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5/28/2018 Oswaldo Munteal Filho - vitorinomagalhaes - hist ria natural.pdf
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Ace rvo , R io de Janeiro, v. 12, n 1-2 , p . 67-8 8, jan /dez 1999 - p g.67
R V O
Mar!
E um aberto poema que
ressoa
No bzio do areal...
Ah, quem pudesse
ouvi-lo sem mais versos!
Assim puro,
Assim azul,
Assim salgado. ..
Milagre horizontal
Universal,
Numa palavra s realizado.
(Miguel Torga, Mar)
Penso, na verdade, que a
histria do Brasil no
histria parte, e que deve
Vitorino Magalhes Godinho
no Labirinto UltramarinoAs frotas, as especiarias e o mundo
atlntico
Oswaldo Munteal FilhoOswaldo Munteal FilhoOswaldo Munteal FilhoOswaldo Munteal FilhoOswaldo Munteal Filho
Historiador da Seo de Pesquisa doArquivo Nacional. Professor adjunto de Histria Moderna e
Contempornea da UERJ e da PUC-Rio. Doutor em Histria Social IFCS/UFRJ. Coordenador do Navegar laboratrio de estudos portugueses da UERJ.
ser consideradanas suas
relaes com a
histria
do meu
pas, e ambas integradas na
evoluo mundial.
(Vitorino Magalhes Godinho)
INTRODUO: ATRAMADAREDEATLNTICA
Oencontro dos navegadores coma Amrica deu-se atravs doMar-Oceano, para tomar aquiuma inspirao de Colombo. Este meio
natural, paulatinamente domesticado, foi
tornando-se aos poucos uma fonte de
mistrios, de interpretaes fantsticas
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cunhadas pelos capites-nobres. Estes co-
mandantes de esquadra formaram-se nos
quadros de um pensamento medieval
comprometido com o ideal da cavalaria,
a obsesso pela honra e, sobretudo, pela
busca da glria. Portanto, o perigo fazia
parte da conquista, assim como a manei-
ra de ultrapassar os obstculos transcen-
dentes, representados por serpentes ma-
rinhas, drages ou mesmo entidades
mgicas capazes de alterar a mente dosmarujos.1
A arte da marinharia, confrontada ao tem-
po histrico em que os aristocratas esta-
vam inscritos, representou uma fonte de
novas certezas para a secularizao da
Ibria.2 O historiador portugus Vitorino
Magalhes Godinho props uma verdadei-
ra reviso da epopia das descobertas,
por meio da histria das frotas e dos me-
tais amoedveis, das rotas ultramarinas,
e, sobretudo, das especiarias do Oriente
e da Amrica.
Pode-se supor que ele percebe uma ver-
tente original para a histria dos desco-
brimentos, fundada no movimento dos
homens e das mercadorias que singraram
os continentes do Novo Mundo. Tempo
secular o tempo da acumulao da ri-
queza das naes, especialmente dos pa-
ses ibricos. A utopia da construo de
uma nova identidade (luso-americana)
tem uma referncia central para Godinho:
os meios p r t icos que melhor
viabilizariam a conquista fsica das novas
terras. Nesse sentido, o encontro do Ve-
lho Mundo com o Novo Mundo depende
de uma compreenso do significado da
realidade palpvel, ao alcance da mo dos
portugueses, articulada ao esforo de
conferir uma dimenso inteligvel Natu-
reza encontrada ou descoberta.3
No devemos nos esquecer que muitos
ainda hoje, no limiar do sculo XXI, con-
sideram a inveno do Novo Mundo como
um dado insofismvel, e sobre o qual
pouco pode-se ainda dizer.4 O que talvez
explique a apatia brasileira ou as mani-
festaes estreis diante das comemo-
raes dos 500 anos de Brasil. Afinal,
como lembra bem a catilinria ps-mo-
derna, para que investigar o que j est
dado? Faz sentido pesquisar?
Faz-se necessrio, pois, retomar o deba-
te acerca das fronteiras, a fim de que pos-
samos perceber o cariz da sociedade por-tuguesa que produziu o encontro com a
Amrica. O conceito de fronteira foi as-
sim explicitado por Lucien Febvre: Fron-
teira: palavra de exrcitos em movimen-
to, palavra relativamente nova que se
ope a limite, essa velha palavra indul-
gente de medidores de terra. Fronteira,
verdadeira fronteira, linear e de choque
um dos nervos flor da pele, cuja dor
lancinante nossa velha Europa carrega em
seus flancos....5 necessrio um esfor-
o de retomada da teoria do sistema mun-
dial na perspectiva analtica de Fernand
Braudel, e dessa forma integrar a com-
preenso da fronteira compulso
globalidade, forada pelas polticas colo-
niais europias em tela desde o sculo
XVI.
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As terras descobertas tm a funo, den-
tro da lgica da mundializao das tcni-
cas e do conhecimento sob controle do
Ocidente moderno, de proporcionar uma
acumulao ilimitada e interminvel de
capitais e de foras em torno do grande
comrcio e dos estados hegemnicos do
ncleo duro da economia mundo dos des-
cobrimentos.
Este estudo pretende, sumariamente e
tendo como foco uma escrita postada,
examinar as fon tes da re f lexo
historiogrfica de Godinho e os caminhos
da sua interpretao, a partir de um tra-
balho intitulado: Portugal, as frotas do
acar e as frotas do ouro (1670-1770).
A estrutura deste trabalho apresentar os
seguintes problemas, tomando-se por
base a anlise da escrita de Godinho: arelao que o autor estabelece entre a
crise civilizacional do mundo contempo-
rneo e o futuro dos pases de lngua por-
tuguesa. Esse elemento atravessa os es-
tudos e cursos mais recentes do historia-
dor portugus; o colonialismo luso como
uma etapa da histria do sis tema mundi-
al; a identidade entre a histria do Brasil
e de Portugal; as frotas e o imprio por-
tugus. Os aspectos apontados nessa
agenda intelectual de Magalhes Godinho
no aparecem nessa ordem, ou mesmo
com esses t tu los . Na verdade, o
ordenamento deste artigo obedecer o
ritmo das frotas do acar e do ouro, com
um olhar sempre atento para as suges-
tes e polmicas implcitas num trabalho
preparado em 1951.
MAREMODERNIDADE: OS IMPASSES
DACIVILIZAO
Areflexo sobre a escrita de Ma-galhes Godinho exige um es-foro de compreenso de duasvertentes que aparecem constantemente
no estudo sobre as frotas: em primeiro
lugar, a percepo do mundo como obje-
to de pesquisa. De uma outra perspecti-
va, Godinho revela uma preocupao
constante com a maneira de pensar a his-
tria, e o ofcio do historiador. Esse pro-
cesso de conhecimento do mundo luso-
americano encontra o seu ponto de
imbricao quando a histria da expan-
so capaz de examinar, articuladamen-
te, o conceito de descobrimento, a idia
de Novo Mundo e a singularidade do
renascimento ibrico para a cultura oci-
dental.
Os homens que cruzaram o Atlntico en-
tre os sculos XV e XVIII buscavam, em
essncia, especiarias que muitos navega-
dores, naturalistas e burocratas rgios
julgavam existi r abundantemente nas ter-
ras exticas do Novo Mundo. Nessa parte
do globo terrestre, as aes dos luso-bra-
sileiros foram impulsionadas por uma es-
pcie de mutao mental de inspirao
renascentista, que, aliada ao esprito
aventureiro, domou as ondas da mar e
quebrou a baa tranqila da resignao
em busca do alto-mar.
Na mente e na alma do navegante deve-
ria haver clareza, quando tudo oscilava
sob ele. Na ponte de comando havia tan-
to a sobriedade do conhecimento para
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pilotar, quanto o sentimento de descobrir
e a caprichosa mstica de errar pelo mun-
do inteiro.
A dimenso multissecular do reconheci-
mento do cu, da terra e do mar, dos li-
mites territoriais nos oceanos e nas no-
vas terras, precipitou as potncias euro-
pias da poca para um cenrio interna-
cional de disputa acirrada. Muitas bandei-
ras singraram os mares, dos piratas aos
comerciantes ultramarinos, alm dos mis-
sionrios, nobres, pilotos, e naturalistas
que lutavam pela hegemonia do Atlnti-
co, transferindo assim para o cu e para
o mar a geografia do continente.
A migrao de povos, idias, especiar ias
e identidades acabou por caracterizar as
sucessivas aventuras de redescoberta dos
territrios ultramarinos. Quando pensa-
mos, quinhentos anos depois, nos poss-
veis significados da conquista da frica,
Amrica e ndia para o fluxo de homens e
mulheres que passaram a experimentar a
cultura portuguesa, perguntamo-nos so-
bre a capacidade que temos de reunio e
o quanto somos diferentes da origem.6
A idia de uma comunidade de povos de
lngua portuguesa ultrapassa o espao
local e ganha fora planetria quando di-
versos pases fora da lngua oficial portu-
guesa se integram de forma fragmentada
cultura lusitana.7 As iniciativas em tor-
no de uma maior integrao tm sido t-
midas. Os centros de pesquisa, acordos
de cooperao econmica e mesmo as
famosas comemoraes em torno dos
quinhentos anos muitas vezes ignoram a
fora vital de uma possvel unidade
lusfona.
O pensamento nico de cunho neoliberal
aumenta os desafios que estamos a en-
f ren ta r , d ian te do p rocesso de
g loba l i zao da economia e de
massificao da cultura. A busca da me-
mria viva, dos laos intelectuais e ticos
que nos unem e da reflexo sobre as di-
ferenciadas rotas que marcaram a hist-
ria de Angola, Cabo Verde, Brasil, Portugal,
Timor Leste, Macau, Moambique, So Tom
e Prncipe e Guin ao longo do sculo XX
adquirem sentido para a formao edu-
cacional e cultural de nossos povos.
de fundamental importncia que as ca-
sas de memria, universidades e os r-
gos de comunicao social trabalhem
articuladamente na revalorizao da tra-dio intelectual luso-brasileira com o
objetivo de informar a sociedade civil so-
bre uma histria que foi durante muito
tempo comum. Para alm disso, devemos
refletir sobre os nossos vnculos com a
modernizao e pensar no passado colo-
nial, que afinal sempre surge como um
fantasma contemporneo para as ex-co-
lnias em busca da superao do atraso.
Parte de nossa elite dirigente econmi-
ca e burocrtica tenta contaminar o sen-
so comum com a explicao perversa que
associa o nosso atraso econmico tra-
dio luso-brasileira, esquecendo eviden-
temente da forma dependente do nosso
capitalismo, este sim associado a fatores
globais e que escapam ao consenso atln-
tico.
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A liderana em torno da idia desse con-
senso depende claro de investimento
material, assim como deve estar compro-
metida com atitude tica e fora intelec-
tua l , que a f ina l concorrem para a
materializao dos nossos ideais.
Quinhentos anos depois da expanso cul-
tural e da explorao econmica do Novo
Mundo, os povos de lngua portuguesa
tm refletido, cada um a sua maneira,
sobre o processo colonizador e sobre o
lugar que cada um ocupa no mundo de
cultura lusfona. As cidades ultramarinas
tm em comum o passado colonial , a he-
rana de uma longa tradio imperial
(1415-1974) e os fragmentos de uma
multifacetada identidade cultural. A expe-
r inc ia de uma un idade imper ia l ,
deslanchada pela cultura renascentista e
consignada pela lngua, pela f e pelo
monoplio metropolitano, caracterizou a
mensagem dos descobrimentos portugue-
Retrato de Vasco da Gama. Roteiro da viagem queem descobrimento da ndia pelo cabo da Boa Esperana fez d. Vasco da Gama em 1497. Porto, 1838.
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ses por trs continentes.8
A reflexo sobre o futuro dos povos de
lngua portuguesa, das origens maturi-
dade, integra uma histria de muitos ca-
ptulos na busca dos traos comuns en-
tre a histria de Portugal e a histria dos
pases que progressivamente se viam en-
volvidos num complexo cultural discursivo
transepocal. As diversidades cultural, t-
nica, lingstica e intelectual presentes na
trajetria das ex-colnias nos obrigam a
cruzar a hipottica temperana e a pecu-
l ia r idade dos t rp icos com a
multiplicidade de dialetos e crenas, e fi-
nalmente com a prpria busca dos pases
que herdaram o portugus do seu senti-
do/destino.9
Na memria dos viajantes que singraram
os mares e invadiram os povos e as ter-
ras exticas, havia a contemplao em re-
lao natureza tropical e ao no sen-
tido dos homens seculares. A perspectiva
de estar-no-mundo foi vital para os des-
cobridores, afinal cu e mar pertenciam
de fato aos navegantes e a todos os que
eram capazes de entender os sinais pre-
sentes na natureza fsica das colnias.
Havia assim uma verdadeira aliana en-
tre a colonizao e a compreenso. Resta
saber, hoje, que sntese possvel ser
recuperada ou criada a partir da rida
conquista da autonomia e da distante
percepo dos fragmentos de uma iden-
tidade.
Viajar era preciso e natural para os ho-
mens do renascimento cientfico-cultural
do chamado Grande Sculo. A necessida-
de de que fossem trilhados caminhos para
dentro e para fora de Portugal, com as
mesmas finalidades e objetivos, reside
nos sentidos de explorar e conhecer.10 Na
viagem est implcito o distanciamento,
fictcio ou no, independente de qualquer
racionalidade para ser, num duelo entre
razo e vontade/instinto. Para quem o ca-
rter de observar constitui a base para um
saber elucidado e no perigosamente su-
posto, o caminho das fontes precauoe lementa r . A v iagem fo i capaz de
(re)construir Portugal pela significao
que lhe d o tempo. Tempo esse que
passado, pois s ele verdadeiramente
tempo.
O desenvolvimento dos espaos de soci-
abilidade intelectual e o investimento no
mtodo cientfico, voltados para o estudo
da natureza como matria filosfica, vi-
saram a promoo imediata de um conhe-
cimento que se constitui utilitrio, ou seja,
de um entendimento de fim prtico, e in-
serido nos termos de uma nova descober-
ta do Novo Mundo. Dessa maneira, a na-
tureza foi a chave para um controle que,
de uma forma pragmtica, correspondeu
a um movimento de largo e minucioso
reconhecimento do imprio colonialatlntico.
O escritor portugus Miguel Torga em
seus Dirios diz: O meu espao de li-
berdade o mapa de Portugal, subenten-
dido na folha de papel onde escrevo.
Tor ga convida-nos em sua obra, espec i-
almente em seus Dirios, a um passeio
imaginrio por Portugal. Apresenta ao lei-
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tor um percurso da aventura lusada des-
de os trs-montanos aos minhotos, ao
Douro, s Beiras, ao passado coimbro, a
Lisboa ultramarina dos cruzados e dos
mouros e a Lisboa peninsular/europia,
e, afinal, converge para as fundaes da
nacionalidade portuguesa de d. Afonso
Henr iques, pa ra en to chegar aos
alentejanos e algarvios, neste caso o ori-
ente criado pela pennsula ibrica, regio
fundadora do cisma Ocidente/Oriente des-de 711.
Esse o roteiro ideal-tpico dos ensastas
de diversas pocas, mesmo entre aque-
les em que a perspectiva do historiador
no necessariamente a dominante e, de
certa maneira, o entendimento acerca de
Portugal acaba por transcender o ofcio
especificamente historiogrfico. Entre
estes intelectuais habitam diversas tradi-
es acadmicas e literrias, como nos
casos de Alexandre Herculano, Antnio
Srgio e Oliveira Martins, que, neste lti-
mo caso, pontifica a reinterpretao da
histria de Portugal luz de uma civiliza-
o ibrica emergente e de um pas que
morreu ao nascer e viveu a imitar os ou-
tros. Portugal teria acabado no sculo XVI
e os Lusadas seriam um epitfio.
Entender Portugal nas suas origens e na
sua integralidade parece ser sempre uma
inteno, uma meta, um objetivo quase
impossvel de ser alcanado.11 Em um
episdio de grande dramaticidade para a
histria moderna portuguesa, o historia-
dor Joo Lcio de Azevedo prope: Nin-
gum acredita j que d. Sebastio venha
a ressuscitar, mas poder-se- dizer que
desapareceu de todo o sebastianismo?
Nascido da dor, nutrindo-se da esperan-
a, ele na histria o que na poesia a
saudade, uma feio inseparvel da alma
portuguesa.12
A difci l e complexa tarefa de, tomando
aqui a perspectiva de Fernand Braudel,
pegar a estrada, e com os prprios olhos
inventariar a diversidade, interpretar a
partir da paisagem, procurar a divergn-
cia, o contraste, a ruptura e a fronteira,
mobiliza-me e impulsiona-me a perceber
a interinfluncia luso-brasileira na sua
singularidade e originalidade.
O problema da identidade no limiar do
sculo XXI recoloca a sociedade brasilei-
ra e a portuguesa frente a frente com as
suas histrias de permanncias e ruptu-
ras. A retomada das discusses em torno
dos quinhentos anos faz reacender no
s a remota histria do povo brasileiro,
mas tambm o sentido desta discusso
para o prximo milnio. A retomada da
herana quinhentista sinuosa, diria
mesmo perigosa, pois remete a uma pes-
quisa sobre o sentido transistrico que
habita no interior da tradio luso-brasi-
leira. Ns no acabamos de nos conhe-
cer. A re lao at lnt ica ant iga e
permeada por significativas contradies
que referem-se ao prprio passado colo-
nial.
Promover uma ligao entre portugueses
e brasileiros, com base exclusivamente na
efemride ou mesmo na comemorao
do acontecimento, um risco calculado
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e imprevisvel. O aqui e agora, escre-
veu Ernst Jnger, trata-se de uma ques-
to central do nosso tempo, quer dizer,
de uma questo que, em qualquer dos
casos, se faz acompanhar de perigos.13
Entre a herana e o futuro h uma traje-
tria errtica e muitas vezes criativa.
Pode-se dizer mesmo que a gnese da
identidade lusfona refere-se, em primei-
ro lugar, a trs influncias tnico-cultu-
rais: a presena islmica (sculo VIII); a
tradio visigtica (criao da diocesis
Hispaniarumpor Diocleciano em 297) que
originalmente fundou a Ibria; e o lega-
do ultramarino marcado pelo incio das
grandes navegaes (em torno de 1415).
Num segundo momento, deve-se consi-
derar a interpretao sobre a histria das
geraes de povos e culturas que entra-
ram em contato reciprocamente a partir
da empresa colonial, das guerras religio-
sas e dos movimentos de independncia.
Aparentemente, as trocas cul turais foram
desprezadas como fatores de integrao,
e muitas vezes encaradas como fontes do
atraso material. Nesse sentido, para que
lembrar de relaes entre partes esque-
cidas ou pouco desenvolvidas do globo,
como a distante e ininteligvel ndiagoense, a miservel frica portuguesa de
descolonizao recente e polmica, ou o
Brasil cada vez mais perifrico quanto s
exigncias do ncleo orgnico do capita-
lismo global?
As dificuldades em torno de uma maior
visualizao acerca da relevncia de se
pensar sobre o passado luso-brasileiro
comeam com o movimento de consoli-
dao do nacionalismo no sculo XIX, se-
gu ido do fenmeno nacional
metamorfoseado em fascismo na dcada
de 1920 em Portugal, e, finalmente, a re-
cuperao econmica em meio a uma
recesso internacional.14 Portugal e Bra-
sil parecem existir em planetas distintos.
A dinmica do encontro contemporneo
parece reivindicar da inteligncia ibero-
americana a elaborao de um verdadei-ro inventrio dos marcos conceituais que
venham a caracterizar uma historiografia
dos povos de lngua portuguesa.
O ensino secundrio dos jovens estudan-
tes brasileiros tem confirmado todos os
preconceitos seculares construdos ao
longo das sucessivas redescobertas das
nossas diferenas. O encontro do sculo
XXI no apenas de culturas, mas essen-
cialmente marcado por uma espcie de
ajuste de contas com a nossa memria
coletiva. curioso observar a estranheza
dos brasileiros no que tange aos quinhen-
tos anos. Um olhar atento pode perceber
as seguintes iniciativas ldicas : a prepa-
rao de uma outra sinfonia do Novo Mun-
do (alm da famosa nona de Antonin
Dvork) pensada para as comemoraesoficiais, uma encenao da chegada dos
navegadores numa espcie de funeral vir-
tual, e, claro, alguns protestos em nome
da busca da alteridade perdida.
Portugal retomado no mbito do senso
comum como o ponto de partida do atra-
so, 15 uma espcie de mergulho para o
nada. Trata-se, na verdade, de eliminar
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fronteiras entre os pases que formam a
comunidade lusfona, e aproximar algu-
mas investigaes realizadas no contexto
dos centros de excelncia, na direo do
grande pblico. A sociedade brasileira
precisa de uma alta dose de histria. H
uma concepo mais ou menos dissemi-
nada de que a empresa e a carreira colo-
niais empreendidas pelos lusos foram in-
feriores s dos holandeses, franceses, in-
gleses e at dos espanhis dos nossosvizinhos no Cone-Sul. Alguns parecem
buscar a metrpole ideal ou a coero
mais perfeita. Pior, h um verdadeiro es-
quecimento do colonialismo recente em
frica. O olhar sobre a histria do pre-
sente imediato parece ameaar decisiva-
mente a crtica e surge a proposta escon-
dida de um homem no-histrico. Mais
uma vez retomando Torga, o escritor por-tugus diz: uma vida d para quase
tudo.
A intolerncia com o passado faz parte das
especulaes neoliberais e ps-modernas
da contemporane idade. A lguns
prepotentes do fim do sculo correm em
busca de uma notoriedade milenarista
propondo o fim do pensamento e da ao,
sinalizando para o pensamento nico que
no cessa de afirmar que tudo j est dito.
Ento para que a pesquisa? H um esfor-
o de retirar da histria qualquer capaci-
dade de compreender ou explicar, num
movimento de esmagamento de todo pro-
jeto coletivo. O desafio posto na mesa
o seguinte: no h memria individual ou
coletiva. O historiador ser capaz de cap-
turar no tempo histrico os registros da
memria social contida na experincia
multissecular dos descobrimentos? A ati-
tude de pensar historicamente civil e
crtica, independente de ideologias, no
momento em que possvel confrontar
concepes, examinar registros documen-
tais dspares, buscar a contradio na
pesquisa rida e minuciosa sobre o pro-
cesso com os seus ritmos e sentidos pr-
prios.
O pai da hermenutica contempornea,
Hans Georg Gadamer, em seu ensaio so-
bre as origens culturais e os fundamen-
tos antropolgicos do continente euro-
peu, medita longamente sobre o hiato
entre a genealogia dos povos europeus e
o futuro que os espreita. Para tanto,
Gadamer lembra muitas vezes do papel
da Segunda Guerra Mundial como um
momento de reflexo ou balano da ex-
perincia humana produzida no passado,
e a manipulao sobre a opinio pbica e
a formao cientfica estril nos dias que
correm. Afinal, e a funo do pensamen-
to filosfico nisso tudo?16
A pergunta que muitas vezes tem sacudi-
do os meios de comunicao, de uma
maneira geral, parte da convico de que
realmente existe alguma coisa para se co-
memorar. Bem, se isso verdade, faz-se
necessrio estabelecer algumas propos-
tas preliminares. O acontecimento/pro-
cesso que engloba o mundo lusfono pos-
sui temporalidades distintas. A reconstru-
o portuguesa de 1974 se deu num mo-
mento extremamente desfavorvel. A eco-
nomia sustentou o processo de moderni-
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zao e redemocratizao nas dcadas
que se seguiram Revoluo do 25 de
abril, movimento militar que foi o res-
ponsvel direto pela liquidao do
salazarismo.17
As ex-colnias v iveram, ao longo do s-
culo XX, uma outra experincia histri-
ca, marcada por uma imensa dvida so-
cial e pela acelerao do processo de de-
pendncia econmica. Em termos
metodolgicos pode-se pensar a relao
luso-brasileira a partir de Portugal, do
Brasil ou de Portugal e Brasil. E este o
ponto fundamental: romper com o iso-
lamento cultural que mais uma vez faz uma
sombra entre a Ibria e o Oriente. 18
A definio do que somos em termos de
uma unidade dos povos de lngua portu-
guesa depende de uma afirmao do en-
contro no sculo XXI. O sentido da come-
morao diverso, e a capacidade de reu-
nio est vinculada diretamente recupe-
rao da memria das ex-colnias e
admissibilidade de uma histria comum
num passado mais remoto.
Uma das tarefas que se apresentam para
os inte lectua is que tm pensado e
pesquisado a longa expanso colonial lu-
Guillaume-Thomas Franois Raynal, Histoire philosophique etpolitique des tablissements et du commerce des europens dans les deux Indes, Paris, 1820, volume
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sitana, estabelecer um dilogo entre os
tempos da conquista19 e as tenses em
torno dos processos de descolonizao.
importante remeter a massa esparra-
mada de dados, fatos e teorias a uma in-
terpretao que insira o espao ibero-
americano no sistema mundial.
Recentemente, o historiador Eric J.
Hobsbawn escreveu uma espcie de bio-
grafia do sculo XX aliada a um profundo
senso prospectivo. A provocao veio
numa entrevista denominada O novo s-
culo, que apresentou o seguinte ponto
de vista logo na sua primeira resposta:
Todos ns, na medida do possvel, ten-
tamos prever o futuro. Faz parte da vida,
dos negcios, nos perguntarmos sobre
o que ele nos reserva. Mas a previso
do futuro deve necessariamente base-ar-se no conhecimento do passado. Os
acontecimentos futuros precisam ter
alguma relao com os do passado, e
nesse ponto que intervm o historiador.
Ele no est em busca de lucros, no
sentido de que no explora seus conhe-
cimentos para assegurar ganhos. O his-
toriador pode tentar identificar os ele-
mentos relevantes do passado, as ten-
dncias e os problemas. Por isso, pre-
ciso que nos arrisquemos a fazer pre-
vises, mas tomando certos cuidados.
Entre os quais, tendo sempre a consci-
ncia do perigo de macaquear o carto-
mante. Precisamos entender que, na
prtica e por princpio, grande parte do
futuro inteiramente inacessvel. Creio
que so imprevisveis os acontecimen-
tos nicos e especficos, ao passo que
o verdadeiro problema para os histori-
adores entender o quo importantes
eles so ou podem vir a ser. s vezes,
podem se mostrar significativos do pon-
to de vista da anlise, mas nem sem-
pre assim.20
Nos dias que correm, posicionamentos
desse t ipo parecem um convite ao
confinamento intelectual. Essa articulao
bastante rara e para muitos um empre-
endimento de alto risco. Hobsbawn come-
a o seu livro mencionando o papel da
bola de cristal para a atividade do inte-
lectual que estabelece um compromisso
com o presente.
O enfoque deste estudo privilegia a co-
municao entre o passado e o presente
como um dos focos para uma viso mais
precisa das contribuies de Magalhes
Godinho histria da expanso martima
da poca moderna.
ASVIAGENSDE DESCOBRIMENTO
Omundo atlntico, na perspecti-va de Godinho, representouuma verdadeira novidade geo-grfica, edificada entre 1520 e o final do
sculo XVI. A civilizao da modernidade
atlntica superou a barreira intransponvel
do oceano, e instalou um mundo marca-
do pelas conexes permanentes entre
americanos, africanos e asiticos. Os pa-
dres de relacionamento constitudos nos
primrdios da modernidade europia
apresentam ritmos e direes variadas,
entretanto Godinho faz questo de frisar
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que os contatos e migraes existiram
sempre.21
O mar na Europa tinha adquirido uma
componente do poder de Estado, mas no
por todo o lado nem ao mesmo tempo,
nem no mesmo grau. De um modo geral,
o papel do mar na afirmao do poder foi
inversamente proporcional extenso do
territrio. Sem retomar as experincias
anteriores ao sculo XIII, as cidades itali-
anas, Veneza e Gnova em part icular, de-ram provas de precocidade. As suas pos-
sesses alm-mar, at o mar do Norte,
fizeram reviver o conceito antigo de
talassocracia. Antes de Inglaterra, Portu-
gal e mais tarde as Provncias Unidas te-
rem fundado, fosse sobre uma ilha, ou
sobre uma margem estreita do continen-
te, domnios martimos, o Mediterrneo
conheceu, em meados do sculo XV, aexperincia original da Coroa de Arago.
A partir de uma expanso catal at o mar
Egeu, o voluntarismo de Afonso V, o Mag-
nnimo (1418-1456), uniu numa espcie
de federao a Catalunha, o reino de
Valncia, a Sardenha, o reino de Npoles
e a Siclia; em 1449, um verdadeiro pro-
grama por ele publicado impunha a es-
ses estados alguns elementos de um im-
prio martimo: proibio de determina-
das importaes estrangeiras, aumento
das construes navais e monoplio da
bandeira aragonesa. Por seu lado, o rei-
no da Frana, intimamente ligado ao con-
tinente tanto por suas fronteiras como
pela mentalidade rural dos seus habitan-
tes, e dividido entre os seus imperativos
terrestres e as suas atraes martimas,
teve hesitaes e atrasos. O poderio es-
panhol, atravs de Castela, deu prosse-
guimento a esses avanos com o fortale-
cimento dinstico e militar absolutista.22
Magalhes Godinho percebe com clareza
que as rotas atlnticas perseguidas pelas
frotas so complementadas pelas rotas de
redistribuio, que transportam mercado-
rias transformadas, atendendo assim a
outras demandas do mundo europeu e
mesmo extra-europeu. Especiarias exti-
cas tornadas produtos medicinais, a pra-
ta metamorfoseada em moeda. Das pro-
dues naturais se podia extrair os
corantes e tinturas em geral. Nesse caso,
pode ser lembrado a partir do estudo de
Godinho: o pau-brasil vindo da Amrica
portuguesa, o pau-de-campeche do
Yucatan, e vindo de Dara no Marrocos
saariano, o anil. O acar partia de vrios
lados do imprio martimo e simboliza na
anlise de Godinho o epicentro de uma
das fases da civilizao ibero-atlntica. A
abordagem sistmica ganha fora quan-
do afirma que a gnese do mundo atln-
tico est pois, em grande parte, ligada
quilo que Fernand Braudel chama muito
apropriadamente a dinmica do acar.23
Uma demarcao que atravessa toda a
modernidade a intencionalidade racio-
nal24 dos estados nacionais e dos intelec-
tuais ligados ao poder mais diretamente,
o r ien tados para uma po l t i ca
preservacionista do mundo natural, ten-
do como pano de fundo o pragmatismo,
o utilitarismo e a perspectiva de uma
redescoberta especulativa do Novo Mun-
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do. Tudo isso atualizado pela ilustrao
setecentista que afinal norteou as potn-
cias, os filsofos naturais e os cientistas
na direo da criao de espaos de soci-
abilidade intelectual, e da formulao de
po l t i cas co lon ia is capazes de
reorientarem a dinmica da explorao
capitalista estruturada no centro da eco-
nomia mundial.25 Afinal, sobre esse as-
pecto deve-se lembrar o importante e atu-
alizado estudo do economista alemoElmar Altvater, acerca do impacto do de-
senvolvimento econmico e do processo
decisrio dos pases de acumulao mais
complexa sobre o meio ambiente. Altvater
medita densamente sobre a natureza do
processo de crescimento econmico das
naes mais desenvolvidas do globo, e
sustenta de uma forma contundente,
apo iado numa fa r ta demonstraoemprica, que o desenvolvimento con-
trrio ao meio ambiente.26
Mas devemos ter um certo cuidado ao jul-
gar que o movimento de p i lhagem
ambiental foi algo que eclodiu quase ex-
clusivamente numa fase posterior ao se-
gundo ps-guerra. Suponho que o movi-
mento exploratrio tenha sido bem ante-
rior, e foi estrutural, enraizado, pensado,calculado pormenorizadamente at mes-
mo em suas conseqncias mais imedia-
tas. Sendo assim o processo de arqueo-
logia, expanso e explorao, iniciado
com os descobrimentos, reveste-se de
uma certa familiaridade com as inflexes
da macropoltica contempornea.
O reconhecimento do territrio aonde se
est pisando nunca foi to valorizado
pelos meios de comunicao, escolas, in-
telectuais oficiais, governo e as universi-
dades. E o sculo XVIII esteve, de certa
maneira, a sombrear a revoluo intelec-
tual e cientfica que funcionou como a
fora motriz da continuidade, e do salto
das geraes futuras no que se refere
mudana de atitude diante das transfor-
maes verificadas no espao natural,
como tentarei demonstrar nas pginasque se seguem.
O jogo de busca e conquista dos objetos
foi um palco privilegiado para o observa-
dor da histria da cultura cientfica oci-
dental. Os viajantes dos descobrimentos
farejaram incessantemente significaes
e vestgios do elo perdido, numa espcie
de pesquisa quase arqueolgica, em ter-
mos do conhecimento produzido e retido
a partir da experincia novomundista.
O esforo despendido pelos navegadores,
missionrios-religiosos e aventureiros
encontra eco na permanente conquista do
espao natural das ex-colnias, que se
pode observar contemporaneamente nas
conferncias sobre a biodiversidade, exa-
mes detalhados acerca das novas frontei-
ras ecolgicas no norte do Brasil, assim
como em toda mobilizao urbana, em
grande medida associada aos setores in-
termedirios da pirmide social, em tor-
no da valorizao da qualidade de vida
dos grandes centros, como Rio de Janei-
ro ou So Paulo.
H uma evidente revitalizao dos ambi-
entes silvestres no interior das residnci-
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as, e uma percepo aguda de que na in-
fncia possvel educar visando a preser-
vao do meio ambiente nas grandes ci-
dades. A aclimatao de parcelas da po-
pulao vida natural no representa um
segredo para os estudiosos da gnese da
adequao dosmodernos ou dos homens
seculares27 ao mundo natural recriado nas
grandes metrpoles.
Esse movimento global de integrao de
grandes contingentes de homens e de
produtos exticos rede de trocas de
mercadorias foi identificado por Russell-
Wood. Aps extensa pesquisa documen-
tal, o historiador norte-americano anali-
sou diversas variveis simultaneamente,
conferindo uma nica inteno carreira
colonial, e vrios sentidos ao fluxo huma-
no , ao f luxo de espec ia r ias
comercializveis por todo o Ocidente, as-
sim como difuso dos elementos per-
tencentes flora e fauna dos ambien-
tes rsticos transplantados para o conti-
nente europeu.28
Os descobrimentos peninsulares investi-
ram numa acumulao de foras na dire-
o de um profundo e contnuo movimen-
to investigativo acerca do mundo natural
das colnias ultramarinas do Novo Mun-
do. Podemos ento procurar detectar as
principais tarefas dos investigadores da
natureza que saltavam das suas naus,
caravelas e caraveles. As marcas deixa-
das pelos primeiros colonizadores na de-
marcao do territrio relacionam-se di-
retamente forma como os lusos enten-
diam o que estavam vendo.29 Nesse sen-
tido, o projeto inicial da empresa metro-
politana, para alm da explorao dos to
sonhados meta is preciosos, estava
alicerado numa certa contemplao do
vazio do territrio, do reconhecimento
dos meios fluviais, do entendimento do
relevo, das potencialidades da natureza e
das propriedades que dela se pode extrair.
Falarei agora um pouco sobre a odissia,
em torno da conquista dos elementos
naturais, pelas terras americanas ao lon-
go dos tempos modernos, mais especifi-
camente na abertura da modernidade.
Este estudo pretende contribuir para uma
compreenso mais apurada das origens
do desvelamento do meio ambiente ame-
ricano numa poca de profunda reflexo
sobre as razes que impulsionam os es-
tados nacionais na direo de uma explo-
rao cada vez ma is v igo rosa dos
ecossistemas planetrios.30 As conseqn-
cias da macropoltica dos estados tambm
tm sido cuidadosamente estudadas por
meio de importantes mensuraes quan-
titativas.31 Para os efeitos desta investi-
gao, cabe-me aqui provocar algumas
discusses sobre um ponto de viragem
em que se deu uma reorientao poltica
e intelectual, visando uma maior explo-rao combinada com uma retrica
preservacionista de tudo o que hipoteti-
camente representasse o mundo das cri-
aturas brutas.
O caminho aparentemente errtico dos
portugueses na rota da Amrica, para al-
guns investigadores e muitos curiosos,
deve ser percebido como uma aventura
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at certo ponto inconclusa, ou at mes-
mo equivocada e acidental, fruto de um
povo procura da sua histria perdida no
tempo, e esfacelada em razo de um con-
junto plural de identidades que viriam a
formar os povos peninsulares rabes,
europeus herdeiros da tradio visigtica
e homens de vocao atlntica que circu-
lavam no alto-mar e traziam costumes
exticos de diversas provenincias.
Quando Portugal confirmava por interm-
dio de Tordesilhas a sua chamada auto-
nomia atlntica (longo processo que tem
no perodo de 1475 at 1494 anos deci -
sivos para os monarcas portugueses32 ), os
demais reinos ibricos batiam-se em tor-
no da unificao e da reconquista crist
em sua fase terminal. No centro dos con-
flitos protonacionais estavam envolvidos
diversas cidades-estados e estados
recentssimos, ainda em busca de legiti-
midade interna e capacidade blica para
que se protegessem do inimigo potencial
externo.
Em meio a teia hobbesiana que se tecia
reinos poderosos lutando entre si como
a Inglaterra e a Frana, outros em forma-
o como Florena e Veneza e finalmente
os reinos que integravam o grande comr-
cio mediterrnico e atlntico faz-se ne-
cessrio lembrar que o Ulisses ibrico ti-
nha uma tarefa no continente e outra no
alm-mar. O reino de Granada buscava no
final do sculo XV e princpios do XVI a
identidade religiosa, os aragoneses divi-
d iam-se en t re os in te resses
mediterrnicos com os aliados de Npo-
les e aqueles propriamente peninsulares
numa possvel aliana com Castela. Cr-
doba vivia a iminente condio de reino
esfacelado pela sobrevivncia das Taifas.
Navarra constituiu-se como regio de in-
teresse dos Habsburgos espanhis, mas
tambm dos absolutistas franceses, e ain-
da tinha que, ao mesmo tempo, se ver li-
vre da obedincia maometana.33
Quero crer que a fora que sobressai de
toda essa rede de trocas mercantis e po-
lticas pode ser caracterizada como uma
forma de conscincia ultramarina que ir
determinar uma vocao desptica, nos
do is scu los que se seguem aos
primrdios da colonizao portuguesa nos
trpicos, fundada na convico de que o
futuro est na origem. como se a salva-
o dos exploradores da natureza estives-
se imobilizada na descoberta dos objetos
encontrados pelos primeiros viajantes.
O fato de sermos de uma maneira ou de
outra ultramarinos pode se ver refletido
nas constantes tenses, freqentemente
capturadas pela historiografia contempo-
rnea, entre a preservao da tradio e
os caminhos que sinalizam novas formas
de conhecimento baseadas no aconteci-
mento. Os conflitos do continente foram
deixados provisoriamente de lado para
que a empresa de constituir um vasto
imprio no esbarrasse na ignorncia
ecolgica, afinal era fundamental enten-
der taxonomicamente o que se estava
vendo.34 Os europeus possuam as ferra-
mentas para europeizar a frica, a Am-
rica e a ndia, entretanto muitos impre-
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vistos ocorreram no decorrer do tempo,
como por exemplo o desconhecimento
das mltiplas propriedades das ervas, da
procriao dos animais que ameaavam
as plantations,ou mesmo os novos mi-
nrios parecidos com preciosidades, mas
que deveriam se converter em outros usos
que no os propriamente pecunirios.35
Primeiro, a natureza a ser conquistada era
a do arquiplago dos Aores, da ilha da
Madeira e demais formaes insulares na
costa africana e na sia. Posteriormente,
o mundo natural da Amrica portuguesa
passou a ser o objetivo em mira ao longo
dos sculos XVII e XVIII, tanto o litoral
quanto o interior do Brasil deveriam ser
explorados. A lgica que preside a funda-
mentao cientfica a apropriao
excedentria funcionalizada para o
expansionismo, que assumiu contornos
cada vez mais objetivos no sculo XX.
A natureza passa a se consti tuir numa
potente estrutura de pensamento forne-
cedora de inspirao para os sbios e es-
tadistas metropolitanos interessados
numa utilizao mais racional dos ele-
mentos naturais e na multiplicao das
suas propriedades. O mundo natural in-
tegra um conhecimento que resultou do
encontro dos navegadores-viajantes com
os costumes nativos e as novas especia-
rias, formando o que o historiador portu-
gus Lus Filipe Barreto denominou de
complexo sociocultural dos descobrimen-
tos. Ao lado disso, a natureza funciona
como estrutura do sistema colonial,
flexibilizando-o diante das novas motiva-
es do capitalismo moderno. O conjun-
to das prticas econmicas do absolutis-
mo (mercantilismo) vai alm das exclusi-
vas relaes de troca ou mesmo de um
iderio limitado pela falta de originalida-
de que abundava entre os fisiocratas.
Alguns trabalhos relativamente recentes
demandam uma determinada originalida-
de conce i tua l do pensamento
mercantilista, muito especialmente nas
seguintes obras: Cosimo Perrota, Produ-
o e t raba lho produt ivo no
mercantilismo e no iluminismo; Francis-
co J. C. Falcon, Exclusivo metropolitano
e comrcio colonial: questes recentes;
Vitorino Magalhes Godinho, Mito e mer-
cadoria: utopia e prtica de navegar. Nes-
ses estudos, pode-se afirmar que h uma
espcie de atualizao de algumas posi-
es consolidadas no que concerne fi-
xidez da prtica mercantil na esfera da
circulao, assim como no aparente
imobilismo do Estado diante das trans-
formaes estruturais do capitalismo eu-
ropeu , que v iv ia um novo c ic lo
hegemnico de acumulao de foras
militares e dinsticas.
ASARTRIASVITAIS
Abusca do fio para o entendi-mento do labirinto ultramari-no exige do investigador daexpanso um conhecimento adensado
sobre o mundo atlntico, expresso cu-
nhada pelo prprio Godinho a fim de de-
signar a insero do Novo Mundo no con-
texto da economia mundo europia. A his-
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tria da expanso trilhada de uma ma-
neira que, muitas vezes, nos conduz para
a hiptese do estabelecimento dos mar-
cos conceituais de uma historiografia dos
povos de lngua portuguesa. Como se
pode verificar imediatamente, a obra de
Magalhes Godinho possui diversas lati-
tudes intelectuais, e todas convergem
para uma compreenso das fontes do
mundo contemporneo.36A histr ia do
presente ronda o tempo todo a tese daexpanso como um movimento global,
sem que o autor abandone o foco: a cir-
culao de homens e moedas pelo imp-
rio martimo. Galees e frotas navegam
pelas rotas primrias na captura do con-
trole de Cdiz, Sevilha, La Corua, Lis-
boa, O Porto e Viana do Castelo. O trfico
do acar feito pelas rotas do Brasil a
So Tom. Godinho prope um verdadei-
ro mapa dos descobrimentos, examinan-
do o atlntico e os eixos comerciais mais
remotos do continente europeu.
A POLTICADO MONOPLIOCOLONIAL
EOSFUNDAMENTOSDACRISE
Otempo longo do colonialismo contemplado pelo historiador
do imprio ultramarino tanto
num olhar dirigido para as motivaes
mentais coletivas, quanto numa ao de
Estado baseada na racionalidade da soci-
Mapa do cabo da Boa Esperana.
Johan Nieuhofs. Gedenkweerdige Brasiliae Zee-em-Lant-Reize(...). Amsterdam, 1682.
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edade portuguesa de antigo regime.
Godinho no se perde na perspectiva de
uma crise econmica esttica, mas privi-
legia efetivamente os elementos que in-
tegram um movimento de crise: a hist-
ria dos preos mundiais, o dficit da ba-
lana comercial,37 e os processos de de-
senvolvimento em curso nas metrpoles
europias. A concorrncia escala do ter-
ritrio e da acumulao de capitais
definidora para a ocupao do posto deEstado controlador do ncleo orgnico da
economia mundial.
Nas sees 4, 5, 6 e 7 do estudo de Ma-
galhes Godinho sobre as frotas e o re-
conhecimento do mundo atlntico, pode-
se observar a participao portuguesa no
sistema mundial por intermdio das co-
lnias. A flutuao do papel do Estado
portugus no cenrio internacional uma
das chaves metodolgicas para a compre-
enso desse estudo. Portugal descrito
por Godinho numa luta incessante diante
das demais potncias frente s alteraes
de demanda por novos produtos exticos,
confron tos p ress ionados pe lo
patrulhamento das rotas promovido por
armadas de diversas bandeiras, e no ho-
rizonte os vrios papis exercidos peloBrasil:
Ao mesmo tempo, o ouro do Brasi l tor-
na-se, cada vez mais, uma tentao. Em
contrapartida, a cultura aucareira vai
diminuir no Brasil, porque a mo-de-
obra desviada para as minas e por-
que o ouro mais rendoso o que, de
resto, no passa de uma miragem, de
um mito, mas os mitos exercem uma
influncia que se no pode desprezar
nas atitudes coletivas; os homens jul-
gam que o ouro rende mais do que o
acar; embora na realidade no seja
exato, isso basta para os desviar do
acar para o metal fulvo.38
Godinho vislumbra vrias leituras para a
evoluo do mercantilismo no espao ib-
rico. O autor rev a centralidade da es-
tratgia metalista, e sugere que o Estado
protecionista da poca moderna tinha
uma grande capacidade de adaptar-se s
situaes de enfrentamento com a din-
mica do sistema interestados.
CONCLUSO: AHISTRIAFORMADE
PENSAMENTO
Adefinio clara do objeto, a
busca da objetividade do co-nhecimento e a erudio no
tratamento das fontes e dos clssicos do
pensamento contemporneo articularam
o conjunto das preocupaes do histori-
ador portugus Vi tor ino Magalhes
Godinho, em sua obra vasta e complexa.
um escritor de Portugal e do Brasil. Um
pensador do sentido imperial da coloni-
zao portuguesa pelo mundo. capaz de
a um s tempo contar a histria de Portu-
gal apoiado numa pesquisa erudita, pen-
sar sobre o significado da totalidade ib-
rica, e impor uma trama da rede atlntica
a partir dos domnios e da poltica imposta
pelas metrpoles. O debate que existe nos
dias de hoje acerca da natureza do pro-
cesso colonial, entre os pesquisadores da
expanso lusa, deveria atingir tambm os
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estudiosos das regies colonizadas.
Retomando o autor mais uma vez:
A pesquisa histrica estava assim es-
treitamente associada anlise das
questes essenciais do presente e do
futuro da grei portuguesa. Pois bem: em
nossos dias, bem mais do que ento,
nesse dealbar da revoluo industrial e
da Revoluo Francesa, a
perspectivao histrica da problem-
tica que se nos impe instrumento
analtico insubstituvel, e isto se volta-
dos, como devemos estar, para a
prospectiva.39
A dimenso prospectiva do seu pensa-
mento tambm deve ser marcada. A
historiografia brasileira demonstra um
profundo desconhecimento acerca da pro-
duo intelectual portuguesa, especial-
mente no sculo XX. O historiador portu-
gus faz parte de uma verdadeira legio
de autores esquecidos por muitos histo-
riadores, ou simplesmente ignorado pe-
los jovens estudantes que se formam em
histria hoje em dia.
Godinho sugere que a histria de alguma
forma seja portadora de um discurso que
amplifique o contedo para a vida, mais
ou menos desta forma: como se o his-
toriador devesse agir sobre o seu meio
social, observando a realidade que o cer-
ca, procurando senti-la, e viv-la no seu
dinamismo. O movimento para ele no
est confinado experincia das trocas.
No, a histria demanda um intercmbio
de homens, restabelecendo, de certa for-
ma, um caminho na direo da civiliza-
o, uma das preocupaes do autor. O
passado deve ser visto luz do presente
e o historiador deve se comprometer com
uma escrita prxima ao pblico, como fica
claro numa entrevista concedida ao pro-
fessor Manuel Nunes Dias na USP, em
1954. O depoimento ocorre exatamente
numa poca em que Godinho retocava
seus estudos sobre as frotas e os merca-
dos coloniais, e preparava uma edio das
frotas com um vasto material de pesqui-sa. Os mercados no representam uma
utopia latente de construo da autono-
mia territorial, mas a verificao de que
processos de desenvolvimento so lutas
de dominao. O estudo das frotas, den-
tre outras lies, demonstra que o cruza-
mento de interesses, o confronto de iden-
tidades e disputas hierrquicas no sig-
nificam descolamento do mundo.O repertrio de problemas que Godinho
delineia nesse estudo, afirma, ou mesmo
silencia e provoca a interpretao, pode
ser pelo menos apresentado sob a forma
de uma agenda para ensaios futuros so-
bre a histria da historiografia luso-bra-
sileira: a retomada da histria econmi-
ca e dos estudos de histria moderna e
contempornea; a crtica pesada hist-
ria acontecimental; a histria diplomti-
ca com seus estudos que levam ao nada;
e, finalmente, a preocupao constante
com parmetros universais para compre-
ender o passado. No final da entrevista
ao professor Nunes Dias, pode-se desta-
car uma referncia para os estudiosos
daquelas dcadas, e um aspecto para a
reflexo para os investigadores da pes-
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N O T A S1. Consultar esse processo de formao da conscincia cortes no Ocidente em: Norbert Elias,
Curializao e romantismo aristocrtico, emA sociedade de corte, Lisboa, Estampa, 1987,pp. 183-233.
2. Conferir a esse respeito: Giacomo Marramao, Poder e secularizao: as categorias do tempo,So Paulo, Unesp, 1995.
3. Ver para maiores detalhes: Edmundo O Gorman,A inveno da Amrica: reflexo a respeito daestrutura histrica do Novo Mundo e do sentido do seu devir, So Paulo, Unesp, 1992.
4. Consultar a este respeito: Vitorino Magalhes Godinho, O papel de Portugal nos sculos XV eXVI. Que significa descobrir? Os novos mundos e um mundo novo, Lisboa, GTMECDP, 1994.
5. Lucien Febvre, O Reno: histria, mitos e realidades, Rio de Janeiro, Civilizao Brasileira , 2000,p. 209.
6. Consultar a esse respeito: A. J. R. Russel-Wood, Um mundo em movimento: os portugueses nafr ica, sia e Amrica (1415-1808), Lisboa, Dife l, 1998.
7. Os documentos fundadores de uma idia em torno da comunidade lusfona podem ser locali-zados na seguinte biografia: Jos Alberto Braga (coord.), Jos Aparecido o homem que cra-vou uma lana na lua, Lisboa, Trinova Editorial, 1999.
8. Conferir o seguinte estudo: A. J. R. Russel-Wood, Portugal e o mar: um mundo entrelaado,Lisboa, Assrio & Alvim, 1997.
9. Sobre esse aspecto o ensasta Eduardo Loureno oferece uma persperctiva decisiva: Portugal precisamente o primeiro reino da pennsula a libertar-se da presena do Islo e a ocupardesde os fins do sculo XIII at hoje a mesma tira estreita beira do Atlnt ico, a outra fronteirasem fim que mais tarde far parte do seu espao real e mtico de povo descobridor. Cf. Eduar-do Loureno, Portugal como destino: dramaturgia cultural portuguesa, em Mitologia da sau-dade, So Paulo, Companhia das Letras, 1999, p. 90.
10.Ver a esse respeito: Jos Saramago, Viagem a Portugal, Lisboa, Editorial Caminho, 1985.11.Ver: K. David Jackson, Os construtores dos oceanos, Lisboa, Assrio & Alvim, 1997.
12.Joo Lcio de Azevedo,A evoluo do sebastianismo, Lisboa, Presena, 1984, p. 7.
13.Ernest Jnger, O passo da floresta, Lisboa, Edies Cotovia, 1995, p. 9.
14.Sobre essa discusso consultar: Kenneth Maxwell, A construo da democracia em Portugal,Lisboa, Presena, 1999.
15.Ver a coletnea de artigos de Jaime Reis, O atraso econmico portugus, 1850-1930, Lisboa,Imprensa Nacional/Casa da Moeda, 1993.
16.Ver: Hans Georg Gadamer, L eredit dell Europa, Torino, Giulio Einaudi Editore, 1991.
17.Consultar dados de Juan J. Linz e Alfred Stepan,A trans io e consol idao da democracia: aexperincia do sul da Europa e da Amrica do Sul, So Paulo, Paz e Terra, 1999. Especialmenteas pginas 115-187.
quisa histrica contempornea: ... Mas o
passado a cada momento reconstitudo
segundo a mentalidade do presente, logo
h um vaivm permanente e a histria
torna-se, em parte, a autodeterminao
do momento de agora por si prpria.
5/28/2018 Oswaldo Munteal Filho - vitorinomagalhaes - hist ria natural.pdf
http:///reader/full/oswaldo-munteal-filho-vitorinomagalhaes-historia-natural
Ace rvo , R io de Janeiro, v. 12, n 1-2 , p . 67-8 8, jan /dez 1999 - p g.87
R V O
18.Para uma clarif icao das tenses Ocidente/Oriente conferir: Salman Rushdie, Oriente, Ociden-te, So Paulo, Companhia das Letras, 1995.
19.Para um aprofundamento dos marcos qualitativos desta discusso ver: Boaventura de SousaSantos, Pela mo de Alice: o social e o poltico na ps-modernidade, So Paulo, Cortez, 1997.
20.Eric J. Hobsbawn, O novo sculo, So Paulo, Companhia das Letras, 1999.
21.O conjunto da obra e do projeto intelectual de Norbert Elias, acerca de uma teoria da civili za-o, fundamental para as nossas reflexes nesta parte do estudo sobre V. M. Godinho.
22.Consultar sobre essa perspectiva mais global: Michel Mollat,A Europa e o mar, Lisboa, Presen-a, 1995.
23.Vitorino Magalhes Godinho, Portugal, as frotas do acar e as frotas do ouro (1670-1770),em Ensaios II: sobre a histria de Portugal, Lisboa, 2aed., Livraria S da Costa Editora, 1978,p. 427.
24.Conferir: Miguel Batista Pereira, Modernidade e secularizao, Coimbra, Almedina, 1990.
25.Assinalo aqui a importncia de um exame das idias do seguinte artigo: Carlos Eduardo Martins,Los desafios del sistema mundial para el siglo XXI: perspectivas para la Amrica Latina, em
Aportes(revista de la Facultad de Economa de la benemrita Universidad Autnoma de Puebla),Puebla, enero-abril 2000, pp. 55-69.
26.Ver essa discusso em Elmar Altvater, O preo da riqueza: pilhagem ambiental e a nova(des)ordem mundial, So Paulo, Unesp, 1995. Especialmente as pginas 21-43. Consultar tam-bm sobre o conceito de desenvolvimento: Elmar Altvater, Obstaculos en la trayectoria deldesarrollo, em Francisco Lpez Segrera, Los retos de la globalizacin, Caracas, Unesco, 2volumes, pp. 609-625. Ver tambm os estudos recentes do socilogo e economista italianoGiovanni Arrighi sobre a noo de desenvolvimento sustentvel no mundo contemporneo apartir de uma perspectiva que admite nveis diferenciados de somas acumuladas de capitalentre os conjuntos de naes, gerando uma espcie de desigualdade macrorregional que darianovos contornos s disparidades locais, regionais e at mesmo numa escala mundial. Cf.Giovanni Arrighi,A iluso do desenvolvimento, Petrpolis, Vozes, 1997.
27.Consultar a seguinte obra: Antnio Edmilson Martins Rodrigues e Francisco Jos Calazans Falcon,
Tempos modernos: ensaios de histria cultural, Rio de Janeiro, Civilizao Brasileira, 2000.
28.Ver: A. J. R. Russell-Wood, Um mundo em movimento: os portugueses na frica, sia e Amrica(1415-1808), op. cit.
29.Conferir sobre esse aspecto o criativo trabalho de Kenneth David Jackson, Os construtores dosoceanos, Lisboa, Assrio & Alvim, 1997.
30.Conferir: Vitorino Magalhes Godinho, O socialismo e o futuro da pennsula, Lisboa, LivrosHorizonte, 1969.
31.Consultar: Immanuel Wallerstein, O capitalismo histrico, So Paulo, Brasiliense, 1985.
32.Sobre esse aspecto, deve-se consultar um artigo que oferece uma viso abrangente e atualiza-da deste intrincado problema que envolve questes de ordem diplomtica e querelas oriundasda gesto da poltica interna lusa: Lus Felipe de Alencastro, A economia poltica dos descobri-mentos, em Adauto Novais (org.),A descoberta do homem e do mundo, So Paulo, Funarte,1998, pp. 193-209.
33.Para uma perspectiva acerca das origens desses conflitos tnico-nacionais ver o tratado deRobert Lopez, O nascimento da Europa, Lisboa, Cosmos, 1965.
34.Consultar: Alfred W. Crosby, Imperialismo ecolgico: a expanso biolgica da Europa, 900-1900, So Paulo, Companhia das Letras, 1993.
35.Ver para maiores detalhes: Sydney Mintz, A antropologia da produo de plantation, emBernardo Sorj, Fernando Henrique Cardoso e Maurcio Font, Economia e movimentos sociaisna Amrica Latina, So Paulo, Brasiliense, 1985.
36.Para uma viso ampla da obra e da vida de Magalhes Godinho consultar: Joaquim RomeroMagalhes, De Victorini Magalhes Godinho vita, scriptis et in adversis animi fortitudine, emEstudos e ensaios em homenagem a Vitorino Magalhes Godinho, Lisboa, Livraria S da CostaEditora, 1988, pp. 1-41. Romero Magalhes abre diversas portas e per mite que o leitor tenha aliberdade de percorrer as possibilidades vislumbradas pela imensa obra produzida pelo histo-riador portugus.
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pg.88, jan/dez 1999
A C E
A B S T R A C T
This text analyses the interpretation of the historian Vitorino Magalhes God inho about the
relationship between the Portuguese America and the process of organization of the economy of
the European world since the fifteenth and sixteenth centuries.
The principa l ideas announced in this study, according to the history of the fleet and the circulation
of the spices related by Godinho, are the following: the conception of the global space discovered
since the opening of the world; the contemporaneous crisis of the human science; the history of
Brazil and Potugal in a unique writing; and, finally, the concept of Maritime Empire.
R S U M
Ce text analyse l'interprtation du historien Vitorino Magalhes Godinho sur la relation entre
lAmrique portugaise et le procs dorgani sation de lconomie du monde europen, depuis les
quinzime et seizime sicles.
Les ides principaux annonces dans cet tude, selon lhistoire des flottes et de la circulation des
piceries racontes par Godinho sont les suivantes: la conception du space global dcouvert depuis
l ouverture du monde; la crise contemporaine de la science de lhumanit; lhistoire du Brsil et
du Portugal dans une criture unique, et finalement, le concept dEmpire Maritime.
37.Conferir sobre esse aspecto: Jos Jobson de Andrade Arruda, Frotas de 1749: um balano,em Varia Histr ia, Belo Horizonte, UFMG/Fapemig/Fundao Joo Pinheiro, no21, jul. 1999, pp.190-209.
38.Cf. Vitorino Magalhes Godinho, Portugal, as frotas do acar e as frotas do ouro (1670-1770),op. cit., p. 438.
39.Idem, Os nossos problemas: para a histria de Portugal e Brasil, em Maria Adelaide GodinhoArala Chaves, Formas de pensamento em Portugal no sculo XV: esboo de anlise a partir derepresentaes de paisagens nas fontes literrias, Lisboa, Livros Horizonte, 1969, p. 9.