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Universidade Federal Fluminense
Instituto de Ciências Humanas e Filosofia
Departamento de História
Graduação em História
Projeto de Monografia
As transformações na comunicação e as disputas por hegemonia no
Brasil contemporâneo (2003 - 2014)
Matheus de Carvalho Leibão
Niterói, 2014
Identificação do problema, formulação e delimitação do tema de pesquisa:
O trabalho pretende discutir aspectos ligados à liberdade (e pluralidade) de
imprensa no Brasil a partir do 1° governo de Luís Inácio Lula da Silva (2003 - 2006). O
ponto inicial deste recorte cronológico escolhido foi tal, pois 2003 marca o fim de um
período de governos do PSDB, sob o comando de Fernando Henrique Cardoso, que
contribuíram para a consolidação de um projeto neoliberal para o Brasil, responsável
por grandes derrotas políticas para a classe trabalhadora brasileira, assim como para os
movimentos sociais do campo e da cidade. O ano final deste mesmo recorte está
relacionado ao momento de aprovação do Marco Civil da Internet, a última grande
medida na área que fora implantada no atual governo. Minha preocupação principal é
com a atuação de veículos de caráter contra hegemônico, isto é, sobre como a atuação
destes é influenciada pelas condições historicamente construídas dentro do período
trabalhado. Sendo assim, pretendo analisar como a legislação, a concentração dos meios
de comunicação e outros fatores foram capazes de limitar ou possibilitar a construção de
uma comunicação contra hegemônica na sociedade brasileira, que pudesse alcançar
diversos setores da população, a partir da chegada do Partido dos Trabalhadores ao
governo federal. Em um estudo de caso, pretendo analisar o jornal Brasil de Fato1 e
verificar se este se trata de um veículo de comunicação contra hegemônico ou não, a
partir das discussões do quadro teórico sobre os conceitos de hegemonia e contra
hegemonia propostos pelo filósofo italiano Antonio Gramsci e por outros autores que
seguiram a linha adotada por ele. A partir de então, tentarei comparar o jornal em foco
com outro(s) jornal(is), a fim de confirmar (ou não) as respostas que terei para minha
problematização.
Discussão Bibliográfica sobre o tema:
Para a realização deste trabalho, algumas obras devem ser discutidas, a fim de
aprofundar os debates sobre as políticas públicas de comunicação no período aqui
proposto. Para tal, os focos principais desta parte do projeto serão guiados em torno de 3
eixos principais. Primeiramente, o debate em torno da concentração oligopólica dos
meios de comunicação no Brasil e a necessidade de criação de um marco regulatório
para o setor. Em seguida, a análise do sistema de mídia brasileiro e como este foi
influenciado por modelos de outras sociedades. Nesta parte, dedica-se uma atenção
especial para o processo de adoção do modelo de televisão digital japonês, ocorrido no
1 O jornal Brasil de Fato foi criado em 2003, durante o fórum social mundial, realizado na cidade de Porto Alegre e visava ser um jornal da esquerda organizada na disputa por hegemonia em contraponto aos veículos da grande mídia. Ver a obra de MIANI, 2006.
período que compreende este estudo. A última parte da discussão pretende analisar a
busca por alternativas de comunicação por parte de movimentos sociais, partidos
políticos e organizações da sociedade civil que lutam por uma mídia mais democrática,
plural e que se opõem ao domínio oligopólico dos setores hegemônicos.
Para a primeira questão a ser levantada, duas obras são fundamentalmente
importantes: a primeira, de Venício A. Lima2 e a segunda, de Dênis de Moraes3. O
primeiro autor, ao fazer um balanço dos dois governos do ex-presidente Luiz Inácio
Lula da Silva no que tange as políticas públicas para a comunicação, ressalta a
importância de se atentar para a estruturação do setor, em especial para as legislações
que guiam a prática da comunicação social no Brasil.
Um dos fatores que Lima traz para a discussão é o fato da legislação brasileira
não conter nenhum dispositivo legal que impeça a propriedade cruzada, isto é, que uma
mesma empresa possua, ao mesmo tempo, canais na televisão e no rádio, por exemplo.
Um caso emblemático de propriedade cruzada no Brasil, sem dúvidas, é o das
organizações Globo, chefiadas pela família Marinho, que possuem canais na televisão
(aberta, a cabo e via satélite), no rádio (AM e FM), jornais, revistas, uma editora e o
principal portal de notícias na internet do país. Este autor explica que os cinco artigos da
constituição federal que compreendem os números 220 e 224 não possuem uma
regulamentação suficientemente clara para definir a estruturação da comunicação social
no Brasil, ainda que, no artigo 220, afirme-se que os meios de comunicação não podem
ser monopolizados ou oligopolizados. No entanto, os termos “oligopólio” e
“monopólio” carecem de qualquer definição constitucional. Sendo assim, Lima
identifica que estas brechas constitucionais permitiram a poucas famílias ter o controle
da mídia e da imprensa brasileiras. Este autor também aponta para as normas legais da
radiodifusão no Brasil, que ainda se pautam no Código Brasileiro de
Telecomunicações4, de 1962, um dos principais responsáveis por permitir a posse da
propriedade cruzada no país. Ressalta ainda o fato da Abert (Associação brasileira de
emissoras de rádio e televisão) ter sido fundada no processo de formulação de tal
código. Tal associação, segundo Lima, hoje responde fundamentalmente aos interesses
2 LIMA, Venício A. Política de comunicações: Um balanço dos governos Lula [2003 - 2010]. 1. ed. São Paulo: Publisher Brasil, 2012.3 Moraes, Dênis de. Vozes abertas da América Latina: Estado, políticas públicas e democratização da comunicação. Rio De Janeiro: Mauad X, 2011.4 O Código Brasileiro de Comunicações foi instituído durante o governo do ex-presidente João Goulart, e teve vários de seus artigos derrubados pelo regime empresarial-militar, imposto a partir de um golpe em 1964, além de estar extremamente defasado, haja vista as inúmeras tranformações tecnológicas o setor de comunicação sofreu nas décadas posteriores. Ver a obra de LIMA, 2012b.
da Rede Globo de comunicação e pode ser considerada um aparelho privado de
hegemonia, dentro dos pressupostos teóricos de Antonio Gramsci, que serão melhor
detalhados no item correspondente a discussão sobre o quadro teórico desta pesquisa.
Esta fraca e vaga legislação apontada pelo autor não é imprecisa por acaso. Ele
afirma que, como a mídia tem a capacidade de pautar a agenda pública de debates, e
como esta mídia está concentrada nas mãos dos mesmos grupos há décadas, a
regulamentação do setor não é trazida ao público para a discussão, ao menos que haja
alguma(s) proposta(s) que vise(m) ameaçar os privilégios dos grupos dominantes. No
entanto, ao contrário do que a maioria dos jornalistas destes meios afirma, a cobertura
de tais propostas não é feita de maneira imparcial e objetiva, mas sempre corresponde
aos interesses dos concessionários, que segundo Lima, muitas vezes se comportam
como verdadeiros proprietários dos canais de rádio e televisão. Um caso em que tal
tendência se verificou foi durante o lançamento do 3° Plano Nacional de Direitos
Humanos, em 2009, no qual as propostas em relação à comunicação social foram
incessantemente classificadas como tentativas de limitação da liberdade de expressão.
Um aspecto da obra de Lima, professor da Universidade de Brasília, é a análise
minuciosa sobre o papel do legislativo nas transformações da comunicação social no
Brasil. Foram feitos diversos levantamentos sobre as atuações parlamentares das quais
se podem tirar interessantes reflexões sobre os partidos políticos com representação nas
casas legislativas e a relação que eles estabelecem com diferentes entidades,
organizações, empresas e movimentos sociais.
A contribuição de Dênis de Moraes5 para a questão da concentração midiática no
Brasil é pautada em uma análise que privilegia um olhar mais amplo sobre o
comportamento do capital neste inicio de século XXI. A obra se preocupa em explicar
como as tendências econômicas influenciaram nos sistemas de mídia, e
consequentemente, na possibilidade de se ter pluralidade de vozes na comunicação
social não apenas no Brasil, mas também em outros países latino americanos.
A obra do professor do departamento de Estudos de Mídia da Universidade
Federal Fluminense destaca a função estratégica que os meios de comunicação possuem
em um contexto econômico cada vez mais globalizado e digitalizado. Como a tendência
da economia capitalista, desde a década de 1980, foi de ampliar a importância e
participação do mercado na vida dos seres humanos, em detrimento de outras
5 MORAES, op. cit.
instituições, sobretudo o Estado, os meios de comunicação passam a ser importantes não
só para garantir a legitimidade de um poder de classe construído, como também servem
para garantir uma parcela significativa de reprodução do capital. Ao longo das últimas
décadas, então, foi sendo construída uma nova ordem socioeconômica que via qualquer
tipo de intervenção estatal, nas palavras do próprio autor, uma “intromissão indevida” 6.
Não poderia ser diferente em relação a qualquer tentativa de regulação da radiodifusão
brasileira.
Outra característica deste modelo econômico citado acima, isto é, do
neoliberalismo, é a tendência de formação de conglomerados empresariais. Tal
tendência se verifica com bastante intensidade nos mercados latino-americanos, em
especial nos mercados de mídia, uma vez que as legislações de diferentes Estados
tenderam a eliminar restrições às concentrações dos meios de comunicação nas mãos de
poucos grupos e a ampliação do mercado estrangeiro neste setor. Tanto Moraes quanto
Lima apontam para o aumento da participação do capital internacional no setor de mídia
no Brasil, tendo como caso emblemático a distribuição do conteúdo audiovisual, isto é,
que concerne Filmes, séries, programas televisivos, entre outros. Moraes identifica que
em toda a América Latina, 85,5% deste tipo de produção cultural é proveniente dos
Estados Unidos da América. Sendo assim, verifica-se que a partir da leitura das obras de
ambos estes autores, foi possível, para o Brasil, a partir do processo de
redemocratização do país, ampliar a abertura econômica do país e aprovar um programa
extenso de desestatização e de mercantilização das atividades humanas que causou
profundas transformações na sociedade. E isso, sem sombra de dúvidas, não poderia
deixar de incluir os meios de comunicação e o sistema de mídia aqui existentes, que
possibilitaram ao capital estrangeiro obter ganhos materiais com a sua participação no
mercado brasileiro. Além dos ganhos do mercado internacional, sobretudo da indústria
fonográfica norte-americana, não pode ser deixado de lado o fato de que tais
modificações foram capazes de reforçar o poder político-econômico-cultural das 10
famílias (Marinho, Civita, Mesquita, Abravanel, Saad, Sirotsky, Sarney, Magalhães, e
Collor) que controlam a maior parte da comunicação brasileira a partir de acordos de
suas empresas de radiodifusão com empresas estrangeiras.
Este trabalho não pode ser realizado sem a discussão sobre o modelo sob o qual
o sistema de mídia brasileiro foi estruturado. Para que se faça esse debate, é
6 Idem, p. 53
fundamental que seja tratado o trabalho de Carolina Matos7. Primeiramente, é
necessário ressaltar que a obra desta autora engloba análises que abrangem a América
Latina, assim como a de Dênis de Moraes. Sendo assim, certas especificidades do
modelo brasileiro podem não ser contempladas nesta discussão.
Matos afirma que o modelo de radiodifusão dos países latino-americanos foi
bastante influenciado pelo modelo de radiodifusão dos Estados Unidos, sobretudo a
partir de fins da década de 1980. Segundo esta jornalista e professora universitária, tal
modelo construído na sociedade norte-americana possui um caráter majoritariamente
privado, com pouco espaço para a comunicação pública (diferentemente da Inglaterra,
que possui uma empresa pública de comunicação forte, a BBC). No entanto, canais de
rádio e televisão privados possuem seus financiamentos oriundos de empresas privadas
e públicas. Ou seja, mesmo que nestes sistemas haja certa resistência à intervenção
estatal, eles dependem parcialmente do Estado para garantir seu sustento. Matos
também aponta, que tanto nos EUA quanto na América Latina, a maior fatia do mercado
está concentrada nas mãos de poucos grupos empresariais, o que, por sua vez, dificulta a
garantia da pluralidade cultural e de opiniões dentro do espaço de radiodifusão destes
países. A consequência de tal estruturação é que grandes parcelas da população,
sobretudo as “minorias” (negros, indígenas, homossexuais, etc.) não se vejam nos
principais espaços de circulação da produção audiovisual (ou, quando incluídos, sejam
estigmatizados de alguma forma que mantenha as relações de poder tradicionais).
Outro aspecto dos sistemas de mídia latino-americanos que a autora ressalta é a
dificuldade em aprovar e positivar uma legislação antitruste. Isso se deve
principalmente ao fato de haver uma íntima relação entre membros do aparelho estatal e
da mídia. No Brasil, tal situação se agrava uma vez que o poder legislativo possui uma
importância central na promoção de políticas públicas de comunicação, e, ao mesmo
tempo, há parlamentares que são concessionários dos serviços públicos de rádio e
televisão e donos de jornais impressos. O fato de não haver restrições legais à
propriedade cruzada, como lembra Venício Lima, também é outro fator fundamental
para se entender as relações entre governos e meios de comunicação neste período
histórico.
7 MATOS, Carolina. Mídia e política na América Latina: globalização democracia e identidade. Rio de Janeiro, Civilização Brasileira, 2013.
Com o processo de globalização e avanço da política econômica neoliberal, a
autora chama atenção para um processo de formação de conglomerados de mídia, que
envolvem grupos empresariais estrangeiros, que passam a entrar com força nos países
latino-americanos. Sendo assim, ela afirma que famílias tradicionais, que assentaram
seu domínio sobre os meios de comunicação a partir das ditaduras empresariais-
militares que se instalaram no continente, passaram a ter menos importância em relação
às grandes corporações internacionais. No caso do Brasil, por exemplo, a autora cita a
necessidade das organizações Globo se aliarem a empresas multinacionais como a News
Corporation e a AT&T, para se adaptar as exigências do mercado.
Convém analisar especificamente o momento no qual a Televisão digital foi
implantada no Brasil. Para tal, me basearei nas obras de César Bolaño8 e Venício Lima9.
Bolaño lembra que o Sistema Brasileiro de TV digital (SBTVD) foi instituído a
partir do decreto número 4901, cuja data é 26 de novembro de 2003, isto é, ao longo do
primeiro ano de governo do ex-presidente Lula. O SBTVD foi responsável por suscitar
importantes debates sobre os rumos que teriam a implantação da televisão digital. No
entanto, é necessário ressaltar que os debates em torno da TV digital no Brasil foram
concebidos durante o governo anterior, de Fernando Henrique Cardoso. Segundo este
autor, os interesses dos grupos de mídia brasileiros tradicionais foram os de fazer com
que o modelo de televisão digital adotado no país fosse semelhante àquele dos EUA e
do Japão e desconsiderar o debate em torno de possíveis alternativas, que inclusive
foram apresentadas pela Federação Nacional de Jornalistas (FENAJ)10. Ele afirma que a
intenção inicial do governo fora de fomentar os debates e este não se mostrou tão
inclinado aceitar as propostas dos setores concessionários de radiodifusão, sendo mais
favorável a alternativas que pudessem ampliar o número de canais de televisão a partir
da criação de novas concessões. No entanto, como a pressão dos radiodifusores foi
enorme, e como houve um forte desgaste do governo devido a escândalos de corrupção,
a adoção do modelo japonês foi feita sem gerar os debates que parcelas significativas da
sociedade civil esperavam. A obra de Venício Lima possui algumas imagens
publicitárias veiculadas pelos radiodifusores que podem auxiliar ao pesquisador na
tentativa de verificar como diferentes emissoras televisivas buscaram a formação de um
8 BOLAÑO, César Ricardo Siqueira. Qual a lógica das políticas de comunicação no Brasil? São Paulo: Paulus, 2007.9 LIMA, Venício A. Política de comunicações: Um balanço dos governos Lula [2003 - 2010]. 1. ed. São Paulo: Publisher Brasil, 2012.10 A Fenaj foi fundada em 1946 a fim de representar os interesses da categoria. Nos últimos anos, esta federação tem se destacado pela defesa da democratização da comunicação e dos direitos humanos.
consenso por parte do público, que como ele mesmo afirma, ficou alijado deste
processo.
Como o sistema de comunicações no Brasil impede que grandes parcelas da
população, sobretudo aquela mais pobre e excluída, participem ativamente da
construção de jornais, programas de televisão, rádios comunitárias, entre outros veículos
da burguesia, e como a televisão pública no Brasil, embora tenha avançado, não tenha
se massificado, tornou-se necessária a busca por alternativas comunicacionais que
rompessem com os editoriais das grandes empresas. Sendo assim, torna-se necessário
recorrer à obra de Dênis de Moraes em conjunto com Ignacio Ramonet e Pascual
Serrano11. Em um artigo intitulado “Agências Alternativas em rede e democratização da
informação na América Latina”, Moraes ressalta o surgimento de uma série de agências
de informação que tem se guiado por outros objetivos, diferentes dos da grande mídia,
comprometida com a agenda de debates da classe dominante, a maioria delas pautadas
em “moldes colaborativos e não lucrativos”12, e identifica nestas experiências de
“jornalismo alternativo” práticas de resistência cultural a um modelo que privilegia as
grandes corporações e algumas famílias tradicionais.
É necessário ter em mente que a produção e distribuição de veículos alternativos
aos grandes meios de comunicação de orientação mercadológica e de manutenção do
status quo sempre se fizeram presentes na história da comunicação brasileira. Os
exemplos de A lanterna13, durante a primeira república e Opinião14 durante a ditadura
empresarial-militar são apenas alguns de variados exemplos que podem ser pesquisados.
O que interessa aqui é verificar como setores não hegemônicos da sociedade utilizam os
meios de comunicação em um período histórico no qual a tendência do setor (e do
mercado, de maneira geral) é se fortalecer em torno de poucos grupos empresariais que
formam grandes conglomerados e limitam o debate público, ao mesmo tempo em que
emerge uma ferramenta comunicativa que possibilita aos meios alternativos ampliar sua
rede de debates, a internet.11 MORAES, Dênis de (org.). Mídia, poder e contrapoder: da concentração monopólica à democratização da comunicação. São Paulo, Boitempo, 2013. 12 Idem, p. 10313 Autointitulada “Folha anti clerical e de combate”, A lanterna foi um dos principais jornais do movimento anarquista brasileiro nas primeiras décadas da república brasileira, e ficou famoso por suas críticas contundentes ao poder da igreja católica. Sobre a imprensa operária no Brasil da primeira república, ver: FERREIRA, Maria Nazareth. A imprensa operária no Brasil (1880 – 1920). Petrópolis, Vozes, 1978.14 Opinião foi um dos principais jornais de oposição ao regime de 1964, contando com diversos nomes da esquerda brasileira em seus quadros, tendo sofrido com vários problemas com os governos militares. Ver MACHADO, J. A. Pinheiro. Opinião x Censura: momentos de luta de um jornal pela liberdade. São Paulo, L&PM, 1978.
Sendo assim, Moraes identifica uma série de agências latino-americanas de
comunicação alternativa que têm ocupado o espaço virtual e ampliado suas visibilidades
a partir dele. Segundo este autor, tais agências por ele pesquisadas possuem em comum
o fato de lançarem mão da internet como a principal (ou única) via comunicativa, uma
vez que os custos para tal são baixos, além do compromisso com a democratização dos
sistemas de mídia de seus países. Entre as agências que ele pesquisa estão a Azkintuwe
do Chile, a Prensa Rural, da Colombia, a Aporrea, da Venezuela, A Cimac, do México
e o Brasil de Fato, como o próprio nome sugere, brasileiro. Como esta pesquisa optou
por um recorte geográfico restrito ao Brasil, o jornal Brasil de Fato assume importância
fundamental, uma vez que este tem adquirido nos últimos anos o “status” de principal
veículo alternativo aos veículos de comunicação da classe dominante, ainda que
algumas questões relacionadas a ele possam e devam ser problematizadas, sendo este
um dos objetivos desta pesquisa.
Critério de Relevância: Acredito que meu trabalho pode trazer uma
contribuição importante para as discussões sobre os governos do PT e das legislaturas
que os acompanharam, analisando mudanças e continuidades em relação aos governos e
legislaturas anteriores, com foco nas políticas de comunicação, como elas interferiram
nos veículos de cunho contra hegemônico e como estes veículos se posicionaram acerca
do papel do Estado perante as políticas públicas. Acredito também que analisar veículos
que propõem visões de mundo alternativas àquelas propostas pelos meios dominantes
seja um papel importante a ser desempenhado pelo historiador, uma vez que permite
identificar diferentes ideologias e projetos de sociedade que se fazem presente dentro de
um determinado contexto histórico, atentando assim para disputas e conflitos entre
diferentes setores da sociedade. Além disso, a constatação de diferentes projetos
políticos e visões de mundo oferece ao(s) leitor(es) a possibilidade de desnaturalizar a
sociedade em que vivemos e crer que outro(s) mundo(s) é(são) possível(eis). Além
disso, tem avançado nos últimos anos a discussão da comunicação como um direito
humano15. Sendo assim, pretendo contribuir para estas discussões, que se fazem
fundamentais uma vez que maioria esmagadora da população brasileira tem poucas
possibilidades de atuação dentro dos meios de comunicação do país, que por lei, são
concessões públicas, mas que, até hoje possuem uma parca regulamentação.
15 Sobre a comunicação como direito, consultar: GOMES, Raimunda Aline Lucena. A comunicação como direito humano: Um Conceito em Construção. Recife: EdUFPE, 2007
Critério de viabilidade: Creio que tal projeto pode se concretizar devido à
diversidade de veículos de comunicação que podem se encaixar dentro do modelo
teórico que tentarei trabalhar, ou seja, que se encaixam dentro do conceito de contra
hegemonia proposto por Gramsci. Dentro do pensamento deste filósofo, a imprensa é
um espaço privilegiado para se verificar as disputas por hegemonia no campo político-
ideológico. Sendo assim, penso que uma discussão sobre como se realiza a disputa por
hegemonia na imprensa no Brasil recente é de fundamental importância para contribuir
para a compreensão de como se dão as correlações de força nessa sociedade.
O acesso a estes veículos pode ser viabilizado a partir da busca em acervos que
se encontram disponíveis on-line. No levantamento bibliográfico que foi feito para a
realização desta pesquisa, consegui encontrar poucas produções de historiadores, sendo
a maioria delas, de intelectuais ligados ao campo da comunicação social. No entanto,
creio que a aproximação entre ambas as áreas seja de fundamental importância para a
realização de meu trabalho, uma vez que pretendo utilizar veículos de comunicação
como fontes para a realização destes, e a perspectiva teórica que adoto aqui compreende
os meios de comunicação como um espaço de extrema importância no qual se
configuram as disputas por orientar a sociedade em relação às ações que devem ser
tomadas e os discursos que devem ser defendidos.
Critério de originalidade: Este, provavelmente, será um dos primeiros
trabalhos realizados na área de história sobre as políticas de comunicação no Brasil no
período que proponho analisar, isto é, de 2003 ao ano de 2014. Este período, inclusive,
seja por sua historicidade recente, ou por uma resistência que persiste em uma parcela
significativa de historiadores em não privilegiar o tempo presente16 em suas produções
historiográficas, não possui (ainda) a mesma quantidade de estudos acadêmicos que
outros períodos da história da república brasileira, ainda que este seja amplamente
debatido pelos(as) historiadores(as). Além disso, por destinar seu foco com
exclusividade para o Brasil, este trabalho também se distingue dos demais verificados
em outras áreas, sobretudo na comunicação social (área na qual se desenvolveram a
maior parte dos estudos sobre este tema), uma vez que a maioria destes abrangem
também outros países da América latina, em especial os do cone-sul, os andinos e a
Venezuela. Penso que, por tratar especificamente de um país, torna-se possível uma
análise mais minuciosa das disputas políticas, projetos, e discursos que ocorreram no
16 Sobre a história do tempo presente, ver: BERTONHA, 2012, FILHO, 2014, FERREIRA, 2000, FERREIRA 2002 e SANTOS, 2009.
Brasil no pós-2003, que se tornariam mais complicadas caso este estudo objetivasse
analisar diferentes processos ocorridos em diversos países, já que tal proposta
demandaria a utilização de uma quantidade maior de fontes.
Objetivos da pesquisa:
1 - Identificar como as políticas públicas para a comunicação influenciaram o trabalho
de órgãos de comunicação contra hegemônicos no período que compreende os anos de
2003 e 2013.
2 – Discutir como o advento de novas tecnologias modifica o alcance dos meios de
comunicação contra hegemônicos.
3 – Verificar até que ponto as reivindicações dos movimentos sociais e meios de
comunicação contra hegemônicos foram atendidas pelos governos no período
trabalhado, sobretudo as medidas relacionadas à área da comunicação social.
4 – Problematizar o jornal Brasil de Fato a partir de uma discussão que se preocupa em
verificar se este se encaixa em um modelo teórico de veículo contra hegemônico ou não,
levando em conta questões primordiais para o(a) historiador(a) que se dispõe a estudar
os veículos de comunicação, como o financiamento do jornal, os principais editores do
mesmo, seus colunistas, o público alvo, o tipo de linguagem utilizada, entre outros
fatores.
Hipóteses:
1 – Minha hipótese inicial para a primeira problemática é de que as políticas de
comunicação do período que contempla os anos de 2003 a 2014 pouco contribuíram
para a solidificação e massificação de meios de comunicação contra hegemônicos no
Brasil. A maior parte dos projetos de regulamentação do sistema de radiodifusão
permaneceu emperrada em tramitações pelo Congresso Nacional, ou foram barradas
pelo mesmo. A explicação para tal processo pode se dar pela própria composição das
bancadas legislativas, uma vez que boa parte dos deputados e senadores são/foram
concessionários dos serviços de radiodifusão brasileiros. Sendo assim, penso que, com a
manutenção da maior parte das estruturas vigentes formadas em períodos anteriores, e
sem a regulamentação do setor, os meios de comunicação contra hegemônicos
mantiveram a maior parte de seus problemas em relação a produção, tiragem,
distribuição, entre outros, ainda que alguns deles pudessem contar com recursos
advindos da publicidade do governo federal, o que ampliou de forma considerável a
tiragem de exemplares de alguns jornais.
2 – A hipótese que visa responder à segunda problemática desta pesquisa é de que o
advento das novas tecnologias de informação e da comunicação ampliou
consideravelmente as possibilidades de diálogo dos meios de comunicação contra
hegemônicos com a população brasileira em termos absolutos. No entanto, em termos
relativos, penso que tal ampliação não se verifica, ou se verifica em proporções tímidas,
fazendo com que tais meios ainda sejam bastante limitados em relação ao seu alcance.
3 – Penso que, para esta terceira questão, poucas reivindicações dos movimentos sociais
e meios de comunicação contra hegemônicos foram atendidas tanto pelo governo
federal, quanto pelo poder legislativo brasileiro, uma vez que tais setores da sociedade
sempre demandaram políticas públicas que visassem à democratização dos meios de
comunicação no Brasil, com o fim de monopólios, oligopólios e da propriedade
cruzada, algo que, até hoje, não aconteceu. Tais mudanças visadas não aconteceram,
sobretudo devido ao fato das legislaturas deste período conterem, em suas composições,
um número significativo de sócios e proprietários de empresas concessionárias de
serviços de radiodifusão. Sendo assim, estes atores, ainda que segundo as normas legais
de funcionamento do legislativo não estivessem possibilitados de legislarem em causa
própria, lançaram mão da máquina pública para exercer a manutenção de seus
privilégios.
4 – Em relação ao último objetivo, penso que, para se chegar a uma conclusão, é
necessário fazer uma análise minuciosa do jornal Brasil de Fato ao longo do período
trabalhado, levando em conta que pessoas fazem parte de seu quadro editorial, que
temáticas foram privilegiadas em suas edições, quais foram as principais formas de
financiamento, que sujeitos contribuíram para a sua divulgação, entre outros fatores.
Como tais questões não foram investigadas a fundo, a pesquisa dispõe de poucas
referências que permitam afirmar, com o mínimo de precisão, se tal jornal possui um
caráter contra hegemônico ou não. Dessa forma, penso que seria, a priori,
demasiadamente precipitado formular uma hipótese pertinente para este objetivo. No
entanto, creio que há meios para se chegar a tal, que serão desenvolvidos no decorrer da
pesquisa.
Fundamentação teórica:
Para a realização do trabalho, é fundamental realizar a discussão sobre o
conceito de hegemonia e contra hegemonia propostos pelo filósofo italiano Antonio
Gramsci. No Brasil, há alguns intelectuais que discutem tais questões, como Dênis de
Moraes e a historiadora marxista Virgínia Fontes. Também pretendo realizar uma
discussão teórica sobre o papel do Estado dentro do pensamento de Gramsci e também
sobre o conceito de intelectuais. Como este trabalho pretende fazer análises dentro do
campo da comunicação, é importante ressaltar que enxerga-se, então, a comunicação
como uma das instâncias da sociedade civil onde se realizam as disputas por hegemonia.
No entanto, alguns autores com os quais trabalharei, como por exemplo, Carolina
Matos, não seguem a mesma linha teórica proposta por Gramsci e os adeptos de suas
ideias. Isso não invalida a utilização de algumas argumentações pontuais nos casos em
que elas forem consideradas válidas em minha proposição.
Quanto ao primordial conceito de hegemonia, Fontes17 explica que falar em tal
conceito implica em “analisar as formas de convencimento, de formação e de
pedagogia, de comunicação e de difusão de visões de mundo, as diferentes modalidades
de adestramento para o trabalho” 18, entre outros fatores. A autora também salienta que a
hegemonia é exercida tanto por meios coercitivos, isto é, onde há o uso da violência,
quanto por meios discretos. Para que os meios “discretos” possam prevalecer, é
necessário que se tenha a formação de um consenso, isto é, que a maioria dos indivíduos
aceite e acredite em determinado projeto político-econômico-cultural como sendo o
melhor para a sociedade.
Dênis de Moraes, em seu texto sobre a contribuição teórica de Gramsci19 para as
disputas políticas, corrobora com a visão acima exposta por Virgínia Fontes,
complementado que tais disputas por hegemonia se dão de forma a afirmar o poder de
uma classe (ou de uma fração de classe) sobre outra(s) classe(s) e/ou fração(ões) de
classe(s)20. O autor ainda afirma que a constituição de uma determinada hegemonia é
dada em um período histórico longo, que segundo ele, “ocupa os diversos espaços da
superestrutura ideológico-cultural.”21. Dessa forma, a hegemonia é alcançada quando o
projeto político de uma determinada classe passa a ser incorporada pelo conjunto da
sociedade e esta passa a ver os principais aspectos de tal projeto como as principais
garantidoras da vontade coletiva e do bem comum. A partir do ponto de vista de ambos
17 FONTES, Virgínia. Intelecutais e mídia: quem dita a pauta?. In: COUTINHO, Eduardo Granja. Comunicação e contra-hegemonia. Rio de Janeiro, Ed. UFRJ, 200818 Idem, p. 14619 MORAES, Dênis de. Comunicação, hegemonia e contra-hegemonia: A contribuição teórica de Gramsci. Revista Debates, Porto Alegre, v. 4, n. 1, p. 54-77. 01/2010. Disponível em: http://www.seer.ufrgs.br/debates/article/viewFile/12420/8298. Acesso em: 13/10/201420 Idem, p. 5421 Ibidem, p.55
os autores, que se identificam com as proposições teóricas de Antonio Gramsci, pode-se
ver que a consolidação do poder político e cultural de um determinado grupo social se
dá a partir de uma combinação entre coerção e consenso, sendo que estes dois não
atuam de maneiras separadas e estanques. Muitas vezes, a produção do consenso é
capaz de legitimar a ação coercitiva, como por exemplo, casos nos quais a ação
truculenta da polícia militar em manifestações estudantis ou atos de reintegração de
posse são elogiados por parcelas significativas da população.
Para que haja a produção de um consenso fortemente consolidado, Fontes chama
a atenção para o papel que os intelectuais exercem nas sociedades contemporâneas. A
autora, se baseando nos escritos de Karl Marx e Friedrich Engels, rompe com a ideia
tradicional da figura do “intelectual”, na qual este seria uma pessoa dedicada a pensar
sobre o mundo e gerar reflexões a partir disto (de maneira isolada da sociedade). Para
ela, intelectuais são “os que atuam socialmente sob duas formas: na concentração da
produção do conhecimento e na apropriação daquele conhecimento socialmente
produzido, existente de forma prática.” 22.
Antonio Gramsci defende a ideia que todo homem é um intelectual, embora nem
todos exerçam tal função. Tal condição, segundo ele, se dá devido a processos históricos
concretos, que permitiram determinadas classes ou camadas da sociedade produzir
intelectuais, e não acontecem “num terreno democrático abstrato” 23.
Sendo assim, qual seria a função dos intelectuais em uma sociedade dividida em
classes antagônicas? Fontes, mais uma vez mencionando Marx e Engels defende que
estes devem estimular “a legitimação do mundo existente como se fosse o mundo
necessário, assegurando assim, a perpetuação dos setores dominantes” 24.
Penso que, para os meios de comunicação pertencentes à fração de classe que se
consolidou no poder na sociedade brasileira nas últimas décadas, tais funções caibam
aos seus intelectuais. Por isso, analisar as estruturas que permeiam o sistema de mídia
no Brasil se faz de fundamental importância para que seja possível compreender quais
são as bases nas quais as disputas por hegemonia se configuram. Para tal, dois autores
que considero fundamentais são Venício Lima e Carolina Mattos.
O primeiro autor possui um estudo de fundamental contribuição para a discussão
das políticas públicas de comunicação no Brasil, e como elas têm atuado em relação à
22 FONTES, op. cit. p. 14823 GRAMSCI, Antonio. Cadernos do cárcere: Os intelectuais. O princípio educativo. Jornalismo. 7. ed. Rio De Janeiro: Civilização brasileira, 2014. 2 v. p. 2024 FONTES, op. cit. p. 148
histórica concentração dos meios de comunicação nas mãos de poucas famílias, e quais
foram as iniciativas, do legislativo, do executivo e de entidades da sociedade civil de
regulamentar (ou não) a comunicação no Brasil. Já a segunda, possui um importante
estudo sobre os sistemas de mídia em escala global, e estabelece comparações entre
modelos de diferentes partes do mundo. A principal contribuição da autora que tirarei
para esta pesquisa é identificar como diferentes sistemas de mídia influenciaram na
estruturação do sistema brasileiro e relacionar tal fato com as conjunturas econômicas,
políticas e econômicas que condicionaram a formação da estrutura comunicacional no
Brasil.
Para analisar essas disputas explicadas por Lima, Gramsci propõe uma discussão
sobre o Estado que o vê como a junção da sociedade civil, a partir dos seus aparelhos
privados de hegemonia (escolas, sindicatos, imprensa, universidades, igreja, entre
outros), com a sociedade política, a partir dos aparelhos coercitivos do Estado. No
entanto, Gramsci e seus seguidores não veem a hegemonia como algo monolítico e
unitário, mas sim que está em grandes transformações e que é constantemente
questionada por aqueles que não consentem com a dominação da classe ou fração de
classe que está no poder. Sendo assim, a hegemonia, pressupõe necessariamente uma
contra hegemonia, isto é, uma alternativa propositiva sobre quais rumos a sociedade
deve tomar, no que diz respeito à produção e a distribuição das riquezas, sobre valores a
serem cultivados e formas de sociabilidade a serem estabelecidas.
Sendo assim, o foco de meu trabalho será o de investigar como o Estado
(entendido aqui da maneira ampliada proposta por Gramsci) atua no sentido de manter a
hegemonia dentro dos meios de comunicação e também a partir deles. Além disso,
pretendo analisar como grupos contra hegemônicos atuaram no sentido de questionar a
ordem a eles imposta e quais foram os meios e os espaços que estes utilizaram para
garantir a viabilidade e a visibilidade de suas pautas.
Por fim, como a principal fonte primária deste projeto é um jornal, acredito que
se torna necessário tratar das relações entre imprensa e História. Segundo Derocina
Sosa, estudar tais relações permite ao historiador perceber “situações concretas que
remetem às especificidades reveladoras de sua ideologia e de seus contatos com o
poder” 25.
25 SOSA, Derocina Alves Campos. Imprensa e história. Biblios, Rio Grande, v. 1, n. 19, p. 109-125. 06/2006. p. 109
Além disso, uma análise crítica que leve em conta os interesses políticos e
econômicos que guiam a produção jornalística de um meio de comunicação pode
permitir a construção de uma história política diferente daquela tradicional, focada nas
grandes figuras e personalidades, de caráter mais factual e com uma noção de tempo
pautada na linearidade.
Como este quadro teórico pretende discutir a noção de Estado a partir de
Gramsci e este trabalho pretende se encaixar no campo da História Política, a relação
entre a História e a imprensa se faz fundamental porque, como afirma Sosa, “Os jornais
estão localizados na encruzilhada desses elementos: estado, política e poder,
combinando-se com eles, ora endossando o discurso oficial, ora opondo-se a ele.” 26.
Soma-se a estas contribuições o fato de uma observação atenta do jornalismo de
determinada época poder contribuir para a análise das disputas político-ideológicas
desta mesma época. Tal análise se faz de extrema importância, pois, ainda que muitos
editoriais se pretendam neutros (ou, ao menos, se mostrar desta forma), o fator subjetivo
está sempre presente neste tipo de produção. Tal fator subjetivo se faz presente
principalmente pelo fato da produção jornalística estar a serviço dos interesses daqueles
que o escrevem e daqueles que os financiam. Sendo assim, a seleção dos assuntos que
entram em determinada edição (em detrimento de outros que ficam de fora), o destaque
que cada notícia possui dentro de cada edição, o tipo de linguagem utilizado pelo
veículo, as imagens que são exibidas em cada reportagem são, sobretudo escolhas
políticas, que visam a formação de um consenso e a legitimação (ou contestação) de
uma determinada estrutura que ajuda a consolidar e manter o poder de uma classe, ou de
fração de classe.
Metodologia e fontes:
Este trabalho será realizado a partir das investigações de fontes secundárias
apontadas no levantamento bibliográfico combinadas com a análise de uma fonte
primária principal, no caso, o jornal Brasil de Fato. É possível que, a título de
comparação, sejam utilizados outros jornais como fontes primárias, como o jornal O
Globo, a fim de discutir algumas das problemáticas levantadas e relacioná-las com o
quadro teórico proposto por esta pesquisa.
Para que esta pesquisa se concretize, pretendo fazer uma discussão sobre o
período histórico no qual se insere a minha pesquisa, ressaltando aspectos gerais da
26 Idem, p. 110
chegada do PT à presidência da república e as bancadas que se formaram nas eleições
nacionais legislativas. Nesse momento, torna-se necessário também relacionar os
processos históricos que se desenvolvem no território brasileiro com os processos que
ocorrem a nível internacional. Para tal, é preciso recorrer a produções historiográficas
sobre o Brasil recente que ressaltem o bloco hegemônico que se constituiu no poder ao
longo do processo de redemocratização do país e o processo que levou à chegada do
Partido dos Trabalhadores à presidência da República.
A pesquisa também possui a intenção de fazer uma discussão sobre a
distribuição dos meios de comunicação no Brasil, identificando quais são os grupos
dominantes e como as políticas públicas para a comunicação no Brasil favoreceram a
formação de uma estrutura oligopólica e concentradora da mídia no país. Neste
momento, torna-se necessário tratar de políticas que foram formuladas em períodos que
não se enquadram no recorte temporal desta pesquisa, mas que sem a análise destes, não
se torna possível realizar a discussão sobre as disputas por hegemonia dentro do campo
dos meios de comunicação. Neste caso, o recurso às fontes secundárias se faz
primordial, principalmente as obras no campo da comunicação social que privilegiam a
análise das relações de poder em relação às políticas públicas para esta área. Sendo
assim, pretendo realizar uma análise, a partir de obras principalmente de Dênis de
Moraes e Venício Lima, que tratam das políticas públicas de comunicação que foram
realizadas durante os anos de 2003 a 2014. Isso significa dizer que serão discutidas
iniciativas do poder legislativo e do executivo para o setor, as demandas da sociedade
civil para a comunicação no país, e como este conjunto de fatores influenciou na
produção jornalística dos meios de comunicação alternativos brasileiros, em especial no
jornal Brasil de Fato.
Finalmente, escolherei alguns momentos específicos da história política
brasileira (ainda a definir) e analisarei a cobertura de tais temas pelo jornal Brasil de
Fato, a fim de verificar se este pode se enquadrar ou não em um veículo de
comunicação contra hegemônico. Para a realização de tal objetivo, será feita a
comparação de notícias e manchetes deste jornal com outro(s) que, segundo o modelo
teórico no qual esta pesquisa se baseia, se enquadraria no campo dos veículos
hegemônicos.
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%20Ros%C3%A2ngela%20Gil. Acesso em: 11/07/06.
Cronograma de execução:
Atividades Janeiro Fevereiro Março Abril Maio Junho Julho
Modificações
no Projeto
X
Coleta de
Fontes
X X
Finalização
das leituras
necessárias
X X
Análise e
estruturação
dos capítulos
X
Redação X X X
Revisão e
ajustes finais
X