Post on 27-Jun-2015
A RESPONSABILIDADE DO ESTADO POR DANOS CAUSADOS A
SEUS AGENTES PARTICULARES EM COLABORAÇÃO
COMPULSÓRIA
Autor: Flávio Henrique Salomão Neto – Professor de Direito Administrativo,
Doutorando em Ciências Jurídicas e Sociais.
SUMÁRIO:
1. ASPECTOS GERAIS; 2. RESPONSABILIDADE CIVIL; 2.1 TEORIAS SOBRE A
RESPONSABILIDADE; 2.1.1 RESPONSABILIDADE OBJETIVA; 2.1.2
RESPONSABILIDADE SUBJETIVA; 2.1.3 TEORIA CONTRATUAL; 2.1.4 TEORIA
EXTRACONTRATUAL 3. AGENTE PÚBLICO; 3.1 CLASSIFICAÇÃO; 3.1.1
JURADOS; 3.1.2 MESÁRIOS; 4. ATO ADMINISTRATIVO; 4.1 ELEMENTOS E/OU
REQUISITOS; 5. CONCLUSÃO; 6. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS; 7 NOTAS.
RESUMO:
O presente trabalho tem por fim apresentar nuances da responsabilidade
do Estado, mormente deste para com aqueles que não são seus servidores, mas
que, por uma circunstância, foram convocados ou se alistaram voluntariamente para
prestar serviços públicos de alta relevância, quais sejam, os de jurados no Tribunal
do Júri e de mesários nas eleições. Há, no nosso entender, um vínculo jurídico entre
o Estado e esses agentes, a partir do momento em que ele, o Estado, confia a esses
particulares uma função pública. No entanto, se os deveres desses são muitos e
amplamente decantados, os direitos são mínimos, previstos em ordenamentos
esparsos. É por conta dessa preocupação que procuramos pesquisar para ver até
onde vai essa responsabilidade, buscando nos ensinamentos doutrinários e
jurisprudenciais as bases para uma sustentação coesa. Uma decisão do Tribunal de
Justiça do Estado de Minas Gerais no Processo de n° 1.0024.03.983101-1/001(1) [1]
despertou-nos o interesse por tema tão intrigante.
1. ASPECTOS GERAIS
Muito nos tem chamado atenção a figura do particular que atua como
Agente Público por Colaboração, seja ela compulsória, como nos casos dos
mesários nas eleições e dos jurados, no Tribunal do Júri e no Serviço Militar, seja
ela voluntária, como nos casos daqueles que atuam em Conselhos municipais de
saúde ou Conselhos tutelares, ou, até mesmo, em campanhas. É certo que os atos
praticados por esses agentes, são atos públicos, alguns tidos como administrativos,
sujeitos aos princípios e normas que regem a Administração Pública.
No presente estudo, vamos nos ater àqueles que atuam
compulsoriamente, especificamente, os jurados e mesários.
Existem determinadas funções estatais que o Estado não tem como
exercer através de seus próprios servidores, pela natureza da função e pela
vedação legal, como no caso do Tribunal do Júri – onde esse júri deve ser popular,
formado por cidadãos daquela sociedade – e como no caso da realização de pleitos
eleitorais, com a utilização de cidadãos que atuarão nas mesas receptoras de votos.
O Estado tem o poder de convocar esses particulares para o exercício dessas
funções. E assim o faz, buscando na sociedade pessoas capazes de suprir essas
suas necessidades. Uma vez convocado, só resta a esse cidadão atender ao
chamamento.
Muito bem. O Estado faz uso dessa mão-de-obra, sem remuneração,
mesmo atribuindo alguns direitos a esse particular, como, no caso dos jurados, que
não recebem qualquer remuneração, ou ajuda de custo, mas têm alguns benefícios
legais: não podem sofrer descontos salariais em função de seu trabalho no Tribunal
do Júri; têm presunção de idoneidade moral e preferência, em igualdade de
condições, em concorrências públicas (não em concursos públicos); e também têm
direito a prisão especial, em caso de crime comum, até o julgamento definitivo, ou no
caso do mesário: a dispensa do serviço, mediante declaração expedida pela Justiça
Eleitoral, sem prejuízo do salário, vencimento ou qualquer outra vantagem, pelo
dobro dos dias trabalhados nas eleições, conforme art. 98, da Lei 9.504/97, e a
prerrogativa da utilização da prestação de serviços à Justiça Eleitoral como critério
de desempate em concurso público (desde que haja essa previsão no Edital).
2
Se da atuação desse agente pode advir uma responsabilização do Estado,
conforme disposto no art. 37, § 6°, da Constituição Federal [2]; se esse agente pode
responder administrativa, civil e penalmente perante o Estado pela sua conduta; se
ele é equiparado a funcionário público para fins penais, conforme prevê o art. 327 do
Código Penal [3], não é difícil deduzir que o Estado também tem responsabilidades
para com esse agente. Então, como é que fica, por exemplo, aquela pessoa que
trabalha no comércio, mas, porque foi convocado pela Justiça Eleitoral, foi trabalhar
naquele domingo de eleições e, para seu azar, sofreu um acidente quando estava
transportando a urna, após o término das votações? Ou aquele que, também
trabalhando no comércio, onde ganha comissão sobre vendas, convocado que foi
para atuar no Tribunal do Júri, sofreu uma agressão física após julgamento do qual
fizera parte, ao simples pensar, pelo agressor, de que fora ele quem condenara o
réu, já que, pelas sábias palavras do Excelentíssimo Senhor Juiz de Direito, eram os
jurados “os juízes de fato”, e ele, o agredido, era um deles? E se esses fatos os
incapacitaram para suas atividades laborais? Atendendo ao chamamento da Justiça
Eleitoral ou do Tribunal de Justiça, eles se tornaram agentes públicos, ainda que,
conforme nos ensina Celso Antônio Bandeira de Mello [4], “em caráter episódico”.
Aí surgem as indagações: é certo o Estado se desobrigar perante esse
agente de eventuais danos por ele sofridos em razão do exercício dessa função? É
certo o Estado transferir o ônus para o órgão ou empresa onde aquele cidadão
trabalha? Entendemos que não, pois se ele não tivesse sido convocado para esse
mister, estaria no seu ambiente de trabalho, ou em casa, menos ali. Então, se algo
lhe acontece no exercício da função, o Estado há que responsabilizar-se. A
convocação para atuar como jurado ou como mesário, já que requisitados são,
assemelha-se à requisição administrativa, e, como nesta, haverá indenização
posterior, se, de forma justificada, o requisitado sofrer algum dano, ou seja, se
houver um nexo de causalidade.
Teríamos aí um acidente de trabalho? Seria, nesses casos,
responsabilidade civil do Estado por ato contratual ou extracontratual? Seria objetiva
ou subjetiva essa responsabilidade?
2. RESPONSABILIDADE CIVIL
3
Viver em sociedade faz com que tenhamos um complexo de relações
ensejadas por interesses de toda ordem. Quando um interesse protegido pelo direito
é injustamente lesionado, é necessário que haja o seu ressarcimento por quem o
feriu.
A antiga tendência, hoje já consagrada, de não se permitir que a vítima de
atos ilícitos deixe de ser ressarcida dos prejuízos que lhes são causados, evoluiu,
sobremaneira, com o advento do atual Código Civil brasileiro, que trata da matéria
em seus artigos 186, 187 e 927 e ss [5].
É a chamada responsabilidade civil, tema hoje por demais debatido em
seminários, congressos, conferências, aulas etc.
Segundo De Plácido e Silva [6], responsabilidade vem de “responsável, de
responder, do latim respondere, tomado na significação de responsabilizar-se, vir
garantindo, assegurar, assumir o pagamento do que se obrigou ou do ato que
praticou”. A responsabilidade civil, segundo ensinamento do mesmo autor, “designa
a obrigação de reparar o dano ou de ressarcir o dano, quando injustamente causado
a outrem”.
É certo que o que se procura na responsabilização, é uma indenização
correspondente ao dano sofrido. Não há se procurar com a indenização um
enriquecimento ilícito. A indenização tem que ser a suficiente para trazer o
indenizado ao estado anterior (rebus sic stantibus), ou seja, todos temos que estar
num mesmo patamar, e assim sermos tratados. A partir do momento em que alguém
é desnivelado por ato de outrem, sofrendo com isso um dano, pode surgir o direito a
uma indenização.
Sintetizando a conceituação desse instituto, Maria Helena Diniz [7]
asseverou que: "poder-se-á definir a responsabilidade civil como a aplicação de
medidas que obriguem alguém a reparar dano moral ou patrimonial causado a
terceiros em razão de ato do próprio imputado, de pessoa por quem ele responde,
ou de fato de coisa ou animal sob sua guarda (responsabilidade subjetiva), ou,
ainda, de simples imposição legal (responsabilidade objetiva)".
O estudo da responsabilidade civil relacionado à teoria dos atos ilícitos
tinha razão de ser no sistema das relações econômicas de épocas ultrapassadas.
Hoje o número e a medida dos danos, que não podem ser reconduzidos ao fato
4
voluntário de uma pessoa, aumentaram consideravelmente e assim tiveram de
encontrar substancial compensação. Segundo o saudoso Orlando Gomes [8] “Nem
todas as pessoas que causam prejuízos a outrem estão obrigadas a indenizá-lo.
Nem todo dano deve ser ressarcido. É preciso saber, pois, em que circunstâncias
nasce a obrigação de reparar o dano causado e que prejuízos são indenizáveis”.
2.1 TEORIAS SOBRE A RESPONSABILIDADE CIVIL
Dentre as várias teorias adotadas para o estudo da responsabilidade civil,
versaremos primeiramente sobre duas: a da responsabilidade objetiva e a da
responsabilidade subjetiva. Depois, trataremos da Teoria Contratual e da Teoria
Extracontratual.
2.1.1 Responsabilidade Objetiva
A regra geral da responsabilidade civil continua sendo a da culpa
subjetiva, também conhecida por “Culpa Aquiliana” - qualificação que vem do
tribuno romano Achilus Gallo, no ano de 286 a. C. A teoria da culpa aquiliana tem
por base a Lex Aquilia, do Direito Romano, que tratava da reparação dos danos
causados às coisas alheias. Era também chamada de teoria extracontratual ou de
culpa delitual. Isto é, para que o ofendido obtenha judicialmente uma reparação dos
danos sofridos, tem ele que provar esses prejuízos e mais, que ocorreram por culpa
do ofensor.
Entretanto, foi introduzida, no Parágrafo único, do artigo 927, do Código
Civil brasileiro, a previsão legal de que “Haverá a obrigação de reparar o dano,
independentemente de culpa, nos casos especificados em lei, ou quando a
atividade normalmente desenvolvida pelo autor do dano implicar, por sua natureza,
risco para os direitos de outrem”. (Grifo nosso)
A mudança importante é de que a idéia de culpa é substituída pela do
risco assumido pela atividade exercida.
Nesses casos, a obrigação de indenizar não depende da prova da culpa,
porque o direito decorre do tipo de atividade exercida pelo causador do dano e não
da sua culpa pelo prejuízo causado.
5
2.1.2 Responsabilidade Subjetiva
Diz-se subjetiva a responsabilidade quando se baseia na culpa do agente,
que deve ser comprovada para gerar a obrigação indenizatória. A responsabilidade
do causador do dano, pois, somente se configura se ele agiu com dolo ou culpa.
Trata-se da teoria clássica, também chamada teoria da culpa ou subjetiva, segundo
a qual a prova da culpa lato sensu (abrangendo o dolo) ou stricto sensu se constitui
num pressuposto do dano indenizável.
2.1.3 Teoria Contratual
Em sentido amplo, quer a expressão exprimir a obrigação assumida pelas
partes contratantes, em virtude da qual se acham no dever de fazer ou cumprir tudo
aquilo que tenham convencionado ou ajustado. Desse modo, evidenciada a
responsabilidade contratual da parte, quando não cumpre a obrigação a que está
sujeita, pode ser compelida pela outra a cumpri-la, sob pena de responder pelos
danos, que lhe possam ser causados.
Em sentido especial, entende-se a obrigação de indenizar ou de ressarcir
os danos causados pela inexecução de cláusula contratual ou pela má execução da
obrigação, nela estipulada. Assim sendo, a responsabilidade, além de fixar a
obrigação que não foi cumprida, determina a obrigação de ressarcir o dano,
conseqüente do inadimplemento ou má execução da obrigação contratual.
Nesta teoria, através de uma cláusula implícita no contrato de trabalho, o
empregador protegia o empregado no caso de acidente do trabalho, cuidando assim
de sua segurança, e se não o fizesse estaria o empregador sujeito a pagar uma
indenização. Com isso houve uma inversão do ônus da prova, ou seja, havia uma
presunção da culpa do empregador, mas esta era uma presunção juris tantum. Mas,
mesmo assim, o empregado ainda estava desprotegido, pois o empregador às vezes
burlava a verdade, falando que adotava todas as medidas necessárias para
prevenção de acidentes, e na verdade não as fazia.
Inicialmente a responsabilidade do empregador, relativamente aos
6
acidentes de trabalho era subjetiva, devendo ser comprovada sua culpa para que se
determinasse sua responsabilização, cabendo à vítima o ônus da prova.
A evolução teórica, que fundamenta a proteção aos empregados em
acidentes de trabalho, nos mostra que devido à inserção de uma cláusula contratual,
o empregador deveria velar pela segurança do empregado, sujeitando-se ao
pagamento de uma indenização, caso procedesse de maneira diversa e fosse o
empregado vítima de algum acidente em seu local de trabalho.
2.1.4 Teoria Extracontratual
A obrigação de indenizar o dano causado pode surgir: a) do
inadimplemento de obrigação negocial ou ex lege; b) da lesão a direito subjetivo,
sem que entre o ofensor e a vítima preexista qualquer relação jurídica. Na primeira
hipótese, diz-se que a responsabilidade é contratual; na segunda, extracontratual ou
delitual, também chamada de “culpa aquiliana” - vem do Direito Romano, da
chamada Lex Aquila, que se referia à reparação de danos causados às coisas
alheias. Nas duas, a lei impõe ao autor do dano uma obrigação que tem por objetivo
a prestação de indenização. Embora tal obrigação seja a mesma, diferem as duas
espécies de responsabilidade, notadamente quanto ao fundamento, à razão de ser e
ao ônus da prova.
A responsabilidade extracontratual é tradicionalmente o aspecto mais
interessante da teoria dos atos ilícitos, mas a tendência moderna, para alargar o
campo das obrigações de indenizar danos sofridos pelas pessoas não ligadas por
uma relação jurídica anterior, dilata erroneamente a órbita da responsabilidade
delitual propriamente dita, atraindo casos nos quais se entende ser justa a imposição
legal do dever de reparar o prejuízo, mas em que a eliminação da culpa impossibilita
a inclusão entre os atos ilícitos. Nessas hipóteses, segundo GOMES [9], cada dia
mais numerosas, não se deveria falar em “responsabilidade delitual”, porque, em
verdade, não se compreende seja alguém responsável por ato que não praticou
culposamente. Não obstante, a tendência assinalada conduziu a doutrina a inserir na
teoria da responsabilidade extracontratual os casos nos quais o dever de indenizar é
idêntico ao que surge da prática de ato ilícito. E, para distinguir semelhante
responsabilidade da autêntica, denomina-a “objetiva”. Nessa ordem de idéias,
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distinguem-se nitidamente duas espécies de responsabilidade civil extracontratual, a
que se funda na culpa, chamada subjetiva, e a que abstrai esse elemento na
justificação do dever de indenizar, denominada objetiva.
Toda a evolução no sentido da chamada responsabilidade objetiva denota
a imprestabilidade do conceito de culpa para a solução dos casos que reclamavam a
atribuição do dever de indenizar independentemente da comprovação do erro de
conduta do agente.
3. AGENTE PÚBLICO
Para Maria Sylvia Zanella Di Pietro [10], em termos bastante amplos,
agente público "é toda pessoa física que presta serviço ao Estado e às pessoas
jurídicas da Administração indireta”. Para Bandeira de Melo [11], "esta expressão –
agentes públicos – é a mais ampla que se pode conceber para designar genérica e
indistintamente os sujeitos que servem ao poder público como instrumentos
expressivos de sua vontade ou ação, ainda quando o façam apenas ocasional ou
episodicamente". Assim, todo aquele que desempenha funções admitidas pelo
sistema jurídico como estatais, é um agente público.
Pela sua manifesta generalidade, esse conceito abrange um leque
bastante amplo de manifestações, englobando tanto o chefe do Poder Executivo (em
qualquer dos níveis federativos), como os senadores, deputados, vereadores,
ocupantes de cargos ou empregados públicos da Administração direta ou indireta,
inclusive empresas públicas e sociedades de economia mista, concessionários e
permissionários de serviços públicos, os requisitados, contratados sob o regime de
locação civil de serviços e os gestores de negócios públicos.
Observe-se que nesta ampla constelação de agentes existem alguns que
participam do aparelho estatal, tanto na organização direta como na indireta
(autarquias, sociedade de economia mista, empresas e fundações públicas). Outros,
por sua vez, não participam ou não são integrantes de qualquer organização estatal,
porque são particulares que, apenas ocasionalmente exercem uma função, como no
caso dos concessionários ou permissionários de serviços públicos, mesários,
jurados, voluntários em campanhas etc., e que, inobstante isso, exercem, em sua
8
atuação, atividades enquadradas pelo ordenamento jurídico como públicas.
A noção é tão abrangente que a Lei nº 8.429, de 2 de junho de 1992, que
dispõe sobre as sanções aplicáveis aos agentes públicos nos casos de improbidade
administrativa, traz em seu artigo 2º o seguinte conceito: "Reputa-se agente público,
para efeitos desta lei, todo aquele que exerce, ainda que transitoriamente ou sem
remuneração, por eleição, nomeação, designação, atribuição ou qualquer forma de
investidura ou vínculo, mandato, cargo, emprego ou função, nas entidades
mencionadas no artigo anterior".
1[?]
EMENTA: Apelação cível. Ação ordinária. Retificação de aposentadoria. Comissário de menores. Prestação voluntária de serviços. Acidente automobilístico. Invalidez subseqüente. Aposentadoria. Proventos integrais. Impossibilidade. Recurso não provido. 1. Sinistro laboral, segundo a Lei estadual nº 869, de 1952, do Estado de Minas Gerais, é o evento danoso causado mediata ou imediatamente no exercício das atribuições inerentes ao cargo. 2. O comissário de menor em serviço voluntário, presta serviços sem qualquer vínculo empregatício ou estatutário. Por ser agente honorífico, seus serviços não geram, para o Estado, qualquer obrigação de natureza trabalhista ou previdenciária. 3. Não se considera sinistro laboral, para fins previdenciários e trabalhista, o acidente automobilístico sofrido por comissário de menor voluntário em serviço para o Juizado da Infância e da Juventude. 4. Inexiste amparo legal para concessão de aposentadoria com proventos integrais quando as seqüelas decorrentes do sinistro não decorrem de vínculo trabalhista ou estatutário. 5. Apelação cível conhecida e não provida. APELAÇÃO CÍVEL Nº 1.0024.03.983101-1/001 - COMARCA DE BELO HORIZONTE - APELANTE(S): HÉRCULES JOSÉ DOS SANTOS - APELADO(A)(S): ESTADO DE MINAS GERAIS - RELATOR: EXMO. SR. DES. CAETANO LEVI LOPES – Data do Julgamento: 21/06/2005 – Data da Publicação: 01/07/2005
2[?] As pessoas jurídicas de direito público e as de direito privado prestadoras de serviços públicos responderão pelos danos que seus agentes, nessa qualidade, causarem a terceiros, assegurado o direito de regresso contra o responsável nos casos de dolo ou culpa.3[?] Considera-se funcionário público, para os efeitos penais, quem, embora transitoriamente ou sem remuneração, exerce cargo, emprego ou função pública. 4[?] Curso de direito administrativo, 13 ed., rev., atual. e ampl,, São Paulo: Malheiros, 2001, p. 232. 5[?] Art. 186. Aquele que, por ação ou omissão voluntária, negligência ou imprudência, violar direito e causar dano a outrem, ainda que exclusivamente moral, comete ato ilícito.Art. 187. Também comete ato ilícito o titular de um direito que, ao exercê-lo, excede manifestamente os limites impostos pelo seu fim econômico ou social, pela boa-fé ou pelos bons costumes....Art. 927. Aquele que, por ato ilícito (arts. 186 e 187), causar dano a outrem, fica obrigado a repará-lo.Parágrafo único. Haverá obrigação de reparar o dano, independentemente de culpa, nos casos especificados em lei, ou quando a atividade normalmente desenvolvida pelo autor do dano implicar, por sua natureza, risco para os direitos de outrem.6[?] Vocabulário jurídico, 13 ed., Rio de Janeiro: Forense, 1997, p. 713.7[?] Curso de Direito Civil Brasileiro – Responsabilidade Civil. V. 7, São Paulo: Saraiva, 2001, p. 69.8[?] Obrigações, 11 ed., Rio de Janeiro: Forense, 1997, p. 277.9[?] Ob. cit. p. 278.10[?] Direito administrativo, 19 ed., São Paulo: Atlas, 2006, p. 431.
11[?] Ob. cit. p. 226.
9
Dada a variedade de sujeitos compreendidos em tal rótulo, faz-se
necessário agrupar os agentes públicos em categorias que apontem referenciais
básicos distintivos, possibilitando-se, dessa forma, melhor identificação.
3.1 Classificação:
I) AGENTES POLÍTICOS – são os titulares dos cargos estruturais da organização
política do país, isto é, são os ocupantes dos cargos que compõem o arcabouço
constitucional do Estado e, portanto, o esquema fundamental do poder. A função é a
de formador da vontade superior do Estado. São eles: Na esfera do Executivo: O
Presidente da República, os Governadores, os Prefeitos, seus Vices e respectivos
auxiliares imediatos (Ministros e Secretários das diversas pastas); na esfera do
Legislativo: os Senadores, Deputados Federais e Estaduais e Vereadores.
A forma de investidura é a eleição, salvo para Ministros e Secretários que
é a nomeação.
II) AGENTES ADMINISTRATIVOS – são os servidores públicos em geral. Agrega
aqueles que planejam e executam as atividades a cargo da Administração Pública.
São:
a) os servidores públicos estatutários - sujeitos ao Estatuto dos servidores públicos e
ocupantes de cargo público;
b) os empregados públicos - contratados sob o regime da Consolidação das Leis do
Trabalho-CLT, são ocupantes de emprego público nas empresas públicas,
sociedades de economia mista e serviços sociais autônomos.
c) os servidores temporários - contratados por tempo determinado para atender a
necessidade temporária de excepcional interesse público; exercem função, sem
estarem vinculados a cargo ou emprego público (CF, art. 37, IX – Leis 8.745/93,
9.849/99 e 10.667/03).
III) AGENTES POR COLABORAÇÃO – são particulares que colaboram com o Poder
Público, de forma voluntária ou compulsória, ou também por delegação. São:
a) Agentes voluntários – os que atuam em campanhas;
b) Agentes compulsórios – os jurados, mesários, escrutinadores;
c) Agentes por delegação – os empregados das empresas concessionárias,
10
permissionárias e autorizatárias de serviços públicos, as pessoas físicas
permissionárias ou autorizatárias de serviços públicos e os que exercem serviços
notariais e de registro (art. 236, CF)
Nos interessa, para fins deste trabalho, estes últimos, classificados como
Agentes por Colaboração. José dos Santos Carvalho Filho [12], os denomina como
“Agentes particulares colaboradores”, informando, ainda, que “tais agentes, embora
sejam particulares, executam certas funções especiais que podem se qualificar
como públicas, sempre como resultado do vínculo jurídico que os prende ao
Estado... Vários desses agentes, inclusive, não percebem remuneração, mas, em
compensação, recebem benefícios colaterais, como o apostilamento da situação nos
prontuários funcionais ou a concessão de um período de descanso remunerado
após o cumprimento da tarefa.”
Mais uma vez recorremos à obra de Bandeira de Mello [13], que os
classifica como “Particulares em colaboração com a Administração”, temos que
“Esta categoria de agentes é composta por sujeitos que, sem perderem sua
qualidade de particulares – portanto, de pessoas alheias à intimidade do aparelho
estatal (com exceção única dos recrutados para serviço militar) – exercem função
pública, ainda que às vezes apenas em caráter episódico. Na tipologia em apreço
reconhecem-se: a) requisitados para prestação de atividade pública, quais os
jurados, membros de Mesa receptora ou apuradora de votos quando das eleições,
recrutados para o serviço militar obrigatório etc. estes agentes exercem um munus
público. b) os que sponte propria assumem a gestão da coisa pública como
‘gestores de negócios públicos’, perante situações anômalas, para acudir a
necessidades públicas prementes;...”
Consigne-se exemplar lição do professor Hely Lopes Meirelles [14], que
classificou esses como “Agentes honoríficos” e assim escreveu: "Agentes
honoríficos: são cidadãos convocados, designados ou nomeados para prestar,
transitoriamente, determinados serviços ao Estado, em razão de sua condição
cívica, de sua honorabilidade ou de sua notória capacidade profissional, mas sem
qualquer vínculo empregatício ou estatutário e, normalmente, sem remuneração.
Tais serviços constituem o chamado munus público, ou serviços públicos relevantes,
12[?] Manual de direito administrativo, 19 ed., rev., ampl. e atual., Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2008, p. 533.13[?] Ob. cit. p. 232.14[?] Direito administrativo brasileiro, 28 ed., São Paulo: Malheiros, 2004, p. 79.
11
de que são exemplos a função de jurado, de mesário eleitoral, de comissário de
menores, de presidente ou membro de comissão de estudo ou de julgamento e
outros dessa natureza.
Os agentes honoríficos não são servidores públicos, mas
momentaneamente exercem uma função pública e, enquanto a desempenham,
sujeitam-se à hierarquia e disciplina do órgão a que estão servindo, podendo
perceber um pro labore e contar o período de trabalho como de serviço público.
Sobre estes agentes eventuais do Poder Público não incidem as proibições
constitucionais de acumulação de cargos, funções ou empregos (CF, art. 37, XVI e
XVII), porque sua vinculação com o Estado é sempre transitória e a título de
colaboração cívica, sem caráter empregatício. A Lei 9.608, de 18.02.1998, dispondo
sobre o serviço voluntário, define-o como a atividade não remunerada prestada por
pessoa física a entidade pública de qualquer natureza ou instituição privada sem fins
lucrativos com objetivos cívicos, culturais, educacionais, científicos, recreativos ou
de assistência social, inclusive mutualidade. Tal serviço não gera vínculo
empregatício, nem obrigações de natureza trabalhista, previdenciária ou afim entre
prestador e tomador. A lei permite o ressarcimento das despesas comprovadamente
realizadas pelo prestador, desde que estejam autorizadas pela entidade a que for
prestado o serviço voluntário.
Somente para fins penais é que esses agentes são equiparados a
funcionários públicos quanto aos crimes relacionados com o exercício da função,
nos expressos termos do art. 327, do CP."
3.1.1 Jurados
A Constituição da República Federal do Brasil de 1988 prevê que os
crimes dolosos contra a vida, sejam consumados ou não, serão julgados pelo
Tribunal do Júri. Seja ele homicídio, instigação, induzimento ou auxílio ao suicídio,
infanticídio, ou aborto, tentados ou consumados.
12
A mesma Constituição Federal elenca o Júri no rol dos direitos e garantias
fundamentais do cidadão, conforme art. 5º, XXXVIII, ‘d’ [15], eis que tal a instituição é
considerada como uma conquista no exercício de direitos, figurando, inclusive, no rol
de cláusulas pétreas em vigor.
O serviço do Júri é obrigatório, conforme disposto no art. 434, do Código
de Processo Penal “O serviço do júri será obrigatório. O alistamento compreenderá
os cidadãos maiores de 21 (vinte e um) anos, isentos os maiores de 60 (sessenta).
O CPP prevê, ainda, em seu art. 435, que “A recusa ao serviço do júri, motivada por
convicção religiosa, filosófica ou política, importará a perda dos direitos políticos”.
O Tribunal do Júri é um órgão de primeira instância, ou de primeiro grau,
da Justiça comum, podendo ser estadual ou federal. É composto de um Juiz
presidente, juiz esse de Direito, e mais 21 (vinte e um jurados), que irão formar o
Conselho de Sentença no qual só serão escolhido sete jurados. Para o início do
julgamento, é necessário estar completo o quadro dos 21 (vinte e um) candidatos a
jurados, embora haja o mínimo legal (art. 442, CPP), ou seja, 15 (quinze) jurados
para instalação da sessão. Neste caso, será realizado o sorteio dos suplentes para
que seja alcançado o número de 21 candidatos a jurados (art. 445, CPP).
O jurado que não comparecer incorrerá em multa (443, CPP).
O juiz poderá acolher escusas dos jurados, as quais deverão ser decididas
antes do sorteio dos 7 (sete) jurados que comporão o conselho de sentença.
O juiz advertirá os jurados sobre os possíveis impedimentos, se são, por
exemplo, parentes da vitima, do promotor, do advogado de defesa ou se considera
impedido por qualquer outro motivo.
Em seguida, o juiz fará o sorteio dos 7 (sete) jurados que irão compor o
Conselho de Sentença, podendo cada parte fazer a exclusão de 3 (três) jurados sem
justificar, sorteado os sete jurados, faz se composto o Conselho de Sentença.
15[?] Art. 5º - Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade, nos termos seguintes: ...XXXVIII - é reconhecida a instituição do júri, com a organização que lhe der a lei, assegurados: a) a plenitude de defesa; b) o sigilo das votações; c) a soberania dos veredictos; d) a competência para o julgamento dos crimes dolosos contra a vida;...
13
Formado o Conselho, os jurados farão o juramento perante o juiz e não
mais poderão se comunicar com ninguém, nem entre si mesmos, muito menos
manifestar sua opinião sobre o processo. É importante ressaltar que os jurados são
incomunicáveis, ou seja, não podem se comunicar com o mundo externo nem entre
si até a prolatação da sentença. Os jurados poderão comunicar-se entre si só sobre
fatos que não se refira ao processo. Tal incomunicabilidade justifica-se pela garantia
de independência dos jurados, que julgam com sua própria convicção, objetivando a
verdade dos fatos. Ao jurado é atribuído o poder de julgar segundo a sua
consciência.
O Tribunal do Júri, para muitos, é a forma mais democrática que o Estado
concedeu ao cidadão para fazer justiça.
Segundo o Ilustre Doutrinador Julio Fabbrini Mirabete [16] “É o jurado, em
termos jurídicos, o leigo do Pode Judiciário, investido, por lei, na função de julgar em
órgão coletivo a que se dá o nome de Júri.
O cidadão é jurado por ter íntima ligação com o meio em que vive, em que
o Conselho de Jurados que integra exerce a sua jurisdição (RTJ 44/646)”
Esses nobres agentes que farão a vontade de uma sociedade, julgando
aqueles réus, são particulares, representantes do povo, escolhidos, normalmente,
naquela mesma sociedade, após o Juiz presidente do Tribunal do Júri requisitar de
repartições públicas, sindicatos, bancos, comércio etc., indicações de pessoas
idôneas para esse mister. Esses nomes indicados, uma vez aprovados, farão parte
de quadro que se prestará a servir ao Tribunal naquele exercício.
Diz o CPP, em seu art. 436: “Os jurados serão escolhidos dentre cidadãos
de notória idoneidade.
Parágrafo único - São isentos do serviço do júri:
I - o Presidente da República e os ministros de Estado;
II - os governadores ou interventores de Estados ou Territórios, o prefeito do Distrito Federal e seus respectivos secretários;
III - os membros do Parlamento Nacional, do Conselho de Economia Nacional, das Assembléias Legislativas dos Estados e das Câmaras Municipais, enquanto durarem suas reuniões;
IV - os prefeitos municipais;
16[?] Processo Penal. 12 ed. rev. e atual. São Paulo: Atlas, 2003, p. 512.
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V - os magistrados e órgãos do Ministério Público;
VI - os serventuários e funcionários da justiça;
VII - o chefe, demais autoridades e funcionários da Polícia e Segurança Pública;
VIII - os militares em serviço ativo;
IX - as mulheres que não exerçam função pública e provem que, em virtude de ocupações domésticas, o serviço do júri Ihes é particularmente difícil;
X - por 1 (um) ano, mediante requerimento, os que tiverem efetivamente exercido a função de jurado, salvo nos lugares onde tal isenção possa redundar em prejuízo do serviço normal do júri;
Xl - quando o requererem e o juiz reconhecer a necessidade da dispensa:
a) os médicos e os ministros de confissão religiosa;
b) os farmacêuticos e as parteiras.“
Sendo previsto ainda, pelo artigo acima transcrito a dispensa do jurado
quando o requererem e o juiz reconhecer a necessidade da dispensa: os médicos,
os ministros de confissão religiosa, os farmacêuticos e as parteiras.
Portanto, para o desempenho da função de jurado são exigidos
determinados pressupostos legais, que são: a) cidadania, vale dizer, somente o
brasileiro, nato ou naturalizado, pode atuar no Tribunal do Júri, excluído o
estrangeiro; b) idade igual ou superior a 21 anos e menor de 60; c) notória
idoneidade moral.
Sendo assim, o exercício efetivo da função de jurado constituirá serviço
público relevante, estabelecerá presunção de idoneidade.
São direitos dos jurados: a) Não sofrer nenhum desconto nos vencimentos
que perceba, nos dias de comparecimentos às sessões do Júri (art. 431, CPP); b)
permanecer em prisão especial, em caso de crime comum, até o julgamento
definitivo (art. 437, CPP); c) gozar de preferência, em igualdade de condições, nas
concorrências públicas (art. 437, CPP). Somente se conferem estes direitos àquele
que tenha servido efetivamente em julgamento do Júri.
São deveres dos jurados: a) Obedecer às intimações, só apresentando
escusas por justos motivos; b) comparecer às sessões para as quais for sorteado,
não se retirando antes da formação do conselho; c) declarar-se impedido, nos casos
legais e de consciência; d) conservar-se incomunicável desde o momento em que se
constitui o juiz, seja com os assistentes, seja com os funcionários do Tribunal,
podendo somente dirigir-se ao Juiz Presidente por ofício ou em voz alta perante o
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público; e) prestar o compromisso legal, com sinceridade e firmeza, mostrando
compreender a alta responsabilidade que assume; f) assistir atentamente aos
trabalhos do plenário, e requerer o que for conveniente para a elucidação do
processo; g) responder, mediante as formalidades legais, os quesitos propostos e
requerer algum outro que entenda de importância; h) proceder, enfim, com
circunspeção e critério; i) não deixar transparecer as impressões que sua
consciência for sofrendo, nem revelar o sigilo do veredictum; j) repetir, com igual
orgulho, tanto os elogios, como as censuras ao seu procedimento.
Não há que se discutir que, realmente, é uma função pública das mais
relevantes.
3.1.2 Mesários
No âmbito do processo eleitoral, temos os mesários, que desempenham
destacado papel e prestam também relevantes serviços à democracia. Apesar da
inovação tecnológica, dispondo hoje a Justiça Eleitoral da urna e da apuração
eletrônica, a importância dos aludidos colaboradores permanece amplamente
significativa.
O Código Eleitoral [17] estabelece, através dos artigos 119 e seguintes, de
forma detalhada, a composição e as atribuições das mesas receptoras das eleições.
Regulamenta o ritual dos trabalhos e as regras que norteiam suas atividades. A
legislação eleitoral confere ao juiz eleitoral e ao presidente da mesa receptora de
votos o exercício do poder de polícia.
Sendo o cidadão designado para exercer a função de mesário, há três
formas para que esta designação seja tornada sem efeito:
a) reconsideração da designação por parte do Juiz Eleitoral;
b) impugnação de seu nome;
c) alegação, pelo próprio mesário, de motivo justo.
A reconsideração ocorre quando o próprio Juiz Eleitoral cancela seu
despacho por ter tomado conhecimento de algum motivo que não recomende a
17[?] Lei Federal n° 4.737, de 15 de julho de 1965.
16
participação do mesário no processo eleitoral, com o objetivo de resguardar a lisura
do pleito.
A outra hipótese é a impugnação do mesário por partido político,
coligação, candidato ou pelo Ministério Público, fundada em algum motivo que
recomende ou impeça a atuação do designado como membro de Mesa Receptora
de votos (art. 121, § 1º, do Código Eleitoral).
Uma terceira hipótese ocorre quando algum motivo de força maior
recomende a exclusão do mesário ou quando existir algum dos impedimentos legais
acima especificados (art. 120 § 4º, do Código Eleitoral). Deve-se observar que para
haver a dispensa do mesário designado, o motivo por ele alegado deve ser justo e
plausível, como problemas de saúde física ou mental. O mesário não pode ser
dispensado por motivos banais ou infundados, como corriqueiramente é alegado
pelos designados. Nestes casos o Juiz Eleitoral deve manter a designação e alertar
ao mesário que o serviço eleitoral é obrigatório e a sua recusa ou abandono pode
ocasionar punição, como adiante se demonstrará neste trabalho.
Fora os casos acima elencados, o serviço de mesário é obrigatório e
sempre gratuito. Em caso de recusa ou abandono injustificado, o mesário faltoso
poderá ser punido administrativa e criminalmente.
Administrativamente a punição do mesário faltoso está prevista no artigo
124 do Código Eleitoral. Segundo este artigo, o membro da Mesa Receptora que
não comparecer no local, dia e hora determinados para a realização da eleição, sem
justa causa, incorrerá em multa eleitoral. Caso o mesário faltoso seja servidor
público ou autárquico, a pena será de suspensão do serviço por até 15 (quinze) dias.
Se, ante a ausência do mesário faltoso a Mesa Receptora de votos deixar de
funcionar, a multa será aplicada em dobro. Também será aplicada em dobro, caso o
abandono ocorra no curso da votação.
Já no âmbito penal, o art. 344 do Código Eleitoral determina: “Recusar ou
abandonar o serviço eleitoral sem justa causa: Pena - detenção até dois meses ou
pagamento de 90 a 120 dias-multa.” O presente tipo incide sobre a conduta do
cidadão que não aceita (recusa) ou tendo aceitado e iniciado a execução do serviço
eleitoral, afasta-se dele ou deixa-o sem completá-lo, o abandona.
17
São direitos dos mesários: a dispensa do serviço, mediante declaração
expedida pela Justiça Eleitoral, sem prejuízo do salário, vencimento ou qualquer
outra vantagem, pelo dobro dos dias trabalhados nas eleições, conforme art. 98, da
Lei 9.504/97 [18]; e a prerrogativa da utilização da prestação de serviços à Justiça
Eleitoral como critério de desempate em concurso público (desde que haja essa
previsão no Edital).
4. ATO ADMINISTRATIVO
Segundo Di Pietro [19], ato administrativo “é a declaração do Estado ou de
quem o represente, que produz efeitos jurídicos imediatos, com observância da lei,
sob regime jurídico de direito público e sujeita a controle pelo Poder Judiciário”.
Para Diogenes Gasparini [20], é “toda prescrição unilateral, juízo ou conhecimento,
predisposta à produção de efeitos jurídicos, expedida pelo Estado ou por quem lhe
faça as vezes, no exercício de suas prerrogativas e como parte interessada numa
relação, estabelecida na conformidade ou na compatibilidade da lei, sob o
fundamento de cumprir finalidades assinaladas no sistema normativo, sindicável
pelo Judiciário”.
Das duas definições dos ilustres administrativistas pátrios acima, podemos
extrair da primeira “declaração do Estado ou de quem o represente” e, da segunda
“expedida pelo Estado ou por quem lhe faça as vezes”, o que quer dizer que, no
caso, são os agentes que fazem a vontade do Estado. Assim, o mesário, no pleito
eleitoral, atua de forma administrativa para que a eleição, que é uma função do
Estado, transcorra dentro de uma legalidade e lisura no processo.
4.1 Elementos e/ou Requisitos do Ato Administrativo
Os elementos e/ou requisitos do ato administrativo há muito foram fixados
18[?] Os eleitores nomeados para compor as Mesas Receptoras ou Juntas Eleitorais e os requisitados para auxiliar seus trabalhos serão dispensados do serviço, mediante declaração expedida pela Justiça Eleitoral, sem prejuízo do salário, vencimento ou qualquer outra vantagem, pelo dobro dos dias de convocação.
19[?] Direito administrativo, 19 ed., São Paulo: Atlas, 2006, p. 206.20[?] Direito administrativo, 11 ed., São Paulo: Saraiva, 2006, p. 61.
18
pelo labor doutrinário e jurisprudencial, encontrando-se positivados no art. 2º da Lei
nº 4.717/65, que, ao tratar da nulidade dos atos administrativos, assim dispõe: "são
nulos os atos lesivos ao patrimônio..., nos casos de: a) incompetência; b) vício de
forma; c) ilegalidade do objeto; d) inexistência de motivos; e) desvio de finalidade”.
A doutrina, seguindo o preceito legal, assim elenca os elementos e/ou
requisitos do ato administrativo: competência (ou agente competente); forma; objeto;
motivo; e finalidade. Ao final, dá a seguinte noção:
a) Competência - a outorga constitucional ou legal de certa quantidade de poder a
determinado agente, órgão ou pessoa jurídica denomina-se, em termos jurídicos,
competência. Um ato administrativo somente é valido quando praticado por quem
tenha competência para tanto, e nos exatos limites que a regra fixadora de
competência o permite.
b) Forma - em sentido amplo, significa o modo de exteriorização do conteúdo das
deliberações administrativas. É o revestimento exterior do ato. É a maneira como ele
se apresenta, palpável e visualmente, no mundo jurídico.
c) Objeto - é o próprio conteúdo do ato administrativo, o que ele prescreve ou
dispõe. Ou seja, é a declaração constante do ato, o resultado prático pretendido com
a sua edição, a modificação por ele introduzida no ordenamento jurídico. Importa,
em atenção ao próprio princípio da legalidade, que o objeto do ato seja lícito. Em
razão do princípio da segurança das relações jurídicas, exigência fundamental no
trato dos negócios públicos, o conteúdo do ato administrativo deve ser não somente
lícito, mas também certo, determinado, claro, preciso e juridicamente possível.
d) Motivo - Por motivo, deve-se entender, no âmbito do Direito Administrativo, os
pressupostos objetivos do ato, as circunstâncias de fato ou de direito, sempre de
natureza objetiva, que autorizam o desencadeamento de determinado ato.
e) Finalidade - Trata-se, aqui, do objetivo de interesse público a ser atingido pelo ato
administrativo, conforme disposição expressa ou implícita prevista em lei. Noutras
palavras, é aquele interesse público específico cuja realização prática e efetiva a lei
objetiva ao conceder ao sujeito público certa autoridade, instrumentalizada com
poderes para agir.
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5. CONCLUSÃO
A partir do momento em que se contrata alguém para a realização de uma
tarefa, assume-se, para com essa pessoa, as obrigações de contratante, e ela, as
de contratado. Quanto a isso, não resta nenhuma dúvida. É a obrigação contratual.
Mas se, por exemplo, por causa do cumprimento dessa obrigação, adveio um dano,
alheio ao contrato, há que se reparar esse dano. É a responsabilidade
extracontratual. E quem é que tem que repará-lo? O causador do dano, seria óbvio
dizer. Ocorre que existem situações nas quais precisa alguém obter reparação do
dano sofrido sem que haja a quem se possa atribuir a responsabilidade do fato
danoso, no sentido genuíno da palavra, mas a quem, por outras razões, se pode
determinar a obrigação de ressarci-lo. É estender o conceito de responsabilidade até
aos casos em que o dano resulta da prática de ato lícito.
Sabemos que a configuração da responsabilidade civil extracontratual
exige a soma: culpa do agente, o dano e o nexo de causalidade.
Assim, se o Estado convoca alguém para atuar no Conselho de Sentença
do Tribunal do Júri, ele está subordinado hierarquicamente ao Juiz Presidente
daquele Conselho; se o Estado convoca alguém para lhe servir como mesário num
dia de eleição, ele está “a serviço da Justiça Eleitoral”. Se, ao prestar esse serviço,
ele sofre um dano, é justo que o Estado por ele se responsabilize. O Estado sabe
que, ao colocar um particular para em seu nome atuar, outorgando a ele poderes e
atribuições, corre o risco inerente à atividade e ao que lhe cerca. Senão, vejamos:
aquele mesário que é deslocado de seu domicílio para ir trabalhar numa seção
eleitoral na zona rural do município, corre um risco de sofrer um acidente de trânsito,
que é inerente à atividade, já que será obrigatório o deslocamento. É uma
excepcionalidade, mas ocorre. Também o jurado que, ao ter seu nome divulgado
numa lista, ou, até mesmo durante o julgamento, passa a sofrer pressão psicológica
por parte daqueles interessados na absolvição do réu – alguns chegam a receber
ameaças antes, durante e depois do julgamento, sendo que, às vezes, passam da
simples ameaça para a execução. Também é uma excepcionalidade, mas ocorre.
Se o Estado não tem para com esses agentes nenhum vínculo trabalhista
ou previdenciário - e reconhecemos que não tem -, ainda assim, não custa trazer
aqui, à guisa de exemplo, o que dispõe a Lei 8.112/90, que vem a ser o Estatuto dos
Servidores Públicos Civis da União:
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“Art. 212. Configura acidente em serviço o dano físico ou mental sofrido pelo servidor, que se relacione, mediata ou imediatamente, com as atribuições do cargo exercido.
Parágrafo único. Equipara-se ao acidente em serviço o dano:
I - decorrente de agressão sofrida e não provocada pelo servidor no exercício do cargo;
II - sofrido no percurso da residência para o trabalho e vice-versa.
Art. 213. O servidor acidentado em serviço que necessite de tratamento especializado poderá ser tratado em instituição privada, à conta de recursos públicos.
Parágrafo único. O tratamento recomendado por junta médica oficial constitui medida de exceção e somente será admissível quando inexistirem meios e recursos adequados em instituição pública” (Grifos nossos).
Se há um amparo para o seu servidor estatutário, é porque ele sabe que,
no exercício de uma função pública, haverá sempre um risco, mesmo que a
atividade em si não seja de alto risco, ou perigosa, no próprio deslocamento da
residência para o trabalho ou deste para a residência, há o risco de um acidente. O
Estado não pode fazer “vistas grossas”, ele não é desconhecedor da situação. Desta
forma, aquele que foi convocado para atuar no Tribunal do Júri ou nas Mesas
eleitorais, ao sair de casa para comparecer perante um ou outro atendendo à
convocação, caso sofra um acidente de percurso, também estará amparado pelo
Estado, que o convocou.
Seria injusto deixar desamparado essa vítima ou imputar esse ônus à
empresa ou órgão onde ela trabalha. Sim, porque, no caso de um afastamento por
prazo superior a 15 dias, a empresa é quem ficará com o encargo de, nos 15
primeiros dias, arcar com o pagamento desse seu funcionário afastado e, se for
servidor público que contribua para um Regime Próprio de Previdência Social, este é
quem arcará por todo o período.
Não importa aqui a caracterização de vínculo empregatício, nem mesmo
previdenciário. Estamos tratando de um vínculo eventual que se deu porque o
Estado o criou e motivou. No nosso entender, cabe sim, a responsabilização
extracontratual do Estado, objetivamente, pela culpa aquiliana.
Afinal, a responsabilidade civil é a obrigação que incumbe o agente de
reparar o prejuízo causado por fato próprio, ou por fato de pessoas ou coisas que
dele estejam juridicamente dependentes.
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atual. e ampl,, São Paulo: Malheiros, 2001.
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2006.
DINIZ, Maria Helena. Curso de Direito Civil Brasileiro – Responsabilidade Civil. São
Paulo: Saraiva, 2001. v. 7.
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VENOSA, Silvio de Salvo. Direito Civil – Contratos em Espécie e Responsabilidade
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7. NOTAS
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