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UNIVERSIDADE DE VORA
Mestrado em Cincias Documentais
CATALOGAO DE DOCUMENTOS MUSICAIS ESCRITOS UMA ABORDAGEM LUZ DA EVOLUO NORMATIVA
Maria Clara Rabanal da Silva Assuno
Dissertao de Mestrado em Cincias Documentais
apresentada Universidade de vora.
Esta dissertao no inclui as crticas e sugestes feitas pelo jri.
Orientadores: Prof. Doutor Rui Vieira Nery
Prof. Doutor Rogrio Santos
2005
UNIVERSIDADE DE VORA
Mestrado em Cincias Documentais
CATALOGAO DE DOCUMENTOS MUSICAIS ESCRITOS UMA ABORDAGEM LUZ DA EVOLUO NORMATIVA
Maria Clara Rabanal da Silva Assuno
Dissertao de Mestrado em Cincias Documentais
apresentada Universidade de vora.
Esta dissertao no inclui as crticas e sugestes feitas pelo jri.
Orientadores: Prof. Doutor Rui Vieira Nery
Prof. Doutor Rogrio Santos
2005
Dedico estes trs anos de trabalho a todos aqueles que me incentivaram com o seu apoio e com a sua confiana: Aos meus orientadores com quem aprendi muito e que me ajudaram a pr alguma ordem no labirinto do meu esprito. Aos meus colegas e amigos (alguns so ambas as coisas) pela minha ausncia e pela sua presena. No C.E.M., uma palavra especial para a Slvia, que identificou e catalogou os manuscritos da Lauriane mesmo a tempo de eu os poder usar. minha famlia, claro, de quem andei to arredada durante tempo de mais. As minhas viagens Sibria acabaram... Uma nota final para aqueles felizmente poucos que estavam espera que eu falhasse. Desiludi-los foi para mim um estmulo nos momentos de maior desnimo. Foi com esse doce pensamento que me algemei ao computador em muitas tardes soalheiras e convidativas das trs ltimas Primaveras.
Em Lisboa, aos 11 dias do ms de Abril do ano da Graa de 2005
Last but not least... ao Jorge. Por tudo. Agora a tua vez...
O melhor da msica no est escrito na partitura. (Gustav Mahler)
WRITTEN MUSIC CATALOGUING: AN APPROACH UNDER THE NEW STANDARD DEVELOPMENT
ABSTRACT
This study results from the knowledge of the insufficiency in standards and rules
used for the identification and description of written musical documents. Enlightened by
the new standard development, particularly the Functional Requirements for Bibliographic
Records (FRBR) and recent studies on the concept of a work and bibliographic
relationships, it must achieve an equilibrium between the music cataloguing rules normally
used on libraries, much generalist, and the rules usually used by musicologists for the
description of the same documents, particularly RISM rules, much specific an inaccessible
to a less specialized public. Some proposals are made in order to contribute to the current
revision of FRBR, ISBD(PM) and UNIMARC format for music. The final result is
expectable to be a description model according to the practice and the spirit to the library
cataloguing, but detailed enough to result in a useful tool to musicians and musicologists.
The model was tested in a sample of bibliographic records from the opera Lauriane,
composed by Augusto Machado.
CATALOGAO DE DOCUMENTOS MUSICAIS ESCRITOS: UMA ABORDAGEM LUZ DA EVOLUO NORMATIVA
RESUMO
Este estudo resulta da constatao da insuficincia das normas e regras utilizadas
para a identificao e descrio de documentao musical escrita. luz da evoluo
normativa, em particular, dos Requisitos Funcionais dos Registos Bibliogrficos e de
estudos recentes sobre o conceito de obra musical e relaes bibliogrficas, pretende-se
conseguir um equilbrio entre as regras de catalogao de msica usadas habitualmente
nas bibliotecas, demasiado generalistas, e as regras usadas normalmente pelos
musiclogos para a descrio das espcies que so objecto dos seus estudos, em
particular as regras RISM, demasiado especficas e inacessveis a um pblico menos
especializado. Fazem-se algumas propostas que visam contribuir para a reviso em
curso dos FRBR, da ISBD(PM) e do formato UNIMARC para a msica. O produto final ,
espera-se, um modelo de descrio conforme s prticas e ao esprito subjacente
catalogao nas bibliotecas mas suficientemente detalhado para resultar num
instrumento til para msicos e musiclogos. O modelo testado numa amostra de
registos bibliogrficos da pera Lauriane de Augusto Machado.
SUMRIO
I VOLUME INTRODUO 1
PARTE I
CAPTULO I O percurso das normas de descrio para documentos
musicais 8
CAPTULO II Os novos desenvolvimentos tericos 17
1. O conceito de obra 20
1.1. Obra e expresso 21
1.2. Obra e manifestao 24
2. Relaes bibliogrficas 26
3. O utilizador e a pesquisa 30
4. Os FRBR 31
5. Aplicao dos FRBR a bases de dados bibliogrficos:
catalogao centrada na obra 42
5.1. AustLit Australian Literature Gateaway 42
5.2. Variations2 42
5.3. MusicAustralia 44
5.4. Virtua VTLS 44
5.5. Observaes 44
CONCLUSES DA PARTE I 45
PARTE II
CAPTULO III Catalogao de documentos musicais: problemas e
especificidades 46
1. Porqu normas especficas para a descrio de espcies
musicais escritas? 46
1.1. Problemas relacionados com a natureza da obra
musical
47
1.1.1. Enquanto unidade literria 47
1.1.1.1. O ttulo uniforme 51
1.1.2. Enquanto actividade artstica 54
1.2. Problemas relacionados com a multiplicidade
documental 56
1.2.1. Manifestaes e itens 57
1.2.2. Documentos de arquivo 58
1.3. Problemas relacionados com aspectos tcnicos 61
1.4. Problemas relacionados com a utilizao 62
2. Normas e regras actualmente utilizadas para a
catalogao de documentos musicais 63
2.1. ISBD(PM) Norma Internacional de Descrio
Bibliogrfica para Msica Impressa 64
2.2. Formato UNIMARC para a msica 67
2.3. RISM Rpertoire International des Sources Musicales 69
2.4. As normas e regras e as necessidades de informao
dos utilizadores
70
CONCLUSES DA PARTE II 73
PARTE III
CAPTULO IV Contributos para a discusso do actual quadro normativo
no mbito da catalogao de documentos musicais escritos 74
1. Contributos para uma reviso dos atributos para as
entidades do primeiro grupo segundo o modelo FRBR 75
1.1. Atributos de uma obra 76
1.2. Atributos de uma expresso 82
1.3. Atributos de uma manifestao 89
1.4. Atributos de um item 95
2. Contributos para uma reviso da ISBD(PM) 97
3. Anlise da aplicao do formato UNIMARC msica 114
4. Propostas para registos de obra e expresso 128
CAPTULO V FeRBeRizando Lauriane 138
CONCLUSES 144
BIBLIOGRAFIA 147
II VOLUME ANEXO 1 Cronologia comparada das ISBD, AACR, RPC e regras RISM 1
ANEXO 2 Relaes bibliogrficas aplicveis a documentos musicais
identificadas no formato UNIMARC segundo os modelos de
Tillett, Smiraglia, Mey e Vellucci 4
ANEXO 3 Sntese dos Atributos definidos para as Entidades do modelo
FRBR 7
ANEXO 4 Sntese as recomendaes do relatrio final FRBR para o
registo bibliogrfico mnimo 10
ANEXO 5 Sntese do Captulo 25 das AACR: Ttulos uniformes msica 11
ANEXO 6 Quadro-sntese de normas 16
ANEXO 7 Esquema da ISBD(PM) 36
ANEXO 8 Sntese das propostas do Grupo de Trabalho UNIMARC para a
Msica 38
ANEXO 9 Campos RISM 43
ANEXO 10 Sntese das propostas do Grupo de Trabalho do IAML para as
Entradas Bibliogrficas Bsicas para a Msica
46
ANEXO 11 Sntese das propostas do Projecto HARMONICA para os
registos bibliogrficos 52
ANEXO 12 Sntese das Regras para a Catalogao de Manuscritos
Musicais 57
ANEXO 13 Distribuio dos elementos no formato UNIMARC em relao
s entidades e atributos do modelo FRBR 58
ANEXO 14 Lauriane: esquema FRBR 61
1
INTRODUO
A normalizao a actividade destinada a estabelecer, face a problemas
reais ou potenciais, disposies para utilizao comum e repetida, tendo em vista
a obteno do grau ptimo de ordem, num determinado contexto. 1 A
normalizao prpria das sociedades industrializadas. Antes da Revoluo
Industrial, j se sentia a necessidade de estabelecer algumas regras,
particularmente as relacionadas com as medidas (de tempo, espao e capacidade)
prprias das sociedades agrcolas. Contudo, estas medidas no eram verdadeiras
normas porque lhes faltavam dois factores essenciais: a conformidade e a
continuidade2. Tem de haver regras que garantam um resultado conforme a um
modelo homogneo e repetvel para todos os processos repetitivos e mecnicos.
Tem, ainda, de ser possvel assegurar a continuidade desse modelo no tempo e
no espao.
S a partir da Revoluo Industrial, com a produo em srie, se tornou
possvel assegurar estes dois factores. As normas multiplicaram-se numa espcie
de reaco em cadeia: a normalizao dos produtos obrigou das mquinas,
esta dos procedimentos e esta ltima da informao. O crescimento
exponencial da produo cientfica e literria, que se deu a partir da 2 Guerra
Mundial e que ficou conhecido por exploso documental, levaria at ao universo
das bibliotecas at ento mergulhado em prticas tradicionais que, no obstante
serem rotineiras, no reuniam as caractersticas necessrias para serem
consideradas verdadeiras normas a necessidade de normalizao. A fiabilidade
que as normas proporcionam e que so um factor vital na universalidade e
exportabilidade dos produtos condio sine qua non da globalizao tornou-
se tambm um factor essencial na universalidade do conhecimento, em particular
do conhecimento cientfico, emergindo a procura de meios de difuso da literatura
cientfica, principalmente a essencial ao progresso tecnolgico. Assim, surgiram
as revistas de resumos nas reas da qumica, da medicina, da engenharia, e de
1 NP EN 45020:2001 2 TANGARI, Nicola Standard e documenti musicali, p. 29
2
outras cincias, e os primeiros esforos no sentido da criao de bases de dados
bibliogrficas de grande dimenso que reunissem informaes relativas aos
documentos disponveis em diferentes bibliotecas. Estamos, ainda, a reportar-nos
a um perodo anterior aos sistemas informticos. Ao mesmo tempo que a
produo cientfica, cultural e artstica cresceu de forma exponencial, tambm os
custos de recolher, organizar e disponibilizar toda esta informao se tornaram
cada vez maiores, tanto mais que tm implicado permanentes adaptaes aos
novos meios e suportes. A emergncia dos sistemas informticos (primeiro locais,
depois em redes dedicadas, hoje em sistema aberto) foi decisiva para o triunfo da
normalizao na catalogao dos documentos a qual, por sua vez, um factor de
grande importncia para a gesto das bibliotecas, proporcionando a troca de
registos bibliogrficos, facilitando o emprstimo inter-bibliotecas, estimulando as
polticas coordenadas de aquisies e, de uma maneira geral, agilizando os
processos de gesto documental.
Nos anos oitenta, com o aparecimento dos primeiros computadores de
secretria, as atenes recaram sobre as aplicaes informticas mais do que
sobre as normas propriamente ditas3. A aco das organizaes internacionais
ligadas ao desenvolvimento e cidadania em particular a UNESCO ,
pressionando polticas de acesso e fruio da cultura, permitiu a democratizao
destas tecnologias e a sua aplicao em bibliotecas de menor dimenso e em
pases menos desenvolvidos tecnologicamente. Destas aces, talvez a de maior
impacto tenha sido a criao de um sistema informtico de criao e gesto de
bases de dados bibliogrficos (CDS/ISIS), de distribuio gratuita, o qual tem
permitido que um nmero crescente de bibliotecas pblicas, escolares e
associativas mantenham bases de dados bibliogrficas a baixssimo custo. O
desenvolvimento da informtica permitiu tambm o surgimento de bases de dados
muito volumosas, de envergadura nacional e internacional, contendo registos
criados e consultados por milhares de bibliotecas envolvidas em programas de
catalogao partilhada. Estas bases de dados no se desenvolveram como
consequncia do alargamento das possibilidades oferecidas pelas novas
3 BUIZZA, Pino Dai Principi di Parigi a FRBR
3
tecnologias mas, antes, este alargamento que respondeu necessidade
premente de reduzir os custos de catalogao evitando que as mesmas tarefas
de catalogao se efectuem simultaneamente em diferentes locais.
O teorema o tempo gasto no input recuperado no output repetido pelas
salas de aula dos cursos de biblioteconomia to verdadeiro quanto idealista. Foi
pensado por bibliotecrios no interesse dos utilizadores. Os gestores no pensam
assim. Sob a presso econmica nomeadamente devido s restries
oramentais que levam a polticas de reduo de pessoal , as bibliotecas
procuram simplificar os procedimentos de catalogao optando cada vez mais
pela catalogao mnima gastar o mnimo no input a fim de no sucumbir
evidente desproporo entre os recursos humanos disponveis e uma produo
editorial crescente.
Paralelamente a esta viso economicista, e apesar dela, prosseguem os
esforos no sentido da promoo e divulgao dos bens culturais. Em 1992,
Nunes 4 chamava a ateno para a urgncia da inventariao do patrimnio
bibliogrfico: O conhecimento do patrimnio bibliogrfico existente em Portugal,
a sua inventariao, preservao, conservao e consequente divulgao e
valorizao so etapas necessrias e urgentes, indissociveis e complementares
para a afirmao da nossa identidade cultural, quando as fronteiras da Europa se
vo abrir definitivamente. E continua: O patrimnio das bibliotecas portuguesas,
[...] encontra-se em perigo de morte ou pelo menos em vias de desaparecimento,
pela usura do tempo, pela incria dos homens, pelas condies de armazenagem,
pelo mau estado de conservao dos suportes, pela consulta de que
constantemente objecto. Impe-se por isso uma poltica nacional de salvaguarda
do patrimnio bibliogrfico [...].5.
No mesmo ano iniciavam-se os trabalhos de um projecto de inventariao de
bens culturais mveis que incluiu os manuscritos musicais iluminados. Por razes
que no cabe descortinar neste espao, o programa, que pretendia ser exaustivo,
no foi levado at ao fim. Em 2001, foi promulgada em Portugal a lei do
4 NUNES, Henrique Barreto Patrimnio escrito em Portugal, p. 126 5 Idem Ibidem, p. 129
4
patrimnio cultural que, no seu artigo 7, afirma: Todos tm o direito fruio
dos valores e bens que integram o patrimnio cultural, como modo de
desenvolvimento da personalidade atravs da realizao cultural. 6 Para tal,
revela-se essencial a identificao e inventariao dos bens que constituem esse
patrimnio a que a mesma lei obriga no seu artigo 16: levantamento sistemtico,
actualizado e tendencialmente exaustivo dos bens culturais existentes a nvel
nacional, com vista respectiva identificao.7 No artigo 85 define patrimnio
bibliogrfico, ficando, implicitamente, abrangidos por esta Lei os documentos
musicais: 1 Integram o patrimnio bibliogrfico as espcies, coleces e
fundos bibliogrficos [...] bem como as coleces e esplios literrios. [...] a) Os
manuscritos notveis; b) Os impressos raros; c) Os manuscritos autgrafos bem
como todos os documentos que registem as tcnicas e os hbitos de trabalho de
autores e personalidades notveis das letras, artes e cincia, seja qual for o nvel
de acabamento do texto ou textos neles contidos; d) As coleces e esplios de
autores e personalidades notveis das letras, artes e cincia, considerados como
universalidades de facto reunidas pelos mesmos ou por terceiros.. A
identificao e inventariao do patrimnio documental tornou-se, assim, a partir
de 2001, uma obrigao permanente e contnua do Estado e no uma mera
aco pontual no mbito de um programa. Tal inventariao, por urgente, no se
compadece com o trabalho necessariamente moroso da investigao, no caso
que nos interessa, a investigao musicolgica, e a divulgao do patrimnio no
pode passar pelas convenes mais ou menos hermticas da descrio
elaborada para fins de investigao. O conhecimento do patrimnio musical,
passa pela sua inventariao de uma forma acessvel, normalizada,
disponibilizvel em bases de dados de natureza generalista como as das
bibliotecas e arquivos pblicos.
O estudo que ora propomos resulta da constatao, em 13 de anos de
contacto profissional com documentao musical escrita, da insuficincia das
normas e regras utilizadas para a sua identificao e descrio. Pretendemos,
pois, com a falibilidade de qualquer trabalho desta natureza, conseguir um
6 LEI n. 107/2001 (2001-09-08) 7 Idem, art. 19
5
equilbrio entre as regras de catalogao de msica usadas nas bibliotecas,
demasiado generalistas, e as regras usadas normalmente pelos musiclogos para
a descrio das espcies que so objecto dos seus estudos, demasiado
especficas e inacessveis a um pblico menos especializado. O produto final ser,
esperamos, um modelo de descrio conforme s prticas e ao esprito
subjacente catalogao nas bibliotecas mas suficientemente detalhado para
resultar num instrumento til para msicos e musiclogos.
Nos ltimos seis anos, as normas internacionais para descrio bibliogrfica
e para descrio arquivstica tm sido alvo de uma reviso sistemtica luz de
uma nova lgica focada no utilizador da informao e, tambm, de novas
possibilidades tecnolgicas, particularmente aquelas associadas ao ambiente
Web. Em particular, a norma internacional para a descrio de msica impressa
ISBD(PM) inicia no ano de 2005 um processo de reviso sujeito a propostas
internacionais. Ao mesmo tempo, esto em reviso as regras de catalogao
anglo-americanas AACR e o formato UNIMARC para a msica. Esto,
tambm, a decorrer estudos no sentido de adequar os incipit musicais, usados
nas regras RISM, aos formatos legveis por mquina usados nas bibliotecas por
forma a torn-los pesquisveis. So, ainda, numerosos os estudos de natureza
terica e experimental relacionados com a aplicao dos requisitos funcionais
para os registos bibliogrficos FRBR identificao de obras musicais. , pois,
todo um mundo novo de possibilidades que se abre evoluo das normas de
catalogao de msica.
Embora muito lentamente, tm sido feitas algumas tentativas no sentido de
tratar a documentao musical existente nas nossas bibliotecas e nos nossos
arquivos em particular os das igrejas quer atravs de trabalhos de musicologia,
quer atravs do trabalho de identificao e inventariao de fundos musicais na
Biblioteca Nacional e em outros pontos do Pas onde o trabalho, mais ou menos
solitrio, dificilmente chega a ser conhecido.
A publicao da traduo da ISBD(PM) pela Biblioteca Nacional, prevista
para o corrente ano de 2005, tambm um dado que torna evidente a
oportunidade de um estudo como o que ora se apresenta e de outros,
6
direccionados para outras reas aplicadas msica, como as linguagens
documentais, as classificaes, a arquivologia musical e o tratamento de registos
sonoros.
Neste estudo abordamos um conjunto de problemas associados ao actual
quadro normativo, detectamos as suas foras e fragilidades e procuramos, em
sntese, responder s seguintes questes:
Em que medida o actual quadro normativo relativo catalogao contempla
os elementos necessrios representao de documentos musicais escritos, de
modo a responder s necessidades de informao dos utilizadores em geral e,
em particular, aos utilizadores especialistas em msica ?
Quais os elementos relativos a espcies musicais escritas necessrios a
encontrar, identificar, seleccionar e aceder informao com eles relacionada?
Debruamo-nos apenas sobre a catalogao de msica escrita, no
abordando os registos sonoros nem os aspectos relacionados com a indexao
por assuntos ou com sistemas de classificao. Cada uma destas reas, por si s,
forneceria material temtico para vrias dissertaes de mestrado.
A pesquisa seguiu as seguintes fases concomitantes mas intelectualmente
distintas:
Reviso da bibliografia j existente, quer impressa quer disponvel em
linha. Esta fase teve como objectivo, no apenas tomar conhecimento dos
problemas j levantados por especialistas mas tambm preparar os instrumentos
de trabalho necessrios s fases seguintes. Dada a profuso de material
disponvel e o seu crescimento constante, decidimos dar por concluda a pesquisa
bibliogrfica no final de Janeiro de 2005. Os resultados desta reviso apresentam-
se na Parte I e distribuem-se pelos Captulos I e II, fazendo, no primeiro, um
percurso da evoluo das normas de descrio de msica, integrando-as no
7
contexto geral das normas de descrio de outras tipologias documentais; e, no
segundo, uma reviso dos estudos tericos e prticos com mais influncia na
evoluo actual da normativa.
Identificao dos elementos necessrios recuperao da informao
relacionada com as espcies musicais escritas com base em estudos prvios
recolhidos na bibliografia e na anlise detalhada das caractersticas da
documentao. O captulo III preenche integralmente a Parte II e faz o
levantamento dos problemas especficos que se colocam descrio de
documentos musicais integrando-os nos estudos que tm abordado estes
problemas.
A Parte III constituda pelos Captulos IV e V. No Captulo IV
apresentamos um conjunto de propostas que pretendem contribuir para as
revises do modelo FRBR, da ISBD(PM) e da aplicao do formato UNIMARC
msica. O Captulo V consiste num exerccio de aplicao das propostas
apresentadas no captulo IV e que visa testar a sua viabilidade. Escolheu-se um
conjunto de registos bibliogrficos da pera Lauriane, do compositor portugus
Augusto Machado.
A bibliografia apresentada no final do corpo da dissertao, de acordo com
a NP 405-1. As citaes seguem a mesma norma, tendo-se optado pelo sistema
de referncia abreviada com localizao em nota (NP 405-1, regra 9.3).
8
CAPTULO I
O percurso das normas de descrio para documentos musicais
No ano em que esta dissertao apresentada, passam 25 anos sobre o
primeiro texto da norma internacional para a descrio bibliogrfica de msica
impressa ISBD(PM)8. Em 1980, porm, era j longo o caminho percorrido no
que respeita s normas de catalogao, em geral, e das prticas de descrio de
espcies musicais, em particular.
O primeiro passo sistemtico no desenvolvimento de regras de catalogao
de msica de aplicao internacional d-se logo a seguir ao fim da Segunda
Guerra Mundial, ainda antes dos primeiros trabalhos destinados coordenao
das regras gerais de catalogao. Em 1949, os congressos da IMS9, em Basileia,
e da IAML10 , em Florena, concluram da necessidade de iniciar um projecto
exaustivo de descrio de fontes musicais existentes em todo o mundo,
necessidade que levaria criao, em 1952, do Projecto RISM Rpertoire
Internationale des Sources Musicales. Nesta altura, ainda no estavam
estabelecidas quaisquer normas de aplicao internacional para a descrio de
documentos, pelo que as regras estabelecidas pelo Projecto RISM se
desenvolveram independentemente de normas biblioteconmicas e se basearam
nas necessidades de informao especficas da investigao musicolgica.
Em 1954, a IFLA11 criou um grupo de trabalho encarregue de estudar a
coordenao das regras de catalogao no plano internacional. Estes trabalhos
culminaram na conferncia internacional sobre os princpios de catalogao
(ICCP 12 ) realizada em Paris, em 1961. Nesta conferncia, cujas concluses
ficaram conhecidas como Princpios de Paris, estabeleceram-se os primeiros
fundamentos de todas as normas e regras de catalogao a aplicar
8 International Standard Bibliographic Description for Printed Music 9 International Musicology Society 10 International Association of Music Libraries, Archives and Documentation Centres 11 International Federation of Library Associations and Institutions 12 International Conference on Cataloguing Principles
9
internacionalmente, particularmente no que respeita aos cabealhos principais e
secundrios, dando origem, em 1967, primeira edio das regras de
catalogao anglo-americanas (AACR13) e, em 1969, publicao dos Trabalhos
Preparatrios das Regras Portuguesas de Catalogao14.
Ainda nessa dcada, desenvolveram-se os primeiros sistemas informticos
de processamento de dados bibliogrficos que, j ento, visavam a organizao
de catlogos colectivos ou partilhados, nomeadamente o programa norte
americano de catalogao partilhada Shared Cataloguing Program. O objectivo
final seria a possibilidade de partilhar e transferir dados bibliogrficos. O Shared
Cataloguing Program deriva da necessidade de gerir grande quantidade de dados
bibliogrficos provenientes de muitos pases, principalmente os centralizados na
Library of Congress. Se os dados bibliogrficos de origem pudessem ser
adoptados sem alterao, no haveria necessidade de recatalogao no destino,
bastando adaptar os cabealhos e introduzir os pontos de acesso por assunto. O
uso de formatos comuns seria, pois, de toda a vantagem para a economia de
meios das bibliotecas encarregues de reunir grandes quantidades de dados
bibliogrficos, em particular daquelas com funes de agncias bibliogrficas
nacionais. Para esse objectivo, em 1966, a Library of Congress criava o primeiro
formato de catalogao legvel por mquina MARC 15 que continua em
evoluo.
Em 1969, deu-se um novo passo decisivo na normalizao da catalogao,
quer na forma, quer no contedo, com a organizao, pela comisso de
catalogao da IFLA, da reunio internacional de especialistas em catalogao,
em Copenhaga. Nesta reunio, ficaram definidos os princpios de catalogao
que esto na gnese das normas internacionais de descrio bibliogrfica (ISBD).
Neste ponto h que precisar alguns conceitos. O termo catalogao
usado em biblioteconomia com dois sentidos: no sentido restrito, o termo designa,
apenas, a descrio formal de um documento; o sentido lato inclui, tambm, o
13 Anglo-American Cataloguing Rules 14 Publicados pela Direco-Geral do Ensino Superior, como separata do boletim Bibliotecas e arquivos 15 Machine Readable Cataloguing
10
estabelecimento de pontos de acesso por autores e ttulos. Em qualquer dos
sentidos est excluda a determinao dos assuntos, seja mediante termos de
indexao, seja mediante um sistema de classificao. As AACR, bem como as
RPC16 e, de uma maneira geral, os diversos cdigos catalogrficos nacionais,
tratam a catalogao no seu sentido amplo, ou seja, determinam as regras para a
descrio bibliogrfica e as regras para o estabelecimento dos pontos de acesso
de autores e ttulos. Pelo contrrio, as ISBD tratam a catalogao apenas no seu
sentido restrito, ou seja, a descrio propriamente dita e constituem, basicamente,
uma estrutura de dados: prescrevem as fontes que fornecem os dados
bibliogrficos a serem includos na descrio de um documento, a ordem em que
so apresentados esses dados e a pontuao que os identifica; estabelecem,
ainda, as convenes relativas omisso ou incluso de dados por iniciativa do
catalogador. O objectivo conseguir uma estrutura de descrio suficientemente
flexvel para se adaptar s prticas e polticas de catalogao particulares mas
suficientemente rgida para eliminar a ambiguidade, permitir a troca de informao
proveniente de fontes e em lnguas diferentes e facilitar a converso das entradas
bibliogrficas em formatos legveis por mquina. Deste modo, torna-se possvel a
cada biblioteca escolher os elementos que figuram em cada descrio, de acordo
com a sua poltica de catalogao, na condio de estes serem apresentados
pela ordem e precedidos da pontuao prescritas pela ISBD.
A primeira ISBD a ser desenvolvida foi a relativa descrio de monografias
ISBD(M) 17 - facto que acabaria por condicionar a estrutura das normas
seguintes. O primeiro texto daquela que viria a ser a ISBD(M) foi publicado em
1971, ainda sob a forma de Recomendaes. A sua adopo para a elaborao
de bibliografias nacionais seria rpida e extensiva tendo levado reviso de
numerosas regras nacionais, nomeadamente, em 1972, o Anteprojecto das
Regras Portuguesas de Catalogao18. O xito desta experincia levaria, ainda
durante esse ano, proposta para a criao de uma norma internacional de
descrio bibliogrfica para publicaes em srie.
16 Regras Portuguesas de Catalogao 17 International Standard Bibliographic Description for Monographic Publications 18 Separata do boletim Bibliotecas e arquivos
11
A primeira edio da norma internacional de descrio bibliogrfica para
monografias ISBD(M) , j com valor normativo, seria publicada em 1974, ento
j com as alteraes introduzidas pelos trs anos de experincia intensiva em
muitos pases. No ano seguinte dava-se por concludo, em Portugal, o Projecto
das Regras Portuguesas de Catalogao.
J nesta altura se tinha compreendido que a escrita e os materiais
impressos por processos tradicionais constituam, apenas, uma parte dos
documentos existentes nas bibliotecas e outros centros de armazenamento,
gesto e difuso de informao, parte essa cujo peso proporcional tendia a
diminuir medida que novas e velhas formas de registar a informao cresciam
em nmero e se desdobravam em complexidade. Ao longo dos anos imediatos
publicao da ISBD(M), seriam numerosas as propostas de adopo da ISBD
para outras tipologias documentais de tal modo que se tornou evidente que era
inadivel a criao de normas internacionais de descrio para documentos que
existiam em profuso crescente nas bibliotecas mas para os quais a ISBD(M) se
revelava insuficiente. Eram os casos da cartografia, do livro antigo, dos materiais
grficos, sonoros e audiovisuais nas suas variadas formas e das partituras
musicais.
Para estabelecer um ponto de ordem, afigurou-se essencial estabelecer uma
norma internacional geral na qual todas as futuras normas internacionais de
descrio bibliogrfica se baseassem, norma geral essa que, por sua vez, teria de
ser coerente com a norma especfica j existente e que tinha sido concebida para
a descrio de monografias.
Ainda esta norma geral no estava concluda, j a comisso de catalogao
da IAML propunha, em 1975, a criao de um grupo de trabalho conjunto com a
comisso de catalogao da IFLA com vista a elaborar uma norma internacional
de descrio bibliogrfica para msica impressa, grupo que seria constitudo em
12
1976. Seguiram-se dois anos de trabalho coordenado com os trabalhos
preparatrios da ISBD(G)19 que seria publicada em 1977.
Em 1974, na UNESCO Intergovernmental Conference, era definido pela
IFLA e pela UNESCO o programa de controlo bibliogrfico universal e formato
MARC internacional UBCIM20 o qual visava tornar universalmente disponveis
para troca, sob forma internacionalmente aceite, os dados bibliogrficos relativos
a todas as publicaes. O conceito de controlo bibliogrfico universal discutido
desde que as primeiras aplicaes informticas o tornaram possvel tendo levado
a dois tipos de soluo: catalogao centralizada e catalogao cooperativa (de
que o j mencionado Shared Cataloguing Program da Library of Congress o
primeiro exemplo, ainda nos anos sessenta).
Em 1977 eram publicadas as primeiras edies das normas internacionais
de descrio bibliogrfica para publicaes em srie ISBD(S) 21 para
documentos cartogrficos ISBD(CM) 22 e para material no-livro (grfico,
sonoro e audiovisual) ISBD(NBM)23 e as recomendaes relativas forma dos
cabealhos para nomes de pessoas24. No mesmo ano saa a primeira verso do
formato UNIMARC, um formato MARC destinado, inicialmente, a funcionar para
efeitos de converso universal de dados mas que acabaria por se tornar um
formato de catalogao adoptado por numerosas bibliotecas em todo o mundo.
Perante a multiplicao de normas internacionais j publicadas decidiu-se,
durante o congresso da IFLA realizado nesse ano em Bruxelas, que todos os
textos das ISBD, j publicados ou a publicar, ficariam inalterados durante cinco
anos no termo dos quais se estudaria a sua reviso no todo ou em parte. Outras
edies das ISBD, entretanto, continuavam a ser publicadas: em 1978, era
publicada a primeira reviso da ISBD(M) baseada na ISBD(G) e no mesmo ano
19 General International Standard Bibliographic Description 20 Universal Bibliographic Control and MARC Format Programme 21 International Standard Bibliographic Description for Serials 22 International Standard Bibliographic Description for Cartographic Material 23 International Standard Bibliographic Description for Non Book Material 24 Guidelines for Authority and Reference Entries
13
era tambm publicada a edio revista das regras de catalogao anglo-
americanas, designada normalmente AACR2; as AACR2 contemplavam j a
descrio de materiais que as ISBD s iriam contemplar nas edies de 1980:
livro antigo ISBD(A)25 e msica impressa ISBD(PM)26.
Para assegurar a reviso ao fim dos cinco anos de experincia, foi
constituda uma comisso de reviso das ISBD ISBD Review Committee que
se reuniu em Londres em Agosto de 1981, quatro anos depois de sair a primeira
edio da ISBD(G). Esta reviso visava, principalmente, a letra das normas,
eliminando incoerncias nas definies e directivas, resolvendo questes de
pontuao, alargando e melhorando os exemplos e abrindo as ISBD s escritas
no latinas. O contedo, porm, sofreu poucas alteraes. Depois desta primeira
reviso eram concludas, em Portugal, as Regras Portuguesas de Catalogao
sendo publicadas em 1984.
Apesar de relativamente lento, o processo de reviso, adaptao e
actualizao das ISBD foi contnuo desde ento. Em 1987 foram publicadas as
edies revistas da ISBD(CM), da ISBD(M) e da ISBD(NBM), em 1988 a edio
revista da ISBD(S), no mesmo ano as orientaes para a aplicao das ISBD
descrio de partes componentes27 e, em 1991, a edio revista da ISBD(A).
O trabalho sobre a reviso da ISBD(PM) comeou na conferncia anual da
IAML, em 1984, realizada em Como (Itlia) e teve em conta as sugestes
emanadas das revises em curso nas outras ISBD. Em Julho de 1987 foi redigido
e difundido por todo o mundo um projecto definitivo tendo os comentrios
recebidos sido levados em considerao na preparao da edio revista da
ISBD(PM), publicada em 1991.
Em 1990, o seminrio de Estocolmo sobre os registos bibliogrficos, sob a
gide do programa para o controlo bibliogrfico universal e formato MARC
internacional (UBCIM28) da IFLA e da seco Controlo Bibliogrfico tambm da
25 International Standard Bibliographic Description for Antiquarian 26 International Standard Bibliographic Description for Printed Music 27 Guidelines for the application of the ISBDs to the description of component parts 28 Universal Bibliographic Control and MARC Format Programme
14
IFLA, adoptou uma resoluo no sentido de virem a ser definidos os requisitos
mnimos para os registos bibliogrficos produzidos pelas agncias bibliogrficas
nacionais. Esta definio visava clarificar de forma precisa o que se pretende de
um registo bibliogrfico tendo em considerao a necessidade de reduzir os
custos de produo dos registos bibliogrficos sem prejuzo da eficcia da
resposta s necessidades dos utilizadores e tomando em considerao a
diversidade de necessidades geradas pelos variados suportes bem como a
diversidade dos contextos de utilizao dos registos bibliogrficos. Dois anos
depois, no congresso da IFLA em Nova Deli, era aprovado o incio do estudo e
era constitudo o grupo de trabalho.
Aps vrios trabalhos preparatrios, o estudo era aprovado, em 1997,
durante o congresso de Copenhaga, pelo comit permanente da seco de
catalogao da IFLA e publicado pela Saur em 1998: Functional Requirements for
Bibliographic Records FRBR. Este estudo acabaria por se revelar o mais
importante documento orientador jamais produzido desde os Princpios de Paris,
de 1961.
Apesar do objectivo inicial dos FRBR ser a definio dos requisitos mnimos
para os registos bibliogrficos produzidos pelas agncias bibliogrficas um
objectivo essencialmente econmico a sua repercusso ultrapassou, em muito,
este objectivo. Ao englobar numa estrutura lgica a descrio, a determinao
dos pontos de acesso por autores e ttulos e ainda a determinao dos assuntos,
os FRBR fazem uma abordagem diferente da de Paris, abordagem esta
abrangente e estruturada prpria anlise do documento, centrando-a no
utilizador da informao. Esta abordagem, apoiada em trabalhos cientficos
prvios que sero focados no captulo II, permite olhar para as normas j
existentes de outra forma e estimula o esforo de aperfeioamento das mesmas
normas.
Antes da concluso dos FRBR mas certamente no alheia a estas, a IAML
avanava, durante o encontro em Ottawa do IAML Council, em 1994, com um
grupo de trabalho para a definio dos elementos obrigatrios e opcionais nos
15
registos bibliogrficos de msica e registos sonoros CBR 29 . Este grupo de
trabalho debruou-se sobre os registos bibliogrficos para trs tipos de
documentos msica impressa, registos sonoros e msica manuscrita tendo
apresentado trs relatrios distintos entre 1995 e 1996.
Os enormes avanos na edio electrnica e na disseminao de
publicaes em srie bem como a publicao dos FRBR, levam a IFLA a
desenvolver, a partir de 1998, uma reviso drstica de todas as ISBD, em
particular da ISBD(G) aquela que mais pode influenciar futuros
desenvolvimentos em outras ISBD e da ISBD(S) com vista sua substituio
por uma nova norma internacional destinada a descrever todas as publicaes em
continuidade independentemente da forma ou do suporte, o que, alm das sries
e publicaes peridicas tradicionais, permite incluir as revistas electrnicas, as
newsletters difundidas por correio electrnico e os websites: International
Standard Bibliographic Description for Serials and Other Continuing Resources
ISBD(CR). Esta ltima levou mais de trs anos a concluir, tendo sido publicada
em 2002, no mesmo ano em que saiu a reviso da ISBD(M), e a ISBD(G) foi
publicada mais recentemente, em 2004, apenas na Internet, por haver a
conscincia da necessidade de manter o documento sujeito a revises mais
frequentes.
Em 2003, o encontro de especialistas sobre o cdigo internacional de
catalogao 30 , realizado em Frankfurt, estabelece uma nova Declarao de
Princpios que vem substituir os Princpios de Paris alargando-se a todos os tipos
de materiais e a todos os aspectos do controlo bibliogrfico e registos de
autoridade usados nos catlogos. Estes novos Princpios incorporam j o modelo
e a terminologia definidos no relatrio final dos FRBR.
No mesmo ano, o UBCIM Universal Bibliographic Control and International
MARC extinto sendo substitudo pelo ICABS IFLA-CDNL Alliance for
29 Core Bibliographic Record 30 IFLA MEETING OF EXPERTS ON AN INTERNATIONAL CATALOGUING CODE, 1, Frankfurt, Germany, 2003 Statement of International Cataloguing Principles
16
Bibliographic Standards o qual herda as funes do UBCIM e do UDT
Universal Dataflow and Telecommunnications. Esta aliana rene a IFLA, a
CDNL31, a Library of Congress, a British Library, a Deutsche Bibliothek, a National
Library of Australia e a Biblioteca Nacional de Portugal, estando esta ltima
responsvel pelo programa de promoo e desenvolvimento do formato
UNIMARC.
Presentemente, esto em estudo as Guidelines for Using UNIMARC for
Music. Durante o ano de 2005 ser editada pela Biblioteca Nacional de Portugal a
primeira traduo em lngua portuguesa da ISBD(PM), ainda a partir da edio de
1991, aguardando-se os resultados da reviso da ISBD(PM), cujo incio a IFLA
prev para o corrente ano de 2005.32
31 Conference of Directors of National Libraries 32 Em Anexo 1 Cronologia das normas
17
CAPTULO II
Os novos desenvolvimentos tericos
A catalogao o processo atravs do qual se descreve formalmente um
documento ou recurso e se estabelece um nmero variado e varivel de pontos
de acesso com o objectivo de proporcionar ao utilizador final a possibilidade de
encontrar, identificar, seleccionar e obter o documento ou recurso descrito ou a
informao nele contida.33 Para a descrio de quaisquer documentos recorre-se
a critrios sinalticos extrados do prprio documento, mais ou menos
reformulados: informao sobre a prpria obra (no caso dos documentos musicais,
gnero, dispositivo, tonalidade, etc.), informao sobre o documento em si
(tipologia, publicao, dimenses, etc.) e critrios analticos e sistemticos
resultantes de uma deduo, de uma anlise de contedo (formas, temas,
funes) expressos pelo meio de terminologias ou thesauri e de sistemas de
classificao.34
O registo bibliogrfico identifica e descreve um documento na sua mltipla
realidade fsica e intelectual funcionando como um seu substituto na medida em
que permita a um utilizador encontrar, identificar, seleccionar e aceder uma obra,
uma edio ou um exemplar numa biblioteca, num centro de documentao, num
arquivo ou num museu. Como explica Howarth 35 : The inherent value or
usefulness of the bibliographic surrogate resides in its ability to represent each
entity (item or object) uniquely, permitting different manifestations or formats of the
title to be distinguished one from another. Entre outras coisas, uma descrio
documental de qualidade permite poupar tempo ao utilizador ao evitar a consulta
de documentos no pertinentes, em alguns casos, ao substituir a consulta de
alguns documentos pertinentes por conter j a informao pretendida e ainda, por
contribuir para a conservao, ao reduzir o manuseamento dos documentos
consultados. Isto significa que, quando confrontado com um registo bibliogrfico,
33 IFLA Functional Requirements for Bibliographic Records : final report, p. 8-9 34 GIULIANI, Elisabeth Des normes aux mtadonnes 35 HOWARTH, Lynne C. Content versus carrier, p. 2
18
o utilizador deve encontrar nele toda a informao necessria a uma deciso
quanto sua consulta. Se o utilizador do catlogo no conseguir encontrar uma
entidade que procura (uma obra, uma expresso de uma obra, uma
manifestao dessa expresso ou um item em particular) apesar de essa
entidade existir na biblioteca, ou no conseguir saber com certeza que essa
entidade no existe na biblioteca, ento o catlogo no cumpre a sua funo. Se
o utilizador do catlogo, ao analisar um registo bibliogrfico, no conseguir saber
se a entidade que procura aquela que est descrita no registo, se no conseguir
saber se vale ou no a pena consult-la (em funo das suas necessidades) ou,
no limite, se souber mas no tiver meios de a obter (por a sua localizao fsica
no estar indicada) ento o registo bibliogrfico no cumpre a sua funo.
Durante muito tempo, o principal foco da teoria da catalogao foi as
funes do catlogo o produto final do processo. O catlogo era visto como um
contentor de entradas bibliogrficas, cada uma concebida como uma unidade
independente descrevendo um determinado item fsico. As bibliotecas tradicionais
possuam o catlogo como um mero inventrio das existncias, uma forma de
controlar que livros possuam. Em 1876, Charles Ammi Cutter 36 faz uma
abordagem diferente ao atribuir ao catlogo de uma biblioteca objectivos
relacionados com o seu contedo intelectual: encontrar um livro com determinado
ttulo, autor ou assunto, mostrar o que a biblioteca possui de um dado autor,
assunto ou gnero e escolher um livro de acordo com a sua edio ou
caractersticas. Esta abordagem representa uma evoluo importante por fazer
desviar o foco da existncia fsica do livro, enquanto objecto, para a existncia
intelectual do livro, enquanto suporte de um determinado contedo. Em termos
normativos, contudo, so os Princpios de Paris que, em 1961, levam a teoria e a
prtica catalogrfica para outro nvel conceptual. Os Princpios de Paris focavam
a descrio aplicada escolha e forma dos cabealhos, diferenciando as funes
de descrio e de ordenao. As funes do catlogo, contudo, continuavam a
ser a de um mero contentor de informaes desligadas entre si.
36 Apud VELLUCCI, Sherry L. Bibliographic relationships in music catalogs, p. 5
19
Mais recentemente, a teoria tem-se focado nas funes do registo
bibliogrfico e, paralelamente, no controlo de obras para alm dos seus suportes
fsicos. A prpria alterao da terminologia de entrada bibliogrfica para registo
bibliogrfico sinal disto. As Regras Portuguesas de Catalogao (1984)
definem assim: Dizem-se Entradas as unidades de informao constitudas por elementos, que identificam e por vezes descrevem os documentos [...]. Quando
agrupadas e ordenadas, as entradas formam catlogos. Mas porqu entradas?
Porque cada uma tem um cabealho que serve para a ordenao no catlogo e
pelo qual ser feita a pesquisa. A entrada , pois, isso mesmo: uma porta, um
acesso, uma forma de chegar a um determinado conjunto de informaes. O
mesmo sucede com as entradas de uma enciclopdia impressa. Nesta, s h
uma maneira de chegar a cada unidade de informao: pela entrada, ordenada
alfabeticamente. A questo que se coloca : uma enciclopdia tem 5000 entradas.
Mas quantas informaes tem? Poder, no ambiente electrnico, continuar a
falar-se de entradas quando este nos permite navegar de entrada em
entrada sem ser pela pesquisa da palavra ou termo que a encabea? E no
catlogo electrnico? Quantas formas temos de chegar a uma informao?
por esta razo que o termo entrada, embora no obsoleto, tende a cair
em desuso. O que temos agora so registos. Cada registo literalmente regista
um conjunto de informaes seleccionadas e organizadas segundo uma
determinada lgica; mas as formas de chegar a esse registo so mltiplas. J no
temos uma entrada: temos um open space, sem portas, sem paredes, mas com
uma sofisticada arquitectura interior. As funes do registo bibliogrfico so, pois,
agora, o foco da teoria catalogrfica. Isto reflecte um interesse crescente em
bases de dados relacionais e orientadas para objectivos.37 O catlogo deixa de
ser o contentor de entradas bibliogrficas independentes para se tornar numa
estrutura organizada de registos bibliogrficos com dados armazenados em
diferentes ficheiros.
37 VELLUCCI, Sherry L. Bibliographic relationships in music catalogs, p. 254
20
Desde meados dos anos 80 do Sculo XX, devido a esta evoluo dos
meios informticos ao dispor das bibliotecas, o debate muito embora no sendo
novo avolumou-se em torno de vrias questes de natureza terica mas de
relevante aplicao prtica na organizao da informao, em geral, e na
catalogao, em particular. possvel distinguir trs temas principais que tm
funcionado como centros de debate: 1) O conceito de obra; 2) As relaes
bibliogrficas; 3) O utilizador e a pesquisa.
1. O conceito de obra
O conceito de obra e a sua distino em relao a outros conceitos
importantes para a informao bibliogrfica tm sido debatidos por vrios
investigadores. O primeiro problema que se coloca em relao ao conceito de
obra tem a ver com o facto de uma obra qualquer que ela seja, literria,
cientfica, etc. no ser uma realidade material e tangvel. Nas palavras de A.
Domanovsky38, an abstraction, an immaterial, intellectual reality. Uma obra
ainda uma realidade mutvel podendo, ao longo do tempo, desde o momento em
que criada, sofrer as mais variadas utilizaes, interpretaes e alteraes e
tornando, por vezes, os seus limites difceis de definir. Ainda para Domanovsky, a
obra, may change freely it may be revised, enlarged, abridged; its formal marks,
its title or the name of its author, may be altered; and even the person(s) of the
author(s) may change without the work losing its identity, without its becoming a
different, a new, work39
Alm da discusso do conceito de obra em si mesmo tem ainda sido
discutido o conceito de obra em relao a outros dois conceitos expresso e
manifestao:
O primeiro diz respeito distino entre obra, enquanto criao intelectual e
a expresso dessa obra ou seja, a sua realizao sob qualquer forma: um texto
38 Apud SMIRAGLIA, Richard P. The nature of a work, p. 26 39 Idem. Ibidem, p. 26
21
original e a sua traduo, uma sinfonia e a sua reduo para piano, uma pintura e
a fotografia dessa pintura.
Outro aspecto diz respeito distino entre a obra (ou uma das suas
expresses) e a sua materializao, a sua manifestao fsica: o manuscrito, o
registo sonoro, a edio em papel.
1.1. Obra e expresso
Ao binmio obra-expresso Patrick Le Buf 40 , de forma imaginativa,
designa com o neologismo workspression. Esta distino entre obra e
expresso no simples nem pacfica. As distines apresentadas nos cdigos
catalogrficos no so suficientes. Distinguir quando estamos na presena de
uma nova expresso de uma obra ou quando estamos na presena de uma nova
obra baseada numa anterior levanta muitos problemas que, para alm dos
aspectos puramente tericos cuja discusso cabe s teorias da arte e da literatura,
filologia e musicologia, se traduzem em questes de ordem muito prtica e
que se colocam ao catalogador.
Nas Anglo-American Cataloguing Rules (AACR), o cdigo catalogrfico mais
amplamente utilizado, estes critrios so explcitos e consideram como mudana
suficiente para gerar uma nova obra a reescrita de um texto para outra forma (por
ex., a dramatizao de um conto), a filmagem de uma pea, a adaptao de uma
obra de arte de um meio para outro (por ex., de pintura para gravura), a mudana
de ttulo de uma srie, a reviso de um texto acompanhada de uma mudana de
meno de responsabilidade, a adio de comentrio ou crtica quando este tem
mais nfase no rosto, a transcrio livre da obra de um compositor, uma obra
musical baseada em outra (por ex. variaes sobre um tema), a aplicao de
msica a um texto pr-existente.
Por outro lado, as AACR consideram como no sendo mudana suficiente
para gerar uma nova obra a traduo, a adio de ilustraes, a reviso de um
40 LE BUF, Patrick Brave new FRBR world
22
texto pelo mesmo autor, o resumo de um texto, uma edio crtica, a adio de
comentrio ou crtica quando a obra original tem mais nfase no rosto, a
reproduo de uma obra de arte, o arranjo, transcrio, etc. de obra musical, a
improvisao, por um intrprete, sobre uma obra musical, a aplicao de
coreografia a uma obra musical pr-existente, a adio de um acompanhamento
musical ou partes adicionais a uma obra musical, a aplicao de letra a uma
msica pr-existente, a execuo de uma obra musical num registo sonoro, a
republicao com um novo tipo de letra, a republicao com um ttulo diferente no
rosto e a republicao como parte de uma srie diferente.
Fcil de ver como alguns destes critrios esto relacionados com
caractersticas intrnsecas da obra (a transcrio livre da obra de um compositor,
por exemplo) enquanto outros dizem respeito forma como a obra ocorre no
documento catalogado (a adio de comentrio ou crtica depende da nfase no
rosto da publicao para ser considerada ou no uma nova obra). Tais critrios
nada tm a ver com a natureza de uma obra e no podem ser considerados como
vlidos para o debate terico.
Na primeira parte das Regras Portuguesas de Catalogao (RPC), dedicada
determinao e forma dos cabealhos, percebe-se que as regras se aplicam a
obras sendo necessrio, para a sua aplicao, determinar com exactido as
autorias das obras contidas nas edies. Apesar de em local algum das RPC se
definir a palavra obra percebe-se implicitamente, pelas prprias regras, que, tal
como nas AACR, h uma distino entre obra original e nova obra baseada numa
obra original, particularmente quando se trata de estabelecer a autoria em obras
de autoria mista e em tradues, adaptaes, etc. Nestes casos, tal como as
AACR, as RPC so explcitas: Desde que se apresentem como modificao
significante e profunda, quer do contedo, quer do gnero e forma literrios, do
texto original em que se baseiam, tais como adaptaes, arranjos, dramatizaes,
cinematizaes, verses livres, comentrios sobrelevando a obra, obras que
incluem material biogrfico e crtico, tm:
Entrada principal, pelos elementos da nova obra;
23
Entrada secundria, pelos elementos da obra original41
No entanto, na segunda parte das RPC, dedicada descrio bibliogrfica, a
distino entre os termos obra, edio e publicao no to clara. Alguns
exemplos (Fig. 1) fazem prova desta afirmao:
RPC
D.M. 1.3.5. ttulo original de uma obra
D.M. 1.5.1. Pessoas [...] que tenham contribudo para a realizao de uma obra
Obra
empregue com
sentido de obra D.M. 1.5.7.2. relao entre a colectividade e a obra
D.M. 1.5.7.2. Colectividades actuando como responsveis por uma publicao Publicao
empregue com
sentido de obra D.M. 5.2.7. Se a publicao se compe [...] de ilustraes
D.M. 0.7. obra a catalogar
D.M. 1.1.3. quando na obra aparece mais do que um ttulo
D.M. 1.1.7. rosto de uma obra
D.M. 1.5.6. menes [...] colhidas de outra(s) parte(s) da obra
D.M. 5.1.2. Obra em um s volume
Obra empregue
com sentido de
publicao
D.M. 5.1.2.9. Se uma obra apresenta [...] numerao
D.M. 1.4.2. quando outro ttulo aparece na publicao
D.M. 1.5.1. responsvel de uma publicao
Publicao
empregue com
sentido de
publicao D.M. 5.1.2.9. Se a publicao tem [...] paginao
Edio
empregue com o
sentido de
publicao
D.M. 4.1. lugar da edio
Fig. 1
Os exemplos apresentados demonstram bem como, sob o ponto de vista dos
cdigos catalogrficos essa distino no lmpida.
41 Regras portuguesas de catalogao. p. 35
24
1.2. Obra e manifestao
Directamente relacionada com o binmio anterior est a distino entre
obra e manifestao. Neste caso, a distino no se coloca ao nvel dos
conceitos perfeitamente distintos do ponto de vista intelectual mas ao nvel da
catalogao bastante mais difceis de distinguir do ponto de vista da aplicao
das regras.
Este debate muito mais antigo do que o debate sobre obra e expresso.
Julia Pettee42, em 1936, introduziu o conceito de unidade literria (literary unit)
a obra em oposio a unidade bibliogrfica (bibliographical unit) o documento
chamando a ateno para a necessidade de distinguir entre o livro fsico em
mo e o seu papel enquanto representante de uma unidade literria. Pettee
considerava essencial que o catlogo reunisse as unidades literrias sob um
nico cabealho independentemente das vrias formas em que estas pudessem
ocorrer. O conceito foi desenvolvido, entre outros, por Eva Verona43, em 1959,
por Seymour Lubetzky44, em 1961, por A. Domanovsky45, em 1974 e tem sido
retomado nas ltimas duas dcadas por autores como Martha M. Yee46 e Richard
P. Smiraglia47.
Numa primeira anlise, podemos dizer que qualquer documento contm uma
ou mais obras ou apenas partes de obras sendo, de imediato, fcil de perceber
que descrever um documento no o mesmo que descrever uma obra e que
estas realidades no so confundveis nem intermutveis. Em termos de
catalogao, estes conceitos traduzem-se numa diferena fundamental: como
unidade bibliogrfica, e para a funo repertorial do catlogo, o livro a edio de
uma obra da qual se apresenta o nome do autor e o ttulo; enquanto unidade
literria, e para a funo organizativa do catlogo, o livro a obra, dotada de um
ttolo uniforme e di um nome uniforme do autor (Buizza48).
42 Apud SMIRAGLIA, Richard P. The nature of a work, p.19-20 43 Idem Ibidem, p. 20 44 Idem Ibidem, p. 22-23 45 Idem Ibidem, p. 25-26 46 YEE, Martha M. What is a work? 47 SMIRAGLIA, Richard P. The nature of a work 48 BUIZZA, Pino Dai Principi di Parigi a FRBR, p. 1
25
Refora esta distino o facto de a maior parte das pesquisas bibliogrficas
se realizarem para obras e no para edies49. Por esta razo, muitos cdigos
catalogrficos estabelecem alguns critrios de distino explcitos ou implcitos
entre obra e publicao. No entanto, estes critrios so estabelecidos, apenas,
para efeitos da catalogao ou seja, como meras instrues para o catalogador
destinadas a auxili-lo na tomada de deciso quanto ao estabelecimento de
cabealhos de ttulo e/ou de autor.
Em relao s AACR, explica Michael Heaney 50 : Theoretically, access
points should arise from the description of the physical item, but in some instances
they depend upon decisions about the 'nature' of a work: for example, the text
versus commentary aspect or the original author versus revising author in AACR2
rule 21.21B. [...] In the end the decision is based on the cataloguer's conception of
what the work 'really' is. [...] The case where a known author is not named in the
work. Here the cataloguer is instructed to give the known author as the main entry
and to add a note identifying the person. Adding the note to the record is access
determining description.
Lynne C. Howarth51 chama a ateno para as incoerncias presentes nas
AACR quanto a este assunto: na primeira parte dessas regras, referente
descrio bibliogrfica, os elementos descritivos referem-se edio em mo o
item sendo as fontes prescritas de informao dependentes do formato. Em
contrapartida, a segunda parte, que trata os pontos de acesso, refere-se a obras e
no a manifestaes fsicas dessas obras, embora mantenha uma dependncia
pouco coerente relativa ao documento: While the code makes explicit that the
descriptive cataloguing is physical object-focused, and access points are work-
dependent, nonetheless the process involves using the chief source of information
for the item-in-hand as a starting point for the choice and form of main and added
entries.52
49 YEE, Martha M. What is a work?, p. 4 50 Apud HOWARTH, Lynne C. Content versus carrier 51 HOWARTH, Lynne C. Content versus carrier 52 Idem Ibidem, p. 3
26
2. Relaes bibliogrficas
Outra parte do debate tem focado as relaes bibliogrficas 53 . Existem
relaes bibliogrficas quando entidades bibliogrficas isto , quaisquer
conhecimentos registados num suporte so associados entre si de alguma
maneira (Vellucci54). Vellucci especifica: Bibliographic relationships should also
be distinguished from other relationships that exist in the bibliographic universe
[]. While both names and subjects may be related to a bibliographic entity, and
both name entities and subject entities may be used to help identify bibliographic
relationships and link related records, it is primarily those relationships between
two bibliographic entities that are included in the study of bibliographic
relationships.55
O estudo das relaes bibliogrficas muito importante para o
desenvolvimento de catlogos mais eficazes e amigveis, principalmente em
sistemas automatizados. Pode permitir o melhor cruzamento de informao, no
apenas no momento da pesquisa (mediante o uso de operadores booleanos),
mas tambm no momento da visualizao, atravs da navegao entre registos
bibliogrficos. Estas relaes podem ser explcitas ou implcitas, conforme o
sistema estabelea, ou no, ligaes de um registo para outro. O formato
UNIMARC, o mais usado nas bibliotecas Portuguesas, prev trs tipos de
relaes bibliogrficas expressas atravs dos campos de ligao do bloco 4xx:
1. Relaes verticais relaes todo-parte, por exemplo, a relao entre uma
coleco e cada um dos volumes que a constituem.
2. Relaes horizontais relaes entre verses em diferentes lnguas, formatos,
meios, etc.
3. Relaes cronolgicas relaes entre nmeros ou partes sucessivas.
53 No Anexo 2 apresentamos um quadro que sintetiza os modelos descritos neste ponto. 54 VELLUCCI, Sherry L. Bibliographic relationships, p. 1 55 Idem Ibidem
27
Na tese de doutoramento sobre o tema, em 1987, Barbara Tillett 56 ,
estabelece uma nova taxonomia de relaes bibliogrficas. Explicando que as
trs relaes previstas no formato UNIMARC so insuficientes por no cumprirem
os dois requisitos essenciais de uma taxonomia ser exaustiva e apresentar
categorias mutuamente exclusivas , Tillett prope no trs mas sete tipos
distintos de relaes bibliogrficas que pretendem cumprir esses requisitos:
1. Relaes de equivalncia entre cpias exactas da mesma manifestao ou
entre um original e a sua reproduo (facsimile, fotocpia, microforma, etc.). Estas
relaes so destacadas atravs dos elementos catalogrficos: entrada repetida57,
notas, ttulo uniforme.
2. Relaes derivativas correspondentes s horizontais no formato UNIMARC.
Relao entre um item58 bibliogrfico e uma modificao baseada no mesmo item,
incluindo variaes ou verses, edies, revises, tradues, adaptaes,
parfrases, novas obras baseadas em outras obras, etc. Estas relaes so
destacadas atravs dos elementos catalogrficos: referncias, entradas repetidas
para novas edies, menes de edio, notas, ttulos uniformes, referncias
cruzadas, cabealhos de assunto, entradas principais, ttulos de ordenao,
entradas secundrias. Foram posteriormente desenvolvidas por Smiraglia, como
veremos mais frente.
3. Relaes descritivas entre um item bibliogrfico ou obra e uma descrio,
crtica, avaliao ou resumo dessa obra incluindo edies anotadas, comentrios,
crticas, etc. Estas relaes so destacadas atravs dos elementos catalogrficos:
notas, entrada principal, entradas secundrias, entradas de assunto.
56 Apud VELLUCCI, Sherry L. Bibliographic relationships in music catalogs, p. 20-21 57 Dash entry: Um tipo de entrada exclusiva dos catlogos em papel e em uso apenas nas bibliografias. Um travesso (dash) encabea a ficha (ou a entrada) para indicar repetio do nome do autor seguida de outro travesso para indicar a repetio do ttulo. 58 O termo item, habitualmente utilizado na bibliografia em lngua inglesa e, particularmente, nas AACR, no tem uma correspondncia unvoca com qualquer termo em portugus. Com efeito, o termo item designa, por vezes, o exemplar em mos fisicamente considerado outras vezes uma determinada edio no obstante representada, necessariamente, por um determinado exemplar e outras vezes, ainda, uma verso de uma obra. Ao explanar as teorias produzidas por autores de lngua inglesa, respeitaremos o uso do termo item mas sempre ressalvando esta multiplicidade de sentidos. Neste caso concreto, o termo item abrange uma unidade bibliogrfica passvel de representao num catlogo. Poderamos traduzir por obra mas essa traduo resultaria enviesada em relao ao sentido com que o termo utilizado no nosso estudo.
28
4. Relaes de todo-parte correspondentes s verticais no formato UNIMARC.
Relao entre uma parte componente de um item bibliogrfico ou obra e o seu
todo, incluindo uma seleco de uma antologia, coleco ou srie. Estas relaes
so destacadas atravs dos elementos catalogrficos: notas de contedo,
entradas analticas, entradas secundrias, descrio multi-nvel, entradas
repetidas, ttulos uniformes, referncias explicativas.
5. Relaes de acompanhamento relaes entre um item bibliogrfico e o item
bibliogrfico que o acompanha, como quando dois itens se ampliam mutuamente
ou um item amplia o outro que o principal, incluindo suplementos,
concordncias, ndices, catlogos, etc. Estas relaes so destacadas atravs
dos elementos catalogrficos: meno de material acompanhante, notas,
entradas repetidas, descrio multi-nvel, notas de ligao entre registos distintos.
6. Relaes sequenciais correspondentes s cronolgicas no formato
UNIMARC. Relaes entre itens bibliogrficos que continuam ou precedem outros,
incluindo ttulos sucessivos de uma srie, sequelas de uma monografia, partes de
sries, etc. Estas relaes so destacadas atravs dos elementos catalogrficos:
notas, entradas secundrias, ttulos uniformes.
7. Relaes de caracterstica partilhada relaes entre dois itens bibliogrficos
pela coincidncia de um autor, ttulo, assunto ou qualquer outra caracterstica
usada como ponto de acesso. Estas relaes so destacadas atravs dos
elementos catalogrficos: ponto de acesso, lngua, editor comercial, data.
Em 1992, em tese de doutoramento, Smiraglia59 desenvolve as relaes
derivativas subdividindo-as em:
59 Apud VELLUCCI, Sherry L. Bibliographic relationships in music catalogs, p. 25
29
1. Derivaes simultneas Obras em duas edies publicadas
simultaneamente ou quase simultaneamente.
2. Derivaes sucessivas Obras revistas uma ou mais vezes e editadas com a
indicao de 2. (3., etc.) edio, nova edio, edio revista, etc., e ainda
obras editadas sucessivamente com novos autores bem como obras editadas
sucessivamente sem indicao da derivao.
3. Amplificaes Obras acompanhadas de ilustraes, verses musicais dos
textos, crticas, concordncias e comentrios que incluam o texto original.
4. Extraces Resumos de obras, condensaes e excertos.
5. Tradues Numa s lngua ou incluindo o texto original.
6. Adaptaes Simplificaes, verses para cinema, libretos, arranjos de obras
musicais e outras modificaes.
7. Execues Incluindo gravaes sonoras ou visuais.
Smiraglia introduz, ainda, o conceito de progenitor e de famlia
bibliogrfica: a verso primeira de qualquer obra, uma verso que no deriva de
qualquer outra e da qual todas as verses derivam.
Em 1997, Vellucci 60 acrescenta duas novas subdivises das relaes
derivativas, estas aplicveis apenas s obras musicais:
Apresentao musical Refere-se s caractersticas fsicas do modo de
transmisso da obra, ou seja, o tipo de partitura. Pode ser partitura, partitura
vocal, parte ou outro termo apropriado.
60 VELLUCCI, Sherry L. Bibliographic relationships in music catalogs
30
Transcrio notacional Consiste na transcrio da msica de um sistema
de notao para outro, por exemplo, de notao mensural para notao moderna.
Em 1998, Mey61 prope outra subdiviso das relaes derivativas as quais,
de algum modo, reagrupam as propostas anteriores:
1 Relaes derivativas directas entre as diferentes edies de uma obra, sem
que haja mudana ou acrscimo de responsabilidade, isto , em que o contedo
apresente poucas variaes;
2 Relaes derivativas conexas entre uma obra original e as suas tradues ou
manifestaes em outro suporte fsico preservando-se o contedo original, por
exemplo, o texto de uma pea teatral e sua leitura em disco ou uma transcrio
de msica para instrumento diferente daquele indicado na partitura original;
3 Relaes derivativas temticas entre a obra original e manifestaes dela
originadas, com mudana substancial de contedo mas preservao do tema, por
exemplo, novas edies com acrscimo ou mudana de responsabilidades,
pardias, adaptaes, entre outras.
3. O utilizador e a pesquisa
Estes debates tm tido como pano de fundo o binmio reduo de custos /
interesse do utilizador. Contudo, este binmio parece-se mais com um antnimo
porque o primeiro objectivo se atinge com a diminuio do detalhe na descrio
o chamado nvel mnimo e o segundo com um enriquecimento da descrio e
das relaes bibliogrficas por esta destacadas.
61 Apud MEY, Eliane Acesso aos registos sonoros
31
Em 1997, Yee62 apresenta um estudo sobre o conceito de obra que parte da
forma como o utilizador lida com o catlogo, baseada na sua observao
enquanto profissional. Essa observao leva-a a concluir que: 1) os utilizadores
procuram obras e no edies; 2) partem do princpio que, numa pesquisa, so
apresentadas todas as edies de uma dada obra; 3) normalmente desconhecem
edies que no encontram; 4) raramente tm meios de protestar ou lamentar-se
e, mesmo quando o fazem, no sabem analisar o problema para alm de dizerem
que no encontram o que procuram.
Ainda segundo Yee, quando os utilizadores no se queixam, isso no
significa que o catlogo esteja a cumprir a sua funo: One of the major reasons
we call ourselves a profession is that we have a kind of expert knowledge our
users do not necessarily have that allows us to help or harm them without their
realizing it. Thus, we have a professional and social responsibility to do everything
we can to help rather than harm, *even though* they cannot evaluate our work.63
A principal funo da catalogao , assim, para Yee, organizar o universo
bibliogrfico catico de forma a permitir aos utilizadores seleccionar a edio da
obra que vai ao encontro das suas necessidades quanto lngua, ilustrao,
proximidade fonte original, etc.
Esta reflexo est directamente relacionada com as discusses
anteriormente expostas e com o ponto que se segue.
4. Os FRBR
Em 1990, o Seminrio de Estocolmo sobre os Registos Bibliogrficos 64
decidiu a criao de um grupo de trabalho visando a definio dos requisitos
funcionais dos registos bibliogrficos (FRBR65). Para este debate, longe de estar
encerrado (mesmo depois da publicao dos FRBR, em 1998), tm contribudo
62 YEE, Martha M. What is a work? 63 Idem Ibidem, p. 4. E prossegue:I particularly want to make this point, because we are a profession under attack by a society that has never grasped the nature of our expertise, and thinks that Bill Gates intelligent assistants are going to solve all the problems they are having finding things on the Internet. 64 Sob a gide do Programa de Controlo Bibliogrfico Universal e Formato MARC Internacional (UBCIM) da IFLA e da Seco de Controlo Bibliogrfico da IFLA. 65 Functional Requirements for Bibliographic Records
32
especialistas em todo o mundo com maior incidncia nos Estados Unidos da
Amrica, Canad, Reino Unido, Frana e Itlia. Neste encontro foram adoptadas
nove resolues, uma das quais deu origem ao projecto de definio dos
requisitos funcionais dos registos bibliogrficos. Tratou-se de elaborar um quadro
conceptual que permitisse compreender claramente que informaes o registo
bibliogrfico visa fornecer e a prpria essncia daquilo que esperamos do registo
bibliogrfico, em termos de adequao s necessidades dos utilizadores.
Este estudo aplicou um modelo designado modelao entidade-relao66
(entity-relationship modelling) utilizado no desenvolvimento de modelos
conceptuais de sistemas de bases de dados relacionais. O conceito de entidade
um conceito importado da filosofia para a cincia da informao. Neste modelo,
entidades so as coisas acerca das quais se recolhe e conserva informao. A
primeira aco da tcnica de anlise de entidades consiste em isolar os objectos
fundamentais pertinentes para os utilizadores da informao num domnio
determinado (no necessariamente bibliogrfico). Por outras palavras, o que o
utilizador de uma base de dados procura. O utilizador pode procurar diversas
coisas que o modelo designa por entidades. Este o modelo que o estudo
aplicou s bases de dados bibliogrficas. O objectivo foi chegar a um modelo
conceptual a partir do qual fosse possvel estabelecer correspondncias entre, de
um lado, os atributos e relaes especficos e, de outro lado, as diversas
operaes efectuadas pelos utilizadores quando consultam os registos
bibliogrficos. Este modelo conceptual permitiria, por sua vez, adequar os dados
que figuram nos registos bibliogrficos s necessidades dos seus utilizadores e
preconizar um nvel mnimo do conjunto das funes que devem ser asseguradas
pelos registos bibliogrficos que as agncias bibliogrficas nacionais produzem.
O utilizador pode procurar uma obra67 ou seja, uma criao intelectual ou
artstica, por exemplo, a obra dramtica Macbeth, de William Shakespeare ou a 9
66 A tcnica de anlise entidade-relao aplicada pelo grupo de trabalho foi baseada em: MARTIN, James Strategic data-planning methodologies. Prentice-Hall, 1982; SIMSION, Graeme Data modeling essentials. Van Nostrand Reinhold, 1994; PERKINSON, Richard Data analysis : the key to data base design. QED Information Sciences, 1984; ELMASRI, Ramez et NAVANTHE, Shamkant Fundamentals of database systems. Benjamin : Cummings, 1989.
33
Sinfonia de Beethoven. Trata-se de uma entidade puramente abstracta, destituda
de qualquer materialidade; no existe qualquer objecto material que possa ser
designado como obra. A entidade obra apenas uma representao mental. A
entidade obra pode ainda constituir uma combinao de obras individuais
reunidas por um editor cientfico (as actas de um congresso, por exemplo), um
ciclo de canes, uma reunio de documentos privados articulados num nico
fundo de arquivo. De igual modo, a entidade obra pode representar um elemento
de uma obra de dimenses mais vastas como uma ria de uma pera, uma
comunicao num congresso ou uma carta.
O utilizador pode procurar uma expresso de uma obra, ou seja, a sua
realizao sob qualquer forma. atravs da expresso que se reconhece a
obra que lhe subjaz. uma entidade concreta mas ainda imaterial. Uma obra
pode encontrar a sua realizao em uma ou mais expresses (por exemplo, o
texto original, em ingls do sculo XVII, da obra Macbeth, uma verso em grafia
moderna da mesma obra ou ainda uma certa representao teatral dessa obra;
a partitura integral da 9 Sinfonia de Beethoven, a sua reduo para piano ou uma
interpretao da mesma obra pela Orquestra Filarmnica de Berlim). Toda a
alterao da forma (por exemplo, a declamao de um texto escrito) constitui uma
nova expresso. De igual modo, o facto de alterar as convenes intelectuais
(por exemplo, uma traduo) ou os utenslios que servem para exprimir uma
obra (por exemplo, os instrumentos musicais) d origem a uma nova
expresso da mesma obra. Uma expresso, por seu lado, constitui a
realizao de uma nica obra pois, quando resultar da fuso de duas ou mais
obras, constitui uma nova obra.
O utilizador pode, tambm, procurar uma determinada manifestao, ou
seja, a materializao da expresso de uma obra, seja a edio princeps de
Macbeth ou a edio em DVD da sua representao teatral; seja uma edio da
partitura integral da 9 Sinfonia ou a edio em CD de uma dada interpretao.
67 Estes termos ocorrero entre aspas sempre que designem as entidades, atributos, relaes ou operaes no contexto do modelo para que no haja lugar a equvocos quando usados com o sentido corrente.
34
uma entidade concreta e material. Uma expresso pode materializar-se em uma
ou mais manifestaes (por exemplo, as edies sucessivas de Macbeth). Uma
manifestao pode representar mais do que uma expresso (por exemplo,
uma edio contendo Macbeth, Henry V e King Lear). Por vezes, pode existir um
nico exemplar de uma manifestao (o caso de um manuscrito, por exemplo,
ou um registo sonoro original de uma apresentao ao vivo). Noutros casos,
existem mltiplos exemplares da mesma manifestao (o caso dos diversos
exemplares de uma mesma edio).
Pode o nosso utilizador, ainda, procurar um item especfico de uma
manifestao. Item, neste caso, tem um sentido muito prximo do termo
exemplar mas no designa exactamente a mesma coisa. Um item pode ser
mltiplo, ou seja, pode ser constitudo por vrias unidades materiais. O conjunto
completo de todos os volumes do Dicionrio da Histria de Portugal constitui, para
efeitos do modelo, um item. Um item pode ser tambm um nico exemplar, por
exemplo, o exemplar de uma edio de Macbeth ricamente encadernado
existente na British Library ou um exemplar impresso da partitura da 9 Sinfonia
de Beethoven com as anotaes manuscritas do maestro Herbert Von Karajan.
Trata-se de uma entidade concreta, material e tangvel. um objecto. Uma
manifestao pode ser representada por um ou mais itens. Mas um item
pode representar apenas uma manifestao.
Esta multiplicidade de relaes entre as entidades expressa no esquema
da fig. 2.
OBRA
EXPRESSO
MANIFESTAO
ITEM
Realizada atravs de
Materializada em
Representada por
Fig. 2
Le Buf68 explica assim como a palavra livro entendida na linguagem
corrente e entendida sob a abordagem do modelo:
When we say book, what we have in mind may be a distinct, merely
physical object that consists of paper and a binding; FRBR calls it Item;
When we say book, we also may mean publication as when we go to
our booksellers and ask for a publication identified by a given ISBN: the particular
copy does not matter to us, provided it belongs to the general class of copies we
require and pages are not missing; FRBR calls it Manifestation;
When we say book, as in Who wrote that book?, we may have a specific
text in mind, the intellectual content of a publication; FRBR calls it Expression;
When we say book, we eventually may mean an even higher level of
abstraction, the conceptual content that underlies all of its linguistic versions,
either the original or a translation; the thing that an author may recognize as
his/her own, even in, say, a Japanese translation and even though he/she cannot
speak Japanese, and cannot therefore be held as responsible for the Japanese
text; FRBR calls it Work.
3568 LE BUF, Patrick Brave new FRBR world, p. 3
36
No so estas as nicas entidades que o nosso utilizador pode procurar num
catlogo bibliogrfico. Ele tambm pode procurar num catlogo pessoas ou
colectividades (organizaes ou instituies) que tiveram ou tm
responsabilidade intelectual, editorial, material, comercial ou outra na criao,
realizao, publicao, produo, posse, etc. de obras, expresses,
manifestaes ou exemplares. Le Buf69 chama-lhes actores.
Uma obra pode emanar de uma ou mais pessoas e/ou de uma ou mais
colectividades. Em contrapartida, uma pessoa ou uma colectividade pode
estar na origem de uma ou mais obras. Uma expresso pode ser realizada por
uma ou mais pessoas e/ou colectividades. Por seu lado, uma pessoa ou
colectividade pode realizar uma ou mais expresses. Uma manifestao
pode ser produzida por uma ou mais pessoas e colectividades que, por sua
vez, podem produzir uma ou mais manifestaes. Um item pode estar na
posse de uma ou mais pessoas e/ou colectividades os quais podem possuir ou
deter um ou mais itens.
Finalmente, o utilizador pode recorrer ao catlogo para procurar assuntos. O
modelo distingue apenas quatro conceito, objecto, acontecimento ou lugar
embora o debate posterior tenha vindo a propor outros. Tambm as entidades j
mencionadas podem constituir o assunto de uma obra e enquanto tal so
passveis de ser procurados pelos utilizadores do catlogo.
Uma obra pode ter por assunto um ou mais conceitos, objectos,
acontecimentos e/ou lugares . Em contrapartida, um conceito, um objecto,
um acontecimento e/ou um lugar podem ser assunto de uma ou mais obras.
Uma obra pode ter ainda por assunto uma ou mais obras, expresses,
manifestaes e itens, bem como uma ou mais pessoas e colectividades.
Uma vez isoladas as entidades, o estudo do Grupo de Trabalho para os
FRBR identificou as caractersticas ou atributos que se ligam a cada uma destas
entidades. Por outras palavras, em que consiste cada entidade e o que a
69 LE BUF, Patrick Brave new FRBR world, p. 3.
37
distingue de outra entidade. Finalmente, procurou as relaes entre as entidades
e entre estas e os respectivos atributos e em que medida estas podem resultar
em informao pertinente para o utilizador.
Foi tambm necessrio determinar o que a informao pertinente para o
utilizador de acordo com critrios coerentes e pr-definidos. Para determinar a
pertinncia da informao, o modelo define um conjunto de operaes que os
utilizadores efectuam no decurso da consulta e explorao de uma bibliografia ou
catlogo. Quando se diz mais atrs que o utilizador procura obras, manifestaes,
pessoas ou assuntos, no se especifica o que se entende por procurar. O
modelo esmiua o conceito ao definir quatro operaes muito especficas que os
utilizadores do catlogo efectuam no decurso da sua explorao.
Assim, o utilizador pode utilizar o catlogo para:
Encontrar as entidades que correspondem aos seus critrios de pesquisa
(por exemplo, encontrar todos os documentos relativos a um determinado assunto
ou encontrar uma obra publicada com um determinado ttulo);
Identificar uma entidade (por exemplo, obter a confirmao de que o documento descrito numa entrada bibliogrfica corresponde quele que o
utilizador procura ou estabelecer a distino entre dois textos ou dois registos
com o mesmo ttulo);
Escolher uma entidade que seja adequada s suas necessidades (por exemplo, escolher um texto redigido numa lngua que o utilizador compreenda ou
um documento electrnico numa verso compatvel com a verso do sistema
operativo de que o utilizador dispe);
Aceder materialmente entidade descrita (por exemplo, fazer uma
encomenda a uma editora, pedir emprstimo de um item existente numa
biblioteca ou consultar em linha um documento existente noutro computador).
O FRBR no uma norma mas um modelo de referncia70. Permite-nos ter
a mesma estrutura em mente e referir os mesmos conceitos sob as mesmas
70 LE BUF, Patrick Brave new FRBR world, p. 3
38
designaes. Permite-nos comparar informao que pode no estar estruturada
da mesma forma no todo ou em parte71.
Este modelo tem, entre outros, o grande mrito de colocar em p de
igualdade sem qualquer espcie de hierarquizao ou valorao a priori a
maior parte dos elementos passveis de integrar uma entrada bibliogrfica
permitindo, assim, a sua avaliao em funo do interesse para o utilizador
enquanto dado pesquisvel e no em funo de qualquer valorao ditada pela
tradio, pela cultura ou pelo hbito. Este aspecto particularmente importante na
medida em que a tradio catalogrfica partiu (como j se viu) da descrio de
monografias e que este facto condicionou todas as normas de descrio que se
seguiram, at hoje, sem que ainda se tenham libertado dessa condicionante. As
indicaes geral e especfica da tipologia do documento (msica impressa,
cassete vdeo, cartaz, etc.) s se d quando no se est a descrever um
documento textual impresso. A prpria norma de descrio de monografias
tambm resultou de uma tradio catalogrfica prvia que, por sua vez, resultou
da adaptao dos catlogos tradio fsica e editorial dos livros. Os primeiros
tipgrafos, semelhana dos copistas medievais, indicavam por vezes no final do
texto o clofon72 o seu nome e o lugar e data da impresso. Durante o sculo
XVI acrescenta-se, no final do volume73, o ttulo exacto da obra e o nome do autor,
o do tipgrafo/livreiro, o lugar e a data de impresso, seguida por vezes pela
marca tipogrfica74.
medida que o livro impresso se vai libertando da tradio do cdice e que
os impressores vo adquirindo relevo social e cultural simultaneamente editores
e livreiros, eles prprios so, muitas vezes, intelectuais que conduzem a sua
poltica editorial por critrios humanistas75 estas indicaes passam para lugar
mais destacado, na mesma pgina onde se encontra o ttulo e o autor da obra
71 Idem Ibidem, p. 3 72 As Regras Portuguesas de Catalogao usam o termo Colofo. Do grego kolophn. Na Grcia antiga designava a indicao, situada no final da ltima coluna de um manuscrito em rolo (volumen), do nmero de folhas de que era composto, assim como do nmero de colunas e de linhas nele escritas; este costume transmite-se ao cdice em pergaminho: o clofon medieval contm a data do acabamento do trabalho, lugar onde foi copiado, nome, idade, qualidade do escriba, etc. e o explicit, frmula final que inclua por vezes o nome do autor do texto, do tradutor (no caso de se tratar de uma traduo), o ttulo da obra e o remate. (Cf: Novo dicionrio do livro da escrita ao multimdia) 73 De volumen, manuscrito em rolo. (Cf: Novo dicionrio do livro...) 74 Novo dicionrio do livro... 75 Como, por exemplo, Aldo Manuzio (14-- - 1515), um importante impressor humanista italiano.
39
impressa: a pgina de rosto76. Fonte prescrita de informao para a maior parte
dos dados catalogrficos, a pgina de rosto , pois, quase to antiga como a
prpria tipografia. A margem inferior (ou de p) da pgina de rosto, onde os
impressores inseriam estas indicaes, d origem ao da zona que as Regras
Portuguesas de Catalogao ainda designam por zona do p d