Post on 05-Jul-2020
0
UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO GRANDE DO NORTE
CENTRO DE CIÊNCIAS HUMANAS, LETRAS E ARTES
MESTRADO PROFISSIONAL EM LETRAS – PROFLETRAS
OS SABERES QUE FUNDAMENTAM O ATO DE ENSINAR:
O USO DA MEDIAÇÃO DO PROFESSOR NO PROCESSO DE
ESCRITA DO 4º ANO
FRANCIMAR SILVA DOS SANTOS
Natal - RN
2019
1
FRANCIMAR SILVA DOS SANTOS
OS SABERES QUE FUNDAMENTAM O ATO DE ENSINAR:
O USO DA MEDIAÇÃO DO PROFESSOR NO PROCESSO DE
ESCRITA DO 4º ANO
Dissertação apresentada ao Programa de Mestrado
Profissional em Letras (ProfLetras), da Universidade
Federal do Rio Grande do Norte, como requisito
para a obtenção do grau de Mestra em Letras.
Orientadora: Profa. Dra. Sulemi Fabiano Campos
Natal/RN
2019
2
Universidade Federal do Rio Grande do Norte - UFRN
Sistema de Bibliotecas - SISBI
Catalogação de Publicação na Fonte. UFRN - Biblioteca Setorial do Centro de Ciências Humanas, Letras e
Artes - CCHLA
Santos, Francimar Silva dos.
Os saberes que fundamentam o ato de ensinar: o uso da mediação
do professor no processo de escrita do 4º ano / Francimar Silva dos Santos. - Natal, 2019.
90f.: il. color.
Dissertação (mestrado) - Universidade Federal do Rio Grande do
Norte, Centro de Ciências Humanas, Letras e Artes, Programa de Mestrado Profissional em Letras. 2019.
Orientadora: Profa. Dra. Sulemi Fabiano Campos.
1. Ensino de Escrita - Dissertação. 2. Mediação Pedagógica -
Dissertação. 3. Protocolos de Escrita - Dissertação. I. Campos,
Sulemi Fabiano. II. Título.
RN/UF/BS-CCHLA CDU 37.012
Elaborado por Heverton Thiago Luiz da Silva - CRB-15/710
3
FRANCIMAR SILVA DOS SANTOS
OS SABERES QUE FUNDAMENTAM O ATO DE ENSINAR: O USO DA MEDIAÇÃO
DO PROFESSOR NO PROCESSO DE ESCRITA DO 4º ANO
Dissertação apresentada ao Programa de Mestrado
Profissional em Letras (ProfLetras), da Universidade
Federal do Rio Grande do Norte, como requisito para a
obtenção do grau de Mestra em Letras.
Aprovado em, _______/_______/________.
Banca Examinadora:
___________________________________________
Profa. Dra. Sulemi Fabiano Campos
Universidade Federal do Rio Grande do Norte - UFRN
Presidente da banca
___________________________________________
Profa. Dra. Nilce Maria da Silva
Universidade do Estado de Mato Grosso - UNEMAT
Examinadora externa
____________________________________________
Prof. Dr. José Antônio Vieira
FWF / Pitágoras-Bacabal
Examinador externo
4
Aos meus pais em memória. Saudades.
5
AGRADECIMENTOS
Ao Mestre e amigo Jesus, por toda força concedida a mim neste processo de escrita e
de tribulações pelos quais passei enquanto escrevia este trabalho, mas também pelos
momentos de alegrias e satisfação em fazê-lo.
A meus pais, Linamar e Francisco (em memória), por toda a criação que recebi e pelos
ensinamentos em relação a importância da educação em minha vida. A eles devo tudo que sou
hoje.
A meu esposo, Fredson Silva, e a minha Madrinha, Sandra Alvarenga, pelo apoio,
carinho, amor e paciência nestes anos de estudo, assim como às minhas amigas, Josielle,
Eliane e Pâmmela por todo o apoio e cooperação.
Um agradecimento especial a minha orientadora, a professora Dra. Sulemi Fabiano,
por não me deixar desistir de concluir este trabalho. Suas orientações foram recheadas de
carinho, atenção e muita competência.
Gostaria de deixar registrada minha gratidão à professora Dra. Alessandra Castilho,
que em momentos cruciais desse processo ouviu minhas angústias e dúvidas.
Aos professores do ProfLetras, por toda disponibilidade e conhecimentos
compartilhados.
Às professoras, Dra. Ana Virgínia Lima e Dra. Maria do Socorro Oliveira, pelas
contribuições no momento do Exame de Qualificação.
Aos professores Dra. Nilce Maria da Silva e Dr. José Antônio Vieira, pela
disponibilidade em ler e contribuir para a melhoria deste trabalho, no momento da defesa.
À CAPES, por ter me concedido a Bolsa de Estudos durante o curso.
A todos minha eterna gratidão!
6
RESUMO
Esta pesquisa tem como objeto de estudo a mediação do professor no processo de escrita dos
textos de alunos do ensino fundamental I. Trata-se de um estudo de cunho qualitativo
interpretativista, por meio do qual se busca responder à seguinte questão: a que saberes o
professor recorre para mediar o processo de escrita dos alunos? Como objetivo geral, procura-
se analisar as contribuições oferecidas pelo trabalho pedagógico sob a perspectiva da
mediação do professor, no processo de escrita de textos dos alunos, em sala de aula. Os
objetivos específicos são: i) diagnosticar como o professor corrige os textos produzidos pelos
alunos, em sala de aula; ii) elaborar e executar atividades que contribuam para o trabalho com
a escrita, como atividade criativa; iii) utilizar a mediação pedagógica como forma de auxiliar
no processo de escrita de textos; iv) analisar e interpretar as produções dos alunos, tendo
como parâmetros protocolos de escrita, a fim de compreender como a mediação do professor
contribui para o processo de escrita. Para atender a esses objetivos, planificou-se um projeto
de intervenção, que foi trabalhado com os alunos do 4º ano do ensino fundamental. Após essa
etapa, analisou-se a evolução da escrita, utilizando os protocolos de escrita, construídos
durante a interação professor e aluno. Teoricamente, esta pesquisa está fundamentada na
concepção de ensino defendida por Freire (1996); de professor como mediador do processo de
ensino-aprendizagem, cujos fundamentos advém de Vygotsky (1991) e Hoffmann (2005a;
2005b); bem como nos saberes docentes ou da prática pedagógica, presentes em Tardif
(2002), Almeida e Biajone (2007); a análise de dados segue a metodologia dos Protocolos de
Escrita. Para questões teóricas sobre língua e linguagem, trabalha-se com a perspectiva
interativa da linguagem, com aporte na teoria bakhtiniana; sobre o ensino de escrita /
produção textual, tem-se como fundamentos os estudos de Geraldi (2004, 2013, 2015),
Cagliari (1998, 2003), Koch e Elias (2009). Ao concluir as atividades de pesquisa e
intervenção, observou-se que houve evolução no desempenho dos alunos ao realizar
atividades de escrita/produção de texto. Fato que conduz à percepção de que a mediação
pedagógica contribuiu, significativamente, para que esse desenvolvimento ocorra. Conclui-se,
ainda, que a metodologia de protocolos de escrita pode contribuir para o trabalho docente,
pois permite ao professor acompanhar o desenvolvimento dos alunos e, assim, pode intervir
no processo de ensino-aprendizagem, tendo como parâmetro as reais necessidades dos alunos.
Palavras-chave: Ensino de escrita. Mediação pedagógica. Protocolos de escrita.
7
ABSTRACT
This research has as object of study the mediation of the teacher in the writing process of the
texts of students of elementary school I. This is a qualitative and interpretative study, through
which one tries to answer the following question: to know the does the teacher use to mediate
the students' writing process? As a general objective, we seek to analyze the contributions
offered by the pedagogical work from the perspective of teacher mediation in the writing
process of students' texts in the classroom. The specific objectives are: i) to diagnose how the
teacher corrects the texts produced by the students, in the classroom; ii) to elaborate and
execute activities that contribute to the work with writing, as a creative activity; iii) use
pedagogical mediation as a way to assist in the process of writing texts; iv) analyze and
interpret students' productions, using written protocol parameters, in order to understand how
teacher mediation contributes to the writing process. To meet these objectives, an intervention
project was planned, which was worked with the students of the 4th year of elementary
school. After this step, we analyzed the evolution of writing, using the writing protocols, built
during the teacher and student interaction. Theoretically, this research is based on the
conception of education defended by Freire (1996); as a mediator of the teaching-learning
process, whose foundations come from Vygotsky (1991) and Hoffmann (2005a; 2005b); as
well as in the teaching knowledge or pedagogical practice present in Tardif (2002), Almeida
and Biajone (2007); the data analysis follows the methodology of the Writing Protocols. For
theoretical questions about language and language, one works with the interactive perspective
of the language, with contribution in Bakhtin's theory; (2004, 2013, 2015), Cagliari (1998,
2003), Koch and Elias (2009). At the conclusion of the research and intervention activities, it
was observed that there was an evolution in the students’ performance when performing
writing / text production activities. This fact leads to the perception that pedagogical
mediation has contributed significantly to this development. It is also concluded that the
writing protocols methodology can contribute to the teaching work, since it allows the teacher
to follow the development of the students and, thus, can intervene in the teaching-learning
process, having as a parameter the real needs of the students.
Keywords: Writing. Pedagogical mediation. Writing protocols.
8
LISTA DE QUADROS E FIGURAS
Quadro 1 – Paradigmas de pesquisa............................................................................ 40
Quadro 2 – Sistemas de conhecimentos envolvidos na escrita de textos.................... 47
Quadro 3 – Legenda de abreviações utilizadas nos planos de aula e nas análises...... 50
Quadro 4 – Plano de aula da atividade diagóstica....................................................... 50
Quadro 5 – Plano de aula nº 2..................................................................................... 55
Figuras 1 – Cartazes com textos dos alunos para atividade de reescrita..................... 57
Quadro 6 – Diálogo estabelecido na aula 2, em atividade de reescrita de texto......... 58
Figura – 2 Atividade de reescrita de textos com os alunos........................................ 59
Quadro 7 – Texto dos alunos após reescrita coletiva.................................................. 59
Figura 3 – Exemplo da reescrita coletiva, no caderno do aluno................................ 60
Quadro 8 – Plano de aula nº 3..................................................................................... 61
Figura 4 – Atividade para a Aula 3............................................................................ 63
Figura 5 – Atividade para a Aula 3............................................................................ 63
Quadro 9 – Plano de aula nº 4..................................................................................... 64
Figura 6 – Cartaz produzido na Aula 4...................................................................... 65
Figura 7 – Cartaz contendo os elementos da narrativa.............................................. 66
Quadro 10 – Plano de aula nº 5..................................................................................... 67
Figura 8 – Texto de apoio para Aula 5 – Parte 1....................................................... 69
Figura 9 – Texto de apoio para Aula 5 – Parte 2....................................................... 69
Quadro 11 – Plano de aula nº 6..................................................................................... 71
Figura 10 – Atividade de produção solicitada aos alunos na Aula nº 6....................... 72
Quadro 12 – Protocolo de escrita – Aula nº 6............................................................... 74
Quadro 13 – Plano de aula nº 7..................................................................................... 75
Quadro 14 – Letra da música utilizada na Aula 7......................................................... 76
9
Quadro 15 – Plano de aula nº 8..................................................................................... 78
Figura 11 – Capa do livro utilizado como recurso na Aula nº 8.................................. 79
Quadro 16 – Texto utilizado como recurso na Aula nº 8.............................................. 80
10
SUMÁRIO
INTRODUÇÃO.................................................................................................. 11
1 MEDIAÇÃO NO PROCESSO DE ESCRITA................................................ 16
1.1 Concepção de sujeito da aprendizagem e de ensino....................................... 17
1.2 A mediação pedagógica: encontro e troca....................................................... 19
1.3 Mediação e protocolos de escrita...................................................................... 22
1.4 Mediação: saberes e práticas pedagógicas....................................................... 24
1.4.1 Saberes da formação profissional........................................................................ 27
1.4.2 Saberes das disciplinas......................................................................................... 28
1.4.3 Saberes curriculares............................................................................................. 28
1.4.4 Saberes da experiência......................................................................................... 28
1.4.5 O que se pode concluir a partir desses saberes? .................................................. 28
2 ESCRITA CRIATIVA EM ATIVIDADE MEDIADA................................... 30
2.1 Concepção de escrita.......................................................................................... 30
2.2 Ensino de escrita na perspectiva mediada....................................................... 31
3 OS CAMINHOS DA PESQUISA: vivências e práticas mediadas................ 39
3.1 Aporte teórico para pesquisa............................................................................ 39
3.2 Projeto de intervenção: A escrita e eu, um novo encontro................................ 41
3.3 Contexto da pesquisa......................................................................................... 43
3.4 Alunos colaboradores da pesquisa................................................................... 43
3.5 Descrição e análise dos dados............................................................................ 44
4 ENSINO DE ESCRITA, MEDIAÇÃO DOCENTE E INTERVENÇÃO…. 46
4.1 Saberes e prática docente na mediação da escrita criativa............................ 47
4.2 Os conhecimentos como fundamentos para intervenção................................ 48
4.3 Narrativa infantil – Aula diagnóstica............................................................... 50
4.3.1 Protocolo de Escrita da Aula 1............................................................................. 51
4.3.2 Análise de dados produzidos na Aula 1............................................................... 52
4.4 Reescrita do texto – Aula 2................................................................................ 55
4.4.1 Protocolo de Escrita da Aula 2............................................................................. 56
4.4.2 Análise de dados da Aula 2.................................................................................. 56
4.5 Escrita, leitura e formação de palavras – Aula 3............................................ 61
4.5.1 Protocolo de Escrita da Aula 3............................................................................. 61
4.5.2 Análise de dados da Aula 3.................................................................................. 62
4.6 Estrutura do texto narrativo – Aula 4.............................................................. 64
4.6.1 Protocolo de Escrita da Aula 4............................................................................. 65
4.6.2 Análise de dados da Aula 4.................................................................................. 65
4.7 Construção de personagem – Aula 5................................................................ 67
4.7.1 Protocolo de Escrita da Aula 5............................................................................. 68
4.7.2 Análise de dados Aula 5....................................................................................... 68
4.8 Construção de parágrafos – Aula 6.................................................................. 70
4.8.1 Protocolos de Escrita da Aula 6........................................................................... 71
4.8.2 Análise de dados da Aula 6.................................................................................. 72
4.9 Produção de texto 1 – Aula 7............................................................................. 75
4.9.1 Protocolos de Escrita da Aula 7........................................................................... 76
11
4.9.2 Análise de dados da Aula 7.................................................................................. 76
4.10 Produção de texto 2 – Aula 8............................................................................. 78
4.10.1 Protocolos de Escrita da Aula 8........................................................................... 79
4.10.2 Análise dos dados da aula 8................................................................................. 81
4.11 Ao final das aulas exemplos, o que dizer sobre mediação? ........................... 83
CONSIDERAÇÕES FINAIS: O grande aprendizado................................... 84
REFERÊNCIAS................................................................................................. 87
12
INTRODUÇÃO
A vocação nasce com a gente, misteriosamente. Ela é o nosso caso de amor
com algo que se faz. A diferença entre quem trabalha por profissão e quem
trabalha por vocação: o primeiro trabalha pelo ganho; o segundo seria capaz
de pagar para poder fazer seu trabalho. Trabalha como quem faz amor, como
quem brinca.
Rubem Alves
Há quase dez anos, tornei-me professora, oficialmente, da rede municipal de ensino de
Natal/RN e, desde então, minha caminhada em cada ano letivo, em cada turma e escola pelas
quais tenho passado, tem sido de aprendizagem. As palavras de Rubens Alves (2003), que
abrem este capítulo, em forma de epígrafe, retratam, em linhas gerais, o início de uma
caminhada de luta, mas, principalmente, de muito amor por uma profissão, muitas vezes, não
valorizada, mas que tenho muito orgulho de ser parte. Por isso, procurei sempre obter novos
conhecimentos a cada passo desta caminhada, sempre procurando melhorar minhas práticas.
Evoluindo como ser humano e como profissional, notei, em vários momentos, a
importância da presença direta do professor junto ao aluno, em seu processo de aquisição do
conhecimento. Entendi que a maior tarefa do professor é deixar seu aluno espantado, um
aluno espantado é um aluno pensante, a parte aprendida, adquirida do conhecimento, é aquilo
que fica depois após o espanto. Os alunos lembram-se daquilo que foi prazeroso, daquilo que
eles realmente aprenderam.
Percebi que de nada adianta encher a lousa de atividades e conteúdos sem dar espaço
para que meu aluno reflita sobre aquilo que está aprendendo. Assim, compreendi que a
primeira tarefa do professor é ensinar os alunos a pensar sobre o objeto da aprendizagem. De
acordo com Alves (2003, p. 56), ao fazer alusão ao voo da águia, no horizonte, sobre espaços
desconhecidos, “pensar é voar sobre o que não se sabe”. Pus-me a pensar sobre essa
afirmação, bem como sobre um caminho para, por meio das atividades de leitura e de escrita,
ensinar os alunos a pensar. Vale ressaltar que, ao utilizar o termo pensar, não o estou
empregando no sentido cognitivo e individual do termo, mas no sentido relacional, ou seja, do
trabalho que se faz sobre o objeto de conhecimento, o dado, sobre os caminhos percorridos
para chegar a um determinado ponto, o novo.
Neste trabalho, pretendo dialogar sobre os caminhos percorridos, quando fui
mobilizada, mais diretamente, por essas reflexões. Isso ocorreu no mestrado profissional em
Letras (ProfLetras), mais especificamente, nos momentos de estudos e nas conversas com
13
minha orientadora, professora Dra. Sulemi Fabiano Campos, durante as aulas e nas seções de
orientação, mediante o desafio colocado pelo programa: realizar pesquisa no contexto de sala
de aula e propor uma intervenção na realidade escolar.
Esta pesquisa está, assim, inserida nas atividades desenvolvidas no âmbito do
Programa de Mestrado Profissional em Letras (ProfLetras) da Universidade Federal do Rio
Grande do Norte. Por ser um Mestrado Profissional, esse programa traz como meta a
construção de uma intervenção que possa favorecer mudanças positivas no processo de ensino
e aprendizagem de leitura e de escrita dos alunos do ensino fundamental, das escolas públicas.
Desenvolvemos, com base nessa diretriz, um projeto de intervenção, que foi aplicado em uma
turma de 4º ano do Ensino Fundamental I, na Escola Municipal Professora Palmira de Souza,
situada na zona norte da cidade de Natal/RN.
Como primeiro ponto desse desafio, delimitamos1 um foco de observação: o ensino de
escrita que possa proporcionar às crianças aprendizagem de maneira prazerosa e eficaz. Em
torno dessa busca, lembremos mais uma frase de Rubem Alves (2003, p. 74) quando ele diz
que “a universidade existe só para ajudar os homens a transformarem os desertos em jardins”.
Compreendemos que, nesse enunciado metafórico, os desertos simbolizam a ausência de
perspectiva para o agir. A universidade pode transformar o deserto em jardim, a medida que
favorece, por meio da teoria, caminhos para pensar e projetar uma prática. A teoria nos faz
sonhar com possibilidades de ação mais exitosas, faz-nos pensar sobre a prática, ajuda-nos a
fazer de outra forma.
Numa atividade de autoavaliação, reconheci que, durante minha vida profissional,
passei por vários cursos de formação, o que indica que essas reflexões sobre o fazer
pedagógico já existira em outros momentos de minha caminhada, contudo, por vezes, devido
à diversos motivos, nem sempre apliquei aquilo que foi aprendido e acabei por voltar às
mesmas práticas. Pus-me a relembrar como era o trabalho com a escrita, resumi: solicitar a
produção do texto, corrigir as tarefas dos alunos com base no certo e errado, sem considerar o
processo e sem que a atividade resultasse em um retorno significativo para eles.
Ao observar a rotina escolar de outros colegas, percebi que essa prática também
existia. Embora existam algumas preocupações no que diz respeito às correções que se faz nos
textos dos alunos por meio de comentários, tais como “Bom!”, “Não entendi!”, “Precisa
melhorar!” e “Ótimo!”, percebemos que essas práticas não auxiliam os alunos na hora de
1 A partir deste ponto, passo a utilizar a segunda pessoa do plural para marcar, na escrita, a união de duas vozes,
a minha e de minha orientadora, uma vez que este trabalho é uma produção orientada. Utilizarei, todavia, a
primeira pessoa do singular nos casos em que eu me referir à minha experiência pessoal como docente.
14
escrever ou de reescrever seus textos, pois não há, nessas palavras, significação real para o
aluno e acaba por fazê-lo acreditar que a escrever é difícil e que ele não sabe escrever. Essas
atividades fazem o aluno observar o erro, não o caminho percorrido até aquele ponto. Frente
ao exposto.
Observando a prática rotineira desse tipo de correção, percebemos que pouco
acrescentamos para a escrita de nossos alunos com correções desse teor. Compreendemos que
os comentários, como os acima citados, fazem parte de uma concepção de textos como
produto pronto e acabado, a escrita, como uma ação solitária, sendo o professor apenas
avaliador dos erros cometidos pelos alunos. O texto, então, nessa situação, serve apenas para
adquirir uma nota e nem sempre é solicitado do aluno a reescrita.
Nesse processo de observação e reflexão, concluímos que o retorno dado aos alunos é
importante, pois será a partir dele que poderão melhorar sua escrita, tornam-se alunos
produtores de textos. Esse retorno, todavia, precisa ser significativo, para que o aluno
compreenda a escrita como processo que envolve diversas etapas; precisa ser motivado, para
que o aluno saiba o porquê, tenha um motivo real para fazer a reescrita.
Geraldi (1996) nos apresenta uma concepção de linguagem, como atividade
constitutiva, na qual a interação verbal é um espaço próprio da língua, porque é por meio dela
que ocorrem os processos de constituição do eu, o sujeito se constitui na relação com o outro.
Acreditamos que assim deve ser a relação entre o aluno, o professor e o texto: interativa. O
aluno se constituirá produtor de texto, na relação com a escrita, na relação com o professor e
com um contexto social mais amplo em que escrever não é apenas uma atividade escolar.
Inspirado no pensamento bakhtiniano, Geraldi (1996) afirma que o trabalho linguístico
é constitutivo “tanto da própria linguagem e das línguas particulares, quanto dos sujeitos”
(1996, p. 28). Isso demonstra que a língua não pode ser estudada como um produto pronto e
acabado. Pelo contrário, a língua deve ser apreendida como resultado de um processo que se
encontra sempre em construção.
Nessa perspectiva, centrar o ensino na produção textual é preocupar-se com o uso da
língua, pensando a relação de ensino “como o lugar de práticas de linguagem e partir delas,
com a capacidade de compreendê-las, não para descrevê-las, como faz o gramático, mas para
aumentar as possibilidades de usos exitosos da língua” (GERALDI, 1996, p.66). O ensino de
forma tradicional, como ainda vemos em algumas salas de aula, trabalhando somente a
formulação descritiva da língua, não ajuda aos alunos a melhorar os usos dela.
Para que, durante as aulas, o ensino torne-se realmente significativo e tenha sentido, é
necessário a presença constante do professor, na condição de mediador que se coloca entre os
15
conhecimentos e os alunos. Ao citarmos a mediação, partimos do pressuposto de que essa
ação é fundamental no ensino-aprendizagem, pois entendemos que todos aprendem de jeitos
diferentes, coisas diferentes e de formas diferentes todos os dias, mas o que vai mudar é
maneira que o professor insere os conhecimentos em suas aulas e como ele chega até o aluno
(HOFFMANN, 2005a).
Dispomos como hipótese inicial, que o professor do Ensino Fundamental I corrige os
escritos de seus alunos de maneira não favorável ao acompanhamento e desenvolvimento dos
alunos e necessita, portanto, de saberes linguísticos e de metodologias diferenciadas para
mediar o processo de escrita dos seus alunos.
Pretendemos responder a seguinte questão: a que saberes o professor recorre para
mediar o processo de escrita dos alunos? Como objetivo geral, procuramos analisar as
contribuições oferecidas pelo professor como mediador do processo de escrita dos textos dos
alunos em sala de aula. Como objetivos específicos: i) diagnosticar como o professor corrige
os textos produzidos pelos alunos, em sala de aula; ii) elaborar e executar atividades que
contribuam para o trabalho com a escrita, como atividade criativa; iii) utilizar a mediação
pedagógica como forma de auxiliar no processo de escrita de textos; iv) analisar e interpretar
as produções dos alunos, tendo como parâmetros protocolos de escrita, a fim de compreender
como a mediação do professor contribui para o processo de escrita.
Nossa investigação terá como aporte teórico, a concepção de ensino defendida por
Freire (1996); de professor como mediador do processo de ensino-aprendizagem, cujos
fundamentos advém de Vygotsky (1991) e Hoffmann (2005a; 2005b); bem como nos saberes
docentes ou da prática pedagógica, presentes em Tardif (2002), Almeida e Biajone (2007); a
análise de dados segue a metodologia dos Protocolos de Escrita. Para questões teóricas sobre
língua e linguagem, trabalha-se com a perspectiva interativa da linguagem, com aporte na
teoria bakhtiniana; sobre o ensino de escrita / produção textual, tem-se como fundamentos os
estudos de Geraldi (2004, 2013, 2015), Cagliari (1998, 2003) e Koch e Elias (2009).
A metodologia aplicada foi por meio do paradigma etnográfico da pesquisa em sala de
aula de maneira qualitativa interpretativa. Para tanto, utilizamos o uso dos protocolos de
escrita, segundo as orientações de Bortoni-Ricardo et. al. (2012) e do uso de bilhetes nos
textos dos alunos, seguindo as informações contidas no texto de Ruiz (2001).
Frente ao exposto, considerando nosso interesse em trabalhar com a prática
pedagógica com foco na escrita de textos, propomos realizar um Projeto de Intervenção no
qual as crianças pudessem melhorar suas atividades de escrita, tornando-se além de escritores,
leitores de seus próprios textos. As atividades foram propostas e desenvolvidas em uma turma
16
de 4º ano; alguns desses momentos foram gravados. Os escritos produzidos, bem como os
fragmentos das mediações feitas pela professora-pesquisadora, com base na metodologia dos
protocolos de escrita foram analisados, utilizando a método qualitativo interpretativista. O
trabalho está constituído em quatro seções.
Na primeira seção, apresentamos as concepções de ensino e de sujeito que embasam
nossas práticas, bem como discorremos sobre os saberes necessários ao professor, durante a
prática pedagógica, tendo em vista o processo de mediação.
Na segunda seção, apresentamos os estudiosos e suas respectivas linhas de estudos, em
acordo com que defendemos ser o ideal para uma prática pedagógica de ensino de produção
de textos de alunos do 4º ano, do Ensino Fundamental I.
Na terceira, abordamos os instrumentos metodológicos da pesquisa, o paradigma
qualitativo interpretativista e situamos os aportes da pesquisa no ensino de língua portuguesa.
Em seguida, contextualizamos a pesquisa, por meio da apresentação do campo de pesquisa,
dos alunos público-alvo e do projeto de intervenção.
Na quarta seção, estão descritas as aulas elaboradas e executadas, bem como os
protocolos e a análise dos textos dos alunos.
E, por fim, serão apresentadas as considerações sobre a pesquisa realizada e sua
aplicabilidade em uma sala de aula de Ensino Fundamental I. Retomando as primeiras
reflexões apontadas no início deste estudo, concluímos que as atividades de pesquisa e
intervenção, favorecem a evolução no desempenho dos alunos ao realizar atividades de
escrita/produção de texto. Esse fato conduziu-nos à percepção de que a mediação pedagógica
contribuiu, significativamente, para que esse desenvolvimento ocorresse. Concluímos, ainda,
que a metodologia de protocolos de escrita contribui para o trabalho docente, pois permite que
o professor acompanhe o desenvolvimento dos alunos e, assim, possa intervir no processo de
ensino-aprendizagem, tendo como parâmetro as reais necessidades dos alunos.
17
1 A MEDIAÇÃO NO PROCESSO DE ESCRITA
Neste primeiro momento, pretendemos mostrar porque a mediação do professor
interfere diretamente no processo de ensino e aprendizagem das crianças. Para tanto,
recorremos às proposições teóricas e a estudos já desenvolvidos sobre esse assunto.
É sabido que, durante muito tempo, o ensino era baseado na “educação bancária”
(FREIRE, 1996), no qual o professor estava à frente da sala para ensinar e os alunos,
sentados, para aprender. Como se o aluno fosse uma folha de papel em branco pronto a
receber todos os conhecimentos, sem em nada contribuir. Essa realidade, todavia, vem
mudando, paulatinamente. Hoje, já temos a liberdade de realizar ações e tarefas junto com os
alunos, em um processo de aprendizagem que envolve ação – reflexão – ação: práticas que
têm o professor como mediador entre o conhecimento e seus alunos.
Entendemos que o professor, enquanto sujeito mais experiente, pode favorecer um
encontro significativo entre o aluno e o conteúdo de aprendizagem. Ao utilizarmos o termo
encontro significativo, o compreendemos como o momento em que, ao aluno, é possibilitada
uma relação dialógica entre o dado, o conteúdo, objeto de conhecimento, e o novo,
conhecimento que surge nessa relação. Conceber a produção de conhecimento, nessa
perspectiva, requer conceber o sujeito como ser ativo, ser de linguagem constituído social e
historicamente, na relação com o outro. Havendo interação no encontro com o conhecimento
compartilhado, o aprendizado acontece. A essa função atribuída ao professor, damos o nome
de mediação, prática cujo objetivo é contribuir para que o aluno desenvolva-se,
satisfatoriamente, no processo de ensino e aprendizagem, realizado no ambiente escolar.
Com base nessas formulações iniciais, abordaremos a mediação, a partir de
perspectivas teóricas. A fim de tornar mais acessível o conhecimento sobre esse tema,
fundamentamo-nos em Freire (1996), que, mesmo sem citar diretamente a palavra mediação,
nos ajuda a compreender o quão importante é essa relação entre professor e aluno; Vygotsky
(1991), principal expoente do sociointeracionismo, em cuja teoria encontramos a defesa de
que o ser humano desenvolve-se em contato com os outros seres humanos; e Hoffmann
(2005a; 2005b) que muito tem contribuído para a inserção da mediação em sala de aula.
Antes, todavia, consideramos relevante trazer uma abordagem sobre a concepção de
sujeito e de ensino que fundamenta o trabalho com a mediação. Em seguida, trataremos a
mediação em relação aos protocolos de escrita, uma metodologia de registro utilizada para
analisar o conhecimento construído pelo aluno, sobre a escrita, a partir da mediação.
18
1.1 Concepção de sujeito da aprendizagem e de ensino
Conforme já apresentamos na introdução deste trabalho, trazemos para o centro desta
investigação o ensino de escrita, cuja experiência ocorreu em uma turma no 4º ano do ensino
fundamental. Ao tematizarmos o ensino da escrita, interligamos os conhecimentos advindos
da educação e os conhecimentos advindos da linguística.
Os conhecimentos advindos da educação, mais especificamente da Pedagogia
Progressista de Freire (1996), nos fazem compreender o sujeito como ser ativo, um ser social
que traz para o processo de ensino-aprendizagem um conjunto de conhecimentos adquiridos
na vivência sócio-histórica, o que Freire denomina “leitura de mundo”, e que não podem ser
desconsiderados pelo professor, pela escola. Freire é enfático nessa defesa e a coloca em
várias passagens de sua obra, das quais citamos:
Respeitar a leitura de mundo do educando significa tomá-la como ponto de
partida para a compreensão do papel da curiosidade, de modo geral, e da
humana, de modo especial, como um dos impulsos fundantes da produção do
conhecimento. É preciso que, ao respeitar a leitura do mundo do educando
para ir mais além dela, o educador deixe claro que a curiosidade fundamental
à intelegibilidade do mundo é histórica e se dá na história, se aperfeiçoa,
muda qualitativamente, se faz metodologicamente rigorosa. E a curiosidade
assim metodicamente rigorizada faz achados cada vez mais exatos (FREIRE,
1996, p. 123).
No âmbito dos estudos linguísticos, Geraldi (2004) explica que, na década de 1960,
duas concepções de sujeito confrontaram-se. De um lado, concebia-se o sujeito como ser
psicológico, a fonte do que diz. É dessa concepção que advém a ideia de sujeitos mais
inteligentes e menos inteligentes. Do outro, concebia-se o sujeito como ser assujeitado, cujo
dizer é definido, ideologicamente, pela estrutura social. Nessa concepção, o sujeito é apenas
reprodutor de dizeres sociais. A terceira concepção, proveniente dos estudos bakhtinianos,
compreende “o sujeito como produto da herança cultural, mas também de suas ações sobre
ela. [...] o sujeito, ao mesmo tempo em que repete atos e gestos, constrói novos atos e gestos,
num movimento histórico no qual repetição e criação andam sempre juntas” (GERALDI,
2004, p. 20).
Partindo dessas duas perspectivas, a de Freire (1996) e a de Geraldi (2004),
compreendemos o sujeito aluno como ser ativo, apto a interagir, pois traz consigo seus
conhecimentos sócio, histórico e culturalmente adquiridos; e a produzir conhecimentos numa
relação entre o dado e o novo. Adotamos essa concepção por compreender que somente por
19
meio dela é possível haver mediação, uma vez que se trata de uma ação de troca e produção
de saberes.
Uma concepção de ensino que contemple esses sujeitos precisa, assim, partir de uma
base também interacionista. Nessa perspectiva, compreendemos que o ensino é uma atividade
mediada de troca entre um sujeito mais experiente, o professor, e um sujeito em formação, o
aluno. Esta concepção de ensino fundamenta-se, também, na Pedagogia Progressista de
Freire, segundo o qual:
ensinar não se esgota no ‘tratamento’ do objeto ou do conteúdo,
superficialmente feito, mas se alonga à produção das condições em que
aprender criticamente é possível. E essas condições implicam ou exigem a
presença de educadores, rigorosamente, curiosos, humildes e persistentes.
Faz parte das condições em que aprender criticamente é possível a
pressuposição por parte dos educandos de que o educador já teve ou
continua tendo experiência da produção de certos saberes e que estes não
podem a eles, os educandos, ser simplesmente transferidos. Pelo contrário,
nas condições de verdadeira aprendizagem os educandos vão se
transformando em reais sujeitos de construção e da reconstrução do saber
ensinado, ao lado do educador, igualmente sujeito do processo (FREIRE,
1996, p. 26).
A concepção de ensino presente na pedagogia freiriana faz-nos compreender que o
ensino pressupõe a existência de um objeto e de um conteúdo. O nosso objeto é o ensino de
escrita, sendo esta, pois, o conteúdo a ser ensinado no projeto de intervenção. Faz-nos
compreender, ainda, que a ação docente não se esgota no ensino de conteúdo, mas se alonga à
produção das condições em que aprender criticamente é possível. Nessa perspectiva,
alongamos nossa ação quando adotamos a mediação como método de trabalho e quando, no
ensino de escrita, estabelecemos um diálogo com o aluno, acreditando que, mesmo criança,
ele possui condições de entrar na interação e ser ativo em seu processo de aprendizagem, ou
seja, não nos colocamos com sujeito que está acima, mas lado a lado com aluno na produção
do conhecimento que pretendemos transformar em aprendizagem: a escrita.
Ao buscar compreender a concepção de ensino de escrita a partir a concepção de
sujeito como ser dialógico, encontramos, em Geraldi (2015, p. 32), a defesa de que “a
educação somente se dá pelo processo de mediação entre sujeitos”. Afirmação semelhante ao
que lemos e aprendemos com Freire. Ao referir-se ao ensino de escrita, Geraldi vai na mesma
direção ao afirmar que:
ensinar a escrever obriga o professor a criar as condições para que
determinados processos se desenvolvam sem implantá-los diretamente.
20
Desenvolvimento cognitivo nunca se pode ensinar diretamente.
Desenvolvimento psíquico representa uma função autônoma do aprendiz,
mas esta função precisa de contexto social, das formas sociais de ensino-
aprendizagem, ou seja, dos processos de mediação (GERALDI, 2015, p.
169).
Com base nessas duas concepções, assumimos, neste trabalho, a concepção de sujeito
da aprendizagem como ser ativo, constituído sócio, histórico e culturalmente constituído;
assumimos a concepção de ensino como processo de interação que se dá na mediação
pedagógica. Assim, no intuito de oferecer uma maior compreensão sobre esse processo, o
abordaremos em seguida.
1.2 A mediação pedagógica: encontro e troca
Para falarmos em mediação, nada melhor que iniciarmos com as concepções teóricas
de Freire (1996) pois, mesmo sem utilizar, diretamente, o termo mediação, ele nos deixou
grandes ensinamentos, conforme vimos demonstrando, acerca de como trabalhar de forma
mediadora, no desenvolvimento do ensino e da aprendizagem.
De acordo com Freire (2003), não há como participar de trabalhos ou processos de
aprendizagem de maneira mecânica, por exemplo, restringir a alfabetização ao ensino das
letras, sílabas e palavras; tampouco o fato de o aluno precisar da ajuda do professor desfaz sua
criatividade e sua responsabilidade no que diz respeito à construção de saberes, em outras
palavras, o aluno precisa ter autonomia, mas isso não significa dizer que ele não precise da
ajuda mediadora do professor.
Nessa perspectiva, concordamos quando Freire (1996, p.22) diz que “ensinar não é
transferir conhecimento, mas criar possibilidades para a sua produção ou a sua construção”.
Sabendo o que o aluno necessita, temos a possibilidade de criar estratégias de ensino para
suprir suas necessidades de aprendizagem. Dessa forma, acreditamos que o professor
necessita ter conhecimentos teóricos específicos de sua área de atuação. Em se tratando do
professor de língua portuguesa, ele precisa de conhecimentos linguísticos específicos para
mediar o processo de escrita de textos dos seus alunos.
O processo de mediação requer confiança mútua entre professor e aluno, em relação as
possibilidades de reorganização conjunta do saber. Com a intenção de transformar o ato de
aprender e ensinar, é possível transformar o desenvolvimento da aprendizagem em um
momento prazeroso de descobertas e troca de conhecimentos. Essa forma conjunta de trabalho
21
entre professor e aluno, realizada através de diálogos, é descrita por Freire, (1996, p. 124) e,
não deixa de ser uma forma de mediar o conhecimento.
Ninguém pode conhecer por mim assim como não posso conhecer pelo
aluno. O que posso e o que devo fazer é, na perspectiva progressista em que
me acho, desafiá-lo a que se vá percebendo na e pela própria prática, sujeito
capaz de saber. Meu papel de professor progressista não é apenas o de
ensinar matemática ou biologia mas sim, tratando a temática que é, de um
lado objeto do meu ensino, de outro, da aprendizagem do aluno, ajudá-lo a
reconhecer-se como arquiteto de sua prática cognoscitiva. [...] Numa
perspectiva progressista o que devo fazer é experimentar a unidade dinâmica
entre ensino do conteúdo e o ensino de que é e de como aprender (FREIRE,
1996, p. 125).
Podemos, assim, definir mediação como a vivência dessa “unidade dinâmica entre
ensino do conteúdo e o ensino de que é e de como aprender”, proposta por Freire. O diálogo é,
nessa perspectiva, a melhor forma de mediar o conhecimento entre professor e o aluno, uma
vez que, no diálogo, se estabelece uma relação entre pares, sujeitos que compartilham
linguagem, conhecimentos e objetivos comuns. No movimento de mediação há ação,
provocação, reciprocidade nas ações de ensinar e de aprender, nelas, professor e aluno
buscam interligar suas ideias de forma conjunta, a fim de reorganizá-las. Em sua essência,
mediação é intervenção, intermediação, intercessão.
Segundo Hoffmann (2005b, p. 63), o professor tem a responsabilidade de fazer com
que seu aluno reflita sobre sua produção de conhecimento. Ela nos adverte que é preciso criar
momentos que favoreçam: “a iniciativa e a curiosidade no perguntar e no responder,
construindo novos saberes junto com os alunos”. E acrescenta ser importante, nas
intervenções mediadoras, que os alunos tenham oportunidades de refletir e desenvolver-se
melhor em relação aos conhecimentos apreendidos em sala de aula.
O educador / mediador oportuniza e favorece processos de reflexão do
educando sobre suas ações (abstração reflexionante) de refletir a própria
experiência, de estabelecer relações entre ideias e ações, de perceber
diferentes pontos de vista para refletir e reconstruir suas próprias
experiências no plano mental, evoluindo em termos do desenvolvimento
moral e intelectual (HOFFMANN, 2005a, p. 21).
A concepção de mediação, conforme vimos apresentando, encontra importantes
fundamentos na obra de Vygotsky, psicólogo russo, cuja perspectiva teórica é interacionista.
A teoria de Vygotsky é norteada por três temas gerais: o uso de um método genético ou de
desenvolvimento; o funcionamento mental advém de processos sociais; os processos mentais
22
e psicológicos são moldados por meio de ferramentas sociais e formas de mediação.
Considerando a delimitação desta abordagem, embora as três perspectivas estejam
relacionadas, trataremos apenas da terceira.
Vygotsky (1991) defendeu que a sociabilidade é uma característica do ser humano, ou
seja, na perspectiva sociointeracionista, o ser humano constitui-se na relação com o outro. A
cultura torna-se, então, parte dele por meio de um processo histórico. Ao tratar sobre o
desenvolvimento da criança, Vygotsky (1991) defende a sociabilidade como ponto de partida
das relações sociais da criança com o entorno. Nessa relação, ele aponta as interações com
adultos como as mais importantes.
Vygotsky (1991) parte do princípio de que as atividades socialmente organizadas e
enraizadas historicamente, são internalizadas pelo sujeito no meio social em que ele habita.
Assim, o processo de aprendizagem começa por uma atividade externa e, a partir desse
princípio, o autor conclui que o desenvolvimento humano passa primeiro pelo nível social,
interpessoal e depois pelo nível individual, intrapessoal.
De acordo com Riolfi (2006), na concepção vygotskyana, qualquer aquisição de
conhecimento é sempre intermediado pelas pessoas que estão ao redor da criança. Esse adulto,
não necessariamente, tinha de ser pai ou mãe, mas alguém com conhecimento histórico e
social de coisas e palavras que a criança irá necessitar. As abordagens educativas que
possuem origem vygotskyana consideram a aprendizagem como um fenômeno que se realiza,
quando há interação do sujeito com o outro.
Em meio a esse processo de internalização, Vygotsky (1991) estabelece dois níveis de
desenvolvimento para entender o processo de aprender. São o nível de desenvolvimento real,
que diz respeito à capacidade que a criança tem de resolver atividades e/ou funções sem ajuda
de outra pessoa, diz respeito aos eventos já consolidados por ela; e o nível de
desenvolvimento potencial que está relacionado às atividades que a criança possui
dificuldades em realizar, precisando, dessa forma, da ajuda de um adulto ou de uma criança
mais velha. Entre um nível e outro, há o que Vygotsky (1991) chamou de zona de
desenvolvimento proximal, a ZDP, que consiste na distância entre o conhecimento real e o
potencial, nela está aquilo que não foi consolidado, mas já está em processo.
Segundo Hoffmann (2005a), por meio desse nível intermediário, a ZDP, o teórico
sugere a importância do professor mediador no processo de aprendizagem dos alunos. Isso
ocorre por meio de observações diárias em relação ao que o aluno já sabe e aquilo que ele
precisa aprender. O professor, como mediador, deverá a cada momento do processo educativo
lançar desafios aos seus alunos, fazendo-os refletir, no sentido de envolve-los em situações
23
diferenciadas, provocando-os a uma superação cognitiva. Na escola, portanto, somos,
também, o elo entre as crianças e o conhecimento. Porque não é somente com os professores
que elas aprendem, mas com os próprios colegas de sala e com o meio social em que vive e
que é exterior a escola.
A mediação, tomando como referência Vygotsky (1991), desenvolve-se por meio da
ação promovida pela pessoa mais experiente para que o outro, pessoa menos experiente, se
aproprie de um dado conhecimento. Mediação, portanto, é uma forma de organizar e orientar
o trabalho na sala de aula, visto que o conhecimento adquirido de maneira mediada é
aprendido e não decorado pelo aluno. O caminho da mediação deve ser o de um olhar único,
para cada indivíduo e para suas trajetórias de aprendizagens. É com a mediação que o
professor pode fazer a diferença na vida e no desenvolvimento da aprendizagem de seus
alunos.
1.3 Mediação e protocolos de escrita
Com o objetivo de auxiliar no processo de mediação em relação a escrita, utilizamos
os protocolos de escrita como metodologia para coleta de dados, durante as atividade de
mediação e ensino. Para trabalhar com os protocolos de escrita, recorremos às experiências de
uso de protocolos contidas em Bortoni-Ricardo et. al (2012). Compreendemos protocolos de
escrita como produto da interação professor e aluno, resultante das atividades mediadas.
Nessa perspectiva, tomamos como objeto de análise o conteúdo resultante dessa interação.
Para Bortoni-Ricardo (2008, p.80), os protocolos (que ela denomina protocolos
interacionais) são descrições de rotinas, “sequência interacionais bem sucedidas no trabalho
pedagógico”. Em Bortoni-Ricardo et. al (2012), encontramos diversos registros de
experiências com o uso de protocolos, porém todos voltados para o trabalho com a leitura.
Neste trabalho, utilizamos essa metodologia para nos ajudar no ensino da escrita, por isso,
denominamos protocolos de escrita.
Segundo Magalhães e Machado (2012, p. 47), o trabalho com protocolos data de 1957,
em pesquisas envolvendo atividades lógicas. Há diversas formas e vertentes de uso dessa
técnica, porém, “em linhas gerais, ao usar os protocolos verbais, o pesquisador pede ao sujeito
que pense alto enquanto se desincumbe de uma tarefa”.
Especificamente, em nosso caso, como trabalhamos com a escrita, o aluno irá dizer
como organizou suas ideias ou pensou determinada estrutura ou palavra. Os protocolos de
escrita são um dos métodos que utilizamos para nos auxiliar na mediação, uma vez que, por
24
meio deles, é possível analisar os dados, buscando compreender os caminhos percorridos pelo
aluno durante a escrita de seus textos. Entendemos que os protocolos de escrita favorecem o
trabalho pedagógico, quando o professor toma-os como referência para o planejamento das
atividades futuras e traça seu plano com base na articulação do que ele, como sujeito mais
experiente, compreende ser relevante para a formação do aluno e do que ele observa ser
necessário para sanar uma dificuldade do aluno.
O trabalho com os protocolos favorecem, ainda, ao professor, pensar as ocorrências à
luz das teorias que o fundamentam, ação nem sempre possível no momento da prática em sala
de aula. Assim, o professor montará intervenções específicas orais ou escritas, no intuito de
promover o crescimento no processo de escrita de textos dos seus alunos.
Naedzold, Santos e Silva (2017, p. 1), ao realizar atividades de pesquisa utilizando a
técnica dos protocolos verbais, testificam que “quando o planejamento está de acordo com o
objetivo desejado, as intervenções do professor nas atividades de produção textual produzem
bons resultados”. É interessante perceber que, com a intervenção adequada no momento de
coleta de dados, por meio dos protocolos de escrita, podemos descobrir como os alunos
planejaram seus textos, no momento da construção. A análise dos protocolos demonstram
que, por meio das intervenções, as crianças conseguem refletir sobre aquilo que escreveram
e/ou estão escrevendo e alguns, ainda, melhoram com relação à oralidade.
As verbalizações presentes nos protocolos, segundo Magalhães e Machado (2012), são
de dois tipos: co-ocorrente e concorrente e retrospectiva. O primeiro ocorre concomitante com
a realização da ação (em nosso caso do processo de escrita); no segundo, o aluno oraliza ao
finalizar a tarefa, esse momento pode variar levando segundos ou dias. Nesta pesquisa,
adotamos os duas formas. A primeira por meio das gravações de áudio, feitas durante as
aulas, atividade de escrita coletiva; a segunda, por meio das intervenções feitas com os alunos
nos momentos de mediação individual.
Nesse processo de torna-se escrevente, os alunos estarão envolvidos em meio a um
contexto e dialogarão sobre ele com o objetivo de construírem conhecimentos, durante o
trabalho com a escrita de textos. É importante não perder de vista que, na concepção de
ensino e de sujeito que adotamos neste trabalho,
ao se propor a produção de textos como a devolução da palavra ao sujeito,
aposta-se no diálogo [...] e na possibilidade de recuperar na ‘história contida
e não contada’ elementos indicativos do novo que se imiscui nas diferentes
formas de retomar o vivido, de inventar o cotidiano (GERALDI, 2004, p.
20).
25
Nesse diálogo, entre professor, o aluno e seu texto desvelam-se as escolhas seja de
cunho gramatical ou lexical que, conscientes ou não, foram realizadas pelo aluno, durante a
escrita. É preciso um olhar atento sobre esses dados, pois eles podem revelar a evolução do
conhecimento adquirido mas também os sentidos socialmente construídos. Os protocolos
favorecem esses acompanhamento direto do professor e esse será um de nossos papéis na
orientação e mediação, no decorrer do uso dos protocolos de escrita.
Assim, temos como objetivo realizar os protocolos de escrita dentro do projeto de
intervenção, como atividade de verbalização co-ocorrente e retrospectiva, a fim de, ao analisá-
los, à luz de teorias, favorecer o desenvolvimento dos alunos como produtores de textos.
Mediante o exposto, reiteramos a importância da mediação pedagógica para o
processo de ensino-aprendizagem e de escrita (foco deste trabalho), ainda mais quando
analisamos escritos por meio do uso dos protocolos de escrita, os quais servem de reflexão e
registro para fazer-nos avançar em sala de aula.
1.4 Mediação: saberes e práticas pedagógicas
Nesta subseção, objetivamos dialogar sobre os conhecimentos específicos que o
professor deve ter para modificar sua prática pedagógica em sala de aula, interagindo e agindo
de forma singular na formação de seus alunos.
Para transformar a prática, precisamos definir saberes, atitudes, crenças, instrumentos,
ferramentas relativas ao ato de ensinar. Nesse sentido, o trabalho transforma o ser humano
assim como tudo e todos que estão ao redor dele. Conforme Tardif (2002, p.57) “trabalhar
remete aprender a trabalhar, ou seja, a dominar progressivamente os saberes necessários à
realização do trabalho”. Isso ocorre devido à experiência e as leituras que acumulamos no
decorrer do tempo, fazendo com que possamos progredir e compreender quais os saberes
necessários à prática. Em nosso caso, à prática pedagógica.
A assimilação da aprendizagem, por meio da formação, fornece ao educador a base
teórica. Contudo, ocorre que tal formação não coincide, muitas vezes com a prática. Os
saberes ligados ao trabalho são construídos de acordo com o tempo e é variável, pois irá
depender da ocupação. Com o tempo de trabalho, progressivamente, há saberes que serão
apreendidos como prática, experiência e hábitos. O tempo, trabalho e aprendizagem, esses três
elementos fazem parte dos saberes profissionais do professor.
Tardif (2002) busca refletir, em suas obras, sobre os diferentes saberes existentes na
prática docente e sua relação com os professores. Esse autor organiza os saberes do professor
26
em seis linhas gerais, quais sejam: o saber e o trabalho; a diversidade do saber; a
temporalidade do saber; a experiência de trabalho enquanto fundamento do saber; saberes
humanos a respeito de saberes humanos; e saberes e a formação profissional. Tais itens
funcionam como fios condutores que vão permear e identificar os saberes necessários à
prática pedagógica do professor.
O saber e o trabalho estão ligados de forma permanente, à relação entre a escola e a
sala de aula de maneira que essa relação ajuda a solucionar os problemas cotidianos. Tardif
argumenta que os saberes do professor são plurais e advém de diferentes fontes, por isso há
diversidade do saber. A temporalidade do saber tem a ver com o saber adquirido ao longo da
história de vida do professor e de sua carreira profissional. A experiência do trabalho
enquanto fundamento do saber envolve os saberes originados da experiência profissional, é o
que Tardif chama de “habitus”, que seriam as experiências vividas por meio da prática real. O
saber humano a respeito dos saberes humanos são aqueles adquiridos pela vivência, interação
com o outro (ALMEIDA; BIAJONE, 2007).
Tardif (2002) utiliza o termo “knowledge” que pode ser entendido de maneira a
referir-se a professores eficientes (conjunto de saberes que fundamentam o ato de ensinar) e
os saberes de formas diversas (experiência na profissão, aprendizagem com os outros). Os
saberes que os profissionais do ensino possuem são de diversas fontes, tais como as
curriculares, da experiência escolar, os conhecimentos das disciplinas ministradas e de sua
vivência pessoal. Por meio do termo “knowledge”, Tardif (2002) nos fala, também, que o
saber está atrelado a aptidões, atitudes, competências e habilidades do professor, esses
requisitos permeiam nosso saber-ensinar.
O saber-ensinar engloba não só conhecimentos específicos, mas também à grande
diversidade de questões que estão ligadas a ele. Os conhecimentos teóricos, nesse caso, são
menos importantes, aqui o que interessa é a experiência “fonte privilegiada de seu saber
ensinar” (TARDIF, 2002, p. 61). Quando falamos em saberes sociais e educação, estamos
tratando da formação e da aprendizagem, socialmente elaborados, a fim de que seus membros
consigam viver esses saberes sociais. De certa forma, estamos dizendo que os educadores
devem ter claro, em sua prática, a definição dos saberes que transmitem. Ao que nos consta,
nós, professores, temos a função de compartilhar, aos outros, aquilo que sabemos, entendendo
que o saber docente é composto de vários saberes advindos de várias fontes (TARDIF;
LESSARD; LAHAYA, 1991).
Na sala de aula, o que interessa é a realização da intenção comunicativa. Os saberes
servem de aparato para o ensino e isso se chama sincretismo. Significa dizer que não é
27
possível ter uma única unidade teórica. “Noutros termos, um professor não possui
habitualmente uma só e única ‘concepção’ de suas práticas, mas várias concepções que utiliza
em sua prática, em função, ao mesmo tempo, de sua realidade cotidiana e biográfica e de suas
necessidades, recursos e limitações” (TARDIF, 2002, p. 65). Sincretismo quer dizer em
segunda instância que esta relação entre os saberes e o trabalho docente não pode ser
entendida como um modelo aplicacionista da racionalidade. Em terceira instância, sincretismo
tem a ver com a capacidade de utilizar, no cotidiano do ensino, uma série de saberes, e é
exatamente isso que fazemos em sala de aula, todos os dias.
Os saberes do professor são guiados por valores, normas, tradições e experiências,
assim, essas ações são “saberes-em-ação, como nos diz Tardif (2002, p. 66):
durante a ação, os saberes do professor são, a um só tempo, construídos e
utilizados em função de diferentes tipos de raciocínio (indução, dedução,
abdução, analogia etc.) que expressam a flexibilidade da atividade docente
diante de fenômenos (normas, regras, afetos, comportamentos, objetivos,
papéis sociais).
Tardif (2002) comenta que o desenvolvimento do saber profissional parte desde suas
fontes e lugares de aquisição até os momentos de construção. O autor afirma que boa parte da
trajetória profissional do professor, com relação ao ensino, advém de sua experiência
enquanto aluno.
Nesta perspectiva, a competência profissional do professor é enraizada em suas
crenças, história de vida, hábitos e rotinas que serão retratados em sua prática, ou seja, sua
trajetória profissional é construída ao longo de vida profissional. Dessa forma, podemos dizer
que os saberes pré-profissionais são adquiridos com experiências familiares e escolares e por
meio de desempenho e capacidades, visto que todos os saberes não são inatos, são construídos
através da socialização, como nos esclarece Tardif (2002). O saber-ensinar, portanto, seria a
combinação perfeita entre a personalidade do ator e o papel do agente, em suma, acreditamos
que haja uma espécie de intercessão entre a história de vida do educador e seu papel, enquanto
professor. Somente as experiências de vida e vividas, não delineiam o saber profissional,
tornam possível a carreira do magistério, porém não é somente isso que nos faz professores.
O saber docente é plural, como nos retrata Tardif (2002, p 61) “no próprio exercício
do trabalho, conhecimentos e manifestações do saber-fazer e do saber-ser, bastante
diversificados e provenientes de fontes variadas, as quais podemos supor também que sejam
de natureza diferente”. É interessante ressaltar que o saber profissional advém da história de
28
vida, da sociedade, da instituição escolar, dos atores educativos, dos cursos e instituições de
formação pelos quais o professor passou, visto que:
enquanto grupo social e pelas próprias funções a que são chamados a
exercer, o(a)s professores(a)s ocupam uma posição estratégica no interior
das relações complexas que unem as sociedades contemporâneas aos saberes
que elas produzem e mobilizam com diversos fins (TARDIF; LESSARD;
LAHAYA, 1991, p. 216).
Seria praticamente impossível haver desenvolvimento com relação ao processo
educativo se não fosse o corpo docente e de formadores, nos centros de sistemas
educacionais. Compreendemos, então, que o saber envolve aprendizagem e formação e,
quanto mais um saber é desenvolvido, mais ele é formalizado e sistematizado para que
ocorram as aprendizagens (TARDIF; LESSARD; LAHAYA, 1991).
Como já foram ressaltados, os saberes docentes são plurais, contudo e para facilitar a
nossa compreensão a respeito deste saberes, Tardif, em muitas de suas obras, os classificou
em quatro grupos distintos e ao mesmo tempo complementares entre si, são eles: o saber da
formação profissional, os saberes das disciplinas, os saberes curriculares e os saberes das
experiências.
1.4.1 Os saberes da formação profissional
Esses saberes são aqueles advindos da formação de professores, obtidos nas
universidades e centros de ensino. Tais instituições procuram transformar os saberes teóricos /
conhecimentos em práticas do professor, visto que ele e o ensino são seus maiores objetivos.
Colocando os conhecimentos científicos em ação, o professor passa a cultivar a formação
científica.
A prática docente inclui outros saberes denominados de pedagógicos. Eles aparecem
como doutrinas ou concepções trazidas por reflexões acerca de suas práticas e conduzem a
metodologias um pouco mais coerentes de representações e orientações de suas atividades
educativas (TARDIF; LESSARD; LAHAYA, 1991). Essas doutrinas trazem ao professor
ideologias e orientações do saber-fazer que começam à fazer parte da sua formação
profissional.
Compreendemos que a formação científica é essencial para a formação inicial e
continuada do professor, ela nos dá subsídios para agir de forma embasada na medicação dos
conhecimentos e nos afazeres científicos extra escolar. Nesse instante, por exemplo, os
29
saberes profissionais estão auxiliando no alicerce de nossa pesquisa, a fim de nos preparar
com segurança e conhecimento para aplicarmos atividades significativas com nossos alunos.
1.4.2 Os saberes das disciplinas
Os saberes relacionados às disciplinas são aqueles que dizem respeito aos
conhecimentos diversos que temos acesso em sociedade. Eles são integrados na forma
sistemática de disciplinas, nas universidades e programas de ensino variados. Com relação a
isso Tardif, Lessard e Lahaye (1991, p. 220) nos esclarecem que “os saberes das disciplinas
emergem da tradição cultural e dos grupos sociais produtores de saberes”. Quando trazemos
para esta pesquisa um conjunto da saberes advindos de áreas diferentes, da educação e da
linguística, estamos mobilizando os saberes relacionados às disciplinas de forma sistemática.
1.4.3 Os saberes curriculares
Esse tipo de saber equivale aos objetivos, conteúdos, métodos e discurso que a
instituição escolar escolhe, define como modelo de cultura. Os requisitos citados acima
devem ser aprendidos e aplicados pelos professores das instituições de ensino.
Fica evidente, nesse saber exposto por Tardif, que os professores não possuem
liberdade de escolha em relação aos conteúdos e, muitas vezes, em relação ao método que
utilizará para mediar os conhecimentos em sala de aula. De certa maneira, isso transporta o
professor para aquela antiga situação da educação bancária, só que, nesse momento inicial, ele
o agente passivo, que só recebe as informações que lhes são transmitidas.
1.4.4 Os saberes da experiência
Para concluir, mas não menos importantes, estão os saberes provenientes da
experiência, ou seja, do exercício da profissão. Estes saberes possuem raízes nos
conhecimentos e vivências cotidianas individuais e coletivas, transformando-se no saber-fazer
e no saber-ser (TARDIF; LESSARD; LAHAYA, 1991).
1.4.5 O que se pode concluir a partir desses saberes?
30
Todos esses saberes são integrantes da prática docente. De fato, o professor
considerado padrão é aquele que “deve conhecer sua matéria, sua disciplina e seu programa,
que deve possuir certos conhecimentos das ciências da educação e da pedagogia, sem deixar
de desenvolver um saber prático, fundado em sua experiência cotidiana com os alunos”
(TARDIF; LESSARD; LAHAYA, 1991, p. 221).
Acrescentaríamos que, além da experiência com os alunos, as vivências com os
colegas de profissão os quais, por vezes, nos auxiliam com as trocas de experiências. Diante
de tantas articulações e anseios entre a prática docente e os saberes do professor, nos
tornamos um grupo social e/ou profissional, na qual sua essência consiste em mobilizar
saberes para a prática pedagógica.
Segundo o texto Os professores face ao saber: esboço de uma problemática do saber
docente, escrito em conjunto por Tardif, Lessard e Lahaya, em 1991, esses saberes são
depositados nos professores, como se eles fossem apenas fontes de transmissão. Nesta
relação, os educadores não são produtores de seus saberes.
De certa forma, é como se houvesse uma relação de ausência ou privação entre os
educadores e o saber. Compreendemos que essa discussão em torno de quem ‘manda ou
desmanda’ no que se transmite nas universidades e instituições escolares é longa, complexa e
não faz parte de nosso objetivo principal, neste momento, talvez em outra oportunidade.
Porém, acreditamos ser interessante deixar registrada as considerações desses autores sobre o
assunto para futuras reflexões.
Por fim, podemos dizer que os saberes servem como base para o ensino e estes
possuem três fundamentos que estão trabalhando em conjuntos e ao mesmo tempo: os
fundamentos do ensino são existenciais, sociais e pragmáticos; existenciais porque nós
professores, não agimos com base nas experiências cotidianas; sociais, porque conhecimento
vem de fontes variadas, família, escola, universidades; e pragmáticos, porque o ensino está
ligado tanto ao trabalho quanto ao trabalhador. Os saberes estão interligados ao trabalho
quanto às funções que temos, no caso, as de professor (Tardif, 2002). E, quando o professor
também é pesquisador, há aí, a junção de outra qualidade que auxiliará no processo de escrita
dos alunos. O professor-pesquisador pode ajudar ao aluno a refletir sobre sua escrita com um
olha diferenciado, ele torna-se leitor dos textos dos seus alunos e isso é extremamente
importante.
31
2 ESCRITA CRIATIVA EM ATIVIDADE MEDIADA
Nesta seção, ampliaremos nossa fundamentação teórica dialogando sobre as
concepção de escrita e de ensino de escrita na perspectiva da produção textual como atividade
mediada. A seção 1 já deixou pistas acerca de nossa concepção, uma vez que partimos de uma
perspectiva freiriana de educação e de ensino, dialogamos sobre mediação numa perspectiva
interativa e dialógica; defendemos que o sujeito é ser social. O que faremos agora é ampliar
essas perspectivas, tratando mais especificamente as questões linguístico-textuais, que nos
fundamentam para o ensino de escrita. Para tanto, recorreremos às contribuições de estudiosos
como Geraldi (2004, 2013, 2015), Koch e Elias (2009), Antunes (2003, 2005), Cagliari (1998,
2003) e outros.
Além disso, discorreremos, embora brevemente, sobre o ensino de escrita mediada,
uma oportunidade que o professor possui de interagir com seus alunos, favorecendo o
processo de ensino-aprendizagem de escrita em contexto de escolarização.
2.1 Concepção de escrita
Iniciamos esta subseção reiterando que assumimos a concepção de que linguagem é
interação, é troca que envolve negociação e produção sentido; a linguagem é o que nos
constitui, por isso engloba a visão de mundo e as práticas sociais dos interlocutores. A
linguagem é, ao mesmo tempo, histórica e dialógica, porque há alteridade, ou seja, a presença
do outro em tudo o que falamos e/ou escrevemos.
Com base nessa concepção, compreendemos o texto como o lugar de interação entre
sujeitos sociais, visto que é, na interação, seja ela oral, seja escrita que tudo acontece, lugar
em que os discursos são constituídos. Afunilando nossa concepção, compreendemos o texto
como “produto de uma atividade discursiva onde alguém diz algo a alguém” (GERALDI,
2013, p. 98).
Dizer algo a alguém pressupõe a existência de, no mínimo, dois sujeitos sociais
envolvidos num ato de interlocução. Assim, conceber a linguagem/língua como produto da
interação é também compreender o texto como produto da interlocução, “espaço de produção
de linguagem e de constituição dos sujeitos” (GERALDI, 2015, p. 34). A produção de um
texto, nessa perspectiva, sempre envolverá mais de um sujeito. A escrita é, assim,
compreendida como forma de interlocução, cujo resultado é o texto.
32
Koch e Elias (2009, p. 34), ao afirmarem que na “concepção interacional (dialógica)
da língua, tanto aquele que escreve como aquele para quem se escreve são vistos como
atores/construtores sociais, sujeitos ativos que – dialogicamente – se constroem e são
construídos no texto”, também demonstram compartilhar dessa compreensão de escrita como
atividade interlocutiva, de produção de sentido.
Considerando esses posicionamentos teóricos, reiteramos que, neste trabalho,
assumimos a concepção de escrita como interação, como atividade de interlocução, como
prática situada na qual o dizer é resposta a outros dizeres. Com base nessa concepção, também
compreendemos a escrita como materialidade e, portanto, produto de atividade epilinguística.
Por atividade epilinguística, fundamentadas em Geraldi (2013), entendemos o trabalho que o
sujeito realiza com a língua ao mobilizar seus conhecimentos. Nessa perspectiva, conceber a
escrita como materialização do dizer implica, também, conceber o texto como:
O lugar das correlações: construído materialmente com palavras (que portam
significados), organiza estas palavras em unidades maiores para construir
informações cujo sentido/orientação somente é compreensível na unidade
global do texto. Este, por seu turno, dialoga com outros textos sem os quais
não existiria (GERALDI, 2004, p. 22).
À luz dessas concepções, tomamos a escrita como conteúdo de aprendizagem a ser
abordado nas aulas de língua portuguesa com alunos do 4º ano do ensino fundamental. Para
tanto, assumimos o trabalho de escrita a partir da proposta que Geraldi (2004) para o ensino
da escrita como atividade de produção textual. Em nossas atividade de ensino de produção de
texto, utilizamos o termo escrita criativa: aquela em que o professor devolve a palavra ao
aluno, dando condições, pela mediação, para que ele, ao retomar o dito por meio de diferentes
formas, materialize seu dizer. A escrita é compreendida, assim, como resultado da relação
entre o dado (conhecimento posto) e o novo (conhecimento a ser construído), na qual o sujeito
aluno, por ser sujeito sócio, histórico e culturalmente constituído, ao mesmo tempo em que
repete, cria formas de dizer.
2.2 Ensino de escrita na perspectiva mediada
A escrita é uma atividade muito presente no cotidiano escolar e muito requisitada aos
nossos alunos. Chegou à escola, vinculada ao processo de alfabetização, primeiro se aprendia
a ler e depois a escrever; teve seu estágio de cópia para aprimoramento da caligrafia, uma vez
que a escrita de textos não era atividade que podia ser desenvolvida por qualquer sujeito, por
33
se tratar de uma atividade que envolvia a presença de talentos e dons; evoluiu para a redação
e, com os estudos linguísticos, chegou à produção textual. Esses dois últimos estágios, da
redação à produção textual, quando pensamos a escrita no contexto do ensino de língua
portuguesa no Brasil, tiveram como marco a década de 1980, época em que, segundo Geraldi
(2004), os professores foram bombardeados com a expressão “produção textual”, o que fez
com que ela se popularizasse muito rapidamente.
Nessa perspectiva, ao tematizar o ensino de escrita, um primeiro ponto a considerar é o
fato de que, apesar de já termos transcorrido quase quatro décadas de história, ainda
encontramos resquícios de um ensino de escrita sob os moldes da redação, um exemplo disso
é a manutenção do termo no Exame Nacional do Ensino Médio (Enem). Como segundo
ponto, consideramos o fato de, embora transcorrido todo esse tempo e haver uma considerável
produção acadêmica sobre esse assunto, ainda estarmos em busca de um trabalho que
contemple, realmente, a escrita como produção de texto.
Geraldi (2015), ao discorrer sobre o texto como unidade de ensino-aprendizagem,
explica que entre a redação e a produção de texto há mais que uma mudança de nomenclatura,
há uma mudança de concepção. Para ensinar a escrever, a produzir textos, faz-se necessário
incorporar dois aspectos fundamentais:
Em primeiro lugar, ao apontar para a produção, aponta-se também para o
fato de que toda a produção depende de condições, instrumentos e agentes de
produção, além de focalizar o modo como se produz na escola. [...] Em
segundo lugar, a introdução da expressão ‘produção de textos’ remete à
noção de texto. Um texto não é produto da aplicação de um conjunto de
regras e nem mesmo o conhecimento das características genéricas com as
quais o texto a ser produzido deve-se coadunar (GERALDI, 2015, p. 167).
No primeiro aspecto, Geraldi aponta para o fato de que a produção de texto deve surgir
de um processo que envolve diversos fatores, dentre os quais estão a formulação de uma
situação real para escrita, com interlocutores também reais e com condições de circulação dos
textos produzidos. Do contrário, não se tem produção, mas treino no qual o aluno escreve e o
professor corrige. Quando se trabalha o texto com foco na estrutura seja linguística, seja
genérica, o sentido do texto se perde, uma vez que não surge como processo de interlocução.
Com base nesses dois aspectos, buscamos construir caminhos para o ensino de escrita,
segundo os pressupostos da concepção de escrita como produção de texto, o que requer
conceber a sala de aula como lugar da interação, de diálogo entre sujeitos; requer
compreender a escrita como trabalho que se faz com a língua, ou seja, como atividade
34
epilinguística. Requer ainda compreender que “escrever não é uma atividade que segue regras
previstas, com resultados de antemão antecipados. Escrever um texto exige sempre que o
sujeito nele se exponha, porque ele resulta de uma criação” (GERALDI, 2015, p. 98).
Compreender que a escrita é uma atividade que não segue regras fixas implica ao
professor ler o texto do aluno com um olhar de quem busca depreender os sentidos por ele
construídos. Nesse ponto, a mediação pode favorecer ao professor a percepção dos não ditos
presentes no texto e que são relevantes para a compreensão. É com base nessa atitude de
leitura e de escuta atenta que o professor pode mediar o processo de ensino e aprendizagem.
O professor, nessa perspectiva, não é um avaliador do texto do aluno, mas o seu leitor
mais experiente que analisa o texto, considerando o nível de desenvolvimento real de seu
produtor, em comparação ao ideal, criando condições para o seu desenvolvimento potencial.
Na análise do texto, associada à do protocolo de escrita, o professor pode observar os
conhecimentos que os alunos mobilizam, bem como os que eles já começaram a mobilizar,
mas ainda não amadureceram e os que eles ainda precisarão desenvolver. “Trabalhar entre o
sabido e o potencial é uma forma de mediação do professor, que se torna assim um coautor
dos textos de seus alunos: faz junto e ambos avançam em suas capacidades de produção de
novos textos” (GERALDI, 2015, p. 170). Nesse contexto, é a leitura atenta do texto do aluno
que definirá o que será ensinado para que ele se desenvolva enquanto produtor de textos.
De acordo com Geraldi (2004, p. 22), há duas possibilidades de análise de textos e
dois caminhos podem ser percorridos: “um mais estritamente linguístico, olhando para o
produto verbal e sua sequência, analisando-o sob a perspectiva da textualidade; outro menos
estritamente linguístico, procurando centrar as observações na relação entre o linguístico e
suas condições de emergência”.
Considerando esses dois caminhos como importantes para o processo de ensino-
aprendizagem, para desenvolver a atividade de mediação, é preciso que o professor estude,
tenha conhecimentos específicos de, por exemplo, linguística de texto, para poder demonstrar
em sala e explicar aos alunos os fatores de textualidade e/ou os mecanismos linguísticos
utilizados para a garantir a textualidade, é o caso dos elementos de referência como o
pronome “ele” que por vezes aparece nos textos referindo-se a algo já colocado. Vale ressaltar
que os fatores de textualidade são princípios e não regras a serem seguidas ao produzir textos
(GERALDI, 2018). Para que esse conhecimento chegue ao aluno, o professor precisa
didatizá-lo, adequando-o à compreensão dele.
O ensino de escrita com foco na produção de texto não pode desconsiderar o fato de
que toda construção faz parte de um processo e com a escrita não é diferente. As atividades de
35
aprendizagem precisam ser planejadas sistematicamente, de forma que o professor tenha
ciência sobre o que quer que o aluno aprenda e trace caminhos para chegar a esse fim. Não
por meio de atividades mecânicas, mas criando situações significativas de escrita. O
conhecimento sobre a escrita deve ser, assim, construído, paulatinamente. Para que isso
ocorra, o aluno necessita da intervenção do professor, como sujeito mais experiente.
Vimos, em nosso diagnóstico que, apesar de ser uma atividade de escrita relativamente
simples, os alunos demonstraram dificuldades e as evidenciaram na escrita. Compreendemos
a fase de desenvolvimento, assim como compreendemos a necessidade de um agir. Nesse
aspecto, também Cagliari (1998) nos orienta sobre o aprendizado da escrita ser um processo e
sobre a necessidade do olhar atento do professor sobre a escrita do aluno.
O professor deve ter em mente que nem sempre um aluno que escreve
corretamente está sabendo o que está fazendo e como funciona a escrita. Por
outro lado, não é porque um aluno erra, ao tentar escrever uma palavra, que
ele não esteja aprendendo a escrever (CAGLIARI, 1998, p. 115).
É preciso então, que nós saibamos como intervir nesses momentos de construção e
para isso, precisamos ter conhecimentos específicos sobre os textos e sobre a língua. Em
suma, precisamos nos apropriar da metalinguagem, para favorecer o aprendizado do aluno.
Calkins (1989, p. 19), ao tratar sobre o ensino de escrita, coloca a atenção sobre outro
ponto, a da motivação para o aprender, “quando a escrita torna-se um projeto pessoal para as
crianças, os professores não necessitam adular, pressionar, seduzir [...]”. Nesse ponto,
observamos que, na mediação, precisamos construir situações em que os alunos sintam-se
instigados a escrever e confiantes para essa ação. É isso que queremos alcançar em nossa sala
de aula, atuando como mediadores entre a escrita e os alunos, por meio de intervenções orais
e / ou escritas, fazendo-os perceber o quão interessante pode ser o ato de escrever.
É preciso, ainda, frisarmos que escrever é uma tarefa que está além de especificidades
linguísticas, pois são as condições de produção que definem o dizer. Considerar esse fator nos
permite analisar a escrita dos alunos, não como um dado apenas linguístico, mas como um
todo, o que nos permite formular hipóteses e questionamentos, considerando que tudo na
linguagem está inter-relacionado. Isso quer dizer que escrever é sempre uma atividade que
retoma outros textos. A leitura do texto do aluno não pode desconsiderar esses fatores.
Com base nessas formulações, observamos a dimensão do trabalho docente quando se
concebe o ensino de escrita sob uma perspectiva interlocutiva, de produção de texto. Para
desenvolver com êxito a atividade de ensino, reiteramos a necessidade de apropriar-se de
36
conhecimentos teóricos. Dentre esses conhecimentos, também Antunes (2005) aponta como
relevante a compreensão de que escrever é uma atividade de interação, assim como a fala, é
um “intercâmbio verbal”, por isso não tem sentido escrever sem destinatário. Isso indica que
escrever é uma atividade cooperativa, já que é interativa; escrever é dessa forma, uma
atividade contextualizada, pois é situada em um momento, espaço e tempo. É sem dúvidas
uma atividade textual, visto que só nos comunicamos por meio de textos; logo as atividades
em sala de aula com frases soltas não fazem sentido, pois enquanto atividade verbal, não
chega às propriedades da textualidade. Escrever é, também, uma atividade tematicamente
orientada, pois um texto sempre terá uma ideia central a qual vai se desenvolver. Como
escrevemos com objetivos previstos a serem consolidados, escrever é assim, uma atividade
intencionalmente definida.
Antunes (2003, p 54) lembra, ainda, que há três grandes momentos na tarefa de
escrever: o planejamento, a escrita propriamente dita e a revisão, assim:
elaborar um texto escrito é uma tarefa cujo sucesso não se completa,
simplesmente, pela codificação das ideias ou das informações, através de
sinais gráficos. Ou seja, produzir um texto escrito não é uma tarefa que
implica apenas o ato de escrever. Não começa, portanto, quando tomamos
nas mãos papel e lápis. Supõe, ao contrário, várias etapas, interdependentes e
intercomplementares, que vão desde o planejamento, passando pela escrita
propriamente, até o momento posterior da revisão e da reescrita.
Um texto bem escrito, ou melhor, a condição do texto escrito vai depender de como o
autor respeita cada etapa do processo e das decisões que tomou. Em se tratando de nosso
público-alvo, alunos do 4º ano do ensino fundamental, a orientação acerca dessas etapas
devem ser dadas e acompanhadas pelo professor, enquanto sujeito mais experiente e com
vista aos objetivos propostos para a atividade, fator que pode flexibilizar o desenvolvimento
dessas etapas.
É interessante destacar que a escrita está tão dentro de nosso cotidiano do mundo
adulto alfabetizado que, às vezes, nem percebemos como esse ato pode ser difícil para uma
criança. Diante dessa realidade, o importante é que possamos compreender como a escrita de
textos acontece, tendo como parâmetro o universo da criança público-alvo da pesquisa.
Outro ponto a considerar é a necessidade de sempre estar atento ao propósito
conferido à escrita. O aluno criança é um interlocutor real e como tal está apto a dialogar
sobre sua aprendizagem. Assim, é importante sempre explicar o propósito da atividade de
escrita aos alunos, antes de iniciar o trabalho de escrita, propriamente dito, em sala de aula.
37
Com efeito, há uma diferença considerável em tratar a escrita como processo ou tratá-
la como produto. Ao abordar a escrita como produto, o foco é tão somente a forma de
organização dos textos e estrutura da língua. O professor que conduz suas aulas com essa
visão de escrita acaba utilizando as atividades de escrita como reforço, treino ou imitação. Em
decorrência disso, o professor transforma-se um mero avaliador dos textos e termina não
solicitando dos seus alunos a reescrita destes (OLIVEIRA, 1997). Deixando, assim, de
estimular a reflexão, a imaginação e a produção de novos escritos.
A escrita como processo analisa o percurso feito pelo aluno, pois, ao escrever, ele
recorre há várias hipóteses, a fim de encontrar a melhor forma de dizer o que pensa. Este tipo
de escrita permite, então, que o aluno escreva e reescreva seu texto, refletindo até chegar à
forma desejada daquilo que quer dizer. Dessa forma, essas idas e vindas ao texto fazem com
que ele se torne autor-leitor de seus textos.
Em experiência com escrita de textos em processo de ensino-aprendizagem, Cagliari
(2003, p. 102) observou que “ao deixar as crianças escreverem textos espontâneos, pude
observar que elas se preocupam em expor conceitos muito pessoais, como sua visão de
mundo, da vida, de maneira objetiva e direta [...]”. Com isso, podemos observar que deixar as
crianças escreverem o que pensam também é uma forma de ver a escrita como processo.
Cagliari (2003) nos traz uma colocação muito pertinente aos dias atuais sobre a
questão da escrita de textos na escola, vejamos:
Minha opinião é que as crianças devem poder escrever o que quiserem,
como quiserem. A professora deve orientar quanto à forma do que se vai
escrever, um bilhete, uma história, uma carta etc. A partir da produção de
textos das crianças, podem-se fazer comentários a respeito de tudo o que se
achar relevante, da ortografia à análise discursiva do texto produzido. Essa
prática deveria ser bastante frequente, pois é um excelente ponto de partida
para todas as outras atividades escolares (2003, p. 123).
Quanto à correção do texto do aluno, há uma diferença significativa na correção dos
textos dos alunos tendo em vista escrita como produto ou como processo. Quando o professor
corrige os textos pensando a escrita como produto, ele não solicita ao aluno a reescrita do
texto, não o faz refletir sobre o que escreveu, devolvendo a ele uma correção cheia de riscos,
traços, círculos sem, contudo, demonstrar ao seu aluno o que realmente necessita ser revisto
no texto. Oliveira (1997) enfatiza que, dessa maneira, a escrita torna-se uma atividade
solitária e individual.
38
Quando o professor corrige os textos analisando a escrita como processo é instigado a
refletir sobre o que acontece durante o momento da escrita. Como correção, o feedback do
professor pode auxiliar o aluno, na construção e reconstrução do seu texto. Todo retorno dado
pelo professor ajudará seu aluno a pensar sobre seu texto, pois “a escrita entendida como
descoberta de sentido desenvolve no escritor a habilidade reflexiva, aquela que lhe permite
(re)examinar a direção dos seus pensamentos quando grafados num papel” (OLIVEIRA,
1997, p. 106). Diante disso, desenvolvemos um projeto de intervenção em que a escrita dos
alunos evoluísse a partir do nosso feedback, de maneira que a ação de escrever fosse
interativa, que envolvesse compreensão, ajustamento e cooperação de todos os envolvidos no
processo.
Calkins (1989, p.28) nos lembra de que “se nós, enquanto professores de escrita,
observarmos como nossos estudantes escrevem, então podemos ajudá-los a desenvolver
estratégias mais efetivas para a escrita”. Precisamos observar nossos alunos, assim poderemos
orientá-los em seu processo de desenvolvimento. Segundo a referida autora, é necessário
ouvir as crianças, compreender como elas pensam e escrevem para, então, poder ajudá-las a
escrever melhor. Calkins (1989) orienta que devemos inclinar nossas cadeiras para frente a
fim de ouvir e aprender com nossos alunos, uma vez que não podemos começar a pensar no
ensino da escrita até que comecemos a observar as crianças em sala produzindo tal
conhecimento.
Frente ao exposto, fica demonstrado que a prática de produção de textos é uma
atividade relevante para as aulas de língua portuguesa e quando mediada pelo professor de
forma atrativa e interativa, não servirá apenas para obter notas. Com base nas ideias de
Cagliari (1998, p. 212), “a prática de produção de textos tem como objetivo ensinar os alunos
a passar seus conhecimentos sobre a linguagem oral para a forma escrita”, somente depois
desta primeira etapa é que será pertinente ensinar a produzir textos de todos os tipos conforme
as exigências de uso culturais e escolares.
Considerando o exposto, procurando dar o melhor retorno aos nossos alunos em
relação aos seus textos, buscamos uma metodologia que pudesse sustentar nosso projeto de
intervenção, a fim de favorecer o conhecimentos dos alunos acerca da escrita de textos.
Conhecemos, então, os protocolos verbais e os adotamos para o trabalho com a escrita; bem
como o uso de bilhetinho, os quais são colocados nos textos dos alunos com orientações para
que pense sobre o que escreveu e possa reescrever seus textos. Trata-se de duas formas de
mediar e intervir naquilo que eles precisam melhorar.
39
Neste processo de desenvolvimento, de construção e reconstrução da escrita por meio
das intervenções e mediações, esperamos que, ao final do projeto de intervenção, os alunos
tenham uma visão ampla e melhor de como a escrita pode ser uma aliada não somente nas
práticas textuais, mas na sua vida além dos muros da escola.
40
3 OS CAMINHOS DA PESQUISA: vivências e práticas mediadas
Esta seção objetiva expor os caminhos que nortearam este trabalho de pesquisa.
Partimos do pressuposto de que a prática de pesquisa requer fazer perguntas e quando se faz
pergunta, alguém precisa responder. Ao conceber a linguagem como atividade interativa
dialógica em que a alteridade é imanente em todas as nossas práticas, entendemos que,
quando se faz uma pergunta de pesquisa, a resposta advém do processo de intervenção, uma
vez que é o trabalho com a escrita mediada e a análise dos dados obtidos nesse processo que
nos mostrarão as respostas. O pesquisador faz a pergunta e ele próprio responde, mas não o
faz sozinho, pois traz consigo os dados observados/coletados em atividades desenvolvidas
com outros. Esses outros são os teóricos e estudiosos que fundamentam a pesquisa e/ou os
interlocutores reais, ou seja, os sujeitos envolvidos na pesquisa. Para nós, são interlocutores
reais, diretamente envolvidos: eu, enquanto professora-pesquisadora, os alunos público-alvo
da pesquisa e a professora Sulemi, minha orientadora e leitora mais experiente, a que faz a
mediação entre mim e o dado e cuja voz está presente, neste texto, quando uso a primeira
pessoa do plural.
São interlocutores também os teóricos e estudiosos a quem recorremos quando
precisamos compreender os fatos e dados obtidos nas atividades de pesquisa. Nesta seção,
Bortoni-Ricardo (2008), por exemplo, foi a interlocutora que favoreceu ampliar a
compreensão sobre os tipos e os caminhos da pesquisa.
Assim, os caminhos desta pesquisa, descritos nesta seção, englobam o estudo sobre
pesquisa; a decisão sobre uma metodologia, utilizamos os protocolos verbais, conforme já
anunciamos; e a pesquisa propriamente dita, cujas partes são a coleta e a análise de dados.
3.1 Aporte teórico para pesquisa
Geraldi (2108), ao tratar sobre o que esperar como pesquisa no ProfLetras, diz que a
pesquisa em linguagem coloca o pesquisador num emaranhado de complexidades e que, nesse
tipo de pesquisa, é possível construir uma metodologia (não um método), pois este pressupõe
algo fixo, imutável. Refletindo sobre essas afirmações e sobre a realidade que nos cerca,
diariamente, no contexto de sala de aula, compreendemos a complexidade desse emaranhado,
ampliado pela responsabilidade de fazer pesquisa com vista a intervir na realidade escolar.
41
Frente ao desafio que nos é apresentado, consideramos ser de suma importância que os
professores e todos aqueles envolvidos com o ensino tenham conhecimentos sobre os tipos de
pesquisa, pois, assim, é possível definir o método que melhor atende a suas necessidades.
Em relação à pesquisa em sala de aula, propriamente dita, conforme Bortoni-Ricardo
(2008), o campo de pesquisa é eminentemente social e pode ser produzida de acordo com o
paradigma quantitativo, que advém do positivismo, ou com o paradigma qualitativo que
deriva da tradição epistemológica, chamada interpretativismo. No Quadro 1, demonstramos
de maneira explicativa os dois paradigmas:
Quadro 1: Paradigmas de pesquisa
Paradigma Positiva Paradigma Interpretativista
Lógico – empirista Interpretativa ou hermenêutico – dialética
Razão analítica Pressupõe a razão dialética sobre a analítica
Busca explicações lineares Busca a interpretação dos significados culturais.
Fonte: BORTONI-RICARDO (2008)
O estudo do texto de Bortoni-Ricardo permitiu-nos observar que a vertente
interpretativista é a que melhor atende aos nossos propósitos de pesquisa. Motivo pelo qual
apenas ele será abordado.
Na teoria interpretativista, não há como observar o mundo dissociado das práticas
sociais e significados vigentes. Isso ocorre porque o observador / pesquisador é um agente
ativo. Como o termo já indica, trata-se de uma vertente cujo princípio é a interpretação dos
dados observados. De acordo com Bortoni-Ricardo (2008, p. 34), “a pesquisa qualitativa
procura entender, interpretar fenômenos sociais, inseridos em um contexto”.
É interessante frisarmos o conceito de etnografia, já que ela está diretamente ligada ao
paradigma interpretativista. A palavra etnografia tem sua origem do grego: ethnoi que quer
dizer “os outros” aqueles que não eram gregos e graphos, que significa “escrita” (BORTONI-
RICARDO, 2008). Na construção de uma pesquisa etnográfica, o pesquisador passa vários
dias convivendo com a rotina de certo ambiente, estudando, observando, colhendo
informações. Trata-se, de acordo com Severino (2007, p. 119), de um tipo de pesquisa que
“visa compreender, na sua cotidianidade, os processos do dia-a-dia em suas diversas
modalidades”. Por isso, quando se comenta que uma pesquisa está sendo realizada em uma
sala de aula ou numa instituição de ensino cuja presença do pesquisa é constante, diz-se que
ela é uma pesquisa etnográfica. Quando, diante dos dados, o pesquisador visa a compreender
o processo e não o produto, dados concretos, palpáveis, entra no âmbito da pesquisa
42
qualitativa; os dados observados no processo, são interpretados com base numa realidade mais
ampla, ação que levará o pesquisador a uma conclusão, por isso o método é interpretativista.
Com base nessas considerações, assumimos o paradigma interpretativista, pois
compreendemos que o trabalho de mediação pedagógica com foco no ensino de escrita /
produção de texto, tendo como objeto de análise a escrita do aluno associada aos protocolos
de escrita requer um olhar interpretativo, uma vez que o professor precisa compreender os
caminhos percorridos pelo aluno para chegar à conclusão acerca do que já é conhecimento
utilizado por ele; do que é conhecimento ainda em fase de maturação, ou seja, em
desenvolvimento; e do que não é mobilizado e precisa, pela mediação, tornar-se
conhecimento.
A metodologia utilizada para coleta de dados, nesta pesquisa, foi a produção de
protocolos de escrita, elaborados a partir de episódios de intervenção / mediação entre a
professora-pesquisadora e os alunos. Esses episódios, quando necessários, foram gravados e
os fragmentos dessa mediação foram inseridos nas aulas descritas na seção 4, deste trabalho.
Para que as observações, a mediação direta, oral ou escrita, a produção textual e tudo
que foi realizado tivesse o efeito esperado, foi desenvolvido um projeto de intervenção, o qual
foi apresentado a escola campo da pesquisa.
3.2 Projeto de intervenção: A escrita e eu, um novo encontro
Nosso Projeto de Intervenção foi construído com o propósito de que as crianças
tivessem um novo encontro com a escrita. Um novo encontro, porque elas já conheciam a
escrita, mas precisavam, a nosso ver, desse novo encontro, a fim de apropria-se da escrita de
forma mais singular, prazerosa, significativa e criativa. Assim, objetivamos, ao propor a
intervenção, devolver a palavra aos alunos. Então, intitulamos nosso projeto de A escrita e eu,
um novo encontro. O projeto de intervenção pautou-se, assim, a intenção de contribuir para a
formação de alunos-escritores, não somente no sentido literal da palavra, tornar-se escritor,
mas que possam escrever melhor a cada passo do projeto, a fim de contribuir para sua
formação escolar e social, enquanto cidadãos críticos e participativos.
Trabalhamos diretamente com o componente curricular de Língua Portuguesa, tendo a
escrita como objeto, porém nossas aulas iam muito além deste componente, acabou
influenciando o restante das aulas, durante o processo. A instituição de ensino a qual o projeto
foi desenvolvido foi a Escola Municipal Professora Palmira de Souza, na direção da
administrativa da escola estava a professora Luciana Barbosa e na direção pedagógica, a
43
professora Adriana Fortes. O público-alvo foram os alunos do 4º ano do ensino fundamental I,
turno matutino. O projeto teve duração de todo o ano letivo de 2018, iniciando dia 15 de
fevereiro e finalizando dia 23 de dezembro.
Acreditamos que a realização desse projeto vem favorecer, expressivamente, o
processo de ensino-aprendizagem, colaborando para o estímulo da escrita e,
consequentemente, da leitura no espaço escolar, além de melhorar o desempenho dos alunos
em outras áreas do conhecimento, como explana Calkins (1989, p. 15) “A escrita permite que
transformemos o caos em algo bonito [...]”.
Colocamos, ainda, como prioridade, deste trabalho, a partir da observação dos dados,
discutir sobre o aprendizado da escrita nos anos iniciais do ensino fundamental I com o intuito
de refletir sobre os saberes linguísticos necessários que o professor precisa dominar para o
ensino da escrita.
A partir das observações realizadas em nossa sala de aula, surgiu-nos a inquietação de
compreender como a mediação do professor pode promover evolução na produção de textos
dos alunos. Partimos, com base em Calkins (1989, p.34), da concepção de que “através da
escrita, podemos ‘revisar’, remodelar e refinar nossos pensamentos”. Não pensamentos numa
perspectiva cognitiva, mas numa perspectiva interacional e dialógica, na qual o sujeito
aprende e formula suas concepções sócio, cultural e historicamente.
Como objetivos desse projeto de intervenção tivemos: compreender como acontece o
processo de escrita, tornando-se agente de sua escrita, por meio da mediação do professor.
Para os objetivos específicos desta parte do processo elencamos: ampliar os conhecimentos
sobre a escrita, procurando compreender aquilo que escreve; desenvolver seus conhecimentos
linguísticos sobre a escrita, discutindo a escrita das palavras e o desenvolvimento de textos;
compreender que as palavras precisam estar em uma sequência lógica para ter sentido;
analisar a escrita dos próprios textos, a fim de perceberem seus avanços; comparar e perceber
as diferenças e semelhanças entre os diversos gêneros discursivos; compreender que podemos
e devemos manifestar nossos pensamentos por meio da escrita; produzir textos de acordo com
o que lhe é solicitado com coesão, coerência e destreza.
Quanto aos procedimentos metodológicos do projeto, tivemos algumas ações, tais
como: dinâmicas de boa convivência; rodas de conversa e contação de histórias; leitura de
textos específicos de gêneros discursivos em estudo; debates sobre o que está sendo lido e
escrito em sala; produção escrita em diversas formas; reescrita de textos, quando possível;
estudo das partes dos textos, escrita empolgante (escrita com tema livre); e relato de texto ou
reconto de histórias por meio da oralidade e da escrita.
44
Procuramos, também, diversificar os materiais utilizados durante as aulas: lousa,
pincel atônico, papel madeira ou collor set, cola, tesoura, revistas, papel ofício, data show,
livros de literatura diversos, materiais impressos, livro didático de Língua Portuguesa etc.
A pretensão com o projeto de intervenção foi conseguir que os alunos do quarto ano
terminem o ano letivo de 2018, escrevendo de forma adequada para a fase de escolaridade,
utilizando os recursos linguísticos de forma coerente e coesa.
A mediação entre professor e aluno é, nesse processo, um momento importantíssimo
para o ensino-aprendizagem. Por meio desse momento, ocorre mais do que, simplesmente, um
elo entre o professor, o conhecimento e o aluno, mas há uma aproximação, acontece a
afetividade no processo de ensino. Tudo isso ajuda na hora da escrita, porque o aluno sente-se
mais seguro de suas escolhas no momento de escrever e realizar suas tarefas diárias na escola.
3.3 Contexto da pesquisa
A pesquisa foi realizada, conforme citado acima, na Escola Municipal Professora
Palmira de Souza, localizada na zona norte do município de Natal / RN. Essa instituição é
responsável por atender alunos de 1º ao 9º ano do Ensino Fundamental; sendo os anos iniciais,
do 1º ao 5º ano, no turno matutino e os anos finais, do 6º ao 9º ano, no turno vespertino,
contendo em média 500 alunos somando os dois turnos de ensino. A escola é relativamente
nova, contêm oito salas de aulas, um laboratório de informática, uma sala de leitura
(biblioteca), cozinha, banheiros femininos e masculinos, uma quadra esportiva coberta, uma
sala para cada setor: secretaria, coordenação pedagógica, direção e Sala de Recursos
Multifuncionais (SEM), para atendimento específico aos alunos com deficiência.
3.4 Alunos colaboradores da pesquisa
A turma em estudo possui 28 alunos matriculados, desses, um é diagnosticado com
Transtorno do Espectro Autismo (TEA). São 16 meninos e 12 meninas, com idades que
variam entre 9 e 12 anos. A maioria não reside próximo à escola e necessita do ônibus escolar
para o translado dos bairros mais distantes até a instituição de ensino. Há em torno de 5
alunos repetentes, cujos motivos são diversos. Encontramos a turma, em sua maioria,
alfabetizada, com casos isolados de processo de alfabetização a ser consolidado.
45
O trabalho com o 4º ano teve como propósito fazer com que os alunos avançassem na
escrita de textos mais extensos, a partir da mediação oral ou escrita do professor, realizada a
partir da escrita e / ou reescrita dos textos iniciais.
3.5 Descrição e análise dos dados
Para a obtenção dos dados, realizamos primeiro uma atividade de diagnóstico, a qual
nos deu subsídios para planejarmos as aulas que viriam depois. Essa aula de diagnóstico foi
pensada e executada de maneira que os alunos tivessem tempo hábil para realizá-la; sem
pressa ou cobranças. Gostaríamos de saber como as crianças reagiriam a uma atividade escrita
sem a mediação do professor, apenas com a explicação básica do enunciado. Depois da
realização da tarefa, a análise dos textos foi efetivada de forma cuidadosa para que não
houvesse nenhum engano por parte da professora-pesquisadora, a qual leu/avaliou os textos
da maneira como sempre fazia. Os textos foram avaliados sem demarcações no corpo do
texto, apenas com um conceito ao final, por exemplo: “ótimo”, “bom” ou “não compreendi”;
não deixando claro, assim, para os alunos quais seus pontos positivos e aqueles que
necessitavam melhorar.
Percebemos, então, que a falta da mediação do professor deixou a turma, ansiosa,
nervosa e até de certa maneira “travada” para escrever; a maioria dizia não saber o que e nem
como escrever. Ao final da correção, a professora-pesquisadora constatou que as crianças
daquela turma de 4º ano tinham vários problemas em relação a escrita, tais como: ordenação
das ideias; paragrafação; não sabiam o que era um diálogo e como fazê-lo; dificuldade para
descrever personagens; não compreendiam o que seria um texto narrativo; e ortografia. Além
disso, percebemos que havia alguns alunos que ainda não tinham concluídos o processo de
alfabetização.
Com base nesses dados, foi construído o projeto de intervenção. Pressupomos que,
com aulas mais interativas e a mediação direta da professora-pesquisadora, os alunos
pudessem avançar de maneira mais eficaz em relação a escrita. Dentro desse projeto, também,
foi realizada a conexão entre a leitura e a escrita, pois os alunos haviam de ser leitores, de
certa forma, dos seus próprios textos, além da professora-pesquisadora que se tornou a leitora
e coautora dos textos dos seus alunos.
No decorrer das aulas, a análise dos dados foi sendo realizada de forma que a aula
seguinte contribuísse de alguma maneira para aumentar o repertório de informações, palavras
e ideias para que as crianças pudessem criar novos textos.
46
No entanto, para que isso ocorresse foi preciso recorrer a muita pesquisa e
informações extras como os conhecimentos específicos da língua, músicas, histórias infantis,
autores diferenciados sobre os temas abordados, tudo para embasar nossas aulas, facilitando
assim, a mediação entre os alunos e os conhecimentos necessários.
Os alunos ganharam, no início do ano letivo, um caderno apenas para registrar os
textos produzidos no projeto de intervenção. Eles escreviam, às vezes, em folhas à parte para
depois organizarem o texto no caderno. Dessa forma, a professora-pesquisadora poderia
manusear melhor os textos, a fim de corrigi-los e devolvê-los aos alunos para que pudessem
ou organizar no caderno de produção ou mesmo reescrevê-los, quando solicitado.
As correções passaram a ocorrer de duas formas: no momento da escrita, no instante
da escritura, com os protocolos de escrita e também, por meio dos bilhetinhos deixados ao
final do texto, segundo as orientações de Ruiz (2001) que consistem em colocar, após a leitura
do texto do aluno, bilhetes textuais que o orientem no trabalho de revisão/reescrita do texto.
É importante que essas mensagens sejam breves e com linguagem adequada à faixa do
aluno. Essas formas de correção começaram a deixar os alunos mais interessados em escrever,
participar, pois todos queriam receber um bilhetinho no seu texto; com frequência
perguntavam: “a senhora já colocou bilhetinho no meu texto?”.
Para que as correções acontecessem, foi necessário, conforme Geraldi (2015) orienta,
encontrar formas diferenciadas de ver os textos escritos do alunos, considerando todo
contexto da turma e de cada aluno individualmente.
47
4 ENSINO DE ESCRITA, MEDIAÇÃO DOCENTE E INTERVENÇÃO
Consideramos esta seção como o ponto central deste trabalho, uma vez que nela
registramos as atividades desenvolvidas com os alunos tanto na atividade diagnóstica, quanto
no projeto de intervenção. Trata-se do ponto em que interligamos, pelo exercício da prática de
ensinar e de aprender, os três pontos do processo de intervenção: o professor, o aluno e o
conhecimento. O professor, conforme vimos defendendo, ocupa o lugar de interventor, por ser
o sujeito mais experiente. O aluno ocupa o lugar de aprendiz, no sentido em que o aprender se
dá na interação com o professor e com o conhecimento. O conhecimento é compreendido
como aquilo que se aprende, ou seja, representa os conteúdos, explícitos e ocultos, trazidos
para ensino-aprendizagem.
São conteúdos explícitos todos aqueles que estão expressos no planejamento das
atividades e que serão ensinados aos alunos, tais como a paragrafação. São conteúdos ocultos
os que, embora não estejam expressos em um plano, são ensinados aos alunos, como é o caso
das etapas de escrita que envolvem a produção de textos, elas não estão postas como
conteúdo, mas a mediação favoreceu a aprendizagem de que um texto nem sempre está pronto
em sua primeira versão. Reescrever o texto passa a ser um conhecimento, sem
necessariamente, ter sido tematizado, diretamente, em sala de aula.
Compreendemos, assim, a relação entre essas três partes como uma relação de troca.
Dessa forma, as atividades foram desenvolvidas com os alunos, ou seja, junto deles. Os
protocolos de escrita resultaram dessa relação. O que faremos, nesta seção, é uma leitura e
desse processo, na qual, duas resposta emergiram: a primeira sobre o desenvolvimento dos
alunos, durante as atividades mediadas; a segunda sobre os saberes necessários para que o
professor seja o leitor do texto do aluno e o mediador de sua aprendizagem na escrita criativa
de textos. Quando citamos o termo relação de troca, consideramos essas duas respostas
obtidas na pesquisa. Elas mostram que o conhecimento sobre escrita criativa não é apenas
objeto voltado para o aluno, mas também é objeto de aprendizagem do professor.
Assim, nesta seção, exporemos uma abordagem sobre os conhecimentos necessários
ao professor e utilizados neste projeto de intervenção. Em seguida, apresentamos os
fundamentados que orientaram a elaboração do projeto A escrita e eu, um novo encontro.
Consideramos essas duas subseções como uma espécie de preparação para apresentar a aula
diagnóstica e as análise realizadas com base nos protocolos de escrita construídos durante as
atividades de mediação, em sala de aula.
48
4.1 Saberes e prática docente na mediação da escrita criativa
Para que nos tornássemos mediadores do processo de ensino-aprendizagem de escrita,
foi necessário ir em busca de um conjunto de conhecimentos, que abordaremos de uma forma
impessoal, utilizando o termo que nos representa: o professor.
Como sujeito mais experiente, o professor é o leitor do texto do aluno. As perguntas,
as observações e os comentários que ele faz sobre o texto do aluno promovem a compreensão
deste sobre o aspecto interacional da construção de sentido(s) e o modo como ele deve levar
em conta seu interlocutor, na construção do texto. Para que isso ocorra, o professor deve ser
conhecedor dos princípios teóricos que envolvem a escrita, a produção de texto.
Um princípio a considerar é o de que escrita é interação. Assim, a interação professor
aluno pode promover o aprendizado a respeito das expectativas que o leitor projeta sobre o
texto a ser lido. Nessa relação, o aluno aprende que quem escreve, escreve algo para alguém.
Entre esses dois sujeitos, há uma relação de troca. No presente trabalho, a metodologia do
protocolo de escrita busca, assim, contribuir para ampliar os conhecimentos dos alunos sobre
a escrita (dos quais esses fatores externos ao ato de escrever propriamente dito são parte)
mediante uma relação de troca.
As atividades desenvolvidas tanto no diagnóstico, quanto no projeto de intervenção
consideraram ainda a relevância da etapa de preparação para a escrita. Nessa etapa, o
professor deve prever o campo de informações a serem ativadas, a fim de que seus alunos
consigam ter subsídios para escrever. A essa preparação damos o nome de contextualização. É
o momento em que o professor mediador pode, também, investigar o que o aluno já sabe
sobre o assunto que será pauta da escrita. Nessa fase de preparação para escrita, entram em
vigor os conhecimentos elencados por Koch e Elias (2009), quais sejam: conhecimento
linguístico, enciclopédico (de mundo), de textos e interacionais. No Quadro 2, apresentamos,
sumariamente, a descrição dos conhecimentos citados por Koch e Elias (2009). Segue
Quadro.
Quadro 2 – Sistemas de Conhecimentos
Conhecimento linguístico Envolve os conhecimentos da ortografia, da gramática e do léxico da
língua.
Conhecimento
enciclopédico (de mundo)
Envolve os conhecimentos adquiridos ao longo da vivência sócio,
histórica e cultural.
Conhecimento de textos Envolve os conhecimentos sobre os elementos que entram na
composição do texto: modos de organização, aspectos do conteúdo,
estilo, função e suporte de veiculação.
Conhecimento Envolve os conhecimentos sobre o objetivo ou propósito do texto, a
49
interacional quantidade de informação necessária para que o leitor compreenda o
texto, a escolha sobre a forma de usa a língua (se mais formal ou
menos formal), a escolha do gênero que atenderá ao propósito
comunicativo e forma como o sujeito articular os elementos
linguísticos na construção textual.
Fonte: KOCH; ELIAS (2009).
Esse conjunto de conhecimentos faz parte dos conhecimentos necessários ao professor
para que ele seja um mediador do ensino-aprendizagem de escrita. Como mediador ele precisa
tanto conhecer teoricamente, como saber utilizar esses conhecimentos, enquanto produtor de
textos. Já o aluno precisa apenas aprender a operacionalizá-los.
No momento de preparação para a escrita e também durante a escrita, o professor pode
ajudar o aluno a ter ideias por meio de questionamentos, pois os fará relembrar os
conhecimentos adquiridos em sua vivência sócio, histórica e cultural, bem como os fará
refletir sobre aquilo que irão escrever. Para que isso ocorra, as perguntas precisam ser
significativas, pois só assim podem influenciar positivamente a reflexão durante a escrita de
textos pelos alunos, em sala. Por meio desses questionamentos vai ocorrendo a mediação,
uma vez que esta é uma das formas que o educador possui de interagir com seus alunos.
Magalhães e Machado (2012, p. 52) nos instigam a atentar para o fato de que “o professor não
pode se contentar com respostas monossilábicas, sob pena de não conseguir atingir os
resultados almejados”.
4.2 Os conhecimentos como fundamentos para intervenção
Considerando esses postulados, em nossos planos de aula, detalhamos como ocorreu
cada fase das aulas e quais as propostas de escrita que realizamos em cada uma delas. Temos
como construto de nossas aulas as orientações de Geraldi (2004, 2015) sobre o ensino de
produção de texto e a mediação na escrita, conforme expomos na seção 2.
Intitulamos nosso projeto de intervenção como A escrita e eu, um novo encontro, pois
um de nossos objetivos foi fazer com que os alunos vivenciassem realmente um novo
encontro com a chamada escrita escolar, passando a compreender como escrita criativa. A
turma em que aplicamos a intervenção passou por vários problemas de adaptação no ano
anterior; por isso, chegou a nós com diversos desencontros em relação a comportamentos,
leitura e escrita. Dessa forma, tivemos que ir adequando a intervenção ao longo do percurso, a
fim de fazer com que a turma avançasse na escrita de textos mais extensos.
50
A leitura dos textos de fundamentação nos fez refletir sobre ensinar e aprender no
contexto de sala aula; sobre o trabalho com linguagem/língua; sobre como ler o texto do aluno
e sobre como intervir no processo de ensino-aprendizagem. Assim, compreendemos que cada
atividade é uma experiência única e não solitária. Nesta perspectiva, avançamos com nossas
aulas, pois gostaríamos que os alunos tivessem novas experiências com a escritura de textos.
Nesse empreendimento, consideramos a seguinte lição:
O que temos considerado como herança cultural válida, pretende que a
relação com o vivido, que é a base da aprendizagem, inspire o processo de
ensino. Trata-se de reencontrar o vivido para nele desvelar o saber auxiliado
pelos conhecimentos disponíveis na herança cultural. Ao contrário do lema
‘aprender para viver’, trata-se de assumir efetivamente que ‘vivemos
aprendendo’. E ‘viver aprendendo’ não descarta a herança cultural. Ao
contrário, demanda que a usemos e para usá-la é preciso conhecê-la. [...] o
professor do futuro, a nova identidade a ser construída, não é a do sujeito
que tem as respostas que a herança cultural já deu para certos problemas,
mas a do sujeito capaz de considerar o seu vivido, de olhar para o aluno
como um sujeito que também já tem um vivido, para transformar o vivido
em perguntas. O ensino do futuro não estará lastreado nas respostas, mas nas
perguntas. Aprender formulá-las é essencial (GERALDI, 2015, p. 95-96).
Pretendemos viver esse futuro neste presente, para tanto planificamos as aulas que
foram ministradas no decorrer do ano letivo de 2018, desde o diagnóstico, até a última fase da
intervenção. A metodologia utilizada, conforme já ressaltado, foi a de protocolos de escrita,
mas enfatizamos que a nossa mediação – antes, durante e depois da escrita – foi fundamental
para o desenvolvimento dos alunos.
Elaboramos planos de aulas que tivessem relação com os conteúdos a serem
alcançados no ano de ensino em questão, mas que, também, viesse a favorecer a escrita de
textos mais longos. Dessa maneira, demos preferência às narrativas, por meio do trabalho com
os contos.
Faz-se necessário explicar que, no Ensino Fundamental I, anos iniciais (1º ao 5º ano),
o tempo das aulas é organizado de maneira diferente do Ensino Fundamental II, anos finais
(6º ao 9º ano), visto que os alunos não trocam de professor a cada horário ou componente
curricular. As aulas de Língua Portuguesa e Matemática são as que possuem carga horária
maior, as demais possuem menos aulas durante a semana, tornando, assim, o tempo de aula
mais flexível. Geralmente, trabalhamos utilizando a primeira parte da manhã, das 7h15 às
9h15, para uma disciplina e das 9h30 às 11h20 para outra. Assim, organizamos para que nossa
aula de realização do diagnóstico fosse durante a primeira parte da manhã, pois gostaríamos
51
que as crianças tivessem tempo suficiente para refletir com relação ao que gostariam de dizer.
Para facilitar a compreensão dos planos de aula, elaboramos a seguinte legenda:
Quadro 3: Legenda de abreviações utilizadas nos planos de aulas e nas análises
P: Professor
A: Aluno
AA: Alunos
FA: Folha de Atividade
Fonte: Autoria própria.
4.3 Narrativa infantil – Aula diagnóstica
O diagnóstico teve como objetivo identificar como acontecem as correções do
professor e qual o retorno que ele dá ao aluno em relação a sua escrita, além de demonstrar
quais as necessidades de escrita dos alunos. Incomodadas com a questão da mediação e
retorno do professor, durante a prática de escrita de textos na escola, realizamos uma
atividade em que as crianças tiveram liberdade para escrever. Nesse caso, não foi efetuada
nenhuma motivação ou intervenção durante a escrita, pois o objetivo da atividade foi
identificar como os alunos reagiriam à tarefa de escrever diante de pouca ou nenhuma
mediação do professor.
Nesta primeira aula, planificamos um momento de diagnóstico, a fim de obtermos uma
visão mais abrangente da aprendizagem da turma em estudo, o qual será exposto no Quadro 4.
Quadro 4: Plano de aula da atividade diagnóstica
Plano de Aula
Professora: Francimar Silva dos Santos
Ano: 4°ano
Módulo: Diagnóstico
Número da Aula: 1
Tema da aula: Narrativa infantil
Objetivo(s): Produzir uma narrativa escrita sobre o “diálogo das frutas”.
Fase Atividade Intera-ção Material
1
2
3
Leitura de fruição (O galinho apressado)
P lê o livro em voz alta e mostra as imagens a AA
Escrita da agenda
P escreve na lousa a agenda de tarefas do dia.
AA copiam da lousa no caderno.
P corrige.
Produção de texto a partir de imagem/desenho com
duas frutas (“Diálogo das Frutas”)
Frontal pelo professor
Classe toda
Individual
Livro infantil
Agenda ou
caderno, lousa,
pincel.
FA, lápis,
borracha.
Fonte: Autoria própria.
52
4.3.1 Protocolo de Escrita da Aula 1
A aula 1 foi organizada de forma a conduzir a atividade diagnóstica. A primeira fase
da aula foi a de leitura de fruição, isto é, uma leitura voltada ao entretenimento, à função da
linguagem que se pode denominar lúdico-poética e que tem por fim causar prazer estético. A
esse respeito, Solé (1998) ressalta que a leitura por prazer é mais livre, quer dizer, um leitor
pode reler o mesmo livro diversas vezes, dado que é a experiência emocional que desencadeia
e orienta a leitura. Compreendemos ser papel do professor ajudar o aluno a elaborar e
conhecer seus critérios de seleção, avaliação e crítica dos textos que lê.
Nesse dia, foi escolhido o livro O Galinho Apressado, da autora Tatiana Belinky.
Apesar de serem alunos do 4º ano do ensino fundamental, a leitura para eles ainda era muito
elementar e foi necessário, praticamente, começar do zero até que a turma adquirisse o gosto
pela leitura. Foi assim que começamos essa jornada. Durante a leitura, os alunos
permaneceram muito quietos, atentos aos acontecimentos da história.
Depois de lermos a história, um aluno comentou: “Quem é apressado come cru!”. E
outro: “Fazer as coisas apressado nem sempre vale a pena!”. Nosso objetivo maior com a
leitura de fruição é fazer com que os alunos apreciem a leitura e, com o tempo, passem a
gostar de ler. A princípio esse era o objetivo, mas diante do comentário do aluno a leitura de
fruição também se tornou uma atividade de interpretação, uma vez que os dois comentários
abriram um diálogo sobre o texto. É importante que o professor fique atento a esses
movimentos que ocorrem na sala de aula, aproveitando-os para proporcionar o diálogo mas
também tendo o cuidado de direcionar as atividades para não perder o foco daquilo que fora
planejado. Isso não quer dizer que o planejamento seja algo inflexível, mas que a mediação
também envolve o controle sobre os caminhos da aprendizagem.
Ler pelo prazer de ler, sem necessariamente ter uma cobrança ao final da leitura. Esse
objetivo foi sendo alcançado no decorrer do ano. Nossa turma era a que mais visitava a
biblioteca da escola para empréstimos de livros. Isso nos mostra que a mediação docente
influencia na formação de hábitos de leitura.
Passamos à segunda fase do dia, “Vamos fazer nossa agenda!”. Em seguida, os alunos
tiraram seus cadernos das mochilas e começaram a copiar, do quadro, as tarefas do dia,
descritas na lousa. Durante essa fase, enquanto copiam do quadro, alguns gostam de conversar
sobre o que fizeram no dia anterior.
A terceira fase dessa aula foi dedicada à produção textual, o objetivo de fazer um
diagnóstico das dificuldades dos alunos. Especificamente, o nosso diagnóstico teve como
53
objetivo identificar como acontecem as correções do professor e qual o retorno que ele dá ao
aluno em relação à sua escrita. Incomodadas com a questão da mediação e o retorno do
professor durante a prática escrita de textos na escola, realizamos uma atividade em que as
crianças tiveram liberdade para escrever.
Nessa proposta de produção, não foi efetuada nenhuma motivação ou intervenção
durante a escrita, pois o objetivo da atividade foi identificar como os alunos reagiriam à tarefa
de escrever diante de pouca ou nenhuma intervenção do professor.
A tarefa de diagnóstico aplicada na turma de 4º ano do Ensino Fundamental I consistiu
em escrever um diálogo entre duas frutas: uma banana e uma maçã. O comando da tarefa
contém instruções explicando que elas (as frutas) eram amigas e que um dia se reencontraram
numa barraca de feira e começam a conversar sobre suas aventuras.
Nossa premissa era que, em primeiro lugar, os alunos percebessem que o texto seria
fictício, já que maçã e banana não conversam; segundo, que eles observassem o ambiente, o
lugar no qual as frutas se reencontraram e, em terceiro, que tivessem atenção no teor da
conversa, considerando que, no comando da atividade, é solicitado que os alunos escrevam
sobre as aventuras vividas pelas frutas enquanto estavam separadas.
Observamos, porém, que os alunos ficaram inquietos na hora da escrita. Diziam não
saber o que escrever ou como começar. Algumas crianças não realizaram a tarefa e outros
fizeram a metade. Foi uma manhã de muitas reclamações em relação ao que iriam escrever.
Fato que ocorreu, também, porque os alunos não receberam maiores intervenções, conforme
já estão habituados, e isso dificultou a compreensão daquilo que estava sendo solicitado, já
que possuem um nível de compreensão leitora muito elementar.
4.3.2 Análise de dados produzidos na Aula 1
Para analisar os textos dos alunos, observamos em primeiro lugar, se o que foi pedido
no comando da atividade foi executado, pois isso nos dá uma resposta sobre o desempenho na
leitura; em segundo, como eles mobilizaram os conhecimentos para atender ao comando e
escrever o diálogo entre as frutas; e em terceiro, como estava a escrita ortográfica, já que as
dificuldades em termos de alfabetização eram bem significativas; e em quarto lugar qual o
resultado final de uma escrita sem a mediação do professor.
Ao analisarmos os textos, depois que o momento de escrita diagnóstica foi finalizado,
percebemos que, sem as orientações corretas e necessárias do professor, os alunos não
conseguiram avançar na produção escrita. Vejamos dois exemplos. Do lado esquerdo
54
colocamos a imagem do texto do aluno e do lado direito, visando a favorecer a leitura,
fazemos a transcrição.
Excerto 1
OI SR BANANA OI SR ORA MAÇÃ
COMO VC VAI VOU BEM E VC TAMBÉM
OK HOJE VOU ESTUDA MUITO
PARA PASAR E VOCE TAMBÉM
HOJE VAI LA EM CASA
OK VOU LALE AJUDA VOU LEVA
CALENDARIO E O CADERNO
EO LAPES EAI CANETA.
Excerto 2
UMA BANANA E UMA MAÇÃ SE-
VIRAM NUMA BARRACA DE FRUTAS
E FICARAM AMIGOS E TEVEREAM
DIAS AS VIENTURAS ESCALARAM UMA
GRANDE MAIS MUITO GRANDE MONTANHA
E A BANANA FICOU PRESA NUMA
ROCHA GRANDE E A MAÇÃ AJUDOU
A BANANA E ELA AGRADECEU E FIM.
Podemos perceber que, no excerto 1, o Sr. Banana e a Sra. Maçã se cumprimentam:
“Como você vai?” “Vou bem. E você?”. Após os cumprimentos, um dos amigos confessa:
“Hoje vou estudar muito para passar. E você?”. O outro se dispõe, então, a ajudá-lo, dizendo:
“Ok. Vou lá lhe ajudar. Vou levar calendário e o caderno e o lápis e a caneta”. Neste escrito, a
criança tornou-se solidária ao escrever que iria à casa do amigo ajudá-lo a estudar, mas
acabou não cumprindo o comando a tarefa que seria a conversa sobre as aventuras vividas
pelas frutas. Embora ele tenha compreendido que deveria escrever um diálogo, os
conhecimentos mobilizados para fazê-lo foram os do ambiente de sala de aula, não o proposto
no comando.
No excerto 2, a Banana e a Maçã “se viram numa barraca de frutas”, e “tiveram dias
de aventuras, escalando uma grande montanha” só que, nesse caminho, ocorreu um incidente,
“a banana ficou presa numa rocha grande e a maçã foi ajudar”. No fim, a banana ficou
agradecida pela ajuda da amiga. Nesse texto, podemos notar diferenças na contextualização
do lugar do encontro das frutas, elas se viram numa barraca de frutas, uma que demonstra
coerência na contextualização. Em seguida, o aluno escreve um pequeno relato da aventura
vivida por elas, ou seja, de certa forma, o aluno atingiu um dos objetivos da produção.
55
Contudo, a maioria das crianças não conseguiu escrever um texto narrativo com um
pequeno diálogo incluso, pois como se tratava de uma conversa entre duas frutas, deveria
haver um diálogo. Notamos que há muitos pontos a serem trabalhados com os alunos, tais
como: a marcação e organização das ideias em parágrafos; o uso de travessão para marca o
discurso direto, em momentos de fala das personagens; a pontuação, uso de articuladores
linguísticos de localização no tempo e no espaço, por exemplo, além de questões de
ortografia. Houve falta de contextualização, coesão e coerência na maioria dos textos
entregues pelas crianças. Sabemos que esse projeto não alcançará todos esses pontos e que
será necessário estabelecer prioridades.
A partir desse diagnóstico, observamos que A1 e A2 marcaram, em seus textos, a
presença de diálogo, embora sem as convenções linguísticas; A1 e A2 explicitaram o
momento do encontro, A1 de forma direta, por meio da saudações e A2 de forma indireta.
Apenas A2 marca a presença de aventura. Com base nesses dados, percebemos que o fato das
crianças não terem entendido, completamente, o comando da questão dificultou o
desenvolvimento da atividade proposta. Esse dado é indício de que a mediação deve favorecer
também o aprendizado da leitura, com vista no desenvolvimento da produção textual.
Essa atividade inicial também nos mostrou que as crianças já haviam desenvolvido a
concepção de escrita de texto como algo que se conclui na primeira versão. A resistência para
reescrever os textos produzidos é fato que não podemos deixar de comentar, assim, como as
crianças realmente não reescreviam seus textos pelas dificuldades que tinham, na maioria das
vezes pedíamos um novo texto, com um novo tema e assim seguíamos nossas aulas.
Precisávamos tematizar, nas aulas, a escrita de textos como um trabalho que se realiza em, no
mínimo, três etapas: planejamento, escrita e reescrita. Sendo esta uma etapa que se pode
repetir inúmeras vezes.
A partir dessas percepções, elaboramos uma série de aulas, a fim de colaborar para
sanar as dificuldades da turma, mas, principalmente, com a intenção de fazê-los refletir sobre
a escrita, tornando-a uma atividade criativa. Não será possível no espaço deste texto, relatar
toda a experiência vivida, assim focalizaremos etapas que consideramos serem representativas
das fases do projeto.
Quando pensamos em uma intervenção para essa turma, imediatamente, nos veio a
ideia de trabalhar com escrita. Foi então, que projetamos a intervenção, na qual podessemos
realizar novas aulas, para que as crianças tivessem um novo encontro com a escrita, que não
fosse algo já visto e massacrado, mas que fosse prazeroso escrever e, consequentemente, ler.
Como tínhamos um livro didático que trabalhava com contos, nós o tomamos como ponto de
56
partida, já que todos os alunos tinham o seu livro em mãos para acompanhar leituras e
atividades dos textos.
Embora existam muitas críticas acerca do uso do livro didático, acreditamos ser ele
uma ferramenta de apoio para o professor. Não se pode concebê-lo como o único recurso, é
preciso saber aproveitar o que ele contém. Nosso livro era o Projeto Buriti Português da
editora Moderna; edição de 2014, mas foi utilizado nos anos seguintes 2015, 2016 e 2017, de
acordo com o que estabelece o Programa Nacional do Livro Didático, o PNLD, no qual o
livro escolhido deve ser usado pelos três anos seguintes.
A atividade diagnóstica foi, para este trabalho, o ponto que nos possibilitou traçar um
conjunto de atividades a serem desenvolvidas. Estas, por sua vez, foram avaliadas e, quando
necessário, replanejadas.
4.4 Reescrita de texto – Aula 2
Nesta aula, procuramos conversar com os alunos sobre o texto do diagnóstico,
mostrando os pontos em que era possível melhorar, qual foi nosso objetivo na escrita do texto
da “Banana e da Maçã” e como seria a sua reescrita, para tanto, organizamos o seguinte plano
de aula.
Quadro 5: Plano de aula nº 2
Plano de Aula
Professora: Francimar Silva dos Santos
Ano: 4° ano
Módulo: Reescrita de texto
Número da Aula: 2
Tema da aula: Reescrita do texto da “Banana e da Maçã”.
Objetivo(s): Reescrever os textos produzidos, a partir da mediação do professor.
Fase Atividade Intera-ção Material
1
2
3
4
Leitura de fruição (A cesta de Dona Maricota)
P lê o livro em voz alta e mostra as imagens a AA
Escrita da agenda
P escreve na lousa a agenda de tarefas do dia.
AA copiam da lousa no caderno.
P corrige.
Conversa sobre a escrita do “Diálogo das Frutas” e
análise coletiva do texto de alguns alunos
colocados em cartaz.
Reescrita coletiva deste texto “Diálogo das
Frutas”.
Frontal pelo professor
Classe toda
Frontal pelo professor
Coletivo
Livro infantil
Lousa, pincel,
caderno, lápis
Cartaz com os
textos escritos
Lousa, pincel,
caderno, lápis
Fonte: Autoria própria.
57
4.4.1 Protocolo de Escrita da Aula 2
A aula 2 foi organizada de forma que acontecesse a análise de alguns dos textos
escritos pelos alunos na atividade diagnóstica, aula 1. Nossa manhã tem início sempre com
uma rotina diária, a fim de ajudar na concentração na turma. A leitura de fruição também faz
parte dessa rotina. Todos os dias, utilizamos um livro diferente. Para ilustrar o diálogo das
frutas, nesta aula, escolhemos o livro A Cesta de Dona Maricota, também de Tatiana Belinky,
por ser uma narrativa muito divertida que conta a discussão entre frutas, legumes e verduras,
unindo-se, assim, ao assunto que estávamos tratando. Partimos do pressupostos de que a
relação entre o assunto dos textos contribui com a atividade de escrita, pois amplia o
conhecimento de mundo dos alunos, ao mesmo tempo em que favorece a criação de novas
ideias.
Os comentários sobre o livro foram muito interessantes, pois as crianças fizeram a
relação com o texto que eles tentaram escrever. “Professora, parece com o que a gente tinha
que fazer”, outro disse: “Só que a discussão do livro tinha mais personagens”. Isso nos mostra
a existência de um diálogo entre o que os alunos estão vivenciando no processo de ensino-
aprendizagem, eles estão conseguindo estabelecer relação entre os textos lidos e as atividades
que estão realizando.
Após a leitura do dia e da escrita da agenda, colocamos três textos dos alunos
ampliados em cartazes, a fim de que a turma observasse e os lesse. Realizamos, juntos, a
análise dos textos, tentando decifrar em alguns momentos o que estava escrito.
4.4.2 Análise de dados da Aula 2
Em nossa segunda fase, passamos à análise coletiva dos cartazes em que
transcrevemos os textos dos alunos, sem claro, expor os nomes de quem os escreveu. A ideia
era fazer com que eles vissem de forma clara e objetiva em que precisavam melhorar, em seus
textos. Partimos da proposição de perguntas, perguntando qual a opinião deles sobre os textos
apresentados. Com base nas respostas e nos silêncios, fomos realizando a intervenção.
Focalizamos primeiro a leitura e os sentidos construídos nos textos. Depois, avaliamos se os
textos atenderam ao comando presente na questão.
No que concerne ao linguístico, podemos notar o nível de escrita com que as crianças
chegaram ao 4º ano: algumas partes sem segmentação entre as palavras, como o “bomdia” e a
falta de acentuação gráfica na palavra “voce”, no texto 1; mistura de letras de imprensa e
58
cursiva nas palavras “aMiGA” e BaNaNa” no texto 2; já no texto 3, notamos que o aluno
possui vários problemas de escrita e, com isso, em alguns momentos, não é possível
compreender o que ele quis dizer, como na segunda linha “BUE FI TU”. Essas percepções
foram se construindo na interação com a turma.
Comecei a comentar sobre os textos que os alunos haviam escrito e discutimos o que
era preciso melhorar, em diversos aspectos. Relemos o comando da questão e, juntos,
avaliamos se o que fora solicitado, havia sido atendido. Depois de elencarmos alguns pontos,
os alunos chegaram à conclusão de que fora atendido em parte. Vimos também que os erros
de ortografia eram bem recorrentes e fomos tentando reescrever o texto.
Assim, aproveitamos a oportunidade de reescrita do texto e trabalhamos a ortografia.
Ao abordar essas questões com os alunos, buscando fazê-los perceber os problemas no texto,
lembramo-nos de uma orientação de Geraldi (2015, p. 99): “ensinar é ensinar o sujeito
aprendente a construir respostas, portanto só se pode partir de perguntas”. Assim, foi
perguntando sobre o texto, que o diálogo ocorreu. A Figura 1, que segue, retrata a forma
como os textos foram apresentados aos alunos na aula de reescrita.
Figuras 1 – Cartazes com textos dos alunos para atividade de reescrita.
Fonte: Autoria própria.
59
A quarta fase da aula consistiu na reescrita coletiva do texto o “diálogo das frutas”
sugerido como produção, no diagnóstico. Faz-se necessário elucidar que a reescrita é a
terceira etapa de uma atividade de produção textual que “corresponde o momento de análise
do que foi escrito [...] para decidir o que fica, o que sai, o que se reformula (ANTUNES,
2003, p. 56) acontece a partir das retificações feitas no texto. Além disso, a reescrita permite a
interação com os alunos, por meio da qual é possível conduzi-los a uma reflexão sistemática
sobre a escrita. Para relatar esse momento, faremos uso da letra (P) para professora –
pesquisadora e (C) para criança.
A primeira ação desta atividade de reescrita foi relê o enunciado da atividade de
diagnóstico para relembrar o que foi pedido. Lemos, junto com as crianças, os três cartazes,
ajudando-os a perceber que havia muitos problemas nos textos, tais como estruturação dos
enunciados, erros ortográficos, pontuação. Em seguida, realizamos a reescrita com a mediação
necessária e a participação de todas as crianças, a fim de construirmos um texto narrativo com
o diálogo incluso. Observemos um trecho do diálogo com os alunos, no Quadro 6, que segue.
Trata-se de um trecho apenas para ilustrar as atividades de mediação, tendo como parâmetro a
atividade de fazer perguntas para obter respostas espontâneas ou mediadas.
Quadro 6 – Diálogo estabelecido na Aula 2 em atividade de reescrita de texto
P:
C:
P:
C:
P:
C:
P:
C:
P:
C:
P:
C:
Gente, esses textos que eu coloquei nos cartazes são produções de vocês. Eu não coloquei
nomes para identificar, porque não se faz necessário expor ninguém. Eles servirão apenas para
verificarmos o que precisamos melhorar. Os textos foram identificados como texto 1, texto 2
e texto 3. Eu escrevi do mesmo jeito que estava no caderno de produção de texto de vocês.
Relembrado o enunciado... Primeira pergunta: Banana e Maçã são o quê?
Frutas!
Onde se vende frutas?
No supermercado, feira!
Em que sessão?
Na sessão de frutas e verduras.
Ótimo! E agora, o que é diálogo? Alguém sabe?
Falar?
Isso. É uma conversa! Era para ser uma conversa entre as frutas. Me digam uma coisa, fruta
fala?
Não!
Mas aqui fala.
É por que é uma história.
[...]
Fonte: corpus de pesquisa.
Na Figura 2, a seguir, ilustramos como ocorreu o processo de reescrita coletiva.
Durante a mediação, P fazia as perguntas e AA respondiam. P ia registrando na lousa. Quando
o coletivo definia que o enunciado reescrito estava adequado, os alunos transcreviam para o
60
caderno de produção. Os três cartazes analisados foram colocados no quadro acima da lousa
e, abaixo, escrevemos o que foi dito pela as crianças.
Figura 2 – Atividade de reescrita de texto com os alunos.
Fonte: corpus da pesquisa.
Realizada a reescrita, P leu o texto com os alunos e os questionou sobre o que acharam
do texto após a atividade de reescrita. Nesse diálogo, foi possível explicar à turma sobre as
etapas que envolvem a escrita de um texto, bem como sobre a marcação de parágrafo por
meio do recuo no início da primeira linha e o uso do travessão para marcar o discurso direto
em um diálogo. O Quadro 7 contém o texto reescrito.
Quadro 7 – Texto dos alunos após reescrita coletiva.
REESCRITA COLETIVA
ERA UMA VEZ UMA BANANA E UMA MAÇÃ QUE FAZIA ANOS QUE NÃO SE
VIAM. SE REENCONTRARAM NA FEIRA E COMEÇARAM A CONVERSAR SOBRE
SUAS VIAGENS.
A MAÇÃ FALOU: — SE LEMBRA DAQUELE DIA QUE A GENTE VIAOU PARA O
HAVAI? NÓS CONHECEMOS O ABACATE, A PÊRA, O LIMÃO E O COCO.
— SIM, ME LEMBRO DE TUDO. VOCÊ LEMBRA QUE A GENTE BRINCOU ATÉ
O DIA ACABAR?
— MEUS AMIGOS CHAMARAM MAIS AMIGOS E NÓS FIZEMOS UMA FESTA
DO PIJAMA.
Fonte: corpus da pesquisa.
Ao comparar as duas versões, observamos que houve uma mudança significativa e
atribuímos isso ao trabalho de mediação. É interessante ressaltar que os alunos participaram e,
ao reescrevermos o texto acrescentaram informações, a realização da festa do pijama. Esse
61
dado nos indica que o diálogo acionou o conhecimento de mundo dos alunos e eles se valeram
dele para ampliar o texto.
A Figura 3 traz uma ilustração do trabalho realizado tomando como fonte o caderno de
produção textual de um aluno. Do lado esquerdo, está a primeira versão do “Diálogo das
frutas” e, do lado direito, está a reescrita coletiva. Esse exemplo é do excerto 2 já
demonstrado.
Figura 3 – Exemplo da reescrita coletiva, no caderno do aluno.
Fonte: corpus da pesquisa.
A partir dessa aula, tivemos uma visão geral de como a turma encontrava-se em
termos de leitura e de escrita e, principalmente, sobre qual a concepção dos alunos acerca do
texto escrito. A princípio, eles não queriam escrever, ficavam reclamando e dizendo: “Pra que
isso professora!”, “Eu não sei fazer!” e outros comentavam “É difícil escrever!”. Mas o que
realmente notamos é que um dos maiores problemas não estava no que dizer, eles
demonstraram ter muitas ideias, mas no como dizer. Os alunos não se sentiam seguros para
mobilizar os conhecimentos linguísticos. Comentavam que era difícil porque não sabiam
escrever.
Então, preparamos algumas aulas em que o foco foi a escrita e a leitura de maneira
bem objetiva, a fim de ajudá-los um pouco nesse processo, pois não tínhamos como parar
sempre os conteúdos da intervenção e do restante das aulas apenas para nos dedicar à questões
de língua, se nosso objetivo consiste em favorecer o aprendizado da escrita como atividade
criativa. Descreveremos a seguir uma dessas aulas com suas atividades.
62
4.5 Escrita, leitura e formação de palavras – Aula 3
Compreendendo as dificuldades de algumas crianças em relação ao processo de escrita
e leitura, organizamos algumas aulas durante nosso projeto que foram voltadas à essas
práticas. Foi preciso ajudar a turma nessa questão, embora nesse tipo de aula a escrita não
ocupe a posição central. A Aula 3 é apenas uma demonstração de como trabalhamos essa
tema em meio aos momentos de escrita de textos.
Quadro 8: Plano de aula nº 3
Plano de Aula
Professora: Francimar Silva dos Santos
Ano: 4° ano
Módulo: Alfabetização
Número da Aula: 3
Tema da aula: Escrita, leitura e formação de palavras
Objetivo(s): Compreender a escrita de palavras utilizando o alfabeto móvel – formação de palavras.
Fase Atividade Intera-ção Material
1
2
3
4
Leitura de fruição (A princesa de Bambuluá)
P lê o livro em voz alta e mostra as imagens a AA
Escrita da agenda
P escreve na lousa a agenda de tarefas do dia.
AA copiam da lousa no caderno.
P corrige.
Conversa sobre escrita de uma forma geral (letras,
sons, fonemas, sílabas).
FA sobre formação de palavras
Frontal pelo professor
Classe toda
Coletivo
Coletivo
Livro infantil
Lousa, pincel,
caderno, lápis
Cartaz do
alfabeto
Lousa, pincel,
caderno,
FA,lápis,
alfabeto móvel
Fonte: Autoria própria.
4.5.1 Protocolo de Escrita da Aula 3
Realizamos nossa leitura de fruição desta aula, com um livro do mestre Câmara
Cascudo, com uma narrativa que utiliza um vocabulário bem diferente, mas, A princesa de
Bambuluá, prendeu a atenção das crianças de uma maneira extraordinária. Ao final da leitura,
alguns comentários, como: “Tinha palavras que eu nem conhecia!”, outro comentou: “Gostei
do final!”. É uma obra fascinante na qual podemos conhecer uma princesa e um rapaz
franzino e essa história de encantamento faz o pensamento das crianças viajar. Foi uma ótima
63
leitura, para começarmos a manhã, visto que o dia seria de muitas atividades relativas à leitura
e escrita com foco na formação de palavras.
Após a leitura de fruição, assim como todas as manhãs, os alunos escrevem a rotina de
atividades daquele dia, a fim de mantermos nossa organização diária e semanal. Essa é
sempre a segunda fase de nossas aulas.
Organizamos a terceira fase da nossa aula com a intenção de fazer as crianças
melhorarem sua escrita começando do básico. Iniciamos a aula perguntando aos alunos se eles
lembravam de alguma palavra que havia escrito de forma incorreta e como eles haviam
percebido o erro. Alguns alunos apresentaram palavras cujo erro foi apontado em sala de aula,
nas atividades de reescrita. Essa introdução nos abriu caminho para falar sobre o alfabeto, os
sons que as letras produzem, separando vogais e consoantes, escrevendo na lousa essa
separação; continuamos nossa fala sobre fonemas e letras, mostrando que no nosso alfabeto
há letras que juntas podem vir a formar um único som, como, por exemplo, o “lh”. Depois,
passamos a formar palavras de maneira bem objetiva, por exemplo, falei: “para formar a
palavra PIRULITO, de quais letras eu preciso?” e os alunos responderam “P, I, R, U, L, I, T,
O!”, e ouvi um comentário: “isso é muito fácil!”.
Expliquei também que para formarmos palavras precisamos das sílabas, os
“pedacinhos” pequenos das palavras. Assim, depois disso, podemos formar frases como:
“João gosta de pirulito”. Para aquelas crianças que já tinham esse domínio foi como uma
revisão, mas para aquelas que tinham uma dificuldade maior foi o começo de uma nova
jornada. Essas crianças estavam tendo, pela primeira vez, um contato diferenciado com a
formação de palavras.
A aula pareceu um pouco desfocada de nossa proposta de intervenção, mas ela se fez
necessário para aquele momento. Assim, aproveitamos a abordagem sobre fonemas, letras,
alfabeto e dialogamos com a turma sobre escrita e convenção ortográfica. Buscando utilizar
uma linguagem bem acessível, foi possível explicar que, quando uma palavra é grafada de
maneira diferente da forma que está no dicionário, há erro.
4.5.2 Análise de dados Aula 3
Na fase três, realizamos as atividades de estudo da ortografia que iremos expor a
seguir. Essas atividades, porém, não foram colocadas no caderno de produção de textos, pois
o objetivo consistiu em trabalhar com ênfase nos conhecimentos linguísticos.
64
Para realizar essas atividades, foram disponibilizados para os alunos alfabetos com
letras móveis, cartões com alfabeto maior, além do cartaz do alfabeto que já havia sido colado
em cima do quadro. Vale salientar que o alfabeto móvel é um pote ou um saquinho em que as
letras do alfabeto ficam soltas e podem ser de letra de imprensa ou cursiva, desde que tenha
mais de uma letra; por exemplo, as vogais têm de ter várias letras “a”.
Figura 4 – Atividades realizadas na Aula 3
Fonte: Acervo digital pessoal.
Figura 5 – Atividades realizadas na Aula 3
Fonte: Acervo digital pessoal.
65
Mesmo sendo atividades relativamente simples para alunos de um 4º ano, houve muita
dificuldade na hora da resolução; então, tivemos de repetir alguns momentos como estes que
não serão descritos neste trabalho, visto que nosso objetivo maior é melhorar a escrita de
textos mais extensos e não somente de palavras separadas.
A aula é um exemplo de como abordamos a estrutura do texto narrativo, pois
queríamos retomar aquilo que estávamos analisando e explicando a partir da escrita e da
reescrita do texto da “Banana e da Maçã”. Dessa forma, preparamos uma aula sobre as
características do texto narrativo com leituras e exemplos de textos conhecidos.
4.6 Estrutura do texto narrativo – Aula 4
Nesta aula, trabalhamos com as características e os elementos que compõem um texto
narrativo, pois percebemos que as crianças precisavam construir esse conhecimento para
utilizá-lo nas atividade de escrita criativa que seriam propostas nas aulas seguintes. Optamos
por narrativos por serem textos figurativos, os mais adequados para se trabalhar com alunos
nessa faixa etária. Então, foi pensada uma aula que pudesse ter exemplos de textos com
estrutura narrativa e suas caracteríscticas.
Quadro 9: Plano de aula nº 4
Plano de Aula
Professora: Francimar Silva dos Santos
Ano: 4°
Módulo: Texto Narrativo
Número da Aula: 4
Tema da aula: Estrutura do texto narrativo.
Objetivo(s): Compreender os elementos e as características que compõem um texto narrativo.
Fase Atividade Intera-ção Material
1
2
3
4
Leitura de fruição (Beijos mágicos)
P lê o livro em voz alta e mostra as imagens a AA
Escrita da agenda
P escreve na lousa a agenda de tarefas do dia.
AA copiam da lousa no caderno.
P corrige.
Ativação dos conhecimentos prévios dos alunos e
coleta no cartaz
P pergunta e AA respondem o que acreditam ser
um texto narrativo
Montagem do cartaz com fichas móveis dos
elementos e características de uma narrativa.
Frontal pelo professor
Frontal pelo professor
Coletivo
Frontal pelo professor
Livro infantil
Lousa, pincel,
caderno, lápis
Cartolina, lápis
Cartaz com os
palavras soltas
66
5 Escrita de esquema no caderno. Alunos Lousa, pincel,
caderno, lápis
Fonte: Autoria própria.
4.6.1 Protocolo de Escrita da Aula 4
A aula 4 foi iniciada com uma roda de leitura com vários textos narrativos, entre eles,
um livro dos Contos de Grimm com a adaptação da autora Maria Heloisa Penteado. Além
deste, outros clássicos como A Bela e Fera e A Bela Adormecida, dentre outras obras
narrativas, tais como Papagaio Real e a A Princesa de Bambuluá do mestre Câmara Cascudo,
os quais já haviam sido lidos; algumas obras de Ana Maria Machado, que foi a escolha da
leitura de fruição Beijos Mágicos. Esse livro conta a história de uma menina cujos pais vivem
separados e ela se divide entre a casa dos dois em momentos diferentes; no decorrer da
história, os pais resolvem casar-se novamente com outras pessoas e isso gera na pequenina
grandes expectativas. Nosso objetivo com a roda de leitura foi demonstrar como cada autor
insere suas ideias / histórias, quais os contextos em que elas ocorrem e suas características;
por isso, colocamos vários livros na roda da leitura de fruição de hoje.
Depois do momento de leitura, passamos para nossa terceira fase: a construção de um
cartaz coletivo a fim de responder a seguinte questão: “O que já sabemos sobre texto
narrativo?”. As respostas foram variadas “é a pessoa narrando”, “é uma história de princesa,
rainhas e reis”, todas as opções giravam em torno dessas observações. Tudo que foi falado
pelos alunos foi escrito no cartaz, vejamos a Figura 6:
Figura 6: Cartaz 1, produzido na Aula 4
Fonte: Autoria própria.
67
As crianças foram questionadas se nesses textos que foram lidos e se nessas
observações que eles falaram continham uso do termo “aí” com frequência. A resposta foi em
uníssono: “não”. A pergunta foi feita para fazê-los pensar em seus próprios textos, pois neles
continham a repetição dessa marca de oralidade, uso do termo “aí”. Em seguida, voltamos a
problematizar o que seria um texto narrativo, buscando construir um conceito junto aos
alunos.
4.6.2 Análise de dados da Aula 4
A nossa quarta fase foi destinada à explicação sobre os elementos que compõem o
texto narrativo. Nosso objetivo foi fazer as crianças compreenderem as partes que compõem
um texto narrativo, como ele se organiza, pois, todo texto precisa ter começo, meio e fim.
Para tanto, utilizamos um cartaz com palavras móveis, que foram sendo colocadas ao longo
da explanação, tendo como exemplificação a história da Branca de Neve, visto que as crianças
conhecem a história de cor. A professora, em diálogo com os alunos, foi fazendo perguntas
sobre o texto e, a partir das respostas dadas pelos alunos, foi apresentando os elementos do
texto narrativo e dando exemplos de partes da história. Assim foi montado outro cartaz,
conforme posto na Figura 7.
Figura 7 – Cartaz 2, produzido na Aula 4
Fonte: Autoria própria.
68
Essa atividade foi realizada de forma oral e a turma participou de forma coletiva. A
professora-pesquisadora foi montando o cartaz, exemplificando e questionando os alunos em
quais partes da história da Branca de Neve estariam cada característica e elementos do texto
narrativo. Por exemplo: qual o clímax da história? Primeiro tivemos de explicar o que seria
essa palavra, que constituía o ponto alto do texto, assim foi exemplificado para facilitar o
entendimento da palavra. No caso da Branca de Neve, o clímax é quando ela come a maçã
envenenada pela rainha má e desmaia, para somente acordar, após o beijo do príncipe
encantado. Ao final da aula, percebemos que nosso objetivo foi alcançado, visto que os alunos
puderam construir uma compreensão do que seria um texto narrativo e quais seus elementos.
Nesta aula, não tivemos produção, apenas explicações e esclarecimentos acerca do texto
narrativo. Acredito que esses momentos são preparatórios para que os alunos sintam-se mais
confiantes ao produzir seus textos, pois no momento da escrita de textos narrativos, eles
poderão ativar esses conhecimentos textuais.
A seguir, passamos a um momento de interpretação utilizando as atividades do livro
didático, essa tarefa foi realizada para que as crianças percebessem a construção e
características de uma personagem; resolvemos organizar esta aula, também, devido às
dúvidas que surgiram durante a aula anterior. O livro didático, nesse contexto, apresenta-se
como um recurso relevante já que traz textos interessantes e nos permite adequar o
planejamento ao que nele está proposto.
4.7 Construção de personagem – Aula 5
Nesta aula, trabalhamos com textos narrativos para que as crianças percebessem como
as persoangens são construidas, para isso aprensentamos o plano de aula a seguir, com o
objetivo de compreender como é possível construir personagens em um texto.
Quadro 10: Plano de Aula nº 5
Plano de Aula
Professora: Francimar Silva dos Santos
Ano: 4°
Módulo: Texto Narrativo II
Número da Aula: 5
Tema da aula: Construção de personagens
Objetivo(s): Identificar como são construídos as personagens de um texto.
Fase Atividade Intera-ção Material
1
Leitura de fruição (Era uma vez)
P lê o livro em voz alta e mostra as imagens a AA
Frontal pelo professor
Livro infantil
69
2
3
4
Escrita da agenda
P escreve na lousa a agenda de tarefas do dia.
AA copiam da lousa no caderno.
P corrige.
Leitura coletiva do texto contido no livro didático
Esta casa é minha.
Exercício referente ao texto Esta casa é minha.
Frontal pelo professor
Coletivo
Alunos
Lousa, pincel,
caderno, lápis
Livro didático
Livro didático
Fonte: Autoria própria.
4.7.1 Protocolo de Escrita da Aula 5
Separamos para este momento um livro muito interessante para leitura de fruição: Era
uma vez, da autora Cacau Vilardo, livro que faz um passeio sobre várias narrativas infantis,
tendo como referência as personagens principais de cada história, exemplificando suas
características mais visíveis.
Nosso objetivo foi que os alunos percebessem como a autora descreveu cada
personagem e isso foi alcançado, visto que os comentários foram imediatos a cada avanço, no
momento da leitura. Fizemos a escrita da rotina e fomos ao livro, trabalhar, na leitura, a
interpretação dos fatos do texto Esta casa é minha.
4.7.2 Análise de dados Aula 5
Passamos, então, à terceira fase da nossa aula, a leitura do texto Esta casa é minha e às
suas respectivas atividades. Realizamos a leitura coletiva e aquelas crianças que possuíam
leitura mais fluente foram lendo as partes dos diálogos do texto. Fomos lendo e fazendo
mediações em relação a algumas partes do texto mais complicadas, intervindo, fazendo
perguntas, levantando inferência e chamando atenção aos diálogos existentes na história.
A leitura é um pouco longa, mas o texto é muito bom. Conta à história de uma família
que compra uma casa na praia, mas acaba tirando o habitat natural de alguns animais e toda
discussão gira em torno disso. Ao final, a família percebe que o espaço da casa é de todos, isto
é, deles e dos animais que ali já habitavam. A leitura permitiu-nos relacionar com a vivência
dos alunos já que eles moram em regiões próximas a praias, áreas em que há duas realidades
bem diferentes, há grandes mansões das famílias abastardas e casas bem humildes.
Essa narrativa de Ana Maria Machado prende a atenção do leitor do começo ao fim e
nos remete ao conto literário, que constituirá um tem das aulas na sequência.
70
Figura 8 – Texto de apoio para Aula 5 – Parte 1
Fonte: Livro didático: Projeto Buriti Língua Portuguesa, 2014.
Figura 9 – Texto de apoio para Aula 5 – Parte 2
Fonte: Livro didático: Projeto Buriti Língua Portuguesa, 2014.
71
Lemos duas vezes o texto, tendo a atenção de marcar, em nossa fala, os diálogos e as
personagens que apareciam na história. Ao final realizamos algumas atividades contidas nas
duas páginas seguintes 37 e 38, às quais continham uma relação interpretativa do texto. Como
os livros do 4º ano não são consumíveis, ou seja, não podem escrever no livro, as crianças
responderam no caderno.
Nota-se que, nas atividades, temos referência aos assuntos que tratamos na aula sobre
as características do texto narrativo, na montagem do cartaz coletivo com as explicações. As
questões trazidas pelo livro didático foram ampliadas com questões que elaboramos e
levamos para o diálogo com os alunos. Esse movimento de interação e mediação levou os
alunos a refletir sobre o texto lido, de forma bem prática e tendo em vista o que foi analisado
em nossas aulas desde o começo.
Além disso, antes mesmo da atividade do livro, pedimos que as crianças circulassem o
título do texto e onde estava a identificação da autora, a referência bibliográfica etc. Sempre
pedimos tais informações, a fim de que os alunos consigam encontrar os nomes dos autores.
Os alunos foram questionados sobre o que seriam esses tracinhos antes das falas e
alguns responderam prontamente “travessão!”. Isso mostra que eles apropriaram-se desse
conhecimento que foi trazido para o contexto de aprendizagem na aula 2, após a escrita da
primeira versão do texto da atividade diagnóstica.
Em relação ao recuo dado para começar algumas partes do texto, outros responderam:
“travessão”; então, falamos “se um tracinho é travessão, o espaço entre a margem e a escrita
não pode levar o mesmo nome, certo?”. “Qual o nome então, desse espaço?” perguntamos e
um aluno um pouco mais atento respondeu: “parágrafo!”. Respondemos positivamente e
percebemos que a maioria da turma não identifica um parágrafo, apesar de já termos abordado
esse assunto em sala de aula.
Dessa forma, preparamos nossa próxima aula com a intenção de unir duas questões
importantes, a construção de personagens e construção de parágrafos.
4.8 Construção de parágrafos – Aula 6
Neste momento, ao perceber que os alunos tinham muitas dificuldades em realizar a
escrita com parágrafos, procuramos estabelecer um critério simples de escrita com começo,
meio e fim, para que os alunos percebem como se constroem os parágrafos, como uma
espécie de microtexto. Dessa forma, montamos nossa aula com a intenção de construir
parágrafos.
72
Quadro 11: Plano de Aula nº 6 Plano de Aula
Professora: Francimar Silva dos Santos
Ano: 4°
Módulo: Parágrafos
Número da Aula: 6
Tema da aula: Construção de parágrafos.
Objetivo(s): Construir um pequeno texto tendo imagens como apoio.
Fase Atividade Intera-ção Material
1
2
3
4
Leitura de fruição (O caminho para o vale perdido)
P lê o livro em voz alta e mostra as imagens a AA
Escrita da agenda
P escreve na lousa a agenda de tarefas do dia.
AA copiam da lousa no caderno.
P corrige.
Explicação sobre parágrafos, utilizando o livro
didático como apoio (remetemos ao texto da aula
anterior: Esta casa é minha).
Produção escrita tendo como apoio as imagens de
um palhaço de crianças.
Frontal pelo professor
Frontal pelo professor
Coletivo
Alunos
Livro infantil
Lousa, pincel,
caderno, lápis
Livro didático
FA
Fonte: Autoria própria.
4.8.1 Protocolos de Escrita da Aula 6
Iniciamos nossa manhã com a leitura de fruição O caminho para o vale perdido, uma
narrativa muito interessante que conta a história de um ratinho que mora em um lixão e de lá
sua família tira todo o sustento, mas, num belo dia, ele encontra uma fotografia que mostra
como era o lixão antes de tornar-se lixão e, então, ele começa uma busca por informações,
contudo, o livro que contém tais informações é proibido em sua casa. É uma história
empolgante que foi lida em dois dias, por ser longa. A pausa ajudou a gerar curiosidade entre
os alunos.
Após a escrita da agenda, passamos à terceira fase da nossa aula que foi a explicação
do que seria um parágrafo. Iniciamos nossa fala demonstrando como os parágrafos são feitos
no livro didático, nos textos que são lidos por nós todos os dias, a fim de que as crianças
percebessem algo comum entre eles. Voltamos ao texto da aula anterior, “Esta casa é minha”
para explicarmos como mudamos de parágrafos, relendo a história, dialogamos para que as
crianças percebessem que as mudanças dos parágrafos aconteciam quando ocorria a
modificação de acontecimento ou de uma ideia.
73
Então, procuramos explicar e esclarecer aos alunos que não é somente fazer o recuo da
margem da folha para se tornar um parágrafo, mas que é necessária a conexão das ideias de
um para o outro até que se finalize o texto. Assim, passamos à quarta parte de nossa aula, a
produção escrita do texto.
4.8.2 Análise de dados da Aula 6
Nesta etapa, entregamos aos alunos uma folha contento imagens de uma história, mas
que precisaria ser construída a parte escrita, ou seja, os alunos tiveram como apoio a questão
das imagens para poder escrever seu texto, obedecendo ao desenrolar da história e tentando
fazer parágrafos de acordo com o que foi orientado ao longo da leitura do texto O caminho
para o vale perdido. A atividade foi solicitada dessa forma:
Figura 10 – Atividade de produção solicitada aos alunos na Aula 6
Fonte: Acervo digital pessoal.
Título:
De acordo com que estudamos, a história deve conter começo, meio e
fim. Então, agora é a sua vez! Vamos tentar escrever começando com
parágrafos pequenos a nossa história.
74
Assim como todas as vezes que tentamos solicitar a escrita de um texto houve muita
reclamação, que era muito para escrever, outros diziam que parecia atividade de criança
pequena. Mas, mesmo assim, grande parte da turma fez a atividade. Demonstraremos no
excerto 3, um dos textos e logo depois o protocolo verbal relativo a esse momento de escrita.
Excerto 3
Fonte: corpus de pesquisa.
Título: o palhaço triste e as
criaçassuper amoroso.
Era uma vez um palhaço
muito triste Ele não sabia
fazer nada. Em uma manha
de sol o palhaço foi
Convidado para uma
Festa de aniversário no
Caminho parou chorando
Muito as crianças repararo
O palhaço chorando e decidiram
Fazer uma supresa para
O palhaço e as crianças começaram
E as crianças foram
Até o palhaço e conversaro
Com o palhaço e a menina
Falou assim – seu palhaço
Porque você não esta
Animado? O palhaço respondeu
-é porque eu não sei fazer
Nada não sei fazer palhaçada
Não sei fazer malabarismo
E o palhaço o conselho
Das crianças e de tudo
Certo como as criaças
Queriam que acontecesse
Porisso que digo siga
Seu coração que as
Tigo certo e todos felizes para sempre
e fim.
Continuação: com as outras crianças
Continuação: e a menina chamada de
Rosângela disse: - não tem problema
só sigua seu coração e você vai
conseguir fazer tudo que você gosta
de fazer tambom q e o palhaço
respirou fundo e no pensamento
disse: - eu vou consegui. E o palhaço
seguio enfrente com as crianças.
75
Logo após o momento dessa escrita, a pesquisadora conversou com o referido aluno
sobre seu texto, na oportunidade utilizamos a metodologia dos protocolos de escrita, na
conversa (P) significa pesquisadora e (A) aluno (a), a seguir:
Quadro 12 – Protocolo de escrita da Aula 6
(P): Eu corrigi o seu texto do palhaço e achei muito interessante a forma como você construiu o seu
texto. Vi que pra você o espaço ficou pequeno, não foi?
(A): Foi!
(P): Você teve de colocar no verso da folha. Como foi que você pensou essa história?
(A): Eu olhei nas fotos, vi que como tá branco, aí não deu pra vê o clima... eu vi o palhaço triste, as
crianças conversando... aí no meio da história Rosângela falando e aí eu fui criando... e no final da
história tava o palhaço feliz que ele seguiu o conselho, foi assim que eu pensei a história.
(P): Quando você fala do clima, o que você quis dizer?
(A): Clima?
(P): Sim, que clima é esse que você está dizendo? É o clima do tempo ou do que está se passando
aqui (aponta para a história)?
(A): Do tempo e do que tá passando aqui.
(P): Por isso que você colocou no primeiro parágrafo... leia aqui pra gente ver!
(A): Era uma vez um palhaço muito triste, não sabia fazer nada...em uma manhã de sol (...)
(P): Hum... em uma manhã de sol, então você quis situar sua história na parte da manhã?
(A): É!
(P): É isso?
(A): Sim!
(P): Você colocou no final... leia aqui o finalzinho... “Queria que...”
(A): Queria que acontecesse por isso que eu digo, siga sempre seu coração que dá tudo certo. E
todos viveram felizes para sempre.
(P): Você acha que todas as histórias terminam com felizes para sempre?
(A): Sim!
(P): Por quê?
(A): Por que tem que ter um final feliz nas histórias.
(P): Sempre tem de ter um final feliz, não pode ser um final triste?
(A): Não!
(P): Por quê?
(A): Por que todos têm de ficar feliz.
(P): E na sua história... você acha que é necessário colocar que todos viveram felizes para sempre ou
poderia acabar quando você diz que seguindo o coração as coisas darão certo?
(A): É por que estão todos felizes, oh... (mostra a imagem do texto)!
Fonte: corpus da pesquisa.
Neste contexto, o aluno deixa bem claro suas ideias para construção do texto e não
deixa de fora suas convicções do “felizes para sempre”, a qual não pode faltar. Esse aluno,
especificamente, gostava muito produzir textos escritos e de explicar suas ideias sempre que
era solicitado. Neste caso, para ele, era muito lógico que o palhaço terminasse feliz, pois a
imagens demonstram exatamente isso.
Corrigimos os textos sempre com um “bilhetinho”, incentivando a reescrita ou uma
conversa posterior sobre o que estava escrito. Deixarei as aspas na palavra “bilhetinho”, para
destacar que não estou tratando aqui daqueles bilhetes igualmente trabalhados nas aulas de
76
redação. A esse tipo de correção, Ruiz (2001) dá o nome de correção textual-interativa, são
comentários a mais, diferentes daqueles escritos nos textos eventualmente. Uma das tarefas
essenciais dessa correção por meio de “bilhetinhos” é “falar acerca da tarefa de revisão pelo
aluno (ou, mais especificamente, sobre os problemas do texto)” (RUIZ, 2001, p. 63).
Durante nossas aulas, as correções dos textos eram realizadas por meio da
metodologia dos protocolos e com “bilhetinhos”, até de incentivo para que as crianças não
parassem de escrever ou, de pelo menos, tentar escrever.
Com a proximidade dos festejos juninos, tínhamos de ensaiar uma música para dançar
na festa junina, mas como não queríamos que a letra da música passasse despercebida,
realizamos uma aula para leitura e produção textual com essa música, que consta no plano de
aula a seguir.
Além disso, os alunos vinham cobrando uma escrita mais livre, sem que tivesse um
tema específico, porém quando solicitados, não conseguiram fazer. Dessa maneira, utilizamos
a música e / ou algumas palavras dela para que eles tivessem palavras de apoio para
montarem seu texto.
4.9 Produção de texto – Aula 7
Nesta aula, aproveitando o momento de festa junina, juntamos música, produção
escrita e dança – de certa forma – pois essa música foi aprensentada em forma de dança no dia
da festa junina. Como as crianças haviam solicitado uma escrita mais livre, trabalhamos a
música da festa junina e a construção de um texto a partir de algumas palavras constidas na
letra da música.
Quadro 13: Plano de Aula nº 7
Plano de Aula
Professora: Francimar Silva dos Santos
Ano: 4°
Módulo: Música
Número da Aula: 7
Tema da aula: Produção de texto tendo apoio a música “No lume da fogueira”.
Objetivo(s): Construir um pequeno texto tendo como apoio palavras existentes na música.
Fase Atividade Intera-ção Material
1
2
Leitura de fruição (O caminho para o vale perdido)
P lê o livro em voz alta e mostra as imagens a AA
Escrita da agenda
P escreve na lousa a agenda de tarefas do dia.
AA copiam da lousa no caderno.
Frontal pelo professor
Frontal pelo professor
Livro infantil
Lousa, pincel,
caderno, lápis
77
3
4
P corrige.
Audição e leitura da letra da música “No lume da
fogueira”
Produção escrita tendo como apoio algumas
palavras destacadas da letra da música.
Coletivo
Alunos
Folhas com a
letra da
música, som
Folhas com a
letra da música
e folhas de
caderno
Fonte: Autoria própria.
4.9.1 Protocolos da Aula 7
Conforme já havíamos mencionado na aula anterior, o livro da leitura de fruição foi
lido em duas aulas; então, nesse dia terminamos a leitura de O caminho para o vale perdido.
Realizamos escrita da agenda e, em seguida, começamos a leitura da letra da música a
qual iríamos dançar na festa junina da escola. Resolvemos utilizar a letra da música para
produção textual, a fim de modificar um pouco a abordagem e deixar que as crianças criassem
suas histórias de forma mais livre.
Lemos a letra, depois ouvimos e marcamos algumas palavras mais significativas que
pudessem ser utilizadas na escritura do texto, tais como: fogueira, noite, forró, coração etc.
Dialogamos sobre o contexto da festas juninas em nossa cidade e também no Nordeste. Foi
um diálogo propositivo, com o intuito de mediar a criação de ideias para o texto que os alunos
iriam escrever, pois de posse das ideias, acreditamos que eles se sentem mais seguros para
realizar a atividade.
Quadro 14 – Letra da música utilizada na Aula 7
No lume da fogueira
No lume da fogueira,
Numa noite de forró,
É terra e chão,
É chão é pó,
Se amam como estrelas,
No azul do arrebó,
Paixão,
Acesa como a luz do sol.
Ting, ling, ling,
Toca o triângulo a noite inteira,
Amor batendo no meu coração,
Ting, ling, ling,
78
Bate a saudade derradeira,
Calor que vai ao céu em um balão,
Voa meu balão,
Na solidão desse luar,
Hoje é são João,
Nossa alegria é ver você voar.
Ôoooooo, ei, eô, chega meu povo que o forró já começou,
Ôoooooo, ei, eô, chega meu povo que o forró já começou.
Canários do Reino
Fonte: https://www.letras.mus.br/canarios-do-reino/1283831.
4.9.2 Análise de dados da Aula 7
Chegamos à quarta etapa da nossa aula e, para as crianças, a mais difícil: a produção
textual. Solicitei que os alunos escrevessem uma história que poderia ser real ou não, mas que
tivesse como tema central um dia de São João ou uma Noite Junina. Dessa forma, poderíamos
observar a conexão das ideias, o uso de parágrafos, a ortografia, dentre outros itens, que
poderiam ser analisados nessa produção. Porém, esperávamos vê-los escrevendo de forma
mais livre e criativa. Após a escrita, lemos algumas das histórias produzidas, elogiamos. Em
seguida dialogamos sobre as ideias e a constituição de parágrafos, pois essa foi a nossa última
intervenção direta. Continuamos nossa correção feita em forma de “bilhetinhos”, os quais
eram muito esperados pelos alunos. Vejamos no Excerto 4 o que um dos alunos conseguiu
realizar.
Excerto 4
Fonte: corpus da pesquisa.
era uma vez uma festa de
luz e Alegria
e com muito forró nua noite de
são joão
era especial porque quem ía
canta
na festa era luizgonza ele era
bom
Música Assa branca e abc do
certão
e muito boa as músicas A
quadrilha Arisão
dança demais e vai bom e veio
outrasquatrilha para dança e
tínha
muita comida nordestina
79
Percebemos, nesse texto, que o aluno tentou mostrar seus conhecimentos acerca de
Luiz Gonzaga e sobre os festejos juninos, mas não deu continuidade à história. Por isso, foi
solicitado no “bilhetinho” que a criança reescrevesse sua história, colocando mais elementos.
Constata-se que o aluno construiu seu texto em parágrafo, mas fez apenas um; também não
utilizou letra maiúscula no início do período e nem pontuação durante todo o texto, além de
misturar letras maiúsculas e minúsculas. Contudo, a ideia do texto é boa: uma festa junina na
qual o cantor era bem famoso e as apresentações iriam acontecer entre várias quadrilhas
juninas.
O recesso escolar do meio do ano chegou e tivemos nosso intervalo de duas semanas
sem aulas. Quando retornamos, o livro didático trazia, entre os textos, especificamente,
contos, de vários tipos. Aproveitamos o uso recurso para ampliar as leituras. Começamos,
também, um trabalho de leitura de contos com o livro Contos Natalenses, organizados pelos
professores de uma escola municipal da cidade de Natal. Esses textos foram escritos pelos
alunos da escola e acreditamos que seria um incentivo aos nossos pequenos escritores do 4º
ano. Assim começamos com novas aulas.
4.10 Produção de contos – Aula 8
Nesta aula, após o recesso do meio do ano, programamos para que as crianças
conhecessem os contos com mais profundidade. Ganhamos de presente um livro sobre Contos
Natalenses, o qual foi escrito por alunos de outra escola municipal e isso fez com que nossos
alunos, ficassem com mais entusiasmo para escrever.
Quadro 15: Plano de Aula nº 8
Plano de Aula
Professora: Francimar Silva dos Santos
Ano: 4°
Módulo: Contos
Número da Aula: 8
Tema da aula: Produção de contos.
Objetivo(s): Produzir pequenos contos.
Fase Atividade Intera-ção Material
1
2
Leitura de fruição (Contos Natalenses)
P lê o livro em voz alta e mostra as imagens a AA
Escrita da agenda
P escreve na lousa a agenda de tarefas do dia.
AA copiam da lousa no caderno.
P corrige.
Frontal pelo professor
Frontal pelo professor
Livro infantil
Lousa, pincel,
caderno, lápis
80
3
4
Leitura e comentários do conto: Dona Cotinha,
Tom e Gato Joca.
Produção escrita tendo como apoio o conto lido em
aula.
Coletivo
Alunos
Folhas com o
conto
Folhas de
caderno, lápis,
borracha.
Fonte: Autoria própria.
4.10.1 Protocolos da Aula 8
Na aula que antecedeu o recesso escolar, trabalhamos com a escrita de um texto que
tinha como apoio a música da festa junina. Percebemos que os alunos queriam escrever, mas
não textos extensos; então, como estratégia didática, começamos a ler contos curtos feitos por
alunos de outra escola municipal e publicados em uma coletânea organizada por seus
professores. Acreditamos que, se nossos alunos ouvissem e vissem textos escritos por outros
alunos, como eles, seriam incentivados a escrever também.
Dessa forma, iniciamos a leitura do livro presenteado por uma das professoras
organizadoras, a professora Gilmara Chaves Valentim da Silva. A obra possui contos dos
alunos de 6º ao 9º ano do ensino fundamental e aborda vários temas. Como é um livro de
produção potiguar e resultado da escrita de aluno, apresentamos a capa como forma de torná-
lo mais conhecido.
Figura 11 – Livro utilizado como recurso na Aula 8
Fonte: Fonte: Acervo pessoal.
81
A leitura desse livro gerou muita empolgação na turma, pois eram contos escritos por
alunos, entrando na fase da adolescência. Por isso, os nossos alunos gostaram tanto.
Após a escrita da agenda, passamos à terceira fase da nossa aula: a leitura do conto
Dona Cotinha, Tom e Gato Joca. Pesquisamos e encontramos esse conto no site da Revista
Nova Escola, que, no período em tela, divulgava contos curtos de vários autores. Lemos e
dialogamos sobre os contos, instigando os alunos a falar sobre suas percepções. Em seguida,
analisamos cada parte do conto, referentemente, a narrador, personagens, enredo, relembrando
nossas aulas em relação ao texto narrativo, para que os alunos fizessem analogias entre as
aulas já lecionadas e esse novo gênero discursivo.
Quadro 16 – Texto utilizado como recurso na Aula 8
Dona Cotinha, Tom e Gato Joca
Conto de Cléo Busatto sobre a amizade lúdica de um menino, uma senhora e um gato.
Em frente à minha casa tem outra casa, pequena, de madeira, azul com janelas brancas. Está no fim
de um terreno enorme com muitas árvores. Para mim aquilo é o que chamam de floresta. Tom diz que é um
quintal.
Ali mora dona Cotinha, uma velhinha que tem cabelos lilás e dirige um Fusquinha vermelho. Esse
passou a ser meu esconderijo. Dona Cotinha sempre aparece com um prato de comida. Diz:
— Vem, gatinho. Olha só o que eu trouxe para você.
Sou premiado com sardinha fresca, atum, macarrão. Tenho engordado além da conta.
Dia desses estava tomando sol e ouvi o Tom me chamar. O danado sentiu meu cheiro e descobriu
meu segredo. Ele estava no portão quando chegou dona Cotinha, no seu Fusquinha.
— Bom dia, menino — disse ela. Já que está em frente à minha casa, faça uma gentileza e abra o
portão.
Tom obedeceu. Dona Cotinha afagou minha cabeça e perguntou:
— Este gatinho é seu?
— Sim, senhora.
— Ele é muito educado.
— Obrigado — disse eu, na minha voz de gato.
No primeiro dia que o vi por aqui, ele entrou na casa e cheirou tudo. Agora, sempre deixo uma
comidinha para ele!
— Ah! Mas o Joca não come comida de gente, não, senhora. Só come ração — disse o Tom.
— Come, sim, meu filho. E come de tudo. Dona Cotinha acabava de denunciar minha gula e o
aumento de peso. Continuou: — Passe aqui no fim da tarde. Faço um bolo de fubá com cobertura de chocolate
que é de dar água na boca.
Com água na boca fiquei eu. Naquela tarde voltamos à casa de dona Cotinha. Ela foi logo mostrando
pro Tom uma coleção de carrinhos antigos. Era do filho dela, que morreu bem pequeno. Depois nos levou para
uma sala repleta de livros. Tom ficou de boca aberta e perguntou: — A senhora já leu todos esses livros?
— Praticamente todos. Ler foi minha diversão, meu bom vício. Infelizmente meus olhos não ajudam
mais. Essa pilha que você está vendo aqui ainda nem foi tocada.
Tom começou a ler em voz alta, e sua voz encheu a sala de seres fantásticos. O tempo parou.
Desse dia em diante, à tardinha, eu e Tom tínhamos uma missão. Abrir os livros de dona Cotinha e
deixar os personagens passearem pela casa mágica, no meio da floresta da cidade de pedra.
Cléo Busatto, autora deste conto é escritora e contadora de histórias.
Fonte: https://novaescola.org.br/conteudo/4156/dona-cotinha-tom-e-gato-joca.
82
4.10.2 Análise dos dados da Aula 8
Passamos, então, à quarta fase da nossa aula: a produção escrita. Assim, as crianças
foram solicitadas a que, inspiradas nos textos lidos, inclusive esse último, realizassem a
escrita de um conto. Nessa aula, houve muitas ausências devido à chuva, mas conseguimos
realizar a intervenção, conversando coletivamente sobre as características de uma narrativa,
para relembrar o que já havíamos tratado anteriormente. Nossa intenção era que o texto-base,
Dona Cotinha, Tom e Gato Joca, fosse apenas um exemplo de como realizar a escrita de um
conto, mas vejamos o que ocorreu no excerto 5:
Excerto 5
Fonte: corpus da pesquisa.
No excerto acima, percebemos que o aluno fez, digamos, uma mistura; na verdade,
uma intertextualidade, quando utilizou as personagens do conto estudado naquele dia e
combinou com o livro lido na leitura de fruição O caminho para o vale perdido. De acordo
Dona cotinha, tom e gato joca
Em um dia sufoso que vivam um
uma velhinha chamada dona Cotinha era uma
senhora muito chata que maltratava o gato e o
rato sempre brigava com o gato era muito
peludo e com olhos verdades e o gato era
muito isolado e dona Cotinha sempre ficava
assistino sua televisão e tinha o cabelo todo
branco e os olhos amarelos.
Um dia o gato descobriu um vale
perdido e rato foi com ele e dona Cotinha
ficou sozinho e o gato e o rato saíram atrás do
vale perdido e depois de muito tempo
procurano eles encontraro um esquilo ele era
muito peludo e muito chato quiseram a dona
cotinha e os tres foram procurar o vale
perdido eles osaram o vale e eles ficaram la
por muito tempo eles ficaram brincano no
vale e passou meses para la e dona cotinha
morreu e todo mundo ficou muito triste e no
caominho encontrou um macaco chamado
Max e todo mundo se separou o macaco foi
pra floresta e o galo foi para encontro um
viado chamado porco e depois de 2 anos todo
mundo se encontrou e fez um baile funk com
o gato, rato, poco e o galinhos chamado
acredite e tinha uma vaca quereno matar dos
amigos e os amigos foram contra a vaca e
todos morrem e Fim.
83
com Koch e Elias “todo texto faz remissão a outro(s) efetivamente já produzido(s) e que faz
(em) parte da memória social dos leitores” (2009, p. 101). O referido aluno uniu as duas
histórias a seu modo, utilizando, além disso, o nome de um dos colegas da sala; descreveu as
personagens, conforme havíamos falado em sala, porém, há alguns problemas de ortografia e
de conexão das ideias no decorrer do texto. Assim, colocamos o “bilhetinho” e o aluno refez
seu texto no mesmo dia, o que mostra que eles se sentem mais confiante e mais motivados
para escrever. Vejamos o resultado:
Excerto 6
Fonte: Corpus da pesquisa.
Nesse excerto, podemos observar que a criança reescreveu o texto conforme
solicitado; porém, não considerou a primeira versão do texto e fez um novo, completamente
diferente daquele que havia feito. A imaginação para criar um texto novo é sempre válida; o
aluno fez uso de parágrafos, utilizou letras maiúsculas na maioria dos casos de forma correta;
porém, a história ficou sem contexto, com muitas repetições e equívocos ortográficos, que se
forem levados em consideração dificultam bastante à compreensão do texto.
Os amigos para sempre
Numa tarde uma menina chamada
Janaina e um menino Gabriel e outros menino
chamado Gustavo e os dois gostavo eles
sempre bringavam e chegou outro menino
chamada Ana Julia. todo mundo viraram
amigos e resoviram fazer um clubinho. E
chegou um menino Riquinho e Janaina e Ana
Julia ficaramgostano dele.
Os mininos não queriam mais falar
com Gabriel e Gustavo e eles ficaram
isolados e chegou mais dus meninos e
comeram a namorar com Gustavo e Gabriel.
Eles queriam suinar as meninas Janaina e ana
Julia e os meninos foram pra balada e la
viram Janaina e Ana Julia e começou a briga
de Janaina e Ana Julia contra as namoradas
dos meninos. e depois muito tempo. Eles
ficaram amigos.
E chegou um menino muito
Baguceiro ele Baguncava muito nos muito
mesmo ate que esse menino ficou mecheno
com os outros. e os dois dos amigos nao
duram eles noraram e os amigos fugiram e
Janaina ficou com Gabriel e Ana Julia ficou
com Gustavo.
84
Contudo, observando o lado da escrita em si, esse aluno melhorou bastante. Com a
mediação realizada, ele escreveu um novo texto, utilizando sua criatividade e alguns dos
elementos explicados em sala, como por exemplo, o parágrafo.
4.11 Ao final das aulas exemplos, o que dizer sobre mediação?
As oito aulas apresentadas, nesta seção, fazem parte de um conjunto muito maior,
afinal o trabalho a intervenção foi desenvolvido durante todo o ano de 2018. Essas aulas
representam, assim, etapas de um processo que envolveu escrita, leitura, estudos linguísticos e
textuais, diálogo, um ir e vir constantes, para que pudéssemos relacionar os conhecimentos
necessários à prática pedagógica e o processo de ensino-aprendizagem.
Dessa experiência ficou o desafio de prosseguir com um trabalho pautado na mediação
pedagógica com vistas à formação de aluno com leitor e produtor de textos, não apenas para a
escola, reiteramos, mas para a vida.
Assim, se no início dessa seção, indicamos que a experiência nos daria duas respostas,
ao final dela podemos comprovar tal proposição.
A primeira é sobre o desenvolvimento dos alunos, durante as atividades mediadas.
Após a experiência compreendemos que o trabalho com a mediação favorece o
desenvolvimento dos alunos e constatamos o quanto é desafiador formar alunos produtores de
textos quando a escrita, na maioria das vezes, só faz parte do cotidiano escolar e mais ainda
quando a escola favorece para que os alunos desde pequenos já passem a conceber a escrita
como algo difícil. Mesmo assim, apesar de não termos conseguido demonstrar grandes
resultados, acreditamos que o processo favoreceu bastante o aprendizado desses alunos e
temos ciência de que é preciso dar sequência, pois há um longo caminho a percorrer.
A segunda é sobre os saberes necessários para que o professor seja o leitor do texto do
aluno e o mediador de sua aprendizagem na escrita criativa de textos. As percepções tidas
durante esse processo não teriam sido possíveis sem um estudo prévio de todos os textos que
nos fundamentaram. Assim, constatamos, na prática, que o professor para desenvolver sua
prática precisa se apropriar de conhecimentos teóricos e metodológicos concernentes a sua
área de atuação.
85
CONSIDERAÇÕES FINAIS: o grande aprendizado
De certa forma, se fizermos um balanço de tudo que foi realizado durante o ano letivo
e por todas as mediações aplicadas, percebemos o quanto é importante o trabalho do
professor, não somente, claro, por se tratar de passar conhecimento aos alunos ou de
contribuir para que o conhecimento chegue da melhor maneira ao aluno. Trata-se de como
esse conhecimento chega até o aluno, qual a qualidade desse conhecimento, em que situações
e quais as possibilidades de fazer o aluno compreender os conteúdos abordados; isso sim, faz
toda diferença quando se fala em mediação.
Elaborar o plano de aula, pô-lo em prática e analisar os dados obtidos, refletir sobre o
que escrever em cada bilhetinho ou como falar a resposta de uma pergunta enquanto grava-se
o áudio são formas diferenciadas de colocar em prática os saberes pedagógicos conquistados
durante o período de professora-pesquisadora. É uma estratégia mediadora ver a sala de aula
não como um depósito vazio que precisa de conhecimentos, mas de um lugar fervendo de
ideias que precisam ser ouvidas e isso faz parte da mediação do professor, ouvir. Alves
(2003), muito nos inspira quando diz que uma das tarefas da educação é ensinar as crianças a
serem elas mesmas, isso se torna desafiador, quando se tem a frente adultos que não sabem
ouvir e o professor precisa também ensiná-los.
Ao realizar o trabalho com a escrita de textos no 4º ano, percebemos que era preciso
muitos saberes para dar conta da demanda de necessidades que aquelas crianças tinham, em
relação a leitura e a escrita. A partir disso, fomos em busca das ideias da mediação na escola,
como ocorre esse processo? Ocorreu através de muita conversa, de atividades em conjuntos,
fazendo e refazendo ideias, perguntando aos alunos e por vezes respondendo aos seus
questionamentos, estando atenta a toda e qualquer dúvidas que apareciam nas aulas e fora
delas, como também nos silêncios que se faziam na turma quando eram as propostas as
atividades.
Percebemos que os protocolos de escrita poderiam ajudar, então, começamos a gravar
fragmentos das aulas, das perguntas que nos eram feitas. Perguntar, questionar enquanto os
alunos escreviam, para obter as respostas daquilo que estavam pensando, no memento da
escrita.
Reunimos e organizamos os saberes pedagógicos para planejar e orientar os conteúdos
que as crianças precisavam saber para escrever melhor: saberes em relação ao currículo para o
4º ano, troca de ideias com os colegas da escola, mais antigos nesse ano de ensino, os saberes
profissionais, ou seja, aqueles apreendidos na universidade, também foram de grande valia
86
neste processo de intervenção, além da experiência que temos na área educacional. Todos
esses saberes reunidos, além de nossas concepções de linguagem, língua e escrita foram
favoráveis no avanço da escrita de nossos alunos.
Realizamos a prática pedagógica com a escrita de textos de maneira diversificada,
utilizando cartazes, leituras diárias e textos de diferentes gêneros discursivos, pois
entendemos que as crianças da turma em estudo necessitavam de um novo encontro com a
escrita. Para tanto, lemos vários textos de diversas ordens, poemas, adivinhas, lendas, contos,
muitos contos, afinal foi o gênero discursivo que mais agradou a turma e foi a partir de
leituras de fruição, como chamamos aquelas leituras despretensiosas que lemos no início da
aula, que a turma começou a querer ter esse novo encontro com a escrita.
A partir das correções, dos retornos, das devolutivas com bilhetes, conversas e aulas
sobre problemas diversos, ou seja, por meio da mediação da professora-pesquisadora, que os
alunos recomeçaram esse processo importante de suas vidas. Não lemos somente para
escrever, lemos para nos aproximar da leitura, da escrita e uns dos outros, consequentemente.
A turma em questão, o 4º “B”, a temida pelos professores que por ela passavam devido
ao seu comportamento peculiar, avançou. Seguindo um novo caminho em relação à escrita.
Ao final do ano letivo de 2018, aqueles que já escreviam, estavam escrevendo melhor, aqueles
que não escreviam avançaram um pouco mais e aqueles que, apesar de estarem no quarto ano
não sabiam ler, terminaram o ano lendo e escrevendo, mesmo que poucas linhas. Tudo isso a
partir de um novo olhar para os textos escritos por eles e pela mediação realizada pela
professora-pesquisadora. Como bem diz Geraldi (2015, p. 140) “O texto é sempre uma
possibilidade dentre múltiplas possibilidades, mesmo consideradas as constrições da situação
em que foi produzido”. E, foi a partir de uma dessas possibilidades que a turma mudou.
A professora-pesquisadora agiu como coautora dos textos dos seus alunos, mas para
que isso ocorresse foi preciso que ela se tornasse leitora dos textos dos seus alunos e não
avaliasse somente marcas linguísticas como a ortografia, por exemplo, (GERALDI, 2015).
Acreditar que o aluno pode aprender é o primeiro passo para que ocorra a mediação e,
consequentemente, para uma ação avaliativa. O professor que não acredita que seu aluno pode
aprender, não tem condições de estar em uma sala de aula. O professor não pode ser
individualista, pois o individualismo não combina com a formação de leitores e escritores.
Para ser um bom educador é preciso fazer uma reflexão todos os dias e perguntar-se: quem é
meu aluno? Como ele se sente e vive as situações do dia a dia? O que ele pensa? Como
aprende? Para, assim, poder planejar os próximos passos. Ao final de uma de suas
conferências a professora Jussara Hoffmann nos falou uma frase de Kharaul Azri Saber, que
87
deveríamos levar para nossa prática diariamente, que diz: “Como crianças, somos todos
amigos não ligamos para cores, se nos ensinarem a amar, amaremos, se nos ensinarem a
brigar, brigaremos. Se nos ensinarem a colocar nossas ideias em prática, voaremos”
(informação verbal).
Segundo Hoffmann (2005) a prática avaliativa deveria ser permeada por três
princípios básicos, a fim de melhorar reflexão do professor quanto aos seus alunos e quanto a
sua prática, são eles: primeiro, o princípio dialógico / interpretativo da avaliação, que avalia o
processo do enviar e receber mensagens entre professores e alunos; é uma questão de
confiança mútua para construção do conhecimento; segundo, o princípio da reflexão
prospectiva na qual aborda uma avaliação do ser aluno que vai poder auxiliar o professor a
planejar os próximos passos; e, terceiro, o princípio da reflexão – ação, é aquele que avalia o
processo de mediação da aprendizagem na prática, onde o professor aprende com seus alunos
durante o processo de aprender (HOFFMANN, 2005).
Para professora Hoffmann (2005) enquanto não acompanharmos os processos de
aprendizagem, individualmente e qualificadamente, a qualidade da educação não irá avançar.
Os registros dos alunos feitos pelas escolas são decididos dentro da escola, internamente,
sobre várias reflexões quanto ao seu sentido. A avaliação não é uma questão política, mas sim
pedagógica, assim como a mediação do professor frente aos conhecimentos que os alunos
precisam aprender. Por isso, tudo o que tem de ser decidido deverá ser dentro da instituição
escolar, se possível na sala de aula. Quer queira ou não, todos nós temos um critério de
avaliação para tomarmos alguma decisão e um dos princípios de uma avaliação mediadora é
colocar em dúvida esses critérios de julgamento, refletindo sobre as decisões pedagógicas
com relação a nossos alunos; assim, torna-se evidente que devemos ser leitores dos textos dos
nossos alunos (HOFFMANN, 2005).
Ao final desta etapa, compreendemos que o questionamento inicial quanto aos saberes
que o professor necessita para mediar o processo de escrita de seus alunos, respondemos que
são muitos, de certa maneira, infinitos, precisamos sim, buscar mediação como ponto de
partida para esse processo, sem contudo, deixar de ler e pesquisar textos científicos que
embasem nossas aulas e texto e leituras agradáveis aos alunos; que os façam refletir sobre
ideias para depois colocá-las, no papel. E, que este momento de escrita, não seja um tormento,
e sim, um momento de troca de ideias entre professor e aluno.
Todos nós aprendemos de formas e coisas diferentes, todos os dias, com pessoas
também diferentes e em momentos diferentes. Por que não propiciar isso ao nosso aluno?
Quando nos comprometemos a sermos leitores de seus textos, não passamos a ser somente
88
coautores, mas instrumentos de aprendizagem, mediadores da aprendizagem; nosso olhar
precisar mudar. “O olhar avaliativo precisa ser tão flexível quanto à própria diversidade do
contexto educacional”, nos diz Hoffman (2005, p. 31), dessa forma, podem além de tudo nos
aproximar dessa criança, auxiliando-a a reler seus escritos e tornar a escrever, reorganizar seu
texto, suas ideias e, dessa forma, participar ativamente da construção e reconstrução de sua
escrituralidade.
Esse olhar diferenciado ao texto dos alunos é interpretativo, o significado desse olhar
que o professor constrói sobre seu aluno vai muito além do que simples instrumentos
avaliativos prontos e acabados na hora da escrita. Segundo Hoffman (2005) o prazer de tentar
e conseguir gera oportunidades, curiosidade e superação; é nesse processo de ir e vir que
acontece a mediação.
89
REFERÊNCIAS
ALMEIDA, Patrícia Cristina Albieri de. BIAJONE, Jefferson. Saberes docentes e formação
inicial de professores: implicações e desafios para as propostas de formação. Educação e
Pesquisa, São Paulo, 2007. v.33, n.2, p. 281 – 295. Disponível em:
http://www.scielo.br/pdf/ep/v33n2/a07v33n2.pdf. Acesso em: jan./2018.
ALVES, Rubem. Conversas sobre educação. Campinas, SP: Verus Editora, 2003.
ANTUNES, Irandé. Lutar com palavras: coesão e coerência. São Paulo: Parábola Editorial,
2005.
ANTUNES, Irandé. Aula de Português: encontro & interação. São Paulo: Parábola Editorial,
2003.
BORTONI-RICARDO. Stella Maris. O professor pesquisador: introdução à pesquisa
qualitativa. São Paulo: Parábola Editorial, 2008.
BORTONI-RICARDO, Stella Maris et. al. (Org.) Leitura e mediação pedagógica. São
Paulo: Parábola Editorial, 2012.
CAGLIARI, Luiz Carlos. Alfabetizando sem bá, bé, bí, bó, bú. São Paulo: Scipione, 1998.
CAGLIARI, Luiz Carlos. Alfabetização e linguística. São Paulo: Scipione, 2003.
CALKINS, Lucy McCormick. A arte de ensinar a escrever: o desenvolvimento do discurso
escrito. Porto Alegre: Artes Médicas, 1989.
FREIRE, Paulo. Pedagogia da autonomia: saberes necessários à prática pedagógica. São
Paulo: Paz e Terra, 1996.
FREIRE, Paulo. A importância do ato de ler: em três artigos que se completam. 45. Ed. são
Paulo: Cortez, 2003.
GERALDI, João Wanderley. Linguagem e ensino: exercícios de militância e divulgação.
Campinas, SP: Mercado das Letras, 1996.
90
__________. Da redação à produção de texto. In: CHIAPPINI, Ligia. Aprender e ensinar
com textos de alunos. 6. ed. São Paulo: Cortez, 2004.
__________. Portos de Passagem. 5. ed. São Paulo: Martins Fontes, 2013.
__________. A aula como acontecimento. 2. ed. São Carlos: Pedro e João Editores, 2015.
__________. Texto e discurso: questões epistemológicas para a linguística. Mestrado em
Linguística. 2008. Disponível em:
http://publicacoes.unifran.br/index.php/colecaoMestradoEmLinguistica/article/view/415/342
Acesso em: jun./2017.
__________. Tranças e danças: linguagem, ciência, poder e ensino. São Carlos: Pedro e
João Editores, 2018.
HOFFMANN, Jussara Maria Lerch. O Jogo do Contrário em Avaliação. Porto Alegre:
Mediação, 2005a.
____________. Avaliação: Mito e Desafio: uma perspectiva construtivista. 35. ed. Porto
Alegre: Mediação, 2005b.
KOCH, Ingedore Villaça. ELIAS, Vanda Maria. Ler e escrever: estratégias de produção
textual. São Paulo: Contexto, 2009.
NAEDZOLD, Simone de Sousa. SANTOS, Leandra Ines Seganfredo. SILVA, Albina Pereira
de Pinho. Protocolos de escrita no ensino fundamental sob os olhares da teoria
bakhtiniana do dialogismo. 2017 Disponível em:
http://www.periodicos.ufpb.br/index.php/actas/article/viewFile/37830/19183. Acesso em: jan.
/ 2018.
MAGALHÃES, Rosineide. MACHADO, Veruska Ribeiro. Leitura e interação no
enquadro de protocolo verbais. In: BORTONI-RICARDO, Stella Maris (Org.). Leitura e
mediação pedagógica. São Paulo: Parábola Editorial, 2012.
OLIVERIA, Maria do Socorro. A díade professor-aluno na produção do texto escrito.
Texto apresentado na XV Jornada de Estudos Linguísticos do Nordeste na UFPE, 1997.
PROJETO, Buriti: português: ensino fundamental: anos iniciais. Obra coletiva produzida
pela Editora Moderna. 3. ed. São Paulo: Moderna, 2014.
91
RIOLFLI, Cláudia Rosa. Linguagem e pensamento. Curitiba: IESDE Brasil S.A, 2006.
RUIZ. Eliana. Como se corrige redação na escola. Campinas: Mercado de Letras, 2001.
SEVERINO. Antônio Joaquim. Metodologia do trabalho científico. 23. ed. São Paulo:
Cortez Editora, 2007.
SOLÉ, Isabel. Estratégias de leitura. 6. ed. Porto Alegre: Penso, 1998.
TARDIF, Maurice. LESSARD, Claude. LAHAYE, Louise. Os professores face ao saber:
esboço de uma problemática do saber docente. Teoria e Educação: Porto Alegre, 1991. Nº 4,
p. 215 – 233.
TARDIF, Maurice. Saberes docentes e formação profissional. Petrópolis, RJ: Vozes, 2002.
VIGOTSKY, L. S. A formação social de mente. São Paulo: Martins Fontes, 1991.