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TEXTO PARA DISCUSSÃO Nº 10
ALCANCE E LIMITES DAS FINANÇAS DE PROXIMIDADE NO CO MBATE À
INADIMPLÊNCIA: O CASO DO AGROAMIGO
Ricardo Abramovay*
São Paulo, abril de 2008
* Professor Titular da FEA/USP, pesquisador do CNPq. www.econ.fea.usp.br/abramovay/
Textos para Discussão FIPE nº 10
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ÍNDICE
1. APRESENTAÇÃO _________________________________________________________ 2
2. AMBIENTE INSTITUCIONAL E FINANÇAS DE PROXIMIDADE_________________ 5
2.1. O CARÁTER ENDÓGENO DAS INSTITUIÇÕES_____________________________________ 5
2.2. VIRTUDES E PERIGOS DOS LAÇOS PESSOAIS_____________________________________ 6
3. UM SISTEMA DE CRÉDITO CRIADO PELO ESTADO__________________________ 10
3.1. SOLUÇÃO ADMINISTRATIVA AO PROBLEMA DA SELEÇÃO DOS CLIENTES_____________ 10
3.2. GARANTIA ESTATAL E TECNOLOGIAS DE EMPRÉSTIMO___________________________ 14
3.3. A AMEAÇA DA INADIMPLÊNCIA _____________________________________________ 17
4. O AGROAMIGO __________________________________________________________ 24
5. CONCLUSÕES ___________________________________________________________ 31
REFERÊNCIAS________________________________________________________________ 35
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Resumo: É notável a expansão do crédito rural voltado a famílias pobres, sobretudo no
Brasil, desde o início dos anos 200. O Programa Nacional de Fortalecimento da
Agricultura Familiar (PRONAF) conseguiu fazer chegar financiamentos a mais de 2
milhões de famílias (num universo de cerca de 4,2 milhões de unidades familiares de
produção), das quais a metade vive próximo à linha de pobreza. Neste segmento de maior
pobreza, correspondente a uma linha específica, chamada de PRONAF B, a inadimplência
é, entretanto, preocupante. O artigo discute as razões que explicam os atrasos no
pagamento e, sobretudo, expõe as novas políticas que pretendem modificar este quadro. O
trabalho se apóia na idéia de self-enforcing institutions (Greif, 2004 e 2005) para explicar
o imenso potencial da introdução de novas tecnologias de empréstimo baseadas no vínculo
personalizado entre o assessor de crédito e o agricultor. Ao mesmo tempo, ele se apóia na
nova economia institucional para mostrar que na ausência de uma clara sinalização de
que a inadimplência será rigorosamente punida, dificilmente estas novas tecnologias
poderão realizar os efeitos tão promissores que delas se pode esperar.
JEL: G21; Q14; Q 18; Z13
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1. APRESENTAÇÃO
O Brasil é hoje o único país em que bancos pertencentes ao Estado fazem empréstimos a
agricultores pobres, não apenas com base em recursos do Tesouro e apoiados em
importantes subsídios, mas isentando as organizações financeiras de qualquer risco.
Subsídios nas taxas de juros são praticados de forma mais ou menos freqüente em diversos
programas da União Européia, da África (Ouédraogo, 2007), em países asiáticos (Jain e
Moore, 2003; Martowijoyo, 2007), além de outras nações latino-americanas (Trivelli e
Venero, 2007). Bancos estatais estão presentes de maneira massiva nas atribuições de
crédito na Índia (Flandrin le Maire e Fontagné, 2007) e na Indonésia (Gremaud e Toneto,
2003). Esta presença pode ser direta ou por meio do repasse de recursos públicos a
organizações não governamentais, como ocorre na Índia (Guérin e Kumar, 2007). Mas o
Brasil é o único caso em que, além de se apoiar em fundos públicos e em recursos do
Tesouro, os empréstimos são concedidos com base na garantia de que o Estado cobrirá os
prejuízos decorrentes de seu eventual não pagamento.
O resultado é que pela primeira vez em sua história, a partir do ano 2000, populações rurais
desprovidas de patrimônio e garantias bancárias, nas localidades mais pobres do País,
tiveram, de forma massificada, acesso ao crédito. Dos 4,2 milhões de agricultores
familiares brasileiros, cerca de 2 milhões recebem financiamentos bancários. Destes, quase
metade inclui-se entre os segmentos mais pobres do setor. Estes dados contrastam com a
constatação mais ou menos generalizada na literatura que mostra a imensa dificuldade de
fazer chegar empréstimos a populações pobres, mesmo em países asiáticos em que o
microcrédito se desenvolveu muito nos últimos anos (Meyer, 2007). A contrapartida desta
massificação, porém, no caso brasileiro, é um preocupante e crescente nível de
inadimplência neste tipo de financiamento com um terço das operações voltadas ao público
mais pobre do programa – o chamado PRONAF B, basicamente no Nordeste do Brasil –
em atraso, ao final de 2007.
A literatura recente sobre o papel do Estado no acesso dos pobres rurais ao crédito pode ser
dividida em dois grandes blocos. Por um lado, encontra-se a chamada escola de Ohio
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segundo a qual existe hoje um “novo paradigma” das microfinanças rurais, que muda a
própria definição do problema do acesso ao crédito: o objetivo hoje não seria mais a
intervenção do Estado para corrigir falhas de mercado, mas sim de reduzir os riscos e os
custos de transação, por meio do maior envolvimento de organizações privadas e
associativas na intermediação financeira (Meyer, 2007). O essencial, neste novo paradigma,
é a sustentabilidade das organizações financeiras voltadas às necessidades dos pobres
(Schreiner e Yaron, 2001, Zeller e Meyer, 2002, Zeller, 2003).
Há, entretanto outra vertente da literatura, cética com relação à possibilidade real de a
liberalização dos mercados e um ambiente macroeconômico propício produzirem
organizações financeiras que beneficiem quem se encontra na base da pirâmide social. Esta
é, por exemplo, uma das mensagens centrais do relatório do Banco Mundial de 2007,
Equity and Development (World Bank, 2006). Bath e Tang (2001), por sua vez, contrariam
a idéia de que haveria um paradigma a ser seguido, um formato único capaz de contemplar
de maneira geral o que deveria ser uma organização voltada a oferecer crédito aos pobres
do meio rural. Jain e Moore (2003) duvidam que seja possível realmente chegar aos mais
pobres na ausência de subsídios ao trabalho das organizações. Embora Trivelli e Venero
(2007:24 e 55) reconheçam as novas visões que procuram articular os esforços do Estado
com os atores privados e o uso de mecanismos de mercado na atribuição do crédito
constatam, ao mesmo tempo, que, na América Latina, “a ausência ou a retirada das
entidades públicas dos sistemas financeiros rurais não foi capaz de expandir a oferta
privada de fundos no meio rural”.
Quais as razões da tão importante inadimplência da linha de crédito governamental
atribuída a agricultores brasileiros mais pobres com base em garantias oferecidas pelo
Tesouro Público? É possível reduzir esta inadimplência de forma consistente sem renunciar
à política que oferece recursos subsidiados, a partir de bancos comerciais pertencentes ao
Estado e na ausência de risco bancário?
A hipótese central deste trabalho é que os atrasos no pagamento não se devem ao fato de o
Estado garantir os créditos: é claro que se houvesse risco bancário, a inadimplência seria
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muito menor, como o provam os exemplos dos financiamentos a segmentos mais prósperos
da agricultura familiar no Brasil. Mas dificilmente o crédito chegaria a quantidade tão
ampla de agricultores. A inadimplência se deve – é o que este trabalho tenta provar - a dois
fatores centrais: em primeiro lugar, à inexistência, até muito recentemente, de tecnologias
de empréstimo que valorizem o papel do agente de crédito, ou seja, à maneira burocrática
como o crédito foi concedido aos agricultores. Além disso, a inadimplência é estimulada
pelo sentimento de que os indivíduos e os grupos sociais não correm qualquer risco diante
do não pagamento de suas dívidas e à expectativa – cultivada, de maneira freqüente por
lideranças locais - de que esta será renegociada ou até anistiada.
Estas hipóteses conduzem à perspectiva de que melhores tecnologias de empréstimo –
como as que começam a ser aplicadas desde 2005 - podem reduzir significativamente os
não pagamentos, desde que os agricultores endividados recebam claro sinal de que haverá
punições caso se inscrevam num horizonte de perpetuação de suas dívidas. Há uma forte
tensão entre os dois componentes da hipótese central deste trabalho: a ausência de boas
tecnologias de empréstimo para este público associa-se à institucionalização do crédito
como um direito social em que os mecanismos para garantir o recebimento do dinheiro são
mais importantes que aqueles que asseguram a devolução do empréstimo pelo produtor.
Introduzir tecnologias de proximidade exige, portanto alteração no ambiente institucional
que legitima o não pagamento das dívidas.
A segunda parte do texto expõe seus fundamentos teóricos. A parte três apresenta as
principais informações sobre a inadimplência e a quarta apresenta as tecnologias de
empréstimos que procuram superar os problemas atuais, bem como as medidas
governamentais para conduzir os agricultores ao pagamento das dívidas acumuladas.
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2. AMBIENTE INSTITUCIONAL E FINANÇAS DE PROXIMIDADE
2.1. O CARÁTER ENDÓGENO DAS INSTITUIÇÕES
O sistema de crédito é uma construção institucional que repousa sobre três pilares básicos –
informação, confiança e capacidade de fazer cumprir contratos (enforcement) – e cuja
reprodução passa por redes sociais que podem ser estudadas empiricamente. Avner Greif
(2004:1) insiste na importância dos micro mecanismos subjacentes a diferentes sistemas de
crédito. Seu trabalho vai realçar não tanto os elementos exteriores capazes de evitar
condutas inadequadas (Estado, justiça, punições econômicas), mas aquilo que chamou de
instituições “self-enforcing” (Greif 2005). Greif reconhece, é claro, a contribuição
intelectual da nova economia institucional, com sua ênfase nos direitos de propriedade
(Coase, 1960), nas regras do jogo capazes de defini-los (North, 1990), nas bases contratuais
que permitem explorar seus benefícios e no tipo de organização econômica necessária a sua
aplicação (Williamson, 2000). No nosso caso, por exemplo, a economia institucional
enfatizaria os mecanismos que transmitem aos atores a clara mensagem de que um
empréstimo apóia-se sobre regras – das quais a mais importante é a devolução pontual dos
recursos – cujo não cumprimento traz prejuízos econômicos, além de reprovação social.
Avner Greif procura, no entanto, dar um passo além deste horizonte: os indivíduos não
seguem regras apenas por medo de punição, mas devem estar basicamente motivados a
fazê-lo: “Por que certas regras comportamentais são seguidas e outras não? Regras são
instruções comportamentais que podem ser ignoradas, o que implica que o impacto de
qualquer regra prescritiva depende da motivação dos indivíduos a segui-la” (Greif, 2004:
3). A convergência com diversas correntes da sociologia é explicitamente enfatizada por
Greif (2004): da mesma forma que Mark Granovetter (1985) ou Neil Fligstein (2001), Greif
estuda as instituições não apenas como modalidades coercitivas, funcionais ou eficientes na
explicação dos comportamentos e sim como reflexo das interdependências entre os
indivíduos em interação.
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No horizonte institucionalista, a redução da inadimplência passaria, basicamente, pela
formulação e pela aplicação de leis e medidas que punissem os indivíduos em caso de não
pagamento. Mais que isso: o horizonte institucionalista tende a concluir que o
envolvimento do Estado nas operações de empréstimo aos mais pobres cria
comportamentos “rent-secking” por parte de indivíduos e grupos sociais, gera interesses no
corpo burocrático governamental em usar o crédito como moeda de troca política e impede
que os financiamentos respondam a qualquer parâmetro de racionalidade econômica
(Adams et al. 1992).
Os estudos da sociologia econômica e o trabalho de Avner Greif em torno das instituições
“self-enforcing” inscrevem-se em outra perspectiva. Não há dúvida que os sinais exteriores
representados pelas leis e pelas regras sociais são decisivos. É certo também que a presença
do Estado é uma ameaça constante à racionalidade de qualquer programa de crédito em
virtude da possibilidade de utilização política dos financiamentos e da inibição ao
surgimento de intermediários privados e associativos. O que faz falta ao horizonte
institucionalista, porém, é a análise tanto das motivações (Greif, 2005) como das redes
sociais em que se inserem os comportamentos dos indivíduos.
2.2. VIRTUDES E PERIGOS DOS LAÇOS PESSOAIS
Independentemente das tecnologias adotadas – bancos da comunidade, grupos solidários ou
empréstimos individuais (Canales, 2005:7) – o traço fundamental das organizações
contemporâneas de microfinanças é a utilização de redes sociais e vínculos personalizados
como elementos decisivos de obtenção de informações e construção da confiança
necessária ao seu funcionamento. Mesmo quando, no caso dos ou village banks, os grupos
são formados especialmente com a finalidade de obter empréstimos, realizar poupança e
apoiar financeiramente as atividades econômicas das famílias, eles só funcionam quando se
baseiam no conhecimento real que os indivíduos têm uns dos outros e quando suas regras
são interiorizadas como legítimas por seus participantes (Ghatak, 1999, Westley, 2004).
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É bem verdade – como bem o mostra o importante trabalho crítico de Ana Marr (2004) -
que o nível de informação dos participantes de um banco da comunidade a respeito dos
negócios dos outros é relativamente baixo, já que o custo de transação para obter dados
precisos a este respeito é elevado. Marr (2004) é particularmente cética com relação à real
capacidade de as redes sociais em que se inserem os bancos da comunidade conseguirem
oferecer as informações necessárias para o funcionamento de um sistema de crédito. O
trabalho de Marr (2004) se insurge contra a visão ingênua e romântica que faz da
“comunidade” uma realidade homogênea, sem contradições e de onde o poder e a
desigualdade estão ausentes. Os bancos da comunidade por ela estudados no Peru são uma
espécie de reprodução da estrutura social em que se inserem e neste sentido acabam
produzindo efeitos não antecipados muito graves como a imensa pressão para que os mais
pobres se endividem em fontes informais para pagar os empréstimos contraídos o que
acaba, ao final de certo tempo, por excluí-los da atividade.
Mas será que o clientelismo, a ausência de racionalidade econômica na atribuição dos
empréstimos e a dominação sofrida pelos mais pobres que Ana Marr constatou em seu
trabalho são inerentes às finanças de proximidade? A personalização dos vínculos sociais,
própria à formação destes mercados, sua imersão em redes que não se limitam ao
anonimato das relações de mercado conduzem, necessariamente, à contrapartida de limitar
ainda mais as liberdades dos indivíduos que delas fazem parte?
É claro que a resposta a estas perguntas passa, em grande parte, pelo estudo do contexto em
que as organizações vão operar e especialmente pelo ambiente institucional existente, tal
como a nova economia institucional o concebe. Mas o formato institucional das
organizações e, particularmente, o papel do agente de crédito, bem como a natureza dos
incentivos a partir dos quais trabalha são essenciais. Vejamos a questão mais de perto.
É surpreendentemente escassa a literatura sobre a figura do agente de crédito nas
organizações contemporâneas de microfinanças (Canales, 2005:6). Ela pode ser dividida
em duas vertentes básicas. Por um lado, há autores que estudam sua atuação com base
fundamentalmente na teoria da agência. É o caso de Fuentes (1996), de Aubert et al.
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(2002) e de Armendariz de Aghion e Murdoch (2005). O ponto de partida destes trabalhos é
a constatação correta de que existem atores locais (em geral pequenos comerciantes) que,
independentemente da existência de organizações de microfinanças, operam regularmente
com populações pobres (Harriss-White, Abramovay, 2004, Dias e Diniz, 2004, Von
Bastelaer, 1999, Timberg e Aiyar, 1984). Caso estes pequenos comerciantes trabalhassem
para um banco ou uma organização de microfinanças seriam capazes de recuperar os
empréstimos que realizam – tanto quanto o são quando se trata de emprestar seu próprio
dinheiro? Quais seriam as melhores modalidades de remuneração para evitar o conluio
(collusion) entre o agente de crédito e os clientes da organização? É preferível que os
agentes de crédito recebam um salário fixo, uma comissão sobre a qualidade da carteira ou
uma mistura entre estas duas modalidades de remuneração? Mas a teoria da agência vai
além das técnicas e das modalidades contratuais para a recuperação dos empréstimos, já
que os objetivos do banco ou da organização de microfinanças (o principal) envolvem
também dimensões sociais como, por exemplo, fazer com que os recursos cheguem às
mulheres ou aos mais pobres. Além disso, os próprios métodos de cobrança dos recursos
emprestados são importantes para a vida da organização financeira. Fuentes (1996) constrói
um modelo em que o agente de crédito pertence à comunidade (como será o caso também
da tecnologia de empréstimo recentemente implantada pelo Banco do Nordeste – BNB -
nos empréstimos a camadas mais pobres de agricultores e exposta na parte 4 deste trabalho)
e, com isso, detém informações que dificilmente alguém de fora seria capaz de reunir. Em
suma, a literatura baseada na teoria da agência discute a atuação dos agentes de crédito a
partir de suas diferentes modalidades de remuneração (incluindo aí explicitamente a
possibilidade de que parte dos ganhos dos funcionários venha de pagamentos não
declarados que lhes seriam feitos por clientes – Aubert et al, 2002), com ênfase, portanto,
no desenho dos contratos que vão reger o que fazem.
Outra vertente da literatura coloca acento na dimensão sociológica da relação entre o agente
de crédito e a população junto à qual ele trabalha. Sua principal virtude, para o que aqui nos
interessa, é que fortalece o caráter endógeno das instituições (Greif, 2005) e coloca as
motivações dos indivíduos no interior das redes sociais em que se inserem. Danielle Guérin
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e Santosh Kumar (2007:4), por exemplo, criticam as abordagens do tema baseadas na teoria
da agência por fazerem do agente de crédito uma espécie de marionete desenraizada
socialmente. Seu trabalho procura mostrar que os agentes de crédito não são apenas
indivíduos auto-interessados atuando em nome de um principal e regidos por um contrato.
É bem verdade que parte da pesquisa recente fortalece a opinião de Ana Marr (2004), acima
citada, segundo a qual os laços de proximidade próprios às microfinanças e o tipo de
intermediação em que elas se apóiam dificilmente conseguem superar a propensão ao
clientelismo e às formas personalizadas de dominação social Este não é, entretanto, o ponto
de vista de Canales (2005), em seu estudo sobre três organizações de microfinanças
mexicanas. Ele mostra como os laços informais e a ligação afetiva entre clientes e agente de
crédito permitem não apenas melhor conhecimento por parte deste último da situação local
em que atua, mas também lhe oferecem poderosos instrumentos de pressão para aumentar
as probabilidades de reembolso. Os agentes de crédito não são apenas cumpridores de
determinações vindas das organizações a que pertencem: eles têm significativa margem de
liberdade nas decisões que tomam.
Os trabalhos de Michel Ferrary vão também na mesma direção. Mesmo organizações
formais como os bancos parisienses apóiam-se em sistemas de proximidade e na
construção, por parte dos gerentes, de vínculos personalizados com o meio social da
clientela onde atuam. Canales (2005) mostra que há agentes de crédito que seguem “a letra
da lei – evitando vínculos pessoais com os clientes – ao contrário de outros que aplicam o
“espírito da lei” e cujo desempenho está ligado a sua proximidade dos clientes”. A
obrigação moral de devolver os recursos emprestados não é genérica e impessoal, mas se
insere em relações personalizadas, tanto no caso do crédito aos desempregados na França
(Ferrary, 2006), nos empréstimos formais feitos por bancos (Ferrary, 2003), como nas
organizações de microfinanças estudadas por Canales (2005) no México.
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3. UM SISTEMA DE CRÉDITO CRIADO PELO ESTADO
3.1. SOLUÇÃO ADMINISTRATIVA AO PROBLEMA DA SELEÇÃO DOS CLIENTES
Os mercados financeiros rurais latino-americanos são segmentados, pouco dinâmicos, não
competitivos e ineficientes (Trivelli e Venero, 2007, Wenner et al., 2002). Esta
precariedade, no Brasil, é agravada pela escassa tradição histórica de grupos financeiros
informais no meio rural. É verdade que a “venda na palha” no Nordeste, (Garcia, 1983,
Abramovay, 2008), o “regatão” no Norte (referência) e a “caderneta do colono” no Sudeste
e no Sul (modalidades de financiamento do consumo familiar dos agricultores contra algum
tipo de garantia de aquisição da safra) foram muito comuns até, no mínimo, o início dos
anos 1970. Mas não se formou no Brasil nada que se compare à densidade das finanças
informais na Indonésia - em que milhões de “arisan” (grupos de crédito rotativo) existem
até hoje (Martowijoyo, 2007:6) - ou no México, que possui uma longa e variada tradição
histórica de instituições locais que estão na origem de organizações contemporâneas como
as cajas populares, as cooperativas de poupança e crédito ou as redes de micro bancos
(Gómez Soto e Gonzáles Vega, 2006, Muñoz Rodríguez et al. 2002).
Esta circunstância histórica se explica, ao menos parcialmente, pela proibição formal, desde
1967, de organizações financeiras que captassem poupança do público e que não fossem
rigidamente controladas pelo Banco Central do Brasil. A instabilidade financeira e a
inflação que acompanharam a vida nacional até meados dos anos 1990 são fatores que
bloquearam o surgimento de organizações financeiras associativas em larga escala no País,
seja no meio urbano seja no meio rural. Por fim, é importante assinalar que o próprio setor
agrícola patronal brasileiro sempre foi financiado (desde a fundação do Banco do Brasil na
primeira metade do Século XIX) por bancos pertencentes ao Estado, o que, é claro, limita a
formação de um sistema privado voltado a esta finalidade.
É neste contexto que foi formado, sob intensa pressão do Movimento Sindical de
Trabalhadores Rurais, o Programa Nacional de Fortalecimento da Agricultura Familiar
(PRONAF), em 1995. Ele tem o objetivo explícito de romper com a marca dominante das
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políticas agrícolas brasileiras até então: a sistemática transferência de recursos públicos
subsidiados basicamente a grandes proprietários, ou, quando muito, àquelas camadas mais
prósperas da agricultura familiar, situadas no Sul do País e altamente integradas à
agroindústria. Optar por uma solução que se apoiasse em atores privados ou associativos
para fazer chegar o crédito aos mais pobres – como o preconizam os adeptos do “novo
paradigma das microfinanças rurais” - poderia ser teoricamente mais interessante, mas
certamente não responderia à importante pressão política que se fazia nesta direção no
início dos anos 1990 e envolvia o risco mais que provável de pura e simples paralisia.
O PRONAF enfrenta dois desafios básicos que serão decisivos para sua evolução
institucional:
a) Embora o programa se apóie em recursos públicos ele é levado adiante por bancos
comerciais (1). Existe, portanto, desde o início, uma tensão entre o objetivo de
ampliar a base social da política de crédito e as necessidades bancárias de obtenção
de informações e garantias capazes de reduzir os riscos de inadimplência.
b) O Programa visa corrigir uma distorção histórica da política de crédito rural,
permitindo que os recursos cheguem a milhões de famílias que até então a eles não
tinham acesso. Mas estas famílias teriam que ser selecionadas evitando que grandes
proprietários, profissionais liberais ou assalariados de alta renda do interior do País,
que possuíssem um sítio de recreio, pudessem ser caracterizados como “agricultores
familiares”. Na verdade, a seleção dos clientes é um dos mais importantes desafios
de qualquer organização e de qualquer programa de crédito. O que está em jogo
nesta seleção são mecanismos de transmissão de informação entre tomadores de
1 Alvarado et al. (2002:14) mostram a tendência geral de que os bancos estatais, durante os anos 1990, passem a reger-se segundo as regras dos bancos comerciais. O Banco do Nordeste é, antes de tudo, um banco de desenvolvimento: 90% de sua carteira é formada por crédito de longo prazo. Mas, suas operações comerciais sujeitam-se às regras prudenciais em vigor no sistema bancário e submetem-se às orientações dos Acordos de Basiléia.
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recursos e os que os emprestam (2). Nas organizações de microfinanças, o desafio
de localizar o cliente com as características do público almejado é resolvido, quase
sempre, por meio de relações sociais diretas seja entre os participantes dos
programas, como os grupos solidários (Cassar et al., 2007, Ritchie, 2007), seja por
meio da inserção local do próprio agente de crédito (Canales, 2005), como foi visto
acima, no item 2.2. No caso brasileiro, este desafio foi enfrentado pelo apelo à
participação de organizações locais, como o movimento sindical de trabalhadores
rurais e as organizações estaduais de assistência técnica e extensão rural (3). Estas
organizações são fortemente inseridas localmente. No entanto, sua capacidade de
selecionar clientes é extremamente limitada. O que elas podiam fazer – e fizeram –
é eliminar aqueles que não pertenciam ao público potencial do programa e oferecer
algum auxílio administrativo para facilitar o preenchimento de formulários,
reduzindo os custos bancários na administração do programa. O que elas não
podiam fazer é selecionar clientes pela qualidade de seus projetos ou pelo
conhecimento individualizado de cada tomador e por sua disposição a devolver
no prazo os recursos tomados. Este segundo desafio envolve, portanto, uma tensão
entre o crédito como resultado de informações que fazem parte de um contrato
capaz de reduzir os riscos de ambos os lados e o crédito como puro e simples
direito social, cuja atribuição se faz de maneira massiva e onde a noção de risco
fica quase excluída.
Este duplo desafio (bancos comerciais e de desenvolvimento pertencentes ao Estado,
conduzidos a atender um público que não faz parte de sua clientela, por um lado, e clientes
2 Os professores Alain de Janvry e Elizabeth Sadoulet da Universidade da Califórnia (Berkeley) conduziram um projeto de pesquisa sobre informações de crédito (BASIS/USAID). Ver, por exemplo, McIntosh e Wydick (2004) e Bittencourt et al. (2006), elaborado especialmente para o projeto BASIS/USAID. 3 Na esmagadora maioria das vezes, a assistência técnica não levava adiante práticas que permitissem atenuar a escassez de meios técnicos do agricultor com orientações organizativas que melhorassem o exercício de suas atividades. A extensão atuava fundamentalmente como um elo na cadeia administrativa que levava à concessão do crédito e não como organismo de melhoria das técnicas produtivas, organizativas e de comercialização.
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selecionados por suas características sócio-econômicas e não pela qualidade de seus
projetos ou por sua disposição de pagamento, por outro) foi enfrentado basicamente de duas
maneiras. Os bancos estatais passaram a receber diretamente do Tesouro recompensa por
trabalharem com o público do PRONAF (Bittencourt, 2003). Além disso, em muitos
municípios foram constituídos fundos de aval a partir dos recursos do próprio PRONAF
(Parente, 2003) e que serviriam de garantia ao banco em caso de não pagamento. Quanto à
seleção do público do Programa, foi criada a Declaração de Aptidão ao PRONAF (DAP),
documento emitido seja pelo sindicato local, pelo escritório local de extensão rural ou
outras organizações credenciadas pelo Ministério do Desenvolvimento Agrário capazes de
atestar que o agricultor realmente correspondia ao que era definido como o público do
programa pela política governamental (4).
A pergunta básica na construção de qualquer organização financeira – como montar um
sistema de informações capaz de selecionar os clientes dotados dos melhores projetos e das
melhores condições de pagamento – recebeu, no âmbito do PRONAF, uma resposta
político-administrativa . Isso significa que o temor – tão freqüente na literatura de
microfinanças - de captura dos subsídios embutidos no PRONAF por segmentos sociais não
visados pela política foi evitado por controles administrativos com forte base local. A
contrapartida desta garantia é que o crédito passa a ser visto e vivido pelos atores como
direito de certo grupo social e não se colocam em funcionamento mecanismos que possam
selecionar, no interior deste grupo social, os que realmente podem corresponder ao que
deles pode esperar uma organização financeira.
Nestas condições é óbvia, no início do Programa, a resistência dos bancos estatais a ampliar
de fato seu público. É bem verdade que no final de 1996, o PRONAF já atinge mais de 300
mil agricultores e em 1997 quase dobra de tamanho. Mas, apesar de sua extensão o
4 Uma vez que o acesso ao PRONAF envolve subsídios públicos, todos os agricultores com Declaração de Aptidão ao PRONAF estão listados nominalmente com acesso público pela internet, por município (http://smap.mda.gov.br/credito/dap/dap.asp): é uma forma de evitar que recebam os recursos indivíduos que não fazem parte do público alvo do Programa. A definição legal da DAP e as organizações que podem emiti-las estão em http://www.mda.gov.br/saf/index.php?sccid=697.
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PRONAF revela, neste seu início, uma tríplice concentração: são financiados de forma
esmagadoramente majoritária agricultores do Sul do Brasil, entre estes, os que se dedicam
aos produtos de maior integração agroindustrial e, em grande medida, segmentos mais
prósperos da agricultura familiar (Abramovay e Veiga, 1999).
Nestas condições, a agenda da política agrícola passa a ser fortemente pressionada por
amplo leque de movimentos sociais (aí não mais apenas o Movimento Sindical de
Trabalhadores Rurais, mas também o Movimento dos Pequenos Agricultores, ligado ao
Movimento dos Trabalhadores Rurais sem Terra) visando maior democratização do crédito.
Quando da vinda ao Brasil do Papa João Paulo II, em 1997, um grupo de agricultores,
ligados ao Movimento dos Pequenos Agricultores entra em greve de fome, é recebido pelo
Papa e, daí resulta uma transformação decisiva na própria lógica do PRONAF, a partir de
1999, durante o segundo mandato de Fernando Henrique Cardoso.
3.2. GARANTIA ESTATAL E TECNOLOGIAS DE EMPRÉSTIMO
O caminho encontrado para ampliar de maneira rápida o público do PRONAF foi a criação
de uma vertente em seu interior, voltada especialmente a populações vivendo próximo à
linha de pobreza (5).Hoje, o atendimento aos segmentos que se encontram na base da
pirâmide social da agricultura familiar (o PRONAF B) visa agricultores com faturamento
bruto anual até R$ 4.000,00, excluídos os benefícios da previdência social e o bolsa-
família. O Programa assume claramente que são famílias pluriativas que, na maior parte
dos casos, não retiram do estabelecimento o essencial de seus meios de vida. Estas famílias
fazem jus a empréstimos de até R$ 1.500,00, valor a ser reembolsado em até dois anos após
a tomada do financiamento. A taxa de juros é de 0,5% ao ano e há um bônus de
adimplência de 25% do valor principal e dos juros.
5 A Declaração de Aptidão do Produtor enfrenta o problema da seleção social da clientela determinando a que classe de renda pertence o agricultor que a recebe e, portanto, a que modalidade de crédito ele faz jus. Na página do PRONAF o leitor poderá encontrar todas as categorias de renda em que foi subdividido o Programa, os financiamentos a elas correspondentes, as taxas de juros e os prêmios de pontualidade no pagamento de seus créditos.
Textos para Discussão FIPE nº 10
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Os recursos para esta linha provêm de duas fontes. Do Orçamento Geral da União e dos
Fundos Constitucionais: a Constituição de 1988 destinou 3% do Imposto de Renda e do
Imposto sobre Produtos Industrializados a fundos atuando no Norte (FNO), no Centro-
Oeste (FCO) e no Nordeste (FNE). A grande diferença entre estas duas fontes – para a
discussão levada adiante neste artigo – é que as punições pelo não pagamento da dívida são
diferentes conforme a fonte dos recursos emprestados. Sob o ângulo legal, somente o
dinheiro vindo do Tesouro pode ser objeto de inclusão na dívida ativa da União, em caso de
inadimplência (6).
Mas a grande novidade desta nova vertente do PRONAF (o PRONAF B e que se
concentrou no Nordeste, nas áreas mais pobres de Minas Gerais e no Norte do País) é que –
como já se fazia para os financiamentos destinados a populações assentadas – não há risco
bancário nas operações. Convém destacar cinco traços básicos do PRONAF B que vão
fundamentar as novas tecnologias de empréstimos expostas na parte 4 deste trabalho.
a) Os tomadores de empréstimo não tinham qualquer relação orgânica com o Banco de
quem tomavam o empréstimo. Para o BNB a situação era tanto mais paradoxal que
ele, quando tem início o PRONAF B, em agosto de 2000, já acumulara larga
experiência na construção daquele que hoje é o mais importante sistema de
microcrédito urbano da América Latina, o CREDIAMIGO.
b) Os atores locais envolvidos com a concessão dos empréstimos (sindicatos e
extensão) estão interessados fundamentalmente em ampliar o público do programa e
cumprir as exigências formais necessárias para esta finalidade. Mas não há qualquer
sinalização real com relação à importância do pagamento da dívida.
6 Isso não quer dizer que esta inclusão seja o melhor método de combate à inadimplência. Em primeiro lugar, ela envolve custos de transação imensos dados pela desproporção entre as exigências burocráticas decorrentes da inscrição na dívida ativa da União e o baixo montante devido pelo agricultor. Além disso, esta inscrição acabaria por eliminar definitivamente o devedor do sistema e não estimularia seu pagamento. Só o fato de o pagamento ter que ser feito junto a um órgão público (e não junto ao banco) já inviabiliza que a grande maioria dos devedores o faça.
Textos para Discussão FIPE nº 10
16
c) Não existe projeto produtivo específico a cada produtor, onde as chances e os riscos
sejam avaliados. A assistência técnica oficial não cumpre o papel que os agentes de
crédito exercem nas organizações de microcrédito. Ela limita-se a preencher
formalidades necessárias à obtenção dos recursos e opera de maneira padronizada,
com base naquilo que, em campo, os atores locais não hesitam em caracterizar
como um “kit” produtivo. 36,8% dos entrevistados por Gomes da Silva (2007) e que
receberam PRONAF B declararam não ter nenhuma renda monetária a partir do
que fazem no estabelecimento para cuja melhoria tomaram o empréstimo. É
interessante observar que os entrevistados por ele declaram conhecer as regras do
programa, os prazos de pagamento das parcelas e os montantes devidos. Mais que
isso: “eles sabiam que deviam pagar dentro do prazo de vencimento, para ter direito
ao bônus de 25% do valor financiado” (Gomes da Silva, 2007, p. 9). O trabalho
qualitativo de Gomes da Silva deixa claro que os agricultores percebem o crédito da
mesma maneira que outros programas de transferência de renda: um montante ao
qual a precariedade de sua situação lhes abre direito .
d) As informações sobre crédito limitam-se às dos serviços de proteção ao crédito e
são apenas negativas. Não há qualquer dispositivo capaz de valorizar informações
positivas quanto à capacidade de pagamento dos atores. A questão central em
qualquer relação de crédito - a informação sobre os riscos – (Guirkinger e Boucher,
2005) está totalmente afastada desta modalidade de operação. Tampouco existem
mecanismos sentidos pelos atores locais como eficientes para punir a inadimplência,
além daquele que consiste em não renovar o crédito de quem está devendo.
e) Neste contexto não é de se estranhar que atores locais (políticos, sindicalistas)
estimulem os agricultores a não honrarem seus compromissos, tanto pelo fato de o
crédito ser um direito ligado ao pagamento de uma imensa dívida social, como com
o argumento de que haverá renegociação dos débitos. Frases como “chegou o 13º
salário, pago pelo Governo” ou, logo no início do Programa, “pega R$ 500,00 que
só vai devolver R$ 300,00” eram bastante freqüentes. Como a prática de
Textos para Discussão FIPE nº 10
17
renegociação de dívidas é comum no âmbito da agricultura patronal (Dias, 2007,
Rezende, 2008), aumenta o sentimento social de legitimidade quanto ao não
pagamento do que se deve. Na verdade, o contexto geral de implantação do
PRONAF é o de um País cujas políticas públicas nunca sinalizaram claramente a
noção de risco para a atividade agrícola, a começar pela agricultura patronal. Este é
um componente decisivo do ambiente institucional em que o PRONAF é construído
e na maneira como se formam o que Avner Greif (2005) define como as motivações
inerentes ao funcionamento de seu aparato institucional.
3.3. A AMEAÇA DA INADIMPLÊNCIA
Estas cinco características resumem a modalidade convencional de atribuição do PRONAF
B que, desde 2005, começa a ser substituída por tecnologias cuja exposição é objeto da
parte 4 deste trabalho. Nesta modalidade convencional, o saldo devedor dos agricultores,
em outubro de 2007 era de 895 milhões de reais. Deste total, 280 milhões estavam em
atraso. Dos 768 mil agricultores contemplados com o financiamento, 229 mil não haviam
honrado pontualmente seus compromissos 7.
Existem quatro razões possíveis para um devedor não pagar o que deve a uma organização
financeira. A primeira refere-se a condições possivelmente draconianas quanto às taxas de
juros e aos prazos do empréstimo. A segunda vem de catástrofes como seca, enchente,
morte ou doenças de animais ou de membros da família. A terceira pode ser determinada
pela própria pobreza da família - agravada por ausência de orientação técnica e falta de
acesso aos mercados - que a impede de investir e a obriga a consumir o que tomou
emprestado para sua sobrevivência. A quarta é de natureza moral e habitualmente exprime
uma cultura disseminada legitimando o não pagamento. Na avaliação da inadimplência, é
7 Este cálculo baseia-se no retrato da situação de outubro de 2007. Ele não leva em consideração os contratos devidamente liquidados que devem ser muito importantes, já que o programa existe desde 2000. Na verdade, uma imagem realista da inadimplência exigiria a montagem de planilhas capazes de acompanhar, desde o começo do PRONAF B, o início e o vencimento dos contratos ao longo do tempo e não apenas um retrato a partir de um mês. Infelizmente as informações não são disponíveis desta maneira.
Textos para Discussão FIPE nº 10
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muito importante separar estes fatores. O que os dados expostos abaixo indicam é que os
não pagamentos, no caso do PRONAF B, devem-se fundamentalmente à difusão, por parte
de organizações locais, da mensagem de que os créditos serão renegociados e que, portanto,
não vale a pena honrar os compromissos assumidos.
Os dados de inadimplência aqui expostos correspondem a certo momento no tempo. É
bastante verossímil a hipótese de que os 30% de inadimplência tendem a aumentar,
conforme outros contratos forem vencendo. É o temor deste crescimento que está na raiz de
um conjunto de medidas, das quais uma das mais importantes foi a portaria 105, da
Secretaria de Agricultura Familiar, do MDA, publicada no dia 3/12/2007 com três
determinações fundamentais:
a) Até o dia 20 de cada mês, em cada município onde houver PRONAF B, os bancos
devem mandar para a Secretaria de Agricultura Familiar a situação municipal da
inadimplência.
b) Quando a taxa de inadimplência atingir 15% dos contratos e, isso corresponder a 50
contratos ou mais, novos financiamentos nesta linha deverão ser suspensos no
município. A portaria diz (artigo 2º parágrafo 2º) que a SAF/MDA publicará
mensalmente a lista dos municípios onde a inadimplência atingiu estas proporções.
Só terão direito a novos financiamentos pelo PRONAF B agricultores que já
tiveram o crédito e pagaram-no pontualmente ou aqueles novos agricultores cuja
atribuição de financiamento for feita sob as novas tecnologias de empréstimo das
quais a praticada pelo Banco do Nordeste e que será exposta na parte 4 deste
trabalho. Também agricultores produtores de matéria-prima no âmbito do Programa
Nacional de Produção e Uso de Biodiesel continuam tendo direito ao PRONAF B.
c) Os municípios inadimplentes devem elaborar um Plano Municipal de Aplicação e
Recuperação das Operações da Linha de Crédito do Grupo “B” do Pronaf (PMAR),
por meio de seu Conselho Municipal de Desenvolvimento Rural ou de Comissão
especialmente criada para este fim. Este plano deverá conter o diagnóstico da
Textos para Discussão FIPE nº 10
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inadimplência, as medidas para a recuperação das dívidas, bem como o que será
feito para o funcionamento salutar do programa, depois que a dívida tiver sido
reduzida a menos de 50 contratos.
A aplicação destas medidas vai exigir um imenso esforço de mobilização. O gráfico 1 e a
tabela 1 mostram que cerca de três quartos dos municípios que receberam PRONAF B têm
inadimplência superior a 15%.
Gráfico 1
Tabela 1
Distribuição dos municípios por intervalos da taxa de inadimplência Intervalos Número de municípios Proporção de Municípios
0 28 1,42%
entre 0 e 15% 450 22,89%
entre 15% e 30 % 468 23,80%
entre 30 % e 60% 541 27,52%
entre 60% e 100% 479 24,36%
Totais 1966 100%
A tabela 2 e o gráfico 2 referem-se aos municípios cuja inadimplência situa-se entre 0 e
15%. Como era de se esperar, na sua grande maioria (três quartos dos casos) são
Textos para Discussão FIPE nº 10
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municípios em que há poucos contratos. O que significa, presumivelmente, que o aumento
do número de contratos nestes municípios – sob as modalidades convencionais de
atribuição do crédito, bem entendido - conduziria igualmente à elevação da inadimplência
além dos 50 contratos. Significa também que nas situações de inadimplência abaixo de 15%
são poucos os municípios com grande número de empréstimos.
Gráfico 2
Tabela 2
Distribuição dos municípios com inadimplência entre 0 e 15% em intervalos para o número de contratos em atraso
Intervalos (número de contratos em
atraso)
Número de municípios Proporção de Municípios
50 368 76,99%
entre 50 e 100 58 12,13% entre 100 e
500 52 10,88%
entre 500 e 1000
0 0,00%
Mais de 1000 0 0,00%
Totais 1966 100%
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Já para os municípios com inadimplência superior a 15%, é bem maior a concentração no
número de contratos por município: 70% dos municípios com taxa de inadimplência maior
do que 15% possuem mais de 50 contratos em atraso, como se vê pelo gráfico 3 e pela
tabela 3.
Gráfico 3
Tabela 3
Distribuição dos municípios com inadimplência maior do que 15% em intervalos para o número de contratos em atraso
Intervalos (número de contratos em
atraso)
Número de municípios Proporção de Municípios
50 459 12,30% entre 50 e 100 362 11,63%
entre 100 e 500
607 69,29%
entre 500 e 1000
59 6,72%
Mais de 1000 1 0,07% Totais 1966 100%
Existem nada menos que 1029 municípios, dos quais a maior parte encontra-se nos Estados
do Nordeste, que superam 15% de inadimplência e, ao mesmo tempo, o número de 50
Textos para Discussão FIPE nº 10
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contratos em atraso. É a este considerável conjunto que deverá aplicar-se o esforço de
mobilização indicado na Portaria 105.
Convém chamar a atenção para dois elementos que explicam a adoção por parte do Banco
do Nordeste e do Governo Federal das novas tecnológicas de empréstimos examinadas logo
abaixo:
a) A inadimplência é tão generalizada que não poderia ser atribuída a qualquer
circunstância local ligada a fatores climáticos ou mercadológicos. Há duas
justificativas para esta afirmação. Em primeiro lugar, fatores climáticos negativos
não podem ser tratados como surpresa, mas ocorrem de maneira regular na região.
A atribuição de crédito tem que contar com o fato de que as condições climáticas da
região são negativas e procurar atividades e tecnologias menos expostas a suas
conseqüências. Sem isso, as chances de os atores viverem os financiamentos
recebidos como transferência de renda aumentam enormemente. Isso envolve não
só cisternas, como métodos para garantir a alimentação animal em condições
climáticas adversas. A segunda justificativa baseia-se numa evidência expressiva e
cujo aprofundamento estatístico vai além dos objetivos deste trabalho. Foram
considerados – dentre os municípios com mais de 50 contratos e mais de 15% de
inadimplência – os dez que apresentam maior proporção de contratos não pagos.
Verificou-se então, entre estes dez municípios de maior proporção de contratos não
pagos, quantos registraram junto à Secretaria Nacional de Defesa Civil
(http://www.defesacivil.gov.br/situacao/municipios.asp) a decretação de estado de
urgência ou calamidade entre 2004 e 2007. Dos dez municípios com maior
proporção de inadimplência, nenhum teve episódios climáticos que justificassem o
não pagamento dos empréstimos por seca ou inundação. Foram então considerados
os dez municípios que apresentaram a maior quantidade absoluta de contratos
não pagos, verificando-se em quantos, entre estes, o estado de emergência ou
calamidade foi decretado: somente em três deles. Claro que estes dados podem ser
Textos para Discussão FIPE nº 10
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aprofundados, mas esta evidência anedótica já é bastante ilustrativa da dissociação
ao menos parcial entre inadimplência e catástrofes naturais.
b) A inadimplência é maior conforme aumenta o número absoluto de empréstimos, o
que fortalece a idéia de que os não pagamentos vinculam-se àquilo que os
economistas costumam chamar de “efeito manada”. O que está em jogo não é tanto
a capacidade de pagamento dos devedores, mas a generalização de que é desejável,
é possível e é aceitável não honrar suas dívidas com o PRONAF B.
Textos para Discussão FIPE nº 10
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4. O AGROAMIGO
Tecnologias de empréstimo baseadas em relações de proximidade, com um papel de
destaque ao agente de crédito podem reverter o quadro de inadimplência acima descrito?
Os três primeiros anos de funcionamento do AGROAMIGO fornecem indicações bastante
promissoras a este respeito. De uma carteira total de R$ 284,7 milhões emprestados sob
esta nova modalidade, apenas 3,2% estavam em atraso. Dos 260 mil agricultores que
tomaram PRONAF a partir do AGROAMIGO, 17 mil estavam em atraso 8.
A grande novidade do AGROAMIGO é que os financiamentos passam a ser geridos por um
assessor de crédito, responsável por uma carteira de projetos e que estabelece uma relação
personalizada com cada agricultor beneficiário do Programa. Vejamos a questão mais de
perto.
a) A base da nova tecnologia de empréstimo está na proximidade e no conhecimento
pessoal que existe entre o assessor de crédito e o agricultor. O agricultor não tem
mais a relação impessoal com uma instância que não pertence a sua vida cotidiana e
que lhe serve apenas de meio de chegada do dinheiro: o banco. Ter acesso ao
crédito depende agora da elaboração de um projeto na companhia de alguém que
pertence a sua comunidade. O assessor de crédito é um técnico agrícola que procura
transmitir ao tomador do empréstimo a idéia de que os recursos não lhe são
atribuídos simplesmente por um “direito”, mas como parte de um projeto de geração
de renda. As decisões de empréstimo, neste sentido, decorrem das relações
descentralizadas entre assessor de crédito e agricultores (Canales, 2005). Passa a
existir entre o agricultor e o Programa um ponto de contacto encarnado,
corporificado numa figura que pertence ao universo social local. É importante levar
em conta um intenso – e contínuo - trabalho de formação dos agentes de crédito não
apenas em técnicas contábeis e administrativas, mas, sobretudo no que se refere a
8 Aqui também, esta informação refere-se a outubro de 2007: na verdade, ela só toma real sentido caso se coloque o total da inadimplência sobre os contratos vencidos e não sobre o total que ainda se encontra em carência.
Textos para Discussão FIPE nº 10
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sua missão. Da mesma forma que o mostra Ferrary (2006), no estudo do
microcrédito dirigido a desempregados na França, no AGROAMIGO, igualmente,
“o contrato de financiamento torna-se um pretexto para a construção de um laço
social entre o financiador e o financiado pelo qual vão transitar não apenas recursos
financeiros, mas igualmente conselhos, recursos não monetários, relações,
sustentação psicológica e uma valorização simbólica da atividade profissional”. O
assessor de crédito traz ao agricultor informações básicas a respeito de higiene
animal e de organização econômica que faz toda a diferença no momento da
utilização do crédito. Ele não é um extensionista e não substitui o que deve fazer a
assistência técnica. Mas o assessor de crédito injeta conhecimento no interior da
unidade produtiva que – embora de maneira simples, com conselhos elementares –
contribui à viabilidade de atividades econômicas ao alcance das capacidades locais.
Este vínculo pessoal será importante nas motivações socialmente construídas que
levarão ao pagamento da dívida ou à inadimplência. O vínculo personalizado com o
assessor de crédito inscreve o pagamento da dívida no interior das obrigações em
torno das quais se faz a própria reprodução da vida local. É claro que a proximidade
pode abrir caminho igualmente a empréstimos realizados de maneira inadequada e
pouco criteriosa, por razões familiares ou de amizade. Mas, como será visto adiante,
o risco do assessor de crédito, neste caso é imenso e, de fato, no início do Programa
aqueles que não foram capazes de compreender que suas funções exigiam colocar
limites a ambições pouco consistentes, foram despedidos. Como bem mostra o
trabalho de Canales (2005), a concessão do crédito, por parte do assessor de crédito,
em situação de forte inserção localizada, é um ato de confiança pessoal. O não
pagamento, portanto, envolve quebra não de um compromisso genérico e anônimo,
mas da reciprocidade que é básica na construção dos vínculos de uma sociedade de
interconhecimento. A informação que o assessor de crédito detém sobre a vida da
comunidade traz em si a forte tensão entre a expectativa de que possa atender às
urgências derivadas de vários tipos de necessidade cotidiana e as exigências
profissionais do rigor de seu trabalho. Pior: no caso brasileiro, haverá uma tensão
Textos para Discussão FIPE nº 10
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entre um passado muito recente em que o crédito era distribuído de forma
indiscriminada e a tentativa agora de submeter sua concessão a critérios técnicos
rigorosos. À existência de um corpo organizado de centenas de agentes de crédito
atuando em diversos municípios na mesma direção, faz pender a balança para o lado
do rigor na concessão dos empréstimos, mas não suprime os vínculos pessoais em
eles se apóiam, nem o peso da forma burocrática que marcou a existência do
PRONAF durante anos. Daí a importância de as finanças de proximidade – que
podem oferecer motivações (Greif, 2005) socialmente válidas para o uso adequado e
o pagamento dos recursos devido – acoplar-se claramente a mudanças no ambiente
institucional capazes de sinalizar aos indivíduos as punições que vão derivar da
tentativa de perpetuar suas dívidas.
b) Atualmente existem 400 assessores de crédito que operam estas novas tecnologias
de empréstimo e a idéia é que este número se estabilize em torno de 500 até o final
de 2008. Cada um deles é responsável pela gestão de uma carteira de projetos.
Nenhum crédito é atribuído sem que o agricultor participe de algumas reuniões
explicativas. O assessor visita, pessoalmente, no mínimo, metade dos clientes
atendidos. Em caso de inadimplência o contato com o assessor de crédito é
imediato. Os créditos agropecuários têm prazos de vencimento maiores que os do
microcrédito urbano. Isso permite que o tamanho da carteira do assessor voltado ao
PRONAF seja superior ao daquela do assessor do CREDIAMIGO, em meio urbano.
Em média, cada assessor de crédito deve chegar a 1.200 clientes a cada dois anos,
período pelo qual acompanha seus projetos (9). A remuneração deste agente de
crédito corresponde à mistura entre um pagamento fixo de R$ 600,00 reais mensais,
9 Guérin e Kumar (2007) consideram excessivo o tamanho da carteira gerida pelos agentes de crédito da região que estudaram, na Índia: igualmente de 1.200 clientes. Mas no caso brasileiro, os assessores de crédito se deslocam em motocicletas e contam com estradas, ao que tudo indica, em melhores condições que na Índia. Além disso, é parte decisiva da formação dos assessores de crédito brasileiros, tomar distância da politização dos empréstimos, que é um dos traços essenciais da atuação das ONGs indianas, que chegam a convocar clientes para participar de manifestações eleitorais, o que seria impensável para um assessor de crédito brasileiro (Guérin e Kumar, 2007).
Textos para Discussão FIPE nº 10
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mais uma remuneração variável em função do tamanho da carteira e da
adimplência. Isso significa que embora não haja risco na operação para o Banco que
concede o empréstimo, este risco é real para o agente de crédito que concretiza a
operação. Se o agricultor não paga, ele prejudica o assessor de crédito direta e
pessoalmente, o que reforça a dimensão já mencionada da quebra da reciprocidade
nas relações locais. Pode-se dizer que estas tecnologias de empréstimos introduzem
a noção de risco não em instituições formais, mas nos próprios vínculos locais.
c) Uma das possíveis reações do assessor de crédito aos riscos da gestão de sua
carteira seria a seleção de clientes que escapam aos objetivos da organização. No
limite, poderia ser reproduzida a situação inicial do PRONAF, em que os bancos
selecionavam pela riqueza (screening on wealth, para usar a expressão de Aubert et
al., 2002). Este risco será reduzido por meio de dois mecanismos básicos. O
primeiro é a própria Declaração de Aptidão ao PRONAF, que continua sendo a base
primeira para a concessão do crédito. O segundo mecanismo é ainda mais
importante: parte da demanda por crédito para os segmentos mais pobres da
agricultura familiar tenderá a ser atendida por outro programa do Banco do
Nordeste: o Crediamigo Comunidade, produto do Crediamigo, que atende as
atividades urbanas nos segmentos de indústria, comércio e serviços, bem como
atividades não agrícolas no meio rural e/ou semi-urbano. Como forma de apoio à
expansão do microcrédito, o Governo Federal determinou que 2% dos depósitos à
vista dos bancos comerciais sejam aplicados no Programa de Microcrédito
Produtivo Orientado. Estes recursos formam o funding de Programa de
Microcrédito Produtivo e Orientado do BNB – o Crediamigo que procura
contemplar tanto segmentos cujas condições não permitem tomar recursos pelo
CREDIAMIGO, no meio urbano, como aqueles que tampouco preencheriam
condições de probabilidade de adimplência nos financiamentos agropecuários.
d) A comparação entre PRONAF B e CREDIAMIGO é problemática, já que as
atividades urbanas são financiadas com taxas de juros mensais líquidas que variam
Textos para Discussão FIPE nº 10
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de 1,95 a 4% e nas agropecuárias as taxas são não apenas negativas (quando
comparadas com a inflação), mas existe um prêmio de pontualidade no pagamento
que corresponde a um subsídio de 25% sobre o principal (e os juros). Por outro
lado, a viabilidade econômica das atividades urbanas é muito maior e seus riscos
bem menores do que aqueles a que se expõe o agricultor. Portanto, caso se
considerem os recursos emprestados como base para a geração de renda, a verdade é
que nem todo o universo dos agricultores vivendo em situação de pobreza é hoje
capaz de levar adiante projetos que permitam atividades que permitirão fazer frente
aos empréstimos do PRONAF B, ainda que sejam altamente subsidiados. A
extensão do CREDIAMIGO comunidade ao meio rural é uma forma de estimular
não apenas a educação para o crédito, mas também de preparar o agricultor para
investimentos de maior porte.
e) O CREDIAMIGO comunidade funciona como um “village bank”. É formado um
grupo entre quinze e trinta pessoas sobre a base de indicações estritamente pessoais.
Existe um assessor de crédito que faz uma convocação geral da iniciativa, que a
explica, procurando sensibilizar a comunidade para sua importância e acompanha
sua implantação. Mas este assessor jamais indicará um membro para participar no
grupo nem tão pouco assumirá responsabilidades executivas em sua gestão
cotidiana. O grupo vai constituir uma organização própria que funciona como um
banco de propriedade coletiva: tem um nome, os indivíduos nela fazem depósitos
numa conta de poupança aberta no Banco do Nordeste em nome de três de seus
representantes. Além disso, cada participante do grupo possui uma conta
simplificada, o que já dá início a sua bancarização. Há regras com relação aos
pagamentos, à pontualidade nas reuniões e ao comportamento dos membros. A
fundação do “banco” é um evento festivo com inauguração, fita e uma série de
rituais voltados a marcar o compromisso do grupo com seu sucesso. O
CREDIAMIGO admite emprestar a pessoas cujos nomes estão assinalados em
serviços de proteção ao crédito (desde que sejam dívidas pequenas e não bancárias).
Textos para Discussão FIPE nº 10
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O indivíduo não precisa ter um ano na atividade (ao contrário do que ocorre com os
demais produtos do CREDIAMIGO) para fazer jus ao empréstimo. O
CREDIAMIGO Comunidade teve início em 2005 e, em dezembro de 2007 tinha
uma carteira ativa de R$ 5,6 milhões, com 20 mil clientes e 1.145“bancos” ativos.
Trata-se de um programa que vincula a obtenção de créditos à formação de
poupança por parte dos clientes: contrariamente ao que ocorre com o PRONAF B,
os empréstimos do CREDIAMIGO comunidade envolvem risco bancário. Cada
“banco” responde, de maneira descentralizada, por seus depósitos de poupança que,
ao todo, somavam, ao final de 2007, cerca de R$ 745 mil, que correspondem a 10%
dos valores emprestados naquela ocasião. Desde seu início o CREDIAMIGO
Comunidade liberou R$ 20,3 milhões, num total de 55,8 mil operações. O valor
médio liberado até aqui é de R$ 364,49. A perda é irrisória, com 0,18% do total
liberado e um saldo em atraso até 90 dias para os empréstimos ativos de 1,12%. O
CREDIAMIGO Comunidade e o PRONAF B têm em comum o fato de se dirigirem,
em grande parte, para beneficiários do bolsa-família, ou seja, famílias vivendo
muito próximo à linha de pobreza.
f) O AGROAMIGO possui uma forma de organização interna que favorece incorporar
a noção de risco ao conjunto dos atores que o compõem. Da mesma forma que no
CREDIAMIGO e no CREDIAMIGO Comunidade, o assessor de crédito do
AGROAMIGO não é funcionário do BNB. O Programa é gerenciado por uma
Organização Não Governamental, o Instituto Nordeste Cidadania, dirigida por
funcionários do BNB. Esta modalidade de organização reduz imensamente os
custos, já que as remunerações dos assessores de crédito são inferiores às de
bancários. Além disso, esta forma de operacionalização permite reduzir o
atendimento dos clientes na própria agência, o que é um importante elemento de
redução de custos. Os assessores de crédito são sistematicamente avaliados não
apenas pelo desempenho de sua carteira, mas também por monitores que também
entram em contato direto com os clientes e têm a função de impedir desvios na
Textos para Discussão FIPE nº 10
30
metodologia, antes que estes se traduzam em deterioração da qualidade da carteira
de crédito. A estrutura do AGROAMIGO é custeada pelo pagamento feito pelo
Governo Federal de 6% de comissão sobre o total financiado para a gestão do
PRONAF B.
Textos para Discussão FIPE nº 10
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5. CONCLUSÕES
É possível reverter o quadro de crescente inadimplência do PRONAF B e, por aí, recuperar
os objetivos de uma das mais importantes iniciativas brasileiras de luta contra a pobreza
pelo estímulo à geração de renda. É perfeitamente compreensível que tanto as populações
beneficiárias do PRONAF B, quanto os atores sociais que junto a elas atuam – a extensão
rural e o sindicalismo – tratem o crédito muito mais como um direito do que como parte de
um contrato que envolve riscos e obrigações. A tradição da política agrícola brasileira,
durante décadas, consolidou a ausência da noção de risco na relação entre Estado e
fazendeiros. Ao eliminar o risco bancário das operações do PRONAF B, foi aberto o
caminho para a real massificação dos financiamentos. Ao mesmo tempo, consolidaram-se
práticas locais que acabaram por fazer do crédito pouco mais que uma modalidade de
transferência de renda.
A introdução de tecnologias de empréstimo que valorizem a proximidade pessoal entre
assessor de crédito e agricultor pode ser um fator decisivo para mudar esta atitude. Por um
lado, o assessor de crédito compõe uma rede social localizada que faz da reciprocidade
entre seus participantes um dos elementos da própria vida cotidiana. Atribuir crédito passa
a ser não a expressão de um direito genérico – como receber a aposentadoria ou a bolsa-
família – mas um gesto de confiança para o qual a retribuição é básica na própria
construção da vida social, como mostram os trabalhos de Marcel Mauss e sua tríade central:
dar, receber, retribuir. A existência deste vínculo personalizado permite que a relação com
um elemento aparentemente tão impessoal – o dinheiro – seja inserida em motivações
decisivas para a decisão de pagar ou não os empréstimos. É claro que esta relação pessoal
deve trazer ao agricultor elementos que ele não possuía anteriormente em termos de
informação e abertura de novas possibilidades de uso de seus recursos e, ao que tudo
indica, o assessor de crédito está especialmente preparado para fazê-lo – nos limites
permitidos pela situação de precariedade das economias junto às quais atua, bem entendido.
No caso brasileiro, os riscos apontados na literatura internacional, de que este poder do
assessor de crédito seja fonte de distorção – seja por seu uso político, seja pelo estímulo à
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seleção de clientes de maior renda – parecem estar afastados. Tanto a formação dos agentes
de crédito quanto mecanismos como a Declaração de Aptidão ao PRONAF reduzem as
chances de que o agente de crédito possa selecionar de forma discriminatória sua carteira de
clientes. O próprio limite do crédito do PRONAF B (de R$ 1.500 reais a cada dois anos) é
suficientemente baixo para reduzir o interesse de captura vindo de segmentos que não
fazem parte do público visado pelo Programa.. A existência de supervisores dos assessores
de crédito também contribui para especial vigilância neste sentido. Há um programa de
monitoria executado por meio tanto de análise à distância como presencialmente, em que
todas as unidades do AGROAMIGO são visitadas pelo menos uma vez ao ano. Nesta
ocasião é avaliado se a metodologia proposta está sendo colocada em prática, e são
entrevistados diversos parceiros, inclusive visitados produtores, para a avaliação dos
resultados do programa no município.
Mas exatamente aí está a tensão de cujo desenvolvimento vai depender a evolução do
PRONAF. Para que o assessor de crédito possa fazer sentir os recursos que atribui como
base de aplicações cujos resultados devem ser devolvidos pontualmente, ele terá que dispor
da possibilidade de negar financiamentos àqueles que – a seu critério - não preenchem os
critérios para tanto. A verdade é que, até agora, esta possibilidade é muito reduzida, já que,
em princípio, para receber o crédito, basta que o agricultor preencha certos requisitos
formais. Introduzir critérios qualitativos nesta relação é algo inédito. Não há organização
creditícia que possa funcionar sem dispor de mecanismos a partir dos quais financiamentos
possam ser recusados. Se estes mecanismos forem os convencionais – patrimônio,
garantias e cadastro negativo – a seleção terá natureza socialmente negativa. Aí reside a
utilidade das tecnologias de proximidade, como as expostas rapidamente acima para o
CREDIAMIGO comunidade ou as que começam a existir sob o AGROAMIGO. Mas é
fundamental que a atribuição do crédito deixe de ser uma decorrência automática da
condição de agricultor familiar de baixa a renda e passe, de fato, a exprimir a elaboração de
um projeto e a relação de confiança entre o agricultor e a organização que o financia, por
meio do assessor de crédito.
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Além disso – e mais importante – o efeito real da introdução de tecnologias de proximidade
nos empréstimos dependerá do sentimento de que a perpetuação da inadimplência será
seriamente punida. Exatamente por se tratar de público de baixíssima renda é fundamental
que circunstâncias objetivas (catástrofes naturais, doenças) envolvendo atrasos no
pagamento não sejam consideradas da mesma maneira que a disposição ao não pagamento
gerada por expectativa de renegociação. Ainda assim, é fundamental fortalecer mecanismos
que sinalizem claramente aos indivíduos que o não pagamento pontual de seus
compromissos será objeto de punição, salvo situações muito excepcionais. A caracterização
da inadimplência como ato ilícito não pode limitar-se àqueles financiamentos que se
originam no Orçamento Geral da União, mas tem que atingir igualmente outras fontes de
financiamento do Programa e particularmente os fundos constitucionais.
É impossível saber qual será a reação dos movimentos sociais diante do esforço
governamental de fazer com que agricultores em dívida com o Tesouro sejam declarados
publicamente como inadimplentes. O tema é tanto mais delicado que não envolve apenas os
devedores do PRONAF B, mas igualmente, os que receberam créditos produtivos após sua
instalação nos assentamentos. Muitos destes são organizados pelo Movimento dos
Trabalhadores Rurais Sem Terra que nunca escondeu sua posição de que estes créditos não
deveriam ser pagos.
O horizonte institucionalista insiste no quadro legal e na capacidade de cumprimento de leis
que sinalizem aos atores os benefícios e os riscos dos contratos em que se envolvem. A
sociologia contemporânea e a perspectiva que procura estudar a capacidade de “self-
enforcing” das instituições colocam ênfase tanto nas redes sociais em que se localizam os
atores como nas motivações a partir das quais agem. A junção destas duas perspectivas é
especialmente interessante em estudos sobre sistemas de crédito, como mostra o trabalho de
Avner Greif (2005). Sua conseqüência prática, para o nosso caso, é que os resultados das
tecnologias de proximidade do PRONAF B não dependem apenas de sua execução correta,
mas também da efetiva incorporação, por parte de todos os protagonistas deste processo –
movimentos sociais, atores políticos locais e extensão – de que mesmo os pobres podem ser
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portadores de contratos e que, portanto, estão submetidos a riscos e possibilidades de
punições.
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