Post on 27-Jan-2021
A indústria têxtil utiliza diversos produtos formula-
dos nos diferentes processos químicos realizados como
limpeza, alvejamento, tingimento etc. Muitos dos produ-
tos utilizados nessas formulações são tensoativos e atu-
am permitindo a eficiente limpeza da fibra têxtil natural,
melhorando a homogeneidade em um tingimento, aumen-
tando a capacidade de umectação de um tecido etc.
O entendimento de como atuam os tensoativos per-
mite a compreensão de sua importância nas formula-
ções de auxiliares têxteis e seu melhor uso. Para isso, a
correlação do tipo de tensoativo utilizado e das proprie-
dades desejadas é muito importante e estes são os obje-
tivos deste artigo.
1. Polaridade
É bastante conhecida uma regra para indicar a solu-
bilidade ou miscibilidade de substâncias. A regra é que
substâncias polares dissolvem ou se misturam em subs-
tâncias polares e que substâncias apolares dissolvem ou
se misturam somente em substâncias apolares. Apesar
de apresentar muitas exceções, esta regra ajuda a enten-
der a interação entre as moléculas de dois compostos
(normalmente líquidos) na formação de uma solução ou
de uma mistura em fases distintas.
Um exemplo típico de composto polar é a água e de
composto apolar, os hidrocarbonetos ou compostos es-
sencialmente de carbono e hidrogênio, como os óleos.
A polaridade de uma molécula é resultado das suas
ligações químicas (se estas são polares ou não) e de sua
estrutura. As ligações químicas entre dois átomos po-
dem ser polares ou apolares. A polaridade de uma liga-
ção é maior ou menor dependendo da eletronegatividade
dos átomos envolvidos.
A eletronegatividade é a propriedade que mede a for-
ça que um átomo tem de atrair elétrons. Essa atração atua
sobre todos os elétrons da vizinhança, inclusive nos elé-
trons que estão envolvidos na ligação química. Os áto-
mos mais eletronegativos, portanto, os que mais atraem
elétrons, são o flúor, oxigênio, enxofre, cloro, nitrogênio
e carbono. A eletronegatividade pode variar de 0,7 a 4,0.
Caso uma ligação química contenha átomos com di-
ferença de eletronegatividade, a ligação é chamada de
polar, onde os elétrons envolvidos se deslocam mais na
direção do átomo mais eletronegativo (figura 1). Caso a
diferença de eletronegatividade seja muito grande, o áto-
Tecnologia Processos Química Têxtiln° 84/set.06
Como funcionam os tensoativosno processamento têxtil
Decio Daltin - Químico de Pesquisa da Oxiteno S.A. Indústria eComércio - decio.daltin@oxiteno.com.br
Revisão técnica: Rodrigo Chrispim
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mo mais eletronegativo é capaz de tirar o(s) elétron(s)
do átomo menos eletronegativo. Nesse caso, temos a
formação de uma ligação iônica quando os átomos do
lado esquerdo da tabela periódica se ligam aos átomos
do lado direito, já que a diferença de eletronegatividade
se torna maior.
O deslocamento dos elétrons da ligação no sentido do
átomo mais eletronegativo torna esse átomo mais negati-
vo, já que o elétron tem carga negativa. Essa carga é cha-
mada de carga parcial e é tanto mais forte quanto maior a
diferença de eletronegatividade entre os átomos da liga-
ção. Como mostra figura 1, a ligação entre o carbono e o
hidrogênio é menos polar que a ligação entre o carbono e
o oxigênio. No entanto, as duas ligações são polares.
No caso da água, a molécula é polar devido à gran-
de diferença de eletronegatividade entre os hidrogêni-
os e o oxigênio e também à forma angular da molécu-
la, como mostra a figura 2. Portanto, a concentração
de elétrons é fortemente deslocada no sentido do áto-
mo de oxigênio. Poderíamos então simplificar a molé-
cula de água como sendo uma estrutura onde existe
uma região com concentração de cargas negativas (polo
negativo) e outra região oposta com concentração de
cargas positivas (polo positivo).
No entanto, compostos formados por ligação entre
átomos de eletronegatividades diferentes ainda podem
ser apolares de acordo com sua estrutura. Compostos de
carbono apresentam suas quatro ligações de forma que
os átomos ligados formem um tetraedro. Dessa forma,
caso o carbono esteja ligado a quatro outros átomos
iguais (como no metano) ou a átomos de eletronegativi-
dades próximas (como nas cadeias orgânicas), o com-
posto formado pode ser apolar, como mostra a figura 3.
Neste caso, existe o deslocamento dos elétrons em
direção ao átomo de carbono, no entanto, a soma vetorial
desses deslocamentos é zero. A concentração das cargas
negativas é no centro da molécula, não havendo a cria-
ção de pólos distintos. Nas cadeias orgânicas, sejam elas
lineares ou ramificadas, esse efeito se multiplica, ge-
rando sempre moléculas apolares. Devido a isso, a gran-
de maioria das moléculas orgânicas, como os óleos, ce-
ras e gorduras é apolar.
Com estas definições, podemos discutir mais pro-
fundamente quais as características moleculares que le-
vam à regra discutida no início do capítulo ser verda-
deira na maioria dos casos. Caso coloquemos um com-
posto orgânico como um hidrocarboneto em água, se
formarão duas fases distintas após algum tempo. Isso
pode ser explicado pelas interações entre as moléculas
do hidrocarboneto e as da água. Entre as moléculas dos
hidrocarbonetos existem forças de atração fracas que as
mantém unidas. Essas forças são essencialmente a for-
ça de Van der Waals e a atração por dipolo induzido.
No caso das moléculas polares, as forças de atração
são fortes (forças de dipolo forte), pois existem pólos
negativos e positivos bem definidos em cada molécula,
que se atraem por terem cargas opostas. Essas forças
aproximam as moléculas polares fazendo com que seja
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mais difícil separar as moléculas de compostos polares.
Portanto, para que uma molécula de um hidrocarboneto
possa entrar nessa estrutura, deveria vencer as forças de
atração entre as moléculas de água substituindo-as por
forças muito menores, o que não é natural.
A solubilidade em água (ou em outros compostos
polares) depende da formação de novas forças de dipolo
fortes em substituição às quebradas na solubilização
(para isto a nova molécula inserida na estrutura também
deve ser polar) ou da formação de novas forças de dipolo
iônicas (mais fortes que as forças de dipolo forte) o que
ocorre na solubilização de um sal em água. A força de
dipolo iônica é tão mais forte que a força de dipolo forte
que as moléculas de água se deslocam da estrutura atra-
ídas pelo íon solubilizado.
A solubilidade de um composto na fase orgânica de-
pende da não existência de grandes forças de atração en-
tre as moléculas deste composto. Portanto, moléculas po-
lares (com sua respectiva força de atração de dipolo forte
entre suas moléculas) podem até ser dissolvidas em fase
orgânica, contanto que em concentrações baixíssimas.
Concentrações mais altas fazem com que essas molécu-
las se encontrem e se agrupem devido a essas forças. Esse
efeito continua ocorrendo até que o agrupamento de mo-
léculas polares for grande o suficiente para formar uma
nova fase. É por isso que a água e os sais inorgânicos são
pouco solúveis em hidrocarbonetos.
2. Tensão superficial
Cada molécula de água sofre forte atração das molé-
culas vizinhas, mas a soma dessas forças de atração é
nula, pois é igual em todas as direções. No entanto, isso
não ocorre nas moléculas de água que estão na superfí-
cie (figura 4). Cada molécula da superfície está "desba-
lanceada" com uma força resultante de atração perpen-
dicular à superfície e voltada para dentro do líquido.
Essa força resultante para dentro do líquido empurra
as moléculas da superfície contra o líquido. É esta força
que é chamada de tensão superficial. Qualquer movi-
mento do líquido que resulte no aumento da superfície
(como o espalhamento de uma gota de líquido sobre uma
superfície) resulta em um número maior de moléculas
do meio do líquido que devem ir para superfície. Para
que isso ocorra, deve ser vencida essa força resultante.
Uma gota, ao ser formada na ponta de um conta-go-
tas, vai aumentando de volume (e de massa) até que a
força peso resultante dessa massa seja suficiente para
vencer a tensão superficial do líquido. Portanto, líqui-
dos que apresentam tensão superficial elevada (alta atra-
ção entre as moléculas) apresentam gotas maiores que
líquidos de tensão superficial baixa. Isto pode ser com-
provado pelo número de gotas necessárias para comple-
tar um mililitro de líquido.
Enquanto para a água são necessários em média vin-
te gotas, para o etanol são necessárias uma média de 32
gotas. Esse resultado mostra que a tensão superficial do
etanol é menor que a da água, portanto, a atração entre
as moléculas é menor, resultado de as moléculas de
etanol serem menos polares que as de água.
3. Molhabilidade e umectação
Molhabilidade e umectação são termos diferentes para
descrever um mesmo fenômeno em aplicações distintas.
O termo molhabilidade é utilizado para descrever o quanto
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uma gota de líquido se espalha sobre uma superfície,
molhando-a. Compostos de elevada tensão superficial
tendem a se comportar como gotas esféricas sobre a su-
perfície, molhando-a pouco. Quando a tensão superficial
é menor, o líquido se espalha mais sobre a superfície.
O alto valor de tensão superficial da água é que faz
com que água forme gotas na superfície do vidro de uma
vidraça após a chuva. O álcool etílico apresenta tensão
superficial muito menor que a da água, tendo menos
tendência de formação de gotas sobre a superfície do
vidro que a água. É por isso que muitas pessoas limpam
vidros utilizando papel embebido em álcool. Como a
formação de gotas é diminuída, existe menos chance de
manchamento da superfície depois de seca.
Umectação é o termo utilizado para a molhabilidade
de superfícies mais complexas, como a de um material
têxtil, onde a capilaridade é fundamental para que o lí-
quido penetre profundamente no material. A figura 5
mostra como a redução da tensão superficial facilita a
penetração dos líquidos nas frestas do material, propor-
cionando a capilaridade e, portanto, a umectação.
4. Tensoativos
Tensoativos são substâncias com moléculas que apre-
sentam uma parte apolar ligada a uma outra parte com
característica polar. Dessa forma, esse tipo de molécula
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é polar e apolar ao mesmo tempo. Para representar esse
tipo de molécula, usa-se a figura de uma barra (que re-
presenta a parte apolar da molécula, portanto solúvel
em hidrocarbonetos, óleos e gorduras) e um círculo (que
representa a sua parte polar, solúvel em água), como
representado na figura 6.
lor de eletronegatividade), atrai outros elétrons (de car-
ga negativa) dos carbonos e hidrogênios vizinhos, re-
forçando ainda mais a polaridade negativa dessa região.
Devido a isso, os tensoativos aniônicos são mais solú-
veis em água, já que sua parcela polar é reforçada por
dois efeitos no sentido de aumentar a carga negativa.
Como a região polar apresenta carga negativa, esse tipo
de tensoativo é chamado de tensoativo aniônico.
Existem muitas outras moléculas classificadas como
tensoativos aniônicos. Pode-se alterar a parte apolar com
mudanças na cadeia carbônica e a parte polar com ou-
tros grupos aniônicos como o sulfato, o sulfonato e o
fosfato. Como a solubilidade de um tensoativo em água
depende da quantidade de carga que a parte polar apre-
senta, não importando o sinal desta carga, também exis-
tem os tensoativos com parte polar com carga positiva,
como o mostrado na figura 8.A parte apolar de um tensoativo normalmente tem
origem em uma cadeia carbônica (linear, ramificada ou
com partes cíclicas) pois, como vimos, os carbonos dessa
cadeia, apesar de serem mais eletronegativos que os áto-
mos de hidrogênio, não formam pólos de concentração
de carga eletrostática. A parte polar deve ser formada
por alguns átomos que apresentem concentração de car-
ga com formação de um pólo negativo ou positivo.
A figura 7 mostra uma molécula de sabão de sódio
obtido a partir da neutralização do ácido dodecanóico
(do óleo de coco) com hidróxido de sódio. Na figura, a
molécula do sabão foi colocada sobre a representação
esquemática genérica de um tensoativo, indicando que
a cadeia carbônica forma a parte apolar da molécula e a
carbonila neutralizada forma a parte polar. Quando dis-
solvido em água, o contra-íon de sódio se dissolve na
água e o restante da molécula adquire uma carga negati-
va verdadeira na região da carbonila. Essa região, por
ser formada de dois átomos de oxigênio (de grande va-
O tensoativo da figura 8 também apresenta a mesma
cadeia carbônica formando a parte apolar da molécula.
Agora, a parte polar é formada pelo nitrogênio quater-
nizado, o que lhe dá uma carga positiva. Essa carga atua
também tornando essa parte da molécula solúvel em água.
Os tensoativos que apresentam cargas positivas na
região polar da molécula são chamados de tensoativos
catiônicos. No entanto, o nitrogênio, por ser mais
eletronegativo que o carbono, atrai parcialmente os elé-
trons envolvidos nessa ligação, o que neutraliza um pou-
co a carga positiva da região polar do tensoativo, dimi-
nuindo sua polaridade total. Essa menor polaridade re-
duz a solubilidade em água dos tensoativos catiônicos
quando comparados com os tensoativos aniônicos. É por
isso que produtos detergentes ou xampus podem ser
transparentes (com base em tensoativos aniônicos) e os
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