Post on 17-Nov-2018
ESTADO DO RIO GRANDE DO SULPODER JUDICIÁRIOTRIBUNAL DE JUSTIÇA
HOPRNº 700102939342004/CÍVEL
APELAÇÃO CÍVEL. EMBARGOS À EXECUÇÃO FISCAL. MULTA. DANO AO AMBIENTE. PRESUNÇÃO DE LIQUIDEZ E CERTEZA DA CDA. POSSIBILIDADE, NA ESPÉCIE, DE APLICAÇÃO DIRETA DA PENA DE MULTA SIMPLES, SEM PRÉVIA PENA DE ADVERTÊNCIA. INVIABILIDADE DE REPARAÇÃO “IN NATURA” DO DANO AMBIENTAL. CABIMENTO DA MULTA. IMPROCEDÊNCIA DOS EMBARGOS.
Constatada a prática de dano ao meio ambiente, possível a aplicação imediata da multa prevista no art. 31 do Decreto nº 3.179/99, independentemente de advertência, desde que não seja possível a reparação do dano. Tratando-se de corte de árvores sob proteção, cuja reparação “in natura” com replantio das espécies se mostra inviável, cabível a aplicação imediata da multa. Inteligência do art. 2º, § 3º, I, do Decreto nº 3.179/99. Legalidade na aplicação da pena de multa simples sem prévia advertência. Improcedência dos embargos.
APELAÇÃO NÃO PROVIDA.
APELAÇÃO CÍVEL PRIMEIRA CÂMARA CÍVEL
Nº 70010293934 COMARCA DE SÃO FRANCISCO DE PAULA
ANTONIO ALVES SCHLICHTING APELANTE
ESTADO DO RIO GRANDE DO SUL APELADO
A C Ó R D Ã O
Vistos, relatados e discutidos os autos.
Acordam os Magistrados integrantes da Primeira Câmara Cível do
Tribunal de Justiça do Estado, à unanimidade, em negar provimento ao apelo.
Custas na forma da lei.
Participaram do julgamento, além do signatário (Presidente), os
eminentes Senhores DES. CARLOS ROBERTO LOFEGO CANÍBAL E DR. NIWTON CARPES DA SILVA.
1
ESTADO DO RIO GRANDE DO SULPODER JUDICIÁRIOTRIBUNAL DE JUSTIÇA
HOPRNº 700102939342004/CÍVEL
Porto Alegre, 13 de abril de 2005.
HENRIQUE OSVALDO POETA ROENICK, Relator.
R E L A T Ó R I O
DES. HENRIQUE OSVALDO POETA ROENICK (RELATOR)
Trata-se de embargos opostos por ANTÔNIO ALVES SCHLICHTING à execução fiscal movida pelo ESTADO DO RIO GRANDE DO SUL, referente à multa aplicada ao embargante em decorrência da constatação
de dano ambiental causado pelo embargante, na extração irregular de
pinheiros da espécie “araucária augustifólia”, considerado madeira-de-lei por
Ato do Poder Público. Entende o embargante ser o caso de aplicação da
sanção de advertência anteriormente à aplicação da multa cominada, nos
termos do art. 2º, § 3º, do Decreto 3.179/99. A aplicação da multa sem
advertência preliminar macula de nulidade a CDA, e, em conseqüência, da
execução oposta. Sustenta ter interesse em recompor o dano causado ao meio
ambiente, mas que a aplicação imediata da multa fere o espírito da Lei. Pela
procedência da ação.
Impugnou o embargado, sustentando que o embargante não
elidiu a presunção de certeza e liquidez da CDA. Defende que, constatada pela
fiscalização o dano ambiental produzido, a aplicação da multa era medida que
se impunha por Lei, ante o princípio da legalidade, inerente à Administração
Pública. Aponta que o dano não pode ser restaurado, não havendo falar em
advertência prévia. Pede a improcedência dos embargos.
Sentenciando o feito, a Magistrada julgou improcedente os
embargos, condenando o embargante ao pagamento das custas processuais, e
verba honorária de 12% sobre o valor da causa.
2
ESTADO DO RIO GRANDE DO SULPODER JUDICIÁRIOTRIBUNAL DE JUSTIÇA
HOPRNº 700102939342004/CÍVEL
Inconformado, apela o embargante. Reitera o argumento da
necessidade de aplicação da sanção de advertência anteriormente à aplicação
da multa cominada, nos termos do art. 2º, § 3º, do Decreto 3.179/99. A
aplicação da multa sem advertência preliminar macula de nulidade a CDA, e,
em conseqüência, da execução oposta. Pede reforma.
Contra-razões às fls. 39/41.
Subiram os autos a esta Corte para julgamento do apelo.
É o relatório.
V O T O S
DES. HENRIQUE OSVALDO POETA ROENICK (RELATOR)
Conheço do recurso, por próprio e tempestivo.
Tenho para mim que o recurso merece o juízo de provimento.
O direito ambiental, como garantia fundamental de 3ª geração, é
um avanço inquestionável e valioso dos ordenamentos constitucionais
modernos.
Nesse sentido a Constituição foi expressa, no art. 225 a
determinar que “todos têm direito ao meio ambiente ecologicamente
equilibrado, bem de uso comum do povo e essencial à sadia qualidade de vida,
impondo-se ao Poder Público e à coletividade o dever de defendê-lo e
preservá- lo para as presentes e futuras gerações”. E nos artigos seguintes a
Carta Política previu uma série de atribuições ao Poder público, como forma de
garantir o cumprimento de tal disposição.
3
ESTADO DO RIO GRANDE DO SULPODER JUDICIÁRIOTRIBUNAL DE JUSTIÇA
HOPRNº 700102939342004/CÍVEL
Outra não é a razão da legislação brasileira em estabelecer a
responsabilidade objetiva do poluidor, cristalizada no art. 14, § 1º, da Lei
6.938/81, a chamada Lei de Política Nacional do Meio Ambiente.
Nesse contexto é que foi editada a Lei nº 9.605/98, que dispõe
sobre as sanções penais e administrativas lesivas ao meio ambiente. O
endurecimento do controle sobre as reservas naturais é decorrência da
crescente devastação a que estão sendo submetidos os recursos naturais de
nosso planeta, alterando as condições climáticas e a sobrevivência das mais
diversas espécimes da fauna e flora mundial.
Sendo assim, o rigor imposto aos que descumprem as normas de
direito ambiental é hoje muito grande, de fato, mas o endurecimento dessa
relação Estado/fiscalizador e poluidor justifica-se no esvaziamento das
reservas naturais em todo o mundo, e em especial no Brasil, país que,
infelizmente, tem notório reconhecimento de devastador de suas reservas
naturais, contando com inúmeras empresas clandestinas de exploração vegetal
e mineral nos Estados da Região Norte do País, e que acabam vendendo
nossos recursos naturais à empresas estrangeiras sedentas de matéria-prima
barata, tão canalhas quanto os que aqui se dedicam à exploração irregular de
produtos de nossas reservas naturais.
Feito esse perfil geral da matéria, temos nos autos a hipótese de
autuação do demandante pelo corte de cerca de cento e cinqüenta pinheiros da
espécie “araucária augustifólia”, considerado madeira-de-lei por Ato do Poder
Público, infração a que a legislação de regência atribui de alta gravidade, com
previsão de aplicação de multa de R$ 500,00 (quinhentos Reais) por metro
cúbico de madeira cortada.
4
ESTADO DO RIO GRANDE DO SULPODER JUDICIÁRIOTRIBUNAL DE JUSTIÇA
HOPRNº 700102939342004/CÍVEL
O embargante não nega o fato do dano ambiental causado,
limitando-se a defender a aplicação prévia da sanção de advertência,
apontando arbitrariedade e excesso do estado na aplicação da multa ora em
cobrança.
O Decreto nº 3.179/99, no que importa, assim dispõe:
“Art. 2o As infrações administrativas são punidas com as seguintes sanções: I - advertência; II - multa simples; III - multa diária; IV - apreensão dos animais, produtos e subprodutos da fauna e flora, instrumentos, petrechos, equipamentos ou veículos de qualquer natureza utilizados na infração; V - destruição ou inutilização do produto; VI - suspensão de venda e fabricação do produto; VII - embargo de obra ou atividade; VIII - demolição de obra; IX - suspensão parcial ou total das atividades; X - restritiva de direitos; e XI - reparação dos danos causados.(...) § 2o A advertência será aplicada pela inobservância das disposições deste Decreto e da legislação em vigor, sem prejuízo das demais sanções previstas neste artigo.
§ 3o A multa simples será aplicada sempre que o agente, por negligência ou dolo:
I - advertido, por irregularidades, que tenham sido praticadas, deixar de saná-las, no prazo assinalado por órgão competente do Sistema Nacional do Meio Ambiente - SISNAMA ou pela Capitania dos Portos do Comando da Marinha;”
5
ESTADO DO RIO GRANDE DO SULPODER JUDICIÁRIOTRIBUNAL DE JUSTIÇA
HOPRNº 700102939342004/CÍVEL
O fato da extração irregular de madeira-de-lei é inquestionável, e
sequer foi negado pelo embargante, como já referido, amoldando-se no tipo
previsto no art. 31 do Decreto nº 3.179/99, em redação similar ao do art. 45 da
Lei nº 9.605/98, norma legal à qual o referido Decreto regulamenta. Diz o
dispositivo legal:
Art. 31. Cortar ou transformar em carvão madeira de lei, assim classificada em ato do Poder Público, para fins industriais, energéticos ou para qualquer outra exploração, econômica ou não, em desacordo com as determinações legais: Multa de R$ 500,00 (quinhentos reais), por metro cúbico.
A multa simples aplicada até atendeu à quantificação
estabelecida no referido artigo, referente à extração irregular de 105 metros
cúbicos de madeira-de-lei, acrescida de correção monetária e demais
consectários de mora.
Contudo, e aqui o cerne da “quaestio”, a pena de multa simples,
caso dos autos, só pode ser aplicada, face aos termos do que dispõe o § 3º, I,
do art. 2º, do Decreto nº 3179/99, após a pena de advertência e desde que o
infrator, por dolo ou culpa, deixar de sanar as irregularidades. Ou seja,
naquelas hipóteses em que seja possível a reparação do dano, parece-me que
a legislação não deixa margem à dúvida. A pena de multa simples só será
aplicada se não houver a reparação.
E no caso em exame, não me parece razoável a posição da
sentença ao afirmar não estar provada a possibilidade da reparação. Trata-se
de abate de árvores nativas, cujo replantio, e conseqüente reparação, é
6
ESTADO DO RIO GRANDE DO SULPODER JUDICIÁRIOTRIBUNAL DE JUSTIÇA
HOPRNº 700102939342004/CÍVEL
plenamente possível. Tanto é assim, que o próprio auto de infração (fls. 10)
consigna, no campo “observação”, ser obrigatório o replantio.
Ora, nestas circunstâncias, havendo, como há, possibilidade de
reparação do dano, a autoridade competente deveria, primeiro, ter aplicado a
pena de advertência, com fixação de prazo para a sanação da irregularidade.
Caso não procedido o replantio no prazo assinalado, então sim, na forma do
art. 2º, § 3º, I, do Decreto nº 3.179/99, aplicar a pena de multa simples. Mas
nada disso foi feito. De pronto, observando que o replantio era obrigatório, mas
sem prazo assinalado a tanto, aplicou a pena de multa simples.
E assim deve ser porque interessa ao Órgão competente, como
também a toda sociedade, que antes de cobrar multa, necessário restabelecer
a integridade do meio ambiente. Neste sentido a doutrina trazida à colação pelo
embargante, que abaixo se reproduz, por pertinente e aplicável à espécie:
“3. Formas de reparação do dano ambiental
Conforme já mencionamos, há duas formas principais de reparação do dano ambiental: a) o retorno ao ‘status quo ante’ e b) a indenização em dinheiro. Não estão elas hierarquicamente em pé de igualdade. A modalidade ideal – e a primeira que deve ser tentada, mesmo que mais onerosa – de reparação do dano ambienta é a reconstituição ou recuperação do meio ambiente lesado, cessando-se a atividade lesiva e revertendo-se a degradação ambiental. É, pois, imperioso que o aplicador da lei atente para a essa constatação, já que não são poucas as hipóteses em que ‘não basta indenizar, mas fazer cessar a causa do mal, pois um carrinho de dinheiro não substitui o sono recuperador, a saúde dos brônquios, ou a boa formação do feto’. Esta opção, verdadeira execução específica, vem claramente defendida no direito brasileiro, inclusive em sede constitucional (art. 225, § 2º, da Constituição Federal).
7
ESTADO DO RIO GRANDE DO SULPODER JUDICIÁRIOTRIBUNAL DE JUSTIÇA
HOPRNº 700102939342004/CÍVEL
A regra, pois, é buscar-se, por todos os meios razoáveis, ir além da ressarcibilidade (indenização) em seqüência ao dano, garantindo-se, ao contrário, a fruição do bem ambiental. Aquela, como já alertamos, não consegue recompor o dano ambiental. O valor econômico não tem o condão – sequer por aproximação ou ficção – de substituir a existência e fruição do meio ambiente ecologicamente equilibrado. O trabalho do legislador, por conseguinte, visa a garantir essa possibilidade de fruição e, só excepcionalmente, o ressarcimento monetário da lesão. Apenas quando a reconstituição não seja viável – fática ou tecnicamente – é que se admite a indenização em dinheiro. Essa – a reparação econômica – é, portanto, forma indireta de sanar a lesão.” (Direito do ambiente – Revista dos Tribunais – 2000 – pág. 336/337).
E não se invoque a regra do § 2º, do mesmo artigo do Decreto nº
3.179/99 para afirmar possível a aplicação imediata e independente de prévia
advertência, da pena de multa simples. O que dispõe a referida regra legal é
que a pena de advertência pelos fatos ali assinalados, pode ser aplicada sem
prejuízo das demais sanções. Mas isto não ocorreu, ou seja, sequer houve
advertência. E esta se fazia necessária, forma antecedente, face à espécie do
dano (passível de reparação), à pena de multa simples, pelos termos do já
referido § 3º, I, do art. 2º, do Decreto nº 3.179/99. O que deve ser feito pelo
Órgão competente é assinalar prazo ao infrator para repor a situação no
estado anterior, com replantio das espécies.
Desta forma, não tendo a autoridade pública atendido, na fixação
da pena, a legislação aplicável, ilegal foi sua conduta, gerando, como
conseqüência, a nulidade da CDA que, com base nela, foi extraída. E uma vez
nula a CDA, a execução merece ser extinta.
8
ESTADO DO RIO GRANDE DO SULPODER JUDICIÁRIOTRIBUNAL DE JUSTIÇA
HOPRNº 700102939342004/CÍVEL
Com tais considerações, dou provimento ao apelo, para julgar
procedentes os embargos do devedor, com extinção da execução em apenso,
invertidos os ônus sucumbenciais.
É o voto.
DES. CARLOS ROBERTO LOFEGO CANÍBAL (REVISOR)
Com a devida vênia do eminente relator, ouso divergir. É que, a
meu sentir, para uma adequada prestação jurisdicional concreta, impõe-se
aquilatar as circunstâncias fáticas com todas as sua elementares à exaustão.
E quando se fala de elementares se está referindo a todos os aspectos
envolventes dos fatos, inclusive as operadoras modais deste.
Necessário se faz destacar, com efeito, que pena é sanção aflitiva
imposta pelo Estado, mediante ação cabível, ao autor de determinada infração
– administrativa ou penal – como retribuição de seu ato ilícito, consistente na
diminuição de um bem jurídico – patrimônio ou liberdade – cujo fim é evitar
novas infrações. Apresenta característica de retribuição. Tem a finalidade de
prevenção.
Deve, porém, ser eficaz e para tanto deve ser sentida de imediato
pelo infrator, sob pena de ser ineficaz, máxime em casos que tais.
Como se trata de pena de multa aplicada em sede de
procedimento administrativo, o caso envolve questionamentos que a espécie –
danos ambientais – reclama. É que no caso houve um dano ambiental não
negado pelo embargante que se insurge tão-só com a ausência da
“advertência” prevista não só no Decreto nº 3.179/99, art. 2º, § 3º, mas cuja
dispositividade advém da Lei de regência da hipótese infracional que é a Lei nº
9.605/98, art. 72, § 3º.
Se é bem verdade que essas disposições normativas assim
dispõem exigindo a prévia “advertência” para a aplicação da pena de multa 9
ESTADO DO RIO GRANDE DO SULPODER JUDICIÁRIOTRIBUNAL DE JUSTIÇA
HOPRNº 700102939342004/CÍVEL
simples, o caso não é de se aplicar a lei sem um juízo de valor a respeito de
sua aplicabilidade. Isto é, a respeito de sua necessidade e também de sua
possibilidade material e jurídica.
A meu sentir não pode o juiz aplicar a lei sem ter em mente um
atributo que lhe é ínsito e atribuído por lei: o “arbitrium regulatum". Sem ele
o juiz não alcança a prestação jurisdicional plena e de acordo com sinalagmas
próprios como a plausibilidade, a realidade, a necessidade e a suficiência da
pena para fins de prevenção e prevenção de infrações que tais.
É que em casos como os dos autos, poderá ou não haver objeto
na advertência ou para ela e para que se possa exigir a advertência. No
presente caso, a meu ver, não tem objeto – e, portanto, desnecessária a
advertência – porque esta serve para, como diz a lei, o caso em que o
advertido “deixar de saná-las” – referindo-se às irregularidades praticadas.
Ocorre que, em primeiro lugar, no caso, não se trata de uma mera
irregularidade, mas como o próprio relator o reconhece, de um crime previsto
na respectiva Lei especial, art. 45. Em segundo lugar, não há como sanar a
“irregularidade” porque se trata de dano ambiental consistente em derrubada
de árvores da espécie “araucária augustifólia” ou “pinheiro brasileiro” que são
árvores centenárias. E por isso, é sabido, é espécie que exige no mínimo uma
quase centena de anos para haver o reflorestamento e reposição das coisas
como estavam antes do impacto ambiental causado pelo dano decorrente da
derrubada das centenárias árvores.
Assim, de todo inócua a advertência para o fim de não se chegar
ao objeto a que se propõe. Isto é, a advertência tem um fim, tem um objetivo,
qual seja, a possibilitação da sanação da infração pelo infrator, mas que
mesmo no caso de optar ele pela recomposição ambiental não o conseguirá no
caso em face de uma impossibilidade material e jurídica conseqüencialmente.
E não se pode remeter a prestação jurisdicional ao absurdo da impossibilidade
do mandamento.
10
ESTADO DO RIO GRANDE DO SULPODER JUDICIÁRIOTRIBUNAL DE JUSTIÇA
HOPRNº 700102939342004/CÍVEL
Com efeito, de possibilidade do cumprimento do mandamento é
do que estou falando, de razoabilidade na dicção do direito dentro de um
critério de lógica do qual não podemos nos afastar. Até porque um juízo de
desvalor da conduta do embargado é do que se trata, conjugado a um outro
juízo, mas este de valor, do bem jurídico atingido que é a floresta de araucária
protegida por lei e danificada pelo recorrente e pertencente ao patrimônio
público nem sempre bem avaliado, mas que é de uso comum e não pode ser
degradado.
E é por isso que a Constituição Federal incumbe ao Poder Público
assegurar a efetividade do direito a um meio ambiente ecologicamente
equilibrado que é considerado essencial à sadia qualidade de vida, aí incluída a
responsabilidade do Poder Judiciário em evitar a aplicação da lei modo de não
se atingir as finalidades constitucionais e infraconstitucionais.
Se assim não for, o que se estará chancelando é o desmatamento
ao dizer que, nestes casos como em casos em que navios estrangeiros que
adentram em nossa Lagoa dos Patos para lavarem os porões de navios que
carregaram pesticidas, petróleo “et caetera” devem ser primeiramente
“advertidos”, na forma da lei, para só ao depois se aplicar a penalidade que a
espécie reclama. Nestes casos não haverá, também, como se levar a efeito a
advertência por absoluta impossibilidade material de se realizar a sanação, o
conserto do crime, da infração, da degradação causada.
Assim não pode ser nestes casos em face da absoluta e total
impossibilidade fático e jurídica de uns e de outros – como no caso dos porões
dos navios - “sanar as irregularidades” que muito mais do que isto são. São
crimes especiais, previstos em lei federal – como não poderia deixar de ser –
especial.
Portanto, em face da total impraticabilidade ou impossibilidade do
sanamento da infração que poderia advir da “advertência”, mesmo que tão-só
pecuniária seja a pena no caso da infração administrativa, não tem esta
11
ESTADO DO RIO GRANDE DO SULPODER JUDICIÁRIOTRIBUNAL DE JUSTIÇA
HOPRNº 700102939342004/CÍVEL
aplicabilidade ao presente caso, pena de se autorizar a degradação ambiental,
o crime ambiental sob o argumento de que se não advertido não se pode
aplicar a multa. E isso o Poder Judiciário não pode levar a efeito, não pode
fazer, não pode dar esta autorização, passando um verdadeiro alvará neste
sentido já que assim se autoriza a degradação, em última análise, ao exigir a
“advertência” prévia prevista em lei em casos que a ela não se adequam por
uma impossibilidade em alcançar seu objetivo. Qual seja, a sanação do dano
ecológico.
Portanto, pedindo a máxima vênia ao eminente relator, estou
divergindo para confirmar a sentença.
É o voto.
DR. NIWTON CARPES DA SILVA - Eminentes colegas, trata-se de embargos
à execução fiscal, em que o embargante pretende a nulidade da CDA em face
da pena de multa aplicada por infração ambiental.
12
ESTADO DO RIO GRANDE DO SULPODER JUDICIÁRIOTRIBUNAL DE JUSTIÇA
HOPRNº 700102939342004/CÍVEL
É fato inconteste que o embargante cortou 150 pinheiros de
araucária. É também certo que a pena de multa simples pressupõe advertência
(art. 2º, § 3º, inc. I, do Decreto nº 3.179/99), mas a advertência somente é
pressuposto se houver possibilidade de sanação, o que, no caso, se faz
irremediável, pois nem o replantio, como aventa o douto Relator, implica
sanação, mas remendo ao problema, pois tais árvores levarão, sem dúvida,
dezenas e dezenas de anos para crescerem e ficarem do porte das que foram
ceifadas. O problema ambiental ocorreu. O impacto maléfico à natureza
concretizou-se de modo irremediável, pelo que concordo plenamente com a
respeitável sentença e com o voto do eminente Revisor.
Nego provimento ao apelo.
DES. HENRIQUE OSVALDO POETA ROENICK - Eminentes Colegas.
Inicialmente, por uma questão eminentemente de técnica na aplicação da lei,
entendi inviável a aplicação da pena de multa simples sem a prévia
advertência, tendo em vista o que dispõe, especialmente, o § 3º, inc. I, do art.
2º do Decreto nº 3.179/99.
Confesso que fiquei sensibilizado com as ponderações dos
eminentes Colegas, em especial com o voto do eminente Revisor, chamando a
atenção para a questão do abate de árvores centenárias da espécie Araucaria
augustifolia, considerada por ato do Poder Público como madeira-de-lei.
Com efeito, em que pese se possa pensar que o causador do
dano deva proceder ao replantio, a hipótese levantada pelo eminente Revisor
leva a concluir de forma diversa daquela que inicialmente concluí. Aqui não
existe viabilidade de reparar o dano, ao menos em curto e médio prazo, com o
que a pena de advertência poderia restar inócua.
13
ESTADO DO RIO GRANDE DO SULPODER JUDICIÁRIOTRIBUNAL DE JUSTIÇA
HOPRNº 700102939342004/CÍVEL
Então, impressionado pelas colocações dos eminentes
Colegas, creio que se está, aqui, na exceção legal, que admite a viabilidade da
aplicação da pena de multa simples sem advertência prévia, porque o dano é
irreparável. Se forem replantadas todas as espécies abatidas, e se vingarem,
por certo nem a geração de nossos filhos poderá desfrutar do bem que foi
sacrificado.
Dessa forma, voltando atrás por repensar melhor o assunto em
face das ponderadas e jurídicas razões levantadas pelos eminentes Pares,
estou também desprovendo o apelo e mantendo a sentença de 1º Grau.
É como voto.
DES. HENRIQUE OSVALDO POETA ROENICK - Presidente - Apelação Cível
nº 70010293934, Comarca de São Francisco de Paula: "À UNANIMIDADE,
NEGARAM PROVIMENTO AO APELO."
Julgadora de 1º Grau: VERA LETICIA DE VARGAS STEIN
14