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ANÁLISE TÓXICO-GENÉTICA COMPARATIVA DOS ANTI-ANÁLISE TÓXICO-GENÉTICA COMPARATIVA DOS ANTI-
RETROVIRAIS ZIDOVUDINA E DIDANOSINA EM CÉLULASRETROVIRAIS ZIDOVUDINA E DIDANOSINA EM CÉLULAS
SOMÁTICAS DE SOMÁTICAS DE Drosophila melanogasterDrosophila melanogaster
Nilza Nascimento GuimarãesNilza Nascimento Guimarães
ANÁLISE TÓXICO-GENÉTICA COMPARATIVA DOS
ANTI-RETROVIRAIS ZIDOVUDINA E DIDANOSINA EM
CÉLULAS SOMÁTICAS DE Drosophila melanogaster
NILZA NASCIMENTO GUIMARÃES
Dissertação de mestrado apresentada ao Programa de Pós-
Graduação em Biologia da Universidade Federal de Goiás, para a obtenção
do Grau de Mestre em Biologia.
Orientadora: Profa. Dra. Kênya Silva Cunha
Goiânia
2006
2
Ao meu pai,
“Aquilo que não me mata,
me faz ainda mais forte.”
Obrigada por me mostrar que os laços de amor e de ternura podem
ser mais fortes que os laços de sangue. Obrigada por me amar. Obrigada
pela educação que me deste e por me ensinar a ter coragem de enfrentar
os meus medos. Obrigada por jamais me deixar sozinha. Mesmo agora
que já partiu, ainda sinto a sua voz falando ao meu ouvido: vai minha
filha, se tudo der errado dê a volta por cima e comece outra vez. Obrigada
por ter sido o meu verdadeiro pai.
À minha mãe,
Se Deus me desse a chance voltar no tempo e escolher em qual
ventre eu seria gerada, eu escolheria o seu. É muito bom ser sua filha.
Perdoe-me por cada dia que passei longe da senhora. É o preço que se
paga pelo crescimento profissional.
Dedico a vocês este trabalho.
3
Ao meu amado Giovanni,
“Não importa que amanheça devagar, as flores não tem pressa.
Nem os frutos. Sabem que a vagareza dos minutos adoça mais o outono
por chegar. Portanto, não faz mal que, devagar, o dia vença a noite em
seus redutos de leste. O que nos cabe é termos enxutos os olhos e a
intenção de madrugar.”
Autor desconhecido
Sua maturidade e paciência foram fundamentais nestes longos
meses de luta. Seu amor me deu forças para superar cada dia difícil. E me
faz ter vontade de voltar para casa todos os dias da minha vida.
4
À Kênya,
“Pois tu formaste o meu interior, tu me teceste no seio de minha
mãe, graças te dou, visto que por modo assombrosamente maravilhoso
me formaste; os teus olhos me viram a substância ainda informe, e no
teu livro foram escritos todos os meus dias, cada um deles escrito e
determinado, quando nenhum deles havia ainda”.
Salmo 139:13-16
Destino, acaso, sorte... Chamem do que quiserem. Para mim, obra
de algo ou alguém maior. Às vezes acho que estamos soltos,
abandonados neste mundo. Outras vezes me sinto uma marionete
conduzida por algo inexplicável que rege a minha vida. E no fim fica uma
pergunta: como vai ser amanhã? Uma resposta eu tenho: para sempre
com você na lembrança.
5
AGRADECIMENTOS
À Dra. Kênya Silva Cunha,
Pela confiança quando nem eu mesma sabia se era capaz. O carinho
e a ética que nos transmite, tornam o ambiente de trabalho muito
prazeroso e confiável. Levarei para sempre a lembrança da sua alegria de
viver. E, também, tudo o que aprendi ao seu lado. Os amigos são a
família que nos permitiram escolher. Obrigada por tudo.
Aos meus colegas de laboratório,
Igor Gomes de Oliveira, Karla de Castro Pereira, Leonardo Pereira
Franchi, Letícia Cunha Fernandes, pela amizade, respeito,
responsabilidade e humildade de todos vocês, que muito contribuíram
para a execução deste trabalho. Sem dúvidas seremos irmãos para toda a
vida.
Ao Dr. Luis Arthur Mendes Bataus
Por estar presente sempre que precisamos de um braço forte, de
um ombro amigo, de um conselheiro ou apenas de um companheiro para
o café da tarde.
À Dra. Alice Helena Andrade Ferreira Rios (IQUEGO),
Pela presteza e prontidão que nos acolheu. Sua contribuição foi
fundamental para a realização desta pesquisa.
Aos meus irmãos,
Por compreender minha distância, torcer por meu sucesso e
pela paciência nos dias de estresse.
6
Este estudo foi realizado nas instalações do Laboratório de Genética
Toxicológica do Departamento de Bioquímica e Biologia Molecular do
Instituto de Ciências Biológicas da Universidade Federal de Goiás, como
parte do projeto “Estudo comparativo da toxicidade genética induzida por
compostos antimetabólicos de uso clínico”, processo nº 472036/2003-3,
estabelecido pelo Edital Universal CNPq 01/2002.
7
SUMÁRIO
1.INTRODUÇÃO.......................................................................... 16
1.1.AIDS.................................................................................... 16
1.2.Tratamento anti-retroviral....................................................... 22
1.3.AZT e ddI: indutores de lesão no DNA...................................... 26
1.4.Recombinação somática e análise tóxico-genética...................... 32
1.5.Drosophila melanogaster na genética toxicológica...................... 33
2.OBJETIVO ............................................................................. 36
3.MATERIAL E MÉTODO ............................................................... 37
3.1.Agente anti-retroviral............................................................. 37
3.2.Meios de cultura e condições de cultivo..................................... 37
3.3.Teste para Detecção de Mutação e Recombinação
Somática (SMART)............................................................. 38
3.4.Linhagens teste de Drosophila melanogaster............................. 38
3.5.Cruzamento e tipos de larvas.................................................. 38
3.6.Tratamentos......................................................................... 39
3.7.Montagem das lâminas........................................................... 39
3.8.Análise microscópica.............................................................. 40
3.9.Bases genéticas..................................................................... 41
3.9.1.Adultos trans-heterozigotos.................................................. 41
3.9.2.Adultos heterozigotos para o cromossomo balanceador TM3..... 41
3.10.Análise estatística................................................................ 42
4.RESULTADO............................................................................. 44
4.1.Efeito citotóxico e toxicidade genética....................................... 44
4.2.Indivíduos trans-heterozigotos................................................ 46
4.3.Indivíduos heterozigotos para o cromossomo balanceador TM3.... 46
4.4.Toxicidade genética padronizada por unidade de exposição......... 47
8
5.DISCUSSÃO............................................................................ 51
6. PERSPECTIVAS PARA FUTURAS INVESTIGAÇÕES......................... 57
7.BIBLIOGRAFIA......................................................................... 60
9
LISTA DE ABREVIATURAS
µg: Micrograma
µM: Milimolar
AIDS: Síndrome da Imunodeficiência Humana Adquirida
AN: Análogos nucleosídeos
APRT: Adenina fosforribosiltransferase
ATP: Adenosina trifosfato
AZT: Zidovudina, 3’-azido-3’-desoxitimidina, retrovir
AZTTP: Zidovudina trifosfato
ddA: Didesoxiadenosina
ddAMP: Didesoxiadenosina monofosfato
ddATP: 2,3-didesoxiadenosina-5-trifosfato
ddC: Zalcitabina
ddI: Didanosina, 2’-3’-didesoxiinosina, Videx
ddIMP: Didesoxiinosina monofosfato
ddNTP: 2’- desoxinucleosídeo-5’-trifosfato endógena
dNTP: Desoxinucleosídeo trifosfato endógena
DNA: Ácido desoxirribonucléico
dNK: Desoxiribonucleosídeo quinase
dTMP: Desoxitimidina monofosfato
dTMPK: Desoxitimidina monofosfato quinase
dTTP: 2’,3’-desoxitimidina trifosfato endógena
FDA: Food and Drug Administration
GAZT: 3'-azido-3'-desoxi-5'-O-β-D-glicopiranosiltimidina
HIV: Vírus da Imunodeficiência Humana
HPRT: Hipoxantina-guanina fosforibosiltransferase
HPV: Papillomavírus
LAV: Vírus associado à linfadenopatia
mg: Miligrama
mtDNA: Ácido desoxi-ribonucléico mitocondrial
NDPK: Nucleosídeo fosfato quinases
10
NMPK: Nucleosídeo monofosfato quinase
NNRTIs: Inibidores não-nucleosídeos da transcriptase reversa
NRTIs: Inibidores Nucleosídeos da Transcriptase Reversa
NtRTIs: Inibidores nucleotídeos da transcriptase reversa
PCR: Reação em cadeia da polimerase
PM: peso molecular
Pol γ: DNA polimerase mitocondrial humana
RNA: ácido ribonucléico
RT: Transcriptase Reversa
SMART: Teste para Detecção de Mutação e Recombinação em Células
Somáticas de Drosophila melanogaster
TK: Timidina quinase autossômico
TTP: Timidina trifosfato
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RESUMO
O vírus da imunodeficiência humana (HIV), causador da Síndrome da
Imunodeficiência Adquirida (AIDS), possui genoma de RNA e não é capaz
de codificar enzimas para metabolização de nucleotídeos ou nucleosídeos
(nucleosídeo quinases, nucleotídeo redutase, timidilato sintetase) e,
então, depende completamente do maquinário metabólico das células
hospedeiras para sua síntese de DNA e RNA. Entretanto, além de uma
série de proteínas estruturais e regulatórias, o HIV ainda codifica muitas
enzimas que são essenciais para a clivagem de proteínas (proteases),
para a síntese de DNA (Transcriptase Reversa) e para a incorporação do
produto do DNA viral no genoma humano (integrase). A ausência de uma
enzima análoga a RT em células humanas e o conhecimento prévio de
inibidores desta enzima, utilizados no tratamento de retroviroses animais,
tornaram a inibição da RT o alvo terapêutico óbvio para o tratamento da
infecção por HIV. Entre os medicamentos mais utilizados no combate ao
HIV estão a zidovudina (AZT) e a didanosina (ddI), que pertencem à
classe dos Inibidores Nucleosídeos da Transcriptase Reversa (NRTIs).
Estas drogas substituem ou imitam os substratos naturais durante a
síntese do DNA viral, interrompendo a atividade de transcrição reversa,
agindo, assim, como terminadores de cadeia. O presente estudo teve
como principal enfoque o diagnóstico genotóxico do AZT e da ddI,
buscando caracterizar, quantificar e padronizar por unidade de exposição,
os efeitos destes fármacos em nível de mutações pontuais, mutações
cromossômicas e/ou recombinação mitótica, através do Teste para
Detecção de Mutação e Recombinação em Células Somáticas de
Drosophila melanogaster (SMART de asa). A comparação das freqüências
padronizadas de indução de clones mutantes, obtidas para estas duas
drogas demonstra que ambas apresentam um elevado potencial
genotóxico. De fato, a ddI mostrou-se 4,25 vezes mais genotóxica que o
AZT (0,34 clones na ddI para 0,08 clones induzidos no AZT) nos
indivíduos trans-heterozigotos. Por outro lado, a análise da freqüência
12
padronizada de clones mutantes induzida pelas drogas, nos indivíduos
heterozigotos para o cromossomo TM3, demonstra que a ddI tem uma
atividade indutora de mutações praticamente nula, ao passo que o AZT
apresenta indução de uma pequena freqüência de clones mutantes. Como
comprovado em outros estudos, a perda de heterozigose tem
demonstrado ser uma chave importante no desenvolvimento de eventos
causadores de diversos tipos de cânceres (esporádicos e/ou hereditários)
em humanos e está intimamente associada com eventos
recombinacionais. A análise dos resultados obtidos no presente estudo
sugere que estas drogas, devido ao seu alto potencial indutor de
recombinação homóloga, são agentes com grande capacidade de induzir
neoplasias como conseqüência do tratamento anti-retroviral.
13
ABSTRACT
The Human Immunodeficiency Virus (HIV) causes the Acquired Immune
Deficiency Syndrome (AIDS), has RNA genome and is unable to codify
enzymes for metabolization of nucleosides or nucleotides (nucleoside
kinases, nucleotide redutase, thymidilate syntetase) and then, depend
completly of the metabolic machinary of host cells for the DNA and RNA
synthesis. However, besides a series of structurals and regulatory protein,
the HIV codify severals essential enzymes for the protein cleavage
(proteases), DNA synthesis (reverse transcriptase - RT) and incorporation
of DNA viral into human genome (integrase). The absence of a RT analog
in human cell and the previous knowledge about this enzyme inhibitors,
used in treatment of retrovirus diseases in animals, make RT inhibition the
main target for the HIV infection treatment. Zidovudine (AZT) and
didanosine (ddI) are the most commonly drugs used for HIV treatment,
belonging to the nucleoside reverse transcriptase inhibitor (NRTIs) class.
These drugs shift or imitate the natural substrate during viral DNA
synthesis, interrupting the reverse transcription, acting as chain
terminator. This study had have as first focus the genotoxic diagnostic of
AZT and ddI, through the characterization, quantification and unit
exposition standardization of the drugs effects in the level of point
mutation, cromossomal mutation and/or mitotic recombination, using the
Somatic Mutation and Recombination Test in Drosophila melanogaster
(wing SMART). Comparison of standardized frequency of mutant clone
induced by these drugs shows that both exhibit a high genotoxic potential.
Indeed, ddI was 4,25-fold most genotoxic than AZT (0,38 clones in ddI for
0,08 clones in AZT) in trans-heterozygote individuals. On the other hand,
the analysis of standardized frequency of mutant clone in heterozygote
TM3 individuals, shows that ddI has a inductive activity of mutations
practically null, whereas AZT it presented induction of a small frequency of
14
mutant clones. As established in other studies, loss of heterozigosity
(LOH) have been demonstrated to be an important key in the
development of events which cause several kinds of human cancers
(sporadic and/or hereditary) and is close associated with recombinational
events. The analysis of results obtained in the present study suggests that
these drugs, which have high homologous recombination potential, are
able to induce neoplasy as a consequence of antiretroviral treatment.
15
1. INTRODUÇÃO
1.1. AIDS
A Síndrome da Imunodeficiência Adquirida (AIDS) é uma doença
degenerativa do sistema imune causada pelo vírus da imunodeficiência
humana (HIV), um lentivírus com genoma de RNA pertencente à família
Retroviridae (Peter & Gambertoglio, 1998). Esta síndrome é caracterizada
por diversos aspectos clínicos que incluem desde perda de peso e
degeneração do Sistema Nervoso Central até uma imunodepressão
profunda, com infecções oportunistas e alterações neoplásicas. O HIV já
contaminou mais de 47 milhões de pessoas em todo o planeta e causou a
morte de quase 14 milhões de adultos e crianças (Abbas, et al., 2003). No
Brasil, entre 1980 e 2004 foram registrados 362.364 novos casos da
doença (http://www.aidsinfo.nih_gov).
O HIV-1 foi simultaneamente isolado em 1983, pelos pesquisadores
Luc Montaigner, na França, como Vírus Associado a Linfadenopatia (LAV) e
Robert Gallo, nos EUA, como Vírus T-Linfotrópico Humano tipo III. Em
1986 foi identificado outro agente etiológico com características
semelhantes, também um retrovírus, que recebeu a denominação de HIV-
2, demonstrando menor virulência que o HIV-1. Recentemente, foram
descritos subtipos destes dois agentes (HIV-1 e HIV-2), em pacientes
infectados oriundos de diversas regiões geográficas do mundo. Os isolados
de HIV-1 são classificados em dois subgrupos: M (major) onde são
identificados nove subtipos (A, B, C, D, E, F, G, H e I) e o grupo O
(outlier) com apenas um subtipo (http://www.aidsinfo.nih_gov/drugs).
A sobrevida de partículas do vírus HIV no meio intracelular é de no
máximo um dia, ao passo que as partículas virais presentes nos fluidos
corpóreos em meio externo podem resistir de forma latente até 15 dias à
temperatura ambiente ou 11 dias a 37°C - se não forem destruídos por
agentes físicos e químicos tais como calor, hipoclorito de sódio e
glutaraldeído (http://www.aidsinfo.nih_gov/drugs).
16
O HIV apresenta maior afinidade pelas células do sistema imune
humano. A infecção por este vírus causa uma severa depleção das células
que expressam as proteínas CD4 e CD8 que incluem os linfócitos T,
macrófagos e monócitos levando a uma profunda imunossupressão (Peter
& Gambertoglio, 1998; Abbas et al., 2003). Através do método de reação
em cadeia da polimerase (PCR) foi revelado que o RNA do HIV pode ser
detectado no plasma em qualquer estágio da doença. Além disso, em
indivíduos assintomáticos, o tecido linfóide demonstrou ser o maior sítio
de replicação viral quando comparado com as concentrações virais
presentes no sangue periférico (Peter & Gambertoglio, 1998).
A estrutura genômica típica do vírus HIV-1 consiste de duas mono-
fitas idênticas de RNA, com aproximadamente 9,2 kb de comprimento,
que, supostamente, existe na forma de uma ribonucleoproteína contendo
as enzimas transcriptase reversa (RT), integrase, protease e a proteína p7
de ligação ao RNA (Peçanha et al., 2002) (Figura 1). Envolvendo o
genoma e suas enzimas associadas há um cerne ou capsídeo formado pela
proteína p24, que está contido em uma matriz protéica (proteína p17)
circundante. Finalmente, a parte mais externa do vírus é formada por um
envelope de membrana fosfolipídica (derivada das células do hospedeiro),
contendo proteínas de membrana (gp41 e gp120) - codificadas pelo
genoma viral - que se ligam às moléculas de CD4 da membrana do
hospedeiro (Peçanha et al., 2002; Abbas et al., 2003).
A infecção se inicia com a ligação das subunidades da proteína
gp120 às moléculas de CD4 e seus co-receptores de quimiocinas. Em
seguida há uma alteração conformacional da proteína gp41 que se insere
na membrana celular (fusão peptídica) e induz a fusão da membrana viral
com a membrana celular da célula hospedeira. Ocorre, então, a liberação
do genoma viral no citoplasma da célula. A partir deste momento são
ativadas as enzimas virais do complexo nucleoprotéico, iniciando-se assim
o ciclo replicativo do HIV. O genoma RNA do vírus é transcrito, pela RT
viral, formando o DNA viral de fita dupla que, juntamente com a integrase
17
Figura 1 - Estruturas do HIV.
18
Glicoproteína transmembrana (gp120)
Glicoproteina transmembrana (gp41)
Membrana viral
TransciptaseReversa
viral, penetra no núcleo da célula e, com o auxílio desta enzima, integra-
se ao genoma do hospedeiro (Abbas et al., 2003) (Figura 2).
O DNA do HIV integrado ao genoma do hospedeiro passa a ser
chamado de provírus. Este poderá permanecer inativo para transcrição
por meses ou anos, produzindo poucas ou nenhuma proteína viral ou
vírions, ficando na forma latente sem infectar outras células do indivíduo.
Estímulos fisiológicos - como as citocinas do sistema imune - podem
acelerar o processo de transcrição do gene viral, reativando o provírus,
que passa a produzir o mRNA viral que é exportado para o citoplasma.
A expressão dos genes virais pode ser dividida em dois estágios: um
inicial, no qual são produzidas proteínas reguladoras, que passam a
comandar a síntese de novos genomas virais e um estágio tardio, no qual
são expressas proteínas estruturais, que participam da construção da
estrutura externa de novos vírus que serão liberados pela célula
hospedeira. Sucede, neste processo, a construção do capsídeo viral, que
envolve o novo genoma transcrito do vírus e migra até a membrana
celular do hospedeiro, onde as proteínas virais gp120 e gp41 já estarão
inseridas - originando assim a partícula viral madura. O vírus pode, então,
infectar novas células ou permanecer no fluido extracelular (Abbas et al.,
2003). É importante salientar que o vírus HIV não codifica enzimas para
metabolização de nucleotídeos ou nucleosídeos (nucleosídeo quinases,
nucleotídeo redutase, timidilato sintetase) e, então, depende
completamente do maquinário metabólico das células hospedeiras para
sua síntese de DNA e RNA. Entretanto, além de uma série de proteínas
estruturais e regulatórias, o HIV ainda codifica muitas enzimas que são
essenciais para a clivagem de proteínas (proteases), para a síntese de
DNA (RT) e para a incorporação do produto do DNA viral no genoma
humano (integrase) (Balzarini, 2000).
Neste contexto, ocorre uma incoerência no organismo infectado pelo
HIV, na tentativa de reagir contra o agente agressor. O vírus ataca
seletivamente as células CD4 ativadas, utilizando o seu maquinário para
19
Figura 2 - Ciclo de vida do HIV na célula hospedeira
20
efetuar a sua replicação. Sob qualquer estímulo que desencadeie o
recrutamento de células de defesa para uma resposta imune aguda,
haverá uma proliferação destes linfócitos CD4, que estarão carreando o
pró-vírus em seu DNA. Conseqüentemente, o pró-vírus também estará se
multiplicando através das células de defesa do organismo infectado. Isto
acontece porque os aspectos pró-inflamatórios da infecção pelo HIV
podem resultar na ativação e proliferação das células T CD4, específicas
para outros antígenos, diferentes daqueles produzidos contra este vírus e
que podem estar infectadas com o HIV, embora em uma menor
freqüência. Assim, uma resposta imune contra o vírus da AIDS pode ter o
efeito paradoxal de intensificar a replicação viral e acelerar a progressão
da doença, ao passo que a perspectiva mais proeminente de seus
hospedeiros (os linfócitos T CD4) em uma ativação crônica intensa do
sistema imune é a depleção progressiva destas células, diretamente
envolvidas (Deeks & Walker, 2004).
A infecção pelo vírus HIV está intimamente associada com uma
elevação do risco de desenvolvimento de linfomas sistêmicos da doença
de Hodgkin e também de linfomas primários no sistema nervoso central
(Parekh et al., 2003). Além disto, alguns estudos demonstraram que, em
situações nas quais os indivíduos têm seu sistema imunológico muito
debilitado, aumentam até cem vezes os riscos de desenvolverem cânceres
associados a vírus. Em uma pesquisa realizada com dois grupos de
pacientes imunossuprimidos para avaliar a incidência do Sarcoma de
Kaposi – um grupo de pessoas infectadas pelo HIV e outro de pessoas que
receberam transplantes de órgãos e utilizavam drogas imunossupressivas
para evitar a rejeição – ficou demonstrado que o Sarcoma de Kaposi foi
quase quatro vezes mais freqüente em indivíduos infectados pelo HIV do
que em transplantados, tornando evidente que o HIV é um agente
potencialmente indutor deste tipo de neoplasia (Serraino et al., 2005). Um
outro agente causador de lesões escamosas intra-epiteliais, de alto e
baixo grau, precursoras de câncer cervical em mulheres, é o
papilomavírus (HPV). Mulheres infectadas pelo vírus HIV têm um grande
21
risco de desenvolver câncer cervical em conseqüência de infecções
secundárias pelo HPV. O mecanismo pelo qual a infecção pelo HIV eleva
os riscos de neoplasia cervical não é completamente conhecido. Uma
explicação plausível é que a imunossupressão induzida pelo HIV leva a
uma inabilidade em controlar a expressão do HPV e a produção de
oncoproteínas pelo HPV (Hawes et al., 2006).
1.2. Tratamento anti-retroviral
A ausência de uma enzima análoga a RT em células humanas e o
conhecimento prévio de inibidores desta enzima, utilizados no tratamento
de retroviroses animais, tornaram a inibição da RT o alvo terapêutico
óbvio para o tratamento da infecção por HIV (Peçanha et al., 2002). A
munição comumente usada na quimioterapia contra infecções pelo HIV
consiste de 5 classes de compostos já licenciados: (i) inibidores
nucleosídeos da transcriptase reversa (NRTIs), (ii) inibidores nucleotídeos
da transcriptase reversa (NtRTIs), (iii) inibidores não-nucleosídeos da
transcriptase reversa (NNRTIs), (iv) inibidores de protease e (v) inibidor
da entrada viral na célula (Peter e Gambertoglio, 1998; De Clercq, 2004).
O uso destes medicamentos em uma terapia anti-viral altamente ativa,
combinados em potentes coquetéis, desde o início dos anos 1990,
diminuiu sensivelmente a morbidade e mortalidade dos pacientes
infectados pelo HIV (Duan et al., 2001; Turner et al., 2004).
O AZT, um NRTI, sintetizado inicialmente como um agente anti-
tumor, e apresentando atividade anti-viral contra o vírus de leucemia em
murinos, demonstrou atividade inibitória contra o vírus HIV in vitro e foi o
primeiro fármaco a ser aprovado pela FDA (Food and Drug Administration)
no tratamento da AIDS e condições relacionadas a ela (Peter &
gambertoglio, 1998; Peçanha et al., 2002). Também denominado 3-azido-
3-desoxitimidina; 3-azidotimidina; azidodesoxitimidina; azidotimidina;
Retrovir; ZDV ou ZVD, possui fórmula química estrutural C10H13N5O4 e
22
peso molecular 267,2438, sendo a sua solubilidade em água de 1-5 g/mL
a 17°C (http://chemfinder.cambridgesoft.com) (Figura 3).
Esta droga é de rápida e quase completa absorção no trato
gastrointestinal, entretanto, a biodisponibilidade sistêmica do AZT, em
formulações do tipo cápsula ou solução, é de aproximadamente 65%
(variando entre 52 a 75%). A biodisponibilidade em neonatos de até
quatorze dias de vida é de aproximadamente 89%, e em neonatos com
mais de quatorze dias de idade, ela decresce para aproximadamente 61%.
A administração em um meio altamente gorduroso pode diminuir as taxas
de absorção. Sua distribuição ultrapassa a barreira hematoencefálica
atingindo, no fluido cerebrospinal, médias aproximadas de 24% da
concentração plasmática em crianças. Também apresenta concentrações
no sêmen de pacientes infectados pelo HIV. Há casos reportados da
presença de AZT no tecido do Sistema Nervoso Central de fetos humanos
demonstrando que a droga também ultrapassa a barreira placentária
(Farmacopéia USP-DI/98).
Após sofrer metabolização no fígado, o AZT é primariamente
eliminado na forma do metabólito inativo 3'-azido-3'-desoxi-5'-O-β-D-
glicopiranosiltimidina (GAZT), com 60 a 80% da dose administrada sendo
detectada na urina como este composto. A excreção desta droga ocorre
por via renal e a meia-vida é de aproximadamente uma hora no plasma
sangüíneo, em humanos e em várias espécies animais, ao passo que a
meia vida intracelular na forma fosforilada é de aproximadamente 3,3
horas (Cretton et al., 1991).
Outro NRTI, a ddI, também denominada didanosina,
2’,3’-didesoxiinosina; didesoxiinosina; CCRIS 805; ddIno ou Videx,
aprovada pela FDA em 1991, possui fórmula química estrutural C10H12N4O3
e peso molecular 236,2298, sendo a sua solubilidade em água de 1-5
g/100mL a 21°C (http://chemfinder.cambridgesoft.com, Styrt et al.,
1996) (Figura 4).
23
A ddI é muito lábil em meio ácido. Portanto, todas as suas
formulações contêm agentes tamponantes para aumentar o pH do trato
gástrico, o que permite que sejam administradas com estômago vazio.
24
A B
Figura 3 - Estruturas químicas da timidina (A) e da zidovudina (B).
A B
Figura 4 – Estruturas químicas da inosina (A) e da didanosina (B).
25
Quando ingerida até cinco minutos após as refeições, os níveis de
concentração plasmática caem até 50%. Caso a ddI não seja tamponada
no estômago, ela se transforma em 2,3-didesoxirribose e hipoxantina, um
precursor do ácido úrico. A biodisponibilidade da ddI é extremamente
variável em adultos e crianças. Em adultos, após a ingestão de uma
formulação liofilizada do produto em uma dose simples, seus valores
chegam a 33%. Já em crianças (de 7 meses a 19 anos de idade) que
recebem a administração de uma formulação similar, em uma solução oral
para uso pediátrico, a biodisponibilidade sistêmica aumenta para 19 a
42% (Farmacopéia USP-DI/98).
A ddI ultrapassa a barreira hemato-encefálica e se distribui no fluido
cerebrospinal. É metabolizada intracelularmente e tem meia-vida de
aproximadamente uma hora e meia, no plasma sangüíneo e, na forma
aminada e fosforilada de ddATP, varia de oito a vinte e quatro horas
dentro das células. Sua eliminação ocorre pelo sistema renal, via filtração
glomerular e secreção tubular ativa (Farmacopéia USP-DI/98).
O AZT foi muito utilizado como monoterapia contra a infecção pelo
HIV. Entretanto, foi demonstrada que a combinação do AZT com outros
compostos levou a uma maior sustentação da supressão viral. O uso
associado do AZT com outros dois NRTIs, como, por exemplo, o coquetel
triplo que associa o AZT com a ddI e zalcitabina (ddC), apresentou uma
redução permanente da viremia no plasma, com aumento da contagem de
CD4, indicando ser clinicamente benéfico (Peter & Gambertoglio, 1998).
O AZT e a ddI são análogos de base que pertencem à categoria dos
medicamentos anti-virais sistêmicos (Farmacopéia USP-DI/98) e atuam
como antimetabólitos causando a inibição de rotas bioquímicas
relacionadas com a síntese da cadeia de DNA viral. O mecanismo de ação
do AZT e da ddI é semelhante ao dos demais análogos de base. Estas
drogas substituem ou imitam bases nitrogenadas que compõem o genoma
viral. Durante a atividade da RT, elas atuam como inibidores enzimáticos
competitivos, ligando-se ao domínio palma, localizado no sítio ativo da RT,
fazendo uma inibição alostérica da enzima, impedindo sua ação no
26
elongamento da cadeia de DNA do HIV, funcionando como terminadores
da cadeia (Peçanha et al., 2002; De Clercq, 2004).
A atividade dos análogos de nucleosídeos somente se inicia após a
sua fosforilação - com conseqüente conversão em nucleotídeos - uma vez
que os metabólitos essencialmente ativos da maioria dos análogos
nucleosídeos são seus trifosfatos (Wutzler & Thust, 2001). Para que isto
aconteça faz-se necessária uma ativação citoplasmática da fosforilação do
nucleosídeo por uma enzima quinase. O AZT, um análogo estrutural da
timidina, atravessa a membrana celular através de transportadores de
nucleosídeos, sendo fosforilado pela timidina quinase intracelular em AZT-
monofosfato, que é convertido em AZT-difosfato pela timidilato quinase e
posteriormente convertido em AZT-trifosfato por outras enzimas celulares
(Farmacopéia USP-DI/98; Peter & Gambertoglio, 1998). O nucleotídeo
formado, AZT-trifosfato, irá competir, então, com o nucleotídeo
trifosfatado endógeno, timidina trifosfato, na atividade de transcrição
reversa do RNA viral (Hoggard & Back, 2002) (Figura 5).
A ddI, um análogo estrutural da inosina, é também fosforilada por
enzimas no citoplasma transformando-se em 2’,3’-didesoxiadenosina-
5’-trifosfato (ddATP). É sabido que a etapa inicial de fosforilação da ddI
em ddIMP é catalizada pela 5’-nucleotidase citosólica, seguida pela
aminação - via enzimas adenilsuccinato sintetase e adenilsuccinato liase -
em ddAMP. A ddAMP é fosforilada pela adenilato quinase, que utiliza ATP
como doador de grupos fosfatos, transformando-se em ddATP. Após a
remoção do grupo difosfato ocorre a incorporação da ddA 5’-monofosfato
à extremidade 3’ da cadeia de DNA viral, mediada pela RT (Farmacopéia
USP-DI/98; Peter & Gambertoglio,1998; De Clercq, 2004) (Figura 6).
1.3. AZT e ddI: indutores de lesão no DNA
O uso dos anti-retrovirais tem sido acompanhado pelo
desenvolvimento de resistência viral específica a estas drogas, o que leva
a uma nova fase de virulência e conseqüente falência clínica (Turner et
27
Figura 5 – Fosforilação intracelular do AZT.
28
al., 2004). O tratamento com estes coquetéis levou os pacientes a
coexistirem com baixos índices do vírus por anos, mas a sua utilização
vem sendo cerceada, por um lado, pelo desenvolvimento de resistência do
HIV a estas drogas e, por outro, pela alta toxicidade destes análogos
(Johnson et al., 2001). Existem também evidências de que estes análogos
atuem como substratos para a DNA polimerase mitocondrial humana (Pol
γ), resultando na inibição da replicação mitocondrial, o que pode gerar os
mesmos sintomas de doenças mitocondriais nos pacientes tratados com
os coquetéis de NRTIs – como, por exemplo, miopatias, neuropatias
periféricas, miocardiopatia hipertrófica, Diabetes mellitus, pancreatite,
acidose láctica e falência das células hepáticas, entre outras (Styrt et al.,
1996; Johnson et al., 2001; Dagan et al., 2002; Bienstock et al., 2004;
Gerschenson et al., 2005). Estudos histológicos e de microscopia
eletrônica em células musculares expostas ao AZT demonstraram
acúmulos anormais de mitocôndrias com inclusões paracristalinas no
espaço abaixo do sarcolema mostrando fibras vermelhas rotas que,
presentes no músculo esquelético, são diagnóstico de desordens genéticas
mitocondriais causadas por mutações pontuais, deleções e/ou
aneuploidias (Dagan et al., 2002). Complementado estes estudos, foram
observados sinais de disfunção mitocondrial em algumas crianças que
foram expostas aos agentes anti-retrovirais ainda no útero materno, as
quais desenvolveram encefalomiopatias neonatal, anemias,
hiperlactatemia, atrasos psicomotores e distúrbios visuais, em períodos
variando de uma semana a trinta meses de idade. Estes achados reforçam
os dados sobre as conseqüências das lesões no DNA mitocondrial nas
funções celulares (Poirier et al., 2003; Tovo et al., 2005).
Além disto, a análise de linfócitos CD4 e CD8, isolados do sangue
periférico de seis pessoas sadias e estimuladas com anticorpos anti-CD3 e
anti-CD28, na presença e na ausência de ddI, revelou que, na ausência da
droga, estas células realizaram mitose normalmente, sendo condizente
com uma auto-regulação dos mtDNA e com a produção de lactato
29
necessárias para que este processo aconteça. Por outro lado, a presença
da ddI causou uma depleção dos mtDNA nos linfócitos gerando
conseqüentes danos funcionais, inclusive nos eventos mitóticos destas
células (Setzer et al., 2005).
O AZT também demonstrou ser um potente indutor de
anormalidades estruturais dos cromossomos, em concentrações iguais ou
maiores que 3 µg.mL-1, em estudos citogenéticos utilizando cultura de
linfócitos humanos. Nestas mesmas culturas, a ddI, em altas
concentrações (≥ 5000 µg.mL-1), elevou a freqüência de células com
mutações cromossômicas (Farmacopéia USP-DI/98). Todavia, os ensaios
com Salmonella typhimurium – Teste de Ames - utilizando AZT e ddI,
demonstraram efeitos negativos para a indução de mutações pontuais.
Tais resultados podem estar vinculados à incapacidade destes organismos
em fosforilar e ativar suficientemente estas drogas – pela ausência de
enzimas específicas equivalentes às encontradas nas células de mamíferos
(Wutzler & Thust, 2001). A análise dos efeitos mutagênicos destas duas
drogas, em cultura de linfoblastos humanos, revelou um aumento
complementar da incorporação do AZT no DNA humano e também um
aumento da freqüência de indução de mutações gênicas e cromossômicas
quando as drogas foram utilizadas associadas em coquetéis, maiores que
nas exposições às drogas em monoterapias. Foram observados, como
sítios-alvo de mutagênese induzida, o gene hipoxantina-guanina
fosforibosiltransferase (HPRT) ligado ao cromossomo X e dois genes
autossômicos, timidina quinase (TK) e adenina fosforribosiltransferase
(APRT). Os níveis de incorporação do AZT e ddI, mensuradas por
radioimunoensaio, demonstraram aumentos nas taxas de incorporação de
AZT no DNA (Meng et al., 2000a; Meng et al., 2000b; Olivero et al.,
1999). Também nos ensaios para HPRT e TK foram observados efeitos
mutagênicos em culturas de células expostas ao AZT, ou doses
equimolares de AZT combinado com ddI, em exposições a concentrações
variando de 3 a 30 vezes os níveis máximos encontrados no plasma
humano (Meng et al., 2000b). Sussman et al., (1999) investigaram, em
30
linhagens de células linfoblásticas humanas TK6, a relação entre os níveis
de incorporação do AZT no DNA genômico e os efeitos citotóxicos
causados pela presença do AZT no DNA, através do delineamento da
freqüência de mutações no gene HPRT e o espectro de mutações do tipo
deleção, por meio de amplificação gênica. Os resultados obtidos
demonstraram que os níveis de incorporação do AZT no DNA genômico
têm relação direta com o tempo de exposição das células à droga e que o
aumento significante da freqüência de mutações no gene HPRT foi
proporcional aos níveis de incorporação deste análogo ao DNA. As análises
moleculares das colônias mutantes, obtidas nos teste HPRT, TK e APRT,
demonstraram que a maioria das mutações induzidas pelo AZT foi
acompanhada por grandes deleções ou perda de heterozigose,
relacionadas com o mecanismo de terminação de cadeia que os análogos
de base exercem. Concomitantemente, a ddI foi moderadamente positiva,
tanto na presença quanto na ausência de ativação metabólica em
concentrações ≥ 2000 µg.mL-1 (Farmacopéia USP-DI/98).
Desde 1987, o AZT vem sendo utilizado em tratamentos contra a
AIDS em adultos e crianças. Em estudos comparativos, uma triagem
controlada com placebos demonstrou que o tratamento com o AZT reduziu
dramaticamente as taxas de transmissão do HIV de mãe para filho -
transmissão vertical ou transplacentária - tornando esta droga a principal
arma na prevenção da transmissão vertical do HIV (Ayers et al., 1997).
Entretanto, em bioensaios realizados para avaliar o potencial
carcinogênico do AZT, em ratos e camundongos expostos por via
transplacentária, alguns autores detectaram, além da presença de
carcinomas de células escamosas, limitados à vagina, uma leve anemia
macrocítica em fêmeas que receberam de 20 a 40 mg/kg/dia de AZT por
24 meses, porém sem apresentar efeitos carcinogênicos transplacentários.
Por outro lado, outros autores demonstraram que o AZT foi incorporado
ao DNA em diversos tecidos e descobriram grande incidência de tumores
no fígado e pulmões dos filhotes de camundongos, que receberam a droga
por via transplacentária e tumores em pulmões e órgãos reprodutores das
31
fêmeas nascidas, após 1 ano de idade (Olivero et al., 1994; Ayers et al.,
1997). Também, em ratos, o potencial carcinogênico do AZT por via
transplacentária foi significante. Em filhotes de ratazanas F344 que
receberam doses de 480, 240 e 80 mg de AZT / kg / dia, nos últimos sete
dias de gestação, houve um aumento na incidência de gliomas (2 a 4%)
comparado ao controle negativo (0%) (Walker et al., 2004). Em análise
por Southem blot, em diversos órgãos fetais de macacos Erythrocebus
patas, foram detectados encurtamentos de telômeros, após a
administração de coquetéis de NRTIs em fêmeas grávidas (Olivero et al.,
1997; 2002). Uma vez que a mutagênese está comumente associada
com a indução de tumores por via transplacentária em modelos
experimentais, crianças também expostas por esta via a combinações de
NRTIs podem ter riscos de desenvolver câncer no decorrer de suas vidas
(Meng et al., 2000b; Mittelstaedt et al., 2004).
Estudos de carcinogenicidade demonstraram a ocorrência de
neoplasias em células escamosas vaginais de 60 fêmeas de camundongos
que receberam AZT em doses de 120 mg/kg/dia, reduzidas até 40
mg/kg/dia. Adicionalmente, ratos que receberam doses de 600 mg/kg/dia,
reduzidas até 450-300 mg/kg/dia, apresentaram carcinoma de células
escamosas. Os tumores ocorreram ao final do curto período de vida
destes animais. O potencial carcinogênico do AZT foi demonstrado em
ensaios de transformação in vitro de células de mamíferos, utilizando-se
concentrações ≥ 0,5 µg.mL-1 (Farmacopéia USP-DI/98, Ayers et al.,
1997).
Embora os estudos sobre a carcinogenicidade destes fármacos em
humanos ainda não tenham apresentado evidências conclusivas, muitos
autores os consideram carcinógenos, baseados no seu modo de ação –
através da interferência no metabolismo de ácidos nucléicos e nas
evidências em organismos experimentais. Como a incorporação e o
subseqüente processamento dos análogos de base no DNA das células
alvo é, presumivelmente, uma pré-condição da atividade genotóxica
destes agentes, a extensão das lesões depende dos modelos
32
experimentais (por exemplo, o tipo de células utilizadas), da sua atividade
proliferativa, da duração da exposição e dos períodos pós-exposição
(Wutzler & Thust, 2001).
1.4. Recombinação somática e análise tóxico-genética
A princípio, a análise dos danos genéticos - decorrentes da
exposição dos organismos vivos aos agentes genotóxicos - concentrou-se
na indução de mutações gênicas e mutações cromossômicas – visto que
tais alterações genéticas eram consideradas como causas primárias de
doenças hereditárias. Portanto, a grande maioria dos ensaios
desenvolvidos para avaliar a toxicidade genética se restringia à avaliação
de parâmetros mutacionais em células germinais. Posteriormente,
verificou-se que, eventos mutacionais em tecidos somáticos poderiam
levar ao desenvolvimento de doenças somáticas que incluem câncer ou
anomalias neurológicas.
Mais recentemente, a recombinação tem sido considerada um
importante parâmetro de avaliação tóxico-genético uma vez que se
estabeleceu uma alta correlação entre estas lesões e o desenvolvimento
do processo carcinogênico. Além disso, eventos recombinacionais
poderiam explicar a existência de carcinógenos destituídos de atividade
mutagênica, seja ela gênica ou cromossômica (Richard, 1994; Stark &
Jasin, 2003). Na procura de respostas para tal comportamento, foram
desenvolvidos sistemas-teste voltados para a detecção de um novo
parâmetro genético - a recombinação mitótica - que poderia estar
envolvida na promoção do câncer mediada por tais agentes (Andrade &
Lehmann, 2003).
Estudos sobre os eventos genéticos envolvidos na formação de
tumores sugerem que um importante fator responsável pelo
desenvolvimento destas malignidades é a perda da heterozigose (Langlois
et al., 1989). Uma vez que conversão gênica e, em particular,
recombinação mitótica são potentes mecanismos que geram a perda da
33
heterozigose, infere-se que estes fenômenos são importantes tanto para
promoção de tumores, em células portadoras de heterozigose herdada,
como para células que adquiriram a heterozigose através de alterações
gênicas causadas por agentes químicos ou vírus tumorais (Guzmán-Rincón
& Graf, 1995). Existem também várias patologias que estão associadas ao
desenvolvimento de desordens genéticas associadas a neoplasias. A
Síndrome de Bloom, é uma rara desordem do crescimento, com
característica genética autossômica recessiva, que aumenta grandemente
as chances dos indivíduos acometidos de desenvolver câncer. Uma
característica constante da Síndrome de Bloom é um arranjo diferente das
anormalidades citológicas em uma variedade de tipos celulares, que
incluem alta freqüência espontânea de quebras e rearranjos
cromossômicos, trocas entre cromátides irmãs, células micronucleadas, e
células com mutações em locus específicos. Um complexo de
anormalidades citogenéticas, demonstradas facilmente em células in vitro
na Síndrome de Bloom, levanta a possibilidade de que mutações pontuais,
rearranjos cromossômicos e recombinações somáticas são também
substancialmente aumentadas in vivo na Síndrome de Bloom e isto
poderia explicar o extremo risco de desenvolvimento de câncer (Langlois
et al., 1989). Sendo assim, torna-se importante o desenvolvimento de
testes que façam a detecção simultânea dos eventos mutacionais clássicos
e rearranjos relacionados com recombinação mitótica.
1.5. Drosophila melanogaster na genética toxicológica
Durante este último século, a mosca-da-fruta foi o instrumento de
trabalho para estudos genéticos em eucariontes. Estes estudos fornecem
a base para a maior parte da nossa compreensão conceitual dos aspectos
fundamentais da genética dos eucariontes, incluindo a base cromossômica
da hereditariedade (Rubin & Lewis, 2000). Atualmente a Drosophila possui
uma variedade de linhagens, que apresentam diversos marcadores
moleculares e outras propriedades que facilitam as manipulações
34
genéticas. A clonagem molecular e a análise funcional dos genes da
Drosophila tornaram possível reunir um perfil molecular de muitos
processos celulares e de desenvolvimento. Genes clonados em Drosophila
levaram à identificação de cognatos em mamíferos que apresentam
funções intimamente relacionadas. Isto inclui fatores de transcrição e seus
reguladores, proteínas estruturais, proteínas cromossomais, canais iônicos
e proteínas sinalizadoras. Os genes homeobox são alguns dos exemplos
da conservação genética entre moscas e outros animais. Mais
recentemente, tem sido demonstrada uma alta correlação entre os
caminhos que controlam o desenvolvimento dos membros, sistema
nervoso, olhos, sistema circulatório, bem como um complexo de
interações sistêmicas - como o ritmo circadiano e imunidade inata. A
conservação dos processos biológicos entre moscas e mamíferos aumenta
a importância das pesquisas utilizando a Drosophila como organismo
experimental para elucidação de problemas relacionados com a saúde
humana, destacando-se os caminhos envolvidos no ciclo celular e na
biologia do câncer (Kornberg & Krasmow, 2000).
O aparato bem desenvolvido de sistemas utilizados para análise
genotóxica em Drosophila melanogaster tem sido amplamente utilizado
para testar também a antigenotoxicidade de vários compostos e misturas
complexas (Graf et al., 1984; 1998). Nos últimos anos, o teste para
detecção de mutação e recombinação em células somáticas de Drosophila
melanogaster (SMART) tem sido o mais empregado neste sentido. Este
teste é baseado no princípio de que a perda da heterozigose de
marcadores recessivos apropriados pode levar à formação de clones de
células mutantes, que são, então, expressas como manchas de células
mutantes nas asas das moscas adultas (Graf et al., 1984). O teste SMART
fornece um grande espectro de informações sobre a detecção de
mutações gênicas, mutações cromossômicas e/ou recombinações
genéticas, ocasionadas por genotoxinas de ação direta ou que necessitem
ser metabolizadas. Neste contexto, a vantagem de se trabalhar com a
Drosophila melanogaster torna-se ainda maior devido à semelhança da
35
atividade das suas enzimas de metabolização com as enzimas de fígado
de mamíferos (citocromo P-450) (Ramel & Magnusson, 1992). Outras
vantagens estão na presença de uma série de genes marcadores, nestes
insetos, que permitem a criação de testes específicos para a detecção e
triagem de atividade genotóxica em células germinais e somáticas e, por
fim, na possibilidade de se detectar, simultaneamente, em ensaios
genotóxicos como o teste SMART, alterações de mutações clássicas assim
como eventos relacionados com recombinação mitótica. Uma conveniência
apreciável da aplicação do teste SMART é a possibilidade de se qualificar
as atividades genotóxicas de muitas substâncias, confirmando efeitos de
natureza exclusivamente recombinogênica, enquanto outros testes
apresentam negatividade quando investigados efeitos mutagênicos e/ou
clastogênicos (Campesato et al., 1997).
36
2. OBJETIVOS
Visando contribuir para uma maior elucidação sobre a indução de
eventos mutagênicos e recombinogênicos induzidos pelos análogos de
base AZT e ddI, são propostos os seguintes objetivos:
1. Caracterização qualitativa da ação mutagênica e/ou recombinogênica
das drogas em estudo empregando o cruzamento padrão do teste SMART
de asa - que permite basicamente o diagnóstico de agentes genotóxicos
de ação direta;
2. Avaliação quantitativa dos diferentes tipos de eventos genotóxicos
induzidos pelos agentes antiretrovirais - estimando a sua contribuição
para a genotoxicidade total - através da comparação dos resultados
obtidos em dois diferentes genótipos, que permitem acompanhar
alterações genéticas específicas:
- genótipo trans-heterozigoto - que evidencia a ocorrência de
eventos mutagênicos e/ou recombinogênicos;
- genótipo heterozigoto para o cromossomo balanceador TM3 -
que expressa, exclusivamente, lesões do tipo mutação gênica e
mutação cromossômica.
37
3. MATERIAL E MÉTODO
3.1. Agente anti-retroviral
Foram utilizados neste trabalho a zidovudina (AZT, PM 267,2438) e
a didanosina (ddI, PM 236,2) adquiridas da Indústria Química de Goiás
(IQUEGO).
As soluções foram preparadas à hora dos tratamentos. O AZT foi
diluído em água destilada, em aproximadamente 40°C, nas concentrações
previamente calculadas de 6,25, 12,5, 25 e 50 mg.mL-1. A ddI foi diluída
em 5% tween 80 + 5% etanol absoluto, para a obtenção das
concentrações de 0,9375, 1,875, 3,75 e 7,5 mg.mL-1. Os respectivos
solventes foram utilizados como controles negativos.
3.2. Meios de cultura e condições de cultivo
Os estoques de Drosophila melanogaster foram mantidos em frascos
de vidro de 300mL contendo o meio de cultura padrão feito com 1000mL
de água destilada, 70g de açúcar cristal, 50g de fermento biológico
(Fleischmann e Royal Ltda), 7g de ágar, 0,005g de nipagin e 100g de
farinha de milho (Graf comunicação pessoal, modificado). Este meio de
cultura também foi utilizado para os cruzamentos.
Utilizamos também um meio de ovoposição, para obtenção de larvas
de terceiro estágio, contendo uma base sólida de ágar-ágar a 2,5% com
aproximadamente 1cm de espessura, coberta por uma camada de
aproximadamente 3cm de fermento pastoso (Fleischmann e Royal Ltda) -
previamente aquecido em banho-maria e fermentado com sacarose na
seguinte proporção: 500g de fermento, 2 colheres de açúcar e 20mL de
água destilada.
Os tratamentos das larvas foram feitos em tubos plásticos
descartáveis contendo 0,9g de meio de cultura instantâneo e hidratado
com 3mL de solução-teste.
38
Todas as culturas de Drosophila melanogaster foram mantidas a
25°C ± 1°C e a umidade de 60-70%.
3.3. Teste SMART
O teste SMART DE ASA avalia os pêlos das asas dos indivíduos
adultos, fundamentando-se no fato de que estas estruturas são originadas
durante o desenvolvimento embrionário, em um grupo de células (discos
imaginais das asas) que se proliferam por mitose até se diferenciarem
formando as asas durante a metamorfose. Se ocorrer alguma alteração
genética durante as divisões celulares, isto resultará em clones de células
mutantes que se expressarão como manchas de pêlos mutantes na
superfície das asas dos adultos (Graf et al., 1984; Andrade et al., 2003).
3.4. Linhagens de Drosophila melanogaster
Foram utilizadas, neste trabalho, duas linhagens de Drosophila
melanogaster. Cada linhagem possui genes marcadores específicos
localizados no braço esquerdo do cromossomo 3, que se expressam
fenotipicamente na forma dos pêlos das asas. Suas constituições
genotípicas encontram-se representadas abaixo:
• flr3 - flr3 / In(3LR)TM3,rippsepI(3)89Aabx34eeBds
• mwh - mwh/mwh
O cromossomo balanceador TM3, presente na linhagem flr3 é
indispensável para a manutenção do gene marcador flr3 em heterozigose,
pois este gene é letal zigótico (Garcia-Bellido & Dapena, 1974).
3.5. Cruzamento e tipos de larvas
Foi utilizado o cruzamento padrão no qual fêmeas virgens flr3
cruzaram com machos mwh. Este cruzamento origina larvas com duas
constituições genotípicas:
39
- larvas mwh + / + flr3 - trans-heterozigotas para os marcadores
recessivos mwh e flr3, ligados ao braço esquerdo do cromossomo 3;
- larvas mwh + / TM3, BdS - heterozigotas para o cromossomo
balanceador TM3. As asas destes indivíduos adultos tem um padrão
recortado, devido à presença do marcador BdS, o que permite diferenciá-
los dos imagos trans-heterozigotos que apresentam asas com formato
normal.
3.6. Tratamentos
Foram cruzados 80 fêmeas e 40 machos em vidros contendo meio
de cultura de farinha por um período de 3 dias. Ao término deste tempo
os casais foram transferidos para vidros contendo meio de ovoposição por
um período de 8 horas. Após este período, os casais foram descartados,
ficando apenas as larvas nos vidros, por 72 ± 4 horas a partir do início da
ovoposição. Estas larvas foram coletadas por flotação em água corrente,
quando atingiram o terceiro estágio e colocadas em tubinhos plásticos
descartáveis contendo meio de cultura sintético (0,9g) hidratado com as
soluções de tratamento (3mL). As larvas ficaram expostas aos
tratamentos, com diferentes concentrações da drogas, por
aproximadamente 48 horas (tratamento crônico), sendo que, neste
período, as células dos discos imaginais passaram por sucessivos ciclos de
divisão mitótica (5 a 6 divisões), sob a ação dos fármacos, até atingirem o
estágio de pupa.
Os indivíduos adultos nascidos de 10 a 12 dias após a postura dos
ovos foram conservados em etanol 70%.
3.7. Montagem das lâminas
As moscas estocadas em etanol 70% foram lavadas em água
corrente. Em seguida as asas dos imagos foram separadas do corpo com
auxílio de duas pinças de relojoeiro (n.5) e mergulhadas em solução de
40
FAURE (preparada com 30g de goma arábica, 20mL de glicerol, 50g de
hidrato cloral e 50mL de água). Após este procedimento as asas foram
retiradas da solução e distendidas sobre a superfície de lâminas de vidro
onde foram mantidas por um período de 24 horas (acondicionadas em
placas de Petri) para secagem. Posteriormente, foram cobertas com
lamínulas (24 x 32 mm), contendo uma gota da solução de FAURE,
permanecendo por mais 24 horas pressionadas com cubos de metal – com
peso total de aproximadamente 400g – visando uma perfeita aderência
das asas às lâminas. Foram montadas lâminas com imagos trans-
heterozigotos ou com imagos heterozigotos para o cromossomo TM3
separadamente, sendo que ambas continham cinco pares de asas de
fêmeas e cinco pares de asas de machos.
3.8. Análise microscópica
Foram analisados os adultos trans-heterozigotos e heterozigotos
para o cromossomo TM3, considerando-se o fenótipo dos tricomas
presentes nas superfícies dorsal e ventral das asas.
A presença de manchas simples, com um único tipo de fenótipo
mutante flr3 (pêlos de base alargada) ou mwh (pêlos múltiplos), pôde
determinar a ocorrência de diferentes eventos genéticos tais como
mutação pontual, alterações cromossômicas ou recombinação mitótica.
Por outro lado, manchas gêmeas contendo ambos fenótipos
mutantes, mwh e flr3 simultaneamente, formadas por células adjacentes,
expressaram exclusivamente eventos relacionados com recombinação.
Foram analisados os tricomas dos adultos trans-heterozigotos e dos
heterozigotos para o cromossomo TM3 presentes nas regiões ventral e
dorsal e nos compartimentos distais das asas - 5 indivíduos de cada sexo
por lâmina, em microscópio óptico com aumento de 400 vezes – para
serem determinadas as seções e o número de células mutadas (Garcia -
Bellido et al., 1976).
41
3.9. Bases genéticas
3.9.1. Adultos trans-heterozigotos
Observando-se a manifestação fenotípica da forma dos pêlos
presentes nas asas dos adultos trans-heterozigotos, podem-se
caracterizar os eventos ocorridos conforme o tipo de mancha mutante
encontrada. Sendo assim, manchas simples com fenótipo pêlos
múltiplos (mwh) ou pêlos com a base alargada (flr3) podem originar-se
por mutação gênica, mutação cromossômica e/ou recombinação mitótica.
As manchas simples com o fenótipo mwh podem ocorrer em
conseqüência de recombinação simples entre os loci mwh e flr3, ao passo
que a ocorrência de duas recombinações simples (entre flr3 e o
centrômero seguida de flr3 e mwh) origina pêlos de base alargada.
Desta forma, as manchas simples podem ser produto tanto de
eventos mutacionais - incluindo as mutações pontuais e mutações
cromossômicas - como também por recombinação mitótica. Já as
manchas gêmeas, cuja manifestação fenotípica expressa
simultaneamente os marcadores flr3 e mwh, são produzidas
exclusivamente por eventos de recombinação simples entre flr3 e o
centrômero, com posterior segregação de um cromossomo recombinado e
um parental.
3.9.2. Adultos heterozigotos para o cromossomo balanceador TM3
A análise das asas de indivíduos adultos heterozigotos para o
cromossomo TM3 revela exclusivamente manchas simples que expressam
o fenótipo pêlos múltiplos. Além disso, o cromossomo TM3 possui uma
série de inversões em aproximadamente 90% de toda a sua extensão,
causando inviabilidade das células que sofrem recombinação mitótica.
Conseqüentemente, células mutantes observadas nestes indivíduos são
42
resultantes de eventos relacionados com mutação gênica e/ou mutações
cromossômicas.
Portanto, a comparação dos resultados obtidos nos dois genótipos,
permite quantificar, separadamente, a porcentagem de eventos
mutagênicos e recombinogênicos no total de eventos genotóxicos
ocorridos.
3.10. Análise estatística
Em experimentos realizados para avaliação genotóxica de um
determinado fármaco, as séries tratadas são comparadas com uma série
controle, que geralmente é o solvente. A partir desta análise pode-se
calcular o potencial genotóxico do fármaco (Andrade et al., 2003). Frei &
Würgler (1988) propuseram duas hipóteses estatísticas que, quando
combinadas, permitem distinguir entre as possibilidades de um resultado
positivo, fraco positivo, inconclusivo ou negativo. Na hipótese nula (H0),
assume-se que não existe diferença na freqüência de mutações entre as
séries tratadas e o controle negativo (freqüência espontânea).
Considerando uma análise unicaudal, a rejeição da hipótese nula indica
que o tratamento resultou em uma freqüência de mutações
estatisticamente maior que o controle negativo. A hipótese alternativa
(HA) postula a priori que o tratamento resultou em uma freqüência de
mutações m vezes maior quando comparado com a freqüência
espontânea. O fator multiplicador (m) foi estabelecido empiricamente
como m=2 para o total de manchas e para as manchas simples pequenas,
devido a sua maior freqüência espontânea, e m=5 para as manchas
simples grandes e também para as manchas gêmeas (Frei & Würgler,
1988; 1995). A rejeição de HA indica que o tratamento não produz um
aumento suficiente de manchas para o composto ser considerado
genotóxico.
43
Para cada hipótese testada existem duas respostas possíveis: (i)
aceita-se H ou (ii) rejeita-se H. A combinação entre as respostas obtidas
para as duas hipóteses testadas pode ser visualizada no Quadro 1.
Quadro 1- Resultados possíveis obtidos a partir da combinação das
hipóteses Ho e HA.
HIPÓTESES Aceita-se H0 Rejeita-se H0
Aceita-se HA inconclusivo PositivoRejeita-se HA Negativo fraco positivo
Para testar as duas hipóteses foi utilizado o teste de χ2 para
proporções com um nível de significância igual a 5% (Andrade et al.,
2003).
44
4. RESULTADO
4.1. Efeito citotóxico e toxicidade genética
As concentrações das soluções de AZT, empregadas nos experimentos,
foram obtidas a partir de um experimento piloto onde foi determinada a
solubilidade máxima de AZT em água a aproximadamente 40°C. A partir
desta concentração máxima (50 mg.mL-1) foram estabelecidas as demais
concentrações seguindo o fator divisor 2 até a menor dose (6,25 mg.
mL-1). O mesmo critério foi adotado para a obtenção das concentrações da
ddI utilizadas nos experimentos. Entretanto, estas concentrações (0,9375
a 7,5 mg.mL-1) só foram obtidas utilizando-se como solvente 5% etanol +
5% tween 80.
Após estabelecidas as diluições dos fármacos, foi realizado um teste
de sobrevivência onde larvas de terceiro estágio foram expostas às
diferentes doses de AZT e ddI. Em todas as concentrações dos fármacos,
o número de indivíduos sobreviventes foi acima de 95% para o AZT e
acima de 70% para a ddI (resultados não apresentados).
Os resultados obtidos nos experimentos e sua avaliação estatística
estão apresentados na Tabela 1. Nos testes com o AZT foram analisados
um total de 350 imagos trans-heterozigotos e 350 indivíduos
heterozigotos para o marcador TM3, derivados de três experimentos
independentes. Paralelamente, nos três experimentos realizados com a
ddI, foram analisadas 297 indivíduos trans-heterozigotos e 248 imagos
heterozigotos para o cromossomo TM3. Em ambos foram incluídos os
respectivos controles negativos.
Os dados obtidos foram avaliados considerando-se os valores
individuais de cada um dos três diferentes tipos de manchas (manchas
simples pequena, manchas simples grande e manchas gêmeas), assim
como o número total de manchas observadas em cada uma das 4 doses
de AZT e ddI. Como podem ser observadas na Tabela 1, as freqüências de
45
aDiagnóstico estatístico de acordo com Frei e Würgler (1988): +, positivo; -, negativo; i, inconclusivo. m, fator de multiplicação para a avaliação de resultados significativamente negativos. Níveis de significância 0,05. bIncluindo manchas simples flr3 raras. cConsiderando os clones mwh para as manchas simples mwh e para as manchas gêmeas. dNúmeros entre chaves são as freqüências de indução corrigidas em relação a incidência espontânea estimada do controle negativo.eC = 48.000, isto é, número aproximado de células examinadas por indivíduo. fCalculado de acordo com Frei et al. (1992). gApenas manchas simples mwh podem ser observadas nos indivíduos heterozigotos mwh/TM3, já que o cromossomo balanceador TM3 não contém o gene mutante flr3.
TABELA 1Avaliação dos efeitos mutagênico e/ou recombinogênico do AZT e ddI em células somáticas de larvas de terceiro estágio provenientes de cruzamento padrão.Genótipos
e Conc.
(mg.mL-1)
N. deIndiv.
(N)
Manchas por indivíduo (nº de manchas) diag. estatísticoa
MSP MSG MG TM (1-2 céls.)b (>2 céls.)b
m = 2 m = 5 m = 5 m = 2
Totalmanchas
mwhc
(n)
Média dasclasses de tam.Clones mwhc,d
(î)
Freqüência de indução de manchas (por 105 células por
divisão celular)f
(n/NC)AZTmwh/flr3
Neg. contr. 70 0,30 (21) 0,11 (08) 0,04 (03) 0,46 (32) 31 2,29 0,916,25 70 0,97 (68) + 0,43 (30) + 0,20 (14) + 1,60 (112) + 111 2,44 {2,50} 3,25 {2,34}12,5 70 0,54 (38) + 0,30 (21) + 0,24 (17) + 1,09 (76) + 76 2,72 {3,02} 2,22 {1,32}25 70 0,64 (45) + 0,43 (30) + 0,17 (12) + 1,24 (87) + 87 2,57 {2,73} 2,55 {1,64}50 70 0,81 (57) + 0,49 (34) + 0,09 (06) i 1,39 (97) + 95 2,37 {2,41} 2,78 {1,87}
mwh/TM3Neg. contr. 70 0,20 (14) 0,04 (03)
6,25 70 0,20 (14) i 0,01 (01) i12,5 70 0,37 (26) + 0,06 (04) i25 70 0,24 (17) i 0,06 (04) i50 70 0,40 (28) + 0,14 (10) +
g0,24 (17) 17 1,59 0,50
0,21 (15) - 15 1,47 {2,50} 0,44 -{0,06}0,43 (30) + 30 1,70 {1,85} 0,88 {0,38}0,30 (21) i 21 1,95 {3,50} 0,61 {0,12}0,54 (38) + 38 1,84 {2,05} 1,11 {0,61}
ddImwh/flr3
Cont. neg. 60 0,43 (26) 0,08 (05) 0,02 (01) 0,53 (32) 32 1,88 1,090,9375 60 0,60(36) i 0,18 (11) i 0,00 (00) i 0,78 (47) i 47 2,02 {2,33} 1,61 {0,51}1,875 60 0,83 (50) + 0,18 (11) i 0,10 (06) i 1,12 (67) + 66 2,03 {2,18} 2,25 {1,16}3,75 60 0,63 (38) i 0,38 (23) + 0,12 (07) + 1,13 (68) + 68 2,47 {3,00} 2,32 {1,23}7,5 57 1,05 (60) + 0,23 (13) + 0,14 (08) + 1,42 (81) + 81 2,05 {2,15} 2,91 {1,82}
mwh/TM3Cont. neg. 50 0,34 (17) 0,02 (01)
0,9375 50 0,14(07) - 0,06 (03) i1,875 50 0,16 (08) - 0,02 (01) i3,75 50 0,18 (09) - 0,08 (04) i7,5 48 0,31 (15) - 0,02 (01) i
g 0,36 (18) 18 1,61 0,740,20 (10) - 10 1,90 {1,25} 0,41 -{0,33}0,18 (09) - 09 1,67 {1,56} 0,37 -{0,37}0,26 (13) - 13 2,08 {0,40} 0,53 -{0,20}0,33 (16) - 16 1,63 {1,44} 0,68 -{0,05}
manchas espontâneas alcançaram valores que são compatíveis com os
resultados apresentados na literatura (Graf et al., 1984).
4.2. Indivíduos trans-heterozigotos
A análise estatística dos resultados obtidos para os imagos trans-
heterozigotos nos experimentos com o AZT (Tabela 1) demonstrou que,
em todas as doses aplicadas, esta droga induziu aumentos significantes
nas freqüências de manchas simples pequenas, quando comparado às
freqüências espontâneas apresentadas no controle negativo, o mesmo
acontecendo com relação à indução de manchas simples grandes.
Entretanto, um único resultado inconclusivo foi observado na freqüência
de manchas gêmeas na maior dose aplicada.
Os resultados da análise estatística dos experimentos com a ddI
(Tabela 1) demonstraram aumento das freqüências de manchas simples e
gêmeas, quando comparadas com as freqüências obtidas no controle
negativo. Entretanto, os resultados obtidos no total de manchas
mostraram diagnóstico positivo dose-resposta para todas as
concentrações.
Considerando os resultados positivos no total de manchas
analisadas nos tratamentos com AZT e ddI podemos inferir que ambos
fármacos são capazes de induzir toxicidade genética relacionadas com
mutações e/ou eventos recombinacionais.
4.3. Indivíduos heterozigotos para o cromossomo TM3
A análise dos indivíduos heterozigotos para o cromossomo TM3
demonstrou que a freqüência total de manchas induzidas pelo AZT não
mantém uma relação dose-dependente. Porém, as três maiores
concentrações apresentam valores acima das freqüências do controle
negativo. Estes resultados foram aproximadamente 2,5 a 7,6 vezes
menores quando comparados com o total de manchas induzidas nos
indivíduos trans-heterozigotos. Infere-se, portanto, que o AZT pode
induzir eventos mutacionais, uma vez que a presença de manchas com
pêlos mutantes, em imagos heterozigotos para o cromossomo TM3, está
relacionada apenas com este tipo de evento.
Por outro lado, a análise dos efeitos mutacionais induzidos pela ddI
nas asas dos imagos heterozigotos para o cromossomo TM3 demonstrou
freqüências de indução de manchas menores ou próximas aos valores
encontrados no controle negativo. Estes resultados caracterizam a
ausência de um possível efeito indutor de mutações causado pela ddI.
4.4. Toxicidade genética padronizada por unidade de exposição
A Tabela 2 apresenta uma visão comparativa da atividade
genotóxica induzida pelos anti-retrovirais AZT e ddI. A análise dos
resultados obtidos com os indivíduos trans-heterozigotos permite observar
a indução de todos os tipos de eventos (mutacionais e recombinogênicos)
causados por estas drogas. A freqüência padronizada dos clones mwh, em
áreas de 105 células, demonstra a ação genotóxica total induzida por
mg.mL-1 dos fármacos, nos indivíduos trans-heterozigotos. Comparando-
se as freqüências padronizadas do AZT e ddI apresentadas na Tabela 2,
pode-se visualizar que a ddI tem um potencial genotóxico 4,25 vezes
maior que o AZT (0,34 clones na ddI para 0,08 clones induzidos no AZT).
Por outro lado, a análise das freqüências padronizadas de clones
mutantes induzida pelas drogas, nos indivíduos heterozigotos para o
cromossomo TM3, demonstra que a ddI tem uma atividade indutora de
mutações praticamente nula, ao passo que o AZT apresenta indução de
uma pequena freqüência de clones mutantes.
Quando se compara as freqüências padronizadas obtidas nos
indivíduos trans-heterozigotos e heterozigotos para o cromossomo TM3
pode-se obter a contribuição de eventos recombinogênicos, considerando
a genotoxicidade total induzida pelos anti-retrovirais. Os valores de
porcentagem de recombinação apresentados na Tabela 2 permitem a
aTodos os valores são corrigidos pelo controle. As freqüências nas moscas heterozigotas para os marcadores mwh/flr3 são calculadas com e sem correção para o tamanho dos clones; por conseguinte, estimativas um pouco diferentes são obtidas para as contribuições relativas de recombinação para os totais de clones induzidos. bAs freqüências de clones por indivíduo, divididas pelo número de células examinadas por indivíduo (48 800) dão uma estimativa das freqüências por célula e por divisão celular em experimentos de exposição crônica (Frei e Würgler, 1988). c,dA média geométrica e as correções foram calculadas de acordo com Frei et al. (1992).
TABELA 2Freqüência padronizada de indução de clones mwh por mg.mL-1 de concentração de exposição e a prevalência de eventos recombinacionais a
Compostos Trans-heterozigotos mwh/flr3 Heterozigotos para os marcadores mwh/TM3 Recombinação (%)Freqüência
padronizadab
(clones mwhpor 105 céls.por mg.mL-1)
Média geométricade tamanhodos clonesc
(células)
Freqüência padronizada por
105 céls.corrigida p/
tam. dos clonesd
Freqüênciapadronizadab
(clones mwhpor 105 céls.
por mg.mL-1)
Média geométricade tamanhodos clonesc
(células)
Freqüência padronizada por
105 céls.corrigida p/
tam. dos clonesd
Sem correçãopor tamanho
de clone
(ft) (2ît-1) (f’t=2ît-2 x ft) (fh) (2îh-1) (f’h=2îh-2 x fh) (1-fh/ft)x100
ddI 0,34 2,40 0,45 0,07 1,20 0,04 79,51
AZT 0,08 2,67 0,13 0,01 2,23 0,01 89,72
diagnose do AZT como um agente efetivamente indutor de eventos do
tipo recombinação mitótica (89,72%), porém capaz de induzir mutações
em menor proporção (10,28%) em células somáticas de D.
melanogaster. Do mesmo modo, os valores obtidos na análise da ddI
demonstram que este fármaco induz preferencialmente eventos
recombinacionais (79,51%), porém com uma porcentagem de indução
de mutações maior do que a do AZT (20,49%).
Os gráficos 1a e 1b mostram a distribuição das manchas de pêlos
mutantes em indivíduos trans-heterozigotos tratados com AZT e ddI.
Nos resultados apresentados pode-se observar que a maior incidência
de alterações está representada por clones com duas a quatro células
mutantes, sendo baixa a incidência de manchas grandes. Considerando-
se que, após o tratamento as células-alvo sofrem 5-6 ciclos de divisões
(Frei & Würgler, 1988), pode-se inferir que os medicamentos foram
capazes de induzir alterações, predominantemente, no final das divisões
celulares.
1 2 3 a 4 5 a 8 9 a 1617 a 32
33 a 6465 a128 129 a
256 >256
Cont. neg.
6,25
12,525
500
2
4
6
8
10
12
14
16
12
3 a 45 a 8
9 a 1617 a 32
33 a 6465 a128 129 a
256 >256
Cont. neg.
0,9375
1,875
3,75
7,50
5
10
15
20
25
30
35
Gráfico 1-Distribuição de manchas por classes em indivíduos trans-heterozigotos tratados com (a) AZT e (b) ddI.
(a)
(a)
(b)
5. DISCUSSÃO
O AZT e a ddI pertencem a uma classe de medicamentos
agrupados sob o nome genérico de antimetabólitos ou análogos de
bases que constituem um dos maiores grupos de quimioterápicos. Como
o próprio nome diz, estes compostos são capazes de serem
reconhecidos e incorporados erroneamente como intermediários
metabólicos normais, causando a inibição de rotas bioquímicas críticas,
destacando-se, neste caso, o metabolismo de ácidos nucléicos. A
estratégia de combate ao HIV através da quimioterapia com AZT e ddI
relaciona-se à capacidade destas drogas de bloquearem a enzima RT e,
uma vez incorporadas ao material genético, induzirem lesões que
podem levar à morte das células infectadas pelo vírus (Farmacopéia
USP-DI/98; Wutzler & Thust, 2001; Hoggard & Back, 2002; Peçanha et
al., 2002; De Clercq, 2004).
Os resultados obtidos neste trabalho revelaram que uma pequena parte
das lesões causadas pela incorporação do AZT (10,28%) originou
eventos caracterizados como mutação gênica e/ou cromossômica. Por
outro lado, a ddI demonstrou uma porcentagem de indução de
mutações maior do que a do AZT (20,49%). Entretanto, ficou
demonstrado que eventos recombinacionais são preferencialmente
induzidos pelo AZT (89,72%) e pela ddI (79,51%).
Estudos sobre o metabolismo da ddI revelaram que este
composto exerce sua atividade anti-viral em virtude da sua capacidade
de gerar didesoxiadenosina trifosfato (ddATP). Sabe-se que a etapa
inicial da fosforilação da ddI em ddIMP é catalizada pela 5’-nucleotidase
citossólica seguida pela aminação, via enzimas adenilosuccinato
sintetase e adenilosuccinato liase, em ddAMP. As posteriores
fosforilações são intermediadas pelas adenilato quinases. Entretanto,
analisando-se o pool de metabólitos da ddI em três linhagens celulares
diferentes, foi demonstrado que apenas 3% da ddI é convertida em
ddATP (Peter & Gambertoglio, 1998).
A fosforilação dos diferentes análogos nucleosídeos é altamente
dependente do estágio de ativação das células envolvidas. Um exemplo
disto é que a atividade da timidina quinase é de alguma forma
dependente do ciclo celular, não sendo surpreendente que o AZT seja
preferencialmente fosforilado em células ativadas. Por outro lado, o
sistema enzimático responsável pela ativação da ddI não é afetado pelo
ciclo celular e os níveis de fosforilação da ddI são iguais tanto em
células ativadas como em repouso (Peter & Gambertoglio, 1998). Um
fato importante ressaltado por Peter & Gambertoglio (1998) é que a
enzima difosfato quinase, que catalisa a última etapa de fosforilação,
pode utilizar tanto purinas quanto pirimidinas como substrato. Durante a
atividade celular, a construção da cadeia de DNA (na replicação ou nas
atividades metabólicas celulares) ocorre paralelamente à produção dos
nucleosídeos e nucleotídeos, que serão utilizados como substrato nesta
construção. Com o pool de análogos de nucleosídeos (AN) intracelular
maior ou igual ao de nucleosídeos endógenos, torna-se maior a
probabilidade das enzimas DNA polimerases utilizarem os análogos de
bases como substrato no lugar dos nucleosídeos endógenos.
Existem duas vias de síntese dos desoxirribonucleotídeos, sendo
uma via por síntese “de novo” e a outra por reciclagem de nucleotídeos
não utilizados pela célula. Os desoxirribonucleotídeos sintetizados por
reciclagem são importantes para os mecanismos de reparo no DNA
(Rompay et al., 2003). As enzimas que participam deste processo são
as desoxirribonucleosídeo quinases (dNK), as nucleosídeo mono-fosfato
quinases (NMPK) e as nucleosídeo difosfato quinases (NDPK).
Entretanto, a fosforilação dos nucleosídeos, assim como dos análogos de
nucleosídeos, é irreversível para os di- e trifosfatos, sendo exceção os
monofosfatos, que podem voltar a nucleosídeos pela 5’-nucleotidase
(Rompay et al., 2003). Com o aumento no pool de AZT intracelular, o
AZT monofosfato (AZTMP) torna-se um substrato alternativo inibidor da
construção da desoxitimidina monofosfato (dTMP) pela desoxitimidina
monofosfato quinase (dTMPK). Isto pode resultar na redução da
desoxitimidina trifosfato endógena (dTTP) na mitocôndria e diminuir,
então, a síntese de DNA mitocondrial (Rompay et al., 2003). O AZTMP
tem sido apresentado como o metabólito mais tóxico do AZT, e estudos
recentes apresentaram evidências de que o AZTMP é comumente
formado no citossol e é o responsável principal pela toxicidade celular. A
incorporação dos AN no DNA nuclear causa quebra na cadeia de DNA
(fase S) e parece ser crucial na iniciação da apoptose. A presença dos
AN no DNA causa a interrupção no elongamento da cadeia e,
posteriormente, também causam resistência à revisão pelas
exonucleases (Rompay et al., 2003), tornando maior a possibilidade de
permanecerem pequenos erros na construção do DNA, que podem
transformar-se em lesões do tipo mutação e/ou recombinação o que
aumenta as chances de iniciação de tumores.
O fator mais importante na inibição do HIV é a interação dos
2’-3’-didesoxinucleosídeos trifosfatos com os 2’-desoxinucleosídeos-
5’-trifosfatos endógenos e a razão resultante (ddNTP/dNTP) desta
interação, uma vez que eles competem diretamente entre si pela RT
viral. Estudos in vitro utilizando diferentes tipos celulares demonstraram
que o AZT reduz substancialmente o pool de timidina trifosfato em
células P19 em até 4 vezes. Entretanto, esta redução depende
parcialmente do tipo celular. No total, a razão AZTTP/TTP é maior em
células ativadas, o que pode explicar a melhor atividade anti-viral do
AZT nestas células (Peter & Gambertoglio, 1998) .
O teste que utiliza Salmonella typhimurium (teste de Ames) foi o
único método no qual o AZT não demonstrou efeito mutagênico. Neste
teste, o AZT parece não exercer nenhuma atividade sobre o genoma
bacteriano, devido à ausência de enzimas de fosforilação compatíveis
com as enzimas presentes nos demais organismos experimentais e que
são específicas e necessárias para ativar esta droga. Uma vez que estas
enzimas de fosforilação são essenciais também no que tange a ativação
da ddI, este método também não foi capaz de detectar mutações
relativas à ação deste medicamento (Wutzler et al., 2001).
Por outro lado, outros trabalhos consideram o AZT como um
potencial agente indutor de mutações em vários modelos experimentais.
Foi demonstrada uma correlação direta entre a incorporação do AZT ao
DNA genômico e o tempo de exposição em células linfoblastóides
humanas TK6, causando um aumento, preferencialmente, na indução de
grandes deleções (64% das mutações induzidas), visualizadas através
do incremento nas freqüências de mutantes HPRT e analisadas por
amplificação gênica. Estas freqüências de mutações aumentaram para
84% quando o parâmetro avaliado foi o gene TK (Meng et al., 2000c).
Estes resultados foram confirmados em experimentos que analisaram
alterações no locus APRT, nas mesmas condições experimentais, com
freqüências de indução semelhantes àquelas obtidas nas análises para o
locus TK. Entretanto tais resultados foram três vezes maiores que
aqueles obtidos para o gene HPRT. Análises moleculares de mutantes
HPRT, TK e APRT indicaram um papel dominante da perda de
heterozigose nos eventos mutagênicos induzidos pelo AZT (Meng et al.,
2000c; Mittelstaedt et al., 2004). Os três trabalhos apresentam uma
alta correlação entre a incorporação de AZT ao DNA celular e o aumento
nas freqüências de mutações nos genes HPRT, TK e APRT, indicando que
os efeitos adversos do AZT podem estar, em parte, relacionados à
incorporação do AZT no DNA celular e subseqüente terminação de
cadeia conforme propostos anteriormente por Sussman et al., 1999.
O AZT apresentou um efeito mutagênico sinergístico com a ddI
quando foi testada a combinação AZT+ddI em bioensaios utilizando
células humanas mutantes para os genes HPRT e TK. Acredita-se que,
em parte, este efeito sinergístico foi causado pelo aumento da
incorporação do AZT, tanto no DNA viral quanto no DNA celular, devido
à co-exposição aos dois agentes anti-retrovirais (Meng et al., 2000b).
Por outro lado, o AZT demonstrou atividade clastogênica através
da indução de micronúcleos em células de medula óssea de
camundongo em doses razoavelmente altas (≥ 200 a 500 mg/Kg/dia),
enquanto a ddI somente foi capaz de induzir micronúcleos em
concentrações muito altas, incompatíveis com as doses usualmente
empregadas em tratamentos clínicos. Sendo assim, a ddI foi
considerada incapaz de induzir a formação de micronúcleos (Phillips et
al., 1991).
Os resultados obtidos com os dois NRTIs no teste SMART de asa,
após exposição crônica das larvas oriundas do cruzamento padrão,
revelaram que a toxicidade genética do AZT e da ddI mescla uma leve
incidência de mutações com índices relativamente altos de
recombinação.
Uma alteração genética comum nas células tumorais é a perda de
heterozigose que pode envolver a perda de grandes segmentos de
cromossomos e posteriormente causar perdas substanciais de
informação genética do alelo específico. Esta é uma das alterações
genéticas mais comumente observadas em tumores esporádicos e
presume-se que esta seja uma etapa obrigatória na tumorigênese em
muitas síndromes de cânceres familiares envolvendo genes supressores
tumorais (Langlois et al., 1989). O mecanismo potencial de perda da
heterozigose pode ser deduzido de uma análise do cariótipo do tumor e
dos marcadores que são polimórficos entre cromossomos parentais. A
perda da heterozigose pode surgir por muitos caminhos, incluindo
deleções, não-disjunção mitótica bem como a recombinação entre
cromossomos homólogos. Cada um destes caminhos tem implicado
também na geração da perda de heterozigose em modelos
experimentais, como camundongos, com recombinação mitótica
predominando na maioria dos casos (Stark & Jasin, 2003).
Os processos mediados por recombinação podem ocorrer em
vários estágios do ciclo celular, podendo ser distinguidas na mitose a
recombinação homóloga e a não-homóloga (Wijnhoven et al., 2001). A
recombinação homóloga pode desempenhar um papel fundamental na
carcinogênese, uma vez que, conversões gênicas, deleções, trans-
locações, amplificações gênicas e crossing-over desiguais podem ser
mediadas por este mecanismo e contribuem para o desenvolvimento de
alguns tipos de tumores (Bishop & Schiestl, 2001). Bishop & Schiestl
(2003) afirma, ainda, que, a recombinação homóloga pode atuar em
diferentes estágios da carcinogênese, contribuindo para a iniciação
tumoral, mas atuando principalmente em etapas subseqüente da
progressão tumoral.
No presente trabalho foram diagnosticadas altas freqüências de
recombinação homóloga induzidas pelos agentes anti-retrovirais AZT e
da ddI. Estes resultados indicam uma maior necessidade de
investigações sobre os efeitos potenciais em humanos, especialmente
aqueles que recebem AZT por razões profiláticas. Os resultados obtidos
em células linfoblastóides indicam que a quimioprofilaxia perinatal com
AZT pode expor as crianças de mães HIV positivas a um risco potencial
de alterações genéticas (Sussman et al., 1999). O aumento da utilização
de AZT como agente profilático para indivíduos HIV-negativos, de alto
risco, e mulheres grávidas HIV-positivo, merece um detalhamento nas
relações entre terapias com o AZT (monoterapias ou coquetéis),
incorporação do AZT ao DNA das células e mutagenicidade e potencial
risco à saúde humana em longo prazo.
6. PERSPECTIVAS PARA FUTURAS INVESTIGAÇÕES
A relação que existe entre os mecanismos que levam ao
surgimento de neoplasias e o tipo de lesão no DNA torna muito
importante o conhecimento acerca dos mecanismos de ação dos
fármacos para que se possa prevenir ou pelo menos avaliar os possíveis
danos que uma terapia com os análogos de base pode causar em um
organismo. As combinações entre as drogas são muito utilizadas nos
coquetéis anti-AIDS, seja para aumentar a eficácia dos tratamentos a
longo prazo, para aumentar a eficácia na prevenção da transmissão
vertical do vírus HIV ou para diminuir os índices de mutações do HIV
que podem levar ao desenvolvimento de resistência do vírus às terapias
de longa duração. O objetivo destas combinações é potencializar a ação
de um ou mais fármacos utilizados no coquetel, para que prevaleça a
função esperada e mais pertinente para cada caso, ficando os demais
componentes como coadjuvantes na terapia. Muitos estudos em torno
dos efeitos de cada combinação tem sido realizados de forma
comparativa, entre os efeitos das monoterapias e os efeitos das
combinações – também chamadas terapias cruzadas. O AZT e a ddI tem
diferentes perfis de cada um dos seus efeitos, e foram consideradas
componentes para a combinação mais favorável de drogas para inibir a
replicação viral e para prevenir a transmissão perinatal do HIV. Nos
testes de mutagenicidade o AZT produziu efeitos primariamente
clastogênicos em culturas de células humanas e em camundongos
expostos a altas concentrações e também a concentrações clinicamente
relevantes, ao passo que a ddI produziu respostas clastogênicas e
mutagênicas apenas em doses muito elevadas. Em um estudo realizado
para comparar a genotoxicidade e mutagenicidade destas drogas em
monoterapias e em terapias combinadas (AZT + ddI), foram
demonstrados aumentos nos níveis de incorporação do AZT no DNA em
células expostas às drogas combinadas (33µM AZT + 33µM ddI) muito
acima dos níveis de incorporação destas drogas em células expostas a
monoterapias. Previamente, a análise de citotoxicidade demonstrou que
a ddI foi mais citotóxica que o AZT em células TK6 de linfócitos
humanos, mesmo em menores concentrações (900µM AZT para
~500µM ddI). As respostas mutagênicas nos genes HPRT e TK foram
analisadas em amostras de células tratadas com AZT, ddI e AZT + ddI.
Exposições às drogas individuais causaram aumentos significativos na
freqüência de mutações no gene HPRT a concentrações ≥ 300µM de
ambas as drogas. Entretanto, a exposição a combinações equimolares
das drogas produziu uma freqüência de mutações significativamente
elevada em todas as concentrações utilizadas, podendo chegar a valores
três vezes maiores que os valores de indução em terapias com apenas
uma das drogas (Meng et al., 2000b). O aumento sinergístico das
respostas mutagênicas em terapias combinadas das drogas está
correlacionado com a potencialização da incorporação do AZT no DNA
causada por este tipo de tratamento. Esta disparidade indica que as
coexposições AZT-ddI, comparadas com a ddI sozinha, levam a
potencialização da contribuição da ddI nos mecanismos de
mutagenicidade, diretamente também pelo aumento na incorporação de
ddI no DNA ou indiretamente através do aumento da inibição das DNA
polimerases, de alterações no pool de nucleosídeos, inibição de enzimas
que participam da biossíntese do DNA e/ou pela interferência nos
processos de reparo no DNA (Meng et al., 2000b).
Desta forma, este registro sobre os efeitos da interação entre o
AZT e a ddI estabelece um valor ainda maior para o conhecimento dos
mecanismos de ação e efeitos individuais de cada uma destas drogas
para que se possa desvendar o porque do aumento na indução de
respostas mutagênicas em exposições aos coquetéis. Torna-se
necessária, ainda, a continuidade da investigação acerca dos potenciais
de indução de mutação e recombinação com estas drogas associadas.
Uma vez que o benefício clínico das terapias cruzadas já foi estabelecido
e as causas do aumento nos níveis de mutações ainda são obscuras, um
critério de avaliação acerca do custo benefício deve ser o maior
responsável pela escolha da melhor forma de terapia a ser utilizada.
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