uma atualização, e não da
estabilidade ou da permanência.
Porque para ambas, as mudanças são reconhecidas de forma positiva, como a mola de
desenvolvimento destas no mundo, porque a memória e a tradição não se encontram
impermeáveis ou imóveis as mudanças ou as influencias da modernidade.
O bispo Macedo faz questão de colocar em campos opostos, as tradições históricas
religiosas das igrejas cristãs e o Espírito Santo e a influencia deste. Pois segundo ele, as
antigas tradições religiosas são produtos humanos, composto por cerimônias, liturgias,
normas eclesiásticas, rituais, usos e costumes etc. Esta última afirmação de Macedo ao
confirmar a materialidade das diversas tradições religiosas bem como a autoria humana
delas, não é nenhum equívoco, concordamos com este reconhecimento dele, porém,
discordamos da sua argumentação utilizada para desclassificar elas na sociedade, nas
diversas instituições religiosas com as quais concorre, utilizando a terceira pessoa da
54
Trindade cristã como um contraponto as mesmas, como um diferencial, valorizando o
empirismo.
Para Edir Macedo, elas não são mais as únicas produtoras de sentido, pois perderam
este monopólio na sociedade. Ele e a IURD esposam esta posição crítica por pertencem
aos novos grupos religiosos que se encontram despreendidos deste meio, se beneficiam
da autonomia dos sujeitos religiosos, do transito religioso e da atomização da matriz
religiosa (MODES, 2.007). Portanto, trata-se do argumento em defesa da ruptura com as
tradições religiosas evangélicas e protestantes históricas (BEZERRA, s/d, CAMPOS,
1.996).
B – Linhagens de crença religiosa:
Segundo Hervieu-Leger toda religião pode ser lida como uma instituição ideológica que
desenvolve o pertencimento a uma determinada linhagem de crença ou de fé. Ela, a
religião, a partir de dispositivos práticos e simbolicos, monitora a consciencia coletiva
ou individual. Chamamos de linhagens de crença ou da religião como a auto-
legitimação da crença de um grupo ou indivíduo, sendo que esta tal legitimação tem
como referencia uma tradição que defende nesta crença e prática, a continuidade, a
transmissão das mesmas de geração em geração (HERVIEU-LÉGER, 2.005).
Segundo ela, as linhas de crença religiosa são mecanismos que permitem identificar,
reconhecer um indivíduo ou grupo religioso, porque tem fortes relações com as
memórias e as tradições, elas, as linhas de crença/religião, dependem do vigor que elas
mantém com o passado compartilhado entre eles, durante o processo de transmissão via
memória/tradição. Por causa disto, as memórias e as tradições são contempladas como
sinônimas das linhagens de crença ou da religião.
Ao analisar os grupos humanos e as memórias e tradições religiosas na construção das
linhagens de crença ou de religião, Hervieu-Lèger, admite alguns aspectos interessantes
em suas pesquisas – a existência concreta e permanente de um grupo humano, pois isto
implica na existência da produção de uma memória e tradição dentro deste grupo
religioso. Uma fé estável – que tem como característica a materialização de sua teologia
nas crenças, nas práticas, nos rituais, nas normas de comportamento interno e externo, e
nos valores compartilhados entre eles.
55
E por último, a identidade ou o pertencimento do grupo a uma determinada fé dentro da
nossa sociedade através de uma inscrição simbólica – os valores religiosos estéticos de
tal fé. Estes aspectos acima citados passam pelos mecanismos formais de adesão à fé do
grupo, o sentimento de pertencimento coletivo àquele grupo religioso através da leitura
emotiva do mesmo, os valores éticos e estéticos compartilhados no interior do grupo,
transformados em determinadas normas de comportamento e o compartilhamento de um
saber religioso coletivo/comunitário, a memória cultural – lendária e histórica daquele
grupo humano, religioso.
Podemos tomar como exemplo de linhagem de crença, o judaísmo existente dentro da
cidade de São Paulo, capital.
O critério de adesão/pertencimento ao grupo – nascimento e a conversão: shuvá/retorno.
Todos os elementos do sexo masculino passam primeiro pelo ritual da circuncisão, da
imersão física, e da sabatina, seja dentro do judaísmo conservador, seja dentro do
judaísmo liberal ou do judaísmo ortodoxo.
O conceito da inclusão/pertencimento é igual, tanto para o judeu nascido de pais judeus
ou de mãe judia, ou pela via da conversão: ger, tem os mesmos deveres e direitos dentro
do grupo religioso, portanto um ger não é contemplado como um judeu de segunda
categoria, podendo assim contrair núpcias e formar família como um judeu de família
judaica tradicional.
Um judeu ortodoxo se diferencia de um judeu conservador ou liberal ou de um não
judeu – goyim devido aos valores que são convertidos em normas de comportamento
compartilhados dentro do grupo religioso específico – a questão estética dos usos:
barba, cabelo e roupas. Mas ele vai além desta identificação estética formal, perceptível
ou visível aos nossos olhos, ele reforça tal identificação cultural religiosa com as
normas de comportamento que estão associadas a questão dos costumes, dentre elas, o
consumo de alimentação estritamente casher, criando desta forma uma convenção de
consumo de tais alimentos pelas companhias aéreas que atendem a clientes pertencentes
a este grupo religioso.
Num vôo nacional no qual este produto não é servido, ele traz comida preparada para
esta finalidade de consumo e a identidade cultural é reafirmada a bordo com o não
consumo dos produtos ditos não casher. Ao passo que os outros judeus não fazem
56
questão deste aspecto, consumindo ou não consumindo alimentos casher em suas
viagens. No caso de um judeu liberal venha a consumir e servir-se desta modalidade de
alimentos especiais, podemos afirmar que ele realiza de modo informal um processo de
re-adesão ao judaísmo conservador ou ortodoxo (tradicional).
O cultural expresso pelos saberes comunitários do cotidiano do grupo étnico religioso,
o conhecimento da língua hebraica para fins de leitura de textos é importante para
participar das cerimônias religiosas dentro da sinagoga no sábado de manhã, no qual
ocorre como evento principal, a leitura regular da Torá e dos profetas neste recinto.
Porque os textos escritos nestas obras tratam da memória histórica e legendária do
grupo. E o hebraico é o mecanismo religioso de como os judeus se comunicam
especialmente com o seu Deus padroeiro.
As linhagens de crença ou de religião são portadoras de dinamismo, o poder de
combinar ou de reconfigurar a identidade religiosa. Ela é a referencia imaginária de uma
identificação coletiva ou comunitária e social de um grupo de crentes.
Ela implica em ir além do simples ato do crer religioso do que é certo/verdadeiro para
um determinado crente, em construir a continuidade desta crença, e dar à verdade
reconhecida uma expressão material ou visível desta filiação a uma determinada
comunidade espiritual que abriga indivíduos pertencentes ao passado, ao presente e ao
futuro desta crença.
Devido a esta situação, ela constrói relações com os rituais religiosos porque o papel
deles é o de inscrever na vida de cada individuo/pessoa, a memória dos eventos
fundadores desta crença, incorporando a esta de forma distinta o individuo/sujeito.
Isto nos leva a responder a seguinte questão: Qual a relação existente entre a memória e
o pentecostalismo praticado na sociedade brasileira?
Hoje vivemos numa sociedade complexa, onde as categorias criadas tinham a função de
abarcar e de explicar os diversos fenômenos que ocorriam na religião e na sociedade.
Porém, o que vemos hoje são dificuldades das categorias anteriores em classificar,
definir e explicar os fenômenos que ocorrem no mundo religioso e social, porque as
particularidades e as vivencias humanas de hoje são fluidas, impedindo que estas sejam
abarcadas totalmente em categorias universais. Sendo tal fato reconhecido por Rivera
57
em suas análises sobre o pentecostalismo na América Latina, por isto ele nestes seus
estudos e pesquisas utiliza a expressão, religiões pentecostais para representar os grupos
religiosos alinhados com a prática do pentecostalismo:
Esses termos não são suficientes para caracterizar os novos fenômenos
religiosos. A utilização neste livro da expressão “religiões pentecostais”
busca representar todas as religiões que descaracterizam os fatos fundadores
cristãos e so substituíram pela centralidade do Pentecostes, constituindo uma
nova referencia fundadora. (...) O acontecimento do Pentecostes ocupa o
lugar fundamental e as doutrinas em torno de Jesus Cristo são relegadas. Os
pentecostalismo contemporâneos representam uma radicalização desse
distanciamento com as religiões cristãs.(RIVERA, 2.010, p.234)
Definimos o pentecostalismo, como o movimento religioso que tem o seu início em
nosso país no começo do século XX, nos centros urbanos – Belém, São Paulo,
expandindo-se no território nacional durante o século citado.
O pentecostalismo tanto como movimento, ou como grupo institucionalizado – igrejas,
tem como fato histórico religioso de sua identidade cristã, o episódio da descida do
Espírito Santo sobre os cristãos de origem judaica que estavam em Jerusalém, por
ocasião da festa do Pentecostes – Shavuot na cultura religiosa do judaísmo.
Este evento ocorre com a manifestação do que chamamos de glossolalia, isto é a
capacidade sobrenatural em falar em outras línguas por parte destes homens e mulheres
mencionados por Lucas no livro de Atos dos Apóstolos (Atos 2:1-13).
Tanto o pentecostalismo do começo do século XX, como os atuais grupos religiosos em
nossa sociedade que esposam este fato histórico religioso como seu evento fundador,
tem como características: ser uma religião de compensação simbólica/redenção para os
grupos humanos menos favorecidos na sociedade de classes, a valorização do
emocionalismo religioso sobre o racionalismo, construindo em decorrência disto, um
discurso religioso simples, com uma oratória breve, limitada.
A valorização do empirismo religioso humano via êxtase coletivo instantâneo, com o
transcendente através do batismo com o Espírito Santo, da glossolalia, da manifestação
de revelações sobrenaturais (valorização do extraordinário, do inexplicável, dos
milagres etc), cultos ou serviços religiosos encantados etc, e com todos eles; a reedição
constante do evento/fato histórico fundador.
Isto significa que os grupos humanos que pertencem a religiões pentecostais em nossa
sociedade aceitam a tese de que a narrativa de Lucas sobre o Pentecostes não é um
58
evento único, como afirmam os grupos protestantes históricos e racionalistas, mas um
evento que pode reproduzir-se no meio cristão, o qual se repete como evento e não
como rito (RIVERA, 2.010).
Durante décadas os diversos grupos alinhados com o pentecostalismo nacional foi o
alvo de críticas teológicas dos grupos protestantes históricos em nossa sociedade, por
causa do emocionalismo, do culto encantado, a valorização do extraordinário ou do
inexplicável, pela crença na reedição, na repetição do evento fundador no meio deste
grupo religioso.
Elas criam o distanciamento das tradições religiosas cristãs protestantes, a domesticação
do racionalismo religioso, e a reprodução constante, indefinida do evento fundador
pertencente ao passado religioso pentecostal ou de fatos considerados extraordinários
possibilita a construção da legitimidade religiosa ancorada no emocionalismo
(subjetividade dos sentimentos), no empirismo (porque ele dignifica o Homem), no
sobrenatural, e não numa memória ou tradição autorizada (MODES, 2.007).
A conseqüência disto na atualidade é a presença de uma pluralidade de grupos
religiosos pentecostais sem memória e sem tradição, no máximo, portadores de uma
memória religiosa rasa, de curta duração, ao valorizar-se o imediatismo, o presente,
portanto, efêmera por se ancorar nas experiências e emoções, frágil e precária, sem a
apropriação da memória/tradição, via doutrinas e rituais (RIVERA, 2.010).
Pois se o evento fundador ao se reproduzir e se tornar num rito, pode ser rememorado,
constrói as condições elementares para haver uma memória e uma tradição nas diversas
religiões pentecostais. O que ocorre é que esta repetição em cada culto se encontra
sempre atualizada, valorizando a última manifestação extraordinária com o sagrado,
alinhada com o fato fundador – uma experiência espiritual dita bíblica próxima do nosso
tempo e do nosso espaço, impedindo a elaboração de uma memória religiosa e do
exercício da mesma, e a produção religiosa e social de uma tradição (RIVERA, 2.010).
Em suas análises e estudos sobre as diversas religiões pentecostais concordamos com
Rivera ao afirmar que os atuais grupos religiosos pentecostais, dentre eles a IURD, em
seu radicalismo tornaram-se mais distantes das tradições ditas cristãs, que os grupos
pentecostais anteriores (RIVERA, 2.010).
59
E qual é o efeito do pluralismo pentecostal contemporâneo sobre a memória e tradições
religiosas na sociedade contemporânea? Em nossos estudos, o processo de
democratização dentro do campo religioso cristão, protestante favorece a multiplicidade
de denominações ou grupos religiosos diferentes, especialmente de origem pentecostal
no meio urbano nacional, ao ponto de constituírem as denominadas “manchas
antropológicas e geográficas” nas nossas pesquisas, a influencia deles sobre a memória
e as tradições ditas religiosas pode ser lida percebida através de dois modos dentro da
modernidade: o primeiro deles, a busca destas memórias e tradições para dar
legitimidade ou suporte â pureza e fidelidade destes agrupamentos humanos em relação
as crenças, dogmas e doutrinas, reforçando a existência de imperativos fundamentalistas
e de conflitos em alguns agrupamentos humanos (GABATZ, 2.014).
O segundo deles, a adaptação ao processo social de fim dos monopólios religiosos e de
suas tradições históricas dentro do catolicismo e protestantismo, onde os novos
movimentos religiosos pentecostais revelam as afinidades individuais e voluntárias das
escolhas humanas por determinadas práticas religiosas e não por opções teológicas entre
os grupos existentes, estimulando uma concorrência por adesões de fiéis.
E a conseqüência deste processo para as memórias e tradições religiosas é o surgimento
de uma fé buscada, conquistada, e não mais herdada, inutilizando a força das tradições e
a constituição de micro-memórias frutos do individualismo religioso.
Portanto, sem coesão, acompanhados de um processo de identidades e pertencimentos
plurais, desconectados de qualquer vínculo com a memória orgânica e organizadora de
um grupo religioso (GABATZ, 2.014).
60
Capítulo II – “A IURD E A OCUPAÇÃO DO ESPAÇO EM SÃO PAULO”
2.0 – Introdução:
O que é a Igreja Universal do Reino de Deus?
Esta é uma questão interessante que pretendemos responder neste capítulo, porque ao
darmos a nossa definição sobre o objeto de nossas pesquisas, estamos deixando evidente
a nossa opinião sobre ele.
Este capítulo abordará a evolução da IURD em nossa sociedade e no campo religioso
brasileiro através da história da instituição Dividimos a história da Igreja Universal do
Reino de Deus em quatro etapas – fase embrionária do movimento religioso (1.975-
1.980), a fase do crescimento e expansão (1.980-1.998), a Era das Catedrais: A primeira
fase da institucionalização (1,998-2.010), Templo de Salomão: A segunda fase da
Instituição (2.010-?). Para cada um deles, escolhermos acontecimento, fatos, de curto e
de médio prazo como marcos que assinalam o início e o término de cada fase. A adoção
destes fatos como marcos históricos para uma melhor compreensão de cada período,
não significa que o significa que as fases estão engessadas dentro do tempo e do espaço,
mas são indicações de alterações já ocorridas ou que ainda estão em fase de
desdobramento ou de desenvolvimento na vida da instituição.
Neste capítulo estarmos dialogando com as seguintes fases: a embrionária do
movimento religioso, a da Igreja contestatória e da primeira institucionalização. Pois as
duas últimas demarcam a expansão da Universal em direção da cidade de São Paulo e
com ela, o processo de aminésia religiosa e social dentro deste grupo religioso na
cidade. O desmoronamento do templo em Osasco e suas implicações – a denominada a
Era das Catedrais, como mecanismo de consolidação da IURD dentro e fora do país e de
uma fase de instituição religiosa iniciada nos períodos anteriores.
A nossa abordagem sobre o templo de Salomão no complexo do Brás, refletirá as nossas
leituras a partir de Lefebvre, Schimit e Rosendhal a luz das nossas experiências, do
nosso trabalho de campo sobre o complexo e especialmente, o Templo de Salomão.
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2.1 – Definição da IURD:
Durante a história da Igreja Universal, vários agrupamentos religiosos e sociólogos a
estudaram e procuraram dar uma definição para ela e ao movimento pentecostal do qual
ela é o seu principal representante, principalmente durante o seu processo de
crescimento e expansão no território brasileiro e fora deste.
Para alguns grupos religiosos conservadores, a IURD, seja como movimento, seja como
Igreja sempre será vista como uma seita protestante, como um típico caso de
contracultura neste subcampo religioso. O termo seita pode ser lido como um
instrumento de luta e de poder, utilizado para desqualificar, enquadrar e rotular
fenômenos religiosos heterodoxos ou não institucionais, que não podem ser assimiláveis
no mundo religioso institucional (CAMPOS, 1.996). Um exemplo deste processo
podemos citar o posicionamento da IPB - Igreja Presbiteriana do Brasil após analisar a
Igreja Universal do Reino de Deus e denominá-la negativamente como uma igreja
impura – Relatório da Comissão permanente de Doutrinas da IPB sobre a IURD em
1997 (GOMES, 2.011).
Os tais agrupamentos humanos denominados de seitas religiosas são autores de críticas
construídas de baixo para cima, reforçando a sua postura de não conformismo ou de
protesto contra os grupos religiosos institucionais e/ou ortodoxos. Pois a maioria dos
movimentos religiosos contestadores afirmam-se através de seus rituais, pois o Sagrado
segundo tais grupos pode ser acessado ou atingido por mecanismos religiosos não
tradicionais dos grupos ou das instituições (CAMPOS, 1.996).
Segundo Macedo rotular a IURD como uma seita cristã, protestante, é uma ação
conservadora e preconceituosa (TAVOLARO, 2.007), porém, é uma estratégia usada
por ele ao “outro” – criando os opostos binários, nós (IURD) e os outros (grupos
religiosos conservadores históricos e tradicionais), nós (cristãos/portadores da fé
inteligente, racional) e os outros (crentes/portadores de uma fé emocional).
Para grupos laicos relacionados com a Sociologia da Religião ela foi contemplada como
um Novo Movimento Religioso – NMR (Hervieu-Léger em suas pesquisas na França),
ou como um Movimento Religioso Livre – MRL por intelectuais nacionais. Pois
algumas das características da Universal são idênticas àquelas que foram identificadas
nos estudos franceses (CAMPOS, 2.002).
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Exemplos:
I – O emprego de explicações simplistas e reducionistas para todos os problemas – a
Universal faz reducionismo das causas dos diversos problemas humanos, manipula a
ideia do mal espiritual como a única causa para os mesmos.
II – A leitura literal dos livros sagrados (Bíblia, com aplicação de trechos fora do
contexto, como se fosse uma revelação mágica, recebida naquela hora – elas, as leituras
são feitas como mecanismo para referendar a utilização de bens simbólicos a serem
adquiridos nas concentrações de fé e milagres ou nas reuniões de correntes específicas.
Exemplo: se faz a leitura do livro bíblico de Efésios – Novo Testamento que menciona
o sacrifício de Jesus para quebrar as barreiras de inimizades entre o Homem e Deus,
para ilustrar a necessidade de quebrar as barreiras entre os Homens – questão conjugal
heteroafetiva e depois distribuir uma cruz, que serve como agente de fidelidade para os
comparecimentos nas palestras na Terapia do Amor, sendo que esta será ungida em cada
reunião.
III – Eleicionismo e salvacionismo dos que fazem parte do grupo. Este item fica
explícito no discurso de Macedo junto a Folha Universal:
(...) A Universal foi chamada para levantar uma nação, uma nação de
vencedores, uma nação de conquistadores, um exército forte do Deus vivo
aqui na Terra.” (“Crentes fracassados”, in: Mensagem do Bispo Edir Macedo,
Caderno Opinião, Folha Universal, 09/10/2.016, p.2).
Para outros pesquisadores, ela foi vista como uma denominação religiosa exótica,
periférica, como um desdobramento das pesquisas sobre os NMR ou MRL, devido à
escassez de estudos sobre a mesma nos meios acadêmicos antes da última década do
século passado, podemos citar a tese desenvolvida por M. Inhauser – A umbandização
do protestantismo brasileiro (CAMPOS, 1.996).
Para Campos afirma em sua tese (1996, p.12, 16), “que a Igreja Universal é uma
instituição contemporânea modelo, com uma mentalidade empresarial religiosa, que
investe socialmente num marketing religioso agressivo”. Ele nesta tese não a contempla
como uma ave de rapina/empresa comercial voltada para ganhar o dinheiro dos pobres,
e nem uma obra prima do Espírito Santo no mundo/empreendimento espiritual. Ele a
define como a portadora da simbiose entre o mercado e a religião (CAMPOS, 1.996).
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Respeitamos os diversos raciocínios elaborados anteriormente, fruto de anos de críticas,
de diálogos, de estudos e de investigações, os quais como saber produzido servem para
enriquecer o nosso debate. Pois a Igreja Universal do Reino de Deus, como objeto de
estudos e de pesquisas, apresenta em determinados momentos de sua história, discursos
e práticas controvertidos. Para nós, a IURD é um grupo religioso concreto, portador de
uma história e de uma memória. Contemplamos a Igreja Universal como um grupo
religioso alinhado com a Modernidade como foi mencionado no capítulo primeiro, onde
o imperativo da mobilidade, da mudança é construído pela experiência pessoal e/ou
social, como forma de identidade.
Vemos a Igreja Universal como um objeto de estudos importante, digno da seriedade
acadêmica por ser um fenômeno religioso bem sucedido entre as duas últimas décadas
do século XX, e a primeira década do século XXI devido aos diversos dados
quantitativos que estão relacionados à mesma. Este fato é reconhecido por Tavolaro na
introdução da biografia de Edir Macedo produzida por ele (TAVOLARO, 2.007), como
nas análises construídas por Mariano sobre os pentecostais contemporâneos, em
especial a IURD (MARIANO, 1.999), sendo este crescimento e expansão reconhecidos
socialmente tanto por adversários, como por críticos desta.
Ao longo destes trinta nove anos de existência, a Igreja Universal do Reino de Deus
construiu uma história marcada pela ascensão meteórica no campo religioso brasileiro e
internacional, adquirindo respeito no meio acadêmico. E a construção e inauguração do
Templo de Salomão nas primeiras décadas do século XXI, refletem este processo de
crescimento e de consolidação do grupo dentro e fora do Brasil. E a famosa frase do
jargão iurdiano – contra fatos não há argumentos é o mecanismo de marketing com o
qual ela se vangloreia, seja dos resultados expressos em dados quantitativos, seja pela
eficiência das estratégias adotadas que lhe fizeram bem sucedida.
Para nós a IURD é uma das faces do pentecostalismo brasileiro, porque existem
diversas formas em ser pentecostal, pois a diversificação, fragmentação e a
heterogeneidade são características deste movimento religioso em nosso país. Em
conseqüência disto temos contemplado em nossas observações, a competitividade entre
os grupos religiosos contemporâneos, apresentando-se à sociedade como uma
alternativa sacral, e com ela, o advento de diferentes denominações pentecostais no
meio urbano, portadores de um processo de adesão/pertencimento efêmeros.
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E a Igreja Universal identifica-se com tal processo citado anteriormente por nós e com
este pentecostalismo contemporâneo pelos seguintes motivos:
A – A crença que a Universal é um movimento religioso edificado na terceira pessoa da
trindade cristã, que é o seu verdadeiro líder e fundador e se faz presente entre os
homens, dentro do imaginário da Universal,. Ele é visto como o espírito da criação, a
energia básica do universo presente na Universal (CAMPOS, 1.996). A foto abaixo
materializa bem esta crença do imaginário iurdiano.
(Foto extraída do site: www.Universal. Org. com/Folha Universal, 25/12/2016))
B – Acreditar na experiência do batismo com o Espírito Santo após as etapas da
conversão e do batismo por imersão, e aceita o fenômeno da glossolalia (a manifestação
ou a capacidade de em falar em outras línguas entre os seus membros).
Esta identidade pode ser lida de diversas formas: por meio racionalista, artigos escritos
por seus bispos e por elementos simbólicos pertinentes a cultura religiosa judaico-cristã:
Exemplo 1 – artigos escritos:
A Folha Universal, órgão oficial da instituição através dos artigos produzidos pelo
episcopado da denominação revela esta identidade. Escolhemos de forma intencional
dois artigos escritos sobre o Espírito Santo por seu bispo primaz – Edir Macedo:
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“Porque muitos não recebem o Espírito Santo” (Folha Universal, 05/06/2.016, p. B-3),
e “O Espírito Santo não vem por acaso” (Folha Universal, 12/06/2.016, p. B-3).
Exemplo 2 – representação simbólica:
A identidade do grupo com o pentecostalismo expressa-se de forma simbólica, na
estética do seu emblema ou logotipo oficial em conformidade com a tradição bíblica e
cristã, citada nos evangelhos em forma de uma pomba :
Entre os anos oitenta e noventa, os principais espaços religiosos da IURD foram
denominados pelo grupo como Cenáculo, numa referencia geográfica e histórica com o
local onde se reuniam os primeiros cristãos, no qual se manifestou o Espírito Santo em
Jerusalém, em conformidade com o relato de Lucas em Atos dos Apóstolos E
Recentemente, ela se faz presente dentro do Complexo do Brás, a partir da réplica do
Jardim das Oliveiras, construindo a relação entre o azeite de oliva e o Espírito Santo.
(Folha Universal, 20/11/2.016, p. 5).
Na prática temos os cultos de quarta-feira e de domingo voltados à Ele. Mas a
identidade pentecostal da Igreja Universal do Reino de Deus é portadora de aspectos
que o diferencia dos demais grupos que partilham desta crença. Este fato torna o
processo de classificação identitária menos precisa possível. (MARIANO, 1.999). Tal
como: a liberalização dos estereótipos de costumes e de usos da santidade, e com esta,
um discurso de afirmação e não de negação do mundo, opondo-se desta forma aos
grupos evangélicos pentecostais clássicos (AD – Assembléia de Deus, CCB –
Congregação Cristã no Brasil) conforme a classificação adotada por Mariano e pelo
CEDI – Centro Ecumênico de Documentação e Informação (MARIANO, 1. 999).
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Para nós ela é um grupo religioso marcado por discursos e práticas controvertidos,
exemplo, mesmo quando ela não se reconhece como um grupo religioso institucional,
portador de uma ideologia – doutrinas, regras estabelecidas por um grupo social
(CAMPOS, 1.996). Esta negação implica em reconhecer o papel da religião como
produtora de representações e sentidos. Nesta autocrítica radical, ela admite ser s um
movimento e não uma religião institucional, porém junto com Jesus, com o Espírito
Santo se apresentam como mediadores simbólicos entre o Homem e o transcendente. A
IURD postula o papel de intermediário do poder divino que é a mesma função exercida
pelas demais instituições religiosas (MARIANO, 1.999).
2.1.1 – História da IURD:
Podemos dividir a história da IURD em quatro fases, a embrionária do movimento
religioso (1.975-1.980), a do crescimento e expansão (1.980-1.998), a Era das Catedrais:
a primeira fase de instituição da Igreja (1.998-2.010), e o Templo de Salomão: a
segunda fase da instituição religiosa (2.010-?). A primeira fase tem como marcos – a
dissidência da Igreja Nova Vida e a instalação do grupo na antiga funerária do bairro da
Abolição. A segunda fase, da IURD/Abolição até o desmoronamento da IURD/Osasco
em São Paulo. A terceira fase, a construção das catedrais até a construção do Complexo
do bairro do Brás, e a última fase, da construção/inauguração do Templo de Salomão (e
edifícios do complexo do Brás) até os nossos dias. Dos períodos históricos mencionados
examinaremos neste capítulo, o período embrionário, o período do crescimento e
expansão, e a primeira fase da institucionalização – A Era das Catedrais.
A história da IURD está sempre sendo reescrita, e a grande prova disto são as produções
bibliográficas da instituição religiosa sobre os seus fundadores – duas biografias sobre
Edir Macedo: a primeira em um único volume, escrita por Chrsitiane Lemos e Douglas
Tavolaro, “O Bispo: a história revelada de Edir Macedo” (2.007). A outra em três
volumes, a autobiografia do bispo Macedo, “Nada a perder“ (2.012, 2.013, 2.014).
E recentemente num único volume, s biografia da esposa do mesmo, Ester Bezerra:
“Ester Bezerra: A Dama da Fé”, lançado no país em oito de outubro de dois mil e
dezesseis.
(“A Dama da Fé,” in: resgatando valores esquecidos/Godllywood, Folha Universal,
02/10/2.016, p. 6; “A Dama da Fé é lançado em todo o Brasil,” in: entretenimento,
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Folha Universal, 16/10/2.016, p. 14,15). Sendo exportada para o México (Livro A
Dama da Fé chega ao México, in: Caderno Internacional, Folha Universal,07/01/2.017,
p. 27). As bibliografias citadas evidenciam duas importantes ideias religiosas:
I – O fenômeno da liderança religiosa carismática, autoritária (de cima para baixo),
centralizadora e personalista de Macedo como o líder empreendedor e criador da cultura
religiosa da Universal, isto significa que ele exerceu e exerce um grande impacto e
influencia sobre o grupo ao qual lidera. Bem como de sua esposa, Esther Bezerra como
modelo de vida para as mulheres da denominação. Em outras palavras, o objetivo delas
é a de moldar as novas gerações de indivíduos que se identificam com a IURD. Logo, a
denominação está estruturada ao redor da figura do bispo Macedo.
II – O processo de fixação de uma memória religiosa coletiva. Segundo Rivera, as
biografias sobre os fundadores das denominações são forma concreta de fixar a verdade
na memória de uma coletividade, em fazer a transmissão da memória e da tradição
religiosa dentro de um determinado agrupamento humano. (RIVERA, 2.010; RIVERA,
2.005).
Estas biografias de certo modo reforçam a tese de que um testemunho contribui para
fixação de uma lembrança, contendo os denominados pontos de referencia no espaço e
no tempo, e que as memórias individuais fazem parte da memória coletiva segundo
Halbwachs. Sendo estas referências valorizadas devido à posição social do produtor
deste depoimento dentro do grupo – no caso da IURD, os fundadores da denominação
religiosa. (HERVIEU-LÈGER; WILLAIME, 2.009)
Mas nelas, temos a aplicação prática de alguns princípios da sociologia da Memória,
tais como, a formação de uma memória coletiva religiosa a partir da mobilização das
memórias individuais dos seus fundadores, portanto, após um processo de filtragem
temos a produção desta, e o processo de exclusão dos nomes de grupos dissidentes da
história da instituição, que é o princípio da memória coletiva em considerar sem
pertinência para a vida atual do grupo e da instituição determinadas lembranças do
passado.
Logo, tais nomes são apagados, esquecidos, excluídos dos registros históricos porque
não tem mais serventia para a memória atual da IURD, portanto trata-se de um processo
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ajustamento dinâmico, de triagem permanente dos dados junto ao presente (HERVIEU-
LÉGER; WILLAIME, 2.009).
Por isto, Romildo Roberto Soares, o atual missionário R. R. Soares, e Roberto Augusto
Lopes apesar de terem prestado importantes serviços nos primeiros anos de vida da
IURD, não são citados como indivíduos de destaque nos relatos de Edir Macedo junto a
Igreja Universal por pertencerem ao grupo dos vencidos na luta pelo poder interno com
ele. Este processo fica bem evidente na edição da Folha Universal comemorativa dos
trinta e nove anos da Universal, onde o editorial ao mencionar este fato, citando apenas
o nome do bispo Macedo, Logo, não há o espaço para a história ou a memória dos
vencidos. Esta última memória só é retomada com estudos específicos na história para
dar voz a grupos marginalizados, que não é o propósito específico de nossas pesquisas
em relação a IURD e as disssidências desta.
I – Período Embrionário do movimento religioso:
O período embrionário inicia-se em 1.975, se estendendo até 1.977. Ele inicia-se com a
dissidência de Edir Macedo da Igreja Nova Vida em 1975, e termina com a instalação
do grupo dissidente e dos novos conversos na funerária do bairro da Abolição, quando
ocorre a fundação da Igreja Universal em 1.977 (MARIANO, 1.999).
Neste período o contexto espacial ou geográfico é a cidade do Rio de Janeiro. O
contexto político nacional é o período da distensão na ditadura militar (1974-1979),
onde o Brasil é governado pelo primeiro presidente não católico, identificado com o
protestantismo histórico – Luteranismo, Gal. Ernesto Geisel. O contexto religioso
carioca a partir de 1.960 é o processo de re-encantamento, com o surgimento de novos
grupos religiosos, dentre eles, pentecostais e sincréticos, bem como de lideranças
carismáticas vista por muitos como messiânicas ou proféticas na sociedade local
(CAMPOS, 1.996, p. 340).
A estes contextos apresentados por nós junta-se o social, porque nenhum grupo
religioso encontra-se divorciado das condições de vida concreta, material da sociedade
ao seu redor, e todo o processo de surgimento, crescimento e de expansão da instituição
tem um cenário que lhe é propício (CAMPOS, 1.9996). Deste período podemos
destacar:
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A – A dissidência:
A dissidência do grupo de Edir Macedo da Igreja Nova Vida, reflete o fenômeno
dinâmico ou dialético que ocorre dentro do pentecostalismo – crescer e diversificar-se.
Caracterizando a dissidência como um movimento religioso de contato, de protesto.
Toda dissidência religiosa é em maior ou menor medida agrega do seu agrupamento de
origem ou igreja matriz, características ou dados culturais e informações que irão
aparecer na futura instituição religiosa (ABUMANSSUR, 2.004). Pois segundo
Campos, não há o fenômeno social de uma ruptura total, mas parcial ou o processo de
continuidade retrabalhada (CAMPOS, 1.996).
No caso da Igreja Universal ela herdou da sua antecessora, a Igreja Nova Vida, a
identidade pentecostal, onde a experiência é o agente construtor da teologia, a forma de
governo – modelo episcopal adaptado a um processo de centralização ou de
verticalização do poder, a liberalização dos estereotipados usos e costumes de santidade
que os grupos evangélicos clássicos ou históricos, transformaram em doutrina. A
oposição religiosa aos grupos de matriz africana, a teologia da prosperidade etc.
Assimila-se desta forma as ideias que deram certo no grupo religioso original.
Sobre a dissidência há duas versões, a primeira da Igreja Nova Vida, onde as lideranças
locais mencionam uma saída amigável, sem conflitos, pois o grupo pretendia constituir
uma igreja ou ministério próprio. Esta versão da Igreja Nova Vida é interessante porque
ela era fruto de dissidência da Assembléia de Deus em Toronto, Canadá, portanto, seria
incoerente lutar contra uma dissidência. Não temos os registros de época com a opinião
do bispo Walter Roberto McAlister, fundador da Igreja Nova Vida que presenciou este
fato, não havendo nenhuma menção deste caso até a sua morte em 1.993.
A versão de Edir Macedo não apresenta neste seu discurso o conteúdo comum das
dissidências religiosas, a revelação especialmente recebida, como ocorreu na história de
diversos grupos religiosos protestantes e pentecostais nos séculos XIX e XX, como
argumento de legitimação espiritual inquestionável (RIVERA, 2.005). Mas confirma a
famosa teoria de que toda a dissidência no mundo religioso é uma forma de protesto, de
ruptura com o passado, com a Igreja Nova Vida. Esta versão pessoal é fruto de
entrevista dele concedida a Lemos e Tavolaro (2.007).
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Segundo Macedo, ela foi fruto da luta interna por espaço, e por oportunidades de
atuação como pregador dentro da instituição, pois na época Macedo era um obreiro
auxiliar. A alegação dada era este ser portador de um defeito físico hereditário em suas
mãos, e como alguém que não tem futuro no exercício de um ministério pastora, uma
vez que ele era obreiro. Nesta mesma entrevista o bispo deixa evidente que o contexto
negativo que determinados grupos humanos viviam no Rio de Janeiro, durante a
ditadura militar lhe despertara a atenção, apresentando-o como o segundo argumento
pró-dissidência, corroborando com as pesquisas de Campos. (TAVOLARO, 2.007).
Para Tavolaro a dissidência religiosa pode ser explicada pelo fato de Macedo não querer
ser um coadjuvante. (TAVOLARO, 2.007). A história do ministério do bispo Macedo
pode ser resumida ao seguinte argumento construído por ele – veja a oportunidade e não
a dificuldade (TAVOLARO, 2.007).
Mariano procura explicar esta se apoiando nas pesquisas de Campos, na aversão de
Macedo ao elitismo do grupo religioso ao qual pertencia, pois o grupo da Nova Vida
tinha a sua mensagem voltada para as classes médias urbanas, e na falta de apoio para
atividades evangelísticas com grupos menos favorecidos bem como na postura de
Macedo em partir para vôos mais altos. (MARIANO, 1.999). A consequência desta
dissidência dentro do pentecostalismo é o fenômeno da autonomia ou independência de
grupos e de suas lideranças, em relação aos grupos religiosos de origem e ao redor desta
dissidência Estas dissidências religiosas caracterizam-se por serem autóctones e
compostas por lideranças fortes. (MARIANAO, 1.999)
B – Os caminhos dos dissidentes:
Até 1.977 o grupo dissidente encabeçado por Edir Macedo o processo de dissidência
interna, por desentendimento, separando-se da Cruzada do Caminho Eterno. Tal nome
não era novo, pois a Igreja Nova Vida, havia passado por esta etapa, com o nome de
Cruzada Nova Vida. Esta dissidência gerou o que hoje denominamos de Igreja
Universal, então com o nome de Casa da Benção. Os espaços que o grupo ocupou após
sair da Igreja Nova Vida foram: o coreto situado no Jardim do bairro do Mèier (Vide
Anexo/imagem 3) (TAVOLARO, 2.007).
Esta prática já havia sido utilizada por McAlister em sua cruzada, antes do processo que
levou a constituição da Igreja como uma instituição no Rio de Janeiro. Portanto,
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podemos contemplar este espaço ocupado por Macedo, como um meio de contestação
ao grupo religioso de origem, por ter abandonado o culto em praça pública, e uma forma
de manter-se fiel a esta tradição evangélica, aproximando-se dos grupos menos
favorecidos. Depois disto passou a alugar cinemas: Bruni Méier, cine Ridan
(TAVOLARO, 2.007). A procura de novos espaços para o grupo dissidente tem uma
explicação: o crescimento do grupo. Este fato é destacado nas pesquisas feitas sobre a
IURD por Gomes (2.011), como uma antecipação de uma forte característica da Igreja
Universal: ser uma denominação ou igreja de massas (GOMES, 2.011). Esta fase do
movimento religioso ganha um novo capítulo com a instalação do grupo na avenida
Suburbana, 7.702, no bairro da Abolição, este galpão havia sido anteriormente a sede
de uma pequena funerária naquele bairro. Estes fatos reforçam na cultura religiosa do
grupo, o papel da geografia na instituição ao ocupar espaços urbanos ociosos,
construídos para outras finalidades, portanto, sem relação direta com atividades
religiosas (ABUMANSSUR, 2.004; CAMPOS, 1.996).
Este processo no meio urbano recebe fortes críticas por parte de antropólogos e de
geógrafos porque os grupos religiosos modernos, entre os quais se encontra a Igreja
Universal, constroem uma relação negativa com a memória da cidade ao destruírem os
espaços culturais do passado – cinemas e teatros antigos.
E com eles, apaga-se a pouca memória da cultura dentro das grandes cidades brasileiras,
dando a estas antigas edificações novas funções e papéis. Sem deixar nesta ocupação
informações explícitas sobre a antiga memória daquele local.
A Igreja no bairro da Abolição é um marco referencial na história da IURD, e não para a
cidade do Rio de Janeiro, pois um determinado lugar ganhou o status de espaço
diferenciado, um não lugar converteu-se em espaço sagrado para a comunidade religiosa
que se reúne nele. O galpão que sediou a antiga funerária torna-se num espaço sagrado
devido ao que ocorre dentre dele, as concentrações ou reuniões (ABUMANSSUR,
2.004).
Entre 1.977 e 1.980, temos a fase de consolidação/expansão da nova denominação no
Rio de Janeiro, abrindo templos em Padre Miguel, Grajaú, Campo Grande, e na baixada
fluminense – Duque de Caxias e Nova Iguaçu (TAVOLARO, 2.007).
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II – A fase do Crescimento e da Expansão:
Esta fase tem início a partir de 1.980 e o seu término em 1.998. Escolhemos este título e
datas porque estão relacionados ao projeto de ascensão da IURD no país ganhando
visibilidade e marcando posicionamentos
O ano de 1.980 demarca o início das hostilidades por parte de grupos relacionados à
imprensa nacional. E a segunda, a catástrofe, o desabamento que vitimou fiéis em
Osasco/SP em 1.998. Pois este último fato levou o movimento religioso a investir numa
outra proposta de expansão nos centros urbanos dentro e fora do país. A prática da
locação de espaços passou a ser substituída pela compra e reforma dos imóveis, gerando
a construção de novos espaços religiosos, as catedrais nas capitais, em outras grandes
cidades brasileiras e nas grandes cidades do exterior.
Entre 1.980 e 1.998 temos o processo de centralização do poder dentro do movimento
religioso nas mãos de Edir Macedo com a saída de Romildo R Soares da Igreja
Universal, o mesmo não retornou para a antiga denominação, mas fundou outro grupo
religioso, a Igreja Internacional da Graça de Deus. Desta forma a IURD passa a
vivenciar a dialética da cissiparidade existente no meio pentecostal.
No mundo religioso cristão/pentecostal, a Igreja ao conquistar o seu espaço e crescer,
diversifica-se, gera uma seita, que mais tarde se transformará numa nova denominação
ou igreja, que por sua vez produzirá uma nova dissidência (MARIANO, 1.999).
Esta luta interna pelo poder com a vitória de Edir Macedo deu-lhe não só o poder
absoluto dentro da instituição religiosa, como também a aprovação do seu projeto
pessoal de expansão internacional da Universal – EUA, ao passo que o cunhado
Romildo admitia um projeto pessoal para a instituição a nível nacional. Portanto, uma
discussão de estratégias, de propostas geopolíticas para o presente e para o futuro. Este
fato reforça a importância da geografia na história da Universal em seus projetos de
expansão dentro e fora do país.
Mas favoreceu o processo de ascensão interna de outras figuras na atual história da
IURD, os quais se agregaram a instituição entre 1.975 e 1.980, dentre eles, Romualdo
Panceiro, indicado pelo próprio Macedo como seu futuro substituto em caso de
impedimento físico ou morte.
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Deste período podemos destacar:
I – A militância da IURD na mídia radiofônica, primeira pela rádio Metropolitana no
final dos anos setenta, depois com o processo de aquisição de emissoras onde a rádio
Copacabana em 1.984 foi a primeira delas, trata-se do embrião da futura rede Aleluia
que já tem mais de vinte anos de existência.
II – A presença da IURD na mídia escrita a partir de 1.992, com a criação da Folha
Universal, substituindo a tribuna Universal, como meio impresso oficial da instituição
circulando junto à comunidade religiosa.
III – A inserção da IURD na mídia televisiva brasileira em caráter definitivo revela-nos
o rompimento de um antigo tabu junto aos diversos grupos religiosos pentecostais no
país em ver o acesso a televisão como algo negativo, Pois a mídia televisiva é o reduto
da civilização da imagem. A estratégia até a compra da Rede Record, é a mesma
utilizada na inserção do grupo na mídia radiofônica – a participação em horários pagos
nas emissoras comerciais de TV. Esta última estratégia continuará sendo utilizada pelo
grupo mesmo após adquirir a Rede Record de Televisão em 1.989.
Posteriormente o episódio polemico, contestador, controvertido do chute na santa em
12/10/1.995, ao qual lemos como a demonstração de banalização e de iconoclastia em
relação aos símbolos religiosos de outros grupos humanos.
IV – Em 1986. Macedo fixa-se nos EUA, tendo como objetivo difundir a IURD no
mundo, graças a uma revelação sobrenatural. O fruto deste trabalho foi a criação de
núcleos da Universal nos Estados Unidos, e a afinidade com os grupos sociais de
imigrantes latino-americanos, os quais se convertem no principal público destas igrejas
nos EUA. (GOMES, 2.011)
V – A visibilidade da IURD na mídia e com ele, os diversos conflitos com a mídia
(denúncias) até a prisão do bispo Edir Macedo em São Paulo, 1.992.
VI – A IURD articula uma série de megaeventos religiosos utilizando como espaço, os
diversos estádios de futebol dentro da cidade do Rio de Janeiro: Estádio do Olaria, e o
estádio Mario Filho, o Maracanã e em São Paulom o estádio Paulo M. de Carvalho, o
Pacaembu.
74
Entre o fim dos anos oitenta e início dos anos noventa e mantendo desta forma viva a
tradição pentecostal iniciada por Manoel de Melo, fundador do Brasil para Cristo em
1.958: realizar cultos públicos em estádios de futebol de nossas principais cidades,
tornando os diversos estádios em espaços para a realização de mega reuniões para as
massas, fora dos denominados espaços religiosos tradicionais, os templos.
Todo este processo de inserção da Igreja Universal dentro do universo midiático e fora
do mesmo reforça as suas relações com o processo de globalização, tornando-se numa
denominação religiosa transnacional, e com o período que Milton Santos denomina de
período técnico científico da informação e da comunicação de massa18
. Este fato foi
comprovado em diversas matérias da Folha Universal, por exemplo: o atendimento e o
aconselhamento através do “Pastor Online.com” (Folha Universal, 26/01/2014, p. B4, e
Folha Universal, 13/11/2016, p.11).
.E percebido por nós durante as nossas visitas à catedral de São Caetano do Sul em
16/11/2.016 *.
O processo de expansão local, regional, nacional e internacional da IURD é
demonstrado por Mariano ao afirmar que a instituição entre 1977-2007, teve um
crescimento de 2.600% que é comprovada pela tabela construída:
18 Segundo Fu Shen Lo e Milton Santos, este período se inicia a pós o fim da segunda guerra mundial, o
qual foi tomando corpo obtendo a partir de 1.980, um grande processo de aceleração, estendendo-se até
nossos dias. (SANTOS, 1,996, p, 113, 120)
75
Quadro de crescimento e expansão da IURD:
Ano
Templos Estados
Brasileiros
Internacional
1980 21 05 Estados -
1982 47 08 Estados -
1983 62 09 Estados -
1984 85 10 Estados -
1985 195 14 Estados e
Distrito Federal
-
1986 240 16 Estados e
Distrito Federal
-
1987 356 18 Estados e
Distrito Federal
02 – Nova York
EUA
1988 437 21 Estados e
Distrito Federal
03 – EUA
01 – Uruguai
76
2.2 – IURD em São Paulo:
São Paulo, tanto a cidade, como o Estado, sempre fizeram parte do projeto de Macedo
para a IURD*, pois tudo o que ocorre dentro desta cidade e deste estado tem forte
repercussão nacional.
* Este espaço religioso da IURD localiza-se à Av. Conde Francisco Matarazzo, 101, Centro, próximo da
estação ferroviária, observamos ali instalado um telão semelhante ao do santuário do Templo de Salomão
no Brás, situação inexistente em nossa visita ao local no ano passado
Basta observarmos que os dois maiores grupos midiáticos escritos desta cidade, a Folha
de São Paulo, e o Estado de São Paulo tem circulação em outras cidades e estados da
federação, ao passo que as notícias de outros estados brasileiros, tem maior dificuldade
de circulação em São Paulo. Isto sem mencionar o potencial histórico econômico da
cidade e do Estado dentro de nosso país, ao ponto de ser apelidada de Locomotiva do
Brasil, devido ao mito do progresso nos anos cinqüenta. De tudo que nosso país produz
onze por cento desta produção econômica é pertencente a cidade de São Paulo.
Lembrando-nos de que São Paulo é uma das cidades mais globalizadas de nosso país,
está hoje situada na décima quarta posição de cidade mais globalizada do planeta,
portanto, ela tem um constante diálogo com o mundo, o que ocorre no mundo, repercute
na cidade, e tudo o que acontece na megalópole brasileira e sul-americana tem eco nos
outros centros urbanos.
Estimulando uma diversidade de fluxos humanos de origem nacional e estrangeira.
Portanto fixar a IURD na capital e no Estado era fundamental nos planos de Edir
Macedo, desde os anos oitenta, e muito mais depois de investir nas mídias escrita,
radiofônica, televisiva do país. Sendo que ela pertence a região sudeste, tendo como
suas grandes concorrentes metropolitanas Belo Horizonte e Rio de Janeiro. Portanto, a
expansão da IURD fora do Rio de Janeiro teve no Sudeste como epicentro, Minas
Gerais. O segundo passo foi implantar a IURD em São Paulo e em Salvador-Ba. É o
peso estratégico e geográfico de São Paulo que leva Macedo transferir o programa “O
Despertar da Fé”, da rede Tupi no Rio de Janeiro, para ser exibido nas madrugadas pela
Rede Bandeirantes em São Paulo, visando alcançar a cidade e ao estado em 1.980.
Posteriormente a este fato, nos anos noventa a IURD lançou-se a comprar emissoras de
rádio no território paulista.
77
A trajetória da IURD na cidade de São Paulo tem o seu início na penúltima década do
século XX. Antes do surgimento da IURD-Brás, a catedral matriz, esta denominação
procurou estabelecer-se na cidade. Segundo Tavolaro, a primeira unidade da IURD na
cidade de São Paulo se estabeleceu na av. Dr. Gentil de Moura, no bairro do Ipiranga
em 1.982. Hoje a IURD tem diversas unidades instaladas no distrito do Ipiranga –
Moinho Velho, Sacomã, Vila D. Pedro I, Vila Monumento e a catedral no bairro, a
Igreja da av. Dr. Gentil de Moura.
O alvo geográfico da IURD em São Paulo era o centro da cidade e não a periferia, pois
a capital de um Estado, de uma Província ou de um País, nos estudos geográficos
significa um espaço urbano elevado a condição de diferenciação junto às outras cidades,
devido ser o centro das diversas decisões de ordem política e a IURD já havia
conseguido atingir este objetivo – estar na cidade de São Paulo.
O centro da cidade é um subespaço/elevado a condição de lugar diferenciado devido às
diversas ações políticas e decisões econômicas tomadas nele. O centro de uma capital é
um lugar onde se concentra os poderes políticos estadual, municipal e econômico. Pois
o centro da cidade é estratégico para a circulação de bens, de capitais, de pessoas e de
serviços. Sendo que este objetivo ainda não havia se concretizado.
Dentro da cultura geográfica da Igreja Universal, estes espaços localizados junto ao
centro das grandes cidades brasileiras são importantes, porque por meio dela são
constituídos os fixos e os fluxos da instituição religiosa. Segundo Santos, um espaço
geográfico pode ser formado por um conjunto de fixos e fluxos. Estes elementos
denominados de fixos encontram-se fixados em cada lugar e as ações dele modificam o
local.
Os fluxos podem ser divididos em novos ou renovados, eles recriam as condições
ambientais e /sociais de cada lugar. Os fluxos são o resultado direto ou indireto das
ações que ocorrem nos fixos, apresentando deste modo a sua diversidade e rapidez.
(SANTOS, 1.996). A teoria de Santos pode ser confirmada na prática através das
observações feitas por Abumanssur sobre o pentecostalismo contemporâneo. Segundo
ele as igrejas pentecostais contemporâneas tomam como estratégia constituir os fixos,
os seus espaços religiosos, os futuros templos, para depois buscarem para estes, os
fluxos, os diversos públicos. Os fixos da Universal se encontram instalados em antigos
cinemas, teatros etc, porque estes ambientes já estão adequados ao projeto arquitetônico
78
e acústico dos grupos pentecostais contemporâneos. Além deles, há opção dos galpões
de antigas indústrias e edifícios que sediaram supermercados, grandes espaços
construídos para fins capitalistas, espaços que se encontram sem uso econômico.
A estes fatores de instalação do grupo se associa aos benefícios da localização – a
facilidade de acesso, a oferta de serviços de transporte coletivo, e do comércio local
como agentes que articulam a presença dos vários fluxos humanos. (ABUMANSSUR,
2.004).
No caso do centro de São Paulo ele reuniria todas estas condições citadas por
Abumanssur. Mas o problema é que a oferta de espaços para a existência de tais
templos, não existe na área central da cidade. Mas num outro lugar: os antigos bairros
periféricos, hoje denominados pelo poder público municipal como bairros centrais. Esta
classificação oficial é um meio de diferenciar tais bairros junto ao centro da cidade, da
antiga área central, bem como das outras periferias da cidade. São nestes bairros
centrais que haverá a oferta de lugares para a existência de novos templos, exemplos: o
antigo Teatro Bandeirantes na Bela Vista, ou o Cine Roxy no Brás (vide imagens do
antigo Cine Roxy, 6 e 7).
A Universal em busca destes espaços com preço acessível e faz a migração entre os
seguintes bairros centrais de nossa cidade. Do Ipiranga ela instala-se no Parque D.
Pedro II, depois se translada para o bairro da Luz, e por último para o Brás, para além
do rio Tamanduateí, fronteira natural entre o centro e a periferia da cidade ao longo dos
séculos. Neste bairro, constituiu a sua sede nacional e estadual, consolidando o poder
simbólico da denominação na cidade de São Paulo (Vide anexo: imagens de 7 à 9). O
processo de fixação da IURD em nossa cidade existe um personagem comum que
articulou a instalação dela nos anos oitenta, o Pastor Roberto Augusto Lopes
(MARIANO, 1.999)..
Isto nos leva a questionar se os membros que freqüentam as catedrais do Ipiranga e do
Brás tem a consciência da historicidade dos edifícios que os abrigam? A nossa resposta
é negativa e se fundamenta nos seguintes ítens:
I - Fora da biografia de Macedo produzida por Lemos e Tavolaro em 2007 (a primeira),
não encontramos nenhum dado sobre este fato em sites da Internet. Porque a memória
cultivada na instituição religiosa apenas olha para o futuro e nunca para o passado.
79
II – O pastor Roberto Lopes, autor do processo de constituição da Igreja Universal na
cidade de São Paulo, deixou a Universal em 1.987, retornando a Igreja Nova Vida, após
fazer sérias críticas a forma de como Macedo administra a IURD, como um líder
absoluto, e que a IURD de hoje, era diferente daquela que ajudou a fundar (época de sua
dissidência), pois a atual versão dela, estava alinhavada como um projeto empresarial,
mercantilista etc, as quais foram reproduzidas pela imprensa carioca do período.
Dentro deste contexto o nome de Lopes deixa de ser uma referência na construção da
IURD na cidade de São Paulo, para ser contemplada como “persona non grata” na
história da instituição.
III – A Igreja Universal como uma religião moderna valoriza o fenômeno da aminésia
social, o imediatismo cultural e não a preservação da memória de seus espaços
religiosos. Este fato é criticado por Halbwachs, como um mecanismo de alienação do
grupo humano. Portanto, não há interesse da instituição em comemorar tais fatos
geográfico-religiosos.
IV – Colabora para agravar este quadro de aminésia religiosa social da IURD em São
Paulo, a existência de um grupo religioso sem expressão ou vínculos com o local para
fixar lembranças comunitárias, fruto do transito religioso porque a maioria destes
membros não pertencem ao grupo de co-fundadores dos anos oitenta.
Segundo a reportagem da Folha de São Paulo em 08/08/2016, a IURD tem cerca de
vinte e um templos próprios em nossa cidade, ocupando no ranking Denominações x
Templos, a décima quarta posição. Mas como explicar a sua presença ostensiva na
cidade com tão poucos templos próprios? A adoção da estratégia da onipresença do
grupo em criar igrejas comuns em espaços privilegiados de acesso a fluxos humanos,
fazendo contratos de locação de determinados espaços19
. Pois segundo E. Macedo, a
Igreja Universal deve invadir a cidade, estar em todos os lugares, porque o espaço
religioso (igreja, catedral, templo) não são objetos de contemplação, mas deve refletir a
conquista – uma fé em ação (GOMES, 2.011).
A esta ideologia de Macedo associa-se a crença religiosa dentro dos grupos pentecostais
contemporâneos, ao qual pertence a Igreja Universal de que cada igreja, catedral são
19
Monteiro & Rodrigues, Folha de São Paulo 8/8/2.016, - www1.folha.uol.com.br/.../1800103-isencao-
de-iptu-a-templos-custa-22-cr.
80
espaços religiosos conquistados para Deus neste mundo (CAMPOS, 1.996). Por que a
IURD investiu na sede do Brás? Esta é uma questão que pode ser respondida através de
quatro fundamentos:
1 – A questão espacial:
A existência de localidades para a ocupação junto a periferia próxima, através do
processo de locação delas. No caso do bairro do Brás esta qualidade geográfica de
periferia próxima, constrói o aspecto de sua centralidade para a instalação da IURD.
2 – A questão econômica:
Ela complementa a questão espacial. O bairro do Brás vivencia um processo de
decadência industrial acompanhado por um processo de degradação geográfica. Pois a
região entre os anos vinte a sessenta do século passado era o reduto da área têxtil na
cidade. Como afirma Santos, as técnicas modernas tem a capacidade de construir novas
formas de ocupação e as fábricas desocupadas do Brás refletem este passado de
ocupação industrial paulistano (SANTOS, 1.996). Este processo de decadência
econômica e da desocupação favoreceu a existência de uma oferta de edifícios em
disponibilidade, que revela o baixo custo imobiliário, atraindo os grupos religiosos a se
instalarem nele.
3 – Avenida Celso Garcia:
A centralidade do bairro do Brás valoriza o aspecto do acesso ao mesmo através do
transporte coletivo e público, as linhas de ônibus que circulam entre a Zona Leste e o
Centro (Pque. D. Pedro II), as estações de Metrô Bresser-Brás, e a antiga estação
ferroviária mostra a vocação mercantil do mesmo. Todos os mecanismos citados por
nós favorecem a circulação dos diversos fluxos humanos de todos os lugares, de
diversas regiões da cidade, e de municípios próximos pelo bairro.
4 – A forte tradição geográfica religiosa pentecostal no bairro:
A história do bairro do Brás está associada a religião, e as avenidas Rangel Pestana e
Celso Garcia antes do século XVII, graças a procissão da padroeira da cidade de São
Paulo – Na. Sra. da Penha, entre as igrejas localizadas no distrito da Sé e no distrito da
Penha, onde as atuais vias, Rangel Pestana e Celso Garcia eram conhecidas pelo nome
de Caminho da Penha durante o período colonial.
81
Devido a tal fato, no século XVII foi construída uma capela em homenagem ao Bom
Jesus do Matosinhos por José Brás, a qual passa a participar deste trajeto religioso deste
corredor entre a Sé/Centro e a Penha//Zona Leste (SILVA, 2,014).
Assim, o antigo Caminho da Penha, torna-se conhecido como o Caminho do Brás,
depois à rua do Brás, criando por conseqüência um núcleo populacional em torno da
igreja que formará o bairro. Desta narrativa sobre a história do bairro no período
colonial, temos a memória religiosa do catolicismo romano na cidade de São Paulo.
Onde a Igreja como espaço religioso, sagrado do período colonial, ocupa papel
geográfico central na constituição dos antigos bairros paulistanos e sua autonomia
(freguesias), ficando em muitos casos conhecidas como igreja-matriz daquele bairro.
Com a fixação dos imigrantes italianos na cidade e no bairro, a religiosidade católica
romana agrega os santos trazidos da Itália por estes que se fixaram no Brás criando a
devoção e os templos dedicados a Na. Sra. de Casaluce – santa da comunidade
napolitana, e São Vitor Martir, santo da comunidade de Bari.
Posteriormente com o advento da República temos a fixação de trabalhos evangelísticos
protestantes históricos no bairro, contemplando-o como um campo missionário, pois a
maioria das denominações protestantes históricas estavam sediadas na região central da
cidade, “aquém rio Tamanduateí.” Podemos citar como exemplo, a história da IPB-
Brás, igreja centenária, fruto da ação da Igreja Unida, situada até hoje na rua Helvetia,
Campos Elíseos. Até esta comunidade tomar o atual domicílio, na região do Belém, ela
situou-se nas primeiras décadas do século XX no eixo urbano Rangel Pestana e Celso
Garcia. (SILVA, 2.014).
Esta comunidade calvinista ao utilizar o nome Brás reflete três aspectos geográficos
paulistanos: o primeiro, as suas origens, as raízes no bairro do Brás, segundo, o seu
translado histórico dentro das antigas fronteiras do bairro, que incluíam a Mooca, o
Belém, Tatuapé e o Pari.
82
Terceiro, a ideia de encontrar-se num bairro central que em determinado momento
ocupa o espaço de centro econômico junto aos outros bairros da Zona Leste da cidade
de São Paulo. Com o fluxo de novas denominações, este processo de domiciliar-se nas
antigas fronteiras do Brás, ou em ruas próximas ou distantes do eixo referencial viário
Rangel Pestana e Celso Garcia, se converterá numa prática, que Silva denomina como
Igrejas Satélites, como demonstra os mapas (SILVA, 2014, p. 46, 50):
Os mapas anteriores nos revelam o processo de geograficidade – a existência de
diversos grupos religiosos e seus respectivos espaços no bairro do Brás e adjacências:
católicos romanos e católicos ortodoxos, protestantes históricos e pentecostais,
83
carismáticos, espíritas kardecistas, grupos de matriz afro-brasileira, e não cristãos –
judeus e muçulmanos.
Mas, eles nos permitem fazer a leitura do processo de concentração ou de uma re-
aglutinização especializada ou setorizada da religião ao longo do século XX nesta
região, por parte dos pentecostalismos existentes, que Silva identificou em suas
pesquisas sobre o tema (SILVA, 2.014, p.14).
Não se trata de um processo isolado ou específico na questão religiosa da cidade de São
Paulo, ele ocorre em outros setores, tais como as ruas especializadas em diversas
atividades comerciais/produtos, exemplos: Rua Santa Ifigênia e adjacências, comércio
de material eletro-eletrônico e da área da informática. A Rua São Caetano, responsável
pela exibição dos vestidos de noiva e acessórios para casamentos em suas vitrines etc.
Neste caso, os produtos comercializados e os estabelecimentos comerciais servem como
referencia visual desta especialização para um determinado público consumidor destes
bens.
O mesmo se aplica aos fluxos imigratórios estrangeiros ao se fixarem em nossa cidade,
constituindo os denominados bairros étnicos. Exemplos, os italianos de diversas regiões
estabeleceram-se conforme a sua cultura regional. Os napolitanos no Brás e na Mooca,
os de Bari, no Pari, etc. Os lituanos (eslavos) na Vila Zelina, etc, Neste caso, o processo
de territorialização e de concentração geográfica identifica a colônia ali presente graças
aos diversos edifícios chaves desta comunidade, dentre eles, os lugares de devoção
religiosa – as igrejas católicas romanas, as igrejas católicas ortodoxas.
Entre os estudiosos deste comportamento urbano – concentração ou re-aglutinização
setorializada em São Paulo, podemos destacar as pesquisas construídas por Magnani
(1.996; 2012), elaborando a denominada teoria das “manchas.” Segundo ele, as
manchas são áreas urbanas que são identificadas geograficamente graças a
especialização visual destas, construindo uma determinada paisagem local, devido a
presença de determinados edifícios ou estabelecimentos e/ou por oferecer ao público
atividades e práticas tornando-se em referencia de tais usuários. Elas são responsáveis
em construir interações, relações e redes sociais.
Tomando este critério de definição da mancha de Magnani, podemos concordar com as
pesquisas de Silva sobre o bairro do Brás a partir do eixo urbano Rangel Pestana e
84
Celso Garcia, em se tornar num corredor “de grupos religiosos”, ou que a nossa mídia
denomina de: “corredor da fé”, “via da oração”, “o bairro da fé” e “o cinturão religioso
do Brás” etc.
Graças a presença de diversos estabelecimentos religiosos com os seus templos
construídos ou fixando domicílio em determinados edifícios degradados pelo tempo no
eixo citado, temos a oferta de atividades ou práticas religiosas que criam a interação
entre espaços religiosos e públicos que circulam pelo bairro.
Em conformidade com a leitura proporcionada por Silva (2014), contemplamos a
instalação da IURD no bairro do Brás nos anos oitenta como um ato de inserção no
circuito20
religioso concorrendo com os demais grupos já instalados na região.
Incentivando a partir dela, um processo de concentração de denominações religiosas de
origem pentecostal que interpretam a fixação destes no eixo viário urbano Rangel
Pestana e Celso Garcia no Brás como estratégia de visibilidade daquela fé. Promovendo
a imagem denominacional e do seu espaço religioso, sagrado etc, buscando desta forma
a adesão em massa dos diversos públicos, arrebanhando estes para os seus respectivos
templos sejam eles grandes, sejam eles modestos.
A ideologia da visibilidade geográfica justifica o ato de instalar a respectiva sede
administrativa neste espaço urbano da cidade de São Paulo. Para muitas lideranças
religiosas, estar na avenida das religiões ou no corredor da fé é adotar dois discursos
distintos e complementares entre si, o geográfico e o religioso. O geográfico abordando
a questão dos fluxos humanos: “aqui passa muita gente”, e o religioso: “hoje estar no
Brás é ser honrado” bispo Agnaldo – Catedral Carismática das Nações (SILVA, 2.014)
Segundo este vocabulário na cultura religiosa dos grupos pentecostais contemporâneos
– ser honrado é ser um utensílio ou vaso para a honra, ser instrumento para propósitos
elevados, é projetar a visibilidade frente ao próprio grupo e aos demais concorrentes, a
partir das qualidades do líder (SILVA, 2.014).
O processo geográfico religioso da setorialização do pentecostalismo reflete o
pluralismo existente dentro desta corrente evangélica, pluralismo que não pode ser
explicado de forma reducionista a questões de ordem política religiosa no interior das
20
Tomamos o conceito de circuito que Silva desenvolve em seus estudos: Circuito é o exercício de uma
prática e/ou a oferta de determinado serviço em estabelecimentos, e espaços, sendo reconhecido em seu
conjunto pelos usuários SILVA, 2014, p. 21.
85
instituições – as dissidências e divisões internas, porque ele é uma das variantes
explicativas.
Pois além dela temos como forma de explicação, o crescimento e a diversidade do
movimento pentecostal graças a sua flexibilidade em absorver nos locais onde se
instalou no mundo, a cultura e as tendências de determinadas sociedades humanas,
aclimatando-se a estas. E os efeitos da Modernidade que compõe e decompõe as
diversas crenças e práticas religiosas, permitindo que elas sejam adquiridas e não mais
herdadas.
III – A Era das Catedrais:
O processo de expansão geográfica da IURD obrigou o movimento religioso a vivenciar
etapas de institucionalização, do empreendimento ou movimento designado como
Igreja, a ser uma Igreja autêntica, legítima, fruto do dinamismo interno e das condições
históricas e sociais.
Em sua análise sobre a passagem de movimento para organização religiosa, Campos em
seus estudos aponta o período entre 1.980 e 1993 como aquele que criará as condições s
históricas de um primeiro processo de institucionalização (CAMPOS, 1.996). Citamos
como fato importante no período, as dissidências internas de Lopes e de Soares,
tornando Macedo em líder único da instituição religiosa.
O crescimento acelerado da Universal obrigou a Macedo a fazer a transferência de parte
de seu carisma inicial para a organização, adotando a divisão política administrativa da
IURD em regiões episcopais dentro do país, e com ela a nomeação de novos bispos. Em
seu depoimento a Folha Universal em 1.992, Macedo justifica este processo de
descentralização necessária devido ao crescimento e a expansão de suas fronteiras
(GOMES, 2.011, p. 55). A fixação de Edir Macedo nos EUA a partir de 1.986 dentro de
um projeto de inserir a IURD na fase da internacionalização levou-o em 1.993 a
constituir um colégio episcopal dividindo com este parte do seu poder a nível
internacional e nacional.
Tal período consolida estas etapas de institucionalização que a IURD vivenciou com a
mediação do seu bispo primaz que pode ser visto como uma liderança religiosa que
concilia o carisma com a burocracia (CAMPOS, 1.996, p. 346). E a ação de Macedo
tem um objetivo, controlar esta nova realidade religiosa que está em construção.
86
Dentro deste novo quadro de realidade religiosa que a Igreja Universal do Reino de
Deus vivencia, há um processo de interação religiosa social organizado, com o qual se
procura desconstruir a imagem negativa da Igreja Universal como um grupo ou
movimento religioso autônomo.
Pois tornar-se numa instituição implica em tornar-se numa agencia religiosa, ser uma
religião e com isto construir doutrinas, normas, regras, uma memória, uma tradição e a
transformação do público/fiéis, de clientes em membros.
A Era das catedrais não começa no Brasil, começa com um mega-templo construído
fora do país, na cidade de Joahnesbuego, na África do Sul em 1.996 (GOMES, 2.011).
No caso brasileiro ela começa com a tragédia em Osasco conforme a entrevista
concedida por Macedo a Lemos e Tavolaro. Nela, o bispo Macedo comenta sobre o
triste fato do desmoronamento do teto da IURD em 1998, na cidade de Osasco, grande
São Paulo, o qual teve vítimas fatais (TAVOLARO, 2.007). Este acidente obrigou o
episcopado a reavaliar os planos de expansão da instituição dentro e fora do país,
abrindo mão do processo de locação de espaços desocupados para adquiri-los e depois
reformá-los ou adquiri-los e mais tarde demoli-los e construir em seu lugar um templo
dentro do padrão arquitetônico neoclássico.
A construção das catedrais implicou em maior conforto para o povo, em investimentos
em grandes espaços (GOMES, 2.011). Assim a IURD começa a ir para além da prática
em ocupar os espaços constituídos sem o objetivo de culto religioso, cinemas, galpões
industriais, supermercados, teatros etc. (GOMES, 2.011,). Esta fase consolida tais
mudanças mencionadas anteriormente com a construção das catedrais modernas e
luxuosas21
.
A política de construção das catedrais na denominação reflete:
A – As alterações no público que freqüenta a Universal, ela não é uma denominação
evangélica pentecostal que se restringe a atender apenas os extratos mais pobres da
população do país. ela agora atende as classes médias urbanas, grupos pertencentes às
21
O termo catedral é uma expressão geográfica, eclesiástica do catolicismo romano, apropriada pela
IURD O termo catedral tem a sua origem no termo latino: cátedra,(0cadeira) que a cultura religiosa
católica romana associará ao seu ocupante, o bispo – a cathedralis ecclesia, Mais tarde o termo catedral
estará associado a ideia geográfica da diocese, a principal igreja de uma região administrada pela Igreja
através de um bispo (BELING, 2.014,p.8) .
87
mesmas: atletas, artistas, empresários, profissionais liberais etc. Logo, a função de um
destes mega templos é absorver públicos heterogêneos maiores (GOMES, 2.011).
B – A conquista da adesão de massa e de visibilidade pública, do grupo religioso com
reconhecimento social, exibindo o seu poder no campo religioso e criando raízes nos
diversos grupos de nossa sociedade (GOMES, 2.011; TAVOLARO, 2007).
C – A conciliação do ideal religioso de permanência com a reprodutibilidade de uma
memória através de uma arquitetura padronizada (GOMES, 2.011)
D – Ser uma igreja autêntica, legítima e não mais uma seita protestante que usa o título
de igreja.
A construção dos mega-templos – as catedrais desta denominação religiosa no Brasil
tiveram início em Curitiba, depois Santo Amaro/São Paulo, São Caetano do Sul, a partir
da segunda metade dos anos noventa. Posteriormente, a IURD-Brás (Vide Anexo:
imagens 9 e 10), no início do ano 2000, sendo construídos em cidades brasileiras,
principalmente nas capitais e no exterior, conforme a entrevista de Macedo a Lemos e
Tavolaro:
“O passo agora é maior. A ordem é erguer um templo de grande porte como
esse em cada capital de país aonde a Universal chegou. Já existem dezoito
áreas compradas em lugares como Piauí e Sergipe, no Nordeste; Acre e
Rondônia, no Norte brasileiro; Miami, nos Estados Unidos; Uruguai e Chile,
na América do Sul; Panamá, Jamaica, Costa Rica e El Salvador, na América
Central; além de Nigéria, Port Elizabeth, Costa do Marfim e Malawi, na
África. E catedrais estão quase em funcionamento em sete cidades brasileiras
e em outros três países: Costa Rica, Botsuana e África do Sul. Há terrenos
com projetos em execução na Itália, Romênia e França. A catedral de Paris
será erguida para mil pessoas até o final de 2008.” (TAVOLARO, 2.007, p.
204, 205)
Tomando o exemplo nacional foram construídas em todo país, quarenta catedrais, destas
catorze estão em São Paulo, onde havia novecentas igrejas em todo o Estado Estes
dados contidos na entrevista concedida em 2007, revelam a importância de São Paulo
nas estratégias da Igreja Universal do Reino de Deus, tornando-o este no centro da
atuação da instituição religiosa no Brasil.
Elas, as catedrais são construções imponentes localizadas nas principais avenidas das
capitais e cidades mais importantes do país e do mundo e reforçam a tese de Magnani –
que estes templos imponentes funcionam como ancoras de vários processos
econômicos, geográficos e sociais. (MAGNANI, 1.996).
88
Estas catedrais fazem parte do discurso da Igreja Universal como um grupo religioso
consolidado socialmente, porque no interior desta se encontra um processo de
institucionalização: a adoção do colégio episcopal internacional e nacional na tomada de
decisões junto com Macedo, que é um mecanismo de descentralização do poder
acompanhado pela nomeação de novos bispos.
Elas, as catedrais são vistas pelo iurdiano como a reação social, visível do seu grupo
religioso como sobrevivente às adversidades que lhe foram impostas de diversas
maneiras nos anos noventa– acusações e perseguições
Mas a construção das catedrais nas principais cidades escolhidas pela Universal revela a
geração de centros ou de pólos de poder geográfico e religioso desta denominação
pentecostal dentro do país. A partir de 1.998, as diversas catedrais construídas
representarão o conceito de centro geográfico do poder e as demais igrejas constituídas
fora deste espaço, as denominadas igrejas comuns no jargão da IURD representarão a
periferia destes, construindo dentro da geografia da Igreja Universal do Reino de Deus,
a oposição assimétrica, binária entre o centro/catedral e a periferia/igreja comum. Pois
dentro da leitura geográfica centro e periferia formam a combinação desigual entre áreas
(MOREIRA, 2.014).
Porque a relação geográfica entre o centro e a periferia é uma relação de autoridade e
dependência e de interação entre elas. A catedral é uma igreja que foi elevada a uma
posição geográfica de poder numa determinada localidade. Logo, a relação religiosa
entre as catedrais e as igrejas comuns encontra-se construída sobre aspectos políticos –
centro/domínio, periferia/submissão. E a presença de Edir Macedo num catedral reforça
este status geográfico da cultura religiosa dentro da Igreja Universal. Por exemplo, o
bispo Macedo esteve presente na inauguração da catedral da Universal em Vitória-ES,
uma igreja luxuosa construída com cinco mil poltronas (TAVOLARO, 2.007).
A expansão da IURD nos centros urbanos do país e fora dele, revela a existência de
diversas periferias que se interligam ao centro, pois as realizações nas periferias são
captadas pelo centro como suas, incorporando-as.
Com a inauguração do templo de Salomão em São Paulo temos a ocorrência do
fenômeno da coexistência entre as diversas periferias, por exemplo, as catedrais do
Brás, de Santo Amaro (Vide Anexo: imagens 11 e 12) e de São Caetano se tornaram em
89
pólos secundários de poder em suas cidades e um centro de poder – o templo
inaugurado em 2.014 no bairro do Brás.
Segundo Tavolaro o Estado do Rio de Janeiro tinha no final dos anos noventa cerca de
setecentos espaços religiosos, perdendo apenas para o Estado de São Paulo com
novecentas igrejas.
Mas não tinha uma catedral representativa na capital carioca à altura da história do
grupo religioso. O que faz Macedo? Convoca o grupo de engenharia da Igreja Universal
do Reino de Deus, responsável pela construção das novas catedrais e reformas nas
igrejas, para construírem um mega-templo na cidade, a catedral mundial de Del
Castilho, que se situa a cinco quarteirões da Igreja Universal do bairro da Abolição (ex-
sede nacional, e hoje sede regional). Esta mega-igreja foi apelidada pela imprensa local
como o “Maracanã da Fé” (TAVOLARO, 2007).
A catedral mundial da fé, ou o templo da Gloria do novo Israel é o antecessor do
complexo iurdiano localizado no Brás, onde está situado o templo de Salomão. E
porque afirmamos isto? Trata-se de um templo gigantesco capaz de reunir cerca de
dezoito mil pessoas no culto dominical matutino e utilizou em sua construção pedras
trazidas de Jerusalém - Israel (GOMES, 2.011). Nele se construiu além do espaço
sagrado, outros espaços profanos: a praça de alimentação, o centro ou o salão de
convenções para a formação de novos pregadores, bibliotecas, berçários, estúdios de
rádio e de TV, sala de projetos sociais, estacionamento para setecentos e vinte e cinco
carros e helioporto.
Para fins turísticos há nele o museu da Universal através de documentários, imagens,
painéis e vídeos, além do CCJ – Centro Cultural Jerusalém e uma réplica do Kotel, do
muro das lamentações em Israel, com pedras importadas deste país (TAVOLARO,
2.007: GOMES, 2.011).
Mas para Edir Macedo em sua entrevista, o mega-templo construído como sede mundial
na cidade do Rio de Janeiro, com o nome ufanista de Templo da Glória do Novo Israel
lhe é pouco, em sua audácia ele quer mais - o futuro templo de Salomão segundo as
observações de Tavolaro e das palavras do bispo Edir Macedo:
Em um dos andares da catedral de São Paulo, Edir nos leva para conhecer o
seu mais audacioso empreendimento dos últimos tempos. Um projeto
guardado a sete chaves. Caminhamos alguns passos até o fundo de um salão
90
de reuniões. Está lá, num dos cantos. A maquete do mais arrojado templo na
história da Igreja Universal.(...) A ideia surgiu na última visita de Edir e dos
demais bispos a Jerusalém. Segundo o bispo Macedo, foi inspirado no
famoso "templo de Salomão" - referência à igreja idealizada por um dos
personagens bíblicos mais conhecidos da história, imortalizado por sua fé e
riqueza.
(...) Será a mais bela das nossas igrejas no mundo inteiro, diz o bispo. O
templo da glória de Deus no Brasil.”(TAVOLARO, 2.007, p. 212) .
2.3 – O Templo de Salomão:
O caderno cotidiano da Folha de São Paulo trouxe a seguinte manchete: “Catedral da Sé
é o vigésimo primeiro maior templo da cidade”. Esta edição publicada em oito de
agosto do ano de dois mil e dezesseis, trouxe como tema a religião na cidade de São
Paulo, a partir de dados quantitativos pertencentes ao cadastro de imóveis da prefeitura
da cidade. Tais dados disponibilizados permitiram a identificar a realidade – a dimensão
arquitetônica em área construída dos maiores templos dentro da cidade.
Neste ranking, a IURD encontra-se em primeiro lugar com o Templo de Salomão,
situado no complexo do Brás. Ela ainda aparece em mais duas posições, a terceira com
a catedral da Igreja Universal do Reino de Deus em Santo Amaro, que é uma sede
regional e a catedral da Universal no bairro do Brás, que é a sede estadual.
Templo e catedrais implicam na nova construção de uma relação hierárquica na
geografia: o Templo de Salomão como espaço religioso passa a ocupar a posição de
centro, de ascendência sobre os demais espaços religiosos, sejam catedrais, sejam
igrejas comuns situados nos bairros da periferia, tornando-se deste modo, no espaço
religioso de maior destaque, privilegiado e as catedrais que antes dele exerciam a função
de centro do poder religioso, são inclusas agora na periferia, como espaços secundários
do pode político da instituição. E como centro, o Templo presente no complexo do Brás
vai eternizar-se como o principal espaço religioso no topo da hierarquia geográfica da
IURD, a sede nacional.
Esta hierarquia geográfica, política, religiosa, influencia via marketing a mentalidade
dos fiéis. Nela, o Templo de Salomão não é apenas o centro do poder político da Igreja
Universal do Reino de Deus, como também o espaço religioso, espiritual mais sagrado
do que as catedrais e as igrejas comuns na periferia.
Isto fica perceptível no marketing, nos programas exibidos pela instituição na mídia
televisiva que fazem deste espaço religioso em relação aos demais espaços que
91
coexistem com ele na nossa cidade. A relação Centro/Templo de Salomão,
Periferia/Catedrais e Igrejas comuns materializa-se nestes últimos, sendo isto possível
observar em nosso trabalho de campo junto à catedral de São Caetano do Sul e a igreja
comum, a Igreja Universal em Vila Diva.
Foi possível perceber que junto à parede principal destes espaços religiosos, próximo ao
altar ou púlpito, há a fotografia ou a imagem do Templo de Salomão associada ao texto
bíblico de II Crônicas, capítulo sete, versículo quinze.
(Imagem do Templo de Salomão presente nas Catedrais e nas Igrejas Comuns)
O que temos acompanhado neste processo geográfico dentro da grande São Paulo: são
os espaços religiosos empoderados fora do bairro do Brás, como o caso da Catedral da
Universal em Sto. Amaro que já teve status de sede estadual e nacional buscando
alternativas para não perder a sua importância geográfica e religiosa agora como um
pólo religioso periférico, torna-se num espaço ou lugar especializado na libertação
humana da dependência química dentro da mídia televisiva da IURD, atraindo para si os
fluxos de diversos lugares do Brasil com esta necessidade..
Logo, o Templo de Salomão é o ícone do investimento de trinta anos da Universal
dentro da capital paulista.
92
A foto anterior revela-nos a relação cartesiana construída entre: criatura/objeto, a
maquete do templo, e depois o templo de Salomão, e o criador/sujeito, Edir Macedo. A
maquete do templo na foto implica na reprodução de uma autenticidade. Logo, o templo
construído em São Paulo é considerado melhor do que os seus antecessores em Israel,
tomando a versão da maquete como modelo. Logo, o templo construído no Brás é uma
cópia única na paisagem urbana (GOMES, 2.011).
Ele não tem concorrentes arquitetônicos ao seu redor com as mesmas dimensões de
altura, largura, área construída etc, ainda que fossem construídos para outros fins, ou
espaços religiosos de outros grupos que ofusquem o seu brilho, a sua monumentalidade,
a sua opulência, a sua visibilidade local, especialmente no período noturno.
foto extraída do site: www.tripadvisor.com.br
93
Sendo também uma cópia única entre os diversos templos construídos pela Igreja
Universal do Reino de Deus – as catedrais estaduais, e o Templo Mundial em Del
Castilho/Rio de Janeiro.
Para Macedo o templo de Salomão descrito nos livros de II Crônicas e de II Reis é visto
como uma obra de engenharia divina no mundo, na qual há a participação de elementos
humanos – a tese da parceria Deus-Homem, portanto uma obra de Deus e não humana.
(GOMES, 2011, p. 24, 26, 156). A opinião construída pelo bispo Macedo pode ser
explicada por Mourão (2.013, p. 76, 83) desta forma:
(...) o templo é um arquétipo ou modelo divino, transcendente a ser
construído (imitado ou repetido), cuja planta é elaborada pelo próprio Deus,
portanto ganha este status de sagrado, de santo, porque esta planta foi
construída pela deidade e dada ao Homem, a uma comunidade específica
(MOURÃO, 2.013, p. 76, 83).
Para nós, o templo construído por Salomão é a referência geográfica e religiosa dos
antigos hebreus e depois judaítas antes do exílio na Babilônia. O segundo templo
construído pelos judeus após o fim do exílio na Mesopotâmia constitui-se num centro
cultural religioso importante para a etnia, sendo esta última residente em dois espaços
geográficos distintos, a diáspora ou galut, e o distrito judeu: Eretz Israel, na antiga
Palestina sob domínio Medo-Persa, Macedônico (Sírio-seleucida) e Romano. Esta é a
visão que os judeus do século XIX, especialmente os sionistas culturais formado por
indivíduos laicos, construíram sobre este segundo edifício religioso, destruído pelos
romanos no século I EC.
E o templo construído no complexo junto ao bairro do Brás, inaugurado em 2014? Edir
Macedo compartilha sobre o mesmo, a opinião sobre os antigos templos construídos,
em Jerusalém, por Salomão e pelos judeus do pós exílio. Portanto, aplicável ao edifício
construído no complexo do Brás: um projeto divino dado aos Homens, que na
linguagem religiosa significa sagrado. Mas ao compararmos os dois prédios
perceberemos que o templo de São Paulo é maior do que o templo de Jerusalém, em
todas as relações métricas apresentadas22
.
22 As dimensões do templo em Jerusalém foi extraída do site do Ministério Seara Ágape, consultado em
08/01/2016: http://www.searaagape.com.br/estudoevangelicosobreotemplodesalomao.html
94
TEMPLOS: Jerusalém x São Paulo
Templo em Jerusalém Templo em São Paulo
Altura Comprimento Largura Altura Comprimento Largura
15,54 m 31 m 10,36 m 55 m 126 m 104 m
Portanto, seriam diferentes colocando em dúvida a autenticidade e a fidelidade desta
cópia ou réplica junto ao seu original (maquete) e com esta dúvida a argumentação de
Macedo que este edifício na América do Sul é uma obra de engenharia divina ou um
projeto dado pela deidade ao Homem. Para superar esta controvérsia métrica entre os
edifícios, Macedo utiliza o texto do profeta Ageu 2:9, associado à construção do
segundo templo, dando-lhe uma interpretação pessoal a expressão a glória dele será
maior do que a da primeira casa, a sua leitura e interpretação valoriza um edifício maior,
mais luxuoso do que o seu antecessor descrito na bíblia, e isto é percebido na
materialização do prédio.
Ainda que se justifique com a interpretação do texto do profeta, as medidas maiores
demonstram que este prédio construído não é uma cópia fiel do seu original, e a sua
argumentação equivocada, sendo este um projeto humano.
O complexo de edificações construídas no bairro do Brás, favorece-nos a uma
diversidade de leituras, seja da memória religiosa, seja da geografia da religião.
Uma das questões interessantes e escolha do Templo de Salomão, que pode ser
respondida pela teoria de Halbrudachs sobre a memória religiosa.
Toda crença religiosa tem a carência da legitimidade no meio social e esta é possível
quando se invoca o apoio ou o suporte de uma tradição religiosa anterior, pertencente a
um passado longínquo (Hervieu-Leger, 2004).
Logo a escolha do construtor mítico e do edifício modelo procura evocar uma
continuidade - o monoteísmo, Abraãmiro, o qual anceia-se na revelação escrita, mas
narrativas da Bíblia Hebraica (Hervieu-Leger, 2009 – p. 230), com isto a IURD
construiu sua memória religiosa numa linha de crença - judaísmo antigo.
O Templo de Salomão é uma referência religiosa da antiguidade oriental, de um passado
distante de uma narrativa bíblica associada ao Judaísmo e a história do antigo Israel.
95
A sua construção entre 2010 e 2014, em São Paulo, nos permite lê-lo não como fruto de
um processo de ressurreição / de um passado ou tradição religiosa (Hervieu-Leger,
2009)
Mas entendê-lo como um resíduo religioso pertencente a um grupo humano concreto -
judeus que foi reativado apropriado por outro grupo - a IURD.
O Rei Salomão é um personagem mítico da história Judaica antiga que tem diversas
leituras, sobre sua figura ninguém discorda que ele foi o monarca importante para a
história política de Israel na antiguidade.
Ao ponto dele ser considerado como o ícone de governante de sua época por causa de
seu poder, riquezas e saberes.
Segundo Halbwachs, existem três elementos importantes na construção da memória
religiosa: as datas, os aspectos geográficos sagrados e as biografias (Rivera, 2010).
O episcopado iurdiano escolhe a Salomão por causa da sua biografia e por que esta
encontra-se associada além espaço sagrado judeu, a cidade de Jerusalém no século X
AEC. Nela encontramos os motivos da escolha.
Por ter sido um gestor “tocador” de uma grande obra pública, fato político comum ao
termos o currículum e ao marketing dos Reis da antiguidade oriental.
Valoriza-se desse modo a carreira do rei como um empreendedor que iniciou e concluiu
no seu governo o templo em Jerusalém.
Além Deste fato, a IURD escolheu para si a figura de Salomão, não por sua relação
mística com a Cabala Judaica ou pela sua produção intelectual, racionalismo presente
em cantoria e provérbios, mas devido ao poder econômico dele, a sua prosperidade
material descrita na Bíblia e em lendas legitimando a ciência desta instituição na
teologia da prosperidade.
E o templo construído no Brás, um reflexo material desta crença através da opulência
Logo o edifício e o seu expoente mítico constrói a ponte entre passado distante e o
presente por serem elementos pertencentes a força de uma tradição (Camurça, 2003 –
pág. 98)
96
As relações métricas comparativas entre os dois templos, fornecem-nos a leitura de uma
Bíblia – a altura, via geográfica da religião. (Segundo Mourão 2003 P 98).
Segundo Mourão (2.013, p. 98), “quanto mais alto for o templo mais próximo esse
estará da ideia das antigas montanhas cósmicas, responsáveis pelo elo de ligação entre o
Céu (espaço espiritual, sobrenatural) e a Terra (espaço material, natural).” Portanto, Céu
e Terra são dois espaços geográficos diferenciados por excelência e lidos como opostos
binários nos estudos da geografia da religião. Logo, todo o templo construído guarda
esta relação cultural religiosa como espaço intermediário e representativo entre dois
mundos binários, e isto fica esteticamente identificável no meio urbano, ao dotarmos o
espaço religioso de acessos que o ligam com o meio profano/público, que podem ser
desde o mais simples deles, um contra piso acima do nível do terreno em forma de
degrau, pela presença de vários degraus, formando uma escada, ou por uma rampa
inclinada, todos eles sós, ou combinados entre si criam um processo de diferenciação
com o espaço considerado comum, natural ou profano.
E o Templo de Salomão dentro do complexo não foge as características citadas por nós,
sendo o seu acesso físico externo formado pela combinação de degraus, de escadas e de
rampas que fazem a separação entre o privado/sagrado e o público/profano. Como as
fotos abaixo deixam em evidencia as escadas lateral e central na entrada. Logo o
Templo se revela como um ambiente sagrado, portador de uma realidade superior à
humana.
Fotos extraídas dos sites:www.pragmatismopolitico.com.br/www.colegioweb.com.br652 × 408
Este espaço religioso construído e inaugurado no Brás é um mega-templo que se
encontra na lista dos maiores espaços religiosos em área construída dentro da nossa
cidade. Ele é monumento imponente na metrópole, esta forma de o contemplarmos é
afirmada pela presença dos outros espaços ao redor do mesmo no bairro do Brás, os
97
quais são em sua maioria formada por espaços degradados ao longo do tempo que
pertenceram ao passado industrial paulistano relacionado ao setor têxtil até os anos
sessenta do século passado.
Ele, o templo pode ser lido por nós de diversas formas, tais como:
A – Um espaço religioso que pertence ao grupo de réplicas de temática bíblica ou extra-
bíblica (arqueológica/histórica) que estão neste século reproduzidas pelo Homem.
Exemplos, a Arca de Noé, construída em tamanho real pelo carpinteiro holandês Joham
Hulbers e a réplica do antigo templo de Baal que se encontrava na cidade síria de
Palmira, o qual foi destruído pelos integrantes do Estado Islâmico.
B – Um espaço não aurálico. Isto é, um local onde ocorre a valorização do espaço em
detrimento do aspecto temporal (GOMES, 2.011), portanto ele não tem aura por ser
uma cópia, uma reprodução. Dentro deste contexto, o templo como um espaço religioso
não aurálico agrega a ideia de ser um espaço desterritorializado, construído fora do
contexto geográfico original do mesmo – Eretz Israel. E devido a estas questões, a
Universal e o templo são alvo de críticas de grupos religiosos judeus conservadores e
ortodoxos no mundo.
C – Uma referencia de ordem cultural, histórica, geográfica e turística dentro do espaço
urbano paulistano. Importante para se conhecer a cidade de São Paulo (GOMES, 2.011)
Segundo as estatísticas da Igreja Universal do Reino de Deus por ele circulam
mensalmente mais de quatrocentas mil visitas, conforme a Folha Universal em sua
reportagem: Porque visitantes de todo o mundo vem ao Templo de Salomão? Referente
a publicação de 11/09/2.016, p. 4..
Devido a esta característica o complexo foi premiado por grupos relacionados com o
turismo na cidade de São Paulo, foi objeto de palestra no Anhembi, em fórum nacional
relacionado ao turismo religioso23
.
E recebeu a visita de autoridades púbicas estaduais relacionadas a área citada e
encontra-se no cadastro turístico para visitações junto a prefeitura da cidade de São
Paulo24
.
23 Reportagem: “Templo de Salomão é homenageado por incentivar o turismo” ref. A Folha Universal,
04/10/2.015, p, B – 10, B-11.
98
Para nós, o complexo do Brás e os seus edifícios é portador de duas leituras, uma a nível
externo e outra a nível interno. A leitura à nível esterno, aborda um espaço identificado,
reconhecido e distinto dos demais prédios ao redor dele no bairro, porque o complexo
está associado às diversas experiências humanas. (GOMES, 2.011).
Mas a nível interno temos a seguinte leitura: o complexo do Brás é uma diversidade de
espaços ou lugares distintos e fragmentados (LEFEBVRE, 2.000), são espaços e
subespaços, lugares concebidos, construídos pela Igreja Universal para mostrar porque
ela é diferente dos demais grupos de nosso campo religioso, sendo este último, (o
templo de Salomão) a diferença de ordem imediatista, presencial, o agora em nossa
sociedade.
Estes edifícios incluindo o seu espaço religioso, o santuário e o templo, são formas de
produção social do espaço, que vivencia três etapas distintas: como um lugar concebido,
percebido e vivenciado, conforme as teorias desenvolvidas por Lefebvre (2.000) e por
Schimid (2.014).
Definimos o espaço concebido como espaços/lugares produzidos e organizados pelo
Homem, ora através da economia, ora através da política, e incluímos nesta definição
ser organizado pela religião. Independente de qual seja o agente que o organiza, este
espaço ou lugar é portador de uma história, portanto sujeito as leis do tempo, tornando-
se finito, pois este aspecto é uma característica que a Humanidade lega a toda sua
produção material.
Concordamos com o pensamento construído por Lefebvre de que o Templo de Salomão
é um espaço concebido porque ele é fruto de uma ideologia religiosa e de um saber
técnico – a arquitetura/construção civil.
Porque afirmamos que o templo é um espaço ou lugar concebido? Esta nossa leitura tem
como fundamentos: a entrevista de Macedo dada a Tavolaro em 2.007, onde ele já
define que o templo será construído em São Paulo, no bairro do Brás.
24 Reportagem:-”Um dos principais marcos turísticos do Brasil”: visita dos secretários do Turismo e do
Esporte, Lazer e Juventude do Estado de São Paulo ao Templo de Salomão”, FU, 12/01/2016, p. B-10, B-
11.
99
A cosmovisão que Edir Macedo construiu acerca do seu grupo religioso na sociedade,
as razões deste projeto dentro de uma linguagem religiosa, a concorrência dos grupos
cristãos já instalados na cidade, que tem um espaço religioso de referencia dentro da
cidade.
O nosso primeiro argumento é a cosmovisão do grupo que Macedo lidera num discurso
deste no Rio de Janeiro, durante a comemoração do jubileu de prata (vinte e cinco anos)
da fundação da Universal:
“A Igreja Universal do Reino de Deus não nasceu para ser mais uma igreja,
mais uma denominação, porque nós não aceitamos ser mai um, mais uma
entre milhões de crentes que estão aí afora. Tem que haver uma diferença,
que esta diferença apareça agora.” (pregação de E. Macedo em 07/07/2.002 –
GOMES, 2.011, p. 45).
No dia nove de Julho, o bispo Macedo efetuou outro discurso com o mesmo teor de
conteúdo, reforçando com ele, a ideia de que a Universal é uma instituição, uma igreja
consolidada. (GOMES, 2.011)
Construir o complexo, principalmente o templo tem o sentido de afirmar quem é a
IURD no campo religioso e na nossa sociedade – ela não é uma denominação qualquer,
ela não quer ser mais uma igreja evangélica dentro do país, da mídia etc. ela não quer
ser é mais uma, ela quer fazer a diferença aqui e agora.
Dentro deste raciocínio de grandeza, de alta estima, ser mais um é construir uma igreja,
mas ser o diferente é construir mais do que uma igreja, ou uma catedral, mas uma mega-
igreja, o Templo de Salomão.
Se pensarmos nas dimensões métricas, na área construída do templo, ela coloca diversos
ícones religiosos em condição de inferioridade tais como, a basílica de Aparecida do
Norte, situada no eixo viário entre São Paulo e Rio de Janeiro, no vale do Paraíba
paulista, o Cristo Redentor na cidade do Rio de Janeiro, competindo assim com a Igreja
Católica Romana é uma forma de Edir Macedo e a Universal fazer a diferença, e uma
diferença imediatista, presencial – agora.
O segundo argumento é o discurso de Macedo para o episcopado em São Paulo, ao qual
não temos data e através deste ele deixa evidente que o Templo será construído em São
Paulo:
“Vocês fiquem sabendo que nós já estamos nos preparando para a construção
do templo cujo formato é o mesmo que foi construído por Salomão – o
100
templo de Salomão. (...) Nós construímos e forramos a Catedral Mundial da
Fé, no Rio de Janeiro com as pedras trazidas de Jerusalém. Nós vamos
construir aqui [em São Paulo] uma catedral para dez mil pessoas e vamos
revesti-la com as mesmas pedras.(...) Nós vamos fazer para a glória de Deus,
porque vocês [(de São Paulo]também merecem(, vocês merecem. Nós
construímos assim no Rio de Janeiro porque não vamos construir aqui em
São Paulo? (...) Porque o modelo vai ser exatamente o modelo externo que
foi feito em Jerusalém que Salomão construiu e que Herodes mais tarde veio
reconstuir. Então esse é o templo que vamos construir (GOMES, 2.011, p.
24-25)
Segundo este raciocínio, o Templo de Salomão é o meio da Igreja Universal Reino de
Deus marcar sua presença espacial e religiosa dentro da cidade de São Paulo, porque
quase todos os grupos religiosos cristãos: católicos, protestantes e pentecostais,
construíram ao longo do tempo as suas catedrais – edifícios que simbolizam a sua
presença religiosa dentro do espaço urbano.
E o edifício construído é a sede, por situar-se no espaço de maior importância da vida
econômica e política nacional, estes prédios são a marca deste grupo via arquitetura
dentro da cidade. Por causa disto, a cidade de São Paulo é considerada como a cidade
das catedrais de vários grupos cristãos, No caso católico temos, a catedral metropolitana
católica ortodoxa Antioquina da Vila Mariana, inaugurada em 1.954, tem a sua
construção inspirada na basílica de Santa Sofia, localizada em Istambul, Turquia. Trata-
se de um grupo humano que tem a sua cultura religiosa ancorada no passado longínquo
(Idade Média), e no caso deste espaço religioso ou templo, ele está ancorado
diretamente no grupo de referencia concreto (Vide Anexo: Imagens 12 e 13). E a
catedral metropolitana da Sé, localizada no centro da cidade, junto ao marco zero da
mesma (Vide Anexo, 14).
No caso protestante temos as seguintes catedrais: Igreja Presbiteriana Independente,
localizada no centro da cidade, junto à rua Nestor Pestana (próximo da Rua da
Consolação), a da Igreja Metodista, situada na avenida Liberdade, no bairro central da
Liberdade. Sem mencionar anglicanos e luteranos que tem estes seus espaços
localizados fora do antigo centro, em bairros da periferia de São Paulo.
Dentro desta lógica geográfica religiosa paulistana, a IURD não tinha um templo capaz
de concorrer ou de rivalizar com tais edifícios que estão instalados na cidade a muitas
décadas, desde o século passado. Fazer a diferença aqui e agora é construir um edifício
que represente a Igreja Universal do Reino de Deus num bairro central, como é o caso
da Igreja Presbiteriana Independente e da Igreja Metodista.
101
Mas que seja um edifício dentro da cidade, que se torne num marco como são até hoje,
as catedrais católicas, ortodoxa e romana (imagens 12 e 13). Em outras palavras, o
templo construído e inaugurado em São Paulo é a forma de como este grupo humano,
portador de crenças, costumes e fé afirma a sua identidade religiosa como Igreja
(MODES, 2.007).
A entrevista publicada em 2.007, três anos antes do início da construção, Macedo deixa
claro que o Templo será construído na cidade de São Paulo, e no bairro do Brás. Porque
neste bairro? Segundo o bispo Macedo a escolha tem o aspecto da geografia urbana, um
bairro popular, ou seja, a questão associada aos fluxos humanos no mesmo.
A resposta de Macedo tem relações com os estudos que Silva (2.014) fez sobre este
bairro central, devido a alta concentração e grupos religiosos evangélicos, debruçando-
se sobre a mancha pentecostal no eixo viário Rangel Pestana e Celso Garcia, pois o
endereço do templo, é este eixo viário por onde circula os diversos fluxos humanos pelo
bairro, e a questão da visibilidade da instituição naquele espaço urbano, transferindo a
sua matriz ou sede para esta localidade: o Templo é a sede nacional da IURD.
E último argumento de que ele é um espaço concebido é o discurso sobre o projeto a
partir de uma linguagem religiosa:
(...) Ele (Macedo) conta que, durante uma viagem de peregrinação à Terra
Santa, comentou com os outros bispos o desejo de que todo o povo da Igreja
Universal pudesse, pelo menos uma vez na vida, pisar no chão e nas pedras
que um dia Jesus pisou. Após esse comentário, ele refletiu: “Se eu não posso
trazer todo o povo para cá, então vou levar pedaços desta terra para eles.”
Depois deste dia, a ideia tomou forma e no mês de julho de 2010 a grande
obra, projetada nas referências bíblicas do Templo do passado, foi anunciada.
(http://centrodeajuda.pt/evento/o-templo-de-salomao - Universal. Org. com)
O texto acima é o que chamamos de discurso sobre o espaço. Nele temos o registro do
Homem – Bispo E. Macedo como o sujeito principal da história da IURD, bem como do
Complexo construído no bairro do Brás, e em especial do Templo de Salomão.
Segundo Lefebvre (2.000) e Schimid (2.014) todo espaço concebido é primeiramente
um espaço imaginado, intencionalizado, pensado, isto fica evidente no discurso de
Macedo “Se eu não posso trazer todo o povo para cá, então vou levar pedaços desta
terra para eles”.
A continuidade do texto relata-nos a passagem do espaço imaginado/pensado para o
espaço concreto/físico com o uso de um saber técnico – arquitetura, e de uma ideologia
102
religiosa: as crenças que a Igreja Universal do Reino de Deus alimenta neste projeto. O
mais importante deles nestes nossos estudos é o carisma da função que E. Macedo
exerce sobre o grupo religioso, isto é fácil em perceber lendo a forma de como os bispos
escrevem sobre o seu líder. Alguns deles afirmam que o bispo primaz é um Homem
iluminado por Deus (GOMES, 2.011).
Ou cada vez que o bispo Macedo viaja para Israel Deus revela algo à ele (GOMES,
2.011). Ou como afirma o bispo Randal Brito, o templo de Salomão é o sonho divino,
ao qual o bispo Macedo disse sim à Deus25
.
Nestes depoimentos do episcopado da Igreja Universal, podemos ler as afirmações a
partir das interpretações presentes nos estudos e pesquisas de Mourão. Segundo ele, um
templo pode ser interpretado como, uma ideia ou projeto divino ao qual o ser humano
teve acesso por meio de uma revelação, e/ou a inspiração divina como um dom dado ao
Homem pela divindade.
Estas duas formas de pensar em Mourão aparecem nestas frases construídas pela elite
religiosa, a primeira frase justificando a ideia da inspiração, A segunda frase é
justificada com a ideia da revelação. Já a frase do bispo Randal, tem referencia a ideia
de que o templo de Salomão é um projeto arquitetônico divino, transcendente, que foi
recriado pelo bispo Macedo. (MOURÃO, 2.013).
O bispo Macedo se enquadra nos modelos de liderança pentecostal contemporânea que
permite uma releitura dos modelos desenvolvidos por Weber. Segundo Rivera em suas
análises sobre o pentecostalismo latino-americano, Macedo encontra-se classificado em
dois modelos de lideranças pastorais: a do pastor-pregador e do pastor-profeta.
Como pastor-pregador ele construiu para si mesmo uma teologia autônoma, rudimentar
uma solução que legitima o seu carisma através da mensagem que afirma ser bíblica
junto aos fiéis. Como pastor-profeta, legitimado por alguma revelação pessoal e
manipulando as emoções e os elementos sagrados (RIVERA, 2.011). Deste modo o
templo de Salomão torna-se legitimado pelo duplo ministério de Edir Macedo,
utilizando a bíblia como referencia do protestantismo tradicional ao desempenhar a
25
BRITO. R. – “O Templo de Salomão como um sonho” in: “Eu realizei o meu sonho...,” m Caderno Reflexão Folha Universal. 29/05/2016, p. B-3.
103
função de pastor pregador e manipulando as emoções através da revelação divina, como
um pastor profeta dentro do pentecostalismo nacional.
Dentro do aspecto ideológico há a questão da função, a atividade ou o papel que o
Templo de Salomão como espaço concebido, criado, desempenha ou exerce, no caso,
uma dupla função:
I – O local construído e inaugurado tem como alvo, resgatar a fé original que existia no
passado, para que possamos experimentar o que acontecia nas histórias bíblicas no dia
de hoje, portanto um resgate material do passado para referendar o presente.
Tornando a experiência espiritual numa experiência pessoal e única (Folha Universal,
29/05/2.016, p. B-10).
II – Recepcionar aos diversos fluxos humanos oriundos do Brasil e do mundo que o
visitarem proporcionando a eles uma experiência transformadora de um encontro com
Deus (Folha Universal, 29/05/2.016, p. B-10).
Destas funções há duas palavras chaves presentes nos diversos depoimentos presentes
na Folha Universal: resgatar a fé, a reverência a experiência transformadora etc.
III – Propiciar a estes fluxos humanos uma experiência cultural, sobrenatural,
transformadora com o sagrado ou com o divino dentro do santuário e do complexo
situado no Brás.
Mas o complexo não é apenas um espaço concebido, ele é um espaço percebido.
Segundo Schimid(2.012, p. 104), definimos o espaço percebido como “aquele que pode
ser apreendido por nós através do uso dos sentidos, principalmente a audição e a visão
Pois a percepção espacial está ancorada na materialidade”
Ou, seja dos elementos pertencentes ao complexo/nível interno – o templo e os
subespaços, sejam dos elementos não pertencentes ao mesmo/nível externo – as
vizinhanças. Sendo que o eixo comum destas distinções visuais, externa e interna é a
forma arquitetônica do templo.
A nossa visita ao complexo no bairro do Brás oportunizou-nos a fazer esta observação
áudio e visual a partir do tour bíblico e em percorrer a vizinhança do mesmo,
articulando a percepção de forma tripla:
104
A primeira fazendo um passeio ao redor do complexo e observando a vizinhança dele, o
edifício é monumental frente aos espaços degradados e desocupados ao seu redor, a
monumentalidade e o luxo fazem esta distinção visual. A segunda a partir do
documentário áudio visual relacionado entre a história do Judaísmo e de Israel antigo
com a história do templo construído no Brás no interior do Memorial. E a terceira a
nossa visita ao santuário do templo, onde tivemos a oportunidade em assistir a
respectiva reunião daquela data – o através do período do pré-culto, entramos em
contato com as regras de acesso ao santuário do templo de Salomão que se encontravam
acessível ao público na esplanada do templo.
Na primeira leitura, a porta de entrada do Templo faz esta separação geográfica e
simbólica do espaço profano e seus subespaços do espaço sagrado e dos seus
respectivos subespaços dentro do santuário.
Na segunda leitura, a organização do espaço ou do lugar, pois quem concebe, cria ou
transforma um espaço ou lugar, tem o direito e o poder de organizá-lo de elaborar as
funções e as regras para este.
Isto ficou bem evidente no nosso trabalho de campo observatório ao vivenciarmos as
regras para assistirmos as reuniões dentro do santuário do templo. As regras
observadas por nós e pelo público que se dirigia ao evento dentro do santuário, nos
permitiram a leitura da distinção entre os espaços profano e sagrado dentro do complexo
e da organização do espaço (Folha Universal, 26/02/2.017, p.4, 5).
O próprio site do templo de Salomão mencionar estas regras de acesso, de admissão,
revela o objetivo das mesmas ao serem aplicadas naquele espaço religioso,
principalmente no seu recinto mais íntimo, o interior do santuário: em proporcionar a
todos os visitantes uma experiência única e espiritual com o Altíssimo, como se
estivessem na Terra Santa, e que todos desfrutem dessa experiência, é fundamental que
estejam imbuídos de reverência para com o Eterno e sua Casa. Pois segundo os líderes
da Igreja Universal do Reino de Deus, responsáveis pela administração daquele espaço
dito sagrado, afirmam que a cuidadosa observação é uma forma de demonstração de
respeito ao Senhor e aos demais visitantes (Regras de Conduta/Templo de Salomão).
O site do templo de Salomão acessado pela Universal. Org, e a Folha Universal trazem
as informações denominadas regras de conduta daquele que freqüenta tal espaço
105
religioso (Folha Universal, 29/05/2.016, p. B-10, B-11). Nele temos uma regra
proibitiva: a de portar alimentos e bebidas dentro do santuário.
É uma forma de não contaminar o santuário com objetos ditos profanos e de facilitar o
processo de limpeza no interior do santuário visto que a cultura religiosa iurdiana é de
promover cultos em horários diferentes durante o dia. As demais regras do templo tem
conotação menos proibitiva mas valorizam a questão disciplinar: a do encaminhamento
dos infantes, das crianças menores para o seu respectivo espaço dentro do templo – a
escola bíblica infanto-juvenil.
As outras três regras reforçam a ideia que o local, o santuário do templo é um espaço
religioso diferenciado – a revista que antecede a entrada no santuário e o estar dentro do
ambiente de reunião no mínimo de quinze minutos antes do início desta, pois cinco
minutos antes as portas serão fechadas pelo lado de dentro pelos levitas e por último, a
regra relacionada a idumentária utilizada para acessar o local: a ausência de roupas
indecentes etc.
Estas regras foram altamente questionadas por lideranças religiosas de diversos grupos
evangélicos, pois elas contemplam este espaço religioso como um templo concebido
acima de todos os outros, dando a ele a aura ou o status de um lugar muito especial e
único. A crítica tem sentido, ela não está errada, porque ela está fundamentada na ideia
de que o sagrado é um elemento que constrói a distinção junto aos demais, criando o
aspecto da transcendência em relação a este mundo, se tornando assim num lugar ou
espaço qualitativamente superior aos outros.
O santuário como a representação do espaço sagrado a partir destas regras agrega duas
qualidades estudadas por Otto em suas pesquisas sobre o sagrado (1.992) – o Augustus
(santidade) – valor objetivo associada a ética, o respeito com o local.
Isto fica bem evidente com as regras de ordem social, relacionadas ao traje, horário de
ingresso para ir ao templo (Folha Universal, 29/05/2.016, p. B-10, B-11). E o Sebastus
(reverencia) – ele está relacionado às regras de acesso relacionadas ao silêncio e a
obscuridade fazem-se presentes no interior do santuário do Templo antes do início das
concentrações (ABUMANSSUR, 2.004; Folha Universal, 08/10/2.016, p. 23).
Escolhemos Otto para estas análises das regras, porque os seus estudos sobre o sagrado
valorizam a experiência religiosa, os seus conteúdos e o seu caráter específico. E as
106
regras valorizam este caráter específico e a experiência humana, religiosa com o
sagrado via reverencia e santidade.
Elas, as regras são mecanismos de ser ou situar-se no mundo, existindo um modo
convencional do Homem situar-se frente ao cotidiano natural, ao profano, e vivenciá-lo,
como há um modo convencional do ser humano situar-se frente ao não natural, ao
sagrado e vivenciá-lo. Elas nos favoreceram a leitura dos opostos binários compostos
por diversos subespaços, segundo a teoria desenvolvia por Rosendhal (1.996, 1.997) aos
quais pudemos identificar dentro do complexo do Brás.
A percepção que o Homem constrói sobre o espaço sagrado nos revela que este não é
uma ilusão para o Homem religioso, mas um fenômeno que agrega sentidos e
significados para este, para além da realidade comum ou profana do ser humano.
Existem duas formas de conceber o sagrado dentro da geografia: a ideia do padrão,
formado por dois espaços opostos entre si, o sagrado e o profano, onde o primeiro ocupa
a posição de centro e o segundo a de periferia estando ao redor do mesmo.
Porque o espaço sagrado seria um espaço profano que vivenciou a experiência da
transcendência, alterando assim a sua natureza, diferenciando-o dos demais. Podemos
tomar como exemplo o restaurante Skina do Templo, localizado próximo do espaço
religioso iurdiano, o qual é um espaço comum, não religioso, profano, sendo que a sua
atividade econômica deste encontra-se ancorada junto ao Templo e os seus públicos,
como possíveis consumidores a partir da leitura da teoria desenvolvida por Silva
(2.014) sobre o Brás, como a mancha antropológica/geográfica/religiosa.
A segundo é a teoria da disposição geográfica do sagrado, isto fica evidente o fato do
edifícios ocupar a região central daquele terreno, e com isto a ideia de importante, e os
outros prédios dentro do complexo ao redor dele no terreno, e com isto a ideia de
secundário. Estas duas ideias estão presentes dentro do complexo construído, como
espaços percebidos.
Tomando a primeira teoria, onde o espaço sagrado ocupa o lugar central e o espaço
profano o lugar periférico. Podemos trabalhar com o conceito de que o espaço pode ser
dividido e subdividido em espaços menores, tanto dentro do espaço profano, como
dentro do espaço sagrado. Segundo Rosendhal, o espaço profano pode ser subdividido
em espaços menores (ROSENDHAL 1.997). E o nosso trabalho de campo observatório
107
realizado no complexo, identificou a geograficidade tanto do profano como do sagrado
conforme as pesquisas desenvolvidas por Rosendhal:
EPV/ ESPAÇO PROFANO VINCULADO: o edifício que abriga o santuário, o templo.
Este edifício dentro da teoria da espacialidade abriga dentro de si os seguintes
elementos profanos: os dois estacionamentos subterrâneos, o guarda-volumes, os
elevadores sociais, os cinco andares destinados a escola bíblia infantil – primeiro,
segundo, terceiro, quinto e sétimo (Folha Universal, 14/05/2.016), e os andares que
abrigam os estúdios de gravação dos programas de Rádio e TV.
EPIV/ ESPAÇO PROFANO INDIRETAMENTE VINCULADO: os espaços profanos
indiretamente vinculados são a esplanada do templo, os estacionamentos cobertos e
descobertos, a praça das bandeiras (Folha Universal, 21/08/2.016).
O tabernáculo do deserto, o memorial de Jerusalém (Folha Universal, 13/12/2.015), o
poço de Jacó em Samaria, (Folha Universal, 17/07/2.016, p B-10, B-1), o Jardim das
Oliveiras (Folha Universal, 20/11/2.016), e o edifício onde reside parte da elite pastoral
da IURD – o condomínio edifício Vidago.
EPRV/ESPAÇO PROFANO REMOTAMENTE VINCULADO: Ele aborda dentro da
geografia da religião, as vizinhanças, o entorno do complexo, o espaço fora dos limites
do quarteirão, o espaço público (a av. Celso Garcia). Ele encontra-se separado do
espaço profano indiretamente profano (espaço privado, o endereço do complexo) graças
ao lance de escadas e as grades que permitem a visibilidade do edifício principal – o
templo.
Ele abriga as diversas lojas, os templos de outras denominações religiosas ao redor do
complexo, o comércio ambulante de bens religiosos, e a loja oficial da IURD que vende
souvenirs do Templo de Salomão na cidade junto ao eixo viário R. Pestana e C. Garcia.
Em relação ao espaço sagrado fizemos este processo de identificação, segundo o
modelo de Rosendhal, tomando como referência os templos do catolicismo romano em
nosso país.
Tanto Mourão como Abumanssur, admitem em seus estudos sobre o espaço sagrado,
que os subespaços dente último, podem ser identificados devido a presença de maior ou
de menor sacralidade (ABUMANSSUR, 2.004; MOURÃO, 2.013). Isto implica em
108
reconhecer que dentro do espaço sagrado chamado de santuário há uma hierarquia de
espaços mais sagrados do que outros.
Pois este fato já existia no antigo Templo em Jerusalém – a esplanada ou o pátio, o
espaço dito profano, o santuário ou o santo lugar e o santíssimo lugar, o santo dos
santos que representa a centralidade do local, onde havia a irradiação desta santidade,
desta sacralidade, cujo modelo a IURD apropriou-se para construir a sua mega-igreja
em São Paulo (MOURÃO, 2.013). Dentro da nave identificamos três deles, o de menor
qualidade de sacralidade é o espaço destinado a platéia, separados por diversos
corredores que se situa entre a porta de entrada, a qual faz a separação entre os espaços
profano e sagrado, privado e público e a área multifuncional do Templo
(ABUMANSSUR, 2.004).
Ele é a área de menor sacralidade porque está mais distante do objeto que representa
esta sacralidade, a arca da Aliança dentro do Santo dos Santos – altar, como também
mais próxima da porta. Neste espaço destinado ao público em geral há um subespaço
especializado, as poltronas especiais reservadas para visitantes estrangeiros com
tradução simultânea26
.
Por isto os voluntários (levitas) orientam ao público em geral para situarem-se à frente,
o mais próximo possível do altar e do objeto que irradia esta sacralidade dentro do
santuário (MOURÃO, 2.013). Posteriormente, há um espaço multifuncional entre o
local destinado ao público, e o altar/púlpito.
Este espaço exerce num culto diversas funções tais como, a recepção das ofertas a
serem entregues pelos fiéis, local para os depoimento de testemunhos dentro do
santuário, e para receberem determinadas bênçãos da campanha, ou o exorcismo. Todos
estes espaços representam no antigo templo, o lugar santo.
E o espaço de maior poder espiritual, de maior sacralidade dentro do santuário, é o santo
dos santos, onde se localiza o altar/púlpito, porque dentro da cultura protestante,
evangélica, ele é o espaço de maior poder por articular a transmissão da tradição nos
grupos históricos, e de articular as emoções nos grupos pentecostais. Sendo este espaço
26
Reportagem: “O templo de Salomão conta com um sistema de tradução simultânea durante as
reuniões”, Caderno Templo de Salomão Folha Universal U, 10/01/2016, p. B-11.
109
frequentado por especialistas religiosos – os bispos durante as concentrações de fé
(cultos ou reuniões).
Nele temos a réplica da arca da Aliança ocupando toda a parede principal do altar do
santuário. Segundo os especialistas religiosos da Igreja Universal do Reino de Deus, o
altar é o espaço ou o lugar mais importante da Igreja, sem ele não existem espaços
religiosos da Universal. (Folha Universal, 14/08/2.016, p. 27). Neste espaço,
representado pelo santo dos santos está o objeto irradiador da sacralidade a réplica da
arca da Aliança ocupando toda a parede frontal onde está o altar, logo, o ponto mais
sagrado deste recinto.
Segundo Lefebvre (2.000, p. 73).”o que seria da Igreja Universal, do Templo de
Salomão sem as outras denominações e os outros espaços religiosos ao seu redor?”
Porque ela constrói a sua identidade através da relação de oposição entre ela e os demais
grupos religiosos em nossa sociedade, nos nossos estudos, o catolicismo romano, o
protestantismo histórico e o pentecostalismo (GOMES, 2.011).
As regras presentes na Folha Universal27
e no site Universal.Org.com28
, dentre elas, a
do silencio interno antes do início das reuniões, nos permite construir a distinção entre
o santuário da Universal e dos demais grupos religiosos pentecostais, ao cultivar o
sebastus – reverencia a partir do silêncio como regra interna.
O objetivo do santuário é de resgatar tais valores nos seus públicos e dentro do
cristianismo, pois simbolicamente ele. o templo é visto como a habitação divina entre os
mortais (Folha Universal, 29/05/2.016). Segundo a IURD acredita-se de que Deus fala
aos Homens dentro do santuário do Templo a partir do silêncio – proibindo-se neste
subespaço, portar objetos pessoais relacionados à mídia (celulares, tablets marcas
fotográficas etc.) e as conversas antes do início das reuniões. Estes dados revelam a
sacralidade do santuário.
Para os outros grupos pentecostais tomando-se como referência as entrevistas
concedidas por Manoel de Melo (fundador do Brasil para Cristo) e pelo bispo Walter R.
27
Porque respeitar as regras de acesso ao Templo de Salomão:‘Veja as recomendçaões para participar das
Reuniões. A reverencia a Deus no Templo e o respeito por outros visitantes são a essência do local” in:
Caderno Templo de Salomão, Folha Universal, 29/05/2.016, p. 10,11) 28
Regras de acesso junto ao templo de Salomão – www. universal.org/templodesalomao/regras-de-
conduta-no-templo-de-salomao
110
McAlister (fundador da Igreja Nova Vida) ambos já falecidos, eles esposam dentro do
pentecostalismo a tese da dessacralização parcial do espaço religioso ao valorizarem o
Homem dentro destes espaços. Eles estimulam os contatos mútuos, a comunhão até o
início do culto: abraços, conversas – palavras de estímulo mútuo etc. Trocas de
experiências sobre bênçãos e o cotidiano etc. Segundo o pastor M. de Melo, o povo
deve conversar com queira, sentir-se a vontade no espaço religioso, ainda que este
pareça um verdadeiro mercado, porque para ele o Sebastus, expresso pelo silencio,
constrói no imaginário pentecostal de que reverencia/silêncio, é sinônimo da ausência
de vida, de estar num cemitério, ou num túmulo e não em um templo. Este é um traço
comum da maioria dos grupos religiosos pentecostais em nosso país identificado tanto
por Abumanssur (2.004) como por Campos (1.996).
A Universal como igreja evangélica pentecostal não partilha desta cultura anteriormente
descrita pelos autores acima, e muito menos da prática de muitos grupos religiosos
cristãos que num determinado momento do culto estimula-se ao abraçar, o
cumprimentar, ou dirigir ao fiel ou visitante próximo ao redor palavras de animo
espiritual.
As regras mencionadas favorecem a passagem do espaço concebido/percebido para o
espaço percebido/vivido, através da experiência audiovisual dentro do complexo. Mas
as distinções entre a IURD e outros grupos não fica restrita ao aspecto das regras dentro
de um espaço dito sagrado, ela também se expressa através das dimensões se ordem
arquitetônica quando comparadas com outros espaços religiosos concorrentes, tornam o
templo num espaço percebido em relação a estes templos, tais como:
A Igreja católica de São João Batista, a Igreja Assembléia de Deus (AD-BRÁS)
situadas na avenida Celso Garcia, em frente ao mesmo, a Igreja Evangélica Brasileira
que se situa na rua Carlos Botelho, atrás do complexo e de outras denominações
pentecostais presentes no eixo viário Rangel Pestana e Celso Garcia.
Aqui temos a prática social da percepção externa apreendida exclusivamente a partir de
um de nossos sentidos, a visão. Um espaço concebido, percebido traz consigo a outra
etapa, a do espaço vivido. Este espaço valoriza a experiência humana acumulada com
aquele lugar criando uma relação subjetiva com o mesmo. Os edifícios do complexo
tem a finalidade de construir uma experiência junto ao público freqüentador e/ou
visitante. Esta é a propaganda oficial da Igreja Universal do Reino de Deus em seu
111
periódico oficial – uma experiência inesquecível uma chance por poder conhecer os
detalhes bíblicos (Folha Universal, 31/01/2.016, p. B-11).
Os subespaços, o Tabernáculo do deserto29
, Jardim das Oliveiras30
e o Santuário do
Templo de Salomão são locais que valorizam o conceito de espaço cênico, identificado
por Campos (1.996) em suas pesquisas sobre a Universal, vendo os espaços da mesma,
como espaços cênicos em potencial.
Temos dois grupos de atores definidos com respectiva idumentária: os levitas que são
voluntários que atuam junto a porta de entrada do templo, em especial ao Santuário do
mesmo. E os diversos pastores que exercem a função de guias do passeio ou do tour
bíblico, vestidos a caráter, como sacerdotes dos antigos tabernáculo e templo.
E no caso de visita de grupos humanos ligados à elite, este se veste de sumo-sacerdote
do período bíblico, como o caso do Pr. Miguel Perez. Portanto, uma experiência
vivenciada por eles, e pelo público valorizando a transmissão audiovisual das
informações.
O objetivo desta experiência vivida é permitir que o frequentador/visitante se transfira
por alguns momentos para os tempos do Antigo Testamento, pois para a instituição o
importante não é apenas abrir a bíblia e fazer a sua leitura, mas ir para além da mesma,
sentindo-se dentro dela, é uma experiência interessante que acrescenta muito mais
(Folha Universal, 30/10/2.016).
Portanto o complexo foi construído para ser um espaço concebido, percebido, e vivido
no meio urbano, proporcionando materialmente o Homem ser transportado para o
passado, tornando os episódios bíblicos concretos, reais, pois todos os lugares dentro
dele foram construídos com este objetivo, a interação entre o cotidiano do ser humano e
o local. Ainda mais o templo que agrega a questão do sagrado valoriza a experiência
acumulada, e construída do seu usuário, freqüentador ou visitante, conforme os registros
contidos nas diversas edições da Folha Universal.
Logo, o nosso trabalho de campo realizado junto ao complexo do Brás confirma a teoria
sobre as etapas do espaço desenvolvida por Lefebvre (2.000) e por Schmid (2.012), e
29
Reportagem: “Por que você deve visitar o tabernáculo?”, Caderno Templo de Salomão, Folha
Universal, 12/06/2.016, p. B-10, B11. 30
Reportagem: “As oliveiras no Templo de Salomão”, Caderno Templo de Salomão, Folha Universal,
20/11/2.016, p. 4, 5.
112
dialogou com a teoria de Rosendhal (1.996), porque tivemos a nossa experiência com os
espaços, o profano e o sagrado, e suas subdivisões. E as regras de acesso servem para
fazer a diferença entre estes dois espaços.
Na nossa leitura dos depoimentos sobre o complexo e especialmente o templo,
percebemos três grupos de públicos distintos, os indivíduos sós, pessoas pertencentes a
grupos de visitantes e profissionais relacionadas à mídia – artistas, atletas, autoridades
civis, jornalistas, teleapresentadores etc.
Dentro deles percebemos dois subgrupos, os estrangeiros em sua maioria relacionados à
caravanas junto a Igreja Universal (coletivo), e estes como átomos (individual), e o
grupo nacional presente em sua maioria as autoridades civis e os profissionais
midiático. Havendo apenas um depoimento de brasileiro como átomo (individual).
Neles há menção direta e indireta ao espaço sagrado (santuário, subespaço do Templo),
o qual é reconhecido como tal, e teoria das etapas espaciais desenvolvida por Lefebvre –
espaço concebido, percebido e vivido. Dentre eles escolhemos dois depoimentos sobre
os espaços:
Depoimento 1 – Madrugada nos portões (Experiência Inesquecível de Adela
Aedo/Chile):
“Minha experiência foi única. Toda aquele ambiente santo e reverente me fez pensar
cada vez mais na magnitude do Deus vivo. Acredito que a minha mente não tenha nem
capacidade de perceber a Sua imensidão. O silencio leva os nossos pensamentos a Deus
naturalmente, percebe-se uma conexão direta com Ele, afirma.(...)
Além de perceber que o templo de Salomão significa: trazer a mesma reverência do
passado aos dias atuais Essa experiência será algo que jamais vou me esquecer,
conclui.” , Caderno Templo de Salomão, in: Folha Universal, 25/10/2.015,p. B-11)
Espaço sagrado: Toda aquele ambiente santo e reverente me fez pensar cada vez mais
na magnitude do Deus vivo, e O silencio leva os nossos pensamentos a Deus
naturalmente, percebe-se uma conexão direta com Ele.
Espaço percebido: perceber que o templo de Salomão significa: trazer a mesma
reverência do passado aos dias atuais
113
Espaço vivido: Essa experiência será algo que jamais vou me esquecer, conclui.
Depoimento 2 – “Senti que estava em Jerusalém, na época descria na Bíblia
(Experiência Inesquecível de Laura Ponce/Equador):
“Foi uma grande experiência para qual eu me preparei, desde que ouvi sobre a
construção determinei que estaria lá. O dia tão esperado chegou, desde que pisei no
local,pude apreciar a majestade do Templo,” afirma (...) “O momento da busca pelo
Espírito Santo foi muito glorioso, majestoso.
Estar ali era como presenciar um coro de anjos adorando a Deus, cada nação em seu
idioma, louvava, glorificava, exaltava. Não foi uma sensação, foi uma experiência
sublime.”
“Estar no tabernáculo e passar pelos jardins me levou a época descrita na Bíblia,
inclusive aquela que Jesus estava em Jerusalém. Por isto convido você a fazer o
sacrifício de ir ao Templo de Salomão, pois a viagem não é turística, mas espiritual.(...)
Por isto e por muito mis, podemos dizer que ver o Templo de Salomão é ver a glória de
Deus”, conclui. ( Caderno Templo de Salomão, in: Folha Universal, 08/11/2.015 p. B-
11 ).
Espaço sagrado: ao Templo de Salomão, pois a viagem não é turística, mas
espiritual.(...) Por isto e por muito mis, podemos dizer que ver o Templo de Salomão é
ver a glória de Deus”, conclui.
Espaço concebido: “Foi uma grande experiência para qual eu me preparei, desde que
ouvi sobre a construção determinei que estaria lá. O dia tão esperado chegou, desde que
pisei no local,pude apreciar a majestade do Templo,” afirma (...) e Estar no tabernáculo
e passar pelos jardins me levou a época descrita na Bíblia.
Espaço percebido: Estar ali era como presenciar um coro de anjos adorando a Deus,
cada nação em seu idioma, louvava, glorificava, exaltava.
114
CAPITULO III – “O Templo de Salomão: A Reconstrução da Memória Religiosa”
3.0 - Introdução:
Nos capítulos anteriores abordamos a existência de uma relação entre a memória e a
religião tomando como referencia os diversos pentecostalismos no Brasil como um
contra ponto a este processo de construção da memória e da tradição dentro do
protestantismo. Construindo a legitimação de tais grupos sem ancorar-se numa tradição
religiosa. E com o modelo religioso citado, há a possibilidade em construir a memória
ou a tradição religiosa de forma artificial, isto é, apropriando de um acontecimento ou
fato fundante sem referencia à história de determinado grupo.
Rivera deixa isto muito bem claro em sua obra, quando comenta que qualquer grupo
cristão de tradição religiosa protestante ou evangélica do dia para a noite pode se
apresentar na sociedade brasileira como mais um agrupamento dito pentecostal, ao
colocar em evidencia a emoção e não a razão, e alterando o fato fundador desta, abrindo
mão da tradição fundadora para abraçar o pentecostes como acontecimento central ou
referencia religiosa do grupo, e com esta pluralidade, torna cada vez mais impreciso
quaisquer esforços em construir uma classificação de grupos humanos desta corrente
religiosa (RIVERA, 2.010).
Neles, abordamos a história de um grupo religioso pentecostal contemporâneo
brasileiro, a Igreja Universal do Reino de Deus analisando as suas origens, o seu
crescimento, bem como a sua expansão no Brasil, na América Latina e para além destas
coordenadas geográficas, bem como as relações que ela construiu ao com as diversas
sociedades humanas ao longo destes quase quarenta anos.
115
A Igreja Universal é uma denominação nacional que se inseriu no mundo competitivo,
globalizado, exportando as suas crenças, as suas práticas, e a sua versão de fé cristã,
interagindo com outros grupos e com outras sociedades. E o Templo de Salomão
construído em quatro anos na cidade de São Paulo espelha esta expansão internacional,
como um fixo mundializado que atrai para si os fluxos de outras nacionalidades e de
grupos nativos, No caso de grupos estrangeiros, trata-se de caravanas promovidas pela
própria Universal nos países e continentes onde ela encontra-se domiciliada a anos e
décadas.
O templo construído encontra-se inaugurado a mais de dois anos (Folha Universal
14/08/2.016, p. 4, 5), e muito foi escrito, ou especulado no meio acadêmico, tais como
Barbosa (2.015, 2.014, Figueiredo e Storto (2.015), Batista Jr (2.014), Camargo (2.014),
Cardoso (2.014) Proença (2.014) etc, e muito ainda será escrito sobre este espaço
religioso, porque há diversas formas de fazermos a leitura deste edifício.
Para uns, o templo é considerado um santo lugar, um centro irradiador energizado pelo
Espírito Santo tornando o local sacramentalizado (CAMPOS, 1.996). Os diversos
testemunhos que abordam a relação fiel com o espaço religioso – Templo de Salomão
contempla-o como um espaço religioso sagrado, um lugar separado no qual ocorre à
repetição dos atos cúlticos, logo, um espaço geográfico particular na mentalidade dos
fiéis. Além; dos fiéis esta mentalidade de contemplar ao templo de Salomão em São
Paulo, como um lugar especial, é compartilhada pelos pastores da IURD fora do país,
como ocorre em Portugal (Folha Universal, 14/08/2.016, p, 27).
Para Cardoso, ele é um edifício que se destaca dos demais prédios degradados e
fechados ao seu redor, por causa do seu luxo, monumentalidade e opulência dentro de
um bairro popular que tem no comércio dos diversos tipos de mercadoria a sua principal
atividade econômica, o qual abriga imigrantes latino-americanos em suas oficinas de
costura, e cortiços onde vivem migrantes das diversas cidades do nordeste brasileiro
(CARDOSO, 2.014), portanto um verdadeiro contraste geográfico humano, econômico,
social no meio urbano.
Outros afirmam que o Templo localizado na “mancha pentecostal do Brás”, revitalizaria
a região, articulando novos comércios associados ao mercado religioso evangélico neste
bairro paulistano, promovendo até a migração de elementos situados junto à rua Conde
de Sarzedas para esta região da cidade. Fato que ainda não ocorreu durante as nossas
116
pesquisas in loco. Como há aqueles que vinculam o templo de Salomão e a sua
arquitetura luxuosa como: reflexo da Teologia da Prosperidade defendida e praticada
por este grupo religioso no meio evangélico, a qual rendeu ao episcopado da Igreja
Universal várias críticas dos grupos religiosos protestantes em nossa sociedade. E a
imagem difundida pelo edifício e seu interior, o santuário ao fiel que nele adentra é da
elegância aliada ao poder e riqueza. (PROENÇA, 2014; FIGUEIREDO; STORTO,
2015, THROUP, 2.011).
Para nós, ele em sua materialidade expressa a ação interventora da instituição no espaço
urbano e o resultado da mesma, bem como a interação com o mundo globalizado, pois
foram importados pela Igreja Universal do Reino de Deus: oliveiras do Uruguai, as
pedras de revestimento da região de Hebron, Israel, as cadeiras são provenientes da
Espanha e os dois telões de vinte metros cada da Bélgica.
A arquitetura deste prédio reflete dois aspectos: o primeiro, a existência concreta, física,
real, deste grupo humano dentro do campo religioso nacional, a sua participação nele
buscando o seu lugar ao sol, e luta pela hegemonia religiosa dentro do respectivo grupo
representativo: pentecostalismo contemporâneo. Ou seja: a concorrência com os demais
grupos cristãos na sociedade que são anteriores a fundação dela em 1.977 – o
catolicismo romano presente desde o período o colonial, os protestantes históricos ou
tradicionais presentes no país desde meados do século XIX, e os demais grupos
pentecostais que estão no Brasil desde o início do século passado e/ou aquelas
denominações pentecostais que se estabeleceram ou surgiram no nosso campo religioso
até os anos setenta.
O segundo, o processo cultural, religioso do pentecostalismo contemporâneo em se
apropriar da bíblia hebraica, das histórias e narrativas das mesmas, construindo uma
interação com os conteúdos dela e com a estética do Judaísmo, sem afinidades com as
correntes ideológicas deste último grupo religioso, bem como sem lealdades com os
valores éticos, morais provenientes dele, e sem afinidades históricas e políticas com o
atual Estado de Israel via sionismo cristão difundido desde o século XIX no meio
cristão evangélico.
Neste capítulo estudaremos o Templo de Salomão como o espaço que aborda dois
aspectos valiosos simultâneos para compreender e entender a reconstrução da memória
religiosa monoteísta e de uma tradição neste grupo pentecostal. Ele como o espaço da
117
manifestação religiosa do lugar da Memória e da Memória de lugares nas diversas
escalas geográficas desde a sociedade paulistana, a qual é o elemento mais próximo de
sua interação, até a expressão mais distante desta interação, a sociedade internacional,
cujas distancias encontram-se aproximadas, reduzidas, graças ao processo de
globalização – a livre circulação de capitais, de ideias. de notícias, de mercadorias, de
pessoas e ao acesso às tecnologias da informação e de comunicação de massa.
O Templo é reflexo da existência de um grupo religioso específico diante do fenômeno
social do pluralismo devocional, a diversidade de pentecostalismos no Brasil. Ele
determina que ali existe uma comunidade religiosa que reúne-se periodicamente, sendo
esta a visão que o protestantismo lega para os seus espaços de culto religioso e por isto a
presença informativa dos dias de serviço religioso naquele lugar. Mas no caso da Igreja
Universal, ele reflete a sua capacidade de existir, de se reinventar, de buscar seus
objetivos, e com eles a sua superação na busca da vitória e de novas conquistas.
Como também ele é um exemplo claro da aplicação de diversas teorias religiosas que
estaremos comentando neste capítulo: a reprodutibildade aurática em Gomes (2.011) a
remitologização e o misticismo emblemático em Throup (2.014), importantes para
entender a relação que a IURD e o templo possuem com a memória e com a tradição.
3.1 – O Existir e o circuito da Conquista e da Superação:
Neste item analisaremos duas referencias importantes para a construção do templo de
Salomão, uma de origem geográfica, outra de origem antropológica, que são
importantes para entendermos a sobreposição das diversas memórias, lugares e
tradições do grupo religioso com o Templo construído no Brás
A teoria geográfica que estamos esposando é a da relação entre a geografia e a
existência que por sua vez implica no exercício do poder sobre um espaço ou lugar
elaborada por Silva, Campos e Modesto (2.014), e a teoria antropológica do circuito do
trinfo elaborada por Gomes (2.011) em suas análises sobre a construção da catedral da
Igreja Universal no bairro de Del Castilho, Rio de Janeiro, que é o edifício antecessor
do Templo de Salomão em relação a características e objetivos.
A – Existir ou o ser/estar no mundo:
118
Silva, Campos e Modesto afirmam que na geografia a expressão existir implica em ser,
em estar no mundo é aplicável ao Homem, indivíduo ou coletivo (instituições) (SILVA ,
CAMPOS, MODESTO, 2.014). Este ser ou o estar no mundo implica em saber fazer a
leitura dele para intervir no mesmo através do exercício do poder. Logo, todos os
movimentos nacionalistas, os diversos movimentos sociais ou os grupos religiosos
adotam esta teoria em seus diversos discursos e práticas, independente dos públicos aos
quais estes discursos são destinados.
Todos eles fazem e/ou fizeram a sua respectiva leitura de mundo e a partir desta
tomaram a ação de intervir, dando formas a sua existência como ser, isto é como sujeito
e não como objeto. Tomando esta referencia geográfica nos movimentos religiosos
dentro do Brasil, podemos materializar esta existência, o estar no mundo através dos
dados quantitativos de uma determinada identidade religiosa nos censos oficiais do
IBGE e de outros institutos privados, porque tais estatísticas são informações de médio
prazo que revelam a visibilidade quantitativa de um grupo e com ela, a necessidade em
dar voz e direitos a este grupo na sociedade.
Exemplo: as estatísticas sobre as confissões e identidades religiosas no Brasil (1.980,
2.000 e 2010), elas revelam a visibilidade dos evangélicos a nível nacional.
(MARIANO, 2013; MAFRA, 2.013) e municipal através dos registros estatísticos do
Data-Folha, 2.006.
EVANGÉLICOS NO BRASIL
1.980 2.000 2.010
6,6% 15,4% 22,2%
O nosso objetivo com esta informação quantitativa nacional é de revelar a existência de
uma determinada identidade religiosa, onde o seu crescimento nos censos do IBGE
revela-nos que o grupo está em busca de novos espaços, de visibilidade e de direito a
voz dentro de nossa sociedade.
EVANGÉLICOS EM SÃO PAULO/ DATA-FOLHA/2.008
2.004 2.008 2.010
19% 20% 22%
119
As informações contidas no Data-Folha revelam-nos: o processo de crescimento dos
evangélicos dentro da cidade de São Paulo, acompanhando a tendência nacional. A área
de maior concentração deles é na Zona Leste da cidade. São Paulo possui
aproximadamente três mil templos religiosos evangélicos, mas este dado não reflete nas
estatísticas do grupo em São Paulo são apenas 21,88% da população paulistana.
O exemplo mais claro disto é o Brás, bairro central que faz a passagem, a transição da
periferia para o centro, o qual concentra para fins um grande número de igrejas
evangélicas – “mancha pentecostal”, tem apenas 16.5% de seus habitantes identificados
com este grupo religioso e a maior concentração de pessoas com esta identidade
religiosa está localizada na periferia desta, segundo informações do Data-Folha.
O estar no mundo não se restringe a ser um dado estatístico, que indica que há a
existência de um determinado grupo religioso em crescimento na sociedade brasileira.
Ele pode ser lido através da representação política deste agrupamento religioso dentro
dos poderes executivo, judiciário e legislativo do país, estado ou da cidade, a ocupação
dos espaços midiáticos, em especial, o radiofônico, o televisivo e a internet em nossa
sociedade. Podemos também citar as estratégias históricas de evangelização urbana, os
cultos ao ar livre nas praças públicas, ou as mega concentrações religiosas em espaços
que abrigam as multidões tais como: os estádios de futebol e os ginásios poliesportivos,
e a mais comum das formas das leituras existenciais, a presença dos templos destas
instituições na cidade. .
A história da Igreja Universal do Reino de Deus nos revela que ela é portadora de
diversos mecanismos de afirmação e de leitura da existência do grupo religioso no
mundo: a pontuação dentro das estatísticas dos censos sobre a demografia religiosa, a
representação do grupo através da legenda partidária: o PRB, e com ele, a eleição de
uma bancada parlamentar, a ocupação dela nos diversos espaços midiáticos – Internet,
radiofônico: a Rede Aleluia, televisivo: os programas religiosos espalhados nos diversos
horários e nas várias emissoras comerciais, além de ser a proprietária da Rede Record
de Televisão, onde a sua presença ou existência ficam evidentes com a programação de
minisséries e de telenovelas que tem narrativas bíblicas como referencias. E
recentemente, o filme e o musical, “Os Dez Mandamentos”.
120
Nos anos noventa ela investiu em mega eventos organizados em estádios de futebol e
ginásios poliesportivos das grandes cidades brasileiras, os quais foram noticiados ou
não nas mídias do período. E entre os anos noventa e as primeiras décadas, o processo
da construção das catedrais nas capitais e nas grandes cidades do país. E por último, a
construção e a inauguração do Templo de Salomão no complexo do Brás marcando de
forma definitiva a sua presença ostensiva na cidade de São Paulo.
Porque o Templo de Salomão pode ser lido como a afirmação de existência ou do estar/
ser desta denominação? Elencamos estes motivos para explicar esta teoria.
I– A posição de sujeito no mundo:
A existência ou o ser, estar no mundo na cultura humana implica em adotar a posição de
sujeito (a atividade) e não de objeto dentro das diversas situações na qual a Humanidade
encontra-se socialmente inserida. Esta ação significa construir o existir como sinônimo
de habitar, de proteger etc, e com ele, a relação com o espaço humano, porque não
existe cultura, humanidade e as várias instituições sem a adoção deste elemento, seja
para habitar, seja para transitar, ou para reconhecê-lo como um espaço com uma
configuração especial: o espaço religioso e/ou o espaço sagrado (transcendente) sendo
este último, construtor e portador de sentidos e de significados diversos. Desta forma a
existência da Humanidade encontra-se associada a algum espaço e/ou lugar.
E a Igreja Universal do Reino de Deus ao construir o complexo do Brás, em especial o
denominado Templo de Salomão, que são formas de espaços humanos e sociais, afirma
a sua existência concreta no mundo, relacionando-se com a geografia do ser/estar como
agente ativo, como sujeito associando-se a um espaço para ser a sua sede nacional e
internacional, um santuário onde o grupo religioso pode reunir-se para fins devocionais,
um espaço para este habitar no mundo, onde as concentrações de fé ou as reuniões
afirmam a existência concreta do grupo e de sua cultura religiosa pentecostal. Assim a
ideia do existir, do ser/estar no mundo para a Igreja Universal implica em construir para
si um espaço, um lugar, um mundo, e o templo de Salomão reflete este aspecto a partir
de sua materialidade dentro do complexo do Brás.
Em conformidade com tal raciocínio, o templo de Salomão torna-se num edifício de
importância histórica para esta comunidade religiosa pentecostal contemporânea,
adotando a referencia/valor estético do diferenciado, do sagrado, do transcendente,
121
frente ao banal, ao comum de nosso cotidiano. Isto é fácil de perceber se observarmos
as diversas igrejas cristãs ao redor do mesmo. Mas existe em paralelo a esta observação,
a leitura que a elite iurdiana e os fiéis compartilham desta construção social, deste
espaço religioso – o espaço, o lugar do encontro com Deus /(Folha Universal,
4//10/2.015, p. B-10, B-11).
Portanto, um espaço concebido para esta finalidade que deve ser percebido desta forma
e vivenciado com esta forma de leitura
II – O exercício do poder no mundo:
A existência material do grupo no mundo através do templo de Salomão implicou no
denominado exercício do poder dentro da geografia. Denominamos a palavra poder
como a descrição de tudo aquilo que se quer, que se pode realizar. Ele, o poder é a
habilidade humana na qual se impõe a vontade de um sobre os demais, ainda que estes
outros venham a oferecer alguma forma de resistências a este poder ou vontade
imposta.Em conformidade com esta definição o exercício do poder é a prática da ação.
Exercício do poder classifica o Homem como sujeito ou como objeto. Na categoria
Homem-sujeito, o exercício do poder é a capacidade, habilidade ou possibilidade do
Homem coletivo ou indivíduo utilizar o trabalho intelectual e manual, e os demais
mecanismos ao alcance de suas mãos, para construir o seu espaço, o seu lugar, o seu
mundo. Já na categoria Homem-objeto, ele tem a sua ação, capacidades,
comportamentos e habilidades determinados pela vontade de outros indivíduos, porque
ele é o objeto sobre o qual este poder é exercido.
O templo de Salomão, como espaço religioso tem a sua sacralidade afirmada pelo
exercício do poder no meio religioso e social, e isto foi possível observar em nossas
visitas em caráter observatório ao local. O primeiro como sujeito na relação da Igreja
Universal do Reino de Deus com os diversos grupos humanos presentes em seu
complexo no Brás ao criar o conjunto de regras para a admissão humana dentro do
santuário para fins participativos na respectiva reunião.
O segundo, os grupos humanos como objetos desta relação de poder naquele espaço são
influenciados em seu comportamento religioso e social pelas regras existentes para cada
espaço, exemplo, fora do santuário, pode-se fazer fotografias de todo o complexo não
havendo interdição, as interdições ou as proibições passam a existir no tour religioso em
122
relação às visitas ao interior do tabernáculo do deserto, do Memorial/Cenáculo, onde
esta prática é vetada para o visitante, mas ele continua em poder de seu celular, máquina
fotográfica. tablet etc.
Tais regras são alteradas na admissão ao santuário do templo onde o indivíduo é
orientado a deixar estes aparelhos dos quais é portador no guarda volumes no
estacionamento do primeiro subsolo para depois ser revistado pela segurança feminina
ou masculina conforme o caso, utilizando aparelhos para detectar a presença de metais
ou não que deverão ser apresentados ao segurança para aprovar a liberação as
dependências do templo.
Ação dos levitas em encaminhar os visitantes para os lugares localizados à frente da
nave e do departamento de comunicação em solicitar o espírito de oração, o silencio e a
meditação nas mensagens bíblicas dos telões para aqueles que adentraram ao santuário
antes do início das reuniões, conformando o comportamento humano com o
conservadorismo das regras dentro de um espaço diferenciado do comum. Desta forma
podemos compreender a existência de dois espaços, o profano e o sagrado a partir das
regras existentes, a mais conservadora ou rígida para o espaço sagrado, e a mais liberal
ou menos rígida para o espaço profano dentro do complexo. Estas duas regras nos
revelam de qual forma a instituição religiosa administra e articula o seu poder social.
Na geografia o exercício do poder não implica apenas em criar as regras de
comportamento social como reflexo da diversidade de espaços ou de lugares existentes.
Ele, o exercício do poder implica em criar os novos espaços, bem como o ato de alterar
a função e a natureza dos espaços já existentes, e/ou de transformá-los a partir de sua
forma e conteúdo, a partir de dois fenômenos: a apropriação e o uso. Isto ficou presente
na história da construção do Complexo do Brás e do Templo através de suas diversas
etapas no meio urbano paulistano.
A primeira etapa, a apropriação – a política da aquisição dos diversos imóveis onde hoje
se situa o complexo, em outras palavras houve apenas a transferência da posse e da
propriedade imobiliária via operação de compra e venda ria direta, sem intermediários,
as imobiliárias do bairro. E a conseqüência direta desta ação a curto e médio prazos foi
o processo de especulação imobiliária. Dentro deste processo de apropriação espacial há
a aquisição do edifício condomínio Vidago, implicou na adoção de outra estratégia de
123
exercício do poder geográfico: a ocupação material do mesmo, dando novos conteúdos
a forma já existente.
Tornando-o em habitação dos pastores da instituição permitindo que este grupo tenha
dentro do condomínio visibilidade e voz como maioria entre os condôminos, exercendo
a sua influencia e poder na tomada de diversas decisões dentro dele.
Todo este processo citado foram práticas de exercício do poder que configuraram a
ampliação do território iurdiano no Brás o qual estava consolidado com a presença da
Igreja Universal com um espaço religioso apropriado para as demandas dos imigrantes
de língua hispânica, e com a catedral do bairro do Brás, que recebeu a alcunha histórica
dentro do grupo religioso como a catedral matriz do Brás, hoje, sede estadual.
Mas este existir ou ser/estar no mundo tornou-se mais concreto com o exercício do
poder dentro da área adquirida, com a demolição dos quarenta antigos edifícios,
comerciais e industriais e dos domicílios naquele quarteirão (CARDOSO. 2.014) e
início da construção dos novos edifícios do complexo, os quais foram guardados em
segredo da concorrência ao redor. Revelando ao público através da mídia institucional
as informações que interessavam ao episcopado naquele momento, ou permitindo o
vazamento proposital de algumas delas pela mídia não institucional em diversos
momentos.
As demolições e o processo de construção dos edifícios dentro do complexo
correspondem a etapa das diversas formas de uso que serão atribuídos aos diversos
edifícios ali construídos. Temos assim o fenômeno da transformação espacial urbana
onde edifícios degradados ou obsoletos, tal como a área pertencente ao antigo Lanifício
Paulista tem a sua arquitetura demolida para atender as novas formas e funções da
cultura religiosa contemporânea. Desta forma, a Universal afirmou a sua existência
material naquele espaço humano a partir da teoria geográfica desenvolvida por Brunhes,
a da destruição construtiva. Segundo ela, o Homem constrói para si um espaço ou lugar
ou mundo, destruindo para construir espaços, pois no ato de destruir ele começa o seu
processo de construção espacial (MOREIRA, 2.014).
Logo, o templo que simboliza este ser/estar no mundo, num espaço geográfico não tem
a sua construção iniciada com o lançamento da pedra fundamental com respectiva
cerimônia religiosa, mas no momento que os antigos imóveis que formam o quarteirão
124
onde está o complexo do Brás foram adquiridos e demolidos pela IURD, para uma nova
organização espacial porque ela exerce o poder como ser no mundo na categoria de
sujeito.
Destruindo a antiga ordem espacial via desordem espacial, o processo concreto da
demolição dos prédios, e depois organizando a nova ordem espacial que lhe é
conveniente, via construção física dos novos edifícios. Este método de transformar os
diversos espaços no templo, é a condição de afirmar a existência dela no mundo.
E a demolição é a instauração de uma nova ordem geográfica urbana, onde a Igreja
Universal do Reino de Deus articula o diálogo entre o espaço humano, a sociedade e o
tempo histórico. Porque a IURD demoliu e construiu o complexo e o templo? Porque
ela é uma instituição portadora de sentidos e de uma visão de mundo, e o templo de
Salomão como sua criação necessita apresentar estas características intrínsicas do grupo
religioso que o originou à sociedade, através da identificação criador/sujeito e
criatura/objeto. Pois ela é uma instituição religiosa que faz a sua leitura de existência,
do estar no mundo não pela capacidade de inclusão e solidariedade, mas da exclusão e
competitividade por visibilidade e voz.
Concorrência por espaços tanto no campo religioso nacional, como pelos mesmos
dentro da mídia, e dentro da cidade de São Paulo etc. Ela, a Universal assume a posição
de sujeito que intervém no mundo urbano através das diversas formas de exercício do
poder, fazendo com o aval, da sociedade ao seu redor o processo de demolição
construtiva, porque todas as suas ações são reconhecidas como legais (legítimas), ou
consideradas válidas pela sociedade maior.
B – O circuito da Conquista e da Superação:
A segunda parte deste item, o circuito da conquista e da superação tem como referencia
os estudos feitos por Gomes (2.011) sobre a construção das catedrais, em especial a do
bairro carioca de Del Castilho que é conhecida como a catedral mundial da fé. Portanto
não estaremos nesta pesquisa avaliando os aspectos técnicos da construção deste
templo, portador de uma arquitetura monumental, o qual antecede a construção do
Templo de Salomão pela Igreja Universal do Reino de Deus. Mas a cultura religiosa que
serviu de fundamentação na construção deste espaço religioso na cidade do Rio de
125
Janeiro estará presente na construção do mega-templo em São Paulo – que Gomes
denominou de circuito da Conquista e da Superação.
Trata-se de uma cultura triunfalista religiosa que alavanca o reconhecimento formal das
ações da IURD na sociedade e a inauguração prestigiada por diversas autoridades
políticas nacionais das três esferas de poder – executivo, judiciário e legislativo, das três
escalas geográficas, federação, estado e município, revelam este processo de
legitimação ou validação social, pois a Igreja Universal é portadora de uma existência
reconhecida em diversas áreas, principalmente na área política.
Pois desde a antiguidade a política e a religião andaram juntos, com a forte influencia da
espiritualidade, hoje num estado laico, mas com uma sociedade não tão secularizada
como a brasileira há a presença desta relação com o predomínio da laicidade. A foto
emblemática abaixo da presença das autoridades políticas laicas na inauguração do
templo em julho de dois anos atrás, reforça esta relação entre a política e a religião. Bem
como o aval, a legalidade ou o reconhecimento federal, estadual e municipal da
existência da Universal, do complexo construído e do templo em nossa sociedade.
(Foto extraída da revista Isto é – www. Isto é.com.br)
126
Posteriormente esta legitimidade ou reconhecimento formal e social feito pela presença
das autoridades citadas, será reforçado com as visitas das autoridades brasileiras, os
secretários de Estado do governo estadual paulista (Folha Universal, 12/01/2016, p. B-
10, B-11.), das autoridades do governo de Israel no Brasil (Folha Universal, 10/01/2016,
p. B-10; 04/09/2016, p. 4.5).
Bem como das autoridades civis relacionadas ao segmento do turismo na cidade e no
país (Folha Universal, 04/10/2015, p. B-10, B-11), por grupos de estudos da
comunidade judaica em Londres (Folha Universal, 06/03/2016, p. B-10, B-11),
E pela presença de diversos átomos sociais que representam a mídia, atores, atrizes,
apresentadores, e atletas de destaque internacional e nacional relacionados às diversas
modalidades desportivas praticadas em nosso país, portanto o reconhecimento formal
dos grupos formadores de opinião pública da existência da IURD no mundo através do
seu templo.31323334
O que é o circuito da conquista e da superação?
Para responde resta questão é necessário fazer o resgate da história da Igreja Universal
entre os anos oitenta e noventa, quando ela tem os seus grandes embates midiáticos com
a imprensa nacional com alguns órgãos de forma específica, contemplando a imprensa
como uma presença indesejável nas reuniões realizadas em seus templos, com a prisão
de Edir Macedo pela polícia federal na cidade de São Paulo, e os diversos processos de
acusação de curanderismo, de estelionato contra o seu fundador e contra a instituição
etc, que corresponde a o período da expansão da denominação na mídia e fora dela. É
neste período que esta cultura começa a ser gestada dentro do grupo religioso, tanto no
episcopado, como entre os fiéis, a cultura da conquista e da superação.
I – Circuito da Conquista:
A teoria do chamado circuito da conquista construído por Gomes em sua obra (2.011),
encontra-se ancorado na chamada memória coletiva do grupo religioso, no caso na
31
Reportagem: “Olho no Templo, olho no lance!” – O radialista Sílvio Luíz conheceu o local ao lado do
presidente da Rede Record (Luis Claudio Costa), e do diretor nacional de comunicação da emissora
(Celso Teixeira), Folha Universal, 01/05/2016, p. B-10, B-11. 32
Reportagem:“Luciana Gimenez no Templo: Apresentadora testemunha a grandiosidade e o caráter
sagrado da casa de Deus no bairro do Brás, em São Paulo”, Folha Uniiversal 16/10/2.016, p. 4-5. 33
Reportagem Heróis da vida real no templo”: Atletas e artistas realizam o passeio bíblico,” Rio de
Janeiro, Gráfica Universal, FU, 25/12/2.016, p. 4, 5 34
“Famoso árbitro do UFC, visita o Templo de Salomão”, Folha Universal, 10/01/2017,p.4, 5)
127
memória dos momentos de perseguição e de sofrimento da Igreja Universal do Reino de
Deus, ele reinterpreta as diversas formas de hostilização, vivenciando ser um grupo
religioso excluído e uma comunidade religiosa perseguida e sofredora.
Segundo a linha de pensamento desenvolvida por Gomes, podemos contemplar o mega-
templo erigido em Del Castilho, no Rio de Janeiro, e o Templo de Salomão no Brás, em
São Paulo, como ícones religiosos que revelam todo um processo de superação dos
obstáculos pela instituição ao longo de sua história bem como na construção deles. Cada
um deles representa a conquista ou a vitória alcançada e materializada, pois segundo
Macedo:
o seu grupo a não aceitar a condição de excluídos em todas as suas formas no
meio social, como a serem semelhantes ao Sol, tem brilho e luz próprios e
não como a Lua que depende de terceiros, do próprio Sol para emitir seu
brilho e luz (GOMES, 2.011, p. 99, 106-108).
Como foi citado no início do capítulo: os espaços religiosos refletem a teologia dos
grupos que estes abrigam, portanto, o Templo de Salomão materializa a cultura religiosa
da IURD, refletindo a vitória social dela contra a exclusão/perseguição que o grupo fora
vítima no período que citamos anteriormente e a presença das autoridades laicas na
inauguração do templo em São Paulo reflete a alteração da ordem: do conflito para o
diálogo, (GOMES, 2.011). Portanto, o templo de Salomão expressa materialmente e
simbolicamente a consolidação institucional do grupo religioso.
A conquista do brilho e da luz próprias, em ser o próprio Sol, presente nas pregações do
bispo primaz nas pesquisas de Gomes, ficou bem evidente quando da inauguração deste
espaço na cidade de São Paulo, como demonstra a foto abaixo.
Sendo considerada por muitos críticos e jornalistas como um espetáculo: uma noite de
gala vivida pelo bairro do Brás (CARDOSO, 2.014).
128
(Foto extraída do site www.istoé.com.br)
II – Circuito da Superação:
As hostilizações ocorridas passaram a ser interpretadas ou lidas por Macedo e pelo seu
colégio episcopal, compartilhadas com o grupo como etapas necessárias para obter as
conquistas, portanto a valorização do esforço de superação coletiva do grupo religioso.
A partir desta interpretação oficial a fé religiosa iurdiana venceu a perseguição e a
repressão com o fenômeno do crescimento e da expansão o grupo (GOMES, 2.011).
E a superação destes e de outros obstáculos existentes se materializa com a construção
das diversas catedrais e do templo como a resposta de um fenômeno consolidado no
meio religioso nacional – a necessidade da construção de novos espaços religiosos para
abrigar os novos grupos humanos que ingressaram na instituição neste período de
crescimento combinado com a hostilização de grupos midiáticos, isto é a presença de
segmentos da alta e da média classe média urbana, pois a Universal concebe a sua
expansão dentro e fora do país como um ato sobrenatural, de iluminação divina do bispo
Macedo. Esta forma de avaliação da presença de novos grupos na Igreja Universal e a
necessidade de novas construções é defendida por Proença com a qual concordamos:
A partir da segunda década, uma nova estratégia: a construção de suntuosos
templos, com capacidade para abrigar confortavelmente milhares de pessoas,
chamados de catedrais. A significativa presença de adeptos oriundos das
classes econômicas mais elevadas, exigindo um espaço de maior conforto e
acomodação, pode ter sido um dos motivos (PROENÇA, 2.014).
129
Assim, a capacidade de adaptação, da superação, implica em construir uma cultua de
não acomodação com os objetivos e resultados alcançados, nem de se atemorizar com as
adversidades e nem se intimidar frente aos obstáculos. O Templo exprime em sua
materialização a ideia da permanência, da solidez, da intenção e do investir no fixar, e
não da transitoriedade do grupo na cidade de São Paulo, e com elas a ideia da
continuidade e da consolidação acompanhadas da suntuosidade (GOMES. 2.011).
Pois segundo o bispo M. Crivella, a materialização e a visibilidade de um mega-templo,
como o Templo de Salomão é “a resposta audaz, da superação às discriminações que o
grupo vivenciou ao longo de sua história como também a potencia da instituição em
buscar o seu espaço no mundo.” (GOMES, 2.011, p. 158).
Logo, a construção do templo de Salomão, significa que a IURD investiu na sua
existência, no seu ser/estar no mundo, demarcando o seu lugar dentro da sociedade e do
campo religioso paulistanos por ela ser uma denominação diferenciada dos outros
grupos religiosos cristãos, e usa a sua capacidade em fazer para afirmar a sua
autoridade/existência e a diferença nas palavras do bispo, senador, e recentemente
prefeito eleito da cidade do Rio de Janeiro, Marcelo Crivella (GOMES, 2.011).
3.2 – Arquitetura e Monumentalidade:
Definimos o conceito de arquitetura como: a ciência que tem como objeto de estudos, o
concreto, a exteriorização material, tangível e visível das ideias ou imagens, bem como
das diversas técnicas em organizar espaços e criar ambientes para abrigar os diversos
tipos de atividades humanas valorizando nestas pesquisas a beleza, a forma, a
funcionalidade de tais edifícios construídos pela ação humana (KOOPÉR, 2.004).
Segundo Mourão (2.013, p.130, 131), “a arquitetura tem a capacidade em absorver ao
longo do tempo nas diversas culturas, religiões e sociedades, as teologias e as tradições,
alinhando-se com elas, reproduzindo de forma contínua tais estruturas e modelos.”
Criar, organizar e dar funções aos espaços são manifestações comuns entre a arquitetura
e a geografia, podemos afirmar que várias propriedades espaciais da geografia são
aplicadas na arquitetura.
130
Segundo o raciocínio desenvolvido por Guattari todo lugar, uma avenida, um parque ou
uma praça são espaços, porque são locais planejados e projetados para atender
determinadas funções (GUATTARI, 1.985.) A partir desta definição podemos
contemplar o complexo do Brás e o Templo de Salomão, como espaços porque foram
planejados e projetados para satisfazer determinadas atividades, necessidades e funções
se tornando em referencia externa.
Esta definição fica evidente quando o pastor Miguel Perez e outros responsáveis pelo
templo e pelo atendimento aos visitantes dentro do tour no complexo em suas
entrevistas deixam claro que a função é proporcionar a paz para aqueles que adentram a
ele, e o encontro do Homem com o divino, com o sagrado (Folha Universal, 04/10/2.15,
p. B-10, B-11).
O templo e o complexo são novos espaços: o espaço existencial denominado por
Guattari (GUATTARI, 1.985) e outros que os contemplam como possíveis instrumentos
de revitalização deste espaço urbano dentro da metrópole, após décadas de vivenciar um
processo de degradação de prédios associados a um processo econômico já superado, o
da industrialização têxtil.
E o aspecto de maior visibilidade da arquitetura deste edifício no bairro do Brás, é a sua
monumentalidade, a qual serve como parâmetro de avaliação por ser um espaço
apropriado deste meio urbano degradado, sendo revitalizado, transformado pelo
exercício do poder para uma nova função e um novo uso. Logo, o templo de Salomão é
um espaço apropriado e usado que agregou ou foi investido de uma supervalorização
simbólica, como um espaço sagrado a partir do lançamento da sua pedra fundamental.
Pois segundo Gomes (2.011) e Mourão (2.013), este caso específico evidencia a
existência de raízes sagradas dentro da arquitetura, e no caso do templo de Salomão não
há a experiência da revelação divina de um espaço sagrado, mas há um espaço profano
tornado em sagrado, sacralizado por um ritual e depois por uma construção considerada
sagrada, pois o lançamento da pedra fundamental do templo, tem o poder de garantir a
legitimidade da sacralidade daquele espaço (GOMES, 2.011; MOURÃO, 2.013).
Definimos a monumentalidade como a qualidade atribuída a uma edificação cujas
dimensões, estética, grande estatura e imponência despertam a admiração urbana em
131
diversos espaços, sociedades e tempos. O outro sentido desta qualidade menciona como
uma construção grandiosa que tem como finalidade de perpetuar a memória de um
acontecimento importante na vida de uma comunidade ou de uma nação ou um
mausoléu ou túmulo de uma pessoa heroificada por uma determinada sociedade.
Neste ítem utilizaremos a primeira versão de qualificação: edificação de grande estatura,
imponência que despertam a admiração. A monumentalidade do edifício que abriga o
santuário do templo faz parte do projeto de Edir Macedo para este espaço religioso da
IURD na cidade de São Paulo, segundo a arquiteta Carolina Gomes (THROUP, 2.011).
Portanto, ela é o mecanismo para que as pessoas apreendam/percebam que a obra de
Deus tem como referência, o arrojo, a grandiosidade, o luxo, a pomposidade e a
suntuosidade, um lugar para fins de referencia religiosa do grupo, um lugar de grane
poder e de paz, em resumo, num lugar da Memória (GOMES, 2.011).
Estas referencias que comentamos da monumentalidade do Templo estão presentes em
algumas entrevistas registradas na Folha Universal, a expressão grandiosidade aparece
nos relatos dos visitantes oriundos da África portuguesa, Angola e Moçambique sobre
o templo. O depoimento de Nelson Jimbi expressa bem o que estamos falando:
“O Templo é uma inspiração de Deus na Terra... É uma obra magnífica para o Deus
vivo da Universal” (Folha Universal, 22/03/2015, p.B-10, B11).
Além dos visitantes iurdianos da África portuguesa, palavras semelhantes a estas são
citadas pelo jornalista desportivo Silvio Luís e a apresentadora Luciana Gimenez ao
visitarem ao complexo e o Templo de Salomão (Folha Universal, 01/05/2016, p. B-10,
B-11; Folha Universal, 16/10/2.016, p. 4, 5), no caso do depoimento do jornalista ele
constrói a relação entre a grandiosidade/monumentalidade e o divino/sagrado. E esta
forma de relacionamento entre o santuário/templo e o divino/sagrado deve-se existe
porque todo o templo é um espaço cujas raízes da sua arquitetura é considerada como
sagrada (MOURÃO. 2.013). Logo, a arquitetura dita sagrada tem sentido e valor para o
Homem.
Mas a monumenalidade do Templo de Salomão não se limita à leitura que fizemos do
aspecto geográfico urbano paulistano seja por Cardoso (2.014), seja por Guatari (1.985),
ou pelo nosso trabalho de campo observatório naquele local, ou através da relação com
132
as crenças ou com a teologia deste grupo, presentes nas leituras de Proença (2.014) e de
Gomes (2.011) ou ainda das entrevistas da Folha Universal. Ela nos possibilita novas
leituras como o espaço existencial de um grupo religioso, o qual reforça o ser/estar da
Igreja Universal do Reino de Deus na capital de São Paulo. Quais os sentidos
articulados pela monumentalidade associados ao Templo que podem ser lidos por nós?
A primeira delas, a distinção entre a Igreja Universal do Reino de Deus e dos demais
grupos humanos dentro do campo religioso, o Templo pode ser lido como um contra-
espaço geográfico e religioso, um símbolo religioso que reforça a distinção entre ela e
os demais grupos de matriz cristã no nosso campo religioso, estimulando desta forma a
competitividade que faz parte da cultura religiosa iurdiana.
A segunda, o templo como um símbolo religioso contemporâneo dentro de São Paulo e
expressa em sua materialidade e visibilidade social, a cultura da concorrência, da
competitividade no campo religioso a partir de uma confrontação com a ordem religiosa
oriunda do catolicismo romano, a denominação cristã mais antiga na história da
sociedade paulistana não só devido a cultura herdada da reforma protestante – anti-
catolicsmo e a iconoclastia. Portanto, a construção de templos grandiosos não é mais
monopólio exclusivo do catolicismo romano, portanto, um elemento a ser agregado ao
processo de perda do monopólio religioso dentro da sociedade maior (FIGUEIREDO;
STORTO, 2.015).
Em Durban, África do Sul, a Igreja Universal utiliza o seu templo, a sua catedral
inaugurada em 1.999, no centro desta cidade para competir com os espaços religiosos
do Islam e do Hinduísmo, construindo ali um templo maior que uma das mesquitas
locais, referencia dentro do grupo na cidade e em tamanho no hemisfério sul (GOMES,
2.011). Na cidade de São Paulo a competitividade dela é com o catolicismo romano para
erigir mega-templos, espaços religiosos caracterizados por sua grandiosidade e luxo
arquitetônicos (FIGUEIREDO; STORTO, 2.015).
Isto fica em evidencia quando se compara o templo de Salomão com as dimensões do
Cristo Redentor, Rio de Janeiro em relação a altura, e da basílica de Aparecida do
Norte, situada no vale do Paraíba paulista, onde a referencia comparativa é o total de
133
área construída em metros quadrados. Em ambos os casos o Templo situado no
complexo do Brás é maior.
Terceiro, o templo de Salomão ao quebrar este monopólio religioso favorece uma dupla
leitura de sua arquitetura monumental. A primeira como um capital simbólico
pertencente à Universal em primeiro plano, porque ela vivencia o papel de sujeito ao
exercer o poder em criar este espaço humano, religioso, bem como as regras do mesmo
etc.
E em plano secundário, como capital simbólico pertinente aos demais grupos
protestantes, evangélicos pentecostais em nossa sociedade. Colocamos em plano
secundário porque há diversos grupos religiosos evangélicos que não se reconhecem
neste projeto arquitetônico, portanto há grupos discordantes da cultura religiosa da
IURD (GOMES, 2.011).
A ideia do templo como um capital simbólico religioso protestante ou evangélico na
cidade por elementos não pertencentes a IURD é a leitura espacial universalista ou pró-
ecumênica em diversos depoimentos midiáticos na imprensa e na televisão, através de
átomos sociais, individualidades que freqüentam ao templo, mas não são pertencentes
ao mundo midiático.
”O Templo é para todos: Não importa a crença, a origem ou a distância geográfica. O
local está aberto a qualquer um que queira um encontro verdadeiro com Deus,” (Folha
Universal, 31/07/2.016, p. B-10, B-11). Este jargão da cultura iurdiana encontra-se
presente em diversas edições da Folha Universal ao comentar a presença de grupos de
visitantes de diversas partes do Brasil e do mundo, que sem distinção visitam o
complexo.
Nas entrevistas junto à mídia televisiva o individuo fornece como dados pessoais, o
nome, o grupo religioso ao qual ele encontra-se associado ou tem pertencimento, seja
evangélico ou não (se este houver), as causas de sua presença no templo de Salomão,
quase sempre relacionadas a questão de ordem espiritual – conhecer o espaço e buscar a
Deus. Portanto trata-se de uma declaração informal, pública em defesa do universalismo
religioso, reforçando a ideologia iurdiana extraída da tradição universalista dos antigos
profetas, o qual é o jargão/moto do site sobre o Templo de Salomão.
134
Ela materializa este discurso universalista através das várias bandeiras hasteadas junto a
esplanada do templo, pois procura anunciar que o templo construído na cidade de São
Paulo é um local simbólico que tem o propósito em ser uma casa de oração para todos
os povos. (Folha Universal, 21/08/2.016, p.4, 5)
Temos assim o posicionamento iurdiano pró-ecumênico conforme os estudos de
Gutierrez (2.014) com um espaço religioso, sagrado, aberto a todas as religiões, por ter
as suas fronteiras borradas, indefinidas propositalmente.
Simultaneamente a ocorrência do processo anteriormente mencionado, há grupos
religiosos pentecostais simpatizantes do projeto, mesmo não pertencendo as fileiras da
Igreja Universal, que assumem para si o capital simbólico que o templo representa para
o mundo religioso protestante e evangélico pentecostal de nossa sociedade, tais como: a
Igreja do Evangelho Quadrangular de Vista do SoI (Belo Horizonte – MG), além dela,
representantes de outra igrejas sediadas em Belo Horizonte: Igreja Batista Getsemani. A
Igreja Batista Ministério da Aliança, a Igreja Assembléia de Deus Fonte dos Milagres a
Igreja Evangélica Peniel de Vitória–ES que estiveram presentes nos Encontros
interdenominacionais de Lideranças evangélicas ocorrido no Templo de Salomão entre
os anos de 2.015 e 2.016.
O pastor da denominação capixaba, Alcemir Pantaleão, 52, que participou do segundo
encontro em 2.01535
, fez a seguinte declaração sobre o templo de Salomão,
reconhecendo-o como capital simbólico dos evangélicos: “Eu compreendo o contexto
histórico de Israel e da construção dessa réplica do Templo de Salomão, e vivencio a
unidade do encontro de hoje. O que nos une é maior do que o que nos faz diferentes,
Deus é a base da nossa fé.”
Outro depoimento importante é o da episcopisa Regina Rocha da AD Fonte dos
Milagrem que participou do quarto encontro, realizado em 2.01636
: “Meu sonho era
pisar aqui [no Templo de Salomão]. Fizemos até pedido em oração no início do ano
porque queríamos realizar esse sonho. Não acreditei quando vi acontecer tão rápido”
A segunda leitura tem fortes aspectos geográficos no meio paulistano. A ideia do
contraponto cultural, geográfico religioso, ao catolicismo romano estabelecido no centro
35
II Encontro Interdenominacional de Lideranças Evangelicas: 03/2015 www.universal.org 36
IV Encontro Interdenominacional de Lideranças Evangélicas: 04/2016 – www.universal.org
135
de São Paulo, distrito da Sé representado pela catedral inaugurada em 1.954, na ocasião
do quarto centenário da cidade.
No caso do templo de Salomão, ele represente este contra ponto protestante, pentecostal
estabelecido num bairro central da cidade, próximo da Zona Leste da cidade,
inaugurado em 2014, na ocasião dos quatrocentos e sessenta anos da fundação da cidade
de São Paulo, sessenta anos após a inauguração da catedral na Praça da Sé. Reforçando
assim a situação de geográfica de opostos binário, entre centro e periferia dentro da
cidade com a emergência de um espaço religioso estratégico, marcado pela
resignificação e subjetividade, portanto um jogo do poder conforme os estudos sobre o
Templo de Salomão segundo Barbosa (2014). Agrega-se a este jogo, a questão
geográfica contemplada por Almeida (ALMEIDA, 2.012) sobre a grande presença
evangélica nos bairros da Zona Leste da cidade.
Quarto, a necessidade de um mega templo como referencia em solo nacional e no caso
paulistano, pois o templo da IURD em Del Castilho, Rio de Janeiro, cidade de origem
da IURD. Portanto o templo que abriga a sede da Universal encontra-se em solo
nacional valorizando as raízes da mesma no solo pátrio e no campo religioso brasileiro.
Se convertendo deste modo num contraponto político geográfico ao catolicismo romano
visto que este tem diversos templos no Brasil, mas a sede desta instituição religiosa, o
Vaticano, encontra-se na Europa, na cidade de Roma, Itália. (FIGUEIREDO; STORTO,
2015).
Quinto, o templo de Salomão é um desdobramento cultural, político e religioso do .
processo de institucionalização que ocorre dentro da Igreja Universal do Reino de Deus,
o qual tem o seu reflexo material com o advento da construção das catedrais dentro
desta denominação religiosa e a partir da segunda metade dos anos noventa do século
passado dentro e fora do Brasil. Porque todo o processo de institucionalização religiosa
é um discurso que faz a afirmação da existência de um determinado grupo no mundo, e
com ele o exercício do poder em suas diversas formas de realização.
Sexto, a monumentalidade, a ostentação, são os instrumentos que permitem grupos
religiosos expressarem a sua imagem, o seu poder junto à sociedade local. No caso da
IURD a ostentação no interior do santuário, e a grandiosidade ou monumentalidade no
exterior do prédio, reforça a aplicação da teoria arquitetônica dos séculos XVII, XVIII.
Segundo ela, os sentidos humanos são mais eficazes que o intelecto na adoção e/ou a
136
defesa de convicções especialmente aquelas relacionados ao poder religioso e ao
sagrado, porque a persuasão visual é uma das formas de se obter a atenção e o
reconhecimento (KOOPER, 2.004).
3.3 – A Cultura judaica e o pentecostalismo contemporâneo:
Entre as formas de exercício do poder no meio cultural é a apropriação e a manipulação
dos símbolos existentes dentro de uma religião ou de uma sociedade, e isto tem sido
uma prática comum no meio religioso brasileiro, em especial entre os diversos grupos
pentecostais contemporâneos. A maioria das denominações religiosas pertencentes ao
pentecostalismo contemporâneo cujos templos tivemos a oportunidade em conhecer e
visitar – Universal (templo de Salomão, Catedral de São Caetano, Igreja em Vila Diva),
a Igreja Plenitude do Trono de Deus, localizada no bairro do Brás.
A SOS JESUS na região da Vila Alpina são exemplos de comunidades evangélicas
pentecostais portadoras deste processo de apropriação dos diversos símbolos religiosos
pertencentes acultura judaica laica ou religiosa. As bandeiras do estado de Israel, da
cidade de Jerusalém, as réplicas da menorá, o candelabro de sete braços, dos rolos da
Torá e seus estojos de proteção etc são os símbolos mais evidentes nestes espaços
religiosos cristãos.
A cultura religiosa pentecostal contemporânea ao valorizar a mercantilização de bens
espirituais ou simbólicos coloca em evidencia a sacralidade destes objetos ao associá-
los à geografia bíblica, aos diversos espaços que o pentecostalismo contemporâneo
denomina de Terra Santa. Esta característica fica evidente nas práticas da Igreja
Universal, e de grupos religiosos que são dissidência da mesma, dentre elas: a Igreja
Plenitude do Trono de Deus localizada na avenida Celso Garcia, no bairro do Brás, a
uma quadra do Templo de Salomão, fundada pelo apóstolo Agenor Duque (ex-Igreja
Universal e ex-Igreja Mundial).
No dia em que visitamos a Igreja Plenitude do Trono de Deus, o pastor que dirigia a
reunião de libertação no sábado de manhã, comentava sobre o óleo importado de Israel
– Óleo Jeová Jiré como um bem simbólico, que ganhava uma valorização extra, a sua
consagração feita pelas mãos do apóstolo A. Duque que não deixa de ser um marketing
que reforça o carisma desta liderança religiosa.
137
Além dos casos mencionados por nós há o fenômeno da apropriação de bens religiosos
relacionados diretamente ao judaísmo, menorá, shofar, kipá, talit etc.
Trata-se de uma cultura de bens religiosos consumidos por diversos grupos evangélicos
pentecostais contemporâneos, os quais são negociados pelas diversas lojas de artigos
evangélicos da Rua Conde de Sarzedas e adjacências, região da Liberdade, bairro
central de São Paulo.
Quais seriam as causas desta cultura de apropriação de elementos relacionados ao
judaísmo por grupos cristãos pentecostais contemporâneos? Existem três autores com os
quais dialogamos para responder esta questão: Cunha (2.014), Gutierrez (2.014), e
Throup (2.011).
Cunha em suas pesquisas menciona que este processo de apropriação de imagens,
figuras e de narrativas da bíblia hebraica pela Igreja cristã é algo normal na história
desta, pois o Judaísmo é a religião de fé monoteísta ancestral ao cristianismo.
Portanto esta última é herdeira de diversos valores culturais e religiosos deste por ser
dissidência da mesma, desta forma ela afirma o conceito de linha de crença ou de
religião presente na sociologia da Memória.
Mas a questão que Cunha procura abordar é o ir para além desta prática cristã: isto é,
buscar imagens fortes nas narrativas da bíblia hebraica para justificar as experiências
humanas relacionadas com a teologia da prosperidade e da guerra espiritual (CUNHA,
2.014) ou um processo de apropriação da cultura do Antigo Testamento cristão dando a
esta uma re-significação, porque a bíblia hebraica é portadora de diversas compreensões
sobre o divino com teologias distintas (CUNHA, 2.014, p. 3, 15).
Ou a utilização de expressões ou de termos em língua hebraica presentes nas narrativas
dos diversos textos bíblicos, sendo elas utilizadas para outras finalidades. Exemplo:
próximo de nossa residência há um pequeno empreendimento comercial que tem como
nome Espetinhos El Shaday, ladeados de duas pequenas bandeiras do atual estado de
Israel, construindo assim um vocabulário hebreu entre os fiéis.
A expressão hebraica El Shaday – Deus todo-poderoso está presente no livro de
Gênesis, numa das entrevistas entre Abrão ou Abraão e o seu Deus padroeiro. O mesmo
138
se aplica ao azeite Jeová Jiré – Deus proverá relacionado ao episódio do sacrifício de
Isaque pelo seu pai, o patriarca Abraão.
Em nosso trabalho de campo entre os grupos religiosos pentecostais contemporâneos,
não contemplamos as outras possibilidades citadas por Cunha: a adoção do calendário
de festas fixas do judaísmo ou a exposição bibliográfica atualizada de personagens da
bíblica hebraica como modelos espirituais na atual sociedade capitalista.
A utilização de bens religiosos ou simbólicos do Judaísmo como elementos de
decoração dos espaços religiosos pentecostais contemporâneos, isto ficou bem evidente
no templo de Salomão, com uma menorá estilizada, na Igreja Plenitude do Trono de
Deus, no chão do púlpito há um enorme magen David que pode ser visualizado quando
não há a utilização deste espaço, e por uma posição privilegiada (alto). Já a comunidade
SOS Jesus, a junção de duas bandeiras do Brasil e do Israel na parede junto ao púlpito, a
presença da bandeira da cidade de Jerusalém entre as bandeiras dos diversos países nas
paredes laterais do espaço religioso.
A presença de elementos não religiosos, isto é, laicos da cultura judaica aparecem na
Igreja Universal fora do espaço de culto ou do santuário, o CCJ – Centro Cultural
Jerusalém, localizado na catedral de Del Castilho, no Rio de Janeiro, no qual localiza-se
a maquete da cidade de Jerusalém no primeiro século da Era Cívil, e no Complexo do
Brás em São Paulo, através do Memorial como espaço de exposição cultural, virtual e a
praça das nações situada junto a esplanada do Templo..
Nesta última encontra-se hasteada as diversas bandeiras dos países onde a Universal
encontra-se presente, dentre elas, a do Estado de Israel, situada estrategicamente junto
às bandeiras do Brasil e da Igreja Universal do Reino de Deus. E no caso da bandeira de
Israel, quais as razões de sua presença na praça das bandeiras e em posição
privilegiada? Existem explicações conhecidas para esta questão.
A primeira delas, a igreja Universal do Reino de Deus tem um espaço religioso situado
na cidade israelense de Telaviv, capital política de Israel, logo o estandarte deste país se
encontra nesta praça junto com as bandeiras dos outros países onde ela atua.
A localização privilegiada da mesma ao lado dos estandartes do Brasil e da Igreja
Universal é o modo dela revelar a sua identidade com uma linha de crença ou de
religião – o monoteísmo abrahâmico proveniente do Judaísmo, pois historicamente o
139
Judaísmo é a fé ancestral do Cristianismo. Justifica-se esta linha de crença/religiosa
devido ao Templo construído em São Paulo procura ser uma réplica fiel do original que
fora edificado na cidade de Jerusalém, construindo assim uma relação com o passado
arquitetônico e religioso do grupo étnico, pois o templo yerushalamita foi o modelo
inspirador do templo construído no Brás. (Folha de São Paulo, 21/08/2.016, p. 4), sendo
esta relação reafirmada com a importação dos trinta e nove milhões, nove mil e trinta e
sete metros de pedras de Israel (Folha Universal, 21/08/2.016, p.5). Portanto, há a
consolidação de laços estreitos entre a Igreja Universal e a Terra Santa.
O único momento onde a cultura judaica laica ganhou espaço no interior do santuário
foi na inauguração deste em trinta e um de julho de dois mil e catorze, quando foram
entoados o hino nacional brasileiro, o Hatíkva, o hino nacional do Estado de Israel, e
canções israelenses (GUTIERREZ. 2.014). A intenção da Universal com o CCJ e com o
Memorial do Complexo é a de promover a cultura e da história de Israel.
Gutierrez dialoga sobre esta questão tomando a IURD como exemplo desta prática.
Segundo ele, esta relação construída entre os pentecostais contemporâneos e o antigo
testamento deve-se ao fato que os rituais judaicos são riquíssimos em símbolos, ao
ponto deles abranger cerca de três quartos da bíblia hebraica. Isto nos leva a concluir
que tal grupo religioso encontra-se muito próximo do Judaísmo, porque elementos
destes rituais presentes nas narrativas são apropriados, incorporados e re-significados
em seus cultos (GUTIERREZ, 2.014).
Estas etapas: a apropriação, incorporação e re-significação que é citado por Cunha,
como por ele, Gutierrez e por Trhoup nas respectivas análises sobre o tema. Pois todo o
processo tem um objetivo, extrair daquele exemplo humano, ou objeto, ou expressão
cultural do seu contexto cultural e religioso original das escrituras, re-significá-lo para
que este tenha a sua aplicação prática na vida do fiel.
Em nosso trabalho de campo no Templo de Salomão percebemos este processo com a
utilização de dois objetos privados do culto judaico – a mezuzá, e o talit, que foram
utilizados como ponto de contato em campanhas, a mezuzá estilizada reproduzida era
feita em tecido e com uma abertura para se por nela, o pedido de oração, oferta etc, o
mesmo ocorreu com o talit.
140
Ora, sabemos que os objetos associados ao judaísmo tem um alto custo econômico e
cultural nas lojas de artigos religiosos judaicos por serem artesanais ou importados
reforçando a partir do consumo de produtos desta cultura a memória e a tradição étnica
do grupo. A indagação então porque destruí-las por incineração segundo o bispo que
presidia a reunião já que teriam este alto custo? Para esta questão temos três respostas:
Por não serem objetos autênticos ou originais, portanto imitações com baixo custo de
produção que se convertem em objetos descartáveis, produzidos especialmente para tal
contexto religioso com o fim da campanha perdem a sua função sagrada ou simbólica
dentro do mercado deste tipo de bens, não sendo reaproveitadas para outras campanhas,
reforçando desta forma a cultura da IURD em relação ao passado.
Evitar na medida do possível a atitude do fiel em se converter em colecionador destes
objetos de campanha em seu ambiente doméstico, dando a eles outras funções e
significações, pois a Universal teria este monopólio de construir funções/significações
simbólicas e a aura de sagrado para tais objetos é quebrada, portanto, há por parte da
instituição uma política em controlar o acesso deles ao público.
E ao mesmo tempo impedir os famosos questionamentos construídos por outros grupos
evangélicos sobre as suas práticas religiosas equiparando a mercantilização de bens
simbólicos, dos pontos de contato à prática da idolatria, da magia, pois tal conclusão
leva esta instituição a ser vista como uma denominação cristã, evangélica impura etc
como afirma o documento oficial da IPB (GOMES, 2.011, p. 123-128).
Outro fato importante é a cosmovisão religiosa do grupo compartilhada entre bispos e
fiéis: a Igreja Universal é o Israel mítico, a continuação do conceito de povo eleito,
sagrado, dos antigos hebreus, que é confirmado por diversos discursos episcopais.
“Nós usamos muito do Antigo Testamento. Esse é um dos segredos da
Universal para o sucesso, com certeza. Pois ali está a manifestação do Deus
vivo e também porque nós somos os novos hebreus. Fomos perseguidos,
humilhados, açoitados, mas nos revoltamos, lutamos e hoje conquistamos”
(Bispo Guaracy) (GUTIERREZ ,2.014, p. 10 ,12).
Segundo Gomes (2.011, p. 137), o bispo e deputado federal Carlos Rodrigues em 2.003
fez no Rio de Janeiro, o discurso de equiparação ente os fiéis da Universal aos judeus da
diáspora primária no século XIX:
(...) Somos como os judeus, quando não tinham pátria, faziam das sinagogas
a sua nação e a sua pátria, é ali que discutiam o novo estado de Israel
141
(presença do movimento sionista nos séculos XIX e XX), cultura, idioma
etc.(GOMES, 2.011, p. 137)
Dentro desta lógica há sentido no nome escolhido para o espaço religioso, a catedral
mundial de Del Castilho, Rio de Janeiro – Templo da Glória do Novo Israel. Mas esta
lógica só é possível entender graças ao alinhamento da instituição com o atual Estado de
Israel e com a absorção da cultura religiosa judaica pelo grupo cristão.
O alinhamento ideológico e religioso entre a Igreja Universal do Reino de Deus, na
pessoa de Edir Macedo, e do moderno estado de Israel, a partir das instituições deste e
dos seus ministros de governo, a partir do discurso de Macedo frente ao ministro do
Turismo de Israel:
“Acreditamos num Deus que se revelou primeiramente para o povo de Israel, então o
nosso Deus é o Deus de Israel, por isso, há uma sintonia de fé entre nós (Folha
Universal n° 253, 09/02/1.997 p. 1ª, GOMES, 2.011, p.175).
E o terceiro sobre a relação entre os judeus e o Templo construído pela Universal no
Brás, pois esta presença local é utilizada para ressaltar a importância histórica do templo
temos como exemplos importantes, a presença das lideranças não religiosas da
comunidade judaica nacional e de São Paulo registrada no site da Universal em
03/08/2.014, no qual encontramos o seguinte comentário: O Templo de Salomão é uma
ferramenta para despertar a fé para o único e verdadeiro Deus e estará aberto a todos os
judeus e a todos os povos do mundo” (Universal. Org. Com; GUTIERREZ, 2.014).
E dentro desta relação, temos o registro de duas visitas do rabino Yehiel Ecskstein ao
templo (/03/2.015, 06/2.016). Segundo este rabino, o templo faz o resgate minucioso
das raízes bíblicas para a fé das pessoas. Além de ser uma casa de oração para todos, e
não somente para os cristãos. (BEZERRA, 2015). .
O terceiro autor é Throup que no seu artigo reconhece a existência de um processo de
apropriação, re-significação dos símbolos veterorestamentários no pentecostalismo
contemporâneo nacional, abordando no seu artigo as raízes históricas deste
comportamento religioso, como uma ideologia importada dos EUA e o perfil dos grupos
que a adotam: heterodoxia e pragmatismo.
Segundo ele, os símbolos criados pela cultura humana, principalmente os religiosos são
símbolos concretos, conhecidos, portanto, podem ser evocados pelo ser humano em
142
diversas situações e não podem ser compreendidos pela razão humana seja de forma
direta ou seja de forma indireta, pois tais símbolos são portadores de uma realidade
invisível que se converte em sinal visível (THROUP, 2.011).
Para Throup existem três formas de fazer este processo de apropriação e de re-
significação, o primeiro através dos sermões pregados pelos grupos pentecostais
contemporâneos, os personagens da bíblica hebraica são esvaziados de seus defeitos e
pecados, e tendo as qualidades espirituais, físicas, emocionais e espirituais dos mesmos
supervalorizadas, re-significando aos atos, palavras e sentimentos destes.
Este modelo de mensagem visa atingir o cotidiano da vida dos fiéis destes grupos,
através do pragmatismo expresso em práticas religiosas sincréticas (TRHOUP, 2.011, p.
118). O segundo método por ele estudado é o processo de remitologização de objetos,
onde a procedência geográfica dos mesmos fornece ao seu usuário a informação de que
ele é um produto dito diferenciado, no caso da cultura religiosa este bem se converte
artigo simbólico porque ele é sagrado devido as suas conexões locais ou origens.
Este é o argumento construído pelos modernos grupos religiosos cristãos pentecostais
em relação a cidade de Jerusalém e ao espaço geográfico do atual Estado de Israel, os
quais ganham o nome de Terra Santa, construindo um espaço diferenciado e mais
sagrado do mundo dentro da cultura cristã do passado e do presente. Portanto se o local
é santo, este artigo ou produto agregará tal qualidade (THROUP, 2.011).
Este processo ficou evidente com a importação de pedras de Hebron e de Jerusalém,
Israel para serem utilizadas na construção do Templo no complexo do Brás, em São
Paulo. Alia-se a este projeto a intenção espiritual do episcopado iurdiano – trazer “a fé
de Israel” para os dias de hoje, mas sem explicar o modo de como isto poder ser
realizado.
E o último fato de pesquisa sobre este processo é a teoria do misticismo emblemático,
que ao resgatar os símbolos veterotestamentários, fazem o esvaziamento parcial/total do
emblema ou símbolo religioso judaico, retirando ele do seu contexto original.
Depois há etapa do reaproveitamento da forma, da estética deste, e a incorporação de
parte destes antigos significados ou de novos significados e sentidos produzindo uma
nova carga simbólica do mesmo e inserindo ele num novo contexto, atendendo aos
interesses de quem controla este (THROUP, 2.011). Um exemplo claro deste processo
143
foi a monumentalidade do templo de Salomão construído no Brás pela IURD. A
monumentalidade e a grandiosidade não é a carga simbólica original dos dois templos
de Jerusalém, porque este é maior do que os edifícios religiosos citados nos registros
bíblicos (THROUP, 2.011).
Este processo citado por Throup reforça os nossos argumentos de desterritorialização do
sagrado de seu espaço ou lugar de origem, bem como do próprio Templo, e a sua
reprodução como um espaço não aurálico, sendo recriado sem a relação física com o
tempo, e com o passado do mesmo.
3.4 – O Templo de Salomão e as Memórias:
O templo de Salomão assim como os demais edifícios do complexo construído pela
Universal são espaços e subespaços concebidos e planejados que nos permite através da
nossa experiência a partir do trabalho de campo e da teoria desenvolvida por Pierre
Norá, a leitura simultânea de duas relações deste subespaço do complexo – templo com
a Memória.
O Templo de Salomão é um local privilegiado dentro da cidade, com grande destaque
visual consagrado para a finalidade religiosa, ele é um lugar segundo os conceitos
construídos pela geografia: uma produção humana que articula diversas relações com as
afetividades, as experiências, os pertencimentos, o poder, as tradições etc. Isto o torna
diferenciado e com significados singulares. Sendo ele um lugar, há a possibilidade em
articular duas relações com a memória – o lugar da Memória, e a Memória do Lugar,
abrigando nesta segunda relação às diversas memórias constituídas a partir dos diversos
subespaços e lugares dentro do complexo (GOMES, 2.011.
I – Lugar da Memória:
O existir ou o ser/estar da Universal no mundo implica em intervir muitas vezes na
memória e na tradição da cidade onde ela se faz presente, isto implica em ser um
movimento religioso que não cultiva qualquer ligação orgânica com o passado urbano
dos locais onde ela se encontra. E a explicação desta posição é o fato da instituição se
afirmar como um movimento religioso moderno e anti-tradicional.
Assim, o complexo construído no Brás, e o Templo de Salomão, são demonstrações
deste processo de intervenção na memória urbana – a demolição do antigo edifício que
144
abrigou o Lanifício foi uma destas intervenções destruindo parte do passado da cidade e
do bairro.
A medida que a Igreja Universal vivencia de modo lento e gradativo a experiência da
institucionalização como grupo religioso, o Lugar da Memória ganha sentido especial
para o mesmo, ainda que este seja uma construção mediada pelo carisma do bispo Edir
Macedo. Assim, o complexo e o templo, ao se tornarem no lugar da memória da
Universal revelam a outra face da intervenção do grupo religioso dentro da memória da
cidade de São Paulo, construindo nela o seu espaço.
Definimos o Lugar da Memória como o envólucro, o estojo que guarda e protege uma
determinada informação – memória coletiva ou individual. Ele pode ser um quadro,
uma fotografia, um hino religioso etc. Mas pode também ser um espaço ou lugar
específico de uma determinada memória: arquivos históricos, bibliotecas, museus etc, e
no meio religioso, desde as diversas cerimônias litúrgicas, e os denominados lugares
sagrados, os cemitérios e os diversos espaços religiosos. Em conformidade com esta
informação de Norá (1.992), o lugar da Memória é um espaço construído pelo Homem
contemporâneo para preservar identidades, lembranças e pertencimentos.
Tanto Halbwachs como Norá concordam que os diversos lugares da Memória são
mecanismos de acesso e de fixação desta na sociedade.
Com tais informações podemos contemplar o Templo de Salomão como o lugar da
Memória da Igreja Universal do Reino de Deus, porque ele é um espaço geográfico
sustenta os significados da Memória, porque ele faz a afirmação e a preservação da
memória religiosa da mesma frente aos outros grupos cristãos na sociedade, e segundo
Hervieu Leger toda a memória é fruto de uma demanda coletiva e social (HERVIEU-
LEGER; WILLAIME, 2.009).
Logo, ele, o Templo é um espaço onde a memória do grupo encontra-se abrigada,
tornando o passado dela conhecido, legitimado e a elite religiosa da IURD como um
grupo concreto, capaz de articular e de mobilizar lembranças e memórias. (HERVIEU-
LEGER; WILLAIME, 2.009).
Em sua obra, A topografia Lendária dos Evangelhos na Terra Santa (1941), Halbwachs
esposa a teoria da espacialização da Memória, porque toda a memória precisa estar
ancorada num espaço geográfico, num lugar para ser conhecida e reconhecida
145
(HEVEU-LÉGER; WILLAIME, 2.009). Logo, a construção e a inauguração do templo
em Julho de 2.014 se torna num importante passo na construção do Lugar da Memória
da Igreja Universal do Reino de Deus.
A presença em destaque da bandeira nacional e da bandeira da IURD presentes na praça
das bandeiras, situada na esplanada do Templo reforçam o local como um lugar da
memória da instituição.
A bandeira do Brasil reforça as origens geográficas e nacionais do grupo religioso,
porque foi no Brasil que começou a história da Igreja Universal, no bairro do Meier, Rio
de Janeiro, em 1.977. Esta forma de memória coletiva cultivada pela Igreja Universal
não se restringe aos dados históricos do grupo, mas ancora-se no início do ministério de
Edir Macedo – um funcionário público estadual com uma carreira bem sucedida, que
abandona a mesma para dedicar-se a pregação do evangelho num coreto do bairro,
valorizando-se assim a biografia desta liderança como elemento fundador.
A bandeira da Universal com o seu emblema relacionado à sua identidade com o
pentecostalismo valoriza a instituição religiosa nacional e a sua experiência de um
processo de expansão internacional, exportando crenças, ideias, práticas, e enviando
pastores brasileiros para países de um mundo globalizado..
Temos assim a afirmação de que o Templo é um lugar da memória institucional,
construindo a identidade, em oposição aos grupos religiosos pentecostais e protestantes
que tem a sua presença a partir de missões estrangeiras enviadas ao Brasil entre meados
do século XIX e o início do século XX.
A tais dados mencionados por nós, temos o projeto da IURD, “do Coreto da Praça do
Méier, até o Templo de Salomão no Brás,” reconstrói a trajetória do bispo Macedo e da
Igreja Universal do Reino de Deus no eixo geográfico Rio de Janeiro e São Paulo é a
prova de que a memória religiosa pode ser espacializada, resgatando a experiência de
quase quarenta anos atrás.
Este trajeto foi feito pelo grupo da FJU/Colômbia, visitando os espaços inicial e final,
fazendo o trânsito entre as duas megalópoles mais importantes do país, Rio de Janeiro e
São Paulo, construindo através do Lugar da Memória o roteiro espacial de peregrinação
dos jovens iurdianos que participaram desta caravana: Coreto do bairro do Meier, a
IURD-Abolição, a catedral Mundial de Del Castilho e os seus subespaços, a Catedral do
146
Brás, de Santo Amaro, o Templo de Salomão e seus subespaços (Folha Universal,
08/11/2.015, p. B-10, B-11). Desta forma há o registro de uma memória construída a
partir da evocação de uma lembrança interpretada pela crença, pela narrativa e pela
experiência.
A visita das diversas caravanas estrangeiras de membros da Igreja Universal a este local
evoca a memória a partir das experiências, das falas, das sensações e dos sentimentos
que estes grupos partilham entre si com determinado espaço.
Mas esta afirmação do Complexo e do Templo como Lugares da Memória da Universal
ganha sentido com este fenômeno de peregrinação internacional interna noticiada em
diversas edições da Folha Universal criticada por lideranças religiosas evangélicas no
pós-inauguração por considerar o complexo e o templo, numa nova Meca (CARDOSO,
2.014).
O papel destas caravanas de fiéis iurdianos é o de estimular a recriação contínua da
lembrança, da memória da IURD, diante de uma demanda: uma memória autorizada,
verdadeira, de combate frente aos conflitos da Igreja Universal do Reino de Deus, ora
com as denominações evangélicas anteriores a ela, ora com as dissidências diretas e
indiretas surgidas a partir da Igreja Universal do Reino de Deus, onde estas últimas são
contempladas por ela, como grupos ou movimentos religiosos portadores de uma
memória condenada, não autorizada ou não verdadeira (HERVEU-LÉGER;
WILLAIME, 2.009).
O Templo e as diversas catedrais da denominação na cidade reforçam a existência
material do grupo religioso em nossa sociedade. Além desta qualificação, o templo
construído no Brás impede um processo de esquecimento – o período da perseguição
sofrida pelo grupo nos anos noventa, se tornando na resposta dada pela instituição aos
críticos e intelectuais que nutriam de curto à médio prazos a expectativa do seu
desaparecimento religioso e social e aqueles que teceram críticas teológicas de
inautenticidade das suas diversas práticas religiosas (GOMES, 2.011).
Ele como lugar da Memória favorece a construção da identidade da Igreja Universal do
Reino de Deus, a sua distinção dos demais grupos religiosos cristãos na sociedade
paulistana. Pois dentro da cultura religiosa deste grupo a relação de oposição é o
mecanismo de construção e da afirmação de tal identidade. E com ele, um referencial
147
histórico, de ser o povo escolhido, o Israel mítico (GOMES, 2.011), sendo uma
instituição cristã com o compromisso de divulgar o evangelho no mundo.
II – Memória do Lugar:
A relação entre O Lugar e a Memória não se limita ao Lugar da Memória, a partir da
dialética, Norá (1.992) também explorou os estudos sobre a Memória do Lugar na
França. Tomando como referencia o Complexo do Brás. ele abriga uma unidade
composta por fragmentos, pela diversidade de lugares, pois nele temos Memória de
diversos lugares. Denominamos de Memória do lugar a capacidade humana e social de
prover indicações ou vestígios de uma memória, podemos tomar por exemplo dos
imóveis adquiridos e derrubados pela Universal para construir o complexo e o templo.
Eles farão parte da Memória do Lugar na vida destes ex-moradores do Brás., dos ex-
funcionários do Lanifício Ítalo Paulista, como também dos arquivos dos sindicatos
patronal e operário do ramo têxtil de nossa cidade.
Para os nossos estudos a teoria de Norá, articula a memória de diversos locais que tem
existência geográfica, mas que se encontram distantes da presença da maioria das
pessoas, que por sua vez constituíram diversas experiências humanas. no caso, os
espaços relacionados com a Memória da religião cristã no Oriente Médio, a Terra Santa.
Os quais foram reproduzidos como lugares temáticos dentro do complexo do Brás.
Definimos os lugares denominados de sagrados, aqueles espaços que estão relacionados
os fatos que deram origem a uma determinada fé e com eles a lembrança do fato
fundador. Segundo Rivera (2.010, p.39), “todo o espaço ou lugar tem um peso material
decisivo na fixação da memória coletiva, porque os locais que evocam tais lembranças
religiosas oferecem a estabilidade para elas.”
Segundo E. Macedo, conhecer a Israel é mais do que um sonho, é uma experiência
pessoal, única, madura com o Senhor, um momento que não pode ser esquecido, uma
necessidade de todo cristão para ser forte frente às adversidades, lutas e perseguições
(Folha Universal, 253, 09/02/1.977; GOMES, 2.011) .
Gomes referenda esta ideia de Macedo, através de sua pesquisa sobre a relação entre a
IURD e a Terra Santa e seus lugares, a partir de um levantamento de matérias sobre o
tema no órgão midiático do grupo, a Folha Universal. a partir do ano de 1.977.
148
GOMES, 2.011). Podemos citar a edição de n° 253, de 09/02/1.977 com quatro artigos
sobre o assunto dentro dela :
I – Igreja Universal conquista Israel, II – A conquista da cidade do grande Rei,
Jerusalém, III – Clamor na Terra Santa, IV – Visitar Israel é o sonho de todo o cristão.
Uma das características da IURD é investir em espaços que valorizam a autenticidade
não aurálica, isto é a valorização do aspecto da recriação/reprodução, emitindo
mensagens a sociedade ao seu redor, tanto de permanência, como de singularidade. E o
complexo construído no bairro do Brás é uma destas mensagens emitidas pelo grupo
religioso (GOMES, 2.011). Trata-se de um processo de re-encenação/repetição de
determinados episódios/eventos bíblicos, valorizando montes, santuários etc, os quais
são práticas questionadas por outros grupos religiosos cristãos protestantes (GOMES,
2.011).
Todos eles são espaços/lugares que evocam o visitante a levar o pensamento à terra
santa como afirmam os bispos Domingos Siqueira e Edir Macedo (UNIVERSAL,
25/09/2.014, Folha Universal, 386, 1.999, p.1; GOMES, 2.011). Temos desta forma o
estímulo de duas memórias, a coletiva religiosa e a individual religiosa pela instituição.
A intenção da IURD em relação aos grupos de visitantes é promover uma memória
coletiva – uma experiência única com Deus, por ter as suas orações ouvidas neste local,
e a sentirem-se estar no templo original, percebendo-o como um espaço destinado à um
gênero de memória, a memória religiosa.
Como também há o estímulo ou a mobilização de uma memória religiosa
individualizada de membros de tais grupos visitantes, por este ser um espaço histórico e
representativo para a humanidade. Estas duas relações da Igreja Universal do Reino de
Deus com a memória coletiva e com átomos ou individualidades referendam o
raciocínio de Halbwachs sobre a dependência da memória individual em relação à
memória coletiva de um grupo concreto, onde a primeira como elemento individual
revela pontos de vistas culturais diferentes, particulares, dentro de uma memória
coletiva ou grupal (HERVIEU-LÉGER; WILLAIME, 2.009).
Pois elas são memórias que se encontram ancoradas de forma efetiva à uma experiência,
a uma referencia espacial-temporal, a um acontecimento que teve um lugar – o
complexo do Templo de Salomão e os subespaços deste.
149
O Complexo como a Memória de um lugar ou a Memória de diversos lugares, valoriza
não apenas os denominados espaços devocionais ou religiosos, restringindo-se ao
Santuário e ao Templo, como espaços ditos sagrados, como também a espaços cuja
sacralidade é menor em relação ao Santuário do Templo, que valorizam acontecimentos
de ordem cultural, histórica-religiosa e social, estas últimas ideias ficam evidentes com
a ocorrência do tour no chamado Jardim Bíblico, o qual tivemos a oportunidade em
fazê-lo. Cada um destes lugares temáticos construídos dentro do complexo encontram-
se ancorados num acontecimento ocorrido num determinado espaço geográfico da
cultura religiosa judaico-cristã, tanto do antigo testamento cristão, como do novo
testamento. São eles: o tabernáculo do deserto junto a imagem do Monte Sinai, o Jardim
das Oliverias, também conhecido como o horto das Oliveiras ou por Jardim do
Gtsemani, o Memorial e o Templo estão associados a cidade de Jerusalém. Como
explicar esta associação?
Toda memória religiosa é dependente de uma base material permanente que é fornecida
pelos lugares sagrados de uma fé (RIVERA, 2.010). Logo, o complexo do Brás abriga
em suas réplicas a forte relação entre estas réplicas e os seus lugares sagrados originais.
E o grande marketing que a instituição faz na Folha Universal destes locais, é que elas
são réplicas ditas fiéis aos seus originais.
I – Tabernáculo do deserto:
O Tabernáculo do deserto é o primeiro registro bíblico do culto religioso móvel dentro
da história de Israel antes da conquista da cidade de Jerusalém por David e antes da
construção do primeiro templo nesta cidade, por Salomão.
Porque esta relação espacial com o Monte Sinai?
O registro da evocação da hierofania que a bíblia narra a entrevista entre Deus e Moisés
antes do êxodo hebreu e depois do mesmo, a entrega das dez palavras e o modelo do
tabernáculo, seus subespaços e conteúdos para cda um deles. Em diversas inserções
midiática escrita ou televisiva vinculadas a campanha do Monte Sinai nos últimos dias
do ano, a hierofania é evocada, como o local físico onde Deus desceu.
Na cultura religiosa da Igreja Universal o Monte Sinai localizado no Oriente Médio, é
considerado como o único altar natural existente no planeta, sendo ali queimados os
150
diversos pedidos que foram levados até aquele local por Macedo e bispos. (GOMES.
2011).
Por causa desta valorização geográfica houveram dois comportamentos religiosos
importantes que Gomes destaca em suas pesquisas: os altares dos templos foram
consagrados com a terra “santa” trazida da região deste acidente geográfico natural,
Nos templos localizados no Brasil temos a reprodução holográfica da montanha,
cobrindo o altar/púlpito e com ela a possibilidade do fiel fazer figuradamente o trajeto
dos seus líderes, imitando os mesmos (GOMES, 2011).
No ano de 2.016, nas igrejas comuns onde este segundo acontecimento ocorreu, tivemos
o uso da mídia para integrar os fiéis aos seus bispos em Israel assistindo online esta
Fogueira Santa do Monte Sinai. De certo modo a Igreja Universal conserva consigo
neste ato religioso coletivo, a antiga cultura pentecostal de orar no monte, e de
conservar através deste ritual a cultura religiosa de longo prazo que acompanha o
Homem em seu contato com o sagrado, constituir, eleger para si montes ou montanhas
sagradas. Além da campanha realizada no Monte Sinai citamos outros montes ou
montanhas sagradas, tais como o Monte Carmelo (nesta campanha há o reforço
ideológico de associar a IURD ao profeta Elias e ao Deus do mesmo), os Montes Moriá
e Hermon (GOMES, 2011; Universal. org. com 2015).
II – Jardim das Oliveiras:
Dos quatro espaços ou lugares temáticos existentes dentro do Complexo do Brás, este é
o único deles que não tem subespaço. A réplica relaciona-se com um espaço
humanizado no Oriente Médio associado à prática de uma cultura especifica junto a
região do antigo templo e dentro da cidade de Jerusalém.
Este espaço da Igreja Universal tem vários nomes bíblicos: o horto/jardim das Oliveiras,
ou jardim do Getsêmani. Todos eles nos indicam a presença da azeitona em Israel
antigo e o principal produto – o azeite/óleo de oliva ou da oliveira, citado em diversos
textos da bíblia. Portanto este espaço valoriza a questão de um gênero de necessidade –
a produção do azeite de oliva e das azeitonas na culinária de Jerusalém.
Além da questão do gênero de subsistência na geografia, os dois lugares, o original e a
réplica mencionam a experiência, a lembrança, a memória cristã dentro do Oriente
Médio, pois tal espaço é evocado nos evangelhos como um dos locais de oração de
151
Jesus de Nazareth dentro da cidade de Jerusalém, através da expressão – como de
costume, e o último lugar que ele freqüentou antes da sua prisão e execução. Portanto
um dos espaços relacionados à paixão e ao sofrimento do fundador do cristianismo em
companhia dos seus seguidores mais diretos, os apóstolos e dentre eles, Pedro João e
Tiago segundo o texto dos evangelhos.
Portanto um espaço que agrega/evoca parte da biografia de Jesus Cristo. Trata-se do
único espaço relacionado com a memória cristã dentro do complexo, revelando a
identidade da Igreja Universal com a fé cristã no mundo.
III – Memorial /Museu:
O Memorial ou museu do complexo reflete a intenção da IURD em divulgar a história
antiga de Israel, por isto ele foi criado. Este espaço abriga a memória religiosa de Israel
na antiguidade, dos espaços religiosos deste grupo monoteísta e apresentando a
Universal como o grupo herdeiro de tais tradições religiosos destes espaços através da
exibição multimídia, a qual já está ideologizada com termos do grupo, tais como revolta
etc.
Segundo a Folha Universal este espaço fora criado com o intuito de resgatar a essência
da fé original dos tempos bíblicos. Este edifício está geograficamente ancorado na
cidade velha de Jerusalém, em especial ao Monte Moriá e sua história a partir da sua
cúpula dourada, procura evocar esta recordação. – o sacrifício de Isaque por Abraão
(Folha Universal, 13/12/2.015, B-10, B-11).
Mas o monte Moriá nos permite outra leitura interessante: de ser uma montanha
cósmica, o umbigo do mundo, dentro da tradição criacionista do Judaísmo:
o Todo Santo criou o mundo como um embrião, afirma um texto rabínico:
“Da mesma forma que o embrião cresce a partir do umbigo, Deus começou a
criar o mundo pelo umbigo e é de lá que ele se estendeu em todas as direções.
“O mundo foi criado começando por Sion”, (MOURÃO, 2.013,124).
IV – Templo/Santuário:
152
O Templo construído na cidade de Jerusalém é historicamente o símbolo mais
importante da nação antes da destruição do mesmo pelos romanos em 70 AD. Segundo
Mourão, ele, o templo representa simultaneamente a imagem do Universo e o centro do
mundo, junto com a Palestina e a cidade de Jerusalém (MOURÃO, 2.013).
Segundo Gomes, o templo construído na cidade de São Paulo não representa apenas um
investimento material num espaço maior, confortável para a recepção de diversos
públicos etc. Ele é um espaço permanente que valoriza alguns aspectos de crença do
grupo, a conciliação das práticas religiosas com as teorias referendadas pela bíblia
hebraica: os discursos elaborados pelos reis da monarquia hebréia unificada – David e
Salomão: o construir espaços religiosos magníficos para glorificar ao Eterno.
Ele é lido e interpretado de diversos modos: pelo iurdiano como expressão material dos
sinais da aliança com o divino e a ratificação da fé e do poder (GOMES, 2.011, p. 135)
porque a arquitetura dele favorece a construção de relações com a Terra Santa. Pelos
acadêmicos como o reflexo dos diversos processos de institucionalização dentro da
Universal (GOMES, 2.011).
A réplica do templo em São Paulo é questionada pelos grupos religiosos judeus,
primeiro porque não é um templo, mas um espaço religioso cristão, protestante,
pentecostal, por não valorizar o passado étnico que é nostálgico, mas as expectativas da
instituição na construção do seu futuro construção do futuro desta instituição (GOMES,
2.011, p. 134). O mesmo vivenciou o processo de misticismo emblemático e por isto ele
não tem condições de suportar a carga simbólica original em conformidade com o
contexto do antigo testamento cristão (THROUP, 2.011).
Diante disto há o grande esforço das lideranças iurdianas em tentar conseguir junto a
opinião pública judaica internacional, diplomatas e outros a afirmação positiva deste
lugar, reconhecendo-o como a própria terra santa, como um pedaçinho de Israel no
Brasil, ou sentir-se em sua terra natal, respirando a atmosfera da cidade de Jerusalém
etc. Bem como construir uma imagem positiva da Universal com a comunidade judaica
e com o Estado de Israel.
153
As fotos dos dois templos acima revelam estas diferenças comentadas por Throup em
seus estudos, primeiro porque o espaço do templo-santuário foram extraídos do seu
contexto original: a maquete da cidade de Jerusalém em Israel e no CCJ do templo em
Del Castilho/RJ, logo, é possível visualizar na maquete a presença de uma série de
subespaços internos para as diversas cerimônias que ali ocorriam.seu interior. E a
imagem da maquete nos permite visualizar este espaço religioso em suas origens como
um espaço não tão grandioso ou monumental como é a sua atual réplica construída na
cidade. O esvaziamento e a substituição de conteúdos culturais, religiosos e geográficos
ficam assim evidentes no templo em São Paulo. .
Para Edir Macedo, os antigos templos e o atual construído em São Paulo, são um
projeto arquitetônico desenhado pelo divino. E para ele, a presença das pedras
importadas do Oriente Médio, são testemunhas inéditas do poder divino a dois mil anos
atrás (GOMES, 2.011) e a reprodução dele nesta cidade da América do Sul em
proporcionar ao brasileiro como ao estrangeiro a possibilidade de entrar em contato com
a Terra Santa por outros meios, sem ser a viagem direta para o Oriente Médio,
reforçando assim que o templo é um sagrado desterritorializado de seu espaço original.
Dentro deste contexto Macedo tem a seu favor a geopolítica do Oriente Médio e seus
conflitos, pois o último templo destruído pelos romanos não pode ser reconstruído em
seu espaço de origem por causa do domínio árabe islâmico na região com a presença da
esplanada das mesquitas. E por não ter outro templo construído, este edificado fora da
região de origem passa a ser considerado como referencia cultural, religiosa para o
Judaísmo. Mas em nenhum de seus comentários, o bispo iurdiano menciona um
importante fato: o conflito da construção de uma réplica do templo de Jerusalém na ilha
de Elefantina, no antigo Egito por judeus ali residentes, criando um grave problema
cultural religioso por autenticidade do espaço sagrado da etnia entre a Diáspora e Centro
Espiritual do povo judeu então na antiga Palestina.
154
Assim a cidade de São Paulo foi escolhida pela IURD para ter um mega-templo, que
represente um pedaço de Israel no Brasil e não apenas elevar o pensamento para a Terra
Prometida.
Para nós, os dois primeiros edifícios do Judaísmo além da sua importância histórica-
religiosa e étnica, se converteram em referencias culturais da história de um povo,
concordamos desta forma com os judeus adeptos do movimento sionista do século XIX
que fizeram esta mesma leitura, lembrando-nos de que o último templo foi um farol
iluminando tanto as comunidades residentes em Eretz Israel, como para as demais
residentes fora do distrito judeu – Diáspora.
Mas discordamos de Macedo sobre o terceiro templo. Ele é um objeto geográfico e
material, uma obra humana porque nele foi aplicado a teoria do misticismo emblemático
por ser mais luxuoso e monumental que os dois templos construídos anteriormente no
Oriente Médio. Trata-se de um objeto não aurático, o qual reforça a ideia de ser um
espaço religioso sem memória, sem conexão com o passado, pois nas palavras do
próprio Macedo é uma igreja cristã que adota a forma arquitetônica do templo de
Jerusalém. (GOMES, 2.011)
Este fato – uma igreja cristã com a forma arquitetônica do antigo templo em Jerusalém,
revela que tal construção não significa um processo de ressurreição do passado ou na
linguagem pentecostal – a restauração. Mas sim um processo de apropriação e/ou de
reapropriação de crenças, de elementos antigos da memória, a reativação/revivência de
um passado religioso longínquo, considerada condenada pelos grupos cristãos
tradicionais, católicos, protestantes e pentecostais, e uma memória ou tradição religiosa
dando a ela um novo ressignificado, mas uma memória ou tradição divorciada de uma
ancoragem direta no seu grupo concreto, os judeus.
Os mais de trinta e nove mil meros quadrados de pedras utilizadas na construção e na
decoração do edifício importadas de Jerusalém/Israel (CAMARGO, 2.014), tem uma
função: dar a este templo a autenticidade dos dois primeiros e reforçar o processo de
remitologização deste material trazido da Terra Santa, tornando o espaço religioso
sagrado, visando construir uma conexão espiritual mística com Israel/Terra Santa.
Portanto ele, o templo, pode ser lido como um fragmento/resíduo de uma religião
antiga, pertencente ao passado.
155
A réplica construída em São Paulo difere dos templos construídos em Jerusalém, pois
no primeiro caso, o templo construído por Salomão, temos a ocorrência do fenômeno
da indicação da área ao antecessor de Salomão, o pai deste, o rei David, conforme está
contido nos escritos de I Crônicas e de I Reis. Na construção do segundo Templo,
contemporâneo de Esdras, Neemias, Ageu e Zacarias não há esta indicação divina.
No caso do templo de São Paulo há em sua origem um fato fundante – a tradição
profética religiosa pentecostal na pessoa do bispo Macedo, pois segundo fontes ligadas
a IURD foi ele que teve a iluminação/revelação divina para assumir e liderar tal projeto,
e por não haver a indicação divina do espaço onde este deveria ser construído, ocorre o
processo de sacralização do espaço, porque se trata de um espaço profano que será
convertido em espaço sagrado a partir do ritual – a colocação da pedra fundamental,
pois nela se acrescenta objetos considerados sagrados daquela fé. (MOURÃO, 2.013).
III – O Templo e a Memória Religiosa
A partir das diversas entrevistas com autoridades laicas do Estado de Israel e com
ícones da mídia televisiva, dentre eles, Luciana Gimenez, todos reconhecem o projeto
de Macedo, trazer parte da terra santa para São Paulo (Folha Universal, 10/01/2.016, p.
B-10, B-11; 04/09/2.016, p. 4- 5; 16/10/2.016, p. 4-5.). E com ele, o projeto religioso
de trazer “a fé de Israel” para os dias de hoje.
Além de ser um espaço sagrado desterritorializado, podemos ler o templo como um
depositário formal de um poder reconhecido, o qual dá sentido a trajetória da Igreja
Universal do Reino de Deus (HERVEU-LEGER, 2.000). E porque podemos fazer esta
leitura?
Porque todos os grupos religiosos afirmam a sua existência no mundo a partir de vários
mecanismos sociais de poder, dentre eles, a memória, a tradição, pois elas fundamentam
as origens de um grupo religioso (RIVERA, 2.000). Logo o papel da tradição é a de
manter intacta a memória dos fatos que deram origem a esta fé. Toda religião é
portadora de um acontecimento ou marco que é o seu evento fundante, portanto, um
evento histórico antigo. Exemplos:
I - JUDAISMO: A imigração de Abrão (depois Abraão) da Caldeia para Eretz Kanaan.
156
II – CRISTIANISMO: O nascimento de Jesus de Nazareth em Belém na província
romana da Judéia.
A Universal desde as suas origens como movimento religioso pentecostal nunca se
preocupou com a questão da memória ou da tradição, pelo contrário por alinhar-se com
a modernidade sempre se revelou avessa a esta proposta, ao ponto de condená-la e como
todo movimento religioso pentecostal a emoção substitui a razão na construção da
memória coletiva (RIVERA, 2.000). Ela, como os demais grupos pentecostais não tem
uma memória ou uma tradição para construir a sua história religiosa, são desprovidas de
um fato original de um passado religioso distante. Diante do fato de não se assumir
como uma religião institucional, ela não vai escolher estes dois acontecimentos
fundantes conhecidos.
Pois em conformidade com a lógica dos grupos dissidentes pentecostais optará por
outro fato religioso fundante antigo, histórico, mas para além destes dois fatos antigos e
conhecidos na memória cristã-judaica, a Universal vai imitar os grupos religiosos
pentecostais anteriores a sua existência, ancorar a sua fé no fenômeno místico do
pentecostes cristão, como evento fundador para além da Reforma Protestante.
E quando não há a memória ou a tradição, como isto pode ser resolvido?
Apropriando-se de uma memória já existente ou então se inventa uma. Este é o caminho
descrito por Eric Hobsbawm em suas análises (RIVERA, 2.005). Podemos citar como
exemplos deste processo de invenção, as antigas famílias da nobreza greco-latina que ao
longo de suas histórias buscaram na mitologia um ancestral de valor para as mesmas,
justificando e legitimando socialmente a sua posição hierárquica e suas origens
relacionadas aos antigos deuses destes dois panteões, interpretando e re-interpretando as
suas origens passando de geração a geração tal legitimidade social.
Mas isto é possível porque houve um passado histórico, mitológico, para assim
estabelecer artificialmente uma continuidade. Este processo cultural na antiguidade
clássica favoreceu: a preservação da memória do passado, a vitalidade do presente, e a
construção de um futuro a partir do novo. Só não existe memória ou tradição se não
houver um passado histórico seja ele oral, seja ele escrito, ou ambos.
Outro processo antigo da invenção de um passado é a produção de textos dentro da
cultura religiosa judaica, onde o novo discurso/texto encontra-se ancorado num texto
157
sagrado ou religioso anterior, dando a esta produção legitimidade, reconhecimento
cultural religiosa. O mesmo ocorreu em relação à Renascença artística italiana no século
XVI, ao buscar como modelo a antiguidade greco-latina.
Passos em suas análises admite que as diversas expressões religiosas dentro da
Humanidade exprimem a capacidade desta em criar, re-criar, inventar, re-inventar,
interpretar e re-interpretar a sua respectiva cultura religiosa conferindo a esta, os novos
significados e reavendo a identidade coletiva ou grupal (PASSOS, 2.015). Logo, é
possível fazer a construção de uma memória ou tradição a partir da existência de um
passado religioso.
Considerando no meio pentecostal a forte influencia do Espírito Santo, que é
considerado em alguns grupos o sagrado em disponibilidade e simultaneamente, um
poder paralelo ao racionalismo das escrituras, torna-se possível construir uma memória
ou tradição religiosa ancorada no emocionalismo à curto prazo ou numa iluminação ou
revelação deste as lideranças religiosas pentecostais.
No caso da Igreja Universal ela associa-se a questão anterior às diversas peregrinações
ao Oriente Médio desde os anos oitenta, e a sua forma de ler e de interpretar as
escrituras, especialmente a bíblica hebraica. Logo, a escolha do templo de Jerusalém é
algo premeditado, com sentido, um marco que nos revela que:a identidade do grupo
com a fé monoteísta abrahâmica, pois o Judaísmo é a linha de crença ou de religião, de
ancestralidade ou das origens do cristianismo. Bem como uma resposta aos
questionamentos dos grupos religiosos cristãos e judeus à sua posição heterodoxa e
pragmática.
As lideranças da Igreja Universal sabem que sem a existência de um fato fundador não
há continuidade religiosa do grupo. E a legitimidade só se constrói quando há uma
memória autorizada, há uma fidelidade as origens ou a uma tradição, pois só desta
forma a crença religiosa se converte numa lembrança (CAMURÇA, 2.011).
Construção do templo de Salomão no Brasil é a leitura de um passado, de uma memória
ou de uma tradição desterritorializada desvinculada do seu lugar geográfico original, do
seu contexto cultural, destradicionalizando a construção ao colocá-la à serviço da
instituição (CAMURÇA, 2.011). Memória e/ou tradição selecionada pela Universal,
porque elas não são herdadas, mas adquiridas, apropriadas que é uma forma de recriar
158
ou inventar estas. Isto implica que a IURD vai construir e legar a este edifício a sua
interpretação particular desta memória/tradição que tem na arquitetura a sua expressão
de linha de crença/religião.
Construir ou inventar uma memória a partir de um passado passa a ser interessante a
medida que a instituição vivencia determinadas necessidades, as diversas baixas –
dissidências internas, como o surgimento da Igreja Mundial do Poder de Deus, o
abandono de pastores do ministério, e das estatísticas do último censo do IBGE/2.010,
que se de um lado confirma um Brasil menos católico-romano, do outro lado, um Brasil
mais protestante, evangélico, há ressalvas que é o caso da Universal, com a diminuição
do crescimento da Igreja Universal do Reino de Deus, isto é a denominação encontrou
um limite, um teto para a sua expansão e influencia, bem como a perda de cerca de
duzentos e vinte e oito mil fiéis entre 2.000 e 2.010 (MAFRA, 2.013) É evidente que
existem diversas teorias para explicar estes dados numéricos desfavoráveis, aos quais
não vamos comentar.
Além destes dados citados, há um processo interno de institucionalização que começa
com o advento das catedrais, a presença de fiéis praticantes, que pressionam esta a
distanciar-se da imagem de seita protestante (investir no transitório) e aproximar-se da
imagem de denominação como os demais grupos cristãos evangélicos (investir na
permanência).
É este conjunto de todos estes fatores que obrigam E. Macedo e equipe a mudar para
ser/estar no mundo. E uma destas alterações é tornar o Templo de Salomão numa
memória autorizada, reconhecida (RIVERA, 2.000) e isto é perceptível graças aos
eventos anuais de lideranças evangélicas patrocinadas pela IURD neste espaço
religioso. É mais uma alteração institucional aproximar-se de outros grupos evangélicos
rompendo com a imagem do isolamento período anterior, o do movimento religioso,
seita pentecostal.
A escolha do Templo reforça: a identidade do grupo com o Israel na antiguidade e
simultaneamente com o cristianismo primitivo devido à experiência de perseguição que
o grupo experimentou nos anos noventa. Logo o templo concilia as diversas
necessidades da denominação. Este em construção, depois de construído e inaugurado,
foi a opção da Universal em recuperar para si um fato original do passado religioso, um
acontecimento relacionado a um passado distante, longínquo (RIVERA, 2.000).
159
Todo o evento da inauguração deste edifício no Brás ocorrido à mais de dois anos atrás
tem um objetivo cultural religioso, constituir um fato fundante. Reencontrar uma
lembrança religiosa bíblica, ou reconstituir o ambiente desta lembrança antiga – a
inauguração do templo em Jerusalém com o translado da arca da Aliança, sendo
revivida com a cerimônia pública da sua retirada e saída do espaço da catedral do Brás
até ser introduzida dentro do Templo de Salomão, um percurso de quase duzentos
metros de distancia dentro do bairro, através da av. Celso Garcia. Logo esta cerimônia
não deixa de ser uma reativação de uma antiga crença monoteísta.
Tornando desta forma o templo de Salomão e sua monumentalidade numa memória
autorizada e materializada, reconhecida implica em apresentar-se como o grupo
religioso herdeiro do passado monoteísta e suas etapas de espaço religioso – o
tabernáculo do deserto, os dois templos em Jerusalém, demonstrada no informativo
multimídia.
O templo construído é o esforço coletivo de voltar as origens, a partir de um fato
histórico distante, longincuo (HERVIEU-LÉGER; WILLAIME, 2.009) e de inventar o
futuro, preservando neste processo a cultura da apropriação dos bens simbólicos do
Judaísmo. Deste modo o ato de inventar uma memória ou uma tradição ou apossar-se de
uma crença ou memória, ou tradição anterior a sua existência, a Universal dá mais um
passo no processo de institucionalização, pois as dissidências/igrejas clone obrigam-na a
construir uma memória de combate permanente para desclassificá-las, e a responder aos
grupos mais conservadores a sua posição, como portadora de uma memória cristã,
portanto há uma chance de reatualização da mesma, pois o templo é lido por nós como o
mecanismo mínimo para dar a continuidade de uma memória apropriada/inventada, uma
memória religiosa mobilizada, recriada.
A IURD como um grupo religioso recente, ao construir e inaugurar o seu espaço
devocional no Brás, esposa a tese da sociologia da Memória de que os novos grupos
religiosos são portadores da capacidade em absorver e de preservar crenças antigas
conforme as suas necessidades (HERVIEU-LÉGER; WILLAIME, 2.009). Assim, o
templo segundo a Sociologia da Memória pode ser lido como um resíduo obsoleto
pertencente ao passado, como espaço espiritual de uma crença marginalizada pela fé
cristã, a qual foi reativada como elemento religioso importante, permanente para tal
grupo (HERVIEU-LÉGER; WILLAIME, 2.009).
160
A mídia tem especulado sobre a instalação de um novo espaço religioso iurdiano em
Brasília-DF, independente de todo o processo ritualístico que será praticado no
lançamento da pedra fundamental dele, conforme noticia a Folha Universal, comenta-se
que este novo espaço religioso seria semelhante ao templo de Salomão na capital
paulista. A segunda parte desta nova não tem confirmação e nem negação por parte da
Igreja Universal do Reino de Deus
Acreditamos sim que será um mega-templo como são as catedrais estaduais, o Templo
da Glória do Novo Israel, em Del Castilho, Rio de Janeiro, e o Templo de Salomão,
construídos pelo departamento de engenharia da instituição religiosa. Pois esta é a
forma da Igreja Universal marcar a sua presença nos espaços urbanos, pois após
instalar-se no eixo Rio-São Paulo o próximo espaço é a cidade de Brasília por ser o
centro do poder político do país.
Se a Universal optar em construir um espaço espiritual diferenciado do Templo de
Salomão, não reproduzindo este último, significa que Macedo optou em tornar o templo
localizado em São Paulo em parte da memória da IURD, num acontecimento ou fato
único, dando desta forma autenticidade ou legitimidade a este. Sendo coerente com a
sua proposta de que a experiência do Homem com Deus naquele espaço é única,
portanto transformar a experiência pessoal numa memória, num ritual. Mas se ele optar
pela reprodutibilidade dele no Distrito Federal implica que ele esposa a teoria
pentecostal de que a memória/tradição não se consolidam como fatos de única
ocorrência, favorecendo a sua reprodução e atualização.
Desta forma o templo de São Paulo pode ser copiado deixando de ser um evento ou
modelo único na lembrança do grupo religioso iurdiano e protestante da cidade, para ser
novamente reproduzido como um espaço não aurática, remitologizado etc, revivendo
assim um outro fato fundante superior ao primeiro, com a reapropriação da memória
judaico-cristã (RIVERA, 2.000).
161
Considerações Finais:
Todo o nosso trabalho de pesquisa bibliográfica aliado ao trabalho de campo,
observatório sobre as diversas denominações pentecostais que tivemos a oportunidade
em visitar, dentre elas, os diversos espaços religiosos da Igreja Universal do Reino de
Deus, e em especial, o Templo de Salomão, situado no complexo construído no bairro
do Brás, entre 2.010 e 2.014, nos permitiu contemplar diversos elementos importantes
dentro da prática religiosa pentecostal brasileira.
O primeiro deles foi o fenômeno do pluralismo religioso presente em nossa sociedade,
onde cada grupo humano construiu e constrói além de seus símbolos estéticos de
identificação com o Espírito Santo (a terceira pessoa da Trindade Divina segundo o
cristianismo), os espaços religiosos locados ou próprios dentro de um processo de
expansão geográfica urbana, práticas litúrgicas com alguma relação entre elas, bem
como a possibilidade ou não da construção de uma memória/tradição religiosas no
interior dos mesmos, de acordo com os interesses questionados naquele momento,
especialmente por parte das dissidências religiosas, o fenômeno promotor do
crescimento visível deste grupo. Isto ficou bem claro ao lermos e interpretarmos a
história da Igreja Universal, uma dissidência, um movimento religioso considerado
seita, se converte em igreja, e posteriormente produz outras dissidências diretas a partir
dela – Igreja Internacional da Graça de Deus, e mais recentemente, a Igreja Mundial do
Poder de Deus.
O segundo, o nosso olhar para o tema abordando a geografia e a sociologia da Memória,
pois estamos dando a nossa contribuição aos estudos sobre a Igreja Universal do Reino
162
de Deus que para muitos acadêmicos e autores é um fenômeno religioso de nosso
tempo. Respeitamos as diversas opiniões construídas a partir de leituras feitas por eles,
sobre os diversos momentos da história da Igreja Universal que nos foi possível acessar
em nossos estudos.
Tomando a geografia como saber distinto em nossos estudos, discutimos sobre questões
geográficas estratégicas que levaram a Universal a instalar-se na cidade de São Paulo e
posteriormente a construção do seu mega-templo num bairro central: o Brás. Sabemos
que este é um tema polemico, e que não existe uma resposta única, mas diversas
abordagens como afirma Barbosa ao fazer as suas considerações sobre o assunto (2.015;
2.014).
Logo, as nossas análises somam-se a este universo de abordagens sobre a IURD.
Para nós, a cidade de São Paulo foi escolhida por motivos de ordem econômica,
geográfica, política, por estar inserida com uma melhor posição no ranking da
globalização de nossas grandes cidades, e isto implica em maior visibilidade do grupo e
do respectivo espaço religioso no meio social local, estadual, nacional e internacional.
Pois estes motivos encontram-se ocultos no discurso religioso de Macedo quando do
anuncio da construção do templo na cidade de São Paulo em 2.010.
Se a escolha da cidade de São Paulo não é obra do acaso ou de uma iluminação ou
revelação espiritual, usando a chamada linguagem religiosa, a escolha do bairro também
não o é. Primeiro pela posição geográfica dele como espaço de passagem entre a Zona
Leste da cidade, área onde há a maior concentração de grupos humanos alinhados com
os diversos pentecostalismos na cidade e o Centro o espaço associado às origens de São
Paulo e elevado a condição geográfica especial de um espaço diferenciado por ser a
sede do poder político e econômico dentro desta cidade.
A nossa leitura dele - o marco histórico da presença protestante, pentecostal e da própria
IURD dentro da cidade, opondo-se geograficamente ao distrito da Sé, onde está
instalada a Catedral da Igreja Católica Romana, ícone da religião dominante da história
paulistana.
O Templo de Salomão construído entre 2.010 e 2.014 no Brás, um bairro popular na
concepção do bispo Macedo foi edificado ali, não somente para ser um fixo
internacionalizado, capaz de atrair os diversos fluxos humanos de dentro da cidade de
163
São Paulo, da grande São Paulo, do Brasil, da América Latina e do exterior. Porém,
com uma intencionalidade geográfica, trazer para esta região que forma a mancha
pentecostal dentro da cidade, a sua sede nacional e internacional, pois o bairro dentro do
jargão pentecostal é considerado como um espaço urbano abençoado, graças a sua
visibilidade que ele permite aos grupos já instalados nele, graças ao fator acessibilidade.
Portanto, a transferência política da sede do Rio de Janeiro – Templo da glória do Novo
Israel, para São Paulo – Templo de Salomão, encontra-se explicada porque muitos
grupos pentecostais menores que a IURD tem as suas sedes instaladas no bairro,
especialmente no eixo Rangel Pestana e Celso Garcia, onde já estão localizados a sede
estadual, Catedral do Brás, e o Complexo que abriga o Templo de Salomão.
Ele, o templo, tem cumprido a função como um espaço concebido e planejado, segundo
as diversas matérias publicadas pela mídia escrita da instituição, a Folha Universal e
pelo site oficial – Universal.Org. com, aos quais consultamos em nossas pesquisas. Mas
ele é um espaço percebido por muitos como sagrado ou santificado, de grande energia
espiritual como afirmam outros. Vivido, graças às experiências acumuladas de todos
aqueles que estiveram presentes nesta localidade, seja para visitação e participação
isolada no tour ou passeio bíblico, seja para participarem somente da respectiva reunião
programada para aquela data/horário na semana. Ou por aqueles, que como nós, optam
pela participação nos dois eventos, no passeio bíblico e na respectiva concentração para
conhecer o santuário que o edifício abriga.
Esta percepção como um local especial, sagrado, sendo até interpretado como a Casa de
Deus, ou de um maior poder espiritual, ou pela sua monumentalidade que não pode ser
oculta, como afirma o sermão da Montanha – não se pode ocultar uma cidade situada no
alto de uma montanha da luz solar, nos foi mencionada em diversos depoimentos tanto
por brasileiros, como por estrangeiros, nas diversas mídias utilizadas pela instituição
religiosa.
O complexo não é uma unidade construída pela uniformidade, mas pela diversidade de
espaços, subespaços e lugares que o compõe. O templo tem como seu subespaço, o
santuário, o espaço destinado à realização das concentrações/reuniões, o espaço dito
mais sagrado dentro do complexo de edifícios. Mas o santuário tem o seu centro de
poder: o altar, pelo qual as mensagens dos seus especialistas, os bispos, atingem os
diversos públicos diários. Este centro de poder localiza-se no espaço de maior poder ou
164
santidade do antigo tabernáculo e templos construídos em Jerusalém, o Santo dos
Santos um espaço descrito nos textos da bíblica hebraica como de maior poder ou
santidade, confirmando assim as teorias sobre o espaço profano ou sagrado
desenvolvidas por Oto (1.992), Rosendahl (1.996; 1.997), e Mourão (2.013).
A partir da Sociologia da Memória e seus diversos autores, colocamos a memória e a
tradição em discussão especialmente em relação à Igreja Universal do Reino de Deus.
Ao abordarmos a história da Igreja Universal dentro da cidade de São Paulo percebemos
a ausência de interesse da instituição em relação a este fato. Segundo as nossas
pesquisas registramos este desinteresse devido as seguintes causas:
O processo de centralização do poder de decisão política nas mãos do bispo primaz dela
– Edir Macedo do Bezerra, pois a memória da Igreja Universal encontra-se associada,
atrelada a trajetória de vida e de ministério do seu fundador, portanto a história da
Universal em nossa cidade só tem valor graças às decisões tomadas no passado pelo
bispo Edir Macedo em instalar a sua instituição aqui. E pela cultura que a ela construiu
para si sobre o passado, onde este não tem grande importância ou valia religiosa e para a
vida dos seus freqüentadores através de uma série de depoimentos, colocando em
evidencia a questão prospectiva, isto é o futuro tanto da instituição, como dos seus
clientes e membros.
O Templo pode ser lido por nós, através de sua relação com a Memória de dois modos
simultâneos, como o Lugar da Memória da IURD e como a Memória do Lugar,
conforme a teoria de Norá (NORÁ, 1.992). O Lugar da Memória reflete o as alterações,
as mudanças que estão ocorrendo no interior da denominação, o processo de
institucionalização no final dos anos noventa com o advento das catedrais da Universal
nas principais cidades do país e do exterior. Ainda que este processo seja negado por
suas lideranças como afirmam, Herveu-Leger (HERVIEU-LEGER; WILLAIME, 2.009)
e por Rivera (RIVERA, 2.010, 2.000) em suas leituras sobre as teorias desenvolvidas
por Halbwachs sobre a memória.
Ele é o lugar da Memória da IURD, pois foi em São Paulo que se iniciou o ciclo de
acusações, de hostilidades e das prisões contra a sua principal liderança – bispo
Macedo.(TAVOLARO, 2.007) Portanto, ele o templo, evoca uma reflexão sobre este
165
momento vivenciado pela Universal e ele representa materialmente a nova leitura que a
denominação faz sobre os fatos dos anos noventa.
O complexo abriga a Memória de diversos lugares, especialmente aqueles relacionados
com a Terra Santa/Oriente Médio, exemplo: a reprodução do Jardim das Oliveiras,
como um espaço geográfico alinhado com a tradição cristã, com a vida de Jesus dentro
de Jerusalém conforme as narrativas dos evangelhos, o texto antigo serve como
elemento de um passado distante para a perpetuação desta memória religiosa cristã.
O tabernáculo, o templo, o memorial são espaços reproduzidos a partir da leitura da
bíblia hebraica, sendo que os dois primeiros são elementos relacionados com o passado
distante do monoteísmo hebraico – espaços religiosos do grupo étnico, com o qual a
Universal tem identidade de crença.
O memorial ou museu serve como elemento de ligação entre a memória antiga, distante
no tempo e no espaço destes locais de culto monoteísta e o seu herdeiro em potencial, a
Igreja Universal que se vê como o Novo Israel, ou o Israel mítico, ao se apropriar e dar
novos sentidos e significados aos antigos espaços de culto relacionados com o
Judaísmo.
E o Templo, evocando dentro da cidade de Jerusalém dois momentos do passado
distante, o Monte Moriá e com ele a memória do sacrifício de Isaac pelo patriarca
Abraão. E os dois templos e sua história de destruição/reconstrução.
Como todo grupo pentecostal contemporâneo alinhado com a modernidade, a Universal
não tem memória/tradição religiosa, porém as alterações diversas na qual está
vivenciando a obriga a construir estas no seu interior, e a ideia do Novo Israel, do Israel
mítico, tomada por empréstimo da literatura bíblica, e a apropriação indevida de
elementos do culto judaico em suas liturgias – uso do kipá, talit, etc por parte dos bispos
que se encontram domiciliados no templo, nos revelam o processo de criar, de inventar
uma memória religiosa, ancorada na bíblica hebraica como o texto anterior, e num fato
do passado distante desta fé – a construção e inauguração do templo em Jerusalém,
especialmente o construído pelo rei Salomão, durante o período do reino unificado de
Israel, procurando reproduzi-lo tanto no processo de construção como de inauguração
dando a ele a maior autenticidade possível e para isto a IURD investiu recursos na
importação de pedras do atual Estado de Israel procurando dotar o santuário e o templo
166
de um processo de remitologização, transferindo para ele, as virtudes existentes neste
espaço geográfico distante – a sacralidade ou a santidade (THROUP, 2.011).
O templo de Salomão no complexo do Brás é criticado por Gomes, por ser um espaço
não aurálico, sem afinidade com o passado histórico distante, sem memória, sem
tradição/(GOMES, 2.010), e por THROUP ao abordar a teoria do misticismo
emblemático (THROUP, 2.011). Onde a grandiosidade, o luxo, a monumentalidade, e a
ostentação, são considerados como elementos introduzidos pelo episcopado iurdiano ,
elaborando um edifício que nada tem a haver com os templos construídos em Jerusalém.
Tornando o espaço religioso diferenciado como a referência histórica religiosa distante,
seja dos espaços religiosos concorrentes ao seu redor e para isto Macedo construir uma
igreja evangélica com a arquitetura do templo de Jerusalém, esvaziando deste antigo
espaço religioso parte do seu conteúdo e introduzindo nele, a cultura da grandiosidade
arquitetônica, por todos que o vêem e/ou o visitam que o tornam diferenciado até do
espaço original descrito na bíblica, não servindo assim como exemplo de cultura da fé
judaica.
167
Anexos:
Imagens:
Imagem 1 – Jerusalém: Kotel/Muro das Lamentações
Imagem extraída da www.wordpress.com
Imagem 2 – São Paulo/Brás:
Vidago: Condomínio Edifício
168
Imagem extraída da www.wordpress.com
Imagem 3 – Rio de Janeiro: O coreto do Jardim do bairro do Méier:
Imagem extraída da obra:
(TAVOLARO, 2.007, p. 85)
Imagem 4/5 – Rio de Janeiro: Igreja Universal/Abolição:
169
Imagem extraída; www.wordpress.com
Imagem extraída: www,universal.org/bispomacedo/historia-do-bispo
Imagens 6/7/8– São Paulo: Cine Roxy-Igreja Universal/Brás:
Antes de 1.980
]
Entre 1.990 e 1.998
Imagens extraídas:
www.jornalbrás.com
www.eventosiurduniversalfcasainforma.blogspot.com.br
170
Imagens 9/10 – São Paulo: Catedral da IURD no Brás
Imagens extraídas: www.wikipédia.com
www.wikimapia.com
Imagem 11/12 – São Paulo: Catedral da IURD/Santo Amaro
imagens extraídas: www.movimentouniversal.wordpress.com/2009/04/22/fotos-iurd-catedral-santo-
amarosp/
171
Imagens 12/13 – São Paulo: Catedral Católica Ortodoxa/Vila Mariana:
Imagem extraída: www.conhecendosp.com/2015/01/paraiso-em-foco.htm
www.portalvilamariana.com/sao-paulo/galeria-de-fotos-vila-mariana.asp
Imagem 14 – Catedral Católica Romana/Se:
Imagem extraída: www.eltiempoesoro.org/viajes/brasil/
172
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IV – CAMARGO, Isadora da – “As pedras ‘sagradas’ na construção do
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América Latina”, eja-universal-inaugura-maior-complexo-religioso-da-america-latina.
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V – CARDOSO, Rodrigo – “O Templo de Salomão, a Meca dos evangélicos” in: “A
Meca dos evangélicos – “Com a inauguração da réplica do "Templo de Salomão", o
maior espaço religioso do Brasil, o bispo Edir Macedo, da Igreja Universal, procura se
aproximar dos símbolos do judaísmo.” (2.014) www.istoe.com.br›Notícias.
(07/03/2.016)
VI – CENTRO DE AJUDA/UNIVERSAL – “Projeto Templo de Salomão pelo bispo
Edir Macedo” in: Inauguração do Templo de Salomão,
http://centrodeajuda.pt/evento/o-templo-de-salomao (consultado em 08/05/2.016)
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Abril Comunicações, 04/08/2.014 - www.saopaulo.com.br/templo-de-salomao-a-
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VIII – FOLHA DE SÃO PAULO - Dados estatísticos e geográficos dos evangélicos
dentro da cidade de São Paulo.
www.folhaspdados.blogfolha.uol.com.br/2012/10/02/folhacoptero-religiao. (Consultado
em 12/04/2.016)
IX – MINISTÉRIO SEARA-ÁGAPE – “As dimensões do templo em Jerusalém”, in:
http://www.searaagape.com.br/estudoevangelicosobreotemplodesalomao0.html. (consultado em
08/01/2.016)
X – MONTEIRO, André & RODRIGUES, Arthur – “Lista das maiores denominações
religiosas na cidade de São Paulo”, in: “Catedral da Sé é apenas o 21º maior templo da
cidade de São Paulo”, in Cotidiano/Folha de São Paulo, São Paulo, Empr. Jorn. Folha
da Manhã, Folha de São Paulo, 08/08/2.016. Consultado em
04/01/2.017.http://www1.folha.uol.com.br/cotidiano/2016/08/1800107-catedral-da-se-e-
apenas-o-21-maior-templo-da-cidade-de-sao-paulo.shtml.
XI – MONTEIRO, André & RODRIGUES, Arthur – ‘A Lista dos dez maiores templos
em São Paulo”, in: “Isenção de IPTU a templos custa 22 creches em São Paulo”,
www1.folha.uol.com.br/.../1800103-isencao-de-iptu-a-templos-custa-22-cr...
(consultado em 04/01/2.017).
XII – NOVA VIDA (Igreja) – “A Nossa História/Biografia do bispo Walter
R.McAlister”, http://www.novavida.com.br/nossa-historia (Consultado em 13/05/2.016)
XIII – PROENÇA, Wander de Lara – “Do Coreto e a Funerária ao Templo de
Salomão”, Porta da Unesp, 2014.
http://www.ftsa.edu.br/site/index.php/component/content/article?id=320:do-coreto-e-a-
funeraria-ao-templo-de-salomao-artigo-do-dr-wander-lara-proenca (consultado em
15/07/2.016)
XIV – UNIVERSAL: www.Universal.Org.
178
Periódicos:
BOLETIM HORA DA MUDANÇA:
I – Boltrini, Ana M. (Saúde), entrevista concedida para Hora da Mudança, Ano 2, n° 24,
Ed. Thais Toledo, São Paulo, Outubro/2.014, p. 2.
II – Lopes, Raul; Fonseca, Eni da (Prosperidade), entrevista concedida para Hora da
Mudança, Ano 3, n° 35, Ed.Thais Toledo, São Paulo, Setembro/2.015, p.3.
III – Silva, Midian da (abandono da criminalidade) entrevista concedida para Hora da
Mudança, Ano 3, n°38, ed. Thais Toledo, São Paulo, Dezembro/2.015, p. 4
IV – Chaiane e Rodrigo (Vida Sentimental), entrevista concedida para Hora da
Mudança, Ano 4, n°40, Fevereiro/2.016, p.3
V – Ricardo, João (Prosperidade), entrevista concedida para Hora da Mudança, Ano, 4,
n°40, Ed. Thais Toledo, São Paulo, Fevereiro/2.016, p.4.
VI – Graças, Maria das (Prosperidade), entrevista concedida para Hora da Mudança,
Ano 4 , n° 42, ed. Thais Toledo, São Paulo, Abril/2.016, p. 3.
FOLHA UNIVERSAL:
I – Aron Amanda – “Caravanas de Angola e de Moçambique visitam o Templo de
Salomão”: Após oito horas de viagem, os africanos tiveram a oportunidade de
conhecerem a grande obra do Brás e participar da reunião com o bispo Edir Macedo.
Rio de Janeiro, Gráfica Universal, Folha Universal 22/03/2.015, p. B-10, B-11.
II – Prestes, Eduardo – “Templo de Salomão é homenageado por incentivar o turismo:
Evento reconhece a importância do local, que recebeu premiação.” Rio de Janeiro,
Gráfica Universal, Folha Universal, 04/10/2015, p. B-10, B-11.
179
III – FOLHA UNIVERSAL – “Nunca tive uma experiência como essa”: depoimento de
da peruana, Judith Riva, Coleção Experiência inesquecível, Rio de Janeiro, Gráfica
Universal, Folha Universal, 22/11/2015, p. B-11.
IV – Rangel Marcelo – “O Memorial do Templo de Salomão: Sob a imponente cúpula,
dezenas de visitantes percorrem um roteiro histórico que retrata fielmente os tempos
bíblicos”, Rio de Janeiro, Gráfica Universal, Folha Universal, 13/12/2015, p. B-10.
V – FOLHA UNIVERSAL – “Madrugada nos portões do templo: depoimento da
chilena Adela Aedo.”, Coleção Experiência inesquecível, Rio de Janeiro, Gráfica
Universal, Folha Universal, 25/12/2015, p. B-11.
VI – Aron, Amanda – “É possível sentir a atmosfera de Jerusalém aqui: Diplomatas de
Israel visitam o templo de Salomão, e comentam a impressão que tiveram do local”, Rio
de Janeiro, Gráfica Universal, FOLHA UNIVERSAL, 10/01/2016, p. B-10.
VII – Prestes, Eduardo – “Venha conhecer o Jardim Bíblico do templo de Salomão: uma
experiência cultural, bíblica inédita no Brasil” – in: Caderno Templo de Salomão, Rio
de Janeiro, Gráfica Universal, Folha Universal, 10/01/2016, p. B-11.
VIII – Frota Kauê, Rangel Marcelo – “O templo de Salomão conta com um sistema de
tradução simultânea durante as reuniões”, Rio de Janeiro, Gráfica Universal, Folha
Universal, 10/01/2016, p. B-11.
IX – Aron, Amanda – “O visitante tem a chance de conhecer os detalhes bíblicos (no
Memorial do templo de Salomão)”, Rio de Janeiro, Gráfica Universal, Folha Universal,
31/01/2016, p. B-11.
X – Prestes, Eduardo – “Um dos principais marcos turísticos do Brasil”: reportagem
sobre a visita dos secretários do Turismo e do Esporte, Lazer e Juventude do Estado de
São Paulo ao Templo de Salomão”, Rio de Janeiro, Gráfica Universal, Folha Universal,
12/01/2016, p. B-10, B-11.
XI – Frota, Kauê; Rangel Marcelo – “Conheça a escola bíblica infanto-juvenil: Na EBI,
crianças aprendem os ensinamentos cristãos de forma dinâmica e atrativa”, Rio de
Janeiro, Gráfica Universal, Folha Universal, 14/02/2016, p. B-10.
XII – Prestes, Eduardo – “Viva uma experiência inesquecível: Conheça o tabernáculo, o
Memorial e o Jardim das Oliveiras” – in: Caderno Templo de Salomão, Rio de Janeiro,
Gráfica Universal, Folha Universal, 06/03/2016, p. B-11.
XIII – Rangel, Marcelo – “Caravanas de Peruanos e Suiços visitam o templo de
Salomão: estrangeiros pisaram em terras brasileiras exclusivamente para conhecer o
santuário”, Rio de Janeiro, Gráfica Universal, Folha Universal, 20/03/2016, p. B-10, B-
11.
XIV – Rangel Marcelo – “Argentinos e uruguaios visitam o Templo de Salomão: pela
primeira vez no Brasil, os visitantes se reuniram para conhecer o santuário em São
Paulo”, Rio de Janeiro, Gráfica Universal, Folha Universal, 10/04/2016, p. B-10, B-11.
XV – Prestes, Eduardo – “Olho no Templo, olho no lance!” – O radialista Sílvio Luíz
conheceu o local ao lado do presidente da Rede Record (Luis Claudio Costa), e do
diretor nacional de comunicação da emissora (Celso Teixeira), Rio de Janeiro, Gráfica
Universal, Folha Universal, 01/05/2016, p. B-10, B-11.
180
XVI – Rangel, Marcel – “As regras de conduta no Templo de Salomão,” Rio de Janeiro,
Gráfica Universal, Folha Universal, 29/05/2.016, p. B-10, B-11.
XVII – Aron, Amanda – “Caravanas de Londres e do Texas visitam o templo de
Salomão”, in: Por que você deve visitar o tabernáculo? Rio de Janeiro, Gráfica
Universal, Folha Universal, 12/06/2.016, p. B-10, B-11.
XVIII – Prestes, Eduardo – “O Templo é para todos: Não importa a crença, a origem ou
a distância geográfica. O local está aberto a qualquer um que queira um encontro
verdadeiro com Deus,” Rio de Janeiro, Gráfica Universal, Folha Universal, 31/07/2.016,
p. B-10, B-11.
XIX – Preste, Eduardo – “Porque vistantes de todo o mundo vem ao Templo de
Salomão?”, Rio de Janeiro, Gráfica Universal, Folha Universal, 11/09/2.016, p. 4, 5.
XX – Frota, Kauê; Rangel, Marcelo – “É Jerusalém no coração de São Paulo: Novo
cônsul israelense no Brasil, conhece o Templo de Salomão e estreita os laços de
amizade entre seu país e a Universal,” Rio de Janeiro, Gráfica Universal, Folha
Universal , 04/10/2016, p. 4, 5.
XXI – Rangel, Marcelo – “Luciana Gimenez no Templo: Apresentadora testemunha a
grandiosidade e o caráter sagrado da casa de Deus no bairro do Brás, em São Paulo”,
Rio de Janeiro, Gráfica Universal, Folha Universal, 16/10/2.016, p. 4-5.
XXII – Aron Amanda – “Como as pessoas de várias nações se conectam com Deus no
Templo de Salomão,” Rio de Janeiro, Gráfica Universal, Folha Universal, 23/10/2.016,
p.4, 5.
XXIII – Rangel, Marcelo – “Heróis da vida real no templo”: Atletas e artistas realizam o
passeio bíblico,” Rio de Janeiro, Gráfica Universal, Folha Universal, 25/12/2.016, p. 4,
5.
XXIV – Rangel, Marcelo – “Jerusalém: O Centro do Mundo: Mapas antigos mostram a
capital sagrada de Israel na posição central, o que a bíblia e a própria história explicam”,
Rio de Janeiro, Gráfica Universal, Folha Universal, 01/01/2017, p. 4,5.
XXV – Prestes Eduardo – “Famoso árbitro do UFC visita o Templo de Salomão”. Rio
de Janeiro, Gráfica Universal, Folha Universal, 15/01/2017, p. 4, 5.
XXVI – Frota, Kaue; Rangel, Marcelo – “Uma conexão especial com o povo hebreu:
Diplomata Israelense conhece o templo de Salomão, e parabeniza a Universal por seu
trabalho em vários países”, Rio de Janeiro, Gráfica Universal, Folha Universal,
19/02/2.017, p. 4, 5.
XXVII – Prestes, Eduardo – “Como proceder ao visitar ao Templo de Salomão?” Rio
de Janeiro, Gráfica Universal, Folha Universal, 26/02/2.017, p. 4, 5.
XXVIII – Prestes, Eduardo – “Faça um passeio diferente de todos que você já fez:
pessoas do mundo inteiro visitam o Templo de Salomão todos os dias. Não perca
tempo, e agende logo a sua visita”, Rio de Janeiro, Gráfica Universal, Folha Universal,
05/03/2.017, p. 4, 5.
181
Sites/Internet: Reportagens na mídia televisiva sobre o Templo de Salomão
I –“Templo de Salomão atrai visitantes de diversos lugares do Brasil” – Reportagem
exibida pelo programa “Domingo Espetacular da Rede Record de Televisão, em
09/2014 - famososnaweb.com/domingo-espetacular-deste-domingo-280914-programa-
co. (consultado em 08/05/2016).
II – Jornal da Band faz reportagem sobre o templo de Salomão – reportagem da Rede
Bandeirantes de Televisão exibida em 25/07/2014
https://www.youtube.com/watch?v=7UbRG5ODJT8 (consultada em 25/04/2.016)
III – Reportagem sobre o Templo de Salomão exibido pelo SBT em 28/07/2014 no
Programa Sílvio Santos dia.ig.com.br/.../silvio-santos-mostra-surpresa-com-templo-de-
salomao-do-bispo-edi.. (consultado em 08/05/2016).
IV – “O templo de Salomão” – reportagem da Rede Record de Televisão, exibida em
04/08/2014. noticias.gospelmais.com.br › Brasil (consultada em 25/04/2.016).
V – “Templo de Salomão é inaugurado em São Paulo”, G1/notícias, exibido pela Rede
Globo de Televisão em 31/07/2014 g1.globo.com/sao.../noticia/2014/.../templo-de-
salomao-e-inaugurado-em-sao-paulo (consultado em 08/05/2016).
VI – “Exclusivo: Gugu desvenda os mistérios do Templo de Salomão” – reportagem
exibida pela rede Record de Televisão. www.universal.org/.../exclusivo-gugu-revela-
todos-os-misterios-do-templo-de-saloma.. (consultado em 25/04/2016).