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7/31/2019 Movimento e a luta independentista da Amrica Latina
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Movimento e a luta independentista da Amrica Latina1
Antonio HOHLFELDT2Jlia Manzano3
Pontifcia Universidade Catlica do Rio Grande do Sul, RS
RESUMOO jornal Movimento destacou-se por uma intensa cobertura aos acontecimentos daAmrica Latina. Contrariamente chamada grande imprensa, Movimento dedicouespaos especficos para cobrir os acontecimentos do continente, que podem sersintetizados pela luta constante pela liberdade econmico-financeira, o que fica evidentenas pginas do jornal. Para que as multinacionais possam manter seu domnio nocontinente, fundamental o controle poltico, o que se d atravs de ditaduras e de golpes,que o jornal acompanha, semana a semana. Para a anlise dos textos, valemo-nos do
conceito de dispositivo, utilizado por Maurice Mouillaud, e que nos permite identificar comclareza um discurso independentista do jornal.
PALAVRAS-CHAVE: Movimento; Amrica Latina; Publicismo.
1.Movimento e seu contexto
Em trabalho anterior, a partir das pginas do jornal Movimento, tivemos aoportunidade de refletir a respeito da industrializao brasileira e das perspectivas da
cultura nacional (HOHLFELDT et MANZANO, 2011). Este primeiro estudo nasceu da
pesquisa, em desenvolvimento, que visa fichar e digitalizar toda a coleo daquela
publicao, colocando-a gratuitamente disposio do pblico4. Posteriormente, foi
lanado o livro Jornal Movimento, uma reportagem (2011), que desenvolve uma
excelente anlise interpretativa e histrica do jornal, incluindo um DVD contendo todo o
conjunto das edies do peridico, num total de 334 exemplares. No entanto, aquele DVD
no tem previso de indexao nem est disponibilizado on line para consulta, conforme
vimos desenvolvendo5. Pode-se dizer que o trabalho de Carlos Azevedo, Marina Amaral e
1 Trabalho apresentado no GP Histria do Jornalismo do XII Encontro dos Grupos de Pesquisa em Comunicao, eventocomponente do XXXV Congresso Brasileiro de Cincias da Comunicao.2 Ps-Doutor em Jornalismo pela Universidade Fernando Pessoa, Porto, Portugal. hohlfeld@pucrs.br3 Estudante de Graduao, aluna bolsista de Iniciao Cientfica, PUCRS.julia.manzano@hotmail.com4 Este trabalho vem sendo desenvolvido h 3 anos, atravs de uma bolsa de iniciao cientfica propiciada pelaPUCRS, do projeto BPAApoio a Acervos Culturais, alis, j renovada para o presente ano de 2012.5 A consulta pode ser feita no endereowww.pucrs.br/famecos/nupecc, de maneira gratuita. At o momento,
podem ser consultadas as 50 primeiras edies do jornal, sendo que o fichamento est sendo realizadoparalelamente, o que vai propiciar uma prxima indexao, mediante outros projetos a serem apresentados aagncias de fomento pesquisa.
mailto:hohlfeld@pucrs.brmailto:hohlfeld@pucrs.brmailto:julia.manzano@hotmail.commailto:julia.manzano@hotmail.commailto:julia.manzano@hotmail.comhttp://www.pucrs.br/famecos/nupecchttp://www.pucrs.br/famecos/nupecchttp://www.pucrs.br/famecos/nupecchttp://www.pucrs.br/famecos/nupeccmailto:julia.manzano@hotmail.commailto:hohlfeld@pucrs.br7/31/2019 Movimento e a luta independentista da Amrica Latina
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Natlia Viana constitui-se numa leitura poltica do jornal que, como se sabe, sucedeu a
outra publicao alternativa, Opinio, de que foi uma ciso6.
Movimento tambm experimentou uma ciso, e dele nasceu, posteriormente,
outro jornal, chamado Em tempo, que mais tarde vincular-se-ia a um segmento
partidrio, a chamada Convergncia Socialista, de que se originaria o Partido dos
Trabalhadores (AGUIAR in CARNEIRO, 2002, p. 407; MAIA in CARNEIRO, 2002, p.
511).
Movimento trazia um programa muito claro de trabalho, conforme o manifesto
da edio Zero: propunha-se no s a descrever o mundo quanto a ajudar a transform-lo.
Para isso, criticava fortemente as grandes empresas jornalsticas, no apenas por serem
empresas quanto, segundo os responsveis pela publicao, terem se rendido s decises dacensura. Movimento propunha-se ser popular, no sentido da busca de uma linguagem
menos acadmica e de escolher focos temticos que eventualmente interessassem a uma
maior parcela da populao potencialmente leitora de uma publicao semelhante
(AGUIAR in CARNEIRO, 2002, p. 409).
O jornal apresentava-se em formato tablide, em pginas de 28cms. de largura por
36,5 cms. de altura. A mancha tipogrfica era recuada um centmetro em cada um dos
quatro lados da pgina. O ttulo colocava-se isolado, no alto, em caixa alta. Abaixo damancha tipogrfica, esquerda, indicavam-se as praas em que havia preo diferenciado do
jornal. Na direita, aparecia o nmero da edio, preo do exemplar e data de circulao, em
letras pequenas, de corpo 12 em negrito.
Cada edio tinha, em mdia, 28 pginas, o que era um verdadeiro desafio para a
sua redao, uma vez que o jornal sofreu censura prvia desde a sua edio zero. E se, nos
primeiros tempos, era censurado diretamente em So Paulo, onde tinha sua sede (Rua
Virglio de Carvalho Pinto, 625, bairro Pinheiros), logo depois tinha de ser enviado paraBraslia, numa operao extremamente difcil do fluxo de sua editorao. Ao longo de sua
histria de trs anos e 153 edies censuradas, teve 3.093 artigos vetados, num total de
18.761 laudas, alm de 3.162 ilustraes, entre fotografias, desenhos variados e charges
(MARCONI, 1980, p. 76).
A pgina do jornal apresentava desenho tipogrfico bastante diferenciado, podendo
contar com 6 colunas, variando s vezes para 4 ou mesmo 3 colunas. Para a diviso das
6 Tambm estamos desenvolvendo o mesmo trabalho de fichamento, digitalizao e indexao destapublicao, atravs de uma bolsa de iniciao cientfica patrocinada pela FAPERGS.
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matrias, as colunas eram separadas por linhas pretas verticais, na maioria das vezes, ou
pela utilizao de boxes em negrito, aplicados sobre o fundo branco da pgina: nestes casos,
a composio aparecia em branco. Contando com uma composio em corpo 10, em geral,
para abrandar o peso e a dificuldade da leitura, algumas pginas traziam ilustraes que
podiam ser fotografias ou desenhos, produzidos por uma equipe de primeira qualidade,
liderada por Elifas Andreato, e de que participavam, dentre outros, Valdir de Oliveira,
Chico Caruso, Jayme Leo, Luis G, Paulo Caruso e Rubem Grilo. O jornal costumava
denunciar os cortes da censura, quando no conseguia fechar os espaos vazios, com
manchas pretas, sobre as quais aplicava o dstico Leia Movimento ou, en to, preenchia o
espao vazio com uma composio tipogrfica diferenciada, repetida sucessivamente, ao
longo das linhas de uma ou mais colunas, com o apelo Leia, assine e divulgue Movimento.Os jornais independentes dependem do leitor.
2. O publicismo atualizado de Movimento: os dispositivosTanto Opinio quanto Movimento eram jornais filiados clssica linhagem do
jornalismo publicstico, isto , aquela linha de jornalismo surgido logo nos primeiros anos
do sculo XVIII, na Inglaterra, atravs de publicaes como The Tatler, (1709), The
Examiner (1710), The Spectator (1711), The Guardian (1713), etc. O publicismo, para
Francisco Rdiger, caracteriza-se pelo fato de que seus textos tinham forte cunhodoutrinrio, consistindo em matrias opinativas sobre questes pblicas, comentrios
ideolgicos e polmicas com os adversrios de publicidade (RDIGER, 1993, p. 15;
RDIGER, 1998, p. 11). Com certa flexibilidade, podemos conceber esses jornais como
filiados a essa tendncia da publicstica - Publizistik, em alemo (GROTH, 2011). No
entanto, Opinio, devido at mesmo a sua gnese, vinculado ao empresrio Fernando
Gasparian e Editora Paz e Terra, tinha uma viso mais abrangente, cobrindo um noticirio
mundial, graas a servios que adquirira de publicaes como Le Monde, TheGuardian, The Washignton Post, The New Yrok review of books e New Statesman,
alm de agncias noticiosas independentes, como a Latin American News. Movimento
tinha um foco mais voltado para a cobertura da poltica dos partidos e governos de esquerda
e/ou revolucionrios. Neste sentido, Movimento deu especial ateno cobertura dos
acontecimentos da Amrica Latina. O noticirio dedicado ao continente localizava-se entre
as pginas 8 e 18, mais comumente entre as pginas 14 e 18.
Para a anlise da cobertura de Movimento Amrica Latina, ampliamos o
corpus utilizado na pesquisa anterior para os doze primeiros meses iniciais de circulao do
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jornal, selecionando o conjunto de matriasreportagens, entrevistas ou artigos de opinio
que abordam o tema, desde a primeira edio, de 7 de julho de 1975, at a edio 30, de
23 de agosto de 1976, num total de 40 edies (dentre aquelas 60) que abordam o tema
escolhido. Em algumas edies, como exista mais do que uma matria, chegamos a um total
de 74 pginas e 96 matrias.
Maurice Mouillaud (MOUILLAUD et PORTO, 2002, p. 29 e ss.) mostra que um
jornal no se limita a informar/noticiar. Ele se organiza a partir do que o autor denomina
dispositivos, como que embalagens que do um outro sentido (melhor, mais profundo,
crtico, etc.) ao que se l/escreve, assim como, no rdio, o noticioso depende da entonao
com que o locutor l seu texto7. Mais que isso, os dispositivos so encaixados uns nos
outros (p. 32), de modo que estes encaixes, mais as relaes entre textos e dispositivos, porsua dinamicidade, permitem outras leituras. Para o pesquisador, os dispositivos so lugares
materiais ou imateriais nos quais de inscrevem (necessariamente) os textos (despachados de
agncias, jornal, livro, rdio, televiso, etc....) (p. 34), possuindo formas especficas que
correspondem a um modo de estruturao do espao e do tempo (p. 35). Neste sentido, o
dispositivo no um suporte, mas uma matriz que impe suas formas aos textos (uma
converso informal se inscreve nas formas da conversao, como variante de um
paradigma (p. 34).Maurice Mouillaud destaca, dentre os principais dispositivos, o ttulo da
publicao, as manchetes e os ttulos de artigos/colunas, etc. Neste caso, o ttulo da
publicao um claro indicativo do que ela almeja: movimento indica dinamicidade, a
busca por uma cobertura ampla, variedade que traga ao leitor a maior amplitude possvel de
informaes do mundo, do continente, do pas. Se levarmos em conta que o Brasil se
encontrava sob uma ditadura militar, marcada por um forte aparato repressivo, dentre os
quais a censura prvia que se abatia inclusive sobre a publicao, deve-se ter comopressuposto a preocupao dos editores em tentar furar este bloqueio, num desafio
permanente e sempre renovado, semana a semana. Alis, isso o que se colhe dos
depoimentos daqueles que respondiam pelo peridico.
Em geral, entre uma tera parte e a metade das matrias enviadas, a cada semana,
sofriam restries ou cortes totais por parte dos censores, o que significava que os editores
sempre precisavam ter matrias alternativas, de igual peso e qualidade para substituir
7
Para os pesquisadores do rdio no Rio Grande do Sul, ficaram famosas as leituras que o locutor Milton Jungfazia, ao microfone da Rdio Guaba, irnicas ou enfticas, destacando contedos que, muitas vezes, poderiampassar despercebidos ou serem tomados como rotineiros, pelo leitor desavisado.
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quelas retiradas da publicao e/ou buscar uma redao capaz de, embora dizendo o que
fosse pretendido, conseguisse ser aceito ou no compreendido pelo censor
3. A Amrica Latina nas pginas do jornalNo caso da Amrica Latina, o levantamento do corpus antes citado nos indica que
as matrias publicadas se caracterizam enquanto pequenas notcias, em geral editadas em
duas colunas, numa matria de cerca de 10 cms. de altura; grandes reportagens de pgina
inteira; dossis relativos a acontecimentos de maior relevncia, incluindo cronologias do
acontecimento (casos da Argentina e do Peru, em 1976); e, enfim, as Notas latino-
americanas, alternativa que o jornal encontrou para dar uma cobertura mais ampla ao
conjunto de pases do continente. Neste caso, as notas... podiam ocupar metade de uma
pgina ou estender-se por duas pginas, em uma coluna contnua. Cada matria secompunha de no mais que dez linhas, sucintas e objetivas, como o noticirio do rdio 8. Os
editores de Movimento sempre se preocuparam em contextualizar e orientar seu leitor, de
modo que as matrias se configuram enquanto sutes de informaes anteriores (s vezes, o
jornal chega a indicar a edio em que anteriormente havia sido informado alguma coisa a
respeito9). No conjunto das edies consultadas, encontramos, ainda, uma espcie de
resumo ou balano dos acontecimentos do ano anterior, sob o ttu lo geral de Amrica
Latina 1975, que se edita a partir da edio 28, de 12 de janeiro de 1976.A Amrica Latina, j caracterizada por Eduardo Galeano como um continente de
veias abertas, recebe, assim, uma ateno muito especial dos editores do jornal. Para alm
do interesse que se pretende dar ao continente, coisa incomum nos jornais da camada
grande imprensa10, h uma evidente preocupao em aproximar este noticirio dos
acontecimentos do prprio Brasil. Movimento vale-se de fontes diferentes daquelas que
usualmente os jornais da imprensa de referncia utilizam, como as agncias Latin
8 Assim como a internet viria a interferir, dcadas depois, no formato dos jornais contemporneos, ser queno era uma influncia do rdio o fato de se apresentarem pequenas informaes em textos que poderiamfacilmente ser lidos por um locutor radiofnico e serem escutadas pelo ouvinte/leitor de jornal, neste caso?9 Esta prtica, alias, mais uma a indicar a clara filiao de Movimento tradio publicstica do
jornalismo. Lembremos que, por exemplo, o Correio Braziliense, de Hiplito Jos da Costa, editado desdeLondres, previa sua encadernao a cada seis edies (semestre), contendo na ltima deles at mesmo umndice com as matrias publicadas, prtica que perdurar at a ltima edio, em dezembro de 1822.Pressupe-se, pois, que o jornal no deve ser apenas lido, mas guardado, refletido e consultadopermanentemente como fonte de informao e de reflexo crtica.10 Vrios trabalhos recentes evidenciam que os jornais brasileiros continuam ignorando seus vizinhos latino-americanos. E, quando eles so notciapor desastres naturais ou movimentos polticos que quebram aperspectiva democrtica eleitoral formal dessas naesboa parte do noticirio vem filtrado por agncias
internacionais, notadamente norte-americanas. Destaco, dentre os trabalhos recentes, A Amrica Latina nojornalismo brasileiro: Os casos de Zero Hora e Folha de So Paulo, de Stfano Aroldi Santagada,Porto Alegre, FAMECOS. 2011. Mimeo.
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American News11, IPS (Inter Press Service)12 ou revistas como Afrique-Asie, Nuevo
Hombre e El periodista, alm de artigos de pensadores acadmicos, como Eric
Hobsbawm ou Warren Dean.
O jornal mantm, ainda, uma equipe de redatores e colaboradores como
responsveis permanentes por tais informaes, de modo que eles podem, no apenas
informar quanto interpretar muitas vezes associar informaes diversas buscando uma
ampla contextualizao do que est ocorrendo, prtica que, evidentemente, a chamada
grande imprensa no faz. o caso daqueles que mais assinam matrias sobre tais
acontecimentos, como Ronaldo Brito (que muitas vezes se assina R.B.), Rafael Marko,
Lauro Bandeira, Vanda Pinto, Fausto Torres, Flvio de Carvalho: de modo geral, contudo, a
maioria das matrias so veiculadas sem autoria, o que significa ser um trabalho de redao.O levantamento realizado nos indica que praticamente todos os pases da Amrica
Latina foram objeto de preocupao do jornal. Contudo, evidente que, seja pela
proximidade ou importncia do pas em relao ao Brasil; seja em relao importncia
dos acontecimentos, algumas naes ocuparam mais espaos que outras no conjunto do
noticirio. A mais destacada, sem dvida, foi a Argentina. Treze matrias acompanham,
passo a passo, os estertores do regime peronista, depois do retorno e da morte de Juan
Pern, em cujo lugar fica sua segunda viva, Maria Stela Martinez de Pern, chamadaIsabelita. O domnio do governo por El Brujo Jos Lopez Rega, sobre o qual,
posteriormente, recairo processos por envolvimento em grandes desvios de dinheiros
pblicos, contrabando e fomento a organizaes para-militares, como a Triple A - AAA
Alianza Anticomunista Argentina. Depois de seu afastamento por doena, substituda pelo
recm-eleito Presidente do Senado, talo Luder, Isabelita retorna e, quando todos esperam
que ela renuncie, resolve reafirmar-se no poder. Apesar do afastamento de Lope Rega, so
seus seguidores que ela escolhe para seu novo ministrio: e com a crescente crise definanas, planos econmicos que sacrificam a populao mais pobre so enfiados goela
abaixo dos trabalhadores, fortalecendo o movimento sindicalista off CGT peronista e
levando a crescentes choques entre governo e centrais sindicais. No surpresa quando o
Exrcito exige e formao do Conselho de Segurana Interna, que passa a combater
11 Mais conhecida como Prensa Latina, foi criada em 1959, por iniciativa de Ernesto Che Guevara, logo aps avitria da Revoluo Cubana, e inicialmente organizada pelo jornalista argentino Jorge Ricardo Masetti.Trabalharam nela, dentre outros, Gabriel Garcia Marquez, Rodolfo Walsh, Leonardo Acosta, etc.12
A IPS foi fundada em 1964 pelo economista Roberto Savio e pelo cientista poltico Pablo Piacentini, ambosargentinos, com o objetivo de trabalhar temas como o desenvolvimento social, defesa ambiental e direitoshumanos. Sua formao original era cooperativada.
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frontalmente aos Montoneros e aos integrantes do ERP Exrcito Revolucionrio del
Pueblo, mas que em breve voltar-se- tambm contra os sindicatos mais combativos,
sobretudo aqueles que se encontram fora do controle peronista. Na sucesso de
acontecimentos, com a desagregao crescente do peronismo e a desnacionalizao da
indstria, o governo se isola progressivamente e se o golpe militar demorou tanto, porque
os militares preferiram governar sem ser governo e, conseqentemente, sem arcar com os
nus da enorme crise econmica-financeira do pas. Mas a situao chegou a um limite
extremo e, em 23 de maro de 1976 nada mais havia a fazer, se no fechar a CGT e os
sindicatos independentes, prender lideranas e afastar Isabel do comando poltico: o
General Videla, que j exercia, de fato, o controle da situao, torna-se o mandatrio do
pas. O resto, bem conhecemos: Movimento acompanha passo a passo todo este processoe em diferentes edies, como em 7 de julho de 1975 (O cerco a Isabelita?) e 29 de maro
de 1976 (O drama argentino), aprofundando a questo, com amplo material que
contextualiza os fatos, para alm de matrias de fundo, de pgina inteira, que
sucessivamente publica em suas edies (O presidente (provisrio) e os peronistas
(autnticos) 29.9.1975; A militarizao do poder civil- 20.10.1975; A desagregao
do peronismo- 12.1.1976; Entre a cruz e a espada- 26.1.1976; As razes e as frmulas
da desnacionalizao- 22.3.1976; O peronismo antes e depois da queda- 12.4.1976, etc.Mas h outros pases que ocupam a ateno constante do jornal e que, vistos agora,
desde o presente para o passado, ganham importncia pelos acontecimentos que se sucedem
e que, de certo modo, explicam a situao atual. o caso, por exemplo, do Mxico, que
neste momento, tem a concluso do mandato do presidente Lus Echeverria, gerando a
expectativa sobre quem ser seu sucessor. O PRI Partido Revolucionrio Institucional
estava no poder h mais de 60 anos, ou seja, a oposio apenas formal. E nestes
momentos, o indicado pelo presidente , em geral, aquele que vir a ser sacramentado pelopartido e, conseqentemente, eleito pela populao. A luta se d, assim, nos bastidores.
Neste caso, a primeira matria estampada pelo jornal a respeito dA ansiosa espera do
tapado, que como se indica o nome do candidato a ser sufragado posteriormente
(15.9.1975). O jornal acompanha o jogo ambguo de Echeverria que, eleito sob um discurso
bastante renovador, tornou-se refm das foras mais conservadoras do pas, ainda que, ao
final da administrao, tente retomar aquele processo inicial, inclusive facilitando o terreno
para seu sucessor. Numa matria seguinte (Mxico: a vitria do continusmo
20.10.1975) revela-se que o sucessor ser Jos Lopez Portillo, um terceiro nome, at ento
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no especulado pela mdia, ainda que fosse, no governo, o Ministro das Finanas. Neste
sentido, Movimento publica importante matria de pgina inteira, denominada As
inverses estrangeiras no Mxico (19.4.1976), de autoria de Joaquim Andrade (da Inter
Press Service) em que se analisa detalhadamente a poltica industrial mexicana. O artigo
contrape um estudo de dois pesquisadores mexicanos, o engenheiro Fernando Fajnzylber e
o economista Trinidad Martinez Tarrag e um documento produzido pela Stanford
Research Institute, a pedido da Cmara de Comrcio USA-Mxico. Embora os americanos
defendam os acordos industriais, evidenciando os grandes investimentos realizados pelas
empresas norte-americanas, o seu aporte de tecnologia e a exportao realizada por tais
empresas, os mexicanos evidenciam que os investimentos, na verdade, saem de agncias do
prprio Mxico ou seja, os investimentos se do a partir de capitais mexicanos, e nonorte-americanos; que as exportaes so amplamente superadas pelas importaes que
estas mesmas empresas realizam e que, conseqentemente, elas so responsveis, no
mnimo, por 70% da dvida externa do pas; e que, enfim, a tecnologia trazida para o
Mxico quase sempre ultrapassada e no est desenvolvida especificamente para o pas,
sendo aplicada em todas as demais filiais. Ou seja, em concluso, a presena das
multinacionais no pas um processo altamente danoso para a nao como um todo,
sobretudo porque, ao invs de criarem novas empresas, boa parte do capital investido se fazmediante aquisio de empresas mexicanas pr-existentes, o que amplia o processo de
desnacionalizao da economia mexicana. A leitura deste texto, para ns, brasileiros,
altamente ilustrativo de um processo que, na verdade, repete-se no debate que o jornal
acompanha em torno de acontecimentos semelhantes em outros pases latino-americanos.
A Venezuela vive o mesmo dilema. Estamos em plena euforia da alta dos preos
do petrleo, o que, se gera incerteza em outras naes, ajuda aquelas que sejam produtoras
da matria-prima, como a Venezuela, sob a administrao de Carlos Andrs Perez. Filiada OPEP, a Venezuela tem provocado resistncias dos Estados Unidos, sobretudo porque
nacionalizou recentemente sua produo petrolfera (sete meses antes, segundo
Movimento de 23.8.1976), indenizando parcialmente as empresas (norte-americanas)
produtoras. Mas enfrenta contradies: depende daquelas mesmas multinacionais para a
distribuio do petrleo; necessita, inclusive, de renovar o conjunto de trabalhadores e
tcnicos do setor, j em idade avanada, fazendo treinamento extensivo e rpido de novos
segmentos de trabalhadores; administrada por um governo de coalizao que inclui
esquerdistas (inclusive marxistas) e conservadores, enfrenta uma indefinio ideolgica: o
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governo est elaborando o 5. Plano Nacional (O 5. Plano Nacional da Venezuela: crticas
e mais crticas- 15.3.1976) mas no consultou nem mesmo seu partido, a Ao
Democrtica, que possui ampla hegemonia entre os eleitores nacionais. O grande desafio
uma profunda reforma scio-econmica, incluindo a questo de quem e quanto paga-se de
imposto; alm disso, as lutas entre as grandes empresas industriais e latifundirios
(terratenientes) e as empresas pequenas e mdias nacionais, ao lado dos camponeses, faz
com que a sociedade se divida e o COPEI, partido democrata-cristo, de oposio, ganhe
fora.
A mesma perspectiva nos dada pelo acompanhamento que Movimento faz dos
acontecimentos no Peru que experimenta, naquele contexto de 1975-1976, uma ditadura
militar de esquerda. O jornal publicaria, em sua edio de 25.8.1975, artigo de pginainteira do historiador britnico Eric J. Hobsbawm a respeito da armadilha do isolamento
das ditaduras de esquerda no mundo, como no caso de Nasser, no Egito; Portugal ps-
Revoluo dos Cravos; o Panam de Osmar Torrijos e, enfim, o Peru de Morales
Bermudez. Para Hobsbawm, o problema que os militares experimentam extremas
dificuldades em se aproximarem de movimentos civis, por temor de perderem sua
identidade de caserna. Uma semana antes (18.8.1975), o mesmo Movimento publicara
matria de um quarto de pgina a respeito dos desafios enfrentados pelo governo peruano,partindo justamente deste artigo que, embora desconhecido do leitor, j estava disponvel
para os editores do jornal em sua redao.
Em outra reportagem, poucas semanas adiante (A questo agrria- 8.12.1975), o
jornal destaca a deciso do governo peruano de praticamente militarizar o processo de
reforma agrria nas 13 diferentes regies em que o pas fora organizado. O governo
enfrenta forte resistncia tanto dos latifundirios quanto de pequenos proprietrios rurais, aomesmo tempo em que a CCP Confederacin Campesina Del Peru, ligada ao Partido
Comunista, tambm aumenta sua presso para que o governo acelere as reformas. A CCP
inclusive denuncia que o governo tem intervido em algumas regies atravs de tropas do
exrcito, enquanto o governo insiste, atravs do General Oscar Vargas Prietto, Primeiro
Ministro, que at meados de 1976 o processo estaria inteiramente concludo.
Na edio de 19.4.1976, Movimento acompanha, com especial ateno,
inusitado processo movido pelo Conselho Superior da Marinha contra a revista esquerdista
Marka, considerada a melhor e mais bem escrita publicao do pas. O processo,
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inteiramente inconstitucional, foi deflagrado depois que a revista publicou documento da
Marinha, com uma anlise de conjuntura, considerado como inaceitvel por aquela fora.
No entanto, o mesmo documento havia sido tambm editado por outras duas revistas de
direita, sem que nada acontecesse s suas direes. Neste sentido, o jornal considera como
uma tentativa da Marinha em radicalizar o processo de presso sobre o governo que, por
seu lado, mantm-se distante do caso mas, ao mesmo tempo, permite o uso de autoridades
formais, como a polcia, para a invaso da redao da revista e a tentativa de priso de seus
diretores, que mantm-se foragidos.
Nas semanas seguintes, a situao peruana se radicaliza e o jornal acompanha com
detalhes os acontecimentos, contando inclusive com um correspondente especial, Llio
Santos. Renegociando a dvida e a revoluo (12.7.1976) aprofunda o relato em torno dapremente necessidade do Peru em buscar divisas estrangeiras e a conseqente dependncia
de presses externas. Para tanto, focaliza um discurso do Ministro Maldonado, em que ele
refere claramente o fato de que, embora o Peru busque organizar-se enquanto um pas
independente, na verdade, ainda depende e convive com uma ordem capitalista
internacional. Para escapar s presses, por isso mesmo, o governo anuncia a divulgao do
novo plano de administrao que vai substituir o original Plano Inca, chamado Plano Tupac
Amaru.A 26 de julho, Movimento, enfim, anuncia que A revoluo retificada do Peru
comea a ganhar forma: Maldonado acaba de ser demitido, o que significa a vitria da
direita, enfrentando o pas uma inflao imensa e a escassez de gneros alimentcios de
primeira necessidade. Para o jornal, a queda de Maldonado tem a ver com as necessidades
urgentes do Peru em arranjar novos emprstimos que, por sua vez, so condicionados a um
realinhamento do pas com as polticas oriundas dos Estados Unidos, representados, como
sempre, pelo Fundo Monetrio Internacional. Movimento entende que, apesar destegritante retrocesso que foi expelir os progressistas do governo, o processo re volucionrio
no saiu totalmente direitizado: Morales Bermudez proclamou-se contrrio a retroceder nas
conquistas revolucionrias e, efetivamente at agora, no aboliu a Propriedade Social, a
Comunidade Industrial, a Reforma Agrria, nem desistiu da tese das 200 milhas ou abdicou
de suas posies terceiro-mundistas, apesar de um provvel abrandamento com relao a
este ltimo item nos prximos meses.
Movimento tambm acompanhou de perto os acontecimentos na Bolvia,
encontrando-se informaes a respeito a partir de 10.11.1975, em Banzer, na hora da
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verdade, quando o jornal indica uma aproximao do General Hugo Banzer, ento
presidente do pas, das lideranas do Peru e do Panam, numa linguagem mais claramente
anti-imperialista. A Bolvia vinha tentando um novo tratado com o Chile (de Augusto
Pinochet), no sentido de alcanar uma sada para o mar. Contudo, a demora do vizinho pas
em encaminhar uma soluo para o caso aumentava a presso sobre o governo boliviano
que, neste caso, preferiu alinhar-se pela outra banda.
Num artigo posterior, Mais um ano sem mar(26.1.1976), o jornal recorda a
guerra de 1879, perdida pela Bolvia, quando lhe foi retirado o acesso ao mar, de que ele
necessita desesperadamente mas que envolve outros interesses, como os do Brasil, por
exemplo. Uma campanha em busca desta alternativa ajuda um governo a resolver
problemas internos, na medida em que unifica discursos de situao e de oposio. Bolviae Chile voltaram a manter relaes diplomticas, mas os militares bolivianos acham que
Hugo Banzer tem sido demasiado lento nas presses sobre o Chile para que se alcance uma
soluo necessria ao pas. O acordo previa uma troca de territrios: a Bolvia receberia um
corredor de 300 quilmetros de largura e daria, em troca, ao Chile, uma rea de 5 mil
quilmetros quadrados de seu territrio. Mas ficaria proibida de ter uma marinha de guerra,
alm de outras concesses. Ocorre que a rea alegadamente a ser entregue pelo Chile, na
verdade insere-se no territrio de Arica, regio originalmente peruana, antes da Guerra doPacfico, o que significa que o Peru tambm precisar concordar com tal arranjo. Para
muitos observadores, assim, segundo o jornal, Pinochet faz um jogo duplo, buscando aliar-
se com Banzer, pela direita, e isolando o Peru mais esquerdista.
Por fim, o Equador tambm merece ateno do jornal. O general Rodriguez Lara,
ditador-presidente de planto, encontra-se, segundo Movimento, ao final de 1975,
prensado entre a direita a includa a hierarquia da Igreja Catlica e as reivindicaes
crescentes dos sindicatos por mudanas fundamentais na estrutura do pas. Lara busca ainstitucionalizao do regime (O labirinto da institucionalizao- 15.12.1975), mas
obrigado a manter a imprensa sob censura e sempre enfrenta o fantasma do retorno de outro
ex-ditador, Jlio Csar Trujillo, por ele derrubado, ainda recentemente. O Equador tambm
membro da OPEP, mas ao contrrio da Venezuela, tem sido constantemente chantageado
pela Taxaco-Gulf, que no atende s determinaes governamentais de aumentar a
produo daquela matria-prima (De concesso em concesso- 12.1.1976). Para tentar
resolver o impasse, Rodriguez Lara chegou a ensaiar uma institucionalizao que , no
entanto, freada pelas diferentes presses que o governo sofre.
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No surpreendente, assim, que na edio de 19.1.1976, sob o ttulo Quem o
dono da rebelio?, Movimento registre uma espcie de transio pacfica experimentada
pelo pas, a partir do ltimo dia 11, quando um Conselho Supremo da Revoluo se
constituiu, para afastar alguns militares mais esquerda que se achavam presentes no
governo. Lara foi substitudo pacificamente, somando-se, pois, este novo movimento quele
de fevereiro de 1972, de carter nacionalista e revolucionrio, mas que jamais se decidi u
claramente por um caminho de mudanas mais profundas para o pas. O Conselho, assim,
no entendimento do jornal, precisa definir com clareza sua linha de ao, sob pena de
tambm sofrer percalos. O boom do petrleo, na verdade, apenas permitiu a importao de
bens suprfluos, sem qualquer redistribuio de renda para os equatorianos mais pobres:
70% da populao no tem gua corrente, energia ou rede de esgotos. Alm do mais, entre1972 e 1974, o poder aquisitivo dos salrios caiu mais de 23%.
As ditaduras do Chile e do Uruguai so acompanhadas a certa distncia: no
Uruguai, registra-se a reorganizao sob o comando de Juan Maria Bordaberry e no Chile
discute-se a violncia da opresso do governo de Augusto Pinochet. Quem mais chama a
ateno, contudo, o General Omar Torrijos, do Panam, que se prepara para radicalizar
posies na discusso com os Estados Unidos em torno canal ali construdo no incio do
sculo XX. Sob o ttulo de A indiscrio do general(4.8.1975), o jornal registra aresistncia do governo panamenho s pretenses norte-americanas de triplicar a rea de
terras concedida. Ao contrrio, o Panam quer a retirada de 11 das 14 bases militares dos
Estados Unidos e pretende uma cifra bem mais expressiva de pagamento, a ttulo de aluguel
da regio do canal, mesmo que, naquele momento, a passagem j desse mostras de
esgotamento ante o aumento dos tamanhos e dimenses dos navios internacionais que por
ali cruzam.
bom lembrar que os Estados Unidos estabeleceram, na zona do canal, aconhecida Escuela de las Americas, onde se treinou boa parte dos militares que, ao longo
dos anos 1960 e 1970 transformaram-se em ditadores em seus prprios pases, inclusive o
Brasil. Por isso, para os Estados Unidos, menos pela lucratividade do que pela localizao
estratgica, o canal precisa ser garantido, e ningum melhor do que Torrijos para ser o
interlocutor dos norte-americanos, apesar de seus discursos. Os Estados Unidos poderiam
ter de enfrentar, bem junto de seu territrio, um novo Vietn, se as coisas no andarem
bem, avalia o jornal, no artigo Novo canal ou novo Vietn? (22.9.1975). Se Torrijos vale-
se do canal para reforar-se politicamente no seu pas, os Estados Unidos enfrentam
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tambm problemas internos, com a campanha presidencial, na medida em que o candidato
republicano Ronald Reagan tem radicalizado sua resistncia a qualquer negociao com os
panamenhos, enquanto o atual governo de Gerald Ford reconhece o risco de o canal vir a
ser sabotado por rebeldes panamenhos.
Mais do que a questo econmica, sob o prisma da segurana dos Estados
Unidos que o canal do Panam visto (Tormenta vista- 24.5.1976). Da no surpreende
o relato que corre no Senado norte-americano de que o Panam teria enviado tropas junto a
soldados cubanos para ajudar a revoluo (esquerdista) do Peru, fato que foi imediatamente
desmentido pelo governo de Torrijos, que classificou o fato como boato articulado pela CIA
para desestabilizar seu governo. Para piorar a situao, o governo panamenho desarticulara
h dias uma tentativa de golpe organizado por um panamenho exilado em Miami e queestaria sendo liderado pelo ex-presidente Arnulfo Arias, derrubado pelo golpe militar de
Torrijos em 1968.
De um lado, a possibilidade do final do bloqueio da OEA a Cuba, inclusive com
certa flexibilizao do Departamento de Estado norte-americano quanto ao comrcio de
empresas dos Estados Unidos que mantenham filiais em outros pases latino-americanos,
para que possam exportar para Cuba. De outro, a aproximao do Paraguai do ditador
Alfredo Stroessner do regime de apartheid da frica do Sul, que vem de construir umaembaixada em Assuncin. Movimento tanto acompanha estes acontecimentos quanto
cobre a tentativa da criao do SELA Sistema Econmico Latino-americano, surgido em
reunio (no por um acaso), no Panam (O SELA e a defesa econmica da Amrica
Latina- 1.9.1975), com forte resistncia dos Estados Unidos. O jornal tambm noticia, na
mesma edio, a possibilidade da formao de uma multinacional latina de aviao, afim de
atender s demandas do continente. O jornal tambm noticia a 11. Conferncia dos
Exrcitos Americanos, idealizada pelos Estados Unidos, tambm a partir da zona do Canaldo Panam, em 1960, mas que agora parece se voltar contra seus idealizadores, na medida
em que aquelas corporaes pretendem incluir em seus discursos a idia da autonomia
econmica do continente, mesmo aquelas naes, como o Chile, que estejam bastante
distantes de qualquer cartilha esquerdista (A subverso revisitada 3.11.1975).
Movimento tambm no esquece de trazer informaes a respeito das novas
naes, como o Suriname, que luta para constituir-se em pas independente, ao se libertar da
Holanda, mas enfrenta os mesmos problemas dos demais governos latino-americanos, ou
seja, a dependncia da economia multinacional, especialmente dos Estados Unidos (A luta
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comea 1.12.1975). Do mesmo modo, o jornal analisa os movimentos do governo da
Guiana, em seu dcimo aniversrio de independncia poltica, mas longe de livrar-se das
aes perniciosas da multinacional inglesa Booker Brothers, que explora monoliticamente a
economia do pas (Multinacionais e socialismo- 29.3.1976). O semanrio acompanha
ainda os debates que ocorrem na OEA, onde os Estados Unidos tentam evitar a adoo de
discursos contrrios s multinacionais (Definindo posies 22.12.1975).
Outros pases que merecem a ateno do jornal so, por exemplo, a Guatemala,
que vinha de um grande terremoto que assolou seu territrio: Movimento edita matria
segundo a qual os cataclismas na Guatemala no so apenas aqueles gerados pela natureza,
mas sobretudo, pela poltica de domnio e explorao que empresas multinacionais norte-
americanas, como a United Fruit desenvolvem na regio (O terremoto permanente -15.3.1976). Tambm o Haiti aparece brevemente em uma matria intitulada A volta dos
tonton macoute (24.5.1976), em que o jornal mostra como a ditadura da famlia Duvivier ,
com a queda do Ministro do Interior, Paul Blanchet, volta a controlar com mo de ferro
toda a populao, buscando aumentar predatoriamente seus ganhos multimilionrios s
custas da pauprrima populao do pas.
4. Observaes generalistasRetomando o que antecipamos antes, teoricamente, a respeito dos dispositivos
apresentados pelos jornais, pode-se dizer que Movimento faz pleno uso de alguns deles:
rene numa mesma pgina diferente noticirio a respeito da Amrica Latina. Isso ainda
mais enfatizado atravs das Notas latino-americanas: tal procedimento evidencia a
unidade de ponto de vista que deve ter o leitor a respeito de tais acontecimentos,
apresentados, no como fatos isolados, mas como parte de certa narrativa que segue certa
lgica perversa que resulta da dominao poltica e econmico-financeira, sobretudo dos
Estados Unidos, sobre o continente. De outro lado, cada matria encabeada,normalmente, por um chapu com o nome do pas, o que facilita para o leitor a
identificao da rea geogrfica a respeito da qual est se escrevendo/lendo. Tambm isso
leva a uma perspectiva de compreenso unitria, pois o noticirio acaba se constituindo
numa espcie de reiterada narrativa das (quase) mesmas informaes: a luta de tais naes
por sua independncia; a sucesso de golpes; as tentativas frustradas para a constituio de
governos autnomos e o risco constante da traio populao por parte dos latifundirios
ou dos grandes industriais desses pases, mais preocupados com seus interesses privados e
imediatos.
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Essa organizao temporal/espacial evidencia o acerto da proposta de estudo de
Maurice Mouillaud, pois de certo modo predispe a leitura diferenciada e crtica de tais
acontecimentos por parte do leitor que se pretende mais atento e bem informado do jornal
Movimento: pode-se identificar um discurso que atravessa todo o conjunto de textos
publicados. Enquanto os governos latino-americanos alguns de esquerda, ainda que
formados por militares tentam a independncia scio-econmica de seus pases, as
multinacionais, notadamente as dos Estados Unidos, atuam mancomunadas com os
latifundirios e entreguistas para prejudicar a grande sociedade latino-americana que tem,
assim, uma grande identidade: a luta pela liberdade.
Por tudo isso, tem razo Eduardo Galeano quando, num posfcio ao livro As veias
abertas da Amrica Latina, sete anos depois de sua primeira edio, sente-se realizadopela recepo do livro e a reao de seus leitores: ao falar de economia poltica em termos
populares, ele oportunizara a milhares de cidados no especialistas a compreenso do que
os explorava cotidianamente e a maneira pela qual, ao longo da histria, tal explorao se
constitura. Do mesmo modo, vale a passagem com que ele abre originalmente sua obra: A
diviso internacional do trabalho consiste em que alguns pases se especializam em ganhar
e outros em perder. Nossa comarca do mundo, que hoje chamamos Amrica Latina, foi
precoce: especializou-se em perder desde os remotos tempos em que os europeus doRenascimento se abalaram atravs do mar e afundaram os dentes em nossa garganta.
Passaram os sculos e a Amrica Latina aperfeioou suas funes. Este j no mais o
reino das maravilhas (...) mas a regio que continua trabalhando como empregada
domstica. Continua existindo ao servio das necessidades alheias, como fonte e reserva do
petrleo e do ferro, do cobre e da carne, das frutas e do caf, das matrias primas e dos
alimentos com destino aos pases ricos que ganham, consumindo-os, muito mais do que a
Amrica Latina ganha, produzindo-os (GALEANO, 1971, p. 3; GALEANO, 1978, p. 285e ss.). Estes os motivos, enfim, que nos parecem oportunos, para refazer a leitura de um
jornal como Movimento: seja no processo colonial; seja nos acontecimentos das
primeiras dcadas do sculo XX; enfim, seja o que experimentemos agora, em pleno sculo
XXI, o panorama pouco mudou e, sobretudo, a luta e a resistncia continuam sendo
fundamentais. Movimento, enquanto jornal vinculado perspectiva do publicismo ingls,
mesmo enfrentando os difceis tempos da ditadura brasileira ps AI-5, buscou cumprir seu
papel, no apenas informandoo que j seria extremamente importantequanto formando
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e ajudando a constituir uma opinio crtica no Brasil, junto a uma gerao que, em ltima
anlise, aquela que hoje responde diretamente pelo presente de nosso pas.
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