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Comunidade Acolhimento Bom Pastor
Estrada Municipal, 1641
Novo Horizonte
CEP 13.212-590
Jundiaí – SP
Fone: (11) 4582-4163
E-mail:
gilberto@comunidadebompastor.com.br
gilbertobegiato@yahoo.com.br
Jundiaí, 15 de abril de 2007- Brasil
Festa da Divina Misericórdia
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DEDICAÇÃO
Ofereço este pequeno livro em nome de todos os mártires
que no campo da justiça ofereceram a vida. No meu país os
cristãos mártires são os que morrem nas trincheiras da
defesa dos irmãos marginalizados.
Ofereço aos filhos da Comunidade Bom Pastor os quais
tiveram a ousadia de não construir grandes impérios de
evangelização. Ao invés de estruturas materiais e
arquitetônicas optaram pela construção da Civilização do
Amor!
Ofereço aos filhos e filhas do Varjão. Varjão que quer ser
Novo Horizonte. Porque nos aceitaram e nos acolheram como
agentes da esperança e amor. Porque não julgaram nossa
miséria e pobreza e porque acreditaram em nossas
intenções. Principalmente porque nos deram condições e
aprendizado que para amar não precisa de grandes
estruturas.
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SUMÁRIO
. Apresentação
. Acolher é amar
. Princípio da dignidade da pessoa humana
. Princípio do respeito pela vida humana
. Princípio da Associação
. Princípio de participação
. Princípio da proteção preferencial dos pobres e
vulneráveis
. Princípio da solidariedade
. Princípio do exercício da administração pública com ética
. Princípio da subsidiariedade
. Princípio da igualdade humana
. Princípio do bem comum
. Civilização do Amor
. Bibliografia
. Biografia
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APRESENTAÇÃO
Ilustre desconhecida. Assim foi tratada por alguns autores.
Neste livro, pequeno, mas denso, o autor, meu irmão Gilberto,
empenha esforço para fazer dela, a Doutrina Social da Igreja
Católica, tão conhecida quanto ilustre.
Tarefa nada fácil levando-se em conta o mundo atual marcado
com inúmeros problemas, todos eles conseqüência do próprio
comportamento humano. Nada que nos faça se empolgar na busca
de soluções para os sofrimentos que acometem tantas pessoas.
Mas tarefa realizada com mérito. Utilizando-se de uma
linguagem simples e compreensível, discorre sobre os pontos
fundamentais da Doutrina Social. É objetivo e esclarecedor e
envolvente, mesmo para aqueles que talvez a desconheça ou
apenas a tenha como ilustre.
Um assunto tão extenso e emocionante! Um grande livro,
suficiente para nos mergulhar no tema e deixar-nos sedentos por
saber mais.
Assim espero. Para quem o ler, que seja um ponto de partida no
descobrimento do pensamento social da Igreja.
Descoberta que leve a mudanças comportamentais.
Santa Marta, rogai por nós.
Diácono João Carlos Begiato
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ACOLHER É AMAR
Aproximadamente no ano 174 a 124 A.C., ou seja, do
começo do reinado de Antíoco IV a bíblia nos relata a história
da revolta dos Macabeus até o estabelecimento da dinastia
dos Asmoneus.
O povo judeu após muitas experiências de exílios
percebeu que sua sobrevivência era uma questão de
obediência à Lei e às suas origens. Neste tempo começa uma
grande batalha em que morrer para defender a Lei era uma
questão de honra e de fé. Chega de se afastar de Deus e
permitir que o “castigo” Divino caia sobre o povo. Tal atitude
protegeu de certa forma o povo da bíblia e a crença no Deus
Único.
Não tardaram muito após esta firme decisão de
defender a Lei e o Templo surgirem as primeiras histórias de
mártires, dispostos a dar a vida para um fim nobre.
Eleazar um homem de certa idade preferiu ser
torturado a ter que violar a Lei e agiu dignamente não
aceitando ser hipócrita, mas sim transparente,
conscientemente morreu para deixar o exemplo aos jovens:
“Senda assim, se eu morrer agora corajosamente, mostrar-
me-ei digno de minha velhice, e terei deixado aos jovens um
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nobre exemplo de zelo generoso, segundo o qual é preciso
dar a vida pelas santas e veneráveis leis” II Mc 6, 27.
Mais espetacular e dramática foi a história de outra
mártir, uma mãe de sete filhos que para não violar a Lei
aconselhou seus filhos a darem a vida se fosse necessário.
Cada filho seu foi sendo torturado e morto diante de seus
olhos. A Mãe por fim entregou também a própria vida.
Um dos filhos disse “Estamos prontos a morrer antes
de violar as leis de nossos pais” II Mc 7, 2b.
Com estes exemplos de radicalidade os judeus
preservaram a raça não esquecendo sua origem. Um povo
que esquece as origens é um povo fadado ao extermínio.
Essa história exalta, a um só e mesmo tempo, os valores
humanos e sobrenaturais: a fé engendra o heroísmo e o
serviço da pátria se identifica com o único Deus.
Porém esta tomada de consciência da importância em
defender a Fé e a Lei, atinge um rumo legalista que por fim
se tornará excessivo; a Lei passará a ser mais importante
que o próprio Deus. Estamos, portanto próximo à época de
Jesus, e aí que notará a preocupação do Senhor em mostrar
que o amor está acima da Lei.
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Deus é amor!
Na época de Jesus existiam aproximadamente 613
mandamentos divididos em 365 negativos e 248 positivos,
todos vistos como importantes e obrigatórios. Imagine você,
o povo ter que decorar todos estes mandamentos? Portanto
os especialistas da Lei diziam que o povo não poderia amar a
Deus suficientemente, pois não conheciam a Lei. Com isso o
povo ficava às margens da fé, excluídos e renegados a
aceitar tudo os que os especialistas diziam.
Então um doutor da lei se aproxima de Jesus e
pergunta-lhe para colocá-lo à prova:
“Mestre, qual é o maior mandamento da Lei?” Mt 22,36
Você pode imaginar que pergunta difícil e que situação
complicada: Se todas as 613 leis eram importantes como
definir uma mais importante que a outra?
Jesus responde a questão derrubando o paradigma que
não é a Lei que é importante, portanto servir a Deus não é
uma questão de obrigação, mas sim de satisfação: Amar é o
essencial para quem quer ser cristão. Respondeu Jesus:
“Amarás o Senhor teu Deus de todo o teu coração, de
toda a tua alma e de todo o teu espírito” Mt 22, 37.
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Jesus não cita uma frase nova e original, mas se baseia
no livro do antigo testamento deuteronômio capítulo seis,
versículo cinco.
Amar a Deus de todo o coração! O coração para o povo
da bíblia tem um sentido bem mais amplo do que para nós.
Coração para nós lembra apenas a vida afetiva. Para o povo
da bíblia, o hebreu, concebe o coração como “interior” do
homem. Além dos sentimentos o coração contém também as
recordações e as idéias, os projetos e as decisões. Deus deu
ao homem um coração para pensar. É o lugar onde o homem
encontra Deus, é a fonte da sua personalidade consciente,
inteligente e livre. Lugar onde faz suas opções decisivas,
lugar da Lei não escrita.
Amar a Deus de toda a tua alma! A alma para o povo
hebreu está longe de ser uma “parte” que com o corpo
compõe o ser humano, a alma designa o homem na sua
totalidade, enquanto animado por um espírito de vida; em
virtude da sua relação com o Espírito, à alma indica no
homem a sua origem espiritual, esta “espiritualidade” tem
raízes profundas no mundo concreto.
Amar a Deus de todo espírito. Espírito aqui designa
num ser seu elemento essencial e inaferrável, aquilo que o
faz viver e aquilo que dele emana sem que ele queira, aquilo
que em grau máximo é ele próprio e aquilo de que ele não
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pode dispor como dono. A palavra hebraica ruah é o sopro da
vida.
Portanto amar a Deus é amá-lo na nossa totalidade.
Amá-Lo com total entrega de si mesmo. Com que você é,
tanto com que você conhece como com o que não conhece
de si próprio.
Porém entregar-se a Deus, conhecê-lo, é uma
experiência concreta, não se ama a Deus somente a partir de
mim mesmo, o amor a Deus é acima de tudo uma extensão
do meu eu para o outro. Deus é trindade e como somos a
imagem de Deus, somos chamados a relacionar com o
próximo. O amor não é egoísta, é solidário. Por isso Jesus
disse:
“E o segundo, semelhante a este, é: Amarás o teu
próximo como a ti mesmo” Mt 22,39. Mais uma vez Jesus
não cita um mandamento novo, mas utiliza do livro do
Levítico 19,18.
O amor a Deus (horizontal) passa necessariamente
pelo amor ao meu próximo (vertical). É o sinal da cruz onde
Cristo deu provas do seu amor por nós.
“Se alguém disser: “Amo a Deus”, mas odeia seu
irmão, é mentiroso” I Jo 4, 20 a
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O papa Bento XVI em sua Carta Encíclica “Deus Caritas
Est” nos fala que crer no amor de Deus é opção fundamental
da nossa vida.
A palavra amor que se exprime de realidades
totalmente diferentes.
O amor entre o homem e a mulher (eros), o amor de
amizade (philia) e o “amor torna-se cuidado do outro e pelo
outro. Já não se busca a si próprio, não busca a imersão no
inebriamento da felicidade; procura, ao invés, o bem do
amado: torna-se renúncia, está disposto ao sacrifício, antes
procura-o.” ( Papa Bento XVI) . É o amor Ágape.
Jesus nos ensina que amar não é um peso, e sim
libertação! Quem ama não faz por obrigação e sim por
prazer. O amor que têm três faces: a Deus, a mim mesmo e
ao próximo.
Diante de tudo isto é que resolvi escrever este pequeno
livreto para expressar que a religião não se vive por meio de
obrigações e preceitos. Que a fé se realiza pelo
comprometimento com o outro, de forma preferencial com
aquele irmão e irmã que sofre.
O documento de Puebla nos lembra que a Igreja não é
uma seita, não é um grupo religioso que só responde às
necessidades e aspirações de um grupo social. Ela deseja
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acolher as angústias de todos os homens, porém mais
especialmente as que brotam da sua pobreza.
Por isso de forma sucinta falo um pouco da Doutrina
Social da Igreja que nos inspira a viver o amor não como Lei
e mandamento obrigatório, mas como compromisso de amor
aos que sofrem e desejam encontrar-se com o Deus que é
Libertador!
Inspirei-me na metodologia utilizada pela Diocese de
São Miguel, por isso dividi em dez itens como princípios
fundamentais na formação do Ensino Social da Igreja.
O mais importante é não esquecer que o amor encerra
todas as Leis e todos os mandamentos. Quem trilha pelo
caminho do amor a Deus e ao próximo estará se realizando
descobrindo a verdadeira felicidade e, portanto amando a si
mesmo.
Quem ama pratica plenamente os mandamentos de
Deus.
Espero que este material possa contribuir para que
cada vez mais nos comprometermos com uma religião
libertadora e compromissada com a pessoa humana como
fundamento maior e principal da criação.
Assim como o sol que nasce para todos, assim também
que a justiça seja para todos.
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“A Doutrina Social da igreja propõe princípios de
reflexão; apresenta critérios de juízo; orienta para ação” CIC
2423.
1º Princípio da dignidade da pessoa humana.
Diz o livro de Gênesis que no início Deus criou o
universo e destinou tudo em função do homem e da mulher.
A palavra diz que depois de criado tudo Deus então fez
o homem e a mulher imagem e semelhança a Ele. Deus deu
a ordem ao homem e a mulher que dominasse e submetesse
a terra. Toda criação estaria a serviço da pessoa humana
como bem mais sagrado. O Universo foi criado por Deus e
conspira a todo o momento em favor da humanidade.
O universo está a disposição, basta o homem tomar a
decisão certa e não desrespeitar a vida.
No centro do jardim está a árvore da vida e a árvore da
ciência do bem e do mal.
Deus ordenou ao homem que não comesse o fruto da
árvore da ciência do bem e do mal. Se comessem
experimentariam a morte.
O homem e a mulher desobedeceram e ao invés de
optar pela árvore da vida, comeram do fruto da árvore da
ciência do bem e do mal e com isto trouxeram a morte.
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O homem descobriu sua nudez, ao ouvir os passos de
Deus que todo final da tarde vinha ao seu encontro se
escondeu. Deus faz a pergunta que até hoje não quer calar:
“Onde estás?”. Lamentavelmente estamos muitas vezes
preocupados com muitas coisas, porém esquecemos do mais
importante: a vida humana!!!!
O pecado de Adão e Eva foi um pecado individual que
afetou socialmente todos nós. Por isso a Igreja nos convida a
uma conversão individual e social.
Nunca necessitamos tanto de uma mudança de
mentalidade. O documento de Medellín diz que tanto a
mudança estrutural como a mudança de mentalidade deve
caminhar junta: “Não teremos um continente novo sem
novas e renovadas estruturas....não haverá continente novo
sem homens novos” (Méd. 1.3)
O homem novo é livre e esta liberdade se alcança
somente com libertação integral. Como disse Jesus: “vida e
vida em abundância”. Liberdade que implica em dispor de
nós mesmos para construir uma comunhão e participação em
três realidades distintas e inseparáveis: a relação do homem
com o mundo como senhor, com as pessoas como irmão e
com Deus como filho.
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Os direitos do homem são os da pessoa: imagem e
semelhança de Deus. Todo que atenta contra a vida humana
e sua dignidade deve ser denunciado e condenado.
Temos que nos libertar do pecado que destrói a vida
divina do homem que é a dignidade humana, pois somos
filhos de Deus; é o maior dano que uma pessoa pode causar
a si mesmo e aos demais.
Jesus Cristo resgatou-nos a dignidade original que os
homens tinham recebido ao serem criados por Deus à sua
imagem.
Em Cristo e Maria o homem e a mulher devem
revalorizar-se sendo todos fundamentalmente iguais
membros da mesma estirpe, apesar das diversidades de
sexos, de línguas, de culturas e de formas de religiosidade.
Devemos nos amar e respeitar se deseja realmente uma
sociedade digna de viver.
Para a Doutrina Social da Igreja a pessoa humana
representa o fim último da sociedade.
“Só se pode conseguir a justiça social no respeito à
dignidade transcendente do homem. A pessoa representa o
fim último da sociedade, que por sua vez lhe está ordenada”.
Para Igreja a defesa e promoção da dignidade é uma
questão de obrigação dos cristãos.
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“A defesa e a promoção da dignidade da pessoa
humana nos foram confiados pelo Criador. Em todas as
circunstâncias da história os homens e as mulheres são
rigorosamente responsáveis e obrigados a esse dever” (SRS
47)
O Papa João Paulo II disse:
“A pessoa é o primeiro caminho, e o caminho
fundamental da Igreja” (João Paulo II – Encíclica Redemptor
Hominis, nº 14).
2º Princípio do respeito pela vida humana
“A vida humana é sagrada porque desde a sua origem
ele encerra a ação criadora de Deus, e permanece para
sempre numa relação especial com o Criador, seu único fim.
Só Deus é o dono da vida, do começo ao fim, ninguém em
nenhuma circunstância pode reivindicar para si o direito de
destruir diretamente um ser humano inocente”.
(CDF, inst. “Donum Vitae, instr. 5) Não matarás (Ex
20,13)
O Chamado de Deus em nossas vidas passa por três
momentos importantes:
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Primeiro o sinal visível do amor por nós: a vida. Nossa
existência é o sinal claro e evidente de que Deus nos chamou
e escolheu.
“Antes que no seio fosses formado, eu já te conhecia;
antes do teu nascimento, eu já havia te consagrado, e te
havia designado profeta das nações” Jr 1,5
Portanto para a Igreja a vida humana deve ser
respeitada e protegida de maneira absoluta a partir da
concepção
Portanto a Igreja é contra o aborto e vê neste ato uma
grave falta.
Assim a Igreja é contra todo tipo de afronta contra a
vida:
- O homicídio voluntário;
- A eutanásia;
- O suicídio.
A Igreja vê a legítima defesa como um ato de amor a si
próprio, portanto é um princípio fundamental da moralidade.
Sendo assim, é legítimo fazer respeitar o próprio direito à
vida.
A vida e a saúde física, mental, psíquica, são bens
preciosos confiados por Deus. Importante entender que
saúde deve ser visto de forma abrangente, não só a saúde
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física, mas também condições de vida que cada ser humano
precisa para viver dignamente.
Portanto todo excesso seja na alimentação, na comida,
bem como, o uso de drogas, bebidas põe em risco a própria
vida e às vezes as dos outros.
O segundo momento do chamado de Deus é a razão
pelo qual Ele nos deu a vida: A felicidade!
Para que o homem seja feliz é preciso que tenha a Paz!
Paz aqui não no sentido apenas da ausência de guerra, mas
no sentido que o povo da bíblia dá a esta palavra: shalon!
A Paz para o povo da bíblia tem sentido amplo de bem-
estar, harmonia com Deus e a natureza, consigo próprio, é
benção, tranqüilidade, glória, riqueza, salvação e vida. Paz é
estar bem de saúde, é concórdia na vida fraternal e familiar,
é felicidade, é segurança, é confiança mútua, é morrer
tranqüilo, só pode estar em paz que não está mal, não há
paz para os maus, paz é justiça, é cura, etc. Resumindo a
Paz é estar bem materialmente, espiritualmente e
psicologicamente.
Toda violência existente na sociedade, assim como as
guerras e a corrida armamentista são prejudiciais à vida e
intoleráveis à felicidade e harmonia entre os povos.
O terceiro momento do chamado é a missão.
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Todos são chamados a defender a vida como bem
maior de Deus.
Das mãos de Deus recebemos a vida e agradecido
retribuímos. Acolher principalmente àqueles que estão
distantes da dignidade de Filhos de Deus. Defender a vida é
realizar-se como pessoa.
3º Princípio da Associação.
A pessoa humana não é sagrada isoladamente. O
homem é um ser social. Para tanto se organiza e se
desenvolve de forma comunitária.
A família é a célula originária da vida social. A vida em
família é onde inicia a vida em sociedade. Portanto podemos
dizer que a sociedade é um reflexo que como se vive na
família.
A família deve ser ajudada e defendida pelas medidas
sociais apropriadas. (CIC 2209).
A comunidade política tem o dever de honrar a família,
de assistí-la, de lhe garantir seus direitos básicos e
fundamentais da pessoa humana: educação dos filhos, a
proteção institucional, liberdade de professar a fé,
propriedade privada, trabalho digno, moradia, emigrar,
saúde, segurança, etc.
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Somos chamados também a respeitar e honrar os que
são chamados ou investidos de autoridade na sociedade.
Lembrando sempre que aqueles que são investidos de
autoridades devem exercê-la como um serviço. Toda
autoridade que se preza, deve ser usada para servir ao bem
comum.
“A submissão à autoridade e a co-responsabilidade pelo
bem comum exigem moralmente o pagamento de impostos,
o exercício do direito do voto, a defesa do país” (CIC 2240).
“É dever dos cidadãos colaborar com os poderes civis
para edificação da sociedade num espírito de verdade, de
justiça, de solidariedade e de liberdade”. (CIC 2255)
4º Princípio de participação.
A liberdade implica sempre aquela participação que
todos temos, em princípio, de dispor de nós mesmos, a fim
de irmos construindo uma comunhão e uma participação que
hão de se plasmar em realidades definitivas, em três planos
inseparáveis: a relação do homem com o mundo como
senhor, com as pessoas como irmão e com Deus como filho.
Pela liberdade, projetada sobre o mundo material da
natureza e da técnica, o homem – sempre em comunidade
de múltiplos esforços –consegue a realização inicial de sua
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dignidade:submeter este mundo, através do trabalho e da
sabedoria, e humanizá-lo de acordo com os desígnios do
Criador. (Puebla 323 e 323) A dignidade inalienável da
pessoa humana se realiza aqui, no amor fraterno, no serviço
mútuo e aceitação e promoção prática do outro,
especialmente dos mais necessitados. Não existe
participação justa se não houver espaço a todos.
Portanto uma forma de promover a pessoa humana é
torná-la útil e importante. O trabalho é mais do que um meio
de ganhar a vida é uma forma de participação contínua na
ação criadora de Deus.
No trabalho, a pessoa exerce e realiza uma parte das
capacidades inscritas em sua natureza. O valor primordial do
trabalho está ligado ao próprio homem, que é seu autor e
destinatário. O trabalho é para o homem, e não o homem
para o trabalho. (LE. 6).
È fundamental que nesta época em que vivemos onde
o ter é mais importante que o ser. Onde uma pessoa é
respeitada e valorizada pelo que tem e não pelo que é; que
reavaliamos até que ponto vale a pena nos matarmos numa
busca desenfreada do ter pelo ter.
È preciso dignificar o trabalho com salário decente e
justo, com horários que respeite a pessoa, o direito ao
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trabalho produtivo, com representação sindical, à
propriedade privada, e à iniciativa econômica.
O lucro, a produtividade, enfim a vida produtiva deve
estar a serviço do homem.
O Estado deve assegurar e promover condições para
geração de empregos. Promover as empresas que produzem
e não as que vivem de especulações financeiras. Por sua vez
as empresas não devem visar o lucro em detredimento a
mão obra escrava e explorada.
Que haja condições de trabalhos igualitários a todos
sem distinção: homens, mulheres, excepcionais, deficientes,
etc.
5º Princípio da proteção preferencial dos pobres e
vulneráveis.
Jesus é enfático ao falar sobre os pobres e muito claro
através da sua vida pela opção pela pobreza. Jesus não
precisaria falar do amor aos pobres e nem sobre opção aos
pobres já que em vida viveu a pobreza e o desprendimento.
Não tinha onde reclinar a cabeça nasceu em uma
manjedoura, amou os enfermos, os excluídos, os
marginalizados.
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No evangelho de Mateus capítulo vinte e cinco, 31-46
fala sobre o julgamento. Seremos julgados pela escolha que
fizemos em fazer ou não fazer ao faminto, ao sedento, ao
enfermo, ao desabrigado. Amar os pobres não é uma
questão de carisma ou espiritualidade ou identidade do
movimento que participo ou comunidade que participo.
Opção preferencial pelos pobres é uma questão de urgência e
coerência de fé. O mesmo Jesus que disse “isto é o meu
corpo, isto é o meu sangue”, disse também, “estive com
fome e me deste de comer...”. É preciso compreender isto
para viver uma religião autêntica e mostrar ao mundo que
nossa fé é uma crença engajada em princípios de caridade e
libertação total.
A dificuldade de algumas pessoas e segmentos para
enxergar a clareza com que Jesus se refere aos pobres é
porque falta conversão. Veja não quero ser moralista, mas
quando falo de conversão, me refiro que se queremos
encontrar-nos verdadeiramente com Jesus eu preciso de
ousadia e coragem de encarar que Ele está presente no
pobre, e que o grito do pobre é o grito de Deus por Justiça e
que somos chamados a praticar justiça se queremos ser bem
aventurados.
A opção é preferencial não excludente. Não é o caso
de julgarmos os ricos, mas conscientizá-los que se na mesa
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deles está sobrando alimento na mesa do pobre está
faltando.
Esta sociedade que desrespeita o idoso, que abandona
os enfermos, que exclui o pobre marginalizando-o,
preconceituosa, do subemprego e desempregados, dos índios
que são expulsos da sua terra, dos sem terra e sem teto.
Tudo isso clama aos céus a justiça de Deus. Nenhuns desses
crimes serão esquecidos diante da justiça divina.
A inversão de valores em nossa sociedade é sem
dúvida uma das causas dos problemas sociais. A cada dia a
ambição que leva ao apego ao materialismo, ao egoísmo, há
individualidade ao consumismo tem deixado cada vez mais
uma grande brecha, uma enorme diferença entre os mais
pobres e os mais ricos.
Observamos à deterioração da honestidade pública e
privada, a corrupção, a venalidade que ocasionam a miséria.
Há uma raiz profunda de corrupção onde “os fins
justifica os meios” que tem levado todos os segmentos da
sociedade a plantar e cultivar a injustiça.
O amor aos pobres é incompatível ao amor imoderado
das riquezas ou uso egoísta delas. (CIC 2445).
São João Crisóstomo lembra-nos desta verdade em
termos bem rigorosos:
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“Não deixar os pobres participar dos próprios bens é
roubá-los e tirar-lhes a vida. Nós não detemos nossos bens,
mas os deles. É preciso satisfazer acima de tudo as
exigências da justiça, para que não ofereçamos como dom da
caridade aquilo que já é devido por justiça”.
São Gregório Magno é mais enfático ainda:
“Quando damos ao pobre as coisas indispensáveis, não
praticamos com eles grande generosidade pessoal, mas lhes
devolvemos o que é deles. Cumprimos um dever de justiça e
não tanto um ato de caridade”.
O pobre não precisa de esmola que o fará sempre
pedinte, humilhando-o pelo resto da vida, é o que fazemos
com nosso assistencialismo. O pobre precisa de justiça para
adquirir a cidadania e a independência material.
Não podemos arrogar o direito de se vangloriar pela
quantidade de pobres que assistimos, porquanto maior é a
obra, maior é a constatação de que a justiça social ainda não
aconteceu.
Assim como não podemos fazer marketing pessoal em
nome da caridade. È preciso ir às raízes da desigualdade
social e extirpar de vez toda diferença que existe entre nós.
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6º Princípio da solidariedade
A solidariedade nos leva não só a atos de caridade com
o irmão que sofre, mas acima de tudo a um
comprometimento com o sofrimento do outro. Solidarizar
como Jesus ao ver povo teve compaixão, ou seja, sofrer
junto. Nossa luta não pode ser egoísta, temos que ter uma
luta justa para o bem comum.
A solidariedade se manifesta na distribuição dos bens e
na remuneração do trabalho. Porém a virtude da
solidariedade vai além dos bens materiais, difundindo os
bens espirituais da fé, a Igreja colabora na transformação
total do homem e da mulher.
A solidariedade nos leva a redução das desigualdades
sociais e econômicas excessivas. Como também ao
desaparecimento das desigualdades iníquas.
“Os problemas sócio-econômicos só podem ser
resolvidos com o auxílio de todas as formas de solidariedade;
solidariedade dos pobres entre si, dos ricos e dos pobres, dos
trabalhadores entre si, dos empregadores e dos empregados
na empresa, solidariedade entre as nações e entre os povos.
A solidariedade internacional é uma exigência de ordem
moral. Em parte é da solidariedade que depende a paz
mundial.” (CIC 1941)
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Qual diferença entre o colaborador, o voluntário e
aquele que solidariza?
O colaborador acompanha a obra de longe. O
voluntário é aquele que ajuda a obra, dispõe da sua vida e de
seu tempo e também de sua capacidade, envolve-se. O
solidário dá a vida pela obra, compadece-se e compromete-
se com a obra.
Enfim ser solidário é dar a vara de pescar, ensinar a
pescar, dizer ao cidadão que aquele rio também é dele e
depois torná-lo solidário a quem precisa.
Na Encíclica “Solicitudo Rei Socialis”, nº. 38, João Paulo
II nos diz que a Solidariedade “não é um sentimento de
compaixão vaga ou de enternecimento superficial pelos
males sofridos por tantas pessoas próximas ou distantes.
Pelo contrário, é a determinação firme e perseverante de se
empenhar pelo bem comum”.
7º Princípio do exercício da administração pública com
ética:
Fomos criados por Deus para dominar todo o universo.
O homem é o centro da criação que por sua vez deve
administrar com ética e responsabilidade.
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O homem é um agente e não um proprietário. Portanto
devemos proteger o meio ambiente que vivemos, pois acima
de tudo, isto é uma questão de sobrevivência.
A ganância materialista que leva ao consumismo
ambicioso além de gerar uma diferença enorme entre ricos e
pobres, dificultando a criação de uma sociedade justa; tem
levado também a um suicídio coletivo pelo esgotamento dos
recursos e as conseqüências dos graves problemas
ecológicos, entre outros, a contaminação do meio ambiente.
São alarmantes as previsões que são feitas por
cientistas sobre a destruição do universo e mesmo assim o
homem não consegue frear sua ganância, desrespeitando a
natureza.
“Se não mudarem as tendências atuais,continuará a
deteriorar-se a relação do homem com a natureza pela
exportação irracional de seus recursos e a contaminação do
ambiente, com o aumento dos graves prejuízos para o
homem e para o equilíbrio ecológico. (Puebla 139).
Também é importante lembrar que a terra é um bem
destinado a todos e não apenas a um grupo de privilegiados.
“A terra a todos pertence, não somente aos ricos”.
Santo Ambrósio
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“A terra foi dada em comum a todos os homens;
ninguém considere próprio aquilo que, além do necessário,
foi retirado do acervo comum por meio da violência” São
Basílio.
O exercício da administração pública com ética é
principalmente administrar os bens para proveito de todos,
para que todos possam realizar-se como pessoa humana.
O Papa João Paulo II ensina: “Sobre toda propriedade
privada pesa uma hipoteca social”.
Por isso a Igreja defende o direito universal dos bens.
Nossa resposta deve ser ambivalente: ao mesmo
tempo não podemos ter uma visão romântica de preservação
da natureza como solução e recusarmos os avanços da
ciência e do desenvolvimento. É um desafio onde precisamos
encontrar o equilíbrio sem perder a qualidade de vida. Urge
uma visão global e integral. Precisamos ter a coragem de
repensar a idolatria do progresso indefinido e encontrar
soluções sensatas para crise em que vivemos.
“Os bens de produção - materiais ou imateriais – como
terras ou fábricas, competência ou profissões, requerem os
cuidados de quem os possui para que sua a fecundidade
aproveite o maior número possível. Os detentores dos bens
de uso e de consumo devem usá-los com temperança,
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reservando a melhor parte ao hóspede, ao doente e ao
pobre”. (CIC 2405)
8º Princípio da subsidiariedade:
Todo governo tem suas responsabilidades e dever de
governar. Cabe ao governo promover condições de vida
digna ao povo. Condições básicas: moradia, educação,
emprego, saúde, etc. Porém nem sempre é assim que
acontece, existem muitas pessoas marginalizadas destes
direitos e para tanto, surgem então do seio da sociedade
pessoas que através do voluntariado e dedicação por meio de
associações, ONG’s, etc colaboram subsidiando, ou seja,
colaborando com o papel do estado em dar dignidade as
estas pessoas marginalizadas pela sociedade.
O Governo deveria olhar estas formas de organização
como parceiras, pois são verdadeiros heróis que dedicam
suas vidas para promoção do outro. Porém na prática não
acontece isto, às vezes, parece que o Governo os trata como
concorrentes.
Apesar da colaboração que estas entidades dão na
promoção da dignidade, nunca é suficiente para extirpar de
vez a injustiça social. Para tanto é preciso que com o controle
da corrupção e com uso devido dos impostos arrecadados
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(diga-se de passagem, altos) o Governo contribua com a
justiça social.
O princípio da subsidiariedade tem também o
importante significado de colocar um limite adequado à ação
do governo:
“A socialização apresenta perigos. Uma intervenção
muito acentuada do Estado pode ameaçar a liberdade e a
iniciativa pessoais. A doutrina da Igreja elaborou o chamado
princípio da subsidiariedade. Segundo este princípio, uma
sociedade de ordem superior não deve interferir na vida
interna de uma sociedade inferior, privando-a das suas
competências, mas deve antes apoiá-la em caso de
necessidade e ajudá-la a coordenar a sua ação com as das
outras componentes sociais, tendo em vista o bem comum”.
( CIC 1883 , CA 48 cf Pio XI).
A família deve ser ajudada e defendida pelas mediadas
sociais apropriadas, principalmente se não são capazes de
desempenhar as suas funções. Porém as comunidades mais
amplas cuidarão de não usurpar seus poderes ou de interferir
na sua vida.
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9º Princípio da igualdade humana:
Nenhum filho ou filha é mais importante aos olhos do
Criador. A todos Deus criou e amou igualmente, pois não faz
distinção de pessoas. Nem o cargo, nem o status que ocupa,
nem a posição na sociedade ou condição financeira faz de
alguém mais amado por Deus.
Assim Deus Pai espera dos seus filhos: que o
tratamento entre eles seja de igualdade e respeito mútuo. Na
concepção de Deus não existe uma raça superior à outra.
A igualdade de todas as pessoas decorre de sua
dignidade essencial e aos direitos que daí decorre. Os
diferentes talentos são partes do plano de Deus e não devem
ser parâmetro para definir a importância de um em relação
ao outro.
Criados à imagem de Deus único, dotados de uma
mesma alma racional, todos os homens tem a mesma
natureza e a mesma origem. (CIC 1934)
“Qualquer forma de discriminação nos direitos
fundamentais da pessoa, seja ela social ou cultural, ou que
se fundamente no sexo, raça, cor, condição social, língua,
religião deve ser superada e eliminada, porque contrária ao
plano de Deus” (GS 29)
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As diferenças que possuímos é um convite a atitudes
de magnitude da nossa parte para com o irmão levando a
partilha e enriquecendo-nos mutuamente.
A desigualdade econômica e social é sinal de escândalo
e são contrárias à justiça social, à equidade, à dignidade da
pessoa humana e à paz social e internacional.
Cabe aqui uma referência à igualdade entre homem e
mulher. Tanto o homem como a mulher foi criados em
idêntica e grande dignidade à imagem e semelhança de
Deus. Em perfeita igualdade enquanto pessoas humanas e
por outro, o seu ser respectivo de homem e de mulher. No
seu “ser-homem” e seu “ser-mulher”, refletem a sabedoria e
a bondade do Criador.
“Deus não é de modo algum à imagem do homem.
Não é nem homem nem mulher. Deus é puro espírito, não
havendo nele lugar para diferença dos sexos. Mas as
“perfeições” do homem e da mulher refletem algo da infinita
perfeição de Deus: as de uma mãe e as de um pai e esposo”.
(CIC 370)
È preciso, portanto um tratamento de igualdade entre o
homem e a mulher, onde nem um e nem outro seja
discriminado na sociedade.
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10º Princípio do bem comum:
A visão do bem comum leva a sociedade e o indivíduo
em seus atos visar o bem de todos. O bem individual está
relacionado necessariamente com o bem comum.
O bem comum interessa à vida de todos. Não posso ser
feliz se meu irmão não está feliz.
As autoridades devem permear seus atos e decisões
levando em consideração sempre do bem comum e não
benefícios próprios.
A perfeição social é que todos de um grupo e cada um
de seus membros atinjam condições igualitárias e justas.
Três elementos são essenciais para que haja o bem
comum:
Primeiro: Respeito pela pessoa como tal. Que a pessoa
se realize e para isso em nome do bem comum os poderes
públicos são obrigados a respeitar os direitos fundamentais e
inalienáveis da pessoa humana.
Segundo: Bem social e o desenvolvimento do próprio
grupo. O desenvolvimento é o resumo de todos os deveres
sociais. Deve permitir que cada pessoa possua aquilo que
precisa para levar uma vida digna verdadeiramente humana:
alimento, vestuário, saúde, trabalho, educação, cultura,
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informação conveniente, direito de fundar um lar, moradia,
etc.
Terceiro: O bem comum envolve a paz. Todos precisam
de segurança, que deve ser legitimidada pelas autoridades
por meios justos.
É na comunidade política que encontramos a
realização mais completa do bem comum. Por isso é
importante que fique claro que quando votamos em alguém,
não é para que ele defenda os interesses de nosso segmento
e sim o direito de todos; Não escolhemos um governo para
defender os direitos de poucos, mas de todos; que promova
o bem comum. De forma preferencial aos que urgentemente
precisam de justiça.
Entre essas realidades temporais, não se pode deixar
de salientar com ênfase especial a atividade política. Esta
abarca um vasto campo, desde a ação de votar, passando
pelamilitância e liderança em algum partido político, até o
exercício de cargos públicos em diversos níveis.
Em todos os casos, o leigo deverá buscar e promover o
bem comum, na defesa da dignidade do homem e de seus
inalienáveis direitos, na proteção dos mais fracos e
necessitados, na construção da paz, da liberdade, da justiça;
na criação de estruturas mais justas e fraternas.
(Puebla 791 e 792)
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“O bem comum está sempre orientado ao progresso
das pessoas: A organização das coisas deve subordinar-se à
ordem das pessoas e não ao contrário. Esta ordem tem por
base a verdade, edifica-se na justiça, é vivificada pelo amor”
(CIC 1912 Gs 26)
Civilização do Amor!
Tem se falado muito sobre a parusia, a volta de Cristo.
O fim do mundo. Tem crescido me parece o desejo e as
angústias para que Jesus venha e cumpra com a promessa
de sua volta.
Mas a pergunta que não quer calar é: fizemos tudo o
que foi necessário para que o reino de Deus acontecesse a
partir de agora? Fomos agentes da paz e da justiça? Nossa fé
e nosso credo estiveram voltados para a caridade, a
solidariedade e a construção de uma sociedade renovada e
transformada em todos os sentidos: socialmente e
espiritualmente?
Porque penso que Deus há de cobrar de nós os cristãos
se plantamos amor concreto através da evangelização e da
promoção humana.
O mundo necessita de uma resposta que seja diferente
de tudo o que está sendo plantado como solução para os
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problemas sociais. Longe de a Igreja querer ter uma resposta
pronta a todos os desafios diante de uma sociedade desigual
e injusta. Mas uma resposta nós temos e que para nós deve
ser parâmetro de nossas decisões e ações: Jesus de Nazaré.
Jesus transforma o pão em corpo e nos ensina a amar
a eucaristia que é acima de tudo comunhão. Sem a
comunhão não podemos dizer que somos cristãos. A
Eucaristia é o chamado claro que todos nós devemos nos
transformar em pão que alimenta a fome de Deus e a fome
de justiça social do irmão que está marginalizado.
O mesmo Jesus que olhou para a prostituta e não a
condenou, pois viu naquela mulher a presença do Criador e a
dignidade de filha de Deus. Viu também que sua dignidade
humana havia sido usurpada pela sociedade hipócrita dos
que a marginalizaram. Por isso Jesus disse também “não
tornes a pecar”, pois a mulher precisava encontrar a
dignidade que lhe roubaram, e não pecando ela valorizava a
si mesmo como mulher e como pessoa humana.
Jesus que amou os enfermos, os demoníacos, os
marginalizados, as crianças, as pessoas. Jesus que optou
pela pobreza não através de um documento, mas pela opção
de ser como os pobres. Não falou tanto de justiça social, pois
Ele não falava e sim testemunha com a vida a opção radical
que fez pelos excluídos.
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Jesus nos dá o exemplo do bem comum, ao morrer
numa cruz para salvar todos os homens e mulheres.
Podemos ouvir os anjos nos interrogar:
“Homens da Galiléia, por que ficais aí a olhar para o
céu? Esse Jesus que acaba de vos ser arrebatado para o céu
voltará do mesmo modo que o vistes subir para o céu” At
1,11
Somos chamados a navegar por ventos contrários, mas
não com a covardia de quem não possui a graça e a proteção
de Deus. É preciso ter os olhos para o céu, mas os pés em
terra. Por que olhamos tanto para o alto e esperamos tanto
os sinais visíveis para começar a viver aqui e agora o reino
de Deus?
Dependem de nós as transformações sociais e
espirituais que o mundo precisa. Somos ferramentas na mão
do Criador. Entendemos que para Deus nada é impossível e
quando menos esperamos, vemos transformações
acontecerem na humanidade que nem imaginávamos que
poderia ser possível. Se o amor transforma e o mundo está
em deforma então é porque os agentes da esperança e do
amor deixaram de plantar e construir um mundo melhor para
viver.
Sempre se torna difícil encararmos a pobreza humana.
Olhar para o irmão pobre e o marginalizado é atestar que
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como cristão não fiz ainda o necessário para transformar a
sociedade. A cada irmão que sofre é o grito de Deus por um
cristão que venha socorrer.
Após a Ascensão para o céu, Ele lhes diz:
“Toda a autoridade sobre o céu e sobre a terra me foi
entregue” Mt 28,18
Veja Jesus tem autoridade tanto para o céu como para
terra. Precisamos tomar posse da autoridade de Jesus que
tem o poder de transformar e converter até mesmo a
sociedade e o mundo em um lugar ideal de viver.
“Os cristãos unidos em comunidades, fomentando sua
adesão a Cristo, procuram uma vida mais evangélica no seio
do povo, colaboram para questionar as raízes egoístas e de
consumismo da sociedade e explicitam a vocação para a
comunhão com Deus e com os irmãos, oferecendo um
valioso ponto de partida para a construção duma nova
sociedade, a Civilização do Amor”. (Puebla)
Somos chamados a ser operários de Cristo para
construir a Civilização do Amor. Após o pecado social de
Adão e Eva, Deus deixou o trabalho como tarefa para
sustento. Sejamos trabalhadores que querem e acreditam
que é possível construir uma sociedade mais justa e
solidária. Tendo bem claro para nós que a Civilização do
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Amor não é um fim e sim um meio de prepararmos a história
que tem seu término e fim na eternidade.
A Doutrina Social nos orienta com a força da Igreja o
caminho para construir esta civilização. Não traz receitas
prontas, mas direciona os passos para concretizar ou então
pelo lutar por dignidade, pela vida, pelo irmão que sofre.
Oremos e trabalhemos. Dois caminhos que acendem
para nós as trilhas da Civilização do Amor.
Nunca o mundo desejou tanto como agora pessoas de
alma terna, do espírito cristão da pobreza, da doçura e do
amor desprendido de tudo e de todos.
O mundo tem oferecido soluções materialistas e
consumistas.
“O racionalismo e a gnose são elementos de uma Nova
Era. Enquanto que a Civilização do Amor é o fruto da história
da Igreja, que é a história do reino de Deus em sua fase
peregrina.” (Patrick de Laubier – Livro As Três Cidades).
Papa Pio XI em 1925 instaurou a Festa do Cristo Rei
justamente para preparar o reino universal de Cristo nos
corações, nas inteligências e sobre os corpos. Ao concluir o
papa acrescenta: “Queira Deus... que os homens que vivem
fora da Igreja procurem e eceitem para sua salvação o jugo
suave de Cristo”.
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O Reino de Deus está próximo de todos nós e Cristo
quer Reinar! O ideal de viver o reino de Deus igualitário e
justo baseado numa visão vitalmente cristã foi proposto pelo
Papa João Paulo VI que encontrou o nome para este ideal de
“Civilização do Amor”, cujo desenvolvimento se dá na
doutrina social da Igreja reafirmada pelo Papa João Paulo II
que na Encíclica Centesimus annus, define a contribuição da
Igreja assim:
“A Igreja não tem modelos a propor. Os modelos reais
e eficazes poderão nascer apenas no quadro das diversas
situações históricas, graças ao esforço dos responsáveis que
enfrentam os problemas concretos em todos os seus
aspectos sociais, econômicos, políticos e culturais que se
entrelaçam mutuamente. A esse empenho, a Igreja oferece
como orientação ideal indispensável, a própria doutrina
social” (43)
A Civilização do Amor tem como matéria prima a
prática da justiça.
Justiça que não é a prática dos preceitos e leis a serem
cumpridos. Não é um mandamento novo a ser praticado. Não
é o próprio princípio do legalismo. Mas acima de tudo é ver o
modelo maior que é Deus, julgar se realmente estamos
praticando justiça e a partir daí agir de forma justa.
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Podemos definir três tipos de justiça baseado na visão
de Santo Tomás de Aquino:
Justiça comutativa: a qual define o direito de uma
pessoa em relação à outra, é a que regula as relações das
pessoas entre si.
Justiça distributiva: consiste em distribuir os bens aos
membros da comunidade conforme as necessidades de cada
um e não conforme o que eles têm para oferecer em troca.
Justiça geral (legal): que visa o bem comum,
permitindo a todos os membros da sociedade a atingir níveis
de vida compatíveis com a sua dignidade.
Do ponto de vista religioso definimos também como
justiça nossa relação com Deus através da santidade onde a
misericórdia Divina é a inspiração da verdadeira justiça.
Portanto o homem para se definir justo é aquele que
pratica a justiça no seu sentido amplo conforme descrito
acima.
Jesus ao ressuscitar desceu a mansão dos mortos para
libertar os justos. Mt 27,52-53.
A civilização do Amor está nas mãos dos cristãos e a
eles compete realizar não a utopia, mas a justiça.
O Reino de Deus que é o reino de justiça começa aqui e
agora. Para que Cristo volte é preciso primeiro ser justos.
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BIBLIOGRAFIA
. O Aspecto Social em Puebla – Ed. Loyola
. As Três Cidades – Patrick de Laubier - Ed. LTr
. Catecismo da Igreja Católica (CIC).
. Apostila 08 Doutrina Social – RCC
. Texto de Fé, Política e Ensino Social da Igreja – O Plano
Pastoral da Diocese de São Miguel Paulista.
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BIOGRAFIA
Gilberto é um dos fundadores da Comunidade Acolhimento
Bom Pastor.
Autor dos livros:
1 - Deus enviou um profeta! Você o acolheu?
2 – Lançai as redes!
3 – Gratia Plena.
Filho de pais católicos é um dos onze filhos que Miltom e
Regina tiveram.
Esposo de Regina e pai de Mariana e Juliana.
Participou de diversos segmentos na Igreja: Vicentino,
Legionário de Maria, Congregado Mariano, Comunidade de Jovens,
Pastorais e Catequista.
Em 1982 conheceu a Renovação Carismática Católica e
através da experiência do Pentecostes teve a certeza do amor de
Deus.
Aos 35 anos de vida juntamente com os irmãos: Branca,
Mauro, Carlos, Isabel, Celso, Rita e Regina fundaram a
Comunidade Bom Pastor – Associação Cristo, Rei do Universo.
A Comunidade tem como carisma o Acolhimento baseado na
tríplice dimensão: acolher é amar, é evangelizar, é formar.
A Comunidade Acolhimento Bom Pastor através de seu
carisma prega a Palavra de Deus onde é convidada e realiza um
trabalho social de promoção humana e cidadania através do
Projeto Madre Teresa de Calcutá.